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LIMA, Ari - FUNKEIROS, TIMBALEIROS E PAGODEIROS: NOTAS SOBRE JUVENTUDE E MÚSICA NEGRA NA CIDADE DE SALVADOR
LIMA, Ari - FUNKEIROS, TIMBALEIROS E PAGODEIROS: NOTAS SOBRE JUVENTUDE E MÚSICA NEGRA NA CIDADE DE SALVADOR
ARI LIMA**
* Como autor, assumo a responsabilidade por todos os pontos de vista e idéias apre-
sentados neste artigo. Estou certo, entretanto, que o amadurecimento dos mesmos são
resultado da interlocução com informantes e com colegas que discutem temáticas pró-
ximas a que apresento. Neste sentido, agradeço a todos aqueles que, anonimamente,
contribuíram para a realização deste artigo e especialmente a Osmundo Pinho, pelas
críticas e comentários.
* Professor substituto do Departamento de Antropologia da Universidade Federal da
Bahia (UFBA) e doutorando em Antropologia Social na Universidade de Brasília (UnB).
E-mail: ari66@ig.com.br
Juventude e geração
A princípio, a noção de juventude se define por um aprofun-
damento biológico do processo vital de um indivíduo. Neste proces-
so, os jovens passam por notórias alterações orgânicas e anatômicas que
o distinguem de uma criança ou de um indivíduo adulto. Mas, justa-
mente, enquanto decorre este processo orgânico e anatômico, os jo-
vens costumam também sofrer uma forte pressão social. Isto porque
se manifesta na família, na escola, no segmento social de origem ou
entre os grupos de amigos uma expectativa em torno de uma consci-
ência juvenil apta à aceitação de novos papéis sociais, à aquisição de
responsabilidades e elaboração de projetos de futuro. A juventude se
torna, então, mais do que o aprofundamento biológico do processo
vital do indivíduo, um aprofundamento crítico, ritualizado, integrador
ou libertário em relação ao tempo, ao espaço e à ordem social. Histo-
ricamente determinado, este processo vital reflete injunções de classe,
raça, gênero, escolaridade e mesmo dos modelos de relações entre uma
“geração” antecedente e outra posterior.
Uma das formas de conferir unidade e maior clareza de senti-
do à noção de juventude é associá-la à idéia de geração. Marialice
M. Foracchi (1972) afirma que se define uma geração através de um
estilo de ação peculiar, uma uniformidade de locação social estranhos
a uma geração anterior. Isto significa que uma geração compartilha
experiências, situações de vida e oportunidades de trabalho, benefí-
Todas essas teorias foram, em maior ou menor grau, criticadas pelo seu
compromisso com o positivismo que transformava as pessoas em objeto e
seu comportamento em fatalidade ou determinação, dificultando o en-
tendimento delas enquanto sujeitos que participariam de forma ativa nas
suas escolhas e ações, apesar das constrições e pressões de forças de várias
ordens (Jankowski, 1991; Katz, 1988; Matza, 1964). Por causa disso,
nenhuma delas poderia explicar porque percentuais tão baixos de po-
bres, números pequenos de negros e poucas pessoas pertencentes a algu-
mas minorias étnicas enveredam, de fato, em carreiras criminosas. (Zaluar,
1997, p. 20)
Notas
1. Guimarães (1999) se refere a “racialismo” ou racialização quando observa a crença de
que determinados atributos morais, mentais, intelectuais, afetivos ou posições sociais
são correspondidos a uma essência biológica racial. Na medida em que esta essência é
sempre determinada pela cultura, é construída historicamente, atitudes, pensamento,
idéias ou relações sociais racializadas se referem não a um sistema de causação, não a
qualquer realidade biológica das raças, mas a ações subjetivamente intencionadas,
hierarquizantes.
2. Sobre a idéia de “música”, absorvo o ponto de vista de John Blacking (1992). Para
este autor, “música” é tanto o produto de uma ação humana observável e intencional
quanto um modo humano básico de pensamento através do qual uma ação humana
pode ser constituída. A fonte mais acessível de informação sobre a natureza da “músi-
ca”, diz Blacking, pode ser, primeiro, a variedade de sistemas musicais, estilos ou
gêneros que são correntemente performados no mundo. Segundo, registros históricos,
iconografia e descrição de performances. Terceiro, as diferentes percepções que as pes-
soas têm da música e da experiência musical, ou seja, os diferentes modos através dos
quais as pessoas dão sentido aos símbolos musicais. Este sentido só pode existir
compartilhadamente.
3. Michel De Certeau (1989) aponta o papel e o poder da escrita etnográfica em pôr os
objetos e identidades em seu devido lugar, fazendo história daquilo que se esvanece
num corte cultural de alteridade, na oralidade, na inconsciência, na espacialidade ou
quadro sincrônico de sistemas sociais sem história. Neste caso, De Certeau opõe a
escrita, “que invade o espaço e capitaliza o tempo”, à palavra, “que não vai longe e que
não retém”. Dito de outra maneira, se “a escrita isola o significante da presença, a
palavra é o corpo que significa, enunciado que não se separa do ato social de enunciação
nem de uma presença que se dá, se gasta ou se perde na nominação” (De Certeau,
1989, p. 217). Neste procedimento, a escrita produz um “resto”, um excesso
Referências bibliográficas