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Encontro Interdisciplinar: Dependência Química, Saúde e Responsabilidade Social

Educando e Transformando Através da Educação Física

COMUNIDADE TERAPÊUTICA: UMA ABORDAGEM


PSICOSSOCIAL

THERAPEUTIC COMMUNITY: A PSYCHOSOCIAL


APPROACH

Psicóloga Laura Fracasso


Coordenadora Técnica de Tratamento da
Comunidade Terapêutica Pe. Haroldo
_____________________________________________

RESUMO

É com a inclusão das diversas dependências no cenário clínico, durante a década de 50,
que a Comunidade Terapêutica adquire maior força como acompanhamento sistemático e
programado de indivíduos com dependências. Todavia, estas interpretavam a dependência
do álcool e outras drogas mais como um comportamento desviante, fruto de um
desenvolvimento defeituoso da personalidade, ou de deficiências crônicas no alcançar a
normalidade social, educacional ou econômica. O conceito básico do tratamento era o da
aprendizagem social num quadro de crescimento pessoal, associado ao crescimento do
grupo de pares com os quais o indivíduo convivia. O presente artigo faz referência ao
histórico da comunidade terapêutica como uma abordagem psicossocial que ao longo dos
anos passa por diversas mudanças evolutivas. O tema é de fundamental importância, visto
que atualmente a dependência química atinge uma parte significante da população
mundial.

Palavras-chave: Comunidade terapêutica; Tratamento; Abordagem psicossocial.

ABSTRACT

It is with the inclusion of various addictions in the clinical setting, during the 50's, the
Community Therapy gaining strength as planned and systematic monitoring of individuals
with addictions. However, they see the dependence on alcohol and other drugs as a
deviation, the result of a defective development of personality, or chronic disabilities in
attaining a normal social, educational or economic. The basic concept of treatment was the
social learning within a framework of personal growth, growth associated with the peer
group with which the individual live. This article refers to the history of the therapeutic
community as a psychosocial approach that over the years passing through several
evolutionary changes. The topic is of fundamental importance, since currently the addiction
affects a significant part of our world population.

Key-words: Community therapy; Treatment; Psychosocial approach.

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INTRODUÇÃO

Em 1860 foi fundada uma organização religiosa chamada Oxford. Esta


organização era uma crítica à Igreja da Inglaterra e seu objetivo era o
renascimento espiritual da humanidade. Originalmente chamada Associação
Cristã do I Século, acabou mudando de nome em 1900 para Moral
Rearmement. Este grupo, conhecido como Grupo de Oxford, buscava um
estilo de vida mais fiel aos ideais cristãos: se encontravam várias vezes por
semana para ler e comentar a Bíblia e se comprometiam reciprocamente a
serem honestos.

Entre 10 e 15 anos depois, constataram que 25% dos seus participantes


eram alcoolistas em recuperação.

Nos Estados Unidos, participantes desse grupo se reuniam para partilhar o


empenho e o esforço que faziam para permanecer sóbrios; desta maneira
nasceu o primeiro grupo de Alcoólicos Anônimos (AA) - fundado em
Akron/Ohio, pelo cirurgião Bob e o Corretor de New York Bill, em 1935; que
com o passar dos anos se tornou o maior grupo de Auto-Ajuda do mundo.
Os AA além do afeto e acolhimento demonstram, a cada momento, muita
disponibilidade em relação aos membros do grupo, em casos de
necessidades.

No dia 18 de setembro de 1958, Chuck Dederich e um pequeno grupo de


alcoolistas em recuperação decidiram viver juntos para, além de ficarem em
abstinência, buscarem um estilo alternativo de vida. Fundaram em Santa
Mônica, na Califórnia, a primeira Comunidade Terapêutica (CT) que se
chamou Synanon. Adotaram um sistema de relacionamento direcionado em
uma atmosfera quase carismática, o que para o grupo foi muito terapêutico.

A aplicação do conceito de ajuda às pessoas em dificuldades, feita pelos


próprios pares, é a base das relações vividas na Synanon, posteriormente
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em Daytop, onde cada pessoa se interessa e se sente responsável pelas


outras. Desde o início acolheram alguns jovens que estavam tentando ficar
em abstinência de outras drogas e em decorrência disto a Comunidade
Terapêutica que teve seu início com uma CT para alcoolistas, abriu suas
portas para jovens que usavam outras substâncias psicoativas.

Esse tipo de alternativa terapêutica se consolidou e deu origem a outras CTs


que, conservando os conceitos básicos, aperfeiçoaram o modelo proposto
pela Synanon.

A Comunidade Terapêutica Daytop Village é o exemplo mais significativo


deste tipo de abordagem. Foi fundada em 1963, pelo Monsenhor William
Bóbrien e David Deitch, tornando-se um programa terapêutico muito
articulado.

Com a multiplicação das iniciativas desse tipo de abordagem terapêutica na


América do Norte, a experiência atravessou o Oceano Atlântico e deu início
a programas terapêuticos no norte da Europa, principalmente na Inglaterra,
Holanda, Bélgica, Suécia e Alemanha.

Em 1968 na cidade de Goiânia nasce no Brasil a primeira Comunidade


Terapêutica denominada Desafio Jovem, oriunda de um movimento religioso
coordenado pelo Pastor Edmundo, assim como em Oxford.

Em 1978 na cidade de Campinas, foi fundada a Comunidade Terapêutica


Senhor Jesus, oriunda de um movimento religioso coordenado pelo Padre
Haroldo Rham, missionário americano.

No início de 1979, a experiência chegou à Itália, onde fundou-se uma Escola


de Formação para educadores de CTs. Os educadores que passaram por
essa formação deram um novo impulso na Espanha, América Latina, Ásia e
África.
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O ex-psicanalista americano, Hobart O. Mowrer, impressionado


positivamente pela capacidade de recuperação através da abordagem das
CTs, começou a estudar o fenômeno, sua história, os conteúdos e
descobriu, através de diferentes experiências, pontos em comum que
confirmaram algumas de suas hipóteses. A saber:

Compartilhar: é um dos valores fundamentais e comuns. A referência não


é somente em relação aos bens, mas de compartilhar com os membros do
grupo o que cada um possui do ponto de vista humano.

Honestidade: é outro ponto forte que emerge do fenômeno das CTs:


"Participe do grupo e fale coisas de você, não de política, trabalho ou de
outras coisas. Fale do que provoca medo e dor dentro de você" (Synanon).
É uma referência clara à necessidade do ser humano de comunicar-se, sem
máscaras, em relações humanas autênticas. Essa honestidade diante do
grupo é um valor muito antigo; apareceu nas primeiras comunidades cristãs
e era chamada confissão aberta ou auto-revelação.

Outra característica que aparece nos estudos do Dr. Mowrer é o abandono,


nas relações terapêuticas, da posição clássica vertical médico e paciente. As
interações que se estabelecem entre as pessoas rompem as estruturas
rígidas da hierarquia, do cargo e oferecem mais possibilidades de ajuda. As
funções, muito flexíveis, garantem a estrutura e a organização da vida
comunitária. A atenção é colocada sobre o indivíduo no grupo ou na
comunidade. Ele é o verdadeiro protagonista das ações terapêuticas porque
sabe do que precisa, porém, sozinho, é incapaz de buscar, por isso a
importância da auto- ajuda. Cada indivíduo é responsável pelo seu próprio
crescimento e pede a ajuda necessária aos outros para se ajudar. Sendo
assim, cada um é "terapeuta" para si mesmo e para os outros componentes
do grupo, da comunidade. A hierarquia é, unicamente, funcional e não
interfere nas relações entre as pessoas.
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A vida comunitária não poderá ser terapêutica se não desaparecer a


dualidade equipe-residente. Isto significa que, enquanto existir dentro da
mesma estrutura o grupo que "faz" o tratamento e o grupo que o "recebe"
estamos muito longe da verdadeira terapia de grupo na CT.

O agente terapêutico não é a estrutura da CT, as regras, os instrumentos,


mas tudo aquilo que estes instrumentos podem fazer para que cada
residente possa viver experimentar uma relação verdadeira e o amor entre
as pessoas.

A observação do comportamento instrumentaliza o indivíduo e o grupo a


avaliarem os processos e o grau de integração social alcançados. A
observação objetiva das ações propicia a cada pessoa se responsabilizar
pela avaliação de seus progressos, de seu crescimento e permite ao grupo a
possibilidade de fazer distinção entre a pessoa e seu comportamento.

Espiritualidade: todos são orientados à capacidade de resgatar e mobilizar


a energia espiritual de seus componentes para que os mesmos encontrem a
coragem necessária para enfrentar e buscar os objetivos propostos. A
energia espiritual pode reintegrar a pessoa consigo mesma, com o grupo,
com a comunidade, com a sociedade, com o seu Poder Superior. A CT tem
capacidade de criar um ambiente ecumênico e oferecer os instrumentos
para que o indivíduo tenha a oportunidade e a liberdade necessária para
procurar sua própria origem e responder de maneira adequada a sua
própria dimensão espiritual.

Com essas premissas, será reforçada a idéia das possibilidades e


necessidades da terapia com algumas considerações de Elena Goti (1997)
sobre a abordagem Comunidade Terapêutica:

• Deve ser aceita voluntariamente;


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• Não se destina a todo tipo de dependente (isto ressalta a


importância fundamental da Triagem como início do processo
terapêutico. Muitas vezes algumas CTs, através de suas
equipes, se sentem onipotentes e ‘"adoecem"’ acreditando que
se o residente não quiser ficar na CT é porque não quer se
submeter à recuperação. Não consideram que o residente tem o
direito de escolher como e onde quer se tratar);
• Deve reproduzir a realidade exterior o melhor possível para
facilitar a reinserção;
• Modelo de tratamento residencial;
• Meio institucional (?) altamente estruturado;
• Atua através de um sistema de pressões artificialmente
provocadas;
• Estimula a explicitação da patologia do residente, frente a seus
pares;
• Os pares servem de espelho da conseqüência social de seus
atos;
• Há um clima de tensão afetiva;
• O residente é o principal ator de seu tratamento. A equipe
oferece, apenas, apoio e ajuda.

Do ponto de vista cultural, o fenômeno moderno da CT está inserido na


proposta da filosofia existencial que deu vida a escola da psicologia
denominada Humanista.

Passados 40 anos do início da primeira CT no Brasil, observa-se a


multiplicação das Comunidades, porém com a cultura da reprodução, isto é,
criam-se centros iguais aos existentes buscando reproduzir modelos.

As Comunidades no Brasil se fazem por interesse de residentes e familiares


que passam por tratamento que buscam mobilizar parceiros dando início em

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pequenos sítios, reproduzindo tratamentos e modelos vivenciados em


experiências pessoais sem estrutura adequada.

Ao longo do tempo a ciência, das mais variadas formas, tem contribuído


com o universo das CTs delineando quadros de dependência, tornando
evidente aspectos da doença que possibilitam o desenvolvimento de planos
terapêuticos possíveis a realidade das Comunidades Terapêuticas.

A partir da existência do serviço oferecido pelas CTs, as teorias a respeito


de dependência química começaram a ser desenvolvidas e precisam ser
aprimoradas, pois o universo complexo da doença produz novos conceitos a
cada internação.

• O Tratamento propõe a INTERAÇÃO entre os pares;


• O Tratamento propõe a INTERAÇÃO entre os serviços;
• O Tratamento propõe a INTERAÇÃO entre os grupos;
• A CT propõe INTERAÇÃO com a Sociedade.

SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS E TERAPIA

Conforme definição da Organização Mundial da Saúde (OMS) são


considerados substâncias psicoativas todas aquelas de origem natural ou
sintética, incluindo álcool, que uma vez utilizadas, modificam as percepções
sensoriais.

Não fazemos distinções entre substâncias leves, pesadas, estimulantes,


depressoras ou alucinógenas porque não consideramos o sintoma da
dependência química através das substâncias psicoativas utilizadas, mas
sim através da problemática humana que está por trás de tudo.

Isso não significa que ignoramos as substâncias químicas e os efeitos que


estas causam às pessoas. Quando se faz necessário tratar sintomatologia
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que as drogas causam às pessoas, estas devem ser encaminhadas aos


serviços médicos especializados.

Partimos do pressuposto que qualquer pessoa, se desejar verdadeiramente,


pode parar de fazer uso de qualquer substância química sem que isso possa
acarretar-lhe algum problema físico sério. A experiência nacional e
internacional tem demonstrado que os sintomas da abstinência podem ser
"represados" dentro da Comunidade Terapêutica, na maioria dos casos, pela
alta coesão do ambiente criado pelo grupo.

Dramatizar a crise de abstinência, muitas vezes, é um jogo das pessoas que


querem parar de usar drogas, porém não estão dispostas a lutar
verdadeiramente para conseguir. Isso reforça o comportamento típico do
dependente químico, ou seja, conseguir alguma coisa sem, na verdade,
"lutar para", como é a dinâmica que a vida impõe a todos os seres
humanos. A droga esconde o sentimento de incapacidade, falência,
impotência etc., e para que haja um processo de recuperação é necessário
o abandono total de qualquer substâncias psicoativas (exceções para
pessoas com comprometimentos neurológicos ou distúrbios psiquiátricos
além do quadro da dependência química), mudança dos comportamentos e
mudança de estilo de vida.

A dependência química não pode ser tratada com medicação alternativa


para aliviar o sofrimento que a própria doença causa porque este tipo de
medicação impede o dependente de entrar em contato consigo mesmo,
perpetuando o seu estado de dependência. Nenhum dependente consegue
fazer uso de substâncias psicoativas todos os dias na quantidade e
qualidade que deseja; algumas vezes não faz uso por diversos dias e não
morre por crise de abstinência.

Sabemos que a crise de abstinência pode ser sentida, mas o dependente,


muitas vezes, quer impressionar para ver se consegue algum tipo de
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medicação alternativa quando não consegue obter a(s) dose(s) habitual


(ais). O dependente não precisa de nossa compaixão ou pena pelo mal
estar provocado pela crise de abstinência. A manipulação do dependente
intensificando os próprios sintomas da crise é quase automática. Porém,
quando eles demonstram o desejo de parar de usar e recebem a ajuda
adequada, existe uma grande possibilidade de "deixar" a droga. Esse é o
momento de oferecermos uma proposta alternativa e uma mudança de
estilo de vida.

Devemos evitar intervenções confusas que podem prejudicar o dependente.


A qualquer momento que o dependente não consiga ou não queira aceitar
as propostas do programa deve ter a liberdade de fazer outras escolhas (é
importante se fazer uma última tentativa no intuito de ajudá-lo a entender
o porquê de outras escolhas) ou ser encaminhado a outras propostas. É
importante evitarmos a confusão, pois este é o terreno predileto do
dependente.

RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – 101/01

No ano de 1998 foi realizado o I Fórum Nacional Antidrogas, onde foi


apresentada a recomendação da normatização dos serviços e
procedimentos na área de tratamento à dependência.

Em 1999 a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) constitui uma comissão


técnica (especialistas e profissionais) para apresentar subsídios à
elaboração de critérios mínimos para o funcionamento de serviços de
atenção.

O documento produzido por esta comissão foi encaminhado à Agência


Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), onde se constitui um grupo
técnico assessor para elaborar uma proposta de regulamento para o
funcionamento das comunidades terapêuticas e serviços assemelhados.
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Em 2000 a proposta de regulamento (aprovada pela Diretoria Colegiada da


ANVISA em 10 de outubro) foi submetida à consulta pública. No ano
seguinte, em 31 de maio de 2001 as sugestões foram avaliadas em
conjunto, algumas foram incorporadas ao texto final e a Resolução da
Diretoria Colegiada (RDC) nº101/01 foi publicada.

Esse foi certamente um momento histórico e importante para as


Comunidades Terapêuticas (CT) porque são reconhecidas, oficialmente, pelo
Ministério da Saúde (MS) como um serviço de atenção a pessoas com
transtornos decorrentes de uso ou abuso de substâncias psicoativas,
segundo modelo psicossocial.

A RDC pode ser conceituada como o oferecimento de serviços de atenção a


pessoas com transtornos decorrentes do uso ou abuso de substâncias
psicoativas (SPA), em regime de residência ou outros vínculos de um ou
dois turnos, segundo modelo psicossocial, são unidades que tem por função
a oferta de um ambiente protegido, técnica e eticamente orientados, que
forneça suporte e tratamento aos usuários abusivos e/ou dependentes de
substâncias psicoativas, durante período estabelecido de acordo com
programa terapêutico adaptado às necessidades de cada caso. É um lugar
cujo principal instrumento terapêutico é a convivência entre os pares.
Oferece uma rede de ajuda no processo de recuperação das pessoas,
resgatando a cidadania, buscando encontrar novas possibilidades de
reabilitação física e psicológica, e de reinserção social.

O PROGRAMA DE TRATAMENTO NA CT

O programa CT envolve quatro categorias distintas e justapostas de


atividades terapêuticas:

1. De Formação de Comportamento;
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2. Emocional/Psicológica;
3. Intelectual/Espiritual;
4. Vocacional/Habilidades Sociais para Sobrevivência.

Essas quatro categorias de atividades são igualmente importantes em


ajudar a pessoa dependente na superação de seus déficits ou problemas.

Dentre as regras estabelecidas pela CT, podemos citar:

• Não às drogas;
• Não à violência ou ameaças de violência;
• Não ao sexo;
• Não aos furtos.

FILOSOFIA DO TRATAMENTO

A CT é um ambiente que ajuda as pessoas a terem ajuda ajudando outros,


passando esta por muitas transformações desde seu início por um grupo
pequeno de dependentes em drogas pesadas. Mas seu legado de auto-ajuda
ou auto-confiança, responsabilidade pessoal, interesse responsável pelo
outro, responsabilidade social, e dos valores da família permanecem.
O ambiente da comunidade terapêutica é um lugar onde se acredita que as
pessoas possam mudar. O grupo pode promover esta mudança assumindo
os indivíduos nesse ambiente, inseridos nas responsabilidades para que
possam se reestruturar e criar novos padrões de vida longe das substâncias
psicoativas.

A CT deve evitar qualquer forma de institucionalização que promova


confiança absoluta nos serviços de cuidado à saúde, ou no terapeuta, para a
mudança. Ao invés disso deverá desenvolver uma abordagem de
tratamento que crie a atitude de auto-ajuda.

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A CT é uma micro comunidade, um microcosmo da sociedade maior, onde


os pacientes são chamados de “residentes” que participam ativamente do
processo de tratamento.

O ambiente de tratamento da CT é criado pelo uso de uma dinâmica original


de grupo que conta com as interações sociais de seus membros, interações
essas guiadas por normas pró-sociais estabelecidas pela própria
comunidade.

Ela opera de um modo bastante similar a uma família funcional, com uma
estrutura hierárquica de membros mais velhos e mais novos. Cada membro
tem papel e responsabilidades definidos para a manutenção do
funcionamento adequado da CT. Existem regras e normas estabelecidas que
os membros se comprometem a aderir e sustentar desde a entrada.

Num dado momento a pessoa pode estar no papel de residente quando


ele/ela recebe ajuda ou amparo dos outros por conta de um problema de
comportamento ou quando experienciando angústia. Noutro momento, a
mesma pessoa assume o papel de cuidador, quando ele/ela tem a vez de
assistir ou apoiar outra pessoa com problemas.
Os membros da CT adquirem status à medida que amadurecem no
comportamento ou demonstram recuperar comportamentos funcionais.

Considerando que a CT é um ambiente de tratamento, as interações entre


os membros são planejadas para serem terapêuticas dentro do contexto das
normas que demandam de cada membro o exercício de um papel duplo. O
objetivo do tratamento não é somente ajudar o dependente a começar a
sair das drogas, mas ajudá-lo também a desenvolver um estilo de vida que
sustente uma vida sóbria.

Os objetivos do tratamento da CT somente podem ser conseguidos


planejando-se um programa altamente estruturado que compreenda fases
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que incluam a preparação para a reintegração social e o aprendizado de


habilidades e estratégias para a prevenção da recaída.

O programa de reinserção social (reentrada) e pós-cuidados é um


componente importante do tratamento que reduz a reincidência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A abordagem CT ao tratamento mostrou ter uma aplicação ampla, não


somente dentro de cenários residenciais para o tratamento de dependência
de álcool e drogas, como tem se mostrado efetiva no cárcere de prisioneiros
dependentes e também dos jovens infratores. Também tem sido usada com
sucesso em programas ambulatoriais e em centros de aconselhamento para
dependentes de álcool e drogas.

Sua filosofia de auto-ajuda tem sido efetiva ao tratar com pessoas


dependentes independente tanto no cenário de tratamento residencial
(meio fechado) como no comunitário (meio aberto).

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.


Resolução da Diretoria Colegiada, n. 101, 31 maio 2001. Diário Oficial da
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