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UNIDADE 05 – INTRODUÇÃO GERAL AOS LIVROS SAPIENCIAIS

A literatura sapiencial é uma forma de expressão muito utilizada no


Antigo Oriente. Tanto no Egito quanto na Mesopotâmia podiam ser facilmente
encontrados provérbios, fábulas e poemas. Em geral, este material procurava
esclarecer

...o destino dos indivíduos, não por uma reflexão filosófica à maneira dos gregos, mas
colhendo os frutos da experiência. É uma arte de viver bem e um sinal de boa
educação. Ensina o homem a se conformar à ordem do universo e deveria dar-lhe os
meios de ser feliz e prosperar.1

O material sapiencial do Egito e Mesopotâmia era bem conhecido do


povo de Israel. Isto pode ser percebido na declaração sobre a sabedoria de
Salomão em 1 Reis 4.30: “A sabedoria de Salomão excedia à de todos os filhos
do Oriente e a toda a sabedoria do Egito.” Com este contato não é
surpreendente que a literatura sapiencial bíblica se assemelhe ao que havia em
seu derredor. Alguns ditos dos outros povos eram realmente interessantes,
foram inclusive utilizados no texto bíblico, veja este exemplo:

Melhor é o pouco com o temor de Jeová


do que grandes tesouros, e, com eles, a inquietação.
Melhor é o prato de hortaliças onde há amor
do que o boi cevado, e, com ele, o ódio. (Pv 15,16 e 17)

É um provérbio bem parecido com outro egípcio, um de Amenemope:

Mais vale a pobreza na mão do deus


que as riquezas num porão
Mais vale um pedaço de pão com o coração feliz
que riquezas com tormentos2

As similaridades são bem interessantes e não podemos mais, como se


fazia na década de 1980, simplesmente dizer que o Egito foi abençoado pela
presença dos hebreus em suas terras. Embora, em alguns momentos, não
tenhamos condições de discernir quem teria sido o original, aqui podemos
descansar no fato que ditado egípcio é o mais antigo. Destarte, isto não macula
a inspiração, de forma alguma. O texto deste faraó do séc. X a.C. não foi

1
BÍBLIA SAGRADA, Língua Portuguesa, Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2008, 797.
2
LÉVÊQUE, 1983, p. 58. APUD MIES, Françoise. Bíblia e economia: servir a Deus ou ao dinheiro. São
Paulo: Loyola, 2007, p.18.
2

inspirado por Deus, mas a utilização dele pelo autor bíblico sim. Outrossim,
devemos lembrar que a preocupação com a vida, no Antigo Testamento, neste
período (anterior ao exílio), estava mais focada com o imediato. Ainda não
havia um entendimento mais claro com relação à eternidade. Este imediatismo
é mais marcante no livro de Provérbios, já nos livros de Jó e Eclesiastes há
uma preocupação maior em entender o que segue além desta vida. Isto em
especial, por sua edição ou finalização no período pós-exílico.
Um propósito claro nos livros sapienciais era o ensino. Isto foi bem
perceptível na versão Vulgata Latina, que denomina este grupo como livros
Didáticos. Que este material traz valiosas lições é inquestionável, mas nem
sempre é tão simples determinar exatamente como nos aproximar deles. Afinal,
eles “não dizem com clareza o que são: sabedoria, ensinamento, poesia ou só
escritos? Que são? De onde vieram? Que significam? Para que servem? Para
que estudá-los? Como revelam a Deus?”.3 Para buscar responder estas
questões é que se segue uma breve introdução de cada um destes livros.

O Livro de Jó

Este livro recebe o nome devido ao seu personagem principal. O texto


bíblico abre afirmando que Jó era natural de Uz, há possibilidade esta terra
ficar entre a Arábia no noroeste e a terra de Edom.4 Alguns autores afirmam
que não há como determinar a localização precisa, sendo possível apenas
afirmar que ficava fora do território de Israel.5 De qualquer forma, fica claro que
esta pessoa notável não fazia parte do povo de Israel. Muito provavelmente
sua história tenha ocorrido antes da formação da nação israelita (talvez,
inclusive antes mesmo do chamado de Abraão). Curiosamente, é o único livro
do Antigo Testamento, sem vínculo direto com os hebreus. Só aqui já podemos
aprender uma valiosa lição: Deus tem filhos fiéis a Ele entre outros povos e
culturas. Não obstante o israelita ter sido chamado para uma missão, não era
simplesmente eleito como o único a receber o cuidado e atenção de Deus.

3
QUEIROZ, Antonio Celso. SABEDORIA e poesia do povo de Deus. São Paulo: Loyola, Rio de Janeiro:
Publicações CRB, 1993, p. 15.
4
BÍBLIA, 2008, p. 1409.
5
GUSSO, Antônio Renato. Os Livros poéticos e os da sabedoria,: introdução fundamental e auxílios
para a interpretação. Curitiba: AD Santos, 2012, p. 30.
3

Infelizmente, “o livro de Jó, ainda que seja parcialmente bem


conhecido, é pouco lido como obra completa pelos cristãos modernos”.6 A
parte que é lida envolve apenas o que é prosa, o início e o final do livro. Toda a
parte poética é, muitas vezes, desprezada. Com isso os leitores não perdem
apenas toda a beleza poética que há nesta parte, mas todo o debate teológico
existente. Tal debate é extremamente interessante, pois os erros que os
amigos de Jó cometiam são, ainda hoje, cometidos em larga escala pela
maioria dos cristãos.
Quanto à sua autoria, não há como afirmar categoricamente quando a
história ocorreu, assim, não há como afirmar quando foi escrita ou quem
redigiu. Há tradições que atribuem a autoria a Moisés, mas tal concepção não
pode ser afirmada. A única certeza, até o momento é que ele foi escrito em
duas partes bem distintas. Inicialmente só existia sua parte central, dos
capítulos 3 a 41. E bem mais tarde foram acrescidos os capítulos 1, 2 e 42. Os
capítulos iniciais e finais demonstram uma teologia da luta entre bem e mal
muito bem traçada, algo típico de uma produção exílica ou pós-exílica. Já a sua
história, é bem antiga. Isto, inferimos a partir da demonstração de um conceito
antigo de mal: “Receberemos o bem da mão de Deus e não receberemos o
mal?” (Jó 2.10).
Independente de como se deu a formação do livro, a beleza da
literatura é reconhecida, Jó é tido como a obra-prima da literatura sapiencial.7
Os dois primeiros capítulos são uma narração em prosa, escritos
posteriormente para ser seu prólogo. No capítulo 3 abrem-se os poemas deste
livro, em forma de diálogos. Até o capítulo 31 os diálogos/poemas ocorrem
entre quatro pessoas, Jó e os três amigo, Elifaz, Bildade e Zofar. Neste trecho,
cada amigo fala duas vezes, sendo que Jó responde a cada uma de suas
alegações. No capítulo 28 há um poema sobre a sabedoria, como se fosse um
interlúdio. Nos capítulos 29 ao 31 encontra-se o último discurso de Jó. No 32
inicia a fala de Eliú, este discurso/poema se estende até o capítulo 37.
Certamente ele estivesse presente desde o início, mas só tenha falado depois
que seus três amigos falharam em convencer a Jó. Talvez esta demora tenha

6
GUSSO, 2012, p. 29.
7
BÍBLIA, 2008, p. 800.
4

ocorrido, pela pouca idade de Eliú. Todavia, embora tenham sido quatro
pessoas diferentes, o erro teológico foi o mesmo.

No final até mesmo Deus repudiou os discursos teológicos pré-fabricados desses


amigos. Os discursos de Elifaz, Baldad, Sofar e Eliú estão recheados de belas
palavras, de aparente humildade e de afirmações eloquentes e grandiosas. Tudo isso
com o propósito de defender a Deus. Os discursos dos amigos pretendem encerrar
Jó no círculo vicioso da teologia da retribuição.8

Para Eliú Jó não responde. É interessante observar que Deus


repreendeu os três amigos de Jó, pede que eles ofereçam sacrifício a Ele e
afirma que não ouvirá as orações deles, mas apenas a intercessão de Jó. Eliú
sai de cena, não é repreendido e Jó não intercede por ele. A aparição e a saída
tão repentina de Eliú, tem levado alguns teólogos a levantarem a possibilidade
de ser uma inserção posterior no livro. O comentário de Barr a este respeito é
interessante:

Deus poderia estar ignorando Eliú, considerando-o insignificante e, com efeito,


colocando o impetuoso jovem no seu devido lugar. A outra objeção levantada pela
teoria de que o monólogo é uma adição posterior é o fato de não trazer nada novo.
Mas esse é precisamente o ponto: a sabedoria humana se esgotou, está na hora de
Deus entrar em cena.9

Mas, ao observar a cultura da época, em que somente os mais velhos


tinham a responsabilidade de chamar a atenção do próximo e a forte
significação do número três, para a cultura, acreditamos que não precisamos
ficar procurando muitas explicações. Somos da opinião que Eliú era um jovem,
talvez um iniciante neste processo de “ancionato”. Por conta disso, não pode
se intrometer antes. Quanto à repreensão divina, seria natural que somente os
representantes oficiais da sabedoria popular (os três amigos), recebessem tal
reprimenda. Não que fosse restrita a eles somente, porque o número três, na
cultura judaica, pode muito bem simbolizar que a totalidade de seus amigos, e
suas teologias, foram discriminados por Deus.
No capítulo 38 começa a resposta de Deus para Jó, e segue até o
capítulo 41. O grande tema que o livro de Jó abarca é o sofrimento humano, a
questão é levantada “quando se conclui que há um Deus Todo Poderoso, justo
8
ROSSI, Luiz Alexandre Solano. Jesus vai ao McDonald's: teologia e sociedade de consumo. 2. ed.
revista. Curitiba: Champagnat, 2011, p. 54.
9
BARR, in: DILLARD; LONGMAN, 2006, p. 194. Apud GUSSO, 2012, p. 36.
5

e amoroso e, ao mesmo tempo, que não acaba com o sofrimento que existe na
terra.”10 Na verdade o livro de Jó é uma Teodicéia.11 Quanto se atenta à
abertura, as cenas narradas nos capítulos 1 e 2, ocorrendo no céu, poderiam
ser vista como uma forma de julgamento. O detalhe surpreendente é que o réu
não é Jó, mas o próprio Deus. O que o inimigo está querendo “demonstrar” é
que Deus é injusto, que “compra” Seus fiéis. O que estaria “em jogo” não seria
a reação de Jó, simplesmente, mas o caráter do próprio de Deus.
Podemos dizer que a grande questão do livro é sobre quem Deus é.
Assim, é mais fácil compreender o diálogo de Deus com Jó. Nesta conversa
Deus não responde aos questionamentos de Jó “do porque ele estava
passando por tudo aquilo” (provavelmente esta resposta Jó nunca teve), a
ênfase no diálogo é a apresentação do próprio Deus. Isto Jó reconhece ao fim
do livro, que após tudo o que aconteceu ele realmente conheceu Deus: “Eu
tinha ouvido de ti com os ouvidos; mas, agora, te veem os meus olhos” (42.5).
O epílogo do livro começa a partir do verso 7 do capítulo 42, na forma de
narrativa.
Há uma linha de pensamento que coloca Jó não como um personagem
real, mas como a representação de um grupo.12 Este pensamento está inserido
na Teologia Liberal. Todavia, a própria Bíblia testifica da existência do homem
Jó (Cf Ez 14,14-20 e Tg 5,10s). Além disso, o próprio livro o apresenta como
um patriarca, alguém muito rico, com estrutura familiar e muita influência.

Provérbios

Embora o livro inicie afirmando que se trata de provérbios de Salomão,


não significa que ele teria sido o autor de todos eles. Na Antiguidade era
comum atribuir um livro a alguém importante ou significativo. No próprio livro
em estudo, há referências a outros autores, como Agur, a mãe do rei Lemuel e
outros sábios anônimos (22,17 e 24,23). Isso não significa que Salomão teria
apenas “emprestado” seu nome. Mesmo porque o próprio texto bíblico afirma

10
GUSSO, 2012, p. 32.
11
Não obstante um anacronismo, optamos em manter tal nomenclatura aqui, por descrever bem sua
finalidade.
12
ROSSI, 2011, p. 19.
6

que ele foi autor de “três mil provérbios, e foram os seus cânticos mil e cinco”
(1 Rs 4.32).
Salomão é citado no capítulo 1,1, no início do capítulo 10, e no início
do cap. 25. Neste último há um acréscimo interessante: “Estes também são
provérbios de Salomão, os quais transcreveram os homens de Ezequias, rei de
Judá.” O próprio texto afirma que estes provérbios foram reunidos e registrados
após o período de Salomão. Tendo as declarações dos capítulos 10 e 25 em
vista, alguns teóricos afirmam que haveria duas coleções principais de
Salomão: a primeira, compreendendo os capítulos 10.1 ao 22.16 e a segunda
do 25 ao 29. A primeira é composta de 375 sentenças, já a segunda, por 128.
Mesmo que sejam apenas estas duas partes escritas por Salomão, envolvem
boa parte do livro. Estas duas partes, são compostas basicamente por Mashal,
uma das formas da literatura sapiencial mais antiga e mais simples.13 É uma
palavra hebraica que significa muito mais que apenas “provérbio”. Também
pode ser traduzida por “sentença, dito, adágio, dito de sabedoria, ditado,
canção satírica”.14 Ou ainda, como “cântico de zombaria [...] máxima, eemplo
[...] parábola ou discurso [...] alegoria, enigma [mostrando] uma multiplicidade
de significados”.15
Assim como os demais livros, o nome deste livro em hebraico vem da
primeira palavra, que se encontra no primeiro verso: Mishley (literalmente:
provérbios de).
A estrutura de Provérbios, por autoria seria a seguinte:
- Os capítulos 1 a 9 seriam como um prólogo, com aqui sentenças de
forma um pouco mais elaboradas.
- Os capítulos 10 a 22,16 seria todo de Salomão.
- O trecho que se inicia no cap. 22,17 e segue até o 24, seriam
discursos de alguns sábios, baseados em fonte egípcia, inclusive.
- Os capítulos 25 até 29 palavras de Salomão compiladas pelos
homens de Ezequias.
- O capítulo 30 é de Agur.

13
BÍBLIA, 2008, p. 1020.
14
KIRST, Nelson, et al. Diconário Hebraico-Português e Aramaico-Português. 20. ed. São Leopoldo:
Sinodal, Petrópolis: Vozes. 2007, p. 145.
15
GUSSO, 2012, p. 75s.
7

- Os provérbios encontrados em 31,1-9 são do rei Lemuel, que recebeu


de sua mãe.
- Os versos finais, do 31,10 em diante seriam um epílogo.
Este livro é, provavelmente, o mais prático do Antigo Testamento,
talvez por isso sua interpretação deveria mais fácil. Mas o fato de ser o livro
menos utilizado em sermões pela sociedade atual demonstra a dificuldade em
se compreender alguns textos corretamente.16 Talvez ele seja ignorado, às
vezes, porque há ditos que não tratam de preocupações espirituais. Por
exemplo, numa primeira leitura, não faria sentido dar este conselho para a
igreja: “Os projetos confirmam-se pelos conselhos; faze a guerra com
prudência.” (Pv 20,18). Todavia, mesmo que tenha sido escrito pensando-se
em uma situação bélica, há princípios que poderiam nortear a todos, ainda
hoje.
Outra dificuldade associada à interpretação é o fato de não ter um claro
contexto literário, a maior parte dos provérbios não foram agrupados em
sequência temática. Em muitos casos não há nem uma ligação entre um
provérbio e os que estão ao seu derredor. Outra dificuldade, não diz tanto
respeito com a interpretação em si, pois quanto a isto, seriam claros. O
problema é que algumas exortações são opostas ao que é aceito e praticado
pela sociedade atual. Por exemplo, por conta de uma onda de violência
generalizada soa estranho o seguinte conselho: “Castiga a teu filho, porque
ainda há esperança, e não consintas na sua destruição” (19.18) e “Não retires
da criança a correção, pois, se a fustigares com a vara, não há de morrer”
(23.13). Não é tão simples estudar e defender algo que é tão mau visto pela
sociedade atual.
Outro valor deste livro é o fato de sua luta contra uma moral baixa.
Mesmo porque “a verdadeira religião não se edifica senão sobre uma base de
honestidade humana”.17 Infelizmente, há algum tempo, nossa sociedade tem
feito a distinção entre secular e espiritual, entre sagrado e profano. Quiçá
pudéssemos aprender com os sábios do Israel antigo, a termos uma vida
integralmente pautada em procurar ser o melhor afim de agradar ao nosso
Deus.

16
GUSSO, 2012, p. 373s.
17
BÍBLIA, 2008, p. 1021.
8

Eclesiastes

O nome deste livro, inicialmente, eram as primeiras palavras do


primeiro verso: “Palavras do Pregador”. Pregador é traduzido do hebraico
Cohelet, não como nome próprio, mas como substantivo designando o orador
ou pregador de uma assembleia.18 Como sua raiz é a palavra qahal, que no
grego é usado ekklesia, a partir da LXX, seu nome passou a ser Eclesiastes,
algo relativo à assembleia. Segundo Gusso, atualmente poderíamos denomina-
lo como “o filósofo” e basicamente pode “indicar: aquele que reúne uma
audiência, aquele que discursa para o povo [ou] aquele que ensina.”19
Quanto à autoria, muitos a atribuem a Salomão, em especial, pela
possível alusão a ele no primeiro verso e, também pelas descrições ao longo
da mesma. Todavia, não é ponto pacífico. A crítica se levanta, particularmente,
contra uma obra tão antiga, pois se a mesma for do séc. IX a.C., como explicar
as possíveis inquietações com a espera por algo além desta vida? Todavia,
não vemos como palavras tão reveladoras assim, ou seja, seu vislumbre sobre
a eternidade, pode ser aceitável já em tal época, como um embrião da teologia
pós-exílica, que viria a se desenvolver mais tarde.
Não há dúvida porém, de uma edição final mais tardia. O uso de
palavras em aramaico atesta para isto. Além de ter no texto termos escritos na
primeira e na terceira pessoa. Cabe lembrar que muitos autores preferem
pensar que se trata de uma obra anônima e que seu autor se fez passar por
Salomão. Se a obra for mais tardia, ou por um autor anônimo ou por edições
posteriores, a data poderia ser até o séc. III a.C.
Este é um livro pouco apreciado, sua interpretação, na verdade, não é
simples. Mesmo aqueles que defendem a autoria salomônica, concordam que
não seria do fiel Salomão, no início do seu reinado. Mas, seria uma obra
produzida ao “final de sua vida, convencido de seu pecado e de suas atitudes
néscias”.20 Assim, ele estaria narrando seu próprio arrependimento e usando “a

18
KIRST, 2007, p. 212.
19
GUSSO, 2012, p. 94.
20
HENRY, Matthew. Comentário Bíblico. Rio de Janeiro: Casa Publicadora da Assembleia de Deus, 2002,
p. 540.
9

sua experiência para proveito do próximo”.21 Consideravelmente anterior ao


surgimento da Filosofia grega, este material possui certa similaridade à sua
estrutura, inclusive no uso da ironia no decorrer da obra.
A despeito de quem teria sido seu autor, ele se apresenta como se
fosse um incrédulo, para a partir de sua “auto-reflexão” descrever sobre o vazio
que a vida passa a ter sem a presença de Deus. Algo importante a se destacar
é o uso desta palavra: vazio (do hebraico hevel). Ela aparece 38 vezes neste
livro. As versões mais antigas usam a palavra vaidade, porque “vazio” era um
dos sentidos desta palavra antes. Mas, hoje ao se falar em vaidade só
pensamos em preocupação com a aparência. Definitivamente não é esta a
inquietação do livro. Apalavra hevel, significa “vazio, inútil, [...] sopro, fôlego,
nulidade”,22 e dá a ideia de algo passageiro ou ilusório. Observe as traduções:

Vaidade de vaidade, diz o Pregador.


Vaidade de vaidade, tudo é vaidade (Tradução Brasileira)

“Que grande inutilidade!”, diz o mestre.


“Que grande inutilidade! Nada faz sentido!” (NVI)

Vazio de vazios, disse o pregador.


Vazio de vazios, é a totalidade de vazios. (Tradução nossa, mais literal)

Neste verso temos o propósito do livro, mostrar que sem Deus a vida
fica vazia, sem sentido. Assim, tentar preenchê-la com outros itens ou objetivos
é inútil. E é exatamente isto que o autor faz ao longo do texto.
A estrutura da obre pode ser assim definida:

Introdução – Capítulo 1
Busca pelo prazer – 2.1-11
Busca pela sabedoria – 2.12-17
Busca por riquezas – 2.18 até 6.12
Reflexão sobre a vida do pregador – 7.1 ao 11.8
Conselhos – 11.9 ao 12.823
Conclusão- 12.9 a 14

21
HENRY, 2002, p. 540.
22
KIRST, 2007, p. 52.
23
GUSSO, 2012, p. 97.
10

O sábio procura mostrar que viver buscando apenas os prazeres deste


mundo, mesmo os nobres como a realização profissional e a sabedoria; ou os
não tão nobres como satisfação pessoal e riquezas é inútil, é como se
estivéssemos “correndo atrás do vento”. É sinônimo de uma vida vazia aquele
que busca viver apenas para para si, longe do Criador.

Concluindo, sem Concluir...

Espero que esta visão geral sobre a poesia hebraica e os livros a elas
relacionados o tenha ajudado a entender melhor o texto Bíblico e possa ainda,
servir de auxílio em sua jornada de estudos na Palavra de nosso Deus. Assim
como as palavras de sabedoria são palavra voltadas para um viver diário mais
equilibrado, prático e feliz, diante de Deus, o nosso estudo teológico precisa
nos levar a uma aplicabilidade maior dos ensinos celestes. Que Deus nos livre
das discussões intermináveis e meramente elucubrativas. Que sejamos
cristãos cada vez mais engajados com as lutas do dia a dia, vislumbrando a
nossa adoração a Deus, através de nosso serviço ao próximo.
Um grande abraço a todos. Com os votos de uma vida bem sucedida,
sob os cuidados de nosso Deus.

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