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Seleção feita por Fábio Rodrigo Leite para a discplina de Filosofia do Cursinho Saber a

partir de: ARISTÓTELES, Partes dos animais, 645a-645b. Lisboa: Imprensa Nacional –
Casa da Moeda, 2010. Trad. Maria de Fátima Sousa e Silva.

“[...] vamos ocupar-nos agora da natureza animal, com a preocupação de, dentro do
possível, não deixar de fora nenhuma questão, seja ela insignificante ou de
importância. De facto, mesmo se se trata de seres que não têm um atractivo sensível,
a natureza, que os concebeu, reserva a quem os estuda prazeres fantásticos, desde
que se seja capaz de lhes perceber as causas e que se tenha um verdadeiro amor à
ciência. Seria estranho e sem lógica que nos satisfizesse a observação de reproduções
desses seres, porque nesse caso estaríamos a apreciar simultaneamente o talento do
artista – seja ele um pintor ou um escultor – e não fôssemos sensíveis ao prazer
supremo de contemplar os seres em si mesmos tal como a natureza os criou, pelo
menos quando conseguimos identificar-lhes as causas. Assim, não é conveniente
alimentar uma aversão infantil pelo estudo dos animais menos nobres, na certeza de
que em todos os produtos da natureza há sempre algo de maravilhoso. Lembremos o
que se conta das observações feitas por Heráclito a uns estrangeiros de visita que, ao
vê-lo aquecer-se ao fogão, se detiveram à entrada: insistiu para que entrassem sem
receio, com o argumento de que também ali havia algo de divino. Do mesmo modo
devemos encetar a pesquisa sobre qualquer animal sem resistência, certos de que
cada um deles tem algo de natural e o seu encanto próprio.

Sobre os produtos da natureza não reina o acaso, mas uma finalidade e no mais
alto grau. É exactamente no objectivo pelo qual cada ser se constitui e se produz que o
belo reside. E quem depreciar o estudo dos outros animais fatalmente deverá estender
a si mesmo igual desinteresse. Porque não é sem uma profunda repugnância que se
observa os elementos que constituem o ser humano, o sangue, a carne, os ossos, os
vasos sanguíneos e outras partes. Por outro lado, quando se considera apenas uma
qualquer parte ou estrutura, importa ter em conta que não se pode falar somente de
matéria e encará-la como um fim em si mesma, mas antes perspectivar a forma no seu
todo; do mesmo modo que, se se trata de uma casa, é da configuração geral que se
fala e não dos tijolos, da argamassa ou das madeiras. Assim também, se se trata da
natureza, importa considerar o conjunto e a substância na sua totalidade, e não os
elementos que não existem nunca em separado da substância a que pertencem.”

Taquaritinga, 02/04/2019.

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