Você está na página 1de 376

ANAIS

ISBN: 978-85-60667-72-7
978 7

01 a 03 de agosto de 2011
Universidade Federal da Bahia
Salvador - Bahia
Anais do
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
V Encontro Internacional de Educação Musical

ISBN: 978-85-60667-72-7
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Reitora

Profª. Dora Leal Rosa

Vice-Reitor

Prof. Luiz Rogério Bastos Leal

Pró-Reitor de Ensino de Pós-Graduação

Prof. Robert Evan Verhine

Diretor da Escola de Música

Prof. Heinz Karl Schwebel

Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Música

Profª. Ana Cristina Gama dos Santos Tourinho


Diana Santiago, Angelita Broock e Tiago Carvalho

Editores

Anais do
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
V Encontro Internacional de Educação Musical

ISBN: 978-85-60667-72-7

Universidade Federal da Bahia


Escola de Música da UFBA
Programa de Pós-Graduação em Música

Salvador, 01 a 03 de agosto de 2011


Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil(2.: 2011:
Salvador, BA)

S471AnaisdoSeminário Brasileiro de Educação Musical Infantil,VEncontro


Internacional de Educação Musical,01 a 03 de agosto de
2011,[recurso eletrônico] / Coordenação Diana Santiago;
Angelita Maria Vander Broock Schultz. –Salvador, BA :
Universidade Federal da Bahia, 2011.
1 CD-ROM : il.color ; 4 ³/4 pol.

Inclui Bibliografias.
Evento realizado pela Universidade Federal da Bahia, Escola
de Música da UFBA e Programa de Pós-Graduação em Música.

1. Música. 2. Música instrução e estudo – Infanto-juvenil. 3.


Professores formação. I. Santiago, Diana Título. II. Broock Schultz,
Angelita Maria Vander. III. Título. IV. Título: Encontro
Internacional de Educação Musical (5. : 2011 : Salvador, BA). III. .
Santiago, Diana. IV.

CDD: 780.77
Coordenação Geral:
Profa. Dra. Diana Santiago

Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock Schultz

Comitê Científico

Profa. Dra. Diana Santiago Profa. Dra. Ana Cristina Gama Santos
Tourinho
Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock
Schultz Profa. Dra. Zuraida Abud Bastião

Profa. Dra. Alda de Jesus Oliveira Profa. Dra. Mara Pinheiro Menezes

Profa. Dra. Beatriz Senoi Ilari Profa. Dra. Leila Dias

Profa. Dra. Taís Helena Palhares Foloni Prof. Ms. Tiago Quadros Maia Carvalho

Comissão Organizadora:

Profa. Dra. Diana Santiago Profa. Dra. Mara Pinheiro Menezes

Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock Profa. Dra. Ana Cristina Gama Santos
Schultz Tourinho

Profa. Dra. Alda de Jesus Oliveira Prof. Ms. Tiago Quadros Maia Carvalho

Profa. Dra. Beatriz Senoi Ilari Profa. Kamile Santos Levek

Prof. Dr. Ricardo José Dourado Freire Profa. Larissa Padula Ribeiro da Fonseca

Profa. Dra. Zuraida Abud Bastião

Monitores

Ana Luiza Tomich Letícia Bartholo

Ana Luisa Barral Luan Sodré de Souza

Gabriel Macedo Roseane Ramos Mota


APRESENTAÇÃO

A Escola de Música e o Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal da


Bahia têm a honra de realizar o II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil /
V Encontro Internacional de Educação Musical, entre os dias 01 e 03 de agosto de 2011.
A motivação inicial em realizar este evento foi a comemoração aos 5 anos do Projeto
Musicalização Infantil da UFBA, pretendendo, através de uma comemoração
acadêmica, promover um intercâmbio de informações entre professores, pesquisadores e
estudantes que se dedicam à área já há alguns anos, além de contribuir para a formação
de professores de educação musical qualificados a atenderem à faixa etária em foco,
necessidade premente no momento em que a legislação torna obrigatória a educação
musical no contexto escolar.
Através de mesas redondas, palestras, workshops, comunicações de trabalhos,
pôsteres e aulas práticas com as crianças, pretendemos nos reunir em três dias intensos,
compreendendo, debatendo, aprendendo, cantando, tocando e, principalmente, vivendo
e trocando grandes experiências com nossos colegas de área. Dentre eles, cumpre
ressaltar a presença de mestres com grande experiência no ensino da música para
crianças, que aceitaram nosso convite para compartilharem suas experiências.
Agradecemos em especial a Alda Oliveira, Beth Bolton, Ilza Joly, Leda Maffioletti, Liu
Man Ying, Luis Bourscheidt, Maria Betânia Parizzi, Ricardo Dourado Freire, Teresa
Mateiro, Ana Favaretto e Márcio Coelho.
A realização deste encontro só foi possível graças ao envolvimento de todos os
membros da comissão organizadora e comitê científico, além do professores do Projeto
Musicalização Infantil da UFBA. Agradecemos especialmente à Professora Beatriz
Ilari, que mesmo estando longe, contribuiu para o evento de forma significativa . Faz-se
necessário também agradecer os nossos apoiadores: CAPES, SONARE, Projeto
“Música para crianças” da Universidade de Brasília, Alecrim Dourado Formação
Musical, Editora Saraiva e Escola Dorilândia, além do Programa de Pós-Graduação em
Música e da Escola de Música da UFBA.
Desejamos boas vindas a todos os participantes e fazemos votos que este
encontro possa gerar bons frutos para a área de Educação Musical Infantil, fortalecendo
a área de Educação Musical no Brasil.
Salvador, 26 de julho de 2011.
Diana Santiago e Angelita Broock - Coordenadoras gerais do evento

6
Abertura, Conferência e Mesas
Redondas

7
Abertura

Musicalização Infantil da UFBA: 5 anos

Angelita Broock
PPGMUS/UFBA
angelbroock@gmail.com

Este é um ano de comemoração para o projeto de Extensão Universitária Musicalização


Infantil da Escola de Música da UFBA, pois, embora as aulas para o público infantil
venham sendo ministradas nesta escola desde a década de 60 para crianças a partir de 4
anos, em 2006 iniciou-se um curso voltado aos bebês da comunidade soteropolitana.
Atualmente o projeto contempla aproximadamente 170 crianças de 0 a 6 anos, divididas
por idade em 17 turmas, sendo uma delas o Conjunto Instrumental para crianças de 6 a
10 anos. A equipe de professores, coordenado pela doutoranda Angelita Broock, conta
com alunos do curso de graduação e pós-graduação da Escola de Música da UFBA e
está sempre de portas abertas para receber novos integrantes. Com o intuito de trocar
experiências, todas as aulas são dadas em pares, sendo um professor com mais
experiência que o outro. Ao longo dos 5 anos muitas pessoas já passaram pelo projeto.
Inicialmente foi coordenado pela Profa. Dra. Leila Dias, e durante um ano pela
professora Marineide Costa. Desde o início o projeto teve uma boa aceitação entre os
pais e as crianças de Salvador. Por esta razão, tendo em vista o aperfeiçoamento dos
professores do projeto e visando a qualidade das aulas, sempre antes do início de cada
semestre organizamos uma vivência musical, onde convidamos algumas pessoas da área
para um encontro. O final deste encontro sempre é movido pelo planejamento do
semestre. Desde 2008 optamos por escolher um tema em comum para todas as turmas
durante o semestre. Sendo assim, além do planejamento de conteúdos musicais,
buscamos um repertório musical em comum para todas as turmas. Durante o período de
aulas, realizamos reuniões semanais, com o intuito de compartilhar o que vem sendo
feito em sala de aula, considerando os sucessos e as dificuldades encontradas durante o
percurso, tanto em relação ao grupo quanto em relação às crianças individualmente.
Aproveitamos estes encontros também para discutir aspectos da organização do projeto
e solucionar eventuais problemas. Ou seja, os professores e estagiários tem um
acompanhamento contínuo durante o trabalho. Acreditamos que a Extensão

8
Universitária pode ser uma prática muito eficiente para a formação do licenciando em
Música, sendo o espaço propício para pesquisa, experimentações e trocas de
experiências, ou seja, um laboratório escola. A prática docente na extensão
universitária, somada à prática docente na escola regular, pode complementar a
formação do licenciando, que, por sua vez, poderá compartilhar e discutir com o colega
de turma e com o grupo suas certezas e incertezas pedagógicas, que normalmente
refletirão diretamente na sua prática na escola regular.

9
Conferência de Abertura

Touch the Future: Make Music with Babies

Beth Bolton

Music provides an ideal medium for the most important aspects of work with children:
listening, and observing, interacting and communicating. Children younger than age 2
years are pre-verbal and are learning about their world through the senses. Sound, sight,
movement, posture, tone, inflection serve as interactive tools as a child learns music as a
first language.

A música é um meio ideal para os aspectos mais importantes do trabalho com crianças:
escuta, observação, interação e comunicação. As crianças com menos de 2 anos são pré-
verbais e estão aprendendo sobre seu mundo através de seus sentidos. Som, visão,
movimento, postura, timbre e inflexão servem como ferramentas interativas enquanto a
criança aprende música como uma primeira língua.

Mesa redonda 1

Educação Musical Infantil: o professor

O Professor de Música e as Articulações Pedagógicas

Alda Oliveira
UFBA
alda@sonare.com.br

Nesta participação sobre o professor para a musicalização infantil, ressalto o que


considero saberes relevantes como articuladores do desenvolvimento musical e geral, da
afetividade, do gosto e alegria pelo fazer musical e artístico, do relacionamento humano
e da criatividade. Na sua formação humana, o professor precisa antes de tudo, ser. Na
sua formação técnica, precisa saber, ser, sentir, ver, saber dar e receber. Precisa
conhecer aquilo que vai ajudar a desenvolver o aprendente naquela área de
conhecimento. Saber observar o outro e o contexto, sentir a tudo e todos que o rodeiam.
Saber respeitar as músicas de todas as culturas, envolver-se com naturalidade com as

10
pessoas, com as familias, com as comunidades e com as obras artísticas. Saber confiar
na intuição criadora para desenvolvê-la, saber demonstrar o afeto e o respeito para a
construção de seres humanos mais íntegros, cidadãos e desenvolvidos em todos os
sentidos.

A Música e as Experiências de Compreensão do Outro

Leda Maffioletti
FACED/ UFRGS
leda.maffioletti@gmail.com

Neste trabalho discuto alguns fundamentos sobre a capacidade intersubjetiva dos bebês,
o caráter precoce de suas habilidades musicais e o papel que elas desempenham no seu
desenvolvimento sócio-afetivo. Procuro mostrar que as relações interpessoais mediadas
pela música promovem o desenvolvimento sócio-afetivo, com possibilidades de
constituírem-se como modelo intersubjetivo de comunicação, capaz de ajudar a criança
a estruturar suas relações com o mundo. Por outro lado, acredito que o conhecimento
sobre as capacidades dos bebês pode ser uma forma de o adulto perceber-se como
pessoa expressiva e capaz de conectar-se com o outro através da música. Com base nos
argumentos apresentados convido os ouvintes a se comprometerem um pouco mais com
a difusão do conhecimento científico, a fim de transformar o conhecimento que detemos
sobre música em atos responsáveis em favor do acesso de todas as crianças à Educação
Musical.

Professor de Educação Musical Infantil: o generalista e o especialista


Teresa Mateiro
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil
Universidade de Örebro, Suécia
teresa.mateiro@udesc.br

A formação profissional para a educação infantil é um tema que abre


possibilidades de discussões múltiplas, desde a própria história do professor como
profissional docente, reconhecido e valorizado até as necessidades formativas em

11
educação musical para a formação inicial de professores generalistas1 e de professores
especialistas em música. É a partir da lei 9394/96 que a formação de profissionais de
educação infantil começa a ser realmente discutida. O debate maior encontra-se junto
aos cursos de pedagogia. Primeiro, por ser uma formação até há pouco oferecida pelos
antigos Cursos Normais, em nível médio, que habilitava o profissional para atuar no
ensino primário (7 a 10 anos), jardins de infância (3 a 6 anos), escolas maternais (2 a 3
anos), classes pré-escolares (6 anos) e creches (0 a 6 anos ou até 10 ou mais). E
segundo, pela possível falta de identidade dos cursos de pedagogia, questão discutida
desde a década de 60, e reconstruída com a LBD de 1996 que assegura a formação
docente paralelamente às outras funções do campo pedagógico (Kishimoto, 1999).
A formação musical dos estudantes dos cursos de pedagogia tem sido discutida
principalmente por Bellochio (2004, 2008a, 2008b) e Figueiredo (2004, 2007).
Bellochio (2008a) argumenta que nos primeiros anos de escolarização as crianças
aprendem de “modo conjunto e não em compartimentos nos quais cada área apresenta
proposta independente” (p.2) e, por isso, propõe uma formação pedagógico musical
mais qualificada para o professor generalista de educação infantil. Figueiredo (2004)
acredita que os professores generalistas podem contribuir significativamente com a
educação musical, uma vez que os professores especialistas em música raramente atuam
nas primeiras séries do ensino fundamental. Ambos ressaltam que não se trata de
substituir o professor licenciado em música.
Acerca dos cursos de Música-Licenciatura, ao realizar uma pesquisa durante o
ano de 2008, não identifiquei um programa que priorizasse a formação docente para a
educação infantil (Mateiro, 2009, 2011). Entretanto, não posso deixar de mencionar
trabalhos de extensão relacionados ao ensino e à pesquisa realizados na área de
educação infantil, como por exemplo, o Projeto de Musicalização Infantil iniciado por
Beatriz Ilari em 2005 na Universidade Federal do Paraná, que motivou estudantes de
licenciatura em música a se identificarem como professores da infância (Ilari, 2010).
Naquela ocasião afirmei que no Brasil temos um único modelo de profissional
apesar dos projetos políticos pedagógicos expressarem intenções de formar profissionais
com diferentes perfis. Penso que os professores que irão trabalhar na educação infantil
não poderão receber exatamente a mesma formação daqueles que serão regentes de
corais adultos. Por isso, tenho proposto que os programas curriculares de formação

1 Outros termos são também utilizados na denominação desse profissional: unidocente, professor de
classe, regente de classe, não especialista, entre outros.

12
docente em música sejam elaborados vislumbrando diferentes perfis para os futuros
professores de música (Mateiro, 2009, 2011).
Os estudos sobre a formação de professores e os estudos acerca da organização
de currículos tem utilizado o conhecimento pedagógico do conteúdo como uma
ferramenta de pesquisa, criando possibilidades para compreender o conhecimento do
professor sobre a forma de pensar o ensino. O professor é visto, portanto, como alguém
que elabora conhecimentos e não apenas como alguém que transmite conteúdos
aprendidos a priori. Este é um tema que tem me interessado.
Pesquisas especificamente na área de educação musical sobre o conhecimento
profissional de professores de música no ensino fundamental e médio e professores de
instrumento (Ballantyne e Packer 2004; Ballantyne 2006; Jorquera Jaramillo 2008),
assim como com estudantes em formação docente (Campbell e Burdell 1996; Mateiro,
2003), têm sido levados a cabo em diversas partes do mundo. Esses estudos analisam o
conhecimento necessário ao ensino de música nas escolas relacionando-o, por vezes, ao
programa de formação docente. As pesquisas mostram que a dicotomização entre os
conhecimentos musicais e pedagógicos parece ser um aspecto comum apontado tanto
por professores de música recém-formados quanto por estudantes em formação, ou seja,
aspectos relacionados ao conhecimento pedagógico do conteúdo é uma área que
necessita maior atenção. O conhecimento pedagógico do conteúdo contempla a
combinação entre o conteúdo da matéria e a prática pedagógica, ou seja, a forma como
o professor ensina.
Saber sobre o que se ensina e saber como ensinar é, sem dúvida, fundamental na
formação de qualquer professor. Tanto as disciplinas de pedagogia da música quanto o
período de práticas dos estudantes durante o período de formação docente deveria
desenvolver habilidades e competências para que os futuros professores sejam capazes
de articular efetivamente o conhecimento do conteúdo (o que) e o conhecimento
pedagógico de conteúdo (como). Esse processo educativo do estudante em formação
implica o domínio de conhecimentos técnicos musicais, o conhecimento de diversos
métodos e abordagens de educação musical, a reflexão sobre a prática pedagógica de
profissionais da área e sobre sua própria prática como professor em sala de aula.
Portanto, a construção desse conhecimento na estrutura curricular dos cursos de
Música-Licenciatura não pode estar restrita às aulas de disciplinas curriculares como
metodologia de ensino, didática da música ou outras disciplinas afins, pois trata-se de
um conhecimento criado na ação, ou seja, em situações de ensino e aprendizagem.

13
Consequentemente, torna-se imprescindível a valorização das disciplinas relacionadas
aos estágios curriculares que privilegiam a formação de novas competências,
estimulando o estudante a ser um professor criativo e reflexivo sobre sua própria
prática. É importante no desenvolvimento da formação profissional tanto do estudante
em formação quanto do professor em exercício que eles possam ser autores de novos
conhecimentos que integrem conteúdos, atividades e contextos.
Diante do exposto caberia discutir modelos de formação profissional, qualidade
da formação profissional, valorização do profissional da educação infantil, concepções
de educação musical para a infância, a oferta de competências necessárias ao educador
no interior dos programas curriculares, tanto de Pedagogia quanto de Música-
Licenciatura ou, ainda, quais as perspectivas que se vislumbram para a formação do
profissional de educação infantil em nível superior considerando a necessidade de
expansão dessa formação.

Predisposições e Neurociência: que devemos ensinar na educação


musical do pré-escolar?

Diana Santiago
UFBA
disant@ufba.br

Revisitando um trabalho anterior de minha autoria que trata das predisposições a serem
ensinadas na aula de música ao pré-escolar, apresento aspectos biológicos do desenvolvimento
cerebral conforme a literatura específica. Pretendo, assim, contribuir com uma discussão sobre
os conhecimentos que fundamentam a elaboração do currículo musical para esta faixa etária.

Mesa redonda 2

Educação Musical Infantil: a criança

A Música e o Desenvolvimento Cognitivo-Musical na Educação


Infantil

Maria Betânia Parizzi


UFMG
betaniaparizzi@hotmail.com

A Música exerce profundas influências no ser humano. Estudos recentes


realizados por neurocientistas confirmam questões que já vinham sendo colocadas por

14
pesquisadores da psicologia da música e da educação musical: a música provoca estados
emocionais, promove alterações fisiológicas, provoca reações motoras e promove
modificações cognitivas (PERETZ et al, 2009; PERETZ e ZATORRE, 2005; TURNER
e IOANNIDES, 2009; ILARI, 2006; PANKSEPP e TREVARTHEN, 2009; SACKS,
2007; LEVITIN, 2006)
Essa influência pode ser nitidamente percebida desde muito cedo na vida. O
comportamento dos bebês frente a estímulos musicais manifesta características
singulares, bem diferentes daqueles observados frente a outros estímulos. Por esta
razão, a música passou a ser considerada um importante veículo capaz de atrair a
atenção do bebê muito precocemente na vida (REIGALDO et al, 2008). Mesmo antes
dos três meses, os bebês já se mostram capazes de desenvolver “protoconversas
expressivas” com seus pais ou cuidadores por meio de gestos e vocalizações, o que
reflete uma predisposição da criança em compartilhar impulsos, interesses, ações e
significados com o adulto (MALLOCH e TREVARTHEN, 2009). Essa pré-disposição
para a comunicação, que se manifesta nas vocalizações e na alta sofisticação de
movimentos de cabeça, rosto e de membros dos bebês durante seus momentos de
interação com os adultos, é uma manifestação da “Musicalidade Comunicativa” do
bebê: “habilidade inata e universal que se ativa ao nascimento, vital para a comunicação
entre as pessoas, que se caracteriza pela capacidade de se combinar o ritmo com o gesto,
seja ele motor ou sonoro” (MALLOCH, 1999/2000; MALLOCH e TREVARTHEN,
2009).
A musicalidade comunicativa está na base da comunicação humana e impulsiona
o desenvolvimento da criança. Essa forma de interação do bebê com as pessoas
apresenta características nitidamente musicais e tem sido objeto de estudos recentes
(SHIFRES, 2007; MALLOCH e TREVARTHEN, 2009; PARIZZI, 2006, 2009, 2010;
BEYER, 2003a, 2003b, 2005). Os bebês parecem ser dotados de uma capacidade
musical diferenciada de outros aspectos de seu desenvolvimento psicológico
(REIGALDO et al, 2008) e esta é uma importante razão para se justificar o aprendizado
da música desde os meses iniciais de vida, (BEYER, 2005; CARNEIRO, 2006;
REIGALDO et al, 2008; PARIZZI, 2010). Este aprendizado tem se configurado como
um processo capaz de estimular não apenas o desenvolvimento musical da criança,
como também o refinamento de outras habilidades físicas e mentais (PARIZZI, 2010;
CARNEIRO e PARIZZI, 2011). A prática sistemática da música envolve um
refinamento sensorial variado, desenvolve habilidades motoras complexas, alimenta a

15
criança com sonoridades que serão vitais na aquisição da linguagem e em sua
capacidade expressiva ao longo da vida (PARIZZI, 2010; CARNEIRO e PARIZZI,
2011).
Reforçando o pressuposto de que todo ser humano é dotado de uma habilidade
inata para se comunicar – “a musicalidade comunicativa” (MALLOCH, 1999/2000;
TREVARTEN, 1999/2000), é importante que o educador musical ofereça ao bebê
experiências musicais expressivas que terão como objetivo “provocar” e “ativar” o
desejo do bebê de se comunicar com as pessoas, por meio de gestos, seja o gesto motor
(movimentos de cabeça, membros ou de todo o corpo) ou sonoro (balbucios)
(CARNEIRO E PARIZZI, 2011).
A partir do segundo ano de vida, o bebê expande, cada vez mais, o seu repertório
de recursos para se comunicar com o mundo. Um recurso poderoso instala-se de forma
gradual e definitiva: a capacidade de utilizar símbolos (PIAGET, 1982/1966). Essa
grande conquista se manifesta principalmente na aquisição da linguagem, nos jogos de
faz-de-conta ou jogos imaginativos, nos desenhos e nos cantos espontâneos. Esses
recursos revelam “o que se passa na cabeça da criança”. O canto espontâneo evidencia
não apenas como ela “pensa” a música, mas também como ela percebe o tempo, uma
vez que as características temporais da música se manifestam nessa forma de expressão
da criança.
O jogo de faz-de-conta representa o prazer da criança em praticar tudo o que ela
já assimilou do mundo. Através do jogo, ela pratica e amplia sua capacidade de utilizar
símbolos (PIAGET, 1982/1966). A criança usa a voz, o corpo e os objetos para se
expressar e o canto espontâneo é uma forma de jogo de faz-de-conta. Ela cria seus
cantos enquanto brinca. Assim, os jogos de faz-de-conta integram-se aos cantos que,
muitas vezes, narram eventos da vida da criança ou “cantam” histórias criadas por elas.
Os jogos de faz-de-conta contribuem não apenas para o desenvolvimento de
habilidades cognitivas como também sociais. Vygotsky (1978, p. 108) já antecipara esta
idéia afirmando que, “sob uma lente de aumento, o jogo contêm todas as possibilidades
de desenvolvimento de uma forma condensada, constituindo-se ele próprio numa grande
fonte de desenvolvimento”.
O desenvolvimento da linguagem falada abre para a criança possibilidades
inovadoras. A internalização do comportamento proporcionada pela linguagem acelera
o ritmo com o qual as experiências podem ocorrer (PIAGET, 1982/1966).

16
Todas essas formas de representação devem ser consideradas no processo de
desenvolvimento musical da criança na educação infantil. A linguagem, o jogo de faz-
de-conta, o desenho e a música são suas mais importantes formas de expressão e
representam sua maneira de perceber e de se integrar ao mundo. Diante desse contexto,
o educador musical deve considerar que o jogo de faz-de-conta deve ser o ponto de
partida de experiências musicais prazerosas que devem privilegiar, principalmente, a
performance corporal e instrumental, a audição de obras musicais e a criação de cantos
espontâneos; essas experiências podem ser verbalizadas pelas crianças que, assim,
manifestam o que perceberam e sentiram, podendo criar relações com outros eventos de
suas vidas; finalmente, elas podem registrar ou desenhar suas experiências musicais por
meio de garatujas, roteiros ou outras formas livres de grafia (BAMBERGER, 1990).
Outro fator que contribui ainda mais para a eficácia dessa abordagem pedagógica é a
possibilidade da interação entre os alunos mediada pelo educador musical, o que
certamente promoverá o desenvolvimento cognitivo-musical e habilidades de interação
social dessas crianças.
Esse conjunto de experiências consolida de forma integrada o desenvolvimento
cognitivo-musical da criança nesta etapa da vida: a música mobiliza emocionalmente,
provoca reações motoras e fisiológicas, promove modificações cognitivas na criança.
Cabe ao educador musical o importante papel de mediador neste processo.

Música na Infância: influências e desdobramentos no desenvolvimento


infantil

Ilza Zenker Joly


UFScar
ilzazenker@gmail.com

A proposta dessa mesa redonda tem por objetivo trazer subsídios para reflexão das
possíveis contribuições da música para o desenvolvimento infantil, em especial aqueles
relacionados à crianças com idades entre 08 meses e 04 anos de idade. Autores que
contribuem para a área de educação musical, psicologia, desenvolvimento humano e
educação fazem a base para essa discussão, que surgiu da necessidade de conhecer os
prováveis desdobramentos das atividades de sala de aula na vida das crianças, tendo em
vista as possíveis influências da música no desenvolvimento global destas e a melhoria
na oferta dos cursos oferecidos para a comunidade, ampliando com isso o leque de
possibilidades de aplicação e produção da educação musica param esta faixa estária.

17
Um olhar específico sobre as relações entre crianças e adultos, pensando na relação que
se dá, por meio da música, entre os bebês e seus pais ou cuidadores será discutido, de
maneira que possamos refletir coletivamente sobre a importância da música na
constituição dos laços afetivos construídos na primeira infância. Um resgate das ações
musicais que são realizadas no Laboratório de Musicalização da Universidade Federal
de São Carlos, por meio de inúmeras pesquisa lá realizadas será o ponto de partida dessa
reflexão.

Elaboração de Metodologia Brasileira para Ensino Coletivo de Violino

Liu Man Ying


ECA - USP
liulumy@yahoo.com

O presente artigo apresenta uma nova proposição metodológica do ensino coletivo de


violino, com uso de elementos musicais das melodias folclóricas brasileiras na
confecção de exercícios para a aprendizagem do instrumento; a grande maioria das
escolas e projetos sociais que empregam o ensino coletivo de violino utiliza apenas
métodos estrangeiros, onde constatamos o intenso uso de música regional e folclórica
destes países, que são muitas vezes desconhecidas pelos nossos alunos brasileiros. A
música folclórica auxilia na identificação musical do aluno com o material, facilita o
aprendizado do instrumento além de fornecer um variado e abundante escopo técnico
para o ensino do violino. Diante de tal panorama, constatamos a necessidade de
estabelecer bases e diretrizes para uma metodologia de ensino coletivo de violino
fundamentada nos elementos da música brasileira; escrita em língua portuguesa para
facilitar a compreensão dos alunos quanto às propostas técnicas e metodológicas
apresentadas; que apresente passo a passo os fundamentos da técnica do violino pelo
método de ensino coletivo através de melodias folclóricas brasileiras.

A Criança e o Outro: interações significativas na infância

Prof. Dr. Ricardo Freire


UNB
ricardo.dourado.freire@gmail.com

18
As aulas de musicalização, em muitos casos, oferecem as primeiras atividades de
interação da criança em um ambiente educacional coletivo. O professor passa a
compartilhar a atenção da criança, que antes estava focada principalmente na mãe e na
família. Durante as aulas são realizadas atividades com várias outras crianças e seus
familiares, sendo que nesses momentos são estabelecidas importantes relações de troca
com o ambiente social. Na aula existe uma comunicação verbal e não-verbal constante
entre os diversos atores no processo: a criança, as mães/pais, o professor, os monitores,
outras crianças e outros adultos. De acordo com Lev S. Vigotski, a alteridade é a base
para a emergência da consciência do eu. É a partir da relação significativa com o outro
no contexto da experiência mediada que ocorre o desenvolvimento dos processos
psicológicos. Na relação entre duas pessoas, a interação é parte essencial para a
formação da consciência do eu, e neste caso do eu musical. Edwin Gordon (2000)
caracteriza a fase de internalização de conteúdos musicais e as primeiras tentativas de
explorações vocais como fase de Balbucio Musical. Da mesma maneira que a criança
desenvolve a fala a partir das interações balbuciadas na troca com o outro mediada pela
linguagem discursiva, torna-se essencial a interação e desenvolvimento da linguagem
musical por meio do balbucio musical em um contexto socialmente compartilhado.
Interações significativas entre o professor e a criança, entre os familiares e a criança ou
entre crianças são fatores fundamentais para o desenvolvimento completo da criança,
tanto na dimensão afetiva, social, cognitivo como na dimensão musicais.

19
Comunicações
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

Professoras de séries iniciais e a obrigatoriedade do ensino da música:


impactos e primeiras impressões

Poliana Carvalho de Almeida


polianaalmeida@ifba.edu.br

Resumo: Vence neste ano de 2011, o prazo legal para o cumprimento efetivo da lei federal
que tornou, em 2008, o ensino da música obrigatório em todos os níveis da educação
brasileira. Infelizmente, é perceptível que somente agora, vencido o prazo, as discussões sobre
esse novo dispositivo legal alcançam os espaços escolares e seus profissionais. Este artigo tem
como objetivo refletir sobre as primeiras impressões de professoras unidocentes da rede
pública de Santo Amaro sobre a Lei 11.769/08. Baseio-me para tanto em três frases proferidas
por professoras participantes do curso para formação continuada em música, oferecido pelo
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Santo Amaro a
professores de séries iniciais da educação básica. Após a introdução deste texto segue-se os
três tópicos nos quais cada uma das frases será analisada de forma a estabelecer sob que
circunstâncias e cotidianos escolares elas se fundamentam.
Palavras chave: Educação musical, escola pública, formação de professores

Introdução

Com a aprovação da Lei 11.769/08 surgem, entre os educadores musicais,


manifestações que vão desde uma euforia crédula de que agora, amparados legalmente, a
música ocupará um lugar importante na escola, até um sentimento de desesperança por parte
dos que ao longo dos anos tem vivenciado o vai e vem das políticas públicas educacionais que
constroem e desconstroem ações e quase sempre são determinantes do fracasso da educação
musical brasileira.
Após a leitura de algumas publicações sobre a Lei 11.769/08, resolvi posicionar-me
ativamente em favor de sua implementação efetiva nas escolas públicas. Acredito, porém,
que a existência de uma determinação legal não basta por si só para mudar determinada
realidade, neste caso a situação do ensino da música.

As políticas públicas para a educação musical e artística não têm contribuído


para uma mudança significativa na situação dessas áreas atualmente. Mesmo
depois das novas legislações (LDB, PCN, Diretrizes Estaduais e Municipais)
as artes em geral continuam a ser tratadas de maneira irrelevante, mesmo
quando alguns sistemas educacionais já adotaram a contratação de
profissionais específicos para cada linguagem, o que já é um avanço com
relação aos tempos da polivalência. (PENNA, 2008, p. 25).

Como então fazer cumprir-se tal dispositivo legal se o cenário é de uma demanda de
escolas muito superior à quantidade de profissionais qualificados para o ensino da música

21
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

nestes espaços? Se pensarmos na situação das séries iniciais do ensino fundamental o quadro
ainda piora, pois aí temos um único professor responsável pelo ensino de todas as disciplinas,
inclusive Artes, função para a qual nem sempre recebeu formação, em nível de graduação,
suficiente.
Cabe, então, as administrações públicas, aliadas a instâncias formadoras, promoverem
a capacitação destes profissionais para o ensino da música, uma vez que muito dificilmente
veremos surgir milagrosamente até 20111 quantidade suficiente de licenciados em música que
atendam a demanda das escolas públicas brasileiras de educação infantil de ensino
fundamental I.
Por ter formação em educação musical e ensinar numa instituição pública2 que me
possibilita a atuação nas áreas de extensão e pesquisa, me senti co-responsável pela
implementação da lei 11.769/08, elaborei um curso de formação3 para professores
unidocentes das séries iniciais do ensino fundamental da rede pública de Santo Amaro-Ba.
A seguir destacarei em três tópicos algumas falas de professoras participantes do
curso, a fim de discutir suas primeiras impressões sobre a Lei 11.769/08.

Impressão 1: “Além de tudo, ainda tenho que ensinar música”

Em nosso primeiro contato, no grupo de formação, procurei saber o quanto as


professoras sabiam sobre a lei 11.697. Elas, de forma geral, responderam que nunca tinham
lido o texto da determinação, mas sabiam que o ensino da música tornou-se obrigatório em
todas as séries. Algumas demonstraram certo descontentamento, pois, além de terem que lidar
com questões desafiadoras como alfabetização nas séries iniciais, dentre outras, deverão agora
se incumbir do ensino de uma disciplina para a qual o curso de pedagogia não as preparou, e,
para a qual se sentem incapazes.
Este descontentamento deixa patente o lugar pouco privilegiado que ocupa a Música e
as Artes na hierarquia das disciplinas escolares e também nos cursos de formação de
professores para séries iniciais.
Pais e responsáveis de crianças da educação infantil e séries iniciais preocupam-se
quando constatam “falhas” no processo de alfabetização, mas não se importam muito com o

1
Período em que expira o prazo para implementação da lei segundo seu Art. 3º: “ Os sistemas de ensino terão 3
(três) anos letivos para se adaptarem às exigências estabelecidas nos arts. 1° e 2° desta Lei.”
2
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Santo Amaro
3
O curso teve início em junho de 2011, com 14 professoras da rede pública matriculadas, terá carga horária de
80h com previsão de término em setembro de 2011. Este curso é um projeto da Coordenação de Pesquisa e
Extensão do IFBA- Santo Amaro.

22
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

desenvolvimento artístico de seus filhos. Desde 2004, como professora de musica em escolas
públicas, nunca ouvi de um pai: “Por que meu filho ainda não consegue cantar afinado?”

[...] o professor que é responsável pelas matérias consideradas “nobres” no


programa escolar (matemática, por exemplo) é diversamente avaliado pela
administração escolar, pelos alunos e pelas famílias. Entretanto, os que são
responsáveis por matérias pouco valorizadas no cômputo geral devem fazer
prova de maestria para “prender” a atenção dos alunos e estimular seu
empenho nos saberes transmitidos.(VASCONCELOS, 2002, p. 309)

Quando falamos sobre realidade no sentido educacional, nos remetemos ao ambiente


escolar, à instituição escola. Nesta “realidade” constrói-se o que denomina-se cultura escolar
que é definida por Júlia (2001) como:

[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas


a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses
conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas
coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas, finalidades
religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização. (JULIA, 2001, p.
41)

Ao colocar a cultura escolar como mediadora da prática profissional docente, Júlia


leva-nos a crer que as singularidades da mesma produzem diferentes perfis profissionais, em
outras palavras, culturas escolares específicas de determinados contextos escolares podem ser
relacionadas à construção de diferentes práticas profissionais.
A cultura escolar, que reproduz e ao mesmo tempo questiona a sociedade, carrega
alguns preconceitos. Um deles, fundamentado na hierarquia dos conhecimentos e disciplinas
escolares. A citação abaixo exemplifica algumas conseqüências dessa hierarquia:

Recorramos ao que por vezes ocorre nos Conselhos de Classe: a “hierarquia”


que se encontra no currículo faz com que se valorizem diferentemente os
conhecimentos escolares e “justifica” a prioridade concedida à Matemática
em detrimento da Língua Estrangeira ou da Geografia. Nessa hierarquia, se
supervalorizam as chamadas disciplinas científicas, secundarizando-se os
saberes referentes às artes e ao corpo. Nessa hierarquia, separam-se: a razão
da emoção, a teoria da prática, o conhecimento da cultura. Nessa hierarquia,
legitimam-se saberes socialmente reconhecidos e estigmatizam-se saberes
populares. Nessa hierarquia, silenciam-se as vozes de muitos indivíduos e
grupos sociais e classificam-se seus saberes como indignos de entrarem na
sala de aula e de serem ensinados e aprendidos. Nessa hierarquia, reforçam-
se relações de poder favoráveis à manutenção das desigualdades e das
diferenças que caracterizam nossa estrutura social. (MOREIRA e CANDAU,
2006, p. 23 e 24).

Cláudia Bellochio (2003) confirma a existência de uma cultura estabelecida no


contexto educacional baseada na tradição de não valorizar determinadas disciplinas do
23
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

currículo. Tal tradição, segundo a autora, atinge as disciplinas artísticas, que quando presentes
na escola “servem, na melhor das hipóteses, para deixar o ambiente mais bonito e agradável”
ou como apoio as disciplinas mais nobres do currículo.
A cultura escolar hierarquiza conhecimentos baseando-se em critérios estabelecidos
pela sociedade sobre o que é importante ser aprendido e, portanto, ser ensinado. A música,
segundo o discurso pedagógico brasileiro corrente, é importante, mas na prática escolar
prevalece a idéia de que ela não é tão necessária quanto língua portuguesa e matemática.
Sendo assim o professor elegerá também suas prioridades a partir do que lhe é cobrado
socialmente, seguindo uma hierarquia disciplinar historicamente construída, mantendo uma
lógica circular de desvalorização do conhecimento musical e artístico que concretizada a cada
nova geração de estudantes.

Impressão 2 – “Será que isso vai dar certo?”

Em sua maioria o grupo de formação é composto por professoras que atuam sistema
público há mais de cinco anos, portanto estão acostumadas a verem suas práticas pedagógicas,
de tempos em tempos, atingidas pelo vai e vem político ideológico das políticas educacionais
brasileiras. Mal nos adequamos ao anterior eis que chega um novo pacote, pronto; neste ponto
minhas colegas professoras questionam ao se depararem com a 11.769/08: Será que isso vai
dar certo? E algumas, menos esperançosas, mas não menos experientes em matéria de sala de
aula, afirmam: Isso não vai dar certo.
Após uma atividade de musicalização4 uma das professoras perguntou se eu elaboraria
um manual de atividades musicais e outra disse: “Eu nem quero tentar. Com meus alunos?
Na minha sala? Olha gente, vocês não sabem como é lá na escola. Se eu fizer essa atividade
lá os meninos acabam com tudo.”
Para quem não tem os pés no chão de uma sala de aula de uma escola pública, a fala
dessa professora revela descompromisso e acomodação apenas. Proponho olharmos por outro
ângulo.
A constatação de que nenhuma instituição pública educacional participou ou foi
consultada durante o processo de elaboração e aprovação da lei 11.769/08 é extremamente
preocupante. Sendo assim não podemos ser intolerantes com a professora que afirma que

4
No programa do curso de capacitação em questão constam atividades musicalização para os professores com
objetivo de desenvolver e potencializar suas habilidades musicais através de atividades de canto, movimento e
percussão corporal.
24
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

“isso não vai dar certo”. Está fadado a não dar certo, pois, os atores principais do processo,
aqueles que porão em prática a lei, foram postos a parte de sua construção.

O debate envolveu músicos atuantes na mídia, entidades musicais diversas,


políticos e educadores musicais, mas causa estranheza a ausência de
representantes das escolas públicas. O locus de efetivação das propostas não
foi presença efetiva nos debates, fazendo pressupor que o consenso podia
não ser tão amplo como se aparentava e que o dispositivo legal seria imposto
às escolas, e não resultado de suas demandas. (SOBREIRA, 2008, p.47).

A oposição à idéia de projetos educacionais elaborados como receitas culinárias


prontas e acabadas, não se resume a nos negarmos a fazer um manual de atividades musicais.
Devemos transformar essa oposição em ações de forma que possamos nos unir a nossas
colegas professoras unidocentes num esforço colaborativo para a construção de seus próprios
manuais de atividades musicais, adequados a suas realidades.
O educador musical que se propõe a capacitar professores para o trabalho com música
deve estar envolvido na realidade da sala de aula. Não é fazer do grupo em formação um
laboratório de pesquisa experimental, mas tomar parte no cotidiano escolar de seus
participantes, acompanhando o desenvolvimento de suas práticas pedagógico-musicais.
A impressão de incerteza e desconfiança explicitadas no questionamento “será que
isso vai dar certo?” estará a poucos passos de ser substituído nos discursos dos professores
pela afirmação “isso pode dar certo”, quando as instituições formadoras de educadores
musicais envolverem-se com a escola pública e seus profissionais de tal forma que sejam
capazes de juntos elaborarem planejamentos educacionais musicais executáveis.

Impressão 3 - “Preciso aprender isso direito porque eu vou ter que ensinar
depois”

A frase acima foi dita por uma das colegas professora participante do curso quando
estávamos conceituando as propriedades sonoras.
Como podem ensinar o que não sabem? Talvez este seja um dos argumentos mais
utilizados pelos que acreditam que não permitir a professores unidocentes ensinar conteúdos
musicais é garantia de que teremos nossos “empregos” como licenciados em música
garantidos e também certa “qualidade” no ensino da música nas escolas.
O discurso academicista tem, há muito tempo, pregado objetivos inatingíveis para os
não iniciados musicalmente. Por vezes ouvimos relatos de pessoas que se frustraram ao
tentarem se aproximar de uma educação formal na área de música. Mas se por um lado não
podemos cobrar virtuosismo musical dos professores unidocentes, por outro lado é necessário
25
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

garantir que eles possuam habilidades musicais e pedagógicas suficientes para o ensino de
música.
De forma alguma pretendo com o comentário acima compartilhar com a idéia da
mensagem 622 de 18 de agosto de 2008, que justifica o veto5 ao artigo 2º da Lei 11.697,
transcrita em parte a seguir: “Vale ressaltar que a música é uma prática social e que no
Brasil existem diversos profissionais atuantes nessa área sem formação acadêmica ou oficial
em música e que são reconhecidos nacionalmente. Esses profissionais estariam
impossibilitados de ministrar tal conteúdo na maneira em que este dispositivo está proposto.”
A música é uma linguagem e, como tal, possui códigos específicos capazes de
produzir discursos, em certos níveis, acessíveis apenas àqueles que detêm o conhecimento de
tais códigos. Os saberes musicais são transmitidos de geração a geração graças também a
esses códigos. Um bom músico, mesmo dominando os códigos da linguagem musical, nem
sempre pode ser considerado um professor de música em potencial, pois, cada vez mais,
tomam corpo as especificidades técnicas e metodológicas para o ensino da música, em
especial quando destinadas a escola básica. Tais conhecimentos pedagógicos específicos que
vem destacando a Educação Musical concedendo-a status de área do conhecimento6 precisam
ser estudados por professores de música. Sobre isso comenta a educadora musical e
pesquisadora Cláudia Bellochio:

Esse campo de saberes carrega especificidades de conhecimento musical e


de conhecimento pedagógico, sem, no entanto, delimitar prescrições de
como agir na situação educacional, que é carregada de situações específicas
da prática. Para ensinar, é preciso que se compreenda a educação e esta em
seus constituintes psicológicos, filosóficos, antropológicos, sociológicos,
pedagógicos. Para ensinar música, é preciso que se compreenda música nos
constituintes acima apontados. (BELLOCHIO, 2003, p. 22).

Sendo assim, temos como objetivo, que professoras participantes do grupo de


formação desenvolvam habilidades musicais adequadas à demanda de sua realidade e também
adquiram conhecimentos de metodologias da música que possam alicerçar uma prática
pedagógica musical significativa. Ao contrário do que esperava nosso grupo de formação
mostrou-se muito disposto a realizar as atividades de musicalização. As professoras gostam
de música, de cantar e tentam, na medida do possível, fazer a música presente em suas salas

5
Ao ser sancionada a lei 11.769/2008, teve vetado o parágrafo 2ª que afirmava: “O ensino da música será
ministrado por professores com formação específica na área.”
6
Luciana Del Ben discute esta questão no artigo “A delimitação da Educação Musical como área do
conhecimento: contribuição de uma investigação junto a três professoras de Música do Ensino Fundamental”
publicado em 2001 na revista Em Pauta, v. 12, n. 18/19, p.65-93.
26
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

de aula. Enxergar na música, obra de arte apreciada, conteúdos musicais educacionais é um


passo seguinte de uma longa caminhada, difícil, mas possível.
O cenário ideal em que cada escola pública terá um licenciado em música no seu
corpo docente ainda está longe de ser vislumbrado, e se tornará cada dia mais utópico se nós,
educadores musicais nos fecharmos nos limites de nossa área com atitudes territorialistas e
excludentes.

Considerações finais – “Eu quero música na escola”

Durante o primeiro módulo do curso de capacitação em música para professores das


séries iniciais, deparei-me com expressões reveladoras sobre que tipo de impressões a
aprovação da lei de obrigatoriedade do ensino da música nas escolas brasileiras causou fora
dos círculos da educação musical. As expressões comentadas são de professoras unidocentes
de escolas públicas de educação infantil e ensino fundamental. Ao comentá-las procurei partir
do meu olhar com professora da rede pública, tentando, assim, expandir a discussão sobre a
Lei 11.769/08, para além da dos limites restritos da área de música.
Apoiada por outros educadores, defendo que uma medida legal não é suficiente por si
só para garantir mudanças significativas no cenário educacional brasileiro.
As inquietações que as falas analisadas deixam transparecer podem ser justificadas (1)
por uma cultura escolar que impõe à música um lugar desprivilegiado dentro da hierarquia das
disciplinas e saberes escolares, (2) pela insuficiência ou ausência do ensino das linguagens
artísticas e suas metodologias de ensino nos cursos de formação de professores para séries
iniciais e (3) pelo distanciamento entre as instancias formadoras de educadores musicais e
cotidiano escolar brasileiro.
Garantir a educação musical dos pequenos brasileiros que freqüentam as escolas de
educação infantil e ensino fundamental, mais que lei, deve ser compromisso dos educadores
musicais.
Para além das polêmicas sobre quem deve ou quem pode ensinar música na escola,
devemos estar atentos aos que realmente podem fazer a lei sair do papel. Como não nos é
possível realizar o milagre da multiplicação dos licenciados em música, cabe-nos o
engajamento em ações que promovam a formação e capacitação dos profissionais da
educação que poderão nos ajudar na tarefa de musicalizar. Não propondo aos unidocentes
pacotes prontos, como se tais profissionais não tivessem nada a oferecer, mas buscando a
construção colaborativa de propostas em educação musical adequadas ao chão da sala de aula.

27
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A formação profissional do educador musical: algumas


apostas. Revista da Abem, n. 8, p. 17-24, mar. 2003.

DEL BEN, Luciana. A cultura escolar como objeto histórico. Em Pauta, Rio de Janeiro, v.12,
n. 18/19, p. 65-93, 2001.

JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História
da Educação, Campinas, n. 1, p. 9-44, 2001.

MOREIRA, Antônio Flávio B.; CANDAU, Vera. Maria. Currículo, conhecimento e cultura.
In: BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Indagações sobre
currículo. Brasília: 2006.

PENNA, Maura. Caminhos para a conquista de espaços para a música na escola: uma
discussão em aberto. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 19, 57-64, mar. 2008.

SOBREIRA, Sílvia. Reflexões sobre a obrigatoriedade da música nas escolas públicas.


Revista da Abem, Porto Alegre, V. 20, 45-52, set. 2008.

VASCONCELLOS, Maria Drosila. O trabalho dos professores em questão. Educ. Soc. [on-
line], Campinas, v. 23, n. 81, Dec. 2002.

28
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Construção de Instrumentos de Percussão: uma experiência na educação


infantil

Maria Luiza Feres do Amaral


UNIVALI
liza.amaral@hotmail.com

Laísa Carvalho da Silva Soares

Eduardo Venturini de Souza

Resumo: Este artigo relata a experiência de Estágio Supervisionado realizada no Centro de


Intervenção e Estimulação Precoce – CIEP- Vovó Biquinha, instituição educacional sem fins
lucrativos que atende crianças com necessidades educacionais especiais, crianças de risco
social e no padrão normal de desenvolvimento, em Itajaí – SC. Os sujeitos envolvidos nesta
experiência foram os dois acadêmicos do 4° período do Curso de Licenciatura em Música da
Universidade do Vale de Itajaí - UNIVALI. Nesta instituição todas as turmas têm como nome
um animal e a turma LEÃO foi o público alvo, composta de 15 alunos com idades entre 5 e 6
anos. O tema escolhida para desenvolver as atividades musicais foi a construção de
instrumentos de percussão com materiais recicláveis objetivando trabalhar e desenvolver a
coordenação motora a partir de brincadeiras de ritmo, promovendo o interesse, o contato com
a música e a consciência ambiental. Especificamente se pensou em compor uma canção para a
turma leão, apresentar os instrumentos de percussão, conhecer os sons dos instrumentos
confeccionados, diferenciar timbres dos instrumentos, divisão rítmica, relacionar o ritmo das
sílabas dos nomes dos animais, apreciar os elementos rítmicos da musica africana e melhorar
a coordenação motora. Como resultados se podem apontar o trabalho com a música de uma
maneira ampla, despertando o interesse pela mesma, o contato com diversos instrumentos de
percussão e o desenvolvimento da criatividade de forma individualizada das crianças, bem
como e cooperação em grupo. As atividades foram fundamentadas em Jeandot (1997); Brito,
(2003), Almeida & Pucci (2003) e Del Ben, Luciane & Hentschke (2002).
Palavras - chave: Educação infantil, construção de instrumentos, educação musical

Apresentação

A criança mesmo antes de nascer já tem contato com uma grande variedade de sons.
Sons estes produzidos pela própria mãe como o som do coração, som da voz, entre outros,
que mesmo sem perceber está estabelecendo um tipo de linguagem com seu filho. Quando a
criança nasce se depara com um universo de sons produzidos pelos seres vivos e por objetos,
pois, na maioria dos povos é muito comum que a mãe cante para seu bebê e assim passa
acontecer os primeiros contatos com a música.
Para Jeandot (1997) “a criança não é um artista, nem um ser meramente
contemplativo, mas antes de tudo um ser rítmico-mímico, que usa espontaneamente os gestos

29
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ao sabor da sensação que eles despertam.” (JEANDOT, 1997, p.19) Partindo deste
pensamento, podemos dizer que é através destes estímulos sonoros e da experimentação dos
sons que a criança desenvolve seus sentidos e constrói seu conhecimento sobre música.
Tendo em vista a importância da música no desenvolvimento da criança se objetivou -
se especificamente trabalhar a partir da prática de atividades musicais que obtivessem o
conhecimento básico sobre propriedades do som e ritmo, uma vez que é de suma importância
na formação do aluno.
Existe uma estreita relação entre a música, educação, e as pessoas com necessidades
de educação especial. Pois, as atividades musicais têm papel importante na formação e no
desenvolvimento do individuo como um todo, justificando sua inclusão no contexto
educacional e social. Muitas manifestações artísticas como a música, aparecem predominantes
em diversos relatos de experiências e pesquisa como ferramenta na qualidade de vida e na
mudança de comportamento das pessoas como o trabalho de Louro (2003) as adaptações a
favor da inclusão do portador de deficiência física na educação musical: um estudo de caso.
Desta forma, o aprendizado musical do mesmo modo como a criação são essenciais
para que as crianças tenham acesso e vivenciem de forma integral as informações e o
conhecimento mediante avaliação continua e formativa. O ensino de música deve ser
construído a partir do fazer musical e da “realidade” dos alunos, contemplando seus
interesses, preferências e saberes. Desenvolver habilidades, atitudes e valores considerados
necessários para a formação do individuo como cidadão. (DEL BEM; HENTSCHKE, 2002).
Neste sentido Correia comenta que,

O som e, conseqüentemente a musica, tem um impacto direto sobre as


funções motoras e o sistema vegetativo passando a construir um valioso
instrumento auxiliar no diagnostico medico e na promoção do
desenvolvimento de potencialidades físicas, mentais, emocionais e sociais do
homem. (CORREIA, 2001, p.38).

Na busca de um aproveitamento efetivo da música na escola, através do tema


escolhido foi possível trabalhar com a música de uma maneira ampla e compartilhar com as
crianças as experiências vivenciadas e desenvolvidas até o momento no processo de formação
acadêmica.
O objetivo central do trabalho a ser desenvolvido seria a construção de instrumentos
de percussão culminou com a filosofia da escola. Pois a escola realiza atendimento
educacional, social, nutricional, psicopedagógico; estudo e pesquisa para a clientela de alto-
risco e necessidades educacionais especiais. Além disto, capacitação de recursos humanos
30
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

através de cursos e treinamentos para professores e campo de estágio, bem como grupo de
pais para troca de experiência e orientações específicas.
Assim, na escola há muitos materiais para se trabalhar com as crianças, principalmente
instrumentos musicais confeccionados pelas mães dos alunos. Pois, na escola existe um
projeto chamado “Uma conversa salva uma Vida” que atende a comunidade em geral,
orientando pais ou responsável pela criança. Com isso as mães fazem um trabalho de
“voluntariado” uma vez por semana confeccionando instrumentos através de materiais
recicláveis.

Procedimentos

Para atingir os objetivos, esta experiência partiu de uma visita técnica com o objetivo
de colher dados e conhecer a estrutura física e pedagógica da escola Vovó Biquinha.
Em uma segunda etapa uma aula diagnóstica permitiu aos professores conhecer o
público alvo que era formado por crianças de 5 e 6 anos num total de 15.
Com objetivo de trabalhar e desenvolver a coordenação motora a partir de brincadeiras
de ritmo e confecção de instrumentos de percussão com materiais recicláveis, promovendo o
interesse, o contato com a música e a consciência ambiental, se optou por atividades
interativas, de cooperação e criatividade.
Os materiais didáticos usados foram: Violão, flauta, garrafas plásticas, cabos de
vassoura, latinhas de alumínio, palitos de churrasco, fitas adesivas, cola, tinta guache, cd de
áudio, desenhos e partituras
As avaliações se deram por meio de participação, colaboração, criatividade,
reconhecimento dos elementos trabalhados e percepção auditiva.
Os registros das intervenções se deram por meio de relatórios, fotografias e vídeo.

Relato de Experiência: o fazer musical na educação infantil

Na visita técnica se pode conhecer o espaço escolar, que atende crianças de 0 a 6 anos
e realiza atendimento educacional, social, nutricional, psicopedagógico; estudo e pesquisa
para a clientela de alto-risco e necessidades educacionais especiais; capacitação de recursos
humanos através de cursos e treinamentos para professores e campo de estágio; grupo de pais
para troca de experiência e orientações específicas.
As professoras da turma LEÃO, comentaram aos estagiários que utilizam à música nas
aulas através das canções, onde as crianças dançavam, pulavam e também interpretavam a
31
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

música no papel por meio de desenhos. Assim, a primeira intervenção teve como objetivo a
interação e socialização entre todos e a apresentação do planejamento das aulas de música
para que todos pudessem ter maior conhecimento sobre ela.
A primeira atividade planejada foi a criação de uma canção com o nome da “Turma
Leão” e assim se pediu para as crianças dizerem o que elas sabiam sobre o as características
do leão com o propósito de formas frases e compor a letra da música. Assim através das ideias
apresentadas foram sendo formadas as frases e sendo harmonizadas pelos professores ao
violão. Além da composição foi sendo adicionada para as crianças uma pequena coreografia
que representasse o rugido do leão.
Na segunda intervenção se deu inicio a confecção de instrumentos de percussão
divididos em 3 aulas e os escolhidos foram a clava, chocalho, reco – reco e o maracá. Toda a
atividade contou com o auxilio dos professores para a organização com atenção e cuidado
diante de sua execução. Desta forma, em um primeiro momento foi feita a apresentação da
clava e reco-reco, partindo dos conceitos básicos que os caracterizam e as crianças puderam
em seguida manuseá-los, assim eles puderam experimentar conhecendo as formas e como são
tocados. Logo após se começou a confecção da clava e do reco- reco pelas crianças e
concordando com as palavras de Brito quando diz que “as crianças devem ser estimuladas a
pesquisar materiais e objetos que produzam sons interessantes, pois, antes de construírem
instrumentos musicais, elas os descobrem em materiais que se transformam a um simples
toque”. (BRITO, 2003, p. 72).
Esta etapa foi consideravelmente difícil, pois se tratava do manuseio de materiais
como: tintas guache, papéis coloridos e fitas adesivas, o que exige certa cautela. A confecção
dos instrumentos foi terminada, mas não se conseguiu concluir a decoração de todos os
materiais, faltando poucos detalhes por conta do tempo de aula. Na terceira intervenção se deu
continuidade à confecção de instrumentos de percussão, sendo confeccionado neste módulo o
chocalho. Apresentado os conceitos básicos que o caracterizam se passou para o manuseio de
alguns chocalhos, a fim de experimentarem e conhecerem as formas e como são tocados.
Nesta tarefa as dificuldades foram às mesmas da aula anterior, pois se tratava do manuseio de
materiais como latinhas feitas de alumínio fino e com isso um maior cuidado para não cortar a
pele da mão das crianças. Para completar o proposto se deu a construção deste instrumento.
Para Brito,

O trabalho na área de música pode (e deve) reunir grande variedade de


fontes sonoras. Podem-se confeccionar objetos sonoros com as crianças,
introduzir brinquedos sonoros populares, instrumentos étnicos, materiais
32
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

aproveitados do cotidiano etc., com o cuidado de adequar materiais que


disponham de boa qualidade sonora e não apresentem nenhum risco à
segurança de bebês e crianças. (BRITO, 2003, P. 64).

Pôde-se observar a cada intervenção, o aproveitamento e a resposta positiva por parte


das crianças sobre a atividade, havendo muita colaboração de todos em cada processo da
tarefa. Além disto, se observou características específicas das crianças, algumas mais ativas,
participativas, enquanto outras precisavam de um acompanhamento mais expressivo por
serem mais quietas e naturalmente acomodadas, outra com dificuldade de locomoção o que
exigiu maior atenção. A partir desta intervenção se procurou abrir novas possibilidades de
estratégias de aula que se adaptassem a esta realidade, solucionando algumas deficiências dos
professores quanto à diversidade encontrada.
Dando continuidade, o instrumento trabalhado em sala de aula foi o Maracá. Esse
talvez tenha sido o instrumento de maior dificuldade para a sua confecção, por utilizar mais
materiais e pelo processo longo e detalhado que os demais instrumentos construídos
anteriormente. Antes de começar com a confecção dos instrumentos foi revisada a música
Turminha do Leão com as crianças para maior fixação da letra e melodia e para surpresa dos
professores a música estava na “ponta da língua”, eles já cantavam sozinhos sem
acompanhamento instrumental. Com o ensaio finalizado foi feito uma exposição do
instrumento para que as crianças conhecessem a forma e o timbre, após a demonstração passo
a passo e auxiliando as crianças em um processo lento que exige paciência e disposição, tanto
dos alunos quanto de nós estagiários. Foram utilizados pedaços de madeiras de 30 cm,
garrafas plásticas de aproximadamente 500 ml, arroz para a emissão do som dentro da garrafa,
e materiais decorativos como: fitas adesivas coloridas, papéis coloridos, durex e fita isolante
branca. Ao final de todo o trabalho se pode perceber que utilizamos mais de 1 hora com todo
o processo. Conseguindo finalizar o trabalho pode observar uma melhora quanto ao
comportamento de algumas crianças, na turma temos um aluno imperativo, que em quase
nada das atividades queria participar, visto que quando confeccionado a clava, ele participou
pintando com tintas guaches, nas histórias contadas ele tocava a clava ou chocalho. Esse
instrumento foi o que as crianças mais gostaram, pois estavam bem animadas e participativas.
“Muitos outros instrumentos poderão ser descobertos se as crianças tiverem a chance de
contar com materiais variados e também com a orientação e o estímulo do educador ou da
educadora.” (BRITO, 2003, p. 74).
Dando seqüência ao planejamento, o próximo objetivo foi de experimentar os
instrumentos confeccionados mostrando a divisão silábica de cada instrumento com sílabas de
33
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

palavras e figuras dos animais como: a monossílaba rã correspondia a semínima, a dissílaba


ga – to correspondia a duas colcheias e a polissílaba pas – sa – ri – nho correspondia a quatro
semicolcheias. Assim, se trabalhou em cima dessas divisões, porém não se conseguiu alcançar
o objetivo das crianças tocarem na divisão correta, mas elas conseguiram marcar a pulsação
quando solicitada. Ao final da intervenção se pode avaliar que se atingiu o alvo principal que
era de instigar a percepção musical das figuras rítmicas e dos sons que as crianças têm desde
quando nascem.
Diante de tudo o que foi desenvolvido nesta experiência musical as palavras de
ALMEIDA e PUCCI (2003) justificam o trabalho realizado, pois, “concebemos a música
como uma das expressões humanas, uma das muitas linguagens utilizadas pelo homem para
falar de si, do seu grupo social e de suas impressões sobre o mundo. (ALMEIDA; PUCCI,
2003, p.15). Essas atividades foram de suma importância no desenvolvimento integral das
crianças, pois se pode realizar um trabalho interdisciplinar, o que nos abre uma dimensão de
outras áreas e só tem a acrescentar em nossa experiência acadêmica e profissional.
Ao dar inicio a intervenção (análise e pesquisa do corpo docente, no qual busca – se
através de pesquisas, levantar dados qualitativos e quantitativos visando a eficiência e
abrangência educacional), se pode observar o quanto houve progresso das crianças e mesmo
com as dificuldades encontradas n esta diversidade, os conteúdos foram bem aproveitados.
Logo se deu a prática da nova etapa de aula a partir da música de origem africana YAYÈ
BÖBÖ do livro “Outras Terras Outros Sons” de Almeida e Pucci (2003). Assim que foi
colocada a música no aparelho de som se despertou a curiosidade das crianças por se tratar de
um repertório desconhecido para elas. O mais incrível disso tudo é que com poucos minutos
de ensaio as crianças já haviam absorvido o conteúdo e já estavam acompanhando cantando a
melodia. Para declarar sobre a devida importância da influência de outras culturas através de
repertórios musicais ALMEIDA e PUCCI comentam que

Para ouvir e cantar canções de outros povos, com sonoridades diferentes das
que estamos habituados, faz-se necessário que despertemos em nós a
curiosidade pelo novo e pelo outro, isto é, pelo que não conhecemos, mas
somos capazes de entender. (ALMEIDA; PUCCI, 2003, p.10).

Desta forma, dando continuidade se começou a ensaiar a música YAYÈ BÖBÖ com o
objetivo final de utilizar os instrumentos percussivos preparados nas primeiras aulas e com o
acompanhamento da música. Além disto, as crianças estariam trabalhando o cantar a melodia,
e também obtendo a noção básica de pulso e organizar uma apresentação final para a escola
deste conteúdo. Em que com poucos minutos de ensaio as crianças já haviam absorvido o
34
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

conteúdo e já estavam nos acompanhando cantando a melodia junto. Dando continuidade a


respeito da organização da turma colocamos todos juntos somente em um canto da sala para
que tivéssemos melhor visão deles e assim simular a apresentação que ocorreria desta mesma
forma, porém no lado de fora da sala. Alguns alunos colaboraram como de costume, outros se
distraíam facilmente, mas apesar de convivermos com essas barreiras desde o início do nosso
estágio percebemos que em geral todos aproveitaram a aula. Um ponto interessante que
observamos durante o ensaio, foi o fato de que os alunos entenderam rapidamente onde
queríamos chegar. Com certeza acreditamos que o peso que se deu através do planejamento
da apresentação fez com que eles tornassem mais preocupados com o andamento em que
tinham de se preparar.
Nesta última intervenção consistiu unicamente da apresentação organizada e ensaiada
na aula anterior. Deu-se inicio com um curto ensaio para deixá-los confiantes e preparados
antes de se apresentarem para toda a escola. Alunos de outra Escola estavam visitando o
CIEP. Por este motivo a apresentação ganhou uma proporção maior do que a esperada e
superou nossas expectativas diante dos objetivos pensados para a última intervenção. Logo
após com a turma sentada, onde os meninos sentados atrás e as meninas sentadas na frente
com os instrumentos em suas mãos. Feita uma breve explicação dos objetivos da apresentação
e se deu o ponto e partida que foi onde as crianças tocam e cantaram as duas músicas
trabalhadas no ambiente escolar. Se pode considerar que as crianças tiveram sucesso absoluto,
além do fato que toda a escola, contando com os alunos, direção e visitantes, pareceram
aprovar a amostra dos trabalhos desenvolvidos em sala de aula, criando laços musicais e
servindo ao futuro dessas crianças.

Considerações Finais

O estágio supervisionado é de grande importância para o crescimento do acadêmico


como profissional e como ser humano por ser a melhor maneira de ele aplicar seu
conhecimento obtido nas diversas áreas do curso.
Foi gratificante dedicar todo este tempo para as intervenções mesmo sendo um
trabalho exaustivo e que exige bastante do aluno como profissional.
O que mais impressionou, foi que apesar de todas as dificuldades impostas antes de se
iniciar as intervenções, se concluiu esta etapa com maior consciência da preparação que o
docente deve ter e conhecer mediante a uma diversidade de pessoas.

35
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Trabalhos como este são de suma importância na escola para que as crianças possam
se desenvolver de forma integral e com qualidade.

36
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ALMEIDA, M. Berenice; PUCCI, Magda Dourado. Outras Terras Outros Sons. São Paulo,
2003.

BRITO, Teca Alencar. Música na educação infantil. São Paulo, Peirópolis, 2003.

CORREIA, C. Musica e saúde. In: I Fórum Catarinense de Musicoterapia, 2001,


Florianópolis. Anais... Florianópolis, 2001.

DEL BEN Luciane; HENTSCHKE, Liane. Educação Musical escolar: uma investigação a
partir das concepções de três professoras de música. Revista da ABEM Porto Alegre, n. 7, p.
49-57, setembro 2002.

JEANDOT, Nicole. Explorando o Universo da Música. São Paulo: Scipione, 1997.

37
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O Brincar no Processo de Escolha de um Instrumento Musical

Larissa Rosa Antunes


UnB - Projeto Música para Crianças
larissinha.rosa@gmail.com

Samara Pires da Silva Ribeiro


UnB - Faculdade de Educação
samara_prs@hotmail.com

Ricardo Dourado Freire


UnB - Projeto Música para Crianças
freireri@unb.br

Resumo: Dentro de um processo de escolha o ato de brincar pode ser uma ferramenta
importante, pois envolve a relação do imaginário com o real, a função afetiva e
principalmente pode proporcionar uma vivência significativa, pois é um ato inerente de todo
ser humano, principalmente da criança. Pensar em um processo de escolha de um instrumento
musical envolve as experiências musicais da criança e a sua relação com o instrumento que se
conhece. O conhecimento pode ser dado por diversas práticas, como as relatadas neste
trabalho, que exemplificam a atuação com crianças que irão optar por um instrumento
musical.
Palavras chave: Instrumento musical, jogo pedagógico musical, educação musical infantil

No processo de escolha de um instrumento pode ser valorizada uma postura de


curiosidade pelo novo. Cada instrumento oferece um tipo de relação física e social com a
música. A afinidade entre crianças e instrumento pode ser o elemento inicial para despertar o
interesse para a escolha. Uma experiência inicial de conhecimento dos instrumentos e suas
características — apreciação do som, da forma e do movimento — pode oportunizar uma
vivência real e concreta antes da escolha final.
A escolha do instrumento musical por crianças de 5 a 6 anos de idade envolve a
curiosidade pelo novo, e neste contexto as atividades realizadas por meio da brincadeira
adquirem uma forma de expressão da música e de ludicidade deste processo. Entre as
questões que surgiram para a realização deste trabalho, destacam-se: Até que ponto as
experiências lúdicas que a criança tem ao longo do seu desenvolvimento são importantes para
a escolha de um instrumento musical? Como a utilização de recursos pedagógico-musicais
pode auxiliar no processo de escolha de um instrumento musical?

38
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Contexto

O presente trabalho é a continuação de uma pesquisa desenvolvida, no ano de 2010, no


contexto do programa de extensão “Música para Crianças” da Universidade de Brasília, que
atende crianças de 0 a 10 anos. O programa “Música para Crianças” proporciona aos
integrantes vivências musicais separadas por cursos. No curso destinado a crianças de 5 a 6
anos, denominado Pré Instrumental (PI), são oferecidas oficinas vivenciais trabalhando os
fundamentos da linguagem musical e propiciando o contato com diversos instrumentos
musicais. Um dos seus objetivos é preparar as crianças para a escolha e prática dos
instrumentos (ANTUNES et al, 2010).
Essa pesquisa foi referente ao processo de escolha de um instrumento musical em um
curso de educação musical infantil. Os objetivos foram a identificação dos fatores que atuam
no processo de escolha do instrumento musical por crianças entre quatro e seis anos de idade,
integrantes de um curso de educação musical e a análise da importância da mediação de um
projeto de orientação vocacional para a escolha do instrumento por essas crianças e suas
famílias. Ao final do trabalho os autores apontam que a influência da família deve ser
considerada, bem como suas expectativas quanto ao futuro da criança, sem uma pretensão
quanto a um determinismo entre a experiência musical na infância e o futuro profissional de
seus filhos. Foram discutidas também a preocupação com a liberdade de escolha e a
oportunização do diálogo promovendo uma motivação pessoal, por parte da criança, na
aprendizagem instrumental (ANTUNES et al, 2010).
Posterior a esse trabalhado, foram promovidas vivências pedagógico-musicais que são
apresentadas como em forma de um relato de experiência que envolve o processo de escolha
de um instrumento musical e a perspectiva do jogo musical inserido nesse contexto.

Brincar e Brincar na música

Ao brincar, as crianças desenvolvem a imaginação, trabalham diversos papéis,


podendo construir relações reais entre elas e elaborar regras de organização e convivência. Na
brincadeira as crianças constroem a consciência da realidade e vivenciam a possibilidade de
modifica-la. A brincadeira propicia oportunidade de aprendizagem, mas o professor deve
assumir o papel de orientador. Para Kishimoto (1996, apud Cória-Sabini; Lucena, 2004):

A utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do


conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico, mas o
trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de
39
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

parceiros bem como a sistematização de conceitos em outras situações que


não jogos (KISHIMOTO, 1996 apud CÓRIA-SABINI, 2004, p. 43).

A criança leva para a brincadeira aquilo que faz parte da sua realidade, expressa as
suas emoções e assimila as regras e comportamentos sociais, através da representação da
realidade em que vive sendo passada em forma de brincadeira. O brincar possibilita a
transição entre o mundo real e o imaginário. Por meio da brincadeira ela pode desenvolver o
papel que lhe agrada. Teles (1997) afirma, com relação à criança e a brincadeira:

Brincando, ela explora o mundo, constrói o seu saber, aprende a respeitar o


outro, desenvolve o sentimento de grupo, ativa a imaginação e se auto-
realiza (...) brincando, a criança, também, coloca para fora as suas emoções e
personaliza os seus conflitos (...). A criança reproduz na brincadeira a sua
própria vida. Através dela, ela constrói o real, delimita os limites frente ao
meio e o outro e sente prazer de poder atuar ante as situações e não ser
dominado por elas (TELES, 1997, p.14).

Os princípios do jogo e a utilização de materiais na educação musical foram discutidos


por educadores musicais. Willems (1962) considera apenas os materiais auditivos, como
instrumentos, músicas e fontes sonoras, enquanto Martenot (1970) considera jogo como
“conduta de ação (energias corporais), ferramenta pedagógica (parlendas, jogos de criação) e
material de jogo (objetos produtores de som ou relacionados à notação gráfica musical)”.
(MORAIS, 2009, p. 903-904). O jogo musical é uma atividade semelhante ao brincar
constituída de regras intrínsecas e objetivos musicais, constituindo o fazer musical.
(MORAIS, 2009).
Por meio dos Jogos Pedagógicos para Educação Musical, França e Guia (2005)
apresentam uma proposta para o ensino dos conteúdos visando a realização musical de
crianças a partir dos 6 anos de idade. Nessa proposta o jogo não visa a competição e sim os
processos psicológicos, promovendo a aprendizagem e o desenvolvimento musical da criança
(FRANÇA; GUIA, 2005).
A prática do jogo musical no contexto de um curso de música pode promover o
desenvolvimento musical individual da criança. Para Brito (2003) a promoção desse
desenvolvimento não exclui as intervenções educativas, e o professor deve promover
vivências a fim de proporcionar um ambiente estimulante, visando não só a música e sim a
formação integral da criança (BRITO, 2003).

40
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A orientação no processo de escolha

Considerando o desenvolvimento da criança, um programa de orientação deve


embasar seu trabalho nos múltiplos fatores que atuam na escolha. A criança pode fazer uma
escolha considerando suas experiências, seus interesses, e, principalmente, sua imaginação.
Para a escolha do instrumento não é diferente. A criança terá condições de escolher se tiver
contato com diversos instrumentos. Tomando o instrumento como uma ferramenta cultural, as
experiências são fundamentais para construir uma representação do som, da ação, da relação e
das possibilidades na relação sujeito-objeto.
Para acontecer uma escolha consciente é importante o papel de um orientador,
professor e de ações pedagógicas planejadas que visem “ampliar a consciência que o
indivíduo possui sobre a realidade que o cerca” (BOCK; AGUIAR, 1995 apud
PASQUALINI; GARBULHO; SCHUT, 2004, p. 72).

Relato de experiência

No 1º semestre de 2011, as aulas do curso são divididas por módulos, sendo que
quatro delas foram destinadas às famílias de instrumentos. A primeira aula foi sobre a família
de Percussão, seguida pela de Cordas e finalizando com a de Sopros. As imagens dos
instrumentos eram relacionadas ao som, alguns instrumentos foram apresentados fisicamente.
Ao final, como forma de sistematização, foi realizado um jogo pedagógico-musical. As
crianças conheceram diversos instrumentos e suas famílias, como violoncelo, violino, violão,
teclado, piano, flauta transversal, a família da flauta doce e a família percussão. Foram feitas
aulas especiais com os instrumentos, dando-lhes a oportunidade de manusear e interagir com
o instrumento e com o/a instrumentista.
Durante as aulas ocorreram dois momentos: 1) espontâneos, por parte das crianças; e
2) direcionados.
Os momentos espontâneos ocorreram de diversas maneiras, entre eles a exploração do
violão ao final das aulas e a sonorização dos instrumentos, por parte das crianças, em canção
sem palavras.
Dentre os momentos direcionados destacam-se a apresentação dos instrumentos por
meio de apreciação, com a visita de instrumentistas e também com a apresentação das
professoras, um jogo envolvendo o reconhecimento da imagem com o som do instrumento e o
manuseio de alguns instrumentos.

41
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Na primeira aula houve uma contextualização de todas as famílias. A professora


iniciou com o violão, que é o instrumento utilizado em todas as aulas. Assim ela questionou
as crianças o que é necessário para tocar o violão e um aluno respondeu que preciso de uma
“parlenda”, a professora confirmou dizendo que era uma palheta. Ao perguntar se sem a
palheta poderia tocar, o mesmo aluno respondeu que não, então houve a demonstração do
tocar com palheta e sem palheta, com essa explicação a professora explicou que a família do
violão era de cordas, depois perguntou sobre a flauta para depois focar na família de
Percussão. Para essa família foram apresentadas, primeiramente as imagens de instrumentos
em fotos e projeções para depois o instrumento real.
O primeiro instrumento apresentado foi o pandeiro. A professora ao perguntar de qual
família ele fazia parte, questionou o nome. Perguntou se o instrumento era da família de
sopro, e as crianças responderam que não. Em seguida uma criança citou que a família do
pandeiro era a “família de bater”, outra disse que era a “família de pandeiro”, então, a
professora explicou que o nome da família era de Percussão. Após a apresentação dos
instrumentos uma criança sugeriu a continuidade da atividade da seguinte forma: “pessoal tive
uma ideia, vamos montar uma banda?”, seguindo-se a exploração livre dos instrumentos.
Na segunda aula, sobre a família de Cordas, foram apresentados vários instrumentos,
dentre eles o piano. Ao gerar confusão por parte de algumas crianças viu-se a necessidade de
apresentar o piano e a sua estrutura física, abrindo-o e vendo o seu funcionamento.
Primeiramente, a professora exemplificou tocando-o, enquanto as crianças viam a articulação
do martelo com as cordas. Em seguida houve exploração individual.
Na aula destinada à família de Sopro foi apresentada a família das Flautas Doces. Por
meio da escuta atenta as crianças perceberam os contrastes sonoros (grave e agudo) e a
percepção de diferentes melodias. As flautas foram nomeadas segundo as suas
especificidades: Flauta Doce Soprano, Contralto e Tenor.
Ao final desse processo foi realizado o jogo Bingo Sonoro e Orquestra Vocal. Este
recurso pedagógico musical foi produzido por uma das professoras e tem por objetivo
reconhecer os sons dos instrumentos musicais associando à imagem de cada um, por meio de
um desenho representativo. Dentro dos objetivos específicos estão o despertar o interesse em
conhecer o instrumento de acordo com o som e a imagem, estimular o interesse por um
instrumento e analisar a representação dos instrumentos executados pelos participantes,
através de uma “orquestra”.

42
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Em sala de aula realizamos a primeira parte do jogo, destinada ao Bingo Sonoro. Antes
de começar o jogo e explicar os comandos da atividade, nós apresentamos os sons e as
imagens, aproveitando para perguntar sobre as famílias dos instrumentos. A atividade contou
com intervenções pedagógicas por parte dos professores e, principalmente com o trabalho
colaborativo entre as crianças tanto na identificação sonora e quanto iconográfica.
O jogo visa a experiência musical por parte das crianças, para proporcioná-las uma
escolha consciente. Pasqualini, Garbulho e Schut (2004) afirmam que:

os processos de internalização da realidade social iniciam-se já na primeira


infância, mediados pelas relações sociais que a criança estabelece com os
adultos (e demais crianças), nos diversos contextos em que está inserida,
como a escola, a família, a comunidade. Neste sentido, embora este seja um
processo em constante movimento ao longo da vida dos indivíduos, as
concepções de mundo, valores e opiniões principiam sua formação nesta fase
do desenvolvimento (PASQUALINI; GARBULHO; SCHUT, 2004, p. 72)

Com isso, constata-se a importância de oportunizar para a criança experiências que


auxiliem em uma escolha consciente e significativa, considerando, principalmente, o contexto
e história do sujeito que escolhe, no caso, a criança.

Considerações Finais

Considerando que a ludicidade é intrínseca da criança, em um processo de escolha de


um instrumento musical é importante a utilização de recursos pedagógicos musicais, visto que
a escolha deve ser significativa e consciente e não necessariamente definitiva. Essa escolha
pode ser modificada, de acordo com as experiências vivenciadas pela criança, alterando assim
seus gostos e preferências. O que é imaginado antes do brincar pode ser modificado após a
experiência com o instrumento propriamente dito. A experiência e o envolvimento com os
instrumentos e com as atividades continuam em casa e o uso de diferentes recursos, como
jogos e brincadeiras, bem como novas tecnologias como sites, vídeos, podem ser facilitadores
para uma experiência significativa.
As atividades concretas servem como parâmetro para a posterior escolha de um
instrumento musical. O trabalho dos instrumentos em famílias permite que a crianças vejam
um conjunto de instrumento com características similares e possam escolher dentro de um
conjunto de possibilidades.

43
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ANTUNES, Larissa Rosa; RIBEIRO, Samara Pires da Silva; FREIRE, Sandra Ferraz C. D. &
FREIRE, Ricardo Dourado. O processo de escolha do instrumento musical em um curso de
educação musical infantil. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
EDUCAÇÃO MUSICAL, 19, 2010, Goiânia. Anais ... ABEM, 2009. p. 1637-1647.

BRITO, Teca Alencar de. Música na Educação Infantil: propostas para a formação integral da
criança. São Paulo: Peirópolis, 2003.

CÓRIA-SABINI, Maria Aparecida; LUCENA, Regina Ferreira. Jogos e Brincadeiras na


Educação Infantil. Campinas: Papirus, 2004.

FRANÇA, Cecília Cavalieri; GUIA, Rosa Lúcia dos Mares. Jogos Pedagógicos para
Educação Musical. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.

MORAIS, Daniela Vilela de. O material concreto do ensino de música: jogo ou brinquedo?
In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL,
18, 2009, Londrina. Anais... ABEM, 2009. p. 903-909.

PASQUALINI, Juliana C.; GARBULHO, Norma F.; SCHUT, Tannie. Orientação


Profissional com Crianças: Uma Contribuição à Educação Infantil. Revista Brasileira de
Orientação Profissional, 2004, 5 (1), p.71-85.

TELES, Maria Luiza Silveira. Socorro! É proibido brincar! Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

44
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Construindo um Modelo de Plano Para Aulas de Musicalização Infantil: a


experiência do Curso de Musicalização Infantil da UFPR

Vivian Dell’ Agnolo Barbosa


UFPR
vivian.agnolo@gmail.com

Tiago Madalozzo
UFPR

Resumo: Com o presente relato pretendemos apresentar um modelo de estruturação de


atividades em aulas do Curso de Musicalização Infantil da UFPR. De construção coletiva
pelos professores-estagiários atuantes no curso, esta estruturação acabou por ser formatada em
um modelo de plano de aula adotado a partir de 2009 para todas as turmas do curso.
Baseamos a argumentação em definições da abordagem fundamental do curso: a
musicalização infantil e o jogo musical. A partir dos relatos de Ilari (2010) e Freire & Freire
(2008), trabalhamos os conceitos de community of practice e construção colaborativa, que
definem a organização logística do curso da UFPR. Ao apresentarmos o modelo de plano de
aula, procuramos analisar a sua gênese e seu layout inicial a partir dos conceitos de estrutura,
conteúdo e andamento, conforme sugeridos por Russell (2005), destacando ainda
contribuições do pensamento de França & Swanwick (2002) e Palheiros & Wuytack (1995).
Por fim, estabelecemos uma crítica a respeito da aplicação do modelo, ou seja, uma análise da
prática em sala de aula a partir do planejamento.
Palavras chave: Musicalização, planejamento, relato

Introdução

Atuando junto à comunidade de Curitiba-PR entre 2003 e 2010, o Curso de


Musicalização Infantil da UFPR, extensão universitária, foi concebido como um laboratório-
escola para prática dos acadêmicos do curso de Música – Educação Musical da instituição,
que, na época, não tinham número relevante de opções para estágio em Educação Infantil.
Ao longo dos anos, a estrutura física e humana do curso se ampliou: em setembro de
2003, havia cerca de vinte e cinco alunos – crianças da comunidade curitibana – e cinco
professores-estagiários – discentes do curso de licenciatura – atuando em uma sala de aula; já
no final do primeiro semestre de 2010, quando o curso foi suspenso, eram cerca de trezentos
alunos atendidos pelo curso e mais de cem em lista de espera, e trinta instrutores divididos em
19 turmas.
O sistema de ensino-aprendizagem entre os professores-estagiários é ponto crucial na
estrutura logística que se implantou desde o início: em cada sala de aula, um grupo de três
professores era responsável pela turma. Desta forma, combinava-se sempre professores mais

45
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

experientes com novos professores, o que promovia um fluxo de ideias, conhecimento,


repertório e experiência dos mais valiosos, num processo de aprendizagem por pares, ou
peer-learning system, conforme apontado por Beatriz Ilari (MADALOZZO et al, 2008, p. 71;
ILARI, 2010, p. 54), criadora e primeira coordenadora do projeto.
Com o decorrer das atividades do Curso de Musicalização Infantil da UFPR, os
instrutores constataram a emergência de um modelo de plano de aula que, entendemos, foi
autoconstruído. Embora uma versão padrão deste modelo tenha sido adotada por todos os
professores do curso a partir de 2009, alguns anos antes seria impossível apontar “o autor” do
modelo, uma vez que a construção foi coletiva e, desta forma, resultou em um produto
original e possível apenas com a interferência de diferentes modos de ensinar e entender o
curso, a partir de constantes avaliações do dia-a-dia de sala de aula.
Com este relato, pretendemos descrever e analisar este modelo de plano de aula,
apontando certas concepções teóricas que a partir dele ficam evidentes.

Construindo um modelo de plano de aula de musicalização infantil

A partir da estruturação do curso em turmas com trios de professores, a cada semestre


realizava-se uma reunião para definição de um tema gerador, comum a todas as turmas. Este
tema não só seria uma espécie de fio condutor para os planos de aula, mas também para a
organização de uma Aula Pública de encerramento, no final dos quatro meses de curso, em
que todas as turmas de uma determinada faixa etária apresentariam duas ou três músicas
trabalhadas ao longo deste tempo.
Com a definição coletiva do tema gerador, enfim os trios se reuniam para organizar
em linhas gerais o planejamento semestral da turma, e a partir disso começavam as reuniões
semanais, fosse presencialmente ou com auxílio da internet, para elaboração de cada plano de
aula. Por este motivo é que, a partir de um dado momento, adotou-se uma versão padrão do
modelo de planejamento em discussão neste trabalho: depois de alguns semestres em que
cada turma registrava os planos de forma particular, e a partir de diversas reuniões para troca
de ideias e repertório entre turmas de professores, aos poucos definiu-se a versão final que
todos deveriam seguir para facilitar inclusive a preparação de material para pesquisa – é
preciso destacar que muitos dos participantes acabaram voltando suas pesquisas acadêmicas a
estudos ligados a musicalização, muitas vezes utilizando planos de aula arquivados como
material para estudo de caso.

46
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A abordagem de ensino no Curso de Musicalização Infantil da UFPR

Quando nos referimos ao curso da UFPR, o título Musicalização Infantil faz referência
a uma abordagem específica de educação musical que é definida no 3º volume do Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 45-51): trata-se da
abordagem da musicalização, em que a partir de canções, jogos, danças, exercícios de
movimento, relaxamento, prática instrumental, improvisação e audição, certas noções básicas
de ritmo, melodia, compasso, métrica, som, tonalidade, leitura e escrita musicais são
apresentadas à criança, sempre se reportando ao universo lúdico da infância – portanto, a
partir do jogo musical.
Maura Penna (2010, p. 22) afirma que musicalizar é “desenvolver os instrumentos de
percepção necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la,
recebendo o material sonoro/musical como significativo”. Desta forma, a musicalização é um
processo em que “as potencialidades de cada indivíduo são trabalhadas e preparadas de modo
a reagir ao estímulo musical” (PENNA, 2010, p. 21). Em outras palavras, a estimulação
musical desde cedo tem por objetivo dotar as crianças de elementos característicos da música
de uma determinada cultura, desenvolvendo não só o ouvido, mas também o movimento
corporal e a expressão verbal, para que ela reaja a estes estímulos. Mesmo que tudo seja
apresentado e aprendido de forma “implícita” – por exemplo, chacoalhando caxixis para
entender o conceito de pulso de forma ativa –, nunca se deixa de utilizar em sala de aula o
conceito musical correto – neste caso, pulso –, e é a partir do aprendizado destes conceitos
básicos que busca-se formar indivíduos que mais tarde possam conhecer e expressar-se com
música, e sejam capazes de emitir um juízo de valor sobre aquilo que produzem e ouvem.
Recuperando o final da definição do RCN, destacamos o papel do jogo musical no
processo de musicalização, e isto se deve a um fator fundamental: a brincadeira é uma espécie
de interface natural da criança com o mundo – nas palavras de Ilza Joly (2003, p. 116), a
criança, a partir da brincadeira, “relaciona-se com o mundo que descobre a cada dia e é dessa
forma que faz música: brincando”.
Neste caso, é importante destacar aquilo que Tizuko Kishimoto (1994, p. 19) apresenta
como “paradoxo do jogo educativo”. Segundo a autora, o que define o jogo educativo é a
presença concomitante de duas funções que parecem antagônicas: a função lúdica e a função
educativa. Ou seja, por um lado, o jogo serve para propiciar a diversão e o prazer; por outro,
deve ter um objetivo pedagógico claro. Se o equilíbrio entre as duas funções não for atingido,
ou não haverá ensino, apenas jogo; ou não haverá hedonismo, apenas ensino.

47
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Já que o trabalho de musicalização no curso da UFPR é intimamente ligado à ideia do


jogo musical, é importante não se deixar cair no perigo de as aulas serem momentos de
“recreação”, ou seja, tomando cuidado para não perder de vista o objetivo pedagógico em
todas as atividades que se propõem.

O trabalho coletivo de planejamento e organização no Curso de Musicalização Infantil


da UFPR

A estrutura logística do Curso de Musicalização Infantil da UFPR, à qual fizemos


referência anteriormente, não era composta somente pelos trios de instrutores. Assim como
apresentado por Ilari (2010, p. 48), o organograma era dividido em três níveis: a) coordenador
(professor do Departamento de Artes da UFPR, proponente do projeto); b) monitores (três
instrutores que se dispõem, a partir de indicação do coordenador, a organizar as questões
burocráticas de matrículas, divisão de turmas, contatos com os pais dos alunos e organização
da Aula Pública de encerramento); e c) professores-estagiários (discentes do curso de
licenciatura organizados em trios).
Deixando de lado o papel dos monitores, que se ocupam de questões burocráticas, a
tomada de decisões pedagógicas era coletiva porém supervisionada: coletiva porque acontecia
no âmbito do grupo como um todo (para estruturação do tema gerador do semestre e troca de
ideias entre turmas de mesma faixa etária) e no contexto de cada turma a partir do sistema de
trocas entre o trio de professores-estagiários; mas nada disso deixava de ser acompanhado
muito de perto pelo coordenador do curso, que participava do projeto ativamente visitando as
aulas, tecendo comentários para os trios, e coordenando todos os momentos de reunião do
grupo.
Desta forma, tendo o curso uma organização coletiva e uma atuação coletiva
supervisionada, podemos resgatar o conceito de community of practice empregado por Ilari
(2010, p. 52), ao entendermos que havia um engajamento mútuo, mas não homogêneo; ou
seja, cada membro do grupo (ou, mais especificamente, do trio) contribuía para a prática de
sala de aula a partir de diferentes graus de envolvimento, conhecimento e participação. É
desta forma que emergem questões como a de liderança e real envolvimento dos participantes
para um mesmo fim pedagógico, conforme analisadas por Ilari.
Esta estrutura é extremamente importante ao analisarmos a questão do planejamento,
uma vez que os professores-estagiários tinham, de certa forma, livre arbítrio para organizarem
o semestre de sua turma da forma como acharem mais relevante. Ou seja, por mais que a
coordenação procurasse fiscalizar o trabalho realizado em sala de aula, a discussão sobre as
48
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

linhas do planejamento a longo prazo muitas vezes ficava restrita ao trio; ou ainda, era
subordinada à forma como os indivíduos mais experientes do trio, justamente por seu maior
conhecimento prático, enxergavam os objetivos do semestre.
Sobre o planejamento coletivo, cabe destacar o que Ricardo e Sandra Freire
registram sobre a organização do Curso de Musicalização Infantil da Universidade de
Brasília. Segundo os autores, não é interessante massificar as aulas ao se propor planos de
aula padrão: um planejamento “construído no diálogo entre os agentes”, portanto integrativo e
flexível, aproveita melhor “a potencialidade dos professores em agenciar o desenvolvimento
de seus alunos com competência” (FREIRE; FREIRE, 2008, 157).
Ainda que o sistema de aulas seja visivelmente diferente do curso da UFPR, esta visão
sobre a qualidade de um planejamento coletivo é ponto em comum com a nossa análise.
Segundo os autores, o planejar é um “processo relacional”, ou ainda uma “construção
colaborativa que inclui e integra” (FREIRE; FREIRE, 2008, p. 158) as características pessoais
de cada professor, aproveitando a diversidade de repertórios, propostas, modos de pensar e
agir em sala de aula etc.
É a partir dessa diversidade, mas sempre reportando-se ao grupo, que percebemos a
construção coletiva de um modelo de plano de aula. O conteúdo de cada aula do curso da
UFPR nunca foi copiado ou imposto para todas as turmas; mas a forma de se agir em sala de
aula é tão coesa que possibilitou a origem de um modelo de plano de aula comum, que será
apresentado em seguida.
Além das questões de planejamento, que são exemplo característico desse sistema de
atuação coletiva supervisionada, é importante destacar duas outras produções originadas a
partir do mesmo sistema de organização: um CD com trinta e oito canções e um livro com
quarenta e quatro propostas de musicalização infantil, lançados ao final do primeiro e do
segundo semestres de 20081, respectivamente, em que todos os professores do curso tiveram a
oportunidade de gravar/publicar materiais de uso cotidiano no Curso ou ainda propostas e
composições inéditas, sempre com igualdade de condições de participação, mas sob
supervisão de uma pequena equipe. Assim, além da experiência de estágio, o Curso de
Musicalização originou produções acadêmicas diversas como os materiais acima e algumas
monografias de conclusão de curso de graduação.

1
O livro, intitulado “Fazendo Música com Crianças”, está sendo reeditado pela Editora da UFPR neste ano.

49
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A gênese e o layout final do plano de aula

Antes que um modelo de plano fosse adotado como padrão, os professores


costumavam anotar as atividades em cadernos. Em trio, muitas vezes definiam a ordem das
atividades da aula utilizando apenas uma estrutura em tópicos. Dessa forma, havia uma
estrutura básica, com início, meio e fim.
Entendemos que a gênese do modelo final de plano tenha sido justamente a estrutura
da aula em tópicos, ou seja, a estrutura básica da aula. A partir de trocas de ideias entre os
professores, aos poucos esta estrutura foi sendo adotada por todas as turmas, sendo possíveis
pequenos ajustes naturais. Abaixo apresentamos um quadro em que se resume a variedade de
tópicos abordados em aula.

Tabela 1: Tipos de atividades – os tópicos iniciais


que deram origem a um plano comum
Estrutura da aula Tipo de atividade
Saudação /
Início
Limpeza de ouvidos
Escala musical
Contorno melódico
Percussão instrumental
Gestual
Meio Percussão corporal
Dança
Audição ativa
Apresentação de
instrumento musical
Relaxamento
Fim Audição
Despedida

As atividades de saudação são canções em que, em geral, destaca-se o nome de cada


criança da turma; da mesma forma com as atividades de limpeza de ouvidos2, o objetivo é
criar um pequeno momento de separação entre as atividades cotidianas das crianças e a aula
da música; ou seja, é um marco musical de início do período de aula.
A partir daí, as outras atividades, a “aula propriamente dita”, são organizadas de
acordo com a variedade de possibilidades exposta no quadro; mas nem sempre na mesma

2
ver as considerações de R. Murray Schafer sobre o assunto em SCHAFER, R. M. Limpeza de ouvidos. In: O
ouvido pensante. São Paulo: UNESP, 2001. p. 67-118.
50
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ordem, e não necessariamente utilizando toda essa variedade em cada aula3. Por fim, as
atividades finais têm o mesmo objetivo das iniciais: marcarem musicalmente o término da
aula.
O modelo a que nos referimos neste relato encontra-se na página 11, em seu layout no
ano de 2010. Destacamos duas informações importantes de início: o espaço para registro dos
objetivos da aula, bem como o tema específico; e a organização das atividades em tabela, em
uma variação a partir de vários modelos, em especial o empregado por Joan Russell (2005, p.
82).
Na tabela, cada linha representa uma atividade da aula. A título de comparação, nas
turmas com crianças entre 0 e 4 anos, que vão às aulas junto com os pais, os professores
utilizavam uma média de doze atividades; já nas turmas de crianças mais velhas, entre 6 e 10
anos, a média cai para seis a oito atividades. O motivo é a maior complexidade e possibilidade
de variação dentro da mesma atividade, no caso das crianças mais velhas, e o menor tempo de
foco das crianças menores, por outro lado.
Nas colunas, inicialmente havia apenas: 1) tipo de atividade; e 2) desenvolvimento.
Assim, a tabela nada mais era que uma nova formulação daquilo que já se fazia
“informalmente” nos cadernos dos professores. Mais adiante, porém, foram incluídas novas
colunas: 3) o condutor das atividades (já que era um trio, e não seria pedagógico que os três
dessem ordens ao mesmo tempo); 4) o tempo médio de duração estimada, para controlar o
andamento da aula; e 5) referências das atividades, para que, se o material fosse utilizado para
fins de pesquisa, se tornasse mais fácil encontrar a autoria das atividades, uma vez que cada
professor tinha conhecimento de estratégias e repertórios diferentes.
Além disso, cada vez mais procurou-se enfatizar a importância de um complemento
escrito: “observações gerais depois da aula”, campo localizado no rodapé do plano.

Avaliando em termos de estrutura, conteúdo e andamento

A pesquisadora canadense Joan Russell publicou em 2005 um trabalho em que


descreve uma aula de música cuja abordagem é a musicalização infantil. A partir da prática, a
autora estabelece três conceitos segundo os quais analisa a aula: estrutura, conteúdo e
andamento (RUSSELL, 2005, p. 83-85). É importante destacar que, no texto de Russell, estes

3
Freire e Freire (2008, p. 160) apresentam uma estrutura em tabela em que enfatizam algumas atividades como
de: aquecimento e concentração; movimento; elaboração; avaliação individual; brincadeiras; avaliação
coletiva; e despedida.

51
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

conceitos foram definidos para análise “pós” aula, a partir da prática; já neste relato,
tomaremos cada um deles teoricamente para avaliar a proposta do plano de aula apresentado.
Em termos de estrutura, é importante que a aula tenha seções pré-estabelecidas e bem
marcadas. Ganha destaque o momento de saudação, uma vez que é necessário marcar o início
do momento pedagógico. Além disso, a partir da alternância de atividades em aula, com o
passar do tempo as crianças começam a entender que a aula tem uma sequência básica, e que
há momentos específicos para cantar, tocar, dançar e ouvir. Além disso, um senso de
comunidade é explorado, uma vez que em certos momentos é necessário dividir instrumentos
com os colegas, ou mesmo entregar um determinado instrumento para pegar outro e dar
sequência à aula. Este entendimento faz com que as crianças se sintam muito confortáveis na
sala de aula depois de algumas semanas. Por estes motivos é que consideramos a estrutura
apresentada na página 6 como o principal resultado pedagógico a que se chegou no curso ao
longo dos anos, uma vez que ela auxiliou na caracterização do “jeito UFPR” de se ensinar
música a crianças.
Esta ordem de tipos de atividade, porém, pode ser analisada por outro conceito, o de
conteúdo. A aula de música deve ser uma espécie de tapeçaria, segundo um princípio básico:
o da unidade na variedade (RUSSELL, 2005, p. 83-85). A partir da contribuição coletiva do
trio de professores, uma boa aula deve ser construída a partir da maior variedade de atividades
e propostas possível, mas sem se perder o fio condutor.
Em termos de variedade, destacamos, mais uma vez, os diferentes tipos de atividades
propostos; mas também podemos registrar a variedade de: repertório; configuração das
crianças (sentados, em roda, em pé, em duplas, com os pais etc); e a alternância das
modalidades do fazer musical.
Sobre este último tópico, citamos o pensamento de Cecília França e Keith Swanwick,
quando destacam a importância de equilíbrio e interação entre atividades de composição,
apreciação e performance; ou criação, audição e execução musical, segundo eles, “facetas
essenciais de uma educação musical abrangente” (FRANÇA; SWANWICK, 2002, p. 15-17).
Ainda neste sentido, sempre procurou-se enfatizar a importância de um cuidado com
os momentos de apreciação musical, afastando-se ao máximo de atividades passivas ao se
discutir o conceito de audição musical ativa conforme apresentado por Graça Boal Palheiros
e Jos Wuytack (1995, p. 12-13): um “processo que implica o envolvimento activo [sic] do
ouvinte, e para o qual são necessárias a experiência e a aprendizagem”, e que acontece a partir
da associação de outros tipos de atividades à de escuta, tais como: movimentos;

52
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

acompanhamento instrumental; acompanhamento verbal; apresentação ou confecção de


gráficos; ou tudo isso junto, de forma a tornar possível a “visualização” do evento musical.
Ainda dentro do conceito de conteúdo, em termos de unidade é necessário destacar o
que Russell chama de “elos conceituais ou temáticos”: apesar da miscelânea de estratégias,
conceitos e repertórios trabalhados, a aula tem uma profunda lógica interna pela existência de
ligações entre as atividades que garantem a transição suave entre as atividades. Exemplos de
elos de ligação são: padrões rítmicos; intervalos ou contornos melódicos; ou quaisquer
conceitos musicais que são trabalhados em ao menos duas músicas, fazendo com que fique
óbvia a ligação entre as atividades.
Por fim, Russell define como andamento a capacidade do professor em conduzir a aula
com o maior nível de concentração possível dos alunos, ou seja, dosando o tempo de cada
atividade, percebendo exatamente o momento de se passar para a próxima atividade sem
haver dispersão. Trata-se, portanto, de algo que se constrói com a experiência em sala de aula.
No curso da UFPR havia três pensamentos que procuravam auxiliar para um bom
andamento: a) a estratégia do “senta-levanta”; b) a economia de linguagem verbal; e c) o
planejamento de atividades extras. A partir de uma alternância de atividades em disposições
espaciais diferentes, procurando agir mais e dar regras de menos, e tendo sempre “cartas na
manga” para momentos em que o número de atividades planejadas era insuficiente,
procurava-se ter uma maior garantia de que a aula seria mais eficiente do ponto de vista do
andamento.

Crítica a respeito do dia-a-dia de planejamento de aulas e considerações


finais

Tecemos abaixo algumas críticas a partir da aplicação do modelo em aula.


Em primeiro lugar, é muito difícil o estabelecimento de elos conceituais ou temáticos
entre todas as atividades, e muitas vezes a ligação passa a ser menos um elo musical do que
um elo “temático” extra-musical. Por exemplo: duas músicas que tratam de animais, sendo o
elo temático os animais, e não um conceito teórico musical. Ainda assim, sempre houve elos
entre atividades reunidas sob um mesmo tópico; portanto, de qualquer forma, era natural a
ocorrência de uma unidade entre atividades nos planos.
Por mais que o curso sempre tenha sido o ponto de partida para um encaminhamento
profissional de muitos professores-estagiários, nem sempre houve um comprometimento geral
com o momento do planejamento, fazendo com que o estabelecimento de metas para o

53
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

semestre fosse algo secundário, bem diferente da importância dada a isso a partir do registro
de Freire e Freire no curso da UnB (2008, p. 158-160). Além disso, mesmo que um
determinado trio de professores tivesse esta preocupação, muitas vezes não havia uma efetiva
troca de ideias entre os trios de uma mesma faixa etária, o que poderia possibilitar um ganho
considerável.
Com o passar dos anos, a estrutura humana do curso aumentou muito, e, infelizmente,
o grande número de professores-estagiários dificultou a manutenção de uma uniformidade em
termos de estratégia de ensino – aquilo a que nos referimos como “jeito UFPR” de
musicalizar.
Ainda assim, o modelo de plano de aula – e mesmo de planejamento geral,
considerando-se a força do critério de conteúdo na gênese do modelo, conforme destacamos –
nos parece bastante efetivo, havendo vasto material padronizado para pesquisa nos arquivos
do curso.
Também não podemos perder de vista que sempre se procurou promover as “rodas de
repertório”, tardes de sábado em que todos os professores-estagiários se reuniam para discutir
ideias e principalmente trocar repertório. Ainda, o curso sempre promoveu oficinas de
capacitação e atualização com professores de renome nacional e internacional para contribuir
com a formação e reciclagem contínua de estratégias e repertório de seus instrutores.
É preciso destacar especialmente a presença de um forte pensamento teórico que
dominou toda uma geração de professores do curso: as ideias de Jos Wuytack e sua pedagogia
Orff, de conhecimento de alguns dos instrutores desde 2005, e fortificada a partir da
realização de grandes cursos de pedagogia musical ativa entre 2007 e 2010, principalmente
nas estratégias de jogos, na diversidade de repertório e com o conceito de audição musical
ativa.
Por fim, concluímos ao destacarmos a utilização do modelo de plano construído ao
longo desse tempo na UFPR em outros projetos de musicalização, já que vários dos
professores-estagiários, após o término da graduação, passaram a gerenciar cursos de
musicalização em escolas e universidades espalhadas em várias regiões do país.

54
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

FIGURA 1 – Modelo de plano de


aula adotado pelos professores-
estagiários do Curso de
Musicalização Infantil da UFPR –
versão do primeiro semestre de
2010.

55
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial curricular nacional para a educação infantil. vol.3. Brasília: MEC/SEF, 1998.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/volume3.pdf>. Acesso em: 21 jul.
2011.

FRANÇA, Maria Cecília Cavalieri.; SWANWICK, Keith. Composição, apreciação e


performance na educação musical: teoria, pesquisa e prática. In: Em Pauta, Porto Alegre, v.
13, n. 21, dez. 2002. p. 5-41. Disponível em:
<http://seer.ufrgs.br/EmPauta/article/download/8526/4948>. Acesso em: 12 mar. 2011.
FREIRE, Ricardo D.; FREIRE, Sandra F. Planejamento na Educação Musical Infantil. In:
CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
(ANPPOM), 18., 2008, Salvador. Anais... Salvador: Programa de Pós-Graduação em
Música da Universidade Federal da Bahia, 2008. p. 157-161. Disponível em:
<http://www.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_2008/comunicas/COM383%20-
%20Freire%20et%20al.pdf>. Acesso em: 12 mar. 2011.

ILARI, Beatriz S. A community of practice in music teacher training: The case of


Musicalização Infantil. Research Studies in Music Education, v. 32, n. 1, jun. 2010. p. 43-60.
Disponível em: <http://rsm.sagepub.com/cgi/content/abstract/32/1/43>. Acesso em: 13 set.
2010.

JOLY, Ilza. Educação e educação musical: conhecimentos para compreender a criança e suas
relações com a música. In: HENTSCHKE, Liane; DEL BEN, Luciana (orgs.). Ensino de
música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Paulo: Moderna, 2003. p. 113-126.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O jogo e a educação infantil. São Paulo: Pioneira, 1994.

MADALOZZO, Tiago; ILARI, Beatriz S.; ROMANELLI, Guilherme; BOURSCHEIDT,


Luís; KROKER, Fabiane; PACHECO, Caroline B. (org.). Fazendo música com crianças.
Curitiba: DeArtes/UFPR, 2008.

PALHEIROS, Graça Boal; WUYTACK, Jos. Audição Musical Activa. Porto, Portugal:
Associação Wuytack de Pedagogia Musical, 1995.

PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2010.

RUSSELL, Joan. Estrutura, conteúdo e andamento em uma aula de música na 1ª série do


ensino fundamental: um estudo de caso sobre gestão de sala de aula. Revista da ABEM, Porto
Alegre, 2005. v. 12. mar. 2005. p. 73-88. Disponível em:
<http://www.abemeducacaomusical.org.br/Masters/revista12/revista12_artigo10.pdf>. Acesso
em: 15 ago. 2009.

56
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Proposta Pedagógica de Ensino Coletivo do Violino para Crianças de 5


Anos na Escola de Música da Universidade Federal do Pará

Joziely Brito
joziely@hotmail.com

Resumo: Há cerca de uma década esta autora vem desenvolvendo, um trabalho voltado para a
iniciação ao violino de crianças de 5 anos na Escola de Música da Universidade Federal do
Pará. A proposição de uma metodologia voltada para o ensino coletivo do violino com
crianças de 5 anos, se dá devido a dificuldade desta autora encontrar material pedagógico
voltado para a faixa etária em questão. Sendo assim, este artigo representa um recorte de
pesquisa em andamento para a obtenção do título de doutora em educação musical pela
Universidade Federal da Bahia cujo objetivo é sistematizar e aplicar uma metodologia de
ensino coletivo voltada para a iniciação musical infantil no violino. Para isso, será necessário
reunir fundamentações teóricas e empíricas sobre ensino coletivo do violino o que enriquecerá
e respaldará essa proposta. Buscar conhecimentos na área da educação e da cognição musical
também se faz necessário para conhecer de forma aprofundada o público alvo da investigação
que são crianças de 5 anos. Com base na pesquisa qualitativa e no estudo de caso, serão
utilizados como instrumentos de coleta de dados questionários, observação participante,
vídeogravações e juízes independentes. A análise de dados contará com técnicas de
triangulação o que promoverá maior fidedignidade nos resultados. Espera-se que esta
investigação proporcione uma maior discussão sobre o ensino coletivo de instrumentos
musicais para crianças em especial no violino, visando não só aspectos técnicos, mas com
perspectivas de aspectos cognitivos e sociais.
Palavras - chave: Educação musical infantil, ensino coletivo de instrumentos musicais,
ensino coletivo do violino

Introdução

A comunidade acadêmica da área musical com freqüência vem se dispondo a


pesquisar e publicar artigos com referentes ao ensino coletivo de instrumentos musicais
(ALMEIDA, 2004; CRUVINEL; ORTIS; LEÃO, 2004; MONTANDON, 2004; TOURINHO,
2004)1. A partir dos anos 90 o tema começa e ser incluído e debatido de forma abrangente em
seminários e encontros de educadores musicais, que pretendem pesquisar a fundo os
benefícios do ensino coletivo de instrumentos musicais (BARBOSA, 2006; CRUVINEL;
MARQUES, 2006; GONÇALVES, 2006)2.
O ensino coletivo na educação musical, por possuir um forte caráter social, pode ser
utilizado para promover a interação entre as pessoas e a comunicação social, integrando
aspectos afetivos, estéticos e cognitivos. Sendo a música uma das grandes formas de

1
Anais do I Encontro de Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais.
2
Anais do II Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais.
57
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

expressão humana, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI,


1998) defende a sua presença no contexto da educação, de um modo geral e particularmente,
na Educação Infantil.
Neste contexto, em estudos anteriores realizados com a classe de violino infantil na
Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA), Brito (2002) buscou, por
meio de pesquisa de campo, fundamentos teóricos e empíricos que norteassem o ensino
coletivo do violino com crianças de 4 e 5 anos. A busca para tentar propiciar um aprendizado
eficaz que proporcionasse ao aluno uma formação lúdica, crítica e social, resultou em um
relato de experiência que motivou a elaboração de uma metodologia específica para atender as
necessidades da faixa-etária trabalhada. Para dar respaldo a essa proposta pedagógica, Brito
(2010), em sua dissertação de mestrado, se propôs a investigar e catalogar trabalhos
científicos que discutissem sobre o ensino coletivo de cordas friccionadas. Brito (2010) optou
por pesquisar sobre cordas friccionadas devido à escassez de trabalhos científicos voltados
para o ensino coletivo de violino. Por sua vez, a presente pesquisa tem em vista mais uma vez
colaborar com tais trabalhos, ao sistematizar uma experiência de ensino coletivo do violino
para crianças de 5 anos de idade, na EMUFPA. Sendo assim, esta proposta de pesquisa
justifica-se pela necessidade de publicações de trabalhos científicos e de material pedagógico
sobre educação musical coletiva do violino para crianças de 5 anos.
A presente proposta de investigação não pretende discutir sobre métodos e tampouco
discutir sobre metodologias de ensino coletivo de violino, porém não será descartada a
hipótese de consultá-los como material referencial. As discussões estarão centralizadas na
proposição de uma metodologia voltada para a iniciação ao violino de crianças de 5 anos na
Escola de Música da Universidade Federal do Pará. Tal pesquisa também possibilita a
ampliação das discussões sobre o ensino coletivo do violino e sua utilização como ferramenta
metodológica eficaz na iniciação musical instrumental.
Assim, delineia-se como objetivo geral a sistematização e aplicação de uma proposta
pedagógica de ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos na Escola de Música da
Universidade Federal do Pará visando desenvolver não só aspectos técnicos, mas também
proporcionar uma formação com perspectivas à verificação de aspectos cognitivos e sociais.
Como objetivos específicos em princípio se estabelecem: desenvolver aspectos técnicos
referentes ao ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos; verificar o desenvolvimento
de aspectos cognitivos no ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos e verificar o
desenvolvimento de aspectos sociais no ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos.

58
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

É imprescindível que a Educação Musical, no contexto social contemporâneo, apoie


seu entendimento dos processos pedagógicos em suas relações com a sociedade para o auxilio
da criação de metodologias inovadoras que auxiliam a transformação social. Oportunizar uma
formação que permita uma prática pedagógica musical que valorize e respeite o
desenvolvimento do indivíduo como um todo, permite uma iniciação musical mais prazerosa
e eficiente principalmente no que se diz respeito ao lado humanístico do individuo.

Revisão de Bibliografia

O Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais – ENECIM, desde


sua primeira edição em 2004, reúne pesquisadores com interesse na área que vem discutindo
o assunto para uma melhor compreensão sobre questões pertinentes ao ensino coletivo de
instrumentos musicais, buscando por meio de trocas de experiências soluções e atribuições
para enriquecimento científico e pedagógico da área. Dentre os pesquisadores podemos
destacar: José de Almeida, Joel Barbosa, Flávia Cruvinel, Maria Isabel Montandon, Fernanda
Ortis, Ana Cristina Tourinho, Diana Santiago entre outros.
Pesquisadores reconhecem que o indivíduo que passa por uma musicalização coletiva
na infância, além de adquirir sensibilidade sonora, desenvolve outras qualidades, como a
concentração, a coordenação motora, a socialização, o respeito a si e ao grupo, e outras
características que colaboram na formação do indivíduo (CAUDURO, 1989; GAINZA, 1988;
MÁRSICO, 1982; SUZIGAN, 1986).

[...] a aprendizagem musical deve ser repensada, visto que para o processo
de musicalização ser importante e significativo, faz-se necessário que nos
primeiros anos de vida o contato musical seja intuitivo, criativo e espontâneo
e de preferência com um repertório de qualidade que vá além das músicas
expostas pela mídia [...] (BAGATIN; DIAS; MAIA; RIBEIRO; RONDEL;
2006 p.1791)

O curso de violino da Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA)


atualmente esta estruturado em três níveis: módulo (duração de cinco anos), básico (duração
de quatro anos) e técnico (duração de três anos). A EMUFPA prevê em seu plano acadêmico
que a partir dos 5 anos de idade o aluno já pode ingressar no curso preparatório de violino.
Sendo assim, a necessidade de direcionamento de metodologia específica para atender essa
clientela de baixa faixa-etária se faz indispensável.
O trabalho com crianças exige em especial o conhecimento de fatores psicológicos,
que envolvem o desenvolvimento biológico e do pensamento (PIAGET, 2001; GORDON,

59
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

2000; SLOBODA, 2008; ILARI, 2006). Para a sistematização de uma metodologia que atinja
essa criança de 5 anos de forma a contribuir com sua formação não só técnica referente ao seu
aprendizado no violino, mas também cognitiva e social deve-se primeiramente buscar
entender: quem é a criança de 5 anos e como se forma seus processos cognitivos e sociais?
Para isso, será muito importante compreender a natureza do conhecimento musical, do
processo de aprendizagem e do social ao qual o aluno dessa faixa-etária é submetido. Logo, a
busca por referências que discutam sobre os processos de aprendizagem de crianças de 5 anos
será de suma importância para a elaboração da proposta de pesquisa.
Além de gerar possibilidades de discussão sobre aspectos técnicos, aspectos cognitivos
e aspectos sociais para o ensino coletivo infantil do violino, será importante selecionar alguns
tópicos para discussão sobre personalidades do meio musical, que através de suas
contribuições reinventaram conceitos e quebraram paradigmas para desenvolver técnicas e
métodos de ensino coletivo da música que pudessem transformar indivíduos não só como
músicos preparados, mas também como indivíduos capazes de viver socialmente de forma
saudável e produtiva. Dentre algumas dessas personalidades podemos citar: Villa-Lobos e o
canto orfeônico, Alberto Jaffé e o projeto espiral que muito contribuiu para a formação de
jovens instrumentistas no Brasil e não esquecendo Shinishi Suzuki e seu método da educação
do talento. Faz-se necessário ressaltar que discutir sobre técnicas e métodos de ensino do
violino não é um dos objetivos da proposta de pesquisa, todas as informações serão tratadas
como aquisição de respaldo teórico para essa investigação.
Como já foi mencionado anteriormente3, Brito em 2010 realizou como proposta de
pesquisa para sua dissertação de mestrado uma catalogação crítica onde pode reunir trabalhos
científicos sobre o ensino coletivo de cordas friccionadas e obteve em seus resultados fatores
que podem contribuir para um bom desempenho do aluno. Apesar da proposta de pesquisa ter
centralizado suas investigações nas cordas friccionadas, entende-se que devido ao fato de o
violino fazer parte desta família pode-se utilizar esses fatores como pontos de discussão
também para essa investigação que consiste no ensino coletivo infantil do violino
possibilitando, assim, mais um ponto para se desenvolver como respaldo teórico o que
enriquecerá esta proposta de pesquisa.
Um ponto muito importante que deve ser levado em consideração é o perfil do
professor para atuar no ensino coletivo infantil do violino. Um profissional que compreenda
as características da faixa-etária proposta nesta investigação e que saiba utilizar recursos

3
Verificar página 5.
60
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

metodológicos adequados de forma motivadora propiciando um aprendizado de qualidade


será de fundamental importância para a pesquisa. Portanto, observar o mediador (professor) e
submetê-lo a um processo de avaliação proporcionará a esta investigação resultados que
contribuirão para a formação do perfil do professor para atuar na área de ensino coletivo
infantil do violino.
Reunir fundamentos que sustentam o envolvimento da família no processo de
aprendizagem musical coletiva do ensino do violino da criança de 5 anos respaldará a
importância da presença da família na educação musical da criança gerando na mesma
segurança para continuar seus estudos no violino.
Quanto aos aspectos sociais, percebe-se a importância de um estudo conceitual à
compreensão do meio enquanto fator motivador de hábitos, atitudes, enfim de
comportamentos. O ensino coletivo infantil do violino pode beneficiar o aluno não só em sua
formação como instrumentista mais também em sua formação humanística.

Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais

Os conservatórios e as escolas de música no Brasil, ainda atendem em sua maioria


uma clientela específica que abrange a classe média e alta, o que transforma o ensino da
música elitista, (CRUVINEL; LEÃO, 2003). Enquanto que nas escolas públicas, segundo as
mesmas autoras, “A Educação Musical ainda é vista, simplesmente, como parte integrante
das atividades complementares e não como parte das disciplinas prioritárias na formação do
aluno” (CRUVINEL; LEÃO, 2003, p.2). Percebe-se que ainda há, em sua maioria, uma
leitura equivocada sobre a forma com que se deve inserir o estudo da música na vida do
indivíduo.
Com a crescente procura da população pelo aprendizado musical, conservatórios e
escolas de música para atender a demanda, criaram projetos de ensino coletivo de
instrumentos com o objetivo de absorver um público maior no início de seu aprendizado
musical, além de propiciar interação social, despertar maior interesse nos alunos iniciantes e
incentivar para a continuação dos estudos através da dinâmica estimulante de classe de aula
(YING, 2007).
O ensino coletivo de instrumentos musicais, além de possibilitar um acesso de maior
número de pessoas ao aprendizado musical, também contribui para um desenvolvimento
sócio-crítico e cognitivo criando aspectos que estimulem uma interação muito maior no
grupo, que não se restringe só à absorção de conhecimento, mas se amplia à compreensão e

61
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

socialização de aprendizado (CRUVINEL, 2004). Um aspecto considerado importante nas


práticas pedagógicas coletivas de instrumentos musicais é a motivação, que proporciona ao
aluno um maior interesse tornando-o participativo, criativo, competitivo (de forma saudável)
e assíduo às aulas.
Segundo Flávia Cruvinel (2003), o ensino coletivo de instrumentos musicais agrega
em seu processo de aprendizagem vários benefícios. Dentre eles, destaca-se no
comportamento social do aluno, a melhora na disciplina, na organização, na cooperação, na
solidariedade, no respeito mútuo, na concentração, no desempenho técnico-musical, na
consciência corporal, na assimilação e acomodação dos conteúdos, na interação entre os
alunos despertando a socialização, a motivação. Sendo assim, pode-se dizer que o ensino
coletivo de instrumentos musicais pode ser utilizado como uma alternativa motivadora e
socializadora nos conservatórios, nas escolas de música e nas escolas públicas.
Em relação ao repertório, Cruvinel (2003) destaca o desenvolvimento de maneira mais
rápida; o desenvolvimento do ouvido harmônico do aluno; a economia de tempo no processo
de aprendizagem nos aspectos instrumentais e musicais. Há também, um maior rendimento do
aluno em sala de aula, baixo índice de desistência, melhora da auto-estima, maior estímulo,
desinibição, ou seja, os alunos passam por uma transformação não só no que diz respeito ao
comportamento, mas também no processo de aprendizagem coletiva (CRUVINEL, 2003, p.
217).
No ensino coletivo de instrumentos de musicais o aluno pode ser visto como um
indivíduo que faz parte do processo de aprendizagem, onde não apenas recebe os
ensinamentos como também participa ativamente das aulas. Valorizar o aluno e estimular sua
participação em sala de aula de forma criativa e produtiva é apenas um dos vários pontos
importantes para proporcionar ao indivíduo uma formação educacional na música prazerosa e
sem traumas.

Metodologia

Para a elaboração e aplicação da proposta pedagógica de ensino coletivo do violino


para crianças de 5 anos, utilizarei o estudo de caso, que de acordo com Adelman e Kemp
(1995) consiste em uma descrição detalhada dos acontecimentos ocorrentes durante a
pesquisa e suas relações internas e externas, desde que estejam dentro dos limites escolhidos e
bem delimitados pelo investigador. Sendo que, caso ocorra algo que fuja dos limites

62
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

estabelecidos deve-se dar uma explicação adequada preservando assim, a pesquisadora e sua
proposta de pesquisa.
De acordo com Flick (2009), entende-se que a pesquisa qualitativa pode proporcionar
a investigação possibilidade de formulação de estratégias de pesquisa de campo contínua,
experimentação e uma exploração profunda da avaliação dos resultados de forma a
contemplar não somente aspectos quantitativos. Sendo assim, entende-se que em princípio, as
estratégias de estudos qualitativos melhor se adequarão a proposta de pesquisa aqui
apresentada, o que não anula de fato a possibilidade da utilização de estratégias quantitativas
caso se faça necessário. Utilizar-se-á também da observação participante devido a
pesquisadora ser a professora que atuará em sala de aula.
Como instrumentos de coleta de dados serão utilizados: questionários (aplicados aos
pais antes e depois do processo), observação participante (cuja professora será a ministrante e
a observadora que anotará as ocorrências em sala), vídeogravações (possibilidade de registrar
em áudio e vídeo as aulas e retiradas de dúvidas posteriormente) e juízes independentes (para
trazer legitimidade nas anotações e vídeogravações).
Após a coleta de dados todo o material será analisado buscando similaridades e
discordâncias entre si. Para isso se faz necessário utilizar de uma técnica metodológica
chamada triangulação.

A triangulação é uma técnica metodológica que visa ampliar o leque de


informações (dados), colocando informações provenientes de diferentes
fontes em interação, na interpretação realizada pela pesquisa (FREIRE,
2010.p.32)

A utilização da técnica de triangulação possibilitará a busca de confiabilidade e


aprofundamento nos resultados dos dados o que promove uma maior fidedignidade na
proposta de pesquisa.

Diferentes fontes de informações (sujeitos internos ou externos ao processo,


documentos etc.) propiciam diferentes ângulos de visão e, portanto,
favorecem o aprofundamento e o enriquecimento das conclusões de
pesquisa, o que torna a triangulação uma estratégia metodológica interessada
para as abordagens qualitativas em especial (FREIRE, 2010.p.32)

Segundo Fagundes (1999, apud. BELEI; MATSUMOTO; NASCIMENTO;


PASCHOAL, 2008, p.5), para se considerar o processo de triangulação como ferramenta
metodológica eficaz na análise dos dados, a margem aceitável quando a classificação do
pesquisador e dos juízes atinge um índice de concordância mínimo de 70%. Sendo assim, será

63
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

considerado para essa pesquisa, o percentual de 70% como referência de cálculo de


concordância entre as observações do pesquisador/participante e os juízes independentes.

Conclusão

O ensino coletivo de instrumentos musicais pode propiciar ao indivíduo uma formação


musical integradora com benefícios que se estendem para a formação social do indivíduo,
além de oportunizar um acesso maior da comunidade no processo de formação musical.
É imprescindível que a Educação Musical, no contexto social contemporâneo, apóie
seu entendimento dos processos pedagógicos em suas relações com a sociedade para o auxilio
da criação de metodologias inovadoras que auxiliam a transformação social. A elaboração de
projetos voltados ao ensino coletivo de instrumentos musicais com propostas pedagógicas
inovadores e eficientes pode contribuir com novas vertentes do ensino de música
especialmente no Brasil.
Oportunizar uma formação que permita uma prática pedagógica musical que valorize e
respeite o desenvolvimento do indivíduo como um todo, permite que o ensino da música não
seja individualista e competitivo o que gera em sua maioria frustração nos alunos que não
desejam a profissionalização. De acordo com discussões realizadas anteriormente neste
trabalho, podemos dizer que a música exerce uma influência na vida do indivíduo, sendo
assim se torna pertinente afirmar que o processo pedagógico do ensino coletivo de
instrumentos musicais deve ser considerado como um dos fatores primordiais na formação do
indivíduo. Estimular criação de projetos que proporcionem um aprendizado abrangente nos
aspectos técnico e social é de suma importância para obtenção de sucesso no decorrer da
aplicação dos mesmos.
Faz-se necessário descrever algumas considerações vislumbrando perspectivas que
possam contribuir para uma proposta de ensino coletivo de instrumentos musicais. Percebe-se
a importância de um estudo conceitual à compreensão do meio enquanto fator motivador de
hábitos, atitudes, enfim de comportamentos. A cultura que o indivíduo carrega dentro de si até
a sala de aula deve ser considerada como um fator positivo para a sua formação. Respeitar a
individualidade sugere ao aluno um ambiente de aprendizagem confortável e seguro.
É pertinente dizer que a proposta de ensino coletivo de instrumentos musicais, não
vem de maneira alguma anular o ensino considerado “tradicional de música instrumental”.
Sabe-se que cada indivíduo possui características diferentes, assim adequando-se a diferentes
formas de aprendizado. Sendo assim, permite-se dizer que o ensino coletivo de instrumentos

64
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

musicais, pode ser uma ferramenta de trabalho que oportuniza ao indivíduo a aquisição de
benefícios que vão além de aprimoramentos técnicos. A prática coletiva de instrumentos
musicais atinge também aspectos sociais como, por exemplo, a integração com o grupo,
respeito e atenção para com o próximo e a sociabilidade com outros indivíduos.
Considera-se também importante deixa-se registrado o quanto o ensino coletivo pode
contribuir para a educação musical como uma proposta de ensino aprendizagem eficiente que
beneficia o indivíduo não somente em aspectos técnicos, mas também contribui para uma
formação mais integradora, social e motivadora.

65
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ADELMAN, Clem; KEMP, Anthony E. Estudo de caso e investigação-acção.


In: Introdução à investigação em educação musical. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian.1995. p. 111-134.

BELEI, Renata A; MATSUMOTO, Patrícia H; NASCIMENTO, Edinalva N; PASCHOAL,


Sandra R. O uso de entrevista, observação e vídeogravação em pesquisa qualitativa.
Cadernos de Educação | FaE/PPGE/UFPel | Pelotas [30]: 187 - 199, janeiro/junho. 2008.
Disponível em: <http://www.ufpel.tche.br/fae/caduc/downloads/n30/11.pdf>. Acesso em: 9
de Abr. de 2011.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. 1998. Secretaria de Educação Fundamental.


Referência Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC – SEF. V. III, 1998.

BRITO, Joziely. Iniciação musical através do violino com crianças de 4 e 5 anos. 62 f.


Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Estadual do Pará, Belém, 2002.

______. Ensino Coletivo de Instrumentos de Cordas Friccionadas: catalogação crítica. 128f.


Dissertação de Mestrado. Universidade Federal da Bahia, 2010.

CAUDURO, Vera Regina Pilha. Iniciação musical na idade pré-escolar. Porto Alegre:
Editora Sacra, 1989.

CRUVINEL, Flávia; LEÃO Eliane. O Ensino Coletivo na Iniciação Instrumental de Cordas:


Uma Experiência Transformadora. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÁO
BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 12. 2003. Florianópolis – SC.
Anais...Florianópolis: ABEM, 2003. p. 326 - 332.

CRUVINEL, Flavia Maria. Efeitos do Ensino Coletivo na Iniciação Instrumental de Cordas:


A Educação Musical como meio de transformação social. Vol.1.Dissertação de Mestrado -
Escola de Música e Artes Cênicas, Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2003.

______. Ensino coletivo de instrumentos musicais: aspectos históricos. In: ENCONTRO


NACIONAL DE ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, 1.2004. Goiânia.
Anais ... Goiânia: ENECIM, 2004. p. 76-80.

______. Educação Musical e Transformação Social: Uma Experiência com o Ensino Coletivo
de Cordas. Goiânia: Instituto Centro-Brasileiro de Cultura, 2005.

______. 2006. Ensino Coletivo de Instrumento Musical: uma alternativa para uma Educação
Musical ativa e transformadora por um mundo melhor. In: ENCONTRO NACIONAL DE
ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, 2. 2006. Goiânia. Anais...
Goiânia: ENECIM, 2006. p.105-113.

ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, 1.


2004. 101p. Goiânia. Anais... Goiânia: ENECIM, 2004.

66
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, 2.


2006. 270p. Goiânia. Anais... Goiânia: ENECIM, 2006.

FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa. 3º Edição. Porto Alegre: Editora Artmed,
2009.

FREIRE, Vanda B. Horizontes da Pesquisa em Música. Rio de Janeiro: Editora 7 Letras,


2010.

GAINZA, Violeta Hemsy de. Estudos de Psicopedagogia Musical. São Paulo: Ed. Summus,
1988.

GORDON, Edwin E. Teoria de aprendizagem musical: competências, conteúdos e padrões.


Lisboa: Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 2000.

ILARI, Beatriz. Em busca da mente musical: ensaios sobre os progressos cognitivos em


música – da percepção à produção. Curitiba: Editora UFPR, 2006.

MÁRSICO, Leda Osório. A criança e a música. Rio de Janeiro-Porto Alegre: Editora Globo,
1982.

PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. 24º Edição. São Paulo: Editora Forense
Universitária, 2001.

SLOBODA, John. A mente musical a psicologia cognitiva da música. Londrina-PR: Editora


EDUEL, 2008.

SUZIGAN, Maria Lucia Cruz; SUZIGAN, Geraldo de Oliveira. 1986. Educação musical: um
fator preponderante na construção do ser. 2º.Edição. Cadernos Brasileiros de Educação. São
Paulo: CLR Balieiro e G4 Editora, 1986.

YING, Liu Man. O ensino coletivo direcionado no violino. 225f. Dissertação de Mestrado –
Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007.

67
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Adoniran Barbosa: educação e samba

Ana Claudia Cesar


Universidade Presbiteriana Mackenzie
cavaco-ana@ig.com.br

Resumo: O Samba como escola é uma reflexão sobre a cultura popular, é uma das muitas
histórias sobre aquisição de conhecimento e propagação dos mesmos de maneira totalmente
alternativa aos meios estabelecidos pela educação formal. Para isto busquei como exemplo o
sambista Adoniran Barbosa, que nos revela em suas músicas a cidade de São Paulo sobre a
ótica dos moradores que não estão inseridos nos planos de desenvolvimento desta grande
metrópole.
Palavras chave: Educação, cultura popular, samba

Introdução

O processo de ensino e aprendizagem tem considerado dentre outros fatores os saberes


que vão além dos conteúdos educacionais oficiais que na sua grande maioria não revela todas
as facetas e aspectos de transformação social, especialmente por focalizar e relevar apenas os
interesses daqueles que detém o poder.
No entanto, é mais que reconhecido em nossos dias que há saberes que se
desenvolvem além das esferas educacionais tradicionais e que compõem a cultura de um povo
levando-o a se reconhecer como sujeitos da história e não apenas como meros participantes
passivos da mesma.
Dentre outros lugares, encontramos nas músicas populares esse conteúdo crítico de um
povo que ao cantar a sua história revela seus sentimentos, suas frustrações e esperanças,
transmitindo assim, oralmente suas convicções sejam elas de ordem política, religiosa ou
social. Tomando isso como base de pesquisa podemos compreender as transformações sociais
que tomaram parte na história da cidade de São Paulo entre os anos 1950 a 1960 mirando
especialmente o estabelecimento da região central que forçou a saída de imigrantes e negros
que viviam naquela região. Para tanto, nos valemos das canções escritas e interpretadas pelo
sambista Adoniran Barbosa que, além de ser considerado aquele que estabelece o samba
paulista, interpreta seu tempo de forma criativa e profunda denunciando não apenas a
ocupação espacial do centro de São Paulo mas também a segregação social existente no
processo de desenvolvimento social.

Adoniran Barbosa: educação e Samba


68
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Talvez a maior discussão para Bourdieu esteja na dificil tarefa de desvendar os


mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Para
empreender esta tarefa, Bourdieu desenvolve conceitos específicos, retirando os fatores
econômicos do epicentro das análises da sociedade, a partir de um conceito concebido por ele
como violência simbólica. Esta violência seria efetivamente legitimada pelas forças
dominantes, que se expressam através dos gostos e de estilos destas classes.

A roda de Samba e o Samba de Roda

O samba desde a sua origem, é uma manifestação popular que narra a história não
oficial. Desde que os negros chegaram ao Brasil que seus hábitos e costumes pouco a pouco
foram se incorporando à cultura dos habitantes deste novo País. Os negros nas senzalas em
seu pouco tempo livre aproveitavam para realizar seus rituais e pedir que o sofrimento da
escravidão tivesse prazo pra acabar. Os negros formavam rodas e com vozes e palmas
cantavam e dançavam num ritual onde um par entrava no centro da roda e com um gesto
característico de umbigada iniciavam um solo da dança, na troca do par acontecia novamente
o encontro dos umbigos. Este ritual foi tão marcante que o nome “Samba” teria sua origem
em um dialeto africano de “Semba”, que significa umbigo.
É o que nos confirma o historiador, pesquisador e escritor André Diniz: “O samba de
roda da Bahia, o lundu, o coco, o calango e o cateretê são tradições musicais e coreográficas
ligadas ao universo do negro que podem ser definidas como samba de umbigada”. (DINIZ,
2008, p.47)
Hoje a roda de samba é um lugar para se divertir, mas a brincadeira pode ser o desafio
de versar, um participante lança um verso provocativo aos demais, e quem conseguir
responder pode desafiar os outros. Estes versos improvisados são sempre intercalados por um
refrão que é repetido por todos como parte da brincadeira, assim se caracteriza uma das
formas mais populares da nossa música: o “Samba de Roda”.
Para se fazer samba não é preciso possuir conhecimentos formais como ler e escrever,
a narrativa é construída pela canção, que pode narrar o cotidiano de qualquer indivíduo que
possua inspiração para cantar versos ritmados sobre qualquer assunto de seu universo
existencial, totalmente inserido na tradição oral, característica inerente à cultura. A letra de
um samba pode revelar o cotidiano do autor, mas pode também narrar a história não oficial da
resistência dos negros oprimidos desde o início da colonização.
O historiador e escritor Francisco Rocha nos ajuda a refletir sobre o tema:

69
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Assim, em seu fazer artístico, o cancionista não tem de requisitar,


necessariamente, um capital cultural relativo ao universo da cultura letrada, e
uma vez que sua habilidade está em produzir ao canto, sua obra pode até
renunciar à escrita, mas não pode prescindir da cultura oral, das
representações do mundo que, entre outros suportes, fixam-se em narrativas
orais. (...) Ao afirmar o paradoxo entre a boa letra de um samba e a condição
de se ignorar o código escrito, caminha-se no campo de um discurso
ambíguo, mas, por outro lado, delimita-se a relação de oposição entre dois
universos culturais: cultura popular / cultura letrada ou oficial (ROCHA,
2002, p. 107-108).

O samba surge como resistência, como a voz de uma classe que não tem direito nem
oportunidade de se manifestar, e que cria essa possibilidade artística para dizer o que sente e
pensa, e isto pode se transformar na grande oportunidade de manifestação dos excluídos.
Segundo Paulo Freire, “Faz parte do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer
forma de discriminação. A prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a
substantividade do ser humano e nega radicalmente a democracia.” (FREIRE, 1996, p.36)
O termo escola de samba surge pelo simples fato de estar próxima de uma escola
formal. O surgimento da escola de samba é sem dúvida a necessidade de se ter um lugar para
reunir pessoas da mesma classe social, que eram constituídas por negros, mulatos e brancos
pobres. É um lugar onde as pessoas encontravam respaldo e diversão além do respeito mútuo,
era também um lugar propício para desenvolver e fomentar a própria cultura.
As escolas de samba fazem parte da nossa história cultural e se preservam desde 1928,
data da formação da primeira escola, que logo serviu de exemplo para a formação de várias
outras em outros bairros cariocas.

Grosso modo, o que pode ser um preconceito contra os compositores de


samba, impondo a eles a condição do desconhecimento da linguagem escrita
para a produção de sua arte, pode estar camuflado a revelação de um saber
que se inscreve na arte do sambista. De fato, o domínio da palavra escrita
não é o elemento primordial de tal arte (ROCHA, 1978, p. 106).

A cidade de São Paulo também foi um celeiro de cultura popular, pois com a vinda de
negros para a cidade as manifestações ligadas ao samba se fizeram cada vez mais presente.
Mas a cidade também era um lugar de planejamento para um ideal de progresso, com o
objetivo de alavancar a economia do País. Devido a este plano de progresso e
desenvolvimento a cidade foi se reestruturando e se ampliando de forma marcante e
avassaladora. Mas mesmo com todo este ideário a cultura popular continuou se manifestando
com muita propriedade e personalidade, muitos são os compositores de samba que podem ser
citados. Vou me ater a uma grande personalidade: Adoniram Barbosa.
70
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Assim, estruturas sociais e agentes individuais se alimentam numa


engrenagem de caráter conservador. É o caso da maneira como cada um lida
com a linguagem. Tudo que a envolve - correção gramatical, sotaque,
habilidade no uso das palavras e construção etc - está fortemente à posição
social de quem fala e à função de ratificar a ordem estabelecida. Para
Bourdieu, todas essas ferramentas de poder são essencialmente arbitrárias,
mas isso não costuma ser percebido (FERRARI, 2008).

Adoniran fazia parte da classe de brancos pobres, e com muita criatividade e humor
revela uma outra cidade, que em sua crítica é desumana e cruel, pois não perdoa os que não
estão incluídos no seu plano de progresso.
Adoniran é o sambista das malocas, e narra pouco à pouco a expulsão de seus
moradores, que sem ter muita alternativa acabam muitas vezes morando nas ruas.
Em seu livro Almanaque do Samba , o escritor André Diniz fala sobre o sambista
Adoniran Barbosa:
“Adoniran percebia as mudanças na cidade e particularmente a perda de memória
coletiva dos antigos espaços de sociabilidade, substituídos pelas modernas construções. Como
um cronista privilegiado, registro também o linguajar do paulistano menos favorecido”
(DINIZ, 2006, p. 81-82).
Adoniran é o artista, o crítico, o cronista da cidade, é a história não oficial, e também é
um formador de opinião com muito saber, pois revela em suas canções as mudanças e
transformações arquitetônicas, e a expulsão dos que não estão incluídos neste projeto de
desenvolvimento.
Isto me remete a outra fala de Paulo Freire:

Não posso virar conivente de uma ordem perversa, irresponsabilizando-a por


sua malvadez, ao atribuir a forças cegas e imponderáveis os danos por elas
causados aos seres humanos. A fome frente a frente à abastança e o
desemprego no mundo são imoralidades e não fatalidades como o
reacionarismo apregoa com ares de quem sofre por nada poder fazer. O que
quero repetir, com força, e que nada justifica a minimização dos seres
humanos, no caso das maiorias compostas de minorias que não perceberam
ainda que juntas seriam a maioria. Nada, o avanço da ciência e/ou da
tecnologia, pode legitimar uma ordem desordeira em que só as minorias do
poder esbanjam e gozam enquanto às maiorias em dificuldades até para
sobreviver se diz que a realidade é assim mesmo, que sua fome é uma
fatalidade do fim do século. Não junto a minha voz à dos que, falando em
paz, pedem aos oprimidos, aos esfarrapados do mundo, a sua resignação.
Minha voz tem outra semântica, tem outra música. Falo da resistência, da
indignação, da justa ira dos traídos e dos enganados. Do seu direito e do seu
dever de rebelar-se contra as transgressões éticas de que são vítimas cada
vez mais sofridas (FREIRE, 1996, p. 100-101).

71
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Com este texto procuro criar uma ponte entre os estudos de Bourdieu e de Paulo
Freire, pois ambos falam sobre classes dominantes e injustiças sociais, para isso construí uma
ponte até o samba que é um representante da opressão social de uma classe não privilegiada, e
desde sua origem é tido como a voz do povo.

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um


modo ou de muitos, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para
aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer, para
ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com
uma ou com várias: Educação? Educações (BRANDÃO, 1995, p.7).

Seja por qualquer via e das formas mais diversas e variadas, ninguém está livre de
aprender. A existência é um eterno aprendizado.

72
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

DINIZ, André. Almanaque do Samba: a história do carnaval, o que ouvir, o que ler, onde
curtir. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2006.

______. Almanaque do Carnaval: a história do carnaval, o que ouvir, o que ler, onde curtir.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2008.

FERRARI, Marcio. Educar para crescer. Disponível em:


<http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/pierre-bourdieu-307908.shtml>. Acesso
em: 18 out. 2009.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários á pratica educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.

ROCHA, Francisco. Adoniran Barbosa: o poeta da cidade. São Paulo: Ateliê Editorial, 1978

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação? São Paulo: Brasiliense, 1995.

73
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Aprendizagem Significativa / Aprendizagem Musical

Ana Claudia Cesar


Universidade Presbiteriana Mackenzie
Cavaco-ana@ig.com.br

Resumo: A aprendizagem significativa é sem dúvida uma forma efetiva de aprender, partindo
de conhecimentos prévios do indivíduo é possível criar pontes cognitivas para novos
conhecimentos. Para que isto aconteça temos que ter uma intencionalidade de todos os
envolvidos nesta nobre missão, pois a intencionalidade é a peça fundamental desta
engrenagem.Tanto o educador como o aluno tem que ter a intenção para que o conhecimento
se consuma.Estudando este conceito descobri que o ensino da música é um ótimo exemplo
para a demonstração efetiva da aprendizagem significativa. Para isto cito um grande educador
musical húngaro, Kodály.Zoltan Kodaly defendia a ideia de que a música tinha que fazer
parte da educação integral do ser humano desde o jardim de infância, com o mesmo número
de horas e mesma ênfase dada às matérias convencionais durante toda a vida escolar dos
jovens cidadãos.
Palavras Chaves: Ensino, aprendizagem, intenção, música

Introdução

Assim como a educação formal, a educação musical sempre buscou modos para
desenvolver novos métodos a fim de tornar cada vez mais acessível a aquisição de novos
conhecimentos, buscando também na educação formal ajuda e possibilidades para se
desenvolver e para atingir todos aqueles que desejam estudar a linguagem musical.
Visto que eu trabalho com música, sempre tive interesse em pesquisar diversos
educadores, principalmente os que desenvolveram métodos específicos para a aprendizagem
musical.
O estudo da aprendizagem significativa de Ausubel (1968) remeteu-me de imediato a
um método musical que pesquisei e utilizo no desenvolvimento do meu trabalho como
educadora musical.
É o método de aprendizagem musical do húngaro Kodály. Tanto Ausubel como
Kodály, estudiosos e pesquisadores contemporâneos, criaram e desenvolveram um método
que era mais acessível à maioria dos alunos, partindo de conhecimentos prévios que os alunos
já traziam em sua bagagem pessoal, e que a partir destes, estabelecessem novos
conhecimentos. Este foi o ponto de partida que utilizei para o desenvolvimento deste trabalho
entre educação formal e educação musical.

Aprendizagem Significativa
74
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Ausubel (1918–2008) desenvolveu a teoria da aprendizagem significativa. Considero


relevante comentar sua experiência infantil de insatisfação com as condições que a escola
oferecia para o desenvolvimento e aprendizagem. Sua experiência pessoal, talvez, tenha sido a
origem de seus estudos sobre a relação professor-aluno e os “caminhos a serem oferecidos
para que a capacidade de perceber, compreender, elaborar fosse facilitada em situação de
educação formal” (MASINI, 2008, p. 64). Em uma escola pública no bairro do Brooklin em
Nova York, frustrou-se com os estudos e com o tratamento recebido. Filho de imigrantes
judeus, Ausubel, aos seis anos, soltou um palavrão, o que bastou para sofrer represálias: além
de ter sua boca lavada com sabão, foi exposto durante toda a aula de pé para que a humilhação
servisse de exemplo para os demais alunos. Sua revolta levou-o a declarar que a escola era um
verdadeiro cárcere para meninos. O vivido, talvez, tenha sido inspiração para um novo olhar
sobre a educação. Este fato, sem dúvida, ajudou a definir o objeto de estudo de Ausubel, que
assinala a importância da relação professor-aluno e da atenção do professor ao que o aluno
sabe para ocorrência da aprendizagem, conforme afirma: “O mais importante fator isolado
que influencia a aprendizagem é o que o aprendiz já sabe. Determine isto e ensine-o de
acordo” (Ausubel, 1968, p. VI).
O diálogo entre professor e aluno sem dúvida é a melhor forma de pesquisa de dados
para a ocorrência da aprendizagem significativa, pois é através dele que se pode promover a
interação com os alunos de uma classe. Uma conversa descontraída e informal pode ser fonte
de um relevante acúmulo de dados sobre o que o aluno conhece para daí pinçar o que de fato
pode ser usado como base para introduzir as novas informações. A revelação de gostos
pessoais do cotidiano, como o time que torce, o filme que mais gostou de assistir, a
reportagem jornalística que mais chamou a atenção ou o estilo de música preferida, sem
dúvida pode ajudar o professor a criar pontes para o ensino propiciando elaboração cognitiva
para um novo conhecimento.
A aprendizagem é dita significativa quando uma nova informação (conceito, idéia,
proposição) adquire significados para o aprendiz através de uma espécie de ancoragem em
aspectos relevantes da estrutura cognitiva preexistente do indivíduo, isto é, em conceitos,
idéias, proposições já existentes em sua estrutura de conhecimentos (ou de significados) com
determinado grau de clareza, estabilidade e diferenciação (MOREIRA, 1997).
São muitos os assuntos que podem servir de prévios pontos de apoio para aquisição de
um novo conhecimento, isso envolverá a criatividade de cada professor.
De acordo com Moreira (2008, p. 15-16), para Ausubel:

75
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

a aprendizagem significativa é aquela em que o significado do novo


conhecimento é adquirido, atribuído, construído, por meio da interação com
algum conhecimento prévio, especificamente relevante, existente na
estrutura cognitiva do aprendiz. Interação é a palavra chave: interação entre
conhecimentos novos e conhecimentos prévios. Se não há interação não há
aprendizagem significativa.

Os conhecimentos prévios são fundamentais para a aquisição de novos conhecimentos.


Estes conhecimentos são chamados de subsunçores, e podem ser uma imagem, um símbolo,
um conceito, ou qualquer outro tipo de dado que já esteja confortavelmente armazenado.
Mas não basta ter estes conhecimentos, é fundamental que o educador desenvolva
condições para ligar os conhecimentos que o aluno já possui, com os novos conhecimentos. O
educador tem que propiciar pontes entre estes conhecimentos, pontes cognitivas que façam
esta conexão. Se o material a ser introduzido é totalmente novo para o aluno, Ausubel propõe
o recurso do uso dos organizadores prévios - materiais introdutórios apresentados com a
principal função de servir de ponte entre o que o aprendiz já sabe e o que o professor irá
ensinar. Os organizadores facilitam a aprendizagem na medida em que propiciam condições
para o aluno compreender a nova informação. O educador, neste aspecto, partindo do que o
aluno conhece, propicia a ele ser o construtor destas pontes cognitivas para aquisição do que é
ensinado, concretizando assim a assimilação dos novos conhecimentos.
É, portanto, fundamental ter acesso ao conhecimento prévio do aprendiz, para o
aprendizado do novo conhecimento. O educador precisa coletar o maior número de
informações sobre conhecimentos já existentes que sirvam de ponte para o novo
conhecimento. Dei-me a liberdade de imaginar esta ponte como um arco-íris por algumas
conexões que fiz com esta imagem, que além de ser bela, ainda traz vários significados.
Como esclarece Moreira (2008, p. 19): “Os significados não estão nos materiais
educativos. Eles estão nos alunos, nos professores e nos autores. Os materiais são apenas
potencialmente significativos”.
Uma questão relevante é a predisposição tanto dos alunos como dos professores. Se
não houver esta predisposição de ambas as partes, nem o melhor dos professores e nem o
mais aplicado aluno, conseguirá realizar esta árdua tarefa, pois essa é a questão fundamental
para a aprendizagem.

A predisposição para aprender não é exatamente aquilo que chamamos de


motivação. É claro que implica motivação, mas é, antes, uma
intencionalidade, um esforço deliberado para relacionar o novo
conhecimento a conhecimentos prévios, mais inclusivos, mais diferenciados,
existentes na estrutura cognitiva com certa estabilidade e clareza. É um

76
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

compromisso afetivo – não no sentido de gostar, mas sim de querer – de


relacionar novos conhecimentos a conhecimentos prévios (Ibid, p. 20).

Esta é sem dúvida a questão principal de qualquer aprendizagem: só se aprende se


quiser aprender, se houver a intencionalidade, pois sem isto se torna impossível aprender
qualquer coisa, e se o aluno não estiver predisposto e aberto à nova informação, será
dificílimo realizar esta tarefa. Parece, assim, que a questão do resgate do prévio conhecimento
poderá contribuir para a predisposição dos alunos; se o educador achar o elo pessoal que
ligará o que o aluno já sabe com o novo conhecimento, esta tarefa poderá facilitar a
construção dessa ponte cognitiva. Podemos, no entanto, dizer que não há aprendizado se não
houver disposição para a aprendizagem: poderão ser apresentados organizadores prévios,
conhecimento em diversos segmentos, mas não haverá aprendizagem se não houver interesse
do aluno em relacionar e significar o conhecimento já existente com o novo que se apresenta.
A intencionalidade se faz fundamental no processo de aprendizagem, mas podemos
considerar também que os organizadores prévios poderão ser uma ferramenta (ponte) para que
o professor possa trazer esse aluno para o aprendizado, descobrindo no aluno quais seus
conhecimentos prévios particulares com os quais estará fazendo as ligações necessárias para
auxiliar o aluno no entendimento de um novo conceito.

Por isso uma educação que apenas pretenda transmitir significados que estão
distantes da vida concreta dos educandos, não produz aprendizagem alguma,
é necessário que os conceitos (símbolos) estejam em uma conexão com as
experiências dos indivíduos. Voltamos assim à dialética entre o sentir
(vivenciar) e o simbolizar. Este é o ponto fundamental no método de
alfabetização do educador brasileiro Paulo Freire: Aprende-se a escrever
quando as palavras se referem às experiências concretamente vividas.
Aprender não é decorar. Aprender é um processo que mobiliza tanto os
significados, os símbolos, quanto os sentimentos, as experiências a que eles
se referem (DUARTE JR., 1991, p. 25).

Para que o ensino se consuma, alunos e professores compartilham significados. A


aprendizagem significativa ocorrerá se os professores propiciarem condições apropriadas para
os alunos reconhecerem e resolverem problemas, compreenderem um novo fenômeno e
construírem modelos mentais a respeito e, utilizando-os em novas situações, ampliar seus
objetivos e sua própria aprendizagem.

Uma Experiência de Aprendizagem Significativa de Música

Para fazer uma breve conexão com o meu objeto de estudo, a música, escolhi dar o
exemplo de um grande educador musical húngaro, Kodály (1882–1967).
77
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Kodály defendia que a música tinha que fazer parte da educação integral do ser
humano desde o jardim de infância, com o mesmo número de horas e mesma ênfase dada às
matérias convencionais durante toda a vida escolar dos jovens cidadãos. (GUEDES, 2009)

A música é uma manifestação do espírito humano, similar à língua


falada. Os seus praticantes deram à humanidade coisas impossíveis de
dizer em outra língua. Se não quisermos que isso permaneça um
tesouro morto, devemos fazer o possível para que a maioria dos povos
compreenda esse idioma (KODÁLY, 1966, apud GOULART, 2001)1.

Kodály sustentava que, assim como na linguagem e na literatura, um país deve


começar com a “musical mother tongue”, isto é, língua musical nativa, que para ele era a
canção folclórica, e através dela ir expandindo até alcançar a compreensão da literatura
musical universal.
Considerava o canto como fundamento da cultura musical: para ele, a voz é o modo
mais imediato e pessoal de nos expressarmos em música. Mesmo o acompanhamento
harmônico é feito por vozes, pois o método enfatiza o canto coral. O canto não é apenas um
meio de expressão musical, mas ele ajuda no desenvolvimento emocional e intelectual
também. Para ele, quem canta com frequência obtém uma profunda experiência de felicidade
na música. Através das nossas próprias atividades musicais, aprendemos conceitos como
pulsação, ritmo e forma da melodia.
Para Kodály a base da educação musical era o canto, mas não qualquer canto, e sim o
ensino de músicas folclóricas húngaras para as crianças pequenas, como o início da
alfabetização musical.

Temos que educar músicos antes de formar instrumentistas. Uma


criança só deve ganhar um instrumento depois que ela já sabe cantar.
Seu ouvido vai se desenvolver somente se suas primeiras noções de
som são formadas a partir de seu próprio canto, e não conectadas com
qualquer outro estímulo externo visual ou motor. A habilidade de
compreender música vem através da alfabetização musical transferida
para a faculdade de ouvir internamente. E a maneira mais efetiva de se
fazer isto é através do canto (Ibid.).

Esse conhecimento era transmitido de forma espontânea, pois estas músicas podiam
ser ensinadas por pais e professores, sem a preocupação do ensino formal de leitura de notas
musicais. Este era o primeiro passo para o ensino da música em todas as escolas da Hungria.
Kodály acreditava que a música era fundamental para o desenvolvimento do intelecto, das

1
KODÁLY, Zoltán. Conferência sobre O Papel da Música na Educação, Universidade da California, 1966.
78
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

emoções, e de toda a personalidade do homem. Não podia ser entendida como um luxo para
poucos, pois acreditava que a música é um alimento espiritual para todos. Por esta razão se
dedicou a estudar uma forma de tornar a música uma linguagem acessível a todos os
estudantes húngaros, e enfrentou essa questão de forma ideológica até conseguir realizar seu
intuito. Depois de aprender as músicas folclóricas húngaras, as crianças estavam prontas para
aprender a distinguir os sons de cada nota, em outras palavras, a distância entre os sons.
Quando as crianças já tinham assimilado estes conhecimentos, elas então estavam prontas
para serem alfabetizadas formalmente, isto é, pela leitura de partituras (GOULART, 2001).
Neste caso específico, saber cantar as músicas folclóricas serviu de conhecimento
prévio (subsunçores) para a aquisição de novos conhecimentos, que neste caso era aprender a
distância entre os sons das notas destas canções, e isso finalmente serviu de âncora para a
aprendizagem da música formal (leitura de partituras).
Zoltán Kodály conseguiu, depois de muita insistência, a implantação do ensino de
música no currículo formal de todas as escolas da Hungria. O resultado efetivo deste trabalho
é que todos os estudantes húngaros saem das escolas totalmente musicalizados, podendo optar
ou não pela profissionalização musical, afinal Kodály acreditava que o ensino musical era
fundamental para a formação intelectual básica de um indivíduo.

Considerações Finais

Ao conhecer o método Kodály, comecei a trabalhar com o repertório de músicas que o


aluno naturalmente trazia em sua memória. Sem ter conhecimento sobre a aprendizagem
significativa, desenvolvi um trabalho musical ilustrativo da teoria da Aprendizagem
Significativa de Ausubel: resgatei, da prática de conjunto, o que os alunos possuíam de
prévios conhecimentos para a construção de um repertório musical específico. Trabalhar uma
música para tocá-la em grupo é, sem dúvida, uma experiência essencial para todos os
estudantes de música; para que isso se realize é preciso ficar em silêncio, estar atento, ouvir o
outro, e muitas vezes até respirar junto para que a música aconteça.
A reflexão sobre esta experiência de aprendizagem significativa de música é um
exemplo vivo e atual de como a ideologia de um grande mestre, Kodály, conseguiu de fato
transformar um país, e como esta transformação manifesta-se na concepção humana de cada
cidadão húngaro. Hoje este método é muito difundido pelo mundo por ser possível e viável.
Não podemos evidentemente esquecer que, em tudo, está presente a intencionalidade, não só

79
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de quem aprende, mas de quem ensinam e, principalmente, de quem luta por uma idéia, com a
certeza de que aquela idéia vai transformar os indivíduos e com isto transformar o mundo.
A idéia do professor construtor é uma idéia viva, o professor é propiciador de
construção de pontes cognitivas. Imagino estas pontes como arco-íris, talvez por intuir que no
final do arco-íris existe de fato um pote de ouro, que simbolicamente é a maior riqueza da
humanidade, o conhecimento.

80
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

AUSUBEL, David Paul. Educational psychology: A cognitive view. New York: Holt,
Rinehart &Winston, 1968.

DUARTE JÚNIOR, João Francisco. Porque arte-educação? 6. ed. Campinas: Papirus, 1991.

GOULART, Diana. Dalcroze, Orff, Suzuki e Kodály: Semelhanças, diferenças,


especificidades. Disponível em: <http://www.dianagoulart.pro.br/english/artigos/dkos.htm>.
Acesso em: 08 mai. 2009.

GUEDES, Chico Moreira. Kodály Zoltán, mestre da música. Disponível em:


<http://hungaromania.wordpress.com/2009/04/01/kodaly-zoltan-um-mestre-magiar-da-
musica/>. Acesso em: 08 mai. 2009.

MASINI, Elcie F. Salzano. O aprender na complexidade. In: MASINI, Elcie F. Salzano;


MOREIRA, Marco Antonio. (Org.). Aprendizagem significativa: condições para ocorrência e
lacunas que levam a comprometimentos. São Paulo: Vetor, 2008.

MOREIRA, Marco Antonio. A teoria da Aprendizagem Significativa segundo Ausubel. In:


MASINI, Elcie F. Salzano; MOREIRA, Marco Antonio. (Org.). Aprendizagem significativa:
condições para ocorrência e lacunas que levam a comprometimentos. São Paulo: Vetor, 2008.

MOREIRA, Marco Antonio. Mapas conceituais e aprendizagem significativa. Disponível em:


<http://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf>. Acesso em: 09 mai. 2009.

81
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Um Estudo Sobre a Educação Musical Para a Pequena Infância no Brasil

Aruna Noal Correa1


arunanoal@hotmail.com

Resumo: Este artigo é proveniente de pesquisa em nível de doutorado pelo


PPGEdu/FACED/UFRGS, e contempla como temáticas centrais as áreas de educação musical
e educação infantil. Constituindo-se a partir de questionamentos acerca de como foi e como
vem sendo organizada a educação musical para a pequena infância brasileira. Pretende-se
investigar a organização da educação musical para a pequena infância no Brasil através das
narrativas de pesquisadoras/educadoras musicais brasileiras. Optou-se por realizar uma
investigação de caráter qualitativo, utilizando-se como método a pesquisa narrativa. O estudo
prevê entrevistas com pesquisadoras/educadoras brasileiras da área de Educação Musical
acerca de suas produções voltadas a crianças pequenas no país, construindo um apanhado a
cerca do ensino da música e considerando suas percepções acerca da educação para a pequena
infância no país nos espaços escolares de educação infantil atuais. A análise culminará em um
entrelaçamento com a pedagogia italiana, visando-se confrontar a perspectiva de construção
músico-pedagógica brasileira com a visão italiana de vínculo da infância com as artes, em
especial nesta pesquisa, com a música. Ao final, visa-se contribuir com a efetivação do
trabalho musical a ser contemplado nas matrizes curriculares das escolas de educação infantil
na medida em que possibilitaremos através das narrativas das educadoras/pesquisadoras
musicais uma perspectiva de como a educação musical brasileira poderia ser organizada e
conduzida atualmente entre os espaços escolares de educação para a pequena infância no
Brasil. Refletindo, consequentemente, na formação musical e pedagógico-musical dos
professores unidocentes.
Palavras chave: Educação musical, educação infantil, unidocentes

O presente artigo é proveniente de pesquisa em desenvolvimento a nível de doutorado


através do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, e contempla como temáticas centrais as áreas de educação musical e educação infantil.
A mesma vem constituindo-se a partir do questionamento acerca de como foi e como vem
sendo organizada a educação musical para a pequena infância brasileira. Entendendo pequena
infância como a faixa etária entre zero e três anos de idade.
Pretende-se com esta, investigar a organização da educação musical para a pequena
infância no Brasil a partir das narrativas de pesquisadoras/educadoras2 consideradas na
pesquisa pessoas-chave para a educação musical brasileira. Procurando sistematizar
cronologicamente as narrativas das participantes acerca de suas propostas e práticas musicais,
compreender o processo de musicalização infantil organizado pelas mesmas e, identificar em

1
Acadêmica do Doutorado em Educação da PPGEdu/FACED/UFRGS. Orgão financiador: CAPES.
2
Termo utilizado no feminino pela constituição da pesquisa ser de maioria feminina.
82
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

suas narrativas perspectivas para a educação musical infantil nos espaços escolares e práticas
musicais unidocentes3 atuais.
No âmbito da educação e da educação musical no país, diferentes pesquisas e práticas
relativas a área de música foram e são produzidas sobre e para a educação infantil. Algumas
destas, desenvolvidas pelas pesquisadoras/educadoras musicais Josette Feres, Walkyria
Passos Claro, Lydia Hortélio, Carmen Mettig Rocha, Elvira Drummond, Esther Beyer (in
memorian), Maria Teresa Alencar de Brito, Beatriz Ilari, Ilza Joly, Maria Cecília Cavalieri
França, Leda Maffioletti, Ricardo Freire, Luciana Ostetto4. Parto do pressuposto de que
pesquisas anteriores, assim como essa, presenciaram uma lacuna no que se refere a trajetória
histórica da educação musical para a primeira infância do Brasil, em especial voltada as
crianças de zero a três anos de idade, e pontuada pela atuação das professoras acima citadas.
O Brasil é um país com vasta diversidade cultural, diversidade esta proveniente das
diferentes influências advindas de nosso processo de colonização, do tamanho de nosso
território e as influências originadas por nossas fronteiras, e os processos de povoamento dos
diferentes momentos históricos que vivenciamos. Com vistas a esta multiplicidade,
emergiram historicamente no país inúmeras práticas musicais diferenciadas, que muitas vezes
passaram a contemplar também um trabalho musical com crianças pequenas.
A partir de então, as práticas organizadas por essas educadoras musicais para a
pequena infância no país em contextos diferentes, passaram consequentemente a ser base para
novas práticas músico-educativas. Práticas estas, que deveriam fazer parte do processo
reflexivo de formação profissional também dos professores unidocentes que trabalham
diretamente, e em muito exclusivamente, com as crianças dessa faixa etária. Ou seja, banindo
práticas que possam ser descontextualizadas e superficiais.
Com base na Lei 11.769 de 2008, a música passou no corrente ano de 2011 a compor
o currículo do ensino fundamental, instigando a reflexão sobre este tema. Contribuindo com
as pesquisas que vem sendo desenvolvidas nessa direção, vide estudos de Bellochio (2000,
2001, 2004), Figueiredo (2004), Spanavello (2005), Correa (2008), Furquim (2009),
Oesterreich (2009), Werle (2010).
Com isso, volto a enfatizar como em estudos anteriores, a necessidade de ações
integradas entre as áreas e os diferentes profissionais para que estabeleçam-se mudanças

3
No que se observa da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – 9.394/96) e do Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI/1998), o professor unidocente é a figura central para
trabalhar educacionalmente com as crianças todas as áreas do conhecimento.
4
São estas pesquisadoras/educadoras musicais que, dentro do possível, serão convidadas a narrar suas histórias
profissionais para a presente pesquisa, constituindo a base de dados.
83
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

efetivas no interior das instituições e de cada comunidade escolar. Foi em virtude destes e
outros aspectos, que emergiu a necessidade de conhecer como se estabeleceu no país a relação
entre música, primeira infância, ensino e suas relações com a formação do unidocente ao
construir práticas músico-educativas com crianças de educação infantil.
O professor unidocente, figura central em turmas de crianças pequenas, tem suas
práticas impregnadas por atividades musicais, no entanto, desconhece que estas ultrapassem
momentos de cantar ou tocar algum instrumento musical, e ignoram que brincar de roda ou
contar histórias, dentre outras atividades, envolvem também a formação musical das crianças.
Em especial, porque na maioria das vezes, as práticas estão envoltas por atividades musicais
que não são associadas a um trabalho dessa natureza, afirmando-se que o cotidiano das
crianças está desvinculado de práticas musicais. Contudo, o que se apresenta é uma realidade
totalmente avessa.

Como a necessidade de refletir a respeito da prática e da função da música


nem sempre é clara [...], muito do que existe em educação musical não se
apresenta, na verdade, como musical ou artístico, mas, antes, como um
conjunto de atividades lúdicas [...] O fato de a música ter ou não seu valor
reconhecido coloca-a dentro ou fora do currículo escolar, dependendo de
quanto é ou não considerada pelo grupo social. Se, em determinada cultura, a
música for uma das grandes disciplinas do saber humano, o valor da
educação musical também será alto [...] Esta é a questão crucial com que se
depara [o] Brasil: o resgate do valor da música perante a sociedade, único
modo de recolocá-la no processo educacional. (FONTERRADA, 2005, p.
12-13)

Dentre os fatores que desencadearam a realização dessa pesquisa estão ainda: a


ausência de licenciados em música suficientes para o trabalho com música nas escolas, a
necessidade de organização de um trabalho musical mais reflexivo e acessível aos pedagogos,
a relevância do trabalho musical com crianças de educação infantil, em especial entre zero
três anos de idade, a construção de uma perspectiva diferenciada de trabalho musical com
bebês nesta faixa etária, a contribuição para a formação cultural e estética de bebês, a
permanente formação musical e pedagógico-musical de pedagogos e as consequentes
mudanças com relação as práticas musicais.
Dentre os autores utilizados para o embasamento teórico desta investigação foram
utilizados até o momento: Pinto e Sarmento (1997), Kohan (2007) e Cerisara (2002) voltados
a sociologia da infância; Fuks (1991) e Borges (2007) relativos a trajetória histórica da
educação musical no país; Planillo (2004, 2006) e Gandini e Edwards (2002) voltadas a

84
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

trajetória da proposta de Loris Malaguzzi; e, relacionado a metodologia foram base para essa
proposta Josso (2004), Souza (2006) e Malaguzzi (1999), dentre outros autores.

A educação musical na pequena infância

Ao salientar que a música nunca esteve ausente dos espaços escolares e nem mesmo
das salas de aula, destaco a impossibilidade de se entrar em uma sala de educação infantil sem
cantar com as crianças. Influenciada, sobremaneira, pelas narrativas obtidas em meu
mestrado, no qual, as professoras unidocentes entrevistadas, ressaltaram a intrínseca relação
entre educação musical e a prática educativa na educação infantil, a necessidade de formação
específica em música no curso de Pedagogia, e ainda, a presença do licenciado em Música na
escola para um trabalho conjunto com as professoras unidocentes.
Esse aspecto é, ainda hoje, relevante para refletir sobre a necessidade de uma base
teórica consistente que permeie o trabalho musical com crianças pequenas, especificamente
entre a faixa etária de zero a três anos, que ampare as professoras unidocentes e, especialistas
em música para atuar nesse campo.
Para as crianças nessa faixa etária, as descobertas acontecem em grande parte através
do contato sonoro com nosso entorno. Ainda no útero materno, bebês identificam e
familiarizam-se com o mundo que o cerca através dos sentidos, “o bebê já está em interação
com seu meio externo desde suas vivências uterinas, o que lhe permite trazer uma bagagem
significativa de conhecimentos quando ele nasce” (BEYER, 2005, p. 96).
Aliás, assim também é com relação a música. Antes mesmo de nascermos, já tivemos
nossas primeiras experiências sonoras. Apesar de estar ciente que os primeiros contatos com o
mundo se dão basicamente pelo olfato, paladar e audição, é este último que instiga a pesquisar
sobre as práticas músico-educativas para os espaços escolares no país, respeitando as questões
sonoro-musicais que envolvem as descobertas e desenvolvimento de crianças pequenas em
ambientes familiares e escolares.

A educação musical frente a perspectiva italiana de educação da pequena


infância

Para o desenvolvimento da presente pesquisa tomo como base para sua estruturação,
reflexão e análise, a experiência italiana organizada por Loris Malaguzzi, pedagogo italiano
que junto as comunidades da Emilia Romagna, uma região ao norte da Itália, construiu

85
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

colaborativamente um trabalho inovador para a pequena infância. E, é de seu modo de


compreender os indivíduos que organizo esta pesquisa.
Este autor destacou aspectos obsoletos da educação, a necessidade de pesquisas que
inviabilizassem cair na rotina improvisada, e uma atitude que deveria ser dotada de
inconformismo, respeitando sempre os direitos das crianças.
A educação em Reggio é descrita como qualquer coisa menos linear, foi organizada
como uma espiral sem fim, na qual as crianças retomam incessantemente as diferentes
experiências, reavaliando todo o processo. Nesta direção, as constantes transformações,
experimentações e reexames excluem do processo educativo a rotina e a rigidez, jamais se
tornando fixo. Com isso a abordagem recusa o termo modelo, enfatizando-a como projetos ou
experiências.
Na estrutura da proposta reggiana, o ano escolar não começa do zero, mas as escolas
não possuem um currículo planejado seguindo unidades e subunidades. Ao contrário, a cada
ano são elaborados projetos de diferentes proporções, dos quais os temas possibilitam um
suporte, como uma linha condutora, mas são as crianças que direcionam a construção de
maior ou menor relevância e a direção a ser tomada. “[...] O que sabemos realmente é que
estar com crianças é trabalhar menos com certezas e mais com incertezas e inovações. As
certezas fazem com que entendamos e tentemos entender” (MALAGUZZI, 1999, p. 101).
A escola para a pequena infância de acordo com Malaguzzi deve se distanciar de um
modo preparatório e de continuidade com o ensino fundamental, porque assim, estariam
presos a um modelo que visa um único fim, estar apto a alguma coisa, estar preparado para
alcançar, para ser capaz de. Visando os aspectos a serem alcançados para poder desempenhar
uma outra tarefa que não a própria que se está envolvido. Como é o caso de distanciar a
formação de músicos dos objetivos mais amplos que envolvem as práticas musicais escolares.
Ainda, Malaguzzi contemplou em seu trabalho a perspectiva de uma pedagogia da
escuta, pela qual o próprio autor instiga os professores mencionando que temos de admitir que
falamos muito das crianças, falamos pouco com elas e muito menos as escutamos
(MALAGUZZI, 1999). É imprescindível em sua perspectiva, que pratiquemos a escuta, estar
atento e dar ouvidos, com todos os sentidos, a infância.
Esta vem proporcionar ferramentas ao adulto, como o espanto, a maravilha, a reflexão
e a alegria de estar com as crianças (PLANILLO, 2004b, p. 130). Uma pedagogia da escuta
além do nível da audição, que faça o ouvinte refletir, apreciar, contemplar com uma postura
ética e estética. Levando-nos a questionar a maneira como as crianças elaboram seus

86
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

pensamentos, desejam, etc. Uma atitude de escuta que transforma a observação, a


interpretação e a aprendizagem, em vista de respeitar a cultura infantil.
A proposta é ouvir aqueles que cotidianamente não temos tempo e nem mesmo
paciência para ouvir. Na proposta de ouvir a criança, também ouvimos os mundos que as
cercam, e isso pode ser explorado através das sonoridades, da sensibilização auditiva, da
acuidade sonora do todo e das partes, trabalhar com o respeito em ouvir o mundo, ouvir o
outro, ouvir-se.
Nessa direção, a proposta italiana poderá fornecer subsídios para compreender em que
proporção o trabalho musical que vem sendo desenvolvido no Brasil considera a visão das
crianças, respeitando as suas potencialidades e necessidades.

Os caminhos metodológicos

O projeto de pesquisa em questão, propõe-se a investigar a educação musical para a


pequena infância brasileira através dos relatos de algumas pesquisadoras/educadoras musicais
do Brasil. Para tanto, optou-se por realizar uma investigação de caráter qualitativo, utilizando-
se como método a pesquisa narrativa.
Inicialmente foi realizado um levantamento em publicações na área da educação e
educação musical em vista de identificar pesquisadores e/ou educadores brasileiros com
produção na temática da pesquisa, seja esta de educação musical infantil entre zero e três anos
de idade. Ao considerar um número reduzido de profissionais que investiram seu trabalho
musical com crianças pequenas (citados anteriormente no presente texto), será possível buscar
o contato com todos, para a possibilidade de entrevista.
O estudo prevê entrevistas gravadas em áudio com pesquisadoras/educadoras
brasileiras da área de Educação Musical acerca de suas produções voltadas a crianças
pequenas no país, construindo um apanhado a cerca do ensino da música e considerando suas
percepções acerca da educação para a pequena infância nos espaços escolares de educação
infantil atuais.
A análise culminará em um entrelaçamento com a pedagogia italiana, em especial com
o trabalho produzido na região de Reggio Emilia e conhecido através da atuação de Loris
Malaguzzi, visando-se confrontar a perspectiva de construção músico-pedagógica brasileira
com a visão italiana de vínculo da infância com as artes, em especial nesta pesquisa, com a
música.

87
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Contribuições

Ao final, viso contribuir com a efetivação do trabalho musical a ser contemplado nas
matrizes curriculares das escolas de educação infantil na medida em que possibilitaremos
através das narrativas dos educadoras/pesquisadoras musicais da pesquisa, uma perspectiva de
como a educação musical brasileira poderia ser organizada e conduzida atualmente entre os
espaços escolares de educação para a pequena infância no Brasil. Refletindo,
consequentemente, na formação musical e pedagógico-musical dos professores unidocentes.
Não objetivo de forma alguma criar novas formas de ensinar música, ou simplesmente
colocar no papel a história de grandes pesquisadoras/educadoras musicais de nosso país.
Entretanto, procurarei refletir como as crianças gostariam de construir seus conhecimentos
musicais nos espaços escolares.
Através dessa pesquisa, objetivo integrar as temáticas da educação infantil e educação
musical de maneira diferenciada, contribuindo na medida em que a criança será observada em
todo o seu potencial, de forma integral, a partir de suas realidades, para vivenciarem
musicalmente o contato com outras crianças, e com os professores, unidocentes e músicos, de
forma lúdica e desafiadora.
É importante ver as experiências musicais durante as primeiras fases das criancas
como aliada para o desenvolvimento global. Este é “um caminho que passa pela aceitação a
novos itinerários, a explorar velhos-novos territórios, dentro de si e a seu redor, arriscando
novos olhares [...] (OSTETTO, 2006, p. 234)
Propondo reflexões sobre o tema, talvez nós possamos organizar musicalmente o
universo das crianças pequenas. Ostetto (2006) enfatiza que “alimentar o universo imaginário
do educador, provocando o desejo, que faz mover a busca, implica tempo de espera. Não se
dá instantaneamente. Talvez por isso a escassez de propostas educativas que incluam as
múltiplas linguagens[...] (p. 234).
E sobretudo, as pesquisas/práticas produzidas no país que comporão as narrativas das
participantes da pesquisa, poderão representar, ao menos inicialmente, a trajetória histórica da
educação musical para a pequena infância brasileira. O que viabilizará um panorama geral
que poderá refletir sobre esta nova fase que vivencia a educação musical no ensino
fundamental do país, desenvolvendo nas crianças brasileiras, dentre outros fatores de modo
geral, uma mentalidade estética diferenciada.

88
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A educação musical nas séries iniciais do ensino


fundamental: olhando e construindo junto às práticas cotidianas do professor. 2000. 340f.
Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
2000.

_______. O espaço da música nos cursos de Pedagogia: demandas na formação de educador.


In: Encontro Regional da ABEM Sul e I Encontro do Laboratório de Ensino de Música/LEM-
CE-UFSM, 4. 2001. Anais... Santa Maria: Ed. UFSM, 2001. p. 13-25.

_______. Formação musical de professores na pedagogia: pressupostos e projetos em


realização na UFSM/RS. In: Encontro Anual da ABEM, 13. 2004. Rio de Janeiro. Anais... Rio
de Janeiro: 2004. p. 208-216. 1 CD-ROM.

BEYER, Esther. Cante, bebê, que eu estou ouvindo: do surgimento do balbucio musical. In:
BEYER, Esher (org.). O som e a criatividade: dimensões da experiência musical. Santa
Maria: UFSM, 2005. p. 93-110.

CERISARA, Ana Beatriz. o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil no


contexto das reformas. In: Revista Educação e Sociedade. Campinas, v. 23, n. 80,
setembro/2002. p. 326-345. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em:
22/01/2011.

CORREA, A. N. “Programa LEM: Tocar e Cantar”: um estudo acerca de sua inserção no


processo músico-formativo de unidocentes da Pedagogia/UFSM. 2008. 167f. Dissertação
(Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal
de Santa Maria, Santa Maria, 2008.

______. Educação musical nos anos iniciais da escola: identidade e políticas educacionais.
Revista da ABEM, Porto Alegre, n. 12, p. 21-29, 2005.

FIGUEIREDO, Sergio Luiz F. A preparação musical de professores generalistas no Brasil. In:


Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, set. 2004. p. 55-61.

FONTERRADA, Marisa T. de O. Diálogo interáreas: o papel da educação musical na


atualidade. In: Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 18, out. 2007. p. 27-34.

FUKS, Rosa. O discurso do silêncio. Rio de Janeiro: Enelivros, 1991.

GANDINI, L; EDWARDS, C. Bambini: a abordagem italiana na educação infantil. Tradução


de Daniel Etcheverry Burguo. Porto Alegre: Artmed, 2002.

FURQUIM, A. S. A Formação Musical de Professores em Cursos de Pedagogia: Um Estudo


das Universidades Públicas do RS. 2009. 150f. Dissertação (Mestrado em Educação).
Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria, 2009.

89
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ILARI, Beatriz; DELL’AGNOLO, Vivian . O desenvolvimento do canto em crianças de 2 a 6


anos de idade. In: Encontro Anual da ABEM, 14, 2005, Belo Horizonte. Anais... Belo
Horizonte: 2003. p. 1-5 . 1 CD-ROM.

JOSSO, Marie - Christine. Experiências de Vida e Formação. São Paulo: Cortez, 2004.

KOHAN, Walter. Infância, estrangeiridade e ignorância: Ensaios de filosofia e educação.


Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 2007.

MALAGUZZI, L. Ao contrário, as cem existem. In: EDWARDS, C.; GANDINI, L.;


FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da
primeira infância. Porto Alegre: Artmed,1999.

OESTERREICH, F. Formação musical do professor unidocente: a música no curso de


Pedagogia da UFSM (1984-2008). 2009. 130f. Qualificação de Mestrado. Programa de Pós-
Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Maria, 2009.

PLANILLO, Alfredo Hoyuelos. El taller. La pedagogia de la expresión: Lóris Malaguzzi,


Reggio Emilia y Pamplona. In: HARF, Ruth. Dirección y organización de instituciones para
niños pequeños. Buenos Aires: Centro de Publicaciones Educativas y Material Didáctico,
2008.

_______. La estética en el pensamiento y obra de Loris Malaguzzi. Barcelona: Octaedro/Rosa


Sensat, 2006.

_______. La ética en el pensamiento y obra pedagógica de Loris Malaguzzi. Barcelona:


Octaedro/Rosa Sensat, 2004 B.

_______. Loris Malaguzzi: biografia pedagogica. Tradução de Mara Davoli. Bolonha:


Edizioni Junior SRL, 2004.

PINTO, Manuel; SARMENTO, Manuel. As crianças: contextos e identidades. Minho: Centro


de estudos da criança, 1997.

SOUZA, Elizeu Clementino. A arte de contar e trocar experiências: reflexões teórico-


metodológicas sobre as histórias de vida em formação (Versão Online). Educação em
Questão, v. 25, p. 22-39, 2006.

SPANAVELLO, Carolina S. A educação musical nas práticas educativas de professores


unidocentes: um estudo com egressos da UFSM. 2005. 152f. Dissertação (Mestrado em
Educação). Universidade Federal de Santa Maria, 2005.

WERLE, K. A música no estágio supervisionado da Pedagogia: uma pesquisa com


estagiárias da UFSM. 128f. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-
Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Maria, 2010.

90
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Caminhos da Musicalização Infantil na UFBA

Marineide Marinho Maciel Costa


UFBA
marineide.costa@gmail.com

Resumo: Pretende-se através deste artigo, apresentar um pouco da história do Curso de


Musicalização Infantil na UFBA, concebida através de: consulta a documentos dos arquivos
da EMUS, entrevistas com ex-alunos, professores e coordenadores, atores do processo
educativo em questão, que serão apresentados ao longo do texto. Organizado por períodos de
acordo com a política pedagógica da instituição, observando principalmente a mudança da
coordenação pedagógico-administrativa , o texto mostra os caminhos percorridos desde os
anos de 1954 a 2011.
Palavras chave: Musicalização, história, educação

Primeiro Período: 1954 a 1969

Era o ano de 1954, quando o então Reitor da Universidade da Bahia1, Edgar Santos,
incentivado pela Professora Rosita Salgado Goes, institui o I Seminário Internacional de
Música como cursos de extensão. Constatando nos programas dos Seminários Internacionais,
que eram cursos de férias promovidos pela então Universidade da Bahia, percebe-se a
preocupação desta instituição, para com a iniciação musical das crianças, visto que um dos
cursos ministrados era o de Pedagogia e Iniciação Musical, ministrado pela Professora Maria
Rosita Salgado Góes.2.
Supondo a existência, de cursos para crianças buscou-se depoimentos de professores
que participaram daquele momento, ou seja, da criação dos cursos de extensão geridos pelo
então Seminários Livres de Música. Maria Angélica Bahia Koellreuter quando numa
entrevista por telefone, foi questionada sobre o atendimento a crianças menores de seis anos,
responde:

O curso não tinha o nome de Iniciação Musical ou Musicalização


Infantil, mas atendíamos a crianças de 6 anos, com as quais
desenvolvíamos atividades de introdução ao instrumento com
iniciação musical. O curso era chamado Pré-Universitário nos anos

1
Até a primeira Reforma Universitária Decreto 62.241 de 13/02/1968 quando passou a UFBA.
2
Folder do I Seminário Internacional de Musica (em anexo e powerpoint).
91
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

1956 e 1957. Eu tive alunos de 6 anos, como aluna do curso superior


de piano sob a orientação do professor Benda.3

A presença da criança era constante, e na década 60, houve uma mudança no olhar e
na postura dos professores quanto ao processo de educação, buscando conhecer e utilizar uma
metodologia baseada nos princípios de psicologia aplicada ao ensino, respeitando o do
desenvolvimento do sujeito como um todo. Os elementos básicos da música passam a ser
transmitidos de maneira adequada ao nível cognitivo, afetivo, psicomotor e social do aluno e
os métodos considerados ativos que defendiam a vivência como base para a construção do
conhecimento teórico musical que surgem na Europa, com renomados teóricos, pedagogos e
psicólogos, como J.Dalcroze, C.Orff, Edgard Willems entre outros chegam à Bahia.
A Bahia estava na frente!

Foi assim... pela primeira vez o renomado Pedagogo Edgard Willems veio à
Bahia a convite do compositor e então diretor dos seminários Livres de
Música, Hans Joachin Koellreuter, foi um curso intensivo de seis semanas;
uma demonstração inigualável de competência, amor à música e às crianças
(Carmen Mettig, site Congresso de Educação Musical Willems Brasil 2009,
acesso em 24 jun. 2011).4

A professora Alda Oliveira conta que, em 1964, quando do seu ingresso SLM5, como
aluna do curso de graduação, teve a oportunidade de ministrar aulas. Comenta posteriormente,
referindo-se a Willems:

ele me introduziu aos seus livros e me deu uma turma de crianças a


partir de 6 anos de idade. Eram sempre turmas pequenas, de no
máximo 12 crianças. De início, eu fazia as preparações e
planejamentos das minhas aulas baseada no método Willems, que foi
o início da minha formação em educação musical feita com o
professor e compositor Ernst Widmer, que, como Edgard Willems, era
também Suiço.6

Mais tarde, no final da década de 60, Oliveira comenta sua interessante experiência
com crianças a partir de 3 anos de idade:

3
Informação obtida através de entrevista pessoal. (Realizado em 25/06/2011). O questionamento enquanto
entrevista a Maria Angélica foi: Havia atendimento ou cursos destinados à crianças menores de seis anos, no
Seminários Livres de Música?
4
N.A.Sobre este curso foram encontradas no Arquivo da EMUS, as cadernetas contendo os nomes dos alunos das
duas turmas de crianças, sendo uma turma de 4 a seis anos e outra de 7 a 10, assim como participação de 30
professores oriundos de várias Escolas de música de Salvador.
5
SLM Seminários Livres de Música.
6
Depoimento escrito de Alda realizado em 17/07/2011.
92
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Nesse período aceitei como desafio na Escola de Música (sempre


gostei de enfrentar problemas educacionais e artísticos), tomar uma
turma de iniciação musical com crianças de 3 anos de idade. No
princípio, comecei a fazer aulas no mesmo estilo, usando canções,
improvisações etc. Mas com o passar do tempo, percebí que eu tinha
de mudar a abordagem, pois elas não ficavam muito tempo na mesma
atividade. Queriam mudar, pegar nos objetos, correr. Tive de me
adaptar a isso e conseguir dar aula sozinha, sem nenhuma ajuda7.

Convém ressaltar que Edgar Willems que aqui chegou em 1963 para ministrar um
curso intensivo retornou em 1971 dando continuidade ao trabalho. Entretanto, oficialmente o
professor que se preocupou com as questões de educação musical para aquele tempo, no
SLM, era Ernst Widmer, que aqui chegou, convidado por Koellreutter em 1956.
Vários foram os alunos do curso de graduação que tiveram a oportunidade de
experimentar educação musical para crianças sob a orientação do professor E.Widmer, e em
conversa com as Professoras Alda Oliveira e Carmen Mettig, elas lembravam nomes das
colegas que também ministravam aulas de iniciação musical e iam citando, com naturalidade,
como se estivessem vivendo aquele momento: Maria Amélia e Maria Amália Martins
(Melinha e Malinha), Maria da Graça Santos, Aida Zollinger, Ida Meireles, Rosa Lúcia Mares
Guia. Estes depoimentos demonstram que os estudantes sempre tiveram oportunidade de
experimentar as teorias e metodologias estudadas durante curso.
A década de sessenta termina com uma grande vitória para Educação Musical no
Brasil e em especial na Bahia, com a criação do Curso de Licenciatura em Música mediante
os documentos: Decreto nº 43/804 de 23/05/1958; pelo Parecer nº 1.284/76 e pela Resolução
nº 10 de 10/10/1969. Sua primeira turma ocorreu em 1969, quando aconteceu o primeiro
vestibular unificado. Graduação Licenciatura em Música.
Curso de Iniciação Musical continua sendo o laboratório para o licenciando, aliás uma
característica específica desta Escola quando utiliza, desde 1954, oportunidades na formação
de professores para experimentação prática do que aprende e do que ele mesmo cria.
A partir daí coordenado pela professora Carmen Mettig, tem em 1973 a primeira
estagiária, a licencianda Jane Souza Palma que realizou seu estágio da disciplina Prática de
Ensino em uma turma de crianças de 6 (seis) anos, sob a orientação da professora Carmen
Mettig.8 Conta a professora Carmen sobre o estágio:

7
Idem.
8
Depoimento da Professora Jane Palma em entrevista por telefone dia 24/06/2011e confirmado em entrevista
com a Professora Carmen Mettig em 15/07/2011 no IEM Instituto de Educação Musical.
93
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O estágio acontecia após o licenciando observar durante um ano as


minhas aulas e durante o tempo de observação iam realizando
atividades até ministrar a aula inteira, sempre sob meu olhar. Quando
assumia a classe sabia dar aula!9

A metodologia usada era baseada no método Willems sob a orientação do próprio, que
estava preparando a Professora Carmen Mettig, para mais adiante entregar-lhe o título de sua
representante no Brasil e na América Latina.

Segundo Período: 1970 a 1986


Com a realização do primeiro vestibular para o curso de Licenciatura em Música,
ocorrido em dezembro de 1969 a então Escola de Música e Artes Cênicas- EMAC recebe a
sua primeira turma. Vale ressaltar que a EMAC não se adequou à Lei de Diretrizes e Bases de
1971, que instituiu o ensino da Educação Artística nas escolas públicas, pelo fato de acreditar
que cada uma das linguagens de Arte tem os seus conteúdos e objetivos específicos.
Em 1971, a professora Carmen Mettig, então coordenadora do Curso de Música,
ainda impactada com o que absorveu sobre o método Willems em 1963, solicita ao Diretor da
EMAC, Ernst Widmer, o retorno do Pedagogo Willems para ministrar um curso na Semana
de Educação Musical. 10Contando com o apoio do coordenador do curso de Dança da UFBA,
Rolf Gelewski, a solicitação foi atendida e a Semana de Educação Musical contou com a
participação de Educadores de varias instituições do país.
A Semana de Educação Musical acontecia anualmente com o objetivo de melhorar o
desempenho dos professores de Educação Musical. Este movimento fortalecia a equipe de
professores da UFBA e o curso de Iniciação Musical continuava sob a coordenação da
Professora Carmen Mettig. A demanda por parte das crianças era grande e filas enormes se
formavam na porta da Escola na ânsia para conseguir uma vaga. Nessa época se cobrava uma
taxa simbólica que era administrada pela FAPEX e eram atendidas 200 (duzentas crianças
entre 4 a 10 anos) no Projeto que na época se chamava “Iniciação Musical / Coral Infantil”.
Os próprios professores e estagiários efetuavam as matrículas. A equipe era formada por
estagiários do curso de Licenciatura, em Música entre as quais, lembra Carmen Mettig:
Heloisa Leone, Isa Valois, Jane Palma de Souza, Marialva Rios, Doraneide.

9
Entrevista com Carmen Mettig 15/07/2011 no IEM.
10
Depoimento de Carmen Mettig no site do Congresso de Educação Musical Willems Brasil 2009e em entrevista
no IEM dia 15/07/2011.
94
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Ao final de cada semestre eram realizadas as apresentações na Reitoria ou no Teatro


Castro Alves, sempre privilegiadas pelos reitores Germano Tabakof e Rogério Vargens, que
apreciavam e prestigiavam com as suas presenças.
Ainda em conversa com Carmen, perguntando como eram escolhidos os estagiários,
responde:

Os estagiários levavam um ano observando as minhas aulas e aos poucos


iam assumindo atividades até ficar responsável pela classe. Quando
terminavam, sabiam elaborar o seu plano de aula e executá-lo sem
dificuldade.

Terceiro Período: 1987 a 1993


Em 1987, o então diretor da Escola de Música, Paulo Costa Lima reestrutura o Curso
preparatório, transformando em curso básico de Música, dividido em: Pré-básico, com foco
na Iniciação Musical e no ensino dos instrumentos para crianças até 12 anos e o curso Básico,
com focos em Licenciatura, Composição, Regencia, Canto e Instrumentos a partir de 13 anos.
Vale salientar que esta divisão era flexível tanto para o Pré-Básico quanto para o Básico
Alda Oliveira nos relata no seu depoimento: 11

Somente quando fomos fazer Mestrado em Boston (1977-1979) e Doutorado


no Texas (1983-1986) é que não dei aulas e nem orientei na EMUS/UFBA.
Em todos os demais periodos, trabalhei com isso. Carmem e eu dividíamos
as responsabilidades de orientar, pois ambas trabalhavam com as disciplinas
principais do curso de Licenciatura. Carmen, usando o método Willems e
eu, tentando levar os professores para desenvolver os próprios projetos assim
como as minhas idéias e propostas, como por exemplo as turmas de
Iniciação Musical com Flauta Doce (com Barbara, do Instituto de Música,
que já faleceu), as turmas de Iniciação Musical com Maratona Musical, a
turma de Iniciação Musical com Capoeira, as turmas de Iniciação Musical
com Introdução ao Teclado, o IMIT.

As aulas aconteciam no mesmo espaço da graduação, até que as crianças foram


transferidas para a casa em anexo onde funciona o Acervo do Grupo de Compositores da
Bahia - Memorial Lindembergue Cardoso. O aumento do espaço proporcionou o aumento do
número de alunos que chegou a ser de 450 (quatrocentos e cinqüenta crianças, distribuidas em
3 (três) grandes projetos: IMMAR - Iniciação Musical com Maratona, a, IMCOR – Iniciação
Musical/ Coral para e IMIT- Iniciação Musical com Introdução ao Teclado. A criança entrava
na escola aos seis anos, sem teste de seleção em um dos cursos de Iniciação Musical, IMCOR
ou IMMAR e depois de um ano de iniciação va musical, passa para o IMIT ou outro projeto

11
Depoimento por escrito de Alda Oliveira em 17/07/2011.
95
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de iniciação ao instrumento (em grupo). Mediante o seu desempenho, ela


seria indicada para submeter-se ao teste de ingresso ao pre-basico, cujas aulas de
instrumento eram individuals.
Com a aposentadoria da Professora Carmen Mettig em 1991, a coordenação passa ser
da professora Alda Oliveira que depõe:12

eu fiquei responsável, mas também dividia as orientações dos estagiários


com Profa. Celina Lopes, com Profa. Ana Margarida Lima, que trabalhava
com violino, e até mesmo com o Prof. Horst Schwebel, quando o aluno era
de instrumentos de sopros, de Banda. Sempre o nosso curso de Liceniatura
em Música teve essa possibilidade de orientação específica para a tendência
de especialização musical do aluno. Isso sempre ajudou muito a aproveitar
os diversos talentos musicais dos estagiários. Entre os meus estagiários e
pessoas que trabalharam comigo estão Adálvia Borges, Kátia Cucchi,
Robertinho Castro (de construção de instrumentos), Marialva Rios, Regina
Cajazeira, Juracy “Bemol” e muitos outros. Teve um período que criei até
um curso Básico de Educação Musical (quem dava aula era eu mesma), que
servia para preparar adultos que queriam fazer vestibular para Licenciatura
em Música. Na primeira turma desse curso, participaram mais de 30 alunos,
dentre eles Leila Dias (quando ainda era médica), Zezinho (cursou
Licenciatura, fez Mestrado em Etnomusicologia), Lara Morelli, Ilma
Nascimento, Patricia Hita, etc. Foi um curso muito proveitoso para a Escola.
Depois eu não tive mais tempo de dar essas aulas e o departamento não teve
interesse em continuar. Eu tinha muitas turmas do IMIT com crianças de
várias idades e ainda os estagiários.

Ainda em 1991, uma nova proposta para Iniciação Musical!

“Aulas para bebês foram introduzidas na Escola de Música da UFBA como


parte da disciplina Educação Musical Especial ministrada pela Profa. Diana
Santiago nos anos de 1991, 1992 e 1996 no então curso de Mestrado em
Música da UFBA. Foram ministradas pelos alunos da disciplina durante a
segunda parte de cada um dos semestres letivos em que a disciplina foi
oferecida, pelo período de 8 semanas em várias turmas e consistiam num
encontro semanal dos professores, das crianças e seus pais. (A primeira parte
dos semestres consistia em aulas teóricas sobre Educação Musical para a
Primeira Infância). O formato das aulas foi baseado no MUSICTIME criado
pela Profa. Dra. Donna Brink-Fox na Eastman School of Music (New York,
USA) na década de 1980, com quem Diana Santiago estudou enquanto
realizou seu Mestrado nos EUA. As aulas – em várias turmas – consistiam
em 15 minutos de atividades lúdicas espontâneas, para as quais eram
disponibilizados brinquedos musicais e instrumentos de percussão leves e
seguros para serem manuseados pelas crianças, e cerca de 30 minutos de
atividades conduzidas pelo (a) aluno (a) de mestrado que atuava como
professor (a) da turma. Essas atividades incluíam atividades musicais para
entrosamento, canções, lengas-lengas, atividades rítmicas e atividades
musicais para imitação e locomoção. As aulas aconteceram na sede da
EMUS.

12
Idem.
96
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Além das atividades desenvolvidas com os alunos da pós-graduação, alunos


da graduação (concluintes de curso e bolsistas de iniciação científica)
também trabalharam com bebês, tendo sido treinados no método. Aulas para
bebês, supervisionadas por Diana Santiago, foram por eles ministradas
durante os anos de 1994 a 1997, na Organização de Auxílio Fraterno (OAF,
entidade que atende a crianças carentes), na Creche da UFBA e na Escola
Dorilândia, como parte dos projetos de pesquisa Padrões do
desenvolvimento psicomotor e comportamentos musicais de resposta em
crianças de classe social menos favorecida (1994-1995) e Atividades
rítmicas e melódicas apropriadas à 1ª infância (1995-1997), bem como dos
estágios de conclusão de curso das licenciandas em música Lara Morelli e
Ilma Nascimento”. (Texto concedido por email pela Professora Doutora
Diana Santiago em 22/07/2009).13

Quarto Período: 1994 a 2011


A professora Leila Dias, que retornava da Inglaterra onde fora realizar o seu mestrado
em Música, assume a coordenação do curso de iniciação Musical por solicitação da então
diretora da EMUS-UFBA, Prof. Dra. Alda Oliveira. Em 1996 convida a professora Marineide
Costa recém aposentada pela Secretaria de Educação do Município de Salvador, para
colaborar com a professora Leila no curso de Iniciação Musical que continuava atendendo a
crianças de 4 anos e meio a 6 anos.
As aulas eram ministradas pela professora Marineide. Eram cinco turmas de até 25
(vinte e cinco crianças, sendo 2 turmas pela manhã e 3 turmas pela tarde, organizadas por
idade cronológica. As do turno matutino uma de 4 e 5 anos e a outra de 6 anos. As do
vespertino como a demanda era sempre maior, uma turma de 4 anos,uma de 5 anos e uma de
6 anos, que eram observadas pelos alunos dos cursos de Licenciatura em Música da UFBA,
assim como dos dos licenciandos do Instituto de Música da Universidade Católica de
Salvador, por solicitação da professora Terezinha Requião, então orientadora e professora da
disciplina Prática de Ensino.quanto da UCSAL.
Nesse período, a observação dos licenciandos era realizada sob a supervisão dos seus
professores, da disciplina Iniciação Musical II, que solicitavam um relatório da aula
observada com a assinatura da professora que havia ministrado. No decorrer das aulas, os
licenciandos que observavam, também participavam de algumas atividades, sem perder o
olhar de observador, para que depois pudessem relatar e até realizar críticas. Após cada aula, a
professora Marineide se reunia com os licenciandos para tirar dúvidas, fundamentar as
atividades realizadas. Somente após um período de um ou dois semestres de observação,

13
Coordenadora - Núcleo de Pesquisa em Performance Musical e Psicologia Escola de Música da UFBA.

97
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

podiam escolher uma turma para realizar o estágio exigido pela disciplina Prática de Ensino.
Por esta experiência de observação passaram dezenas de estagiários, mas poucos se
habilitavam a realizar o seu estágio nas turmas dos pequeninos de 4 a 6 anos, a exemplo:
Micheline Fontal, Glicéria Santos, NelzaSuzart, Carmelito Lopes, Sérgio Teixeira e muitos
outros.
Vale a pena salientar que Sérgio Teixeira participou como estagiário da implantação
do IMAV – Iniciação Musical com introdução ao Violino, em 1997 sob a orientação dos
professores Dilson Peixoto e Marineide Costa. Esse projeto chegou a atender crianças a partir
de 3(três) anos, quando foi utilizado o método Suzuki.14
Ainda na sua gestão como diretora da EMUS, Alda Oliveira cria o NEM- Núcleo de
Educação Musical, com objetivos de:

1. Atender às necessidades do curso Licenciatura em Música especialmente no que se


refere às disciplinas pedagógicas, quer teóricas, ou práticas que são:
Iniciação Musical I - Disciplina Teórica que fundamenta
métodos e teorias da Educação Musical
Iniciação Musical II-Disciplina Teórico-prática - Vivência dos métodos e
teorias estudadas em Iniciação Musical I
Prática de Ensino - Estágio - Disciplina Prática
Orientação Para Prática de Ensino.
2. Funcionar como laboratório dos cursos de Graduação e Pós-Graduação , através do
programa de Extensão “Iniciação Musical” que oferece cursos para crianças e
adolescentes.
M.I. Musicalização Infantil para crianças de 4 a 6 anos
IMIT Iniciação Musical com Introdução ao Teclado de 7 a 12 anos
IMIV Iniciação Musical com Introdução ao Violão de 7 a 12 anos
IMAV Iniciação Musical através do Violino de 7 a 12 anos
IMAF Iniciação Musical através da Flauta Doce de 7 a 12 anos
IMIP Iniciação Musical através da Percussão de 7 a 12 anos (novo,
1ª experiência em 2003)
Pré-básico de Piano após o 4º ano do IMIT
desde 2004
3- Atender a demanda da comunidade infantil, cumprindo assim o papel da extensão
na Universidade.
Os cursos oferecidos pelo Programa de Extensão “Iniciação Musical” têm como
objetivo iniciar a criança ao conhecimento da música, preparando-a para participar de etapas
mais avançadas do conhecimento musical, tanto nas oficinas quanto no curso básico, e,
atualmente, estão com duração de 4 anos, com exceção de Musicalização Infantil que tem
uma duração mínima de dois anos, podendo usar o tempo necessário para o amadurecimento
das crianças. É um curso que não deve ser realizado com pressa, pois é a base da construção

14
Método criado pelo Japonês Shinichi Suzuki.
98
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

do conhecimento musical, que em países desenvolvidos começa muito antes dos 4 anos, idade
mínima para os nossos cursos da EMUS.
A coordenação do NEM é realizada por Marineide Costa, desde 2000 e cada projeto
tem o seu coordenador.15
Em 1999, o espaço físico da Escola é modificado. O então diretor Oscar Dourado,
transforma o antigo Salão de Orquestra em 3 salas de aula, sendo uma delas destinada às aulas
de Iniciação Musical para as crianças também usada pela graduação para as disciplinas
teóricas.
Com a coordenação alternando entre as professoras Leila Dias e Marineide Costa, os
vários cursos do NEM se mantinham com um número grande de alunos sendo necessário a
inclusão de monitores, os estagiários que não faziam a disciplina Prática de Ensino
começaram também a assumir turmas pelas quais recebiam uma quantia por hora aula
ministrada. O processo para assumir uma turma continuava o mesmo. Primeiro observar no
mínimo um semestre para depois assumir a turma. Nesse período, ou seja, a partir do ano
2000, passaram vários monitores e estagiários que atualmente estão bem inseridos no
mercado de trabalho como bons profissionais, ex: Carmelito Lopes, Jaqueline Leite, Michele,
Valéria Badaró, Amélia Dias e outros.
Em 2006, sob a coordenação da Professora Leila Dias o curso é ampliado com a
implantação do curso de Musicalização de Bebês, atendendo crianças de 0 a 3 anos, e as aulas
eram ministradas pela professora Angelita Broock, recém chegada na Bahia, vindo de
Curitiba.
A partir daí o curso de Musicalização Infantil que atendia crianças de 4 a 10 anos
desde os anos 50, passa a atender crianças de 0 a 10anos.
Em 2007, com a saída da professora Leila Dias para o doutorado fora de Salvador,
assume a coordenação a professora Marineide Costa. O trabalho prossegue, bem aceito pela
comunidade servida e começam a surgir trabalhos com a comunidade fora da escola,
cumprindo assim a proposta da Universidade de servir à comunidade. Como por exemplo uma
tarde de oficina com os bebês e suas mamães na Maternidade Climério de Oliveira,
maternidade Escola da UFBA, oficinas pontuais em uma loja de móveis e decoração para
bebês
Em 2008, por conta de assumir a Coordenação Pedagógica dos Cursos de Extensão, a
por solicitação do então diretor da EMUS Professor Horst Schwebel,a professora Marineide

15
Informações obtidas através do Relatório escrito em 2004 para a Comissão de Extensão da EMUS em 2004.
99
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

entrega à Professora e Doutouranda Angelita Broock a coordenação do Musicalização


Infantil, curso que atende crianças de 0 a 6 anos, que até agora tem assumido com muita
competência criatividade e seriedade.
O curso continua sendo o laboratório dos cursos de graduação, tanto para os alunos de
Licenciatura, quanto de Instrumento, ou composição, onde têm a oportunidade de
experimentar os conhecimentos teóricos adquiridos durante o curso. As turmas são
organizadas por idade e as aulas tem duração de quarenta e cinco minutos por turma.
As aulas das crianças de 0 a 2 anos são realizadas em companhia dos pais ou
responsável e a partir de 3 anos já ficam sem os seus acompanhantes, que ficam do lado e
fora da sala esperando

Durante o caminho percorrido e relatado aqui, lá se vão cinco décadas


de Musicalização Infantil na Escola de Música da UFBA. Um projeto
que foi crescendo e amadurecendo junto com a Escola, adotando
nomes diferentes, mas sempre com o objetivo de dar o melhor do
mundo da música às crianças que aqui chegam.Leila dias parantão
diretor dos Seminários Livres de o(1963) à convite do c

100
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ALDA DE JESUS OLIVEIRA. Entrevista realizada em 24 de junho2011.

CARMEN MARIA METTIG ROCHA. Entrevista realizada em 25 de junho 2011.

______. Entrevista realizada em 13 de julho 2011.

DIANA SANTIAGO. Entrevista realizada em 22 de julho de 2011.

LEILA DIAS. Entrevista realizada em 24 de junho 2011.

HELOISA LEONE. Entrevista realizada em 24 de junho 2011.

JANE PALMA. Entrevista realizada em 21 de junho 2011.

OLIVEIRA, Alda de Jesus. Escola de Música da Universidade Fedral da Bahia: Cursos de


Extensão. Salvador-Bahia. Revista ABEM, n’ 1, p. 53-56.

PERRONE, Maria da Conceição Costa . Música, Contexto e Tradição: estudo sobre a criação
de uma Instituição de Ensino. Tese de Doutorado em Música da UFBA. Salvador-Bahia,
2008.

ROCHA, Carmen Maria Mettig: Foi assim... Contato Método Willems no Brasil- Site do
Congresso Internacional Willems Brasil 2009. Disponível em:
<http://www.musicaiem.com.br/congressowillemsbrasil>. Acesso em: 24 jun. 2011.

SÉRGIO EMMANOEL TEIXEIRA. Entrevista realizada em 8 de julho de 2011.

101
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O Sapo Não Lava o Pé: cantando, tocando e escrevendo música com


estudantes da educação infantil
Cássia Vanessa O. Cotrim1
FUNORTE
cassiaeanacotrim@yahoo.com.br

Resumo: Este relato de experiência é uma proposta educativa para alunos da educação
infantil do segundo período desenvolvida com crianças por volta de cinco anos no ano
letivo de 2010. A proposta não se encerra no âmbito da educação infantil, podendo ser
utilizada nos diversos níveis da educação básica, desde que haja adequação à idade,
repertório e exigência do conteúdo trabalhado com outros alunos. O objetivo da
proposta foi trabalhar iniciação à escrita musical tradicional, unindo o gesto corporal à
prática coral, desenvolvendo habilidades principalmente de leitura rítmica e corpórea
com cerca de trinta crianças. Outros conteúdos extrínsecos à música fizeram parte do
trabalho como socialização, leitura imagética, desenvolvimento do letramento e outros.
Habilidades essas citadas no Referencial Curricular para a Educação Infantil- RCNEI,
documento oficial do estado brasileiro para esta fase da educação básica. A canção
utilizada foi “O sapo não lava o pé” de domínio público resultando na confecção de
partitura alternativa e interpretação corporal e vocal da canção escolhida com muito
entusiasmo.
Palavras- Chave: Educação infantil, canção popular e notação musical

Introdução

Temos visto a crescente discussão em torno da música na escola, como por


exemplo: quais são as concepções que devem estar inseridas no planejamento? Como
devemos direcionar a construção do currículo? E ainda, quais profissionais que devem
atuar em seu ensino? Tais indagações podem ser percebidas em anais de congressos e
em textos diversos como Queiroz; Marinho (2009); Bellochio; Figueiredo (2009) e
Beyer; Kebach (2009), entre tantos outros. Refletir sobre a música na escola é pertinente
principalmente quando consideramos cada contexto educativo, pensando numa proposta
que atenda à necessidades de cada local em que a música deverá ser ensinada, levando
em consideração as especificidades de cada escola e clientela. O espaço da música
perpassa todos os níveis do ensino básico brasileiro, seja com finalidade de
aprendizagem musical ou não.

1
Graduada em Artes/ Música pela Universidade Estadual de Montes Claros- UNIMONTES e pós-
graduanda em Metodologia do ensino das Artes/ Processos Pedagógicos em Educação Musical pela
Faculdades Unidas do Norte de Minas- FUNORTE/ SOEBRAS.
102
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A presença da música na educação infantil é relatada em diversos trabalhos do


campo da educação, pedagogia, educação musical e afins, pois se configura como
prática enraizada no cotidiano desta fase da educação básica. “Nas escolas de educação
infantil, devido aos programas de ensino serem abordados com uma certa flexibilidade,
a música encontra-se presente no cotidiano da sala de aula de várias maneiras”
(CISZEVSKI, 2010, p. 24). Pensando nestas questões, partimos para o registro de uma
prática em educação musical na educação infantil que ao mesmo tempo contempla a
realidade de uma escola particular e que também pode ser aplicada em diversas
localidades de nosso país sendo adaptada a cada realidade de ensino.
Esta proposta surgiu a partir da reflexão e necessidade de sistematização de
nossa prática docente junto a alunos da Educação Infantil de uma escola da rede
particular de ensino na cidade de Pirapora, situada na região norte do estado de Minas
Gerais. O mesmo retrata o desenvolvimento das aulas de música com exploração do
conteúdo de iniciação à escrita musical a partir do cancioneiro infantil brasileiro. Além
de habilidades como pulsação em conjunto, percussão corporal e canto coral. As
práticas em questão envolveram ainda a aprendizagem de conhecimentos extrínsecos à
educação musical, como coordenação motora e gestual, linguagem visual e imagética, e
ainda consciência de corpo e espaço.
A proposta perpassou tais objetivos com a finalidade de ampliação de
conhecimentos e habilidades para além do universo musical, uma vez que o limite entre
“disciplinas” ou conteúdos não são bem delimitados na educação infantil como bem
retrata Ponso (2008, p. 13). Dessa forma, a exploração dos conteúdos musicais não se
encerrou nesta questão apenas. A proposta buscou reafirmar vários objetivos,
desenvolvendo aptidões e capacidades diversas que por sua vez ajudam a preparar o
estudante para avaliações futuras, em que mais de um conteúdo e habilidade são
previstos.
Entre as atribuições para além do universo musical temos o desenvolvimento do
letramento com reconhecimento e leitura de palavras simples, a representação gráfica de
palavras além de acentuação das mesmas, todos relacionado à área de linguagens e
códigos.

103
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“O Sapo Não Lava o Pé... Não Lava Porque Não Quer!” Definições da
atividade

A escolha dos elementos que compuseram a proposta foi definida a partir dos
propósitos gerais e específicos das aulas, porque acreditamos que toda a metodologia de
ensino deve estar associada ao contexto de produção do conhecimento, os objetivos
traçados e abordagens escolhidas pelo educador. Desta forma escolhemos a canção
popular “O sapo não lava o pé” que é comum às crianças, parte do repertório deles e já
foi trabalhada por outros professores em outros momentos com objetivos variados como
letramento, treino de palavras simples, e outros. Sobre escolha, ampliação e
desenvolvimento de repertório, Lima e Stencil recomendam:

Devemos levar em consideração não só as diversas maneiras de nos


relacionarmos com a música, num verdadeiro contexto
interdisciplinar, como também associarmos a ela os diversos contextos
culturais, por meio de um repertório que tenha significado e que parta
dos alunos, valorizando a vivência das crianças, trazendo benefícios a
outras áreas do currículo (LIMA; STENCEL, 2010, p. 90).

Os aspectos rítmicos da peça foram facilitadores da realização desta prática, pois


o acompanhamento da linha melódica foi facilmente adaptado à performance corporal
que propusemos. O trabalho perpassou alguns dos aspectos que poderiam ser
explorados através desta canção. O principal deles foi iniciação à escrita musical e
desenvolvimento da prática interpretativa em conjunto. Sobre o primeiro aspecto,
buscamos inicialmente trabalhar somente duas das figuras tradicionais: a mínima e a
semínima. A exploração das mesmas se deu de forma gradual. Iniciamos mostrando
quais elementos fazem parte das figuras (cabeça e haste) o que diferencia uma da outra
(a cabeça cheia e outra vazia) bem como poderíamos representar cada uma delas.
Fizemos ilustrações, descobrimos que com as mãos é possível fazer o desenho das duas
figuras para somente depois disto tocá-las. Ao propor a execução, fizemos percussão
corporal tocando duas semínimas batendo na coxa, uma de cada vez e a mínima com
uma palma que se estendia pelo ar.
As duas figuras musicais permitiram o desenvolvimento de variação rítmica de
maneira simples, porém, estruturada de modo a ampliar o universo rítmico dos alunos e
ainda compor um novo jeito de vivenciar a canção do sapo. O RCNEI- Referencial
Curricular nacional para a Educação Infantil aponta:
104
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O trabalho com Música proposto por este documento fundamenta-se


nesses estudos, de modo a garantir à criança a possibilidade de
vivenciar e refletir sobre questões musicais, num exercício sensível e
expressivo que também oferece condições para o desenvolvimento de
habilidades, de formulação de hipóteses e de elaboração de conceitos
(BRASIL, 1998, v.I, p. 48).

Esta sensibilidade foi estimulada através da apreciação e exploração do contexto


musical, explorando desenhos livres sobre a canção, versões gravadas, desenhos das
figuras, exercícios rítmicos trazendo variações com as duas figuras até chegarmos à
confecção de cartaz com a partitura já escrita e a maneira de execução e assim
consolidar o conhecimento construído de maneira coletiva.
O segundo aspecto citado: a prática interpretativa em conjunto, nos remete à
formação musical em grupo que entre outras habilidades estimulam: solidariedade,
confiança, companheirismo, amplia a visão de mundo dos envolvidos, desenvolve
harmonia em grupo (COSTA, 2009, p. 84) e tantas outras habilidades que justificam
este tipo de proposta de maneira bem consistente.
O desenvolvimento das habilidades previstas no texto do RCNEI foi real na
prática com a canção do sapo, pois os alunos uniram gesto corporal, acentuação rítmica
e canto coral. No tocante ainda a interpretação, propomos a união do gesto corporal à
música, prática que nos surgiu a partir da influência do movimento na canção. Para
Rodrigues (2009, p. 37) é comum o uso do gesto como recurso pedagógico em aulas de
música por ser esta uma das formas de vivenciar a própria música. Trazendo o sentido
literal da canção escolhida, o sapo é um animal que constantemente se movimenta, ao
explorarmos os deslocamentos do sapo já pretendíamos trazer à tona a pulsação contida
na canção, alvo de nosso estudo a partir da perspectiva da distribuição dos sons em duas
figuras musicais. Assim:

A influência da música sobre o movimento é iniciada nas suas


respectivas gêneses, pois quando Wisnik (op.cit) explica o pulso da
música, utiliza para isso uma metáfora corporal, colocando que o
universo sonoro e a música passam por padrões somáticos e psíquicos,
trazendo à tona uma idéia fundamental: a música como fenômeno
corporal (RODRIGUES, 2009, p. 39 e 40).

105
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“Ele Mora Lá na Lagoa...” Estratégias de trabalho

Escolhida a canção, as figuras musicais e após a sensibilização para a proposta,


escolhendo a canção, ouvindo versões, interpretando-a cantando e com desenhos,
partimos para a execução da proposta apresentada: Primeiro aprendemos a canção com
a boa repetição típica do trabalho com esta faixa etária. Após a escola da música do
sapo, cada um cantou as versões que conhecia, cantamos juntos, marcando a pulsação,
dançando e explorando parâmetros do som: forte e fraco, grave e agudo e ainda o
andamento, rápido e devagar. Exploramos toda a expressividade vocal que poderíamos
utilizando os parâmetros citados acima, imitamos o som do sapo, inventamos a voz
dele, o gesto que ele emitia ao falar entre outros. Tais estímulos trouxeram mais
significado e verdade à interpretação das crianças nesta etapa da atividade.
Após descobrirmos o sapo que “existia” dentro da cada um, partimos para a
sensação do pulso da música para então apresentar a variação rítmica escolhida com as
figuras mínima e semínima. O desenvolvimento do pulso foi estimulado através de
brincadeiras circulares, marcação acompanhando a cação em cd e cantada pelos alunos,
utilizamos a mesa, o corpo, pulos e palmas para marcar, sempre na perspectiva binária
da canção: um tempo mais forte e outro fraco. Experimentamos a maneira de distribuir
as figuras explorando variantes. Fizemos isto cantando esta e outras canções somente
tocando a semínima com o corpo (batendo nas coxas alternadamente) tocando a
semínima e a pausa, em andamentos diferentes. Daí, incluímos a mínima (com uma
palma prolongada), juntamos as duas figuras em variações executadas com o corpo
como: uma mínima e duas semínimas; pausa e mínima; semínima, pausa mínima;
mínima e duas semínimas e tantos que eles mesmos foram criando. Até chegar ao
resultado final apresentado na imagem abaixo em duas etapas da canção:

106
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Imagem 01- Variação rítmica utilizada no acompanhamento


corporal da canção “O sapo não lava o pé”, nas duas primeiras
estrofes.

A célula rítmica apresentada na Imagem 01 foi executada utilizando as coxas nas


semínimas e uma palma prolongada pelo ar na mínima, sendo tocadas nas duas
primeiras estrofes da canção:“O sapo não lava o pé / Não lava porque não quer”.
A Imagem 02 traz o acompanhamento corporal (batidas nas coxas
alternadamente nas semínimas e a palma prolongada na mínima) executado na segunda
parte da canção, no trecho:“Ele mora lá na lagoa / Não lava o pé porque não quer /
Mais que chulé!

Imagem 02- Variação rítmica utilizada no acompanhamento


corporal da canção “O sapo não lava o pé” nas três últimas
estrofes.

107
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“Não Lava o Pé Porque Não Quer...” definindo caminhos

Façamos agora uma breve justificativa sobre as possibilidades que poderiam ter
sido trabalhadas mas, que não exploramos nesta proposta, a fim de esclarecer objetivos
e definir os caminhos trilhados pelos envolvidos (professora de música, monitora e
crianças).
Não nos preocupamos em entrar no estudo da fórmula de compasso, ficando esta
sugestão para um outro trabalho com estudantes maiores. Prova disso é o final da
canção que traz uma discrepância entre o valor das últimas figuras, possível de observar
na análise da Imagem 02. Nosso objetivo foi utilizar as figuras não incorporando ao
trabalho os valores das pausas nesta etapa do trabalho, acreditando da gradação de
aquisição de conhecimentos como meio de conseguir uma aprendizagem significativa e
não excludente. Trabalhamos as pausas anteriormente no processo de experimentação
de variação das figuras musicais escolhidas, não na execução da peça do sapo.
Exploramos anteriormente a notação não tradicional, extremamente importante
para o trabalho tradicional, de maneira alguma inferior. Ciszevski já aponta um
direcionamento quanto à utilização deste recurso pedagógico explicando que já em
partituras contemporâneas há o uso de símbolos e desenhos bem próximos aos
produzidos por crianças da educação infantil e séries iniciais (CISZEVSKI, 2010, p.
28). Entretanto, apesar deste trabalho introdutório e não menos importante partimos
para a escolha da notação tradicional como norteadora da proposta. Fica aqui o
apontamento para possíveis desdobramentos.
A imagem tem auxiliado muito na aprendizagem infantil, pois aproxima o tema
da canção ao cotidiano dos alunos uma vez que estes representam a canção com
símbolos específicos de seu repertório imagético. Em nossa proposta buscamos
relacionar a canção à escrita das figuras musicais e não à ilustração da canção como é
feito muitas vezes. Trabalho esse que sem dúvida dá subsídio à construção da
apreciação musical bem como registro de músicas diversas com crianças de todas as
idades. Eles perceberam através desta experiência, que podem escrever (representar) a
música de outras formas, não mais somente por meio de desenhos. Esta experiência foi
sem dúvida uma novidade para eles que anteriormente em sala de aula com professoras

108
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

não especialistas em música haviam explorado somente no âmbito do letramento e


desenhos sobre o tema.

“Mais que Chulééé...” finalizando!

A construção da partitura (a ilustração das figuras musicais) foi feita pela


professora de música, o que não impede a sugestão da confecção em conjunto com os
alunos, estratégia até já utilizada com êxito em outros momentos. Utilizamos cartolina,
pincel, régua e a ilustração de um sapo, colorido por uma das alunas. Para facilitar a
associação da imagem ao gesto, organizamos a disposição das figuras exatamente aonde
executaríamos o movimento corporal.
A imagem a seguir é a foto da partitura pronta, após todo o processo exposto
conseguimos:

Imagem 03- Partitura da canção o sapo não lava o pé a partir da


proposta apresentada.

109
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Treinamos a execução juntamente com a leitura corporal da peça, unindo o gesto


ao auxílio visual, expondo a partitura pronta para que todos pudessem ver e
acompanhar. Primeiro analisamos todos os elementos contidos nela: as figuras, a letra
da canção e a figura do sapo. Após essa exploração executamos a percussão corporal e o
canto individualmente, depois incentivamos os alunos a cantarem sozinhos e
produzirem os gestos separadamente para daí unirem tudo, sempre lembrando que a
partitura estava presente em sala de aula para ser vista e lida por eles. Após duas
semanas de “treino” apresentamos a canção à comunidade escolar por mais de uma vez,
com aprovação dos pais, alunos e funcionários da escola.
A experiência foi fruto de acesso a poucas alternativas para o trabalho com
música na educação infantil, uma vez que o sistema de ensino que a escola adota, não
oferece material didático específico de educação musical nesta fase de ensino. A escola
nos disponibilizou o material necessário para a construção da partitura e ofereceu ainda
o estímulo ao desenvolvimento e construção de atividades para executar com os alunos
da EI, além do apoio nas apresentações, demonstrando interesse na divulgação das
práticas educativas desenvolvidas nas aulas de música.
Acreditamos que a busca por propostas educacionais para o trabalho com a
música na escola deve ser contínua e constantemente renovada a partir das vivências de
cada grupo de estudantes.
Esperamos desta forma que este trabalho contribua para a prática incessante de
professores de músicas de todo o país que pretende construir decididamente uma
educação musical de qualidade em seu contexto de atuação. É válido ressaltar que esta
proposta não se esgota nela mesma, sendo base para outras práticas e facilitadora da
busca por alternativas condizentes com as perspectivas da área da educação musical
brasileira, sendo apenas uma idéia a ser discutida e repensada em todo o tempo.

110
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro; FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira. Cai, cai balão...
Entre a formação e as práticas musicais em sala de aula: discutindo algumas questões
com professores não especialistas em música. Música na educação básica. Porto
Alegre, v. 1, n. 1, p. 36- 45. Outubro de 2009.

BEYER, Ester; KEBACH, Patrícia (Org.). Pedagogia da Música: experiências de


apreciação musical. Porto Alegre: Mediação, 2009.

BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: Conhecimento de


Mundo. Brasília: MEC/SEF, 1998, v.3.

CISZEVSKI, Wasti Sivério. Notação musical não tradicional: possibilidade de criação e


expressão musical na educação infantil. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 2,
n. 2, p. 22- 33. Setembro de 2010.

COSTA, Patrícia. Coro Juvenil nas escolas: sonho ou possibilidade? In: Música na
educação básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 83-91. Outubro de 2009.

LIMA, Ailen Rose B. de; STENCEL, Ellen de Albuquerque B. Vivência musical no


contexto escolar. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 88- 103.
Setembro de 2010.

PONSO, Caroline Cao. Música em diálogo: ações interdisciplinares na educação


infantil. Coleção Músicas. Porto Alegre: Sulina, 2008.

QUEIROZ, Luis Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino
de música nas escolas de educação básica. Música na educação básica. Porto Alegre, v.
1, n. 1, p. 60- 75. Outubro de 2009.

RODRIGUES, Márcia Cristina Pires. Apreciação Musical através do gesto corporal. In:
BEYER, Ester; KEBACH, Patrícia (Org.). Pedagogia da Música: experiências de
apreciação musical. Porto Alegre: Mediação, 2009. P. 37- 67.

111
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Planejamento de atividades musicais para bebês com Síndrome de Down e


suas famílias

Ricardo José Dourado Freire


UnB
ricardo.dourado.freire@gmail.com

Resumo: As atividades musicais propostas em um curso de música visam estimular aspectos


específicos do desenvolvimento dos bebês com Síndrome de Down (SD), visando superar
dificuldades fisiológicas congênitas além de contribuir para o estabelecimento de vínculos
afetivos essenciais ao desenvolvimento. O planejamento das atividades musicais em grupo
tem como objetivo a criação de um modelo de referência com boa colocação vocal e um rico
repertório de padrões melódicos e rítmicos a partir da interação do adulto com a criança. O
trabalho é realizado junto à família com bebês entre dois meses e dois anos. A aula é
organizada em quatro momentos: 1) recepção e aquecimento, 2) movimento, 3) interações
individuais e 4) carinho e acolhimento. As atividades realizadas são escolhidas entre canções
sem palavras, parlendas, interações melódicas e rítmicas, colocação da voz de cabeça, canções
conhecidas com sílabas específicas, interação com instrumentos e objetos musicais, histórias e
livros musicais, canções do folclore e do cancioneiro infantil. A atuação em grupo permite a
troca de informações entre as famílias e também a interação entre crianças da mesma faixa
etária. O trabalho de estimulação musical é uma parceria do professor com as famílias em
benefício da criança e as atividades são conduzidas de forma que a família possa utilizá-las
em sua rotina, pois as aulas são apenas um pequeno momento da rotina semanal da criança. A
verdadeira estimulação ocorre em casa de forma contínua, quando mães, pais, irmãos e
cuidadores passam a “musicalizar” a vida das crianças.
Palavras chave: Síndrome de down, educação musical, atividades musicais

O Projeto de Extensão “Música para Crianças”, da Universidade de Brasília, oferece


aulas de musicalização para 850 crianças desde o nascimento até o início do aprendizado de
um instrumento musical (FREIRE, 2008). O curso teve inicio em agosto de 2002, com aulas
de musicalização para crianças de 0 a 5 anos, e a partir de 2004 foi criada uma turma
específica para bebês com Síndrome de Down (SD), desde o nascimento até os dois anos de
idade. Este grupo também está aberto para crianças com outras necessidades especiais e teve a
participação de crianças com paralisia cerebral, cegueira, e outras síndromes não
diagnosticadas.
A turma para crianças com Síndrome de Down surgiu a partir da necessidade de se
oferecer um serviço de estimulação precoce e acompanhamento diferenciado para bebês e
suas famílias. O acolhimento de uma família com bebê portador de Síndrome de Down é
fundamental nos primeiros meses de vida, tanto para a integração da criança em um grupo

112
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

com atividades musicais, quanto para o contato da família com outras famílias de crianças
SD.
O trabalho com bebês e crianças portadores de Síndrome de Down (SD) é
significativamente marcado pelas relações afetivas dessas crianças com seus pais, mães e
irmãos (MATIAS; FREIRE, 2005). A aceitação da criança e a superação do “luto” pela
família são aspectos fundamentais para que o acompanhamento e estimulação precoce da
criança SD tenha êxito. A partir dos relatos das mães e observação das respostas das crianças,
foi possível verificar que as atividades musicais tornaram-se muito importante para as
famílias como mediadoras das relações afetivas. Além de estimular o desenvolvimento
musical, cognitivo, social e psicomotor dos bebês, a música também teve impacto no
desenvolvimento dos pais e mães, auxiliando estes na superação do “luto”.
Voivodic (2004) considera importante que, desde os primeiros anos de vida da criança
com Síndrome de Down, seja realizada uma estimulação precoce que "leve em conta seus
diferentes modos e ritmos de aprendizagem, em função de suas necessidades especiais"
(p.31). Considera também que a família tem um papel de fundamental importância no
desenvolvimento social, emocional e cognitivo durante o período crítico (primeiros meses de
vida) das crianças SD. Segundo diretrizes do MEC/SEESP de 1995, estimulação precoce "é o
conjunto de atividades e recursos humanos e ambientais incentivadores que são destinados a
proporcionar à criança, nos seus primeiros anos de vida, experiências significativas para
alcançar pleno desenvolvimento no seu processo evolutivo" (s.p.).
A turma realiza as aulas todas as sextas-feiras, no período da tarde, com duração de 50
minutos. Quando as crianças completam 2 anos e já andam, são encaminhadas para a
integração nas turmas com crianças comuns da mesma idade cronológica. A participação
nesta turma é considerada fundamental como preparação para a integração efetiva nas turmas
regulares, pois as crianças que participam da turma para bebês SD já conhecem a rotina da
aula e conseguem acompanhar com ótimo desempenho as turmas da mesma faixa etária.
Os conceitos e as referências para a montagem da estrutura de aula se baseiam na
proposta de Dourado e Millet para o trabalho na área de artes cênicas: “Para uma melhor
dinamização da aula, o mais eficaz seria dividi-la em quatro etapas sequenciadas: 1)
aquecimento, 2) relaxamento-concentração, 3)elaboração e, 4) avaliação” (DOURADO;
MILLET, 1998, p. 30). Estes conceitos são observados como diretrizes e adaptados aos
objetivos de cada semestre para incluir e combinar etapas no processo, dessa forma, foi
possível estabelecer um modelo próprio de rotina de aula que tem se mostrado produtivo para

113
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

o trabalho na turma específica. A estrutura da aula consiste em quatro momentos: recepção e


aquecimento, 2) movimento, 3) interações individuais, e 4) carinho e acolhimento.

Atividades musicais

As atividades realizadas em aula são concebidas de forma que mães, pais e cuidadores
também possam realizar atividades musicais em casa. O professor estimula as crianças em
sala e orienta as famílias sobre como realizar brincadeiras musicais em casa. A criança com
SD necessita de modelos consistentes e bem realizados em casa, uma vez que a repetição de
um bom modelo irá facilitar a aprendizagem da criança.
O repertório musical consiste de canções do universo infantil brasileiro, baseadas no
folclore de diversas regiões, parlendas faladas, brinquedos musicais e canções da MPB.
Dentro do Projeto “Música para Crianças”, foi criado um repertório especifico para
musicalização infantil, formado por canções sem palavras nas quais são utilizadas músicas em
diversos modos e também parlendas rítmicas em compassos irregulares. De acordo com
Gordon (2000), a variedade de métricas e modos é fundamental para o desenvolvimento
cognitivo musical da criança.

1- Recepção e Aquecimento

A chegada da criança e o início da aula podem ser considerados com uma transição
entre as atividades cotidianas e o ambiente da musicalização. A aula é iniciada com a
formação de uma roda, com as pessoas sentadas no chão, e começa com a canção de abertura
que estabelece o padrão de interação musical entre as pessoas presentes. Cada semestre possui
uma canção própria, sendo que todas as canções permitem a apresentação de cada criança e
adulto presente na roda. O professor deve dar atenção a todos os participantes, mantendo
contato visual e falando o nome de cada pessoa. Neste momento o professor estabelece o
primeiro contato com a criança e sua família, abrindo as portas do relacionamento e
permitindo que seja criado um vínculo de confiança entre ambas as partes.

a) Respiração e Concentração

A respiração, além de sua importância na expressividade musical, é um aspecto que


deve ser muito estimulado com as crianças SD. Devido à fisiologia do nariz e uma propensão
a irritações nas vias aéreas, as crianças SD apresentam tendência a desenvolver uma
respiração curta e com pouco consumo de oxigênio. Nas aulas são realizadas atividades de

114
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

respiração acompanhadas do movimento dos braços para representar o fluxo da respiração. A


aula inicia com o som de uma respiração profunda, realizada pelo nariz, acompanhada da
movimentação dos braços se abrindo ou se movimentando para cima e para baixo. Em
seguida são feitas várias brincadeiras com a movimentação das mãos acompanhadas de
diversos tipos de respiração: rápida e devagar, funda e rasa, sibilar e nasal, utilizando vários
sons e sílabas.
O foco na respiração visa ilustrar a importância do ato de respirar antes de cantar ou
falar. Esta abordagem também auxilia na concentração, uma vez que o grupo começa a
respirar junto e o silêncio torna-se um fator de concentração coletiva. Todos acompanham o
ato de inspirar e expirar, focalizando nos movimentos do grupo e despertando para a
importância do outro dentro da roda.

b) Voz de Cabeça

Crianças com SD apresentam como característica a hipotonia muscular. Sua


musculatura é mais flácida e apresenta maior dificuldade para criar tônus muscular. No caso
do desenvolvimento da linguagem, os músculos da laringe também apresentam hipotonia e
necessitam de um cuidado específico para o desenvolvimento do registro agudo. As vozes
infantis apresentam nos primeiros anos uma tessitura específica entre Ré 3 (297 hz) e Lá
3(440hz) sendo possível estender esta tessitura para uma oitava, até Ré 4 (594 hz). Algumas
crianças SD apresentam uma voz muito grave e fora do registro infantil, sendo que a tessitura
grave não permite uma definição de altura e prejudica muito a afinação musical. Torna-se,
assim, muito importante trabalhar com as mães a construção de um modelo vocal que valorize
o registro agudo e as crianças possam interagir com vozes agudas em casa, estimulando a
procura de um timbre que utilize a “voz de cabeça” e não o timbre grave da “voz de peito”.
Atualmente, na cultura brasileira, existe uma valorização extrema da voz feminina
muito grave, sendo que as principais cantoras da MPB utilizam o registro de peito para cantar.
Podemos observar o uso da voz grave em cantoras como: Ivete Sangalo, Ana Carolina, Zélia
Duncan e Maria Bethânia. No entanto existem poucos modelos de vozes agudas e muitas
mães se mostram desconfortáveis ao cantar com a voz aguda. Para que a criança possa
desenvolver o registro agudo são realizadas várias atividades enfatizando a importância da
“voz de cabeça”. Atividades específicas consistem em começar uma música mais grave e
modular por graus conjuntos ascendentes até chegar ao registro infantil. Outra atividade visa
explorar vozes de personagens ou animais que fazem sons agudos. O estimulo do uso do

115
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

registro agudo é fundamental para conseguir desenvolver o senso de afinação nas crianças, e o
desenvolvimento da voz de cabeça precisa da participação e engajamento das mães na
valorização da voz aguda da criança.

c) Interação com instrumentos e objetos musicais

A utilização de instrumentos musicais de sopro, corda ou percussão permite um foco


em uma fonte sonora específica. Cada instrumento apresenta um timbre único que chama a
atenção da criança, principalmente quando a frase musical é acrescentada de um gesto ou
movimento. Instrumentos de sopro (flauta-doce, flauta, clarineta) possuem um
direcionamento específico que permite a identificação do local de onde o som é gerado. Os
instrumentos de percussão (pandeiros, tambores, chocalhos, agogôs) possuem uma
característica visual muito forte e chamam atenção pela movimentação das mãos e do corpo.
Os instrumentos de cordas dedilhadas (violão e cavaquinho), em geral oferecem apoio
harmônico e rítmico para as canções, e atraem o contato direto das crianças que apreciam
sentir a vibração das cordas. Permite-se que a criança entre em contato com os instrumentos,
desde que haja cuidado para criança não se machucar ou haver dano para o instrumento.
Algumas crianças SD desenvolvem perda auditiva devido ao acúmulo de secreção no
canal auditivo e faz-se necessário verificar a lateralização auditiva das crianças,
principalmente ao usar instrumentos que possam ser tocados atrás das crianças e observar se a
criança acompanha o direcionamento do instrumento com os ouvidos. Neste caso, é
importante não mostrar os instrumentos musicais na frente da criança, pois ela irá acompanhar
o movimento do som com os olhos. Uma estratégia é colocar o estímulo musical por trás e
observar se a criança tenta localizar com os olhos a fonte sonora que está tocando.
Durante as aulas é possível observar a capacidade de reorganização emocional da
criança, para tanto acontecem pequenos sustos durante as aulas. O professor pode exagerar na
dinâmica de uma palavra ou tocar um instrumento um pouco mais forte. Muitas vezes as
crianças choram nos primeiros encontros, mas o período de recuperação emocional torna-se
cada vez mais rápido e as crianças passam a não se desequilibrar emocionalmente quando
ocorrem sons inesperados.

2- Movimento e Dança

O movimento do corpo é essencial para o desenvolvimento da musicalidade, sendo


que bebês e crianças são muito beneficiados da movimentação com um adulto. Podem ser

116
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

realizadas diversas atividades de movimento com os adultos dançando com as crianças em pé.
Canções de roda permitem que todos se movimentem juntos, já a dança em pares permite uma
interação muito íntima entre adulto e criança. Outra atividade é brincar de estátua: dançar
quando tem música e parar quando houver pausa, neste caso enfatiza-se a relação entre
música e movimento. Dançar vários tipos de ritmos oferece uma possibilidade de interação
única, na qual a comunicação corporal é o elemento central na relação adulto-criança.

3- Interações Individuais

A interação individual professor-criança é um aspecto essencial nas aulas com bebês e


crianças pequenas. O ato de olhar no olho, cantar e estabelecer uma comunicação não-verbal
de cunho musical modifica a relação com a criança. A interação musical permite a troca de
sons, balbucios, sílabas e movimentos entre professor e criança, possibilitando que o
professor entre em sintonia com as expressões da criança. A partir das interações individuais é
possível estabelecer um diálogo sonoro que favoreça a organização do material musical em
pequenas unidades: os padrões musicais. Um padrão musical ocorre quando dois ou mais
sons/ritmos são organizados como uma unidade musical. Por exemplo, dois sons que juntos
fazem o movimento Lá – Ré ou duas sílabas (pa-pa) que juntas formam duas colcheias.
Os bebês entre 6 e 18 meses estão na fase inicial de aquisição da linguagem, este
período de tentativa no uso de sílabas e palavras é denominado balbucio e Gordon (2000)
considera que existe também um período de tentativas na utilização dos elementos musicais à
qual denomina balbucio musical. Nesta fase a criança começa a explorar os sons do ambiente
e a organizá-los em pequenas unidades, para as quais serão associados significados musicais.
A criança começa a emitir sons que podem ser relacionados com as notas de determinadas
músicas ou padrões melódicos que estão sendo cantados na aula, ou interagir dentro de um
acorde de tônica ou dominante. Do ponto de vista rítmico existe um balbucio específico,
quando as crianças começam a criar grupos de sons que podem ser relacionados a figuras
rítmicas e frases rítmicas. A realização de parlendas com sílabas neutras estimula que as
crianças a emitirem sons que podem ser imitados pelo professor como um padrão rítmico. A
emissão de qualquer som pode ser o início de um diálogo musical no qual, muitas vezes o
professor inicia a comunicação e a crianças imita o professor, mas também acontecem
situações nas quais a criança toma iniciativa e o professor imita a criança.

117
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

a) Histórias e livros musicais

Crianças com necessidades especiais terão um processo de alfabetização próprio, serão


alfabetizadas a partir das suas capacidades e precisarão desenvolver recursos de leitura de
diversos códigos visuais. A estimulação da leitura também começa com os bebês, e a
preparação da família para a alfabetização pode ser iniciada nos primeiros anos. A partir do
momento que a criança começa a fixar o olhar, é possível a interação por meio de livros
infantis. O uso de ilustrações claras, que ofereçam um foco visual por página, permite a
criação de uma trilha sonora para os personagens e objetos que reforçam o conteúdo do livro.
O livro pode ser considerado como um brinquedo interativo, que deverá ser mediado por um
adulto. A leitura de histórias e poesias também reforça a capacidade de concentração da
criança, pelo ritmo da leitura e pela musicalidade das frases que embalam as histórias.

b) Canções com sílabas específicas

Em geral, o trabalho de desenvolvimento da linguagem é realizado com especialistas


da área de fonoaudiologia, que são os responsáveis diretos por estimularem a colocação da
língua, o desenvolvimento dos músculos faciais e promoverem a articulação das sílabas. A
aula de música faz uma estimulação indireta, ao promover a articulação e a expressividade da
palavra cantada e das músicas que são apresentadas em aula. Uma atividade que promove a
intersecção das duas áreas é a realização de músicas conhecidas dos adultos com o uso das
sílabas recomendadas pelos fonoaudiólogos. Em cada aula existe um momento em que os
adultos escolhem uma música que todos conhecem, olham diretamente para as crianças e
cantam repetindo a mesma sílaba do começo ao final da música. As sílabas mais comuns para
o uso com crianças pequenas são PA, DA, MA e BA, mas existem variações na utilização das
vogais E, I, O e U. Esta estimulação é feita para que a música cantada com sílabas específicas
seja inserida nas atividades cotidianas de estimulação da criança.

4- Canções de acolhimento e carinho

O processo de aceitação de uma criança SD é diferente para cada uma das famílias. A
realização de canções de acolhimento em grupo é um forte estímulo para as famílias
superarem o luto e fortalecerem os vínculos com a criança. Canções de carinho permitem a
expressão musical de pequenos atos de amor para com a criança. As atividades de carinho são
realizadas ao final da aula, quando o professor pede para que as mães e pais sejam os
protagonistas das atividades musicais e o professor passa a oferecer o acompanhamento
118
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

musical para as interações dos adultos com as crianças. Neste momento, a aula adquire a
característica de promover os encontros autênticos entre crianças e adultos, sendo estes
encontros mediados pela música, que se torna muito significativa para as famílias
participantes na aula.

Conclusão

A música pode ser parte do processo de estimulação de bebês e crianças com SD


desde os primeiros meses de vida. Sabe-se que a maior parte do tratamento clínico é realizado
de maneira individual e as famílias possuem poucas oportunidades de observar o
comportamento de outras crianças da mesma idade. Aulas de música para bebês com
Síndrome de Down podem ser a primeira experiência escolar da criança. Nas aulas de música
a interação entre crianças e entre famílias é um aspecto muito positivo que permite a troca de
informações tanto sobre as crianças, como também sobre clínicas de acompanhamento e
escolas que oferecem serviços de boa qualidade.
Entretanto, trabalhar a estimulação precoce de crianças SD exige um planejamento
rigoroso e cuidadoso. Os planos de aula visam valorizar a concentração e a interação durante
as atividades realizadas na aula. Cada bebê é visto como capaz de estabelecer uma
comunicação musical e estimulado a responder aos estímulos feitos em grupo e
individualmente. Qualquer som emitido pelo bebê é incorporado nas atividades e o contato
visual torna-se elemento fundamental para que a criança possa imitar os adultos e crianças
presentes na aula. Bons modelos vocais e rítmicos são fundamentais para que a criança possa
construir sua experiência musical de maneira sólida. A colocação da voz de cabeça e
valorização do movimento corporal são elementos que preparam a crianças para serem
integrados de maneira efetiva tanto em atividades musicais futuras quanto na escola regular.
O trabalho de estimulação musical é uma parceria do professor com as famílias em
benefício da criança, e as aulas são apenas um pequeno recorte na vida da criança. A
verdadeira estimulação ocorre em casa, quando as mães, pais, irmãos e cuidadores passam a
“musicalizar” a vida das crianças, colocando música em vários momentos do dia. Desde a
hora de acordar, passando pelas brincadeiras do dia a dia, os passeios no carro, hora de comer,
hora de tomar banho e também na hora de dormir. As atividades musicais podem ser um
elemento de alegria e descontração, ao permitir pequenos prazeres musicais que são essenciais
no cotidiano das famílias.

119
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

DOURADO, Paulo; MILLET, M.E. Manual de Criatividades. Salvador: EGBA, 1998.

FREIRE, R. J. D. Implementação e estruturação de um projeto de musicalização infantil:


relato de experiência. In: XVII ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 2008, São Paulo. Anais… São Paulo- SP:
Editora da Unesp, 2008. v.1. p.1 - 9

FREIRE, R. J. D., FREIRE, S.F. de C.D. Parents’ conferences in early childhood music
learning process: A case study. In: ECME [EARLY CHILDHOOD MUSIC EDUCATION]
COMMISSION13TH INTERNATIONAL SEMINAR OF ISME [INTERNATIONAL
SOCIETY FOR MUSIC EDUCATION, 2008, Frescati - Itália. Proceedings... ROMA, ISME-
Internation Society for Music Education, 2008a. v.1. p.22 – 25

FREIRE, R. J. D., FREIRE, S.F. de C.D.. Planejamento na Educação Musical Infantil. In:
XVIII CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-
GRADUAÇÃO EM MÚSICA, 2008, Salvador- BA. Anais... Salvador, ANPPOM, 2008a. v.1.
p.1 – 8

FREIRE, R. J. D., PRESTES, C., PORTO, C., ROSA, L. Aspectos da avaliação do


desenvolvimento musical. In: ENCONTRO REGIONAL DA ISME AMÉRICA LATINA
2007, 2007, Campo Grande. Anais... Campo Grande, Editora da UFMS, 2007. v.1. p.1 – 9.

GORDON, Edwin E. Teoria de Aprendizagem Musical para Recém-nascidos e Crianças em Idade


Pré-escolar. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa, 2000.

MATIAS, R.B., FREIRE, R. J. D. A importância da música no fortalecimento de vínculos


afetivos em famílias com bebês com Síndrome de Down. ICTUS, v.6, p.41 - 52, 2005.

VOIVODIC, M. A. Inclusão Escolar de Crianças com Síndrome de Down. Petrópolis: Vozes,


2004.

120
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O Educador Musical no Ensino Infantil: sua presença na rede regular de


ensino

Carolina Chaves Gomes


carolinacg@ymail.com

Resumo: Este trabalho objetiva apresentar um levantamento das escolas que oferecem aulas
de música com um educador musical nas aulas regulares da educação infantil na cidade de
Natal. Trata-se de um recorte da primeira etapa de uma pesquisa em nível de mestrado que
buscou analisar as concepções e práticas pedagógicas que caracterizam a atuação dos
professores de música na educação infantil em escolas públicas municipais e privadas da
cidade de Natal/RN. Foram contatadas 208 escolas privadas e 71 da rede pública municipal de
ensino, dentre as quais verificou-se uma demanda para o educador musical nas escolas que
possuem esse nível de ensino na rede privada, bem como a distribuição de 1 ou 2 educadores
em cada região na rede pública municipal.
Palavras chave: Educação infantil, educador musical, levantamento

A educação musical constitui-se hoje como um campo diversificado. Mais


recentemente, a pesquisa em educação musical tem aprofundado questões diversas e, como
aponta Figueiredo (2010, p. 173) “crescido sistematicamente, como se pode observar através
das produções bibliográficas que tratam das mais diversas temáticas e estão cada vez mais
disponíveis”.
Dentro da abrangência da área de educação musical na atualidade, este trabalho
apresenta resultados de uma pesquisa em nível de mestrado que se insere no âmbito da
educação musical para o ensino infantil. Tendo como objetivo analisar as concepções e
práticas pedagógicas que caracterizam a atuação dos professores de música na educação
infantil em escolas públicas municipais e privadas da cidade de Natal/RN, a pesquisa
realizada foi dividida em duas etapas: a primeira identificando as escolas de Natal que
oferecem aulas específicas de música na educação infantil, bem como aspectos gerais de seus
espaços, práticas, concepções, formação, dentre outros; e a segunda realizando dois estudos
de caso para verificar com maior profundidade essas características.
Para este artigo apresento o início da primeira etapa da pesquisa, que trata
especificamente da identificação das escolas que oferecem aulas de música com um educador
musical nas aulas regulares da educação infantil. Espera-se que essa pesquisa auxilie no
delineamento dos atuais espaços de atuação do educador musical, além de apresentar
especificamente a realidade natalense acerca de suas demandas emergentes no que diz
respeito ao ensino de música.
121
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Com efeito, foi considerado como educador musical ou professor de música, aqueles
que atuam no ensino da disciplina específica de música na escola regular, possuem formação
na área, ou conferem ênfase à música em sua prática na disciplina Artes de modo a constituir
uma disciplina específica. Assim, foram incluídos docentes que lecionavam a disciplina há
mais de cinco anos e que possuíam alguma formação mínima em música, bem como
graduandos do curso Música-Licenciatura que também eram responsáveis pela disciplina
específica na escola regular.

1. Contexto e metodologia de pesquisa

Na cidade de Natal apesar da Licenciatura em Música ser um curso recente (até o ano
de 2004 ainda ingressavam alunos no curso de Educação Artística-Música), a Secretaria
Municipal de Educação (SME) admite a necessidade de um professor específico de Arte na
educação infantil quando esta estiver presente no projeto político pedagógico da escola,
aspecto previsto pela Resolução 002/08 SME/PMN (PREFEITURA MUNICIPAL DE
NATAL, 2008).
Para identificação dos educadores musicais recorreu-se à abordagens específicas para
a rede pública e rede privada. Para as escolas públicas municipais solicitei através de ofício
autorização da Secretaria Municipal de Educação, apresentando a pesquisa e o objetivo geral,
seguido dos procedimentos metodológicos que seriam realizados posteriormente
(questionário, entrevistas, observação), explicando a relevância desse estudo para a SME e
afirmando que, ao final, disponibilizarei os dados analisados sobre a situação do ensino de
música na educação infantil na cidade de Natal, como forma de auxílio no estabelecimento
das estratégias municipais.
Recebi a autorização a qual permitia a realização da pesquisa e comunicava às escolas
e Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) a realização do estudo. Junto a esse
documento me foi concedida uma lista com 28 escolas e CMEIs que possuem professor de
Artes atuando na Educação Infantil. Ainda assim, complementarmente foi utilizada a lista
geral de escolas e centros municipais de ensino disponibilizada no site da Secretaria.
Posteriormente, para identificar o professor de música atuante na educação infantil, foco desta
investigação, utilizei contato telefônico com as escolas, participei da primeira reunião mensal
de professores de Artes do Município e da Mostra de Arte, Cultura e Conhecimento das
escolas municipais, bem como recorri a contatos pessoais.

122
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Para as escolas privadas optei em fazer contatos por telefone, de acordo com a lista
telefônica, Listel on-line dos anos 2009 e 2010, da cidade de Natal. Foi realizado também
contato telefônico, bem como autorizado pelas professoras da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte o acesso às escolas que eram campos de estágio de observação das duas
turmas da disciplina “Atividades Orientadas I: metodologia do ensino da música na educação
infantil e fundamental”. Assim, a lista final de escolas privadas totalizou 208 instituições de
ensino.

2. Identificando escolas e professores: caracterização do universo de


pesquisa na rede pública e privada

2.1 O ensino de música na rede privada na cidade de Natal

As escolas privadas da cidade de Natal investigadas para constituição do universo de


pesquisa perfizeram um total de 208 escolas. O GRAF. 1 apresenta as categorias surgidas
desses contatos:

Gráfico 1: Total de escolas privadas.

As “instituições que não foi possível contatar” são aquelas cujo número de telefone
não existe, não atende ou a ligação não é completada. Para cada uma dessas escolas foram
feitas no mínimo três tentativas de contato telefônico em dias e horários distintos.
“Escolas sem educação infantil” refere-se às que são apenas ensino fundamental,
cursinho, aulas de reforço dentre outros. Ainda assim, nessa categoria, foram encontradas
duas escolas de ensino regular que possuíam professor de música.
123
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“Escolas com educação infantil sem professor de música” contabilizaram 85


instituições ou 40,9% do total. Ressalte-se que neste grupo encontram-se escolas que possuem
ensino infantil, fundamental e médio, ou ensino infantil e fundamental, ou somente ensino
infantil.
“Escolas com professor de música sem atuar na educação infantil”, compreendem
aquelas que possuem educação infantil e docente em música, contudo, este atua com
atividades extracurriculares ou apenas a partir do fundamental.
Por fim, as “escolas com professor de música atuando na educação infantil”
contabilizam 24 instituições, correspondentes a 11,54% do total de escolas pesquisadas.
Assim, do total de 208 escolas, encontrou-se 114 que possuem educação infantil e
apenas 24 com educador musical atuando nesse espaço. Contudo, apesar de representarem 24
escolas da rede privada, são apenas 15 docentes encontrados que atuam nas aulas regulares da
educação infantil na cidade de Natal. Considerando apenas as escolas que possuem educação
infantil, conforme o GRAF. 2, a maioria ainda não possui educador musical atuante (74,6%).

Gráfico 2: Total de escolas privadas com educação infantil.

Contudo, dentre as escolas que possuem educação infantil e um educador musical


(GRAF. 3), percebe-se a predominância do espaço infantil para atuação desse profissional.
A atuação do educador musical no ensino infantil, provavelmente é uma solicitação
advinda da própria escola, que cria esse espaço e demanda para profissionais capacitados
nesta categoria de ensino, demanda verificada também através dos questionários.

124
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Gráfico 3: Total de escolas privadas com educação infantil e professor de


música.

Sobre essa questão, Beyer (2001) já afirmava que:

São pouquíssimos os Centros públicos de Educação Infantil. No entanto, há


milhares de escolas particulares de Educação Infantil [...]. Quantas destas
tem Educação Musical? Talvez 2 a 5%, muito pouco em relação ao número
imenso de crianças que deixarão de ter aulas de música na Educação Infantil.
Mesmo assim, há muita procura atualmente para a música nestes espaços”
(BEYER, 2001, s.p.).

Felizmente na cidade de Natal essa projeção de até 5% foi superada se verificarmos


apenas as escolas que possuem educação infantil. Ou seja, dentre as escolas privadas
pesquisadas na cidade de Natal, percebe-se claramente uma demanda para aulas de música na
educação infantil nas instituições que possuem esse nível de ensino. Algo que, enquanto
educadora musical, vinha percebendo empiricamente ao longo da minha formação, tanto em
virtude das propostas de empregos quanto em conversas com gestores e pais.
Cabe, portanto atenção para esse nível de ensino durante a formação de professores,
para que contemplem as especificidades que lhe cabem enquanto espaço institucional de
ensino e aprendizagem de crianças de até cinco anos (GOMES, 2009). Especificamente no
curso de Licenciatura em Música na UFRN há um componente curricular exclusivo para
ensino infantil e fundamental denominada Atividades Orientadas I - Metodologia do ensino
da música na educação infantil e fundamental (MUS5011), cuja ementa diz que é realizada
125
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“atividade de observação de metodologias de ensino de música utilizadas na Educação infantil


com subsequente desenvolvimento de atividades práticas a partir dessas observações”
(UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, 2011), ou seja, é uma
disciplina do tipo atividade que enfatiza a relação teoria-prática neste universo. Contudo,
ressalta-se que apenas os profissionais que ingressaram a partir do ano de 2005 tiveram acesso
a esse componente curricular.

2.2 O ensino de música na rede pública na cidade de Natal

As escolas públicas municipais da cidade de Natal investigadas para constituição do


universo de pesquisa foram agrupadas por zonas de distribuição, seguindo a organização da
lista disponível no endereço eletrônico da SME.
Buscou-se abranger a maior quantidade possível de escolas, sendo que, do total de
cada região foi investigado o seguinte número de escolas (GRAF. 4):

Gráfico 4: Total de escolas públicas versus escolas públicas pesquisadas.

Na Zona Norte, contatou-se 27 dentre 54 escolas da rede; na Zona Sul, 17 dentre 19


escolas; da Zona Leste, 9 dentre 17 instituições; da Zona Oeste, 24 dentre 46 estabelecimentos
de ensino. Assim, de um universo de 136 instituições, foram investigadas um total de 71
escolas da rede pública municipal de ensino, correspondente a 52,2%.

126
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Ainda assim, dentre a lista entregue pela SME de escolas e CMEIs que possuem um
professor de Artes atuando na Educação Infantil, foram investigadas todas as 28 escolas
mencionadas no documento. Investigar os demais 43 estabelecimentos – que totalizam 71
escolas - foi iniciativa própria em virtude da pequena representatividade do número de escolas
apresentado no documento pela Secretaria.
Dentre as escolas investigadas, foram identificados pelo menos 1 professor de música
atuante na educação infantil em cada região, sendo que na Zona Oeste há 2 educadores
musicais e um deles lecionava na educação infantil de 2 escolas distintas, totalizando 5
docentes na rede pública municipal (GRAF. 5).

Gráfico 5: Escolas públicas com ensino de música na educação infantil


versus professores de música atuantes na educação infantil.

Totalizando 6 escolas públicas com ensino de música na educação infantil, tal


realidade corresponde à apenas 4,41% do total de escolas, ou 8,45% do total de escolas
pesquisadas.
Em virtude da organização e funcionamento do sistema público, ainda não foram
absorvidos os profissionais advindos das licenciaturas específicas, já que a primeira turma da
Licenciatura em Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte concluiu no ano de
2009, e o primeiro concurso com vagas destinadas à profissionais com habilitação específica
em Música realizado em 2010. Assim, a maioria dos profissionais que atuam no ensino de

127
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Artes da rede pública municipal de ensino são aqueles formados na Educação Artística, que
permite uma atuação polivalente da qual as licenciaturas específicas vêm findar.
Acredito que tal fato também esteja relacionado aos poucos profissionais da música
atuantes na educação infantil. Entretanto, recentemente (11 de fevereiro de 2011) foram
convocados 21 novos professores específicos de música para atuarem no município de Natal,
dentre os quais estão profissionais formados em Educação Artística habilitação Música e os
primeiros alunos egressos do curso Música Licenciatura.
Outros fatores que provavelmente estão relacionados é a falta de educadores, em geral,
e em Artes, o que levou a Secretaria Municipal de Educação a criar o cargo professor de
Múltiplas Linguagens, nome que surgiu diversas vezes durante os contatos com as
instituições. Tal profissional caracteriza-se por ser responsável pelas aulas de Artes, Educação
Física e recreação (como mencionaram alguns gestores). Em alguns casos é um pedagogo, um
fisioterapeuta ou um professor de Arte (formado e atuando com linguagem distinta da
música). Contudo, a tendência é que esses profissionais sejam substituídos por professores de
Arte ao longo do tempo, fazendo valer a Resolução 002/08 SME/PMN, que afirmar que, se
contemplado no Projeto Político Pedagógico da educação infantil, as aulas de Artes e
Educação Física deverão ser ministradas por professor específico.
Desse modo, no contexto do ensino de música na rede pública municipal da cidade de
Natal, percebe-se que existe pelo menos um educador musical atuando na educação infantil
em cada região, sendo esses professores formados em Educação Artística. É notável também a
falta de professores com formação em Arte na rede municipal de Natal, considerando a falta
desses profissionais na educação infantil – o que é previsto na legislação municipal – e a
criação do cargo “professor de Múltiplas Linguagens” – com formação diversificada – para
atender essa demanda.

3. Considerações Finais

A cidade de Natal vem traçando um delineamento de políticas, ações e demandas que


se identificam com o momento de ressignificação da música na escola a partir da Lei
11.769/08. A legislação que especifica professor específico de Artes atuando no ensino
regular da educação infantil, a oferta de licenciatura específica e a demanda verificada pelo
profissional no espaço infantil escolar, são alguns exemplos.
Foram percebidos diferentes configurações da presença do educador musical a partir
da rede de ensino que se encontra: pública municipal ou privada. Na rede pública municipal

128
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de ensino percebe-se uma participação mais tímida dos educadores musicais no ensino
infantil. Contudo, mostra-se representado por ao menos 1 docente em cada região da cidade,
que, em geral se apresenta em escolas que possuem o nível fundamental e infantil no mesmo
prédio, e no qual o educador leciona em ambos os níveis.
Verificou-se que o contexto do ensino de música na escola privada da cidade de Natal
apresenta-se com uma demanda para aulas de música na educação infantil nas instituições que
possuem esse nível de ensino. Portanto, pelo fato de ser um espaço que vem solicitando a
presença de um educador musical, faz-se necessário uma atenção a esse nível de ensino
durante a formação de professores, aspecto minimamente revelado na estrutura curricular do
Curso de Licenciatura em Música da UFRN.
Assim, percebe-se que o ensino de música na educação infantil na cidade de Natal é
uma realidade emergente, que parte das configurações atuais desse contexto e apresenta-se
como um campo diversificado a partir das dinâmicas de seus educadores, escolas e
legislações.

129
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BEYER, Esther. O formal e o informal na educação musical: o caso da educação infantil. In:
IV Encontro Regional da ABEM-Sul e I Encontro do Laboratório de Ensino de Música.
Anais... Santa Maria/RS, 23 a 25 mai 2001.

FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. Considerações sobre a pesquisa em educação


musical. In: FREIRE, Vanda. Horizontes da pesquisa em música. Rio de Janeiro: 7Letras,
2010. p. 155-175.

GOMES, Carolina Chaves. Perspectivas para atuação do professor de música na Educação


Infantil. In: II FÓRUM PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 2, 2009, João Pessoa.
Anais...João Pessoa: UFPB, 2009. p. 35-41.

PREFEITURA MUNICIPAL DE NATAL. SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO.


Referenciais Curriculares para Educação Infantil. Natal, RN: SME, 2008. Disponível em:
<http://www.natal.rn.gov.br/sme/> Acesso em: 27 abr. 2009.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. SISTEMA INTEGRADO DE


GESTÃO DE ATIVIDADES ACADÊMICAS. Dados Gerais do Componente Curricular:
MUS5011-Atividades Orientadas I - Metodologia do ensino da música na educação infantil e
fundamental. Disponível em:
<http://www.sigaa.ufrn.br/sigaa/public/componentes/busca_componentes.jsf> Acesso em: 21 jan.
2011.

130
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Resposta Emocional à Música

Kamile Santos Levek


Universidade Federal da Bahia
kamilesl@hotmail.com

Diana Santiago
Universidade Federal da Bahia
disant@ufba.br

Resumo: Alguns estudos procuraram demonstrar como a música provoca emoções nos seres
humanos. Porém, este é um tema bastante espinhoso, pois é sabido que existem vários fatores
além da própria música, que também podem ser determinantes para a resposta emocional à
música. O presente estudo é uma revisão de literatura sobre o assunto, e tem por objetivo
esclarecer alguns aspectos relacionados ao tema, como a definição de emoção, quais os
elementos musicais que influenciam as respostas emocionais à música, e quais outros
elementos também podem determinar essas respostas emocionais, como a memória do
ouvinte e a cultura em que este está inserido.
Palavras chave: emoção, música, educação musical

Introdução

Os estudos relacionados às emoções são bastante complexos, já que a própria


definição de emoção ainda é muito vaga, e isso se deve a diversos fatores. Um deles é que as
emoções são difíceis de serem mensuradas (JUSLIN; SLOBODA, 2001) e, segundo Damásio
(2000), existem mais emoções do que palavras para defini-las. Quando tratamos de emoção
em música, o assunto se torna ainda mais dificultoso.
A maioria das pessoas conhece emoções como sinônimo de sentimentos, e alguns
estudiosos da psicologia, por vezes, tratam dessa maneira. Porém, segundo alguns
pesquisadores, existe uma certa diferença com relação às emoções e aos sentimentos.
Goleman sugere que "a emoção se refere a um sentimento e seus pensamentos distintos,
estados psicológicos e biológicos, juntamente com suas combinações, variações e matizes.”
(GOLEMAN, 1995, p. 303). Segundo Delgado (1971), o sentimento é algo que apenas o
sujeito pode notar, ou seja, é percebido apenas interiormente, e a emoção é expressa, na
maioria das vezes, por mudanças fisiológicas no corpo, podendo ser percebida pela expressão
externa do sujeito. Já Reeve aponta que os sentimentos são apenas uma parte da emoção, e
que as emoções podem ser sentimentos subjetivos, pois nos fazem sentir de determinado
modo, tal como zangados ou alegres (REEVE, 2006).

131
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

De acordo com Damásio (1996), alguns sentimentos estão relacionados com as


emoções, mas muitos não estão. Segundo o pesquisador, "todas as emoções originam
sentimentos, se se estiver desperto e atento, mas nem todos os sentimentos provém de
emoções" (DAMÁSIO, 1996). Segundo Oatley e Jenkins (apud JUSLIN, 2001; ZENTNER,
2002), o termo emoção refere-se a reações mais breves e intensas, que levam a mudanças
relevantes no estado da pessoa. Em outras palavras, o termo será definido, para este estudo,
como reações breves (no estado emocional da pessoa) a determinado estímulo.

Emoção

Emoção Versus Razão

Antigamente a emoção era considerada algo irracional, oposto à razão. Porém, nos
dias de hoje, a emoção é entendida como um elemento determinante para o raciocínio
(DAMÁSIO, 2000; DELGADO, 1971; FILLIOZAT, 1998). Segundo Goleman (1995),
temos duas mentes, a que raciocina e a que sente. A mente racional é mais destacada na
consciência, mais atenta e capaz de ponderar e refletir. Já a mente emocional é considerada
como um sistema de conhecimento impulsivo e poderoso, embora às vezes ilógico. Contudo,
a mente emocional e a racional trabalham juntas, mas é a emocional que guia nossas decisões,
e quando se trata de moldar nossas decisões e ações a emoção é, por vezes, mais significativa
que a razão. Isso pode ser comprovado por acontecimentos em que uma ação ocorre devido a
uma determinada emoção, que surge antes mesmo de qualquer pensamento. Em outras
palavras, a reação à emoção provocada é muitas vezes imediata, portanto, é bastante provável
que o fator emocional seja predominante em algumas decisões racionais. Portanto, o
conhecimento sobre as emoções é fundamental para o ser humano. Segundo Goleman (1995),
ser emocionalmente alfabetizado é tão importante quanto a matemática e a leitura.

Inatas ou Aprendidas?

Existe também a possibilidade de algumas respostas emocionais à música serem


inatas, pois as crianças já nascem com capacidade de sentir emoções consideradas básicas
como alegria, tristeza e zanga (HARRIS, 1996). Em estudos mais recentes relacionados à
emoção em música, alguns pesquisadores consideram alegria, tristeza, raiva e medo como
emoções básicas (ver ESPOSITO; SERIO, 2007).
Alguns estudiosos ainda sugerem a possibilidade de as emoções serem aprendidas
(LEDOUX, 1998; SLOBODA, 1985) e de que o fator cultural altera as respostas emocionais
132
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

(MEYER, 1956). Apesar disso, um determinado estímulo é capaz de provocar a mesma


resposta emocional em culturas diferentes quando as emoções primárias ou universais são
consideradas (DAMÁSIO, 2000). Porém, não se sabe ainda se essas asserções são válidas
quando consideramos a percepção de emoção em música.

Emoção em Música

Todas as culturas experienciam a música, em suas distintas funções, sendo esta um


comportamento universal e social bastante complexo (CROSS, 2001; TRAINOR, 2010), que
instiga muitos pesquisadores devido às suas respostas emocionais. Segundo Krumhansl
(2002), o efeito emocional provocado pela música é a principal motivação para ouvir música,
e o fato de a maioria das pessoas gostarem de música também pode ser explicado por esta
provocar emoções (JOHNSON-LAIRD; OATLEY, 1992).
Há indícios de que a percepção de emoção em música se inicie já nos primeiros dias
de vida (MILLIGAN et al., 2003; TRAINOR; AUSTIN; DESJARDINS, 2000; citados em
LEVEK; ILARI, 2005), talvez pela influência do canto e da fala direcionada aos bebês (ver
SLANEY; MCROBERTS, 2003; citado em SCHUBERT; MCPHERSON, 2006). Essa fala
tem como uma das características a afetividade para com a criança, podendo ser fundamental
para o desenvolvimento emocional. Contudo, estudos experimentais vêm confirmando que os
bebês, apesar de possuírem experiências relativamente limitadas com a música, exibem certas
capacidades perceptivo-musicais bastante semelhantes às dos adultos (ver ILARI, 2006;
NAWROT, 2003), inclusive no que diz respeito à percepção de emoção (TREHUB, 2001;
NAKATA, 2002; KASTNER; CROWDER, 1990, citado em NAWROT, 2003). Segundo
Izard et al. (1995; citado em SCHUBERT; MCPHERSON, 2006), aos 7 meses de idade, os
bebês são capazes de reconhecer as seguintes emoções: alegria, tristeza, raiva, prazer (joy),
surpresa e medo. Alguns pesquisadores consideram essas emoções básicas, já que são
possíveis de serem experenciadas pelas crianças de mesma idade, em todas as culturas (ver
MALATESTA et. al, 1989; CAMRAS, 1992 citados em SCHUBERT; MCPHERSON,
2006).
Em um estudo, pesquisadoras verificaram as respostas emocionais à música por
crianças de 6 anos de idade e compararam as respostas com adultos (ESPOSITO; SERIO,
2007). Os participantes ouviram 8 excertos musicais que representavam alegria, tristeza, raiva
e medo, com aproximadamente 20 segundos de duração cada. Os resultados do estudo
sugerem que não há diferenças significativas no reconhecimento de emoções em música por

133
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

adultos e crianças. Isso demonstra que algumas respostas emocionais à música podem ser
inatas, porém sabe-se que muitas dessas respostas são aprendidas (Sloboda, 1985), incluindo-
se as convenções pré-estabelecidas pela psicologia da música (Meyer, 1956).
Outro estudo, realizado no Brasil (BUENO; MACEDO, 2004), procurou verificar a
percepção de emoção em música por 82 crianças de 5 a 9 anos de idade, com relação ao
reconhecimento das emoções alegria, tristeza, espanto, raiva e medo. Este reconhecimento foi
realizado através de carinhas expressivas onde as crianças deveriam associar as carinhas aos
estímulos musicais ouvidos. Diferente da maioria dos estudos relacionados à emoção em
música, onde os estímulos musicais são provenientes de músicas eruditas, este estudo utilizou
14 trechos de músicas populares, com enfoque principal no estilo musical. Os resultados
apontaram que as emoções alegria e tristeza foram mais facilmente associadas pelas crianças.
Segundo Swanwick (2003), quando uma música provoca emoção é porque essa tem
alguma relação com as experiências humanas já vividas, e que, por sua vez, se fundem com
novas experiências. Portanto, as respostas emocionais à música variam de pessoa para pessoa
dependendo de suas experiências passadas, que são múltiplas e pessoais. Entretanto, ouvintes
sem uma cultura musical geralmente concordam com o caráter emocional de uma
determinada peça musical mesmo sem tê-la ouvido antes (HEVNER, 1936 apud SLOBODA,
1985), o que contrasta com a idéia de que as respostas emocionais à música têm, como fator
decisivo, experiências já vividas pelo ouvinte (SWANWICK, 2003).
Contudo, não se pode esquecer-se de considerar a diferença de percepção entre as
pessoas. Por exemplo, se uma pessoa é consciente de altura e outra não, a que não é
consciente estará sujeita a perceber apenas o que ouve de acordo com seu estudo musical, ou
seja, suas respostas emocionais estarão de acordo com o que ouve. A pessoa que percebe
altura estará sujeita a respostas afetivas à altura, e a outra nem tanto. Imagens de altura,
memórias de altura, pensamentos relacionados à altura, emoções provocadas por altura, entre
outros, evocam fortes sentimentos de atração ou repulsão, de concordância ou discordância. O
mesmo acontece com andamento, intensidade e timbre (SEASHORE, 1967).
Há ainda aqueles que questionam a percepção de emoção por pessoas. Por exemplo,
Hindemith (1961) nega que a música provoca efeito emocional no ouvinte, devido à rapidez
com que a composição musical muda seu caráter emocional. Aponta que as pessoas não têm
capacidade de mudar o estado emocional tão rapidamente. Hanslick (1989) sugere que, na
música, não existe um conteúdo único cujo entendimento é compartilhado por todos os
ouvintes. Portanto, como linguagem “indeterminada” não consegue traduzir conceitos, então a

134
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

conclusão de que ela pode expressar sentimentos determinados é psicologicamente irrefutável


(HANSLICK, 1989).

Convenções

De acordo com a psicologia da música, os elementos musicais mais importantes na


distinção entre feliz e triste são o tempo e o modo. As convenções pré-estabelecidas sugerem
que o andamento rápido pode representar felicidade, enquanto o andamento lento pode
representar tristeza. O mesmo acontece com a tonalidade: uma música em tonalidade maior
tende a ser percebida como feliz, enquanto uma música em tonalidade menor tende a ser
percebida como triste (DALLA BELLA et al, 2001). Algumas pessoas percebem uma relação
com os acordes também, onde os acordes menores soam “tristes” e os maiores “felizes”.
Segundo Wisnik (1989), as cores do modo maior e menor são, respectivamente, “luminosas”
ou “sombrias” e “alegres” ou “tristes”. Uma vez que essas associações se tornam habituais, a
presença do próprio estímulo musical irá provocar respostas emotivas convencionais
(MEYER, 1956). Isso pode ser observado com frequência em programas de televisão ou
filmes, sendo pouco freqüente a sonoplastia de uma cena triste conter uma música em
tonalidade maior e andamento rápido. Cabe citar que os estudos sobre essas convenções ainda
são recentes, e existe a possibilidade de a atribuição de emoções relacionadas à música
diferenciar-se substancialmente, dependendo do lugar, região e cultura (MEYER, 1956). Por
exemplo, um estudo realizado no Brasil (LEVEK; ILARI, 2005) demonstrou que as
convenções pré-estabelecidas pela psicologia da música não são concretas na idade dos 5 aos
7 anos, e que não há diferença significativa se comparadas as respostas de meninos e meninas.
Contudo, na faixa etária dos 8 aos 10 anos já há diferença significativa por gênero. No estudo
supracitado (LEVEK; ILARI, 2005), as meninas de 8 a 10 anos apresentaram um melhor
rendimento em relação aos meninos da mesma idade, de acordo com algumas convenções
pré-estabelecidas pela psicologia da música. Talvez haja, portanto, um aprendizado das
convenções com maior intensidade, nessa faixa etária, por parte das meninas, o que reflete o
modo de como as meninas e os meninos aprendem nesta idade. Vale ressaltar que a diferença
cultural pode ser um fator relevante em estudos como este, ou seja, talvez o resultado
encontrado nesse estudo não seja o mesmo de estudos similares realizados em outros países.
Todavia, dificilmente um elemento musical designa respostas emocionais quando
utilizado separadamente, mas são feitas associações e combinações onde um elemento reforça
o outro. A altura, por exemplo, não é suficiente para designar uma conotação emocional

135
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

complexa: outros aspectos como andamento, dinâmica, tonalidade, caráter rítmico e textura
também são importantes. Se o compositor deseja escrever uma obra que possua um caráter
religioso, ele não irá apenas empregar o instrumento (timbre) apropriado, mas também irá
utilizar técnicas específicas de composição como modalidade, polifonia, e outras que tenham
a mesma conotação. É o conjunto de elementos combinados que causa determinada
“impressão” (MEYER, 1956). Essas conotações, porém, mudam com o decorrer do tempo.
Na música ocidental, por exemplo, a harpa já não é mais associada aos assuntos religiosos
como era na Idade Média (MEYER, 1956). Portanto, é provável haver um desenvolvimento
na percepção de emoção em música com o decorrer do tempo. Neste sentido, é de extrema
importância que novos estudos sobre a percepção de emoção em música sejam realizados,
sobretudo em populações de culturas e faixas etárias variadas.
Além dos elementos musicais já citados, há outros elementos que influenciam essa
distinção: o timbre do órgão, como exemplo, é associado muitas vezes à religião; a escala
pentatônica foi muito utilizada no século XIX para representar elementos pastorais; e alguns
intervalos também foram e continuam sendo usados para indicar certas idéias ou estados de
espírito (MEYER, 1956). Um exemplo é o trítono ser freqüentemente chamado de “intervalo
do diabo”. Ainda há a possibilidade de a música imitar sons de objetos ou eventos com
conotações emocionais (KRUMHANSL, 2002), o que implica em uma possível memória do
ouvinte, capaz de influenciar na resposta emocional à música. Segundo Swanwick (2003), é
possível que os padrões musicais também “estejam em movimento”, assim como nossos
pensamentos e sentimentos constantemente mudam. A habilidade da música em sugerir esse
movimento sem apontar para um evento determinado pode nos levar, erroneamente, a pensar
que a expressão musical é um tanto vaga e sem “conteúdo”.
Contudo, o uso de música na infância é universal tem seu início nos primeiros anos de
vida. As crianças utilizam a música para brincar, dançar, entre outras coisas e, com o decorrer
do tempo, a finalidade de ouvir música vai mudando. É provável que a percepção de emoção
em música também mude juntamente com as funções e a maneira de se ouvir música ao longo
da vida.

Fatores que Influenciam a Percepção de Emoção em Música

Levinson (1997) sugere a existência da "emoção estética" ("aesthetic emotion"), sendo


esta diferente das emoções cotidianas, especialmente provocada pela percepção de trabalhos
artísticos (LEVINSON, 1997). Portanto, as emoções provocadas pela música são diferentes, e

136
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

as experiências e características do ouvinte são determinantes para as respostas emocionais à


música. Segundo Juslin & Sloboda (2001), a música é sempre ouvida em um contexto social,
em determinado momento e lugar, com ou sem outras pessoas presentes, e com ou sem outras
atividades acontecendo, tendo sua própria fonte de significado e emoção. As respostas
emocionais podem ser influenciadas ou até mesmo determinadas por esse contexto. Em outras
palavras, as respostas emocionais à música dependem das situações em que a música é ouvida
(JUSLIN; SLOBODA, 2001).
A tabela seguinte, com base nos estudos já citados, sugere alguns fatores
determinantes para as respostas emocionais à música:

Tabela 1: Fatores que influenciam a percepção de emoção em música


ALGUNS FATORES QUE INFLUENCIAM AS RESPOSTAS EMOCIONAIS À MÚSICA
convenções pré- humor (estado memória: gosto musical:
estabelecidas: de espírito):
padrões estabelecidos as experiências padrões já
para determinar certas junto com a vivenciadas estabelecidos pelo
emoções, o que o emoção anteriormente pelo ouvinte que o farão
compositor procurou provocada pela ouvinte podem ser gostar ou não de
expressar através da música ouvida, relembradas por determinada música e,
música e padrões provoca músicas ou consequentemente,
possivelmente determinada elementos musicais, sentir uma emoção
aprendidos. emoção. provocando positiva ou negativa.
determinada emoção.

A partir da tabela, pode-se entender que esses fatores se interligam, e é a junção dos
mesmos que provocará determinada resposta emocional à música ouvida:

convenções + humor + memória + gosto + música ouvida


=
emoção provocada pela música

Portanto, são muitos os elementos "extra-musicais" que influenciam a resposta


emocional à música, sendo necessária a realização de diversos estudos para verificar até que
ponto as experiências vividas e os conhecimentos adquiridos pelo ouvinte são fundamentais
para a resposta emocional à música. Além disso, é importante verificar também quais os
elementos musicais capazes de provocar emoções, e se existem aqueles que são comuns para
diversas culturas.

137
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BALKWILL, Laura-Lee; THOMPSON, William. A cross-cultural investigation of the


perception of emotion in music: Psychophysical and cultural cues. Music Perception, n. 17, p.
43-64, 1999.

BUENO, Viviane; MACEDO, Elizeu. Julgamento de estados emocionais em faces


esquemáticas por meio da música por crianças. Psicologia: teoria e prática. n.6 (2): 27-36,
2004.

CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. A Descoberta do Fluxo: a psicologia do envolvimento com


a vida cotidiana. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

CAMRAS, Linda. Expressive development and basic emotions. Cognition and Emotion, n. 6,
p. 269 - 283, 1992.

CROSS, Ian. Music, mind and evolution. Psychology of Music, n. 29, p. 95 - 102, 2001.

DALLA BELLA, Simone, PERETZ, Isabelle, ROUSSEAU, Luc & GOSSELIN, Nathalie. A
developmental study of the affective value of tempo and mode in music. Cognition, 80, B1-
B10, 2001.

DAMÁSIO, Antonio. O Erro de Descartes: emoção, razão e cérebro humano. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.

DAMÁSIO, Antonio. O Mistério da Consciência. São Paulo: Companhia das Letras., 2000.

DELGADO, José. Emoções. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1971.

ESPOSITO, Ana. & SERIO, Manuela. Children's perception of musical emotional


expressions. In: ESPOSITO, Ana et. al (eds.) Verbal and Nonverbal Commun Behaviors,
Berlim, p. 51-64, 2007.

FILLIOZAT, Isabelle. Inteligência do Coração: a nova linguagem das emoções. Rio de


Janeiro: Campus, 1998.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional:a teoria revolucionária que define o que é ser
inteligante. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.

HARRIS, Paul. Criança e Emoção: o desenvolvimento da compreensão psicológica. São


Paulo: Martins Fontes,1996.

HANSLICK, Edward. Do Belo Musical: uma contribuição para a estética musical. Tradução:
Nicolino Simone Neto. Campinas: Unicamp, 1989.

HEVNER, Kate. Experimental studies of the elements of expression in music. American


Journal of Psychology, n. 48, p. 246 - 268, 1936.

HINDEMITH, Paul. A Composer's World. New York: Doubleday, 1961.

138
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ILARI, Beatriz. Desenvolvimento cognitivo-musical no primeiro ano de vida. In: ILARI,


Beatriz. (Org.). Em Busca da Mente Musical: ensaios sobre os processos cognitivos em
música - da percepção à produção. Curitiba: Editora da UFPR. p.271 - 302, 2006.

IZARD, Carrol, ACKERMAN, Brian, SCHOFF, Kristen. & FINE, Sarah. Self-organization
of discrete emotions, emotion patterns, and emotion-cognition relations. In: M.D. Lewis & I.
Granic (eds.), Emotion, development and self-organization: Dynamic systems approches to
emotional development. New York: Cambridge University Press, 2000.

JOHNSON-LAIRD, Philip. & OATLEY, Keith. Basic emotions, rationality, and folk theory.
Cognition & Emotion. n. 6, p. 201-223. 1992.

JUSLIN, Patrik. & SLOBODA, John. Music and Emotion: theory and research. Oxford:
Oxford University Press, 2001.

JUSLIN, Patrik & ZENTNER, M. R. Current Trends in the Study of Music and Emotion:
Overture. Musicae Scientiae, p. 3-21, 2001/2002.

JUSLIN, Patrik. From mimesis to catharsis: expression, perception and induction of emotion
in music. In: Miell, D., McDonald, R. & Hargreaves, D. (ed.). Musical Communication. New
York: Oxford University Press, 2005.

KAMENETSKY, Stuart, HILL, David. & TREHUB, Sandra. Effect of Tempo and Dynamics
on the Perception of Emotion in Music. Psychology of Music. 25, 149-160, 1997.

KASTNER, M., CROWDER, R. Perception of the Major/Minor Distinction: IV. Emotional


Connotation in Young Children. Music Perception 8(2): 189-201, 1990.

KRUMHANSL, Carol. A link between cognition and emotion. Current Directions in


Psychological Science, 11 (2), 45-49, 2002.

LEDOUX, Joseph. O Cérebro Emocional. Tradução: Terezinha Batista dos Santos. Rio de
Janeiro: Objetiva, 1998.

LEVEK, Kamile. & ILARI, Beatriz. Emoção em música: a influência de andamento e


tonalidade na resposta emocional à música por crianças e adolescentes brasileiros.In:
1°SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS, 2005. Anais…
Curitiba: DeArtes, 2005. p. 460-465.

LEVINSON, J. Music and negative emotion. In: ROBINSON, Jenefer (ed.). Music and
Meaning. New York: Cornell University Press, 1997.

LISBOA, Christian. A intenção do intérprete e a percepção do ouvinte: um estudo das


emoções em música a partir da obra Piano Peace de Jamary Oliveira. Tese de Doutorado
(Execução Musical) - Universidade Federal da Bahia, 2008.

MALATESTA, C. Z. et al. The development of emotion expression during the first two years
of life. Monografs of the Society for Research in Child Development, 54 (1-2), 1-104, 1989.

139
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

MARSHALL, Nigel. & HARGREAVES, David. Musical style discrimination in the early
years. Journal of Early Childhood Research, 5 (1), 35-49, 2007.

MEYER, Leonard. Emotion and Meaning in Music. Chicago: University of Chicago


Press,1956.

MILLIGAN, K., ATKINSON, L., TREHUB, S.E., BENOIT, D. & POULTON, L. Maternal
attachment and the communication of attachment through song. Infant Behavior and
Development, 26, 1-13, 2003.

MURRAY, E. J. Motivação e Emoção. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1971.

NAWROT, E.S. The perception of emotional expression in music: evidence from infants,
children and adults. Psychology of Music, 31(1), 75-92, 2003.

PICHIN, B. Como acontece a relação entre música e emoção. V SIMPÓSIO DE COGNIÇÃO


E ARTES MUSICAIS. Anais... Curitiba: DeArtes, UFPR, 2009.

SCHUBERT, Emery & MCPHERSON, Gary. The perception of emotion in music. In:
MCPHERSON, G. (ed.) The child as musician: A handbook of musical development. Oxford:
Oxford University Press, 2006.

SEASHORE, Carl. Psychology of Music. New York: Dover Publications, 1967.

SLOBODA, John. A. The Musical Mind. New York: Oxford University Press, 1985.

STANLEY, M. & MCROBERTS, G. Baby ears: a recognition system for affective


vocalizations. Speech Comunication, 39, 367-384, 2003.

SWANWICK, Keith. Ensinando Música Musicalmente. Tradução: Alda Oliveira & Cristina
Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

TRAINOR, Laurel, AUSTIN, C.M. & DESJARDINS, R. Is infant-directed speech prosody a


result of vocal expression of emotion? Psychological Science, 11, 188-195, 2000.

TRAINOR, L. The emotional origins of music. Physics of Life Reviews, 7, 44-45, 2010.

TREHUB, S.E. & NAKATA, T. Emotion and music in infancy. Musicae Scientiae, special
issue, 37-61, 2001/2002.

WEBSTER, G. & WEIR, C. Emotional Responses to Music: Interactive Effects of Mode,


Texture and Tempo. Motivation and Emotion. 29, 1, 2005.

WISNIK, José Miguel. O Som e o Sentido: uma outra história das músicas. São Paulo:
Companhia das Letras, 1989.

140
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Educação Infantil e Música: o que dizem as pesquisas?

Mônica Luchese Marques


Universidade de Brasília
monicaluchese@hotmail.com

Maria Cristina de Carvalho Cascelli de Azevedo


Universidade de Brasília
criscarvalhocazevedo@gmail.com

Resumo: Como tema recorrente em estudos da Educação e da Educação Musical, a relação


entre a Música e a Educação Infantil está presente em diversas pesquisas dessas áreas. Como
recorte da revisão de literatura da pesquisa de mestrado em andamento fez-se um
levantamento no banco de teses e dissertação da CAPES com o intuito de verificar o que as
pesquisas sobre a temática estudada estão trazendo em seus resultados. Com isso esta
comunicação tem os seguintes objetivos: 1) verificar o que dizem os resultados das pesquisas
brasileiras sobre a relação Música e Educação Infantil; e 2) Identificar o que esses resultados
trazem em comum e divergem. Com o mapeamento realizado, em um total de 40 teses/
dissertações, podemos perceber a predominância de trabalhos que relatam a prática musical de
professores generalistas e especialistas. As principais necessidades apontadas por esses
trabalhos foram: a presença do profissional especializado em Música na Educação Infantil e a
formação continuada e musical de professores generalistas.
Palavras chave: Estado da arte, música e educação infantil, pesquisas

Introdução

A relação Música e Criança é tema recorrente em estudos da Educação e da Educação


Musical considerando-se diferentes abordagens teóricas e metodológicas de pesquisa. Em
levantamento1 realizado para pesquisa de mestrado em andamento, cujo objetivo é
compreender a ação pedagógica de professor(a) de música em escola regular de Educação
Infantil, foi possível constatar um total de 40 teses e dissertações que envolvem o tema
Música e Educação Infantil e a sua relação com o desenvolvimento musical. Entre as
temáticas encontradas percebemos uma predominância em trabalhos que focam a prática
docente (40%). Nestes, o professor é a principal fonte de informação e de dados. Outros
trabalhos discutem o desenvolvimento musical infantil (15%), o repertório musical (15%), o
papel da Música na Educação Infantil (15%), a formação de professores (7,5%), a importância
da Música na Educação Infantil (5%) e os materiais didáticos (2,5%). A partir dessas
temáticas buscou-se aprofundar quais são as principais questões e debates nessa área, como

1
Esse levantamento buscou caracterizar as pesquisas que envolvem a Música e a Educação Infantil de acordo
com as universidades e áreas aonde foram realizadas, sua abordagem metodológica e suas temáticas. O artigo foi
publicado nos anais do X Encontro Regional Nordeste da ABEM.
141
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

elas estão sendo investigadas e que resultados estão sendo divulgados. Dando origem assim
aos seguintes questionamentos: o que dizem os resultados das pesquisas brasileiras sobre a
relação Música e Educação Infantil? O que os resultados trazem em comum e como eles
divergem? Até que ponto esses resultados contribuem com a ação pedagógico-musical de
professores de Educação Infantil? Até que ponto esses resultados definem uma prática
pedagógico musical na educação Infantil?
Para responder as seguintes questões foi realizado um mapeamento de cunho
bibliográfico enfatizando o que essas pesquisas destacam e privilegiam dentro desse conjunto
de investigações que permeiam o universo infantil em que se encontra a pesquisa de mestrado
em andamento. Esse tipo de estudo caracteriza um levantamento denominado “Estado da
arte”. Segundo Ferreira (2002),

Nos últimos quinze anos tem se produzido um conjunto significativo de


pesquisas conhecidas pela denominação “estado da arte” ou “estado do
conhecimento”. Definidas como de caráter bibliográfico, elas parecem trazer
em comum o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica
em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e
dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e
lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas
dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e
comunicações em anais de congressos e de seminários. Também são
reconhecidas por realizarem uma metodologia de caráter inventariante e
descritivo da produção acadêmica e científica sobre o tema que busca
investigar, à luz de categorias e facetas que se caracterizam enquanto tais em
cada trabalho e no conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a ser
analisado (FERREIRA, 2002, p. 258).

Para realizar esse “mapeamento” das pesquisas que envolvem Música e Educação
Infantil, adotou-se como referência a base de dados de Teses e Dissertações da CAPES2, fonte
legítima de pesquisas realizadas no âmbito nacional. A metodologia utilizada para busca
seguiu os seguintes passos: 1) digitação das palavras-chaves: Educação Musical e Educação
Infantil e Música, com a seleção do tópico “todas as palavras”; 2) seleção da opção de
“expressão exata” com os termos: Educação Musical e Educação Infantil, Música e Educação
Infantil, Música na Educação Infantil, Educação Infantil e Música e Educação Musical
Infantil. Todos os termos foram digitados na categoria “assunto”. Optou-se assim, partir de
um assunto mais amplo e com a análise quantitativa dos resultados obtidos seguir realizando
um recorte mais específico por meio do tópico “expressão exata”. Dos resultados encontrados,
um total de 86 teses/dissertações, foi realizado um recorte para a análise, e somente as

2
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
142
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

investigações que abordam a Música e a Educação Infantil foram levantadas sendo


desconsiderados, para este mapeamento, os trabalhos que tinham apenas uma dessas áreas
como eixo de pesquisa. Assim, após esse recorte tivemos um total de 40 teses/dissertações
para a análise sendo dessas 6 teses de doutorado e 34 dissertações de mestrado.

A Música e a Educação Infantil

A Música é muito presente nas instituições infantis e essa presença é descrita pelo
Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil (RCNEI) com diversas finalidades:
disciplinares; para desenvolver atitudes e valores; comemorar datas e festividades do
calendário escolar; memorizar conteúdos e executar instrumentos de “bandinhas”
reproduzindo e imitando padrões sonoros e rítmicos (BRASIL, 1998, p.46). Ou seja, a Música
está presente em vários momentos da rotina das crianças visando diferentes objetivos, porém
como afirma o mesmo documento, a presença da Música nessas instituições não pode ser
restrita a apenas essas práticas, ela deve ser contemplada como uma linguagem e deve ser
vivenciada pela produção, apreciação e reflexão (BRASIL, 1998, p. 43).
A forma como a Música vem sendo abordada e a sua função nas instituições infantis
são apontadas pelas pesquisas levantadas, assim como o RCNEI, de acordo com suas diversas
finalidades na escola associada a rotina com ênfase: no controle disciplinar, no lúdico, no
entretenimento e em objetivos pedagógicos. A presença e importância da Música nessas
instituições de ensino são relatadas a partir da prática de professores, da fala de coordenadores
e da análise de repertório musical e do papel da Música. Os estudos destacam a ausência de
objetivos musicais na rotina das crianças, o que é explicado pela falta de um profissional
especializado e pela insegurança das professoras unidocentes em trabalhar com conteúdos
musicais. Assim, as pesquisas enfatizam a importância desse profissional na Educação
Infantil e a necessidade de uma formação básica em Música e formação continuada para os
professores generalistas.
A prática docente nessa faixa etária é pesquisada por Tiago (2007), Piva (2008), Soler
(2008), Toledo (2004), Oliveira (2007), Stavracas (2008), Diniz (2005), Loureiro (2009),
Tozetto (2003), Abrahão (2006), Cunha (2006), Vieira (2004), Paiva (2009), Sugahara
(2008), Darezzo (2004), Beaumont (2003), Mosca (2009), Wrobel (1999), Siqueira (2000),
Moraes (2009), Pires (2006), Bonna (2006), Martins (2003), Guimarães (2003), Brook (2009)
e Carvalho (2005).

143
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Com relação às práticas de professoras, alguns trabalhos abordam os professores


unidocentes e têm como foco a formação continuada e a necessidade de conhecimentos
básicos musicais em sua formação. Dentre eles, as pesquisas de Pacheco (2005), Makino
(2003), Krobot (2006) e Aquino (2007) relatam experiências de pesquisa-ação e de análise de
currículo de cursos superiores de pedagogia. Fernandes (2009) e Luly (2000) apontam para a
formação continuada de professores de música
O repertório musical que está presente na Educação Infantil é focado e analisado por
Bessa (2007), Souza (2007) e Furlanetto (2006).
Todas essas pesquisas enfatizam a importância da Música para o desenvolvimento
infantil e por isso a necessidade da presença dessa na escola, os trabalhos que retratam o
desenvolvimento infantil também enfatizam essa importância, dos estudos listados temos:
Soares (2007), Pacheco (2009), Jordão (1997), Stifft (2008) e Fonseca (2009).

Resultados: Análise e Descrição das pesquisas

Pela análise da prática docente de professores generalistas e especialistas em Música


as pesquisas retratam a rotina musical das crianças na Educação Infantil. Diniz (2005) e Soler
(2008) realizaram um survey para investigar como a Música é inserida e utilizada nas práticas
pedagógicas de professoras da Educação Infantil. A primeira realizou seu estudo na rede
municipal de Porto Alegre (RS) e a segunda na rede municipal e em escolas privadas da
cidade de Indaiatuba (SP). As autoras afirmam que a música é muito presente nas práticas
pedagógicas das professoras unidocentes e que ela é utilizada de diversas formas de acordo
com os contextos e a formação dessas professoras. As respondentes afirmam não se sentirem
seguras para trabalhar com conteúdos musicais e destacam a necessidade e a importância do
profissional específico de Música na escola. A análise das práticas musicais confirma a
presença da música para desenvolver atitudes e valores, comemorar datas e festividades;
memorizar conteúdos e executar instrumentos de “bandinhas”, como é apontado pelo RCNEI.
Em sua pesquisa, Soler (2008) investiga ainda o professor de Música e os professores
generalistas de escolas particulares, esses dois grupos afirmaram a importância da presença de
profissionais especializados em Música nessas instituições. Esses resultados revelam que os
professores unidocentes não abordam conteúdos específicos de música porque não têm
formação qualificada. Assim, podemos afirmar que a presença de um professor de música na
Educação Infantil é fundamental sob os seguintes aspectos: o desenvolvimento de habilidades

144
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

e conhecimento musical, a atuação colaborativa entre os professores especialistas e


unidocentes e a formação continuada de professores generalistas.
Essa função da Música, para desenvolver atividades sem objetivos musicais, nas
instituições infantis também foi relatada nos resultados encontrados por Oliveira (2007),
Stavracas (2008) e Loureiro (2009). As duas últimas autoras realizaram suas pesquisas com
professores da cidade de São Paulo (SP) e investigaram como a música está sendo utilizada na
Educação Infantil. Sob essa mesma perspectiva, porém com sujeitos de pesquisa diferente,
Oliveira (2007) coletou seus dados por meio de entrevistas com a Supervisora Estadual da
Superintendência Regional de Ensino e com a coordenadora da área de Artes do Município de
Uberlândia (MG). A autora afirma que a situação do ensino de Música na Educação Infantil e
no Ensino Fundamental ainda não contempla as orientações oficiais, e enfatiza a utilização da
música para diversos fins não musicais, visto que essa é ministrada por professores
unidocentes e que não existe a disciplina Música como integrante do currículo escolar. Essas
investigações nos mostram que o papel restrito da Música na Educação Infantil está ligado
não somente a prática educativa do professor, mas também a necessidade de políticas públicas
educacionais voltadas a inserção da Música nessa modalidade de ensino.
A análise das práticas musicais de professores também foi investigada com o intuito
de verificar a presença, consciente ou inconsciente, de princípios construtivistas (WROBEL,
1999). A análise da utilização do construtivismo na ação pedagógica dessas professoras foi
realizada por meio de entrevistas e questionários. Siqueira (2000), nessa mesma abordagem
teórica, investigou esses princípios nas canções utilizadas nas escolas de Educação Infantil e
de Ensino Fundamental. Seus resultados apontam que a canção é composta por importantes
elementos musicais (instrumentação e arranjo) e extra musicais (contextualização histórica da
letra e de compositores) que a caracterizam como uma rica fonte de conhecimentos musicais
essenciais para a formação básica e cultural da criança. Esses conhecimentos são
experienciados e adquiridos em um processo construtivo de ensino e aprendizagem. Apesar
de Siqueira (2000) investigar as canções da rotina infantil e destacar suas possibilidades
pedagógicas para o ensino e aprendizagem da música na Educação Infantil, o processo de
construção do conhecimento depende da ação pedagógica do(a) professor(a).
A prática relacionada com os saberes docentes foi pesquisada por Tiago (2007) e
Beaumont (2003), com o foco também nos relatos de professores. Tiago (2007) realizou sua
pesquisa com três professoras generalistas que atuam na Educação Infantil em uma escola
municipal de Uberlândia (MG), por meio de entrevistas e observação participante seus

145
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

resultados mostram que as professoras trabalham muito com a música e que esta é muito
importante para suas práticas, porém as atividades musicais se restringem ao cantar. Por isso a
autora afirma a necessidade de formação continuada a essas professoras e enfatiza a
necessidade de profissionais especializados em Música, recursos materiais e estrutura
adequada para as atividades com Música na Educação Infantil. Beaumont (2003) buscou
compreender a inter-relação entre os saberes e as práticas por meio de cinco entrevistas, três
com professoras da Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e duas com
professoras de musicalização. Por meio dessa inter-relação ela aponta a expectativa de
professoras unidocentes e especialistas para trabalharem com a Música de modo integrado às
demais disciplinas escolares. Seus resultados apontam para a necessidade de uma formação
musical reflexiva inserida no contexto atual e no curso de formação das professoras
generalistas. Para a pesquisadora é importante que esses cursos conheçam, ampliem e
aprofundem tanto os saberes que esses profissionais possuem, quanto as práticas que
desempenham com a Música. A relação entre os saberes e as práticas musicais dos
professores generalistas pesquisados nos mostra que a formação desses docentes não esta
contemplando a Música como um fim de suas ações educativas, não a contempla de forma
reflexiva dentro de seu corpo de conhecimentos necessário para sua atuação docente.
A importância da formação de professores dentro desse cenário atual e real da
Educação Infantil também é abordada por Aquino (2007) que buscou investigar a Música na
formação inicial do pedagogo dos cursos localizados no Centro-Oeste. Diante do quadro
encontrado pela autora, com poucas instituições de nível superior que possuem disciplinas
ligadas a Artes e Música, ela afirma que os pedagogos da região Centro-Oeste não são
formados, ou seja, preparados para lidar com a Música na escola regular. Essa necessidade de
formação musical para o aluno de pedagogia também é enfatizada por Krobot (2006) que
pesquisou a inclusão da modalidade Música no curso de pedagogia em Jaraguá do Sul (SC).
Por meio das práticas de professores e de observação da rotina escolar alguns
trabalhos focaram o repertório musical que permeia as crianças em seu ambiente de
aprendizagem, como as investigações de Bessa (2007), Souza (2007) e Furlanetto (2006).
Bessa (2007) pesquisou o uso das músicas “politicamente corretas” nas instituições infantis, a
partir dessas observações a autora relata a presença da memória afetiva nas práticas docentes.
Souza (2007) e Furlanetto (2006) pesquisaram a canção infantil. O primeiro realizou sua
pesquisa na cidade de São Paulo e investigou a canção infantil urbana: sua história, sua
estrutura, meios de produção e divulgação e sua utilização prática em sala de aula. A segunda

146
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

pesquisadora buscou as concepções de infância presentes no processo histórico da Educação


Infantil, e como elas se articulam às canções ensinadas nessa tipologia de ensino. Como
resultados vemos a utilização de canções como meio de manifestação do conceito de infância
presentes nas políticas educacionais brasileiras correspondente a um determinado período
histórico social. A utilização de canções sem a reflexão do docente sobre seus elementos
musicais e não musicais em sua ação educativa pode gerar equívocos ou a não exploração do
conteúdo em sua atuação. A ação educativa é caracterizada por Sacristán (1999) como sendo
pessoal e social, ou seja, ela traz consigo as crenças e individualidades do professor como um
ser único que compartilha, colabora e é influenciado por toda a cultura educativa e social em
que está inserido.
Soares (2007) investigou os movimentos de bebês, de quatro a vinte e quatro meses de
idade, em uma creche pública em Goiânia (GO). Analisando seus movimentos, a partir dos
critérios de Wallon, pode-se perceber como os bebês se movimentam e se expressam por
meio da Música, os benefícios trazidos pelas atividades realizadas e identificar as
possibilidades e os limites para o trabalho de musicalização para bebês. Em seus resultados a
autora também enfatiza a importância da qualificação profissional como um dos fatores mais
importantes para a promoção de padrões de qualidade de ensino. Sobre a prática de
musicalização para bebês Stifft (2008) analisou a influência das relações interpessoais no
desenvolvimento musical de bebês, sua investigação foi realizada nas aulas de musicalização
do projeto de Extensão do Departamento de Música da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS).
Ainda sobre o desenvolvimento musical infantil, Pacheco (2009) realizou um estudo
correlacional que buscou investigar as relações entre as habilidades musicais e a consciência
fonológica em crianças de quatro e cinco anos de idade. Seu estudo buscou replicar
parcialmente o estudo de Anvari et al. (2002) com crianças brasileiras. Em seus resultados a
autora traz a correlação entre as habilidades musicais e a consciência fonológica, com isso
pode-se sugerir o compartilhamento de mecanismos auditivos e/ou cognitivos entre a Música
e a linguagem. Fonseca (2009) estudou o canto espontâneo de crianças entre dois e seis anos
de idade com o intuito de analisar os conteúdos musicais presentes neles como: ritmo,
direcionamento, forma, estruturação melódica, caráter expressivo, contrastes, texto e
influências culturais específicas. A partir desses elementos a pesquisadora investigou a
construção da percepção do tempo dessas crianças. Como resultados a autora aponta que o
tempo é a característica do canto espontâneo mais influenciado pela idade da criança e coloca,

147
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de acordo com as características do canto espontâneo, que esse, assim como a Música, pode
ser considerado um instrumento metodológico importante para investigações acerca do
desenvolvimento da criança. Essas pesquisas sobre o desenvolvimento musical infantil nos
ajudam a compreender como esse é construído a partir de diferentes abordagens teóricas e
experiências de campo. A importância da Música no desenvolvimento infantil, apresentado
nessas investigações, enfatizam a necessidade do ensino de qualidade dessa nas instituições
de ensino infantil.

Conclusão

A partir da análise das pesquisas levantadas com a temática Educação Infantil e


Música podemos verificar como esses assuntos estão sendo abordados nas diversas
investigações. Desse modo, nos permite avaliar a contribuição da pesquisa de mestrado em
andamento para os estudos na área de Educação Musical e discutir o que as investigações
realizadas acrescentam a pesquisa.
A forma como a Música é inserida na Educação Infantil, em diversas cidades e estados
do Brasil, pode ser percebida pela descrição e análise de práticas docentes, do repertório
musical, do papel e importância dessa nessas instituições de ensino. Como resultados
recorrentes dessas pesquisas temos a necessidade de formação musical aos professores
generalistas e a presença do professor especialista na Educação Infantil. A troca de
conhecimentos e experiências entre esses profissionais pode consolidar a prática musical de
qualidade nessas escolas, pois a socialização da ação docente permitirá práticas e vivências
musicais explicitadas nos documentos legais. Porém, essa realidade ainda está distante do
contexto atual, visto que são poucas as políticas públicas que contemplam o professor
especialista na Educação Infantil. Assim, com a obrigatoriedade do ensino de Música na
Educação Básica, temos que cuidar o como a Música esta sendo inserida nessas escolas,
buscando sua inserção com qualidade, surgindo assim os seguintes questionamentos: Quem
deve ministrar a aula de Música na Educação Infantil? Qual será sua formação? Qual é a
função do profissional especialista nessas escolas? Quais são os saberes e habilidades
necessários a esses professores de Música para atuarem em instituições infantis?

148
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ABRAHÃO, Ana Maria Paes Leme Carrijo. A música na escola: um privilégio dos
especialistas? Concepções dos professores sobre o talento musical e a música na escola e a
representação gráfica do som de crianças de 3 a 6 anos de idade. Dissertação de mestrado.
2006

AQUINO, Thaís Lobosque. A música na formação inicial do pedagogo: embates e


contradições em cursos regulares de pedagogia da região centro-oeste. Dissertação de
mestrado. 2007

BEAUMONT, Maria Teresa de. Paisagens polifônicas da música na escola: saberes e


práticas docentes. Dissertação de mestrado. 2003

BESSA, Beatriz De Souza. Não atire o pau no gato: o politicamente incorreto e memória na
educação infantil. Dissertação de mestrado. 2007

BONNA, Melita. Nas entrelinhas da pauta: repertório e práticas musicais de professores dos
anos iniciais. Dissertação de mestrado. 2006

BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.


3° volume. Brasília: MEC/SEF, 1998.

BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.


1° Volume. Brasília: MEC/SEF, 1998.

BROOK, Angelita Maria Vander. A abordagem pontes na musicalização para crianças entre
0 e 2 anos de idade. Dissertação de mestrado. 2009

CARVALHO, Patricia Alves. Re-tocando a aprendizagem na educação de infância: a música


como linguagem. Dissertação de mestrado. 2005

CUNHA, Daiane Solange Stoeberl da. Educação musical e emancipação: a formação do


educador musical a partir de uma perspectiva crítica. Dissertação de mestrado. 2006

DAREZZO, Margaterh. Impacto de um programa de ensino para cuidadoras em creche:


música como condição facilitadora de condutas humanas ao lidar com bebês. Dissertação de
mestrado. 2004

DINIZ, Lélia Negrini. Música na educação infantil: um survey com professoras da rede
municipal de ensino de porto alegre - RS. Dissertação de mestrado. 2005

FERNANDES, Iveta Maria Borges Avila. Música na escola: desafios e perspectivas na


formação contínua de educadores da rede pública. Tese de doutorado .2009

FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. Revista: Educação & Sociedade, ano XXIII, no 79,
Agosto/2002, p. 257-272.

149
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

FONSECA, Maria Betania Parizzi. O desenvolvimento da percepção do tempo em crianças


de dois a seis anos: um estudo a partir do canto espontâneo. Tese de doutorado. 2009

FURLANETTO, Beatriz Helena. Infância em pauta - um estudo histórico sobre as


concepções de infância presentes nas canções e na formação de professores. Dissertação de
mestrado. 2006

GUIMARÃES, Marcia Aparecida Baldin. O Canto Coletivo na Educação Infantil e no Ensino


Fundamental. Tese de doutorado. 2003

JOLY, Ilza Zenker Leme. Um processo de supervisão de comportamentos de professores de


musicalização infantil para adaptar procedimentos de ensino. Tese de doutorado. 2000

JORDÃO, Maria de Fátima Marinho. Musicalização Infantil na Creche Berta Lutz.


Dissertação de mestrado. 1997

KROBOT, Liara Roseli. A inclusão da modalidade música no curso de pedagogia -


habilitação educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental: o caso do curso de
pedagogia em Jaraguá do Sul - SC. Dissertação de mestrado. 2006

LOUREIRO, Sonia Regina Catellino. Música na educação infantil: além das festas
comemorativas. Dissertação de mestrado. 2009

MAKINO, Jéssica Mami. A arte invade o Brás: uma proposta de educação musical na creche
do Brás. Dissertação de mestrado. 2003

MARTINS, Maria Audenora das Neves Silva. Cantigas de roda: o estético e o poético e sua
importância para a Educação Infantil. Tese de doutorado. 2003

MORAIS, Daniela Vilela de. O material concreto na educação musical infantil: uma análise
das concepções docentes. Dissertação de mestrado. 2009

MOSCA, Maristela De Oliveira. Como se fora brincadeira de roda: a ciranda da ludopoiese


para uma educação musical humanescente. Dissertação de mestrado. 2009

OLIVEIRA, Gisele Crosara Andraus. A música na escola tem futuro: uma análise da situação
do ensino de música na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, em
Uberlândia/MG, 10 anos após a promulgação da lei de diretrizes e bases da educação nacional
– lei 9.394/96. Dissertação de mestrado. 2007

PACHECO, Caroline Brendel. Habilidades musicais e consciência fonológica: um estudo


correlacional com crianças de 4 e 5 anos de Curitiba. Dissertação de mestrado. 2009

PACHECO, Eduardo Guedes. Educação musical e educação infantil: uma investigação-ação


na formação e práticas das professoras. Dissertação de mestrado. 2005

PAIVA, Juliane De Sousa Silva. A música nas propostas educacionais dos parques infantis
na cidade de São Paulo: 1947 a 1957. Dissertação de mestrado. 2009

150
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

PIRES, Maria Cristina de Campos. O som como linguagem e manifestação da pequena


infância: música? Percussão? Barulho? Ruído? Dissertação de mestrado. 2006

PIVA, Fabrícia. Educação musical: a perspectiva de professoras da educação infantil.


Dissertação de mestrado. 2008

SACRISTÁN, J. Gimeno. Poderes Instáveis em Educação. Porto Alegre: Artmed. 1999.

SIQUEIRA, Egle Maria Luz Braga Zamarian de. Música: da casa à escola de educação
infantil e ensino fundamental. Dissertação de mestrado. 2000

SOARES, Cintia Vieira Da Silva. A música na educação infantil: o movimento dos bebês em
ambiente musical. Dissertação de mestrado. 2007

SOLER, Karen Ildete Stahl. A música na educação infantil: um estudo das EMEIS e EEIS da
cidade de Indaiatuba, SP. Dissertação de mestrado. 2008

SOUZA, João Ricardo de. Os cancionistas urbanos e a educação musical infantil. Estudos de
caso: Colégios Clip e Passionista São Paulo da Cruz (SP 1996-2006). Dissertação de
mestrado. 2007

STAVRACAS, Isa. O papel da música na educação infantil. Dissertação de mestrado. 2008


STIFFT, Kelly. A construção do conhecimento musical no bebê: um olhar a partir das suas
relações interpessoais. Tese de doutorado. 2008

SUGAHARA, Leila Yuri. Música na escola: um estudo a partir da psicogenética Walloniana.


Dissertação de mestrado. 2008

TIAGO, Roberta Alves. Música na educação infantil: saberes e práticas docentes. Dissertação
de mestrado. 2007

TOLEDO, Claudia Maria Fróes de. As contribuições do ensino de música e sua interface com
a educação infantil. Dissertação de mestrado. 2004

TOZETTO, Anita Henriqueta Kubiak. Educação musical: a atuação do professor na educação


infantil e séries iniciais. Dissertação de mestrado. 2003

VIEIRA, Edna Aparecida Costa. Música: sua influência no processo de alfabetização no


período pré-escolar. Dissertação de mestrado. 2004

WROBEL,Vera Bloch. A educação musical na educação infantil sob uma abordagem


construtivista. Dissertação de mestrado. 1999

151
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Música e o Jogo na Educação Infantil

Elizabeth Carrascosa Martínez


UNICAMP
elicarras@hotmail.com

Beatriz Senoi Ilari


University of Southern California

Resumo: Este artigo descreve uma experiência interdisciplinar realizada em uma escola
pública na Espanha durante o ano letivo de 2008-2009. O projeto chamado "Brincando
fazemos amigos: brincadeiras de 5 continentes” permitiu trabalhar o multiculturalismo,
desenvolver valores e promover a convivência entre os alunos da escola. Usando os jogos
não-competitivos em sala de aula, nos quais os alunos devem trabalhar juntos para alcançar
um objetivo, estamos incentivando a coesão do grupo e ajudando a criar laços afetivos entre
os alunos. Este projeto teve como objetivo implementar os princípios estabelecidos pela nova
lei de educação, usando o jogo como ferramenta metodológica no ensino de música na escola
regular.
Palavras chave: A música no sistema educativo espanhol, o jogo na musicalização infantil,
projetos interculturais

Introdução

Neste artigo descrevemos o projeto intercultural “Brincando fazemos amigos: jogos de


5 continentes”, que foi realizado no Centro de Educação Infantil e Ensino Fundamental Nove
de Outubro de Alcàsser, escola localizada em Valência (Espanha) durante o ano escolar 2008-
2009.
Primeiramente, examinaremos brevemente a situação da música no sistema educativo
espanhol, com ênfase na etapa da educação infantil. Em seguida, discutiremos a importância
da brincadeira para o desenvolvimento integral das crianças e suas implicações para a
educação musical. Por fim, descreveremos os detalhes da experiência e suas contribuições.

A Música no Sistema Educativo Espanhol

A música foi introduzida como disciplina obrigatória nas escolas espanholas, graças à
Lei Orgânica 1/1990 de 3 de outubro, de Ordenação Geral do Sistema de Educação (LOGSE),
que estabeleceu a escolaridade obrigatória em um período de 10 anos. Como resultado desta
lei, a educação musical passou a ser obrigatória nos níveis de ensino fundamental (6-12 anos)
e médio (12 a 16 anos).
152
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A LOGSE substituiu a antiga lei de 1970, comumente chamada de lei Villar Palasí,
que estabelecia o ensino básico (EGB) até os 14 anos de idade e não considerava a música
como disciplina obrigatória. Nessa lei (Lei 14/1970, de 4 de agosto da Educação Geral) a
música era introduzida nas atividades escolares à mercê da vontade, disposição e capacidade
dos professores. Na grande maioria das escolas, a presença da música era praticamente
inexistente, e nas poucas em que estava presente, esta se reduzia à aulas extracurriculares de
flauta doce, violão ou canto coral.
A partir da LOGSE, se abriram novas perspectivas para a educação musical na
Espanha. A obrigatoriedade da música nas escolas permitiu que se criassem nas universidades
espanholas as titulações específicas de educação musical, visando atender às exigências da lei
no artigo 16:

O ensino fundamental será ministrado por professores, que terão


competências em todas as áreas deste nível. O ensino da música, da
educação física, das línguas estrangeiras ou de outras matérias que se
determinem, será ministrado por professores com a especialização em
questão (ESPANHA, 1990).

Seguindo essa nova demanda uma infinidade de vagas para professores de educação
musical nas escolas e colégios em todo o estado espanhol foram abertas. Com a chegada dos
novos especialistas o cenário da educação musical começou a mudar na Espanha.

A situação específica da música em Valência

A Comunidad Valenciana, uma das dezessete regiões espanholas, está localizada na


região do Mediterrâneo e tem pouco mais de 5 milhões de habitantes. Esta região da Espanha
tem duas línguas oficiais: valenciano e castelhano (espanhol), ambos integrados no sistema
educativo.
A situação da música nesta pequena região da Espanha é notável. A música tem um
papel particularmente importante na cultura e na sociedade, como parte de celebrações, e
manifestações culturais tradicionais. A região de Valência tem mais de 500 sociedades
musicais e escolas de música federadas, mais de 100 coros que incluem mais de 3.000
membros do coro, 33 Conservatórios Profissionais de música e 3 Conservatórios Superiores
de Música. De acordo com a Associação de Professores de Música (AULODIA) "Valência
tem mais de 200.000 músicos com titulação superior (de nível profissional), incluindo mais de
1.000 que trabalham na principais orquestras espanholas e estrangeiras."

153
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Devido a essas circunstâncias, o Departamento de Educação estabeleceu o


fornecimento de materiais didáticos e equipamentos específicos1 para todas as escolas
públicas, a fim de garantir uma educação musical de qualidade. O Departamento também
criou cargos de especialista nos centros de formação de professores2, a fim de organizar e
ministrar cursos de educação musical, contribuindo deste jeito para a formação dos
professores de música.
Devido à mudança de governo em 2000, em 2002 foi aprovada a LOCE, Lei Orgânica
10/2002 de 23 de dezembro de 2002, de Qualidade da Educação. As consequências da
aplicação desta lei não foram muito favoráveis para a educação musical, posto que o número
de horas dedicadas ao ensino de música no nível fundamental e médio foi reduzido.
A mais recente reforma educacional teve lugar em 2006, na sequência de outra
mudança de governo em 2004, que introduziu a Lei Orgânica de Educação, LOE (Lei 2 /
2006, 03 de maio). Esta lei, que define os objetivos, conteúdos e critérios de avaliação para as
diferentes áreas em todas as etapas da educação, se baseia em três princípios fundamentais: 1.
proporcionar educação de qualidade a todos os cidadãos em todos os níveis da educação; 2.
promover a colaboração entre todos os membros da comunidade educativa; e 3. Seguir as
metas para o século 21 estabelecidas pela União Europeia (ESPANHA, 2006a).
Após a aprovação desta legislação foi adotado na Espanha a aprendizagem por
competências. De acordo com Philippe Perrenoud, sociólogo da Universidade de Genebra, a
competência é "a capacidade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos
(conhecimentos conceituais, procedimentais e atitudinais) para lidar com pertinência e
eficácia em diferentes situações problemáticas” (GENTILE e BENCINI, 2000, p. 19).
Os decretos que se desenvolvem na LOE no ensino fundamental (RD 1513/2006) e
médio (RD 1631/2006) estabelecem, no Anexo 1, as oito principais competências:

competência em comunicação linguística, a competência matemática,


competência do conhecimento e interação com o mundo físico,
processamento de informação e competência digital, competência
social e cívica, a competência cultural e artística, competência para
aprender a aprender e autonomia e iniciativa pessoal (ESPANHA,
2006b, p. 43).

1
Na maioria das escolas e colégios da região de Valência, a música é ministrada em uma sala específica equipada
com instrumentos Orff, instrumentos de pequena percussão, teclado ou sintetizador, aparelho de som, livros, Cds
e em alguns casos computador, televisão e vídeo.
2
Centros de formação, inovação e recursos educacionais (CEFIRES) dependente do Serviço de Formação de
Professores de Valência.
154
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A música se encontra principalmente no contexto da competência artística e cultural.

A Música na Educação Infantil

A educação infantil na Espanha é uma etapa não obrigatória que compreende a faixa
etária dos 0 aos 6 anos de idade. Esta etapa está dividida em dois ciclos: de 0 a 3 anos, e de 3
a 6 anos, sendo o segundo de ensino gratuito.
De acordo com a LOE, “a educação infantil, tem como objetivo primordial contribuir
para o desenvolvimento físico, emocional, social e intelectual das crianças, em estreita
cooperação com as famílias" (ESPANHA, 2006a, artigo 12). Para isso a LOE estabelece que
as crianças devem desenvolver 6 habilidades básicas dentre as quais duas estão
especificamente relacionadas com a educação musical: desenvolver habilidades de
comunicação em diferentes linguagens e formas de expressão, e iniciação ao movimento, no
gesto e no ritmo (ESPANHA, 2006c, p. 17167).
Para o desenvolvimento das capacidades mencionadas acima, os conteúdos do ensino
fundamental estão organizados em três áreas: autoconhecimento e autonomia pessoal,
conhecimento do ambiente e das linguagens, comunicação e representação. Todas elas devem
ser abordadas de maneira globalizada (ESPANHA, 2006d, p.475). Cada área é dividida em
vários blocos de conteúdo, apresentados na Tabela 1:
Tabela 1: Blocos de conteúdos
Conhecimento de si Conhecimento do meio Linguagens: comunicação e
mesmo e autonomia representação
pessoal
O corpo e a própria Meio físico: elementos, Linguagem verbal
imagem relações e medida
Jogo e movimento Aproximação à natureza Linguagem audiovisual e
tecnologias da informação e
da comunicação
A atividade e a vida Cultura e vida em Linguagem artística
cotidiana sociedade
O cuidado pessoal e a Linguagem corporal
saúde

A educação musical está incluída no contexto da área de linguagens (mais


especificamente no bloco de conteúdo da linguagem artística e linguagem corporal), com base
em uma abordagem que integra música e movimento, conforme sugerido por Orff e Keetman
(GOODKIN, 2002).Sendo assim, as atividades de musicalização infantil sugeridas no RD
155
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

1630/2006 incluem: cantar, tocar, manipular e experimentar com instrumentos e objetos


sonoros, criar, brincar com sons, ouvir, dançar, entre outros (ESPANHA, 2006d).
A LOE (2006a) estabelece também como devem ser tratados os conteúdos e as
atividades na educação infantil: "Os métodos de trabalho se basearão em experiências,
atividades e jogos e serão aplicados em uma atmosfera de afeto e confiança, para melhorar a
autoestima e a integração social" (p. 17167). Destaca-se nesse texto a importância de
atividades práticas e lúdicas para garantir a aprendizagem significativa. Mais adiante
aprofundaremos a discussão sobre o valor educativo do jogo como ferramenta metodológica
na educação.

O Jogo no Desenvolvimento Integral do Indivíduo

O homem só joga quando é plenamente homem e é plenamente homem quando joga


Friedrich Schiller

Segundo Huizinga (1971) o jogo é uma atividade de grande importância para o


desenvolvimento da civilização. Trata-se de uma necessidade "antropológica e cultural"
(BUSQUÉ; PUJOL, 1996, p. 12). Da pré-história às grandes civilizações da antiguidade e aos
dias de hoje, os seres humanos têm utilizado atividades lúdicas para diversos fins. Jogamos
para nos divertir, relaxar, passar o tempo, para descobrir nossos próprios limites, para
desenvolver habilidades específicas ou para nos relacionarmos com os outros.
Jogar não depende de idade, e o jogo está presente durante a infância, adolescência,
idade adulta e velhice. “No homem, o jogo aparece desde muito cedo, a partir das primeiras
etapas do período sensório-motor. [...] Depois, experimenta uma longa evolução que vai
cedendo lugar a diferentes tipos de jogos e que se prolonga até a idade adulta” (DELVAL,
1998, p. 90). Porém, seu papel é especialmente importante durante a infância e assim é
considerado em 1977 pela Associação Internacional pelo Direito de Brincar da Criança (IPA)
e desde 1989, pela Convenção sobre os Direitos da Criança, assinada pela Assembleia Geral
das Nações Unidas, conforme o artigo 313:

1. Os Estados Membros reconhecem o direito das crianças a repouso e


lazer, a brincar e a realizar atividades recreativas adequadas a sua
idade e assim como o direito de participar livremente na vida cultural
e as artes.

3
IPA- Espanha, Associação Internacional pelo direito das crianças a brincar http://www.marinva.es/; Nações
Unidas- Direitos Humanos http://www.ohchr.org/

156
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

2. Os Estados Partes respeitarão e promoverão o direito da criança a


participar plenamente na vida cultural e artística e encorajarão
oportunidades apropriadas, em condições de equidade, de participar de
atividades culturais, artísticas, recreativas e de lazer.

Como apontado por Louro (2006, p. 105), "filósofos como Platão, Aristóteles e,
posteriormente, Quintiliano, Montaigne e Rousseau, destacaram o papel do jogo na
educação". Grandes autoridades da psicologia do desenvolvimento, tais como Piaget,
Vygotsky e Bruner salientam a importância do brincar no desenvolvimento do indivíduo”.
Vygotsky (2001) afirma que o jogo contribui para o desenvolvimento mental, emocional e
sociocultural, ou seja, o desenvolvimento integral do indivíduo.
Na educação infantil, foi Froebel (1989) quem estabeleceu o jogo como ferramenta
pedagógica. Para as crianças é muito motivador aprender através de jogos. Segundo Louro
(idem, p. 106) "o jogo em si possui componentes do cotidiano e o envolvimento desperta o
interesse do aprendiz, que se torna um sujeito ativo do processo".

O Jogo na Educação Musical

Para a área de educação musical, o jogo desempenha um papel fundamental. Os


principais educadores do século 20, concordam com a necessidade de utilizarmos o jogo
como ferramenta didática na educação musical. Podemos, inclusive, encontrar muitas
referências a este respeito nos trabalhos de Dalcroze (apud BACHMANN, 1998), Orff-
Keetman (apud GOODKIN, 2002), e Willems (2002), entre outros.
O jogo é um ato espontâneo e voluntário. As crianças estão dispostas a jogar pelo
simples prazer, o que torna o jogo um recurso ideal para levar música para os estudantes.
Jogos com música permitem desenvolver determinados competências musicais ao mesmo
tempo em que proporcionam uma experiência real e contextualizada da música.
Em muitas culturas, há uma grande variedade de jogos que usam a música como
elemento essencial. Podemos classificar os jogos musicais de diferentes maneiras. Busqué e
Pujol (1996), os classificam como: jogos com deslocação, sem deslocação, jogos dançados, e
jogos com objetos. Delalande (1984 apud BRITO, 2003, p. 31) "relaciona as formas de
atividades lúdica propostas por Piaget à três dimensões presentes na música: jogo sensório-
motor, jogo simbólico e jogo com regras.” Ao agruparmos os jogos com base em seu
elemento musical mais significativo, podemos encontrar:
1. Jogos vocais: ecos, provérbios, rimas, adivinhações, jingles, trava-línguas e
brincadeiras de escolhas que desenvolvem a capacidade respiratória, a emissão, a articulação,
157
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

a impostação, a ampliação da tessitura, que permitem o trabalhar elementos melódicos


específicos, desenvolver audição interior, construir vocabulário, reforçar a aprendizagem de
idiomas, facilitar a compreensão da forma musical e criatividade.
2. Jogos rítmicos: com instrumentos, com objetos, percussão corporal que
desenvolvem o senso rítmico, a memória, a identificação de células rítmicas, a técnica
instrumental, a descoberta das possibilidades sonoras dos instrumentos e a improvisação.
3. Jogos com movimento: canções com gestos, canções de pular a corda, canções de
roda, jogos de mãos, jogos de dedos, jogos de equilíbrio, jogos pulados, jogos de velocidade,
jogos de perseguição e jogos de improvisação de movimentos que permitem o
desenvolvimento de habilidades motoras, o desenvolvimento espacial, a coordenação, a
lateralidade e o esquema corporal.
4. Jogos educativo-musicais (ou didático-musicais): jogos com os nomes das notas,
jogos para distinguir entre o som e o silêncio, a origem/direção do som, timbres, alturas,
durações, intensidades, que permitem aprender as grafias da linguagem musical e discriminar
as propriedades do som.
Entre os jogos que contêm a música como elemento principal destacam-se os jogos
tradicionais e folclóricos. "Através de jogos populares, podemos conhecer certas tradições e
costumes que compõem a nossa herança cultural, e que formam parte de nosso passado e
conformam a nossa identidade" (SOLÉ, In: BUSQUÉ; PUJOL, 1996, p. 9). Infelizmente,
porém, muitos desses jogos tradicionais estão se perdendo nos tempos atuais. Devido às
mudanças do modo de vida na sociedade contemporânea, "a criança vem perdendo as
referências educativas do jogo e da brincadeira para ficar imersa num mundo consumista e
alienante [...]" (RAMOS, 2008, p. 13).
Como dito acima, jogar é uma necessidade e um direito, mas para que nossos alunos
possam exercer este direito na sua totalidade, pais e educadores precisam fomentar a
utilização deste tipo de atividades lúdicas no tempo livre das crianças.
A experiência descrita adiante exemplifica como a escola pode contribuir para
expandir o repertório de jogos e brincadeiras infantis das crianças. O uso destes recursos de
forma voluntária e espontânea permitirá a interação entre os alunos nesta etapa crucial do
desenvolvimento da socialização.

158
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Brincando na Sala de Aula: uma experiência na Espanha

O projeto intercultural "Brincando fazemos amigos: jogos de cinco continentes" foi


realizado na escola de ensino infantil e fundamental “9 de Outubro” na cidade de Alcàsser em
Valência. Este projeto foi realizado durante todo o ano letivo 2008-2009, e de forma
interdisciplinar com todas as áreas do currículo de ensino infantil e fundamental.
O objetivo principal do projeto foi recuperar os jogos tradicionais de diversas partes
do mundo, especialmente da região de Valência, e dos países de origem dos estudantes
estrangeiros da escola. O intuito secundário foi de promover o respeito pelas diferenças e
conscientização de todos os alunos em relação à outras culturas, bem como o de fornecer uma
ampla gama de jogos para as crianças brincarem no horário do recreio escolar.
A ideia de resgatar os jogos tradicionais teve como justificativa os problemas de
convivência detectados na escola após a chegada de um número considerável de famílias
estrangeiras à localidade. Para ser trabalhado em cada curso foi selecionado um país de um
continente diferente. A equipe de professores da escola preparou um dossiê com informações
sobre os diversos países, contendo mapas, rimas, poemas, obras de arte, jogos tradicionais,
canções e danças a serem trabalhados em sala de aula com seus respectivos grupos.
Tomando como referência os objetivos, capacidades e conteúdos estabelecidos nos
currículos da educação infantil e do ensino fundamental foram propostos pequenos projetos
ou tarefas integradas.

Atividades realizadas no segundo ciclo da educação infantil

No segundo ciclo da educação infantil foi trabalhado o tema Espanha, mais


especificamente a Comunidad Valenciana, com o intuito de partir da realidade mais próxima
à criança de 3 a 5 anos de idade e contribuir para uma aprendizagem significativa. Com base
em uma abordagem abrangente, foi utilizado como elemento motivador a tela Kinderspiele
(Jogos de crianças) do pintor flamengo Pieter Brueghel4.

4
A ideia de utilizar esta pintura foi tirada de uma oficina de música ministrada pela professora Sofía López-Ibor
durante a Conferência Nacional Orff-Schulwerk nos Estados Unidos, em 2007.

159
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Figura 1 - Jogos de crianças (1560), Pieter Brueghel,


Kunsthistorisches Museum de Viena. 118 x 161 cm. óleo sobre tábua.

Esta tela retrata 86 jogos tradicionais do século 16 representados por 249 personagens,
que foram catalogados por Navacerrada (2007). Algumas das atividades iniciais se
concentraram na descrição da cena, na localização de uma determinada atividade ou a
imitação dos movimentos representados pelas figuras na imagem, conforme demonstra a
figura 2.

Figura 2 e 3 - Jogo da bola. Aluna da Escola 9 de Outubro e detalhe da


tela de Brueghel.

Visando partir dos conhecimentos prévios dos alunos, foi realizada uma lista de suas
brincadeiras preferidas. Cada aluno teve que ensinar um jogo novo para seus companheiros.
Também foi solicitado aos alunos que descobrissem um jogo popular com música, pedindo
ajuda a seus pais ou avós e eles tiveram que explicar e mostrar o jogo para o restante da
classe. Essa experiência ajudou a desenvolver valores e atitudes de respeito entre alunos e
reforçou os laços de amizade entre eles (vide figuras 3 e 4).

160
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Figuras 3 e 4. Alunos da Educação Infantil (5 anos) aprendendo a


brincadeira tradicional catalã “A comprar Peix”

Ao longo do ano letivo os alunos do terceiro ao quinto anos aprenderam diversos jogos
representados na pintura de Brueghel que ainda estão presentes na cultura Valenciana como
galinha cega, “la piñata”, boliche, cadeira da rainha, fazer bolhas de sabão, o peão, entre
outros (vide figuras 5 e 6).

Figura 5 e 6. Jogo da cadeira da Rainha. Detalhe da pintura de


Brueghel.

Os jogos musicais tradicionais serviram para trabalhar diferentes aspectos musicais do


currículo da educação infantil. Abaixo está uma lista de jogos ensinados na educação infantil
e no primeiro ano do fundamental:
Jogos musicais da Espanha: Al pasar la barca , Al Corro la Patata, Chocolate
molinillo, ¿Dónde están las llaves?, El juego chirimbolo, El patio de mi casa, en Salamanca
tengo, En el salón del Prado, Este corro es un jardín, Pasimisí, Soy la reina de los mares, Un
Cocherito leré.

161
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Figura 7. Brinquedo de roda “Chocolate molinillo”

Jogos musicais de Valência: A la cadireta, Peu regató, Pissi -pissiganya, La Xata


Merenguera, Palmeja, La tia Monica, Aserrín aserrán, El sambori, La Caterineta, Els quatre
llauradors, En Joan Petit, Volta cap aquí, El ball de la civada, El ball de Sant Corneli, Els
esclops d´en Pau.

Figuras 8. Brinquedo de roda “Pissi, pissiganya”

Para atingir o objetivo de envolver as famílias na vida escolar, conforme estabelecido


pela LOE, os pais e os avós dos alunos tiveram a oportunidade de participar em várias
atividades do projeto, contando histórias e ensinando brincadeiras tradicionais a todos. Os
alunos concluíram que eles conheciam uma quantidade menor de jogos do que seus pais e
avós, e que estes brincavam com objetos simples, como pedras ou paus enquanto eles utilizam
brinquedos sofisticados e caros.
Como ponto culminante do trabalho desenvolvido ao longo do curso, os alunos
tiveram a oportunidade de compartilhar o aprendizado com os colegas, pais e parentes em
uma apresentação musical. A atividade final consistiu na representação de brincadeiras
162
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

musicais de vários países aprendidas na aula de música, e concluiu com uma dramatização
coletiva da pintura "Jogos de Crianças", com representantes de todos os cursos da escola.
Esta apresentação consistiu em uma "viagem musical ao redor do mundo", integrando
diferentes linguagens: corporal, verbal, musical e plástica. Os alunos recitaram versos e
poemas, cantaram, tocaram instrumentos, dançaram e dramatizaram os jogos selecionados
(vide figura 9).

Figura 9. Atividade final, dramatização da pintura de Brueghel.

Conclusão

A partir deste projeto, foi possível recuperar uma grande quantidade de jogos
tradicionais. Os alunos e alunas da escola aprenderam jogos de diferentes países, o que
facilitou uma aproximação à cultura de seus pares. Os estudantes gradualmente incorporaram
esses jogos em seu tempo livre e estreitaram suas relações interpessoais. Na aula de música,
os alunos trabalharam conteúdos e habilidades por meio dos jogos e aprenderam a desfrutar
da música brincando.
Vivemos em uma sociedade multicultural. Acreditamos que ensinando aos alunos
jogos populares pertencentes ao seu meio bem como jogos de outros países, estamos ajudando
a restaurar e manter as nossas tradições, oportunizando o conhecimento de aspectos de outras
culturas, criando assim um ambiente intercultural que pode ajudar a torná-los mais tolerantes
e solidários.

163
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BACHMANN, Marie-Laurie. La Rítmica Jaques-Dalcroze: una educación por la música y


para la música. Madrid: Pirámide. 1998.

BRITO, Teca Alencar de. Música na educação infantil: propostas para a formação integral da
criança. 2. Ed. São Paulo: Editora Fundação Peirópolis, 2003.

BUSQUÉ, Montserrat; PUJOL, M. Antònia. Ximic, Jocs tradicionals. Berga: Amalgama


Edicions ,1996.

DELVAL, Juan. Crescer e pensar. A construção do conhecimento na escola. Porto Alegre:


editora artes médicas, 1998.

ESPAÑA. Ley General de Educación y Financiamiento de la Reforma Educativa. Ley


14/1970, de 4 de agosto. Madrid: Jefatura de Estado, 1970.

______.Ley Orgánica de Ordenación General del Sistema Educativo (LOGSE). Ley 1/1990,
de 3 d Octubre. Madrid: Jefatura del Estado, 1990.

______. Ley Orgánica de Calidad de la Educación (LOCE). Ley 10/2002, de 23 de


diciembre. Madrid: Jefatura del Estado, BOE, 2002.

______. Ley Orgánica de Educación (LOE). Ley 2/2006, de 3 de mayo. Madrid: Jefatura del
Estado, BOE, 106 de 4/5/2006. 2006a.

______.Real Decreto 1631/2006, de 29 de diciembre, por el que se establecen las enseñanzas


mínimas correspondientes a la Educación Secundaria Obligatoria. Madrid: Jefatura del
Estado, 2006b.

______.Real Decreto 1513/2006, de 7 de diciembre, por el que se establecen las enseñanzas


mínimas de la Educación primaria. Madrid: Jefatura del Estado, 2006c.

______. Real Decreto RD 1630/2006, de 29 de diciembre, por el que se establecen las


enseñanzas mínimas del segundo ciclo de Educación Infantil. Madrid: Jefatura del Estado,
2006d.

FROEBEL, Frederich. L´Educació de l´home i el jardí d´infants. Barcelona: Vic, 1989

GENTILE, Paola; BENCINI, Roberta. Construindo competências: Entrevista com Philippe


Perrenoud. In Nova Escola. Brasil , 2000, p. 19-31.

GOODKIN, Doug. Play, sing & dance: an introduction to Orff Schulwerk. Miami, US: Schott
Music Corporation, 2002.

HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. O Jogo como elemento da cultura. São Paulo:
Perspectiva/editora da USP, 1971.

164
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

LÓPEZ-IBOR, Sofía. Playing the Old Games. The Orff Echo Volume XL, Number 1 (Fall):
9-10, 2007.

LOURO, Viviane dos Santos. Educação musical e deficiência: propostas pedagógicas. Sao
José dos Campos, SP: Ed. do Autor, 2006.

NAVACERRADA, Ricardo. 2007. Jeux d´enfants: una visión detallada del juego tradicional
en el Renacimiento europeo. Buenos Aires: www. efdeportes.com/ Revista Digital.

RAMOS, José Ricardo da Silva. Dinâmicas, brincadeiras e jogos educativos. Rio de Janeiro:
DP&A, 2008.

VIGOTSKY, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In El Desarrollo de los
procesos Psicológicos Superiores. Barcelona: Ed. Crítica, 2001

WILLEMS, Edgar. El valor humano de la educación musical. Barcelona: Paidos ibérica,


2002.

ZARAGOZÁ, Josep Lluís. Didáctica de la música en la educación secundaria. Competencias


docentes y aprendizaje. Barcelona: Graó, 2009.

165
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Educação Musical e o Universo Radiofônico Infantil

Melissa Lima
UFBA
melissablima@gmail.com

Mara Pinheiro Menezes


UFBA
Mara.kroger@gmail.com

Resumo: O presente relato tem como foco agregar a educação musical infantil e o universo
radiofônico na comunicação, expressão e desenvolvimento humano. A meta do projeto
Educação Musical e Rádio Infantil, projeto de estágio da graduanda Melissa Lima,
supervisionado por Mara Menezes e dado início em março do ano de 2011, é auxiliar e
incentivar o aluno a pesquisar, criar e produzir dois programas radiofônicos infantis, os quais
serão veiculados na Rádio Educadora FM, 107.5, através do Programa Rádio Legal. A Rádio
Legal é um projeto de 54 programas radiofônicos infantis, inscrito para o Edital do IRDEB e
aprovado em 2008. A data prevista para início da veiculação dos programas é agosto de 2011.
O objeto do projeto de estágio Educação Musical e Rádio Infantil é um grupo de oito alunos,
que se encontram semanalmente no espaço de educação musical “A Casa da Música”
participando de vivências, produções e discussões tanto especificamente musicais quanto de
um contexto artístico integrado. Algumas produções são capturadas, selecionadas e
arquivadas, para ao fim do projeto, fazerem parte da edição do programa radiofônico. Dentre
os resultados parciais do projeto podemos citar, além do desenvolvimento musical, as
respostas de cunho humano, que são claramente percebidas a cada encontro, desde auto-
reflexões, desinibições e aumento da liberdade e força de expressão musical, como a sutileza
com que os sons e produções musicais são geradas e observadas por seus geradores. Nas
atividades de captura do áudio das produções musicais e no registro da imagem de momentos
singulares de socialização em sala de aula, os alunos demonstraram ser capazes de fazer gerar
autoanálises e autodisciplina, percebendo a importância, por exemplo, do som e silêncio (do
saber ouvir e expressar-se em momentos distintos).
Palavras chave: Educação musical, rádio infantil, estágio supervisionado, desenvolvimento
musical e humano

A Educação Musical, o Rádio e o Desenvolvimento do Ser Humano

O fazer musical é um fenômeno universal, pois está presente em todos os tempos e


grupos sociais (PENNA, 2010, p.22). Porém, cada cultura percebe a música como uma
linguagem distinta, e por que não dizer, uma linguagem cultural. A música comunica,
expressa e ainda estabelece-se como identidade cultural para a sociedade que a produz e
reproduz. Nota-se atualmente, que muitas culturas já tratam a estética musical como algo
naturalmente enraizado e ligeiramente rígido desde a escuta musical na infância. A criança
como ser, ainda no início da formação das suas capacidades cognitivas e intelectuais, deveria
ser incentivada a manter-se aberta a construções próprias acerca do fazer e do apreciar
166
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

musicalmente. Conforme Gurdjieff (2011), a música, acima de tudo, deve servir para conduzir
a humanidade a um despertar.

Muito do que ouvimos, contudo, é música "subjetiva". Não apenas ela flui
do estado subjetivo do compositor, mas ela afeta cada ouvinte de acordo com
o estado subjetivo no qual, por acaso, ele se encontra. Infinitamente mais
rara é a música "objetiva", que requer um conhecimento objetivo da natureza
humana, mais especificamente, da função e propriedades do sentimento e de
como o sentimento é afetado pela "qualidade" específica de cada vibração. A
música objetiva afeta todas as pessoas da mesma maneira. Ela não só toca os
sentimentos como os transforma, trazendo o ouvinte a um estado unificado
ou "harmonioso" dentro de si mesmo e, dessa maneira, a uma nova relação
com o Universo que é em si um campo de vibrações. (INSTITUTO
GURDJIEFF BRASIL, 2011).

De acordo com Schafer, “O rádio é uma voz invisível, e como é uma voz invisível,
tem poder e tem influência que pode ser amigável ou aterrorizante...” (1998, p.83). Esse
pensamento nos permite mergulhar em um mar de possibilidades educativas que permeia o
universo radiofônico. É preciso, de antemão, conceber a importância do compromisso com o
conteúdo e o formato das informações que serão passadas através do rádio como um veículo
de comunicação em massa e ater-se à qualidade. O rádio propõe ao ouvinte desenvolver um
ambiente de construção de pensamentos críticos, educacionais, culturais, sociais e humanos,
porém é notório que não é normalmente usado com esse intuito. Sabendo-se desse potencial,
vale ressaltar um pensamento defendido por Schafer:

O rádio poderia ser um instrumento educacional muito mais forte do que é..
A televisão é fria, o rádio é quente... quer dizer, o rádio tem mais impacto
imediato que a televisão. A televisão é mais textura e cor, mas não tão forte e
imediata como uma voz súbita no rádio pode ser. (SCHAFER, 1998, p.87).

O universo radiofônico estimula na criança seu potencial natural: o poder criativo no uso do
imaginário. Apesar de estimulada diretamente por apenas um canal de aprendizagem, o auditivo, a
criança inconscientemente aciona outros meios que poderão ajudá-la a formular um entendimento
mais elaborado ou satisfatório. A relação entre essa percepção auditiva e o imaginário estabelece-se
através de visualizações cênicas, remetendo-se a cores, cheiros, texturas e lembranças. Com isso, é
notória a importância qualitativa com a resposta que a paisagem sonora radiofônica passará para o
ouvinte infantil. Se observarmos pontos de interesse para o público adulto, principalmente pedagogos,
pais, dentre outros interessados, podemos constatar duas principais atuações advindas do universo
radiofônico. Uma, é aquela em que o adulto ouvinte consegue agregar novas técnicas didáticas
intrinsecamente sugeridas ao longo do programa. A outra é a resultante das diversas abordagens

167
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

culturais e musicais, agregando valores sociais e educacionais, satisfazendo pedagogicamente tanto ao


adulto ouvinte quanto à demanda infantil a qual ele julga necessária.

O Projeto “Rádio Legal” e a Prática de Ensino

Diante da meta final do projeto de Rádio e Educação Musical, que é a produção de


dois programas radiofônicos infantis, será disponibilizado espaço para veiculação dos
programas na Rádio Educadora FM, 107.5, inseridos no Programa Radiofônico Infantil:
Rádio Legal. Em suprimento da aprovação do edital do IRDEB (2008) de Programa
Radiofônico Infantil, o projeto Rádio Legal é encarregado de criar o tema, conteúdo, roteiro e
gravação de 54 programas radiofônicos voltado para o público de 5 a 10 anos. Esses
programas já estão sendo gravados e editados desde o começo de 2011. Cada programa
precisa ter 30 minutos de edição e será veiculado aos sábados às 9 horas da manhã (horário
que poderá sofrer alterações segundo a programação interna da Educadora FM) na Rádio
Educadora FM, 107.5. A estrutura do programa integra blocos fixos com músicas, sempre
respeitando e dialogando com o tema proposto no dia. Como exemplo de estrutura, temos:
1. Vinheta (vinheta de entrada da Rádio Legal gravada);
2. “Apresentação” (vinheta específica do bloco e apresentação do tema);
3. “Vamos Ouvir Música!” (vinheta específica do bloco e músicas relacionadas
ao tema);
4. “Curiosidades” (vinheta específica do bloco e curiosidades ou entrevista com
participação das crianças);
5. Músicas;
6. “Contação de Histórias” (vinheta específica do bloco e contação de história
literária relacionada ao tema com participação das crianças);
7. Músicas;
8. “Trava-língua” (vinheta específica do bloco e trava-línguas gravados por
crianças);
9. “Paisagem Sonora” (vinheta específica do bloco e instantes de sonoridades
capturadas em ambientes diversificados, lançando a pergunta: “Que paisagem
sonora é essa?”);

168
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

10. “Brincadeiras” (vinheta específica do bloco e brincadeiras de crianças,


gravadas por elas);
11. “Fazendo Som!” (vinheta específica do bloco e improvisações de sons e
músicas gravadas pelas crianças);
12. “Poesias” (vinheta específica do bloco e recital de poesias compostas e
gravadas pelas crianças);
13. Músicas;
14. “Agenda Cultural” (vinheta específica do bloco e divulgação cultural sem
datas, apresentando lugares e movimentos culturais fixos pela cidade);
15. (Gravações engraçadas – “erros de gravação de blocos e comentários, risadas,
fechando uma sessão bem descontraída e engraçada”);
16. Créditos.
O programa é pensado, construído respeitando o formato do roteiro e o tema escolhido
para o mesmo, gravado e editado. Somente depois disso é enviado para a Rádio Educadora
para futura veiculação. Os programas são elaborados por adultos (em sua maior parte) e
crianças. As gravações contam com crianças de escolas públicas e privadas de toda Salvador.
Profissionais de cada área de tema abordado são convidados especialmente para a sessão de
entrevista, onde as crianças fazem as perguntas.
Ao iniciar a veiculação do primeiro programa será lançada a proposta de parceria com
a diretoria e o grêmio acadêmico das escolas regulares de Salvador, disponibilizando parte do
programa para divulgação de feiras e projetos culturais e de ciência (ocorridos nas escolas),
onde crianças envolvidas nos mesmo trarão conclusões experimentais, informações. Assim,
estará sendo permeada a inter-relação dos conteúdos e disciplinas escolares no
desenvolvimento do tema de cada programa.
A partir de todas essas informações anteriormente citadas, é válido pontuar que os
programas gerados como produto do projeto Rádio e Educação Musical aderem ao formato
estipulado pelo programa infantil Rádio Legal. Julga-se, a partir disso, que estará sendo
estimulado o comprometimento das crianças, enquanto produtores de programas radiofônicos
profissionais, em manter essa formatação. O resultado humano é o desenvolvimento da
responsabilidade.
O projeto Educação Musical e Rádio, atual prática de ensino da graduanda Melissa
Lima, orientada por Mara Menezes, busca agregar momentos de produção musical e de
experimentos especificamente pedagógicomusicais, como jogos e atividades musicais e de

169
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

elementos do som por exemplo, com o universo radiofônico. Essa tarefa nem sempre é fácil,
pois há a demanda humana (individual e social) e dos prazos a serem cumpridos.
Percebe-se assim, necessidade de avaliação do quão necessário e importante é o
processo dos encontros das aulas e suas produções. Com a escolha do tema do programa já
brota um arsenal de possibilidades de músicas, brincadeiras, travalínguas, parlendas, histórias,
questionamentos para a entrevista, dentre outros elementos. Os alunos trabalham a apreciação
musical através da seleção das músicas a fazerem parte do programa. Ampliam seu repertório
musical e sonoro, além de conhecerem e se apropriarem de novos significados e
experimentações musicais e lúdicas.

O Rádio Como Ambiente do Pensar, Fazer e Comunicar Musical e


Sonoramente

O processo de elaboração de um programa de rádio tendo como fator a educação


musical mostra-se efetivo em suas metas educacionais e humanas. Uma das mais prazerosas
observações é a avaliação que surge a cada encontro. Durante esses momentos em sala ou
estúdio, são notórias as transformações de comportamento. A proposta é claramente quebrar
os condicionamentos de conduta. O aluno com baixa autoestima é estimulado delicadamente e
didaticamente para posicionar-se, encontrar-se no grupo e expressar-se verbalmente e
musicalmente. Sente-se valorizado e importante ao ouvir suas colocações e produções
gravadas. O mesmo acontece com o aluno muito agitado e com dificuldade de concentração.
Ele precisa (mesmo que não seja a prioridade para ele no momento) ouvir, esperar, silenciar
para conseguir atingir sua meta: ouvir-se nas gravações. Sutilmente são trabalhados fatores
terapêuticos.
A “Natureza” foi o primeiro tema escolhido pelas crianças. Esse tema foi discutido,
pesquisado e desenvolvido pelos alunos dentro e fora da sala de aula através de interessantes
experiências de diálogos e vivências sonoras. Curiosidades foram aparecendo ao longo das
aulas (o que continua até o momento presente) e dando asas a confecções de poesias,
sonorizações e ensaios de diálogos. Muitos momentos desse processo foram registrados. As
crianças puderam mergulhar no universo radiofônico com a intenção de repassar o que
aprenderam e descobriram sozinhas ou coletivamente, através das trocas de informações com
o grupo.
Perante a vastidão de oportunidades que o universo radiofônico pode sugerir, há a
conexão entre os temas abordados na rádio e o desenvolvimento do seu conteúdo e a

170
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

interdisciplinaridade das escolas regulares. Aproveitando as feiras de ciências e feiras


culturais das escolas, alunos, diretores e professores poderão ser convidados a participar de
entrevistas elaboradas e conduzidas pelos alunos e em concordância com o tema. Assim, tanto
estará sendo trazido para dentro do contexto radiofônico a abordagem escolar, quanto o
contrário. Percebe-se a importância para a formação do pequeno aprendiz como ser pensante e
mobilizador de ideias e divulgador de conceitos.

A Educação Musical Antroposófica


Se trouxermos o olhar para a importância da criação e da expressão artística das
crianças, constatamos que uma educação musical antroposófica as deixa mais livres para
experimentar, pois há, prioritariamente, o cuidado com o conteúdo humano. O pesquisador,
educador, músico e biólogo Marcelo Petraglia afirma que:

Quando pensamos agora em uma real formação do indivíduo, queremos


acima de tudo desenvolver suas potencialidades. Torná-lo apto a, no futuro,
aprender tudo que quiser e precisar, ter à disposição infinitas formas de
pensar, sensibilidade para perceber sua relação com os outros e o mundo e
vontade de agir e transformar seu meio ambiente. Isto significa que a criança
em fase escolar deveria ter a possibilidade de desenvolver as potencialidades
de sua alma, sem contudo dar a seus processos uma forma cristalizada e
definitiva. (...) nesse sentido, as artes e em especial a música são uma
ferramenta poderosa e indispensável (PETRAGLIA, 2011).

Uma educação musical com olhar antroposófico visa otimizar a relação do ser humano
com seu desenvolvimento holístico e com a natureza, através da linguagem musical. Há então
o despertar de novos conceitos e pontos de vista, onde a música é uma pura forma de
expressão e autoconhecimento. Nessa busca devem-se quebrar os parâmetros convencionais
do fazer musical, assim como a estética musical (pré) existente. Isso se amplia para a forma
como os instrumentos devem ser tocados, possibilitando criativamente a curiosidade e
nascimento de novas formas de experimentar e conduzir sonoridades de instrumentos
convencionais e não convencionais.
Apesar da proliferação de novos métodos, teorias e abordagens para o ensino de
música, ainda vemos prevalecer o ensino tradicional focado na leitura e escrita musicais.
Percebemos que há um universo equivocado onde, para uma boa educação musical, o aluno
deve, indispensavelmente, dominar a escrita e leitura da partitura formal. Devemos
reconhecer outras necessidades implícitas que há por trás desta formalidade da escrita

171
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

musical. A expressão musical no aspecto criativo nos permite ir além. Olhar as necessidade e
buscar supri-las também com criatividade.
Dentre muitas alternativas, a simbologia musical se constitui como uma rica
possibilidade pedagógico musical. Elementos, desenhos, cores, gráficos, texturas, paisagens
sonoras, entre tantos outros, podem ser considerados argumentos de comunicação musical. O
aluno, enquanto pequeno compositor, elaborando suas próprias peças sonoras e/ou musicais,
pode ser encorajado a registrá-las. Mas como, se o mesmo ainda não lê “as bolinhas pretas”?
Seria o objetivo final da educação musical a leitura e escrita da notação tradicional?
Músicas, sons e sonoridades, num sentido mais amplo da palavra, podem ser
transcritas para o papel, sem que haja pentagrama, notas ou figuras de tempo conhecidas ou
reconhecidas por músicos acadêmicos. Surge então a importância de, criativamente, achar ou
adequar elementos que mais auxiliem o pequeno músico a registrar seus sons e músicas
produzidos. Que textura tem esse instrumento? É forte ou piano? Qual movimento sonoro ele
produz? E quanto à dinâmica? Onde há o silêncio? Quando o som retorna? E através, de
perguntas como essas, podemos fazer com que a criança mergulhe em um mar de
possibilidades descritivas do som por ela produzido.
Vale salientar que um dos blocos radiofônicos é a Paisagem Sonora, onde o fator
pedagógico musical permeia na escuta do ambiente sonoro. A criança ouvinte se remete a
uma viagem de espaço, tempo e memórias ao lidar com o poder da imaginação auditiva.

A Música Enquanto Fator de Desenvolvimento Holístico do Ser

Se ampliarmos nosso olhar, percebemos que há um diálogo regido entre a música e o


ser humano. Esse diálogo promove alterações de estados do campo emocional, físico e mental
do indivíduo, enfatizando a importância da relação entre a música, a natureza e o homem.
Holisticamente, os diferentes timbres são capazes de produzir reações e conexões com
aspectos humanos peculiares e que estão associados à melodia, ritmo e harmonia e aos
elementos da natureza. O som, antes mesmo de ser formatado por nosso cérebro como tal, é
vibração sonora. De acordo com Petraglia “o fenômeno externo e presente em toda a natureza
é vibração. Quando somos tocados por ela temos uma sensação e, se conseguimos extrair do
fenômeno um sentimento artístico, estamos diante de um fato musical.” (2010, p.186). Assim,
a vibração sonora além de captada por nosso ouvido interno é percebida por todo nosso corpo.
Ela é capaz de produzir ressonâncias com nossa estrutura física e nosso campo energético.
Sobre a percepção humana para os fatores sonoros e musicais Petraglia defende que:

172
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Esta percepção que se dirige ao eterno observador dentro de nós é recebida


em diversos níveis, desde uma suave sensação de movimento, a evocação
dos mais variados sentimentos até o reconhecimento de um significado que
revela a essência do fenômeno percebido. Devemos reconhecer também que
a impressão recebida do mundo externo é altamente modulada por nossos
próprios processos e memórias subjetivas (PETRAGLIA, 2010).

Estudos de sonocitologia tem mostrado que as células sadias do corpo humano


mantém vibrações. Essas, quando colocadas em escala audível formam um padrão constante
de som. Sabe-se ainda que uma célula cancerígena, por exemplo, expressa um “ruído”, pois
não estabelece um padrão de vibração, por ter sido “quebrado”. Hoje, a Massagem Sonora
tenta (re)organizar esse padrão vibratório através de estímulos de vibrações sonoras no
paciente. Geralmente são utilizados instrumentos de vibração sonora direta (Mesa-lira ou
Monochord Table ou ainda os Bowls Tibetanos) onde instrumentos são colocados sobre ou
sob o corpo humano e instrumentos de vibração sonora indireta (Flautas, Tambores,
chocalhos, Carrilhão de Tubos metálicos, Didgeridoo, entre outros), havendo o cuidado com a
frequência de cada instrumento usado. Cada paciente recebe vibratoriamente e sonoramente
sua composição.
A música nos permite sensações subjetivas incríveis. Podemos acessar memórias
sonoras, podemos promover a sensação hedônica da curiosidade, do prazer ou ainda da
tristeza. Com a música podemos acender ou apagar o interesse e com isso ganhar ou perder
chances de promoção do bem-estar ou de ensinamentos sociais e humanos. Podemos ainda
auxiliar para autorreflexões do ouvinte. Gurdjieff, quando amplia o pensamento sobre a
vibração acústica, a música e a relação de ambas com o ser humano ressalta que:

Quando se toca uma determinada nota num instrumento, outro instrumento


próximo ressoa a mesma nota. É uma lei. Quando uma melodia toca a
música do universo, o universo ressoa, da mesma forma. Quando uma
melodia toca a música do universo e o universo ressoa, nosso universo
interior também ressoa, matematicamente na mesma medida (Instituto
Gurdjieff Brasil, 2011).

Diante disso, percebemos que a troca musical se dá em um contexto mais amplo, o que
implica uma maior responsabilidade para os agentes envolvidos nos processos da produção
radiofônica, tanto para quem cria e veicula o programa, quanto para quem recebe essa
produção, ou seja, o ouvinte.

Conclusão

173
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Os resultados preliminares da nossa Prática de Ensino indicam que a metodologia


utilizada tem se mostrado eficaz à medida que proporciona ao aluno a oportunidade de criar e
manipular ideias musicais criativamente dentro do contexto radiofônico. Tem sido percebida a
expansão da expressão musical, corporal, oral, poética e social de cada criança durante os
momentos da prática pedagógica. Em autoavaliações os alunos trouxeram entusiasmo e
emoção ao perceberem-se indo além em suas colocações e atuações individuais e coletivas.
Faz-se notório o universo radiofônico como contexto de atuação de amplo conceito
pedagógicomusical, assim como meio de exercícios e reflexões para melhor desenvolver os
potenciais do ser humano.

174
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BROOK, Peter. Encontro com homens notáveis. Disponível em:


<http://www.google.com.br/#hl=ptBR&tbm=vid&sa=X&ei=o2oHTtW2JeXr0gHHzvy5Cw&
ved=0CC8QBSgA&q=GURDJIEFF+encontro+com+homens+not%C3%A1veis&spell=1&ba
v=on.2,or.r_gc.r_pw.&fp=18758fcdb4704135&biw=1280&bih=709 > Acesso em: 18 jun.
2011.

DEWHURST-MADDOCK, Olivea. A cura pelo som. Trad. Andréa Medeiros. São Paulo:
Madras, 1999.

GURDJIEFF, George; HARTMAN, Thomas De. Instituto Gurdjieff Brasil. Disponível em: <
http://www.gurdjieff.org.br/musica.htm >. Acesso em: 18 jun. 2011.

PENNA, Maura. Música(s) e Seu Ensino. Porto Alegre: Sulina, 2010.

PETRAGLIA, Marcelo S. Estudos sobre a ação de vibrações acústicas e música em


organismos vegetais. Botucatu: UNESP, 2008.

PETRAGLIA, Marcelo S. O fenômeno sonoro como revelação da vida. Boletim da Sociedade


Antroposófica no Brasil, n. 60, 2010.

PETRAGLIA, Marcelo. Educação Musical. OuvirAtivo, 2011. Disponível em:


<http://www.ouvirativo.com.br/?page_id=25>. Acesso em: 18 jun. 2011.

PETRAGLIA, Marcelo. O processo da audição, o meio ambiente e a música. OuvirAtivo,


2011. Disponível em: < http://www.ouvirativo.com.br/?p=728>. Acesso em: 18 jun. 2011.

QUEIROZ, Luis Ricardo Silva. A música como fenômeno sociocultural. In: QUEIROZ, Luis
Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho (Org.). Contexturas. O ensino das artes em
diferentes espaços. João Pessoa: Universitária/UFPB, 2005.

RIBEIRO, Sônia Tereza da Silva. A rádio como espaço para a prática docente em música. In:
MATERIRO, Teresa; SOUZA, Jussamara (Org.). Práticas de ensinar música. Uberlândia:
Sulina, 2008.

SCARASSATI, Marco. Walter Smetak: o alquimista dos sons. São Paulo: Perspectiva, 2008.

SCHAFER, Murray. A Afinação do Mundo. São Paulo: UNESP, 1977.

SCHAFER, Murray. Paisagens Sonoras – Murray Schafer fala do projeto e do rádio como
arte, educação e política. Revista Pesquisa e Música: Conservatório Brasileiro de Música, Rio
de Janeiro, v. 4, n. 1, p. 79 – 88, 1998.

SCHAFER, Murray. O ouvido pensante. Tradução Brasileira (FEU). São Paulo: UNESP,
1992.

SMETAK, Walter. Em potencial, sem realidade porém.... Salvador, 1983.


175
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Disponível em: <http://old.gilbertogil.com.br/smetak/taktx_0.htm>. Acesso em: 18 jun. 2011.

SOKOLOWSKI, Robert. Introdução à fenomenologia. Tradução: Alfredo de Oliveira


Moraes. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina


Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

WISNIK, José Miguel. O som e o sentido. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

176
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Musicalização Infantil na Escola Pública: um relato de experiência

Roseane Ramos Mota


UFBA
roseaneramos86@hotmail.com

Resumo: Este artigo trata de um relatório de estágio que aconteceu na Escola Municipal de
Paripe, em Salvador - BA no ano de 2010. O trabalho foi desenvolvido com crianças entre 5 e
6 anos de idade, de classe econômica e social menos favorecida. O objetivo geral do trabalho
foi promover uma vivência musical com estas crianças, onde se utilizou diversos
instrumentos, músicas de várias etnias, contextos culturais, estilos e épocas. Foram
desenvolvidas atividades práticas envolvendo conceitos de música e vivenciados de forma
lúdica e intuitiva.
Palavras chave: Musicalização infantil, escola pública, bairro de Paripe

Introdução

O presente artigo relata uma experiência com musicalização infantil vivenciado na


Escola Municipal de Paripe, localizada no subúrbio ferroviário de Salvador- BA. Tratou-se de
um estágio supervisionado com carga horária de 68h de aulas teóricas com o professor
orientador e 68h de aulas práticas. Este teve início em março de 2010 e finalizado em
dezembro do mesmo ano.
O objeto do estágio foi a abordagem da educação musical na escola pública –
musicalização para crianças entre 5 e 6 anos de idade. O relatório de estágio, assim como este
artigo, procurou trazer as reflexões realizadas durante o processo de musicalização das
crianças e os resultados alcançados nessa prática de ensino, além de ser uma forma de
observar e estruturar uma metodologia adaptada à realidade dessas crianças e ao contexto no
qual ocorreu o estágio.

A Escola Municipal de Paripe

A Escola Municipal de Paripe, localizada no subúrbio ferroviário de Salvador é uma


instituição de médio porte que atende a comunidade durante os turnos matutino, vespertino e
noturno. Nessa escola é oferecida a educação básica que se inicia do pré-escolar (Grupo 5) e
vai até o 5º ano do ensino fundamental I no período diurno. Durante o período noturno é
oferecida uma educação voltada para jovens e adultos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental.

177
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Turma

A turma era composta por 21 crianças entre 5 e 6 anos que cursavam o pré-escolar, ou
seja, o primeiro nível que a escola oferece, atualmente chamado de Grupo 5.
As crianças durante o período do estágio sempre se mostraram participativas e
entusiasmadas em realizar as atividades, algumas mais animadas do que outras, porém todas
queriam desfrutar daquele momento que não era comum nos outros dias de aula da semana.

Metodologia

As aulas foram realizadas na escola Municipal de Paripe, na sala de aula das crianças
do Pré-escolar, Grupo 5. Aconteceram às quartas-feiras e esporadicamente às segundas-feiras
com duração de 1h, iniciando às 13h 30 min.
As atividades propostas foram baseadas nos métodos Willems, Dalcroze, Kodály e
Martenot com influências de teóricos como Swanwick, Schafer e do educador Paulo Freire.

Estrutura das aulas

As aulas seguiam uma estrutura que variava de acordo às necessidades da turma e das
atividades desenvolvidas em cada aula. Adaptou-se esta estrutura com base em estudos de
Broock (2009), e criou-se uma forma que organizasse melhor as aulas, principalmente porque
os alunos desta faixa etária necessitam de organização e rotina, isto segundo algumas
educadoras musicais (BEYER, 2000; JOLY, 2003; FERES, 1998 apud BROOCK, 2009,
p.44), que consideram a rotina como algo importante na educação das crianças. Acredita-se
que essa importância possibilita sentimentos de estabilidade, segurança e facilidade de
organização espaço-temporal.
A sequência de atividades das aulas eram as seguintes:
1) Acolhida- Novidades: Todos se sentavam no chão em forma de roda. Cada criança
contava uma novidade. Exemplo: Como foi o final de semana, se viajou, fez algo que gosta
muito, etc;
Este momento era proposto para que a criança se sentisse recepcionada e pudesse
compartilhar com os demais uma novidade.
2) Canção de boas-vindas: Cantava-se a música do “Boa Tarde” no qual o nome de
cada criança era pronunciado;

178
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Neste momento além da canção de boas-vindas marcar o início da aula, era também
para as crianças se sentirem presentes e importantes por estarem ali.
3) Atividade de locomoção ou expressão corporal (roda, dança, brincadeira):
Cantava-se ou ouvia-se uma música que sugeria movimentos;
Este também era um momento de integração no qual as crianças, de acordo com
Willems, são estimuladas a alongar o corpo, colocando-as prontas para cantarem, tocarem e
criarem juntas. Dalcroze também traz o movimento corporal como importante para o trabalho
da motricidade, socialização, memória, concentração, ouvido interior, criatividade.
(FONTERRADA, 2008)
4) Atividade de pulsação: Cantava-se ou ouvia-se uma música que era acompanhada
por um instrumento de percussão ou pelo corpo;
Este momento tinha como objetivo trabalhar e desenvolver o sentido de pulsação e
também a apreciação musical propiciando o desenvolvimento auditivo.
5) Execução musical: Tocava-se um instrumento de percussão onde era feita a
execução de uma canção ou leitura de gráfico sonoro, etc;
Neste momento era trabalhado o desenvolvimento auditivo como também a execução
musical. Willems sugere que em uma aula de música deve conter atividades que possam
trabalhar a escuta musical de diversas maneiras. Swanwick traz a execução como um dos
aspectos musicais que devem ser trabalhadas em sala de aula, assim como a técnica,
composição, literatura e apreciação musical. (FONTERRADA, 2008)
6) (Re)Conhecimento de um instrumento da orquestra ou algum outro: A cada
aula apresentava-se um instrumento e apreciava-se o seu som;
Neste momento as crianças tinham contato direto ou indireto (através de imagens e
áudio) com instrumentos diversos, (re)conhecendo o seu som e explorando diferentes
maneiras de fazê-lo soar, sendo este um instrumento que todos pudessem experimentar.
7) Relaxamento: Todos deitavam no chão e apreciavam uma música. A professora
passava para fazer um carinho (cafuné) em cada criança;
Neste momento a professora sugeria que as crianças pensassem nas atividades que
fizeram, o que aprenderam e mais gostaram. Também “sussurrava” para cada criança o seu
aproveitamento na aula.
8) Auto-avaliação: Relembrar atividades realizadas na aula para que cada criança
relatasse aquela em que gostou de fazer.

179
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Este momento marcava o final da aula no qual as crianças faziam críticas e citavam
atividades que mais gostaram de realizar durante o encontro. É necessário salientar que essa
estrutura de aula era apenas uma sugestão a seguir, sendo que se podia suprimir ou
acrescentar momentos no decorrer da aula, dependendo do interesse da turma e da
flexibilidade do professor.

Materiais Didáticos

Nas aulas de musicalização infantil com as crianças do pré-escolar foram usados em


sua grande maioria instrumentos de percussão como pandeiros de tamanhos menores,
confeccionados especialmente para o trabalho com crianças, caxixis, ovinhos de percussão,
agogô, xequerê, maraca, tamborzinho, cabuletê, pau-de-chuva, clava, além de metalofone,
xilofone, teclado, flauta doce, dentre outros.
É necessário salientar que a professora estagiária dispõe dos instrumentos de
percussão que foram utilizados nas aulas, principalmente os pandeiros e caxixis que tem em
maior quantidade, em que todas as crianças podiam tocar o mesmo instrumento numa
determinada atividade. Dispõe também de instrumentos que foram supracitados.
A instituição de ensino dispõe de diversos instrumentos que também foram utilizados
nas aulas, como o teclado, o metalofone, o atabaque, as clavas. Esses instrumentos foram
adquiridos através de uma solicitação realizada pelo professor de música dessa instituição do
período noturno.
Havendo necessidade, a professora estagiária utilizava além dos instrumentos musicais
outros materiais alternativos como fitas, lencinhos de cores diversas, bonecos de pelúcia,
gravuras, gráficos sonoros e jogos musicais. Além desses materiais utilizou-se o aparelho de
som e CDs.

Repertório

Nas aulas de musicalização o repertório abrangeu músicas de várias etnias, contextos


culturais, estilos e épocas, como abarca também o Referencial Curricular Nacional para
Educação Infantil (RCNEI, 1998), considerando a flexibilidade do professor à inserção destas
nas aulas e os objetivos específicos em relação aos conteúdos musicais a serem trabalhados.
O RCNEI (1998, p. 64), também sugere que sejam trabalhados nas aulas de
musicalização abrangendo crianças de quatro a seis anos: o “reconhecimento de elementos
musicais básicos: frases, partes, elementos que se repetem etc. (a forma) e informações sobre
180
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

as obras ouvidas e sobre seus compositores para iniciar seus conhecimentos sobre a produção
musical”.
“O trabalho com a apreciação musical deverá apresentar obras que despertem o desejo
de ouvir e interagir, pois para essas crianças ouvir é, também, movimentar-se, já que as
crianças percebem e expressam-se globalmente” (RCNEI, 1998, p. 64).

Conceitos

Nas aulas as crianças vivenciaram os conceitos musicais de forma lúdica e intuitiva.


Eram trabalhados elementos como o som e suas propriedades, andamento, silêncio, forma
musical, escala diatônica, pulsação, improviso, instrumentos diversos, dentre outras
habilidades como socialização, respeito, psicomotricidade e regras.

Avaliação da Turma

A avaliação feita durante o processo de musicalização se deu de forma processual, no


qual se avaliou o desenvolvimento musical de cada criança, o seu desenvolvimento social,
afetivo e motor. Também avaliou-se a participação das mesmas em aula, na realização das
atividades e a assiduidade.
Geralmente, quando se pensa em avaliação logo se associa a aplicação de testes,
provas e a atribuição de notas, no entanto, de acordo com Sant’ana (1995, p. 17)

Para avaliar podemos usar instrumentos que testem e/ou meçam, mas é
muito mais do que atribuir um número, quantificar, pesar, qualificar e
atribuir um valor quantitativo e/ou qualitativo; é, acima de tudo, confirmar a
validade de um empreendimento. É constatar se a estratégia escolhida, na
busca de algo, funcionou, era a mais adequada à situação e compensou, isto
é, satisfez nossas expectativas.

Partindo destas considerações podemos dizer que o educador é levado a pensar e


refletir em diferentes pontos de avaliar o desenvolvimento e progresso de um aluno.
O projeto de musicalização proposto e relatado aqui objetivou promover uma vivência
musical ativa na qual o processo de avaliação não se submeteu a provas e atribuição de uma
nota. Preocupou-se, principalmente em realizar observações constantes considerando as
diferenças e peculiaridades de cada criança, o seu tempo de responder e reagir aos estímulos
pelos quais estavam sendo expostas, possibilitando auxiliá-las em suas necessidades e pontos
a serem superados. De acordo com Hoffmann (1993, p. 43),

181
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O aluno constrói o seu conhecimento na interação com o meio em que vive.


Portanto, depende das condições desse meio, da vivência de objetos e
situações, para ultrapassar determinados estágios de desenvolvimento e ser
capaz de estabelecer relações cada vez mais complexas e abstratas.

Assinala-se que a vivência da linguagem musical requer uma avaliação que vai além
de provas, notas, conceitos, sendo que o trabalho de musicalização é sucessivo e infinito para
o indivíduo. A busca pelo novo nos possibilita criar, recriar, adaptar, alterar, no qual o
desenvolvimento musical e capacidade de criação passam por diferentes etapas de
aprimoramento e amadurecimento, sendo um processo inacabado.
É necessário salientar que todas as aulas foram filmadas e o professor estagiário pode fazer
uma segunda avaliação mediante os vídeos assistidos, podendo observar com mais atenção
episódios que no momento não foram percebidos.
Os critérios utilizados para avaliação foram: Relacionamento com o grupo;
Participação, atenção e concentração nas aulas; Desenvolvimento nas atividades individuais e
em grupo; Desenvolvimento do canto; Percepção e discriminação dos sons; Percepção e
execução rítmica; Leitura, interpretação e execução de gráfico sonoro.

Resultados

As crianças durante o processo de musicalização puderam treinar e desenvolver a


atenção, concentração, memória e principalmente o hábito de parar para ouvir, escutar o
outro, ouvir a si mesmo, ouvir atentamente os sons em geral para, posteriormente reconhecer
e discriminar diferenças e semelhanças de alturas, durações, intensidades e timbres, sendo que
a princípio foi mais trabalhoso obter e manter a atenção e uma concentração proveitosa da
turma.
As crianças desenvolveram também o sentido de pulsação, a percepção rítmica e
melódica através de exercícios de imitação e criação. O desenvolvimento do canto deu-se com
a conscientização das crianças com relação à intensidade com que se empregava na entoação,
o que foi mais trabalhado durante as aulas, pois estas tinham o hábito de cantar da mesma
forma que falavam, geralmente aos gritos. Foi trabalhada também a forma musical, na qual as
crianças vivenciaram a partir da mudança de movimento corporal, tanto enfatizados pela letra
da música quanto por movimentos sincronizados e sugeridos pela professora estagiária ou
pelas próprias crianças.
Com a vivência musical, as crianças puderam desenvolver maior confiança na
realização das atividades avançando para a leitura, interpretação e execução dos gráficos
182
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

sonoros. Foram realizadas atividades de prática instrumental em conjunto, em que pudessem


desenvolver o hábito de ouvir e tocar com o outro, respeitando o seu tempo e o do colega, o
que de fato alcançaram êxito. As crianças conseguiram perceber a necessidade de parar para
ouvir, escutar com atenção e assim lograr nas atividades que envolvem basicamente a
percepçãoauditivo musical.
Todos esses pontos supracitados serviram de base e estratégias eficazes para o trabalho
e desenvolvimento das habilidades musicais durante o processo de alfabetização musical.
Com isso, pode-se notar uma melhor compreensão e desenvoltura da turma na realização das
atividades musicais propostas.

Considerações Finais

Durante o estágio buscou-se promover uma vivência musical ativa com as crianças
participantes do projeto, para estas desenvolverem durante o processo de musicalização tanto
habilidades musicais como também linguísticas, psicomotoras, cognitivas e sócio-afetivas.
Houve também a preocupação em oferecer as crianças um leque de variedades em relação as
suas vivências musicais anteriores, considerando que todos nós estamos expostos ao que é
mostrado, oferecido ou imposto pela mídia, tanto como positivo ou negativo.
Feita uma observação prévia das necessidades da turma e dos alunos individualmente,
foram propostas atividades nas quais as crianças pudessem desenvolver principalmente o
hábito de ouvir, de escutar atentamente.
Durante o processo tornou-se nítido o desenvolvimento das crianças com relação à
escuta consciente. Para este fim foram realizados, além de atividades musicais, momentos em
que cada criança pudesse comentar algo, compartilhar uma canção, ou seja, tanto atividades
musicais que despertassem na criança o interesse em ouvir e escutar atentamente, como
também momentos em que era necessário ouvir o outro, ouvir a si mesmo.
Pode-se concluir que a maioria dos objetivos específicos foi alcançada e as crianças do
Pré-escolar, Grupo 5, iniciaram um processo de vivência musical consciente, a fim de
futuramente se optar por um gosto musical, tornando-se apreciadoras musicais conscientes,
desenvolvendo também o seu lado crítico em relação à música.

183
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BROOCK, Angelita Maria Vander. A Abordagem Pontes na Musicalização para Crianças


entre 0 e 2 anos de idade. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música, UFBA,
Salvador, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. 3 v,: il.

FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De Tramas e Fios: Um ensaio sobre música e


educação. 2.ed. - São Paulo: Editora UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008.

HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à


universidade. Porto Alegre. Editora Mediação, 1993. 20ª Edição revista, 2003

SANT’ANA, Ilza Martins. Por que avaliar? Como avaliar? Critérios e instrumentos.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

184
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

“Poemas para Cantar”: uma proposta para a ampliação do repertório


musical na educação infantil. Relato de experiência a partir do estágio
supervisionado

Maria Teresa de Souza Neves


Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
mariateresaneves@yahoo.com.br

Resumo: O presente texto trata de um relato de experiência sobre um trabalho realizado em


torno de poemas de Vinícius de Moraes, durante a prática do estágio supervisionado, com
uma turma do 2º período do ensino infantil de uma escola municipal da cidade de Montes
Claros, entre maio e junho do ano de 2011. Durante o estágio supervisionado, após a
observação da turma, foi elaborado o projeto “Poemas para Cantar” com o intuito de ampliar
o repertório musical das crianças, incentivando a apreciação musical e o aprender a ouvir,
bem como conhecer algumas obras literárias musicadas. Observou-se ao final do processo um
grande interesse das crianças pelas músicas estudadas e a viabilidade em trabalhar projetos
temáticos em educação musical infantil sobre uma determinada obra musical.
Palavras Chaves: Estágio supervisionado, música na escola, educação musical infantil

Introdução

Na área de educação musical nas últimas décadas, questões relacionadas à


importância da música nas escolas de educação básica, aos desafios que marcam a trajetória e
a prática docente nesse contexto, bem como aos conteúdos e metodologias que devem
alicerçar a atuação do educador musical nessa realidade têm sido amplamente debatidas.
Queiroz e Marinho (2009) afirmam que:

tal fato se deve, sobretudo, ao reconhecimento da necessidade e da


importância de propostas consistentes de educação musical nas escolas.
Propostas que permitam estabelecer, de maneira abrangente, um cenário
musical educativo coerente, consistente e contextualizado com o que se
almeja para a formação plena do indivíduo (QUEIROZ e MARINHO, 2009,
p. 61).

A música na escola pode adquirir um papel relevante se tratada como uma área de
conhecimento que requer estudo, diversidade, prática e reflexão, de forma que esteja inserida
nos planejamentos e no cotidiano escolar de maneira significativa, compondo com as demais
áreas um conjunto de saberes fundamentais para o desenvolvimento sociocognitivo e humano
dos alunos. No dizer de Bellochio e Figueiredo (2009),

185
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Ensinar música na escola envolve a experiência musical de forma direta,


ouvindo, apreciando, cantando, tocando, compondo, improvisando, dentre
outras. Falar sobre música com os alunos é uma atividade que também
envolve conhecimentos musicais, mas não os coloca em contato direto com a
linguagem musical. Ensinar música envolve fazer música, produzir
sonoramente e estar atento a essa produção sonora. Estar atento implica
apreciar e entender o que se está fazendo, buscar alternativas para fazer
melhor (BELLOCHIO e FIGUEIREDO, 2009, p.39-40).

Dentro dessa proposta de apreciação musical, durante o estágio supervisionado na área


de música, foi elaborada uma proposta para ampliar o repertório musical das crianças do 2º
período, de uma escola municipal a partir da realidade observada. ‘’O estágio em licenciatura
(...) constitui o alicerce para a formação de profissionais de todas as categorias e,
principalmente, daquelas que exigem formação acadêmica” (BIANCHI, ALVARENGA,
BIANCHI, 2009, p.5). O Estágio Supervisionado é de grande relevância, pois através dele o
acadêmico estabelece a relação entre a teoria e a prática.
O estágio é onde é concedida a oportunidade de vivenciar tudo aquilo que (não)
aprendemos em sala de aula. É a oportunidade de refletir sobre nossas “escolhas” a partir da
observação de um meio e estabelecer as formas mais adequadas para atingir os objetivos, o
que ensinar e quais as formas de agir no futuro ambiente de trabalho. O estágio deve ser
pensado como uma forma de unir o saber com o fazer. Porém antes da aplicação do saber é
necessário que se faça uma leitura da realidade estudada para saber o que fazer. O “fazer”
deve proporcionar mudanças nesse meio, de formar a atenuar as discrepâncias sociais, de
modo que o educando seja capaz de atuar na sociedade de maneira crítica e transformadora.

Desenvolvimento

O Estágio Supervisionado I (Ensino Infantil)

A escola escolhida para desenvolver o estágio supervisionado foi a Escola Municipal


Professora Maria da Conceição de Almeida Costa CEMEI - Cintra, na cidade de Montes
Claros - MG. Fui recebida pela diretora da escola, e expliquei a ela a proposta do estágio
supervisionado, área de concentração Artes-música, e assim como a professora orientadora do
estágio da universidade sugeriu, foi solicitada a classe das crianças maiores do Ensino
Infantil. A Turma do 2º período (nascidos até 31/03/2006, 5 anos) foi indicada para o
desenvolvimento das atividades de observação e regência.
Iniciei o estágio de observação, no período matutino, acompanhando o trabalho
pedagógico desenvolvido, bem como a rotina das crianças. A turma composta por 17 crianças,
186
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

sendo uma delas portadora de necessidades especiais (cadeirante). Devido a esse motivo além
da professora regente, havia uma professora especialista que acompanhava esse aluno e estava
presente durante a aula. Observei um ambiente escolar de muita afetividade e respeito entre
todos, o que proporcionava às crianças acolhimento e segurança ao se sentirem amadas e
respeitadas.
O trabalho pedagógico desenvolvido pela professora regente, na área de música,
esteve voltado à concepção tradicional, onde a música estava reduzida a forma canção,
servindo sempre como estratégias para obtenção de padrões de comportamento, hábitos e
atitudes, tais como formar fila, iniciar aula, memorizar dias da semana, lanchar (músicas de
comando). Outra prática observada foi a utilização da música dentro do calendário de
festividades: música para o dia das mães.
Em um primeiro momento de regência também quis reduzir minha prática às
festividades. Adentrando ao mês de junho propus trabalhar o baião, escolhi uma música do
gênero e quis mais uma vez reproduzir movimentos estereotipados sem considerar a riqueza
do processo de exploração e expressividade. Porém não obtive sucesso. No dizer de
Nachmanovitch (1993), se não cometermos erros, provavelmente não chegaremos a fazer
nada. Ele afirma que:

os erros e acidentes são grãos de areia que se transformarão em pérolas; eles


nos oferecem oportunidades imprevistas, são em si fontes frescas de
inspiração. Aprendemos a considerar novos obstáculos como ornamentos,
oportunidades a serem aproveitadas e exploradas. (...) Prática é autocorreção
e refinamento, é trabalhar em busca de uma técnica mais clara e mais
confiável. Mas, quando um erro ocorre, podemos encará-lo como uma
informação sem valor sobre nossa técnica ou como um grão de areia a partir
do qual será possível produzir uma pérola” (NACHMANOVITCH ,1993,
p.87-88).

A partir do erro, comecei a questionar: como trabalhar o ensino musical com crianças
pequenas? O que ensinar?
De acordo com a educadora musical Gainza (1988) “O objetivo específico da
educação musical é musicalizar, ou seja, tornar o indivíduo sensível e receptivo ao fenômeno
sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, respostas de índole musical” (p.101). Para Penna
(2008) apud Souza e Joly (2010) musicalizar é:

[...] desenvolver os instrumentos de percepção necessários para que o


indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o material
sonoro/musical como significativo. Pois nada é significativo no vazio, mas
apenas quando relacionado e articulado ao quadro das experiências

187
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

acumuladas, quando compatível com os esquemas de percepção


desenvolvidos. (p. 31).

O ensino de música nas escolas tanto de Educação Infantil, pode contribuir não só para
a formação musical dos alunos, mas principalmente como uma ferramenta eficiente de
transformação social. As educadoras musicais Hentschke e Del Ben (2003) apud Souza e Joly
(2010) destacam que:

é importante que a educação musical escolar, seja ela ministrada pelo


professor unidocente ou pelo professor de artes e/ou música, tenha como
propósito expandir o universo musical do aluno, isto é, proporcionar-lhe a
vivência de manifestações musicais de diversos grupos sociais e culturais e
de diferentes gêneros musicais dentro da nossa própria cultura. (p. 181).

Dentro dessa proposta de expandir o universo musical, proporcionar a ampliação e o


enriquecimento de saberes à produção da área, foi elaborado o projeto “Poemas para Cantar”,
como uma forma de ampliar o repertório musical, através da apreciação musical, e permitir
acesso a práticas lúdicas, visando estimular a criatividade e a expressividade da criança.
O RCNEI refere-se a apreciação musical como a audição e interação com músicas
diversas e propõe escuta de obras musicais de diversos gêneros, estilos, épocas e culturas, da
produção musical brasileira e de outros povos e países, bem como informações sobre as obras
ouvidas e sobre seus compositores para iniciar seus conhecimentos sobre a produção musical.

Projeto “Poemas para Cantar”

Faixa etária: 4-5 anos


Conteúdo: linguagem musical
Introdução: Nessa sequência de atividades, além de ampliar seu repertório musical, as
crianças podem conhecer um pouco mais sobre a canção, uma composição normalmente
curta, que combina música (uma melodia), com poesia (letra), bem como seus compositores.
Objetivos:
- Ampliar o repertório musical das crianças;
- Aprender a ouvir/apreciar músicas diversas;
- Conhecer alguns poemas ou obras literárias musicadas.
Conteúdos específicos:
Escuta musical, repertório musical, poesias e canções.
Desenvolvimento da Atividade:

188
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Fazer um levantamento dos conhecimentos prévios da criança sobre o tema do poema ou


texto.
Ler o poema, texto ou a letra da canção
Ouvir a canção em roda (áudio ou vídeo).
Estimular a criatividade da criança sobre o tema (Dramatizações, desenhos livres,
sonoridades.)
Elaborar Cd com as canções trabalhadas e um livreto contendo as letras das canções e as
atividades (dobraduras, desenhos...) realizados pelas crianças.

Poema 1. O Relógio

Composição: Vinícius de Moraes/ Paulo Soledade


“Sensibilização”
-Fazer o levantamento prévio dos conhecimentos sobre a função do relógio (levar um relógio
grande).
-Levar a criança a perceber a noção de dia e de noite.
-Perguntar às crianças o que elas fazem normalmente nas horas do dia (6hs, 7hs, 8hs, 9hs
etc.). Pedir q elas façam mímica. (Tempo e Ação)
-Incentivar as crianças a imitar o som do relógio (tic-tac).
-Ler o poema enquanto elas fazem tic-tac. Ouvir a canção
- Dramatizar o poema utilizando expressões corporais e sonoridades do texto.
-Estimular a criatividade da criança através de criação de desenhos espontâneos sobre o
poema.

Poema 2: A Casa

Composição: Vinicius de Moraes


“Sensibilização”
-Fazer o levantamento prévio dos conhecimentos sobre “casa” (todas as casas são do mesmo
tamanho? São da mesma cor? De que material é feita?).
-Levar gravuras de casas, réplicas de casas (casa de pedra), casas de animais (João de Barro).
-Refletir sobre a importância da casa (lar), independente do seu tamanho..
- Escutar o audio da música “A Casa”
-Indagar sobre como é a casa apresentada na música
-Entender o significado de cada frase da música.
189
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

-Ler o poema “A Casa” de Vinícius de Moraes.


-Estimular a criatividade da criança através de dobraduras de casas.
- Assistir vídeo da música.

Poema 3. O Pato

Composição: Vinícius de Moraes/Toquinho/Paulo Soledade


“Sensibilização”
-Assistir DVD da música O pato
-Conversar com as crianças: O Pato é igual a gente? O que o pato tem de diferente? Como é a
voz do pato?
-Imitar o Pato
-Estimular a criatividade da criança através de criação de desenhos espontâneos sobre o
poema.

Considerações Finais

De acordo com Bianchi, Alvarenga e Bianchi (2009), ”(...)‘O aluno não pode ser
insensível aos problemas do mundo contemporâneo’ e deve contribuir com todas as suas
forças para dar respaldo e solução, no que lhe compete, à sociedade que atuará” (p.4).
A Escola é uma das organizações da sociedade onde o conhecimento científico
fundamenta o saber humano. Cabe ao professor/acadêmico lançar de todas as disciplinas da
licenciatura para elaborar sua proposta de trabalho de forma a conscientizar o aluno da
importância social do seu papel enquanto educador.
Durante o período em que foram desenvolvidas as aulas com as crianças, pude
constatar que como educadora, as minhas ações devem ser planejadas e estudadas antes de ir à
frente da turma, assim como o processo de reflexão não apenas após o término, mas também
durante a ação. Dessa maneira, valorizar os conhecimentos prévios dos alunos e fazer com
que tivessem a liberdade para apresentá-los tornou-se uma ferramenta valiosa em minha
prática educativa.
A escolha pelas músicas do gênero infantil a partir da obra literária de Vinícius de
Moraes, “A Arca de Noé”, foi feita propositalmente com o intuito de apresentar músicas que
talvez as crianças não teriam acesso se não fosse no meio escolar, ampliando seu repertório e
proporcionando também acesso a práticas lúdicas visando estimular a criatividade e a
expressividade.Ao fim do projeto observei um grande interesse das crianças pelas músicas
190
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

estudadas. Foi confeccionado um livreto com as atividades realizadas por cada uma das
crianças e gravado um cd com as músicas trabalhadas e outras da mesma obra, com a
finalidade de permitir que as crianças continuassem a expandir seu universo musical em casa.
Outra observação significativa na minha prática foi a viabilidade em trabalhar um projeto
temático na educação infantil, através de uma determinada obra literária musical.
Verificar a transformação na minha prática foi algo muito relevante para minha
formação. Como ressalta Moita “Ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca,
experiência, interações sociais, aprendizagens, um sem fim de relações”. (MOITA, 1992, p.
115). Sendo assim, estamos em constante formação se nossa ação estiver sempre
acompanhada da reflexão durante e depois da prática. De acordo com Freire “Ninguém
começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde. Ninguém nasce
educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como
educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática”. (FREIRE, 2000, p. 58).

191
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro; FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. Cai, cai balão…
Entre a formação e as práticas musicais em sala de aula: discutindo algumas questões com
professoras não especialistas em música. Revista Música na Educação Básica. Porto Alegre,
v. 1, n. 1, outubro de 2009. p 36-45.

BIANCHI, Ana Cecília de Moraes; ALVARENGA, Marina; BIANCHI, Roberto. Manual de


Orientação-Estágio Supervisionado. Editora Cengage Learning 4º edição, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília, MEC/SEF, v.3, 1998.

FREIRE, Paulo. A Educação na Cidade. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2000.

GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de Psicopedagogia Musical. Tradução de Beatriz A.


Cannabrava. São Paulo: Summus, 1988.

MOITA, Maria da Conceição. Percursos de formação e de trans-formação. In: NÓVOA,


Antônio (Org.). Vidas de Professores. Porto: Porto Editora, 2º edição, 1995. p 111-140.

MORAES, Vinicius de. A Arca de Noé. Companhia das Letrinhas, 2º edição, 1991.

MORAES, Vinicius de. A Arca de Noé. Vol. 1. Polygram, 1980.

NACHMANOVITCH, Stephen. Ser Criativo – O Poder da Improvização na Vida e na Arte.


Tradução de Eliana Rocha. São Paulo: Summus, 1993.

QUEIROZ, Luis Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino da
música nas escolas de educação básica. Revista Música na Educação Básica. Porto Alegre, v.
1, n. 1, outubro de 2009. p 60-75.

SOUZA, Carlos Eduardo de; JOLY, Maria Carolina Leme. A Importância do Ensino Musical
na Educação Infantil. Cadernos da Pedagogia. São Carlos, Ano 4 v. 4 n. 7, jan -jun. 2010,
p 96 – 110.

192
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Improvisação Livre na Educação Infantil: algumas reflexões a partir das


ideias da Prof.ª Dr.ª Chefa Alonso

Débora Niéri
deboranieri@ig.com.br

Resumo: Objetiva-se refletir sobre a importância da improvisação musical livre na Educação


Infantil (EI), a partir das ideias apresentadas no Seminário “Técnicas Básicas de Improvisação
Musical Livre e Orquestra de Improvisadores” pela professora Chefa Alonso da Espanha, em
abril de 2011 no Instituto de Artes da Unesp. Essa reflexão justifica-se pela necessidade de
fomentar propostas pedagógico-musicais que atentem para o desenvolvimento da
musicalidade da criança, por meio da atuação do professor generalista, oportunas nesse
momento de implantação legal da música como conteúdo obrigatório no ensino básico, o que
instiga a contemplação do Eixo Música apontado nos Referenciais Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil (1998).
Palavras chave: Música, improvisação livre, educação infantil

Introdução

A improvisação livre é um dos campos da Educação Musical que apesar de “presente


há mais de quarenta anos no mundo musical da maior parte dos países da Europa, Estados
Unidos e Canadá” (ALONSO, 2008, p.8), segue marginalizada tanto no meio artístico-
musical, como no campo do ensino da música.
A improvisação livre consiste em outra forma de fazer música mais ligada à expressão
do corpo, voz ou instrumento pela exploração sonora e escuta do que ao apego a um
determinado repertorio estilo ou sintaxe musical. Baseia-se num conceito de música que
contempla sonoridades diversas, formas de composição diferentes das tradicionais, incluindo
o ruído, as explorações sonoras e as variações timbrísticas como elementos chave no processo
de criação.
Caracteriza-se pela “ausência de um marco normativo”, onde é só para lugar o melhor
é no qual os limites impostos pela presença de uma gramática ou de um contexto regulado por
regras do contraponto ou da harmonia, são substituídos “pelo desejo de criar no momento e
coletivamente uma música nova” (ALONSO, 2008, p. 8).
O processo de criação baseado na improvisação livre não possui relações hierárquicas,
nem estimula a competitividade e tampouco se sujeita às convenções. O prazer estético não
consiste no esperado, e sim, no imprevisto.

193
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A improvisação livre reveste-se de um posicionamento político contestador,


questionador das convenções estabelecidas. Sem território fixo, assim como os nômades,
“alimentam o imaginário coletivo de um mundo igualitário, sem fronteiras, a existência de
uma irmandade universal” (apostila do curso, p.7). Os improvisadores desafiam a relação
preestabelecida com o tempo cronológico, medido pelo relógio, demorando-se,
perambulando, vagueando, testando, experimentando, prescrevendo um tempo irregular,
impreciso, desinteressado que busca as possibilidades do tempo real.
Há nessa postura músico-pedagógica uma preocupação com a ampliação dos conceitos
de composição musical e do ensino musical baseado no repertório tradicional, principalmente,
o europeu. A improvisação livre inspira-se no desejo de aproximar a música das pessoas, de
“democratizar” o fazer musical, buscando relações com as atividades e experiências do
cotidiano. Coloca em jogo a subjetividade do improvisador, uma vez que ele tem de
relacionar-se não só com a música, numa atitude individualista, mas com os outros, num
processo coletivo.
Opostamente ao pensamento de que improvisar é ‘fazer qualquer coisa’ a
improvisação livre guia-se pelo sentir e ouvir o outro, num processo de profunda
concentração e respeito pelo grupo, ampliando as possibilidades de exploração, de liberdade e
criatividade musicais.
Sentir e ouvir o outro, dentro de uma perspectiva coletiva e criativa. Essa concepção
pedagógica sempre me impulsionou enquanto educadora. Mas, minha formação musical como
pianista dentro da tradição erudita, pautada principalmente pelo repertório romântico do
século XIX, não respaldava minha atuação didático-musical nas classes da Educação Infantil.
Sempre à procura por cursos, tive a oportunidade, em abril deste ano, de participar do
Seminário “Técnicas Básicas de Improvisação Musical Livre e Orquestra de Improvisadores”,
ministrado pela saxofonista e improvisadora Prof.ª Dr.ª Chefa Alonso (La Coruña - Espanha)
de 11 a 28 de abril de 2011, no Instituto de Artes da UNESP. O curso foi organizado pelo
GEPEMIA, Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Musical do IA/UNESP sob liderança
da Prof.ª Dr.ª Marisa Trench Fonterrada. Destinado a instrumentistas de qualquer nível,
envolveu alunos dos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Música, e de Pós-Graduação
em Música (Mestrado e Doutorado) de diversos lugares da capital paulistana.
O curso viabilizou o entendimento dos princípios educacionais, tangenciando também
objetivos políticos, da improvisação livre, e permitiu, também, uma vivencia prática com a
Orquestra de Improvisadores. Nesse conjunto, a ênfase era desaprender o aprendido, e, ao

194
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

mesmo tempo, ampliar as referencias sonoras, entender o espaço individual e o momento de


atuar, descobrir novos materiais ou maneiras de desenvolver o já estabelecido, e empreender
um trabalho em grupo.

Discussão

Com base nas ideias de Chefa Alonso, trago à discussão alguns princípios da
improvisação livre que podem ser pertinentes para os contextos educativo, musical e infantil.
O primeiro refere-se à arte como provocadora de mudanças sociais, o segundo, à
improvisação livre no ensino musical, e o terceiro enfatiza a improvisação livre na Educação
Infantil.

A arte (e a improvisação livre) na educação como promotora de mudanças sociais e


políticas

Para Chefa Alonso a música não pode ser entendida desvinculada de seu contexto
histórico, social e politico, uma vez que reflete o espirito de uma época, de uma sociedade ou
de um grupo social, seus conflitos e tensões.
Baseada no conceito de Andrei Tarkovsky (2005) de que a sociedade tende à
estabilidade enquanto o artista busca a mudança, almeja à transformação (p. 217) e nas ideias
de Jacques Attali veiculadas em seu livro Ruido: la politica econômica de la musica (1977),
no qual toma a música como metáfora do real, Alonso observa que essa arte “prevê” o futuro,
adiantando-se aos acontecimentos sociais que se desenrolarão (p.65). Alonso coloca em pauta
o papel social do artista de violar as regras do sistema estabelecido, instaurando novas
possibilidades formais e exigências de sensibilidade. Observa que o artista tem de perturbar a
estabilidade, provocar o desequilíbrio, gerando novas formas e maneiras de ver o mundo. Tem
de estar atento às transformações sociais e fazer a música do seu tempo.
O ponto que Alonso quer estabelecer é o caráter desafiador e contestador da prática da
improvisação: está à margem do consumo massificado, por isso não interessa ao mercado; não
busca a fragmentação, a especialização que pode gerar a competitividade e, como tal, nem
interessa às políticas públicas. Seu sentido é promover um engajamento que representa
desestabilidade e desequilíbrio na manutenção do poder.
Numa perspectiva educacional, o desafio que se impõe no século XXI é o de
integração de saberes, religando a multiplicidade de dimensões fragilizadas pela fragmentação
tão eficazmente perpetuada pelo paradigma cartesiano vigente. Essas expectativas emergentes

195
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

impõem um paradigma conectado ao pensamento em rede, não linear, e baseia-se no


processo, na construção, na diferença, no vir a ser, no não estabelecido, em outra relação de
tempo, em alianças. Alinhada à perspectiva ideológica e política, a improvisação livre
apresenta-se como um caminho para o ensino de música, pois reflete possibilidades de novas
formas de ser, pertencer e estar no mundo, tendo “relações com o pensamento político da auto
gestão, da autonomia e da democracia radical” (ALONSO, 2008, p.6) e caracterizando-se
como prática de uma sociedade alternativa. Constitui-se, portanto, numa verdadeira ‘ameaça’
às políticas que visam à o controle social.
Os princípios de uma educação para a paz (KOELLREUTTER, 1997, p.60), estão
embutidos nos preceitos e ideais da improvisação livre.

A improvisação livre na educação musical

A improvisação livre para Chefa Alonso (2008, p. 8-21) se define como um modo de
fazer música baseado em atividade coletiva e com ênfase na perspectiva criativa.
O ensino de musica calcado na tradição europeia, de maneira geral, segrega o tocar da
atividade de compor, de criar, de experimentar. Essa concepção fortalece os mitos arraigados
na cultura de que música “é difícil” ou “para poucos”, ou para os “gênios” ou ainda, para
quem “tem dom”, o que pode provocar um distanciamento do das pessoas em relação ao
aprendizado e interesse na linguagem. Alonso observa que “é fácil encontrar um compositor
que não toca nenhum instrumento, um intérprete que não sabe improvisar ou um improvisador
que não escreve música” (2008, p. 10). Critica esse ensino musical padronizado, fragmentado,
limitado ao repertório do passado e cunhado fundamentalmente na atividade individualista,
pela ausência da improvisação nos currículos escolares como técnica básica de aprendizagem
musical, pessoal e social, pois pela improvisação o aluno pode aprender a aceitar o diferente,
a buscar soluções, a confiar em si mesmo e nos outros, e a adquirir uma linguagem própria e a
técnica necessária para expressar-se.
A improvisação tornaria a formação do estudante de música (escolas especificas de
música) e do aluno (na escola regular) mais completa, pois contemplaria tanto a abordagem
intuitiva, com o foco na escuta e na organização centrada no momento, como a orientação
para a atividade analítica, de cunho individualista, com base na memória e na forma, com a
música escrita.

196
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O educador musical e compositor Koellreutter alertava sobre a necessidade da


educação musical que fosse estética e crítica de forma a levar o aluno à investigação, à
especulação, à pesquisa.

um ensino que indica caminhos para a invenção e criação de novas ideias,


novos conceitos e novos princípios de ordem; que treina o ouvido como
exercício de ler e ouvir, produzir, distinguir e definir qualquer fenômeno
sonoro, incluindo o ruído e o som artificial; que faz o aluno improvisar sem
determinação do material a ser usado (...) (KOELLREUTTER, 1994, p.13).

A preparação e o aprendizado da improvisação livre se dão pela exploração do próprio


instrumento, que passa a ser uma fonte de material. A técnica não é considerada um fim em si
mesmo, mas sujeita aos aspectos criativos, dando-lhe suporte, pois “desprovida de sua relação
com o instrumentista e com as suas necessidades de expressão, conduz apenas a uma
profissionalização fria e desumanizada” (ALONSO, 2008, p.15). Busca-se o
desenvolvimento de habilidades como flexibilidade, adaptabilidade, eficiência,
expressividade, fluidez, tolerância, independência, coerência e inventividade.
A integração, a exploração das relações entre os músicos, a generosidade para
sacrificar as preferencias individuais e a capacidade para agir e tomar decisões são as
características marcantes dos improvisadores.
E mais ainda, como o improvisador é responsável pelo resultado sonoro do grupo, é
imposto a ele a necessidade de concentração, de respeito, habilidade de escuta, e liderança
para tomadas de decisões durante o processo de criação. Segundo Alonso, o grupo tem que se
descobrir, sentir-se junto, compondo e improvisando em tempo real, seja nos ensaios ou frente
ao publico, em uma atitude coletiva e que revele integração.

A improvisação livre na Educação Infantil

A conexão entre música e cotidiano que a improvisação livre busca estabelecer


contribui para a aproximação e construção de significados musicais por parte da criança, pois
é principalmente durante a infância que se dá a apropriação do mundo social pelo
engajamento em trocas recíprocas que permitem compartilhamento de experiências sociais, de
apropriação cultural, de elaboração de significados, que constituem o referencial, os valores e
a identidade do sujeito. A experiência e a aprendizagem, que se dão a partir da perspectiva
cultural, do cotidiano, da realidade social, exercem papel preponderante no desenvolvimento.
Assim, pela ação e experiência, a vivencia musical propiciada pela improvisação, permite a

197
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

construção e reconstrução em nível cognitivo de esquemas sensoriais, motores e operatórios


que, em relação com a cultura, constituirão a referencia musical das crianças.
A educadora musical argentina, Violeta Gainza, também observa que a improvisação
esta implicada no processo da cultura infantil por contribuir ativamente para a “mobilização e
metabolismo das estruturas musicais internacionalizadas, promovendo a absorção de novos
materiais e estruturas mediante a exploração e manipulação criativa dos objetos sonoros” 1.
No sistema público de ensino no Brasil, o trabalho com a música na Educação Infantil
é enfatizado pelo eixo especifico apresentado no III volume dos Referenciais Curriculares
Nacionais da Educação Infantil (1998). Fundamentado em uma concepção musical
contemporânea, que atenta para o “criar instantaneamente, o eixo música orienta-se por
alguns critérios pré-definidos, mas com grande margem a realizações aleatórias, não
determinadas” (p. 57) e contempla o fazer musical baseado nos jogos de improvisação,
entendidos como “ações intencionais que possibilitam o exercício criativo de situações
musicais” (p.57).
Nesse sentido a improvisação livre pode ser um caminho para que a música venha a
ser trabalhada na EI pelo professor generalista, pois não necessita de um conhecimento prévio
e especifico da sintaxe musical. Pode ser trabalhada por meio de jogos e brincadeiras que
envolvem elementos sonoros básicos e diversos conforme a percepção do professor.
A proposta de improvisação livre na Educação Infantil corrobora o objetivo especifico
da educação musical que segundo Gainza (1988, p. 101) “é de musicalizar, ou seja, tornar o
individuo sensível e receptivo ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo,
respostas de índole musical” (1988, p. 101), pois tem como foco principal a relação do
individuo com o som e com o grupo.
A “paisagem sonora” da Educação Infantil torna-se um gancho para o aprendizado
musical, como aponta Arianna Sedioli (2003) “a natureza oferece aos bem pequenos as folhas
caindo, a chuva, o trovão, entre outros sons que privilegiam os parâmetros sonoros, uns mais
que outros” (p.27).
Sedioli (2003, p.27) afirma que as crianças pequenas são atraídas pela sonoridade
daquilo que os circunda e iniciam uma interação com o ambiente em forma de jogo
explorativo. Demonstram que passam por um processo de construção, desenvolvimento e
formação de repertório sonoro, uma vez que se apropriam das descobertas sonoras e a
utilizam em seu cotidiano imitando-as e ampliando-as. Sendo assim, se tornam

1
IN Cadernos de Estudos de Educação Musical n.1. s/d. Disponível em www.atravez.org.br. Acesso em
25/04/2010.
198
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

simultaneamente, consumidores, produtores e reconstrutores dos sons do ambiente que os


cercam.
A própria produção sonora das crianças, tais como o balbucio, a lalação (sons com
lábios e boca), o choro, os gritos, a experimentação com os sons do corpo, o olhar atento, a
expectativa do silencio, o toque, pode ser transformada em criações musicais pela mediação
do professor, pois a criança pequena está sempre atenta, interagindo consigo e com seus
pares, com movimentos corporais diversos, demonstrando interesse por situações e estímulos
novos.
Mas a relação do tempo medido pelo relógio, que entra em conflito com os propósitos
da improvisação livre pela necessidade de tempo para explorar, descobrir, analisar, criar e se
apropriar, também se modifica com o aprendizado e as descobertas infantis. A criança precisa
de tempo para brincar, jogar, descobrir, inventar e reinventar, construir significados e pontes
com o conhecimento musical, pois é “mediante a expressão do corpo, mente, emoções e
sentimentos que a criança manifesta suas necessidades e expressa seu conhecimento; há um
outro tempo e um outro espaço na relação adulto-criança” (HADDAD, 2006, p.539). Segundo
a educadora musical Teca Alencar de Brito “o modo como as crianças percebem, apreendem e
se relacionam com os sons, no tempo-espaço, revela o modo como percebem, apreendem e se
relacionam com o mundo que vêm explorando e descobrindo a cada dia” (2003, p.41).
Além da construção do conhecimento musical por meio do professor generalista, a
improvisação livre pode viabilizar uma formação instigadora de novas maneiras de estar e ser
no mundo. Além de ampliar as possibilidades sonoras das crianças, uma formação integral,
ativa e participativa contribui para o desenvolvimento da autonomia, pois como afirma
Moema Craveiro de Campos “improvisar é ter coragem de se colocar, expor-se musicalmente
de acordo o momento, de maneira muito própria, única, expressando o sentimento vivido no
instante” (2000, p.93).
Para Abramowicz, Levcovitz e Rodrigues “uma educação não fascista concebe a
infância como experiência, aceita um currículo pautado no pensamento nômade e vê no
espaço-tempo da aula a possibilidade do ato de criação” (2009).
É certo há de se “romper com a resistência das condutas pré-estabelecidas no bloqueio
e nas fixações pedagógicas” (GAINZA, ibid) e isso não constitui tarefa fácil. Mas, diante
desse desafio,

podemos nos agarrar ao que esta passando ou já passou, ou podemos nos


manter abertos e acessíveis - até mesmo entregues - ao processo criativo,
sem insistir em conhecer de antemão o resultado final que nos advirá - para
199
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

nós, para nossas instituições, para nosso planeta. Quem aceitar esse desafio
estará acalentando a liberdade, abraçando a vida e encontrando um sentido
para ela (NACHMANOVITCH, 1993, p.170).

Pois, a improvisação “não propõe o absoluto, o estável, o certo e o errado, mas a


mutação, e por isso, é também vida. É a oportunidade de renovação da educação musical”
(CAMPOS, 2000, p.94).

Considerações Finais

O ensino de música hoje, na educação infantil, encontra-se em processo de construção


diante das grandes transformações pelas quais essa arte passou no século XX e continua
passando no nosso tempo.
Há, atualmente no Brasil, políticas públicas voltadas para esse segmento escolar,
políticas que apontam diretrizes, referenciais e incentivam expectativas de aprendizagens.
O momento é propicio para que pesquisas teóricas e de campo sejam realizadas, para
que as atuações nesse nível de ensino venham a corresponder às expectativas da educação
para o século XXI: educação baseada na diversidade, na flexibilidade, na pesquisa, e na
valorização dos conhecimentos culturais- locais e mundiais.
Por tudo o que foi levantado, considera-se que a improvisação musical livre alinha-se
a essa postura educacional, atendendo a esses princípios educacionais contemporâneos, e
poderá constituir-se em mola propulsora de pesquisas, projetos e realizações sonoro-musicais
no contexto da educação infantil. Os fundamentos da improvisação musical livre respondem
(ou atendem) ao princípio contemporâneo da educação geral, uma vez que contempla, na
prática, o educar, o brincar e o integrar-se socialmente.

200
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ABRAMOWICZ, Anete; LEVCOVITZ, Diana; RODRIGUES, Tatiane Consentino. Infâncias


em Educação Infantil. IN Revista Pro-Posições. Vol.20. n.3. Campinas. set/dez, 2009.
Disponível em <www.sielo.br> . Acesso em: 24 mai. 2010.

ALONSO, Chefa. Improvisación Libre: la composición em movimiento. Baiona: Editora Dos


Acordes, 2008.

ATTALI, Jacques. Ruido: la politica econômica de la musica. Editorial Ruedo Ibérico, 1977.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. 3.vol.

BRITO. Teca de Alencar. Música na educação infantil. 2.ed. São Paulo: Petrópolis, 2003.

CAMPOS, Moema Craveiro. A Educação Musical e o Novo Paradigma. Rio de Janeiro:


Enelivros, 2000.

GAINZA, Violeta Hemsy de. Estudos de Psicopedagogia Musical. Tradução de Beatriz A.


Cannabrava. São Paulo: Summus Editorial, 1988.

HADDAD, Lenira. Políticas integradas de educação e cuidado infantil: desafios, armadilhas e


possibilidades. In: Cadernos de Pesquisa. V.26, nº 129, p.519-46. São Paulo. Set/dez. 2006.
Disponível em: <www.scielo .br/scielo.phd> Acesso em: 17 set. 2009.

KOELLREUTTER, H. J. O Humano: objetivo de estudos musicais na escola moderna.


SIMPÓSIO PARAENSE DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 3. Anais... Londrina, p.10-17, 1994.

______. Educação e cultura em um mundo aberto como contribuição para promover a paz.
Cadernos de Estudos: Educação Musical. N 16. Belo Horizonte, Ed: Atravez, fev, 1997.

NACHMANOVITCH, Stephen. Ser criativo: o poder da improvisação na vida e na arte. São


Paulo: Summus, 1993.

SEDIOLI, Ariana. Sonorità in gioco. In: MAZZOLI, F; SEDIOLI, A; ZOCCATELLI, B


(orgs). I giochi musicali dei piccoli. Bergamo, Itália: Ed. Junior, 2003. p. 49-90. (Quaderni
Operativi).

TARKOVSKY, Andrei. Esculpir en el tempo. Ediciones Rialp, 2005.

201
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Compreensão das Funções Harmônicas Básicas (Tônica e Dominante)


Através da Aprendizagem de Acordeom: um olhar a partir do fazer
musical de crianças

Jonas Tarcísio Reis


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS)/PPGEDU/CAPES -EDUCAMUS/CNPq
jotaonas@yahoo.com.br

Leda de Albuquerque Maffioletti


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS)/PPGEDU - EDUCAMUS/CNPq
leda.maffioletti@gmail.com

Resumo: O presente trabalho trata de um projeto de pesquisa em andamento que tem como
objetivo compreender e explicar como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender
as funções harmônicas básicas (tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de
acordeom. A pesquisa está sendo realizada com três crianças de idade entre seis a oito anos,
em um Lar para crianças e adolescentes, localizado na cidade de Porto Alegre – RS. O
desenho metodológico da pesquisa se apóia em princípios do método clínico piagetiano. Os
dados estão sendo coletados através de entrevistas e observações clínicas. O registro dos
dados se dá por meio de diários de campo e filmagens das aulas. Escolheu-se este espaço
educativo-musical pelo fato de os educandos estarem imersos em um processo de educação
musical com acordeom apianado. Utilizaremos como subsídio teórico o conceito de tomada
de consciência proposto por Piaget et. al. (1977; 1978). As questões complementares a serem
respondidas são: Quais as estratégias empregadas pela criança para definir a mudança de
função harmônica no acompanhamento da melodia em estudo, e a natureza das explicações
construídas para justificar suas próprias escolhas? Quais as noções que prefiguram ou estão
implicadas na compreensão das funções harmônicas básicas (tônica e dominante) na
aprendizagem de acordeom?
Palavras chave: Acordeom, harmonia, tomada de consciência

1. Introdução

É notório que as músicas e o ensino e aprendizagem de instrumentos populares no


Brasil, tais como acordeom, gaita de boca, viola caipira, cavaquinho, bandolim, entre outros,
somente agora vêm adquirindo mais espaço no ensino superior.
O acordeom foi um instrumento inventado para ser usado na interpretação de música
tonal (com harmonia tonal), embora, também, seja utilizado na interpretação de repertório
atonal na atualidade, principalmente em países onde ele já foi amplamente incorporado aos
circuitos da música erudita, como na Europa e Ásia.

202
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A baixaria do acordeom é a parte onde se toca o acompanhamento rítmico-harmônico.


Foi organizada considerando o círculo das quintas, possibilitando o fácil deslocamento entre
as funções harmônicas básicas do sistema tonal, a saber: Tônica, Subdominante e Dominante.
Complementarmente, é necessário frisar que a baixaria do acordeom está disposta fisicamente
de modo igual em todos os modelos, variando apenas em números de botões (baixos). A
técnica para a construção de acompanhamento nessa parte do instrumento é semelhante nas
diferentes culturas musicais que fazem uso do acordeom. Porém, algumas variações são
encontradas de acordo com a cultura musical propagada (REIS, 2010a, p. 29). Muitos são os
conhecimentos musicais a serem produzidos na aprendizagem de acordeom, a harmonia é um
deles. E ela vem sendo pouco abordada nas pesquisas da área de Educação Musical.
“Acordes maiores, menores, de sétima da dominante e sétima da diminuta são obtidos
ao apertar apenas um baixo. Tal mecanismo facilita a construção dos acompanhamentos
rítmico-harmônicos na baixaria” (REIS, 2010a, p. 23). O acompanhamento é como se fosse
uma espécie de plataforma por onde andam os sons principais presentes na melodia. O que
fica em nossas mentes em um primeiro momento são as melodias, mas, embora muitas vezes
não tenhamos consciência, elas estão escritas, construídas com base em um suporte
harmônico consciente ou inconscientemente concebido pelo compositor (LEVITIN, 2010).
Parece que a peculiaridade concebida ao acordeom pelo fato de a baixaria ter de ser
tocada sem podermos visualizar as ações motoras nela empregadas têm implicações na
aprendizagem das funções harmônicas básicas (Tônica e Dominante) da harmonia tonal. Esta
peculiaridade oportuniza ao aprendiz a criação de outros mecanismos para usar a baixaria com
eficiência, por não poder ver o que está fazendo. É possível olhar a baixaria caso se queira,
mas é dificílimo fazê-lo durante a interpretação musical com o instrumento.
Assim, esta pesquisa buscará trazer avanços conceituais e teóricos para a área de
Educação Musical. Terá implicações diretas na minha formação profissional, pois poderá
revelar a natureza das dificuldades que os alunos enfrentam na interpretação de música tonal
no acordeom1 ao ter de conciliar a interpretação simultânea de melodia (no teclado) e
acompanhamento rítmico-harmônico (na baixaria). Procurará trazer para o campo da
psicologia da aprendizagem musical, novas reflexões acerca da compreensão e da
aprendizagem de harmonia no acordeom, bem como sobre a conceituação harmônica por
parte de crianças. Servirá também para compreendermos como a aprendizagem de harmonia
funciona neste instrumento para podermos exercitá-la com base em um conceito claro, uma

1
Existem vários modelos de acordeom. Nesta pesquisa usamos o acordeom apianado de 24 baixos que facilita o
manuseio por parte de crianças pelo seu tamanho reduzido.
203
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

vez que dominar alguns princípios da lei harmônica tonal subsidia: a atividade de “tirar
música de ouvido”, muito presente na prática musical popular; o acompanhamento
instrumental de canções na figura das improvisações; como requisito à prática composicional
tonal.

2. Objetivo Geral

Compreender e explicar como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender as


funções harmônicas básicas (tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de acordeom.

2.1 Objetivos específicos

Identificar as estratégias empregadas pela criança para definir a mudança de função


harmônica no acompanhamento da melodia em estudo, e a natureza das explicações
construídas para justificar suas próprias escolhas.
Identificar as noções que prefiguram ou estão implicadas na compreensão das funções
harmônicas básicas (tônica e dominante) na aprendizagem de acordeom.

3. Justificativa

A prática musical com acordeom é um fato muito presente na Música Popular


Brasileira (MPB) - maiormente nos regionalismos compostos por gêneros musicais mais
antigos, anteriores a década de 1950, como na: Música Popular Gaúcha (MPG); Música
Caipira; Música Nordestina; etc. Contudo, a sua discussão no âmbito acadêmico é
severamente escassa. Isso é explicado pela ausência significativa do acordeom no contexto da
música erudita, que ainda impera como atriz principal no palco das graduações em música
desta nação.
Com isso, são poucos os trabalhos de discussão sobre os fenômenos culturais e
educacionais envolvendo o acordeom. Na literatura brasileira temos três monografias relativas
à processos educativo-musicais com acordeom (PERSCH 2006; MACHADO, 2009; REIS,
2010a) nove artigos (REIS, 2009, 2010b, 2010c, 2010d, 2010e, 2010f; REIS; BEYER, 2010;
REIS; BÜNDCHEN, 2010; WEISS; LOURO-HETTWER, 2010), e uma dissertação
(ZANNATA, 2005) escrita no campo das ciências sociais. Assim, na condição de professor-
pesquisador, seguimos empreendendo esforços para compreender melhor o ensino e a
aprendizagem de acordeom em contextos brasileiros. Mas, agora, o foco estará mais voltado

204
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

para a compreensão da aprendizagem de acordeom do que para o ensino deste instrumento,


diferentemente de empreitadas anteriores (REIS, 2009, 2010a).
A discussão sobre cognição musical no campo da harmonia requer fôlego e novas
investidas investigativas, uma vez que a área, ainda, é carente de pesquisas nesse sentido.
Poucos são os trabalhos acerca da aprendizagem e compreensão harmônica musical. Destaca-
se o trabalho realizado por Pecker (2009), que buscou compreender os processos cognitivos
que asseguram as conquistas das crianças de dois a cinco anos de idade sobre os modos do
sistema tonal. Pecker (2007) também traz reflexões nesta mesma linha temática. Na literatura
internacional os trabalhos de Costa-Giomi (1994a; 1994b; 2001a; 2001b; 2003) sobre o
desenvolvimento da percepção harmônica na infância igualmente podem ser mencionados
como relevantes para as reflexões que queremos projetar nesse estudo. Do ponto de vista
cognitivo entendemos, neste estudo, percepção como um primeiro reconhecimento, por parte
do sujeito, de algo existente em objetos com os quais interage.
A harmonia é o eixo central da música. Ela estabelece as relações entre os objetos
sonoros que formam as obras musicais, e por isso, cada indivíduo que manipula e cria algo
que pode ser chamado de música estará fazendo uso singular de leis harmônicas já existentes,
ou, então, estará promovendo uma nova invenção. Foi através desse tipo de promoção que os
novos sistemas harmônicos emergiram e emergem no mundo atual. Nesse sentido, do ponto
de vista educacional que nos apetece, levar o educando à compreensão do aspecto individual
da invenção harmônica consiste em uma das mais importantes tarefas de um ensino de
harmonia para a produção artística (MOTTE, 1994, p. 18). A eficácia, aplicabilidade e
receptividade das relações harmônicas criadas ou reproduzidas em novas obras musicais é
fruto direto da interação entre o sujeito - seja este, alguém que crie, recrie, aprecie, dance, ou
interaja de algum outro modo possível com os conglomerados sonoros - e o material musical
em foco. Assim, a compreensão de determinadas elaborações harmônicas contidas nas
músicas de específicos grupos humanos depende dos mecanismos cognitivos social e
culturalmente desenvolvidos destes.
Nessa perspectiva, como educadores musicais e pesquisadores, nosso desejo se
encontra numa circunscrição que aponta e reside na inquietação de compreender e explicar
como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender as funções harmônicas básicas
(tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de acordeom. Trata-se de uma temática
ainda não interpelada pela área de educação musical. E é necessário sabermos como o sujeito
aprende tal elemento da linguagem musical, desvelando os possíveis obstáculos que podem

205
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

emergir no processo de ensino-aprendizagem, para posteriormente subsidiarmos a


estruturação de práticas pedagógico-musicais que facilitem os processos de construção de
conhecimento musical. O estudo sobre como as crianças aprendem é necessário para melhorar
a educação musical.

4. Desenho metodológico

Esta pesquisa se caracteriza pela sua natureza qualitativa. Qualitativa por que
buscaremos compreender, interpretar e apreender a estrutura do pensamento da criança. Sem
com isso almejar mensurações ou quantificações como pressupõe as pesquisas de natureza
quantitativa, muito menos usar classificações de modo a enquadrar os sujeitos em modelos de
certo ou errado estritamente. Pelo contrário, queremos aprofundar-nos no estudo das causas
que levam o sujeito a pensar de modos específicos, nos atendo aos detalhes que lhe são
inerentes no que tange a compreensão harmônica musical via aprendizagem de acordeom.
Tal investida é desafiadora, porque sabemos que fazer pesquisa sobre a construção de
conhecimento em crianças é difícil, uma vez que a clareza no discurso delas é uma
característica quase ausente para subsidiar a compreensão do pesquisador acerca de como elas
aprendem e pensam. E isso já fora constatado pelos estudiosos da Epistemologia Genética,
liderados por Jean Piaget. Tendo essa premissa como fato consumado, a alternativa que se
apresenta com melhores sinalizações de viabilização da compreensão do pensar infantil, é o
uso de alguns princípios do Método Clínico como estratégia básica para a presente pesquisa
em comum acordo com os alinhavos teóricos que sustentarão a interpretação dos dados e
exposição dos resultados.
Kebach (2003), Maffioletti (2005) e Pecker (2009) já fizeram uso deste método em
pesquisas no campo da cognição musical. Ele engloba observação, experimentação e
entrevista clínica. A experimentação é uma situação criada para observar a ação do sujeito
diante de um objeto específico. A entrevista foca a representação verbal do sujeito acerca de
suas ações (KEBACH, 2002).
O método clínico é um procedimento de coleta e análise de dados para o estudo do
pensamento humano. A coleta é realizada por meio de “entrevistas” ou “situações muito
abertas”, onde a meta é acompanhar o curso do pensamento do sujeito diante de uma situação-
problema, “fazendo uso de novas perguntas para esclarecer respostas anteriores. Consta,
portanto, de algumas perguntas básicas e de outras que variam em função do que o sujeito vai
dizendo e dos interesses que orientam a pesquisa que esta sendo realizada” (DELVAL, 2002,

206
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

p. 12). Usa-se da contra-argumentação “do seu ponto de vista para captar a lógica mais
profunda sobre a qual se apóia” e “compreender sobre quais bases assenta-se seu raciocínio”
(MAFFIOLETTI, 2005, p. 137-136).
O estudo será feito com três crianças2 de seis a oito anos de idade, de um Lar para
crianças e adolescentes situado na cidade de Porto Alegre, com consentimento legal para
participarem da pesquisa. A entidade fora escolhida por ser o local onde são desenvolvidas
atividades pedagógico-musicais com acordeom para crianças desta faixa etária. É uma
entidade não-governamental que presta serviços de amparo a crianças e adolescentes menores
de dezoito anos de idade.

4.1 Coleta de dados

Os dados serão coletados através de entrevistas semi-estruturadas e observações do


fazer musical dos educandos nas aulas individuais de acordeom. Esse tipo de entrevistas se
constitui de perguntas básicas comuns para todos os sujeitos, que irão sendo “ampliadas e
complementadas de acordo com as respostas dos sujeitos para poder interpretar o melhor
possível o que vão dizendo” (DELVAL, 2002, p. 147).
As entrevistas serão feitas durante os eventos educativo-musicais, mais precisamente
no momento da aprendizagem da conjugação das duas mãos na interpretação musical com
acordeom, instigando as crianças a explicar o que estão fazendo, o que fizeram, e o que
pensaram em fazer para desempenhar tal tarefa musical. Isto será feito durante doze semanas
de aulas, com uma hora de aula de acordeom por semana com cada criança, totalizando doze
horas de aulas por sujeito.
Durante estas aulas as crianças aprenderão três músicas (três valsas compostas
exclusivamente para este fim) com evolução harmônica idêntica (quatro compassos iniciais
feitos com acompanhamento de acorde de Tônica, seguidos de quatro compassos com
acompanhamento de acorde de Dominante, e um nono compasso na Tônica, finalizando a
composição), porém em tonalidades diferentes, para verificarmos a construção de
conhecimento harmônico. Durante a aprendizagem, as atenções do professor-pesquisador
estarão voltadas para a compreensão das estratégias empregadas pelas crianças para chegar à
interpretação tocando melodia e acompanhamento rítmico-harmônico concomitantemente.

2
Para preservar a identidade dos sujeitos de pesquisa, usaremos letras escolhidas aleatoriamente para referir-nos
aos mesmos.
207
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

As entrevistas serão usadas para que as crianças verbalizem sobre as estratégias


empregadas no curso da sua aprendizagem, e comuniquem as suas representações mentais
acerca do seu fazer para compreendermos como elas pensam. Para as entrevistas, as perguntas
básicas serão:
- Como você sabe quando tem que mudar o acompanhamento na baixaria?
- No que você se baseia para tocar as duas partes juntas (acompanhamento e melodia)?
- Como você sabe o momento de mudar?
- Esta música tem algo de parecido com a outra que tocastes?
- Nos baixos tem alguma coisa que você faz baseado na outra música, ou é tudo novo?
Quando o sujeito estiver tocando a segunda e terceira músicas, será questionado por
que razão achou que devia trocar o acompanhamento em determinado momento a fim de
identificarmos os processos cognitivos envolvidos e se faz relações entre as evoluções
harmônicas das músicas. Posteriormente, será colocado aos educandos o desafio de identificar
semelhanças entre as obras estudadas e o que se faz igual ou não em termos de
acompanhamento nelas, valendo-se estritamente de suas memórias.
Quando envolvidas no seu fazer musical com acordeom questionarei as crianças sobre
quais estratégias estão empregando para saber quando mudar o acompanhamento. Procurarei
apreender o nível de compreensão que as crianças contraem sobre seu próprio fazer, e que
mecanismos elas põem em ação para saber o momento exato de mudar o acompanhamento do
campo da Tônica para a Dominante e vice-versa, e a natureza das explicações construídas
para justificar suas próprias escolhas. Buscarei tornar explícitas: as possíveis causas da
estruturação do saber harmônico como necessário a continuação da aprendizagem no
acordeom, identificando o que das ações anteriores fora generalizado; as coordenações
inferenciais e de ações que possibilitam a aprendizagem harmônica no uso do acordeom; as
noções que prefiguram ou estão implicadas na compreensão das funções harmônicas básicas
(tônica e dominante) na aprendizagem de acordeom; a composição de generalizações acerca
dos encadeamentos idênticos entre as funções harmônicas básicas presentes no repertório
tonal em estudo.

4.2 Registro dos dados

Os dados serão registrados através de diários de campo de acompanhamento


individualizado, e gravação audiovisual das aulas e entrevistas para podermos rever as ações
dos sujeitos. Serão doze horas de gravação de aulas por educando. Desse total serão
208
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

recortadas partes onde as entrevistas clínicas foram realizadas. Nos diários de campo serão
registradas as análises das aulas de acordeom, e todas as atitudes e manifestações dos
educandos que possam implicar na estruturação do conhecimento harmônico. Com base nos
dados registrados, far-se-á a composição de protocolos únicos para cada sujeito pesquisado
descrevendo a sua aprendizagem.
Os procedimentos para a composição dos protocolos serão:
- Degravação integral das entrevistas, e parcial das aulas (partes onde a problemática
harmônica se mostrar evidente na aprendizagem musical com acordeom);
- Síntese analítica das sequências de ações dos educandos durante as aulas a partir dos
registros no diário de campo, com identificação do sujeito e datação do acontecimento
educacional;
- Avaliação das entrevistas e observações com base nos conceitos teóricos (adaptação,
assimilação, acomodação, esquema, coordenações de ações, inferência, generalização,
compreensão, tomada de consciência, conceituação, fazer e compreender) adotados à
pesquisa. Esse procedimento irá permitir o mapeamento das peculiaridades identificadas no
fazer e compreender dos indivíduos pesquisados, viabilizando a construção de articulações
entre o processo de compreensão das funções harmônicas básicas dos três sujeitos
pesquisados.

4.3 Parâmetros das análises

O desenvolvimento da compreensão das funções harmônicas básicas (Tônica e


Dominante) será analisado a partir do fazer musical das crianças com o acordeom, dos
diálogos verbais estabelecidos com o professor na sala de aula, e pelas condutas dos alunos
frente aos questionamentos colocados nas entrevistas clínicas realizadas nas aulas. Isso
permitirá destacar a conduta do educando frente aos desafios da aprendizagem de acordeom,
procurando perceber no que o sujeito baseou-se para aprender a música em questão na aula.
Será possível identificar se o apoio encontra-se em aspectos motores estritamente, decorando
por contagem de tempos o momento de mudar de função harmônica no acompanhamento
rítmico-harmônico, ou se fundamenta na cadência e na sensação de tensão e repouso existente
na melodia para guiar a interpretação do acompanhamento. Assim, identificaremos, o apoio
sobre a noção de ritmo harmônico, caracterizando, por conseguinte e, com efeito, a efetuação
de generalizações a partir das experiências de aprendizagem construídas com as três músicas
empregadas no estudo. Desse modo será possível desvelar os enlaces lógicos que constituem a

209
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

compreensão das funções harmônicas como conhecimento estruturado e também como


subsídio a aprendizagem de outras obras musicais, ancorado no aparato teórico
epistemológico que embasa esta pesquisa.
Os parâmetros para as análises dirigem a atenção diretamente para as ações das
crianças frente à junção da interpretação da melodia com o acompanhamento rítmico-
harmônico das músicas em estudo. Através das próprias ações das crianças no fazer musical
poderemos observar as relações e conexões do seu pensamento, podendo, eventualmente,
pedir esclarecimentos sobre como conseguiram desempenhar determinada tarefa, ou superar
um obstáculo posto em evidência. O interesse é explicar o desenrrolar da compreensão das
funções harmônicas básicas no acordeom, sabendo que é preciso fazer para compreender, e
tendo a hipótese de que é preciso ter construída as noções tensão, repouso e cadência da
harmonia tonal, estando envolvidas as noções de consonância e dissonância (sons que
combinam ou não). A observação clínica será baseada nestes princípios teóricos previamente
estabelecidos pelo pesquisador, do contrário ficaríamos a observar qualquer coisa.
Tendo o pesquisador acompanhado o desenrolar do fazer musical dos educandos,
buscará a coerência entre o fazer musical deles durante as aprendizagens e a maneira como
refletem sobre elas, como as verbalizam. Na análise visaremos à interpretação: das reações do
sujeito frente às atividades propostas; das explicações fiduciosas e hesitosas dadas sobre como
fazia para aprender; dos seus comentários arbitrários durante as aulas, revelando momentos
ricos do seu pensar e refletir. Buscar-se-á, sempre, coerência entre os dados analisados e o
corpo teórico proposto, o que caracterizará o grau de confiabilidade da novidade trazida pelo
estudo.
Na análise dos dados, mediante as leituras dos protocolos, pretende-se estabelecer
paralelos entre o pensamento de um e de outro aluno no sentido de identificar patamares
comuns na estruturação do conhecimento sobre as funções harmônicas básicas. O
procedimento comparativo é necessário para aprofundar a compreensão a respeito de um
fenômeno específico para, verdadeiramente, compreender possíveis nuances e diferenças na
aprendizagem musical harmônica, sem, com isso, almejar hierarquizações ou quantificações.

210
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

COSTA-GIOMI, Eugenia. Recognition of Chord Changes by 4- and 5-Year-Old American


and Argentine Children. Journal of Research in Music Education, Spring, vol. 42, 1, 1994a, p.
68-85.

______. Effect of timbre and register modifications of musical stimuli on young children's
identification of chord changes. Bulletin of the Council for Research in Music Education, 121,
1994b, p. 1-15.

______. El desarrollo de la percepción armónica durante la infancia. In: Cuadernos


Interamericanos de Investigación en Educación Musical, n. 002, 999, p. 43-56, 2001a.

______. Young Children’s Harmonic Perception. In: Annals of the New York Academy of
Sciences, 999, p. 477-484, 2003.

COSTA-GIOMI, Eugenia; SANTOS, Regina Antunes Teixeira dos. The effects of instruction
on young children´s perception of tonic and dominant chords. In: Meeting of the Society for
Music Perception and Cognition, 2001, Kingston. Proceedings, 2001b, p. 1-10.

DELVAL, Juan. Introdução à prática do Método Clínico: descobrindo o pensamento das


crianças. Porto Alegre: Artmed, 2002.

KEBACH, Patrícia. A construção do conhecimento musical: um estudo através do método


clínico. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Porto Alegre, 2003.

______. Entrevista clínica piagetiana na verificação das construções representativas dos


parâmetros do som pelas crianças. In: BECKER, Fernando (Coord.). Função simbólica e
aprendizagem. Porto Alegre: Edição Independente, 2002. p. 95-117.

LEVITIN, Daniel J. A música no seu cérebro: a ciência de uma obsessão humana/ Daniel J.
Levitin; trad. de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.

MAFFIOLETTI, Leda de Albuquerque. Diferenciações e integrações: o conhecimento novo


na composição musical infantil. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2005.

MACHADO, André Vargas. Ensino de acordeon: um estudo a partir da prática docente de


dois professores. Monografia (Licenciatura em Música) Curso de Graduação em Música:
Licenciatura, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Montenegro, 2009.

MOTTE, Dieter de La. Armonia. 2ª edição. Barcelona: Editorial Labor, 1994.

PECKER, Paula Cavagni. As condutas musicais da criança entre dois e cinco anos:
trabalhando com os modos do sistema tonal. Dissertação (Mestrado em Educação),
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2009.

211
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

______. A compreensão harmônica sob a perspectiva da criança entre dois e quatro anos. In:
ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 16, E CONGRESSO REGIONAL DA ISME, 2007,
Campo Grande. Anais... Campo Grande: Editora UFMS, 2007, p. 01-05.

PERSCH, Adriano José. O ensino particular de acordeon auxiliado por computador: um


estudo de caso utilizando o software Encore. Monografia (Licenciatura em Música) Curso de
Graduação em Música: Licenciatura, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul.
Montenegro, 2006.

PIAGET, Jean et. al. Tomada de Consciência. Trad. de Edson Braga de Souza. São Paulo:
Melhoramentos, 1977.

PIAGET, Jean et. al. Fazer e compreender. Trad. de Christina Larroudé de Paula Leite. São
Paulo: Melhoramentos, 1978.

REIS, Jonas Tarcísio. Aulas de acordeom na terceira idade: uma abordagem reflexiva sobre
um caso específico. In: CONGRESSO NACIONAL DA ABEM, 18, e SPEM, 15, 2009.
Londrina. Anais... Londrina: ABEM, 2009, p. 320-328.

______. A abordagem do conceito de harmonia tonal nos processos de ensino e


aprendizagem fomentados por dois professores de acordeom na região metropolitana de
Porto Alegre – RS. 118 f. Monografia (Especialização em Música) Curso de Especialização
em Música: Ensino e Expressão, Universidade Feevale. Novo Hamburgo, 2010a.

______. A abordagem do conceito de harmonia tonal no ensino e aprendizagem de acordeom


na região metropolitana de Porto Alegre - RS: dois estudos de caso In: XX Congresso da
ANPPOM, 2010, Florianópolis. Anais... Florianópolis: ANPPOM, 2010b. p. 365-369.

______. A construção do conceito de harmonia tonal através de aulas particulares de


acordeom na região metropolitana de Porto Alegre - RS: três estudos de caso In: SIMPÓSIO
DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS – SIMCAM, 6, 2010, Rio de Janeiro. Anais... Rio de
Janeiro: UFRJ - Escola de Música, 2010c, p. 606-618.

______. O ensino de harmonia no acordeom: reflexões a partir de dois estudos de caso In:
SEMINÁRIO NACIONAL DE ARTE E EDUCAÇÃO, 22, 2010, Montenegro. Anais...
Montenegro: FUNDARTE, 2010d, p. 186-190.

______. O ensino e a aprendizagem de acordeom: reflexões acerca de um caso de educação


musical coletiva em um curso de extensão. In: CONGRESSO NACIONAL DA ABEM, 19,
2010. Goiânia. Anais... Goiânia: ABEM, 2010e, p. 1550-1560.

______. Interlocuções entre Acordeom e Música Popular Gaúcha (MPG): algumas reflexões
envolvendo o ensino musical. In: ENCONTRO DA ABET REGIONAL NORDESTE, 2,
2010. João Pessoa. Anais... João Pessoa: ABET, UFPB, 2010f, p. 01-07.

REIS, Jonas Tarcísio; BEYER, Esther. Música e Acordeom: discutindo experiências de


educação musical na Maturidade In: SIMPÓSIO DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS –
SIMCAM, 6, 2010, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: UFRJ - Escola de Música, 2010.
p. 595-605.

212
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

REIS, Jonas Tarcísio; BÜNDCHEN, Denise. A abordagem do conceito de harmonia tonal nos
processos de ensino e aprendizagem fomentados por três professores de acordeom na região
metropolitana de Porto Alegre - RS: três estudos de caso In: ENCONTRO REGIONAL DA
ABEM - SUL, 13, 2010. Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: Editora Universitária Metodista
IPA, 2010, p. 1-10.

ZANATTA, Maria Aparecida Fabri. Dialetos do acordeão em Curitiba: Música, cotidiano e


representações sociais. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), Universidade Estadual de
Ponta Grossa. Ponta Grossa, 2005.

WEISS, Douglas Rodrigo Bonfante; LOURO-HETTWER, Ana Lúcia de Marques e.


Refletindo sobre a própria prática como pesquisador de auto-narrativas e professor particular
de acordeom. In: ENCONTRO REGIONAL DA ABEM - SUL, 13, 2010. Porto Alegre.
Anais... Porto Alegre: Editora Universitária Metodista IPA, 2010, p. 01-07.

213
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Recriação Musical no Teclado: reflexões pedagógico-musicais com “O


Filho do Piano”

Jonas Tarcísio Reis


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS)/PPGEDU/CAPES -EDUCAMUS/CNPq
jotaonas@yahoo.com.br

Filipe Batista Minho


Secretaria Municipal de Educação
de Porto Alegre (SMED)
fbminho@msn.com

Resumo: A conjuntura atual de efervescência tecnológica resulta em efeitos diretos no ensino


de música, implicando novas possibilidades de vivência e construção de conhecimento
musical. Neste sentido, este trabalho congrega reflexões sobre possibilidades de ensino e
aprendizagem de teclado com crianças, tendo como campo empírico aulas particulares
realizadas por dois professores de música na região metropolitana de Porto Alegre - RS.
Discute-se a importância de considerar o desejo do educando e o seu saber musical informal
na recriação musical no teclado. Abordam-se os recursos disponíveis no instrumento para o
enriquecimento da prática pedagógico-musical, visando a aproximar o aluno do “filho do
piano” (teclado) através de recursos tecnológicos disponíveis nele.
Palavras chave: Teclado, ensino e aprendizagem musical, recriação musical

Introdução

No tempo atual borbulham abundantemente novas informações e surgem, cada vez


mais, novas tecnologias. Isso repercute diretamente na aula de música. Nesse contexto, que
não é novo, o teclado emergiu no cenário do ensino e aprendizagem de instrumentos musicais.
Surgiu não de forma a tomar o espaço do piano - que já está consolidado na cultura musical
ocidental, principalmente -, mas, sim, em um movimento em que as novas tecnologias
permeiam frequentemente as aulas de instrumentos musicais. Esse momento histórico, onde a
tecnologia é grande atriz, leva ao surgimento de interesses diferentes pela aprendizagem
musical, onde a possibilidade de trabalhar e brincar com timbres e outras características do
som e da música, em um instrumento musical harmônico ligado ao nosso tempo, insere os
alunos em um contexto que é inevitável: o de seu cotidiano, da modernidade, da diversidade,
dos sons eletrônicos, etc.
Levando em consideração tais ponderações, este artigo busca trazer reflexões sobre o
ensino de teclado para crianças em alguns contextos específicos, apresentando considerações

214
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

para a área de estudos sobre a recriação1 musical à luz do legado teórico de Jean Piaget e de
discussões realizadas na área de educação musical acerca do ensino do referido instrumento
(SANTOS, 2005, 2006; AMARAL e TAVARES, 2011; VERHAALEN, 1989; OBA e
LOURO, 2010; PEREIRA, 2004; NEVES, 2002). A base empírica advém de aulas realizadas
em escolas particulares de música de Porto Alegre, e também de aulas desenvolvidas no
LARCAMJE (Lar da Criança e do Adolescente Menino Jesus)2, localizado na mesma cidade.
Como as aulas foram desenvolvidas pelos autores, todas as reflexões partem diretamente da
prática destes.
A discussão buscará evidenciar os específicos caminhos seguidos durante a prática
docente que visa a aproximar o aluno do instrumento através de recursos tecnológicos que
estão disponíveis no “filho do piano”. Chamamos “filho do piano” porque o teclado advém
desta necessidade, por razão da evolução tecnológica, de suprir aspectos não saciados no
piano e em seu ensino, sem desconsiderar a técnica e o legado histórico deste. Ou seja,
consideramos que o teclado é a continuação (ramificação) do piano em um contexto moderno
– que está em constante inovação e transformação –, assim como uma família constitui sua
descendência através do nascimento de filhos. Diante disto, encontra-se uma das principais
características do ensino de teclado. As novas possibilidades educacionais musicais
influenciadas pela evolução tecnológica também se tornaram um fator de inclusão de muitos
alunos, tendo também importância a emergência do acesso em larga escala a instrumentos
mais baratos, pois produzidos em grande quantidade.

Considerando o Desejo do Aluno na Recriação Musical no Teclado

No LARCAMJE a proposta de educação musical desenvolvida visa a propiciar o


acesso dos moradores do Lar à educação musical formal, em uma perspectiva construtivista e

1
Ao invés de usar o conceito de execução musical como comumente se tem empregado na área científica de
Educação Musical no Brasil, optou-se pelo termo recriação, pelo fato de que nenhuma obra musical pode ser
apresentada, tocada ou cantada duas vezes da mesma maneira, do ponto de vista psicológico. Toda execução
musical, embora possa ser da mesma música, nunca será idêntica a anteriores, principalmente pelo fato de cada
interprete aplicar os seus conhecimentos musicais no fazer musical específico. Então, cada execução,
verdadeiramente, trata-se de uma recriação musical, visto que emerge visual e sonoramente com variações.
Estas variações podem ser facilmente observadas e identificadas, ou surgir tão sutilmente que somos capazes de
dizer que uma interpretação se dera de modo igual à outra específica apresentação que tomamos por base.
Todavia, os elementos presentes em uma apresentação sempre se diferenciam em algum ponto dos elementos
que constituíram modelos anteriores. Portanto, por mais que determinado professor, sendo adepto de uma visão
epistemológica empirista, queira que a interpretação da obra musical específica, que é objeto de estudo em
determinado momento, seja uma “reprodução mecânica” (KEBACH, 2008), pura, feita pelo aluno, ela não
ocorrerá, por causa dos fatores supracitados.
2
Entidade filantrópica que presta serviços de amparo a crianças e adolescentes menores de dezoito anos de idade
oriundos de situações de vulnerabilidade social.
215
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

libertadora, fundamentada em alguns dos pressupostos teóricos piagetianos e freirenianos, tais


como o respeito ao tempo de aprendizagem do aluno, a valorização do saber informal e das
interações sociais e a autonomia e liberdade para aprender, propiciando uma postura
educativo-musical fomentadora de aprendizagens significativas para os educandos. O foco
principal do ensino é a musicalização por meio da prática de conjunto de flauta doce, canto e
percussão, e individual de teclado e acordeom, enfatizando atividades calcadas no eixo
triádico formado por apreciação, recriação e criação musical3. As músicas usadas para se
aprender a tocar, e aprofundar o nível de domínio sobre o teclado, são as mesmas utilizadas
no ensino dos instrumentos supracitados. São músicas folclóricas e obras musicais retiradas
do cancioneiro popular brasileiro. Isso acontece desta maneira porque o conhecimento prévio
das melodias e dos ritmos das obras musicais tocadas naqueles instrumentos permite a
dedicação maior a outros elementos da música, como harmonia e forma, e da técnica
específica de tocar teclado por parte das crianças. Portanto, no aprendizado a atenção se volta,
inicialmente, para a formação de esquemas motores próprios para a interpretação musical no
teclado das obras que são escolhidas pelos alunos dentre aquelas que já conhecem.
Um dos princípios das aulas de teclado é não expor o aluno à aprendizagem de uma
série grande de elementos musicais ao mesmo tempo, mas sim desenvolver cada conteúdo
musical para promover a construção do conhecimento musical, de forma que a criança se
aproprie e compreenda cada aspecto musical trabalhado em aula. Destarte, também a busca
não é por ensinar a tocar por partitura, compreendendo esse instrumento na sua complexidade
imediatamente, ou fazer com que os alunos sejam detalhistas ou ensinar desde as primeiras
aulas as obras musicais nos seus mais variados elementos formadores, nos mínimos detalhes.
Os processos de ensino e aprendizagem ocorrem com agregação gradual de elementos
musicais que, ao final, resulta na interpretação quase fiel4 da obra tomada como conteúdo. O
indivíduo é levado, através da prática pedagógica e da manipulação ativa do objeto musical a
sucessivas tomadas de consciência (PIAGET et al., 1977; 1978), que o conduzem ao domínio
cada vez mais aprofundado da linguagem musical.
Sabemos que cada sujeito manipula o objeto musical de uma forma diferente, visto
que possui esquemas mentais diferentes (BEYER, 1996). Desta forma, por desenvolverem
diferentes processos de aprendizagem, vários indivíduos que compõem um mesmo corpo
discente assumem objetivos musicais diversos. Por isso, uma recriação musical em conjunto,

3
Para aprofundamentos sobre o ensino musical no LARCAMJE, ver REIS, 2009a; 2009b; 2009c.
4
Usa-se a expressão quase fiel, por tratar-se de uma interpretação que contém elementos e intenções de cada
indivíduo.
216
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

por exemplo, é o somatório das interpretações semelhantes dos interpretes envolvidos. A


recriação musical de uma mesma música por diferentes pessoas carrega características
próprias, principalmente quando aliada a liberdade expressiva, culminando no
desenvolvimento de condutas criativas no fazer musical coletivo.
No entanto, esta recriação musical coletiva normalmente não acontece na escola de
música. Somente ocorrerá se em tal instituição forem oferecidas aulas em grupo que
oportunizem tal vivência aos seus alunos. No entanto, uma das principais características da
aula particular de um instrumento musical, principalmente no ensino do teclado, é a recriação
musical individual.
Em um modelo pedagógico mais clássico, o professor disponibiliza, ao início da aula,
a partitura da nova música que deve ser aprendida até o fim da aula, e o produto final
satisfatório é a simples reprodução do que está escrito na pauta. Por causa de ações docentes
como estas, muitos são os alunos que se decepcionam, porque não vêem relação daquilo que
fazem em aula com o que, verdadeiramente, desejam vivenciar como indivíduos ativos
musicalmente. Desta forma, não há interesse para fazer e, consequentemente, o aluno não
ativa instrumentos cognitivos para resolver problemas e transcender dificuldades.
Portanto, como professores libertadores conscientes de nosso papel educacional,
sabemos que o desejo discente é fundamental para o processo de aprendizagem e, muitas
vezes, este anseio está explícito em frases constantemente ouvidas nas aulas, como “quero
formar uma banda de...”, “vim aprender porque entrei em grupo”, “quero só tocar com
minha família e amigos”, “quero tocar porque gosto do som...”, entre outras, seja da resposta
mais simples a mais complexa, são recorrentes nos discursos de alunos particulares de
instrumento. Entretanto, no ensino tradicional, o professor nem ao menos oportuniza ao aluno
um espaço de liberdade para conhecer sua vivência musical, perguntando sobre suas cobiças e
experiências prévias relacionadas à música. E é neste ponto que se encontra uma das
principais diferenças entre o modelo tradicional e a abordagem construtivista e libertadora.
Neste sentido, levá-lo até a exaustão com reproduções individuais constantes, sem
proporcionar liberdade expressiva e o desenvolvimento da capacidade criativa, ou não
oportunizar momentos onde o aluno possa vislumbrar sua interpretação individual no âmbito
coletivo, pode não produzir relações de significado e, consequentemente, frustrar as
expectativas geradas pelo aluno a respeito do próprio aprendizado musical. E, assim, muitos
são aqueles que, por causa destes motivos, não permanecem nem ao menos seis meses em
uma aula particular de instrumento.

217
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Na contramão disto, o ensino do teclado reaproxima este aluno, em sala de aula, do


contexto modernizado no qual ele está inserido no dia-a-dia. Através dos recursos disponíveis
no teclado, que podem ser utilizados para ampliar a ludicidade como fator preponderante nas
aulas para as crianças, o professor desenvolve práticas que abordam diversos conteúdos, como
pulsação, ritmo, acompanhamento na interpretação musical, reconhecimento de timbres e
estilos, parâmetros do som, etc., de modo ímpar.
Tudo isso se torna mais prático quando contemplamos uma situação típica de uma aula
de teclado. Cada indivíduo cultiva suas preferências musicais e as leva para o aprendizado do
instrumento (sobre o ensino centrado no aluno, ver GLASER; FONTERRADA, 2006). Se o
professor em questão tiver sua ação pedagógica baseada no pensamento construtivista, ele
trabalhará também com o conhecimento e gosto musical trazido pelo aluno, compreendendo
que nunca se aprende algo novo do nada, nunca se parte do zero, pois as bases para as novas
construções, de alguma forma, mesmo sendo esta elementar, já estão lançadas. Nisso, o
diálogo saber formal e saber informal musical (ARROYO et al. , 2000; WILLE, 2003; REIS,
2009d) surge na aula de música como uma ferramenta e uma prática indispensável para a
construção do conhecimento musical do educando de maneira significativa, pois permite o
estabelecimento de relações entre o que se sabe, o que se quer saber, e o que é necessário
saber para atingir um fim que é construído democraticamente entre docente e discente.

Os Desafios do Repertório

Abordar o ensino de músicas pertencentes a estilos musicais recorrentes nos discursos


dos alunos, como o rock, o pop, o pagode, etc., evidencia outra problemática, visto que há a
necessidade de mais instrumentos e pessoas para alcançar o produto sonoro desejado pelo
aluno através de sua interpretação. É neste aspecto que o teclado se encaixa perfeitamente,
evidenciando algumas de suas possibilidades para o trabalho com esse tipo de repertório.
Neste caso, a bateria da versão original da música estudada pode ser programada no teclado.
Podemos programar, também, outros instrumentos musicais, como baixo, guitarra, violão,
entre tantos outros encontrados no instrumento teclado. Logo, o aluno é levado a um processo
de recriação musical em nível de produção de arranjo musical, uma interpretação individual
diferente, que contempla características da música original.

218
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Outro aspecto constantemente vivenciado nesta recriação musical no teclado concerne


à instrumentação da música escolhida. Muitas das grandes obras da música erudita ocidental5
foram compostas para orquestra. Dessa forma, utilizar esse repertório no piano nem sempre
gera o resultado sonoro esperado pelo aluno. As notas que devem ser tocadas, a pulsação
imprimida e a expressão podem estar perfeitas, de acordo com o que foi estipulado, mas “não
é este som que está na música que eu ouço...”, “não está igual à música do CD”, “está
faltando alguma coisa”, são algumas das frases que os alunos costumam afirmar. Como
exemplo, pode-se citar “Assim Falou Zaratustra”, de Richard Strauss, e a “5ª Sinfonia”, de
Ludwig van Beethoven, como obras da música erudita que permanecem no cotidiano musical
da sociedade, seja através da mídia ou relacionamentos familiares ou de amizade. Isto nos
leva a acreditar que este repertório não está distante dos ouvidos das crianças, e que o teclado,
através de seus recursos, pode reaproximar cada vez mais o aluno de estilos musicais que não
seriam contemplados em outras abordagens. Por exemplo, ao interpretar músicas como estas
no piano, a sensação do aluno é que, por mais que as notas estejam corretas, a música não está
completa ainda. Ora, em parte, ele está certo!
Por conseguinte, sendo os alunos de teclado também conhecedores do produto sonoro
destas músicas, muitas vezes, não estarão satisfeitos em ouvi-las somente com a sonoridade
do piano. Nesse ponto se encontra mais um recurso disponível no teclado: a seleção de
timbres. Dessa forma, a mesma interpretação, de uma obra para orquestra, que seria feita no
piano tem um produto sonoro mais aproximado do original, gerando outro significado para o
aluno quando feito no teclado com a seleção de timbres de cordas.
Outro recurso trazido pela evolução tecnológica é a gravação. Assim como acontece
com a voz cantada, tocar e logo após ouvir a interpretação serve como ferramenta para a
correção de erros e lapidação dos resultados obtidos. Isso é possível também no ensino do
teclado, permitindo o acompanhamento da construção do conhecimento musical do aluno a
partir da análise da recriação musical gravada. E, acima de tudo, essa análise não é feita
somente pelo professor, mas, sim, e muito mais, pelo próprio aluno que, ao ouvir sua
recriação, julga quais ações foram corretas e quais devem ser reformuladas na próxima vez,
em um processo constante de ação-reflexão-ação. De tal modo, este recurso tem sido cada vez
mais utilizado pelos professores com o intuito de mostrar para o próprio aluno o

5
Utiliza-se como exemplo a música erudita ocidental com o intuito de fomentar estratégias educativo-musicais
no teclado, trabalhando o repertório comumente utilizado no ensino do piano, mostrando uma abordagem
diferente desse repertório.
219
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

desenvolvimento do seu processo de construção do conhecimento musical: as etapas pelas


quais passa até a obtenção de um produto final.
Nessa linha reflexiva, convém lembrar que o caminho da aprendizagem é regado
também por dois aspectos indispensáveis para qualquer aula de música, seja individual ou
coletiva: interesse e significação. Por exemplo, o aluno que está na aula de teclado ou piano
por que este é o sonho dos seus pais poderá não demonstrar a mesma vontade daquele que
descobriu por si mesmo a preferência em tocar um ou outro instrumento musical. Não basta
estar presente em aula: é necessário o interesse em fazer. Isso produz significado para toda e
qualquer ação discente e gera efetividade para toda e qualquer ação docente. E, atualmente, o
aluno está inserido em um tempo onde o conhecimento sobre o avanço e a evolução
tecnológica é essencial para a sua convivência social. Por esta razão, dentre outras, como a
necessidade de saber mais e de ser mais (FREIRE, 2005), seu desejo em continuar
conhecendo está relacionado com a significação e com a constante construção de novos
conhecimentos a cada aula, a cada instante em que age musicalmente sobre os objetos
musicais e estes sobre ele.
Ao oferecer um ensino em que a cada nova aula coloca-se um novo desafio a ser
superado para o aprofundamento no saber musical, uma nova informação para ser convertida
em conhecimento, e um novo conceito para ser construído, estamos gerando movimentos pela
busca no aperfeiçoamento da arte de tocar teclado. Constantemente, o aluno se sente
desafiado e munido do desejo de superar barreiras e de contornar problemas, que quando
efetivamente resolvidos, fazem com que o aluno passe a acreditar com mais segurança no seu
poder de realização de determinadas tarefas. O indivíduo passa a crer com mais força, com
convicção nas suas capacidades, não só como músico, mas também como ser humano que faz,
que é capaz, que é ativo como aqueles com os quais convive ou dos quais tem informações
(FREIRE, 2005).

Considerações Finais

Refletindo a respeito do aproveitamento das aulas e da transformação das informações


em conhecimento pelos educandos, também fazemos a seguinte aferição: não basta termos
instrumentos, boa infra-estrutura, ótimas intenções pedagógicas e excelente metodologia, pois
o aluno precisa ser cúmplice nesse processo de acreditar no valor da música e do
conhecimento musical para a vida, estando motivado (no sentido de ter desejo de fazer) para

220
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

agir sobre a música e dela retirar elementos para a complexificação da sua cognição musical.
Desse modo, a proposta de educação musical significativa será concretizada.
Por exemplo, Mansion (1999, p. 17) fala sobre a voz, que não basta tê-la, é necessário
fazê-la vibrar melodiosamente, “e para isso se requer muitas condições, mas primeiro e,
sobretudo, o desejo de cantar e o amor ao canto” (idem, tradução nossa). Transportando e
generalizando essa ideia no âmbito da educação musical, entende-se que os alunos, em nosso
caso específico as crianças, precisam ter vontade de tocar, cantar ou fazer atividades
relacionadas à música. Do contrário, estar-se-á desenvolvendo uma prática de ensino
infrutífera, pois os alunos não estarão construindo o conhecimento musical da forma mais
sadia, visto que ninguém aprende aquilo que não quer aprender. Além disso, também não se
estará transformando as vivências musicais em experiências significativas na sala de aula, nas
quais infelizmente o professor obriga, muitas vezes, seus alunos a determinadas práticas e
atividades distantes do interesse e das preferências deles.
A propósito, o gosto por estudar música e por conhecer mais detalhadamente esta área
do conhecimento humano precisa ser cultivado e incentivado desde os primeiros momentos de
vida de uma criança, não basta querer que ela aprenda um ou outro instrumento no momento
que o adulto deseja, como acontece com muitos pais de alunos nossos. Na educação musical
formal isto não deve ser diferente, visto que é dever do educador musical mobilizar recursos
próprios da arte de ensinar ao organizar estratégias que possibilitarão o diálogo do educando
(e tudo aquilo que ele almeja e que, consequente e umbilicalmente, está diretamente ligado às
possibilidades de seu tempo histórico) com a arte musical, com os objetos musicais em
destaque na sala de aula e fora dela, primando pela manutenção em longo prazo deste contato
(REIS, 2010). Esse diálogo é sinônimo de manipulação ativa do objeto musical, de construção
do conhecimento musical subjetivo e também coletivo. Nesse sentido, a prática democrática
da recriação musical individual e em conjunto contribui para a construção de conhecimento
musical de forma efetiva e singular, pois considera o aluno na sua individualidade e lhe
oferece maneiras de expressar a sua subjetividade musical na aula, sem necessariamente estar
ligado a uma prática reprodutivista musical essencialmente.
Ou seja, a necessidade primeira é estruturar um modelo didático-pedagógico
específico em um ambiente democrático para se alcançar a realização de vivências
significativas com a música e de música deveras, contemplando um processo de ensino e
aprendizagem musical progressivo, onde a interação sujeito-objeto é premissa para a
construção de conhecimento musical. Para isso, é crucial estabelecer um diálogo sadio entre o

221
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

saber musical do educando e os conteúdos a serem tratados nas aulas de teclado. Mais do que
aprender e ensinar a tocar teclado é preciso fazê-los dialogando com o professor sobre música
e com música, fomentado uma educação musical onde o processo de ação-reflexão-ação tem
espaço privilegiado e a aprendizagem se dá significativamente por que docente e discente
traçam objetivos juntos.
Por fim, cabe lembrar que,

ao professor de música lhe está reservada uma importante e difícil tarefa.


Seu papel deve ser o de um discreto observador e o de um hábil condutor
que descubra nas atitudes de seus alunos aqueles elementos válidos e, com
singular sutileza focado atue, sem imposições autoritárias caprichosas, de tal
maneira que a criança, trabalhando em um ambiente de liberdade não se
sinta submetida a uma atividade na qual tudo se reduz a repetição de
elaborações alheias (GONZÁLEZ, 1963, p. 19, tradução nossa).

Enfim, cabe ressaltar que este texto é pontual, é sobre um determinado modelo de ação
pedagógico-musical com o teclado. Ele configura-se como um patamar e foco específico das
reflexões dos autores, suscitadas a partir de suas práticas profissionais de educação musical
através do teclado, embasadas na visão epistemológica construtivista piagetiana, que perpassa
todo o texto e a ação em sala de aula dos professores. Acreditamos que as supracitadas
informações e pensamentos sobre práticas pedagógicas com o referido “filho do piano” (assim
chamado o teclado, por derivar diretamente do piano), situadas social e culturalmente, possam
contribuir para novas e produtivas realizações no campo da educação musical, não só no
âmbito da educação infantil, de onde advém a base empírica das menções anteriormente
expostas, mas também em outros níveis de ensino.

222
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

AMARAL, M. L. F. do; TAVARES, V. V. O ensino de teclado coletivo: uma perspectiva no


processo de ensino aprendizagem, metodologias, funções e concepções. In: Encontro
Regional da ABEM Sul, 14, 2011, Maringá. Anais... Maringá: ABEM, 2011, p. 01-09.

ARROYO, M. et al. Transitando entre o “formal” e o “Informal”: um relato sobre a formação


de educadores musicais. In: SIMPÓSIO PARANAENSE DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 7,
2000, Londrina. Anais... Londrina: SPEM, 2000, p. 77-90.

BEYER, E. Os múltiplos caminhos da cognição musical: algumas reflexões sobre seu


desenvolvimento na primeira infância. Revista da ABEM. Porto Alegre: V. 03, Jun. 1996, p.
09-16.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 47° edição. Rio de janeiro, Editora Paz e Terra, 2005.

GLASER, S.; FONTERRADA, M. Ensaio a respeito do ensino centrado no aluno: uma


possibilidade de aplicação no ensino do piano. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 15, 91-99,
set. 2006.

GONZÁLEZ, M. E. Didáctica de la Música. Buenos Aires: Editorial Kapelusz, 1963.

KEBACH, P. F. C. Musicalização Coletiva de Adultos: o processo de


cooperação nas produções musicais em grupo. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de
Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2008.

MANSION, M. El estudio del canto: técnica de la voz hablada y cantada. Tradução de


Francine Debenedetti. Buenos Aires: Ricordi, 1999.

NEVES, Á. M. P. das. O ensino do piano e do teclado: uma proposta metodológica em


educação musical sob a ótica da percepção e da criação. In: ENCONTRO ANUAL DA
ABEM, 11, 2002, Natal. Anais... Natal: ABEM, 2002, p. 71-76.

OBA, C. M. F.; LOURO, A. L. Práticas educativas no contexto do projeto social: dilemas,


reflexões e contribuições para a formação de uma licencianda em música. In: CONGRESSO
NACIONAL DA ABEM, 19, 2010. Goiânia. Anais... Goiânia: ABEM, 2010, p. 1855-1863.

PEREIRA, S. A. O surdo: caminho para educação musical. In: ENCONTRO ANUAL DA


ABEM, 13, 2004, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: ABEM, 2004, p. 966-970.

PIAGET, J. et al. Tomada de Consciência. Trad. de Edson Braga de Souza. São Paulo:
Melhoramentos, 1977.

______. Fazer e compreender. Trad. de Christina Larroudé de Paula Leite. São Paulo:
Melhoramentos, 1978.

REIS, J. T. Música no LARCAMJE: uma proposta de educação musical não-escolar. In:


ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM CATARINENSE DE
EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009a, p. 01-08.

223
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

______. O LARCAMJE e a Educação Musical: Reflexões acerca de uma intervenção


pedagógico-musical em um espaço não-escolar. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE
EDUCAÇÃO, 6, 2009, São Leopoldo. Anais... São Leopoldo: Unisinos, 2009b, p. 01-13.

______. Música folclórica na atualidade: um projeto pertinente de ensino-aprendizagem


através de flauta doce, canto e teclado. In: SEMINÁRIO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA
FEEVALE, 2, 2009, Novo Hamburgo. Anais... Novo Hamburgo: Feevale, 2009c, p. 396-407.

______. A influência da educação musical informal em uma atividade de composição


musical. In: ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-SUL, 12, e FÓRUM CATARINENSE
DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009d, p. 01-07.

______. A formação do educador musical no mundo hodierno: pensamentos necessários


perspectivados na realidade brasileira. Revista da FUNDARTE. Montenegro. Ano 10, n° 20,
2010, p. 44-48.

RÚDIO, F. V. Introdução ao projeto de pesquisa científica. 17ª edição. Petrópolis: Vozes,


1992.

SANTOS, C. V. dos. Teclado eletrônico: a musicalização de adultos em grupo por meio de


um instrumento potencialmente musicalizador e criativo. In: ENCONTRO ANUAL DA
ABEM, 14, 2005, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: ABEM, 2005, p. 01-02.

______. Teclado eletrônico: estratégias e abordagens criativas na musicalização de adultos


em grupo. Dissertação (Mestrado em Música) - Universidade Federal de Minas Gerais, 2006.

VERHAALEN, M. Explorando música através do teclado: guia do professor. Trad. e


Adap. Denise Frederico. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1989.

WILLE, R. B. Educação musical formal, não formal ou informal: um estudo sobre processos
de ensino e aprendizagem musical de adolescentes. Dissertação (Mestrado em Música) -
Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.

224
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Reflexões Acerca do Ensino Musical para Crianças do LARCAMJE:


práticas musicais em um contexto não-escolar

Jonas Tarcísio Reis


Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS)/PPGEDU/CAPES
Lar da Criança e do Adolescente
Menino Jesus (LARCAMJE)
jotaonas@yahoo.com.br

Resumo: Este trabalho revela reflexões acerca de práticas educativo-musicais ocorridas no


LARCAMJE (Lar da Criança e do Adolescente Menino Jesus), localizado em Porto Alegre -
RS. A proposta de educação musical desenvolvida nessa instituição busca propiciar o acesso
de crianças e adolescentes, moradores do Lar, à educação musical formal. O foco principal do
ensino é a musicalização através da prática musical com flauta doce, canto, teclado, acordeom
e percussão, enfatizando atividades de apreciação, interpretação e criação musical. O artigo
visa contribuir com a área de educação musical, baseado no exame dos acontecimentos
educativo-musicais realizados na instituição, que foram registrados na forma de relatórios e
gravações das aulas. Tem por meta, também, cooperar com o alargamento das discussões que
vêm acontecendo no âmbito da educação musical não-escolar infantil e infanto-juvenil, e os
desafios de se trabalhar a música com classes heterogêneas de crianças e adolescentes.
Palavras chave: Ensino instrumental e vocal, espaço não-escolar, educação musical infantil

Introdução

Com a promulgação da Lei 5.692, de 1971, o ensino de música passou a perder seu
espaço nos currículos escolares e na educação básica de um modo geral. Diante da
problemática da polivalência trazida pela referida lei, e pela histórica desvalorização da
profissão de professor da educação básica, os profissionais da educação musical passaram a
ocupar mais extensiva e intensivamente os espaços alternativos para o ensino da música.1
Assim, a educação musical se projetou de forma determinante nos espaços não-escolares,
consolidando um campo de atuação que hoje, expressivamente, se apresenta rico em
experiências. Nesse sentido, abordaremos práticas de educação musical realizadas em um
destes espaços tidos como não-escolares, denominado LARCAMJE (Lar da Criança e do
Adolescente Menino Jesus).
O LARCAMJE é uma ONG onde acontecem práticas de educação musical não-
escolar, porém formais. Esta instituição, além de sanar as necessidades básicas de alimentação

1
Com a promulgação da LDB de 1996 (BRASIL, 1996), e da Lei 11.769/2008 (BRASIL, 2008), a música vem
retomando gradativamente o seu espaço no âmbito da educação básica formal (ver SOBREIRA, 2008).
225
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

e habitação dos residentes, oferece aulas de reforço escolar, de artes plásticas, artesanato,
acompanhamento psicológico, recreação e, logicamente, aulas de música, tudo no contra-
turno escolar. Dessa forma, as crianças e adolescentes que residem na entidade não possuem
tempo ocioso. Eles vivem uma situação semelhante a um regime escolar de tempo integral.
Isso se dá por que a maior preocupação da instituição é formar cidadãos humanos, ativos e
críticos, munidos da maior bagagem possível de conhecimentos para viverem de forma
autônoma na vida adulta, serem donos de seus destinos e poderem escolher uma profissão que
lhes agrade quando ingressarem na fase adulta.
Nesse ambiente as aulas são desenvolvidas com flauta doce, teclado, acordeom,
percussão e canto, ora coletivamente, ora individualmente. O número de alunos varia de três a
doze nas aulas coletivas de música. A faixa etária predominante é de crianças de seis a dez
anos. No texto que segue trataremos de alguns elementos pontuais extraídos e refletidos a
partir da prática de dois anos de educação musical desenvolvida nesse ambiente social,
focando com mais profundidade a prática de canto.

Delineamentos da Educação Musical no LARCAMJE

As concepções de didática e de ensino musical que compõem a metodologia


pedagógica buscam privilegiar a natureza interativa dos alunos, sendo preocupação dominante
que eles participem na procura, no entendimento e elaboração do saber musical, procurando-
se, simultaneamente, atingir a dimensão do saber fazer música, ou seja, proporcionar aos
indivíduos experiências musicais que os ajudem no seu processo de humanização, na sua
busca pelo “ser mais” (FREIRE, 1996), tocando, cantando, criando, recriando, apreciando
música e discutindo sobre ela. Nisso, o trabalho pedagógico-musical apetecido constrói uma
base que abre novas portas para a real aproximação desses educandos com o universo sonoro
desenvolvido e criado pela humanidade ao longo da sua evolução e nas suas diferentes
culturas.
Como na instituição a flauta doce é abordada, cabe lembrar que muitos autores já
falaram sobre o ensino dela, perspectivando diferentes enfoques e em diferentes espaços, com
diversas faixas etárias. Dentre os trabalhos mais recentes podemos destacar Beineke (1997;
2003), Beineke, Torres e Souza (1998), Garbosa (2009), Cuervo (2009), Garcia (2003),
Santos (2007), Souza, Massirer e Garbosa (2010), Weiland (2006), Weiland e Valente (2007),
Diniz e Morato (2005), Vechi e Uriarte (2009), Amaral et. al. (2009), Reis (2009a; 2009b;
2009c; 2011), Fernandes (2009), entre outros que nos ajudam a refletir sobre as possibilidades

226
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de se trabalhar o ensino desse instrumento, que hoje se encontra bastante difundido na área de
educação musical, sendo parte integrante ou carro chefe de inúmeras propostas de
musicalização espalhadas pelo país.
Como a musicalização formal tem, muitas vezes, sido iniciada pelo ensino da flauta
doce, seja na educação básica ou em espaços não-escolares, existe uma grande quantidade de
material didático para o ensino desse instrumento, entre os quais se encontram Suzigan e
Mota (2001; 2002), Frank (2005; 2006), Videla (1985), Tirler (1993, 2006a; 2006b), Beineke
e Freitas (2006), Beineke (2001; 2002), Velloso (2006), para citar apenas os materiais que são
utilizados para a pesquisa de repertório para ser interpretado pelos alunos do Lar.
Existem algumas rotinas no Lar, que às vezes são quebradas, mas em geral a prática de
conjunto de flauta doce é a primeira coisa que acontece. Eles acompanham na partitura a
leitura das alturas das notas musicais, e o ritmo é aprendido por imitação. Em alguns casos um
ou outro aluno toca teclado acompanhando os demais colegas nas flautas e na percussão. O
canto acontece concomitantemente às aulas de flauta doce. Algumas canções não são
cantadas, embora possuam letras, pois os alunos demonstram maiores interesses pela
interpretação instrumental, e também por termos a intenção de montar uma mini orquestra de
flautas doces com um repertório próprio, para posteriormente fazermos apresentações. Mas
não nos enganemos, porque a intenção basilar é formar indivíduos educados musicalmente no
sentido holístico da expressão.
O ensino de percussão também é trabalhado. Os instrumentos de percussão como
pandeiro, bombo, agogô, triângulo e chocalho, aparecem para possibilitar o enriquecimento
da massa sonora obtida na interpretação conjunta dos arranjos, que são construídos
principalmente com obras musicais do folclore nacional e do folclore de outros povos também
(ver REIS, 2009c). O ensino e a aprendizagem de ritmos típicos de gêneros populares como
marchinha, samba e valsa, é facilitado com a utilização de instrumentos de percussão por
permitir que o sujeito se preocupe exclusivamente com o ritmo, o que não acontece através do
canto nem através da flauta doce. Isso traz resultados musicais quase que imediatamente,
gerando cada vez mais desejo ao estudo musical.

O Canto Como Possibilidade Educativo-Musical Ampla

Como afirmado anteriormente, o ensino do canto acontece juntamente com o ensino


de flauta, intercalando um e outro. Ele se dá através das mesmas canções interpretadas na
flauta doce. Além de fixar as melodias e outros parâmetros das músicas trabalhadas na flauta

227
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

doce, a aprendizagem de canto por meio de canções tem implicações diretas na construção e
expansão do vocabulário dos alunos, bem como no seu modo de falar, entoar a voz e articular
as palavras com boa dicção, facilitando a comunicação no dia-a-dia - são habilidades e
competências extramusicais adquiridas com a prática do canto e técnica vocal. “Por meio de
uma canção se põe em prática mecanismos que permitem relacionar logicamente
conhecimentos que de outra maneira a criança acumularia de forma isolada, sem integrá-los
adequadamente no complexo utilitário da sua vida” (GONZÁLEZ, 1963, p. 12, tradução
nossa).
Mansion (1999) fala que o estudo do canto resulta em um desenvolvimento físico e
moral mais saudável da criança:

Primeiro porque a obriga a conquistar uma boa postura do corpo e


desenvolver sua caixa torácica, por meio dos exercícios de cultura física;
segundo porque provoca uma imensa oxigenação, por intermédio dos
exercícios respiratórios; terceiro porque durante a exploração dos
ressonadores, se acusam, nas crianças cujos ressonadores estão
enfraquecidos, deformações e outros problemas, que reclamam os cuidados
de um fonoaudiólogo e/ou um laringologista; quarto porque a prática da
articulação corrige desde o princípio os defeitos de pronunciação das
palavras; e quinto porque o estudo do canto desenvolve o gosto artístico e
por meio do canto em conjunto, cria na criança o espírito de grupo (idem, p.
22, tradução nossa).

Pensando sobre a prática do canto, podemos notar que o trabalho e a utilização da


memória acontecem não só pelo processo de decorar as letras das canções, mas também inclui
a memorização das melodias e movimentos rítmicos das obras musicais. Decorar a letra, a
melodia e o ritmo propiciam a ativação de redes maiores de neurônios entre as diferentes
partes do nosso cérebro. Isso ocasiona uma construção mais concreta, consolidada a nível
cognitivo do conhecimento musical, pois se o indivíduo quiser se lembrar de uma canção que
canta ou já cantou, terá a possibilidade de acessá-la recordando-se do ritmo e/ou melodia e/ou
letra, para citar os três pontos mais evidentes e presentes de uma canção e sem limitar o
incontável número de relações ou informações que nos permitem lembrar algo.
Segundo Janzen (2008, p. 44), muitos estudos que foram realizados sobre a memória e
a aprendizagem musical mostraram “que a memória musical requer memórias associativas,
como por exemplo, aquelas que resgatam informações acerca do gênero, título, compositor,
forma e estrutura dos eventos musicais, mudança de instrumentação, modulações”.
Numa perspectiva semelhante, González (1963) ressalta pontos importantes sobre o
canto, a memória e a aprendizagem musical e seus problemas. Mas creio que o problema

228
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

central não seja o mau uso da memória nas atividades de canto. Acredito que o problema
resida no fator denominado má emissão das alturas. Pois os alunos de canto podem ter
bastante atenção, de modo que estejam suficientemente concentrados na obra musical que está
sendo estudada, também podem estar ouvindo e memorizando perfeitamente, mas ainda não
possuem a capacidade de emitir as notas e as melodias através da sua voz de modo idêntico ao
professor ou como pede a partitura, mesmo que, às vezes, eles não percebam que estão
errando as notas ao cantar, desafinando. Uma hipótese para isso é que eles não possuem
esquemas mentais2 para desempenhar essa função de afinação conforme os padrões e o
modelo de escalas e alturas convencionadas socialmente, nem possuem um domínio vocal
sobre a emissão de notas mais agudas ou graves, pois - no caso de nossos alunos - em muitos
momentos conseguem cantar afinadamente as notas centrais das melodias, sem muitos saltos.
Quanto à desafinação, González (1963) destaca que as causas para ela podem se
condensar em quatro principais, sendo a primeira a falta de atenção do aluno, a segunda a
memória pouco cultivada, onde “os alunos desafinam porque não chegaram a apreender tudo
o que fora escutado e, em consequência, inventam o que não puderam lembrar” (idem, p. 23,
tradução nossa). A terceira é a má audição, “seja ela por má formação orgânica do aparato
auditivo ou por razões patológicas. Uma má audição tem como resultado uma repetição
defeituosa: a criança repete o que ouve” (idem). E a quarta é a má emissão, “também por má
formação orgânica, defeitos no aparato fonador, ou falhas no mecanismo da voz. É
relativamente fácil encontrar casos de alunos que ouvem bem, mas não podem repetir com
exatidão devido a uma falha de seu aparelho fonador” (idem).
Um elemento que ajuda na afinação das notas cantadas é o fato de os alunos do Lar já
tocarem na flauta doce as obras musicais utilizadas no canto. Desse modo, o aprendizado das
canções ocorre de maneira tranquila, pois os alunos têm, apenas, que transportar para o canto
os esquemas metais que já possuem acerca do contorno melódico e rítmico das músicas.
Assim, o principal desafio é decorar as letras das canções. Nota-se que os alunos procuram as
alturas certas das notas com a voz, eles notam que existe uma forma certa de repetir com a sua
voz a canção ouvida, mas ainda não tem consciência do que seja afinação, o propósito é ir
criando essa consciência primeiramente através da prática e posteriormente teorizar acerca
dela.

2
Quanto à definição de esquemas mentais, Beyer (1995, p. 25) afirma que, “os esquemas são um modo prático
da atividade de assimilação do indivíduo. [...] São conjuntos de ações generalizáveis ou possíveis de serem
repetidas e aplicadas a diversas situações ou objetos”.
229
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Reflexão Constante Sobre o Fazer Pedagógico-Musical do Docente

Complementarmente às informações discutidas até agora, se faz oportuno falar que os


alunos são sempre ouvidos durante e depois das aulas, de modo que estas se desdobram de
acordo com as suas intenções, seus pedidos, enfatizando e aperfeiçoando aquilo que eles mais
têm apreço, que mais gostam de fazer. Entender o aluno como um ser ativo na sala de aula e
como foco principal do ensino é militar por uma educação humana, libertadora e que permite
aos educandos a tomada de consciência de que eles não são objetos, mas, sim, sujeitos nos
eventos educativo-musicais e sujeitos da sua aprendizagem.
Com certeza, este processo ao qual chamamos aprendizagem é infinito e ininterrupto.
Todos os seres que possuem vida estão constantemente aprendendo e apreendendo algo do
meio ao qual estão inseridos. O aprender à que me refiro, diz respeito ao aprendizado que
afeta diretamente a vida do indivíduo, aquele que acontece através de nossas experiências, dos
problemas para os quais buscamos soluções. A todo o momento necessitamos aprender mais,
precisamos nos atualizar para lidar com as exigências do mundo externo para com nós, tendo
como finalidade a nossa sobrevivência. Para concluir este pensamento, poderíamos dizer que
o ser humano é o próprio processo do aprender, pois ele se auto-constrói, e se modifica para
seguir aprendendo.
O ser humano só aprende aquilo que quer, aquilo que é necessário, aquilo que
provocará modificações significativas na sua vida, na sua personalidade ou nas suas atitudes.
Por isso a importância de considerar a opinião do educando no processo de ensino-
aprendizagem, visto que o interessado maior é ele. Ele experimentará uma educação musical
mais significativa quando os seus anseios estiverem sendo contemplados na pedagogia
musical de seu educador, pois aprender é buscar o que há de melhor para nós, buscar a
felicidade - em nosso caso através do fazer musical - e todas as outras formas de realização
humana.
O problema que ocupa um ponto central nas reflexões desencadeadas durante e depois
das aulas, e diríamos também que este é o foco principal e desencadeador dos processos de
formulação e reformulação da proposta metodológica e pedagógico-musical desenvolvida
com os educandos do Lar, se defini pela busca da compreensão acerca do desenvolvimento
cognitivo, afetivo e comportamental desses indivíduos. A lógica central dessas reformulações
reside na procura de soluções para problemas técnicos, práticos e expressivos no tocante ao
ensino e à aprendizagem musical.

230
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Nesse sentido, se origina a procura por um ensino que avalia o desenvolvimento


musical dos alunos, que observa as suas participações em aula, as suas atitudes frente aos
diferentes modos de se abordar e vivenciar a música nesse espaço, bem como o
aproveitamento e a transformação de informações em conhecimento concreto e consolidado a
nível cognitivo e exteriorizado.
A meta norteadora é identificar possíveis problemas cognitivos, comportamentais e
emocionais que têm implicações diretas e determinantes, não só na aprendizagem musical,
mas no desenvolvimento global dos alunos. Essa meta coaduna-se com o sentimento de
comprometimento social e humano que todo o educador precisa nutrir na sua prática diária
pelo seu público alvo, os alunos, almejando atingir e suscitar o desenvolvimento do ponto de
vista intelectual, ético e humano, no sentido mais intenso dessas palavras. Aqui, toma forma e
força o objetivo idealizado de promover o acesso a educação musical formal, e
consequentemente a uma gama inumerável de saberes que refletirão de forma decisiva na
formação individual desses alunos.
Busca-se, também, interpretar os acontecimentos de aula, focando-se ora em um aluno
ora em outro, procurando compreender como esses alunos estão sentindo a aula. Se eles estão
aproveitando consideravelmente as aulas. Se as atividades são interessantes, ou se elas estão
aquém daquilo que os educandos são capazes de realizar, e se os saberes discutidos em aula
estão sendo compreendidos, assimilados, interiorizados pelos educandos.
Em muitos momentos, solicita-se para os alunos explicações sobre determinada
passagem musical, sobre determinada entrada, sobre dinâmicas específicas, sobre a existência
ou não de acidentes musicais nas melodias, sobre a mudança de andamento, entre outros
questionamentos para mensurar na prática o nível de compreensão das informações
trabalhadas em aula. Eis aí a busca pela construção de saber musical autêntico, definido dessa
forma pelo jeito como emerge. Surge a partir da prática e vai em direção a explicitação verbal
dos conhecimentos adquiridos. Não que a construção desse saber não seja notada nos gestos
musicais durante as práticas em conjunto, mas, sim, pela objetivação da construção teórica,
conceitual acerca de fenômenos musicais.

Considerações Finais

Entender o mundo interno de cada indivíduo do grupo em questão, e como esse mundo
se estrutura, pressupõe ouvir os alunos, ficar a par de suas angústias, desejos, quereres,
anseios e objetivos de vida, mesmo que em um processo de metamorfose constante, não só

231
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

quanto à música em específico, mas, também, em relação às suas expectativas de vida futura e
presente, suas metas pessoais quanto a sua existência e atuação num futuro próximo.
As limitações, sejam da ordem mental ou motora, podem gerar na aula de música o
sentimento de solidariedade com o outro, a construção mútua do conhecimento musical
acontece à medida que as pessoas vão interagindo, umas ajudando as outras. Existe certo
companheirismo crucial para a consolidação de uma educação musical de qualidade. Com
base nessa aferição podemos pensar na busca pelo “ser mais” de cada indivíduo (FREIRE,
1996), que se transforma também, pela transformação do “ser mais” dos outros, onde a
experiência do colega influencia na concretização de sua própria experiência. Principalmente
quando estamos tratando de interpretação musical e aprendizagem em conjunto. Nessas
práticas há a relevância e a importância em se aprender não só com a própria experiência, mas
do mesmo modo com os erros e acertos de nossos pares.
Considera-se, também, com base me nossa experiência no LARCAMJE, que não se
pode mais sustentar um ensino musical baseado em atividades específicas e repetitivas, pois
com isso o interesse dos alunos pela busca e aperfeiçoamento na linguagem musical se
apresenta comprometido. O ensino e aprendizagem formal de música só acontecem
efetivamente quando as proposições da instituição, do professor e dos alunos culminam em
uma única meta. Conteúdos de música só são aprendidos quando estes passam a fazer sentido
para os educandos. Ou seja, se a música não assume uma aplicabilidade própria na vida dos
educandos, o trabalho pedagógico-musical perde força e eficácia na busca por impactar
significativamente a construção humana, cognitiva e intelectual dos sujeitos educandos.
É mister para o educador musical, independentemente do contexto institucional,
social e cultural em que desenvolva seu trabalho, pensar com dedicação e observar com
acuidade o modo como os educandos estão agindo em sala de aula e fora dela também. Temos
notado a importância disso no LARCAMJE. Saber se a aula fora agradável do ponto de vista
deles; procurar compreender como realmente se dera o desenvolvimento da aula; quais foram
as dificuldades e facilidades apresentadas durante o processo educativo; quem gostou disso,
quem gostou daquilo; o que funcionou, o que não funcionou com esse grupo, são todos
questionamentos que precisam estar presentes na práxis do professor de música. Assim o
processo de ação-reflexão-ação é um caminho a ser percorrido sempre que o objetivo de
desenvolver uma prática de ensino musical atual, comprometida e significativa for um
pensamento norteador.

232
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências
AMARAL, M. F. et. al. Desenvolvendo a leitura e escrita de partituras nas séries iniciais a
partir da flauta doce. In: ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM
CATARINENSE DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009,
p. 01-04.

BEINEKE, V. O ensino de flauta doce na educação fundamental. In: HENTSCKE, Liane


(org.); DEL BEN, Luciana (org.). Ensino de música: propostas para pensar e agir ema sala de
aula. São Paulo, Moderna, 2003, p. 86-100.

______. A Educação Musical e a Aula de Instrumento: Uma visão crítica sobre o ensino da
flauta doce. Revista Expressão, Santa Maria, v.1 (1-2) p. 25-32, jan/dez. 1997.

______. Canções do mundo para cantar. Vol. 02. Florianópolis: Cidade Futura, 2002.

______. Canções do mundo para cantar. Vol. 01. Florianópolis: Cidade Futura, 2001.

BEINEKE, V.; FREITAS, S. P. R. Lenga la lenga: jogos de copos e mãos. São Paulo:
Ciranda Cultural, 2006.

BEINEKE, V.; TORRES, M. C.; SOUZA, J. Tocando flauta doce de ouvido: análise de uma
experiência. In: ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 07, 1998, Recife. Anais... Recife: ABEM,
1998, p. 01-11.

BEYER, E. A construção de conceitos musicais no indivíduo: perspectivas para a educação


musical. Em Pauta, Porto Alegre, Vol. 09/10, p. 22-31, Dez. 1994/Abril 1995.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro


de 1996.

BRASIL. Leis Ordinárias de 2008. Lei n° 11.769/2008. Altera a lei n° 9394/1996, de 20 de


dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação para dispor sobre a obrigatoriedade
do ensino de música na educação básica. Brasília, 2008. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/lei/L11769.htm>. Acesso em: 27
maio. 2011.

CUERVO, L. da C. Musicalidade na performance com a flauta doce. Dissertação (Mestrado


em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Educação.
Programa de Pós-Graduação em Educação, Porto Alegre, 2009.

DINIZ, J. A. R.; MORATO, C. T. Mini-curso de flauta doce e bandinha rítmica para crianças
de 6 e 7 anos: uma experiência com a fundamentação metodológica na disciplina Prática de
Ensino do Curso de Educação Artística Habilitação em Música da Universidade Federal de
Uberlândia (Ufu). XIV ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 14. Anais... Belo Horizonte, 2005.

DÓRIS, H.; GARBOSA, L. W. F. Desafios de uma educadora musical em formação: um


relato de experiência. In: ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM
CATARINENSE DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009,
p. 01-07.
233
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

FERNANDES, R. Iniciação ao instrumento: uma experiência com ensino de flauta doce. In:
ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM CATARINENSE DE
EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009, p. 01-07.

FRANK, I. M. Pedrinho toca flauta: uma iniciação musical através da flauta doce para
crianças, Vol. 1. 12ª edição. Ed. Sinodal. São Leopoldo, 2005.

______. Pedrinho toca flauta: uma iniciação musical através da flauta doce para crianças,
Vol. 2. 7ª edição. Ed. Sinodal. São Leopoldo, 2006.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo.


Editora Paz e Terra, 1996.

GARBOSA, G. S. O ensino da flauta doce no curso de licenciatura em música da UFSM. In:


CONGRESSO NACIONAL DA ABEM, 18, 2009, Londrina, Anais... Londrina: ABEM,
2009. p. 844-850.

GARCIA, E. do C. P. Flauta doce soprano: construindo uma habilidade técnica em educação


musical. In: ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 12, 2003, Florianópolis, Anais...
Florianópolis: ABEM, 2003. p. 279-284.

GONZÁLEZ, M. E. Didáctica de la música. Buenos Aires: Editorial Kapelusz, 1963.

JANZEN, T. B. Pistas para compreender a mente musical. Cognição & Artes Musicais/
Cognition & Musical Arts 3, 42-49. 2008.

MANSION, M. El estudio del canto: técnica de la voz hablada y cantada. Tradução de


Francine Debenedetti. Buenos Aires: Ricordi, 1999.

REIS, J. T. Música no LARCAMJE: uma proposta de educação musical não-escolar. In:


ENCONTRO REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM CATARINENSE DE
EDUCAÇÃO MUSICAL, 5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009a, p. 01-08.

______. O LARCAMJE e a Educação Musical: Reflexões acerca de uma intervenção


pedagógico-musical em um espaço não-escolar. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE
EDUCAÇÃO, 6, 2009, São Leopoldo. Anais... São Leopoldo: Unisinos, 2009b, p. 01-13.

______. Música folclórica na atualidade: um projeto pertinente de ensino-aprendizagem


através de flauta doce, canto e teclado. In: SEMINÁRIO DE POS-GRADUAÇÃO DA
FEEVALE, 2, 2009, Novo Hamburgo. Anais... Novo Hamburgo: Feevale, 2009c, p. 396-407.

______. Flauta doce no ensino fundamental: uma experiência de educação musical no


município de Porto Alegre – RS. In: ENCONTRO REGIONAL NORDESTE DA ABEM, 10,
ENCONTRO REGIONAL NORDESTE DOS PROFESSORES DE MÚSICA DOS IFETs,
01, e FÓRUM PERNAMBUCANO DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 01, 2011, Recife. Anais...
Recife: ABEM, 2011, p. 01-09.

234
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

SANTOS, C. Ensino coletivo de instrumento: uma experiência junto ao Grupo de Flautas do


Projeto “Musicalizar é Viver”. In: ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 16, 2007, Campo
Grande, Anais... Campo Grande: ABEM, 2007. p. 01-06.

SOBREIRA, S. Reflexões sobre a obrigatoriedade da música nas escolas públicas. Revista da


ABEM. Porto Alegre, V. 20, 45-52, set. 2008.

SOUZA, Z. A. de; MASSIRER, L. A.; GARBOSA, G.Sampaio. Ensinando flauta doce num
projeto social: relato de uma experiência em Santa Maria/RS. In: ENCONTRO REGIONAL
DA ABEM - SUL, 13, 2010, Porto Alegre, Anais... Porto Alegre: ABEM, 2010. p. 01-06.

SUZIGAN, M. L. C.; MOTA, F. Método de iniciação musical para jovens e crianças: flauta
doce. Vol. 1. 2ª edição. Editora G4. São Paulo, 2001.

______. Método de iniciação musical para jovens e crianças: flauta doce. Vol. 2. Editora G4.
São Paulo, 2002.

VECHI, H.; URIARTE, M. Z. A educação musical através da flauta doce. In: ENCONTRO
REGIONAL DA ABEM-Sul, 12, e FÓRUM CATARINENSE DE EDUCAÇÃO MUSICAL,
5, 2009, Itajaí. Anais... Itajaí: ABEM, 2009, p. 01-05.

VELLOSO, C. A. Sopro Novo Yamaha: caderno de flauta doce contralto. São Paulo: Irmãos
Vitale, 2006.

VIDELA, M. Método para Flauta-doce soprano. Vol. 1. São Paulo: Ricordi Brasileira, 1985.

TIRLER, H. Vamos tocar flauta doce: 38 canções infantis brasileiras muito fáceis em arranjos
para das flautas-soprano. 29ª Edição. Vol. 01. São Leopoldo: Sinodal, 2006a.

______. Vamos tocar flauta doce: 36 canções infantis brasileiras muito fáceis em arranjos
para das flautas-soprano. 15ª Edição. Vol. 02. São Leopoldo: Sinodal, 2006b.

______. Vamos tocar flauta doce: canções de Natal. Vol. 05. São Leopoldo: Sinodal, 1993.

WEILAND, R. L. Aspectos figurativos e operativos da aprendizagem musical de crianças e


pré-adolescentes, por meio do ensino de flauta doce. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Universidade Federal do Paraná. Programa de Pós-Graduação em Educação, Curitiba, 2006.

WEILAND, R. L.; VALENTE, T. S. Aspectos figurativos e operativos da aprendizagem


musical de crianças e pré-adolescentes, por meio do ensino de flauta doce. Revista da ABEM.
Porto Alegre, V. 17, 49-57, set. 2007.

235
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Notação Musical na Infância: um processo gerador de subjetividade


Sandra Rhoden
smrarte@yahoo.com.br

Resumo: a presente comunicação é um recorte da minha pesquisa de Mestrado que aborda a


subjetividade presente no fazer musical infantil. De modo específico, busca compreender os
processos subjetivos das notações musicais, de um grupo de nove crianças, com idade entre 4
a 6 anos, alunos de musicalização da FUNDARTE. A epistemologia da pesquisa qualitativa e
subjetividade, defendida por Gonzáles Rey, orienta a escolha metodológica e os conceitos
relevantes da investigação, adotando-se o estudo de caso como estratégia de pesquisa. A
subjetividade das notações musicais das crianças foi compreendida, a partir de núcleos
configurados em torno da materialidade, das narrativas, das relações interpessoais e
simbologias compartilhadas no processo dialógico que envolveu as crianças participantes e o
pesquisador. Os aportes teóricos de Silvia Helena Cruz e colaboradores (2008) possibilitaram
que as interações dessa pesquisa fossem guiadas pela voz das crianças, para então apreender
os fundamentos de sua subjetividade.
Palavras-Chave: Notação musical, subjetividade, pesquisa com crianças

Introdução

Compreender o que meus alunos estavam representando no papel, e qual o sentido e o


significado subjetivo, para si mesmos, dessas representações, passou a ser uma inquietação
para mim no decorrer da minha prática pedagógica. Para entender melhor suas produções,
procurei dialogar com as crianças, buscando saber um pouco mais sobre a presença de
elementos, não necessariamente musicais, que surgiam nos registros de suas criações
musicais. Solicitei que as crianças falassem sobre o que tinham anotado, e pude perceber que
suas explicações ultrapassavam as questões musicais, parecendo estar completamente absortas
ao registro dos elementos formadores da música (altura, duração, intensidade, timbre, ritmo e
melodia).
A partir das inquietações sobre as notações musicais, realizadas pelos meus alunos, e,
considerando, principalmente, os comentários que faziam sobre as notações musicais que
realizavam, percebi que essas informações eram preciosas e que necessitavam de um maior
questionamento: por que as crianças trazem elementos de sua vida pessoal e social para as
notações musicais? O que ocorre durante o processo da atividade de notação musical? Qual o
sentido e o significado subjetivo das notações musicais das crianças?

236
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Estudos Sobre a Notação Musical da Criança

Revisando a literatura sobre a notação musical, encontrei pesquisas recentes e


importantes para a área da educação musical, dedicadas à alfabetização musical
(BAMBERGER 1990; CESTARI 1983; FREY-STREIFF 1990; LINO 1998; SALLES 1996).
As pesquisas focalizam a compreensão da criança ao realizar a notação musical do ritmo e da
melodia, buscando também uma explicação para o desenvolvimento cognitivo que ocorre
nesse processo. Também chamam a atenção sobre as formas de organização e reorganização
que o sujeito realiza ao apreender e realizar a notação musical. Além de traduzir o seu
conhecimento musical, ao realizar notações, adquire e desenvolve o conhecimento cognitivo.
Refletindo sobre os estudos, verifica-se que não foi intenção dos autores analisarem o
lado subjetivo do sujeito e, sim, como ele representa graficamente aspectos relacionados à
música, juntamente com as contribuições para o seu desenvolvimento cognitivo. De acordo
com Cruz (2008, p. 12) “os julgamentos, os desejos, os receios, as preferências das crianças,
geralmente não têm sido alvo de interesse de estudo”. Nesse sentido, percebi a necessidade de
ampliar o olhar da pesquisa, prestando atenção no que a criança revela, em todo o processo de
notação, uma vez que o contexto das crianças é evidente e presente nas suas grafias.

Estudos Sobre o Método

A pesquisa qualitativa orienta-se pela produção de sentidos subjetivos e significados


do sujeito participante, no espaço em que ela ocorre. Por esse motivo, compreende a
importância da subjetividade inserida no método.
A subjetividade é caracterizada pelo mundo interno do ser humano, através do seu
íntimo, expressando emoções, sentimentos e pensamentos, que serão responsáveis pelas
relações com as outras pessoas.
De acordo com Gonzáles Rey (2005b, p. 36), o termo subjetividade é definido como
“um sistema complexo de significações e sentidos subjetivos produzidos na vida cultural
humana”. A subjetividade está presente tanto no sujeito individual, como nos vários espaços
sociais em que ele se insere, sendo, tanto o individual quanto o social, aspectos constituintes
da subjetividade.

237
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Subjetividade: sentido e significado

A nossa realidade é constituída por elementos objetivos, que influenciam a formação


da nossa subjetividade. Essa mesma realidade não deixa de ser subjetiva, quando os elementos
objetivos ganham um sentido subjetivo, a partir das significações já construídas, que fazem
parte da nossa história e das significações do momento atual. Essa relação forma uma
complexidade, dificilmente, compreensível fora do terreno das significações.
O sujeito se expressa e se integra no processo de fazer sentido no que Gonzáles Rey
chama de “configurações”, tornando-se capaz de agir, de modo colaborativo. A dimensão
social da subjetividade não significa que ela é externa, mas que forma, com a dimensão
interna, uma só configuração, capaz de gerar vários sentidos e significados. Para debater sobre
o sentido e o significado é preciso compreender para apreender a complexidade que esses
termos geram.
Para Aguiar e Ozella (2006, p. 225), “os significados são produções históricas e
sociais, são eles que permitem a comunicação, a socialização de nossas experiências”. Desse
modo, qualquer atividade realizada pelo sujeito gera significados, pois ele “transforma a
natureza e a si mesmo na atividade”. O significado também pode ser compreendido pelas
apropriações que o sujeito constitui e compartilha, a partir da sua subjetividade. Sob o ponto
de vista de Gonzáles Rey (2004, p. 60), “os significados não geram emoções de forma direta”,
sendo o contrário do sentido que transcende o significado, pois não pode ser entendido como
uma dialética natural externa do sujeito.
De acordo com Aguiar e Ozella (2006, p. 227), “o sentido coloca-se em um plano que
se aproxima mais da subjetividade que, com mais precisão, expressa o sujeito, a unidade de
todos os processos cognitivos, afetivos e biológicos”. Da mesma forma, Gonzáles Rey
(2005a) amplia o seu olhar pelo sentido, quando diz que:

O sentido não aparece de forma direta na expressão intencional do sujeito,


mas sim diretamente na qualidade da informação, no lugar de uma palavra,
em uma narrativa, na comparação das significações atribuídas e conceitos
distintos de construção, no nível de elaboração diferenciado no tratamento
dos temas, na forma como se utiliza a temporalidade, nas construções
associadas a estados anímicos diferentes nas manifestações gerais do sujeito
em seus diversos tipos de expressão (GONZÁLES REY, 2005a, p. 116).

238
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Partindo das contribuições teóricas sobre o sentido e o significado, podemos


compreender que o significado é o ponto de partida para a configuração do sentido subjetivo
do sujeito. A determinação de um espaço simbólico, onde o sujeito realizará alguma
atividade, oportunizará a produção de sentido. Para abordar o sentido e o significado das
representações sociais do sujeito, intrínsecas na subjetividade social e individual, Gonzáles
Rey sugere a criação de um cenário de pesquisa
Com a finalidade de compreender o sentido e o significado subjetivo da notação
musical das crianças, esta pesquisa foi construída, na perspectiva da pesquisa qualitativa e
subjetividade experimentada e defendida por Gonzáles Rey1. Para este autor, o estudo da
subjetividade está vinculado aos métodos de pesquisa, que tornam possíveis a sua observação.
No caso da presente pesquisa, as manifestações empíricas dos sujeitos assumem o valor de
informação, a partir do qual o pesquisador construirá novos conhecimentos.
Outro fator importante abordado na Epistemologia Qualitativa é a legitimação do
singular como instância de produção de conhecimento científico. A singularidade na produção
de conhecimento está intimamente conectada à compreensão subjetiva do sujeito investigado,
à sua cultura e à sociedade na qual se insere.
Seguindo os passos da pesquisa qualitativa e subjetividade, compreendi que a
construção do conhecimento, a partir das manifestações empíricas, é um processo vivo e
constante, uma descoberta que acontece entre o pesquisador e os sujeitos participantes da
pesquisa, sendo assim possível atribuir o sentido e o significado ao que se constrói.
Para a realização das notações, inicialmente, deixei as crianças vivenciarem,
individualmente ou em pequenos grupos, os instrumentos de percussão (coco, clavas, pau-de-
chuva, caxixi, tambor, metalofone, xilofone, entre outros). Para Maffioletti (2005), esta é uma
das etapas em que o professor deve ter um olhar direcionado. Nas palavras da autora:

A exploração livre dos instrumentos musicais é um espaço para muitas


aprendizagens, tanto para o aluno como para o professor. Nem tudo o que a
criança realiza traduz-se em aprendizagem, porque ela poderá ou não
integrar suas experiências; poderá modificar ou não sua forma de interação
com os instrumentos musicais (MAFFIOLETTI, 2005, p. 34).

Após explorarem os instrumentos e escolherem um para trabalhar, solicitei que


formassem duplas ou trios para a realização da composição musical. Para Leite (2008, p.
124), o trabalho em grupo favorece os ecos e vozes diferentes, bem como “a concepção de
1
Fernando Luis Gonzáles Rey – é doutor em Psicologia, pelo Instituto de Psicologia Geral e Pedagógica de
Moscou e doutor em Ciências (pós-doutorado), pelo Instituto de Psicologia da Academia de Ciências da União
Soviética.
239
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

linguagem e o papel do outro na constituição do sujeito e na formação da consciência”.


Procurei colocar sempre uma dupla ou trio de crianças em frente à câmera de vídeo, para
capturar todo o processo de trabalho realizado por eles, bem como os momentos de
intervenção do pesquisador. Sem ter que deslocar a câmera, enquanto circulava pelos outros
grupos, tinha em mãos um gravador MP4, pois a gravação em áudio garantiria a captura do
processo dialógico das crianças, ao elaborarem suas criações musicais e notações. Minha
intervenção nos grupos não tinha caráter de entrevista, pois não estava prevista, na
metodologia, uma relação de perguntas fechadas; porém, realizei algumas questões que
puderam ampliar o processo dialógico.
Ao tocarem e narrarem suas produções, o sentido e o significado subjetivo, eram
traduzidos pelas emoções vividas e proporcionadas, na atividade de notação musical.
Observei minuciosamente suas vozes, seus gestos e a intenção em revelar suas produções, de
maneira viva.
A maneira como as crianças se organizavam, nos grupos de trabalho, as ações que
realizavam, as concordâncias e as divergências, levaram-me aos indicadores necessários para
a construção dos futuros núcleos de análise.
Os indicadores, presentes nos trechos de informação, me possibilitaram a identificação
de conteúdos importantes, que surgiam com frequência nos momentos analisados. De acordo
com Aguiar e Ozella (2006, p. 231), a partir da “articulação dos conteúdos semelhantes,
complementares ou contraditórios seria possível verificar as transformações e contradições
que ocorrem no processo de sentido e significado”. Conforme essa orientação, a análise dos
núcleos, na minha pesquisa, estaria alicerçada em trechos de informações, com relação à
maneira como o sujeito pensa, age, sente e se expressa, em todo o processo da notação
musical.

A Construção dos Núcleos

Partindo dos indicadores que expressavam regularidades, na expressão das condutas


das crianças, e que pudessem revelar a presença de sentido e significado subjetivo, intrínsecos
em todo processo referente à notação musical, foram identificados quatro núcleos para
análise. Esses núcleos compreendem os conteúdos principais expressos pelas crianças que, de
alguma maneira, traduzem o envolvimento emocional, dos sujeitos participantes.

240
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Baseando-me nos estudos de Correia e Meira (2008), elaborei os meus núcleos. Esses
núcleos foram categorizados como materialidade, narrativa, relações interpessoais e
simbologia.

Os núcleos geradores da subjetividade

Os núcleos tornaram inteligíveis os processos de construção de sentido e significado


subjetivo produzidos pelas crianças. Para valorizar as informações em que os núcleos se
fazem presentes, recortei dos protocolos os trechos dialógicos que anunciavam a presença da
materialidade, da narrativa, as relações interpessoais e simbologias. Retomando as leituras
sobre a pesquisa qualitativa e subjetividade, defendida por Gonzáles Rey (2005a), a
articulação entre o material empírico e a teoria deu lugar ao processo construtivo-
interpretativo do conhecimento, gerado por essa pesquisa. A partir desse momento, as
manifestações empíricas foram compreendidas como informações essenciais, na interpretação
da realidade analisada.
Com base nas análises realizadas, entendo que o sentido subjetivo e o significado da
notação musical das crianças não pode ser identificado em um núcleo apenas, mas estão
presentes em todo o processo que inclui a escolha dos instrumentos, a criação de narrativas, as
relações interpessoais e a simbologia. Às vezes, com maior intensidade, em um momento do
que em outro.
A subjetividade, que a criança expressa em suas notações, são reveladas no modo
como ela constrói suas notações musicais, na maneira como se organiza, como desenvolve
suas narrativas, pelo seu imaginário, pelo seu contexto individual e social. Também se
expressa no modo como se relaciona com seus pares, até eleger um símbolo, onde representa
suas vivências como uma totalidade integrada.

Conclusões

Sendo a subjetividade um tema de grande complexidade, entendo que minhas


inquietações não se esgotariam nessa investigação, e, por isso, procurei delimitar, ao máximo,
minhas expectativas, adotando um único referencial teórico que abordasse, em sua

241
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

metodologia, estudos sobre a subjetividade, procedimentos e conceitos relevantes sobre o


tema.
A materialidade, a narrativa, as relações interpessoais e a simbologia são modelos de
interpretação teórica, que tornaram inteligíveis os processos de sentido e significado subjetivo
das notações musicais das crianças, porque valorizaram o sujeito individual concreto, sua
história e sua capacidade de reflexão e construção.
A materialidade apareceu como primeiro núcleo, pois foi o momento em que as
crianças escolheram os instrumentos para a atividade de notação musical e definiram, a partir
do som de cada instrumento, os personagens ou elementos que dariam vida à notação musical.
A construção do significado depende da significação que cada criança atribui para o
instrumento de sua preferência.
A narrativa teve como objetivo principal gerar subjetividade. O corpo da notação
musical foi construído, a partir da narração de vivências, histórias e imaginação, trazidas da
subjetividade individual e social de cada criança, como parte de um único sistema, gerando
sentido e significados, através do que a criança falou, e na maneira como se expressou.
As relações interpessoais foram responsáveis pelo surgimento dos recursos subjetivos
empregados pelas crianças frente às possíveis situações de conflitos. O acolhimento das
sugestões entre os participantes, a liderança e a negação em participar da atividade de notação
musical, o modo de agir, falar ou se expressar corporalmente, foram formas de manifestação
das emoções vividas e geradoras de sentido.
A simbologia traduziu, através do desenho, o resultado de todo o caminho que foi
percorrido pelo grupo de trabalho, da materialidade à simbologia. Cada integrante pertencente
a um grupo de trabalho foi representado e significado simbolicamente, trazendo um contexto
de sentido para cada uma das notações. Várias condições subjetivas foram retratadas nestes
contextos.
Ao realizarem a atividade de notação musical, as crianças trouxeram elementos de sua
subjetividade individual, atreladas à subjetividade social, que são os diferentes espaços por
onde ela transita. O individual e o social de cada criança estiveram presentes em todo o
processo, sendo possível perceber este elo na maneira como se expressaram e o que disseram,
gerando, assim, sentidos e significados subjetivos para as notações musicais.
A elaboração desta investigação também possibilitou o contato com pesquisas e
artigos relacionados à Psicologia e à Sociologia da Infância, que enfatizam a importância de

242
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ouvir e realizar pesquisa com crianças, bem como as bases metodológicas para a sua
realização.
A presente pesquisa foi um estudo de caso realizado com um grupo de crianças
dotadas de uma singularidade própria. Por essa razão, não pode ser enquadrada em uma
concepção única sobre a subjetividade das notações musicais, realizadas pelas crianças.
Ao identificar o sentido e o significado das notações musicais das crianças, desenvolvi
um novo olhar para as suas produções. Acredito que esta pesquisa poderá contribuir como um
referencial para futuras pesquisas, a serem realizadas em outros contextos e áreas da
educação, contemplando o sentido e o significado.
Retomando e reforçando a importância da voz da criança nesse processo, recomendo o
desenvolvimento de pesquisas que enfoquem, em sua concepção epistemológica, a
investigação com crianças e não sobre crianças.

243
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

AGUIAR, Wanda Maria Junqueira; OZELLA, Sergio. Núcleos de Significação como


Instrumento para a Apreensão da Constituição de Sentidos. Psicologia: ciência e profissão.
Brasília, v.26, n.2, p.222-245, jun. 2006. Disponível em: <http://pepsic.bvs-
psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141498932006000200006&lng=pt&nrm=iso>
Acesso em: 10 mai. 2010.

BAMBERGER, Jeanne. As estruturas cognitivas da apreensão e da notação musical de ritmos


simples. In: SINCLAIR, Hermine (Org). A produção de notações na criança: linguagem,
número, ritmos e melodias. São Paulo: Cortez, 1990, p. 97-124.

CESTARI, Maria Luiza. A representação gráfica da melodia numa perspectiva


psicogenética. Porto Alegre: 1983. Dissertação (Mestrado em Educação). Faculdade de
Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

CORREIA, Mônica F. B.; MEIRA, Luciano R. L. Explorações acerca da Construção de


Significados na Brincadeira Infantil. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 21, n. 3,
2008, p. 356-364. Disponível em: <www.scielo.br/prc> Acesso em: 06 dez. 2009.

CRUZ, Silvia Helena Vieira. Apresentação. In: CRUZ, Silvia Helena Vieira (Org.) A criança
fala: a escuta de crianças e pesquisas. São Paulo: Cortez, 2008, p. 11-31.

FREY-STREIFF, Marguerite. A notação de melodias extraídas de canções populares. In:


SINCLAIR, Hermine (Org). A produção de notações na criança: linguagem, número, ritmos
e melodias. São Paulo: Cortez, 1990, p. 125-168.

GONZÁLES REY, Fernando Luiz. Pesquisa Qualitativa e Subjetividade: os processos de


construção da informação. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005a.

______. Pesquisa Qualitativa em Psicologia: caminhos e desafios. São Paulo: Pioneira


Thomson Learning, 2005 b.

LEITE, Maria Isabel. Espaços de narrativa: onde o eu e o outro marcam encontro. In: CRUZ,
Silvia Helena Vieira (Org.) A criança fala: a escuta de crianças e pesquisas. São Paulo:
Cortez, 2008, p. 118-140.

LINO, Dulcimarta Lemos. Pensar com os sons: um estudo na notação musical como um
sistema de representação. Porto Alegre: 1998. Dissertação (Mestrado em Educação).
Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

MAFFIOLETTI, Leda de Albuquerque. Diferenciações e integrações: o conhecimento novo


na composição musical infantil. Porto Alegre: 2005. Tese (Doutorado em Educação).
Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

SALLES, Pedro Paulo. Gênese da Notação Musical na Criança. São Paulo, 1996.
Dissertação (Mestrado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo.

244
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Notação Musical ou Alfabetização Musical: perspectivas para a atuação na


educação musical infantil

Samara Pires da Silva Ribeiro


UnB - Faculdade de Educação
samara_prs@hotmail.com

Ricardo Dourado Freire


UnB - Projeto Música para Crianças
freireri@unb.br

Resumo: Dentro do conceito da musicalização e se tratando da linguagem musical, são


apresentadas discussões conceituais sobre a notação musical e a alfabetização musical, no
contexto das áreas de pedagogia e educação musical. O artigo relata ainda como que estes
conceitos são entendidos no ambiente musical e como é compreendida o conceito de notação
nos documentos e na literatura utilizada neste trabalho, bem como o conceito de alfabetização,
considerando o contexto de letramento e de processo de alfabetização.
Palavras chave: Alfabetização musical, notação, musicalização

O ensino de música na escola é regulamentado pelos documentos bases da educação


sendo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Artes e o Referencial Curricular
Nacional da Educação Infantil (RCNEI) as principais referências para o ensino de música nas
escolas. Foi realizada uma discussão dos termos alfabetização musical e notação musical no
contexto das áreas de educação musical e pedagogia a partir dos documentos oficiais.
O contato visual com uma partitura ou com um texto desperta o interesse e a
curiosidade, por parte das crianças, em entender o que está escrito. Ao vivenciar o processo de
musicalização, como sendo um processo orientado visando o desenvolvimento da linguagem
musical, e partindo das experiências em sala de aula, eis os questionamentos que foram feitos:
Como o processo de aquisição da leitura e escrita musical está relacionado com a
alfabetização? Em termos conceituais como é vista a alfabetização musical e a notação
musical no contexto da educação musical?
O presente trabalho tem por objetivo discutir a relação entre conceitos de alfabetização
e notação musical com base nos documentos oficiais e na literatura das áreas de música e
pedagogia.
A partir da reflexão das propostas conceituais será possível estabelecer um referencial
teórico para orientar as práticas pedagógicas. No contexto da educação infantil, a
musicalização envolve a linguagem musical e o fazer musical e faz-se necessário a discussão
das concepções de alfabetização presentes tanto na pedagogia quanto na educação musical. O
245
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

contexto da pesquisa foram aulas de música do Programa de Extensão Música para crianças
da Universidade de Brasília com crianças de 5 a 7 anos, que estão iniciando também o
processo de alfabetização nas escolas, a partir da interação destas crianças com o processo de
leitura e escrita musical gerou-se o interesse em discutir o assunto neste artigo.

Alfabetização Musical ou Notação Musical?

Rubem Alves (2002), em seu livro “Por uma educação romântica”, mostra como nos
dias de hoje o conceito de alfabetização é utilizado de forma simplista. Ele afirma que
“Alfabetizar é ensinar a ler. A palavra alfabetizar vem do “alfabeto”. “Alfabeto” é um
conjunto das letras de uma língua, colocadas numa certa ordem” (p. 39). Para reforçar esse
pensamento ele ainda faz uma comparação com o termo para o ensino de música. No capítulo
“O prazer da leitura”, Alves (2002) coloca:

Se é assim que se ensina a ler, ensinando as letras, imagino que o ensino da


música deveria se chamar “dorremizar”: aprender o dó, o ré, o mi... Juntam-
se as notas e a música aparece! Posso imaginar, então, uma aula de iniciação
musical em que os alunos ficassem repetindo as notas, sob a regência da
professora, na esperança de que, da repetição das notas, a música
aparecesse... (ALVES, 2002, p. 40)

A proposta de Alves é adotada na prática a partir da perspectiva do ensino da notação


musical, que advém de uma atuação descontextualizada, sem considerar uma discussão
conceitual de princípios de aprendizagem ou ação de alfabetização.
O processo histórico da alfabetização está vinculado com a compreensão e a reflexão
da linguagem, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa. O
processo de alfabetização, segundo o PCN, no início dos anos 80, mudou seu foco do que se
ensina para o que se aprende. Um dos principais trabalhos destinado a compreender o
processo da leitura e da escrita foi a psicogênese da língua escrita. Com o deslocamento do
foco para o aprendizado foi possível identificar a relação da criança com o processo de
alfabetização, na qual, compreendeu-se que a criança possui um conhecimento adquirido fora
da escola (BRASIL, 1997).
Ferreiro (1985), uma das pioneiras desse trabalho, considera que a alfabetização deve
ser um processo contínuo e que não está restrito à sala de aula. Um dos pontos principais na
pesquisa dessa psicóloga é a compreensão do processo de alfabetização independente dos
métodos. Deve-se considerar que a criança aprende porque ela possui uma curiosidade inata e
vontade de conhecer o mundo. A partir daí, a criança tem condições suficientes de assimilar a

246
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

leitura e escrita. “através da teoria de Piaget [o] sujeito (...) procura ativamente compreender o
mundo que o rodeia, e trata de resolver as interrogações que este mundo provoca.”
(FERREIRO, 1985, p.26).
O sujeito, primeiramente, tem um contato com o que quer apreender, por meio da
interação com o mundo, transformando, assim, a realidade em experiências. A aprendizagem
é uma conseqüência, uma síntese realizada pelas funções psíquicas e físicas.
Ainda segundo Ferreiro (2001), há a denominação de escrita alfabética, como sendo
“sistemas de representação cujo intuito original – e primordial – é representar as diferenças
entre os significantes.” (FERREIRO, 2001, p.13). Ao falar de escrita alfabética, faz-se
necessária a referencia à notação alfabética, que segundo Morais (2006)

constitui em si um domínio cognitivo, um objeto de conhecimento com


propriedades que o aprendiz precisa reconstruir mentalmente, a fim de vir a
usar, com independência, o conhecimento de relações letra-som, que lhe
permitirá ser cada vez mais letrado (MORAIS, 2006, p.3).

Nos Parâmetros Curriculares Nacional da Língua Portuguesa, o termo notação é


compreendido com relação ao ensino da ortografia da língua. Ao discutir a conceituação de
notação, porém no contexto da educação musical, observa-se o vínculo com a grafia musical.
O termo nos PCNs de artes aparece vinculado à linguagem musical e ao sistema de escrita
musical tradicional (BRASIL, 1997)
Em relação a alfabetização, Soares (2010) coloca que “em seu sentido próprio,
específico [é o] processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita.”
(SOARES, 2010, p. 15) Essa primeira conceituação sobre o termo implica a aquisição de um
código, sendo ele pertencente de uma linguagem que pressupõe organização e compreensão.
Um conjunto de palavras sem organização não pode ser considerada linguagem enquanto não
apresentar regras que combinem formando orações. (FERREIRO 1985)
O conceito de Alfabetização discutido por Magda Soares (2010) “é um processo de
representação de fonemas em grafemas, e vice-versa, mas é também um processo de
compreensão/expressão de significados por meio do código escrito.” (SOARES, 2010, p.16).
Além disso, o processo de alfabetização

deve levar à aprendizagem não de uma mera tradução do oral para o escrito,
e deste para aquele, mas à aprendizagem de uma peculiar e muitas vezes
idiossincrática relação fonemas-grafemas, de um outro código, que tem, em
relação ao código oral, especificidade morfológica e sintática, autonomia de
recursos de articulação do texto e estratégias próprias de
expressão/compreensão. (SOARES, 2010, p. 17)

247
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Alves (2009) discute que em qualquer sistema de comunicação escrita deve-se


considerar as experiências sociais dos sujeitos e também refletir sobre o papel do professor e
demais instâncias ao longo do processo. A “alfabetização como o aprendizado do alfabeto e
de sua utilização como código de comunicação” (ALVES, 2009, p.3) necessariamente implica
a compreensão e a utilização nas práticas sociais, pois a comunicação por meio desse código
pressupõe socialização. Ser alfabetizado pressupõe a aquisição de habilidades tanto
“habilidades mecânicas (codificação e decodificação) do ato de ler, mas da capacidade de
interpretar, compreender, criticar, resignificar e produzir conhecimento.” (ALVES, 2009, p.
3). Soares (2003), afirma que:

uma teoria coerente da alfabetização deverá basear-se em um conceito desse


processo suficientemente abrangente para incluir a abordagem "mecânica"
do ler/escrever, o enfoque da língua escrita como um meio de
expressão/compreensão, com especificidade e autonomia em relação à língua
oral, e, ainda, os determinantes sociais das funções da aprendizagem da
língua escrita (SOARES, 2003, p. 18).

É interessante pensar na resignificação e unificação do conceito de alfabetização, ao


invés de criar outra palavra para tentar explicar o que a alfabetização já faz. O que se deve
pensar, como já foi muito estudado, é tratar a alfabetização como um processo e não como o
objeto que ao nos apropriarmos dele não temos mais nada a aprender sobre esse objeto. O
principal motivo para afirmar o processo é considerar que o sujeito que aprende está em
constante transformação e ao adquirir um conhecimento tem a capacidade de resignificá-lo de
acordo com as suas experiências e vivencias, pois os sujeitos são seres culturais, sociais e
históricos.
Além disso, o sujeito deve compreender que o processo de alfabetização, mais
especificamente a aquisição da leitura e escrita, é a representação de uma linguagem, como
explica o PCN de língua portuguesa:

que a alfabetização não é um processo baseado em perceber e memorizar, e,


para aprender a ler e a escrever, o aluno precisa construir um conhecimento
de natureza conceitual: ele precisa compreender não só o que a escrita
representa, mas também de que forma ela representa graficamente a
linguagem (BRASIL, 1998).

Este é o conceito utilizado neste trabalho que compreende o processo de aprendizagem


e transformação do conhecimento em escrita. O aluno deve ter a oportunidade de levar a
música para a sala e aula, dentro de uma proposta de ensino que considere os aspectos
culturais e as diversidades de meios de comunicação devido aos avanços tecnológicos. As
248
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

atividades devem ser significativas para os alunos possibilitando a abertura da diversidade


cultural, no entanto, sem deixar de ser um ensino contextualizado. (BRASIL, 1998)
A música e a língua materna são linguagens presentes na sociedade, sendo a música a
primeira forma de expressão. “A música é a nossa forma mais antiga de expressão, mais
antiga do que a linguagem e a arte; começa com a voz e com a nossa necessidade
preponderante de nos dar os outros” (MENUHIN E DAVIS 1981, p.1 apud PENNA 2008).
Penna (2008) coloca a “musicalização como um processo educacional orientado que se
destina a todos que, na situação escolar, necessitam desenvolver ou aprimorar seus esquemas
de apreciação da linguagem musical” (PENNA, 2008, p. 44)
Uma criança no processo de apropriação da linguagem, tanto verbal quanto musical,
passa pelo reconhecimento do mundo por meio da linguagem em que está aprendendo. No
contexto da educação musical a apropriação dessa linguagem ocorre por meio da
musicalização. Penna (2008) afirma

o indivíduo se torne capaz de apropriar-se criticamente das várias


manifestações musicais disponíveis em seu ambiente – o que vale dizer:
inserir-se e, seu meio sociocultural de modo crítico e participante. Esse é o
objetivo final da musicalização, na qual a música é o material para um
processo educativo e formativo mais amplo, dirigido para o pleno
desenvolvimento do indivíduo, como sujeito social (PENNA, 2008, p.49).

Watanabe (2009) afirma que “a Música enquanto linguagem tem um sistema de


códigos de grafia. O processo de codificação e decodificação desta linguagem torna
necessária a sua alfabetização” (p.20). Por alfabetização essa autor entende que é “um
processo de apropriação de instrumentos de interpretação de significantes.” (WATANABE,
2009, p.21) Significante é o sistema de significação do som em forma de registro, podendo ter
registro do som da palavra ou da música.

Com a invenção da escrita gráfica e musical os signos vieram substituir os


desenhos e assim, iniciou-se toda a teorização para a sua aprendizagem. [...]
A gênese da grafia sonora é comparativamente semelhante à gênese dos
vocábulos, das funções classificatórias e da imitação (ABRAHÃO, 2005,
p.91 apud WATANABE, 2009).

Watanabe (2009) na citação acima apresenta uma relação entre a alfabetização e a


alfabetização musical convergente na necessidade do homem em criar um registro gráfico
para significar o som.

249
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Considerações Finais

O conceito de notação parte de princípios de organização do material gráfico,


principalmente após as experiências de linhas ativas nas quais a criança representa o som que
compreende de maneira livre. As diferentes posturas entre construção livre da notação e
aprendizagem da notação tradicional muitas vezes entram em conflito, mas na gênese
pedagógica apresentam conceitos diametralmente opostos.
O processo de aprendizagem dos códigos de uma linguagem passa pelo domínio dos
símbolos que constituem a própria linguagem. No caso da escrita, o código é o alfabeto, mas
no caso da música o código refere-se a conjunção de elementos melódicos e rítmicos usados
na partitura musical.
Os documentos oficiais oferecem uma conceituação clara do processo de alfabetização
da língua materna, definindo-o como o processo de aquisição da linguagem. No entanto os
conceitos de notação são limitados por tentar focar na grafia de elementos musicais. No caso
da música a alfabetização musical possa ser considerada um processo de construção do
conhecimento de natureza conceitual, no qual a criança precisa compreender o que a escrita
musical representa e principalmente como a escrita representa graficamente a linguagem
musical.

250
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ALVES, Bruna Pereira. As distintas concepções acerca dos conceitos de alfabetização.


Revista Urutágua – revista acadêmica multidisciplinar, n,17. Maringá: Paraná
dez.2008/jan./fev./mar. 2009. Disponível em:
<http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/Urutagua/article/viewFile/5280/3797>. Acesso em:
25 out. 2010.

ALVES, Rubem. Por uma Educação Romântica. Campinas: Papirus, 2002.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. B823p Parâmetros curriculares nacionais:


língua portuguesa / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: DF. 144p. Disponível
em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro02.pdf> Acesso em: 22 nov. 2010.

FERREIRO, Emília; Teberosky, ANA. Psicogênese da língua escrita. Trad. de Diana


Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco e Mário Corso. Porto Alegre: Artes Médicas, 1985.
284p.

FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. 24. ed. São Paulo: Cortez, 1981.

PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. 2. Ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Sulina, 2010. 246p.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 4.ed. Belo Horizonte: Autêntica,
2010. 128p.

WATANABE, Maria Kyoko Arai. A leitura e a escrita do som na educação infantil.


Universidade Estadual de Londrina. Disponível em: < http://alb.com.br/arquivo-
morto/edicoes_anteriores/anais17/txtcompletos/sem14/COLE_11.pdf>. Acesso em 20 mar.
2011

251
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Canção no Contexto Escolar: filosofia, linguagem, cultura escolar e


práxis

Alexandre Rebouças de Santana


Mestrando pelo Programa de
Pós-graduação em Educação - UFBA

Resumo: Este artigo discute a Música no contexto escolar tendo como recorte a canção em
uma abordagem fenomenológica, considerando cultura, cultura escolar e práxis pedagógica
face à implantação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Iniciamos com um breve
relato histórico da educação musical no Brasil. Para tal, definimos um conceito de cultura,
relação entre linguagem e linguagem musical, fenomenologia como aporte teórico e
filosófico, análise temática de alguns compositores infantis e apresentação de parte de nossa
produção e estudos advindos da nossa prática profissional na esperança de apontar novas
possibilidades de utilização da canção no contexto escolar frente aos desafios contemporâneos
de educar para o século XXI.
Palavras-chave: Educação, música, canção

1. Introdução

Este trabalho é fruto da reflexão e estudos centrados na cultura, práxis, linguagem e


música no contexto escolar sob o enfoque das perspectivas e desafios da educação no século
XXI.
Visa-se encontrar outros enfoques que podem assumir a práxis pedagógica da música,
ou melhor, a canção, face a implantação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
discutindo, principalmente, o seu conteúdo textual. O tema passa por uma reflexão sobre
cultura, cultura escolar, perspectiva história da educação musical no Brasil, semelhança entre
linguagem musical e verbal, perspectiva da construção de uma possibilidade de abordagem
filosófica para a educação musical e aponta alguns compositores infantis que se dedicam a
investigar novas propostas musicais para a Educação Infantil.

2. Educação Musical no Brasil

Com a aprovação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 a ABEM (Associação


Brasileira de Educação Musical) preocupou-se em debater sob qual enfoque se daria a
educação musical em sala de aula. Colaborando com este debate vislumbramos algumas
perspectivas para a utilização da música, especificamente a canção no contexto escolar.

252
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Para compreendermos melhor a educação musical da canção em sala de aula


buscamos, através da história, retomar alguns momentos nos quais a música se fez presente
para, assim, refletirmos sobre suas perspectivas filosóficas, culturais e suas possíveis
implicações pedagógicas.
De acordo com Salvarez destacamos, dentre muitos movimentos históricos, três
períodos relevantes como marco inicial das nossas reflexões sobre a educação musical dentro
da realidade brasileira. São eles: Período Colonial, Período Independente e Metodologias
Contemporâneas, conforme classificação do autor.
No Período Colonial, destacamos a influência jesuítica na música, tendo o Auto da
Pregação Universal (1555) como a primeira peça musical brasileira cujo título já define a
filosofia e ideologia musical dominante da época.
No Período Independente, temos dois marcos importantes regulamentados através de
leis. O primeiro, em 1847, que estabelece os conteúdos musicais para serem ensinados sendo
divididos em solfejo, instrumentos de sopro, instrumentos de orquestra e harmonia. Em 1851,
a lei 650 estabelece o ensino de música nas escolas primárias e secundárias, todas duas leis
sancionadas por D. Pedro II.
No início do século XX, em que surgem as Metodologias Contemporâneas,
influenciado por tendências educativas advindas de outras áreas do conhecimento, inicia-se
outra fase na qual temos como expoente brasileiro o maestro Villa Lobos.1 Atualmente,
podemos observar o ecletismo de tendências pedagógicas nas quais cada educador possui seu
princípio filosófico e teórico que fundamentam suas práticas educativas. Dentre muitos que
desenvolveram métodos, abordagens ou filosofia destacamos o próprio Villa Lobos, além de
outros como Suzuki, Dalcroze, Willems, Swanwick, Sá Pereira, Martenot etc.
Diante do que foi visto historicamente, passemos agora a compreender como esta
cultura vai se modificando e, consequentemente, a sua práxis, em função de movimentos
históricos, ideológicos, políticos e filosóficos. Não nos interessa abordar todos estes
segmentos, mas apenas recortá-los para compreensão de como se fundamenta e norteiam a
nossa perspectiva e estudos frente aos desafios para o século XXI.

3. Cultura Escolar, Práxis Pedagógica e Linguagem

1
Não é de interesse, neste momento, discorrer sobre seu envolvimento com a ideologia e política deste período,
apenas o citamos por sua influência pedagógica e musical internacionalmente reconhecida, apesar deste fato se
constituir também como grande relevância social.

253
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Apontamos três tendências em que linguagem, cultura escolar e práxis se


entrecruzam para formar uma concepção pedagógica para o exercício profissional do
educador. Baseado em autores que discutem esses temas, como Grideon, Inbert, Peréz,
Sacristan, Silva, dentre outros, reproduzimos abaixo, em função das perspectivas pedagógicas,
este cruzamento entre linguagem, cultura escolar e práxis.

Quadro 1: Cruzamento entre cultura, linguagem, práxis e perspectivas educativas.

Uma vez compreendida como cultura escolar, práxis e linguagem interagem nesta
discussão acreditamos ser necessário definirmos um conceito de cultura que permeei todas
estas relações. Para isto, compreendemos a cultura como “o tecido de significados,
expectativas e comportamentos discrepantes ou convergentes que um grupo humano
compartilha” (PERÉZ, 2001, p. 15). Nessa perspectiva, este movimento

[...] requer, ao mesmo tempo, tomar consciência do caráter flexível e plástico


do seu conteúdo. As produções simbólicas não podem ser entendidas como
as produções materiais. As relações mecânicas entre os elementos
confundem mais do que esclarecem a verdadeira natureza das interações
humanas.[...] A cultura é um texto ambíguo, inacabado, metafórico, que
requer constante interpretação. (PERÉZ, 2001, p. 15).

A cultura, como fenômeno radicalmente interativo e hermenêutico, requer


interpretação mais do que explicação casual. De acordo com a autora

Conhecer, inclusive, a própria cultura é um empreendimento sem fim. O


próprio fato de pensá-la e repensá-la, de questioná-la ou compartilhá-la
supõe seu enriquecimento e sua modificação. Seu caráter reflexivo implica

254
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

sua natureza cambiante, sua identidade auto construtiva, sua dimensão


criativa e poética. (PERÉZ, 2001, p. 15).

Esta definição de cultura nos ajuda a compreender a importância da música inserida na


escola e no processo de sensibilização dos atores envolvidos na cultura escolar.
Passemos, assim, a compreender como a linguagem se entrelaça neste contexto para
dialogar com a canção na escola. Lembremos que a canção é, necessariamente constituída por
melodia e texto, por isso seu recorte dentro da música e a escolha feita por nós como objeto de
reflexões.

4. A Linguagem Musical

De acordo com Fonterrada (1994), a educação musical segue duas tendências,


atualmente: a primeira delas é a “[...] ‘tradicional’ que se ocupa do ensino de instrumentos
musicais e, para isso, se serve de técnicas e práticas mundialmente aceitas como eficazes para
que seus objetivos sejam atingidos”. Esta tendência tem por objetivo o de

[...] promover a formação de instrumentistas, cantores, compositores e


regentes através da vivência musical, obtida pelo contato com o som e com
instrumentos musicais; proporcionar ao aluno a aquisição de técnicas de
execução e leitura, bem como o domínio técnico necessário à sua formação.

Desta forma, a autora continua esclarecendo que, dentro desta perspectiva, sua forma
de arte é reprodutora e não há muito espaço para o desenvolvimento do pensamento criativo.
Sendo assim, o papel do professor pode ser “caracterizado como o de um determinador e
orientador da ação: seu principal objetivo é ensinar”. (FONTERRADA, 1994).
A segunda tendência entende a Música como derivada da Arte-educação e é chamada
de “alternativa” e isso implica dizer que

Esta forma de educação musical não está especificamente interessada na


formação do músico profissional, mas, sim, de apreciadores de música. A
vivência musical se dá através do contato com o som, instrumentos de
percussão pequenos, ou fabricados com sucata. (FONTERRADA, 1994).

A arte é considerada como inerente a todos os seres humanos e o pensamento criativo


predomina sobre a aquisição de técnicas. Além disso, o papel do professor é o de “coordenar a
ação com o mínimo de interferência”. (FONTERRADA,1994).

255
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Neste momento, torna-se relevante aproximarmos a linguagem musical a linguagem


verbal quando tratamos de inseri-los no contexto escolar através da canção transformando
assim a cultura escolar e a práxis.
Existe uma tendência na área da Música a classificar, de acordo com a linguagem
verbal, a linguagem musical. Sendo assim, muitos músicos se expressam e analisam as obras
seccionando-as em frases, períodos, etc. assim como fazemos nas orações literais. Logo, um
ponto, vírgula e interrogação também têm seu respectivo na linguagem musical, porém
Fonterrada (1994) vai tratar este assunto em uma perspectiva fenomênica e hermenêutica. Ela
parte desta visada, fenomênica existencial, e dialoga, com base neste referencial, sua
influência e proximidade com a linguagem musical. O resultado dessa visão é que linguagem,
aprendizagem e a experiência musical se assemelham, logo podemos obter uma visão
filosófico-experencial-fenomênica aplicada à educação musical.

5. Filosofia e Música

Considerando-se que a diretriz política também influencia a perspectiva cultural


escolar e a práxis pedagógica, nossas reflexões e estudos fenomenológicos buscam
compreender a linguagem musical e verbal dentro da cultura escolar vigente apontando novas
possibilidades no trato da música neste contexto, valendo-se da canção. Neste percurso, faz-se
necessária uma reflexão dos conceitos filosóficos de Ponty (2011), no que se refere ao ato
vivencial e experiencial do ser no mundo e implicado no mundo, de onde importantes
referências podemos assumir frente à música e, de um modo geral, da música enquanto Arte.
De acordo com Ponty (2011, p. 244),

[...] toda linguagem se ensina por si mesma e introduz seu sentido no espírito
do ouvinte. Uma música ou uma pintura que primeiramente não é
compreendida, se verdadeiramente diz algo, termina por criar por si mesma
seu público, quer dizer, por secretar ela mesma sua significação.

Quando analisado o fenômeno da fala, este autor afirma que

É preciso reconhecer em primeiro lugar que o pensamento, no sujeito


falante, não é uma representação, quer dizer, que este não põe expressamente
objetos ou relações. O orador não pensa antes de falar, nem mesmo enquanto
fala; sua fala é seu pensamento. (PONTY, 2011, p. 244).

Assim Ponty (2011, p. 245) conclui que

256
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

[...] não temos um pensamento à margem do próprio texto, as palavras


ocupam todo o nosso espírito, elas vêm preencher exatamente nossa
expectativa e nós sentimos a necessidade do discurso, mas não seríamos
capazes de prevê-lo e somos possuídos por ele. O fim do discurso ou do
texto será o fim de um encantamento.

Queremos situar este encantamento como, dentro da própria filosofia de Ponty, entre o
ser no mundo e aberto para o mundo onde nesta relação de abertura vivemos a experiência de
sermos ou do vir a ser, ou seja, tornar-se. Vejamos o que o autor comenta sobre a relação
entre palavra, fala e o artista

[...] a palavra é um certo lugar de meu mundo linguístico, ela faz parte de
meu equipamento, só tenho um meio de representá-la para mim, é
pronunciá-la, assim como o artista só tem um meio de representar-se a obra
na qual trabalha: é preciso que ele a faça. (PONTY, 2011, p. 246).

Quando aproximamos o fenômeno da fala a expressão, operação da expressão e


potência da expressão associadas à música, Ponty (2011, p. 248) nos ajuda a compreender que

A operação de expressão, quando é bem-sucedida, não deixa apenas um


sumário para o leitor ou para o próprio escritor, ela faz a significação existir
como uma coisa no próprio coração do texto, ela a faz viver em um
organismo de palavras, ela a instala no escritor ou no leitor como um novo
órgão dos sentidos, abre para nossa experiência um novo campo ou uma
nova dimensão. Essa potência da expressão é bem conhecida na arte e, por
exemplo, na música.

Esta aproximação parece limitar a capacidade de percebermos a música, pois

Se nos parece sempre que a linguagem é mais transparente do que a música,


é porque na maior parte do tempo permanecemos na linguagem constituída,
damo-nos significações disponíveis e, em nossas definições, limitamo-nos,
como o dicionário, a indicar equivalências entre elas. (PONTY, 2011, p.
255).

Diante do que foi visto sobre a fenomenologia podemos situar a escola como este
espaço multicultural e multi referencial em que as relações sociais se estreitam e se
entrecruzam para formar um contexto vivencial e experiencial no qual cada aluno está exposto
a uma ampla possibilidade do vir-a ser. É neste espaço que suas ações-reflexões ganham
“vida”, ou seja, no contato do seu corpo com o mundo e aberto para o mundo onde há a
possibilidade de vivenciar novas experiências.
Considerando este enfoque vejamos como a arte, corpo, ser humano e significações
são apresentadas por Ponty (2011, p. 210):

257
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

[...] um romance, um poema, um quadro, uma peça musical são indivíduos,


quer dizer, seres em que não se pode distinguir a expressão do expresso, cujo
sentido só é acessível por um contato direto, e que irradiam sua significação
sem abandonar seu lugar temporal e espacial. É nesse sentido que nosso
corpo é comparável à obra de arte. Ele é um nó de significações vivas e não
a lei de um certo número de termos co-variantes.

Observamos como a abordagem filosófica da fenomenologia pode contribuir e


embasar uma possibilidade diferente de percepção do fenômeno musical ampliando assim a
visão sobre sua utilização no contexto escolar frente a educação para o século XXI.

6. A Canção Na Escola

Passemos agora a analisar a canção, gênero musical que contém letra e melodia dentro
das tradições ou cultura escolar, atualmente utilizada nas salas de aulas. Na busca por
pesquisadores preocupados com este tema, no que se refere a canções e conteúdos
pedagógicos em sala de aula, encontramos em Maffioletti (2003) a confirmação de que a
música não é devidamente trabalhada por não oferecer objetivos claros. No desenvolvimento
do seu texto, a autora utiliza a canção “De olhos vermelhos de pelo branquinho...” para
descobrir, junto às professoras, os possíveis conteúdos trabalhados nesta canção. Desta forma,
ela afirma que estes conteúdos levantados pelas professoras – esquema corporal, coordenação
motora, lateralidade, expressividade e criatividade – não alcançam o objetivo principal, que
seria “[...] permitir a criança conhecer o coelho, fazendo relações entre a forma do seu corpo
com o modo como ele se movimenta, sua alimentação e seus hábitos.”, ou seja, não possibilita
a criança conhecer o objeto em suas características fundamentais e não contempla nem a
motricidade sugerida, pois os movimentos corporais geralmente são estereotipados em uma
coreografia criada por um adulto. Logo, a criatividade e a expressividade também não são
trabalhadas.
Uma vez tomado isso como verdade, deveríamos nos preocupar com os tipos de
relações que são construídas quando se utiliza a música em sala de aula, pois, muitas vezes,
estamos distantes de uma aprendizagem significativa para a construção da inteligência das
crianças, além de perdermos a oportunidade de ampliar o vocabulário, a compreensão de
mundo, criar novas significações simbólicas, experiência estética, desenvolvimento do
pensamento, dentre outros.

258
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

7. Para Além das Aparências

Encontramos na obra de Ponty (2011) a identificação com a música, no sentido de não


se separar o objeto do sujeito. Acreditamos, assim como Ponty, que o corpo no mundo aberto
ao mundo é o espaço de estar no mundo vivenciando-o, assumindo-o e se responsabilizando
por sua permanência no próprio mundo, ou seja, assumindo as suas escolhas nesse mundo
complexo, dinâmico, multi referencial, multilingual, etc.
Como acabamos de ver, podemos, através da canção, oferecer uma possibilidade quase
infinita de relações culturais, vivenciais e experienciais para o sujeito. Podemos caminhar
tanto na letra como na música em si para diversas áreas de conhecimento, por isso,
enumeramos alguns compositores cujo foco recai nos conteúdos mais relevantes da sua
produção artística descritos assim: Esquema corporal – Bia Bedran; Universo infantil –
Palavra Cantada; Alfabetização – Teco Treco; Multi referencial sonoro – Hélio Ziskind,
dentre outros.

8. Nossa Pesquisa

Assim como alguns dos artistas citados acima que são compositores, intérpretes e/ou
músicos e, considerando a nossa experiência profissional em sala de aula, apresentamos uma
das nossas composições desenvolvidas com o objetivo de exemplificar os conceitos discutidos
ao longo deste artigo. Esta canção busca equacionar a problemática entre cultura escolar,
cultura musical, práxis pedagógica e filosofia em sua utilização na sala de aula.

VAMO DANÇÁ
Letra e Música:
Alexandre Rebouças

Olha a quadrilha, João


Fazendo o balancê
An avant tour no salão (Bis)
Damas prum lado
Cavalheiros pro outro
Vai começar o namoro
Paquera moça
Pisca e beija meu bem
259
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Lá vem o túnel
Simbora no trem
A festa é boa
O rasta pé tá animado
O corpo todo suado
E o sapato furado (Bis)

Nesta canção, abordamos a festa junina, uma de nossas manifestações culturais, de


forma lúdica e com ampla possibilidade de exploração textual. Quanto a parte vivencial
deixamos a critério dos professores regente ou de música chamando a atenção para a ideia da
expressão corporal da dança, ou seja, a quadrilha, formação típica da festa de São João.
Assim, acreditamos que os conteúdos textuais, musicais, experienciais e vivenciais, centrados
no corpo, serão valorizados e contribuirão para uma aprendizagem integrada e significativa
dos participantes da atividade.

9. Conclusão

Acreditamos, desta forma, poder contribuir para as indagações sobre a ampliação das
possibilidades educativas no século XXI frente aos novos desafios encontrados na área da
Educação. Tecemos algumas reflexões, que acreditamos serem relevantes, para a utilização da
canção no contexto escolar, e assim, colaborarmos para que a Arte e a Música sejam mais
participativas e atuantes neste contexto, pois muitas vezes, observamos durante a nossa
prática profissional, que estas áreas de conhecimento são utilizadas de forma estereotipada e,
em alguns casos, menosprezadas por diversos grupos sociais dentro da própria escola.

260
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

FONTERRADA, Marisa T. de Oliveira. Linguagem verbal e Linguagem musical. 1994.


Disponível em: <http://www.atravez.org.br/ceem_4_5/linguagem_verbal.htm>. Acesso em:
29 mai. 2011.

GRIGNON, Claude. Cultura dominante, cultura escolar e multiculturalismo popular. In:


SILVA, Tomaz Tadeu (org.) Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos
culturais em educação. Petrópolis: Vozes, 1995.

IMBERT, Francis. Para uma práxis pedagógica. Brasília: Plano Editora, 2003.

MAFFIOLETTI, L. In: Educação - Pra que te quero? Cramem Craidy, Gladis E. Kaercher.
Porto Alegre: Artmed, 2001.

PERÉZ-GOMÉZ, A. I. A Cultura Escolar na sociedade neoliberal. Tradução: Ernani Rosa.


Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.

PONTY, Maurice Merleau. In: Fenomenologia da percepção. 4ª edição. São Paulo: Martins
Fontes, 2011.

SACRISTÁN, Gimeno; GÓMEZ, Pérez. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre:


Artes Médicas, 1998.

SALVAREZ, Sérgio Luís de Almeida. 500 Anos de Educação Musical no Brasil: aspectos
históricos. Disponível em:
<http://www.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_1999/ANPPOM%2099/CONFE
REN/SALVARES.PDF>. Acesso em: 13 jun. 2011.

SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos
culturais em educação. Petropólis: Vozes, 1995.

TOSQUELLES, François. Éducation et psycothérapie institutionelle. In: Mantes-la-Ville.


Hiatus, 1984. In IMBERT, Francis. Para uma práxis pedagógica. Brasília: Plano Editora,
2003.

VÁZQUEZ. A. S. Filosofia da Práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

261
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Humanizando, Socializando e Intervindo Através da Musicalização Infantil

Felipe Rocha Santos1


fellyperocha_2007@hotmail.com

Resumo: O educador Paulo Freire deixou a todos nós educadores um legado inestimável de
como educar e substantivamente formar. Aplicamos a Pedagogia Freireana a Educação
Musical Infantil, afim de através da prática musical, acolher e valorizar a Cultura Ancestral
Africana de nossas crianças. Utilizar as concepções freireanas na musicalização infantil
permitiu que promovêssemos um real acesso a arte e a cultura e contribuíssemos na
construção de uma sociedade de com relações étnico-racias e culturais mais justas e iguais.
Palavras chave: Freire, cultura, música

Introdução

Humanizar, socializar e intervir era o que desejamos realizar através da musicalização


infantil na Escola Municipal Irmã Elisa Maria da Secretária Municipal de Educação e Cultura
de Salvador, localizada em uma região carente da cidade. As atividades de musicalização são
realizadas por educadores provenientes do Brasil, da Argentina e do Chile, que através dos
estudos em cultura africana encontraram uma maneira de musicalizar levando em
consideração a cultura ancestral contida na comunidade em que a escola está inserida.
Os educadores fazem parte de programas educacionais desenvolvidos nessa instituição
e realizam o voluntariado educativo como tecnologia social e ferramenta pedagógica. O
objetivo da prática voluntária, utilizando o fazer artístico-musical é criar um currículo
integrador e inovador e ajudar a criança a respeitar as diferenças e viverem a diversidade
musical presente em sua cultura e na de outros povos.
Para estimular a criatividade e tornar mais completa a formação da criança, optou-se
por criar um ensino musical infantil que fosse além do lúdico e do passageiro e que ajudasse a
perpetuar a cultura da criança e de sua comunidade. Assim, as atividades de musicalização
distribuídas entre quatro educadores, além de possuir as ações musicalizadoras comumente
utilizadas incluem canto africano e música percussiva que se unem as aulas de canto coral,
jogos rítmicos e ensino de instrumento. Esse trabalho oferece uma rotina diária de estudos e
vivências que ocorrem no contra-turno e fins de semana e são monitoradas por regentes,
solistas e coreografas psicomotricistas com vasta experiência internacional na pesquisa e
ensino de música, canto e dança africana.

1
Escola Municipal Irmã Elisa Maria.
262
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O trabalho atinge mais de 150 crianças entre cinco e oito anos de idade que cursam o
Ensino Fundamental I e são originárias de famílias negras e afro-descendentes. As atividades
ocorrem desde o primeiro semestre de 2011 com um total até então de 400h de atividades
artísticas.
Todo e qualquer trabalho nessa área visam à constituição do sujeito e soerguimento de
sua personalidade e sensibilidade através da música e do movimento corporal com pano de
fundo a sua cultura ancestral.

As contribuições do educador Paulo Freire

Para Paulo Freire (2001) devemos construir o nosso “ser no mundo com os outros”
pela relação com as pessoas, com a sociedade e com sua cultura. Helena Trope (1993, p.108)
diz que “o educador, ou o músico-educador ou o educador-músico é membro de um grupo
social. E, por isto, tem compromisso com a música e com a sociedade.” Assim para Paulo
Freire e Helena Trope a escola e as atividades que nela ocorrem, o que inclui a educação
musical, deveria acolher a cultura, a história da comunidade e do povo. Por isso encaramos a
metodologia freireana uma um aspecto importante nas atividades de musicalização infantil, já
que a mesma incentiva o engajamento do educador com a comunidade popular, com sua
música e cultura.
Paulo Freire muito destaca o papel da escola na promoção da cultura popular e a
importância dos conhecimentos prévios. Nas nossas atividades musicalizadoras colocamos
como referência de trabalho a Cultura Africana e Afro-brasileira presente no patrimônio
imaterial da cidade de Salvador como meio de valorização dos conhecimentos prévios e da
cultura do aluno que em geral está relacionada a essa manifestação cultural.
Para esse fim, de acordo com as orientações pedagógicas encontradas na Pedagogia
Freireana, construímos um currículo musicalizador que estivesse em compasso com os
conceitos, filosofias e modos de vida da comunidade baiana que é basicamente formada por
descendentes de africanos. Conforme abordado por Alicia Loureiro (2003, p. 190) “é
necessário interagir e complementar práticas pedagógicas, como procedimentos organizados
com os modos de pensar e agir, com as experiências vividas e os estímulos diversos que
cercam o mundo das crianças e dos jovens.”

Utilizando o Método Paulo Freire

263
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Em 1962, Paulo Freire desenvolveu o que hoje é conhecido como “Método Paulo
Freire”, um método educacional usado inicialmente na alfabetização de jovens e adultos que
visava à valorização da Cultura do Povo. O professor era um animador de debates que sempre
ensinava, ou melhor, desenvolvia suas atividades, a partir de conhecimentos prévios e das
experiências vividas por eles, isso era um estimulo o seu desenvolvimento cognitivo,
emocional e cultural. Para esse fim, os educadores utilizavam três momentos: (1) Investigação
Temática, (2) Tematização e (3) Problematização.
Nós educadores, na Escola Municipal Irmã Elisa Maria construímos o currículo
musical da instituição através dessa metodologia. Apresenta-se agora como o método foi
utilizado.
No momento de Investigação Temática cada um preocupou-se em conhecer as
influências musicais presentes no cotidiano da criança a fim de tornar o ensino de música
mais integrado com a comunidade social e sua cultura. Através de vivências e Rodas
Musicais, o educador buscava compreender o modo de pensar musical da criança e as
manifestações artísticas de sua comunidade. Paulo Freire (1996, p. 41) disse que “uma das
tarefas mais importantes na prática educativo-crítica é propiciar condições em que os
educandos em suas relações com o professor ou professora ensaiam a experiência profunda de
assumir-se.” Percebeu-se devido a alguns fatos e no decorrer de vivências musicais que a
criança necessitava assumir-se como ser social, criador, transformador, pensante e cultural.
Ela necessitava individualmente assumir a sua identidade como pertencente à Comunidade
Negra, e para conseguirmos isso se decidiu utilizar referências musicais da cultura ancestral.
Na Tematização estudamos um meio de elaborar um tema gerador interdisciplinar
que buscasse o reconhecimento da identidade cultural (FREIRE 1996, p. 41). O tema “Cultura
Musical e Dançante Africana e Afro-brasileira” nos fornece a possibilidade de instituir um
significado social à música dentro da escola. Esse tema ajuda cada criança a melhor
compreender a sua cultura e identidade, já que a música em si, como linguagem artístico-
cultural é uma pratica social. A memória, historia e saberes do povo negro tornou-se objeto de
educação musical infantil. Hentschke (1991, p. 59) nos recorda que o valor multicultural da
música é ‘tentar evitar o isolamento de sub-culturas, bem como a imposição ás mesmas da
cultura dominante do país em que se situam'.
A fase de Problematização é o momento em que usamos, para fazer do educador
musical um problematizador e orientador de aprendizagem o que ajuda a criança a colocar-se
pessoalmente como construtora de conhecimento e saberes musicais, nós nos 'educamos em

264
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

comunhão' (FREIRE 1981, p. 79). Aqui buscamos musicalizar através de valores culturais
africanos e estimulamos a criatividade, a excussão e a composição utilizando instrumentos,
canções e gêneros da cultura ancestral. A problematização é importante para desafiar a
criança a novas aprendizagens através da prática musical, ao ser estimulada, ela percebe que
necessita aprender mais, “seus modos de perceber, suas formas de ação e pensamento” são
aguçadas (FONTERRADA, 1994, p.141). E isso é importante, pois Porcher (1982, p.15) nos
esclarece que “não existe espontaneidade natural nem liberdade imediatamente criativa. É
preciso dá a criança os instrumentos necessários para sua auto-expressão”.
As idéias democráticas de Freire muito nos ajudam a musicalizar crianças. Tais
conceitos nos ajudam a perceber cada criança e família como fazedores de cultura e valorizar
tais saberes. Além do mais, colocar as artes negras como objeto de estudo musical contribuí
para desfazer a visão etnocêntrica de alguns e construir uma Pedagogia Musical Anti-racista e
Multicultural.
Paulo Freire também destaca a necessidade da dialógicidade no momento educativo ao
dizer que “a educação é comunicação, é diálogo” e utilizar o método dialógico-pedagógico
contribui muito para que sempre elaboremos atividades musicais voltadas para o
desenvolvimento social, cultural e integral da criança (FREIRE 1982, p. 69).
No entanto, a grande contribuição de Freire nos trabalhos é a sua insistência de que a
escola deveria tornar-se um espaço cultural e que toda cultura deveria ser acolhida como meio
de apreensão de conhecimentos. Como disse ainda Koellreutter (1997 p. 38-39) a arte é um
“instrumento de libertação” e não de “alienação social” e Freire (1996, p. 81) ainda contribui
em dizer que não podemos 'de maneira alguma, nas nossas relações politico-pedagógicas com
grupos populares desconsiderar seu saber e experiência feito' e nós não desconsideramos nem
mesmo a sua música, sua arte e cultura. Procuramos valorizar a diversidade musical dos
povos negros na África e na diáspora.

A Arte Negra e Educação Musical Infantil

Jusamara Souza (1996, p. 26) disse que o significado musical é “construído


culturalmente, em dadas condições contextuais, e ignorá-las pode implicar a projeção de
preconceitos e distorções, por isso entendemos que considerar a diversidade musical na
educação de crianças é construir um modelo pluridimencional da música.
Um currículo musicalizador que busca referências na Cultura de Matriz Africana tem
sido importante na valorização das concepções estéticas baseadas na cultura de nossas

265
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

crianças negras, presente, no entanto, no cotidiano de pessoas negras e não-negras da escola e


da comunidade em que realizamos o trabalho de educação musical. Isso se mostra positivo,
pois a maioria das escolas em suas atividades musicalizadoras “não inclui em suas atividades
pedagógicas, referências do patrimônio cultural e artístico africano e, quando contempla a arte
afro-brasileira, geralmente, o faz de modo folclorizado ou sem devida menção de que se trata
de uma manifestação oriunda da matriz africana, valorizando-a” (SECRETARIA
MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E CULTURA DE SALVADOR 2005, p. 67).

Corpo, Cultura e Música

Na arte negra o corpo é o centro é o centro da produção artístico-musical. Ele é


essencial para criar e recriar. De acordo com determinada publicação “sobre o corpo se
assenta toda uma rede de sentidos e significações” (MEC, 2010 p. 58). O corpo, portanto, é
um espaço importante para concepção, produção e recriação da vida. Trabalhar o corpo na
musicalidade africana é ir além do teórico e pratico a fim de alcançar uma dimensão holística.
Paulo Freire também nos fala sobre a importância do corpo ao dizer que “nas culturas
em que o corpo não foi submetido a um intelectualismo racionalizante (...) em que o corpo
consciente encontrando-se em maior liberdade em suas relações com a natureza, move-se
facilmente de acordo com seus ritmos” (FREIRE, 1978 p. 111).
Em nosso trabalho musical o corpo assumiu essa dimensão integral e integrante do
processo de musicalização. Através de vivências a música corporal foi sendo trabalhada para
produção de sons, diferentes ritmos, tonalidades e intensidades.
Nas aulas de instrumento e canto coral focalizou-se a necessidade de “ouvir” a música
do próprio corpo. Ele (corpo) tornou-se o centro das produções musicais. Fazer isso era
importante, pois a criança, ao compreender que seu corpo produzia diferentes sons, aprendeu
de maneira mais concreta que a sua própria voz ou os instrumentos são capazes de
semelhantemente expressar-se em diferentes sons, ritmos, intensidades e tonalidades.
A cultura foi uma questão e continua sendo, muito trabalhada na educação musical
infantil. Procuramos de todos os modos evitar o isolamento de sub-culturas dando a cada
criança a oportunidade de conhecer e executar gêneros de diferentes grupos étnico-culturais
africanos formadores de nossa brasilidade. Por isso, ela teve a oportunidade de se familiarizar
com gêneros musicais do oeste e sul africano, do recôncavo baiano e da cidade de Salvador.
Também buscamos inspiração em Freire para tornar a educação musical algo
nitidamente musical para as crianças. Ele nos ensinou que a cultura é resultado do trabalho e

266
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

do acréscimo humano de algo ao mundo que ele não fez. E essa realidade cultural de trabalho
e acréscimo pode manifestar-se em diferentes linguagens, inclusive na música. Por isso cada
povo ou comunidade produziu e produz cultura, cultura que deve ser valorizada e trabalhada
pelo educador. (FREIRE 1983, p. 108-109). Portanto a construção de um currículo musical
infantil que dá significado e valor a cultura ancestral da criança é um meio de tornar a escola
mais envolvida com a vida e história do educando e de seu povo, nosso povo na verdade.

Saberes Prévios

Para Freire o educador teria de levar em conta os saberes e experiências de vida do


educando, pois ninguém é vazio de conhecimento. Para esse fim, fazia-se necessário um
esforço dele de se comunicar com o educando. Essa relação dialógica seria capaz de buscar
significados e ressignificados (FREIRE 1982, p. 69). Isso é importante na educação musical
infantil, pois Penna (1990, pp. 19-20) disse que não adianta colocar o aluno “submerso na
escola com uma malha de conteúdos e metodologias desconexos”
Tomados por esse modo de pensar freireano procuramos valorizar os saberes prévios e
experiências musicais da criança. Portanto, a musicalização sempre parte de estilos
conhecidos pelas crianças. Nas aulas de Linguagem Musical Percussiva, por exemplo, o
educador musical tem o cuidado de associar determinados gêneros musicais africanos a
produções musicais conhecidas pelas crianças, comparações com o tão difundido pagode são
mais comuns.
As crianças na comunidade crescem ouvindo pagode, estilo que nasceu e se
desenvolveu nas regiões periféricas de Salvador. Como se utilizou esse estilo popular na
musicalização infantil? De modo geral a criança sabia executar em instrumentos percussivos
esse estilo musical, daí o educador ao ensinar formas de execução de gêneros originários do
oeste africano, comparava os estilos em sua intensidade e diferenciava a tonalidade. Além do
mais o educador não se negava a ouvir e executar a música ouvida pela criança fora da escola,
aprimorando, no entanto, o seu modo de executá-la e senso crítico-musical. Como nos disse
Snyders (1992, p. 88) “a aula de música constitui uma ocasião bastante privilegiada de
colocar-se em ‘uníssono’ com os outros, de escutar uns aos outros, com habituais
ressonâncias de conhecer-se, apreciar-se, aceitar-se”.
Portanto a educação musical infantil em nossa experiência procura emergir do próprio
meio do educando ou senão, aproximar-se ao máximo dele. Esse esforço está em harmonia
com o comentário de Loureiro (2003, p. 176) que disse:

267
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Compreender o modo como os jovens se relacionam com a música, seus


gostos e estilos, significa uma abertura ao diálogo permanente com a
realidade sócio-cultural na qual estão engajados os mais diferentes grupos
socais, inclusive do professor.

Resultados e Conclusões

“Como educador preciso ir lendo cada vez melhor a leitura do mundo que os grupos
populares com quem trabalho fazem de seu contexto imediato e do maior de que esse é parte”,
disse Freire (1997 p. 90). Por isso a tarefa do educador é “Ler o mundo” dos educandos,
conhecê-los, respeitá-los e valorizar a sua cultura, acolhendo as suas diferenças.
Através de educação musical infantil a escola tem dado as crianças negras o apoio para
que elas possam construir de maneira positiva a sua identidade social e cultural como
pertencente ao grupo afro-descendente. E de uma maneira geral contribuímos para que todos
reconheçam a Arte Negra e sua musicalidade como saber socialmente construído e
reconhecendo a África como uma das matrizes legitimas da cultura humana e especialmente,
da brasileira.
A valorização de tradições musicais e costumes da cultura da criança e de seu povo
têm dado suporte ao aprendizado musical. E o trabalho com música africana e afro-brasileira é
um meio de acolher para o seio da escola a diversidade cultural.
Acolher a Pedagogia Freireana na musicalização infantil nos fornece o desafio diário
de “promover o real acesso ao saber, a cultura e a arte” (PENNA 1996, p. 23). Acesso este
que é dado através da valorização das memórias, histórias e artes do povo negro, que
majoritariamente compõem nossa clientela. O Método Paulo Freire nos permiti conhecer de
maneira mais profunda o modo de pensar musical da criança e sempre partir de suas
experiências musicais, permitindo a nós, mergulhar em sua cultura e ajudá-la a prezar suas
raízes ancestrais.
Destaca-se também que essa perspectiva musical diversificada, construída em direção
a um processo aberto e dialógico contribui para a aproximação das crianças a nós educadores,
ao saber, as artes e a música. Considerado aspectos formativos da personalidade da criança
acreditamos que o acesso a arte e a música na vida de cada criança tem se transformado “num
instrumento de soerguimento da personalidade e de estimulo a criatividade”
(KOELLEREUTTER 1997, pp. 38-39).

268
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A educação para Freire (1997, p. 100-105) era uma forma de intervenção no mundo.
Portanto a musicalização infantil por nós desenvolvida contribui para reforçar o projeto de
construção de uma sociedade com relações étnico-raciais e culturais mais igualitárias.
Assim em nossa experiência estamos comprovando a responsabilidade que nós
educadores musicais temos de ‘abrir portas, de dar acesso ao conhecimento
musical’(SWANWICK 1993, p.29-30), mais também, o nosso maior dever com a sociedade
brasileira em perpetuar a sua cultura, a sua ancestralidade e de fazer com que esses
importantes elementos constituintes de nossa identidade façam parte da musicalização
infantil.

Referências

BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Orientações e Ações para Educação das


Relações Étnico-raciais. Brasilia: SECAD, 2010

FONTERRADA, Marisa T. de Oliveira. “Linguagem verbal e linguagem musical”. In:


Cadernos de Estudo: Educação Musical, n. 4 e 5. São Paulo, p. 41, 1994

FREIRE, Paulo. Cartas a Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo. Rio de


Janeiro: Paz e Terra, 1978.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para liberdade. 15. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981

FREIRE, Paulo. Extensão e Comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1983.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996 e 1997

HENTSCHKE, Liane. “A educação musical: Um desafio para a educação”. Educação em


Revista, n° 13 jun. Belo Horizonte, p. 51, 1991.

KOELLEREUTTER, Hans J. Cadernos de Estudo: Educação Musical, n°6. São Paulo, pp. 1-
210, 1997.

LOUREIRO, Alicia Maria Almeida. O ensino da música na escola fundamental. Campinas


SP: Papirus, 2003.

PENNA, Maura. Reavaliações e buscas em musicalização. São Paulo: Loyola, 1990.

PORCHER, Louis. Educação Artística: Luxo ou necessidade? São Paulo: Sammus, 1982.

269
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

SOUZA, Jusamara. Contribuições teóricas e metodológicas da sociologia para a pesquisa em


educação musical. V ENCONTRO ANUAL DA ABEM. V S IMPÓSIO PARANAENSE DE
EDUCAÇÃO MUSICAL. Anais... Londrina: Abem, pp. 11-40, 1996.

SNYDERS, George. A escola pode ensinar as alegrias da música? São Paulo: Cortez, 1992.

SWANWICK, Keith. Permanecendo fiel a música na educação musical. II ENCONTRO


ANUAL DA ABEM. Anais... Porto Alegre: Abem, pp.19-32, 1993.

TROPE, Helena R. As músicas da America Latina e a educação Musical. VI ENCONTRO


ANUAL DA ANPPOM. Anais... Rio de Janeiro: Anppom, pp. 47-53.

270
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Música e Cultura Popular com Crianças na Educação Básica

Leila Cristina Pereira dos Santos


Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES)
Lekasmusic@hotmail.com

Valéria Poliana Silva


Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES)
Lelapolly@hotmail.com

Resumo: A cultura popular brasileira é ampla e diversificada, refletindo diretamente nas


formas de expressão cultural dos sujeitos. A compreensão dos elementos culturais e sua
diversidade são importantes dispositivos de entendimento dos sujeitos inseridos em processos
de ensino e aprendizagem, tornando assim o âmbito escolar apropriado para o
desenvolvimento de atividades que valorizem elementos da cultura popular. Na relação
cultura-educação é possível proporcionar aos envolvidos o autoconhecimento e o respeito à
diversidade. Nessa perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo principal, estimular a
presença da cultura popular através da educação musical na educação básica, buscando
entender à adoção dessa temática em projetos de extensão universitária. A realização desse
trabalho foi possível, através da revisão bibliográfica e pela participação no Projeto Tesouros
do Tempo.
Palavras chave: Cultura popular, educação musical, extensão universitária

1. Introdução

O presente trabalho aborda a presença da cultura popular no contexto escolar da


educação básica, seguindo de descrição sobre a importância da valorização cultural e do
respeito à diversidade na formação do aluno. As ações são articuladas com o GPAM (Grupo
1
PET Artes Música) programa vinculado ao MEC e financiado pela CAPES no intuito de
produzir conhecimento em torno da temática música na escola.
É perceptível que a cultura popular encontra-se conectada à diversidade social do
nosso país, que segundo Lima (2002, p. 23) configura-se como uma das mais diversificadas
sendo assim, a mesma torna-se importante instrumento que juntamente com a música pode
auxiliar de forma intensa e eficaz no ensino-aprendizagem no âmbito escolar. Compartilhando
com, Cristina Rolim Wolffenbüttel a sala de aula é um local interessante para se tratar da
cultura popular, pois apresenta uma grande diversidade cultural entre os alunos presentes

1
Grupo Pet Artes Música da Unimontes, sob tutoria do Prof. Ms. Luciano Cândido e Sarmento têm como
objetivo desenvolver as ações de ensino, pesquisa e extensão em música, bem como compreender e desenvolver
a educação musical e assim promover o desenvolvimento sócio cultural dos sujeitos, destacando a importância
da música no contexto escolar.

271
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

(WOLFFENBÜTTEL, 2000, p. 31). Além disso, trabalhar a cultura popular em sala de aula é
a oportunidade do autoconhecimento e do respeito à diversidade.
Diante disso, nota-se que as universidades brasileiras vêm adotando a cultura popular
como base em projetos de extensão universitária. Dessa forma, o projeto Tesouros do Tempo2
vinculado ao Pólo Arte na escola da Universidade Estadual de Montes Claros –
UNIMONTES se propôs a retratar a história cultural da cidade de Montes Claros com
crianças em cinco escolas públicas municipais, no período de outubro a dezembro de 2009.
Fundamentado na participação no projeto Tesouros do Tempo e em pesquisas bibliográficas
(Corrêa 2007, Kater 2004, Laraia 2010, Lima 2002, Queiroz 2004, Queiroz 2009, Santos
2011, Souza 2010, Wolffenbüttel 2000), como em livros e artigos científicos. Buscamos nesse
estudo estimular a presença da cultura popular através da educação musical na educação
básica, procurando entender à adoção dessa temática em projetos de extensão universitária.
Esperamos que esse trabalho contribua para valorização da cultura popular na
formação do aluno e para exemplificar através do projeto Tesouros do Tempo, o papel da
extensão universitária para os acadêmicos e sociedade. Contribuindo ainda, para o
fortalecimento das pesquisas relacionadas à educação musical, cultura popular e extensão
universitária o que é de grande relevância para nosso constante desenvolvimento. Pois
acreditamos que através da pesquisa ampliamos os conhecimentos e encontramos respostas as
nossas inquietações.

2. Desenvolvimento

Sabemos que a cultura de um povo é constituída por vários elementos, crenças valores,
mitos, jeito de falar, modo de vestir, alimentação, dança, música, folclore, entre outros. Mas
vale ressaltar que, a cultura popular não se limita às manifestações festivas e tradições, esta
também se refere à organização e expressão de todos os elementos citados anteriormente.
Diante do exposto, concordamos com Freire (2003), citado por Gabriel:

Quando falamos de cultura popular estamos nos referindo não apenas às


manifestações festivas e às tradições orais e religiosas do povo brasileiro,
mas ao conjunto de suas criações, às maneiras como se organiza e se
expressa, aos significados e valores que atribui ao que faz [...] (FREIRE
apud GABRIEL, 2005, p.5).

2
Tesouros do Tempo refere-se a um projeto desenvolvido de um musical com o mesmo nome.
272
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Para a continuidade deste estudo é importante compreender a valorização da


identidade cultural e sobre o meio em que ela é disseminada, como afirma Laraia:

O homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é


herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a
experiência adquiridos pelas numerosas gerações que o antecederam. A
manipulação adequada e criativa desse patrimônio cultural permite as
inovações e as invenções. (LARAIA, 2001, p.41)

Baseado na afirmação de Laraia, podemos concluir que a cultura popular não muda de
um dia para o outro, ela advêm de um processo acumulativo que percorre gerações. Como
podemos observar, a cultura refere-se a uma temática ampla e complexa, porém o foco deste
trabalho é em específico na área musical.

2.1 Música e cultura popular na sala de aula

A cultura musical se relaciona com inúmeros aspectos da vida humana, baseado nos
resultados de Queiroz quando o mesmo afirma que “a música na e como cultura representa
uma forte e complexa fonte de significados, sendo parte intrínseca da experiência de cada
sujeito”. (QUEIROZ, 2004, p.105/106). Por conseguinte, observamos que por meio da música
é possível identificar elementos da identidade cultural da realidade em que foi desenvolvida.
No que se refere ao ensino aprendizagem em sala de aula, a música vem sendo
trabalhada de diferentes maneiras com diversas finalidades, uma dessas possibilidades é a de
valorização da cultura popular e o respeito pela diversidade cultural. Souza enfatiza que:

A cultura popular, além de apresentar elementos de riquíssimas


possibilidades para o trabalho com a música na sala de aula, nos faz entender
sobre diferenças culturais, nos faz sair de cada experiência, de cada
brincadeira, mais felizes e principalmente mais humanizados (SOUZA,
2008, p.80).

Em torno de trabalhos culturais através da educação musical na educação básica,


Queiroz e Marinho (2009) vem nos dizer que, “lidar com diferentes expressões culturais
permite contemplar uma série de objetivos fundamentais para o ensino da música nas
escolas.” (QUEIROZ; MARINHO, 2009, p. 66). Mas para que isso aconteça e necessário
estarmos cientes que não basta simplesmente abordar a cultura popular, é imprescindível que
se faça de forma eficaz, desenvolvendo práticas significativas, que contemplem a realidade
dos alunos. Proporcionando aos envolvidos um real entendimento das atividades
desenvolvidas, para assim, possibilitar a valorização e o respeito as diversidades culturais

273
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

presentes nesse contexto. Seguindo esse pensamento, é possível afirmar a importância da


relação cultura e educação. Assim concordamos com Kater (2004), quando mesmo diz que a
união de música e educação contribui para ampliação do conhecimento e do
autoconhecimento, pois se tornam ferramenta de formação.

Música e educação são, como sabemos, produtos da construção humana,


de cuja conjugação pode resultar uma ferramenta original de formação,
capaz de promover tanto processos de conhecimento quanto de
autoconhecimento. Nesse sentido, entre as funções da educação musical
teríamos a de favorecer modalidades de compreensão e consciência de
dimensões superiores de si e do mundo, de aspectos muitas vezes pouco
acessíveis no cotidiano, estimulando uma visão mais autêntica e criativa da
realidade (KATER, 2004, p.440).

Deste modo, é compreensível o envolvimento da música em projetos que visam à


educação, humanização e que prezam tanto pelo respeito à diversidade, quanto pela
valorização da cultura popular.

2.2 Extensão Universitária

Nota-se que nas universidades brasileiras há uma crescente adoção da cultura popular
como base na confecção de projetos de Extensão Universitária. Os mesmos visam difundir e
recriar os elementos do cotidiano local, fazendo assim um diálogo entre universidade e
sociedade.
Conforme Corrêa (2007 p.17), “A Extensão Universitária é o processo educativo,
cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a
relação transformadora entre a Universidade e a Sociedade”. Logo, podemos afirmar que a
Extensão Universitária possibilita um novo espaço de aprendizagem. Concordamos com
Santos (2010, p.13), pois além de formar profissionais as Instituições de Ensino Superior,
devem promover a socialização e democratização do conhecimento, fazendo uma difusão
entre universidade e sociedade. Segundo o mesmo, complementa a formação dos discentes e
docentes é uma das oportunidades onde os acadêmicos colocam em prática os conhecimentos
que vem adquirindo em sala de aula, ou seja, vivenciam o fazer profissional. Dessa forma é
possível afirmar que a extensão não beneficia apenas a sociedade, e sim, todos os envolvidos
O Projeto Tesouros do Tempo vinculado ao Pólo Arte na escola da Universidade Estadual de
Montes Claros – UNIMONTES foi uma dessas formas de diálogo entre universidade e
sociedade.

274
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Esse projeto foi idealizado pela professora Raquel de Paula3, na execução contou com
a participação das professoras Raiana Maciel e Fátima Mendes do departamento de Artes e
departamento de Estágio e Práticas Escolares da Universidade Estadual de Montes Claros -
Unimontes e com acadêmicos de Música e Teatro da mesma instituição juntamente com a
parceria entre Secretária Municipal de Educação de Pró-Reitoria de Extensão. Vale ressaltar,
que essa participação para alguns acadêmicos foi à primeira experiência no que se refere à
extensão e estágio, já que o convite para se integrar no projeto se estendeu aos alunos de todos
os períodos.
Esse projeto foi desenvolvido em cinco escolas municipais da cidade de Montes
Claros, sendo elas, Escola Municipal Jair de Oliveira, Escola Municipal Jason Caetano, Escola
Municipal Professora Maria de Lourdes, Caic do Maracanã (Escola Municipal Dominguinhos
Pereira) e Caic do Renascença (Escola Municipal Dominguinhos Pereira). A proposta foi
transmitir através de canções, parlendas e brincadeiras a história cultural da cidade de Montes
Claros no contexto escolar e assim prestar uma homenagem ao centenário de Hermes de
Paula4. Em torno disso, Paula (2009) 5
diz: “poderemos homenageá-lo acreditando que a
escola possa e deve ser um espaço de formação ampla do educando. Acreditando, podemos
contribuir para o processo de humanização, através de experiências culturais significativas”.
Vale destacar, que entendemos cultura popular como várias manifestações que
resultam de interações entre pessoas, o que reflete nas diversidades culturais. Diante
disso, torna-se perceptível a importância do trabalho com a cultura popular na escola, pois
nesse contexto lidamos com a diversidade, devido à cultura que cada um carrega consigo.
Visando trabalhos educativos com a cultura popular, é importante conscientizar os alunos as
concepções de significados que as manifestações culturais apresentam para aqueles que estão
inseridos nessa cultura. Contribuindo para o respeito e melhor convívio em grupo.

3. Considerações finais

Com base nas discussões apresentadas nesse estudo e através da participação no


projeto Tesouros do Tempo, podemos concluir que o trabalho com a cultura popular através
da música pode ser considerado importante fator para formação do indivíduo crítico, criativo
e participativo. Lembrando que a educação musical é importante instrumento de socialização,

3
Idealizadora e coordenadora geral do projeto “Tesouros do Tempo”.
4
Médico, escritor, historiador, importante folclorista da cidade de Montes Claros.
5
Citação retirada do projeto “Tesouros do Tempo”, organizado pela Professora Raquel Helena Mendonça de
Paula no ano de 2009. Esse documento não foi publicado.
275
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

e que através da música podemos vivenciar manifestações culturais, possibilitando contato


com outras realidades.
Sabendo que a escola é detentora de valores que auxiliam diretamente nessa formação,
acreditamos ser relevante articular a cultura popular nesse contexto de ensino e aprendizagem.
Assim, para desenvolver ações com essa temática, se faz necessário abrir os olhos para as
muitas vertentes da diversidade cultural, presente nos distintos contextos. Portanto,
percebemos que a convivência entre alunos e professores em sala de aula contribui
diretamente na formação da identidade cultural dos indivíduos.
Quanto ao Projeto Tesouros do Tempo, consideramos o trabalho satisfatório uma vez
que, desenvolveu um trabalho grandioso em pouco tempo alcançando um grande número de
pessoas. Um fator significativo foi que além de ensinar o repertório, as equipes envolvidas
tiveram a preocupação em saber se as crianças sabiam o que estavam trabalhando. Para tanto
à medida que o roteiro era transmitido, a história de Montes Claros era contada para as
crianças, e elas também compartilhavam o conhecimento que já tinham sobre a cidade, o que
reforça a idéia de que a extensão universitária é mesmo uma forma de diálogo entre a
Universidade e a Sociedade uma troca de saberes. Diante disso, explica-se a adoção da
temática em projetos de extensão que possibilitam a integração da teoria com prática, fazendo
chegar à sociedade o resultado do conhecimento construído na universidade.

276
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

CORRÊA, Edilson José. Extensão Universitária: organização e sistematização / Fórum de


Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras. Belo Horizonte Ed.
Coopemed., 2007.

KATER, Carlos. O que podemos esperar da educação musical em projetos de ação social.
Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 10, p. 43-51, 2004.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14ª ed. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2001.

LIMA, Sonia Regina Albano de. As rupturas ideológicas do processo cultural brasileiro e seus
reflexos na educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, V.7, p. 21-29, 2002.

QUEIROZ, Luis Ricardo Silva. Educação musical e cultura: singularidade e pluralidade


cultural no ensino e aprendizagem da música. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 10, p. 99-
107, 2004.

QUEIROZ, Luiz Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino da
música na educação básica. Música na educação básica. Porto Alegre, v.1, n.1, p.60-75,
2009.

SANTOS, Marcos Pereira dos. Contributos da Extensão Universitária Brasileira à formação


acadêmica docente e discente no século XXI: Um debate necessário. Revista Conexão UEPG,
Ponta Grossa, V.6, n1, p. 10-15, 2010 - ISSN 1808-6578. Disponível:
http://www.uepg.br/revistaconexao/revista/edicao06/1.pdf. Acesso: 29 abr. 2011.

SOUZA, Fernanda de. O brinquedo popular e o ensino de música na escola. Revista da


ABEM, Porto Alegre, V. 19, p.75-81, mar. 2008. Disponível em:
www.abemeducacaomusical.org.br/Master/reevista19/revista19_artigo8.pdf Acesso em: 10
mar. 2010.

WOLFFENBÜTTEL, Cristina Rolim. A Presença das Raízes Culturais na Educação Musical.


Revista da ABEM, V. 5, p.31-37 setembro 2000.

277
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Produção Fonográfica “A Turma da Maré”: um relato de experiência


Elaine Maria da Silva
Ufal
nany_music18@hotmail.com

Elias Pereira Laurentino Júnior

Resumo: Este trabalho tem como objetivo apresentar A Turma da Maré, projeto iniciado em
2009 pelos alunos da disciplina Projetos Integradores IV do curso de Licenciatura em Música
da Universidade Federal de Alagoas - UFAL. Este projeto resultou em composições musicais
que estão sendo utilizadas nos conteúdos de educação musical nas escolas de ensino
fundamental em Maceió. A Turma da Maré é um trabalho fonográfico em CD
disponibilizado, também, em um livro didático. Tem, ainda, como uma das propostas, a
utilização de ritmos nacionais e internacionais integrados a elementos e/ou espécies da fauna
aquática em geral.
Palavras chave: Educação musical, produção musical e cultura

A Turma da Maré

Este relato de experiência tem por objetivo destacar o projeto de educação musical, A
Turma da Maré, que surgiu em 2008 com os alunos da disciplina Projetos Integradores I na
Universidade Federal de Alagoas – UFAL.
A disciplina Projetos Integradores IV do curso de Licenciatura em Música da
Universidade Federal de Alagoas - UFAL está presente em oito semestres, sendo incluída na
grade curricular de todas as licenciaturas da UFAL. Em música, os professores da graduação
têm autonomia para o planejamento do conteúdo desta disciplina de acordo com o plano
político pedagógico. Com isso, em 2008 participamos do primeiro PI-11 ministrado pela
docente especialista em educação musical que nos apresentou como proposta: a elaboração de
atividades educativo-culturais, tendo como principal objetivo a construção de atividades
relacionadas à educação musical, com foco nas peculiaridades de nossa geografia referenciada
nos elementos e/ou espécies da fauna marítima, lagunar e fluvial. Os discentes elaboraram
canções com temas relacionados a animais aquáticos e parâmetros com objetivos didáticos e
adequados para cada faixa etária. Após essa construção produzimos os arranjos para cada
canção.
Esse trabalho integrou disciplinas como metodologia, história da música, harmonia,
percepção e prática de conjunto. No segundo semestre de 2009 no PI-4 foi possível editar a

1
Projetos integradores: disciplina.
278
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

proposta do PI-1. Com isso, reelaboramos o projeto com o seguinte objetivo: a produção de
um CD com 10 faixas e um livro com as informações didáticas para cada canção.

Justificativa

Mas como produzir se não há recursos? Sabemos que uma produção fonográfica e
elaboração de livros didáticos requerem investimentos elevados. Todavia, não foi obstáculo
para que os alunos elaborassem uma logística para a realização deste projeto. Um dos
discentes que é arranjador e produtor musical propôs patrocinar este projeto com idealização
do trabalho em estúdio próprio para gravação de cada canção como forma de minimização
dos custos de produção. Das etapas do cronograma de execução: 1) revisão das composições
realizadas em 2008 no PI-1; 2) elaboração dos arranjos; 3) a gravação em estúdio e; 4) a
produção das atividades didáticas em um livro.
O professor de música deve possuir uma capacidade que o habilite a realizar a sua
tarefa com êxito e com máximo de rendimento. Essa capacidade compreende o conhecimento
profundo sobre a matéria que se ensina e sua preparação pedagógica para tanto. (JOLY, 2003,
p. 123). É importante que o professor compreenda que o ensino da música na escola não é só
feito por materiais conjugados aos métodos ativos, é preciso que a criação seja de acordo com
a necessidade do aprendizado.
Em Maceió cerca de 110 escolas privadas do ensino básico, 10% exploram em seu
currículo o conhecimento musical no ensino fundamental 1 e 2, já a rede pública promove
projetos de música com a participação de docentes formados em licenciatura em musica. Em
visita a biblioteca do setor de artes, observamos que grande a carência de material didático na
área de educação musical. Após a Lei 11.769/08, constatou-se que algumas instituições de
ensino têm se manifestado, por meio de seus docentes, sobre os materiais que poderiam ser
trabalhados na sala de aula no ensino regular. Logo, percebemos que a intervenção desta
referida lei nos permitiria a criação de trabalhos didáticos para ajudar e capacitar os trabalhos
já existentes na cidade de Maceió.

Objetivos

Compor canções com objetivos didáticos para faixa etária infantil e uma atividade
teórico musical que evidencie a estética e os objetos das canções, utilizando referências dos
métodos ativos e contemporâneos na produção contextualizados dentro da realidade temática
da nossa cultura.
279
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A criação do arranjo construirá o molde do Cd com 9 faixas, todas voltadas para o


conteúdo teórico musical, brincadeiras e curiosidades sobre a geografia e cultura de Alagoas.

Fundamentação teórica

A partir desses conteúdos sentimos a necessidade de elaborar as canções que


abordassem conceitos como lúdico, criatividade e apreciação musical. Do caráter lúdico a
música permite o clima infantil, mesmo possuindo conteúdos complexos, por que isso se
torna uma forma de inserção da criança na familiarização com a linguagem musical utilizando
aquilo que faz parte da infância, o divertimento e a brincadeira. “A arte infantil é
essencialmente lúdica. Porém, não apenas como livre brincadeira ou enquanto brincadeiras, o
lúdico na linguagem artística envolve o expressivo, o sensível, o estético e introduz a criança
na esfera do artístico.” (CORAGEM, 2002, p. 90).
O fazer musical pressupõe uma atitude ativa do pensamento humano, pois é neste
momento que o indivíduo busca as soluções frente aos desafios proporcionados pela música.
É uma oportunidade de adquirir novas perspectivas e fazer descobertas. Já da criatividade
segundo (GAINZA, 1988 p. 107) não surge de improviso na pedagogia moderna. Quase todos
os métodos da primeira época da nova pedagogia musical do século XX (Dalcrose, Orff,
Kodály, Willems) preocuparam-se em estimular e desenvolver a capacidade criadora da
criança. A visão de criatividade exposta na afirmação seguinte exprime este ideal:

Na educação, e considerando o aspecto da transmissão de conhecimentos, o


professor tem todas as respostas, e os alunos, a cabeça vazia – pronta para
assimilar informações. Numa classe programada para a criação não há
professores: há somente uma comunidade de aprendizes. O professor pode
criar uma situação com uma pergunta ou colocar um problema; depois disso,
seu papel de professor termina. Poderá continuar a participar do ato de
descobertas, porém não mais como professor, não mais como a pessoa que
sempre sabe a resposta (SCHAFER, 1992, p. 286).

Sob outro aspecto é possível inferir que a criação é uma ferramenta de formação da
identidade cultural do ser, é um instrumento de auto-reconhecimento e de comunicação. Isto
pode ser corroborado nesta ótica:

Criar é transformar. Perceber, sentir, mobilizar-se relacionar-se internamente


e formalizar-se para se comunicar com o exterior – a criatividade permite ao
indivíduo estar atualizado consigo mesmo, renovando-se e
consequentemente sentindo-se presente ao se comunicar com o externo
(CAMPOS, 2000, p. 80).

280
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Constitui-se também num trabalho de apreciação musical, já que é um trabalho


embasado no contexto músico-cultural de nosso país e uma oportunidade de aproximar as
crianças e professores, contribuindo para o distanciamento do pensamento da música
unicamente com o caráter de entretenimento largamente oferecido pela mídia cada vez mais
crescente. Essa preocupação pode ser vista na seguinte afirmação:

O abandono da educação musical por parte das escolas e do governo foi


acompanhado por profundas modificações na sociedade, que se abriu para o
lazer e os entretenimentos ofertados pelos meios de comunicação de massa,
afastando-se a população escolar, cada vez mais, da prática da música como
atividade pedagógica, aderindo, em vez disso, aos hits do momento e ao
consumo da música da moda, do conjunto instrumental da moda, do cantor
da moda (FONTERRADA,2008 p. 13).

O contato com a apreciação musical é um passo primordial para o bom


desenvolvimento musical, pois na fase inicial do aprendizado ele se tornará um mecanismo de
aguçar a percepção musical em todas suas nuances. Isso é defendido por Beyer e Kebach, haja
vista:

A apreciação permitirá às crianças construírem esquemas mentais que


possibilitem novas produções sonoras, ou seja, organizações posteriores
sobre forma, timbres, ritmos intensidades e variações na dinâmica para obter
determinados resultados em execuções ou criações, como terminar uma
criação, etc. (BEYER; KEBACH, 2009, p. 35).

Metodologia
A primeira etapa consistiu em revisões dos temas escolhidos pelos alunos, uns dos
requisitos desta revisão foram: rima, atividade didática e arranjo. Foram produzidas dez
canções com caráter educativo para o cd intitulado A Turma da Maré, são elas: o tema a
turma da maré, maré, a peleja do pescador, o tubarão, a escala do polvo, a baleia e o
golfinho, cavalo marinho, o caranguejo, a piranha Morgana e mororó – um peixe dançarino.
Apresentaremos os objetivos de cada canção partindo da prática da aprendizagem musical do
trabalho em geral.
Na segunda etapa do processo, pesquisamos sobre a diferença entre canções infantis e
canções para educação infantil. Após a análise das canções infantis, percebemos que na
maioria dos casos possuem ênfase em ritmos acelerados e atribuindo à letra da música uma
função pouco significante sob o ponto de vista pedagógico-musical. Já as canções para
educação musical, o ritmo e o arranjo têm a função de acompanhamento propriamente dito e a
letra, por sua vez, passa a ser o principal fator para apropriação do lúdico e o educacional.
281
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Baseados nessas informações, os arranjos foram trabalhados para que os conteúdos fossem
transmitidos a partir do caráter lúdico e apreciativo. Para Luis Maria Pescetti (apud
BEINEKE, 2007, p.3), há três elementos para a produção musical infantil: (1) as letras que se
referem ao mundo infantil; (2) o trabalho com elementos musicais reduzidos/essenciais e (3) a
presença do jogo.
A produção, terceira etapa, durou cerca de dois meses e para os arranjos utilizamos um
sistema totalmente seqüenciado, onde simulamos através de um teclado arranjador, baterias,
baixos e sons sintetizados para fazer o acompanhamento. Dando foco aos instrumentistas
deste trabalho, utilizamos instrumentos acústicos e elétricos como violão, flauta, sax, guitarra
e clarinete. E, para interdisciplinar esse conjunto, convidamos dois cantores: um interprete
feminino do curso de bacharelado em canto e um interprete masculino que já era integrante do
grupo. É importante salientar que a figura do produtor musical, decisivamente, influenciou na
plasticidade do produto musical no momento de sua gravação, assumindo o papel de
executivo nas funções administrativas para viabilização de todo o desempenho do projeto.
Na quarta etapa produzimos atividades didáticas para cada canção, de acordo com
todos os conteúdos sugerimos algumas atividades, sempre com o pensamento voltado para o
lúdico. Foi pensado também em composições que valorizassem a rima, permitindo-se uma
maior proximidade e interação da criança com este gênero literário comum em nosso país
como forma de interdisciplinaridade. A preocupação inicial foi sempre fazer tudo em contato
com a diversão, porém diversão aqui mencionada é concernente à ludicidade através da
aprendizagem coletiva, logo, pois, estas canções poderão ser executadas com instrumentos ou
com a voz. Por isso deixamos um espaço flexível às atividades para possíveis recriações de
cada docente ou apreciador do nosso trabalho.
Dos conteúdos teórico-musicais encontraremos figuras rítmicas como: síncope,
colcheia, semínima, mínima, semibreve; propriedade sonora: sons onomatopaicos;
instrumentos como guitarra, trompa, sax, clarinete, flauta transversal, flauta doce e piano;
escala de Dó maior; ritmos como frevo, baião, coco de roda, country, swing, pop, rock, valsa
e improvisação. Contando com esse conteúdo A Turma da Maré oferece o uso do play-back
para cada atividade.

Resultados do trabalho

O trabalho concluiu-se com dez canções lúdicas e divertidas para o ensino/


aprendizagem seguindo o objetivo da temática alagoana, vejamos:

282
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

1. A canção que inicia caracteriza o tema e chama-se A Turma da Maré, e tem por
objetivo a chamada de cada canção, exemplo: quando diz: Cai na rede caranguejo que chegou
a sua vez, coloca-se o nome do animal da próxima música no lugar da palavra caranguejo.
Ela pode ser cantada em semicírculo, com os alunos de mãos dadas caminhando para
frente na primeira frase e retornando na segunda. No verso: é um é dois é três, é quatro é
cinco é seis, pode usar palmas. E na última frase, posiciona-se a turma para a próxima canção.
2. A segunda faixa tem como tema A Maré, onde se utiliza uma grande brincadeira de
roda cuja simulação do movimento das águas compreende alguns elementos da dinâmica
musical, tais como crescendo e decrescendo. E esses elementos podem ser articulados através
da voz, palmas entre outros.
3. A Peleja do Pescador, nesta faixa utilizou síncopes e o grupo de quatro
semicolcheias como caracterização dos ritmos nordestinos - o coco e o baião. Durante o solo
de flauta, sugeri-se que sejam feitas rápidas coreografias, semelhante ao uso de objetos como
a rede de pescador, simulando uma pesca.
4. O Tubarão, essa canção utiliza-se de ações onomatopéicas, pois o compositor, por
meio do conhecimento da espécie marinha, inseriu os sons para os diversos tipos de tubarões,
como: tubarão tigre, tubarão lixa e tubarão gato. A Intenção é produzir os sons e ruídos. Nesta
música há momentos de silêncio antes dos ruídos de cada tipo de tubarão, por tanto o
professor pode iniciar a idéia de pausa, mostrando a importância dela numa composição.
5. A Escala do Polvo, o animal citado é da ordem octopoda, que significa oito pés.
Inserimos esse animal ao conteúdo de escala musical, onde a criança pode associar às oitos
pernas com oitos sons numa escala musical. Com dinâmica executamos a escala ascendente e
descente, pois vimos que as crianças obtêm dificuldade em entoar a escala da direção
ascendente para descendente.
6. A Baleia e o Golfinho é uma canção que propõe trabalhar com dois grupos de
alunos ou dois alunos de cada vez, divididos entre “baleias e golfinhos”. A intenção não é
fazer com que os alunos imitem o som da respiração em si, mas que criem a cada repetição
um novo ruído ou timbre com a utilização da voz, o corpo ou instrumentos musicais. Há ainda
a possibilidade de ser cantada com duas vozes se aproveitando dos dois grupos, uma primeira
voz, mais aguda, e mais grave, no trecho em que se canta “faz a baleia” “faz o golfinho”.
7. Cavalo Marinho, em estilo de ninar, esta canção utiliza figura rítmica, (mínima,
semínima e colcheia), além da execução da flauta doce. É também uma música que foi
pensada com o objetivo de mostrar que existem vários tipos de andamentos na música, mas

283
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

que para esta composição foi escolhido o andamento, andante, andamento nem lento nem
rápido.
8. O Caranguejo, com a presença do ostinato poderá ser valorizado a unidade de
tempo, unidade de compasso e o movimento por fraseado que a música oferece. As crianças
poderão andar na unidade de tempo e bater palma do ritmo do ostinato ou andar neste ritmo
para os lados imitando o andar do caranguejo.
9. A Piranha Morgana, a intenção é fazer com que o ritmo dançante do rock conduza a
criança a movimentos livres, como os da piranha na busca por seu alimento, afim de que a
criatividade seja o ponto máximo do fazer musical. Na parte: destemida, atrevida (...) até (...)
querendo ser sua amiguinha, dá-se a ideia de um ostinato rítmico que por meio da repetição se
criem movimentos de ranger de dentes, pular, bater com as mãos, com os pés etc...
10. O mororó, esta música foi criada para ser cantada e dançada com um ritmo
ternário conhecido como valsa. Há nesta música a possibilidade de se trabalhar o uso das
terças, como percepção melódica, além de inserir um timbre de instrumento de metal, a
trompa, para mostrar o uso das oitavas no trecho posterior em que se canta “solfejando
assim:”. Têm basicamente três pulsações, configurando o ritmo valsa, cuja complementação
se dá com um pequeno trecho de uma valsa bastante conhecida de um exímio compositor de
valsas que foi John Strauss. A valsa é também um ritmo dançante, partindo disso, a sugestão é
que os alunos formem-se aos pares e dancem a valsa, mas que não se limitem apenas a esta
possibilidade de expressão corporal dançante. O professor poderá fazer pulsações rítmicas
com palmas, pulos e solfejar a segunda parte da música tocada pelos instrumentos, permitindo
a todos solfejarem juntos os mesmo trechos.
O Serviço Social da Indústria – SESI promoveu um evento intitulado 24 HORAS DE
CULTURA, cuja programação consistiu de apresentações infantis e a convite da instituição, A
Turma da Maré testou o trabalho com 25 crianças com idade de 2 a 6 anos de escolas da rede
privada da cidade de Maceió. O objetivo do projeto citado era recriar e proporcionar o lúdico
às crianças através da música. Compreendendo o objetivo do projeto citado, elaboramos uma
apresentação musical com tempo máximo de 40 minutos. Escolhemos quatro canções,
prevendo o tempo de 10 minutos para cada uma delas, as canções foram: A Maré, A Escala do
Polvo, O Tubarão e Piranha Morgana. Elaboramos nossa metodologia de apresentação da
seguinte forma: 1) interpretação das canções através do play-back pelos cantores do cd A
turma da Maré; 2) a repetição das frases das canções utilizando movimentos corporais para
memorização da música; 3) a brincadeira e a interpretação coletiva. O objetivo foi apresentar

284
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

as canções do cd A Turma da Maré com o intuito de observar a aceitação das crianças com o
ritmo e letra. Dos resultados, constamos que as crianças de 2 a 4 responderam sem inibição
aos nossos objetivos. Já as crianças de 5 e 6 anos ficaram tímidas com a utilização do
movimento corporal, mas com interpretação da letra o objetivo foi alcançado.

Conclusão

A Turma da Maré é um trabalho musical educativo com dez canções que enaltece a
cultura alagoana. E, neste atual contexto de música nas escolas vale salientar o papel da
universidade como viabilizadora do conhecimento necessário para ações como A Turma da
Maré. Nossa experiência com este projeto foi muito relevante porque nos permitiu conhecer
de perto a realidade educacional vivida em Maceió, onde constatamos que existem programas
sociais promovidos pelos governos de Alagoas como o Primeiro Tempo e no município o
PET (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) e, que utilizam as aulas de música
através dos professores já existentes na rede pública que possuem licenciatura em música e
não estão no ensino regular.
Verificamos que as lacunas no âmbito da educação musical ainda são latentes em
Maceió, seja pela carência de professores e com uma boa formação musical acadêmica
presentes nas escolas privadas, seja pela falta de um bom planejamento no tocante ao projeto
político pedagógico para o desenvolvimento do ensino e aprendizagem nas escolas públicas.
No entanto, iniciativas como a Turma da Maré são os primeiros passos e exemplo afim de
transformar essa realidade.
Não pretendemos esgotar todo conteúdo musical nas atividades propostas, no entanto
objetivamos mostrar que o aprender música pode ser algo prazeroso e atrativo. Fornecemos
apenas mais um subsídio necessário para educação musical fortalecendo sua práxis.
Nosso trabalho, a Turma da Maré, é apenas um exemplo de como podemos fazer um
trabalho voltado para o ensino e aprendizado musical é necessário um conhecimento
fundamentado na apreciação musical e na criação. Em se tratando de um trabalho direcionado
à criança, tornar-se-á indispensável haver uma proposta baseada, também, na ludicidade.
O transcorrer de toda produção do cd nos mostra um desafio para a comunidade
acadêmica em geral, a necessidade das universidades terem seus próprios laboratórios de
produção musical, entendemos que isso oportunizará um maior contato com as tecnologias
próprias de estúdios de gravação, que na verdade está no atual contexto musical e deve fazer
parte da formação acadêmico-musical. Este projeto foi contemplado pelo Edital de número

285
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

003/09 de incentivo à produção de CDs e/ou DVDs de música em Alagoas realizado pela
Secretaria de Estado da Cultura – SECULT, com recursos do Fundo de Desenvolvimento de
Ações Culturais – FDAC em 09 de abril de 2010.

286
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BEINEKE, Viviane; FREITAS, Sérgio Paulo Ribeiro de. Canção infantil e educação musical:
uma reflexão sobre a produção de música para crianças. ABEM - associação brasileira de
educação musical, 2007. Anais... Disponível em: <http://www.abemeducacaomusical.or
g.br/Masters/anais2007/Data/html/pdf/art_c/Cancao%20infantil%20e%20educacao%20music
al_Viviane%20Beineke. pdf>. Acesso em: 09 mar. 2011.

CAMPOS, Moema Craveiro. A educação musical e o novo paradigma. Rio de Janeiro:


Enelivros, 2000.

CORAGEM, Amarílis Coelho. Desenvolvimento e aprendizagem. Belo Horizonte: Editora da


UFMG; Proex – UFMG, 2002. p. 89-96.

FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De tramas e fios: um ensaio sobre música e


educação. 2.ed. São Paulo: Editora UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008.

GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de psicopedagogia musical. Tradução Beatriz A.


Cannabrava. São Paulo: Summus, 1988.

JOLY, Ilza Zenker Leme. Educação e educação musical: conhecimentos para compreender a
criança e suas relações com a música. In: HENTSCHKE, Liane. BEM, Lucia Del. (org.)
Ensino de música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Pualo: Moderna, 2003.p.
113-126.

PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. Porto Algre: Sulina, 2008.

SCHAFER, R. Murray. O ouvido pensante. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1992.

287
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Aula de Música na Escola Municipal Martagão Gesteira: música e


alfabetização para uma aprendizagem significativa

Ana Luiza Lemos Tomich


analuizatomich@gmail.com

Resumo: Este artigo relata a experiência em andamento do estágio do curso de Licenciatura


em Música da UFBA, que está sendo realizado na Escola Municipal Martagão Gesteira, onde
o ensino de música auxilia o processo da alfabetização. A partir do diagnóstico feito da turma
do 3° ano do ensino fundamental, com faixa etária de 8 a 14 anos, onde a maioria sabe copiar,
mas não sabe ler e escrever, sendo considerados pela escola pré-silábicos ou silábicos,
procurei caminhos onde a música e a alfabetização se convergem, com o objetivo de melhorar
a qualidade da aprendizagem nesta fase tão crucial para o desenvolvimento da inteligência.
Todo o processo tem por base a apreensão da cultura oral: o repertório de canções, ritmos,
brincadeiras, trava-línguas, estórias, cordéis, dentre outras manifestações populares do Brasil,
com o intuito de trazer para o cotidiano destes alunos o conhecimento de sua própria cultura
e, a partir desta apropriação cultural, construir uma ambiência favorável para uma
aprendizagem significativa que envolva a música e a alfabetização. A fundamentação teórica
é de caráter transdisciplinar, conciliando idéias da área da Educação Musical e da Linguística,
dentre outras que permeiam estas.
Palavras-chave: Música e alfabetização, cultura oral, aprendizagem significativa

Música na Escola Martagão Gesteira

Ao chegar no ambiente escolar, o professor de música se depara com inúmeras


dificuldades, desde a falta de recursos materiais à questão: como ensinar música na escola
regular de modo significativo? Compreender o conceito de aprendizagem significativa de
David Ausubel é de suma importância para a compreensão dos rumos tomados nesta
experiência. De acordo com Ausubel, (1963; 1968), aprendizagem significativa é o processo
através do qual um novo conhecimento se relaciona de maneira não-arbitrária e substantiva à
estrutura cognitiva do aprendiz (p.1). Ou seja, para que o material potencialmente
significativo interaja com as estruturas cognitivas do indivíduo, é necessário que seja
especificamente relevante. Para isso, é necessário que haja um conhecimento prévio, que
servirá como ponto de ancoragem; e, o que é incorporado à estrutura cognitiva é a substância
do novo conhecimento, e não o “veículo” de sua expressão: as formas de signos (p.2).
Respondendo a pergunta acima, cada situação terá muitas possibilidades de caminhos
a percorrer, sendo que, nas palavras de Maura Penna (2010, p.28), da parte do professor cabe
ter “disposição de buscar e experimentar alternativas de modo consciente; e, encarar a

288
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

música em sua diversidade e dinamismo”. A experiência relatada neste artigo trata-se de uma
adequação das aulas de música de acordo com o perfil do professor e a realidade da turma.
A Escola Municipal Martagão Gesteira, fica no bairro Engenho Velho de Brotas, na
cidade de Salvador. O bairro tem em torno de 25.000 moradores, que são na maior parte
negros. A desigualdade social é uma das marcas do bairro, pois no mesmo, encontram-se
vários condomínios, onde vivem pessoas da classe média e, ao redor, existem casas
construídas sem planejamento urbano, com saneamento básico precário. Quando cheguei à
escola, não pude deixar de notar a falta de um espaço de lazer, portanto, os alunos não têm o
horário do recreio e merendam dentro da sala. É uma escola que não tem professor de artes e
nem de esportes. O diagnóstico da turma foi logo se apresentando nas primeiras aulas: alunos
com dificuldade de aprendizagem; alunos que sabem copiar, mas não sabem ler e nem
escrever; índice alto de violência dentro da sala de aula; muita resistência ao novo, no caso, às
atividades propostas na aula de música. Senti nestes alunos uma infância sem identidade, pois,
no início das aulas a maioria achava sem graça as brincadeiras e canções que eu propunha,
como se fossem infantis demais para eles, mas quando se permitiam participar, tudo fluía
prazerosamente. Percebi que estes alunos tinham medo de se exporem e dos outros colegas
rirem (o clima entre eles é bastante conflituoso); que preferiam negar a participar de uma
atividade alegando não saber fazer do que tentar; e a falta de conhecimento relacionado à
própria cultura, demonstrando o domínio da cultura de massa, e também, cada vez mais a
preferência pela Igreja Evangélica, discriminando a cultura afro-brasileira e os rituais do
Candomblé, numa cidade onde a maior parte da população é afro-descendente. A partir de
tantas complexidades, percebo que a entrada da música nas escolas deve estar mais de acordo
com a realidade brasileira, podendo estar auxiliando outros aspectos de relevância social,
como a melhoria do rendimento escolar, a valorização da cultura, a não violência, dentre
tantos outros assuntos que devem ser conscientizados no ambiente escolar. Por isso, decidi
mudar o programa que havia elaborado para o estágio, trazendo a música para este contexto
escolar como um instrumento de auxílio à alfabetização. Não deixaria a música ficar em
segundo plano, apenas enfatizaria os pontos de convergência entre estas. Minha decisão em
fazer este trabalho também se deve a oportunidade que tive de assistir a palestra do professor
de metodologia do ensino da língua portuguesa, Claudemir Belintane, onde coordena o
projeto “Ensinando a leitura a partir de diagnósticos orais”.

“Como se observou nas duas fases da pesquisa, a renitência do aluno diante


da escrita é progressiva, tornando-se cada vez mais complexa ao longo dos
anos. (...) O que fica claro é que o foco das pesquisas e das ações
289
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

pedagógicas deve se centrar mais nas singularidades pessoais e culturais da


criança brasileira.” (BELINTANE, 2009, p.1).

Para o professor Claudemir, aquele aluno que não aprendeu a ler depois de passar da
1°, 2° e 3° série, quando chega na 4° está totalmente fechado à aprendizagem, cria
resistências, dizendo, por exemplo, que não quer aprender a ler (p. 1). Esse é um dos possíveis
motivos da evasão escolar. De acordo com os dados do INEP, Instituto Nacional de Estudos
Anísio Teixeira, a cada 100 alunos que ingressam na escola na 1° série, apenas 5 concluem o
ensino fundamental, sendo, 20,3% da população analfabetos funcionais, que são aqueles que
freqüentaram até 4 anos de escolaridade (IBGE, 2007). E, 9,7% da população acima de 15
anos são analfabetos, que corresponde a 14,1 milhões de pessoas, sendo o maior índice na
região nordeste (IBGE,2010).

Musicalização e Alfabetização: pontos de convergência

As perguntas que nortearam este trabalho foram: Como a música pode auxiliar a
alfabetização? E, como a aquisição da linguagem verbal, pode auxiliar a musicalização? E
outra pergunta veio posteriormente: Qual é o ponto de convergência entre as duas áreas?
Com o objetivo de visualizar tais semelhanças, trago à reflexão o termo - linguagens
artísticas, que também é empregado na música. Atualmente existem discussões acerca do
conceito linguagem, se é correto ou não utilizar o termo para outras áreas que não seja a da
lingüística. Maura Penna (2010) abre a discussão no capítulo 4, “Contribuições para uma
revisão das noções de arte como linguagem e como comunicação”, com o objetivo de tornar
este conceito preciso e consistente, sem ambigüidades. Baseado em análises dos
posicionamentos diametrais de Susanne Langer (1989) e Marcuschi (1995), Maura Penna
conclui:

Em contraposição à visão dos significados lingüísticos como fixos,


permanentes e literais, articulados em sucessão no discurso, como defendido
por Langer, Marcuschi concebe, portanto, a significação como resultante de
um conjunto de fatores, entre eles a inserção contextual. Dessa forma, são
possíveis múltiplas leituras de um mesmo texto, mas não qualquer leitura,
uma vez que, entre os diversos fatores envolvidos, atua também o próprio
sistema lingüístico. Em suma, embora a significação dependa dele, ela não
se esgota no funcionamento do sistema lingüístico (PENNA, 2010, p. 71).

Outra discussão que aproxima a música e a linguagem verbal é feita por Jonh A.
Sloboda (2008), onde ele examina dois teóricos: o lingüista Chomsky e o musicólogo
Schenker, no qual os dois argumentam em suas respectivas áreas que “o comportamento
290
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

humano deve ser sustentado pela capacidade de formar representações abstratas


subjacentes”. Sloboba faz uma revisão destes trabalhos empíricos que demonstram que a
música e a linguagem compartilham não só de elementos comportamentais como também
formais (p.17). O esquema analítico que Sloboba utiliza é baseado na subdivisão da
linguagem e da música nos termos da lingüística: fonologia, sintaxe e semântica. Ele também
faz outras comparações mostrando as principais semelhanças entre musica e linguagem.

A melhor analogia lingüística para a composição musical não é tanto a


enunciação de uma sentença nova, mas a enunciação de uma não sentença
(como o poema); neste caso, o enunciador leva em conta as competências
lingüísticas de seu ouvinte; por isso, a não sentença (o poema) é significativa
para o ouvinte (SLOBOBA, 2008, p.67).

Com o objetivo de acrescentar a esta discussão, vou apresentar as comparações feitas


por Sloboba, e em seguida as comparações feitas por mim:

(a) Tanto a linguagem quanto a música são características da espécie


humana.(...); (b) Tanto a linguagem quanto a música são capazes de gerar
um número ilimitado de seqüências novas.(...); (c) As crianças parecem
possuir uma habilidade natural de aprender as regras da linguagem e da
música através da exposição a exemplo das mesmas.(...); (d) O meio natural
de transmissão, tanto da linguagem quanto da música é auditivo vocal.(...);
(e) Embora o modo auditivo-vocal seja o primário, muitas culturas
desenvolveram maneiras de escrever música. (...) O analfabetismo é
reconhecido como um problema social enorme em quase todas as culturas
letradas, e a habilidades de ler à primeira vista atormenta um número grande
de performers.(...); (f) As habilidades receptivas precedem as habilidades
produtivas no desenvolvimento infantil. (...); (g) As formas adotadas pela
linguagem natural e pela música natural diferem entre as culturas mas
existem elementos universais que restringem essas formas. (...); (h) É
comum considerar a linguagem humana como composta de três
componentes: a fonologia(...), a sintaxe(...), e a semântica(...). A música
parece dividir-se exatamente nos mesmos três componentes (...).
(SLOBOBA. 2008, pp. 25-31).

Quando comecei a pensar sobre as semelhanças entre música e linguagem verbal, a


primeira coisa que veio em minha mente foi: tanto a música quanto a palavra são constituídas
por som e sentido. No caso da música, temos o som com sentido subjetivo que prevalece
sobre o objetivo, pois a interpretação vai estar mais de acordo com o ouvinte. Para a música
ter um som com sentido objetivo, tem que haver algum som com sentido simbólico, como por
exemplo, o piar dos pássaros, a sirene da polícia ou o próprio instrumento musical ou vocal
imitando estes sons que são simbólicos para nós, seres humanos. Na linguagem verbal
acontece exatamente o contrário, o som com sentido objetivo prevalece, representando

291
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

palavras com significado simbólico, mas quando se trata de uma poesia passa a ser subjetivo,
pois o significado pode não ter tanta importância quanto o sentido do som ou da interpretação
do leitor ou ouvinte. As duas utilizam a representação de signos, portanto passam a ser
imagens sonoras com sentido. Temos, portanto, a capacidades de ler um texto ou uma
composição musical e escutar estes sons em nossa mente, que são carregados de sentido. O
resultado deste raciocínio foi bastante matemático: um está contido no outro! Então, comecei
a pensar nas atividades que trabalham as duas áreas simultaneamente. No caso, o objetivo não
é de fato ensinar a notação musical. Eu não poderia atravessar o carro na frente dos bois! Os
alunos não tiveram a oportunidade de serem musicalizados o suficiente para estarem
aprendendo a escrita musical. Mas eles estão precisando aprender a ler e a escrever a língua
falada com urgência, pois estão na fase escolar em que são cobrados por isso.

Música, Alfabetização e Oralidade

Indispensável ouvir qualquer som. A manhã, sem pássaros, sem folhas e


sem ventos, progredia num silêncio de morte. (...) Sinhá Vitória precisava
falar. Se ficasse calada, seria como um pé de mandacaru, secando, morrendo.
(Graciliano Ramos, Vidas Secas.)

A cultura oral é aquela transmitida oralmente de geração a geração, e que abarca


narrativas, brincadeiras, canções, sabedorias, manifestações populares tradicionais, e diversas
informações da própria cultura. É o nosso patrimônio cultural oral. A oralidade é vista neste
trabalho como alimento para as estruturas cognitivas do aprendiz, de David Ausubel (1963,
1968), pois, como poderíamos ensinar música, ou, a ler e escrever se não tiver onde ancorar
tais conhecimentos? Segundo Belintane (2008), o aproveitamento da oralidade constitui
estratégias indispensáveis na preparação das bases da alfabetização e da leitura.

Se o aluno sabe ouvir, contar e relacionar histórias (intertextualidade


temática) se tem textos lúdico-poéticos na memória e aprendeu a identificar
os elementos estéticos de cada gênero oral (paralelismos, aliterações,
assonâncias, rimas e outras iterações), muito provavelmente sua leitura e seu
manejo da escrita se tornará mais dinâmicos e significativos
(BELINTANE, 2010 p.695).

As atividades que foram selecionadas para serem desenvolvidas em sala de aula têm
como característica e objetivo central alcançar a área de convergência entre a música e a
linguagem verbal. Para isso, foi utilizado o vasto repertório já conhecido da oralidade
brasileira, e atividades adaptadas por mim.

292
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Tabela 1: Atividades de música e alfabetização


Atividades Características Objetivos
Estórias São narrativas acompanhadas Enriquecer o repertório oral
musicadas por instrumentos musicais. dos alunos e estimular
a percepção dos diversos sons.
São poesias cantadas,
Literatura de acompanhadas pela viola, Trabalhar a rima, o verso, e discutir
cordel que falam do cotidiano e do sobre o tema do cordel.
imaginário nordestino.
São cantigas cantadas Trabalhar o canto, o ritmo e a
Cantigas de em roda, que pode haver coordenação motora de forma
roda uma brincadeira. lúdica, além de enriquecer o
repertório oral do aluno.
São desafios orais em forma de
Trava-línguas versos, com o Trabalhar o desenvolvimento da fala
agrupamento de palavras e a sonoridade das palavras
difíceis de pronunciar.
São versos com o objetivo de Trabalhar o ritmo do verso e
Parlendas aprender novas palavras e a enriquecer o repertório oral
contar.
Brincadeiras de mãos e de copos Trabalhar a coordenação motora,o
Jogos de que trabalham o canto, o ritmo ritmo dos versos, o canto, e
mãos e copos do verso e a coordenação enriquecer o repertório oral.
motora.
Conhecer as diversas manifestações
Ritmos e instrumentos que e seu contexto histórico; tocar os
Percussão fazem parte das manifestações instrumentos; aprender as células
brasileira musicais do Brasil. rítmicas através das palavras (ex:
tum tum ta).
São fichas que contém os nomes Reconhecer os nomes dos
dos instrumentos e dos sons instrumentos e os sons
Fichas onomatopéicos dos ritmos e dos onomatopéicos de cada ritmo e
diversos sons ao nosso redor. outros sons.
Gráficos São gráficos que representam as Desenvolver a leitura dos gráficos
sonoros intensidades, alturas e duração sonoros utilizando diversas sílabas.
silábicos com a utilização de sílabas. Trabalhar a leitura musical e a
formal simultaneamente.
Apreciação Desenvolver a habilidade de
musical Escutar música e desenhar expressar a apreciação musical por
com desenho meio do desenho(o desenho é a pré-
escrita).
São cantigas que possibilitam a Desenvolver a composição
Cantigas de entrada de versos, criados espontânea de versos; trabalhar o
Versos espontaneamente. canto.
Reconhecer a música através da
Diagnóstico Percepção musical e melodia; lembrar as canções
da memória Memória oral trabalhadas nas aulas anteriores; e
compartilhar seu repertório oral.
293
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Conclusão

Já consigo perceber mudanças positivas no que se refere à receptividade dos alunos, ao


interesse e ao desenvolvimento da aprendizagem, tanto musical quanto na aquisição da leitura
e escrita verbal. A professora Nilzete, que acompanha esta turma desde o 1° ano, afirmou que
está tendo resultados positivos, e fazia questão de anotar as atividades que aconteciam nas
aulas de música para poder dar continuidade em suas aulas. Pude notar tais mudanças, a partir
das atividades: de apreciação e desenho, que foram se tornando mais criativos e coloridos; de
memória, pois, sempre eles lembravam quais músicas cantamos na aula anterior, e alguns
deles compartilhavam do seu repertório oral; na atividade de fichas, onde ocorre a associação
das palavras onomatopéicas ao objeto sonoro e dos sons onomatopéicos às palavras; e, na
realização de gráficos musicais. Espero alcançar mais resultados positivos. Para isso, sei que
ainda tenho disponibilidade, criatividade e consciência para planejar aulas interessantes e
cheias de significâncias.

294
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências
BELINTANE, Claudemir. A oralidade que faz escrever. Revista Educação, Jun de 2009.
Disponível em: <http://revistaeducacao.uol.com.br/textos.asp?codigo=12710 >. Acesso em:
27 de mai. de 2011.

______. Leitura e alfabetização no Brasil: Uma busca para além de polarização. Mai/Ago de
2006. Disponível em: <www.scielo.br/pdf/ep /v 3 2n 2/a04v32n2.pdf>. Acesso em: 27 de
mai. de 2011.

______. Oralidade, alfabetização e leitura: enfrentando diferenças e complexidades na escola


pública. Set/ dez de 2010. Disponível em: <www.scielo.br/pdf/ep/v36n3/v36n3a03.p
df>.Acesso em: 27 de mai. de 2011.

BIANCARDI, Emília. Raízes musicais da Bahia. Salvador: Omar G, 2000.

Moreira, M.A. Aprendizagem significativa: Um conceito subjacente. 1997. Disponível em:


<http://www.if.ufrgs.br/~moreira/apsigsubport.pdf>. Acesso em: 3 de junho de 2011.

PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. Porto Alegre: Sulina, 2010.

SARAIVA, Alessandra. IBGE: Brasil ainda tem 14,1 milhões de analfabetos.


ESTADÃO.COM.BR, 08 de set. de 2010. Disponível em:
<http://www.estadao.com.br/noticias/geral,ibge -brasil-ainda-tem-141-milhoes-de-
analfabetos,606738,0.htm>. Acesso em: 27 mai. de 2011.

SLOBODA, Jonh A. A mente musical: Psicologia Cognitiva da Música. Tradução de Beatriz


Ilari e Rodolfo Ilari. Londrina: EDUEL, 2008.

295
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

As Culturas Musicais em Turmas Multietárias na Educação Infantil

Kelly Werle1
kelly_werle@hotmail.com

Cláudia Ribeiro Bellochio2


claubell@terra.com.br

Resumo: O presente trabalho faz parte de um projeto de pesquisa vinculado ao Programa de


Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria (PPGE/UFSM) e ao
grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical (FAPEM). Tem por objetivo
investigar como o professor percebe o protagonismo infantil e a produção de culturas
musicais no cotidiano de uma turma multietária de educação infantil. Os pressupostos
teóricos, que orientam a pesquisa, se sustentam basicamente nos estudos de Vygotsky (1984),
de Prado (2006), os quais abordam a construção de conhecimentos a partir da interação social
entre crianças de diferentes idades; e Lino (2008) no que diz respeito às culturas musicais da
infância. Como abordagem metodológica, optou-se pela pesquisa participante, a qual será
realizada através de observações, entrevistas e registros no diário de campo. A pesquisa está
em fase inicial de construção e de revisão de literatura.
Palavras chave: Culturas musicais; educação infantil; agrupamento multietário

Agrupamentos multietários na educação infantil

A interação social e a produção de culturas infantis, através das relações estabelecidas


entre crianças maiores e menores, têm sido um tema tratado em pesquisas no campo da
Educação Infantil, a exemplo de Prado (2005). A autora em questão aponta como
possibilidade a riqueza das interrelações das crianças, buscando superar concepções
tradicionais psicogenéticas que estabelecem fases do desenvolvimento, tendo como critério
fixo a idade cronológica da criança. Prado entende que as teorias desenvolvimentistas criam
falsas categorias acerca do desenvolvimento infantil, ao fixar idades e períodos cronológicos
para a superação de determinadas etapas. A crítica que se faz é que, a partir dessa concepção,
crianças maiores não poderiam brincar com crianças menores e vice-versa, porque não se
entenderiam, já que estão em fases diferenciadas de desenvolvimento. Essa acepção é
superada...

[...] dado que a idade não corresponde a uma variável natural e que a
variabilidade de desenvolvimento biológico, psicológico e social nem
sempre permite estabelecer uma correspondência coerente entre tamanho,
1
Doutoranda em Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE, Universidade Federal de Santa
Maria/UFSM.
2
Profª Drª adjunta do Departamento de Metodologias de Ensino/MEN, Universidade Federal de Santa
Maria/UFSM.
296
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

idade e competências, o fato de se ser mais frágil do ponto de vista físico não
significa, necessariamente, ser mais novo, nem implica, do ponto de vista
das interações, uma menor competência cognitiva ou social (FERREIRA,
2004 apud PRADO, 2005, p. 685).

Nesse contexto, emergem pesquisas que tratam de uma nova concepção de infância, a
qual transcende os limites etários e compreende as crianças como produtoras de cultura,
reinventoras da realidade.

O fato de nem sempre encontrarmos uma correspondência coerente entre


tamanho, idade e competências entre as crianças pequenas (não só das
crianças) coloca, pois, em questão, a própria noção de infância e de educação
infantil. Se as crianças nos surpreendem, propondo o inusitado, o imprevisto
num espaço previsto, planejado e organizado, então, não detemos o controle
sobre seus pensamentos e atitudes como ousamos supor (PRADO, 2005, p.
3).

Os resultados da pesquisa de doutoramento de Prado (2006), através da análise de uma


variedade de materiais coletados junto às crianças (desenhos, histórias, canções, etc) apontam
para a impossibilidade de precisar as idades em um coletivo de crianças maiores e menores.
“Nas diversas produções das crianças foi possível observar a diversidade de formas, estilos,
cores, figurações e elementos presentes, sem que fosse possível identificar as idades das
crianças. O que isso significa?” (PRADO, 2005, p. 3).
Em consonância com esse entendimento sobre as diversas possibilidades de
construção e expressão infantil - não limitadas à categoria etária, recorre-se às teorias sócio-
interacionistas (VYGOTSKY, 1984) para sustentar a relevância da interação entre crianças
maiores e menores no que diz respeito à construção do conhecimento. As trocas realizadas
entre crianças com diferentes idades permitem que a aprendizagem possa ocorrer na zona de
desenvolvimento proximal (ZDP), que é a distância entre o nível de desenvolvimento real
(que se constitui em função daquilo que a criança já pode fazer sem auxílio) e o nível de
desenvolvimento potencial (que se entende como sendo aquilo que a criança poderá fazer sob
orientação de um adulto ou com o auxílio de outro par). A ZDP compõe um conjunto de
informações que a criança tem a potencialidade de aprender, mas ainda não completou o
processo, isto é, conhecimentos fora de seu alcance atual, mas potencialmente atingíveis
(VYGOTSKY, 1984).

297
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Culturas musicais infantis

Compreender as crianças pequenas, como produtoras de culturas infantis, implica em


considerar seu protagonismo diante da construção do conhecimento. Diferentemente do que
durante muito tempo se acreditava, as crianças não são receptores passivos da realidade; elas
são sujeitos ativos que interagem, descobrem e recriam possibilidades, buscando representar e
compreender situações cotidianas da vida, construindo variadas hipóteses, até chegar à
sistematização de conhecimentos mais elaborados. “As manifestações infantis são
provenientes de uma cultura própria das crianças. Suas expressões, nas variadas linguagens
decorrem da relação com a cultura que as cerca, ou seja, dos bens culturais que a sociedade
disponibiliza para elas” (COUTINHO, 2005 p. 8).
Na medida em que as crianças brincam, (re)criando espaços e (re)inventando a
realidade, elas reelaboram os conhecimentos construídos socialmente, produzindo, assim,
culturas infantis, que são representativas de vivências culturais mais amplas. Portanto, “as
culturas infantis não nascem no universo simbólico exclusivo da infância, esse universo não é
fechado – pelo contrário, é, mais do que qualquer outro, extremamente permeável – nem lhes
é alheio à reflexibilidade global” (PINTO; SARMENTO, 1997 apud COUTINHO, 2005, p.8).
Deste modo, assim como há diferentes infâncias, coexistem também diferentes
culturas infantis, as quais são influenciadas por questões de gênero, etnia, contexto social,
crenças religiosas, etc. “[...] A criança não é só produto, mas também criadora de cultura, [...]
possui desejos, sonhos, paixões. Que se expressa fundindo sentimento e linguagens, ações e
reações, fantasia e realidade” (COUTINHO, 2005, p.12).
No que diz respeito às culturas musicais infantis, elas constituem um tema que ainda
carece investigação no campo da educação musical. Posterior ao contexto de aprovação da
Lei 11.769/08, a qual estabelece a obrigatoriedade da Música como conteúdo do componente
curricular Arte, muitas pesquisas têm se destinado a problematizar o ensino de música na
escola, tanto na perspectiva de professores especialistas em Música (HENTSCHKE;
AZEVEDO; ARAÚJO, 2006; PENNA, 2007), quanto na de professores unidocentes
(BELLOCHIO, 2000; FIGUEIREDO, 2004; SPANAVELLO, 2005; CORREA, 2008;
WERLE, 2010). Embora essas pesquisas sejam relevantes para a constituição do campo da
educação musical na escola, se faz necessário, também, investigar a música a partir da ótica
das crianças, buscando conhecer suas culturas, preferências e vivências musicais.
Lino (2008) pesquisou a música da infância na escola através do cotidiano de um
grupo de crianças da educação infantil. Em sua tese, ele afirma que
298
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

[...] Ainda conhecemos muito pouco a respeito da música das crianças, seus
valores, crenças e compreensões sonoras do mundo. A pesquisa em
educação musical ainda tem dedicado todo um corpo teórico a pensar como
tornar as crianças mais afinadas, mais adaptadas à destreza instrumental,
mais sujeitas à intervenção e conduta aos esquemas de aprendizagem e
desenvolvimento instrumental (LINO, 2008, p. 32).

A autora caracteriza a música das crianças como barulhar, que corresponde a uma
dimensão ficcional em que a música não opera somente com sons; mas também, com a
escuta. “Todas as crianças produziram insistentemente barulhadas, vivendo o descontínuo
como presença na natureza sonora ao expor uma miríade de explorações com a música como
experimentação, jogos de escuta ou narrativas sonoras” (LINO, 2008, p. 8).
Percebe-se que, para as crianças, a música está vinculada ao brincar. Isso demonstra o
caráter lúdico da música na infância. As crianças não brincam porque gostam de criar e
imaginar. Brincam porque, através do brincar, tem a possibilidade de representar e
compreender a realidade. Brincando, as crianças produzem culturas. Segundo Pinto e
Sarmento (1997, apud COUTINHO, 2005, p. 10) “o que caracteriza a cultura das crianças é a
relação sempre presente entre fantasia e realidade, entre o possível e o impossível, entre o
presente e o imaginário. Para as crianças, a realidade é fantasiosa”.
As culturas musicais da infância estão interrelacionadas a um contexto sociocultural
que influencia as vivências e os gostos musicais das crianças. A música é trazida para o
cotidiano da educação infantil, independente da vontade ou das intervenções dos professores,
por meio das manifestações das crianças, que muitas vezes, estão imersas na cultura midiática
e contexto sociocultural. Contudo, ressalta-se que

A música da infância não é apenas a folclórica, a disciplinar, a erudita, a


mpb, a cantiga de roda, a gaúcha, a pequeninha, a com mensagem e texto
reduzido, etc. A música é essa e aquela simultânea e heterofonicamente,
porque, como um substantivo plural, ela acolhe e se nutre de vários
repertórios que lhe conferem um identidade multicultural (GARBIN, 2001) e
servem a diversão e a alegria, expondo a necessidade de experimentar
sentidos. Música que movimenta o ator plural nas redes complexas e
múltiplas de significações, crenças e hábitos das culturas infantis dados na
socialização possível nos tempo de ser a música da infância, essa ação
inabordável e encantadora de conjugar diversidade, multiplicidade e escutas
num só corpo de sonoridades (LINO, 2008, p. 31).

Nesse contexto, esta pesquisa está organizada com vistas a problematizar, junto a
educadores infantis, um olhar para as culturas da infância que estão sendo produzidas no
cotidiano de determinada instituição de educação infantil. “Escutar sensivelmente a música
nas culturas da infância requer que contemplemos o ponto de escuta das crianças em seu
299
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

encontro com o mundo, buscando uma aproximação com a complexidade desse encontro”
(LINO, 2008, p. 35).
Considera-se relevante que os professores possam aguçar seu olhar para as culturas
construídas na coletividade das relações estabelecidas entre crianças de diferentes faixas
etárias. Assim, com o decorrer da pesquisa, objetiva-se investigar como o professor percebe o
protagonismo infantil e a produção de culturas musicais no cotidiano de uma turma
multietária na educação infantil.

Delineamentos metodológicos

A pesquisa está em fase inicial de elaboração e revisão de literatura. Pretende-se


adotar uma abordagem participante com a finalidade de possibilitar a discussão e reflexão
junto a professores que atuam na educação infantil no Núcleo de Educação Infantil Ipê
Amarelo (NEIIA), locus da pesquisa.
O Ipê Amarelo está vinculado à UFSM e vem desenvolvendo suas atividades junto a
grupos de crianças, construindo sua trajetória há 22 anos, demonstrando e demarcando
possibilidades de construções e de descobertas na educação infantil. Dentre o trabalho que
vem sendo realizado, destaca-se a proposição de turmas de crianças a partir do critério de
agrupamento multietário; ou seja, crianças de 01 a 05 anos convivendo no mesmo espaço,
interagindo, construindo e produzindo culturas infantis, constituindo, assim, uma turma
composta na/pela diversidade.
Há três anos, foi criada a primeira turma composta por crianças de 1 a 5 anos, a qual se
denominou de “Integração”. A partir das constatações, observação atenta e avaliação das
conquistas obtidas, no corrente ano, foram criadas mais três turmas “Integração” (nos turnos
manhã e tarde). As turmas “Integração” têm se constituído um verdadeiro desafio aos
professores e aos pais, que necessitam ressignificar a importância atribuída em demasia às
idades, no que se refere ao desenvolvimento infantil, buscando considerar que crianças
maiores e menores aprendem umas com as outras, independente de faixa etária, mediadas
pelas problematizações e pelas intervenções do professor.
Dessa forma, o Ipê Amarelo constitui-se locus de realização desta pesquisa em função
da proposição de turmas multietárias. Como instrumentos metodológicos, têm-se observações
participantes nas turmas, entrevistas semi-estruturadas com as professoras, registros no diário
de campo e filmagens.

300
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Estão sendo realizadas inserções e observações participantes no contexto das turmas


de Integração do NEIIA, como parte de uma pesquisa de campo com a finalidade de perceber
as múltiplas relações e construções das crianças, tendo por base o protagonismo infantil e as
mediações realizadas pelos professores.
Pretende-se realizar observações e gravações, buscando verificar as interações das
crianças em diferentes momentos do cotidiano, suas construções e produções de culturas
musicais. Essas gravações serão usadas posteriormente para discutir e problematizar os
recortes de cenas do cotidiano junto às professoras, a fim de analisarmos como elas percebem
o protagonismo infantil e a produção de culturas musicais no contexto do agrupamento
multietário.

Algumas considerações iniciais

A partir das inserções da pesquisa de campo que estão sendo realizadas junto às
turmas multietárias do NEIIA, foi possível observar as interações e construções das crianças
em momentos de atividades dirigidas e mediadas pelas professoras, bem como momentos de
atividades livres, em que as crianças organizavam suas brincadeiras. Percebe-se que o
trabalho pedagógico realizado tem foco nas crianças, de modo que são suas curiosidades e
questionamentos, os quais ao serem problematizados pelas professoras, que constituem o(s)
tema(s) do projeto da turma (BARBOSA; HORN, 2008). Desta forma, torna-se visível o
protagonismo da criança diante da elaboração e dos encaminhamentos da proposta de
trabalho.
Nos momentos de atividades mais livres, os quais também são entendidos como
relevantes para o desenvolvimento infantil, é possível observar a forma como as crianças se
organizam para brincar, as questões de poder e de liderança, a representação dos papéis
sociais e das regras acordadas. São comuns brincadeiras que envolvam um grupo de meninos
e meninas, o qual representa uma organização familiar, e eles desempenham a função de
mamãe, papai, irmão(ã) mais velho(a) ou mais novo(a), tio(a), primo(a), etc.
Nesse jogo simbólico de representar as relações estabelecidas no cotidiano de uma
família, as crianças constroem e expressam variadas relações que envolvem gênero, classe,
etnia, poder, etc. Neste contexto, manifestações musicais também adentram e fazem parte do
brincar. Como, por exemplo, certa menina que desempenhava papel de mãe cantora e
realizava um show para os seus filhos e amigos. Todos resolvem fazer parte do show, subindo

301
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

numa parte mais elevada do terreno, imaginando estar segurando microfones ou instrumentos
musicais enquanto cantavam “fada, fada querida, dona da minha vida”.
Constata-se, portanto, que as crianças pequenas da educação infantil produzem
culturas musicais; todavia, há que se problematizar e questionar, junto a esses professores da
infância, o modo como percebem essas culturas no cotidiano de seu fazer pedagógico – foco a
que se destina a presente pesquisa.

302
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BARBOSA, Maria Carmen Silveira; HORN, Maria da Graça Souza. Projetos pedagógicos na
educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008.

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A educação musical nas séries iniciais do ensino


fundamental: olhando e construindo junto às práticas cotidianas do professor. Tese
(Doutorado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de
Educação, Porto Alegre, 2000.

CORREA, Aruna Noal. Programa LEM: Tocar e Cantar: Um estudo acerca de sua inserção
no processo músico-formativo de unidocentes da Pedagogia/UFSM. Dissertação (Mestrado
em Educação), Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2008.

COUTINHO, Ângela Maria Scalabrin. Culturas infantis: conceitos e significados no campo


da pesquisa e no cotidiano da educação infantil. Zero-a-seis. Florianópolis, n. 12, jul./dez.
2005. Disponível em:
<http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/zeroseis/article/view/9713/10369>. Acesso em: 10
jun. 2011.

FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. A preparação musical de professores generalistas no


Brasil. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p. 55-62, 2004.

HENTSCHKE, Liane; AZEVEDO, Maria Cristina de Carvalho C. de; ARAÚJO, Rosane


Cardoso de. Os saberes docentes na formação do professor: perspectivas teóricas para a
educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 15, p. 49-58, 2006.

LINO, Dulcimarta Lemos. Barulhar: a escuta sensível da música nas culturas da infância.
Tese (Doutorado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de
Educação, Porto Alegre, 2008.

PENNA, Maura. Não basta tocar? Discutindo a formação do educador musical. Revista da
ABEM, Porto Alegre, v. 16, p. 49-56, 2007.

PRADO, Patrícia Dias. Contrariando a idade: condição infantil e relações etárias entre
crianças pequenas da educação infantil. Tese (Doutorado em Educação), Universidade
Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, 2006.

______. “A gente gosta é de brincar com os outros meninos!” Relações sociais entre crianças
num jardim de infância. Educação e Sociedade, Campinas, v. 26, n. 91, p. 683-688,
Maio/Ago. 2005. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 13 maio 2011.

SPANAVELLO, Caroline da Silveira. A educação musical nas práticas educativas de


professores unidocentes: um estudo com egressos da UFSM. Dissertação (Mestrado em
Educação), Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2005.

VYGOTSKY, Lev Semenovitch. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes,
1984.

303
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

WERLE, Kelly. A música no estágio supervisionado da Pedagogia: uma pesquisa com


estagiárias da UFSM. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal de Santa
Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2010.

304
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Sonorizando Histórias e Discutindo a Formação e as Práticas Musicais de


Pedagogas na Educação Infantil

Kelly Werle1
kelly_werle@hotmail.com

Cláudia Ribeiro Bellochio2


claubell@terra.com.br

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo discutir a formação e atuação pedagógico-
musical de pedagogas na educação infantil, apontando para a sonorização de histórias como
uma possibilidade metodológica para o trabalho com a educação musical. O relato decorre de
uma pesquisa de mestrado vinculada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal
de Santa Maria (PPGE/UFSM) e ao grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical
(FAPEM) que objetivou investigar como as estagiárias concebem, organizam e potencializam
a música no processo de construção da docência, através de um grupo composto por quatro
estagiárias e mestranda (ou pesquisadora). A partir dos resultados obtidos se identificou as
histórias sonorizadas como práticas recorrentes adotadas pelas estagiárias no trabalho com a
educação musical, foco metodológico que será abordado no decorrer deste texto.
Palavras chave: Educação musical, educação infantil, sonorização de história

Introdução

O presente texto decorre de uma pesquisa de mestrado desenvolvida junto ao


Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria e ao
grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical (FAPEM). A pesquisa buscou
investigar como estagiárias do curso de Pedagogia/UFSM concebem, organizam e
potencializam a música durante a realização do estágio supervisionado na educação infantil3.
Como abordagem metodológica utilizou-se a pesquisa participante, a qual foi realizada por
intermédio de um grupo composto por quatro estagiárias da Pedagogia e a mestranda. Como
instrumentos metodológicos foram utilizados: entrevistas semi-estruturadas, observações,
caderno de registros dos encontros do grupo e das observações e caderno de registro das
participantes.
Este texto constitui um recorte de parte dos resultados da pesquisa e focaliza a
sonorização de histórias, prática recorrente adotada pelas estagiárias no trabalho com a

1
Doutoranda em Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE, Universidade Federal de Santa
Maria/UFSM.
2
Profª Drª adjunta do Departamento de Metodologias de Ensino/MEN, Universidade Federal de Santa
Maria/UFSM.
3
Na ocasião deste texto está sendo enfocada a educação infantil, mas a pesquisa também abarcou os anos iniciais
do ensino fundamental.
305
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

educação musical durante o estágio supervisionado na educação infantil. Pretende-se discutir,


ao longo do texto, acerca da educação musical na formação acadêmico-profissional4 do curso
de Pedagogia apontando para a sonorização de histórias como uma das possibilidades para o
trabalho com a educação musical, através de um relato, registrado no caderno de uma das
participantes da pesquisa, envolvendo uma atividade vivenciada com uma turma de crianças
da educação infantil.

A Formação Musical e Pedagógico-Musical no Curso de Pedagogia

A música está presente em nossa vida e permeia nossas relações e construções com o
mundo, desde muito cedo. Basta exercitarmos um pouco nossa memória para percebermos
que crescemos e nos constituímos humanos envoltos por um ambiente sonoro e musical
característico de nosso cotidiano e contexto social e cultural, repleto de sentidos e significados
que nos são únicos e também se mesclam com experiências musicais de outros sujeitos.
Somos seres musicais e temos a capacidade de responder sonoramente e musicalmente
à cultura em que estamos inseridos. Algumas pessoas afirmam “não ter dom para música”,
sem ter a consciência, contudo, que o fazer musical, não é algo concedido naturalmente sem
influência do meio ou esforço próprio. Portanto, a música não é um dom concedido a uns e
negado a outros, o que ocorre é que, no decorrer de nossas trajetórias de vida possuímos
maiores ou menores oportunidades de estarmos nos desenvolvendo musicalmente.
Assim, não existe uma pessoa amusical, pois “a musicalidade é uma característica da
espécie humana e [...] todos os seres humanos estão aptos a se desenvolverem musicalmente”
(FIGUEIREDO; SCHMIDT, 2008).
Essa concepção acerca da música também pode ser levada para a discussão quando
pensamos na professora5 que atua com a educação infantil e anos iniciais. Pois, refletir sobre
o trabalho com a educação musical na escola, implica em considerar essas múltiplas relações
e construções acerca da música que perpassam pela trajetória pessoal e profissional.
Neste contexto, é importante que na formação acadêmico-profissional as futuras
professoras possam ter a oportunidade de ampliarem seus conhecimentos musicais e
pedagógico-musicais. Para que, a partir de suas experiências, em consonância com novas

4
Tomo por formação acadêmico-profissional o conceito adotado por Diniz-Pereira (2008), o qual opta por esse
termo em detrimento da formação inicial porque acredita que a formação inicia-se muito antes da entrada em um
curso superior. Assim, o autor defende a utilização do termo formação acadêmico-profissional para a etapa da
formação que acontece no interior das instituições de ensino superior.
5
Utilizo o gênero feminino devido à expressividade de mulheres atuando como professoras nesses níveis de
ensino.
306
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

vivências possam desenvolver conhecimentos, que as possibilitem trabalhar com a educação


musical na docência.
É relevante lembrar que, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais para o
curso de Pedagogia, o egresso deve estar apto a “ensinar Língua Portuguesa, Matemática,
Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às
diferentes fases do desenvolvimento humano” (BRASIL, 2006).
Recentemente, as diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental de nove
anos orientam em seu artigo 31, que “do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, os
componentes curriculares Educação Física e Arte poderão estar a cargo do professor de
referência da turma, aquele com o qual os alunos permanecem a maior parte do período
escolar, ou de professores licenciados nos respectivos componentes” (BRASIL, 2010). No
parágrafo 2º deste artigo orienta-se que “nos casos em que esses componentes curriculares
sejam desenvolvidos por professores com licenciatura específica (conforme Parecer
CNE/CEB n 2/2008), deve ser assegurada a integração com os demais componentes
trabalhados pelo professor de referência da turma”.
Considerando que mediante a homologação da Lei 11.769/2008 fica determinada a
obrigatoriedade da Música como conteúdo do componente curricular Arte, o egresso em
Pedagogia também necessita ter conhecimentos acerca da música para poder desenvolvê-la e
integrá-la ao seu contexto de docência, o que implica em formação neste campo do saber.
Certamente que essa formação musical e pedagógico-musical na Pedagogia não substitui a
necessidade de um professor especialista em música atuando nas escolas, trabalho que poderá
ser construído conjuntamente nesses níveis de ensino. Mas, salienta-se a importância da
professora da infância desenvolver um trabalho musical com desempenho mais qualificado,
maior clareza e criticidade junto aos alunos.
A Universidade Federal de Santa Maria tem uma trajetória formativa em educação
musical no curso de Pedagogia há 25 anos. Desde 1984, o curso de Pedagogia possui
disciplinas obrigatórias de educação musical, as quais foram reconfiguradas e mantidas após
as reformulações e adaptações curriculares ocorridas em 2004 e 2006. A formação
proporcionada pelas disciplinas vem sendo ampliada e complementada pelas oficinas
musicais ofertadas pelo “Programa LEM: Tocar e Cantar”6 desde 2003. Esse espaço
formativo da educação musical na Pedagogia tem propiciado um ambiente fértil para a

6
Projeto de extensão coordenado pela Profª Drª Cláudia Ribeiro Bellochio e pela Profª Drª Luciane Wilke
Freitas Garbosa, o qual oferta gratuitamente oficinas musicais, ministradas por licenciandos em Música, para
acadêmicos do curso de Pedagogia e outras graduações, bem como comunidade em geral.
307
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

produção de pesquisas tendo como lócus a formação musical do curso de Pedagogia da


UFSM, como Bellochio (2000), Spanavello (2005), Correa (2008), Furquim (2009) e
Oesterreich (2010); Werle (2010).
Embora, o trabalho com a educação musical possa representar um grande desafio para
as professoras de educação infantil, já que na maioria das vezes tiveram poucas vivências
musicais formais em sua trajetória de vida, acredita-se que através de um processo
longitudinal de vivências musicais e acompanhamento das práticas, seja possível que as
pedagogas possam potencializar a educação musical junto aos alunos.
A seguir são apresentados partes dos registros de uma história sonorizada a qual foi
criada por uma estagiária participante da pesquisa e desenvolvida em uma turma de educação
infantil, com crianças de 3 anos de idade.

“Vamos Passear na Floresta?”: sonorizando histórias

Parte I
Olhos curiosos e atentos à organização da sala que estava diferente. Em um
canto da sala, um tapete grande com alguns objetos sonoros, no outro uma
caverna construída com panos e cadeiras, e interligando os dois, um amplo
espaço livre sem qualquer objeto. Cortinas abertas... luzes apagadas... um
estranho mistério no ar. A professora, então, convida como quem se propõe a
iniciar uma aventura: - Vamos passear na floresta? Eis que no segundo
seguinte a sala se transforma por completo! Tudo foi tomado por árvores e
plantas que cresciam, não se sabe de onde, tornando o ambiente inusitado e
desconhecido. A possibilidade de haverem animais e feras na floresta
aumentava a cada instante. Ouvidos muito atentos à jornada que estava para
começar (Caderno de registro, estagiária Dora, set. 2009).

Como já sabido, as histórias são muito importantes para o desenvolvimento e


construção do pensamento simbólico das crianças. Segundo Brito (2003, p. 161)

Ouvindo e, depois, criando histórias, elas estimulam sua capacidade


inventiva, desenvolvem o contato e a vivência com a linguagem oral e
ampliam recursos que incluem o vocabulário, as entonações expressivas, as
articulações, enfim, a musicalidade da própria fala.

Neste sentido, as histórias podem se tornar metodologia para o trabalho com a música,
a partir do momento que se busca torná-las mais expressivas e sonoras. A forma como se
narra uma história, variando a entonação de voz conforme as diferentes partes: ora mais
grave, mais agudo, pronunciando mais rápido ou lentamente, suave ou mais forte, enriquecem
a história e despertam as crianças para as variações sonoras que estão ocorrendo.

308
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

As histórias sonorizadas são uma possibilidade para o trabalho com música de fácil
acesso para professoras da educação infantil, pois essas professoras conhecem o contexto de
suas turmas, sendo possível identificar os elementos e temas que lhes são mais significativos e
que possam aguçar ainda mais a imaginação e a criatividade, contribuindo para a construção
da história sonorizada.
Além disso, neste tipo de atividade não se faz necessário habilidades vocais ou o uso
de instrumentos musicais convencionais, podendo ser utilizados uma variedade de objetos
sonoros.
Durante a realização da pesquisa constatou-se que trabalhar com histórias sonorizadas
foi uma prática utilizada por todas as estagiárias que participaram do estudo. As histórias
surgiam a partir de interesses demonstrados pelas crianças e de temáticas que estavam sendo
desenvolvidas.
É importante que o ambiente a ser realizado a história possa ser pensado, organizado e
planejado, a fim de que possa ser convidativo às crianças adentrarem na história proposta,
contribuindo assim com a criação durante o processo de sonorização.

Parte II
- Vamos passear na floresta?
- Vamos!!
E o passeio começa com todas as crianças sentadas no tapete, que já não era
mais um tapete, mas sim um barco que navegava pelo rio da floresta.
- Vocês estão ouvindo o som do rio? Como podemos fazer o som do rio?
Rapidamente as crianças passam a explorar os sons dos instrumentos e
objetos sonoros, e a cada desafio proposto pela professora, iam sonorizando
e vivenciando a história, ora com os objetos disponíveis, ora com sons do
próprio corpo.
Uma cascata se aproxima, é chegada a hora de abandonar rapidamente o
barco, nadar até a margem. Na medida em que se movimentavam por todos
os espaços iam desvendando os mistérios da floresta. A caminhada, o trecho
do mato fechado, a trilha de pedrinhas, a escalada nas árvores, a colméia, o
encontro com os macacos, tudo ia somando muita sonorização e estimulando
a imaginação com as situações que as próprias crianças iam sugerindo. Até
que, copiosamente, começou a chover, a trovejar e a ventar... E agora? Para
onde ir? (Caderno de registro, estagiária Dora, set. 2009)

Realizar uma história sonorizada junto aos alunos implica em elaborar um enredo e
um cenário sonoro pelo qual a mesma será contada ou vivenciada, conforme a situação
exemplificada. A história a ser sonorizada pode ser alguma já conhecida de livros infantis,
uma adaptação e construção da professora ou uma construção coletiva da turma. Na situação
relatada, a história foi uma adaptação realizada pela professora a partir de “Vamos passear na

309
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

floresta?” (faixa 8 do CD que integra guia prático para professores Música 1 – editora Lua,
2006).
Os elementos a serem utilizados para sonorizar uma história podem variar conforme as
possibilidades de materiais disponíveis. Nessa atividade foram usados objetos sonoros
confeccionados, anteriormente, pelas próprias crianças, como por exemplo: tambores feitos
com latas de diversos tamanhos; chocalhos feitos com potes de iogurte acrescido de pedrinhas
e sementes; móbiles feitos com chaves; reco-reco e claves feitos com pequenos bastões de
madeiras; lixas; pau de chuva. Também foram utilizados negativos de exame de raios-X e
pedaços de mangueiras amarelas usadas em construções, pois costumam causar um bom
efeito semelhante ao som de trovoadas e do vento – quando a mangueira é segurada em uma
das extremidades e balançada rapidamente em movimentos circulares.
Por outro lado, quando não houver objetos sonoros, está atividade também pode ser
realizada utilizando objetos da própria sala de aula dos quais seja possível extrair algum tipo
de som, como, por exemplo, passar o lápis ou caneta na mola do caderno, abrir e fechar o
estojo ou mochila, friccionar o giz no quadro, dentre outros. Pode-se desafiar os alunos a
explorar as possibilidades sonoras da sala de aula para criar um cenário sonoro para a história.

Parte III
- A caverna! Vamos correr para a caverna!
Protegidos da chuva, inicia-se a exploração da caverna e dos sons deste
inusitado lugar. Que criatura habitaria a caverna?
- Gente, olha lá! É peludo, tem rabo comprido... Que cheiro é esse?
- É um gambá!
Todos corriam para fora da caverna fugindo do gambá. Era necessário fazer
todo o caminho de volta e muito rápido.
***
No dia seguinte, uma criança chega à sala de aula acompanhada de um
gambá de pelúcia. A turma revive a história e agora ganha um novo mascote
que passa a acompanhá-los nas próximas atividades. “O gambá de pelúcia
virou o mascote da turma. As crianças disputavam ele, tratavam ele como
uma pessoa, tudo por causa da história ‘Vamos passear na floresta’. Até no
banheiro levaram o gambá junto” (Caderno de registro, estagiária Dora, set.
2009).

A história sonorizada teve como dispositivo a mediação da professora buscando


desafiar as crianças a explorar as diferentes possibilidades sonoras dos objetos
disponibilizados. Na medida em que, a professora contava a história também conduzia a
sonorização da mesma, de modo que todas as crianças pudessem participar da trilha sonora.
Além disso, as intervenções da professora possibilitaram que as crianças pudessem
pensar ao produzir os sons, realizando pequenas variações, como por exemplo, no trecho da

310
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

história em que começou a chover: a chuva iniciou lenta, aos poucos foi aumentando a
intensidade até que se tornou um temporal com chuva forte, ventos e trovadas.
Percebe-se que a problematização da professora é fundamental, para que as crianças
possam ser estimuladas não só a produzir sons, mas também a ouvir os sons que estão sendo
produzidos pelos colegas, de modo atento, organizado e reflexivo. Após a história foram
feitos questionamentos acerca dos efeitos produzidos por esses sons, bem como comparações
entre as propriedades dos mesmos: longo ou curto (diz respeito à duração), fraco ou forte
(intensidade), agudo ou grave (altura7), etc. A professora propôs diferentes organizações para
que os sons não fossem produzidos somente de modo concomitante, e assim seus efeitos
pudessem ser explorados separadamente e alternadamente.

Algumas Considerações

Entende-se que as histórias sonorizadas têm potencial metodológico para o trabalho


sonoro-musical a ser realizado junto às crianças. Contudo, é importante que a professora, ao
conceber a relevância da educação musical como parte do desenvolvimento integral da
criança, possa colocar-se em um constante movimento de busca por alternativas diferenciadas
as quais possam estar contemplando em sua prática docente. Para isso, é preciso ressignificar
a sua relação com a música, não restringindo ou limitando a sua atuação por não ter o domínio
de certa habilidade vocal ou com instrumentos musicais convencionais.
A possibilidade da professora de educação infantil trabalhar com a música em suas
práticas amplia a capacidade de contextualização e significação a ser construída acerca da
música pelas crianças. Na medida em que a professora organiza seu projeto e sua ação
pedagógica e articula as áreas do conhecimento, integrando à música, as aprendizagens
passam a ter mais sentido para as crianças.

7
Para que essa propriedade possa ser compreendida mais facilmente pela criança, pode-se fazer referência ao
som agudo associando-o a um som mais “fino”, ao passo que um som grave pode ser referido como um som
mais “grosso”.
311
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BELLOCHIO, C. R. Formação de professores e práticas em educação musical: transformando


o existente e gerando alternativas. In: BEYER, E. (Org.). Som e Criatividade. 1. ed. Santa
Maria: Editora da UFSM, 2005. v. 1. p. 199-219.

BELLOCHIO, C. R. A educação musical nas séries iniciais do ensino fundamental: olhando e


construindo junto às práticas cotidianas do professor. 2000. Tese – Curso de Doutorado em
Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

BRASIL, Diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia. Resolução CNE/CP n. 1, de 15


de maio de 2006. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>.
Acesso em: jun. de 2009.

BRASIL, Novas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental de 9 anos. RSL N.7, de
14 de dezembro de 2010, sobre o ensino fundamental.
Disponível em: <http://www.cne.gov.br.html>. Acesso em: fev. 2011.

BRITO, T. A. de. Música na educação infantil: Propostas para a formação integral da criança.
São Paulo: Peirópolis, 2003.

CORREA, A. N. Programa LEM: Tocar e Cantar: um estudo acerca de sua inserção no


processo músico-formativo de unidocentes da Pedagogia/UFSM. 2008. Dissertação – Curso
de Mestrado em Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria.

DINIZ-PEREIRA, J. A formação acadêmico-profissional: compartilhando responsabilidades


entre universidades e escolas. In: EGGERT, E. et al. Trajetória e processos de ensinar e
aprender: didática e formação de professores. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008. P. 253-266.

FIGUEIREDO, S. L. F. de.; SCHMIDT, L. M. Refletindo sobre o talento musical na


perspectiva de sujeitos não-músicos. In: SIMPÓSIO DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS,
4., 2008, São Paulo, SP. Anais... São Paulo: SIMCAM, 2008. Disponível em:
<http://www.fflch.usp.br/dl/simcam4/anais_simcam4.htm>. Acesso em: abr. de 2009.

FURQUIM, A. S. dos S. A formação musical de professores em cursos de Pedagogia: um


estudo das universidades públicas do Rio Grande do Sul. 2009. Dissertação – Curso de
Mestrado em Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria.

OESTERREICH, F. A história da disciplina de música no curso de Pedagogia da UFSM


(1984-2008). 2010. Dissertação – Curso de Mestrado em Educação, Centro de Educação,
Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria.

SPANAVELLO, C. da S. A educação musical nas práticas educativas de professores


unidocentes: um estudo com egressos da UFSM. 2005. Dissertação – Curso de Mestrado em
Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria.

312
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

WERLE, K. A música no estágio supervisionado da Pedagogia: uma pesquisa com


estagiárias da UFSM. 2010. Dissertação – Curso de Mestrado em Educação, Centro de
Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria.

313
Pôsteres
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Corridos de Capoeira na Creche: prática pedagógica musical e diversidade


étnico-cultural

Flávia de Jesus Damião1


Creche da UFBA
flaviad@ufba.br/afroflaviadamiao@gmail.com

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo identificar ações e interações de meninas e
meninos entre 1 e 2 anos a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica
musical em sala a fim de verificar se os mesmos se configuram como uma ferramenta
educativa que contribui para o desenvolvimento musical, na construção de identidade étnico-
cultural, bem como, na formação e ampliação de um repertório musical infantil plural pautado
na contribuição do legado dos afro-brasileiros para música brasileira. O presente estudo
privilegia a interface de estudos nas áreas da educação infantil: Brasil, 1998; Rocha,1998; da
educação musical infantil: Santiago e Nascimento, 1996; Ilari, 2002; Brito, 2003; Russell,
2006, da história e cultura afro-brasileira: Oliveira, 2003; 2005; Cunha, 2005; Munanga,
2004; da educação das relações étnico-raciais: Cavalleiro, 2000; Machado, 2002(a); Brasil,
2004(a); Brasil, 2004(b) dentre outros. Metodologicamente, o trabalho caracteriza-se pela
abordagem qualitativa da pesquisa-ação. A escolha por tal abordagem deve-se ao fato da
inserção da pesquisadora no lócus da pesquisa, e por considerarmos as crianças como atores
sociais que participam do processo de pesquisa. O lócus do trabalho é a creche da
Universidade Federal da Bahia em Salvador. Os sujeitos da pesquisa serão 20 crianças entre 1
e 2 anos que freqüentam o grupo I e seus pais. Nosso ponto de partida é que a prática
pedagógica na creche deve atuar no sentido de fomentar a construção positiva de identidades,
das crianças negras, brancas, indígenas através do acesso aos referenciais sócio-históricos e
das matrizes culturais que nos constitui.
Palavras chave: Educação em creche, prática pedagógica musical, diversidade étnico-cultural

Introdução

A conformação histórica, política e social do Brasil, sinalizam para a existência de um


país multi-étnico e pluricultural. Entretanto, a sociedade brasileira negou-se como
pluricultural, escondeu a questão étnica e estabeleceu um projeto de Estado destacando
valores hegemônicos oficiais brancos (Nery, 2004).
De acordo com Munanga (2004) o discurso de formação do povo brasileiro, de forte
caráter ideológico, esteve ligado a construção da idéia de nação e de identidade nacional
ocorrido nos fins do século XIX até meado do século XX. Para forjar essa idéia de nação,
elegeu-se o biótipo do homem branco e a cultura ocidental européia como modelo sobre o

1
Pedagoga-UFBA; Especialista em Educação Infantil- UNEB; Mestre em Educação-UFC; Professora
do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico na Creche da UFBA

315
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

qual erigir-se a nação brasileira. À indígenas, africanos foram relegados a periferia da historia
e cultura do Brasil.
Dada a impossibilidade de negar a existência da população negra e indígena, vários
intelectuais brasileiros se dedicaram ao projeto de construção da idéia do povo brasileiro. Um
povo que resultaria da mestiçagem - mistura - entre as três raças (branca, negra e índia).
Pensando com Marques (1994) compreendemos que neste processo o que estava em jogo era
o controle social, a homogeneização. Era preciso “administrar” a diversidade.
A construção dos discursos e de práticas de invisibilização das diferenças e da
diversidade no país reverberou em todas as dimensões da vida dos brasileiros. Desde as
esferas das micro-relações, como as relações afetivas, por exemplo; até o âmbito do acesso
aos bens sociais, econômicos, políticos e culturais.
No campo da educação, a conseqüência dessas práticas de negação do outro se
traduziu de muitos modos: proibição de acesso à educação; práticas pedagógicas racista e
discriminatórias com prevalência da pedagogia do embranquecimento; silenciamento e
negação do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro; práticas de desqualificação da
identidade étnica; política de baixo investimento em sistemas públicos de educação, quando a
população negra, começou a ter acesso a ele; dentre outros.
O cenário acima descrito, nos revela da omissão do Estado brasileiro em oportunizar à
parcela da população afro-brasileira condições dignas de acesso e permanência à educação de
qualidade. No vácuo institucional deixado pelo estado, os afro-brasileiros vêm ao longo dos
tempos se (pre)ocupando com a educação dos seus. Assim, os negros, de modo individual, ou
articulados em movimentos se incumbiram da tarefa de educar-se e de cuidar da educação dos
seus.
Ao longo dos cinco séculos da presença de africanos e seus descentes em terras
brasileiras, estes sempre reivindicaram o acesso à educação, bem como, propuseram
estratégias educacionais ora mantidas por eles mesmos, ora de responsabilidade do Estado. A
partir do século XX, os movimentos negros, passaram a apontaram de modo mais enfático: a
necessidade de políticas e diretrizes educacionais públicas de reparação a população negra, o
reconhecimento e valorização da história e cultura afro-brasileira, ações afirmativas, e
relações étnico-raciais positivas na educação. (Brasil, 2004(a).
Essa demanda da comunidade afrodescendente brasileira pela afirmação do direito a
educação foi contemplada/apoiada com a promulgação da Lei 10.634/2003, que alterando a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº9.394/1996 (LDB), torna obrigatório o

316
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ensino sobre a História e Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimento de ensino fundamental


e médio. Ainda, seguindo a referida Lei, tais conteúdos serão ministrado no âmbito de todo
currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História
Brasileiras.
Apesar da Lei 10.639/2003 não se referir a Educação Infantil, dois marcos legais
incluem a Educação da Relações Étnico-raciais e o Ensino da História e Cultura Afro-
Brasileira desde a educação infantil. São eles; o Parecer do CNE/CP nº3 de 2004 e a
Resolução nº 1 de 2004 do Conselho Nacional de Educação(CNE).
No Parecer nº03/2004 isso fica explicito quando aborda diz que a História e Cultura
Afro-Brasileira precisa ocorrem em todos os níveis e âmbitos da Educação. “O ensino de
História e Cultura Afro-brasileira e Africana, a educação das relações étnico-raciais, tal como
explicita o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e
modalidades de ensino,(...)”. E, quando fala das responsabilidades dos níveis de ensino para
com o cumprimento da Lei. “Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de
Educação Básica, nos níveis de Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Média,
Educação de Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão providenciar (...)”. (Brasil,
2004(a).
Já na Resolução nº 1 de 2004 do Conselho Nacional de Educação(CNE) que institui as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, e, também o Parecer do CNE/CP nº3
de 2004 inclui a História e Cultura Afro-Brasileira e a Educação da Relações Étnico-raciais
desde a educação infantil.
Nesse contexto, compreendemos que a inserção da cultura de matriz africana, na
prática educativa de creches e escolas de educação infantil, é um movimento indispensável no
sentido de buscarmos superar o etnocentrismo europeu e desalienar os processos pedagógicos
desde o primeiro âmbito da educação infantil. Fundamentalmente, porque as crianças de 0 a
3 anos são sujeitos de direitos, e, como tal tem direito de freqüentar uma ambiência educativa
onde o respeito às diferenças, a diversidade étnica, a pluralidade cultural e alteridade do ser
sejam elementos basilares de sua ação.
É necessário que a prática pedagógica na creche atue no sentido de fomentar a
construção positiva de identidades, das crianças negras, brancas, indígenas, etc; através do
acesso aos referenciais sócio-históricos e das matrizes culturais que nos constitui, de modo
equânime. Essas ações, são estratégias necessárias, para que as instituições de educação da

317
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

primeira infância em Salvador, sejam, efetivamente espaços democráticos e plurais nos quais
a diversidade não seja trascodificada em desigualdade.

Justificativa

Partindo da compreensão apresentada anteriormente, é que o presente trabalho busca


dar conta de uma lacuna, qual seja: articular discussões acerca da educação de crianças em
creches, práticas pedagógicas musicais, cultura de matriz africana e diversidade étnico-racial.
Quando pensamos na presença da cultura de matriz africana na prática pedagógica na
creche, vislumbramos sua inserção através das múltiplas linguagens simbólica. Primeiro,
porque é através delas que a criança pequena realiza o duplo movimento de lançar-se no
mundo, e ao mesmo tempo, tomá-lo para si. Segundo, porque as a cultura de matriz africana
utiliza-se de inúmeras elementos simbólicos para assegurar sua existência. A música é uma
das linguagens quais os afrodescendentes (re)elaboraram no Brasil a cultura originária no
continente africano.
As práticas pedagógicas musicais das creches precisam contemplar a música
produzida no continente africano, bem como, aquela elaborada pelos afrodescendentes em
terras brasileiras. O importante é assegurar que as crianças de 0 a 6 anos possam ter
oportunidade de produzir, apreciar e sentir diferentes ritmos e sonoridades de modo lúdico e
prazeroso.

Pressupostos Teóricos

De caráter interdisciplinar, o presente estudo privilegiará a interface de estudos e


pesquisas nas áreas da educação infantil Brasil, 1998; Rocha, 1998; Brasil, 1999; Rosemberg,
1999, Machado, 2002(b); Dahlberg; Moss e Pence, 2003; Quinteiro, 2002, da educação
musical infantil Santiago e Nascimento, 1996; Brasil,1998; Ilari, 2002; brito, 2003; Oliveira,
2006; Russell, 2006, da história e cultura afro-brasileira Oliveira, 2003; 2005; Cunha, 2005;
Munanga, 2004; Adriano, 2006, da educação das relações étnico-raciais Oliveira, 1994; Dias,
1997; Lopes, 2001; Cavalleiro, 2000; Machado, 2002(a); Gusmão 2003; Brasil, 2004(a);
Brasil, 2004(b); Brasil, 2005. Nessa perspectiva, os referidos trabalhos serão nossos guias no
processo de produção de novos conhecimentos em educação infantil.

318
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Objetivo Geral

A presente pesquisa tem por objetivo identificar ações e interações de meninas e


meninos entre 1 e 2 anos a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica
musical em sala a fim de verificar se os mesmos se configuram como uma ferramenta
educativa que contribui para o desenvolvimento musical, na construção de identidade étnico-
cultural, bem como, na formação e ampliação de um repertório musical infantil plural pautado
na contribuição do legado dos afro-brasileiros para música brasileira.

Questões de Pesquisa

Diante do exposto, o presente trabalho teve por objetivo responder as seguintes


questões:
Quais as ações e interações são produzidas por meninas e meninos entre 1 e 2 anos de
idade a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica musical em sala?
Os corridos contribuem para o desenvolvimento musical de crianças entre 1 e 2 anos?
De que forma?
Os corridos favorecem a construção da identidade étnico-cultural? Como?
Os corridos se configuram como musicas que podem integrar e/ou ampliar o repertório
musical infantil destacando sua origem ligada aos afro-brasileiros?
Quais as compreensões, posturas, reações, dos pais das crianças acerca dos corridos de
capoeira e da inserção dos mesmos na prática pedagógica musical em sala?

Metodologia

Metodologicamente, o presente trabalho caracteriza-se como uma abordagem


qualitativa da pesquisa-ação. Para Thiollent (1988) “a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa
social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou
a resolução de um problema.”. A escolha por tal abordagem deve-se ao fato de que estamos
interessadas em melhor compreender um aspecto do processo educacional em creche, pela
inserção da pesquisadora no lócus da pesquisa, pelo compromisso da pesquisadora com a
população pesquisada, e, principalmente, por considerarmos as crianças como atores sociais
que, possuindo ação e voz, participam do processo de pesquisa.

319
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Sujeitos e Lócus

Sujeitos da pesquisa serão 20 crianças entre 1 e 2 anos que freqüentam mesmo grupo
em uma creche e seus pais. O lócus do trabalho é a creche da Universidade Federal da Bahia
em Salvador.

Dimensão ética

Nas questões éticas de investigação com crianças deve considerar-se uma trilogia entre
direitos, deveres e danos/benefícios, devendo o trabalho do investigador social orientar-se pela
observância destes três pilares fundamentais. (Alderson,1995),
Partindo de tal compreensão inicialmente o projeto será apresentado a coordenação geral
da creche e as profissionais que trabalham no grupo I; No momento seguinte far-se-á uma reunião
com pais das crianças para apresentar o projeto de pesquisa, solicitá-los a autorizar a participação
dos filhos(as) e convidá-los também a participarem; A participação das crianças do grupo terá
como eixo a observação cuidadosa das reações faciais, corporais e verbais de bem-estar das
mesmas. Sob nenhuma hipótese as crianças serão obrigada a realizarem uma atividade que não
desejem.

Ferramentas metodológicas

A fim de alcançarmos os objetivos a que esta pesquisa se propõe usaremos um amplo


conjunto de ferramentas metodológicas a fim de nos aproximarmos do fenômeno a ser
estudado. Da interação das crianças serão privilegiadas: desenhos infantis; observação de
situações de brincadeiras; observação do seu movimento corporal; fotos e filmagens; diários
de observação. Na parte da pesquisa que envolver os pais serão usados questionários.

320
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ADRIANO, J. A. Capoeira na Educação Infantil. Review Especial: Portal Capoeira, fev.


2006. Disponível em:
<http://www.portalcapoeira.com/index.php?option=com_content&task=view&id=816&Itemi
d=76>. Acesso em: 10 out. 2007.

ALDERSON. P. Listening to children: children, ethics, and social research. Essex: Barnardos.
IN: SOARES, N.A investigação participativa no grupo social da infância. Currículo sem
fronteiras, v. 6, n.1, pp. 25-40, Jan/Jun, 2006.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial curricular para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. 3 v,: il.

______. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Resolução Ceb nº 1,


Conselho Nacional de Educação. Brasília, 7 de abril de 1999.

______. Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações étnico-raciais e para
o ensino de história e cultura afro-brasileira. Brasília, 2004.(a)

______. Resolução CNE nº1, de 17 de junho. Diretrizes curriculares nacionais para a


educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira.
Brasília 2004.(b)

______. Parecer CNE/CEB nº18. Setembro de 2005.

BRITO, T. A. Música na Educação Infantil, propostas para a formação integral da criança.


São Paulo: Peirópolis, 2003.

CAVALLEIRO, E. Do silêncio do lar ao silêncio escolar: racismo, preconceito e


discriminação na educação infantil. São Paulo: Contexto, 2000.

CUNHA JÚNIOR, H.; LUIZ, M. C; SALVADOR, M. N. A criança (negra) e a educação.


Cadernos de Pesquisa, São Paulo: Fundação Carlos Chagas, n. 31, 1979.

______. Nós afrodescendentes: história africana e afrodescendente na cultura brasileira. In:


ROMÃO, Jeruse (Org.). História da educação dos negros e outras histórias. Brasília:
Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização Diversidade/ Ministério da Educação,
2005.

DAHLBERG, G.; MOSS, P.; PENCE, A. Qualidade na educação da primeira infância:


perspectivas pós-modernas. Porto Alegre: Artmed. 2003

DIAS, Lucimar Rosa. Diversidade étnico-racial e educação infantil: Três Escolas, uma
Pergunta, muitas Respostas. Mato Grosso do Sul: UFMGS, 1997.

FARIA,A.; PALHARES,M. Educação Infantil pós LDB: rumos e desafios. Campinas:


Autores Associados, 1999.

321
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

GUSMÃO, N. M. M. Linguagem, cultura e alteridade: imagens do outro. São Paulo:


Cadernos de Pesquisa, nº107, p.41-78, Julho/1999.

______. Os desafios da diversidade na escola. In: GUSMÃO, Neuza Maria. Diversidade,


cultura e educação: olhares cruzados. São Paulo: Biruta, 2003

ILARI, B. Bebês também entendem de música: a percepção e a cognição musical no primeiro


ano de vida. Revista da ABEM, Porto Alegre, 2002. p. 83-90.

LOPES, M. J.. As artes e a diversidade étnico-cultural na escola básica. In: MUNANGA,


Kabengele. (org.). Superando o racismo na escola. 3. ed. Brasília: MEC, 2001

LORDELO, E. R.;CARVALHO, A..M.; KOLLER, .S. (orgs.). Infância brasileira e contextos


de desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, Salvador:EDUFBA.(2002).

LUZ, N.. Abebe: a criação de novos valores na educação. Salvador: Secneb, 2000.

MACHADO, V.; PETROVICH, C. Ilê Axé: vivências e invenções pedagógicas. As crianças


do Ôpo Afonjá. 2.ed. Salvador: EDUFBA, 2002.(a)

MACHADO, M. L. de A. Encontros e Desencontros em Educação Infantil. São Paulo:


Cortez, 2002.(b)

MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus


identidade negra. Belo horizonte: Autêntica, 2004.

NERY, Eugênica Lúcia. Proposta de Pesquisa para o Doutorado. In: BOAVENTURA,


Edivaldo M; SILVA, Ana Célia. O Terreiro, a quadra e a roda: formas alternativas de
educação da criança negra em Salvador. EDUFBA: Salvador, 2004

OLIVEIRA, A. Educação musical e diversidade: pontes de articulação. Revista da ABEM,


n.14, Porto Alegre, 2006. p. 25-34.

OLIVEIRA, E. Relações raciais nas creches do município de São Paulo. 1994. Dissertação
(Mestrado) – PUC, São Paulo, 1994.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, J. ; FORMOSINHO J. (orgs.). Associação Criança: um


contexto de formação em contexto. São Paulo: Pioneira, 2002.

OLIVEIRA, E.D. Cosmovisão Africana no Brasil: elementos para uma filosofia


afrodescendente. Fortaleza: IBECA, 2003.

______. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na filosofia da educação. 2005. Tese


(Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Ceará,
Fortaleza, 2005.

QUINTEIRO, J. Infância e educação no Brasil: um campo de estudos em construção. In:


FARIA, A. L; DEMARTINI, Z.B; PRADO, P. (orgs.). Por uma cultura da infância:
metodologia de pesquisa com crianças. Campinas: Autores Associados, 2002.

322
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

ROCHA, E. A. C. Infância e Pedagogia: dimensões de uma intricada relação. Revista


Perspectivas,Florianópolis, p. 21-33,1998.

ROSEMBERG, F. Expansão da educação infantil e processo de exclusão. Cadernos de


Pesquisa. São Paulo: Fundação Carlos chagas, n. 107, jul. 1999.

RUSSELL, J. Perspectivas socioculturais na pesquisa em educação musical: experiência,


interpretação e prática. Revista da ABEM, n.14, Porto Alegre, 2006. p. 7-16.

SANTIAGO, D. NASCIMENTO, I. Atividades rítmicas e melódicas apropriadas a primeira


infância. De 1985-1986.

SANTIAGO, D. NASCIMENTO. I. Ensinar “disposições”: o caminho do meio na Educação


Musical pré-escolar. 1996. Disponível em:
<http://www.abemeducacaomusical.org.br/revistas.htm1>. Acesso em: 18 jun. 2011.

SUZIGAN, G. O. & SUZIGAN, M. L. C. Educação Musical – Um fator preponderante na


construção do ser. São Paulo: G4 Editora, 2003.

THIOLLENT, Michel. Metodologias da pesquisa-ação. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1998.

323
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Oficinas de música no Projeto de Extensão Multicampi da Universidade


Estadual de Montes Claros

Talita Daniele Alves Gomes


talitinhagomes@yahoo.com.br

Resumo: O presente trabalho relata uma experiência pedagógico-musical realizada a partir do


Projeto de extensão “Multicampi” da Universidade Estadual de Montes Claros-MG. As
vivências musicais foram desenvolvidas no primeiro semestre de 2011, mais especificamente
entre os meses de abril e junho, nas cidades de Salinas e Almenara, respectivamente. No
projeto foram atendidos alunos provenientes de escolas públicas municipais (que
apresentavam baixo IDH - índice de desenvolvimento humano) com faixa etária de 06 à 10
anos de idade. Este trabalho musical se insere em um conjunto mais amplo de atividades
extensionistas que incluem práticas voltadas à educação infantil, a saúde e a atividades
esportivas. O trabalho teve como objetivo proporcionar aos alunos momentos musicais
lúdicos e significativos que pudessem contribuir na sua formação básica. As oficinas foram
realizadas em contextos diversificados e assim, não ficaram restritas à sala de aula. Acredita-
se que os relatos aqui transcritos poderão contribuir para a reflexão sobre trabalhos que vêm
sendo realizados com vistas ao desenvolvimento de atividades musicais nos espaço escolares.
Palavras chave: Educação infantil, música, oficinas

Introdução

Sou acadêmica bolsista do PET (Programa de Educação Tutorial) que é um projeto do


MEC, financiado pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino
Superior). A ação tem por objetivo propiciar aos alunos participantes, sob a orientação de um
tutor, a realização de atividades extracurriculares que complementem a formação acadêmica
do estudante e atendam às necessidades do próprio curso de graduação (BRASIL, 2006).
Buscando aprofundar minha formação acadêmica, elaborei o projeto “Oficinas
Itinerantes”. A proposta tem como principal objetivo realizar capacitações para futuros e já
atuantes, professores de música no contexto escolar.
As atividades são desenvolvidas por meio de oficinas com aplicação de temas práticos
e teóricos. Assim, as atividades buscam desenvolver práticas musicais dentro do próprio
contexto visando à mobilização e sensibilização dos alunos contemplados.
O projeto visa unir a proposta extensionista do Multicampi com a prática exercida nas
oficinas itinerantes. Assim, reestruturei o projeto de forma que atendesse às demandas
solicitadas pela Coordenadoria de Apoio ao Estudante, a qual é responsável pela orientação e
realização das oficinas dos Multicampis, a fim de atender a crianças da educação infantil com

324
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

idade entre 06 e 10 anos com oficinas de curta duração dentro das áreas de educação, saúde,
esporte e cultura.
Realizadas no 1º semestre de 2011, as oficinas itinerantes de música no projeto
Multicampi se destacam por propiciar aos alunos contemplados uma nova experiência com a
música no contexto escolar, diferente do que estão acostumados vivenciando a prática e a
escuta musical em um pequeno espaço de tempo.
Este artigo buscará relatar como as oficinas foram realizadas e assim, serão apontados
os objetivos, a metodologia, os recursos e as concepções pedagógicas que nortearam o
trabalho.

Detalhamento da experiência pedagógica

O projeto Multicampi é um projeto extensionista da Coordenadoria de Apoio ao


Estudante vinculado à Pró-Reitoria de Extensão Cultural da Universidade Estadual de Montes
Claros e tem como principal objetivo levar às cidades que possuem campus da Unimontes
oficinas práticas e rápidas de áreas diversas bem como saúde, esporte, educação, cultura e
lazer. O Multicampi é realizado durante dois dias nas cidades contempladas durante todo o
período diurno atendendo às crianças da faixa etárias de 06 a 10 anos matriculadas em escolas
publicas e/ou municipais.
Segundo Gonçalves (São Paulo, Brasil 2009) a música é uma ferramenta que contribui
para formação integral do ser humano. Por meio dela a criança entra em contato com o mundo
letrado e lúdico. Ensinar utilizando-se da música ajuda a criança a valorizar uma peça
musical, teatral, concertos, pois, dando a oportunidade do conhecimento dos vários gêneros
musicais ela tem a oportunidade de construir sua autonomia, criatividade, aquisição de novos
conhecimentos e criticidade.
Essa proposta teve como objetivo de desenvolver um trabalho prático e rápido nas
oficinas que se desenvolvem no projeto Multicampi. Assim, relato experiências que vivi no
mesmo, com o intuito de mostrar uma realidade que encontramos hoje no segmento da
educação infantil de algumas cidades do estado de Minas Gerais, tendo como objetivo ainda
relatar algumas atividades realizadas nas oficinas como forma de dissociação das idéias
utilizadas.
Presentes em todo o trabalho extensionista as práticas metodológicas estão ligadas
diretamente com o lúdico, imaginário e recreativo sendo desenvolvidas atividades práticas
com utilização de materiais informativos de tal forma que os alunos recebam o maior número

325
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de informação possível em um curto espaço de tempo. São utilizados recursos audiovisuais


como o data show, reais como instrumentos musicais e ainda recursos lúdicos como desenhos,
pinturas e retratos do imaginário.
Nas oficinas de música foram realizadas algumas atividades de diferentes objetivos.
Iniciou-se com a sensibilização das crianças cantando músicas do cancioneiro infantil as quais
as crianças têm um momento de recreação. É realizado também um trabalho de coordenação
motora com batidas alternadas nas pernas e palmas acompanhando a melodia da música
trabalhada. Após a sensibilização é realizado uma atividade que trabalha a identidade dos sons
onde se é cantado uma música que fala de uma fazenda onde se citam nomes de animais onde
as crianças projetam os sons referentes aos animais citados. Segue a letra da música com a
idealização da dinâmica:

A fazenda
Na fazenda pato tem (quém quém)
Tem um cão (au au)
Tem peru (glu glu)
Carneiros brancos como algodão (béééé)
Ainda tem um galo se achando um valentão (cocoricóóó)

Tem um gato angorá (miau miau)


Passarinhos sempre a cantar (assobios)
Quando o boi se põe a mugir (muuuuu)
A casa ameaça até cair. (nesta hora se levanta os dois braços na intenção de não se deixar a
casa cair)

Bem cedinho de manhã (duas palmas)


Quando o sol (duas palmas)
Levantar (duas palmas)
Todos os bichos vão acordar (nesta hora os meninos fazem o movimento de espreguiçar e
imitam vários bichos ao mesmo tempo)
É hora da fazenda trabalhar (duas palmas)

Após esta atividade pedimos às crianças que retratem em forma de desenho os bichos
citados na música ensinada pelos acadêmicos.
Realizando estas atividades práticas percebi que a metodologia utilizada pela equipe
sendo trabalhada de uma maneira mais informal possibilitava uma maior recepção dos alunos
com a música. As crianças eram recepcionadas em sala de aula e a maioria das vezes
apresentavam um comportamento agitado o qual era trabalhado pelos oficineiros do curso de
música, por meio da sensibilização, prática rítmica e de coordenação motora e percepção da
identidade dos sons bem como sua intensidade, altura e timbre. Dentro de todas as condições

326
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

possíveis a equipe realizava um trabalho especial com as crianças com forma de possibilitar
um momento de sensibilização e aproveitamento da música infantil.
Para Siqueira (São Paulo, Brasil, 2009) As atividades musicais realizadas na escola
não visam à formação de músicos, e sim, através da vivência e compreensão da linguagem
musical, propiciara abertura de canais sensoriais, facilitando a expressão de emoções,
ampliando a cultura geral e contribuindo para a formação integral do ser.
Outra atividade também realizada pela equipe era a brincadeira de “Qual é a música?”.
Nesta prática musical uma parte dos oficineiros apresentava melodias de músicas do
cancioneiro infantil, MPB, sertanejo com ênfase nas músicas cantadas por eles. A música se
representava com forma real onde os oficineiros executavam instrumentos bem como o
violão, a flauta transversa e alguns instrumentos de percussão tocando a melodia onde as
crianças dividas por equipes deveriam realizar uma corrida para estourar um balão o qual
dava direito à criança de responder qual era o nome da música e marcar ponto para sua
equipe. Ao final presenteamos a todos agradecendo pela participação e aproveitamento das
atividades oferecidas.

Conclusão

A elaboração de oficinas rápidas e práticas no Projeto Multicampi da Universidade


Estadual de Montes Claros contribuiu de forma favorável às crianças que participam uma vez
que as mesmas realizam contato direto com práticas musicais, e estas permitem uma
integração com outras áreas, além de servirem como forma de recreação e desenvolvimento
de percepção auditiva e rítmica.
Segundo Almeida (2005) o bom senso, a humildade em reconhecer sua incompletude,
o aprender com o aluno, a paciência, a tolerância, a responsabilidade, a preocupação com o
social e o respeito aos alunos e à comunidade são também reconhecidas como necessidades na
atuação do professor de música.
Tendo como foco deste trabalho o relato de uma experiência vivida no Projeto
Multicampi, enfatizo a importância destas oficinas para a formação acadêmica dos alunos do
curso de graduação da Universidade Estadual de Montes Claros, as quais proporcionam uma
vivência mais ampla com uma realidade da educação básica como forma de experiência com
diversos tipos de alunos e locais. Esta proposta possibilita ao acadêmico uma significativa
experiência com o cotidiano vivido pelas crianças da educação infantil.

327
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

GONÇALVES; SIQUEIRA; SANCHES, Adriana Rodrigues; Geyza Mara; Thiago Palma. A


importância da música na Educação Infantil com crianças de 5 anos. Lins, SP, 2009

ALMEIDA, Cristiane Maria Galdino de; DEL BEN, Luciana Marta. Educação musical não-
formal: Um estudo sobre a atuação do profissional em projetos sociais de Porto Alegre – RS

Ministerio da educação – Secretaria de Educação Superior; Departamento de Modernização e


programas de Educação Superior. Manual de Orientações básicas. Brasília – DF, dezembro
de 2006.

328
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Música na Educação Infantil em Pelotas: mapeando as escolas privadas

Isabel B. Hirsch
isabelhirsch@ymail.com

Vitor H. R. Manzke
vitormanzke@gmail.com

Marilúcia D. da Silva
maridusil@hotmail.com

Janaina P.V. Cruz


janinhapvc@hotmail.com

Resumo: Este texto apresenta elementos de uma pesquisa em andamento e faz parte de um
mapeamento do ensino de música em toda a educação básica das redes pública e privada de
Pelotas – RS após a Lei 11.769/08. Nesta comunicação, será mostrado apenas o projeto de
pesquisa nas escolas infantis privadas do município de Pelotas na zona sul do estado do Rio
Grande do Sul. Tem por objetivo geral mapear o ensino de música nas escolas infantis
privadas e por objetivos específicos identificar quem é o profissional que trabalha com a
música nas escolas; reconhecer quais as atividades musicais que são desenvolvidas nas
escolas; e, identificar quais são as necessidades dos profissionais que trabalham com música
nas escolas. O método desenvolvido é o survey de desenho interseccional e o instrumento de
coleta de dados é o questionário auto-administrado. A pesquisa encontra-se na fase de coleta
de dados e pretende contribuir com a compreensão do trabalho musical realizado nas escolas.
Palavras-chave: educação musical em escolas privadas, educação infantil, mapeamento

Introdução

Muito se tem discutido sobre o ensino de música nas escolas desde que a Lei nº 11.769
foi homologada em 18 de agosto de 2008 instituindo a obrigatoriedade da música como
conteúdo do componente curricular da educação básica.
De acordo com Figueiredo (2010),

Apesar do avanço que a legislação pode trazer, ainda restam diversas


questões sobre a educação musical na escola a partir da nova lei. A questão
do professor adequado para ensinar música na escola ainda não está definida
com toda a clareza necessária, pois a lei 11.769/2008 é genérica; cabe aos
estados e municípios, estabelecerem os detalhes desta questão. A prática
polivalente para o ensino das artes ainda está muito presente nos sistemas
educacionais brasileiros e, para vários deles, a nova lei não acrescenta
modificações (FIGUEIREDO, 2010, p.4).

329
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Pelo que se pode observar, o que mais deixou dúvidas em boa parte da população
brasileira é sobre quem será o profissional que irá trabalhar com a música nas escolas: o
professor especialista ou o não-especialista?
De acordo com Verle & Bellochio (2009), o professor de educação infantil tem papel
fundamental para fazer com que a música seja uma realidade nas escolas. Além disso, as
autoras complementam que

É imprescindível que o professor tenha conhecimentos musicais suficientes


para que possa trabalhar com esta área do saber. Todavia, é bom destacar
que esse professor não é especialista em música e sim no desenvolvimento
de crianças pequenas, é responsável pela educação da criança numa
perspectiva integral, evitando fragmentações curriculares, trabalhando com
todas as áreas do conhecimento de maneira articulada, incluindo-se,
portanto, a educação musical (VERLE; BELLOCHIO, 2009, p.106).

Nem sempre as escolas da rede pública ou da rede privada de ensino dispõem de um


profissional habilitado para desenvolver atividades musicais. Além disso, não há informação
de que todos os cursos de formação inicial de futuros pedagogos tenham também alguma
disciplina sobre metodologia da educação musical no currículo. De acordo com Pacheco
(2007),

a Educação Musical não tem recebido atenção no que se refere a sua


inclusão nos currículos de formação de futuros professores pedagogos.
Ainda são poucos os cursos de graduação que oferecem essa disciplina na
sua matriz curricular (PACHECO, 2007, p.89).

Mesmo assim, sem esta devida atenção, Pacheco (2007) propõe ao professor
unidocente

a possibilidade de pensar e discutir como a música pode-se tornar [...] um


elemento importante do processo educativo das crianças destes níveis da
educação básica (PACHECO, 2007, p.95).

Para ambos os autores, o professor não-especialista pode sim contribuir com o


professor especialista nas atividades musicais nas escolas, desde que tenham condições de
fazê-lo.
De acordo com Gomes (2010), sobre o espaço de trabalho nas escolas,

a educação musical infantil tem contemplado abordagens metodológicas


diversas e, apesar de ser espaço do professor unidocente, o educador musical
tem encontrado lugar na instituição (GOMES, 2010, p. 815).

330
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Além da preocupação sobre o profissional que irá trabalhar nas escolas, também se
questiona quais conteúdos serão abordados e em que contexto. A educação musical não
possui um currículo obrigatório e nem a Lei 11.769/08 definiu o que deverá ser trabalhado e
abordado nas escolas. Neste sentido, Figueiredo (2008) afirma que

temos valorizado a diversidade ao invés da busca de modelos únicos para


todos, compreendendo e respeitando as diferenças locais e regionais. Creio
que esta é a direção que deveríamos assumir daqui para frente para o
estabelecimento de orientações ou diretrizes para as escolas brasileiras. A
diversidade deve ser respeitada em primeiro lugar, e isto inclui a diversidade
de músicas e a diversidade de abordagens para o ensino de música
(FIGUEIREDO, 2008, p.7).

Tendo o autor comentado a respeito da diversidade, é importante também que o


trabalho desenvolvido seja de qualidade para a contribuição da formação dos alunos.
Para que os alunos das escolas tenham um ensino de qualidade, é necessário que os
professores também tenham uma formação de qualidade. Para isso, pensa-se que a formação
continuada busca um aperfeiçoamento para a atuação dos profissionais para as possíveis
mudanças na educação. Para Queiroz & Marinho (2007), a formação continuada é entendida
como

um projeto contínuo, que possibilita aos professores caminhos para que, de


forma coletiva e contextualizada com o universo de atuação de cada
profissional, possam criar alternativas para (re)discutir, (re)definir e
transformar o seu pensamento e, consequentemente, a sua prática docente
(QUEIROZ; MARINHO, 2007, p.1).

Com este contexto, de formação e atuação dos professores, sentiu-se a necessidade de


pesquisar como a música está presente nas escolas de educação infantil da rede privada do
município de Pelotas – RS. Por rede privada de ensino entende-se que

É um sistema caracterizado por possuir instituições de ensino privadas,


assim entendidas as mantidas e administradas por pessoas físicas ou jurídicas
de direito privado, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), de 1996. A rede particular de ensino geralmente é mantida
por recursos próprios ou através de anuidades pagas pelos alunos,
englobando escolas abertas e outras de vários tipos, como as de orientação
religiosa, as mantidas por sindicatos de classe ou grupos empresariais ou,
ainda, as escolas cooperativas, mantidas por grupos de pais de alunos
(MENEZES; SANTOS, 2002).

331
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Objetivos

Esta pesquisa tem por objetivo geral mapear o ensino de música nas escolas infantis
privadas e por objetivos específicos identificar quem é o profissional que trabalha com a
música nas escolas; reconhecer quais as atividades musicais que são desenvolvidas nas
escolas; e, identificar quais são as necessidades dos profissionais que trabalham com música
nas escolas.

Justificativa

Esta pesquisa se justifica porque, ao darmos continuidade às pesquisas já realizadas


e/ou em andamento pelo grupo de pesquisa Formação Docente e Educação Musical,
apresentaremos um panorama geral sobre a presença da música em parte da rede privada de
ensino de Pelotas. As pesquisas na rede privada são muito escassas fazendo com que haja a
necessidade, também, de mapear a presença da música nesta rede de ensino. Além disso,
resultará em dados que subsidiem parcerias entre a UFPel e as escolas privadas, para que
venham atender as necessidades destas escolas e de seus professores.

Metodologia

De acordo com os objetivos da pesquisa, o método utilizado foi o survey de desenho


interseccional. Para Cohen e Manion (1994),

os surveys agrupam dados em um determinado momento com a intenção de


descrever a natureza das condições existentes, ou de identificar padrões com
os quais essas mesmas condições existentes podem ser comparadas, ou de
determinar as relações que existem entre eventos específicos (COHEN;
MANION, 1994, p.83).

Como os dados desta pesquisa serão coletados em uma única vez, num determinado
período de tempo, este trabalho caracterizou-se como um survey de desenho intersecccional.
De acordo com Babbie (2005, p. 101), o survey de desenho intersecccional permite descrever
uma população maior na mesma ocasião.
Foi selecionado como unidade de análise (Babbie, 2005, p.98) o profissional que
trabalha com a música nas 97 escolas de educação infantil privadas do município de Pelotas –
RS. As 97 escolas selecionadas para esta pesquisa são escolas oficialmente regularizadas no
Conselho Municipal de Educação de Pelotas.

332
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Antes da coleta de dados, entraremos em contato com todas as 97 escolas para


averiguar se estão todas em funcionamento, se os endereços estão corretos e, ainda, se existe a
figura do professor de música, ou, se existe outro profissional que trabalha com a música. A
partir destes dados iniciais é que serão distribuídos os questionários auto-administrados. Para
Babbie (2005), o questionário é “um documento com perguntas e outros tipos de itens que
visam obter informações para análise” (BABBIE, 2005, p. 504). Esse instrumento parece ser
o mais adequado, pois o universo de professores a serem pesquisados é num total de 97. Para
Laville e Dionne (1999), uma das vantagens do questionário é que “permite alcançar rápida e
simultaneamente um grande número de pessoas” (LAVILLE; DIONNE,1999, p. 184).
O questionário, construído com base nos questionários elaborados Hirsch (2007),
inclui questões que fornecem dados sobre formação inicial e continuada dos professores,
tempo e áreas de atuação, atividades musicais desenvolvidas nas escolas, recursos disponíveis
para a realização das atividades musicais bem como necessidades dos professores.
Os questionários serão entregues aos professores das escolas e, juntamente com ele,
uma carta para a direção e outra carta ao professor, explicando os objetivos da pesquisa, a
necessidade da participação e a garantia da não-exposição do nome da escola e nem do
professor no trabalho. Neste documento também será incluída uma provável data de
devolução do questionário para a validação do mesmo. Após, os dados serão analisados,
principalmente, com base na literatura da área de educação musical, focalizando estudos que
investigaram a presença da música, especificamente, nas escolas de educação infantil em
diversas regiões do país.

Considerações finais

Espera-se que, com essa investigação, possamos mapear a situação do ensino de


música nas escolas de educação infantil da rede privada do município de Pelotas. Levantando
dados sobre a presença da música, mais especificamente sobre os profissionais que trabalham
com música nestas escolas, as atividades que eles desenvolvem e suas necessidades,
esperamos poder contribuir com parcerias que venham colaborar na formação continuada
desses profissionais, visando estratégias para o fortalecimento da educação musical nas
escolas.

333
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BABBIE, Earl. Métodos de Pesquisas de Survey. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2005.

COHEN, Louis.; MANION, Lawrence. Research Methods in Education. London: Rutledge,


1994.

FIGUEIREDO, Sérgio. A ABEM e o projeto nacional de música na escola. 2008. Disponível


em:<http://www.jacksonsavitraz.com.br/abemco.ida.unb.br/admin/uploads/pdf/palestra_sergi
o_figueiredo.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2011.

______. O processo de aprovação da Lei 11.769/2008 e a obrigatoriedade da música na


Educação Básica. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO,
15, 2010, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: ENDIPE, 2010.

GOMES, Carolina. Educação Musical para o Ensino Infantil: levantamento acerca das
produções brasileiras. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
EDUCAÇÃO MUSICAL, 19, 2010, Goiânia. Anais... Goiânia: ABEM, 2010. p 814-821.

HIRSCH, Isabel B. Música nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio: um
survey com professores de arte/música de escolas estaduais da região sul do Rio Grande do
Sul. Dissertação (Mestrado em música) - Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Porto Alegre, 2007.

LAVILLE, Christian; DIONE, Jean. A construção do saber: manual da metodologia da


pesquisa em ciências humanas. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1999.

MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Dicionário Interativo da
Educação Brasileira – EducaBrasil, 2002. Disponível em
<http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=194>. Acesso em: 26 jun. 2011.

PACHECO, Eduardo. Pedacursão: uma experiência de formação em Educação Musical na


pedagogia. Cadernos de Educação, FaE/PPGE/UFPel, Pelotas [29]: 89 - 104, julho/dezembro
2007.

VERLE, Kelly; BELLOCHIO, Cláudia. A educação musical e o professor de educação


infantil e anos iniciais: um mapeamento das produções da ABEM. In: ENCONTRO ANUAL
DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 18, 2009, Londrina.
Anais... Londrina: ABEM, 2009. p.104-110 .

334
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Música na Escola: um musical infantil para alunos do ensino fundamental I

Gabriel Alamino Martins Iglesias


iglegabriel@gmail.com

Felipe Veiga de Lara Gomes


felipeveigamus@gmail.com

Lineu Formighieri Soares


lineusoares@gmail.com

Regina Helena Cunha Mota Maier


reginamota@gmail.com

Resumo: O presente trabalho relata um projeto de pesquisa em andamento, realizado por


professores e alunos do curso de Educação Artística – Habilitação em Música – do Centro
Universitário Adventista de Ensino, campus Engenheiro Coelho, interior de São Paulo. O
grupo reúne-se há um ano, com o intuito de estudar temas ligados à criação musical. Como
primeiro projeto, decidiu-se por música direcionada às crianças do Ensino Fundamental I, a
ser realizado em três etapas. A primeira, foi uma apreciação do material disponível para
utilização em salas de aula dessas séries. Como segunda etapa, passou-se à composição
musical em si, com a criação de um enredo e canções que contam uma história através da qual
são trabalhados aspectos musicais, noções de respeito à natureza e conhecimentos da fauna e
flora brasileiras. A terceira fase consiste numa pesquisa de campo. O objetivo, ao término do
projeto, é contribuir com o ensino de música em escolas, oferecendo opções para o dia a dia
em sala de aula, bem como possibilidades de produções culturais envolvendo a escola como
um todo.
Palavras chave: Música na escola, canto infantil, criação musical

1. Introdução

Com a Lei No. 11.769/2008, que complementa a LDB homologada em 1996, surge, no
Brasil, uma demanda redobrada por professores de música. Com isso, as escolas precisam
buscar profissionais que possam oferecer aos alunos uma base musical integrada a outros
conteúdos do currículo, garantindo o bom aproveitamento das aulas. Na experiência vivenciada
por este grupo como professores, regentes, alunos de música e estagiários em escolas públicas e
particulares, observa-se que parte do material utilizado na educação musical não é apropriado
para este fim. Funcionam como lampejos repentinos, apenas visando a descontração e não
utilizando a música como meio de ensinar valores e proporcionar o desenvolvimento cognitivo
do aluno em vários níveis. Segundo Dewey, é importante não haver separação entre a vida e a
educação, fomentando, assim, uma contínua reconstrução de experiências (apud CUNHA,

335
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

2007, p. 22).
Por outro lado, levando em consideração o docente, parece ser fundamental a produção
de materiais que venham somar-se àqueles que têm dado suporte ao ensino, mantendo
princípios pedagógicos sem perder o potencial da experiência musical. O professor precisa
buscar a interação entre a vida social e a escolar, levando em consideração o discurso musical
do aluno (SWANWICK, 2003) e estimulando sua criatividade e interesse. É essencial uma
atualização constante dos materiais produzidos, pois se “hoje não se ouvem mais os mesmos
ruídos do tempo de Mozart,” é preciso “fazer a música do nosso tempo” (ZAGONEL, 1999, p.
3).

2. Etapa inicial: pesquisa

O projeto ora relatado começou em 2010, quando três alunos e dois professores de
licenciatura em música decidiram formar um grupo de estudos com o intuito de compor e
produzir material para crianças. Como primeira atividade, o grupo iniciou uma revisão do
material fonográfico direcionado às crianças e produzido no Brasil nos últimos vinte anos. Em
encontros semanais, paralelamente à pesquisa auditiva, iniciou-se a leitura de textos de
referência na área de educação musical. O foco foram os relatos de experiências e pesquisas
sobre o ensino de música escritos nos últimos dez anos. Entre as inúmeras publicações
passíveis de estudo, o grupo aprofundou-se nos textos de PENNA, 2008, ZAGONEL, 1999,
ILARI, 2006, e MATEIRO, 2008. Esse levantamento de material visava uma construção de
conhecimento daquilo que tem sido produzido no Brasil recentemente, gerando parâmetros
que delimitariam a criação musical.
Uma terceira vertente do projeto envolve, ainda, uma pesquisa de campo,
entrevistando – até o momento – vinte e dois (22) professores de música de treze estados do
país. Os entrevistados advém de distintas realidades: sala de aula e prática coral em escolas
públicas e particulares, bem como conservatórios. Os resultados da pesquisa, nestas três
frentes da primeira etapa, têm possibilitado, até agora, uma idéia parcial daquilo que está
disponível aos professores em escolas de várias partes do país. A reflexão sobre as
descobertas feitas até o momento, corroboram os objetivos iniciais do grupo, que incluem a
criação e viabilização de material que venha a acrescentar ao que atualmente é oferecido aos
professores de música. Lembrando que, por mais que tenha havido crescimento nos últimos
anos, não existe, ainda, abundancia de material musical à disposição dos professores do
ensino básico. O grupo crê que a diversidade de opções é um fator de motivação para o

336
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

docente, que, na fartura de alternativas poderá escolher aquelas que melhor se adaptam à sua
realidade.

2. Criação: fase de composição e escrita do musical

No cronograma de trabalho do grupo, após a fase inicial, exclusivamente de pesquisas,


teve início a segunda etapa: criação de um musical infantil para os alunos do Ensino
Fundamental 1. O projeto propõe uma integração entre música, artes cênicas e artes plásticas
(criação de figurinos e cenário). Além das expressões artísticas, busca-se abranger, no
trabalho, conceitos de ética, ciência e ecologia. Não pretende-se algo que acarrete simples
entretenimento, ou apenas apreciação musical, embora estes também façam parte do conjunto
dos objetivos. O grupo tem observado que o essencial é ensinar música através do próprio
fazer musical, justificando, assim, a idéia de integrar vários conhecimentos num programa
com roteiro fechado. A prática demonstra que a possibilidade de reunir música e encenação
pode tornar o aprendizado musical mais interessante e proveitoso para os alunos.
O primeiro passo da criação foi a concepção de um argumento. A partir dele, o
trabalho dividiu-se em criação do roteiro e composição de canções que integram-se ao
mesmo. O trabalho era feito individualmente e, mais tarde, apresentado ao restante do grupo.
Assim, num primeiro momento, roteiro e composições surgiam da soma de criações
independentes. Com o texto do roteiro finalizado, o grupo – atualmente composto de dois
professores e dois alunos – iniciou uma fase de criação colaborativa, reunindo-se para compor
letra e música juntos. As canções ainda não escritas já têm temas definidos e cada
componente tem liberdade para trazer novas contribuições, as quais são desenvolvidas em
grupo.
O roteiro conta a história de uma menina da cidade – Paloma – que um dia, de repente,
encontra-se numa fazenda. Lá, é abordada por um pica-pau e um burro, que a levam para um
passeio, mostrando a realidade e as dificuldades dos animais em conseqüência de uma
queimada num canavial. No desenrolar da trama, os bichos da fazenda e os animais silvestres
passam por situações em que a união de todos e o fazer musical em conjunto ajuda-os a
vencer os problemas. Na história, a música aparece como um meio de superação e contribui
para reforçar mensagens de respeito à natureza, em geral, e às plantas e animais,
especificamente.
As canções que já foram compostas tiveram como referência a música brasileira, já
que a valorização da música de raiz – suas características regionais e os diferentes estilos

337
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

existentes em distintos estados do Brasil – está dentro dos objetivos do grupo a longo prazo.
Além disso, as peças têm caráter poético, facilitando a memorização das letras através de
rimas, assonâncias e outros recursos literários. Tanto este, como os aspectos ligados à fauna e
flora brasileiras, podem ser trabalhados de forma interdisciplinar com os programas de
português/literatura e ciências.

3. Objetivos musicais e pedagógicos

No plano pedagógico, a intenção é que as melodias apresentem noções de percepção


de forma progressiva. Assim, nas primeiras canções aprendidas, as melodias, saltos de
intervalos, figuras rítmicas, andamento e harmonia dos instrumentos, são simples e fáceis para
que o crescimento do conhecimento musical do aluno aconteça de forma gradual. Porém, para
que não deixe de ser significativo, a proposta é que, no decorrer do aprendizado,
gradualmente os aspectos musicais se tornem mais complexos e desafiadores. Além disso, a
instrumentação de cada peça tem sido planejada no sentido de aumentar as referências
musicais dos alunos, ampliando o espectro de referencias auditivas.
A progressão na construção do conhecimento também será enriquecida com o fato de
as canções, utilizadas em sala, poderem ser reunidas em forma de musical ao final de um
período. O objetivo é que o professor explore, no dia a dia das aulas, as competências
musicais previstas nas canções, enriquecendo o ensino de cada uma delas com atividades
variadas. Ao final do ciclo – ano letivo, semestre, ou outro período definido pelo professor de
acordo com sua realidade – a montagem do musical poderá funcionar como revisão e
fechamento de todos os elementos musicais trabalhados com os alunos.
Como laboratório inicial do material criado até aqui, o grupo pretende trabalhar na
escola básica do próprio campus em Engenheiro Coelho, a partir do segundo semestre de
2011. A escola, que é particular e já trabalha com música em seu currículo há vários anos, faz
parte do trabalho de estágio dos alunos de licenciatura. Os alunos do grupo de pesquisa fazem
estágio nos 3o e 4o anos do ensino fundamental e as crianças destas classes serão as primeiras
com as quais o grupo testará as composições musicais.
Os objetivos do grupo, a médio e longo prazo, incluem a produção de material para
utilização em escolas de ensino fundamental. Durante os três primeiros anos, o objetivo é
gerar um livro ilustrado, partituras das canções e manual para o professor, bem como um
CD/DVD, este último utilizando uma escola da região – ainda a ser definida – como
laboratório de ensaios e montagem do musical.

338
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

CUNHA, Marcus V. John Dewey: uma Filosofia para Educadores em Sala de Aula. 4ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes, 2007.

ILARI, Beatriz Senoi. Desenvolvimento Cognitivo-Musical no Primeiro ano de Vida. In:


________. (org). Em Busca da Mente Musical: ensaios sobre os processos cognitivos em
musica – da percepção à produção. Curitiba: Editora UFPR, 2006, cap. 8.

MATEIRO, Teresa da Assunção Novo. Educação Musical nas Escolas Brasileiras:


Retrospectiva Histórica e Tendências Pedagógicas Atuais. Arte Online: Periódico online de
Artes. Volume 2: novembro 1999/fevereiro 2000. Disponível em:
<http://www.ceart.udesc.br/Revista_Arte_Online/Volumes/artteresa.htm>. Acesso em: 21 fev.
2008.

PENNA, Maura. Caminhos para a conquista de espaços para a música na escolar: uma
discussão em aberto. Revista da ABEM, Universidade Estadual Paraíba (UEPB), No. 19, p. 57-
64, Março, 2008.

SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina


Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

ZAGONEL, Bernadete. Em Direção a um Ensino Contemporâneo de Música. Revista Ictus.


Salvador, no. 1, p. 1-15, 1999.

339
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Ensinando a Ensinar Música: experiências de prática de ensino em uma


relação espelhada de ensino-aprendizagem

Tiago Madalozzo
UFPR
tmadalozzo.ufpr@gmail.com

Resumo: Neste relato procuro registrar aspectos relacionados à prática de ensino na disciplina
de Metodologia do Ensino das Artes para o 3º ano do curso de Formação de Docentes em um
colégio estadual de Curitiba. A partir de pesquisas teóricas e documentais, observações e
questionários, construiu-se um panorama teórico, chegando-se a uma questão: o que era
possível fazer para que minhas aulas fossem produtivas, já que talvez fossem os únicos
momentos em que a turma teria aulas específicas de música? E quais procedimentos utilizar
para “ensinar a ensinar” música, uma vez que se tratava de uma turma de professores em
formação? O tema gerador do plano de ensino foi a percepção do som como matéria-prima de
todo evento musical, tendo como objetivos a apresentação dos elementos sonoros e sua
organização em torno da forma musical, além da ênfase na discussão de metodologias de
aplicação destes conteúdos teóricos a partir de jogos musicais e da apreciação musical ativa,
sempre com variado repertório (França, 2002; Joly, 2003; Palheiros e Wuytack, 1995;
Schafer, 2001). Desta forma, foi possível promover a sensibilização musical dos alunos-
professores em formação, mostrando novas possibilidades de ensino e de construção de
planos de aula musicalmente ricos e criativos.
Palavras chave: Prática de ensino, formação de docentes, metodologias de ensino

Introdução

A disciplina de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado para o curso de Música –


Educação Musical da UFPR engloba dois semestres, o primeiro voltado à prática no Ensino
Médio, e o segundo, no Ensino Fundamental. No primeiro semestre de 2009, tive a
oportunidade de realizar o estágio com uma turma do curso de Formação de Docentes de um
colégio em Curitiba.
O início da prática foi justamente um período de questionamentos: como funciona um
curso de Formação de Docentes? O que se aprende em música neste caso, e como se aprende
a ensinar música? É suficiente o contato com a música em uma disciplina de poucas horas
dividida, teoricamente, entre as quatro áreas artísticas? E por onde começar um trabalho de
ensino de música frente a estas especificidades?
A partir de leituras iniciais e atividades práticas como observações de aula e aplicação
de questionário aos alunos, construí um panorama teórico cujos principais apontamentos estão
registrados abaixo. Isso serviu como ponto de partida para novo questionamento: frente a
várias possibilidades, o que escolher para ensinar aos futuros professores em uma curta
340
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

unidade didática com seis aulas (meu tempo de contato com eles)? A abordagem escolhida e o
tema gerador da prática estão especificados neste relato, destacando-se ainda a curiosa relação
de simetria de condições que se estabeleceu em sala de aula, afinal, os alunos eram
professores em formação.
Apresento a seguir as principais conclusões do panorama teórico inicial e os
desdobramentos da prática, registrando questionamentos e possíveis soluções encontradas ao
longo do trabalho, tendo em vista a ideia de que aqueles breves momentos de prática
poderiam ser os únicos destinados a aulas exclusivas de música em toda a vida acadêmica da
maioria dos alunos.

Panorama Teórico

De acordo com a LDB (1996), a Formação de Docentes se dá em vários níveis;


entretanto, é admitida como formação mínima para o ensino do magistério na educação
infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental a oferecida em nível médio, na
modalidade Normal. Dessa forma, o contexto de prática de ensino descrito neste trabalho é
uma das habilitações oficiais para a formação docente.
Entre as possibilidades de trabalho destes professores em formação, a Arte, enquanto
disciplina do currículo básico do colégio, é bastante valorizada de acordo com informações
contidas no Projeto Político-Pedagógico do colégio: considera-se a escola como espaço de
formação de indivíduos com uma identidade cultural e de democratização do acesso dos
alunos às linguagens artísticas e manifestações culturais (GOVERNO, 2007).
A ementa da disciplina de Metodologia do Ensino de Artes, oferecida para o 3º ano do
curso de Formação de Docentes, é voltada para as quatro linguagens artísticas (música, teatro,
artes visuais e dança), com uma grande quantidade de conteúdos – apenas em Música, resumo
da seguinte forma: toda a história, os gêneros, as técnicas de composição e execução.
Por se tratar de uma disciplina de Metodologia, desde o início procurei dar ênfase para
a parte específica de estratégias de trabalho e prática com as linguagens artísticas, tendo a
intenção de apresentar o maior número de ideias possíveis para que os alunos pudessem
oportunamente desenvolver ainda novas ideias para seus planos de aula (tipo de trabalho
comum da disciplina).
Cabe salientar que, de acordo com dados dos questionários, nenhum dos alunos
possuía formação musical, e poucos já haviam trabalhado com música em suas aulas. Além
disso, a partir das observações constatei que a turma era bastante interessada nas estratégias

341
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

de ensino de conteúdos de outras disciplinas, e estava bastante ansiosa para o trabalho com
Música.

Musicalização: um caminho metodológico

Há várias abordagens para o ensino da Música; contudo, a partir de experiências


pessoais anteriores em educação musical, procurei insistir na valorização da sensibilização
musical dos alunos, o que está relacionado à ideia de musicalização. Para alguns autores, a
musicalização é um processo de educação musical em que noções teóricas são ensinadas aos
alunos a partir de atividades lúdicas; portanto, toma-se o jogo musical como suporte para
transmissão de conteúdos. Isto faz sentido ao se pensar que, para o ensino infantil – o
“público” dos docentes formados no curso –, o jogo é a forma de expressão, é a atividade
fundamental da infância, conforme considera Ilza Joly (2003, p. 116): “A criança, por meio da
brincadeira, relaciona-se com o mundo que descobre a cada dia e é dessa forma que faz
música: brincando”.
A sensibilização pode começar, então, por um conceito fundamental: nas palavras de
R. Murray Schafer (2001, p. 61-62), “abrir os ouvidos” para os sons que nos cercam, pois a
partir de exercícios de “limpeza de ouvidos” é possível trabalhar as ideias de som, silêncio e
ruído. Ou seja, a partir da densa paisagem sonora que nos cerca todos os dias, é preciso
prestar atenção para aquilo que é a matéria-prima de qualquer trabalho musical: o som. Desta
forma, considerei que o tema gerador da unidade didática deveria ser baseado no
entendimento das propriedades do som, uma vez que seria lógico que um futuro trabalho
destes professores em formação tivesse uma estruturação semelhante em torno do som.
Após um trabalho minucioso com o som, seria possível discutir com a turma uma
definição de “música” enquanto organização de sons, e, a partir daí, trabalhar-se com
estruturas musicais maiores – e por isso escolhi apresentar noções de forma musical, a
alternância de momentos de tensão e relaxamento que caracteriza boa parte da música
ocidental.
Para que isso acontecesse de forma eficiente, outro conceito de grande importância é a
apreciação musical ativa, ou seja, a audição musical através de um processo de escuta não-
passiva por parte do ouvinte, conforme apresentado por Graça Boal Palheiros e Jos Wuytack
(1995, p. 9-13), em que os autores sugerem a associação de outros elementos ao ato de escuta
a fim de tornar o evento musical “palpável” ou “visível”, e dessa forma facilitar o
entendimento do conceito de forma musical.

342
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Estruturação do Plano de Ensino

A fim de discutir a estratégia de ensino e a abordagem metodológica, registro abaixo o


eixo temático da unidade didática, os objetivos e os conteúdos do plano de ensino.
Eixo temático: Apreciação ativa, entendimento, compreensão e reflexões sobre a
aplicação metodológica do som como elemento que faz parte do cotidiano de todos, e é a
gênese de qualquer fazer musical.
Objetivos: 1) apresentar e estimular a compreensão e a apreciação das propriedades do
som e da forma musical; 2) fornecer referencial teórico para pesquisa dos conteúdos acima,
além de metodologias e repertórios-modelo para a sua aplicação; 3) esclarecer informações
relativas à legislação que regulamenta as especificidades do ensino da música no Brasil.
Conteúdos: 1) propriedades do som: ruído, som, silêncio, timbre, altura, intensidade,
dinâmica, duração, densidade, ritmo, melodia, música; 2) forma musical: organização dos
sons segundo o princípio básico da alternância de repetição e contraste, unidade e variedade: a
forma A B A e variações; 3) metodologias de ensino de música: canções de saudação, limpeza
de ouvidos, escala musical, apreciação musical ativa, danças, canções com gestos, cânones
rítmicos e melódicos, construção de instrumentos, imitação rítmica, canções de despedida.

Trabalhando Numa Relação Espelhada de Ensino-Aprendizagem Para a


Educação Musical Infantil

Toda a experiência de ensino foi pensada para um contexto bastante específico, em


que destaco esta “relação espelhada” de ensino-aprendizagem: meus alunos eram professores
em formação. Por este motivo, procurei trabalhar a partir da abordagem da musicalização
infantil, uma vez que dizia respeito diretamente ao universo com o qual os futuros professores
trabalhariam, a educação infantil.
Quando me refiro a este abordagem, listo alguns fatores importantes que procurei
destacar: a) o trabalho em sala de aula a partir da atividade – ou seja, o fazer musical como
foco; b) as atividades construídas sempre a partir de um suporte lúdico; c) uma grande
variedade de repertório para ser usada em sala – lembrando que, concordando com uma série
de pesquisadores, a música levada para crianças pequenas não deve ser, de forma nenhuma,
música “simples” mas, pelo contrário, se deve trabalhar com muitos tipos diferentes de
música; e d) principalmente, não se deve deixar que a aula de música seja “recreação” – deve,
sim, ser muito bem estruturada em termos de objetivos e conteúdos claros, sendo estes
objetivos e conteúdos ligados a elementos musicais. Sobre este último fator: é importante que,
343
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

no contexto da educação musical infantil, não se trabalhe com objetivos extramusicais, mas
sim, com metas muito claras de desenvolvimento e formação musical. Por este motivo é que
optei por mostrar uma possibilidade aos alunos: conteúdos relacionados às propriedades do
som, ou seja, claramente “musicais”.
Há várias formas de se trabalhar com música. Algumas insistem na teoria; outras, na
notação musical (escrita na partitura). Mas há, também, a musicalização, em que os
conhecimentos musicais devem ser trabalhados através dos exercícios práticos. Não se pode,
porém, fazer isso sem o estabelecimento de objetivos claros.
Procurei mostrar que repertórios variados são interessantes, mas um trabalho com
músicas do cancioneiro tradicional brasileiro – ou músicas diferentes que conhecemos, que
lembramos da nossa infância – é igualmente importante, pois podemos estabelecer uma
ligação clara com o universo infantil, além de eventualmente ter mais segurança a partir de
um trabalho com músicas bem conhecidas.
Tudo com que trabalhei foi discutido intensamente com os participante do curso:
desde conversas sobre a abordagem da musicalização, passando pela legislação e chegando a
experiências sobre o uso de instrumentos musicais contruídos em sala junto com as crianças.
Enfim, procurei ligar todas as propostas levadas com a realidade de sala de aula dos futuros
professores, trabalhando com exemplos musicais relevantes.

Discussão e considerações finais

Os planos de aula reuniram atividades em que não só procurei ensinar música aos
alunos, como também ensinar a ensinar tais conteúdos. Um ponto positivo do trabalho foi a
introdução de conteúdos de forma intuitiva, ou seja, chegando-se à teoria a partir da prática –
a metodologia da “sensibilização musical”. Absolutamente todos os conceitos trabalhados
foram comentados e discutidos a partir das atividades musicais, e apenas depois nomeados
teoricamente.
Optei por insistir na expressão corporal e vocal, incluindo nas aulas repertório de
conhecimento pessoal dos alunos, principalmente cantigas de roda que remetiam à sua
infância, por acreditar que teriam mais segurança ao trabalhar com repertório conhecido.
Ainda assim, procurei enfatizar a importância de uma pesquisa constante por novos
repertórios; mas as canções de domínio público pareceram ser um bom ponto de partida.
Alguns conteúdos foram modificados ou inseridos nos planos de aula ao longo da
prática, de acordo com questionamentos e demanda dos próprios alunos. A prática levou em

344
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

conta atividades de apreciação ativa, fazer musical (a parte que é deixada um pouco de lado
nas atividades normais da disciplina) e reflexão sobre estas duas para se chegar à teoria, de
forma a contemplar a chamada “proposta triangular” de trabalho com Arte. Isso garantiu certa
coerência estrutural ao trabalho.
Como exemplo de conteúdo inserido oportunamente, destaco a noção de pulso, que
acabou permeando boa parte das atividades musicais desempenhadas pelos alunos, e também
foi um conceito apresentado a partir da prática. Outro tópico solicitado pelos alunos foi a
construção de instrumentos com materiais alternativos, que acabou originando um trabalho
avaliativo.
A notação musical não foi a ênfase do trabalho, mas houve a necessidade de se
registrar as atividades de forma não-convencional (utilizando materiais alternativos como
cartolinas e gráficos). Um ponto de grande interesse dos alunos foi minha escolha por gravar
todas as canções em sala de aula. Isso possibilitou a confecção de um CD que foi
posteriormente entregue a todos, e auxiliou no cumprimento de uma expectativa registrada
nos questionários aplicados aos alunos antes da prática: a aquisição de repertório.
A avaliação foi além da simples participação em aula: em três trabalhos, solicitei aos
alunos que pesquisassem repertórios, criassem estratégias de aplicação de conteúdos musicais
aprendidos nas aulas através de atividades lúdicas, e construíssem instrumentos também com
objetivos musicais e pedagógicos, além de estéticos. Com estes trabalhos procurei estimular a
criação de atividades de aplicação de conteúdos da disciplina de forma ativa, não se
resumindo à escrita de planos de aula, prática comum nos outros bimestres.
Experimentar fazer música acabou abrindo precedente para o ensino de conteúdos
musicais básicos, que não só foram interessantes para os alunos em sua vida acadêmica, mas
também para sua formação docente, porque a variedade de atividades que foram apresentadas
para trabalhar esses conteúdos poderá abrir caminho para a construção de planos de aula mais
criativos.

345
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BRASIL. Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 2008a. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro


de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a obrigatoriedade do ensino
da música na educação básica. Diário Oficial da União, Brasília, 19 ago 2008. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11769.htm>. Acesso em:
08 jun. 2009.

BRASIL. Mensagem nº 622, de 18 de agosto de 2008b. Mensagem de veto parcial, por


contrariedade ao interesse público, ao Parágrafo único do Art. 2º do Projeto de Lei no 2.732,
de 2008 (no 330/06 no Senado Federal), que Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de
1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a obrigatoriedade do ensino da
música na educação básica. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-
2010/2008/Msg/VEP-622-08.htm>. Acesso em: 08 jun. 2009.

CORRÊA, Bianca C. “A educação infantil”. In: OLIVEIRA, Romualdo P.; ADRIÃO,


Theresa (orgs). Organização do ensino no Brasil: níveis e modalidades na Constituição
Federal e na LDB. 2. ed. São Paulo: Xamã, 2007. p. 13-30.

FRANÇA, Cecília C.; SWANWICK, Keith. Composição, apreciação e performance na


educação musical: teoria, pesquisa e prática. In: Em Pauta, Porto Alegre, v. 13, n. 21, dez.
2002. p. 5-41. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/EmPauta/article/download/8526/4948>.
Acesso em: 12 mar. 2011.

GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Projeto Político Pedagógico. Curitiba: Colégio


Estadual Paulo Leminski, 2007.

JOLY, Ilza. Educação e educação musical: conhecimentos para compreender a criança e suas
relações com a música. In: HENTSCHKE, Liane; DEL BEN, Luciana (orgs.). Ensino de
música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Paulo: Moderna, 2003. p. 113-126.

PALHEIROS, Graça Boal; WUYTACK, Jos. O lugar da audição na educação musical. In:
Audição Musical Activa. Porto, Portugal: Associação Wuytack de Pedagogia Musical, 1995.
p. 9-13.

SCHAFER, R. M. Limpeza de ouvidos. In: O ouvido pensante. São Paulo: UNESP, 2001. p.
67-118.

346
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

A Música de Casa na Aula de Música: a proposta do projeto "Música para


Bebês" da UEM

Vânia Gizele Malagutti


DMU – UEM
vmalagutti@hotmail.com

Resumo: Este trabalho tem por objetivo apresentar a proposta de aulas de música para
crianças de zero a cinco anos realizada no projeto de extensão “Música para Bebês”, da
Universidade Estadual de Maringá. Iniciado em 2009, tem por objetivo oportunizar a
iniciação musical de crianças por meio de atividades de apreciação, criação e execução
musical. A ação, além de promover o contato da Universidade com a comunidade, tem
oportunizado a formação de professores reflexivos, já que procura refletir sobre metodologias
e fundamentos do ensino de música para crianças. O projeto utiliza como referencial teórico
autores como Souza (2000) e Delgado e Müller (2005), que consideram as crianças como
“atores sociais plenos”, bem como autores que discutem o desenvolvimento musical infantil,
como Ilari (2006) e Beyer (2003). Dessa forma, o curso conta com uma metodologia que
procura entrelaçar duas propostas: o cotidiano e o cognitivo.
Palavras chave: Educação musical, cotidiano, criança

A universidade é uma instituição social e tem como principais tarefas “o


desenvolvimento de conhecimentos, a educação e a cultura” (MARQUES, 2004, 114). Para
tanto, constrói-se a partir de um tripé indissociável: o ensino, a pesquisa e a extensão
(MARQUES, 2004). Dentro desse tripé, a extensão assume a função de oportunizar os
conhecimentos produzidos na universidade à comunidade, e, segundo Penna (2006),
oportuniza a formação de professores, uma vez que possibilita uma maior compreensão da
realidade, bem como a solução de problemas nela encontradas (PENNA, 2006, p. 41).
Com o objetivo de atender a essa prerrogativa, a Universidade Estadual de Maringá
mantém, desde 2006, o projeto de Extensão “Educação Musical, Escola e Comunidade”. O
projeto atua em frentes distintas e complementares, oferecendo aulas de música para a
comunidade (alunos da educação básica, pessoas com deficiência visual e bebês),
proporcionando cursos de formação continuada à professores da educação básica e
configurando-se em um espaço de ações pedagógico-musicais para a formação do educador
musical (FIALHO, 2009).
Dentro da proposta de extensão, é oferecido à comunidade de Maringá o curso de
“Música para Bebês”. O curso foi iniciado em 2009 atendendo crianças de zero a três anos e
nesse ano, o projeto foi estendido a crianças de até cinco anos. As aulas têm como objetivo

347
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

estimular o fazer musical das crianças por meio do canto, movimento, criação, apreciação e
execução musical.
O projeto se justifica a partir de pesquisas como a de Ilari (2006), que considera que os
benefícios da música para as crianças vão além do desenvolvimento cognitivo. A autora
aponta que a música traz benefícios psicológicos, fisiológicos, culturais, auditivo-
educacionais e estético-musicais (ILARI, 2006). Beyer e Braga (2006), afirmam que, no caso
dos bebês, as experiências sonoras podem auxiliar o desenvolvimento da fala e do canto.
Cerca de dezesseis crianças participam do projeto, e são divididas em três turmas, de
acordo com a faixa etária. São aulas semanais, de aproximadamente 40 minutos, ministradas
por acadêmicas do terceiro e quarto ano de licenciatura em música, que trabalham em duplas
e com uma co-repetidora ao piano. Na turma de crianças de até dois anos, os pais ou
responsáveis acompanham as atividades.
Isso porque, entendemos que essa presença traz segurança às crianças, e, além disso,
possibilitam que os pais também aprendam como estimular musicalmente seus filhos. Dessa
forma, possibilita trocas de conhecimento e incentivo, que, de acordo com Bandura (1994)
citado por Cavalcanti (2009), torna as experiências das crianças mais eficazes. Como relata
uma mãe que participou do projeto no ano de 2009,

ao compartilhar o que aconteceu na aula, ao querer cantar as músicas e


mostrar o que aprendeu temos um momento só nosso, de troca de
olhares, toque, elogios e incentivo, ampliando nosso vínculo de mãe e
filha (MALAGUTTI; GÓES, 2009, p. 6)

As bases metodológicas do projeto consideram as crianças como “atores sociais


plenos” (DELGADO; MÜLLER, 2005, p. 352). Sem a idéia do “reducionismo biológico,
substituído pelo reducionismo sociológico” (PROUT, 2004, citado por DELGADO E
MÜLLER, 2005, p. 1-2), procuramos uma interdisciplinaridade entre as áreas. Dessa forma,
as aulas estão fundamentadas dentro de uma linha da sociologia que é ouvir o cotidiano e
estar atento a ele. Isso possibilita que as aulas sejam planejadas levando em consideração,
além das especificidades de cada faixa etária (ILARI, 2006; BEYER, 2003), também as
preferências musicais das crianças e suas vivências musicais fora das aulas de música
(SOUZA, 2000).
Após dois anos de projeto, nesse ano surgiram diversos questionamentos sobre a
forma de planejar as aulas. Isso foi muito significativo pois, como corrobora Souza (2003, p.
48), “toda prática educativa tem como condição básica ser reflexiva, porque é saindo da

348
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

prática, indo para a reflexão e voltando para a prática que o professor fortalece a sua ação,
renova sua competência e ganha mais segurança”.
A partir de discussões e reflexões, optamos por não utilizar uma estrutura pré-
estabelecida para as atividades, como acontecia nos anos anteriores. De acordo com as
ministrantes de 2009, a metodologia consistia em uma rotina

Essa rotina foi dividida em partes que se realizavam na seguinte


seqüência: canto de entrada; expressão corporal; movimento com
locomoção; movimento sem locomoção; percussão corporal;
socialização; execução instrumental; relaxamento e hora da despedida.
Dentre essas partes, foram inseridas criações e apreciações musicais
(MALAGUTTI e GÓES, 2009, p. 7).

Essa metodologia é decorrente dos estudos de educadoras como Feres (1998) e Beyer
(2003). Decidimos por deixar como rotina apenas o “canto de entrada e a hora da despedida”,
possibilitando uma maior flexibilidade para adptar as atividades a cada turma e a cada
professor. Russell (2005), a partir da análise de uma aula de música para crianças com uma
proposta semelhante a nossa, fala sobre a função desses itens em uma aula de música

A introdução teve um valor social e musical, pois assinalou o início da


aula e ajudou as crianças a ajustarem-se rapidamente às tarefas da aula
de música. No decorrer da seção de conteúdo básico as crianças
vivenciaram conceitos e habilidades musicais. O encerramento
marcou o final da aula e também teve uma função social (RUSSELL,
2005, p. 84).

Deixando como rotina apenas o canto de entrada e a hora da despedida, optamos por
construir as aulas a partir de temas. Com um tema escolhido, criaram-se histórias para serem
contadas durante as aulas, para que, por meio da narrativa, as atividades musicais sejam
ligadas, um “senso de Gestalt ou totalidade”, evitando a fragmentação das atividades
(RUSSEL, 2006, p. 83). O primeiro tema escolhido foi “carrinhos e bonecas”, para ser
trabalhado durante quatro aulas e os objetivos estabelecidos foram a exploração de sons,
percepção, execução, apreciação e criação musical. Dessa forma, a aula é realizada de
maneira contínua, trazendo
Os planejamentos também são flexíveis no sentido de levar em consideração o
interesse demonstrado pelas crianças, possibilitando explorar ao máximo as vivências que as
mesmas trazem para as aulas de música. Nosso objetivo é que, a partir das aulas de música, as
crianças estabeleçam um vínculo com seu cotidiano, e promovam trocas entre a vivência
musical em casa e as aulas de música no projeto. Para tanto, são utilizados materiais
349
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

diversificados, desde instrumentos musicais a sacolas plásticas, e, freqüentemente, é


solicitado aos pais que tragam materiais do cotidiano das crianças, como seus brinquedos ou
objetos, oportunizando a exploração de materiais em casa, juntamente com os pais.
Segundo Souza (2000), “ao tentar se aproximar do “mundo vivido”, o interesse da aula
de música não está nas atividades padronizadas, mas sim, nas experiências musicais que os
alunos realizam diariamente fora da escola”. (SOUZA, 2000, p. 40). Para a aproximação entre
o cotidiano das crianças e a aula de música, foram realizadas entrevistas com os pais para
investigar quais as músicas que os bebês gostam de ouvir e como é a vivência musical da
família. Esse procedimento de investigar o ambiente musical das crianças em cursos para
bebês também é verificado em trabalhos como de Broock (2008) e Beyer (2009). Para Beyer
(2009), esse diagnóstico traz reflexões acerca da forma como planejar aulas para bebês e
questionamentos acerca de qual repertório abordar nas aulas.
Considerando que é nossa a primeira experiência com aulas de música para crianças
com esse formato, ainda há muitas dúvidas e reflexões. Cada aula aplicada é refletida e
discutida para que possamos fazer aulas prazerosas e produtivas no que diz respeito ao
aprendizado musical dos alunos. Como afirma Parizzi (2006), a educação musical “deve
procurar enfatizar a estimulação da criança através de experiências musicais plenas e
prazerosas, capazes de motivá-la a levar adiante seu entusiasmo e alegria com relação à
música” (PARIZZI, p.47, 2006).
O projeto também tem sido um importante espaço para a formação de professores
reflexivos. A partir das reflexões de metodologias e mudanças na forma de planejar e
conduzir as aulas pretendemos a formação de professores que não sejam repetidores de ações
pedagógicas, mas que reflitam, questionem e experimentem novas formas de trabalhar
objetivando a qualidade de ensino. Como Libâneo (2002) recomenda, é na reflexão sobre a
sua prática que o professor adota teorias que se configuram como um marco para as melhorias
das práticas de ensino e avaliação dos resultados.

350
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BEYER, Esther. A interação musical nos bebês: algumas concepções. Educação: Revista do
centro de educação. Santa Maria: v. 28, n. 2, p. 87 – 97, 2003.

______. Diversidade e preferências musicais dos bebês. Revista de Educação Musical:


Espaços e Contextos. Universidade Federal de São Carlos – UAB. Ano 1 – 2009. V.1. Junho,
2009. P. 1 – 5. Disponível em: <http://revista-uab.webnode.com/artigos/>. Acesso em: abr.
2011.

BEYER, Esther; BRAGA, Cláudia. Contornos melódicos do canto e da fala em bebês de 12 a


24 meses. In: ENCONTRO NACIONAL DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS, 1, 2006.
Curitiba, Anais... Curitiba: 2006. p. 100-105

BROOCK, Maria Vander. A música em casa: de que forma os pais participantes do Projeto de
Musicalização Infantil da UFBA utilizam a música com seus filhos? XVIII CONGRESSO
DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO (ANPPOM).
Salvador – 2008. Anais... Salvador: 2008. p. 301 - 304

CAVALCANTI, Célia Regina Pires. Auto-regulação e prática instrumental: um estudo sobre


as crenças de auto-eficácia de músicos instrumentalistas. Dissertação de Mestrado, Curitiba,
UFPR, 2009.

DELGADO, Ana Cristina Coll; MÜLLER, Fernanda. Sociologia da Infância: Pesquisa com
crianças. Educação e Sociedade: revista de Ciência da Educação. Centro de estudos Educação
e Sociedade. São Paulo: Cortez; Campinas, vol. 26, n. 91. p. 351-360, Maio/Ago. 2005
Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: nov. 2010

FERES. Josette. Bebês: Música e Movimento. São Paulo: Ricord, 1998.

FIALHO, Vania Malagutti; ARALDI; Juciane; HIROSE, Kiyome. Políticas públicas de


extensão universitária no Paraná: Projeto Música na escola. ENCONTRO ANUAL DA
ABEM, 17. São Paulo, Anais... São Paulo: ABEM, 2009. p. 1059 - 1064

ILARI, Beatriz S. Desenvolvimento cognitivo-musical no primeiro ano de vida. In: ILARI,


Beatriz Senoi (org). Em busca da mente musical: Ensaios sobre os processos cognitivos em
música – da percepção à produção. Curitiba: Ed. UFPR, 2006.

LIBÂNEO, José Carlos. Reflexividade e formação de professores: outra oscilação do


pensamento pedagógico brasileiro? In: PIMENTA, Selma G; GHEDIN, Evandro (Org.).
Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
p. 53-80.

MALAGUTTI, Vania ; GOIS, Micheline . Música para bebês: do cotidiano para sala de aula.
ENCONTRO DE PESQUISA EM MÚSICA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
MARINGÁ, IV. Maringá, Anais... Maringá, 2009.

MARQUES, Maria de Resende. A Universidade na atualidade: o papel do ensino, da pesquisa


e da extensão. In: Revista Expressão. Mossoró: 2004. n 35; p.113-120

351
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

PARIZZI, Maria Betânia. O canto espontâneo da criança de zero a seis anos: dos balbucios às
canções transcendentes. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 15, 39-48, 2006.

PENNA, Maura. Desafios para a educação musical: ultrapassar oposições e promover o


diálogo. Revista da ABEM, Porto Alegre, n. 14, p. 35 – 43, 2006.

RUSSELL, Joan. Estrutura, conteúdo e andamento em uma aula de música na 1ª série


do ensino fundamental: um estudo de caso sobre gestão de sala de aula. Revista da
ABEM, Porto Alegre, n. 12, p. 73-88, 2005.

SOUZA, Claudia. Educação Musical a distância e formação de professores. In: Revista do


centro de educação – UFSM. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria. V.28, nº2,
2003.

SOUZA, Jusamara (Org.). Música, Cotidiano e Educação. Porto Alegre: PPG – Música
UFRGS, 2000.

352
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Trabalhando Interdisciplinarmente o Sentido da Audição: música e ciências


na educação infantil

Vitor H. R. Manzke
vitormanzke@gmail.com

Isabel B. Hirsch
isabelhirsch@ymail.com

Joséti R. Manzke
josetimanzke@gmail.com

Vitor H. B. Manzke
vimanzke@gmail.com

Resumo: Este trabalho é um relato de experiência que integra parte do curso de Formação
Continuada ministrado aos professores de educação infantil da rede pública de ensino da
região sul do Estado do Rio Grande do Sul. O curso é desenvolvido no âmbito da Rede
Regional de Ciências promovida pelo NECIM – Núcleo de Estudos em Ciências e
Matemáticas – do Campus Pelotas Visconde da Graça – CAVG/IFSul, localizado no
município de Pelotas – RS. Teve por objetivo subsidiar os professores da educação infantil
com metodologias alternativas para o desenvolvimento do tema “sentido da audição”. Além
disso, compreender os parâmetros do som; estimular a percepção auditiva por meio de
atividades musicais, criando estratégias para o desenvolvimento da percepção auditiva em
sala de aula. As atividades foram desenvolvidas durante uma tarde com professores da rede de
ensino público pertencentes à área de abrangência da Rede Regional. Dada a especificidade
do trabalho com professores não especialistas em música, consideramos que os resultados
foram satisfatórios dentro da proposta do Núcleo, que é refletir sobre as diferentes formas de
trabalhar as ciências da natureza e a matemática de forma interdisciplinar utilizando-se dos
mais diversos conteúdos em cada etapa da educação infantil.
Palavras chave: Educação infantil, interdisciplinaridade, música, formação de professores

Introdução

Muitos são os trabalhos que têm focado o professor não-especialista em música, como,
por exemplo, Bellochio (2002, 2007, 2008, entre outros), Figueiredo (2003, 2004, 2007, entre
outros) e Pacheco (2007). Mesmo que cada autor dê um enfoque diferente em seus contextos,
os textos revelam a necessidade que os professores dos cursos de pedagogia têm de uma
formação inicial e continuada em música para atender uma demanda que, cada vez mais, está
sendo solicitada. Pacheco, 2007 afirma que,

A área de Educação Musical vem assumindo um grau de importância nas


discussões referentes à formação de professores e a relevância da Educação

353
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Musical nas práticas escolares das crianças das Séries Iniciais e Educação
Infantil (PACHECO, 2007, p.89).

Com a instituição da obrigatoriedade da música como conteúdo do componente


curricular da educação básica, homologada pela Lei nº 11.769/08, o professor unidocente tem
um papel preponderante para que a educação musical seja desenvolvida nas escolas. De
acordo com Figueiredo (2004),

Professores especialistas (em música) e generalistas (unidocentes) poderiam


ser preparados para entender a escola nas suas múltiplas perspectivas. Um
profissional não substituirá o outro. É preciso que se busquem mais ações
que propiciem o desenvolvimento de uma escola integrada, interdisciplinar,
onde cada profissional desempenha um papel único e relevante na formação
escolar (FIGUEIREDO, 2004, p.60).

Embora não seja proposta de trabalho do NECIM atuar com a educação musical, o
convite para ministrar uma oficina de percepção auditiva para integrar o curso de formação
continuada com professores da educação infantil vai ao encontro do pensamento destes
autores.
As ciências em muitos casos são vistas como única e de maior importância entre “as
ciências”. Entretanto, um olhar mais holístico sobre o tema por certo levará a uma discussão
mais ampla sobre as diversas formas de ver uma determinada realidade. O aluno em sua
individualidade deve ter a possibilidade de interpretar o conteúdo da maneira que mais lhe
interessar. A interação entre este, o aluno, e o seu cotidiano, por certo, lhe mostrará vários
caminhos para alcançar o objetivo traçado pelo professor.

Formação continuada com os professores de educação infantil

Sou acadêmico do Curso de Música – modalidade Licenciatura da Universidade


Federal de Pelotas – UFPel e este relato, especificamente, contempla o trabalho desenvolvido
com os professores da educação infantil da rede municipal da cidade do Capão do Leão-RS e
São Lourenço do Sul minha participação no curso foi realizada na sede do NECIM/CAVG/IF-
Sul no dia 02 de março de 2011. Nenhum dos professores participantes possuía algum tipo de
formação musical.
A proposta inicial do curso de formação continuada em Ciências é instigar os
participantes refletirem sobre as diferentes formas que temos de trabalhar os mais diversos
conteúdos específicos referentes às atividades desenvolvidas em cada etapa da educação

354
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

infantil, buscando assim, formas alternativas de trabalhar temas tradicionais, desde a forma de
abordar cada tema até a escolha dos materiais didáticos a serem utilizados.
Pensei em como trabalhar música e ciências de uma forma interdisciplinar. De acordo
com Jupiassu,1976 interdisciplinaridade é, também, uma prática coletiva, onde se faz um
diálogo com outras disciplinas reconhecendo a necessidade de aprender com outras áreas do
conhecimento (JAPIASSU, 1976, p. 82).
Parte do conteúdo do Curso de Formação Continuada em Ciências para os professores
de educação infantil é trabalhar os cinco sentidos, e, fui convidado a desenvolver atividades
voltadas para o sentido da audição. Foi a primeira vez em que a música integrou o programa,
interdisciplinarmente, e, como forma de projeto piloto, foram desenvolvidas atividades
musicais, mais especificamente, com a percepção auditiva.
De acordo com a proposta do curso, organizei o conteúdo e a forma de como deveria
ser trabalhado de modo que as professoras participantes pudessem vivenciar as atividades
para que, posteriormente, viessem a desenvolvê-las em sala de aula com as crianças. Neste
relato, descreverei, além dos passos iniciais da oficina, duas das seis dinâmicas trabalhadas
com os alunos.
Primeiramente, de uma forma bastante simples, trabalhei os conceitos de som e dos
parâmetros do som, conforme Med 1996, já que nenhum dos professores tinha qualquer
conhecimento musical. Desta forma, para eles, ficou mais fácil de entender qual era minha
proposta de trabalho.
Após esta introdução com a apresentação breve dos conceitos, passei para a primeira
parte prática da proposta de trabalho, que foi a confecção de um chocalho. Optei por construir
este instrumento, não só em função de sua simplicidade de confecção e manuseio, mas
também porque apesar de ser um instrumento relativamente simples, proporciona diversas
formas de aplicabilidade em atividades lúdicas e é feito de material alternativo, sendo fácil de
encontrar. Segundo Pacheco 2007,

O trabalho com materiais alternativos propõe para os seus participantes uma


atuação que implica um exercício de pesquisa e de criatividade. Tocar, fazer
música com material alternativo exige que se procure, que se investigue,
buscando possibilidades sonoras (PACHECO, 2007, p.92).

Para a confecção do chocalho, utilizamos garrafas PET, sendo o tamanho de cada


garrafa escolhido por cada aluno, e porções de areia e pó de brita. Normalmente trabalha-se
com grãos, porém, optei por trabalhar com areia e pó de brita pela função educativa de não
trabalhar com alimentos.
355
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Cada aluno confeccionou dois chocalhos, sendo um com garrafa e areia e o outro com
garrafa e pó de brita. Após cada aluno confeccionar seus dois chocalhos, iniciei a proposição
de atividades a seres trabalhadas com o a utilização do instrumento confeccionado. A primeira
atividade proposta foi à diferenciação dos parâmetros timbre, altura, intensidade e duração.
Para isso, solicitei aos participantes que, por sua conta, descobrissem as mais variadas
formas de produção de sons possíveis com os dois chocalhos e, que, junto com essas
possibilidades, fossem se familiarizando com os sons que cada forma de manuseio produzia.
Após alguns minutos de livre utilização do chocalho, propus uma atividade que
chamei de Fantoches Musicais. Esta atividade consiste em criar uma história com duração de
30 segundos, com tema de livre escolha, utilizando os chocalhos como fantoches. Para esta
atividade separei o grande grupo em duplas, e, foi dado de 10 a 15 minutos com o intuito de
que criassem e ensaiassem a história. Em cada história, além do enredo criado, deveriam ser
utilizados todos os parâmetros do som trabalhados.
Ao término do tempo dado para a criação e ensaio, cada dupla apresentou o seu
trabalho ao grande grupo. Embora tenha sido proposto que fosse uma história criada por cada
dupla, duas das duplas não se sentiram em condições de criar e solicitaram então que
representassem histórias clássicas infantis, já que durante nossa apresentação da proposta de
trabalho com os fantoches musicais, expus que o trabalho poderia ser iniciado com as crianças
através das representações das fábulas já conhecidas por elas, inclusive com a caracterização
de cada fantoche, até que as crianças se sentissem a vontade com a atividade para que então
criassem suas próprias histórias.
Após a apresentação de cada dupla, solicitei ao grande grupo que apontassem a
utilização de cada um dos parâmetros do som que estavam presentes em cada uma das
histórias apresentadas. É importante salientar que o grande grupo apontou não só os
parâmetros presentes em cada uma das histórias apresentadas, mas também apontou, sem que
fosse solicitado, os parâmetros que não foram apresentados, pois algumas duplas não
utilizaram todos os parâmetros.
Além disso, devo registrar que, talvez pela preocupação em utilizar os parâmetros do
som, todas as duplas deixaram bem marcados os momentos em que elas tinham consciência
que estavam usando algum parâmetro.
A segunda dinâmica proposta, chamada de Memória Auditiva, trata de um jogo onde
os alunos são chamados individualmente frente ao grande grupo, posicionam-se junto à mesa
onde existem dois chocalhos construídos da mesma forma, porém com materiais diferentes.

356
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Nesta atividade os dois eram de garrafas PET de 500 ml, porém, um continha em seu interior
areia e o outro continha pó de brita. Por serem de materiais diferentes, o resultado sonoro de
seu manuseio também era distinto. Tendo em vista essa diferença, a cada aluno que era
chamado, era dado até um minuto para que se familiarizasse com as possíveis sonoridades
emitidas por cada um dos chocalhos. Após este minuto, solicitava ao aluno que se voltasse de
costas para os chocalhos e de frente para o restante da turma, e a cada som emitido, o aluno
deveria dizer qual chocalho foi utilizado para aquele resultado sonoro. Cada chocalho foi
utilizado para produzir sons no mínimo de três formas diferentes, e cada forma era repetida no
máximo três vezes. Foi possível fazer com que todos os alunos passassem por essa
experiência, e por se tratar de um grupo pequeno, podemos fazer com que os alunos
tomassem a posição de professor e manuseassem os chocalhos para que os colegas de curso
concluíssem de qual dos dois chocalhos estava sendo produzido o som.

Conclusão

Após esta primeira investida, ainda que se tratando de um “experiência piloto”,


percebi que mais do que possível, é necessário que todas as ciências, que teimam em sustentar
suas unanimidades e individualismos, unam-se em prol dos alunos. Pois como já tratamos
acima, o objetivo que devemos atingir enquanto educadores não devem depender de uma
única e exclusiva forma de ensino-aprendisagem, devemos ofertar aos alunos os mais diversos
meios, para que então ele escolha a forma mais confortável e de fácil assimilação para
chegarmos juntos aos objetivos traçados. E uma das formas que acredito seja adequada a este
formato de ensino-aprendisagem, é a interdisciplinaridade, pois através da união dos
conhecimentos específicos de cada área, neste caso de música e ciências, foi possível
trabalhar o sentido da audição não só enquanto teoria dos cinco sentidos, mas principalmente
como forma de dar subsídios às professoras da educação infantil afim de que trabalhem em
sala de aula o estímulo a percepção auditiva.

357
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BELLOCHIO, C. R. A formação musical de professores da infância no ensino superior:


alguns pressupostos e desafios. In: TRAVERSINI, C. et al. (Org.) Trajetórias e processos de
ensinar e aprender: práticas e didáticas. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008.

_____. As necessidades formativas em educação musical: um estudo na formação inicial da


Pedagogia UFSM. In: X ENCONTRO REGIONAL DA ABEM SUL, 10., 2007, Blumenau.
Anais... Blumenau: ABEM SUL, 2007. p. 1-8.

_____. Escola - Licenciatura em Música – Pedagogia: compartilhando espaços e saberes na


formação inicial de professores. Revista da ABEM, Porto Alegre, n 7, p. 41- 48, 2002.

FIGUEIREDO, S. L. F. de. A pesquisa sobre a prática musical de professores generalistas no


Brasil: situação atual e perspectivas para o futuro. Em Pauta, Porto Alegre, 2007.

_____. A preparação musical de professores generalistas no Brasil. Revista da ABEM, Porto


Alegre, v. 11, p.55-62, 2004.

_____. A formação musical nos cursos de pedagogia. In: ENCONTRO NACIONAL DA


ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 12., 2003, Florianópolis.
Anais... Porto Alegre: ABEM, 2003. Disponível em CD-ROM.

JAPIASSU, Hilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

MED, Bohumil. Teoria da música. Brasília: MusiMed, 1996.

358
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Classe Hospitalar HUPES: educação musical em ambiente hospitalar

Luciano Medeiros de Moraes


Universidade Federal da Bahia
lucianosilva.moraes@bol.com.br

Resumo: A educação musical com crianças e adolescentes em ambiente hospitalar tem como
objetivo essencial, proporcionar aos alunos-pacientes o contato com o universo sonoro através
das percepções auditiva, visual e tátil. Fazê-los reproduzir os sons com o corpo e ter contato
com os instrumentos musicais, observando-se a maneira como se expressam individualmente
e coletivamente pela música. Contribuir à promoção do desenvolvimento cognitivo e psíquico
desses pacientes hospitalizados e/ou portadores de doenças crônicas, afastadas das rotinas
acadêmicas de ensino-aprendizagem, sendo possível, ainda, o uso da música como uma
ferramenta terapêutica que controla a ansiedade e o estresse.
Palavras chave: Classe hospitalar; educação musical; terapia musical; aluno-paciente

FIGURA 11 - Acervo do Autor FIGURA 2

A Classe Hospitalar é uma modalidade de atendimento escolar prestada às crianças e


adolescentes internados em hospitais. É oficialmente reconhecida pelo MEC e estimulada
pelas políticas de humanização do SUS. Existem aproximadamente treze Classes Hospitalares
na cidade do Salvador, mas nem todas possuem professor de música especializado na área. No
Hospital das Clínicas a educação musical já está presente há dois anos.
Os alunos da UFBA, bolsistas do PROAE - Programa Permanecer, são beneficiados
em seus currículos pela proposta da Educação Musical em Classe Hospitalar. Aos
alunos/professores é dada a oportunidade de compreender a docência como um exercício
desafiador de flexibilidade de métodos e técnicas pedagógicas que caracterizam o ambiente
no qual estão inseridos.

1
Fig.1 e 2 - O professor orienta sobre as particularidades de cada instrumento musical, escolhe um ritmo e uma
canção para ser executada junto com os alunos. Nesse contexto, o papel da música é atuar como uma ferramenta
que educa, diverte e possibilita de modo terapêutico a melhora da saúde física e mental dos alunos-pacientes.
359
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

O trabalho didático de escolarização no Hospital das Clínicas (HUPES) com crianças


internadas tem de ser bastante adaptado, por isso o professor de uma classe hospitalar deve
interar-se de tudo um pouco: de jogos recreativos; de música, de artes plásticas; de contação
de histórias, de dramatizações, de material audiovisual, de brinquedos educativos, da internet,
de jogos eletrônicos, de passeios, de muito recurso lúdico e de tudo mais que sua criatividade
e flexibilidade sugerirem.
Nesse contexto e de acordo com as referências curriculares da educação brasileira, a
musicalização infantil torna-se obrigatória, possibilitando de maneira privilegiada uma
atuação como área do conhecimento que desenvolve o psíquico e o cognitivo. A música
também age de modo terapêutico, na medida em que diminui o estresse ocasionado pela
condição de hospitalização.

FIGURA 32 FIGURA 4

A vivência musical em ambiente hospitalar torna-se imprescindível, na medida em que


esta possibilita a inserção de momentos de entretenimento, ludicidade e descontração, em
busca de melhorar e amenizar sensivelmente as condições físicas e psíquicas do aluno-
paciente. A intenção é ainda fazer a música atuar como “antídoto” de efeito positivo e
terapêutico que reverbera na saúde do corpo e do espírito, considerando-se, também, que cada
elemento que constitui a música possa está despertando de maneira particular ou generalizada
sob o indivíduo, desenvolvendo, portanto, sua psicomotricidade, sensibilidade e/ou cognição.
A aprendizagem musical é garantida oportunamente com exercícios e atividades
pedagógicas adequadas à realidade do ambiente hospitalar, levando-se em consideração a
condição de cada paciente e sua enfermidade. O nosso intuito é também promover o bem-

2
Fig. 3 e 4 - A música como objeto de integração social, realizando o encontro com o próximo, fortalecendo os
laços de amizade e afetividade.

360
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

estar do paciente, diminuir o estresse e a ansiedade, buscando aliviar a dor e


consequentemente fazê-lo reagir aos estímulos causados pela música.
Práticas pedagógicas que possibilitem a expressão individual e coletiva devem ser
estimuladas como: a percepção dos sons ao nosso redor, o ritmo do corpo coordenado, a
interpretação musical, o contato com os instrumentos musicais e a audição de repertório
variado. O papel do professor é reinventar maneiras de ensinar a música, observando as
reações comportamentais dos alunos-pacientes através dos exercícios propostos.

FIGURA 53

Nesse contexto, o papel responsável do professor enquanto agente transmissor e


transformador é o de ter a capacidade de enxergar no outro as possibilidades de sempre
assimilar algo. Aprender primordialmente é entender que aquilo existe saber fazer e entender
será num outro momento. Por isso, a música existe, deve-se agora despertar o interesse em
conhecê-la, saber da dimensão dela e da sua influência em nossos comportamentos, deixá-la
tocar no corpo e no espírito - envolvendo nossos pensamentos e sentimentos - fluindo por
vibrações sonoras revitalizantes.

3
Fig. 5 - A música tem a capacidade de adentrar ambientes nem sempre convencionais, entretanto torna-se
necessária a sua presença para alimentar nossas esperanças.

361
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ALVIM, Neide; BERGOLD, Leila; Cabral, Ivone. O lugar da música no espaço do cuidado
terapêutico: sensibilizando enfermeiros com a dinâmica musical. Texto e Contexto Enferm.
Florianópolis, 2006. p. 262-269.

CARMO, Rosângela; CUNHA, Eudes. Educação musical em ambiente hospitalar: uma


experiência no município de Salvador. IX Encontro Regional da ABEM Nordeste. Anais...
Junho/2010. Rio Grande do Norte.

CARVALHO, Ana Maria; VALLADARES, Ana Claudia. A arteterapia e o desenvolvimento


do comportamento no contexto da hospitalização. Revista Esc. de Enfermagem – USP. São
Paulo, 2006. p.350-355, 2006.

FONSCECA, Eneida. Atendimento escolar no ambiente hospitalar. São Paulo: Menon, 2003.

MATOS, Elizete. Escolarização hospitalar: educação e saúde de mãos dadas para humanizar.
Rio de Janeiro. Petrópolis, 2003.

MOTTA , Maria; RAVELLI, Ana Paula. O lúdico e o desenvolvimento infantil: um enfoque


na música e no cuidado de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem – REBEN. Brasil,
p. 611-613, 2005.

RUUD, Even. Caminhos da musicoterapia. Tradução Vera Wrobel. São Paulo: Summus,
1990.

SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina


Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

362
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Musicalização Infantil da UFPB: primeiros passos

Andréa Matias Queiroz


Universidade Federal da Paraíba
vlnandrea@yahoo.com.br

Samara Rodrigues de Oliveira


Universidade Federal da Paraíba
Rodrigues.samara84@gmail.com

Caroline Brendel Pacheco


Universidade Federal da Paraíba
carolbrendel@gmail.com

Resumo: Este artigo trata-se de um relato de experiência que tem como objetivo além de
promover uma breve reflexão acerca da musicalização infantil, descrever a experiência do
ensino de música para crianças de zero a seis anos promovido pelo do Grupo de Estudos de
Educação Musical Infantil da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. A primeira parte
deste trabalho traz um relato das aulas. Posteriormente são apresentadas algumas discussões
acerca da literatura referente a musicalização infantil e, por fim, serão apontados os próximos
passos da musicalização infantil na cidade de João Pessoa – PB, bem como as suas
implicações para a educação musical.
Palavras chave: Musicalização infantil, desenvolvimento infantil, musicalização na UFPB

Introdução

O presente trabalho aborda a nossa experiência no Grupo de Estudos de Educação


Musical Infantil da Universidade Federal da Paraíba, que teve início no ano de 2010 sob a
coordenação da professora Ms. Caroline Pacheco. Trazemos aqui, além da reflexão sobre
nossas experiências no decorrer das aulas, uma breve discussão acerca do ensino de música
para crianças de zero a seis anos de idade.
Refletir acerca da importância do ensino de música para as crianças é de suma
importância, pois como apontam alguns estudos existentes na área (FREIRE; PRESTES;
PORTO, 2007; PARIZZI, 2006; GONÇALVES, 2004; FERREIRA, 2010; ILARI, 2009) as
crianças possuem um grande potencial para desenvolver musicalmente, que deve ser
estimulado desde cedo, beneficiando também o desenvolvimento geral da criança. Nesse
sentido, Freire, Prestes e Porto (2007) explicam que,

A musicalização tem como objetivos oferecer a crianças de zero a cinco anos


e suas famílias uma experiência musical significativa que sirva como
elemento enriquecedor para o desenvolvimento da criança. Os aspectos
afetivo, social, psicomotor e cognitivo são valorizados como os alicerces do
363
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

processo de construção do conhecimento musical (FREIRE; PRESTES;


PORTO, 2007, p. 04).

Deste modo, as aulas oferecidas para as crianças na Musicalização Infantil da UFPB


buscaram proporcionar uma vivência musical bastante rica e proveitosa não só para as
crianças da comunidade, mas igualmente aos seus pais e/ou cuidadores que também
participaram das atividades.
A seguir apresentamos um relato das atividades e do contexto em que aconteceram as
primeiras aulas de musicalização infantil, uma breve reflexão acerca de alguns estudos
realizados a musicalização e as crianças pequenas, e posteriormente, as implicações para a
educação musical, especialmente no contexto da cidade de João Pessoa/ PB.

As Aulas de Musicalização Infantil

A proposta de dar aulas de música para crianças surgiu da necessidade de se criar um


ambiente que abordasse a musicalização para crianças de zero a seis anos, tendo em vista que
as escolas de música da cidade de João Pessoa oferecem aulas apenas para crianças a partir
dos sete anos.
O projeto de Musicalização Infantil da UFPB teve início, no ano de 2010, como um
grupo de estudo coordenado por uma professora especialista na área e constituído por alunos
do curso de Licenciatura em Música da UFPB, uma professora de música da rede básica de
ensino da cidade João Pessoa e colaboradores.
Nos encontros semanais efetuados pelo grupo eram realizadas diversas leituras,
reflexões, discussões e também atividades práticas sempre direcionadas à educação musical
infantil. Além dos encontros semanais, o grupo realizou quatro aulas abertas de musicalização
infantil para a comunidade. Essas aulas iniciais funcionaram como um meio de praticar
nossos conhecimentos adquiridos durante os encontros semanais, além de beneficiar a
comunidade com a socialização desses conhecimentos adquiridos.
As duas primeiras aulas fizeram parte da programação da I Semana de Ciências,
Tecnologia, Esporte, Arte e Cultura – SECITEAC, evento interno realizado anualmente na
UFPB. Como as atividades programadas eram aulas abertas, não foi necessário realizar
inscrições prévias. As crianças que chegavam eram divididas de acordo com a faixa etária e
participaram de aulas com cerca de 40/50 minutos de duração.
As atividades e canções eram diferenciadas para cada turma. Os bebês estavam
acompanhados de seus pais ou cuidadores, pois, como explica Parizzi (2006), eles são

364
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

fundamentais nesse processo de aprendizagem. Segundo a autora a forma como articulam


com os filhos é um modelo de predisposição inconsciente, ou seja, ao se dirigir às crianças, os
pais se comunicam de uma maneira diferenciada, utilizando distintos timbres, alturas,
contornos melódicos, mudanças de intensidade e padrões rítmicos, que serão os primeiros
estímulos musicais na vida delas. Já as crianças maiores participaram da roda de atividades
sozinhas, mas sob o olhar atento dos pais e também de outras pessoas da comunidade que
vieram para conhecer esta nova atividade, ainda pouco divulgada no estado da Paraíba.

O Que a Literatura Nos Diz Sobre a Musicalização

Alguns estudos da neurociência apontam para a infância como um período favorável


para o desenvolvimento do cérebro (KOTULAK, 1997 apud ILARI, 2003; CARDOSO;
SABATINI, 2000). Do nascimento aos 10 anos de idade, o cérebro da criança está em pleno
desenvolvimento e apresenta as melhores condições de aprendizado (ILARI, 2003).
Alguns autores (CARDOSO; SABATINI, 2000; ILARI, 2002; 2003; 2009) sugerem
que a música pode ser um estímulo importante para o desenvolvimento cerebral da criança.
Para isso, se faz necessário um ambiente bastante estimulante, onde a criança possa vir a ter
um desenvolvimento satisfatório.

A educação de crianças em um ambiente sensorialmente enriquecedor desde


a mais tenra idade pode ter um impacto sobre suas capacidades cognitivas e
de memória futuras. A presença de cor, música, sensações, [...] variedade de
interação com colegas e parentes das mais variedades idades, exercícios
corporais e mentais podem ser benéficos (desde que não sejam excessivos)
(CARDOSO; SABBATINI, 2000).

Antes mesmo de nascer, os bebês têm contato com diversos sons presentes no útero
materno, como explica Soares (2008) “desde a vida intra-uterina, o bebê é cercado por um
ambiente sonoro, convive tanto com ruídos externos quanto com os sons interiores causados
pelo funcionamento do corpo da mãe e pela sua voz” (SOARES, 2008, p.80). Ilari (2003)
acrescenta ainda que, após o nascimento,

O hábito de cantar e dançar com bebês e crianças, presente em praticamente


todas as culturas do mundo, auxilia no aprendizado musical, no
desenvolvimento da afetividade e socialização, e também no progresso da
aquisição da linguagem (ILARI, 2003, p. 14).

Quando o bebê nasce, essa relação sonora se amplia. Os sons percebidos com
limitadas ações motoras passam a ser reagidos. Eles também passam a responder aos

365
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

estímulos musicais por meio de movimentos corporais e de algum tipo de produção sonora.
Em seu estudo sobre os balbucios musicais, Beyer (2005) explica que, “a exploração sonora
do bebê contempla todos os parâmetros sonoros, mas que vai variar conforme o contexto
sonoro-musical em que o bebê está inserido” (BEYER, 2005, p. 101).
Deste modo, apesar de ainda haver quem pense no bebê apenas como um ouvinte
passivo, as reflexões a respeito da musicalização para crianças já existentes na área, nos
mostram que elas também são capazes de reagir e responder aos estímulos sonoros (ILARI,
2002).
O trabalho com os sons nesta idade é fundamental, pois a criança explora várias
capacidades musicais, estimulando seu desenvolvimento musical e geral. Logo, a
musicalização de crianças de zero a três anos tem o objetivo de trabalhar com a música
desenvolvendo competências como ouvir, perceber, discernir e interagir com diferentes
universos sonoros. Com as crianças de quatro a seis anos os objetivos a serem explorados são
basicamente os mesmos, embora sejam trabalhados de forma mais aprofundada. Nesse
sentido, Penna (2008) acrescenta que,

Musicalizar é desenvolver os instrumentos de percepção necessários para


que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o
material sonoro/musical como significativo. Pois nada é significativo no
vazio, mas apenas quando relacionado e articulado ao quadro das
experiências acumuladas, quando compatível com os esquemas de percepção
desenvolvidos (PENNA, 2008, p.31).

Alguns estudos confirmam que a musicalização infantil é importante para a formação


das crianças, pois ela desenvolve aspectos sociais, afetivos, psicomotores e cognitivos
(ILARI, 2002; GONÇALVES, 2004; FERREIRA, 2010). Gonçalves (2004) ainda comenta
que, “as atividades físicas realizadas nessa faixa etária resultam em maior domínio do corpo,
desenvolvendo a força, a resistência, a flexibilidade, a destreza e a autonomia”
(GONÇALVES, 2004, p. 34).
Assim sendo, a prática musical nesta fase é essencial para o processo do
desenvolvimento infantil, pois permite que as crianças experimentem e vivenciem a música,
as atividades realizadas na musicalização infantil fazem com que elas passem a explorar e
desenvolver o seu universo sonoro.

366
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Implicações Para a Educação Musical: como seguiremos aqui em João


Pessoa

Os estudos e as atividades extensionistas ligadas a musicalização infantil vêm sendo


desenvolvidos em algumas universidades do Brasil - como UFPR, UFBA, UNB, UFRGS,
entre outras - mas, pelo que se tem notícia, ainda não existia nenhuma proposta semelhante no
estado da Paraíba.
Os motivos que levaram à criação do grupo de Musicalização Infantil da UFPB foram
o interesse de seus participantes na área de educação musical infantil, assim como a ausência
de projetos e/ou escolas que ofereçam atividades musicais para essa faixa etária na cidade de
João Pessoa. Embora o ensino de música para crianças pequenas seja de fundamental
importância para o desenvolvimento infantil, as principais escolas de música da cidade só
oferecem musicalização para crianças a partir de sete anos de idade.
Este trabalho teve como objetivo relatar a nossos primeiros passos com a
musicalização infantil. Acreditamos que a iniciativa de realizar aulas abertas foi de grande
importância, pois além de beneficiar as crianças da comunidade, nos deu a oportunidade de
vivenciar o nosso aprendizado obtido ao longo dos encontros do Grupo de Estudos de
Educação Musical Infantil. A partir dessa experiência, pudemos observar como as atividades
acontecem realmente, pois é também na prática, com todas as particularidades existentes e até
mesmo com a risada e o choro de cada criança, que vemos de fato, como é gratificante e
proveitoso participar da atividade.
Recentemente o nosso grupo tornou-se projeto de extensão universitária
(FLUEX/PROBEX), com o propósito de ampliar a oferta de atividades de musicalização
infantil para a comunidade pessoense e contribuir para a formação profissional dos alunos da
UFPB. Como parte desse projeto, ofereceremos a partir do mês de agosto, aulas semanais de
musicalização para as crianças de zero a seis anos de idade.
Portanto, além de oferecer musicalização para bebês e crianças da nossa comunidade e
colaborar para o desenvolvimento musical infantil, o projeto contribui como um laboratório
para formação de educadores musicais especializados no atendimento à infância.

367
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

BEYER, Esther. (Org.). O som e a criatividade: reflexões sobre experiências musicais. Santa
Maria: Ed. UFSM, 2005.

FERREIRA, Tânia Barbosa. Diálogo entre a pedagogia e a música. Aparecida de Goiânia,


2010. Disponível em:
<http://www.unifan.edu.br/files/pesquisa/DI%C3%81LOGO%20ENTRE%20A%20PEDAG
OGIA%20E%20A%20M%C3%9ASICA%20-%20Tania%20Barbosa.pdf>. Acesso em 14
jun.2011.

FREIRE, Ricardo D. ; PRESTES, Clarisse; ROSA, Larissa. Aspectos da avaliação do


desenvolvimento musical de crianças do nascimento aos 5 anos e seu impacto na família.
Revista da ABEM, Campo Grande, 2007.

GONÇALVES, Alessandra de Araújo. Psicomotricidade na educação infantil a influência do


desenvolvimento psicomotor na Educação Infantil. Universidade Candido Mendes Pós-
Graduação "Lato Sensu" Projeto Vez do Mestre Psicomotricidade, Rio de Janeiro, 2004.
Disponível em:
<http://www.avm.edu.br/monopdf/7/ALESSANDRA%20DE%20ARAUJO%20GONCALVE
S.pdf>. Acesso em: 14 jun.2011.

ILARI, Beatriz Senoi. Música na infância e na adolescência: um livro para pais, professores e
aficionados. Curitiba: Ibpex, 2009.

______. Bebês também entendem de música: a percepção e a cognição musical no primeiro


ano de vida. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 7, 83-90, set. 2002.

______. A música e o cérebro: algumas implicações do neurodesenvolvimento para a


educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 9, 7-16, set. 2003.

PARIZZI, Maria Betânia. O canto espontâneo da criança de zero a seis anos: dos balbucios às
canções transcendentes. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 15, 39-48, set. 2006.

PENNA, Maura. Música(s) e seu Ensino. Porto Alegre: Sulina, 2008.

SOARES, Cíntia Vieira da Silva. Música na creche: possibilidades de musicalização de


bebês. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 20, 79-88, set. 2008.

368
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Música na Educação Infantil: um mapeamento das práticas pedagógico-


musicais da rede municipal de ensino de Belo Horizonte

Rosa Maria Ribeiro


UFMG
rosinha1963@gmail.com

Resumo: Na observância da lei de inclusão da música no currículo das escolas do nosso país
e com a conseqüente necessidade de se construir propostas de educação musical adequadas a
realidade brasileira, torna-se imprescindível esclarecer a real situação do ensino da música na
escola regular. Diante deste contexto, esta pesquisa visa mapear o ensino de música nas
Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI’s) da Rede Municipal de Educação da
Prefeitura de Belo Horizonte/MG. Para isso, serão delineados os perfis dos professores que
ministram atividades musicais nas UMEIs; será analisado o status da música utilizada como
componente dos currículos escolares; serão identificados os tipos de atividades musicais
desenvolvidas e os recursos disponíveis para a realização dessas atividades; serão levantadas
as necessidades dos professores para desenvolver o ensino de musica na educação infantil. A
metodologia utilizada é o survey, sendo que os dados serão coletados por meio de
questionário junto aos professores das Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI).
Palavras chave: Educação musical, educação infantil, formação de professores

Introdução

Educadores musicais têm manifestado sua preocupação com a observância da Lei


Diretrizes e Base da Educação Nacional nº 9394/96, da Lei nº 11.769/08 de inclusão da
música no currículo das escolas do nosso país e com a construção significativa de uma
educação musical adequada à realidade brasileira e às necessidades e características do aluno.
Na LDBEN de 1996, a educação infantil, recebeu destaque inexistente nas legislações
anteriores, sendo tratada como primeira etapa da educação básica, com finalidade de
desenvolver de forma integral a criança até os seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.
Em agosto de 2008, a Lei nº 11.769 veio acrescentar a obrigatoriedade do ensino de
música na educação básica. Visando assegurar o cumprimento dessa Lei, a Fundação
Nacional de Artes (Funarte) tem firmado parceria entre o Ministério da Cultura e o Ministério
da Educação e está organizando encontros regionais com acadêmicos, especialistas,
Secretarias de Educação e Associações de Estudos Musicais para realizar mapeamentos do
ensino de Música nos estados brasileiros.1

1 Revista Nova Escola. Disponível em (http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/legislacao/musica-


sera-conteudo-obrigatorio-educacao-basica-541248.shtml) acessado no dia 27 de abril de 2010.
369
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Conjuntamente, a Prefeitura de Belo Horizonte tem promovido reuniões com o intuito


de discutir a política educacional expressa na rede de ensino, bem como examinar as possíveis
marcas que revelem a postura da instituição diante da prática musical nas escolas e político-
pedagógicas entre os docentes desde a sua obrigatoriedade. Nessa intenção, em 2009,
elaborou-se um documento que apresenta as Proposição Curriculares para a Educação Infantil
em que o ensino de música foi contemplado. Para efeito de organização didática, esse
documento apresenta a Natureza, Sociedade e Cultura e o Brincar como eixos estruturadores
em torno das quais as sete linguagens2 se desenvolvem e, estas não se apresentam
fragmentadas nem isoladas, mas, na prática, se interligam e se complementam.
Apesar da existência das Proposições Curriculares, a Rede Publica de Belo Horizonte
não dispõe de dados mais abrangentes sobre a prática do ensino de música nos diferentes
níveis da educação básica. Diante deste contexto, surgiram as seguintes questões para
delineamento desta pesquisa: qual a real situação do ensino de música na Unidade Municipal
de Educação Infantil (UMEI’s) de Belo Horizonte? Como a música está presente? Quais são
as necessidades para desenvolver o ensino de música? As condições de trabalho são
favoráveis? Os profissionais sentem-se capazes de atuar frente à realidade encontrada nas
escolas? Os professores têm formação específica para lecionar esta área do conhecimento?
Como capacitar os professores generalistas3 a atuarem de maneira eficaz no ensino de
música?

2 Linguagens: Artes plásticas visuais; Corporal; Digital; Escrita; Musical; Matemática e Oral)
3 Com formação em curso Normal (Nível Médio) e/ou com nível superior em Pedagogia (Graduação)

370
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

FIGURA 1 – UMEI BH / MG

Justificativa

É incontestável a influência da música no desenvolvimento da criança, confirmada por


inúmeras pesquisas desenvolvidas em diferentes países e épocas, particularmente nas décadas
finais do século XX e, principalmente, no Brasil no início do século XXI (CARNEIRO &
PARIZZI, 2011; PARIZZI, 2010, 2009; CARNEIRO, 2006; BEYER, 2005, 2003a, 2001a,
2001b; MARINO, 2005; FIGUEIREDO & SCHMIDT, 2005; ARROYO, 2004; DEL BEN,
2003; BRITO, 2003; PENNA, 2002a; SOUZA ET AL, 2002; ARAUJO, 2001)
Para implementar um retorno consciente e consistente do ensino de música, torna-se
imprescindível o esclarecimento das questões relativas à real situação da escola regular na
atualidade. Esse mapeamento é, pois, de grande interesse para diversas vertentes que
discutem, analisam e pesquisam questões relativas à fundamentação para o ensino de música
na educação infantil, formação do professor para esse segmento da educação básica, práticas
pedagógicas e alternativas metodológicas adequadas para a atuação do profissional em
consonância com a realidade social.

FIGURA 2 – UMEI BH / MG

Objetivos

Geral

Mapear a situação do ensino de música no contexto das Unidades Municipais de


Educação Infantil (UMEI) da Rede Municipal de Educação da Prefeitura de Belo
Horizonte/MG.

371
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Específicos

• Identificar quem são os professores que atuam na área, sua formação e suas
demandas em relação à sua atuação;
• Analisar o status da música como componente dos currículos escolares;
• Levantar as atividades musicais predominantes;
• Identificar os recursos disponíveis nas escolas para a realização das aulas de
música.

Metodologia

• A metodologia escolhida é o survey que busca coletar dados sobre populações


amplas, visando descrever e compreender uma determinada situação social, verificando
condições existentes, bem como fazendo comparação de condições para resolver um
problema prático (BABBIE, 2005).
• Núcleo fornecedor de informações: o educador que atua nas 57 unidades
municipais de educação infantil (UMEI’s) das 7 regionais da Rede Municipal de Educação;
• Tamanho da amostra: 292 professores. Este número foi determinado por meio
de um estudo estatístico que considerou para o calculo o número total de 1.202 professores;
• Os dados serão coletados por meio de questionários com questões fechadas e
abertas, respondidos por 292 educadores infantis;
• Está sendo realizado um levantamento bibliográfico com uma maior atenção à
análise conjunta de estudos semelhantes já realizados em outros estados do Brasil.
• Após a coleta, será feita a análise, interpretação dos dados, consubstanciados
pela fundamentação teórica estudada.

Resultados Esperados:

Espera-se que esta pesquisa possa identificar “onde acontece”, “como acontece”,
“quem faz acontecer” a educação musical infantil na rede municipal de educação em Belo
Horizonte. Assim, haverá maior segurança, clareza e delineamento na orientação dos caminhos
a seguir para construção de práticas pedagógico-musicais eficazes voltadas para essa faixa

372
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

etária. Este fato trará contribuições para a formação e ações de cada um dos educadores,
considerando os processos indissociáveis do cuidar e educar de cada criança4.

FIGURA 3 – UMEI BH / MG

4 Proposições Curriculares Educação Infantil:<http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=por


tlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=educacao&tax=8489&lang=pt_BR&pg=5564&taxp=0&>.

373
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

Referências

ARAÚJO, Rosane C. A situação do ensino de música nas séries iniciais das escolas
municipais de Curitiba no ano de 2000. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade
Tuiuti do Paraná, Tuiuti, 2001.

ARROYO, Margarete. Música na educação básica: situações e reações nesta fase pós-
LDBEN/96. Revista da ABEM, Porto Alegre, n. 10, p. 29-34, mar. 2004.

BABBIE, Earl. Métodos de pesquisa de survey. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.

BEYER, Esther. Do balbucio ao canto do bebê em sala de aula. In: 1º SIMPÓSIO


INTERNACIONAL DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS, 2005, Curitiba. Anais...
Curitiba: Deartes, 2005. p. 350-356.

BEYER, Esther.; STIFFT, Kelly. A relação mãe-filho no Projeto "Música para Bebês”: um
estudo sobre possíveis interferências no desenvolvimento musical dos bebês. Revista Do
Centro de Educação/UFSM, Santa Maria/RS, v. 28, n. 01, p.93-99, 2003a.

BEYER, Esther. Interagindo com a música desde o berço: um estudo sobre o


desenvolvimento musical em bebês de 0 a 24 meses. In: XIII ENCONTRO NACIONAL DA
ANPPOM. Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: UFMG, 2001a. v. II. p. 617-620.

BEYER, Esther. O formal e o informal na educação musical: o caso da educação infantil. In:
ENCONTRO REGIONAL DA ABEM SUL, 4., 2001, Santa Maria. Anais... Santa Maria:
ABEM, 2001b, p. 45-52.

BRASIL. Ministério da Educação. LDBEN no 9.394/96. Brasília, 1996. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/seb> Acesso em 27 de abril de 2010.

______. Lei nº 11.769, de 18 de agosto de 2008, altera a Lei no 9.394, PARA DISPOR
SOBRE A OBRIGATORIEDADE DO ENSINO DA MÚSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA.

BRITO, Teca Alencar de. Música na educação infantil – propostas para a formação integral
da criança. São Paulo: Ed. Peirópolis, 2003.

CARNEIRO, Aline Nunes e PARIZZI, Maria Betânia. Parentalidade intuitiva e musicalidade


comunicativa: conceitos fundants da educação musical no primeiro ano de vida. Revista da
ABEM, n. 25, maio, 2011.

CARNEIRO, Aline Nunes. Desenvolvimento musical e sensório-motor da criança de zero a


dois anos: relações teóricas e implicações pedagógicas. Dissertação (Mestrado em Música).
Escola de Música. UFMG. 2006.

DEL BEN, Luciana M. Um estudo com escolas da rede estadual de ensino básico de Porto
Alegre, RS: subsídios para a elaboração de políticas de educação musical. In: Revista Hodie,
Porto Alegre, 2003. Disponível em:
<http://www.revistas.ufg.br/index.php/musica/article/view/2475/2429>. Acesso em: 26 abr.
2010.

374
II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil
Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto de 2011

FIGUEIREDO, S. L. F.; SCHMIDT, L. M. Discutindo o talento musical. I SIMPÓSIO


INTERNACIONAL DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS (SINCAM). Anais... Curitiba:
UFPR, p.386-392, 2005.

MARINO, Gislene. Educação musical escolar: análise do ensino de música nas escolas
municipais de Belo Horizonte. 2005. (Dissertação de Mestrado em Educação) - Faculdade de
Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005.

PARIZZI, Maria Betânia. Influências da educação musical nas respostas vocais e de interação
social em crianças nascidas prematuras. In: XX ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DE PESQUISA E PÓS GRADUAÇÂO EM MÙSICA. Anais... Florianópolis:
Udesc, 2010.

PARIZZI, Maria Betânia. O desenvolvimento da percepção do tempo em crianças de dois a


seis anos: um estudo a partir do canto espontâneo. 2009. 232 f. Tese (Doutorado em Saúde e
Música). Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte,
2009.

PENNA, Maura (Coord.). A arte no ensino fundamental: mapeamento da realidade nas


escolas públicas da Grande João Pessoa. João Pessoa: D’Artes/UFPB, 2002.

SOUZA, Jusamara, et al. O que faz a música na escola? Concepções e vivências de


professores do ensino fundamental. Porto Alegre: Programa de Pós-Graduação em Música do
Instituto de Artes da UFRGS, 2002. (Série Estudos, 6)

375

Você também pode gostar