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João Marecos

Resolução de casos práticos


(Disclaimer: tem por fonte apenas o Manuel do Prof. Figueiredo Dias; não contém história
nem divergências doutrinárias.)

PASSO 1 – identifica o tipo incriminador a que vais tentar imputar o resultado, i.e., vais
analisar a acção para decidires a imputação face a que crime.

1.Concurso efectivo ou concurso de crimes: constitui a situação em que o agente comete


efectivamente vários crimes e a sua responsabilidade contempla todas essas infracções
praticadas;
2. Concurso aparente ou legal ou de normas: uma vez que a conduta do agente só
formalmente preenche vários tipos de crimes, na concretização da sua responsabilidade a
aplicação de um dos crimes afasta a aplicação de outro ou outras de que o agente tenha
também preenchido os elementos típicos. 2.1 Especialidade – um dos tipos contém todos os
elementos do outro e mais alguns: aplica-se o especial; 2.2.Subsidariedade – 2.2.1, expressa,
quando a lei impõe a subsidiariedade e 2.2.2., implícita, quando se deduz da abrangência do
tipo essa relação (por ex., não se aplicará a pena relativa aos actos de preparação (art. 271º)
quando haja consumação desse acto – pune-se só pela consumação; ou, por ex. os crimes de
perigo são subsidiários relativamente aos crimes de dano) 2.3. Consumpção - quando o
conteúdo de um ilícito-típico inclui em regra o de outro facto, de tal modo que a condenação
pelo ilícito-típico mais grave exprime já o desvalor de todo o comportamento.

PASSO 2

Identificar a posição do agente em análise

Autor – todo aquele que executa, total ou parcialmente, a conduta que realiza o tipo de ilícito.
Dada a teoria do domínio do facto, pode-se precisar que é autor aquele que tem o domínio do
facto e pode decidir se ele ocorrerá ou não (não se aplica esta teoria nos crimes negligentes ou
de omissão). Art. 26.
Imediato – o que executa por suas próprias mãos.
Mediato - executa por intermédio de outrem; todos os pressupostos de punibilidade têm de
ocorrer face a este. Só o autor mediato tem domínio do facto. O instrumento (pessoa utilizada
pelo autor mediato) actua atipicamente, mais comummente por actuar sem dolo do tipo (por
não saber, por ex., que está a praticar um crime), ou por actuar sem culpa (não tem o domínio
da sua vontade).
Co-autoria – quando vários tomam parte directa na execução do facto. Por representar uma
decisão conjunta, é justificado responsabilizar pela totalidade do resultado o co-autor que só
participou em parte da acção. Cada co-autor é punido na moldura penal prevista para o facto
decidido e executado conjuntamente, tal como se o tivesse cometido sozinho.
Instigador – 26/1, 4ª alternativa, o que dolosamente determina outro à prática do facto.
Fronteira ténue com o cúmplice que induz à pratica do facto. O instigador cria no executor a
decisão de atentar contra um certo bem jurídico-penal através da comissão de um concreto
ilícito típico: tem o domínio da decisão. Tanto é autor o instigador como o executor.
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Se o executor excede a medida da instigação, o instigador só responde pelo tipo que


pretendeu instigar. Inversamente, se o executor ficar aquém do que o instigador pretendeu,
este só responde pelo facto efectivamente praticado.

(Nestes casos de comparticipação, como aplicar o regime da tentativa: a cada um


individualmente ou a todos globalmente?
Na autoria mediata, solução global. Na co-autoria, solução individual. Na instigação, solução
global.)

Cúmplice – art. 27º. É acessória, supõe a existência de um facto principal doloso. A


cumplicidade só é possível até à consumação, não existe cumplicidade post factum. Só existe
relativamente a factos dolosos. Auxilio material ou moral (favorecimento ou reforço da
decisão do autor de praticar o crime).
A pena do cúmplice é determinada em função da pena aplicada ao autor do facto,
especialmente atenuada através da recorrência aos arts. 72º e 73º.
Há punição da cumplicidade na tentativa, ainda que duplamente atenuada. Já a tentativa de
cumplicidade não é punida.
São comunicáveis todas as qualidades ou relações especiais do agente (por ex., é funcionário
ou médico) que sirvam para fundamentar ou para graduar a ilicitude (28º); já não relações
que sirvam para graduar a culpa (como relações de ascendência).

PASSO 3

Acção ou Omissão?

Se Omissão:
Crimes de omissão 1. Próprios (quando a omissão faz parte do tipo, v.g. art. 200) ou 2.
Impróprios (todo e qualquer tipo descrito como acção que, compreendendo certo resultado,
possa ser equiparado à omissão da acção que impediria aquele resultado – estabelecida por
força da cláusula de equiparação do art. 10).
1 - A situação típica do delito de omissão é constituída especificamente pelos pressupostos
fácticos que determinam o conteúdo concreto do dever de actuar. A omissão é relevante
apenas em função da acção devida e quando potencie ou crie um risco de verificação de um
resultado típico.
2 – Para que exista omissão típica, a acção esperada ou devida deve ser facticamente possível.
3 – (v. imputação objectiva infra) A imputação objectiva da omissão, para Figueiredo Dias: se se
verificar que a omissão resultaria numa diminuição do risco, deve haver imputação objectiva;
em caso de dúvida, esta deve ser negada; caso se comprove que da acção omitida não
resultaria tal diminuição, aplica-se a tese do comportamento lícito alternativo.
4 – Posição de garante (só releva para os crimes de omissão impróprios) permite-nos saber
sobre quem recaem deveres jurídicos de actuar. Teoria material-formal (adoptada pelo Prof.
Figueiredo Dias), que conjuga a teoria formal (lei, contrato, ingerência) e das funções (ou
material, função de guarda de um bem jurídico concreto e função de vigilância de uma fonte
de perigo).
5 – Dolo do tipo: momento volitivo - o autor omite a acção imposta, apesar de contar
seriamente com a possibilidade de realização típica, com a qual se conforma; momento
intelectual – representação dos pressupostos que constituem a posição de garante (daí
aplicar-se 16/1 quando haja erro sobre a posição de garante).
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(Pode haver tentativa de omissão: a partir do momento em que a omissão da acção devida
aumenta o risco do bem. E desistência: quando a autor acaba por diminuir o perigo, na
tentativa inacabada; na tentativa acabada, só se tentar proceder a salvamento.
Quanto à autoria/ co-autoria: o(s) que não agiu(agiram), devendo agir. Não é possível a
instigação ou a autoria mediata. Quanto à cumplicidade: cumplicidade por acção num crime
de omissão: sim. Cumplicidade por omissão é que dificilmente.)

Se Acção:
É típica? Se SIM, segue para o passo seguinte. Se não, não te chateies mais com isso.
Actos preparatórios: art 21º, não são puníveis salvo disposição em contrário (v.g. 271 e 275).

Tentativa: quando a realização do tipo de ilícito objectivo que se previu e intentou não atingiu
perfeitamente o objectivo. Tem por elementos 1. A decisão de cometer o facto (não há
tentativas negligentes e, para Faria Costa, nem com dolo eventual – falta intenção); 2. Os actos
de execução (expressão externa da decisão – 22/2 a), plasma a teoria objectiva, todos os factos
típicos são actos de execução; 22/2 b) equipara a típicos os actos idóneos à realizaçao do
resultado típico; 22/2 c) são de execução os actos que antecedem imediatamente os actos da
al. a) e b). Os actos de execução devem ter ainda uma conexão de perigo (e temporal) e uma
conexão típica; 3. A não consumação.
Punibilidade, com as limitações do 23/3.
Tentativa impossível pune-se se, num juízo ex ante, ela não era manifestamente impossível ou
era aparentemente possível.

Desistência voluntária da tentativa – 24/1º, exige que o agente deixe de prosseguir a execução
do crime antes de estarem cumpridos todos os passos ou, já os tendo cumprido, actue no
sentido de evitar o resultado: se assim for, não se pune a tentativa. A desistência tem de ser
voluntária.

PASSO 4

Pode haver imputação objectiva do resultado à acção?

Imputa-se o resultado à acção através de uma série de critérios, que se devem preencher
cumulativamente:
1º - Conditio Sine Qua Non, toda a condição sem a qual o resultado não teria lugar. É
exigência mínima e limite máximo da imputação.

2º - Teoria da Causa Adequada, que permite escolher ou afastar, de entre as diferentes


conditios, aquelas que, segundo um juízo de prognose póstumo (o juiz deve deslocar-se
mentalmente para o passado e observar objectivamente, dadas as regras da experiência e
normalidade, se a acção praticada teria aquele resultado), são ou não são adequadas a
produzir o resultado. Devem ser tidos em conta os especiais conhecimentos do agente, bem
como a actuação de terceiros, salvo se ela aparecer como provável ou previsível.
Uma vez que existem “causas adequadas” lícitas, é necessário um terceiro critério.

3º - Conexão de Risco, que nos diz que o resultado só deve ser imputado à conduta quando
esta tenha criado ou aumentado um risco proibido que se vem a concretizar. Assim, não se
imputa um resultado a uma acção ilícita se se comprovar que a acção lícita correspondente
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provocaria o mesmo resultado – teoria do comportamento lícito alternativo, entroncada no


princípio da igualdade.
Para se verificar conexão do risco é ainda necessário que esse risco esteja abrangido pelo
escopo protector da norma violada.

Questão da causalidade virtual: quando, se o agente não tivesse actuado, a acção se


produziria em tempo e sob condições tipicamente semelhantes, fruto da acção de terceiros ou
de facto natural. Figueiredo Dias diz que não faz sentido abandonar protecção do bem só
porque já não pode ser salvo.

PASSO 5

Há imputação subjectiva?

1ª nota: artigo 13º do CP, só se punem crimes praticados com dolo ou, NOS CASOS
ESPECIALMENTE PREVISTOS, com negligência. Quer isto dizer que se verificarem que
determinado crime foi cometido com negligência e a lei não tipificar essa possibilidade, não
há tipo para preencher, logo não há imputação nenhuma.
O dolo compõe-se de dois elementos:
1. Elemento intelectual, o agente tem de ter consciência que preenche um tipo de ilícito
objectivo; essa consciência deve ser actual face ao momento da acção, entendendo-se que o é
mesmo quando existe apenas uma co-consciência imanente à acção (aquelas situações em que
a possibilidade de preenchimento do tipo passou necessariamente pela cabeça do agente).
Erro sobre a factualidade típica: Quando falta ao agente o conhecimento referido supra, o dolo
do tipo não se pode afirmar: 16/1, 1ª parte CP. Erro aqui vale tanto como representação
errada e como falta de representação. Este mecanismo vale também para as circunstâncias
que agravam o ilícito, bem como para a aceitação errónea de circunstâncias que o atenuam
(por exemplo, erro quanto à existência de uma causa de justificação).
Erro sobre o processo causal: divergência entre o risco criado pelo agente e aquele do qual
deriva o resultado (ex: A empurra B da ponte para ele se afogar no rio, B não morre, nada até
à margem e morre porque escorrega ao sair do rio). Figueiredo Dias diz que A, se se
conseguir passar o crivo da imputação objectiva, só pode ser punido por tentativa.
Dolus Generalis: Quando o agente erra sobre qual dos diversos actos produz o resultado (A
bate em B e pensando erroneamente que o matou atira-o para a água, afogando-o). Aqui o
problema é: quando há dolo do facto, há mera tentativa (porque B não morre), quando há
consumação, já não existe dolo do facto, porque o autor já não tem consciência de que está a
matar. Teoria dominante (Dr. Rui Pereira; Jescheck/Weigend): há crime consumado.
Figueiredo Dias: verificando a conexão de risco, dir-se-á consumado (se o risco consumado se
reconduz à primeira acção) ou tentado (em caso negativo).
Aberratio ictus vel impetus: erro na execução, atinge-se objecto diferente do pretendido;
quanto ao alvo, há tentativa; quanto ao outro resultado, crime negligente (assim reza a teoria
da concretização).
Error in persona vel objectus: erro quanto à identidade da vítima, quando não seja também
um erro sobre as qualidades tipicamente relevantes (A dá tiro em B pensando ser C), não
releva para efeitos de imputação, já que o tipo proíbe todas as lesões compreendidas no tipo e
não uma determinada lesão.
Erro sobre a proibição legal: 16/1, exclui o dolo do tipo, quando ao crime não corresponda
uma valoração axiológica de conhecimento indispensável (v.g., conduzir com 1,2 gr/l álcool
no sangue é crime: é indispensável à afirmação do dolo do tipo o conhecimento deste valor).
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2. Elemento volitivo, i.e., vontade dirigida à realização do resultado.


Dolo directo: a realização do tipo objectivo de ilícito é o verdadeiro fim da conduta (14/1º);
Dolo necessário: a realização do tipo objectivo de ilícito não surge como fim, mas como
consequência inevitável, ainda que lateral (14/2º);
Dolo eventual: a realização do tipo objectivo de ilícito surge apenas como consequência
possível da conduta (14/3º). Problema de distinção com negligência consciente. Roxin, apud
Figueiredo Dias, “Quando a verificação de um resultado como possível é completamente
indiferente, então tanto está bem a sua verificação como a sua não verificação”: neste caso, há
dolo. Solução frágil e imperfeita. Apoio nas teorias da probabilidade, aceitação e
conformação.
Faria Costa considera que não existe sequer tentativa com dolo eventual.
O dolo do tipo e a realização do tipo devem ser simultâneas (i.e., se A quer matar B e quando
vai tirar a pistola esta se dispara acidentalmente e mata B, então não há dolo de homicídio).

PASSO 6

Existe causa de exclusão de ilicitude?

Questão prévia: os efeitos justificativos de uma determinada situação dependem da


intencionalidade do agente nesse sentido? (v.g.: A mata B para herdar bens, no momento em
que B ia matar A por não gostar dele: é legítima defesa?). Uma doutrina que defenda a pura
objectividade dos tipos justificadores só excluem o desvalor do resultado, enquanto o
subjectivismo nos leva para o desvalor da acção. Figueiredo Dias: conhecimento pelo agente
dos elementos do tipo justificador é exigência mínima indispensável à exclusão da ilicitude.
Quando não haja esse conhecimento, mas se cumpram todos os pressupostos objectivos do
tipo justificador, não há desvalor do resultado (logo não é justo punir como “crime
consumado”). Assim, o Prof. considera que esta é uma situação análoga à da tentativa (que se
distingue por ter desvalor da acção sem desvalor do resultado) e, por essa via (que é
permitida, pois alarga os limites da justificação), a aplicação do seu regime. O CP prevê esta
solução expressamente para o consentimento, no 38/4: alarga-se a todas as outras causas
justificativas. Resumindo: no caso acima, A seria punido por ter tentado matar B mas, dado
que não existe desvalor no resultado (uma vez que B ia matar A, preenchendo-se o tipo de
legitima defesa), mas beneficiando do regime da tentativa (23 CP).

Outra questão: e quando o agente supõe erroneamente que está abrangido por uma causa de
justificação? Estão cumpridos os elementos subjectivos, mas não os objectivos (A mata B
porque B, numa brincadeira que A desconhecia, o ameaça com uma pistola). Há uma
suposição, errada, de que existe uma causa de justificação. A lei responde: 16/2 – exclui o
dolo, queda a negligência.

Roxin, acompanhado pelo Prof., sustenta a aplicação da teoria do comportamento lícito


alternativo às causas de justificação (A dá um tiro em B, ladrão, no que conforma excesso de
legítima defesa. Se, ex post, se confirmar que sempre seria necessário atirar, então não se
pune).

Legítima defesa: 1. Agressão a um bem juridicamente protegido do agente ou de terceiro; 2.


Actual; 3. Ilícita; 4. Acção de defesa 4.1.usando como meio necessário o menos gravoso de
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entre os idóneos a repelir a agressão, 4.2. como necessidade de defesa, 4.3 não se exige animus
defendendi.

Estados de Necessidade Justificantes: 1. Direito de necessidade (34º CP) (causa de


justificação, quando o facto típico se destina a afastar um perigo sobre um interesse de valor
sensivelmente superior) (vs. 2. Estado de necessidade desculpante (35º CP), quando o
interesse a salvaguardar não é superior mas, pelo cumprimento dos pressupostos, a culpa
pode ser excluída – v. causas de exclusão de culpa).
Salvaguarda (quaisquer) interesses juridicamente protegidos, que estão objectivamente em
perigo actual (com uma perspectiva alargada: é licita a acção não actual quando o seu
adiamento potenciaria o perigo), não provocado pelo agente (com este limite: só se o
provocou com a intenção de, por essa via, lesar os bens de terceiro – 34/a); ainda existe
direito de necessidade se, apesar de provocado pelo agente, este agiu depois para proteger
terceiro).
34/ b) – princípio do interesse preponderante. A preponderância entre os bens não pode ser
apreciada objectivamente: estamos no campo do merecimento pessoal. Ter em conta a
intensidade da lesão dos bens, o grau do perigo, a autonomia pessoal do lesado; (34 c) CP,
para aquelas situações que, apesar de perderem no confronto valorativo, ofenderiam a
dignidade da pessoa humana se não fossem tuteladas – A precisa de um rim de B senão
morre, então o médico C tira-lho contra a sua vontade: há um valor superior a ser protegido –
a vida de A -, mas cuja protecção ofende a dignidade de B – não há direito de necessidade,
pune-se C).
Fernanda Palma: há que seleccionar factores de ponderação para aferir a “sensível
superioridade”.
Elementos subjectivos: o agente tem de conhecer a situação de conflito e actuar com
consciência de salvaguardar o interesse preponderante. Não se deve exigir uma vontade de
defender o interesse, uma vez que não faz sentido negar a justificação a quem salva outrem
de um perigo só por, por ex., o agente só pretender aparecer na TV.

A vida humana como elemento de ponderação? Não. A vida é imponderável para efeitos de
exclusão de ilicitude. Quanto muito, falar-se-á de exclusão de culpa. Mas com certos limites:
hipóteses excepcionais em que a preservação de vidas prepondera sobre o sacrifício de
outras.

36º: conflito de deveres. Confrontado com dois deveres de agir que se conflituam, deve o
agente escolher o que seja pelo menos igual ao que sacrifica.

Consentimentos Justificantes: Discute-se se não será causa de exclusão da tipicidade (nesse


sentido, Roxin, Taipa de Carvalho), com o argumento de que, se há consentimento, não há
violação do bem jurídico. Figueiredo Dias discorda: existem situações em que há um
autêntico conflito entre “sistema pessoal” e “sistema social”; quando a lei dá prevalência ao
sistema pessoal, o consentimento vale como causa justificativa.
Objecto do consentimento: 1. Tese dominante, que nos diz que, nos crimes de resultado, tem
de abranger tanto a acção como o resultado típicos (Costa Andrade, Figueiredo Dias); 2. Tese
minoritária, só precisa de abranger a acção (Hirsch).
Pressupostos de eficácia: 1. Carácter pessoal e disponibilidade do bem jurídico lesado; 2. Não
contrariedade aos bons costumes (38/1, in fine) (sobretudo por gravidade ou irreversibilidade
do dano num bem, apesar da sua disponibilidade); 3. Autodeterminação (38/3, vontade livre,
esclarecida e séria, 38/2), (em caso de erro provocado sobre a situação de consentimento, o
Prof. entende que o consentimento é ineficaz quando o engano se refira ao bem jurídico ou,
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não se referindo, versa sobre uma finalidade altruística), (quanto ao erro espontâneo do
declarante, não prejudica a eficácia do consentimento, se o autor, desconhecendo o erro, agir
com base nesse consentimento); 4. O conhecimento do consentimento (se ele existir mas não
for conhecido pelo agente, há punição – analogicamente - por tentativa: desvalor da acção
sem desvalor do resultado).
Consentimento hipotético: aplicação da teoria do comportamento lícito alternativo ao
consentimento: se se comprovar, ex post, que seria dado o consentimento, não há que punir o
agente.
Consentimento presumido: 39/2 CP, que equipara a um consentimento real e eficaz de um
facto que o lesado teria presumivelmente consentido se tivesse conhecido.
Requisitos: Recair sobre bens jurídicos disponíveis, não ofender os bons costumes, ser a
decisão necessária naquele momento, conformar-se com a vontade “normal e razoável” de
uma pessoa (tendo em conta qualquer conhecimento prévio do agente).

Passo 7

Causas de exclusão da culpa

Todos os passos foram dados até aqui: imputou-se objectiva e subjectivamente o resultado ao
agente; o facto era ilícito e não existia causa de exclusão de ilicitude. Resta saber se, ainda
assim, se pune o agente, atendendo ao tipo de culpa.

Dolo e falta de consciência do ilícito – A consciência do ilícito (do seu desvalor axiológico) é
um elemento essencial do juízo de culpa, devendo esta ser negada sempre que, sendo
exigível, essa consciência não exista – art. 17º. Negada a culpa, não há lugar a imputação. Se
subsistir a culpa, pune-se quanto ao tipo doloso, ainda que com pena especialmente
atenuada.

Inimputabilidade – 1. Em razão da idade (art.19º), menores de 16 anos; 2. Em razão de


anomalia psíquica (art. 20º), cujos elementos são 2.1 a anomalia psíquica, 2.2. que origina uma
incapacidade para avaliar a ilicitude ou de se determinar de acordo com essa avaliação, 2.3. e
que se revela no momento da prática do facto.
Questão da acção livre na causa: Figueiredo Dias diz que em casos de dolo directo ou
necessário (o autor coloca-se em situação de anomalia psíquica para cometer o crime)
funciona o 20/4 e pune-se; quando ao dolo eventual ou negligência (o agente não se colocou
em estado de anomalia para praticar o crime, mas acabou por praticá-lo), não se pune o facto
praticado mas aplica-se o 295º, punindo o facto, anterior, de auto-colocação em estado de
anomalia.
Estado de necessidade desculpante – manifestação do princípio da inexigibilidade. Situações
onde não é exigível ao agente que aja de outro modo. Olhar antes para o direito de
necessidade (art. 34º), que se aplica em primeiro lugar e, a proceder, exclui a ilicitude, pelo
que não nos interessa continuar a analisar a culpa do agente ou de cúmplices/ instigadores.
Se não for aplicável, passa-se então para uma análise da culpa de cada um dos envolvidos,
via 35º: e aí poderemos ver que a culpa é excluída face a um dos autores e não face aos outros,
i.e., cabe analisar a culpa do ponto de vista de cada um dos intervenientes.
Excesso de legitima defesa desculpante – art. 33/2. Raciocínio idêntico, mutatis mutandis.

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