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Conflitos nos Oriente Médio

Alessandra de Fatima Alves


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GEOPOLÍTICA DO ORIENTE MÉDIO
Na qualidade oficial de presidente da OLP e de chefe da Resistência Palestina, proclamo aqui que nós não
queremos derramar uma só gota de sangue árabe ou judeu. Não nos comprazemos na busca de um confronto que
queremos ver terminar desde o aparecimento de uma paz justa... Vim, trazendo numa das mãos o ramo de oliveira
e na outra o fuzil de um combatente da liberdade. Não deixem o ramo de oliveira tombar de minha mão.
ARAFAT, Yasser. In: O problema palestino. Coimbra: Centelha, 1976.

Esta aula de Atualidades abordará o Oriente Médio pela óptica da regionalização geopolítica, isto é, apesar
do Oriente Médio constituir uma unidade, mostraremos um desenrolar geo-histórico pautado em duas linhas para-
lelas: a questão da Palestina e os conflitos no golfo Pérsico, que tem como esteio o petróleo.

As raízes da questão da Palestina


A região hoje conhecida como Oriente Médio esteve por muitos séculos sob domínio do Império Otomano.
Quando esse império, que já se encontrava decadente, perdeu a Primeira Guerra Mundial, Inglaterra e França as-
sumiram o comando de grande parte daquela região e estabeleceram os chamados mandatos – uma nova forma
de dominação pós-colonial. O Oriente Médio então foi repartido entre essas duas potências europeias: à Inglaterra
coube os mandatos da Palestina, Iraque e Transjordânia; a França herdou a Síria e o Líbano.
Concomitantemente aos acontecimentos no Oriente Médio, desenvolvia-se na Europa o projeto sionista
– um movimento político-religioso formulado e idealizado no século XIX por Theodore Herzel, com o objetivo de
viabilizar o retorno do povo judeu à Terra Prometida. Inicialmente, a Organização Sionista Mundial (OSM), fundada
por Herzel em 1897, era uma organização política, mas acabou dominada por sua ala religiosa, que acabou assu-
mindo o controle do processo.
Lideranças judaicas tentavam viabilizar a criação de um Estado judeu, de forma a reunir esse povo que, há
séculos, vivia disperso por toda a Europa. Um dos maiores banqueiros da Europa, lorde Rotshild, de origem judaica,
estreitou os laços dos judeus com dirigentes britânicos e também contribuiu decisivamente na ajuda econômica ao
movimento sionista. Rotshild e outras lideranças da OSM conseguiram influenciar o Império Britânico a ponto de,
em 1917, o ministro das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, Arthur James Balfour, declarar:

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5. Os árabes controlam 99,9% do território no
Caro lorde Rothschild, Oriente Médio. Israel representa apenas um dé-
Tenho o grande prazer de endereçar a V. Sa., cimo de 1% da região.
em nome do governo de Sua Majestade, a seguinte 6. A história demonstrou que a segurança do povo
declaração de simpatia quanto às aspirações sio- judeu apenas pode ser garantida através da
nistas, declaração submetida ao gabinete e por ele existência de um Estado judeu forte e soberano.
aprovada:
Há relatos que dizem que judeus e palestinos
”O governo de Sua Majestade encara fa-
voravelmente o estabelecimento, na Palestina, de viviam harmonicamente. No entanto, as imigrações
um Lar Nacional para o Povo Judeu, e empregará de judeus começaram a aumentar muito nas décadas
todos os seus esforços no sentido de facilitar a real- de 1920 e 1930. A partir daí, não tardaram a explodir
ização desse objetivo, entendendo-se claramente os primeiros conflitos entre habitantes locais e judeus
que nada será feito que possa atentar contra os di- imigrados. Os camponeses palestinos não entendiam
reitos civis e religiosos das coletividades não judai- direito aquela chegada repentina e numerosa de ju-
cas existentes na Palestina, nem contra os direitos deus europeus para a sua terra. Muitos palestinos
e o estatuto político de que gozam os judeus em vendiam suas propriedades aos judeus que chaga-
qualquer outro país.” vam, sem saber o projeto que estava por trás daquela
Desde já, declaro-me extremamente grato a
apropriação gradual.
V. Sa. pela gentileza de encaminhar esta declara-
Os conflitos se intensificaram no início da déca-
ção ao conhecimento da Federação Sionista.
da de 1930, quando os judeus já eram mais de 10% do
Arthur James Balfour total de habitantes da Palestina. O movimento sionista
havia constituído exércitos clandestinos para proteger
Este documento ficou conhecido como Decla- as colônias judaicas.
ração Balfour. Estruturado e contando com o apoio Diante das hostilidades, a Grã-Bretanha tentou
explícito da Grã-Bretanha, o movimento sionista tinha intervir. Para restringir o fluxo migratório de judeus sio-
como passo seguinte organizar a migração de judeus nistas, elaborou, em 1922, um documento intitulado
europeus para a Palestina. Essa migração foi ainda o Livro Branco, mas que não surtiu o efeito desejado.
mais facilitada pelo fato de a Grã-Bretanha ter saído Essa migração de judeus se intensificou ainda
mais na época da ascensão nazista na Alemanha, pois,
grande vencedora da Primeira Guerra Mundial e a Pa-
naquele contexto de perseguições e mortes, as migra-
lestina estar então sob seu mandato.
ções só poderiam aumentar. Recrudesceu a revolta po-
O povo judeu baseia suas reivindicações pela
pular dos árabes, que ficavam cada vez mais inconfor-
Terra de Israel em alguns fatores:
mados com a absorção gradativa de suas terras pelos
1. A Terra de Israel foi prometida por Deus aos judeus, e a Grã-Bretanha se perdia na armadilha que
judeus. Esta é a antiga terra dos patriarcas e armou em prometer uma terra já habitada e que não
profetas bíblicos. lhe pertencia.
2. Desde que os judeus foram exilados pelos ro-
manos, a Terra de Israel nunca foi estabelecida A criação do Estado de Israel
como um Estado.
3. O Estado de Israel foi criado pelas Nações Uni- Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o ce-
das em 1947. É um Estado democrático, moder- nário da bipolaridade é de importância fundamental
no e soberano. para a compreensão do nascimento e da existência de
4. Toda a Terra de Israel foi comprada pelos judeus Israel. Se não fosse o apoio dos Estados Unidos, o país
ou conquistada por Israel em guerras de defesa, dificilmente teria continuado a existir. Israel foi peça
após o país ter sido atacado por seus vizinhos fundamental na geoestratégia estadunidense para o
árabes. Oriente Médio no pós-guerra.

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Partilha da Palestina proposta pela ONU (1947)
A primeira guerra árabe-israelense
O primeiro conflito armado entre árabes e israe-
lenses ocorreu logo após a criação do Estado de Israel,
com a vitória incontestável do novo Estado – pequeno,
mas forte e rico. Israel incorporou vasta área daquele
território destinado inicialmente aos palestinos. Aliás,
o Estado palestino nem chegou a existir: sendo grande
parte incorporada por Israel, a porção oriental foi in-
corporada pela Transjordânia (mais tarde, Jordânia) e a
Faixa de Gaza foi incorporada pelo Egito. Os palestinos
se viram sem Estado e muitos passaram a viver sob
custódia israelense, enquanto que aproximadamente
40% se refugiaram em países vizinhos árabes, como
o Líbano e a Síria.
Foi no exílio que os palestinos deram início à re-
sistência e à luta pelo retorno às suas terras de origem.
Nos corredores universitários do Egito e também na
Faixa de Gaza, surgia a primeira forma de organização
palestina, a Al Fatah, embrião da Organização para Li-
bertação da Palestina (OLP). Em 1964, em Alexandria,
no Egito, nascia oficialmente a OLP, que seria o princi-
pal porta-voz do movimento palestino. O primeiro pre-
sidente da OLP foi o advogado Ahmed Shukeiri, mas a
A ONU despontava como o novo fórum de reso- organização ganharia força efetiva com a eleição, em
luções internacionais, tentando apagar a malfadada Liga 1969, do engenheiro Yasser Arafat. A OLP congregava
das Nações. A Grã-Bretanha solicitou a transferência da as mais diferentes correntes e facções da causa palesti-
questão da Palestina para o órgão recém-criado e pro- na (diplomáticas e armadas), muitas vezes divergentes.
Arafat dirigiu a OLP até sua morte, em 2004, resistindo
gramou sua retirada da região para o dia 1° de agosto
a vários momentos de tensão e guinadas políticas.
de 1948. Em 1947, a ONU encaminhou a partilha da Pa-
O povo palestino baseia suas reivindicações
lestina, criando dois Estados: um Estado judeu, com 14,1 pela Terra de Israel em alguns fatores:
mil km2, correspondendo a 56% da Palestina e compre-
1. Os árabes muçulmanos viveram no local por
endendo uma população de 1.008.800 habitantes, sendo
muitos anos.
uma metade composta por árabes e a outra por judeus; e 2. O povo palestino tem o direito à independência
um Estado árabe, correspondendo a 43% do território da nacional e à soberania sobre a terra onde vive-
Palestina, com 11,5 mil km2 e 814 mil habitantes – 804 ram.
mil árabes e 10 mil judeus (ONU, 1986). Como se vê, os 3. Jerusalém é a terceira cidade sagrada na reli-
dados da ONU indicam a parcialidade na divisão. gião muçulmana, local de elevação do profeta
Os palestinos e os jovens países árabes não aceita- Maomé aos Céus.
4. O Oriente Médio é dominado por árabes. Ou-
ram a partilha, considerando-a uma interferência indevida.
tras religiões ou nacionalidades não perten-
Quando a Grã-Bretanha antecipou sua retirada
cem à região.
da Palestina para o dia 15 de maio de 1948, o líder 5. Todos os territórios árabes que foram coloniza-
judeu David Bem Gurion proclamou a independência dos tornaram-se Estados completamente inde-
de Israel. Os países árabes imediatamente declararam pendentes, exceto a Palestina.
guerra ao novo Estado. 6. Os palestinos tornaram-se refugiados.

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Guerra de Suez (1956) O presidente Nasser, buscando fortalecer o
mundo árabe, tomou medidas importantes: deslocou
Teve como objetivo garantir o acesso dos forças árabes para a fronteira com Israel; exigiu a reti-
ocidentais (principalmente franceses e ingleses) ao rada de representantes militares da ONU mantidos na
comércio oriental, antes realizado pelo contorno do região desde 1956; e ameaçou fechar a navegabilida-
sul da África. O controle das operações realizadas no de do Estreito de Tiran aos israelenses.
canal ficou sob o domínio inglês e continuou mesmo No entanto, a reação israelense a essas medi-
após a independência do Egito. No entanto, em 1952, das foi rápida e decisiva: atacou o Egito, a Jordânia e a
um golpe de Estado, realizado pelo revolucionário Ga- Síria, encerrando o conflito num curto espaço de tempo
mal Abdel Nasser, pôs fim ao regime monárquico do – 5 a 10 de junho (6 dias) de 1967. Israel dominava as
rei Faruk. A liderança de Nasser no governo egípcio forças aéreas e, por terra, contava com forças blinda-
revelou uma política de caráter nacionalista, buscan- das comandadas pelo general israelense Moshé Dayan.
do a modernização do Estado por meio da reforma O resultado da guerra aumentou consideravelmente o
agrária, do desenvolvimento da indústria e de uma Estado de Israel: foram conquistadas áreas do Egito,
melhor distribuição de renda. A luta contra o Estado Faixa de Gaza, península do Sinai, região da Jordânia,
de Israel, entretanto, não deixou de ser alimentada. a Cisjordânia, o setor oriental de Jerusalém, partes per-
tencentes à Síria e às colônias de Golan.
A guerra dos Seis Dias fortaleceu o Estado de
Israel e agravou o nível de tensão entre os países beli-
gerantes. Consolidada a vitória, Israel lançou um novo
expediente: a colonização do territórios ocupados. Ju-
deus de várias partes do mundo seriam convocados a
ocupar terras “disponíveis” na Palestina. As colônias
se multiplicaram, principalmente na Cisjordânia, mas
também em Gaza, Golã e Sinai. A península do Sinai
foi devolvida aos egípcios em 1979, num acordo em
separado entre o primeiro-ministro israelense Mena-
chem Begin e o presidente egípcio Anuwar Sadat.
A ONU condenou a ocupação através da reso-
lução 242, que exigia o estabelecimento das fronteiras
anteriores à guerra. Essa resolução passaria a ser o
Numa atitude de combate ao colonialismo an- guia das reivindicações palestinas dali em diante. No
glo-francês, Abdel Nasser nacionalizou o canal de Suez entanto, Israel não cumpriu a resolução.
e proibiu a navegação de navios israelenses no local.
A medida causou um grande impacto na Inglaterra,
França e Israel que, então, iniciaram uma guerra contra
o Egito. No desenrolar do conflito, os egípcios foram
derrotados, mas os Estados Unidos e a União Soviética
interferiram, obrigando os três países a retirarem-se
dos territórios ocupados. Ao final, o canal de Suez vol-
tava, definitivamente, para o Egito, mas com o direito
de navegação estendido a qualquer país.

Guerra dos Seis Dias (1967)


A guerra dos Seis Dias foi mais um desdobra-
mento dos conflitos entre árabes e judeus. Ela recebeu
esta denominação devido ao efetivo contra-ataque is-
raelense à ofensiva árabe, promovido pelo Egito.

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além de muitas aldeias e campos de refugiados pales-
Nações Unidas, 22 de novembro de 1967 tinos, que foram tornando o clima cada vez mais tenso.
O Conselho de Segurança (...), enfatizando A criança palestina aprendeu a odiar o soldado
a inadmissibilidade da aquisição de território de israelense desde cedo, pois vê nele seu ocupante opres-
guerra e a necessidade de trabalhar por paz justa sor. É essa criança que, ao crescer, somada o ingredien-
e duradoura na qual cada Estado na região possa te de fanatismo religioso, vai engrossar as fileiras dos
viver em segurança (...), afirma a aplicação dos homens-bomba que proliferaram no Oriente Médio nos
seguintes princípios: anos de 1990.
Outro fato é a orientação que as mães palestinas
I. Evacuação das forças armadas israelenses dos
seguem de ter o máximo possível de filhos, com o objeti-
territórios ocupados no recente conflito;
vo de interferir na balança demográfica regional. Nesse
II. Encerramento de todas as reivindicações ou
contexto, em 1987, os palestinos viram surgir um fato
estados de beligerância e respeito pelo reconhe-
novo que lhes traria grandes ganhos políticos: a intifada,
cimento da soberania, integridade territorial e in-
a rebelião das pedras.
dependência política de cada Estado da região e
“Intifada“ quer dizer “levante“, e foi exatamen-
de seu direito a viver em paz dentro de fronteiras
te isto que ocorreu: uma rebelião conduzida por mu-
seguras e reconhecidas (...)
lheres e crianças que viviam sob ocupação em Gaza e
Adaptado do Centro de Informação
das Nações Unidas no Brasil, 1988. na Cisjordânia, cujas armas eram basicamente paus e
pedras. Configurou-se uma situação inusitada, pois os
soldados israelenses, muito bem armados, tiveram que
enfrentar esse exército diferente.
Guerra do Yom Kippur (1973)
A guerra dos Seis Dias e, mais ainda, os anos
subsequentes demonstraram a superioridade militar
dos israelenses diante dos árabes, cuja força se restrin-
gia no campo da ameaça, enquanto Israel agia. Outras
guerras de menor expressão ocorreram, praticamente
todas vencidas por Israel. A guerra do Yom Kippur teve
um desfecho diferente, mas a vitória árabe foi apenas
política, pois, no aspecto militar, Israel demonstrou
mais uma vez sua superioridade.
Foi a quarta guerra árabe-israelense. Síria e Egi-
O movimento foi espontâneo e começou no
to atacaram Israel de surpresa, mas a reação israelense
campo de refugiados de Jebalya, na Faixa de Gaza. Um
mais uma vez forçou os árabes a um imediato cessar-
motorista de um caminhão militar perdeu o controle do
-fogo. No entanto, nessa guerra os árabes se utilizaram
veículo, matando quatro palestinos em Gaza. A revolta
de um novo recurso: interromperam o fornecimento de
logo explodiu e alcançou a Cisjordânia. A OLP se apro-
petróleo aos países alinhados com Israel, provocando
veitou do movimento para tirar proveitos políticos, visto
a crise mundial do petróleo.
que a Intifada logo ganhou a simpatia internacional.

Intifada (1987-1993) Os planos de paz


A década de 1980 foi bastante tensa em Israel e Em mais de 40 anos desde a guerra dos Seis
nos territórios ocupados. Sob domínio estrangeiro desde Dias, em 1967, houve diversos planos e negociações de
1967, os palestinos passaram a conviver com forças isra- paz no Oriente Médio. Alguns foram considerados bem-
elenses, com constantes toques de recolher. A persegui- -sucedidos, como os firmados entre Israel e Egito e entre
ção às principais organizações de resistência aumentou. Israel e Jordânia, mas a disputa central entre israelenses
Houve o fechamento de sindicatos, comitês e escolas, e palestinos ainda não foi resolvida.

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A resolução 242 encarna o princípio que tem São talvez as mais bem-sucedidas conversas do
guiado a maioria dos planos subsequentes: a troca de processo de paz. O acordo durou, apesar de tensões
terra por paz. posteriores entre Israel e Egito e de Sadat ter sido as-
Ela pedia “a saída das forças armadas israelen- sassinado.
ses dos territórios ocupados no conflito daquele ano,
como Jerusalém Oriental, península do Sinai, Cisjordânia
Conferência de Madri (1991)
e colinas de Golã“ e o “respeito pela soberania, integri-
dade territorial e independência política de cada Estado
Resultou em um tratado de paz entre Israel e
na região e seu direito de viver em paz”.
Jordânia em 1994, mas as conversas israelenses com o
Mas a resolução é famosa por sua imprecisão
Líbano e a Síria avançaram pouco desde então, compli-
ao pedir a retirada israelense de “territórios”. Israel ar-
cadas por disputas de fronteira e pela guerra de 2006
gumentou que isso não significava necessariamente a
entre Israel e militantes libaneses do Hezbollah.
retirada de todos os locais ocupados.

Camp David, EUA (1978) Acordo de Oslo (1993)

Houve diversos planos de paz após 1967, mas As negociações de Oslo tentaram contemplar o
nada de significativo aconteceu até depois da guerra de que faltara em todas as conversas prévias, como um
1973, que abriu espaço para uma nova iniciativa pela acordo direto entre israelenses e palestinos, represen-
paz, como mostra a visita a Jerusalém do então presi- tados pela OLP (Organização pela Libertação da Pa-
dente egípcio, Anwar Sadat, em novembro de 1977. lestina). Sua importância é que resultou no reconheci-
O presidente dos EUA na época, Jimmy Carter mento mútuo entre Israel e a OLP.
(1977-1981), capitalizou em cima desse espírito e con-
vidou Sadat e o então premiê israelense, Menachem
Begin, para conversas em Camp David.

Israelenses e palestinos reconheceram-se mutuamente, em 1993.

O acordo estipulava que tropas israelenses dei-


xariam a Cisjordânia e Gaza, que um governo interino
O acordo mediado por Carter foi considerado um dos mais
bem-sucedidos. palestino seria montado para um período de transição
de cinco anos, abrindo caminho para a formação de um
O primeiro acordo expandia a resolução 242,
pedia negociações multilaterais para resolver o “proble- Estado palestino.
ma palestino”, falava em um tratado entre Israel e Egito O grupo Hamas e outros palestinos não acei-
e instava a assinatura de outros tratados entre Israel e taram os termos de Oslo e iniciaram ataques suicidas
seus vizinhos. Mas a fraqueza deste primeiro acordo foi contra Israel, que, por sua vez, enfrentou a oposição de
que os palestinos não participaram das negociações. colonos israelenses e outros setores da sociedade.
O segundo acordo tratava da paz entre Israel e O acordo foi assinado em 1993, na Casa Bran-
Egito, o que ocorreu em 1979, com a saída de Israel da ca, onde, sob a mediação do presidente estadunidense
península do Sinai, ocupada desde 1967. Isso resultou Bill Clinton, Yasser Arafat, líder da OLP, e Yitzhak Rabin,
no primeiro reconhecimento do Estado de Israel por premiê israelense, apertaram as mãos. Mas seus termos
parte de um país árabe. foram apenas parcialmente implementados.

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Camp David (2000) Segundo o plano, as fronteiras voltariam à con-
figuração de 1967, um Estado palestino seria estabe-
O objetivo de Clinton era tratar de temas como lecido em Gaza e Cisjordânia e haveria uma “solução
fronteiras, Jerusalém e refugiados, que haviam sido justa” ao problema dos refugiados. Em troca, os países
deixados de lado em Oslo. Mas não houve acordo árabes reconheceriam Israel.
entre Arafat e o então premiê de Israel, Ehud Barak. Sua força é o apoio árabe à solução de dois
O problema foi que o máximo oferecido por Israel era Estados. Sua fraqueza é que instou as partes a nego-
menos do que o mínimo que os palestinos estavam ciar os mesmos temas em que elas haviam falhado até
prontos para aceitar. então.
Israel ofereceu a Faixa de Gaza, uma grande
parte da Cisjordânia e terras do deserto de Negev, Mapa da Paz (2003)
mas mantendo grandes assentamentos em Jerusalém
Oriental. Os palestinos queriam começar com a rever- O plano proposto pelo “Quarteto” (EUA, Rússia,
são das fronteiras determinadas pela guerra de 1967 e União Europeia e ONU), que negocia a paz no Oriente
pediam o reconhecimento do “direito de retornar” dos Médio, não dá detalhes sobre um acordo final, mas sim
refugiados palestinos. diretrizes sobre como chegar a ele.
O fracasso de Camp David foi seguido pelo se- A proposta foi precedida de um comunicado, em
gundo levante palestino, conhecida como Intifada. junho de 2002, de George W. Bush, que propunha fases
para pôr a segurança antes de um acordo final:
ƒ Fase 1: Declaração dos dois lados apoiando a
solução de dois Estados. Palestinos poriam fim
à violência e agiriam contra os que estivessem
“engajados no terror”, criariam uma Constitui-
ção e fariam eleições; israelenses parariam de
construir assentamentos ou ampliar os já exis-
tentes e conteriam ações militares.
ƒ Fase 2: Criação de um Estado palestino, em
conferência internacional, com “fronteiras pro-
Barak (esquerda) e Arafat não se entenderam em 2000. visórias”.
ƒ Fase 3: Conversas finais.
O Mapa da Paz não foi implementado, mas se-
Taba (2001)
gue sendo um ponto de referência para as negociações.
Houve mais flexibilidade quanto à questão ter-
ritorial, mas um comunicado posterior dizia ter sido Acordo de Genebra (2003)
“impossível chegar a um entendimento em todas as
questões”. Revisa os conceitos do Mapa da Paz em que a
Com a eleição de Ariel Sharon em Israel, em segurança e a confiança precederiam um acordo políti-
2001, o acordo foi abandonado. co. O maior compromisso de Genebra era que os pales-
tinos desistissem de seu “direito de retorno” em troca
Iniciativa de paz árabe (2002) de praticamente toda a Cisjordânia. Israel desistiria de
grandes assentamentos, como Ariel, mas manteria ou-
Após o fracasso dos diálogos bilaterais e da vol- tros perto da fronteira.
ta dos conflitos, o plano saudita retomou uma aborda- Os palestinos teriam sua capital em Jerusalém
gem multilateral e sinalizou o interesse árabe em pôr Oriental, mas Israel manteria a soberania sobre o Muro
fim às disputas ente israelenses e palestinos. das Lamentações, na Cidade Velha.

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Annapolis, EUA (2007) O xá baseou seu poder no petróleo e estimulou a
entrada de empresas transnacionais no Irã, entendendo
O premiê israelense, Ehud Olmert, e o presidente a adoção de hábitos ocidentais como “modernização”.
da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, participaram Essa ocidentalização acelerada produziu uma forte resis-
de negociações com o Quarteto e mais de uma dúzia de tência do clero iraniano. Os grupos de oposição se mul-
países árabes. tiplicaram e as manifestações, que começaram nas es-
Mas o Hamas, que ganhara as eleições parlamen- colas secundárias em 1977, se generalizaram, em 1978.
tares em Gaza, em 2006, e dominara no ano seguinte a Os distúrbios foram evidentes, culminando com
região não estava representado e disse que não se com- a fuga do xá para o exterior, em janeiro de 1979. Ainda
prometeria com nenhuma decisão tomada em Annapolis. no final de janeiro de 1979, retornou do exílio o líder
Após um comunicado conjunto, Olmert e Abbas religioso aiatolá Ruhollah Khomeini, que anunciou a
tiveram reuniões regulares para acordar questões de fron- criação da República Islâmica do Irã, em 10 de fevereiro.
teira, mas as negociações foram interrompidas pela ofen-
siva militar israelense em Gaza, no final de 2008.

Mohamed Reza Pahlevi Ruhollah Khomeini

O consumo de álcool foi proibido, as mulheres


foram obrigadas a cobrir o rosto em público (xador),
As negociações de 2007 foram interrompidas, após a ofensiva
israelense em Gaza. filmes ocidentais foram banidos. Esse retorno obriga-
tório à doutrina e aos costumes originais e a busca de
uma maior fidelidade aos textos sagrados, com o apoio
GEOPOLÍTICA DO GOLFO PÉRSICO do Estado, ficaram conhecidos como fundamentalismo
islâmico.
O motivo pelo qual o golfo Pérsico se conver- O fundamentalismo islâmico fortaleceu-se no
teu num dos pontos mais importantes da Terra é bem Irã e visava expandir-se para outros países do Oriente
claro: a região guarda aproximadamente 3/4 de todo o Médio. Essa intenção gerou reações tanto de alguns
petróleo existente no Planeta. O petróleo – a “mola do países da região quanto das superpotências. Por outro
capitalismo” – foi, é e será ainda por pelo menos al- lado, encontrou acolhida nas forças políticas que se
gumas décadas a principal fonte energética existente. opunham a governos pró-ocidentais e queriam fundar
É claro que a compreensão do cenário geopolí- Estados guiados pelas leis islâmicas, principalmente a
tico do golfo, do Iraque e da Arábia Saudita transcende partir da década de 1990.
o aspecto econômico: contam também o aspecto reli-
gioso e o caráter multiétnico.
Guerra Irã-Iraque (1980-1988)
Revolução islâmica (1979)
Em 22 de setembro de 1980, teve início o conflito
A partir de 1977, o xá iraniano Mohamed Reza entre o Irã e o Iraque, apresentando como causa imediata
Pahlevi passou a sofrer uma forte crise interna em seu a partilha das águas do estreito do Chatt-el-Arab.
país, em função de uma série de reformas por ele implan- Outros motivos ainda podem ser lembrados, como
tadas e não aceitas pela maioria de muçulmanos xiitas. o desejo do Iraque de recuperar terras perdidas para o Irã,

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em 1975; a questão do separatismo curdo, que sempre foi Este conflito, que até o final de 1985 não apre-
um ponto de desacordo entre os dois países; a preocu- sentava expectativa de término a curto prazo, apresen-
pação do governo de Bagdá com a evolução do islamis- tou desdobramentos paralelos, como: diminuição da
mo xiita em seu território; e o ódio pessoal de Khomeini produção de petróleo do Irã; venda de peças de museus
contra o Iraque, de onde foi expulso em seu exílio. tradicionais do Irã para financiar o conflito; possibilidade
No ano de 1980, o líder do Iraque, Saddam Hus- da venda de aviões Super-Standard e mísseis Exocet da
sein, não cumpriu um tratado firmado em 1975, que França para Bagdá; ameaças de fechamento do estreito
cedia ao Irã, aproximadamente, 518 km2 de seu territó- de Ormuz por parte do Irã, impedindo o comércio do
rio, e o Irã, em permuta, cessaria a assistência militar à petróleo de todo o golfo Pérsico para o restante do mun-
minoria curda no Iraque que lutava pela independência. do; bombardeamento de refinarias, oleodutos, áreas de
Saddam Hussein invadiu três ilhas do Irã, no es- exploração e terminais petrolíferos, que provocaram
treito de Ormuz, e, no dia 22 de setembro de 1980, ocu- grandes vazamentos de petróleo no Golfo, ameaçando
pou a zona ocidental do Irã, para tentar reconquistar o seu a vida de outros países como o Kuwait e Catar; bombar-
território através de acordo. O que na verdade o Iraque deamento de petroleiros de outras bandeiras em pleno
queria era causar instabilidade no governo islâmico irania- golfo Pérsico, que iam em busca do petróleo do Irã ou
no de Teerã e juntar territórios ricos em petróleo. do Iraque; e aumento da frota estadunidense no mar da
Desde o princípio do conflito, o Iraque não conse- Arábia, tentando evitar ataques a petroleiros e o fecha-
guia alcançar a vitória, pois o seu ataque encontrava forte mento do estreito de Ormuz.
resistência. Sempre que as tropas iraquianas conquistavam
um território, o Irã recuperava. O Iraque só manteve o poder
sobre Khorramshahr. Com esta situação, o Iraque resolveu Guerra do Golfo (1991)
propor um cessar-fogo ao Irã, que não aceitou a proposta.
Desse modo, o que favoreceu o Iraque foi o país Ao final do conflito armado que travara durante
poder contar com o apoio de grandes potências, como oito anos com o Irã, o Iraque acumulava uma fortuna em
EUA e URSS. Isso garantiu ao Iraque uma condição de con- dívidas com credores externos: mais de 80 bilhões de
tinuar lutando contra o Irã. Apesar disso, em meados dos dólares. A economia iraquiana dependia essencialmente
anos 1980, o Iraque perdeu o apoio desses países, pois foi do petróleo e, com seus preços em baixa, o país viu-se
acusado de ter utilizado armas químicas contra o Irã. impossibilitado de saldar ao menos parte do que devia,
Em 1988, a ONU obrigou os países a um cessar- além de não poder aumentar os recursos que financia-
-fogo. O Iraque aceitou a proposta, mas o Irã não parou vam seu programa armamentista.
de atacar o Iraque. Porém, no dia 15 de agosto de 1988, Em julho de 1990, o ditador governante do país,
foi concedido o acordo de paz entre os dois países. O que Saddam Hussein, acusou o vizinho Kuwait de forçar as
levou o Irã a aceitar o acordo foi que a sua economia baixas internacionais no preço do petróleo para aumen-
estava totalmente agravada. tar suas cotas de venda. Além disso, evocando antigas
Nesta guerra não houve vencedores, ambos os rixas territoriais, o Saddam reivindicava partes do ter-
países só tiveram perdas. As suas economias foram de- ritório do Kuwait, que declinou de todas as exigências
sestruturadas, não houve mudanças nos domínios terri- iraquianas e, por isso, foi invadido em agosto. As con-
toriais políticos e muitas vidas foram perdidas no conflito. sequências da ação iraquiana foram imediatas: o então
presidente dos EUA, George Bush, enviou tropas para o
golfo Pérsico e impôs um boicote econômico ao Iraque.
Tamanho alvoroço deu-se por causa da grande
importância econômica dos países do golfo, que são os
maiores produtores e exportadores de petróleo do glo-
bo. Uma crise de proporções na região poderia levar a
incidentes de consequências devastadoras para a eco-
nomia mundial. Com as sanções ocidentais em resposta
às suas ações, Saddam não pestanejou: anexou unilate-
ralmente o Iraque e aprisionou todos os estrangeiros ali

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presentes, para poder barganhar mais tarde sua liber-
Guerra do Iraque (2003)
tação. Tudo isso levou a acontecimentos interessantes.
Como primeira crise internacional de considerá- A invasão do Iraque, em 2003, comandada pelo
veis proporções do pós-Guerra Fria, a guerra do Golfo general Tommy Franks, começou em 20 de março, com
promoveu a aproximação dos EUA com a Síria e com a o nome de código “Operation Iraqi Freedom“ (Opera-
União Soviética, sendo que, pela primeira vez, as duas ção Liberdade do Iraque) para a ofensiva estaduniden-
potências encontravam-se lado a lado numa disputa in- se. O nome de código da ofensiva britânica foi “Ope-
ternacional. Além disso, países outrora aliados do Iraque, ração Telic“. As forças da coalizão cooperaram com as
como a Arábia Saudita, subitamente passaram para o forças curdas peshmerga no norte. Aproximadamente,
outro lado, condenando veementemente as ações de outras 40 nações, designadas “a coalizão dos inte-
Saddam. ressados“ (coalition of the willing), participaram for-
Quanto mais sérios tornavam-se os desdobra- necendo equipamento, serviços e segurança, tal como
mentos da crise, mais firmemente a opinião pública
forças especiais. As forças militares iniciais da coliga-
internacional exigia o uso de medidas enérgicas para
ção eram de cerca de 180 mil, dos quais 98% eram
decretar-se uma solução. Inúmeras tentativas diplomá-
estadunidenses ou britânicos.
ticas não deram em nada, e os Estados Unidos lançaram
O exército de Saddam foi rapidamente ultrapas-
então um ultimato: caso o Iraque não se retirasse do
sado, apesar de a sua tropa de paramilitares, os Fedayin
Kuwait até o dia 15 de janeiro de 1991, o uso da força
de Saddam, terem colocado uma resistência desafiado-
seria autorizado. Em 17 de janeiro, uma coalizão, lidera-
ra. Em 9 de abril, Bagdá caiu nas mãos das forças dos
da pelos EUA e formada por 28 países, iniciou o ataque.
EUA. A infantaria estadunidense cercou os ministérios
abandonados do partido Baath e derrubaram uma enor-
me estátua de ferro de Saddam Hussein, terminando
com o seu domínio de 24 anos no Iraque. No entanto,
generalizaram-se pilhagens de instituições governamen-
tais e uma grande desordem, pouco tempo depois de
as forças de Saddam Hussein, incluindo os Fedayin, se
desmembraram em grandes proporções na cidade.
Em 13 de abril, Tikrit, a cidade natal de Saddam
e a última cidade a ser tomada pela coalizão, foi ocu-
pada pelos fuzileiros da Task Force Tripoli. Talvez para
a surpresa de muitos, a resistência foi pequena. Dois
A sofisticada tecnologia de que dispunham ar- dias depois, os membros da coalizão declararam que a
rasou as tropas iraquianas e destruíram muitos pon- guerra estava efetivamente terminada.
tos do país, ainda que Saddam tenha causado alguma Estima-se que aproximadamente 9,2 mil com-
devastação na Arábia Saudita e em Israel, países que batentes iraquianos foram mortos nessa fase inicial da
bombardeou regularmente durante o conflito armado. guerra. Além destes, o Projeto de Contagem de Vítimas
Em fins de fevereiro, as forças chegaram ao Kuwait e do Iraque (Iraq Body Count Project), incorporando re-
não encontraram resistência iraquiana. Bush anunciou latórios subsequentes, declarou que, no fim da fase de
a vitória e o cessar-fogo. Para agravar ainda mais sua maiores combates, até 30 de abril, morreram 7.299 ci-
situação, após o término das hostilidades o Iraque en- vis, fundamentalmente pelas forças aéreas e terrestres
trou em processo de guerra civil. Todavia, apesar do estadunidenses.
aparente sucesso, a guerra deixou um saldo apavoran- De acordo com a CNN, o governo dos EUA re-
te: mais de 150 mil iraquianos foram mortos (cerca de portou que tinham morrido 139 militares estaduniden-
10 mil civis); a capital Bagdá foi destruída; inúmeros ses em combate até 1 de maio. No mesmo período,
poços de petróleo foram incendiados e a fumaça e os morreram 33 britânicos.
derramamentos oriundos dessas ações constituem-se Pouco depois da invasão, a coalizão multinacio-
no pior acidente ambiental da história da humanidade. nal criou a Autoridade Provisória da Coalizão, baseada
O número de mortos da coalizão não chegou a 150. na Zona Verde, como governo de transição do Iraque

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até ao estabelecimento de um novo governo. Citan- torização de eleições democráticas naquele momento,
do a resolução nº 1.483 (de 22 de maio de 2003) do preferindo, em vez disso, entregar o poder a um gover-
Conselho de Segurança da ONU e as leis da guerra, a no iraquiano interino ou “de transição“. Devido a uma
APC revestiu-se de autoridade legislativa, executiva e luta interna pelo poder no interior do novo governo, o
judicial, desde 21 de abril de 2003 até à sua dissolução movimento de resistência à ocupação intensificou-se.
em 28 de junho de 2004.

EUA, COLONIZAÇÃO E
A APC foi originalmente liderada por Jay Gar-
ner, antigo oficial estadunidense, mas a sua indicação
durou apenas um breve período. Depois de Garner se
demitir, o presidente Bush indicou Paul Bremer como ORIENTE MÉDIO
chefe da APC, o qual serviu no cargo até a dissolução
da Autoridade, em julho de 2004. Outro grupo criado
na primavera de 2003 foi o Grupo de Pesquisa do Ira-
que, que foi uma missão de descoberta de fatos, en-
viada após a invasão pelas forças multinacionais para
encontrar programas de armas de destruição massiva
desenvolvidos pelo Iraque. Consistia numa equipe in-
ternacional de 1,4 mil membros organizada pelo Pen-
tágono e pela CIA para procurar supostos armazéns de
armas de destruição massiva, tal como agentes bioló-
gicos e químicos, e qualquer programa de investigação
de apoio ou infraestruturas que pudessem ser usadas Segundo o livro Pangeia: fragmentos da guerra
para desenvolver armas de destruição massiva. Em da Síria no Brasil, os Estados Unidos aderem a uma pos-
2004, o relatório Duelfer do Grupo de Pesquisa do Ira- tura moderna de colonização, ou seja, ao invés de se
que concluiu que o Iraque não tinha nenhum programa utilizarem de ocupações militares, como nas colônias,
de armas de destruição massiva viável. utilizam-se das ciências avançadas, econômicas e polí-
No contexto das informações dos serviços se- ticas.
cretos que levaram às invasões contra os membros do O país construiu sua hegemonia como potência
partido Baath ligados à insurgência, Saddam Hussein econômica na Segunda Guerra Mundial e na Guerra
foi capturado em 13 de dezembro de 2003, perto de Ti- Fria. Como exemplo, o petróleo é cotado e vendido por
krit, na operação Red Dawn. A operação foi conduzida dólares americanos, e é a partir dele que a economia
pela 4ª divisão de infantaria do exército estadunidense mundial se estabiliza.
e por membros da Task Force 121. Tendo outros países como aliados, a China
Com a captura de Saddam e uma queda do nú- (representando o socialismo) e os Estados Unidos (re-
mero de ataques dos insurgentes, alguns concluíram presentando o capitalismo) disputam os recursos do
que as forças multinacionais estavam a ter sucesso na Oriente Médio. No passado, a região foi colonizada,
luta contra a insurgência. O governo provisório começou repartida “à régua“ como espólios da França e da In-
a treinar novas forças de segurança iraquianas para de- glaterra.
fenderem o país e os Estados Unidos prometeram 20 mi- Segundo o dicionário, terrorismo é “um modo
lhões de dólares de crédito na forma de futuros ganhos de impor a vontade pelo uso sistemático do terror; em-
petrolíferos para a reconstrução. Mais valias resultantes prego sistemático de violência para fins políticos; práti-
do petróleo foram também usadas para reconstruir esco- ca de atentados e destruições por grupos cujo objetivo
las e infraestruturas elétricas e de refinação de petróleo. é a desorganização da sociedade existente e a tomada
Pouco depois da captura de Saddam Hussein, do poder“.
elementos deixados de fora da Autoridade da Coalizão Então por que as colonizações – que no passa-
Provisória começaram a agitar-se pelas eleições e pela do, em busca de domínio, destruíam povos, saqueavam
formação de um governo iraquiano interino. O mais nações e se apossavam de seus recursos naturais em
proeminente foi o clérigo xiita grande aiatolá Ali al-Sis- busca de poder – nunca foram vistos como vilões pela
tani. A Autoridade da Coalizão Provisória opôs-se à au- história, tampouco como terroristas?

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A situação na Síria Com a morte de Al-Zarqawi em 2006, a Al-Qa-
eda do Iraque organizou a criação do “Estado Islâmico
do Iraque (ISI – sigla em inglês para Islamic State in
Iraq), o que já demonstrava a intenção de se distanciar
da influência da Al-Qaeda e de criar um território.
O grupo fundamentalista passou a ser combati-
do pelas tropas estrangeiras, pelo governo iraquiano e
pelos sahwa, conselho de tribos sunitas que se posicio-
naram contra os métodos brutais do grupo. A participa-
ção das tribos sunitas ficou conhecida como o Despertar
Sunita.
Em 2014, o Estado Islâmico do Iraque e do Le-
vante (ou da Síria), ou ISIS, passou a se chamar Estado
Islâmico (EI ou IS, em inglês, Islamic State). Também foi
Na atual situação de guerra da Síria, os grupos
proclamado sobre os territórios controlados do Iraque
terroristas são o Jhabat al-Nusra, um abraço da Al-Qa-
e da Síria o califado, que representa um território sob
eda (que é do Afeganistão), e o Estado Islâmico, forma-
a forma de um governo monárquico e totalitário, co-
do por muçulmanos sunitas. Este começou no Iraque,
mandado pela sharia e pelas tradições e costumes dos
depois da invasão estadunidense, como oposição ao
primeiros séculos do islã.
governo xiita, que possui alianças com os Estados Uni-
A adoção do nome Estado Islâmico tem a ver
dos. Entram no país, em maior parte, através da Turquia.
com o abandono da geopolítica do grupo de ser ape-
Os grupos têm aparências específicas que possibilitam
nas associado aos territórios da Síria e do Iraque. O
identificá-los, o que é possível fazer também a partir das
intuito do EI é estabelecer o domínio de um grande
armas que usam.
território que inclua o mundo árabe muçulmano no
A região da Síria é rica em petróleo e gás natural;
Oriente Médio e no norte da África.
além disso, dá acesso ao canal de Suez, principal região
portuária entre o Ocidente e o Oriente Médio. Por isso, é
muito visada economicamente. Como é o último país da
Características do Estado Islâmico
região fechado ao Ocidente e apoiado pela Rússia, que
Apesar de não conseguir dominar Bagdá, o EI
lhes dá armamento, a existência de tais armas denota
passou a controlar várias cidades ao norte do Iraque,
que Ocidente é um dos responsáveis pelo fornecimento
perseguindo infiéis, cristãos, xiitas, tribos sunitas do
de armas; também a desorganização social do local é
Despertar Sunita e os yazidis, que possuem entre 50 mil
favorável aos interesses ocidentais.
e 500 mil membros. Por ser uma comunidade fechada
étnico-religiosamente, fica difícil enumerar exatamente
O Estado Islâmico sua população; é vista como herege pelos membros do
EI, que assassinam os homens que se recusam à con-
A origem do Estado Islâmico remonta ao ano versão religiosa e levam as mulheres para serem noivas
de 2002, quando da criação do grupo fundamentalista jihadistas, as quais acabam sofrendo violência sexual ou
Jama’at Al-Tawhid wa Al-Jihad, fundado por Musab Al- são vendidas como escravas.
-Zarqawi, em 2004. Tudo começou quando Al-Zarqawi Dentro do califado, as regras são rígidas e se-
declarou lealdade a Al-Qaeda, originando a Al-Qaeda guem a sharia. Os combatentes, que são entre 30 mil
do Iraque, ou da Mesopotâmia, composta por sunitas, e 50 mil, sendo 12 mil vindos de outros locais, como
que representam a minoria da população iraquiana. Europa (França e Bélgica), África do Norte (Tunísia),
Os sunitas permaneceram representados no América (Canadá e EUA), Ásia (Paquistão, Afeganistão
poder, durante a ditadura de Saddan Hussein, pelo Par- e Arábia Saudita), recebem salários, o que é uma grande
tido Baath. Os jihadistas sunitas insurgentes tornaram- inovação perante outros grupos fundamentalistas, como
-se os principais combatentes à invasão dos EUA no a Al-Qaeda, o que ajuda o grupo a conseguir mais com-
Iraque. batentes jihadistas.

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O petróleo é a principal fonte de recurso econô-
mico, pois, segundo a Organização Council on Foreign
Relations (CFR, sediada em Nova Iorque, nos EUA, vol-
tada para a política internacional), o EI consegue comer-
cializar 48 mil barris por dia (44 mil dos campos sírios e
4 mil dos iraquianos), além do gás natural.
Outras fontes de renda correspondem à retirada
de dinheiro dos bancos nas cidades que são ocupadas,
da pilhagem, da extorsão e da cobrança de impostos nas
regiões que controla na Síria e no Iraque. Há suspeitas
sobre a contribuição de pessoas da Arábia Saudita e do
Catar para financiar o EI, inimigo dos xiitas.
O Estado Islâmico utiliza a internet para divulgar
suas ações, difundir suas propostas e fazer recrutamen-
tos, conseguindo, assim, aliciar mais simpatizantes para
sua causa.
No início de 2014, Barack Obama anunciou a
formação de uma coalizão de aproximadamente 50 paí-
ses, envolvendo principalmente nações do Ocidente e do
Oriente Médio, que passou a realizar ações militares em
bombardeios contra posições do EI na Síria e no Iraque.
Em 2016, importantes ações militares realizadas
principalmente pela Rússia, EUA e França provocaram
ao EI a perda de controle sobre territórios e cidades.

PESQUISAR
ƒ A guerra da Palestina: da criação do Es-
tado de Israel à nova Intifada (livro); autor:
André Gattaz
ƒ Promessas de um novo mundo (documen-
tário); direção: Justine Arlin, Carlos Bolado e
B.Z. Goldberg (2001) – ambientado em Israel
e nos territórios ocupados, mostra a tensa re-
alidade do cotidiano local a partir da visão de
crianças palestinas e judias.

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