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Redação

Interdisciplinaridade: repertório e argumentação

Atividade 1

VIVER EM SOCIEDADE

Bucci, Duíque e Henrique

Resumo da atividade

No cancioneiro popular, na Literatura, na Filosofia e em tantos outros espaços de reflexão, os conflitos


da vida em sociedade são tema frequente. Entre os diversos aspectos desse assunto que podem ser abor-
dados, optamos por colocar o foco desta atividade em um elemento central da questão: o próprio homem.
Seria ele o “animal cívico” de Aristóteles? O “lobo do homem” de Hobbes? O “bom selvagem” de
Rousseau? Sem buscar a “resposta correta”, mas sim entendendo que todas as opções são, na verdade,
modelos teóricos para analisar a vida em comunidade é que chegamos ao ponto fundamental destas aulas:
a citação de autoridade não deve funcionar como mero adereço em textos dissertativos.
Para causarem impacto positivo, as referências a pensadores devem deixar claro que suas formulações
realmente serviram de base para a reflexão sobre o tema. Do contrário, soam pedantes ou mesmo artificiais.
Nos exercícios a seguir, trataremos não apenas de diferentes concepções a respeito de como se deve
organizar a vida em sociedade, mas analisaremos também situações concretas do Brasil contemporâneo, o
qual o pensamento filosófico pode ajudar a interpretar com maior profundidade.

Parte 1

DESENVOLVIMENTO DE REPERTÓRIO
1. Leia o seguinte excerto da obra “Política”, do filósofo grego Aristóteles (385 a.C. – 322 a.C.):
(...) o homem é um animal cívico, mais social do que as abelhas e os outros animais que vi-
vem juntos. A natureza, que nada faz em vão, concedeu apenas a ele o dom da palavra, que não
devemos confundir com os sons da voz. Estes são apenas a expressão de sensações agradáveis
ou desagradáveis, de que os outros animais são, como nós, capazes. A natureza deu-lhes um ór-
gão limitado a este único efeito; nós, porém, temos a mais, senão o conhecimento desenvolvido,
pelo menos o sentimento obscuro do bem e do mal, do útil e do nocivo, do justo e do injusto,
objetos para a manifestação dos quais nos foi principalmente dado o órgão da fala. Este comér-
cio da palavra é o laço de toda sociedade doméstica e civil.
ARISTÓTELES, Política.

VIVER EM SOCIEDADE 1
Com base na leitura do fragmento,
a) aponte o que diferencia “o dom da palavra” dos “sons da voz”;

b) explique, tendo em vista o título da obra, a frase final do fragmento.

2. (Unesp / Adaptada)

Millôr Fernandes.

Tendo a charge em mente, reflita sobre a seguinte frase do filósofo Aristóteles (385 a.C. – 322 a.C.), na
qual ele discorre sobre o aprendizado que obteve com a Filosofia:

Aprendi a fazer, sem ser comandado, aquilo


que os outros fazem apenas por medo da lei.

2 VIVER EM SOCIEDADE
Relacionando a charge à frase,
a) explique sucintamente o papel atribuído por Aristóteles à Filosofia, no que diz respeito à vida em
sociedade;

b) comente por que o “medo da lei” é insuficiente para garantir o respeito às regras.

3. Leia o seguinte excerto de Leviatã, do pensador inglês Thomas Hobbes (1588 – 1679):
(...) durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter
a todos em respeito, eles se encontram naquela condição a que se chama guerra; e uma guerra
que é de todos os homens contra todos os homens. Pois a guerra não consiste apenas na bata-
lha, ou no ato de lutar, mas naquele lapso de tempo durante o qual a vontade de travar batalha
é suficientemente conhecida. Portanto a noção de tempo deve ser levada em conta quanto à na-
tureza da guerra, do mesmo modo que quanto à natureza do clima. Porque tal como a natureza
do mau tempo não consiste em dois ou três chuviscos, mas numa tendência para chover que
dura vários dias seguidos, assim também a natureza da guerra não consiste na luta real, mas na
conhecida disposição para tal, durante todo o tempo em que não há garantia do contrário. Todo
o tempo restante é de paz.
HOBBES, T, Leviatã.

Considerando o fragmento analisado,


a) pode-se afirmar que Hobbes acredita no surgimento espontâneo do senso de coletividade entres os
indivíduos? Explique sua resposta.

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b) explique sucintamente qual papel, segundo Hobbes, deve ser assumido pelo Estado.

4. Leia o seguinte excerto do artigo “Olho por olho? Apoio a linchamento pode ser crime”:
(...) Ao usar a seção de “comentários”– seja de portais de notícias ou de redes sociais – para
exaltar a justiça com as próprias mãos, o internauta não sabe que, muitas vezes, pode estar co-
metendo um crime.
O Código Penal afirma, em seus artigos 286 e 287, que incitação e apologia ao crime também
são atos criminosos e devem ser punidos com prisão (de três a seis meses) ou multa (...).
Disponível em http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/fazer-comentario-de-apoio-a-linchamento-pode-ser-crime-en-
tenda,4a31f550282bddbcd844c800a633d1f2g9k4RCRD.html. Acesso 25 de julho de 2015.

Considerando as ideias de Thomas Hobbes, analise a atuação do Estado nos episódios de que trata o
fragmento.

5. O exercício que segue é baseado no fragmento do Discurso sobre a origem da desigualdade, do filósofo
Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778). Leia-o para responder ao que se pede:
Parece, à primeira vista, que os homens nesse estado [de natureza], não tendo entre si ne-
nhuma espécie de relação moral nem de deveres conhecidos, não podiam ser bons nem maus,
nem tinham vícios nem virtudes (...).
Não vamos, principalmente, concluir com Hobbes que, por não ter nenhuma ideia de bon-
dade, o homem seja naturalmente mau; que seja vicioso, porque não conhece a virtude; que
recuse sempre aos seus semelhantes serviços que não acredita serem do seu dever; ou que,
em virtude do direito que se atribui com razão às coisas de que tem necessidade, imagine lou-
camente ser o único proprietário de todo o universo. (...) Não creio ter contradição alguma
que temer concedendo ao homem a única virtude natural que o detrator mais extremado das
virtudes humanas é forçado a reconhecer. Refiro-me à piedade, disposição conveniente a seres

4 VIVER EM SOCIEDADE
tão fracos e sujeitos a tantos males como nós; virtude tanto mais universal quanto mais útil ao
homem que precede nele ao uso de toda reflexão, e tão natural que os próprios animais dão, às
vezes, sinais sensíveis dela (...).
ROUSSEAU, J, Discurso sobre a origem da desigualdade.

a) transcreva do texto a passagem em que Rousseau sintetiza a visão de Hobbes sobre a natureza dos
seres humanos;

b) aponte os motivos apresentados por Rousseau para discordar de Hobbes.

6. Analise a seguinte frase do sociólogo brasileiro Herbert de Souza, conhecido popularmente como Beti-
nho (1935-1997), recorrentemente utilizada por opositores à redução da maioridade penal:
Se não vejo, na criança, uma criança, é porque alguém a violentou antes; e o que vejo é o que
sobrou de tudo o que lhe foi tirado.
Considerando as ideias de Hobbes e de Rousseau,
a) indique à qual desses pensadores a frase de Betinho mais se aproxima;

b) justifique sua resposta.

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7. ( ENEM)
TEXTO l
Olhamos o homem alheio às atividades públicas não como alguém que cuida apenas de
seus próprios interesses, mas como um inútil; nós, cidadãos atenienses, decidimos as questões
públicas por nós mesmos na crença de que não é o debate que é empecilho à ação, e sim o fato
de não se estar esclarecido pelo debate antes de chegar a hora da ação.
TUCÍDIDES. História da Guerra do Peloponeso. Brasília: UnB, 1987 (adaptado).

TEXTO II
Um cidadão integral pode ser definido por nada mais nada menos que pelo direito de ad-
ministrar justiça e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são limitadas quanto ao
tempo de exercício, de tal modo que não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela
mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de certos intervalos de tempo prefixados.
ARISTÓTELES. Política. Brasília: UnB, 1985.

Comparando os textos l e II, tanto para Tucídides (no século V a.C.) quanto para Aristóteles (no século
IV a.C.), a cidadania era definida pelo(a)
a) prestígio social.
b) acúmulo de riqueza.
c) participação política.
d) local de nascimento.
e) grupo de parentesco.

8. ( Unesp) O fim último causa final e desígnio dos homens (...), ao introduzir aquela restrição so-
bre si mesmos sob a qual os vemos viver nos Estados, é o cuidado com sua própria conservação
e com uma vida mais satisfeita. Quer dizer, o desejo de sair daquela mísera condição de guerra
que é a consequência necessária (...) das paixões naturais dos homens, quando não há um po-
der visível capaz de os manter em respeito, forçando-os, por medo do castigo, ao cumprimento
de seus pactos (...).
Thomas Hobbes, Leviatã, 1651. In: Os pensadores, 1983.

De acordo com o texto,


a) os homens são bons por natureza, mas a sociedade instiga a disputa e a competição entre eles.
b) as sociedades dependem de pactos internos de funcionamento que diferenciem os homens bons
dos maus.
c) os castigos permitem que as pessoas aprendam valores religiosos, necessários para sua convivência.
d) as guerras são consequências dos interesses dos Estados, preocupados em expandir seus domínios
territoriais.
e) os Estados controlam os homens, permitindo sua sobrevivência e o convívio social entre eles.

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Parte 2

PRODUÇÃO TEXTUAL

Os exercícios exploraram basicamente três concepções sobre a associação dos seres humanos em so-
ciedades: a de Aristóteles, a de Hobbes e a de Rousseau. É fundamental ter em mente, porém, que a mera
remissão a eles não é suficiente para desenvolver um bom texto argumentativo.
O desafio agora é, valendo-se de noções filosóficas já consagradas, criar um texto com sua marca au-
toral. Isso começa já na adesão a um dos conjuntos de ideias: qual deles parece mais convincente a você?
Suas ideias podem se somar? De que maneira?
Tendo em mente toda essa bagagem acumulada nos exercícios de repertório, vamos agora à redação.

Proposta de redação

A partir da leitura dos textos motivadores seguintes e com base nos conhecimentos construídos ao
longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo na modalidade escrita formal da língua
portuguesa sobre o tema “Viver em sociedade: anseios e desafios”. Selecione, organize e relacione, de
forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.

Ódio revisitado

Eram apenas nove os jovens negros selecionados pela direção do principal colégio da cidade,
o Central High School, para cumprir a ordem judicial de integração racial no país. Segundo David
Margolick, autor do recém-publicado Elizabeth and Hazel: Two Women of Little Rock (ainda inédito
no Brasil), a peneira foi cautelosa. A busca se concentrou em colegiais que moravam perto da esco-
la, tinham rendimento acadêmico ótimo, eram fortes o bastante para sobreviver à provação, dóceis
o bastante para não chamar a atenção e estoicos o suficiente para não revidar a agressões. Como
conjunto, também deveria ser esquálido, para minimizar a objeção dos 2 mil estudantes brancos
que os afrontariam.
HARAZIM, Dorrit, Revista Piauí, ed. 62, nov/2011.

Crimes de ódio em redes sociais disparam no período eleitoral

As discussões em redes sociais sobre as eleições fizeram aumentar em 84% o número de de-
núncias de crimes de ódio cometidos na web. As páginas incluem conteúdo relacionado a racismo,
homofobia, xenofobia, neonazismo e intolerância religiosa.
Segundo o levantamento, obtido pela Folha, 8.429 denúncias envolvendo crimes de ódio no
Facebook e no Twitter foram feitas entre 1º de julho e 6 de outubro deste ano; 3.018 páginas hospe-
davam os conteúdos. No mesmo período de 2013 –sem eleições–, foram 4.583 denúncias para 1.719
páginas.
ROMANI, Bruno. Folha de S. Paulo, 10/10/2014. Adaptado

VIVER EM SOCIEDADE 7
O Globo: O que significa o ódio à democracia que dá título ao livro?
Jacques Rancière: Quis analisar e criticar uma tendência muito forte na França, cuja particulari-
dade é tomar a democracia não como forma de Estado, mas como forma de vida em sociedade. Este
ódio denuncia uma pretensa invasão da igualdade e do igualitarismo em todos os domínios da vida
e a relação com uma figura central: o indivíduo da sociedade de consumo de massa, que o ódio à
democracia acusa de ser destruidor de todos os laços sociais tradicionais. O que esse ódio expressa
é o ódio à igualdade, e está acompanhado do recuo efetivo da democracia e da igualdade nesses
Estados. A democracia, no estrito senso desse termo, é o poder do povo, o poder de qualquer um,
dos que não estão destinados ao exercício do poder por nascimento, riqueza, conhecimento cientí-
fico ou qualquer qualidade especial.
“Em novo livro, filósofo Jacques Rancière analisa contradições do sistema representativo”. 06/09/2014
Disponível em http://glo.bo/1pjPraV. Acesso 21 de julho de 2015. 

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Redação
Interdisciplinaridade: repertório e argumentação

Atividade 2

MOBILIDADE URBANA

Bucci, Henrique e Pablo

Resumo da atividade

“(...) é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz (...)”


Constituição da República Federativa do Brasil, art. 5º, XV.

O chamado “direito de ir e vir” está certamente entre as garantias constitucionais mais conhecidas
pelos cidadãos do Brasil. Apesar disso, o exercício desse direito não tem sido tarefa das mais simples nas
cidades brasileiras.
Nesta atividade, abordamos os desafios da mobilidade urbana em nosso país, tendo em vista dois as-
pectos fundamentais: problemas de mobilidade no espaço urbano nacional e propostas para intervir sobre
a questão.
No que diz respeito aos problemas, destacamos:

• a velocidade da urbanização brasileira;

• a industrialização brasileira e a opção pelo rodoviarismo;

• a falta de planejamentos das cidades;

• a ineficiência das políticas para o transporte coletivo.

Para amenizar tais problemas, algumas medidas que já começam a ser implementadas, principalmente
em cidades europeias. Cada uma a seu modo, todas visam a combater um “inimigo” comum: o uso exces-
sivo do automóvel como meio de locomoção cotidiano. Pensando em propostas de intervenção para ajudar
a resolver esse problema, podemos citar:

• o investimento em redes de transporte coletivo;

• a ampliação da rede de ciclovias;

• a criação de zonas exclusivas para pedestres.

Nos textos a seguir, que servem de base aos exercícios, aprofundamos este debate. Vamos a ele.

MOBILIDADE URBANA 9
Parte 1

DESENVOLVIMENTO DE REPERTÓRIO

1. O fragmento seguinte aborda a velocidade do processo de urbanização brasileira. Leia-o para responder
ao que se pede:
A grande novidade, no caso brasileiro, semelhante a alguns outros países em desenvolvi-
mento, foi a velocidade do processo de urbanização, muito superior à dos países capitalistas
mais avançados. Somente na segunda metade do século 20, a população urbana passou de 19
milhões para 138 milhões, multiplicando-se 7,3 vezes, com uma taxa média anual de crescimen-
to de 4,1%. Ou seja, a cada ano, em média, nessa última metade de século, 2.378.291 habitantes
eram acrescidos à população urbana.
BRITO, F.; SOUZA, J. Expansão urbana nas grandes metrópoles:
o significado das migrações intrametropolitanas e da
mobilidade pendular na reprodução da pobreza. Revista Perspectiva,
Fundação Seade, jan. 2006.

Dada a rapidez com que se deu o processo de urbanização nacional – comparado com o de países tidos
como “mais avançados” –, pode-se afirmar que o Brasil:
a) teve de optar por redes ferroviárias mais extensas e modernas que as europeias.
b) neutralizou os problemas do êxodo rural com políticas públicas emergenciais.
c) tornou-se dependente do automóvel pela ausência de outros meios para locomoção.
d) passou a enfrentar problemas decorrentes da falta de planejamento das cidades.
e) foi capaz de superar sua histórica defasagem tecnológica de modo rápido e eficiente.

2. Leia o texto seguinte para responder à questão:


A intensa transformação na mobilidade das pessoas nas cidades brasileiras começou a
ocorrer na década de 1950 do século passado, quando o processo intenso de urbanização
se associou ao aumento do uso de veículos motorizados, tanto os automóveis quanto os
ônibus, resultado de uma política de Estado que priorizou o investimento na indústria au-
tomobilística.
Mobilidade Urbana no Brasil - Infraestrutura Social e Urbana no Brasil
subsídios para uma agenda de pesquisa e formulação de políticas públicas.
IPEA. 2011. Adaptado.

A participação do veículo individual nos deslocamentos urbanos é resultado também do empenho


da indústria automobilística. Analisando o excerto reproduzido acima, pode-se inferir que esse grupo
atuou
a) construindo vias de rolamento.
b) aumentando o conforto dos automóveis.
c) pesquisando fontes alternativas de energia.
d) influenciando decisões governamentais.
e) tornando o automóvel um objeto de desejo.

10 MOBILIDADE URBANA
3. Analise a ilustração seguinte:

Disponível em: http://bit.ly/1SgDr7N

A frase presente na imagem (“O melhor amigo do homem”) remete a um discurso de elogio ao auto-
móvel. Tendo isso em mente,
a) aponte duas razões pelas quais, segundo a visão de mundo implícita na mensagem, o automóvel
deve ser valorizado;

b) comente como a atuação do governo brasileiro durante o período de industrialização do país con-
tribuiu para criação dessa imagem positiva do automóvel.

MOBILIDADE URBANA 11
Para responder às duas questões seguintes, leia os fragmentos da canção “Saudosa Maloca” (1955), de
Adoniran Barbosa, e do rap “Homem na estrada” (1993), de Mano Brown:

TEXTO 1
Se o sinhô não tá lembrado,
Dá licença de contá
Que aqui onde agora está
Esse adifício arto
Era uma casa véia,
Um palacete assobradado.
Foi aqui, “seu” moço,
Que eu, “Mato Grosso” e o Joca
Construímos nossa maloca
Mais, um dia,
— Nóis nem pode se alembrá —,
Veio os homens c’as ferramentas
O dono mandô derrubá.
Adoniran Barbosa, “Saudosa Maloca”.

TEXTO 2
Equilibrado num barranco, um cômodo mal-acabado e sujo
Porém, seu único lar, seu bem e seu refúgio
Um cheiro horrível de esgoto no quintal
Por cima ou por baixo, se chover será fatal
Um pedaço do inferno, aqui é onde eu estou
Até o IBGE passou aqui e nunca mais voltou
Numerou os barracos, fez uma pá de perguntas
Logo depois esqueceram, filha da *!
Mano Brown, “Homem na estrada”.

4. Na primeira estrofe de Saudosa Maloca, faz-se referência a três utilizações distintas de uma mesma área
urbana. Considerando isso,
a) transcreva a sequência de versos em que se mencionam esses três usos;

12 MOBILIDADE URBANA
b) explique sucintamente as diferentes utilizações.

5. Os fragmentos de ambas as músicas abordam, cada um em sua época, problemas relacionados à mora-
dia em um grande centro urbano. Comparando as duas realidades, porém, o enunciador de Homem na
estrada teria problemas de mobilidade inexistentes aos personagens de Saudosa Maloca. Esclareça com
isso ocorre.

6. Para responder ao que se pede, analise o seguinte fragmento da letra de “Rodo cotidiano”, gravada pelo
conjunto O Rappa:
Não se anda por onde gosta
mas por aqui não tem jeito todo mundo se encosta
ela some ela no ralo de gente
ela é linda
mas não tem nome
é comum e é normal

MOBILIDADE URBANA 13
Sou mais um no Brasil da Central*
Da minhoca de metal
que corta as ruas
da minhoca de metal
como um Concorde apressado
cheio de força
voa, voa pesado que o ar
e o avião, o avião, avião
do trabalhador
Marcelo Falcão e Marcelo Lobato

* “Central do Brasil” é o nome da famosa estação de trem localizada no centro do Rio de Janeiro, eternizada pelo filme homônimo.

Na primeira estrofe do fragmento, destaca-se este problema recorrente no transporte coletivo dos gran-
des centros urbanos:
a) o alto custo das tarifas cobradas.
b) a lentidão no deslocamento.
c) a extensão dos trajetos urbanos.
d) a lotação dos meios de transporte.
e) o desconforto dos veículos.

7. Leia o seguinte excerto:


Depois de mais de um século convivendo com carros, algumas cidades aos poucos compre-
endem que o automóvel não faz muito sentido no contexto urbano. Não apenas pela poluição
ou pelas mortes no trânsito: em uma cidade, carros não são sequer uma maneira conveniente
de locomoção.
O trânsito de Londres, hoje, flui mais vagarosamente do que se move um ciclista amador (ou
do que uma carroça). As pessoas em Los Angeles perdem 90 horas por ano presas no tráfego.
Um estudo realizado na Grã-Bretanha mostra que motoristas gastam 106 dias de suas vidas
procurando por vagas.
PETERS, Adele. “7 cidades adeptas da batalha contra o carro”.
Trad.: ANJOS, Anna Beatriz. Revista Fórum.
Disponível em: http://bit.ly/1M7CkBW

No fragmento, a afirmação de que “o automóvel não faz muito sentido no contexto urbano” se ampara
em alguns problemas a que o próprio trecho alude. Entre eles, NÃO podemos citar apenas:
a) degradação do meio ambiente.
b) perda de vidas humanas.
c) diminuição da produtividade.
d) gasto de tempo em deslocamentos.
e) alto preço dos automóveis.

14 MOBILIDADE URBANA
8. Analise a imagem e o fragmento abaixo para responder ao que se pede:

Rua das Flores, Curitiba.


Disponível em: http://bit.ly/1KzDm8r

Madri já baniu grande parte do tráfego de automóveis de certas ruas e, neste mês,
as car-free zone (zonas livres de carros, na tradução para o português) se expandirão ainda
mais. Estendendo-se por mais de uma milha quadrada, tais áreas ainda permitirão que seus
moradores dirijam, mas qualquer outra pessoa que nela adentrar será multada em mais de
100 dólares. Esse é mais um passo no plano de “pedestrizar” completamente o centro da
cidade nos próximos cinco anos. 
PETERS, Adele. “7 cidades adeptas da batalha contra o carro”. Revista Fórum. Trad.: ANJOS, Anna Beatriz.
Disponível em: http://bit.ly/1M7CkBW

a) defina sucintamente o significado do neologismo “pedestrizar”;

b) além da exclusão do automóvel, cite duas outras medidas importantes para efetivamente “pedes-
trizar” o centro de uma cidade.

MOBILIDADE URBANA 15
9. Compare as duas imagens seguintes:

Disponível em: http://bit.ly/1LYnAa7

Disponível em: http://bit.ly/1IqA2bK

Aponte em qual fotografia se observa o uso mais democrático do espaço urbano. Justifique.

16 MOBILIDADE URBANA
Parte 2

PRODUÇÃO TEXTUAL
Os exercícios de repertório exploraram diversos aspectos do tema mobilidade urbana. Após a leitura e
a reflexão sobre eles, certamente seu ponto de partida para a discussão que segue é bastante privilegiado.
Para tirar proveito disso, após ler a proposta de redação como um todo, busque relacionar os pontos
levantados nos textos de apoio aos aspectos abordados nos exercícios de repertório.
O desafio agora é não pecar pelo excesso: de todas as informações disponíveis, sua tarefa é selecionar
as mais pertinentes para a linha de raciocínio a ser desenvolvida em sua redação.

Proposta de redação

Imagine que, como editor-chefe de uma publicação digital sobre o exercício da cidadania nas grandes
cidades, você resolve abordar problemas brasileiros de mobilidade urbana.
Considere que, em meio a sua pesquisa, chamaram sua atenção a matéria “Trânsito: o maior problema
de São Paulo” e a reportagem “Desrespeito às ciclovias continua em São Paulo” (fragmentos reproduzidos
abaixo). Com base nesses textos e em outras informações relevantes do seu repertório cultural, você opta
por escrever um editorial sobre o seguinte tema:

Mobilidade urbana: desafios e perspectivas


O trânsito é um dos maiores problemas da cidade de São Paulo. Para começar, mata (em 2009,
foram 1.382 mortos em acidentes de trânsito na capital contra 1.301 vítimas de assassinato). Em-
porcalha o ambiente. Segundo a Cetesb, os veículos despejam todo ano 1,7 milhão de toneladas
de substâncias nocivas na atmosfera e são a principal fonte de poluição do nosso ar. Torna mais
vulnerável a segurança da população (não faltam ocorrências de arrastões e assaltos nos congestio-
namentos). Rouba dos cidadãos um tempo que jamais será recuperado (os paulistanos perdem, em
média, 2h42 por dia nas imensas filas, segundo pesquisa do Ibope encomendada pelo movimento
Nossa São Paulo em 2010). E, para ficar só em alguns exemplos, afeta a economia. Estudo da Fun-
dação Getúlio Vargas (FGV) estima que só em 2008 as perdas tenham atingido 33,5 bilhões de reais,
o equivalente a 9,4% do produto interno bruto (PIB) da cidade. É a soma dos 27 bilhões de reais que
deixamos de produzir enquanto ficamos parados com outros 6,5 bilhões que resultam do aumento
de gastos com combustível, saúde pública e transporte de cargas.
“Trânsito: o maior problema de São Paulo”. Veja, 01/04/2011.

O desrespeito às novas ciclovias instaladas na cidade de São Paulo ainda é recorrente. Um dia após
o prefeito Fernando Haddad (PT) anunciar que os guardas-civis também multarão irregularidades pra-
ticadas por motoristas e motoqueiros nas vias exclusivas das bicicletas, o Estado flagrou, na sexta-feira,
atitudes não permitidas em alguns trechos. Até uma escada foi colocada no caminho dos ciclistas.
Das vias visitadas pela reportagem, a situação era pior na Rua Barra Funda, entre a região
central e a zona oeste. Por volta das 10h30, quatro veículos foram vistos parados na ciclovia, que
fica rente à calçada, no lado esquerdo da rua. Um deles era um carro de manutenção da rede de
telefonia, estacionado ao lado de um poste no qual técnicos ajustavam a fiação aérea. Para subir até
os fios, os técnicos apoiaram a escada na ciclovia.
Um pouco mais para baixo, um caminhão de bebidas estava estacionado em cima da ciclovia,
bloqueando-a parcialmente, enquanto era descarregado em um posto de combustíveis (...).
Caio do Valle, O Estado de S. Paulo, 23/08/2014.

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Redação
Interdisciplinaridade: repertório e argumentação

Atividade 3

SONHO X REALIDADE

Bucci, Gian e Henrique

Resumo da atividade

“Sejamos realistas, peçamos o impossível”


Che Guevara

Em maio de 1968, na França, em meio aos mais variados ímpetos revolucionários, a frase de Ernesto
Che Guevara embala os sonhos dos jovens estudantes: ser realista deveria ser pedir o impossível.
Mas a década de 1960 ficou para trás e, atualmente, são comuns discussões – no campo político,
econômico, social e até mesmo pessoal – que envolvem temas como a falência das utopias, a implosão das
ilusões ou as descrenças generalizadas.
Diante disso, há os que preferem crer que o mundo perfeito não existe e os que ainda sonham com
a possibilidade de que a sociedade chegue a um estágio de perfeição. Desse modo, é como se utopia e
realidade fossem ideias antagônicas e excludentes.
Mas será que as coisas são assim mesmo? Os exercícios a seguir ajudarão você a refletir sobre essa
questão.

Parte 1

DESENVOLVIMENTO DE REPERTÓRIO
1. ( Uepa) O teólogo humanista Tomas Morus publicou em 1516 aquele que seria um dos mais
importantes livros de todos os tempos. Trata-se de uma descrição conjectural de um não lugar,
numa ilha do Atlântico Sul, com uma baia esplendorosa e ao fundo uma cadeia de montanhas.
Ali viveria um povo diferente: homens e mulheres solidários uns aos outros, sem diferenças
sociais ou econômicas decidindo os assuntos políticos em coletivo. De onde Morus havia tirado
as informações? No prólogo, ele relata que conversara com marinheiros irlandeses que haviam
estado no Brasil e lhe contado detalhes sobre o povo que lá vivia: eram os tupinambás. Foi esse
povo o modelo para a obra que irá influenciar todo um sonho do Ocidente.
(GOMES, Mércio Pereira. “Bom selvagem, mau selvagem”. Revista de História da Biblioteca Nacional.
Ano 8/N° 91/Abril 2013. p.34)

18 SONHO X REALIDADE
Identifique, nas alternativas abaixo, a obra e o período histórico a que o texto se refere.

a) Elogio da Loucura que, junto com Ensaios, iniciava a época do Renascimento, cujas origens locali-
zam-se na Itália, mas que ganha uma grande projeção em Portugal e Espanha, a partir do momento
que esses dois países se projetam nas grandes navegações.
b) Utopia, escrito no período de transição entre o chamado Medievo e os tempos Modernos,
quando muitas mudanças ocorrem não só na percepção do espaço geográfico, como tam-
bém por acontecimentos que apontam para mudanças culturais, pregadas inicialmente pelos
humanistas.
c) Gargântua e Pantagruel que, escrito inicialmente em francês, ganha notoriedade quando ocorre a
Reforma e seu conteúdo passa a se constituir como modelo de sociedade a ser construída por essa
nova doutrina religiosa.
d) Ensaios, que ganhou projeção após seu autor ter sido condenado e morto pela Inquisição num mo-
mento em que a Igreja Católica, sentindo-se ameaçada pela Reforma, passa a combater de forma
drástica ideias que apresentassem modelos que se contrapunham à teologia católica.
e) Utopia, escrita em inglês inicialmente e logo publicada em diversos idiomas devido à projeção que
ganham os livros em função da invenção da imprensa, o que provoca na sociedade europeia da
época o desejo de se aventurar por além-mar em busca desse lugar em que o ser humano era va-
lorizado.

2. (UFG / Adaptada) Leia o texto a seguir.


A ilha de Utopia tem cinquenta e quatro cidades grandes e magníficas, onde todos fa-
lam a mesma língua, têm os mesmos hábitos e vivem sob as mesmas leis e instituições. O
governador conserva o cargo por toda a vida, a menos que se suspeite que o titular deseja
instituir uma tirania. Uma lei proíbe que as questões de interesse público sejam discutidas
durante menos de três dias, sendo crime de morte deliberar sobre assuntos de Estado fora
do Senado ou da Assembleia Popular. Aparentemente, isso é feito para impedir que o go-
vernador e os representantes das famílias conspirem para ignorar os desejos da população
e alterar a Constituição.
MORE, Thomas. Utopia. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2009. p. 82 e seq. (Adaptado).

Este texto integra a obra de Thomas Morus, publicada em 1516, na Inglaterra governada por Henri-
que VIII. Ao narrar a vida cotidiana em um país fictício, chamado Utopia, o autor descreve instituições
políticas que projetam um governo voltado à vida comunitária ideal. Com base no texto apresentado,
explique como essa vida comunitária ideal expressa um elemento de crítica ao governo absolutista.

SONHO X REALIDADE 19
3. Leia com atenção os dois textos a seguir:

Texto 1
Utopia: do Latim utopia, formado com o Grego ou- (do adv. de negação) + Grego tópos (lu-
gar). Em outros termos, utopia é o “não lugar”, o “fora de lugar”.
(Adaptado do Houaiss)


Texto 2
Literalmente, “utópico” significa “o que não está em nenhum lugar”. Dá-se o nome de “uto-
pia” a toda descrição de uma sociedade que se supõe perfeita em todos os sentidos.
(adaptado de Mora, José Ferrater. Dicionário de Filosofia.
São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 694-695.)

Com base nos textos e em seus conhecimentos sobre o termo, discuta qual o sentido que “utopia”ad-
quire na obra de Thomas Morus.

4. Platão – que criou uma filosofia fundada no desvendamento de formas do pensamento – elaborou uma
pólis ideal, governada pelos filósofos:
A menos que as comunidades tenham filósofos como reis – disse eu – ou que as pessoas que
atualmente são chamadas reis e governantes pratiquem a filosofia com bastante integridade –
em outras palavras, a menos que o poder político e a filosofia coincidam, (...) não poderá haver
fim para os problemas políticos, meu caro Glauco, ou mesmo para os problemas humanos em
geral.
(República, V, 473d)

Em compensação, Platão tinha uma visão muito crítica dos poetas:


[A representação poética] rega e cultiva essas coisas [paixões, sentimentos de prazer e dor],
quando deveria deixá-las murchar, e as transforma em nossos governantes, quando deveriam
ser nossos súditos, porque de outro modo não teremos vidas melhores e mais felizes.
(República, X, 606d)

20 SONHO X REALIDADE
Com base nesses fragmentos, analise a visão de política e de sociedade revelada por Platão.

5. (UFPE) O século XIX foi cenário de movimentos políticos que criticaram o capitalismo. Pensadores como
Karl Marx defenderam alternativas políticas diferentes e formularam utopias. Sobre as ideias de Marx,
podemos afirmar que elas:
a) ressaltaram a necessidade política de fazer reformas no capitalismo, contudo, sem grandes radica-
lizações.
b) restringiram-se ao mundo europeu e ao catolicismo da época, marcados pelo conservadorismo.
c) denunciaram, de forma apaixonada, as injustiças sociais e políticas do capitalismo, sem construir
utopias.
d) sofreram influências de algumas ideias do liberalismo, embora construíssem outra concepção de
mundo.
e) fortaleceram a crítica à classe dominante, sem contudo oferecer alternativas políticas para mudar

6. O fragmento a seguir é de autoria de Marx e Engels e trata de uma sociedade ideal:


Assim que a distribuição do trabalho passa a existir, cada homem tem um círculo de ativida-
de determinado e exclusivo que lhe é imposto e do qual não pode sair; será caçador, pescador,
pastor ou um crítico, e terá de continuar a sê-lo se não quiser perder os meios de subsistência
Na sociedade ______________, porém, onde cada indivíduo pode aperfeiçoar-se no campo
que lhe aprouver, não tendo por isso uma esfera de atividade exclusiva, é a sociedade que regu-
la a produção geral e me possibilita fazer hoje uma coisa, amanhã outra, caçar da manhã, pescar
à tarde, pastorear à noite, fazer crítica depois da refeição, e tudo isto a meu bel-prazer, sem por
isso me tornar exclusivamente caçador, pescador ou crítico.
(A ideologia alemã, I, 4, 17)

O espaço em branco deve ser preenchido com a palavra


a) comunista
b) capitalisa
c) liberal
d) conservadora
e) individualista

SONHO X REALIDADE 21
7. Na década de 1960, em meio ao movimento de renovação nas artes e costumes conhecido como Con-
tracultura, foi experimentada uma nova utopia: tendo como principal protagonista a juventude, bus-
cava-se uma ruptura com formas estéticas e normas de comportamento herdadas e reproduzidas im-
pensadamente. Inovações como a pílula anticoncepcional e drogas que promoviam alteração no estado
de consciência, surgiram novas formas de sociabilidade, tendo no horizonte a superação da repressão.
Em 1968, estudantes foram às ruas no mundo inteiro, com as mais diferentes reivindicações. Em Paris,
surgiram slogans utópicos, dentre os quais não podemos citar:
a) “Precisamos fazer necessário o possível”
b) “É proibido proibir”
c) “A imaginação no poder”
d) “O agressor não é aquele que se revolta, mas aquele que reprime” 
e) “Corram camaradas, o velho mundo está atrás de vocês”

22 SONHO X REALIDADE
Parte 2

PRODUÇÃO TEXTUAL

As questões de repertório que propusemos mostraram como alguns pensadores – basicamente Morus,
Platão e Marx – abordaram a questão da utopia, do mundo ideal, da sociedade perfeita.
Se, por um lado, percebemos que grandes filósofos têm visões diferentes sobre o que é essa perfei-
ção, por outro, não podemos deixar de reconhecer que é uma preocupação recorrente refletir sobre essa
questão.
Agora, é o momento de você participar efetivamente dessa reflexão.

Proposta de redação

Leia com atenção a coletânea de textos a seguir:


Na Utopia tudo está de tal modo previsto e organizado, que é raríssimo verem-se obriga-
dos a construir de novo. Reparam-se as deteriorações presentes e preveem-se até as possíveis.
Deste modo conservam-se os edifícios com poucos encargos e trabalho. Os operários estão a
maior parte do tempo em casa, trabalhando a pedra ou a madeira e, quando há uma construção
a fazer, os materiais encontram-se já prontos e a obra rapidamente se conclui.
(Morus, Tomás. A Utopia. Lisboa: Guimarães Editores, 1996.)

O sonho não é o contrário da realidade. Ele é um aspecto real da vida humana, assim como a
ação; e um e outra, bem longe de se excluírem, se completam. (...) Quando, numa noite, todos os
exploradores sonharem que é preciso acabar com o sistema tirânico que os governa, aí então,
talvez, a aurora surgirá em todo o mundo, sobre barricadas.
(Schuster, Jean. Surrealismo e Anarquismo. São Paulo: Imaginário, 1990.)

não era esta a independência que eu sonhava


não era esta a república que eu sonhava
não era este o socialismo que eu sonhava
não era este o apocalipse que eu sonhava
(Paes, José Paulo. “A marcha das utopias”. Um por todos. São Paulo: Brasiliense, 1986.)

Se as coisas são inatingíveis... ora!


Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
(Quintana, Mário. “Espelho Mágico”. Apud Rónai, Paulo. Dicionário Universal de Citações.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.)

Miguilim doidava de não chorar mais e de correr por um socorro. Correu para o oratório e
teve medo dos que ainda estavam rezando. Correu para o pátio chorando no meio dos cachor-
ros. Mãitina caminhava ao redor da casa, resmungando coisas na linguagem, ela também sentia

SONHO X REALIDADE 23
pelo estado do Dito. – “Ele vai morrer, Mãitina?!” Ela pegou na mão dele, levou Miguilim, ele
mesmo queria andar mais depressa, entraram no acrescente, lá onde ela dormia estava escuro,
mas nunca deixava de ter aquele foguinho de cinzas que ela assoprava. – “Faz um feitiço para
ele não morrer, Mãitina! Faz todos os feitiços, depressa, que você sabe...”
(Rosa, João Guimarães. “Campo geral”. Manuelzão e Miguilim. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995.)

Com base em tudo o que foi dito, bem como em informações de seu repertório cultural individual, pro-
duza uma dissertação em prosa, discutindo a seguinte questão:

A UTOPIA É O CONTRÁRIO DA REALIDADE?

24 SONHO X REALIDADE

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