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ABSTRACT
Objective: To evaluate the nutritional status and evolution, as well as
the appropriateness of prescribing nutrition in patients with acute pan-
creatitis.
INTRODUÇÃO
A glândula pancreática tem como função, dentre São várias as causas envolvidas na etiologia da
outras, a secreção de enzimas lipolíticas, proteo- pancreatite aguda, no entanto, a doença do trato
líticas e de amilase, essenciais para a digestão de biliar e a ingestão abusiva de álcool correspon-
nutrientes no intestino. A pancreatite aguda ocor- dem a cerca de 80% dos casos. O restante é atri-
re quando a ação dessas enzimas é ativada ina-
buído ao trauma, drogas, infecção, dano vascu-
dequadamente no interior das células acinares,
lar, manuseio endoscópico, hipertrigliceridemia,
em resposta a agressões por várias causas, como
organismos vivos, processos metabólicos, tóxicos hipercalcemia e gravidez, sendo que, em 10%
e alterações obstrutivas da papila de Vater ou do dos casos aproximadamente, a etiologia ainda é
próprio ducto pancreático1,2. desconhecida1,3.
massa muscular, edemas e ascite). No final, com milímetros (decimal). A DCT foi realizada em três
base na classificação de cada um desses aspectos, tomadas e considerado a média desses valores.
o paciente é diagnosticado como: A - bem nutrido,
B - suspeito de ser desnutrido ou moderadamente Para aferição da CB, foi utilizada fita métrica de
desnutrido e C - desnutrido grave7. Para facilitar a material inextensível de até 150cm, com escala de
comparação entre os métodos de avaliação nutri- um cm. A CB e a DCT foram feitas com o paciente
cional, a classificação da ASG foi considerada da em posição ereta, braço relaxado na lateral do cor-
seguinte forma: eutrofia significa bem nutrido e po e a palma da mão voltada para a coxa. A medi-
abaixo da eutrofia significa suspeita de desnutri- da utilizada foi a do ponto médio entre o acrômio
ção ou desnutrição moderada ou grave. e olécrano do braço direito. Essas aferições foram
realizadas por uma única pessoa a fim de evitar
O peso corporal foi aferido utilizando a balança variações interexaminadores. Para encontrar o va-
digital marca G-Tech® com capacidade de 150 kg lor da CMB foi utilizada a fórmula CMB = CB –
e escala de 100 gramas. Os pacientes apresenta- (0,314 x DCT)8.
vam-se descalços, em uso de roupa leve, sem ade-
reços que pudessem interferir no valor da aferição, As medidas de DCT, CB e CMB foram compara-
permanecendo em pé no centro da balança, com o das com o padrão de referência de Frisancho8 e
peso corporal distribuído igualmente em ambos os a adequação foi calculada a partir da divisão dos
pés8. Caso constatada a presença de edema ou asci- valores obtidos pelo percentil 50º multiplicados
te no exame físico do paciente, o peso seco foi utili- por 100. Para a classificação do estado nutricional
zado, ou seja, foi descontado o líquido presente no foram considerados os seguintes valores de obe-
espaço extravascular. Conforme recomendado por sidade: >120%, sobrepeso: 110-120%, eutrofia:
Martins9, foi considerado excesso de peso: 1kg, 90%-110%, desnutrição leve: 80%-90%, desnu-
edema de tornozelo (+); 3 a 4kg, edema até o joe- trição moderada: 70%-80% e desnutrição intensa:
lho (++); 5 a 6kg, edema até a base da coxa (+++); <70%13. Da mesma forma que a ASG e o IMC, as
e 10 a 12kg, anasarca (++++). James10 considera medidas de DCT, CB e CMB foram classificadas
excesso de peso: até 2,2kg na ascite leve, até 6,0kg em: abaixo da eutrofia, eutrofia e acima da eutro-
na ascite moderada e até 14,0kg na ascite grave. fia.
A estatura foi obtida por meio de estadiômetro da A avaliação da adequação da prescrição nutricio-
marca Personal Capice Sanny®, com escala de me- nal foi realizada por meio da análise do tempo de
dição de 115cm a 210cm. O paciente foi posicio- jejum e dos teores nutricionais (calorias e macro-
nado com calcanhares, glúteos e dorso da cabeça nutrientes) das dietas e fórmulas (oral, enteral e
contra o estadiômetro, permanecendo descalço, parenteral) prescritas, conforme as recomenda-
com os braços ao longo do corpo ereto, olhos fixos ções da European Society for Clínical Nutrition
em um plano horizontal, paralelo ao chão8. and Metabolism (ESPEN, 2006 e 2009)5,6, Ame-
rican Society for Parenteral and Enteral Nutrition
Após a aferição do peso e da estatura, foi obtido (ASPEN, 2009)14 e Sociedade Brasileira de Nutri-
o Índice de Massa Corporal (IMC) pela divisão ção Parenteral e Enteral/Sociedade Brasileira de
do peso, em quilogramas, pela estatura, em me- Clínica Médica/Associação Brasileira de Nutrolo-
tros, elevada ao quadrado. Para a classificação do gia (SBNPE/SBCM/ABN, 2011)15, que estabelecem
estado nutricional por este índice foram utiliza- diretrizes específicas para esta doença, além de
dos os pontos de cortes para adultos segundo a outros estudos publicados sobre o tema.
Organização Mundial de Saúde (OMS)11 e, para
idosos, segundo Lipschitz12. Porém, para possi- A prescrição nutricional foi obtida a partir das
bilitar a comparação com os outros métodos de prescrições médicas e dietéticas por meio da con-
avaliação foram considerados, para adultos: abai- sulta em prontuário eletrônico e do contato com
xo da eutrofia (IMC<18,5Kg/m²), eutrofia (18,5 a os profissionais responsáveis para esclarecimentos
25Kg/m²) e acima da eutrofia (IMC > 25Kg/m²) e de dúvidas.
para idosos: abaixo da eutrofia (IMC<22Kg/m²),
eutrofia (22 a 27Kg/m²) e acima da eutrofia (IMC A composição nutricional da dieta por via oral foi
> 27Kg/m²). verificada por meio do cálculo das médias dos va-
lores de calorias e macronutrientes dos cardápios
Para a verificação da DCT utilizou-se o plicômetro diários, que foram levantados a partir do relatório
cientifico Sanny®, com resolução em décimos de nutricional fornecido pela empresa prestadora de
serviços (responsável pela elaboração dos cardá- Segundo o protocolo da nutrição parenteral, duas
pios e fornecimento das refeições). A dieta zero e vezes por semana deve ser realizado o hemograma
tentativas de realimentação mal sucedidas por via e semanalmente o sódio, potássio, cloreto, glice-
oral, sem concomitante oferta de nutrientes por mia, cálcio, magnésio, fósforo, uréia, creatinina,
outra via – suporte nutricional artificial, foram bilirrubina total e frações, Alanina transaminase
consideradas jejum. (ALT), Aspartato transaminase (AST), triglicerí-
deos, fosfatase alcalina, Tempo de Atividade da
O teor nutricional das fórmulas enteral e parente- Protrombina (TAP) e ferro sérico. Os exames de
ral foi obtido conforme cálculo a partir das pres- rotina padronizados para o paciente internado in-
crições individualizadas dos pacientes, sendo que, cluindo os com nutrição enteral são os seguintes:
para a nutrição por via enteral foi considerada a colesterol total e triglicerídeos (na avaliação nu-
prescrição nutricional desde o primeiro dia de ad- tricional inicial), hemograma, sódio, potássio, cál-
ministração e para a nutrição parenteral a partir cio, magnésio, fósforo, ureia, creatinina e albumi-
do terceiro dia (devido ao fato do paciente, con- na (semanalmente).
forme o protocolo específico para esta última via,
geralmente atingir as necessidades nutricionais no Para a análise estatística, o banco de dados foi ela-
terceiro dia de prescrição e administração). borado em planilhas do software Microsoft Excel
2007, apresentados como medidas de posição
A evolução nutricional foi verificada conforme (média e mediana) e de dispersão (desvio padrão)
monitoramento bioquímico e ponderal. Os exa- e na forma de tabelas de frequências.
mes bioquímicos e pesos foram levantados sema-
nalmente até a intervenção cirurgica, nos casos
que necessitavam de cirurgia, ou até a alta hos- RESULTADOS E DISCUSSÃO
pitalar do paciente. Lembrando que, a ingestão
alimentar do paciente não foi investigada, por A pancreatite aguda tem uma incidência que varia
não fazer parte do propósito deste estudo, que se amplamente de acordo com a população estuda-
restringiu a avaliação da adequação da prescrição da, no entanto, estima-se que ocorra de 5 a 80
nutricional. casos por 100.000 habitantes ao ano no mundo16.
Quando a oferta de nutrientes é por via parenteral Neste estudo, durante aproximadamente cinco
ou enteral, o monitoramento bioquímico, neste meses de coleta de dados, foram identificados 64
serviço, é realizado de acordo com o protocolo es- casos de pancreatite aguda, embora devido aos
pecífico padronizado pela Equipe Multiprofissio- critérios da pesquisa, 11 tenham sido excluídos
nal de Terapia Nutricional – EMTN. da amostra (Figura 1).
Figura 1.
Amostra inicial e final de pacientes com pancreatite aguda internados nas clínicas médica, cirurgia geral e emergência, do
Hospital Regional da Asa Norte (HRAN) da Secretária de Estado de Saúde. Brasília, 2012
Na amostra final (n=44), o número de pacientes coólica1,16. Esses dados podem justificar a maior
com educação básica prevaleceu (93%, n=41). A prevalência nesta amostra da pancreatite aguda
maioria (68%, n=30) da amostra era procedente do em mulheres, pois a causa mais frequente foi a bi-
Distrito Federal, seguido pelas cidades do entorno liar (62%, n=27), seguida da alcoólica (5%, n=2)
e de outros estados do Brasil. A pancreatite aguda (Tabela 1). Os dois estudos supracitados, Losada
biliar foi a etiologia predominante, corresponden- et al.16 e Rockenbach et al.3, verificaram, assim
do a mais da metade (62%, n=27) dos casos da como este estudo, maior prevalência da pancrea-
amostra, seguida por outras causas (Tabela 1).
tite aguda no sexo feminino, também foi observa-
A média de idade dos pacientes desta pesquisa foi da predominância da pancreatite de origem biliar
de 47,61 anos (± 14,28 anos) e mediana de 47 com 83,6% e 61% dos casos respectivamente.
anos, sendo a idade mínima igual a 23 e a máxi-
ma igual a 80 anos. A média de idade em estudo A pancreatite aguda biliar pode ser causada pela
de Rockenbach et al.3, realizado num hospital da obstrução da ampola de Vater, no duodeno, de-
cidade de Porto Alegre/RS no período de 2000 a vido ao cálculo ou inflamação decorrente da sua
2004, foi de 49,71 ±16,9 anos e no de Losada et passagem por este local e a calculose biliar está
al.16, conduzido em um hospital do Chile entre associada com alimentação inadequada, obesi-
2005 e 2006, foi de 52,9 ± 17,7 anos. dade, perda rápida de peso, idade, gestação, dia-
betes tipo 2, dislipidemia, resistência à insulina,
A maior prevalência (48%, n=21) foi a faixa etária etnia, história familiar, uso de contraceptivo oral
de 40 a 60 anos, seguida da faixa etária de 20 a 39 e sedentarismo, sendo a obesidade o maior fator
anos (18%, n=08) (Tabela 1). Santos et al.4 referem de risco1,19.
que a doença, usualmente, acomete a faixa etária
de 30 a 60 anos. Fagenholz et al.17, por meio de Tabela 1.
estudo realizado nos Estados Unidos da América
Caracterização da amostra de pacientes com pancre-
entre 1993 e 2003, encontraram uma incidência a atite aguda internados nas clínicas médica, cirurgia
partir dos 22 anos com aumento a partir dos 40 geral e emergência, do Hospital Regional da Asa Norte
anos, atingindo o seu máximo a partir dos 80 anos (HRAN) da Secretária de Estado de Saúde. Brasília,
de idade. A idade avançada (maior que 70 anos) 2012. (n = 44)
parece aumentar a mortalidade em 19%3. VARIÁVEL N %
20-39 15 34
No presente estudo, houve prevalência de pa-
cientes do sexo feminino, correspondendo a 66% 40-60 21 48
Idade (anos)
(n=29), enquanto que, os pacientes do sexo mas- > 60 08 18
culino corresponderam a 34% (n=15). A preva- Total 44 100
lência de pancreatite aguda no sexo feminino tam-
bém é encontrada em outros estudos como o de Educação Básica 41 93
Escolari-
Rockenbach et al.3, na qual 58,33% (n=35) dos Educação Superior 03 07
dade
pacientes eram do sexo feminino e 41,66% (n=25) Total 44 100
do sexo masculino. No estudo de Losada et al.16,
Distrito Federal 30 68
54% (n=136) da amostra eram do sexo feminino.
Ao contrário, na pesquisa de Fagenholz et al.17 foi Entorno 09 21
Procedência
demonstrado que o gênero masculino é mais aco- Outros estados 05 11
metido pela pancreatite aguda que o feminino o Total 44 100
que ocorreu também no estudo de Chatzicostas
et al.18, realizado no Departamento de Gastroen- Biliar 27 62
terologia e Cirurgia Oncológica de um hospital Alcoólica 02 05
universitário da Grécia, quando encontraram uma Hipertrigliceridemia 01 02
prevalência maior em homens (42 homens para Pancreatite
Edematosa 01 02
36 mulheres). Aguda
Necro hemorrágica 01 02
Segundo a literatura, a etiologia da pancreatite Não descrita 12 27
aguda predominante nas mulheres tende a ser a
Total 44 100
biliar, enquanto nos homens, geralmente, é a al-
Tabela 2.
Classificação do estado nutricional na admissão de pacientes com pancreatite aguda internados nas clínicas médica,
cirurgia geral e emergência, do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN) da Secretária de Estado de Saúde. Brasília, 2012.
(n=44)
ABAIXO EUTROFIA ACIMA TOTAL
MÉTODO
N % N % N % N %
ASG 11 25 33 75 - - 44 100
IMC 05 11 17 39 22 50 44 100
CB 08 19 24 55 11 26 43* 100
DCT 16 37 13 30 14 33 43* 100
CMB 03 07 28 65 12 28 43* 100
Legenda: ASG: Avaliação Subjetiva Global; IMC; índice de Massa Corporal; CB: Circunferência do Braço; DCT: Dobra Cutânea Triciptal; CMB: Circunferên-
cia Muscular do Braço. (*) Amostra com menos um paciente, pois um era maior de 75 anos e a referência usada (Frisancho, 1990) só considera a idade
até 74,99 anos.
Conforme tratamento inicial, todos os pacientes Triviño et al.2, em sua pesquisa, referem que não
após diagnóstico de pancreatite aguda, ficaram em existe um tratamento específico para o processo in-
jejum por um tempo médio de 3,63 dias (±1,83 flamatório que impeça a progressão da doença. Des-
dias) sendo o mínimo de um dia e o máximo de sa forma, o tratamento inicial é clínico e sintomático
11 dias. O tempo de jejum inferior a sete dias cor- sendo caracterizado por jejum oral, hidratação pa-
respondeu a 93% (n=41) dos casos. Portanto, o renteral, nutrição parenteral (nos casos mais graves)
tempo de jejum da maioria dos pacientes foi ade- e analgesia sistêmica. Em alguns casos, a interven-
quado segundo SBNPE/ SBCM/ ABN15, ASPEN14 e ção cirúrgica está indicada para tratar a patologia de
ESPEN6,7, pois estas diretrizes indicam que os pa- base. O jejum é indicado até que as náuseas, vômi-
cientes impossibilitados de ingerir alimentos por tos e dor abdominal desapareçam. A elevação das
via oral até 5 – 7 dias após início da sintomatologia enzimas pancreáticas sem sintomas não justifica o
devem iniciar com a nutrição enteral ou parenteral. jejum prolongado, segundo Santos et al4.
A dieta por via oral foi a mais usada para a reali- O tempo médio do suporte nutricional por via
mentação dos pacientes, após o período de jejum, enteral exclusiva foi de quatro dias (±2,71 dias),
correspondendo a 73% (n=32) da amostra, o que sendo o mínimo de um dia e o máximo de nove
sugere predominância da forma leve da doença. dias. A prescrição nutricional da dieta por esta via
foi personalizada e evoluída conforme a tolerância
Não existe na literatura uma recomendação nutri- de cada paciente. Apenas um paciente alcançou a
cional clara para a forma leve da doença, de acor- meta de 1,0 a 1,5g/kg de peso de proteínas com
do com a ESPEN5, a dieta por via oral deve ser rica 50% de carboidratos e 30% de lipídio do valor
em carboidratos e proteínas e com teor de lipídios calórico total (que com base nestes dados corres-
menor que 30% da ingestão energética e, de pre- ponderia a 20 – 30kcal/kg/dia) antes da introdu-
ferência, que a gordura seja de origem vegetal. Os ção da dieta por via oral, conforme recomendado
pacientes, deste estudo, iniciaram a realimentação pela ESPEN5.
com dieta de prova, conforme a rotina das clíni-
cas, que foi evoluída, de acordo com a tolerância A nutrição parenteral é recomendada na impos-
digestiva, para dieta com a média de 40,74kcal sibilidade de uso do trato digestivo ou quando a
e 1,51g de proteína por kg/dia, sendo 68,25% e nutrição enteral for insuficiente de acordo com a
16,93% das calorias totais provenientes de carboi- SBNPE/SBCM/ABN15, ASPEN14 e ESPEN6, sendo
dratos e lipídios respectivamente. que a última acrescenta que o tempo de jejum de
5-7 dias pode ser reduzido no caso desnutrição
Em relação à consistência da dieta, uma meta-a- pré-existente.
nálise direcionada por Meng et al.20, (n=362) que
comparou a dieta líquida com as dietas não líqui- Neste estudo, o tempo médio do suporte nutricio-
das (pastosa e sólida), demonstrou que a dieta nal por via parenteral exclusiva, para os dois pa-
pastosa ou sólida não aumentaram a recorrência cientes, foi de 29 dias, sendo que a oferta calórica
da dor após a realimentação, em comparação com média foi de 29,8kcal/kg/dia, a de proteína foi de
a dieta líquida na pancreatite aguda leve. Os auto- 1,5g/kg/dia, porém apenas um paciente recebeu
res ainda concluem que o valor energético interfe- lipídio (1,0g/kg/dia) e por apenas quatro dias, de-
re mais no reaparecimento dos sintomas do que a vido a falta do produto na instituição. A distribui-
consistência da dieta. ção calórica dos macronutrientes, considerando a
média, correspondeu a 69% de carboidratos, 18%
Conforme a literatura supracitada, a realimentação
do paciente com pancreatite aguda não precisa ser de proteínas e 13% de lipídios (Tabela 3).
de consistência líquida e o cuidado maior deverá
Portanto, os pacientes com nutrição parenteral,
ser em relação à evolução das calorias ingeridas.
embora não tenham recebido lipídios por boa
Como a dieta na realimentação, neste estudo, foi
evoluída para dieta padrão hospitalar que fornece parte do tempo, alcançaram ou ficaram próximos
calorias e proteínas acima do recomendado para aos valores recomendados. A ESPEN6 recomenda
um indivíduo eutrófico, em relação ao estado nu- 25-30cal/Kg/dia não proteicas, exceto em casos
tricional, e apresentando a forma leve da pancrea- com presença da síndrome da resposta inflamató-
tite aguda, é importante destacar que uma atenção ria sistêmica (SIRS), da síndrome da disfunção de
especial deve ser dispensada no acompanhamento múltiplos órgãos (SDMO) e do risco da síndrome
diário destes pacientes para a realização de orien- da realimentação, quando as necessidades energé-
tação enfatizando a mastigação, comer devagar e o ticas devem ser reduzidas para 15-20kcal/kg/dia
suficiente para a satisfação sem exagerar na quan- não proteicas.
tidade.
Em relação aos teores proteicos, estes foram atin-
A nutrição artificial foi usada em 27% (n=12) da gidos. A ESPEN6 recomenda de 1,25 a 1,5g/Kg/
amostra, sendo 22% (n=10) com nutrição enteral dia, exceto em caso de insuficiência renal ou hepá-
e 5%(n=2) com nutrição parenteral. Destes, 18% tica quando pode ser reduzida para 0,87 a 1,25g/
(n=08) receberam dieta por via oral, associado Kg/dia.
com nutrição enteral ou parenteral, no período
de desmame. No estudo de Losada et al.16, 23% Quanto aos macronutrientes, a glicose deve cor-
(n=09) dos pacientes receberam aporte nutricio- responder a 50 a 70% das calorias totais, o que foi
nal enteral e 2% (n=05) nutrição parenteral, du- atingido considerando os valores médios, de acor-
rante a internação. do com a ESPEN6. Os lipídios conforme a SBNPE/
SBCM/ABN15 e a ESPEN6 devem corresponder a dos pacientes recebeu lipídio e só por quatro dias,
0,8 a 1,5g/Kg/dia (exceto em caso de hipertrigli- sendo que o tempo médio do uso desta via foi
ceridemia, isto é, valor maior que 1000mg/dL por de 29 dias, consequentemente pode ter ocorrido
mais de 72h) quando deve ser suspensa tempora- risco de desenvolvimento de deficiência de ácido
riamente. Porém, como foi observado, apenas um graxos essenciais e de suas consequências.
Tabela 3.
Análise da composição nutricional das fórmulas enteral e parenteral ofertadas aos pacientes com pancreatite aguda
internados nas clínicas médica, cirúrgica e emergência do Hospital Regional da Asa Norte da Secretaria de Estado de
Saúde do Distrito Federal, Brasília, 2012. (n=12)
NUTRIÇÃO ENTERAL EXCLUSIVA
PACIENTE KCAL/dia KCAL/Kg CHO (g/Kg) PTN (g/Kg) LIP (g/Kg) TEMPO/SNE (*) METAS
1 1042,5 15,4 2,7 0,6 0,3 08 Não atingiu
2 840,0 12,9 2,2 0,5 0,2 05 Não atingiu
3 583,0 9,1 1,3 0,3 0,3 03 Não atingiu
4 1831,1 43,6 5,8 1,6 1,6 09 01
5 700,0 11,7 1,6 0,5 0,4 03 Não atingiu
6 700,0 18,4 3,9 0,7 0,3 03 Não atingiu
7 1400,0 24,8 3,9 0,9 0,8 02 Não atingiu
8 1400,0 14,3 1,8 0,6 0,6 01 Não atingiu
9 1330,0 19,4 2,5 0,7 0,7 06 Não atingiu
10 700,0 6,9 1,2 0,3 0,1 02 Não atingiu
Média 1052,7 17,7 2,7 0,7 0,6 4,2 -
NUTRIÇÃO PARENTERAL EXCLUSIVA
KCAL/
PACIENTE KCAL/dia CHO (g/Kg) PTN (g/Kg) LIP (g/Kg) TEMPO/SNE (*) METAS
Kg
1 1437,0 31,2 6,7 1,6 1,0** 25 03
2 2000,0 28,4 6,7 1,4 0,0 33 03
Média 1719,0 29,8 6,7 1,5 0,5 29 03
(*) Número de dias para alcançar as metas nutricionais; (**) Recebeu lipídios apenas por 4 dias.
A oferta calórica diária de macronutrientes por via Neste estudo, também foi realizado monitoramen-
oral foi superior em comparação à via enteral e pa- to bioquímico dos pacientes. Os dois pacientes
renteral. Essa diferença é justificada devido ao fato que receberam suporte nutricional por via paren-
da oferta por via oral ter sido em geral conforme teral foram monitorados e, com exceção da dosa-
a dieta padrão hospitalar, enquanto que a oferta gem de fósforo, triglicerídeos, ferro sérico e tempo
por via enteral e parental ter sido estabelecida de de atividade da protrombina (TAP), o protocolo
acordo com as necessidades e tolerância de cada foi seguido adequadamente. Um destes pacientes
paciente. apresentou aumento das bilirrubinas totais e fra-
ções e o outro aumento da fosfatase alcalina, AST
A ESPEN6 recomenda cuidado com a hiperalimen- e ALT, todavia estas são favorecidas pelo próprio
tação, monitoramento da hidratação, eletrólitos, quadro clínico4. O monitoramento bioquímico
glicemia, triglicerídeos, função hepática e oligoe- dos pacientes em uso da nutrição enteral também
lementos. A presença de hiperlipidemia, hipergli- foi seguido parcialmente. A dosagem de fósfo-
cemia e disfunção hepática ou esteatose hepática ro sérico, colesterol total e triglicerídeos não foi
podem exigir a interrupção temporária da nutri- solicitada. Alterações nos exames bioquímicos dos
ção parenteral. pacientes não foram percebidas no período que
receberam nutrição enteral, porém, vale ressaltar eutrofia ou acima da eutrofia, enquanto que todos
que o tempo em nutrição enteral exclusiva, nestes aqueles (n=3) que receberam alta após 36 dias de
pacientes, foi provavelmente pequeno para a de- internação estavam na eutrofia ou abaixo da eutro-
tecção de alguma alteração. fia na admissão e abaixo da eutrofia na alta.
A verificação do peso nas primeiras 72horas da Kondrup et al.21 por meio de um estudo publicado
admissão ou após o diagnóstico e antes da alta, e validado na Dinamarca, destacam que cerca de
de acordo com o monitoramento ponderal, pa- 30% dos pacientes em ambiente hospitalar estão
rece indicar perda ponderal aumentada naqueles desnutridos na admissão ou a desenvolvem no de-
pacientes que ficaram mais tempo internados (Ta- correr da internação. Por isso, recomendam que
bela 4). todos os pacientes internados sejam triados em até
48 horas da admissão a fim de identificar aqueles
Em relação às medidas antropométricas (CB, DCT em risco nutricional e evitar a desnutrição ou o
e CMB), uma considerável parte dos pacientes seu agravo. Assim, quando considerado em risco
(73%, 64% e 86% respectivamente) que estiveram nutricional, o paciente deve ser avaliado por um
hospitalizados por 10 a 35 dias (n=22) estavam, especialista a fim de receber um cuidado nutricio-
na admissão e na alta, dentro da classificação de nal adequado.
Tabela 4.
Alteração ponderal no período de internação de pacientes com pancreatite aguda internados nas clínicas médica,
cirúrgica e emergência do Hospital Regional da Asa Norte da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. Brasília,
2012. (n=25)
PESO (Kg)
INTERNAÇÃO (dias) N ALTERAÇÃO
ADMISSÃO ALTA
Sendo assim, pacientes com pancreatite aguda de- No estudo de Rockenbach et al.3 o tempo de inter-
vem ser monitorados periodicamente em relação à nação variou entre 1 e 100 dias, sendo que a mé-
possibilidade do desenvolvimento da desnutrição dia de internação foi de 12,93 dias (±13,46 dias).
ou do seu agravo durante a internação hospitalar, Na pesquisa de Werner et al.22 80% dos indivíduos
pois a evolução da doença com a piora do quadro com pancreatite aguda eram portadores da forma
clínico está fortemente associada às alterações do leve e evoluíram para a melhora da doença em três
estado nutricional. Neste estudo, conforme já cita- a cinco dias. Por fim, Losada et al.16 encontraram
do, a perda ponderal parece ter sido proporcional uma hospitalização média de 14,20 dias e men-
ao tempo de internação, o que sugere uma atenção cionaram que não houve diferença estatisticamen-
maior em relação aos fatores envolvidos que po- te significativa no tempo de internação hospitalar
dem estar influenciando na sua ocorrência, com entre os pacientes com pancreatite aguda leve ou
intuito de evitá-la o máximo possível. grave. Os resultados, encontrados neste estudo,
estão próximos dos encontrados na literatura.
O tempo médio de internação foi de 16,20 dias
A realização de exames e ou cirurgia para trata-
(±13,58 dias), sendo o mínimo de 04 dias e o má-
mento, são fatores que podem prolongar o tempo
ximo de 71 dias. A maioria dos pacientes (59%,
de permanência hospitalar, além da gravidade da
n=26) recebeu alta até a 2ª semana de internação. doença3.
Os fatores limitantes para esse estudo incluíram: sendo importante a atenção e orientação, prestada
ausência de registro, no prontuário do paciente ao paciente, em relação à mastigação e comer de-
sobre a gravidade da pancreatite aguda e comor- vagar sem exagerar na quantidade.
bidades associadas à doença, assim como a não
realização da avaliação do consumo real da fórmu- Poucos pacientes necessitaram da nutrição artificial
la neste estudo. Essas variáveis poderiam ajudar (enteral ou parenteral). Apenas um paciente com
na elaboração do desenho de novos estudos, que nutrição enteral alcançou as recomendações protei-
poderiam considerar, por exemplo, a avaliação cas. Por outro lado, os dois pacientes com nutrição
da adequação da indicação da nutrição artificial, parenteral alcançaram as recomendações nutricio-
além da verificação da ingestão alimentar e o con- nais a partir do terceiro dia da administração da fór-
mula, exceto em relação à oferta de lipídios.
sumo real de nutrientes.
O protocolo específico para o monitoramento
bioquímico foi seguido parcialmente para os dois
CONCLUSÃO pacientes com nutrição parenteral e apresentou
Neste estudo, mais da metade (75%) dos pacientes alteração em alguns marcadores da função hepá-
com pancreatite aguda foram classificados como tica. Os pacientes com nutrição enteral também
bem nutridos pela ASG e metade estavam acima seguiram parcialmente a rotina de solicitação de
da eutrofia pelo IMC. exames bioquímicos do paciente internado e ne-
nhuma alteração foi observada.
O tempo médio de jejum sem suporte nutricional
foi considerado curto, com poucos pacientes ul- Mais estudos para a avaliação do cuidado nutri-
trapassando o limite de sete dias. cional do paciente com pancreatite aguda são ne-
cessários, pois são escassos na literatura e devem
A reintrodução da dieta por via oral foi a preva- envolver a identificação precoce do paciente em
lente entre os pacientes, porém a oferta calórica risco nutricional, a adequada prescrição nutricio-
observada pode ser elevada e contribuir para a re- nal (indicação da via, prescrição e evolução da
corrência da dor e dos sintomas gastrintestinais, dieta ou fórmula) e o monitoramento nutricional.
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Acessado em 29/maio/2012. 436.
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Esse texto foi retirado do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “Cuidado nutricional na pan-
creatite aguda em pacientes internados em um hospital público do Distrito Federal” realizado pela
primeira autora, orientado pela segunda autora, e defendida em outubro de 2012 perante o 1Programa
de Residência em Nutrição Clínica (PRNC) do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Secretaria de
Estado e Saúde do Distrito Federal (SES/DF), Brasília-Brasil.