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O fazer teatral de Stella Adler

Por Luigi Lourenço

“Atuar é um trabalho obstinado, necessitando de atenção constante e de planejamento


rigoroso. Não é algo para gênios. É para pessoas que trabalham passo a passo.”
STELLA ADLER

Exercícios Práticos

1- Energia Vocal

1. Leia um editorial em voz alta todos os dias


2. Leia, fale, três, quinze, trinta metros afastado de alguém

Quando ler em voz alta deve ter em vista que deve ser ouvido, leia como se a
plateia estivesse além da mesa, além da sala, além da rua. Não se trata de gritar,
mas sim de alcance vocal.

2 – Corpo

Imagine que você tenha um joelho rígido.

1. Caminhe com o joelho rígido em casa


2. Suba degraus.
3. Vista-se com ele.
4. Viva com ele.
5. Marche com ele.
6. Dance com ele.

Se fizer isso algumas horas por dia, poderá gerar uma memória desse controle muscular
e usar isso cenicamente numa composição futura.

3 – Sotaques

Para obter conscientemente um novo formato de fala é interessante trabalhar com a


língua, como encostá-la atrás dos dentes superiores e tentar falar ali, ao ver o que essa
configuração te desperta modelar a fala.

Exercícios – Praticar o sotaque do Nordeste Brasileiro – Assistir e observar – O Auto da


Compadecida. Praticar sotaque russo e/ou alemão.
4 – Memória Muscular

Compor ações que deixem a cena crível com detalhes que vemos na vida como limpar os
óculos ou endireitar, o ator tem que usar de sua composição para lidar com o adereço real
a partir de uma circunstância cênica apresentada, como se algo estivesse em mau estado,
por exemplo.

Algumas ações interessantes para se guardar – A dificuldade de abrir um pote que estiver
duro (exige uma força muscular, expressão), a dificuldade de pôr a linha na agulha, a
afobação e o tempo de pegar algo que caiu, limpar lama imaginária do sapato, tirar pelos
da roupa.

5 – Animais

Observe um animal que você gosta. Dê atenção aos detalhes, os pequenos movimentos,
sons e tenta aplicá-los no seu corpo. A observação de animais é algo muito rico para
composição de personagens, ajuda a explorar nosso corpo e voz de formas diferentes e
expressar características que singularizam a figura, como uma persona que ao mentir tem
o hábito de fazer uma perna de flamingo, algo que inspirado num animal vira um cacoete
único da personagem. Assim como energicamente pode afetar, dependendo da
personalidade do animal, se for um animal mais agressivo para uma persona raivosa.

6 – Conhecimento

A importância de conhecer:

▪ Todas as características regionais e nacionais como sotaques.


▪ Os diferentes estilos de vestimentas e suas mudanças.
▪ Os diferentes períodos de tempo.
▪ Consciência de classe.
▪ Os costumes e princípios de épocas passadas.
▪ O imobiliário diferente.
▪ Os vários gêneros de música atuais e do passado.

Para o ator mais importante que a imaginação é o conhecimento, a consciência das coisas.
Saber como são. Vivência. Experiência. Repertório.

7 – Descrição/Visão

Se peço a um ator que descreva o que viu na mercearia e ele responde “Vi algumas uvas,
peras e bananas”, concluo que ele poderá ser talvez um bom banqueiro, mas nunca um
bom ator. Ele vê as coisas como um contador, apenas relata fatos.
O ator deve deixar que os objetos lhe digam algo, com isso, poderá discorrer pessoalmente
sobre o que viu.
“Vi peras fantásticas! Eram grandes, mas pareciam muito caras para se comprar. Então vi
aquelas deliciosas uvas Málaga, grandes e muito doces. Haviam também daquelas... quais
mesmo? Aaa sim, aquelas uvas mais gordas, pequenas e também daquelas verdinhas,
essas que a gente come aos quilos e, a propósito, eram muito baratas!”
O sentimento evocado pela descrição é mais importante que a própria descrição.
Os atores devem exercitar seu poder de observação. Uma árvore tem uma certa grandeza
e se faz merecedora de toda uma descrição. Descreva como uma folha se apresenta em
diferentes estações. Há escritores e artistas de todo o mundo que viajam ao sul da França,
ou á Inglaterra, só para ver as árvores no outono e sua poesia.
A maior parte do tempo somos indiferentes ao que vemos: isto é uma mesa, uma cadeira,
essas são abelhas. Porém cada coisa é viva e tem seu universo particular. Ao ver as coisas
por cima, as matamos, banalizando a vida.

Exercício – Descreva uma rosa.


Se você diz “Eu vi uma rosa”, espera-se que ele e o público também vejam sua rosa. Se
você acreditar, todos também o farão. A imagem de uma rosa é bem específica:
“Eu vi uma rosa. Era vermelha, de um vermelho vibrante, dessas que é impossível não
olhar e tinha um longo talo verde com espinhos.”

8 – Memória/Concentração

Exercícios:

Vá a seção de verduras de um super mercado

1. Veja tudo o que puder em dez segundos


2. Anote num papel o que você viu.

Olhe para seu parceiro

1. Veja tudo quanto puder em cinco segundos


2. Vire o rosto.
3. Anote o que ele está vestindo

Olhe ao redor da sala


1. Conte até cinco, olhe para longe.
2. Cite dez objetos que você observou.
Esse exercício pode ser feito com passos de ballet, por exemplo, e com qualquer coisa
que você queira memorizar.
9 – Observação/detalhes/vivência
Atuar está em tudo, exceto em palavras frias. Alguns atores se contêm e não reagem. Nós
fomos muito amortecidos pelo cinema e pela internet, alguns atores têm medo de “forçar”,
pois não force, mas seja capaz de deixar acontecer. A função do ator é desinventar a
ficção, qualquer coisa que passar por sua imaginação, acaba por ser criada e ter vida, se
você imaginou agora existe, tem o direito de viver e agora tem sua própria verdade. Para
essa criação é necessário a vivência dos detalhes, a ator é como um escritor, cheio de
impressões que o inspiram. Ele não anda por aí como um funcionário desocupado
dizendo: “Vou comer ovos e bacon.” Quando o ator compra ovos e bacon ele vê:
1. A garçonete
2. A mesa.
3. O restaurante em sua atividade agitada.
O ator assimila tudo e tudo passa por ele tendo vida. Ele é capaz de ver que:
1. O piso está sujo
2. A mesa tem uma mancha de copo molhado na madeira. A madeira cheira forte.
3. O café está fraco.
4. Ninguém está realmente prestando atenção em ninguém.
5. Aquela senhora parece preocupada com algo, tem um tremor nas mãos peculiar.
6. Aquele grupo está com pressa.

Ele não está lá apenas para comer, pagar sua conta e ir embora. Ele é capaz de viver lá,
prestando atenção, vendo, entendendo e até dizendo: “O que é isto? Como isso é? Em que
lugar estou?” da maneira que faz um pintor ou escritor.

10 – Circunstância

Viver aquilo em todos os detalhes e porquês.

“Quando se fala tomar sol na praia. Deixo meu corpo e alma entregue de tal forma que
brinco, um brincar acreditando. Eu trago toda a sensação de praia para o meu ser, o cheiro,
a areia nos meus pés, a voz de praia sai como resultado de estímulos, da ação e da entrega,
não a voz de praia que fabriquei na minha cabeça na hora do exercício. Teatro não é
fabricado, é vivo. O corpo é vivo, a voz é viva, o texto é vivo, o ator é vivo. Atuar não é
fingir, é viver, é brincar. É presentar. Estar ali. Presente. Vivo. Pulsante. Latente.”
Você está na praia.
O sol é quente.
Você está mole de cansaço e calor.
A areia está nos seus pés.
A praia tem um cheiro.
1. Onde a ação ocorre?
2. Quando?
3. Por que está aí?
4. Como se sente?
5. Qual é a ação?
6. Como essa ação impacta a persona e quem ela se relaciona/
7. Qual a história do todo e da persona?

Atmosfera/energia das circunstâncias

Todas as circunstâncias tem uma energia, uma atmosfera.

▪ Uma igreja tem sua atmosfera


▪ Um bar tem sua atmosfera.
▪ Um passeio no parque tem sua atmosfera.
▪ Um hospital tem sua atmosfera.
▪ Um velório tem sua atmosfera.
▪ Um parque de diversões tem sua atmosfera.

Sua ação deve ser leve ou carregada a depender da atmosfera.


Há a atmosfera/energia da ação, da persona, do ambiente e de todo o contexto que se
insere.
Cada ação que você faz tem sua natureza. Que quer dizer a sua verdade. Para ser
verdadeiro em cena você deve saber a natureza da ação que está fazendo e ela deve ser
verdadeiramente executada. Ou seja, o trabalho envolve atmosfera mais a veracidade, a
verdade do ator, em como a persona se insere, age e como o ator dá vida a isso.

11 – Elementos dados pelo dramaturgo sobre a personagem que auxiliam na


composição:

▪ Situação social
▪ Classe – operária, alta, média, aristocracia.
▪ Profissão
▪ Passado da personagem
▪ Características
▪ Atitude da personagem em relação ao parceiro

Esses permitem que você “vista a camisa” da personagem e amplie suas dimensões, pois
você não pode interpretar Hamlet, que é um príncipe, sem ter o mínimo de noção de como
é a vida de um, deve saber reagir as circunstâncias que o envolvem.

Lugar que se encontra socialmente:

▪ Crenças
▪ Educação
▪ Vida familiar
▪ Ética
▪ Moral
▪ Situação econômica
▪ Orientação e expressão sexual
▪ Posicionamento político

Ex. Característica – Cauteloso

▪ Seu personagem é cauteloso quando arruma suas roupas?


▪ Cauteloso ao servir comida?
▪ Fala ao telefone com cautela?

12 – Construindo um enredo

Definição de enredo: Enredo é uma estrutura, sequencial ou não, de ações executadas ou


a executar pelas personagens numa ficção. Sequência de acontecimentos numa história,
também chamado de trama.
Toda peça tem um enredo. Esse enredo irá sendo revelado a partir dos diálogos que
conduzirão a trama e farão revelações das personagens e da história. Todo enredo deve
progredir de novos atos ou novas cenas.
Todo enredo tem uma ação. Para compreender a ação você deve entender que tudo que é
feito tem o propósito de conduzir a história, os antes, os depois e os durantes.

Em cena há sempre uma razão para a fala que vai depender:

▪ Das circunstâncias
▪ Do seu parceiro
▪ Do decorrer do texto e da ação

13 – Conhecimento

Exercício:

Tome um período da história, desenvolva-o pesquisando a música, a literatura, os


pintores, a arquitetura, as vestimentas, a relação econômica. Pode seguir uma tabela:

Ano: 1906

Artes Vida
Política Teatro Visuais Música Ciência diária Religião

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