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Revista Magister de
Direito Penal e Processual Penal
Ano XVI – Nº 95
Abr-Maio 2020
Classificação Qualis/Capes: B1
Editores
Fábio Paixão
Walter Diab
Coordenador
Aury Lopes Júnior
Conselho Científico
Fernando da Costa Tourinho Filho – Luiz Flávio Borges D’Urso
Elias Mattar Assad – Marco Antonio Marques da Silva
Conselho Editorial
Adeildo Nunes – Amadeu de Almeida Weinmann
Carlos Ernani Constantino – Celso de Magalhães Pinto – César Barros Leal
Cezar Roberto Bitencourt – Élcio Pinheiro de Castro – Fernando Capez
Fernando de Almeida Pedroso – Haroldo Caetano da Silva
José Carlos Teixeira Giorgis – Marcelo Roberto Ribeiro
Maurício Kuehne – Renato Marcão – René Ariel Dotti – Roberto Victor Pereira Ribeiro
Rômulo de Andrade Moreira – Sergio Demoro Hamilton
Umberto Luiz Borges D’Urso
A responsabilidade quanto aos conceitos emitidos nos artigos publicados é de seus autores.
As íntegras dos acórdãos aqui publicadas correspondem aos seus originais, obtidos junto ao
órgão competente do respectivo Tribunal.
A editoração eletrônica foi realizada pela LexMagister, para uma tiragem de 3.100 exemplares.
CDU 343(05)
LexMagister
Diretor Executivo: Fábio Paixão
Jurisprudência
1. Supremo Tribunal Federal – Pena. Tóxicos. Tráfico. Incidência da Causa
Especial de Redução Prevista no § 4º do Art. 33 da Lei nº 11.343/06.
Possibilidade
Rel. Min. Ricardo Lewandowski............................................................................ 104
2. Superior Tribunal de Justiça – Poluição Ambiental Qualificada. Arts. 54,
§§ 2º, I, II, III e IV, e 3º, e 56, § 1º, I e II, c/c o Art. 58, I, da Lei nº 9.605/98.
Não Cessação da Atividade. Impossibilidade de Aferição da Prescrição
Rel. Min. Joel Ilan Paciornik.................................................................................. 110
3. Superior Tribunal de Justiça – Pena. Estelionato. Dosimetria. Registros
Criminais Anteriores Nominados de Conduta Social. Atecnia. Maus
Antecedentes. Consideração Desfavorável das Consequências do Crime.
Falta de Fundamentação. Decote da Vetorial
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz............................................................................. 121
4. Superior Tribunal de Justiça – Arma Branca. Contravenção Penal
Prevista no Art. 19 do Decreto-Lei nº 3.688/1941. Alegação de
Atipicidade da Conduta. Não Ocorrência
Rel. Min. Ribeiro Dantas....................................................................................... 129
5. Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Sonegação Fiscal. Quitação
Integral do Débito Tributário. Realização Após o Recebimento da
Denúncia. Extinção da Punibilidade. Admissibilidade
Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis.............................................................................. 133
6. Tribunal de Justiça do Espírito Santo – Unificação de Penas. Detenção e
Reclusão, com Votação Não Unânime. O Art. 111 da LEP Expressamente
Autoriza a Unificação para Fins de Execução da Pena
Relª Desª Subst. Rozenea Martins de Oliveira......................................................... 144
7. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – Prisão Preventiva. Violência
Doméstica. Medidas Protetivas. Descumprimento. Lesão Corporal. Não
Realização de Audiência, na Presença das Partes, com Vistas a Analisar
Alternativa Diversa da Prisão. Liberdade Concedida
Relª Desª Viviane de Faria Miranda....................................................................... 147
8. Tribunal de Justiça de São Paulo – Prisão Preventiva. Decretação de
Ofício. Revogação da Medida. Possibilidade. Lei nº 13.964/2019 que
Veda a Decretação de Ofício da Prisão
Rel. Des. Luis Augusto de Sampaio Arruda............................................................. 159
9. Divergência Jurisprudencial............................................................................... 162
10. Ementário............................................................................................................ 163
Sinopse Legislativa. .............................................................................................. 190
Destaques dos Volumes Anteriores.................................................................... 191
Índice Alfabético-Remissivo................................................................................ 192
Doutrina
Introdução
O presente artigo analisa, de forma crítica, alguns aspectos relevantes do
acordo de não persecução penal, introduzido pela recente Lei nº 13.964, de 24
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
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1 “Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática
de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público
poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do
crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
II – renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou
proveito do crime;
III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada
ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha,
preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo
delito; ou
V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e
compatível com a infração penal imputada.
§ 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas
de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto.
§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:
I – se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;
II – se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual,
reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;
III – ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não
persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e
IV – nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões
da condição de sexo feminino, em favor do agressor.
§ 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério
Público, pelo investigado e por seu defensor.
§ 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar
a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade.
§ 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução
penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância
do investigado e seu defensor.
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público
para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal.
§ 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada
a adequação a que se refere o § 5º deste artigo.
§ 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de
complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia.
§ 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e de seu descumprimento.
§ 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público
deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia.
§ 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo
Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo.
§ 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes
criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º deste artigo.
§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de puni-
bilidade.
§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado
poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.”
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1 Definição
O acordo de não persecução penal pode ser definido como modalidade
de negócio jurídico processual entre o Ministério Público e o investigado,
com vistas a evitar o oferecimento da denúncia e a instauração da ação penal.
Trata-se, em última análise, de medida de desencarceramento e de economia
processual, porque objetiva evitar a imposição de pena privativa de liberdade,
mediante sua substituição pelo cumprimento de “condições” semelhantes às
penas restritivas de direitos, previstas no art. 43 do Código Penal.
Em relação à natureza jurídica das condições impostas ao investigado, da
ótica da dogmática, tais condições, apesar de suas semelhanças com as penas
restritivas de direitos, previstas no art. 43 do Código Penal, não podem ter
natureza de sanção penal, em razão do consagrado princípio da nulla poena sine
judicio. Por outro lado, do aspecto criminológico, o acordo possui natureza penal,
dada a restrição de direitos imposta, pois a prestação de serviços comunitários
e a prestação pecuniária possuem caráter penal. Nesse sentido, segundo o
pensamento criminológico de Zaffaroni, toda pena reflete um sofrimento
ou restrições de direitos impostos pelo aparato estatal, desprovidos de função
positiva ou reparadora2, ainda que aplicados na esfera civil ou administrativa.
Segundo o referido acordo, presentes os requisitos objetivos e subjetivos
estabelecidos em lei, o investigado não será submetido a processo penal com
vistas à aplicação e ao cumprimento de pena privativa de liberdade, mas tão
somente à execução de condições previstas na nova legislação, entre as quais, a
prestação de serviços à comunidade e a prestação pecuniária.
O acordo de não persecução penal distingue-se de outros acordos, como o
acordo de colaboração premiada e o acordo de leniência, pois enquanto os últimos
exigem intensa colaboração probatória, naquele não há o compromisso do
investigado com a cooperação probatória.
2 Pressupostos Objetivos
O primeiro pressuposto objetivo previsto na legislação está relacionado à
pena mínima fixada para o delito. Cabe o acordo de não persecução penal nas in-
frações penais (crimes e contravenções penais), com penas mínimas inferiores
2 JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI, Patricia. Manual de direito penal: parte geral. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
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3 MESSUTI, Ana. O tempo como pena. Trad. Antonio Dix Silva e Maria Clara Veronesi de Toledo. São Paulo: RT, 2003.
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4 FULLER, Paulo Henrique. Alterações ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI,
Patricia; FULLER, Paulo Henrique; PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por artigo. São Paulo: Saraiva,
2020. p. 159.
5 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 465.
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6 A confissão, quando feita fora do interrogatório, será tomada por termo nos autos, observado o disposto no art. 195 do CPP.
7 Diante da garantia constitucional ao silêncio ao arguido, ninguém pode ser constrangido a confessar a prática de uma
infração penal em um procedimento investigatório ou no processo penal. Por esse motivo, a confissão do investigado
não deveria figurar entre as condições do acordo de não persecução penal. A ausência de confissão, na espécie, não
poderia lhe prejudicar e impedir a celebração do acordo, sob pena de se violar a garantia constitucional (art. 5º,
LXIII, da CF). De fato, em inúmeras situações fáticas concretas, o investigado iria confessar por temor de ver-se
processado, razão pela qual a exigência dessa confissão na legislação reflete implicitamente um constrangimento
inconstitucional. Para Paulo Henrique Fuller, essa exigência tem caráter inquisitorial, ao perseguir uma confissão do
investigado no âmbito de uma solução que almeja a não persecução penal (FULLER, Paulo Henrique. Alterações
ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI, Patricia; FULLER, Paulo Henrique;
PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por artigo. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 134).
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3 Pressupostos Subjetivos
Para fazer jus ao acordo, o investigado não pode ser reincidente, ou
seja, não pode ter sofrido condenação criminal com trânsito em julgado em
período igual ou inferior a cinco anos. O art. 63 do Código Penal considera
reincidente a pessoa que comete novo crime, depois de transitar em julgado
a sentença que o tenha condenado por crime anterior. Além disso, não pode
haver suporte probatório apto a demonstrar ter o investigado praticado conduta
criminosa reiterada – repetição frequente de infração penal –, ser criminoso habi-
tual ou profissional. O crime habitual é uno, sendo a habitualidade elemento
integrante do tipo penal. Há o crime profissional quando o agente comete
crime habitual com a intenção de lucro, como ocorre no rufianismo9. Já na
8 FULLER, Paulo Henrique. Alterações ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI,
Patricia; FULLER, Paulo Henrique; PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por artigo. São Paulo: Saraiva,
2020. p. 169.
9 JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 1. p. 254.
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4 Cláusulas Essenciais
O acordo de não persecução penal deve conter algumas cláusulas con-
sideradas essenciais. São elas:
– A obrigação de reparar o dano, o qual deverá ser estimado e o investigado
deverá prometer repará-lo. A reparação, quando possível, poderá ocorrer in
natura, pela restituição do bem à vítima. A vítima, nessa situação, não interfere
no acordo de não persecução penal, na medida em que a lei se refere à manifestação
volitiva do investigado, de seu advogado e do membro do Ministério Público.
– A renúncia da titularidade de bens e direitos considerados instrumentos,
produtos ou proveitos do crime, com a consequente transferência da pro-
priedade para o ente público correspondente: União ou Estados-membros.
– A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas indicadas pelo
juízo da execução, por período correspondente à pena mínima cominada ao
delito, diminuída de um a dois terços.
– A obrigação de pagar prestação pecuniária à entidade pública ou de interesse
social, indicada pelo Juízo da Execução, com objetivos sociais similares aos
bens jurídicos protegidos pelo tipo penal violado;
10 JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 1. p. 254.
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5 Procedimento
Para sua validade, o acordo deve ser celebrado por escrito e assinado
pelo investigado, seu advogado e membro do Ministério Público. Depois de
celebrado, deve ser submetido ao Poder Judiciário para homologação em au-
diência designada para esse ato. O magistrado, antes de homologar o acordo,
é obrigado a realizar audiência para verificar a voluntariedade do acordo e controlar
a abusividade das cláusulas nele propostas. Assim, o magistrado poderá não
homologar o acordo se detectar ausência de voluntariedade na sua celebração
ou se constatar a presença de cláusulas abusivas, vexatórias, constrangedoras
ou desproporcionais, caso em que devolverá os autos ao Ministério Público
para que revise e reveja os termos do acordo proposto.
A sentença que homologa o acordo de não persecução penal seria ou uma
sentença homologatória de acordo constitutiva de um título executivo judicial
ou uma sentença de natureza penal, por resultar na imposição de sanções
penais, ainda que distintas da pena privativa de liberdade.
Uma vez homologado o acordo, os autos serão devolvidos ao Ministério
Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal. Para
Paulo Henrique Fuller, “a competência funcional do juiz da execução penal
reforça a natureza de pena das denominadas ‘condições’ do acordo de não
persecução penal (...)”11. Como conclui o penalista, tal reconhecimento tem
importância, pois, em caso de descumprimento das condições impostas, se
11 FULLER, Paulo Henrique. Alterações ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI,
Patricia; FULLER, Paulo Henrique; PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por artigo. São Paulo: Saraiva,
2020. p. 166.
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14
12 FULLER, Paulo Henrique. Alterações ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI,
Patricia; FULLER, Paulo Henrique; PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por artigo. São Paulo: Saraiva,
2020.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 15
pois o valor probatório da confissão seria nulo, pelo fato de não ter sido obtida
em procedimento judicial. Entretanto, se o confitente quiser beneficiar-se
perante outras esferas de responsabilização deverá, se for o caso, solicitar a
participação de outros órgãos e celebrar com eles compromissos de não perse-
cução. A título de exemplo, a Lei de Improbidade Administrativa, Lei nº 8.429,
de 2 de junho de 1992, possibilitou no art. 17, § 1º, a celebração de acordo de
não persecução cível13, embora registre-se que os vetos efetuados na citada
lei deixaram o compromisso de não persecução sem qualquer disciplina legal14.
O termo de acordo de não persecução penal produz, em algumas situações,
efeitos em outras esferas de responsabilização. A esse respeito, o valor pago a
título de reparação de dano deve ser abatido, caso haja a condenação a reparar
o dano em outras instâncias. Isso ocorre, por exemplo, nos crimes contra a
Administração Pública praticados por agentes públicos em que a reparação
de dano pode ser fixada também em ação de improbidade administrativa.
A vítima, como regra, não participa do acordo de não persecução. Por conta
disso, em relação a ela, o acordo de não persecução configura uma modalidade
de estipulação em favor de terceiro, que a autoriza a executar o valor fixado
no acordo para reparação do dano, sem, no entanto, perder a pretensão de
solicitar, por meio de ação própria, indenização suplementar.
Conclusão
Diante do exposto, constatamos, de um lado, que o acordo de não perse-
cução penal reforça o princípio constitucional implícito de intervenção mínima
em matéria penal, ao propiciar o afastamento da pena privativa de liberdade,
13 “§ 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta
Lei.”
14 Transcrevemos o artigo vetado que disciplinava o compromisso de não persecução cível nas ações de improbidade
administrativa:
“Art. 17-A. O Ministério Público poderá, conforme as circunstâncias do caso concreto, celebrar acordo de não
persecução cível, desde que, ao menos, advenham os seguintes resultados:
I – o integral ressarcimento do dano;
II – a reversão, à pessoa jurídica lesada, da vantagem indevida obtida, ainda que oriunda de agentes privados;
III – o pagamento de multa de até 20% (vinte por cento) do valor do dano ou da vantagem auferida, atendendo a
situação econômica do agente.
§ 1º Em qualquer caso, a celebração do acordo levará em conta a personalidade do agente, a natureza, as circunstân-
cias, a gravidade e a repercussão social do ato de improbidade, bem como as vantagens, para o interesse público, na
rápida solução do caso.
§ 2º O acordo também poderá ser celebrado no curso de ação de improbidade.
§ 3º As negociações para a celebração do acordo ocorrerão entre o Ministério Público e o investigado ou demandado
e o seu defensor.
§ 4º O acordo celebrado pelo órgão do Ministério Público com atribuição, no plano judicial ou extrajudicial, deve
ser objeto de aprovação, no prazo de até 60 (sessenta) dias, pelo órgão competente para apreciar as promoções de
arquivamento do inquérito civil.
§ 5º Cumprido o disposto no § 4º deste artigo, o acordo será encaminhado ao juízo competente para fins de homo-
logação.”
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 17
TITLE: Criminal non-persecution agreement and its repercussions in the administrative scope.
ABSTRACT: We have analyzed in this article the most important aspects of the non-criminal prosecution
agreement, of the new Law no. 13,964, of December 24, 2019, which regulated this institute in article
28-A of the Criminal Procedure Code. In this study, the definition and legal nature of this agreement are
assessed, as well as the conditions required in it for the investigated person. The objective and subjective
assumptions of this agreement are also studied, with an in-depth analysis of its essential clauses. The work
goes on to verify the criminal and extrapenal effects of the agreement, with emphasis on its consequences
in the administrative scope.
Referências
FULLER, Paulo Henrique. Alterações ao Código de Processo Penal. In: JUNQUEIRA, Gustavo; VAN-
ZOLINI, Patricia; FULLER, Paulo Henrique; PARDAL, Rodrigo. Lei Anticrime comentada: artigo por
artigo. São Paulo: Saraiva, 2020.
JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 1.
JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI, Patricia. Manual de direito penal: parte geral. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 2019.
MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 3. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2016.
MESSUTI, Ana. O tempo como pena. Trad. Antonio Dix Silva e Maria Clara Veronesi de Toledo. São Paulo:
RT, 2003.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
15 Sobre o assunto, DUEK MARQUES, Oswaldo Henrique. Fundamentos da Pena. 3. ed. São Paulo: WMF Martins
Fontes, 2016.
Doutrina
Victor Labate
Advogado; ex-Aluno Pesquisador na Erasmus Universiteit
Rotterdam – Holanda (EUR).
Eloisa Yang
Advogada; Mestranda em Direito Penal na USP.
1 Conforme notam Machado e Kehdi, a proteção do sigilo de dados informatizados, em nível infraconstitucional,
encontrava-se respaldada pelo singelo inciso VIII da Lei de Informática (Lei nº 7.232/84), o qual erige como um dos
princípios orientadores da Política Nacional de Informática o “estabelecimento de mecanismos e instrumentos legais
e técnicos para a proteção do sigilo dos dados armazenados, processados e veiculados, do interesse da privacidade
e de segurança das pessoas físicas e jurídicas, privadas e pública” (MACHADO, André Augusto Mendes; KEHDI,
Andre Pires de Andrade. Sigilo das comunicações e de dados. In: FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA,
José Raul Gavião de; MORAES, Maurício Zanoide de [Coord.]. Sigilo no processo penal: eficiência e garantismo. São
Paulo: RT, 2008. p. 261).
2 “Art. 4º Esta Lei não se aplica ao tratamento de dados pessoais: (...) III – realizado para fins exclusivos de: a) segurança
pública; b) defesa nacional; c) segurança do Estado; ou d) atividades de investigação e repressão de infrações penais;
(...)”
3 “Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos: I – o respeito à privacidade; II – a
autodeterminação informativa; III – a liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião; IV – a
inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem; V – o desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação;
VI – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e VII – os direitos humanos, o livre desenvol-
vimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais.”
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4 A proposta de redação do tipo penal foi feita nos seguintes termos: “Art. 161. Violar, mediante processo técnico, o
direito à intimidade da vida privada ou o direito ao resguardo das palavras ou discursos que não forem pronunciados
publicamente” (COSTA Jr., Paulo José. Comentários ao Código Penal: parte especial. 2. ed. atual. e ampl. São Paulo:
Saraiva, 1987. v. 2. p. 127).
5 Em cenários como o acima referido, Paulo José da Costa Jr. vislumbrava duas formas de violação à intimidade alheia:
a primeira consistiria na violação à intimidade por intrusão na esfera de resguardo do titular, isto é, mediante trespasse
de limites físicos, gravações clandestinas, etc., em casos que o titular sequer chega a conceder suas informações de
forma lícita a terceiro; a segunda, entretanto, se configura quando o titular do direito concede a outrem informações
e segredos próprios, mas não autoriza sua divulgação ou, autorizando, esta vem a ocorrer de forma contrária ao que
estabelecido pelo titular do direito (idem, p. 144-145).
6 TOMÉ, Herminia Campuzano. Vida privada y datos personales. Madrid: Tecnos, 2000. p. 66-67.
7 TENE, Omer; POLONETSKY, Jules. Privacy in the age of big data: a time for big decisions. Stan. L. Rev. Online, v.
64, n. 63, 2011, p. 64. Nesse artigo, por exemplo, os autores atribuem à análise de big data a possibilidade de vinculação
do uso do remédio Vioxx a 27.000 mortes de parada cardíaca entre 1999 e 2003.
8 RODRÍGUEZ, Víctor Gabriel. Tutela penal da intimidade: perspectivas da atuação penal na sociedade da informação.
São Paulo: Atlas, 2008. p. 21.
9 MASIELLO, Betsy; WHITTEN, Alma. Engineering privacy in an age of information abundance. 2010 AAAI Spring
Symposium Series. 2010. p. 122.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 21
10 Nesse caso, S. and Marper v. The United Kingdom, a Corte entendeu que não seria lícita a guarda de material genético e
cópia das digitais dos autores da demanda que, mesmo após a absolvição dos seus titulares pelos delitos que ensejaram
a colheita em um primeiro momento, continuavam armazenados em bancos de dados estatais para eventual uso em
investigação futura. O entendimento da Corte foi respaldado também pelo fato de que referido banco de dados se
encontrava à disposição de 56 agências não policiais, incluindo órgãos do Governo e entidades privadas, portanto
passível de colheita e tratamento impróprios. No ponto nº 103 da decisão, especificamente, asseverou-se a proteção
de dados como de fundamental importância ao gozo do direito por uma “vida privada e familiar”.
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b) Interceptação Telefônica
A interceptação telefônica é a captação de comunicação telefônica rea-
lizada por terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores12. É prevista no
art. 5º, XII, da Constituição Federal, sendo atualmente regulamentada pela
Lei nº 9.296/96 – cujas normas também se aplicam à interceptação do fluxo
de comunicações em sistemas de informática e telemática, por força do seu
art. 1º, parágrafo único.
O debate acerca dos limites entre o direito à vida privada e a implementa-
ção de métodos de investigação já ganhou relevo internacional em julgamento
realizado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, no denominado
caso Escher, em que o Brasil foi condenado como decorrência de sucessivas
interceptações de pessoas ligadas a movimentos sociais ocorridas no decorrer
de 49 dias por agentes da Polícia Militar de Paraná, após decisão proferida sem
motivação e sem conhecimento do Ministério Público13.
não se confunde com a definição de dados que trata a LGPD, que é relacionada
à identificação pessoal. O que se tutela por meio da Lei de Interceptação é
o sigilo na comunicação dos dados, não os dados em si mesmos, conforme
entendimento do Supremo Tribunal Federal (RE 418.416/SC, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence).
Com base nessa mesma interpretação, entende a jurisprudência que o
sigilo dos dados mantidos em empresa de telefonia (dados cadastrais, registros
telefônicos) não se confunde com a comunicação em si, de forma que não
se exigem os requisitos constantes do art. 2º da Lei nº 9.296/96 para a quebra
desse sigilo (STJ, HC 237.006, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura).
Tem-se admitido, ainda, que esses dados podem, inclusive, ser obtidos por
requisição direta da autoridade policial, sem necessidade de autorização judicial
(STF, HC 124.322, Rel. Min. Roberto Barroso), não se aplicando as cautelas
da LGPD para essas situações.
operador, uma vez que sujeitos às obrigações atinentes ao sigilo de dados nos
processos de tratamento.
Insta ressaltar que no ordenamento penal brasileiro, a única hipótese
de responsabilização penal das pessoas jurídicas socorre nos casos de crimes
ambientais. Na hipótese de os agentes de tratamento serem pessoas jurídi-
cas, no entanto, nada impede que o titular pessoa física seja responsabilizado
criminalmente quando cabível.
Ainda em relação ao art. 153, § 1º-A, a LGPD também traz as hipóteses
que justificam o referido tratamento de dados em seu art. 7º – que podem ser utili-
zadas como parâmetro para a interpretação da justa causa14 prevista no tipo penal.
Por outro lado, no art. 154 (violação de segredo profissional), o que se
pune é a conduta de quem revela, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão
de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem.
Aqui se aplica a mesma análise realizada acima sobre a interpretação do
que pode se entender por revelar, justa causa e segredo. O elemento “em razão
da função” faz com que este seja crime próprio, de forma que os agentes de
tratamento podem ser inseridos como autores do crime. Ainda, a LGPD traz
obrigações de segurança e boas práticas no tratamento de dados em seu Ca-
pítulo VII (arts. 46 e ss.), especialmente no que se refere à proteção dos dados
de acessos de terceiros não autorizados. Assim, descumpridos tais deveres de
proteção que resvalem em lesão ao bem jurídico tutelado, é possível aferir
conduta omissiva de relevo penal.
Note-se que o simples descumprimento, entretanto, não é suficiente
para a atribuição automática de responsabilidade penal, de forma que será
necessário que se demonstre que o descumprimento das obrigações de se-
gurança e boas práticas estipuladas na lei causaram concretamente perigo de
lesão à intimidade.
Por fim, o art. 154-A (invasão de dispositivo informático), previu a
modalidade de crime em que se pune a invasão de
14 Conforme evidencia Miguel Reale Jr., a doutrina tem historicamente encontrado dificuldades em delimitar o con-
teúdo do termo “justa causa”, bastante para obstar o aperfeiçoamento do tipo penal, de forma que tal análise, muitas
vezes, dependerá das circunstâncias do caso concreto (REALE Jr., Miguel. Dos crimes contra a liberdade individual.
In: REALE Jr., Miguel [Coord.]. Direito penal: jurisprudência em debate. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 238).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
26
15 Ao tratar sobre a necessidade de equiparação normativa-estrutural entre as condutas omissivas subsumidas ao tipo,
Ana Oliveira identifica critérios que devem ser somados para essa aferição: “o significado político-criminal das
omissões (a existência ou não de um dever de solidariedade, a extensão dessa solidariedade exigida pelo Estado,
etc.), a existência de uma responsabilidade qualificada pela posição de garante, e a escala de valores sobre a gravidade
e reprovabilidade de cada omissão”. Dessa forma, não havendo tal equiparação, não há que se falar em adequação
típica da conduta omissiva (OLIVEIRA, Ana Carolina Carlos de. A responsabilidade por omissão dos sujeitos obrigados pela
lavagem de dinheiro: o dever de informação. Tese (Tese em Direito) – USP. São Paulo, 2015. p. 158.
16 Talvez por essa razão, inclusive, Bitencourt afirme que tal crime não existe na modalidade omissiva: BITENCOURT,
Cezar Roberto. Código Penal comentado. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 699.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 27
3 Conclusões
Em que pese a previsão do art. 4º, III, alínea d, da LGPD, no sentido
do disposto na lei não se aplicar ao tratamento de dados pessoais realizados
para fins exclusivos de investigação ou repressão criminal, pode-se observar
que existem diversos pontos de convergência entre a legislação penal e a Lei
Geral de Proteção de Dados, de forma que se justifica uma análise dos seus
impactos nessa seara.
Nesse sentido, tendo a lei criado as figuras dos agentes de tratamento,
mostra especial relevância o debate acerca da responsabilização penal por omissão
desses encarregados, em face do dever de garantidor exercido pelos mesmos.
4 Síntese Conclusiva
Do presente artigo podem ser extraídas as seguintes conclusões:
1. A privatividade ou a intimidade é um bem jurídico tutelado por
diversas leis penais convergindo nesse aspecto com o objetivo da LGPD, que
procurou trazer maior segurança no tratamento de dados pessoais.
2. Na seara penal, são exemplos de crimes que têm como bem jurídico
predominante a intimidade, os crimes de violação de residência, correspon-
dência e divulgação de segredo, todos previstos no Código Penal de 1940.
Também podem ser citados o crime do art. 10 da Lei nº 9.296/96, Lei de In-
terceptação Telefônica e, mais recentemente, o crime previsto no art. 154-A,
acrescentado ao Código Penal pela Lei nº 12.737/2012, que pune a invasão
a dispositivo informático para obtenção, alteração ou destruição de dados.
3. A previsão do art. 4º, inciso III, alínea d, da Lei nº 13.709/2019, Lei
de Proteção de Dados (LGPD), que, expressamente, dispõe sobre a não apli-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
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TITLE: Criminal aspects of the General Data Protection Law and the criminal protection of personal data.
ABSTRACT: This article aims at analyzing the possible consequences of the new General Data Protection
Law in the context of criminal legislation from the perspective of their convergence points, particularly
the protection of the essential legal interest that is the intimacy.
KEYWORDS: General Data Protection Law. Protection of Intimacy. Criminal Protection of Intimacy.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 29
5 Bibliografia
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Introdução
O objetivo do presente artigo é tratar, exclusivamente, das análises jurídica
e acadêmica dos possíveis delitos correlatos à Covid-19, tendo sido ilustradas
diversas hipóteses para fins de reflexão e contribuição sobre o tema.
O Poder Público tem adotado medidas para prevenção e contenção do
novo coronavírus, tendo sido editada a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020,
a qual foi regulamentada pela Portaria nº 356, de 11 de março de 2020, do
Ministério da Saúde.
O art. 3º da Lei nº 13.979/2020 introduziu um rol de medidas a serem
implementadas para o enfrentamento da situação emergencial de saúde pú-
blica, dentre as quais destacamos o isolamento e a quarentena, tendo a legislação
acima referida distinguido ambas as hipóteses na seguinte forma:
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 31
2 Crime de Epidemia
Em relação ao crime de epidemia (art. 267 do Código Penal), este é
praticado quando determinada pessoa, ciente de estar contaminada pela Co-
vid-19, promover deliberadamente a transmissão da doença a outros.
Oportuno registrar que a mens legis (“espírito da lei”) abrange as situações
de pandemia, porquanto não haveria lógica em conferir proteção à propagação
de uma epidemia e deixar sem tutela penal a propagação do indigitado vírus
(muito mais amplo e desastroso para a incolumidade pública), devendo-se
conferir uma interpretação extensiva, ainda que se trate de norma penal incri-
minadora, porquanto a aludida hipótese apenas é vedada nas situações onde
se configura um desvirtuamento do sentido da lei.
Nesse sentido, colaciona-se a seguinte ementa de decisão do Supremo
Tribunal Federal (STF):
Pena – reclusão, de dez a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de
25.7.1990)
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 35
“Art. 131. Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que
está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:
5 Crime de Desobediência
Em relação à infração criminal de desobediência (art. 330), a lei pode
ser aplicada se, por exemplo, um agente público determinar que seja disse-
minada uma aglomeração em determinado local com a finalidade de evitar a
disseminação do vírus (reunião de inúmeras pessoas em local público), e o
indivíduo se recusar a cumprir a ordem legal, sem motivo justificado, atuando
de forma consciente e voluntária (dolo genérico).
O bem jurídico protegido é a Administração Pública, tutelando-se a sua
autoridade e prestígio, sendo ainda delito comum, isto é, pode ser praticado
por qualquer pessoa.
Ademais, o tipo penal não se configura quando houver um simples
pedido ou solicitação do funcionário, mas, sim, na hipótese de uma ordem
legal e individualizada de funcionário público competente, dirigindo-se àquele
que tem o dever jurídico de obedecê-la.
Eis o teor do disposto no art. 330 do Código Penal:
§ 2º Se o crime é culposo;
Com efeito, o agente que fizer afirmação falsa sobre dados essenciais
do álcool em gel poderá responder pelo aludido delito previsto no Código de
Defesa do Consumidor (CDC).
Cite-se o exemplo do anúncio da venda de álcool em gel a 70% (setenta
por cento), embora o produto efetivamente contivesse apenas 46% (quarenta
e seis por cento), ofertando-se mercadoria com característica e conteúdo falsos
em detrimento da saúde e boa-fé dos consumidores.
O fato (objeto de tutela do direito penal) consubstancia-se mediante
conduta dolosa, isto é, a vontade livre e consciente do agente de fazer afirmação
falsa ou enganosa de produto ou serviço, omitindo informação relevante ou
patrocinando oferta de mercadorias com dados inverídicos, sem que haja a
necessidade da respectiva aquisição do bem ou produto por parte do consumidor.
De outra parte, se houver indução do consumidor a erro (instigação, inspi-
ração de ideias, etc.) ou a efetiva aquisição do produto com características
não correspondentes à sua natureza ou qualidade, o agente poderá responder
pelo crime contra as relações de consumo previsto do art. 7º, VII, da Lei nº
8.137/90, com penas de detenção de 2 (dois) a 5 (cinco) anos ou multa, conforme
a seguir descrito: “induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou
afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço,
utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publi-
citária” (grifos acrescidos).
§ 1º-B – Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no
§ 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições: (Incluído
pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)
Modalidade culposa
§ 2º Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Redação dada pela Lei
nº 9.677, de 2.7.1998)”
Conclusão
As infrações penais relacionadas ao descumprimento das respectivas
normas são de ação penal pública incondicionada, ou seja, independem de provo-
cação da vítima, podendo ser instaurada a investigação por parte do Delegado
de Polícia ou Membro do Ministério Público, assim como lavrado termo
circunstanciado ex officio (de ofício) pela autoridade policial e, posteriormen-
te, submetido à apreciação do titular da ação penal (Ministério Público) para
fins de propositura de transação penal ou denúncia, caso seja comprovada a
materialidade e autoria do fato.
Enfim, diante da proliferação da aludida pandemia, é necessário que toda
a sociedade se conscientize e auxilie na contenção e minimização dos efeitos
negativos da propagação da Covid-19, cumprindo as determinações do Poder
Público, e atentando, sempre que possível, para a observância das recomendações e
orientações emanadas dos órgãos públicos e dos profissionais da área de saúde,
no intuito de salvaguardar os direitos à vida e à saúde da população.
ABSTRACT: This article deals exclusively with legal and academic analyses of possible crimes connected
with COVID-19, with several hypotheses illustrated for the purpose of reflection and contribution on
the topic
Referências
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com/curiosidades-biologia/quarentena.htm>. Acesso em: 21 mar. 2020.
1 Introdução
O presente ensaio almeja, de modo não exauriente, cuidar do acaso e de
suas variadas influências no Direito Penal e no Processo. Cuida-se de assinalar
uma nova chave de reflexão para eventos corriqueiros, em perspectiva, muitas
vezes, olvidada pela dogmática. Com efeito, os eventos fortuitos, aleatórios,
derivados da sorte ou azar, no fundo, apontam para os limites da condição
humana e para a impossibilidade de controle absoluto sobre a totalidade dos
processos causais. Daí, cumpriria potencializarmos indagações a propósito do
processo de imputação, e de suas consequências.
Certo: atualmente, estamos muito focados nas questões de eficiência,
e a eficiência dispensa a filosofia. Tornamo-nos pragmáticos, a liberdade é
barganhada, e o sucesso de nossas atitudes e ações convolou-se numa di-
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 45
2 A Filosofia do Acaso
À multiplicidade de efeitos do acaso, no Direito, corresponde, entre-
tanto, o seu olvido1. É verdade que a ocorrência de fatos para os quais não
1 Para uma visão ampla sobre as interferências do acaso em vários setores do Direito, cf. CERQUEIRA, Antonio
Augusto. O acaso no direito português. Lisboa: Tipografia Universal, 1916. passim.
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46
2 Sobre o tema, cf. VELOSO, José António. Sortes. In: Jornadas de Homenagem ao Professor Doutor Cavaleiro de Ferreira.
Separata da Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Lisboa, 1995. p. 87-90.
3 JIMÉNEZ, José. A vida como acaso. Trad. Manuela Agostinho. Lisboa: Passagens, 1997. p. 162-168.
4 ARISTÓTELES. The physics. Trad. Philip H. Wicksteed, M.A e Francis M. Cornford. London: William Heinemann;
Cambridge, Massachusets: Harvard University Press, 1970. p. 139-161; ARISTÓTELES. Física. Trad. Guillermo R.
de Echandía. Madrid: Editorial Gredos, 2008. p. 146-158; ARISTÓTELES. Física I-II. Trad. e comentários de Lucas
Angioni. Campinas: Editora Unicamp, 2010. p. 50-57.
5 BOHM, David. Causality & chance in modern physics. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1957. p. 1-2.
6 ARISTÓTELES. Ética a Eudemo. Trad. J. A. Amaral e Artur Morão. Lisboa: Tribuna da História, 2005. p. 110.
7 ARISTÓTELES. The physics..., p. 155.
8 A este respeito, cf. KENNY, Anthony. Nova história da filosofia ocidental: filosofia antiga. Trad. Maria de Fátima Carmo
e Pedro Galvão. Lisboa: Gradiva, 2010. v. 1. p. 207-210.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 47
16 COSTA, José de Faria. A criminalidade em um mundo globalizado: ou plaidoyer por um direito penal não-securitário.
In: Direito penal económico e europeu: textos doutrinários. Coimbra: Coimbra Editora, 2009. v. III. p. 121.
17 Segundo Angioni, apesar de Aristóteles sugerir a neutralidade do acaso, visto que resultante de uma conjunção
concomitante de séries causais entre si independentes, quando do acaso resulta algo que “é bom, dizemos que se
trata de um ‘bom acaso’ (tychê agathê), ou ‘boa sorte’, mas, quando é ruim, dizemos que se trata de um ‘mau acaso’
(tychê phaulê) ou ‘má sorte’ (...) o mesmo termo tychê exprime tanto acaso como sorte” (cf. ARISTÓTELES. Física
I-II. Trad. e comentários de Lucas Angioni. Campinas: Editora Unicamp, 2010. p. 310). Na tradução portuguesa da
Ética a Eudemo também constata-se a utilização de sorte, onde se poderia ler acaso. Nesse ponto, cf. ARISTÓTELES.
Ética a Eudemo. Trad. J. A. Amaral e Artur Morão. Lisboa: Tribuna da História, 2005.�����������������������������
p. 110-111. A tradução espa-
nhola da Física, utiliza-se de suerte, invariavelmente, como sinônimo de acaso. Basta-nos aludir ao início do Capítulo
4, do Livro II, em que assim se estabeleceu: “se suele decir también que son causas la suerte y la causalidad y que
muchas cosas son y acontecen debido a la suerte y a la causalidad” (ARISTÓTELES. Física. Trad. Guillermo R. de
Echandía. Madrid: Editorial Gredos, 2008. p. 146). Na tradução inglesa, frequentemente vê-se utilizado luck, para
efeito de tratamento do acaso. Para tanto, cf. ARISTÓTELES. The physics. Trad. Philip H. Wicksteed, M.A e Francis
M. Cornford. London: William Heinemann; Cambridge, Massachusets: Harvard University Press, 1970. p. 141 e
p. 147-148.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 49
18 Curioso é que, no chamado desvio de golpe (aberratio ictus), ou mesmo nos casos de erro sobre a pessoa, a interpo-
sição do acaso é minimizada, privilegiando a vontade e o plano do agente, visto que, em tais situações, a fortuidade
de atingir pessoa diversa da almejada, não obstante, resolve-se respondendo pelo crime como se o tivesse praticado
contra quem pretendia fazê-lo.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
50
4 Acaso e Culpabilidade
Uma outra dimensão do acaso surge, na filosofia, a partir das discussões
a respeito das influências da sorte, particularmente da designada sorte moral
(moral luck), as quais abalaram a intuição de que os indivíduos não poderiam
19 VILLAR, Mario. Suerte penal: un estudio de la interferencia de la suerte en los sistemas de imputación. Buenos Aires:
Didot, 2016. p. 210.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 51
suportar juízos morais por eventos que se devessem, em último termo, a fatores
situados fora de seu controle. Isso colocaria em xeque a própria idoneidade
de se estabelecerem esses juízos20.
Melhor dizendo, trata-se de observar que o impacto de circunstâncias
não controladas ou não controláveis pelo agente é uma vertente da “tensão que
sempre perdura na nossa condição humana (...) tensão entre a nossa vontade
de comandarmos e transformamos o mundo e a resistência que o mundo
oferece, vulnerabilizando-nos”21 –, sendo certo que o conteúdo do que somos
nós mesmos, nosso modo de ser, nossas características pessoais, em alguma
medida são também derivadas de uma espécie de sorte22.
Naquilo que se poderia denominar de sorte constitutiva reside a circuns-
tância de, por razões variadas, ostentarmos certas características pessoais de
modo completamente independente de nossas pretensões, seja no plano físico
como no ético. Não há mérito próprio no nascimento em determinada família,
na ostentação de certos atributos, bem assim numa pluralidade de pressupostos
e condições que contribuem decisivamente para sermos quem efetivamente somos.
Villar denomina, por sua vez, de sorte circunstancial aquela concernente
às alternativas e âmbitos nos quais o agente “se encuentra a sí mismo durante
su vida”, sabido seja que determinadas circunstâncias da vida do indivíduo
“lo someten a diferentes retos morales”23. Por isso, que boa parte dos efeitos
de nossos projetos em relação ao curso das coisas escapam ao controle da
intenção e entrelaçam-se com os desenvolvimentos do mundo exterior. É,
deveras, um sinal da finitude humana o abismo entre os efeitos pretendidos
pelo agente e a totalidade inumerável dos corolários da ação24.
Não se trata, aqui, cumpre esclarecer, de uma exaltação do determinismo,
e sim, ao contrário, da percepção de que será o sentido dado à ação a razão de
fundo para a afirmação e avaliação da culpabilidade. O determinismo, com
efeito, priva a vida de toda uma escala de expressões morais25, e sua aceitação
acabaria por ensejar uma drástica mudança no significado e uso de certos
20 Sobre isso, cf. WILLIAMS, Bernard. Moral luck. In: Philosophical Papers 1973-1980. Cambridge: Cambridge University
Press, 1981. p. 20-40. Ainda, com vastas referências, cf. ARAÚJO, Fernando. Sorte moral, carácter e tragédia pessoal.
In: OTERO, Paulo; ARAÚJO, Fernando; GAMA, João Taborda da (Org.). Estudos em memória do Prof. Doutor J. L.
Saldanha Sanches: direito público e europeu, finanças públicas, economia, filosofia, história, ensino, vária. Coimbra:
Coimbra Editora, 2011. v. I. p. 781-836.
21 ARAÚJO, Fernando. Sorte moral..., p. 783.
22 ARISTÓTELES. Retórica (1362a). Trad. Manuel Alexandre Júnior et al. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda,
2005. p. 112.
23 VILLAR, Mario. Suerte penal..., p. 27.
24 RICOEUR, Paul. O justo ou a essência do direito. Trad. Vasco Casimiro. Lisboa: Instituto Piaget, 1995. p. 58-59.
25 BERLIN, Isaiah. Sobre la libertad. Trad. Julio Bayon et al. Madrid: Alianza Editorial, 2009. p. 44.
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32 BURKHARDT, Björn. First-person understanding of action in criminal law. In: Voluntary action: brains, minds, and
sociality. Oxford: Oxford University Press, 2003. p. 238-262.
33 STRAWSON, Peter Frederick. Freedom and resentment. In: EKSTROM, Laura Waddel (Ed.). Agency and responsibility.
Oxford: Westwiew Press, 2001. p. 183-202.
34 Conforme Baccelliere, a “responsabilità morale tiene conto della vulnerabilità e fragilità dell´uomo, ragion per cui
essa è al contempo un presupposto e un compito”; essa fragilidade é a de “un essere responsabile: è il paradosso
della responsabilità umana, quello di essere potenzialmente illimitata ma in un essere chiaramente limitato” (BAC-
CELLIERE, Domenico. La responsabilità e la sua rilevanza etica: presentazione e attualità della proposta di Hans Jonas.
Roma: Aracne, 2007. p. 22).
35 BERLIN, Isaiah. Liberta-te da esperança e do medo. In: A busca do ideal: uma antologia de ensaios. Trad. Teresa
Curvelo. Lisboa: Bizâncio, 1998. p. 152-153.
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54
36 MENDES, Paulo Sousa. As proibições de prova no processo penal. In: PALMA, Maria Fernanda (Coord. Cient.).
Jornadas de direito processual penal e direitos fundamentais. Lisboa: Almedina, 2004. p. 133.
37 AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: Las prohibiciones probatorias.
Bogotá: Editorial Temis, 2009. p. 65.
38 CUNHA, Manuel Araújo Teixeira da. A ideia de acaso em filosofia. Dissertação para licenciatura em Ciências Históricas
e Filosóficas. Policopiado. Lisboa, 1961. p. 11-12.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 55
39 Sobre o encontro fortuito nas delações, ainda que sinteticamente, cf. VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de.
Colaboração premiada no processo penal. 2. ed. São Paulo: RT, 2018. p. 299-300.
40 Amplamente, sobre a fortuidade e nas interceptações, máxime em vista da legislação portuguesa, cf. FACCINI NETO,
Orlando. Prova ao acaso: os conhecimentos fortuitos nas escutas telefônicas, os limites do direito e as vanidades
normativas – Portugal e Brasil. Revista Lex, n. 58, 2012, p. 360-401.
41 FERNANDES, Antonio Scarance. A Lei de Interceptação Telefônica. In: PENTEADO, Jaques Camargo (Coord.).
Justiça penal: críticas e soluções. Provas ilícitas e reforma pontual. São Paulo: RT, 1997. v. 4. p. 48-70.
42 RANGEL, Paulo. Breves considerações sobre a Lei 9296/96. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT,
n. 26, abr./jun. 1999. p. 147.
43 Nesse sentido, cf. JESUS, Damásio Evangelista de. Interceptação de comunicações telefônicas: notas à Lei 9296/96.
Revista dos Tribunais, São Paulo, RT, v. 86, n. 735, jan. 1997, p. 458-473, quando sustenta a invalidade do conhecimento
fortuito em qualquer hipótese. Ao revés, cf. GRECO FILHO, Vicente. Interceptação telefônica. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2005. p. 22-25, que a admitia sem restrição. Do mesmo modo que Greco Filho, cf. NUCCI, Guilherme de Souza.
Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: RT, 2006. p. 355-356. Com o mesmo entendimento de Jesus, cf.
ARANHA, Adalberto Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 295.
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6 Conclusão
Uma nova concessão à arte: no cenário musical brasileiro, muitos
cantaram o refrão em que se diz: “(...) e não há lógica que faça desandar, o
que o acaso decidir”; tratava-se do reencontro fortuito de dois amantes, feitos
“um pro outro”. Mais rebuscada é a asserção de Ovídio, ao aludir que: “O
acaso pode muito: tem sempre pronto o anzol; no rio de que nada esperas,
aparecerá o peixe”.
De um modo ou de outro, não se olvidam os efeitos do acaso. No
universo jurídico, contudo, e mormente em termos de Direito e Processo
Penal, estamos muito aquém dos desenvolvimentos possíveis a partir do
reconhecimento de que certos eventos sucedem em decorrência da sorte, do
azar, da coincidência ou do aleatório.
Nossa intenção, aqui, foi meramente a de sugerir um caminho, uma
chave de leitura, um outro tipo de argumentação, a ser perseguido no futuro,
sobre a virtualidade dos efeitos do acaso. Em caráter não exaustivo, procuramos
aduzir consectários ao tema da tentativa, da culpabilidade e mesmo da prova,
já aí setorizadamente no Processo Penal.
Muito mais haverá por dizer e, se por acaso nosso texto fustigar a refle-
xão para futuros desenvolvimentos de um improvável leitor, o objetivo terá
sido atingido.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 57
TITLE: Essay on chance and its consequences for criminal law and criminal procedure.
ABSTRACT: This text intends, not exhaustively, to deal with chance and its multiple influences in Criminal
Law and Process. Fortuitous events, derived from good or bad luck, mark the limits of the human condition
and the impossibility of absolute control over the causal processes, allowing for reflections concerning the
allocation process, notwithstanding the doctrine oblivious. Both in circumstances beyond the will of the
agent and, certainly, in the very personal configuration of the person acting, chance and its consequences
denote the presence of something that is beyond the control of the will and which also sometimes leads to
the demonstration of crimes, found randomly when the evidentiary search pointed in another direction.
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1 Introdução
A questão da responsabilidade penal da pessoa jurídica sempre gerou
discussões acaloradas entre os doutrinadores. Longe de estar pacificada, ainda
há quem rejeite tal possibilidade. Seja pela simples reverência ao princípio
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
60
1 BRASIL. Ministério da Saúde. Plano brasileiro de preparação para enfrentamento de uma pandemia de influenza. Disponível
em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/plano_brasileiro_pandemia_influenza_IV.pdf>. Acesso em: 29 mar.
2020.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 61
2 ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação penal especial. 9. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 658.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
62
3 LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação especial comentada. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2014. p. 295.
4 GALVÃO, Fernando. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 4. ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: D’Plácido,
2017. p. 29.
5 ZUGALDÍA ESPINAR, José Miguel. La responsabilidad criminal de las personas jurídicas en el derecho penal
español (análisis de la cuestión tras la reforma operada por la LO 1/2015, de 30 de marzo). ������������������
In: ZUGALDÍA ESPI-
NAR, José Miguel; ESPINOSA CEBALLOS, Elena B. M. (Org.). La responsabilidad criminal de las personas jurídicas
en Latinoamérica y en España. Pamplona: Thomsom Reuters (Legal) Limites, 2015. p. 219.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 63
6 SILVA SÁNCHEZ, Jesús-Maria. Responsabilidad penal de las empresas y de sus órganos en derecho español. In:
PRADO, Luiz Regis; DOTTI, René Ariel (Org.). Responsabilidade da pessoa jurídica: em defesa do princípio da im-
putação subjetiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 70-71.
7 TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el derecho comparado. In:
GOMES, Luiz Flávio (Org.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias e direito penal. São Paulo: RT,
1999. v. 2. p. 27.
8 CUADRADO RUIZ, María Ángeles. La responsabilidad penal de las personas jurídicas. Un paso hacia adelante...
¿un paso hacia atrás?. Revista Jurídica de Castilla y León, n. 12, abr. 2007, p. 125.
9 Ibid., p. 126-127.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
64
10 GONZÁLEZ CUSSAC, José L. O modelo espanhol de responsabilidade penal das pessoas jurídicas. In: OLIVEIRA
et al. Direito penal econômico: estudos em homenagem aos 75 anos do professor Klaus Tiedemann. São Paulo: LiberArs,
2013. p. 380.
11 Ibid., p. 380.
12 JOFFRE CALASICH, Fabio. La responsabilidad penal de las personas jurídicas en el derecho penal boliviano. In:
ZUGALDÍA ESPINAR, José Miguel; ESPINOSA CEBALLOS, Elena B. M. (Org.). La responsabilidad criminal de
las personas jurídicas en Latinoamérica y en España. Pamplona: Thomsom Reuters (Legal) Limites, 2015. p. 40.
13 HERNÁNDEZ BASUALTO, Héctor. La responsabilidad penal de las personas jurídicas y reforma penal integral
en Chile. In: ZUGALDÍA ESPINAR, José Miguel; ESPINOSA CEBALLOS, Elena B. M. (Org.). La responsabilidad
criminal de las personas jurídicas en Latinoamérica y en España. Pamplona: Thomsom Reuters (Legal) Limites, 2015. p. 93.
14 SARCEDO, Leandro. 2015, p. 113-114.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 65
15 ROTHENBURG, Walter Claudius. A pessoa jurídica criminosa. 1. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2007. p. 52-55.
16 �����������������������������������������������������������������������������������������������������������
SCHÜNEMANN, Bernd. Die Strafbarkeit der juristischen Personenausdeutscher und europäischer Sicht. In: Baus-
teine des europäischen Wirtschaftsstrafrechts: Madrid-Symposium für Klaus Tiedemann. Berlim, Carl Heymanns
Verlag, 1994. p. 272. Apud Revista – Série Pensando o Direito, n. 18/2009: responsabilidade penal da pessoa jurídica.
Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (Direito GV). Coord. Acad. Marta Rodriguez de Assis
Machado, 2009. p. 13.
17 HASSEMER, Winfried. Três temas de direito penal. Porto Alegre, publicação da Escola Superior do Ministério
Público, 1993, p. 48 apud BITENCOURT, Cezar Roberto. Reflexões sobre a responsabilidade penal da pessoa
jurídica. In: GOMES, Luiz Flávio (Org.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias e direito penal. São
Paulo: RT, 1999. v. 2. p. 65.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
66
4 O Compliance
Ao que tudo indica, a etimologia da palavra compliance deriva do latim
complere e seu significado está ligado à vontade de fazer o que foi pedido, ou,
ainda, agir ou estar em concordância com regras, normas e condições. Os
norte-americanos, por sua vez, utilizaram o termo to comply para representar
a necessidade de regulamentação nas relações comerciais, sendo que pode-
mos concluir que o termo compliance significa cumprir, executar, atender a
algo imposto, e devemos compreendê-lo no sentido de conformidade ou de
cumprimento da norma21.
18 HASSEMER, Winfried. Perspectivas del derecho penal del futuro. Trad. Enrique Anarte Borrallo. Revista Penal, Univer-
sidad de Huelva, España, 1998. p. 40.
19 JOFFRE CALASICH, Fabio. In: ZUGALDÍA ESPINAR, José Miguel; ESPINOSA CEBALLOS, Elena B. M.
(Org.). 2015, p. 40.
20 COSTA Jr., 1996, p. 57.
21 CARDOSO, Débora Motta. Criminal compliance na perspectiva da Lei de Lavagem de Dinheiro. São Paulo: LiberArs,
2015. p. 37.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 67
22 Ibidem, p. 38-39.
23 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Compliance, direito penal e Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 65.
24 PASTOR MUÑOZ, Nuria. ¿Organizaciones culpables? Revista para el Análisis del Derecho – InDret, Barcelona, v. 4,
n. 340, abr. 2006. Disponível em: <https://www.raco.cat/index.php/InDret/article/viewFile/121377/167825>. Acesso
em: 15 out. 2018.
25 SIEBER, Ulrich. Programas de compliance en el derecho penal de la empresa. Una nueva concepción para controlar la
criminalidad económica. In: NIETO MARTÍN, Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant
lo Blanch, 2013. p. 70.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
68
26 CARDOSO, Débora Motta. Criminal compliance na perspectiva da Lei de Lavagem de Dinheiro. São Paulo: LiberArs,
2015. p. 41-42.
27 Ibidem, p. 57-58.
28 CARDOSO, Débora Motta. Criminal compliance na perspectiva da Lei de Lavagem de Dinheiro. São Paulo: LiberArs,
2015. p. 61-62.
29 Ibidem, p. 63.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 69
30 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Compliance, direito penal e Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 128-129.
31 NIETO MARTÍN, Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant lo Blanch, 2013. p. 13-14.
32 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Compliance, direito penal e Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 132.
33 NIETO MARTÍN, Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant lo Blanch, 2013. p. 10.
34 CIGÜELA SOLA, Javier. El injusto estructural de la organización. Revista para el Análisis del Derecho – InDret,
Barcelona, v. 1, n. 340, ene. 2016, p. 11. ���������������������������������������������������������������������
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Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
70
35 SIEBER, Ulrich. Programas de compliance en el derecho penal de la empresa. Una nueva concepción para controlar la
criminalidad económica. In: NIETO MARTÍN, Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant
lo Blanch, 2013. p. 95.
36 Ibidem, p. 96-98.
37 BOSCO GIMENO, Juan. Abordar la pandemia desde el compliance. World Compliance Association, 2020. Disponível
em: <http://www.worldcomplianceassociation.com/2664/articulo-abordar-la-pandemia-desde-el-compliance.
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38 BRITES, Elise. Compliance como ferramenta para enfrentamento da pandemia (COVID-19). Be Compliance,
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pandemia-covid-19>. Acesso em: 4 abr. 2020.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 71
39 LAUFER, William. O compliance game. In: SAAD-DINIZ, Eduardo; BRODOWSLI, Dominik; SÁ, Ana Luiza de
(Org.). Regulação do abuso no âmbito corporativo: o papel do direito penal na crise financeira. São Paulo: LiberArs, 2015.
p. 60-61.
40 NEIRA PENA, Ana María. La autorregulación y las investigaciones internas corporativas como forma de privatización
del proceso penal. El peligro para los derechos de los trabajadores. In: SAAD-DINIZ, Eduardo; BRODOWSLI,
Dominik; SÁ, Ana Luiza de (Org.). Regulação do abuso no âmbito corporativo: o papel do direito penal na crise financeira.
São Paulo: LiberArs, 2015. p. 150-151.
41 BITENCOURT, 2009, p. 352-353.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
72
42 Ibidem, p. 353.
43 CERNICCHIARO, Luiz Vicente; COSTA Jr., Paulo José da. Direito penal na Constituição, p. 138-139 Apud
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015. p. 230-231.
44 PRADO, Luiz Regis; DOTTI, René Ariel (Org.). Responsabilidade da pessoa jurídica: em defesa do princípio da im-
putação subjetiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2013, p. 133.
45 BITENCOURT, 2009, p. 354.
46 PRADO, Luiz Regis. Op. cit., p. 133.
47 Ibid., p 134.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 73
48 DOTTI, René Ariel. A incapacidade criminal da pessoa jurídica. In: PRADO, Luiz Regis; DOTTI, René Ariel
(Org.). Responsabilidade da pessoa jurídica: em defesa do princípio da imputação subjetiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2013.
p. 184.
49 Ibid., p 185.
50 René Ariel Dotti extrai dos arts. 26 e 27 do Código Penal o conceito normativo de imputabilidade, que consiste na
reunião dos pressupostos de capacidade biopsicológica que deve ter a pessoa humana, a partir dos 18 anos de idade,
para entender o caráter criminoso do fato e de se determinar de acordo com esse entendimento:
“Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado,
era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Redução de pena
Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde
mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Menores de dezoito anos
Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na
legislação especial. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
51 DOTTI. In: PRADO; DOTTI, 2013, p. 185.
52 NORONHA, Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 38. ed. rev. e atual. por Adalberto José Q. T. de
Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 1. p. 113-114.
53 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 97.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
74
54 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal das pessoas jurídicas. In: OLIVEIRA et al. Direito penal econômico:
estudos em homenagem aos 75 anos do professor Klaus Tiedemann. São Paulo: LiberArs, 2013. p. 353.
55 SHECAIRA, 2011, p. 98-99.
56 ARAÚJO Jr., João Marcello. Societas delinquere potest – revisão da legislação comparada e estado atual da doutrina.
In: GOMES, Luiz Flávio (Org.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias e direito penal. São Paulo:
Editora RT, 1999. v. 2. p. 92-93.
57 Ibid., p. 93.
58 SANCTIS, Fausto Martin de. Responsabilidade penal das corporações e criminalidade moderna. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2009. p. 91.
59 TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el derecho comparado. In:
GOMES, Luiz Flávio (Org.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias e direito penal. São Paulo: RT,
1999. v. 2. p. 40.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 75
60 TIEDEMANN, Klaus. El derecho comparado en el desarrollo del derecho penal económico. In: NIETO MARTÍN,
Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant lo Blanch, 2013. p. 40.
61 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. Prefácio à 5. ed. Ada Pellegrini Grinover. 5.
ed. ref., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007. p. 928.
62 Ibid., p. 928.
63 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 713.
64 GÓMEZ-JARA DÍEZ, Carlos. A responsabilidade penal da pessoa jurídica: teoria do crime para as pessoas jurídicas. São
Paulo: Atlas, 2015. p. 85.
65 Ibid., p. 38.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
76
66 Ibid., p.39-40.
67 Ibid., p. 41.
68 SARCEDO, Leandro. Compliance e responsabilidade penal da pessoa jurídica: construção de um novo modelo de im-
putação, baseado na culpabilidade corporativa. 2015. Tese (Doutorado em Direito Penal) – Faculdade de Direito,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015. p. 138.
69 CAMARGO, Beatriz Corrêa. A construção da personalidade jurídica na prevenção de crimes através da responsabi-
lidade penal de pessoas jurídicas. In: SAAD-DINIZ, Eduardo; BRODOWSLI, Dominik; SÁ, Ana Luiza de (Org.).
Regulação do abuso no âmbito corporativo: o papel do direito penal na crise financeira. São Paulo: LiberArs, 2015. p.
122-123.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 77
7 Conclusão
A situação de calamidade pública gerada pela pandemia da Covid-19,
bem como por outras que a precederam e que poderão a suceder, demanda
a revisão de diversos institutos que compõem o Direito Penal brasileiro. A
revisão do rol de delitos pelo qual as pessoas jurídicas podem responder pe-
rante nosso ordenamento parece conveniente. Por óbvio, tal revisão não se
refere a um direito penal que atenda, por princípio, ao clamor público, mas,
sim, que se adéque à realidade que o demanda.
A responsabilidade penal das pessoas jurídicas é um instituto, que, a
despeito de todas as controvérsias que suscita, está em franca ascensão. Tem
sido adotada pelos mais diversos ordenamentos, algumas vezes sob uma certa
pressão de organismos internacionais, como a Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico – OCDE. Há um interesse na internaciona-
lização desse instituto, tendo em vista a ampliação da economia globalizada e
os abusos cometidos por empresas, que passam a ser sujeitos ativos de delitos
com impactos imensos sobre a economia mundial.
Nesse cenário, a multiplicação dos programas de compliance é fruto des-
sa pressão que recai sobre empresas. A autorregulação e a responsabilização
penal da pessoa jurídica se desenvolvem de maneira peculiar, criando uma
dinâmica propícia a se retroalimentarem. Percebemos que a insuficiência da
autorregulação fomenta a implementação da responsabilidade penal da pessoa
jurídica pelos Estados; essa responsabilização penal, por sua vez, fomenta o
desenvolvimento de programas de compliance que buscam diminuir os impactos
da responsabilidade penal.
Dessa forma, os programas de compliance têm uma dupla função: atuam
como fator preventivo de delitos cometidos pelas empresas, e mesmo contra
essas, pois quando bem implementados e funcionais, podem servir a esse
70 NIETO MARTÍN, Adán. El derecho penal económico en la era compliance. Valencia: Tirant lo Blanch, 2013. p. 15-16.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
78
TITLE: Criminal liability of legal entities and compliance in the face of pandemic situations.
ABSTRACT: The situation of public calamity generated by the pandemic of COVID-19, as well as by
others that preceded it and that may succeed it, demands the revision of several institutes that compose
the Brazilian criminal law. The review of the list of offences for which legal entities may be liable to our
legal system seems appropriate. The prediction that legal entities can be held criminally liable for crimes
involving a pandemic situation gains special prominence. Of course, such a revision does not refer to a
criminal law that meets, in principle, the public outcry, but rather that suits the reality that demands it. In
view of this scenario, we have the adoption of compliance programs with a dual function, the prevention
of crimes and a tool for measuring corporate culpability under criminal law.
KEYWORDS: Pandemic. Criminal Liability of Legal Entities. Compliance. Culpability of Legal Entities.
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Introdução
A acusação de estupro em face do jogador de futebol Neymar Jr., em
junho de 2019, foi noticiada no mundo inteiro, ganhando ampla repercussão.
Em tempos de processo penal midiático e legitimação do julgamento por um
tribunal de exceção, qual seja, o “tribunal da internet”, emergiram os mais
diversos posicionamentos a respeito do ocorrido, notadamente após a divul-
gação de um vídeo, pelo atleta, no qual constam cenas de nudez da suposta
vítima, divulgação esta que teria sido realizada sob o pretexto de provar sua
alegada inocência.
Não se pretende, neste trabalho, discutir sobre a materialidade e autoria
do crime de estupro, que foi objeto de investigação pela Polícia Civil de São
Paulo, mas, sim, fazer um exame sobre a divulgação das imagens pelo atleta,
tendo em vista a previsão legal de crime para a conduta de quem publica ou
divulga, sem o consentimento da vítima, cena de nudez, na forma do art.
218-C do Código Penal. Busca-se fazer tal exame numa perspectiva analítica,
cotejando os aspectos relativos ao injusto penal e à culpabilidade, a fim de
apontar qual o correto enquadramento jurídico-penal da divulgação do vídeo
em questão pelo jogador Neymar.
Para além de uma mera discussão sobre condenação/absolvição, bem
como de uma análise precipitada dos fatos, preferiu-se adotar, aqui, uma
metodologia analítica. Parte-se do pressuposto de que, sendo a conduta do
referido atleta uma postura defensiva, há enquadramento a partir dos elemen-
tos tridimensionais da Teoria do Delito: tipicidade, ilicitude e culpabilidade.
Essa análise se faz relevante, pois, em épocas de respostas imediatas e
pouco aprofundadas sobre o tema, é preciso identificar, caso prevalecente a
tese absolutória, se a conduta tem albergue de alguma circunstância justifi-
cante ou exculpante. O correto posicionamento dogmático sobre a natureza
jurídica da conduta tem repercussões teóricas e práticas, já que a decisão pela
atipicidade, exclusão de ilicitude ou de culpabilidade acarretará consequências
penais e extrapenais distintas.
1 Entendendo o Caso
No dia 1º de junho de 2019, foi noticiado que uma mulher, a qual, ini-
cialmente, não teve a identidade revelada, registrara um boletim de ocorrência,
na cidade de São Paulo/SP, acusando Neymar Jr., famoso jogador de futebol,
de tê-la estuprado no dia 15 de maio, em Paris, capital da França.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 83
1 As informações relatadas neste capítulo foram divulgadas pelos principais canais midiáticos do país, como o sítio
eletrônico da Revista Época (CASTRO, 2019) e o portal eletrônico UOL (UOL, 2019).
2 Conforme noticiado, dentre outros canais midiáticos, no Portal iBahia (IBAHIA, 2019).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
84
3 Adota-se, para compreensão da tipicidade, as ideias do alemão Ernst von Beling, datadas de 1906. Nessa perspectiva,
tipicidade formal é o juízo de subsunção entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o modelo descrito
pelo Código Penal, a adequação ao catálogo. Já a tipicidade material/substancial caracteriza-se quando há lesão ou
perigo de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado em razão da prática da conduta legalmente descrita (BELING,
1944, p. 59).
4 Rogério Greco (2019) não menciona a existência de dolo especial, referindo-se ao tipo apenas como “doloso”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
86
específico, vale dizer, o agente pode divulgar fotos ou vídeos de crimes sexuais
ou relacionamentos sexuais por qualquer finalidade. Poderá haver finalidade
específica quando se configurar uma das causas de aumento”.
Dessa forma, não se adota o posicionamento defendido por Bitencourt,
pois o crime de divulgação de cena de nudez não exige uma finalidade especial,
ou seja, não há o elemento subjetivo do tipo por ele vislumbrado. O texto legal
não impõe tal exigência, que tampouco foi construída jurisprudencialmente,
de modo que, para haver tipicidade formal, basta a divulgação, independente
do motivo.
Interessante observar que, apesar de sustentar tal posicionamento no
artigo a respeito da imputação de crime sexual a Neymar, no seu Tratado de
Direito Penal, Bitencourt (2019b, p. 168) afirma que, quanto ao crime tipificado
no art. 218-C do CP, “Não vemos, neste tipo penal, a necessidade de elemento
subjetivo especial do injusto, não havendo previsão de nenhum especial fim
de agir”. Considera-se, portanto, que a conduta de Neymar, ao divulgar as
cenas de nudez, é formal e materialmente típica.
5 CP: “Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação
administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que
o sabe inocente”.
6 A instantânea e enorme repercussão do caso pode ser aferida a partir do fato de que o vídeo no qual o jogador Neymar
Jr. se defende da acusação de estupro ultrapassou a marca de 18 milhões de visualizações em 24 horas (CASTRO,
2019).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
88
caluniosa, crime pelo qual Najila Trindade foi, inclusive, indiciada, conforme
registrado acima (CAMPOS; GONÇALO Jr., 2019).
Quanto à concepção da divulgação como uma forma de evitar a de-
nunciação caluniosa, deve-se ponderar que, sendo confirmada a falsidade da
acusação, não se trata de uma situação de perigo, mas de uma efetiva agressão,
que afastaria a incidência do estado de necessidade, devendo-se investigar a
possibilidade de incidência da legítima defesa.
Nos termos do art. 25 do CP, aplica-se a legítima defesa a “quem,
usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual
ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
A legítima defesa deve ser exercida da forma menos lesiva possível,
e a injustiça da agressão deve ser entendida como ilicitude, ainda que não
se trate de infração penal. A priori, é de se cogitar a aplicabilidade dessa jus-
tificante, pois a conduta de Neymar consistiu em resposta proporcional a
uma agressão injusta. Porém, deve-se considerar que não é possível haver
legítima defesa contra agressão futura, tornando-se forma imponderável de
defesa, ou passada, que configura autêntica vingança, nem tampouco contra
meras provocações.
Conforme explicado, a agressão perpetrada pela suposta vítima de crime
sexual, ao registrar o Boletim de Ocorrência, não foi atual, tampouco iminente,
razão pela qual se entende inaplicável a justificação da legítima defesa ao caso
de Neymar. Quando da divulgação do vídeo, o registro já havia ocorrido,
tratando-se, portanto, de uma agressão passada.
Evidentemente, também não incide a excludente de ilicitude prevista
no § 2º do art. 218-C, que se concretiza quando a vítima é maior de 18 anos,
autoriza previamente a publicação, adota-se recurso que impossibilite a iden-
tificação da vítima e a divulgação tem caráter jornalístico, científico, cultural
ou acadêmico.
No caso em apreço, a vítima não autorizou previamente a publicação e
a divulgação não teve nenhum caráter dentre aqueles mencionados. Embora
as imagens tenham sido distorcidas, a menção ao nome da vítima, constante
na conversa, não impossibilitou a sua identificação.
Diante da constatação, portanto, de que se trata de conduta típica e an-
tijurídica, questiona-se: qual enquadramento jurídico deve ser dado ao caso?
Entende-se que a conduta de Neymar, embora típica e ilícita, não é culpável.
É o que se passa a demonstrar.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 89
3 Ausência de Culpabilidade
Diante da constatação de que a conduta do jogador Neymar é típica e
antijurídica, a culpabilidade parece ser o caminho a indicar a inexistência de
responsabilidade penal do atleta. Justamente por estar mais próxima da pena
do que o injusto, a culpabilidade termina sendo o fundamento pelo qual vai
se justificar – ou não – a imposição da pena a um indivíduo concreto. E, nesse
diapasão, a exposição de fotos íntimas sem consentimento pode, conforme
o caso, não ensejar responsabilidade penal, por ausência de culpabilidade.
No caso examinado, a situação pode ser analisada no mais normativo
dos elementos da culpabilidade, que é a inexigibilidade de conduta diversa.
A conduta do atleta será tratada, portanto, a partir de um juízo de valor à luz
da ideia de inexigibilidade de outra conduta.
7 Nesse mesmo sentido é o entendimento de Maurício Stegemann Dieter (2008, p. 75), para quem “o juízo de culpa-
bilidade deve ser afastado ou mitigado, porque circunstâncias excepcionais excluem ou reduzem a responsabilidade
individual, independente de previsão legal”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
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de fogo, na oportunidade dos acontecimentos, consistentes em sucessivas rebeliões, atentados contra pessoas, ônibus
incendiados, ataques a postos policiais dentre outros, numa visível demonstração de forças da organização criminosa,
a segurança pública estava comprometida e, por isso, não se poderia exigir de um agente de segurança penitenciário,
refém em duas rebeliões, que não portasse a arma de fogo que havia adquirido para sua defesa pessoal porque ainda
não havia conseguido autorização para tanto.” (TJSP, Apelação 990.08.18774.6-5, Rel. Des. Lucas Tambor Bueno,
j. 15.10.09)
12 “APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 39 DA LEI Nº 9.605/98. ABSOLVIÇÃO. INADMISSI-
BILIDADE EM RELAÇÃO AO PRIMEIRO APELANTE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE
COMPROVADAS. POSSIBILIDADE NO TOCANTE AO SEGUNDO APELANTE. INEXIGIBILIDADE DE
CONDUTA DIVERSA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O TIPO PENAL PREVISTO NO ART. 48 DA LEI Nº
9.605/98. DESCABIMENTO. RECURSOS CONHECIDOS, DESPROVIDO O DO PRIMEIRO APELANTE E
PROVIDO O DO SEGUNDO. Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão
da autoridade competente constitui crime tipificado no art. 39 da Lei nº 9.605/98, pelo que, havendo efetivamente
o desmatamento, não há que se falar em desclassificação para o disposto no art. 48 do mesmo estatuto legal. Merece
guarida a pretensão absolutória, quando o agente contribui para a prática criminosa obedecendo a uma ordem ex-
pressa do patrão, proprietário da fazenda, não havendo como exigir-lhe conduta diversa, haja vista a ameaça, ainda
que implícita, de perder o emprego.” (TJMG, 1.0303.06.000478-3/001(1), Relª Desª Márcia Milanez, j. 15.05.07)
13 O mesmo entendimento é compartilhado por Débora Cunha Mautone, segundo quem “A possibilidade de agir de
acordo com o ordenamento jurídico é verificada caso a caso, não existindo um padrão de culpabilidade” (MAUTONE,
2014).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Doutrina
96
conduta diversa. Para fundamentar essa tese, o referido autor considera que se
trata de um dos principais jogadores de futebol do mundo, que tem milhões
de fãs e seguidores de todas as idades, e é patrocinado por diversas empresas,
sendo seu próprio nome uma marca a ser preservada. Além disso, ele entende
que, como qualquer cidadão, Neymar deve ter a possibilidade de se defender
das acusações que lhe forem dirigidas. Nas palavras do autor, “a linguagem
do silêncio tem que ser uma faculdade, jamais uma imposição”.
Santoro opina no sentido de que, alguém que está com sua honra ma-
culada perante a opinião pública e é acusado da prática de crime hediondo,
tendo em mãos o que acredita ser a prova da sua inocência, não deve ser
obrigado a aguardar usá-la somente em um futuro remoto, como defesa em
um processo penal.
O mencionado autor, nesse ponto, adota o mesmo entendimento que
este artigo, de que a conduta de Neymar, ao divulgar as conversas conten-
do cenas de nudez, está amparada pela inexigibilidade de conduta diversa,
afastando-se a culpabilidade, e, portanto, a imposição da sanção penal.
É evidente, portanto, que a conduta de Neymar, ao divulgar vídeo
contendo conversas com a suposta vítima do crime de estupro, no qual apare-
cem cenas distorcidas de nudez, foi adotada em um contexto completamente
anormal, de extrema vulnerabilidade e sob intensa pressão psíquica.
Assim, além de ter atuado em um âmbito de determinação extrema-
mente restrito, sendo, portanto, refém de circunstâncias externas, Neymar
agiu de modo que a ofensa representada pelo seu crime foi infinitamente me-
nor ao dano por ele sofrido quanto à sua honra, saúde psíquica e perspectiva
profissional. A medida adotada pelo jogador não foi capaz de impedir nem
anular tal dano, mas, ao menos, o conteve, diante da apresentação de forte
evidência de que o atleta não teria cometido o crime hediondo do qual foi
acusado sob os holofotes de milhões de expectadores, que acompanharam o
caso de repercussão mundial.
Infere-se, portanto, que a conduta típica e ilícita de Neymar não é cul-
pável, em face da inexigibilidade de conduta diversa, exculpante amplamente
aceita pela jurisprudência pátria e pela doutrina, conforme demonstrado neste
artigo.
Conclusão
Enfrentou-se o problema do enquadramento jurídico-penal da conduta
do jogador Neymar, ao divulgar conversas virtuais com a mulher que o acusou
de estupro, nas quais constavam cenas de nudez.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 101
TITLE: The Neymar case: disclosure of intimate images under the perspective of the unenforceability
of miscellaneous conduct.
ABSTRACT: This article examines the conduct of the soccer player Neymar Jr., who posted a video fea-
turing nude scenes of the woman who accused him of rape, generating widespread repercussions around
the world. The fact is analysed in the light of the theory of the crime, concluding that it is a typical fact,
illicit, but not guilty, due to the application of supralegal cause of unenforceable conduct.
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ACÓRDÃO
Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual
da Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimidade,
negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 15 de maio de 2020.
Ministro Ricardo Lewandowski – Relator
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 105
RELATÓRIO
O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Trata-se de agravo
regimental interposto contra decisão por mim proferida nestes autos.
A Defensoria alegou, em suma, que o paciente faz jus à causa de dimi-
nuição da pena pelo tráfico privilegiado, pois
“não pode ser considerado com maus antecedentes, sendo tecnicamente
primário, porquanto não há registro de folha de condenação transitada em
julgado, tampouco pela condenação em atos infracionais, uma vez que o art.
27 do Código Penal afirma que ‘os menores de 18 anos são penalmente inim-
putáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial’.” (p.
116 do documento eletrônico 2)
Aduziu, ainda, que,
“não havendo outros argumentos desfavoráveis ao pleito do paciente, forçoso
é reconhecer que ao manter a decisão que afastou a aplicação da causa de
diminuição do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 com base somente em ações
penais em curso e atos infracionais viola manifestamente o direito de loco-
moção do paciente por mantê-lo em pena privativa de liberdade por tempo
maior que o determinado por lei.” (p. 121 do documento eletrônico 2)
Requereu, por fim, o provimento do recurso para que fosse aplicada a
causa de diminuição da pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06.
Diante do exposto, dei provimento ao recurso ordinário em habeas corpus
para determinar ao Juízo competente que proceda à nova dosimetria da pena,
aplicando, fundamentadamente, a causa especial de redução prevista no § 4º
do art. 33 da Lei nº 11.343/06, na fração que entenda adequada e suficiente
para reprovação e prevenção do crime, com os demais consectários legais.
Contra essa decisão, sobreveio o presente recurso de agravo regimental
interposto pelo Parquet.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Bem reexaminados
os autos, tenho que a decisão ora atacada não merece reforma ou qualquer
correção.
Isso, porque, ao proferir a sentença condenatória, o Magistrado de
primeiro grau afastou a incidência da causa especial de redução penal prevista
no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06, sustentando que,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
106
para fins de dosimetria da pena. 7.2. Para efeito de aumento da pena, somente
podem ser valoradas como maus antecedentes decisões condenatórias irre-
corríveis, sendo impossível considerar, para tanto, investigações preliminares
ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal,
sob pena de violação ao art. 5º, inciso LIV (presunção de não culpabilidade),
do texto constitucional. 8. Decisão monocrática do STJ. Ausência de inter-
posição de agravo regimental. Superação. 9. Ordem concedida parcialmente
para que o Juízo proceda à nova dosimetria.” (HC 151.431/MG, Rel. Min.
Gilmar Mendes)
“AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DRO-
GAS. DOSIMETRIA. AFASTAMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. PROCEDIMENTOS
E/OU PROCESSOS CRIMINAIS SEM TRÂNSITO EM JULGADO.
IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA PARA APLICAR A MI-
NORANTE FUNDAMENTADAMENTE E RECALCULAR A DOSI-
METRIA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
I – A causa de diminuição pelo tráfico privilegiado, nos termos do art. 33,
§ 4º, da Lei nº 11.343/06, não pode ter sua aplicação afastada com fundamen-
to em ‘investigações preliminares ou processos criminais em andamento,
mesmo que estejam em fase recursal, sob pena de violação ao art. 5º, inciso
LIV (presunção de não culpabilidade), do texto constitucional’ (HC 151.431/
MG, Rel. Min. Gilmar Mendes). Precedentes. II – A escolha do patamar de
diminuição da pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas não prescinde
de adequada fundamentação. Precedentes. III – Agravo regimental a que se
nega provimento.” (HC 144.309-AgR/MG, de minha relatoria)
Com essa mesma compreensão, destaco trechos das seguintes decisões
monocráticas proferidas em casos análogos:
“(...)
3.1. Inicialmente, verifico que a exasperação da pena-base e o afastamento do
redutor foram fundamentados unicamente em condenação criminal sem o
devido trânsito em julgado. Ocorre que, ao preceder dessa forma, o Juízo a
quo incorreu em flagrante violação ao princípio da não culpabilidade.
Observa-se que esta Corte, sob a sistemática da repercussão geral, consignou
que, ‘ante o princípio constitucional da não culpabilidade, inquéritos e pro-
cessos criminais em curso são neutros na definição dos antecedentes crimi-
nais’ (RE 591.054, Tema 129, Rel. Marco Aurélio, Pleno, DJe 26.02.2015).
Em que pese a tentativa do MPF de revisitar a matéria, no julgamento do RE
1.012.344 AgR (Rel. Dias Toffoli, DJe 19.05.2017), a Segunda Turma afastou
a proposta de revisão do tema, tendo assentado que o entendimento fixado
no processo-paradigma tem sido hodiernamente aplicado, sem objeções, por
ambas as Turmas do STF. Destaco trecho do voto do Relator (com grifos da
redação original):
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
108
‘A decisão agravada deve ser mantida por seus próprios fundamentos, pois,
conforme consignado naquela ocasião, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar
o mérito do RE 591.054/SC-RG, Rel. Min. Marco Aurélio, cuja repercussão
geral havia sido reconhecida (Tema nº 129), firmou a tese de que a existência
de inquéritos policiais ou de ações penais sem trânsito em julgado não pode
ser considerada como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena.
Transcrevo a ementa do caso paradigma:
‘PENA. FIXAÇÃO. ANTECEDENTES CRIMINAIS. INQUÉRITOS E
PROCESSOS EM CURSO. DESINFLUÊNCIA. Ante o princípio consti-
tucional da não culpabilidade, inquéritos e processos criminais em curso são
neutros na definição dos antecedentes criminais.’ (DJe 25.02.2015)
Não obstante os argumentos do agravante no sentido de que a Corte estaria
inclinada a modificar esse entendimento, o fato é que ambas as Turmas pos-
suem precedentes contemporâneos que têm referendado a tese fixada em
repercussão geral pelo Pleno no RE 591.054/SC-RG.
(...)
Dessa forma, ante a desconsideração da ação penal sem o trânsito em julga-
do à época da prolação da sentença como maus antecedentes, bem como a
ausência de outras circunstâncias que atribuam maior desvalor à conduta,
impõe-se a reforma da dosimetria da pena, com a fixação da pena-base no
mínimo legal e a aplicação da minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº
11.343/06 em seu grau máximo.
(...)” (HC 168.788/SP, Rel. Min. Edson Fachin)
“(...)
Sobre o tema (caracterização da dedicação a atividades criminosas com base
em decisões transitadas em julgado, sob pena de violação ao princípio da pre-
sunção de inocência), registro que, em sessão realizada em 17.12.2014, o Ple-
no do STF, ao julgar o RE 591.054, de relatoria do Ministro Marco Aurélio,
firmou orientação no sentido de que a existência de inquéritos policiais ou de
ações penais sem trânsito em julgado não pode ser considerada como maus
antecedentes para fins de dosimetria da pena.
Na ocasião, ficou consignado que, para efeito de aumento da pena, somente
podem ser valoradas como maus antecedentes decisões condenatórias irre-
corríveis, sendo impossível considerar para tanto investigações preliminares
ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal,
sob pena de violação ao art. 5º, inciso LIV (presunção de não culpabilida-
de), do texto constitucional. No mesmo sentido, menciono: HC 94.680/SP,
Plenário, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 24.11.2015; HC 104.266/RJ,
Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 26.05.2015 e HC 125.367/ES,
por mim relatado, DJe 24.02.2015.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 109
Assim, à luz do novo entendimento adotado por esta Corte, verifico ilegalida-
de na dosimetria realizada pelo magistrado de primeiro grau.
Ante o exposto, com fundamento no art. 192, caput, do RI/STF, dou par-
cial provimento ao recurso, para, mantida a condenação e seus efeitos, de-
terminar que o Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Belo Horizonte/
MG (Processo 0024.15.011.665-5), proceda à nova dosimetria, analisando os
maus antecedentes do paciente em conformidade com a jurisprudência deste
Tribunal, considerando, ainda, a possibilidade de incidência da minorante
prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, e, por fim, analise o regime pri-
sional adequado nos termos do art. 33 do Código Penal.
(...)” (RHC 149.273/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes)
Isso posto, nego provimento ao agravo regimental.
EXTRATO DE ATA
Ag. Reg. no Recurso Ordinário em Habeas Corpus 182.516
Proced.: Distrito Federal
Relator: Min. Ricardo Lewandowski
Agte.: Ministério Público Federal
Proc.: Procurador-Geral da República
Agdo.: Pedro Henrique de Moraes Silva
Adv.: Defensor Público-Geral do Distrito Federal
Intdo.: Ministério Público do Distrito Federal e Territórios
Proc.: Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios
Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo re-
gimental, nos termos do voto do Relator. Segunda Turma, Sessão Virtual de
08.05.2020 a 14.05.2020.
Composição: Ministros Cármen Lúcia (Presidente), Celso de Mello,
Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Edson Fachin.
Ravena Siqueira – Secretária
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-
das, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental.
Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro
Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Leopoldo de Arruda Raposo
(Desembargador Convocado do TJPE).
Brasília, 5 de março de 2020 (Data do Julgamento).
Ministro Joel Ilan Paciornik – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
112
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Joel Ilan Paciornik:
Trata-se de agravo regimental interposto contra a decisão de fls. 737/741,
em que se negou provimento ao recurso especial.
A agravante sustenta que: “(...) os julgados invocados para suportar tal
conclusão, além de datarem do ano de 2015 – desde o qual a jurisprudência
desse e. Tribunal se alterou e amadureceu em relação ao tema –, dizem res-
peito ao crime definido no art. 48 da Lei nº 9.605/98, que trata da conduta de
impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de
vegetação. Tal delito jamais foi imputado à agravante” (fl. 749).
Afirma que “causar poluição não é ação que se protrai no tempo, mas,
ao contrário, conduta que se esgota tão logo executada – ainda que seus efeitos
possam se mostrar duradouros (fl. 751). Por isso, está-se diante de delito de
consumação instantânea, aperfeiçoados no exato momento em que a CBB/
USPAM teria descartado irregularmente os tambores da marca ESSO no
meio ambiente (em 1999 a 2002). A denúncia foi recebida em 18 de janeiro
de 2016 e a CBB/USPAM interditada em 23 de junho de 2003 (termo inicial
do lapso prescricional), sendo a pena máxima cominada ao delito de maior
gravidade 5 anos e, consoante o art. 109, III, do CP, prescreve em 12 anos,
tendo sido atingida”.
Aduz que a proposta de Termo de Ajustamento de Conduta, além de
não se apresentar vinculante ao seu destinatário, emanou de órgão que não
se enquadra no conceito de autoridade competente para a exigência de deter-
minada conduta na seara ambiental.
Insiste que na denúncia inexiste elemento que compõe a definição le-
gal do tipo penal e que o Tribunal de origem foi omisso quanto ao conteúdo
deduzido nas contrarrazões recursais.
Requer a reconsideração da decisão agravada ou a submissão do presente
recurso ao órgão colegiado.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Joel Ilan Paciornik (Relator):
O recurso não merece ser provido.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 113
são aqueles fatos em que o delito não está concluído com a realização do tipo,
mas que se mantém pela vontade delitiva do autor tanto tempo como subsiste
o estado antijurídico criado por ele’.” (PACELLI, Eugênio; CALLEGARI,
André. Manual de direito penal: parte geral. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Atlas, 2017)
O que podemos extrair desses preceitos legais é que a diferença de
classificação consiste na ação tomada pelo agente quanto aos efeitos gerados
da conduta delitiva inicial, pois para o crime permanente, realizada a ação
típica, os efeitos só perduram no tempo por nova ação do autor ou diante da
sua inércia em cumprir determinação estipulada, quando, nos instantâneos de
efeitos permanentes, o delito se consuma tão somente no primeiro momento,
sendo as consequências daí geradas independentes da sua vontade.
Vejamos na Lei nº 9.605/98 como estão descritos os delitos em exame,
que se resumem ao crime de poluição qualificada (arts. 54, §§ 2º, I, II, III e
IV, e 3º, e 56, § 1º, I e II, c/c o art. 58, I):
“Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam
resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a
destruição significativa da flora:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
(...)
§ 2º Se o crime:
I – tornar uma área urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos
habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público
de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
Pena – reclusão, de um a cinco anos.
§ 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar,
quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de
dano ambiental grave ou irreversível.
(...)
Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, trans-
portar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, peri-
gosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências
estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 115
(...)
Art. 58. Nos crimes dolosos previstos nesta Seção, as penas serão aumentadas:
I – de um sexto a um terço, se resulta dano irreversível à flora ou ao meio ambiente em
geral;”
Ao que se percebe, essas condutas delituosas se resumem na ação de
causar poluição ambiental que provoque danos à população e ao próprio
ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas na legislação de
proteção, e na omissão em adotar medidas de precaução nos casos de risco
de dano grave ou irreversível ao ecossistema.
A princípio, percebo a dificuldade de classificação do tipo legal quanto
ao momento de sua consumação na medida em que podemos visualizar uma
conduta inicial definida – causar poluição – que pode restar configurada
simplesmente na primeira ação ou omissão por parte do autor ou perdurar
no tempo.
Aqui cabe uma reflexão, pois importante perceber, nos casos pontuais,
como se dão os efeitos da primeira conduta criminosa.
Mais uma vez recorro à doutrina para firmar meu posicionamento,
extraindo um trecho de grande valia da obra de Nicolao Dino Neto, Ney
Bello Filho e Flávio Dino, em comentários à Lei nº 9.605/98: “A consumação
do crime ocorre quando há descumprimento de medidas determinadas pelo
Órgão competente. Trata-se de crime permanente, que se protrai no tempo enquanto
durar a desobediência à ordem administrativa. Entretanto, se essa ordem se consubs-
tanciar em um ato instantâneo, o crime vai se configurar no exato momento
em que o ato agressor da determinação administrativa é praticado” (Crimes
e infrações administrativas ambientais: comentários à Lei nº 9.605/98. Brasília:
Brasília Jurídica, 2000. p. 277).
Destarte, necessário verificar, no caso aqui tratado, qual o elemento
volitivo do autor no que se refere aos efeitos da primeira conduta criminosa
– poluição.
In casu, o que se extrai do aresto hostilizado, às fls. 544/548, é que a em-
presa agravante armazenou seu lixo industrial, no Município de Ulianópolis,
e dessa conduta resultou poluição grave da área degradada, sendo que, até o
momento de prolação do julgado, não teria tomado providências para reparar
o dano, caracterizando a continuidade da prática infracional. A propósito:
“Conforme o recorrente, a recorrida não adotou medidas para constatar que se a
CBB apresentava condições técnicas para proceder a correta e adequada destinação do
lixo tóxico, situação que perdura até os dias atuais, pois as perícias constataram que
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
116
recipientes oriundos da recorrida, contendo este tipo de material, ainda se encontram nas
instalações da CBB.
(...)
Inicialmente, cumpre esclarecer que o recorrente não está questionando se o
crime de poluição (art. 54, § 1º, I, II, III e V, da Lei nº 9.605/98) é permanente
ou instantâneo de efeitos permanentes, mesmo porque o magistrado a quo, ao
reconhecer a prescrição disse, expressamente, que o delito é permanente.
(...)
Ocorre que, além do crime de poluição, antes examinado, a recorrida também foi denun-
ciada pelo cometimento do delito do art. 56, § 1º, I e II, da Lei nº 9.605/98, o qual
transcrevo, in verbis:
(...)
Desse modo, verifica-se que todos os delitos pelos quais a recorrida foi acusada são de
natureza permanente e a prova pericial juntada aos autos não deixa dúvidas que a re-
corrida armazenou seu lixo industrial, consistentes em substâncias tóxicas e perigosas ao
meio ambiente, no Município de Ulianópolis e dessa conduta resultou poluição da área
degradada e, até a presente data, não tomou providências para reparar o dano.
Ademais, na resposta a acusação, a recorrida não informou que havia sequer reparado o
dano ambiental, o que constitui indicativo de que as condutas criminosas descritas acima
continuam sendo praticadas.
Por isso, mostra-se equivocado o entendimento do Juízo a quo ao considerar
como cessada a permanência das condutas o ano de 2002, quando foi remeti-
do, pela recorrida, o último carregamento de resíduos industriais.
Registre-se ainda que, como a prática delitiva ainda perdura no tempo, a
prescrição não poderia ser reconhecida pela ausência do dies a quo que se dá
justamente com a cessação da permanência, ex vi do art. 111 do CP, que não
ocorreu na hipótese em exame.”
Ao que se tem, a conduta criminosa ultrapassou a ação inicial, ou seja,
os efeitos decorrentes da poluição permaneceram diante da própria omissão
da empresa recorrente em corrigir ou diminuir os efeitos geradores da con-
duta inaugural.
Assim, no caso em exame, entendo que o crime de poluição qualificada
é permanente, diante da continuidade da prática infracional, ainda que por
omissão da parte autora, que foi prontamente notificada a reparar o dano
causado – retirar os resíduos e assim não o fez (fl. 596).
Registre-se que a prescrição penal nos crimes ambientais, praticados
por pessoas jurídicas, tem vinculação direta com os preceitos do art. 109 do
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 117
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acor-
dam os Ministros da Sexta Turma, por unanimidade, conceder parcialmente
a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nefi
Cordeiro, Antonio Saldanha Palheiro e Sebastião Reis Júnior votaram com
o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Laurita Vaz.
Brasília, 10 de março de 2020.
Ministro Rogerio Schietti Cruz – Relator
RELATÓRIO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz:
Vania Cristina Ecle Rodrigues alega sofrer coação ilegal em decorrên-
cia de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na
Apelação 0002717-44.2015.8.26.0168.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 123
VOTO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz (Relator):
I – Contextualização
A paciente foi condenada por incursão no art. 171, c/c o art. 71, ambos do
Código Penal, porque, no período compreendido entres os dias 19.03.2012 e
05.05.2013, obteve para si vantagem ilícita, em prejuízo de três vítimas, mantidas
em erro por meio fraudulento. Ela prometeu aos ofendidos ingressar com
pedidos de aposentadoria, o que não foi feito.
Consta dos autos que “Vânia era funcionária pública municipal e fre-
quentava os primeiros anos da Faculdade de Direito. Resolveu, então, prestar
seus serviços a quem pretendia se aposentar ou receber benefícios previden-
ciários”. Ela “prometia um meio ágil para alcançar esses benefícios e exigia
quantias em dinheiro das vítimas, o que caracteriza engodo” (fl. 18). Todavia,
passado algum tempo, os ofendidos constatavam que não havia pedidos em
andamento no INSS e que “haviam caído em um golpe” (fl. 19). A teor do
aresto, “o mesmo procedimento foi adotado com diversas outras pessoas” (fl.
19), consoante registram inquéritos em curso e ações penais sentenciadas.
Transcrevo trecho da sentença:
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
124
II – Pena-Base
A fixação da pena é regulada por princípios e regras constitucionais e
legais previstos, respectivamente, nos arts. 5º, XLVI, da Constituição Federal,
59 do Código Penal e 387 do Código de Processo Penal.
Todos esses dispositivos remetem o aplicador do direito à individuali-
zação da medida concreta para que, então, seja eleito o quantum de pena a ser
imposta ao condenado criminalmente, com vistas à prevenção e à reprovação
do delito perpetrado.
Assim, para obter-se uma aplicação justa da lei penal, o julgador, den-
tro dessa discricionariedade juridicamente vinculada, há de atentar para as
singularidades do caso concreto. Deve, na primeira etapa do procedimento
trifásico, guiar-se pelas oito circunstâncias relacionadas no caput do art. 59 do
Código Penal. São elas: a culpabilidade; os antecedentes; a conduta social; a
personalidade do agente; os motivos; as circunstâncias e as consequências do
crime e o comportamento da vítima.
Não se pode olvidar, ainda, o princípio da proporcionalidade, que vin-
cula não somente o legislador, mas também o aplicador do direito, a quem
compete observar, no caso concreto, a proporção entre a pena e a transgressão
do réu. A resposta penal deverá ser sempre correspondente ao dano causado
pelo crime, conforme seja necessário para sua prevenção e reprovação.
Além do mais, consoante precedentes deste Superior Tribunal, somente:
a) a falta de fundamentação ou b) a manifesta desproporcionalidade na fixação
da pena permitem o reexame da dosimetria em habeas corpus.
No caso, a pena-base da paciente foi fixada acima do mínimo legal em
razão da conduta social (cinco condenações anteriores, irrecorríveis, pelo mesmo
crime de estelionato) e das consequências desfavoráveis do crime.
A respeito do tema controvertido:
“A Terceira Seção desta Corte Superior, no julgamento do EAREsp 1.311.636,
realizado em 10.04.2019, por maioria, firmou precedente segundo o qual as
diversas condenações pretéritas devem ser atreladas apenas aos maus antecedentes, pois
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
126
IV – Dispositivo
À vista do exposto, concedo o habeas corpus parcialmente, a fim de: a) corrigir
a atecnia da sentença e nomear corretamente as condenações irrecorríveis da
paciente como maus antecedentes (e não como conduta social); b) afastar a con-
sideração negativa das consequências do crime; c) aplicar a fração de 1/5 em
razão da prática de três estelionatos em continuidade delitiva. Em consequência,
reduzo a pena final da ré para 1 ano, 9 meses e 18 dias de reclusão, mais 18 dias-
multa, mantidos o regime inicial semiaberto e os demais termos da sentença condenatória.
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-
das, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
130
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Ribeiro Dantas (Relator):
Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, com pedido de liminar,
interposto por Felipe Bruno Morais, contra acórdão do Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais, cuja ementa registra:
“HABEAS CORPUS. CONTRAVENÇÃO PENAL. PORTE DE ARMA
BRANCA. CONDENAÇÃO. INOCORRÊNCIA DE AMEAÇA ILEGAL
AO DIREITO DE IR E VIR DO PACIENTE.
O habeas corpus é instrumento de tutela do direito de liberdade individual no
sentido de ir, vir e ficar, não se admitindo sua utilização diante da inexistência
de qualquer ilegalidade ou abuso de poder que resulte em coação ou ameaça
a esse direito constitucionalmente protegido.
Não havendo qualquer ameaça ilegal à liberdade de locomoção do paciente,
a denegação da ordem se impõe.
V.V.
A falta de regulamentação legal da contravenção penal descrita no art. 19 da
LCP (porte de faca) afasta a incidência, in casu, do Direito Penal, devendo
ser rejeitada a denúncia por falta de justa causa (Desembargador Doorgal
Andrada).”
Consta dos autos que o recorrente foi condenado, pela prática da con-
travenção penal prevista no art. 19 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, à pena de
1 mês de detenção, substituída por pena restritiva de direitos consistente em
prestação pecuniária.
Não se conformando, a Defensoria Pública estadual interpôs o recurso
em análise, sustentando, em síntese, que: a) não há justa causa para o pros-
seguimento da ação penal, em razão da atipicidade do fato; b) não há que se
falar em tipicidade da conduta na qual o Recorrente restou condenado, pois
ausente qualquer possibilidade de concessão de licença para o porte de arma
branca, em especial, uma faca; c) a execução da pena imposta em razão de
condenação por fato atípico configura claramente a ilegalidade.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 131
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Ribeiro Dantas (Relator):
Pretende a defesa, no presente recurso, o reconhecimento da atipicida-
de da conduta praticada descrita na peça acusatória, qual seja a contravenção
penal de portar arma branca, prevista no art. 19 do Decreto-Lei nº 3.688/1941.
Como cediço, em relação às armas de fogo, o art. 19 da Lei de Contra-
venção Penal foi tacitamente revogado pelo art. 10 da Lei nº 9.437/97, que,
por sua vez, também foi revogado pela Lei nº 10.826/03. O porte ilegal de
arma de fogo caracteriza, atualmente, infração aos arts. 14 ou 16 do Estatuto
do Desarmamento, conforme seja a arma permitida ou proibida. Entremen-
tes, permaneceu vigente o referido dispositivo do Decreto-Lei nº 3.688/1941
quanto ao porte de outros artefatos letais, como as armas brancas.
A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da possibilidade de
tipificação da conduta de porte de arma branca como contravenção prevista
no art. 19 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, não havendo que se falar em violação
ao princípio da intervenção mínima ou da legalidade, tal como pretendido.
Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte:
“AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ECA. ATO INFRA-
CIONAL EQUIPARADO À CONTRAVENÇÃO PENAL PREVISTA
NO ART. 19 DO DECRETO-LEI Nº 3.688/1941. ALEGAÇÃO DE ATI-
PICIDADE DA CONDUTA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGI-
MENTAL DESPROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da possibilidade de tipifi-
cação da conduta de porte de arma branca como contravenção prevista no art.
19 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, não havendo que se falar em violação ao
princípio da intervenção mínima ou da legalidade.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
132
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da ré para julgar extinta sua
punibilidade em relação ao delito previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90,
pelo pagamento integral do crédito tributário constituído em nome de Josiane
Garcia Sampaio, nos termos do art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 7 de maio de 2020.
Desembargador Federal Fausto de Sanctis – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
134
RELATÓRIO
O Desembargador Federal Fausto de Sanctis:
Trata-se de apelação criminal interposta por Josiane Garcia Sampaio,
nascida aos 19.03.66, em face da r. sentença acostada às fls. 385/390v., pro-
ferida pelo Exmo. Juiz Federal Roberto Modesto Jeuken (7ª Vara Federal de
Ribeirão Preto/SP), a qual julgou procedente o pedido contido na denúncia para
condenar a ré pela prática do crime previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137,
de 27 de dezembro de 1990, c/c o art. 69 do Código Penal, à pena privativa
de liberdade de 2 (dois) anos de reclusão para cada crime, totalizando 8 (oito)
anos de reclusão, no regime semiaberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa
para cada crime, totalizando 40 (quarenta) dias-multa, no valor unitário de
R$ 500,00 (quinhentos reais). Incabível a substituição da pena corporal por
restritivas de direitos.
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Josiane
Garcia Sampaio, como incursa nas sanções do art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137,
de 27 de dezembro de 1990, combinado com o art. 71 do Código Penal (fls.
200/202).
Narra a exordial que a acusada, na qualidade de sujeito passivo da obri-
gação tributária, nos anos-calendário de 2007, 2008, 2009 e 2010 (exercícios
2008, 2009, 2010 e 2011, respectivamente), teria suprimido parte do imposto
de renda pessoa física (IRPF), mediante declarações falsas de despesas médicas,
bem como gastos com previdência privada. Intimada a comprovar as dedu-
ções feitas nas declarações de ajuste anual, no curso da fiscalização realizada
pela Receita Federal, teria informado que tais deduções foram equivocadas,
solicitando as retificações pertinentes para o devido pagamento do tributo.
Apurou-se o crédito tributário de R$ 71.348,63 (setenta e um mil, trezentos e
quarenta e oito reais e sessenta e três centavos), já acrescido de juros de mora
e multa proporcional.
A consolidação definitiva do crédito tributário ocorreu em 06.07.2013 (fls.
176/177) nos autos do Procedimento Administrativo-Fiscal 15956.720031/2013-
91. Referido crédito foi inscrito em Dívida Ativa da União em 24.09.2013,
sob nº 80.1.13.009558-20 (fls. 191/194).
A denúncia foi recebida em 14 de maio de 2014 (fl. 204).
Processado regularmente o feito, sobreveio a sentença, publicada em
31 de março de 2016 (fl. 391).
Em sede de apelação, a acusada pleiteia, preliminarmente, a extinção
de sua punibilidade no que tange aos períodos de 2007 e 2008, em razão do
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 135
VOTO
O Desembargador Federal Fausto de Sanctis:
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia (recebida em
14.05.2014 – fl. 204), em face de Josiane Garcia Sampaio, como incursa nas
sanções do art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, com-
binado com o art. 71 do Código Penal, porquanto, na qualidade de sujeito
passivo da obrigação tributária, nos anos-calendário de 2007, 2008, 2009 e
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
136
punir o acusado, o que pode se dar em qualquer fase do processo, não haven-
do óbice à sua apreciação pelo juízo de primeiro grau, mesmo após prolatada
sentença de mérito.
3. Ordem concedida parcialmente para que a autoridade impetrada aprecie
o pedido.” (TRF 3ª Região, 5ª Turma, HC 5020270-08.2018.4.03.0000, Relª
Juíza Fed. Conv. Raquel Coelho Dal Rio Silveira, j. 22.10.2018, intimação via
sistema data: 27.11.2018) (grifo nosso).
“HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PA-
GAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. TRANCAMENTO DE AÇÃO
PENAL. ORDEM CONCEDIDA.
1. A denúncia imputa ao paciente a prática do delito previsto no art. 1º, inciso
I, da Lei nº 8.137/90, diante da omissão em declarar rendimentos tributáveis
ao Fisco, aduzindo que ‘o crédito tributário em questão, vinculado ao Proces-
so Administrativo Fiscal 19515.00134/2010-73, foi definitivamente constitu-
ído em 02.04.2014 (fl. 320 do apenso) e inscrito em Dívida Ativa da União
em 10.10.2014, encontrando-se ativo e exigível, sem registro de pagamento
integral ou parcelamento vigente’.
2. Entretanto, de acordo com o que consta no extrato da Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional acostado aos autos, no dia 02.03.2017, o Processo Ad-
ministrativo Fiscal 19515.002.134/2010-73 foi ‘extinto por pagamento com
ajuizamento a ser cancelado’.
3. A decisão ora impugnada, por sua vez, publicada no dia 23.11.2017, ou
seja, após quase 9 meses da decisão administrativa que extinguiu o proces-
so administrativo fiscal por pagamento, aduziu que ‘segundo informação da
PFN, o crédito tributário encontra-se na situação ‘ativa com ajuizamento a
ser prosseguido’, não havendo que se falar, ao menos por ora, em extinção da
punibilidade’.
4. Contudo, o que se vislumbra dos documentos que acompanharam a impe-
tração é que houve o pagamento integral e a extinção do débito tributário vin-
culado ao Processo Administrativo Fiscal 19515.00134/2010-73, razão pela
qual o trancamento da ação penal é medida que se impõe.
5. Cumpre ressaltar que, de acordo com o art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03, o paga-
mento integral do débito tributário, a qualquer tempo, é causa de extinção da punibili-
dade. Precedentes.
6. Ordem concedida para determinar o trancamento da Ação Penal
0000563-60.2017.4.03.6181.” (TRF 3ª Região, 5ª Turma, HC 5002418-
68.2018.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Paulo Gustavo Guedes Fontes, j.
25.04.2018, intimação via sistema data: 02.05.2018) (grifo nosso)
Portanto, conforme se extrai do acima disposto, ainda que a quitação
integral do débito tenha ocorrido após o recebimento da denúncia, deve
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 143
ser extinta a punibilidade da apelante, nos termos do art. 9º, § 2º, da Lei nº
10.684/03, dispositivo em pleno vigor e com ampla aplicabilidade.
Ressalte-se, por oportuno, que a extinção da punibilidade constitui
matéria de ordem pública, que pode ser conhecida de ofício, em qualquer grau
de jurisdição, nos termos do art. 61 do Código de Processo Penal. Considera-
se que o Estado não tem mais interesse em punir o acusado, o que pode ser
reconhecido em qualquer fase do processo, não havendo óbice à sua apreciação
pelo juízo de primeiro grau ou mesmo após ser prolatada sentença de mérito.
No caso em concreto, a inscrição em Dívida Ativa da União do crédito
tributário tratados nestes autos ocorreu em 24.09.2013, sob nº 80.1.13.009558-
20 (fls. 191/194). Em simples análise aos extratos trazidos pela Procuradoria
da Fazenda Nacional (fls. 476/477v.), constata-se que o crédito tributário
constituído em nome de Josiane Garcia Sampaio, constante da exordial acu-
satória, foi integralmente quitado junto ao Fisco.
Dessa forma, considerados todos os argumentos expendidos, compro-
vado o integral pagamento do tributo a qualquer tempo, imperiosa a extinção
da punibilidade da apelante, sendo este o caso dos autos.
Diante do exposto, voto por dar provimento à apelação da ré para julgar ex-
tinta sua punibilidade em relação ao delito previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº
8.137/90, pelo pagamento integral do crédito tributário constituído em nome
de Josiane Garcia Sampaio, com fulcro no art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03,
tudo nos termos da fundamentação.
É o voto.
Desembargador Federal Fausto de Sanctis – Relator
Jurisprudência
DECISÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, Embargos Infringentes e
de Nulidade AGEXPE 0014457-69.2019.8.08.0035, em que são as partes as
acima indicadas, acorda o egrégio Tribunal de Justiça do Espírito Santo (Câ-
maras Criminais Reunidas), na conformidade da ata e notas taquigráficas da
sessão, que integram este julgado, em, à unanimidade: Conhecido o recurso
de Guerino Comércio e não provido.
VOTO
Conheço do recurso porquanto adequado e tempestivo. Quanto ao
mérito recursal, o embargante pleiteia a prevalência do voto que entendeu
pela impossibilidade da unificação das penas de detenção e reclusão, sob o
fundamento da natureza distinta de ambas, em sentido contrário aos votos
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 145
quanto constituem penas de mesma espécie, ou seja, ambas são penas privativas
de liberdade. 2. As reprimendas de reclusão e de detenção devem ser somadas
para fins de unificação da pena, tendo em vista que ambas são modalidades de
pena privativa de liberdade e, portanto, configuram sanções de mesma espé-
cie. Precedentes do STF e desta Corte Superior de Justiça (REsp 1.642.346/
MT, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 17.05.2018, DJe 25.05.2018). 3.
Agravo regimental improvido.” (AgRg no HC 473.459/SP, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 19.02.2019, DJe 01.03.2019)
“EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RE-
CURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. UNIFICAÇÃO DE PENAS.
RECLUSÃO COM DETENÇÃO. WRIT NÃO CONHECIDO. I – A Ter-
ceira Seção desta Corte, nos termos do entendimento firmado pela Primeira
Turma do col. Pretório Excelso, sedimentou orientação no sentido de não
admitir habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que im-
plica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em
que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal,
seja possível a concessão da ordem de ofício. II – ‘A teor do art. 111 da Lei nº
7.210/84, na unificação das penas, devem ser consideradas cumulativamente
tanto as reprimendas de reclusão quanto as de detenção para efeito de fixação
do regime prisional, porquanto constituem penas de mesma espécie, ou seja,
ambas são penas privativas de liberdade’ (AgRg no HC 73.459/SP, Quinta
Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 01.03.2019). Habeas cor-
pus não conhecido.” (HC 540.636/SC, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo
[Des. Conv. do TJPE], Quinta Turma, j. 05.11.2019, DJe 11.11;2019)
“PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO. HABEAS CORPUS SUBSTI-
TUTIVO DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. UNIFICAÇÃO DE PE-
NAS. RECLUSÃO COM DETENÇÃO SUPERVENIENTE. WRIT NÃO
CONHECIDO. I – A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento
da Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de
não admitir habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que
implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais
em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal,
seja possível a concessão da ordem de ofício, em homenagem ao princípio
da ampla defesa. II – In casu, o paciente cumpria pena de 15 (quinze) anos e
6 (seis) meses de reclusão (regime fechado), sobrevindo as condenações de
6 (seis) anos e 1 (um) mês de reclusão (regime fechado) e de 1 (um) ano de
detenção (regime semiaberto). III – ‘A teor do art. 111 da Lei nº 7.210/84,
na unificação das penas, devem ser consideradas cumulativamente tanto as
reprimendas de reclusão quanto as de detenção para efeito de fixação do regi-
me prisional, porquanto constituem penas de mesma espécie, ou seja, ambas
são penas privativas de liberdade’ (AgRg no HC 473.459/SP, Quinta Tur-
ma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 01.03/2019). Habeas corpus
não conhecido.” (HC 486.763/RS, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, j.
21.03.2019, DJe 28.03.2019)
Deste modo, sem maiores delongas, nego provimento ao recurso.
É como voto.
Jurisprudência
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes da Terceira Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, vencida a Relatora, Dra. Viviane,
concederam a ordem, sem prejuízo da manutenção das medidas protetivas de urgência.
Na origem, expeça-se alvará de soltura em favor de Tayrone Vasconcelos Machado, por
este processo, e notifique-se a vítima acerca da concessão de liberdade ao paciente.
Custas na forma da lei.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
148
RELATÓRIO
Dra. Viviane de Faria Miranda (Relatora):
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pela Dra. Francieli
Weischimer, advogada, em favor de Tayrone V. M., recolhido cautelarmente
no sistema prisional desde 03.02.2020, pela suposta prática do delito de lesão
corporal qualificada, prevista no art. 129, § 9º, do Código Penal, e do crime
previsto no art. 24-A da Lei Maria de Penha, em razão do descumprimento
das medidas protetivas deferidas nos autos do Expediente 141/2.20.0000242-2.
Em suas razões, a impetrante sustentou que o paciente está a sofrer
constrangimento ilegal, uma vez que decretada sua prisão preventiva sem que
presentes as hipóteses autorizadoras do art. 312 do Código de Processo Penal.
Referiu, nessa toada, que o decisum fustigado carece de devida fundamenta-
ção. Teceu considerações acerca do princípio constitucional da presunção de
inocência e da possibilidade de substituição da custódia cautelar preventiva
por medidas cautelares diversas (fls. 04/13).
Em 26.03.2020, a liminar foi indeferida, sendo dispensadas as infor-
mações (fls. 140/149).
Neste grau de jurisdição, em parecer exarado pela Dra. Luciana Maria
Ribeiro Alice, Procuradora de Justiça, o Ministério Público manifestou-se
pela parcial concessão da ordem (fls. 154/160).
O impetrante peticionou, requerendo a reconsideração da liminar (fl.
164), o que indeferido (fl. 168).
É o relatório.
VOTOS
Dra. Viviane de Faria Miranda (Relatora)
“HABEAS CORPUS PREVENTIVO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO
ÂMBITO FAMILIAR CONTRA A MULHER. LEI Nº 11.340/06. DES-
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 149
1 “Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:
I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;
II – se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no
inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal;
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
150
III – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou
pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;
IV – (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 1º Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando
esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade
após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (Redação dada pela Lei nº 13.964,
de 2019)
§ 2º Não será admitida a decretação da prisão preventiva com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena
ou como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)”
2 Pacote anticrime comentado: Lei 13.694, de 24.12.2019. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 82.
3 Alerta Rogério Sanches da Cunha (Promotor de Justiça do MPSP) que, “Na esteira da jurisprudência do STJ, o § 2º
do art. 312 do CPP, acrescentado pela Lei nº 13.964/2019, reconhece que a urgência intrínseca às cautelares exige
a contemporaneidade dos fatos justificadores dos que se pretende evitar com a segregação processual. Tese outra
não se coaduna com a excepcionalidade da prisão preventiva, princípio que já de ser observado para a convivência
harmônica da cautela pessoal extrema com a presunção de não culpabilidade (STJ, HC 509.878/SP, j. 05.09.2019)”
(in: Pacote anticrime: Lei 13.964/2019 – comentários às alterações no CP, CPP e LEP. Salvador: Juspodivm, 2020. p.
253).
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 151
4 “Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada e fundamentada.
(Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concre-
tamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I – limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a
questão decidida; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
154
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada
pelo julgador; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V – limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem
demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a
existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)”
5 “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura,
observados os seguintes princípios:
(...)
IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob
pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou
somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o
interesse público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)”
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 155
6 STJ, HC 289.373/MG, 6ª Turma, Relª Minª Marilza Maynard (Desª Conv. do TJSE), DJe 05.06.2014.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 157
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus Criminal
2072464-90.2020.8.26.0000, da Comarca de Santos, em que são pacientes
Guilherme Carvalho Franco Saraiva e Wilson Daniel de Oliveira e impetrante
Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Acordam, em sessão permanente e virtual da 13ª Câmara de Direito
Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:
Concederam a ordem, para cassar a decretação da prisão preventiva dos Pacientes Wil-
son Daniel de Oliveira (Wilson Daniel de Carvalho) e Guilherme Carvalho Franco
Saraiva (Guilherme Carvalho Franco Saraiva). Caso os mandados de prisão expedi-
dos pelo Juízo a quo ainda não tenham sido cumpridos, determinaram a expedição de
contramandados de prisão; caso já tenham sido cumpridos, determinaram a expedição
de alvarás de soltura clausulados. V.U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores Moreira da
Silva (Presidente sem voto), Cardoso Perpétuo e Augusto de Siqueira.
São Paulo, 15 de maio de 2020.
Desembargador Luis Augusto de Sampaio Arruda – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 – Jurisprudência
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Voto nº 13340
Vistos.
Tânia Cristina Oliveira dos Santos, Defensora Pública do Estado de
São Paulo, impetra este habeas corpus, com pedido liminar, em favor de Wilson
Daniel de Oliveira (Wilson Daniel de Carvalho) e Guilherme Carvalho Franco Saraiva
(Guilherme Carvalho Franco Saraiva), apontando como autoridade coatora o
MMº Juiz de Direito da 5ª Vara Criminal da Comarca de Santos, alegando, em
síntese, que os pacientes estão sofrendo constrangimento ilegal, em razão da
decisão que decretou a prisão preventiva, carente de fundamentação, amparada
na revelia dos pacientes e em fatos ocorridos em 2018, sem demonstrar em
termos concretos a necessidade da manutenção da medida. Aduz que não estão
preenchidos os requisitos da prisão preventiva, que não haviam sido impostas
medidas cautelares, que os pacientes não têm conhecimento do processo, pois
não foram ouvidos durante a fase inquisitiva e não foram citados, bem como
que o mandado de prisão foi expedido durante a pandemia da “Covid-19”.
Assim, requer a concessão da liminar, para que sejam expedidos alvarás
de soltura ou contramandados de prisão em favor dos pacientes, bem como,
ao final, que seja concedida a ordem de habeas corpus, convalidada a liminar,
para sanar o constrangimento ilegal que sofrem os pacientes (fls. 01/07).
O pedido liminar foi indeferido (fls. 49/51).
Prestadas as informações pela digna autoridade Judiciária dita coatora
(fls. 57/60), manifestou-se a douta Procuradoria Geral de Justiça pela concessão
da ordem, sem prejuízo da aplicação das medidas cautelares previstas no art.
319, incisos I, IV e V, do Código de Processo Penal (fls. 86/88).
É o relatório.
No caso presente, verte das informações prestadas pela autoridade
Judiciária dita coatora, datadas de 23.04.2020, que os Pacientes foram denun-
ciados como incursos no art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal, porque,
em 01.10.2018, previamente conluiados entre si e com outras pessoas cujas
identidades remanescem desconhecidas, supostamente subtraíram, para si,
diversos bens pertencentes à vítima M. O. S. Consta que os pacientes, junta-
mente com mais dois indivíduos não identificados, alugaram informalmente
um dos imóveis de propriedade da vítima e, na data dos fatos, adentraram a
casa dos fundos existente no mesmo terreno, onde, em tese, subtraíram a res
furtiva. Após a vítima noticiar os fatos, policiais encontraram os Pacientes na
posse de alguns dos bens subtraídos, ocasião em que eles confessaram o furto
dos objetos e do dinheiro. Recebida a denúncia, os Pacientes não foram en-
contrados para serem citados, tampouco constituíram defensor, sendo citados
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 161
por edital. Após, foi proferida decisão determinando a suspensão dos autos,
nos termos do art. 366 do CPP, e decretando a prisão preventiva. Aguarda-se
a citação dos Pacientes e o cumprimento dos mandados de prisão (fls. 57/60).
Ademais, analisando-se os autos, verifica-se que não consta represen-
tação pela decretação da prisão preventiva pela autoridade policial ou pedido
da decretação da medida pelo Ministério Público ou de eventual assistente
da acusação, tendo o Juízo a quo decretado, de ofício, a prisão preventiva dos
Pacientes (fls. 41/42).
Todavia, o art. 311 do Código de Processo Penal, com a redação con-
ferida pela Lei nº 13.964/2019, dispõe: “Em qualquer fase da investigação
policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz,
a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por
representação da autoridade policial”.
Nesse contexto, diante do advento da Lei nº 13.964/2019, que con-
feriu nova redação do art. 311 do Código de Processo Penal, não há mais a
possibilidade de decretar a prisão preventiva de ofício, ainda que no curso da
ação penal.
Cumpre salientar que não se olvida que o § 5º do art. 282 do Código
de Processo Penal dispõe que “o juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes,
revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo
para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que
a justifiquem”. Todavia, in casu, o Juízo a quo não voltou a decretar a prisão
preventiva, e sim a decretou sem que houvesse pedido anterior para tanto.
Dessa forma, sendo evidente o constrangimento ilegal que sofrem os
Pacientes, em face dos quais foram expedidos mandados de prisão em razão
da decretação da prisão preventiva de ofício, a despeito do disposto no art.
311 do Código de Processo Penal, vedando a decretação, de ofício, da medida,
impõe-se a concessão da ordem para que seja sanado referido constrangimen-
to, sem prejuízo da nova decretação da prisão preventiva dos Pacientes ou de
medidas cautelares diversas, após a devida provocação.
Ante o exposto, concede-se a ordem, para cassar a decretação da prisão
preventiva dos pacientes Wilson Daniel de Oliveira (Wilson Daniel de Car-
valho) e Guilherme Carvalho Franco Saraiva (Guilherme Carvalho Franco
Saraiva). Caso os mandados de prisão expedidos pelo Juízo a quo ainda não
tenham sido cumpridos, expeçam-se contramandados de prisão; caso já te-
nham sido cumpridos, expeçam-se alvarás de soltura clausulados.
Providencie o cartório as intimações e notificações de praxe.
Desembargador Luis Augusto de Sampaio Arruda – Relator
Divergência Jurisprudencial
95/30 – EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO. Apenado que não exerce atividade laboral
ou de estudo por conta da ausência de oferta estatal. Inexistência de meios, no estabelecimento
prisional, para o desempenho de atividades laborais ou pedagógicas. Pretendido cômputo fic-
tício de potenciais dias de trabalho ou estudo. Inadmissibilidade. Remição que só é devida em
caso de efetivo trabalho ou estudo. Inteligência do art. 126 da LEP. Impossibilidade de afastar a
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 95 – Abr-Maio/2020 171
Retroação benéfica da lei penal posterior que não pode ser afastada pelo Poder Judiciário. Art.
5º, XL, da CF. Garantia individual fundamental que constitui cláusula pétrea constitucional.
Precedentes do egrégio STF. Conversão do julgamento em diligência para abertura de vista às
partes para avaliar a possibilidade de concretização do novo instituto despenalizador. (TJSP;
ACr 0002105-13.2015.8.26.0587; Ac. 13557771; 12ª C.D.Crim.; Rel. Des. Heitor Donizete de
Oliveira; DJESP 29/05/2020; p. 3.512)
Ausência de previsibilidade. Prova testemunhal a apontar que o réu não descumprira disposi-
tivos da Norma Regulamentar 18. Existência de equipamentos de proteção contra a queda de
materiais no edifício em construção. Dúvida razoável. Absolvição mantida. Recurso conhecido
e desprovido. (TJSE; ACr 202000302990; Ac. 6434/2020; C.Crim.; Rel. Des. Diógenes Barreto;
DJSE 05/05/2020)
acessados por terceiros, de qualquer lugar, desde que esteja conectado à internet, como é o caso
dos autos. 4. Dosimetria. 4.1. Pena-base redimensionada e mantida acima do mínimo legal. 4.2.
Aplicação da regra da continuidade delitiva apenas quanto ao delito previsto no art. 241-A da
Lei nº 8.069/90 (Código Penal, art. 71). 5. Condenação mantida. Recurso do Ministério Público
Federal provido em parte. Dosimetria da pena alterada. Recurso defensivo desprovido. (TRF 3ª
R.; ACR 0010772-30.2014.4.03.6105; SP; 1ª T.; Rel. Des. Fed. José Lunardelli; DEJF 08/05/2020)
não sendo de se confundirem, patrimônio nacional com bens da União. II – Laudo pericial
atestando não estar a área referida nos autos localizada em unidade de conservação estadual ou
federal. Não configurada hipóteses do art. 109, IV, da Constituição Federal. III – Recurso em
sentido estrito improvido. (TRF 2ª R.; RSE 0500283-05.2016.4.02.5111; 1ª T.Esp.; Rel. Des.
Fed. Antonio Ivan Athié; DEJF 21/05/2020)
no que concerne à fração de incremento (1/6), na justa medida em que o acusado ostentava a
profissão de advogado e, nesta qualidade, maculou preceito ético de indicada profissão (que,
aliás, mostra-se essencial à Justiça a teor do art. 133 da Constituição Federal). todavia, colhe-
se da sentença a existência de erro material quanto à referência ao artigo de Lei que prevê a
agravante em tela, devendo, desta feita, ser corrigido de ofício o ponto ora em comento para
que conste que a majoração em comento encontra fundamento de validade no art. 61, II, g,
do Código Penal. 5. Negado provimento ao recurso de apelação interposto pelo acusado. De
ofício, redução do quantum majorador aplicado na 1ª etapa da dosimetria penal e correção do
erro material acerca da referência ao artigo de Lei que prevê a agravante reconhecida em 1º
grau de jurisdição. Além disso, redimensionamento do número de dias-multa, de forma pro-
porcional à fixação da pena privativa de liberdade, fixação do regime aberto e substituição da
pena corporal por penas restritivas de liberdade. (TRF 3ª R.; ACR 0000570-21.2015.4.03.6117;
SP; 1ª T.; Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis; DEJF 28/05/2020)
física e psicológica da vítima. Inviável, assim, a aplicação das cautelares diversas (previstas no
art. 319 do CPP), ou a concessão da prisão domiciliar ao paciente, pois medidas insuficientes e
inadequadas ao caso em concreto. Da pandemia causada pelo vírus Covid-19. Verifica-se que a
autoridade judiciária está atenta aos problemas de saúde supostamente enfrentados pelo paciente
(artrose e lesões fraturais). Inexistem informações de que o estabelecimento prisional não esteja
fornecendo a medicação necessária. Além disso, irrelevante, no caso em concreto, a suposta
retratação. Isso porque, a própria vítima relatou ao magistrado, que temia por sua integridade
física, em face da reiterada conduta do paciente, que insiste em desrespeitar ordens judiciais
(crime de ação penal pública incondicionada, tipificado no art. 24-A da Lei nº 11.340/06),
em tese. Os demais argumentos apresentados pela defesa inclusive deverão ser analisados no
momento processual oportuno, já que não é possível o exame de provas, de forma pormeno-
rizada, em sede de habeas corpus. A prisão preventiva não ofende o princípio constitucional da
presunção de inocência, nem se trata de execução antecipada da pena. A Constituição Federal
prevê, no seu art. 5º, LXI, a possibilidade de prisão, desde que decorrente de ordem escrita e
fundamentada. Constrangimento ilegal anunciado não demonstrado. Ordem denegada. (TJRS;
HC 0046475-09.2020.8.21.7000; Proc. 70084081165; 2ª C.Crim.; Relª Desª Rosaura Marques
Borba; DJERS 27/05/2020)
Destaques do Volume nº 94
– Reflexões sobre o Tempo e o Direito Penal a Partir da Obra O Tempo do Direito
por Aury Lopes Junior, Professor e Doutor, e Jádia Larissa Timm dos Santos, Especialista e Mestra
– As Mudanças na Legislação Penal e Processual Penal com o Pacote Anticrime
por Benigno Núñez Novo, Advogado e Doutor
– O Arrependimento Posterior e o Desnível de Tratamento Jurídico-Penal Envolvendo Delitos
Patrimoniais e Socioeconômicos: uma Violação ao Princípio da Igualdade e o Parâmetro Regulatório
da ADO 26/DF
por Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira, Mestre e Doutor
– Ciberterrorismo no Brasil: uma Análise Sobre os Desafios Impostos pelos Ciberataques e a
Efetividade da Lei Antiterrorismo
por Greice Patrícia Fuller, Mestre e Doutora, e Gabriel Oliveira Brito, Advogado e Mestrando
– A Presunção de Inocência na Investigação Criminal
por Túlio Leno Góes Silva, Delegado de Polícia e Mestrando, e Felipe Martins Pinto, Mestre e Doutor
– A Responsabilidade Penal do Indutor Prevista no Artigo 218 do Código Penal: uma Releitura à Luz
do Princípio da Vedação à Proteção Insuficiente
por Diego Leal Nascimento, Especialista e Mestrando, e Américo Bedê Freire Junior, Mestre e Doutor
Destaques do Volume nº 93
– Prisão em Segunda Instância Versus Justiça como Liberdade e a Garantia Máxima da Personalidade
pela Presunção da Inocência
por Marcelo Negri Soares, Mestre e Doutor, Maurício Ávila Prazak, Mestre e Doutor, e Patrícia
Jorge da Cunha Viana Dantas, Especialista
– A Constitucionalidade do Confisco Alargado e da Ação de Extinção de Domínio
por Silvio Luís Ferreira da Rocha, Mestre e Doutor, e Daniela Marinho Morganti, Advogada e Especialista
– Feminicídio: Fundamento da Pena Qualificada
por Flavio Rodrigues Calil Daher, Mestre e Doutor, e Roberta Cordeiro de Melo Magalhães,
Professora e Mestre
– Reflexões sobre o Regime Inicial de Cumprimento de Pena
por Gustavo Octaviano Diniz Junqueira, Mestre e Doutor, e Oswaldo Henrique Duek Marques,
Professor e Doutor
– Criminalização Objetiva do Inadimplemento Tributário: Abordagem Dogmática Penal
por Thiago Buschinelli Sorrentino, Professor e Mestre, e Cesar Luiz de Oliveira Janoti, Professor e
Especialista
– Análise Crítica da Inserção de Norma Penal Incriminadora, no Ordenamento Jurídico Brasileiro, por
Ato Internacional: o Exemplo da Convenção de Palermo e a Figura da Organização Criminosa
por Gustavo Britta Scandelari, Professor e Mestre
– A Teoria Geral do Crime na Encruzilhada
por Orlando Faccini Neto, Mestre e Doutor
I L
IMPRONÚNCIA LAVAGEM DE DINHEIRO
- Homicídio qualificado. Materialidade com- - Pena. Lavagem praticada com habitualidade
provada. Indícios de autoria insuficientes. e por intermédio de organização criminosa.
Acervo probatório frágil. Impronúncia. Causa especial de aumento de pena. Ausência
Necessidade. Recurso provido. TJMG (Em.
de teratologia, ilegalidade flagrante ou abuso
95/44).............................................................. 175
de poder. STF (Em. 95/53)............................ 177
INTERNAÇÃO
LEANDRO BASTOS NUNES
- Medida socioeducativa. Ato infracional aná-
logo ao delito de estupro de vulnerável (art. - Artigo: “Crimes Relacionados à Pandemia do
217-A do CP). Configuração da hipótese Novo Coronavírus”....................................... 30
de aplicação da medida socioeducativa de
LIBERDADE PROVISÓRIA
internação prevista no art. 122, I, do ECA.
TJSE (Em. 95/7)............................................. 164 - Estelionato. Cabimento. Pandemia do Co-
ronavírus. Covid-19. Crime cometido sem
J violência ou grave ameaça à pessoa. Primazia
da dignidade humana e da saúde individual e
JOÃO DANIEL RASSI, VICTOR coletiva. TJSP (Em. 95/65)............................ 182
LABATE E ELOISA YANG
- Furto qualificado tentado. Prisão preventi-
- Artigo: “Aspectos Criminais da Lei Geral de
va. Revogação. Paciente que responde pela
Proteção de Dados e a Tutela Penal dos Dados
suposta prática de crime que não envolve
Pessoais”.......................................................... 18
violência ou grave ameaça à pessoa. Con-
JÚRI cessão do benefício de liberdade provisória,
- Execução automática de sentença condena- mediante a imposição das medidas cautelares
tória do Tribunal do Júri. Não possibilidade. elencadas no art. 319, I e IV, do CPP. TJSP
STJ (Em. 95/47)............................................. 175 (Em. 95/40)..................................................... 173
- Homicídio duplamente qualificado tentado. - Pornografia infantojuvenil. Prisão preventiva.
Conselho de sentença que desclassificou Insurgência defensiva pleiteando a concessão
o delito para lesão corporal de natureza de liberdade provisória. Cabimento. TJSP
grave. Cassação. Possibilidade. TJMG (Em. (Em. 95/4)....................................................... 163
95/49).............................................................. 176
- Homicídio tentado qualificado pelo motivo LICITAÇÃO
torpe e recurso que dificultou a defesa da - Fraude. Adesão como carona em licitação na
vítima. Cassação da decisão do conselho de modalidade pregão. Arts. 85 e 88 do CPPM.
sentença. Decisão manifestamente contrária Fixação do foro militar. Regra geral. Lugar
à prova dos autos. Inviabilidade. Decote da
da ocorrência da infração penal. STM (Em.
qualificadora do recurso que dificultou a
95/38).............................................................. 173
defesa da vítima. Não cabimento. Fração de
redução da pena de metade acertada. Razoa- - Fraude. Art. 89 da Lei 8.666/93. Dolo es-
bilidade. TJMG (Em. 95/50)......................... 176 pecífico ausente. Prejuízo ao Erário não
- Pronúncia. Absolvição sumária ou despro- comprovado. Art. 312. Peculato. Ausência
núncia por negativa de autoria. Impossibi- de dolo. Sentença absolutória mantida. TRF
lidade. Indícios fortes carreados aos autos. 1ª R. (Em. 95/37)............................................ 172
Prevalência do princípio do in dubio pro
societate. TJMG (Em. 95/51)........................... 177 LIVRAMENTO CONDICIONAL
ção da pena privativa de liberdade, fixação do de uma das condutas. Materialidade e autoria
regime aberto e substituição da pena corporal incontestes em relação às demais. Dosimetria
por penas restritivas de liberdade. TRF 3ª R. inalterada. Prisão preventiva mantida. TRF 2ª
(Em. 95/85)..................................................... 187 R. (Em. 95/5).................................................. 163
- Violência doméstica. Lesão corporal (art. 129, - Programa de compartilhamento de dados.
§ 9º, do CP). Pleito de absolvição. Tese de Uso. Pena. Dosimetria. Alterações. Re-
legítima defesa. Art. 25 do CP. Inocorrência. conhecimento da continuidade delitiva.
Utilização pela ré de meios imoderados para Crimes previstos nos arts. 241-A e 241-B da
repelir a conduta de sua sobrinha. Pleito Lei 8.069/90. Materialidade incontroversa.
de redução da pena-base. Acolhimento.
Autoria e elemento subjetivo. Comprovação.
Valoração negativa da circunstância judicial
TRF 3ª R. (Em. 95/60)................................... 180
das consequências do crime baseada na de-
claração da vítima de que ainda sente dores PRESCRIÇÃO
no dedo lesionado. TJSE (Em. 95/89)........... 189
- Marco interruptivo. Publicação da sentença
PENA DE MULTA em cartório. A prescrição se interrompe na
- Natureza de sanção. Competência da vara de data da publicação da sentença em cartório,
execuções penais. Prescrição. Prazo da pena ou seja, de sua entrega ao escrivão, e não da
privativa de liberdade. Prescrição da pena de intimação das partes ou publicação no órgão
multa reconhecida. TJES (Em. 95/59).......... 180 oficial. TRF 1ª R. (Em. 95/61)....................... 181
- Procuração com endereço falso para mo- 3.688/1941). Depoimento da vítima. Alegação
dificação de competência. Prescrição. Não de especial valor e que deve ser cotejado com
ocorrência. Materialidade, autoria e dolo as demais provas. Dúvida que atua em favor
demonstrados. A utilização de procuração do réu ainda que em contexto de violência
contendo dado inverídico sobre fato juri-
doméstica. TJSE (Em. 95/88)........................ 189
dicamente relevante, como na hipótese dos
autos, em que a indicação de endereço falso - Acórdão do TJRS – Prisão preventiva. Me-
se deu com a finalidade de burlar as regras didas protetivas. Descumprimento. Lesão
de competência judicial. é conduta que se corporal. Não realização de audiência, na
amolda ao tipo penal do art. 304 c/c o art. presença das partes, com vistas a analisar
299 do CP. O dolo específico, consistente alternativa diversa da prisão. Liberdade con-
na finalidade de alterar a verdade sobre fato
cedida.............................................................. 147
juridicamente relevante está evidenciado.
Mantida a exasperação da pena-base, por- - Ameaças. Descumprimento de medidas
quanto devidamente fundamentada e calcada protetivas. Audiência de custódia. Prisão
em elementos concretos extraídos dos autos. preventiva. Retratação da vítima. Ação penal
TRF 3ª R. (Em. 95/66)................................... 182 pública incondicionada. A circunstância de
USO INDEVIDO DE UNIFORME, que o paciente não foi conduzido para au-
DISTINTIVO OU INSÍGNIA MILITAR diência de custódia não enseja a revogação
da prisão. Inviável, a aplicação das cautelares
- Condenação em primeiro grau. Atipicidade
formal da conduta. Militar da reserva re- diversas (previstas no art. 319 do CPP), ou
munerada. Não acolhimento. Atipicidade a concessão da prisão domiciliar ao paciente,
material da conduta. Ausência de dolo pois medidas insuficientes e inadequadas ao
específico. Não comprovação. Princípio da caso em concreto. A prisão preventiva não
bagatela imprópria. Não reconhecimento. ofende o princípio constitucional da presun-
Tratando-se o delito do art. 172 do CPM de ção de inocência, nem se trata de execução
crime de mera conduta, inexiste elemento antecipada da pena. TJRS (Em. 95/87).......... 188
subjetivo específico, de sorte que a conduta
caracteriza-se pela vontade livre e consciente - Lesão corporal (art. 129, § 9º, do CP). Pleito
de utilizar uniforme, distintivo ou insígnia de absolvição. Tese de legítima defesa. Art.
militar que sabe não ter direito a usar. STM 25 do CP. Inocorrência. Utilização pela ré
(Em. 95/86)..................................................... 188 de meios imoderados para repelir a conduta
de sua sobrinha. Pleito de redução da pena-
V base. Acolhimento. Valoração negativa da
circunstância judicial das consequências do
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA crime baseada na declaração da vítima de que
- Absolvição. Ameaça e contravenção penal de ainda sente dores no dedo lesionado. TJSE
vias de fato (art. 147 do CP e art. 21 do DL (Em. 95/89)..................................................... 189
Edital de Submissão de Artigos