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E O LEME
AGRADECIMENTOS
A BÚSSOLA
E O LEME
Editores: Luiz Saegusa e Cláudia Z. Saegusa
Capa: Filipa Pinto e Eduardo Foresti
Projeto gráfico e diagramação: Casa de Ideias
Finalização: Mauro Bufano
Revisão: Rosemarie Giudilli
1ª Edição: 2019
Impressão: Lis Gráfica e Editora
Copyright© Intelítera Editora
SUMÁRIO
19-26385 CDD-158.1
Índices para catálogo sistemático:
1. Desenvolvimento pessoal : Psicologia aplicada 158.1
Cibele Maria Dias - Bibliotecária - CRB-8/9427
PARTE II A NAVEGAÇÃO.....................................................................121
EXERCÍCIO 1 ...............................................................................................................123
EXERCÍCIO 2 ...............................................................................................................123
A natureza soberana
01
Olhai as aves do céu que
não semeiam, nem ceifam…
Os dias são curtos, e as noites são mais longas. O ver- bem harmonia e previsibilidade. Sem esses padrões, não
de e as cores brilhantes parecem esconder-se em algum seria possível o conhecimento humano, muito menos a
local secreto, invisível. O inverno reina soberano. Tem- ciência.
-se a impressão de que chegou para nunca mais partir. Tudo se move e se altera no momento certo.
Há certa magia no recolhimento, quando tudo apa- Nessa coreografia das quatro estações, cada período
rentemente parece repousar. Em meio à quietude, for- desenha seu traçado, seu movimento, seu ritmo próprio.
ças latentes da Natureza se preparam para ciclo novo É necessário bailar em sintonia com a música. É o que
e promissor. fazem os moradores da ilha, desde os Esquimós aos Ur-
Esse segredo, entretanto, pede um olhar atento, in- sos Polares. Eles se adaptam o máximo que podem, mu-
quieto e inquiridor. É preciso “olhos de ver”. Nem tudo dando hábitos e expectativas.
permanece cinzento, algo escapou do gelo. Luzes verdes Entretanto, nem sempre é possível ficar…. Alguns mi-
e vermelhas dançam no céu ao anoitecer. É a Aurora gram para longe. É necessário sobreviver! Navegadores
Boreal que, em contraponto à nevasca, anuncia seu lu- antigos tinham uma frase gloriosa:
minoso e espetacular balé, clamando em alto e bom som
Navegar é preciso, viver não é preciso
que há algo mais por trás da geleira. Na verdade, por de-
Quero para mim o espírito desta frase, transformada
trás da tempestade há sempre uma dança de luzes. Ven-
A forma para a casar com o que eu sou: Viver não
tos, tempestades, gelo e neve, frio e escassez nos fazem
é necessário; o que é necessário é criar.
ter calafrios, literalmente, mas são cíclicos. Dificuldades
Fernando Pessoa1
e obstáculos, sofrimento e perda sempre foram descritos
com o auxílio da metáfora do inverno. Entretanto, eles
Deslocar-se com senso de direção e sentido, oportuni-
também são cíclicos.
dade e conveniência, estratégia e performance, de modo
a poder viajar e regressar em segurança tem nome e se
O inverno não dura chama: MIGRAÇÃO.
para sempre.
1 No Século I a.C, o general romano Pompeu encorajava marinheiros receosos,
inaugurando essa frase “Navigare necesse, vivere non est necesse”. No Século XIV, o
A Lição? Na Natureza, tudo obedece padrões de re-
poeta italiano Petrarca transformava a expressão para “Navegar é preciso, viver não
gularidade e ordem, que podem ser observados e men- é preciso”. Fernando Pessoa se apropriou da frase para criar seu belo poema. Segun-
do a Universidade de Coimbra: “Viver não é preciso? Não, quando navegar é sonhar,
surados com precisão. Todos os elementos naturais exi- ousar, planear, arriscar, empreender, realizar… Porque aí, navegar é viver”.
12 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A natureza soberana 13
O seu grito evoca, para muitos habitantes, o último Antártida, e retornam ao ponto de origem, percorrendo
sinal de um longo inverno, bem como o início do ve- em média 71.000 km.
rão, com o retorno modesto do sol, acompanhado de Perto da linha do Equador (10 N), há uma divisão
pequena elevação das temperaturas. Eis que é chegado o na rota de migração: algumas aves seguem ao longo da
Verão, pois “depois da tempestade sempre vem a bonan- Costa da África, enquanto outras se dirigem à Costa da
ça”. A voz amiga e esperançosa do pequenino pássaro América do Sul. O retorno para a região de reprodu-
apazigua as angústias. ção na Groelândia é realizado com espantosa rapidez,
O seu canto tem sabor de esperança.
em média 520 km/dia, aproveitando a rota dos ventos
Há na Groelândia até mesmo uma tradição popular, um
favoráveis.
dos destaques da temporada de verão, que é o ritual da co-
Em sua migração para o Sul, fazem uma parada de
lheita dos ovos dessa Andorinha, guardados como símbolo
quase um mês nas águas rasas do Atlântico Norte. Uti-
da estação de veraneio, verdadeira festa folclórica Nórdica,
aclamada pelos populares, embora não muito bem vista pe- lizam essa região de alta produtividade biológica, de-
las Andorinhas nem pelos biólogos. corrente da intensa reprodução de zooplânctons e da
A Andorinha-do-Ártico é, igualmente, símbolo da migração em massa de peixes, como ponto de abasteci-
migração de longa distância – a mais longa migração mento em pleno mar.
anual já registrada em qualquer animal. Nenhuma outra A viagem para o polo Sul dura em média três meses,
espécie conecta as duas regiões polares, empregando tão e as andorinhas atingem velocidade média de 330 km/
sofisticada estratégia, quanto esse pequeno pássaro. dia. Já o percurso de volta, para as áreas de reprodução
Ela atravessa vastas regiões marinhas, experimenta no norte, é bem mais rápido, dura aproximadamente
bruscas mudanças no meio ambiente, vence enormes 40 dias, e os pequenos pássaros voam com velocida-
desafios, mas sabe aproveitar as oportunidades que sur- de média de 520-670 km/dia, aproveitando os sistemas
gem nos locais de reprodução, onde encontra alimenta-
eólicos globais predominantes no período.
ção e abrigo.
Embora seja pequenina e leve, a Andorinha-do-Ártico é
Quando se sabe a direção
uma heroína, absolutamente comprometida consigo mes-
ma e com os seus. e o sentido, há sempre
Saindo das colônias reprodutivas da Groelândia, elas ventos favoráveis.
se dirigem ao Sul, em direção ao Mar de Weddell, na
16 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A natureza soberana 17
O quadro esquemático dessa migração nos revela fina A primeira migração é feita com os pais, na compa-
sintonia entre a Andorinha-do-Ártico e os elementos cí- nhia do grupo, ocasião em que incorpora um elemen-
clicos da Natureza: Estações, Clima, Ventos, Correntes to fundamental para o sucesso da jornada, a memória
Marítimas. Além disso, ela possui um profundo senso de geográfica. Trata-se do aprendizado e memorização dos
localização e deslocamento. locais importantes do percurso, utilizados com bastante
regularidade por todas as aves da espécie.
A imensa adaptabilidade dessa pequenina ave, e a
extraordinária disposição em cruzar o planeta de uma
1o de Junho à
1o de Agosto
ponta a outra, em busca de melhores condições de vida,
sem se prender aos obstáculos e adversidades do percur-
1o de Setembro so, e sem ficar apegada ao ponto de origem, representam
lições profundas para todos nós.
Quando dirigimos nosso olhar para os seres huma-
nos, encontramos o mesmo gênero de desafios, mas nem
sempre a mesma atitude da andorinha.
Vemos a estação do frio invadindo periodicamente
nossas vidas. Contemplamos as tempestades, mudanças
1o de Maio
bruscas, deslocando tudo e a todos. Experimentamos a
escassez e a penúria invadindo e dominando onde an-
1o de Novembro
tes era verdura e abundância. Após um arco-íris de ale-
grias, surge o tom cinzento que aniquila, em parte, as
1o de Novembro
esperanças.
Nessas horas desafiadoras, a espécie humana é sur-
1o de Dezembro preendente, tanto na inércia quanto na atividade. Ao
à 1 de Abril
lado das disposições mais corajosas de resistência e luta,
encontramos a desilusão, a amargura e, infelizmente,
em alguns casos, até mesmo a desistência do próprio
ato de viver.
18 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS
02
O que faltaria ao Ser Humano para lidar com a cíclica
estação da invernada?
Qual a direção a tomar, quando o local onde nos si-
tuamos ameaça nossa sobrevivência física ou psíquica?
Somos também portadores de inato senso de direção e
sentido?
Como ativar esses potenciais no momento adequado?
A vida é sempre uma balança tentando equilibrar o Os ciclos da vida
desagradável e o agradável em perfeita sincronia. Quase
nunca tudo está bom.
Por outro lado, todo período difícil e desafiador tem
data certa para terminar. É o que nos diz a história da Cada homem possui, com a existência, uma série
Andorinha-do-Ártico, em seu longo percurso migrató- de estações e uma relação de dias, estruturada em
rio, verdadeira metáfora da vida humana. precioso cálculo de probabilidades. Razoável se
O seu voo audaz é portador de valiosa mensagem. Eis torna que aproveite a primavera da mocidade, o
a lição: verão das forças físicas e o outono da reflexão, para
a grande viagem do inferior para o superior.
Em muitas ocasiões, (Emmanuel)
o melhor a fazer é
A Andorinha-do-Ártico vive em média 30 anos. No
simplesmente MIGRAR curso da sua vida, suas migrações podem somar 2,2 mi-
lhões de quilômetros. Isso é suficiente para ir e voltar
três vezes à lua, ou dar 60 voltas ao redor da Terra. É um
feito impressionante para um pássaro com pouco mais
de 100 gramas.
Refletindo um pouco, chegamos à conclusão de que a
pequenina Andorinha não somente experimenta os ciclos
da natureza, as estações, os ventos… sua própria vida é
um ciclo natural que finda ao cabo de trinta viagens.
20 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS Os ciclos da vida 21
O ciclo da sua vida biológica tem começo, meio e fim. Para um cientista, o tempo não possui significado pes-
O contato e o aprendizado desses ciclos e padrões de soal. Ele é matemático e linear – passado, presente e fu-
regularidade da Natureza podem ser, igualmente, encon- turo. No entanto, um filósofo como Bergson2 compreen-
trados, na história do próprio Ser Humano. deu o tempo como “duração”, algo experimentado pela
Nos primórdios da Humanidade, vivíamos como ca- mente, e mostrou que a nossa experiência do tempo é
çadores-coletores. Nossa compreensão da Natureza era subjetiva – um minuto pode parecer uma hora, ou uma
muito limitada. Predadores ferozes, mudanças climáti- hora pode parecer um minuto, de acordo com a nature-
cas ou condições meteorológicas nos subjugavam com- za do que foi vivido naquele momento específico.
pletamente. A busca por alimento e pela sobrevivência Seguindo essa abordagem, o psicólogo Carl Gustav
estava à mercê dos caprichos da sorte. Jung, tratando do seu princípio de sincronicidade, julgou
Depois de muito fugir, muito lutar, o Homo Sapiens oportuno atribuir qualidade particular a cada momento
começa a observar. Desenvolve uma habilidade inesti- do tempo, e essa qualidade ou significado, segundo ele,
mável: aprende a reconhecer e a utilizar padrões. geralmente seria percebida de modo muito particular
Os padrões das estações do ano o levam a realizar o por cada pessoa. Assim, ele concluiu que o tempo não
plantio de determinadas culturas no momento adequa-
transcorre em vão. Percebeu que o tempo guarda consi-
do, dando surgimento à agricultura. A compreensão do
go o significado, o propósito, a experiência.
padrão biológico de algumas espécies animais o levam à
Ao meditarmos sobre o tema, somos obrigados a re-
domesticação e ao pastoreio.
conhecer que todas as atividades humanas são estru-
Aldeias e cidades, civilizações e impérios puderam as-
turadas pelos ciclos diários, mensais e anuais, mas fre-
sim florescer graças à habilidade humana de reconhecer
quentemente nos esquecemos de que nossa vida em si,
padrões. Uma importante lição foi absorvida:
vista como um todo, é também um ciclo que mais dia
menos dia chega ao final…
Obtemos resultados quando
Compartilhamos com as Andorinhas o destino de vi-
fazemos a coisa certa ver uma série de estações e uma relação de dias. Nossa
no momento certo. Ninguém existência física possui igualmente princípio, meio e fim.
planta no inverno, ninguém 2 Henri Bergson foi um filósofo e diplomata francês, de origem judaica, autor da
colhena estação chuvosa. célebre obra “A Evolução Criadora”, na qual desenvolve sua peculiar noção do
tempo.
22 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS Os ciclos da vida 23
As tradições espirituais e religiosas que floresceram O quadro abaixo detalha a primeira divisão do ciclo
na China milenária, na Índia, e nos povos do Crescente da vida humana:
Fértil3 guardam, todas elas, histórias, ensinos e filosofias
a respeito do tempo e seus ciclos. Observando a Nature- TABELA DO CICLO DA VIDA - AS QUATRO ESTAÇÕES
za, seus padrões e regularidades, essas filosofias propor- PRIMAVERA OUTONO
Isso explica, em parte, a crise da meia-idade, sentida Após um período simbólico da Lua cheia, tem início
ou experimentada por volta dos 42 anos. É como se o a fase descendente, metade minguante do ciclo da vida.
indivíduo tivesse um pressentimento de que o outono se Os desafios dessa segunda metade da vida são todos eles
avizinha. introvertidos, exigindo “reavaliação” e “regeneração”
A metade minguante da vida é tão cheia de significado de todos aqueles valores apreciados e cultivados na pri-
quanto a metade crescente, mas o significado muda. O psi-
meira metade do ciclo. Esses valores perdem seu caráter
cólogo Carl Gustav Jung expressou essa mudança com as
absoluto.
seguintes palavras: “(…) as pessoas que estão envelhecen-
Muitos problemas psicológicos que surgem nessa se-
do deveriam saber que suas vidas já não estão crescendo
gunda metade decorrem daquilo que ficou incompleto,
e se expandindo, mas que um inexorável processo interior
força a contração da vida. Se para um jovem é perigoso ou foi omitido durante a primeira metade. É natural que
preocupar-se excessivamente consigo mesmo, para a pes- esses elementos voltem à tona, exigindo nova aborda-
soa que está envelhecendo é um dever e uma necessidade gem. Por essa razão, desenvolvemos o quadro abaixo
dedicar séria atenção a si mesma (…). O ser humano cer- que fornece detalhamento da segunda divisão do ciclo
tamente não alcançaria os setenta ou oitenta anos se esta da vida humana:
sua longevidade não tivesse significado para a espécie.”
(The Stages of Life, p. 399)
Na juventude, a onda ascendente da vida é basica-
mente extrovertida. É uma época de crescimento e ex- NÍVEL AFETADO
NÍVEL PSÍQUICO-ESPIRITUAL
pansão em todos os níveis de desenvolvimento humano: 6 35 - 42 42 - 49 7
Nesse modelo, é fácil compreender que os eventos, os mentos sistêmicos presentes na família (constelação fa-
acontecimentos exteriores possuem importância mais miliar), do meio ambiente onde a criança se desenvolve,
ou menos relativa, variando de pessoa para pessoa, pois dos elementos caracterizadores da geração na qual ela
dependem do contexto e do “fator idade”. nasceu e de suas características inatas.
A idade é o recipiente, a vasilha na qual estão contidas Os nutrientes físicos (carboidratos, proteínas, vitami-
as experiências da vida. Eventos semelhantes, ocorridos nas e sais minerais) e os nutrientes emocionais (amor,
em diferentes fases da nossa vida, apresentam significa- estímulo, apoio, proteção), recebidos nesse período, te-
dos completamente diferentes. Por exemplo: perder-se
rão forte impacto na formação dessa estrutura biológica
em um shopping center com a idade de 7 anos, ou com
e psíquica. Da mesma forma, a ausência ou insuficiência
a idade de 21 anos não possuem o mesmo significado.
deles terá forte impacto no psiquismo do indivíduo.
Assim, a idade da pessoa na ocasião em que ela expe-
Em verdade, tudo aquilo que ocorrer neste período
rimentou o evento é fundamental para a construção do
deixará suas marcas profundas.
significado daquela experiência.
O Tema Central desse período é: AUTONOMIA FÍSI- O Tema Central desse período é: AUTOAFIRMA-
CA, ORGÂNICA. ÇÃO, AUTOEXPRESSÃO.
Nessa fase, ocorre o desenvolvimento do corpo, de Nesse período, ocorre a formação do EGO conscien-
seus órgãos e de seus reflexos psíquicos, de modo que a te, o desenvolvimento do sentimento do EU. Inicia-se a
criança possa viver feito um ser independente. A criança existência verdadeiramente pessoal, e a criança passa a
aprende a comer, a andar e a se vestir sozinha. Aprende a apresentar ações e reações cada vez mais definidas, cada
falar, a ler, a escrever e desenvolve um raciocínio compa- vez mais individuais, nas quais ela testará seus poderes
tível com a aritmética simples. Recebe, igualmente, seus pessoais por meio de uma autoexpressão ativa.
valores e crenças básicas, oriundos do ambiente familiar. O princípio da individualidade, o EU, começa a ope-
O material (substância) que será utilizado para a rar mais vigorosamente dentro do organismo, à medida
construção dessas estruturas é proveniente da heredi- que a criança começa a falar de si mesma cada vez mais
tariedade (biológica, familiar e sociocultural), dos ele- na primeira pessoa: Eu quero, eu sei, eu consigo...
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No final desse período, esboça-se a adolescência, mo- 4. Nível sociocultural ascendente (21 – 28 anos)
mento em que o indivíduo passa a expressar sua resis-
O Tema Central desse período é: INSERÇÃO SO-
tência às limitações impostas pelos pais, professores, au- CIAL E CULTURAL.
toridades, com o objetivo de se afirmar e delimitar seu Nessa fase, há um imenso esforço para emergir da
espaço individual. família, para se separar psiquicamente das influências
predominantes no ambiente familiar, bem como para se
3. Nível mental e emocional ascendente (14 – 21 anos) libertar das pressões do ambiente social.
Ocorre a formação da vida adulta, que pode ser mar-
O Tema Central desse período é: SEXUALIDADE e cada pela escolha da companhia afetiva, pelo desenvol-
RELACIONAMENTO. vimento de mais senso de responsabilidade nas relações,
Nessa época, ocorre o desenvolvimento mais intenso assim também pela preparação para o ingresso no mer-
das faculdades emocional e mental, acompanhada da cado de trabalho. Há, muitas vezes, preparação para o
explosão da sexualidade, de um despertar para relacio- casamento e constituição da própria família.
namentos afetivos mais íntimos. Em regra, percebe-se que esse período é marcado
Surge a crise da puberdade e um forte desejo de se pelo desejo de se inserir no mundo profissional, comer-
unir a grupos, amigos, parceiros afetivos, bem como cial e cultural do seu tempo, necessidade de se enqua-
às instituições culturais e/ou religiosas da sociedade. drar na vida da comunidade. Surge o anseio de atender
às expectativas dessa mesma comunidade no que diz
É momento propício para o surgimento do amor ide-
respeito à profissão, relacionamento, conquistas eco-
alizado, romantizado, projetado. Surge, do mesmo
nômicas, religião.
modo, a percepção de que os pais são adultos falíveis,
imperfeitos.
Ocorre, ainda, ampliação dos horizontes e dos in- 5. Nível individual ascendente (28 – 35 anos)
teresses do indivíduo, com o descobrimento do seu O Tema Central desse período é: DESCOBERTA E
posicionamento profissional, social, político. É o pe- EXPRESSÃO DA PRÓPRIA IDENTIDADE.
ríodo da educação mais avançada, do aprendizado da Nessa fase, o indivíduo começa a perceber a contri-
responsabilidade social, da preparação profissional, do buição pessoal que pode dar à vida, à sua comunidade,
ingresso ao ensino superior. ao seu tempo. Surge igualmente o anseio de afirmar e
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expressar sua verdadeira individualidade. Ocorre a for- Pode surgir a necessidade de decidir claramente o que
mação da identidade individual. fazer da vida e ocupar seu próprio lugar, assumindo os
A pessoa compreende neste período que cada indiví- anseios mais profundos.
duo, em potencial, é uma resposta única a uma necessi- Trata-se da crise da meia-idade, momento em que o
dade do seu tempo. Por isso, é preciso compreender qual externo enfrenta o interno, produzindo tensão e autoco-
o significado original e pessoal da sua própria vida, do nhecimento.
seu destino singular. Por outro lado, sente também desejo
de usar o legado do passado (hereditário, familiar, espiri- 7. Nível psíquico espiritual descendente (42 – 49 anos)
tual) e pode experimentar uma crise de identidade.
O Tema Central desse período é: BUSCA PELO SEN-
TIDO DA VIDA.
6. Nível psíquico espiritual ascendente (35 – 42 anos)
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos no
O Tema Central desse período é: CRISE EXIS- período de 35 – 42 anos.
TENCIAL. A mente ingressa no outono da vida, o que evoca to-
Nesse momento, a individualidade experimenta a cul- das as características dessa estação. Tem início o pro-
minância dos talentos físicos e pessoais. Normalmente, cesso de introversão. O interno passa a ser confrontado
questões de relacionamento, profissão, inserção social, pelo indivíduo. Assim, surge a necessidade de descobrir
sexualidade já foram de alguma forma vivenciados, de o verdadeiro significado e o valor de tudo o que foi vivi-
modo positivo ou negativo. do e construído até aquele momento.
Nessa fase, a mente atinge um platô, com a estabili- Em geral, surge a necessidade de encontrar valor pes-
zação da atividade externa, extrovertida, acompanhada soal para os relacionamentos, sem motivações extroverti-
de certo anseio indefinido de confrontar os aspectos in- das, como aparência, carências; e sem as pressões sociais,
teriores, íntimos. A pessoa tem a nítida sensação de que especialmente da família.
haverá mudança de sentido no fluxo da vida, mudança de Uma corrente psíquica subterrânea percorre todo esse
polaridade: o movimento que se dirigia para o exterior, período – uma sensação de última chance. Se a pessoa
inevitavelmente, será conduzido para o interior. for resistente à mudança, ela pode tentar fugir para um
Inconscientemente, inicia-se uma preparação para o mundo de sonho, ou se afundar no trabalho, nas ativi-
ingresso no Outono da vida. dades sociais.
32 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS Os ciclos da vida 33
O indivíduo percebe o desaparecimento da geração Retorno da questão de como usar o legado do pas-
dos seus pais, e o envelhecimento da sua própria gera- sado. Pode haver nesse período uma cristalização, em
ção. A reação natural é a negação, ou a tentativa de pro- virtude da crença: “Estou velho demais para mudar”.
longar a juventude imitando os jovens do seu tempo. Necessidade de encarar as crises e tragédias que a
À medida que a vitalidade física começa a declinar, vida trouxe, a fim de extrair sabedoria, sem se deixar
porém, há um desenvolvimento complementar dos po- paralisar pelos traumas, pelas expectativas não atendi-
deres internos. das, pelas frustrações.
Somente nas vidas em que o medo e a aflição emocio-
nal impedem a pessoa de mudar suas atitudes, fazendo 9. Nível sociocultural descendente (56 – 63 anos)
com que ela se rebele insensatamente contra o processo
O Tema Central desse período é: REINSERÇÃO SO-
de envelhecimento, somente nesses casos é que a mente
CIAL E CULTURAL.
também se cansa. Na verdade, é o EGO que se cansa.
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos no
8. Nível individual descendente (49 – 56 anos) período de 21 – 28 anos.
Nessa fase, o indivíduo tem segunda oportunidade de
O Tema Central desse período é: REVISÃO DA reorientar e transformar seus relacionamentos humanos,
IDENTIDADE. em geral, bem como seu posicionamento na sociedade
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos no em que vive. Transcorrido o período de revisão da sua
período de 28 – 35 anos. identidade (49 – 56 anos), ele agora pode se ver melhor,
Percebendo claramente o declínio da vitalidade física, e consequentemente ampliar a sua visão dos outros e do
o inexorável processo de introversão, e os sinais incon- mundo. A partir dessa nova percepção do outro e de si
testáveis do outono da vida, o indivíduo experimenta mesmo, torna-se possível escolher com maturidade e sa-
profundo anseio por regeneração, purificação, e limpeza. bedoria novo tipo de participação na sociedade, em suas
Há um retorno das questões de identidade, do destino instituições, com uma visão mais crítica dos costumes,
singular, da contribuição pessoal ao mundo, forçando a crenças e limitações da sua comunidade.
pessoa a se redesenhar, a se reinventar. É uma espécie de Muitas pessoas se tornam, nesse período, mais sen-
redescobrimento da própria identidade, mas dessa vez síveis às necessidades coletivas, sentem necessidade de
com um grau de maturidade mais refinado. oferecer uma contribuição mais permanente, mais dura-
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doura. Por esta razão, seu posicionamento profissional, Pode haver também o ressurgimento do amor roman-
comercial, cultural, religioso costuma sofrer profundas tizado, idealizado, projetado da adolescência, como ten-
alterações ou reavaliações, tendo em vista o anseio de tativa de resgatar a juventude perdida.
deixar uma marca perene no mundo. Em indivíduos mais maduros, ampliam-se os horizontes
O relacionamento íntimo e o familiar são também e os interesses, com reflexos em sua vida pessoal, social,
afetados por essas mudanças internas. Muitos buscam política, religiosa.
atividades religiosas, culturais, trabalhos comunitários
como veículos para expressão dessas necessidades.
11. Nível psicológico descendente (70 – 77 anos)
10. Nível mental e emocional descendente (63 – 70 anos) O Tema Central desse período é: NECESSIDADE IN-
TENSA DE ATENÇÃO E ADMIRAÇÃO.
O Tema Central desse período é: CRISE DA SEXUA-
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos no
LIDADE e DO RELACIONAMENTO.
período de 7 – 14 anos.
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos no
Nesse período, a individualidade SELF confronta o
período de 14 – 21 anos.
EGO, mergulhando a pessoa no oceano das recordações
Nessa época, o declínio da vitalidade torna-se mais
intenso, se comparado com as fases anteriores, com ex- da sua infância, juventude e maturidade, como movi-
pressivas mudanças fisiológicas, psíquicas e sociais, in- mento psíquico de síntese, de resumo, de reavaliação
cluindo marcas acentuadas do envelhecimento. Essas construtiva. Surge, assim, a necessidade de falar de si
mudanças afetam profundamente a sexualidade, e con- mesmo, contar histórias do passado, ressignificar acon-
sequentemente o relacionamento afetivo do indivíduo, tecimentos vividos, reavaliar a infância e o papel dos
áreas que precisam de novo significado. É o ingresso no pais na vida.
inverno da vida. Pode também ocorrer uma cristalização de atitudes
Se no período de 14 – 21 anos surgiu a crise da puber- com a retomada de posicionamentos típicos, represen-
dade, nesse momento a energia sexual sofre mudanças tados pelas frases: Eu quero, eu sei, eu consigo… muito
significativas, assumindo formas criativas e despertando similares ao período correspondente (7 – 14 anos).
forte desejo de se unir a grupos, amigos, instituições cul- A necessidade de se afirmar e delimitar seu espaço in-
turais, religiosas. dividual agora deverá confrontar, nas marcas irrecusá-
36 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS Os ciclos da vida 37
veis do inverno da vida, encarando de forma criativa o graus acima expostos. No entanto, esse estudo é muito
chamado interior ao recolhimento e à reflexão. interessante, mas não será feito nesse momento.
O Tema Central desse período é: LIMITAÇÃO FÍSI- No primeiro capítulo, nosso objetivo era observar e
CA, ORGÂNICA. compreender os padrões de regularidade da Natureza,
Trata-se da fase introvertida dos processos vividos aprender a arte da migração, tomando por modelo a
no período de 0 – 7 anos. maratonista ideal – a Andorinha-do-Ártico. Nossa meta
Nessa fase, a fragilidade do corpo, dos seus órgãos e era aprender a enfrentar os períodos de crise e desafio
com mais habilidade e sabedoria.
dos reflexos psíquicos força o indivíduo a redefinir sua
Nesse capítulo, nossa intenção foi demonstrar que,
essência e seu valor a partir de novas premissas que não
antes de iniciar o planejamento de qualquer viagem, um
sejam exclusivamente materiais, orgânicas, corporais.
bom piloto sempre se pergunta: Quanto tempo de voo?
A demanda por nutrientes físicos (carboidratos, pro-
A vida humana é também uma desafiadora viagem.
teínas, vitaminas e sais minerais), e os nutrientes emo-
Sendo assim, qualquer planejamento deve levar em con-
cionais (amor, estímulo, apoio, proteção) é mais inten- ta a idade e a fase específica (fator idade) na qual nos
sa, acarretando maior ou menor grau de dependência encontramos. Tudo o que fizermos será feito dentro des-
dos familiares ou cuidadores. sa moldura básica – o fator idade. Todas as “viagens”,
Em virtude do aprofundamento da estação do inver- “migrações” ou “deslocamentos” devem levar em conta
no, a morte passa a ocupar os pensamentos e reflexões, esses ciclos presentes na vida humana.
do mesmo modo a ideia da imortalidade, da sobrevi- Nosso maior compromisso, sem dúvida, deve ser o de
vência, reforçando o processo de interiorização. nos tornarmos, o mais plenamente possível, aquilo que
Muitas pessoas, com o avanço atual da ciência e da somos potencialmente. Todavia, a duração de nossa vida
medicina, ultrapassam os 84 anos de idade, levando- representa elemento determinante: a vida física possui
-nos a refletir que, nesses casos, o processo se reinicia- começo, meio e fim.
ria, em outro patamar, mas percorrendo os mesmos de- Desse modo, todas as decisões importantes ou pontos
decisivos da nossa vida podem ser avaliados em função
38 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS
03
do fator idade, que fornece uma dimensão adicional, um
significado mais pessoal, um significado que está acima e
além do próprio evento em si.
Diversas experiências podem ser examinadas em fun-
ção da idade na qual o indivíduo passa por elas: o casa-
mento, o divórcio, a profissão, doenças graves, a perda
do pai ou da mãe, o nascimento dos filhos, conversões
religiosas, engajamento social.
A consciência cocriadora
Nesse exame, percebemos claramente que a tabela dos
ciclos da vida, em função da idade, fornece uma moldura
básica dentro da qual os acontecimentos, eventos, circuns-
tâncias serão experimentados e receberão um significado
por parte do indivíduo. A principal tarefa do homem na vida
O fator idade não revelará o sucesso ou fracasso de um consiste em dar à luz a si mesmo,
empreendimento, ou se um evento terá ou não um final em se tornar aquilo
feliz, até porque essa avaliação é muito subjetiva; o que o que potencialmente ele é.
fator idade indica é o papel que o evento desempenhará no (Erich Fromm)
desenvolvimento total da vida de um indivíduo.
Esse fator idade nos ajuda a compreender que cada
Aprendemos que o voo migratório da Andorinha-
existência humana é uma jornada estruturada, repleta de
sentido, e cada acontecimento é um elemento que integra -do-Ártico exige apurado senso de orientação e nave-
essa teia de significado. Há, porém, o dia da chegada e o gação. Afinal, ninguém vence anualmente 71.000 km
dia da partida. sem habilidades e faculdades especiais.
Ela conta com múltiplos recursos sensoriais que lhe
fornecem indicações seguras sobre localização, inten-
sidade e duração diária da luz solar, movimento das
estrelas, fases e ciclos da Lua, ciclo das correntes marí-
timas, diferentes odores no ar, referenciais geográficos
no solo, e o surpreendente mecanismo que a torna ca-
40 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 41
paz de enxergar as linhas do campo geomagnético do atravessam o período de crise, outras superam essa
planeta. fase, saindo renovadas e transformadas das reviravoltas
Para que tantos recursos? Com qual finalidade esses re- e conflitos da vida. Para uns a crise representou perigo,
cursos são acionados nessa pequenina ave logo após seu para outros oportunidade.
nascimento? Qual fator externo serve de gatilho para que Qual a diferença? Por que as pessoas reagem de ma-
tudo isso venha à tona? neira tão peculiar?
Uma resposta direta e simples? O INVERNO. Evidentemente, é bastante humano recuar diante de
situações dolorosas, desejar ardentemente que tudo vol-
A migração é uma te a ser do jeito que era antes, ou simplesmente recusar
a mudança.
resposta à crise No entanto, podemos alterar nossa leitura dos acon-
do inverno. tecimentos, e compreender a crise como uma virada, um
estágio ou degrau crítico do nosso desenvolvimento – a
Esse deslocamento não precisa ser, necessariamente,
possibilidade de algo novo acontecer, a transformação.
físico. Pode ser um deslocamento psicológico, uma mu-
Albert Schweitzer4 disse certa vez: “A maior descober-
dança de mentalidade, mudança de emoções, nova leitu-
ta de qualquer geração é a de que os seres humanos po-
ra sobre a vida e sobre nós mesmos. Mas é sempre uma
dem alterar suas vidas alterando suas atitudes mentais.”
mudança.
De modo semelhante às aves migratórias, o Ser Hu-
No vocabulário chinês há uma sábia palavra para no- mano também vem equipado com uma série de recursos
mear crise: Wei-Chi, uma combinação de duas outras biológicos, psíquicos e anímicos que o torna apto a en-
palavras, perigo Wei e oportunidade Chi. frentar, ao longo de sua vida, imenso conjunto de situa-
Sabemos que é impossível viver profundamente sem ções muito mais complexas do que aquelas enfrentadas
experimentar dor, sem atravessar tempos de crise, colap- pelas Andorinhas.
so, mudança ou ruptura. Embora tudo isso seja inevitá- O que, então, nos paralisa, nos bloqueia?
vel, nem sempre somos capazes de perceber o papel que
a crise e a dor desempenham no processo de crescimento
4 Albert Schweitzer nasceu na Alsácia em 1875. Tornou-se teólogo, filósofo, músico
e evolução do indivíduo. e humanista. Em sua época, foi considerado um dos maiores intérpretes de Bach no
Por esta razão, enquanto algumas pessoas desabam órgão. Publicou renomadas obras teológicas, incluindo uma historiografia de Jesus.
No entanto, seu trabalho humanitário na África seria sua grande marca, dado o
completamente e nunca mais se recuperam quando desprendimento e dedicação com que foi realizado.
42 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 43
Acreditamos que duas coisas: primeiramente, estamos mais concretas, mais objetivas e, às vezes, mais dolorosas,
excessivamente focados no exterior; em segundo lugar, para chegar ao mesmo grau de compreensão.
temos muito pouco autoconhecimento. Há outro aspecto de nossa atitude que também preci-
Examinemos o excessivo foco no exterior. sa ser analisado: os eventos e circunstâncias que a pes-
Há um ditado espiritualista que afirma: “Não é o soa enfrenta ao longo de sua vida dependem, em grande
evento que acontece à pessoa, mas a pessoa que acon- parte, daquilo que ela frequentemente expressa, exterio-
tece ao evento”. Um indivíduo se encontra com deter- riza. Em outras palavras,
minados eventos porque necessita deles para se tornar
mais completo. Nesse sentido, a vida se desdobra diante você recebe de volta aquilo que põe
dos nossos olhos, mas também desdobra dentro de nós para fora, pois todas as coisas voltam
aquilo que ainda não pode ser visto, aquilo que existe
em estado potencial.
para sua fonte.
Nessa perspectiva, os eventos e circunstâncias exterio- Se alguém expressa impaciência ou orgulho, por
res apenas interagem com nossos anseios inconscientes exemplo, automaticamente fará surgir reações seme-
de completude. A vida colabora, nem sempre de modo lhantes nas pessoas ao seu redor. Nesse sentido, não é
agradável, para que nos tornemos efetivamente aquilo saudável culpar os outros pelos infortúnios que criamos.
que somos apenas em potencial. Por essa razão, examinaremos agora a questão do “co-
Em resumo, nós atraímos as coisas necessárias ao nhece-te a ti mesmo”.
nosso crescimento. Quando o assunto é autoconhecimento, todos são
Por outro lado, nossa atitude diante da dor e da crise unânimes em ressaltar a sua importância. A maioria das
afetam profundamente o modo pelo qual atravessare- pessoas, porém, se sente feito um adolescente que entra
no seu quarto todo revirado, com tudo fora de lugar, e
mos tais períodos.
se pergunta: Por onde começar?
Para uma pessoa altamente consciente, basta uma pe-
Nossas mães diriam: cada coisa em seu lugar, uma
quena sugestão, um evento simples, uma experiência cor-
coisa de cada vez. No entanto, quando se trata de au-
riqueira, a fim de que ela aprenda determinada lição, ou
toconhecimento, a dúvida a respeito de “por onde co-
alcance certa compreensão da situação. Alguém menos
meçar” é legítima e revela um grande desafio tanto na
consciente, porém, necessita de experiências exteriores filosofia quanto na psicologia.
44 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 45
O próprio Sigmund Freud declarou a Hereward Car- A imagem dessa máquina ilustra bem os seus re-
rington, no verão de 1921, ao aproximar-se do fim de cursos.
sua carreira: “Se eu fosse viver de novo, eu me dedicaria
à pesquisa psíquica mais do que à psicanálise” (Jones, LOCALIZAÇÃO DE SUPERFÍCIES DE CONTROLE DE VOO
Ernest; “A Vida e a Obra de Sigmund Freud”, vol III, REDUTOR
DE ARRASTO
Rio de Janeiro, Imago Ed., 1989, p.384).
A imensa quantidade de teorias psicológicas, de teo- FLAPS
rias sobre a natureza humana, de abordagens filosóficas,
tudo isso acaba por dificultar os planos modestos de al-
guém que quer apenas aumentar seu grau de conheci-
mento sobre si mesmo.
Nosso propósito, porém, é bem modesto. Desejamos FLAPS
SLETS
apenas um mapa, um inventário dos potenciais, das fun-
ções psíquicas, das necessidades e anseios humanos, de
modo a favorecer o nosso tão sonhado autoconheci- LEME DE
DIREÇÃO
SPOILERS DE SOLO
mento.
Assim, precisamos elaborar pequeno inventário dos SPOILERS DE VOO
ESTABILIZADOR
nossos recursos interiores, lembrando as faculdades e
habilidades da Andorinha-do-Ártico. AILERONS ESTABILIZADOR
HORIZONTAL
Nossa intenção é mapear os recursos internos do Ser Hu-
mano, de modo a favorecer nossa migração pessoal nos mo- Temos como superfícies primárias de voo: as asas, o
mentos de crise. estabilizador horizontal (pequenas asas traseiras), e o
Para termos ideia do que seriam esses recursos in- Rudder ou leme de direção (a asa da cauda que fica na
ternos, podemos pensar, igualmente, em um avião que vertical). Nas asas temos os Ailerons (controlam as cur-
realiza voos comerciais. Visto que o Ser Humano não vas), os TE Flaps, LE Flaps, LE Slats (permitem voos em
pode voar por conta própria, e depende do auxílio des- velocidades mais baixas, usados na decolagem e pousos),
sas aeronaves para cruzar os ares, é bem útil conhecer os os Spoilers (auxiliam na redução de velocidade, perda de
recursos dessa embarcação moderna. altitude e sustentação), e os Elevators (atuam na estabi-
46 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 47
lidade do voo e nos movimentos de subida e descida do Cada uma dessas dimensões psíquicas podem ser exa-
avião). Há inúmeros outros recursos, mas acredito que é minadas como funções, Impulsos/Anseios e Necessida-
o suficiente para termos uma ideia. des. E além disso, elas podem se expressar de modo po-
sitivo ou negativo.
E o Ser Humano? Quais são seus Vamos examinar agora cada um desses três aspectos,
e seus desdobramentos.
recursos interiores? Há como construir
esse inventário de modo simples Potencialidades de cunho pessoal
sivo de destaque, assim também a perda de significado, cessidade de nutrição e apoio emocional. Quando essa
propósito e alegria pessoal. função se expressa no indivíduo de modo saudável, ele
Para investigar como essa função opera em cada um apresenta uma boa dose de adaptabilidade e receptivi-
de nós, elaboramos as seguintes perguntas que irão guiar dade, além da capacidade de prover a si mesmo e aos
nossa busca por autoconhecimento. Essas questões serão outros no nível afetivo e emocional. No entanto, quando
elaboradas para cada uma das dez potencialidades. essa mesma função se expressa de forma negativa sur-
Questões: Como você experimenta ou vê seu pai? Qual gem a sensibilidade exagerada, a baixa autoestima, a in-
é sua imagem do “masculino”? Que caminho você preci- segurança e a incapacidade de cuidar tanto de si mesmo
sa seguir para desenvolver um ego saudável e um senso quanto do outro.
de individualidade? Pelo que você precisa lutar, se esfor- Questões: Como você experimenta ou vê sua mãe?
çar para conquistar? Que qualidades você precisa adqui- Qual é sua imagem do “feminino”? Como você é en-
rir para se sentir completo e realizado? O que precisa quanto progenitora ou mãe? Como você provê ou gosta
acontecer ou ser feito para que ocorra a expressão e irra- de ser provido? Como você cuida e gosta de ser cuidado?
diação das suas qualidades pessoais? O que você precisa Como você descreveria sua natureza emocional? Como
fazer para se sentir bem-sucedido ou para se destacar? você responde instintivamente? Como reage a eventos
e ao ambiente? O que lhe traz conforto e segurança?
Sentir/reagir
O que você gosta de fazer para descansar? Como é sua
Todas as pessoas possuem uma maneira de reagir emo-
cionalmente e espontaneamente, uma necessidade de cui- vida doméstica? Espontaneamente, como você reage?
dado, segurança, proteção e nutrição afetiva. Essa função Qual o seu grau de empatia, como reage prontamente
psíquica diz respeito ao nosso padrão interno de instintos, aos sentimentos dos outros?
emoções e sentimentos. Revela nossas reações emocionais
inconscientes, nossa autoimagem, nosso grau de empatia Pensar/comunicar
e sensibilidade ao outro, pois a imagem que tenho de mim Todos possuímos habilidade para pensar, raciocinar,
afeta a imagem que tenho do outro. Representa o impulso trocar ideias e nos comunicar com outras pessoas. Essa
para experimentar novamente a fusão com o útero ma- função psíquica diz respeito ao padrão de funcionamen-
terno, e por consequência o impulso para a fusão com to de nossa mente lógica e racional, e define o modo
o semelhante, traduzindo anseio de segurança emocional,
como pensamos, aprendemos, percebemos e digerimos a
obtida nos relacionamentos com maior grau de profun-
experiência, bem como a maneira como nos comunica-
didade e interação. Indica, igualmente, nossa necessidade
de cuidar e ser cuidado, de participar e de pertencer, ne- mos, trocando ideias e informações. Está ligada à nossa
50 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 51
capacidade de captar e ler o ambiente. Representa o im- ciado, uma necessidade e uma capacidade para o amor
pulso para nos comunicar e interagir, em nível da mente e o relacionamento íntimo. Essa função psíquica diz res-
e das ideias, assim também o impulso para expressar peito ao padrão de valores, desejos, gostos, afinidades
nossas percepções, nossa inteligência. Indica também e preferências individuais. Diz respeito ao nosso senso
nossa necessidade de interação mental, de conhecimen- estético, amor-próprio, autoestima e o modo como per-
to, de aprendizado. Quando essa função se expressa na mutamos afeto. Representa o impulso para o social e o
pessoa de modo saudável, temos o uso criativo da in- amoroso, anseio por expressar afeições, gostos e prefe-
teligência, o raciocínio claro, o poder de discriminação rências, bem como o anseio por beleza, harmonia, satis-
e análise, a compreensão objetiva e a expressão verbal fação, conforto e nosso anseio por prazer. Indica tam-
clara e respeitosa. Porém, quando essa mesma função bém nossa necessidade de experimentar prazer, beleza e
se expressa de forma negativa surge o intelectualismo satisfação por meio dos sentidos físicos, assim também
insensível, amoral, soberbo, a má utilização da inteligên- a necessidade de conquistar e usufruir as coisas que va-
cia para prejudicar os outros e a comunicação opiniática lorizamos. Quando essa função se expressa na pessoa de
e parcial. modo saudável, temos alguém que assume seus valores,
Questões: Que tipo de assuntos ocupam frequente- gostos e preferências, é sociável, amoroso e apto para a
mente sua mente? O que você costuma notar e captar permuta afetiva, e expressa beleza, harmonia e satisfa-
no ambiente com mais frequência? Em que área de sua ção. Porém, quando essa mesma função se expressa de
vida você se sente inquieto, necessitado de variedade, forma negativa surge o desconhecimento dos próprios
mudança ou espaço para se mover? Em qual área você valores, gostos e preferências, exibindo uma espécie de
utiliza a inteligência e a habilidade de comunicação para inibição afetiva, cobiça, autoindulgência, além de apre-
ser enganador, ardiloso, astuto ou para distorcer a rea- sentar exigências emocionais descabidas.
lidade em seu próprio benefício? Como você lida com Questões: Quais são meus valores, gostos, preferên-
o inesperado, com o acidental, com a coincidência ou cias e afinidades? O que mais valorizo e estimo na vida?
sincronicidade? O que você precisa fazer de divertido Que qualidades você valoriza, acha atraente ou preza
para que sua criança interior se sinta feliz? Quais são nas pessoas e nas coisas? Por qual área da sua vida você
suas habilidades artesanais, manuais? se sente atraído em busca de satisfação, beleza e prazer?
O que você julga belo e desejável? O que precisamos
Gostar criar em nossas vidas para sentir que temos algum va-
Todo Ser Humano possui um modo de expressar afei- lor, para construir autoestima e amor-próprio? O que
ção, de se dedicar ao outro, de apreciar e sentir-se apre- gostaríamos de ter ou receber para conquistar mais au-
52 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 53
toestima e felicidade? Meu amor-próprio é saudável, su- afirma e expressa sua identidade, seu poder, sua potência?
ficiente, maduro? Qual parte do seu ser você projeta e Como você expressa e afirma seu impulso sexual? Onde
valoriza no outro, especialmente no ser amado? precisamos desenvolver a habilidade de dominar o mundo
exterior, a vida? Em que situações você se mostra agres-
Agir sivo, impaciente, com raiva? Que tipo de raiva leva você
Todos os indivíduos possuem um modo de se afir- à depressão e à doença? Em que área da vida você tenta
mar, de expressar seus desejos, um impulso para a ação impressionar os outros com seu poder, sua sensualidade?
e para a autodefesa, uma sexualidade específica. Essa
função psíquica diz respeito ao padrão do impulso se- Potencialidades de cunho social
xual e da agressividade no indivíduo, a força que nos
permite crescer e dominar o mundo exterior: a vontade, Além das potencialidades ou características de cunho
a autoafirmação, a assertividade e a autodefesa. Repre- pessoal, o indivíduo possui anseios e necessidades de
senta o impulso para agir, para compreender e dominar cunho social. Ele deseja fazer parte do mundo, participar
o mundo exterior, para adquirir novas habilidades, bem das atividades sociais, integrar-se à comunidade.
como o impulso sexual, agressivo, de autoafirmação, de Prosperar
assertividade e autodefesa, o anseio de se impor. Indica Todos trazemos em nosso íntimo potencial para o
também nossa necessidade de expressar a própria agres- progresso, para o desenvolvimento, a prosperidade, o su-
sividade (de forma saudável ou adoecida), necessidade cesso, a expansão; confiança inata na vida, além de ética,
de se autoafirmar, de se impor, de se defender, de domi- nobreza, altruísmo, senso de aventura e disposição para
nar, domar, controlar; necessidade de vivenciar a pró- correr riscos. Essa função psíquica diz respeito ao padrão
pria sexualidade, bem como de estímulo e excitação físi- de crenças socialmente adquiridas, à visão de mundo, à
ca, corporal. Quando essa função se expressa na pessoa filosofia de vida e ao modo como a pessoa se expande,
de modo saudável, temos a coragem, a força de vontade, cresce, se desenvolve e prospera. Aponta também para
a iniciativa, o controle da agressividade e o impulso se- a espiritualidade e religiosidade vivida no nível social e
xual equilibrado. Porém, quando essa mesma função se coletivo, além de indicar o modo como a pessoa expres-
expressa de forma negativa surge a violência, o descon- sa fé, confiança e otimismo. Representa o impulso para
trole da agressividade e do impulso sexual, a obstinação se ligar, no âmbito social, a algo maior que o indivíduo
agressiva, a impaciência, a ansiedade. (causa, movimento, instituição); o impulso para o cresci-
Questões: De que modo você se manifesta, ou se afir- mento, a expansão, a prosperidade e para correr riscos;
ma? Como você busca aquilo que deseja? Como você representa também o anseio de atribuir e encontrar um
54 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 55
significado e um sentido para a vida, bem como o im- EGO (pensamentos, sentimentos e comportamentos) que
pulso em direção ao futuro. Indica também nossa ne- constrói, estabiliza e mantém nossa personalidade. Re-
cessidade de crescimento, aperfeiçoamento e expansão; presenta o impulso para a conservação, para a manuten-
necessidade de confiar, de acreditar em algo; necessidade ção em todos os níveis (individual, social e espiritual); o
de dar sentido à vida através de uma filosofia de vida impulso para defender a estrutura e integridade do EGO,
ou sistema de crenças. Quando essa função se expressa ou seja, os pensamentos, sentimentos e comportamentos
na pessoa de modo saudável, temos a fé, a confiança, o que constroem, estabilizam e mantêm a nossa personali-
otimismo, o equilíbrio na expansão e no crescimento; te-
dade. Representa também a tradição e o conservadoris-
mos a prosperidade legítima, que beneficia não somente
mo. Indica ainda nossa necessidade de manter, de preser-
o indivíduo, mas a comunidade na qual está inserido.
var, de conservar nosso modo de ser, de viver, bem como
Porém, quando essa mesma função se expressa de forma
conservar nossas crenças, hábitos e valores; necessidade
negativa surge a dispersão, a confiança exagerada e pue-
de aprovação social, de segurança material, bem como de
ril, o crescimento irresponsável; a expansão exagerada,
sem sustentabilidade; surge a prosperidade individual às preservação dos valores sociais e culturais. Quando essa
custas do prejuízo alheio. função se expressa na pessoa de modo saudável, temos
Questões: Quais são suas crenças? Qual a sua visão de a disciplina, o esforço metódico, o senso dos deveres e
mundo, sua filosofia de vida? Como é sua religiosidade? responsabilidades; o cuidado com a organização e o res-
Como se manifesta sua espiritualidade? Qual a sua visão peito à ordem e a hierarquia. Porém, quando essa mesma
do futuro? Em que você confia? Que aspectos em uma função se expressa de forma negativa surge o apego ex-
pessoa lhe transmitem confiança? Em que área da vida cessivo a rotinas, métodos e regras, à rigidez; ocorre ain-
você gostaria de se expandir? O que é prosperidade para da a valorização excessiva da hierarquia, trazendo frieza,
você? Qual o sentido da vida para você? desconfiança, pessimismo, medo e negatividade.
Questões: Que elementos você quer preservar em sua
Preservar
vida? O que você não quer que mude de jeito nenhum?
Ao lado da expansão, toda pessoa busca também a
Você é disciplinado? Qual sua relação com a hierarquia,
aprovação social, a segurança financeira, a estabilidade,
as tradições, e as instituições de controle e autoridade na
a manutenção das tradições, além de possuir, em maior
sociedade? Que características você abomina em uma
ou menor grau, senso de disciplina, hierarquia, esforço, e
persistência. Essa função psíquica diz respeito ao padrão pessoa? O que você não se permite fazer? Em que área da
interno que conferiu forma, limite e estrutura ao nosso vida você experimenta limitações, sacrifícios? Qual área
EGO; aponta também para o sistema de defesa desse da sua vida demanda esforço permanente e sem fim?
56 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 57
vida. Porém, quando essa mesma função se expressa de se expressa de forma negativa surge a manipulação, a
forma negativa surge o misticismo, o fanatismo, a ilusão compulsão, a impiedade e o fascínio por dominar o outro.
e o escapismo autodestrutivo. Questões: Quais aspectos da sua personalidade você re-
Questões: Qual a sua capacidade de concentração? jeita? Qual é a sua sombra? Qual a parte bruta, primitiva e
Como se expressa a sua imaginação? Qual a sua sensibi- instintiva da sua personalidade você não reconhece? Qual
lidade ao espiritual, ao transcendente, ao insconsciente? o seu lugar na vida? Quais são seus limites? O que está
Qual seu grau de empatia? Como você expressa sua com- excessivo em sua alma, o que precisa ser equilibrado? Do
paixão pelo sofrimento humano? Como você lida com a que a sua consciência lhe acusa? Em qual área da sua vida
renúncia? Em que área da vida você se perde em deva- você está sendo convidado ao desapego? Em que área da
neios e fantasias, sem contato com a realidade concreta? vida você está lidando com o término, com a morte (fim de
uma fase, de uma amizade, de um relacionamento, de uma
Regenerar carreira, de uma condição econômica ou social)?
Todo indivíduo busca, de forma consciente ou incons-
ciente, a purificação emocional, psíquica e espiritual, a Conclusão
transmutação, o renascimento e/ou refinamento do pró- Nenhuma das três dimensões pessoal, social e transpes-
prio ser. Essa função psíquica diz respeito ao padrão de soal pode ser negligenciada sem algum tipo de prejuízo
catarse da nossa mente, a força regeneradora e purifica- para a formação e estabilidade psíquica do indivíduo.
dora da vida; constitui a chamada Justiça Imanente (Lei Por esta razão, saber o que nos deixa felizes GOSTAR,
na Consciência); um padrão de equilíbrio e autorregu- expressar isso para os outros PENSAR/COMUNICAR, e
lação da própria mente. Representa o impulso para re- ficar firmes diante da oposição AGIR representam saú-
generação da psique, para a integração das partes som- de mental. Aqui vale a regra de ouro: “Amar ao próximo
brias, reprimidas e negadas de nosso psiquismo; o anseio como a si mesmo”.
de purificação e catarse emocional. Indica também nos- Se não pudermos ser um indivíduo livre, independente
sa necessidade de integração, harmonia e equilíbrio da e autônomo SER, como reconheceremos a individualida-
mente; necessidade de catarse dos conteúdos reprimidos, de e a autonomia dos outros?
negados ou desconhecidos da nossa mente. Quando essa Se não pudermos ser espontâneos, expressar nossas
função se expressa na pessoa de modo saudável, temos emoções irracionais, se não pudermos buscar segurança,
a profundidade e a intensidade emocional; o reconheci- alimento emocional e afetivo SENTIR/REAGIR, como se-
mento e a gestão de nossas compulsões; o poder interior, remos capazes de acatar as emoções, inseguranças e ca-
o autoconhecimento. Porém, quando essa mesma função rências do semelhante?
60 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS A consciência cocriadora 61
Se não pudermos nos expressar, se não tivermos nos- quando é negligenciado, que parece possuir um tipo de
sos próprios pensamentos e atitudes PENSAR/COMUNI- conhecimento abrangente não somente sobre aquilo que
CAR, como seremos capazes de ouvir outra pessoa, respei- o indivíduo necessita, mas até mesmo sobre o que ele
tar seu modo de pensar? vai necessitar no desenrolar de sua vida. Eu não tenho a
Se não pudermos expressar nossos gostos, preferên- pretensão de saber o que é essa coisa… mas não me en-
cias, nossa beleza, se não nos valorizarmos GOSTAR, vergonho em dizer que gosto de chamá-la de consciência
como poderemos encontrar a beleza ou o valor do pró- de Deus em nós.
ximo? Nosso EU profundo (consciência) nos coloca num
Se não pudermos agir, defender nossos interesses e contínuo processo de desdobramento, ele nos reserva,
nossas vidas, sermos assertivos, afirmativos quanto ao em qualquer ponto de nossas vidas, experiências neces-
nosso modo de ser AGIR, como seremos capazes de aca- sárias ao nosso aperfeiçoamento. Ele representa aquela
tar e respeitar o direito que o próximo tem de se expres- parte de nós que guia e revela nosso aprimoramento es-
sar, de se afirmar, de ser ele mesmo? piritual. Se não ouvirmos ou não aceitarmos o padrão
Além disso, não somos seres exclusivamente individuais. de crescimento proposto por nosso EU interior, o mais
Vivemos em sociedade, somos gregários, necessitamos de provável é que atraiamos eventos ou circunstâncias ex-
uma comunidade, de uma sociedade para expressar nossos ternas para nossas vidas, situações que irão forçar nossa
mais altos potenciais. Necessitamos de expansão, progres- mudança e nossa adaptabilidade à vida.
so, prosperidade, conjugada com ética, nobreza, altruísmo Algumas vezes, fica muito claro o que nosso EU pro-
PROSPERAR, sob pena de vivermos uma vida egocêntrica, fundo pretende nos ensinar. Outras vezes, as razões pelas
socialmente irrelevante. Ao mesmo tempo, precisamos de quais ele nos faz passar por períodos de crise e dor nem
segurança, estabilidade social, tradições, hierarquia, disci- sempre são óbvias ou diretas. Não acredito que o EU inte-
plina, ordem PRESERVAR, a fim de que nossa vida pesso- rior queira apenas nos torturar, sem qualquer propósito, a
al não se converta em puro subjetivismo, voluntarismo e não ser o prazer sádico. Não é dessa forma que nosso EU
anarquia. (consciência) funciona. O seu propósito é dirigir e supervi-
Entretanto, há algo mais… sionar nosso completo desenvolvimento espiritual.
Filósofos e místicos, sábios e poetas, religiosos e pen- Por esta razão, temos necessidade de mudança, exci-
sadores são unânimes em afirmar que há certa coisa, um tação, originalidade e criatividade MUDAR; um impul-
núcleo interior – podemos chamá-lo de Destino, Provi- so para escapar das limitações físicas, do mundo ma-
dência Divina, Lei Natural, Inconsciente, Karma, não terial, sede de transcendência TRANSCENDER; bem
importa – que reage quando se transgride seus limites ou como necessidade de purificação emocional, psíquica e
62 A BÚSSOLA E O LEME | HAROLDO DUTRA DIAS
conhecer o território. Um bom mapa vai lhe ajudar bas- Fé; Confiança; Otimismo; Equilibrio na ex- Confiança exagerada e pueril; Dispersão;
PROSPERAR pansão e no crescimento; Prosperidade Crescimento irresponsável, e expansão exa-
tante. Mas isso já são cenas do próximo capítulo. legítima gerada; Prosperidade às custas do prejuízo
alheio
Para tornarmos essa abordagem mais leve, a seguir, PRESERVAR
Disciplina; Esforço metódico; Senso dos Rigidez; Apego excessivo a rotinas, regras e
deveres e responsabilidades; Organização; métodos; Valorização excessiva da hierarquia;
você tem uma tabela com o resumo dessas funções psí- Respeito à ordem e a hierarquia Frieza, desconfiança; pessimismo; Medo e
negatividade
quicas. Isso irá facilitar a memorização e a compreensão Liberdade; Originalidade; Criatividade; Sin- Rebelião; Extremismo; Mudança inoportuna;
MUDAR
desses elementos. tonia com a verdade; Capacidade de mu-
dar; Intuição; Tecnologia
Necessidade constante de excitação,
movimento; Inquietação