Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
(sociopatia)
■ Encontrei Ryan pela primeira vez em sua festa de 17 anos. Infelizmente, estava
comemorando a data em um hospital psiquiátrico. Havia se ausentado da
escola por diversos meses e tinha provocado alguns problemas; o juiz que
analisou o seu caso havia recomendado avaliação psiquiátrica mais uma vez,
embora Ryan já tivesse sido hospitalizado 6 vezes, sempre por problemas
relacionados ao uso de drogas e negligência com os estudos. Ele era veterano
do sistema e já conhecia a maioria da equipe hospitalar. Eu o entrevistei para
avaliar por que havia sido internado desta vez e para recomendar um
tratamento.
■ Minha primeira impressão foi de que Ryan demonstrava cooperação e era
simpático. Apontou para uma tatuagem que ele mesmo havia feito, no braço, e
disse que foi uma “coisa estúpida” tê-la feito, agora estava arrependido. Na
verdade, arrependia-se de muitas coisas e tinha expectativa de progredir na
vida. Mais tarde, descobri que ele nunca sentira remorso por nada.
■ A segunda entrevista foi bem diferente. Durante essas 48 horas, Ryan havia
participado de algumas atividades que demonstraram a necessidade de muita
ajuda. O incidente mais sério envolveu uma moça de 15 anos chamada Ana que
estava na mesma classe de Ryan na escola do hospital. Ryan disse-lhe que iria
pedir alta, criaria problemas e seria enviado à mesma prisão em que estava o pai
de Ana. Lá, ele violentaria essa pessoa. A ameaça de Ryan perturbou tanto a
moça a ponto de ela agredir o professor e diversos membros da equipe.
■ Quando falei com Ryan a respeito disso, ele esboçou um leve sorriso, disse que
estava entediado e se divertia provocando Ana. Quando lhe perguntei se ficava
perturbado pelo fato de seu comportamento poder estender a permanência de
Ana no hospital, pareceu surpreso e disse: “Por que isso deveria perturbar-me.
Ela quem vai ficar nesse buraco do inferno!”.
■ Um pouco antes da internação de Ryan, um adolescente em sua cidade foi
assassinado. Um grupo de jovens foi ao cemitério à noite para realizar rituais
satânicos e um rapaz foi esfaqueado até morrer, aparentemente por causa de
droga.
■ Ryan estava no grupo, embora não tivesse esfaqueado o rapaz. Ele me disse
que, ocasionalmente, os amigos violavam sepultaras a fim de conseguir
caveiras para as festas; não por acreditarem no Diabo, mas por ser divertido
e assustar os meninos mais novos. Perguntei: “E se esse fosse o túmulo de
um conhecido, parente ou amigo seu você ficaria aborrecido pelo fato de
estranhos estarem profanando os restos mortais”. Ele meneou com a cabeça.
“Eles estão mortos, cara; não se importam. Por que eu deveria”.
■ Ryan disse-me que adorava “pó-de-anjo”, e que preferia consumi-lo a tudo o
mais. Com frequência, viajava 2 horas até Nova York para comprar drogas
em um bairro perigoso. Negou ter ficado nervoso em alguma ocasião. Isso
não era machismo; realmente parecia despreocupado.
■ Ryan progrediu pouco. Discuti seu futuro em sessões de terapia com
familiares e conversamos a respeito de seu padrão de demonstrar suposto
arrependimento e remorso e, então, furtar dinheiro dos pais e voltar à rua.
A maior parte de nossas discussões tinha como foco tentar incutir nos
pais a coragem de dizer não ao filho e de não acreditar nas mentiras dele.
■ Uma noite, após diversas sessões, Ryan disse que havia percebido o “erro
de seu modo de ser” e que se sentia mal por ter aborrecido seus pais. Se
eles o levassem para casa essa última vez, seria o filho que deveria ter
sido todos esses anos. Suas palavras fizeram que os pais, comovidos,
derramassem lágrimas e olhassem-me reconhecidos, como em
agradecimento por ter curado o rapaz. Quando Ryan parou de falar, sorrir,
aplaudir disse-lhe que era a melhor performance que havia visto.
■ Os pais deles olharam-me irritados. Ryan parou um segundo, também sorriu
e disse: “Valeu como provocação!”. Os pais de Ryan ficaram
impressionados pelo fato de o filho ter lhes enganado mais uma vez; não
houve sinceridade em nenhuma palavra que acabara de dizer.
■ No final, Ryan teve alta e foi encaminhado a um programa de recuperação
de drogados. No intervalo de 4 semanas, havia convencido os pais a leva-lo
para casa e após 2 dias tinha roubado todo o dinheiro deles e desaparecido;
aparentemente, juntou-se aos amigos e voltou a usar drogas.
■ Aos 20 anos, após uma das várias detenções por furto, foi diagnosticado
como portador do Transtorno da Personalidade Anti-social. Seus pais nunca
tiveram coragem para expulsá-lo ou recusar dinheiro; Ryan continua a
manipulá-los a fim de que lhe deem meios para comprar mais drogas.