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serem sólidos) e o petróleo ou o carvão (por não serem inor- lita a sua modelação (conformação) e que é traduzida em
gânicos). linguagem corrente como “trabalhabilidade”.
A argila constitui 5% do volume estimado dos materiais Uma propriedade é um atributo que está correlaciona-
geológicos comuns presentes na crusta terrestre (Ronov & do com o arranjo microestrutural do material. Propriedades
Yaroshevsky, 1969). De entre os recursos naturais é o que como a resistência, a porosidade, o retraimento, etc., con-
apresenta maior variedade e aquele que permite maior nú- correm para a qualificação de um material. As coresponden-
mero e maior diversidade de aplicações (Gomes, 1987). tes características evidenciam a sua aparência ou aspeito,
A definição de argila abrange alguma diversidade de con- tal como a cor, a textura, a forma, etc.
ceitos, segundo o âmbito técnico, científico ou industrial. As argilas não são materiais monominerálicos, mas as que
Segundo o critério granulométrico, considera-se argila apresentam composição mais simples são as que têm maior
toda a porção de rocha, solo ou sedimento que comporte interesse de aplicação e, dependendo da tipologia, maior
minerais cujo diâmetro esférico equivalente (tamanho de valor económico (Gomes, 1987).
partícula) seja inferior ou igual a dois micrómetros (2 mm). A argila cerâmica, o “barro”, está intimamente associa-
Do ponto de vista mineral, considera-se argila um mate- da à história da Humanidade, tem sido um dos primeiros
rial natural de granularidade muito fina que contém minerais materiais a ser utilizado na produção de utensílios essencial-
filossilicatados hidratados. Os comités de nomenclatura da mente de uso quotidiano. Hoje é fundamental para uma das
Association Internationale pour l’Étude des Argiles (AIPEA) indústrias mais relevantes na produção de utensílios essen-
e da Clay Minerals Society (CMS) propuseram a seguinte ciais à vida quotidiana, onde cada vez mais a componente
definição (Guggenheim & Martin, 1995): argila é um ma- artificial e compósita se sobrepõe à componente de origem
terial natural composto fundamentalmente por minerais de natural.
granulometria fina que apresenta comportamento plástico As argilas, do ponto de vista de utilização industrial, são
quando adicionada água em quantidade apropriada e en- simplificadamente designadas por argilas especiais e argilas
durece com a secagem. comuns (Velho et al., 1998; Gomes, 2002). Esta subdivi-
A granulometria de um determinado material reporta- são diz respeito ao valor económico dos produtos com elas
-se à distribuição dimensional do grão representada por um fabricados. As argilas especiais, relativamente às argilas
conjunto de classes, cada uma delas com um limite mínimo comuns, encontram-se em depósitos de menor volume e
e máximo. A granularidade corresponde simplesmente a em número mais reduzido. Têm composições mais simples
um valor máximo ou mínimo de um corte na curva granu- que lhes conferem propriedades específicas. Requerem tra-
lométrica. O tamanho da partícula representa o diâmetro tamentos mais complexos e de maior custo, e com elas fa-
esférico equivalente de uma partícula, que corresponde ao bricam-se produtos de maior valor acrescentado.
diâmetro de uma esfera virtual que a circunscreveria e que Consideram-se argilas especiais: o caulino (“china-clay”),
lhe é equivalente em volume. as esmectites, as vermiculites, as argilas fibrosas (sepiolite
A plasticidade é a propriedade que um determinado e palygorskite, conhecidas comercialmente por atapulgite),
material possui em manter a deformação causada por uma as “fuller’s earth” (mistura de montmorilonite e palygorski-
força mecânica. A argila tem esta propriedade que possibi- te), as argilas refractárias (”fire-clays”) e as argilas plásticas
(“ball-clays”). As argilas do tipo “ball-clay”, as refractárias escala e destinam-se a pequenos nichos dos mercados na-
e o caulino são designadas argilas cauliníticas por conterem cionais e internacionais.
caulinite como o mineral argiloso mais abundante. • Categoria 3: Compreende as argilas de qualidade me-
As designadas argilas comuns são usadas na produção diana e de ocorrência relativamente abundante. Requerem,
industrial de materiais de construção e artesanal de olaria usualmente, moderada tecnologia de processamento e des-
e terracota, que normalmente cozem com uma tonalida- tinam-se predominantemente a mercados locais. A Cate-
de avermelhada, da qual resulta a referência corrente de goria 3 é subdividida na Categoria 3A e na Categoria
cerâmica de “barro vermelho”, por oposição às argilas 3B. Enquanto na Categoria 3A são incluídas as argilas que
especiais que cozem tendencialmente com um tom claro e podem ser processadas para um mercado específico, a Ca-
daí a referência de cerâmica de “barro branco”. tegoria 3B diz respeito às argilas que são utilizadas nos
A classificação proposta por Harvey (2000) e por Harvey mercados sem grande especificidade.
& Keeling (2002) agrupa as argilas industriais nas quatro ca- • Categoria 4: Abrange as argilas de baixa qualidade e
tegorias, em função da sofisticação dos produtos com elas de ocorrência abundante. O seu processamento tecnológi-
fabricados e das tecnologias necessárias para os produzir, co é baixo ou mesmo inexistente. A produção pode ser em
seguintes: grande escala e destina-se a mercados locais. Estas argilas
• Categoria 1: Inclui as argilas de alta qualidade e de poderão estar sujeitas a constrangimentos geográficos, am-
ocorrência muito escassa. Requerem alta tecnologia para bientais e de ordenamento que tornam economicamente
o seu processamento e fornecem tanto os mercados nacio- inviável a sua exploração e comercialização.
nais como os internacionais. Estas argilas são utilizadas para A tipologia das argilas cerâmicas e a cor após cozedura
a fabricação de produtos de elevada qualidade. serviram de base a Gomes (1990, 2002) para o estabeleci-
• Categoria 2: Engloba as argilas de qualidade e ocor- mento de uma classificação em três tipos de materiais ce-
rência relativamente rara. Requerem também alta tecnolo- râmicos: pasta branca, pasta vermelha e refractários (ver a
gia para o seu processamento. São exploradas em pequena Figura 1).
Figura 1
Classificação de materiais cerâmicos com base na cor e na natureza das matérias-primas em atmosfera oxidante (Gomes, 1990; Gomes, 2002)
ou no vidrado. As técnicas de decoração mais frequentes Um produto cerâmico avançado é obtido a partir de
são: a incisão (realizada por intermédio de um instrumento matérias-primas normalmente sintéticas, monominerá-
pontiagudo na peça); ou o relevo (conseguido através da licas, com reduzido teor de penalizantes, que apresenta
aplicação de várias porções de argila sobre a superfície da funções térmicas, físico-mecânicas, químicas, eléctricas,
peça). A pintura manual com diversos pigmentos pode ser ópticas, nucleares, biológicas, acústicas, tribológicas ou
realizada imediatamente sobre o corpo cru ou após cozedu- magnéticas especiais, e que permite a sua utilização ge-
ra e sobre uma camada de vidrado. nericamente em indústrias tecnologicamente avançadas e
Outras técnicas comuns na decoração industrial são: a particularmente em condições de exigência extrema. Esta
aerografia, que consiste na aplicação de vidrado ou pig- categoria inclui produtos usados em aplicações estruturais
mentos, em solução, através de um jorro de ar; o decalque, ou acabamentos de superfície (óxidos, carbonetos, nitre-
cujos motivos decorativos são aplicados sobre o vidrado co- tos, boretos e fluoretos), no fabrico de magnetos (ferrites),
zido através de papéis com os ornatos definidos; a estam- em medicina (platinatos e auratos), na indústria aeronáu-
pilhagem, que consiste na utilização de matrizes (estampi- tica, espacial e nuclear (grafite), na balística, em electró-
lhas) para aplicação das cores, usando-se uma matriz para nica (titanatos, zirconatos, tantalatos e niobatos), entre
cada cor, que constituem o motivo decorativo, aplicados outras aplicações. Existem ainda materiais compósitos de
sobre o vidrado com trincha ou rolo; a estampagem, em cerâmica e metal designados cermetos. O carboneto de
que os motivos decorativos são aplicados imediatamente na tungsténio é um exemplo de um cermeto correntemente
chacota ou sobre o vidrado por meio de papéis endurecidos utilizado em revestimentos de peças de desgaste rápido
ou placas metálicas que transportam imediatamente as tin- (por exemplo, ferramentas para cortar ou furar metais) e
tas para a superfície. abrasivos.
Abobadilha Telhas
TIPOLOGIAS DE PRODUTOS CERÂMICOS TRADICIONAIS que é aplicado especificamente em funções estruturais (re-
DE UTILIZAÇÃO CORRENTE sistentes), apresenta elevada resistência mecânica à com-
Não existe uma classificação universal, inequívoca e con- pressão e tem reduzida massa volúmica.
sensual para os inúmeros produtos cerâmicos fabricados O tijolo de face-à-vista é maciço ou perfurado, com
decorrente do contexto histórico-cultural das suas utili- absorção de água inferior a 6%, sendo utilizado para o re-
zações e do aparecimento de novos produtos resultantes cobrimento de parede, geralmente exterior.
do desenvolvimento e inovação técnico-científica. Porém, Existem outros elementos que conceptualmente são ti-
a sistematização genérica de Palmonari & Nassetti (1993) jolos mas têm funções específicas e designações próprias
classificam os produtos cerâmicos clássicos em quatro tipos: como: o paver, que é um tijolo maciço, de elevada espes-
estruturais; pavimento e revestimento; mesa e decoração; sura (7 a 10 cm), apresenta elevada resistência à compres-
e sanitário. Foi esta a base da subdivisão dos vários ramos são, durabilidade e estabilidade cromática, sendo exclusiva-
da indústria cerâmica clássica em Portugal e que, presente- mente utilizado em pavimentação; a fuga cerâmica, que
mente, ainda serve de referência para esta indústria. tem funções de condução e exaustão de efluentes gasosos
As diversas tipologias de cerâmica tradicional, que se apre- (poeiras, gases, etc.), apresenta uma secção externa qua-
sentam a seguir, são indicativas, sendo que os conjuntos drangular ou rectangular e uma geometria interna, de me-
dimensionais são os que normalmente estão disponíveis no nor secção, quadrangular, rectangular ou circular.
mercado e os valores indicados são apenas orientadores. A plaqueta é uma peça cerâmica de geometria ten-
O tijolo, habitualmente, tem formato paralelepipédico, dencialmente paralelepipédica, maciça ou perfurada, com
podendo ser furado, perfurado ou maciço. O tijolo fura- espessura moderada (1 a 5 cm). Apresenta uma absorção
do apresenta, no seu interior, septos de fina espessura (< de água inferior a 6%, sendo utilizada no revestimento de
6 mm), que se dispõem na direcção horizontal e vertical. fachadas interiores e exteriores.
O tijolo perfurado apresenta, no seu interior, furos ge- A abobadilha tem geometria irregular sensivelmente
ralmente de pequena secção (habitualmente circulares) em trapezoidal, sendo utilizada exclusivamente no preenchi-
reduzido número e dispersos. Os tijolos furados e perfura- mento do espaço entre vigotas para a construção de placas
dos são cozidos entre 875 e 950 ºC, durante 45 a 60 horas de piso de edifícios. Apresenta baixa resistência mecânica e
(ciclo lento), ou a cerca de 1000 ºC, durante 2,5 a 3,5 horas elevada porosidade. As abobadilhas são cozidas em condi-
(ciclo rápido). O tijolo maciço não apresenta qualquer tipo ções semelhantes às dos tijolos furados.
de furação e perfuração. As peças maciças são cozidas en- A telha é utilizada na cobertura de um edificado, ten-
tre 1000 e 1300 ºC, durante 45 a 60 horas (ciclo lento) ou do uma geometria muito variável e irregular. A tonalidade
entre 1000 e 1100 ºC, durante 4 a 5 horas (ciclo rápido). tradicional é avermelhada, existindo presentemente uma
O tijolo furado pode ser classificado, segundo a orienta- gama de cores e padrões muito variados. A telha tradicional
ção dos septos que definem a furação: o tijolo de furação é porosa (< 7%), existindo também produtos hidrofugados
horizontal, de utilização corrente e formato normalizado, ou vidrados. As telhas são cozidas a uma temperatura entre
apresenta baixa resistência mecânica à compressão e tem 1000 e 1150 ºC, com tempos que variam entre 10 e 40
elevada massa volúmica; e o tijolo de furação vertical, horas (ciclo lento) ou entre 3 a 4 horas (ciclo rápido).
Quadro I
Proposta de sistematização dos produtos cerâmicos clássicos
Tijolo de face-à-vista
Parede
Ladrilhos: azulejo, tijoleira, grés e grés porcelânico
Revestimento
Cerâmica de Pavimento Ladrilhos: tijoleira, grés porcelânico e porcelanato
Acabamento
Sanita, bidé, lavatório, toalheiro, banheira, base de duche e aces-
Sanitária
sórios (porta-rolos, saboneteira, etc.)
No Quadro I é apresentada uma proposta de sistematiza- dustriais: Geologia, Propriedades, Tratamento, Aplicações,
ção de alguns produtos cerâmicos clássicos. Especificações, Produções e Mercados”, Aveiro.
[6] Gomes, C. (2002), “Argilas: Aplicações na Indústria”,
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