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Aracy A. Amaral
ARTES PLÁSTICAS
NA SEMANA DE 22
s• edição revista e ampliada
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Copyright © Editora 34 Ltda., 1998 5 , ..e o\ '
Artes plásticas na Semana de 22 © Aracy A. Amaral, 1970/1998J._ ' dv
É vedado o uso de qualquer item da pesquisa iconográfica deste livro sem a
prévia autorização por escrito da autora.
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Ao mesmo tempo, Hélios anuncia a Semana, como a "primeira : ARC}I!TlECTURA
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aparição oficial" do movimento, "a realizar-se daqui a alguns dias, no ··( ~E.att.dp_ ,dt~-~:
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Municipal, sob os auspícios do que São Paulo tem de mais represen- 2""T....,t.. •.
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[lli colocava a Semana, pelo lado social, como o "maior acontecimento · r:Sc0L~TúRA . :.: ··,, . . . ~ .sw-!f.~~ullirr de ubclk>. mdu.
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mundano da temporada", depois do baile dos Campos Elísios e antes ~:·;~" -~~~~·~::~!·
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do baile da Hípica. O amparo dado à manifestação por·grandes figu- I
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ras da aristocracia paulista fez com que ela se tornasse "a coqueluche"
do nosso grand monde. 5 .
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Para Di, entretanto, o grande responsável foi Graça Aranha, com f 'F" ---. ,. ..... .. -
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sua figura festejada, que imprimiu ao·movimento de 22 "um tom festivo w ' ' ' "' .
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irreconciliável talvez com o sentido de transformação social que para f,;
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mim deveria estar no fundo de nossa revolução artística e literária" 6 . r-f 16'.:... Bihi.rw.· '
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Faca de dois gumes, foi justamente este grupo de alta projeção 19 - S. . Scb.,.Uio.
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social que possibilitou aos modernistas a onda promocional que lhes • DI.'CAVALCANTI
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21-Ao pi ·dt. eru&-pticw:J pu~ tàpan,. ...·· 49-Aqu~oriual\.
abriria as portas dos jornais como do Teatro Municipal: 22-0 Hornua do Mar-1920, 50 --f'~. ~
51 - Pa;.l deeontiYo.
i 21-C.Cé tureo-1917.
"A Semana de Arte Moderna, que constará de três noitadas lite- H. -~s· ·~
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24- .... . - 1921.
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rárias e musicais e de uma grande e complexa exposição de escultura,
25. - R.él!l.ttl.
26~A Duvida.
27 - l ~imidadc.
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i 26- " "' 5-4 - NatiU'aa · d~daiMa.
jl l pintura e arquitetura, revelará o que São Paulo possui de mais culto, 29 - 11Ju1.111çae. pua um Ji-o·ro:
30 - Coqucteri.a. . ·VICENTE Rgco MONTEJRO
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de mais sensacional em arte; realizar-se-á no teatro máximo da cida- 56-~alo.
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57-Retrato.
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de, como disse, sob os auspícios da elite paulistana, devendo a ela com- J. CRAZ s9...:..c...br.ç. Verde.
60- Baile • A...,no.
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parecer nosso mundo oficial" 7 . n-Mi-na no lwnulo.
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61 - Uoda Bre.Wlein .
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JS- Rorllato do Minft!rtt C. 63-C..r,;....
A pecha de futuristas continuava sendo dada aos moderriistas 8 . 36- N•twua morta.
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6<-Cubi,ooo.
li Mário em vão tentou desfazer o equívoco: "A erronia, é verdade, come-
38-P•)'taCml &.P.a,
39-PaJ»&emc.k E..p.llâa.
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:I çou por nós. Oswald de Andrade chamou-nos futuristas um dia. Mas o
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'!lj largo sentido em que tomava a palavra foi bastante explicado mais tar-
., de por ele mesmo e luminosamente em seguida, numa crônica de Hélios, Páginas internas do catálogo da exposição da Semana de Arte Moderna,
por Menotti dei Picchia. E no Jornal do Commercio, de 6 de junho pas- com relação de artistas e obras, São Paulo, 1922.
sado, assinei um artigo em que me excluía do futurismo. E Buarque de
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Hollanda parece ter dito qualquer coisa também pelas revistas do Rio" 9 .
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~li 138 Aracy A. Amaral
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n 'I de cabotinismo" 10 .
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Era o reconhecimento de uma situação de fato, pois"[ ... ] já não
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se dirá, depois do veredito de Graça Aranha, que a poesia de Mário
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de Andrade, a pintura de Di Cavalcanti, a escultura de Brecheret e a
\ música de Villa-Lobos são casos de excepcionalidade mórbida ou recla-
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. ~-·--·~--·-.--....- mista. E a semana de arte moderna virá mostrar como esses espíritos
de vanguarda são apenas os guias de um movimento tão sério que é
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Municipal de São
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A EXPOSIÇÃO I quem Paulo Prado solicitara colaboração, tendo a exposição sido ins-
talada no saguão do Teatro, "aberto durante oito dias". Os artistas
expositores, que se diziam "vanguardistas" 16 , se apresentavam, segun-
Pelos jornais falou-se muito nas idéias nebulosas expostas pelos do descrição de Yan de Almeida Prado, à esquerda e à direita da esca-
conferencistas no decorrer dos três festivais (sendo as conferências de daria, estando neste último local "relevos de Brecheret, fortemente
Graça Aranha e de Menotti dei Picchia transcritas nos diários de São influenciado por Mestrovic". "No meio do saguão havia outros tra-
Paulo), bem como sobre os programas e músicas executadas no de- balhos seus e a maquete de projeto da casa na Praia Grande do arqui-
correr da Semana. E as artes plásticas? Devemos confessar que, fora ~ . teto polonês Georg Przyrembel" 17 .
as menções feitas às obras por Sérgio Milliet, Graça Aranha, Menotti Mas, "no saguão do teatro apinhado e rumorejante ... (É verda-
e Mário, e além das defesas de Oswald em relação aos artistas presentes de que o teatro se apinhou à noite inesperadamente!) .. . no saguão do
em geral; não possuímos outros comentários sobre a exposição. Embo- teatro, onde fôra instalada a exposição de quadros e escultura- não
ra nos jornais, ao pé da coluna que noticiava os eventos da Semana, havia quem se não deixasse tomar de pavor e êxtase, ao defrontar com
constasse sempre uma nota como: "No saguão do Municipal estarão os horrores épicos da senhorinha Anita Malfatti. E não a poupavam!
expostas, desde às 20 e meia hora, esculturas e pinturas futuristas" 14 . Era com requinte que se punham a gozar o epigramazinho em que se
Comentários detalhados não surgiram. Assim como não há uma desabotoavam, estilantes de veneno".
relação que se possa considerar exata sobre os artistas participantes. Assim foi, narra Renê Thiollier, "que ouvi dizer a muita gente,
Por outro lado, esse silêncio da imprensa sobre a exposição indica sobre o seu O homem amarelo, que ela se havia inspirado na clínica
I.
também indiferença total do meio ambiente intelectual em relação às dos irmãos Revoredo, onde, pela manhã, num assalto de enjôo, em
obras expostas ou pelo objeto artístico em si 15 . lamentável postura, de cabeça pendida, agoniados de suores frios, se
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tando trabalhos que contradiziam aquilo que as expGsições regular- a escola de Marinetti. No dia 7 de feve~eiro, vai mais longe: analisa
mente mostravam na São P;ulo pacata, o objetivo estava alcançado. um a um os principais expoentes do grupo moço, mostrando as con-
Tentando explicar essa ausência de unidade, Mário, em sua polêmica
("Pró" e "Contra") diária com Cândido Motta Filho em A Gazeta,
reporta-se ao conhecido grupo "dos Seis", d~ músicos: "São moços de
tradições que suas obras apresentam com o verdadeiro futurismo, e,
ao contrário, suas afinidades com os poetas e romancistas de Paris, ou
com o expressionismo alemão, no caso de Malfatti:
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11
tendências múltiplas, às vezes contrárias, moços apenas iguais pela "Anita Malfatti: pintora. Estudou na Alemanha e nos Estados i;
liberdade com que usam das possibilidades técnicas da música. Reu- Unidos. A orientação de Munique reflete-se nas suas melhores obras.
niram-se apenas porque união é força, e nestes tempos de sindicalismo, Victor Brecheret: em Roma filiou-se a ... Mestrovic. Para aperfei-
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o ente solitário dispersa-se e empobrece. Assim somos os rapazes da çoar-se escolheu Paris.
Semana de Arte Moderna" 20 . O importante, como disse Paulo Prado, Di Cavalcanti: arlequim menino de roupa multicor. Lautrec e
era estar presente. Era mostrar um movimento de reação contra o aca- ·Rackam. Só não tem a cor do futurismo".
demismo, "a imitação servil, a cópia sem coragem e sem talento que Depois de mencionar Villa-Lobos ("Creio que nunca viu música
forma os nossos destinos, faz as nossas reputações, cria as nossas gló- de Pratella ou Russolo. Seguiu Debussy. Hoje aparenta-se com o grupo
rias de praça pública" , como diria Oswald, e contra o que se levan- dos Seis"), finaliza dizendo que nem "Cândido Motta Filho, dono das
tou "o chamado futurismo paulista" 21 . filosofias, nem Deabreu, nem Barbosa, Afonso Schmidt, Rodrigues de
"Já que Monteiro Lobato não quis continuar a sua atitude inicial, Almeida, a senhora Graz, ou Ferrignac refletem o futurismo. Falei só
que foi um estouro nos arraiais bambos da estética paulista, façamos de brasileiros. Corno se vê, pode haver falta de ensaios entre as Juve-
ROGER AVf:RMACTC
LC.ON IIAZALGCTI~ Leo-.jowá.esui~í... La'P.u-n~aurait...;.. ~et.~u~~sê~parleurO:,urase
JOSEI>H BII.LIET miem; dit ~ i~~ ~. ~' ·. caryet~~foi; '
LOUL<; IIOUOUET ame, il faut méditero' de. ternPCI , en tempo '..,:. . · ,· C<:dut_, ~e ~ de p_~emim d'Hemani
JAN CANTRé cette vérité connue. ' · · , -~t. enle.,!e.-~o .de Ancliàde le poete
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GEORGE LINZC
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MARCEL MlllET Quelqueo artistes 1 ~ :mourroiit,t~ ~ ; le aecond .qxm.
SI:RGE MllliCT Et voici que tout d'un coup eeo artistes font clant avec elplit et pOiiteo.e, en aristoaate de la
HENRIC1TE SAURET un appel aux autres méconnue du Bzé.il et que, ~ aux quolibeu ·de; l'asoiatanee.
RODO THAMER
à force de courage et de ~ce. ils réus-
HENRI VAN STRATEN
sissent cette chose étonnante : donner à SAo P~~ns .ensem~ i:l,.;.sle hall du Grand
Paulo, la' ville du café, la ville nouoeau rlch~. ~ et achiiiiôno'un peu-eette ezposition.
i des soirées d'art moderne. v~. de_púdie à #i,te,/ohn' c;,u, ancien
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Et tous les arts y oont rq>réeentéo, Marthe, diociPle de-l-'liídler,.qui.iiOua pz61ente.des toiles
sculpture, peinture, muaique, ~ture et d'un ooiQria ,.;g.,._.,. et· d';m aymboliame
jusqu'à l'architecture. m,-atique Oim'p)e'et chír et. nalf. • La descent<>
Ahl mon amie, ce pays est atraordinaire. de la aQix • en eát lé uieilleur eD:mple. Dano
les arts ae cléveloppont avec la m&ne vigueur et les pa~ et ~ Jeá natures mortes eette
la m!me mpidité que leo grande ubreo """ ~ - ~,!'~qui est un des
tronco tordus des foréta -.-.crgeo. Et que de hien ~ de· Hodbr. P~ d'Espegne est
jc:voue en dirais encore ai je ne voulaie pueel' une bélle tcilé. ·
rapidement en :revue cette spleadide :mauifea. Zbttl .AU.. :de Rio de j...eiro, bizane pluwt
tation. qu'........ .m.aDt la coaiCar- et"""'
eM:.- - m cela ·car ·elle a.,...léun ._.
Capa da revista Lumiere, editada em Antuérpia, na Bélgica, Primeira página do artigo "Uma semana de arte moderna e~ São Paulo",
ano 3, n° 7, 15 de abril de 1922. de Sérgio Milliet, publicado em Lumiere, 15 de abril de 1922.
nilidades Auriverdes; mas é certo que elas bandeirantemente recusam cimento no Brasil no curioso Mulher em círculos (192,1), onde a di-
a batuta de Marinetti". nâmica que caracteriza as obras desse movimento está visível no re-
O desejo de épater foi plenamente conseguido. Mas a grita da- trato tratado- mas não construído, daí o seu pseudofuturismo:....... com
queles que se consideraram insultados não foi menos forte. Do Rio, sobreposições de figuras geométricas 25 .
Oscar Guanabarino, crítico de arte segundo Menotti, refere-se como É possível que os modernistas de então rejeitassem Belmiro de
"mambembe" à "embaixada de arte moderna" enviada do Rio para Almeida por terem sido essas obras simples exemplos de virtuosismo
São Paulo, sem "o menor vislumbre de autoridade artística". Acres- e não representarem uma adesão às novas idéias. Porém, parece-me
centa que tudo isso não "passa de uma patacoada, procurando imitar antes que provavelmente não pudesse ser seu nome cogitado ou por
um grupo de desequilibrados, que, capitaneados por Mallarmé em Pa- desconhecimento desses trabalhos ou por sua relação com a Escola
ris, criaram a escola do absurdo com a pretensão de dcsbancar a arte Nacional de Belas-Artes. O certo, contudo, é que havia alguns exem-
que vem sendo aperfeiçoada através dos séculos" 23 . Depois de citar plos de tentativas de "modernidade" em certas obras de artistas liga~
Blaise Cendrars como "nada mais cômico em literatura", na impossi- dos à arte da Academia, muito embora elas fossem esporádicas e tal-
bilidade de acreditar em qualquer sinceridadr em alguma ânsia de vez desvestidas daquela juventude que os novos desejavam (ou mes-
renovação ("essa nova arte, que tem por basda- ausência de arte, in- mo efeito de excitação, como foi o caso de Artur Timóteo, que fale-
vadiu a música, a pintura e a escultura sob diversas denominações, mas I
I
ceu em asilo para doentes mentais).
sem nenhuma novidade, nem interesse, a não ser para os psiquiatras"), Mas, pelo grupo que compôs a Semana, o desejo era realmente
I
finaliza dando um "exemplo": "Tivemos aqui um futurista: o sr. Mi- apresentar um grupo novo, sem relações com o passado. Aqui tam-
·I
lhaud, que foi vaiado em Paris; temos agora o sr. Villa-Lobos, que ouviu bém o rompimento se nota. No Rio, a participação se articularia em
assobios e gaitadas em São Paulo" 24 .
I torno a Di Cavalcanti e Ronald de Carvalho, tendo vindo, além de
I Vicente do Rêgo Monteiro, Zina Aita, Hildegardo Leão Velloso e Mar-
I tins Ribeiro. Em depoimento, Di Cavalcanti, Paim Vieira e John Graz
Os ARTISTAS E O CATÁLOGO recordam-se de Goeldi, mas nenhum pôde peremptoriamente confir-
·l· mar a presença do gravador paraense na exposição do MunicipaF 6 .
'
A escolha das obras e os convites aos artistas não podem ser Todavia, se aqui esteve presente, terá sido com desenhos, pois Goeldi
definidos segundo um critério, a não ser que consideremos como um se iniciaria na gravura somente a partir de 192427 .
princípio o fato de serem convidados os artistas jovens que seguiam Como veremos na tentativa de estudo das obras presentes na
ou tentavam outra orientação que não a da Academia. Este aspecto, exposição da Semana de 1922, o alarido foi bem maior que o escân-
"artistas jovens", parece-nos digno de ser acentuado, posto que Artur dalo que os trabalhos mostraram. Contudo, as artes visuais não se
I
Timóteo (Rio de Janeiro, 1882- Rio de Janeiro, 1923), um verda- apresentaram sós, e a fúria dos passadistas se ergueu contra o movi-
deiro fauve em sua última fase, em 1922, não foi incluído no grupo. mento em si e pelo conjunto das dissonâncias que assinalou em rela- :l
Mesmo que tivesse impedimento físico de comparecer à exposição, po- ção às manifestações artísticas consagradas até então, fosse música, :I:I
:I
deria ter tido obras suas representando-o, tal qual Brecheret ou Rêgo fosse pintura, escultura ou poesia.
Monteiro, então na Europa. Outro caso seria o de Belmiro de Almei- A programação visual da Semana esteve a cargo de Di Cavalcanti, I.
da (Cerro, MG, 1858 -Paris, 1935); o autor do precioso realismo indubitavelmente um de seus mais entusiastas organizadores. A ele
do pequeno quadro Arrufos, do Museu Nacional de Belas-Artes, fizera, coube o planejamento gráfico do programa da Semana 28 , de grande
nos anos que antecederam à Semana, incursões experimentais e sua- simplicidade: em vermelho e negro os dizeres "Semana de Arte Mo-
ves pelo divisionismo de Signac e Seurat, tanto na técnica pontilhista derna", sendo que a primeira e a última letras em vermelho encimam,
como na composição desses neo-impressionistas; bem como uma cla- em caixa alta, o desenho representando um tenro arbusto cujas raízes
ra e única experimentação de aparência futurista de que temos conhe- começam a se aprofundar no solo. Sob a ilustração, os dizeres "São
i
148 Aracy A. Amaral Artes Plásticas na Semana de 22 149
)
Paulo 1922 ", com apenas a data em vermelho: Esse programa inclui- ! Deve-se observar que, sob a catalogação de "Pintura", estavam
ria, no seu interior, as datas dos festivais com os acontecimentos, mu- f
.I incluídos pastéis, óleos, colagens, gravuras e desenhos, indiferen temen-
sicais e literários, bem como as conferências a serem realizadas de 13 te. Percebe-se igualmente que não houve qualquer preocupação de pre-
a 17 de fevereiro. I
paro de um catálogo mais cuidado. Inexistem, assim, indicações so-
O catálogo da exposição foi preparado como literatura à parte: J· bre técnica, dimensões, bem como datação de obras; a não ser em casos
era ele também de forma retangular e de capa i.S'ualmente desenhada excepcionais, como datação de algumas obras do próprio Di Caval-
por Di, com os dizeres "Semana de Arte Moderna- Catálogo da Ex- canti, e de Haarberg, onde o material, madeira, de suas obras, está
posição- São Paulo- 1922", em caixa alta, no mesmo tipo dele- indicado.
tra do programa anteriormente descrito, sob ilustração ocupando a par-
te mais ampla da capa: uma figura, nu feminino, no centro, linear e
sem qualquer preocupação de modelado, traço negro sobre branco, ARQUITETURA: MOYA E PRZYREMBEL
rodeada de intensa vegetação, sem dúvida relacionada à exuberância
dos trópicos. Unindo os diversos planos da vegetação os traços rítmi- Antônio Garcia Moya foi "o arquiteto da., ana" para os mo-
cos paralelos, breves: "Era moderno e era uma moda", como nos di- dernistas, declarou-nos em depoimento o ttet ,.,J;)~{ís Saia. Nave~
ria Paim Vieira, sobre esse recurso usado pelos novos 29 • dade, se examinarmos os projetos;~~ ~t<; ·. • "'~:i!fs· ~~is arquitetos
Sob a figura, colocada como em pedestal, as iniciais "D.C. ".Em ·i Moya e Przyrembel, veremos que/a mve. '· " a de poettca de Moya
nanquim preto sobre papel, esse desenho fôra primeiramente conce- I
' J. ressalta diante do projeto do arquit5~9)?_jf nês. Em seus projetos apre-
bido por Di Cavalcanti para ser realizado em linoleogravura. Mas, dada sentad~s na ~em~na, Moya.' "o~~;;~da ~edra", como o chamava
a premência de tempo, foi feito clichê do originaP 0 • I
Menott1 del Ptcchta, tomou hberdãJ:I·es maudttas, talvez por partu mes-
O estilo dessa capa, muito mais consistente dentro de uma con- l mo da impraticabilidade das ~d~ias com que sonhava. O momento real
cepção moderna (com o entrosamento da figura no primeiro plano com
o fundo, sem preocupação de volume, de composição muito mais cons-
[ da arquitetura, mesmo para·aqueks qué então se consideravam ousa-
dos, era o do neocolonial ~maneirado, prontamente consagrado pela
truída), reflete a contínua alteração por que passava Di.Cavalcanti nessa
fase, sobretudo se a compararmos com os trabalhos de época diversa l oficialidade. Declarou-nos o engenheiro Guilherme Malfatti, de quem
anos depois Moya seria sócio por longo tempo, que "nenhum de se us
(de 1917 a 1922) presentes na exposição da Semana. É bem feliz, ao projetos da Semana foi construído pois naquela época tudo era ima-
mesmo tempo, que tenha cabido a Di Cavalcanti, fruto da mais jovem I ginação, o importante era propor algo contrário ao que se fazia. Daí
geração brasileira, a realização da capa deste catálogo histórico, pois I 'por que Moya fez para a Semana algo que mais se coadunava com o
este artista é tipicamente produto de nosso meio ambiente de então, espírito do movimento, embora não correspondesse à realidade". No
insatisfeito com o academismo, e lançando-se em buscas, tão indepen- campo da arquitetura eram aqueles anos "de transição, procurava-se
dentes quanto indefinidas como orientação, mas que tão bem assina- dar uma tendência moderna, restabelecer o colonial brasileiro" 31 .
lam sua inquietação. Realmente, Di Cavalcanti somente viajaria para Todavia, ao mesmo tempo em que crescia em prestígio o neo-
a França em 1923, contrariamente à maior parte dos demais exposi- colonial, curioso como aos modernistas não tenha tocado, ou estra-
tores, formados no estrangeiro, como Przyrembel, Brecheret, Haarberg, nho que a eles não tenha chegado a informação da conferência pro-
Anita, Yan, Zina Aita, Rêgo Monteiro e John Graz. nunciada por Vicente Licínio Cardoso na Escola Politécnica do Rio,
O interior do catálogo, sem qualquer introdução ou prefácio, sobre a "Arquitetura norte-americana", realizada em 1916. Pela pri-
apresenta uma relação das obras expostas, se bem que, segundo depoi- meira vez em nosso país alguém indicava um caminho, nas artes, que
mento citado de Anita Malfatti, é bem possível que outras obras estives- não o da Europa. Baseando-se em Viollet Le Duc, segundo o qual a
sem presentes sem, contudo, constar do catálogo. É o caso, por exem- arquitetura é a mais social das artes, e, por essa mesma razão, a de
plo, de Hildegardo Leão Velloso, do Rio, que não consta da relação. maior estabilidade ou menor capacidade de evolução, o autor da Filo-
r:-•.;K.
I J' .
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Antônio Garcia Moya, Pantheon, c. 1919, lápis e crayon s/ papel,
33 x 37,9 em, co!. Regina Ferreira da Silva, São Paulo.
I I
so dos negros, como Wildt. É expressionista e vem da, gloriosa Munich
anterior à Guerra. É um amante do volume; e consegue tirar deste varia-
díssimas expressões, capazes de nos transmitir todos os estados de seu
~
eu interior".
I•
Nessa mesma mostra de janeiro de 1923, Haarberg exporia Mãe
e filho (Mutter und Kind), que vemos no catálogo da Semana como
~li , título de duas peças. Mário de Andrade teria uma dessas peças in-
tegrando sua coleção particular (possivelmente uma aquisição, pois
Wilhelm Haarberg, Mãe e filho (Mutter und Kind), s.d., madeira,
31,5 x 14,7 x 14,7 em, Coleção Mário de Andrade,
!li. i'
Mário gostava de adquirir, mesmo com sacrifício), hoje no Instituto Instituto de Estudos Brasileiros, Universidade de São Paulo.
;I fi de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo:"[ ... ] calmo e pos-
'I sante em Mutter und Kind, é sereno e piedoso na Heilige Madonna.
1 O seu David é um símbolo ao mesmo tempo que uma ironia quase sar- Como se vê, a realização da Semana não alteraria subitamente a
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,.1
1
cástica, de veemente dor. Salienta-se ainda a Granada de mão, admi- fisionomia das exposições de São Paulo e esse registro de Mário não
:1,! rável nu, elástico e vigoroso, dum ritmo impressionante. Pouca gente deixa de ser uma alusão ao nítido avanço, como abertura, desse pu-
!. . estilizará a criança com mais verdade sintética e amor que o sr. Haar- nhado de expositores de origem germânica, em relação à maioria dos
li
li berg. A cabecinha de Anne Marie, chorando, é porventura o melhor artistas brasileiros. E refere-se ainda, nesse mesmo texto, à tarefa de
I,
i' trabalho do escultor" 46 . Haarberg como professor de arte na Escola Alemã de São Paulo (hoje
ill'I
il 162 Aracy A ..Amaral Artes Plásticas na Semana de 22 163
...li li
Colégio Porto Seguro): "Além de artista o sr. Haarberg é excelente ...
professor. Imprimiu uma orientação clarividente ao seu curso de plás-
tica na Escola Alemã, e os trabalhos expostos, de seus pequeninos alu-
,1
nos, deram à exposição uma de suas mais vivas atrações" 47 .
1! Brecheret na Semana
Como projeção, a grande presença em escultura na Semana se-
ria indiscutivelmente o conjunto de doze peças deixadas por Brecheret !,.t
,~:
164 Aracy A.. Amaral Artes Plásticas na Semana de 22 165 .
.I _.-<'
I
~
"Brecheret é brasileiro, paulista, fruto de uma amálgama de raças
:I caldeadas no nosso clima profundamente tocado pelas forças a m bien-
tes. Daí sua arte, mesmo no profundo misticismo em que se 'e nevoa,
I conservar algo de visceralmente nosso, tropical e indígena ... " 48 . Mes-
mo reconhecendo em Brecheret o discípulo de Dazzi e o admir ad or de
Mestrovic (que é sempré citado.:.), Menotti afirma que em nosso es-
l j cultor sente-se'bem "o autóctone brasileiro que se projeta nos zigomas
I:
das suas máscaras, nas proeminências da fronte e na audácia d os lá-
bios carnosos e sensuais". E acrescenta: "Ajuda essa impressão a es-
tilização do cabelo" 49 . Nada mais impreciso. Europeu, como menta-
lidade e formação, Brecheret pode ter-se contagiado, pelos amigos, da
euforia do momento e, às vésperas das comemorações do Centenário
da Independência, ter criado a sua proposta maquete ao Monumento
às Bandeiras, que só seria por ele terminado às vésperas do IV Cente-
nário de São Paulo.
Para todos os seus companheiros de então, Brecheret "é genial"
e, comparado a Bourdelle, considerado "o Rodin brasileiro", admi-
rado até por Monteiro Lobato, o que, para Menotti, chegou a pare-
cer uma espécie de desagravo por parte do autor de Urupês por sua
injustiça cometida contra Anita Malfatti. Segundo narra Mário da Silva
Brito, Menotti chegou a sugerir-lhe fazer "justiça à vibrante criadora
de uma arte moderna, forte, livre, penitenciando-se do mal que, com
tanta injustiça e irreflexão, fez" 50 .
Segundo depoimento pessoal de Vicente do Rêgo Monteiro, foi
ele o defensor de Victor Brecheret junto a Monteiro Lobato, quando
esteve em São Paulo em 1920, pois Lobato "o combatia por simples
política literária e antagonismo jornalístico paulistano ... Sei que o
Lobato tornou-se um defensor do V.B. após a minha estada em São
Paulo (1920)" 51 .
A obra conhecida como tendo sido realizada em Roma, Eva, ho-
je da Municipalidade de São Paulo, trabalho trazido em sua bagagem
ao aqui chegar em 1919 52 , se caracteriza por um naturalismo já com
tendências para o impressionismo, sobretudo no aproveitamento dos
efeitos de luz e sombra. O problema da luz não mais abandonaria Bre-
cheret, constituindo sempre elemento essencial em suas obras. Em
trabalho realizado a seguir em São Paulo, a cabeça de Daisy (c. 1920),
I observa-se uma exacerbação nesse sentido, se bem que aqui puxan-
!'
Victor Brecheret, Soror dolorosa, c. 1919-20, bronze, 58 x 16 x 40 em, com a do mais para o expressionismo, no dramático dos jogos de luz, na ten-
base, Governo do Estado de São Paulo, Casa Guilherme de Almeida. são dos músculos e nervos que imprimem uma dinâmica espacial,
''
I
l
Victor Brecheret, Cabeça de Cristo, c. 1919-20, bronze, 32 x 14 x 24,2 em,
Coleção Mário de Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros,
Universidade de São Paulo.
lj
"'i'l 171
lil 170 Aracy A. Amaral Artes Plásticas na Semana de 22
IlM.
Sem qualquer dúvida, às indecisões do jovem Di Cavalcanti se
opunham obras de plena maturidade de Anita Malfatti e John Graz,
aos quais seguia de perto o neo-impressionista Vicente do Rêgo Mon-
teiro. Quanto a Martins Ribeiro, que, segundo depoimento de Yan de
Almeida Prado, veio pessoalmente a São Paulo para a Semana, não nos
foi possível acesso a quaisquer trabalhos seus presentes na mostra. No
catálogo estão registrados quatro trabalhos de sua autoria. Segundo
Di Cavalcanti, "Martins Ribeiro fazia uns retratos, desenhos de ca-
beça, de im.aginação" 5 8.
A presença de Anita
A precursora do movimento abre, no catálogo, a seção de pin- I
tura, com a maior representação individual da exposição, ~:vidente
homenagem e reconhecimento por sua presença catalisadora: "Na l
pintura, aparece meu nome, Anita Malfatti, com doze telas a óleo e
oito peças entre gravuras e desenhos, alguns deles coloridos" 59 .
Algumas pinturas eram conhecidas em São Paulo pois tinham
sido exibidas em sua controvertida exposição de 1917 na rua Líbero
Badaró (como A estudante russa, O homem amarelo, O japonês), ao
passo que outros trabalhos já indicavam, pelo seu simples título, uma
alteração de caminho, que se confirmaria a partir de 1923 com sua
viagem a Paris (como Impressão divisionista). A falta de firmeza de
Anita, já sobejamente comentada, e seu conseqüente recuo após a crí-
tica de Monteiro Lobato, se refletiria em sua necessidade de apoio e
ambiente em fatos aparentemente irrelevantes: por ter freqüentado o '
(
ateliê de Pedro Alexandrino assim como o de Elpons, após seu retor-
no dos Estados Unidos, ambos de tendência oposta ao seu vibrante·
expressionismo (um, acadêmico, especialista em metais, discípulo de
Vollon, e o austríaco, com telas de espessa matéria). Ao mesmo tem-
po, a escolha do ateliê de Maurice Denis para trabalhar em Paris, Anita Malfatti, O homem amarelo, c. 1917, óleo s/ tela, 61 x 51 em,
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
quando de se u pensionato em 1923, seria também indicativa de in-
decisões quanto ao seu próprio trabalho: não ia Anita então desenvol-
ver as suas experiências, mas buscar outras definições ... Infelizmente, O que abalaria o público da Semana nas obras desta pintora se~-\
sua arte voltou bastante debilitada como expressão dessa longa estada riam, contudo, as mesmas características que estremeceram o ambiente
na Europa, tendo perdido todo o vigor que a caracterizara em 1917. de 1917 nas suas pinturas "mais Anita": a cor descompromissada, o
Embora não conheçamos grande parte dos trabalhos que Anita traço-pincelada gestual, o entrosamento do segundo com o primeiro
apresento u na Semana, não nos passa desapercebida a temática bra- plano numa valorização igualitária de ambos, os diversos planos da
sileira (como Baianas e Moemas) que passa a integrar seu envio, indi- figura simplificados conferindo um máximo vigor em su~ grafia, a dra-
cação evidente da preocupação nacional. maticidade de seu estilo numa exaltação emocional nunca antes vista
173 .
172 Aracy A. Amaral Artes Plásticas na Semana de 22
São Paulo, pintava e escrevia poemas, era um típico fruto do a mbien-
te artístico modernista: inquieto, curioso, se encaminharia par a a luta
política- como, aliás, quase todos os modernistas depois de 1924 -,
mas já apresentou, na Semana, obras que dão idéia dessa "Bela Épo-
ca" que terminava ainda em nossa capital. Época romântica, que se
prolongaria até a revolução de 30, tempo da imagem voluptu osa do
apartamento onde não falta a vitrola onde geme um tango, "umas pol-
tronas macias, um abat-jour feito de pecados roxos, uma mulher alta,
magra e loura, loura ou morena ... " 60 .
Nesse tempo, Di Cavalcanti já era conhecido como ilustrador.
Seu nome é obrigatório em todos os fatos que antecedem a Semana, a
partir de 1917, em São Paulo: ilustrador de Manuel Bandeira em Car-
naval, em 1919, já era desenhista de humor, ilustrador e autor de ca-
pas de O Pirralho em 1917, além de colaborar assiduamente em 1918
em Panóplia, e na Fon Fon! em 1921, não apenas como ilustrador, mas
também como jornalista.
Apesar de sua estada irregular em São Paulo de 1917 a 1922,
como estudante-pintor-jornalista, expusera três vezes na capital pau-
lista61. Por ocasião da Semana estava em fase de lançamento o seu li-
vro Fantoches da meia-noite, uma sátira social por meio de figuras de
marionetes, prefaciado por Ribeiro Couto e editado por Monteiro
Lobato & Cia.
Nas revistas acima citadas, as suas ilustrações- e aliás nesta fase
são algumas confundíveis com as de Ferrignac - denunciam a nítida
inspiração em Beardsley, com a estilização característica do grande
artista gráfico inglês impregnado de orientalismo. Mas a alteração de
experimentação do jovem Di, pastel, nanquim, óleo, carvão, está pa-
tente nas suas colaborações nessas revistas. Assim é que um retrato do
,,
1'1 .
il dr. Caio Prado, em O Pirralho, em setembro de 1917, aponta uma
1:1, preocupação de geometrização construtiva, uma depuração que foge
~~Ii
I·q, Anita Malfatti, O japonês, 1915-16, óleo s/ tela, 61 x 51 em, Coleção Mário de à elegância mais fácil das demais ilustrações da época.
Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros, Universidade de São Paulo. Se do ponto de vista artístico ainda não estava seguro, Di repre-
li. sentava, entretanto, a inquietação do momento. E fez-se representar
'I
11
entre nós e que fazem de telas como O farol e A boba, exemplares, com doze trabalhos, sendo que somente dois em ól'eo: Ao pé da cruz e
il
sem dúvida, da melhor pintura até hoje já realizada no Brasil. Retrato . Caracteriza este último o tom "penumbrista" tão ao gosto
da época, como o afirma o próprio Di, o rosto parcialmente ilumina-
O jovem Di do, emergindo de uma densa obscuridade. Todos os demais trabalhos
Idealizador da Semana, o jovem Di Cavalcanti, que se iniciara expostos na Semana, conforme depoimento do artista 62 , "são em de-
como ilustrador e caricaturista, e nos anos anteriores à Semana, em senho e pastel". O homem do mar, de 1920, foi da coleção de Mário
Emiliano Di Cavalcanti, Sem título (Figura), c. 1920, Emiliano Di Cavalcanti, Boêmios (Amigos ), c. 1921,
óleo s/ tela, 74,5 x 48,5 em, co!. Fanny Feffer, São Paulo. pastel s/ papel, 34 x 23 em, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
de Andrade, e trata-se de pastel. Quanto ao Café turco, foi apresenta-
do em duas versões, sendo a de 1917 um desenho em sépia e carvão
preto, e a de 1921, segundo o artista, "uma có'pia do primeiro porém
com técnicas mais avançadas, experiências cubistizantes". O roman- . ..:- ',
tismo de Di, nessa fase, está bem expresso nos títulos dos seus traba-
lhos em pastel A dúvida, Coqueteria, Boêmios e Intimidade. A obra
Boêmios, que integrou a coleção de Freitas Valle, já demonstra uma
técnica apurada no pastel, ao mesmo tempo em que a atmosfera bem
fim-de-século a que nos referimos, com os dois rostos em iluminação
penumbrosa, envoltos em névoa escura.
Além de uma penúltima obra, A piedade da inerte, ilustração, o
seu último conjunto de trabalhos: "Ilustrações para um Livro". T ra-
ta-se, segundo Di, das ilustrações para os Fantoches da meia~noite, ou
das ilustrações que fez para a Dança das horas, de Guilherme de Al-
meida, sendo difícil precisar exatamente qual, tantos anos passados.
Encerrada a Semana, Di partiu para o Rio, de onde embarcaria
em 1923 para Paris, lá permanecendo até 1925. Seria nessa estada que,
independente de estudos com mestres, mas guiado apenas por sua sen-
sibilidade, produziria os seus melhores desenhos, assim como se apli-
II.
caria ao exercício severo de técnicas, atendo-se à disciplina cubista,
numa depuração cujo resultado mais elevado seria, poucos anos de-
pois, a tela Cinco moças de Guaratinguetá. Já então, Di se centraliza
no seu assunto predileto, a mulher brasileira, que cultivaria em todo
o decorrer de sua carreira.
"0(\
Aracy A. Amaral Artes Plásticas na Semana de 22 181
Vicente do algo que correspondesse ao título Natureza dadaísta. Aqui, o adj eti-
Rêgo Monteiro, vo t;elacionado ao grupo niilista da Primeira Guerra Mundial, assim
Sem título como em exemplos anteriores já citados (como Impressão divisionista,
(Composição), de Anita, ou Cubismo, de Rêgo Monteiro), vigora no sentido de de-
1921, óleo s/
monstrar a informação sobre as diversas tendências mais recentes na
tela, 70 x 50 em,
Coleção Mário Europa, mesmo que a absorção e digestão do grupo em questão não
de Andrade, se tivesse realizado.
Instituto de Nem seria de supor que o ilustrador e caricaturista Ignácio da
Estudos Costa Ferreira, cujo traço rápido e expressivo fixou não poucos no fa -
Brasileiros,
Universidade de
São Paulo.
Ferrignac, Colombina, s.d., ·
nanquim, aquarela e colagem
s/ papel, 27,8 x 13,8 em,
Coleção Mário de Andrade,
Instituto de Estudos Brasileiros,
Universidade de São Paulo.
- DE-:S~NfQS(c:•:, -·. E; ;iJ::1t~i~qfÍ~lfol~:1;1if'1 na, o pintor suíço John Graz, recém-aportado, e casado com R egina
cousas.·: iiúí''lli~rliuenf.:'~· '":~,.JI-~iJI~{J;R!ª!-::P~'-.~~if71i. I Gomide Graz 7 1, rapidamente se integrou ao grupo modernista, apre-
sentando-se na Semana com oito quadros a óleo.
::~ ~;~i~!:~-~~;~~i::.a-:.= ~i!~:J~~~i~~~!~s .> - ~ , ::_~;:
llsqq-nt.__ , ll~i.':J_ J.b,& <::~4a4~,-.;tt~, m..UÍ'ftn&t• 1 -.-a ·:~--·~--·Ate ,tlrl4:-: »lu·
Ex-aluno de Gilliard e Vernet, da Escola de Belas-Artes de Gene-
1u~d~ , ~D(fa _a .. t..,tt.·:~d•~ -111:0~ -.,,_~é:: n&LII!lca., - -.o;::JituJi.ltlp~1~~--»~o bra, John Graz estudara durante dois anos com Moos, em Munique,
~ t~~~~;i.':JJ~::~::~=~~~ .:;~4-i;.~.~:_~~~~~~~:· ~~4: ~;~~:fôl
0 1
D.ltqaai--:;- ~ecll4&1:~~taa " • .·,Drati"'· ~ I_OI;·.HIMC'(SYW _- ~1Jil.lli:U.d.~ro,; ..... especialista em técnica de cartazes de publicidade. Depois de uma bolsa
»~I~. J~Uil~{· \f~ ,. ço'at_u~~-~ .-eqt; ff:t,"/::::~.~~'à.~~-~ii!:~!in~~~~- d~.
por;~~la _·•r~·-pacea~tt-. .,,~-~~- "'oDiaJt.t~í~ d_J :. :n~•r.· .~o jog· -bolltoa_c.rl···
m'aa ~r... ~_, aoU~;c14o.,"~•j•r•. t:ôm?~JtC:t~QtM -e..pou.çoa:. ~_nlf·ri-J~ V~Loo:- ·
de estudos de três meses na Espanha, chegou ao Brasil em 1920, já dono
rarJ_t~•4..-~ IJ."'<D:t•U•~·:Il.O :-.ID~l· n.;·A•r-m. .;,.nt~.Udo•- ·tq~~-· o• -:.Pprq ..
1 4o - •uu ·, tuoocGn:' d•(a~1J4•1..... 'P.l"'~-- · $-qif:,;,:a:et\IJt,ai:\a~- 4 ~ t1,.,1do de uma técnica amadurecida, e expôs em São Paulo nesse mesmo ano.
: ': :.:\ "· . ·;. · ,,._..:.. -.·,, ·/ PrJ A~pal=.~~-• ::: ••-• _;Ju·!ço'a_ · · ~aõ'Jõ_C!_..~
4~ulm: .A· q_U~ .- ~t . . · etpal~' rt4oa o_ qu_•::.._~":. Cl0~ 't_\•V.,' 4!_··'(1a ..
hiS . l'tllill- «t . lnaJa , eentrae)f , ,--e : hU:~·. .... ,~, __.~ ,_ -;cava·~~ ~~ qu.~ ;.~~-. ll~
du P~~ :- tam.a_U«a : dtcn••,d~. aü-n_:~:,,:f::!.~~··~ -~~ :i~~·!f ,_ ~~~·-
At;;:::t!;:,·~·;:.:~;~~;~b~~~ ~~~i=~-~-.~-=~~~J::,~:· :/:.:·~---~
lt••· :~~~· o ·. ueandat~.- •. ~~.:4•~- :...:po4Uí .qu.,..~:•.:.-~.-~r~~c.~a.. o..
l~_&D10,-_tp~:.ar-.T~_. Qlii~O'_.P~ •-& ·- ~~o>., -.!•·•:C~q':;.J)U: ~~ l:mo.~to~.·
tii\Q--~M
:LJ. 1 c ~
John Graz,
;~~~~ª~~~~.,;~~;_; 'j
Paisagem de
Espanha
(Ciprestes), c. 1920,
•lntti,IUILa IIIUO ''O.:"idludJ\I,o ·-poiJela,l X)QOClQC)OQràoQOopooot-OOOOOoá-,, ,-r • :· ~ - ••. ·,_
óleo s/ tela,
;,:·~·~\!~~~.{~::~:;.~:;~~!~::;~ · ~:~.;.~~:~,,~~~:1-:;~:~SJ:~f:;g.~~;:~::l - _ _.;:. 73 x 59 em,
co!. Gerda Brauen,
São Paulo.
cificamente à sua participação na Semana. Depoimento à Autora em 22 de março brasileiros. É certo, porém, que o futurismo terá sido o que menos pesou", escre-
de 1970 . veria Manuel Bandeira, e esse comentário se ajusta também às artes plásticas.
27
Segundo depoimento à Autora a 5 de fevereiro de 1970, Paim Vieira, por Manuel Bandeira, in op. cit., p. 132.
volta de 1924, esteve com Goeldi no Rio, "onde fazia umas gravuras minúsculas, 39 Na época da Semana, bem corno nos anos que a antecederam, a juventu-
quase cr-o tamanho de caixa de fósforos tiradas em papel de seda". de inquieta e curiosa, sem os canais de informação de nossos dias (TV, rádio, cinema,
~,
Carta de Rêgo Monteiro à Autora, de Brasília, datada de 6 de setembro
e artes". Depoimento de Paim Vieira à Autora, a 5 de fevereiro de 1970.
de 1968.
40
"Novos depoimentos sobre a Semana de Arte Moderna", in O Estado de 52 Embora estejam na escultura os dizeres "Roma 3-2-1920", com a inscri-
'j
S. Paulo (Suplemento Literário), 14 de abril de 1962.
~ 41
ção da assinatura. Mas é explicável pelo fato de talvez ter o artista assinado a peça
11
,, Depoimento de Mateus Fernandes, no Rio de Janeiro, à Autora, a 4 de somente em São Paulo, na data assinalada, 'registrando, porém, o local onde foi a
outubro de 1969.
1
\~I'
,
1
peça realizada.
1, 42 Ronald de Carvalho, op. cit., p. 162. 53 Mário da Silva Brito, op. cit., p. 117.
d
43
~
' 1 Depoimento de Menotti de! Picchia à Autora, a 12 de janeiro de 1968. 54
René Thiollier, op. cit., p. 44.
44
Aliás Mário diria, em Klaxon, em seu primeiro número, publicado com 55 Mário da Silva Brito, op. cit., p . 112.
1: data de 15 de maio de 1922, com certa amargura: "No Messager de S. Paulo de 8 56 Essa tendência adocicada de Brecheret o levaria, na década seguinte, a uma
!I de abril, o sr. Henri Mugnier assina um artigo sobre 'Modernismo' cheio de bom-
senso e reflexão. É curioso. Os únicos jornais que publicaram críticas independentes
aproximação de vários escultores da Europa como da América. Brecheret, em ver-
dade, foi para nós o que um Paul,Manship foi para os Estados Unidos em escultu-
~ sobre a Semana de Arte Moderna foram o Fanfulla, o Messager de S. Paulo, o
ra: "versão do 'moderno' internacional de atletas musculares heróis e supertra-
Deutsche Zeitung, a Revista Coloniale. Artigos assinados por estrangeiros ... ". Em
balhadores que.surgiram por toda a Europa e América durante essa década". Bar-
virtude dessa informação, procuramos encontrar exemplares da Revista Coloniale
bara Rose, American art since 1900, p. 246. Trad. da Autora .
(inexistente no Consulado da Itália em São Paulo), do Fanfulla (perdidos seus ar-
57 Em meio às polêmicas divulgadas pela imprensa na época da Semana,
quivos por ocasião de incêndio do jornal), e do Deutsche Zeitung (faltante no Ins-
tituto Hans Staden, de São Paulo, exatamente o mês correspondente à Semana, fe- Oswald repele, com justa fúria, nota de um anônimo em A Gazeta "contra os es-
vereiro de 1922). Posto que inexistentes essas coleções ou esses exemplares no Ar- critores e artistas que tomaram parte na Semana de Arte Moderna", na seção
quivo do Estado de São Paulo não pudemos, infelizmente, conhecer esses textos. "Publicações a Pedidos- Semana de Arte Moderna", no jornal do Commercio
Entretanto, durante a pesquisa para atualização desta edição, conseguimos locali- (Ed. de São Paulo), de 23 de fevereiro de 1922: "[ ... ]Não ignorando decerto que
zar no Instituto Italiano de Cultura (em São Paulo) exemplar microfilmado do sei me defender em qualquer terreno, ele envenenou a aquisição feita pela Prefei-
Fanfulla, datado de 21 de fevereiro de 1921, contendo um' artigo sobre a Semana, tura, da Eva, do imortal Brecheret, para ofender-me em casos personalíssimos que
artigo esse reproduzido no "Apêndice" deste volume. nada tem que ver com a literatura". Conta Oswald que Eva foi paga, da mesma
45 forma que a primeira prestação do monumento contratado a Francisca Júlia pelo
Mário de Andrade, "Folhas mortas" (Crônica de Arte), in Revista do Brasil.
Governo do Estado, ao capitalista e intelectual Armando Pamplona, a quem Bre-
São Paulo, no 86, fevereiro de 1923, pp. 139-40 . .
cheret dera procuração para "ambas as liquidações". Refere-se depois à entrega,
46
Idem, ibidem. pelo sr. Pamplona, das somas ao sr. Enrique Nanni, tio de Brecheret.
47
· ·~ I IIDI r Com efeito, Haarberg proporcionava aos mesmos, em suas aulas, liber- 58 Depoimento de Di Cavalcanti à Autora, a 5 de fevereiro de 1970.
' dade antiacadêmica. Dos trabalhos desses alunos, Mário de Andrade diria no 59 Segundo o catálogo da Exposição Comemorativa da Semana realizada
mesmo texto que procediam de meninos "educados na jus.ta noção de arte, capa-
no Museu de Arte Moderna de São Paulo em 1952, é possível ver que, além das
j zes de compreender a escultura como jogo da luz no volume", conceito esse bas-
12 telas, Anita Malfatti apresentou trabalhos nas seguintes técnicas, na Semana
11 1
tante avançado no tempo em nosso meio onde a modelagem estava restrita às leis
il
de 22: nanquim sobre papel, pastel, gravura (água-tinta) e carvão. Assim, lá se
:111•
acadêmicas da imitação da natureza, a temática superando os problemas de or-
acham discriminados como "óleo" telas que também constam da relação da Se-
I dem estrutural. ·
mana : A estudante russa, O homem amarelo, O japonês, A mulher de cabelos
48
Mário da Silva Brito, op. cit., p. 110. verdes, A ventania, Penhascos . Nanquim sobre papel: Casa de chá. Pastel: O
49 Idem, p. 111 . homem das sete cores, Moemas. Carvão: Cristo e São Sebastião. Água-tinta em
50
Idem, p. 113. Acrescenta, entretanto, o historiador do Modernismo que 3 cores: Arvores japonesas.
60
De entrevista de Brasil Gerson, crítico teatral, ao Diário de São Paulo, 24
os apelos de Menotti de! Picchia não encontraram ressonância em Lobato, que
jamais reformou a sua opinião, apesar de o famoso escritor, no dizer do poeta de de março de 1929.
]uca Mulato, ter alargado, então, "seu horizonte estético, saindo da cafurna do 61 Em sua edição de 20 de abril de 191 7, O Pirralho, revista dirigida por
67
Depoimento à Autora, a 7 de outubro de 1969.
"Novos depoimentos sobre a Semana de Arte Moderna", in O Estado de A expressão "reacionários", usada por Oswald no texto que abre
S. Paulo (Suplemento Literário), 14 de abril de 1962. É bem típica do Brasil esta
este capítulo, significa, evidentemente, que os modernistas represen-
ausência de convicção, esta improvisação, esta fa lta de respeito cultura lmente fa-
lando, esta audácia de "também-entro-nesta-vamos-ver-no-que-dá", bem brasi-
tam uma reação contra o academismo. E embora possa causar estra-
leira. Denuncia também a inconsistência do nosso ambiente artístico e a ausência nheza em muitos que ele denomine de "classicismo" o movimento re-
de profissionalismo no mundo artístico daquela época. volucionário, isso nos dá contudo a certeza de que o desejado pelos
68
69
Depoimento de Antônio Paim Vieira à Autora, a 5 de fevereiro de 1970.
Paim Vieira menciona três trabalhos feitos, porém no catálogo constam
modernistas não era apenas destruir, mas, numa segunda etapa, cons-
tituir uma nova escola, caracterizada, porém, por abertura, posto que
,,
apenas Dois desenhos. desvestida de dogmas. Quando Oswald se refere ao passadismo como
70 Ver "Nossas revistas de cultura", de Antônio Barreto do Amaral, in Re- "sufocador de todas as aspirações joviais e de todas as iniciativas pos-
vista do Arquivo Municipal, vol. CLXXIV, Ano XXXI, p. 156. Paim Vieira foi santes", está bem claro que o rejeitado é sobretudo a ausência de aber-
autor do extra-texto de Ariel, intitulado Ecce homo!, do número de abril de 1924. tura, e a estratificação de uma arte em função de um tempo que não
Elementos decorativos de inspiração indígena, bem como de vegetação tipicamente mais existe. Daí por que a declaração citada está banhada em tom
brasileira, eram motivos constantes nas vinhetas da revista.
71
guerreiro: "Não podemos refletir ainda atitudes de serenidade. Essa
Embora não participante da Semana na exposição do Municipal, ao cort-
virá quando vier a vitória", ou seja, passado o período de clímax revolu-
trário do que afirmaram René Thiollier e Di Cavalcanti, Regina Gomide Graz
desenvolveu intensa atividade no campo da renovação das artes decorativas em cionário, o movimento, tornado situação, se transformará em escola.
São Paulo. Ver em Mirante das Artes, o artigo de Aracy Amaral, "Os artistas da Para vencer o academismo, entretanto, é preciso usar de todas
Semana de Arte Moderna", março-abril, 1968. as armas, está-se em guerra: o sarcasmo que humilha, a violência demo-
72 Mário da Silva Brito, op. cit., pp. 163, 182. lidora como a força do ataque. E se pela imprensa os ataques já se su-
73 Di Cavalcanti, op . cit., p. 122. cediam havia dois anos, o confronto violento se daria na primeira gran-
de luta, que foi a Semana de 22. Curioso que, de certa forma, a !in-