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1. Primeiras linhas
1.1 Introdução
3. O Direito na história
Referências
INTRODUÇÃO AO DIREITO DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
1.Primeiras linhas
1.1 Introdução
Neste sentido, como ponto de partida propõe-se superar alguns dogmas do ensino
jurídico, quais sejam: a) de que o direito sempre ocasiona harmonia e paz social; b) de que
o sistema jurídico é somente acessível para agentes do campo jurídico (juízes,
desembargadores, procuradores, promotores, delegados etc.); c) de que somente o Estado
produz direito.
Por conseguinte, é necessário ressaltar que:
1 - O direito é resultante das condições históricas, não existe direito destacado de seu tempo;
2 - Nem sempre o direito produziu pacificação social, a história indica que a aplicação do
direito ocasionou situações de exclusão e opressão de grupos dominantes sobre grupos
oprimidos;
4 - Todas as pessoas e grupos sociais podem ter acesso ao conhecimento jurídico e a fazer
valer seus direitos de forma individual ou coletiva;
5 – O direito pode ser resultante da atuação estatal e também pode ser produzido em
comunidades;
6 – A escrita não cria o direito, modifica-o. Ou seja, o direito não nasce unicamente com a
escrita.
Inicialmente, apresenta-se a seguir conceito proposto sobre o direito. Vimos que, adotamos
uma concepção pluralista de direito em opção ao paradigma monista. É um ponto de partida
que amplia a noção da produção normativa para além do aparelho estatal.
Aqui pode-se mencionar que os povos indígenas na época da ocupação europeia podem ter
atingido a mais de mil povos, podendo ter alcançado de cinco milhões e seis milhões de
indígenas. Ao chegarem ao Brasil, os portugueses encontraram um território povoado. Seus
habitantes originários, porém, desconheciam a escrita e não deixaram documentos sobre o
próprio passado.
É preciso assumir uma concepção de direito que supere o colonialismo imposto contra os
povos originários, afrodescendentes e demais comunidades tradicionais. Estudos mais
recentes indicam a vinda de mais de cinco milhões de pessoas escravizadas de África para o
Brasil de diversas nações e línguas. De grupos étnicos diversos, os povos detinham formas
jurídicas de regulação de condutas e solução de litígios. Estudos indicam a existência de
“uma série de direitos que os cativos vinham adquirindo pelo costume, e a aceitação de
alguns dos objetivos das lutas dos negros” (Sidney Chaloub).
Portugal nos impôs suas Ordenações Afonsinas (1446), Manuelinas (1521) e Filipinas
(1603). Esta última vigorou no Brasil até o século XX quando foi completamente revogada
pelo Código Civil de 1916 em plena República. Portugal a partir de 1534 implantou o
regime das Capitanias através da Carta de doação e da Carta Foral. Na carta de doação
transmitia-se a posse da capitania. Na Foral eram estabelecidos direitos e deveres do
donatário ou através de seu representante (ouvidor da capitania), como por exemplo, exercer
a jurisdição (dizer o direito) e a gestão administrativa na capitania; aplicar penalidades;
exercer o monopólio do Pau-Brasil; exportar índios para Portugal. Os primeiros juízes
brasileiros eram leigos e foram os ouvidores das capitanias.
(Mapa capitanias hereditárias)
3. O Direito na história
Tudo tem história, inclusive o direito. Esta não pode ser uma história única, pode-se falar
das histórias dos direitos. Atualmente estudos indicam a existência de regulação entre o final
do período paleolítico e início da revolução neolítica. Este período registra o surgimento de
indícios de juridicidade que regulavam papéis sociais, procriação e restrição de incesto.
Pode-se denominar este momento de existência de um “protodireito” por volta de 15.000 a
10.000 a.C. A escrita vai surgir entre 4.000 a.C e 3.000 a.C, mais precisamente com a escrita
cuneiforme entre os Sumérios.
(Os sumérios inventaram o sistema cuneiforme de escrita, que foi utilizada em toda a Mesopotâmia e por
povos vizinhos)
(Mesopotâmia)
Foi na Mesopotâmia entre os rios Tigre e Eufrates que surgem os primeiros documentos
jurídicos escritos. Foi lá que surgiram as primeiras leis escritas, em geral as leis eram
cunhadas em pedra ou placas de argila. Foram as primeiras normas escritas na
Mesopotâmia: a) Estela dos Abutres – 2450 a.C; b) Código de Urukagina – 2350 a.C;
c)Código de Ur-Nammu - 2100/2050 a.C; d) Código de Eshunna – 1930 a.C; e) Código de
Lipit-Ishtar – 1870 a.C; f) Código de Hamurabi – 1700 a.C. Os documentos jurídicos pré-
hamurábicos foram legislações de cidade-estado, somente em Hamurabi verifica-se a
existência de codificação de Império. Importante registrar a existência no primeiro deus da
justiça explicitamente citado, Shamash.
“Quando Anu o Sublime, Rei dos Anunaki, e Bel, o senhor dos céus e da
terra, que decretaram o destino da terra, assinalaram a Marduk , o todo-
poderoso filho de Ea, deus de tudo o que é direito, o domínio sobre a
humanidade, fazendo dele grande entre os Igigi, eles chamaram a
Babilônia por seu nome ilustre, fizeram-na grande na terra, e fundaram
nela um reino perene, cujas fundações são tão sólidas quanto as do céu e
da terra; então, Anu e Bel chamaram por meu nome, Hamurabi, o príncipe
exaltado, que temia a deus, para trazer a justiça na terra, destruir os maus
e criminosos, para que os fortes não ferissem os fracos; para que eu
dominasse os povos das cabeças escuras como Shamash, e trouxesse
esclarecimento à terra, para assegurar o bem-estar da humanidade.
Hamurabi, o príncipe de Bel sou eu (...)”, prólogo do Código de Hamurabi
Egípcios. No Egito antigo (África, antigo Império 3200 a. C a 2100 a. C., médio Império
2100 a. C. a 1580 a. C. e novo Império 1580 a. C. a 715 a. C.). Não há indícios de
codificação propriamente dita por conta de fontes históricas deterioradas, mas foram
encontrados excertos de contratos, testamentos, decisões judiciais e atos administrativos
(com a decifração dos hieróglifos). Outro elemento a ser registrado é a estrutura de
Judiciário: kenbet aat (tribunal superior) para aplicar a maat (princípio da justiça). O faraó
julgava em última instância. O chefe da justiça comandava os juízes, dirigindo o serviço e
fazendo leis. O vizir poderia julgar pelas leis e regulamentos. Como algo a ser registrado no
direito de família, “homens e mulheres em igualdade”.
Existia uma simbologia jurídica retratada no Livro dos Mortos (1580 a.C. a 1085 a. C)
representando o julgamento dos mortos com simbologia de uma balança pela primeira vez
na análise do direito e uma primeira deusa mulher da justiça Maat.
Romanos. Foram aqueles que sistematizaram uma elaboração sobre o direito. Sem dúvida,
ocupam centralidade do discurso de que o direito surge com seus trabalhos, algo
relativizado desde o início deste curso. Para alguns, a ciência jurídica nasce com os
romanos.
De fato, foram vinte e dois séculos de influência direta entre a fundação de Roma (753 a.C.)
e a queda do Império Romano do Oriente (1453 d. C). Existiram vários direitos romanos a
seguir indicados. Direito arcaico ou quiritário (753 a.C. – II a.C.) Característica:
formalismo, rigidez e ritualidade, observância das regras religiosas somente para romanos.
Pontífices possuíam o direito de interpretar as leis, fixar as ações e nomear os juízes que as
deviam julgar. Direito clássico (República tardia até o principado) tendo como
característica: auge do direito romano, poder de pretores e jurisconsultos Direito tardio ou
pós-clássico (séc. III d.C. ao fim do Império) tendo como característica: legado da fase
áurea; vulgarização, influência do imperador e codificação Corpus Juris Civilis -
obra jurídica fundamental, publicada entre os anos 529 e 534 por ordem do imperador
bizantino Justiniano.
(O Corpus Juris Civilis foi formado pela reunião dos seguintes livros: Digesto, Institutas, Código Novo
(códex) e as Novelas)
Direito medieval. A experiência jurídica medieval (nasce com a queda de Roma, 476 d.C.)
pode ser entendida a partir de suas principais características: a) direito que se desenvolve no
vazio relativo do poder político (com a queda do Império Romano na Europa Ocidental); b)
relativa indiferença do poder político pelo direito que permite que este se crie e se
desenvolva na sociedade um direito feudal; c) forte pluralismo de ordens jurídicas
simultâneas, observado nesse direito medieval; d) a sua factualidade – um direito que se dá
e se verifica na práxis; e) a sua historicidade – construção histórica e não ato de império ou
poder de um soberano; f) presença da igreja na constituição dessa mentalidade jurídica
(direito canônico);
Direito Moderno. Nasce com as revoluções liberais Inglesa (1688), Americana (1775-
1793) e Francesa (1789). Característica do direito atual de caráter liberal burguês e
individualista, expresso pelos códigos civis e pelos contratos que garantiram a ordem
jurídica da autonomia da vontade privada, da propriedade e de uma igualdade jurídica
formal centrada unicamente no indivíduo (cidadão liberal). O código civil napoleônico
representou o paradigma deste modelo (1804): inspirado no Direito Romano, igualdade dos
indivíduos perante a lei, direito à propriedade privada, proibição de sindicatos e greve,
dispõe sobre educação nos liceus e possibilita escravidão nas colônias)
Observação importante: Para saber mais, consultar livros e capítulos sobre a temática da
história do direito indicados na referência.
Direito interno pode ser entendido como o sistema legal de cada Estado-nação, tais como, a
Constituição Federal, Emendas à Constituição, Leis Federais complementares, Leis Federais
Ordinárias, Constituições estaduais, Leis estaduais, Leis Orgânicas municipais e Leis
municipais, decretos, resoluções, portarias. Existe uma hierarquia entre as normas de direito
doméstico. Assim, todas as normas federais devem buscar fundamentação na Constituição
Federal, todas as normas estaduais devem buscar fundamentação na Constituição Estadual e
todas as normas municipais devem buscar fundamentação na Lei Orgânica Municipal.
A estrutura judicial interna é regulada pela Constituição federal nos seus artigos 92 a 126.
Ele é constituído de diversos órgãos, com o Supremo Tribunal Federal (STF) no topo. O
STF tem como função principal zelar pelo cumprimento da Constituição. Abaixo dele está o
Superior Tribunal de Justiça (STJ), responsável por fazer uma interpretação uniforme da
legislação federal. Contempla ainda tribunais superiores, tribunais e juízes, como indicados
a seguir:
Por outro lado, o direito internacional é o sistema de normas das gentes, tais como tratados,
acordos, convenções e protocolos. As normas internacionais para serem aplicadas nos
sistemas internos (países) necessitam de procedimentos de incorporação: adesão, assinatura,
ratificação e decreto legislativo do parlamento.
Por exemplo, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho que trata dos
“povos indígenas e tribais” é norma internacional. Com efeito, o Decreto Legislativo nº
143, de 2002, “Aprova o texto da Convenção nº 169 da Organização Internacional do
Trabalho sobre os povos indígenas e tribais”.
Parágrafo único. Ficam sujeitos à apreciação do Congresso Nacional quaisquer atos que
impliquem revisão da referida Convenção, bem como quaisquer atos que, nos termos do
inciso I do art. 49 da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gravosos
ao patrimônio nacional.
Atualmente, considera-se que tratados de uma forma geral têm patamar de lei ordinária
federal. O tratado jamais se sobrepõe à Constituição Federal: os tratados estão sujeitos, no
Por outro lado, pode-se defender que tratados, convenções, acordos que versem sobre
norma constitucional. Com efeito, desde que aprovados, em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos. Esses atos são equivalentes às emendas
constitucionais, conforme estabelece o art. 5º, §3º da Constituição Federal.
Conflitos normativos. Direito interno. Importante registrar que as normas podem estar em
conflito e é preciso saber superar tais conflitos, denominados de “antinomias”. Tais conflitos
podem ser solucionados através da aplicação dos critérios:
a) Hierárquico;
b) Cronológico;
c) Especialidade.
O critério cronológico regula que norma posterior revoga a anterior: “A lei posterior revoga
a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando
regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”. O Decreto 4887/2003 (que
regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e
titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que
trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) revogou o Decreto
3912/2001.
Conclui-se, que os casos anteriores tratam de antinomia aparente, pois foi possível a solução
deste conflito com um dos critérios explanados acima (hierárquico, cronológico e da
especialidade).
Por fim, conforma-se campo jurídico específico de proteção aos povos e comunidades
tradicionais, determinando o conceito normativo como: “grupos culturalmente diferenciados
e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que
ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas
gerados e transmitidos pela tradição” (Decreto federal 6040/2007)
(http://www.mma.gov.br/desenvolvimento-rural/terras-ind%C3%ADgenas,-
povos-e-comunidades-tradicionais):
Situação (1)
https://www.cartacapital.com.br/sociedade/numa-canetada-o-recuo-de-15-anos-na-
politica-de-terras-quilombolas
Situação (2)
Nesta quarta-feira (19), foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) a portaria do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que reconhece e declara seu território como
remanescente de quilombo.
Publicado em 01/março/2014
A comunidade quilombola de Pau D’arco Parateca, localizada em Malhada, sudoeste baiano, deu
um passo importante para a regularização fundiária. Nesta quarta-feira (19), foi publicada no Diário
Oficial da União (DOU) a portaria do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
que reconhece e declara seu território como remanescente de quilombo.
Com a publicação da portaria e do memorial descritivo no DOU, o Incra pode iniciar a
desapropriação de 41.780 hectares do território de Pau D’arco Parateca, sendo que 7.801,44 foram
titulados em setembro do ano passado devido à concessão da Gerência Regional de Patrimônio da
União (GRPU) no estado.
A ocupação da comunidade Pau D’arco Parateca, onde vivem 423 famílias, começou na segunda
metade do século XVI, com destaque para a criação de gado e a mineração. A região entrou em
decadência econômica no início do século XVIII, o que possibilitou a insurgência da população
escrava contra a ocupação de terras. Os negros se estabeleceram e se desenvolveram nas terras
próximas das fazendas dos brancos, principalmente, devido à doação de uma légua de terras para
Nossa Senhora Santana e para eles.
(http://www.folhadovale.net/comunidades-quilombolas-de-pau-darco-e-parateca-sao-
reconhecidas-pelo-incra.html)
Situação (3)
O empresário e advogado Ademir Oliveira dos Passos está sendo processado em uma ação
civil conjunta do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual da Bahia por
ofensa à liberdade religiosa e destruição de patrimônio... - Veja mais em
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2011/10/25/mps-pedem-indenizacao-
a-empresario-que-destruiu-terreiro-sagrado-de-candomble-para-construir-condominio-de-
luxo.htm?cmpid=copiaecola.
6. Considerações finais: direito étnico e campo jurídico dos povos e comunidades
tradicionais
http://www.scielo.br/pdf/ccrh/v29n76/0103-4979-ccrh-29-76-0119.pdf
Para reflexão, quais os maiores desafios ao tratar do direito dos povos e comunidades
tradicionais atualmente no Brasil?
Trabalho em grupo: Que direitos podem ser observados advindos dos próprios povos e
comunidades tradicionais (faça análise em grupo de um caso de produção jurídica
comunitária)
Referências