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O Trafico de Drogas e o Crime Organizado 21069 - 2011 - 8 - 7 - 51 - 24 PDF
O Trafico de Drogas e o Crime Organizado 21069 - 2011 - 8 - 7 - 51 - 24 PDF
RESUMO
Este artigo busca abordar o tráfico de drogas ilícitas e verificar se esta modalidade
criminosa está inserida no conceito de “crime organizado”, encontrado com frequência
em textos, artigos, notícias. Foi feita uma contextualização sobre essa atividade
criminosa no Brasil, em especial a facção criminosa “Comando Vermelho”,
descrevendo suas origens e de como as atividades com as drogas ilícitas começaram no
Brasil. Por fim, foram verificadas correlações entre as atividades “administrativas” do
tráfico de drogas ilícitas e a estrutura administrativa de setores públicos e privados,
apresentando características semelhantes entre eles.
1. INTRODUÇÃO
1
Oficial da Polícia Militar de Minas Gerais – 2º Tenente PM - Bacharel em Ciências Militares – Pós-
graduado e Especialista em Segurança Pública e Complexidade - Mestrando em Administração.
O tema tornou-se tão importante que passou a ser utilizado como sustentáculo em
campanhas políticas. Dentre os assuntos mais discutidos em campanhas políticas, como
saúde, educação, emprego, a segurança pública ganhou tanto espaço que hoje figura
entre os temas mais importantes e que a sociedade mais cobra dos seus futuros
governantes, em época de campanha política.
Faremos uma abordagem dos diversos conceitos de ”crime organizado” utilizados por
escolas de polícia do mundo todo. Abordaremos a adaptação criminal do Comando
Vermelho, saindo da prática de roubo a estabelecimentos bancários e partindo para o
tráfico de drogas ilícitas. Faremos uma breve contextualização sobre o tráfico de drogas
no Brasil, percorrendo os caminhos que levaram ao surgimento do tráfico de drogas,
considerado por muitos, até mesmo por algumas autoridades, o grande responsável pelo
aumento da violência. Posteriormente, faremos uma correlação dos artigos e textos
estudados que servirão de sustentação para elucidar se a modalidade “tráfico de drogas
ilícitas” se enquadra no conceito de “crime organizado”.
O que é realmente novo, e isso tem causado grande preocupação, é que o tráfico de
drogas ilícitas, particularmente a cocaína, crack e maconha, vai seguindo a mesma trilha
dos jogos de azar, ou seja, está se transformando em um grande negócio à mercê da
incapacidade, descaso e falta de vontade das autoridades de afrontar esse problema que
afeta a sociedade. (ESPÍRITO SANTO, 2003, p. 131)
Caldeira (1998)2, citado por Lúcio Emílio (2003), lembra que o jogo de azar é uma
atividade ilícita que se tornou a alma de um grande negócio. Lembra ainda que esta
prática se tornou usual no país, sendo aceita de certa forma. Os grandes “bicheiros”
eram pessoas que tinham a fama de intocáveis, pois não eram punidos mesmo
cometendo os ilícitos penais. O tráfico de drogas ilícitas está seguindo pelo mesmo
caminho do jogo do bicho, pois o processo de “aceitação” de práticas delituosas, por
parte da sociedade e por parte das autoridades, acaba banalizando essas atividades,
culminando numa tolerância aos crimes e contravenções.” (ESPÍRITO SANTO, 2003,
p. 132)
Assim como os bicheiros circulavam livremente pelas altas rodas do poder, ligavam-se
ao futebol e às pessoas de influência na sociedade, esse mesmo privilégio está sendo
2
CALDEIRA (1998), “Políticas de Segurança Pública no Rio de Janeiro. Apresentação de um debate
público”.
buscado pelos traficantes. Essa tendência fica muito clara no cinismo com que os
traficantes têm encarado o aparelho repressivo do Estado, principalmente o sistema
prisional. Conhecem e exploram com maestria as falhas, que são muitas, dos sistemas
policial, judicial e prisional. Os traficantes têm procurado intimidar os honestos,
reduzindo-os a quase inação, e aliciar os desonestos, propiciando assim o
funcionamento do negócio do tráfico, que em pouco tempo alcançará aquele status
ambíguo do ilegal-tolerado, mesmo porque “seria até desumano deixar os dependentes
químicos sem papelotes e buchas”. Sob a mesma óptica dos “bicheiros”, muito tem se
falado da impossibilidade de erradicação do tráfico em face do seu valor econômico e
ainda como fonte de “emprego” do jovem morador das comunidades/aglomerados.
Dentro desse prisma, lembra Caldeira (1998), que alguns segmentos chegam, inclusive,
a propor sua despenalização3. A falta de solução para esse grave problema só faz crescer
o medo e conseqüentemente a insegurança.
As atividades econômicas ilegais, que não são poucas, por não terem controles
institucionais, tendem a ser muito lucrativas para certos personagens estrategicamente
posicionados em suas redes de contato que atravessam fronteiras entre os estados
brasileiros e as nações do mundo. Com tanto lucro, fica fácil corromper agentes
públicos e, por serem ilegais, quaisquer conflitos e disputas são resolvidos por meio da
violência. Assim, compreendemos a facilidade com que armas e drogas chegam até
favelas e bairros populares; bem como as mercadorias roubadas – automóveis,
caminhões, jóias, eletrodomésticos – usados na troca com as drogas ilegais, alcançam os
seus destinos finais, os traficantes. A corrupção e a política institucional equivocada,
predominantemente baseada em táticas repressivas dos homens pobres envolvidos nessa
extensa malha, adicionam ainda mais efeitos negativos à já atribulada existência dos
pobres nas cidades brasileiras. (Zaluar, Alba. Artigo digital)4
O combate aos pequenos “aviões”5 não têm um efeito eficaz no combate às drogas. A
repressão sistemática, quando bem planejada e empregada com o devido controle, é
muito importante para a comunidade, pois proporciona a chamada “segurança objetiva”
mas, não se revela eficiente para abalar a estrutura das organizações criminosas e
3
Deixar o tráfico de drogas ser abordado como crime, ou seja, a pessoa não mais seria punida por praticar
o tráfico e drogas ilícitas.
4
http:// www.ims.uerj.br/nupevi/artigos_midia/confianca.pdf
5
Pessoas encarregadas de vender pequenas quantidades de drogas aos usuários. Posto mais baixo na
hierarquia do tráfico de drogas ilícitas.
interromper a prática de homicídios, roubos, ameaças e outros delitos conexos ao
tráfico”. (DPSSP 03/2002)
“Sendo que muitas das vezes esses criminosos encontram nos assaltos e demais crimes
contra o patrimônio a saída para obtenção de dinheiro para pagar o dinheiro devido ao
traficante” (ZALUAR, 2004, p. 59).
Percebe-se que o tráfico de drogas ilícitos é uma modalidade criminal que traz junto
consigo uma série de outros crimes, principalmente, o crime violento contra o
patrimônio e contra a pessoa.
Muito se questiona qual o papel das autoridades frente ao problema das drogas ilícitas.
Paixão (1994)7, citado por citado por Lúcio Emílio (2003), levanta a seguinte questão:
a partir de que momento a ingestão de drogas ilícitas, que a rigor pertenceria à esfera da
moralidade, transforma-se em um problema social? Em resposta a este questionamento,
autores como Ardaillon e Debert, (1987, p. 136), dizem que o uso indevido de drogas
tornou-se um problema público, e conseqüentemente objeto de políticas públicas, por
tornar o dependente químico mais propenso a cometer crimes, resultando no aumento da
criminalidade. (grifo nosso)
6
De acordo com a DPSSP 03/2002 são os efeitos negativos causados pela atuação policial, representando
um aumento na criminalidade em razão das intervenções da Polícia Militar.
7
PAIXÃO, Antônio Luiz. (1994)
“O uso de drogas ilícitas resulta no aumento da violência e criminalidade em geral”.
Chacinas, disputas de ponto de venda, assaltos, prostituição, aliciamento de menores,
contrabando de armas, dentre outros crimes graves, passaram a povoar o cotidiano das
grandes cidades (ARDAILLON e DEBERT, 1987, p. 136).
A organização de grupos criminosos dentro das cadeias do Rio de Janeiro, visando atuar
em uma nova modalidade criminosa, o tráfico de drogas ilícitas, é um marco para a
inserção do Comando Vermelho8 (CV) no mercado varejista das drogas ilícitas. É a
partir daí que temos a escalada da violência armada.
O Comando Vermelho nasceu na prisão e lá continua seu poder até hoje. No fim dos
anos 70, os membros encarcerados do Comando Vermelho começaram a organizar as
atividades criminais (principalmente assaltos a banco e seqüestros) no Rio de Janeiro,
comprando, em seguida, sua liberdade com ganhos ilícitos cuidadosamente introduzidos
nas prisões. Isso coincidiu com a chegada da cocaína, trazida da Bolívia, do Peru e da
Colômbia ao Rio de Janeiro para exportação aos países ocidentais e para consumo local.
Assaltantes de bancos liberados, vinculados ao Comando Vermelho, perceberam os
8
Facção criminosa, provavelmente ainda a mais poderosa facção da droga no Brasil.
grandes lucros que podiam ser auferidos com a venda de cocaína. Assim, realizaram
alguns assaltos a bancos e seqüestros para financiar um movimento organizado rumo ao
negócio do varejo de drogas (AMORIM, 2004).
Esse posto alcançado pelos traficantes é que vem a prejudicar a atuação policial no
combate às drogas, pois, como ele é visto como “dono” do morro, os moradores têm
suas ações controladas por esses criminosos. A coerção exercida pelos traficantes
inviabiliza a colaboração da sociedade, pois esta tem medo de denunciar ou ser
testemunha contra alguém da favela com medo de sofrer represálias, o que muitas das
vezes impossibilita aos órgãos de segurança pública realizar um trabalho eficaz no
combate ao tráfico de drogas ilícitas. (Instrução 002/2004 . Regula atuação do GEPAR).
O dinheiro gerado pela venda da droga tornou-se uma importante fonte de renda, que
estimula o desenvolvimento econômico local dentro das comunidades de favelas, mas a
ampla maioria do lucro não circula na comunidade e vai para o dono da boca e os
matutos9, que geralmente vivem fora da favela. (AMORIM, 1995)
9
Pessoas que levam a cocaína para o coração das favelas que os donos controlam
Verifica-se a mudança do foco das ações do crime organizado. Percebe-se em um
primeiro momento que as organizações criminosas investiam na realização de roubos à
mão armada a estabelecimentos bancários, tendo essa ação como fonte de renda para a
“organização”. Com a introdução da droga no país, nota-se que as formas de atuação do
crime organizado foram mudando, os crimes de roubo à mão armada a bancos foram
sendo deixados de lado, pois, além de ser uma prática extremamente perigosa, os lucros
eram menores dos que poderiam ser alcançados com a venda das drogas ilícitas.
(AMORIM, 2004). Foi então que facções criminosas entraram para o mundo do
comércio de drogas ilícitas, sendo que este comércio ilegal é um dos mais rentáveis de
todo o mundo, segundo o professor de Direitos Humanos da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO), João Dornelles.10
Para estruturar uma rede de venda das drogas ilícitas, quadrilhas hierarquicamente
estruturadas foram implantadas nas favelas para defender pontos de venda e as
comunidades vizinhas contra invasões policiais ou ataques de facções criminosas rivais,
e entre 1984 e 1986 começaram a surgir os primeiros “soldados do tráfico”11
(AMORIM, 1995).
3 O CRIME ORGANIZADO
Para uma análise do processo evolutivo do crime, faz-se necessário entender o que vem
a ser o termo “Crime Organizado”.
Para as Nações Unidas12, organizações criminosas são aquelas que possuem vínculos
hierárquicos, usam da violência, da corrupção, lavam dinheiro e têm a intenção de obter,
direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material.
10
Disponível em: http://www.universia.com.br/html/materia/materia_bfcf.html
11
Geralmente jovens que ficam armados fazendo a “segurança” das bocas-de-fumo para impedir a
invasão de facções inimigas ou mesmo as ações da polícia.
12
http://conjur.estadao.com.br/static/text/58542,1
Os especialistas do Fundo Nacional Suíço de Pesquisa Científica afirmam que existe
crime organizado, especificamente o transnacional, quando uma organização tem o seu
funcionamento semelhante ao de uma empresa capitalista, pratica uma divisão muito
aprofundada de tarefas, busca interações com os atores do Estado, dispõe de estruturas
hermeticamente fechadas, concebidas de maneira metódica e duradoura, e procura obter
lucros elevados. (revista digital Espaço Acadêmico, n°34)
13
http://www.espacoacademico.com.br/034/34coliveira.htm
crime organizado está presente. Portanto, uma das características do crime organizado é
buscar apoio para a sua atuação no âmbito institucional – instituições do Estado. Ao
avaliarmos a história da população brasileira e suas característica cultural, percebemos
facilmente que não é uma prática comum o debate de assuntos relevantes para o
cotidiano nacional. Outro ponto importante é que as ações do crime organizado têm
como engrenagem o sistema capitalista. Por meio dos benefícios do capitalismo, como,
por exemplo, a interação dos mercados financeiros, é possível tornar as atividades das
organizações criminosas bastante lucrativas. A interação dos mercados financeiros
proporciona a lavagem de dinheiro.
Nesse sentido percebe-se que o tráfico de drogas ilícitas preenche vários requisitos para
ser classificado como uma modalidade criminosa que compõe o hall dos crimes tidos
como “organizados”.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
14
Antônio Rafael é doutorando do Museu Nacional/UFRJ
entre os grupos. A logística é voltada para a aquisição de mais produtos a serem
comercializados, bem como de aparato bélico, para a defesa dos pontos de venda de
drogas ilícitas. A produção e venda são setores fortes do tráfico, pois é nesta atividade
que os traficantes irão aliciar pessoal para que realize a venda das drogas. De uma forma
bem simplória o tráfico de drogas ilícitas consegue preencher as características inerentes
dos crimes entendidos como “crime organizado”.
Embora entendamos que há uma certa organização nas atividades criminosas, deve-se
ter cuidado ao referenciar o termo. O tráfico de drogas ilícitas é entendido como “crime
organizado” em relação à sua dinâmica estrutural para realização das atividades ilegais.
Caso as drogas venham ser legalizadas no Brasil, o tráfico de drogas ilícitas passará a
figurar como uma atividade legal, fazendo com que as “organizações criminais”, que
exploram essa atividade, percam seu caráter ilegal, uma das poucas características que
as diferem das organizações formais.
REFERÊNCIAS