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ACÓRDÃO DE 1. 2.

2005 — PROCESSO C-203/03

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)


1 de Fevereiro de 2005 *

No processo C-203/03,

que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE,
entrada em 12 de Maio de 2003,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por N. Yerrell e H. Kreppel,


na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República da Áustria, representada por H. Dossi e E. Riedi, na qualidade de


agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandada,
* Língua do processo: alemão.

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COMMISSÃO / AUSTRIA

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans e A. Rosas,


presidentes de secção, J.-P. Puissochet, R. Schintgen, N. Colneric (relatora),
J. Malenovský, J. Klučka, U. Lõhmus e E. Levits, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,
secretano: R. Grass,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 8 de Julho


de 2004,

profere o presente

Acórdão

1 Com a sua petição, a Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de


Justiça que declare que a República da Áustria, ao manter, contrariamente às
disposições da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976,
relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e
mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção
profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70),
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— no § 2 do Verordnung des Bundesministers für Wirtschaft und Arbeit über


Beschäftigungsverbote und -beschränkungen für Arbeitnehmerinnen (Decreto
do Ministro Federal da Economia e do Emprego relativo às proibições e
restrições no emprego de mulheres), de 4 de Outubro de 2001 (BGBl. II,
356/2001, a seguir «Decreto de 2001»), uma proibição geral de empregar
mulheres, com um número limitado de excepções, no sector da indùstria
mineira subterrânea, e

— nos §§ 8 e 31 do Druckluft- und Taucherarbeiten-Verordnung (Decreto relativo


aos trabalhos em atmosferas com sobrepressão elevada e aos trabalhos de
mergulho), de 25 de Julho de 1973 (BGBl. 501/1973, a seguir «Decreto de
1973»), uma proibição geral de empregar mulheres neste tipo de trabalhos,

não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2° e 3.° desta
directiva e dos artigos 10.° CE e 249." CE, e que condene a República da Áustria nas
despesas da instância.

2 A República da Áustria conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne

— julgar a acção inadmissível no que diz respeito ao Decreto de 2001 e

— condenar a Comissão nas despesas,

bem como, no caso de o Tribunal de Justiça considerar a acção admissível,


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COMISSÃO / AUSTRIA

— julgar a acção improcedente e

— condenar a Comissão nas despesas.

Enquadramento jurídico

O direito internacional

3 O artigo 2.° da Convenção n.° 45 da Organização Internacional do Trabalho (a seguir


«OIT»), de 21 de Junho de 1935, relativa ao emprego de mulheres em trabalhos
subterrâneos em minas de qualquer espécie, ratificada pela Áustria em 1937, estipula
o seguinte:

«Não poderá ser empregada nenhuma pessoa do sexo feminino, seja qual for a sua
idade, nos trabalhos subterrâneos em minas.»

4 Nos termos do artigo 3." desta convenção:

«A legislação nacional poderá exceptuar desta proibição:

a) as mulheres que ocupem cargos de direcção e não realizem trabalho manual;


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b) as mulheres empregadas em serviços de saúde e em serviços sociais;

c) as mulheres que, no âmbito dos seus estudos, tenham de passar um período de


tempo na parte subterrânea de uma mina, para efeitos de formação profissional;

d) qualquer outra mulher que ocasionalmente tenha que descer à parte


subterrânea de uma mina, no exercício de uma profissão que não seja de
caracter manual.»

5 O artigo 7° da referida convenção estipula:

«1. Todo o membro que tiver ratificado a presente convenção poderá denunciá-la
ao fim de um período de dez anos depois da data da entrada em vigor da convenção,
por acto comunicado ao director-geral da Repartição Internacional do Trabalho e
por ele registado. A denúncia só terá efeito um ano depois de registada na
Repartição Internacional do Trabalho.

2. Todo o membro que, tendo ratificado a presente convenção, não fizer uso da
faculdade de denúncia prevista no presente artigo no prazo de um ano após o termo
do período de dez anos mencionado no número precedente, ficará vinculado por um
novo período de dez anos, podendo, a partir daí, denunciar a presente convenção no
fim de cada período de dez anos, nas condições previstas no presente artigo.»

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6 A Convenção n.° 45 da OIT entrou em vigor em 30 de Maio de 1937.

7 A Convenção n.° 176 da OIT, de 22 de Junho de 1995, relativa à segurança e à saúde


nas minas, não visa apenas os homens, enunciando regras sobre a segurança e a
saúde, independentemente do sexo do trabalhador.

8 A República da Áustria ratificou esta convenção, em 26 de Maio de 1999, mas não


denunciou a Convenção n.° 45 da OIT.

O direito comunitário

9 O artigo 307.°, primeiro e segundo parágrafos, CE dispõe:

«As disposições do presente Tratado não prejudicam os direitos e obrigações


decorrentes de convenções concluídas antes de 1 de Janeiro de 1958 ou, em relação
aos Estados que aderem à Comunidade, anteriormente à data da respectiva adesão,
entre um ou mais Estados-Membros, por um lado, e um ou mais Estados terceiros,
por outro.

Na medida em que tais convenções não sejam compatíveis com o presente Tratado,
o Estado ou os Estados-Membros em causa recorrerão a todos os meios adequados
para eliminar as incompatibilidades verificadas. Caso seja necessário, os Estados-
-Membros auxiliar-se-ão mutuamente para atingir essa finalidade, adoptando, se for
caso disso, uma atitude comum.»
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10 O artigo 2.°, n.os 1 a 3, da Directiva 76/207 prevê:

«1. O princípio da igualdade de tratamento, na acepção das disposições adiante


referidas, implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer
directa, quer indirectamente, nomeadamente pela referência à situação matrimonial
ou familiar.

2. A presente directiva não constitui obstáculo à faculdade que os Estados-


-Membros têm de excluir do seu âmbito de aplicação as actividades profissionais e,
eventualmente, as formações que a elas conduzam, e para as quais, em razão da sua
natureza ou das condições do seu exercício, o sexo constitua uma condição
determinante.

3. A presente directiva não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção


da mulher, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade.»

11 Nos termos do artigo 3.° desta directiva:

«1. A aplicação do princípio da igualdade de tratamento implica a ausência de


qualquer discriminação em razão do sexo nas condições de acesso, incluindo os
critérios de selecção, a empregos ou a postos de trabalho, seja qual for o sector ou o
ramo de actividade e a todos os níveis da hierarquia profissional.
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2. Para este efeito, os Estados-Membros adoptarão as medidas necessárias a fim de


que:

a) Sejam suprimidas as disposições legislativas, regulamentares e administrativas


contrárias ao princípio da igualdade de tratamento;

[...]»

12 O artigo 2.° da Directiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa


à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da
saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (Décima
Directiva especial na acepção do n.° 1 do artigo 16.° da Directiva 89/391/CEE) (JO
L 348, p. 1), dispõe:

«Definições

Para efeitos da presente directiva, entende-se por:

a) 'Trabalhadora grávida': toda a trabalhadora grávida que informe o empregador


do seu estado, em conformidade com as legislações e/ou práticas nacionais;
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b) 'Trabalhadora puérpera': toda a trabalhadora puérpera nos termos das


legislações e/ou práticas nacionais que informe o empregador do seu estado,
em conformidade com essas legislações e/ou práticas;

c) 'Trabalhadora lactante': toda a trabalhadora lactante nos termos das legislações


e/ou práticas nacionais que informe o empregador do seu estado, em
conformidade com essas legislações e/ou práticas.»

13 O artigo 4.° desta directiva prevê:

«Avaliação e informação

1. Para toda a actividade susceptível de apresentar um risco específico de exposição


a agentes, processos ou condições de trabalho, cuja lista não exaustiva consta do
anexo I, a natureza, o grau e a duração da exposição, na empresa e/ou
estabelecimento em causa, das trabalhadoras referidas no artigo 2.° deverão ser
avaliados pelo empregador, quer directamente quer por intermédio dos serviços de
protecção e prevenção referidos no artigo 7." da Directiva 89/391/CEE, para que seja
possível:

— apreciar todo e qualquer risco para a segurança e/ou a saúde, bem como as
repercussões sobre a gravidez ou a amamentação, das trabalhadoras referidas no
artigo 2.°,

— determinar as medidas a tomar.


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COMISSÃO / ÁUSTRIA

2. Sem prejuízo do artigo 10.° da Directiva 89/391/CEE, na empresa e/ou no


estabelecimento, as trabalhadoras referidas no artigo 2.° e as que possam encontrar-
-se numa das situações referidas no artigo 2.° e/ou os seus representantes serão
informados dos resultados da avaliação referida no n.° 1, bem como de todas as
medidas relativas à segurança e à saúde no local de trabalho.»

14 Nos termos do artigo 5.° da Directiva 92/85:

«Consequências dos resultados da avaliação

1. Sem prejuízo do artigo 6.° da Directiva 89/391/CEE, se os resultados da avaliação


referida no n.° 1 do artigo 4.° revelarem riscos para a segurança ou a saúde ou
repercussões sobre a gravidez ou a amamentação de uma trabalhadora, na acepção
do artigo 2.°, o empregador tomará as medidas necessárias para evitar a exposição
dessa trabalhadora àqueles riscos, adaptando temporariamente as condições de
trabalho e/ou do tempo de trabalho da trabalhadora em questão.

2. Se a adaptação das condições de trabalho e/ou do tempo de trabalho não for


técnica e/ou objectivamente possível ou não constituir uma exigência aceitável, por
razões devidamente justificadas, o empregador tomará as medidas necessárias para
garantir uma mudança de posto de trabalho à trabalhadora em causa.

3. Caso a mudança de posto de trabalho não seja técnica e/ou objectivamente


possível ou não constitua uma exigência aceitável, por razões devidamente
justificadas, a trabalhadora em questão será dispensada do trabalho durante todo
o período necessário à protecção da sua segurança ou saúde, em conformidade com
as legislações e/ou práticas nacionais.
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4. O disposto no presente artigo aplica-se mutatis mutandis ao caso em que uma


trabalhadora que exerça uma actividade proibida por força do artigo 6.° fique grávida
ou se torne lactante e do facto informe o seu empregador.»

15 O artigo 6.° da Directiva 92/85 está redigido da seguinte forma:

«Proibições de exposição

Para além das disposições gerais relativas à protecção dos trabalhadores e


designadamente as respeitantes aos valores-limite de exposição profissional:

1) As trabalhadoras grávidas, na acepção da alínea a) do artigo 2.°, não poderão em


caso algum ser obrigadas a exercer actividades cuja avaliação tenha revelado
riscos de exposição aos agentes e condições de trabalho referidos na secção A
do anexo II, que ponham em perigo a segurança ou a saúde;

2) As trabalhadoras lactantes, na acepção da alínea [c)] do artigo 2.°, não poderão


em caso algum ser obrigadas a desempenhar actividades cuja avaliação tenha
revelado riscos de exposição aos agentes e condições de trabalho referidos na
secção B do anexo II, que ponham em perigo a segurança ou a saúde.»
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COMISSÃO / AUSTRIA

16 O anexo I desta directiva, intitulado «Lista não exaustiva dos agentes, processos e
condições de trabalho a que se refere o n.° 1 do artigo 4.°», precisa:

«A. Agentes

1. Agentes físicos quando considerados agentes que acarretem lesões fetais e/


/ou possam provocar o desprendimento da placenta, nomeadamente:

a) Choques, vibrações mecânicas ou movimentos;

b) Manuseamento de cargas que comportem riscos, nomeadamente dorso-


-lombares;

c) Ruído;

[...]

f) Temperaturas extremas;
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g) Movimentos e posturas, deslocações — dentro e fora do estabelecimento


—, fadiga mental e física e outras sobrecargas físicas ligadas à actividade
da trabalhadora, na acepção do artigo 2.°

2. Agentes biológicos

[...]

3. Agentes químicos

Os seguintes agentes químicos, na medida em que é sabido que fazem


perigar a saúde das mulheres grávidas e da futura criança e se ainda não
constarem do anexo II:

[...]

e) Monóxido de carbono;

[···]
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B. Processos

— Os processos industriais enumerados no anexo I da Directiva 90/394/CEE.

C. Condições de trabalho

— Trabalhos mineiros subterrâneos.»

17 O anexo II da Directiva 92/85, intitulado «Lista não exaustiva dos agentes e


condições de trabalho a que se refere o artigo 6.°», prevê:

«A. Trabalhadoras grávidas na acepção da alínea a) do artigo 2.°

1. Agentes

a) Agentes físicos

— Trabalho em atmosferas com sobrepressão elevada, por exemplo,


recintos sob pressão, mergulho submarino.

[...]
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2. Condições de trabalho

— Trabalhos mineiros subterrâneos.

B. Mulheres lactantes na acepção da alínea c) do artigo 2.°

[...]

2. Condições de trabalho

— Trabalhos mineiros subterrâneos.»

O direito nacional

18 O § 16 da Arbeitszeitordnung (decreto que regula a duração do trabalho), de 30 de


Abril de 1938 (Deutsches RGBl. I, p. 447; GBl.f.d.L.Ö 231/1939, a seguir «Decreto de
1938»), dispunha:

«Proibições de emprego

(1) Não serão empregados trabalhadores femininos em minas, salinas, fábricas de


processamento, escavações subterrâneas ou minas a céu aberto, assim como em
trabalhos de extracção à superfície [excepto processamento (separação e
lavagem)], transporte e carregamento.
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(2) Também não serão empregados trabalhadores femininos em fábricas de


coquefacção ou no transporte de matérias-primas para qualquer tipo de
construção.

(3) O Reichsarbeitsminister pode proibir totalmente o emprego de trabalhadores


femininos, ou fazê-lo depender de certas condições para determinados tipos de
empresas ou de trabalho que acarretem riscos particulares para a saúde e a
moral.»

19 Em 1972, esta disposição foi revogada, à excepção do domínio das minas


subterrâneas.

20 O emprego de mulheres na indústria mineira subterrânea está regulado, desde 1 de


Agosto de 2001, pelo Decreto de 2001.

21 O § 2 do Decreto de 2001, intitulado «Emprego na indústria mineira subterrânea»,


encontra-se redigido como segue:

«(l)Não serão empregados trabalhadores femininos na indústria mineira subterrâ-


nea.

(2) O n.° 1 não se aplica:


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1. a trabalhadores femininos com responsabilidades de direcção ou técnicas


que não envolvam trabalho fisicamente exigente;

2. a trabalhadores femininos que trabalham em serviços sociais ou de saúde;

3. a trabalhadores femininos que necessitam de fazer formação profissional


como parte dos seus estudos ou instrução similar, enquanto durar essa
formação;

4. a trabalhadores femininos que estejam empregados esporadicamente na


indústria mineira subterrânea em funções que não são fisicamente
exigentes.»

22 O § 4 do referido decreto, intitulado «Trabalhos especialmente exigentes no plano


físico», dispõe:

«(1)Não deverão ser empregados trabalhadores femininos em trabalhos que


envolvam levantar, carregar, empurrar, rodar ou transportar cargas, que os
exponham a um esforço físico envolvendo stress psicológico que lhes seja
prejudicial.

(2) Na avaliação do trabalho referido no n.° 1, os factores determinantes a tomar em


consideração no que respeita ao esforço e ao stress são, acima de tudo, o peso, o
tipo e a forma da carga, os meios e a velocidade do transporte, a duração e a
frequência do trabalho e a robustez dos trabalhadores femininos.
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(3) O n.° 1 não se aplicará ao trabalho que os trabalhadores femininos


desempenhem apenas por um curto período de tempo ou em condições que
não se presume coloquem em risco a sua vida ou saúde.»

23 O § 8 do Decreto de 1973 prevê:

«(1)Em atmosferas com sobrepressão elevada apenas podem ser empregados


trabalhadores masculinos com idade igual ou superior a 21 anos, que possuam,
do ponto de vista da saúde, robustez física para o efeito. [...]

(2) [...] Se o requisito de saúde previsto no n.° 1 estiver satisfeito, podem igualmente
ser empregados trabalhadores femininos com idade igual ou superior a 21 anos,
como pessoal supervisor ou noutras funções em atmosferas com sobrepressão
elevada que não envolvam qualquer esforço físico acrescido. [...]»

24 Nos termos do § 31 do Decreto de 1973:

«(1) Apenas podem ser empregados como mergulhadores trabalhadores masculinos


com idade igual ou superior a 21 anos, que possuam, do ponto de vista da saúde,
robustez física bem como o conhecimento especializado e a experiência
profissional necessária do ponto de vista da saúde e da segurança. [...]»
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A fase pré-contenciosa

25 P o r considerar q u e a proibição prevista pelo Decreto de 1938, de empregar


trabalhadoras na indústria mineira subterrânea, era contrária ao direito comunitário,
tal c o m o a proibição semelhante respeitante aos trabalhos e m atmosferas c o m
sobrepressão elevada e aos trabalhos d e mergulho, a Comissão d e u início ao
processo p o r incumprimento. Após ter notificado a República da Áustria para
apresentar as suas observações, a Comissão emitiu u m parecer fundamentado, e m
7 de Fevereiro de 2002, convidando este Estado-Membro a tomar as medidas
necessárias para lhe d a r cumprimento n o prazo d e dois meses a contar da sua
notificação. N o q u e respeita ao emprego na indústria mineira subterrânea, esse
parecer visava o Decreto de 1938 e não o Decreto de 2001, que é objecto da presente
acção e q u e foi invocado pela primeira vez n a resposta d o Governo austríaco ao
referido parecer.

26 Por considerar q u e as informações comunicadas pelas autoridades austríacas


revelavam q u e o incumprimento invocado n o parecer fundamentado subsistia, a
Comissão decidiu intentar a presente acção.

Quanto à acção

No que respeita à admissibilidade

Argumentação d o Governo austríaco

27 O Governo austríaco entende q u e a acção da Comissão é inadmissível n o q u e


respeita à proibição de empregar mulheres n a indústria mineira subterrânea.
Sustenta que o parecer fundamentado da Comissão e a acção se devem basear e m
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acusações idênticas. Invocando o acórdão de 10 de Setembro de 1996, Comissão/


/Bélgica (C-ll/95, Colect, p. 1-4115), este governo sustenta que apenas no caso de as
medidas evocadas na fase pré-contenciosa terem sido mantidas na íntegra é que as
modificações da legislação nacional adoptadas entre essas duas fases do processo
não constituem um obstáculo à admissibilidade da acção. Ora, o Decreto de 2001
modificou consideravelmente a situação existente.

Apreciação do Tribunal

28 É verdade que o objecto da acção intentada nos termos do artigo 226." CE está
circunscrito pelo procedimento pré-contencioso previsto por esta disposição e que,
por conseguinte, o parecer fundamentado e a acção devem estar baseados em
acusações idênticas (v., nomeadamente, acórdão de 16 de Setembro de 2004,
Comissão/Espanha, C-227/01, Colect., p. 1-8253, n.° 26).

29 Todavia, esta exigência não pode ir ao ponto de impor, em todos os casos, uma
coincidência perfeita entre a parte decisória do parecer fundamentado e as
conclusões da petição, quando o objecto do litígio não tenha sido alargado ou
alterado, mas, pelo contrário, simplesmente restringido (acórdão de 11 de Julho
de 2002, Comissão/Espanha, C-139/00, Colect., p. 1-6407, n.° 19). Nesta medida,
quando se verifica uma alteração legislativa durante a fase pré-contenciosa, a acção
pode versar sobre disposições nacionais que não sejam idênticas às referidas no
parecer fundamentado.

30 O acórdão Comissão/Bélgica, já referido, não se opõe a esta interpretação. No n.° 74


do referido acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que basta que o sistema aplicado
pela legislação impugnada no decurso do procedimento administrativo tenha, no seu
conjunto, sido mantido pelas novas medidas adoptadas pelo Estado-Membro
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posteriormente ao parecer fundamentado e impugnadas no âmbito da acção. Com


esta afirmação, o Tribunal de Justiça não excluiu que basta igualmente que as novas
medidas introduzam excepções ao sistema objecto do parecer fundamentado,
remediando desta forma parcialmente a situação na origem da acusação. Não
admitir a admissibilidade da acção nestes casos poderia permitir que um Estado-
-Membro se opusesse a uma acção por incumprimento, alterando ligeiramente a sua
legislação sempre que lhe fosse dirigido um parecer fundamentado, mas mantendo,
por outro lado, a regulamentação criticada.

31 No presente processo, o § 2 do Decreto de 2001 proíbe, à semelhança do § 16 do


Decreto de 1938, o emprego de mulheres na indústria mineira subterrânea.
Diversamente do decreto anterior, institui certas excepções que restringem o alcance
da proibição. Admitir a admissibilidade da acção no caso vertente não viola porém o
direito de defesa, na medida em que, ao longo da fase pré-contenciosa, puderam ser
apresentados todos os argumentos, nomeadamente de ordem médica e física, a favor
da proibição absoluta, e que esses argumentos são, no essencial, os que foram
invocados para justificar uma proibição com excepções.

32 Por consequência, há q u e afastar a questão prévia de admissibilidade suscitada pelo


Governo austríaco.

A proibição de empregar trabalhadoras na indústria mineira subterrânea

Q u a n t o à Directiva 76/207

— A r g u m e n t a ç ã o das partes

33 A Comissão sustenta que o § 2 do Decreto de 2001, que apenas autoriza o emprego


de mulheres na indústria mineira subterrânea em certas actividades limitadas, não é
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compatível com o artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 76/207. Na medida em que esta
mesma directiva contém certas restrições à proibição de discriminação, ela não pode
ser invocada no caso vertente para justificar a proibição de empregar controvertida.

34 Segundo a Comissão, a actividade exercida no sector da indústria mineira


subterrânea não contempla situações profissionais do tipo da que está prevista no
artigo 2.°, n.° 2, da referida directiva.

35 No que respeita à derrogação ao princípio da igualdade de tratamento entre homens


e mulheres, prevista no artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207, a Comissão alega que os
riscos a que as mulheres estão expostas na indústria mineira subterrânea não são, de
um modo geral, de natureza diferente daqueles a que os homens estão igualmente
expostos.

36 Apoiando-se nesta última disposição, o Governo austríaco sustenta que o artigo 2.°
do Decreto de 2001 é consentâneo com a Directiva 76/207.

37 Na opinião deste governo, o trabalho na indústria mineira subterrânea implica uma


solicitação permanente do aparelho locomotor, numa posição fisicamente exigente,
ligada a trabalhos frequentemente realizados com os braços levantados, numa
atmosfera fortemente carregada, nomeadamente, de poeiras de quartzo, óxido de
azoto e monóxido de carbono, e apresentando, a maior parte do tempo, valores
superiores à média no que respeita à temperatura e à higrometria. Daqui resulta,
para os trabalhadores em causa, doenças frequentes dos pulmões, das articulações e
da coluna vertebral («joelho dos mineiros», lesões dos discos intervertebrals,
reumatismo muscular).
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38 A massa e a força musculares, a capacidade vital, a absorção de oxigénio, o volume


sanguíneo e o número de eritrocitos são, em média, inferiores nas mulheres em
comparação com os homens. As mulheres que suportam grandes esforços físicos
estão expostas a elevados riscos de aborto e de osteoporose na menopausa e sofrem
mais de enxaquecas.

39 Uma vez que, em média, as suas vértebras são de menor dimensão, as mulheres
correm mais riscos do que os homens quando transportam cargas pesadas. Além
disso, após diversos partos, aumentam os riscos de lesão das vértebras lombares.

40 E, por conseguinte, evidente que, dadas as diferenças morfológicas existentes, em


média, entre homens e mulheres, um trabalho físico muito exigente na indústria
mineira subterrânea expõe estas últimas a mais riscos, contrariamente ao que
acontece, por exemplo, no trabalho nocturno, que impõe aos homens e às mulheres
as mesmas exigências.

41 A este respeito, a Comissão alega, nomeadamente, que o próprio Governo austríaco


declarou, na fase pré-contenciosa, que «o campo das variáveis energéticas é
considerável, as zonas de sobreposição com os valores masculinos são importantes e
[que] convém portanto proceder a uma apreciação individual».

— Apreciação do Tribunal

42 Nos termos do artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 76/207, a aplicação do princípio da


igualdade de tratamento implica a inexistência de discriminações em razão do sexo
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nas condições de acesso aos empregos ou postos de trabalho. E dado assente que o
§ 2, n.° 1, do Decreto de 2001 trata os homens e as mulheres diferentemente no que
respeita ao emprego na indústria mineira. Atendendo a que o Governo austríaco
invoca a derrogação prevista no artigo 2°, n.° 3, desta directiva, há que examinar se
uma diferença de tratamento dessa natureza está abrangida pela referida disposição
e é, portanto, autorizada.

43 Como o Tribunal observou no acórdão de 30 de Junho de 1998, Brown (C-394/96,


Colect., p. I-4185, n.° 17), o artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207, ao reservar aos
Estados-Membros o direito de manterem ou de adoptarem disposições destinadas a
proteger a mulher no que respeita «à gravidez e à maternidade», reconhece a
legitimidade, à luz do princípio da igualdade de tratamento entre os sexos, por um
lado, da protecção da condição biológica da mulher durante a sua gravidez e na
sequência desta e, por outro, da protecção das relações especiais entre a mulher e o
seu filho durante o período a seguir ao parto.

44 Foi precisamente devido ao facto de certas actividades poderem apresentar um risco


específico de exposição da trabalhadora grávida, puerpera ou lactante a agentes,
processos ou condições de trabalho perigosos, que põem em perigo a segurança ou a
saúde, que o legislador comunitário instituiu, ao adoptar a Directiva 92/85, um
dispositivo de avaliação e de comunicação de riscos, bem como a proibição de se
exercerem certas actividades.

45 Contudo, o artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207 não permite excluir as mulheres de
um emprego pelo simples motivo de deverem ser mais protegidas do que os homens
contra riscos que afectam os homens e as mulheres da mesma forma e que são
distintos das necessidades de protecção específicas da mulher, como as necessidades
expressamente mencionadas (v., neste sentido, acórdãos de 15 de Maio de 1986,
Johnston, 222/84·, Colect., p. 1651, n.° 44, e de 11 de Janeiro de 2000, Kreil,
C-285/98, Colect., p. I-69, n.° 30).
I- 977
ACÓRDÃO DE 1. 2. 2005 — PROCESSO C-203/03

46 Também não é permitido excluir as mulheres de u m emprego pelo simples motivo


de serem, em média, mais baixas e menos fortes do que a maioria dos homens, desde
que sejam admitidos para esse emprego homens c o m características físicas
semelhantes.

47 N o caso vertente, embora seja verdade que o Decreto de 2001 não proíbe o emprego
de mulheres na indústria mineira subterrânea, sem ter previsto excepções a essa
proibição, não é menos verdade que o âmbito de aplicação da proibição geral que
figura n o § 2, n.° 1, do referido decreto é muito lato, na medida e m que também
exclui as mulheres de trabalhos que n ã o são fisicamente exigentes e que,
consequentemente, não apresentam u m risco específico para a preservação das
capacidades biológicas da mulher de engravidar e de dar à luz, ou para a segurança
ou a saúde da mulher grávida, puèrpera ou lactante, o u ainda para o feto.

48 A excepção prevista no § 2, n.° 2, ponto 1, desse decreto apenas visa, efectivamente,


os lugares de direcção e as tarefas técnicas assumidas por pessoas que ocupem u m
lugar «com responsabilidades» e se encontrem, portanto, n u m escalão superior da
hierarquia. A excepção prevista n o ponto 2 do referido número apenas diz respeito
aos trabalhadores femininos que exerçam uma actividade nos serviços sociais ou de
saúde, e os pontos 3 e 4 do mesmo número tratam unicamente de situações
específicas limitadas no tempo.

49 Uma regulamentação desta natureza vai além do que é necessário para garantir a
protecção da mulher na acepção do artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207.
I-978
COMISSÃO / AUSTRIA

50 Daqui decorre que, mesmo interpretada em conjugação com o § 2, n.° 2, do Decreto


de 2001, a proibição geral de empregar mulheres no sector da indústria mineira
subterrânea, estabelecida no § 2, n.° 1, do mesmo decreto, não constitui uma
diferença de tratamento admitida ao abrigo do artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207.

Quanto ao artigo 307.° CE e à Convenção n.° 45 da OIT

— Argumentação das partes

51 O Governo austríaco sustenta que, independentemente das razões de ordem médica


invocadas, as restrições ao emprego de mulheres na indústria mineira subterrânea,
nos limites previstos pela nova regulamentação, se justificam igualmente pelo facto
de a República da Áustria estar vinculada pela Convenção n.° 45 da OIT, por ela
ratificada em 1937.

52 À luz dos acórdãos de 2 de Agosto de 1993, Levy (C-158/91, Colect, p. I-4287,


n.os 17 e segs.), e de 3 de Fevereiro de 1994, Minne (C-13/93, Colect., p. 1-371,
n.° 19), os Estados-Membros podem legitimamente invocar os direitos decorrentes
desses tratados. Daqui resulta que, uma vez que se encontrava obrigado a transpor
para o direito nacional a proibição de emprego inscrita na Convenção n.° 45 da OIT,
o Governo austríaco não tinha de aplicar a esse respeito os artigos 2." e 3.° da
Directiva 76/207.

53 A Comissão alega que a conclusão retirada pelo Governo austríaco dos acórdãos
Levy e Minne, já referidos, é demasiado abrangente.
I-979
ACÓRDÃO DE 1. 2. 2005 — PROCESSO C-203/03

54 Segundo a Comissão, a interpretação do artigo 307.° CE, dada pelo Tribunal de


Justiça no seu acórdão de 4 de Julho de 2000, Comissão/Portugal (C-84/98, Colect,
p. 1-5215, n. os 51 e 53), pode ser directamente aplicada ao caso vertente.
Efectivamente, a Convenção n.° 45 da OIT contém uma cláusula de denúncia no
seu artigo 7.° É incontestável que a República da Áustria podia denunciar esta
convenção a partir de 30 de Maio de 1997, isto é, numa data posterior àquela em que
a directiva se tinha tornado obrigatória para ela em razão da ratificação do Acordo
sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de Maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3). A
República da Áustria estava obrigada a proceder a essa denúncia por força do
artigo 3.°, n.° 2, da Directiva 76/207.

55 O Governo austríaco contrapõe que não podia saber que o direito aplicável neste
domínio na Áustria era contrário ao direito comunitário, nem que a Comissão
considerava as disposições em causa contrárias ao direito comunitário. A primeira
carta da Comissão acerca desta questão data de 29 de Setembro de 1998. Daqui
resulta que, na melhor das hipóteses, só é possível denunciar a Convenção n.° 45 da
OIT em 30 de Maio de 2007.

56 O acórdão Comissão/Portugal, já referido, não impõe aos Estados-Membros


nenhuma obrigação geral de denunciar acordos internacionais quando estes sejam
contrários ao direito comunitário. Na opinião do Governo austríaco, essa
interpretação resulta igualmente do acórdão de 5 de Novembro de 2002,
Comissão/Áustria (C-475/98, Colect., p. 1-9797, n.° 49), onde o Tribunal de Justiça
declarou, a respeito de acordos ditos «de céu aberto», que, em caso de modificações
de um acordo desta natureza celebrado antes da adesão, os Estados-Membros estão
impedidos não só de assumir novos compromissos internacionais mas também de os
manter em vigor se estes violarem o direito comunitário. Se existisse uma obrigação
geral de denunciar os acordos contrários ao direito comunitário, não teria sido
necessário demonstrar que o acordo estava confirmado na íntegra, aquando da
modificação de algumas das suas partes.

I-980
COMISSÃO / ÁUSTRIA

— Apreciação do Tribunal

57 Decorre do artigo 307.°, primeiro parágrafo, CE que as disposições do Tratado CE


não prejudicam as obrigações decorrentes de convenções concluídas, em relação aos
que aderem à Comunidade, anteriormente à data da respectiva adesão, entre um ou
mais Estados-Membros, por um lado, e um ou mais Estados terceiros, por outro.

58 A República da Áustria, que aderiu à Comunidade Europeia com efeitos a contar de


1 de Janeiro de 1995, ratificou a Convenção n.° 45 da OIT antes dessa data. Esta
convenção contém, no seu artigo 2.°, uma proibição geral de emprego de mulheres
em trabalhos subterrâneos nas minas e permite, no seu artigo 3.°, algumas excepções
do mesmo tipo que as previstas no Decreto de 2001. É dado assente que o referido
decreto executa as obrigações decorrentes dessa convenção, sem ir além das
restrições ao emprego de mulheres aí previstas.

59 Nestas condições, embora a República da Áustria possa, em princípio, invocar o


artigo 307.°, primeiro parágrafo, CE, para manter em vigor as disposições nacionais
que executam as obrigações acima referidas, não é menos verdade que o segundo
parágrafo do mesmo artigo precisa que, na medida em que as convenções anteriores
na acepção do primeiro parágrafo do mesmo artigo não sejam compatíveis com o
Tratado, o Estado ou os Estados-Membros em causa recorrerão a todos os meios
adequados para eliminar as incompatibilidades verificadas.

60 Ora, perante a conclusão a que o Tribunal de Justiça chegou no n.° 50 do presente


acórdão, as obrigações que decorrem da Convenção n.° 45 da OIT para a República
da Áustria são incompatíveis com os artigos 2.° e 3.° da Directiva 76/207.
I-981
ACÖRDAO DE 1. 2. 2005 — PROCESSO C-203/03

61 Como resulta do n.° 50 do acórdão de 4 de Julho de 2000, Comissão/Portugal


(C-62/98, Colect, p. I-5171), entre os meios apropriados para eliminar uma
incompatibilidade dessa natureza, mencionados no artigo 307.°, segundo parágrafo,
CE, figura, nomeadamente, a denúncia da convenção em causa.

62 Todavia, importa sublinhar que, posteriormente à sua adesão à Comunidade


Europeia, a única ocasião em que a República da Áustria podia ter denunciado a
Convenção n.° 45 da OIT, nos termos das regras enunciadas no artigo 7.°, n.° 2, desta
convenção, surgiu durante o ano a contar de 30 de Maio de 1997. Ora, nesta época, a
incompatibilidade entre a proibição prevista pela referida convenção e as disposições
da Directiva 76/207 não estava provada de forma suficientemente clara para que este
Estado-Membro fosse obrigado a denunciar a mesma convenção.

63 Importa acrescentar que, como resulta do artigo 7.°, n.° 2, da Convenção n.° 45 da
OIT, a próxima ocasião em que a República da Áustria pode denunciar essa
convenção surgirá n o termo de u m novo período de dez anos, a contar de 30 de
Maio de 1997.

64 Daí que, ao manter em vigor disposições nacionais como as que figuram no Decreto
de 2001, a República da Áustria não violou as obrigações que lhe incumbem por
força do direito comunitário.

65 Decorre das considerações precedentes que a acção deve ser julgada improcedente
na medida em que respeita à proibição de empregar mulheres no sector da indústria
mineira subterrânea.
I-982
COMISSĀO / ÁUSTRIA

A proibição de empregar mulheres em trabalhos em atmosferas com sobrepressão


elevada e em trabalhos de mergulho

Argumentação das partes

66 A Comissão considera que as suas observações acerca da proibição de empregar


mulheres na indústria mineira subterrânea são aplicáveis da mesma forma à
proibição de empregar mulheres em trabalhos a realizar em atmosferas com
sobrepressão elevada e em trabalhos de mergulho. Estabelecer, sem apreciação
individual, uma proibição geral de empregar mulheres não pode ser justificada por
alegadas necessidades especiais de protecção destas últimas.

67 Na opinião do Governo austríaco, as restrições ao emprego que constam dos §§ 8 e


31 do Decreto de 1973 justificam-se igualmente por motivos de ordem médica e
especificamente atinentes às actividades das mulheres.

68 Os trabalhos em atmosferas com sobrepressão elevada e os trabalhos de mergulho


representam, na maioria dos casos, uma pesada carga no plano físico, por exemplo,
no quadro da construção de metropolitanos em atmosferas daquele tipo, bem como
quando de trabalhos de drenagem efectuados em pontes e praticados debaixo de
água. A proibição de empregar mulheres em trabalhos muito exigentes no plano
físico, em atmosferas com sobrepressão elevada, e a proibição de as empregar em
trabalhos de mergulho justificam-se em razão de uma capacidade respiratória
inferior à dos homens e de um número menos elevado de eritrocitos na mulher.

I-983
ACÓRDÃO DE 1. 2. 2005 — PROCESSO C-203/03

Apreciação do Tribunal

69 A proibição absoluta de empregar mulheres em trabalhos de mergulho não constitui


uma diferença de tratamento autorizada ao abrigo do artigo 2.°, n.° 3, da Directiva
76/207.

70 O leque de trabalhos de mergulho é vasto e inclui, por exemplo, actividades nos


domínios da biologia, da arqueologia, do turismo e de polícia criminal.

71 A proibição absoluta imposta pelo § 31 do Decreto de 1973 também exclui as


mulheres de trabalhos que não são fisicamente exigentes, indo assim, sem dúvida,
além do que é necessário para garantir a protecção da mulher.

72 No que respeita ao emprego em atmosferas com sobrepressão elevada, o Decreto de


1973 exclui as mulheres dos trabalhos que representem uma exigência elevada para
o seu organismo.

73 Na medida em que invoca, relativamente às mulheres, uma capacidade respiratória


inferior e um número menos elevado de eritrocitos para justificar essa exclusão, o
Governo austríaco baseia-se num argumento que parte dos valores médios apurados
no que respeita às mulheres para os comparar com os dos homens. Ora, como o
I - 984
COMISSÃO / AUSTRIA

próprio Governo austríaco admitiu na fase pré-contenciosa, a propósito dessas


variáveis, as zonas de sobreposição dos valores femininos individuais e dos valores
masculinos individuais são importantes.

74 Nestas condições, uma regulamentação que exclui que se proceda a uma apreciação
individual e proíbe às mulheres o emprego em causa, quando o mesmo não é
proibido aos homens cuja capacidade vital e número de eritrócitos é igual ou inferior
aos valores médios dessas variáveis nas mulheres, não está autorizada ao abrigo do
artigo 2.°, n.° 3, da Directiva 76/207 e constitui uma discriminação em razão do sexo.

75 Face às considerações precedentes, deve declarar-se que a República da Áustria, ao


manter, nos §§ 8 e 31 do Decreto de 1973, uma proibição geral de empregar
mulheres em atmosferas com sobrepressão elevada e em trabalhos de mergulho,
com um número limitado de excepções neste primeiro caso, não cumpriu as
obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.° e 3.° da Directiva 76/207.

Quanto às despesas

76 Nos termos do artigo 69.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se


as partes obtiverem vencimento parcial quanto a um ou mais fundamentos, o
Tribunal de Justiça pode repartir as despesas ou decidir que cada uma das partes
suporte as suas próprias despesas. No caso vertente, tendo a Comissão vencido
apenas parcialmente, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas.
I- 985
ACÓRDÃO DE 1. 2. 2005 - PROCESSO C-203/03

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1) A República da Áustria, o manter, nos §§ 8 e 31 do Druckluft- und


Taucherarbeiten-Verordnung (decreto relativo aos trabalhos em atmosfe-
ras com sobrepressão elevada e aos trabalhos de mergulho), de 25 de Julho
de 1973, uma proibição geral de empregar mulheres em atmosferas com
sobrepressão elevada e em trabalhos de mergulho, com um número
limitado de excepções neste primeiro caso, não cumpriu as obrigações que
lhe incumbem por força dos artigos 2.° e 3.° da Directiva 76/207/CEE do
Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio
da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao
acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de
trabalho.

2) A acção é improcedente quanto ao resto.

3) Cada parte suporta as suas próprias despesas.

Assinaturas.

I-986

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