Você está na página 1de 3

O Bibliotecário e sua função social – Aparelhagem disciplinar.

A importância da educação para os indivíduos e a sociedade, em geral, é indiscutível. Por


ela, o cidadão adquire os rudimentos necessários ao usufruto da cultura e das ciências. Ela
adquire importância ainda maior se se levar em conta o contexto atual no qual vivem as
sociedades humanas, e “(...) a necessidade de aprender gera a necessidade de ler” (ARAÚJO,
1985, p. 110). Estamos vivendo o que chamamos de sociedade da informação, onde o
aprendizado ganha cada vez maior importância, e a informação, principal instrumento de
trabalho do bibliotecário, está constantemente evoluindo. Porém, o acesso à mesma não é
igualitário. Os suportes nos quais a informação se encontra estão fora das possibilidades
aquisitivas de grande parcela da população, e “(...) a leitura ainda é monopólio das classes
favorecidas economicamente.” (ARAÚJO, 1985, 110).

Nesse sentido, a função que o bibliotecário adquire é a de democratizador do


conhecimento. Tal função adquire ainda maior importância no contexto abordado por Walkiria
Toledo de Araújo. A autora argumenta que “(...) as funções gerais da biblioteca pública são
relevantes em qualquer país, mas deveriam merecer maior atenção nos menos privilegiados, onde
a população, por dispor de menores recursos pessoais, precisa mais desse apoio.” (ARAÚJO,
1985, P. 107).

Eliany Alvarenga de Araújo, por sua vez, afirma que “a informação (...) está se tornando
em elemento constitutivo de produção e, assim sendo, (...) adquire uma natureza de mercadoria.”
(ARAÚJO, 1997, p. 2). Na sociedade capitalista, quando um bem adquire um valor de
mercadoria, apenas aqueles que podem pagar mais por ele têm direito ao seu usufruto. Como
resultado, a lógica mercadológica é altamente excludente.

A Biblioteca e o Bibliotecário adquirem enorme importância. “A biblioteca em si tem


como papel fundamental o de promover a difusão da informação em quaisquer suportes, pois é
através da informação que ela pode contribuir na formação dos cidadãos e na construção de uma
sociedade mais justa” (MACIEL, MENDONÇA, LAVOR, P. 2).

Pensando na conjuntura abordada, faz-se de suma importância a análise curricular que


compõe os cursos superiores de Biblioteconomia. Ao bibliotecário, é insuficiente que ele detenha
apenas “as habilidades técnicas na área de Biblioteconomia, ou esteja atento aos avanços
tecnológicos, este profissional necessita conhecer a real necessidade da sociedade e habilitar-se
como um agente social.” (FRANCISCO, 2007, p. 14). A análise das grades curriculares dos
cursos de Biblioteconomia revela, no entanto, que as disciplinas relacionadas ao fazer social do
bibliotecário se encontram em número insuficiente. A grade curricular do curso de graduação em
Biblioteconomia da UFES revela que apenas uma disciplina trata da ação social como temática
prioritária, dentro da grade curricular obrigatória. O nome da disciplina é Ação Cultural, e ela é
ministrada no quinto período do curso. A ementa da disciplina consiste no ensino de
fundamentos teóricos e metodológicos para a atuação em contextos de mediação cultural. Na
grade de disciplinas eletivas, estão as disciplinas Tópicos Especiais em Biblioteconomia I, II e
III. Essas disciplinas tratam da integração entre os conceitos informação, cidadania e tecnologia,
e problematizam a democratização do conhecimento. No entanto, apenas essas disciplinas são
insuficientes, e o bibliotecário acaba se preparando apenas para o trato com a informação e suas
diversas mídias, problematizando sobre sua prática, é verdade, mas ainda sem um grande preparo
para o trato com o público em seus diferentes matizes. Um olhar para as grades curriculares de
outros cursos de Biblioteconomia em outras universidades federais pelo Brasil revela uma
situação semelhante à presenciada na instituição capixaba.

A UFBA, também uma instituição de ensino conceituada, também conta com um


currículo mais voltado para a parte tecno-científica da biblioteconomia do que para o
fazer social do bibliotecário. Apenas duas disciplinas, Ação Cultural em bibliotecas e
Bibliotecas Públicas Escolares, preenchem esse vazio. As ementas destas disciplinas,
respectivamente, são:

• "Ambiente onde a ação cultural pode ser deflagrada. Estímulos socioculturais das
comunidades: Histórias culturais, artísticas e educativas. A ação cultural como
conceito decorrente das necessidades existentes ou circunstanciais expressas pelo
público-alvo. A ação cultural como processo: etapas, concretização de objetivos e
avaliação.

• Conceituação e função das bibliotecas infantis, escolares, públicas e comunitárias.


Estrutura, funcionamento e dinamização. As diferentes abordagens da leitura
como fator de desenvolvimento. Legislação e estabelecimento de uma política de
bibliotecas. Perspectivas e alternativas das bibliotecas e o papel do bibliotecário."
(Biblioteconomia Matriz UFBA, p. 4 e 5)

Outra instituição pública de ensino, a Universidade Federal de Santa Catarina, também


conta com um curso de Biblioteconomia tão conceituado quanto das supra citadas. As
disciplinas ministradas a tratarem do fazer social do bibliotecário, nesta instituição,
também são poucas. Comunicação, cuja ementa visa o estudo de progressos sociais,
processos de comunicação e abordagens teóricas referentes; e Relações humanas, que
cuida de estudar os grupos e suas dinâmicas, a comunicação e os problemas a ela
relacionados, são as disciplinas vltadas ao fazer sociocultural do bibliotecário, oferecidas
na grade de disciplinas obrigatórias. Na grade de disciplinas optativas, há as disciplinas
de Biblioterapia, que conceitua filosoficamente a biblioterapia, e apresenta o módulo
biblioterápico; Informação e cidadania, que trata da problemática referente ao Estado e à
garantia dos direitos do cidadão e da coletividade à informação e à comunicação; e
Unidades de Informação gerais, que trata da elucidação da questão das bibliotecas
infantis, escolares e públicas, são as disciplinas voltadas para o fazer biblioteconômico
social. Como se viu nas outras IES descritas, na UFSC, o foco do curso de
biblioteconomia está centrado no trato e conservação do documento, mais do que na
disseminação e democratização da informação.

Conclui-se, a partir dos dados apresentados, que uma reforma curricular se faz necessária
em todos os cursos de graduação em Biblioteconomia, pois mais do que um serviço de
documentação, o fazer do bibliotecário é um fazer social.

Você também pode gostar