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Diagonalização

Matrizes Semelhantes e Matrizes Diagonalizáveis


Nosso objetivo neste capı́tulo é estudar aquelas transformações lineares de Rn para as quais existe pelo menos
uma base em que elas são representadas por uma matriz diagonal. Uma matriz diagonal é a matriz mais
simples possı́vel. Note, no entanto, que não é possı́vel encontrar para toda transformação linear uma base
em que a transformação é representada por uma matriz diagonal: rotações, por exemplo, não podem ser
representadas em geral por matrizes diagonais, pois uma rotação transforma um vetor em outro vetor com
uma direção completamente diferente.
É possı́vel provar que duas matrizes A e B representam a mesma transformação linear, com respeito a
bases diferentes, se e somente se elas estão relacionadas através da seguinte equação
B = P −1 AP,
para alguma matriz invertı́vel P ; a matriz P é precisamente a matriz de mudança de coordenadas, quando
passamos de uma base para a outra. Assim, dada uma transformação linear, representada em uma certa base
por uma matriz A, a questão de determinar se existe uma base na qual a tranformação linear é representada
por uma matriz diagonal D se reduz a encontrar uma matriz invertı́vel P tal que
D = P −1 AP.
Isso motiva as seguintes definições.
Definição. Sejam A, B matrizes n × n. Dizemos que B é semelhante a A, se existe uma matriz invertı́vel
P tal que
B = P −1 AP.
Definição. Dizemos que uma matriz A é diagonalizável, se ela é semelhante a uma matriz diagonal.

Autovalores e Autovetores
Dada uma transformação linear T , suponha que exista alguma base em que T é representada por uma matriz
diagonal, digamos por  
λ1 0 · · · 0
 0 λ2 · · · 0 
 
B= . .. .. ..  .
 .. . . . 
0 0 0 λn
Para os vetores desta base      
1 0 0
 0   1   0 
     
e1 =  ..  , e2 =  ..  , ..., en =  .. ,
 .   .   . 
0 0 1

1
temos
Be1 = λ1 e1 , Be2 = λ2 e2 , ..., Ben = λn en .
Isso mostra que, dada uma transformação linear T , seremos capazes de diagonalizar T (em outras palavras,
encontrar uma base em que ela é representada por uma matriz diagonal) se e somente se formos capazes de
encontrar n vetores linearmente independentes v1 , v2 , ..., vn tais que

T v1 = λ1 v1 , T v2 = λ2 v2 , ..., T vn = λn vn .

Tudo isso motiva as seguintes definições.

Definição. Seja A uma matriz n × n. Dizemos que um número real λ é um autovalor de A se existir um
vetor não nulo v de Rn tal que
Av = λv.
O vetor v é chamado um autovetor de A, correspondente ao autovalor λ.
Teorema. Uma matriz An×n é diagonalizável se e somente se ela possui n autovetores linearmente inde-
pendentes.

Prova: Suponha que A é diagonalizável, isto é, que exista uma matriz invertı́vel P tal que D = P −1 AP .
Em particular, segue que
AP = DP
Escreva P segundo suas colunas:
P = [V1 V2 . . . Vn ].
Então
AP = [AV1 AV2 . . . AVn ]
e
DP = [λ1 V1 λ2 V2 . . . λn Vn ].
Comparando, concluı́mos que

AV1 = λ1 V1 ,
AV2 = λ2 V2 ,
..
.
AVn = λn Vn ,

isto é, as colunas de P são autovetores de A. Como P é invertı́vel, suas colunas são L.I., logo encontramos
n autovetores L.I. para A.
Reciprocamente, suponha agora que existam n vetores L.I. V1 , V2 , . . . , Vn tais que AV1 = λ1 V1 , AV2 =
λ2 V2 , . . . , AVn = λn Vn . Defina uma matriz n × n P por

P = [V1 V2 . . . Vn ].

Como as colunas de P são L.I., segue que P é invertı́vel. Temos


 
λ1 0 ··· 0
 0 λ2 ··· 0 
 
AP = A[V1 V2 . . . Vn ] = [AV1 AV2 . . . AVn ] = [λ1 V1 λ2 V2 . . . λn Vn ] = [V1 V2 . . . Vn ]  .. .. .. ..  = PD
 . . . . 
0 0 0 λn

2
onde denotamos  
λ1 0 ··· 0
 0 λ2 ··· 0 
 
D= .. .. .. .. .
 . . . . 
0 0 0 λn
Multiplicando ambos os lados da equação por P −1 , obtemos P −1 AP = D. ¥

Corolário. Se D = P −1 AP , então as colunas da matriz P são n autovetores linearmente independentes de


A.

Portanto, a matriz P pode ser obtida encontrando-se n autovetores L.I. de A. O que não é surpreendente:
a matriz P é exatamente a matriz da mudança de coordenadas de uma base B formada por autovetores da
matriz A para a base canônica, onde se supõe que a matriz A está escrita; para obter D é necessário voltar
para a base B através da mudança de coordenadas inversa P −1 .

Exemplo 1. Considere a transformação linear T : R3 → R3 definida por


µ ¶
3 13 27 1 1 21 21 3
T ((x, y, z)) = x − y + z, x + 3y + z, x + y − z
8 4 8 2 2 8 4 8

Esta transformação linear é representada na base {i, j, k} pela matriz


 3 
8 − 13
4
27
8
A =  12 3 1 
2 .
21 21
8 4 − 38

Mas, se tomarmos os vetores V1 = (1, 2, 3), V2 = (1, 0, −1) e V3 = (−2, 1, 0), notamos o seguinte:
     
1 4 1
T V1 = A  2  =  8  = 4  2  = 4V1 ,
3 12 3
     
1 −3 1
T V2 = A  0  =  0  = −3  0  − 3V2 ,
−1 3 −1
     
−2 −4 −2
T V3 = A  1  =  2  = 2  1  = 2V3 .
0 0 0

Note que os vetores V1 , V2 , V3 são L. I., logo eles também formam uma base para R3 . Portanto, com
relação à base {V1 , V2 , V3 }, a transformação linear T é representada pela matriz
 
4 0 0
B =  0 −3 0  .
0 0 2

Observe que a matriz A tem autovalores 4, −3 e 2. Autovetores correspondentes a estes autovalores


são V1 = (1, 2, 3), V2 = (1, 0, −1) e V3 = (−2, 1, 0). Segue que
 
1 1 −2
P = 2 0 1 .
3 −1 0

3
Como  −1  1 
1 1
1 1 −2 8 4 8
P −1 = 2 0 1  =  83 3
4 − 58 ,
3 −1 0 − 14 1
2 − 14
concluı́mos que
   1 1 1
 3
 
4 0 0 8 4 8 8 − 13
4
27
8 1 1 −2
 0 −3 0  =  38 3
− 58  1
3 1  2 0 1 .
4 2 2
0 0 2 − 14 1
2 − 14 21
8
21
4 − 83 3 −1 0

Portanto, para determinar se uma matriz é diagonalizável, precisamos determinar antes de mais nada
seus autovalores. Isso pode ser feito da maneira a seguir.
Denotando por I a matriz identidade, então a equação Av = λv é equivalente a Av = λIv, ou

(A − λI)v = 0.

Portanto, λ será um autovalor de A se e somente se o sistema homogêneo (A − λI)X = 0 possuir soluções


não-triviais. Mas isso acontecerá se e somente se det(A − λI) = 0. A expressão det(A − λI) é um polinômio
de grau n em λ, logo concluı́mos que os autovalores de A são exatamente as raı́zes deste polinômio. Este
polinômio é chamado o polinômio caracterı́stico de A.

Proposição 1. Seja A uma matriz n × n. Os autovalores de A são as raı́zes do polinômio caracterı́stico de


A
p(λ) = det(A − λI).

Em particular, uma matriz n × n possui no máximo n autovalores distintos.

Exemplo 2. Determine os autovalores da matriz


a) µ ¶
2 −2
A= .
2 2

b) µ ¶
cos θ − sin θ
B= .
sin θ cos θ

Solução: Temos
µ ¶
2−λ −2
det(A − λI) = det = (2 − λ)2 + 4
2 2−λ
= λ2 − 4λ + 8.

Este polinômio não tem raı́zes reais, pois ∆ = b2 − 4ac = 16 − 32 = −16, logo a matriz A não tem
autovalores. Observe que à √ √ !
√ 2
− 2
A=2 2 √2 √2 ,
2 2
2 2

é, A representa uma rotação de R2 por um ângulo de 45◦ , seguida de uma dilatação por um fator
isto √
de 2 2, portanto este resultado está de acordo com o que seria esperado. Similarmente, a matriz em

4
(b) representa uma rotação de R2 por um ângulo θ e nós temos
µ ¶
cos θ − λ − sin θ
det(B − λI) = det = (cos θ − λ)2 + sin2 θ
sin θ cos θ − λ
= cos2 θ − 2λ cos θ + λ2 + sin2 θ
= λ2 − 2λ cos θ + 1.

Como o discriminante deste polinômio é ∆ = b2 − 4ac = 4 cos2 θ − 4 = 4(cos2 θ − 1), ele só possui raı́zes
reais se cos θ = ±1, ou seja, para θ = 0 ou θ = 180◦ . O primeiro corresponde à matriz identidade
µ ¶
1 0
B= ,
0 1

cujos autovalores são as raı́zes de λ2 − 2λ + 1, ou seja, todos iguais a 1, enquanto que o segundo
corresponde à matriz µ ¶
−1 0
B= ,
0 −1
cujos autovalores são as raı́zes de λ2 + 2λ + 1, ou seja, todos iguais a −1. São os únicos exemplos de
rotações em R2 que podem ser representadas por matrizes diagonais. ¥
Exemplo 3. Determine os autovalores da matriz
 
−1 −2 −2
A= 1 2 1 .
−1 −1 0

Solução: Temos
 
−1 − λ −2 −2
det(A − λI) = det  1 2−λ 1 
−1 −1 −λ
¯ ¯ ¯ ¯ ¯ ¯
¯ 2−λ 1 ¯ ¯ −2 ¯¯ ¯ −2 ¯¯
= −(1 + λ) ¯¯ ¯ − 1 ¯ −2 + (−1) ¯¯
−2
−1 −λ ¯ ¯ −1 −λ ¯ 2−λ 1 ¯
= −(1 + λ)[λ2 − 2λ + 1] − 2λ + 2 + 2 − 4 + 2λ
= −(1 + λ)[λ2 − 2λ + 1].

As raı́zes de (1 + λ)[λ2 − 2λ + 1] = 0 são λ = 1 e λ = −1, logo estes são os autovalores de A. ¥

Uma vez encontrados os autovalores da matriz, para encontrar os autovetores basta resolver o sistema
linear homogêneo
(A − λI)X = 0.
Como eles são as soluções de um sistema linear homogêneo, segue que os autovetores associados a um
determinado autovalor λ formam um subespaço vetorial, que nós chamamos o autoespaço associado ao
autovalor λ.

Proposição 2. Seja A uma matriz n × n. Se λ é um autovalor de A, então os autovetores de A associados


a λ são as soluções do sistema homogêneo

(A − λI)X = 0.

Vamos resumir tudo o que foi explicado acima no seguinte teorema.

5
Teorema. Seja A uma matriz n × n. A é diagonalizável se e somente se existe uma base para Rn formada
por autovetores de A. Neste caso, ela é semelhante a uma matriz diagonal D cuja diagonal principal é
formada pelos autovalores de A, cada um aparecendo tantas vezes quanto for a dimensão do autoespaço
associado a ele.

Exemplo 4. Determine se a matriz do Exemplo 3 é diagonalizável. Se for, determine uma matriz diagonal
semelhante a ela.
Solução: Já determinamos que A possui 1 e −1 como autovalores. A será diagonalizável se e somente
se pudermos formar uma base para R3 entre os autovetores associados a estes autovalores.
Os autovetores associados ao autovalor 1 são as soluções do sistema homogêneo (A − I)X = 0, ou seja,
 
−2 −2 −2
 1 1 1  X = 0.
−1 −1 −1

Resolvemos este sistema. É fácil ver que sua matriz aumentada tem forma escalonada reduzida
 
1 1 1 0
 0 0 0 0 .
0 0 0 0

Obtemos então que o autoespaço associado a 1 é


  
 −α − β 
 α  ∈ R3 : α, β ∈ R .
 
β

Como (−α − β, α, β) = α(−1, 1, 0) + β(−1, 0, 1), segue que uma base para este autoespaço é formada
pelos vetores
(−1, 1, 0) e (−1, 0, 1).

Os autovetores associados ao autovalor −1 são as soluções do sistema homogêneo (A + I)X = 0, ou


seja,  
0 −2 −2
 1 3 1  X = 0.
−1 −1 1

Resolvemos este sistema. É fácil ver que sua matriz aumentada tem forma escalonada reduzida
 
1 0 −2
 0 1 1 .
0 0 0

Obtemos então que o autoespaço associado a −1 é


  
 2γ 
 −γ  ∈ R3 : γ ∈ R .
 
γ

Como (2γ, −γ, γ) = γ(2, −1, 1), segue que uma base para este autoespaço é formada pelo vetor

(2, −1, 1).

6
Os vetores (−1, 1, 0), (−1, 0, 1) e (2, −1, 1) são L. I., como pode ser facilmente verificado, portanto
concluı́mos que a matriz A é diagonalizável. Ela é semelhante à matriz
 
1 0 0
 0 1 0 .
0 0 −1

O seguinte resultado facilitará o trabalho de determinar a independência linear de autovetores.


Proposição. Seja A uma matriz n × n. Sejam λ1 , λ2 autovalores distintos de A. Suponha que {v1 , ..., vk }
são autovetores L. I. associados a λ1 e {w1 , ..., wl } são autovetores L. I. associados a λ2 . Então o
conjunto {v1 , ..., vk , w1 , ..., wl } é L. I.
O mesmo resultado vale para qualquer número de autovalores distintos de A.
Prova: Suponha que existem escalares x1 , ..., xk , y1 , ..., yl tais que
x1 v1 + ... + xk vk + y1 w1 + ... + yl wl = 0. (1)
Multiplicando ambos os lados por A e usando o fato de que Avj = λ1 vj , Awj = λ2 wj segue que
x1 λ1 v1 + ... + xk λ1 vk + y1 λ2 w1 + ... + yl λ2 wl = 0. (2)
Por outro lado, multiplicando a equação (1) por λ2 obtemos
x1 λ2 v1 + ... + xk λ2 vk + y1 λ2 w1 + ... + yl λ2 wl = 0. (3)
Agora, equação (3) menos equação (2) produz
x1 (λ2 − λ1 )v1 + ... + xk (λ2 − λ1 )vk = 0.
Como os vetores v1 , ..., vk são L. I. e λ1 6= λ2 , concluı́mos que x1 = ... = xk = 0. Analogamente, multiplicando
a equação (1) por λ1 e subtraindo da equação (2) obtemos y1 = ... = yl = 0.
Corolário. Se uma matriz n × n possui n autovalores distintos, então ela é diagonalizável.
Exemplo 5. Determine se a matriz a seguir é diagonalizável ou não.
 
−1
√ 0 0 0
 2 1 0 0 
A=  1
.

√ π −2 0
7
π 6

17 e 10 π

Solução: Temos
 
−1 −
√λ 0 0 0
 2 1−λ 0 0  √
det(A − λI) = det 
 1
 = (−1 − λ)(1 − λ)(−2 − λ)( π − λ),

√ π −2 − λ 0
7
π

17 e 106 π−λ
(lembre-se que o determinante de uma matriz triangular
√ é o produto dos elementos na diagonal prin-
cipal), logo os autovalores de A são −1, 1, −2 e π. Como A é uma matriz 4 × 4 com 4 autovalores
distintos, segue que A é diagonalizável. A é semelhante à matriz
 
−1 0 0 0
 0 1 0 0 
D=  0 0 −2
.

√0
0 0 0 π
¥

7
Exemplo 6. Determine se a matriz a seguir é diagonalizável ou não. Se for, determine uma matriz diagonal
semelhante a ela.  
3 3 0 0
 3 3 0 0 
B=  0 0 3 3 .

0 0 3 3
Solução: Temos
 
3−λ 3 0 0
 3 3 − λ 0 0 
det(B − λI) = det 



0 0 3−λ 3
0 0 3 3−λ
µ ¶ µ ¶
3−λ 3 3−λ 3
= det det
3 3−λ 3 3−λ
= [(3 − λ)2 − 9]2 ,

logo det(B − λI) = 0 quando (3 − λ)2 − 9 = 0, ou seja, quando 3 − λ = ±3, donde concluı́mos que os
autovalores de B são
λ = 0 e λ = 6.

O autoespaço associado ao autovalor 0 é o conjunto-solução do sistema homogêneo BX = 0, cuja


matriz aumentada é
   
3 3 0 0 0 1 1 0 0 0
 3 3 0 0 0   0 0 0 0 0 
   ,
 0 0 3 3 0  que é equivalente por linhas a  0 0 1 1 0 
0 0 3 3 0 0 0 0 0 0

que representa o sistema ½


x1 + x2 = 0
.
x3 + x4 = 0
Portanto, o autoespaço associado a 0 é o conjunto de vetores da forma (−α, α, −β, β) = α(−1, 1, 0, 0) +
β(0, 0, −1, 1), logo uma base para este autoespaço é dada por

B0 = {(−1, 1, 0, 0), (0, 0, −1, 1)}

e portanto ele tem dimensão 2.


O autoespaço associado ao autovalor 6 é o conjunto-solução do sistema homogêneo (B − 6I)X = 0,
cuja matriz aumentada é
   
−3 3 0 0 0 1 −1 0 0 0
 3 −3 0 0 0   0 0 0 0 0 
  que é equivalente por linhas a  ,
 0 0 3 3 0   0 0 1 −1 0 
0 0 3 3 0 0 0 0 0 0

que representa o sistema ½


x1 − x2 = 0
.
x3 − x4 = 0
Portanto, o autoespaço associado a 0 é o conjunto de vetores da forma (γ, γ, δ, δ) = γ(1, 1, 0, 0) +
δ(0, 0, 1, 1), logo uma base para este autoespaço é dada por

B6 = {(1, 1, 0, 0), (0, 0, 1, 1)}

8
e portanto ele também tem dimensão 2.
Como R4 tem dimensão 4, segue da Proposição 2 (ou pode ser verificado diretamente) que

B = B 0 ∪ B6 = {(−1, 1, 0, 0), (0, 0, −1, 1), (1, 1, 0, 0), (0, 0, 1, 1)}

é uma base de autovetores de B para R4 , logo B é diagonalizável e é semelhante à matriz diagonal


 
0 0 0 0
 0 0 0 0 
D=  .
0 0 6 0 
0 0 0 6

¥
Exemplo 7 Determine se a matriz a seguir é diagonalizável ou não. Se for, determine uma matriz diagonal
semelhante a ela.  
4 2 3
C= 2 1 2 .
−1 −2 0
Solução: Temos
 
4−λ 2 3
det(C − λI) = det  2 1−λ 2  = −λ3 + 5λ2 − 7λ + 3.
−1 −2 −λ

Substituindo λ = 1, verificamos que este valor é uma raiz para esta equação do terceiro grau; como
λ3 − 5λ2 + 7λ − 3
= λ2 − 4λ + 3, cujas raı́zes são λ = 1 e λ = 3, concluı́mos que os autovalores de C
λ−1
são
λ = 1 e λ = 3.

O autoespaço associado ao autovalor 1 é o conjunto-solução do sistema homogêneo (C − I)X = 0, cuja


matriz aumentada é
   
3 2 3 0 1 0 1 0
 2 0 2 0  que é equivalente por linhas a  0 1 0 0  ,
−1 −2 −1 0 0 0 0 0

que representa o sistema ½


x1 + x3 = 0
.
x2 = 0
Portanto, o autoespaço associado a 1 é o conjunto de vetores da forma (−α, 0, α) = α(−1, 0, 1), logo
uma base para este autoespaço é dada por

B1 = {(−1, 0, 1)}

e ele tem dimensão 1.


O autoespaço associado ao autovalor 3 é o conjunto-solução do sistema homogêneo (C − 3I)X = 0,
cuja matriz aumentada é
   
1 2 3 1 0 53
 2 −2 2  que é equivalente por linhas a  0 1 23  ,
−1 −2 −3 0 0 0

9
que representa o sistema ½
x1 + 53 x3 = 0
.
x2 + 23 x3 = 0
Portanto, o autoespaço associado a 1 é o conjunto de vetores da forma (− 53 β, − 23 β, β) = β(− 53 , − 23 , 1),
logo uma base para este autoespaço é dada por
½ ¾
5 2
B3 = (− , − , 1)
3 3

e ele também tem dimensão 1.


Como R3 tem dimensão 3 e só existem no máximo 2 autovetores linearmente independentes para C,
segue não existe uma base para R3 formada por autovetores de C, logo C não é diagonalizável. ¥

Diagonalização de Matrizes Simétricas


Exemplo 8. Considere o problema de identificar a curva no plano representada pela equação do segundo
grau
3x2 + 2xy + 3y 2 = 4.
Esta equação do segundo grau também pode ser escrita como uma equação matricial:
· ¸· ¸
£ ¤ 3 1 x
x y = 4,
1 3 y

ou, se denotarmos · ¸ · ¸
x 3 1
X= eA= ,
y 1 3
por
X t AX = 4.

Como veremos adiante, é possı́vel escrever a matriz simétrica A na forma

A = P DP t

em que " #
· ¸ √
2

2
2 0 √2 √2
D= eP = .
0 4 − 22 2
2

[Note que P é a matriz de rotação por um ângulo de 45◦ .] Assim, a equação matricial acima se torna

X t AX = X t (P DP t )X = (P t X)t D(P t X) = 4.

Fazendo a mudança de coordenadas X 0 = P t X, no novo sistema de coordenadas


· 0 ¸
0 x
X = ,
y0

a equação matricial é
X 0t DX 0 = 4,
ou · ¸· ¸
£ 0 0
¤ 2 0 x0
x y = 4,
0 4 y0

10
que pode ser reescrita como a equação de segundo grau

2x02 + 4y 02 = 4.

Dividindo por 4, obtemos


x02 y 02
+ = 1,
2 1
que reconhecemos ser uma elipse com eixo maior de comprimento 2 e eixo menor de comprimento 1.
Como a matriz de mudança de coordenadas é uma rotação, que não introduz nenhuma distorção de
comprimento (não transforma cı́rculos em elipses, por exemplo), concluı́mos que a equação original
também representava uma elipse com as mesmas dimensões. ¥

Uma cônica é uma curva no plano descrita por uma equação do segundo grau (o nome se deve ao fato de
que tais curvas sempre podem ser obtidas seccionando-se um cone por um plano).O problema de identificar
tais cônicas se reduz a encontrar um sistema de coordenadas mais apropriado, em que a equação do segundo
grau tem a forma mais simples possı́vel e permite a identificação imediata da curva através da comparação
com equações modelos. Neste tipo de problema, quando se muda de um sistema de coordenadas para outro é
importante assegurar que esta mudança de coordenadas não introduz nenhuma distorção nos comprimentos.
Uma matriz de mudança de coordenadas com esta propriedade é chamada uma matriz ortogonal (um
nome mais correto seria “matriz ortonormal”, que implica preservação também de comprimentos, enquanto
que o nome matriz ortogonal sugere apenas a preservação de ângulos, mas a tradição se estabeleceu e o nome
“matriz ortonormal” não foi definido e não tem qualquer significado). Assim, se P é ortogonal, então

kP vk = kvk

para todo v. Operacionalmente, existem várias definições equivalentes para que uma matriz seja ortogonal.

Teorema. As seguintes definições são equivalentes para que uma matriz P seja ortogonal.
(i) P t = P −1 .
(ii) As colunas de P formam uma base ortonormal de vetores.
Corolário. Se P é ortogonal, então
det P = ±1.

Prova: Como P é ortogonal, a inversa de P é a sua transposta, logo (lembrando que o determinante da
transposta de uma matriz é igual ao determinante da matriz)

PPt = I ∴
det(P P t ) = det I ∴
det P det P t = 1 ∴
(det P )2 = 1

e daı́ det P = ±1.


Se uma matriz A é diagonalizável através de uma matriz ortogonal P , então ao invés de escrevermos
A = P DP −1 , podemos escrever simplesmente A = P DP t . Foi isso que vimos no exemplo acima. Isso ocorre
para qualquer matriz simétrica.

Teorema. Uma matriz simétrica é sempre diagonalizável. Além disso, ela sempre pode ser diagonalizada
através de uma matriz ortogonal.

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Para que a matriz P seja ortogonal, é necessário, como vimos acima, que suas colunas sejam vetores
ortonormais. Portanto, para que a matriz A seja diagonalizável por uma matriz ortogonal P , é suficiente
que seja possı́vel encontrar uma base de autovetores ortonormais de A. Quando isso for possı́vel, podemos
usar o processo de Gram-Schmidt para encontrar uma tal base ortonormal. Como o último teorema afirma,
isso é sempre possı́vel para uma matriz simétrica (em particular, os autovetores correspondente a autova-
lores distintos de uma matriz simétrica são sempre ortogonais). Será que é possı́vel encontrar uma matriz
diagonalizadora P ortogonal para uma matriz não-simétrica?

Exemplo 9. A matriz do Exemplo 3  


−1 −2 −2
A= 1 2 1 ,
−1 −1 0
não pode ser diagonalizada através de uma matriz ortogonal. De fato, como vimos no Exemplo 5, o
autoespaço associado ao autovalor 1 tem base B1 = {(−1, 1, 0), (−1, 0, 1)}, enquanto que uma base para
o autoespaço associado ao autovalor −1 é B−1 = {(2, −1, 1)}. Evidentemente, aplicando o processo de
Gram-Schmidt a B1 , podemos encontrar uma base ortonormal para o autoespaço associado a 1. Mas,
como os autoespaços associados a 1 e −1 não são ortogonais (pois (−1, 1, 0) × (−1, 0, 1) = (1, 1, 1) e
(1, 1, 1) · (2, −1, 1) = 2 6= 0), não é possı́vel encontrar uma base ortonormal de autovetores de A para
todo o espaço R3 . ¥
Exemplo 10. Diagonalize a matriz simétrica
 
4 2 2
B= 2 4 2 
2 2 4
através de uma matriz ortogonal.
Solução: Temos que o polinômio caracterı́stico de B é dado por det(B −λI) = −λ3 +12λ2 −36λ+32 =
(λ − 2)2 (8 − λ), logo os autovalores de B são

λ = 2 e λ = 8.

O autoespaço associado ao autovalor 2 é o conjunto-solução do sistema homogêneo (B − 2I)X = 0,


cuja matriz aumentada é
   
2 2 2 1 1 1
 2 2 2  que é equivalente por linhas a  0 0 0  ,
2 2 2 0 0 0
que representa o sistema ©
x1 + x2 + x3 = 0 ,
logo o autoespaço associado a 2 é o conjunto de vetores da forma (−α − β, α, β) = α(−1, 1, 0) +
β(−1, 0, 1), e portanto uma base para este autoespaço é formada pelos autovetores

V1 = (−1, 1, 0), V2 = (−1, 0, 1).

Esta base não é ortonormal (nem mesmo ortogonal). Aplicando Gram-Schmidt, chamamos W1 = V1 =
(−1, 1, 0) e
(−1, 0, 1) · (−1, 1, 0)
W2 = V2 − projW1 V2 = (−1, 0, 1) − 2 (−1, 1, 0)
k(−1, 1, 0)k
µ ¶
1 1
= − ,− ,1 ,
2 2

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donde
à √ √ !
W1 2 2
U1 = = − , ,0 ,
kW1 k 2 2
à √ √ √ !
W2 6 6 6
U2 = = − ,− ,
kW2 k 6 6 3

formam uma base ortonormal para o autoespaço associado a 2.


O autoespaço associado ao autovalor 8 é o conjunto-solução do sistema homogêneo (B − 8I)X = 0,
cuja matriz aumentada é
   
−4 2 2 1 0 −1
 2 −4 2  que é equivalente por linhas a  0 1 −1  ,
2 2 −4 0 0 0
que representa o sistema ½
x1 − x3 = 0
,
x2 − x3 = 0
logo o autoespaço associado a 8 é o conjunto de vetores da forma (γ, γ, γ) = γ(1, 1, 1), e portanto uma
base ortonormal para este autoespaço é formada pelo autovetor
Ã√ √ √ !
3 3 3
U3 = , , .
3 3 3

Segue que para  √ √ √ 


− √22 − √66 √3
3
 2 
P = 2 − √66 √3
3

6 3
0 3 3
e  
2 0 0
D= 0 2 0 
0 0 8
temos A = P DP t :
 √ √ √    √2 √   
− 2 − √66 3
2 0 0 − 2
0 4 2 2
 √22 √3   √2 2√ √  
 2 − √66 3
 0 2 0   − 66 −√ 66 6
= 2 4 2 
√3 √ √3
0 6 3 0 0 8 3 3 3 2 2 4
3 3 3 3 3

Note que para a matriz de mudança de coordenadas não ortogonal cujas colunas são formadas pela
base de autovetores não ortonormais V1 , V2 e V3
 
−1 −1 1
Q= 1 0 1 ,
0 1 1
nós temos também evidentemente que
   1 2
  
−1 −1 1 2 0 0 −3 3 − 13 4 2 2
 1 0 1  0 2 0   − 13 − 31 2 = 2 4 2 .
3
1 1 1
0 1 1 0 0 8 3 3 3
2 2 4
¥

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