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Universidade Mackenzie - São Paulo

MANUAL DE RADIODOCUMENTÁRIO
PRODUÇÃO: MÁRCIA DETONI

Este manual foi produzido exclusivamente para orientação dos alunos do curso de
Radiojornalismo II da Universidade Mackenzie a partir de experiências pessoais e de
várias fontes internacionais. Não deve ser utilizado ou reproduzido, mesmo com menção
à fonte, fora da referida disciplina.
O que é um documentário?
Cambridge Dictionary: “filme ou programa de rádio ou TV que oferece informação
factual sobre um tema”.

Oxford Dictionary: “relato factual de determinado assunto ou atividade usando imagens,


gravações etc... de pessoas envolvidas; filme ou programa de rádio ou de TV”

Novo Aurélio: “(...)2. filme, em geral de curta metragem, que registra, interpreta e
comenta um fato, um ambiente, ou determinada situação.”

Dicionário Houaiss: “(...)2. CINE TV filme informativo e/ou didático feito sobre pessoas
(geralmente de conhecimento público), animais, acontecimentos (históricos, políticos,
culturais etc.) ou ainda sobre objetos, emoções, pensamentos, culturas diversas etc...”

Definição da UNESCO:

“No noticiário, o apresentador CONTA o que aconteceu na sociedade. No documentário,


nós MOSTRAMOS o que acontece na sociedade. Falamos com os envolvidos. Eles
mostram o fato em vez de nós o relatarmos. Mas nós compomos a forma como o fato é
apresentado.

O documentário de rádio funciona como o de TV. Busca mostrar a verdade sobre um


determinado tópico, sobre certo incidente ou local ou sobre relacionamentos entre
pessoas.

Num documentário, o apresentador tem um papel secundário. O mais importante é as


pessoas ligadas aos fatos contarem elas mesmas o que aconteceu.

Num documentário, usamos os sons da realidade como um poderoso instrumento de


comunicação.

O documentário tem um elemento humano que dá ao ouvinte a chance de interpretar a


realidade sozinho em vez de ser informado sobre ela. Um bom documentário muda
nossa percepção da realidade”.
História do radiodocumentário: evolução das
narrativas radiofônicas
- Os documentários falados surgem no final dos anos 20, por influência dos documentários feitos
no cinema. Produtores percebem que o formato poderia tornar o rádio mais interessante e “vivo”.

- Por cerca de quatro décadas, os produtores usaram narradores para contar histórias, ilustradas
com música, efeitos sonoros, e atores.

- Os gravadores portáteis, ainda pesados e primitivos, dificultavam a coleta de sons ambientais e


de vozes fora do estúdio. Os sons e entrevistas, quando obtidos, tinham a mesma função das
citações entre aspas no texto escrito: serviam de “evidência” ou “ilustração”.

- As revoluções sociais e acadêmicas dos anos 60 e 70 fizeram com que a fórmula soasse
ultrapassada. A voz solene narrando protestos pacifistas e feministas soava completamente fora
da realidade.

- Com EUA e Europa substituindo o consenso pelo pluralismo, as emissoras passaram a abrir o
microfone para mulheres, trabalhadores, negros e outras minorias.

- Quando a National Public Radio entra no ar, nos anos 70, o principal programa do novo sistema
de rádio não-comercial é apresentado por uma mulher. O forte da rede são os “sound pieces”
(peças sonoras), nos quais as pessoas contavam suas próprias histórias.

- Na nova fórmula, a figura do narrador desaparece. O produtor/autor abandona o microfone, mas


continua “dando as cartas” no estúdio.

- A mudança foi possível graças aos novos gravadores de fitas analógicas K-7, portáteis, baratos
e com boa qualidade de som, que facilitaram as gravações em campo.

- Nos anos 80 e 90 surgem os “sound artists” ou “radio artists”, que passam a produzir peças
sonoras só com sons ambientais, sem usar a voz.

- Atualmente, sob o signo da convergência, todas as fórmulas são usadas em documentários e


reportagens especiais por emissoras dos EUA, Canadá Reino Unido, Alemanha, Holanda,
França, Austrália, etc... O formato mais usado tem sido, no entanto, o documentário conduzido
pelo repórter por causa dos custos, da facilidade de produção e de exposição da mensagem.
Tipos de radiodocumentário

Classificação por tema:

1. Documentários jornalísticos

- Ligados a questões e contemporâneas (Meio-ambiente e poluição, racismo,


desenvolvimento urbano, lutas indígenas, reforma agrária, educação...)

Podem examinar apenas um aspecto desses temas ou tentar, de forma mais ampla,
examinar como eles afetam a sociedade.

Podem ainda retratar apenas uma única pessoa, um evento ou uma atividade (uma
descoberta científica, a construção do avião Concorde, a vida de uma celebridade, o
trabalho de uma determinada fábrica, grupo teatral ou escola).

- O objetivo é abordar as questões com mais profundidade que o noticiário. Vai além das
manchetes. EXPLICA o que está acontecendo e ABRE UMA JANELA PARA O MUNDO.

- São organizados a partir do trabalho de reportagem.

2. Documentários históricos

- Relembram e reinterpretam o passado.

- Podem ser investigativos e reveladores, expondo fatos novos sobre determinado


acontecimento.

- Usam gravações históricas, pesquisa jornalística, entrevista com testemunhas, inclusão


de vozes excluídas pela história oficial.

3. Documentários culturais
- Têm como tema as artes em geral, permitindo um uso maior de música, poesia e
drama.

4. Documentários de abordagem filosófica ou psicológica

- Tratam de temas que não perdem a atualidade:

Temas filosóficos: identidade, crença, existência, amor, vingança

Temas psicológicos: relações interpessoais (familiares, de trabalho, homem e mulher


etc...), comportamento humano.

Classificação pela narrativa:

1. Observacional

Dispensa o narrador. Não busca interpretar ou criticar, apenas mostrar um fato e


provocar reflexões.

2. Conduzido pelo narrador ou repórter

O repórter o narrador faz os links explicativos, ajudando o programa a desenrolar-se


de forma lógica e informativa. O repórter/narrador dá o contexto, dados estatísticos,
faz as apresentações.

3. Autoral

O repórter ou narrador não é neutro. Ele dá a sua própria visão de determinado


acontecimento ou narra a sua própria experiência.
DOCUMENTÁRIO X FEATURES (ESPECIAIS)

São histórias contadas através dos sons: o som da voz humana, das atividades
humanas e da música. Ambos visam a informar e entreter. A diferença básica está na
seleção e tratamento do material usado.

Documentário

É totalmente factual, baseado em evidências documentadas (registros escritos,


entrevistas atuais, fontes mencionáveis)

O objetivo é prioritariamente informar, e o produtor se dispõe a fazer um relato


completo, equilibrado e verdadeiro sobre alguma coisa ou alguém.

Feature (Especial)

O produtor não está preocupado em abordar determinado fato de forma profunda e


abrangente. Também não há preocupação de se ater totalmente ao factual.

Um especial pode incluir música, poesia e ficção para ajudar a ilustrar o tema.

O formato é totalmente livre. O produtor pode dar asas à imaginação mesmo


trabalhando com fatos reais.

A distinção nem sempre é fácil por causa dos híbridos (documentários “especiais”,
semidocumentários, dramadocumentários), que usam todas as técnicas sonoras e
narrativas disponíveis.
5. Planejamento e Produção de Documentários

Idéia inicial

Tudo pode virar um documentário, desde assuntos quentes na mídia até pautas do
cotidiano. As possibilidades estão em todas as partes: nas notícias dos jornais, nas
esquinas das cidades, no dia-a-dia do próprio produtor.

Planejamento

Após a idéia inicial, a primeira coisa que o produtor deve fazer é responder a duas
perguntas:

- Qual é o objetivo desse documentário? (O que quero contar ou mostrar)

- O que quero deixar para o ouvinte? (mensagem)

As respostas a essas perguntas ajudam a definir o ângulo do documentário. São de


grande valia na hora de decidir o que entra no programa ou sai. O objetivo pode mudar
ao longo do trabalho quando somos confrontados com novos dados e situações, mas
saber o que se quer atingir é fundamental para estruturar o programa.

Não há uma técnica única e infalível de planejamento. Cada produtor segue seu próprio
método. Mas é fundamental fazer uma boa pesquisa sobre o tema e anotar os tópicos
que devem entrar no documentário:

- pessoas a serem entrevistadas

- locais de gravação

- sons ambientais

- possibilidades de música.

Com base nesse roteiro é que vamos decidir quais técnicas usar para contar a história.
O planejamento e a pesquisa também ajudam a definir melhor o ângulo. Podemos, por
exemplo, escolher contar a história tendo como fio condutor “um dia no parque” (da
abertura ao fechamento dos portões) ou “um domingo no parque”.

Montagem do projeto – Veja o exemplo abaixo sobre um documentário sobre o


parque do Ibirapuera

Título: geralmente é decidido após a realização do documentário (pode, inclusive, sair de uma
frase de um entrevistado)

Objetivo:

(O que quero contar ou mostrar)

- Mostrar como é o parque, atrações que oferece ao público, como ele contribui para a qualidade
de vida das pessoas.

(O que quero deixar para o ouvinte? mensagem)

- Incentivar o ouvinte urbano a ver os parques como alternativas prazerosas de lazer e de contato
com a natureza e não apenas como espaços que enfeitam a cidade.

Duração: 15 minutos

Informações a serem levantadas:

Dados históricos, importância ambiental, características (área, flora e fauna), estimativa de


público, número de funcionários, de bebedouros, de banheiros e de lanchonetes, gastos com
manutenção, atrações (shows, jardinagem, leitura, quadras de esporte, áreas para ginástica,
áreas de descanso, passeios de bicicleta....)

Conteúdo do documentário:

- descrição do parque e de suas atrações;


- influência no cotidiano das pessoas: como o público o utiliza.

Tópicos-chave:

- O que o parque significa na vida e na saúde das pessoas que o frequentam?

- Histórias humanas e engraçadas envolvendo público/funcionários e o parque.

- Pessoas que ganham a vida no parque (funcionários e ambulantes).

- Pessoas que tem vida social e cultural no parque.

Entrevistados:

- Administradores/

- Funcionários da limpeza e manutenção, responsáveis pelo cuidado das plantas e aves

- Guardas que fazem a segurança

- Vendedores de balas e picolés/ Artistas de rua

- Responsável pelo aluguel das bibicicletas

- Público: os que caminham, correm, tomam sol, fazem ginástica, jogam, andam de bicicleta,
patins e skate, levam crianças, idosos e cães para passear.

Sons:

- som ambiente/ aves

- crianças brincando e nos balanços/ pessoas correndo

- bicicletas (aluguel de bicicletas)

- água jorrando no lago

- quadras de futebol e basquete

- ginástica (música ou instruções)

- músicos e artistas de rua

- pessoas conversando nos bares/shows


Formato e Técnicas de Narração

Após a pesquisa sobre o tema (entrevista com a administração do parque para obter
dados e checar pontos fortes) teremos condições de decidir melhor que técnicas
usaremos para contar a história.

A escolha do formato deve levar em conta o material obtido, a melhor forma de passar a
mensagem e o tipo de público que se quer atingir.

Narração do repórter em estúdio intercalada de trechos de entrevistas, sons e


música

O narrador faz os links. O script é montado a partir das entrevistas. A presença do


narrador facilita bastante a produção e o andamento do documentário, fazendo com que
progrida de forma lógica e informativa. O narrador faz as apresentações, expõe a maior
parte dos dados estatísticos e esclarece o contexto das opiniões. Com a ajuda do
narrador, se pode dizer muito em menos tempo, mas é aqui que mora o perigo! O
programa pode ficar muito “picado” e passar uma impressão de formalidade ou frieza. U

Dica: O narrador deve sempre ligar e nunca interromper. Não há necessidade de usar a
voz do narrador entre cada entrevistado.

Exclusão do narrador - colagens de sonoras

Os próprios entrevistados contam a história a partir de colagens de sonoras. Pode-se


também usar um personagem para apresentar a história. Os documentários sem
narrador geralmente são mais atmosféricos. Mas é preciso fazer com que cada item siga
um fluxo natural formando uma justaposição inteligível.
Dica: Nesse formato é importante pedir que o entrevistado faça a própria apresentação,
diga quem é, o que faz, qual a sua relação com a história. As respostas devem incluir
todas as informações necessárias e deixar claro quem está falando.Exemplo: - “Como
administrador do parque, eu acho que.....”

- “Eu corro aqui todos os dias há 15 anos... Sou bancário, tenho uma vida sedentária e
preciso me exercitar...”

- “Eu trabalho numa metalúrgica, mas vendo picolé nos domingos aqui no parque há dez
anos..”.

A apresentação do entrevistado não precisa necessariamente estar nas primeiras frases


dele, mas deve aparecer logo em seguida. Não deixe o ouvinte muito tempo sem saber
quem está falando. A experiência mostra que os ouvintes reagem mal quando não
entendem o que está no ar.

Mix de narração em estúdio com gravações externas

Passagens gravadas ao estilo da reportagem de TV e pequenas entrevistas in loco. A


reportagem interage com os entrevistados.

O programa deve ser consistente na estrutura, no desenvolvimento da idéia. Mas a forma


e o estilo podem ser flexíveis e variados. Podemos usar várias técnicas dentro de um
mesmo programa. É importante explorar novas formas de apresentar o tema. A chave
é a clareza.
Sons Ambientais

Pare, ouça, grave!


Quando você estiver no local da gravação use as orelhas para ter idéias sobre sons.
Tente identificar os sons que caracterizam o ambiente.

Não deixe escapar nenhum barulho. Grave todos os tipos de sonoridade: telefone
tocando, cães latindo, relógios badalando, portas abrindo ou batendo, crianças
brincando, máquinas em operação, trânsito, buzinas, helicópteros, aviões, trens, sinos de
igreja, água correndo, mensagens de telefone, pessoas cantando ou tocando
instrumentos.

Peça para que cantem para você. Grave sistemas de rádio, sirenes da polícia ou de
ambulâncias, o cantar dos pássaros, ondas, cachoeiras, torcidas de futebol, protestos de
rua, programas de rádio e TV, noticiário.

Todos esses sons são muito importantes para ajudar na ambientação e quebrar a rigidez
de textos longos. São eles que enriquecem os documentário ou reportagens. As palavras
podem dizer muito mas são os sons que transportam o ouvinte para o local do fato.

Não perca a chance!


Toda a vez que você notar alguém fazendo algum som que possa ser útil, tente gravar
na hora, porque dificilmente você terá outra oportunidade. Esteja com o gravador pronto
para gravar a qualquer momento.

Grave antes, durante e depois!


Você pode começar a gravar ainda antes de fazer a entrevista. Se você ligar o gravador
antes de entrar no local, por exemplo, o som da porta, a conversa com a secretária, ou a
troca de cumprimentos podem ser úteis. Mas fique atento à ética. Nem sempre é
apropriado gravar sem o consentimento das pessoas.

Essa técnica é indicada quando o entrevistado tem uma relação com o local em que
está, como uma família que vai falar sobre seu cotidiano.

Sempre tente gravar o som daquilo que as pessoas fazem. Se você não estivesse lá, o
que elas estariam fazendo? Ouvindo rádio ou TV? Operando algum equipamento?
Lavando roupa? Dando aula?

Não esqueça de gravar pelo menos um minuto do som da sala onde você fez a
entrevista. Será muito útil na mixagem.

Peça ajuda
Quando marcar a entrevista, mencione que você estará gravando também som
ambiente. Isso fará com que o entrevistado comece a pensar em termos de sons.
Quando você chegar, pergunte novamente: “Que sons eu poderia gravar aqui?

Como usar o som ambiental:


A função dos sons ambientais é ajudar a criar atmosfera. Além disso, para os ouvintes
que conhecem o assunto, o reconhecimento de sons autênticos aumenta a autoridade do
programa.

Nos documentários factuais, jornalísticos, é possível usarmos efeitos sonoros de arquivo.


Mas esses efeitos devem ser usados com cuidado. Eles precisam passar uma
impressão de autenticidade.

Sons artificiais misturados a sons verdadeiros confundem o ouvinte de um documentário


factual, que espera ouvir material genuíno.
Como usar a música:
A música é a moldura do documentário ou especial

- Cria atmosfera e aumenta o impacto sonoro

- Faz com que as palavras soem verdadeiras ou heróicas, ou urgentes...

- Ajuda a acordar e surpreender o ouvinte

- Um trecho ou uma frase de uma canção também podem servir de gancho para o
comentário inicial do narrador. Exemplo:

Técnica: Música do Skank : “Ganja, legalize já...Ganja, legalize já... uma


erva natural não pode lhe prejudicar....”

Narrador: A legalização da maconha....

Quanta música devemos usar?

Nos documentários e reportagens jornalísticas a música deve ser usada com


parcimônia para não competir com o conteúdo e tirar sua autoridade.

O programa soa mais verdadeiro se a atmosfera for criada com sons e situações
verdadeiras.

Geralmente usa-se de 3 segundos a 15 segundos de música separando trechos de voz.

Nos especiais, a música é um elemento forte de ambientação. Uma boa música anima e
dá vida às vozes e textos.
Dicas para uma boa entrevista

1. Bons entrevistadores não brilham, quem brilha são seus entrevistados

Não use a entrevista para demonstrar seus conhecimentos, vocabulário, charme ou a


bela voz nem faça da entrevista um debate.

2. Aproxime-se com simpatia e respeito

Seja positivo e confiante. Pressuponha que a pessoa em questão queira falar com você.
A forma como as pessoas respondem depende da forma como você as aborda. O
segredo é fazer com que elas perceberem a importância do seu projeto.

3. Explique a razão da entrevista

Diga para que programa ou projeto você está fazendo a entrevista e deixe claro que tudo
pode ser e será editado. Esclareça qual é o objetivo do documentário, o ângulo
abordado, as implicações de uma exposição no rádio.

É necessário proteger o entrevistado, omitindo o seu nome ou alterando a voz? Há


nomes que não podem ser mencionados?

Com um “código de conduta” firmado, o entrevistado se sentirá mais seguro para falar e
terá mais confiança em você.

4. Procure uma posição confortável

Mova cadeiras para que você fique perto do entrevistado. Sente-se na ponta da mesa e
não do outro lado dela. Assim, o microfone ficará próximo do entrevistado e o braço não
fraquejará.
5. Evite ruídos indesejados

Se a entrevista for importante e você quiser gravá-la em local silencioso, tente conversar
com o entrevistado em um quarto ou numa sala com tapete e cortinas. Não deixe a
entrevista ser prejudicada pelo ruído de lâmpadas florescentes, ar-condicionado,
telefones, rádio, TV e geladeira ou pelo som do trânsito e do vento. Os ruídos podem
desviar a atenção do ouvinte e dificultar a edição. Algumas vezes, queremos o som
ambiente, mas é melhor gravar separadamente para mixar mais tarde.

6. Em ambientes barulhentos, aproxime o microfone da boca

Se barulho é exatamente o que você quer, coloque o microfone bem perto da sua boca
ou da boca do entrevistado para que a voz fique clara.

7. Deixe as pessoas a vontade

Lembre o entrevistado que ele pode errar e repetir a fala e que o material será editado
mais tarde. Aja de forma natural em relação ao microfone. Segure-o, inicialmente, de
maneira displicente. Você pode encostá-lo no queixo (para mostrar que não morde!).
Ligue o gravador sem formalidade e faça algum comentário sobre o tempo ou sobre o
equipamento. Só depois coloque o microfone na posição para gravar. Isso evita o
constrangedor “Ok. Vamos gravar”, aliviando a tensão.

8. Mantenha o contato de olhos

Não esqueça de olhar nos olhos do entrevistado. Faça a entrevista como se estivesse
conversando normalmente com ele. Não deixe o microfone ser o centro das atenções.

9. Entrevista é uma mão de duas vias


O sucesso de uma entrevista depende, em parte, de fazermos a pergunta certa. Mas
estabelecer um clima amistoso com o entrevistado é muito importante. Às vezes é
preciso contar alguma coisa sobre nós mesmos. Para que a entrevista se transforme
numa conversa honesta e aberta, as pessoas precisam sentir que realmente nos
interessamos pelo que elas estão dizendo e que vamos respeitar suas opiniões.

10. Faça uma lista de perguntas, mas não fique preso a ela

Deixe a lista a mão para, no final da entrevista, checar se todos os pontos importantes
foram abordados.

11. Identificação das entrevistas

No início da entrevista, sempre peça que o entrevistado se apresente, dizendo nome,


idade, profissão. Isso facilita a identificação dos tapes, mas também ajuda o entrevistado
a relaxar, enquanto você vai ajustando o nível da gravação.

12. Faça perguntas curtas

Seja objetivo e elabore perguntas que exijam respostas mais longas que um sim ou não.
Em vez de perguntar, por exemplo, “João da Silva era um bom patrão?”, pergunte “O que
os funcionários achavam de João da Silva como patrão?”

13. Aborde uma questão de cada vez

Algumas vezes os entrevistadores fazem várias perguntas ao mesmo tempo.


Provavelmente o entrevistado responderá apenas a primeira ou a última.

14. Algumas perguntas produzem boas respostas em documentários e especiais:

Como você vê (o mundo, a vida, a cidade..) desde que aconteceu ( o acidente, o assalto,
a demissão)? O que você sente quando passa pelo local?
15. Não se preocupe em construir frases perfeitas

Uma ou outra pergunta gaguejada ou insegura ajudam a deixar o entrevistado a vontade


à medida que ele percebe que você não é perfeito e que ele também não precisa ser.

16. Adie a polêmica

Comece com as perguntas menos polêmicas. Deixe as mais delicadas, se houver


alguma, para quando você e o entrevistado já tiverem estabelecido um contato maior.

17. Não tenha medo de perguntar o óbvio

Perguntas óbvias podem produzir respostas interessantes. Pergunte o óbvio e o sutil.

18. Faça silêncio enquanto o entrevistado estiver falando

A menos que sua intenção seja interagir com o entrevistado, não dê risadas altas ou diga
“uh-hun” durante a entrevista porque você não conseguirá editar esses trechos. A sua
presença no tape elimina a sensação de que o entrevistado está se comunicando
diretamente com o ouvinte. Deixe o entrevistado saber que você está acompanhando o
que ele diz balançando a cabeça ou através do contato do olhar.

19. Deixe a fita rolando...

Não ligue e desligue o gravador durante pausas na entrevista. É melhor desperdiçar um


pouco de fita do que perder uma boa história contada na última hora.

20. Faça entrevistas individuais.


As entrevistas geralmente rendem mais se forem realizadas individualmente. Algumas
vezes dois ou mais entrevistados podem ser ouvidos simultaneamente com sucesso ,
mas geralmente eles se saem melhor quando estão sozinhos.

21. Não alugue o entrevistado!

Termine a entrevista num tempo razoável. Uma hora e meia é o máximo. Depois disso,
tanto você quanto o entrevistado estarão cansados.

22. Olhe, além de ouvir.

Logo após a entrevista, faça anotações específicas sobre o que você viu e sentiu. Anote
a forma como as pessoas estavam vestidas e outros detalhes que poderão ajudar no
script.

INCENTIVANDO O ENTREVISTADO FALAR MAIS E MELHOR...

23. Deixe as pessoas falarem e permita o silêncio.

Não se apresse em fazer a pergunta. Freqüentemente as pessoas dizem algo verdadeiro


após um silêncio.

24. Refaça a pergunta se for necessário.

Não se sinta constrangido em perguntar a mesma coisa de diversas formas até


conseguir uma resposta que o satisfaça. Você pode editar o começo de uma resposta
com o final de outra.

Para fazer com que a pessoa repita um resposta ou fale com mais entusiasmo pergunte:

“O quê?”, “É mesmo?” “Você está brincando?” “Sério?”


Se o barulho interferir, faça a pergunta novamente.

25. Peça descrições de pessoas.

É difícil para os entrevistados descreverem pessoas. Uma forma fácil de começar é pedir
a eles que descrevam a aparência da pessoa em questão. A partir daí é mais provável
que o entrevistado passe a descrever a personalidade.

26. Abordagem negativa pode render mais que a positiva.

Pergunte sobre aspectos negativos de determinada situação.

Por exemplo, ao perguntar sobre uma pessoa, não comece com uma descrição muito
positiva:

“Sei que o prefeito era uma pessoa muito generosa e inteligente. Você achava
isso dele?”

Poucos entrevistados vão contestar uma declaração dessas mesmo que eles não
gostem do prefeito. Você terá uma resposta mais forte se salientar algum aspecto
negativo:

“Apesar de o prefeito ter uma boa reputação pelo trabalho que desenvolveu, ouvi
dizer que ele era um homem de temperamento difícil”...

Se o entrevistado admira muito o prefeito, ele sairá em defesa dele dizendo por que a
afirmação que você fez está equivocada. Se ele achava o prefeito uma figura difícil, sua
pergunta dará a ele a chance de comentar algumas das características desagradáveis do
prefeito.
RECONSTITUINDO A HISTÓRIA.......

27. Tente estabelecer em cada ponto importante da história onde o entrevistado estava e
qual era o seu papel no evento para identificar o quanto a informação é testemunhal ou
se baseia no depoimento de outros.

“Onde o senhor estava na hora do desabamento do prédio? O senhor falou com


algum sobrevivente mais tarde?”

Faça isso com cautela para não parecer que você está duvidando do depoimento.

28. Não questione relatos que você acha que podem ser incorretos. Em vez disso, tente
obter o maior número possível de informações para descobrir, depois, o que realmente
ocorreu. O entrevistado pode estar contando corretamente o que ELE viu.

Pesquisadores que falaram com sobreviventes do Titanic dizem que cada senhora
entrevistada dizia estar no último bote que deixou o navio. Mais tarde, estudando o local
onde estavam os botes, os pesquisadores perceberam que os passageiros não
conseguiam ver os outros botes, o que fez com que acreditassem que estavam no último
deles.

29. Diga, com tato, ao entrevistado que há uma versão diferente da que ele está
contando: “ Eu ouvi.... ou eu li que...”. Isso não é para questionar o relato do entrevistado,
mas para dar a oportunidade a ele de trazer outras evidências que rebatam a versão
oposta ou para esclarecer por que aquela versão surgiu.

30. Peça para as pessoas “fazerem”coisas

Além da entrevista sentada, peça que o entrevistado lhe mostre, por exemplo, o álbum
de fotos da família ou o funcionamento de uma determinada máquina. Gravar uma
entrevista em movimento funciona muito bem e ajuda o entrevistado a relaxar. Peça que
o entrevistado mostre o local onde vocês estão, descrevendo o ambiente, o que vocês
estão vendo, o que está acontecendo. Isso faz com que o ouvinte se sinta mais próximo
do local e reforça a sensação de ação e imediatismo.

VOX POP (Povo Fala)

Para ouvir a opinião do público vá onde as pessoas estão esperando: ponto de ônibus,
frente de escolas, filas longas etc.... É mais fácil aborda-las quando estão paradas.

ÚLTIMA, MAS GRANDE DICA PARA UMA BOA ENTREVISTA

Para fazer com que as pessoas falem de maneira aberta e honesta você precisa de uma
coisa muito simples, mas fundamental: sentir uma curiosidade verdadeira pelo mundo
que o cerca.

SE O NARRADOR FOR O PRÓPRIO ENTREVISTADO....

1. Defina a história antes de começar a gravar:

Repasse a história com o entrevistado. Ambos têm de concordar sobre como a história
será contada. É comum o entrevistado e o entrevistador terem prioridades e expectativas
diferentes. Peça que o entrevistado conte o fato de forma abreviada. Isso também fará
com que ele se sinta mais confortável porque já sabe o que tem de contar.
Existe uma crença de que a primeira versão é mais espontânea. Mas a experiência
mostra que isso não é verdade. Uma boa história é uma boa história e pode ser contada
muitas vezes.

2. Explique o método da entrevista:

Explique que a entrevista não segue o tradicional estilo “pergunta-resposta”. A entrevista


é um projeto conjunto. Você e o entrevistado compartilham o projeto de contar uma
história ou resgatar memórias.

O objetivo comum é reconstruir uma realidade para a “tela do rádio”.

Como não há links, o entrevistado precisa apresentar-se, dizer quem é, o que faz, qual a
sua relação com a história. As respostas devem incluir todas as informações
necessárias e deixar claro quem está falando.

Ex: “O que o senhor achou da decisão? Como advogado da vítima, eu achei que.....”

A apresentação do entrevistado não precisa necessariamente estar nas primeiras frases


dele, mas deve aparecer logo em seguida. Não deixe o ouvinte muito tempo sem saber
quem está falando. A experiência mostra que os ouvintes reagem mal quando não
entendem o que está no ar.

Às vezes é preciso pedir que o entrevistado acrescente algumas informações e


estatísticas a sua fala, já que não haverá narrador.
Como Recontar a História

A entrevista pode começar com uma pergunta como:

“Imagine que você voltou no tempo e está naquele lugar onde tudo começou. O que você
sente, vê, pensa...?

Os entrevistados não estão acostumados com esse método de entrevista. Eles


geralmente começariam contando o que aconteceu:

“O plano era jogar uma granada no primeiro carro da polícia que chegasse na ponte. Eu
decidi me esconder atrás de uma pilastra e jogar a granada de lá”.

Insista para que ele traga algumas imagens e movimentos para a primeira cena.
Colocando o entrevistado novamente naquela situação você também consegue
transportar o ouvinte para aquela realidade.

O começo poderia ser:

“Eu estava parado atrás de uma pilastra da ponte. Comecei a ouvir o barulho dos carros
do Exército se aproximando. Havia fumaça no ar. Eu ainda não estava certo de qual era o
melhor momento para jogar a granada contra o comboio. A velha ponte começou a
tremer...”

Você também pode decidir contar a história no presente para dar maior impacto a
narrativa:

“Estou parado atrás de uma pilastra da ponte. Posso ouvir o barulho dos carros do
Exército se aproximando. Há fumaça no ar. Ainda não estou certo de qual é o melhor
momento para jogar a granada contra o comboio. A velha ponte começa a tremer....”

Se você escolher contar a história no presente, terá de ficar de ouvidos muito atentos
principalmente nos primeiros 15 ou 20 minutos da entrevista até que o entrevistado se
acostume com a forma.
O presente e passado podem ser usados conjuntamente para contar a história. Você
pode escolher o presente para destacar certas cenas e contar o resto no passado.

O resto da entrevista é uma busca conjunta por lembranças, cenários, desdobramentos,


imagens, formas, cores, diferentes pontos de vista, pensamentos, falas, cheiros, sons,
sentimentos....

Seu papel como entrevistador é cuidar para que toda a história seja contada. Você
conseguir registrar todas as cenas de forma clara e com todos os detalhes importantes?
Todas as cenas estão na ordem correta, permitindo que as pessoas entendam o que
aconteceu?

Uma entrevista como essa geralmente é feita em duas ou mais etapas. Às vezes, o
entrevistado não lembra de tudo no primeiro dia, mas a entrevista acaba reavivando a
memória.

Se a entrevista for feita com cuidado, você terá todos os elementos necessários para
recriar o fato, cena por cena. Você poderá, inclusive, editar o material, dando maior
impacto as falas sem alterar o contexto:

“Há fumaça no ar. Minhas pernas estão tremendo. Posso ouvir o barulho dos carros do
Exército se aproximando...”

Diferentes cenas podem ser combinadas em ordem diferentes para tornar a narrativa
mais interessante. Ou duas pessoas podem contar a mesma história, de forma
intercalada, a partir de pontos de vista diferentes:

“Eu estava dirigindo o primeiro caminhão do Exército. Quando chegamos na ponte....”


Dicas de gravação
• Fique íntimo de seu equipamento. Aprenda a usá-lo, descubra todos os
recursos. Se você estiver a vontade com o equipamento e seguro em relação ao
manuseio, as gravações ocorrerão de forma muito mais tranqüila.

• Deixe o microfone a dez centímetros (uma mão) da boca. Se o barulho for


muito intenso você terá de aproximá-lo mais. Isso também vale para sussurros. Para
gargalhadas altas ou vozes muito altas, afaste o microfone.

• Sempre use fones de ouvido durante a gravação. Com o fone de ouvido, você
terá a noção exata da qualidade do que está sendo gravado. Se alguma coisa não soar
bem, pare e detecte o problema. Os problemas mais comuns são “pops”, vento e o
barulho feito pelo cabo do microfone. Mas também podem ocorrer interferências de
equipamentos e rádios. Prenda o cabo na mão e não o deixe balançando contra o corpo.
Cheque se os cabos estão bem conectados. Use o corpo para proteger o microfone do
vento, ficando de costas contra ele.

• Preste atenção nos "P" pops. Se você ouvir "P" pops, mova o microfone um
pouco para o lado da boca do entrevistado, afastando-o da área central de projeção da
voz. Os pops ocorrem na área em frente ao centro da boca, mas são evitados com uma
leve inclinação do microfone para a lateral. (Faça um teste: diga a palavra "pop" com a
mão na frente da boca, depois mova a mão levemente para o lado enquanto diz a
palavra pop. Veja como o “p” desaparece rapidamente!)

• Cuidado com o botão da pausa. Sempre cheque para ver se a fita está
rodando. Se você estiver usando o fone de ouvido, pode ser enganado pelo botão da
pausa e achar que a entrevista está sendo gravada.

• Sempre tenha pelo menos um conjunto extra de pilhas e mais de uma fita ou
mini-disc à mão. Calcule uma fita de 90 minutos para cada entrevistado, já que uma
entrevista com mais de uma hora e meia é insuportável tanto para ele quanto para você.
• Coloque etiquetas nas fitas e as numere antes de começar a gravação. As
etiquetas evitam que, na pressa, você use fitas gravadas pensando serem novas. Depois
da gravação, marque todo o conteúdo conforme a sequência de entrevistas e sons.

• Use o contador, se houver. Zere o contador no início de cada fita e anote o


número cada vez que coisas novas acontecerem. Isso facilita a localização do material
na hora da edição.

Repetindo:

• Sempre grave um ou dois minutos de som ambiente após a entrevista. Isso é


particularmente importante se você está gravando num local barulhento. Quando você
começar a editar o seu documentário, precisará desse som para suavizar as passagens
de entrada e saída da cena e entre a voz do narrador e a do entrevistado. Se você está
fazendo a entrevista num ambiente que é normalmente barulhento (numa sala onde o
radio está sempre ligado), faça a entrevista com o rádio desligado, depois grave dois
minutos de som ambiente e mais cinco minutos do som do rádio. Você poderá usar o
som do ambiente com o rádio ligado embaixo da entrevista na mixagem final para dar
uma “sensação de lugar”. Pense no documentário como se fosse um filme – pense em
termos de cenas, de sons e de transições.
Montagem do Script

1.Transcreva as entrevistas

A única forma de lidar adequadamente com o material e não perder o foco é passar as
entrevistas para o papel. Não há necessidade de transcrever todas as palavras, mas faça
um roteiro com as idéias básicas. É mais fácil trabalhar com papel que com uma
montanha de tapes.

2. Destaque os trechos mais importantes

Marque as partes mais contundentes, dramáticas, engraçadas ou sensíveis da


entrevista. Se você está trabalhando com vários sub-temas, use uma cor para cada um
deles:

Numa série sobre drogas:

Amarelo – causas da dependência

Azul – tratamento

Vermelho – papel da família na recuperação

3. Faça a edição final junto com o script

A escolha final dos trechos da entrevista e a edição do material deve ser feita no
momento em que você escreve o script. É aí que você decide o que realmente entra, o
que precisa ser acrescentado ou alterado para dar movimento ao documentário.
4. Escreva para o ouvido.

Repare como você conta uma história a um amigo. Repare nas coisas que você diz e na
ordem em que diz. É assim que você deve escrever. Se houver alguma frase no script
que você não diria numa conversa informal, reescreva.

Evite frases longas, com muita pontuação. Procure usar a ordem direta e expressar um
mínimo de idéias em cada sentença.

“Porque os ouvintes de rádio, ao contrário do leitor de jornal, têm de guardar na memória


o que foi dito para compreender o sentido da frase, sentenças invertidas como esta que
você está lendo agora devem ser evitadas!”

Usar linguagem simples não significa escrever sem estilo, cor ou energia. O texto deve
ter vivacidade.

6. Evite o monólogo

- Parágrafos curtos em torno de dez ou 12 linhas (30”a 35”);

- Intercale narração com sons e vozes. Use o som ambiente para fazer passagens
suaves do estúdio para a gravação.

- O depoimento do entrevistado também não deve ser muito longo, a menos que seja
animado o bastante para prender atenção do ouvinte (30” a 45” );

- Só deixe correr a entrevista se for intercalada de perguntas;

- Evite repetição: a chamada para o entrevistado não deve dizer o mesmo que ele.
Apenas introduza o assunto ou a pessoa;
- Selecione os trechos mais contundentes da entrevista e não esqueça que momentos de
humor descontraem e despertam o ouvinte;

- A música e as ilustrações sonoras devem estar relacionadas com o texto e o assunto.


Tente encaixar a música no texto, fazendo com que comece sob a voz e suba nas frase
melodiosas;

- Em reportagens noticiosas, a música deve ser usada com parcimônia para não virar
poluição sonora e truncar a mensagem;

VALE A PENA ME OUVIR!

ABERTURA

Tente capturar a atenção do ouvinte já no começo usando os sons e a criatividade para


fazê-lo entrar no clima. Uma reportagem de rádio pode começar com:

1. Música – Tocar em torno de 10” a 15”. Pode desaparecer sob a voz ou ser mantida em
volume baixo para subir e descer, marcando intervalos;

2. Declarações de entrevistados. Frase ou frases curtas e relevantes sobre o tema em


discussão;

3. Sons ambientais – o repórter pode estar dentro de um trem ou avião, numa escola,
numa igreja...

4. Mix de sons (música, vozes e sons ambientais);


SEQUÊNCIA

Não há regras quanto à seqüência do documentário. O importante é que o resultado faça


sentido.

A falha mais comum dos documentários não está no conteúdo, mas na estrutura: falta de
identificação dos entrevistados, uso de uma voz ouvida anteriormente sem nova
identificação, uso inadequado de música, falta de contexto....

Quando estamos muito envolvidos com o tema é fácil ignorarmos informações


fundamentais para a compreensão do ouvinte.

ENCERRAMENTO

As possibilidades são ilimitadas. Algumas sugestões:

- Narrador faz um apanhado final e esclarecedor sobre o tema.

- Entrevistado dá a última palavra, repetindo algum ponto-chave do documentário.

- Narrador especula sobre o futuro, levantando novas questões.

- Repetição de vozes e sons usados na abertura.

- Não apresentar nenhuma conclusão, deixando que o ouvinte forme o seu próprio
parecer sobre o tema.

PONTOS PERIGOSOS!

Atenção para certos momentos-chave no documentário.

Produtores americanos dizem, com base na própria experiência, que, num programa de
meia hora, há vários momentos em que a atenção da audiência tende a diminuir a menos
que algo novo e interessante aconteça no programa.
Para manter aceso o interesse dos ouvintes, eles recomendam o uso de música, novas
vozes ou novos sons e idéias nesses “pontos perigosos”.

Partindo do início do programa (00:00), os pontos perigosos são: 3, 5, 8, 16, 21 e 27


minutos.

SÉRIES

Um documentário de rádio é geralmente programado como uma série. O tema é


desmembrado em vários programas, cada qual abordando um aspecto.

O importante é que cada programa tenha o seu próprio conteúdo e faça sentido
separadamente.

Para que os programas prendam a atenção do ouvinte, segmente o documentário


sempre por sub-temas e não por categoria. Mantenha sempre a pluralidade de vozes e
sons.
Script na Prática
LESTE EUROPEU DO COMUNISMO AO CAPITALISMO, UM RETRATO DA
TRANSIÇÃ0

PRODUÇÃO E REPORTAGEM: MÁRCIA DETONI

PROGRAMA 7 : SÉRVIA

DURAÇÃO: 14 minutos

FEVEREIRO 1994

CD SÉRVIA FAIXA 3 – TOCAR POR 9”/ FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 1 - DUR: 25”

Entra: São dez horas da manhã...

Sai: ...vou encontrar por lá (som do trem)

CD SÉRVIA RETOMAR MÚSICA – FADE IN AOS 24” DO MD MÁRCIA

TOCAR POR 6”/ FADE OUT

NARRADOR (MÁRCIA): As sanções internacionais e o apoio do governo iugoslavo à


luta dos sérvios da Bósnia arruinaram completamente a economia do país, e a Sérvia
conseguiu bater todos os recordes históricos com uma inflação de 300 milhões por cento
só em janeiro deste ano. É isso mesmo que você ouviu: 300 milhões por cento em
apenas um mês. Nem os brasileiros, acostumados com inflação alta, conseguem
imaginar o que seja isso. Mas, uma semana antes de eu chegar a Belgrado, no início de
fevereiro, o governo introduziu um pacote econômico atrelando o dinar ao marco alemão.
A medida conseguiu estabilizar os preços, e o que eu encontrei ao desembarcar na
capital do que restou da Iugoslávia foi uma cidade aparentemente calma.
MD SONS FAIXA 1 – FADE IN - TOCAR POR 3” – FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 2 – DUR: 2:00

Entra: Esta é a ...

Sai: ...esse tipo de coisa

MD SONS FAIXA 2 – FADE IN ( 1:59” DO MD)

TOCA POR 8” FADE OUT

MD SÉRVIOS FAIXA 1 (34” de música) – TOCAR POR 9”/ VAI A BG

MD MÁRCIA FAIXA 3 – DUR: 16”

Entra: A Sanja está dizendo...

Sai: não se costumava vender

MD SONS SOBE MÚSICA/ TOCAR ATÉ O FIM DA FAIXA (dur: 9”)

NARRADOR (MÁRCIA) As ruas de Belgrado estão agora também cheias de músicas


nacionalistas e antigas canções sérvias. Esse nacionalismo que se vê hoje não só em
Belgrado mas em toda a antiga Iugoslávia sempre existiu, mas vinha sendo mantido sob
controle desde a Segunda Guerra Mundial pelo governo de Tito. Com a morte do
general, em 1980, o sentimento nacionalista voltou a crescer, e o colapso do comunismo
no leste europeu criou o momento para a Croácia e a Eslovênia declararem a
independência, em 1991. O Exército federal, liderado pela Sérvia reagiu atacando as
duas Repúblicas, mas foi derrotado e recuou. Em seguida, os sérvios da Croácia e da
Bósnia se rebelaram contra a fragmentação da Iugoslávia e começaram a lutar para
continuarem ligados à Sérvia. O apoio do presidente sérvio Slobodan Milosevic à luta dos
sérvios bósnios levou a ONU a impor um embargo comercial contra o país, que
deteriorou completamente o padrão de vida da população.

MD SONS FAIXA 3 – TOCA POR 12”– FADE OUT

NARRADOR (MÁRCIA): Nos restaurantes de Belgrado, uma minoria que ainda pode
pagar 50 dólares por uma refeição tenta esquecer a crise relembrando canções de uma
época em que a Iugoslávia era bem mais próspera. De todos os países comunistas do
leste europeu, a Iugoslávia era o que possuía o regime mais aberto. As pessoas tinham
liberdade para viajar e abrir pequenos negócios e um padrão de vida invejável, como
observa o economista Yuri Baiets, do Instituto de estudos econômicos de Belgrado.

MD SÉRVIOS FAIXA 2 – TOCA POR 7”- VAI A BG

MD MÁRCIA FAIXA 4 – DUR: 14”

Entra: Três anos atrás...

Sai: ...praticamente desapareceu.

MD SÉRVIOS SOBE SOM POR 10”/ FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 5 – DUR: 18”

Entra: A população está vivendo ...

Sai: ...alimentos para a cidade.


NARRADOR (MÁRCIA): Sérvia e Montenegro são auto-suficientes em produção
agrícola, e as sanções internacionais atingiram principalmente a população urbana.

MD SONS FAIXA 4 – FADE IN

TOCAR POR 5”/ VAI A BG

MD MÁRCIA FAIXA 6 – DUR: 21”

Entra: Como você pode ouvir...

Sai: ...com esse tipo de negócio

MD SONS SOBE O SOM – TOCA POR 3”/ VAI A BG

MD MÁRCIA FAIXA 7 - DUR: 29”

Entra: Mas se o trânsito...

Sai: ... que estão por aqui.

MD SONS SOBE O SOM – TOCAR POR 3”/ CROSSFADE COM MD FEIRA

MD FEIRA FAIXA 1 – TOCA POR 3”/ VAI A BG

FADE OUT NO NARRADOR

MD SÉRVIOS FAIXA 3 – TOCA POR 15”/ FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 8 – DUR:

Entra: É não fui muito feliz...


Sai: comprando frutas....

MD SÉRVIOS FAIXA 4 – TOCA POR 7” FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 9 – DUR: 20”

Entra: ela diz que...

Sai:.. acontecendo na Bósnia.

MD SÉRVIOS FAIXA 5 – TOCA POR 7” / FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 10 - DUR: 22”

Entra: Esse jovem com uma cicatriz...

Sai:.. muçulmanos e croatas.

MD SÉRVIOS FAIXA 6 – TOCA POR 6”/ VAI A BG

MD MÁRCIA FAIXA 11 – DUR: 10”

Entra: Já esse senhor...

Sai: ..acabaram votando nele.

MD SÉRVIOS SOBE SOM/ TOCAR ATÉ O FINAL DA FAIXA (3”)

NARRADOR (MÁRCIA) Uma das coisas que mais me impressionaram em Belgrado foi
a resignação dos sérvios. Apesar de todas as dificuldades econômicas não há qualquer
sinal de rebeldia contra o governo. Eu conversei sobre essa questão com o deputado da
oposição Vladeta Jankovic, vice-presidente do Partido Democrata da Sérvia.

MD SÉRVIOS FAIXA 7 – TOCA POR 7”/ FADE OUT

MD MÁRCIA FAIXA 12 – DUR: 20”

Entra: É preciso ter em mente...

Sai: ...em outras repúblicas.


Histórias no Ar

O rádio é um excelente veículo para contarmos histórias. Mas nem todas as histórias
conseguem engajar o ouvinte e capturar a sua atenção.

As histórias que geram mais curiosidade são as que podem ser contadas numa
seqüência de ações.

Veja esse exemplo tirado do programa “This American Life”, produzido para a National
Public Radio, nos EUA:

Brett estava na plataforma do trem. Horário de pico. Estação lotada. Ele avista um
rapaz no final da plataforma. O rapaz caminha em sua direção parando, de pessoa
em pessoa, para dizer alguma coisa. É um rapaz bem vestido que parece estar
pedindo esmola. Ele chega cada vez mais perto. Vai de pessoa em pessoa,
dizendo rapidamente alguma coisa. Conforme ele se aproxima, Brett começa a
ouvir o que ele está dizendo...

A essa altura está todo mundo ligado. Por quê? A história não podia ser mais banal, mas
contém um elemento fundamental para o sucesso da narrativa:

Seqüência de ações: a história é contada numa ordem lógica

Sempre que houver uma sequência de eventos – aconteceu isso, depois aquilo... –
vamos querer saber o que aconteceu depois.

Essa história banal consegui despertar uma curiosidade: O que o rapaz estava dizendo?
E o ouvinte provavelmente vai ficar ligado até descobrir .

... e o que ele está dizendo é: “Você fica. Você cai fora. Você pode ficar. Você tem
de ir”... Quando ele chega na frente de Brett, se aproxima e diz: “Você pode ficar”.
E Brett sente euforia! Não há outra palavra para descrever o que Brett sente.
Euforia!!! Ele sabe, no seu íntimo, que não tem motivo para se sentir assim. Mas,
no fundo de seu coração, o fato de o rapaz ter dito que ele podia ficar o deixou
realmente feliz! É que existe alguma coisa muito forte em relação ao julgamento
que os estranhos fazem da gente. Parece que, por serem estranhos, eles têm uma
outra visão, uma visão especial, de nós...

Depois da seqüência de fatos, vem uma reflexão. E essa reflexão sobre o significado da
seqüência de atos é outro elemento importante da narrativa.

Trata-se de uma estrutura milenar de contar histórias. É a mesma estrutura de uma


parábola ou de um sermão, uma estrutura que consegue manter a atenção das pessoas
do começo ao fim.

“O Rádio é um meio peculiarmente didático. Não basta contar a história. Você tem de
explicar o que ela significa. Se a história de Brett não tivesse uma reflexão sobre o
julgamento dos outros não teria o mesmo efeito”. (IRA GLASS – produtor de “This
American Life”)

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