Você está na página 1de 14

Transtorno da personalidade anti-social

(sociopatia)

Profª. Msc. Sarah Monteiro


sarah_mctf@hotmail.com
Definição básica

■ A personalidade se trata de um conjunto integrado


de traços psíquicos, consistindo no total das
características individuais, em sua relação com o
meio, incluindo todos os fatores físicos, biológicos,
psíquicos e socioculturais de sua formação,
conjugando tendências inatas e experiências
adquiridas no curso da existência do indivíduo.

■ Possui um duplo aspecto:


- É relativamente estável ao longo da vida do
indivíduo.
- É dinâmico, isto é, sujeito a determinadas
modificações, dependendo de mudanças
existenciais. Portanto, a estrutura da personalidade
pode ser mutável sem ser necessariamente
instável.
Transtornos da personalidade

■ O transtorno da personalidade foi, ao longo dos últimos dois séculos, nomeado


de diversas formas: insanidade moral, monomania moral, transtorno ou neurose de
caráter, etc. Entretanto, o termo que mais se tornou popular entre os profissionais
de saúde mental foi psicopatia. Tal vocábulo foi, infelizmente, utilizado de modo
muito impreciso, ora se identificando psicopatia com personalidade sociopática,
ora com transtornos da personalidade em geral.

■ No transtorno da personalidade, há uma marcante desarmonia que se reflete


tanto no plano intrapsíquico como no das relações interpessoais.

■ Embora de modo geral produzam consequências muito penosas para o


indivíduo, familiares e pessoas próximas, os transtornos da personalidade não são
facilmente modificáveis por meio das experiências da vida; tendem, antes, a
permanecer estáveis ao longo dela toda.
Características dos transtornos da personalidade

■ Geralmente surgem na infância ou adolescência e tendem a permanecer


relativamente estáveis ao longo da vida do indivíduo;
■ Manifestam um conjunto de comportamentos e reações afetivas claramente
desarmônicos;
■ O padrão anormal de comportamento e de respostas afetivas e volitivas é
permanente, de longa duração;
■ O padrão comportamental é mal adaptativo, produz uma série de dificuldades
para o indivíduo e para as pessoas que com ele convivem;
■ Em geral, o transtorno da personalidade contribui para o mau desempenho
ocupacional (no trabalho, estudos, etc.) e social (com familiares, amigos,
colegas de trabalho ou estudo).
Classificação dos transtornos da personalidade

■ Os transtornos da personalidade podem ser agrupados


em três grandes subgrupos:

A – esquisitos e/ou desconfiados;

B – instáveis e/ou manipuladores;

C – ansiosos e/ou controlados-controladores.


Transtorno da personalidade anti-social (sociopatia)

■ Segundo a tradição psicopatológica, os sociopatas são pessoas


incapazes de uma interação afetiva verdadeira e amorosa.

■ Não têm consideração ou compaixão pelas outras pessoas,


mentem, enganam, trapaceiam, prejudicam os outros, mesmo a
quem nunca lhes fez nada.

■ São popularmente conhecidos como “mau caráter”, “canalha”, etc.


Características do Transtorno da personalidade
anti-social (sociopatia) segundo o CID-10

1. Indiferença e insensibilidade pelos sentimentos alheios


2. Irresponsabilidade e desrespeito por normas, regras e obrigações sociais
3. Incapacidade de manter relacionamentos, embora não haja dificuldade em
estabelecê-los
4. Muito baixa tolerância a frustrações e baixo limiar para descarga de
agressão, inclusive violência
5. Incapacidade de experimentar culpa e de aprender com a experiência,
particularmente com a punição
6. Propensão marcante para culpar os outros ou para oferecer racionalizações
plausíveis para o comportamento que gerou seu conflito com a sociedade
7. Crueldade e sadismo são frequentes nesse tipo de personalidade
Critérios do DSM-IV para o transtorno de
personalidade anti-social

A. Padrão global de desrespeito e violação dos direitos dos demais


que ocorre desde os 15 anos, conforme indicado por três ou mais
dos seguintes critérios:

1. Incapacidade para seguir as normas sociais relativas ao


comportamento de acordo com a lei indicada pela repetição de atos
que motivam detenção.
2. Falsidade indicada por repetir mentiras, usar pseudônimos ou
pressionar outras pessoas para obter vantagem pessoal ou prazer.
3. Impulsividade ou fracasso para planejar o futuro.
4. Irritabilidade e agressividade indicadas por repetidas lutas ou
agressões físicas.
5. Desprezo imprudente pela própria segurança e pela alheia.
6. Irresponsabilidade consistente indicada pela incapacidade contínua
para manter um comportamento constante no trabalho ou honrar
obrigações financeiras.
7. Ausência de remorso indicada por indiferença ou racionalização em
relação ao fato de ter prejudicado, maltratado ou roubado outras
pessoas.

B. A pessoa ter no mínimo 18 anos.


C. Há indícios de transtorno de conduta que surge antes dos 15 anos.
D. A ocorrência do comportamento anti-social não se manifesta
durante a existência da esquizofrenia ou de um episódio maníaco.
Caso clínico: Transtorno de personalidade anti-social

■ Encontrei Ryan pela primeira vez em sua festa de 17 anos. Infelizmente, estava
comemorando a data em um hospital psiquiátrico. Havia se ausentado da
escola por diversos meses e tinha provocado alguns problemas; o juiz que
analisou o seu caso havia recomendado avaliação psiquiátrica mais uma vez,
embora Ryan já tivesse sido hospitalizado 6 vezes, sempre por problemas
relacionados ao uso de drogas e negligência com os estudos. Ele era veterano
do sistema e já conhecia a maioria da equipe hospitalar. Eu o entrevistei para
avaliar por que havia sido internado desta vez e para recomendar um
tratamento.
■ Minha primeira impressão foi de que Ryan demonstrava cooperação e era
simpático. Apontou para uma tatuagem que ele mesmo havia feito, no braço, e
disse que foi uma “coisa estúpida” tê-la feito, agora estava arrependido. Na
verdade, arrependia-se de muitas coisas e tinha expectativa de progredir na
vida. Mais tarde, descobri que ele nunca sentira remorso por nada.
■ A segunda entrevista foi bem diferente. Durante essas 48 horas, Ryan havia
participado de algumas atividades que demonstraram a necessidade de muita
ajuda. O incidente mais sério envolveu uma moça de 15 anos chamada Ana que
estava na mesma classe de Ryan na escola do hospital. Ryan disse-lhe que iria
pedir alta, criaria problemas e seria enviado à mesma prisão em que estava o pai
de Ana. Lá, ele violentaria essa pessoa. A ameaça de Ryan perturbou tanto a
moça a ponto de ela agredir o professor e diversos membros da equipe.

■ Quando falei com Ryan a respeito disso, ele esboçou um leve sorriso, disse que
estava entediado e se divertia provocando Ana. Quando lhe perguntei se ficava
perturbado pelo fato de seu comportamento poder estender a permanência de
Ana no hospital, pareceu surpreso e disse: “Por que isso deveria perturbar-me.
Ela quem vai ficar nesse buraco do inferno!”.
■ Um pouco antes da internação de Ryan, um adolescente em sua cidade foi
assassinado. Um grupo de jovens foi ao cemitério à noite para realizar rituais
satânicos e um rapaz foi esfaqueado até morrer, aparentemente por causa de
droga.
■ Ryan estava no grupo, embora não tivesse esfaqueado o rapaz. Ele me disse
que, ocasionalmente, os amigos violavam sepultaras a fim de conseguir
caveiras para as festas; não por acreditarem no Diabo, mas por ser divertido
e assustar os meninos mais novos. Perguntei: “E se esse fosse o túmulo de
um conhecido, parente ou amigo seu você ficaria aborrecido pelo fato de
estranhos estarem profanando os restos mortais”. Ele meneou com a cabeça.
“Eles estão mortos, cara; não se importam. Por que eu deveria”.
■ Ryan disse-me que adorava “pó-de-anjo”, e que preferia consumi-lo a tudo o
mais. Com frequência, viajava 2 horas até Nova York para comprar drogas
em um bairro perigoso. Negou ter ficado nervoso em alguma ocasião. Isso
não era machismo; realmente parecia despreocupado.
■ Ryan progrediu pouco. Discuti seu futuro em sessões de terapia com
familiares e conversamos a respeito de seu padrão de demonstrar suposto
arrependimento e remorso e, então, furtar dinheiro dos pais e voltar à rua.
A maior parte de nossas discussões tinha como foco tentar incutir nos
pais a coragem de dizer não ao filho e de não acreditar nas mentiras dele.

■ Uma noite, após diversas sessões, Ryan disse que havia percebido o “erro
de seu modo de ser” e que se sentia mal por ter aborrecido seus pais. Se
eles o levassem para casa essa última vez, seria o filho que deveria ter
sido todos esses anos. Suas palavras fizeram que os pais, comovidos,
derramassem lágrimas e olhassem-me reconhecidos, como em
agradecimento por ter curado o rapaz. Quando Ryan parou de falar, sorrir,
aplaudir disse-lhe que era a melhor performance que havia visto.
■ Os pais deles olharam-me irritados. Ryan parou um segundo, também sorriu
e disse: “Valeu como provocação!”. Os pais de Ryan ficaram
impressionados pelo fato de o filho ter lhes enganado mais uma vez; não
houve sinceridade em nenhuma palavra que acabara de dizer.
■ No final, Ryan teve alta e foi encaminhado a um programa de recuperação
de drogados. No intervalo de 4 semanas, havia convencido os pais a leva-lo
para casa e após 2 dias tinha roubado todo o dinheiro deles e desaparecido;
aparentemente, juntou-se aos amigos e voltou a usar drogas.
■ Aos 20 anos, após uma das várias detenções por furto, foi diagnosticado
como portador do Transtorno da Personalidade Anti-social. Seus pais nunca
tiveram coragem para expulsá-lo ou recusar dinheiro; Ryan continua a
manipulá-los a fim de que lhe deem meios para comprar mais drogas.

Você também pode gostar