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ANATOMIA ESÔFAGO GÁSTRICA por peritônio da bolsa omental, contínuo com aquele que reveste

ESÔFAGO a face posterior do estômago.


O esôfago é um tubo muscular (aproximadamente 25cm de A junção esofagogástrica situa-se a esquerda da vértebra T11 no
comprimento) com um diâmetro de 2cm que conduz alimento da plano horizontal que atravessa a extremidade do processo xifoide.
faringe para o estômago. A fluoroscopia (radiografia usando Os cirurgiões e endoscopistas designam a linha Z, uma linha
fluoroscópio) após a ingestão de bário mostra que o esôfago irregular em que há mudança abrupta da mucosa esofágica para a
normalmente tem 3 constrições, onde estruturas adjacentes mucosa gástrica, como a junção. Superior a essa junção, z
deixam impressões: musculatura diafragmática que forma o hiato esofágico funciona
 Constrição cervical (esfíncter superior do esôfago): seu como um esfíncter inferior do esôfago fisiológico que se contrai e
inicio na junção faringoesofágica, a 15cm dos dentes relaxa.
incisivos; causada pela parte cricofaríngea do músculo Exames radiológicos mostram que o alimento para
constritor inferior da faringe. momentaneamente nesse lugar e que o mecanismo esfincteriano
 Constrição broncoaórtica (torácica): uma constrição normalmente é eficiente para evitar refluxo do conteúdo gástrico
combinada, no local onde ocorre primeiro o cruzamento para o esôfago. Quando uma pessoa não está comendo, o lúmen
do arco da aorta, a 22,5cm dos dentes incisivos, e depois do esôfago normalmente encontra-se colapsado acima desse nível
o cruzamento pelo brônquio principal esquerdo, a para evitar a regurgitação de alimentos ou suco gástrico para o
27,5cm dos dentes incisivos; a primeira constrição é esôfago.
observada em vistas anteroposteriores, a segunda em A irrigação arterial da parte abdominal do esôfago é feita pela
vistas laterais. artéria gástrica esquerda, um ramo do tronco celíaco, e pela
 Constrição diafragmática: no local onde atravessa o artéria frênica inferior esquerda. A drenagem venosa das veias
hiato esofágico do diafragma, a 40cm dos dentes submucosas dessa parte do esôfago se faz para o sistema venoso
incisivos. porta, através da veia gástrica esquerda, e para o sistema venoso
sistêmico, pelas veias esofágicas que entram na veia ázigo. A
drenagem linfática da parte abdominal do esôfago se faz para os
linfonodos gástricos esquerdos; os vasos linfáticos eferentes
desses linfonodos drenam principalmente para os linfonodos
celíacos. É inervado pelo plexo esofágico, formado pelos troncos
vagais (que se tornam os ramos gástricos anteriores e posterior) e
pelos troncos simpáticos torácicos por meio dos nervos esplênicos
(abdominopélvicos) maiores e plexos periarteriais ao redor das
artérias gástrica esquerda e frênica superior.

O conhecimento dessas constrições é importante ao introduzir


instrumentos no estômago através do esôfago e ao examinar
radiografias de pacientes com disfagia.
O esôfago segue a curva da coluna vertebral ao descer através do
pescoço e do mediastino. Tem lâminas musculares circulares
internas e longitudinais externas. Em seu terço superior, a lâmina
externa consiste em músculo estriado voluntário; o terço inferior
é formado por musculo liso, e o terço médio tem os dois tipos de
músculos. Atravessa o hiato esofágico no pilar muscular direito do
diafragma, no nível da vértebra T10. Termina entrando no
estômago no óstio cárdico do estômago, no nível da 7 cartilagem
costal esquerda e da vértebra T11. É circundado pelo plexo
nervoso esofágico distalmente.
Está fixado as margens do hiato esofágico no diafragma pelo
ligamento frenicoesofágico, uma extensão da fáscia diafragmática
inferior. Esse ligamento permite o movimento independente do
diafragma e do esôfago durante a respiração e a deglutição.
A parte abdominal do esôfago, com 1,25cm de comprimento, vai
do hiato esofágico até o óstio cárdico do estômago, alargando-se
a medida que se aproxima em posição anterior e a esquerda na
sua descida. A face anterior é coberta por peritônio da cavidade
ESTÔMAGO
peritoneal, contínuo com aquele que reveste a face anterior do
É a parte expandida do sistema digestório. É especializado para o
estômago. Encaixa-se em um sulco na face posterior (visceral) do
acúmulo do alimento ingerido, que ele prepara química e
fígado. A parte posterior da parte abdominal do esôfago é coberta
mecanicamente para a digestão e a passagem para o duodeno. O
estômago mistura os alimentos e atua como um reservatório; sua O interior do estômago é coberto por uma camada de muco
principal função é a digestão enzimática. O suco gástrico converte continua que protege sua superfície contra o ácido gástrico
gradualmente a massa de alimento em uma mistura semilíquida, secretado pelas glândulas gástricas. Quando contraída, a mucosa
quimo, que passa rapidamente para o duodeno. O estômago vazio gástrica forma estrias longitudinais (pregas gástricas); estas são
tem calibre apenas ligeiramente maior que o intestino grosso, mais acentuadas em direção a parte pilórica e ao longo da
entretanto, é capaz de se expandir muito e pode conter 2 a 3 litros curvatura maior. Durante a deglutição, forma-se um sulco ou um
de alimento. canal gástrico temporário entre as pregas longitudinais ao longo
O tamanho, o formato e a posição do estômago podem variar da curvatura menor. O canal gástrico se deve a firme fixação da
bastante em pessoas com diferentes biótipos e podem mudar até túnica mucosa gástrica a túnica muscular, que não tem uma
no mesmo indivíduo, de acordo com os movimentos do diafragma lâmina oblíqua nesse local. A saliva e pequenas quantidades de
durante a respiração, o conteúdo (vazio ou cheio) e a posição. Na alimento mastigado e outros líquidos drenam ao longo do canal
posição de decúbito dorsal, o estômago costuma estar nos gástrico para o canal pilórico quando o estômago está quase
quadrantes superiores esquerdo e direito, ou no epigástrio, região vazio. As pregas gástricas diminuem e desaparecem quando o
umbilical, hipocôndrio e flanco esquerdos. Na posição ereta, o estômago está distendido.
estômago desloca-se para baixo. Em indivíduos magros, o corpo O estômago é coberto por peritônio, exceto nos locais em que há
gástrico pode estender-se até a pelve. vasos sanguíneos ao longo de suas curvaturas e em uma pequena
área posterior ao óstico cárdico. As duas lâminas do omento
menor estendem-se ao redor do estômago e separam-se de sua
curvatura maior como omento maior. Anteriormente, o estômago
relaciona-se com o diafragma, o lobo hepático esquerdo e a
parede do abdome. Posteriormente, o estômago relaciona-se com
a bolsa omental e o pâncreas; a face posterior do estômago forma
a maior parte anterior da bolsa omental. O colo transverso tem
relação inferior e lateral com o estômago e segue ao longo da
curvatura maior até a flexura esquerda do colón.
A abundante irrigação arterial do estômago tem origem do tronco
celíaco e em seus ramos. A maior parte do sangue provém de
anastomoses formadas ao longo da curvatura menor pelas
O estômago tem 4 partes: artérias gástrica direita e esquerda, e ao longo da curvatura maior
CÁRDIA: a parte que circunda o óstio cárdico, a abertura superior pelas artérias gastromentais direita e esquerda. O fundo e a parte
do estômago. Em decúbito dorsal, o óstio cárdico está situado superior do corpo gástrico recebem sangue das artérias gástricas
posteriormente a 6 cartilagem costal esquerda, a 2 a 4cm do plano curtas e posteriores.
mediano, no nível da vértebra T11.
FUNDO: a parte superior dilatada que está relacionada com a
cúpula esquerda do diafragma, limitada inferiormente pelo plano
horizontal do óstio cárdico. A incisura cárdica está situada entre o
esôfago e o fundo gástrico. O fundo pode ser dilatado por gás,
líquido, alimento ou pela combinação destes. Em decúbito dorsal,
o fundo está situado posteriormente a 6 costela.
CORPO: parte principal, entre o fundo e o antro.
PARTE PILÓRICA: região afunilada de saída do estômago, sua parte
mais larga, o antro pilórico, leva ao canal pilórico, sua parte mais
estreita. O piloro é a região esfincteriana distal da parte pilórica. É
um espessamento acentuado da camada circular do músculo liso As veias gástricas acompanham as artérias em relação a posição e
que controla a saída do conteúdo gástrico através do óstio pilórico ao trajeto. As veias gástricas direita e esquerda drenam para a
para o duodeno. Há esvaziamento intermitente do estômago veia porta ; as veias gástricas curtas e as gastromentais esquerdas
quando a pressão intragástrica supera a resistência do piloro. drenam drenam para a veia esplênica que se unem a veia
Normalmente, o piloro se encontra em estado de contração mesentérica superior para formar a veia porta. Uma veia pre-
tônica, de modo que o óstio pilórico é reduzido, exceto quando dá pilórica ascende o piloro até a veia gástrica direita (identificação
passagem ao quimo. Em decúbito dorsal, a parte pilórica está no do piloro).
nível do plano transpilórico. Esse plano corta a 8 cartilagem costal
e a vertebra L1. Em posição ortostática, a localização da parte
pilórica varia da vértebra L2 a L4.

O estômago também tem 2 curvaturas:


MENOR: forma a margem direita côncava mais curta do
estômago. A incisura angular, parte inferior da curvatura, indica a
junção do corpo gástrico com a parte pilórica. A incisura angular
se situa logo a esquerda da linha mediana.
MAIOR: forma a margem esquerda convexa mais longa do
estômago. Segue inferiormente a esquerda da junção do 5 espaço
intercostal; a seguir curva-se para direita, passando Os vasos linfáticos do estômago acompanham as artérias ao longo
profundamente a 9 ou a 10 cartilagem esquerda enquanto das curvaturas maior e menor. Elas drenam linfa de suas partes
continua medialmente para alcançar o antro. anterior e posterior em direção as suas curvaturas, onde estão
localizados os linfonodos gástricos e gastromentais. Os vasos
eferentes desses linfonodos acompanham as grandes artérias até DRGE em não erosiva, erosiva e complicada, quando ocorre
os linfonodos celíacos. A linfa dos 2 terços superiores drenam ao ulceração, estenose ou metaplasia intestinal (esôfago de Barrett).
longo dos vasos gástricos direito e esquerdo para os linfonodos As manifestações atípicas variam de acordo com o órgão
gástricos. A linfa do fundo e da parte superior do corpo também acometido. Nas vias respiratórias pode provocar tosse crônica,
drenam ao longo das artérias gástricas curtas e dos vasos faringite, laringite, traqueíte, bronquite de repetição, asma,
gastromentais esquerdos para os linfonodos pneumonia recorrente, bronquiectasia, fibrose pulmonar
pancreaticosesplenicos. A linfa dos dois terços direitos do terço idiopática ou, ainda, crises de apneia. As principais
inferior do estômago drena ao longo dos vasos gastromentais manifestações otorrinolaringológicas são rouquidão/disfonia,
direitos até os linfonodos pilóricos. A linfa do terço esquerdo da sinusite, faringite, otalgia/otite, lesão de cordas vocais,
curvatura maior drenam para os linfonodos laringoespasmo, laringite crônica, e estenose subglótica. Além
pancreaticoduodenais, que estão situados ao longos dos vasos desses sintomas, a DRGE pode resultar em ruminação,
gástricos curtos e esplênicos. enteropatia perdedora de proteínas, síndrome de Sandifer e
A inervação parassimpática do estômago provém dos troncos síndrome da morte súbita do lactente.
vagais anterior e posterior e de seus ramos, que entram no
abdome através do hiato esofágico. O tronco vagal anterior, FISIOPATOLOGIA
derivado do nervo vago esquerdo (10), geralmente entra no A etiologia da DRGE é multifatorial. Tanto os sintomas quanto as
abdome como um ramo isolado situado na face anterior do lesões teciduais resultam do contato da mucosa com o conteúdo
esôfago. Segue em direção da curvatura menor, onde emite gástrico refluxado, decorrentes de falha em uma ou mais das
ramos hepáticos e duodenais. O restante do tronco vagal anterior seguintes defesas do esôfago: barreira antirrefluxo, mecanismos
continua ao longo da curvatura menor, dando origem aos ramos de depuração intraluminal e resistência intrínseca do epitélio.
gástricos anteriores. O tronco vagal posterior, maior, derivado do
nervo vago direito, entra no abdome na face posterior do esôfago CAUSAS DO AUMENTO DA EXPOSIÇÃO DO EPITÉLIO ESOFÁGICO
e segue em direção a curvatura menor. O tronco vagal posterior AO CONTEÚDO GÁSTRICO
emite ramos para as partes anterior e posterior do estômago. - alteração da depuração esofágica.
Emite um ramo celíaco, que segue para o plexo celíaco, e depois - disfunção do esfíncter inferior esofágico (EIE)
continua ao longo da curvatura menor, dando origem aos ramos - hérnia hiatal
gástricos posteriores. - aumento da pressão intra-abdominal
A inervação simpática do estômago, provenientes dos - esvaziamento gástrico retardado.
seguimentos T6 a T9 da medula espinal, segue para o plexo celíaco
por intermédio do nervo esplênico maior e é distribuída pelos BARREIRA ANTIRREFLUXO
plexos ao redor das artérias gástricas e gastromentais. Principal proteção contra o RGE, é composta por: esfíncter interno
(ou EIE) e esfíncter externo (formado pela porção crural do
DOENÇA POR REFLUXO GASTRESOFÁGICO diafragma). O EIE mantem-se fechado em repouso e relaxa com a
O refluxo gastresofágico é o fluxo retrógrado, repetido e deglutição e com a distensão gástrica. O relaxamento não
involuntário do conteúdo gástrico para o esôfago, que consiste relacionado com a deglutição é chamado relaxamento transitório
de gás (eructação) ou fluido (regurgitação). Quando causa do EIE, sendo considerado o principal mecanismo fisiopatológico
morbidade e passa a ser sintomático resultando em lesões é associado a DRGE, responsável por 63 a 74% dos episódios de
conhecido como DRGE. É caracterizada por uma combinação entre RGE. Em pacientes com formas graves de RGE, a pressão de
o contato de refluídos irritantes, principalmente o ácido clorídrico repouso do EIE está diminuída. Muitas substâncias afetam a
e a pepsina, com a mucosa e uma deficiência nos mecanismos pressão do EIE: a colecistocinina (CCK) é responsável pela
de proteção. Ocorre em todas as pessoas várias vezes ao dia e, diminuição da pressão do EIE observada após a ingestão de
desde que não haja sintomas ou sinais de lesão mucosa, pode ser gorduras; outros neurotransmissores estão envolvidos, entre os
considerado um processo fisiológico. É a doença crônica mais quais destacam o óxido nítrico (NO) e o peptídio intestinal
comum do trato digestivo alto. vasoativo (VIP).
Atualmente, a DRGE é considerada um problema de saúde pública A presença da hérnia hiatal contribui para o funcionamento
em razão de sua elevada prevalência, evolução crônica, inadequado da barreira antirrefluxo através da dissociação entre o
recorrências frequentes e comprometimento da qualidade de esfíncter externo e o interno e do refluxo sobreposto (fluxo
vida. Existe uma quantidade crescente de informação sobre retrógrado do conteúdo refluxado preso no saco herniário para a
manifestações extraesofágicas da DRGE, com evidências de que a porção tubular do esôfago).
DRGE pode ser mais comum do que estimado atualmente. Dados A distensão gástrica, principalmente após as refeições, contribui
epidemiológicos baseados na presença de pirose como indicador para o RGE. O retardo do esvaziamento gástrico, o aumento da
da DRGE revelam que 15 a 44% dos adultos tem esse sintoma pelo pressão instragástrica (ambos presentes quando há obstrução ou
menos uma vez por mês, e 14 a 17,8%, diariamente. Apesar da semiobstrução antropilórica) e a alteração da secreção gástrica
elevada prevalência na população, a maioria dos pacientes não (como hipersecreção da síndrome de Zollinger-Ellison – aumento
procura atendimento médico, devido à sua característica da gastrina fazendo com que o estômago produza ácido gástrico
intermitente e ao fácil acesso a medicações não prescritas. em excesso) são fatores que podem estar presentes, mas são
Acredita-se que essa prevalência seja devido a uma confluência poucos frequentes.
de fatores, desde maus hábitos alimentares, obesidade até
fatores genéticos. MECANISMOS DE DEPURAÇÃO INTRALUMINAL
Suas manifestações clínicas são divididas em sintomas típicos – A depuração do material refluxado presente na luz do esôfago
esofagianas - (pirose e regurgitação), sintomas atípicos – decorre de uma combinação de mecanismos mecânicos (retirando
extraesofagianas - (dor torácica, tosse, manifestações a maior quantidade do volume refluído, através do peristaltismo e
otorrinolaringológicas [rouquidão, pigarro, laringite] e asma) e da gravidade) e químicos (neutralização do conteúdo residual pela
formas complicadas. Do ponto de vista endoscópico, classifica-se a saliva ou pela mucosa). A alteração do peristaltismo pode ser
primária (no caso dos distúrbios motores do esôfago, como na
motilidade esofágica ineficaz) ou secundária (nas doenças do
tecido conjuntivo, como esclerodermina, síndrome CREST ou
doença mista do tecido conjuntivo).
Episódios de refluxo ocorridos durante a noite, na posição supina,
são duradouros e tem grande chance de causar lesão mucosa
devido a diminuição do fluxo salivar, que ocorre normalmente a
noite, associada a falta de ação da gravidade.

RESISTÊNCIA INTRÍNSECA DO EPITÉLIO


É constituída pelos seguintes mecanismos de defesa,
normalmente presentes no epitélio esofágico:
 Defesa pré-epitelial (composta por muco, bicabornato e
água no lúmen do esôfago, formando uma barreira
físico-química, que é pouco desenvolvida no esôfago,
quando comparada a mucosa gástrica e duodenal);
 Defesa epitelial (junções intercelulares firmes,
características do epitélio estratificado pavimentoso, o
SINTOMAS TÍPICOS
que dificulta a retrodifusão de íons, e substâncias
Os sintomas clássicos da DRGE são pirose (queimação
tamponadoras intersticiais, como proteínas, fosfato e
retroesternal, muitas vezes proveniente do epigástrio alto,
bicarbonato);
ascendente em direção ao pescoço, raramente para o dorso e
 Defesa pós-epitelial (suprimento sanguíneo, responsável
membros superiores) e regurgitação, de fácil reconhecimento. Os
tanto pelo aporte de O2 e nutrientes quanto pela
pacientes podem relatar alívio dos sintomas com uso de
remoção de metabólitos). O defeito mais comum da
medicamentos antiácidos. Esses sintomas são mais frequentes
resistência epitelial é o aumento da permeabilidade
após refeições ou quando o paciente está em decúbito supino ou
para-celular. A esofagite ocorre quando os fatores de
em decúbito lateral direito.
defesa são sobrepujados pelos fatores agressivos.
Os fatores desencadeantes mais comuns são os alimentos
Outro constituinte do material refluxado, que tem sido
gordurosos ou picantes, cítricos, carminativos, café, refrigerantes,
correlacionado com maior agressividade para a mucosa do
álcool, refeições volumosas, tabaco, medicamentos e o hábito de
esôfago, é o conteúdo duodenal (bile e secreções pancreáticas). O
se deitar imediatamente após as refeições. Os fatores de alívio
refluxo duodeno-gastresofágico é um fenômeno fisiológico, de
mais frequentes são a ingestão de leite, água ou antiácidos.
composição variada, que lesa a mucosa esofágica pela ação das
Situações que provocam aumento da pressão intra-abdominal
enzimas proteolíticas, potencializando a lesão provocada pelo
também podem desencadear pirose, tais como ganho de peso,
ácido. A variabilidade da composição do conteúdo refluxado é
levantamento de peso, exercícios isométricos, gravidez ou
uma das possíveis explicações para os diferentes graus de
exercícios abdominais.
esofagite observadas em pacientes com a mesma quantidade de
Alguns pacientes com pirose referem alívio do sintoma quando
refluxo ácido demonstrado por exames pHmétricos.
assumem o decúbito lateral esquerdo. O estresse também é
O mecanismo responsável pelas manifestações extraesofágicas da
reconhecido como fator de piora da pirose, provavelmente pelo
DRGE, como tosse e broncoespasmo, nem sempre é a aspiração
seu efeito amplificador de sintoma e não por provocar aumento
com lesão da mucosa de vias respiratórias por contato direto.
do refluxo gastroesofágico.
Pode ser via reflexo vagal por acidificação da mucosa esofágica
A pirose pode vir associada, ainda que não necessariamente de
distal. No caso de granulomas de cordas vocais e estenose
forma simultânea, à regurgitação ácida ou, mais frequentemente,
subglótica, é necessário, provavelmente, o contato direto com a
à sensação de refluxo ácido retroesternal, atingindo até a faringe
mucosa das vias respiratórias.
ou a boca, sem exteriorização. Alguns pacientes referem sintomas
dispépticos associados, tais como plenitude pós-prandial,
SINTOMATOLOGIA
sensação de empachamento, eructações frequentes e, menos
A DRGE tem uma grande variabilidade de apresentação clínica,
comumente, náuseas. Outros apresentam sialorreia ou soluços,
podendo os sinais e sintomas ser agrupados de acordo com o
estes muitas vezes em crises ou até incoercíveis. Disfagia pode se
quadro seguinte:
associar à pirose; quando para sólidos e líquidos, de forma
intermitente, pode significar alteração da motilidade do órgão, e
Típicos Alarme Atípicos Outros
quando rapidamente progressiva, com grande emagrecimento,
sintomas
assentamento de neoplasia em paciente já portador de esôfago
Azia/Pirose - Disfagia - Dor torácica - Globus
de Barrett.
Regurgitação - Odinofagia não cardíaca Ptialismo
ácida - Perda de - (water brash)
peso Manifestações: - Náusea SINTOMAS TÍPICOS COM ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA (EDA)
inexplicada 1- ORL 2- NORMAL
- Anemia Pulmonares 3- Estudos indicam que aproximadamente 60% dos pacientes com
-Hemorragia Orais DRGE tem endoscopia normal.
digestiva A maior parte dos pacientes com sintomas de refluxo não
apresenta evidências de esofagite ou de suas complicações a
A ausência de sintomatologia típica não exclui o diagnóstico de endoscopia, mas manifestam sintomas com a mesma intensidade
DRGE. Quando presente têm elevada especificidade (> 90%), mas e o mesmo impacto na qualidade de vida do que os que tem
sensibilidade inferior (55%). Nas síndromes extra-esofágicas, uma esofagite.
percentagem elevada de doentes não apresenta azia/pirose ou
regurgitação.
De acordo com o resultado da pHmetria, os portadores de DRGE A DRGE pode se manifestar através de sintomas atípicos, que
com endoscopia normal podem ser subdivididos em dois grupos: compreendem dor torácica de origem indeterminada, sintomas
doença do refluxo não erosiva e pirose funcional. otorrinolaringológicos (rouquidão, globus, roncos, pigarro,
Alguns pacientes com pirose podem revelar, durante a alterações das cordas vocais, laringite crônica, sinusite e erosões
investigação, endoscopia digestiva alta e pHmetria prolongada dentárias) e sintomas pulmonares (tosse crônica, asma, bronquite,
normais e ausência de resposta ao uso dos IBP, sendo então fibrose pulmonar, aspiração recorrente), dentre outros.
classificados como portadores de pirose funcional. Representam O refluxo do conteúdo gastroduodenal para a região faringo-
cerca de 10% dos pacientes com pirose e geralmente apresentam laríngea, mais conhecido como refluxo laringofaríngeo, é uma
resposta parcial ao tratamento antissecretor. Sua fisiopatologia importante causa de sintomas otorrinolaringológicos. Os sintomas
está ligada à hipersensibilidade visceral, sendo a pirose deflagrada ORL, assim como os pulmonares, podem ser causados por dois
por alterações sutis de pH ou mesmo por outros fatores, como mecanismos: o primeiro, a ação irritativa direta da secreção
distensão luminal ou alterações motoras como contrações gastroduodenal aspirada para a laringe e árvore brônquica, e o
sustentadas da camada muscular do esôfago. segundo, uma ação indireta mediada pelo reflexo
É importante salientar que a intensidade da pirose não guarda esofagobrônquico (via nervo vago).
relação com a gravidade da esofagite à endoscopia digestiva alta, Sobre os sintomas pulmonares, define-se tosse crônica como a
isto é, pacientes com pirose intensa e frequente não persistência deste sintoma por mais de oito semanas. Em não
necessariamente apresentarão esofagites mais graves ou fumantes, com radiografia de tórax normal e que não estejam
complicadas, ou pacientes com sintomas leves e esporádicos usando inibidores da ECA, as quatro causas mais comuns são:
podem apresentar, à endoscopia digestiva alta, esofagite DRGE, asma, bronquite crônica e gotejamento pós-nasal. Cerca de
acentuada ou complicada com esôfago de Barrett. 50% dos pacientes com tosse crônica são diagnosticados como
portadores de DRGE, que pode ser implicada como fator causal ou
Doença do refluxo não erosiva apenas um agravante da tosse.
Trata-se de condição na qual o paciente apresenta sintomas Os pacientes com manifestações atípicas com frequência não
típicos da DRGE e o exame endoscópico não evidencia alterações apresentam sintomas típicos de DRGE associados ou sinais
da mucosa esofágica. Baseados na resposta terapêutica com IBP e endoscópicos de esofagite, tornando o diagnóstico clínico difícil e
pHmetria esofágica prolongada, esses pacientes podem ser exigindo alto índice de suspeição. A relação causal entre DRGE e
classificados em: manifestações atípicas é outro desafio, já que a DRGE é uma
 Pacientes com exposição ácida anormal (que tem doença altamente prevalente, e a associação não causal pode
resposta terapêutica semelhante a dos pacientes com ocorrer com frequência, tornando o teste terapêutico ferramenta
esofagite endoscópica). importante para o estabelecimento de causalidade.
 Pacientes com exposição ácida normal e com correlação
positiva entre sintomas e episódios de refluxo (estimado
pelo índice de sintomas, que é positivo) e resposta ao
uso de IBP.

SINTOMAS ATÍPICOS
A causa mais comum da dor torácica de origem esofágica é a
DRGE, que pode ser indistinguível da dor de origem cardíaca.
O estímulo de quimiorreceptores da mucosa esofágica pelo
refluxato desencadeia essa dor, visto que a inervação do esôfago e
do miocárdico é a mesma.
Alguns autores têm demonstrado particularidades da dor SINTOMAS DE ALARME
esofagiana que, embora inespecíficas, poderiam sugerir este Sugerem formas mais agressivas ou complicações da doença, são:
diagnóstico, tais como relação atípica com exercícios, dor noturna, odinofagia, disfagia, sangramento, anemia e emagrecimento.
incômodo retroesternal contínuo após episódio agudo, dor
retroesternal sem extensão para região lateral, dor espontânea, ESOFAGITE EROSIVA
dor causada por mudança postural ou alimentação, alívio com A visualização endoscópica de erosões esofágicas sela o
antiácidos, alívio com nitroglicerina em prazo superior a 10 diagnóstico de DRGE. Apesar disso, ainda cabem diagnósticos
minutos e a presença de sintomas esofagianos associados (pirose, diferenciais, como lesão esofágica induzida por comprimido e
disfagia, regurgitação líquida ou dor desencadeada pela esofagite eosinofílica, dentre outros.
deglutição).
ESTENOSE PÉPTICA Nos pacientes com pHmetria normal, porém com resposta
A incidência de estenose péptica caiu muito após a introdução dos favorável aos inibidores de bomba de prótons, impõe-se o
IBP. A DRGE é responsável por 70% das estenoses esofágicas. diagnóstico de doença do refluxo não erosiva. Outra situação
Outras causas incluem ingestão de cáusticos, sequela de relativamente comum é aquela na qual o paciente apresenta
radioterapia ou esclerose de varizes, epodermólise bolhosa, pHmetria normal, índice de sintomas negativo e falta de resposta
doença de Crohn, tumores, sífilis, tuberculose e CMV, dentre aos inibidores de bomba de prótons, fatos que indicam o
outras. diagnóstico de pirose funcional.
O sintoma mais frequente de apresentação da estenose péptica é
a disfagia esofágica. Cerca de 30% dos pacientes não referem INSTRUÇÕES PARA A REALIZAÇÃO DE PHMETRIA PROLONGADA
sintomas prévios de pirose e regurgitação ácida. O paciente já deverá ter realizado esofagomanometria, pois é
Na propedêutica, utiliza-se habitualmente o estudo radiológico e a necessária a informação do limite superior do esfíncter esofagiano
endoscopia digestiva. A radiologia do esôfago tem alta inferior, que é dado em centímetros em relação às narinas e
sensibilidade na detecção das estenoses esofágicas, muitas vezes consta no laudo daquele exame. O posicionamento da sonda de
não visualizadas pela endoscopia. A endoscopia é um exame pHmetria no esôfago é feito em relação a este limite. Trata-se de
imprescindível, pois, além de visualizar a estenose, permite a um exame de 22-24 horas de duração em que o paciente vai para
coleta de biopsias para estudo histopatológico. casa portando o equipamento e voltará no dia seguinte para
retirá-lo.
ESÔFAGO DE BARRETT A sonda de pHmetria deverá ser calibrada em relação a soluções
Condição em que um epitélio colunar associado a metaplasia de pH conhecidos, ou seja pH 7 e pH 1. Cada marca de aparelho
intestinal substitui o epitélio escamoso normal que recobre o tem suas especificações, mas basicamente a sonda e o eletrodo de
esôfago distal. Trata-se na grande maioria das vezes de uma referência (peças amarelas) são mergulhados nas soluções de pH
sequela de DRGE de longa evolução. 7 e após na solução com pH 1 sendo aguardado o sinal emitido
DIAGNÓSTICO pelo aparelho de que a calibração foi satisfatória. Faz-se anestesia
A principal ferramenta para o diagnóstico da DRGE é a história das duas narinas com lidocaína gel (anestesia local). Não é feita
clínica. A anamnese deve identificar os sintomas característicos, sedação. Sabendo-se a distância em centímetro do limite superior
sua duração, intensidade, frequência, fatores desencadeantes e do esfíncter inferior, marca-se com esparadrapo a distância igual a
de alívio, padrão de evolução no decorrer do tempo e impacto na 5 cm acima deste valor. Uma sonda de fino calibre (2 mm), que
qualidade de vida. Se o paciente apresenta estes sintomas (pirose pode ou não já estar conectada ao aparelho, será introduzida em
e regurgitação) no mínimo duas vezes por semana, em período de uma das narinas e o paciente instruído a degluti-la com a cabeça
quatro a oito semanas ou mais, o diagnóstico da DRGE deve ser fletida e auxílio de goles de água (copo com canudo). A introdução
suspeitado. Deve ser lembrado, entretanto, que pacientes com da sonda se faz até o estômago, que é reconhecido pelo encontro
outras doenças tais como úlcera péptica, gastrite e câncer gástrico de pH muito ácido, em geral em torno de 2. Após isto, traciona-se
podem também referir estes sintomas. o cateter para cima até a marca de esparadrapo, sendo ancorada
Pacientes com manifestações atípicas podem não apresentar na narina, também com esparadrapo. Observa-se o pH do esôfago
sintomas típicos da DRGE. Os critérios de seleção para se que deve estar entre 6-7. Pode haver náuseas durante a passagem
investigar o refluxo gastroesofágico em pacientes com tosse da sonda, que melhoram rapidamente. Pode haver pequeno
crônica incluem ausência de tabagismo e de irritantes ambientais, sangramento nasal durante a introdução. Após a instalação do
exclusão de asma, secreção pós-nasal e radiografias de tórax e aparelho, o paciente recebe uma folha-diário onde deve anotar os
seios da face dentro da normalidade. horários em que se deitou e se levantou (mesmo que não seja
para dormir) e os horários em que iniciou e terminou todas as
PHMETRIA ESOFÁGICA PROLONGADA refeições, incluindo lanches e líquidos (com exceção de água).
O exame é realizado ambulatorialmente, utilizando equipamentos Sintomas tais como azia, golfada, dor no peito, tosse e chiado no
portáteis, sensores miniaturizados de PH e análise de dados peito, que surjam durante a monitorização devem ser anotados
computadorizados. A pHmetria prolongada permite o diagnóstico (nome e hora de surgimento).
de DRGE por demonstrar a presença de refluxo ácido
gastresofágico anormal. IMPEDANCIOMETRIA ESOFÁGICA
A pHmetria não é considerada padrão-ouro no diagnóstico, pois é Trata-se de técnica que permite a identificação do refluxo
um método que apresenta várias limitações. Cerca de 25% dos gastresofágico independente de seu Ph e de seu estado. Sendo
pacientes sabidamente portadores de esofagite apresentam um assim, possibilita a avaliação qualitativa do tipo de refluxo (ácido
estudo pHmétrico normal. Essas limitações são previsíveis, pois a ou fracamente ácido), seu alcance proximal, sua composição
pHmetria prolongada mede apenas um aspecto fisiopatológico da (líquido, gasoso ou misto), bem como o tempo de depuração
DRGE, que é uma doença multifatorial. esofágico. A principal indicação de impedanciometria é na
O exame está indicado nas seguintes situações: avaliação de pacientes com sintomas típicos ou extraesofágicos
a) diagnóstico da DRGE em pacientes com endoscopia normal; atribuídos a DRGE, que não responderam de forma completa ao
b) caracterização do padrão do refluxo gastroesofágico; tratamento com IBP.
c) participação do refluxo ácido nas manifestações atípicas do Nos pacientes refratários ao tratamento com inibidores de bomba
refluxo gastroesofágico. Nessa situação é aconselhável que o de prótons, o diagnóstico de refluxo não ácido constitui indicação
exame seja realizado com cateter de no mínimo dois canais de para o tratamento cirúrgico, pois a fundoplicatura elimina os dois
registro, ficando um posicionado no esôfago distal e o segundo no tipos de refluxo.
esfíncter superior do esôfago ou acima dele, o que permite o
diagnóstico de refluxos gastroesofágico e laringofaríngeo ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA
respectivamente; Exame de escolha para avaliação das alterações da mucosa
d) estudo da recidiva de sintomas no pós-operatório; esofágica secundárias a DRGE, permitindo, além de sua
e) avaliação da eficácia do tratamento clínico. visualização direta, a coleta de fragmentos esofágicos através de
biopsias. As principais indicações de realização de ED em peristáltica. A melhor indicação desse exame é na avaliação de
pacientes com suspeita de DRGE são: diagnósticos diferenciais de afecções que podem provocar
a) Excluir outras doenças ou complicações da DRGE, sintomas semelhantes aos da DRGE.
principalmente em pacientes com sintomas de alarme.
b) Pesquisar a presença de esôfago de Barrett em TRATAMENTO
pacientes com sintomas de longa duração A abordagem terapêutica da DRGE inclui duas modalidades, o
c) Avaliar gravidade da esofagite tratamento clínico e cirúrgico, cuja escolha depende das
d) Orientar o tratamento e fornecer informações sobre a características do paciente (idade, aderência ao tratamento,
tendência de cronicidade do processo. preferência pessoal, presença de comorbidades), além de outros
A endoscopia digestiva alta permite diagnosticar outras afecções, fatores tais como, resposta ao tratamento, presença de erosões
tais como úlcera péptica, monilíase esfágica, câncer do estômago na mucosa esofagiana, sintomas atípicos e complicações.
e esofagite eosinofílica, que também apresentam sintomas
dispépticos. Além disso, este exame permite visualizar erosões MEDIDAS HIGIENODIETÉTICAS
(soluções de continuidade limitadas à mucosa, com pelo menos 3 Considera-se que é recomendável educar os pacientes a respeito
mm de extensão, com depósito de fibrina e permeação dos fatores que podem precipitar episódios de refluxo, mas o
neutrofílica do epitélio, caracterizando a esofagite), úlceras emprego isolado dessas recomendações não é suficiente para
(soluções de continuidade que atingem pelo menos a camada controlar de modo eficaz seus sintomas. A adesão da grande
muscular da mucosa), estenose péptica de esôfago de Barrett. maioria dos pacientes a essas medidas é geralmente limitada.
De um modo geral, as classificações endoscópicas das esofagites Refeições pouco volumosas, com alto conteúdo de proteínas e
não contemplam as alterações mínimas da mucosa esofágica baixo conteúdo de gorduras, podem evitar a distensão gástrica e
(friabilidade, edema e hiperemia). contribuir para manter a pressão do EIE. A ingestão de alimentos
nas 3 horas precedentes ao horário de deitar contribuiria para
A complementação do exame endoscópico com biópsia não deve reduzir a frequência dos episódios pós-prandiais de refluxo,
ser conduta de rotina, estando reservada para situações especiais, especialmente na posição de decúbito. O suco de laranja teria
tais como estenose, úlcera e esôfago de Barrett. efeito irritativo direto na mucosa esofágica independente do PH, o
que poderia ser explicado pela elevada osmolaridade dos sucos
concentrados, também presente em comidas apimentadas que
geralmente são preparadas com muito sal. A hiperosmolaridade
dos alimentos pode também ser responsável pela pirose. Em
relação ao café, existem estudos conflitantes quando ao seu efeito
sobre o EIE, mas o café descafeinado diminui em 85% a exposição
ácida observada a pHmetria quando comparado com o café
tradicional.
A obesidade é considerada fator de risco para DRGE,
principalmente a gordura intra-abdominal medida pela
ESTUDOS RADIOLÓGICOS circunferência abdominal. A perda de peso deve ser estimulada
A cintigrafia e o esofagograma com bário são os métodos nos pacientes obesos, senso comumente observada melhora
radiológicos habitualmente utilizados na avaliação da DRGE e suas subjetiva dos sintomas.
complicações. Os estudos baritados são úteis em pacientes com O tabagismo tem influência negativa na DRGE devido a:
disfagia, visto que apresentam boa sensibilidade na detecção de diminuição da pressão do EIE, diminuição do volume e da
hérnias hiatais, estenoses e anéis esofágicos. A cintigrafia para secreção de bicarbonato salivar, e aumento do risco de
estudo da DRGE utiliza alimento marcado com tecnécio. Como desenvolvimento de adenocarcinoma do esôfago distal e cárdia.
permite avaliar o RGE do material isotopicamente marcado,
independente de sua acidez, pode ser útil em estudo de pacientes TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
gastrectomizados, portadores de anemia perniciosa, ou em IBP
vigência de tratamento com drogas inibidoras da secreção ácida Vários fármacos podem ser utilizados no tratamento da DRGE.
gástrica. Atualmente as drogas de primeira escolha são os inibidores de
bomba de prótons (IBP), que inibem a produção de ácido pelas
TESTE DE BERNSTEIN células parietais do estômago, reduzindo a agressão do esôfago
Objetiva comprovar que o sintoma do paciente decorre do refluxo representada pelo ácido. O omeprazol é o IBP largamente
ácido gastresofágico. Utiliza-se infusão de ácido clorídrico na luz empregado em nosso país, sendo fornecido gratuitamente pelo
esofágica na tentativa de reproduzir o sintoma típico do paciente, Ministério da Saúde para a população de baixa renda. Os IBP em
e a infusão de solução salina como placebo. Considera-se o teste dose plena devem constituir o tratamento de escolha inicial por
positivo naquele paciente que apresentou sintomas típicos apenas período de quatro a oito semanas. Se o paciente não apresentar
durante a infusão de HCL. Deve ser reservado para situações em abolição dos sintomas, a dose deve ser dobrada, isto é, antes do
que não se dispõe de pHmetria prolongada, ou para pacientes que desjejum e antes do jantar.
apresentam sintomas infrequentes, e que não ocorreram durante A DRGE erosiva responde de maneira satisfatória ao tratamento
o monitoramento esofágico do PH. clínico. Entretanto, após a retirada da medicação, observa-se
retorno dos sintomas. Isto acontece pelo fato de se tratar de
MANOMETRIA ESOFÁGICA doença crônica, necessitando portanto de administração crônica
Apresenta uma indicação limitada na avaliação inicial da DRGE e do IBP. Este é o chamado tratamento de manutenção, no qual
não deve ser realizada para diagnóstico dessa doença. Esse exame deve ser administrada a mínima dose capaz de manter o paciente
pode ser útil na avaliação da gravidade da DRGE, podendo prever assintomático. A terapêutica a longo prazo é eficaz, não se
sua gravidade ao demonstrar um EIE defectivo ou disfunção observando a ocorrência de displasia ou neoplasia.
Doses padronizadas dos IBP: omeprazol 20mg; lansoprazol 30mg; A metoclopramida não é considerada boa escolha no tratamento
pantoprazol 40mg; rabeprazol 20mg; esomeprazol 40mg. da DRGE, pois atua no SNC, causando efeitos colaterais como
Se o paciente apresentar sintomas pouco frequentes, o uso do sonolência, irritabilidade, tremores e discinesia.
medicamento pode ser feito de acordo com a demanda própria. A domperidona, antagonista da dopamina apenas em nível
Porém, nos pacientes com esofagite grave (classificação de LA C e periférico, é útil, mas observa-se hiperprolactinemia em 10 a 15%
D), deve-se iniciar com a dose-padrão e mantê-la. Caso os de seus usuários crônicos.
sintomas ou as lesões endoscópicas persistam, acrescentam-se
NOVAS DROGAS
uma segunda dose a noite.
Algumas drogas de diferentes perfis farmacológicos têm sido
São considerados pacientes refratários aqueles que necessitam testadas, apresentando resultados iniciais limitados. Resultados
usar IBP mais que 2x/dia, sem controle dos sintomas associados promissores tem sido obtidos com o baclofeno, agonista dos
ao refluxo e/ou com alterações mucosas significativas após 12 receptores B do GABA. Seu uso em pacientes com DRGE mostrou
semanas ou mais de tratamento. redução do número de episódios de refluxo e o percentual de
A recorrência dos sintomas após a interrupção do IBP não é tempo de exposição ácida após uma única dose de 40mg. Seu
considerada refratariedade, pois a DRGE é condição crônica ou mecanismo parece ser a supressão dos refluxos transitórios.
recidivante.
As principais preocupações sobre as consequências da inibição da TRATAMENTO CIRÚRGICO
secreção gástrica incluem: Consiste no reposicionamento do esôfago na cavidade abdominal
associado a hiatoplastia e fundoplicatura.
a) Hipergastrinemia, reversível com a interrupção do
O tratamento cirúrgico do esôfago de Barrett não complicado
tratamento e não relacionada com desenvolvimento de
consiste na fundoplicatura, atualmente realizada por via
carcinoides ou displasias;
videolaparoscópica. A realização de uma pHmetria pós-operatória
b) Progressão da gastrite do corpo gástrico induzida pela seria ideal para se confirmar a ausência de refluxo ácido no
infecção do H. pylori. Nos pacientes que necessitam de esôfago.
uso continuado de IBP, é recomendável a pesquisa e A falha de resposta ao tratamento clínico não é atualmente
erradicação do microrganismo. considerada como indicação de tratamento cirúrgico, pois a falha
c) Possível interferência na absorção de nutrientes, devido terapêutica pode ser devida a incorreção do diagnóstico. Nesse
a hipocloridria resultante do uso prolongado de IBP. caso, deve-se sempre reconsiderar o diagnóstico e reavaliar a
terapia.
MECANISMO DE AÇÃO As indicações da cirurgia antirrefluxo variam.
- houver razões que impossibilitem a continuidade do tratamento
Todos os inibidores da bomba de prótons são “pró-fármacos” que
clínico (de ordem pessoal, econômica ou intolerância) e nos casos
necessitam ativação em ambiente ácido. Os fármacos dessa classe
em que for exigido tratamento contínuo de manutenção com IBP,
entram na célula parietal a partir do sangue e acumulam-se nos
especialmente naqueles com menos de 40 anos, que optem pelo
canalículos secretores ácidos da célula parietal, onde são ativados
tratamento cirúrgico.
por um processo catalisado por prótons, que resulta na formação
Outra vantagem do tratamento cirúrgico é o controle do refluxo
de uma sulfenamida tiofílica ou ácido sulfênico. Essa forma
não ácido (componentes biliar e pancreático) e seu controverso
ativada reage por meio de ligação covalente com o grupo sulfidril
impacto nas alterações metaplásicas e displásicas do epitélio
de cisteínas do domínio extracelular da H+, K+-ATPase, as quais são
esofágico.
essenciais para a inibição da produção ácida.
Sintomas pós-operatórios como disfagia, incapacidade de eructar,
O resultado é a inibição irreversível da secreção ácida da bomba
plenitude pós-prandial, síndrome do ar preso e flatulência
de prótons. Por causa da ligação covalente, os efeitos inibitórios
ocorrem em até 40% dos casos e devem ser informados
dos IBPs duram muito mais tempo do que
previamente aos pacientes.
sua meia-vida plasmática. A meia-vida plasmática dos IBPs varia
em torno de 1 a 2 horas, e o efeito sobre a secreção ácida pode
TRATAMENTO ENDOSCÓPICO
durar até 24 horas, até que ocorra a síntese de nova enzima.
Novos e variados procedimentos endoscópicos para o tratamento
da DRGE estão sendo investigados e todos tem como objetivo
ANTAGONISTAS H2
aumentar a barreira antirrefluxo. Apesar de algumas dessas
Cimetidina, ranitidina, famotidina, nizatidina são drogas seguras e
técnicas terem sido aprovadas pelo órgão regulador, elas
bem toleradas, mas tem curta duração de ação (entre 4 a 8h) e
continuam sendo investigadas: radiofrequência (Stretta), sutura
resultam em inibição incompleta da secreção ácida.
endoscópica, implantação de microesferas. O procedimento com
Consequentemente, para o tratamento da DRGE, são necessárias
Stretta cria uma lesão, que ao cicatrizar, resulta em estenose. A
doses múltiplas. Além disso observa-se declínio da inibição da
sutura endoscópica cria uma plicatura endoluminal no esôfago
secreção ácida quando usada por mais que 2 semanas, fenômeno
distal.
conhecido como taquifilaxia ou tolerância, que limita a eficácia
terapêutica.
USO PROLONGADO DE INIBIDORES DA BOMBA DE PRÓTONS E O
Dentre os antagonistas de H2, a cimetidina e ranitidina foram os
mais estudados no tratamento da doença, com boa resposta após RISCO DE CÂNCER GÁSTRICO
8 semanas de tratamento em aproximadamente 50 a 66% dos Em um estudo prospectivo, pacientes com gastrite com
pacientes. Os melhores resultados foram obtidos em pacientes predominância de corpo, atrofia gástrica severa e metaplasia
com esofagite leve a moderada, tratados com doses elevadas. intestinal estavam todos em maior risco de desenvolvimento de
câncer gástrico.
PROCINÉTICOS Com a potente supressão ácida, os IBPs podem induzir alterações
As alterações fisiopatológicas responsáveis pela DRGE poderiam no ambiente gástrico, incluindo hipergastrinemia e hiperplasia das
ser corrigidas por drogas que aumentassem a pressão do EIE, células enterocromafins. Há também evidências sugerindo que os
melhorassem o peristaltismo do esôfago e o esvaziamento IBPs podem contribuir para o supercrescimento bacteriano no
gástrico. Os medicamentos procinéticos não corrigem essas estômago. Intuitivamente, os IBPs pioram a atrofia gástrica e,
alterações, e são eficientes apenas quando usados em pacientes portanto, podem aumentar o risco de câncer gástrico.
com sintomas dispépticos associados.
Potenciais mecanismos carcinogênicos de inibidores da bomba de
prótons
Dados emergentes mostraram que os IBP de longo prazo estão
associados a vários efeitos colaterais, incluindo fratura óssea,
infecção por Clostridium difficile, pneumonia, infarto do miocárdio
e AVE, embora uma causalidade ainda não tenha sido confirmada.
A supressão ácida potente tem sido suspeitada há muito tempo
como um fator de risco de câncer gástrico pelo agravamento da
atrofia gástrica com consequente hipergastrinemia e
supercrescimento bacteriano no estômago.

Interação com infecção por Helicobacter pylori


O H. pylori tipicamente coloniza o antro gástrico e causa uma
gastrite predominante no antro na maioria dos indivíduos
infectados. A inflamação da mucosa do antro, por sua vez,
estimula a secreção gástrica, mantendo um ambiente normal ou
altamente ácido. No entanto, quando a produção de ácido é
suprimida por IBPs, o padrão de gastrite muda para uma gastrite
predominante no corpo, com resultante comprometimento da
função das células parietais; um fenômeno que não ocorre em
pacientes negativos para H. pylori. Como tal, o efeito supressor de
ácido dos IBPs é ainda aumentado pela gastrite do corpo induzida
por H. pylori.

Hipergastrinemia
Em resposta à supressão da produção de ácido gástrico por IBP, há
um aumento compensatório na produção de gastrina como um
feedback negativo. Durante o uso de IBP a longo prazo (> 3 anos),
os níveis médios de gastrina subiram para uma a três vezes o
limite superior do normal. O efeito de crescimento da gastrina é
suspeito de ter um papel no desenvolvimento do câncer gástrico.
A hipergastrinemia impulsiona a hiperplasia de células do tipo
enterocromafina (ECL) na mucosa oxínica, que ocorre em 10 a
20% dos pacientes com uso prolongado de IBP. Tem sido relatado
que o risco de hiperplasia de células ECL é maior em pacientes
infectados com H. pylori do que em pacientes negativos para H.
pylori.
Além disso, outro estudo também sugeriu que a promoção do
crescimento de carcinomas gástricos de "tipo intestinal" pode ser
devida ao efeito indireto da hipergastrinemia, via estimulação da
liberação de substâncias sinalizadoras (por exemplo, histamina,
proteína gênica em regeneração) das células ECL.

Supercrescimento bacteriano não-Helicobacter pylori


A supressão ácida de IBP pode levar tanto a luminal quanto a
mucosa não-H. supercrescimento bacteriano pylori no estômago
que pode exacerbar a inflamação crônica. Foi demonstrado que
não-H. supercrescimento bacteriano de pylori é um fator de risco
para gastrite atrófica. A infecção simultânea com H. pylori e não-
H. A bactéria pylori tem um efeito sinérgico na indução de um
nível mais alto de citocinas séricas [interleucina (IL) -1 beta e IL-8]
e aumenta o risco de gastrite atrófica. Além disso, há um aumento
no número de bactérias, incluindo microorganismos não-gástricos
(principalmente da flora oral) que possuem nitrato redutase para
produzir compostos N-nitrosos a partir de nitratos alimentícios,
conhecidos como carcinógenos gástricos.

Os autores propuseram que os IBPs podem ser prescritos por um


curto período como parte do regime de erradicação do H. pylori
para aqueles que usam IBP <1 ano; e quando tempo
suficientemente longo for permitido, o IBP e a infecção por H.
pylori agem sinergicamente para aumentar o risco de câncer
gástrico naqueles que utilizam IBP> 3 anos.

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