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ISSN 1807-3395

Revista Magister de
Direito Penal e Processual Penal
Ano XV – Nº 88
Fev-Mar 2019

Repositório Autorizado de Jurisprudência


Supremo Tribunal Federal – nº 38/2007
Superior Tribunal de Justiça – nº 58/2006

Classificação Qualis/Capes: B1

Editores
Fábio Paixão
Walter Diab

Coordenador
Aury Lopes Júnior

Conselho Científico
Damásio E. de Jesus – Fernando da Costa Tourinho Filho – Luiz Flávio Borges D’Urso
Elias Mattar Assad – Marco Antonio Marques da Silva

Conselho Editorial
Adeildo Nunes – Amadeu de Almeida Weinmann
Carlos Ernani Constantino – Celso de Magalhães Pinto – César Barros Leal
Cezar Roberto Bitencourt – Élcio Pinheiro de Castro – Fernando Capez
Fernando de Almeida Pedroso – Haroldo Caetano da Silva
José Carlos Teixeira Giorgis – Luiz Flávio Gomes – Marcelo Roberto Ribeiro
Maurício Kuehne – Renato Marcão – René Ariel Dotti – Roberto Victor Pereira Ribeiro
Rômulo de Andrade Moreira – Ronaldo Batista Pinto (in memoriam)
Sergio Demoro Hamilton – Umberto Luiz Borges D’Urso

Colaboradores deste Volume


André Faustino – Edmilson Souza da Silva – Elias Gemino de Carvalho
Fabiano Augusto Martins Silveira – Gustavo Filipe Barbosa Garcia
Leonardo Pozzi Loverso – Marcellus Polastri Lima – Reinaldo Denis Viana Barbosa
Rodrigo Julio Capobianco – Vinicius Lacerda e Silva
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal
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Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal


v. 1 (ago./set. 2004)-.– Porto Alegre: LexMagister, 2004-
Bimestral. Coordenação: Aury Lopes Júnior.
v. 88 (fev./mar. 2019)
ISSN 1807-3395

1. Direito Penal – Periódico. 2. Direito Processual Penal


– Periódico.

CDU 343(05)

Ficha catalográfica: Leandro Augusto dos S. Lima – CRB 10/1273


Capa: Apollo 13

LexMagister
Diretor Executivo: Fábio Paixão

Rua 18 de Novembro, 423 Porto Alegre – RS – 90.240-040


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Sumário
Doutrina
1. Iniciativas de Criminalização das Fake News no Brasil: Reflexo do
Expansionismo Punitivista
André Faustino, Leonardo Pozzi Loverso e Gustavo Filipe Barbosa Garcia.................. 5
2. O Habeas Corpus Coletivo
Marcellus Polastri Lima e Elias Gemino de Carvalho................................................ 30
3. O Princípio da Proporcionalidade e o Problema do Controle de
Conteúdo das Normas Penais
Fabiano Augusto Martins Silveira............................................................................. 44
4. O Crime de Lavagem de Dinheiro no Brasil: Compliance Criminal
Corporativo e os Métodos de Prevenção e Combate do Conselho de
Controle de Atividades Financeiras
Vinicius Lacerda e Silva........................................................................................... 55
5. Direito Penal Econômico: uma Reflexão Crítica sobre o seu Conceito e
Objeto
Reinaldo Denis Viana Barbosa................................................................................. 76
6. Descriminalização da Interrupção Gestacional
Edmilson Souza da Silva e Rodrigo Julio Capobianco............................................... 93

Jurisprudência
1. Supremo Tribunal Federal – Habeas Corpus. Recurso Ordinário.
Substituição. Possibilidade. Em Jogo, na Via Direta, a Liberdade de Ir
e Vir do Cidadão, Cabível É o HC Ainda que Substitutivo do Recurso
Ordinário Constitucional
Rel. Min. Marco Aurélio........................................................................................ 105
2. Superior Tribunal de Justiça – Invasão de Dispositivo Informático. Art.
154-A do CP. Representação. Inequívoco Interesse de Instaurar a Ação
Penal Demonstrado
Relª Minª Laurita Vaz........................................................................................... 109
3. Superior Tribunal de Justiça – Pena. Progressão de Regime.
Indeferimento. Gravidade Abstrata do Delito e na Longa Pena a
Cumprir. Constrangimento Ilegal Configurado. Ordem Concedida de
Ofício
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca.................................................................... 114
4. Superior Tribunal de Justiça – Júri. Condenação. Execução Provisória
da Pena. Impossibilidade. Necessidade de Exaurimento da Jurisdição
Ordinária. Apelação em Liberdade
Rel. Min. Jorge Mussi............................................................................................ 120
5. Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Licitação. Delito Previsto no
Art. 90 da Lei nº 8.666/93. Fraude. Dolo Específico. Não Comprovação.
Absolvição Mantida
Rel. Des. Fed. Olindo Menezes.............................................................................. 134
6. Tribunal de Justiça do Acre – Roubo Qualificado. Uso de Arma Branca
(Faca). Exasperação da Pena Basilar pela Valoração Negativa das
Circunstâncias do Crime. Possibilidade
Rel. Des. Pedro Ranzi............................................................................................ 141
7. Tribunal de Justiça do Distrito Federal – Injúria Racial e Ameaça.
Condenação. Recurso da Defesa. Pedido de Aplicação do Concurso
Formal Próprio. Impossibilidade. Desígnios Autônomos
Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati...................................................................... 149
8. Tribunal de Justiça de São Paulo – Excesso de Prazo. Prisão Preventiva.
Paciente que Está Preso Cautelarmente Há Quase 3 Meses, sem
Conclusão do Inquérito Policial. Constrangimento Ilegal. Ocorrência
Rel. Des. Sérgio Coelho.......................................................................................... 156
9. Divergência Jurisprudencial............................................................................... 160
10. Ementário............................................................................................................ 161
Sinopse Legislativa. .............................................................................................. 189
Destaques dos Volumes Anteriores.................................................................... 190
Índice Alfabético-Remissivo................................................................................ 191
Doutrina

Iniciativas de Criminalização das Fake


News no Brasil: Reflexo do Expansionismo
Punitivista

André Faustino
Mestrando em Direito da Sociedade da Informação pelo
Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas;
Bacharel em Direito pelo Centro Universitário das Faculdades
Metropolitanas Unidas; Especialista em Direito Imobiliário
pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas
Unidas; Bacharel em Música pela FAMOSP; Especialista
em Direito Civil pelo Centro Universitário das Faculdades
Metropolitanas Unidas; Especialista em Direito Digital
Aplicado pela FGV; Advogado.

Leonardo Pozzi Loverso


Mestrando em Direito da Sociedade da Informação das
Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU); Bacharel em
Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP); Delegado de Polícia do Estado de São Paulo.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia


Livre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo; Pós-Doutor em Direito pela Universidade
de Sevilla; Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo; Especialista em Direito pela
Universidade de Sevilla; Membro Pesquisador do IBDSCJ
e da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Titular da
Cadeira nº 27; Professor Titular do Centro Universitário do
Distrito Federal e da Faculdade de Direito da Universidade
Presbiteriana Mackenzie; Professor Doutor do Centro
Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas;
Advogado.

RESUMO: Este estudo analisa as recentes iniciativas visando à criminalização


da produção e divulgação de fake news no Brasil, tal como se verifica com as
proposições legislativas recentemente apresentadas no Congresso Nacional,
entre elas o Projeto de Lei do Senado nº 473, de 2017. O estudo parte de uma
análise ampla e crítica a respeito da pós-verdade no contexto da Sociedade da
Informação, passando a situar a discussão, sobretudo, quanto ao fenômeno
crescente da difusão das fake news nas redes sociais. A título de tutelar pretenso
interesse público e social, em uma perspectiva equivocada de política criminal, as
iniciativas de enquadramento criminal em relação à criação e à disseminação de
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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notícias falsas, na verdade, aparentam estabelecer controle ideológico a partir de


fato social, cujos contornos, infelizmente, nem sempre são totalmente compre-
endidos pelas autoridades estatais, configurando tais investidas legislativas, am-
pliadoras de tipos penais, em inequívoca expressão do expansionismo punitivista.

PALAVRAS-CHAVE: Sociedade da Informação. Pós-Verdade. Fake News.


Direito Penal. Expansão.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Sociedade Informacional e Pós-Verdade. 3 Redes


Sociais e Fake News. 4 Movimento de Expansão do Direito Penal. 5 Iniciativas
de Criminalização das Fake News no Brasil como Expressão do Expansionismo
Punitivista. 6 Conclusão. 7 Referências Bibliográficas.

1 Introdução
Desde a criação e efetiva popularização da internet, que se deu na década
de 1990, ocorreu o desenvolvimento desse meio de comunicação, surgindo
diversas aplicações voltadas para o contato entre as pessoas nesse novo am-
biente e, principalmente, para exposição ou aproximação de suas relações,
antes existentes e sustentadas em um mundo físico, e que passaram para um
mundo considerado virtual, em que se destacam aplicações de internet, como
o Facebook e o Twitter, por exemplo.
Essas aplicações de internet, conhecidas como redes sociais ou mídias
sociais, possibilitam a exposição da vida pessoal dos participantes, permitindo
a exteriorização de pensamentos, ideias, opiniões sobre determinado assunto,
sendo esse espaço um local marcado pelo exercício da liberdade de expressão
e manifestação do pensamento, possibilitando várias relações e ligações entre
os seus participantes.
Traçando um paralelo, é como se a Ágora da Grécia antiga – famosa
por ser o lócus de discussão e debate – tivesse se transferido para o interior
da internet ou o ciberespaço1, passando as relações sociais que ocorrem no
interior dessas aplicações de internet a assumir esse tipo de possibilidade.
O ambiente tecnológico fez surgir uma nova visão da realidade que
se descortina, dando origem a um pensamento ou modo de enxergar esse
espaço, na forma de um senso comum, que leva à crença do surgimento de
um “mundo virtual” e de um “mundo real”, cada um com as suas próprias

1 Cf. GIBSON, William. Neuromancer. São Paulo: Aleph, 2003. p. 35: “Ciberespaço. Uma alucinação consensual
diariamente experimentada por bilhões de operadores legítimos, em cada país, por crianças a quem são ensinados
conceitos matemáticos... Uma representação gráfica de dados extraídos de bancos de cada computador do sistema
humano. Complexidade impensável. Linhas de luz alinhadas no não espaço da mente, clusters e constelações de dados.
Como luzes da cidade, afastando-se (...)”.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 7

características e formas de comportamento e até mesmo códigos de conduta. É


como se as ações adotadas no interior desse “mundo virtual” não provocassem
consequências fáticas no “mundo real” e vice e versa.
Na década de 1990, na fase de inicial de popularização da internet,
surgiram alguns pensadores ou teóricos que evidenciavam essa forma de
pensar, na existência de um mundo à parte localizado na internet, como é o
caso de John Perry Barlow, que acreditava na existência de um local chamado
ciberespaço, e que esse novo espaço era livre de regulação e todos possuíam
liberdade plena no seu interior:

“Estamos formando nosso próprio Contrato Social. Essa maneira de


governar surgirá de acordo com as condições do nosso mundo, não do
seu. Nosso mundo é diferente. O espaço cibernético consiste em ideias,
transações e relacionamentos próprios, tabelados como uma onda parada
na rede das nossas comunicações. Nosso é um mundo que está ao mesmo
tempo em todos os lugares e em nenhum lugar, mas não é onde pessoas
vivem. Estamos criando um mundo que todos poderão entrar sem privilé-
gios ou preconceitos de acordo com a raça, poder econômico, força militar
ou lugar de nascimento. Estamos criando um mundo onde qualquer um
em qualquer lugar poderá expressar suas opiniões, não importando quão
singular, sem temer que seja coagido ao silêncio ou conformidade. Seus
conceitos legais sobre propriedade, expressão, identidade, movimento
e contexto não se aplicam a nós. Eles são baseados na matéria. Não há
nenhuma matéria aqui.”2

A própria interconectividade que existe na internet cria uma infinidade


de possibilidades de ligações entre os seus usuários, trazendo consigo a sen-
sação de atuar no ciberespaço, este entendido, segundo a definição de Pierre
Lévy, como “o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos
computadores e das memórias dos computadores”3. Nessa forma de enxergar
a internet, é possível determinar a existência de uma vida no mundo virtual e
de outra vida que seria a do mundo real, isto é, do mundo físico.
A liberdade de expressão na internet é o fundamento da disciplina de
seu uso no Brasil, segundo a Lei nº 12.965/20154, a qual é conhecida como
Marco Civil da Internet. O art. 2º desse diploma legal evidencia tal princípio
como corolário do direito fundamental da liberdade de expressão, insculpido

2 BARLOW, John Perry. Declaração de independência do ciberespaço. 1996. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/
ciber/textos/barlow.htm>. Acesso em: 2 out. 2018.
3 LÉVY, Pierre. Cibercultura. Trad. Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Ed. 34, 1999. p. 94.
4 “Art. 2º A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem
como (...)”
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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no art. 5º, IV e IX, da CF/885. No ambiente da internet associa-se a liberdade


de expressão com o anonimato, fruto do pensamento coletivo da existência
de dois mundos distintos.
Em um primeiro momento, pode surgir um conflito entre direitos
fundamentais, de um lado figurando a liberdade de expressão e de outro o
direito de informação, sendo necessária a ponderação de interesses para a
solução desse possível conflito.
No entanto, em uma análise mais minuciosa, verifica-se que surge a
possibilidade de encontro entre o direito de informação e a pós-verdade6, ou
as fake news, no sentido de mitigação do que se entende por verdade. Ou seja,
aquilo baseado em fatos ou na realidade dá lugar à especulação, à informação
falsa ou àquela informação distorcida que não tem compromisso algum com
a verdade.
A informação passa a ser baseada em meras percepções e sensações, ou
até mesmo manipulada para um determinado fim, porém protegida sob o
manto constitucional da liberdade de expressão, que é utilizada como forma
de legitimar a propagação de mentiras ou meias verdades.
As eleições presidenciais dos Estados Unidos, no ano de 2016, deixaram
evidente essa possibilidade de utilização da pós-verdade como ferramenta de
direcionamento da opinião pública em relação ao então candidato Donald
Trump, atribuindo a ele uma série de discursos e informações falaciosas, que
só foram possíveis devido a essa efemeridade da informação e à possibilidade
de qualquer um transforma-se em emissor de notícias ou de informações,
sem o compromisso com a verdade7.
No atual cenário social brasileiro, com a proliferação de notícias falsas
nas redes sociais, começa-se a observar diversas iniciativas, no plano legislativo,
que buscam criminalizar a conduta de divulgação ou criação dessas fake news.
Nesse contexto, o Estado busca, por meio da utilização das ferramentas
existentes à sua disposição, sobretudo, o Direito Penal, controlar e sancionar

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“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos es-
trangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes: (...) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (...) IX – é livre a
expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”
6 KEYES, Ralph. The post-truth era: dishonesty and deception in contemporary life. California: St. Martin’s Press,
2004. p. 58: “Within the post-truth period, we have not only a fact and a lie, but a third type of ambiguous assertions
that are not precisely the fact, but simply need a lie. The improved truth would be known as: Neo-truth. Soft fact,
false fact, light fact”. “No período pós-verdade, não temos apenas um fato e uma mentira, mas um terceiro tipo
de afirmações ambíguas que não são precisamente o fato, mas simplesmente precisam de uma mentira. A verdade
melhorada seria conhecida como: Neo-verdade. Fato suave, fato falso, fato light” (tradução livre).
7 VICTORIA UNIVERSITY. Evaluating information: fake news in the 2016 US elections. Library Guides. Disponível
em: <http://libraryguides.vu.edu.au/c.php?g=460840&p=5330649>. Acesso em: 29 out. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 9

um maior número de condutas, sem se atentar se esses comportamentos pos-


sam afetar possíveis bens juridicamente tutelados pela ordem constitucional,
daí surgindo a relevância em se investigar as consequências de tais tendências
de ampliação do chamado punitivismo.
O objetivo deste artigo, portanto, é demonstrar que as recentes ten-
tativas de criminalização das condutas de criação e divulgação de fake news,
no âmbito, ou não, da internet, são frutos desse movimento de expansão do
Direito Penal, propulsionado por autoridades estatais que demonstram não
compreender a natureza de novos fenômenos sociais associados à proliferação
das novas tecnologias.
O presente estudo está dividido da seguinte forma: sociedade infor-
macional e pós-verdade; redes sociais e fake news; movimento de expansão
do Direito Penal; iniciativas de criminalização das fake news no Brasil como
reflexo do expansionismo punitivista e conclusão.
A metodologia utilizada neste trabalho parte do método dedutivo,
realizando a revisão da bibliografia apontada nas referências, procurando pes-
quisar a doutrina e a legislação sobre o tema apresentado. A leitura das obras
e dos textos apontados nas referências torna-se a base do presente estudo, de
modo que a sua interpretação serviu de subsídio para a construção do que
será apresentado.

2 Sociedade Informacional e Pós-Verdade


Um dos grandes dilemas dos indivíduos que vivem em sociedade nos
dias atuais é saber o limite ou até mesmo onde estão as “fronteiras” no mundo
da internet. Existe uma grande quantidade de informações disponível no inte-
rior da web, bastando apenas um clique para acessá-las e descobrir um universo
de possibilidades e de conteúdo, que pode ser por meio das redes sociais ou
dos motores de busca, como, por exemplo, o Google ou o Bing. Essas infor-
mações são acessíveis a qualquer um que tenha internet, reduzindo distâncias
e possibilitando novas formas de interação social ou busca de informação8.

8 Cf. BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. p.
38: “O advento da proximidade virtual torna as conexões humanas simultaneamente mais frequentes e mais banais,
mais intensas e mais breves. As conexões tendem a ser demasiadamente breves e banais para poderem condensar-se
em laços. Centradas no negócio à mão, estão protegidas da possibilidade de extrapolar e engajar os parceiros além
do tempo e do tópico da mensagem digitada e lida, ao contrário daquilo que os relacionamentos humanos, noto-
riamente difusos e vorazes, são conhecidos por perpetrar. Os contatos exigem menos tempo e esforço para serem
estabelecidos, e também para serem rompidos. A distância não é obstáculo para se entrar em contato – mas entrar
em contato não é obstáculo para se permanecer à parte. Os espasmos da proximidade virtual terminam, idealmente,
sem sobras nem sedimentos permanentes. Ela pode ser encerrada, real e metaforicamente, sem nada mais que o
apertar de um botão”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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O acesso à informação ou ao conhecimento foi extremamente facilitado


com a evolução das ferramentas de TIC (tecnologia da informação e conhe-
cimento), permitindo uma circulação e, principalmente, exteriorização dessa
informação por meio dessas novas tecnologias que refletem diretamente na
forma com que os indivíduos se relacionam atualmente9.
A ligação dos indivíduos com esse conteúdo contido nos provedores
de aplicações de internet após a popularização do uso e acesso à web, que
ocorreu no final da década de 1990, fez com que a prioridade ao procurar essa
informação na internet possuísse relação estreita com a questão de sua oferta,
já que nesse ambiente ela é abundante e de fácil acesso.
Nesse sentido, começou a surgir uma indiferença com a fonte de
informação e uma ligação mais forte com a quantidade e a velocidade10 da
sua circulação. Mais tarde, esse fenômeno irá justificar o surgimento de um
conceito efetivo de pós-verdade, notadamente quando inserida em uma
concepção de pós-modernidade, que representa uma direta desconstrução
do padrão moderno ou até mesmo cartesiano. Quanto ao tema, Geertz bem
evidencia essa questão:

“A mais destacada dessas propostas, ou a mais celebrada, de qualquer


modo, é, pelo menos num sentido desse termo fabricado e mutável, ‘o
pós-modernismo’. Segundo essa visão, a busca de padrões abrangentes
deve ser simplesmente abandonada, como um resto da busca antiquada
do eterno, do real, do essencial e do absoluto. Não existem, segundo se
afirma, narrativas mestras sobre a ‘identidade’, a ‘tradição’, a “cultura”
ou qualquer outra coisa. Há apenas acontecimentos, pessoas e fórmulas
passageiras, e, mesmo assim, incoerentes. Devemos contentar-nos com
histórias divergentes em idiomas irreconciliáveis, e não tentar abarcá-las
em visões sinóticas. Tais visões (segundo essa visão) são impossíveis de
obter. Tentar obtê-las leva apenas à ilusão – ao estereótipo, ao preconceito,
ao ressentimento e ao conflito.”11

A informação como representação dos fatos sociais, quando vista sob


uma perspectiva atual e de como a sociedade e o mercado se relacionam com
a sua existência, passa a dar sentido ao conceito de sociedade informacional.

9 Cf. TAKAHASHI, Tadao. Sociedade da informação no Brasil: livro verde. Brasília: Ministério da Ciência e Tecnologia,
2000. p. 3: “Rapidamente nos adaptamos a essas novidades e passamos a viver na sociedade da informação, uma via
em que a informação flui a velocidades e em quantidades há apenas poucos anos inimagináveis, assumindo valores
sociais e econômicos fundamentais”.
10 Cf. LÉVY, Pierre. O que é o virtual? Trad. Paulo Neves. São Paulo: Ed. 34, 1996. p. 16: “Já o virtual não se opõe ao real,
mas sim ao atual. Contrariamente ao possível, estático e já constituído, o virtual é como o complexo problemático,
o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade
qualquer, e que chama um processo de resolução: a atualização”.
11 GEERTZ, Clifford. Nova luz sobre a antropologia. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p. 194.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 11

A informação, assim, deixa de possuir apenas o sentido de conhecimento, de


comunicação, e passa a assumir papel central no mercado. Em última análise,
a informação passa a ser considerada mercadoria, dotada de valor econômico,
o que se contrapõe ao conceito original de sociedade da informação, que leva-
va em conta apenas as questões da sua circulação e sua relação com aspectos
voltados ao conhecimento e à comunicação.
Se para Alan Touraine12 e Daniel Bell13 o conceito de sociedade da
informação tem relação com o advento da sociedade pós-industrial e o novo
paradigma ligado à relação dos indivíduos e do mercado com a circulação dessa
informação ou conhecimento, um conceito mais recente, de ascenção, bem
evidencia essa relação da circulação da informação por meio das “autoestradas
da informação”:

“Mas a Sociedade da Informação não vive só de novos produtos. É essencial


a disponibilidade de veículos ou meios de comunicação aperfeiçoados. E
com isto nos surge o papel decisivo das autoestradas da informação. In-
felizmente, é típica deste domínio a utilização de expressões gongóricas,
anfibológicas e imagísticas. Autoestradas da informação é apenas uma
imagem a mais. Digamos que as autoestradas da informação são meios de
comunicação entre computadores, que seriam caracterizados por grande
capacidade, rapidez e fidedignidade.”14

Por outro lado, o conceito de sociedade informacional terá ligação direta


com o valor econômico dessa informação na sociedade, pois ela passa a ser
mercadoria e influencia na forma do desenvolvimento do capitalismo baseado
no seu valor. Essa relação entre capital e informação fará sentido ao analisar
o conceito de pós-verdade e a relação dos indivíduos com a sua circulação,
principalmente a indiferença com a verdade, já que a informação enquanto
produto possuirá mais valor do que como verdade ou conteúdo que possa
representá-la.
Para Castells, o conceito de sociedade informacional pode ser indicado
da seguinte forma:

“No novo modo informacional de desenvolvimento, a fonte de produtivi-


dade acha-se na tecnologia da geração de conhecimentos, de processamento
da informação e de comunicação de símbolos. Na verdade, conhecimento e
informação são elementos cruciais em todos os modos de desenvolvimento,
visto que o processo produtivo sempre se baseia em algum grau de conhe-

12 TOURAINE, Alain. La société post-industrielle. Paris: Denoël/Gonthier, 1969.


13 BELL, Daniel. O advento da sociedade pós-industrial. São Paulo: Cultrix, 1974.
14 ASCENSÃO, José Oliveira. Direito da internet e da sociedade da informação: estudos. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 68.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
12

cimento e no processamento da informação. Contudo, o que é específico


ao modo informacional de desenvolvimento é a ação de conhecimentos
sobre os próprios conhecimentos como a principal fonte de produtividade...
chamo esse novo modo de desenvolvimento de informacional, constituído
pelo surgimento de um novo paradigma tecnológico baseado na tecnologia
da informação.”15

A grande relação com esse conceito tradicional de informação é jus-


tamente quanto à relação desta com verdade, pois a sua garantia é que vai
dotá-la de cunho econômico em uma visão liberal. Nesse sentido, Carvalho
bem explica a relação da informação com a verdade:

“O postulado liberal da livre informação só garante que o informador no-


ticie o que ele quiser noticiar, da maneira como quiser e no momento que
entender oportuno. O componente social será o responsável pelo direito
do informador de pesquisar e pelo dever de o Poder Público permitir ser
pesquisado, pelo direito do público de receber informação, pelo direito
de público de selecionar a informação que deseja receber e, talvez o mais
importante, pelo direito do público à informação verdadeira.”16

Entretanto, a popularização da internet e a possibilidade de qualquer


pessoa acessar uma infinidade de conteúdo, informação ou até mesmo co-
nhecimento por meio da rede mundial de computadores e, principalmente,
criar qualquer tipo de conteúdo, fez surgir uma visão efêmera do conceito
de verdade. Criou-se nos indivíduos uma sensação de indiferença com esta,
pouco importando a sua relação com a realidade dos fatos ou até mesmo com
a credibilidade da fonte, o que dá origem ao conceito de pós-verdade.
Em 2016, o dicionário Oxford considerou o termo pós-verdade como
a palavra do ano, definindo-a como: “relativo a ou que denota circunstâncias
nas quais fatos objetivos são menos influentes na formação da opinião pública
do que apelos à emoção e à crença pessoal”17, ficando clara a relação dos indi-
víduos com a verdade da informação. Ou seja, tornam-se mais importantes as
questões ligadas a percepções pessoais ou momentâneas do que efetivamente
com a fonte e a credibilidade dessa informação, o que é a característica principal
do conceito de pós-verdade.

15 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: a era da informação: economia, sociedade e cultura. 17. ed. São Paulo: Paz
e Terra, 2016. p. 74.
16 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à informação verdadeira.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 82.
17 BBC BRASIL. Como Trump e o Brexit ajudaram a cunhar a palavra do ano escolhida pelo dicionário Oxford. Disponível em:
<https://www.bbc.com/portuguese/internacional-37998165>. Acesso em: 1º out. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 13

A relação dos indivíduos com o conceito de verdade é bastante relativa, e


embora a credibilidade de uma informação tenha ligação direta com a verdade
nela contida, o conceito de pós-verdade mitiga essa relação.
Nietzsche questiona a definição de verdade relacionando-a com ques-
tões muito mais sensitivas do que efetivamente pragmáticas, como se pode
observar na seguinte lição:

“O que é, pois, a verdade? Um exército móvel de metáforas, metonímias,


antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que
foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que,
após uma longa utilização, aprecem a um povo consolidadas, canônicas e
obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se tornaram desgastadas e
sem força sensível, moedas que perderam seu troquel e agora são levadas
e, conta apenas como metal, e não mais como moedas. Ainda não sabemos
donde provém o impulso à verdade: pois, até agora, ouvimos falar apenas
da obrigação de ser veraz, que a sociedade, para existir, institui, isto é, de
utilizar metáforas habituais; portanto, dito moralmente: da obrigação de
mentir conforme uma convenção consolidada, mentir em rebanho num
estilo a todos obrigatório.”18

Portanto, no conceito de pós-verdade está contido o de fake news, ser-


vindo o primeiro como gênero, do qual o segundo é espécie, pois enquanto as
fake news possuem relação direita com a mentira, a pós-verdade possui relação
direta com a indiferença à verdade, pouco importando se o fato ou a informa-
ção tem relação direta ou não com o sentido de verdade19. Essa indiferença ou
relativização terá mais relação com o que as redes sociais determinam como
verdadeiro, principalmente na “corrida” em busca de visualizações ou curtidas.

3 Redes Sociais e Fake News


A internet possui uma série de aplicações que possibilitam a navegação
em seu ambiente, criando uma falsa sensação da existência de um mundo real
e de um mundo virtual, onde no mundo virtual existem inúmeras possibilida-
des de interação, pois apenas com um clique ou com uma simples mensagem

18 NIETZSCHE, Friedrich. Sobre verdade e mentira no sentido extra-moral. Trad. e Org. Fernando de Moraes Barros. São
Paulo: Hedra, 2008. p. 36.
19 Cf. ANDREUCCI, Ana Cláudia Pompeli Torezan; JUNQUEIRA, Michele Asato. Pinóquio em tempos de pós-
verdade: fake news e comunicação na construção da cidadania digital para crianças e adolescentes. In: RAIZ, Diogo
(Coord.). Fake news: a conexão entre a desinformação e o direito. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. p. 238:
“Assim relativiza-se a verdade, relativiza-se a sua importância para a formação da moral, para construção da ética e a
utiliza como instrumento de poder, coerção e manipulação. Não importa se é verdade, mas o que todos acreditam
ser verdade”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
14

é possível conquistar amigos ou “consumir” vidas alheias20. Desse modo, as


redes sociais facilitam essa aproximação entre as pessoas, permitem que cada
indivíduo faça uma publicação ou postagem de qualquer tipo de conteúdo e
que, dependendo do tamanho da sua rede de contatos, irá atingir um número
inimaginável de pessoas ao redor do mundo.
Essa divisão conceitual a respeito da existência do mundo real e do
mundo virtual é que permeia e impulsiona, mesmo que inconscientemente,
as relações e as ações dos indivíduos no ambiente das redes sociais, já que na
internet surge esse conflito entre o atual e o que é idealizado (real e virtual).
Desse modo, cria-se uma percepção equivocada da realidade se observada
apenas sob o prisma das redes sociais, pois esse mundo fantasioso e que muitas
vezes não representa efetivamente as “realidades” do mundo físico geram uma
falsa sensação de que tudo é possível no espaço virtual. A respeito do tema,
Lévy bem evidencia essa questão:

“Já o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual. Contrariamente ao


possível, estático e já construído, o virtual é como o complexo problemá-
tico, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um
acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer, e que chama um
processo de resolução: a atualização. Esse complexo problemático pertence à
entidade considerada e constitui inclusive uma de suas dimensões maiores.
O problema da semente, por exemplo, é fazer brotar a árvore. A semente
‘é’ esse problema, mesmo que não seja somente isso. Isto significa que
ela ‘conhece’ exatamente a forma da árvore que expandirá finalmente sua
folhagem acima dela. A partir das coerções que lhe são próprias, deverá
inventá-la, coproduzi-la com as circunstâncias que encontrar.”21

As redes sociais representaram uma revolução na forma como os in-


divíduos passaram a se relacionar em sociedade e enxergar o próximo, já que
esse tipo de comunidade permitiu a criação de um novo tipo de se “fazer
sociedade”22. Nesse sentido, a aproximação entre as pessoas passa a ocorrer de

20 Cf. SIBILIA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. p. 4: “Todas
essas tendências atuais de exposição da intimidade vão ao encontro e prometem uma vontade geral do público: a
avidez de bisbilhotar e ‘consumir’ vidas alheias. Nesse contexto, os muros que costumavam proteger a privacidade
individual sofrem sérios abalos; cada vez mais, essas paredes, outrora sólidas, são infiltradas por olhares tecnicamente
mediados que flexibilizam e alargam os limites do dizível e do mostrável”.
21 LÉVY, Pierre. O que é o virtual? Trad. Paulo Neves. São Paulo: Ed. 34, 1996. p. 16.
22 Cf. LEMOS, André; LEVY, Pierre. O futuro da internet: em direção a uma ciberdemocracia. São Paulo: Paulus, 2010.
p. 101: “O desenvolvimento de comunidades e redes sociais on-line é provavelmente um dos maiores acontecimentos
dos últimos anos, sendo uma nova maneira de ‘fazer sociedade’. Os grupos de discussão, listas de difusão, new groups,
chat rooms, mundos virtuais multiparticipantes (Second Life), softwares sociais (Orkut, Facebook), blogs e microblogs,
jogos eletrônicos coletivos, redes sociais móveis (mobile social networking) têm um desenvolvimento espetacular,
particularmente entre as jovens gerações. As comunidades virtuais começaram a se desenvolver há mais de vinte
anos antes da aparição da web. Hoje, elas constituem o fundamento social do ciberespaço e uma das chaves para a
futura ciberdemocracia”.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 15

forma quase instantânea, apenas com o clicar de um botão, tornando possível


estabelecer vínculos sociais mais rápidos e efêmeros.
O tipo de relação estabelecida nessa aplicação da internet evidencia a
possibilidade de criação de vínculos no ciberespaço, embora não precise existir
o contato pessoal, físico, fazendo com que cada detentor de perfil se conecte
com outros detentores de perfil e dessa forma criando redes de relacionamento
com alcance quase que incalculável a depender da extensão dessa cadeia de
contatos e pessoas.
Dessa forma, as redes sociais possuem ligação direta com a exposição
daquilo que os atores de cada rede desejam postar nesse ambiente, bem como
se relacionam com a criação ou divulgação de conteúdo de caráter privado
ou restrito àquele grupo específico pertencente a cada rede interligada que
passará a ser público.
Por ser possível criar uma base de contatos, quanto mais abrangente for
e quanto mais pessoas fizerem parte desse grupo, mais potência as publicações
terão e maior será o alcance de pessoas. Assim, a razão de existir dessas redes
sociais passa a ser justamente a possibilidade de tornar pública ou a exposi-
ção de qualquer tipo de postagem, como forma de exteriorização da vida ou
dos fenômenos que anteriormente ficavam na esfera privada. Nesse aspecto,
Raquel Recuero bem explica a questão:

“Sites de redes sociais propriamente ditos são aqueles que compreendem


a categoria dos sistemas focados em expor e publicar as redes sociais dos
atores. São sites cujo foco principal está na exposição pública das redes co-
nectadas aos atores, ou seja, cuja finalidade está relacionada à publicização
dessas redes. É o caso do Orkut, Facebook, do Linkedin e vários outros.
São sistemas onda há perfis e há espaços específicos para a publicização
das conexões dos indivíduos. Em geral, esses sites são focados e, ampliar e
complexificar essas redes, mas apenas isso. O uso do site está voltado para
esses elementos, e o surgimento dessas redes é consequência direta desse
uso. No Orkut, por exemplo, é preciso construir um perfil para interagir
com outras pessoas. E só a partir desta construção que é possível anexar
outros perfis à sua rede social e interagir com eles. Toda interação está,
portanto, focada na publicização dessas redes.”23

A exposição nas redes sociais é que vai garantir a visibilidade do con-


teúdo lá publicado e tornar esse tipo de aplicação de internet em algo que
irá transformar a vida nesse ambiente em uma espécie de apresentação, um
verdadeiro espetáculo. Trata-se de uma forma de expor a intimidade ou a vida

23 RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. p. 104.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
16

em si, mostrar tudo como um show, como algo que seja objeto de desejo de
outras pessoas que não façam parte daquela realidade exposta na rede social e
dessa forma fomentar uma conduta em busca da exposição, da espetaculari-
zação como forma de convívio social. Nesse sentido, o conceito de sociedade
do espetáculo, de Debord24, amolda-se perfeitamente ao tipo de conduta ou
comportamento adotado pelos atores sociais no interior dessas redes.
Os critérios de confiabilidade das fontes de informação passam a ser
mitigados no atual contexto de evolução tecnológica e pela quantidade de
possibilidades que surgem para o compartilhamento dessa informação. Nesse
aspecto, a volatilidade e a velocidade da circulação da informação, bem como
a possibilidade infinita de acessos a essa informação por meio das redes so-
ciais, fez com que em poucos anos as redes sociais passassem a ser o lócus de
discussão e de divulgação de informação.
Embora as postagens sejam, em sua grande maioria, de conteúdo super-
ficial, as redes sociais passaram a ser o maior ponto de divulgação de notícia
e de procura por essas notícias. Com isso, a timeline do Facebook substitui a
antiga página do jornal, fazendo com que os hábitos das pessoas se direcionem
a esse tipo de meio. Nesse sentido, Jean Baudrillard bem elucida a questão:

“Há muito tempo a informação ultrapassou a barreira da verdade para


evoluir no ciberespaço do nem verdadeiro nem falso, pois que aí tudo
repousa sobre a credibilidade instantânea. Ou, antes, a informação é mais
verdadeira que o verdadeiro por ser verdadeira em tempo real – por isso
é fundamentalmente incerta. Ou, ainda, para retomar a teoria recente de
Mandelbrot, podemos dizer, que tanto no espaço da informação ou no espa-
ço histórico quanto no espaço fractal, as coisas não têm mais uma, duas ou
três dimensões: flutuam numa dimensão intermediária. Logo, nada mais de
critérios de verdade ou objetividade, mas uma escala de verossimilhança.”25

Os próprios padrões de comunicação são alterados nas redes sociais, ga-


nhando espaço a informação ou notícia rápida e “rasteira”, aquela que informa

24 Cf. DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2017. p. 64: “A vedete do espetáculo, a
representação espetacular do homem vivo, ao concentrar em si a imagem de um papel possível, concentra pois essa
banalidade. A condição de vedete é a especialização do vivido aparente, o objeto de identificação com a vida aparente
sem profundidade, que deve compensar o estilhaçamento das especializações produtivas de fato vividas. As vedetes
existem para representar tipos variados de estilo de vida e de estilos de compreensão de sociedade, livres para agir
globalmente. Elas encarnam o resultado inacessível do trabalho social, imitando subprodutos desse trabalho que são
magicamente transferidos acima dele como sua finalidade: o poder e as férias, a decisão e o consumo que estão no
início e no fim de um processo indiscutido. Num caso, é o poder governamental que se personaliza em pseudovedete;
no outro, é a vedete do consumo que se submete a plebiscito como pseudopoder sobre o vivido. Mas, assim como
essas atividades da vedete são realmente globais, também não são variadas”.
25 BRAUDRILLARD, Jean. Tela total: mito-ironias da era do virtual e da imagem. Porto Alegre: Sulina, 2005. p. 45.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 17

e ao mesmo tempo desinforma. Para Bauman, essa é uma das características


do atual momento em que se insere o ser humano:
“a tarefa de construir uma ordem nova e melhor para substituir a velha ordem
defeituosa não está hoje na agenda – pelo menos não na agenda daquele domí-
nio em que se supõe que a ação política resida. O ‘derretimento dos sólidos’,
traço permanente da modernidade, adquiriu, portanto, um novo sentido, e,
mais que tudo, foi redirecionado a um novo alvo (...). Os sólidos que estão
para ser lançados no cadinho e os que estão derretendo neste momento, o
momento da modernidade fluida, são os elos que entrelaçam as escolhas
individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de comunicação e
coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente, de um
lado, e as ações políticas de coletividades humanas, de outro.”26

Notícias falsas ou fake news são aquelas notícias que não possuem con-
teúdo verdade ou verossímil e buscam influenciar ou atingir de alguma forma
a opinião pública27, ou até mesmo o senso comum. Elas podem ser definidas
de forma mais completa, segundo Allcott e Gentzkow, do seguinte modo:
“Nós definimos ‘notícias falsas’ como artigos de notícias que são falsas de
forma intencional e verificável, e poderiam enganar os leitores. Concen-
tramo-nos em artigos de notícias falsas que têm implicações políticas, com
especial atenção para as eleições presidenciais de 2016 nos EUA. Nossa
definição inclui artigos de notícias intencionalmente fabricados, como um
artigo amplamente compartilhado do site agora denunciado denverguar-
dian.com com a manchete, ‘agente do FBI suspeita de falhas de e-mail da
Hillary encontradas mortas em aparente assassinato-suicídio’. Inclui muitos
artigos que se originam de sites satíricos, mas podem ser mal interpretados
como factuais, especialmente quando vistos isoladamente no Twitter ou
nas postagens do Facebook.”28 (tradução livre)

As fake news representam uma forma de manifestação do pensamento


e têm ligação com a liberdade de expressão, já que criam a possibilidade do
emissor dessas notícias falsas promover a sua circulação, amparado em um
suposto direito constitucional garantido no Estado Democrático de Direito,
mas ocorrendo abusos nessa emissão.

26 BAUMAN, Zygmunt. A modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p. 12.
27 “No nível coletivo, a prece como entidade mítica: a opinião pública é o sentimento do povo.” (AUGRAS, Monique.
Opinião pública: teoria e pesquisa. São Paulo: Vozes Limitadas, 1970. p. 9)
28 ALLCOTT, Hunt; GENTZKOW, Matthew. Social media and fake news in the 2016 election. Journal of Economic
Perspectives, v. 31, n. 2, p. 211-236, 2017. p. 213: “We define ‘fake news’ to be news articles that are intentionally and
verifiably false, and could mislead readers. We focus on fake news articles that have political implications, with special
attention to the 2016 US presidential elections. Our definition includes intentionally fabricated news articles, such as
a widely shared article from the now-defunct website denverguardian.com with the headline, ‘FBI agent suspected in
Hillary email leaks found dead in apparent murder-suicide’. It also includes many articles that originate on satirical
websites but could be misunderstood as factual, especially when viewed in isolation on Twitter or Facebook feeds”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
18

No Brasil, a questão das fake news não é um fenômeno recente. Notícias


que ficaram famosas evidenciando absurdos, mas que foram absorvidas pelos
receptores de notícias que deram credibilidade a esse tipo de informação.
Exemplificativamente, o jornal Notícias Populares veiculou na década de 1970
uma série de reportagens sobre um suposto bebê que seria “filho do diabo”,
ficando conhecido como “bebê-diabo”29, e essas notícias ganharam visibilidade
e notoriedade, embora dotadas de clara falsidade, aguçando a curiosidade dos
leitores do jornal daquela época.
Nesse ambiente marcado pela superficialidade e velocidade de informa-
ção, as fake news encontram espaço para seu surgimento e desenvolvimento,
principalmente, no interior das redes sociais, já que muitas vezes o veículo de
divulgação da notícia é um indivíduo comum que faz uma postagem de sua
casa e acaba atingindo grande número de pessoas, com pluralidade de fontes
sem alguma confiabilidade.
Ao possibilitar que notícias de cunho duvidoso ou até mesmo comple-
tamente mentiroso e distorcido sejam divulgadas nas redes sociais, o emissor
não tem a preocupação com a qualidade do tipo de notícia que está sendo
divulgada. Quem irá determinar a veracidade desse tipo de notícia ou informa-
ção veiculada acaba sendo o receptor, que muitas vezes não estará preocupado
com a “verdade” dessa notícia. Nesse sentido, Kunczik bem evidencia essa
característica: “Seja qual for a relação entre realidade divulgada e a realidade
‘verdadeira’, os receptores consideram as notícias como o testemunho autên-
tico dos acontecimentos ‘reais’. Isto significa que, no tocante ao seu efeito,
ele deve colocar-se em equação com a realidade”30.
Portanto, as características próprias das redes sociais, bem como a vola-
tilidade das informações, a superficialidade e a ausência de interesse em obter
a veracidade da informação ou notícia por parte de certos receptores dessas
notícias nas redes sociais, harmonizam-se perfeitamente com as características
das fake news que buscam, justamente, atingir a opinião pública ou o senso
comum, por meio do sensacionalismo da notícia aos assuntos que estão em
voga no interior dessas mesmas redes.
Permite-se, com isso, que a mentira se junte à verdade e produza um
resultado inadequado, o qual pode gerar consequências efetivas no mundo real.
As notícias falsas, quando confrontadas com os fatos verdadeiros do mundo

29 FERREIRA, Luiz Carlos. Bebê-diabo nasce no ABC paulista, mas some de forma misteriosa. Folha de S. Paulo, 15
de setembro de 2017. Banco de dados (saiu no NP). Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/banco-de-
dados/2017/09/1820253-bebe-diabo-nasce-no-abc-paulista-mas-some-de-forma-misteriosa.shtml>. Acesso em: 10
jan. 2018.
30 KUNCZIK, Michael. Conceitos de jornalismo: norte e sul – Manual de Comunicação. São Paulo: Edusp, 2001. p. 250.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 19

real, exaurem-se, pois não conseguem se sustentar, já que só a realidade pode


dar credibilidade e veracidade a uma notícia no plano do mundo real e objetivo.

4 Movimento de Expansão do Direito Penal


O papel do Direito Penal e a sua finalidade em relação à proteção dos
bens jurídicos identificados na sociedade é discussão que mobiliza diversos
estudiosos, não havendo muito consenso a esse respeito.
As transformações culturais, sobretudo no campo tecnológico, por que
passa a sociedade atual, globalizada e pós-industrial, têm, de fato, provocado
pontos de vista contrapostos no que se refere ao papel do Direito Penal: de
um lado, impulsionados pelos clamores sociais que se mostram cada vez mais
influenciados pelos meios de comunicação de massa (e, nos dias atuais, pelas
redes sociais na internet), alguns se posicionam pela expansão do Direito Penal,
ao passo que outros teóricos entendem que o futuro desse ramo do Direito
passa por seu minimalismo ou abolicionismo31.
Leticia de Almeida Maestri observa que, enquanto sistema de normas
voltadas ao controle social, deveria o Direito Penal se limitar à tutela dos bens
jurídicos mais relevantes, ou seja, dos bens mais fundamentais para a garantia
de existência e de sobrevivência da sociedade. Para esse desiderato, deveria
ser necessário um comportamento socialmente nocivo, uma lesão real a um
bem jurídico tutelado para que se possa acarretar a necessária imposição de
uma pena ao criminoso32.
Já as teorias expansionistas do Direito Penal, consoante lição de Luciano
Anderson de Souza:

“defendem que somente com uma atuação firme, rígida e multifacetada do


Direito Penal será possível à sociedade exercer o necessário controle sobre
uma nova forma de criminalidade. Assentados sobre a ideia de que o ramo
jurídico-criminal possui condições de garantir um melhor regramento da
atividade social danosa, permitindo uma mais intensa observância de seus
preceitos pelos atores sociais em razão, principalmente, de seu caráter
estigmatizante, os defensores deste Direito Penal expandido divergem,
todavia, com relação à forma por que deverá se dar a sua atuação mais
contundente.”33

31 SOUZA, Luciano Anderson de. Expansão do direito penal e globalização. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 173.
32 MAESTRI, Leticia de Almeida. Direito penal na pós-modernidade. Diritto & Diritti. 2011, p. 9. Disponível em:
<https://www.diritto.it/direito-penal-na-pos-modernidade/>. Acesso em: 10 jun. 2018.
33 SOUZA, Luciano Anderson de. Expansão do direito penal e globalização. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 62.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
20

As causas da expansão do Direito Penal nas sociedades pós-industriais


são elencadas por Jésus-María Silva Sánchez, destacando-se o surgimento de
novos bens jurídicos, bem como o incremento de valor em relação aos inte-
resses já existentes, de sorte que mais bens jurídicos são considerados dignos
de proteção penal, em razão: da conformação com novas realidades, como as
instituições de crédito; da deterioração das realidades anteriormente abun-
dantes, como o meio ambiente; e do incremento de realidades já conhecidas,
como o patrimônio histórico34.
Com a difusão da sensação de insegurança, como observa Silva Sanchéz,
ocorre cada vez mais clamor por segurança com propostas de endurecimento
das leis penais e flexibilização das garantias dos cidadãos35.
Analisando o fenômeno expansivo punitivista, Maiquel Ângelo Dezordi
Wermuth aponta alguns de seus principais reflexos, segundo sua percepção,
notadamente deletérios:

“(...) a partir do fenômeno expansivo vivenciado pelo Direito Penal, além


do incremento dos comportamentos elevados à categoria delitiva por meio
da antecipação da intervenção punitiva ao estágio prévio à efetiva lesão
dos bens jurídicos, verifica-se um processo de flexibilização das garantias
político-criminais materiais e processuais, mediante o desrespeito ao prin-
cípio da legalidade penal, à redução das formalidades processuais, à violação
ao princípio da taxatividade na elaboração dos tipos penais e à violação ao
princípio da culpabilidade.”36

É certo que, para alguns, a utilização da sanção penal desenfreada causa


efeitos negativos ao Direito Penal. Fala-se em hipertrofia da função penal.
Nessa esteira, Winfried Hassemer afirma que a missão penal é mais
“modesta” do que a atualmente atribuída e a consequência dessa hipertrofia
é a desconformidade entre a missão que se declara e os resultados obtidos,
ou seja, o Direito Penal não consegue realizar aquilo que se propõe a fazer,
resultando em um Direito Penal meramente simbólico37.
A respeito da ineficácia do Direito Penal simbólico, Rogério Zeidan
explica que:

34 SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais.
São Paulo: RT, 2002. p. 27.
35 SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais.
São Paulo: RT, 2002. p. 41.
36 WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Medo e direito penal: reflexos da expansão punitiva na realidade brasileira.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. p. 35.
37 HASSEMER, Winfried. Perspectivas de uma moderna política criminal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São
Paulo, v. 2, n. 8, p. 41-51, out./dez. 1994, p. 49.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 21

“A legislação simbólica, e especialmente o direito penal simbólico, carac-


teriza-se pela ineficácia de seus dispositivos legais. A lei penal simbólica
configura-se como letra morta quando carece de política criminal para
sua efetivação, pois não existe um vínculo instrumental entre o meio e o
fim, de modo a conduzir à hipertrofia simbólica, falta-lhe eficácia social
na medida em que não alcança operacionalidade, e pode faltar-lhe também
vigência social, já que a base fática que sustenta a lei penal não é vivenciada
pela sociedade.”38

Hassemer apresenta quatro situações de expressão do Direito Penal


simbólico: a existência de leis que declaram valores, como a do aborto, con-
trapondo a autodeterminação da mulher, sua vontade de ter filhos e a vida do
feto; leis de apelo moral, como as leis ambientais que tentam criar no cidadão
uma consciência ecológica; leis de “resposta” a uma situação de insegurança,
como é o caso da disseminação das fake news, em que se tenta tranquilizar
o medo das classes sociais. E, por último, as leis de compromisso, que são
cláusulas penais feitas apenas para demonstrar que o Estado se preocupa com
tal problema. Exatamente nesta terceira situação destacada por Hassemer, em
particular com a criação de leis de “resposta”, percebe-se como o fenômeno das
fake news, com suas características e peculiaridades, conforme já mencionado,
potencializado na sociedade informacional, tem operado como importante
fator de legitimação de movimentos de expansão punitivista39.
No tópico seguinte, serão criticados alguns importantes aspectos de
proposições legislativas a respeito da criminalização das fake news, mormente
o Projeto de Lei do Senado nº 473/2017, que reúne todas as características de
um típico exemplo, na acepção hassemeriana, de “lei de resposta”.

5 Iniciativas de Criminalização das Fake News no Brasil como


Expressão do Expansionismo Punitivista
É preciso, inicialmente, reconhecer que, em determinadas situações
específicas, a criação e o compartilhamento de notícias falsas, seja ou não pela
Internet, já podem ser caracterizados como comportamentos criminosos pela
legislação existente.
Com efeito, caso a fake news diga respeito a determinado indivíduo,
ofendendo-lhe sua dignidade ou decoro, poderia incidir o crime de injúria40.

38 ZEIDAN, Rogério. Direito penal contemporâneo: fundamentos críticos das ciências penais. São Paulo: Saraiva, 2013.
p. 177.
39 HASSEMER, Winfried. Derecho penal simbólico y protección de bienes jurídicos. In: BUSTOS RAMIREZ, Juan.
Pena y Estado. Santiago: Editorial Jurídica Conosur, 1995. p. 23-36.
40 Código Penal: “Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
22

Se a notícia difundida especificar um fato que é ofensivo à reputação de


determinado indivíduo, poderia se cogitar no crime de difamação41. Por sua
vez, se houver falsa imputação de fato definido como infração penal à pessoa
determinada, possível se pensar no crime de calúnia42.
Vale lembrar, ainda, que o § 1º do art. 57-H da Lei das Eleições (Lei nº
9.504, de 30 de setembro de 1997), com a redação dada pela Lei nº 12.891,
de 11 de dezembro de 2013, prescreve que “constitui crime a contratação
direta ou indireta de grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir
mensagens ou comentários na internet para ofender a honra ou denegrir a
imagem de candidato, partido ou coligação”. Dessa maneira, se a divulgação
de notícias falsas ocorrer em época de eleição com o objetivo de desqualificar
um candidato, partido ou coligação, a pena será de dois a quatro anos de prisão
e multa de 15 mil a 50 mil reais. E quem for contratado com essa finalidade
também está sujeito à punição, que vai de seis meses a um ano de prisão, mais
multa de 5 mil a 30 mil reais.
Ocorre que, além destas hipóteses possíveis de enquadramento criminal
na legislação penal, apenas na primeira metade de 2018, diversos projetos de
lei foram apresentados nas duas casas legislativas do Congresso Nacional,
com vistas à criminalização das fake news, de forma ampla, envolvendo ou não
pessoa determinada, desde a criação de boatos nas redes sociais, até notícias
inverídicas na mídia convencional.
Segundo levantamento da agência de notícias Pública, ao todo são vinte
projetos de leis, com penalidades que variam de multas a partir de R$ 1.500,00
a até oito anos de reclusão para quem divulgar fake news, sendo dezenove deles
na Câmara dos Deputados e um no Senado Federal43.
Além, obviamente, do conteúdo em relação ao tipo penal, os projetos
diferem sobre quais códigos ou leis seriam modificados para receber o novo
crime. Há propostas que alteram o Código Penal, o Código Eleitoral e, até
mesmo, o Código de Defesa do Consumidor. Um dos mais radicais, inte-
ressante consignar, é o Projeto de Lei nº 9.533/2018, de autoria do Deputado
Francisco Floriano (DEM/RJ), que pretende inserir o crime de participação
na produção e divulgação de notícias falsas à Lei nº 7.170/83, que define os
crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social.

41 Código Penal: “Art. 139. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação”.
42 Código Penal: “Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime”.
43 GRIGORI, Pedro. 20 projetos de lei no Congresso pretendem criminalizar fake news. Pública, 11 de maio de 2018.
Disponível em: <https://apublica.org/2018/05/20-projetos-de-lei-no-congresso-pretendem-criminalizar-fake-
news/>. Acesso em: 30 ago. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 23

Entre as proposições legislativas, como paradigma, podemos destacar o


Projeto de Lei do Senado nº 473, de 2017, de autoria do Senador Ciro Nogueira
(PP/PI), que pretende a criação do crime de divulgação de notícia falsa, a ser
incluído no texto do Código Penal, com a seguinte redação:

“Divulgação de notícia falsa

Art. 287-A. Divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar
ou corromper a verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segu-
rança pública, à economia nacional, ao processo eleitoral ou que afetem
interesse público relevante.

Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui
crime mais grave.

§ 1º Se o agente pratica a conduta prevista no caput valendo-se da internet


ou de outro meio que facilite a divulgação da notícia falsa:

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa, se o fato não constitui crime


mais grave.

§ 2º A pena aumenta-se de um a dois terços, se o agente divulga a notícia


falsa visando a obtenção de vantagem para si ou para outrem.”44

É de se destacar que, caso aprovado nesses termos, o futuro tipo penal


seria demasiadamente aberto, uma vez que uma de suas elementares assim
menciona: “possa distorcer, alterar ou corromper a verdade”. Verdade esta que
deve ser relacionada aos seguintes temas, segundo a comentada proposição:
saúde, segurança pública, economia nacional, processo eleitoral ou qualquer
outro “interesse público relevante”.
O emprego da palavra “verdade” parece inadequado para a redação do
tipo penal que se pretende criar com a proposta legislativa. O princípio da
legalidade45 em matéria penal exige o necessário grau de determinação e cer-
teza da norma jurídica incriminadora, constituindo fundamental conquista do
indivíduo frente ao arbítrio na criação de tipos penais. A expressão “verdade”
não é unívoca, ensejando grande margem de interpretação e amplo grau de
subjetividade por parte do operador do Direito. De qual “verdade” se estaria
tratando? Verdade em relação a fatos? Verdade em relação ao pensamento
científico? Verdade no tocante a convicções filosóficas?

44 BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 473, de 2017. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/


documento?dm=7313311&disposition=inline>. Acesso em: 27 ago. 2018.
45 O princípio da legalidade está expressamente previsto no art. 5º, XXXIX, da CF/88, bem como reproduzido no art.
1º do CP: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
24

Não se desconhece a possibilidade de condutas consistentes em afir-


mações ou declarações que sejam dolosamente feitas em desconformidade
com fatos objetivos, como, por exemplo, produzir uma notícia em que se
afirma ter certo evento ocorrido em determinado dia do mês, sendo falsa, pois,
objetivamente, tal situação ocorreu em outra data. No exemplo imaginado
haveria uma “verdade” objetiva falseada.
Porém, há diversas outras situações em que não se pode afirmar que
a “verdade” foi distorcida ou corrompida, como em questões da ciência, nas
quais não há consenso ou entendimento majoritário na comunidade científi-
ca. Imaginemos alguém produzir uma notícia afirmando que o aquecimento
global é uma mentira, ou que o “Big Bang” não ocorreu, pois a criação do
universo é de origem divina, sendo enquadrado em um tipo penal como o da
proposta em questão, pois “distorceu a verdade sobre informações relacionadas
a interesse público relevante”. Seria absurdamente inaceitável por violação à
liberdade de manifestação do pensamento.
A criação de novos tipos penais, utilizando-se à sobeja das formulações
de tipos abertos, como é o caso do Projeto analisado, assim como normas pe-
nais em branco, crimes de perigo abstrato, supressão de garantias processuais
e recrudescimento de penas são expressões características de certas tendências
do expansionismo punitivista46.
É importante destacar que a incompleta compreensão sobre as fake news
também fica evidente da leitura das justificativas do mencionado Projeto,
segundo as quais a vítima do novo crime que se pretende instituir seria a “so-
ciedade como um todo” e o bem que se visa a tutelar seria o “direito difuso de
a população receber notícias verdadeiras e não corrompidas”. Nesse sentido,
cabe transcrever o seguinte trecho da justificativa da proposição em tela:

“Quando a vítima pode ser identificada, a divulgação de fake news, via de


regra, configura crime contra a honra (calúnia, injúria ou difamação). Há
situações, no entanto, em que embora o dano não possa ser individualizado,
o direito difuso de a população receber notícias verdadeiras e não corrom-
pidas é atingido. Ocorre que para estes casos a lei penal não prevê qualquer
tipo de punição. Dessa forma, o presente projeto de lei busca criminalizar a
divulgação de notícia falsa em que a vítima é a sociedade como um todo.”47

Embora se reconheça o direito fundamental de acesso à informação,


este é diferente de um “direito difuso de a população receber notícias verda-

46 SOUZA, Luciano Anderson de. Expansão do direito penal e globalização. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 62.
47 BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 473, de 2017. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/
documento?dm=7313311&disposition=inline>. Acesso em: 27 ago. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 25

deiras e não corrompidas”, porquanto tal formulação é extremamente aberta,


enseja grande multiplicidade de interpretações e, assim, conduz à insegurança
jurídica. A informação deve ser livre em sua criação e difusão, sendo a todos
reservado o direito de seu acesso. Trata-se de direito fundamental relacionado
à difusão do conhecimento. Há, ainda, o direito à manifestação do pensamen-
to e à liberdade de expressão. Por outro lado, no texto constitucional não há
redação parecida com a formulada pela proposta, ou seja, “direito de receber
notícias verdadeiras e não corrompidas”.
Assim, certamente com o intuito de mostrar serviço em relação ao
assunto do momento, o referido Projeto aparenta demonstrar desconheci-
mento sobre a complexidade do próprio fenômeno social que se pretende
regulamentar por meio da lei penal.
Outra questão importante é a do efeito meramente simbólico pela
ausência de efetividade da norma penal pretendida48. A título de exemplo, há
no Facebook e em redes sociais similares uma quantidade enorme de posta-
gens, sendo muito difícil processar todos aqueles que compartilham alguma
mensagem com conteúdo falso. E, com isso, muitos casos não seriam levados
à Justiça criminal. É improvável, nesse sentido, que com a criação de mais
um tipo penal poderia ser combatida efetivamente a existência e circulação de
notícias falsas. Poderia, é certo, haver um enfraquecimento ou vulgarização
da lei penal.
Por outro lado, a norma penal pretendida poderia acabar sendo utilizada
como instrumento de patrulha ideológica contra aqueles eventualmente con-
siderados opositores ou detratores. Com efeito, apenas alguns casos seriam
enquadrados, o que criaria uma situação em que a futura lei seria aplicada sele-
tivamente apenas a determinado grupo ou pessoa, classe social, candidato, etc.
O Projeto nº 473/2017, na forma como redigido, daria margem a insi-
nuações no sentido de um (presumível) ímpeto de se criminalizar condutas
que se mostrem ideologicamente contrárias a certos setores, e não somente
às fake news. Seria possível pensar que a lei pudesse ser utilizada contra aque-
les que ousassem discordar de governos e detentores temporários do poder
político. Da forma como se apresenta, portanto, a proposição aparenta certo
excesso em relação ao exercício do poder punitivo.
Para concluir, o Direito Penal se revela legítimo apenas quando são
tutelados os bens jurídicos considerados essenciais pela ordem jurídico-
constitucional. Quando a lei penal passa a punir indiscriminadamente, sem

48 HASSEMER, Winfried. Derecho penal simbólico y protección de bienes jurídicos. In: BUSTOS RAMIREZ, Juan.
Pena y Estado. Santiago: Editorial Jurídica Conosur, 1995. p. 23-36.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
26

razoabilidade, qualquer comportamento que não se mostra digno de poten-


cial lesivo a bem jurídico constitucionalmente protegido, estamos diante, na
verdade, de uma crise de legitimidade do próprio Estado de Direito.

6 Conclusão
O fenômeno das fake news não é recente, porém ganhou força e espaço
com a popularização da internet e o avanço tecnológico, que permitiram um
ambiente facilitador da dinâmica de circulação de informação.
A efemeridade que a informação possui hoje e a indiferença dos indi-
víduos com a verdade, fortalecendo o conceito de pós-verdade, evidenciam
o campo perfeito para o desenvolvimento de uma cultura de criação de con-
teúdo e até mesmo de compartilhamento de notícias que não correspondem
à verdade.
Juntamente com a efemeridade da informação, bem como com a indi-
ferença com a verdade, observa-se a capacidade de estabelecer valor monetário
ou de quantificar economicamente essa informação, o que cria, ainda, uma
visão desta como mercadoria e a possibilidade de se obter receitas financeiras
com a sua circulação. Isso gera uma postura de busca de informação, não para
agregar conhecimento, mas sim para obter vantagem econômica. Nesse sen-
tido, a velocidade da informação ganha mais espaço do que a sua veracidade.
Por outro lado, a internet é um ambiente de difícil regulação, já que o seu
próprio funcionamento e a sua arquitetura tornam qualquer tipo de iniciativa
nesse sentido muito difícil de alcançar os resultados desejados. Quanto mais se
busca regular a internet, mais meios ela encontra para se desviar da regulação,
já que as iniciativas de legislação buscam disciplinar o aspecto visível, ou seja,
a superfície da internet. Entretanto, existem outras questões, como a estrutura
e a própria dinâmica de interação, que são difíceis de serem reguladas, uma
vez que os reflexos das ações no ciberespaço possuem alcance mundial, e
qualquer iniciativa que não leve isso em conta pode fracassar.
A busca por regulação da internet sob o aspecto criminal será mais com-
plexa ainda, já que esse ramo do Direito possui princípios basilares, entre os
quais a da legalidade e a exigência de tipicidade material e formal, exigindo do
legislador intenso esforço no sentido de imaginar todas as possíveis condutas
para, desse modo, tipificá-las em lei. A dinâmica da internet é muito peculiar
e a velocidade das interações é extrema.
Dessa forma, as diversas iniciativas de enquadramento criminal quanto
à criação e à disseminação de notícias falsas, ou seja, as denominadas fake news,
estão fundamentadas em um suposto interesse social. Entretanto, na realidade,
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 27

podem encobrir certo viés autoritário, decorrente de uma política criminal


fundada em premissas equivocadas.
Embora talvez não seja o objetivo direto, tais iniciativas tendem a
fomentar um Estado ideologicamente controlador, como reflexo de um
enfretamento equivocado de fenômeno social típico da sociedade informa-
cional, cujas características nem sempre são bem compreendidas por todas
as autoridades públicas.
A tentativa seria de tentar regular, sob o rigoroso enfoque penal, um
dos aspectos da internet ligado à informação e sua circulação, que são as fake
news, mas os reflexos da criação ou divulgação de notícias falsas podem não
interferir em bens penalmente tutelados, já que, em alguns casos, podem re-
presentar condutas que colidam com os preceitos da legislação civil existente,
como é o caso do Marco Civil da Internet.
Dessa maneira, essas investidas legislativas podem provocar o acréscimo
desnecessário de tipos penais, por meio de textos nem sempre bem redigidos,
muito abertos e de conteúdo indeterminado, sendo tais manifestações fruto
de certa tendência de expansão do punitivismo que por vezes surge em alguns
sistemas jurídicos na contemporaneidade.

TITLE: Initiatives on criminalization of fake news in Brazil: reflection of the punitive expansionism.
ABSTRACT: This study deals with the recent initiatives aimed at criminalizing the production and
dissemination of fake news in Brazil, as is the case with the legislative proposals recently presented in
the National Congress, including Senate’s Proposition of Law no. 473, of 2017. The study starts from a
broad and critical analysis about the post-truth in the context of the Information Society, starting to place
the discussion, above all, on the growing phenomenon of the diffusion of fake news in social networks.
In order to safeguard the public and social interest, within a mistaken perspective of criminal policy, the
initiatives of criminal framing regarding the creation and dissemination of false news, in fact, appear to
establish ideological control based on social fact, whose contours, unfortunately, not always are fully
understood by the state authorities, configuring such legislative incursions, amplifying penal types, in
unequivocal expression of punitive expansionism.
KEYWORDS: Information Society. Post-Truth. Fake News. Criminal Law. Expansion.

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Recebido em: 21.12.2018


Aprovado em: 26.12.2018
Doutrina

O Habeas Corpus Coletivo*


Marcellus Polastri Lima
Doutor e Mestre em Direito pela UFMG (ênfase em Processo
Penal); Professor-Doutor (Associado) da Graduação e do
Mestrado da UFES – Universidade Federal do Espírito
Santo; Professor da Pós-Graduação em Ciências Penais do
IEP-MPRJ; Professor Emérito da Fundação Escola do MPRJ;
Pesquisador Visitante em Processo Penal Comparado no
Instituto de Ciências Criminais do Departamento de Direito
Penal Estrangeiro e Internacional na Georg-August Universität
de Göttingen/Alemanha; Membro do Instituto Brasileiro de
Direito Processual (IBDP); Procurador de Justiça.

Elias Gemino de Carvalho


Aluno Especial do Curso de Mestrado em Direito Processual da
UFES; Pós-Graduado em Direito Privado pela Universidade
Gama Filho (2009) e Pós-Graduado em Direito Público pela
Universidade Cândido Mendes (2014); Defensor Público na
Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo.

RESUMO: Este trabalho pretende compreender e elucidar a questão do cabi-


mento da impetração do habeas corpus na modalidade coletiva no ordenamento
pátrio. O estudo analisará as vantagens trazidas pela evolução do processo coletivo
e sua importância para enfrentar os problemas da morosidade e da sobrecarga
do Poder Judiciário, buscando dar maior celeridade, economia e efetividade
a prestação jurisdicional. Ao final, será tratado do cabimento do habeas corpus
coletivo como ação constitucional capaz de garantir o direito fundamental à
liberdade de locomoção de uma coletividade, através do posicionamento da
doutrina e da jurisprudência de nossos Tribunais Superiores.

PALAVRAS-CHAVE: Habeas Corpus Coletivo. Direito à Liberdade. Processo


Coletivo.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Escorço Histórico. 3 Natureza Jurídica e Espécies.


4 A Coletivização dos Direitos como Forma de Garantir uma Tutela Jurídica
Efetiva e Célere. 5 A Coletivização do Habeas Corpus. 6 Conclusão. 7 Referências.

1 Introdução
O objetivo do presente trabalho é um exame da ação de impugnação do
habeas corpus na modalidade coletiva na legislação brasileira, fazendo um breve

* Última doutrina escrita pelo Doutor Marcellus Polastri Lima, falecido em 13 de fevereiro de 2019.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 31

escorço histórico de sua inclusão, natureza e cabimento no direito brasileiro,


até chegar à sua utilização como ação impugnativa destinada a enfrentar as
violações sofridas ao direito de liberdade de um grupo de pessoas.
A natureza jurídica, as espécies e as hipóteses legais de cabimento do
habeas corpus, na Constituição da República e na legislação processual penal,
serão devidamente detalhadas, para que se conheça quando a utilização do
remédio constitucional é realmente adequada.
Será, por fim, pontuado o cabimento da impetração do habeas corpus
coletivo como uma tendência contemporânea, tanto na doutrina, como na
jurisprudência, garantindo a tutela coletiva de direitos, na seara penal, visan-
do promover economia e celeridade processuais, a igualdade de tratamento
entre os jurisdicionados e o pleno acesso à justiça, especialmente para os
hipossuficientes, em respeito a garantia fundamental do direito à liberdade e
ao princípio da dignidade da pessoa humana.

2 Escorço Histórico
Historicamente, o habeas corpus aparece no direito anglo-saxão, através
da Magna Carta de João Sem Terra, de 1215, que foi imposta pelos condes e
barões revoltados com as arbitrariedades do governo da monarquia.
Como elucida José Barcelos de Souza:

“Não há dúvida de que o habeas corpus, nos moldes e com o nome que nos
foram legados, é uma instituição inglesa; mas sua origem, tem-se admiti-
do, remonta ao interdito de líbero homine exhibendo dos romanos. O nome
vem das duas primeiras palavras, em latim, que significam ‘tome o corpo’,
palavras iniciais do writ, ou mandado que, como acontece nas encíclicas,
ou bulas papais (Rerum novarum, Pacem in terra, etc.), deram nome ao ins-
tituto. O mandado dizia: ‘Tome o corpo do preso e o apresente à Corte’.
Nosso Código de Processo Penal conserva até hoje um resquício daquele
mandado inglês. Lá está, com efeito, em um de seus artigos, que ‘se o
paciente estiver preso, o juiz mandará que ele seja trazido imediatamente
à sua presença’. Só que, atualmente, isso não ocorrerá de modo rotineiro,
mas quando pedido pelo impetrante, visto que se firmou a praxe de, em
vez disso, pedirem-se informações ao coator, tal como se faz nos tribunais,
nos casos de competência originária.”1

O habeas corpus entra na legislação brasileira em 1832, com o Código


de Processo Criminal, nos arts. 340 a 355, sendo que, conforme o art. 340:

1 SOUZA, José Barcelos de. Do habeas corpus. Revista da Faculdade de Direito Milton Campos, Belo Horizonte, Del Rey,
vol. 25, 2012, p. 61.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
32

“Todo cidadão que entender que ele, ou outrem, sofre uma prisão ou cons-
trangimento ilegal em sua liberdade, tem o direito de pedir uma ordem de
habeas corpus em seu favor.”

Com a República, a Constituição de 24 de fevereiro de 1891 ganhou o


habeas corpus o status de garantia constitucional no seu art. 72 e, da forma que
foi originariamente previsto, o writ não tinha um cabimento restrito para a
coação da liberdade de locomoção do indivíduo (liberdade de ir e vir), pois
estabelecia esse diploma magno que, “Dar-se-á habeas corpus sempre que o
indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência ou coação,
por ilegalidade ou abuso de poder”.
Dada essa garantia constitucional tão ampla, se encontrou um campo
fértil para a criação da doutrina brasileira do habeas corpus, mas veio a reforma
da Constituição em 1926, sob a presidência de Artur Bernardes, e houve
um retrocesso, pois essa reforma limitou a utilização do habeas corpus para
as questões relativas à prisão ilegal ou violenta, constrangimento ilegal e ao
direito de locomoção.
Mas, o resquício da doutrina brasileira do habeas corpus ainda está pre-
sente na atual Constituição, em seu art. 5º, LXVIII: “Conceder-se-á habeas
corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou
coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
Assim, o remédio originário da Carta Magna inglesa, hoje, tem função
ampliada no Direito brasileiro, não só como ação para corrigir o abuso de
poder que compromete a liberdade de locomoção, mas, às vezes, até como
substitutivo de recurso, quando for o meio mais rápido para estagnar o cons-
trangimento ilegal.
Historicamente, é utilizado o vocábulo “ordem”, que aparece na expres-
são “ordem de habeas corpus”, que é uma tradução do inglês writ of habeas corpus,
servindo para compor o nome do remédio jurídico, que pode ser chamado
simplesmente de habeas corpus, sendo que é também chamado de writ, como
por vezes se veem trabalhos forenses ou outros escritos jurídicos.

3 Natureza Jurídica e Espécies


Sob a ótica do CPP, o habeas corpus seria um recurso, mas, com o tempo,
a doutrina passou a ver no habeas corpus um remédio jurídico-constitucional,
uma ação constitucional, para a proteção do direito de ir e vir2.

2 Neste sentido: MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Campinas: Bookseller, 2002. v. IV.
p. 367.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 33

Porém, hoje se tem uma visão mais ampla deste remédio heroico, pois,
na área do Direito Processual Penal, estamos assistindo à consolidação de
uma nova concepção do instituto, tão importante e tão significativa como a
da antiga e histórica doutrina brasileira do habeas corpus. O writ tem sido usado
com grande abrangência independentemente mesmo da existência de prisão
ou de ameaça concreta à liberdade de locomoção. É o que chama Barcelos de
Souza de habeas corpus processual, que tem uma “face de remédio processual
contra a ilegalidade e contra os constrangimentos sem justa causa no processo
penal, para o que pode aí ser perfeitamente utilizado ainda que o réu não se ache
preso nem concretamente ameaçado de prisão (...) Mas é bem de ver que nem por
isso perdeu sua natureza também de ação, uma vez que com ele se instaura
uma relação processual nova ainda quando impetrado contra decisão judicial”3.
As hipóteses de cabimento da medida estão indicadas nos arts. 647 e 648
do CPP, esclarecendo, como dito supra, que, cada vez mais, tem sido ampliado
o espectro de seu cabimento.
Dispõe o art. 648 do CPP:

“A coação considerar-se-á ilegal:

I – quando não houver justa causa;

II – quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

III – quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;

IV – quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;

V – quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que
lei autoriza;

VI – quando o processo for manifestamente nulo;

VII – quando extinta a punibilidade.”

Obviamente que a enumeração não é taxativa e sim exemplificativa,


mesmo porque, na prática, como dito, o remédio tem tido sua aplicação
ampliada.
Qualquer pessoa pode impetrar a ação, pois esta não exige maiores for-
malidades4, e, inclusive, pode impetrá-la o Ministério Público, que é fiscal da
lei, sendo que o juiz também pode conceder a ordem de habeas corpus de ofício.

3 SOUZA, José Barcelos de. Doutrina e prática do habeas corpus. Belo Horizonte: Sigla, 1998. p. 11-19.
4 Não há necessidade de ser advogado para impetrar o habeas corpus, e tem-se admitido sua interposição redigida a
petição em qualquer folha de papel, mesmo à mão, sem qualquer formalidade.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
34

A jurisprudência e a doutrina também têm admitido impetração contra


ato de particular, se bem que o instituto visa à proteção contra ato de agente
público.
Divide-se o writ nas modalidades de liberatório, que é aquele em que se
busca restituir a liberdade do paciente que se encontra ilegalmente preso; ou
preventivo, que é aquele em que diante de uma situação iminente de ameaça
ou coação ao direito de locomoção pode ser impetrado para se evitar que uma
prisão se concretize.
Apesar de a ação constitucional de habeas corpus buscar garantir o direito
fundamental à liberdade dos indivíduos, essa também poderá ser coletiva
quando os beneficiários da prestação jurisdicional forem constituídos por uma
coletividade de pessoas que necessitam de tutela para seu direito coletivo de
locomoção ou para tutela coletiva de direitos.
E é justamente do habeas corpus coletivo que passaremos a tratar neste
estudo.

4 A Coletivização dos Direitos como Forma de Garantir uma Tutela


Jurídica Efetiva e Célere
Antes de adentrarmos na coletivização do habeas corpus, necessário se faz
uma passagem sucinta pelos problemas estruturais enfrentados pelo Judiciário
brasileiro, assim como pelo tema do acesso à justiça que pretende mostrar um
caminho para minimizar todas essas dificuldades à efetividade do processo.
Em relação aos problemas estruturais constata-se que o aumento do
contencioso e a judicialização das relações sociais, principalmente após a
abertura democrática, no caso brasileiro, geraram um grande aumento das
demandas jurídicas, eclodindo num número excessivo de processos, na falta e
insuficiência de juízes e na consequente morosidade da prestação jurisdicional.
A partir daí, teve início no Brasil um amplo processo de discussão e
reorganização do Poder Judiciário que deu relevância à celeridade, à econo-
mia de recursos, à ampliação do acesso à justiça, a coletivização do processo,
resultado da necessidade de se conferir proteção coletiva aos interesses e
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos e ao uso de técnicas que
melhorem a qualidade com que o Estado atue seu monopólio da jurisdição.
Dentre essas questões destacamos a problemática do acesso à justiça,
preocupação mundial na atualidade, que diz respeito ao efetivo exercício do
direito de ação, à formação cultural da população sobre a Justiça e à resolução
dos entraves relativos aos custos processuais.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 35

Mauro Cappelletti e Bryant Garth5 apresentam o que chamam de “solu-


ções práticas para os problemas de acesso à justiça”, dividindo o tema em três
ondas renovatórias: a primeira onda trata da assistência judiciária, que consiste
em proporcionar serviços jurídicos aos pobres para conscientizá-los de seus
novos direitos e para que passem a ser vistos como uma classe a fim de facili-
tar a promoção de tais direitos. A segunda onda refere-se à representação dos
interesses difusos, principalmente quanto à legitimação ativa por indivíduos
ou grupos, mudando o foco de uma visão individualista de processo para uma
concepção social e coletiva. E a terceira onda cuida do novo enfoque dado ao
acesso à justiça, através da realização de reformas no sistema judiciário, que
inclui: alterações procedimentais; busca por soluções mais simples, acessíveis
e céleres; mudanças estruturais; modificação no direito substantivo destinada
a evitar litígios; promoção de uma justiça coexistencial6, baseada na conciliação
e no critério de equidade social distributiva e diminuição da burocracia, com
utilização de mecanismos privados ou informais.
Seguindo esta linha de pensamento, o direito a uma prestação ju-
risdicional do Estado deixa de priorizar o processo apenas individual para
valorizar demandas que atinjam uma gama maior de indivíduos, de forma
coletiva, considerando assim, a possibilidade de ajuizamento de ações para
prestação jurisdicional a um conjunto de pessoas com interesses individuais
homogêneos, coletivos ou difusos, passando a se admitir a tutela dos direitos
coletivos e a tutela coletiva de direitos7.
Segundo leciona Zavascki,

“já na década de 1970, a Lei nº 6.513, de 20.12.77, introduziu significativa


modificação no art. 1º, § 1º, da Lei de Ação Popular, a fim de considerar
como patrimônio ‘os bens e direitos de valor econômico, artístico, estéti-
co, histórico e turístico’. Com isso, viabilizou-se a possibilidade de tutela
dos referidos bens e direitos, de natureza difusa, pela via da ação popular.
Todavia, foi a Lei nº 7.347, de 24.07.85, que assentou o marco principal do
intenso e significativo movimento em busca de instrumentos processuais
para a tutela dos chamados direitos e interesses difusos e coletivos. Essa
lei, conhecida como lei da ação civil pública, veio preencher uma impor-
tante lacuna do sistema do processo civil, que, ressalvado o âmbito da ação
popular, só dispunha, até então, de meios para tutela de direitos subjetivos
individuais. Mais que disciplinar um novo procedimento qualquer, a nova

5 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris, 1988.
6 TAVARES, Marcelo Leonardo. Carentes de Justiça. Revista de Direito da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro,
n. 17, 2001, p. 127-146.
7 ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela dos direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 7. ed. São Paulo:
RT, 2017.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
36

lei veio inaugurar um autêntico subsistema de processo, voltado para tutela


de uma também original espécie de direito material: a dos direitos transin-
dividuais, que são caracterizados por se situarem em domínio jurídico, não
de uma pessoa ou de pessoas determinadas, mas sim de uma coletividade.”

A Constituição da República de 1988 consagrou também a tutela de


direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, fixando as premissas
para o ajuizamento da ação popular, da ação civil pública e do mandado de
segurança coletivo.
Ainda nesse diapasão, nossos legisladores introduziram e continuam
a implantar no ordenamento jurídico importantes mecanismos de proteção
aos interesses difusos e coletivos, como por exemplo, o Código de Defesa do
Consumidor, que conjuntamente a lei de ação civil pública, a lei do mandado
de segurança e demais normas afins formam o microssistema de proteção e
defesa dos interesses difusos e coletivos, que buscam atenuar o problema
da falta de uma boa e célere prestação jurisdicional e resolver coletivamente
inúmeras lides em prol do efetivo acesso à justiça.
Neste sentido, não pode e não deve o processo penal ficar aquém dessa
evolução da teoria processual, devendo também se adequar para o atendimento
das demandas coletivas na seara penal. Destarte, o habeas corpus na modalidade
coletiva deve trilhar este caminho em sua interpretação e aplicação, de forma
a dialogar com as demais ações constitucionais como: a ação civil pública,
o mandado de segurança, o mandado de injunção e as disposições do novo
Código de Processo Civil, como meio para ampliar os instrumentos para
proteção coletiva de direitos, em busca de maior celeridade, efetividade e
adequação nas soluções dos conflitos processuais penais.

5 A Coletivização do Habeas Corpus


As ações coletivas têm, em geral, duas justificativas atuais de ordem
sociológica e política: a primeira, mais abrangente, revela-se no princípio do
acesso à justiça; a segunda, de política judiciária, no princípio da economia
processual8.
Sendo assim, sabendo-se que as violações ao direito de locomoção,
muitas vezes, desbordam da esfera individual, atingindo uma coletividade de
indivíduos, mostra-se plenamente cabível a impetração da ação constitucional
de habeas corpus, para, nos termos da Constituição Federal, afastar ameaça de

8 DIDIER Jr., Fredie; ZANETI Jr., Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo. 4. ed. Salvador: Juspodivm,
2009. vol. IV. p. 34.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 37

violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso


de poder.
Neste sentido, pode-se dizer que a violação de um direito coletivo é
ato ilícito que pode dar ensejo a demandas cíveis ou penais. Embora isso não
seja muito examinado pela doutrina, a tutela jurisdicional dos direitos coleti-
vos pode ser feita por meio de ações penais9, como através, por exemplo, do
habeas corpus coletivo.
Apesar da inexistência de uma norma legal expressa sobre o habeas cor-
pus coletivo, pode-se extrair, ainda que, de forma indireta, a plausibilidade da
sustentação do cabimento quanto à impetração do habeas corpus coletivo dos
arts. 654, § 2º e 580, ambos do CPP.
O art. 654, § 2º estabelece que os juízes e os Tribunais têm competência
para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso do processo
verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal. Já
o art. 580 do CPP, que trata de recursos, prevê que a ordem concedida em
determinado habeas corpus pode ser estendida para todos que se encontram
na mesma situação.
Os incisos LXVIII, LXIX e LXX do art. 5º da Constituição Federal afir-
mam que é cabível mandado de segurança quando não couber habeas corpus.
Dessa forma, como o mandado de segurança pode ser coletivo, também seria
plenamente possível a impetração de habeas corpus coletivo.
Ainda, pautando-se no princípio da atipicidade das ações coletivas, pre-
visto no art. 83 do CDC, fica claramente sem sentido qualquer afirmação em
contrário, ou seja, de que não é cabível o habeas corpus coletivo, por ausência
de previsão legal.
Portanto, não existem fundamentos para que não se admita a tutela
coletiva do status libertatis, na seara processual penal. A violação ao direito de
liberdade pode atingir múltiplos sujeitos a partir de um ato danoso comum.
Assim, a tutela efetiva da liberdade, por vezes, somente será alcançada através de
instrumentos processuais de demanda coletiva, como o habeas corpus coletivo10.
Cabe ainda ressaltar que o habeas corpus coletivo é uma solução viável
para garantir acesso à justiça de grupos sociais mais vulneráveis, tendo em vista
ter como objetivo primordial salvaguardar um dos direitos fundamentais do
indivíduo que é a liberdade.

9 DIDIER Jr., Fredie; ZANETI Jr., Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo. 4. ed. Salvador: Juspodivm,
2009. vol. IV. p. 45.
10 LIMA, Thais. Ministros, precisamos falar sobre habeas corpus coletivo. JOTA. Disponível em: <https://www.jota.
info/stf/do-supremo/defesa-senhores-ministros-precisamos-falar-sobre-habeas-corpus-coletivo-22092016>.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
38

O professor Daniel Sarmento, em parecer ofertado pela Clínica de


Direitos Fundamentais da Faculdade de Direito da UERJ, em relação ao uso
de habeas corpus coletivo pela DPE-RJ, asseverou:

“(...) é possível sintetizar as principais ideias desenvolvidas ao longo do


estudo nas seguintes proposições objetivas: (i) A tendência contemporânea
de tutela coletiva de direitos individuais visa a promover economia e cele-
ridade processuais, a igualdade de tratamento entre os jurisdicionados e o
pleno acesso à justiça, especialmente para os hipossuficientes. Todas essas
preocupações se fazem presentes na esfera penal, em que a seletividade
do aparelho repressor do Estado deixa especialmente vulnerável a camada
populacional mais pobre. Nesse contexto, o habeas corpus coletivo consti-
tui instrumento necessário à tutela da liberdade de locomoção em uma
sociedade de massa, marcada pela desigualdade, como a brasileira. (ii) O
remédio constitucional do habeas corpus revelou, desde os seus primórdios,
uma natureza receptiva a inovações e flexibilizações processuais. A ampla
aceitação da substituição processual, a desnecessidade de observância de
fórmulas processuais e de representação por advogado, e a possibilidade
de concessão do writ de ofício evidenciam que, dada a essencialidade do
interesse em jogo, a ordem jurídica prioriza a efetividade da tutela à liber-
dade de locomoção em detrimento de preocupações formais. A admissão
do habeas corpus coletivo se alinha a essa tradição virtuosa e honra os valores
liberais, emancipatórios e democráticos da Carta de 88. (iii) O direito a uma
tutela constitucional efetiva, que tem sede tanto na Constituição como no
Pacto de San Jose da Costa Rica, exige que os instrumentos processuais
possuam idoneidade para a proteção dos direitos materiais que objetivam
tutelar. Desse modo, a constatação de que violações à liberdade ambulato-
rial são perpetradas de maneira coletiva, possuindo uma origem comum,
impõe também a aceitação da tutela jurisdicional com alcance coletivo na
via do habeas corpus. (iv) A jurisprudência do STF consagra a interpretação
ampliativa de remédios constitucionais visando ao seu fortalecimento. A
Corte Suprema reconheceu, mesmo sem previsão constitucional ou legal
expressa, a possibilidade de impetração coletiva de mandado de injunção,
em entendimento que pode ser estendido, por razões ainda mais robustas,
ao habeas corpus. Diante do exposto, pode-se responder à Consulente afir-
mando que se afigura plenamente admissível a impetração de habeas corpus
coletivo no ordenamento jurídico brasileiro.”11

A jurisprudência de Tribunais estaduais já vem admitindo o processa-


mento de habeas corpus na modalidade coletiva. Neste sentido, a 1ª Câmara
Criminal do TJES concedeu ordem de habeas corpus coletivo (Processo

11 GALLI, Marcelo. Cabimento de HC coletivo ainda divide opiniões no meio jurídico e dentro do STF. Conjur.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-fev-21/cabimento-hc-coletivo-ainda-divide-opinioes-meio-
juridico>.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 39

0027027-66.2017.8.08.0000) impetrado pela Defensoria Pública do Espírito


Santo (DPES) que obriga a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus) a estabe-
lecer duas horas de banho sol, previstas em lei (art. 3º da LEP), a todos os
custodiados do sistema prisional do Estado do Espírito Santo, extensivo aos
menores do sistema socioeducativo12.
O STJ possui decisão interpretando o conteúdo da garantia do habeas
corpus, de modo a admitir a impetração do habeas corpus coletivo, verbis:

“(...) ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. HABEAS


CORPUS. TOQUE DE RECOLHER. SUPERVENIÊNCIA DO JUL-
GAMENTO DO MÉRITO. SUPERAÇÃO DA SÚMULA Nº 691/STF.
NORMA DE CARÁTER GENÉRICO E ABSTRATO. ILEGALIDADE.
ORDEM CONCEDIDA. 1. Trata-se de habeas corpus coletivo ‘em favor
das crianças e adolescentes domiciliados ou que se encontrem em caráter
transitório dentro dos limites da Comarca de Cajuru-SP’ contra decisão
liminar em idêntico remédio proferida pela Câmara Especial do TJSP. 2.
Narra-se que a Juíza da Vara de Infância e Juventude de Cajuru editou a
Portaria nº 01/2011, que criaria um ‘toque de recolher’, correspondente à
determinação de recolhimento, nas ruas, de crianças e adolescentes desa-
companhados dos pais ou responsáveis: a) após as 23 horas; b) em locais
próximos a prostíbulos e pontos de vendas de drogas; e c) na companhia
de adultos que estejam consumindo bebidas alcoólicas. A mencionada
portaria também determina o recolhimento dos menores que, mesmo
acompanhados de seus pais ou responsáveis, sejam flagrados consumindo
álcool ou estejam na presença de adultos que estejam usando entorpecen-
tes (...) 5. No mérito, o exame dos ‘considerandos’ da Portaria nº 01/2011
revela preocupação genérica, expressa a partir do ‘número de denúncias
formais e informais sobre situações de risco de crianças e adolescentes pela
cidade, especificamente daqueles que permanecem nas ruas durante a noite
e madrugada, expostos, entre outros, ao oferecimento de drogas ilícitas,
prostituição, vandalismos e à própria influência deletéria de pessoas voltadas
à prática de crimes’. 6. A despeito das legítimas preocupações da autoridade
coatora com as contribuições necessárias do Poder Judiciário para a garantia
de dignidade, de proteção integral e de direitos fundamentais da criança e
do adolescente, é preciso delimitar o poder normativo da autoridade judi-

12 No acórdão restou estabelecido que “(...) o que se discute, em suma, neste habeas corpus é a compreensão do real
significado da dignidade humana e o dever que o Estado tem em preservá-la. Nesse sentido, no julgamento do
RE 592.581/RS, com repercussão geral, o STF entendeu que a supremacia dos postulados da dignidade da pessoa
humana e do mínimo existencial legitima a imposição, ao Poder Executivo, de medidas em estabelecimentos pri-
sionais destinadas a assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral, não sendo oponível à decisão
o argumento da reserva do possível. Alinhando-se a essa posição, o STJ também já se posicionou ao decidir que não
afronta o princípio da separação dos poderes a intervenção judicial em esfera de competência do Poder Executivo para,
de algum modo, fazer cessar ou, ao menos, amenizar, a situação de grave violação da dignidade humana dos presos
(RMS 42.051/GO, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 05.04.2016, DJe 15.04.2016). Assim, diante da fundamentação
acima exposta, concedo a ordem para determinar que se garanta a todas as pessoas custodiadas no Sistema Prisional e
Socioeducativo do Espírito Santo o direito à saída diária da cela por tempo de 2 (duas) horas para banho de sol”.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
40

ciária estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em cotejo


com a competência do Poder Legislativo sobre a matéria. 7. A portaria em
questão ultrapassou os limites dos poderes normativos previstos no art.
149 do ECA. ‘Ela contém normas de caráter geral e abstrato, a vigorar por
prazo indeterminado, a respeito de condutas a serem observadas por pais,
pelos menores, acompanhados ou não, e por terceiros, sob cominação de
penalidades nela estabelecidas’ (REsp 1.046.350/RJ, Primeira Turma, Rel.
Min. Teori Albino Zavascki, DJe 24.09.09). 8. Habeas corpus concedido para
declarar a ilegalidade da Portaria nº 01/2011 da Vara da Infância e Juventude
da Comarca de Cajuru.” (STJ, HC 207.720, Proc. 2011/0119686-3/SP, Se-
gunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 01.12.2011, DJE 23.02.2012)

E, mais recentemente, a Segunda Turma do STF concedeu habeas corpus


coletivo (HC 143.641) para determinar a substituição da prisão preventiva
por domiciliar de mulheres presas, em todo o território nacional, que sejam
gestantes ou mães de crianças de até 12 anos ou de pessoas com deficiência,
sem prejuízo da aplicação das medidas alternativas previstas no art. 319 do
CPP, nos seguintes termos:

“HABEAS CORPUS COLETIVO. ADMISSIBILIDADE. DOUTRI-


NA BRASILEIRA DO HABEAS CORPUS. MÁXIMA EFETIVIDADE
DO WRIT. MÃES E GESTANTES PRESAS. RELAÇÕES SOCIAIS
MASSIFICADAS E BUROCRATIZADAS. GRUPOS SOCIAIS VUL-
NERÁVEIS. ACESSO À JUSTIÇA. FACILITAÇÃO. EMPREGO DE
REMÉDIOS PROCESSUAIS ADEQUADOS. LEGITIMIDADE ATIVA.
APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI Nº 13.300/2016. MULHERES
GRÁVIDAS OU COM CRIANÇAS SOB SUA GUARDA. PRISÕES
PREVENTIVAS CUMPRIDAS EM CONDIÇÕES DEGRADANTES.
INADMISSIBILIDADE. PRIVAÇÃO DE CUIDADOS MÉDICOS PRÉ-
NATAL E PÓS-PARTO. FALTA DE BERÇÁRIOS E CRECHES. ADPF
347 MC/DF. SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO. ESTADO DE COI-
SAS INCONSTITUCIONAL. CULTURA DO ENCARCERAMEN-
TO. NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO. DETENÇÕES CAUTELARES
DECRETADAS DE FORMA ABUSIVA E IRRAZOÁVEL. INCAPACI-
DADE DO ESTADO DE ASSEGURAR DIREITOS FUNDAMENTAIS
ÀS ENCARCERADAS. OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO
MILÊNIO E DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA OR-
GANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. REGRAS DE BANGKOK.
ESTATUTO DA PRIMEIRA INFÂNCIA. APLICAÇÃO À ESPÉCIE.
ORDEM CONCEDIDA. EXTENSÃO DE OFÍCIO. I – Existência de
relações sociais massificadas e burocratizadas, cujos problemas estão a
exigir soluções a partir de remédios processuais coletivos, especialmente
para coibir ou prevenir lesões a direitos de grupos vulneráveis. II – Conhe-
cimento do writ coletivo homenageia nossa tradição jurídica de conferir a
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 41

maior amplitude possível ao remédio heroico, conhecida como doutrina


brasileira do habeas corpus. III – Entendimento que se amolda ao disposto
no art. 654, § 2º, do CPP, o qual outorga aos juízes e tribunais competência
para expedir, de ofício, ordem de habeas corpus, quando no curso de processo,
verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.
IV – Compreensão que se harmoniza também com o previsto no art. 580 do
CPP, que faculta a extensão da ordem a todos que se encontram na mesma
situação processual. V – Tramitação de mais de 100 milhões de processos no
Poder Judiciário, a cargo de pouco mais de 16 mil juízes, a qual exige que
o STF prestigie remédios processuais de natureza coletiva para emprestar
a máxima eficácia ao mandamento constitucional da razoável duração do
processo e ao princípio universal da efetividade da prestação jurisdicional.
VI – A legitimidade ativa do habeas corpus coletivo, a princípio, deve ser
reservada àqueles listados no art. 12 da Lei nº 13.300/2016, por analogia
ao que dispõe a legislação referente ao mandado de injunção coletivo.
VII – Comprovação nos autos de existência de situação estrutural em que
mulheres grávidas e mães de crianças (entendido o vocábulo aqui em seu
sentido legal, como a pessoa de até doze anos de idade incompletos, nos
termos do art. 2º do ECA estão, de fato, cumprindo prisão preventiva em
situação degradante, privadas de cuidados médicos pré-natais e pós-parto,
inexistindo, outrossim berçários e creches para seus filhos. (...) Extensão
da ordem de ofício a todas as demais mulheres presas, gestantes, puérperas
ou mães de crianças e de pessoas com deficiência, bem assim às adolescen-
tes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no território
nacional, observadas as restrições acima.”

Verifica-se assim que diante de atos que violem uma coletividade de


indivíduos, que a impetração de vários habeas corpus individuais seriam inconve-
nientes e ineficientes, apenas sobrecarregando o já combalido e moroso sistema
de justiça. Por isso, mostra-se plenamente cabível, com base no ordenamento
jurídico brasileiro, na doutrina e, inclusive, na jurisprudência de nossos Tri-
bunais Superiores, o cabimento da impetração de habeas corpus coletivo para
evitar que alguém sofra ou seja ameaçado de sofrer violência ou coação em
sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, superando,
dessa forma, o constante risco de injustiças e o congestionamento do Poder
Judiciário, dando maior celeridade e eficácia social ao direito fundamental de
ir e vir dos indivíduos, em apreço ao princípio da dignidade da pessoa humana.

6 Conclusão
O artigo estudou o habeas corpus como ação impugnativa de índole
constitucional essencial para garantia do direito fundamental de liberdade dos
indivíduos, quando estes sofram ou sejam ameaçados de sofrer violência ou
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
42

coação em seu direito de locomoção e, dentro do exame realizado, procurou-se


demonstrar a plausibilidade jurídica da impetração de habeas corpus na moda-
lidade coletiva à luz da juridicidade.
Após uma sucinta visão da evolução do writ no Brasil, especialmente da
chamada doutrina brasileira do habeas corpus, foi feita uma análise da neces-
sidade de coletivização do processo, com intuito de se enfrentar os gargalos
do Poder Judiciário, buscando dar maior efetividade, celeridade e economia
a prestação jurisdicional, garantindo o acesso à justiça das camadas mais vul-
neráveis, assim como a paridade de armas entre os litigantes.
Nesse sentido, procurou-se através do ordenamento jurídico pátrio,
da doutrina e das decisões jurisprudenciais de nossos Tribunais Superiores,
enfrentar a questão de seu cabimento para enfrentar as violações ao direito
de locomoção de grupos de pessoas, de forma coletivizada.
Em que pese, a inexistência de norma expressa e explícita, quanto ao
cabimento do habeas corpus coletivo, verificou-se que através do microssistema
de normas de direito coletivo, como a Lei da Ação Civil Pública, o Código
de Defesa do Consumidor, a Lei do Mandado de Segurança, a Lei do Man-
dado de Injunção, entre outras, resta plenamente possível a sua impetração
na modalidade coletiva.
Dessa forma, conclui-se que o habeas corpus coletivo é uma ação impug-
nativa constitucional dedicada para tutelar o direito de grupos de indivíduos
que tenham seu direito à liberdade de locomoção violado, pois é capaz de aten-
der de forma célere e com eficácia social, a proteção de direitos fundamentais
transindividuais na seara penal, o que tem sido admitido pela jurisprudência
de nossos Tribunais, em especial, o STF.

TITLE: The habeas corpus collective.

ABSTRACT: This work intends to understand and elucidate the question of the appropriateness of habeas
corpus in the collective modality in the national order. The study will analyze the advantages brought by
the evolution of the collective process and its importance to face the problems of slowness and overload
of the Judiciary, seeking to give greater speed, economy and effectiveness to the jurisdictional provision. In
the end, the habeas corpus will be treated as a constitutional action capable of guaranteeing the fundamental
right to freedom of movement of a community, through the positioning of the doctrine and jurisprudence
of our Superior Courts.

KEYWORDS: Habeas Corpus Collective. Right to Freedom. Collective Process.

7 Referências
CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores?. Trad. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris, 1993.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 43

______; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris, 1988.
DIDIER Jr., Fredie; ZANETI Jr., Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo. 4. ed. Salvador:
Juspodivm, 2009. vol. IV.
GALLI, Marcelo. Cabimento de HC coletivo ainda divide opiniões no meio jurídico e dentro do STF.
Conjur. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-fev-21/cabimento-hc-coletivo-ainda-divide-
opinioes-meio-juridico>.
LIMA, Thais. Ministros, precisamos falar sobre habeas corpus coletivo. JOTA. Disponível em: <https://
www.jota.info/stf/do-supremo/defesa-senhores-ministros-precisamos-falar-sobre-habeas-corpus-
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MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Campinas: Bookseller, 2002. v. IV.
ROCHA, Jorge Bheron. Legitimidade da Defensoria Pública para ajuizar ação civil pública tendo por objeto direitos
transindividuais. Disponível em: <https://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/3097/Monografia_De-
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SARMENTO, Daniel. A proteção judicial dos direitos sociais: alguns parâmetros ético-jurídicos. In:
SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). Direitos sociais: fundamentos, judi-
cialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
SOUZA, José Barcelos de. Do habeas corpus. Revista da Faculdade de Direito Milton Campos, Belo Horizonte,
Del Rey, vol. 25, 2012.
______. Doutrina e prática do habeas corpus. Belo Horizonte: Sigla, 1998.
ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela dos direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 7. ed.
São Paulo: RT, 2017.

Recebido em: 21.01.2019


Aprovado em: 31.01.2019
Doutrina

O Princípio da Proporcionalidade e o
Problema do Controle de Conteúdo das
Normas Penais

Fabiano Augusto Martins Silveira


Professor do Programa de Mestrado em Direito da Universidade
Nove de Julho – UNINOVE; Consultor Legislativo do
Senado Federal, licenciado; Mestre e Doutor em Direito pela
UFMG.

RESUMO: Como preencher as normas penais? Deve haver uma relação de


equilíbrio entre a conduta e a pena escolhida para repreendê-la? Com o pro-
pósito de solucionar esses questionamentos, o princípio da proporcionalidade
ganhou prestígio no circuito jurisprudencial ao se mostrar apto a identificar e
corrigir normas penais destituídas de razoabilidade. O debate sobre a aplicação
do princípio da proporcionalidade coloca-se diante do problema do controle
de conteúdo das normas penais. Percebem-se contribuições autênticas quanto
ao sindicato de constitucionalidade das leis, seja do ponto de vista valorativo,
seja pelo escrutínio do quantum da pena, via tertium comparationis. O apelo ao
princípio da proporcionalidade tem gerado, porém, críticas que são discutidas
no presente estudo.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal. Política Criminal. Conteúdo das Normas


Penais. Controle. Proporcionalidade.

SUMÁRIO: 1 O Problema do Controle de Conteúdo das Normas Penais. 2


Pontos de Contato entre o Princípio da Proporcionalidade e os Princípios Genui-
namente Penais. 3 O Debate se Enriquece. O Quadro Valorativo se Amplia. Entra
em Cena o Tertium Comparationis. 4 Críticas e Acenos. Referências Bibliográficas.

1 O Problema do Controle de Conteúdo das Normas Penais


Como preencher as normas penais do ponto de vista do seu conteúdo?
Quais condutas merecem ser criminalizadas? Quais não podem ser? Deve
haver uma relação de equilíbrio razoável entre a conduta incriminada e a
pena escolhida para repreendê-la? Como proteger o destinatário da norma
penal de excessos punitivos? Essas questões sempre perturbaram o universo
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 45

da doutrina penal e remetem a duas ordens de problemas: o do merecimento


e o da necessidade de pena.
Evidentemente, não se tem aqui a pretensão de discorrer sobre o con-
junto de fórmulas doutrinárias que abordaram essas tormentosas questões. O
fato relevante é que a doutrina não poupou esforços em apresentar enunciados
prescritivos que pudessem orientar a atividade legislativa em matéria penal.
Referimo-nos, especialmente, aos três princípios esculpidos por gerações
de penalistas: a) fragmentariedade (extrema ratio); b) ofensividade (abstrata e
concreta); c) subsidiariedade (ultima ratio)1. Como seria possível sintetizá-los
em uma única frase? Determinados bens jurídicos, por sua relevância cons-
titucional, devem ser objeto de tutela penal, enquanto outros não, mas de
tal modo que a conduta incriminada revele necessariamente um conteúdo
lesivo, concretamente verificável, a ponto que se diga que a pena criminal era
necessária, depois de cotejada com outras modalidades de sanções jurídicas.
Essa afirmação, aparentemente singela, esconde uma centena de pro-
blemas teóricos. Não vem ao caso discuti-los nesse momento. O que importa,
por ora, é perceber que a trinca de princípios aos quais fizemos referência foi
genuinamente gestada no campo fértil da doutrina penal. Se esses princípios,
como formulados, obtiveram sucesso em conter a atividade legislativa ou
excessos judiciais, é outro ponto que mereceria uma reflexão em separado.
Tenha-se em conta, ainda, que a expressão “conteúdo”, no particular
sentido que queremos lhe emprestar, abrange não apenas a análise do pre-
ceito primário da norma penal incriminadora, mas também a qualidade e a
quantidade da pena criminal. Ou seja, sempre que criticarmos as escolhas do
legislador, seja por uma narrativa falha e deficiente da conduta incriminada,
seja por excessos na cominação da pena, é do conteúdo da norma que esta-
remos tratando, e isso nos remete precisamente à esfera da política criminal.
Bem por essa perspectiva é que gostaríamos de introduzir o princípio
da proporcionalidade e o seu uso no campo específico da disciplina penal.

2 Pontos de Contato entre o Princípio da Proporcionalidade e os


Princípios Genuinamente Penais
Sem pedir licença aos princípios genuinamente penais, um quarto enun-
ciado foi ganhando prestígio no circuito jurisprudencial, até que se mostrasse
apto a identificar e corrigir normas penais destituídas de proporção. Soube,

1 Sobre o tema, seja permitido o reenvio a: SILVEIRA, Fabiano Augusto Martins. A Constituição e o princípio da ofensividade
penal vinte anos depois, 2008, p. 315-348; Idem. A revisão do modelo constitucionalista de ilícito penal e a chamada “orientação
às consequências”, 2011, p. 213-236.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
46

assim, ativar o controle de constitucionalidade das leis partindo de um raciocínio


generalizante (pois se aplica a qualquer norma do ordenamento jurídico) que
conjuga as noções de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito2.
Trata-se, convém realçar mais uma vez, de uma fórmula que não nasce
pelas mãos da doutrina penal, mas, sim, nos tribunais e pelo esforço de síntese
da doutrina constitucionalista alemã3, e que, por virtudes não alcançadas pelos
enunciados anteriores, despertou notável interesse entre os penalistas, que a
incorporaram, de modo provavelmente irreversível, ao seu réquiem argumen-
tativo.
Em sede penal, o princípio da proporcionalidade4 alarga as hipóteses
de contestação das escolhas legislativas, sem se prender necessariamente ao
universo dos enunciados antes expostos (fragmentariedade, ofensividade e
subsidiariedade). Verdade que existem enormes áreas de interseção, a co-
meçar pelo imperativo de adequação meio-fim, que já está satisfatoriamente
contemplado na ofensividade abstrata, segundo a qual o campo descritivo de um
determinado tipo penal não pode distrair-se do bem jurídico tutelado; deve,
ao contrário, ser um meio idôneo a sua preservação.
Da mesma forma, o juízo de necessidade comumente associado ao
princípio de proporcionalidade não difere, em substância, da regra de prefe-
rência estabelecida pela noção de ultima ratio, isto é, entre todas as técnicas de

2 São os três pilares (ou subprincípios) do juízo de proporcionalidade, conforme formatação oferecida pela doutrina
alemã, largamente difundida: “a máxima da proporcionalidade significa que a proporcionalidade, com suas três máximas
parciais da adequação, necessidade (mandamento do meio menos gravoso) e da proporcionalidade em sentido estrito
(mandamento do sopesamento propriamente dito), decorre logicamente da natureza dos princípios, ou seja, que a
proporcionalidade é deduzível dessa natureza”. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. p. 117-118. Conferir,
ainda: MAUGERI, Anna Maria. I reati di sospetto dopo la pronuncia della Corte Costituzionale n. 370 del 1996, 1999,
p. 476; DONINI, Massimo. Sussidiarietà penale e sussidiarietà comunitaria, 2003, p. 156; CARBONELL MATEU,
Juan Carlos. Derecho penal, 1999, p. 206-214. A doutrina brasileira também reproduz o referido esquema em inúmeros
trabalhos monográficos, com variações terminológicas do tipo: adequação (conformidade, pertinência ou idoneidade);
necessidade (exigibilidade); proporcionalidade em sentido estrito (custo-benefício). Consultar: SARLET, Ingo Wolfgang.
Constituição e proporcionalidade, 2004, p. 101-102; DILGUERIAN, Miriam Gonçalves. Princípio constitucional da
proporcionalidade e sua implicação no direito penal, 2003, p. 188-189; BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da
proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais, 1996, p. 72-84; BUECHELE,
Paulo Arminio Tavares. O princípio da proporcionalidade e a interpretação da Constituição, 1999, p. 124-135.
3 Sobre o vínculo materno do princípio da proporcionalidade para com a doutrina e jurisprudência da Corte Cons-
titucional alemã, consultar, mais uma vez: ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais, 2008, p. 101.
4 Encontramos, na doutrina e na jurisprudência, designações diversas que orbitam o princípio da proporcionalidade, o
que tem gerado, por vezes, confusões e equívocos. Seria a razoabilidade sinônimo de proporcionalidade? A proibição
de excesso também cumpre o mesmíssimo papel? Há, de fato, uma espécie de polifonia que circunda os problemas
que o princípio da proporcionalidade é chamado a resolver. Sem a pretensão de esgotar o debate terminológico, pode-
se afirmar que a razoabilidade é postulado de origem histórica norte-americana, que se traduz na ideia de equidade,
aplicada para solucionar problemas com normas manifestamente “injustas” (ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos
princípios, 2005, p. 103); já a proporcionalidade é de origem alemã, considerado postulado geral do direito utilizado na
resolução de colisão entre direitos fundamentais (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais, 2008, p. 117; SILVA,
Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável, 2002, p. 24). Quanto à proibição de excesso, pode ser entendida,
segundo Gilmar Mendes, como a “contraditoriedade, incongruência e irrazoabilidade ou inadequação entre meios
e fins”, e é tratada, portanto, como sinônimo de proporcionalidade (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de direto constitucional, 2017, p. 201).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 47

intervenção, têm preferência aquelas que chegam a resultados semelhantes


com menores custos aos direitos fundamentais.
Até aí, portanto, nenhuma grande novidade, salvo o fato de que os
mencionados parâmetros de proporcionalidade se aplicam inclusive a normas
de parte geral, enquanto os enunciados genuinamente penalísticos focalizam
mais o quadro de normas penais incriminadoras.

3 O Debate se Enriquece. O Quadro Valorativo se Amplia. Entra em


Cena o Tertium Comparationis
A prosa começa a mudar de rumo em relação à proporcionalidade em
sentido estrito, que nos remete às noções de ponderação, justa medida, razoa-
bilidade, exigindo “a manutenção de um equilíbrio (proporção e, portanto,
de uma análise comparativa) entre os meios utilizados e os fins colimados”5.
Ficariam precluídas, assim, medidas jurídicas excessivas ou exorbitantes por
parte do ordenamento estatal (proibição de excesso)6. Tal maneira de encarar
as coisas, convenhamos, não é estranha ao conceito de fragmentariedade do
direito penal, em cuja raiz está a relação minimamente equilibrada – não
significando equivalência – entre a restrição da liberdade pessoal e o bem
jurídico sob tutela7.
Ocorre que o princípio da proporcionalidade vai além. Interessam-lhe
as disputas de ordem valorativa, só que menos na perspectiva do clássico e
estático conflito com o jus libertatis8. Sobretudo, questiona se o bem jurídico
escolhido não impõe um sacrifício excessivo a outro bem merecedor de
atenção, na hipótese a ser descrita como crime9. Importa saber se a opção por

5 SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade, 2004, p. 101. Comentando a proporcionalidade em sentido
estrito, J. C. Carbonell Mateu afirma: “trata-se, por empregar expressões próprias da análise econômica do Direito,
de não aplicar um preço excessivo para obter um benefício inferior: se se trata de obter o máximo de liberdade, não
poderão ser previstas penas que resultem desproporcionais em relação à gravidade da conduta” (Derecho penal, 1999,
p. 210).
6 O outro lado da moeda seria a “proibição de insuficiência”, na hipótese de omissão injustificada ou quando a medida
jurídica escolhida esteja muito aquém do objetivo perseguido. Cf., a propósito: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição
e proporcionalidade, 2004, p. 97-105.
7 A confirmar a aplicação básica do juízo de proporcionalidade no confronto entre o objeto da tutela e o objeto da
reação penal (liberdade pessoal), conferir, por outros: ANGIONI, Francesco. Beni costituzionali e criteri orientativi
sull’area dell’illecito penale, 1985, p. 63-65.
8 Sobre a diversificação do painel valorativo no juízo de proporcionalidade, como superando o esquema “fixo” e
“invariável” que contrapõe liberdade pessoal, de um lado, e o bem tutelado pela incriminação, de outro, conferir:
PALAZZO, Francesco. I confinidella tutela penale, 1992, p. 455-456; Idem. Offensività e ragionevolezza nel controllo
di costituzionalità sul contenuto delle leggi penali, 1998, p. 379-380.
9 Sobre esta perspectiva do princípio da proporcionalidade, em experiência comparativa, a Corte Constitucional espanhola,
em decisão, formula a seguinte ponderação: “El principio de proporcionalidad no constituye en nuestro ordenamiento
constitucional un canon de constitucionalidad autónomo. Mas la desproporción entre el fin perseguido y los medios
empleados para conseguir lo puede dar lugar a un enjuiciamiento desde la perspectiva constitucional cuando esa falta de
proporción implica un sacrificio excesivo e innecesario de los derechos que la Constitución garantiza (SSTC 62/1982,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
48

um determinado valor constitucional, na fórmula típica proposta, não reduz


absurdamente as possibilidades de realização de outros direitos previstos pelo
texto constitucional. Isso porque há situações em que a conduta incriminada
está materialmente próxima do núcleo legítimo de um direito10.
Em tese, o preceito primário da norma penal incriminadora pode aco-
modar essas tensões de maneira razoável, contanto que não imponha o sacri-
fício absoluto do bem jurídico tido como secundário, isto é, encurralando-o
sem deixar nenhuma válvula de escape. Por esse prisma, o enunciado deve
zelar pela ponderação entre os bens jurídicos colidentes na situação a ser
detalhada pelo tipo penal11.
Um bom exemplo, embora polêmico, do uso do princípio da propor-
cionalidade no campo penal como forma de dirimir conflitos entre direitos
fundamentais, deu a Primeira Turma do STF no julgamento do Habeas Corpus
124.306, em que foi discutida a criminalização do aborto. Utilizou-se, naquela
oportunidade, o princípio da proporcionalidade para resolver a colisão entre
o direito à vida do nascituro e os direitos fundamentais da mulher (direitos
sexuais e reprodutivos, autonomia, integridade física e psíquica, além da igual-
dade). A decisão considerou a medida de criminalização desproporcional, tal
como exposta nos arts. 124 a 126 do Código Penal, por gerar custos sociais
superiores aos benefícios, entre outros argumentos12.
Ademais, o juízo de proporcionalidade em sentido estrito descola-se do
contexto puramente valorativo ao enfatizar um aspecto que fora desprezado

66/1985, 19/1988, 85/1992, 50/1995, 66/1995, 55/1996 y 161/1997). El juicio que procede en esta sede de amparo debe
ser muy cauteloso. Se limita a verificar que la norma penal no produzca ‘un patente derroche inútil de coacción que
convierte la norma en arbitraria y que socava los principios elementales de justicia inherentes a la dignidad de la persona
y al Estado de Derecho’ o una [FF. JJ. 22 y 23].” Sentença nº 136/1999 da Corte Constitucional Espanhola.
10 Ilustrativos os chamados delitos de opinião (apologia ao crime, incitação ao racismo, entre outros), nos quais se evi-
dencia o afastamento momentâneo da liberdade de expressão em favor de outros interesses juridicamente válidos.
Vemos semelhantes tensões entre os crimes contra a organização do trabalho, com a criminalização limite de condutas
relacionadas aos direitos de greve e de reunião. O mesmo esquema de análise se estende ao crime militar de deserção
(liberdade de locomoção versus disciplina militar), embriaguez ao volante (autodeterminação e a integridade física de
terceiros), evasão de divisas (direito de deixar o país com os bens patrimoniais e o sistema financeiro), porte de arma de
fogo (autodefesa e vida de terceiros), entre tantos outros casos.
11 Referência essencial à Lei da ponderação de Robert Alexy: “Quanto maior é o grau de não satisfação ou de afetação
de um princípio, tanto maior terá de ser a importância da satisfação do outro” (Teoria dos direitos fundamentais, 2008,
p. 161). Ainda sobre o balanceamento de princípios antagônicos, ver: TASSI, Andrea. Il sindacato di ragionevolezza
della Corte Costituzionale sul sistema processuale penali, 2002, p. 228-229.
12 Extrai-se do voto-vista proferido pelo Ministro Roberto Barroso o seguinte trecho: “A tipificação penal viola, também,
o princípio da proporcionalidade por motivos que se cumulam: (i) ela constitui medida de duvidosa adequação para
proteger o bem jurídico que pretende tutelar (vida do nascituro), por não produzir impacto relevante sobre o número
de abortos praticados no país, apenas impedindo que sejam feitos de modo seguro; (ii) é possível que o Estado evite
a ocorrência de abortos por meios mais eficazes e menos lesivos do que a criminalização, tais como educação sexual,
distribuição de contraceptivos e amparo à mulher que deseja ter o filho, mas se encontra em condições adversas;
(iii) a medida é desproporcional em sentido estrito, por gerar custos sociais (problemas de saúde pública e mortes)
superiores aos seus benefícios” (Habeas Corpus 124.306/RJ, 1ª Turma, 29.11.2016, Rel. Min. Marco Aurélio, Pre-
sidente e Redator para o acórdão Min. Luís Roberto Barroso).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 49

pelos enunciados genuinamente penais: a relação entre o preceito primário e


o preceito sancionatório da norma penal incriminadora.
De fato, é o processo de individualização legislativa da pena que expri-
me, em termos numéricos, a gravidade da conduta. Trata-se, sem dúvida, do
momento mais delicado daquilo que aceitamos por discricionariedade legislativa.
Quem reina e governa, nessa etapa, é a sensibilidade do legislador, que projeta
o impacto da criminalização em face de novos cenários e condições sociais.
Qualquer proposta teórica bem-intencionada que queira conduzir o referido
processo sofreria, afinal, as mesmas críticas que hoje dirigimos democraticamente
ao legislador13. Significa que a relação de correspondência entre as duas prin-
cipais categorias do direito penal, crime e pena, não pode ser razoavelmente
aferida? Esse é um buraco negro da política criminal?
Ante o impasse, o juízo de proporcionalidade lança mão de um inteli-
gente recurso, o tertium comparationis. Se é difícil interrogar o legislador sobre
os motivos que o levaram a adotar um determinado parâmetro cominatório,
podemos ao menos exigir coerência em relação a outras decisões já operadas.
Aqui, o enunciado assume, nada mais, as vestes do princípio da igualdade ou
isonomia, para evitar que situações semelhantes sejam tratadas de maneira
muito diferenciada ou que situações desiguais sejam tratadas uniformemente14.
Se não podemos entrar na intimidade da relação entre o crime e sua
respectiva pena, salvo em casos de gritante desajuste, nada obsta invocar um

13 Luigi Ferrajoli propõe o seguinte critério: “(...) a pena não deve exceder a violência informal que em sua ausência
o réu sofreria por parte do ofendido ou de outras forças mais ou menos organizadas”. Em seguida, no entanto, o
autor admite que o referido critério não se presta a medições precisas: “Trata-se, na realidade, de uma indicação que
pode apenas orientar as valorações do legislador” (Diritto e ragione, 2002, p. 398-399).
14 Para doutrina e jurisprudência italianas, o princípio de proporcionalidade (ragionevolezza) está radicado, sobretudo
no primeiro parágrafo do art. 3º da Constituição Republicana, que é pura expressão do princípio da igualdade. A
propósito, conferir: GUAZZALOCA, Bruno et al. Controllo di ragionevolezza e sistema penale, 1998, p. 32; INSOLE-
RA, Gaetano. Principio di eguaglianza e controllo di ragionevolezza sulle norme penali, 1997, p. 271-272; TASSI,
Andrea. Il sindacato di ragionevolezza della Corte Costituzionale sul sistema processuale penali, 2002, p. 226 e 229.
Reivindicando, no entanto, uma fundamentação mais versátil, ver: MAUGERI, Anna Maria. I reati di sospetto dopo
la pronuncia della Corte Costituzionale n. 370 del 1996, 1999, p. 463-467. De sua vez, Francesco Angioni vincula o
referido princípio às funções da pena criminal: “qualquer ou quaisquer que sejam, entre aquelas indicadas, as funções
que a Constituição atribui à pena (arts. 25 e 27), visto que para qualquer delas vale o princípio de proporcionalidade,
este último princípio resulta medianamente constitucionalizado por implicação lógica. (...) a previsão de uma pena
desmedidamente severa em relação a qualquer crime (e, portanto, desproporcional em excesso), longe de possuir
uma eficácia intimidativa mais forte, cria no potencial transgressor sentimentos de indiferença ou de fatalismo,
e de outra parte ofusca nos consorciados a escala de valores cristalizada na lei, escala que eles deveriam perceber
justamente pela relação entre espécie e magnitude da sanção e do ilícito” (Beni costituzionali e criteri orientativi
sull’area dell’illecito penale, 1985, p. 62). Na literatura brasileira, notam-se caminhos bem diversos, ora conjugando
o conteúdo do art. 5º e a sua descrição como cláusula pétrea nos termos do art. 60, § 4º, IV, da Constituição Federal,
ora invocando a cláusula geral do Estado Democrático de Direito consagrada no caput do art. 1º, ora apoiando-se na
cláusula do devido processo legal (art. 5º, LIV), ora no comando da reserva legal (art. 5º, II). Conferir: BARROS,
Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais,
1996, p. 87-94; LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. Teoria constitucional do direito penal, 2000, p. 420, 433 e 452; DIL-
GUERIAN, Miriam Gonçalves. Princípio constitucional da proporcionalidade e sua implicação no direito penal,
2003, p. 175-181.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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outro tipo penal como régua de ponderação, visto que, em última análise,
como explica Paliero, “uma escala de sanções bem individuada (por ‘tipo’ e por
‘quantidade’) é o indicador essencial para a orientação e segurança coletivas,
porquanto representa o mais ‘visível’ critério de comparação dos valores aceitos
pelo ordenamento jurídico”15.
O legislador não ficará, assim, constrangido na sua prerrogativa exclu-
siva de definir crimes e estabelecer penas, senão a prestar contas de sua obra
como um todo. Sem discutir o mérito da decisão política, a figura do tertium
comparationis faz com que o legislador se queixe a outro legislador, pois um dos
dois se equivocou ao fixar um parâmetro penal desbalizado. Resgata-se, dessa
forma, uma linha de continuidade entre os atos legislativos passados e futuros.
Portanto, se olharmos com atenção, o juízo de proporcionalidade pega
o legislador no contrapé, já que sua escolha não pode ser defendida à custa do
equilíbrio e congruência mínima do sistema de penas. O que seria defensável,
digamos, sob a lógica interna do tipo penal (endonormativa), deixa de sê-lo no
contraste com normas penais de natureza análoga. Assim concebido, “o juízo
de igualdade-razoabilidade (...) seria, em suma, um controle de racionalidade,
de coerência, baseado sobre o princípio de não contradição”16.
Como dissemos, na maioria dos casos, seria muito doloroso operar o
juízo de proporcionalidade recorrendo, tão somente, ao binário crime/pena,
razão pela qual o tertium comparationis funciona como um elemento de simpli-
ficação17, um atalho pretensamente neutro, matemático, que se aproveita da
força de uma norma de direito positivo (alçada a gênero próximo) para desqualifi-
car outro produto legislativo. Quem fala por último não é o intérprete, diz-se,
senão o próprio ordenamento jurídico que reage contra a norma intrusa. Com
efeito, o terreno da dosimetria legislativa da pena, até então imperscrutável, é
submetido a um esquema triádico que confronta o tipo penal suspeito, o próprio
juízo de proporcionalidade e a norma penal de apoio18.

15 PALIERO, Carlo Enrico. Metodologie de lege ferenda, 1992, p. 545.


16 TASSI, Andrea. Il sindacato di ragionevolezza della Corte Costituzionale sul sistema processuale penali, 2002, p. 227.
17 Conferir: PALAZZO, Francesco. Offensività e ragionevolezza nel controllo di costituzionalità sul contenuto delle
leggi penali, 1998, p. 378-379. Não obstante, o estudioso é bastante crítico quanto às exigências impostas pela Corte
Constitucional italiana no que diz respeito à correta identificação do tertium comparationis, relativizando sua importância
no juízo de proporcionalidade. Na mesma direção, apontando situações em que não seria possível a utilização do
esquema trilateral, ver: MAUGERI, Anna Maria. I reati di sospetto dopo la pronuncia della Corte Costituzionale
n. 370 del 1996, 1999, p. 458-460.
18 Conferir: DI GIOVINE, Ombretta. Sul c. d. principio di ragionevolezza nella giurisprudenza costituzionale in
materia penale, 1995, p. 175 e 182; GUAZZALOCA, Bruno et al. Controllo di ragionevolezza e sistema penale,
1998, p. 33 e 36; MAUGERI, Anna Maria. I reati di sospetto dopo la pronuncia della Corte Costituzionale n. 370
del 1996, 1999, p. 456-458; MANES, Vittorio. Il principio di offensività, 2003, p. 153.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 51

4 Críticas e Acenos
Como a unidade lógica do sistema jurídico – e especialmente do sistema
jurídico-penal com suas pressões inflacionárias – é um ideal a ser perseguido,
mas dificilmente realizável, fica evidente que o juízo de proporção tem sempre
um papel a cumprir. Rápido se constata que o fenômeno do crescimento do
direito penal seria um prato cheio para o critério em exame.
Receamos, todavia, a despeito de sua crescente aplicação jurisprudencial,
que o enunciado ainda não fora explorado até as últimas consequências, no
sentido de desencadear, dada a abundância de matéria-prima19, uma revisão
mais abrangente das normas penais a ponto de preocupar a atividade legife-
rante. Talvez porque não estejam bem esclarecidas, ainda, as consequências
da desproporcionalidade relevante entre duas ou mais figuras típicas: a) ou
o juiz simplesmente recusa validade ao dispositivo impugnado e declara sua
inconstitucionalidade, isentando o acusado de qualquer responsabilidade pe-
nal20; b) ou o juiz aplica a pena (ou outro comando) da norma penal de apoio,
quando mais branda, criando um tipo híbrido por analogia in bonam partem.
Outra hipótese não menos interessante é a de que, tudo considerado,
o juízo de proporcionalidade atuaria mais na fase de acabamento, e não na
conformação geral do sistema. Ao contrário dos enunciados genuinamente
penais, que nutrem expectativas pouco modestas, a proporcionalidade não se
apresentaria como autêntico paradigma de política criminal. Estaria quase que
exclusivamente direcionada ao Judiciário, isto é, à fase pós-legislativa, pelo
menos nas suas mais recentes aparições via tertium comparationis.
A rigor, a ideia de isonomia ou não contradição não nos fornece uma
chave para modelar, idealmente, a parte especial de um código ou o conjunto

19 No caso do direito penal brasileiro, interessantes sugestões em: FRANCO, Alberto Silva. A pessoa humana como centro
do sistema punitivo, 2000, p. 4; ESTELLITA, Heloisa. Direito penal, Constituição e princípio da proporcionalidade,
2003, p. 11-13; SANTORO, Antonio. Casuísmo político-penal, 2004, p. 13; PEIXOTO, Marcos Augusto Ramos.
Possibilidade de controle jurisdicional sobre a proporcionalidade da pena in abstracto, 2005, p. 13-14.
20 Na ocasião do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade no Habeas Corpus 239.363, o Superior Tribunal de
Justiça optou por declarar inconstitucional o preceito secundário do art. 273 do Código Penal, sob a seguinte funda-
mentação: “(...) 4. O crime de ter em depósito, para venda, produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de
procedência ignorada é de perigo abstrato e independe da prova da ocorrência de efetivo risco para quem quer que
seja. E a indispensabilidade do dano concreto à saúde do pretenso usuário do produto evidencia ainda mais a falta de
harmonia entre o delito e a pena abstratamente cominada (de 10 a 15 anos de reclusão) se comparado, por exemplo,
com o crime de tráfico ilícito de drogas – notoriamente mais grave e cujo bem jurídico também é a saúde pública. 5.
A ausência de relevância penal da conduta, a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à
saúde pública decorrente da ação e a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua
pela falta de razoabilidade da pena prevista na lei. A restrição da liberdade individual não pode ser excessiva, mas com-
patível e proporcional à ofensa causada pelo comportamento humano criminoso. 6. Arguição acolhida para declarar
inconstitucional o preceito secundário da norma” (Arguição de Inconstitucionalidade no Habeas Corpus 239.363/PR,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Corte Especial, j. 26.02.2015). No mesmo sentido: “A ausência de relevância penal da
conduta, a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à saúde pública decorrente da ação e
a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua pela falta de razoabilidade da pena
prevista na lei. A restrição da liberdade individual não pode ser excessiva, mas compatível e proporcional à ofensa
causada pelo comportamento humano criminoso” (RE 921.055, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.04.2016).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
52

de incriminações previstas na legislação complementar. Atuaria – muito bem,


é verdade – no controle das distorções à flor da pele, superficiais, não ao nível
das inclinações políticas e ideológicas do sistema. A doutrina agiria sempre de
forma reativa, como censores à espera de um deslize.
Se assim for, a ideia de bem jurídico tornar-se-ia inclusive dispensável,
démodé, na linha do que manifesta Silva Sánchez: “não é possível controlar norma
penal alguma desde a perspectiva de uma hipotética vulneração do princípio
de exclusiva proteção dos bens jurídicos, senão, apenas (e no máximo), desde
o princípio de proporcionalidade”21. Eis porque Vittorio Manes, recusando tal
crítica, fala do empobrecimento da dimensão valorativa no juízo de ragionevo-
lezza, justamente por não se atrever ao problema do merecimento de pena22.
Em suma, descontado o fato de que tal característica pode ser uma
vantagem no que diz respeito à justiciabilidade, cabe perguntar, no entanto, se
o enunciado da proporcionalidade, concebido nessa versão low profile, seria
capaz de pôr freios ou resistir ao fenômeno do crescimento do direito penal,
e se esse não seria um desafio legítimo a ser encarado pela doutrina.
Também a doutrina constitucional, é preciso registrar, não tem poupado
críticas ao uso irrefletido do princípio da proporcionalidade. A ideia de um
controle de constitucionalidade baseado unicamente na tensão entre princípios
e normas positivas tem despertado justas preocupações. Seria uma forma de
suplantar as atribuições do poder constitucionalmente habilitado a legislar?
Tais questionamentos surgem com muita força, sobretudo quando a norma
infraconstitucional atacada é clara no seu sentido e alcance, sem revelar, con-
tudo, uma evidente oposição ao princípio supostamente defendido. Diante
do estado de banalização de um discurso marcado pela defesa de princípios
abstratos, emergem expressões, como, por exemplo, “estado principiológico” e
“neoconstitucionalismo principialista”23, para descrever a perplexidade gerada
por algumas decisões judiciais.

TITLE: The principle of proportionality and the problem of controlling the contents of criminal regulations.

ABSTRACT: How fill out the criminal regulations? Should there be a balancing relation between the
conduct and the punishment chosen to suppress it? Aiming at answering those questions, the principle of
proportionality has acquired some prestige among courts for being capable of identifying and correcting
criminal regulations lacking reasonability. The debate about the application of the principle of propor-

21 SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. La expansión del derecho penal, 1999, p. 91.


22 Conferir: MANES, Vittorio. Il principio di offensività, 2003, p. 153-154.
23 Sobre a expressão “Estado principiológico”, ver: ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos princípios: da definição à
aplicação dos princípios jurídicos, 2008, p. 1. Sobre a expressão “neoconstitucionalismo principialista”, ver: CA-
NOTILHO, José Joaquim Gomes. Os métodos do achamento político: comentários à Constituição do Brasil, 2013, p.
100-112.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 53

tionality faces the problem of content control of criminal regulations. There are genuine contributions
concerning the constitutionality of laws, from a value perspective and based on the examination of the
force of punishment, via tertium comparationis. The appeal to the principle of proportionality has generated,
however, criticisms that are discussed in this article.

KEYWORDS: Criminal Law. Criminal Policy. Contents of Criminal Regulations. Proportionality.

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Recebido em: 12.12.2018


Aprovado em: 21.12.2018
Doutrina

O Crime de Lavagem de Dinheiro no


Brasil: Compliance Criminal Corporativo
e os Métodos de Prevenção e Combate
do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras

Vinicius Lacerda e Silva


Mestre em Direito pela Faculdade Milton Campos (MG);
Bacharel em Direito pela Faculdade Milton Campos (MG);
Assessor no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

RESUMO: O presente ensaio pesquisado pelo método dedutivo aborda os


aspectos conceituais e históricos do crime de lavagem de dinheiro no Brasil.
Após estudadas suas fases de forma mais aprofundada, passa-se à discussão
acerca de qual seria o bem jurídico tutelado e se seria possível abarcar uma
pluriofensividade. Em seguida, são tratadas as funções e os métodos preventivos
e repressivos do Conselho de Controle de Atividades Financeiras. Por fim, é
abordada a origem do compliance criminal no branqueamento de capitais e a
evolução corporativa no sentido de exercer as atividades empresariais aliadas a
um programa de integridade autorregulativo.

PALAVRAS-CHAVE: Lavagem de Dinheiro. Bem Jurídico Tutelado. COAF.


Compliance Criminal. Programa de integridade.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Lavagem de Dinheiro: Notas Iniciais e Evolução


Histórica. 3 Aspectos Conceituais e Fases da Lavagem de Dinheiro; 3.1 Concei-
tuação; 3.2 Fases; 3.2.1 Ocultação (Placement); 3.2.2 Dissimulação (Layering); 3.2.3
Integração (Integration). 4 Bem Jurídico Tutelado. 5 Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (COAF): Métodos de Prevenção e Repressão à Lavagem
de Dinheiro. 6 A Lei nº 12.683/2012 como Origem do Compliance Criminal no
Brasil: Prevenção de Riscos no Ambiente Corporativo e Incentivos à Autorre-
gulação em Programas de Integridade. 7 Considerações Finais. 8. Referências.

1 Introdução
Tradicionalmente, no Brasil, os crimes econômicos passavam desperce-
bidos ou impunes por não serem, em regra, o foco dos órgãos de investigação
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
56

e de acusação. Porém, nos últimos anos, essa concepção tem sofrido mudanças
importantes, tendo sido, inclusive, inaugurado um novo e complexo ramo
do Direito Penal, que visa à proteção da atividade econômica desenvolvida na
economia de livre mercado, qual seja, o Direito Penal Econômico.
A atual sociedade de riscos vive um intenso desenvolvimento tecno-
lógico marcado pela inexorável globalização econômica, na qual facilita-se
a circulação de informações, mercadorias e capital, mas, ao mesmo tempo,
fragiliza todo o sistema financeiro (SARCEDO, 2016)1.
Por este motivo, é cada vez mais constante a investigação e a acusação
por crimes econômicos, bem como o relato de uma postura mais ativa e atenta
das empresas, autarquias e instituições para apurá-los.
Toda essa dinamicidade nas relações comerciais acaba por tornar a
ordem econômica e o sistema financeiro mais vulneráveis à criminalidade
econômica, na medida em que o Estado não consegue acompanhar todas as
movimentações com eventuais ocultações e dissimulações, nem tampouco
dispõe de instrumentos suficientes para regulá-las adequadamente.
Assim, as preocupações existentes com esse modo de criminalidade
superaram as barreiras da dogmática penal tradicional e da própria adminis-
trativização do Direito Penal, chegando na prevenção empresarial voltada à
neutralização de riscos.
E é precisamente nesse contexto de prevenção de crimes dessa natureza
que tem se exigido os deveres de integridade, transparência, ética e conformi-
dade às leis, reforçados pela Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013).
Todo esse processo culminou no conceito de compliance criminal, que
pode ser entendido, basicamente, como a forma de detectar condutas delitivas
e de criar uma cultura de conformidade com o direito por meio de proce-
dimentos internos e externos padronizados que visam a mitigar eventuais
infrações penais.
Para a compreensão mais aprofundada do compliance criminal e da
autorregulação corporativa para prevenção de riscos, será analisada a noção
inaugurada pela Lei de Lavagem de Dinheiro brasileira, passando por sua
evolução histórica, conceituação, fases, bens juridicamente tutelados e os
métodos de prevenção e combate do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (COAF).

1 SARCEDO, Leandro. Compliance e responsabilidade penal da pessoa jurídica: construção de um novo modelo de imputação
baseado na culpabilidade corporativa. São Paulo: LiberArs, 2016. p. 21.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 57

Para a presente pesquisa, elege-se a pesquisa documental indireta, com


consulta a fontes primárias da legislação brasileira aliada a fontes secundárias
de investigação bibliográfica. O procedimento empregado será o jurídico-
compreensivo analítico pelo método dedutivo.

2 Lavagem de Dinheiro: Notas Iniciais e Evolução Histórica


A luta contra a lavagem de dinheiro é o método mais eficaz de combate
ao crime organizado hierarquizado (societas sceleris). O ataque preciso ao capital
que gira sofisticadas estruturas criminosas no mundo inteiro, notadamente no
tráfico de drogas, e interliga diferentes redes de corrupção, é a melhor estratégia
para ao menos tentar a redução das atividades de seus agentes, ou seja, praticar
a política criminal que os norte-americanos chamaram de follow the money.
A atividade de branqueamento de capitais teve início na Inglaterra,
no século XVII, por meio da pirataria realizada em embarcações. Devido
ao elevado custo de manutenção dos navios, os piratas ingleses saqueavam
amiúde armas, munição e demais objetos de aberto interesse de mercadores
americanos que trocavam as mercadorias por moedas.
Assim, quando o pirata resolvia se aposentar, ele já havia reunido uma
quantia substanciosa de moedas, a qual aparentava uma procedência advinda
de negócios lícitos, já que era praticamente um anônimo em função da falta
de documento.
Contudo, a expressão lavagem de dinheiro (money laundering) somente
foi utilizada pela primeira vez depois de 1920, nos Estados Unidos, para des-
crever um série de operações praticadas pela máfia americana como forma
de apresentar justificativas para a origem ilícita do patrimônio. E a atribuição
do nome é literal: os mafiosos exploravam lavanderias, negócios nos quais a
circulação de recursos era intensa à época.
Como a prisão de alguns membros não implicava resultados práticos
satisfatórios no combate às organizações, percebeu-se, à época, que a desarti-
culação dos grupos demandava o olhar para aquilo que movimentava a base
estrutural: o dinheiro.
Nesta toada, surgiram algumas unidades de inteligência financeira que
coletam dados e emitem relatórios com fins de identificação do capital ilícito
e desmantelamento dos grupos criminosos que tanto prejudicam as comu-
nidades que se encontram inseridos.
É claro que, como já mencionado, determinados grupos agem de forma
transnacional, o que exige a cooperação internacional de diversos Estados, por
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
58

meio de legislações convergentes, a exemplo da Convenção de Viena (1988)


originada de reunião da Organização das Nações Unidas (ONU) – ratificada
pelo Brasil em 1991, pelo Decreto nº 156, e da Convenção de Palermo (2000),
não sendo suficientes apenas as políticas nacionais localizadas.
Atualmente, inclusive, existe o Financial Action Task Force (FATF – glo-
bal) e o Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI – sul-americano),
do qual o Brasil é membro, que tem o escopo de formular recomendações à
prevenção e repressão à lavagem e ao financiamento do terrorismo por meio
do confisco dos lucros dos delitos cometidos.
A primeira tipificação se deu em 1978, no Código Penal Italiano (Codice
Rocco). No Brasil, em 1998, aprovou-se a primeira Lei de Lavagem de Dinheiro
(Lei nº 9.613/98), a qual tipificou o mascaramento, previu regras adminis-
trativas e criou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
Posteriormente, já no ano de 2012, a Lei nº 12.683, que alterou a Lei nº
9.613/98, contou com a participação nos debates de diversos órgãos públicos
relevantes, como a Receita Federal do Brasil, o Banco Central, o Ministério da
Justiça, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal, a Justiça Federal, etc.
A aludida lei ampliou as infrações antecedentes para todos os crimes e
contravenções penais, objetivando abarcar as brechas que pudessem viabilizar
a lavagem de dinheiro e, ipso facto, incorporou recomendações e normas in-
ternacionais, além do fortalecimento do controle e da fiscalização de setores
sensíveis ao crime em tela.
Ademais, expandiu o tipo penal para admitir o dolo eventual (AZEVEDO;
PEREIRA in LOPES; MARTINS, 2017)2, previu a possibilidade de realizar
delação premiada a qualquer tempo, ainda que posterior à sentença condenatória
(art. 1º, § 5º), dispôs sobre a alienação antecipada dos bens apreendidos oriundos
da lavagem (art. 4º, § 1º) e proclamou a possibilidade de afastar cautelarmente
o servidor público indiciado pela prática de crimes (art. 17-D).

3 Aspectos Conceituais e Fases da Lavagem de Dinheiro

3.1 Conceituação
A tipificação do crime de lavagem de dinheiro no Brasil não fora pro-
movida no Código Penal, mas, sim, em legislação especial com a finalidade

2 AZEVEDO, Guilherme Henrique Peixoto de; PEREIRA, Lucas de Freitas. Lavagem de dinheiro: o advento da Lei
nº 12.683/2012, a banalização do crime e o elemento subjetivo especial. In: LOPES, Luciano Santos; MARTINS,
Amanda Jales (Org.). Direito penal econômico: tendências e perspectivas. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 251.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 59

de tentar exauri-lo por meio de disposições penais, processuais penais e


administrativas.
Historicamente, existem três gerações das leis que tratam de lavagem
de dinheiro. As leis de primeira geração são aquelas que trazem somente o
delito de tráfico de drogas como crime antecedente. As de segunda geração
estabelecem um rol de crimes antecedentes, dos quais se pode lavar o dinheiro.
Por fim, as leis de terceira geração são aquelas que admitem qualquer delito
ou contravenção penal como infração antecedente.
Nos termos do art. 1º da Lei nº 9.613/98, alterada pela Lei nº 12.683/2012,
a lavagem de dinheiro é a sequência de ações praticadas pelo sujeito ativo com
fins de ocultação da origem, natureza, disposição, localização, propriedade ou
movimentação de determinado bem, direito ou valor de origem em crime ou
contravenção penal para que, em último escopo, possa inseri-lo novamente
na economia formal com falso aspecto lícito.
Assim, “temos hoje uma lei de terceira geração, sem lista fechada de
delitos antecedentes” (ARAS, 2012)3, de sorte que o critério é calcado na maior
ou menor gravidade de qualquer crime precedente.
Para Sérgio Fernando Moro (2010, p. 36)4, a extinção do rol de crimes
antecedentes “facilita a criminalização e a persecução penal de lavadores pro-
fissionais, ou seja, de pessoas que se dedicam profissionalmente à lavagem
de dinheiro”.
O legislador optou pelo que se convencionou a chamar de tipos mistos
alternativos, ao prever o encaixe ao corpo do tipo a prática de uma ou mais
fases (núcleos) do delito advindas de condutas diversas.
Portanto, a lavagem engloba todas as operações com o viés de ocultar
a proveniência ilegal do dinheiro ganho e tem como fim a eliminação de
“quaisquer vestígios sobre sua origem criminosa, transformando esses valo-
res em dinheiro ‘limpo’, dando-lhes uma aparência de legalidade” (SOUZA
NETTO, 1999, p. 41)5.
Para a concretização deste tipo doloso de resultado6, é condição sine qua
non o agente ter a plena ciência (elemento cognitivo) da ilicitude do delito-base

3 ARAS, Vladimir. A investigação criminal na nova Lei de Lavagem de Dinheiro. Boletim IBCCRIM, ano 20, n. 236,
ago. 2012. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/site/boletim/pdfs/Boletim237.pdf>. Acesso em: 1º dez. 2018.
4 MORO, Sérgio Fernando. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 36.
5 SOUZA NETTO, José Laurindo de. Lavagem de dinheiro: comentários à Lei 9.613/98. Curitiba: Juruá, 1999. p. 41.
6 RHC 80.816-6/SP, Rel. Min. Sepulveda Pertence, 1ª T., j. 18.06.2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso
em: 1º dez. 2018.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
60

antecedente (consumado ou tentado) e querer (elemento volitivo) ocultar


ou dissimular a origem ilícita, sem admitir, todavia, a modalidade culposa.
Destarte, conforme muito bem apontado por Ignacio Berdugo Gó-
mez de La Torre, o usufruto em proveito próprio do produto do crime não
caracteriza a lavagem7.
E Pierpaolo Cruz Bottini e Gustavo Henrique Badaró (2012, p. 65) vão
adiante: “se o agente utiliza o dinheiro procedente da infração para comprar
imóvel, bens, ou o deposita em conta corrente, em seu próprio nome, não
existe o crime em discussão”8.
Assim sendo, não constitui fato típico o mero usufruto e aproveita-
mento do produto do crime, ato este tido como irrelevante no ponto de vista
da administração da justiça.
Ademais, devem ser demonstrados todos os elementos subjetivos do
tipo, isto é, a vontade de limpar o capital e reinseri-lo na economia para se
misturar com os demais capitais lícitos, a fim de que tome a mesma forma.
Para entendermos um pouco mais sobre as operações e procedimentos
realizados pelo sujeito ativo, passemos ao exame de suas fases.

3.2 Fases
Classicamente, a doutrina divide o crime de lavagem de dinheiro em
três fases, são elas: (i) ocultação (placement), na qual visa-se “tirar a visibilidade
dos bens adquiridos criminosamente” (SANCTIS, 2015, p. 177)9; (ii) dissi-
mulação (layering), em que se objetiva separar o capital de sua origem ilícita,
dissimulando os resquícios do modo como fora conseguido; (iii) e integração
(integration ou recycling), na qual o dinheiro sujo reingressa na economia formal
coberto pelo manto da aparência de licitude.
Passa-se à análise mais pormenorizada de cada uma.

3.2.1 Ocultação (Placement)


O significado de ocultar é subtrair de vista, retirar de circulação, escon-
der. Neste caso, ocultar, portanto, é proteger o capital ilegal do olhar público
e, especialmente, das autoridades.

7 GÓMEZ DE LA TORRE, Ignacio Berdugo. La “emancipación” del delito de blanqueo de capitales en el derecho
penal español. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT, vol. 87, 2010, p. 69.
8 BOTTINI, Pierpaolo Cruz; BADARÓ, Gustavo Henrique. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais:
comentários à Lei 9.613/1998, com alterações da Lei 12.683/2012. São Paulo: RT, 2012. p. 65.
9 SANCTIS, Fausto Martin de. Delinquência econômica e financeira: colarinho branco, lavagem de dinheiro, mercado de
capitais. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 177.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 61

Indira M. Carr e Miriam Goldby (2009, p. 16) destacam que:

“The fact that money laudering is itself a crime ensures that those who,
because of the nature of their business, are liable to become involved in the
laundering of the proceeds of corruption, are deterred from providing kno-
wing assistance to those who wish to disguise the source of their wealth.”10

Nesta etapa, o sujeito ativo oculta a origem ilícita dos bens, direitos e
valores adquiridos ao utilizar instituições financeiras tradicionais (bancos) e
não tradicionais (cassinos, postos de gasolina e casas de câmbio), além de ati-
vidades econômicas como hotéis e restaurantes, sempre no intuito de inserir
o resultado dos delitos praticados na economia formal (LIMA, 2014, p. 68)11.
Como se vê, é nesta fase que a lucratividade auferida mais se aproxima
de sua origem delituosa, apresentando uma tênue e vulnerável linha divisória,
de modo que é a fase mais fácil de ser detectada pelas autoridades.
A consumação da lavagem se dá com o mero encobrimento, desde que
acompanhado do elemento volitivo, no sentido de reverter em lícito o ativo.
São exemplos da ocultação: o depósito paulatino de pequenas quan-
tias em instituições financeiras (structuring12) para não chamar a atenção das
autoridades competentes, o depósito em contas de terceiros, a conversão em
moeda estrangeira, etc.

3.2.2 Dissimulação (Layering)


A fase seguinte à ocultação é a dissimulação do capital. Recorrendo uma
vez mais ao vernáculo, dissimular, aqui, é distanciar o bem, direito ou valor
de sua origem maculada, de modo a escamotear ainda mais o rastreamento
para que se evite a ligação com crime antecedente.
Pierpaolo Cruz Bottini e Gustavo Henrique Badaró (2012, p. 24-25)
a explicam:

“(...) caracterizada pelo uso de transações comerciais ou financeiras poste-


riores à ocultação que, pelo número ou qualidade, contribuem para afastar
os valores de sua origem ilícita. Em geral são efetuadas diversas operações
em instituições financeiras ou não (bancárias, mobiliárias, etc.), situadas

10 CARR, Indira M.; GOLDBY, Miriam. The United Nations Anti-Corruption Convention and Money Laundering. 2009.
Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=1409628>. Acesso em: 1º dez. 2018.
11 LIMA, Vinícius de Melo. Lavagem de dinheiro e ações neutras: critérios de imputação penal legítima. Curitiba: Juruá,
2014. p. 68.
12 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. 3. ed. Navarra: Arazandi, 2012. Cap. I, 3.1.1.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
62

em países distintos – muitos dos quais caracterizados como paraísos fiscais


– que dificultam o rastreamento dos bens.”13

Portanto, afasta-se o que fora obtido de sua fonte-matriz para apagar as


pegadas deixadas no caminho (paper trail) através de diversas transações finan-
ceiras eletrônicas para que o dinheiro sujo se confunda com o capital lícito.
Os exemplos desta etapa são o envio de moeda estrangeira para o exte-
rior via cabo, transações entre conta correntes, retroempréstimo, remessa de
capital para sociedades off-shore constituídas em país com estabilidade política
situados em zonas econômicas de alto sigilo bancário, câmbio controlado,
tributação reduzida e fiscalização precária.

3.2.3 Integração (Integration)


Por fim, a terceira etapa é o ato final do delito em exame. E esta se
caracteriza pela inserção direta aos destinatários dos valores na economia
formal com a falsa aparência de licitude. Os ativos são reciclados em negócios
simulados como se lícitos fossem, retornando à organização criminosa.
Por exemplo, loanback, operações de importação ou exportação pratica-
das com preços superfaturados, contrato de compra e venda de imóvel com
valores dissociados da realidade do mercado imobiliário, etc.
No Brasil, há o caso do Primeiro Comando da Capital (PCC), maior
organização criminosa do país que lava seus recursos a todo tempo no mercado
financeiro, conforme expõe Fábio Portela (2007, p. 62-64):

“Com 15.000 integrantes no Estado de São Paulo (...), o grupo se esforça


para vender a idéia de que luta pela melhoria das condições de vida nos
presídios. Nada mais falso. O principal objetivo do PCC é o mesmo do
mais reles ladrão pé-de-chinelo: ganhar dinheiro fácil. No caso, com o
tráfico de drogas, em especial a cocaína. Hoje, a facção detém o mono-
pólio da venda de entorpecentes nos presídios de São Paulo. Quando o
PCC foi formado, em 1993, seus primeiros líderes viviam da extorsão de
detentos nas cadeias paulistas. (...) O interesse pelo tráfico surgiu em 2001.
(...) A venda de cocaína é o negócio mais lucrativo do mundo do crime.
Estima-se, portanto, que o PCC movimente mais de 200 quilos da droga
mensalmente, só nas cadeias. O resultado dessa operação é fabuloso: lucro
de 2 milhões de dólares a cada trinta dias. (...) Em 2005, 40% dos grandes
carregamentos de cocaína apreendidos pela PF em rodovias e sítios do
estado pertenciam à facção. (...) Como ocorre com todas as máfias, uma

13 BOTTINI, Pierpaolo Cruz; BADARÓ, Gustavo Henrique. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais:
comentários à Lei 9.613/1998, com alterações da Lei 12.683/2012. São Paulo: RT, 2012. p. 24-25.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 63

das preocupações do PCC é lavar o dinheiro ganho no crime. Para isso,


o grupo financia ‘laranjas’, que atuam em ramos legalizados. A polícia de
São Paulo já sabe que o dinheiro do PCC é lavado em cooperativas de
perueiros, postos de combustíveis, desmanches e lojas de carros usados.
O montante auferido nessas atividades segue para contas bancárias abertas
por parentes dos integrantes da cúpula.”14

Tantos exemplos nos levam à formulação do seguinte questionamen-


to: qual seria o bem jurídico tutelado pela norma em comento? Esta é uma
indagação interessante, cuja abordagem será trazida a seguir.

4 Bem Jurídico Tutelado


É cediço que a função do Direito Penal, na esteira do que já dizia Bernd
Schünemann (2005), é proteger os bens jurídicos indispensáveis ao funcio-
namento da sociedade15.
A teoria do bem jurídico protegido é bastante relevante para a dog-
mática quando se fala de legitimação dos tipos incriminadores. Claus Roxin
(1997) afirma que os bens jurídicos são finalidades úteis para o indivíduo e
seu desenvolvimento no sistema globalizado e estruturado sobre a base dessas
próprias finalidades16.
Com efeito, o bem jurídico tutelado está intimamente ligado ao jus
puniendi do Estado, que revela seu interesse mediante a tipificação penal de
condutas que o afeta, encontrando limite nos direitos e garantias individuais
fundamentais.
Os riscos à objetividade jurídica decorrem da conduta de terceiros e
revelam a existência de determinados poderes sociais que ameaçam a própria
coletividade, sendo a delinquência financeira e econômica um exemplo disso,
o que legitima o monopólio da intervenção estatal.
Todavia, não há imperativos categóricos absolutos ante a infinidade de
condutas e a dinamicidade das alterações de paradigmas. Logo, a flutuação
legiferante implica a impossibilidade de precisar tudo que deveria ser tutelado
pelo Estado.

14 PORTELA, Fábio. PCC: Primeiro Comando da Cocaína. Veja, São Paulo, v. 40, n. 1990. p. 62-64, 10 jan. 2007.
15 SCHÜNEMANN, Bernd. O direito penal é a ultima ratio de proteção de bens jurídicos! – Sobre os limites invioláveis
do direito penal em um Estado de Direito liberal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT, vol. 53, 2005,
p. 18.
16 ROXIN, Claus. Derecho penal: parte general. Fundamentos. La estructura de la teoria del delito. Trad. Diego Manuel
Luzón Peña, Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remesal. 2. ed. Madrid: Civitas, 1997. p. 56.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
64

E quando assim acontece, devemos, sempre, nos socorrer à Constitui-


ção, que tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana
(CF/88, art. 1º, III).
Desse fundamento da república de natureza antropológica extrai-se que
os valores pilares da sociedade indicam que os bens jurídicos que são tutelados
penalmente são os imprescindíveis ao livre exercício da auto-determinação
política, social, econômica e cultural do indivíduo, sem a interferência de
qualquer outro ente de poder que seja, para que decida por si mesmo, mas
sem violar o pluralismo e a coexistência imanente à vida coletiva.
Em outras palavras, este é o pensamento de Roxin (1997, p. 56):

“los bienes jurídicos son circunstancias dadas o finalidades que son utiles
para el individuo e su libre desarrollo en el marco de um sistema social
global estructurado sobre la base de esa concepción de los fines o para el
funcionamiento del proprio sistema.”17

Isso implica que as normas penais devem proteger bens e valores indi-
viduais, como a vida, patrimônio, honra, ou coletivos, a exemplo da ordem
econômica e do meio ambiente.
Relativamente ao crime de lavagem, as doutrinas brasileiras e interna-
cionais são bastante divididas a respeito de qual seria o bem jurídico tutelado,
a começar se a constatação deve ser feita em cima da infração antecedente ou
sobre a própria lavagem de dinheiro.
Se se considerar que deve ser levado em conta o delito pretérito, con-
forme já retroafirmado, houve três gerações legislativas. Como a primeira era
atrelada ao tráfico de drogas, naturalmente que o bem jurídico protegido é a
saúde pública. Na segunda e terceira gerações, caracterizadas pela pluraridade
de infrações penais antecedentes à lavagem, pacificou-se que não mais se res-
tringe apenas à saúde pública, mas também deve ser protegido o patrimônio,
a liberdade individual e a Administração Pública (MOLINA, 2009)18.
Lado outro, se considerarmos que o bem jurídico protegido pelas
normas de lavagem de dinheiro é o lesionado pela própria lavagem, Rodolfo
Tigre Maia aponta a administração da justiça como sendo o bem violado, sob
o fundamento de que tal crime coloca em risco a credibilidade das autorida-

17 ROXIN, Claus. Derecho penal: parte general. Fundamentos. La estructura de la teoria del delito. Trad. Diego Manuel
Luzón Peña, Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remesal. 2. ed. Madrid: Civitas, 1997. p. 56.
18 MOLINA, Fernandos. Que se protege en el delito de blanqueo de capitales? Reflexiones sobre un bien juridico
problemático. In: BACIGALUPO, Silvina; FERNANDEZ, Bajo. Politica criminal y blanqueo de capitales. Madrid:
Marcial Pons, 2009. p. 122.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 65

des públicas e o funcionamento da justiça ante o notório prejuízo à atividade


jurisdicional (MAIA, 2007)19.
Há, outrossim, os que entendem que o bem jurídico inobservado é
a ordem econômica, como consta nas lições de Marco Antônio de Barros
(2007)20 e Wilfried Bottke (1998)21.
Tais mestres dizem que ocultar, dissimular e reintegrar capital sujo no
mercado como se fossem lícitos, constituem atos que desestabilizam a eco-
nomia do país e, por isso, devem ser valorados negativamente.
De fato, quando se analisa os princípios constitucionais da atividade
econômica positivados no art. 170 da CF/88, vê-se que a reinserção de capital
de origem maculada implica flagrante desequilíbrio na livre concorrência (in-
ciso IV), na livre iniciativa (caput) e, por corolário, na defesa do consumidor
(inciso V).
Assim, concluímos pela pluriofensividade, de modo que os bens ju-
rídicos tutelados aqui são a administração da justiça e a ordem econômica
(proteção dos bens de origem delitiva).
Administração da justiça, pois o crime coloca em risco a credibilidade e
a operacionalidade da Justiça, já que utiliza complexas transações para afastar
o produto de sua origem ilícita, engazupando, assim, as autoridades públicas
de forma consciente e deliberada com vistas a evitar o descobrimento dos atos
infracionais e o confisco das vantagens obtidas.
E ordem econômica, porque a lavagem quando exaurida impacta no
funcionamento da economia por gerar um estado de desconfiança nos negó-
cios pela falta de transparência.
A afetação negativa ao regular funcionamento da economia formal
é abordada por diversos institutos financeiros mundiais e órgãos públicos
econômicos de cada país, a exemplo do Conselho de Controle das Atividades
Financeiras (COAF) que atua no Brasil.

5 Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF): Métodos


de Prevenção e Repressão à Lavagem de Dinheiro
Conforme já anotado, o nível de complexidade da lavagem de dinheiro
demanda a criação de métodos de prevenção e repressão bastante sofisticados.

19 MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de dinheiro. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 58.
20 BARROS, Marco Antônio de. Lavagem de capitais e obrigações civis correlatas. 2. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 54.
21 BOTTKE, Wilfried. Mercado, criminalidad organizada y blanqueo de dinero en Alemania. Revista Penal, n. 2, 1998.
p. 13.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
66

Para tanto, o trabalho de uma unidade financeira de inteligência é de funda-


mental importância para sintetizar dados e identificar atos obscuros com o
intuito de escamotear capitais.
No Brasil, esse órgão administrativo foi criado pela Lei nº 9.613/98,
recebeu o nome de Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF)
e é composto por representantes de vários setores da Administração Pública,
nos termos do art. 16 da referida Lei22.
Embora o art. 14 prescreva que o órgão é vinculado ao Ministério da
Fazenda, é importante o registro de que a partir do ano de 2019, o COAF
funcionará no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, e não
mais no do Ministério da Fazenda23.
Por ser um conselho administrativo, não possui poder para promover
quebra de sigilo de um investigado, denúncia ou instauração de processo
criminal.
Pierpaolo Cruz Bottini e Gustavo Henrique Badaró (2012, p. 42) listam
as principais atividades e funções a cargo do COAF:

“Cabe à instituição receber, armazenar e sistematizar informações, elaborar


Relatórios de Inteligência Financeira, e contribuir para o combate à lavagem
de dinheiro através do planejamento estratégico, de ações de inteligência e
de gestão de dados. Além disso, o COAF detém atribuições de supervisão
administrativa de setores sensíveis e de formulação de políticas para o setor.
No campo da inteligência, cabe ao COAF receber dados, organizá-los, e
elaborar relatórios para subsidiar autoridades competentes para investigar ou
dar início à persecução pelo crime de lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/98,
art. 15). (...) Na seara de supervisão administrativa, o COAF tem funções
regulatórias e repressivas. No campo regulatório cabe ao COAF elaborar
regras voltadas aos setores sensíveis à lavagem de dinheiro (bancos, correto-
ras, contadoras, etc.) sobre a forma e método de registro de informações de
clientes e sobre os atos suspeitos de lavagem que devem ser comunicados,
além daqueles previstos expressamente na Lei em comento. A atividade
repressiva decorre da competência do COAF para instaurar processo ad-
ministrativo e aplicar sanções às entidades e pessoas – indicadas no art. 9º

22 “Art. 16. O Coaf será composto por servidores públicos de reputação ilibada e reconhecida competência, designados
em ato do Ministro de Estado da Fazenda, dentre os integrantes do quadro de pessoal efetivo do Banco Central do
Brasil, da Comissão de Valores Mobiliários, da Superintendência de Seguros Privados, da Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional, da Secretaria da Receita Federal do Brasil, da Agência Brasileira de Inteligência, do Ministério
das Relações Exteriores, do Ministério da Justiça, do Departamento de Polícia Federal, do Ministério da Previdência
Social e da Controladoria-Geral da União, atendendo à indicação dos respectivos Ministros de Estado. (Redação
dada pela Lei nº 12.683, de 2012)” (BRASIL. Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. Disponível em: <www.planalto.
gov.br>. Acesso em: 1º dez. 2018.
23 Disponível em: <https://www.valor.com.br/politica/6003575/coaf-ficara-no-ministerio-da-justica-comandado-por-
sergio-moro>.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 67

da Lei de Lavagem – que descumprirem as regras previstas nos arts. 10 e


11 do mesmo diploma legal. (...) Por fim, é função do COAF a organização
de estudos e diagnósticos sobre lavagem de dinheiro e a formulação de
estratégias de combate à prática (Lei de Lavagem, art. 11, § 2º).”24

Partindo de pesquisa do plano nacional de capacitação e treinamento para


combate à corrupção e à lavagem de dinheiro elaborado pelo Chefe de Gabinete
e da Assessoria Internacional do COAF, Vinícius de Melo Lima (2014, p. 70-71)
elencou 10 sinais de alerta que, se realizados em conjunto e de forma reiterada e
sistemática, apontam para a provável ocorrência do crime de lavagem, são eles:
“a) movimentações incompatíveis com a capacidade econômico-financeira
dos investigados; b) contas movimentadas por procuração; c) movimen-
tações de grandes volumes de depósitos; d) retiradas sistemáticas geral-
mente por meios eletrônicos; e) atuação contumaz sem revelação dos reais
beneficiários; f) contas que não demonstram ser resultado das atividades
normais dos envolvidos; g) operações com estrangeiros ou em regiões de
fronteira; h) indícios de manipulação do mercado paralelo de câmbio; i)
venda simulada de passagens aéreas; j) indícios de evasão de divisas.”25

Portanto, conjugando tais operações ou, ao menos algumas delas, é sinal


de branqueamento de capital.
No tocante à participação internacional, o COAF coordena a participa-
ção brasileira em organizações multigovernamentais de prevenção e combate
à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo (PLD/FT).
O Brasil integra o Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de
Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI/FATF), o Grupo de Eg-
mont de Unidades de Inteligência Financeira e o Grupo de Ação Financeira
da América Latina (GAFILAT).
O COAF também visa internalizar as orientações de como implementar
as recomendações dos órgãos internacionais com o objetivo de se adequar
às melhores práticas para combater efetivamente os delitos financeiros, sem
prejuízo da soberania do país, mas sabedor de que os riscos de lavagem são
maiores em zonas de fronteiras com economia informal ativa.
Ademais, o Conselho brasileiro também se relaciona com as Unidades
de Inteligência Financeiras de outros países na troca de informações, bem
como na prestação de assistência àquelas unidades que solicitaram apoio.

24 BOTTINI, Pierpaolo Cruz; BADARÓ, Gustavo Henrique. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais:
comentários à Lei 9.613/1998, com alterações da Lei 12.683/2012. São Paulo: RT, 2012. p. 42.
25 LIMA, Vinícius de Melo. Lavagem de dinheiro e ações neutras: critérios de imputação penal legítima. Curitiba: Juruá,
2014. p. 70-71.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
68

Analisando os dados registrados em 2017, de acordo com o que se ex-


trai do sítio eletrônico do COAF, o número da produção anual de relatórios
de inteligência financeira (RIF) vem crescendo desde 2013, quando atingiu
2.450, contra 3.178 (2014), 4.304 (2015) e 5.662 (2016), registrando que as
comunicações ficaram entre 1.000.000 e 1.500.000 aproximadamente26.
Quando o resultado das análises de inteligência indicar a existência
de fundados indícios de lavagem de dinheiro ou qualquer outro ilícito, os
relatórios são encaminhados às autoridades competentes, nos termos do art.
15 da Lei nº 9.613/9827.
Apesar de toda a sistematização, tais números, em verdade, revelam a
carência estrutural da unidade. Conquanto haja profissionais muito bem pre-
parados, não há servidores suficientes para analisar toda a informação recebida.
Ainda é baixo o número de comunicações transformadas em relatórios
consistentes devido à ausência de investimentos no órgão. Além disso, são
ainda menores os relatórios que resultam em investigações pelo Departamento
de Polícia Federal. De 2.000 relatórios encaminhados pelo COAF à Polícia
Federal entre 2005 e 2010, apenas 136 inquéritos policiais foram instaurados28.
Não obstante isso, o Brasil melhorou substancialmente a persecução no
crime de lavagem de dinheiro por meio da implementação de Varas Federais
Especializadas, a partir do ano de 2003, que reúnem Procuradores e Juízes
Federais com experiência em crimes financeiros.
Vê-se, portanto, que o COAF representa um importante órgão no
Brasil na luta contra a lavagem e o financiamento do terrorismo, contando,
inclusive, com reconhecimento internacional, a exemplo do recebimento
do Prêmio Brasil de Destaque no Combate à Corrupção na 5ª Conferência
Internacional promovida pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia
Federal, em reconhecimento aos serviços prestados em prol do combate à
corrupção no país29.

26 Disponível em: <https://siscoaf.discovery.fazenda.gov.br/coaf/servlet/mstrWeb?src=mstrWeb.3140&evt=3140&


documentID=8DC8B1DD11E72FF300000080EF756E0B&Server=161.148.236.17&Port=0&Project=
DD-COAF&.>. Acesso em: 1º dez. 2018.
27 “Art. 15. O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos procedimentos cabíveis, quando
concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro
ilícito.” (BRASIL. Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º dez.
2018)
28 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Controle de Atividades Financeiras. Relatório de atividades 2011. Brasília:
COAF, 2012.
29 Disponível em: <http://www.coaf.fazenda.gov.br/noticias/coaf-ganha-premio-brasil-de-combate-a-corrupcao>.
Acesso em: 1º dez. 2018.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 69

6 A Lei nº 12.683/2012 como Origem do Compliance Criminal no


Brasil: Prevenção de Riscos no Ambiente Corporativo e Incentivos à
Autorregulação em Programas de Integridade
Compliance é o estado de conformidade com regulamentos internos
e normas externas impostos às atividades desempenhadas por determinada
instituição, visando a prevenção e gestão de riscos inerentes a qualquer objeto
empresarial.
Já o programa de compliance a ser instituído é mais precisamente o me-
canismo instaurado no âmbito interno de uma empresa para operar de forma
contínua, a fim de detectar e prevenir condutas ilícitas que venham a ocorrer
eventualmente em seu interior (WELLNER, 2005)30.
Uma das premissas básicas para o alcance dessa cultura de segurança e
de lealdade empresarial é a existência de uma comunicação interna aberta e
transparente entre os membros do próprio ambiente corporativo.
Com efeito, os referidos programas devem ser compreendidos e imple-
mentados casuisticamente, de acordo com a realidade econômica e o mercado
em que estão inseridos.
De toda forma, a noção geral dos programas de compliance se mostra
inserida na percepção de soft law31, na medida em que é recomendação dada
pela OCDE contra a corrupção em diversos instrumentos, a exemplo do Good
Practice Guidance on Internal Controls, Ethics and Compliance32, elaborado em 2010.
Sob a ótica do Direito Penal, os programas de integridade dizem respeito
às medidas que exigem um comportamento de acordo com regras e proibições
do Direito Penal (SILVEIRA; SAAD-DINIZ, 2015)33.
E tais autores também tecem considerações sobre a instituição de um
compliance criminal como consequência do novo pensamento empresarial
quanto ao atendimento às obrigações penais:

“Interessante perceber que, desde as valorações de Beck quanto à im-


plementação dos variados tons das crises futuras – crise ecológica, crise
financeira global e a crise advinda do terrorismo transnacional –, parece

30 WELLNER, Philip A. Effective compliance programs and corporate criminal prosecutions. Cardozo Law Review,
New York, v. 27-1, 2005. p. 497.
31 Soft law são normas sem força cogente, não vinculativas. Refere-se a qualquer instrumento regulatório dotado de
força normativa limitada, isto é, que em princípio não é vinculante, não cria obrigações jurídicas, mas ainda assim
pode produzir certos efeitos concretos aos destinatários.
32 Disponível em: <https://www.ocde.org/daf/anti-bribery/44884389.pdf>. Acesso em: 1º dez. 2018.
33 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ; Eduardo. Compliance, direito penal e Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2015.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
70

ser evidente que o Estado não mais se basta. Os custos locais, para não se
falar nos custos globais, são tremendos, a ponto de bradar, por outro lado,
também por necessidades de controles éticos. Tais valores éticos podem, e
devem, também ser postos como balizas para a autorregulação. Considera-
dos assim, e tendo-se em vista que a estipulação de determinados códigos
de conduta empresariais poderá sorrir como novo firmamento da cultura
empresarial, começa-se a verificar a possibilidade de edificação de um novo
Direito Penal em um novo marco preventivo, ou, verdadeiramente, um
Direito Penal com foco no criminal compliance.”34

Assim, nesse âmbito, em razão do caráter preventivo do referido ins-


tituto, ele deve ser dotado de medidas antecipatórias capazes de externar a
ausência de suspeita de infrações penais e de detectar qualquer prática ilícita
classificada como crime antes que ela ocorra, a partir da imposição de uma
autorregulação que evite a instauração de um inquérito policial.
Nesse sentido também são as lições de Ana Maria Neira (2016, p. 469):

“Los compliance programs son sistemas organizativos que incluyen princi-


pios, reglas, procedimientos, e instrumentos orientados a asegurar el cumpli-
miento de la legalidad en el desarollo de las actividades de una organización,
mientras que los criminal compliance programs, en los que se centra este
trabajo, constituyen sistemas de organización empresarial, que también
tienden a garantizar el cumplimiento normativo, si bien limitados a asegurar
la observancia de la normativa jurídico-penal por parte de la empresa.”35

Essa autorregulação demonstra não apenas a ética e o controle das


atividades exercidas pela empresa, mas, também, antecipa um processo de
due diligence e revela a ausência de dolo numa eventual prática delituosa por
qualquer colaborador.
É nesse contexto que as recomendações éticas internas inseridas no
código de conduta empresarial assumem especial relevância, na medida em
que servem, indiretamente, para reprimir condutas criminosas e garantir a
transparência em suas atividades.
No Brasil, o art. 41 do Decreto nº 8.420/201536 denomina o compliance
program de programa de integridade e a implementação de um canal de denún-
cias (identificada ou anônima) dentro da própria empresa é incentivada pela Lei

34 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ; Eduardo. Compliance, direito penal e Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 73-74.
35 NEIRA, Ana Maria. La efectividad de los criminal compliance programs como objeto de prueba en el proceso penal.
Politica Criminal, v. 11, n. 22, dez. 2016. p. 469.
36 “Art. 41. Para fins do disposto neste Decreto, programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica,
no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregula-
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 71

Anticorrupção37, no intuito de reprimir mais rapidamente o crime e permitir


que a apuração pelas autoridades competentes ocorra de forma mais eficaz.
Já no aspecto repressivo, o sistema de compliance possui eficácia a curto
e a longo prazo, conforme lecionam Tatiana Antunes Ávila e Vinicius Lacerda
e Silva (2018, p. 106):

“A curto prazo, pois, constatado o crime, notadamente mediante a verifica-


ção de prejuízo à empresa, deverá ser formulada a denúncia imediatamente
às autoridades competentes – CVM, Ministério Público e Polícia Federal – a
fim de apurar a conduta delituosa, o que demonstrará lealdade e respeito
para com o mercado financeiro e com as práticas anticorrupção, nos termos
do art. 7º, VIII, da Lei nº 12.846/2013.

De outro lado, a longo prazo, a simples existência de um compliance interno


já demonstra a transparência das práticas adotadas pela empresa e por seus
componentes, bem como a sua preocupação em evitar condutas que estejam
em desacordo com aquelas reguladas pelo mercado.”38

Especificamente quanto à lei brasileira de lavagem de capitais (arts.


9º, 10, 11 e 12), previu-se a obrigatoriedade de as pessoas físicas e jurídicas
sujeitas à aplicação da norma identificarem seus clientes e comunicarem todas
as operações de ativos que ultrapassar o valor previamente estabelecido pelo
Banco Central do Brasil (Bacen), sob pena de responsabilização administrativa.
E segundo Daniela Villani Bonnacorsi (2017, p. 209), “entende-se que esta
obrigatoriedade é a origem do criminal compliance no Brasil”39.
Assim, com o já mencionado intercâmbio cooperativo do COAF com
outros órgãos internacionais de inteligência financeira, é possível aprofundar
o controle de fiscalização com vistas a um combate muito mais eficiente ao
branqueamento de capitais.

ridades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar
desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Parágrafo único. O programa de integridade deve ser estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características
e riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual por sua vez deve garantir o constante aprimoramento e
adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade.” (BRASIL. Decreto nº 4.820, de 18 de março de 2015.
Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º dez. 2018)
37 “Art. 7º Serão levados em consideração na aplicação das sanções:
(...)
VIII – a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de
irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;” (BRASIL. Lei
nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º dez. 2018)
38 ÁVILA, Tatiana Antunes; SILVA, Vinicius Lacerda e. Criminal Compliance e o uso indevido de informação privilegiada
no mercado de valores mobiliários. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, Porto Alegre, LexMagister, ano
XIV, v. 83, abr./maio 2018, p. 106.
39 BONACCORSI, Daniela Villani. Compliance e prevenção penal. In: OLIVEIRA, Luís Gustavo Miranda de (Org.)
Compliance e integridade: aspectos práticos e teóricos. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 209.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
72

Logo, também concluímos que a prevenção da lavagem representada


na obrigatoriedade de operações e registros nos mais diversos setores da
economia aliada ao dever de transparência dos responsáveis teve início, no
Direito Penal Econômico, na Lei nº 9.613/98 com as alterações trazidas pela
Lei nº 12.683/2012.

7 Considerações Finais
O Brasil e todos os países pertencentes ao Financial Action Task Force
(FATF) e ao Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) devem seguir
suas recomendações e atender aos padrões internacionais de combate à lava-
gem de dinheiro.
Os Estados membros deveriam criminalizar a lavagem de dinheiro com
base na Convenção de Viena e na Convenção de Palermo, de modo a incluir
a maior quantidade possível de crimes antecedentes, o que fora atendido no
caso brasileiro com o advento da Lei nº 12.683/2012.
Internamente, o Brasil deve identificar, avaliar e compreender os riscos
da lavagem de dinheiro para o país, designando mecanismos de coordenação
das ações e alocando eficientemente os recursos antilavagem, com o objetivo
de garantir que esses riscos sejam efetivamente mitigados, exigindo que as
instituições financeiras e não financeiras cumpram todas as determinações.
Deve-se assegurar que os formuladores de políticas públicas, a unidade
de inteligência financeira e as autoridades de cada país possuam a independên-
cia suficiente que permita a cooperação internacional e, quando apropriado, a
coordenação doméstica atinente ao desenvolvimento das atividades preventivas
e repressivas.
Nesta toada, a legislação deve contemplar o congelamento, a apreensão
e o confisco de bens lavados e produtos usados ou com a intenção de que fos-
sem usados em crimes de lavagem de dinheiro sem a exigência da condenação
criminal transitada em julgado (non-conviction based forfeiture).
Além disso, o ideal é que se conte com a possibilidade de aplicação
de medidas cautelares para prevenir qualquer negociação, transferência ou
alienação de tais bens.
No âmbito empresarial, deve ser adotado um conjunto de mecanismos
internos de gestão para detectar e prevenir condutas criminosas no ambiente
corporativo de acordo com a legislação nacional e as convenções internacio-
nais, de modo que fique comprovado que a pessoa jurídica praticou todos os
atos preventivos necessários.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 73

Com efeito, as melhores formas de promover tais práticas e externar


um comportamento de boa-fé ao mercado e perante os órgãos de controle
estatais são:
(i) criar um órgão interno de fiscalização que monitore as operações
potencialmente danosas dos colaboradores;
(ii) realizar treinamento contínuo e periódico com diretores/gestores
e empregados;
(iii) reforçar a prevenção no regimento interno e no código de ética
com as devidas penas em caso de eventual infração;
(iv) elaborar uma cartilha das relações comerciais mais suscetíveis à
ocorrência de lavagem;
(v) instituir canais de comunicação e reclamação com premiação a
whistleblower;
(vi) publicizar informações financeiras e contábeis.
Portanto, resta claro que a criação de uma estrutura de supervisão
e análise autorregulativa do estado atual e futuro de riscos não desejados,
intimamente ligados à lei criminal e, em especial, à de lavagem de dinheiro,
se tornou hodiernamente mais do que uma garantia, mas um dever da socie-
dade empresária que se preocupa em formar uma nova cultura de combate à
criminalidade econômica e à corrupção.

TITLE: The money laundering crime in Brazil: corporate criminal compliance and the prevention and
combating methods of the financial activities control board.

ABSTRACT: The present essay investigated by the deductive method approaches the conceptual and
historical aspects of the money laundering crime in Brazil. After studying its phases in more depth, it
is the discussion about what would be the legal protected interest and whether it would be possible to
cover a multi-harmensiveness. Then, the functions and the preventive and repressive methods of the
Financial Activities Control Board are dealt with. Finally, it addresses the origin of criminal compliance
in money laundering and the corporate evolution in order to carry out the business activities allied to a
self-regulatory integrity program.

KEYWORDS: Money Laundering. Legal Protected Interest. COAF. Criminal Compliance. Integrity
Program.

8 Referências
ARAS, Vladimir. A investigação criminal na nova Lei de Lavagem de Dinheiro. Boletim IBCCRIM, ano
20, n. 236, ago. 2012. Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/site/boletim/pdfs/Boletim237.pdf>.
Acesso em: 1º dez. 2018.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
74

ÁVILA, Tatiana Antunes; SILVA, Vinicius Lacerda e. Criminal Compliance e o uso indevido de informação
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Recebido em: 21.01.2019


Aprovado em: 31.01.2019
Doutrina

Direito Penal Econômico: uma Reflexão


Crítica sobre o seu Conceito e Objeto

Reinaldo Denis Viana Barbosa


Mestrando em Direito (UFSC/SC); Especialista em Direito
Penal e Processual Penal (Escola do Ministério Público de
Santa Catarina); Graduado em Direito (CESUSC/SC);
Advogado.

RESUMO: Por meio de remissão às referências à Ordem Econômica nas Cons-


tituições brasileiras, o artigo demonstra como o tema foi tratado no decorrer da
história. Em seguida é apresentado o conceito e objeto do Direito Penal Eco-
nômico, tendo-se como plano de fundo as preocupações geradas pela utilização
do direito penal desgarrada dos seus princípios fundantes, em oposição a um
Direito reativo. Trata-se de pesquisa bibliográfica e legal para a exposição das
referências constitucionais, bem como do conceito e objeto do direito penal
econômico, utilizando a análise explicativa.

PALAVRAS-CHAVE: Constituições Brasileiras. Direito Penal. Direito Penal


Econômico. Direito Penal Mínimo.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Referência Constitucional da Tutela da Ordem


Econômica; 2.1 A Constituição Política do Império de 1824; 2.2 A Constituição
da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891; 2.3 A Constituição da Re-
pública dos Estados Unidos do Brasil de 1934; 2.4 A Constituição dos Estados
Unidos do Brasil de 1937; 2.5 A Constituição dos Estados Unidos do Brasil
de 1946; 2.6 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1967; 2.7 A
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 3 Conceito e Objeto
do Direito Penal Econômico. 4 Considerações Finais. 5 Referências.

1 Introdução
Com maior ou menor destaque, a Ordem Econômica sempre esteve
presente nas Constituições brasileiras. Considerando que as Constituições
refletem a [ou resultam da] ordem social vigente, o assunto era tratado de
acordo com a realidade política da época.
Para conclusões sobre o tratamento dado à tutela da Ordem Econômica
é necessário avaliar diversos fatores. Contudo, neste trabalho, como limitação
da pesquisa, a referência será tomada exclusivamente do texto constitucional
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 77

da época, sem descuidar, obviamente, de referências a fatos históricos que


tenham significativa relevância ao tema.
Embora desde a Constituição Política do Império de 1824 assuntos
relacionados à Ordem Econômica já estivessem presentes, a referência à tutela
penal somente surgiu na de 1934, determinando que fosse editada Lei para
prescrever o crime de usura. A partir das previsões constitucionais, outras leis
foram editadas para conferir tutela penal à Ordem Econômica.
A atualidade da pesquisa está no cenário de insegurança vivida no país:
o controle midiático, a (falsa) necessidade que os Poderes entendem de apre-
sentação de resultados, a resposta legislativa aos apelos sociais, construindo
um direito penal reativo, além das heurísticas das decisões influenciadas por
todos esses fatores, tornam necessária a reflexão sobre o conceito e objeto do
que se convencionou chamar Direito Penal Econômico.
Quanto ao método de abordagem, dada a necessidade de sistematização
da pesquisa e o caminho a ser percorrido, foi utilizado o método dedutivo
por considerar análises gerais sobre os elementos conceituais para, então,
possibilitar conclusões pontuais. O método de procedimento é o monográfico
pela individualização do objeto da pesquisa. Finalmente, quanto à técnica de
pesquisa, foi escolhida a bibliográfica e legal.

2 Referência Constitucional da Tutela da Ordem Econômica


A relação do Estado com a Ordem Econômica será medida neste artigo
pelas disposições constitucionais sobre o tema. Ainda que para um posiciona-
mento conclusivo sobre como o Estado lidava com assuntos afetos à Ordem
Econômica fosse necessário considerar outros fatores que não somente o texto
constitucional, as Constituições brasileiras elaboradas ao longo do tempo serão
utilizadas como um indicador.
Nesse sentido, Karl Marx (2008, p. 47) conclui que

“As relações jurídicas, bem como as formas de Estado, não podem ser
explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução geral do espírito
humano; essas relações têm, ao contrário, suas raízes nas condições ma-
teriais de existência (...)”

Para o autor, a estrutura política e jurídica do Estado surge das relações


de produção. A progressão da sociedade dá-se por luta de classes: a classe
burguesa, controladora da produção, choca-se com o proletariado, detentor
da mão de obra.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
78

No mesmo sentido eram os estudos de seu contemporâneo, Friedrich


Engels, o qual fundamentava a origem do Estado na propriedade privada e
na divisão do trabalho em classes, conforme asseverou na sua obra “A origem
da família, da propriedade privada e do Estado”.
Para outros teóricos, como Ferdinand Lassale, o Estado é formatado
por forças reais de poder, dentre as quais se encontra o econômico. Desta
forma, as relações econômicas influenciam o Estado por serem fatores reais
de poder, mas não o cria ou justifica.
Citados três dos mais relevantes teóricos dispostos a explicar a origem
do Estado, vê-se que a Ordem Econômica é tema comum, ainda que toma-
da por diferentes perspectivas. As Constituições brasileiras no decorrer da
história fizeram diferentes abordagens sobre a tutela da Ordem Econômica,
como se verá.

2.1 A Constituição Política do Império de 1824


A campanha de conquistas da França, liderada por Napoleão, que
culminou na vinda da Família Real para o Brasil, é um dos principais fatores
históricos influenciadores da tutela da Ordem Econômica na Constituição
de 1824.
Com a vinda da Família Real, dois acontecimentos influenciaram dire-
tamente na atividade econômica: a fundação do Banco do Brasil e a abertura
dos portos brasileiros. Com isso, os produtos que antes eram enviados a
Portugal para então serem reexportados, puderam ser comercializados dire-
tamente do Brasil.
Alberto Venâncio Filho (1968, p. 25) esclarece que

“Do ponto de vista da intervenção do Estado no domínio econômico, o


panorama do Império revela sempre a ênfase nos problemas de tarifas al-
fandegárias, que eram, na verdade, os que tinham influência no incipiente
sistema econômico da época, e os quais, em todas as situações históricas,
têm sempre primazia como primeira atividade onde o Estado intervém no
domínio econômico.”

Os dispositivos da referida Constituição que podem ser relacionados


à ordem econômica são, basicamente, os que se referem aos tratados (art.
102, VIII), à Fazenda Nacional (art. 170), à dívida pública (art. 179, XXIII) e
à extinção das corporações (art. 179, XXV).
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 79

A possibilidade de realização de tratados comerciais – por isso a afini-


dade com o tema Ordem Econômica – estava prevista no inciso VIII do art.
102 (BRASIL, 1824):

“Art. 102. O Imperador é o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos


seus Ministros de Estado.

São suas principaes attribuições

(...)

VIII. Fazer Tratados de Alliança offensiva, e defensiva, de Subsidio, e


Commercio, levando-os depois de concluídos ao conhecimento da As-
sembléa Geral, quando o interesse, e segurança do Estado permittirem.
Se os Tratados concluídos em tempo de paz envolverem cessão, ou troca
de Território do Império, ou de Possessões, a que o Império tenha direito,
não serão ratificados, sem terem sido approvados pela Assembléa Geral.”

Curioso observar que a celebração de tratados não era submetida à


apreciação do Poder Legislativo, embora já houvesse um sistema bicameral
composto pela Câmara dos Deputados e pela Câmara dos Senadores, as quais
compunham a denominada “Assembleia Geral”.
A participação do Legislativo era posterior e somente quando o interesse
e segurança do Estado permitissem. Em outras palavras, no Brasil Império,
o interesse e a segurança do Estado eram definidos pela vontade do próprio
Imperador.
O art. 170, por sua vez, ao tratar da Fazenda Nacional, tinha cunho
predominantemente organizacional, atribuindo a tal órgão a função de ad-
ministração, arrecadação e contabilidade das receitas e despesas do Império.
A Constituição não tratava detalhadamente sobre contribuições e tri-
butos. Uma das poucas referências que se tem é a atribuição à Assembleia
Geral de fixar as despesas públicas e repartir a contribuição direta, prevista
no inciso X do art. 15.
Outra menção que se tem é a constante do art. 179, XV, o qual, ao tratar
das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos, definiu que ninguém
seria isento de contribuir para as despesas do Estado na medida dos seus bens.
Constava também na Carta de 1824 o reconhecimento da dívida pública
no inciso XXIII do mesmo art. 179. Tal dispositivo é resultado do processo de
independência, uma vez que a dívida fora assumida junto à Inglaterra pelos
empréstimos feitos aos portugueses para custear a resistência do seu exército
em alguns pontos do território brasileiro.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
80

Não há nesta Constituição referência à tutela penal da Ordem Eco-


nômica. Isto se justifica pelo fato de que ela expressamente destinava-se a
regular os poderes políticos e os direitos políticos e individuais dos cidadãos,
conforme disposto no art. 178.

2.2 A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891


O cenário da promulgação da Constituição de 1891 já mostrava o Brasil
independente. Assim como na Constituição de 1824, a regulamentação da
Ordem Econômica restava reservada às leis ordinárias. Nesse sentido, Gastão
Alves de Toledo (2004, p. 123):

“Durante todo o período imperial e na vigência da primeira Constituição


republicana, a atuação do Estado na esfera econômica se dava com base
em dispositivos genéricos que permitiam a interferência do Poder Público
para regrar determinadas atividades sem se referir, contudo, à atividade
econômica propriamente dita.”

A Ordem Econômica ainda não ganhara relevância na Carta Constitu-


cional. Contudo, alguns dispositivos já tratavam do assunto, especialmente
por conta da atividade de exportação do café. Assim como na Constituição
anterior, não havia qualquer dispositivo que desse tratamento penal à Ordem
Econômica.
O art. 7º, ao definir a competência exclusiva da União, apontava os
impostos sobre a importação no § 1º; no § 2º havia referência às Alfândegas,
as quais embora não relacionadas diretamente à Ordem Econômica, com esta
guardavam pertinência devido à tributação.

2.3 A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934


A Constituição de 1934 rompeu com o afastamento do Estado da Ordem
Econômica. O próprio preâmbulo apresenta o bem-estar econômico como
uma garantia da nação. Importante frisar que outras constituições que consa-
graram o Estado Social já estavam bastante difundidas, como a Constituição
do México de 1917. A Revolução de 1930 e a Revolução Constitucionalista
de 1934 são fatos históricos que marcaram o cenário desta Constituição.
Ensina Pinto Ferreira (1991, p. 576) que:

“Antes de 1930, a preocupação pela ordem econômica e social no Brasil


era mínima. Foi somente depois da revolução que o legislador constituinte
debateu a matéria, de modo que a Constituição de 1934 sofreu influência
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 81

da constituição alemã de 1919 e criou um capítulo especial com o título


‘Da Ordem Econômica e Social’.”

A liberdade econômica foi apresentada com limites, conforme se ve-


rifica no art. 115 (BRASIL, 1934): “A ordem econômica deve ser organizada
conforme os princípios da Justiça e as necessidades da vida nacional, de modo
que possibilite a todos existência digna. Dentro desses limites, é garantida a
liberdade econômica”.
A previsão do art. 115 permitia a possibilidade de intervenção estatal na
Ordem Econômica. O próprio art. 116 afirmava que por motivo de interesse
público poderia ocorrer a estatização de indústria ou atividade.
A Constituição de 1934 inovou também no que se refere ao trabalho.
Trouxe direitos consagrados dos trabalhadores como o salário mínimo regional,
o trabalho diário não excedente a oito horas, repouso semanal remunerado,
férias, indenização contra demissões sem justa causa, etc.
Relativamente à propriedade, algumas inovações significativas ocorre-
ram, como a instituição das contribuições de melhoria (art. 124), a usucapião
(art. 125) e o imposto sobre propriedade rural (art. 126). Além disso, a pro-
priedade passou a ser vista sob o prisma da função social.
João Mangabeira (1934, p. 216), relator geral do anteprojeto governa-
mental apresentado à Assembleia Nacional Constituinte, assinalou que:

“O anteprojeto não manteve, nem poderia manter, o conceito de proprie-


dade da Constituição de 91, que outro não era senão o do velho domínio
quiritário, que, juntamente com o império, no direito público, caracterizava,
nas duas esferas jurídicas, a expressão absoluta do Poder. Nem seria possí-
vel repetir, numa Constituição de 1934, a declaração do indivíduo liberal
e burguês, que assegurava a manutenção do direito de propriedade, em
toda a sua plenitude, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade
pública mediante indenização prévia.”

No que se refere à tutela penal da Ordem Econômica, a Constituição de


1934 somente fazia referência ao crime de usura, atribuindo à lei a função de
prescrevê-lo. A regulamentação veio em 1938, pelo então presidente Getúlio
Vargas, o qual, por meio do Decreto-Lei nº 869, de 18 de novembro de 1938,
tipificou os crimes contra a economia popular.

2.4 A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937


A Constituição de 1937 nasceu sob diversas críticas. Isso porque ela
foi resultante de um golpe de Estado do então presidente Getúlio Vargas,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
82

substituindo, em 10 de novembro daquele ano, a Constituição de 1934. A


maneira como foi outorgada esta Constituição fez com que ficasse conhecida
como a “Constituição Polaca”, em virtude das semelhanças com a constituição
polonesa de 23 de abril de 1935.
Uma das maiores características da Constituição de 1937 foi a centrali-
zação de poder nas mãos do presidente. O art. 9º, por exemplo, possibilitava
a intervenção do governo no Estado-membro por diversos motivos, dentre
eles, assegurar o princípio constitucional do governo presidencial1.
A preocupação da Constituição de 1937 era eminentemente política.
O presidente era autorizado a legislar por meio de decreto-lei mesmo no
recesso do Parlamento e na dissolução da Câmara. Os Códigos Penal e Pro-
cessual Penal são exemplos dessa possibilidade legislativa presidencial, uma
vez que foram criados, respectivamente, pelos Decretos-Lei ns. 2.848, de 7
de dezembro de 1940, e 3.689, de 3 de outubro de 1941.
A tutela da Ordem Econômica foi tratada em capítulo próprio, com-
preendendo os arts. 135 a 155. Dada a flagrante preocupação com o controle
político da Constituição do Estado Novo, muitos dispositivos ficaram seme-
lhantes à Constituição de 1934.
Uma significativa mudança foi a valorização da iniciativa individual,
do poder de criação, organização e invenção do indivíduo, fazendo com que
a intervenção do Estado no domínio econômico passasse a ser subsidiária,
admitida somente para suprir as deficiências da iniciativa individual e coor-
denar os fatores de produção.
Com relação à tutela do trabalho, muitos direitos e princípios foram
mantidos. Foi estipulada a proibição do trabalho aos menores de 14 anos,
do trabalho noturno aos menores de 16 e do insalubre aos menores de 18.
Repouso semanal, férias, estabilidade de emprego e vários outros direitos já
consagrados foram mantidos.
Relativamente à tutela penal da Ordem Econômica, o art. 141 da Cons-
tituição de 1937 equiparava os crimes contra a economia popular aos crimes
contra o Estado, determinando que a lei cominasse penas graves e julgamentos
adequados à pronta e segura punição. Da mesma forma, continuou prevendo
o crime de usura no art. 142.

1 Constituição de 1937: “Art. 9º O Governo federal intervirá nos Estados mediante a nomeação, pelo Presidente
da República, de um interventor que assumirá no Estado as funções que, pela sua Constituição, competirem ao
Poder Executivo, ou as que, de acordo com as conveniências e necessidades de cada caso, lhe forem atribuídas pelo
Presidente da República: (...) d) Para assegurar a execução dos seguintes princípios constitucionais: (...) 2º) governo
presidencial (...)”.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 83

2.5 A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946


A Constituição de 1946 surgiu com a promessa de redemocratizar o país.
A Ordem Econômica passou a ser fundada nos princípios da justiça social,
destacando a liberdade de iniciativa e a valorização do trabalho, conforme o
art. 145: “A ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios
da justiça social, conciliando a liberdade de iniciativa com a valorização do
trabalho humano”.
A possibilidade de intervenção do Estado no poder econômico era mais
aparente. O art. 146 tinha previsão expressa nesse sentido ao afirmar que,
mediante lei especial, poderia intervir no domínio econômico e monopolizar
determinada indústria ou atividade, tudo visando ao interesse público e tendo
por limite os direitos fundamentais.
Como exemplos de tal permissão constitucional, pode-se citar a criação
da Companhia Siderúrgica Nacional – CSN (1941), da Companhia Vale do
Rio Doce (1942) e da Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras (1953). Comentando
o assunto, assevera Gastão Alves de Toledo (2004, p. 147):

“Por várias razões de cunho protecionista, propiciaram o ingresso do Estado


brasileiro no âmbito econômico como protagonista, tendo em vista o argu-
mento de que a iniciativa privada não era capaz de riscos de tal magnitude,
considerando-se, sobretudo, o fato de que a visão nacionalista não permi-
tiria capitais estrangeiros nestes segmentos de vital interesse para o país.”

Ademais, o constituinte preocupou-se em estabelecer repressão ao


abuso do poder econômico. O art. 131 asseverava que a lei reprimiria toda e
qualquer forma de abuso do poder econômico e o art. 154 continuava pre-
vendo a punição para a usura.
Para regulamentar o mandamento constitucional foi editada, em 10
de setembro de 1962 a Lei nº 4.137, cujo objetivo preambular era regular a
repressão ao abuso do poder econômico. Esta lei foi posteriormente revogada
pela Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, que passou a dispor sobre a pre-
venção e repressão às infrações contra a ordem econômica.

2.6 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1967


A Constituição de 1967, por sua vez, estava marcada por consideráveis
mudanças sofridas no cenário político brasileiro. Recorde-se que o Movimento
Militar de março de 1964 subverteu a ordem política do país.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
84

Os atos institucionais estabeleciam uma nova constituição material.


O Ato Institucional nº 4, especificamente, convocou o Congresso para votar
a Carta que havia sido elaborada por uma comissão de juristas, tendo sido
promulgada em 1967.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1977, p. 146) assinala

“A Constituição de 1967 não fugiu, sem dúvida, ao fixar os princípios fun-


damentais do ordenamento econômico, à linha traçada pela Constituição
de 1946. Antes, explicitou o que, na obra dos constituintes de 1946, fora,
talvez, sintetizado de mais.”

A Emenda nº 1 de 1969 reescreveu consideravelmente a Constituição


de 1967. O seu caráter era eminentemente político, uma vez que se destinava
a legitimar a retomada do poder. Por esse motivo, a ordem econômica não
sofreu consideráveis alterações.
A intervenção do Estado na economia seria motivada pela segurança
nacional ou pela necessidade de organizar determinado setor quando a inicia-
tiva privada não se mostrasse eficaz, conforme estabelecia o art. 163.
Contudo, a repressão ao abuso do poder econômico continuou a ser
uma preocupação do constituinte. Tanto que o art. 157 previa, no inciso VI,
a repressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos
mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros.

2.7 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988


O histórico das Constituições anteriores aponta para uma constante
autorização da intervenção estatal na ordem econômica por diversos motivos.
A Constituição de 1988 surgiu operando uma mudança significativa em tal
assunto. Nesse sentido, André Ramos Tavares (2003, p. 126-127) acentua:

“Tendo em vista que a Constituição de 1967, com as alterações que lhe


foram feitas pela Emenda Constitucional nº 1, em 1969, serviu de base para
um amplo intervencionismo, a promulgação da Constituição Federal de
1988 pretendeu operar uma profunda mudança nessa concepção econômi-
co-intervencionista do Estado, estabelecendo um regime bem mais liberal
do que o anteriormente vigente, reiterando a adoção do sistema capitalista
de economia descentralizada, baseada, pois, no mercado.”

A Ordem Econômica veio disposta como título específico desde a Cons-


tituição de 1934, seguindo assim nas Constituições de 1946 e 1967. Nessas
Constituições o tema era tratado no capítulo referente à Ordem Econômica
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 85

e Social. Diferentemente, a Constituição de 1937 utilizava a designação sim-


plificada de Ordem Econômica. Na Constituição Cidadã (de 1988) o sistema
financeiro foi integrado à Ordem Econômica e a Ordem Social desmembrada.
Interessante observar que pela primeira vez foi utilizada pelo constituinte a
expressão ordem econômica e financeira. Pinto Ferreira (1991, p. 497) explica que
com essa expressão, reconhecia-se a conexão e a interdependência necessárias
entre ambas.
Sob a égide da Constituição de 1988 foi editada a Lei nº 8.137/90, a
qual teve por objetivo definir os crimes contra a ordem tributária, econômica
e contra as relações de consumo, sendo necessário fazer uma leitura do con-
ceito e objeto do Direito Penal Econômico a partir de referências limitadoras
à utilização do direito penal.

3 Conceito e Objeto do Direito Penal Econômico


A tutela penal da Ordem Econômica, como se demonstrou no tópico
anterior, nem sempre foi tema amplamente tratado. A verdade é que o avan-
ço da tecnologia, dos meios de comunicação, o encurtamento de distâncias,
a ampliação das possibilidades de realizarem-se negócios, além de outros
motivos, tem tornado o processo de globalização cada vez mais acentuado.
No sentido de que estas mudanças sociais interferiram sobremaneira
nas relações econômicas, aduz Guilherme Guedes Raposo (2011, p. 268):

“No âmbito das relações econômicas, esse conjunto de transformações foi


marcado pelo grande aumento populacional e pela utilização crescente de
máquinas e métodos modernos de produção em larga escala, o que inten-
sificou consideravelmente a produção e o fornecimento de mercadorias e
riquezas, fazendo com que fabricantes, fornecedores e consumidores se
perdessem no anonimato das sociedades de massa.”

Tais fatores contribuem para o aumento da dificuldade de o Estado lidar


com demandas originadas de relações tão complexas e cada vez mais impes-
soais. Diante desse contexto de consideráveis mudanças socioeconômicas, o
Estado deixa a sua posição marcada por obrigações negativas e passa a atuar
positivamente em tais situações. E é exatamente nesse contexto de inseguranças
que se passa a utilizar o Direito Penal, sendo este [utopicamente] apresentado
como a solução necessária de que dispõe o Estado.
Ocorre que um dos baluartes do Estado Democrático de Direito é, sem
dúvida, a utilização fragmentária do direito penal. Está amplamente consagrada
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
86

e difundida a máxima de que o Estado somente poderá utilizar-se de tal ramo


do direito quando mostrarem-se insuficientes os demais.
Rogério Greco (2014, p. 75) afirma que o princípio da intervenção
mínima firma-se sobre dois vieses: como orientador do legislador na eleição
dos bens jurídicos a serem tutelados por tipos penais, ou seja, ab initio, e como
ultima ratio de intervenção do Estado.
O princípio em comento presta-se, inicialmente, a subsidiar o legislador
no momento da escolha dos bens jurídicos a serem protegidos pelo direito
penal. O segundo critério existe pela constatação da drasticidade do sistema
penal.
Na verdade, desde o momento pré-processual, o sujeito que tem sobre
si as suspeitas do cometimento de crime já sofre as duras penas anteriores ao
resultado conclusivo do processo. Desta forma, ciente dos reflexos possíveis,
o Estado deve somente utilizar-se de tal ferramenta repressiva quando os
demais ramos não se mostrarem suficientes.
Luigi Ferrajoli (2002, p. 574) refere-se à existência de uma “elefantíase
da jurisdição penal” asseverada pela inobservância do princípio da interven-
ção mínima, de uma transformação pontual da legislação penal resultante do
incremento da incerteza, de antinomias, de concurso de normas e de crimes.

“Os juristas têm dificuldade extremada em orientar-se na selva de leis espe-


ciais surgidas extracodicem, e apaziguar os inúmeros problemas de definição,
coordenação e diferenciação entre os tipos penais de conteúdo análogo,
e o que é pior, formulados não raras vezes de maneira vaga e obscura.”

Nesse sentido, reside importantíssimo raciocínio feito pelo autor em


Direito e Razão (FERRAJOLI, 2002, p. 574), no sentido de despenalização
de todas as contravenções. Ainda que inicialmente pareça tendenciosamente
minimalista, na verdade é aplicação do princípio da intervenção mínima que
deve reger as normas penais: uma vez que o legislador considerou determi-
nados comportamentos como simples contravenções, atribuindo-lhes menor
valor, menor ofensividade, não necessitariam da tutela penal.
Ao escrever sobre a finalidade do direito penal no Estado contem-
porâneo, Guilherme Guedes Raposo (2011, p. 270) afirma que os autores
que defendem um modelo ultraliberal de intervenção jurídico-penal estatal,
propõem a sua incidência limitada ao que chama de Direito Penal básico, que
seria composto por condutas que atentassem contra interesses individuais
determinados, como a vida, a liberdade e a propriedade.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 87

Para esses autores – da chamada Escola de Frankfurt – a intervenção


do Direito Penal para além de tais interesses individuais seria ilegítima, posto
que seria utilizado para resolver problemas sociais de maneira simbólica, com
o objetivo de tranquilizar a opinião pública, e não de maneira efetiva.
Em oposição ao pensamento da Escola de Frankfurt, outros autores
sustentam a ideia de que o Direito Penal não tem validade atemporal, e assim
como os demais ramos do direito – e a própria sociedade – deve adaptar-se
às mudanças ocorridas. Desta forma, buscam fugir dos limites impostos pelo
Direito Penal clássico para permitir a regulamentação de novas condutas le-
sivas, como são os danos ao meio ambiente e à ordem econômica.
A utilização do Direito Penal sempre se pautou pelo objetivo de garan-
tir duas necessidades: de um lado, a proteção dos indivíduos contra abusos
cometidos por outros indivíduos e pelo Estado; e de outro, a possibilidade
de intervenção do Estado na liberdade dos indivíduos sem violar direitos
fundamentais.
Guilherme Guedes Raposo (2011, p. 271) ressalta

“Na verdade, quando se analisa a necessidade de ampliação ou diminuição


do poder punitivo exercido pelo estado por meio do Direito Penal, deve-se
preliminarmente verificar se esse ramo do Direito Penal cumpre alguma
função positiva para o indivíduo e para a coletividade e, em caso positivo,
analisar de que forma ele deve operar para o alcance dessa finalidade. Em
outros termos, deve-se perguntar qual a finalidade do Direito Penal e se,
de fato, as normas penais produzidas estão de acordo com o motivo de
sua existência.”

Quando a reflexão recai especificamente sobre o direito penal econô-


mico, a principal crítica vem dessa fonte principiológica de subsidiariedade
do direito penal. O questionamento não é se o Estado deve ou não intervir
na economia, mas como o fará. Ao estender o alcance da intervenção ao
campo penal, corre-se o risco de sacrificar garantias essenciais do Estado de
Direito. Isso na medida em que se está a tutelar bens supraindividuais e de
perigo abstrato.
Nesse sentido – de que com a utilização do direito penal no campo
econômico estar-se-á a tutelar bens de um perigo abstrato –, Raposo (2011,
p. 269) ressalta o surgimento de novos objetos de proteção, os quais antes não
tinham relevância penal. Tal fenômeno, segundo o autor, tem sido acompa-
nhado por uma antecipação da tutela a um momento prévio à lesão ao perigo
concreto a bens jurídicos:
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
88

Na doutrina alemã, Winfried Hassemer propõe como solução à vigente


tutela penal da ordem econômica, a criação do Direito da Intervenção, con-
forme explica Rodrigo Sánchez Rios (2000, p. 436):

“esse novos bens jurídicos (no caso, por exemplo, a ordem econômica)
poderiam ser reguladas pelo ‘Direito da Intervenção’ que teria que ser
configurado como um Direito sancionador situado a meio caminho entre
o Direito Penal e o Direito de contravenções ou de infrações de ordem,
entre o Direito Público e o Direito Civil. Este Direito da Intervenção se
caracterizaria por conter garantias e procedimentos menos rigorosos e
exigentes que os que acompanham o Direito Penal e disporia de sanções
de menor gravidade que este último, ou seja, menos lesivas para os Direitos
individuais.”

O bem jurídico tutelado e o conceito de direito penal econômico estão


intimamente ligados. Historicamente, a tarefa de chegar a um conceito con-
clusivo sobre ramo tão específico do direito foi demasiada difícil. O profes-
sor Raúl Cervini (2009, p. 18) assevera que “en una primera instancia se ha
definido al derecho penal económico como aquella rama del derecho penal
cuya función es la protección del orden económico dirigido o intervenido
directamente por el Estado”.
Raúl Cervini (2009, p. 20), ao citar Yacobucci, apresenta a concepção
sobre o conceito de direito penal econômico em diversos países. Assevera
que na Alemanha, por exemplo, Klaus Tiedmann afirma ser o direito penal
econômico aquele que se aplica aos ilícitos que surgem na atividade de inter-
venção e regulação estatal dentro da vida econômica. Enquanto na Espanha,
Miguel Bajo Fernández define o direito penal econômico como o conjunto de
normas penais que protegem a ordem econômica. Sendo esta definida como
a regulação jurídica da participação do Estado na economia.
Felipe Augusto Forte de Negreiros Deodato (2003, p. 42) esclarece
que, não muito tempo atrás, o direito penal econômico era visto como uma
ferramenta de intimação utilizada pelo Estado para direção e controle da
economia; uma espécie de matéria especial fora do Código Penal. Contudo,
afirma Deodato, hoje já é visto a partir de uma perspectiva mais ampla, como
consequência do progresso econômico; uma disciplina autônoma do direito
administrativo.
A conceituação de direito penal econômico passa pela ponderação de
dois extremos: se de um lado não é prudente defini-lo restritivamente de
modo que se confunda com o direito penal convencional, de outro modo
não é salutar que se lhe amplifique demasiadamente o conceito, pois se a
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 89

base conceitual for simplesmente a ordem econômica, furtos deverão ser


considerados crimes contra a ordem econômica por lesionarem o patrimônio.
Longe de ser tema pacífico, o conceito de “direito penal econômico”
lida com questionamentos que vão desde a sua denominação até a extensão
interpretativa, além da própria legitimidade de se criminalizar certos com-
portamentos, além da inovação de conceber a pessoa coletiva como possível
agente delituoso (DEODATO, 2003, p. 41).
Buscando identificar o bem jurídico do direito penal econômico, João
Marcello de Araújo Júnior (1995, p. 34), redator do Título “Dos Crimes
Contra a Ordem Econômica”, na reforma da parte especial do Código Penal,
faz brilhante reflexão asseverando que, historicamente, os Códigos Penais
ajustavam-se aos homens. A imagem do homem a que correspondiam tais
códigos era aquela do liberalismo burguês, cuja inserção social fundamental era
a propriedade. Por esse motivo, tutelava-se a vida, a liberdade e a propriedade.
Rodrigo Sánches Rios (2000, p. 432), ao analisar a Constituição de
1934, ressalta que:

“o sistema penal sempre tutelou bens de conteúdo econômico, restrito


à esfera individual – propriedade e patrimônio –, e a tipificação clássica
conseguia englobar normativamente tais situações. Assim, as condutas
lesivas ou que causassem perigo a estes bens receberam imediata e severa
resposta do poder punitivo estatal.”

Atualmente, nos Estados Democráticos de Direito, a concepção do


homem para o fim da tutela penal é sensivelmente diferente. Nesse tipo de
Estado, a erradicação das desigualdades que antes impulsionavam a sociedade
passam a ser as suas normas programáticas.
Dessa necessidade proporcionada pelo Estado Democrático de Direito
de enxergar o homem social, privilegiando o interesse coletivo, o direito penal
traz como condutas a serem reprimidas não só aquelas ligadas às ofensas ao
patrimônio considerado na sua individualidade. Diferentemente disso, as
ofensas ao coletivo também passam a ser tuteladas penalmente. É exatamente
desse viés que surge a ordem econômica como bem jurídico penal.
Nesse sentido, Rodrigo Sánches (2000, p. 432), ao referenciar Bajo
Fernandez, explica que a intervenção do Estado na economia, dessa vez como
Estado Dirigente, viu-se na necessidade de criminalizar condutas que antes
eram inimagináveis.

“A Constituição moderna nasce com dois evidentes limites: de um lado,


a impossibilidade de renunciar a aqueles interesses gerais que exigem a
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
90

intervenção estatal (pleno emprego, política fiscal, estabilidade monetária,


recursos internacionais, proteção do meio ambiente, etc.) e que, portanto,
impedem retornar a um liberalismo puro. De outro lado, a impossibilidade
de admitir um sistema econômico de planificação total, centralizada e im-
perativa, que impedisse qualquer iniciativa empresarial autônoma. Nesse
amplo contexto constitucional tem de atuar o direito penal econômico.”

A tutela penal da Ordem Econômica surge, portanto, a partir da ne-


cessidade de desenvolvimento do Direito Penal para continuar atingindo o
objetivo de proteger o indivíduo contra os atos lesivos de outros indivíduos
e de abusos perpetrados pelo Estado, embora neste mesmo ponto resida a
crítica à subsidiariedade do Direito Penal.

4 Considerações Finais
O tratamento da Ordem Econômica foi dado de diferentes formas e
intensidades nas diversas constituições que já orientaram o Brasil. Realidades
sociais e econômicas estiveram como cenário nas diversas mudanças. A erradi-
cação das desigualdades que antes estratificavam os homens e impulsionavam
a sociedade, hoje é diretriz constitucional.
Fruto dessa mudança de concepção, especificamente na Constituição
de 1988, o Estado abandonou uma posição de obrigações negativas para atuar
positivamente na garantia do bem estar socioeconômico. Como resposta, e a
fim de tutelar direitos coletivos, o Estado passou a adotar medidas que extra-
polam o direito penal clássico.
Foi devido a essa necessidade de enxergar o homem social, privilegian-
do-se o interesse coletivo, com relações cada vez mais impessoais, que o Estado
deixou uma posição caracterizada por obrigações negativas para assumir uma
atuação positiva, julgando necessário, para tanto, a utilização do direito penal
para reprimir não só as ofensas ao patrimônio individualmente considerado,
mas aquelas afetas à coletividade.
O perigo que se avizinha é a inevitável abertura a um intervencionismo
penal que desconsidere as precauções necessárias à utilização da ferramenta
punitiva. Não se defende neste artigo o abolicionismo penal ou um modelo
ultraliberal de intervenção tal como sustentado por autores da Escola de
Frankfurt, os quais sustentam a utilização do que chamam de Direito Penal
básico, destinado a resolver apenas os conflitos gerados das relações individuais.
Contudo, não se pode perder de vista o risco ocasionado pela tutela de
bens de perigo abstrato, antecipando-se a proteção para momento anterior à
lesão, o que resulta, em alguns casos, em exercícios de futurologia.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 91

O conceito e objeto do direito penal econômico devem estar entre


duas balizas: não demasiadamente restritivos, sob pena de se confundir com
o direito penal convencional; não amplos de mais, a fim de que crimes como
furto não sejam considerados como praticados contra a ordem econômica.

TITLE: Economic criminal law: a critical reflection on the its concept and object.

ABSTRACT: Through remission of the references of the Economic Order in the Brazilian constitutions,
the article demonstrates how the theme was treated in the course of history. Next, the concept and object
of Economic Criminal Law is presented, with the background of the concerns generated by the use of
criminal law deprived of its founding principles, as opposed to a reactive right. It is a bibliographical and
legal research for the exposition of constitutional references, as well as the concept and object of economic
criminal law, using explanatory analysis.

KEYWORDS: Brazilian Constitutions. Criminal Law. Economic Criminal Law. Minimum Criminal Law.

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Recebido em: 22.02.2019


Aprovado em: 06.03.2019
Doutrina

Descriminalização da Interrupção Gestacional

Edmilson Souza da Silva


Advogado; Especialista em Direito de Família e Sucessões; Pós-
Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade
Legale.

Rodrigo Julio Capobianco


Advogado Criminalista Militante Especializado em Tribunal
do Júri e Direito Penal Econômico; Formado pela Faculdade de
Direito de Guarulhos (1994); Doutorando em Direito Penal
na Universidade de Buenos Aires; Mestrando em Criminologia
na Fernando Pessoa – Porto/Portugal; Pós-Graduado em
Direitos Fundamentais pela Universidade de Coimbra e em
Moderna Criminologia pelo IBCCrim/Apamagis.

RESUMO: Seria possível tocar num assunto tão delicado quanto a descrimina-
lização do aborto? E que consequências reais traria para a sociedade? Quem de
fato será atingido se tal descriminalização acontecer? Nosso artigo traz, de uma
maneira muito delicada, um assunto que até então está sendo tratado de várias
maneiras pela sociedade. No entanto, não estão sendo colhidas corretamente
as informações sobre a questão da interrupção gestacional, principalmente com
as mais interessadas no assunto, ou seja, as mulheres. Partindo dos princípios
constitucionais e religiosos verificamos uma grande divergência, por isso, não
se pode confundir e deixar que tenhamos por base a frieza da lei ou os dogmas
religiosos. O assunto merece maior envolvimento e cumplicidade com a decisão,
seja ela qual for. Nosso objetivo é trazer apenas um pouco mais de luz sobre esse
assunto, para que possamos refletir melhor e aceitarmos as decisões que serão
tomadas por nossos legisladores.

PALAVRAS-CHAVE: Descriminalização. Princípios. Gestacional. Aborto.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O Estado Gestacional. 3 Interrupção Gestacional


Segundo a Legislação. 4 A Descriminalização e a Constituição. 5 A Descrimina-
lização e o Estado Laico. 6 Interrupção da Gestação no Brasil. 7 Considerações
Finais. 8 Referências Bibliográficas.

1 Introdução
Sempre gera uma grande discussão falar sobre a legalização do aborto.
Assim, de forma mais sutil, resolvemos abordar o assunto requerendo uma
atenção muito delicada e de maneira respeitosa. Sendo assim, procuramos
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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trazer um ponto de vista diferenciado, inclusive achamos melhor substituir


a palavra aborto por interrupção gestacional, como será tratado de agora em
diante, isso porque entendemos que a palavra “aborto” é muito agressiva e
pode desviar a atenção que o tema exige. Entendemos que de nada adianta os
homens discutirem sobre um assunto em que eles não sentirão, seja na pele
ou na alma, diretamente qualquer efeito, por isso, o assunto que tratamos
aqui é muito importante, pois se faz necessário entender que não tratamos
apenas e simplesmente de ser ou não a favor da interrupção gestacional, mas
sim entender que essas interrupções acontecem e em maior quantidade do
que a sociedade possa imaginar.
Quando se fala em legalizar o aborto, o som da mensagem é muito ruim,
mas na mesma esteira, quando falamos em descriminalizar tal ato, o som é
mais audível, fazendo com que a discussão ganhe mais atenção e seriedade.
Importante lembrar que não temos qualquer pretensão de esgotar o
assunto ou de impor qualquer posição, mas sim de mostrar a realidade que,
por estar no submundo, não é muito clara.
Um dos grandes problemas encontrados pelas mulheres que, por algum
motivo resolvem interromper a gestação, é a ausência do Estado, deixando-as
nas mãos de pessoas que não têm como preocupação central o bem-estar delas,
tudo isso porque a interrupção gestacional, mais conhecida como aborto, é
considerada crime.
É por demais importante que esse tema volte à pauta das discussões
sociais e políticas porque as consequências são suportadas diretamente pela
mulher e mais ninguém. Entendemos que é uma falta de respeito e até mesmo
de humanidade tratar uma pessoa que resolve interromper a gestação como
criminosa.
Tal assunto pode ser ignorado por conta de preceitos religiosos, mas
deve-se entender que não se podem misturar os assuntos, mesmo porque
vivemos num país laico e as posições religiosas divergem como, mesmo que
brevemente, demonstraremos.
Uma vez que se necessita do Estado, esse não pode virar as costas para
quem, uma vez resolvida a praticar o ato de interromper a gestação, irá procu-
rar o submundo, podendo sofrer danos irreparáveis, ou até mesmo a morte.
Nosso objetivo não é engessar o assunto ou formar opiniões, estamos
apresentando um problema real e que deve ser tratado com mais seriedade, e
fazer com que nosso Congresso observe a necessidade de se descriminalizar
o ato para que se possa amparar essa mulher e não deixá-la sofrer qualquer
tipo de dano ou, se sofrer, que esses sejam os menores possíveis.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 95

Nosso trabalho foi elaborado buscando apresentar uma ordem estrutural


menos complexa e mais lógica para que se possa pensar objetivamente sobre
o assunto, trazendo desde o início da gestação, passando pela nossa legislação,
e o porquê nossa lei está indo na contramão de um direito inerente à mulher.

2 O Estado Gestacional
A gravidez provoca uma série de alterações hormonais, a partir do mo-
mento em que o óvulo chega ao útero. Nesse momento, a mulher já está se
preparando para a gestação. Com relação a esses efeitos, nenhum homem, por
mais que entenda de gravidez, como, por exemplo, um médico obstetra, pode
dar qualquer opinião sobre o que seja, e por motivos óbvios. Pode-se imaginar
da seguinte forma: a gravidez provoca uma alteração hormonal imediata na
mulher, em que já se observa que o ambiente hormonal não é mais o mesmo.
A função biológica dessa mudança no ambiente hormonal é para
prepará-la para suportar todo o período gestacional.
Nós, como homens, imaginamos que não seja fácil crescer algo den-
tro da barriga da gestante, cujas consequências imediatas são de empurrar o
coração para cima, deslocando o pulmão, havendo uma grande retenção de
líquido..., enfim, uma série de alterações que não é fácil.
Nós perguntamos então: como a mulher suporta até chegarem as
dores do parto? Imaginamos que nenhum homem aguentaria isso, mas de
jeito nenhum.
Elas suportam porque o cérebro está inundado de hormônios, sendo
isso que as prepara para aquele momento de estresse durante o trabalho de
parto. Mas e quando a mulher toma a decisão de interrompê-la?
Se a mulher grávida resolve interromper a gravidez é porque ela, com
certeza, tem um motivo muito, mas muito forte pra isso, e é esse motivo que
vai fazer com que ela interrompa a gravidez, de um jeito ou de outro.
Então, se alguém diz que é contra a interrupção da gestação, tudo bem,
podemos entender, mas isso é apenas e tão somente por questões dogmáticas,
puramente religiosas.
Se assumirmos a posição de sermos contra a interrupção gestacional,
acreditamos que as mulheres que buscam as formas ilegais de interrupção
são mais contra do que nós, isso porque são elas que podem sofrer com as
consequências.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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O singular tema tem ganhado uma atenção muito grande nos meses
que antecederam às últimas eleições, isso porque está ligado a uma série de
princípios, inclusive religiosos.
Para tratar da interrupção gestacional de maneira mais objetiva, preci-
samos conhecer o instituto do aborto em nosso sistema legiferativo.
Vale trazer que o crime por interrupção da gestação, legalmente conhecida
como crime de aborto, apareceu no Codigo Criminal do Imperio do Brazil de
18301, em seu capítulo “Dos Crimes Contra a Segurança da Pessoa e da Vida”,
mais precisamente na seção de infanticídio, nos arts. 199 e 200 que traziam:

“Art. 199. Ocasionar aborto por qualquer meio empregado interior, ou


exteriormente com consentimento da mulher pejada.
Penas – de prisão com trabalho por um a cinco anos.
Se este crime for cometido sem consentimento da mulher pejada.
Penas – dobradas.
Art. 200. Fornecer com conhecimento de causa drogas, ou quaisquer meios
para produzir o aborto, ainda que este se não verifique.
Penas – de prisão com trabalho por dois a seis anos.
Se este crime for cometido por medico, boticario, cirurgião, ou praticante
de tais artes.
Penas – dobradas.”

Há que se destacar que, muito diferente de como acontece hoje, no


Código supracitado, o autoaborto não tinha previsão legal, assim sendo, so-
mente eram punidos os terceiros que viessem a provocá-lo, mesmo que com
total consentimento da gestante.

3 Interrupção Gestacional Segundo a Legislação


Dentro da legislação brasileira existem diferentes tipos de interrupção
gestacional. Essas estão previstas no Código Penal e recebem o nome de aborto.
Podemos destacar as interrupções entre puníveis e não puníveis.
As interrupções não puníveis acontecem por acidente, na maioria das
vezes, quando não existe vontade da gestante em interromper a gestação,
acontece por uma torpeza do destino, inexistindo culpabilidade.
Dentre as não puníveis destacamos:

1 O Codigo Criminal do Imperio do Brazil é a Lei de 16 de dezembro de 1830 onde se escrevia Brazil com a letra “z”.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 97

– interrupção gestacional, natural ou espontânea: é proveniente de causas


naturais ou patológicas, em decorrência de um processo fisiológico e espon-
tâneo do próprio organismo feminino;
– interrupção gestacional acidental: é proveniente de traumas externos,
inesperados que geram o dano e assim a sua interrupção;
– interrupção gestacional culposa: é a que resulta de uma conduta impru-
dente, negligente ou imperita, seja da própria gestante ou de terceiros;
– interrupção gestacional terapêutica: com previsão no art. 128, inciso I, do
Código Penal brasileiro, este é um procedimento adotado quando inexiste
outro meio para salvar a gestante. Para as mães isso é muito traumático, pois
se elas fossem consultadas optariam pela vida do filho. Mas entende-se que
ela pode ter outro filho e dar continuidade ao sonho da maternidade;
– interrupção gestacional sentimental e ou humanitária: com previsão no art.
128, inciso II, do mesmo dispositivo penal, esse é o tipo de interrupção da
gestação que é autorizada nos casos de violência sexual, o popular estupro.
Agora, dentre as interrupções puníveis, também chamadas de aborto
típico, essas têm antijuridicidade e culpabilidade e serão punidos todos os que
interromperem dolosamente a gestação, ou seja, quando a gestante ou um
terceiro, querendo interromper a gestação, a realiza. Tal fato tem previsão nos
arts. 124 a 126 do Código Penal brasileiro:
– interrupção gestacional eugênica/eugenésia: é realizada quando o feto
apresenta graves e irreversíveis defeitos genéticos, como, por exemplo, feto
anencefálico; no entanto, pode-se recorrer ao Judiciário para que essa seja ou
não interrompida;
– interrupção gestacional econômico-social: realizada para que não se agrave
a situação de miserabilidade da gestante, isso porque ela não tem condições
socioeconômicas para criar a prole.
– interrupção gestacional honoris causa: realizada para esconder a desonra
própria, como, por exemplo, ficar grávida do amante ou, de acordo com a
realidade de hoje, de quem nem se sabe quem é o pai.
Uma vez entendidos os tipos de interrupção gestacional, verifica-se que
o assunto vem ganhando uma atenção maior na mídia e sendo comentado
com mais ênfase entre as pessoas e vários grupos da sociedade, isso por se
tratar da vida ou do direito a ela.
Para que entendamos melhor esse tema no mundo jurídico, vejamos
pela ótica constitucional onde pretendemos panoramicamente, continuar
dissertando.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
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4 A Descriminalização e a Constituição
Os movimentos feministas no Brasil sempre lutaram pelo reconheci-
mento dos seus direitos, direito esses que vêm evoluindo perceptivelmente
nas várias Constituições que já tivemos.
Vale lembrar a Carta Constitucional, datada de 1946, trouxe muitos
direitos sociais, que já tinham sido amplamente reivindicados na década de
1930, como, por exemplo, a desigualdade dos salários, direito de descanso
da gestante logo após o nascimento do filho sem que houvesse desconto
no salário, entre outros, que deveras só se tornou realidade na Constituição
Federal de 1988.
A criminalização da interrupção gestacional se deu com o Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, ou seja, muito antes da nossa Carta
Republicana, que é de 1988. Isso significa que a sociedade da década de 1940
tinha outra forma de ver a vida, uma cultura baseada fortemente nos preceitos
religiosos.
De fato, a criminalização da interrupção gestacional coibiria as mulheres
de tal comportamento. Talvez nem fosse o mais preocupante na época; porém,
nos dias de hoje, o que se verifica é que essa proibição legal faz com que as
mulheres procurem interromper a gestação de forma clandestina, correndo
risco de morte ou de ferimentos graves, sem contar o risco de ficar estéreis,
dessa forma, ferindo princípios constitucionais como igualdade, dignidade da
pessoa humana, da autonomia e da reprodutividade.
A sociedade tem que perceber que essa é a hora de reanalisar o Código
Penal, não só com relação a esse assunto, mas em outros também. Não há
como se negar tal necessidade, mesmo porque a realidade social das mulheres
vem se modificando e se solidificando mais nas últimas décadas.
São exemplos das transformações sociais sobre as mulheres no mundo
contemporâneo: o reconhecimento da igualdade entre os sexos, a superação
da ótica que limitava a mulher às suas características reprodutivas e a mudança
do cenário em relação à sexualidade feminina.
A Carta Republicana de 1988 não faz expressamente qualquer referência
à interrupção voluntária da gestação, seja para autorizar ou proibir.
Assim, é possível concluir que a Constituição Federal serve como pa-
râmetro para que outras normas legislativas sejam revistas e amoldadas aos
princípios constitucionais, de forma a garanti-los.
O Estado brasileiro é basicamente cristão e majoritariamente católico.
Todos sabemos que a interrupção gestacional é condenada em qualquer cir-
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 99

cunstância, até mesmo nas que são admitidas pelo nosso arcaico ordenamento
jurídico, como a gestação proveniente de violências como o estupro.
A Constituição Republicana é totalmente neutra a posições religiosas.
Observa-se melhor isso analisando o art. 5º, em seu inciso VI, que traz a
igualdade de todos perante a lei, assegurando, inclusive, a inviolabilidade da
liberdade de consciência e de crença, certificado assim o livre exercício dos
cultos religiosos e protegendo os locais onde os cultos e ou liturgias sejam
exercidos.
Devemos, assim, analisar a relação entre a proibição da interrupção
gestacional, por demais influenciada pelas religiões, e a igualdade garantida
constitucionalmente, pois o que abordamos não é a liberação do aborto, mas a
descriminalização, isso porque, segundo nossa Carta Magna2, as mulheres têm
o direito legítimo de interromper o estado gestacional quando esse for indese-
jado, e não há que se admitir que caberia ao Estado esse tipo de preocupação.
Num outro contraponto, verifica-se que uma vez que a gestação não
foi planejada e a mulher resolve interrompê-la, não é o Estado, por força de
lei, quem vai impedi-la, ou seja, ela vai interromper assim mesmo.

5 A Descriminalização e o Estado Laico


Desde os primórdios do cristianismo se prega a ilicitude moral da
interrupção gestacional, afirmando ser pecado por ferir preceitos religiosos,
fazendo com que os cristãos abominassem qualquer tipo de pensamento
nesse sentido. Podemos verificar isso em algumas passagens bíblicas como,
por exemplo, Gn 9,6; Sl 139 [138],13-14.16; Ex 20,13 entre outros.
A Didaché3, texto do século I, atribuído aos Apóstolos, considerado o
primeiro catecismo da religião cristã, ensinava: “Não matarás o fruto do ventre
por aborto, e não farás perecer a criança já nascida” (Didaché 2,2).
De acordo com o judaísmo, segundo a tradição de Maimônides, século
XII, se o embrião colocar em risco a vida, saúde mental ou até mesmo física da
mulher, poderia esta interromper a gestação, como uma forma de autodefesa,
isso porque o embrião seria considerado um agressor.
Contudo, a decisão só poderá ser tomada ao lado de um rabino (líder
espiritual).

2 Carta Magna é um dos nomes que se dá juridicamente a Constituição Federal de 1988, assim como Carta Republi-
cana, Constituição Republicana, Carta Maior...
3 Instrução dos Doze Apóstolos (do grego Didache kyriou dia ton dodeka apostolon ethesin) ou Doutrina dos Doze Apóstolos
é um escrito do século I que trata do catecismo cristão.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
100

Na esteira budista, segundo as leis do Karma4, o matrimônio não é


apenas um ritual religioso, mas sim a segunda maior e melhor instituição
social, ficando atrás apenas do sacerdócio, assim, a “infidelidade”, tanto o ato
sexual com um monge, ou com uma mulher sobre a proteção dos pais são
considerados como atos de “má-conduta”. E nesse entendimento, mesmo não
havendo nenhuma citação com relação à interrupção da gestação nos escritos
tradicionais, essa pode ser dada como algo muito negativo.
Enquanto que no islamismo se permite evitar a concepção por razões que
eles considerem válidas, não se permitindo cometer qualquer violência contra
a gestante, bem como com a gravidez, uma vez que essa estiver consumada.
Os operadores do direito muçulmano, seguindo as leis da Sharia5, são
unânimes em concordar que logo após o feto estar completamente formado
e receber uma alma, é ilícito interromper essa gestação.
Não diferente de nossa legislação, é também considerado um crime,
cuja consumação é proibida aos muçulmanos, isso representa uma ofensa
contra um ser humano vivo e completo.
Dogmaticamente existem muitas divergências sobre quando a vida
começa.
Vejam que um cristão, seja católico ou evangélico, pode pensar que tudo
acontece com a fecundação, mas há outros que não pensam assim, como, por
exemplo, os judeus.
Para os judeus, orientados pela leitura da Torá6, a vida começa quando
a criança nasce, portanto, percebe-se que é incompatível com o nosso Estado
laico, afirmar que eles estão errados e assumir uma postura dogmática de que
já havia vida dentro do útero, pois eles não as consideram, de fato, eles acham
que a vida só começa quando a criança nasce.
Então, diante de um tema tão importante, não se pode ser induzido ou
orientado por apenas uma coisa!
O que de verdade se deve ser contra, é permitir que alguns venham a
impor para os outros critérios, que são exclusivamente deles, como se fossem
uma verdade absoluta e incontestável. Todos nós deveríamos saber que inexiste
verdade absoluta e que é inadmissível impor aos outros princípios seus que
se considerem emanados da vontade divina.

4 É um conjunto composto por 12 leis que são seguidas pelos budistas.


5 As leis da Sharia são organizadas em livros jurídicos escritos de acordo com as quatro escolas de Direito, que tomam
seus nomes de juristas islâmicos famosos dos séculos VIII e IX: Máliki, Hambali, Hanafi e Shafi.
6 Torá é o conjunto composto pelos primeiros cincos livros da Bíblia e é a base da religião judaica.
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 101

Infelizmente, encontramos pessoas que se dizem intérpretes da vontade


divina e que fazem questão de impor essa tal verdade para a sociedade inteira.
Não podemos considerar isso correto, porque o que acabamos de demonstrar
é que existem várias crenças e que em alguns pontos elas divergem.
Nota-se que esse tipo de imposição dogmática pode levar as meninas
a interromperem a gestação no submundo, em condições inseguras, onde
podem vir a sofrer danos irreparáveis ou, quem sabe, até morrer.
Infelizmente, é de conhecimento da maioria das pessoas que são as
mulheres mais pobres que vão, quando decidirem, fazer abortos em condições
inseguras, buscando pessoas inescrupulosas que estão apenas preocupadas
com a pecúnia, sem a menor preocupação de alguma coisa dar errado e, se
der, como farão para buscar uma reparação?
Por outro lado, as meninas com melhores condições financeiras têm
como buscar ajuda de profissionais qualificados, mesmo que na clandestini-
dade, gastam um valor grande para fazer com médicos, diminuindo e muito
os riscos.
Uma vez tomada a decisão por interromper a gestação ela irá buscar no
submundo uma resposta para seus anseios.
Porém, há de se questionar:
No submundo quem ela vai encontrar?
Não se faz a mínima ideia!
E por que ela buscou essa ilegal alternativa?
Fácil responder.
Porque o Estado irá tratá-la como criminosa, não como uma mulher
que precisa de apoio, seja para continuar a interrupção ou até mesmo que lhe
sejam apresentadas alternativas para desistir. Uma coisa é certa: esse tipo de
apoio ela não encontrará no submundo, podendo ainda morrer, ficar debilitada
ou ficar estéril para sempre!
O comportamento de alguns membros da sociedade e, mais precisa-
mente, de nossos parlamentares, hoje na maioria homens, demonstra cada
vez mais um desconhecimento geral sobre o tema abordado, isso porque os
efeitos serão produzidos na mulher que optar em interromper a gestação, não
que eles não liguem para o que venha a acontecer com elas.
Entende-se então que descriminalizar esse comportamento dará à mu-
lher muito mais poder e, ao invés de se esconder procurando pelo proibido,
a partir da descriminalização, ela procurará os meios legais, seus profissionais
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
102

de saúde, que poderão inclusive dar todo o suporte, seja antes da interrup-
ção ou até mesmo depois, evitando, dessa forma, o número assustador de
mulheres que tiveram suas vidas ceifadas e/ou marcadas pela ausência do
Estado que previamente as condenou e as empurrou para o obscuro! Assim,
a descriminalização da interrupção gestacional não viola qualquer princípio
constitucional, muito pelo contrário, manter essa condição penal é que viola
os princípios da igualdade, da liberdade e da privacidade.

6 Interrupção da Gestação no Brasil


A interrupção da gestação no Brasil, apesar de ser ilegal, de fato é livre,
desde que a gestante tenha condições financeiras de arcar com os perigosos
procedimentos.
Pode-se afirmar, então, que nós vivemos em duas realidades: a da lei
que proíbe e criminaliza a mulher e a realidade de fato, em que a mulher faz
o que deseja.
O que se tem que fazer é agir de forma a impedir a gravidez, oferecendo,
principalmente, métodos anticoncepcionais dirigidos diretamente às meninas,
assim que começarem a atividade sexual, que como se percebe é muito preco-
ce, e ainda orientando os meninos, fazendo com que eles percebam que são
responsáveis também e que a responsabilidade por uma gravidez indesejada
não é exclusiva da mulher, é dele também.
Existe no Congresso a discussão sobre a interrupção gestacional, mas
será que o Congresso Nacional tem mesmo legitimidade para discutir isso,
no que tange ao interesse que é exclusivamente feminino?
De fato, o que se verifica é que o Congresso Nacional é basicamente
formado por homens, e a gravidez é um processo feminino. O nosso papel
como homens é irrelevante, vejam só: um homem e uma mulher resolvem
fazer sexo casualmente. Essa mulher engravida e vai ter um filho. Será que
o homem, uma vez tomado conhecimento, vai dizer que esse filho é dele?
Mesmo que diga não, na verdade é, sim.
Biologicamente é dele, isso porque tem metade dos seus genes. Ele
nunca mais viu essa mulher, que nunca mais o viu também, a mulher nem sabe
quem é o homem; agora, ela resolve tocar essa gestação até o fim, igualzinho
à mulher que é casada, seja no civil ou no religioso, tudo certinho.
Veja porque a gestação é um processo exclusivamente feminino, onde
o homem apenas contribui com a fertilização, ele colabora com uma célula. A
mulher pega essa célula e trata do seu desenvolvimento intrauterino. Depois
Doutrina – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 103

de nove meses nasce uma criança sadia, com boca, nariz, dois olhos..., por
isso, percebam, todo o processo se deu no interior da mulher.
O homem se considerará realmente pai dessa criança?
Até vai, depois que a criança nascer, e que seja submetida a exames de
DNA. Daí, ele que teve sua paternidade comprovada, poderá até ser um pai
maravilhoso.
Então vejamos, fica com esses homens (hoje grande maioria no Con-
gresso Nacional), que não têm a mínima ideia do que é esse processo, para
ficarem impondo regras, e mais, entendemos que sem a participação efetiva
das mulheres a questão não será realmente resolvida, seria isso uma forma
de subjugá-las.

7 Considerações Finais
A importância de fazer com que a mulher evite essa procura e fazer
com que se busque o Estado, é que uma vez detectado o fator que a levou a
tomar essa decisão abrupta, ela saiba que outras providências poderiam ter
sido tomadas.
Na mesma esteira, a manutenção da lei penal afasta das mulheres qual-
quer tipo de ação do Estado, onde esse pode reunir uma série de profissionais
como médicos, psicólogos, assistentes sociais e, se for o caso, juristas, para
ajudar a gestante e dar todo o apoio, nem que seja verificando o que a levou
a tomar essa radical decisão.
Entendemos, ainda, que como o procedimento não é oferecido pelo
SUS e essa prática é considerada criminosa, as mulheres acabam recorrendo
a clínicas clandestinas, e quando não morrem ficam hospitalizadas.
Com a descriminalização da interrupção gestacional, essas mulheres
decididas e cada uma com seu motivo, seriam acolhidas pelo Estado, que
através desses profissionais, trabalhando em equipe multidisciplinar, podem
oferecer melhores alternativas para a gestante, e quem sabe mostrar outras
alternativas.

TITLE: Decriminalization of the termination of pregnancy.

ABSTRACT: Is it possible to touch on a subject as delicate as the decriminalization of abortion? And


what real consequences would it bring to society? Who will actually be affected if such decriminalization
happens? This article brings, in a very considerate way, a subject that so far has been treated in various
ways by society. However, information on the issue of termination of pregnancy, especially with those
most interested in the subject, that is, women, is not being correctly collected. Based on constitutional
and religious principles, there is great divergence, there cannot be confusion and let it be based on the
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Doutrina
104

coldness of law or religious dogmas, as the subject deserves more involvement and complicity with the
decision, whatever it may be. The goal of this article is to bring a little more light to this subject so that
we can better reflect and accept the decisions that will be made by our lawmakers.

KEYWORDS: Decriminalization. Principles. Gestation. Abortion.

8 Referências Bibliográficas
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Recebido em: 03.01.2019


Aprovado em: 10.01.2019
Jurisprudência

Supremo Tribunal Federal


HABEAS CORPUS Nº 148.380 SÃO PAULO
RELATOR: MINISTRO MARCO AURÉLIO

Habeas Corpus. Recurso Ordinário. Substituição


Em jogo, na via direta, a liberdade de ir e vir do cidadão, cabível é o
habeas corpus, ainda que substitutivo do recurso ordinário constitucional.

Pena. Dosimetria
A dosimetria da pena envolve, de regra, o justo ou injusto, não cabendo
presumir ilegalidade.

Pena. Causa de Diminuição. Tráfico de Entorpecentes.


Inadequação
Ante a dedicação do réu a atividades criminosas, surge inadequada a
observância da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º,
da Lei nº 11.343/06.

Pena. Cumprimento. Regime


O regime de cumprimento é definido a partir do patamar alusivo à
condenação e das circunstâncias judiciais – art. 33, §§ 2º e 3º, do Có-
digo Penal.
(STF; HC 148.380; SP; 1ª T.; Rel. Min. Marco Aurélio; DJE 19/02/2019)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal em indeferir a ordem, nos
termos do voto do relator e por unanimidade, em sessão presidida pelo
Ministro Luiz Fux, na conformidade da ata do julgamento e das respectivas
notas taquigráficas.
Brasília, 5 de fevereiro de 2019.
Ministro Marco Aurélio – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
106

RELATÓRIO
O Senhor Ministro Marco Aurélio – O assessor Dr. Rafael Ferreira de
Souza assim revelou os contornos da impetração:
“Eis o que informado quando da análise do pedido de liminar:
‘(...)
1. O assessor Dr. Rafael Ferreira de Souza prestou as seguintes informações:
O Juízo da Quarta Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, no Processo
0005511-47.2015.4.03.6106, condenou o paciente a 5 anos e 7 meses de re-
clusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 468 dias-multa, ante a
prática dos delitos descritos nos arts. 33, cabeça (tráfico de entorpecentes),
combinado com o § 4º do citado dispositivo e com o 40, incisos �������������
I e�����������
���������
V �������
(trans-
nacionalidade e interestadualidade), da Lei nº 11.343/06, e 334, cabeça (des-
caminho), do Código Penal.
No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, foram interpostas apelações pela
defesa e pelo Ministério Público. A Décima Primeira Turma proveu-as para
aumentar a pena-base alusiva ao delito de tráfico, em razão da quantidade de
entorpecente, fixando-a em 8 anos e 4 meses de reclusão; afastar a causa de
diminuição do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, presente a dedicação a ativida-
des criminosas e a impossibilidade de reconhecer-se participação de menor
importância; e desconsiderar a causa de aumento alusiva à transposição de
fronteiras estaduais. Estabeleceu a sanção em 10 anos, 8 meses e 20 dias de
reclusão, em regime fechado, mais o pagamento de 971 dias-multa.
Chegou-se ao Superior Tribunal de Justiça com o Habeas Corpus 398.702/
SP, o qual teve a ordem indeferida pela Sexta Turma.
O impetrante sustenta a inidoneidade das premissas lançadas para aumentar a
pena-base e afastar a causa de diminuição. Evoca jurisprudência. Diz competir
aos Tribunais Superiores examinar a legalidade e constitucionalidade dos crité-
rios empregados na dosimetria da sanção penal. Destaca as condições pessoais
favoráveis do paciente – primariedade, bons antecedentes e trabalho lícito.
(...)’
O impetrante requereu, no campo precário e efêmero, o reconhecimento
da incidência do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, a fixação da pena-base no
mínimo legal e o implemento de regime de cumprimento mais brando. No
mérito, busca a confirmação das providências.
Vossa Excelência, em 4 de outubro de 2017, indeferiu o pedido de medida
acauteladora.
A Procuradoria-Geral da República opina pela inadmissão da impetração,
dizendo-a substitutiva de recurso ordinário. Afirma ausente ilegalidade a ser
reparada.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 107

No Superior Tribunal de Justiça, o Agravo em Recurso Especial 1.195.491/SP


não foi conhecido pela Relatora. O trânsito em julgado da decisão ocorreu em
12 de dezembro de 2017, seguindo-se a baixa definitiva do processo à origem.”
Lancei visto no processo em 8 de dezembro de 2018, liberando-o para
ser examinado na Turma a partir de 18 de dezembro seguinte, isso objetivando
a ciência do impetrante.
É o relatório.

VOTO
O Senhor Ministro Marco Aurélio (Relator) – Em jogo a liberdade
de ir e vir, não se tem como deixar de adentrar a matéria versada no habeas
corpus, pouco importando que ganhe contornos de substitutivo de recurso
ordinário constitucional. Rejeito a preliminar suscitada pela Procuradoria-
Geral da República.
Reitero o que assentado, em 4 de outubro de 2017, quando do não
implemento do pedido de medida de urgência:
“(...)
2. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao definir a pena-base para o
crime de tráfico de drogas, presente o mínimo de 5 e o máximo de 15 anos,
veio a estabelecê-la em 8 anos e 4 meses. Considerou a quantidade da en-
torpecente – 340,55 quilos de maconha –, reportando-se ao art. 42 da Lei nº
11.343/06. A dosimetria resolve-se, de regra, no campo do justo ou injusto.
Difícil é o pronunciamento judicial que, sob tal ângulo, encerre ilegalidade,
e esta não surge.
No tocante à causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, do mesmo
diploma, o Regional, ao afastar a incidência, agindo dentro do figurino legal,
observou a dedicação a atividades criminosas, levando em conta os contornos
do delito e a constatação de que o paciente fazia do descaminho meio de vida.
Aludiu ao fato de haver aruado como ‘batedor’ de corréu, dizendo ser condu-
ta que não pode ser tida como participação de menor importância.
Quanto ao regime de cumprimento da sanção, atentem para o disposto no
art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal. A pena-base, presente a quantidade de
substância encontrada, foi fixada acima do mínimo versado para o tipo, e o
total da sanção imposta supera a baliza de 8 anos, sendo o fechado o único
regime adequado.
(...)”
Indefiro a ordem.
É como voto.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
108

EXTRATO DE ATA
Habeas Corpus 148.380
Proced.: São Paulo
Relator: Min. Marco Aurélio
Pacte.: José Carlos Melo da Silva
Impte.: José Luís Siqueira (132119/SP)
Coator: Superior Tribunal de Justiça
Decisão: A Turma, por unanimidade, denegou a ordem, nos termos
do voto do Relator. Presidência do Ministro Luiz Fux. Primeira Turma,
05.02.2019.
Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. Presentes à Sessão os Senho-
res Ministros Marco Aurélio, Rosa Weber, Luis Roberto Barroso e Alexandre
de Moraes.
Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio Marques.
Cintia da Silva Gonçalves – Secretária da Turma
Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça


AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.394.738 ESPÍRITO SANTO
RELATORA: MINISTRA LAURITA VAZ

Crime do Art. 154-A do Código Penal. Invasão de


Dispositivo Informático. Representação. Inequívoco
Interesse de Instaurar a Ação Penal Demonstrado.
Tese de Absolvição. Óbice da Súmula nº 7 do Superior
Tribunal de Justiça. Agravo Regimental Desprovido
1. O Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que
a representação da vítima para a investigação ou deflagração da ação
penal não exige nenhum rigor formal, bastando a demonstração ine-
quívoca do interesse da vítima ou do representante legal em iniciar a
persecução criminal.
2. Na hipótese, como bem retratado no acórdão recorrido, além de
mencionar as supostas ameaças que estaria sofrendo, a vítima também
noticiou que o acusado “publicou fotos íntimas em redes sociais sem
sua permissão para denegrir sua imagem, fotos essas que estavam em
seu celular que o acusado furtou”, o que demonstra o inequívoco
interesse de representação também quanto ao delito do art. 154-A do
Código Penal.
3. No caso, o pleito recursal de absolvição implicaria, necessariamente,
o reexame de todo o conjunto fático-probatório, o que não se coaduna
com a via eleita, em face do óbice do Enunciado nº 7 da Súmula do
Superior Tribunal de Justiça.
4. Agravo regimental desprovido.
(STJ; AgRg-AREsp 1.394.738; Proc. 2018/0296072-6; ES; 6ª T.; Relª Minª
Laurita Vaz; DJE 22/02/2019)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sex-
ta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo
regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora. Os Srs. Ministros
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
110

Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio Sal-
danha Palheiro votaram com a Sra. Ministra-Relatora.
Brasília (DF), 5 de fevereiro de 2019 (Data do Julgamento).
Ministra Laurita Vaz – Relatora

RELATÓRIO
A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz:
Trata-se de agravo regimental interposto por Gabriel Emery Santana
contra a decisão de fls. 305-309, em que conheci do agravo para conhecer
parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento,
nos termos da seguinte ementa (fl. 305):
“AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DO ART. 154-A DO
CÓDIGO PENAL. INVASÃO DE DISPOSITIVO INFORMÁTICO.
REPRESENTAÇÃO. INEQUÍVOCO INTERESSE DE INSTAURAR A
AÇÃO PENAL DEMONSTRADO. TESE DE ABSOLVIÇÃO. ÓBICE DA
SÚMULA Nº 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO
CONHECIDO PARA CONHECER PARCIALMENTE DO RECURSO
ESPECIAL E, NESSA EXTENSÃO, NEGAR-LHE PROVIMENTO.”
Nas razões recursais, a Defesa argumenta que, “estando diante de duas
condutas que necessitam de representação, se faz necessário sua perfeita e
exata manifestação, haja vista que a vítima pode não querer a instauração da
ação penal em relação a um dos fatos” (fl. 318).
Sustenta que “o agravante não pretende que esta corte faça o reexame
das provas (reincursão no acervo fático probatório), mas tão somente obter o
reconhecimento deste egrégio Tribunal do error in judicando” (fl. 318).
Também assevera que, “para a ocorrência da adequação típica do crime
do art. 154-A do CP, é necessário que haja a violação do dispositivo, de seus me-
canismos de segurança, o que não ocorreu no caso em tela, pois, na eventual
hipótese de ter o agravante acessado o aparelho celular da suposta vítima, o
mesmo possuía a senha deste” (fl. 318).
Requer o provimento do agravo regimental para que o recurso especial
possa ser analisado e provido, com a absolvição do agravante.
É o relatório.

VOTO
A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora):
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 111

Em que pesem os argumentos despendidos pelo ora agravante, entendo


que não lhe assiste razão.
Em relação à suposta falta de representação quanto ao crime do art.
154-A do Código Penal, a Corte local registrou o seguinte (fls. 198-199):
“Como bem observado pela douta Procuradoria de Justiça, a vítima Rafaella ex-
pressou de forma cristalina, em sede policial, o desejo de representar contra o réu.
Nesse sentido, são as declarações de fls. 10/11:
‘(...) que Gabriel apanhou o aparelho celular da declarante e bateu na parede,
danificando-o, e disse com deboche ‘você quer o celular, eu vou levar para
o conserto’, não mais devolvendo; que no ‘celular tinha fotos íntimas e ele
publicou em rede social; que deseja representar criminalmente’.
(...)
Deste modo, destituída de fundamento a tese de nulidade do processo em
razão da ausência de representação.”
Na decisão atacada, ressaltei que o Superior Tribunal de Justiça sedi-
mentou o entendimento de que a representação da vítima para a investigação
ou deflagração da ação penal não exige nenhum rigor formal, bastando a demons-
tração inequívoca do interesse da vítima ou do representante legal em iniciar a
persecução criminal.
Exemplificativamente, dentre tantos outros julgados:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. CONDUTA. INEQUÍVOCO DESE-
JO DE INSTAURAR AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE
REPRESENTAÇÃO POSTULATÓRIA. VENIRE CONTRA FACTUM
PROPRIUM. MATERIALIDADE DELITIVA. SÚMULA Nº 7 DO STJ.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. AGRAVO RE-
GIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2. Desnecessário rigor formal quando demonstrado inequívoco desejo pelo ofendido de ver
instaurado inquérito policial e competente ação penal privada contra seu ofensor.
(...)
5. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp 1.058.122/ES, Rel.
Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 16.10.2018, DJe 31.10.2018; sem
grifos no original)
“HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO.
INADMISSIBILIDADE. NULIDADES. SUPRESSÃO DE INSTÂN-
CIA. AMEAÇA. INCÊNDIO. CRIMES PRATICADOS POR POLICIAIS
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
112

MILITARES. REPRESENTAÇÃO. DISPENSA DE FORMALIDADES.


MANIFESTAÇÃO PÚBLICA E INEQUÍVOCA DA VÍTIMA. COMPE-
TÊNCIA.
(...)
2. A simples manifestação verbal e inequívoca da vítima dirigida às autoridades com-
petentes, de forma pública, ainda que sem formalização, ‘exigindo providências para
apuração do fato e sua autoria’, conforme consta do acórdão impugnado, é suficiente para
a deflagração da ação penal pública condicionada à representação.
(...)
Habeas corpus não conhecido.” (HC 331.087/RS, Rel. Min. Joel Ilan Pacior-
nik, Quinta Turma, j. 19.10.2017, DJe 06.11.2017; sem grifos no original)
Na hipótese, como bem retratado no acórdão recorrido, além de men-
cionar as supostas ameaças que estaria sofrendo, a vítima também noticiou
que o acusado “publicou fotos íntimas em redes sociais sem sua permissão
para denegrir sua imagem, fotos essas que estavam em seu celular que o acu-
sado furtou” (fl. 9), o que demonstra o inequívoco interesse de representação
também quanto ao delito do art. 154-A do Código Penal.
Dessa forma, mais uma vez, não verifico ofensa ao art. 154-B do Có-
digo Penal.
De outra parte, a Corte de origem entendeu que há provas suficientes
para a condenação do agravante (fl. 199):
“Nesse sentido, além da palavra da vítima acima transcrita, a qual fora cor-
roborada em juízo, as demais provas apontam que o réu Gabriel se apossou
do celular pertencente à Rafaella, divulgando por meio de redes sociais fotos
íntimas da vítima.
Não se pode olvidar que, em sede judicial, a também vítima André, atual
companheiro de Rafaella, esclareceu que Gabriel havia se apoderado do apa-
relho telefônico e divulgado as aludidas fotos íntimas.”
Reafirmo o entendimento de que, para esta Corte Superior afastar tal
conclusão, teria, necessariamente, que reexaminar fatos e provas, o que é
vedado pela Súmula nº 7/STJ:
“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.”
Nesse sentido:
“PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRA-
VO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.
ABSOLVIÇÃO. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7 DO STJ. REGIME INICIAL SE-
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 113

MIABERTO. IMEDIATAMENTE MAIS GRAVOSO CONSIDERAN-


DO A PENA DE 3 ANOS DE RECLUSÃO. GRANDE QUANTIDADE
DE DROGA APREENDIDA. INDEFERIMENTO DA PERMUTA DA
PENA. MEDIDA NÃO SOCIALMENTE RECOMENDÁVEL. AGRAVO
NÃO PROVIDO
1. Para alterar a conclusão a que chegaram as instâncias ordinárias e decidir pela absolvi-
ção do recorrente demandaria, necessariamente, revolvimento do acervo fático-probatório
delineado nos autos, procedimento que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ, que dispõe:
‘a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’.
(...)
5. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp 1.077.564/SP, Rel. Min.
Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 18.10.2018, DJe 24.10.2018; sem grifos no
original)
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO. DECISÃO MO-
NOCRÁTICA. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. OFENSA. INE-
XISTÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO.
PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDA-
DE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS NS. 7/STJ E 279/STF. ALEGADA
VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. PREQUESTIONAMENTO. AU-
SÊNCIA.
(...)
3. O Tribunal de origem, analisando os elementos probatórios colhidos nos autos, sob o
crivo do contraditório, concluiu pela comprovação da autoria e da materialidade do delito.
Desse modo, a mudança da conclusão alcançada no acórdão impugnado exigiria o ree-
xame das provas, o que é vedado nesta instância extraordinária, uma vez que o Tribunal
a quo é soberano na análise do acervo fático-probatório dos autos (Súmula nº 7/STJ e
Súmula nº 279/STF).
4. A alegada violação ao art. 155 do Código de Processo Penal não foi discu-
tida pelo acórdão recorrido, inexistindo o requisito do prequestionamento.
Incidência das Súmulas ns. 282 e 356/STF.
5. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no AREsp 1.338.879/DF, Rel. Min.
Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, j. 09.10.2018, DJe 26.10.2018; sem
grifos no original)
Assim, na ausência de argumentos relevantes que infirmem as razões
consideradas no julgado ora agravado, entendo que deve ser mantida a decisão
recorrida.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É o voto.
Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça


AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS Nº 471.579 SÃO PAULO
RELATOR: MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA

Progressão de Regime Prisional. Indeferimento


pela Corte de Origem com Base, Tão Somente, na
Gravidade Abstrata do Delito e na Longa Pena a
Cumprir. Constrangimento Ilegal Configurado. Ordem
Concedida de Ofício. Decisão Mantida
1. Na espécie, a progressão do reeducando para o regime semiaberto
foi indeferida pelo Tribunal de origem com fundamento, tão somente,
na gravidade abstrata do delito pelo qual foi condenado o paciente e na
longa pena a cumprir.
2. Sobre a matéria, esta Corte Superior de Justiça pacificou enten-
dimento no sentido de que fatores relacionados ao crime praticado
são determinantes da pena aplicada, mas não justificam diferenciado
tratamento para a progressão de regime, de modo que a avaliação do
cumprimento do requisito subjetivo somente poderá fundar-se em
fatos ocorridos no curso da própria execução penal.
3. Decisão concessiva da ordem de ofício mantida, na esteira da juris-
prudência consolidada por este Tribunal.
4. Agravo regimental não provido.
(STJ; AgRg-HC 471.579; Proc. 2018/0254031-0; SP; 5ª T.; Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca; DJE 20/02/2019)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-
das, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros
Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer e Jorge Mussi votaram com
o Sr. Ministro-Relator.
Brasília (DF), 12 de fevereiro de 2019 (Data do Julgamento).
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca – Relator
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 115

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto pelo Ministério Público Federal
contra decisão que concedeu a ordem de ofício.
Narra a parte agravante, in verbis (e-STJ, fl. 91):
“Verifica-se da folha de antecedentes penais que o paciente cumpre pena total
de 16 anos, 4 meses e 13 dias, em regime fechado, pelo cometimento dos
crimes de tráfico de drogas, estelionato, furtos e roubos.
Para indeferir o pedido de progressão de regime, o juízo de primeiro grau
entendeu que:
‘A pretensão é improcedente.
Com efeito, o sentenciado não reúne méritos subjetivos para alcançar a pro-
gressão e possui longa pena por cumprir, conforme cálculo de liquidação de
penas.
Tratando-se de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, de-
monstram a necessidade de permanência maior no cárcere,visando absorver a
terapia penal e revelar seu merecimento à progressão para regime mais brando.
Sendo que diante da situação específica do sentenciado, apesar do atestado de
bom comportamento carcerário, não se pode dizer somente com base nele que
está preenchido o requisito subjetivo. Diante do exposto, por ora, indefiro a pro-
moção do sentenciado supra qualificado ao regime semiaberto.’
Veja-se que o art. 112 da Lei de Execução Penal (progressão de regime) de-
manda a aptidão do apenado para o convívio com a sociedade ou em regime
mais brando (requisito subjetivo), assim, em que pese o Paciente possua o
requisito objetivo, ainda não preencheu o requisito subjetivo previsto em Lei
para a progressão para o regime intermediário.”
Requer, nesse diapasão, “seja dado provimento ao agravo, revogando-se
a concessão da ordem de ofício, de fls. 78-84, e-STJ” (e-STJ, fl. 93).
É o relatório.

VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):
O presente agravo não apresenta qualquer argumento capaz de des-
constituir os motivos sobre os quais se baseou o decisum ora impugnado, que
merece ser integralmente mantido.
Vejamos:
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
116

“O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção


deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva
do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ile-
gal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possi-
bilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
Esse entendimento objetivou preservar a utilidade e a eficácia do mandamus,
que é o instrumento constitucional mais importante de proteção à liberdade
individual do cidadão ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantin-
do a celeridade que o seu julgamento requer. Nesse sentido, confiram-se os
seguintes julgados, exemplificativos dessa nova orientação das Cortes Supe-
riores do país:
‘PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE
RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CABIMENTO. ROUBO EM CON-
CURSO DE PESSOAS E COM EMPREGO DE ARMA DE FOGO. PRI-
SÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. ALEGADA
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL.
INOCORRÊNCIA. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PERI-
CULOSIDADE CONCRETA DO PACIENTE. MODUS OPERANDI.
HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
I – A Primeira Turma do col. pretório excelso firmou orientação no senti-
do de não admitir a impetração de habeas corpus substitutivo ante a previsão
legal de cabimento de recurso ordinário (v.g.: HC 109.956/PR, Rel. Min.
Marco Aurélio, DJe 11.09.2012; RHC 121.399/SP, Rel. Min. Dias Toffoli,
DJe 01.08.2014; e RHC 117.268/SP, Relª Minª Rosa Weber, DJe 13.05.2014).
As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte alinharam-se a esta
dicção, e, desse modo, também passaram a repudiar a utilização desmedida
do writ substitutivo em detrimento do recurso adequado (v.g.: HC 284.176/
RJ, Quinta Turma, Relª Minª Laurita Vaz, DJe 02.09.2014; HC 297.931/
MG, Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 28.08.2014; HC
293.528/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe 04.09.2014; e HC
253.802/MG, Sexta Turma, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, DJe
04.06.2014). II – Portanto, não se admite mais, perfilhando esse entendimen-
to, a utilização de habeas corpus substitutivo quando cabível o recurso próprio,
situação que implica o não conhecimento da impetração. Contudo, no caso
de se verificar configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento
ilegal, recomenda a jurisprudência a concessão da ordem de ofício (...) Habeas
corpus não conhecido.’ (HC 320.818/SP, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Tur-
ma, j. 21.05.2015, DJe 27.05.2015)
‘HABEAS CORPUS. SUBSTITUTIVO DO RECURSO CONSTITU-
CIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRÁFICO INTERNA-
CIONAL DE DROGAS. DOSIMETRIA. SUPRESSÃO DE INSTÂN-
CIA. REGIME INICIAL FECHADO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.
CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 117

1. O habeas corpus tem uma rica história, constituindo garantia fundamental


do cidadão. Ação constitucional que é, não pode ser o writ amesquinhado,
mas também não é passível de vulgarização, sob pena de restar descaracteriza-
do como remédio heroico. Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal
Superior, prevê a Constituição Federal remédio jurídico expresso, o recurso
ordinário. Diante da dicção do art. 102, II, a, da Constituição da República,
a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o ins-
tituto recursal próprio, em manifesta burla do preceito constitucional. Igual-
mente, contra o improvimento de recurso ordinário contra a denegação do
habeas corpus pelo Superior Tribunal de Justiça, não cabe novo writ ao Supre-
mo Tribunal Federal, o que implicaria retorno à fase anterior. Precedente da
Primeira Turma desta Suprema Corte. (...).’ (STF, HC 113.890, Relª Minª
Rosa Weber, Primeira Turma, j. 03.12.2013, DJ 28.02.2014)
Assim, de início, incabível o presente habeas corpus substitutivo de recurso
próprio. Todavia, em homenagem ao princípio da ampla defesa, passa-se ao
exame da insurgência para verificar a existência de eventual constrangimento
ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.
Razão assiste ao impetrante.
In casu, o Tribunal a quo manteve a decisão que indeferiu a progressão de
regime sob fundamento de ausência de requisito subjetivo, tendo em vista
a gravidade do delito, pelo qual foi condenado o paciente, e da longa pena a
cumprir, o que caracteriza flagrante constrangimento ilegal imposto ao sen-
tenciado.
Veja-se a fundamentação adotada pela Corte de origem, constante do voto
condutor do acórdão prolatado (e-STJ, fls. 54/59):
‘(...)
In casu, o agravante cumpre pena de 16 anos e 4 meses, e 13 anos, 4 meses
e 28 dias, pela reiterada prática de crimes patrimoniais, dentre os quais dois
furtos, dois estelionatos e dois roubos majorados, com término previsto para
05.02.2030 (fls. 37/39).
Como se vê, trata-se de pessoa que ‘evoluiu’ no submundo do crime, indo de
delitos não violentos para condutas graves, reiteradas, inclusive.
Tais aspectos foram acertadamente sopesados pelo nobre magistrado a quo,
o qual percebeu que, no caso em tela, faltava ao agravante mérito suficiente
para gozar de regime menos gravoso.
Com efeito, a prática de reiterados delitos violentos e a longevidade da pena
espelham elementos que devem ser sopesados, incutindo dúvidas ao julgador
se o bom comportamento atestado reflete a necessária maturidade necessária
para gozar de tão amplo benefício, marcado pela menor vigilância. Tal dúvida,
aliás, não beneficia o sentenciado, mas a sociedade.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
118

Ora, em que pese a argumentação defensiva, impossível promover um corte


na ordem dos eventos; cego seria o apartamento dos fatos que ensejaram as
condenações e suas respectivas penas; temerário seria simplesmente fadar ao
esquecimento os funestos eventos que resultaram na execução da reprimen-
da. São, pois, indissociáveis, ao menos para a profunda e necessária análise do
mérito à progressão de regime.
(...)’
Sobre a matéria, esta Corte Superior de Justiça pacificou entendimento no
sentido de que fatores relacionados ao crime praticado são determinantes da
pena aplicada, mas não justificam diferenciado tratamento para a progressão
de regime.
Confiram-se:
‘AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.
PROGRESSÃO DE REGIME. REALIZAÇÃO DE EXAME CRIMINO-
LÓGICO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. CONS-
TRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
1. Em casos pontuais, a circunstância de o apenado ter praticado vários crimes
com violência, ou grave ameaça contra a pessoa e o registro de faltas disci-
plinares graves no curso da execução penal podem ser sopesados, conjunta-
mente, como indicativos de maior periculosidade, a recomendar cuidado na
promoção de benefícios.
2. Entretanto, a simples menção a gravidade abstrata dos crimes cometidos
(tráfico de drogas e formação de quadrilha), isoladamente, não se mostra su-
ficiente para cassar a progressão de regime concedida pelo magistrado das
execuções.
3. Agravo não provido.’ (AgRg no HC 304.495/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti
Cruz, Sexta Turma, j. 24.02.2015, DJe 02.03.2015)
‘HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECUR-
SO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABI-
MENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDEN-
CIAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA
DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. EXECUÇÃO PENAL.
PROGRESSÃO DE REGIME CASSADA PELO TRIBUNAL DE ORI-
GEM. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL MANIFESTO. 3. ORDEM NÃO CONHECIDA. HABEAS
CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO, RATIFICADA A LIMINAR.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a racionalidade
do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal, vinha se
firmando no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio
constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de
Processo Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 119

Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por objetivo subs-
tituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie. Precedentes. Contudo,
devem ser analisadas as questões suscitadas na inicial, no intuito de verificar
a existência de constrangimento ilegal evidente – a ser sanado mediante a
concessão de habeas corpus de ofício –, evitando-se, assim, prejuízos à ampla
defesa e ao devido processo legal.
2. No caso, valeu-se o Tribunal de origem de fundamentação inidônea para
cassar a progressão de regime concedida pelo Juízo das Execuções Penais, pois
utilizou-se apenas da gravidade do crime pelo qual a apenada foi condenada,
do restante da longa pena a cumprir, bem como de ilações genéricas acerca da
imprescindibilidade da realização do exame criminológico, de forma que fica
evidenciado o constrangimento ilegal ocasionado à paciente.
3. Ordem não conhecida. Ratificada a liminar anteriormente deferida. Habeas
corpus concedido de ofício para cassar o acórdão proferido no Agravo de Exe-
cução Penal 0198389-77-2013.8.26.0000 e restabelecer a decisão do Juízo da
Execução Penal que concedeu à paciente a progressão para o regime semia-
berto.’ (HC 293.882/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, j.
07.08.2014, DJe 21.08.2014)
Configurada, portanto, na espécie, efetivamente, flagrante ilegalidade, a jus-
tificar a concessão do writ de ofício.
Diante do exposto, não conheço do habeas corpus. No entanto, concedo a or-
dem de ofício para cassar o acórdão proferido no Agravo de Execução Penal
0006560-50.2018.8.26.0996 e, confirmando a liminar anteriormente deferi-
da, determinar que o Juízo de primeiro grau reexamine o pedido de progres-
são de regime formulado em favor do paciente, analisando os requisitos com
base em elementos concretos da execução da pena, à luz do disposto no art.
112 da Lei de Execução Penal.
Comunique-se, com urgência.
Publique-se. Intimem-se.
Sem recurso, arquivem-se os autos.”
Assim, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca – Relator
Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça


RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 93.520 RIO GRANDE DO SUL
RELATOR: MINISTRO JORGE MUSSI

Homicídio Qualificado. Associação para o Tráfico.


Corrupção de Menores. Tribunal do Júri. Condenação.
Execução Provisória da Pena. Impossibilidade.
Necessidade de Exaurimento da Jurisdição Ordinária.
Prisão Preventiva Determinada na Sentença.
Réus que Permaneceram em Liberdade no Curso do
Processo. Fundamentação Idônea. Gravidade Concreta
Demonstrada
1. A sentença condenatória do Tribunal do Júri não é prontamente exe-
quível. A sua execução provisória está condicionada ao exaurimento da
jurisdição ordinária. Portanto, será viável somente após o julgamento
do respectivo Tribunal de apelação que mantenha a condenação do
Conselho de Sentença. Esta é a hermenêutica que coaduna a questão
jurídica discutida à tese definida pelo STF no ARE 964.246-RG.
2. “É da jurisprudência das Turmas que compõem a Terceira Seção deste
Superior Tribunal a permissividade de se negar ao acusado o direito de
recorrer solto da sentença condenatória, se presentes os motivos para a
segregação preventiva, ainda que o réu tenha permanecido solto durante
a persecução penal” (RHC 100.750/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca, Quinta Turma, j. 21.08.2018, DJe 29.08.2018).
3. Há gravidade concreta a embasar a decretação da preventiva o empre-
go de diversos disparos de arma de fogo à prática de homicídio qualifi-
cado, com a intenção de afastar qualquer chance de sobrevivência, ainda
mais quando motivado pela cobrança de dívidas do tráfico de drogas.
4. O longo período da associação para o tráfico demonstra a pericu-
losidade dos agentes, que fazem deste crime sua forma de vida, o que
aponta, também, à possibilidade de reiteração delitiva.
5. Demonstrada a imprescindibilidade da segregação provisória, está
clara a insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão à proteção
da ordem pública.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 121

6. Condições pessoais favoráveis não têm o condão de, isoladamente,


desconstituir a prisão preventiva, quando há elementos hábeis que
autorizam a manutenção da medida extrema.
7. Recurso ordinário em habeas corpus parcialmente provido, para afastar
a possibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade
por condenação pelo Tribunal do Júri, eis que pendente o julgamento
da respectiva apelação, mantendo-se, contudo, a prisão preventiva dos
recorrentes, na forma do art. 312 do Código de Processo Penal.
(STJ; RHC 93.520; Proc. 2017/0334274-5; RS; 5ª T.; Rel. Min. Jorge
Mussi; DJE 21/02/2019)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e
das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar parcial provimento ao
recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Rey-
naldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik e Felix Fischer
votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Brasília (DF), 12 de fevereiro de 2019 (Data do Julgamento).
Ministro Jorge Mussi – Relator

RELATÓRIO
Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Trata-se de recurso or-
dinário em habeas corpus, com pedido liminar, interposto por Marcio Alan
Elias Fernandes e Mara Rosa Elias contra acórdão proferido pelo Tribunal
de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que denegou a ordem visada no
Writ 70074479726. Manteve a Corte a quo a prisão decretada nos autos da
ação penal em que restaram condenados, o primeiro, pela prática dos delitos
previstos no art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, e do art. 35, caput,
c/c o art. 40, incisos IV e VI, ambos da Lei nº 11.343/06, e a segunda, como
incursa nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, do art.
244-B, § 2º, da Lei nº 8.069/90, e do art. 35, caput, combinado com o art. 40,
incisos IV e VI, ambos da Lei nº 11.343/06.
Sustentam os recorrentes que na sessão de julgamento do Tribunal
popular, realizada em 13.07.2017, tiveram prisão preventiva decretada em
total desrespeito à legislação vigente – ausência de fundamentação idônea –,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
122

mormente por terem sido comparados indevidamente à mesma situação pro-


cessual da corré Shélida, que responde a 3 (três) outras ações penais na vara
do júri, o que configurou flagrante constrangimento ilegal.
Aduzem que, diante da interposição do recurso de apelação, “embora
não possa o TJRS decretar a absolvição dos pacientes, poderá anular a sessão
do júri por eventuais nulidades ocorridas ou, ainda, decidir que a sentença
foi contrária a aprova dos autos” (e-STJ, fl. 212).
Alegam que teriam permanecido soltos durante toda a instrução proces-
sual, desde 2014, atendendo a todos os chamamentos da Justiça, não tendo sido
decretadas as prisões em momento anterior, justamente porque não se fizeram
presentes os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.
Defendem ser réus primários, possuírem bons antecedentes, terem
residência fixa no distrito da culpa, família e trabalho lícito, predicados que
lhes permitiriam responder ao processo em liberdade.
Entendem que a decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 118.770/
SP que considera possível a execução provisória da pena nas condenações do
Tribunal do Júri não se aplica à hipótese, uma vez que, naquele julgamento,
o agente teria respondido preso durante toda a instrução, ao contrário destes,
que “responderam toda a instrução soltos e somente foram presos no ato da
prolação da sentença” (e-STJ, fl. 215).
Demonstram, outrossim, que foi interposto recurso de apelação pela
defesa, que ainda se encontra pendente de julgamento, o que não permitiria
nem mesmo a execução provisória da pena, com base no decidido no HC
126.292/SP pelo STF, uma vez que ainda não foram esgotadas as instâncias
ordinárias.
Afirmam a ocorrência de constrangimento ilegal, sob o argumento de
que não haveria fundamentação idônea para justificar a ordenação da prisão
preventiva, porquanto embasada em motivações genéricas, insuficientes para
respaldar a medida extrema.
Discorrem que não restou demonstrado de que maneira, soltos, pode-
riam causar ofensa à ordem pública, à ordem econômica, à conveniência da
instrução processual ou à segurança na aplicação da lei penal.
Ponderam que se mostraria mais adequada a substituição da prisão
preventiva por medidas cautelares menos gravosas, em atenção ao princípio
da presunção de não culpabilidade.
Requereram, liminarmente e no mérito, o provimento do recurso, a
fim de que a prisão fosse relaxada ou revogada, expedindo-se o competente
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 123

alvará de soltura, para que pudessem aguardar em liberdade o trânsito em


julgado da condenação.
Postulou a defesa, ao final, pela intimação da data em que o presente
mandamus será levado a julgamento, para o fim de realizar sustentação oral,
o que foi deferido.
A liminar foi indeferida.
Solicitadas informações, foram devidamente prestadas.
O Ministério Público Federal opinou pelo improvimento do recurso
ordinário em habeas corpus.
É o relatório.

VOTO
Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Da análise dos autos infere-se
que o recorrente Marcio Alan Elias Fernandes foi denunciado e processado
como incurso nas penas do art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal,
e do art. 35, caput, c/c o art. 40, incisos IV e VI, ambos da Lei nº 11.343/06,
e Mara Rosa Elias foi igualmente denunciada e processada pela prática dos
delitos previstos no 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, do art. 244-B,
§ 2º, da Lei nº 8.069/90, e do art. 35, caput c/c o art. 40, incisos IV e VI, ambos
da Lei nº 11.343/06.
Consta da denúncia que, no dia 06.02.2014, os denunciados teriam
ceifado a vida de Diogo da Silva Weinheimer, por motivo torpe e mediante
recurso que dificultou a defesa da vítima, utilizando-se de disparos de arma
de fogo, e durante o ano de 2013, teriam se associado para o fim de praticar o
tráfico de drogas, juntamente com menores (e-STJ, fls. 57-68).
Encerrada a instrução processual, durante a qual os réus permaneceram
em liberdade, no dia 13.07.2017, foram condenados, o primeiro, ao cumpri-
mento de 18 (dezesseis) anos e 6 (seis) meses de reclusão, no regime inicial
fechado, mais o pagamento de 700 dias-multa, e a segunda, à pena de 19 (de-
zenove) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado, mais
o pagamento de 700 dias-multa, pela prática das infrações penais capituladas
nos dispositivos legais supramencionados.
Na ocasião, o Magistrado presidente do Tribunal do Júri negou aos
ora recorrentes o direito ao recurso em liberdade, determinando a execução
imediata da decisão proferida, ao fundamento de que “A partir da ratio que
moveu essas decisões, em julgamento recente, por maioria de votos, a Primeira
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
124

Turma do Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus 118.770, Relator


para o acórdão o Ministro Roberto Barroso, desenvolveu a tese de que, sendo
a rigor inalterável a decisão condenatória do Tribunal do Júri, poder-se-ia, a
partir de então, deflagrar-se a execução da pena, com a prisão do acusado em
Plenário” (e-STJ, fls. 41-42).
Acrescentou o Juízo sentenciante, ainda, fundamento cautelar, aduzindo
serem graves os delitos, seja por haver diversos disparos de arma de fogo con-
tra a vítima do homicídio ou por terem os recorrentes mantido a associação
criminosa ao menos por um ano.
A defesa interpôs recurso de apelação, a qual, conforme consulta à
página eletrônica do Tribunal de origem (www.tjrs.jus.br), foi encaminhada
à segunda instância em 09.10.2018 para processamento.
Irresignada com o decreto constritivo, as partes também impetraram
remédio constitucional perante o Colegiado a quo, que, entendendo suficiente
e fundamentada a decisão de primeiro grau, denegou a ordem, mantendo a
custódia processual.
Prosseguiu o Tribunal estadual pontuando que “O egrégio STF (HC
118.770/SP) reconhece a possibilidade de pronta execução da decisão con-
denatória pelo Tribunal do Júri, assim, mantida a execução imediata da pena
determinada pelo juízo de origem” (e-STJ, fls. 185-186).
Delineado o contexto fático-processual, verifica-se que o acórdão im-
pugnado trata de duas formas de segregação corporal, quais sejam, a execução
provisória da pena e a prisão preventiva. Assim, as questões devem ser tratadas
separadamente, para que não se tome uma pela outra.
Quanto à primeira tese, discute-se a possibilidade de impor o cum-
primento provisório à pena privativa de liberdade imposta pelo Tribunal do
Júri desde logo, ou seja, com a prolação da sentença condenatória pelo Juiz
Presidente, independentemente de qualquer possível impugnação do réu, tal
como fez o juízo de 1º grau neste caso.
Baseou-se o Magistrado – e, neste ponto, mantida a decisão pelo Tri-
bunal a quo – no HC 118.770 do STF que, em síntese, entendeu compatível
a execução provisória da pena com a lógica do ARE 964.246-RG, eis que em
eventual recurso o Tribunal não poderia reapreciar fatos e provas, tendo em
conta a soberania do veredito do Júri. Logo, a execução provisória ocorreria
de pronto, independentemente do julgamento da apelação ou de qualquer
outro recurso.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 125

Com o devido respeito à decisão do STF, a solução jurídica não deve


prevalecer. Há particularidades na construção do citado precedente que
autorizam seu próprio afastamento. Analisando os fundamentos da decisão,
observa-se que, vencido o Relator originário – que concedia a ordem –, houve
a discussão sobre o cabimento ou não do habeas corpus, prevalecendo a tese pelo
não conhecimento. Ocorre que não houve a redação de um voto vencedor,
em que a maioria anuísse aos seus fundamentos. Mantiveram-se apenas as
notas taquigráficas, das quais se observa que não houve a expressa anuência
desta maioria quanto à tese da execução provisória da pena.
Esta circunstância já foi apontada por esta Quinta Turma, no HC
462.763/SC, salientando-se o Relator, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, que
“os votos dos quatro ilustres componentes do referido colegiado presentes
no julgamento não acompanharam, expressamente, a tese jurídica sustentada
pelo eminente Redator para o acórdão, Min. Luiz Roberto Barroso”. Por isso,
“a conclusão majoritária do referido julgado foi no sentido de não admitir a
impetração, sem comprometimento com a respeitável tese esboçada na ementa
do digno Relator para o acórdão”.
A construção da ratio decidendi extraída do conjunto de votos não au-
toriza a conclusão do Tribunal a quo. Confluem os eminentes Ministros que
compuseram a maioria em não conhecer o habeas corpus, as razões de cada
um para tanto, contudo, não convergem. Logo, perde força a decisão como
precedente a nortear a atuação futura das demais Cortes do país.
Nem mesmo a superveniência dos embargos de declaração ao aludido
julgamento autoriza conclusão diversa. Nestes, concluiu-se tão somente pela
não existência dos vícios do art. 619 do Código de Processo Penal. No mais,
considerou-se prejudicado o recurso, eis que, no caso concreto, houve a cer-
tificação do trânsito em julgado da decisão condenatória, passando a prisão
possuir caráter definitivo. Observa-se, portanto, que a discussão quanto à
execução provisória ficou à margem. Não se pode concluir, assim, que se trata
de razão de decidir dos embargos de declaração, considerando-se um obter dicta.
A execução provisória da pena desde a condenação pelo Tribunal do Júri
não se coaduna com a decisão do ARE 964.246-RG. Neste, estipulou-se que
a execução provisória da pena privativa de liberdade não ofende o princípio
da presunção de inocência ou o da não culpabilidade quando ultimada a ju-
risdição ordinária. Assim, de um lado, permite-se o cumprimento do duplo
grau de jurisdição e, por outro, aguarda-se o encerramento da fase apropriada
à discussão da matéria de fato de um determinado caso.
Deve-se aguardar, portanto, a resolução dos recursos ordinários antes
da execução provisória da sentença condenatória. Com a decisão do Tribunal
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
126

do Júri, a premissa não deve ser diferente. Em que pese a estreita cognosci-
bilidade, a apelação contra decisão do Conselho de Sentença não perde seu
caráter de meio processual da jurisdição ordinária. Tanto que após o acórdão
do Tribunal, abre-se a possibilidade de interposição dos recursos excepcionais.
A soberania dos vereditos do Tribunal do Júri convive em harmonia com
o duplo grau de jurisdição. A diminuição de escopo das matérias conhecidas
na apelação criminal, na forma do art. 593, inciso III, alíneas a, b, c e d, do
Código de Processo Penal, não tem o condão de alterar sua natureza jurídica,
transmutando-a em recurso excepcional. Antes, mantém-se a apelação como
meio processual adequado ao exercício do duplo grau de jurisdição, ínsito à
jurisdição ordinária.
Embora algumas hipóteses do art. 593, inciso III, do Código de Pro-
cesso Penal, tratem de matérias eminentemente de direito, isto não exclui a
apreciação de matéria fática em outras hipóteses, como o recurso interposto
pela decisão manifestamente contrária à prova dos autos.
Aplica-se à decisão condenatória do Tribunal do Júri a regra geral dis-
posta no art. 597 do Código de Processo Penal, que dispõe que “a apelação
da sentença condenatória terá efeito suspensivo”, salvo internações, medidas
de segurança e no caso de suspensão condicional da pena.
Além da inviabilidade jurídica da execução provisória de pronto, há
uma questão de política judiciária extremamente importante a ser ponderada.
Espera-se de uma decisão, seja ela do Tribunal do Júri ou não, o maior grau de
justiça e, para tanto, possibilita-se a ampla produção probatória e ao acusado
falar no processo, inclusive em plenário. Se autorizada a execução provisória,
invariavelmente todo aquele cidadão condenado sairá preso da própria sessão
de julgamento, independentemente da necessidade da constrição. Isto, por
certo, afastará a presença de acusados à própria sessão do Júri, não oportuni-
zando o contato direto dos jurados com a pessoa que estão a julgar, o que é
negativo não só ao réu, mas principalmente à justiça dos vereditos.
A sentença condenatória do Tribunal do Júri não é prontamente exequí-
vel. A sua execução provisória está condicionada ao exaurimento da jurisdição
ordinária. Portanto, será viável somente após o julgamento do respectivo
Tribunal de apelação que mantenha a condenação do Conselho de Sentença.
Esta é, em verdade, a hermenêutica que coaduna a questão jurídica discutida
à tese formulada pelo STF no ARE 964.246-RG.
O entendimento ora esposado é convergente com julgados desta Quinta
Turma. Cito, além do já lembrado HC 462.763/SC, o RHC 92.108/RS, tam-
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 127

bém da lavra do eminente Ministro Reynaldo Soares da Fonseca e, de minha


relatoria, o HC 441.590/RS e o RHC 84.406/RJ.
A Sexta Turma, de igual sorte, possui o mesmo entendimento. Sobre
o assunto, tem-se:
“HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO.
TRIBUNAL DO JÚRI. CONDENAÇÃO. EXECUÇÃO IMEDIATA
DO VEREDICTO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE EXAURI-
MENTO DA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. COGNIÇÃO DO TRIBU-
NAL DE JUSTIÇA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
ORDEM CONCEDIDA.
1. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o veredicto do Tri-
bunal do Júri não é imediatamente exequível, sendo necessário aguardar a submissão da
sentença condenatória ao crivo do Tribunal de Apelação, que poderá, caso julgue necessá-
rio e nos termos da legislação processual penal, cassar a referida condenação e determinar
um novo julgamento, com reexame de fatos e provas.
2. A determinação do início da execução da pena imposta antes mesmo do
encerramento da cognição do Tribunal de Justiça, como ocorreu na hipótese,
configura flagrante constrangimento ilegal apto a ensejar a concessão da or-
dem de habeas corpus.
3. Ordem concedida para, confirmando os efeitos da liminar, revogar a prisão
do Paciente, sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares diversas pelo
Juízo de origem e da decretação de nova prisão após o exaurimento das ins-
tâncias ordinárias.” (HC 457.273/RN, Relª Minª Laurita Vaz, Sexta Turma, j.
18.09.2018, DJe 02.10.2018)
Obviamente, a inviabilidade de execução provisória não exclui a possi-
bilidade da decretação da preventiva, verificada as circunstâncias legalmente
previstas no art. 312 do Código de Processo Penal. Por isso, afastada a primeira
tese, necessário o enfrentamento da segunda, da falta de motivos ensejadores
da preventiva.
Sabe-se que as prisões cautelares são excepcionais e, como tal, sua
incidência em cada caso deve vir fulcrada em elementos que demonstrem a
sua efetiva necessidade no contexto fático-probatório apreciado. Inadmissí-
vel, portanto, a decretação sem razão concreta, especialmente com a edição e
entrada em vigor da Lei nº 12.403/2011, em que a prisão deve ser empregada
como última medida para garantir a ordem pública, a conveniência da instrução
criminal e a aplicação da lei penal.
No que toca à alegação de fundamentação inidônea e, por conseguinte,
a ocorrência de constrangimento ilegal, não assiste razão aos recorrentes.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
128

Na sentença, o Magistrado consignou, em relação à necessidade de


decretação da preventiva:
“A possibilidade, assim revelada, de, desde logo, partir-se para a execução provisó-
ria da pena, não exime a adição de algum outro elemento, com sentido cautelar.
E, no caso, tal tipo de fundamentação há: a gravidade do crime é patente,
diversos foram os disparos de arma de fogo que atingiram a vítima. Ademais,
Márcio e Mara foram condenados pelo crime de associação criminosa voltada
para a prática do crime de tráfico de drogas, a qual perdurou por cerca de, no
mínimo, um ano. Tudo a indicar a necessidade da decretação de suas segre-
gações cautelares.”
Da leitura da decisão objurgada, evidencia-se que o Tribunal de origem
houve por bem manter a segregação cautelar dos condenados. Considerou
satisfatória a motivação apresentada, constando já na ementa do acórdão que
“o decreto prisional está devidamente fundamentado, conforme se verifica
da decisão proferida pelo Tribunal do Júri, (...)”.
Do corpo do aresto, ressalta-se que:
“Conforme se verifica, não há respaldo para se modificar a decisão, porquan-
to não é caso de ausência de pressupostos autorizadores do decreto prisional
dos pacientes, Márcio Alan Elias e Mara Rosa Elias, que foram condenados,
respectivamente, às penas de 18 anos e 6 meses de reclusão e 19 anos e 10
meses de reclusão, em regime fechado.”
Agiu com acerto o Tribunal a quo. Observa-se que o Juiz presidente
do Tribunal do Júri, ainda que de forma sucinta, explicitou seus motivos à
decretação da preventiva. Apontou a gravidade concreta dos delitos pratica-
dos. Quanto ao crime de homicídio, considerou agravar a conduta o modus
operandi dos agentes, que efetuaram diversos disparos de arma de fogo. Esta
circunstância, com efeito, demonstra destacada periculosidade dos réus, que
buscaram afastar qualquer chance de sobrevivência da vítima, o que justifica
a segregação provisória.
Conforma já julgou esta Quinta Turma:
“HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO PRÓPRIO. INA-
DEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUA-
LIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. MODUS OPERANDI. VÍTIMA
MORTA COM 12 DISPAROS NA REGIÃO DO TÓRAX E DA CABEÇA.
PERICULOSIDADE. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM
PÚBLICA. EVASÃO DO LOCAL DOS FATOS. APLICAÇÃO DA LEI
PENAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INOCÊNCIA. INOCOR-
RÊNCIA. INOVAÇÃO NOS FUNDAMENTOS PELA CORTE A QUO.
NÃO CONSTATAÇÃO. COAÇÃO ILEGAL NÃO EVIDENCIADA.
1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso pró-
prio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional,
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 129

com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que


se concede a ordem de ofício.
2. Hipótese na qual o paciente e comparsa chamaram a vítima para conversar,
tendo ambos, de súbito, alvejado-a com 12 disparos que atingiram a região do
tórax e cabeça, causando-lhe a morte instantânea.
3. As circunstâncias do cometimento do delito, em especial a quantidade de disparos
efetivados contra a vítima, que demonstram a intenção de afastar qualquer chance de
sobrevivência, denotam a periculosidade do paciente, bem como o desprezo pela vida
humana, justificando a segregação cautelar.
4. Não se exige, para a decretação da prisão preventiva, um juízo de certeza
definitivo – como aquele necessário para a condenação –, sendo suficiente a
presença de indícios plausíveis de autoria e materialidade. Precedentes.
5. A necessidade da segregação é reforçada diante da circunstância de que o
paciente e corréu evadiram-se do local dos fatos, somente sendo localizado
posteriormente por meio de investigação policial.
6. Não há nulidade em acórdão no qual a Corte estadual trouxe maiores de-
talhes à motivação já contida na decisão primeva sem, contudo, inovar na
fundamentação.
7. Habeas corpus não conhecido.” (HC 315.516/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, Quinta Turma, j. 19.04.2016, DJe 28.04.2016)
Além disso, a própria condenação pela associação ao tráfico denota que
o delito de homicídio foi praticado em virtude de cobrança de dívidas do
comércio proscrito, o que torna ainda mais reprovável a conduta criminosa.
Em caso análogo, já foi julgado:
“PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COR-
PUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. CONCURSO DE
AGENTES. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLI-
CA. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. GRAVIDADE
CONCRETA. MODUS OPERANDI. MOTIVO TORPE. CONTUMÁ-
CIA DELITIVA. TENTATIVA DE INFLUIR NAS INVESTIGAÇÕES.
(...)
3. No caso, a prisão preventiva está justificada, pois a decisão que a impôs delineou
o modus operandi empregado pelo recorrente, consistente em tentativa de homicídio
qualificado por motivo torpe – a saber, disputa acerca de mercancia ilícita de entorpecentes
–, mediante vários disparos de arma de fogo contra a vítima. Tais circunstâncias deno-
tam sua periculosidade e a necessidade da segregação como forma de acautelar a ordem
pública.
(...)” (RHC 98.811/MG, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma,
j. 04.09.2018, DJe 19.09.2018)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
130

No que toca à associação ao tráfico, o Juízo de primeiro grau consi-


derou deter maior gravidade o amplo período pelo qual os recorrentes, em
conjunto com outros corréus e adolescentes, mantiveram a coligação para o
comércio ilícito. Com efeito, há grande desvalor na conservação por longo
tempo da prática delitiva. Afirma a autoridade judiciária que os recorrentes
preservaram a associação ao tráfico por, ao menos, um ano. Isto denota, por
si só, a periculosidade dos agentes, que fazem do ilícito combatido o meio
de vida, e, também, a possibilidade de reiteração delitiva, o que fundamente
a decretação da preventiva.
Em caso análogo, já se considerou de maior gravidade, a justificar a
segregação cautelar, a manutenção da associação pelo prazo de 10 (dez) meses:
“PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COR-
PUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO ILÍCITO DE EN-
TORPECENTES. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA.
INOCORRÊNCIA. TRÂMITE REGULAR. PROCESSO EM FASE DE
APRESENTAÇÃO DE ALEGAÇÕES FINAIS. INCIDÊNCIA DA SÚ-
MULA Nº 52/STJ. PRISÃO PREVENTIVA. IDONEIDADE DA FUN-
DAMENTAÇÃO. PERICULOSIDADE SOCIAL EVIDENCIADA. NE-
CESSIDADE DE RESGUARDAR A ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES
PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. INSUFICIÊNCIA DE
MEDIDA CAUTELAR ALTERNATIVA. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE
ILEGALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PREJUDICADO E DES-
PROVIDO.
(...)
5. No caso, verifica-se que a prisão preventiva foi adequadamente motivada com base em
elementos concretos extraídos dos autos, restando demonstrada a elevada periculosidade
social da recorrente, evidenciada pelo fato de integrar associação criminosa voltada para
o comércio de drogas, no interior de Penitenciária e na Comarca de Caruaru/PE, sendo
responsável por levar as drogas para dentro do presídio, atuando, também, no pagamento
e entrega de valores e drogas. Salienta, ainda, o Magistrado de piso, o risco real de reitera-
ção delitiva, porquanto durante longo período de investigações – 10 meses –, a recorrente
praticou o delito de modo recorrente e contumaz, sendo imperiosa a manutenção de sua
custódia como forma de interromper ou minimizar a atuação do grupo criminoso. Nesse
contexto, forçoso concluir que a prisão processual está devidamente fundamentada na
necessidade de garantia da ordem pública, não havendo falar, portanto, em existência de
evidente flagrante ilegalidade capaz de justificar a sua revogação.
6. Esta Corte Superior possui entendimento firme no sentido de que a pre-
sença de condições pessoais favoráveis do agente, como primariedade, domi-
cílio certo e emprego lícito, não representa óbice, por si só, à decretação da
prisão preventiva, quando identificados os requisitos legais da cautela.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 131

7. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de ser ina-


plicável medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que
as providências menos gravosas seriam insuficientes para manutenção da or-
dem pública.
Recurso ordinário parcialmente prejudicado e, no mais, desprovido.” (RHC
85.233/PE, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 03.10.2017, DJe
16.10.2017)
Conclui-se, portanto, que a decisão que decretou a prisão preventiva
está justificada de forma sucinta, o que é suficiente à sua validade, eis que se
refere de forma concreta a circunstâncias autorizadoras da custódia cautelar,
na forma do art. 312 do Código de Processo Penal. Deve-se lembrar a re-
mansosa jurisprudência que indica que a falta de motivação não se confunde
com a fundamentação sucinta. Sobre o assunto, já se manifestou o Supremo
Tribunal Federal:
“AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PROCESSO DO
TRIBUNAL DO JÚRI. ALTERAÇÃO DO TÍTULO PRISIONAL. AD-
VENTO DE SENTENÇA DE PRONÚNCIA. PERDA DO OBJETO
DA IMPETRAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO
DE PODER QUE JUSTIQUE A CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍ-
CIO. FUNDAMENTAÇÃO SUCINTA NÃO SE CONFUNDE COM
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. RATIFICAÇÃO DA NECESSI-
DADE DA PRISÃO PELAS INSTÂNCIAS DE JULGAMENTO. VIABI-
LIDADE. EXCESSO DE PRAZO NÃO CONFIGURADO. SUSTEN-
TAÇÃO ORAL EM JULGAMENTO DE AGRAVO REGIMENTAL EM
HABEAS CORPUS. DESCABIMENTO.
(...)
3. A custódia cautelar, por sua natureza excepcional, exige a demonstração
inequívoca de sua necessidade e adequação, em face à presunção de não cul-
pabilidade que vigora em favor do acusado ou investigado, não podendo con-
figurar mera antecipação da reprimenda a ser cumprida quando da condena-
ção (HC 105.556/SP, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 30.08.2013).
4. Não há ilegalidade na decisão que, embora sucinta, apresenta fundamentos essenciais
para a decretação da prisão, uma vez apontadas as razões de convencimento do juízo
sobre a necessidade de segregação do paciente, com base na garantia da ordem pública.
Nessa linha, ‘a falta de fundamentação não se confunde com fundamentação sucinta’
(HC 105.349-AgR/SP, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 17.02.2011).
5. Primariedade, ocupação lícita e bons antecedentes não constituem óbi-
ces à decretação ou manutenção da prisão preventiva, desde que preenchidos
os pressupostos e requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal (HC
108.314/MA, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 05.10.2011).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
132

6. O amparo pelo Estatuto do Idoso, em razão da idade do paciente, não


assegura a concessão da liberdade provisória por haver a supremacia da or-
dem pública (HC 92.204/PR, Rel. Min. Menezes Direito, 1ª Turma, DJe
19.12.2007).
7. A ratificação da necessidade de prisão preventiva do paciente, pelas ins-
tâncias de julgamento, enfatizando o modus operandi da ação criminosa, não
implica ‘inovação da causa determinante da cautelar, com o objetivo de su-
plementar a decisão originária’, hipótese rechaçada pela jurisprudência desta
Suprema Corte (HC 125.555/PR, Rel. Min. Teori Zavascki, 2ª Turma, DJe
14.04.2015).” (HC 128.684 AgR, Relª Minª Rosa Weber, Primeira Turma,
j. 05.10.2018, processo eletrônico, DJe-220, Divulg. 15.10.2018, Public.
16.10.2018)
Não se pode negar que os recorrentes responderam soltos ao processo.
Contudo, isso não impede a decretação da preventiva por ocasião da sentença
condenatória; ao contrário, caberá ao juiz analisar nela a necessidade ou não
da segregação cautelar, na forma do art. 387, § 1º, do Código de Processo
Penal. Neste passo, a superveniência da condenação autoriza a custódia, se
observada alguma das hipóteses do art. 312 do Código de Processo Penal, o
que ocorre no presente caso. Neste particular, “é da jurisprudência das Tur-
mas que compõem a Terceira Seção deste Superior Tribunal a permissividade
de se negar ao acusado o direito de recorrer solto da sentença condenatória,
se presentes os motivos para a segregação preventiva, ainda que o réu tenha
permanecido solto durante a persecução penal” (RHC 100.750/SC, Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 21.08.2018, DJe 29.08.2018).
Já decidiu sobre o tema esta Quinta Turma:
“PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COR-
PUS. TRÊS HOMICÍDIOS QUALIFICADOS CONSUMADOS E UM
HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO PREVENTIVA
DECRETADA NA SENTENÇA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.
PERICULOSIDADE DO AGENTE. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. RECUR-
SO NÃO PROVIDO.
1. Nos termos do § 1º do art. 387 do CPP, o magistrado, ao proferir sentença
condenatória, decidirá fundamentadamente sobre a manutenção ou, se for o
caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem preju-
ízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
2. Hipótese em que, embora o recorrente tenha respondido parte do processo solto, em ra-
zão do relaxamento da sua prisão preventiva por excesso de prazo na instrução criminal,
o julgador trouxe fundamentação válida para negar-lhe o recurso em liberdade.
3. A prisão cautelar está devidamente motivada na necessidade de se assegurar a ordem
pública, diante da periculosidade concreta do agente, evidenciada na extrema gravidade
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 133

dos homicídios perpetrados (três consumados e um tentado). Segundo consta, o re-


corrente, em concurso de agentes e por ordem da chefe do tráfico local, inva-
diu a residência das vítimas e, após tê-las cruelmente torturado, arrancando-
lhes inclusive os dentes, as executou com disparos de arma de fogo. O motivo
do delito teria sido o inadimplemento de dívidas relativas a venda de crack.
4. A presença de condições pessoais favoráveis não tem o condão de, isola-
damente, garantir a liberdade ao acusado, quando há, nos autos, elementos
hábeis que autorizam a manutenção da medida extrema nos termos do art.
312 do CPP.
5. Recurso ordinário em habeas corpus não provido.” (RHC 95.436/MG, Rel.
Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 05.06.2018, DJe 13.06.2018)
Concluindo-se pela necessidade da segregação provisória, resta clara a
insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão para garantir a ordem
pública, diante da presença do periculum libertatis, como demonstrado na es-
pécie.
Como reiteradamente vem decidindo esta Corte Superior, “inaplicá-
vel medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que as
providências menos gravosas seriam insuficientes para a manutenção da or-
dem pública” (HC 415.815/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma,
j. 07.11.2017, DJe 14.11.2017).
Por fim, impende salientar que as condições pessoais favoráveis não têm
o condão de, isoladamente, desconstituir a prisão preventiva, quando há nos
autos elementos que autorizam a manutenção da medida extrema.
Não procede a alegação de que houve indevida comparação entre a situ-
ação dos recorrentes com a corré Shélida, que possui antecedentes criminais.
Como visto, independentemente da vida pregressa de um ou outro, a existência
de motivos idôneos à preventiva torna indiferente o fato das circunstâncias
pessoais dos recorrentes serem positivas.
Dessa forma, demonstrados os pressupostos e motivos autorizadores
da custódia cautelar, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, não
se vislumbra constrangimento ilegal a ser reparado por este Superior Tribunal
de Justiça.
Diante do exposto, dou provimento parcial ao recurso ordinário para
afastar a possibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade por
condenação pelo Tribunal do Júri, eis que pende o julgamento da respectiva
apelação criminal, mantendo-se, contudo, a prisão preventiva dos recorrentes,
na forma do art. 312 do Código de Processo Penal.
É o voto.
Jurisprudência

Tribunal Regional Federal da 1ª Região


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002731-82.2011.4.01.3309 BAHIA
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL OLINDO MENEZES

Licitação. Fraude. Dolo Específico. Não Comprovação.


Absolvição Mantida
1. A caracterização do delito previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93
demanda a comprovação efetiva da conduta delituosa, por meio de
elementos de prova hábeis a demonstrar, com a necessária segurança a
fundamentar uma condenação, que os acusados, ora apelados, teriam
praticado ou concorrido, consciente e voluntariamente, para a prática
do delito em análise, fazendo-se necessária a manutenção da sentença
recorrida que absolveu os apelados, com fundamento no art. 386, inciso
VII, do Código de Processo Penal.
2. A sentença, acertadamente, demonstrou a inexistência do dolo na
conduta dos acusados, no que as razões do recurso são insuficientes
para afastar o decreto absolutório, que se firmou na prova colhida du-
rante a instrução penal, formando um juízo acerca da improcedência
da imputação.
3. Apelação desprovida.
(TRF 1ª R.; ACR 0002731-82.2011.4.01.3309; BA; 4ª T.; Rel. Des. Fed.
Olindo Menezes; DJF1 25/02/2019)

ACÓRDÃO
Decide a Turma negar provimento à apelação, à unanimidade.
4ª Turma do TRF da 1ª Região – Brasília, 11 de fevereiro de 2019.
Desembargador Federal Olindo Menezes – Relator

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Saulo Casali Bahia (Relator Convocado): O
Ministério Público Federal apela de sentença da Vara Federal de Guanambi/
BA, que absolveu Agenor Borges de Souza, Cátia Maria de Souza e Avanício
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 135

Novaes de Freitas da prática do delito descrito no art. 90 da Lei nº 8.666/93


(art. 386, VII, do CPP). Segundo a denúncia, sumariada pela sentença:
“(...)
Agenor Borges de Souza, em maio de 2005, enquanto prefeito do municí-
pio de Sebastião Laranjeiras/BA, teria promovido a montagem fraudulenta da
Carta Convite nº 06/2005, com a participação de Avanício Novaes de Freitas
e de Cátia Maria de Souza de Souza, enquanto representantes das empresas
participantes do certame (respectivamente, Imediata Distribuidora de Ali-
mentos Ltda. e Alimentar Comércio de Alimentos Ltda.).
Sustenta que referido certame teria sido deflagrado com a finalidade de ad-
quirir gêneros alimentícios, com recursos oriundos do Programa Nacional
de Alimentação Escolar – PNAE.
Aponta vários indícios no sentido de que os denunciados teriam frustrado
ou fraudado, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o
caráter competitivo do procedimento licitatório, como intuito de obter, para
si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação
pelo Município de Sebastião Laranjeiras, dessa forma incorrendo na prática
do art. 90 da Lei nº 8.666/93.”
Pugna pela manutenção da absolvição da acusada Cátia Maria de Souza,
e pela condenação dos apelados Agenor Borges de Souza e Avanício Novaes de
Freitas nas penas do art. 90, caput, da Lei nº 8.666/93, c/c o art. 69 do Código
Penal. Afirma que as provas produzidas são suficientes para fundamentar
um decreto condenatório dos acusados, ora apelados, pela prática do delito
previsto no art. 90, caput, da Lei nº 8.666/93.
O órgão do Ministério Público Federal nesta instância, em parecer
firmado pelo Procurador Regional da República Gustavo Pessanha Velloso
(fls. 489-495), opina pelo provimento da apelação.
É o relatório. Sigam os autos ao exame do revisor, que pedirá a desig-
nação de dia para o julgamento (art. 613, I, do CPP).

VOTO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Olindo Menezes (Relator): A sen-
tença, de forma acertada, concluiu pela atipicidade da conduta, nestes termos:
“(...)
Imputa-se aos réus a prática de crime de fraude a licitações, capitulado no art.
90 da Lei nº 8.666/93, o qual incrimina a seguinte conduta:
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
136

‘Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro


expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito
de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do
objeto da licitação.
Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.’
Da análise do tipo penal em questão, resta claro que este não exige a com-
provação de qualquer forma de lesão efetiva ao Erário, buscando tutelar, para
além do patrimônio público, a regularidade e lisura do procedimento licita-
tório, o qual é voltado, dentre outros aspectos, à garantia de isonomia, impes-
soalidade, moralidade e competitividade.
Por outro lado, também é inequívoco que para a caracterização típica desse
delito, o agente deverá agir com o dolo de fraude, bem como com uma fina-
lidade especial de agir (buscando proveito para si ou outrem).
Traçados estes contornos, e cotejando as provas constantes dos autos, não
encontro elementos suficientes para a comprovação do dolo dos acusados,
sobretudo em razão do especial fim de agir exigido em relação ao delito em
questão. Vejamos.
A licitação na modalidade Convite de nº 06/2005, realizada no âmbito do
Município de Sebastião Laranjeiras, teve por objeto a aquisição de gêneros
alimentícios – merenda escolar – com recursos do Programa Nacional de
Alimentação Escolar. Participaram do ‘certame’ as empresas Imediata Distri-
buidora de Alimentos Ltda., Alimentar Comércio de Alimentos Ltda. e SBA
Comercia/ Ltda., sagrando-se ‘vencedora’ a primeira (fls. 70/71).
Decerto que há indícios de irregularidades quanto à realização desse certame,
o que se extrai, em síntese, do seguinte:
a) os excertos do relatório da Controladoria Geral da União colacionados
às fls. 08/09 apontam como indício de fraude à licitação supracitada o fato
de que as empresas Imediata Distribuidora de Alimentos Ltda. e Alimentar
Comércio de Alimentos Ltda. possuíam sede no mesmo endereço, conforme
fls. 83 e 91 dos autos;
b) os acusados Avanício Novaes de Freitas – representante da empresa Ime-
diata Distribuidora de Alimentos Ltda. – e Cátia Maria de Souza representan-
te da licitante Alimentar Comércio de Alimentos Ltda. – residiam no mesmo
endereço no ano da prática dos fatos, qual seja, Avenida Rondônia, nº 165,
Bairro lbirapuera, Vitória da Conquista/BA (fls. 79 e 87), sendo manifesta-
mente inverossímil que as empresas Alimentar e Imediata, tendo seus respec-
tivos ‘representantes’ convivendo na mesma residência, praticassem efetiva
concorrência entre si;
c) a testemunha Etelvino Luz de Oliveira Filho, ao ser questionada pelo re-
presentante do MPF, confirmou que era ‘uma espécie de laranja’ da empresa
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 137

Imediata (mídia audiovisual de fl. 243), comprovando que essa pessoa jurídi-
ca funcionava de forma irregular;
d) situação análoga se verifica quanto à empresa Alimentar, que tinha Cátia
Maria de Souza como sócia (fl. 59), pessoa que aparentemente estava comple-
tamente alheia ao funcionamento de tal empresa. Apesar de não ter admitido
que se tratava de ‘laranja’, Cátia afirmou que, como sócia, nunca participou
de nada, e que tudo referente à empresa era resolvido por ‘Sara Jane’, pessoa
que a teria convencido a entrar para a sociedade (mídia audiovisual – fl. 269);
e) verifico da análise das propostas apresentadas pelas três empresas envolvi-
das (fls. 32, 43 e 55, resumidas no mapa comparativo de preços de fl. 68) que
houve variação mínima de preços entre os produtos licitados. Não obstante
a planilha de especificações do edital (fl. 25) não tenha indicado maiores ca-
racterísticas dos bens a serem licitados, os preços oferecidos pelos licitan-
tes foram praticamente idênticos, com diferença de pouquíssimos centavos
entre um e outro, o que é bastante improvável em condições normais de
concorrência;
f) as propostas das empresas Imediata, Alimentar e da SBA Comercial apre-
sentam a mesma formatação e forma de disposição do texto, inclusive com
os mesmos erros de grafia (na palavra ‘iten’, por exemplo), além de idênticas
abreviações (p. ex., ‘V.Unitario.’, ‘V.Total.’, ‘VIr. Da Proposta’, etc.). Somente
as fontes do editor de texto e os valores foram alterados de uma proposta para
outra (fls. 32, 43 e 55);
g) a proposta da empresa SBA Comercial (fl. 32) é apócrifa, e ainda sem indi-
cação da data de sua suposta apresentação.
Tais características deixam patente a existência de irregularidades no aludido
certame, indicando não ter existido licitação real (com efetivo caráter compe-
titivo e sigiloso entre as propostas dos licitantes).
Entretanto, do conjunto probatório produzido, não foi possível constatar
com segurança a existência de consciência e vontade dos acusados no sentido
de frustrar ou fraudar o caráter competitivo do procedimento licitatório apu-
rado, seja mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, com
uma finalidade especial de buscar proveito para si ou outrem.
Ao ser interrogado, o réu Agenor Borges de Souza, então prefeito municipal,
afirmou que as licitações/compras eram realizadas pela Secretaria da Educa-
ção, não tendo ciência de queixas a respeito da merenda no período em que
foi gestor municipal. Não soube dizer se Avanício teria assinado algum docu-
mento referente à licitação Carta Convite nº 006/2005, sustentando que isso
ficava a cargo da aludida Secretaria de Educação (mídia de fl. 269).
Apesar de responsável pela gestão municipal e de ter homologado o certame
fraudulento, adjudicando o objeto da licitação em favor da empresa benefi-
ciada (fl. 72), não foi possível extrair com segurança que o acusado Agenor
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
138

efetivamente tenha aderido de maneira voluntária e consciente à fraude, ou


que sequer soubesse do ardil. É possível que a alegada fraude tenha sido en-
gendrada por terceiros dentro do próprio Poder Público municipal, sem o
envolvimento do prefeito.
Embora seja indiscutível que enquanto prefeito devia o réu agir com probi-
dade, zelo e dedicação, observando todos os princípios inerentes à Adminis-
tração Pública no fiel exercício de suas funções, o que de fato não ocorreu
em relação ao procedimento em questão, também é certo que o delito em
questão exige o dolo (acrescido de um especial fim de agir) para sua con-
figuração, não bastando a mera inobservância de tais deveres (culpa) para a
caracterização do tipo subjetivo exigido.
Quanto ao réu Avanício Novaes de Freitas, afirmou por ocasião de seu in-
terrogatório que ‘quem cuidava dessa parte [de licitações] era João Paulo’,
pessoa que teria recebido de Avanício uma procuração para atuar em nome da
empresa e que teria participado como representante da Imediata por ocasião
da licitação cuja regularidade se apura nestes autos.
Não obstante o laudo de perícia grafotécnica (fls. 358/363) tenha sido incon-
clusivo quanto à autoria dos manuscritos existentes no processo licitatório
no campo referente à empresa Imediata, é inequívoca a semelhança entre a
assinatura do representante da referida empresa à fl. 324 (contrato adminis-
trativo oriundo da referida licitação) e a assinatura de João Paulo Oliveira
Silva (constante do cartão de assinaturas do Cartório do 3º Ofício de Notas
de Vitória da Conquista – fls. 361/362), que não é réu na presente demanda.
A testemunha Etelvino Luz de Oliveira Filho, por sua vez, afirmou que no
ano de 2005 trabalhava em um escritório de contabilidade e que era sócio da
empresa Imediata ‘apenas no papel’, pois teria ‘emprestado’ seu nome ao ‘Sr.
João Paulo’ [contador do referido escritório], a fim de compor aquela socie-
dade empresária. Revela-se plausível, assim, o envolvimento desse terceiro
na fraude.
Ainda que se considere a tese do MPF, no sentido de que Avanício teria con-
corrido para o crime ao fornecer documentos falsos para que fosse monta-
do o irregular procedimento licitatório; e que ao conferir poderes para uma
pessoa inidônea (João Paulo Oliveira Silva) teria desejado ou, no mínimo,
assumido o risco da perpetração de crimes mediante a utilização da pessoa ju-
rídica da qual era sócio-administrador, tal, por si só, não seria suficiente para a
caracterização de um dolo com especial fim de agir nos moldes exigidos pelo
delito em questão (consistente no intuito de obter, para si ou para sua empre-
sa – conforme sustentou o MPF –, vantagem decorrente da adjudicação do
objeto da licitação).
Ressalto, ademais, que não há prova de qualquer ligação, ajuste ou combi-
nação entre o então prefeito Agenor e o particular Avanício (ora réus), bem
como que o ônus de comprovar tais circunstâncias, e ainda a consciência e
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 139

vontade dirigida ao fim ilícito por parte dos réus competia ao órgão acusador,
o que, a meu ver, não ocorreu a contento na hipótese vertente.
Por fim, quanto à acusada Cátia Maria de Souza, verifico que era sócia mino-
ritária na empresa Alimentar Comércio de Alimentos Ltda. (fls. 57/63), não
tendo exercido poderes de gestão/administração da sociedade. Ademais, ne-
nhum documento ideologicamente falso, constante do procedimento licita-
tório ora apurado, foi firmado pela acusada. Tampouco representou a empre-
sa Alimentar no certame fraudado. Não é possível, assim, da análise de toda a
prova constante dos autos, concluir que Cátia tenha fornecido a proposta de
preços fraudulenta apresentada em nome da Alimentar, por exemplo, e dessa
forma concorrido para a prática delituosa.
Assim, verifico que não existem nos autos provas suficientes a embasar o édi-
to condenatório, impondo-se, portanto, a aplicação do consagrado princípio
in dubio pro reo e a consequente absolvição dos acusados.
III – DISPOSITIVO
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na denúncia e absol-
vo os réus Agenor Borges de Souza, Cátia Maria de Souza e Avanício Novaes
de Freitas, qualificados nos autos, quanto à prática do crime previsto no art.
90 da Lei nº 8.666/93, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Pro-
cesso Penal.
(...)”
O dolo do crime do art. 90 da Lei nº 8.666/93, na hipótese dos autos,
consistiria na consciência voltada para fraudar e frustrar, mediante combi-
nações e ajustes, o caráter competitivo dos procedimentos licitatórios no
âmbito do Município, com a finalidade de obter as vantagens que descreveu
a denúncia, e consistiria basicamente em auferir proveito em benefício pró-
prio ou de outrem com frustração da regularidade e lisura do procedimento
licitatório, o qual é voltado, dentre outros aspectos, à garantia de isonomia,
impessoalidade, amoralidade e competitividade, sendo que a sentença, acerta-
damente, demonstrou a inexistência dos elementos caracterizadores do ilícito
em comento, qual seja o desvio de verbas públicas federais, no que as razões
do recurso são insuficientes para afastar o decreto absolutório, que se firmou
na prova colhida durante a instrução penal, formando um juízo de certeza
acerca da improcedência da imputação.
Tal o contexto, nego provimento à apelação, confirmando a sentença
absolutória em todos os seus termos, pelos seus próprios fundamentos.
É o voto.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
140

VOTO REVISOR
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Cândido Ribeiro (Revisor):
Acompanho integralmente o voto do insigne Relator Saulo Casali Bahia para
negar provimento ao apelo do Ministério Público Federal, confirmando a sentença que
absolveu Agenor Borges de Souza, Cátia Maria de Souza e Avanício Novaes
de Freitas da prática do delito tipificado no art. 90 da Lei nº 8.666/93, uma vez
que a sentença demonstrou a inexistência do dolo na conduta dos acusados.
É o voto.
Desembargador Federal – Cândido Ribeiro
Jurisprudência

Tribunal de Justiça do Acre


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007161-30.2018.8.01.0001
RELATOR: DESEMBARGADOR PEDRO RANZI

Recurso Ministerial. Roubo Praticado Mediante o


Emprego de Arma Imprópria. Pleito de Instauração
de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade
e Conhecimento da Causa de Aumento de Pena.
Rejeição. Exasperação da Pena Basilar pela
Valoração Negativa das Circunstâncias do Crime.
Possibilidade. Recurso Conhecido e Provido
1. Rejeita-se o pleito de instauração de incidente de arguição de incons-
titucionalidade, quando não restar comprovada a existência de vício de
inconstitucionalidade formal na elaboração da Lei. Precedentes.
2. Mesmo após a edição da Lei nº 13.654/2018, o emprego de arma
branca ou imprópria no crime de roubo podem ser consideradas na
fixação da pena basilar do sentenciado, vez que a conduta do agente é
bem mais grave do que a subtração da res por meio de ameaça verbal.
3. Recurso conhecido e provido.
(TJAC; APL 0007161-30.2018.8.01.0001; Ac. 28.026; C.Crim.; Rel. Des.
Pedro Ranzi; DJAC 19/02/2019; p. 19)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação 0007161-
30.2018.8.01.0001, acordam os Senhores Desembargadores da Câmara Crimi-
nal do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, por unanimidade, em rejeitar
a Preliminar suscitada. No mérito, por igual julgamento, dar provimento ao
recurso, nos termos do voto do relator e das mídias digitais gravadas.
Rio Branco – Acre, 14 de fevereiro de 2019.
Desembargador Elcio Mendes – Presidente
Desembargador Pedro Ranzi – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
142

RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Pedro Ranzi, Relator: Trata-
se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Estadual, em razão
do inconformismo com a sentença condenatória da lavra do Juízo da 3ª Vara
Criminal da Comarca de Rio Branco que, julgando parcialmente procedente
a denúncia, condenou Catrine Nobre da Silva ao cumprimento da pena de
4 (quatro) anos de reclusão, em regime semiaberto, bem como ao pagamento
de 15 (quinze) dias-multa, cada dia no mínimo legal, em razão da prática do
crime previsto no art. 157, caput, c/c o art. 61, inciso I, ambos do Código Penal.
O Parquet, em suas razões recursais de p. 115/123, requisitou, prelimi-
narmente, a instauração de incidente de controle difuso de constitucionalidade,
a fim de declarar a inconstitucionalidade do art. 4º da Lei nº 13.654/2018, que
revogou o inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal. No mérito, pugnou
pela reforma da pena-base para reconhecer a negativação do vetor judicial
atinente às circunstâncias do crime.
Em sede de contrarrazões, a defesa rechaçou os argumentos ventilados
pelo Ministério Público, requestando, ao final, o desprovimento do recurso
de apelação.
A Procuradoria de Justiça manifestou-se no parecer de p. 163/169.
É o relatório.

VOTO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Pedro Ranzi, Relator: Sendo
o presente recurso próprio e tempestivo, bem como preenchidos os demais
requisitos de admissibilidade recursal, dele conheço, passando-se de pronto, à
análise do pleito de instauração de incidente de controle difuso de constitu-
cionalidade, a fim de declarar inconstitucional o art. 4º, da Lei nº 13.654/2018,
que revogou o inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal.

I – Do Pedido de Instauração de Incidente de Controle Difuso de


Constitucionalidade
Em suas razões recursais, o Ministério Público do Estado do Acre pug-
nou pela instauração de incidente de controle difuso de constitucionalidade,
a fim de que se reconheça a inconstitucionalidade formal do art. 4º da Lei nº
13.654/2018.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 143

Nesse diapasão, ao digressar sob o sistema bicameral da elaboração das


leis, destacou o Parquet que “durante a tramitação do mencionado projeto de
lei que resultou na promulgação da Lei nº 13.654/2018, que, por sua vez, fez
alterações nos crimes contra o patrimônio insertos no Código Penal, houve
vício no procedimento, traduzido num ‘atropelo’, pois num determinado
momento houve alteração a qual não foi levada ao crivo de debate por uma
das casas legislativas” – p. 118.
Prossegue assentando que a revogação sem a aprovação do Congresso
Nacional, antes da sanção ou veto constitui manifesta inconstitucionalidade
formal e, in casu, entende que a mudança no texto legal realizada pela CO-
RELE, sem a deliberação dos congressistas e suas consequente aprovação, foi
capaz de caracterizar a inconstitucionalidade do art. 4º da Lei nº 13.654/2018,
fazendo menção, inclusive, de procedente oriundo do Tribunal de Justiça de
São Paulo que reconheceu o apontado vício formal na Lei.
Pois bem, fincadas estas premissas insta salientar que a Câmara Crimi-
nal do Tribunal de Justiça do Estado do Acre já analisou idêntica matéria nos autos do
Processo 0002395-31.2018.8.01.0001, da relatoria do Excelentíssimo Desembargador
Elcio Mendes, ocasião em que o pleito de instauração do incidente de incons-
titucionalidade do art. 4º da Lei nº 13.654/2018, senão vejamos:
“Penal. Processo Penal. Apelação Criminal. Roubo majorado. Questão de
ordem: instauração de incidente de arguição de inconstitucionalidade. Rejei-
ção. Ausência de afronta ao devido processo legislativo. Recurso defensivo.
Redução da causa de aumento de pena do art. 157, § 2º, do Código Penal
ao patamar mínimo. Possibilidade. Súmula nº 443 do Superior Tribunal de
Justiça. Exclusão do valor fixado a título de reparação mínima. Não cabimen-
to. Pedido expresso na denúncia. Comprovação de danos causados à vítima.
Recurso Ministerial. Aplicação da majorante do emprego de arma. Não cabi-
mento. Novatio legis in mellius. Lei mais benéfica. Provimento parcial.
1. Decorrido o prazo sem manifestação acerca da apreciação pelo Plenário,
sendo o Projeto de Lei do Senado nº 149, de 2015, aprovado terminativa-
mente pelas Comissões competentes, Câmara dos Deputados e Senado, e,
por fim, encaminhado para sanção presidencial, inexiste afronta ao devido
processo legislativo.
2. Exige-se fundamentação concreta para aplicação do aumento na terceira
fase da pena no crime de roubo, de acordo com Enunciado nº 443 da Súmula
do Superior Tribunal de Justiça.
3. Mantém-se o valor fixado a título de indenização prevista no art. 387, IV,
do Código de Processo Penal, diante de pedido expresso na denúncia e dos
danos materiais causados às vítimas.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
144

4. Revogada a causa de aumento de pena prevista no inciso I, § 2º, do art. 157,


do Código Penal, aplicável o princípio da novatio legis in mellius, para beneficiar
o agente.
5. Instauração de incidente de arguição de inconstitucionalidade rejeitada.
6. Recurso da defesa conhecido e provido parcialmente.
7. Recurso do Ministério Público conhecido e desprovido.”

No mesmo são os seguintes precedentes da Câmara Criminal:


“Processo penal. Embargos de declaração em apelação criminal. Omissão.
Obscuridade. Conflito de interpretação. Aplicação da novatio legis in mellius de
ofício. Declaração incidental de inconstitucionalidade. Inviabilidade. Mero inconfor-
mismo. Aplicação de tese contrária ao entendimento do Ministério Público.
Rejeição.
1. O inconformismo quanto ao desfecho da causa não justifica a oposição de
embargos de declaração.
2. Embargos de declaração conhecido e rejeitado.” (Embargos de Declara-
ção na Apelação Criminal 0000706-47.2017.8.01.0013.50000, Rel. Des. Elcio
Mendes)
“Apelação criminal. Roubo com causa de aumento de pena. Pleito de instaura-
ção de incidente de arguição de inconstitucionalidade. Impossibilidade de incidência da
causa de aumento de pena do emprego de arma branca.
Rejeita-se o pleito de instauração de incidente de arguição de inconstitucionalidade,
quando não restar comprovada a existência de vício de constitucionalidade formal na
elaboração da Lei respectiva.
A Lei posterior, a princípio, não pode retroagir, salvo nas hipóteses em que puder bene-
ficiar o réu. Constatado que a nova Lei exclui a causa de aumento de pena decorrente
do emprego de arma branca, mantém-se a sentença que condenou o réu pelo crime de
roubo simples.
Instauração de incidente de arguição de inconstitucionalidade rejeitada.
Recurso de apelação criminal improvido.” (Apelação Criminal 0007845-52.
2018.8.01.0001, Acórdão 27.835, Rel. Des. Samoel Evangelista, j. 17.01.2019)

Dessa forma, firme no hígido entendimento jurisprudencial desta


Câmara Criminal, não vislumbro a existência de qualquer vício de incons-
titucionalidade formal no art. 4º da Lei nº 13.654/2018, razão pela qual, voto
pela rejeição da pretendida instauração do incidente de arguição de inconstitucionalidade,
passando-se, à análise do mérito recursal.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 145

II – Do Pedido de Exasperação da Pena Basilar – pela Necessidade


da Valoração Negativa do Vetor Judicial Atinente às Circunstâncias
do Crime
Com a impossibilidade do reconhecimento da inconstitucionalidade
formal do art. 4º da Lei nº 13.654/2018, o Ministério Público requestou a
valoração negativa do vetor judicial atinente às circunstâncias do crime em
desfavor da apelada Catrine Nobre da Silva, sustentando, em resumo, que a
subtração de bens mediante o emprego de uma arma, ainda que branca, pos-
sui o condão de desbordar o tipo penal inicialmente previsto pelo legislador.
In casu, o caderno processual é indene de dúvidas em apontar que no dia
26 de junho 2018, por volta das 21h10min, em via pública no Bairro Preven-
tório, a apelada Catrine Nobre da Silva, por meio de grave ameaça exercida
com emprego de uma tesoura, subtraiu, para si ou para outrem, 1 (um) celular
de marca Samsung, pertencente à vítima Fabilson Cabral da Silva.
Indo direto ao ponto fulcral, tem-se que o Juízo a quo, atento ao sistema
trifásico, dosou a pena da Apelada nos seguintes moldes:
“Em atenção às diretrizes do art. 59 do Código Penal, verifico que restou
comprovada a culpabilidade da ré em grau não acentuado, posto que a sua
conduta não excedeu aos limites do tipo penal; os antecedentes são maculados,
pois a acusada é reincidente; contudo, será apreciado na segundo fase de do-
simetria de pena; a conduta social e a personalidade sem registro de máculas; os
motivos do crime são os naturais do próprio tipo penal, eis que visava amea-
lhar bens materiais, sem a necessária contrapartida laboral, de forma ilícita e
em detrimento do patrimônio alheio, não havendo o que se valorar em seu
desfavor; as circunstâncias fazem parte do desenrolar natural do tipo, não ha-
vendo o que se considerar, sob pena de incorrer no fenômeno do bis in idem;
as consequências não foram graves, pois o celular foi recuperado; comportamento
da vítima em nada contribuiu para o cometimento do crime, não havendo o
que se valorar. A situação econômica da ré aparentemente não é boa.
Assim sendo, fixo a pena base em 4 (quatro) anos de reclusão.
Na segunda fase de dosimetria, compenso a atenuante da confissão espontâ-
nea com a agravante da reincidência.
Na terceira e última fase da dosimetria da pena, mantenho em 4 (quatro)
anos de reclusão, total que torno concreto e definitivo.”
Com base nas circunstâncias acima transcritas, constata-se que a pena-
base da Apelada em seu mínimo legal, qual seja, em 4 (quatro) anos de reclusão,
ante a ausência da valoração negativa de qualquer vetor judicial.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
146

Dessa forma, constata-se que o Juízo primevo não levou em consi-


deração o emprego de grave ameaça – mediante a utilização de uma arma
branca (tesoura) na dosimetria de sua pena, dai porque, escorreita a preten-
são Ministerial em obter a valoração negativa do vetor judicial atinente às
circunstâncias do crime.
A respeito da reportada circunstância judicial, leciona Cleber Masson1
que:
“São dados acidentais, secundários, relativos à infração penal, mas que não in-
tegram sua estrutura, tais como o modo de execução do crime, os instrumentos em-
pregados em sua prática, as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal,
o relacionamento entre o agente e o ofendido, etc. Não há lugar para a gravi-
dade abstrata do crime, pois essa circunstância já foi levada em consideração
pelo legislador para a cominação das penas mínima e máxima.”
Assim, muito embora a Lei nº 13.654/2018 tenha revogado o inciso
I do § 2º do art. 157 do Código Penal, não mais fazendo incidir a causa de
aumento da pena, àquele que tenha cometido (art. 2º, parágrafo único, do
CP) ou venha a cometer o crime de roubo, quando a ameaça ou a violência
é exercida com o emprego de arma imprópria ou branca, a jurisprudência já
firmou o entendimento no sentido da possibilidade da valoração destas circunstâncias na
primeira fase da dosimetria da pena.
Nesse sentido, vejamos o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ES-
PECIAL. NÃO CABIMENTO. ROUBO. DOSIMETRIA. CONDE-
NAÇÕES DIVERSAS HÁBEIS A JUSTIFICAREM OS MAUS ANTE-
CEDENTES E A REINCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM.
CONFISSÃO ESPONTÂNEA E REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. COM-
PENSAÇÃO. INTEGRAL. POSSIBILIDADE. EMPREGO DE ARMA
BRANCA (FACA). LEI Nº 13.654/2018. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS.
APLICAÇÃO EM BENEFÍCIO DO RÉU. REGIME FECHADO. ADE-
QUADO. RÉU PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES E REINCI-
DÊNCIA (ART. 33, §§ 2º E § 3º, DO CP). WRIT NÃO CONHECIDO.
ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
(...) V – A Lei nº 13.654/2018 retirou o emprego de arma branca como circunstân-
cia majorante do delito de roubo. Em havendo a superveniência de novatio legis in
mellius, ou seja, sendo a nova lei mais benéfica, deve retroagir para beneficiar o réu, nos
termos do art. 5º, XL, da CF e do art. 2º, parágrafo único, do CP. VI – O emprego de
arma branca, embora não configure mais causa de aumento do crime de roubo, poderá ser
utilizado para majoração da pena-base, quando as circunstâncias do caso concreto assim

1 Direito penal esquematizado: parte geral. 5. ed. São Paulo: Método, 2011. p. 638.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 147

justificarem, o que não se verifica no caso em análise.” (HC 476.385/SP, Rel. Min.
Félix Fischer, Quinta Turma, j. 11.12.2018, DJe 14.12.2018) (g.n.)
“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
APLICAÇÃO DA LEI Nº 13.654/2018. AUSÊNCIA DE REFLEXO CON-
CRETO NA DOSIMETRIA. CONTRARIEDADE AO ART. 59 DO CÓ-
DIGO PENAL. DOSIMETRIA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO
LEGAL. FUNDAMENTO IDÔNEO. COMPROVAÇÃO DA REINCI-
DÊNCIA. NECESSIDADE DE DOCUMENTO HÁBIL E IDÔNEO.
ART. 63 DO CÓDIGO PENAL. SISTEMA INFORMATIZADO DOS
TRIBUNAIS. DADOS. UTILIZAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL DES-
PROVIDO.
(...) 2. Mesmo após a edição da Lei nº 13.654/2018, ‘o emprego de arma branca,
embora não configure mais causa de aumento do crime de roubo, poderá ser utilizado
para majoração da pena-base, quando as circunstâncias do caso concreto assim justifi-
carem’ (HC 436.314/SC, Rel. Min. Félix Fischer, Quinta Turma, j. 16.08.2018,
DJe 21.08.2018). (...)” (AgRg no AREsp 1.340.032/PI, Relª Minª Laurita Vaz,
Sexta Turma, j. 02.10.2018, DJe 23.10.2018) (g.n.)
Dessarte, em análise às idiossincrasias do caso concreto, constatei não só o
maior grau de reprovabilidade da conduta da apelada, que se passando por passageiro
da vítima, que é mototaxista, teve seus objetos subtraídos pela Apelada mediante o
emprego da arma imprópria (tesoura) – cuja conduta é certamente mais grave do que a
subtração por meio de ameaça verbal, tenho por necessária a valoração negativa do
vetor judicial atinente às circunstâncias do crime.

III – Da Realização da Nova Dosimetria


1ª fase da dosimetria – conforme anteriormente reportado e firme à
obediência do princípio do tantum devolutum quantum appellatum, tem-se que
somente o vetor judicial atinente às circunstâncias do crime deva ser levada em
desfavor da apelada, daí porque a sua pena-base deve ser fixada em 4 (quatro)
anos e 8 (oito) meses de reclusão.
2ª fase da dosimetria – presente a agravante da reincidência (art. 61, I, do
CP) e a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP), as quais,
por serem de natureza igualmente preponderantes, devem ser compensadas.
3ª fase da dosimetria – Inexistem causas de aumento ou diminuição de
pena, razão pela qual mantenho a pena da apelada em 4 (quatro) anos e 8 (oito)
meses de reclusão, a qual torno concreta e definitiva.
Condeno-a, ainda, à pena cumulativa de multa que fixo em 15 (quinze)
dias-multa, fixando o valor do dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário
mínimo vigente à data do fato, cada dia sujeito à atualização prevista no § 2º,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
148

do art. 49, do Código Penal e recolhida ao Fundo Penitenciário na forma e


prazo estabelecidos pelo art. 50, do referido Diploma Legal.
Fixa-se o regime fechado para o cumprimento da pena, nos termos do art.
33, § 2º, alínea b, do Código Penal, considerando a sua reincidência.
Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos,
ainda a aplicação de sursis, pois a apelada não preenche os requisitos dos arts. 44
e 77, ambos do Código Penal.
Assim, em resumo as considerações expostas, voto pela rejeição da preli-
minar de instauração do incidente de inconstitucionalidade e, no mérito, pelo provimento
do recurso de apelação.
É como voto.

DECISÃO
Conforme consta da Certidão de Julgamento, a decisão foi a seguinte:
“Decide a Câmara, à unanimidade, rejeitar a preliminar suscitada pelo Minis-
tério Público e, no mérito, dar provimento ao apelo. Câmara Criminal – 14.02.2019.”
Participaram do julgamento os Desembargadores Pedro Ranzi, Elcio
Mendes e Samoel Evangelista.
Bel. Eduardo de Araújo Marques – Secretário
Jurisprudência

Tribunal de Justiça do Distrito Federal


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2017.15.1.001079-6
RELATOR: DESEMBARGADOR ROBERVAL CASEMIRO BELINATI

Injúria Racial e Ameaça. Sentença Condenatória.


Recurso da Defesa. Pedido de Aplicação do Concurso
Formal Próprio entre os Crimes de Injúria Racial
e Ameaça. Impossibilidade. Desígnios Autônomos.
Recurso Conhecido e Não Provido
1. Em se tratando de crimes praticados mediante uma ação e desígnios
autônomos, aplica-se a regra do concurso formal impróprio previsto
na segunda parte do art. 70 do Código Penal, cumulando-se as penas.
2. Recurso conhecido e não provido para manter a condenação do
recorrente nas sanções dos arts. 140, § 3º (por duas vezes), e 147, caput
(por três vezes), ambos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos e 2
(dois) meses de reclusão e 3 (três) meses e 5 (cinco) dias de detenção,
ambas em regime inicial aberto, substituída a pena privativa de liberdade
por duas restritivas de direitos, além de 21 (vinte e um) dias-multa, à
razão mínima.
(TJDF; APR 2017.15.1.001079-6; Ac. 115.2577; 2ª T.Crim.; Rel. Des.
Roberval Casemiro Belinati; DJDFTE 26/02/2019)

ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores da 2ª Turma Criminal do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Roberval Casemiro
Belinati – Relator, Silvanio Barbosa dos Santos – Revisor, João Timóteo de
Oliveira – 1º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Roberval
Casemiro Belinati, em proferir a seguinte decisão: Recurso conhecido e não
provido. Unânime., de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 14 de fevereiro de 2019.
Roberval Casemiro Belinati – Relator
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
150

RELATÓRIO
Cuida-se de apelação criminal interposta pela defesa de Humberto Ribeiro
da Silva contra a sentença que condenou o réu nas sanções dos arts. 140, § 3º
(injúria racial), por duas vezes, e 147, caput (ameaça), por três vezes, ambos do
Código Penal, nos autos da Ação Penal 2017.15.1.001079-6, em curso perante
o Juizado da Vara Criminal e Tribunal do Júri da Circunscrição Judiciária do
Recanto das Emas/DF (fls. 88/99).
A denúncia narrou os fatos nos seguintes termos (fls. 02/02-B):
“(...) No dia 1º de março de 2017 (quarta-feira), por volta das 13h, no interior
de um ônibus de transporte coletivo que se encontrava em via pública situada
na Quadra 803 do Recanto das Emas/DF, Humberto Ribeiro da Silva, com
vontade livre e consciente, injuriou Francisco Ramos e Milane Barros por
meio da utilização de elementos referentes à condição de raça, ofendendo-
lhes a dignidade.
Consta dos autos que, nas condições de tempo e local declinadas, Humber-
to, aparentemente embriagado, adentrou o ônibus coletivo então conduzido
pela vítima Francisco, causando confusão por se recusar a pagar a tarifa res-
pectiva. Após o pagamento, Humberto passou a injuriar a vítima Francisco,
valendo-se de elementos relacionados à raça, chamando-o de ‘macaco’ e di-
zendo ‘como é que um macaco está dirigindo’. Milane, passageira do ônibus
que se prontificou a testemunha contra Humberto, também foi vítima de
injúria racial, sendo chamada pelo denunciado de ‘macaca nojenta’.
No mesmo contexto fático, horário e local acima apresentados, Humberto,
ainda agindo de forma livre e consciente, ameaçou as vítimas Rafael Eloi,
Francisco Ramos e Milane Barros de causar-lhes mal injusto e grave.
Extrai-se dos autos que, nas circunstâncias acima narradas, Humberto amea-
çou as vítimas de morte, dizendo ‘vou te matar, vou pegar um 38’ e ‘eu tenho
um oitão e vou te matar’. (...)”
Processada a ação penal, a pretensão punitiva estatal foi julgada pro-
cedente para condenar o acusado à pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses
de reclusão, além de 3 (três) meses e 5 (cinco) dias de detenção, ambas em
regime inicial aberto, e 21 (vinte e um) dias-multa, à razão mínima. A pena
privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, a serem
estabelecidas pelo Juízo das Execuções. Ao sentenciado foi concedido o direito
de recorrer em liberdade e não houve a fixação de valor mínimo a título de
danos morais (fls. 88/99).
O acusado foi intimado por edital da sentença condenatória (fl. 110).
Inconformada, a defesa apresentou recurso de apelação em favor do
réu (fl. 105).
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 151

Nas razões recursais (fls. 105/105v), requer o reconhecimento do con-


curso formal próprio entre os crimes de injúria e de ameaça, aplicando a pena
mais grave do crime de injúria aumentada de 1/6 (um sexto) e a mais grave
do crime de ameaça aumentada em 1/5 (um quinto).
O Ministério Público apresentou contrarrazões, pelo conhecimento e
não provimento do apelo (fls. 115/115v).
Parecer do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Antônio Gaspar Viegas,
pelo conhecimento e não provimento do apelo (fls.119/121).
É o relatório.

VOTOS
O Senhor Desembargador Roberval Casemiro Belinati – Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Da Aplicação do Concurso Formal Próprio


A defesa requer o reconhecimento do concurso formal próprio entre
os crimes de injúria e de ameaça, aplicando a pena mais grave do crime de
injúria aumentada de 1/6 (um sexto) e a mais grave do crime de ameaça au-
menta em 1/5 (um quinto).
Sem razão.
Na sentença, a douta Magistrada a quo fez incidir a regra do concurso
formal impróprio (art. 70, segunda parte, do Código Penal), por entender que
os crimes concorrentes resultaram de desígnios autônomos.
Neste ponto, a sentença não merece reparos.
No caso ora em análise, observa-se do conjunto probatório que o réu
praticou os crimes de injúria e os crimes de ameaça com desígnios autônomos
em relação a cada uma das vítimas.
A vítima Francisco Ramos Dourado, motorista do ônibus, em sede
inquisitorial, declarou que o réu ingressou no coletivo e causou confusão
em frente à catraca, pois não queria efetuar o pagamento devido. Disse que
esclareceu que, se o acusado não pagasse, seria necessário que descesse do
ônibus. Afirmou que o réu pagou, mas passou a proferir ameaças e ofensas,
dizendo: “vou te matar, vou pegar um 38 e como é que um macaco está di-
rigindo?”, verbis:
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
152

“(...) Exerce a função de motorista na empresa URBI, sendo que na data de


hoje, dia 01.03.2017, por volta das 13h, na altura da Quadra 803, Recanto das
Emas/DF, em frente ao supermercado EURO, um indivíduo do sexo mascu-
lino (35 a 40 anos) entrou no coletivo e causou confusão em frente à catraca,
pois não queria efetuar o pagamento devido. Diante disso, o declarante disse
que caso o indivíduo não pagasse que seria necessário que descesse. Contra-
riado, o indivíduo efetuou o pagamento, mas continuou a causar confusão,
tendo passado a proferir ameaças e ofensas, tendo o agressor dito: ‘vou te
matar, vou pegar um 38’ e ‘como é que um macaco está dirigindo’. O agressor
passou a implicar com uma passageira que estava gestante de 8 meses. Tendo
tal fato motivado o declarante a parar o veículo no posto policial, onde relatou
os fatos e onde a passageira se prontificou a servir como testemunha. O autor
passou a ofender e a ameaçar a passageira, dizendo que ‘ela era macaca, que
iria matá-la, que iria descobrir onde ela mora, tendo a xingado de prostituta’.
Deseja representar criminalmente em desfavor do agressor (...)”. (fl. 04)
Em Juízo, o ofendido Francisco não foi ouvido, tendo as partes dis-
pensado sua oitiva (fl. 83).
A vítima Milane Barros Maciel, que estava gestante à época dos fatos,
tanto nas fases inquisitorial e judicial, declarou que, após as ofensas e ameaças
dirigidas ao motorista Francisco, houve a condução do ônibus até um posto
policial, onde se prontificou a servir como testemunha. Disse que diante de
tal situação, o acusado ficou revoltado e passou a ofendê-la e ameaçá-la den-
tro da viatura policial, com os seguintes dizeres: “você é uma macaca velha,
vagabunda, prostituta, você vai morrer, eu vou te dar um tiro de oitão, eu
vou também matar o seu filho que está para nascer” (fl. 05 e mídia de fl. 86).
De igual modo, a vítima Rafael Eloi Alves Noronha, cobrador do ônibus,
relatou que o acusado entrou no coletivo alegando que não tinha dinheiro, e
o motorista pediu para ele se retirar. Disse que o réu pagou e após começou
a xingar e ameaçar o motorista do ônibus. Afirmou que o apelante, na dele-
gacia, também o ameaçou de morte, dizendo que iria matá-lo com um tiro de
revólver, enquanto os casos de racismo foram dirigidos somente ao motorista
e à outra vítima (fl. 03 e mídia de fl. 86).
O policial Eder Franco Silva, em sede judicial, relatou que estava em um
posto policial e logo após o ônibus chegou. Disse que foi informado de que o
réu, que estava aparentemente alcoolizado, dirigiu ofensas raciais e ameaças a
algumas pessoas que estavam no ônibus. Declarou que, durante a condução à
delegacia, dentro da viatura, presenciou o réu ameaçando e xingando a vítima
Milena, falando “macaca nojenta, vou te pegar, vou te matar” (mídia de fl. 86).
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 153

Assim, observa-se dos autos que o réu possuía vontade deliberada diri-
gida a diversos resultados, quais sejam, injúrias dirigidas às vítimas Francisco
e Milane e ameaças dirigidas às vítimas Francisco, Milane e Rafael.
Ademais, verifica-se que os crimes foram perpetrados em momentos
distintos, evidenciando que o réu praticou os dois crimes de injúria racial e os
três crimes de ameaça com desígnios autônomos, o que atrai ao caso concreto
a incidência do art. 70, caput, segunda parte, do Código Penal (concurso formal
imperfeito ou impróprio), que assim dispõe:
“Art. 70. Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois
ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabí-
veis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de
um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se
a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios
autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.”
A respeito do concurso formal imperfeito, Guilherme de Souza Nucci
pontua:
“(...) na segunda parte, está previsto o concurso formal imperfeito: as penas
devem ser aplicadas cumulativamente se a conduta única é dolosa e os deli-
tos concorrentes resultam de desígnios autônomos. A intenção do legislador,
nessa hipótese, é retirar o benefício daquele que, tendo por fim deliberado
e direto atingir dois ou mais bens jurídicos, cometer os crimes com uma só
ação ou omissão. (...)”
Desse modo, deve ser o réu condenado nas sanções dos arts. 140, § 3º
(por duas vezes), e 147, caput (por três vezes), ambos do Código Penal, na
forma do art. 70, caput, segunda parte, do Código Penal.

Da Dosimetria da Pena
Em relação à pena, não há o que se alterar, tendo em vista que os dis-
positivos legais e pertinentes foram bem aplicados à espécie.
Em relação à vítima Milane, a douta Magistrada aplicou a pena-base do
crime de injúria racial no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão.
Na segunda fase, à míngua de circunstâncias atenuantes e reconhecida a
agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea h, do Código Penal (contra mulher
grávida), a pena foi majorada para 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão.
Na terceira fase, ausentes causas de diminuição ou de aumento, estabiliza-
se a pena em 1 (um) ano de reclusão e 2 (dois) meses de reclusão e 11 (onze) dias-
multa, à razão mínima.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
154

Em relação à vítima Francisco, a douta Magistrada aplicou a pena-base


do crime de injúria racial no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, por
considerar favoráveis as circunstâncias judiciais.
Na segunda fase, à míngua de circunstâncias atenuantes e agravantes, a
pena permaneceu no mesmo patamar.
Na terceira fase, ausentes causas de diminuição ou de aumento, estabi-
lizou-se a pena em 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à razão mínima.
Após, aplicada a regra do art. 70, segunda parte, do Código Penal, as
penas dos crimes de injúria racial foram somadas, totalizando 2 (dois) anos e 2
(dois) meses de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa, à razão mínima.
Em relação à vítima Milane, a douta Magistrada aplicou a pena-base do
crime de ameaça no mínimo legal de 1 (um) mês de detenção.
Na segunda fase, à míngua de circunstâncias atenuantes e reconhecida a
agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea h, do Código Penal (contra mulher
grávida), a pena foi majorada para 1 (um) mês e 5 (cinco) dias de detenção.
Na terceira fase, ausentes causas de diminuição ou de aumento, estabiliza-
se a pena em 1 (um) mês e 5 (cinco) dias de detenção.
Em relação aos crimes de ameaça (vítimas Francisco e Rafael), na primeira
fase, a pena-base de cada um dos delitos de ameaça foi aplicada no mínimo
legal de 1 (um) mês de detenção, por considerar favoráveis as circunstâncias
judiciais.
Na segunda fase, à míngua de circunstâncias atenuantes e agravantes, a
pena permaneceu no mesmo patamar.
Na terceira fase, ausentes causas de diminuição ou de aumento, estabili-
zou-se a pena em 1 (um) mês de detenção.
Após, aplicada a regra do art. 70, segunda parte, do Código Penal, as
penas dos crimes de ameaça foram somadas, totalizando 3 (três) meses e 5
(cinco) dias de detenção.
Tratando-se de hipótese de concurso material (art. 69, caput, do Código
Penal), tal como reconhecido na sentença, as penas devem ser somadas, to-
talizando 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 3 (três) meses e 5 (cinco) dias de
detenção, além de 21 (vinte e um) dias-multa, à razão mínima.
Mantém-se o regime inicial aberto para o cumprimento das penas,
conforme estabelecido na sentença, nos termos do art. 33, § 2º, alínea c, do
Código Penal, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por
duas restritivas de direitos.
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 155

Diante do exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento para man-


ter a condenação do recorrente nas sanções dos arts. 140, § 3º (por duas vezes),
e 147, caput (por três vezes), ambos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos e
2 (dois) meses de reclusão e 3 (três) meses e 5 (cinco) dias de detenção, ambas
em regime inicial aberto, substituída a pena privativa de liberdade por duas
restritivas de direitos, além de 21 (vinte e um) dias-multa, à razão mínima.
Em observância ao Provimento nº 29 – CNJ e à Lei Complementar nº
64/90, a presente condenação não gera inelegibilidade, por se tratar de crimes
não abrangidos pela Lei Complementar nº 64/90.
É como voto.
O Senhor Desembargador Silvanio Barbosa dos Santos – Revisor
Com o Relator.
O Senhor Desembargador João Timóteo de Oliveira – Vogal
Com o Relator.

DECISÃO
Recurso conhecido e não provido. Unânime.
Jurisprudência

Tribunal de Justiça de São Paulo


HABEAS CORPUS Nº 2005347-19.2019.8.26.0000
RELATOR: DESEMBARGADOR SÉRGIO COELHO

Art. 24-A da Lei nº 11.340/06. Revogação da Prisão


Preventiva por Ausência dos Requisitos Legais.
Inadmissibilidade
Necessidade da custódia para garantia da ordem pública e segurança
da ofendida. Excesso de prazo da prisão injustificado. Paciente que está
preso cautelarmente há quase três meses, sem conclusão do inquérito
policial. Constrangimento ilegal. Ocorrência. Ofensa ao disposto no
art. 10 do CPP. Ordem concedida, expedindo-se alvará de soltura clau-
sulado em favor do paciente, se por outro motivo não estiver preso,
mediante condições.
(TJSP; HC 2005347-19.2019.8.26.0000; Ac. 12222507; 9ª C.D.Crim.;
Rel. Des. Sérgio Coelho; DJESP 26/02/2019; p. 3.000)

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus 2005347-
19.2019.8.26.0000, da Comarca de Avaré, em que é paciente Alex Sandro
Forlini e impetrante Rogero Aparecido da Silva, é impetrado M.M. Juiz de
Direito da 2ª Vara Criminal do Foro de Avaré.
Acordam, em 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Concederam a ordem em favor do pa-
ciente Alex Sandro Forlini, determinando a expedição de alvará de soltura em
seu favor, se por outro motivo não estiver preso, mediante o comparecimento
em juízo sempre que for convocado para tanto, proibição de ausentar-se da
Comarca e recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga
(art. 319, I, IV e V, do CPP), sem prejuízo, ainda, de estrita observância das
medidas protetivas fixadas pelo Juízo de piso em favor da ofendida. V.U.”, de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores Sérgio
Coelho (Presidente), Costabile e Solimene e Amaro Thomé.
São Paulo, 14 de fevereiro de 2019.
Desembargador Sérgio Coelho – Relator
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 157

VOTO Nº 41164
O Dr. Rogero Aparecido da Silva, Advogado, impetra a presente ordem
de habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de Alex Sandro Forlini,
apontando como autoridade coatora o MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Cri-
minal da Comarca de Avaré, que indeferiu o pedido de revogação da prisão
preventiva do paciente (fl. 109).
Sustenta, em resumo, que a decisão a quo carece de fundamentação
idônea, porquanto não demonstrou de modo concreto a presença dos re-
quisitos legais autorizadores da excepcional prisão cautelar. Argumenta que
o paciente é primário e ostenta outros predicados pessoais favoráveis, sendo
desproporcional a sua manutenção no cárcere, mesmo porque, em caso de
eventual condenação, fará jus ao regime aberto. Anota, ainda, que as medidas
cautelares alternativas se afiguram suficientes e adequadas no caso dos autos.
Pleiteia, assim, a revogação da prisão preventiva do paciente, com ime-
diata expedição de alvará de soltura em seu favor. Subsidiariamente, pugna
pela aplicação de uma cautelar alternativa ao cárcere.
Os autos vieram instruídos com documentos (fls. 26/118).
Indeferida a liminar (fl. 120), foram prestadas as informações de estilo
pela autoridade apontada como coatora (fls. 123/124) e a douta Procuradoria
de Justiça opinou pela denegação da ordem (fls. 127/131).
É o relatório, em síntese.
Os informes constantes dos autos indicam que a ordem deve ser con-
cedida.
Com efeito, ao que consta, o paciente está preso preventivamente des-
de 20.11.2018, porque, segundo os elementos dos autos, no dia 28.10.2018,
teria ele descumprido as medidas protetivas fixadas em favor da vítima (sua
ex-convivente) nos Autos Digitais 1501509-37.2018.8.26.0073 (fls. 41/42,
44/45 e 61/62).
Ocorre que, pelo que se verifica das informações prestadas pela autori-
dade apontada como coatora no dia 28.01.2019 (fls. 123/124), os autos ainda
“aguardando encerramento do inquérito policial”, sendo certo que, conforme
os registros digitais dos autos de origem, a autoridade policial solicitou, pela
segunda vez, dilação de prazo para conclusão do inquérito, pedido com o
qual concordou o Ministério Público, culminando com o deferimento de
dilação de prazo de mais 60 dias, por decisão proferida no dia 4 de fevereiro
(respectivamente, fls. 151/152, 156 e 184 dos autos de origem).
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Jurisprudência
158

Bem evidenciada, portanto, flagrante ofensa ao art. 10 do Código de


Processo Penal, segundo o qual “O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se
o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado
o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão”.
De fato, sabe-se que os julgamentos devem ser céleres para evitar demo-
ra na prisão cautelar dos acusados, devendo ser julgados em tempo razoável,
segundo o princípio da razoabilidade. No presente caso, contudo, o paciente
nem mesmo figura como acusado, posto que não concluído o inquérito policial
e, por consequência, não oferecida a denúncia, não podendo o paciente pagar
pela morosidade do Estado, por motivo ao qual não deu causa.
Neste sentido:
“HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO. EXCES-
SO DE PRAZO INJUSTIFICADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
OCORRÊNCIA.
1. A impetração demonstra que no caso dos autos, os prazos foram excedidos
de modo injustificado e, ainda que se considerem os percalços enfrentados
pelos Juízos declinantes, tamanha demora afronta o princípio da razoabilida-
de, não se podendo admitir a prisão do paciente por quase de seiscentos dias,
sem que tenha se concluída a formação da culpa.
2. Cabe ao Estado garantir ao réu preso os meios necessários à aplicação da
lei penal, sem que seja o acusado submetido a constrangimento ilegal decor-
rente de excesso de prazo para o encerramento de instrução que se arrasta, de
comarca a comarca, causando considerável dano ao réu.
3. Ordem concedida.” (STJ, 6ª Turma, HC 46.031/BA, Rel. Min. Hélio Qua-
glia Barbosa, v.u., j. 15.12.05, DJU 13.02.06, p. 852)
Ademais, como já reconheceu este eg. Sodalício:
“Habeas corpus. Receptação, adulteração de sinal identificador de veículo auto-
motor e posse ilegal de armas de fogo. Alegação de excesso de prazo no ofere-
cimento da denúncia. Admissibilidade. Demora do órgão ministerial para oferecer
denúncia em processo com um único réu preso que ofende o princípio constitucional da
razoabilidade e reclama o relaxamento da prisão cautelar, máxime por ter extrapolado o
prazo conjunto dos arts. 10 e 46 do Código de Processo Penal. Ordem concedida.”
(HC 0002144-93.2013.8.26.0000, j. 07.03.2013)
Ora, no caso em comento, como já assinalado, o paciente está preso
desde 20 de novembro de 2018, portanto, há quase três meses, sem que a ação
penal tenha se iniciado até o presente momento, o que equivale a reconhecer
que já cumpriu, em regime mais rigoroso, quase a totalidade da pena que
eventualmente lhe venha a ser imposta, a qual, como cediço, é de detenção e
não admite a fixação do regime fechado (art. 33, caput, do CP) – ainda que se
Jurisprudência – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 159

o considere como portador de maus antecedentes por já ter sido condenado


por incurso no art. 65 da LCP (Apelação Criminal 0004166-31.2015.8.26.0073,
Rel. Des. Almeida Sampaio, j. 06.03.2017).
Desta feita, a medida restritiva de liberdade cautelar, por se revestir de
caráter excepcional, não pode e muito menos deve ser mantida, sem justa
razão, por período excessivo, sob pena de se tornar abuso por parte do Estado,
incompatível com o Estado Democrático de Direito. Todo réu, especialmente
aquele que se acha acautelado provisoriamente, tem o direito subjetivo de
ser julgado pelo Poder Judiciário dentro de um prazo razoável, sem demora
excessiva e sem dilações indevidas, sob pena de se caracterizar uma situação
de injusto constrangimento ao seu status libertatis.
Com estas considerações, concedo a ordem em favor do paciente Alex
Sandro Forlini, determinando a expedição de alvará de soltura em seu favor,
se por outro motivo não estiver preso, mediante o comparecimento em juízo
sempre que for convocado para tanto, proibição de ausentar-se da Comarca
e recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga (art. 319,
I, IV e V, do CPP), sem prejuízo, ainda, de estrita observância das medidas
protetivas fixadas pelo Juízo de piso em favor da ofendida.
Desembargador Sérgio Coelho – Relator
Divergência Jurisprudencial

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Prisão Domiciliar – Inexistência de Vaga Adequada em


Estabelecimento Prisional para o Cumprimento da Pena –
Possibilidade/Impossibilidade
88/1 → AGRAVO EM EXECUÇÃO. INEXISTÊNCIA DE ESTABELECIMENTO
PRISIONAL ADEQUADO AO REGIME SEMIABERTO. SUPERLOTAÇÃO CARCE-
RÁRIA. SÚMULA VINCULANTE Nº 56 DO STF. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA
INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. EXCEP-
CIONAL CONCESSÃO DA PRISÃO DOMICILIAR. DECISÃO MANTIDA. Diante da
superlotação carcerária e da impossibilidade de adequação do cumprimento da pena às regras
do regime semiaberto, é de se admitir a excepcional concessão da prisão domiciliar, até que
surja vaga em estabelecimento adequado, a fim de evitar excesso na execução. Inteligência da
Súmula Vinculante nº 56 do STF. (TJMG; AG-ExcPen 1.0313.16.004915-8/001; 2ª C.Crim.;
Rel. Des. Renato Martins Jacob; TJEMG 28/05/2018)

88/2 → EXECUÇÃO PENAL. REGIME PRISIONAL SEMIABERTO. INEXIS-


TÊNCIA DE VAGA ADEQUADA EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL PARA O
CUMPRIMENTO DA PENA. EXCESSO NA EXECUÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART.
185 DA LEP. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
POSSIBILIDADE DE PRISÃO DOMICILIAR. RECURSO NÃO PROVIDO. Diante da
inexistência de vagas em estabelecimento prisional adequado (art. 33, § 1º, b, do CP), é cabível
a prisão domiciliar, por período determinado, pois não pode a ineficiência estatal prejudicar o
apenado. Recurso não provido. (TJMG; AG-ExcPen 1.0693.15.009247-8/002; 4ª C.Crim.; Rel.
Des. Corrêa Carmargo; DJEMG 30/05/2018)

88/3 ← AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. REGIME SEMIABERTO. AUSÊNCIA


DE VAGA EM ESTABELECIMENTO PRÓPRIO OU LOCAL ADEQUADO. CONCES-
SÃO DO REGIME DOMICILIAR. INCABIMENTO. MEDIDAS COMPENSATÓRIAS
FIXADAS EM CONFORMIDADE COM A SÚMULA VINCULANTE DO STF. BENE-
FÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. CONCESSÃO. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO
DAS CUSTAS PROCESSUAIS. 1. Inviável a concessão do cumprimento de pena em regime
domiciliar aos apenados que se encontram em regime semiaberto, uma vez que, apesar de não
haver estabelecimento adequado ao cumprimento de pena no referido regime, foram adotadas
outras medidas compensatórias, em conformidade com os parâmetros estabelecidos no RE
641.320. 2. Tendo em vista a declaração da inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 14.939/03,
pelo Órgão Especial deste Tribunal, e sendo o agravante pobre no sentido legal, deve ser a ele
concedida a gratuidade da justiça, com a consequente suspensão da exigibilidade das custas
processuais, nos termos das disposições trazidas pelo CPC. V.V. Segundo entendimento con-
solidado, configura constrangimento ilegal a submissão do apenado a regime mais rigoroso do
que aquele fixado na sentença condenatória ou em sede de execução penal, não podendo o réu
ser prejudicado pela precariedade do sistema prisional, sob pena de violação aos princípios da
dignidade da pessoa humana e da individualização da pena, devendo-se observar, nessa hipó-
tese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS. (TJMG; AG-ExcPen 1.0702.16.006443-3/001;
7ª C.Crim.; Rel. Des. Sálvio Chaves; DJEMG 08/06/2018)
Ementário

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88/4 – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXPRESSÃO “COM


EXCLUSIVIDADE” DO ART. 4º DA LC CATARINENSE Nº 453/09. ATRIBUIÇÕES DE
DELEGADO DA POLÍCIA CIVIL. PRECEDENTES. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE
PROCEDENTE. 1. Inocorrência de inconstitucionalidade formal da LC catarinense nº 453/09.
As normas relativas ao reconhecimento de atribuições do cargo de delegado de polícia, de
polícia judiciária e de apuração de infrações penais não versam sobre matéria processual penal.
A circunstância de as atividades, em tese, conduzirem a futura instauração de inquérito penal,
não altera a natureza administrativa da matéria tratada na norma impugnada. 2. Jurisprudência
do STF: não exclusividade do desempenho das atividades investigativas pela polícia civil. RE
593.727-RG/MG. 3. Ação julgada parcialmente procedente para dar interpretação conforme
ao art. 4º da LC nº 453/09 de Santa Catarina, assentando-se haver exclusividade da atuação dos
delegados de polícia civil apenas quanto às atribuições de polícia judiciária. As infrações penais,
todavia, podem ser apuradas pelas demais instituições constitucionalmente responsáveis pela
garantia da segurança pública, da ordem jurídica e do regime democrático. (STF; ADI 4.618;
SC; T.P.; Relª Minª Carmen Lúcia; DJE 19/02/2019)
88/5 – AÇÃO PENAL. PECULATO-DESVIO. DEPUTADO FEDERAL E COR-
RÉU SEM PRERROGATIVA DE FORO. 1. DESVIO, EM PROVEITO PRÓPRIO, DOS
RECURSOS PÚBLICOS DESTINADOS À CONTRATAÇÃO DOS ASSESSORES
PARLAMENTARES. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. ÔNUS DA PROVA.
INCUMBÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. AUSÊNCIA DE COR-
ROBORAÇÃO. 2. MODALIDADE SUBSIDIÁRIA DE PECULATO-DESVIO. ERÁRIO
PÚBLICO UTILIZADO PARA PAGAMENTO DE EMPREGADOS PARTICULARES,
CONTRATADOS, FORMALMENTE, COMO SECRETÁRIOS PARLAMENTARES.
PRECEDENTES: INQ 1.926 E INQ 3.776. LASTRO PROBATÓRIO INSUFICIENTE.
ATIVIDADE DE SECRETÁRIO PARLAMENTAR NA AMBIÊNCIA DO DIREITO PE-
NAL ASSENTADA NA AP 504/DF. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. 1. A
denúncia descreve esquema de desvio, em proveito próprio, dos recursos públicos da Câmara
dos Deputados destinados à contratação de assessores parlamentares. 2. Ausência de inequívoca
comprovação de que os assessores parlamentares, efetivamente, repassaram a remuneração
ao Deputado Federal por intermédio de seu irmão. 3. As provas orais colhidas nos autos se
mostram insubsistentes para caracterizar o cometimento dos crimes noticiados na incoativa,
sobretudo quanto cotejadas com o laudo pericial e documentos requisitados. 4. Crime de pe-
culato, sob o viés do desvio de dinheiro público, em proveito próprio, por meio da utilização
da Administração Pública para pagar o salário de empregado particular. 5. O julgamento da
AP 504/DF, Segunda Turma, Rel. do Acórdão Dias Toffoli, densificou a discussão da matéria
ao esclarecer que, na ambiência do direito penal, a atividade de secretário parlamentar “não se
limita ao desempenho de tarefas burocráticas (pareceres, estudos, expedição de ofícios, acom-
panhamentos de proposições, redação de minutas de pronunciamento, emissão de passagens
aéreas, emissão de documentos, envio de mensagens eletrônicas oficiais, etc.), compreende
outras atividades de apoio intrinsecamente relacionadas ao exercício do mandato parlamentar,
como o atendimento à população (art. 8º do Ato da Mesa nº 72/97 da Câmara dos Deputados)”.
6. Lastro probatório insuficiente para demonstrar que os secretários parlamentares foram
contratados, apenas formalmente, para que recebessem os salários por meio da Câmara dos
Deputados, quando, na realidade, desempenhavam exclusiva atividade privada para parlamentar,
com auxílio do irmão. 7. Princípio do in dubio pro reo, tendo em conta que a prova contida nos
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
162

autos é totalmente insegura, o que impõe a absolvição, com fulcro no art. 386, VII, do Código
de Processo Penal. (STF; AP 528; DF; 2ª T.; Rev. Min. Celso de Mello; DJE 01/02/2019)
88/6 – ADULTERAÇÃO DE SINAL DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ADULTE-
RAÇÃO GROSSEIRA. ATIPICIDADE. Não implica infração material à norma do art. 311
do Código Penal a adulteração grosseira de placa de veículo que se faça facilmente perceptível,
posto que produzida com colagem de papel para modificação dos algarismos respectivos. (TJSP;
RSE 0104636-08.2016.8.26.0050; Ac. 12204861; 2ª C.D.Crim.; Rel. Des. Sérgio Mazina Martins;
DJESP 26/02/2019; p. 2.961)
88/7 – AMEAÇA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ART. 217-A, CAPUT E § 1º,
PARTE FINAL, DO CÓDIGO PENAL. ABSOLVIÇÃO. ERRO DE TIPO. ART. 20 DO
CÓDIGO PENAL. TESE AFASTADA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS.
DEPOIMENTO DA VÍTIMA. COERENTE. HARMONIA COM A PROVA TÉCNICA E
DECLARAÇÕES DOS INFORMANTES. LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO.
VESTÍGIOS DE CONJUNÇÃO CARNAL E VIOLÊNCIA. LESÕES CORPORAIS. DO-
SIMETRIA. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. DESFAVORÁVEIS.
FATOS CONCRETOS MANTIDOS. QUANTUM. DESPROPORCIONALIDADE. RE-
DUÇÃO. DADO PARCIAL PROVIMENTO. 1. Não se acolhe a tese de erro sobre elemento
do tipo quando ausente prova de que o autor do crime realmente tinha elementos seguros para
assim entender, o que não é o caso dos autos. 2. Mantém-se a condenação quando o acervo
probatório, constituído por laudos técnicos, depoimentos da vítima e mais declarações de
informantes, demonstrarem com certeza a prática e autoria de crime de estupro de vulnerá-
vel. 3. A valoração negativa das circunstâncias judiciais foram fundamentadas em elementos
constantes dos autos, inclusive com análise advinda de dados técnicos. 4. O Magistrado possui
certa discricionariedade no momento de estabelecer o quantum de aumento da pena-base,
devendo atender, no entanto, aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. No
presente caso, verifica-se que a majoração da pena na primeira fase da dosimetria se deu em
patamar desproporcional, razão pela qual deve ser reduzida. 5. Dado parcial provimento ao
recurso. (TJDF; APR 2018.04.1.000533-8; Ac. 115.2787; 2ª T.Crim.; Rel. Des. João Timóteo de
Oliveira; DJDFTE 26/02/2019)
88/8 – APROPRIAÇÃO INDÉBITA. ÔNUS DA PROVA. Aquele que alega o repasse
de dinheiro ao proprietário haveria de positivar de modo inequívoco esse fato, sob pena de
responder pela apropriação indébita respectiva. (TJSP; ACr 0084953-87.2013.8.26.0050; Ac.
12215500; 2ª C.D.Crim.; Rel. Des. Sérgio Mazina Martins; DJESP 26/02/2019; p. 2.958)
88/9 – ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO MAJO-
RADO. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA. EXECUÇÃO
PROVISÓRIA DA MEDIDA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO SOMENTE NO EFEITO
DEVOLUTIVO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. Não há constran-
gimento ilegal na determinação da execução imediata da medida socioeducativa de liberdade
assistida, ainda que o paciente tenha permanecido em liberdade no curso de processo, haja vista
o escopo ressocializador das medidas socioeducativas e a observância ao princípio da proteção
integral da criança e do adolescente e da atualidade na aplicação das medidas socioeducativas.
2. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-HC 472.186; Proc. 2018/0258378-0; SC; 6ª T.;
Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 22/02/2019)
88/10 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO. FORAM REALIZADAS DIVERSAS
TENTATIVAS DE LOCALIZAÇÃO DA PARTE, PORÉM INFRUTÍFERAS. ART. 66,
PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 9.099/95. A remessa dos autos ao Juízo comum é cabí-
vel quando o acusado não for encontrado. Não sendo encontrado o autor do fato, o declínio
de competência para o Juízo Comum é a solução mais acertada. Ademais, não cabe, em sede
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 163

de Juizado Especial Criminal, a rotina de expedição de ofícios às repartições públicas com a


finalidade de localização do autor do fato, até porque, o referido procedimento, mesmo em se
tratando de juízo comum, constitui mera liberalidade. Para que seja autorizado o declínio de
competência, basta, tão somente, que se verifique a necessidade de realização de citação por
edital. Realização de diligências com a finalidade de localização do endereço do autor do fato
não se coaduna com os critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual
e celeridade, critérios que norteiam a sistemática dos Juizados Especiais Criminais. Improce-
dente o conflito para declarar como competente o juízo de direito da 2ª Vara Criminal de São
Gonçalo, a quem deverão ser remetidos os autos. (TJRJ; ICJ 0068705-21.2018.8.19.0000; 4ª
C.Crim.; Relª Desª Gizelda Leitão Teixeira; DORJ 26/02/2019; p. 139)
88/11 – CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DESOBEDIÊNCIA E
DESACATO. PROVÁVEL ABSORÇÃO DO MENOS PELO MAIS GRAVE. APLICAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. PENA MÁXIMA EM ABSTRATO DENTRO
DOS LIMITES DA LEI Nº 9.099/95. 1. Para a fixação da competência não é suficiente
apenas a soma abstrata das penas máximas cominadas para os crimes supostamente come-
tidos. 2. Considerando que as condutas foram praticadas em um único contexto fático sem
demonstração de desígnios autônomos, é altíssima a possibilidade de aplicação do princípio
da consunção (ou da absorção), pelo qual o crime menos grave (resistência) é absorvido
pelo de maior gravidade (desacato). 3. Nesse cenário, deve ser considerada apenas a pena
do desacato (que tem teto de 2 anos de detenção) e que fica dentro das arestas previstas no
art. 61 da Lei nº 9.099/95. Conflito de competência procedente para declarar a competência
do juízo suscitado. (TJTO; CJ 0024260-90.2018.827.0000; 2ª C.Crim.; Relª Desª Jacqueline
Adorno; DJTO 13/02/2019; p. 51)
88/12 – CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA A
LEI DE LICITAÇÕES PRATICADO POR MILITAR EM SITUAÇÃO DE ATIVIDADE
CONTRA PATRIMÔNIO SOB A ADMINISTRAÇÃO MILITAR. SUPERVENIÊNCIA
DA LEI Nº 13.491/2017. AMPLIAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA CASTREN-
SE. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM.
SENTENÇA DE MÉRITO NÃO PROFERIDA. NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
DA PERPETUATIO JURISDICTIONIS. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR
COMPETENTE O JUÍZO SUSCITANTE. 1. Hipótese em que a controvérsia apresentada
cinge-se à definição do Juízo competente para processar e julgar crime praticado, em tese, por
militar em situação de atividade contra patrimônio sob a administração militar antes do advento
da Lei nº 13.491/2017. 2. A Lei nº 13.491/2017 promoveu alteração na própria definição de crime
militar, o que permite identificar a natureza material do regramento, mas também ampliou, por
via reflexa, de modo substancial, a competência da Justiça Militar, o que constitui matéria de
natureza processual. É importante registrar que, como a Lei pode ter caráter híbrido em temas
relativos ao aspecto penal, a aplicação para fatos praticados antes de sua vigência, somente será
cabível em benefício do réu, conforme o disposto no art. 2º, § 1º, do Código Penal Militar e no
art. 5º, inciso XL, da Constituição da República. Por sua vez, no que concerne às questões de
índole puramente processual – hipótese dos autos –, o novo regramento terá aplicação imediata,
em observância ao princípio do tempus regit actum. 3. Tratando-se de competência absoluta em
razão da matéria e considerando que ainda não foi proferida sentença de mérito, não se aplica
a regra da perpetuação da jurisdição, prevista no art. 43 do Código de Processo Civil, aplicada
subsidiariamente ao processo penal, de modo que os autos devem ser remetidos para a Justiça
Militar. 4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Auditor da 4ª Auditoria da 1ª
Circunscrição Judiciária Militar do Estado do Rio de Janeiro, ora suscitante. (STJ; CC 160.902;
Proc. 2018/0238712-4; RJ; 3ª S.; Relª Minª Laurita Vaz; DJE 18/12/2018; p. 743)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
164

88/13 – CONTRAVENÇÃO DE VIAS DE FATO, AMEAÇA E DESCUMPRI-


MENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA NO ÂMBITO DAS RELAÇÕES
DOMÉSTICAS. INSURGÊNCIA CONTRA A MANUTENÇÃO DA PRISÃO PRE-
VENTIVA. Alegações de ausência de fundamentação e dos requisitos da prisão preventiva.
Inadmissibilidade. Acusado que não só desobedeceu à medida protetiva de urgência, como
agrediu a vítima, além de ser reincidente. Manutenção da custódia cautelar em perfeita con-
sonância com os ditames dos arts. 312 e 313, inciso III, ambos do Código de Processo Penal,
em perfeita consonância com a exigência da norma-princípio inscrita no art. 93, inciso IX, da
Carta Constitucional de 1988. Ordem denegada. (TJSP; HC 2000333-54.2019.8.26.0000; Ac.
12200200; 13ª C.D.Crim.; Rel. Des. Moreira da Silva; DJESP 26/02/2019; p. 3.015)
88/14 – CONVERSÃO DA PENA ALTERNATIVA EM PRIVATIVA DE LIBER-
DADE. CONDENAÇÃO À PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. Reeducando que, devidamente
intimado para manifestar-se sobre o descumprimento, manteve-se inerte, não apresentando
justo motivo para sua omissão. Conversão negativa. Necessidade. Determinação de elaboração
de novo cálculo de penas. Unificação de penas que não interrompe o prazo para benefícios.
Impossibilidade de desconsideração do período cumprido antes da unificação. Precedentes do
STJ. Agravo parcialmente provido para determinar a não interrupção do prazo. (TJSP; AG-
ExPen 9000318-34.2018.8.26.0506; Ac. 12205903; 16ª C.D.Crim.; Rel. Des. Guilherme de Souza
Nucci; DJESP 26/02/2019; p. 3.059)
88/15 – CORRUPÇÃO PASSIVA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE SANÇÕES
RESTRITIVAS DE DIREITOS. ART. 147 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. IMPOSSI-
BILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. Embora o STF tenha decidido pela viabilidade
da imediata execução da pena imposta ou confirmada pelos tribunais locais após esgotadas as
respectivas jurisdições, esta Corte Superior de Justiça tem se posicionado no sentido de que
tal possibilidade não se estende às penas restritivas de direitos, tendo em vista a norma contida
no art. 147 da LEP. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ; AgRg-EDcl-AREsp
1.301.024; Proc. 2018/0126840-5; SP; 5ª T.; Rel. Min. Jorge Mussi; DJE 26/02/2019)
88/16 – CRIME AMBIENTAL. PESCA EM LOCAL PROIBIDO. ART. 34 DA LEI
Nº 9.605/98. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. A aplicação do
princípio da insignificância tem sido admitida em matéria criminal ambiental em situações
excepcionais pelos Tribunais. 2. Somente quando as circunstâncias nas quais o crime foi
cometido apresentarem potencial mínimo ou inexistente, consubstanciando ínfimo prejuízo
ambiental, autoriza-se a aplicação do princípio favorável à defesa. 3. Apelação criminal im-
provida. (TRF 4ª R.; RCRSE 5016228-17.2018.4.04.7200; SC; 8ª T.; Rel. Des. Fed. João Pedro
Gebran Neto; DEJF 26/02/2019)
88/17 – CRIME CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL. AUTORIA E MA-
TERIALIDADE COMPROVADAS. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL. INAPLI-
CABILIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO
MANTIDA. A circunstância de estar o agente em situação difícil e desempregado, não
caracteriza o estado de necessidade. A conduta descrita no art. 184, §§ 1º e 2º, do CP, é típica,
formal e materialmente, conforme Súmula nº 502 do STJ, afastando a aplicação dos princípios
da adequação social e da intervenção mínima. V. V. APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO
DE DIREITO AUTORAL. AUSÊNCIA DE PERÍCIA NO CONTEÚDO DOS FONO-
GRAMAS E VIDEOGRAMAS. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. Inexistindo laudo pericial
que ateste a real falsificação do conteúdo dos fonogramas e videofonogramas mantidos em
depósito pelo agente, forçoso reconhecer a ausência de provas da materialidade do delito de
violação de direito autoral. (TJMG; APCR 0397958-09.2012.8.13.0145; 3ª C.Crim.; Rel. Des.
Paulo Cézar Dias; DJEMG 22/02/2019)
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 165

88/18 – CRIME DE DESERÇÃO. NECESSÁRIA QUALIDADE DE MILITAR DO


RÉU PARA SUA TIPIFICAÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – A
jurisprudência desta Suprema Corte consolidou-se no sentido de que a qualidade de militar é
elemento estrutural do tipo penal de deserção, de modo que a ausência de tal requisito impede
o processamento da ação penal e, existindo condenação, a execução da reprimenda imposta.
II – A decisão ora atacada destoa da jurisprudência desta Suprema Corte, pois ausente a con-
dição de procedibilidade para o prosseguimento da ação penal por suposta prática do crime de
deserção. (STF; HC-AgR 151.559; RJ; 2ª T.; Rel. Min. Ricardo Lewandowski; DJE 01/02/2019)
88/19 – CRIME DE LAVAGEM DE CAPITAIS. AUTONOMIA. CRIMES ANTE-
CEDENTES. OBTENÇÃO DE VANTAGEM OU IMPUNIDADE. CONEXÃO. PROCES-
SOS EM CURSO. AUSÊNCIA DE SENTENÇA. POSSIBILIDADE. 1. Nos termos do art.
76, II, do CPP, a conexão objetiva ocorre se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido
umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem
em relação a qualquer delas. 2. A conexão objetiva que poderia dar-se do branqueamento com o
antecedente – para obter vantagem ou impunidade no crime prévio – somente ocorre durante
o andamento do processo, antes da sentença, sempre admitindo-se a facultativa separação dos
processos. 3. Estando os processos relativos à prática do delito funcional contra a ordem tri-
butária e do crime de lavagem de capitais ainda em curso, não havendo sentença, impõe-se a
conexão dos feitos, tendo em vista que a eventual prática do delito de branqueamento resultou
das investigações ocorridas no procedimento que ensejou a instauração da ação penal por crimes
funcionais. 4. Agravo regimental provido para dar provimento ao recurso especial, fixando a
competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Sorocaba/SP. (STJ; AgRg-REsp 1.754.773;
Proc. 2018/0179408-7; SP; 6ª T.; Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 22/02/2019)
88/20 – CRIMES DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. EXECUÇÃO PRO-
VISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. NULIDADE PROCESSUAL. INOCORRÊNCIA.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 691 DO STF. 1. Não se conhece de habeas corpus impetrado
contra decisão monocrática proferida por Ministro de Tribunal Superior que indefere a cautelar
em idêntica ação constitucional. Incidência do óbice da Súmula nº 691/STF. 2. A orientação
firmada pelo plenário do STF, no julgamento do HC 126.292 e do ARE 964.246-RG, ambos
da relatoria do Ministro Teori Zavascki, é no sentido de que a execução provisória da pena não
compromete o princípio da presunção de inocência. Ademais, eventual registro da sentença
pelo direito de recorrer em liberdade não impede a execução imediata da reprimenda, desde
que exauridas as instâncias ordinárias. 3. Ausência de teratologia, ilegalidade flagrante ou abuso
de poder que autorize a anulação do processo-crime. 4. Habeas corpus não conhecido, revogada
a liminar. (STF; HC 139.663; PR; 1ª T.; Rel. p/o Ac. Min. Roberto Barroso; DJE 01/02/2019)
88/21 – DELITO DESCRITO NO ART. 217-A, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL.
ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA. Execução provisória
da pena com fundamento no decidido pelo STF no HC 126.292/SP. Possibilidade. Garantia da
ordem pública que autoriza a prisão, em casos graves, após o esgotamento das vias ordinárias.
Descabimento de pedido de sustentação oral em julgamento de agravo regimental em habeas
corpus. Jurisprudência. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF; HC-AgR 161.907;
PR; 2ª T.; Rel. Min. Gilmar Mendes; DJE 11/02/2019)
88/22 – DESAFORAMENTO. MEDIDA EXCEPCIONAL. DÚVIDA QUANTO
À IMPARCIALIDADE DO CONSELHO DE SENTENÇA. CRIME ENVOLVENDO
INTEGRANTES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. Restando demonstrada a dúvida
quanto a imparcialidade do Conselho de Sentença, para julgar crimes praticados por integrantes
de organização criminosa, justifica-se o deferimento de pleito do Juiz de Direito da Comarca,
para o desaforamento da ação penal para a Comarca da Capital, que é contígua. Desaforamento
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
166

deferido. (TJAC; Desaf 0100031-63.2019.8.01.0000; Ac. 28.105; Rel. Des. Samoel Martins Evan-
gelista; DJAC 26/02/2019; p. 9)
88/23 – DESCAMINHO. ART. 334 DO CP. TRIBUTOS ILUDIDOS NO VALOR
DE R$ 1.163,57. INEXISTÊNCIA DE REITERAÇÃO DELITIVA EXPRESSIVA. AU-
SÊNCIA DE CONTUMÁCIA NA PRÁTICA DELITIVA. PRINCÍPIO DA INSIGNI-
FICÂNCIA. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO A QUO. 1. A inexistência de contumácia
delitiva abre a possibilidade de incidência do princípio da insignificância em relação ao delito
de descaminho (art. 334 do CP). 2. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as
razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão
agravada. 3. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-REsp 1.752.824; Proc. 2018/0166901-7;
SC; 6ª T.; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; DJE 22/02/2019)
88/24 – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OPOSIÇÃO. PRAZO LEGAL DE 2
(DOIS) DIAS. 1. O prazo para oposição de embargos declaratórios é de 2 (dois) dias quando
se tratar de matéria criminal, nos termos do art. 619 do CPP. 2. No caso, a decisão do agravo
regimental foi disponibilizada no DJe/STJ em 31.01.2019, considerada publicada em 01.02.2019,
e os aclaratórios foram opostos somente em 06.02.2019, sendo, portanto, intempestivos. 3. Em-
bargos de declaração não conhecidos. (STJ; EDcl-AgRg-AREsp 1.294.801; Proc. 2018/0117602-0;
SP; 5ª, T; Rel. Min. Jorge Mussi; DJE 26/02/2019)
88/25 – EMBARGOS INFRINGENTES. ART. 157, § 2º, INCISOS I E II, DO CÓ-
DIGO PENAL E ART. 244-B DA LEI Nº 8.069/90. PREVALÊNCIA PARCIAL DO VOTO
VENCIDO. Reconhecimento do concurso formal próprio. Da análise da pretensão do em-
bargante em cotejo com os votos proferidos, há de prevalecer, parcialmente, o voto vencido do
desembargador relator Paulo de Tarso Neves que o declarou às fls. 216/218 (item 000216), em
apenas um ponto: reconhecer o concurso formal entre o roubo e a corrupção de menor (art. 157,
§ 2º, incisos I e II, c/c o art. 14, inciso II, do Código Penal), excepcionado o reconhecimento da
modalidade tentada do delito de roubo por entender esta julgadora que o injusto patrimonial
restou consumado, nos exatos termos do vencedor. Consumação. Improcede a pretensão de
valoração da incidência do art. 14, II, do Código Penal, pois o roubador, ainda que por breve
espaço de tempo, desfrutou da posse mansa e pacífica da res furtiva e ao se considerar a narrativa
da vítima Rafael conjugada com o depoimento do policial militar Hugo Ricardo –, dos quais é
extraído que em determinado momento a vítima perdeu o réu de vista e, somente após a per-
seguição realizada pelos agentes da Lei foi ele abordado e detido, não havendo de lhe socorrer
o fato de ter sido preso em flagrante. Concurso formal próprio. Cabível o reconhecimento do
concurso formal do crime de roubo com o de corrupção de menores, porque com uma única
ação o réu perpetrou dois delitos (roubo circunstanciado pelo emprego de arma e concurso
de pessoas e corrupção de menores [duas vezes]), o que acarretará no exaspero da reprimenda
em 1/6 (um sexto) ao se considerar que o Superior Tribunal de Justiça já firmou posição no
sentido de que para a fixação do quantum do exaspero na última fase. Aumento mínimo de 1/6
e máximo de 1/2. Deve ser observado o critério aritmético, ou seja, a quantidade de infrações
perpetradas. Parcial provimento. (TJRJ; EI-ENul 0001601-08.2016.8.19.0024; 5ª C.Crim.; Relª
Desª Denise Vaccari Machado Paes; DORJ 26/02/2019; p. 160)
88/26 – EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. EXCLUSÃO DE CIRCUNSTÂNCIA
JUDICIAL VALORADA NEGATIVAMENTE SEM FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE.
EXCLUSÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO DA ATENUAN-
TE DA CONFISSÃO. ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE
PENA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. PENA PECUNIÁRIA. SUBSTITUIÇÃO.
INVIABILIDADE. Não obstante a exclusão de uma das circunstâncias judiciais na primeira
fase da dosimetria da pena, remanesce outra valorada de forma negativa ao réu, justificando a
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 167

manutenção da pena-base fixada. As provas demonstram a existência de diversas condenações


do apelante, deixando evidente que se trata de réu multirreincidente, razão pela qual se mostra
correta a sentença que não fez a compensação integral da atenuante da confissão com a referida
agravante. A Lei estipula parâmetros para a fixação do regime inicial de cumprimento da pena
imposta. Verificado que o Juiz singular, de forma fundamentada, após examinar as condições
pessoais do réu, fixou regime mais gravoso para o início do cumprimento da pena que lhe foi
imposta, deve a sentença ser mantida no ponto. Ausentes provas da impossibilidade financeira
do apelante, deve ser mantida a pena de prestação pecuniária substitutiva, que pode, inclu-
sive, ser parcelada perante o Juízo da Execução. Recurso parcialmente provido. (TJAC; ACr
0002478-16.2015.8.01.0013; Ac. 28.078; C.Crim.; Rel. Des. Samoel Martins Evangelista; DJAC
26/02/2019; p. 9)
88/27 – EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. VIOLAÇÃO DA PROIBIÇÃO DE DIRI-
GIR VEÍCULO AUTOMOTOR. EXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONDE-
NAÇÃO MANTIDA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE. PROVA
SUFICIENTE. DOSIMETRIA DA PENA. CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
(1º FATO). MANUTENÇÃO DO DECRETO CONDENATÓRIO. As provas existentes
no caderno processual são suficientes para o julgamento de procedência do pedido conde-
natório deduzido na denúncia. Materialidade e autoria suficientemente demonstradas. A
comprovação da alteração da capacidade psicomotora em razão da influência de álcool ou de
outra substância psicoativa que determine dependência pode ser realizada, nos termos do §
2º do art. 306 do CTB, por intermédio de teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico,
perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos. No caso dos
autos, os testemunhos prestados por terceiro envolvido no acidente e pelo policial que atuou
na ocorrência, aliados aos resultados dos testes de alcoolemia e ao atestado médico constante
dos autos, deixam assente que o acusado, conduzindo seu veículo com a carteira de habilitação
suspensa, invadiu a pista contrária e colidiu no veículo que se deslocava em sentido contrário,
apresentando visíveis sinais de embriaguez que, ao final, foram confirmados quando da reali-
zação do teste do etilômetro. Constatada a presença de 1,15 miligramas de álcool por litro de
ar alveolar e, na contraprova, realizada cerca de 20min depois, de 1,21 miligramas de álcool
por litro de ar alveolar. VIOLAÇÃO DA PROIBIÇÃO DE DIRIGIR VEÍCULO AUTO-
MOTOR. SUFICIENTE PROVA. CONDENAÇÃO MANTIDA. Prova documental e oral
demonstrando que o agente foi flagrado conduzindo o veículo Ford Del Rey em via pública,
com seu direito de dirigir suspenso, em que pese ciente da proibição previamente imposta no
âmbito administrativo. Conduta que se subsome ao tipo penal descrito no art. 307 do CTB,
cuja descrição não exige, para fins de caracterização do delito, tenha sido a proibição do direito
de dirigir determinada judicialmente. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICÁVEL. Na
hipótese dos autos, a violação da proibição do direito de dirigir não decorre logicamente do tipo
incerto no art. 306 do CTB, isto é, não constitui meio necessário para a prática do delito de
embriaguez ao volante. E em sendo assim, não há falar em absorção de um delito pelo outro,
uma vez que a condução de automóvel com a habilitação suspensa não decorre logicamente do
tipo inserto no art. 306 do CTB, isto é, não constitui meio necessário para a prática do delito
de embriaguez ao volante, tratando-se, pois, de desígnios absolutamente diversos, figurando-se
autônomos entre si. DOSIMETRIA DA PENA. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA SUBSTITU-
TIVA. REDUÇÃO. Basilares corretamente firmadas em 6 meses e 15 dias de detenção, assim
consolidadas, na ausência de causas de aumento ou redução a operar. Mantido o incremento
de 1/6, pelo concurso de crimes, diante do benevolente reconhecimento da continuidade de-
litiva. Pena total sedimentada em 7 meses e 2 dias de detenção, substituída por uma restritiva
de direitos, consistente em prestação pecuniária, agora reduzida para o montante equivalente
a 1 salário mínimo, considerando que o acusado foi assistido pela Defensoria Pública ao longo
do feito e que teve suspensa a exigibilidade das custas processuais em virtude de sua condi-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
168

ção econômica. PENA PECUNIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO OU


ISENÇÃO. A condenação do réu à pena de multa configura simples realização do preceito
secundário da norma incriminadora e, por isso, é de aplicação cogente, não sendo possível o
seu afastamento ou isenção, sob pena de violação do Princípio da Legalidade. Pena mantida
em 13 dias-multa, à razão mínima, para cada um dos delitos. PREQUESTIONAMENTO. O
julgador não está compelido a esgotar os fundamentos e artigos de lei invocados pelas partes,
sendo suficiente que exponha de forma clara e precisa os argumentos de sua convicção, com
a incidência das normas em que baseia sua decisão. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.
Adesão ao entendimento assentado pelo plenário do STF no julgamento do HC 126.292/SP.
Possibilidade de se executar provisoriamente a pena confirmada por esta segunda instância,
sem ofensa ao princípio constitucional da presunção da inocência. Determinada a execução
provisória da pena. Apelo parcialmente provido. (TJRS; ACr 356467-23.2017.8.21.7000; 8ª
C.Crim.; Rel. Des. Dálvio Leite Dias Teixeira; DJERS 25/02/2019)
88/28 – ESTUPRO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE IMPORTUNA-
ÇÃO SEXUAL PREVISTO NO ART. 215-A DO CÓDIGO PENAL. IMPROCEDÊNCIA.
VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA. 1. Indefere-se o pedido de desclassificação do crime de
estupro para o crime de importunação sexual previsto no art. 215-A do Código Penal, uma
vez que a conduta do acusado se amolda ao crime previsto no art. 213, caput, do Código Penal,
tendo em vista que o recorrente usou de força física, consistente na aplicação de uma gravata,
para imobilizar a vítima, enquanto a apalpava nas nádegas e tentava retirar sua peça íntima
(calcinha), para alcançar sua genitália. 2. Recurso conhecido e não provido. (TJDF; RAG
2019.00.2.000056-9; Ac. 115.4003; 3ª T.Crim.; Rel. Des. Waldir Leôncio Lopes Júnior; DJDFTE
26/02/2019)
88/29 – ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PEDIDO DE CONDENAÇÃO. ERRO DE
TIPO. ART. 20, § 1º, DO CP. VÍTIMA MENOR DE QUATORZE ANOS. DESCONHE-
CIMENTO PELO AGENTE. PALAVRA DA VÍTIMA. 1. A negativa do réu de conhecimento
da menoridade da vítima, corroborada pelas declarações harmônicas da vítima, inspira, sem
nenhuma dúvida, a percepção de ser ela maior de 14 (quatorze) anos de idade, configurando
o erro de tipo quanto à idade da ofendida. 2. O error aetatis evidencia a ausência do dolo ne-
cessário à configuração do delito de estupro de vulnerável, ocasionando, consequentemente,
o reconhecimento da atipicidade do fato, eis que ausente ameaça ou violência e presente o
consentimento da menor. 3. No sistema processual penal brasileiro, vige o princípio do in
dubio pro reo, consubstanciado na tese de que a existência de provas conflitantes nos autos, ou
mesmo a ausência de elementos aptos a confirmarem a autoria do delito, conduzem à absolvição
do acusado nos termos do art. 386, III e VII, do CPP. 4. Recurso desprovido, mantendo-se a
absolvição do apelado. (TJAC; APL 0001343-04.2017.8.01.0011; Ac. 28.045; C.Crim.; Rel. Des.
Pedro Ranzi; DJAC 19/02/2019; p. 16)
88/30 – EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA. PRETENDI-
DA A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA. ACOLHIMENTO. Encontrando-se o
paciente encarcerado há mais de 1 ano e 9 meses, sem ter havido a manifestação do Ministério
Público quanto à possibilidade de aditamento da denúncia, mostra-se imperiosa a revogação
da prisão cautelar, por excesso de prazo. Ordem concedida, com determinação. (TJSP; HC
2252936-57.2018.8.26.0000; Ac. 12225693; 13ª C.D.Crim.; Rel. Des. Luis Augusto de Sampaio
Arruda; DJESP 26/02/2019; p. 3.024)
88/31 – EXCLUSÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE CONDENAÇÃO CRIMI-
NAL DO BANCO DE DADOS DO INSTITUTO DE IDENTIFICAÇÃO RICARDO
GUMBLETON DAUNT – IIRGD, E DEMAIS BANCOS DE DADOS CRIMINAIS.
AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 169

AGRAVADA. SÚMULA Nº 182/STJ. ART. 76, § 4º, DA LEI Nº 9.099/95. REABILITAÇÃO


CRIMINAL. TESES NÃO PREQUESTIONADAS. EXCLUSÃO QUE IMPOSSIBILITA-
RIA A RECUPERAÇÃO NAS HIPÓTESES PERMITIDAS PELA LEI. POSSIBILIDADE
DE OBTENÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA. FUNDAMENTOS INATACADOS. SÚ-
MULA Nº 283/STF. TESE DO DIREITO AO ESQUECIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO
CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA EXCLUSÃO DOS REGISTROS CONS-
TANTES DOS TERMINAIS DE INSTITUTOS DE IDENTIFICAÇÃO CRIMINAL.
ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA
CORTE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Não houve impugnação específica
de todos os fundamentos da decisão ora atacada. Incide, na espécie, a Súmula nº 182/STJ. 2.
O prequestionamento admitido por esta Corte Superior se caracteriza quando o Tribunal de
origem emite juízo de valor sobre determinada questão, englobando aspectos presentes na tese
que embasam a irresignação apresentada no Recurso Especial. Assim, uma tese não refutada
pelo Tribunal de origem não pode ser conhecida no âmbito do recurso especial, por ausência
de prequestionamento. 3. Remanescendo no julgado objurgado fundamento suficiente para
a manutenção da sua conclusão e contra o qual não se insurgiu a parte recorrente, afigura-
se inviável o processamento do recurso especial ante a incidência, por analogia, do óbice da
Súmula nº 283/STF. 4. É descabida, em recurso especial, a revisão de acórdão assentado em
fundamento constitucional. 5. O STJ já enfatizou, em sucessivas decisões, que as anotações
referentes a inquéritos e ações penais em que houve absolvição ou extinção da punibilidade,
conquanto não possam ser mencionadas na folha de antecedentes criminais, nem mesmo em
certidão extraída dos livros em juízo, não podem ser excluídas do banco de dados do Instituto
de Identificação, porque tais registros comprovam fatos e situações jurídicas e, por essa razão,
não devem ser apagados ou excluídos, observando-se que essas informações estão protegidas
pelo sigilo. 6. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-REsp 1.751.708; Proc. 2018/0159003-2;
SP; 6ª T.; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; DJE 22/02/2019)
88/32 – EXECUÇÃO PENAL. ADVENTO DE NOVA CONDENAÇÃO PENAL
COM TRÂNSITO EM JULGADO. SAÍDA TEMPORÁRIA. INTERRUPÇÃO DE PRAZO.
UNIFICAÇÃO DE PENAS. FIXAÇÃO DE NOVA DATA DE CÁLCULO PARA O BENE-
FÍCIO. AUSÊNCIA DO PREENCHIMENTO DE CONDIÇÃO OBJETIVA PREVISTA
NO ART. 123, INCISO II, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. RECURSO CONHECIDO
E DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte de Justiça é pacífica no sentido de que,
sobrevindo nova condenação no curso da execução, considera-se interrompido o prazo para a
concessão de saída temporária, o qual reinicia a partir do novo marco temporal estabelecido na
decisão que efetuou a unificação das penas. 2. Indefere-se o pedido de saída temporária quando
o apenado não preenche o requisito objetivo previsto no art. 123, II, da LEP, a contar da nova
data-base fixada na decisão que unificou suas penas pelo advento de nova condenação criminal
transitada em julgado. 3. Agravo conhecido e não provido. (TJDF; RAG 2019.00.2.000008-7;
Ac. 115.4002; 3ª T.Crim.; Rel. Des. Waldir Leôncio Lopes Júnior; DJDFTE 26/02/2019)
88/33 – EXECUÇÃO PENAL. Limitação de visita do companheiro apenas ao par-
latório. Visitante que possui situação processual de egresso. HC não é meio inidôneo para
questionar sua legalidade. Inexistência de efetiva restrição ao status libertatis do paciente. Prece-
dentes. Direito de visita pode e deve ser regulamentado pela administração penitenciária e pelo
juízo das execuções. Ausência de constrangimento ilegal. Agravo desprovido. (STF; HC-AgR
160.456; SP; 2ª T.; Rel. Min. Gilmar Mendes; DJE 22/02/2019)
88/34 – EXECUÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA.
REINCIDÊNCIA. CONDIÇÃO PESSOAL DO ACUSADO. IRRADIAÇÃO DOS EFEI-
TOS PARA TODAS AS EXECUÇÕES PENAIS EM CURSO APÓS A UNIFICAÇÃO.
INCIDÊNCIA DO ACRÉSCIMO DE 1/3 NA CONTAGEM DO PRAZO PRESCRI-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
170

CIONAL. NÃO INCIDÊNCIA. UNIFICAÇÃO PROCEDIDA APÓS O ADVENTO


DA PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA. SENTENÇA MERAMENTE DECLARATÓRIA. 1.
Conforme entendimento jurisprudencial, após a unificação das penas, a condição de reincidente,
por ser uma condição pessoal do apenado, se alastra para a totalidade da pena a ser cumprida
pelo apenado. 2. Unificada a pena e reconhecida a condição de reincidente, a incidência do
incremento de 1/3 (um terço) na contagem do prazo prescricional se estende a todas as exe-
cuções penais em curso, inclusive em relações àquelas em que o apenado era considerado, até
então, primário. 3. A sentença que extingue a punibilidade pelo advento da prescrição possui
natureza meramente declaratória, tendo em vista que apenas pronuncia algo que já ocorreu
anteriormente e não naquele momento. 4. Considerando que a unificação da pena só ocorreu
após o transcurso do lapso temporal exigido para a prescrição da pretensão punitiva, não há falar
em extensão dos efeitos do reconhecimento da reincidência e, por conseguinte, do aumento
de 1/3 (um terço) no prazo da pretensão executória, previsto no art. 110 do CP. 5. Recurso
conhecido e não provido. (TJDF; RAG 2019.00.2.000058-5; Ac. 115.4001; 3ª T.Crim.; Rel. Des.
Waldir Leôncio Lopes Júnior; DJDFTE 26/02/2019)
88/35 – EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA POR TRABALHO EXTER-
NO. JORNADA INFERIOR A 6 HORAS AOS SÁBADOS. SOMA DAS HORAS PARA
FINS DE REMIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. WRIT NÃO CONHECIDO.
1. Em consonância com a orientação jurisprudencial da Primeira Turma do STF, esta Corte
não admite habeas corpus substitutivo de recurso próprio, sem prejuízo da concessão da ordem,
de ofício, se existir flagrante ilegalidade na liberdade de locomoção do paciente. 2. Para fins
de remição da pena por trabalho externo, a jurisprudência desta Corte não admite a soma de
horas trabalhadas em dias com jornada inferior a 6 horas, nos termos dos arts. 33 e 126, § 1º, da
LEP. Nesse sentido: REsp 1.721.257/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 05.06.2018,
DJe 15.06.2018. No caso, as horas trabalhadas aos sábados, com jornada diária de 4 horas, não
podem ser somadas e incluídas no cálculo da remição da pena. 3. Habeas corpus não conhecido.
(STJ; HC 468.733; Proc. 2018/0235630-2; RS; 5ª T.; Rel. Min. Joel Ilan Paciornik; DJE 21/02/2019)
88/36 – EXTRADIÇÃO INSTRUTÓRIA. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA
PELA JUSTIÇA NORTE-AMERICANA. TRATADO ESPECÍFICO. REQUISITOS
FORMAIS ATENDIDOS. CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO. AUSÊNCIA DE PRE-
VISÃO NO TRATADO. AUSÊNCIA DE DUPLA TIPICIDADE. CRIME DE FRAUDE.
PREVISÃO NO TRATADO. DUPLA TIPICIDADE. INOCORRÊNCIA DE PRESCRI-
ÇÃO. EXTRADIÇÃO PARCIALMENTE DEFERIDA. 1. O pedido formulado pelos Estados
Unidos da América atende aos pressupostos necessários ao deferimento, nos termos da Lei
nº 13.445/2017 e do tratado de extradição específico, inexistindo irregularidades formais. 2.
O Estado requerente dispõe de competência jurisdicional para processar e julgar os crimes
imputados ao Extraditando. 3. Na espécie vertente, não existe autorização expressa da Segunda
Turma para a homologação monocrática da concordância do extraditando, devendo o caso ser
levado à sessão colegiada, até que eventualmente sobrevenha manifestação da Turma no sentido
de delegar competência também para esses casos. 4. O crime de lavagem de dinheiro imputado
ao extraditando não está previsto como hipótese de extradição no Tratado, não preenchendo,
no caso, o requisito da dupla tipicidade. 5. O crime de fraude imputado ao extraditando está
previsto como hipótese de extradição no Tratado. Preenchido o requisito da dupla tipicidade.
Inexistência de prescrição no Brasil ou nos Estados Unidos. 6. Extradição parcialmente de-
ferida. 7. Os bens apreendidos com o extraditando, não reivindicados por terceiros, deverão
ser entregues ao Governo dos Estados Unidos da América, mediante assinatura de termo de
entrega. (STF; Ext 1.503; DF; 2ª T.; Relª Minª Carmen Lúcia; DJE 13/02/2019)
88/37 – FALSIDADE IDEOLÓGICA. LAUDO PERICIAL COMPROVANDO A
MATERIALIDADE DO DELITO. PROVA ORAL SEGURA NO SENTIDO DE QUE
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 171

O RÉU ADERIU À CONDUTA DOS COMPARSAS. Condenação mantida; Falsidade


ideológica. Pena base reduzida. Alteração da modalidade de uma das penas substitutivas. Im-
possibilidade. Opção do Magistrado sentenciante sobre a pena justa e suficiente à reprovação
da conduta. Recurso provido em parte. (TJSP; ACr 0963871-96.2012.8.26.0506; Ac. 12219873;
11ª C.D.Crim.; Rel. Des. Alexandre Almeida; DJESP 26/02/2019; p. 3.014)
88/38 – FALTA GRAVE. RECURSO DEFENSIVO. Alegação de ausência de fun-
damentação da decisão judicial. Inocorrência. Decisão que, mesmo sucinta, foi devidamente
fundamentada. Preliminar afastada. Mérito. Absolvição ou desclassificação para falta média.
Impossibilidade. Autoria e materialidade da infração bem demonstradas. Falta grave confi-
gurada. Perda dos dias remidos. Análise da natureza, dos motivos, das circunstâncias e das
consequências do fato, bem como da pessoa do faltoso e seu tempo de prisão que indicam a
adequação da perda de 1/6 dos dias remidos. Inteligência dos arts. 127 e 57, ambos da Lei nº
7.210/84. Recurso parcialmente provido. (TJSP; AG-ExPen 7006678-91.2018.8.26.0482; Ac.
12230930; 16ª C.D.Crim.; Rel. Des. Leme Garcia; DJESP 26/02/2019; p. 3.059)
88/39 – FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA FORMA DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL DE ADOLESCENTE. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
ACÓRDÃO REFORMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECONHE-
CIMENTO DA TIPICIDADE DA CONDUTA. DETERMINAÇÃO DE REMESSA DOS
AUTOS A ORIGEM PARA PROCEDER UNICAMENTE A DOSIMETRIA DO APELAN-
TE. CUMPRIMENTO. PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. POSSIBILIDADE.
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. APLICAÇÃO DO CONCURSO
FORMAL PERFEITO. OCORRÊNCIA. PENA DEFINITIVA REDIMENSIONADA. 1.
Havendo circunstâncias judiciais desfavoráveis, revela-se correta a fixação da pena-base acima
do mínimo legal. 2. Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, no mesmo contexto
temporal e espacial, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, justifica-se o reconhecimento
do concurso formal, com uma exasperação de um sexto até metade (art. 70, caput, do Código
Penal – 1ª parte). 3. Recurso parcialmente provido. (TJAC; APL 0002477-98.2014.8.01.0002;
Ac. 27.863; C.Crim.; Rel. Des. Francisco Djalma; DJAC 23/01/2019; p. 7)
88/40 – FRAUDE EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. CRIME FORMAL.
DENÚNCIA APTA. DOSIMETRIA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS.
APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1. Não cabe falar, em acerto, em inépcia da denúncia depois da
condenação, que faz supor que a peça cumpriu a sua finalidade, tanto que o processo chegou ao
seu fim natural. Inepta seria a peça cujo vício de narrativa fosse tão grave que impossibilitasse a
defesa dos acusados ou mesmo a própria prestação jurisdicional. Na espécie, a denúncia atende
aos requisitos do art. 41 do CPP, embora com as naturais dificuldades em relação aos crimes
da Lei de licitações, como no caso. 2. O delito previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93 é formal,
não exigindo para a sua consumação a efetiva ocorrência do resultado. Não há como afastar o
prejuízo ao erário, em razão da fraude ao procedimento licitatório, tendo em vista que, o obje-
tivo da licitação é exatamente propiciar à administração contratar o serviço pelo menor preço.
3. Os acusados, de forma livre e consciente, agiram para fraudar o procedimento licitatório,
não havendo prova alguma de que teriam praticado o fato induzidos pelo parecer do procura-
dor municipal, na forma como individualmente demonstrada pela sentença, exaustivamente
transcrita, sendo insuficientes as razões do recurso para afastar as do decreto condenatório.
4. As chamadas circunstâncias judiciais, estabelecidas no art. 59 do Código Penal, matéria do
primeiro exame do julgador na fixação da pena, traduzem fatos exteriores ao tipo penal. Assim,
está correta a sentença quando concluiu que a culpabilidade dos agentes não extrapola aquela
inerente à gravidade do próprio crime praticado, e que os motivos revelam-se ordinários nesta
espécie de delito, não havendo ajustes a considerar. 5. Apelações desprovidas. (TRF 1ª R.;
ACR 0002622-11.2011.4.01.3813; MG; 4ª T.; Rel. Des. Fed. Olindo Menezes; DJF1 25/02/2019)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
172

88/41 – FUNCIONÁRIO PÚBLICO. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO OFICIAL


E DO CARTÃO DE ABASTECIMENTO (TICKET CAR). PECULATO. ART. 312 DO
CP. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. INEXISTÊNCIA DE PROVA. PRE-
SUNÇÃO DE INOCÊNCIA. I – Para a caracterização do crime de peculato é necessária a
demonstração da existência efetiva do ânimo, por parte do funcionário público, de apropriação
indevida de valor ou qualquer outro bem móvel da Administração Pública. II – Inexiste ilícito
penal quando o agente tem ânimo apenas de usar o bem móvel público com nítida intenção
de devolvê-lo, sem prejuízo, contudo, de possível punição na esfera cível e administrativa.
III – É ônus do órgão acusador demonstrar a presença do elemento subjetivo do ilícito, sob
pena de ofensa ao princípio da presunção de inocência. IV – Não havendo dolo, não há que se
falar em atipicidade da conduta e, consequentemente, em continuidade delitiva. V – Recurso
desprovido. (TRF 2ª R.; ACR 0002150-07.2013.4.02.5108; RJ; 2ª T.Esp.; Rel. Juiz Conv. Vlamir
Costa Magalhães; DEJF 22/02/2019)
88/42 – FURTO. REDUÇÃO DA PENA-BASE AO MÍNIMO LEGAL. IMPOS-
SIBILIDADE. AFASTAMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL “MOTIVOS DO
CRIME”. INERENTE AO TIPO. MANUTENÇÃO DOS VETORES “ANTECEDEN-
TES, CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE”. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.
PROVIMENTO PARCIAL. 1. A presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis autoriza
a fixação da pena-base acima do mínimo legal. 2. Para efeito de antecedentes criminais devem
ser utilizadas as condenações anteriores transitadas em julgado. 3. A forma com que o agente
se comporta no meio em que convive, conforme depoimentos colhidos em Juízo, revela que
sua conduta é inaceitável perante a sociedade. 4. O exame negativo da personalidade poderá
ser realizado pelo julgador quando tiver fundamentos concretos no processo que demonstrem
a efetiva periculosidade do agente, independentemente de laudo. 5. A obtenção de lucro fácil
não é fundamentação idônea a justificar a exasperação da pena-base em delitos de cunho patri-
monial. 6. Apelo conhecido e parcialmente provido. (TJAC; APL 0008435-34.2015.8.01.0001;
Ac. 28.008; C.Crim.; Rel. Des. Elcio Mendes; DJAC 20/02/2019; p. 16)
88/43 – FURTO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PENA DE 1 (UM) ANO DE
RECLUSÃO, ALÉM DE 10 (DEZ) DIAS-MULTA, NO VALOR UNITÁRIO MÍNIMO
LEGAL. SUBSTITUIÇÃO, PELO MESMO PERÍODO, DA PENA PRIVATIVA DE LI-
BERDADE POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS CONSISTENTE EM PRESTAÇÃO
DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU A ENTIDADE PÚBLICA A SER ESTIPULADA
PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. REGIME ABERTO EM CASO DE DESCUMPRIMEN-
TO. DEFERIDO O DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. RECURSO DEFENSIVO
PLEITEANDO O RECONHECIMENTO DA TENTATIVA. A dinâmica delitiva consistiu
na subtração de telefone celular Samsung modelo J7 pertencente a vítima participante de evento
que se realizava na praia de Copacabana. Materialidade e autoria adequadas e não impugnadas.
A vítima, em oitiva realizada por carta precatória, que estava na calçada em Copacabana quando
o réu o abordou de forma divertida. O réu o abraçou e logo depois percebeu que seu celular
havia sido subtraído do bolso. Populares perseguiram o réu e conseguiram reaver o telefone,
mas o réu empreendeu fuga. Reconheceu o réu no local dos fatos e embora tenha recuperado
o bem, este estava quebrado. O policial militar Hélio Coelho, em juízo, reconheceu o réu
pela foto de pasta 26 e afirmou que apenas atendeu à solicitação de apoio e conduziu o réu à
unidade policial. A policial militar Adriana Góes, em juízo, reconheceu o réu pela foto de pasta
26 e esclareceu que visualizou um rapaz correndo e algumas pessoas correndo no encalço,
dizendo que ele havia furtado um celular. Quando a policial imobilizou o réu, a vítima já havia
recuperado o telefone, mas o réu fugira. Disse que no local dos fatos elucidou que após o casal
perceber o furto, correram atrás do indivíduo, conseguiram arrecadar o celular, mas o réu con-
tinuou fugindo. A vítima o reconheceu no local dos fatos. Não se procedeu ao interrogatório,
uma vez que William não foi encontrado no endereço fornecido, tendo sido decretada a sua
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 173

revelia. A defesa requer o reconhecimento da prática do delito em modalidade tentada. De


forma acertada, a r. sentença reconheceu que o crime restou consumado. Apesar de o acusado
ter sido preso em flagrante, malgrado posição divergente deste relator, mas quedando-me ao
entendimento majoritário das cortes superiores, há que se reconhecer a consumação do delito,
porque houve a inversão da posse, tendo o bem saído da esfera de disponibilidade da vítima,
tanto que o apelante foi preso em local diverso da subtração, ainda que próximo. Verifica-se
que o agente logrou tirar a coisa da esfera de proteção da vítima e passou, ele próprio, ainda
que por pouco tempo, a desfrutar de sua posse, como ocorreu no presente caso. Outrossim, a
vítima narrou em juízo que, embora tenha recuperado o telefone, este estava quebrado. Con-
sidero adequada a condenação do apelante pela prática do crime previsto no art. 155, caput, do
Código Penal. A dosimetria foi bem lançada, não merecendo reparo, sendo certo que a pena
foi fixada em seu mínimo legal. O sentenciante de forma adequada promoveu a substituição da
pena privativa liberdade por restritiva de direitos. Recurso conhecido para negar provimento.
(TJRJ; APL 0457529-79.2015.8.19.0001; 7ª C.Crim.; Rel. Des. Siro Darlan de Oliveira; DORJ
26/02/2019; p. 202)
88/44 – FURTO QUALIFICADO. ART. 155, § 4º, I, DO CÓDIGO PENAL. SEN-
TENÇA CONDENATÓRIA. INCONFORMISMO DA DEFESA. Mérito. Absolvição,
por insuficiência de provas. Improcedência. Autoria e materialidade configuradas. Restou
demonstrado nos autos, que a subtração foi cometida mediante rompimento de obstáculo, uma
vez que o acusado quebrou o vidro do carona do automóvel para assim subtrair a mochila da
vítima. Prova segura. Pleitos subsidiários. Do afastamento dos maus antecedentes. Inviabilidade.
Folha de antecedentes criminais do apelante acostada aos autos, ostenta maus antecedentes e
reincidência, com 10 anotações, sendo que 4 delas com trânsito em julgado. Agiu com acerto, o
douto magistrado sentenciante, ao reconhecer as anotações de ns. 1 e 3, com trânsito em julgado
em 17 de junho de 2009 e 19 de dezembro de 2006, respectivamente, como maus antecedentes
e as duas últimas anotações como reincidência, não tendo o que afastar a reincidência e os
maus antecedentes. Precedentes do STJ. Do reconhecimento da tentativa. Improcedência. O
delito de furto se consumou, na medida em que houve a inversão da posse do bem. É cediço
que se considera consumado o delito de furto, assim como o de roubo, no momento em que o
agente se torna possuidor da coisa alheia móvel, ainda que não obtenha a posse tranquila, sendo
prescindível que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima para a caracterização
do ilícito. Prequestionamento. Afastamento. Ausência de violação a dispositivos constitucionais
e infraconstitucionais. Apelo defensivo desprovido. (TJRJ; APL 0486212-63.2014.8.19.0001;
7ª C.Crim.; Rel. Des. Sidney Rosa da Silva; DORJ 26/02/2019; p. 201)
88/45 – FURTO QUALIFICADO. CONCURSO DE PESSOAS. CONTINUI-
DADE DELITIVA. PROVA SUFICIENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIME-
TRIA DA PENA. PRIVILÉGIO LEGAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. Para
a configuração do indiferente penal, é preciso verificar a mínima ofensividade da conduta
do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada (STF, HC 84412, Rel. Min.
Celso de Mello, Segunda Turma, j. 19.10.04). E no presente caso, não se constatam todos
esses vetores simultaneamente. Bens avaliados em cerca de 45% do salário mínimo vigente.
Furtos com contornos de maior gravidade, porquanto qualificados pelo concurso de agentes
e praticados contra dois estabelecimentos comerciais distintos. MANUTENÇÃO DO DE-
CRETO CONDENATÓRIO. As provas existentes no caderno processual são suficientes para
o julgamento de procedência do pedido condenatório deduzido na denúncia. Materialidade e
autoria suficientemente demonstradas pela prova produzida. Relatos testemunhais uníssonos
desde a fase investigativa, corroborados pelo depoimento do policial militar que atuou em
ambas ocorrências, responsável por conduzir as acusadas, que estavam na posse da Res furtivae.
Inversão do onus probandi. FURTO PRIVILEGIADO. ART. 155, § 2º, DO CÓDIGO PENAL.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
174

RECONHECIMENTO. Em sendo as acusadas primárias e verificado o pequeno valor da coisa


subtraída (inferior a um salário mínimo), estão presentes os requisitos para a concessão do
privilégio legal, figura prevista no art. 155, § 2º, do CP, em consonância com a Súmula nº 511
do STJ. DOSIMETRIA DAS PENAS. Basilares no mínimo legal. Na segunda etapa, ausentes
agravantes ou atenuantes. Na terceira fase, conservado o recrudescimento nas penas em 1/6,
em face da continuidade delitiva. Por fim, reconhecido o privilégio legal nesta instância, foram
reduzidas as reprimendas em 1/3. Penas definitivas em 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte)
dias. Regime inicial de cumprimento de pena inalterado, assim como a pena de multa. PENA
PECUNIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO OU ISENÇÃO. A condenação
das rés à pena de multa configura simples realização do preceito secundário da norma incri-
minadora e, por isso, é de aplicação cogente, não sendo possível o seu afastamento ou isenção,
sob pena de violação do princípio da legalidade. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.
Adesão ao entendimento assentado pelo plenário do STF no julgamento do HC 126.292/SP.
Possibilidade de se executar provisoriamente a pena confirmada por esta segunda instância,
sem ofensa ao princípio constitucional da presunção da inocência. Determinada a execução
provisória das penas. Apelo parcialmente provido. (TJRS; ACr 276132-80.2018.8.21.7000; 8ª
C.Crim.; Rel. Des. Dálvio Leite Dias Teixeira; DJERS 25/02/2019)
88/46 – FURTO QUALIFICADO. Condenação. Intimação do acórdão. Ausência de
publicação do nome de um dos defensores. Prejuízo à defesa verificado. Inteligência do art. 563
do Código de Processo Penal. Constrangimento ilegal evidenciado. Anulação da publicação.
Expedição de alvará de soltura. Ordem concedida. (TJSP; HC 2256687-52.2018.8.26.0000; Ac.
12218794; 9ª C.D.Crim.; Rel. Des. Silmar Fernandes; DJESP 26/02/2019; p. 3.002)
88/47 – FURTO QUALIFICADO. FORMA PRIVILEGIADA. ATIPICIDADE DA
CONDUTA PELO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. A
história do Direito Penal está intrinsecamente ligada à relativização dos poderes e dos abusos
impingidos pelo Estado aos indivíduos e entre os seus próprios integrantes, de modo que o
equacionamento do postulado em questão trouxe consigo o advento de um sistema de ga-
rantias aos cidadãos frente às diversas possibilidades de reações públicas e privadas. Entre as
novas garantias asseguradas pelo Estado, está a de reconhecer a atipicidade material de atos
minimamente ofensivos ou que causem lesões insignificantes a bens juridicamente tutelados,
compreendidos não só a partir de um viés econômico, mas igualmente em razão do grau de
violação da ordem social que venham a ocasionar. Essa construção doutrinária significou não
só a superação de formas primitivas aplicadas pelo direito penal, mas o estabelecimento de
um moderno e preventivo modo de interpretação, afastando, definitivamente, a ideia de que
o ramo criminal ressoa como alternativa à vingança pública, privada ou divina que se instalara
na sociedade em seus primórdios. Assim, a aplicação do princípio da insignificância não pode
ser realizada sem restrições, sob pena de originar situações de perigo, permitindo que qualquer
indivíduo justifique a prática de pequenos delitos no citado postulado, incentivando a crimi-
nalidade e trazendo o sentimento de impunidade à população. No caso sob julgamento, houve
ofensa considerável ao bem jurídico tutelado, o grau de reprovabilidade da conduta extrapola o
ordinário e a lesão jurídica registra expressividade. Ré que apresenta outras incursões no mundo
do crime. Análise destas diretrizes que impede a consideração da conduta como insignificante.
ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNI-
MA. INAPLICABILIDADE. Justamente por conduzir à atipicidade da conduta, o postulado
da intervenção mínima deve ser reservado a circunstâncias excepcionais nas quais a ofensa
causada ao bem jurídico seja ínfima a ponto de representar ideia desprestigiadora do objeto
jurídico ante sua escassa reprovabilidade. No caso em apreço, os atos perpetrados são reprová-
veis sob a ótica social vigente, não se mostrando irrelevantes ao Direito Penal. Este se mostra
instrumento adequado e proporcional para punir o autor da ação praticada, não havendo falar
em atipicidade material da conduta. Precedentes. MULTA. AFASTAMENTO. OFENSA AO
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 175

PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA. INOCORRÊNCIA. A multa, porque disposta


no preceito secundário da norma incriminadora na qual incidiu o agente, não dá margem
ao acolhimento do pedido de isenção embasado na precariedade de sua situação econômica.
Seu pagamento é dirigido exclusivamente ao acusado, não havendo determinação quanto à
transmissão da obrigação a terceiro e ofensa ao princípio da intranscendência (art. 5º, XLV, da
CF/88). DOSIMETRIA. Manutenção das penas nos moldes sentenciais, totalizando 1 ano de
detenção, em regime inicial aberto, e 10 dias-multa à razão unitária mínima. Determinado o
início da execução provisória. Apelação desprovida. (TJRS; ACr 358104-72.2018.8.21.7000;
8ª C.Crim.; Relª Desª Naele Ochoa Piazzeta; DJERS 25/02/2019)
88/48 – FURTO QUALIFICADO. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA
TESTEMUNHAL. PACIENTE CITADO POR EDITAL. REVELIA. IMPOSSÍVEL PRE-
CISAR O PRAZO PARA RETOMADA DO CURSO DO PROCESSO. TRANSCURSO
DE CONSIDERÁVEL TEMPO DESDE A DATA DOS FATOS. RISCO REAL DE EXAU-
RIMENTO DA MEMÓRIA DOS FATOS. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA
TESTEMUNHAL ACOMPANHADA POR NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA. POSSI-
BILIDADE DE REINQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS EM CASO DE APRESENTAÇÃO
POSTERIOR DO ACUSADO PARA ACOMPANHAR A INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Com efeito, a partir da edição
do Enunciado nº 455 da Súmula do STJ, consolidou-se neste STJ o entendimento de que a
decisão que determina a produção antecipada de provas, com base no art. 366 do CPP, deve
ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo. É
também firme nesta Corte a orientação de que a decretação de nulidade processual, na esteira
do art. 563 do CPP, absoluta ou relativa, depende da demonstração do efetivo prejuízo para
a acusação ou para a defesa. Aplicação na esfera processual do princípio do pas de nullité sans
grief. As instâncias ordinárias, soberanas na análise dos fatos, reconheceram a necessidade de
produção antecipada da prova testemunhal, tendo em vista que uma das testemunhas é policial
militar e participa de inúmeras ocorrências, bem como da revelia do acusado torna impreciso
o tempo da retomada processual, aumentando o risco de que o decurso de tempo pudesse
exaurir a memória dos fatos, prejudicando, assim, a apuração da verdade real. Como visto,
após o decurso de mais de 2 anos da data do crime, o Magistrado de primeiro grau prolatou
decisão que autorizou o deferimento da produção antecipada de provas. Destaque-se que a
defesa técnica foi realizada por núcleo de prática jurídica, na ocasião da produção antecipada da
prova. Ademais, no caso de o paciente se apresentar em Juízo para acompanhar a instrução do
processo, nada impede que sejam as testemunhas novamente inquiridas ou que se indique real
prejuízo apto a ser arguido a fim de anular a prova produzida anteriormente. Nesse contexto,
a meu sentir, não demonstrada, portanto, a ocorrência de prejuízo à defesa do acusado pela
produção antecipada de prova, consistente na oitiva das testemunhas de acusação. 2. Recurso
em habeas corpus desprovido. (STJ; RHC 105.130; Proc. 2018/0295731-0; DF; 5ª T.; Rel. Min.
Joel Ilan Paciornik; DJE 21/02/2019)
88/49 – FURTO SIMPLES. ACÓRDÃO CONFIRMATÓRIO DA CONDENA-
ÇÃO. NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO. PRESCRIÇÃO CONFIGURADA. 1. A ju-
risprudência desta Corte Superior, desde há muito, firmou entendimento de que a expressão
“acórdão condenatório recorrível”, prevista no art. 117, IV, do Código Penal, com o texto
dado pela Lei nº 11.596/07, tem alcance semântico bem delimitado, não abrangendo o decisum
que se restringe a confirmar a sentença condenatória. 2. Agravo regimental desprovido. (STJ;
AgRg-REsp 1.753.784; Proc. 2018/0176413-7; PA; 6ª T.; Relª Minª Laurita Vaz; DJE 22/02/2019)
88/50 – HABEAS CORPUS COLETIVO EM FAVOR DE TODOS OS CIDADÃOS
QUE SE ENCONTRAM PRESOS, OU QUE ESTEJAM NA IMINÊNCIA DE SEREM,
PARA FINS DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE PENA DECORRENTE DE CONDE-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
176

NAÇÃO CONFIRMADA EM SEGUNDO GRAU. Não há constrangimento ilegal na não


inclusão em pauta das ADCs 43 e 44. Justa causa nas prisões que são efetuadas. Impossibilidade
de concessão de ordem genérica. Necessidade de análise de cada caso concreto. Agravo regimen-
tal desprovido. (STF; HC-AgR 154.322; DF; 2ª T.; Rel. Min. Gilmar Mendes; DJE 22/02/2019)
88/51 – HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, II E IV, DO CÓDIGO
PENAL). DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS.
LEGÍTIMA DEFESA. ERRO NA DOSIMETRIA DA PENA. ATENUANTE DA CON-
FISSÃO ESPONTÂNEA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. 1. Como se sabe,
cabe ao órgão recursal apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência de
suporte probatório para a decisão proferida pelo Conselho de Sentença, somente admitindo a
cassação do veredicto se flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de
sustentá-lo. 2. A legítima defesa constitui excludente de ilicitude prevista no art. 25 do Código
Penal, e sua configuração exige a presença simultânea e a demonstração cabal dos seus requisitos
legais (agressão injusta, atual ou iminente, direito próprio ou alheio; meios necessários usados
moderadamente; elemento subjetivo; animus defendendi). 3. No caso dos autos, o acolhimento
da tese de legítima defesa não encontra substrato suficiente na oitiva das testemunhas e demais
provas, não havendo, pois, que falar em decisão manifestamente contrária à prova dos autos.
4. No tocante à dosimetria, especialmente na segunda fase, verifica-se que o apelante agrega
teses defensivas descriminantes, exculpantes ou até mesmo privilegiadoras de possíveis causas
de diminuição, o que configura a confissão qualificada, impondo-se então o reconhecimento
da atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal e o redimensionamento da pena. Pre-
cedentes do STJ. 5. Apesar do reconhecimento da atenuante da confissão espontânea (art. 65,
III, d, do CP), a justificar a redução da pena em 1/6 (um sexto), ou seja, 2 (dois) anos e 2 (dois)
meses, deve ser mantida a pena-base no patamar mínimo de 12 (doze) anos, em obediência à
Súmula nº 231 do STJ, a qual estabelece que “A incidência da circunstância atenuante não pode
conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. 6. Permanecendo o apelante segregado
durante toda a instrução criminal, dada a presença dos fundamentos do art. 312 do CPP, e,
inexistindo alteração fática, como na espécie, impõe-se a manutenção da custódia cautelar. 7.
Recurso conhecido e parcialmente provido, à unanimidade. (TJPI; ACr 2017.0001.010209-0;
1ª C.Esp.Crim.; Rel. Des. Pedro de Alcântara da Silva Macêdo; DJPI 07/01/2019; p. 68)
88/52 – HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, II E IV, DO CÓDIGO PE-
NAL). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA. CRIME PUNIDO COM PENA DE
RECLUSÃO. IMPOSIÇÃO DE MEDIDA DE SEGURANÇA DE NATUREZA DETEN-
TIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ADEQUAÇÃO DA MEDIDA.
IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. 1. O
art. 97 do Código Penal impõe a aplicação da medida de segurança de internação ao agente
inimputável que tenha praticado fato típico e jurídico punido com pena de reclusão, como
ocorreu na espécie. 2. Nos termos do art. 182 do CPP, a existência de laudo médico pericial,
elaborado antes da prolação da sentença absolutória imprópria, o qual concluiu pela possi-
bilidade de tratamento ambulatorial da paciente, não vincula a conclusão do juiz, que pode
aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, caso entender pela insuficiência da medida para a
cessação da periculosidade. 3. O juízo acerca da adequação da medida de segurança imposta à
paciente, de forma a infirmar o entendimento da instância ordinária, demandaria o reexame do
conjunto probatório, providência incompatível com esta via processual. 4. Agravo regimental
a que se nega provimento. (STF; HC-AgR 163.395; MG; 1ª T.; Rel. Min. Alexandre de Moraes;
DJE 06/02/2019)
88/53 – HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PEDIDOS DE RETIFICA-
ÇÃO DA PENA-BASE, RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO E APLICAÇÃO DA
FRAÇÃO RELATIVA À TENTATIVA NO PATAMAR DE 2/3. 1. Diante da ausência de
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 177

fundamentação apta a ensejar a valoração negativa da culpabilidade, esta circunstância judicial


deve ser considerada neutra. 2. A atenuante da confissão espontânea deve ser reconhecida,
ainda que tenha sido parcial ou qualificada. 3. Não há que se falar em maior redução da pena
em razão da tentativa, vez que o delito de homicídio por muito pouco não se consumou, sen-
do irrelevante a quantidade de munição restante na arma, posto que os dois disparos seriam
suficientes para ceifar a vida da vítima, caso não tivesse se submetido a cirurgia de urgência.
4. Dosimetria parcialmente retificada, de forma a se estabelecer a pena de 12 (doze) anos e
20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado. 5. Recurso conhecido e parcialmente
provido. (TJPI; ACr 2018.0001.003755-6; 2ª C.Esp.Crim.; Rel. Des. Joaquim Dias de Santana
Filho; DJPI 09/01/2019; p. 14)
88/54 – HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO PREVENTIVA.
EXCESSO DE PRAZO PARA O INÍCIO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. PRAZO PARA
A AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO NÃO PREVISTO. OCORRÊNCIA DE CONSTRAN-
GIMENTO ILEGAL. POSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES
DIVERSAS. Constatado o injustificado excesso de prazo para o início da instrução da Ação Penal
em caso de réu preso, resta configurado o constrangimento ilegal, impondo-se a concessão da
Ordem. Habeas corpus concedido. (TJAC; HC 1000173-42.2019.8.01.0000; Ac. 28.083; C.Crim.;
Rel. Des. Samoel Martins Evangelista; DJAC 26/02/2019; p. 10)
88/55 – HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO. MOTIVO TORPE. AS-
FIXIA. RECURSO QUE DIFICULTOU OU TORNOU IMPOSSÍVEL A DEFESA DA
VÍTIMA. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. POSTERIOR
REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA. MANUTENÇÃO DA LIBERDADE NA SENTENÇA DE
PRONÚNCIA. CONSTRIÇÃO CAUTELAR DECRETADA EM RAZÃO DA PRÁTICA
DE NOVOS DELITOS. SEGREGAÇÃO FUNDADA NO ART. 312 DO CPP. CIRCUNS-
TÂNCIAS DO DELITO. GRAVIDADE CONCRETA. HISTÓRICO CRIMINAL DO RÉU.
RISCO EFETIVO DE REITERAÇÃO. PERICULOSIDADE SOCIAL. NECESSIDADE DE
ACAUTELAMENTO DA ORDEM PÚBLICA. FUGA DO DISTRITO DA CULPA. APLI-
CAÇÃO DA LEI PENAL. CONSTRIÇÃO MOTIVADA E NECESSÁRIA. CONDIÇÕES
PESSOAIS FAVORÁVEIS. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊN-
CIA. COAÇÃO ILEGAL NÃO EVIDENCIADA. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. O STF,
buscando dar efetividade às normas previstas na Constituição e na Lei nº 8.038/90, passou a não
mais admitir o manejo do habeas corpus originário em substituição ao recurso ordinário cabível,
entendimento que foi aqui adotado, ressalvados os casos de flagrante ilegalidade, quando a
ordem poderá ser concedida de ofício. 2. Não há ilegalidade no Decreto da prisão preventiva
quando demonstrado, com base em fatores concretos, que a segregação se mostra necessária,
dada a gravidade da conduta incriminada, bem como em razão do efetivo risco de o acusado
se furtar à futura aplicação da Lei Penal. 3. Caso em que o paciente restou pronunciado por
homicídio qualificado pelo motivo torpe e por meio que impediu ou dificultou a defesa da
vítima, acusado de asfixiar sua ex-companheira com um fio de extensão elétrica, ceifando-lhe a
vida, em razão do inconformismo com término do relacionamento entre ambos. 4. O fato de o
agente, após a concessão da liberdade provisória, haver praticado novos delitos, é circunstância
que revela sua periculosidade social e a inclinação à prática de crimes, demonstrando a real
possibilidade de que, solto, volte a delinquir, autorizando a preventiva. 5. A fuga do distrito da
culpa é motivo que reforça a necessidade de manutenção da custódia antecipada, também como
forma de garantir a futura aplicação da Lei Penal. 6. Condições pessoais favoráveis não têm o
condão de revogar a prisão cautelar, se há nos autos elementos suficientes a demonstrar a sua
necessidade, consoante ocorre in casu. 7. Indevida a aplicação de medidas cautelares diversas
da prisão quando a segregação encontra-se justificada na gravidade do delito cometido e na
necessidade de se evitar a reiteração delitiva. 8. Habeas corpus não conhecido. (STJ; HC 484.659;
Proc. 2018/0336703-6; MG; 5ª T.; Rel. Min. Jorge Mussi; DJE 21/02/2019)
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
178

88/56 – INCÊNDIO MAJORADO POR TER SIDO EM CASA HABITADA,


AMEAÇA MAJORADA POR MOTIVO FÚTIL OU TORPE E CONTRA ASCENDEN-
TE, DESCENDENTE, IRMÃO E CÔNJUGE, DUAS VEZES, E DANO QUALIFICADO
CONTRA O PATRIMÔNIO DA CONCESIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS, EM
CONCURSO MATERIAL (ART. 250, § 1º, II, A; ART. 147 (DUAS VEZES) C/C O ART.
61, II, A E E; E ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III, NA FORMA DO ART. 69,
TODOS DO CÓDIGO PENAL). RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA PRESCRIÇÃO
RETROATIVA QUANTO AOS CRIMES DE AMEAÇA E DE DANO. Denúncia recebida
em 01.09.2014 e sentença penal condenatória prolatada em 02.10.2017. Pena aplicada de 2 meses
de detenção pelo crime de ameaça e 6 meses de detenção para o crime de dano qualificado.
Prescrição operada, eis que transcorrido o prazo de três anos entre o recebimento da denúncia
e a prolação da sentença. Art. 109, VI, c/c o art. 110, § 1º, ambos do Código Penal. Pretensão
defensiva à absolvição em relação ao crime de dano pela absorção pelo delito de incêndio
prejudicado, face ao reconhecimento da prescrição retroativa quanto aos crimes de ameaça e
de dano. Redução da pena-base que não se concede, em razão da gravidade das consequências
do crime e da conduta social reprovável do réu. Aplicação do art. 59 do Código Penal. Fixação
de regime mais brando inviável. O regime fechado é o único adequado aos objetivos preven-
tivo/repressor da pena. Ausência de violação à norma constitucional ou infraconstitucional.
Desprovimento do recurso, com reconhecimento, de ofício, da prescrição retroativa quanto
aos crimes de ameaça e de dano. (TJRJ; APL 0025374-60.2014.8.19.0054; 4ª C.Crim.; Rel. Des.
Francisco Jose de Asevedo; DORJ 26/02/2019; p. 136)
88/57 – LEGITIMIDADE. QUEIXA-CRIME. OFENDIDA. Possui legitimidade
para formalizar ação penal privada a mulher de cidadão quando atribuída a este infidelidade
conjugal. Inteligência do art. 30 do CPP. (STF; Pet-AgR 7.417; DF; 1ª T.; Rel. p/o Ac. Min. Marco
Aurélio; DJE 26/02/2019)
88/58 – LESÃO CORPORAL NO CONTEXTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.
LEI MARIA DA PENHA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.
PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA. REJEIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA. AVALIA-
ÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES, DA CONDUTA SOCIAL E DA PERSONA-
LIDADE DO RÉU. MANUTENÇÃO. REDUÇÃO DO QUANTUM DE EXASPERAÇÃO
POR CADA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL. AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA.
ACRÉSCIMO DESPROPORCIONAL À PENA-BASE. REDUÇÃO. ALTERAÇÃO DO
REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. CRIME APENADO COM DETEN-
ÇÃO. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IN-
VIABILIDADE. REDUÇÃO DO VALOR MÍNIMO DA INDENIZAÇÃO. PRELIMINAR
REJEITADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Havendo
sujeição física e psíquica da ofendida em relação ao apelante – seu irmão –, e havendo o crime
sido cometido por motivação de gênero, aplica-se ao caso a Lei Maria da Penha, de forma que
não há que se falar em incompetência do Juízo sentenciante. Preliminar rejeitada. 2. Diversas
condenações, por fatos anteriores, transitadas em julgado, autorizam a valoração negativa dos
antecedentes, da personalidade do réu e da sua conduta social, vedado apenas o bis in idem. 3. O
Magistrado possui certa discricionariedade no momento de estabelecer o quantum de aumento
da pena-base, devendo atender, no entanto, aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Na espécie, o aumento operado na sentença se mostra desproporcional, sendo necessária a
redução do quantum de exasperação da pena-base. 4. O quantum de aumento pela agravante, na
segunda fase da dosimetria, deve guardar proporcionalidade com a pena-base. 5. O regime inicial
de cumprimento da pena, quando a condenação diz respeito a crime punido com detenção,
será o aberto ou o semiaberto, conforme dispõe o art. 33, caput, do Código Penal, admitindo-
se o cumprimento no regime fechado apenas em caso de regressão de regime. 6. De acordo
com o entendimento do STJ, firmado no julgamento dos Recursos Especiais 1.643.051/MS e
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 179

1.675.874/MS, o Juízo criminal é competente para fixar o valor de reparação mínima a título
de danos morais, em processos envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher,
desde que haja pedido expresso na denúncia ou queixa, ainda que não especificada a quantia
da indenização e sem necessidade de instrução probatória específica quanto à ocorrência do
dano moral. 7. Considerando que a extensão do dano não foi grave, que a intensidade da dor
experimentada pela vítima não excedeu à normalidade para o tipo penal, bem como levando em
consideração as condições econômicas do réu e da ofendida, mostra-se razoável a fixação como
valor mínimo de reparação a título de danos morais a quantia de R$ 300,00 (trezentos reais). 8.
Preliminar de incompetência rejeitada. Recurso conhecido e parcialmente provido para, mantida
a condenação do réu nas sanções do art. 129, § 9º, do CP, c/c o art. 5º, II, da Lei nº 11.340/06,
reduzir o quantum de exasperação por cada circunstância judicial analisada negativamente e pela
agravante da reincidência, diminuindo a pena de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de detenção
para 5 (cinco) meses e 7 (sete) dias de detenção, bem como alterar o regime de cumprimento
de pena do inicial fechado para o inicial semiaberto e reduzir o valor mínimo de reparação a
título de danos morais para R$ 300,00 (trezentos reais). (TJDF; APR 2018.15.1.001976-0; Ac.
115.3896; 2ª T.Crim.; Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati; DJDFTE 26/02/2019)
88/59 – LIVRAMENTO CONDICIONAL. Indeferimento em primeiro grau. Recurso
defensivo. Preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo. Exame criminológico favorável.
Benefício concedido. Recurso provido. (TJSP; AG-ExPen 9000848-13.2018.8.26.0482; Ac.
12235734; 16ª C.D.Crim.; Rel. Des. Leme Garcia; DJESP 26/02/2019; p. 3.058)
88/60 – MANDADO DE SEGURANÇA. Impetrante condenado em primeira instân-
cia por furto e estelionato, sendo-lhe concedido o direito de apelar em liberdade. Intimação
de defensor dativo pelo Diário Oficial que, na verdade, não produziu efeito, pois deveria ter
sido pessoal. Não obstante a realização de intimações pela imprensa em outras oportunida-
des, constatação de que não há termo firmado pelo referido advogado aceitando esta forma
de intimação. Inteligência do art. 370, § 4º, do Código de Processo Penal. Demonstração de
prejuízo ao direito de defesa do paciente. Afastamento do trânsito em julgado, com reabertura
de prazo para apresentação de razões de apelação. Manutenção do direito de recorrer solto,
originalmente previsto na própria sentença condenatória. Ordem concedida, nesses termos,
determinando-se a expedição de contramandado de prisão ou, se já for o caso, de alvará de
soltura clausulado. (TJSP; MS 2251864-35.2018.8.26.0000; Ac. 12221477; 13ª C.D.Crim.; Rel.
Des. De Paula Santos; DJESP 26/02/2019; p. 3.054)
88/61 – MANDADO DE SEGURANÇA. MULTA. ABANDONO DO PROCESSO.
Constitucionalidade. Ausência dos advogados à audiência. Não comparecimento do réu. Con-
duta dos advogados que não constituiu a causa do prejuízo ao bom andamento do processo.
Continuidade do exercício da defesa do réu após a renúncia não aperfeiçoada pela ciência
do mandante. Abandono do Processo não caracterizado. Ilegalidade da imposição da multa
configurada. Segurança concedida. (TJSP; MS 2272813-80.2018.8.26.0000; Ac. 12236665; 2ª
C.D.Crim.; Rel. Des. Luiz Fernando Vaggione; DJESP 26/02/2019; p. 2.961)
88/62 – MEDIDA DE SEGURANÇA. Alegada demora na apresentação do laudo
de exame de cessação de periculosidade. Informações que dão conta de que o procedimento
está sendo processado. Prática, pelo Juízo, de atos prévios necessários para tanto. Avaliação
psicológica que se mostra necessária. Inteligência do art. 97, §§ 1º e 2º, do Código Penal. Não
evidenciada demora na tramitação processual que possa ser imputada a falha ou inércia do Juízo
impetrado. Ordem denegada, com recomendação. (TJSP; HC 2258761-79.2018.8.26.0000; Ac.
12194927; 13ª C.D.Crim.; Rel. Des. De Paula Santos; DJESP 26/02/2019; p. 3.026)
88/63 – OFENSA À SAÚDE PÚBLICA. CRIME PREVISTO NO ART. 272, § 1º-A,
DO CÓDIGO PENAL – CP. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS INTERESSES DA
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
180

UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. COAÇÃO ILEGAL INEXIS-


TENTE. RECURSO DESPROVIDO. 1. O art. 109, inciso I, da Constituição Federal – CF
prescreve competir à Justiça Federal processar e julgar as causas em que a União, entidade
autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes
ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral
e à Justiça do Trabalho, ao passo que o inciso IV confere à esfera federal competência para
analisar os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços
ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as
contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral. No caso dos
autos, as circunstâncias não são hábeis a afastar a competência da Justiça Estadual para processar
e julgar o feito, na medida em que as condutas apuradas – crimes contra a saúde pública – têm
a consumação no momento em que a substância se torna nociva à saúde. No ato da fabricação
e comercialização inicial, a competência se encontrava definida. O caráter interestadual da
comercialização dos produtos não tem o condão, por si só, de atrair a competência da Justiça
Federal para o caso. Não se verifica ofensa direta e específica a bens, serviços ou interesses da
União ou de qualquer de suas entidades, a afastar o interesse da União na apuração dos fatos.
2. Recurso ordinário desprovido. (STJ; RHC 95.173; Proc. 2018/0039397-4; RS; 5ª T.; Rel. Min.
Joel Ilan Paciornik; DJE 21/02/2019)
88/64 – PENA DE MULTA. PRESCRIÇÃO. COMPETÊNCIA. JUÍZO DA EXE-
CUÇÃO FISCAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. “(...) não há falar em
competência do Juízo da Execução Penal para decidir a respeito da prescrição da pena de multa
convertida em dívida de valor, uma vez que, independentemente da origem penal da sanção, a
multa restou convolada em obrigação de natureza fiscal e, por essa razão, a competência passou
a ser da autoridade fiscal” (AgRg no REsp 1.728.871/ES, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta
Turma, j. 21.06.2018, DJe 01.08.2018). 2. Agravo regimental desprovido. (STJ; AgRg-AREsp
1.310.794; Proc. 2018/0146149-7; ES; 6ª T.; Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro; DJE 26/02/2019)
88/65 – POSSE DE ENTORPECENTE (ART. 290 DO CÓDIGO PENAL MILI-
TAR). INCIDÊNCIA DO ART. 28 DA LEI Nº 11.343/06. IMPOSSIBILIDADE. APLICA-
ÇÃO DA LEGISLAÇÃO CASTRENSE. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. 1. Ao tráfico,
posse ou uso de entorpecente ou substância similar em local sujeito à administração castrense
aplica-se o art. 290 do Código Penal Militar, ante a incidência do princípio da especialidade.
Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF; HC-AgR 163.581; DF; 1ª
T.; Rel. Min. Alexandre de Moraes; DJE 06/02/2019)
88/66 – POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO COM SI-
NAL DE IDENTIFICAÇÃO RASPADO. ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO IV, DA
LEI Nº 10.826/03. Matéria preliminar. Nulidade. Prova ilícita. Ausência de mandado judicial.
Inexistência de nulidade. Crime permanente. Flagrante delito. Diligência acompanhada por
testemunha presencial. Preliminar rejeitada. Mérito. Autoria e materialidade comprovadas.
Versão exculpatória inverossímil. Palavra de policiais militares que atenderam a ocorrência.
Validade e credibilidade. Álibi não comprovado. Inteligência do art. 156 do CPP. Dosimetria
penal adequada. Substituição por restritiva de direitos. Regime inicial aberto em caso de
conversão. Recurso não provido. (TJSP; ACr 3008725-89.2013.8.26.0318; Ac. 12219063; 9ª
C.D.Crim.; Rel. Des. Silmar Fernandes; DJESP 26/02/2019; p. 3.003)
88/67 – POSSE ILEGAL DE ARMAS DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA.
BUSCA E APREENSÃO SEM MANDADO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. DESNECESSI-
DADE NA HIPÓTESE DE CRIME PERMANENTE. EXCEÇÃO À INVIOLABILIDADE
DE DOMICÍLIO. PROVA LÍCITA. PRECEDENTES DO STJ. 1. Escorreito o entendimento
do Tribunal de origem ao considerar que é prescindível o mandado de busca e apreensão para
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 181

que os policiais ingressarem no domicílio do acusado, como na hipótese, em que existiram


fundadas razões a justificar a atitude dos policiais, que acabaram por apreender o revólver mu-
niciado, guardado na casa, configurando, assim, o flagrante de crime permanente, situação esta
que autoriza a entrada no domicílio sem necessidade de mandado judicial (fl. 139). Precedentes.
2. Agravo regimental desprovido. (STJ; AgRg-AREsp 1.296.353; Proc. 2018/0120536-7; SP; 5ª
T.; Rel. Min. Joel Ilan Paciornik; DJE 26/02/2019)
88/68 – POSSE SEXUAL MEDIANTE FRAUDE. PLEITO ABSOLUTÓRIO.
NÃO CARACTERIZAÇÃO DAS ELEMENTARES DO CRIME. AUSÊNCIA DE IM-
PUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. ENUNCIADO Nº
182 DA SÚMULA DO STJ. NECESSIDADE DE REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-
PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO CONHECIDO. 1. Enquanto a
decisão agravada assentou a ausência de demonstração da divergência jurisprudencial, alegada
e a necessidade de revolvimento do acervo fático-probatório dos autos para análise do pleito
absolutório, no presente regimental, a defesa limitou-se a reiterar os argumentos apresentados
no apelo especial. 2. Deixando a parte agravante de impugnar especificamente os fundamentos
da decisão agravada, é de se aplicar o Enunciado nº 182 da Súmula do STJ. 3. Concluindo o
Tribunal de origem acerca da suficiência de elementos capazes de imputar a autoria delitiva ao
ora agravante, inviável a alteração dos fundamentos apresentados pelo acórdão recorrido, ante
a necessidade de revolvimento do conteúdo fático-probatório dos autos, incidindo o óbice
contido na Súmula nº 7 desta Corte. 4. Em razão das dificuldades que envolvem a obtenção
de provas de crimes que atentam contra a liberdade sexual, praticados, no mais das vezes, longe
dos olhos de testemunhas e, normalmente, sem vestígios físicos que permitam a comprovação
dos eventos – a palavra da vítima adquire relevo diferenciado, como no caso destes autos. 5.
Agravo não conhecido. (STJ; AgRg-AREsp 1.268.174; Proc. 2018/0066521-0; RJ; 5ª T.; Rel. Min.
Jorge Mussi; DJE 26/02/2019)
88/69 – PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
(CF, ART. 5º, LVII). EXECUÇÃO PROVISÓRIA DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREI-
TOS. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA REAFIRMADA. 1. Jurisprudência acolhida
por esta Corte, consoante o julgamento do ARE 964.246-RG/SP, Rel. Min. Teori Zavascki,
Plenário Virtual, DJe 25.11.2016, sob a sistemática da repercussão geral, nos seguintes termos:
a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que
sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da
presunção de inocência, prevista no art. 5º, LVII, da CF. 2. O entendimento consolidado não
se restringiu aos réus condenados a penas privativas de liberdade, alcançando também aqueles
cujas penas corporais tenham sido substituídas por restritivas de direitos. Precedentes. 3. Recebo
os embargos de declaração como agravo regimental, ao qual nego provimento. (STF; RE-ED
1.169.624; SC; 1ª T.; Rel. Min. Alexandre de Moraes; DJE 26/02/2019)
88/70 – PRISÃO PREVENTIVA. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. AUSÊNCIA. A
ausência de audiência de custódia constitui irregularidade que não tem o efeito de afastar a
prisão preventiva imposta. PRISÃO PREVENTIVA. DROGAS. QUANTIDADE. Tem-se
sinalizada a periculosidade do agente quando surpreendido na posse de grande quantidade de
drogas, sendo viável a inversão da ordem do processo-crime, no que direciona a apurar para,
selada a culpa, prender, em verdadeira execução da pena. (STF; HC 149.080; MG; 1ª T.; Rel.
Min. Marco Aurélio; DJE 19/02/2019)
88/71 – PRONÚNCIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO FÚTIL
E RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. FEMINICÍDIO. POSSE DE
ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. QUA-
LIFICADORAS. CARACTERIZAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos do art.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
182

413 do CPP, a decisão de pronúncia requer apenas o convencimento sobre a materialidade do


fato e indícios suficiente da autoria nos crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.
Trata-se de decisão interlocutória meramente declaratória, na qual o julgador, em juízo de
prelibação, sem adentrar no mérito, entende ser admissível a imputação feita na denúncia e
a encaminha para julgamento pelo Tribunal do Júri, juiz natural dos crimes dolosos contra a
vida por mandamento constitucional. 2. Presentes indícios mínimos de autoria e comprovada
a materialidade dos crimes, não há que se falar em impronúncia, tampouco desclassificação
para a modalidade culposa, em face da alegada ausência do animus necandi, devendo a questão
ser submetida ao Conselho de Sentença para a análise aprofundada das provas. 3. Subsistindo
indícios de que o autor possuía e portava a arma de fogo antes do cometimento do delito, não
pode o colegiado impronunciar o réu com respaldo no princípio da consunção, pois possível que
a prática do delito decorra de desígnio autônomo. 4. A exclusão de qualificadoras, na primeira
fase do procedimento do Tribunal do Júri, só é permitida quando manifestamente improcedente
ou completamente dissociada do contexto fático-probatório dos autos. Do contrário, deve ser
submetida à apreciação do Conselho de Sentença. Ademais, o aprofundamento da questão sobre
a motivação de gênero deverá ocorrer perante os jurados, que deverão se manifestar a respeito
de sua existência ou não. 5. Recurso conhecido e desprovido. (TJDF; RSE 2017.12.1.002797-9;
Ac. 115.4036; 3ª T.Crim.; Rel. Des. Demétrius Gomes Cavalcanti; DJDFTE 26/02/2019)
88/72 – QUEIXA-CRIME. CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE. APURAÇÃO
POR MEIO DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA PARA A QUAL NÃO
POSSUI LEGITIMIDADE ATIVA O REQUERENTE. Ausência de condição para o exercício
da ação penal. Crimes contra a honra. Ausência de indícios suficientes de prova a autorizar o
recebimento da queixa. Justa causa para a ação penal não configurada. Queixa rejeitada com
fulcro no art. 395, II e III, do CPP. (TJSP; Rec 2190565-57.2018.8.26.0000; Ac. 12218156;
O.Esp.; Rel. Des. Ferraz de Arruda; DJESP 26/02/2019; p. 3.122)
88/73 – REDUÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 115 DO CP. 70 ANOS.
INAPLICABILIDADE DA IDADE ESTABELECIDA NO ESTATUTO DO IDOSO. INO-
CORRÊNCIA DE REVOGAÇÃO TÁCITA DO DISPOSITIVO PENAL. BENEFÍCIO
QUE DEVE SER APLICADO MESMO DEPOIS DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA
CONDENATÓRIA. INTERPRETAÇÃO AMPLA. PROVIMENTO DO AGRAVO. I – A
Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso) não revogou tacitamente o art. 115 do CP, de modo que
devem ser mantidos os 70 anos para fins de redução do prazo prescricional. Os 60 anos devem
ser aplicados apenas para direitos e obrigações que estejam previstos naquela norma de regên-
cia. II – Ainda que o réu complete 70 anos depois da sentença, o prazo prescricional deve ser
reduzido. Interpretação ampla do dispositivo que se adequa ao princípio da razoabilidade e não
fere a legalidade. III – Agravo Interno provido. (TRF 2ª R.; HC 0011788-86.2018.4.02.0000;
RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Fed. Paulo Espirito Santo; DEJF 21/02/2019)
88/74 – REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA. 1. O acórdão da 1ª Câmara
Criminal do TJRS está em desarmonia com as balizas fixadas por esta Corte, à medida que a
concessão de prisão domiciliar deve ser a última opção a ser adotada e não a primeira, como
procedido neste caso, pois o beneplácito puro e simples da prisão domiciliar não alcança as
finalidades da pena, nem garante a ressocialização do apenado. 2. Antes da sua concessão, o
Juízo da Execução deve perquirir outras alternativas, como a progressão de regime antecipada
de preso que já se encontra no regime aberto, com a consequente liberação de vaga para o sen-
tenciado, ou a avaliação do estabelecimento existente para definição sobre a sua compatibilidade
com as regras do regime prisional escolhido. 3. No caso concreto, o recorrido possui saldo de
pena a cumprir com data final que aponta para o ano de 2032, com pena definitiva de 32 anos
e 6 meses pela prática de crimes graves, como roubo majorado, homicídio qualificado e evasão
mediante violência contra a pessoa (cf. informações extraídas do seu processo de execução). E,
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 183

pela leitura do decisum, não houve qualquer espécie de análise por parte do Colegiado sobre a
utilização da prisão domiciliar como a última opção a ser adotada, muito pelo contrário, afinal,
a escolha da prisão domiciliar foi a única para o caso que se está a analisar, ancorando-se na
jurisprudência do STJ, que é pretérita ao julgamento do RE 641.320 RG/RS, Rel. Min. Gilmar
Mendes, desta Suprema Corte. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STF; RE-AgR
1.078.674; RS; 1ª T.; Rel. Min. Alexandre de Moraes; DJE 06/02/2019)
88/75 – REVISÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO PRATICADO POR POLICIAL
MILITAR CONTRA VÍTIMA CIVIL. PERDA DE CARGO PÚBLICO. APRECIAÇÃO
PELA JUSTIÇA COMUM. LEGALIDADE. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO
ESPECÍFICA. INTELIGÊNCIA DO ART. 92, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO
PENAL. VALOR MÍNIMO DE INDENIZAÇÃO. TEMA NÃO SUBMETIDO AO
CONTRADITÓRIO NOS AUTOS DA AÇÃO PENAL. DECOTE. REFORMA PARCIAL
NECESSÁRIA. PEDIDO PROCEDENTE. 1. Cargo ou função pública não são sinônimos de
graduação ou patente. Enquanto estas podem ser perdidas através de processo administrativo
ou judicial, no âmbito da Justiça Castrense, a perda do cargo ou função pública, mesmo que
de natureza militar, pode ser declarada pela Justiça Comum. 2. Observada a regra do parágrafo
único do art. 92 do Código Penal, não se trata a perda do cargo público de efeito automático da
condenação, razão pela qual, para a sua imposição, é necessária a devida motivação. 3. Para que
o valor mínimo de indenização seja estabelecido, é necessário, além de pedido do ofendido (ou
seu representante) ou do Ministério Público, amplo debate a respeito do tema, assegurando-se
as garantias processuais ao acusado, para que ele se defenda também do aspecto cível debatido.
Logo, não estabelecido o contraditório sobre a questão, deve ser decotado o valor fixado. 4. Se a
r. sentença objurgada mostrou-se, em parte, contrária a texto expresso do Código Penal, confi-
gurando a hipótese do art. 621, I, do Código de Processo Penal, violando, também, o princípio
do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da CR/88), viável a reforma através da revisão
criminal própria a este fim. 5. Pedido procedente. (TJMG; REVC 0709792-70.2018.8.13.0000;
2ª G. C.Crim.; Rel. Des. Eduardo Brum; DJEMG 22/02/2019)
88/76 – ROUBO. RECONHECIMENTO DE VOZ. DEPOIMENTO DA VÍTIMA.
COERENTE COM AS DEMAIS PROVAS. CRIME CONTINUADO. INAPLICÁVEL.
CRIMES CONCOMITANTES. CONCURSO FORMAL. INEXISTÊNCIA DE DESÍG-
NIOS AUTÔNOMOS. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. 1. Restou evidenciado
que as vítimas conhecem o apelante desde criança, visto que sempre frequentou o comércio
da vítima, bem assim realizava compras no depósito de gás do filho da vítima, o que tornam a
vítima apta a fazer o reconhecimento de sua voz, visto que já o atendeu diversas vezes durante
a sua vida. 2. Do cotejo minucioso das provas dos autos, estas em um mesmo contexto proba-
tório, mormente quando todas confirmam a forma como se deu o crime, torna-se indiscutível
a autoria delitiva imputada ao apelante no crime de roubo. 3. Sobre a pretendida aplicação do
instituto da continuidade delitiva, entendo totalmente descabida, uma vez que os crimes foram
praticamente concomitantemente – na medida em que os agentes, mediante uma mesma ação
afetaram os membros de uma mesma família, porém patrimônios distintos, e, em uma mesma
oportunidade, ensejando assim a aplicação do art. 70 do Código Penal, o qual dispõe sobre o
concurso formal de crimes. 4. Não há que se falar em desígnios autônomos no cometimento
dos crimes, muito pelo contrário, do que se extrai das provas coligidas na instrução é que o
intento era roubar dinheiro proveniente do comércio, sendo relatado que os assaltantes per-
guntavam insistentemente sobre o malote de dinheiro. 5. Recurso conhecido e parcialmente
provido à unanimidade. (TJPI; ACr 2017.0001.009735-4; 2ª C.Esp.Crim.; Rel. Des. Joaquim Dias
de Santana Filho; DJPI 09/01/2019; p. 13)
88/77 – ROUBO CIRCUNSTANCIADO (CP, ART. 157, § 2º, I E II – ANTIGA
REDAÇÃO). 1º APELO: DOSIMETRIA. PENA-BASE. Avaliação negativa das circunstâncias
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
184

do crime. Fundamentação idônea. Duas causas de aumento. Utilização de uma delas na terceira
fase de aplicação da pena e a outra como circunstância judicial desfavorável para exasperar a
pena-base. Possibilidade. Precedentes do STJ. Consequências do crime. Valoração neutra, sem
repercussão na basilar. Ausência de interesse recursal, neste ponto. 2º APELO: ABSOLVIÇÃO.
Inviabilidade. Materialidade e autoria comprovadas. Sentença mantida. Recursos desprovidos.
(TJRR; ACr 0010.16.013000-0; C.Crim.; Rel. Des. Ricardo Oliveira; DJERR 21/01/2019; p. 51)
88/78 – ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. EMPREGO DE ARMA DE
FOGO. CONCURSO DE AGENTES. TENTATIVA. 1. Majorante. Emprego de arma. À
luz do entendimento firmado pelo e. STF e pelo e. STJ, prescindível a apreensão da arma uti-
lizada na prática subtrativa e laudo atestando seu grau de lesividade, para fins de configuração
da majorante, se demonstrado o emprego do artefato por outros elementos de prova. Hipótese
na qual não impressiona não tivesse a arma sido apreendida, porquanto não houve prisão em
flagrante dos comparsas do increpado, que lograram escapar. Emprego de arma de fogo com-
provado pela narrativa da vítima, que confirmou a abordagem por três indivíduos, um deles
empunhando uma arma de fogo. Majorante mantida. 2. Dosimetria da pena. Pena-base bem
fixada em 5 anos de reclusão, pela valoração negativa emprestada ao vetor circunstâncias, que
realmente desbordaram da previsão típica, a vítima tendo sido violentamente agredida pelos
agentes criminosos, incidindo dupla elementar – grave ameaça (uso de arma) e violência.
Consequências do delito que também foram excepcionalmente graves, visto as lesões sofridas
pela vítima, descritas no laudo pericial, decorrentes da ação ilícita de que foi alvo. Pena-base
mantida. Na 2ª etapa do processo dosimétrico, reconhecida a atenuante da confissão espontânea,
foi reduzida a pena em 2 meses, quantum justificado por terem sido recusadas algumas peculia-
ridades. Índice de aumento pela incidência da dupla majorante. O índice de aumento da pena
pela incidência de duas ou mais majorantes é questão que se insere na órbita de convencimento
do magistrado, no exercício de seu poder discricionário de decidir a quantidade de aumento
que julga conveniente na hipótese concreta, desde que observados os limites estabelecidos pela
norma penal. Hipótese na qual o decisor singular, pelas causas majorativas, aumentou as penas
dos delitos de roubo em 3/8, o que proporcional ao número de adjetivadoras incidentes (2) e,
principalmente, à qualidade delas, já que se tratavam de 3 agentes, que abordaram a vítima na
entrada de sua residência, um deles empunhando uma arma de fogo, apontada diretamente
ao lesado. Impossibilidade, nesse contexto, de aplicação do acréscimo no patamar mínimo
(1/3). Critério objetivo adotado pelo e. STJ seguido por este órgão fracionário. Por fim, pela
tentativa, a pena foi reduzida em 2/3, restando definitivada a sanção em 2 anos, 2 meses e 17
dias de reclusão. 3. Suspensão condicional da pena. Impossibilidade. Inviável a concessão do
benefício do sursis, porque a pena aplicada supera 2 anos, a pretensão esbarrando no óbice
previsto no caput do art. 77 do estatuto repressivo. (TJRS; ACr 304608-31.2018.8.21.7000; 8ª
C.Crim.; Relª Desª Fabianne Breton Baisch; DJERS 25/02/2019)
88/79 – ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO POR EMPREGO DE ARMA DE
FOGO E CONCURSO DE AGENTES (ART. 157, § 2º, I E II, DO CÓDIGO PENAL).
ACUSADO QUE, EM COMUNHÃO DE AÇÕES E DESÍGNIOS COM UM COMPAR-
SA, MEDIANTE GRAVE AMEAÇA, CONSISTENTE NO EMPREGO DE ARMA DE
FOGO, SUBTRAIU, PARA SI OU PARA OUTREM, UMA MOTOCICLETA DE PRO-
PRIEDADE DA VÍTIMA NILTON. Pretensão ministerial à reforma parcial da sentença para
fixação do regime inicial fechado que se acolhe, pois injustificavelmente benevolente o regime
semiaberto imposto na sentença, especialmente pela natureza violenta e altamente reprovável
da imputação. Ademais, o réu ostenta antecedente por crime de igual natureza. Provimento
do recurso ministerial para impor ao réu o regime prisional fechado. (TJRJ; APL 0336667-
45.2016.8.19.0001; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Francisco José de Asevedo; DORJ 26/02/2019; p. 147)
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 185

88/80 – ROUBO MAJORADO. EMPREGO DE ARMA BRANCA (FACA). TEN-


TATIVA. 1. Édito condenatório. Manutenção. Prova amplamente incriminatória. Relatos da
vítima, coerentes e convincentes, descrevendo a forma como o acusado abordou-a em via pública
e anunciou o assalto, com emprego de uma faca, exigindo seu aparelho de telefone celular,
momento em que reagiu, entrando em luta corporal com o inculpado, resultando lesionada em
uma das mãos e o acusado fugindo do local sem levar seus pertences. Policiais militares que,
acionados, efetuaram diligências, culminando na prisão do acusado. Relevância da palavra da
vítima, no caso, corroborada, ainda, pelas narrativas dos policiais militares que atenderam à ocor-
rência. Acusado que em ambas as fases optou pelo silêncio, não trazendo versão pessoal capaz
de derruir a robustez da prova acusatória. Eventuais contradições nos depoimentos do lesado
e de agente de segurança pública, que, além de meramente circunstanciais, não apresentaram
qualquer relevância para o deslinde do feito. Prova segura à condenação, que vai mantida. 2.
Majorante. Prova segura quanto ao emprego de arma branca, à perpetração do delito. Vítima
que afirmou que o acusado fez uso de uma faca para a prática ilícita, resultando, inclusive,
lesionada, e o artefato apreendido. Superveniência da revogação do inciso I do § 2º do art. 157
do CP pela Lei nº 13.654/2018, não mais considerando majorado o roubo empregado com
arma imprópria. Novatio legis in mellius, que retroage, alcançando o réu. Majorante afastada.
Conduta desclassificada para os lindes do art. 157, caput, do CP. Extirpada a majorante, a pena
fica em 4 anos de reclusão. 3. Tentativa. Índice de redução. Redução pelo tentame fixada em
2/3, em 1º grau, alterada para 1/3, observado o iter criminis percorrido pelo acusado, que mais se
aproximou da consumação, tanto que a vítima apresentou lesões provocadas por instrumento
pérfuro-cortante, perdendo, parcialmente, a mobilidade de um dos dedos da mão. Pena, agora,
estabelecida em 2 anos e 8 meses de reclusão. 4. Multa. Isenção. Inviabilidade. Inviável a ex-
clusão da pecuniária imposta, por tratar-se de pena cumulativa, prevista expressamente em Lei,
de aplicação cogente, portanto, sem afrontar o princípio da intranscendência da pena – art. 5º,
XLV, da CF. Eventual impossibilidade de pagamento, pelo invocado estado de pobreza, deve ser
alegada no juízo da execução, não competindo a análise ao juízo do conhecimento. Inviabilidade
da isenção requerida, por ausência de previsão legal. (TJRS; ACr 305906-92.2017.8.21.7000;
8ª C.Crim.; Relª Desª Fabianne Breton Baisch; DJERS 25/02/2019)
88/81 – SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO MINISTERIAL. LESÃO COR-
PORAL LEVE. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AÇÃO PÚBLICA INCONDICIONADA.
DISPENSÁVEL A REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO PARA OFERECIMENTO DA
DENÚNCIA. CONDENAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS INSUFICIENTES. IN
DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. DESPROVIMENTO. 1. Os Tribunais Supe-
riores firmaram entendimento que os delitos de lesão corporal, praticados mediante violência,
são de natureza pública incondicionada, sendo dispensável a representação do ofendido. 2.
Existindo dúvidas em relação à autoria, aplicável o princípio in dubio pro reo. 3. Apelo conhecido
e desprovido. (TJAC; APL 0011418-06.2015.8.01.0001; Ac. 28.061; C.Crim.; Câmara Criminal;
Rel. Des. Elcio Mendes; DJAC 26/02/2019; p. 6)
88/82 – SUSPENSÃO DOS PRAZOS ATÉ 20 DE JANEIRO. NÃO OCORRÊNCIA.
PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É intempestivo o recurso
especial interposto fora do prazo de 15 dias corridos, nos termos do art. 994, VI, c/c os arts.
1.003, § 5º e 1.029, todos do CPC e também do art. 798 do CPP. 2. Em razão do princípio da
especialidade, os prazos previstos no art. 220 do CPC, regulamentados pela Resolução nº 244/
CNJ, não se aplicam aos processos criminais, tendo em vista o regramento disposto no art.
798, caput, e § 3º, do CPP. Precedentes. 3. O recesso judiciário e o período de férias coletivas,
em matéria processual penal, têm como efeito, em relação aos prazos vencidos no seu curso,
a mera prorrogação do vencimento para o primeiro dia útil subsequente ao seu término, não
havendo interrupção ou suspensão (AgRg no Inq 1.105/DF, Rel. Min. Herman Benjamin,
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
186

Corte Especial, j. 29.03.2017, DJe 19.04.2017). 4. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-
AREsp 1.338.886; Proc. 2018/0196909-0; SC; 6ª T.; Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 26/02/2019)
88/83 – TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06). FIXA-
ÇÃO DO REGIME PRISIONAL SEMIABERTO. FUNDAMENTOS IDÔNEOS. SUBS-
TITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO.
INVIABILIDADE. REQUISITO SUBJETIVO DO ART. 44, III, DO CP NÃO ATENDIDO.
CUMPRIMENTO DA PENA EM PRISÃO DOMICILIAR. PEDIDO SEM AMPARO NO
ART. 117, II, DA LEP. DOSIMETRIA. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELO STJ. SUPRES-
SÃO DE INSTÂNCIA. 1. A fixação do regime inicial de cumprimento da pena não está atrelada,
de modo absoluto, ao quantum da sanção corporal aplicada, devendo-se considerar as especiais
circunstâncias do caso concreto. Assim, desde que o faça em decisão motivada, o magistrado
sentenciante está autorizado a impor ao condenado regime mais gravoso do que o recomendado
nas alíneas do § 2º do art. 33 do Código Penal. Esse entendimento se amolda à jurisprudência
cristalizada na Súmula nº 719 (A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a
pena aplicada permite exigir motivação idônea) e replicada em diversos julgados. Inexistência
de ilegalidade. 2. A conversão de pena corporal em restritiva de direitos é condicionada ao pre-
enchimento dos requisitos objetivos (pena inferior a 4 anos e que o crime tenha sido cometido
sem violência ou grave ameaça) e subjetivos (prognose acerca da suficiência da substituição)
elencados no art. 44 do Código Penal. Ausente, no caso, requisito de ordem subjetiva previsto
no art. 44, III, do Código Penal. 3. O pedido de cumprimento da pena em prisão domiciliar
deve ser dirigido, por primeiro, ao Juízo da Vara de Execuções Penais. Ademais, não há nos
autos qualquer documento que comprove a impossibilidade de continuação de tratamento
médico no estabelecimento prisional. 4. O STJ não enfrentou os demais pedidos relacionados
à dosimetria da pena. Desse modo, qualquer juízo desta Corte a respeito deles implicaria dupla
supressão de instância e contrariedade à repartição constitucional de competências, o que não
é admitido pela jurisprudência do STF. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF;
HC-AgR 163.821; SP; 1ª T.; Rel. Min. Alexandre de Moraes; DJE 06/02/2019)
88/84 – TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. CAUSA ESPECIAL
DE DIMINUIÇÃO DE PENA (ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06). QUANTIDADE E
NATUREZA DAS DROGAS APREENDIDAS. PATAMAR MÁXIMO. INVIABILIDA-
DE. ART. 42 DA LEI Nº 11.343/06. REGIME INICIAL SEMIABERTO. VEDAÇÃO À
SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIRETOS. FUNDAMENTAÇÃO
IDÔNEA. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Firme nesta Corte o
entendimento de que o Magistrado deve levar em consideração a quantidade e a natureza da
substância apreendida, por expressa previsão legal (art. 42 da Lei nº 11.343/06). In casu, foram
apreendidas 325,7 g de maconha e 221,3 g de cocaína, o que justifica a aplicação do redutor de
pena no patamar de 1/2. 2. A quantidade e a natureza da droga apreendida constituem funda-
mento idôneo para a imposição de regime inicial mais gravoso para o início de cumprimento
da pena, no caso o semiaberto, bem como inviabiliza a conversão da reprimenda privativa
de liberdade em restritiva de direitos, conforme precedentes do STJ. 3. Agravo regimental
desprovido. (STJ; AgRg-AREsp 1.394.010; Proc. 2018/0292898-5; SP; 5ª T.; Rel. Min. Joel Ilan
Paciornik; DJE 26/02/2019)
88/85 – TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. NATUREZA E
QUANTIDADE DA DROGA. INDEVIDO BIS IN IDEM. PRECEDENTE DO PLE-
NÁRIO DO STF. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O plenário do Supremo
Tribunal Federal, no julgamento dos HCs 112.776 e 109.193, sob a relatoria do Ministro Teori
Zavascki, por maioria de votos, consolidou o entendimento de que “configura ilegítimo bis in
idem considerar a natureza e a quantidade da substância ou do produto para fixar a pena-base
(primeira etapa) e, simultaneamente, para a escolha da fração de redução a ser imposta na ter-
Ementário – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 187

ceira etapa da dosimetria (§ 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06). Todavia, nada impede que essa
circunstância seja considerada para incidir, alternativamente, na primeira etapa (pena-base)
ou na terceira (fração de redução)”. 2. Situação concreta em que a natureza e a quantidade da
droga foram utilizadas tanto na primeira fase quanto na terceira fase da dosimetria da pena.
Em contrariedade, portanto, à orientação fixada pelo plenário do STF. 3. Ordem concedida,
em parte, apenas para que as instâncias de origem refaçam a dosimetria da pena, afastado o
indevido bis in idem, observada a jurisprudência do plenário do STF. (STF; HC 141.420; SP;
1ª T.; Rel. p/o Ac. Min. Roberto Barroso; DJE 01/02/2019)
88/86 – TRÁFICO DE DROGAS. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO
LEGAL. PENA DEFINITIVA INFERIOR A 4 ANOS DE RECLUSÃO. CIRCUNSTÂN-
CIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. REGIME INICIAL SEMIABERTO. POSSIBILI-
DADE. VEDAÇÃO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIRETOS.
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.
APLICAÇÃO DO ART. 12 DA LEI Nº 6.368/76. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO
DE PENA (ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06). COMBINAÇÃO DE LEIS. INVIA-
BILIDADE. AUSÊNCIA DE DOLO NA CONDUTA. REEXAME DO CONTEXTO
FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INVIABILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA Nº 7
DO STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA
DE SIMILITUDE FÁTICA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A fixação do regime prisional
semiaberto com base em circunstância judicial desfavorável considerada para a fixação da
pena-base (circunstâncias e consequências do crime), é fundamento justificável, nos exatos
termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal – CP. 2. Do mesmo modo, tais circunstâncias
e a reprovabilidade da conduta do réu na execução do crime impedem a substituição da pena
privativa de liberdade por restritivas de direitos. 3. A Terceira Seção deste STJ, no julgamento
do RER 1.117.068/PR, acolheu a tese no sentido de que a concessão da minorante do § 4º
do art. 33 sobre a pena fixada com base no preceito secundário do art. 12 da Lei nº 6.368/76
não decorreria de mera retroatividade de Lei nova mais benéfica, mas de verdadeira aplicação
conjugada das normas revogada e revogadora, sendo, por isso, de todo inviável (AgRg no REsp
1.578.209/SC, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 27.06.2016). Assim,
esta Corte Superior admite a retroatividade da Lei nº 11.343/06, a fatos anteriores a sua vigência,
quando mais favorável ao réu, sendo vedada a sua combinação com a revogada Lei nº 6.368/76.
4. Sobre a alegada ausência de dolo na conduta, inafastável a incidência do Enunciado nº 7 da
Súmula desta Corte, porquanto necessário o reexame do conjunto fático-probatório. 5. Nos
termos do art. 1.029, § 1º, do CPC e do art. 255, § 1º, do RISTJ, a divergência jurisprudencial
deve ser comprovada por meio de cotejo analítico, no qual se demonstre a similitude fática
entre o aresto recorrido e o tomado por paradigma, bem como as interpretações divergentes
em relação ao dispositivo de Lei Federal. 6. Agravo regimental desprovido. (STJ; AgRg-AREsp
954.614; Proc. 2016/0190772-7; PR; 5ª T.; Rel. Min. Joel Ilan Paciornik; DJE 26/02/2019)
88/87 – TRÁFICO DE DROGAS. PROTEÇÃO DO DOMICÍLIO (ART. 5º, XI,
DA CF). POSSIBILIDADE. LICITUDE DA PROVA. CIRCUNSTÂNCIAS SUSPEITAS.
PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. GRANDE QUANTIDADE DE DRO-
GA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. HC NÃO CONHECIDO. 1. O
STF, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste STJ, diante da utilização crescente e
sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for
passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da
ordem de ofício nos casos de flagrante ilegalidade. 2. A Suprema Corte definiu, em repercussão
geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo
– a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fun-
dadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem
estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE 603.616/RO, Rel. Min.
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Ementário
188

Gilmar Mendes, DJe 08.10.2010; REsp 1.498.689/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta
Turma, j. 27.02.2018, DJe 08.03.2018). 3. No caso, a entrada na residência pelos policiais foi
legitimada pelas circunstâncias do caso – paciente encontrado em via pública, próximo a um
ponto de tráfico conhecido, com grande quantidade de maconha e que “correu” ao avistar a
viatura policial –, o que afasta a hipótese de violação domiciliar. 4. Para a decretação da prisão
preventiva é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime e
a presença de indícios suficientes da autoria. Exige-se, ainda que a decisão esteja pautada em
lastro probatório que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato (art. 312 do
CPP), demonstrada, ainda, a imprescindibilidade da medida. Precedentes do STF e STJ. 5. No
caso, a constrição cautelar foi preservada pelo Tribunal impetrado em razão da periculosidade
do paciente, evidenciada pela grande quantidade de maconha apreendida – 900 g –, aliada às
circunstâncias do flagrante já mencionadas. Conjuntura fática que demonstra a necessidade da
medida para a garantia da ordem pública, a fim de evitar a reiteração delitiva. 6. Habeas corpus
não conhecido. (STJ; HC 472.224; Proc. 2018/0258693-8; RS; 5ª T.; Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca; DJE 20/02/2019)
88/88 – UNIFICAÇÃO DE PENAS. CONTINUIDADE DELITIVA. REQUI-
SITO SUBJETIVO. NÃO IMPLEMENTAÇÃO. HABITUALIDADE CRIMINOSA. A
jurisprudência dominante do e. STJ e do e. STF, bem como desta Corte, ao lado da doutrina
prevalecente, exige, à configuração da continuidade delitiva, a implementação dos requisitos
objetivos do art. 71 do CP (mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modos de execução) e
do requisito subjetivo (unidade de desígnios) – adotando, pois, a teoria objetivo-subjetiva,
também denominada híbrida ou mista –, sob pena de, olvidado este último, premiar-se, com
o instituto, o criminoso habitual, que faz dos delitos um meio de vida. Precedentes e escólio
doutrinário. Hipótese na qual ao condenado foi deferida a unificação das penas relativas a
quatro condenações, duas delas por delitos praticados em 02.06.06, e as demais em 05.06.06 e
16.06.06. Embora atendidos os requisitos de tempo, lugar e modus operandi entre as condutas,
os crimes perpetrados não passam de ações absolutamente autônomas, não se observando,
entre elas, qualquer elemento a interligá-las, condizentes, apenas, com a mera habitualidade
criminosa. A habitualidade criminosa não enseja o reconhecimento do delictum continuatum.
Precedentes. Habitualidade criminosa configurada. Decisão monocrática reformada. (TJRS;
AG 341707-35.2018.8.21.7000; 8ª C.Crim.; Relª Desª Fabianne Breton Baisch; DJERS 25/02/2019)
Sinopse Legislativa
* Nota: íntegras das normas disponíveis em nosso endereço eletrônico, no link dedicado a esta publicação.

Norma Data Publicação Ementa/Apelido


Acordo sobre Auxílio Jurídico Mútuo
em Matéria Penal entre a República Fe-
Decreto nº 9.729 15/3/2019 18/3/2019
derativa do Brasil e o Reino Hachemita
da Jordânia - Promulgação.
Tratado de Extradição entre o Governo
da República Federativa do Brasil e
Decreto nº 9.728 15/3/2019 18/3/2019
o Governo do Estado de Israel - Pro-
mulgação.
Decreto nº 9.706 8/2/2019 11/2/2019 Indulto Humanitário - Concessão.
“As oitivas previstas no art. 8º, § 2º
da Resolução nº 243/2018/CSMPDFT
devem ser realizadas preferencialmente
Enunciado do por membro do MPDFT, podendo fazê-
MPDFT nº 89 *** 18/3/2019 lo servidor, independente da formação
(alterado) jurídica mas desde que demonstre
conhecimento da matéria específica,
inclusive para colheita de declarações
das vítimas.”
“O acordo de não-persecução pe-
nal, compreendido na Resolução nº
181/2017/CNMP não foi incorporado
na normatização interna prevista na
Enunciado do
Resolução nº 243/2018/CSMPDFT,
MPDFT nº 88 *** 18/3/2019
sendo que sua constitucionalidade
(alterado)
pende de apreciação pelo Supremo
Tribunal Federal, sendo indicado por
cautela sua não realização no âmbito
do MPDFT.”
Destaques dos Volumes Anteriores

Destaques do Volume nº 87
– O Acordo de Não Persecução Penal no Processo Penal Brasileiro
por Marcellus Polastri Lima, Mestre e Doutor
– A Emenda Constitucional nº 45/2004 e o Direito Fundamental à Razoável Duração do Processo
Penal
por Álvaro Gonçalves Antunes Andreucci, Professor e Doutor, e Cristian Lima dos Santos Louback,
Mestrando
– Considerações sobre os Requisitos para Prisão Preventiva
por Gisele Leite, Mestre e Doutora
– A Presunção de Inocência Cessa no Segundo Grau da Jurisdição?
por Fernando Tourinho Filho, Professor
– Notas sobre o Habeas Corpus Coletivo: uma Análise a Partir do HC 143.641/SP e do Microssistema
do Processo Coletivo
por Francisco Vieira Lima Neto, Professor e Doutor, e Thaís Milani Del Pupo, Pesquisadora e
Mestranda
– Contribuições da Filosofia da Linguagem de Wittgenstein na Dogmática Penal: um Diagnóstico do
Dolo
por Ana Carla Pinheiro Freitas, Professora e Doutora, Eduardo Rocha Dias, Professor e Doutor, e
Érica Montenegro Alves Barroso, Advogada e Mestranda

Destaques do Volume nº 86
– O Papel do Juiz na Homologação do Acordo de Colaboração Premiada
por Fabiano Augusto Martins Silveira, Mestre e Doutor
– A Verdade no Processo Penal
por Octahydes Ballan Junior, Promotor de Justiça e Mestre
– A Sentença no Projeto de Código de Processo Penal
por Sergio Demoro Hamilton, Procurador de Justiça e Professor
– A Confissão Qualificada e seus Desdobramentos na Legislação Brasileira
por Rafael Simonetti, Promotor de Justiça, e Priscila Gonçalves, Assessora de Promotoria
– Prova por Videoconferência no Processo Penal
por José Antonio Remedio, Professor e Doutor, e Marcelo Rodrigues da Silva, Especialista e Mestre
– Homicídio no Trânsito: Acerca da Divergência entre Dolo Eventual e Culpa (In)Consciente por
Ocasião do Habeas Corpus 124.687 do Supremo Tribunal Federal
por Felinto Alves Martins Filho, Advogado e Especialista, e Martonio Mont’Alverne Barreto Lima,
Doutor e Pós-Doutor

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Í n d i c e A lf a b é t i c o - R e m i s s i v o

A ANDRÉ FAUSTINO, LEONARDO


POZZI LOVERSO E GUSTAVO
ABANDONO DO PROCESSO FILIPE BARBOSA GARCIA

- Vide Multa. - Artigo: “Iniciativas de Criminalização das


Fake News no Brasil: Reflexo do Expansio-
ABSOLVIÇÃO nismo Punitivista........................................... 5
- Acórdão do TRF 1ª R. – Licitação. Delito ANTECEDENTES CRIMINAIS
previsto no art. 90 da Lei 8.666/93. Fraude.
Dolo específico. Não comprovação. Absol- - Exclusão de informações sobre condenação
vição mantida.................................................. 134 criminal do banco de dados do Instituto de
Identificação Ricardo Gumbleton Daunt –
- Estupro de vulnerável. Erro de tipo. Art. IIRGD, e demais bancos de dados criminais.
20, § 1º, do CP. Vítima menor de 14 anos. Art. 76, § 4º, da Lei 9.099/95. Reabilitação
Desconhecimento pelo agente. Palavra da criminal. Exclusão que impossibilitaria a
vítima. Princípio do in dubio pro reo. TJAC recuperação nas hipóteses permitidas pela
(Em. 88/29)..................................................... 168 lei. Possibilidade de obtenção de certidão
negativa. Tese do direito ao esquecimento.
- Peculato-desvio. Deputado federal e corréu
Impossibilidade da exclusão dos registros
sem prerrogativa de foro. Desvio, em provei-
constantes dos terminais de institutos de
to próprio, dos recursos públicos destinados
identificação criminal. STJ (Em. 88/31)....... 168
à contratação dos assessores parlamentares.
Acervo probatório insuficiente. Ônus da - Pena. Furto qualificado. Subtração cometida
prova. Incumbência do MPF. Presunção de mediante rompimento de obstáculo, uma vez
inocência. STF (Em. 88/5)............................. 161 que o acusado quebrou o vidro do carona do
automóvel para assim subtrair a mochila da
- Violência doméstica. Sentença absolutória.
vítima. Do afastamento dos maus anteceden-
Recurso ministerial. Lesão corporal leve.
tes. Inviabilidade. TJRJ (Em. 88/44)............. 173
Ação pública incondicionada. Dispensável a
representação do ofendido para oferecimento APELAÇÃO EM LIBERDADE
da denúncia. Condenação. Impossibilidade.
Provas insuficientes. In dubio pro reo. TJAC - Acórdão do STJ – Júri. Condenação. Exe-
(Em. 88/81)..................................................... 185 cução provisória da pena. Impossibilidade.
Necessidade de exaurimento da jurisdição
AÇÃO DIRETA DE ordinária.......................................................... 120
INCONSTITUCIONALIDADE
APROPRIAÇÃO INDÉBITA
- Expressão “com exclusividade” do art. 4º
da LC catarinense 453/09. Atribuições de - Ônus da prova. Aquele que alega o repasse de
delegado da polícia civil. Ação julgada par- dinheiro ao proprietário haveria de positivar
cialmente procedente para dar interpretação de modo inequívoco esse fato, sob pena de
conforme ao art. 4º da LC 453/09 de Santa responder pela apropriação indébita respec-
Catarina, assentando-se haver exclusividade tiva. TJSP (Em. 88/8)..................................... 162
da atuação dos delegados de polícia civil ARMA DE FOGO
apenas quanto às atribuições de polícia ju-
diciária. As infrações penais, todavia, podem - Posse ilegal. Numeração raspada. Busca e
ser apuradas pelas demais instituições cons- apreensão sem mandado judicial. Possibili-
titucionalmente responsáveis pela garantia dade. Exceção à inviolabilidade de domicílio.
da segurança pública, da ordem jurídica e do Prova lícita. STJ (Em. 88/67)......................... 180
regime democrático. STF (Em. 88/4)........... 161
- Posse ilegal. Uso permitido com sinal de
ADULTERAÇÃO DE SINAL DE identificação raspado. Art. 16, p. único, IV,
VEÍCULO AUTOMOTOR da Lei 10.826/03. Prova ilícita. Ausência
de mandado judicial. Inexistência de nuli-
- Atipicidade. Adulteração grosseira. Facil- dade. Crime permanente. Flagrante delito.
mente perceptível, posto que produzida Diligência acompanhada por testemunha
com colagem de papel para modificação dos presencial. Palavra de policiais militares que
algarismos respectivos. TJSP (Em. 88/6)...... 162 atenderam a ocorrência. Validade e credibi-
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
192

lidade. Substituição por restritiva de direitos. CONFISSÃO ESPONTÂNEA


Regime inicial aberto em caso de conversão.
- A atenuante deve ser reconhecida, ainda que
TJSP (Em. 88/66)........................................... 180
tenha sido parcial ou qualificada. TJPI (Em.
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA 88/53).............................................................. 176

- Ausência. A ausência de audiência de custó- CONFLITO DE JURISDIÇÃO


dia constitui irregularidade que não tem o
- Foram realizadas diversas tentativas de locali-
efeito de afastar a prisão preventiva imposta.
zação da parte, porém infrutíferas. Art. 66, p.
Drogas. Quantidade. STF (Em. 88/70)......... 181
único, da Lei 9.099/95. A remessa dos autos
ao Juízo comum é cabível quando o acusado
C não for encontrado. Improcedente o conflito
para declarar como competente o juízo de
COMPETÊNCIA direito da 2ª Vara Criminal de São Gonçalo,
a quem deverão ser remetidos os autos. TJRJ
- Conflito de jurisdição. Foram realizadas
(Em. 88/10)..................................................... 162
diversas tentativas de localização da parte,
porém infrutíferas. Art. 66, p. único, da CONSTRANGIMENTO ILEGAL
Lei 9.099/95. A remessa dos autos ao Juízo
comum é cabível quando o acusado não for - Vide Pena. Progressão de Regime.
encontrado. Improcedente o conflito para - Vide Prisão Preventiva. Excesso de Prazo.
declarar como competente o juízo de direito
da 2ª Vara Criminal de São Gonçalo, a quem CRIME AMBIENTAL
deverão ser remetidos os autos. TJRJ (Em.
- Pesca em local proibido. Art. 34 da Lei
88/10).............................................................. 162 9.605/98. Princípio da insignificância. Apli-
- Conflito negativo. Crime contra a Lei de cabilidade, somente quando as circunstâncias
Licitações praticado por militar em situação nas quais o crime foi cometido apresentarem
de atividade contra patrimônio sob a ad- potencial mínimo ou inexistente, consubs-
ministração militar. Superveniência da Lei tanciando ínfimo prejuízo ambiental. TRF
13.491/2017. Ampliação da competência da 4ª R. (Em. 88/16)............................................ 164
Justiça castrense. Aplicação da lei no tempo.
CRIME DE RESPONSABILIDADE
Princípio do tempus regit actum. Sentença
de mérito não proferida. Não aplicação do - Prefeito. Execução provisória da pena. Possi-
princípio da perpetuatio jurisdictionis. STJ (Em. bilidade. Nulidade processual. Inocorrência.
88/12).............................................................. 163 Incidência da Súmula 691/STF. STF (Em.
88/20).............................................................. 165
- Conflito negativo. Desobediência e desacato.
Provável absorção do menos pelo mais grave. CRIME MILITAR
Aplicação do princípio da consunção. Pena
- Tóxicos. Posse. Art. 290 do CPM. Incidência
máxima em abstrato dentro dos limites da Lei
do art. 28 da Lei 11.343/06. Impossibilidade.
9.099/95. Nesse cenário, deve ser considerada
Aplicação da legislação castrense. Princípio
apenas a pena do desacato (que tem teto de 2
da especialidade. STF (Em. 88/65)................ 180
anos de detenção) e que fica dentro das arestas
previstas no art. 61 da Lei 9.099/95. Conflito
de competência procedente para declarar a D
competência do juízo suscitado. TJTO (Em.
88/11).............................................................. 163 DELEGADO DE POLÍCIA

CONEXÃO - Atribuições de delegado da polícia civil.


Ação julgada parcialmente procedente para
- Crime de lavagem de capitais. Autonomia. dar interpretação conforme ao art. 4º da LC
Crimes antecedentes. Obtenção de vantagem 453/09 de Santa Catarina, assentando-se
ou impunidade. Conexão. Processos em haver exclusividade da atuação dos delegados
curso. Ausência de sentença. Possibilidade. de polícia civil apenas quanto às atribuições
STJ (Em. 88/19)............................................. 165 de polícia judiciária. STF (Em. 88/4)............ 161
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 193

DESAFORAMENTO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO


- Medida excepcional. Dúvida quanto à impar- - Oposição. O prazo para oposição de embar-
cialidade do Conselho de Sentença. Deferido. gos declaratórios é de 2 dias quando se tratar
TJAC (Em. 88/22).......................................... 165 de matéria criminal, nos termos do art. 619
do CPP. STJ (Em. 88/24)............................... 166
DESCAMINHO
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
- Princípio da insignificância. Tributos iludi-
dos no valor de R$ 1.163,57. Inexistência de - Exclusão de circunstância judicial valorada
reiteração delitiva expressiva. Ausência de negativamente sem fundamentação suficien-
contumácia na prática delitiva. Manutenção te. Exclusão da agravante da reincidência.
do acórdão a quo. STJ (Em. 88/23)................ 166 Compensação da atenuante da confissão.
Alteração do regime inicial de cumprimento
DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME de pena. Requisitos não preenchidos. Pena
- Roubo qualificado. Emprego de arma branca pecuniária. Substituição. Inviabilidade. TJAC
(faca). Tentativa. Lei 13.654/2018. Novatio (Em. 88/26)..................................................... 166
legis in mellius, que retroage, alcançando o - Violação da proibição de dirigir veículo
réu. Conduta desclassificada para os lindes
automotor. Exame do conjunto probatório.
do art. 157, caput, do CP. TJRS (Em. 88/80). 185
Condenação mantida. Princípio da con-
DESCRIMINALIZAÇÃO DA sunção. Inaplicabilidade. Prova suficiente.
INTERRUPÇÃO GESTACIONAL Dosimetria da pena. Prestação pecuniária
substitutiva. Redução. Mantido o incremento
- Artigo de Edmilson Souza da Silva e Rodrigo de 1/6, pelo concurso de crimes, diante do be-
Julio Capobianco............................................ 93 nevolente reconhecimento da continuidade
delitiva. TJRS (Em. 88/27)............................. 167
DESERÇÃO
ESTUPRO
- Necessária qualidade de militar do réu para
sua tipificação. STF (Em. 88/18)................... 165 - Desclassificação para o crime de importu-
nação sexual previsto no art. 215-A do CP.
DESOBEDIÊNCIA/DESACATO Improcedência. Violência e grave ameaça.
- Provável absorção do menos pelo mais grave. TJDF (Em. 88/28).......................................... 168
Aplicação do princípio da consunção. TJTO
ESTUPRO DE VULNERÁVEL
(Em. 88/11)..................................................... 163
- Absolvição. Erro de tipo. Art. 20, § 1º, do CP.
DIREITO DE VISITAS
Vítima menor de 14 anos. Desconhecimento
- Limitação de visita do companheiro apenas pelo agente. Palavra da vítima. Princípio do
ao parlatório. Visitante que possui situação in dubio pro reo. TJAC (Em. 88/29)................. 168
processual de egresso. Direito de visita pode
- Ameaça. Art. 217-A, caput e § 1º, parte final,
e deve ser regulamentado pela administração
do CP. Laudo de exame de corpo de delito.
penitenciária e pelo juízo das execuções. STF
Vestígios de conjunção carnal e violência.
(Em. 88/33)..................................................... 169
Lesões corporais. Pena. Dosimetria. Culpa-
DIREITO PENAL ECONÔMICO: bilidade e circunstâncias do crime. Desfavo-
UMA REFLEXÃO CRÍTICA SOBRE O ráveis. Fatos concretos mantidos. Quantum.
SEU CONCEITO E OBJETO Desproporcionalidade. Redução. TJDF (Em.
88/7)................................................................ 162
- Artigo de Reinaldo Denis Viana Barbosa...... 76
- Continuidade delitiva. Execução provisória
da pena com fundamento no decidido pelo
E STF no HC 126.292/SP. Possibilidade. STF
(Em. 88/21)..................................................... 165
EDMILSON SOUZA DA SILVA E
RODRIGO JULIO CAPOBIANCO EXCESSO DE PRAZO
- Artigo: “Descriminalização da Interrupção - Acórdão do TJSP – Prisão preventiva. Pacien-
Gestacional..................................................... 93 te preso cautelarmente há quase 3 meses, sem
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
194

conclusão do IP. Ofensa ao disposto no art. FALTA GRAVE


10 do CPP....................................................... 156
- Decisão que, mesmo sucinta, foi devidamen-
- Encontrando-se o paciente encarcerado há te fundamentada. Absolvição ou desclassi-
mais de 1 ano e 9 meses, sem ter havido a ficação para falta média. Impossibilidade.
manifestação do MP quanto à possibilidade Autoria e materialidade da infração bem
de aditamento da denúncia, mostra-se im- demonstradas. Falta grave configurada. Perda
periosa a revogação da prisão cautelar, por dos dias remidos de 1/6. TJSP (Em. 88/38).. 171
excesso de prazo. TJSP (Em. 88/30)............. 168 FAVORECIMENTO DA
- Prisão preventiva. Homicídio qualificado PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA
tentado. Constatado o injustificado excesso FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
de prazo para o início da instrução da ação DE ADOLESCENTE
penal em caso de réu preso, resta configurado - Reconhecimento da tipicidade da conduta.
o constrangimento ilegal. HC concedido. Determinação de remessa dos autos a origem
TJAC (Em. 88/54).......................................... 177 para proceder unicamente a dosimetria do
apelante. Cumprimento. Pena base acima do
EXTRADIÇÃO INSTRUTÓRIA
mínimo legal. Possibilidade. Circunstâncias
- Prisão preventiva decretada pela Justiça judiciais desfavoráveis. Aplicação do concur-
norte-americana. Tratado específico. Requi- so formal perfeito. TJAC (Em. 88/39).......... 171
sitos formais atendidos. Crime de lavagem
FEMINICÍDIO
de dinheiro. Ausência de previsão no trata-
do. Ausência de dupla tipicidade. Crime de - Pronúncia. Homicídio qualificado. Motivo
fraude. Previsão no tratado. Dupla tipicidade. fútil e recurso que dificultou a defesa da víti-
Inocorrência de prescrição. Extradição par- ma. Posse de arma de fogo de uso permitido.
cialmente deferida. STF (Em. 88/36)............ 170 Fundamentação suficiente. Qualificadoras.
Caracterização. TJDF (Em. 88/71)................ 181

F FURTO
- Pena. Redução ao mínimo legal. Impos-
FABIANO AUGUSTO MARTINS
sibilidade. Afastamento da circunstância
SILVEIRA
judicial “motivos do crime”. Inerente ao tipo.
- Artigo: “O Princípio da Proporcionalidade Manutenção dos vetores “antecedentes, con-
e o Problema do Controle de Conteúdo das duta social e personalidade”. Fundamentação
Normas Penais”.............................................. 44 idônea. A obtenção de lucro fácil não é funda-
mentação idônea a justificar a exasperação da
FALSIDADE IDEOLÓGICA pena-base em delitos de cunho patrimonial.
TJAC (Em. 88/42).......................................... 172
- Laudo pericial comprovando a materialidade
do delito. Prova oral segura no sentido de que - Pena. Substituição da privativa de liberdade
o réu aderiu à conduta dos comparsas. Pena por uma restritiva de direitos consistente
base reduzida. Alteração da modalidade de em prestação de serviços à comunidade ou a
uma das penas substitutivas. Impossibilidade. entidade pública a ser estipulada pelo juízo
TJSP (Em. 88/37)........................................... 170 da execução. Regime aberto em caso de des-
cumprimento. Deferido o direito de apelar
FALSIFICAÇÃO, CORRUPÇÃO, em liberdade. De forma acertada, a r. sentença
ADULTERAÇÃO OU ALTERAÇÃO reconheceu que o crime restou consumado.
DE SUBSTÂNCIA OU PRODUTOS TJRJ (Em. 88/43)........................................... 172
ALIMENTÍCIOS FURTO PRIVILEGIADO
- Ofensa à saúde pública. Crime previsto no - Pena. Em sendo as acusadas primárias e
art. 272, § 1º, A, do CP. Inexistência de vio- verificado o pequeno valor da coisa subtra-
lação aos interesses da União. Competência ída (inferior a um salário mínimo), estão
da JE. Coação ilegal inexistente. STJ (Em. presentes os requisitos para a concessão do
88/63).............................................................. 179 privilégio legal, figura prevista no art. 155, §
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 195

2º, do CP. Reduzidas as reprimendas em 1/3. curso material (art. 250, § 1º, II, a; art. 147
TJRS (Em. 88/45)........................................... 173 (duas vezes) c/c o art. 61, II, a e e; e art. 163, p.
único, III, na forma do art. 69, todos do CP).
FURTO QUALIFICADO Redução da pena-base que não se concede,
- Pena. Atipicidade da conduta pelo princípio em razão da gravidade das consequências do
da insignificância. Inaplicabilidade. TJRS crime e da conduta social reprovável do réu.
(Em. 88/47)..................................................... 174 TJRJ (Em. 88/56)........................................... 178
- Pena. Subtração cometida mediante rompi- INICIATIVAS DE CRIMINALIZAÇÃO
mento de obstáculo, uma vez que o acusado DAS FAKE NEWS NO BRASIL:
quebrou o vidro do carona do automóvel REFLEXO DO EXPANSIONISMO
para assim subtrair a mochila da vítima. Do
PUNITIVISTA
afastamento dos maus antecedentes. Invia-
bilidade. Do reconhecimento da tentativa. - Artigo de André Faustino, Leonardo Pozzi
Improcedência. TJRJ (Em. 88/44)................. 173 Loverso e Gustavo Filipe Barbosa Garcia..... 5

INJÚRIA RACIAL/AMEAÇA
H
- Acórdão do TJDF – Condenação. Recurso
HABEAS CORPUS da defesa. Pedido de aplicação do concurso
- Acórdão do STF – Recurso ordinário. Subs- formal próprio. Impossibilidade. Desígnios
tituição. Possibilidade. Em jogo, na via direta, autônomos. Regime inicial aberto, substi-
a liberdade de ir e vir do cidadão, cabível é o tuída a pena privativa de liberdade por duas
HC ainda que substitutivo do RO constitu- restritivas de direitos, além de 21dias-multa,
cional............................................................... 105 à razão mínima............................................... 149

HABEAS CORPUS COLETIVO INTIMAÇÃO DO ACÓRDÃO

- Artigo de Marcellus Polastri Lima e Elias - Ausência de publicação do nome de um dos


Gemino de Carvalho: “O Habeas Corpus defensores. Prejuízo à defesa verificado. Inte-
Coletivo”......................................................... 30 ligência do art. 563 do CPP. Constrangimento
ilegal evidenciado. Anulação da publicação.
- Não há constrangimento ilegal na não in-
TJSP (Em. 88/46)........................................... 174
clusão em pauta das ADCs 43 e 44. Justa
causa nas prisões que são efetuadas. Impos- INTIMAÇÃO PESSOAL
sibilidade de concessão de ordem genérica.
Necessidade de análise de cada caso concreto. - Mandado de segurança. Intimação de de-
STF (Em. 88/50)............................................ 175 fensor dativo pelo Diário Oficial que, na
verdade, não produziu efeito, pois deveria
HOMICÍDIO QUALIFICADO ter sido pessoal. Inteligência do art. 370, § 4º,
TENTADO do CPP. Afastamento do trânsito em julgado,
- Pena. Pedidos de retificação da pena-base, com reabertura de prazo para apresentação de
reconhecimento da confissão e aplicação da razões de apelação. Manutenção do direito de
fração relativa à tentativa no patamar de 2/3. recorrer solto. TJSP (Em. 88/60).................. 179
A atenuante da confissão espontânea deve ser
reconhecida, ainda que tenha sido parcial ou INVASÃO DE DISPOSITIVO
qualificada. TJPI (Em. 88/53)........................ 176 INFORMÁTICO
- Acórdão do STJ – Art. 154-A do CP. Repre-
I sentação. Inequívoco interesse de instaurar a
ação penal demonstrado................................. 109
INCÊNDIO
INVASÃO DE DOMICÍLIO
- Pena. Casa habitada, ameaça majorada por
motivo fútil ou torpe e contra ascendente, - Tóxicos. Tráfico. Licitude da prova. Circuns-
descendente, irmão e cônjuge, duas vezes, tâncias suspeitas. Prisão preventiva. Funda-
e dano qualificado contra o patrimônio da mentação. Grande quantidade de droga. STJ
concesionária de serviços públicos, em con- (Em. 88/87)..................................................... 187
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
196

J - Homicídio qualificado (art. 121, § 2º, II e


IV, do CP). Sentença absolutória imprópria.
JÚRI Crime punido com pena de reclusão. Impo-
sição de medida de segurança de natureza
- Acórdão do STJ – Condenação. Execução detentiva. STF (Em. 88/52)........................... 176
provisória da pena. Impossibilidade. Neces-
sidade de exaurimento da jurisdição ordiná- MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
ria.................................................................... 120 - Execução provisória. Possibilidade. Ato
- Desaforamento. Medida excepcional. Dúvida infracional equiparado ao crime de roubo
quanto à imparcialidade do Conselho de majorado. Liberdade assistida. Apelação so-
Sentença. Deferido. TJAC (Em. 88/22)........ 165 mente no efeito devolutivo. STJ (Em. 88/9). 162

- Homicídio qualificado (art. 121, § 2º, II e IV, MULTA


do CP). Decisão manifestamente contrária - Abandono do processo. Ausência dos advo-
à prova dos autos. Legítima defesa. Erro na gados à audiência. Não comparecimento do
dosimetria da pena. Atenuante da confissão réu. Abandono do processo não caracteriza-
espontânea. Direito de recorrer em liberdade. do. TJSP (Em. 88/61)..................................... 179
Impossibilidade. TJPI (Em. 88/51)............... 176

N
L
NULIDADE
LEGITIMIDADE DE PARTE
- Intimação do acórdão. Ausência de publica-
- Vide Queixa-Crime. ção do nome de um dos defensores. Prejuízo
à defesa verificado. TJSP (Em. 88/46)........... 174
LICITAÇÃO
- Acórdão do TRF 1ª R. – Delito previsto no O
art. 90 da Lei 8.666/93. Fraude. Dolo específi-
co. Não comprovação. Absolvição mantida.. 134 O CRIME DE LAVAGEM DE
- Fraude em procedimento licitatório. Crime DINHEIRO NO BRASIL:
formal. Denúncia apta. TRF 1ª R. (Em. COMPLIANCE CRIMINAL
88/40).............................................................. 171 CORPORATIVO E OS MÉTODOS
DE PREVENÇÃO E COMBATE DO
LIVRAMENTO CONDICIONAL CONSELHO DE CONTROLE DE
ATIVIDADES FINANCEIRAS
- Indeferimento em primeiro grau. Recurso
defensivo. Preenchimento dos requisitos - Artigo de Vinicius Lacerda e Silva................. 55
objetivo e subjetivo. Exame criminológico
favorável. Benefício concedido. TJSP (Em. O HABEAS CORPUS COLETIVO
88/59).............................................................. 179 - Artigo de Marcellus Polastri Lima e Elias
Gemino de Carvalho...................................... 30
M O PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE E O
MARCELLUS POLASTRI LIMA E
PROBLEMA DO CONTROLE DE
ELIAS GEMINO DE CARVALHO
CONTEÚDO DAS NORMAS PENAIS
- Artigo: “O Habeas Corpus Coletivo................ 30
- Artigo de Fabiano Augusto Martins Silveira. 44
MEDIDA DE SEGURANÇA
- Avaliação psicológica que se mostra neces-
P
sária. Inteligência do art. 97, §§ 1º e 2º, do
PECULATO
CP. Não evidenciada demora na tramitação
processual que possa ser imputada a falha ou - Funcionário público. Utilização de veículo
inércia do Juízo impetrado. Ordem denegada, oficial e do cartão de abastecimento (ticket
com recomendação. TJSP (Em. 88/62)......... 179 car). Art. 312 do CP. Dolo específico não de-
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 197

monstrado. Inexistência de prova. Presunção de nulidade. Crime permanente. Flagrante


de inocência. TRF 2ª R. (Em. 88/41)............ 172 delito. Diligência acompanhada por testemu-
nha presencial. Dosimetria penal adequada.
PECULATO-DESVIO Substituição por restritiva de direitos. Regi-
- Deputado federal e corréu sem prerrogativa me inicial aberto em caso de conversão. TJSP
de foro. Desvio, em proveito próprio, dos re- (Em. 88/66)..................................................... 180
cursos públicos destinados à contratação dos - Conversão da alternativa em privativa de li-
assessores parlamentares. Acervo probatório berdade. Condenação à prestação pecuniária.
insuficiente. Ônus da prova. Incumbência do Conversão negativa. Necessidade. Determi-
MPF. Ausência de corroboração. Modalidade nação de elaboração de novo cálculo de penas.
subsidiária de peculato-desvio. Absolvição. Unificação de penas que não interrompe o
STF (Em. 88/5).............................................. 161 prazo para benefícios. Impossibilidade de
desconsideração do período cumprido antes
PENA
da unificação. TJSP (Em. 88/14)................... 164
- Acórdão do STF – A dosimetria da pena
- Crime de responsabilidade. Prefeito. Execu-
envolve, de regra, o justo ou injusto, não
ção provisória. Possibilidade. Nulidade pro-
cabendo presumir ilegalidade. Causa de
cessual. Inocorrência. Incidência da Súmula
diminuição. Tóxicos. Tráfico. Inadequa-
691/STF. STF (Em. 88/20)............................ 165
ção. Cumprimento. Regime. O regime de
cumprimento é definido a partir do patamar - Embriaguez ao volante. Violação da proibi-
alusivo à condenação e das circunstâncias ção de dirigir veículo automotor. Exame do
judiciais – art. 33, §§ 2º e 3º, do CP.............. 105 conjunto probatório. Condenação mantida.
Princípio da consunção. Inaplicabilidade.
- Acórdão do STJ – Execução provisória. Júri.
Prova suficiente. Dosimetria da pena.
Condenação. Impossibilidade. Necessidade
Prestação pecuniária substitutiva. Redução.
de exaurimento da jurisdição ordinária.
Basilares corretamente firmadas em 6 meses
Apelação em liberdade................................... 120
e 15 dias de detenção, assim consolidadas, na
- Acórdão do STJ – Progressão de regime. ausência de causas de aumento ou redução
Indeferimento. Gravidade abstrata do delito a operar. Mantido o incremento de 1/6, pelo
e na longa pena a cumprir. Constrangimento concurso de crimes, diante do benevolente
ilegal configurado. HC concedida de ofício. 114 reconhecimento da continuidade delitiva.
TJRS (Em. 88/27)........................................... 167
- Acórdão do TJAC – Roubo qualificado. Uso
de arma branca (faca). Exasperação da pena - Estupro de vulnerável. Continuidade delitiva.
basilar pela valoração negativa das circuns- Execução provisória da pena com fundamen-
tâncias do crime. Possibilidade...................... 141 to no decidido pelo STF no HC 126.292/SP.
Possibilidade. Garantia da ordem pública
- Acórdão do TJDF – Injúria racial/ameaça. que autoriza a prisão, em casos graves, após
Recurso da defesa. Pedido de aplicação do o esgotamento das vias ordinárias. STF (Em.
concurso formal próprio. Impossibilidade. 88/21).............................................................. 165
Desígnios autônomos. Regime inicial aberto,
substituída a pena privativa de liberdade por - Execução provisória. Princípio constitucional
duas restritivas de direitos, além de 21dias- da presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII).
multa, à razão mínima.................................... 149 O entendimento consolidado não se restrin-
giu aos réus condenados a penas privativas de
- Ameaça. Estupro de vulnerável. Art. 217-A, liberdade, alcançando também aqueles cujas
caput e § 1º, parte final, do CP. Laudo de penas corporais tenham sido substituídas por
exame de corpo de delito. Vestígios de con- restritivas de direitos. STF (Em. 88/69)........ 181
junção carnal e violência. Lesões corporais.
Dosimetria. Culpabilidade e circunstâncias - Execução provisória de sanções restritivas de
do crime. Desfavoráveis. Fatos concretos direitos. Art. 147 da LEP. Impossibilidade.
mantidos. Quantum. Desproporcionalidade. STJ (Em. 88/15)............................................. 164
Redução. TJDF (Em. 88/7)........................... 162
- Falsidade ideológica. Laudo pericial com-
- Arma de fogo. Posse ilegal. Uso permitido provando a materialidade do delito. Prova
com sinal de identificação raspado. Art. 16, oral segura no sentido de que o réu aderiu à
p. único, IV, da Lei 10.826/03. Prova ilícita. conduta dos comparsas. Pena base reduzida.
Ausência de mandado judicial. Inexistência Alteração da modalidade de uma das penas
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
198

substitutivas. Impossibilidade. TJSP (Em. da, ainda que tenha sido parcial ou qualifica-
88/37).............................................................. 170 da. TJPI (Em. 88/53)...................................... 176
- Favorecimento da prostituição ou de outra - Incêndio. Casa habitada, ameaça majorada
forma de exploração sexual de adolescente. por motivo fútil ou torpe e contra ascendente,
Reconhecimento da tipicidade da conduta. descendente, irmão e cônjuge, duas vezes,
Determinação de remessa dos autos a origem e dano qualificado contra o patrimônio da
para proceder unicamente a dosimetria do concesionária de serviços públicos, em
apelante. Cumprimento. Pena base acima concurso material (art. 250, § 1º, II, a; art.
do mínimo legal. Possibilidade. Circuns- 147 (duas vezes) c/c o art. 61, II, a e e; e art.
tâncias judiciais desfavoráveis. Aplicação 163, p. único, III, na forma do art. 69, todos
do concurso formal perfeito. Ocorrência. do CP). Reconhecimento, de ofício, da
Pena definitiva redimensionada. TJAC (Em. prescrição retroativa quanto aos crimes de
88/39).............................................................. 171 ameaça e de dano. Redução da pena-base que
não se concede, em razão da gravidade das
- Furto. Redução ao mínimo legal. Impos- consequências do crime e da conduta social
sibilidade. Afastamento da circunstância reprovável do réu. Aplicação do art. 59 do
judicial “motivos do crime”. Inerente ao tipo. CP. Fixação de regime mais brando inviável.
Manutenção dos vetores “antecedentes, con- O regime fechado é o único adequado aos
duta social e personalidade”. Fundamentação objetivos preventivo/repressor da pena. TJRJ
idônea. A obtenção de lucro fácil não é funda- (Em. 88/56)..................................................... 178
mentação idônea a justificar a exasperação da
pena-base em delitos de cunho patrimonial. - Júri. Homicídio qualificado (art. 121, § 2º,
TJAC (Em. 88/42).......................................... 172 II e IV, do CP). Decisão manifestamente
contrária à prova dos autos. Legítima defesa.
- Furto. Substituição da pena de liberdade Erro na dosimetria da pena. Atenuante da
por uma restritiva de direitos consistente confissão espontânea. Direito de recorrer
em prestação de serviços à comunidade ou a em liberdade. Impossibilidade. TJPI (Em.
entidade pública a ser estipulada pelo juízo da 88/51).............................................................. 176
execução. Regime aberto em caso de descum-
- Regime de cumprimento. Prisão domiciliar.
primento. Deferido o direito de apelar em
A utilização da prisão domiciliar como a
liberdade. A defesa requer o reconhecimento
última opção a ser adotada, muito pelo con-
da prática do delito em modalidade tentada.
trário, afinal, a escolha da prisão domiciliar
De forma acertada, a r. sentença reconheceu foi a única para o caso que se está a analisar.
que o crime restou consumado. TJRJ (Em. STF (Em. 88/74)............................................ 182
88/43).............................................................. 172
- Remição por trabalho externo. Jornada in-
- Furto privilegiado. Reconhecido o privilégio ferior a 6 horas aos sábados. Soma das horas
legal nesta instância, foram reduzidas as para fins de remição. Impossibilidade. STJ
reprimendas em 1/3. TJRS (Em. 88/45)....... 173 (Em. 88/35)..................................................... 170
- Furto qualificado. Atipicidade da conduta - Roubo. Reconhecimento de voz. Depoimen-
pelo princípio da insignificância. Inaplicabili- to da vítima. Coerente com as demais provas.
dade. No caso sob julgamento, houve ofensa Crime continuado. Inaplicável. Crimes con-
considerável ao bem jurídico tutelado, o grau comitantes. Concurso formal. Inexistência de
de reprovabilidade da conduta extrapola o desígnios autônomos. Redimensionamento
ordinário e a lesão jurídica registra expressi- da pena. TJPI (Em. 88/76)............................. 183
vidade. TJRS (Em. 88/47).............................. 174
- Roubo duplamente qualificado. Concurso
- Furto qualificado. Subtração cometida me- de agentes (art. 157, § 2º, I e II, do CP).
diante rompimento de obstáculo, uma vez Natureza violenta e altamente reprovável da
que o acusado quebrou o vidro do carona imputação. Provimento do recurso minis-
do automóvel para assim subtrair a mochila terial para impor ao réu o regime prisional
da vítima. Do afastamento dos maus antece- fechado. TJRJ (Em. 88/79)............................ 184
dentes. Inviabilidade. Do reconhecimento da
tentativa. Improcedência. TJRJ (Em. 88/44). 173 - Roubo duplamente qualificado. Concurso de
agentes. Tentativa. Majorante. Emprego de
- Homicídio qualificado tentado. A atenuante arma de fogo comprovado pela narrativa da
da confissão espontânea deve ser reconheci- vítima, que confirmou a abordagem por três
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 199

indivíduos, um deles empunhando uma arma - Tóxicos. Tráfico. Pena definitiva inferior a
de fogo. Majorante mantida. Dosimetria da 4 anos de reclusão. Circunstâncias judiciais
pena. Hipótese na qual o decisor singular, desfavoráveis. Regime inicial semiaberto.
pelas causas majorativas, aumentou as penas Possibilidade. Vedação à substituição da pena
dos delitos de roubo em 3/8, o que propor- por restritiva de diretos. Circunstâncias judi-
cional ao número de adjetivadoras incidentes ciais desfavoráveis. Fundamentação idônea. A
(2) e, principalmente, à qualidade delas, já Corte Superior admite a retroatividade da Lei
que se tratavam de 3 agentes, que abordaram 11.343/06, a fatos anteriores a sua vigência,
a vítima na entrada de sua residência, um quando mais favorável ao réu, sendo vedada a
deles empunhando uma arma de fogo, apon- sua combinação com a revogada Lei 6.368/76.
tada diretamente ao lesado. Impossibilidade, STJ (Em. 88/86)............................................. 187
nesse contexto, de aplicação do acréscimo no
- Violência doméstica. Lesão corporal. Avalia-
patamar mínimo (1/3). TJRS (Em. 88/78).... 184
ção negativa dos antecedentes, da conduta
- Roubo qualificado. Avaliação negativa das social e da personalidade do réu. Manuten-
circunstâncias do crime. Fundamentação ção. Redução do quantum de exasperação
idônea. Duas causas de aumento. Utilização por cada circunstância judicial. Agravante
de uma delas na terceira fase de aplicação da da reincidência. Acréscimo desproporcional
pena e a outra como circunstância judicial à pena-base. Redução. Alteração do regime
desfavorável para exasperar a pena-base. inicial de cumprimento de pena. Crime ape-
Possibilidade. TJRR (Em. 88/77).................. 183 nado com detenção. Pedido de afastamento
da indenização por danos morais. Inviabili-
- Roubo qualificado. Concurso formal próprio. dade. TJDF (Em. 88/58)................................ 178
Aumento mínimo de 1/6 e máximo de 1/2.
Deve ser observado o critério aritmético, ou PENA DE MULTA
seja, a quantidade de infrações perpetradas.
- Prescrição. Competência. Juízo da execução
TJRJ (Em. 88/25)........................................... 166
fiscal, independentemente da origem penal
- Roubo qualificado. Emprego de arma branca da sanção, a multa restou convolada em obri-
(faca). Tentativa. Lei 13.654/2018. Novatio legis gação de natureza fiscal e, por essa razão, a
in mellius, que retroage, alcançando o réu. competência passou a ser da autoridade fiscal.
Tentativa. Índice de redução. Redução pelo STJ (Em. 88/64)............................................. 180
tentame fixada em 2/3, em 1º grau, alterada
para 1/3, observado o iter criminis percorrido PERDA DE CARGO PÚBLICO
pelo acusado. TJRS (Em. 88/80)................... 185 - Revisão criminal. Homicídio. Praticado por
- Tóxicos. Tráfico. Causa especial de diminui- policial militar contra vítima civil. Apreciação
ção (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06). Quan- pela Justiça Comum. Legalidade. Necessida-
tidade e natureza das drogas apreendidas. de de fundamentação específica. Inteligência
Patamar máximo. Inviabilidade. Art. 42 da do art. 92, p. único, do CP. Valor mínimo de
Lei 11.343/06. Regime inicial semiaberto. indenização. Tema não submetido ao con-
Vedação à substituição da pena por restritiva traditório nos autos da ação penal. Decote.
de diretos. Fundamentação idônea. STJ (Em. Pedido procedente. TJMG (Em. 88/75)....... 183
88/84).............................................................. 186 POSSE SEXUAL MEDIANTE FRAUDE
- Tóxicos. Tráfico. Fixação do regime prisional - Em razão das dificuldades que envolvem a
semiaberto. Fundamentos idôneos. Subs- obtenção de provas de crimes que atentam
tituição da pena privativa de liberdade por contra a liberdade sexual, praticados, no mais
restritiva de direito. Inviabilidade. STF (Em. das vezes, longe dos olhos de testemunhas e,
88/83).............................................................. 186 normalmente, sem vestígios físicos que per-
- Tóxicos. Tráfico. Natureza e quantidade mitam a comprovação dos eventos – a palavra
da droga. Configura ilegítimo bis in idem da vítima adquire relevo diferenciado, como
considerar a natureza e a quantidade da subs- no caso destes autos. STJ (Em. 88/68).......... 181
tância ou do produto para fixar a pena-base
PRESCRIÇÃO
(primeira etapa) e, simultaneamente, para a
escolha da fração de redução a ser imposta na - Pena. Furto simples. Acórdão confirmatório
terceira etapa da dosimetria (§ 4º do art. 33 da condenação. Não interrupção do prazo.
da Lei 11.343/06). STF (Em. 88/85).............. 186 Prescrição configurada. STJ (Em. 88/49)...... 175
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
200

- Pena. Pretensão executória. Reincidência. PRISÃO PREVENTIVA


Condição pessoal do acusado. Irradiação dos
- Acórdão do TJSP – Excesso de prazo. Pa-
efeitos para todas as execuções penais em cur-
ciente preso cautelarmente há quase 3 meses,
so após a unificação. Incidência do acréscimo
sem conclusão do IP. Constrangimento ilegal.
de 1/3 na contagem do prazo prescricional.
Ocorrência. Ofensa ao disposto no art. 10 do
Não incidência. Unificação procedida após
CPP................................................................. 156
o advento da prescrição executória. Sentença
meramente declaratória. TJDF (Em. 88/34). 169 - Audiência de custódia. Ausência. A ausência
de audiência de custódia constitui irregulari-
- Pena. Redução do prazo. Art. 115 do CP. 70
dade que não tem o efeito de afastar a prisão
anos. Inaplicabilidade da idade estabelecida
preventiva imposta. Drogas. Quantidade.
no estatuto do idoso. Inocorrência de revoga-
Tem-se sinalizada a periculosidade do agente
ção tácita do dispositivo penal. Benefício que
quando surpreendido na posse de grande
deve ser aplicado mesmo depois da prolação
quantidade de drogas, sendo viável a inversão
da sentença condenatória. TRF 2ª R. (Em.
da ordem do processo-crime, no que dire-
88/73).............................................................. 182
ciona a apurar para, selada a culpa, prender,
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA em verdadeira execução da pena. STF (Em.
88/70).............................................................. 181
- Crime ambiental. Pesca em local proibido.
Art. 34 da Lei 9.605/98. Aplicabilidade, so- - Excesso de prazo. Encontrando-se o paciente
mente quando as circunstâncias nas quais o encarcerado há mais de 1 ano e 9 meses, sem
crime foi cometido apresentarem potencial ter havido a manifestação do MP quanto à
mínimo ou inexistente, consubstanciando possibilidade de aditamento da denúncia,
ínfimo prejuízo ambiental. TRF 4ª R. (Em. mostra-se imperiosa a revogação da prisão
88/16).............................................................. 164 cautelar, por excesso de prazo. Ordem conce-
dida, com determinação. TJSP (Em. 88/30). 168
- Descaminho. Tributos iludidos no valor
- Homicídio qualificado tentado. Excesso de
de R$ 1.163,57. Inexistência de reiteração
prazo. Constatado o injustificado excesso
delitiva expressiva. Ausência de contumácia
de prazo para o início da instrução da ação
na prática delitiva. Manutenção do acórdão
penal em caso de réu preso, resta configurado
a quo. STJ (Em. 88/23)................................... 166
o constrangimento ilegal. HC concedido.
PRISÃO DOMICILIAR TJAC (Em. 88/54).......................................... 177

- Inexistência de estabelecimento prisional - Homicídio triplamente qualificado. Motivo


adequado ao regime semiaberto. Superlota- torpe. Asfixia. Recurso que dificultou ou tor-
ção carcerária. Súmula Vinculante 56/STF. nou impossível a defesa da vítima. Prisão em
Ofensa aos princípios da individualização da flagrante convertida em preventiva. Posterior
pena e dignidade da pessoa humana. Excep- revogação da custódia. Manutenção da liber-
cional concessão da prisão domiciliar. TJMG dade na sentença de pronúncia. Constrição
(Em. 88/1)....................................................... 160 cautelar decretada em razão da prática de
novos delitos. Segregação fundada no art. 312
- Inexistência de vaga adequada em estabele- do CPP. Circunstâncias do delito. Gravidade
cimento prisional para o cumprimento da concreta. Histórico criminal do réu. Risco
pena. Regime prisional semiaberto. Excesso efetivo de reiteração. Periculosidade social.
na execução. Inteligência do art. 185 da LEP. Necessidade de acautelamento da ordem
Ofensa ao princípio da dignidade da pessoa pública. Fuga do distrito da culpa. Aplicação
humana. Possibilidade de prisão domiciliar. da lei penal. Constrição motivada e necessá-
TJMG (Em. 88/2).......................................... 160 ria. Condições pessoais favoráveis. Medidas
cautelares alternativas. Insuficiência. Coação
- Inexistência de vaga adequada em estabele-
ilegal não evidenciada. STJ (Em. 88/55)....... 177
cimento prisional para o cumprimento da
pena. Regime semiaberto. Concessão do - Violência doméstica. Contravenção de vias
regime domiciliar. Descabimento. Medidas de fato, ameaça e descumprimento de me-
compensatórias fixadas em conformidade dida protetiva de urgência no âmbito das
com a súmula vinculante do STF. TJMG relações domésticas. Alegações de ausência
(Em. 88/3)....................................................... 160 de fundamentação e dos requisitos da prisão
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 201

preventiva. Inadmissibilidade. TJSP (Em. Inteligência do art. 30 do CPP. STF (Em.


88/13).............................................................. 164 88/57).............................................................. 178

PRODUÇÃO ANTECIPADA DE
PROVA TESTEMUNHAL R
- Vide Prova. RECURSO ESPECIAL

PRONÚNCIA - Intempestividade. É intempestivo o recurso


especial interposto fora do prazo de 15 dias
- Homicídio qualificado. Motivo fútil e corridos, nos termos do art. 994, VI, c/c os
recurso que dificultou a defesa da vítima. arts. 1.003, § 5º e 1.029, todos do CPC e tam-
Feminicídio. Posse de arma de fogo de uso bém do art. 798 do CPP. STJ (Em. 88/82).... 185
permitido. Fundamentação suficiente. Quali-
ficadoras. Caracterização. Nos termos do art. REINALDO DENIS VIANA BARBOSA
413 do CPP, a decisão de pronúncia requer
apenas o convencimento sobre a materiali- - Artigo: “Direito Penal Econômico: uma
dade do fato e indícios suficiente da autoria Reflexão Crítica sobre o seu Conceito e
nos crimes dolosos contra a vida, tentados ou Objeto............................................................. 76
consumados. TJDF (Em. 88/71)................... 181 REPRESENTAÇÃO
PROVA - Acórdão do STJ – Invasão de dispositivo
- Produção antecipada de prova testemunhal. informático. Art. 154-A do CP. Inequívoco
Paciente citado por edital. Revelia. Impossível interesse de instaurar a ação penal demons-
precisar o prazo para retomada do curso do trado................................................................ 109
processo. Transcurso de considerável tempo - Violência doméstica. Ação pública incon-
desde a data dos fatos. Risco real de exauri- dicionada. Dispensável a representação do
mento da memória dos fatos. Produção an- ofendido para oferecimento da denúncia.
tecipada de prova testemunhal acompanhada Condenação. Impossibilidade. TJAC (Em.
por núcleo de prática jurídica. Possibilidade 88/81).............................................................. 185
de reinquirição de testemunhas em caso
de apresentação posterior do acusado para REVISÃO CRIMINAL
acompanhar a instrução processual. Ausência
- Homicídio. Praticado por policial militar
de prejuízo. STJ (Em. 88/48)......................... 175
contra vítima civil. Perda de cargo público.
- Reconhecimento de voz. Depoimento da Apreciação pela Justiça Comum. Legalidade.
vítima. Coerente com as demais provas. Necessidade de fundamentação específica.
Roubo. Crime continuado. Inaplicável. TJMG (Em. 88/75)........................................ 183
Crimes concomitantes. Concurso formal.
Inexistência de desígnios autônomos. Redi- ROUBO
mensionamento da pena. TJPI (Em. 88/76). 183 - Pena. Reconhecimento de voz. Depoimento
da vítima. Coerente com as demais provas.
Q Crime continuado. Inaplicável. Crimes con-
comitantes. Concurso formal. Inexistência de
QUEIXA-CRIME desígnios autônomos. Redimensionamento
da pena. TJPI (Em. 88/76)............................. 183
- Crime de abuso de autoridade. Apuração por
meio de ação penal pública incondicionada ROUBO DUPLAMENTE
para a qual não possui legitimidade ativa o QUALIFICADO
requerente. Crimes contra a honra. Ausência
de indícios suficientes de prova a autorizar o - Pena. Concurso de agentes (art. 157, § 2º, I
recebimento da queixa. Queixa rejeitada com e II, do CP). Pretensão ministerial à reforma
fulcro no art. 395, II e III, do CPP. TJSP (Em. parcial da sentença para fixação do regime
88/72).............................................................. 182 inicial fechado que se acolhe, pois injustifi-
cavelmente benevolente o regime semiaberto
- Ofendida. Possui legitimidade para formali- imposto na sentença, especialmente pela
zar ação penal privada a mulher de cidadão natureza violenta e altamente reprovável da
quando atribuída a este infidelidade conjugal. imputação. TJRJ (Em. 88/79)........................ 184
Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 – Índice Alfabético
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- Pena. Concurso de agentes. Tentativa. Fixação de nova data de cálculo para o benefí-
Majorante. Emprego de arma de fogo cio. Ausência do preenchimento de condição
comprovado pela narrativa da vítima, que objetiva prevista no art. 123, II, da LEP. TJDF
confirmou a abordagem por três indivíduos, (Em. 88/32)..................................................... 169
um deles empunhando uma arma de fogo.
Hipótese na qual o decisor singular, pelas
T
causas majorativas, aumentou as penas dos
delitos de roubo em 3/8, o que proporcional
TÓXICOS
ao número de adjetivadoras incidentes (2)
e, principalmente, à qualidade delas, já que - Acórdão do STF – Tráfico. Pena. A dosimetria
se tratavam de 3 agentes, que abordaram a da pena envolve, de regra, o justo ou injusto,
vítima na entrada de sua residência, um deles não cabendo presumir ilegalidade. Causa
empunhando uma arma de fogo, apontada de diminuição. Cumprimento. Regime. O
diretamente ao lesado. Impossibilidade, regime de cumprimento é definido a partir
nesse contexto, de aplicação do acréscimo no do patamar alusivo à condenação e das cir-
patamar mínimo (1/3). Por fim, pela tentativa, cunstâncias judiciais – art. 33, §§ 2º e 3º, do
a pena foi reduzida em 2/3, restando defini- CP................................................................... 105
tivada a sanção em 2 anos, 2 meses e 17 dias
de reclusão. Suspensão condicional da pena. - Posse. Crime militar. Art. 290 do CPM.
Impossibilidade. TJRS (Em. 88/78).............. 184 Incidência do art. 28 da Lei 11.343/06.
Impossibilidade. Aplicação da legislação
ROUBO QUALIFICADO castrense. Princípio da especialidade. STF
(Em. 88/65)..................................................... 180
- Acórdão do TJAC – Pena. Uso de arma
branca (faca). Exasperação da pena basilar - Tráfico. Pena. Causa especial de diminuição
pela valoração negativa das circunstâncias do (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06). Quanti-
crime. Possibilidade........................................ 141 dade e natureza das drogas apreendidas.
Patamar máximo. Inviabilidade. Art. 42 da
- Pena. Avaliação negativa das circunstâncias
Lei 11.343/06. Regime inicial semiaberto.
do crime. Fundamentação idônea. Duas
Vedação à substituição da pena por restritiva
causas de aumento. Utilização de uma delas
de diretos. Fundamentação idônea. STJ (Em.
na terceira fase de aplicação da pena e a outra
88/84).............................................................. 186
como circunstância judicial desfavorável para
exasperar a pena-base. Possibilidade. TJRR - Tráfico. Pena. Fixação do regime prisional
(Em. 88/77)..................................................... 183 semiaberto. Fundamentos idôneos. Subs-
tituição da pena privativa de liberdade por
- Pena. Concurso formal próprio. Aumento
restritiva de direito. Inviabilidade. Requisito
mínimo de 1/6 e máximo de 1/2. Deve ser
subjetivo do art. 44, III, do CP não atendido.
observado o critério aritmético, ou seja, a
Cumprimento da pena em prisão domiciliar.
quantidade de infrações perpetradas. TJRJ
Pedido sem amparo no art. 117, II, da LEP.
(Em. 88/25)..................................................... 166
Dosimetria. STF (Em. 88/83)........................ 186
- Pena. Emprego de arma branca (faca). Ten-
- Tráfico. Pena. Natureza e quantidade da
tativa. Prova segura à condenação, que vai
droga. Indevido bis in idem. Configura ile-
mantida. Majorante. Lei 13.654/2018. Novatio
gítimo bis in idem considerar a natureza e
legis in mellius, que retroage, alcançando o réu.
a quantidade da substância ou do produto
Majorante afastada. Conduta desclassificada
para fixar a pena-base (primeira etapa) e,
para os lindes do art. 157, caput, do CP.
simultaneamente, para a escolha da fração
Tentativa. Índice de redução. Redução pelo
de redução a ser imposta na terceira etapa da
tentame fixada em 2/3, em 1º grau, alterada
dosimetria (§ 4º do art. 33 da Lei 11.343/06).
para 1/3, observado o iter criminis percorrido
STF (Em. 88/85)............................................ 186
pelo acusado. TJRS (Em. 88/80)................... 185
- Tráfico. Pena. Pena definitiva inferior a 4
S anos de reclusão. Circunstâncias judiciais
desfavoráveis. Regime inicial semiaberto.
SAÍDA TEMPORÁRIA Possibilidade. Vedação à substituição da pena
por restritiva de diretos. Circunstâncias judi-
- Advento de nova condenação penal com ciais desfavoráveis. Fundamentação idônea.
trânsito em julgado. Interrupção de prazo. Aplicação do art. 12 da Lei 6.368/76. Causa
Índice Alfabético – Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 88 – Fev-Mar/2019 203

especial de diminuição de pena (art. 33, § e os Métodos de Prevenção e Combate do


4º, da Lei 11.343/06). Combinação de leis. Conselho de Controle de Atividades Finan-
Inviabilidade. Ausência de dolo na conduta. A ceiras”.............................................................. 55
Corte Superior admite a retroatividade da Lei
11.343/06, a fatos anteriores a sua vigência, VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL
quando mais favorável ao réu, sendo vedada a
- Crime contra a propriedade imaterial. A con-
sua combinação com a revogada Lei 6.368/76.
duta descrita no art. 184, §§ 1º e 2º, do CP,
STJ (Em. 88/86)............................................. 187
é típica, formal e materialmente, conforme
- Tráfico. Proteção do domicílio. Licitude Súmula 502/STJ, afastando a aplicação dos
da prova. Circunstâncias suspeitas. Prisão princípios da adequação social e da interven-
preventiva. Fundamentação. Grande quanti- ção mínima. TJMG (Em. 88/17)................... 164
dade de droga. Ausência de constrangimento
ilegal. No caso, a entrada na residência pelos VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO
policiais foi legitimada pelas circunstâncias do - Arma de fogo. Posse ilegal. Numeração raspa-
caso – paciente encontrado em via pública,
da. Busca e apreensão sem mandado judicial.
próximo a um ponto de tráfico conhecido,
Possibilidade. Desnecessidade na hipótese de
com grande quantidade de maconha e que
crime permanente. Exceção à inviolabilidade
“correu” ao avistar a viatura policial –, o que
de domicílio. Prova lícita. STJ (Em. 88/67).. 180
afasta a hipótese de violação domiciliar. Con-
juntura fática que demonstra a necessidade VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
da medida para a garantia da ordem pública,
a fim de evitar a reiteração delitiva. STJ (Em. - Contravenção de vias de fato, ameaça e
88/87).............................................................. 187 descumprimento de medida protetiva de
urgência no âmbito das relações domésti-
cas. Insurgência contra a manutenção da
U
prisão preventiva. Alegações de ausência de
fundamentação e dos requisitos da prisão
UNIFICAÇÃO DE PENAS
preventiva. Inadmissibilidade. TJSP (Em.
- Advento de nova condenação penal com trân- 88/13).............................................................. 164
sito em julgado. Saída temporária. Interrup-
ção de prazo. Fixação de nova data de cálculo - Lesão corporal. Aplicação da pena. Avaliação
para o benefício. Ausência do preenchimento negativa dos antecedentes, da conduta social
de condição objetiva prevista no art. 123, II, e da personalidade do réu. Manutenção.
da LEP. TJDF (Em. 88/32)............................. 169 Redução do quantum de exasperação por cada
circunstância judicial. Agravante da reinci-
- Continuidade delitiva. Requisito subjetivo. dência. Acréscimo desproporcional à pena-
Não implementação. Habitualidade crimi- base. Redução. Alteração do regime inicial
nosa. A habitualidade criminosa não enseja de cumprimento de pena. Crime apenado
o reconhecimento do delictum continuatum. com detenção. Pedido de afastamento da
Habitualidade criminosa configurada. TJRS indenização por danos morais. Inviabilidade.
(Em. 88/88)..................................................... 188 TJDF (Em. 88/58).......................................... 178
- Sentença absolutória. Recurso ministerial.
V
Lesão corporal leve. Ação pública incon-
dicionada. Dispensável a representação do
VINICIUS LACERDA E SILVA
ofendido para oferecimento da denúncia.
- Artigo: “O Crime de Lavagem de Dinheiro Condenação. Impossibilidade. Provas insu-
no Brasil: Compliance Criminal Corporativo ficientes. In dubio pro reo. TJAC (Em. 88/81). 185
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