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Morre o autor,
Morre o poema,
Descanso eu.
II
O farmacêutico é terapêutico
Meu coração é hermenêutico
III
E se me aborreço
E desapareço,
Não te preocupes,
Ainda assim e sempre te agradeço
IV
Meias Verdades
Metades da laranja
Ilusões de pomar
Histórias de cozinheiras
Coisa de saci
Se há metades de laranjas
Disso não passarão
Meias frutas, fruta e meia
Isso e só é o que elas são
É hora da colheita
Eia chega o colhedor
Eu que nunca fui metade
Como faço com o amor?
Só no bolo de laranja
No refresco e na geleia
É que as duas metades se juntam
Se eu fosse laranja-lima,
Tudo estava resolvido
Era só laranja inteira
Com a lima misturada.
VI
Ficagarrada no portal
Não abandona a esquadria
Ignora a piaçava
Sonsa, lesa, debochada
VII
Eu acredito no Criacionismo.
Deus fez o homem do barro,
Mas esqueceu de tirá-lo da lama.
VIII
O sono acaba
A vida insiste
E eu que preciso sonhar?
Escrita insone
VIIII
Penso que a literatura seja como um rio: ela nasce, corre por onde quer e por onde pode, eventualmente dá
de beber a quem deseje e deságua numa imensidão de sentidos. A teoria da literatura é a geografia, que dá
nome ao leito, à margem, chama de riacho, arroio, correnteza, corredeira; explica as cachoeiras e as
sinuosidades; é a biologia que estuda a vida que nela há, nas mais variadas formas, e procura entender
como essas vidas interagem. A teoria literária é a engenharia que elabora barragens, açudes; quer retê-la,
dominá-la, controlá-la, "melhorá-la"; é também a química, que quer limpá-la, tratá-la, meter-lhe cloro,
flúor, recriá-la e prepará-la para ser potável; é também a política e a economia, que quer dizer quem pode
bebê-la, onde e quando, a que preço, sob essas ou aquelas condições; a água não é mais de todos. E eu,
que só quero tomar banho de rio?
Hoje era preciso uma boa notícia, qualquer boa nova, algo que me fizesse acreditar que vale a pena
continuar. Era preciso uma surpresa, daquelas que experimentávamos quando crianças ao abrirmos os
presentes de Natal.
Hoje era preciso que o pardal não apenas pousasse na beirada da janela, mas que também me contasse
histórias de outras terras e de outros povos; era preciso que ele trouxesse com ele a rama de oliveira
roubada da pomba que se imortalizou no Ararat.
Hoje era preciso o milagre (ou o juízo final). Era preciso que uma metafísica qualquer fosse produzida
pelas engrenagens do universo e ecoasse dentro de mim provando que estou errado.
Hoje era preciso que uma das portas do corredor do manicômio se abrisse. Era preciso o sorriso da
enfermeira e a alta do médico.
Hoje era preciso afogar-me na chuva.
Hoje era preciso que o amanhã viesse mais cedo e me contasse algum segredo, porque todos os meus
hojes já se transformaram em ontem, quando também era preciso um hoje.
Hoje era preciso caminhar com a morte e ouvir o que ela tem a dizer sem nada dizermos.
Hoje era preciso que um anjo de um mausoléu qualquer me convidasse a entrar e perguntasse o que eu
quero.
Hoje é um daqueles dias em que só seu cachorro sabe o que fazer.
Mas eu não tenho um cachorro.
XI
XII
XIII
Lembro das cores, das vozes, dos sorrisos, dos doces, da correria.
Lembro dos brinquedos, das filas, das músicas.
Lembro de quando a alegria era possível
E a felicidade ainda não conhecia a filosofia.
E lembro do dia em que voltei sozinho do parque a casa:
Eu tinha crescido e deixei lá a criança
Que morrera entre algodões (-) doces
Sufocada de fantasia
Num mundo feliz.
O trem-fantasma é aqui fora.
XIIII
O vazio e a solidão são a estopa de que me encheu o tempo, como boneca de trapos costurada pela vida.
Agulha e linha.
Pontos sem nó.
Somos todos bonecos de trapo, feitos de retalhos e cheios de nada, com quem, mais cedo ou mais tarde,
ninguém mais brincará.
E seremos do tempo, do tempo de um presente infinito, de um
tempo que quanto mais passa, mais deixa tudo igual.
Sinto falta de tanta coisa que é como se estivesse completo de
tanto vazio.
Vejo lágrimas a abandonar-me no espelho... Com o tempo, mesmo elas, vão.
Já houve sorrisos, em outros tempos: amou-se a boneca de pano
que, agora, é trapo, é tempo, é tic, é tac...
Espelhos, janelas... A diferença está no “eu” que se vê em cada um deles.
No espelho, o tempo que foi, na janela, o que há de ser. Se houver.
Ismália através do espelho, o espelho do tempo que há de ser...
Um segundo já se passou...
Acabou!
Acabou?
XV
XVI
Do alto da colina, entre mim e a sombra de montanha que a noite recortava no horizonte,
Faiscavam as luzes das casinhas do pequeno vilarejo,
Talvez refletindo as estrelas do céu
(ou era o contrário?).
Veio um anjo noturno, desses que voam sozinhos
E tristes,
Como corujas a sussurrarem orações misteriosas e infernais,
E disse-me assim, olhando para a montanha:
O que te separa daquela montanha?
São as luzes dos homens ou as luzes do firmamento?
E eu, sem que tirasse os olhos da majestosa sombra adormecida,
Refleti sobre a perversa sugestão e respondi-lhe:
Não é o que me separa da montanha,
Mas o que separa a montanha de mim
Que agita o meu espírito.
E todos na vila apagaram as luzes;
E o sol apagou as estrelas;
E o dia matou a noite;
E o anjo tornou-se estátua;
E eu adormeci;
E apenas a montanha permaneceu imóvel
Para servir de paisagem
À lua.
XVII
XVIII
Diletante, você diz. Imprevisível, você julga. Dom Juan, você ironiza. Quando todos nós estivermos
mortos, e a civilização tiver esquecido da nossa ridícula existência, preferirei ter amado e desamado,
aprendido e esquecido, satisfeito minhas curiosidades e aprofundado meus estudos, ter visto um pouco de
tudo, provado um pouco de tudo, aqui e acolá, contigo ou com o mundo; preferirei ter digerido tudo
dentro do meu silêncio melancólico - porque só eu sei o significado que o mundo me oferece dada a sua
realidade - do que ter passado minha vida como um trem: numa única direção de, quando muito, dois
sentidos apenas.
Faço da minha
Maria Fumaça
Um maço
de linhas
Escritas
Em muitas trilhas
Por que se o trilho
Não é opção
Quem escolhe a junção
É o meu coração
Que bate
No compasso
Desse maço
De escritas
E de trilhas
Todas minhas
Ferrovias
Atrevidas
Trocaria a hipocrisia
Dessa tal felicidade
Pela dura realidade
Dessa minha fantasia
XX
Ai que saudade boa, daquelas mineiras, de ficar pendurada na janela, vendo as modas, as fofocas, o sol
escorregar pela linha da montanha e as abelhas virem correndo por causa do cheirinho do bolo de milho e
do café forte da preta bá.
Ai, saudade boa, sem fim, dessas que quando morrem, viram poesia e, teimosas, não deixam o peito, só
por estética.
Eita, saudade danada! Fecha a janela, olha a mosquitada!
Saudade, já pra dentro, menina!
Vou não, quero ver a lua...
Ai, saudade sem fim, saudade danada, saudade teimosa.
XXI
(Suspiro)
Moço, duzentos gramas.
Pra viagens...
XXII
Sonetus Mellitus
E deitei-me à guloseima:
Fiz do verso o guardanapo
Do prazer que tanto teima!
E a rima, esquecida,
Mais que o bolo e o chantilly
Acabou, a pobrezinha, digerida.
XXIII
XXIIII
Ausento-me
E perco-me de vista
- desintegro-me –
Na cromática dos degradés
Do óleo sobre tela
- ou seria uma aquarela –
Que há no pôr e no nascer do sol
- tolice separar a noite do dia –
Tão iguais, tão iguais
Se a natureza
Pode dar-se ao desatino
De perder-se, ela também
Nessa loucura de misturas
Por que não posso eu
Esvanecer-me
Entre a sandice e a sanidade
Ton-sur-ton
Tão iguais, tão iguais
?
XXV
Navega-me
Ama-me
Sonha-me
Perco-te.
XXVI
XXVII
A ironia de morrer
Afogado de desejo
No deserto da solidão
Cáfila de corações
Em busca de um oásis
De translúcidas paixões
Amantes tuaregues
Caravana de infelizes
Amores-tempestades de areia
XXVIII
Da espuma do mar
Faria o colchão
À deriva no teu coração.
E da pesada âncora
Meu triste fim:
Submerso em teu oceano.
XXVIIII
Não é o sono da morte
Nem a apatia
Da agonia
E nem da desesperança
A letargia.
É a prece do sonho
De onde espero
Toda a alegria.
Não acorda!
Sou sonho
Não acorda...
XXX
A gente
Quanto é carente
Trinca os dentes
Abraça o travesseiro
Se afoga em aguaceiros
E no auge do desespero
Finge
(Que se é)
Feliz
XXXI
XXXII
XXXIII
XXXIIII
Se morro em vida,
Que o cinza seja
O meu esquife.
XXXV
Poesia de madrugada
Aparece como morcego
No meio da sala:
Poesia de madrugada
Acorda com sobressalto
Terrível desassossego
Querendo sair,
A desesperada,
Bate e rebate
Avoa e revoa
E causa aflição
E ansiedade
E inspira o medo
Que a gente tem
Das coisas com asas
Que então confinadas
Debatem-se e voam
Pra cima da gente
XXXVI
Lepidopterophobia:
Medo de poesia
Ou seria
Do medo a poesia?
XXXVII
XXXVIII
Sopra o vento
E eu me contento
Com o teu nome que ele parece sussurrar.
XXXVIIII
Eclipse.
XXXX
XXXXI
XXXXII
XXXXIII
Viver
Também é dar-se
O tempo
De observar
A cauda de um pavão.
XXXXIIII
uma vez
a cada mês
— mulher —
a lua
cheia
menstrua
— la mère —
e dá à luz
a nossa cruz
XXXXV
Escrevo meus versos
Entre corpos, ratos e restos
De flores e de histórias
Porque é morta a musa
E jaz reclusa
cadáver em minhas memórias
Mas há ironia
Nesta agonia
Porque a defunta alegria
Minha
Ainda que em pedaços
Sob meus passos
Mesmo podre e deformada
Inspira-me à poesia envenenada
De cadaverina
Musa morta,
Poesia torta,
O que mais importa?
XXXXVI
O vento corta
A face morta
Que me observa
À porta
Terror noturno
De amores não vividos
XXXXVII
Alguns de nós escrevem pessoas, outros as sonham, mas, no final, não são a mesma coisa, sonhos e
livros?
Os sonhos nascem dos livros, que são possíveis apenas por causa dos sonhos. Nós somos o minotauro
desse labirinto.
XXXXVIII
Assim como o céu
à noite mente
com brilhos de estrelas
que não existem mais
XXXXVIIII
Só sobre ti
Velados por fria lápide
É que durmo
Sonos e sonhos bons
Os anjos de mármore
Hão de me proteger
Teu silêncio
[é]moldura
Para o som da chuva
Que chove cá
Dentro d'alma
E molha
Lá fora
Nosso jardim
De promessas
Secas
/////////////////
LI
LII
LIII
Camaleoa
Cama e leoa
Quantas cores e lençóis
Já tocaram nua a pele tua?
Disfarçada de ti mesma
Oculta nas sombras de cortinas
Escapas à realidade minha
Mentiras?
Camas e leoas
Carnes e travesseiros
Que luz te revelaria
Minha?
LIIII
LV
LVI
LVII
Me ame amanhã
À mesa
À moda
Sem modos
Cem modos!
Manhã de mainha
Manhas de menina
Monte de Vênus
Movimentos marinhos
Marés
A molhar-nos
Meneios de menina-moça
Maçãs mortas
Mordidas em manicômios
Mente o mensageiro
Missivas mordazes
Moldas maldades
Mas ama-me
A mim
Muito
Minueto de mamilos
Marcas de mordidas
Melhor morrer
A não ser amado.
Mechas e cachos
Mexes – o facho –
E o tacho
Entalhos e atalhos
E o leite talhado
Tabuleiro dos prazeres.
LVIII
LVIIII
Talvez
Em rostos desconhecidos
Em mechas de outras cores
E olhos de outras luzes
Que nossa frágil realidade
- a que abandonaste quando era só esperança –
Se torne, em sonhos de álcool e ópio,
A real fantasia de nós dois,
Ainda que nela tu vistas
Uma outra máscara qualquer.
LX
LXI
O pôr do sol
Por tão só
Fez-se tal como a alvorada
E assim são dois o mesmo sol
Esse sol que era tão só
Tão só num pôr de sol
Que nasce e morre
No mar de sal
E só
LXII
LXIII
Chove, choro
Charco cheio
— de chumbo —
Chilreio
LXIIII
Eu só queria...
Eu só penso no dia...
Eu só não sei da alegria
Eu só não pontuo a poesia
LXV
Em tua mesa
F / a / t / i / a / d /o
Devora-me!
LXVI
LXVII
LXVIII
LXVIIII
LXX
A cela,
Os choques,
As pílulas e injeções.
Nem mesmo a camisa de força,
Me fazem esquecer de ti,
Deixar de te ver,
E de te querer.
LXXI
Insana idade
Imortal idade
Saudade,
Moça.
LXXIII
Relativ(a)idade
[Sinais de fumaça]
E basta, sabemos,
Apenas querermos.
Mas, se sabemos que queremos,
Por que não somos
E nem estamos
No mesmo tempo
Na mesma batida
Do carrilhão?
LXXIIII
LXXV
Verdades
Vaidades
Oh, desditosa rima
LXXVI
Se vieres
Uma vez mais
Abraçar-me em alta noite
Deixar teus beijos e sorrisos
E te meteres entre outras musas
— Posto que és ciumenta e me queres só a ti —
Rogo-te que recues; procura, tu, a lua
Ou as estrelas — devem dar por tua falta —
Assombra as escuras ruas
E seus pobres transeuntes
Que buscam morenas
E loiras de branco
LXXVII
LXXVIII
LXXVIIII
LXXX
LXXXII
Os versos e as rimas
Estavam todos lá
No teu sorriso alexandrino
Naquele olhar hai-kai
Nas curvas concretistas
Nesse amor surrealista
Nos seios de sonetos
No refrão dos teus quadris
Nas longas pernas parnasianas
Em teu coração barroco
Em nossas vidas de quadrinhas
Mas foi no dia em que te foste
Que tudo virou poesia
LXXXIII
Eis a cena
Ouço sinos
Percebo incensos
Em meu sono
Ai, a sina
Deste amor insano
Tormento intenso
Profundo, denso
Epifania imensa
Tão nonsense
Essa tua absence...
LXXXIIII
LXXXV
LXXXVI
Não te importes
Com meu cadáver
A rodear-te
As mariposas
— e os mortos —
Procuram a luz.
LXXXVII
De todos,
Édipo foi o mais sensato.
LXXXVIII
Eu te quero tanto,
E te desejo tanto,
E te escrevo tanto,
E, entretanto...
LXXXVIIII
Assim te quero
Assim mesmo
Ah, sim!
É cisma
Desejo barato
Corriqueiro
Teimosia
Quero por que quero
Insistência
— bobagem a resistência —
Pode ser pela tua beleza
[que eu mesmo construí]
Pode ser pela tua inteligência
[te quero inteligente e pronto]
Pode ser por esse teu jeito
Que me faz rir e me deixa feliz
[Insana felicidade infeliz]
Pode ser por esse gosto de carne
Que temos inerente à espécie
E que quero provar
Carne crua, nua
Peça de açougue
[desejo estranho esse]
Quero porque decidi te querer
Não sei se te amo
Provavelmente, não
— O amor e ridículo —
Quero-te como quis a tantas
E hei de outras querer
Porque enjoa-se da mesma carne
Depois de tê-la à mesa demasiado
E à cama embriagado
Quero te porque escolhi te amar
E porque já não possuo
As chaves de tua cela.
XC
XCI
XCII
Deite-se
De bruços
[Debruço-me
Deleite-se
No leito
De morte
XCIII
[só]
seu,
Tantos amigos, programas,
Eu te amo, tu me amas,
Pôr do sol, lua cheia,
Café, almoço, jantar e ceia.
XCIIII
XCV
XCVI
E do alto contemplar
O corpo empalidecido
Já sem vida, tão sem rima
Fim de todo sofrimento
— O sorriso do cadáver —
De ti.
XCVII
É preciso abandonar
Toda a dura realidade?
Ou devo cá eu procurar
Por vestidos amarelos?
XCVIII
Do contrário,
Quede verso?
XCVIIII
CEM TIDOS
FRAGMENTOS PÓSTUMOS
Ganhaste, vida
Fizeste por merecer
Usaste de todos os truques
Tiraste-me tudo
Pouco a pouco
Dilacerando
Desacelerando
Meu celerado
Coração
Ganhaste, eu disse
Triunfaste, escrevi
Contudo, repenso
Neste meu vagar
Sem rumo nem prumo
Morto ainda vivo
Cadáver engendrado
No reino da vida
Isto posto, concluo
Que a bem da verdade
Triunfo maior tive eu sobre ti
Porque faço-me morto
Não sinto mais nada
Nem mesmo as dores
Em que ainda insistes
E por isso mesmo
Porque não me mataste
― ainda que um corpo ―
Sou em quem escarneço
Pois despedaçado
Tão amargurado
E mui torturado
Ainda vagueio imundo
Por esse teu mundo
De vida e frescor
Beleza e amor
Mas quem sabe consigo
Por culpa, ironia,
Da tua vil covardia
Enegrecer estas cores
Murchar todo o viço
De tudo o que é vivo
Com apenas um toque
De morte
Do morto
Que vivo, entretanto,
Sem que notasses
Resistiu às feridas
E agora as devolve
Não a ti, mãe perversa,
Mas a teus filhos e filhas
Que mortos, doentes,
Infelizes tal qual
Apedrejam e cortam
O teu coração
O seio da vida
Matasses a mim
E teria ganho a pendenga
Escolheste a tortura
Criaste teu próprio
Verdugo
Ah, vida,
Há coisas que à morte
Pertencem
Dá-me cá um abraço
Apodrece comigo
Quero mostrar-te
O fim que terá
Todo o vivo.
***
Na Antiguidade (nem é preciso ir tão longe...), quando uma civilização chegava ao fim, desestruturada,
corroída em todos os seus valores, destituída do que chamamos hoje tecido social, uma outra civilização
tomava o seu lugar, cultural e/ou territorialmente. O que diferencia a nossa contemporaneidade daquela
longínqua (?) Antiguidade, é que hoje nossa civilização é uma só, não há ninguém para nos substituir,
tomar as rédeas, reorganizar-nos sob novos protocolos ou instituições.
Nossa civilização ocidental (ainda há isso de ocidental e oriental?) está morta. Não há mais o que
corromper, não há mais valores éticos ou morais seguros, delimitadores, norteadores da mínima
convivência social. Somos um cadáver maquiado.
Nosso drama é não termos ninguém que venha nos velar nem fechar nosso caixão: somos um corpo
exposto ao tempo, empesteando tudo, maculando tudo até que não sobre mais nada de nossa podridão
sobre a Terra.
***
***
Inveja rara
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