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Revista SÍNTESE
Direito Imobiliário
Repositório autorizado
Tribunal Regional Federal 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087
Diretor Executivo
Elton José Donato
Coordenador Editorial
Cristiano Basaglia
Editora
Simone Costa Saletti Oliveira
Conselho Editorial
Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior,
Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho
Bimestral.
v. 4, n. 20, mar./abr. 2014
ISSN 2236-1553
1. Direito imobiliário.
CDU 347.453
CDD 342.1242
Eliane Beltramini
Gerente Editorial e de Consultoria
Sumário
Normas Editoriais para Envio de Artigos.....................................................................7
Assunto Especial
Loteamento
Doutrinas
1. Loteamento, Loteamento Fechado e Loteamento Irregular
Luiz Antonio Scavone Junior......................................................................9
Jurisprudência
1. Acórdão na Íntegra (STJ)...........................................................................49
2. Ementário.................................................................................................54
Parte Geral
Doutrinas
1. A Responsabilidade Civil do Incorporador e do Construtor sob
o Ponto de Vista Consumerista
Barbara Heliodora de Avellar Peralta.......................................................62
Seção Especial
Em Poucas Palavras
1. Liminar Possessória nos Contratos de Alienação Fiduciária de
Imóveis
Denis Donoso........................................................................................234
Clipping Jurídico...............................................................................................237
Bibliografia Complementar..................................................................................244
Índice Alfabético e Remissivo..............................................................................245
Normas Editoriais para Envio de Artigos
1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e
focados em sua área temática.
2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação
do Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas
publicações.
3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade
da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebi-
do e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.
4. No caso de publicação dos artigos enviados, não serão devidos direitos autorais,
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ainda, a critério do Editor a seleção e aprovação para publicação, a qual será comu-
nicada ao autor.
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6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos
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7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos
artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.
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TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente
os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.
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ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pes-
quisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e
finalizadas por ponto.
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bico”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem
este item.
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Assunto Especial – Doutrina
Loteamento
SUMÁRIO: 1 O instituto do parcelamento do solo urbano; 2 Loteamento fechado – Noções gerais; 3 Lotea
mento fechado e vias e espaços públicos – Concessão administrativa; 4 A sociedade sem fins lucrativos
como órgão administrativo do loteamento fechado – O regulamento interno; 5 O registro do loteamento
fechado – A concessão, o contrato padrão e o registro do regulamento como fundamento para a poste-
rior cobrança das despesas dos adquirentes; 6 Fórmulas mirabolantes no ato de parcelar o solo urbano;
7 Fechamento de loteamento comum já constituído.
1.2.1 Gleba
Gleba é a porção de terra que não tenha sido submetida a parcelamento
sob a égide da Lei nº 6.766/1979, o que equivale dizer que estaremos diante
de uma gleba se a porção de terra jamais foi loteada ou desmembrada sob a
vigência da nova lei.
Entretanto, mesmo que não tenha havido parcelamento do solo sob a re-
gulamentação da Lei nº 6.766/1979 com as alterações posteriores, haverá lote e
não gleba, se a porção de terra atenda, quanto à dimensão, os parâmetros da Lei
Municipal ou do Plano Diretor, e, além disso, disponha de infraestrutura básica,
assim considerada na exata medida da existência de equipamentos urbanos de
escoamento de águas pluviais, iluminação pública, rede de esgoto sanitário e
abastecimento de água potável, energia elétrica pública e domiciliar, além de
vias de circulação, pavimentadas ou não (Lei nº 6.766/1979, art. 2º, §§ 4º e 5º,
com a redação dada pela Lei nº 9.785, de 29.01.1999).
O resultado do parcelamento sob os auspícios do Decreto-Lei nº 58/1937,
nos termos do § 1º do art. 4º e parágrafo único do art. 11 da Lei nº 6.766/1979,
trata de gleba (aqui não há, tecnicamente, lote, embora, na prática, mesmo a
subdivisão de glebas de acordo com o Decreto-Lei nº 58/1937 seja denomi-
nado lote. Na verdade há uma gleba por força da inferência que se extrai do
§ 1º do art. 4º e parágrafo único do art. 11 da Lei nº 6.766), isso no caso desse
parcelamento não ter destinado o mínimo de área pública, acorde com a Lei
Municipal, e, também, não ter atendido aos requisitos dimensionais e de infra-
estrutura dos §§ 4º e 5º do art. 2º da Lei nº 6.766/1979, quando se exige, para
parcelamentos posteriores, que o Município ou Distrito Federal fixe as normas
urbanísticas.
Nesse caso, é de se verificar a modificação do § 1º do art. 4º da Lei
nº 6.766/1979, que, anteriormente, exigia, de forma indelével, o mínimo de
35% de áreas públicas (arts. 2º e parágrafos; 4º, § 1º; e 11, parágrafo único, da
Lei nº 6.766/1979), cujo percentual, com as alterações legais, fica hoje a critério
da Legislação Municipal.
Assim, somente não haverá falar-se em gleba na hipótese de parcelamen-
to do solo urbano de acordo com o Decreto-Lei nº 58/1937, caso esse mesmo
parcelamento tenha observado para os logradouros públicos o mínimo do § 1º
do art. 4º da Lei nº 6.766/1979, exigível no momento do novo parcelamento,
ou se enquadre no conceito de lote trazido à colação pelos §§ 4º e 5º da Lei
nº 9.785/1999, hipótese em que estaremos diante de lote para os fins da Lei
nº 6.766/1979.
12 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA
Concluindo, haverá gleba se a porção de terra:
– não sofreu, anteriormente, parcelamento de acordo com a Lei
nº 6.766/1979, ou, tendo sofrido, a área não atenda as dimensões
urbanísticas definidas no Plano Diretor ou na Lei Municipal ou não
contenha a infraestrutura básica requerida pelos §§ 4º, 5º e 6º do
art. 2º da Lei nº 6.766/1979;
– sofreu parcelamento sob a égide do Decreto-Lei nº 58/1937, cuja
destinação de áreas públicas não atenda atualmente aos requisitos
contidos na Lei Municipal (art. 4º, § 1º), ou cuja área não atenda as
dimensões urbanísticas definidas no Plano Diretor ou na Lei Muni-
cipal ou, ainda, não contenha a infraestrutura básica requerida (Lei
nº 6.766/1979, art. 2º, §§ 4º, 5º e 6º).
1.2.2 Lote
Lote é o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões aten-
dam aos índices urbanísticos definidos pelo Plano Diretor ou pela Lei Municipal
para a zona que se situe (Lei nº 6.766/1979, art. 2º, § 4º).
Verifica-se que essa definição, trazida pela Lei nº 9.785/1999, não existia
anteriormente, o que demandava enorme esforço exegético para se chegar à
definição de lote.
Com efeito, anteriormente, considerava-se lote a porção de terra que
resultasse de um desmembramento ou de um loteamento sob a égide da Lei
nº 6.766/1979 ou legislação anterior, desde que, neste último caso, tenha sido
destinada área pública mínima.
Nesse sentido, Toshio Mukai, Alaor Caffé Alves e Paulo José Villela
Lomar (Loteamentos e desmembramentos urbanos. São Paulo: Sugestões Literá-
rias, 1987) definiram lote como toda porção de terra resultante de parcelamento
urbano de uma gleba, destinada à edificação.
Atualmente, com a definição de lote trazida pela Lei nº 9.785/1999,
entendemos que não há mais falar-se em necessidade de loteamento ou des
membramento para que se verifique um lote.
Se a porção de terra se enquadra nos parâmetros dos §§ 4º, 5º e 6º da
Lei nº 6.766/1979, haverá lote mesmo que a porção de terra não tenha sido,
anteriormente, loteada ou desmembrada, vez que para loteamento ou desmem-
bramento, nos termos dos §§ 1º e 2º, mister se faz a subdivisão de gleba em lote.
Ora, se já existe lote, não há falar-se em loteamento ou desmembra-
mento.
É de se verificar, outrossim, que o art. 11, parágrafo único, da Lei
nº 6.766/1979 descreve a necessidade de desmembramento para o caso de
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA............................................................................................................. 13
lotes resultantes de parcelamentos cuja destinação de área pública tenha sido
inferior à mínima prevista no § 1º do art. 4º da Lei nº 6.766/1979.
De fato, a lei exige desmembramento, entretanto, atecnicamente, se re-
fere a lote.
Ora, o desmembramento, de acordo com o art. 2º, é a subdivisão de
gleba em lotes destinados à edificação, com aproveitamento do sistema viário
existente, desde que não implique a abertura de novas vias e logradouros públi-
cos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.
Conclui-se, por conseguinte, que o art. 11, parágrafo único, da Lei
nº 6.766/1979, quando fala em lote, na verdade, refere-se à gleba, já que não
existe o desmembramento de lote.
Portanto, é possível concluir que é lote o terreno servido de infraestrutura
básica, cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo Pla-
no Diretor ou pela Lei Municipal para a zona que se situe (Lei nº 6.766/1979,
art. 2º, § 4º), independentemente de ter sido ou não objeto de anterior parcela-
mento do solo urbano (loteamento ou desmembramento).
A conclusão é importante na exata medida da definição legal de lotea
mento e desmembramento, contida que está nos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei
nº 6.766/1979, implica, basicamente, na subdivisão de uma gleba em lotes.
Se já existe lote não haverá, consequentemente, a adequação ao tipo legal e,
assim, não haverá falar-se em loteamento ou desmembramento.
1.3 Desdobro
Desdobro é a subdivisão de lote sem alteração de sua natureza, desde
que permitida por Legislação Municipal.
A Lei nº 6.766/1979 não disciplinou o desdobro, embora este ocorra
e não seja por ela vedado. Entretanto, ressalte-se, só é possível se previsto na
Legislação Municipal.
Em verdade, partindo do pressuposto da permissão e regulamentação da
Lei Municipal, se não houver subdivisão de gleba em lote, não há nem lotea-
mento e nem desmembramento, mas sim o denominado desdobro.
Nesse caso, se a porção de terra é lote, com essa natureza permanecerá.
Conclui-se, por conseguinte, que desmembramento ou loteamento não
se confundem com o desdobro, vez que, neste, após a divisão, não há alteração
da natureza em face do resultado; há lotes resultantes de outro já existente.
A importância da distinção se dá principalmente em função da necessi-
dade ou não de observância de farta legislação disciplinadora dos loteamentos
e desmembramentos urbanos, principalmente da Lei nº 6.766/1979.
14 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA
O desdobro de lote deve respeitar o limite legal de 125m2 (art. 4º, II), ou
aquele maior da Lei Municipal.
Outro requisito, comum a qualquer desdobro, é a permissão por Lei Mu-
nicipal, que trará à colação os parâmetros necessários e o procedimento a ser
adotado.
Normalmente, observa-se que há necessidade de um projeto simples,
uma planta que contenha a situação anterior, a atual e o resultado do desdobro,
acompanhados da nova descrição dos lotes resultantes.
Este projeto, acompanhado da descrição, após a devida aprovação pela
Prefeitura Municipal, é submetido a registro no Oficial de Registro de Imóveis
competente, que procederá as novas matrículas.
Por fim, cabe ressaltar que a doutrina inadmite o desdobro de gleba e,
da mesma forma, o de lote em que haja necessidade de abertura de novas vias
de circulação.
Somos de opinião contrária – isolada, é verdade –, vez que se não houver
subdivisão de gleba em lote, acorde com os parâmetros insculpidos nos pará-
grafos do art. 2º da Lei nº 6.766/1979, não haverá falar-se em parcelamento do
solo urbano.
Ora, se a Lei Municipal estabelece um limite máximo de lote, nada im-
pede a subdivisão de glebas, sem que haja parcelamento do solo urbano, desde
que resulte em novas glebas (com metragem acima do limite máximo do lote).
No caso, inexistirá a subdivisão de glebas em lotes, mas de gleba em
glebas.
Da necessidade de abertura de vias de circulação não se extrai a infe-
rência do loteamento ou desmembramento, desde que não haja subdivisão de
gleba em lotes.
Portanto, havendo subdivisão de gleba em glebas (neste caso, só se a Lei
Municipal estabelecer o limite máximo do lote) ou de lote em lotes, não haverá
falar-se em parcelamento do solo que se subsuma à Lei nº 6.766/1979, mas,
exclusivamente, à Lei Municipal.
6.4 Associações
Outra modalidade teratológica de parcelar o solo urbano é aquela pela
qual o “loteador” aliena a sua gleba a uma Associação que ele incentiva, que,
por seu turno, “vende” participação a diversas pessoas que dividem a gleba para
fins habitacionais.
Nesse caso, os adquirentes são “associados” de uma pessoa jurídica que
é proprietária da gleba ou, então, adquirem pura e simplesmente dessa associa-
ção uma fração ideal “devidamente individualizada”.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA............................................................................................................. 31
Esta modalidade ilegal muito se assemelha ao clube de recreio do qual
falamos, mas, na prática, de forma criminosa, é método mais utilizado para
lotes populares.
Por óbvio que se trata de um meio ingênuo de driblar todas as exigên-
cias urbanísticas inerentes à atividade de lotear e desmembrar e, por tal ra-
zão, deve ser prontamente repelida pelos órgãos municipais e estaduais, sem
contar o Ministério Público, cuja função é de fiscalizar a correta aplicação Lei
nº 6.766/1979.
Nem se fale da hipótese de dissolução dessa sociedade nos termos dos
atos constitutivos. Como ficariam, nessa eventualidade, os “associados”?
A respeito, recentemente, no ABC paulista, diversos compradores incau-
tos foram rechaçados de suas humildes residências exatamente por conta de
prática desse jaez. Ocorre que, no caso, as autoridades competentes demora-
ram a agir, e, quando agiram, havia uma situação de fato consolidada, o que
tornou violenta a remoção de inúmeras pessoas, terceiros de boa-fé.
Outra região bastante atingida é a Cantareira, em São Paulo, e, para ilus-
trar, transcrevemos trecho de reportagem do Estado de São Paulo a respeito:
Um dos mais novos loteamentos clandestinos na Cantareira é o Brasil Novo [...].
A área, que até a década de 60 era conhecida como Sítio Piqueri, começou a ser
desmatada e dividida em 700 lotes de apenas 132 metros quadrados, há menos
de dois meses.
Cada lote de 6 metros por 22 metros está sendo vendido por R$ 12.000, que po-
dem ser pagos com uma entrada de R$ 2.100,00 e 76 prestações no valor de dois
salários mínimos. A responsável pelo empreendimento, a “Cooperativa” [...], co-
bra ainda uma taxa de contrato de R$ 250,00 que dá direito a uma planta-modelo
e a assessoria de um arquiteto para a construção da casa. Se vendesse todos os
lotes em seis anos, que é o prazo para quitação do negócio, a falsa associação
faturaria R$ 8,4 milhões.
Quem adquire o lote recebe apenas um contrato de compra e venda e a promes-
sa de uma escritura no futuro, quando o loteamento for regularizado – fato que,
informam os corretores, é garantido.
Continua o repórter, fazendo-se passar por comprador em conversa com o ven-
dedor da “cooperativa”:
Estado – Esse terreno é invadido?
Rivelino – Não, o terreno é legal. Nós temos a escritura do terreno registrada em
cartório.
Estado – Quer dizer que vou ter a escritura do meu lote?
Rivelino – Não, você vai receber um contrato de compra e venda assinado pelo
presidente da Cooperativa [...], o [...]. O terreno é legal, mas o desmembramento
total ainda não foi autorizado.
32 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA
Estado – Então isso é que chamam de loteamento clandestino?
Rivelino – É. A cooperativa é uma associação sem fins lucrativos, criada para
fazer o loteamento [...].
Estado – Mas a associação tem fins lucrativos, não é?
Rivelino – É, tem. (O Estado de São Paulo, p. C3, 27 set. 1998)
Registre-se que a União tem competência para editar normais gerais, en-
quanto os Estados e os Municípios podem estabelecer suas regras, desde que
não conflitem com as disposições gerais de lei federal, haja vista tratar-se de
competência concorrente sobre direito urbanístico (art. 24, I e §§ 1º a 4º, Cons-
tituição Federal de 1988).
A diferença básica entre loteamento e desmembramento é que, no pri-
meiro, abrem-se novas vias e logradouros públicos, enquanto que no segundo
não. No presente artigo, contudo, ater-se-á à figura dos loteamentos, particular-
mente os irregulares.
O interessado em promover um loteamento do solo urbano deve, desde
que não sujeito o terreno a ser parcelado às restrições impeditivas dos incisos I
a V do art. 3º da Lei nº 6.766/1979, apresentar projeto à Prefeitura Municipal ou
ao Distrito Federal, com a obediência dos requisitos dos arts. 4º, 5º e 6º da Lei
do Parcelamento do Solo Urbano.
O projeto será aprovado pelo Distrito Federal ou Município (art. 12 da
Lei nº 6.766/1979) e pelos Estados nos casos excepcionais previstos nos incisos
I a III do art. 13 da Lei nº 6.766/1979.
É requisito básico que o parcelador ou loteador, evidentemente, seja o
proprietário da gleba original, pois a ninguém é dado parcelar solo de proprie-
dade alheia. Outra consideração relevante é que, ainda que nominado “con-
domínio” ou “rural”, se a atividade se enquadrar na previsão legal alusiva ao
loteamento, deste será a natureza jurídica do empreendimento.
Note-se que o instituto de direito civil denominado condomínio pressu-
põe uma copropriedade dividida em frações ideais, mas, quando efetivamente
dividida uma gleba em lotes fisicamente individualizados, objeto de proprie-
dade individual exclusiva e distinta, resta prejudicado o rótulo de propriedade
condominial. Como abertas novas vias dentro da gleba original, parcelada a
gleba em lotes perfeitamente definidos e fisicamente individualizados, objeto
de domínio exclusivo pelo adquirente do lote, está-se falando de uma modali-
dade de parcelamento do solo denominada loteamento, por força de expressa
disposição legal (art. 2º, § 1º, Lei Federal nº 6.766/1979).
O loteamento não é rural, ainda que assim denominado, se não se des-
tina à exploração agrícola, agropastoril ou extrativista mineral. Se se volta à
ocupação nitidamente urbana, reger-se-á pelos ditames da Lei nº 6.766/1979.
O título “Condomínio Rural” geralmente é empregado pelo loteador com o pro-
pósito de evadir-se às exigências da Lei nº 6.766/1979, quando encobre nítida
finalidade urbana.
40 R���������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR
Podem-se resumir as providências necessárias para a regularização ou
a implantação legal de um loteamento urbano, conforme as exigências da Lei
Federal nº 6.766/1979: o loteador deve submeter o projeto do parcelamento
à prévia aprovação do Distrito Federal ou Município, obter o licenciamento
ambiental, se o caso, e, depois de aprovado, promover o registro do loteamento
no Cartório do Registro de Imóveis, quando, e somente a partir desse momento,
poderão ser alienados os lotes a terceiros, como segue dos seguintes preceitos.
Reza o art. 12 da Lei nº 6.766/1979 (Lei de Parcelamento do Solo): “O
projeto de loteamento e desmembramento deverá ser aprovado pela Prefeitura
Municipal, ou pelo Distrito Federal...”.
Dispõe o art. 18 do mesmo estatuto: “Aprovado o projeto de loteamento
ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo a registro imobiliário
dentro de 180 (cento e oitenta dias), sob pena de caducidade da aprovação...”.
Já o art. 37 do mesmo diploma legal assevera: “É vedado vender ou pro-
meter vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado”.
Prevê ainda o art. 50, I, da Lei Federal nº 6.766/1979:
Art. 50. Constitui crime contra a Administração Pública:
I – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do
solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em
desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito
Federal, Estados e Municípios.
[...].
Então, vê-se que é pacífico, não somente no direito positivo, mas também
na doutrina, que não se pode, até mesmo por lógica, vender lotes de um lotea
mento não registrado no Cartório de Registro de Imóveis, justamente porque, in
casu, como é a inscrição que dá existência no mundo jurídico ao loteamento
(principal), o loteamento, por não estar registrado no Cartório de Registro de
Imóveis, não existe no plano jurídico. Consequentemente, se o principal (o lo-
teamento) não tem existência legal, como poderia ser vendido o acessório (os
lotes), que também não existe para o universo jurídico? Ora, se o direito não
reconhece a validade do próprio loteamento enquanto não registrado, como
admitir, por provimento judicial declaratório, que os lotes dele originários po-
deriam ser vendidos? Accessio cedit principale.
Não é a toa que o art. 37 da Lei Federal nº 6.766, de 19.12.1979, dispõe:
“É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembra-
mento não registrado”. Não pode ser vendida uma parcela ou parte (lote) de um
empreendimento (loteamento) que não existe, pois só tem existência perante o
direito a partir do registro do projeto de loteamento no Cartório de Registro de
Imóveis. Admitir o contrário significa, por absurdo, o mesmo que se permitir
que sejam vendidos apartamentos de um condomínio em propriedade horizon-
4 Configuração dos loteamentos urbanos e rurais. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial,
n. 28, v. 8, p. 114 e 129, abr./jun. 1984.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ........................................................................ 45
tal, sem que o empreendimento nem esteja registrado no cartório imobiliário
competente, o que, a propósito, também é proibido pela Lei Federal nº 4.591,
de 16.12.1964, em seu art. 32, caput e alíneas a a p, e §§ 1º a 12, sob o mesmo
fundamento.
Pois bem: um lote que integre um loteamento não registrado no Cartório
de Registro de Imóveis não pode ser alienado porque inexistente para o direito.
Daí o motivo de a regra da proibição de venda de lotes de loteamento urbano
não registrado no cartório imobiliário (art. 37 da Lei Federal nº 6.766/1979) e
da venda de unidades de incorporação imobiliária também sem registro imo-
biliário (art. 32 da Lei Federal nº 4.591/1964) aplicar-se, por igual fundamento,
no tocante à venda de lotes de loteamento rural não registrado no Cartório de
Imóveis (art. 167, I, 19, Lei Federal nº 6.015/1973; art. 89 do Decreto Federal
nº 59.428, de 27.10.1966; item 4.7.2 da Instrução Normativa Incra nº 17.b, de
09.12.1980; e art. 61, caput, da Lei Federal nº 4.504/1964).
Parece não socorrer o loteador a inovação do direito de usar, gozar e
dispor enquanto faculdades inerente ao direito de propriedade. A tese indivi-
dualista de interpretação do direito de propriedade, segundo a qual se defendia
ao proprietário as faculdades de usar, gozar e dispor da coisa como lhe aprou-
vesse, foi concepção em vigor no século XVIII, mas atualmente se mostra de
todo repelida pelo ordenamento jurídico das nações civilizadas, que elegeram
a propriedade em função social.
De fato, o inciso XXII do art. 5º da Constituição Federal de 1988 dispõe
que “é garantido o direito de propriedade”. Mas o inciso XXIII do mesmo artigo
da Lei Fundamental reza que “a propriedade atenderá a sua função social”.
Comenta, com o brilho contumaz, o emérito constitucionalista José
Afonso da Silva5:
[...] Demais, o caráter absoluto do direito de propriedade, na concepção da De-
claração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, [...] foi sendo superado
pela evolução, desde a aplicação da teoria do abuso de poder, do sistema de
limitações negativas e depois também de imposições positivas, deveres e ônus,
até chegar-se à concepção da propriedade como função social...
[...] Pois, em verdade, o regime jurídico da propriedade tem seu fundamento na
Constituição. Esta garante o direito de propriedade, desde que ela atenda a sua
função social (art. 5º, XXII e XXIII)...
[...] Essa dicotomia fica superada com a concepção de que o princípio da função
social (Constituição Federal, art. 5º, XXIII) é um elemento do regime jurídico
da propriedade, é, pois, princípio ordenador da propriedade privada, incide no
conteúdo do direito de propriedade, impõe-lhe novo conceito... A função social,
assinala Pedro Escribano Collado, “introduziu, na esfera interna do direito de pro-
priedade, um interesse que pode não coincidir com o do proprietário e que, em
1428
EMENTA
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – LOTEAMENTO FECHADO – CONTRIBUIÇÕES PARA
MELHORAMENTOS E MANUTENÇÃO – ASSOCIAÇÃO DE MORADORES – IMPOSIÇÃO A QUEM
NÃO É ASSOCIADO – OBRIGAÇÃO ASSUMIDA CONTRATUALMENTE – REEXAME DE MATÉRIA
FÁTICO-PROBATÓRIA
1. Na linha de reiterados pronunciamentos da Segunda Seção desta Cor-
te: “As taxas de manutenção criadas por associação de moradores, não
podem ser impostas a proprietário de imóvel que não é associado, nem
aderiu ao ato que instituiu o encargo” (EREsp 444.931/SP, 2ª Seção, Rel.
p/ Acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 01.02.2006).
2. Recurso Especial provido, determinando-se o retorno dos autos à ori-
gem para que se julgue novamente a causa com base nos parâmetros
estabelecidos pela jurisprudência desta Corte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-
cadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas
Bôas Cueva e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
50 R��������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA
Dr(a). Vera Lucia Machado Franceschetti, pela parte Recorrida: Associa-
ção Residencial Vale da Santa Fé.
Brasília, 22 de outubro de 2013 (data do Julgamento).
RELATÓRIO
O Exmo Sr. Ministro Sidnei Beneti (Relator):
1. Marino Francesco Gaiofatto interpõe Recurso Especial com fundamen-
to nas alíneas a e c do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, contra
acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Relator o
Desembargador Oscarlino Moeller, assim ementado (e-STJ fl. 549):
COBRANÇA – IMÓVEL INSERIDO EM LOTEAMENTO FECHADO – SERVIÇOS
DE MANUTENÇÃO EFETUADOS POR SOCIEDADE DE PROPRIETÁRIOS –
COBRANÇA DE TAXA DE CONTRIBUIÇÃO RELATIVAS A ADMINISTRAÇÃO
E MANUTENÇÃO DE ÁREA COMUM – VALORES APROVADOS EM ASSEM-
BLÉIA GERAL – CABIMENTO – EXISTÊNCIA DE COMUNHÃO DE INTERESSES
– OBRIGAÇÃO TIDA COMO PROPTER REM, QUE ACOMPANHA O DESTINO
DO IMÓVEL – IRRELEVANTE O FATO DE SER ASSOCIADO OU NÃO A ASSO-
CIAÇÃO QUE REALIZA A MANUTENÇÃO E MELHORIA DO LOTEAMENTO
– ADEMAIS, APLICAÇÃO DO PRINCIPIO JURÍDICO QUE VEDA O ENRIQUECI-
MENTO ILÍCITO – ART. 884 DO NOVO CÓDIGO CIVIL – ARCABOUÇO PRO-
BATÓRIO DEVIDAMENTE APRECIADO PELO JUÍZO SENTENCIANTE – PRE-
CEDENTES DESTA CÂMARA REFERENTES AO MESMO LOTEAMENTO – TESE
SUFRAGADA PELO DO STJ – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE
RELAÇÃO JURÍDICA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO
IMPROVIDO
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0037368-0
Processo Eletrônico REsp 1.184.084/SP
Números Origem: 13742000 42131542 4213154401 99405075801050001
Pauta: 22.10.2013 Julgado: 22.10.2013
Relator: Exmo. Sr. Ministro Sidnei Beneti
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Bonifácio Borges de
Andrada
Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha
AUTUAÇÃO
Recorrente: Marino Francesco Gaiofatto
Advogado: Carlos Antonio David e outro(s)
Recorrido: Associação Residencial Vale da Santa Fé
Advogados: Vera Lúcia Machado Franceschetti
Bruna Machado Franceschetti Ferreira da Cunha e outro(s)
Assunto: Direito civil – Coisas – Propriedade – Condomínio
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a). Vera Lucia Machado Franceschetti, Pela Parte Recorrida: Associa-
ção Residencial Vale da Santa Fé
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-
fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator.
1432 – Loteamento – construção em lote situado em área de reserva ambiental – projeto arquite-
tônico e hidrossanitário aprovados pelo Município
“Direito ambiental e direito administrativo. Remessa ex officio e apelação voluntária. Loteamento.
Construção em lote situado em área de reserva ambiental. Projeto arquitetônico e hidrossanitário
aprovados pelo Município recorrente. Alvará de habite-se. Autorização do Ibama para construção
em área não superior a 40% (quarenta por cento) de lote situado em área de preservação ambien-
tal. Regularidade comprovada nos autos. Art. 15 da Lei Federal nº 9.985/2000. Remessa ex officio
e apelação voluntária conhecidas e improvidas. I – Consoante disposto no art. 15 da Lei Federal
nº 9.985/2000 (que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza), que
‘a Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação
humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes
para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos
proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabili-
dade do uso dos recursos naturais. § 1º A Área de Proteção Ambiental é constituída por terras
públicas ou privadas. § 2º Respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO........................................................................................................... 57
e restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de Proteção
Ambiental’. II – Na hipótese vertente, a despeito de o Município recorrente afirmar que o imóvel
dos recorridos, compreende área de uso não consolidado, portanto, insuscetível de edificação,
por ser reconhecida como área de reserva ambiental (Parque Estadual de Setiba), os recorridos
comprovaram a regularidade na construção de sua residência, tendo, inclusive, apresentado os
projetos arquitetônico e hidrossanitário aprovados pela Municipalidade, bem como, apontando o
cumprimento do acordo, formalizado com o Ibama, de edificar até o limite de 40% (quarenta por
cento) da respectiva área. III – O Município recorrente concedeu aos recorridos, posteriormente,
o Alvará de Habite-se nº 020/2005 (fl. 92), atestando que o imóvel sub judice fora construído em
atenção à Legislação local e atendendo às exigências previstas pelo Município para a aprovação
de projetos, mostrando, portanto, comportamento contraditório, no que tange às alegações trazi-
das nos autos. IV – A Área de Preservação Ambiental (APA) de Setiba, abrangendo a área do Par-
que Estadual de Setiba, não enseja o reconhecimento da inviabilidade absoluta da edificação, na
forma do art. 15 da Lei Federal nº 9.985/2000. Desta forma, restou reconhecida que a construção
dos recorridos atendeu às exigências da Municipalidade para construção e, também, não violou
qualquer norma ambiental de proteção ao ecossistema, devendo, portanto, ser mantida a Sentença
a quo, não se descurando do fato de que, embora tenha limitado o exercício da propriedade, certo
é que a obra restou concluída, devendo permanecer, contudo, a restrição, caso haja a intenção
dos recorridos na modificação do projeto original, sujeita à aprovação do Município recorrente.
V – Remessa ex officio e apelação voluntária conhecidas e improvidas.” (TJES – Ap-RN 0037986-
24.2003.8.08.0021 – Rel. Des. Namyr Carlos de Souza Filho – DJe 06.03.2014)
1444 – Registro de imóveis – dúvida – loteamento – venda a várias pessoas – DL 58/1937 – regis-
tro especial
“Registro de imóveis. Dúvida. Parcelamento do solo, com abertura simultânea de vias públicas,
efetuado na vigência do Decreto-Lei nº 58/1937. Loteamento. Assentamento no fólio real de um
compromisso de venda e compra de um dos lotes com pagamento do preço a prazo, em prestações
sucessivas e periódicas. Venda dos lotes a várias pessoas. Oferta pública. Necessidade de registro
especial do loteamento nos termos do Decreto-Lei nº 58/1937. Irrelevância do cadastramento dos
lotes na Municipalidade e sua tributação. Recurso a que se nega provimento.” (TJSP – AC 66.728-0/5
– Rel. Des. Luís de Macedo – DJ 11.10.2000)
Parte Geral – Doutrina
A Responsabilidade Civil do Incorporador e do Construtor sob o
Ponto de Vista Consumerista
BARBARA HELIODORA DE AVELLAR PERALTA
Advogada atuante no Contencioso Cível, Família e Sucessões, Doutoranda em Direito pela Uni-
versidade Federal Lomas de Zamora, Buenos Aires/AR, cursando Especialização em Processo
Civil pela Universidade Federal Fluminense.
RESUMO: Este artigo faz abordagens sobre o atraso na entrega das unidades, as multas, os danos morais
e materiais decorrentes da inexecução ou a mora do contrato, as cláusulas abusivas e jurisprudências
relacionadas.
INTRODUÇÃO
Inicialmente, pretendo abordar, no trabalho em pauta, alguns aspectos
da responsabilidade civil do incorporador e do construtor devido ao grande
desenvolvimento da atividade no mercado imobiliário.
A contratação parece envolvente, pois, ao adquirir um imóvel na planta,
estamos aparentemente realizando um excelente negócio que, em sua grande
maioria, é bastante proveitoso do ponto de vista econômico.
A rentabilidade em voga é mais palpável se estamos diante de uma em-
presa confiável e segura no mercado, onde os riscos são calculados. No entan-
to, mesmo diante de tais características, podemos nos deparar com situações
de empresas que não respeitam os seus clientes, bem como a função social do
contrato, e são desleais no decorrer da execução destes tratos.
Assim, baldadas as previsões abusivas contratualmente diante da prote-
ção consumerista aplicável em nossas relações.
1 A RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR
Inicialmente, cumpre assinalar que a responsabilidade do construtor de-
corre do contrato de empreitada, onde uma das partes, denominado empreitei-
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 63
ro, se obriga a realizar uma obra por intermédio de terceiros ou pessoalmente,
recebendo uma remuneração que é fornecida pelo proprietário da obra.
A obrigação derivada de tal contrato é a de resultado, onde a obrigação
principal é executar a obra, como contratualmente pactuada.
Assim, deve ser certo e determinado o resultado, onde, do contrário, gera
o inadimplemento ou mora contratual.
A responsabilidade do construtor é de resultado, como já assinalado, porque se
obriga pela boa execução da obra, de modo a garantir sua solidez e capacidade
para atender ao objetivo para qual foi encomendada. Defeitos na obra, aparentes
ou ocultos que importem sua ruína total ou parcial configuram violação do dever
de segurança do construtor, verdadeira obrigação de garantis (ele é o garante da
obra), ensejando-lhe o dever de indenizar independentemente de culpa. Essa res-
ponsabilidade só poderá ser afastada se o construtor provar que os danos resulta-
ram de uma causa estranha – força maior, fato exclusivo da vítima ou de terceiro,
não tendo aqui, relevância o fortuito interno.1
Tendo em vista que a maioria dos defeitos de obra são ocultos, não seria
razoável que a responsabilidade do construtor cessasse com a entrega desta.
Por sua vez, estabelece o art. 618 do CC/2002:
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções con-
sideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo
irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão
dos materiais, como do solo.
Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que
não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao
aparecimento do vício ou defeito.
1 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, p. 344.
64 R������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Tratando-se de danos pelo fato da obra, surge a responsabilidade inde-
pendente da comprovação de culpa, bastando que se comprove o dano e o
nexo causal.
Saliente-se que há a possibilidade de inversão do ônus da prova, como
será analisado mais adiante.
Urge frisar que, diante do dano ocorrido, torna-se imperiosa a responsa-
bilidade solidária do incorporador e do construtor, sendo a responsabilidade do
construtor abalizada pelo art. 618 do CC/2002 e a do incorporador no art. 937
do CC/2002.
2 A RESPONSABILIDADE DO INCORPORADOR
Cumpre notar que a incorporação é toda atividade destinada a alienar
frações ideais de um terreno, vinculando-se a unidades autônomas, sem edifica-
ções a serem construídas ou em construção sob regime condominial, podendo
ou não o incorporador também efetivar a construção do prédio (arts. 28 e 29 da
Lei nº 4.591/1964), in verbis:
Art. 28. As incorporações imobiliárias, em todo o território nacional, reger-se-ão
pela presente Lei.
Parágrafo único. Para efeito desta Lei, considera-se incorporação imobiliária a
atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alie-
nação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de
unidades autônomas.
2 Idem, p. 357.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 67
Assim, a simples negociação de unidades, antes deste registro, enseja a
aplicação da multa em favor do consumidor, devendo os responsáveis pagar
uma multa correspondente a 50% sobre a quantia que tiver recebido.
Ressalte-se que um sinal de reserva de imóvel já é suficiente para a inci-
dência da multa, se o incorporador não cumpriu os requisitos do art. 32.
Registre-se, ainda, que a multa em comento não está condicionada a
nenhum outro pré-requisito do art. 35, como, por exemplo, o seu § 4º, tendo
em vista que o aludido parágrafo apenas concede uma opção ao adquirente de
resguardar seu direito real de aquisição a terceiros.
Assim, a multa pode ser exigida antes ou depois da faculdade do § 4º do
aludido artigo.
Neste sentido, a Desembargadora Leila Mariano3 proferiu a sua decisão
com uma maestria ímpar sobre o estudo em pauta.
O fato determinante da aplicação da penalidade prevista no art. 35, § 5º, consiste
no simples descumprimento pelo incorporador de suas obrigações legais, sendo
devida a multa independentemente do fato de os adquirentes optarem pelo adim-
plemento ou pela extinção do contrato.
Impende ressaltar que uma das causas tuteladas pelo CDC é o prazo
imprevisto para a entrega da coisa, como ensina o ilustre Desembargador e
Professor Sérgio Cavalieri Filho10:
Em face dessa nova concepção contratual, são reputadas abusivas, entre outras,
cláusulas que estabelecem reajustes aleatórios nos contratos de compra e venda
de imóveis, ou com base em índices a serem escolhidos pelo incorporador, pra-
21 Idem, p. 163.
22 Art. 12, § 3º, do CDC.
23 CAVALIERI FILHO, Sergio. Ob. cit., p. 363.
76 R������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Essa responsabilidade pelo vício do produto ou serviço decorre da falta
de conformidade com a qualidade da coisa ou do serviço com sua perspectiva
de durabilidade e utilidade.
24 Código de defesa do consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1997. p. 119.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 77
Assim, há a possibilidade de inversão do ônus da prova, nos termos do
art. 6º, VIII, da Lei nº 8.078/1990.
28 Manual do processo de conhecimento. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 203.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 83
imóveis, o que não estaria ocorrendo caso a obra estivesse sido en-
tregue, demonstrando que a situação está causando abalo financei-
ro na vida do adquirente ou outro dano advindo da relação jurídica.
Ainda recentemente, o Desembargador Marcus Faver, em lapidar acór-
dão derivado do Processo nº 2000.002.00050, decidindo idêntica questão, en-
fatizou a necessidade da concessão da tutela para o pagamento do aluguel até
que seja entregue o imóvel, in verbis:
PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE APARTAMENTO EM CONSTRUÇÃO
– ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – TUTELA ANTECIPADA – LOCAÇÃO DE
IMÓVEL – ALUGUEL – OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO – AGRAVO DE INSTRU-
MENTO – TUTELA ANTECIPADA – AÇÃO DE NATUREZA CONDENATÓRIA –
EMPRESA DE CONSTRUÇÃO IMOBILIÁRIA – CONTRATO DE COMPROMISSO
DE COMPRA E VENDA DE APARTAMENTO, COM OBRIGAÇÃO DE ENTREGA
DA UNIDADE ATÉ MAIO DE 1999 – NÃO CUMPRIMENTO – Antecipação do
pedido para compelir a construtora a pagar o aluguel do adquirente até a entrega
do imóvel. Pressupostos da medida evidenciadas. Verossimilhança das alegações
evidenciadas por prova inequívoca. Dano de difícil reparação. É patente o receio
de dano de difícil. Evidenciando-se que o autor encontrava-se na iminência de
não ter condições de cumprir com a dupla obrigação: o pagamento dos alugue-
res e o da prestação do imóvel prometido. Decisão correta. Recurso desprovido.
(AI 2000.002.00050, 5ª C.Cív., Des. Marcus Faver, J. 15.02.2000)
29 AC 2003.001.12499.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 85
danos imateriais com o inadimplemento do incorporador, sendo preciso obser-
var os parâmetros a conceder tal reparação.
Sendo o dano moral in re ipsa; logo, não há que fazer prova, estando
provado, por si só, pelo simples ocorrido.
Não pode ser considerado mero dissabor para uma família que junta
economias durante anos e, após todo o esforço empenhado, se vê diante de um
acontecimento que desestabiliza toda a família e, em muitos casos, traz, sim,
um enorme abalo psíquico no indivíduo, brigas e estresses familiares.
30 “Direito civil. Rescisão de contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel em construção.
Inadimplemento da construtora. Atraso na entrega da obra que justifica a resolução do contrato e o
retorno das partes ao status quo ante. Dano moral. Ocorrência. A falta de respeito no trato dos direitos do
consumidor é geradora de dano moral. Se os apelantes restaram vencidos devem suportar por inteiro os
ônus da sucumbência. Recurso desprovido.” (Ap 2009.001.18652, 17ª C.Cív., Desª Luisa Bottrel Souza,
J. 24.06.2009)
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 87
do princípio tantum devolutum quantum apellatum. Entendimento consagrado
pelo STJ, segundo o qual o promitente comprador tem direito a perceber, a tí-
tulo de lucros cessantes, valor relativo a alugueres desde a data prevista para a
entrega do imóvel. Consequente alteração da sucumbência, que agora deve ser
suportada pela apelada [...]. (Ap 2009.001.13275, 5ª C.Cív., Desª Teresa Castro
Neves, J. 12.05.2009)
31 “No ramo de atividade da autora, é notório que o respeito aos prazos de entrega do serviço é uma das
principais características que o consumidor procura ao contratar, visto que o atraso em obras causa muitos
88 R������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE
APARTAMENTO EM CONSTRUÇÃO – INADIMPLEMENTO CONTRATUAL
– ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – CULPA EXCLUSIVA DO INCORPORA-
DOR – RESCISÃO DE CONTRATO – RESTITUIÇÃO DAS IMPORTÂNCIAS PA-
GAS – PERDAS E DANOS – PREVISÃO CONTRATUAL DE RESSARCIMENTO
– DANO MORAL – OCORRÊNCIA – TRANSTORNOS QUE EXTRAPOLAM O
MERO ABORRECIMENTO – Havendo inadimplemento contratual por parte da
incorporadora, que não entrega a unidade no prazo avençado, e não logran-
do êxito em demonstrar as excludentes de responsabilidade, deve devolver as
quantias pagas, uma vez rescindido o contrato. Havendo cláusula no instrumento
particular de incorporação prevendo o ressarcimento do adquirente em caso de
atraso na entrega das chaves, faz o mesmo jus à reparação pretendida. O dano
moral se caracteriza em razão da demora na entrega da unidade e na frustração
da realização do sonho da casa própria, estando a verba indenizatória bem fi-
xada, não merecendo qualquer censura. Recurso ao qual se nega provimento.
(Ap 2008.001.30306, 16ª C.Cív., Des. Lindolpho Morais Marinho, J. 07.10.2008)
transtornos aos clientes, que, muitas vezes, aguardam sua conclusão para retornar às suas residências ou a
seus estabelecimentos.” (Ap 2009.001.08897)
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 89
ao apelado, a fim de que a casa que adquirira reunisse as condições mínimas
para que fosse ocupada, perpassam a fronteira do mero aborrecimento. Tal fato
iniludivelmente configura dano moral, pois abala sua integridade psicológica,
causando-lhe tristeza, angústia e sofrimento; e existe in re ipsa. Verba fixada em
R$ 5.000,00, valor que corresponde a justa reparação do prejuízo extrapatrimo-
nial da parte. Recurso provido. (Ap 2008.001.26174, 13ª C.Cív., Des. Nametala
Machado Jorge, J. 25.06.2008)
Neste sentido, finalizo o artigo acreditando não pode haver uma inver-
são de valores na sociedade, onde se deixa de punir a prática de um dano em
decorrência de uma suposta “fábrica de dano moral”, pois se há uma imensa
demanda de dano moral é porque os fornecedores estão prestando um péssimo
serviço.
O correto é que as empresas, seja por serem leais com seus consumido-
res, seja por medo de sofrer um condenação pecuniária alta, passem a respeitar
o consumidor. E que sejam abolidas do cotidiano dos indivíduos as situações
vexatórias a que são submetidos diariamente ao reclamar por seus direitos. Não
cabe mais em nosso mercado de consumo nacional o descaso e a falta de res-
peito com que são tratados os consumidores brasileiros.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, forçoso concluir que o contrato de incorporação imo-
biliária deve ser analisado conjuntamente com o Código de Defesa do Consu-
midor.
REFERÊNCIAS
Código de defesa do consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto. 5. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1997.
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo:
Malheiros.
MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento. 5. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais.
RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
SCHMITT, Cristiano Heineck. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. 2. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais.
Sites
www.stj.gov.br.
www.tj.rj.gov.br.
www.planalto.gov.br.
Parte Geral – Doutrina
A Proteção dos Acionistas e Credores na Incorporação
TÉRCIO TÚLIO NUNES MARCATO
Mestrando em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos.
RESUMO: Este texto visa a tratar sobre as formas pelas quais as partes vinculadas em uma operação
de incorporação podem socorre-se do direito para sanarem ou dirimirem situações que eventualmente
venham lhe causar prejuízos. Para tanto, todo o processo pelo qual as empresas – tanto incorporadora
quanto incorporada – perpassam será minuciosamente discutido, com uma exposição conceitual dos atos
preparatórios e executivos, além de sua repercussão ante os envolvidos.
ABSTRACT: This paper aims to discuss the ways in which the parties bound in a merger transaction may
help is the right to remedy or address any situations that may cause you harm. Thus, the process by which
companies – both real as incorporated – permeate will be thoroughly discussed, with an exhibition of
conceptual history and executive acts, and its effect before those involved.
A INCORPORAÇÃO DE EMPRESAS
A incorporação de empresas é regida pelo art. 223 da Lei nº 6.404/1976,
a Lei das Sociedades Anônimas. Dispõe o referido artigo:
Art. 223. A incorporação, fusão ou cisão podem ser operadas entre sociedades
de tipos iguais ou diferentes e deverão ser deliberadas na forma prevista para a
alteração dos respectivos estatutos ou contratos sociais.
§ 1º Nas operações em que houver criação de sociedade serão observadas as
normas reguladoras da constituição das sociedades do seu tipo.
§ 2º Os sócios ou acionistas das sociedades incorporadas, fundidas ou cindidas
receberão, diretamente da companhia emissora, as ações que lhes couberem.
§ 3º Se a incorporação, fusão ou cisão envolverem companhia aberta, as so-
ciedades que a sucederem serão também abertas, devendo obter o respectivo
registro e, se for o caso, promover a admissão de negociação das novas ações no
mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data
da assembléia-geral que aprovou a operação, observando as normas pertinentes
baixadas pela Comissão de Valores Mobiliários.
§ 4º O descumprimento do previsto no parágrafo anterior dará ao acionista di-
reito de retirar-se da companhia, mediante reembolso do valor das suas ações
(art. 45), nos trinta dias seguintes ao término do prazo nele referido, observado o
disposto nos §§ 1º e 4º do art. 137.
E arremata:
No momento em que as vontades das sociedades se cruzam ou se justapõem, é
evidente a existência de um contrato. Decorrente ou não de um protocolo, de um
tratado ou de um projeto, não se pode negar a existência de um contrato. Não
se deve, pois, confundir a série de atos corporativos, internos, de formação da
98 R������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
vontade social com a relação das sociedades entre si, como sujeitos de direito. É
verdade que a doutrina vem atribuindo preponderância à serie de atos corporati-
vos, mas isto não significa que fusão possa ser meramente interna.
Não há, portanto, dúvidas de que a fusão se apresenta sob dois aspectos: contra-
tual, externo, portanto, entre as sociedades, e corporativo, associativo ou socie-
tário, portanto, interno. São as duas faces do mesmo fenômeno, porém, não se
contrapondo nem se sobrepondo. (Bulgarelli, 2000, p. 82)
PROTOCOLO
Dispõe o art. 224 da Lei de Sociedades Anônimas:
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 99
Art. 224. As condições da incorporação, fusão ou cisão com incorporação em so-
ciedade existente constarão de protocolo firmado pelos órgãos de administração
ou sócios das sociedades interessadas, que incluirá:
I – o número, espécie e classe das ações que serão atribuídas em substituição dos
direitos de sócios que se extinguirão e os critérios utilizados para determinar as
relações de substituição;
II – os elementos ativos e passivos que formarão cada parcela do patrimônio, no
caso de cisão;
III – os critérios de avaliação do patrimônio líquido, a data a que será referida a
avaliação, e o tratamento das variações patrimoniais posteriores;
IV – a solução a ser adotada quanto às ações ou quotas do capital de uma das
sociedades possuídas por outra;
V – o valor do capital das sociedades a serem criadas ou do aumento ou redução
do capital das sociedades que forem parte na operação;
VI – o projeto ou projetos de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão
ser aprovados para efetivar a operação;
VII – todas as demais condições a que estiver sujeita a operação.
Parágrafo único. Os valores sujeitos a determinação serão indicados por estima-
tiva.
No que tange aos requisitos que devem constar no protocolo, estes são
minuciosamente detalhados no art. 224 da Lei nº 6.404/1976 e devem obriga-
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 101
toriamente constar no protocolo. Contudo, é também previsto e permitido que
outras condições constem no documento, figurando como cláusulas comple-
mentares, salientando que estas cláusulas não podem contrariar, suprimir ou
substituir as cláusulas obrigatórias.
No que se refere às ações, conforme mencionado no inciso I do art. 224,
devem constar no protocolo o número, a espécie e a classe das ações que serão
atribuídas em substituição dos direitos dos sócios que sairão da sociedade. Esta
determinação decorre do fato de haver um aumento de capital na sociedade
incorporadora mediante integralização do capital da incorporada e do fato de
este capital ser transferido aos acionistas que não mais farão parte da sociedade.
Por isso, deve ser descrito de forma minuciosa de que forma esta transferência
de ações ocorrerá, de forma a respeitar tanto os interesses dos acionistas da
sociedade incorporada quanto da incorporadora, além de outros interesses di-
retamente ligados à operação.
Os demais requisitos, que devem constar no protocolo, guardam estreita
relação com a avaliação da sociedade. Todavia, é com relação às ações a se-
rem transferidas que o presente artigo tem a sua fundamentação, uma vez que,
havendo qualquer ato contrário ao que determina o protocolo, no que tange a
esta condição, alguma medida judicial deve ser tomada, a fim de sanar eventual
problema que surja.
Uma vez considerado contrato preliminar, este é dotado de certas pecu-
liaridades, como bilateralidade, que consiste em obrigações recíprocas assumi-
das por ambas as partes e que devem ser aprovadas por uma assembleia-geral.
No protocolo, há, portanto, imperativa a aplicação da teoria da exceptio non
adimplenti contractus. Com propriedade, Modesto Carvalhosa assim lecionou:
Cabe, portanto, em matéria de protocolo, a condição resolutiva tácita, ou seja,
o princípio de que o inadimplemento da obrigação de fazer assumido por uma
das sociedades envolvidas, constitui justa causa para que a outra promova a re-
solução do acordo. Isso porque, se uma sociedade deixa de honrar, nos prazos
consignados os compromissos de fazer, a obrigação da outra fica sem causa,
resolvendo o contrato.
Devem, assim, as sociedades envolvidas cumprir especificamente o prometido,
ou seja, promover as medidas de avaliação e consectárias e submeter soberana
o negócio da fusão, incorporação ou cisão com incorporação, instruída por seus
termos. (Carvalhosa, 2002, p. 240)
JUSTIFICAÇÃO
Ultrapassadas as questões impostas pelo protocolo, o art. 225 da Lei
nº 6.404, de 1976, determina o próximo passo a ser seguido, qual seja, a justi-
ficação.
Art. 225. As operações de incorporação, fusão e cisão serão submetidas à deli-
beração da assembléia geral das companhias interessadas mediante justificação,
na qual serão expostos:
I – os motivos ou fins da operação, e o interesse da companhia na sua realização;
II – as ações que os acionistas preferenciais receberão e as razões para a modifi-
cação dos seus direitos, se prevista;
III – a composição, após a operação, segundo espécies e classes das ações, do
capital das companhias que deverão emitir ações em substituição às que deverão
extinguir;
IV – o valor de reembolso das ações a que terão direito os acionistas dissidentes.
FORMAÇÃO DO CAPITAL
O art. 226 disciplina de que forma o capital envolvido na incorporação
será formado e assim dispõe:
Art. 226. As operações de incorporação, fusão e cisão somente poderão ser efe-
tivadas nas condições aprovadas se os peritos nomeados determinarem que o
valor do patrimônio ou patrimônios líquidos a serem vertidos para a formação do
capital é, ao menos, igual ao montante do capital a realizar.
§ 1º As ações ou quotas do capital da sociedade a ser incorporada que forem de
propriedade da companhia incorporadora poderão, conforme dispuser o proto-
colo de incorporação, ser extintas, ou substituídas por ações em tesouraria da
incorporadora, até o limite dos lucros acumulados e reservas, exceto a legal.
§ 2º O disposto no § 1º aplicar-se-á aos casos de fusão, quando uma das socieda-
des fundidas for proprietária das ações ou cotas da outra, e de cisão com incor-
poração, quando a companhia que incorporar parcela do patrimônio cindida for
proprietária de ações ou quotas do capital desta.
Dessa forma, indiscutível resta que o art. 230 não foi revogado pela Lei
nº 7.958/1989, razão pela qual o direito de recesso dos acionistas dissidentes
deve ser mantido com a vigência da referida lei.
Ademais, há salientar que a Lei nº 10.303/2001 introduziu importantes
alterações no que diz respeito ao direito de recesso. Com relação aos titulares
de ações dotadas de liquidez ou emitidas por companhias com o capital disper-
so no mercado, a citada lei não alterou o determinado pela Lei nº 9.457/1997,
no sentido de negar o direito de recesso na fusão, incorporação ou cisão.
Apesar de não modificar estes critérios, negando o direito de recesso aos
acionistas dissidentes, a Lei nº 10.303/2001 modificou os critérios para se afe-
rir a liquidez das ações. Assim se manifestaram Modesto Carvalhosa e Nelson
Erizik:
A Lei nº 10.303/2001, no que se refere ao direito de recesso na fusão, incorpo-
ração ou participação em grupos de sociedades introduz alterações importantes.
Em primeiro lugar, observa-se que não foi alterado o princípio introduzido pela
Lei nº 9.457/1997, de negar o direito de recesso aos titulares de ações dotadas de
liquidez ou emitidas por companhias com o capital disperso no mercado.
Não obstante, a Lei nº 10.303/2001 modificou substancialmente os critérios para
que se possam aferir os parâmetros de liquidez e dispersão das ações, visando a
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 109
reduzir as hipóteses em que pode ser negado o direito de recesso aos acionistas
dissidentes. (Carvalhosa, Erizik, 2002, p. 272)
Certo é que os credores também são envolvidos por certo tipo de prote-
ção quando da efetivação da reorganização societária, sendo certo que a legis-
lação faculta a estes o direito de, no prazo de 3 (três) meses, buscar a reparação
judicial de prejuízos que eventualmente tenham sofrido no processo de incor-
poração.
112 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Esta reparação se dará por meio da anulação da operação, sendo certo
que os credores podem ser tanto da sociedade incorporada quanto da incorpo-
radora. Entretanto, considerando os aspectos econômicos, sociais e, principal-
mente, objetivos que envolvem um processo de reorganização societária, seria
um tanto quanto temerário facilitar o direito dos credores ao ponto de dificultar
o procedimento de incorporação. Waldírio Bulgarelli expôs o seguinte enten-
dimento:
A tendência geral vem sendo, como na Itália e na Espanha, a de diminuir os
prazos de oposição, tendo em vista a necessidade de não dificultar em demasia a
sua realização. Trata-se, portanto, de uma diminuição da margem de tempo que
dispõem os credores para reclamar da incorporação, facilitando e simplificando
o mecanismo para certas incorporações, sem prejudicá-los, retirando-lhes este
direito.
Por seu turno, a lei brasileira se de um lado facilita a realização da incorporação,
não concedendo esse direito de oposição, utilizando em alguns casos por credo-
res de má fé para dificultar e até mesmo impedir a incorporação, como já se veri-
ficou em outros países, faz, de outro, pender sobre ela uma verdadeira condição
“resolutiva”, pois poderá ser desfeita, se os credores lograrem sucesso no pedido
de anulação. (Bulgarelli, 2000, p. 184)
REFERÊNCIAS
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Saraiva, 2007.
ASCARELLI, Túllio. Problemas das sociedades anônimas e o direito comparado.
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______. Fusões, incorporações e cisões de sociedades. 5. ed. Atualizada de acordo com
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CARVALHOSA, Modesto. A Lei nº 7.958/1989, de 20 de dezembro de 1989, e o direito
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de 1976, com as modificações das Leis nºs 9.475, de 5 de maio de 1997, e 10.303, de
30 de outubro de 2001. São Paulo: Saraiva, 2002.
______. A nova lei das sociedades anônimas. São Paulo: Saraiva, 2002.
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 3. ed. Rio de Janeiro:
Borsoi, 1970.
PENTEADO, Mauro Rodrigues. A Lei nº 7.958/1989 e a pretensa modificação do direi-
to de retirada dos acionistas: uma discussão inócua. Revista de Direito Mercantil, n. 77,
jan./mar. 1990.
SIMONSEN, Mário Henrique. A nova economia brasileira. São Paulo: José Olímpio,
1971.
Parte Geral – Doutrina
A Relação entre Corretores de Imóveis, Imobiliárias e o Mercado
Imobiliário
ALEXANDRE BARBOSA MACIEL
Corretor de Imóveis, Advogado.
COMPARTILHANDO IDEIAS
Uma importante modificação na legislação, que beneficiaria não só os
profissionais da corretagem de imóveis, mas toda a sociedade, seria a institui-
ção da reserva exclusiva de mercado na comercialização de imóveis no Brasil,
instituto que é representado pela palavra exclusividade, já citada e prevista no
art. 726 do Código Civil de forma opcional e praticada por muitos profissionais.
Essa simples modificação atenderia a um antigo anseio da categoria, que foi
criada a duras penas, sofrendo à época da sua regulamentação o lobby con-
trário e pesado de segmentos como o dos advogados e dos engenheiros, por
sentirem ameaçadas as suas atividades com uma nova atividade que surgia e
que de certa forma tirava desses profissionais algumas prerrogativas que eles
desempenhavam, como a intermediação de compra e venda, da locação e da
avaliação de imóveis. As últimas modificações no ordenamento jurídico envol-
vendo a atividade da corretagem de imóveis apontam para uma maior responsa-
bilização e, consequentemente, uma maior valorização do trabalho desses pro-
fissionais que desempenham uma importante atividade econômica, responsável
pela grande maioria das transações imobiliárias correntes no nosso País. Provas
disso foram a criação do capítulo da corretagem no Código Civil em 2002, da
alteração do art. 723 do mesmo diploma, atribuindo responsabilidade civil total
aos corretores no exercício da sua atividade recentemente em 2010, de atos do
nosso Conselho Federal normatizando através de resoluções a regulamentação
das avaliações realizadas por corretores de imóveis de acordo com a Norma
Técnica nº 14.653-26, como também obrigando os corretores a se cadastrarem
A EXCLUSIVIDADE
Ressalto a importância de que toda transação seja intermediada por cor-
retor de imóveis e através de contrato escrito, mas isso só não basta: a lei pre-
cisa ser modificada atribuindo exclusividade aos corretores de imóveis para a
intermediação de todas as transações imobiliárias, promovendo a escrituração
pública e o registro da transação ou simplesmente fornecendo um parecer de-
terminando o valor do negócio para apuração dos impostos. Isso poria fim ao
exercício ilegal da profissão, pois apenas os corretores poderiam intermediar as
transações imobiliárias de todas as espécies e opinar quanto à comercialização
imobiliária, conforme determina o art. 3º da Lei nº 6.530/1978, fornecendo aos
órgãos envolvidos e interessados na operação por ele intermediada os valores
negociados, através de declaração própria, ou de escritura particular, o que
reduziria a 0 (zero) a sonegação dos impostos sobre as transações imobiliárias,
pois o corretor e/ou a imobiliária que intermediou a transação, seja a compra e
venda, permuta ou locação, seriam obrigados a informar à Receita Federal, ao
Estado e ao Município toda e qualquer transação intermediada, fornecendo-lhe
todos os dados para a apuração dos impostos incidentes na operação, como
também os impostos e encargos sobre os honorários, inclusive no caso de di-
visão. Para termos uma ideia, estima-se que cerca de R$ 50 bi são sonegados
anualmente nas transações imobiliárias.
PERIGO DE RETROCESSO
Apesar de apresentar argumentos amparados em fundamentos legais, po-
rém que não se aplicam à atividade da corretagem de imóveis, o relatório do
Auditor Fiscal do Estado de Maceió, Glauco Nogueira, deixa de levar em con-
sideração várias questões de ordem legal e prática na relação entre corretores
de imóveis e imobiliárias, que não podem ser colocadas de lado, sob pena de
prejudicar um segmento empresarial de suma importância para a economia
do nosso País. Primeiramente, é importante salientar que qualquer corretor de
imóveis pode se tornar pessoa jurídica, buscando para tanto atender às exigên-
cias previstas em lei. Outro fato importante é o de que as formas de divisão
dos honorários, que é o que percebemos como pagamento pela concretização
dos negócios, ou, ainda, conforme determina o art. 725 do CC, são determi-
nadas pelas tabelas de honorários confeccionadas pelos sindicatos de correto-
res de imóveis de cada Estado, e homologadas pelos Conselhos Regionais na
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 119
sua jurisdição, devidamente amparados pela Lei nº 6.530/1978 e pelo Decreto
nº 81.871/1978. Outra importante consideração é a de que o contrato de corre-
tagem é um contrato típico, especial, não se confundindo com os demais tipos
de contratos de prestação de serviço. Estes sim geram vínculo empregatício.
Portanto, a contratação por escrito, além de ser uma obrigação legal e ética dos
corretores de imóveis, serve para proteger o proprietário do imóvel ou seu pre-
posto do vínculo empregatício com o corretor de imóveis. Se não fosse assim,
qualquer corretor poderia entrar com ação na Justiça Trabalhista pedindo reco-
nhecimento do vínculo empregatício contra o seu contratante, proprietário de
imóveis que o contratou para vender ou alugar o seu imóvel. O que existe entre
corretores de imóveis e imobiliárias, na verdade, é um contrato de parceria para
corretagem, onde o corretor pode fazer o papel tanto de captador do negócio
quanto de vendedor, ou ambos, e a imobiliária fornece-lhe credibilidade, estru-
tura e muitas vezes até o cliente. O direito aos honorários é determinado pelos
arts. 724 e 725 do CC. Não existe relação de hipossuficiência entre eles, pois o
corretor que captar e vender um imóvel utilizando a marca e a estrutura de uma
imobiliária receberá 50% dos honorários auferidos no negócio. Fica para mim
muito claro de que não existe previsão legal que apoie a ideia de que os corre-
tores de imóveis, no exercício da atividade, estejam eles trabalhando isolada-
mente ou em parceria com outros corretores ou imobiliárias, possam pretender
buscar na Justiça do Trabalho o reconhecimento de vínculo empregatício nem
contra o proprietário do imóvel nem contra o parceiro. Ambos, portanto, cor-
retores e imobiliárias, devem se resguardar, assinando um contrato de parceria
para fins de corretagem. Esse contrato deve conter todas as condições envolvi-
das na parceria, como o respeito às regras contidas nas normas legais, comum
a todos, a forma divisão de honorários estabelecida na tabela de honorários,
os direitos e as obrigações de parte a parte, os investimentos que cada um tem
que fazer, a dedicação exclusiva à imobiliária ou não. Porém, nada impede
que corretores de imóveis tenham funções assalariadas dentro das imobiliárias
que eles prestem serviços, como de gerência de equipes, de produtos ou de
serviços. Nossa profissão é assim mesmo, moderna e sem direitos trabalhistas.
O pagamento dos respectivos honorários aos corretores deverá ser feito sempre
através de RPA, descontando os encargos e impostos incidentes sobre o bruto
da remuneração.
O relatório deixa de considerar todos os investimentos que são feitos pela
imobiliária para que o corretor de imóveis pessoa física possa desempenhar a
sua atividade. Achei ainda curioso também o fato de que a denúncia que moti-
vou a iniciativa da Presidência da República tenha partido de uma corretora de
imóveis do Estado de Alagoas que preferiu preservar-se no anonimato, mesmo
Estado do Auditor Fiscal Glauco Nogueira, único no País a atender a determi-
nação presidencial. Creio que ele tenha simplesmente comparado a relação
existente entre corretores de imóveis pessoas físicas com as imobiliárias, que
são nada mais do que corretores de imóveis que fazem parte de uma sociedade
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que exerce a atividade da corretagem de imóveis, com a relação entre os pa-
trões e empregados.
Embora alguns defendam o reconhecimento do vínculo empregatício,
considero que, caso isso venha a ser aprovado, causará um grande choque na
atividade empresarial, pois, desta forma, os corretores passarão a ter não só di-
reito a piso salarial, mas também todas as outras obrigações comuns à relação
empregatícia, 13º salário, férias de 30 dias acrescidas de 1/3 do salário, FGTS,
INSS, PIS, Cofins, CSLL, licença de até 15 dias recebendo da empresa sem traba-
lhar caso adoeça, multa de 50% sobre o montante do FGTS para ser demitido,
o que não se encaixa nos atuais costumes. Este é o modelo arcaico de sistema
trabalhista implantado na primeira metade do século passado pelo Estado, onde
se transferiu para o empregador o custo de todas as obrigações que deviam ser
do Estado. Esta regra não se aplica a nossa atividade, que é meio e não fim,
e foi concebida para ser assim mesmo, autônoma, o que significa que cada
um cuida da sua vida, inclusive recolhendo para a Previdência, que deveria
cuidar da nossa saúde durante a nossa vida laboral e nos oferecer aposenta-
doria quando completarmos 35 anos de contribuição ao INSS, como também
recolhendo o imposto sobre as rendas auferidas, nas suas diversas faixas de
contribuição e o ISS à prefeitura, sejamos corretores de imóveis pessoas físicas
ou empresários. Também é sabido que as pessoas jurídicas quando pagam os
honorários aos seus colaboradores pessoas físicas devem fazer através de RPA
(recibo de pagamento a autônomo), recolhendo na fonte todos os impostos e
encargos trabalhistas do autônomo. Agora eu pergunto aos senhores: Quantos
de vocês donos de imobiliárias estão fazendo a coisa desse jeito? Quantos dos
senhores corretores de imóveis querem que sejam descontados das suas partes
dos honorários os encargos e impostos que são obrigatórios o seu recolhimento
na fonte pagadora? Quem nos paga é o cliente e cada um responde por sua par-
te. É assim que nossa atividade funciona. Sabemos também que existem outras
formas de pessoas jurídicas como as associações de profissionais e as coopera-
tivas onde as responsabilidades e os resultados são divididos igualmente entre
os sócios ou o sistema de franchising, onde o franqueado paga para aderir a
determinada empresa.
O QUE FAZER?
Essa não é a mudança que precisamos que aconteça. Não agora. Talvez
nunca. Temos que lutar por uma causa que nos una e não que nos divida, pois
o que temos diante de nós é uma luta muito maior, que é pela instituição da
exclusividade de comercialização pelos corretores de imóveis. Não podemos
nos dividir nesse momento. Precisamos concentrar nossos esforços no sentido
de ver modificada a nossa lei, a Lei nº 6.530/1978, nos seus arts. 2º e 3º, pará-
grafo único, criando de fato e de direito a reserva exclusiva de mercado sobre
a comercialização de imóveis no Brasil. Precisamos fazer lobby junto a nossa
Presidenta e aos nossos parlamentares, principalmente a nossa entidade norma-
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 121
tizadora, o sistema Cofeci/Creci, os sindicatos e as associações de corretores
de imóveis de todo o País, para que atendam a esse clamor da categoria, pelos
argumentos que já apresentei supra. A mudança na Lei nº 6.530/1978 deverá
vir acompanhada da alteração de outras leis, como a dos registros públicos.
Na prática, o corretor de imóveis, como responsável técnico pela transação,
deverá ser o responsável pela informação do valor da transação aos órgãos inte-
ressados, desde o seu anúncio nos meios de comunicação, como jornais, sites,
portais, panfletos, etc., pois a divulgação do valor nesses veículos é obrigatória,
conforme determina o Código de Defesa do Consumidor, e servirão de prova
quanto ao valor ofertado no mercado, até na sua escrituração pública e regis-
tro, transferindo posse ou propriedade, quando este emitiria uma declaração
atestando quanto foi o valor do negócio ou através de escritura particular feita
pelo próprio (art. 108 do CC). Para atingir maior eficácia, o limite de 30 salários-
-mínimos previstos deveria ser aumentado para até 300 salários-mínimos. Com
base nessa declaração ou no valor da escritura particular feita pelo responsável
pela transação, seriam calculados os impostos incidentes devidos à União, aos
Estados e ao Município. Isso reforçaria a segurança dos negócios imobiliários
que acontecem no País, geraria uma arrecadação de qualidade no segmento e
daria ao corretor de imóveis e às imobiliárias o status que os mesmos merecem,
dada a responsabilidade que é o exercício desta atividade.
REFERÊNCIAS
Disponível em: <http://goo.gl/G2e3fv>.
Disponível em: <http://circruz.blogspot.com.br/2013/03/o-corretor-de-imoveis-e-o-
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Disponível em: <http://www.cofeci.gov.br/portal/arquivos/legislacao/2007/resolu-
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Disponível em: <http://www.cofeci.gov.br/portal/arquivos/legislacao/2010/resolu-
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Disponível em: <http://www.cofeci.gov.br/portal/arquivos/legislacao/2012/resolu-
cao1256_2012.pdf>.
Parte Geral – Doutrina
Hipoteca Judiciária sobre Bens Não Elencados no Artigo 1.473
do Código Civil – A Efetividade da Jurisdição Como Horizonte
Hermenêutico
ALINE VEIGA BORGES
Juiz do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região/RS, Membro do Grupo de
Estudos de Direito Processual da Escola Judicial do TRT4.
RESUMO: O presente estudo tem a finalidade de propor a adoção da utilização do instituto da hipoteca
judiciária sobre bens não elencados no art. 1.473 do Código Civil, na perspectiva de inibir a fraude à exe-
cução e de prover segurança à futura execução.
PALAVRAS-CHAVE: Hipoteca judiciária; hipoteca judiciária de bens móveis; efetividade da jurisdição; exe-
cução trabalhista; fraude à execução; ônus do tempo do processo.
INTRODUÇÃO
Recentemente editada, prevê a Súmula nº 57 do TRT da 4ª Região que “a
constituição de hipoteca judiciária, prevista no art. 466 do CPC, é compatível
com o processo do trabalho”1.
1 A INTERPRETAÇÃO ESTRITA
No inventário dos bens que podem ser objeto da hipoteca judiciária pre-
vista no art. 466 do CPC2, o primeiro movimento do intérprete será investigar
essa questão à luz dos preceitos de direito material que disciplinam o instituto
da hipoteca, porquanto o art. 466 do CPC não indica quais são os bens sujeitos
à hipoteca judiciária, embora faça remissão à Lei dos Registros Públicos3. Esse
primeiro movimento de investigação científica apresentar-se-á intuitivo tanto
pelo fato de que a hipoteca é antigo instituto de direito material regulado pelo
direito privado (CC, arts. 1.473 e seguintes) quanto pela relação estabelecida na
teoria geral do direito civil entre hipoteca e bem imóvel.
No âmbito do direito privado, a relação entre hipoteca e bem imóvel é
expressão de uma construção conceitual historicamente estabelecida há muitos
séculos. Tais aspectos podem conduzir o operador jurídico à interpretação de
que a hipoteca judiciária recai apenas sobre os bens relacionados no art. 1.473
do Código Civil, a saber: I – os imóveis e os acessórios dos imóveis conjunta-
mente com eles; II – o domínio direto; III – o domínio útil; IV – as estradas de
ferro; V – os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente
do solo onde se acham; VI – os navios; VII – as aeronaves; VIII – o direito de
uso especial para fins de moradia; IX – o direito real de uso; X – a propriedade
superficiária.
Portanto, uma interpretação estrita dos bens sujeitos à hipoteca judiciá-
ria conduzirá o intérprete à conclusão de que apenas os bens relacionados no
art. 1.473 do Código Civil podem ser objeto de hipoteca judiciária. Essa inter-
pretação estrita foi adotada no bem articulado ensaio escrito pelo magistrado
Arlindo Cavalaro Neto sobre o tema4. Trata-se de uma interpretação respeitável.
2 “Art. 466. A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação, consistente em dinheiro ou coisa,
valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita
na Lei de Registros Públicos.
Parágrafo único. A sentença condenatória produz hipoteca judiciária:
I – embora a condenação seja genérica;
II – pendente arresto de bens do devedor;
III – ainda quando o credor possa promover a execução provisória da sentença.”
3 Trata-se da Lei nº 6.015/1973, que dispõe sobre os Registros Públicos e dá outras providências.
4 “O Código de Processo Civil não relaciona os bens sujeitos à hipoteca judiciária. Partindo-se da premissa
de que a hipoteca judiciária constitui-se em espécie de hipoteca, impõe-se ao intérprete valer-se do elenco
124 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
2 A FINALIDADE DA HIPOTECA JUDICIÁRIA
Não se pode, no entanto, olvidar a finalidade do instituto, que é a de pre-
venir fraude à execução e assegurar futura execução. No processo do trabalho,
essa execução geralmente se presta à satisfação de verba de natureza alimentar.
Daí a proposta de ampliar a utilização do instituto da hipoteca judiciária para
bens outros, que não apenas imóveis e os demais elencados no art. 1.473 do
Código Civil, tornando, assim, mais efetiva a execução trabalhista.
Enquanto a hipoteca convencional constitui direito real de garantia inci-
dente sobre bens imóveis do devedor, para assegurar ao credor o recebimento
preferencial de seu crédito, a hipoteca judiciária é instituto de direito processual,
de ordem pública, cujo escopo teleológico é o de inibir a fraude à execução e a
assegurar a satisfação do crédito reconhecido em sentença. Por consequência,
não parece adequado assimilar a hipoteca judiciária à hipoteca convencional
definida no direito privado, inclusive no que se refere aos bens que podem ser
objeto da hipoteca judiciária, especialmente se, para cumprir a finalidade do
instituto, for necessário buscar garantia em outros bens do devedor.
O objetivo de inibir fraude patrimonial revela a dimensão preventiva do
instituto da hipoteca judiciária, que se expressa tanto na potencialidade para
inibir a fraude patrimonial praticada pelo executado quanto na advertência ao
terceiro adquirente, para que não adquira o bem hipotecado judiciariamente,
tudo a fim de preservar a efetividade das normas de ordem pública que estabe-
lecem a responsabilidade patrimonial do executado pelas respectivas obriga-
ções (Lei nº 6.830/1980, arts. 10 e 30; CPC, art. 591), bem como para prover
segurança jurídica aos negócios na vida de relação (Claus, 2013, p. 52).
O objetivo de conferir efetividade à execução revela a dimensão assecu-
ratória do direito material que o instituto realiza por meio do direito de sequela
inerente à hipoteca judiciária enquanto efeito anexo da sentença condenatória.
O direito de sequela assegura ao autor fazer recair a penhora sobre o bem hi-
potecado ainda que o bem tenha sido alienado a terceiro. Adquirente de má-fé,
o terceiro não terá êxito nos embargos de terceiro. E não lhe restará alternativa:
para não perder o bem na hasta pública, terá que fazer a remição da execução;
ou a adjudicação do bem pelo valor da avaliação5, se o valor da execução for
superior ao valor do bem sobre o qual recaíra a hipoteca judiciária.
apresentado pelo Direito Material. O art. 1.473 do CCB apresenta rol taxativo de bens sujeitos à hipoteca.”
(Cavalaro Neto, 2010, p. 492)
5 Essa avaliação é realizada pelo Oficial de Justiça Avaliador da Justiça do Trabalho (CLT, art. 721).
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 125
tituto da hipoteca convencional, esse primeiro movimento do intérprete acaba
por revelar-se insuficiente à adequada pesquisa dos bens que podem ser objeto
de hipoteca judiciária. Isso porque à hipoteca judiciária prevista no art. 466 do
CPC é reconhecida natureza jurídica de instituto processual de ordem pública,
enquanto que à hipoteca convencional prevista no art. 1.473 do CC é reconhe-
cida a condição de instituto de direito privado.
Enquanto a hipoteca judiciária visa a assegurar a autoridade estatal da
sentença condenatória em geral, a hipoteca convencional visa a garantir o inte-
resse privado de determinado particular envolvido em negócio interindividual.
Vale dizer, a dicotomia entre interesse de ordem pública e interesse de ordem
privada decalca indelével distinção entre os institutos da hipoteca judiciária e
da hipoteca convencional.
É a distinta natureza jurídica da hipoteca judiciária (instituto processual de
ordem pública), na comparação com a hipoteca convencional (instituto jurídico
de ordem privada), que autoriza o jurista a afastar-se dos limites do art. 1.473
do CC quando se trata de inventariar os bens sujeitos à hipoteca judiciária. Isso
porque os objetivos superiores da hipoteca judiciária demandam uma interpre-
tação apta a potencializar tanto o escopo teleológico de inibir fraude patrimo-
nial quanto o escopo teleológico de assegurar a futura execução da sentença
condenatória. É dizer: demandam uma interpretação que transcenda aos limites
do art. 1.473 do CC.
6 “Ao socorrer-nos, na exposição precedente, das lições dos grandes filósofos do direito contemporâneos,
tivemos a intenção de mostrar que, como diz Kaufmann, a analogia não deve ser utilizada apenas como um
instrumento auxiliar, de que o intérprete possa lançar mão, para a eliminação das lacunas. Ao contrário, o
raciocínio jurídico será sempre analógico, por isso que as hipóteses singulares nunca serão entre si idênticas,
mas apenas ‘a fins na essência’. Este é o fundamento gnoseológico que não só legitima mas determina,
como um pressuposto de sua essência, a natureza hermenêutica do Direito, cuja revelação pela doutrina
contemporânea conquista, cada vez mais, os espíritos.” (Baptista da Silva, 2004, p. 285)
126 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
adotadas no âmbito do direito processual civil têm por diretriz o objetivo de
aumentar a efetividade da jurisdição.
Entre as minirreformas mais recentes, destaca-se a adoção da averbação
premonitória prevista no art. 615-A do CPC7, cuja lembrança é evocada pelas
afinidades finalísticas que a averbação premonitória guarda com a hipoteca
judiciária: ambas as medidas visam a inibir a fraude patrimonial e têm por ob-
jetivo garantir o êxito da execução.
Sobre o art. 615-A do CPC, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero
esclarecem que a finalidade da norma é a efetiva tutela do direito material. Afir-
mam que “o objetivo do art. 615-A, CPC, é manter atrelado à tutela jurisdicional
o patrimônio do demandado, de modo que seja possível alcançá-lo para even-
tual atuação da tutela jurisdicional em favor do demandante (art. 591, CPC)”
(Marinoni; Mitidiero, 2013, p. 638-9).
O raciocínio é o mesmo para a hipoteca judiciária, embora a ela não es-
tejam se referindo. O atrelamento de um bem para futura execução é necessário
para garantir a efetividade daquela execução e, com isso, do direito material
que a fundamenta. Assim, quanto mais espécies de bens puderem ser garantido-
ras da futura execução, mais efetiva ela se tornará e, por essa razão, parece não
se justificar adotar interpretação restritiva ao instituto da hipoteca judiciária,
atrelando-a apenas às espécies de bens arrolados no art. 1.473 do Código Civil.
Portanto, analogicamente8, pode-se pensar na averbação de hipoteca ju-
diciária em relação a bens móveis. Ao ordenamento jurídico incumbe propor-
cionar meios de assegurar a futura execução da sentença. Na fase de conheci-
mento, proporciona a hipoteca judiciária. Para a fase de execução, proporciona
a averbação do ajuizamento da execução, não só no registro de imóveis, mas
também no registro de veículos e no registro de outros bens sujeitos à penhora
ou arresto. Restringir a hipoteca judiciária a bens imóveis implica, pois, restrin-
7 “Art. 615-A. O exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento da
execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis,
registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.
§ 1º O exequente deverá comunicar ao juízo as averbações efetivadas, no prazo de 10 (dez) dias de sua
concretização.
§ 2º Formalizada penhora sobre bens suficientes para cobrir o valor da dívida, será determinado o cancelamento
das averbações de que trata este artigo relativas àqueles que não tenham sido penhorados.
§ 3º Presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (593).
§ 4º O exequente que promover averbação manifestamente indevida indenizará a parte contrária, nos termos
do § 2º do art. 18 desta Lei, processando-se o incidente em autos apartados.
§ 5º Os tribunais poderão expedir instruções sobre o cumprimento deste artigo.”
8 “Toda a regra jurídica é susceptível de aplicação analógica – não só a lei em sentido estrito, mas também
qualquer espécie de estatuto e ainda a norma de Direito Consuetudinário. As conclusões por analogia não têm
apenas cabimento dentro do mesmo ramo do Direito, nem tão-pouco dentro de cada Código, mas verificam-se
também de um para outro Código e de um ramo do Direito para outro.” (Engisch, 2008, p. 293)
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 127
gir-lhe a eficácia, o que não se coaduna com uma hermenêutica contemporâ-
nea para o instituto.
9 As maiores empregadoras são as micro e pequenas empresas, das quais 61% deixam de atuar no primeiro
ano; exatamente as empresas que mais cometem fraude patrimonial (Cf. Silva, 2007, p. 18).
128 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
que evoluiu e se distanciou daquela que vigorava ao tempo da publicação do
Código Buzaid.
10 “Impende, no entanto, ponderar, desde logo, que o tempo deve ser distribuído no feito, entre as duas partes
litigantes, sem sobrecarregar apenas a detentora do direito ameaçado ou violado, como se tem visto na prática
quotidiana do foro. Marinoni relembra que: ‘Por ser ligado ao contraditório, o tempo deve ser distribuído entre
as partes. Essa é a grande questão da doutrina processual contemporânea’.” (Fava, 2009, p. 51)
11 A hipoteca judiciária atua no sentido de distribuir equitativamente, entre as partes, o ônus do tempo do
processo judicial. A arguta observação é do magistrado trabalhista Arlindo Cavalaro Neto (2010, p. 495): “É
necessário distribuir equitativamente o ônus da demora do processo, e o registro da sentença como hipoteca
judiciária também alcança esse desiderato, pois parcela do patrimônio do vencido será objeto de ônus real,
assim que publicada a sentença condenatória, até que haja o pagamento do credor”.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 129
imóveis. Essa conclusão decorre da observação da experiência ordinária12, ob-
servação na qual o cotidiano revela que a troca de propriedade de veículo é
mais frequente do que a troca de propriedade de imóvel. Além de potencializar
o escopo teleológico de inibir fraude patrimonial, a hipoteca judiciária sobre
veículos também potencializa o escopo teleológico de assegurar a futura exe-
cução, porquanto veículos têm maior apelo comercial do que imóveis, situação
em que se atrai mais licitantes para leilões judiciais.
Por outro lado, até mesmo pela ótica do devedor, pode ser interessante
que a hipoteca judiciária não se constitua sobre bem imóvel de sua proprie-
dade. Assim, se o próprio devedor tiver outros bens e preferir que a garantia
recaia sobre esses outros bens, e não sobre um bem imóvel, estar-se-á atuando
em consonância com a regra exceptiva, segundo a qual a execução se deve dar
pelo modo menos gravoso ao devedor, quando por vários meios o credor puder
promover a execução (art. 620 do CPC).
E conclui que,
diferentemente, também, da hipoteca legal, que incide apenas sobre bens rela-
cionados nos incisos I a VII do art. 1.473 do Código Civil, a hipoteca judicial
incide sobre qualquer bem, qualquer que seja a sua natureza (móveis, imóveis,
semoventes, direitos e ações). O autor acrescenta não ver sentido em restringir
12 Art. 335 do CPC: “Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum
subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica,
ressalvado a esta, o exame pericial”.
130 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
essa especial modalidade de garantia apenas aos bens imóveis, podendo ela,
para mim, compreender quaisquer bens (móveis ou imóveis) ou direito (pessoal
ou real).
CONCLUSÃO
A hipoteca judiciária sobre veículos e outros bens móveis potencializa
tanto o objetivo de inibir fraude à execução quanto o direito de sequela próprio
à hipoteca judiciária, operando como fator de distribuição mais equânime do
ônus do tempo do processo entre partes em situação de desigualdade econô-
mica. Sua aplicação ao processo do trabalho visa a dar concretude substancial
às garantias constitucionais da efetividade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) e da
razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII; CLT, art. 765); aplicação que
13 “O que falta, porém, é atentar para que, se a técnica processual é imprescindível para a efetividade da
tutela dos direitos, não se pode supor que, diante da omissão do legislador, o juiz nada possa fazer. Isso por
uma razão simples: o direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional não se volta apenas contra o
legislador, mas também se dirige ao Estado-juiz. Por isso, é absurdo pensar que o juiz deixa de ter dever de
tutelar de forma efetiva os direitos somente porque o legislador deixou de editar uma norma processual mais
explícita.” (Marinoni, 2013, p. 178)
14 “Derivado do grego hypothéke, onde mesmo teve origem este instituto jurídico, quer significar a coisa entregue
pelo devedor, por exigência do credor, para garantia de uma obrigação. E, assim, originariamente, a palavra
hipoteca, mesmo entre os romanos, designava a convenção de penhor ou pignoratícia, não importando a
maneira por que se realizava, isto é, se se tratava de garantia móvel entregue ao credor, ou de garantia imóvel,
que se conservasse em poder do devedor. Entretanto, sobreavisados e cautelosos, os gregos tinham por
costume, quando se tratava de garantia imobiliária, assinalar com brandões ou postes os terrenos hipotecados.
Fazendo gerar dela um jus in re, o que também ocorria no penhor, os romanos terminaram por distinguir os
dois institutos, considerando a hipoteca aquela em que a coisa dada em garantia não ia às mãos ou à posse
do credor, o que era da essência do penhor (pignus).” (De Plácido e Silva, 1982, p. 384) [grifos do autor]
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA................................................................................................................... 131
se justifica em face do privilégio reconhecido ao crédito trabalhista na ordem
jurídica brasileira (CF, art. 100; CTN, art. 186; CLT, art. 449; Lei nº 6.830/1980,
arts. 10 e 30), crédito alimentar representativo de direito fundamental social
(CF, art. 7º, caput).
A fim de operacionalizar o registro da hipoteca judiciária com maior
agilidade e economia, a hipoteca judiciária pode ser realizada na modalidade
de restrição de transferência de veículo inserida mediante utilização do convê-
nio RenaJud (CLT, art. 765), observada a necessária proporcionalidade com o
valor da condenação e adotada a Tabela FIPE – Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas. Caso assim não se entenda de proceder, o registro da hipoteca ju-
diciária sobre veículos pode ser realizado mediante expedição de ofício-papel
ao Detran – Departamento Nacional de Trânsito.
Insuficiente a hipoteca judiciária sobre veículos, poderá ser avaliada a
hipótese de fazer-se hipoteca judiciária sobre imóvel, registrando-se o gravame
na matrícula do imóvel no respectivo Cartório de Registro de Imóveis.
Inexistente imóvel, a hipoteca judiciária poderá recair sobre outros bens
registrados, tais como as quotas sociais no caso de sociedades de responsabili-
dade limitada e as ações no caso de sociedades anônimas de capital fechado,
hipótese em que a hipoteca judiciária será registrada perante a respectiva Junta
Comercial do Estado. No caso de sociedades anônimas de capital aberto, a
inscrição da hipoteca judiciária poderá recair sobre as ações, registrando-se a
hipoteca judiciária perante a respectiva Junta Comercial e perante a Comissão
Valores Mobiliários (CVM).
Outrossim, poder-se-á fazer a hipoteca judiciária recair sobre embarca-
ções, mediante registro na Capitania dos Portos. No caso de aeronaves, o regis-
tro da hipoteca judiciária far-se-á na Agência Nacional de Aviação Comercial
(ANAC). Para marcas e patentes, o registro é realizado perante o Instituto Nacio-
nal de Propriedade Industrial – INPI.
O escopo teleológico de ordem pública do instituto hipoteca judiciária,
aliado à privilegiada natureza jurídica alimentar do crédito trabalhista, auto-
rizam conferir interpretação pela qual se reconheça a juridicidade de a hipo-
teca judiciária recair sobre outros bens que não apenas aqueles elencados no
art. 1.473 do Código Civil, em especial veículos automotores e outros bens
móveis pertencentes ao réu condenado em sentença, que sejam passíveis de
registro.
REFERÊNCIAS
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Rio de Janeiro: Forense, 2004.
CAVALARO NETO, Arlindo. A sentença trabalhista como título constitutivo de hipo-
teca judiciária. In: SANTOS, José Aparecido dos (Coord.). Execução trabalhista. 2. ed.
São Paulo: LTr, 2010.
132 D���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA
CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários ao código de processo civil brasileiro. Curitiba:
Juruá, v. 5, 2011.
CLAUS, Ben-Hur Silveira. Hipoteca judiciária: a (re)descoberta do instituto diante Sú-
mula nº 375 do STJ – Execução efetiva e atualidade da hipoteca judiciária. Revista do
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Porto Alegre, n. 41, 2013.
DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário jurídico. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 1982.
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 10. ed. Lisboa: Fundação Calouste
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FAVA, Marcos Neves. Execução trabalhista efetiva. São Paulo: LTr, 2009.
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. 4. ed. São Paulo:
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MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comenta-
do artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
SILVA, Antônio Álvares da. Execução provisória trabalhista depois da reforma do CPC.
São Paulo: LTr, 2007.
Parte Geral – Acórdão na Íntegra
1445
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – PROCESSUAL CIVIL – ENFITEUSE
DE BEM PARTICULAR – BASE DE CÁLCULO DO LAUDÊMIO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL
DE 2002 – RECURSO ESPECIAL – ACÓRDÃO EMBARGADO QUE NÃO RECONHECE OMISSÃO
NO ARESTO RECORRIDO E LEVANTA ÓBICE DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO –
PARADIGMAS QUE EXAMINARAM O MÉRITO – CASUÍSMO – CONTROVÉRSIAS QUE SE RESOLVEM
COM A ANÁLISE PARTICULARIZADA DE CADA CASO E SUAS PECULIARIDADES – AUSÊNCIA DE
SIMILITUDE FÁTICO-PROCESSUAL – COMPARAÇÃO INVIABILIZADA – DISSENSO PRETORIANO
INDEMONSTRADO – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA LIMINARMENTE INDEFERIDOS – DECISÃO
MANTIDA EM SEUS PRÓPRIOS TERMOS – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO
1. Entendeu o acórdão embargado que não havia omissão do acórdão re-
corrido e que a matéria arguida padeceu da falta de prequestionamento,
porque não foi “objeto de debate o próprio conteúdo infraconstitucional
do art. 6º da LICC”.
2. Os paradigmas, por seu turno, ao revés, examinaram o mérito do re-
curso, para concluírem de forma diversa, mas a partir de bases fático-
-processuais também distintas. Não há, portanto, dissídio jurisprudencial
a ser composto.
3. Na verdade, saber se há ou não omissão no acórdão recorrido, ou se a
matéria suscitada no recurso especial atende ou não ao requisito do pre-
questionamento, é tarefa realizada com a análise particularizada de cada
caso, consideradas as peculiaridades da hipótese em apreço, não sendo
os embargos de divergência a via adequada para buscar o rejulgamento
pura e simples da questão deduzida no recurso especial.
4. Agravo regimental desprovido.
134 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Cor-
te Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo re-
gimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros João
Otávio de Noronha, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins, Herman Benjamin,
Napoleão Nunes Maia Filho, Sidnei Beneti, Jorge Mussi, Og Fernandes, Raul
Araújo, Ari Pargendler, Gilson Dipp e Nancy Andrighi votaram com a Sra. Mi-
nistra Relatora.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Licenciada a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Convocado o Sr. Ministro Raul Araújo.
Brasília/DF, 19 de fevereiro de 2014 (data do Julgamento).
RELATÓRIO
A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz:
Trata-se de agravo regimental interposto pela Diocese de Jaboticabal –
Fábrica do Patrimônio de São João Batista em face de decisão de minha lavra
que indeferiu liminarmente os embargos de divergência, os quais, por sua vez,
foram opostos contra acórdão da eg. Terceira Turma, relatado pelo eminente
Ministro Sidnei Beneti, e ementado nos seguintes termos:
“RECURSO ESPECIAL – ENFITEUSE DE BEM PARTICULAR – BASE DE CÁLCULO
DO LAUDÊMIO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 – OFENSA AOS
ARTS. 458, 515, 535, DO CPC – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO ATO JURÍDICO
PERFEITO E DO DIREITO ADQUIRIDO – INVALIDADE DO ART. 2.038, § 1º, I,
DO CC/2002 – SÚMULAS NºS 282, 284, 356/STF – IMPROVIMENTO
1. Embora rejeitando os embargos de declaração, o acórdão recorrido examinou,
motivadamente, todas as questões pertinentes, logo, não há que se falar em ofen-
sa aos arts. 458, 515, 535 do Código de Processo Civil.
2. Nas enfiteuses de bens particulares, as edificações e as plantações excluem-se
da base de cálculo do laudêmio, nos termos da norma inserta no art. 2.038, § 1º,
I, do Código Civil de 2002, que expressamente excluiu essas acessões.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 135
3. Prevalece o tratamento da enfiteuse em virtude do direito intertemporal, no
caso como definido pelo julgado de origem, pois é pacífica a orientação do STJ
no sentido de que os princípios contidos na Lei de Introdução ao Código Civil
(LICC) – direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada –, apesar de pre-
vistos em norma infraconstitucional, não podem ser analisados em Recurso Espe-
cial, pois são institutos de natureza eminentemente constitucional” (AgRg-AREsp
189.013/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 27.08.2012), não tendo sido, ade-
mais objeto de debate o próprio conteúdo infraconstitucional do art. 6º da LICC.
4. Os dispositivos apontados como violados quanto à nulidade da norma relativa
à exclusão das edificações e construções da base de cálculo do laudêmio não
foram objeto de debate no Acórdão recorrido, tampouco foram interpostos Em-
bargos de Declaração para suprir eventual omissão, de modo que, ausente está o
necessário prequestionamento, incidem as Súmulas nºs STF/282 e 356.
5. A ausência de demonstração no que teria consistido a alegada ofensa ao
art. 2.038 e de divergência jurisprudencial constitui empecilho, com sede na pró-
pria fundamentação da insurgência recursal, que impede a abertura da instância
especial, a teor do Enunciado nº 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal,
aplicável por analogia, também ao recurso especial.
6. Recurso Especial improvido.”
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – PROCESSUAL CIVIL – ENFITEUSE
DE BEM PARTICULAR – BASE DE CÁLCULO DO LAUDÊMIO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL
DE 2002 – RECURSO ESPECIAL – ACÓRDÃO EMBARGADO QUE NÃO RECONHECE OMISSÃO
NO ARESTO RECORRIDO E LEVANTA ÓBICE DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO –
PARADIGMAS QUE EXAMINARAM O MÉRITO – CASUÍSMO – CONTROVÉRSIAS QUE SE RESOLVEM
COM A ANÁLISE PARTICULARIZADA DE CADA CASO E SUAS PECULIARIDADES – AUSÊNCIA DE
SIMILITUDE FÁTICO-PROCESSUAL – COMPARAÇÃO INVIABILIZADA – DISSENSO PRETORIANO
INDEMONSTRADO – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA LIMINARMENTE INDEFERIDOS – DECISÃO
MANTIDA EM SEUS PRÓPRIOS TERMOS – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO
1. Entendeu o acórdão embargado que não havia omissão do acórdão re-
corrido e que a matéria arguida padeceu da falta de prequestionamento,
porque não foi “objeto de debate o próprio conteúdo infraconstitucional
do art. 6º da LICC”.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 137
2. Os paradigmas, por seu turno, ao revés, examinaram o mérito do re-
curso, para concluírem de forma diversa, mas a partir de bases fático-
-processuais também distintas. Não há, portanto, dissídio jurisprudencial
a ser composto.
3. Na verdade, saber se há ou não omissão no acórdão recorrido, ou se a
matéria suscitada no recurso especial atende ou não ao requisito do pre-
questionamento, é tarefa realizada com a análise particularizada de cada
caso, consideradas as peculiaridades da hipótese em apreço, não sendo
os embargos de divergência a via adequada para buscar o rejulgamento
pura e simples da questão deduzida no recurso especial.
4. Agravo regimental desprovido.
VOTO
A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora):
Não trouxe a Embargante nenhum argumento apto a infirmar os funda-
mentos da decisão agravada, razão pela qual a mantenho em seus próprios
termos, valendo ressaltar que dessemelhança entre os casos comparados é fla-
grante, na medida em que o fundamento central do acórdão recorrido é a falta
de prequestionamento da matéria que pretende a Embargante discutir, enquan-
to que, nos acórdãos paradigmas, tal óbice não havia.
“[...]
Os embargos não possuem as mínimas condições de serem processados, por-
quanto desatendidos os requisitos elementares do art. 266, § 1º, do Regimento
Interno do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, extrai-se do acórdão embar-
gado os seguintes entendimentos (grifei):
(i) ‘Embora rejeitando os embargos de declaração, o acórdão recorrido exami-
nou, motivadamente, todas as questões pertinentes, logo, não há que se falar
em ofensa aos arts. 458, 515, 535 do Código de Processo Civil’;
(ii) ‘Prevalece o tratamento da enfiteuse em virtude do direito intertemporal,
no caso como definido pelo julgado de origem, pois é pacífica a orientação
do STJ no sentido de que os princípios contidos na Lei de Introdução ao
Código Civil (LICC) – direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada
–, apesar de previstos em norma infraconstitucional, não podem ser anali-
sados em Recurso Especial, pois são institutos de natureza eminentemente
constitucional (AgRg-AREsp 189.013/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe
27.08.2012), não tendo sido, ademais objeto de debate o próprio conteúdo
infraconstitucional do art. 6º da LICC’;
(iii) ‘Os dispositivos apontados como violados quanto à nulidade da nor-
ma relativa à exclusão das edificações e construções da base de cálculo do
laudêmio não foram objeto de debate no Acórdão recorrido, tampouco fo-
ram interpostos Embargos de Declaração para suprir eventual omissão, de
138 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
modo que, ausente está o necessário prequestionamento, incidem as Súmulas
nºs STF/282 e 356’.
Os paradigmas, por seu turno, ao revés, examinaram o mérito do recurso, para
concluírem de forma diversa, mas a partir de bases fático-processuais também
distintas. Não há, portanto, dissídio jurisprudencial a ser composto.
Na verdade, saber se há ou não omissão no acórdão recorrido, ou se a matéria
suscitada no recurso especial atende ou não ao requisito do prequestionamento,
é tarefa realizada com a análise particularizada de cada caso, consideradas as
peculiaridades da hipótese em apreço, não sendo os embargos de divergência a
via adequada para buscar o rejulgamento pura e simples da questão deduzida no
recurso especial.
A jurisprudência deste Tribunal é assente e remansosa nesse sentido. Confiram-
-se, dentre inúmeros outros, os seguintes precedentes da col. Corte Especial:
‘AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – RECURSO
ESPECIAL AO QUAL SE NEGOU SEGUIMENTO – PRETENSA OMISSÃO
DO ACÓRDÃO RECORRIDO – VÍCIO NÃO RECONHECIDO PELO ACÓR-
DÃO ORA EMBARGADO – AUSÊNCIA DE CÓPIAS DO INTEIRO TEOR DO
ACÓRDÃO PARADIGMA OU REPOSITÓRIO OFICIAL – DESATENDIMEN-
TO AO DISPOSTO NO ART. 266, § 1º, DO RISTJ – ALEGADO DISSENSO
PRETORIANO ACERCA DE RECONHECIMENTO OU NÃO DE OMISSÃO
APONTADA – CASUÍSTICA – PARTICULARIDADES DE CADA CASO – INE-
XISTÊNCIA DE TESES DIVERGENTES – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO
CONFIGURADO – EMBARGOS LIMINARMENTE INDEFERIDOS – DECISÃO
MANTIDA
[...]
2. Ainda que assim não fosse, consoante entendimento jurisprudencial assen-
te nesta Corte, a conclusão de haver ou não omissão no acórdão recorrido
é tarefa realizada com a análise particularizada de cada caso, consideradas
as peculiaridades da hipótese em apreço, não sendo os embargos de diver-
gência a via adequada para buscar o rejulgamento puro e simples da questão
deduzido no recurso especial, porque, na verdade, não há divergência de
teses jurídicas.
3. Agravo regimental desprovido.’
(AgRg-EREsp 1030317/ES, Corte Especial, Relª Min. Laurita Vaz, DJe de
01.02.2011)
Ante o exposto, com arrimo no art. 266, § 3º, do Regimento Interno do Superior
Tribunal de Justiça, indefiro liminarmente os embargos de divergência.”
AUTUAÇÃO
Embargante: Diocese de Jaboticabal – Fábrica do Patrimônio de São João
Batista
Advogados: Luís Enrique Marchioni e outro(s)
Mário Lúcio Marchioni e outro(s)
Embargado: Edson José Gomes da Silva
Advogados: Marcos Fogagnolo
Telmo Lencioni Vidal Júnior
Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Compra e venda
AGRAVO REGIMENTAL
Agravante: Diocese de Jaboticabal – Fábrica do Patrimônio de São João
Batista
Advogados: Luís Enrique Marchioni e outro(s)
Mário Lúcio Marchioni e outro(s)
Agravado: Edson José Gomes da Silva
Advogados: Marcos Fogagnolo
Telmo Lencioni Vidal Júnior
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia Corte Especial, ao apreciar o processo em epígrafe
na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 141
A Corte Especial, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos
termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
EMENTA
CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DECLARATÓRIA – NULIDADE DE DOAÇÃO – IMÓVEL –
VÍCIO DE CONSENTIMENTO – PRAZO DECADENCIAL – TERMO INICIAL – DATA DA CELEBRAÇÃO
DO NEGÓCIO – ARTIGOS ANALISADOS: ART. 178, II, DO CÓDIGO CIVIL
1. Ação declaratória de nulidade de doação por vício de consentimen-
to, ajuizada em 29.06.2009. Recurso especial concluso ao Gabinete em
18.10.2013.
2. Discussão relativa ao termo inicial do prazo decadencial para anula-
ção de negócio jurídico por vício de consentimento.
3. Antes do registro imobiliário, que lhe dá publicidade erga omnes, o
negócio jurídico envolvendo bens imóveis só tem eficácia entre as partes
que o celebraram, não fluindo contra os terceiros, que dele não têm co-
nhecimento inequívoco, o prazo decadencial para anulação.
4. A decadência é causa extintiva de direito pelo seu não exercício no
prazo estipulado pela lei, cujo termo inicial deve coincidir com o conhe-
cimento do fato gerador do direito a ser pleiteado.
5. Não é razoável invocar a ausência de “conhecimento inequívoco do
ato”, pelo próprio donatário do bem, diante da ausência de registro do
contrato e aferição pelo Tabelião da regularidade do empreendimento
onde se encontrava o lote doado.
6. O prazo decadencial para anulação da doação na hipótese, portanto,
é de quatro anos, contados do dia em que se realizou o negócio jurídico,
nos termos do que expressamente dispõe o art. 178, II, do Código Civil.
7. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Tercei-
ra Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 143
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros
Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com a Sra. Ministra Rela-
tora. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros João Otávio de Noronha e
Ricardo Villas Bôas Cueva. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Nancy
Andrighi.
Brasília (DF), 18 de março de 2014 (data do Julgamento).
RELATÓRIO
A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora):
Trata-se de recurso especial interposto por RVM Participações Ltda. e
outro, com base no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão
proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP).
Ação: declaratória de nulidade de contrato de doação de imóvel, ajuiza-
da por Ricardo Batista Rodrigues em face de RVM Participações Ltda. e outro,
com fundamento em vício de consentimento. Aduz o autor que foi contempla-
do em um sorteio de imóvel localizado em condomínio às margens da Represa
de Jurumirim, devendo pagar apenas as respectivas taxas de manutenção. Após
algum tempo, em razão de dificuldades financeiras, deixou de pagá-las e a do-
ação do bem foi revogada.
Contudo, passou a ser cobrado por débitos do imóvel. Além disso, a in-
viabilidade do empreendimento foi constatada em ação civil pública. Pleiteia o
ressarcimento das despesas pagas com a manutenção e conservação do bem e
a compensação por danos morais.
Contestação: RVM Participações Ltda. e outro alegaram, preliminarmen-
te, a decadência do direito do autor para pleitear a anulação do negócio, e a
prescrição relativa à reparação por danos materiais e compensação por danos
morais. Sustentaram, ainda, a legalidade da inscrição do nome do autor nos ca-
dastros de proteção ao crédito porque o débito inscrito na dívida ativa se refere
ao período em que o autor foi proprietário do bem e que a sentença prolatada
na ação civil pública ocorreu após a doação. Aduzem, por fim, que o loteamen-
to era regular.
Sentença: julgou extinto o processo, com resolução do mérito, acolhen-
do a preliminar de decadência, relativa à pretensão de anulação do contrato por
vício de consentimento; e de prescrição, relativa à pretensão de reparação dos
danos. Isso porque o negócio jurídico fora celebrado em 28.02.2005 e a ação
proposta em 20.06.2009.
144 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
Acórdão: deu provimento à apelação interposta por Ricardo Batista
Rodrigues, para afastar a prescrição da pretensão anulatória, cujo prazo so-
mente teria início com o registro público do contrato de doação, nos termos da
seguinte ementa (e-STJ fls. 224/231):
Anulação. Doação de imóvel. Desconstituição de negócio jurídico sob alegação
de erro ou dolo. Ausência de registro da doação. Prazo prescricional de quatro
anos a contar do conhecimento inequívoco do ato. Sentença reformada para
afastar a prescrição. Recurso provido.
VOTO
A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora):
Cinge-se a controvérsia a verificar qual o termo inicial do prazo deca-
dencial de 4 anos, para anular doação, com fundamento em vício de consen-
timento.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2013/0335715-5
Processo Eletrônico REsp 1.418.435/SP
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 147
Números Origem: 0014557182009 00145571820098260344
104109 14557182009 145571820098260344 201303357155
3440120090145573 34401200901455730000 819964
Pauta: 18.03.2014 Julgado: 18.03.2014
Relatora: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi
Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Maurício de Paula Cardoso
Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha
AUTUAÇÃO
Recorrente: RVM Participações Ltda. e outro
Advogado: Marisa Mitico Vivan Mizuno de Oliveira e outro(s)
Recorrido: Ricardo Batista Rodrigues
Advogado: Marcus Vinicius Teixeira Borges
Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Doação
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-
fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do
voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).
EMENTA
DIREITO CIVIL – COTAS CONDOMINIAIS – OBRIGAÇÃO PROPTER REM – RESPONSABILIDADE
DO PROPRIETÁRIO – RESSARCIMENTO – CABIMENTO – CORREÇÃO MONETÁRIA
1. Todas as obrigações que decorrem pura e simplesmente do direito
de propriedade (em razão da coisa) são propter rem e, ao contrário das
obrigações em geral, não surgem por força do acordo de vontades, mas
sim em razão de um direito real dentre aqueles previstos no art. 1.225
do Código Civil de 2002: propriedade, penhor, anticrese, usufruto, servi-
dões, uso, habitação, enfiteuse etc.
2. É dever de o condômino contribuir para as despesas do condomínio,
na proporção de suas frações ideais (art. 1.336, I, do Código Civil).
3. In casu, segundo Escritura de Empréstimo, de Compra e Venda de
Imóvel, de Constituição de Garantia Real e outros Pactos, celebrada em
30.06.1986, as Cooperativas, ora Apeladas, se sub-rogaram em dívida
constituída pelas Construtoras Cojan Engenharia S/A, Master Incosa En-
genharia S/A e Construtora Balbo S/A, que haviam sido contratadas pelo
extinto BNH (sucedido pela CEF), para a construção do empreendimento
“Moradas do Itanhangá”.
4. Em face do inadimplemento contratual das Cooperativas, inviabilizan-
do a comercialização das unidades, a CEF obteve autorização judicial
para comercializar as unidades habitacionais, para o fim de recompor
seu prejuízo.
5. O pagamento das cotas condominiais atrasadas decorreu da exigência
do Condomínio, para fornecer o recibo de quitação, sem o qual as es-
crituras não poderiam ser assinadas e registradas no respectivo Cartório
de RGI.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 149
6. Inexistente nos autos qualquer prova da consumação de processo de
execução por parte da CEF, que a tornaria proprietária por meio de algum
dos métodos previstos na legislação processual vigente.
7. Em sede de liquidação de sentença é cabível a apresentação dos bole-
tos de cobrança para aferição do débito e sua origem.
8. Sentença reformada, para condenar as Rés a ressarcirem à CEF o valor
referente ao pagamento das cotas condominiais, efetuado na venda das
unidades imobiliárias.
9. Apelação provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os presentes autos em que são partes as acima indica-
das, decide a Quinta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, na forma do Relatório e
do Voto, que ficam fazendo parte do presente julgado.
Rio de Janeiro, 25 de fevereiro de 2014 (data do Julgamento).
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta pela Caixa Econômica Federal, ob-
jetivando a reforma da sentença de fls. 626-630, proferida pela MMª Juíza da
24ª Vara Federal/RJ, nos autos da ação de rito ordinário, com requerimento de
antecipação de tutela, ajuizada pela CEF em face da Cooperativa Habitacional
dos Sócios do Clube dos Subtenentes e Sargentos do Exército – COOPHABS
– CSSE, da Cooperativa Habitacional de Integração Social do Rio de Janeiro –
CHIS-RIO e da Cooperativa Habitacional do Servidor Público, pleiteando:
(i) o bloqueio da quantia de R$ 984.000,00 (novecentos e oitenta e quatro mil
reais), correspondente ao valor das cotas condominiais antecipadas pela CEF,
referente à venda de 615 (seiscentos e quinze) unidades do empreendimento
“Moradas do Itanhangá”, depositado na conta corrente nº 005.4002958-4, da
agência CEF/PAB Justiça Federal – 0625, até decisão final;
(ii) a condenação das rés a restituírem o valor integral que seria devido à Autora,
nos termos das planilhas anexas, atualizado até a data do efetivo pagamento.
VOTO
Cinge-se a controvérsia recursal em aferir se a CEF faz jus ao ressarcimen-
to de quantia referente ao valor pago, a título de cotas condominiais, quando
realizada a venda das unidades imobiliárias do empreendimento “Moradas do
Itanhangá”.
Argumenta a CEF que seria apenas a credora hipotecária no caso concre-
to e não a proprietária dos imóveis, cuja venda foi autorizada judicialmente e
teve o único propósito de ser ressarcida dos valores aportados no empreendi-
mento. Também acrescentou que inexistiria informação acerca da consumação
de qualquer processo de execução que a tornaria proprietária através dos méto-
dos previstos na legislação processual vigente.
Por outro lado, a sentença julgou improcedente o pedido, por entender
que a CEF, “na qualidade de credora hipotecária, é a responsável pela quitação
das cotas condominiais dos imóveis gravados com hipoteca em seu favor”, bem
como que, “a teor do acordo de fls. 29/32, celebrado entre o condomínio e a
CEF, esta demonstrou ser sabedora de que é seu ônus o pagamento das cotas
condominiais (fl. 629)”.
A irresignação da CEF merece prosperar. Senão vejamos.
Da análise do conjunto fático-probatório constante dos autos, verifica-se
que as Cooperativas, ora Apeladas, são as proprietárias das referidas unidades
imobiliárias, pois, segundo cópia da Escritura de Empréstimo, de Compra e Ven-
da de Imóvel, de Constituição de Garantia Real e outros Pactos, celebrada em
30.06.1986 (fls. 130-150), se sub-rogaram em dívida constituída pelas Constru-
toras Cojan Engenharia S/A, Master Incosa Engenharia S/A e Construtora Balbo
S/A, que haviam sido contratadas pelo extinto BNH (sucedido pela CEF), para a
construção do empreendimento “Moradas do Itanhangá”.
Como se vê, a CEF é apenas credora hipotecária, razão pela qual somen-
te responde pelo débito nos casos em que adjudica o bem, o que não restou
comprovado por quaisquer documentos nos autos.
Por outro lado, tendo a CEF verificado que as cooperativas alteraram,
unilateralmente, as condições de pagamento ajustadas em contrato, inviabi-
lizando a comercialização das unidades, resolveu ajuizar uma ação judicial
152 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
(processo nº 2002.51.01.009126-4), na qual foi proferida decisão antecipatória
dos efeitos da tutela reconhecendo o prejuízo patrimonial do agente financeiro,
e da qual transcrevo o seguinte trecho (fls. 20-22), in verbis:
“Fazendo uma cognição sumária dos fatos aventados na inicial (cognição típica
da análise de um pedido de tutela antecipada), vislumbro plausibilidade jurídica
suficiente nas alegações da Autora para deferir a tutela de urgência pleiteada.
Vislumbro, também, a periclitação do direito alegado.
A questão de fundo trazida a Juízo envolve um contrato de financiamento para
a construção de imóveis do empreendimento chamado ‘Morada do Itanhangá’,
que, pelos documentos carreados, decorrem de longa data, mais precisamente
do ano de 1982.
De fato, me parece plausível que a cobrança de uma ‘taxa’ de 10% sobre o valor
do imóvel a ser vendido não só inviabiliza a comercialização da unidade, como
também coloca em risco o nome da Caixa Econômica Federal na atuação de
agente financiador da moradia.
Nota-se que, aparentemente, houve um desvio à manifestação de vontade ex-
pressada no item V da 2ª Cláusula do 3º Termo Aditivo de Empréstimos e Outras
Avenças, firmado entre as rés a Autora, em 05 de abril de 2000 (folha 85 dos
autos).
Deve ser considerada sem validade a atividade que contraria a cláusula contra-
tual acima, uma vez que cobrar parcela não prevista em tal avença só inviabiliza
a venda dos imóveis que, há muito, já deveriam estar ensejando a sua função
social.
Não vejo como determinante ao não cumprimento do contrato o fato de terem
sido vendidas apenas 564 unidades dois anos após o perfazimento do terceiro
termo aditivo (folhas 82/89). Como se sabe, o país vive hoje uma crise financeira
em que o poder de compra encontra-se estagnado e a aquisição de imóvel torna-
-se uma conquista de poucos. Não é este o fato que impressiona.
O que efetivamente chama a atenção é o fato de se estar, aparentemente, violan-
do o contrato com a cobrança de valores não compatíveis com os 5% estabele-
cidos à folha 85. Realmente, o empreendimento foi iniciado nos idos de 1982,
já tendo decorrido longo tempo sem que as moradias estejam sendo exercidas
em sua plenitude. Um empreendimento que permanece sem a venda de imóveis
por longo tempo certamente gera a desconfiança de pretendentes, demonstrando
a pouca liquidez dos imóveis. Cabe ao empreendedor reverter essa situação de
maneira a viabilizar a venda dos imóveis.
Inúmeras foram as irregularidades apontadas pela Autora em sua inicial. Aponta
inclusive o perigo de invasão do imóvel em razão de inércia do negócio, colo-
cando em risco aqueles que já se encontram no conjunto habitacional. Além
disso, esse estado de aparente paralisação do empreendimento prejudica, a prin-
cípio, a economia da CEF que se vê impedida de recompor o prejuízo pela não
reversão dos montantes direcionados à sua construção. Não havendo a venda
das unidades, a Caixa, que tanto atua no mercado imobiliário, financiado a mo-
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 153
radia, não consegue recuperar o que foi alocado monetariamente no ‘Moradas
de Itanhangá’.
Na presente relação contratual que ora se discute, está presente uma empre-
sa pública federal (a Caixa Econômica Federal), pertencente ao que se concebe
como ‘Administração Pública Indireta’, inserida, portanto, no contexto do art. 37,
caput, da CF/1988. É de se lhe aplicar, dessarte, o princípio da eficiência.
Também não vislumbro perigo de dano irreparável (ao inverso) para as coopera-
tivas, na medida em que a CEF se propõe a efetuar judicialmente o depósito das
parcelas a que fazem jus as rés (5% sobre o preço da unidade vendida).
Ao longo da vasta documentação juntada aos autos, constato que, a princípio, a
Autora efetivamente vem suportando um prejuízo patrimonial indevido, já que
financiou a construção de imóveis e agora se observa impossibilitada de reverter
essa operação econômica.
Diante do exposto, defiro a tutela antecipada pleiteada à folha 12, pelo que au-
torizo a Caixa Econômica Federal a praticar os atos necessários à comercializa-
ção das unidades habitacionais do empreendimento denominado ‘Moradas do
Itanhangá’, efetuando propaganda, instalando estande de vendas e assinando as
escrituras de compra e venda em nome das cooperativas rés. Determino, tam-
bém, a realização depósito judicial do percentual de 5% devido às cooperativas
acima, por cada unidade vendida, conforme contrato entre as partes (fls. 19-22).”
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – CERCEAMENTO DO DIREITO
DE PRODUÇÃO DE PROVAS – PRELIMINAR REJEITADA – ALEGAÇÃO DE PROPRIEDADE DE-
CORRENTE DA QUALIDADE DE BENEFICIÁRIO DE PROGRAMA HABITACIONAL – DESCABIMENTO –
EXERCÍCIO DA POSSE – INOCORRÊNCIA – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO – SENTENÇA MANTIDA
1. O julgamento antecipado da lide, quando desnecessária a dilação pro-
batória, não configura cerceamento de defesa, máxime quando acervo
probatório existente nos autos basta ao convencimento do julgador. Pre-
liminar rejeitada.
2. Para que seja possível o acolhimento do pedido de reintegração de
posse, deve ser demonstrada a presença dos requisitos exigidos pelo
art. 927 do CPC.
3. Em se tratando de ação possessória, a alegação de domínio, decorren-
te da qualidade de beneficiário de programa habitacional, sobre a área
objeto de disputa pelas partes não encontra guarida, porquanto não se
perquire acerca da propriedade do bem, mas sim quanto ao jus posses-
sionis (direito de posse).
4. Confirma-se a sentença que julgou improcedente pedido de reintegra-
ção de posse se a parte nem mesmo alega já ter exercido a posse sobre
bem. Inteligência do art. 927, inciso I do Código de Processo Civil.
Apelação Cível desprovida.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores da 5ª Turma Cível do Tribunal
de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Angelo Canducci Passareli –
Relator, João Egmont – Revisor, Luciano Moreira Vasconcellos – Vogal, sob a
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 159
Presidência do Senhor Desembargador Sebastião Coelho, em proferir a seguinte
decisão: Conhecer. Rejeitar preliminar. Negar provimento. Unânime, de acordo
com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília/DF, 26 de março de 2014.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de Apelação interposto por Andrea Geralda Sardinha
contra a sentença de fls. 141/144, lançada no bojo de Ação de Reintegração de
Posse ajuizada em desfavor de Luis Carlos dos Santos Pinheiro e Gildeni Alves
Pinheiro, por meio da qual a MMª Juíza a quo julgou improcedente o pedido
inicial de reintegração da Apelante na posse do imóvel situado na SHRF QS 8,
conjunto 3-A, lote nº 24, Riacho Fundo/DF.
Entendeu a MMª Juíza sentenciante que a Autora, ora Apelante, nunca
exerceu de fato a posse do imóvel, razão pela qual não faz jus à reintegração.
Em suas razões recursais de fls. 148/157, a Apelante suscita, preliminar-
mente, a nulidade da sentença, sob a alegação de que o órgão monocrático
julgou antecipadamente a lide, não vislumbrando a necessidade de produção
de provas.
No mérito, afirma que detém, sim, a posse do imóvel, desde 1992, pois
o ordenamento jurídico nacional adotou, no que tange ao conceito de posse,
a teoria objetiva de Ihering, segundo a qual a posse não requer a intenção do
dono, tampouco o poder físico sobre o bem, mas simplesmente uma relação
entre a pessoa e a coisa com base na sua função socioeconômica.
Assevera, então, que possui desde 1992 a posse sobre o imóvel referido.
Ressalta, por outro lado, que a posse dos Apelados era precária e vio
lenta.
Requer a cassação da sentença, ante a nulidade por cerceamento do di-
reito de produção de provas, ou, subsidiariamente, o provimento do recurso
para julgar procedente seu pedido de reintegração de posse.
Preparo regular à fl. 158.
Contrarrazões dos Réus apresentadas extemporaneamente às fls. 164/166,
pugnando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
160 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
VOTOS
O Senhor Desembargador Angelo Canducci Passareli – Relator:
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Trata-se de recurso de Apelação interposto contra a sentença de
fls. 141/144, lançada no bojo de Ação de Reintegração de Posse, por meio da
qual a MMª Juíza a quo julgou improcedente o pedido inicial de reintegração
da Apelante na posse do imóvel descrito na inicial, sob o fundamento de que a
Autora nunca exerceu, de fato, a posse do imóvel.
Passo, inicialmente, à análise da preliminar de cerceamento do direi-
to de produção de provas, suscitada pela Apelante ao argumento de ter sido
indeferido seu pedido de juntada do processo administrativo que tramitou na
CODHAB, em razão do julgamento antecipado da lide.
A preliminar não prospera.
Com efeito, o julgamento antecipado da lide, quando a questão é exclu-
sivamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não existir a necessidade de
outras provas (CPC, art. 330, I), não configura cerceio do direito de produção
probatória.
Ao Juiz, destinatário da prova, incumbe verificar a necessidade de sua
realização, oportunidade em que, se reputá-la desnecessária, procederá ao jul-
gamento antecipado.
Assim, é lícito ao magistrado dispensar a juntada de documentos quando
isso se mostrar irrelevante ao desfecho da lide, porquanto a produção de outras
provas é uma faculdade colocada à disposição do Juiz, direcionada à formação
de seu convencimento.
Por outro lado, na espécie, a matéria dispensava a produção de novas
provas, visto que os demais documentos que instruem o Feito são suficientes
para o deslinde da controvérsia.
Ademais, sendo o Magistrado o destinatário das provas, resta-lhe asse-
gurado que proceda ao julgamento antecipado da lide se reputar desnecessária
a produção de provas adicionais para firmar seu convencimento, na forma dos
arts. 130 e 330, I, do CPC.
Rejeito, pois, a preliminar.
Passo ao exame do mérito.
Sustenta a Apelante que tem a posse do imóvel desde 1992, esclarecen-
do, todavia, que o conceito de posse abrange a idéia de poder fático sobre a
coisa.
A pretensão recursal não merece abrigo.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 161
No que tange à posse, assim dispõe o Código Civil brasileiro:
“Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício,
pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, tempora-
riamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem
aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o
indireto.
Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de depen-
dência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de
ordens ou instruções suas.
Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve
este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que
prove o contrário.”
4. As provas coligidas aos autos não convergem em favor do apelante, já que não
restou comprovada sua condição de possuidor, nem o alegado esbulho perpetra-
do, não se desincumbindo, portanto, do ônus de provar o fato constitutivo do seu
direito (art. 333, I, do CPC). Assim, a melhor posse encontra-se com o apelado,
não havendo que se falar, em mora na tramitação do feito, vez que a posse do
recorrido remonta ao ano 2007.
DECISÃO
Conhecer. Rejeitar preliminar. Negar provimento. Unânime.
Parte Geral – Acórdão na Íntegra
1449
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL – REVISÃO CONTRATUAL – PRELIMINAR – PRECLUSÃO LÓGICA – REJEIÇÃO –
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PREVIDÊNCIA PRIVADA – CLÁUSULA – PRORROGAÇÃO
DO FINANCIAMENTO – BENEFÍCIO PARA O CONTRATANTE – MAJORAÇÃO DA TAXA DE JUROS
– DESLIGAMENTO DO SEGURADO – FUNDO DE QUITAÇÃO POR MORTE – ELEVAÇÃO DO RISCO
– REGULAMENTO – CARTEIRA IMOBILIÁRIA – CIÊNCIA – CUMULAÇÃO – JUROS MORATÓRIOS E
COMPENSATÓRIOS – POSSIBILIDADE – CET – LEGALIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS
– CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO ANTERIOR À MP 2.170-36 – IMPOSSIBILIDADE
– CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR – ESCOLHA UNILATERAL – CLÁUSULA ABUSIVA – MULTA
EM CASO DE NECESSIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE AÇÃO JUDICIAL – ILICITUDE – RECURSOS
IMPROVIDOS
Rejeita-se a preliminar de preclusão lógica se não houver incompatibi-
lidade entre atos processuais. Aplica-se o Código de Defesa do Consu-
midor às entidades de previdência privada. A cláusula que prevê a pror-
rogação do financiamento em caso de saldo devedor remanescente não
é abusiva, vez que se traduz em benefício ao consumidor. Lícita a dis-
posição que prevê a elevação da taxa de juros em caso de desligamento
do segurado. A estipulação que prevê a majoração da taxa do fundo de
quitação por morte após os 70 anos de idade não é abusiva, pois, nesse
caso, há aumento do risco. O fato do regulamento da carteira imobiliária
contemplar a possibilidade de modificação do contrato, por si só, não
caracteriza abusividade, sendo necessária a demonstração do prejuízo.
Possível a cumulação de juros moratórios e compensatórios, tendo em
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 167
vista que possuem finalidades distintas. Legal a cobrança da taxa do CET
– Coeficiente de Equalização de Taxas. É vedada a capitalização de juros
em contratos firmados sob a égide do Sistema Financeiro de Habitação.
A disposição que estatui a possibilidade do credor escolher, de forma
unilateral, o índice de correção do saldo devedor denota abusividade.
Ilícita a cláusula que fixa multa em caso de necessidade de interposição
de ação judicial. Recursos improvidos.
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em re-
jeitar a preliminar oferecida em contrarrazões e negar provimento a ambos os
recursos.
VOTO
Trata-se de apelação interposta à sentença que, nos autos da ação revi-
sional de contrato, julgou parcialmente procedente o pedido para determinar
seja recalculada a dívida de forma a ser extirpada a capitalização de juros, redu-
zir a pena convencional para 2% e decotar da cláusula décima a expressão “ou
de outro indicador publicado por instituição idônea e que reflita a real inflação
ocorrida no período considerado” (ff. 911/922).
Inconformados, os primeiros apelantes aviaram o recurso de ff. 923/931,
aduzindo que a cláusula sexta que prevê a prorrogação do financiamento em
caso de saldo devedor remanescente é abusiva e, portanto, deve ser declarada
nula. Sustentam que a taxa de juros deve ser limitada ao percentual de 6% ao
ano. Asseveram ser ilícita a Cláusula 8ª, eis que eleva a taxa do FMQ de 1%
para 6,02% na data em que o devedor completar 70 anos de idade. Argumen-
tam que o valor cobrado pelo agente financeiro, em razão de tal elevação,
extrapolou os limites da Susep. Defendem ser ilegal a cumulação indevida dos
juros moratórios e compensatórios. Alegam ser indevida a cobrança do coefi-
ciente de equalização de taxas. Declaram ser abusiva a Cláusula 20ª, uma vez
que permite à apelada alterações no preço de forma unilateral. Dizem ser nula
a Cláusula 22ª, visto que autorizam à apelada modificar o contrato assinado em
nome dos apelantes. Pedem a reforma da sentença.
Ausente o preparo por litigarem os primeiros apelantes sob o pálio da
Justiça Gratuita.
168 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
Inconformada, a segunda apelante apresentou o recurso de ff. 936/956,
afirmando a inexistência da prática da capitalização mensal de juros. Sustenta
inexistir qualquer inadequação na parte final da Cláusula 10ª, eis que seu obje-
tivo sempre foi a alteração para índice mais favorável aos sócios. Defende que
a relação jurídica mantida entre as partes não é de consumo. Aduz ser lícita a
cobrança da multa convencional no percentual de 10%. Postula o provimento
do recurso.
Foram apresentadas contrarrazões (ff. 959/965 e 969/993), sendo que
nessa última peça foi sustentada preliminar de preclusão lógica.
Cláusula 22ª
Conforme explicitado no item acima citado, os apelantes limitam-se a
requerer a nulidade da referida cláusula sob o argumento de que essa permite à
apelada assinar contrato de retificação ou ratificação.
Entretanto, novamente não demonstram a ocorrência de nenhum dano
decorrente desta cláusula que, diga-se de passagem, foi livremente estipulada
entre as partes. Sequer informam se foi ou não realizada qualquer alteração no
instrumento contratual por força dessa estipulação.
Destarte, por não estar caracterizada abusividade, rejeita-se o pedido de
declaração de nulidade.
Ante o exposto, nego provimento ao primeiro recurso.
Sendo assim, andou bem o juízo a quo ao afastar indigitada prática, por-
quanto, além do contrato ter sido firmado em momento anterior à edição da
Medida Provisória nº 2.170-36, não é admitida a capitalização mensal de juros
em contratos de financiamento habitacional.
A propósito:
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – ESCRITURA DE
CONFISSÃO DE DÍVIDA HIPOTECÁRIA – FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO
VINCULADO AO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO – PRESCRIÇÃO –
INOCORRÊNCIA – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – IMPOSSIBILIDADE
– JUROS REMUNERATÓRIOS – ELEVAÇÃO DE 6% PARA 8% EM VIRTUDE DO
DESLIGAMENTO DO ASSOCIADO DA PREVI – POSSIBILIDADE – TABELA PRI-
CE – CET – LEGALIDADE
I – Conforme entendimento do STJ, em ação de execução de título extrajudicial,
o termo inicial do prazo de prescrição subsiste inalterado mesmo diante do ven-
cimento antecipado da dívida, que, in casu, se trata do dia do vencimento da
última parcela.
II – É pacífica a jurisprudência no sentido de que é vedada a capitalização dos
juros em qualquer periodicidade nos contratos de financiamentos imobiliários
celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, como in casu.
III – A elevação dos juros remuneratórios de 6% para 8% ao ano, em virtude
do desligamento do associado da Previ, não é abusiva, a uma, porque expres-
samente prevista na escritura de confissão de dívida; a duas, pois é natural que,
ao deixar de ser associado, o contratante não faça jus aos benefícios concedidos
pela associação.
IV – A utilização da Tabela Price trata-se de método de amortização de dívida,
pelo qual há sua correção antes do desconto da parcela paga, o que não se mos-
tra abusivo, conforme súmula 450 do STJ.
V – É lícita a cobrança do Coeficiente de Equalização de Taxas – CET, porque visa
à amortização do saldo devedor.”
(Apelação Cível nº 1.0701.12.021641-4/001, Rel. Des. Luciano Pinto, 17ª C.Cív.,
J. 17.10.2013, publicação da súmula em 24.10.2013)
176 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
Cláusula 10ª – Parte final
Verifica-se que agiu com acerto a ilustre juíza sentenciante ao determinar
o decote da expressão “ou de outro indicador publicado por instituição idônea
e que reflita a real inflação ocorrida no período considerado”, isso porque se
mostra abusiva a disposição que permite ao fornecedor escolher, a seu bel pra-
zer, o índice de correção do saldo devedor.
Ademais, aludida estipulação, por não ser clara quanto ao índice a ser
aplicado, viola os princípios da transparência e informação previstos na legisla-
ção consumerista. Como consectário, padece de nulidade por impedir o deve-
dor de ter acesso ao real saldo devedor.
Nesse sentido:
“EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA – INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA – SEGURO
DE VIDA EM GRUPO – INVALIDEZ TOTAL E PERMANENTE POR DOENÇA –
SENTENÇA EXTRA PETITA – INOCORRÊNCIA – ALTERAÇÃO DA COBERTURA
– AUSÊNCIA DE ANUÊNCIA E CIÊNCIA DO SEGURADO – NULIDADE – CDC
– INVALIDEZ E AFASTAMENTO TEMPORÁRIO COMPROVADOS – INDENIZA-
ÇÕES DEVIDAS
Não há se falar em sentença ultra e/ou extra petita se o Julgador se atém exclusi-
vamente ao que foi pedido.
As cláusulas que implicarem qualquer limitação ou exclusão ao direito do consu-
midor, ou indicarem desvantagem, deverão ser claras e vir expostas no contrato
de adesão, caso contrário, não podem ser invocadas em seu prejuízo.
A alteração da cobertura firmada entre a seguradora e a estipulante do contrato
de seguro de vida em grupo, sem a sua ciência e concordância, cria uma con-
dição desfavorável ao segurado, ofendendo o inciso III do art. 6º, do CDC e o
art. 46, do mesmo Diploma Legal.
Restando comprovada a invalidez permanente e total por doença, que incapacita
o segurado para as suas atividades laborativas habituais, bem como seu afasta-
mento temporário, devem ser deferidas as indenizações conforme previsão con-
tratual anterior.
Preliminar rejeitada e recurso improvido.”
Multa convencional
Mostra-se abusiva a cláusula vigésima primeira ao autorizar a aplicação
de multa no percentual de 10% caso seja necessária a interposição de ação
judicial, haja vista que, nessa hipótese, o fornecedor estaria transferindo ao con-
sumidor um ônus que seria seu e, por conseguinte, haveria ofensa ao disposto
no art. 51, III do CDC.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 177
Em relação ao assunto, cita-se o seguinte julgado:
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – CONTRATO DE FINANCIAMENTO HABI-
TACIONAL – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO DA ÚLTIMA
PARCELA – AUMENTO DOS JUROS EM RAZÃO DA PERDA DA QUALIDADE
DE SEGURADO – LEGALIDADE – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR – SÚMULA Nº 321 DO STJ – COEFICIENTE DE EQUALIZAÇÃO
DE TAXA (CET) – LEGALIDADE – CAPITALIZAÇÃO – INOCORRÊNCIA – TABE-
LA PRICE – LEGALIDADE – PENA CONVENCIONAL – ELEVAÇÃO DO DÉBITO
EM DECORRÊNCIA DA COBRANÇA DE DÍVIDA JUDICIAL – ILEGALIDADE
Tratando-se de relação jurídica de trato sucessivo, a prescrição não alcança o
fundo do direito reclamado, mas tão somente as parcelas vencidas, anteriores aos
cinco anos do ajuizamento da ação (art. 206, § 5º, I CC).
Estando ainda em vigor o contrato questionado, mesmo que com algumas par-
celas em atraso, não há falar em início da fluência do prazo prescricional, a teor
do art. 199, II do CC.
Em sendo a Previ entidade de previdência complementar fechada, que visa a
beneficiar seus associados, inexiste qualquer ilegalidade no aumento da taxa de
juros para o contratante que não mais contribui para a entidade na qualidade de
segurado.
Nos termos da Súmula nº 321 do STJ, o ‘Código de Defesa do Consumidor é
aplicável à relação jurídica entre entidade de previdência privada e seus partici-
pantes’.
É legal a cobrança cumulada do coeficiente de equalização de taxa (CET), que
objetiva, precipuamente, a amortização da dívida, sendo, via de conseqüência,
benéfica ao mutuário.
Não há falar em capitalização de juros, se tal encargo não restou apurado quando
da realização da perícia contábil.
A jurisprudência pátria já se sedimentou no sentido de que, uma vez pactuada, é
legal a utilização da Tabela Price, que, por si só, não importa em capitalização.
A pena convencional que importa na elevação do saldo devedor em 10%, tão
somente por ter o credor ingressado com ação judicial para receber a dívida é
abusiva e deve ser decotada da avença.”
(Apelação Cível nº 1.0707.11.002805-7/001, Rel. Des. Leite Praça, 17ª C.Cív.,
J. 17.01.2013, publicação da súmula em 29.01.2013)
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ALTERAÇÃO DE ZONEAMENTO – PARCELAMENTO
E OCUPAÇÃO DO SOLO URBANO – ALTERAÇÃO QUE NÃO OFENDE AOS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – APROVAÇÃO PELO CONSELHO MUNICIPAL DE PLANEJAMENTO
URBANO – AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A alteração de zoneamento urbano submetida à apreciação do Conselho
Municipal de Planejamento Urbano, e aprovada pelos órgãos competen-
tes, não ofende aos princípios da Administração Pública.
Recurso não provido.
RELATÓRIO
O Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou a ação civil pública
contra o Município de Londrina, alegando que, no dia 15 de dezembro de
2004, a Câmara Municipal de Londrina aprovou a Lei nº 9.699/2004, que dis-
ciplinou as seguintes matérias:
“a) inclusão dos lotes nºs 257-A/259-B1 e 257-A/259-B2, com 96.800 m², na
área urbana e de expansão urbana do Município de Londrina (arts. 1º e 2º da Lei
nº 9.699/2004), com a respectiva inclusão destes lotes nas Zonas Residenciais
Um (ZC-1) e Zona Comercial Quatro (ZC-4); b) implantação do condomínio ho-
rizontal fechado nos lote nº 22 e 22-A, com 43.716,50 m², localizado na Gleba
Simon Frazer, com a correspondente dispensa da doação de percentual de 35%
180 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
da área condominial ao domínio do Município de Londrina (arts. 3º e 4º da Lei
nº 9.699/2004); c) autorização de metragem mínima de 180,00 m² para os lotes
residenciais do condomínio fechado situado na Gleba Simon Frazer (art. 6º da Lei
nº 9.699/2004); d) autorização de metragem mínima de 250,00 m² para os lotes
comerciais com testada para a Avenida Robert Koch, que serão independentes do
condomínio fechado e estarão lotados na Zona Comercial Seis (ZC-6) art. 6º da
Lei nº 9.699/2004; e) Criação de um parágrafo único ao art. 66 da Lei nº 7.483,
de 20 de julho de 1998 (dispõe sobre o parcelamento do solo para fins urbanos
no Município de Londrina), cuja finalidade foi a de excluir do campo de incidên-
cia daquela disposição legal (art. 66) o lote nº 74/1, com área de 84.700,00m,
cuja área poderia ser loteada dentro dos parâmetros da zona comercial Seis
(ZC-6) para os lotes lindeiros à estrada Municipal ali existente, após a elaboração
da RIAU e sua aprovação para IPPUL e CMTU (art. 7º da Lei nº 9.699).”
VOTO
A apelação tem por objeto a reforma parcial da r. sentença, na parte que
julgou improcedente julgou improcedente o pedido para declarar a nulidade
dos arts. 1º e 2º da Lei Municipal nº 9.699/2004, por ausência de desvio de
finalidade e interesse público.
Os artigos citados limitam-se a incluir dois lotes, de nºs 257-A/259-B1 e
257-A/259-B2, com 96.800 m², na área urbana e de expansão urbana do Mu-
nicípio de Londrina, com a respectiva inclusão destes lotes nas Zonas Residen-
ciais Um (ZC-1) e Zona Comercial Quatro (ZC-4) (fls. 55/56).
Trata-se de disposições que se inserem na competência legislativa do
Município, nos termos do art. 30, inciso VIII, da Constituição Federal:
“Art. 30. Compete aos Municípios:
[...] VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, median-
te planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo
urbano.”
Vistos etc.
1. Ação de despejo por falta de pagamento c/c cobrança de alugueres
atrasados e multa de imóvel residencial aforada por Tayana Amaral Ribeiro em
face de Moema Fernandes Garcia e Josélia Mançano Ximenes Viana, essa como
fiadora, que o eminente doutor Juiz de 1º grau julgara proceder em parte para
decretar o desalijo do apartamento nº 405, da Rua Rodrigues Távora, 915, Go-
vernador Roberto Silveira, em Itaperuna, declarando, por consequência, rescin-
dido o contrato de locação – concedido o prazo de 15 dias para a desocupação
voluntária do imóvel, e, ademais, condenar as rés, solidariamente, ao pagamen-
to dos aluguéis vencidos a partir do mês de fevereiro de 2013, da taxa de gás a
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 185
partir do mês de setembro de 2012 e das taxas de condomínio a partir do mês de
dezembro de 2012, até a data da efetiva desocupação do imóvel. Submeteu-as,
também, ao pagamento da multa contratual no valor de R$ 2.040,00 (dois mil e
quarenta reais), corrigidos pelos índices oficiais da CGJ e acrescidos de juros de
mora de 1% ao mês a partir da citação. Ônus sucumbenciais pelas rés, fixados
os honorários advocatícios em 10% do valor da condenação.
1.1 Daí os apelos, o primeiro deles da locatária, que se bate pela reforma
da sentença na medida em que os aluguéis estavam devidamente quitados à
época da distribuição da presente ação, em cujos depósitos mensais estavam
incluídas as taxas de condomínio. Bate-se, ainda, pela redução da multa aplica-
da, que haveria de ser fixada proporcionalmente ao número de meses faltantes
para o término do prazo da locação.
1.2 A fiadora, por sua vez, assevera a nulidade da fiança prestada, à mín-
gua de outorga uxória.
1.2 Contrarrazões em prestígio da sentença hostilizada.
Brevemente relatados, decido.
2. Não cobra reparos o julgado de piso.
2.1 Isso porque o conjunto probatório é firme no sentido de que, muito
embora assista razão à primeira apelante no que respeita ao fato de ter adim-
plido antecipadamente os aluguéis referentes ao contrato de locação, o qual
se iniciara em 30.05.2012 e o primeiro pagamento ocorrera em 25 de maio
daquele ano, a locatária cessara o depósito dos aluguéis na conta da autora a
partir de fevereiro de 2012, em ordem a caracterizar a falta do pagamento dos
locativos, causa de pedir da ação.
Ademais, à míngua de comprovação de que os valores pertinentes às ta-
xas condominiais e de gás foram depositados conjuntamente com os alugueres,
não há como acolher o pleito recursal.
2.2 Por outro lado, constatado o descumprimento pela locatária de suas
obrigações contratuais, sua condenação ao pagamento da multa estipulada, que
fora avençada em sua integralidade pelo descumprimento de qualquer das cláu-
sulas presentes no contrato de locação (índice eletrônico 15), era de rigor.
Cumpre ressaltar que a referida penalidade não se confunde com aquela
prevista no art. 4º da Lei nº 8.245/1991, sempre proporcional ao período de
cumprimento do negócio. Pelo contrário, as partes, livre e conscientemente,
avençaram cláusula penal no valor de três aluguéis, a serem pagos por aquele
que infringisse quaisquer das obrigações contratuais.
Aliás, considerado que a coima não fora estipulada para a hipótese em
que o locatário pretende devolver o imóvel e, ademais, que a apelante abstive-
ra-se de adimplir não só os últimos aluguéis, como também grande parte dos
186 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
demais encargos pertinentes ao imóvel, não caberia reduzi-la pelo acenado
fundamento do art. 413 do CC.
3. Por derradeiro, cuido da insurgência da segunda apelante, restrita a
arguir a nulidade da fiança por ela prestada no contrato de locação em questão.
É bem verdade que no instrumento acostado aos autos consta apenas a
assinatura da segunda apelante, ali qualificada como casada. Entretanto, a teor
do que dispõe o art. 1.650 do CC, falece legitimidade ao constituidor da garan-
tia fidejussória para arguir nulidade decorrente da ausência de outorga marital,
da linha, aliás, de acalmado entendimento jurisprudencial:
“PROCESSUAL CIVIL – LOCAÇÃO – FIANÇA – PREQUESTIONAMENTO – INE-
XISTÊNCIA – SÚMULAS NºS 282/STF E 211/STJ – AUSÊNCIA DA OUTORGA
UXÓRIA – NULIDADE RELATIVA – ARGUIÇÃO PELO CÔNJUGE QUE PRES-
TOU A FIANÇA – ILEGITIMIDADE – DECRETAÇÃO DE OFÍCIO PELO MAGIS-
TRADO – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVI-
DO – 1. É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido
de que é nula a fiança prestada sem a necessária outorga uxória, não havendo
considerá-la parcialmente eficaz para constranger a meação do cônjuge varão.
[...] 3. Nos termos do art. 239 do Código Civil de 1916 (atual art. 1.650 do Novo
Código Civil), a nulidade da fiança só pode ser demandada pelo cônjuge que
não a subscreveu, ou por seus respectivos herdeiros. 4. Afasta-se a legitimidade
do cônjuge autor da fiança para alegar sua nulidade, pois a ela deu causa. Tal
posicionamento busca preservar o princípio consagrado na lei substantiva civil
segundo a qual não poder invocar a nulidade do ato aquele que o praticou,
valendo-se da própria ilicitude para desfazer o negócio. 5. A nulidade da fiança
também não pode ser declarada ex officio , à falta de base legal, por não se tratar
de nulidade absoluta, à qual a lei comine tal sanção, independentemente da pro-
vocação do cônjuge ou herdeiros, legitimados a argui-la. Ao contrário, trata-se
de nulidade relativa, válida e eficaz entre o cônjuge que a concedeu, o afiançado
e o credor da obrigação, sobrevindo sua invalidade quando, e se, legitimamente
suscitada, por quem de direito, vier a ser reconhecida judicialmente, quando,
então, em sua totalidade será desconstituído tal contrato acessório. 6. Recurso
especial conhecido e improvido.” (STJ, REsp 772419, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo
Esteves Lima, DJ 24.04.2006)
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sétima Câmara Cí-
vel do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, vencida a Relatora, em dar
provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participou do julgamento, além dos signatários, a eminente Senhora Desª
Liége Puricelli Pires.
Porto Alegre, 27 de março de 2014.
RELATÓRIO
Desª Elaine Harzheim Macedo (Presidente e Relatora):
Irineu Roque Forgearini e Maria Beatriz Oliveira Forgearini apelaram da
sentença de fls. 277/281, resultou na improcedência do pedido de usucapião
deduzido contra o Município de Porto Alegre, e na procedência do pedido de
reintegração de posse que o ente municipal deduziu contra os usucapientes.
Preliminarmente, destacaram que o Município de Porto Alegre foi revel,
devendo ser aplicados os efeitos desse instituto. Quanto ao mérito, sustentaram
que a sentença deve ser reformada porque a conclusão nela manifestada não
está de acordo com a prova existente nos autos. Disseram não haver confusão
entre as propriedades das ruas Marcelo Gama e Petersen Jr. Explicaram que
locaram o imóvel situado na Rua Marcelo Gama nº 1189, durante um ano,
porém (destacaram) esse imóvel não se estendia até a Rua Germano Petersen
Jr. Sustentaram exercer posse ad usucapionem, com todos os atributos legais,
relativamente ao imóvel da rua Marcelo Gama nº 1189. Argumentaram sobre
os depoimentos das testemunhas e sobre as provas documentais, afirmando que
essas ratificam seu exercício possessório. Disseram que na data da distribuição
da ação usucapienda (20.11.2005), o imóvel ainda encontrava-se registrado em
nome de Amaro Bizzarro Pereira Porto, portanto, houve o implemento do prazo
prescricional antes de o imóvel tornar-se público, devido à permuta feita pelo
proprietário com o Município de Porto Alegre no ano de 1998, a qual somente
foi registrada no ano de 2005. Pediram o provimento do recurso.
Recebido o recurso (fl. 290), apresentadas as contrarrazões (fls. 293/298),
e ouvido o Ministério Público, os autos foram remetidos ao Tribunal de Justiça,
vindo os autos conclusos para julgamento.
Registra-se que foi observado o disposto nos arts. 549, 551 e 552 do CPC,
tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.
VOTOS
Desª Elaine Harzheim Macedo (Presidente e Relatora):
Rejeito a preliminar de intempestividade da contestação e aplicação dos
feitos da revelia ao ente municipal. Embora a tese defendida pelos recorrentes
possa se mostrar afinada com o sistema processual vigente quando se estiver
frente a feitos comuns, de procedimento ordinário, o fato é que – no caso con-
190 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
creto – se está a debater sobre pedido de usucapião, o qual se desgarra, por
inúmeros motivos, do padrão previsto no Livro I do CPC.
A esse respeito, vale citar as razões deduzidas no parecer do douto Pro-
curador de Justiça, Dr. Armando Antonio Lotti, que vão aqui reproduzidas, até
para evitar tautologia:
Por primeiro, não há a intempestividade da contestação do Município de Por-
to Alegre arguida pelos apelantes. É certo que, por ocasião da expedição da
carta de cientificação da fl. 33, o Município de Porto Alegre quedou-se silente
(fl. 38). Ocorre que tal cientificação operou-se por força do art. 943 do Código de
Processo Civil (a cientificação por carta das pessoas jurídicas de direito público
interno). Novo ofício foi expedido, em 17.05.2007 (fl. 138), para o Município
de Porto Alegre, uma vez que, na contestação do casal Amaro Bizarro Pereira
Porto e Elena Cristina Antola Porto, há a informação de que a propriedade da res
soli usucapienda, em decorrência de permuta, é, em realidade, do referido ente
público. Aliás, em casos tais, o Município deveria ser citado. O AR foi firmado
em 28.05.2007 (fl. 139 – não há carimbo que certifique a sua juntada ao grampo
dos autos) e a contestação do Município de Porto Alegre foi protocolizada em
28.06.2007 (fl. 140). Não se vislumbra, assim, qualquer irregularidade.
De outra sorte, mesmo que fosse intempestiva a contestação, não há aplicação,
em casos tais, dos efeitos da revelia. Com efeito, é consabido que a usucapião é
modo originário de aquisição da propriedade, não existindo, assim, a disposição
de vontade do proprietário para tal, ou seja, de efetuar qualquer espécie de tran-
sação. Deve o prescribente, então, de qualquer forma, provar o direito material
alegado, rectius, suporte fático necessário, não sendo escorreito argumentar, para
fins de julgamento antecipado da lide, que ninguém, dentro da gama enorme
de interessados, compareceu para contestar o feito. A falta de contestação não
pode predispor qualquer tipo de declaração de vontade pelo silêncio e sim pela
simples perda do momento processual para contraditar. Há somente a ausência
do contraditório (contumácia). Caso contrário, se estaria aceitando uma autêntica
denúncia vazia em favor do usucapiente em detrimento do dominus, ainda mais
que a revelia não tem, e nem pode ter, a virtude de transmudar o quadrado em
redondo e o preto em branco.
Por outro lado, estando a usucapião inserida na classe dos direitos absolutos,
o direito de propriedade do titular dirige-se contra todas as pessoas que a rigor
teriam o dever de abstenção, não havendo gradação de intensidade entre o do-
mínio e eles. São os denominados sujeitos passivos totais. Não existe pessoa
determinada, como nas obrigações de crédito, criando-se qualquer espécie de
vínculo material entre demandante e demandado. Assim, não há que se falar em
abstenção de provar em virtude da falta de contestação do demandado, pois é
questão que envolve postulação de eficácia erga omnes. Nesse sentido, inclusive,
ementa de aresto deste órgão fracionário, a saber:
“USUCAPIÃO – JULGAMENTO ANTECIPADO – Inserindo-se o domínio dentre
os direitos absolutos e a sentença declaratória em usucapião sendo oponível erga
omnes, não se há de aplicar a pena de confissão sobre a matéria de fato em razão
da revelia, pois, casos tais, posse ad usucapionem não se presume contra uma
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 191
comunidade inteira. Hipótese em que não há prova documental e, pois, inviável
o julgamento antecipado. Apelação provida. Sentença desconstituída.”
(Apelação Cível nº 599.326.865, Rel. Fernando Braf Henning Júnior,
J. 15.02.2000)
Cuidando-se de demanda que tem por objeto direito absoluto, repita-se, com
sujeitos passivos totais no dizer de Pontes de Miranda, não se pode falar em pre-
sunção de veracidade.
1 Isso porque, como adiante se verá, a posse dos autores quando da entrada em vigor do Código Civil de 2002
já passava de 10 anos, subsumindo-se à regra de transição insculpida no art. 2.028 deste. Logo, aplicável
o art. 550 do Código Civil de 1916 na espécie: “Art. 550. Aquele que, por vinte anos, sem interrupção, nem
oposição, possuir como seu imóvel, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente de título de boa-fé, que, em
tal caso, se presumem; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual lhe servirá de título
para a inscrição no registro de imóveis. (Vide Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 1919)”
192 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
O Município contrapõe que em 1998 o bem foi objeto de permuta com os anti-
gos proprietários (embora o registro da propriedade somente tenha se dado em
2006, conforme documento da fl. 170). Tanto o Município quanto os ex-proprie-
tários defendem que no curso do processo administrativo de permuta nenhuma
das diligências realizadas demonstrou que os suplicantes estivessem na posse do
bem, não pelo menos até o ano de 2000 (a fls. 77, verso, e 79, do processo de
reintegração de posse é afirmado que a área estava desocupada).
A prova testemunhal realizada no processo de usucapião (fls. 206/215) confirma
que o autor, desde 1978, exerceu a profissão de mecânico na região onde se situa
o bem objeto da lide, embora não seja preciso se explorava a atividade especifi-
camente no imóvel de nº 418.
De outra banda, os documentos acostados pelos ex-proprietários do bem, Amaro
Bizarro Pereira Porto e Elena Cristina Antola Porto (fls. 70, 79-v, 81-v,/98, 105 e
109) e pelo Município de Porto Alegre, como já dito (fls. 77-v/79 do processo de
reintegração), dão conta de que o imóvel estava desocupado até o ano de 2000.
Colhida a prova testemunhal, não ficou suficientemente clara a situação fática,
como delineado no despacho de fls. 218/219 que, ao deferir a prova pericial con-
signou: “De duas, uma: ou o casal Porto comprou e permutou terreno diferente
do matriculado (nº 46.442) no Registro de Imóveis da 1º Zona de Porto Alegre,
ou o casal Forgearini está na posse de lote urbano distinto do que julga estar.”
A prova pericial concluiu (fls. 236/244) que o imóvel hoje ocupado pelos autores
corresponde ao bem objeto da ação.
Todavia, não é crível que desde 1978 a posse exercida pelos autores tenha, de
fato, incidindo sobre o mesmo imóvel.
Conforme é possível aferir do documento de fls. 245/246, foi firmado um con-
trato de locação entre o suplicante e Jorge Bona, proprietário do imóvel nº 1189
da Rua Marcelo Gama, sendo que o locatário ocuparia os fundos desse terreno
(isso em 1983/1984).
Da planta de fl. 95 do processo de reintegração, é possível verificar que o imóvel
nº 1189 cortava todo o quarteirão, isto é, ia da Rua Marcelo Gambá até a Rua
Germano Peterson Júnior (embora na planta de fl. 81 do feito da usucapião cons-
te que havia dois imóveis – nº 1189, na Marcelo Gama, e nº 430, na Germano
Peterson Júnior –, isso não interfere na conclusão a seguir exposta2).
Logo, os fundos do terreno correspondem à ocupação deste na parte em que testa
com a Rua Germano Peterson, e exatamente por isso é que se pode explicar por
que o pedido de alvará (nos anos de 1990/1993), constante às fls. 98/111 do feito
de reintegração, foi realizado para o imóvel nº 428 da Rua Germano Peterson
Júnior3, e não 418 (imóvel objeto da ação).
2 Inclusive, corroborando com a tese de que o bem atravessava o terreno, o documento de fl. 247, que intima
o autor acerca do exercício do direito de preferência, descreve tão somente o nº 1189 para ambas as ruas.
3 O documento de fl. 110 também aponta que o imóvel nº 428 da Rua Germano Petersen Júnior corta todo o
quarteirão entre esta e a Rua Marcelo Gama, fato que induz a inevitável conclusão de que a essa altura esse
terreno é o mesmo de nº 1189 da Rua Marcelo Gama.
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 193
Outrossim, não é possível que os demandantes tenham utilizado este mesmo
imóvel até 1999 (data da intimação para o exercício do direito de preferência
na compra do imóvel alugado – fl. 247), e isso porque, pelo menos em 1996, já
moravam sobre o terreno de nº 418, conforme confirma Vitor Hugo Mello Leal
(fls. 210/210-v.), residente da Rua Marcelo Gama nº 1179 (imóvel situado atrás
do de nº 4184):
J: Relação íntima? O que o senhor é dele? T: Sou vizinho. Eu moro na frente e ele
mora nos fundos.
J: Advertido e compromissado na forma da lei. Quanto tempo o senhor conhece
o Irineu? T: De 15 para 16 anos, desde que eu fui morar lá na Marcelo Gama.
J: Que ano o senhor foi morar lá? T: Em 1996.
J: Dada a palavra ao Procurador do Autor. PA: Só para a testemunha explicar, ele
disse que mora na frente e ele mora atrás, se ele quer dizer que ele mora na outra
rua paralela com a rua objeto da usucapião?
J: Qual é a rua que o senhor mora? T: Eu moro na Marcelo Gama. E o seu Irineu
é meu vizinho de fundo. Ele mora na Germano Petersen, mas dá divisa com o
terreno onde eu moro.
Aliás, corrobora a tese (de que em algum momento entre os anos de 1990 e 1996
os autores alteraram o local onde residiam e exploravam a mecânica), o teste-
munho de Antônio Carlos Garay Zanotto, pessoa que prestou serviços ao autor
(fls. 212/213-v):
J: Ele está reivindicando um imóvel ali, o município está pedindo para ele sair e
ele está dizendo que ele é dono desse imóvel. O senhor poderia nos esclarecer
sobre isso? T: Dono eu não sei. Eu sei que eu conheço ele ali desde esse tempo
mais ou menos.
J: O senhor sabe qual é o número da casa dele? T: Não tenho certeza, mas parece
que é 428.
J: 418 lhe diz alguma coisa? T: 18, não.
Outrossim, extrai-se desse mesmo testemunho que também o terreno que a tes-
temunha (Antônio Carlos5) julga estar atrás de onde hoje existe a praça permitia
a livre passagem entre os terrenos que testavam para as ruas Marcelo Gama e
Germano Peterson Júnior:
J: Qual é a rua que o senhor mora? T: Eu moro na Marcelo Gama. E o seu Irineu
é meu vizinho de fundo. Ele mora na Germano Petersen, mas dá divisa com o
terreno onde eu moro.
[...]
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Victor
Ferreira, com voto, e dele participou o Exmo. Des. Luiz Fernando Boller.
Florianópolis, 20 de março de 2014.
VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
O apelo envereda contra a decisão que reconheceu a ilegitimidade dos
réus/apelados para responderem ao pedido indenizatório deduzido na inicial,
porque o locador teria eximido os antigos locatários (recorridos) do pagamento
das despesas para o reparo do imóvel.
O recorrente nega veementemente tivesse anuído com a sublocação, as-
severando que não subscreveu o contrato referido na sentença, defendendo,
por isso, que as despesas para o restabelecimento do imóvel devem ser supor-
tadas pelos réus.
Pois bem, conforme se retira da parcela da sentença que resolveu a ação
de despejo (contra a qual não houve recurso), não houve prévia autorização
202 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
do apelante/locador para que os locatários sublocassem o imóvel, tanto que foi
reconhecida a responsabilidade solidária dos locatários iniciais pelo pagamento
dos aluguéis.
Assim, se o apelante não anuiu, previamente e por escrito, com a sublo-
cação, não se pode imputar ao autor os termos de um contrato do qual ele não
participou.
Repito, o “contrato de locação comercial”, encartado às fls. 90/92 da
ação de despejo (fls. 252/254), não foi assinado pelo autor Jonatas, mas apenas
pelo locatário, fiadores e testemunhas.
Ora, se o recorrente não subscreveu o ajuste, não vejo como dizer que
concordou com o disposto na cláusula décima quinta, que exonerou os locatá-
rios primitivos do pagamento das despesas com reparos no imóvel, pré-fixadas
em R$ 15.000,00.
Destarte, se o locatário original e os fiadores respondem solidariamen-
te pelo pagamento dos aluguéis e encargos do imóvel até a entrega das cha-
ves, como reconhecido na sentença, devem também responder pelas despesas
decorrentes da necessidade de restabelecimento das condições originárias do
bem, em virtude das modificações promovidas no local.
O art. 23 da Lei de Locações é claro ao imputar ao locatário a obrigação
de “restituir o imóvel, finda a locação, no estado em que o recebeu, salvo as
deteriorações decorrentes do seu uso normal” (inciso III).
No caso em foco, a perícia realizada na ação cautelar de produção ante-
cipada de provas apurou que foram promovidas, pelos locatários, “significativas
modificações, que alteraram profundamente as características básicas” (fl. 25).
Destarte, considerando que os réus não impugnaram objetivamente a
aludida perícia, que apresentou um orçamento estimado, em dezembro de
2001, em R$ 20.293,46, tenho que este é o valor que deve ser ressarcido pelos
recorridos, tal como postulado na exordial.
Já se decidiu:
“APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA – OBRIGAÇÕES ADVINDAS DE ENCERRA-
MENTO DE CONTRATO DE LOCAÇÃO – IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM –
IRRESIGNAÇÃO DA PARTE AUTORA – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE
DEFESA AFASTADA – MÉRITO – DEVER DO LOCATÁRIO EM RESTITUIR O
IMÓVEL NO ESTADO EM QUE SE ENCONTRAVA – VISTORIA FINAL NÃO
REALIZADA – NÃO INDISPENSABILIDADE – INTELIGÊNCIA DO ART. 333, IN-
CISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – DEVER DE PAGAMENTOS DAS
DESPESAS EFETUADAS NOS REPAROS DOS DANOS CAUSADOS – INVERSÃO
DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PRO-
VIDO. [...]” (TJSC, Apelação Cível nº 2012.021281-5, de Chapecó, Rel. Des.
Eduardo Mattos Gallo Júnior, J. 25.09.2012).
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 203
Ou ainda:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – ENCARGOS DECORRENTES
DE CONTRATO DE LOCAÇÃO – DECLARAÇÃO EXPRESSA PELO LOCATÁ-
RIO DE QUE RECEBEU O IMÓVEL EM BOAS CONDIÇÕES – OBRIGAÇÃO DE
RESTITUÍ-LO NO MESMO ESTADO – ABANDONO DO IMÓVEL – VISTORIA
FINAL NÃO REALIZADA – DIREITO DO AUTOR NÃO DERRUÍDO – ÔNUS DA
PROVA QUE INCUMBIA À PARTE RÉ (ART. 333, INC. II, DO CÓDIGO DE PRO-
CESSO CIVIL) – MERAS AFIRMAÇÕES DESPROVIDAS DE APARATO PROBA-
TÓRIO – DEVER DE RESTITUIR AS DESPESAS EFETUADAS NOS REPAROS DAS
AVARIAS CAUSADAS E QUITAÇÃO INTEGRAL DOS ALUGUÉIS – SENTENÇA
MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO – Finda a locação deve
o locatário restituir o imóvel nas mesmas condições em que o recebeu, salvo as
deteriorações decorrentes de seu uso normal (inc. III, art. 23, Lei nº 8.245/1991).
[...] Nos termos do art. 333, II, do Código de Processo Civil, o ônus da prova
incumbe ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extin-
tivo do direito do autor; não de desincumbindo ele do onus probandi, impõe-
-se o acolhimento do pedido inicial [...] (Apelação Cível nº 2002.007207-4, da
Capital, Rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, J. 16.03.2006). [...] O pagamento se
comprova através de recibo de quitação passado pelo locador ou quem o repre-
sente, ipso facto, a alegação de pagamento desacompanhada de demonstração
cabal acerca de fato extintivo do direito do autor, não pode ser acolhida, por
força do disposto no art. 333, II, do CPC [...] (Apelação Cível nº 2008.013350-9,
de Balneário Camboriú, Rel. Des. Carlos Adilson Silva, J. 01.10.2010)”. (TJSC,
Apelação Cível nº 2007.056371-6, de Joaçaba, Rel. Des. Stanley da Silva Braga,
J. 30.06.2011)
Registro, por fim, que a tese de que houve uma mudança no quadro so-
cietário do Mini Mercado Ilha do Campeche Ltda. não tem o condão de afastar
a responsabilidade dos réus, pois tanto o contrato de locação como o aditivo
não foram firmados pela pessoa jurídica, mas sim por Pedro e Edir, razão pela
qual devem eles responder pelas obrigações assumidas.
Isso posto, eu dou provimento ao recurso, para acolher o pedido for-
mulado na inicial, condenando os réus ao pagamento de R$ 20.293,46, a ser
corrigido monetariamente desde dezembro de 2001, e acrescido de juros de
mora, contados da citação.
Além disso, sujeito os requeridos ao pagamento das despesas processuais
e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado do débito.
É como voto.
EMENTA
Direito de vizinhança. Reparação de danos materiais e morais. Explosão
na pedreira vizinha que teria causado trincas e rachaduras no imóvel
da autora. Relação de causalidade excluída pela prova pericial. Imóvel
da autora que passa por reformas de ampliação da casa, que inviabili-
zou a verificação dos danos reclamados na inicial. Laudo técnico bem
fundamentado e não elidido por outros elementos constantes dos autos.
Danos morais não caracterizados. Meros incômodos ou aborrecimentos
que não são aptos a configurar prejuízos extrapatrimoniais. Ação julgada
improcedente. Sentença mantida. Recurso improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0133979-
06.2010.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante Cleonice
de Brito Soares (Justiça Gratuita), é apelado Pedreira São Matheus Lageado S/A.
Acordam, em 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça
de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso.
V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Ruy
Coppola (Presidente), Kioitsi Chicuta e Luis Fernando Nishi.
São Paulo, 27 de março de 2014.
Ruy Coppola
Relator
Assinatura eletrônica
Vistos.
Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais, ajuizada
por Cleonice de Brito Soares contra Pedreira São Matheus Lageado S/A, que a
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 205
respeitável sentença de fls. 591/592, cujo relatório se adota, julgou improce-
dente.
Apela a autora (fls. 597/604) sustentando, em suma, que a responsabili-
dade da sociedade ré é objetiva, sendo baseada na teoria do risco e, assim sen-
do, é dispensável a existência de culpa, sendo que os danos e o nexo causal res-
taram devidamente comprovados nos autos por outras provas apresentadas pela
autora. Argumenta que o laudo pericial é equivocado e contraditório. Pede, ao
final, a reforma da sentença.
É o relatório.
A autora-apelante ajuizou a presente ação, alegando ser proprietária de
um imóvel localizado no bairro de Guaianazes, nesta Capital, o qual desenvol-
veu diversas trincas e rachaduras creditadas a potentes explosivos frequente-
mente detonados pela sociedade ré.
Argumentou também que no “dia 30.07.2007, ocorreu uma explosão de
grande monta na pedreira, explosão essa que causou agravamento nas trincas
e rachaduras nas paredes da casa” (cf. fl. 03), sendo que os atos ilícitos prati-
cados pelos recorridos expuseram a autora a situação degradante e vexatória,
retirando-lhe a qualidade de vida e a segurança física e psíquica de sua família.
Nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, “haverá obri-
gação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados
em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (grifei).
Sobre esse ponto examine-se a lição de Rui Stoco:
“[...] o parágrafo único trouxe acréscimo antes inexistente, dispondo que ‘haverá
obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especifica-
dos em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem’.
Como se verifica, mantêm-se o princípio da responsabilidade com fundamento
na culpa (teoria da culpa), mas abre-se exceção para admitir a responsabilidade
independente de culpa ‘nos casos especificados em lei’.
[...]
‘Com relação à dispensa ou abandono da culpa como pressuposto da responsa-
bilidade, por força da adoção da teoria do risco criado, nas hipóteses em que a
atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar risco especial e permanente
para os direitos de outrem, o Código Civil curvou-se ao entendimento pacífico da
doutrina e dos precedentes reiterados de nossos tribunais, que já vinham abra-
çando esse entendimento.’
[...]
‘Mas aprofundando no texto da lei e buscando refinamento exegético, é bom
lembrar que o “risco” referido no parágrafo único do art. 927 tem que decorrer
206 D����������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA
da própria natureza da atividade exercida, ou seja, deve ser inerente não à forma
de exercer mas à própria atividade. Exige-se, ainda, que ademais de ser um risco
embutido e, portanto, inerente, seja também especial e anormal.
Traduz o que se pode chamar de risco de atividade perigosa.’
[...]
‘Assim, se a atividade que a pessoa física ou jurídica explora for potencialmente
lesiva e do seu exercício decorrer dano para outrem, a responsabilidade será
objetiva e nascerá a obrigação de reparar, pouco importando o modo pelo qual
referida atividade tenha sido exercida, na consideração de que a periculosidade
deve ser uma qualidade preexistente e intrínseca.
É importante e fundamental chamar a atenção de que no referido parágrafo único
do art. 927 tem-se uma hipótese de responsabilização por ato lícito, posto que
gerador de perigo.’ (grifei)
[...]
‘Note-se que essa responsabilidade pelo exercício de atividade perigosa, seja em
razão da sua própria natureza ou a natureza dos meios utilizados, independe de
culpa.’ (in Tratado de Responsabilidade Civil. 7. ed. RT, p. 174/175)”
De outra parte, tem-se que os valores das vibrações e da pressão acústica obtidos
nas medições efetuadas in situ, constantes dos documentos juntados aos autos
pela ré (fls. 446/477), ficaram abaixo dos limites preconizados pelas normas vi-
gentes, em particular a NBR 9653/05 da ABNT.” (fl. 558)
A matéria aqui discutida foi objeto de recente decisão proferida por esta
Colenda Câmara:
“Responsabilidade civil. Direito de vizinhança. Reparação de danos materiais e
morais decorrentes de explosão na pedreira-ré. Ausência de comprovação dos
fatos alegados. Laudo pericial que exclui qualquer relação entre os danos do imó-
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA........................................................................................................ 209
vel e a atividade da empresa-ré. Ação julgada improcedente. Apelação do autor.
Renovação dos argumentos iniciais. Danos materiais. Perícia técnica. Constata-
ção de que os danos verificados no imóvel decorrem de problemas estruturais da
própria edificação (‘imóvel erigido em regime de “mutirão”, subsolo mole, com
elevado nível de lençol freático, falta de observância às normas técnicas e cons-
trutivas, baixa qualidade dos materiais utilizados e condições de conservação’).
Não demonstrado o nexo de causalidade entre os supostos danos e as explosões
decorrentes da atividade da ré. Danos morais. Meros dissabores que não podem
ser alçados ao patamar de danos morais. Atividade da ré que é realizada dentro
dos parâmetros exigidos pelo poder público. Ausência de comprovação dos fatos
alegados na inicial. Ônus da prova de quem alega (art. 333, I, do CPC). Autor que
não se desincumbiu desse mister. Danos materiais e morais indevidos. Sentença
mantida. Recurso improvido” (Apelação nº 0114252-54.2007.8.26.0007, Rel.
Des. Francisco Occhiuto Júnior, J. 30.08.2012, v.u.).
Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso, nos termos
acima alinhavados.
Ruy Coppola
Relator
Parte Geral – Ementário de Jurisprudência
1455 – Ação de nunciação de obra nova – alegação de nulidade processual – ausência de prejuízo
“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Nunciação de obra nova. Alegação de nulidade
processual. Ausência de prejuízo. Reexame de prova. 1. Inviável a análise do recurso especial
quando dependente de interpretação de reexame de matéria fática (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo
regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AG-REsp 175.939 – (2012/0092263-1) – 4ª T.
– Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 06.03.2014)
1456 – Ação de nunciação de obra nova – cerceamento de defesa – julgamento antecipado da lide
“Agravo regimental em recurso especial. Ação de nunciação de obra nova. Cerceamento de defe-
sa. Julgamento antecipado da lide. Reexame de provas. Inviabilidade. Súmula nº 7/STJ. Prequestio-
namento. Ausência. Súmula nº 211/STJ. Dissídio jurisprudencial prejudicado. Multa diária. Valor.
Razoabilidade. 1. Para prevalecer a pretensão em sentido contrário à conclusão das instâncias
ordinárias, que entenderam não ser preciso maior dilação probatória, seria necessária a revisão do
conjunto fático-probatório dos autos, o que é inviável nesta instância especial por força da Súmula
nº 7/STJ. 2. A ausência de prequestionamento da matéria suscitada no recurso especial, a despeito
da oposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial (Súmula
nº 211/STJ). 3. A falta de prequestionamento inviabiliza o recurso especial também pela alínea c
do permissivo constitucional. 4. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no sentido da
possibilidade de alteração do valor da multa diária, em sede de recurso especial, apenas em casos
excepcionalíssimos, diante da manifesta exorbitância do valor ou de flagrante impossibilidade de
cumprimento da medida, circunstâncias inexistentes no presente caso. 5. Agravo regimental não
provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.122.787 – (2009/0089853-7) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva – DJe 13.02.2014)
1460 – Condomínio – violação dos arts. 51 do Código de Defesa do Consumidor e 1.220 do Có-
digo Civil – prequestionamento – ausência
“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Condomínio. Violação dos arts. 51 do Có-
digo de Defesa do Consumidor e 1.220 do Código Civil. Prequestionamento. Ausência. Súmula
nº 211/STJ. 1. As matérias versadas nos artigos apontados como violados no recurso especial não
foram objeto de debate pelas instâncias ordinárias, sequer de modo implícito, e embora opostos
embargos de declaração com a finalidade de sanar omissão porventura existente, não foi indicada
a contrariedade ao art. 535 do Código de Processo Civil, motivo pelo qual, ausente o requisito do
prequestionamento, incide o disposto na Súmula nº 211/STJ. 2. Agravo regimental não provido.”
(STJ – AgRg-Ag-REsp 95.431 – (2011/0222851-9) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva –
DJe 13.02.2014)
1462 – Conflito positivo de competência – juízo de direito e juízo do trabalho – falência – aliena-
ção de imóvel
“Agravo regimental. Conflito positivo de competência. Juízo de direito e juízo do trabalho. Fa-
lência. Alienação de imóvel. Inexistência de manifestação dos juízos suscitados. Hipóteses pre-
vistas no art. 115 do CPC. Não configuração. Análise da matéria de mérito. Impossibilidade.
1. Inexistindo, nos autos, manifestação de órgão jurisdicional suscitado no tocante à competência
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA................................................................................ 213
para julgamento de demanda, não se configura o conflito de competência. 2. O conflito positivo
de competência não é a via para se aferir a inteireza e legitimidade de deliberações dos juízos
suscitados nem para se pronunciar o acerto ou desacerto de decisões proferidas em demandas
que deram origem a sua instauração. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-CC 131.267 –
(2013/0382683-0) – 2ª S. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 14.02.2014)
1464 – Corretagem – comissão – ação de cobrança – art. 535 do CPC – ausência de omissão
“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de cobrança de comissão de corretagem.
Art. 535 do CPC. Ausência de omissão. Dissídio jurisprudencial. Ausência de indicação de dispo-
sitivo de lei federal ao qual teria sido dada interpretação divergente. Súmula nº 284/STF. Agravo re-
gimental a que se nega provimento. 1. Não há falar em violação do art. 535 do Código de Processo
Civil, pois o Tribunal de origem dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispen-
sável que venha examinar uma a uma as alegações e fundamentos expendidos pelas partes. Além
disso, basta ao órgão julgador que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo
exigível que se reporte de modo específico a determinados preceitos legais. 2. A ausência de indi-
cação do dispositivo de lei federal ao qual teria sido dada interpretação divergente daquela firmada
por outro Tribunal importa em deficiência de fundamentação, nos termos da Súmula nº 284/STF.
3. Agravo regimental não provido, com aplicação de multa.” (STJ – AgRg-AG-REsp 428.777 –
(2013/0369926-2) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 19.03.2014)
1468 – Desapropriação – interesse social – reforma agrária – oferta inicial – inferior – indeniza-
ção – arbitramento
“Direito administrativo. Processual civil. Recurso especial. Desapropriação. Interesse social. Refor-
ma agrária. Oferta inicial. Inferior. Indenização. Arbitramento. Sentença. Definição. Sucumbência.
Necessidade. Comparação. Valores. Correção monetária. Ausência. Prestação jurisdicional. 1. A
sucumbência nas ações de desapropriação por interesse social é definida objetivamente conside-
rando o valor da oferta inicial e o da indenização arbitrada judicialmente, sobre ambas incidindo
a correção monetária para, então, apurar-se se realmente a oferta era inferior, idêntica ou superior
à reparação. 2. Verificado não haver a origem se debruçado sobre essa tese imprescindível ao cor-
reto deslinde da causa – porque dela derivam a incidência de juros e o pagamento de honorários –,
embora tenha sido oportunamente instada a fazê-lo, configurada está a inobservância ao dever de
prestação jurisdicional e a violação ao art. 535 do CPC. 3. Recurso especial provido.” (STJ – REsp
1.421.705 – (2013/0393724-8) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 18.02.2014)
1476 – Hipoteca constituída pela construtora em favor do agente financeiro – penhora dos imó-
veis adquiridos por terceiros – litigância de má-fé
“Agravo regimental em recurso especial. Embargos de terceiro. Hipoteca constituída pela cons-
trutora em favor do agente financeiro. Penhora dos imóveis adquiridos por terceiros. Litigância
de má-fé. 1. Insistência da CEF no prosseguimento de execução individual contra a Encol e na
manutenção da penhora de imóveis adquiridos da construtora que obteve a decretação de sua
falência. Reconhecimento de litigância de má-fé na origem. Manutenção. 2. Agravo regimental
desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.391.083 – (2011/0245039-0) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino – DJe 06.03.2014)
1481 – Locação de bem imóvel – ação de execução de título extrajudicial – embargos à execução
“Agravo de instrumento. Locação de bem imóvel. Ação de execução de título extrajudicial. Embar-
gos à execução. Relevante questão relacionada à ilegitimidade passiva dos embargantes. Situação
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA................................................................................ 219
que pode gerar danos de difícil reparação. Cabimento do efeito suspensivo aos embargos, nos ter-
mos do art. 739-A, § 1º, do CPC. Recurso provido.” (TJSP – AI 2037322-69.2013.8.26.0000 – São
Paulo – 35ª CDPriv. – Rel. Melo Bueno – DJe 19.12.2013)
1486 – Posse – contrato de dação em pagamento – eficácia suspensa – utilização como justo título
para fins de proteção possessória – impossibilidade
“Civil. Posse. Contrato de dação em pagamento. Eficácia suspensa. Utilização como justo título
para fins de proteção possessória. Impossibilidade. Enunciado nº 487 da Súmula/STJ. Posse que
não é disputada com base no domínio. Não incidência. 1. Ação de manutenção de posse ajuizada
em 07.07.1993. Recurso especial concluso ao gabinete da relatora em 03.10.2012. 2. Recurso
especial em que se discute qual das partes detém o direito à posse do imóvel objeto do litígio.
3. Estando o contrato de dação de imóvel em pagamento impossibilitado de produzir efeitos ju-
rídicos, o negócio subsiste nos planos da existência e validade, mas fica impedido de produzir
resultado no plano da sua eficácia, de modo que o referido instrumento não constitui justo título
para fins de proteção possessória. 4. O direito à posse é relativo, podendo esta ser justa em relação
a uns e injusta em relação a outros, a depender da relação existente entre os sujeitos, a ser anali-
sada casuisticamente. 5. Nas hipóteses em que a posse não é disputada com base no domínio não
incide o Enunciado nº 487 da Súmula/STF. 6. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ –
REsp 1.347.390 – (2012/0089982-3) – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 14.02.2014)
1488 – Posse – reintegração – indenização por danos materiais – prova emprestada – possibili
dade
“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Reintegração de posse c/c indenização por
danos materiais. Prova emprestada. Possibilidade. Precedentes. Indeferimento de prova pericial.
Reexame. Súmula nº 7/STJ. Agravo regimental a que se nega provimento. 1. É pacífico o entendi-
mento do Superior Tribunal de Justiça quanto à legalidade da prova emprestada, quando esta foi
produzida com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Rever os fundamentos
que levaram a tal conclusão, ou seja, de que a prova emprestada utilizada no processo não teria
passado pelo crivo do contraditório, demandaria reexame do conjunto probatório. Incidência da
Súmula nº 7/STJ. 2. Tendo as instâncias ordinárias entendido pela desnecessidade de realização
de provas, hão de ser levados em consideração o princípio da livre admissibilidade da prova e do
livre convencimento do juiz, que, nos termos do art. 130 do Código de Processo Civil, permitem
ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como o
indeferimento daquelas que considerar inúteis ou protelatórias. Precedentes. 3. Agravo regimental
não provido.” (STJ – AgRg-AG-REsp 426.343 – (2013/0364582-1) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe
Salomão – DJe 18.03.2014)
1491 – Promessa de compra e venda de imóvel – ação anulatória de ato jurídico – cumulação com
rescisão
“Agravo regimental em recurso especial. Ação anulatória de ato jurídico cumulada com rescisão de
contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Decisão monocrática negando seguimento ao
reclamo. 1. Razões do regimental que não impugnam especificamente os fundamentos invocados
na deliberação monocrática. Em razão do princípio da dialeticidade, deve o agravante demons-
trar, de modo fundamentado, o desacerto da decisão agravada. Incidência da Súmula nº 182/STJ:
‘É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da
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decisão agravada’. 2. Agravo regimental não conhecido, com aplicação de multa.” (STJ – AgRg-
-REsp 1.251.952 – (2011/0107417-1) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 19.02.2014)
1493 – SFH – saldo residual – ausência de cobertura pelo FCVS – responsabilidade do mutuário
“Agravo regimental no recurso especial. Sistema financeiro de habitação. Saldo residual. Ausência
de cobertura pelo FCVS. Responsabilidade do mutuário. 1. Nos termos da jurisprudência desta
Corte, não havendo previsão de cobertura pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais –
FCVS, como no presente caso, os mutuários finais responderão pelos resíduos dos saldos devedo-
res existentes, até sua final liquidação, na forma que for pactuada, conforme o disposto no art. 2º
do Decreto-Lei nº 2.349/1987. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp
1.381.981 – (2013/0134123-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 13.02.2014)
1494 – SFH – vício de construção – financiamento pela Caixa – ilegitimidade passiva ad causam
“Processo civil. Apelação. SFH. Vício de construção. Financiamento pela Caixa. Ilegitimidade
passiva ad causam. 1. A sentença negou a revisão da prestação do mútuo do SFH e indenização
por danos materiais e morais, excluindo a responsabilidade da Caixa pelos vícios de construção
de imóvel adquirido com recursos do SFH. 2. O mero financiamento da construção de prédio de
apartamentos, objeto de incorporação imobiliária, não vincula o agente financeiro pelos vícios
da obra, devendo os adquirentes prejudicados demandar aos responsáveis diretos pelo empre-
endimento. Precedentes. 3. Compete à Justiça Estadual, em princípio, julgar ações sobre vícios
de construção de imóveis financiados pelo SFH, e a Caixa, parte passiva ilegítima, só pode ser
responsabilizada se comprovada a sua condição de proprietária/vendedora do imóvel objeto da
controvérsia, o que não é o caso. Precedentes. 4. Tocante à ‘revisão do contrato de financiamento
[...], considerando que a casa financiada foi construída numa área sem água, sem rua asfaltada e
de péssima qualidade de vida e o valor financiado está muito além da realizada’, é decorrência
lógica da condição de mera mutuante o direito da Caixa à restituição do valor que financiou, em
nada interferindo a eventual desvalorização do imóvel. Precedente da Turma. 5. Sentença par-
cialmente anulada de ofício, para reconhecer a ilegitimidade da Caixa quanto aos danos morais
e materiais por vício da construção. Confirmada quanto à improcedência da pretensão revisional.
Apelação desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 2013.51.02.000226-2 – 6ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Nizete
Antônia Lobato Rodrigues Carmo – DJe 18.02.2014)
1495 – Solo urbano – parcelamento – indenização por danos morais e materiais – ocupação irre-
gular de área pública – promoção de políticas públicas em prol do interesse público
“Apelação cível. Indenização por danos morais e materiais. Ocupação irregular de área públi-
ca. Ato ilícito competência do Município. Art. 30, VIII, da CF. Promoção de políticas públicas
em prol do interesse público. Art. 182 da CF. Prevalência sobre o interesse privado. Possibilida-
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de de imediata demolição da construção irregular, em área pública, sem prévia notificação. Lei
nº 1.974/1998, arts. 95, I, e 98. Indenização. Incabível. Recurso provido. 1. É da competência dos
Municípios promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento
e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (art. 30, VIII, da CF). O direito
de construir, portanto, não é absoluto, irrestrito, e condiciona-se ao respeito do direito dos vizinhos
e à observância dos regulamentos administrativos (art. 1.299 do CC). 2. Incontroverso que a cons-
trução do imóvel não só era ilegal, pois edificado sem licença ou alvará da municipalidade, bem
como era que erguida em área pública, decorrendo que a apelada agiu de má-fé e praticou condu-
ta ilícita. 3. Ainda que o Município não a tenha notificado da irregularidade, não há como se falar
em dano moral e material, porque aquele que não procedendo de boa-fé edifica em terreno alheio,
sabe que perderá em proveito do proprietário a construção, a qual, a critério daquele, poderá ser
mantida ou demolida. 4. O acolhimento da pretensão deduzida implicaria afronta ao princípio da
igualdade, porque a invasão de área de domínio público destina-se, na verdade, a servir exclusi-
vamente aos invasores, não havendo utilidade pública, mas utilidade restrita a particulares. Além
disso, ocupação privativa de bem público por particular viola o preceito da legalidade (regente
da Administração Pública) e constitui benesse injustificada de particular em desfavor dos demais
administrados. 5. A teor do art. 182 da CF, cabe ao Poder Público visar ao pleno desenvolvimento
das funções sociais da cidade e garantir o bem estar dos habitantes, razão pela qual, não se pode
privilegiar apelada e em detrimento dos demais administrados se a região não se destina a esse
fim, mas, ao contrário, à circulação de pedestres e veículos (via de acesso ao bairro vizinho).
6. A Administração Pública goza do Poder de Polícia que tem como atributos específicos a discri-
cionariedade, a autoexecutoriedade e a coercibilidade, pelo que incabível se mostra a pretendida
indenização, diante da legalidade do ato praticado pelo Município e da ilegalidade do ato pratica-
do pela apelada. Precedentes. 7. Recurso provido.” (TJES – Ap 0006233-60.2006.8.08.0048 – Rel.
Fabio Clem de Oliveira – DJe 25.03.2014)
RESUMO: O presente trabalho propõe-se a examinar os aspectos jurídicos mais relevantes do contrato
de alienação fiduciária de imóveis, instituída pela Lei nº 9.514/1997, em especial a questão relativa aos
requisitos da liminar possessória nas respectivas ações de reintegração de posse.
1 Cf., por exemplo: TJSP, AI 1087315-0/1, 31ª Câmara, Rel. Des. Antonio Rigolin, J. 19.12.2006, v.u.
2 MARTINEZ, Sergio Eduardo. Alienação fiduciária de imóveis. Porto Alegre: Norton, 2006. p. 84.
Clipping Jurídico
É nula doação que inclui parcela de patrimônio destinada aos herdeiros neces-
sários
A doação de bens feita em vida pelo pai aos filhos gerados no casamento, excluindo
a filha fruto de outro relacionamento, é nula quanto à parte que obrigatoriamente
deve ser destinada a ela por herança. Assim como os três meios-irmãos por parte de
pai, a filha também é herdeira necessária de um quarto da metade dos bens do geni-
tor. Com base nessa regra do direito civil brasileiro, o STJ determinou que 6,25% do
valor bruto de dois imóveis, doados e posteriormente vendidos, sejam entregues à
herdeira que não foi contemplada na doação. Um terceiro imóvel deve ser colocado
em processo de inventário para partilha entre os herdeiros necessários, resguardada a
metade doada pela viúva aos seus próprios filhos. O juízo de primeiro grau julgou o
pedido procedente. Declarou a nulidade dos atos de transmissão da propriedade e de-
terminou o retorno dos bens ao espólio do falecido, para futura partilha em inventário.
A decisão foi mantida em segundo grau. Os irmãos recorreram ao STJ alegando que
metade dos imóveis foi doada pela mãe deles, de forma que a irmã apenas por parte
de pai não teria legitimidade para pedir em juízo a declaração de nulidade do negó-
cio. Sustentaram que, em relação à metade doada pelo pai comum, a invalidade da
doação deveria recair somente sobre a parte que excede o que o genitor pode dispor
livremente, que corresponde à metade de seu patrimônio. Assim, a outra metade deve
ser dividida entre os quatro herdeiros necessários, cabendo a cada um 6,25% de cada
um dos imóveis doados. Para a Relatora do recurso, Ministra Nancy Andrighi, a autora
tem legitimidade para propor a ação a fim de obter sua parte na herança. Seu objetivo
é a declaração de nulidade da doação para posterior abertura de inventário dos bens
deixados pelo pai falecido, com sua inclusão no rol de herdeiros necessários. “O fato
de a recorrida ter realizado a cessão de direitos hereditários não lhe retira a qualidade
de herdeira, que é personalíssima, e, portanto, não afasta sua legitimidade para figurar
no polo ativo desta ação, porque apenas transferiu ao cessionário a titularidade de sua
situação jurídica, de modo a permitir que ele exija a partilha dos bens que compõem a
herança”, explicou a relatora. Os recorrentes também alegaram no recurso que houve
julgamento fora do pedido feito na ação, pois foi declarada a nulidade da doação com
base no art. 1.175 do Código Civil de 1916: “É nula a doação de todos os bens, sem
reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador” Nancy Andrighi
afirmou que não se pode falar em julgamento fora do pedido (extra petita), porque
nulidades absolutas podem ser conhecidas de ofício pelo julgador. Por outro lado,
ela destacou que a caracterização da doação universal de que trata o referido artigo
exige a demonstração de que o doador não tinha condições de garantir a própria sub-
sistência, o que não ocorreu no caso. Portanto, a situação nesse processo, segundo a
relatora, não é de julgamento extra petita nem de doação universal, pois não se pode
presumir que a após a doação o pai tenha assumido estado de miserabilidade. A juris-
prudência do STJ estabelece que a doação a descendente que exceder a parte da qual
o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento é qualificada
como inoficiosa – portanto, nula. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de
Justiça)
ARTIGOS DOUTRINÁRIOS
• Responsabilidade Civil Extracontratual do Condomínio Edilício – A
Responsabilidade por Furto ou Roubo e por Danos Causados a Ter-
ceiros
Denis Donoso
Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET
Disponíveis em: online.sintese.com
Locação
EM POUCAS PALAVRAS
• Apelação cível – Ação indenizatória – Con-
trato de locação – Despesas para o restabele-
Assunto cimento do imóvel diante das modificações
Posse realizadas pelos locatários – Sentença que reco-
nheceu a ilegitimidade passiva dos réus – Insur-
• Liminar Possessória nos Contratos de Aliena- gência do autor (TJSC)..............................1453, 200
ção Fiduciária de Imóveis (Denis Donoso)..........234
Posse
Autor • Civil e processual civil – Ação de reintegração
de posse – Cerceamento do direito de produ-
Denis Donoso ção de provas – Preliminar rejeitada – Alega-
• Liminar Possessória nos Contratos de Aliena- ção de propriedade decorrente da qualidade
ção Fiduciária de Imóveis...................................234 de beneficiário de programa habitacional –
Descabimento – Exercício da posse – Inocor-
rência – Improcedência do pedido – Sentença
mantida (TJDFT)........................................1448, 158
ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA
Solo
Condomínio
• Apelação cível – Ação civil pública – Alteração
• Direito civil – Cotas condominiais – Obrigação de zoneamento – Parcelamento e ocupação do
propter rem – Responsabilidade do proprietá- solo urbano – Alteração que não ofende aos
rio – Ressarcimento – Cabimento – Correção princípios da Administração Pública – Aprova-
monetária (TRF 2ª R.)................................1447, 148 ção pelo Conselho Municipal de Planejamento
RDI Nº 20 – Mar-Abr/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO.......................................................................................................... 247
Urbano – Ausência de ofensa aos princípios da Desapropriação
Administração Pública (TJPR)....................1450, 179
• Desapropriação – ação de indenização –loca-
Usucapião ção – fundo de comércio – imissão provisória
.................................................................1467, 214
• Apelação cível – Ações de usucapião extraor-
dinária e de reintegração de posse – Aplicável • Desapropriação – interesse social – reforma
ao caso o prazo do art. 550 do Código Civil agrária – oferta inicial – inferior – indenização –
de 1916 (atual art. 1.238 do CC/2002), para arbitramento.............................................1468, 214
aquisição do domínio (TJRS).....................1452, 188
• Desapropriação – reforma agrária – justa indeni-
zação........................................................1469, 214
Ementário
• Desapropriação por interesse público – valor inde-
Ação de nunciação de obra nova nizatório – contemporaneidade................1470, 215