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Helena Regina Lobo da Costa !
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Direito Penal Econômico e
Direito Administrativo
Sancionador

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ne bis in idem como medida de
;
Vo política sancionadora integrada
i CD
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N
VO

Tese apresentada à Egrégia Congregação


da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo como exigência parcial
ao concurso de Livre-Docência junto
ao Departamento de Direito Penal,

Medicina Forense e Criminologia.

•7 í
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cr

■: São Paulo
2013
■: BIBLIOTECA
I CENTRAL
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Helena Regina Lobo da Costa - n3

2.1. A APROXIMAÇÃO EXISTENTE: A “


DIREITO RENAL E O AUMENTO DO “
! f

DIREITO ADMINISTRADOR

Consoante mencionado no capítulo anterior, uma das mais marcantes


características do direito penal econômico consiste em sua conexão com o
i: direito administrativo, seja para definir o ilícito, seja para apurá-lo. No campo
I
economico, de fato, direito penal e direito administrativo aproximam
-se a
: largos passos, verificando-se, de um lado, uma administrativização do direito
penal e, de outro, um recrudescimento punitivo do direito administrativo I
i
sancionador412.
O fenômeno da administrativização do direito penal já foi amplamente
diagnosticado pela doutrina413. Sua principal característica consiste no
excesso de complementações a que fica sujeito o ilícito penal. Assim, para
!
compreender a tipicidade — e muitas vezes, também a ilicitude de uma
1 conduta - é necessário recorrer a regulamentos, portarias, resoluções e até
i ;
mesmo a atos administrativos, caso das autorizações, permissões e licenças.
i Não raro a ilicitude penal resume-se à desobediência à administração.
Descrevendo esse fenômeno, Miguel Reale Júnior afirma que:
a administrativização do Direito Penal torna a lei penal um
l::
regulamento, sancionando a inobservância a regras de conveniência
l :
da Administração Pública, matérias antes de cunho disciplinar.
No seu substrato está a concepção pela qual a lei penal visa antes a

!
ll:
: W É o que cons,aumente, Silva Forné. Cf.: SILVA FORNÉ, iculos pam
RI^OLL^JoséLuis^taLfiTC^ncAH^f^èrecAopeno/OTEee/nüevos/^/oilibrohomenajea^ProfeKv

DoctorDonJoséCerezoMir.Madr^jSdCadmMrtrati^''Cf.' DONINL NRissima//voto


•administrativização do penal epenahaçs', differenziazioneesussidiaricíà.Milano: Giuffinè,
anuoledelIUIecilopenole: a democrazia pena ZUNICA R0DRlCUEZ,
2004.pp. 97 e ss. Também administrativo sancionador: JHacia una
j! Laura. Relaciones entre derecho penal y oerec
"administrativización" dei Derecho pe c
a|ización„ de, Derecho administrativo
PHomenaJe al Dr Maríno Borbcro Santos in
sancionador?. In: NIETO MAR m, 1 Salamanca. pp. W'444,2001. v. 1.
memorian. Cuenca: Ediciones Questõesfundamentais do direito penai reWsiladas.
413 Por exemplo, vide: DIASJorge de 8 a MATO Astolfo di. Dirítto penale deli impreso. 5. ed.,
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999-^ ' JensejtsderStrafe:Rechtsgüterschutzinder
Milano: Giuffré, 2003. P- 79- BARATT/^AIessa ^strafrechts. |n: HAFT, Fritjof, HASSEMER,
Risikogesellschaft. ZurNeubevvertungderrun ulrich. (CoordJStrafgerechtigkeit:
Winfried, NEUMANN, Ulfrid,SCHILD, Wolfg Heidelberg: Müller, pp. 393-4i6, i993-
Festschrift für Arthur Kaufmann zum 70. 6
I
i 114 ■ Direito Penal Econômico e Direito Administrativo Sancionador

Helena Regina Lobo da Costa - n5

“organizar”do que a proteger, sendo, portanto, destituída da finalidade


de consagrar valores e tutelá-los.414 entretanto, com essa afirmação. Ap esar
. . e^a parecer decorrer d e um
afastamento das iincriminações e daqueles conteúdos
No âmbito do direito penal econômico, esse fenômeno é particularm ente que poderiam ser
abarcados pelo direito penal - e esse é um
acentuado415. Até mesmo Donini, que enxerga na administrativização
modelo completamente tradicional e amplamente utilizado, vislumbra
um é q«, c„m„ j4 ,»b,i„h„u L»d™, c;“c;d;a^t
sua
como as ,eo=S se ou»e, po, um, diferenciação eone Mu.fr* «
maior importância e extensão em setores do direito penal econômico416
mere prohwita pertence ao passado científico”420.
Essa maior incidência da denominada administrativização
ocorre O grande problema desse aspecto da administrativi

; porque se trata de uma seara na qual o direito penal incide sobre áreas já zação é a des-
consideração dos limites necessários à utilização do direito penal. Criminalizam-
intensamente reguladas por outros ramos do direito.
-se matérias meramente organizacionais; condutas ainda não plasmadas como
Essa regulação tem como finalidade ordenar axiologicamente negativas; comportamentos que correspondem somente a
e estruturar atividades
econômicas, geralmente de forma muito mais complexa, flexível e dinâmica uma desobediência administrativa, sem consequências mais graves421. E, com
do que o direito penal. Ocorre que, sendo o direito penal derivado e isso, o direito penal adentra âmbitos que, provavelmente, sequer deveríam ser
pen enco412 acabará por se deparar com um contexto cuja racionalidade regulamentados por meio de instrumentos punitivos.
ç b»„„,e divern d, Giu„«, ,„b« „ tema> ^ q„e , &
Sob o prisma do destinatário da norma, criam-se enorme insegurança
ZZ T1"ní'Í“1Ó6Í“ <™di> 1” ™° "«cessariamentt
e profunda desorientação. Surgem intensas dificuldades para se conhecer e
cronologico) a regulamentação penal418.
identificar as condutas proibidas criminalmente Já se propôs, por tal razão,
d* doutrina afirru, que o direito conferir maior amplitude à figura do erro de proibição422 - o que, entretanto,
jl; cocon gura-se como mk fMpMUtf». Nío se concorda, não veio a ser adotado pragmaticamente.

4’4
415
p. 21.V.1. y derecho penal econômico. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 20, n. 99, pp.
416
327‘356, nov./dez. 20u.p. 329.
420 LÜDERSSEN Klaus. Soziale Marktwirtschaft, Finanzmarktkrise und Wirtschaftsstrafrecht.
In- KEMPF Eberhard ______ VOLK, Klaus (Hrsg.) Die Handlungsfreiheit des Unternehmers -
!; Wiftschqftiiche Perspektiven, slrarechtlicl.euneelischeSchranken. Berlin: Gruyter Recht, pp.21-25,

417 É o que ensina Faria Costa:''97'2'7' 2°°4-p' 2°°- ' "" C°°rd)' * 0ereC/'° W 2009-p. 21.
421 Sobre o tema, vide, dentre outros: CARVALHO, Érika Mendes de Limites e alternativas à
quinada têm a P°rUma' ^^^0™°"^“' qUer num sistema capitalista quer administrativização do Direito Penal do Ambiente. Revisto Bras.le.ra de Oencas Cnm.no,s, Sao
depois como,/,Ver' nU™ primeira apm^a^
Paulo, v. ,9, n. 92, pp. ""-«^.^''reconhecida no ordenamento positivo da Alemanha
direito penal ecoZ r°"odo siste™ sancionado', pT,? d,'re't0 penal econômico. Este vem 422 A relevância do erro de Pro,b ^ âmbito do direito penal econômico e, somente apos,
Costa. Sobre a conreprâo de"Vada 6 periférica." COCTA^o' ^ persPectiva- 3 ilicitude do Ocidental num primeiro mom k ,areceque já na primeira guerra o legislador alemão,
colóquiopreparatórinH prindP'°s do direito n f de Faria- ANDRADE, Manuel da foi introduzida no direito penal. * á de tJoa_fé pode facilmente se enganar no que se
*^/topPenoP/™°™daA'DftFreiburg,setembroí Pe"ai económico: notas a propósito do reconhecendo que mesmo aquele qu n0 campo do djrejt0 pena|
418 CIUNTA Faústc r Sâ° Paul0: Avista do/írfh 982'ln: PODVAL' «obeno (Org.). Temas refere às proibições do direito Pe^°^ de^ontra-ordenações. Cf, R.NCK,
e.rea,isocfetan?'Í?9™s zoor.p. ,09. tributário e de divisas, na le. de crimes econom c 0 tem3/ vjde, ainda: LEITE, Alaor.
dizendo que “o caráter n5 n° G.’ GiaPPichelli, 2ooa n*si ^ Delitti contro 1'economia pubblica Cerd. Wirtschaftsrecht. Kõln etal, pa3u|0- Atlas, 2013. DANNECKER, Gerhard.
a estreita correlação oup 0 exc*usiv° da regulamentar' ^ autor complementa seu raciocínio Dúvida e erro sobre a proibição no tireito pem01. xa desrepublik Deustschland. In: WABNITZ,
Die Entwicklung des Wirtschaftsstra Handbucb des Wirtschafts- und Steuerstrafrechts.
J| 419
quando tais correlações orn*6 Gntre 3 norma penal e rq° PCnal exp,ica' sob ° perfil funcional,
Nessa linha, Silva Sánchez afir^.^ níVel da “P^dadeZ/b/T extraPenais' sobretudo
Heinz-Bernd, JANOVSKI, Thomas. coNDE, Francisco. Begriff und Reform des
München: Beck, pp. 1-66, 2007-P- ç^ummfmANN, Bernd, GONZÁLES, CarlosSuáres (Hrsg.)
: que^co^tituye^com^^^^H^vlo^egnmdeoçjjgjj160105 defa actividad empresarial, el
I 0quiapiohibHo* SILVA cxM!í®u*atonaextrapenal.Surgendelitos Carl Heymanns, pp- 6i-74/ 1994* PP-
CHEZ, Jesús-María. Teoria dei delito
CO e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -117
116 - Direito Penal Econômi

No direito penal econômico brasileiro, há incontáveis exemplos do órgãos do sistema penal para aferir se houve ou não conduta criminosa. Ocorre,
quadro narrado acima. A Lei dos Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/98) é como bem aponta Carmona, que esse olhar não é isento, pois é o próprio
pródiga em trazer figuras de difícil compreensão, de absoluta ilegitimidade representante do sujeito tutelado pelo tipo penal, a administração pública, quem
ou que criminaliza condutas de mera desobediência administrativa. Também faz a verificação da ofensa que sofreu, havendo claro conflito de interesses426.
a figura da evasão de divisas, prevista no art. 22, da Lei n. 7.492/86, traz Além da falta de isenção, a administração trabalha a partir de
com plementação normativa de difícil aferição pelo destinatário da norma. parâmetros de racionalidade diversos daqueles adotados pelo direito penal.
Desse modo, a administrativização promove, ainda, a não efetividade Assim, apresenta tendência a considerar ilícita a simples desobediência
da norma penal, pois não consegue motivar o destinatário - que precisará, às suas resoluções, e não uma lesão ou colocação grave em perigo do bem
no mínimo, ter conhecimento dos comportamentos proibidos para que jurídico427.
possa deixar de praticá-los. O direito penal se vê, pois, diante de configurações bastante diversas

Elio Lo Monte, em idêntico sentido, afirma que “o elevado número de sua racionalidade.
de preceitos, comandos, obrigações e proibições penalmente presididas No campo do direito administrativo, por sua vez, verifica se uma
representa uma das causas de inefetividade da resposta penalística”423. acentuação do seu aspecto punitivo428. A origem remota desse fato pode ser
encontrada no alargamento das fiinções estatais, que passaram a englobar
O uso excessivo da norma penal em branco acaba por gerar, também,
I a regulação de questões atinentes à defesa do consumidor, do meio- ^
dispersão da criminalização, além de conjunturalidade em seu uso. Esses
ambiente, da liberdade e livre concorrência econômicas, à regulaçao e
ii dois fatores, como aponta Munoz Conde, dificultam qualquer intento
diversas atividades, como telecomunicações, transportes, dentre outros,
i sistematizador e produzem, no intérprete e no aplicador da norma, grande
regulação é feita não apenas por meio do estabelecimento de normas, mas
confusão e insegurança, não se sabendo com clareza e certeza o que o
\
também fia fi.cafeação d. ««cumprimento e . consequente .mpostçao
legislador pretende proibir424. Este autor chega a apontar a norma penal
em branco como uma porta falsa” no direito penal, que representaria uma de sanções em caso de inobservância.
burla ao princípio da legalidade425. mais recente da acentuação do campo
Mas há, ainda, uma causa
to do Estado no contexto de globalizaçao,
Um segundo aspecto da administrativização revela-se nas fases de punitivo. Diante do enfraquecimen
das diretamente por órgãos estatais
apuração ou processamento do ilícito. No campo do direito penal econômico, muitas atividades que antes eram pratica

p«::r: zzzzzsz*. •—**• - -


ncessionárias ou permissionárias,
em regra, é um órgão da administração que detecta e classifica a conduta, bem
como produz elementos
que, posteriormente, poderão ser utilizados pelos
atividades.

2 ‘***
proyecto de ley orgânica de códiennpnfií delitos contra el orden socio-económico en el
132,1982. p. 107. h p naK Cuodemos de Política Criminal, Madrid, n. 16, pp.i07" de "diritto burocra 11 ° a(econômico: consideraciones
criminógeno. lbid™^Q VASQUEZ, Ma nuelA. Derecho pen
425 Ibidem. p. 108. Também Elio Lo Monte
0 uso da norma penal em função meram3™*65*3 erri senticl0 semelhante, referindo-se a que 427 No mesmo sentido, aba , igg7, p. 39. . aclua| y deficiente
com consequente dificuldades interorMn,en 6 sanaonat°da de regras de natureza privada, jurídicas y econômicas. • yALDÉS, Antonio. N°tas AcluaudadPenal, Madrid, n.
428 Exemplificativamente,vi ■ stacjónyjunsdiccio
instrumentos para garantir sua obsetvânr! mesmo quando a norma civilística já preve
penale ,n tema di criminaltià económTca n T M0NTE' Eli°- Le disfunzioni deltintervento regulación de Ia relac.on entre a
dez. ,999.p. mo. °m Ca'L lndl“Penale, Pádova, ano 2, n. 3, pp. ,,0,-1133, ^ 24, pp. 623-645, jun. 2002. p- 626.
Econômico e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -119
I n 8- Direito Penal

Deve-se concordar, portanto, com Terradillos Basoco, no sentido de Em nossa doutrina e, especialmente, em nossa jurisprudência prevalece
statal está fortemente administrativizada, tanto em sua ainda o paradigma de “independência entre as instâncias”, que além de não
que a intervenção e
faceta promocional quanto na sancionadora . apresentar fundamentação científica convincente, gera diversos resultados
paradoxais. Além disso, constrói um modelo que pouco se coaduna com a
Di Pietro, discorrendo sobre aspectos do Estado Social, aponta ter
ideia de unidade da ordem jurídica, como um sistema jurídico estruturado e
ocorrido uma hipertrofia do Poder Executivo - 0 que, certamente, também
dotado de racionalidade interna. O ordenamento jurídico não pode ser tido
contribui para a inflação sancionatória administrativa
como um conjunto desconexo de normas jurídicas, submetidas somente ao
Esse fenômeno não ocorre isento de problemas. Além de ser necessário princípio da hierarquia432.
questionar sobre os fundamentos e os limites, materiais e processuais, do
Evidentemente, afirmar que 0 ordenamento jurídico constitui uma
alargamento da atuação punitiva da administração pública - o que vem
lí unidade não significa dizer que ele é uniforme e trabalha todas as questões
ganhando espaço nos estudos do direito administrativo - também é preciso da mesma forma, com a mesma metodologia e alcançando os mesmos
[) observar que os órgãos administrativos atuam, muitas vezes, sem observar a resultados. Como observa Lüderssen,“a unidade do ordenamento jurídico
i:i racionalidade imbuída em qualquer função sancionadora. não significa uniformidade do ordenamento jurídico; naturalmente, existem
Nesse diapasão, Maia Filho e Maia anotam que a administração com níveis de ilicitude e também de culpabilidade, ou, dito com mais cautela,
frequência comporta-se, no exercício do poder administrativo sancionador,
II; de imputação”433.
como se praticasse atos executivos, desconsiderando as especificidades da bastante ilustrativa dessa concepção de diferentes níveis
1 atuação punitiva431.
Uma figura
de ilicitude, porém coordenados entre* " jtíXJs Fdho
Portanto, a hipertrofia do âmbito punitivo da administração pública
nos “círculos concêntricos de ilicitude . bobre esse
não veio acompanhada de um conjunto de regras e princípios que delimite
é preciso:
; ; e imponha parâmetros rigorosos à aferição do ilícito e imposição da sanção.
N.«P—,'Z
í! círculos concêntricos, o Pen ^ estará também, tfsofodo,
2.2. A APROXIMAÇÃO NECESSÁRIA
};■
assim, qualquer fato que s ^ estar fora dele mas
dentro de todos os demais, por própria aos demais
2.2.1 . A construção da ilicitude penal A luz dos sujeito à incidência da responsabilidade que e p P
DADOS DAS
ESFERAS EXTRAPENAIS (administrativa, civil etc.).
Essa aproximação entre direito penal e direito administrativo, conforme
verificado traz diversos problemas e dificuldades a serem refletidas nos dois 432 PUERTA, Luis-Román. Duplicidad sai
nCÍOm1e^yd^o^l- Madnrid: Consejo General dei

âmbitos. Entretanto, praticamente não


se verificam novas propostas para
coordenar melhor esses espaços de sob
reposição.
- 'ss^ss^stsssat^ssssxss:
429 TERRADILLOS BASOCO Juan M F
430 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Buenos Aires: Ad-Hoc, 2001. p. 99
Sao Paulo: Atlas, 2001. p. 32. nanedode administrativa na Constituição de 1988. 2. ed.,
431 MAIA FILHO, Napoleào Nunes, MAIA Má • Celso Sanchez, BRESSER n são Paulo: Saraiva, PP-
econômico: análise contemporânea.
sonaonodor: origem e controle jurídico
Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -121
12o-Direito Penal Econômico e
i
Consequentemente, o que é permitido no direito civil ou comercial ilicitude penal. Nessa linha, a proibição penal “não pode ser dissonante das
de desencadear qualquer proibição no direito penal. Contudo, o qUe regras de direito civil ou comercial, até porque, tratando-se de exercício de
não po
atividade privada, a liberdade é a regra”437. Além disso, diante da inexistência
é proibido no direito comercial ou civil não resulta automaticamente em
ibição também no direito penal, que exige outras qualificações435. de normas claras para determinados procedimentos no campo civil ou
proí
empresarial, tampouco se pode criminalizar a realização indevida de tais
Um bom exemplo é fornecido por Alexandre Macedo Tavares:
procedimentos - a não ser em casos de fraude438, pois se trata de uma figura
é de se sublinhar a impossibilidade do cometimento de um crime
ilícita seja no campo extrapenal, seja no penal.
fiscal de qualquer espécie que, simultaneamente, não configure
infração tributária administrativa de índole forma ou material Outro ponto importante a ser considerado devem ser as consequências
(=crime impossível); já a recíproca não é verdadeira, vez que poderá jurídicas de atos administrativos como permissões, autorizações, licenças
haver configuração de infração tributária material ou forma (v.g., e, inclusive, acordos firmados com o administrado. Ainda que não haja
falta: insuficiência do pagamento de tributo ou não-cumprimento
previsão expressa, na esfera penal, de ausência desses atos como elementos
de deveres instrumentais)436
típicos ou como causas extintivas da punibilidade, eles não podem ser
li Entretanto, parece que tal concepção não foi ainda suficientemente te desconsiderados na construção da ilicitude penaT39.Tamp ouco
Ij,'
simplesmen
apreendida a ponto de gerar resultados satisfatórios para a solução de casos sua consideração somente na tipicidade subjetiva, como um indicativo de
concretos. Pouco se caminhou nesse sentido para além da vinculação entre a boa-fé e, portanto, de ausência de dolo do agente, parece ser satisfatória.
esfera fiscal e os crimes tributários, por meio da jurisprudência do Supremo É interessante observar que muitas vezes a própria jurisprudência acaba
Tribunal Federal - matéria, aliás, que persiste apresentando, agora, novos
por criar soluções para essas questões com base muito mais enip—
desafios teóricos e práticos bastante relevantes.

:' Este trabalho não pretende enfrentar tais questões, que transbordam
que ofereça um recurso adequado de saução
líí: seu objeto, mas não pode deixar de mencioná-las, seja para situar o proble ma
concepção de que, quanto ao crime configuração do tipo;
I; que se dispõe a examinar (a aplicação de sanção penal e administrativa
diíriaiLir»it;:L..o.re^çlodod.oo
, em virtude de um mesmo fato), seja para ressaltar q
: ue os esforços de ou a de que na apropriação
racionalização precisam ser muito mais ibilidade do agente.
• !f
amplos se se pretende atingir um antes do recebimento da denúncia extinguida a p un
grau de racionalidade -
, e’ Por consequência, de legitimidade e efetividade efetivo déficit dogmático que existe
Essas construções revelam o
!Ü da atuação punitiva do Estado. de forma cabal essas intrincadas
nesse campo, sem, contudo, solucionar
Esses esfo ^ Precisam perpassar pela construção coordenada do ilícito, uma estrutura teórica
. questões, não apenas por deixarem de apresent
, cT™ ,"T“VeI “>“■*'» » que é proibido , „ que é permitido
nos campos cml, come,ciai e/ou tributári0e, a partir desse dado, construir a —COSSEIA. ESsani,0-

Coimbra: Centro de Estudos judiean , PP^ ^ ngo existem regras^ errada de


435 LÜDERSSEN, Klaus. Reguli
interdisziplinãren SystemâtSemna1'bstrt8“lierung u"d Wirtschaftsstrafrecht: Versuch einer 438 Ibidem.p. 21. Prossegue 0 autor a nào pode haver^jtodcjvj, e administrativo são
Handlungsfreiheit des Uniemehmefs -°JíM!!F*?erhard'_____ / V°LK, Klaus. (Hrsg.) D* elaboração de um balanç , P Regras claras e rigorosas dojoc cit.
Schronken.Beriin:GruyterRecht Dn ,rtschafihche Perspektiven, strarechtiiche une etische balanço - a não ser se fraudu ■ pré-delituais". CORRE , ^ casos _ a autorização
a luz do caso Mannesmann, em outm í?°9*p* 2"‘0 autor também discutiu essa questão pressupostos paracrimina iz jo_ou,aomenos,em doa autorização para jogos
Mrtsdwftsrechts//. Baden: Nomos 20^^°' LÜDERSSEN, Klaus. Entkriminalisierung des A literatura alemã consideraemp -Q Sobre o tema, ' christian. Zurechnung
439
436 TAVARES, Alexandre Macedo A PP‘" e 48‘
undRechtferíigungolsKategonolpnnvp
Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -123
122 - Direito Penal Econômico e
1

suficientemente fundada na teoria do delito, mas também por serem consiste em um processo de decisão, sendo 0 seu mérito passível de exame,
excepcionais - a maior parte dos casos acaba por ser solucionada com base seja quanto à análise da adequação entre os meios escolhidos e os fins, seja
na ideia de “independência entre as instâncias”, ainda que dando ensejo a no escrutínio da legitimidade dos fins escolhidos444.

soluções contraditórias e paradoxais. Portanto, a doutrina penal não deve se resumir aos estudos dogmáticos,
Muitas outras pautas de pesquisa devem ser percorridas para aprimorar adotando apenas a estratégia de “asumir el arbitrio irracional dei legislador e
0 relacionamento entre o direito penal e o direito administrativo440 e superar intentar atemperarlo mediante principios limitadores en el momento de la

o paradigma da independência absoluta entre as instâncias, estruturando- aplicación dei derecho”445 ,mas deve também desenvolver critérios destinados
à criação de legislação minimamente racional.
se uma relação não de identidade, mas de coordenação entre os diferentes
ramos que incidem na formação do ilícito e de sua sanção. Nesse sentido, três pressupostos mínimos precisam ser observados: a
li descriminalização, a consideração da subsidiariedade do direito penal e de
2.2.2. Da necessidade de se desenvolver uma política
sua fragmentar iedade446.
SANCIONADORA INTEGRADA Sem descriminalizar uma série de condutas já reiteradamente apontadas
Para além de refletir e buscar solucionar os complexos problemas dogmá­ pela doutrina como descabidas, inúteis, desproporcionais ou disfuncionais
ticos trazidos pela aproximação entre direito penal e direito administrativo, não é possível atingir qualquer grau de racionalidade no d.re.to penal
ij é, também, preciso adotar um enfoque conjunto no campo da política cionalidade, tampouco é possível alcançar alguma
econômico. E, sem ra
!!
sandonadora. Assim, seguindo-se a proposta de Rando Casermeiro441, crê-se que efetividade.
!ÍÍ uma política jurídica conjunta, que leve em conta os dois ramos sancionadores,
Aftalión, nesse sentido, já aduzia q ue:
é imprescindível para aportar um mínimo de racionalidade à questão.
;!> E, u« hccho con.prob.do por
O autor observa, com razão, que a dogmática somente poderá funcionar cuando un pais se excede en a ac " disposiciotles sancionatorias.
unmomentoquelamulümddenorma.yispo^^^ ^ ^
! alheia a distorções se estiver diante de elementos legislativos elaborados
a partir de bases mínimas de racionalidade; do contrário, seguirá sendo que en ningún momento Sl£í pue se cansan de soportar
íli! infrutífera. Por isso, acredita ser fúndamental o desenvolvimento de uma posibilidades y la conKptúan injusto. [...] Siendo
en sus transacciones un han p q cas0s de inexcusable
firme teoria da legislação442. ello así, no se trata, a nuestro juico, de amp ^ q sino sólo
ÍÜ Diez Ripollés, que vem se dedicando desidia o de mala fe de muc os co incjustriales honestos
recorrentemente ao tema da de no cargar en la cuenta e °S “ estado de cosas dei que no
sistematização da legislação penal443, yde buenafelaresponsabibdadporun
acentua que o processo legislativo
son los responsables.
440 Dentre elas, a título de exemplo noHp
partindo do conceito de antiiuríriiriH J6 Crt?r 0 tra^a*ho desenvolvido por Hellmann, que, 444 Ibidem. p. 14- . *Sanktionenrecht" unitário que
ordem jurídica, avalia a aplicacão Hp de SUa fundamentação na ideia de unidade da 445 Ibidem. p. 103.
HELLMANN, Uwe-DieAnwendbarteitJT'?en}V de ilicitude do direito civil ao direito penal.
Carl Heymanns, 1987. der^vilredul,chen RechtfertigungsgründeimStrafrecht. Berlin:
441 RANDO CASERMEIRO, Pablo La d 'r bagatelares, quando nao deve ^iuseppe.'Crisi" deli djnttof "uolf0SÍS,emasanzionatonodel
sancionador. un análísis de políticTi^r'^ * °erecho Penal Y el Derecho administrativo
especialmentepp.3oe3i. J r,d,ca- Valencia: Tirant Io Blanch, 2010. Possim,
442 Ibidem. p. 39, dirittopenaíe delieconomia, e c.Abeledo-Perrot,i959 P-4'-
443 Dentre diversos trabalhos do l Pp.8i-,56 p.i30. perechopenal econômico. Buenos Aire -
roaonahdadedelosleyespenales■ Madrid^Trotta 2003^' V'de: °ÍEZ RIPOLLÉS'José lUlS'L° 447 AFTALIÓN, Enrique R. Uere h

ÍP
Econômico e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -125
124 - Direito Penal
j

Nessa linha, ganha especial importância, mais uma vez, a discussão Já no que se refere à subsidiariedade do direito penal, 0 campo dos
crimes econômicos revela-se bastante promissor, pois regulações extrapenais
antenormen te realizada sobre a concepção do direito penal econômico, que
não pode ser determinada por ideais de “criminalização da classe alta", que podem se mostrar muito mais adequadas e efetivas para a promoção das
condutas tidas como positivas e desincentivo às negativas. Além disso,
já se mostrou serem falaciosos. A descriminalização, pois, se impõe como
importante medida de racionalização do direito penal, assim como na maior a própria sanção administrativa mostra-se, em diversas hipóteses, mais
adequada do que a penal. Arnaldo Malheiros Filho, por exemplo, é um dos
parte de suas matérias.
muitos autores a concordar com essa linha, ao afirmar que:
Da mesma forma, refletir sobre a seleção do aparato sancionador a
em setores de grande regulação e fiscalização - como as relações
ser utilizado é igualmente fundamental. A atual afluência sancionadora, tributárias e a operação de instituições financeiras-punições adminis­
derivada da criação de ilícitos administrativos e penais praticamente trativas poderiam resolver problemas (carência de subsidiariedade)
idênticos, acarreta sobreposição normativa, conflitos na aplicação do gerados por condutas que não chegam a agredir o bem jurídico
direito e, especialmente, consternação e perda de autoridade, em razão de (carência de ofensividade) de maneira mais eficaz do que 0 faria o
Direito Penal (carência de idoneidade), sem, de modo algum, legitimar
o destinatário ter margem de segurança jurídica bastante reduzida448. O
': a conduta que desmerece repressão criminal.
! Iti legislador deve, pois, proceder a uma delimitação mais certa dos ilícitos449,
Outro exemplo é trazido por Thiago Bottini e Eduardo Oliveira, que
o que certamente proporcionará mais clareza e efetividade ao direito penal e
trabalho de Ela Wiecko453 sobre
ao direito administrativo sancionador. Igualmente, desonerando-se o aparato realizaram pesquisa estatística, na esteira no
os crimes contra o sistema financeiro, na qual foi verificado que, em regra, nos
! penal de ilícitos de menor gravidade, poder-se-á alcançar mais facilmente na esfera administrativa
í!; um maior grau de efetividade no direito penal econômico450. casos em que foi assinado termo de compromisso _
Mobiliários), não haveria instauraçao de
(junto à Comissão de Valores
O excesso de figuras acarreta, ainda, uma aplicação pontual do direito reconheceria a
inquérito policial, demonstrando que o próprio sistema
penal, que acaba por se revelar arbitrária e, ao final, injusta. Assim, caso não de superposição de esferas normativas. Nessa
se adira a uma ampla descriminalização, 0 bode expiatória se transformará inadequação de suas regrasesfera legislativa, deve ser discutida a adoçao de
em programa legítimo do direito penal, como já alertou Prittwitz451. linha, concluíram que, na 454. Lüderssen anota, seguindo
! j
1
regulamentação exclusivamente admimstraW^^^^ ^nômicos
Portanto, proceder à descriminalização de diversas condutas configura
essa percepção, que “quanto melhores os r0-nenais”455
o primeiro pressuposto de uma política sancionadora integrada. tivermos, menor será a necessidade daqueles,nr,d,co-pe

do direito penal ambiental,


448 452 MALHEIROS FILHO, Amaldo.O/l A P^aÉoquedefen^, encuentra en^ Ia necesidad de
SOLO,
449 . c/f. p. 29. Corcoy Bidasolo, nd, penal y
450 coordinaciondelaprotero P y|o ambiente: legitiuudadj ' Rafae! Lara(Coord.).
normativa e a imperfeição técnico-iurídiraP^nal am5*'ental' Por exemplo, que a hipennflaçao

por parte dos destinatários quanto dm fim' ?ue/esu tam em desconhecimento da norma tanto
inefetividade das normas sancionadnmc \/-a na[ll<? ^ue a devem aplicar são evidentes fatos de £>er«cAo penal de Ia empresa. Arrosadia.
administrativas y penales en matéria amhi/i JENZAGARCÍA, José Francisco. Las sanciones
CORCOY BIDASOLO, Mirentxu (Dir) I ara rr\L^xCÍOnes y Pr°blemas de articulación. In:
empreso. Arrosadia: Universidade Púhlim ri m ^fael (Coord.). Derecho penaI de lo
451 PRITTWITZ, Comelius. BegrenzuLd. w? aVarra'PP'593-6.2, P- 598.
454
die Crundsãtze der ultima ratio, der BestimmtlftSSt,?frechts durch die Rechtsgutslehre, sowie mercado de capitais. ,n: strafrecht. Sirafiertcidiger,
derAkzessorietát und der Subsidiaritãt In des Schuldgrundsatzes, Elsevier/CV, pp.i47->75.Risikomanagement und
(Hrsg.) D/e Hondlungsfreihei, des Un^mehmTP^berhard'* LÜDERSSEN, Klaus; VOLK, Klaus. LÜDERSSEN, Klaus. Augus. 2009. P- 494-
455
el/scheSchranken. Berlin: Gruyter Recht 2000 ~ Wirtschaftlic** Perspektiven, strarechtliche une Neuwied, Jahrgang 29
' y'pP‘ 53-6o. pp. 58-9.

V:
Econômico e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -127
126 - Direito Penal
l
Não apenas a sanção administrativa pode revelar-se mais efetiva no adequados de prevenção de condutas, afastando a atuação penal exatamente
âmbito econômico. Vem se examinando, com grande interesse, a possibilidade onde ela se revela mais fraca460. Nessa linha, deve 0 Estado estimular
de prevenção técnica ou interna às próprias empresas 6. sua formação, sem, todavia, tomar para si 0 papel de regulação. Reduzir
sanções das empresas que tenham adotado programas sérios e eficientes
Nessa linha, a título de exemplo, Hefendehl aborda a questão por
de compliance e usam códigos de conduta e de ética, bem implementados e
meio do exame da tríade business ethics, corporate governance e compliance^1.
fiscalizados, pode ser uma acertada medida estatal no sentido de estimular a
O autor sublinha a importância de certas regras de governança corporativa
adoção de normas de controle interno. Além disso, não se deve automatizar
em companhias com ações em bolsa, como a estrita separação entre direção
a punição criminal dos responsáveis pela implementação e cumprimento
e conselho de administração458. O conselho de administração não deveria
dos programas de compliance (compliance officers), para não desestimular o
;| ser composto por ex-membros do órgão diretivo, a não ser em casos
desenvolvimento de normas internas de prevenção - até porque, obviamente,
excepcionais, e membros de conselhos de administração de companhias tratando-se de responsabilidade penal, jamais poderá ser configurada sem
i. abertas com ações em bolsa não deveríam acumular mais de cinco mandatos
a presença de todos os pressupostos necessários.
!!■

ao mesmo tempo459.Tais regras podem, quiçá, se revelar muito mais efetivas


pois, que é necessário racionalizar e coordenar não apenas o
!j para prevenir ilícitos do que a criminalização de condutas praticadas no Vê-se,
área econômica, mas também
seio da empresa. direito penal e o direito administrativo na
as formas de regulamentação e autorregulação desse setor. Do contrário, a
1: Formas de autorregulação devem ser tidas, entretanto, não como desarticuladas gerará
substitutos absolutos do direito penal, mas como meios eficientes e insistência em se adotarem estratégias sobrepostas e
a perda de qualquer aptidao das tres esferas.
, que acumular
Volk nos lembra . r „„
as pcfratéáas
estrateg de prevenir
" condutas pelo

direito econômico e punir pelo direlt° ec0nÔmica. Além


Müller\%^2004 P^6 ' ^ (Hreg*)' Handbuch Wirtschaftsstrafrecht. Heidelberg:
a via do direito penal é suficrente bloquearia ou pervertería
1 457 Essas questões ganharam proeminência
ocorrência dos casos Enron no direito penal brasileiro especialmente após a disso, essa “utopia pouco concreta , a g
0 direito penal». ^ ^«Me exige af<«*o
Dessa maneira, a propn ^ coordenada entre direito penal e
direito penal econômico e da pmnrp . e^lstadosTr|buriais,2oii (Coleção doutrinas essenciais.
I viderSILVEIRA, Renato de Mello \nrtl' ca wAP'541’565‘Sobreo impacto da Lei Sarbanes-Oxley, de uma atuação refletida, conj g Hefende o estabelecimento de
mercado de capitais e 0 SarbamL n i SA^VAD0R nettO, Alamiro Velludo. A tutela penal do *-» administrativo. Po, «"“o dimi» P=n
al, buscando
SICA, Leonardo (Coord.). Resnnnçnhr^'^' "0vas considerações. In: RUIZ FILHO, Antonio;
e jurisprudência comentada Sãn p-, ‘ \ pena^na ot'v'dode econômico-empresarial: doutrina uma ciência dasubsidianedadem
458 O autor critica 0 sistema americano1 no 2010' PP* 371_396-
presidente do órgão de controle sp rónf, 6m aProximadamente três quartos das empresas o alternativas à ameaça de pena
Ro and. Corporate Governance and í!°do ór8aode direção da empresa. HEFENDEHL,
ekampfung der Wirtschaftskriminalitãf?11/6^ Et^ics: Scheinberuhigung oder Altemativen bei der
P*,22* inwnalitatUunstenzeitung, Tübingen! v. 61, n. 3, pp. 119-125,2006.
459 Ibidem. P-122. Apesar disso
460 Deforma se.—
Monatsschrifljur Kriminologi |jtische Probleme und dogmatische

Schwierigkeiten. junstenz neumANN, Ulfnd, P 2005. pp. 183-184.


462 ROXIN, Claus. SchlussbenditJ • et a|, Reter Lang, PP-
Rechtferíigung des Strajrechts. Fran
>soes excluídos das medidas /bidem,0narioS/ deixando exatamente aqueles qu

I
Econômico e Direito Administrativo Sancionador
128 - Direito Penal Helena Regina Lobo da Costa -129
(

A fragmentariedade impõe abandonar a concepção de que o direito (e ilegítimo) atribuir ao direito penal tarefas promocionais. Deixando-se
penal pode regular setores inteiros. A uma, porque o direito penal não é as ilusões de lado, o direito penal intervém para consolidar dispositivos já
instrumento regulador e, a duas, porque somente pode ser usado de forma tutelados por outros instrumentos normativos e a reprimir atos específicos467.
pontual, descontínua, voltado a condutas específicas, que apresentem
Elio Lo Monte também advoga a impossibilidade de atuações
acentuada reprovabilidade, e quando se revelar apto a atuar de forma eficiente promocionais por parte do direito penal, asseverando que “0 direito penal
naquele contexto. [...] não pode produzir transformações no terreno da economia. Ele não
Observar 0 postulado da fragmentariedade implica reconhecer que 0 pode ser chamado a preencher as lacunas deixadas por outros ramos do
direito penal não se presta a lidar com contextos de alta complexidade463, ordenamento”468.
1 em que não seja possível identificar e isolar condutas de seus contextos Entretanto, há quem defenda que, no âmbito do direito penal
sociais, econômicos ou políticos e nos quais não faça sentido, por conse­ econômico, o caráter subsidiário e fragmentário do direito penal deva ceder
guinte, imputar resultados desvalorados individualmente464. Esse dado é espaço. Isto porque a aplicação de pena a determinados comportamentos
especialmente importante no campo do direito penal econômico. Não se específicos consistiria em um meio frequentemente menos gravoso do que
está a negar, de forma absoluta e geral, a legitimidade do uso do direito a instituição de uma rede de controle amplo, por meio de mecanismos
penal nesse campo, mas é preciso depurá-lo de incontáveis condutas administrativos, destinada a todos os atores; do setor469. Ademais, a busca
criminalizadas sem qualquer legitimidade ou idoneidade da atuação penal, estabelecimento de uma “proteção
ií I
por uma tutela “efetiva” significaria 0
í ou, ainda, completamente insignificantes. Rainer Hamm observa, com razão,
sem lacunas pelo direito penal470.
•I que o direito penal vive das suas lacunas, em decorrência da taxatividade e Essa linha recebeu diversas críticas, em raaío de desconsiderar o
Ri da subsidiariedade que 0 caracterizam46^. ponto de vista d. pessoa apenada»'. Prittwte, com raalo, afirma ,ue quem
A lição de Bricola sobre defende «solução penal como a solução liberal ou o meio m.no, gmvo.o,
ÜÜ esse ponto é exata: “a sanção penal não
.!i! pode jamais assumir 0 1encargo de garantir uma gestão em seu conjunto, deve se pergunta, acerca de quem responde po, meses e anos de vrda em
mas somente de intervir
- Para impedir atos singulares”466, sendo utópico razão dessa concepção de justiça

:
conduta dos atores econômicos - 3° afirmarc|ue "Quando, em razão da complexidade da
I financeiro os limites exieirío* n„i_a°^e.n?s'masso^retudo-não se puder extrair do mercado 467
r.; penal econômico recuar - na rnelhm-T01?-0 ^ taxativ'dade do direito penal, deve o direito 468
baseado na compensação Dor nart a* ‘PoteseS/ a favor de um direito regulatório privado,
nos resultados econômicos de fnrm ° administrac,or, e que preveja altas muitas, baseadas
stoollicheDuldungrechtswidriqen sensíveis" HERMES, Georg. Die 469
464 Autores alemães têm apontado tendo. ^ Mü,,er' *88. p. 45- Rechtstexten. 2. aktualisierte und e
irmarem acordos processuais náauelp n ^ V,Sta 3 refativarT>ente ampla possibilidade de se 33.SCHÜNEMANN, Bernd. Altemat.ve KGldõdunisschríftjvrArmin Koufma .
crimes econômicos que vêm sendo feitof315- a,enorme quantidade de acordos relativos a Gerhard; HORN, Eckhard et. alli (Hrsgd.
ais casos, sobretudo em decorrência Hp na^ustll»a f um sinal de que ela não consegue lidar com Heymanns Verlag, 1989, pp- 629-649- P* .......
Lage des Wirtschaftsstrafrechts in DeutJhi3^^ GXÍdade-ACHENBACH' Hans.Zuraktuellen
465 HAMM r0°4 P* 571‘ H 3nd G°ltdammer'sArchivfòrStrafrechl, Heidelberg,
KEMPF,FÍ!1ehd'e^^^^^®fiScMdpnStrH^C^tS ^Urc^ d'r Grundsàtze der ultima ratio, der

472 PRITTWITZ, Cornelius. Begrenzu^de*tbeú der Tatbesv0lK, Klaus. (Hrsg.)


"2^nn1Chle PersPe^ven, strarechSkhe^ Hondlungsfreiheil des Unlernchmers'.
466 BRICÓU Franco°L Schranken' B^rlin: G™yter Recht, PP-
i : j Pm0k-V- Tom° 'liDWto delllmconeSa: Pr0filí costituzionali. In:_____ . ScrittididiriUO
onomia. Milão: Ciuffrè, ,997. pp. 3305-3342. P-334'-
Econômico e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -131
i 130 - Direito Penal

Devem-se, ainda, relembrar as razões anteriormente citadas para legislativa. Tais critérios478 podem ser considerados insuficientes, mas sua
ia do direito penal econômico, que também levarão
afastar uma autonomia fiinção é exatamente a de servir como um norte para a tomada de decisão
à não aceitação de lógicas e concepções específicas no campo da política legislativa, sem, contudo, substitui-la ou impedir a existência de um espaço
criminal. Portanto, também no campo do direito penal econômico, a legislativo de decisão discricionária.
fragmentariedade e a subsidiariedade têm contribuição importante para a Por fim, tratando-se de questões afeitas ao ambiente econômico, uma
legitimação do direito penal. Elas impõem limites à política criminal473 e política sancionadora bem articulada, que leve a atuações e resultados
devem, pois, configurar pressupostos e vetores permanentes ao se refletir mais claros e previsíveis, redundará também em maior segurança a todos
sobre uma política sancionadora única. aqueles que atuam no mercado. Esse aspecto pode parecer lateral e pouco
relacionado com as questões punitivas, porém significa um importante dado
Necessário frisar que esses princípios ganham especial relevância no
para a geração de investimentos e atração de atividades econômicas - muitas
campo da política legislativa. Apesar de se submeterem à verificação pela
1 ciência penal e controlados pela jurisprudência, têm um campo de aplicação vezes prefere-se um ambiente de grande rigor jurídico empresarial, mas
dotado de segurança, previsibilidade e confiabilidade nas instituições, a um
muito mais amplo como postulados político-criminais,pois não configuram
ambiente mais flexível, no qual impere a imprevisibilidade, a mutabilidade
princípios precisos, que consigam fornecer respostas evidentes474.
e a conjunturalidade479.
Esses três postulados, entretanto, são insuficientes para o desenvol­
vimento de uma pauta minudente destinada ao legislador475. É preciso, como 2.2.3. Delimitação da função de punir
buscou fazer Rando Casermeiro, concretizá-los em regras mais específicas476, relevante decorrente de uma aproximação científica,
O aspecto mais
preferentemente plasmadas em um texto legal, para que sua aplicação seja áticos e de política criminal, entre direito penal
incluindo-se aspectos dogm
mais factível. estabelecimento de limites mais rigorosos
e direito administrativo reside no
, Isso ocorreu, em boa medida, na Itália, onde, por meio de circulares do e claros ao âmbito punitivo do Estado.
Conselho de Ministros contendo critérios orientadores para a escolha entre
sanção penal e sanção administrativa477, se procurou sistematizar a escolha E“ P-*» f-' 7“
”480 . Alguns desses limites vêm
473 KÜHL, Kristian.
sobre as liberdades e os direitos subjetivo
Gerhard et ai ftSTÍÍ? U?d subsidiãres Strafrecht. In: SIEBER, Ulrich; DANNECKER,
W^nfisstrafrecht - Dogmatik, Rechtsvergleich, RecfUstatsachen:
estscnnft fur KlausTiedemann zum 7o. Ceburtstag. München: Carl Heymanns, pp. 29-46,2008. 478 E!pedncamenteqUümoàes4olhaerrt.d™“^lesUbe|Kia,para«^pii™.^^|^
P-32.
474 De forma semelhante, vide: Ibidem. p. 46.
de "indébita da genericWadem'*™ 3 Ududosa Practicabilidad dei principio de subsidiariedad,
como critério informado^ GARCÍaTo^0 COncret0' lo ^ dificulta su efectiva relevância
administrativo: texto y contexto riP l LB.ERT Ramon- La relación entre ilícito penal e dic» forma de
OLIVARES, Gonzalo, MORALES PRATS^e^n^^r°brj la distinción de ilícitos. Inr QUlNTERO
penales en memória dei Profesnr i« • .7™°' (Coord-)- &nuevo derechopenalespanol: estu
2001. p.353. se Manuel Valle Muniz. Navarra: Aranzadi, pp- 295'4° '
476 fc^NDO CASERMEIRO, Pablo. Op. cit. passim.
di beni e tutela di fuíz^ nella scefta f S°ri 7* ° tema' vide' e9A PADO VA NI, Tullio. Tutela
Cassazionepenate, Milano, n ? Dn a-, 7 o lt0/ contrawenzione e illecito amministrati • 480
sanzionatoriapenaleeamminítrariv/p •7(8'í,987- d°LCINI, Emilio. Sui rapporti fra tecn*®
PP- 777-797,1987. RlSta ,lalian° diDiritto e Procedura Penate, Milão, v. 3o' prirdia-a-diae procedimento a p
cum

i
Econômico e Direito Administrativo Sancionador Helena Regina Lobo da Costa -133
132 - Direito Penal
I
expressamente previstos na Constituição Federal - especialmente a partir Na esfera do direito administrativo, o alargamento da função punitiva
da proteção de direitos fiindamentais, que não podem ser violados por meio também parece ter restado relegada durante muito tempo. Além dos
da atuação estatal para além dos limites definidos constitucionalmente, bem mencionados limites constitucionais, não existe, por exemplo, lei específica a
de garantias processuais previstas tanto ao processo judicial quanto definir uma parte geral do direito administrativo sancionador. Há, é verdade,
como
ao administrativo481 e, ainda, do princípio da legalidade. diplomas que se ocupam do processo administrativo, tais como a Lei n.
9.784/99, que o regula no âmbito da administração pública federal. Essa
No que concerne ao direito administrativo sancionador, deve-se
lei não necessariamente se aplica aos demais entes federativos, devendo-se
mencionar também a inafastabilidade do controle jurisdicional, destacada no
destacar, de todo modo, que alguns Estados têm leis próprias a regul ar a
i art. 5o, inc.XXXV, da Constituição Federal482. Essa norma é de fundamental
matéria. Entretanto, tais diplomas nada definem sobre o conteúdo material
relevância, até porque se costuma classificar a função sancionadora atribuída à
do ilícito e seus pressupostos.
Administração como autotutela483, sendo, pois, imprescindível que se possam
Por conta disso, há quem aponte poder-se dizer que “que as sanções
íi submeter ao menos alguns aspectos de sua atuação ao Poder Judiciário.
que [a administração] aplica são geradas, em muitos casos, em ambiente
n Entretanto, nem sempre esses limites constitucionais são suficientes desprovido de garantias processuais, a se avaliar pelos resultados desses
para barrar os excessos punitivos estatais.
mesmos julgamentos”484.
Por conta disso, cabe à doutrina um papel essencial no sentido de A par deste déficit legislativo, a doutrina administrativista parece
desenvolver limites à atuação estatal, por meio de critérios que devam ser voltado ao âmbito sancionador da administração apenas mais
encam pados pelo legislador no momento de sua atuação. Essa preocupação, ter se
certa demora em se acercar do tema e
recentemente485. Por um lado, essa
de fato, perpassa incontáveis estudos no campo do direito penal e deu origem
à formulação de diversos institutos que têm como finalidade a contenção
ü! do poder estatal, tais como a teoria da exclusiva proteção de bens jurídicos, 484 MAIA FILHO, Napoleão Nunes, MAIA, Mar q^ admjnjstrativo não tem sabido
485 Carlos Ari Sundfeld criticou o fato a cada um deles (novos ramos de atuaçao
!:j ; oferecer uma teoria geral apta a ser P estudioso buscar na teoria do direito
ji a formulação dos princípios da fragmentariedade, da subsidiariedade, etc. administrativa]. De pouco ou de nada ^'aaracompreenderoslimiteseexigênciasdasnovas
administrativo as categonas de que "ec“S JL ainda se debate com dificuldades onginanas em
Devem- se, todavia, no que se refere ao direito penal econômico, retomar funções do Estado. Encontrara uma doutnnaq conhecemos: 0 surgimento de teonas adhoc
torno do poder de polícia! O resultado dissoeclescompramissadas mu.tasve^s
as reflexões desenvolvidas no capítulo 1 deste trabalho, recordando que esse
voltadas apenas aosadministrativo já fixou^ SUNDFELD, |Carlos^
po expandiu se, em larga medida, alheio às preocupações científicas e,
pois, aos esforços de delimitação de seu âmbito e, ademais, também conta
com certo impulso dogmático à sua expansão. Nesse contexto, torna-se 1988. São Paulo: Malheiros, p.* ^^administrativasà luz da Constituição Fede» _
ainda mais relevante o empenho em buscar constringir o âmbito punitivo. direito administrativo sancionador assa Ç DOssível n
17
Sã° Paulo: Malheiros, 2°°7S Pnd£,ld e Rafael Mello, mas também dos Tribunais,
não somente nas obras de^\ ed. rev., atual, e ampi. Sa são Pau|0: Revista dos
Direito administrativo saneio ,4 ínfações e sanções admt Sa0 pau|0: Malheiros,
2on. OLIVEIRA, Régis Fernandes • JAsanção no direito odmmistra _ A|émdisSo, devem
dispersão do poder é o seurnntrf**> pod^ ® uma tendência natural das organizações - a Tribunais, 1985- VITTA, Heraldofa^frJas. São Paulo: Malheiros,^ acadêmico
instâncias econômicas e dominAm [l0 ~^°^retudo quando seus aparelhos monopolizam 2003. FERREIRA, Daniel.Sonçoesa " do quetambém reve "° brasileiro. 2008.
dos meios de comunicação.'Sm d° pensame"to coletivo, mediante o controle ser citadas as seguintes d’ssea ^u^ão Ovares. A sanção no ^^g^p^ulo^TOGNETTI, Eduardo,
481
administrativo, e aos acusados^eeraUs00’ LV: *3°S ^‘Santes, em processo judiciajf” pelo tema: VERZOLA, Mays*paCuldade de Direito, õesanções administrativas.
Dissertação (Mestrado em D,r^^ (Mestrado em
os meios e recursos a ela inerentes"8 ° asseSurados o contraditório e ampla defesa, co Oslimitesdopoderdiscriaonanodaod Centra, do Brasd. 2012u D SonÇÕesadministrativas
482 "XXXV-a lei não excluirá da análise das sanções ap*|pS£ PaulaAMpR^^^oireliaUSRMcPW,®-
483 Trata-se de questão extremamenra Poder^Judiciário lesão ou ameaça a direito Direito) Faculdade de D.re.to, USR Sao Direito) Facu|dade
Mário Henrique Goulart. Op. dt. p ™ntrovertida- Vide: MAIA FILHO, Napoleão Nunes, MA'A' ambientais. 2002. Dissertação (Mestra
I
Administrativo Sancionador
i ,34 - Diurno Penai Econômico e Direito
I
compreensível,já que a administração pública exerce muitas outras funções,
que inclusive sofreram alterações drásticas mais recentemente, demandando
e atraindo os esforços doutrinários. No entanto, a constatação de que a
administração pública exerce poder sancionatório com mais frequência que
o Poder Judiciário, além de aplicar sanções gravíssimas486, torna urgente que
se trate da questão com maior detalhamento, como, efetivamente, parece
ter começado a ocorrer.
Nesse caminho, a interação com o direito penal tem se revelado
intensa e, ainda que timidamente, frutífera. Conforme será analisado mais
adiante, há divergência sobre se os princípios e garantias penais devem
Í!
ii
ser transportados ao direito administrativo sancionador ou se parcela
desses princípios e garantias tem origem num direito sancionador geral, 3-
if, que apresentaria como espécies o direito penal e o direito administrativo
sancionador. Porém, em ambas as vertentes se verifica um próximo diálogo Direito Administrativo
! j: com o campo penal, com a finalidade de delimitar o âmbito punitivo do
Ü
direito administrativo. Sancionador: Um Exame de
Assim sendo, nota-se que uma aproximação entre o paradigma penal Suas Características à Luz do
e o direito administrativo pode ser bastante produtiva no sentido de buscar
delimitar o âmbito punitivo da administração, inserindo-se esta tarefa no Direito Penal
já mencionado esforço de racionalização mínima487 e de coordenação entre
lí: os dois âmbitos.

486

para os jurisdicionados não é se o órn-3«^|Uaí0 a^rmava 9ue na realidade, o mais relevan

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