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ALAGOAS MUNDI

PANORAMA DA CULTURA ALAGOANA EM VERBETES


PARA CONHECER E ENTENDER A TERRA CAETÉ

F. A. CASTRO

Concepção, pesquisa e organização

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RESUMO DO LIVRO

“A massa ainda comerá os biscoitos finos que fabrico”,


disse em seu tempo o escritor brasileiro Oswald de Andrade. É
assim que tratamos essa obra, no sentido de que ela ganhe corpo
junto aos alagoanos e brasileiros, numa tentativa de obter uma
massa crítica que reúna o essencial da “alma alagoense”: quem
somos nós? De onde viemos? Para onde vamos? A publicação traz
um verniz a mais, o coloquial, o compreensivo, uma lupa sobre os
maiores tesouros, os ícones, as incríveis estórias e histórias do
povo e da terra de Alagoas. Trata-se de uma ampla coleção de
verbetes em todas as áreas em que foi possível ao longo da
pesquisa, da investigação e da vivência: heróis e vilões, figuras
populares, alagoanos universais, história, geografia,
biodiversidade, celebrações, literatura, arte popular, folguedos e
folclore, música, cinema, literatura, política, economia, esportes,
memórias e perfis. Todas as pérolas capturadas estão enfeixadas
em textos curtos e concisos, mas editados de forma a não
comprimi-los em excesso, para que a publicação cumpra com
eficiência o seu objetivo: instruir a todos sobre todas as coisas de
Alagoas e tentar construir uma memória coletiva. Boa leitura!

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SUMÁRIO

VERBETES TEMÁTICOS

ÁGUA

Águas do Norte
Águas do Sul
Águas de Maceió

TERRA

Terra de ícones
Terra das maravilhas
Terra de valentes
Terra de heroínas
Terra do cangaço
Terra dos vilões
Terra da poesia
Terra de campeões
Terra de futebol

GENTE

Profissões e ofícios
Índios das Alagoas
Negros das Alagoas

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Ilustres iletrados
Figuras populares
Figuras do Carnaval
Legião estrangeira
Memória da Imprensa Alagoana
Memória política e parlamentar

CULTURA POPULAR

Folclore e Folguedos
Mestres do Patrimônio Vivo
Pensadores do folclore alagoano

ARTE POPULAR

Riqueza das matérias primas


Artistas populares de ofício
Principais Centros de produção

ARTES & ARTISTAS

Música
Teatro
Dança
Cinema
Artes Plásticas

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LITERATURA ALAGOANA

Pioneiros
Livros do século XX
Alagoanos imortais
Escritores e poetas
Escritoras e poetisas
Caldeirão Cultural de Lindoso
Alagoanos Universais

PATRIMÔNIO HISTÓRICO

Bens Oficiais Tombados


Circuito Cultural
Celebrações

BIODIVERSIDADE: FAUNA & FLORA

Interior de Alagoas
Litoral de Alagoas
Ambientalistas alagoanos

LIVROS PARA ENTENDER ALAGOAS

ÍNDICE REMISSIVO

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ÁGUAS

“Alagoas nasceu assim, sem saber que nascia. Passou


quatrocentos anos pensando que era Pernambuco, e a partir da
correntezinha de água do riacho Persinunga já era Alagoas. E na
parte Sul, Alagoas se afaga nas águas mágicas e santas do forte do
Penedo. E é assim, Penedo nasce penha, e é pedra até hoje. Em
Penedo nós alagoanos enterramos nossas almas. Em Penedo subimos
o rio, e deixamos nos seus conventos nossas orações. Em Penedo está
a pedra que fundou Alagoas. Em Porto Calvo o alemão Christoffer
Linz cavou a terra molhada das enchentes do rio Manguaba e criou
canaviais. Em Penedo se pôs a pedra e se construiu a fortaleza
memorável. Em Porto Calvo se plantou a riqueza da sociedade
colonial. Na rocha do Penedo se plantou a fortaleza, e na moleza do
massapé de Porto Calvo se plantou o verde-mar das riquezas dos
canaviais. Alagoas foi feita dessa mistura da pedra do Penedo com o
barro massapê das colinas de Porto Calvo”.

Dirceu Lindoso, trecho do discurso do professor e


antropólogo alagoano ao receber o título de Honoris Causa da
Faculdade de Direito da Ufal, em 2011

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ÁGUAS DO SUL

Sambaqui na pré-história das Alagoas (sec. XV)

Esqueletos de índios achados no litoral Sul são as marcas


dos tempos imemoriais. O escritor alagoano Alfredo Brandão
registra em seu livro “A escripta prehistórica do Brasil”,
publicado em 1937, a existência, em Coruripe, de um grande
sambaqui (montes de fósseis calcificados, com ossos e esqueletos
que chegam a alcançar dezoito metros de altura).

“Um enorme sambaqui começava a ser explorado para o


fabrico de cal, e do qual se retiraram ossos, machados, armas de
guerra, pilões e outros artefatos de pedra. Posteriormente foram
identificados restos de sambaquis no litoral e nas ilhas das lagoas
desse Estado”.
Alfredo Brandão, citado por Gabriele Martins, em Povos do
Litoral Nordeste na Pré-História, 2006.

Um mundo de fósseis e inscrições rupestres

Ainda em seu livro, no capítulo “A pré-história de


Alagoas”, o escritor viçosense Alfredo Brandão assinala registros
de fósseis em todo território alagoano, desde um crânio petrificado
encontrado em 1866, nas imediações da cachoeira de Paulo
Afonso, “dentro de uma pedra partida por um raio”, até no outro
lado do mapa, em Porto de Pedra, no litoral Norte de Alagoas, em

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uma gruta que guardava “grande quantidade de corpos humanos
ressequidos, quase petrificados”. Quanto às inscrições rupestres,
dois renomados exploradores, o americano Richard Burton e o
inglês John Brenner, em trabalho nas regiões do São Francisco e
do Sertão de Alagoas, descobriram paredões “com estranhos
caracteres feitos nas pedras”, em Olho d´Água do Casado, Piranhas
e Santana do Ipanema.

“Essas inscrições têm sido assinaladas em inúmeras partes do


território alagoano. Alfredo Brandão faz referências a algumas delas,
encontradas em rochedos de Viçosa, Capela, Atalaia, Porto de Pedra,
Anadia, Palmeira dos índios, e até em Maceió, no sítio Leópolis, na
localidade de Bica da Pedra. Consequentemente, as regiões
alagoanas devem ser compreendidas entre aquelas que ofereceram
testemunho da pré-história americana”.
Por Jayme de Altavila, no livro História da Civilização das
Alagoas, reeedições DEC 1962

Navios de Cabral: Alagoas, terra à vista! (1500)

Para uma corrente de cientistas, formada por historiadores


locais e até internacionais do século passado, não foi em Porto
Seguro, na costa baiana, que o navegante Pedro Cabral descobriu o
Brasil. Estes pesquisadores apontam as serras do litoral Sul de
Alagoas como a primeira visão de Cabral, em 1500. No famoso
livro do escritor alagoano Jayme de Altavila, A História da
Civilização das Alagoas, de 1962, o primeiro ponto avistado não

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foi o monte Pascoal, na Bahia, mas a Serra da Nacêa, em Anadia.
Em um relato vibrante e histórico, mas sempre presumindo os
fatos, Altavila conta ainda que foi no litoral de Coruripe o
“possível ancoradouro da esquadra” de Cabral. Leia trechos do
livro, colhido da quarta edição, com o chancela do Departamento
Estadual de Cultura e anotações do historiador Moacir Medeiros de
Sant´Anna.

“O primeiro ponto avistado pela frota portuguesa é de se


presumir que tenha sido um dos cabeços da Serra da Nacêa, no
município alagoano de Anadia. Esta é a minha opinião,
fundamentada no erudito Alexandre Von Humbolt, os quais afirmam
que as primeiras terras avistadas pela armada portuguesa estavam
localizadas a 10 graus de latitude Sul, por conseqüência entre Jequiá
e Coruripe”.

“O aspecto físico da Baía de Cabrália que se aponta como


ancoradouro das naus portuguesas, é semelhante ao nosso, pelo
menos com relação às barreiras vermelhas e brancas, porquanto
naquela região baiana não existe nenhuma lagoa de água doce,
existindo apenas “três pequenas lagoas salgadas, cujas
comunicações com o mar, só se estabelecem nas marés altas”.

Descoberta da foz do São Francisco (1501)

Há 517 anos, mais precisamente no dia 4 de outubro de


1501, o rio São Francisco, já habitado por índios, foi descoberto

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pelos navegantes Américo Vespúcio e André Gonçalves. Para os
índios ele sempre se chamou opara (rio mar), mas foi o navegador
italiano Vespúcio, que o batizou de rio São Francisco. No comando
de quatro caravelas, ele navegou a costa marítima das terras recém
descobertas, e em 4 de outubro (dia de São Francisco), chegou à
foz do grande rio. Só em 1522, durante as Capitanias Hereditárias,
é fundado o primeiro núcleo de povoação de todo Baixo São
Francisco, hoje a cidade de Penedo.

Piratas franceses e o tráfico do pau-brasil (1555-1840)

Os franceses desde cedo, por volta de 1555, começaram a


fazer incursões pela região costeira alagoana, de olho no tráfico do
pau-brasil.

“A passagem dos franceses pelas plagas alagoanas está


comprovada na denominação do porto que serviu, no período
colonial, para escoamento das mercadorias da região da lagoa
Mundaú, o Porto dos Franceses (hoje a praia do Francês), localizada
a uns 12 quilômetros da Capital (Maceió), e que se acha consignado
no chamado mapa de (Gaspar) Barleus (historiador holandês), e que
data do longínquo ano de 1643. O contrabando de pau-brasil nas
costas alagoanas foi praticado até 1840, quando foi apreendido em
Coruripe um brigue francês, que se achava em parte carregado de
pau-brasil.”
Jayme de Altavila, História da Civilização de Alagoas, 1962
– com anotações de Moacir Medeiros de Sant´Ana

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Índios Caetés dominavam litoral Sul

Os caetés – na língua nativa morador de grandes florestas -


eram conhecidos navegadores das costas brasileiras. Faziam
embarcações de junco e taboa e navegavam de Salvador à Ilha de
Itaparica (PE). Atacavam as naus portuguesas com flechas
incendiárias. Segundo o professor e historiador alagoano João
Ribeiro Lemos, os caetés viviam nas Barreiras de Coruripe, em
cima de uma colina que se derrama sobre o mar, existe um lugar
chamado “Espia Grande”. Lá, eles tinham sua aldeia e vigiavam o
mar. De acordo com notas do visconde de Porto Seguro, em seu
livro “História Geral do Brasil”, os caetés eram os mais famosos
navegadores das costas brasileiras. Faziam embarcações para 15
guerreiros com folhas de peri-peri (uma espécie de junco) e com
elas desafiavam tropas portuguesas e corsários. Em sua obra sobre
a história de Coruripe, João Lemos traça um magnífico perfil de
como eram e como viviam os caetés.

“Eram antropófagos ferozes, mas de rara beleza. Tinham


estatura mediana, eram robustos e entroncados, de olhos pequenos de
coloração negra, nariz meio achatado, boca grande e cabelos grossos
e pretos. A pele tinha cor de folha seca. Certamente impressionaram
Pero Vaz de Caminha, pela forma como ele os descreve em sua
carta”.

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João Ribeiro Lemos, professor e historiador alagoano em
História de Coruripe, 2004, edição do autor

Caetés devoram 1º bispo do Brasil (1556)

Antes do banquete antropofágico - que envolveu os nativos


caetés e dom Pero Fernandes Sardinha – nas três primeiras décadas
dos anos 1500, todo território do Sul de Pernambuco até a foz do
Rio São Francisco, era dominado por duas nações indígenas:
Caetés (litoral Sul de Alagoas) e Potiguares (ao norte de
Pernambuco). Quando naquele dia 16 de junho de 1556, aconteceu
o naufrágio da nau portuguesa Nossa Senhora da Ajuda, nos
Baixios de Dom Rodrigo, litoral de Coruripe. Com destino a
Lisboa, toda tripulação ficou pelo caminho: fora devorada pelos
índios caetés, incluindo o 1º bispo do Brasil, dom Pero Fernandes
Sardinha.

“Segundo Moreno Brandão e Craveiro Costa, apoiados em


Frei Vicente de Salvador, acompanhavam dom Fernandes Sardinha
nesta viagem a Lisboa, onde o bispo ia se queixar ao rei do
governador-geral, o provedor Antonio Cardoso e Barros, dois
cônegos, duas mulheres honradas, muitos homens nobres e outra
muita gente, que por todo eram mais de cem pessoas. Rumando os
sobreviventes do naufrágio para Olinda, por terra, foram supliciados
pelos selvagens, salvaram-se apenas dois índios baianos e um
português por falarem a língua nativa”.

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Nota de Elcio de Gusmão Verçosa, em Cultura e Educação
nas Alagoas – História, histórias, Secretaria de Educação -Maceió-
2001

Guerra de extermínio aos Caetés

O episódio do naufrágio e morte da tripulação provocou


uma grande ira entre os homens da corte, os donatários e os
senhores de engenho. Segundo Moreno Brandão, citado por Élcio
Verçosa, o ato provocou uma expedição punitiva, que se
transformou em uma “guerra de extermínio”. A expedição seria
comandada por Jerônimo Albuquerque, cunhado do donatário da
capitania de Pernambuco, e teria a participação do senhor de
engenho e o fundador de Porto Calvo, Cristóvão Lins. O ato de
canibalismo dos caetés foi considerado pelo Movimento
Modernista de 1922, liderado por Oswald de Andrade, como o
marco zero da civilização brasileira, quando os índios caetés
atacaram e comeram toda tripulação. O castigo veio a galope e de
forma desumana e cruel.

“Jerônimo Albuquerque, comandante das tropas portuguesas,


provocou uma guerra de extermínio contra os caetés, e ainda foi
ratificada pela Igreja Católica que colocou os caetés em escravidão
perpétua. Depois dessa expedição que se estabelece o projeto
português de colonização das terras alagoanas”.

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Elcio de Gusmão Verçosa, em Cultura e Educação nas
Alagoas – História, histórias, Secretaria de Educação -Maceió-
2001

Polos primitivos de colonização (1560)

Passados os tempos medievais, de caça, morte e esconjuro


dos caetés, se deu o início do projeto de colonização portuguesa,
com o surgimento das cidades-mães, os primeiros polos de
desenvolvimento e formação de Alagoas. De acordo com o
historiador alagoano, Manoel Diégues Junior, Alagoas nasceu a
partir de três frentes bem definidas: No Norte, com Porto Calvo
sendo o núcleo de irradiação, outra no Centro do litoral, no entorno
das duas grandes lagoas alí existentes (Mundaú e Manguaba):
Alagoas do Sul (hoje Marechal Deodoro), e o terceiro em Penedo.

Penedo: a “civilização do couro”

O polo de colonização de Penedo é o primeiro na formação


de Alagoas, além de ser o mais antigo é também o que
experimentou uma nova vocação econômica além da cana-de-
açúcar. A região gerou um tipo de sociedade formada de pastores,
criadores de gado bovino, que surgiu a partir da ocupação e

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conquista do sertão e semiárido alagoano, com a criação da
chamada “civilização do couro” (termo cunhado pelo historiador
cearense Capistrano de Abreu). Uma sociedade de estrutura social
mais simples, com um mínimo de distância social entre os “donos”
da terra e do gado com o vaqueiro-tangedor, sem o uso do trabalho
escravo negro comprado dos navios negreiros.

“Os proprietários das fazendas de gado nem sempre sabiam


aonde iam os limites, pois não havia demarcação. O gado pastava ao
dará, e só nos rodeios se fazia a partilha do gado chucro. Era uma
sociedade – a do pastoreio são-franciscano – que punha como quase
companheiros a vaqueirada-proprietária e vaqueirada-tangedora.
Não era visível a hierarquia da casa-grande, pelo fato de não haver
escravos negros africanos e porque os índios se adaptavam à
condição de servo-pastores e à vida do pastoreio”.
Dirceu Lindoso, em Primeiros Passos da Formação de
Alagoas, livreto publicado pela Secretaria de Comunicação de
Alagoas, 2005

Porto Calvo: cana e madeira

Em Porto Calvo surgiu a sociedade dos donos de terras,


notadamente os senhores de engenho, do uso maciço da mão-de-
obra escrava negra e da fabricação do açúcar. Os engenhos se
proliferaram na zona das matas úmidas e litorâneas do Norte de
Alagoas.

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“Os moradores eram empregados no corte da madeira de lei
destinada aos estaleiros de Lisboa e da Inglaterra, Eram matas ricas
em madeira tortas para o cavername dos navios. Daí surgiu uma
sociedade complexa e muito hierarquizada, de imensos latifúndios,
polarizada entre a casa-grande e a senzala”.
Dirceu Lindoso, em Primeiros Passos da Formação de
Alagoas, livreto publicado pela Secretaria de Comunicação de
Alagoas, 2005
Grandes lagoas, grandes latifúndios

Já o polo pioneiro da região das grandes lagoas (Mundau e


Manguaba), ocupado pouco depois do de Porto Calvo, nasceu
também da concessão (pela coroa portuguesa) de sesmarias aos
aristocratas de sua confiança, como Diogo Soares. Seu papel foi
muito semelhante ao de Cristóvão Lins no litoral Norte: ganharam
da Coroa portuguesa, durante as Capitanias Hereditárias, no
sistema de sesmarias, imensos nacos de terra. Os alcáides-mor
beneficiados pela doação fatiavam as sesmarias para a família.

“Para se ter uma ideia da dimensão dessas sesmarias, basta


dizer que elas eram concedidas em léguas de terra, cabendo, por
exemplo, a Diogo Soares, uma extensão territorial que ia da enseada
da Pajuçara ao Porto do Francês (hoje praia do Francês), com cerca
de seis léguas por sete léguas de fundo. Dá para imaginar então a
imensidão dos latifúndios que são outorgados oficialmente aos
primeiros colonizadores, que, por sua vez, irão subdividir seus
domínios impossíveis de serem tocados como uma única empresa”.

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Elcio de Gusmão Verçosa, em Cultura e Educação nas
Alagoas – História, histórias, Secretaria de Educação -Maceió-
2001

Rios e escravos na economia do açúcar

Os engenhos de açúcar durante a colonização portuguesa e a


invasão holandesa, nunca deixaram de prosperar. Os senhores de
engenho usavam rios e escravos para prosperar negócios. Pela
exuberante hidrografia da região Norte do Estado, com muitos rios,
lagoas e mananciais, os engenhos permaneceram com o
predomínio da economia regional, mesmo em épocas de guerra,
como entre Portugal e Holanda, e com uso intensivo de mão de
obra de negros africanos. No ensaio de Catarina Agudo, da
Universidade Federal de Alagoas, sobre Georg Marcgraf
(cartógrafo alemão que em 1643 fez um criterioso e pioneiro
mapeamento dos rios e lagoas da costa alagoana, a pesquisadora
cita (Cortesão, 1971) para mostrar como funcionava o sistema
entre os engenhos de cana e os rios.

“A cultura da cana procurou sempre as proximidades das


regiões de rios ou riachos, e não se distanciou, por interesses
comerciais, do mar. É na água dos rios, dos pequenos rios, que o
senhor de engenho encontra o melhor colaborador para sua
organização econômica. É nos rios que ele vai buscar não somente a
água para movimentar a moenda; nele está água para umidade ao

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solo, para o transporte da produção, para o banho dos animais;
também para o seu banho e o da sua família”.
Catarina Agudo Menezes, no trabalho Alagoas de Marcgraf,
apresentado no 1º Simpósio de Cartografia Histórica, em Paraty
(RJ) – 2011.

Mapas mostram vida colonial em Alagoas

Ainda no trabalho de Catarina Agudo, Marcgraf fez


registros de toda a vida cotidiana da época na região das Matas e
do Litoral Norte de Alagoas, onde mostra uma casa de farinha, a
pesca do arrastão e até cenas de batalhas entre europeus e
indígenas, caças de animais, e os conflitos marítimos. Marcgraf,
segundo Catarina, identificou 63 rios, 12 lagoas, sendo seu
trabalho bem superior aos mapas confeccionados no século XVIII.

“No contexto alagoano, estes mapa consiste em uma rica


representação de diversos aspectos de seu território, como povoados,
vilas, engenhos de açúcar, currais e alguns objetos arquitetônicos.
Entretanto, sua característica mais notável é o levantamento
cuidadoso dos rios e lagoas da costa alagoana, conhecidos até
então”.
Catarina Agudo Menezes, no trabalho Alagoas de Marcgraf,
apresentado no 1º Simpósio de Cartografia Histórica, em Paraty
(RJ) – 2011.

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ÁGUAS DO NORTE

Praias do Norte viram praça de guerra (1631)

Em pleno “ciclo do açúcar”, quando os engenhos


dominavam a economia, Alagoas entrou na guerra entre
portugueses e holandeses, em 21 de setembro de 1631, na praia de
Barra Grande (Maragogi), com o desembarque de tropas lusas de
10 caravelas e 400 homens para tentar retomar Porto Calvo dos
holandeses. Foram batalhas ferozes entre vitórias e derrotas para
ambos os lados. Um ano depois, em outubro de 1632, na mesma
praia de Barra Grande, os comandantes holandeses, guiados por
Domingos Fernandes Calabar - lendário mestiço alagoano que
passou a apoiar os batavos – consegue reconquistar Porto Calvo e
Porto de Pedras.

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“Após o assalto e tomada de Rio Formoso (PE), Calabar
lembrou a necessidade de transportar-se a campanha para Alagoas.
À frente de 400 homens, embarcados em seis navios e oito barcaças
velejou para sua terra, trazendo o desígnio de apoderar-se de Porto
de Pedra e Porto Calvo”.
Moreno Brandão, História das Alagoas, Uneal – 2004,
Arapiraca

Na trincheira do Arraial do Bom Jesus (1632)

Em 1632, Calabar ainda combatia o Exército holandês ao


lado do general Matias de Albuquerque, no lugar denominado
Arraial de Bom Jesus (atual Sítio da Trindade, no bairro de Casa
Amarela, em Recife). Em 14 de março de 1630, na defesa do
Arraial, Calabar foi alvejado por um tiro de mosquetão na perna
pelas forças holandesas. Mas em 30 de abril de 1632, Calabar
deixa o Arraial, e vai ao encontro ao alto comando militar
holandês.

“Na naquela madrugada Calabar era recebido com todas as


honras militares, no acampamento holandês em Recife. Sua fama de
guerrilheiro chegara até ali. O Conselho Supremo estava reunido. O
coronel Waerdenburch, o velho e heróico soldado flamengo, foi o
primeiro a apertar a mão do novo aliado. Que fisionomia! Que altivez
de porte! Que músculos! dizia o militar. À boa hora chegava Calabar,
para reanimar os brios da gente batava, justamente quando a

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Holanda desanimada por tantos reveses amadurecia a ideia de
abandonar o Brasil”.
Romeu de Avelar, em Calabar (Interpretação romanceada
do tempo da invasão holandesa), 2ª edição, 1973, edição do
Departamento de Ciência e Cultura do Governo de Alagoas

Calabar vira o jogo para a Holanda (1632-1635)

Nos anos 1632 a 1635, um jovem mestiço alagoano de Porto


Calvo – na época ainda colônia de Pernambuco – Domingos
Fernandes Calabar, então com 23 anos, proprietário de três
engenhos de açúcar junto com sua mãe Ângela Alvarez, adere ao
Exército português entre 1630 a 1632. Idealista e exímio
conhecedor de toda a região, Calabar era prestigiado, sendo braço
direito do general e governador de Pernambuco, Matias de
Albuquerque, até sua deserção, quando passou para o campo das
tropas holandesas, em 22 de abril de 1632.

“A adesão de Calabar aos holandeses coincidiu com o avanço


da conquista, até então restrita ao litoral de Pernambuco e à Ilha de
Itamaracá. Em 1635, a conquista holandesa no Nordeste estava
consolidada, inclusive na Paraíba e no Rio Grande do Norte, além do
interior pernambucano. Os cronistas portugueses destacam muito o
papel de Calabar, que conhecia trilhas e maneiras de lidar com os
índios, pois era mameluco e falava a língua de tabajaras e
potiguaras, além de aprender o holandês e o latim. Parte dos
historiadores, porém, vê um pouco de exagero na “glorificação” de

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Calabar. Na verdade, o que contou mais para as vitórias dos
invasores foram o aumento dos investimentos da Companhia das
Índias e a troca do comando militar, com a chegada do coronel
polonês Christoffel Artichewsky, que ouvia muito os palpites do
Calabar”.
Entrevista com o professor Ronaldo Vainfa, professor de
História da Universidade Federal Fluminense, na revista
Continente, Imprensa Oficial de Pernambuco, 2016

Ataque a Igaraçu: 1ª vitória de Calabar (1632)

Inicialmente, os holandeses não confiaram muito nele. No


entanto, dez dias depois Calabar provou pela primeira vez sua
força como soldado e guerrilheiro. Ele levou as tropas do coronel
Van Waerdenburch a conquistar Igaraçu, segunda cidade de
Pernambuco, para onde uma parte das riquezas de Olinda tinha
sido transportadas. Durante os meses seguintes, muitas campanhas
foram feitas pelas colunas volantes batavas sob a orientação de
Calabar. Eles atacaram à noite, de surpresa, com um esquadrão de
poucas centenas de homens, e lá apreenderam oitenta mil ducados
em ouro e joias, além de gado e outras provisões. Porto Calvo e
Serinhaém também foram vítimas dessa tática, mais eficiente do
que a guerra tradicional e sem grandes e custosos deslocamentos
de tropas. De quebra, muitos senhores de engenhos, temerosos de
ver suas propriedades saqueadas e destruídas, passaram a se
comprometer, secretamente, a não mais apoiar Matias de
Albuquerque, em troca de serem poupados.

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“A lealdade de Calabar se expressa no decurso da guerra.
Segundo os cronistas portugueses, Calabar colaborou, guiou e
comandou muitas investidas holandesas no território através das
quais efetuou as tomadas de Igarassu em 1632, de Rio Formoso,
Itamaracá e Rio Grande do Norte em 1633 e de Nazaré do Cabo em
1634, além de sitiar o Arraial do Bom Jesus em 1635”.
Regina de Carvalho Ribeiro, no artigo Calabar: um
intermediário cultural no Brasil Holandês, 2013

A conquista da fortaleza dos Reis Magos (1633)

Em 1633, com a ajuda de Calabar, foi conquistado grande


parte das capitanias portuguesas no Nordeste, desde Itamaracá até
a fortaleza dos Reis Magos, e com isso o Rio Grande do Norte. Na
parte sul, no litoral pernambucano, foi tomado o valioso
ancoradouro do Cabo Santo Agostinho, o que privou os
portugueses do porto mais próximo do Arraial, dificultando o
recebimento de reforços de Lisboa e o envio de açúcar para
Portugal.

“Entramos finalmente pela aldeia de Natal. Com mais de uma


hora de marcha avistamos o forte. É uma soberba fortaleza cercada
de recifes e de águas mansas. Pareceu-me de acesso difícil e bem
defendida pelas dunas. Do acampamento a ela é um tiro. A nos
pressentirem, fizeram-nos fogo cerrado com mosquetes e canhões,
sem, contudo, nos atingirem. Vale dizer que nossas companhias estão

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bem dispostas e já conhecedoras das melhores posições. Penso que a
fortaleza cairá de hoje para amanhã, caso o major Calabar e o
comandante Gastman já tenham entrado em entendimentos com os
janduis. A bordo ficou-se a aguardar ansiosamente a resposta (da
rendição), não obstante ter-se a certeza de que a praça se renderia, e
com mais sobejas razões, porque Calabar se achava em terra fazendo
entendimentos com os moradores e índios da cercania”.
Romeu de Avelar, em Calabar (Interpretação romanceada
do tempo da invasão holandesa), 2ª edição, 1973, edição do
Departamento de Ciência e Cultura do Governo de Alagoas.

Holandeses conquistam Capitania da Paraíba (1634)

No final de 1634, a Paraíba também havia se rendido aos


invasores. Liderada pelo general Sugismund Von Schkoppe, com o
apoio de Domingos Fernandes Calabar, uma frota neerlandesa
chegou à Paraíba em 3 de dezembro de 1634 e, durante o ataque ao
forte de Santa Catarina de Cabedelo, iniciou uma série de batalhas
até a tomada geral

“A 19 de dezembro uma frota neerlandesa vinda do Recife


bloqueou a barra do rio Paraíba, alvejando o Forte de Santa
Catarina, sitiado em seguida por tropas de terra, comandadas por
Calabar. Em 23 de dezembro caía o Forte de Santo Antônio que o
apoiava, cruzando fogos da margem oposta na foz do rio Paraíba do
Norte. A praça ainda resistiu por quinze dias, mas com as muralhas
arrasadas, sem munição e com a artilharia danificada, a guarnição

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rendeu-se com honras militares, entregando a Capitania da Paraíba
aos neerlandeses”.
Romeu de Avelar, em Calabar (Interpretação romanceada
do tempo da invasão holandesa), 2ª edição, 1973, edição do
Departamento de Ciência e Cultura do Governo de Alagoas.

Porto Calvo: Holanda capitula e Calabar morre (1632)

A participação de Calabar na invasão holandesa em Alagoas


durou exatamente três anos, de sua deserção das tropas portuguesas
– em abril de 1632 – ao dia 22 de julho 1635, quando as tropas
holandesas capitulam diante o Exército português comandado pelo
general Matias de Albuquerque, em Porto Calvo, e Calabar é morto
e esquartejado, apesar da resistência dos oficiais batavos em
entregá-lo. A guerra entre portugueses e holandeses continuou em
Alagoas. O próprio chefe supremo holandês, Maurício de Nassau,
chega em janeiro de 1637, para reforçar as tropas. Neste mesmo
ano, depois de ganhar várias batalhas em solo alagoano, chega a
Penedo, onde constrói o famoso forte Maurício. Em 1640, neste
mesmo forte, a Holanda cai mais uma vez, acossada por tropas
portuguesas e deixa Penedo. A invasão holandesa no Brasil durou
de 1630 a 1654.

“Mas em 22 de junho de 1635, depois de várias escaramuças


do general português Matias de Albuquerque, com a ajuda de
Sebastião do Souto, contratado a peso de ouro para despistar as
tropas holandesas, apesar de Calabar insistir junto ao comando para

25
não confiar em Souto, Matias ganha a famosa batalha de Mata
Redonda e captura Calabar. Ele é preso pelo seu ex-comandante, e é
julgado por crime de Lesa Majestade, e em plena praça pública, no
adro da igreja, é enforcado e esquartejado, e partes de seu corpo
espalhados pela cidade, em postes e paliçadas”.
Romeu de Avelar, em Calabar (Interpretação romanceada
do tempo da invasão holandesa), 2ª edição, 1973, edição do
Departamento de Ciência e Cultura do Governo de Alagoas.

Alagoas holandesa teve brasão e escudo

Os holandeses chegaram às terras alagoanas em setembro de


1631 – com a invasão da praia de Barra Grande (Maragogi) - e
delas foram expulsas pelos portugueses em 1654 – depois da queda
do Forte Maurício em Penedo. Foram mais de 20 anos de ocupação
(dispersa). Neste tempo, Alagoas foi instituída como uma
província do Brasil holandês de Nassau, com direito a escudo e o
dístico Alagoas Ad Austrum.

“As províncias da Holanda no Nordeste brasileiro tinham


cada uma o seu escudo. O distrito das Alagoas também possuía o seu,
que constava de um rolo de pergaminho desenrolado, com três
(peixes) tainhas em faixa, sobreposta ao centro, e, numa fita, por
baixo, a legenda em latim – ALAGOAS AD AUSTRUM (Alagoas da
parte sul), sendo o escudo encimado por duas asas espalmadas.”

26
Jayme de Altavila, no livro História da Civilização das
Alagoas, edição do Departamento Estadual de Cultura – Maceió
1952

Rio Manguaba: o “roteiro da civilização”

O antropólogo, romancista e poeta alagoano Dirceu


Lindoso, um nome seminal para entender a região Norte do Estado
– ele mesmo um nativo de Maragogi - em seu livro Formação de
Alagoas Boreal, mostra a importância do rio Manguaba para
conhecer a colonização da região, inserida no contexto do Ciclo da
cana de Açúcar, onde os engenhos usam da água do rio para seu
funcionamento e desenvolvimento.

“De Porto de Pedra a Porto Calvo foram erguidos engenhos


de açúcar com casa grande e capela, senzala de escravos. E. ainda
hoje, subir o rio Manguaba, nos seus 4 quilômetros até o Porto de
Varadouro, é uma admirável aula de história. O rio Manguaba é
pois nosso roteiro da civilização, uma espécie de caminho hídrico por
onde a civilização européia dos séculos XVI e XVII penetrou o
interior de Alagoas Boreal. Caminho de índios, colonos, escravos,
espanhóis e portugueses, soldados e de comerciantes das Índias
Ocidentais. Em suas ribeiras plantaram-se os primeiros centros de
colonização e produção colonial: os engenhos de açúcar. E eram
eles: Porto Lino, Porto das Ostras, Bateria, Porto Gersino, Tibau,
Barbaça, Preguinha, Pinheiro, Estaleiro. E no Vale do Grapiúna os
engenhos Caxangá, Areal, Sabiaú e Capivara”.

27
A aula do mestre Dirceu continua, quando ele ala de outro
importante curso de água da região Norte,o rio Camaragibe:

“Mais ao Sul, já no século XVII, o rio Camaragibe, com suas


vastas matas que admiraram o capitão-general Júlio Cezar de
Menezes, surgem os pequenos ancoradouros do fundo do estuário,
denominado “passos”, que deram origem à cidade de Passo de
Camaragibe, e Matriz de Camaragibe. Ainda mais ao Sul, o rio Santo
Antonio Grande tem o mesmo papel de entrada na colonização.
Graças a ele se povoou a mesopotâmia formada, a um lado, pelo
Camaragibe, e ao Sul, pelo Santo Antonio Grande, que deu origem ao
povoado de Quitunde, onde havia o porto de embarque de açúcar, de
onde saiu a atual São Luis do Quitunde.

Engenhos polvilhavam margens


Estes engenhos ficavam, quase sempre, nas margens do
Manguaba e seus afluentes. A localização de Porto Calvo como o
centro motivo da irradiação dos engenhos foi uma estratégia
natural, pelas boas condições da terra com a proximidade das
águas, mas também uma tática política e econômica, imposta pelo
senhor de engenho e fundador de Porto Calvo, Christopher Linz.
Política por assegurar repasses vultosos para a Coroa Portuguesa,

28
que lhe deu de presente à sua terra, e uma estratégia econômica,
pelas facilidades do transporte do açúcar e o escoamento da
produção pelo rio Manguaba, até a foz. Apesar do começo do fim
dos engenhos e banguês, que já estavam em decadência de sua
produção por queima do carvão e a destruição das matas
(começava a faltar lenha para as fornalhas de cozimento do
açúcar), foi no coração dessa mata úmida, entre árvores magníficas
e madeiras excelentes e às margens resplandecentes dos rios, que
começou a se erguer a civilização açucareira nestes núcleos
pioneiros das Alagoas.

“Do ponto de vista geográfico podem-se caracterizar estes


núcleos pela influência do seu principal acidente; acidente, no caso
dos três núcleos do litoral, principalmente o hidrográfico, por isso o
seu elemento é a água: rios ou lagoas. O litoral alagoano, por
exemplo, podemos distribuí-lo em três regiões: a região dos quatro
rios, que é a do Norte, pela presença dos rios Manguaba,
Camaragibe, Santo Antonio Grande e Tatuamunha, a que se juntam
outros rios menores: o São Bento, o Maragogi, o Comandatuba,o
Moicatá, o Tapamundé. Depois a região das grandes lagoas, onde se
estacam as lagoas do Norte, ou Mundaú, e a do Sul, ou Manguaba;
finalmente a região são-franciscana presidida pelo São Francisco,
cujo centro, Penedo, foi o ponto de irradiação do se povoamento,
quer dilatando-se para o norte, quer penetrando o sertão”.
Manoel Diégues Júnior, em O Banguê nas Alagoas,
reimpressão da 3ª edição, editora Edufal, 2012, Coleção
Nordestina

29
Guerra dos Cabanos: episódio “esquecido” (1832-1850)

A Guerra dos Cabanos, foi um episódio esquecido pela


historiografia recente do país. Foram batalhas travadas entre o
governo imperial e seus aliados civis, os senhores de engenho,
contra a rebeldia que queria seu espaço na região e lutaram
bravamente: os índios, brancos e mestiços lavradores, moradores
nas periferias dos engenhos, além de negros fugidos passaram a ser
identificados como “cabanos”, em alusão às pequenas cabanas no
meio do mato em que viviam.

“Foi a rebelião mais importante de nossa história política, que


correu na fronteira alagoano-pernambucana de 1832 a 1850, numa
área de 300 quilômetros de extensão e 60 kms de largura, envolvendo
cerca de 50 mil pessoas”.
Dirceu Lindoso, em Primeiros Passos da Formação de
Alagoas, separata do Governo de Alagoas, com texto extraído do
jornal Gazeta de Alagoas, edição de 07/05/2005.

Vicente de Paula: o capitão de todas as matas

Na verdade, o episódio dos Cabanos foi uma guerrilha


encravada na Zona da Mata alagoana, entre o governo imperial, e
em sua segunda frente, contra senhores de engenhos restauradores,
escravos foragidos – os famosos papa-méis, das Matas de

30
Maragogi e de Jacuípe, de índios cariris aldeados, e de brancos
pobres moradores de engenho, sob a liderança de Vicente de Paula,
que era chamado de Capitão de Todas as Matas. Vicente de Paula
liderou o quanto pode o grupo que queria implantar uma nova
sociedade alternativa na mata alagoana. Mas os governantes de
Pernambuco e Alagoas fizeram um cerco em 1834, e decidiram
atacá-los na mata, com um exército de mais de 4.000 homens. Os
cabanos seriam sitiados. Foi dado um prazo para a população
evacuar o espaço, o que reduziu o número de integrantes dos
grupos, limitados, agora, aos mais comprometidos com a revolta e
os escravos negros, por preferirem a luta à escravidão. Outra tática
utilizada pelos governadores foi a promessa de anistiar os
dissidentes que se entregassem. Em 1835, se renderam os
derradeiros cabanos de Alagoas e Pernambuco, mas Vicente de
Paula foge para o sertão.

“Vicente de Paula será preso e remetido para (colônia penal)


Fernando de Noronha. Dalí, voltará anos depois, velho, sem a
liderança anterior sobre as matas e começará uma espécie de pedinte
de terra, tentando a todo custo que o governo oficializasse a sua.
Mesmo velho, continuará a ocasionar temores; e reinstalação do
caudilho nas matas continuaria e perturbar o poder senhorial, assim,
conseguiu apenas o Maravano, onde já morava sua família. No
entanto, o velho caudilho vai assentar-se na região de Porto Calvo,
nas suas antigas terras. Ali morrerá em torno de 1868”

31
Luiz Sávio de Almeida, Memorial Biográfico de Vicente de
Paula, Guerrilha e Sociedade alternativa na mata alagoana. Edufal,
Maceió, 2008

ÁGUAS DE MACEIÓ

Alagoas: capitania independente (1817)

32
Passados episódios de relevância histórica, como a Guerra
de Palmares, a capitulação holandesa e a revolução Pernambucana,
Alagoas é desmembrada da capitania de Pernambuco, por um
decreto régio de Dom João Sexto, datado de 16 de setembro de
1817, que deu legitimidade jurídica a um processo histórico de
quase dois séculos que viera acumulando. O decreto erigiu a
comarca das Alagoas à condição de capitania, isentando-a
absolutamente da sujeição ao governo da capitania de Pernambuco.

“Na segunda década do século XIX a imagem do espaço


alagoano se achava completa, configurada na expressão territorial,
social, política e econômica numa comarca sujeita à capitania de
Pernambuco. O decreto régio de 1817 é um reconhecimento, em nível
político, de realidades econômicas e demográficas jacentes. Como
escreveu o historiador Craveiro Costa (A Emancipação de Alagoas,
Arquivo Público, Maceió, 1967): em 1817 fatores econômicos e
demográficos, operando o desenvolvimento da comarca, haviam
preparado o cenário do drama histórico da autonomia”
Dirceu Lindoso, em Interpretação da Província Estudo da
Cultura Alagoana, Edufal, Maceió, 1985

Batalha: protagonista da emancipação

33
Três anos depois de sua emancipação política, em 1819, um
novo recenseamento acusou uma população de mais de cento e
onze mil pessoas (111.973). Na nova província de Alagoas já tinha
oito vilas, 13 freguesias. O ouvidor Antonio José Ferreira Batalha,
foi o principal mentor da então comarca de Alagoas, aproveitando-
se da situação – ele não aderiu à revolução Pernambucana, ficando
fiel à Coroa Portuguesa - e infringindo as próprias leis régias,
desmembrou a comarca da jurisdição de Pernambuco e nela
constituiu um governo provisório. Esses atos foram suficientes
para abrir caminhos que levaram D. João a sancionar o
desmembramento. Mas o ouvidor perdeu a batalha: Sebastião
Francisco de Melo e Póvoas foi governador nomeado, mas que só
assumiu em 22 de janeiro de 1819.

Acentuou-se a partir de então o surto de prosperidade de


Alagoas. Em 17 de agosto de 1831 apareceu o Íris Alagoense,
primeiro jornal publicado na província, assim considerada a partir
da independência do Brasil e organização do império. É certo que os
primeiros anos de independência não foram fáceis. Uma sequência de
movimentos abalou a vida provincial: em 1824, a Confederação do
Equador; em 1832-1835, a Cabanada; em 1844, a rebelião conhecida
como Lisos e Cabeludos; em 1849, a repercussão da revolução
praieira.
Larouse Cultural, Brasil A/Z, Editora Universo, 1991

Controvérsias na emancipação de Alagoas

34
Depois de passados episódios e fatos, alguns deles ainda não
tão claros à luz da historiografia oficial, de como realmente eles
aconteceram- como por exemplo, a derrota dos Cabanos, o
extermínio dos Quilombos dos Palmares e o caso da “traição” de
Calabar - em 16 de setembro de 1817, em ato do príncipe regente,
Alagoas é desmembrada e emancipada da capitania de
Pernambuco. Mas há controvésia entre historiadores sobre o
verdadeiro sentido do ato real. Se foi um prêmio à fidelidade dos
alagoanos em contrapartida à audácia e ao sentimento de
natividade dos pernambucanos, que tinham acabado de vencer a
Revolução Republicana, ou em consideração ao nível de
desenvolvimento que chegara à região. Alagoas, na época, já havia
ultrapassado, em índices de renda, em relação a algumas
capitanias, como a da Paraíba.

“O que parece é que de fato a autonomia de Alagoas resultou


da conjugação desses dois fatores: o político, como irão comprovar
as reaçõee adversas da nova Capitania... e o econômico, pelas novas
conduções do controle administrativo criadas com a nova unidade.
Afinal, Alagoas já contava com 13 freguesias e oito vilas, a maior
parte delas distribuídas ao longo do litoral, mas já com algumas a
razoável distância da costa. A produção de açúcar já era significativa
e o número de engenhos tinha atingido, em 1802, a importante cifra
de 180 unidades”.
Elcio de Gusmão Verçosa, em Cultura e Educação nas
Alagoas – História, histórias, Secretaria de Educação -Maceió-
2001

35
Rebeliões na transferência da capital

Criada a capitania de Alagoas, só dois anos depois, em


1819, é que assume o primeiro governador de Alagoas, Sebastião
Francisco de Mello Póvoas. Sua primeira providência foi criar a
Junta de Arrecadação, a Alfândega e o porto de Jaraguá, além de
fortificar todo litoral. Tendo desembarcado na Vila de Maceió, o
governador foi ficando na cidade, embora a capital fosse ainda a
cidade de Alagoas do Sul (hoje Marechal Deodoro). que ficava
afastada da costa litorânea, mas que não correspondia à crescente
demanda econômica com o novo status de capitania independente.
Alagoas do Sul, centralizou a administração e a atividade
política até 9 de dezembro de 1839, quando o então presidente
(atual cargo de prefeito) da província, Agostinho da Silva Neves
assinava a “resolução” que erigia Maceió como a capital da
capitania de Alagoas e “dona” do cofre, a Tesouraria Provincial.
Mas a transferência não se deu sem lutas políticas e
rebeliões, nas quais tomaram parte grandes vultos de nossa
história, como os opositores da ideia, José Tavares Bastos (o pai),
Manoel Mendes da Fonseca, e o situacionista João Lins Vieira
Cansanção, o visconde de Sinimbú, que após a deposição de Silva
Neves, para evitar derramamento de sangue, o reconduziu ao
cargo.

“No porto de Jaraguá, já o aguardavam (Silva Neves) Sinimbu


e os maceioenses, com grande entusiasmo. Transmitida a
administração para o seu titular, agora Maceió repicava os sinos das

36
igrejas, desta vez de alegria, pois se sabia que era irreversível o
processo de trasferência da capital. O epsisódio não se encerraria
por ali, muita coisa aconteceria. Os alagoanos jamais perdoaram a
ação enérgica de Sinimbú, e a política alagoana, por muito tempo,
amargou essa divisão, com conseqüência nefastas”.
Douglas Apratto Tenório, em Memórias Legislativas, no 4,
Visconde de Sinimbú – Emérito Estadista do Império, 1998

Águas do mestre Aurélio

Em 1923, o jovem alagoano Aurélio Buarque de Holanda


Ferreira (1910-1989) deixa sua cidade-berço Passo de Camaragibe,
e muda-se para Maceió, onde, aos 14 anos de idade, começou a dar
aulas particulares de português. Aos 15, ingressou efetivamente no
magistério: foi convidado pelo Ginásio Primeiro de Março a
lecionar em seu curso primário. Já naquela época passou a se
interessar por língua e literatura portuguesas. Formou-se em direito
pela Faculdade de Direito do Recife em 1936. Mestre Aurélio
então subiu o olimpo, tornando-se um intelectual de classe
universal: foi lexicógrafo, filólogo, professor, tradutor, ensaísta e
crítico literário. Foi o autor do Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa e membro da Academia Brasileira de Letras. Aurélio
passou a residir no Rio de Janeiro a partir de 1938, onde ficaria até
sua morte, em 1989. Mas ele nunca esqueceria sua terra natal.

“Águas, águas. Marítimas, lacustres. Além das fluviais -


sobretudo as do São Francisco, muito lá - longe. Uma toponímia

37
úmida, aquosa. Desde o nome do estado, Alagoas, e o da capital -
talvez do tupi maçayó, o "alagado", ou o "que tapa o alagadiço". Até
os bairros - Poço, Levada, Bebedouro. Os de povoações do
município, como Riacho Doce, praia belíssima, cenário de um
romance de José Lins do Rego, e famosa pelo seu petróleo, e os
nomes de vários lugares do interior: Volta D' água, Bica da Pedra,
Água Branca, Barra Grande, Barra de Santo Antônio, Barra de São
Miguel, Minador do Negrão, Olho d' Água das Flores, Rio Largo,
Porto Calvo, Porto de Pedras, Porto Real do Colégio".
Aurélio Buarque de Holanda em Alagoas: roteiro cultural e
turístico. Pierre Chalita, Carmem Lúcia, Solange Berard. Maceió –
1979

Civilização das águas

“A história da gente alagoana é a história de uma gente


quase anfíbia”. Assim o antropólogo, sociólogo e escritor
pernambucano Gilberto Freyre descreveu, em 1948, o povo
nascido nas Alagoas. A frase serviria como epígrafe para o
historiador e escritor alagoano Dirceu Lindoso, que em seu livro
Interpretação da Província, confirma a importância seminal do
elemento água como formador da índole alagoana. Leia trechos:

“Da história da gente alagoana já se disse ser a história de


uma gente quase anfíbia, e que no espaço de Alagoas – com tal
abundância de lagoas, rios e riachos – a importância da água foi
máxima na caraterização do complexo agrário... A água presencia

38
tudo: a economia, a vida literária, as formas de moradia, o transporte
e a fixação da vida rural e urbana”

“A alagoana é, de fato, uma civilização das águas: de chuvas,


nas matas úmidas, onde amadurecem os canaviais; marinhas, no
recortado litoral de rios e manguezais; lacustres, nas lagoas que se
estendem esparsas de Maceió para o Sul; fluviais, na abundância dos
grandes rios – como o São Francisco – e nos pequenos rios onde
medrou a civilização do açúcar. São inúmeras as águas que escorrem
pelo recôncavo de Maceió, fazendo que a cidade crescesse numa
restinga seca a arenosa, e subisse ávida para os tabuleiros do Farol,
do Martins e do Jacutinga”.
Dirceu Lindoso, Historiador, trechos do livro Interpretação
da Província – Estudo da Cultura Alagoana, Edufal - 2005

A Planta de Maceió por Lêdo Ivo

O poeta alagoano Lêdo Ivo, imortal da Academia Brasileira


de Letras, que morreu em 2012, em Sevilha, na Espanha, aos 88
anos, sempre acentuava a sua alagoanidade. Muitos de seus livros
retratam sua Alagoas, principalmente Maceió, como o romance
Ninho de Cobras. Traduzido para mais de 12 países, incluindo
EUA, Espanha, Itália, Inglaterra, Holanda e México, o poeta
alagoano sempre mostrou a importância de sua terra natal em suas
poesias, em livros como Linguagem (1951); Estação Central
(1964); Calabar (1985); Curral de peixe (1995) e Finisterra (1972),

39
que traz a poesia Planta de Maceió, mostrada aqui em sua segunda
parte:

Foi aqui que nasci, onde a luz do farol


cega a noite dos homens e desbota as corujas.
A ventania lambe as dragas podres,
Entram pelas persianas das casas sufocadas
e escalavra as dunas mortuárias
onde os beiços dos mortos bebem o mar.

Mesmo os que se amam nesta terra de ódios


são sempre separados pela brisa
que semeia a insônia nas lacraias
e adultera a fretagem dos navios.
Este é o meu lugar, entranhado em meu sangue
como a lama no fundo da noite lacustre.

E por mais que se afaste, estarei sempre aqui


e serei este vento e a luz do farol,
e minha morte vive na cioba encurralada.

Octávio Brandão: entre canais e lagoas

“Comecei a escrever Canais e Lagoas (1919) entre aratus e a


ventania de um desterro da Lagoa Mundaú”, dizia o autor do livro
que pode-se considerar como o marco zero dos escritos sobre a
relação água e povo alagoanos, o ambientalista Octávio Brandão.

40
Ele ressalta um roteiro preciso do quanto era exuberante a região
formada no entorno das grandes lagoas Mundaú e Manguaba.
Octávio Brandão percorreu um total de 1.500 quilômetros, sendo
600 a pé, em viagens e excursões para escrever Canais e Lagoas.
“Fiz penosas caminhadas, atravessei Calunga, em novembro de
1916, lutei terrivelmente para escapar ao naufrágio e morte”.

“Descobri as riquezas naturais em geral e indícios de petróleo


em particular. Pesquisei a natureza viva, o povo e a história. Coligi
materiais folclóricos. Investiguei a formação e o desenvolvimento da
terra, as condições de vida e trabalho das populações. Convivi
fraternalmente com os simples homens do povo – pescadores,
canoeiros, lavradores pobres. Publiquei o livro no Rio de Janeiro,
em 1919. Estuda a geografia, a mineralogia e a geologia da região
dos canais e lagoas do Estado de Alagoas. Ataca o regime dominante.
Condena a exploração do Brasil pelos capitalistas estrangeiros.
Prega a divisão de terras. É um poema telúrico. Estuda a terra e o
homem trabalhador. Protesta contra a miséria e abandono do povo.
Procura fundir a ciência com a poesia. Aspira a fundir o realismo
literário espontâneo com o romantismo histórico”.
Octávio Brandão citado por J.R. Guedes (org.), Cartas de
Octávio Brandão, Editora da UFSC, 2005.

A Lagoa Mundaú e os hidroaviões Catalina

Na década de 1930, hidroaviões pousavam na lagoa


Mundaú, na enseada natural ali existente, na entrada do canal,

41
bairro da Levada. Um píer de concreto facilitava o desembarque
dos voos regulares dos bimotores da companhia Catalina/Panair -
tanto os cargueiros, operados pela Força Aérea Brasileira (FAB),
que mantinha uma base na rua Santo Antônio, no entorno do local
– quanto ao uso civil, as aeronaves transportavam turistas para
Alagoas e o Nordeste.
“Na Levada aterrissavam os aviões, de modo que o viajante
que chega a Maceió pelos ares tem um encontro pitoresco com a
cidade: através da lagoa. É um gosto ver-se aquilo lá de cima; é um
labirinto d’água, a que não faltam o colorido dos coqueiros, os
mangues extensos, os guiamuns pela areia e os pescadores
apanhando sururu nas suas canoas”.
Craveiro Costa, Maceió de Outrora, 1ª edição Arquivo
Público de Alagoas, 1976

Gogó da Ema não resiste à força do mar

Gogó da Ema era um coqueiro torto, empescoçado


semelhante ao da Ema (considerada a maior ave brasileira, que tem
o pescoço em forma de S). Em 2017, completaram 62 anos do dia
em que o Gogó da Ema tombou - em 27 de julho de 1955. Durante
todo tempo o coqueiro virou símbolo de Maceió, uma marca
registrada das praias da capital, principalmente Ponta Verde, onde
nasceu e cresceu o coqueiro. Os mais jovens só conhecem por
imagens de cartão postal, TV, jornal ou pela internet. É difícil
precisar sua idade, mas segundo o historiador Bráulio Leite Júnior,
em Histórias de Maceió (2000), diz que ninguém lhe dera atenção,

42
“era apenas um coqueiro torto que existia no sítio do Chico Zu,
quem queria ver tinha que pular o muro e correr do cachorro”. Mas
o coqueiro se transformou na atração da cidade, mil vezes foi
fotografado, pintado, traduzido em versos, contos e até uma lenda
apareceu. Seu final foi dramático, como uma cena de filme. Dois
dias depois de tombado, tentaram de tudo para reerguê-lo. Teve
guindaste, agrônomo, polícia, jornalistas, e o povo batendo palmas
e dando salvas com emoção. Mas nada adiantou.

“Foram três dias de peleja para aprumar a debilitada


palmácea. Os esforços chegaram ao limite, mas não adiantaram.
Depois de muita amarração em cabos, que mantinham o coqueiro
imobilizado, o mar inclemente e impiedoso continuava a atacar.
Depois de 90 dias acabou o Gogó da Ema perdendo para o Oceano
Atlântico”.
Jornalista José Carivaldo Brandão, no artigo Paixão e Morte
de um Coqueiro.

Paleta das cores do mar de Alagoas

O famoso verso do maior poeta espanhol Federico Garcia


Lorca - "verde que te quero verde" – poderia cair como uma
moldura para as praias de Alagoas. Mas será que elas são verdes?
Ou azuis? Ou tonalidades diferentes que se alternam numa imagem
mais que perfeita? O que faz do mar de Alagoas tão bonito? A
geografia e a biologia podem oferecer alguns motivos. O cantor
Carlos Moura entoava “Mergulhar no azul piscina do mar de

43
Pajuçara”. Djavan, o maior cantor das Alagoas, ao escrever
“Azul”, pedia que “alga marinha, vá na maresia buscar ali um
cheiro de azul” e confessava: “essa cor não sai de mim, bate e finca
o pé”. O mar de Alagoas é da cor do mar de Alagoas. O jornalista,
poeta, escritor e boêmio Noaldo Dantas, falecido em 1999,
paraibano de nascimento, fez de Alagoas sua terra natal. Aqui,
viveu feliz, fundou jornais, namorou, tomou um uisquinho, fez
muitos amigos e curtiu como nunca. Inspirado nas cores do mar,
ele escreveu O dia em que Deus criou Alagoas:

“Escrevi certa vez que Deus, além de brasileiro, era alagoano.


Em verdade, não se cria um estado com tanta beleza, sem
cumplicidade. Sou capaz de imaginar o dia da criação de Alagoas. Ô
São Pedro, pegue o estoque de azul mais puro e coloque dentro das
manhãs encarnadas de sol; faça do mar um espelho do céu
polvilhado de jangadas brancas; que ao entardecer sangre o
horizonte; que aquelas lagoas que estávamos guardando para uso
particular, coloque-as neste paraíso. E tem mais, São Pedro: dê a
esse estado um cheiro sensual de melaço e cubra os seus campos com
o verde dos canaviais. As praias... Ora, as praias deverão ser
fascinantementes belas, sob a vigilância de ativos e fiéis coqueirais.
Faça piscinas naturais dentro do mar; coloque um povo hospitaleiro
e bom; e que a terra seja fértil e a comida típica melhor que o nosso
maná. Dê o nome de Alagoas e a capital pela ciganice e beleza de
suas noites, deverá chamar-se Maceió e a padroeira: Nossa Senhora
dos Prazeres”.
Por Noaldo Dantas

44
Pajuçara: ai, ai que saudade ai que dó!

Enseada de rara beleza. Nos anos 1930 sua paisagem


mostrava apenas cinco residências, castanheiras, coqueirais e
jangadas ao mar. Na década de 1940 e 1950, novos moradores,
veranistas e crescimento habitacional. Nos anos 1960 e 1970,
começo da especulação imobiliária e “expulsão” dos pescadores de
seu habitat, que formaram um novo bairro: a Ponta da Terra. Anos
1980, 1990 e 2000, o “boom” imobiliário, apartamentos de luxo,
hotéis cinco estrelas, bancos, a Feira de Artesanato, a orla
revitalizada com calçadão, barracas de alvenaria e ciclovia.
Pajuçara foi cantada em verso e prosa, mas ficou famosa no
cancioneiro popular, na voz de Luiz Gonzaga.

Ai, ai
Que saudade, ai que dó
Viver longe de Maceió
Alagoas
Tem joias tão caras
Que meus olhos
Não cansam de olhar
Uma delas és tu Pajuçara
Praia linda engastada no mar
Quando a lua no céu adormece
Pajuçara se enfeita ainda mais

45
Vem a brisa rezar uma prece
Entre as folhas dos seus coqueirais
As noitadas felizes nas ostras
Bons amigos que choram até
Que saudade de Bica da Pedra
E dos banhos lá no Catolé
Recordando estas coisas tão boas
Sou feliz não me sinto tão só
Toda gente que sai de Alagoas
Coração deixa em Maceió

A Pajuçara de Craveiro Costa

No começo, o bairro da Pajussara (era escrito com dois


esses) era habitado por pescadores, que moravam em mocambos à
beira-mar. Seu clima abrasivo e a bela faixa litorânea atraíram a
especulação imobiliária e o cenário mudou.

"Da Pajussara podemos dizer que se transformou num arrebol


dos banhos de mar. A princípio eram apenas casas de veraneio, que
foram tornando-se fixas. Assim toda a comunidade de pescadores que
habitava a orla foi expulsa de seu habitat e formou um novo
arrabalde: a Ponta da Terra. Além das festas carnavalescas com os
banhos de mar à fantasia, o Sábado de Zé Pereira, existia a
Procissão de Bom Jesus dos Navegantes, com os barcos fazendo
cortejo pela orla. E no meio do mar da Pajussara aquela policromia
de trajes dava um colorido pitoresco à procissão”.

46
Craveiro Costa, Maceió de Outrora, 1ª edição Arquivo
Público de Alagoas, 1976
Maceió a novacap de Alagoas

A posição marítima e topográfica de Maceió foram os


argumentos usados pelo então presidente da província, Silva
Neves, para a transferência da capital de Alagoas do Sul (Marechal
Deodoro) para Maceió, em 1839. No início do Segundo Império,
passados mais de duas décadas desde que a antiga capitania fora
emancipada de Pernambuco, Alagoas continuava em “um estado
lastimoso de atraso e descultura” (Moreno Brandão, 1909), citado
por Elcio de Gusmão Verçosa. As mudanças provocaram conflitos
de sérias consequências, mas se efetivou, quando o vice-
presidente, João Lins Vieira Cansação de Sinimbu, o futuro
Visconde de Sinimbu garantiu a transferência do cofre e a
organização da resistência política. Depois de trocas de deputados
favoráveis à Alagoas, o Legislativo aprova a transferência da
capital. Na sua mensagem aos deputados, assim justificou Silva
Neves, sobre a importância da proximidade do mar para a nova
capital.

“Um de vós, senhores, não haverá, examinando a questão pelo


lado dos interesses públicos, que não reconheça que a vila de
Maceió, pela sua posição marítima e topográfica, é de todos os
pontos da Província, aquele que melhor condições reúne para ser a
capital. Colocado no centro da Província, na borda de um porto
vasto, capaz de entreter relações de comércio com as partes do

47
mundo... A vila de Maceió é hoje, pela natureza das cousas, o ponto
principal da Província”.

Em Cultura e Educação nas Alagoas, Elcio Gusmão


Verçosa, Secretaria de Educação, 2001

Maçayó: A cidade que morreu

Em 1959, o antropólogo Théo Brandão escreveu um notável


prefácio para a primeira edição do livro de Félix Lima Júnior,
Maceió de Outrora, volume I, em que acenava como uma
despedida dos velhos tempos, da Maçayó antiga, para lembrança
dos que aqui hoje vivem.

“Que tempo era aquele que paulatinamente foi


desaparecendo, a Maceió do Grande Ponto do Mesquita, da
Chapelaria do José Maria, da Porta do Sol, dos tamarindos da Praça
São Bendito, dos pavilhões de madeira da Praça da Catedral, dos
trapiches de Jaraguá. Da Ponte de Desembarque, dos botes e
alvarengas do porto, do telégrafo semafórico da encosta do Farol,
das saídas do Santíssimo, das ruas alcatifadas de folhas de
pitangueira e das janelas adornadas de colchas nos dias de
procissão, dos maracatus, das cavalhadas de máscaras, dos soldados
do Tiro Alagoano, chapéus de feltro quebrados de lado, dos sorvetes
da “Santa Laura”, das retretas na Praça Deodoro, dos negros de
ganho Quatro Cantos”.

48
Théo Brandão, no prefácio do livro Maceió de Outrora vol.
I. Sergasa Maceió – 1959

Maçayó: A cidade que morreu (2)

Ainda no prefácio ao livro de Félix Lima Júnior, Théo


Brandão questiona a mudança de curso da foz do riacho
Salgadinho, que fluía suas águas por baixo da Ponte dos Fonseca,
ao lado do Clube Fênix, na Avenida da Paz, depois de uma
enxurrada que fez ruir a ponte, mudando muito toda a geografia
urbana naquela região.

“Em 19 de abril de 1924, uma sexta-feira da paixão, choveu a


noite toda. Caiu uma tromba d água no Reginaldo, a primeira que se
tem notícia nesta capital. Tendo o rio recebido enorme volume de
água, como jamais recebera, ficou alagado todo o trecho entre a
ponte do Poço e a Estação Central da Great Western (hoje a CBTU).
Ruiu parte da Ponte dos Fonseca. Vinte anos depois (1944), mudaram
a foz do rio Salgadinho. Por que e para quê? Encerrou-se,
melancolicamente, um período da vida da cidade e de muito menino
vadio”...

Théo Brandão, no prefácio do livro Maceió de Outrora vol.


I. Sergasa Maceió – 1959

Pescadores deixam centro de Maceió

49
O Centro foi um dos bairros de Maceió que ao longo da
história que mais sofreu intervenções em sua urb. Nos primeiro
anos do século XX, a chamada Boca de Maceió – onde a capital
começou, há 200 anos, dominada por pescadores, gente simples e
trabalhadores que subiam da parte baixa para a parte alta da cidade
– mudou de forma irreconhecível sua feição urbanística e social.
As transformações começaram com a edificação da Catedral de
Maceió, que depois pontificou a quadratura da nova face do
Centro: a Praça Pedro II, a Assembleia Legislativa, o Biblioteca
Pública Estadual, o prédio da Receita Federal. Sobre o começo
desta mudança, fala o historiador Felix Lima Júnior.

“Pela rua do Comércio, em tardes sonolentas, passava, a pé, o


Governador Euclides Malta (governou Alagoas de 1906-1909),
acompanhado de amigos, inclusive os secretários de Estado e o
intendente Municipal (prefeito). Fechando o préstito vinha o
Cobrinha, cabo de Polícia, ordenança de Sua Excelência, conduzindo
ao lado esquerdo, com a pose de um “Royal Horse Guard” da
Rainha Vitória e ares de mosqueteiro, velha espada de cavalaria que,
de tão antiga, já deveria ter sido recolhida ao museu do Instituto
Histórico de Alagoas. Nessa mesma artéria, sentados em cadeiras, na
calçada, ou encostados em caixões vazios, negociantes, magistrados,
funcionários e professores conversavam e discutiam, além da política,
os acontecimentos sociais da cidade semimorta. À passagem da
primeira autoridade do Estado levantavam-se e respondiam,

50
atenciosos, aos cumprimentos do supremo dirigente da terra de
Deodoro”.
Felix Lima Júnior no artigo Evocação, do livro Festejos
Populares em Maceió de Outrora, editado pela Associação Atlética
Banco do Brasil, Rio de Janeiro, 1956

Os pitorescos pregões contados por Félix

Félix Lima Júnior, com seus olhos e sua caneta afiados,


retratou Maceió de forma iningualável. O escritor, no livro Maceió
de Outrora (1976), estuda os aspectos pitorescos da Maceió antiga,
os costumes e hábitos do Centro, no começo do século passado. Os
amoladores de canivetes, facas e tesouras, os tocadores de realejo;
o vendedor de papagaios; os moleques de pés descalços que
pregoavam à porta dos teatros; o afenim, dedinho, broa de goma,
tapioca de eucalipto, broas de eucalipto, de goiaba e de mel de
abelha; do vendedor de leite tirado da vaca na hora, em frente das
casas dos clientes; e ainda dos pregões de Maceió.

“Num dos portões do Mercado Municipal aos domingos, o


doutor Raiz, xingando o “homem da cobra”, concorrente perigoso,
no centro de um círculo e futuros fregueses, fazia propaganda e suas
misturas maravilhosas, suas garrafadas, suas ervas e raízes infalíveis
para qualquer doença, da lepra, à dor de barriga, da “espinhela
caída” ao câncer. Muito compenetrado, com ares de verdadeira
sumidade “soltava o verbo”. – Batata de purga! banha de preguiça!

51
Gitó! Pimenta d´água! Óleo de jibóia preta! Mangiroba! Catingueira
rasteira! Mamão jaracatiá! Raiz de juá! Remédio para mulher
desconcertada! Garrafada das sete sementes! A turma ria a bom rir
enquanto dona Apolinária, antiga zeladora da Confraria de Nossa
das Vitórias, da Catedral, fechava a cara, resmungando, e ia rogando
pragas ao doutor”.

Boca de Maceió virou puro glamour

Durante os anos 1930 e 1950, enquanto o Mercado


Municipal, continuava com seus pregões, sua venda de
hortifrutigranjeiros, suas quinquilharias e bugigangas, folhetos de
cordel, e todo tipo de ervas, a região já era então um local de pleno
desenvolvimento, o comércio vivia seu tempo de glamour. Em
meio à massa proletária, circulavam homens trajando paletós e
mulheres lindamente vestidas nos “footings” de domingo. Em
1950, conforme aponta o anuário Maceió de Bolso, organizados
pelos jornalistas Ajérico Vieira e Pedro Lopes Barbosa, o comércio
de Maceió tinha 17 alfaiatarias, cinco camisarias, seis ateliês de
corte e costura, cinco revendedoras de automóvel, doze tipografias
e livrarias. Os bares, restaurantes e cafés eram mais de 40,
povoando as ruas do Comércio, Senador Mendonça e Moreira
Lima. Mas foram os cafés que fizeram sua fama no centro, como o
Colombo, o Cristal, A Helvética, do Cupertino (depois Ponto
Central), Java e até restaurantes de grife como o Elegante, na Rua
do Comércio, 321, conforme anúncio no anuário de 50.

52
“Restaurante e bar fundado em 1928, estabelecimento de
primeira ordem, adquirido pela firma Cunha & Cia, garantindo um
serviço a contento de seus fregueses, e espera a preferência do mundo
elegante de Maceió. Cozinha à vista do freguês, e sortimentos
completo de bebidas nacionais e estrangeiras. Pedidos à lá carte e
serviço rápido para o pessoal do salão”.

A cidade se moderniza: a belle èpoque

A urb de Maceió – quando a capital começa a ter feições de


cidade grande - foi formada no começo do século XX. Antes desse
estágio Maceió disputava com outras cidades o deslumbramento de
grandes centros, puxados pela burguesia local. A aristocrática
Penedo e a lacustre Pilar, dominavam a cena. Mas o centro
político, econômico e administrativo de Maceió retomou o
planejamento, ainda que tímido, e reconquistou o seu lugar como
capital de Alagoas.

“O alargamento das ruas,o surgimento de praças onde se


reuniam os munícipes, deixando a reclusão de suas casas; a
contrução do Palácio Floriano Peixoto, do Teatro Deodoro e do
Tribunal de Justiça, em prédios monumentais marcaram o
ingresso de Maceió na chamada belle èpoque”.

Douglas Apratto Tenório, em Revista Graciliano, n 9, julho


de 2011, no artigo Maceió: da elevação a Vila às turbulentas
primeiras décadas republicanas

53
Bye Bye Brasil na Rua do Sol e no Francês

Um dos filmes cult do cineasta alagoano Cacá Diegues, Bye


Bye Brasil (1979), traz como trilha a música de Chico Buarque,
que embalou a caravana Rolidei de Salomé (Bety Faria), Lorde
Cigano (José Wilker), Ciço (Fábio Júnior) e Zé da Luz,
interpretado pelo ator alagoano Jofre Soares, nas filmagens em
Alagoas – Piranhas, Murici, Maceió e Praia do Francês -
Amazonas e Brasília. Um convite para passear nos sets do filme,
38 anos depois, em algumas estrofes da música, está lá: a rua do
Sol.

Baby, bye bye


Abraços na mãe e no pai
Eu acho que vou desligar
As fichas já vão terminar
Eu vou me mandar de trenó
Pra Rua do Sol, Maceió
Peguei uma doença em Ilhéus
Mas já tô quase bom
Em março vou pro Ceará
Com a benção do meu orixá
Eu acho bauxita por lá
Meu amor.
Bye bye, Brasil
A última ficha caiu

54
Eu penso em vocês night and day
Explica que tá tudo okay

Rios de Maceió pedem socorro

Sauaçuí, Saúde, Meirim, Pratagy, Riacho Doce, Garça


Torta, Jacarecica, Reginaldo, o Salgadinho. Nomes bonitos para
rios de outrora, que hoje viraram depósito de lixo e esgoto a céu
aberto. Em alguns trechos, oxigênio zero, sem vida. Como o Rio
Fragoso, ou Riacho do Silva, na passagem para estação do trem de
Bebedouro. Mangues petrificados, urubus, odores insuportáveis e
mais lama e lixo. Das sete nascentes do rio Fragoso, a 500 metros
da foz, dentro do único Parque Municipal de Maceió, a sujeira
começa, sapatos velhos, garrafas plásticas e restos de uma pocilga
vêm se arrastando até a foz, na Lagoa Mundaú. Estiagem,
poluição, desmatamento, assoreamento, especulação imobiliária,
ocupação desordenada de encostas e grotas e o desleixo público
com a situação dos recursos hídricos da capital. Este é o estopim
de uma bomba que pode provocar a morte dos rios e mananciais de
Maceió e causar um colapso na distribuição de água potável.

"Quanto mais poluído os rios estiverem mais cara ficará a


tecnologia para recuperá-los. Todos os mananciais estão
comprometidos, principalmente quanto ao abastecimento. O que se
tem apenas são as águas superficiais do Catolé e a perspectiva do
Sistema Pratagy. As condições deixam a desejar com relação à
qualidade.”

55
Gustavo Accioly, biólogo do Instituto do Meio Ambiente
(IMA), em entrevista a Mário Lima, jornal Extra, 2003

Fim do Rio Payol

As águas do Rio Payol, que antes eram caudalosas e


ligavam os bairros do Trapiche da Barra ao Vergel do Lago, não
existem mais. Hoje, as águas viraram esgoto a céu aberto,
despejado ao longo da favela que corta a margem da Lagoa. A
recomposição das matas ciliares e procedimentos de monitoração,
com fiscalização é única forma de salvar os rios. Se não houver
renovação dos poços a tendência mesmo é secar. Os rios, com
relação à calha original, tiveram uma perda sensível de volume nos
últimos anos.

"Era um rio fundo, limpo, com porto de barcos na Rua


Formosa, onde pescávamos com caiçara e tarrafa muita tainha,
bagre do melhor e camurim".

Benedito Roque da Costa, presidente da Federação dos


Pescadores no Estado de Alagoas, Jornal Extra, 2003

56
TERRAS

“O trem entra em terras de Alagoas. As estações fervilham de


gente; cai uma tarde poeirenta; vêm meninos vender água a cem reis
o copo. Lá vem plantações de algodão. Lavoura de gente pobre o
algodão, tão diferente da cana dos senhores! Para isso tanta
desgraça planejada, banguês comidos, senhores reduzidos à miséria,
e atrás de tudo o homem do eito, da bagaceira, das limpas, das
fornalhas, cambiteiros, metedores de cana, caldeireiro,trabalhadores
da enxada, mal alimentados, malvestidos, descalços, trabalhando
noite e dia para aguentar o banguê, para o banguê ser devorado pela
usina... Todo aquele chão tinha história de espoliação e tirania”.

Jorge de Lima, no romance Calunga, de 1943

57
TERRA DE ÍCONES

O trem da Great Western

É de grande beleza literária o relato da viagem de Lula


Bernardo, personagem de Calunga, no romance de Jorge de Lima,
no trem da Great Western do Brasil Railways (G.W.B.R.), nos
anos 1940, que ligava Recife a Paulo Afonso. As “estaçãozinhas”
em que Lula parava ao longo do trajeto tinham gente e paisagens
reais: mocambos, praias, cajueiros, mangabeiras, cambuí, coco,
peixe, manga, tarecos, louças de barro “e até uvas”. Era o fim dos
banguês, o fogo morto, a fome rondando o Nordeste. Jorge de
Lima captou essa realidade dentro do trem, passando pelos vagões
e observando a paisagem. Leia trechos de Calunga.

“Lula achava um encanto novíssimo nas casinhas das


margens, na população esperando o trem de domingo: caboclos,

58
caixeiros, meninas namoradeiras, cegos cantando, aleijados,
ferimentos com úlcera cheia de moscas, expondo a moléstia aos
passageiros para arranjar esmolas... toda aquela gente tinha história
de espoliação e tirania”.

“Entravam pelos vagões da primeira classe senhores de


engenho, de chapéus do Chile, guarda-pós de fazenda clara, fumando
charutos fumegantes como os bueiros das fábricas... A segunda classe
era gozada; ia entupida, soldados de polícia que voltavam das
escaramuças de Lampião; matutos que iam embarcar aos magotes
para as lavouras de São Paulo; mulheres-damas ratuinas, de
tamanco, vestido de cassa, barrigudas, malamanhadas. A segunda
classe é religiosa: compra gravuras de “padrim” Cícero... orações
fortes, caixilhos com imagens de santo”.
Jorge de Lima, em Calunga, editora Alba – RJ – 1943, 2ª
edição

Os faróis de Alagoas

Eles são os olhos da cidade diante o oceano, para orientar


navios, mas são tidos como tesouros para quem observa de perto.
Em Alagoas são seis faróis espalhados ao longo da costa. Em
Maceió são dois: o do bairro do Reginaldo e o da Ponta Verde, que
fica dentro do mar, encravado nas pedras. É o mais fotografado de
todos. Construído em alvenaria com fundação em concreto
armado, suas cores são branca e vermelha em listras horizontais.
Possui 11 metros de altura, com alcance luminoso e geográfico de

59
13 e 12 milhas. Alagoas ainda tem os faróis do Pontal do Coruripe,
Pontal do Peba e São Miguel dos Campos, no litoral Sul, e Porto
de Pedras, ao Norte. O farol mais icônico, que fez história, e que
hoje não existe mais, era o velho farol da Jacutinga, que ficava ao
fundo da Catedral Metropolitana, ao seu lado tinha uma praça e um
mirante para o porto de Jaraguá. Teve que ser demolido.

“As famílias vinham aos domingos, e a praça ficava com ar de


festa. O velho farol era lindo como peça arquitetônica, resistiu de
1851 a 1940. Num sábado do mês de março abriram-se as portas do
céu. Uma tromba d´água se abateu sobre Maceió. O riacho
Salgadinho virou mar, casas foram soterradas, famílias inteiras
morreram. O bairro do Poço foi tragado. O morro onde estava o
velho farol de Maceió desabou em parte pela entrada do Poço. E
ficou rachado”.
Bráulio Leite Júnior, Histórias de Maceió, editora Catavento
Maceió - 2000

Embarcações do Velho Chico

Até o final dos anos 1950, o rio São Francisco era um porto
seguro para barcos, navios a vapor, chatas, grandes canoas como a
Alagoana e a Canindé, que chegavam a carregar 1.200 sacos de
arroz. O porto de Penedo recebia grandes cargueiros, e navios a
vapor transportaram milhares de passageiros, como o mais famoso
deles, o Comendador Peixoto, que fazia a linha Penedo-Piranhas.
Mas hoje, o volume de água do Velho Chico não suporta mais esse

60
grande movimento de embarcações pelo baixo calado. Os navios
foram desativados, as embarcações bonitas só aparecem uma vez
por ano, sempre no começo de janeiro, na procissão naval de Bom
Jesus dos Navegantes. Com o fim das grandes embarcações, estão
desaparecendo também os pequenos estaleiros artesanais.
Carpinteiros construtores, como Pedro de Aristides, do alto de seus
84 anos (em 2010), conhecido em todo Baixo São Francisco, e que
participou da reforma e reestruturação de grandes naus, lembra dos
tempos áureos e a situação hoje no Baixo.

“Hoje não tem imitação do passado. O rio acabou. A


embarcação acabou. Hoje o povo só quer lancha de plástico e motor.
Existem ainda grandes mestres em Pão de Açúcar. Mas, as canoas
acabaram. O porto de Penedo não cabia de tanta embarcação, eram
mais de 400 para cima e para baixo”.

Dirigível Zepelin sobrevoa Maceió

Uma foto em preto e branco, tirada pelo cônsul francês em


Alagoas, monsieur Marcel Girard, residente na Praça São Gonçalo,
mostra um belo zepelin prateado cortando o antigo farol da
Jacutinga. O jornalista Floriano Ivo relatou ter visto, em 1935, em
plena Intentona Comunista, um desses dirigíveis que teria baixado
em um campo improvisado no Tabuleiro, com a ajuda de soldados
do 20º Batalhão de Caçadores segurando as cordas para
desembarque dos passageiros.

61
“Maceió não tinha campo adequado para estes maravilhosos
engenhos voadores, mas todo mundo via passar pelos céus, em várias
oportunidades, pelas madrugadas e outras vezes em dia claro, entre
os idos de 1931 a 1935. Toda a cidade parava apontando para cima,
com mãos protegendo os olhos da claridade solar”.
Bráulio Leite Júnior, Histórias de Maceió, Edições
Catavento, 2000.

Jangadas da Pajuçara

Elas formam outro importante cartão postal de Maceió, e


movimentam uma economia solidária para os pescadores locais,
que fazem a travessia de turistas até a Piscina Natural da Pajuçara.
A jangada faz parte do cenário litorâneo alagoano - com seus paus
roliços e sua vela impulsionada pelo vento - mas as da praia da
Pajuçara estão na história. A música Minha Sereia, do cantor e
compositor alagoano Carlos Moura fez história.

Mergulhar no azul piscina


No mar de Pajuçara
Deixar o sol bater no meu rosto
Ai que gosto me dá.

E as jangadas partindo pra o mar


Pra pescar, minha sereia

62
Maceió, minha sereia

Os sinos de Maceió

Em 1885, chegava a Maceió o sino fundido em Paris, com


37 arroubas. Quatro anos depois, 31 de dezembro de 1859, o sino
badalava para chamar os fiéis na inauguração da Matriz da Nossa
Senhora dos Prazeres (hoje a Catedral Metropolitana). Um fato
curioso sobre o sino é contado no livro as Igrejas de Maceió
(1987), do padre Ernani Méro. Enquanto o sacristão fazia dobrar o
sino, ele despencou sobre o piso da torre, seria uma espécie de
maldição em torno da briga entre irmandades que queriam ser as
responsáveis pelo sino. “O fato é que havia uma briga constante
entre a irmandade do Sacramento e a Confraria das Almas pela
posse do sino, todavia nenhuma delas entrou com um tostão”.
Hoje, os sinos não tocam mais na Catedral, um sistema de som
emite os badalos. Quem olha para cima, está lá o sino parado. Não
há mais sinos com antigamente, veja na poesia de Ledo Ivo.

Os sinos de Maceió
Ledo Ivo

Não escuto os sinos


que sempre escutei
quando era menino.
Não escuto os sinos
que anunciam a morte

63
na cidade morta.

De manhã à noite
os sinos tocavam
nas velhas igrejas.

Sinos do Rosário
e do Livramento
e da Catedral
sinos da alegria
da fé e tormento
perdidos no vento
sinos dos Martírios
que se irradiavam
pelo firmamento.

Imagem de Bom Jesus dos Navegantes

Um dos ícones religiosos mais adorado pelos alagoanos é a


imagem sacra em madeira de Bom Jesus dos Navegantes, talhada
exatamente há 100 anos pelo santeiro e escultor penedense Cesário
Procópio dos Mártyres. Todo segundo domingo de janeiro
milhares de fieis acompanham a imagem em procissão pelas ruas
de Penedo, até às águas do rio São Francisco, onde outra procissão
(fluvial) reúne centenas de barcos enfeitados que percorrem as
cidades ribeirinhas. Desde 1915, a Festa do Bom Jesus dos

64
Navegantes – protetor dos ribeirinhos – se consolidou como a
maior festa popular e religiosa do Baixo São Francisco.

Sereia do Riacho Doce

A construção da escultura da Sereia em Riacho Doce foi


durante a gestão (1961-1966) do governador Luís Cavalcante,
popularmente conhecido como o “Major”. A sereia começou a ser
construída em 1962 – hoje uma senhora com 55 anos em pedra. A
escultura de quase quatro metros de altura é de autoria do artista
plástico pernambucano Corbiniano Lins, feita em concreto e
cimento parecendo estar surfando nas cristas das ondas. O local,
desde a construção da Sereia, que passou a ser conhecido como
Praia da Sereia, fica em Riacho Doce. Em datas como 8 de
dezembro, dia de Iemanjá, centenas de pessoas costumam jogar
suas oferendas. Quem acompanhou a construção da sereia de
Riacho Doce foi o engenheiro Vinícius Maia Nobre, que era
diretor do DER da época. Foi ele que deu a ideia de erguer a
estátua nos arrecifes.

“Falei para o major que tinha uma sereia de bronze na


entrada do porto de Copenhague (Holanda) e ele aceitou a idéia. Em
seguida discutimos os detalhes com o artista, Deveria ser feita em
partes, a estrutura oca seria presa às pedras com concreto, primeiro
sua cauda, em seguida encher-se-ia de concreto os vazios para depois
serem colocadas as outras partes, durante a maré vazante”.

65
Depoimento de Vinícius Maia Nobre, no livro Arte em
Alagoas, de Tânia de Maya Pedrosa – Grafitex 2004

Estátua de Zumbi na Serra

Feita pelo escultor pernambucano José Faustino, em pedra


sabão, a estátua de Zumbi dos Palmares, na Serra da Barriga, tem
três metros de altura. O líder negro está de corpo inteiro, com o
que parece um chocalho em uma mão e uma lança na outra, ao
lado de um garoto, com a mão segurando a perna de Zumbi. Foi
inaugurada em 20 de novembro de 1984, o primeiro 20 como Dia
Nacional da Consciência Negra. Foi uma festa na serra. Na visita
que fez ao sítio histórico, em 20 de novembro 2003, nos 308 anos
da morte de Zumbi dos Palmares, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva depositou flores ao pé da estátua. Desde aquele remoto 1984
se falava muito do tombamento, da construção de museu vivo de
Zumbi, do Memorial Zumbi, da retomada arqueológica do que
sobrou dos Quilombos. Mas tudo ficou na história e no papel. A
Serra da Barriga continua lá intocável, cercada por canaviais e
pelos donos dos canaviais. Para entrar tem que pedir licença.

Cachaça Azuladinha

Está lá no dicionário Caldas Aulete digital: Azuladinha. f. ||


(Bras., Alagoas) (pop.) cachaça, aguardente. F. Azulada. A famosa
cachaça de cor azulada, fabricada em Coruripe, litoral Sul, se
tornou um ícone, e apesar de ainda ser vendida não tem mais o

66
sabor de antes, como dizem os “especialistas”. Todo alagoano
boêmio tem alguma história para contar da aguardente de cana
composta de folhas de laranjeira adoçada. Em seu livro, A História
do Turismo em Alagoas, o escritor Luiz Veras Filho, revela que
quem gostava mesmo da cachaça Azuladinha era a atriz francesa
Jeanne Moreau, e o designer de moda Pierre Cardin, italiano
naturalizado francês, que estiveram em Alagoas em 1973, para
participar do filme Joana Francesa, dirigido por Cacá Diegues e
rodado no município de União dos Palmares.

“O Cardin se vestia de maneira simples: camisa, calça e


sapatos sem meia e era chamado de “alfaiate rico da França”. Por
sua vez, Jeanne Moreau adorou a nossa cachaça, especialmente a
famosa Azuladinha, de Coruripe. Ao se despedir, suas últimas
palavras foram: "Deixo muitas saudades em Maceió, e vou levar
comigo a frase que mais gostei: não tem problema”.
Luiz Veras Filho, A História do Turismo – Sergasa Maceió
- 1991

Banda "Esquenta Muié"

É uma tradição genuinamente alagoana e foi estudada pelo


folclorista Abelardo Duarte, que em sua síntese diz tratar-se de um
folclore negro. Para ele o conjunto musical das Alagoas “Esquenta
Mulher” é composto em sua essência por dois pifes, um bombo (ou
zabumba) e uma caixa, instrumentos toscos, de fabricação popular,
“os pífaros de taquara e os furos a fogo; o bumbo e a caixa, de

67
madeira oca, e cobertos com pelo de carneiro”. Um modo de fazer
do negro e do índio. Duarte também explica a razão do nome.

“O nome de Esquenta-Mulher, atribuído ao conjunto


instrumental nas Alagoas procede do alvoroço, da agitação, que as
músicas provocam no ânimo feminino. Apelidou-o, assim, o povo e a
denominação pegou para sempre”.

Abelardo Duarte, no artigo O Esquenta Mulher, em revista


da Academia Alagoana de Letras, nº 10 – dezembro de 1984

Réplica da estátua da Liberdade

Maceió tem uma réplica em menor escala da Estátua da


Liberdade, feita em bronze pelo mesmo escultor da Statue of
Liberty, feita pelo francês Frédéric Auguste Bartholdi, a original,
que tem 46 metros e fica na entrada do porto de Harvard, em Nova
Iorque. Ela chegou em Maceió para embelezar o novo porto da
cidade, no final do século XIII. Existem apenas duas peças,
réplicas da original, feita por Bartholdi, uma foi enviada para a
cidade de Paris, na França. A outra, primeiramente foi enviada
para o Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro. Porém, devido à
grande amizade do escultor francês com o pintor alagoano Rosalvo
Ribeiro, a estátua foi transferida para Maceió. Depois de “rodar”
por várias praças, finalmente ele voltou para Jaraguá, por trás da

68
Praça Dois Leões, em um pedestal próximo ao Museu da Imagem e
do Som. Hoje, a estátua eleva sua tocha com uma das mãos,
olhando o mar de Jaraguá.

Galo da torre da Igreja N.Sra. do Rosário

Imponente e secular, no alto da torre da Igreja Nossa


Senhora do Rosário dos Pretos, na rua do Sol, centro de Maceió, o
galo foi colocado ali, por negros que construíram a igreja, no
século XIX. São várias histórias e lendas, mas ele foi colocado por
ser mais um simbolismo cristão, a vigilância (“Pedro, antes que o
galo cante, tu me negará três vezes”, reza a Bíblia); o mesmo galo
“que alerta o homem e a natureza quando dormem “. A igreja
começou a ser construída quando da expansão da irmandade
católica da Senhora do Rosário Preto, que se espalhou pelo litoral
brasileiro, com o intuito de integrar o negro a sociedade, com uma
igreja construída por eles e para eles. Só em Alagoas, são três os
templos dedicados à santa: Maceió, Penedo e Marechal.

“Realmente, a Igreja Católica, (que) muitas vezes (era)


malhada, teve um papel importante na integração do negro com a
sociedade, pois, sabemos todos, quem eles eram tidos “como bestas e
ser tratado como tal, dentro da confraria, ele já é alguém”.
Padre Ernani Méro, no livro Igrejas de Maceió (1987)

Coleção Perseverança

69
A Coleção Perseverança é considerada uma das mais
importantes e raras coleções etnográficas existentes no País com
relação a história do negro e afrodesdentes. O “tesouro” reúne
objetos resgatados do Dia do Quebra (1912) em que os terreiros de
Maceió foram destruídos e queimados por manifestantes anti-
religiosos, integra o acervo do Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas (IHGAL). A coleção reúne esculturas, imagens,
instrumentos, indumentárias e paramentos que resistiram à
perseguição e aos ataques em fevereiro de 1912, quando as Casas
de Xangô da capital alagoana foram alvo da intolerância religiosa e
ficaram totalmente destruídas.

Americanos quase levam o tesouro


Antes de a Coleção Perseverança chegar ao Instituto
Histórico, houve uma tentativa de compra da raridade por
marchands dos Estados Unidos. Eles souberam da existência das
peças em artigo do sociólogo Gilberto Freyre. Enviados da
América chegaram a propor um lance ao museu da extinta
Sociedade Perseverança e Auxílio dos Empregados do Comércio
de Maceió, que era o guardião da coleção. Só o capacete de Ogun-
China estava avaliado em 500 mil réis. Rapidamente os intelectuais
do IHGA se mexeram e conseguiram abortar a compra, e receber a
coleção como doação. A organização e a reclassificação foram
realizadas pelos folcloristas Abelardo Duarte, Théo Brandão e
Solange Berard Lages, então diretora do Departamento de
Assuntos Culturais da Secretaria de Educação. São 85 peças

70
classificadas pelo orixá pertencente e a especificação. São fetiches
e insígnias; esculturas e imagens; instrumentos musicais,
indumentárias, paramentos e mais muletas, machados, espingardas
e revólveres de oxum.

“O Instituto Histórico se esforçou para recolher ao seu


museu esse material, preservando-o da inevitável perda por falta
de conservação ou de sua evasão para coleções particulares, ou
para mãos inescrupulosas de meros exploradores”.
Abelardo Duarte, na abertura do Catálogo Ilustrado da
Coleção Perseverança, IHGA – Maceió 1974

Cartões Postais antigos de Alagoas

Entra também para a história como um ícone de primeira


grandeza, o livro Cartofilia Alagoana Redescobrindo o Passado, de
Douglas Apratto Tenório e Cármem Lúcia Dantas, que com um
trabalho perfeito de garimpagem, conseguiram reunir de
colecionadores aficcionados cartões postais de nosso estado de
Alagoas, em um impecável trabalho memorialístico e de uma
memoráblia inacreditável. No final do livro um postal-foto de um
homem segurando um guarda-chuva, sentado sabe onde? Na curva
do famoso coqueiro Gogó da Ema!

71
“Alagoas também se inseriu nessa trajetória e foi fotografada
nesse período, detendo a cartofilia uma memória histórica da
fisionomia arquitetônica, social e cultural da sua capital e de outras
cidades interiorianas. Cartões de bela feição gráfica mostram as
cheias do Rio São Francisco, a Boca de Maceió, os antigos engenhos
e banguês, a dança do coco no meio rural, populares candidamente
conversando nas ruas vazias de automóveis”.
Douglas Apratto e Carmem Lúcia Dantas, em Cartofilia
Alagoana Redescobrindo o Passado, 2ª edição – Sebrae 2009

O esplendor do Hotel Bella Vista

Projetado pelo arquiteto alemão Guilherme Jagerfeld, o


espetacular Hotel Bella Vista, inaugurado em 1923, quando o
Centro de Maceió ainda vivia tempos de glamour, e durou até
1963, quando foi demolido para dar lugar à construção do edifício
que seria a sede do Inamps (Previdência Social), na Praça dos
Palmares. Mas, nada disso aconteceu. O prédio de catorze andares
é hoje uma carcaça de “elefante branco”, interditado pelo poder
público. Do velho e charmoso hotel só as fotos em preto e branco,
com suas torres enrodilhadas (em forma de sorvete na casquinha).
O hotel tinha três andares, com trinta metros de altura, ocupava
uma área de 1,4 mil metros quadrados, com 40 quartos do mais
puro luxo, cinco terraços de mosaico e mármore, balaustradas em
alto relevo, uma jóia perdida da arquitetura clássica alagoana. No
livro Memórias, Discursos, Artigos e Rimas, de A. C. Simões, há
uma referência à existência de um elevador no hotel, e que este

72
seria o primeiro de Maceió a utilizar tal recurso. Para se ter uma
ideia da importância do hotel na vida da capital, a posse do
governador Costa Rego, em junho de 1924, ocorreu em suas
dependências.

Na boca de Maceió
Popularmente conhecida por Praça dos Palmares, este
ambiente também já foi anteriormente chamado de Boca de
Maceió, pois era o primeiro local onde os visitantes da nova capital
do estado se hospedavam nos hotéis localizados na região, além de
desfrutar dos cafés, dos bares, dos cabarés e das diversas casas de
diversões que se localizavam ao redor. Um dos locais de
hospedagem mais famoso que havia na praça, era o Hotel
Universal, que posteriormente deu lugar ao Hotel Petrópolis, que
era bastante famoso por não sofrer com o ataque de mosquitos que
era bastante freqüentado na época. No auge do ramo da hotelaria,
mais na frente o Hotel Petrópolis foi substituído pelo Bella Vista
Palace Hotel. Construído para ser a residência do comerciante
Arsênio Fortes, em 1929 o hotel foi a leilão. Arrematado, passou a
ser administrado por Romeu dos Santos e depois, passou para as
mãos do ‘capitalista’ Adib Robay, quando ganhou Palace Hotel em
seu nome.

Coleção de fotos de Marcel Gautherot

O fotógrafo francês Marcel Gautherot (1910-1996) é o autor


da série de fotos numeradas, em preto e banco, dos Guerreiros de

73
Maceió, em 1943, hoje sob a guarda do Instituto Moreira Salles
(IMS), mas aberta ao público. A raridade é considerada – nos
estudos de antropologia sobre a fotografia – uma das mais
importantes coleções fotográficas sobre o Brasil no século XX.
Gautherot chegou a registrar mais 25 mil fotogramas por todo o
país, durante os anos em que permaneceu no Brasil (1940 a 1980).
O acervo foi adquirido pelo IMS em 1999.

“Com formação em arquitetura, o fotógrafo busca nas


paisagens, nas comemorações e na vida cotidiana, na história vivida
das ruas, o equilíbrio minucioso das formas, o jogo com a
profundidade e campo e o movimento, o registro calculado das luzes.
Pré-visualiza o momento particular em que as disposições do quadro
sintetizam como trama gráfica e representação o acontecimento.
Cabe relembrar que a formação fotográfica de Gautherot tem como
primeira referência seus experimentos com a revelação fotográfica no
laboratório do novo Musée de l´Homme, em Paris, como arquiteto
decorador, do projeto de reorganização das exposições
etnográficas”.
Lygia Segala, pesquisadora da Universidade Federal
Fluminense, dos Anais do Museu Paulista, dezembro de 2005

Um museu para Théo Brandão

O Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore,


instalado no lindo casarão da Avenida da Paz, maior referência em
cultura popular de Alagoas, fez 40 de sua fundação em 2017. Mas

74
a história do museu é de emocionar os alagoanos e brasileiros. Ele
surgiu pela determinação do maior folclorista alagoano, Théo
Brandão, que repassou todo seu acervo, garimpado durante 25 anos
de pesquisas ao longo de suas viagens de trabalho e observação.
Em seu discurso de inaguração do novo museu, Théo afirmou que
“a verdade verdadeira é que o Museu não passa de uma sopa de
pedras, que ainda está a ser cozinhada com vagar, paciência e
cautela”. Ele se referia que o “pequeno acervo” doado à
Universidade Federal de Alagoas, mantenedora do museu, não
passava de “materiais de uso comum e diário do nosso homem do
povo”. E assim ele resumia a conquista do prédio próprio, em seu
discurso de 20 de agosto de 1977, na sede do museu, durante a V
Festa do Folclore Brasileiro.

“Eis a razão pela qual o impertinente fradinho Théo Brandão


vai ao dono maior da Casa – o reitor Nabuco Lopes e pede-lhe, agora
oficialmente para lhe arranjar no Campus uma panela maior para
colocar suas pedrinhas e começar a esquentar o fogo para fazer a sua
“Sopa de Pedras”. Nabuco Lopes, em boa hora assessorado por
Manoel Ramalho e João Azevedo, seu pró-reitores que certo dia, em
visita ao Campus Tamandaré (onde Théo guardava um acervo de
mais 10 mil peças) passaram os olhos no pequeno acervo que estava
sendo arrumado e capacitaram-se da importância da manutenção da
iniciativa, cedeu o prédio, nessa ocasião já desocupado pela
prefeitura da Ufal que fora a casa de residência do comandante da
antiga Escola de Aprendizes de Marinheiros”.

75
Trecho do discurso de Théo Brandão no livro Vida em
Dimensão, edição comemorativa ao Centenário do folclorista
1907/2007, organizado por Cármem Lúcia Dantas, Fernando Lôbo,
Vera Lúcia Calheiros Malta, editado pelo Governo de Alagoas

Museu Pierre Chalita de Arte sacra

O Museu de Arte Pierre Chalita é uma instituição privada,


mantida pela Fundação Pierre Chalita. Foi fundado em 1980, sob a
denominação Museu de Arte Sacra. Mantém parte da coleção
particular do pintor Pierre Chalita, composta por obras
provenientes do Brasil e de outros países, executadas entre os
séculos XVII e XX, em que sobressai um importante núcleo de arte
sacra. O Museu de Arte Pierre Chalita foi oficialmente criado em
19 de maio de 1980. O museu está instalado em um antigo casarão
de 800 m² no entorno da praça Floriano Peixoto (Martírios), no
centro da capital alagoana, e é parte integrante do "conjunto
arquitetônico dos Martírios", tombado pelo patrimônio estadual de
Alagoas desde março de 2000.

Acervo de primeiro mundo


Acervo permanente e exposições. A coleção do museu é
constituída por parte das 2270 obras pertencentes à Fundação
Pierre Chalita. Abrange pinturas, esculturas, desenhos, gravuras,
objetos decorativos e um núcleo substancial de arte sacra,
originários do Brasil e de outros países. Há um pequeno núcleo de
pinturas europeias, em que se destaca uma cópia do século XVII da

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Transfiguração de Rafael, adquirida do Museu do Prado, Lavínia e
Vênus, ambas atribuídas a Ticiano, além de uma madona já
creditada ao ateliê de Leonardo da Vinci e cópias antigas de
Caravaggio e Guido Reni. Do Modernismo, há obras de João
Câmara, Alfredo Volpi, Carlos Scliar, entre outros. Dentre os
artistas alagoanos, há obras de Lourenço Peixoto, Rosalvo Ribeiro,
Fernando Lopes, e Vicente Ferreira de Lima, além de várias peças
do próprio Pierre Chalita e de sua esposa, Solange.

Museu Palácio Floriano Peixoto

O Museu Palácio Floriano Peixoto (MUPA) é a antiga sede


do governo de Alagoas. Seu acervo é constituído do mobiliário dos
séculos XIX e XX, prataria, cristais e objetos decorativos, além de
inúmeros quadros de pintores alagoanos, como os destacados José
Zumba, Luis Silva, Miguel Torres, Lourenço Peixoto e telas do
pintor alagoano Rosalvo Ribeiro, premiado em várias exposições
no Brasil e na França. Em 2010, o museu agregou ao seu acervo, o
Espaço Aurélio Buarque de Holanda e o Memorial Lêdo Ivo. O
museu faz parte do cadastro do Sistema Alagoano de
Museus/SAM, do Sistema Brasileiro de Museus e do Cadastro
Nacional de Museus - CNM.

Pinacoteca: um espaço contemporâneo

Criada em 1981, a Pinacoteca Universitária pertencente à


Universidade Federal de Alagoas, nasceu com o propósito de

77
preservar e difundir a memória artística e cultural de Alagoas, por
meio do incentivo à produção artística e à execução de projetos
educativos para o público estudantil dos diversos níveis e a
comunidade alagoana. A Pinacoteca, apesar da degradação em seu
entorno, na Praça Sinimbú, se firma como lugar destinado a
promover o conhecimento e o contato com a arte em geral e, em
especial, com a produção contemporânea, buscando ultrapassar o
papel de espaço de observação e lazer. Desde que se transformou
em Museu de Arte Contemporânea, a Pinacoteca o espaço
educativo, democrático e proativo foi consolidado.

Brasão de armas de Alagoas

Sob pseudônimo de Carlos Vilalva, o maior folclorista,


etnólogo e antropólogo alagoano Théo Brandão, foi o autor do
Brasão de Armas do Estado de Alagoas, e mais, da cidade de
Maceió e da Universidade Federal de Alagoas. O Brasão do Estado
é um primor de história e beleza. O brasão é originário da heráldica
holandesa, porém Théo Brandão construiu algo bem mais
alagoano. Um escudo de cores azul e vermelha, no meio uma
ilustração de um rochedo (alusão à Penedo), sobre três montes
(alusão à Porto Calvo), na fronte, um cardume de tainhas prateadas
na contracorrente (alusão à cidade de Marechal Deodoro) e abaixo
o mar ondulado. Acima do escudo pontifica uma estrela. De cada
lado, protegendo o escudo, um ramo de cana de açúcar e outro do
algodão, ambos com suas flores. Abaixo os dizeres em latim: Ad
Bonum et prosperitate (algo como pelo bem e pela prosperidade).

78
Relatórios do prefeito Graciliano

Graciliano Ramos foi prefeito de Palmeira dos Índios entre


janeiro de 1928 e abril de 1930 e imortalizou a experiência em
relatórios de prestação de contas enviados ao governador de
Alagoas, Álvaro Paes, nos quais descrevia suas atividades e
comentava os problemas da cidade. Com ironia, ele escreveu, no
relatório sobre o ano de 1929, acerca dos mais ricos do município:

“Bem comido, bem bebido, o pobre povo sofredor quer


escolas, quer luz, quer estradas, quer higiene. É exigente e
resmungão. Como ninguém ignora que se não obtém de graça as
coisas exigidas, cada um dos membros desta respeitável classe acha
que os impostos devem ser pagos pelos outros”.

Relatórios levaram à edição de Caetés

Foram os relatórios que chamaram a atenção do editor


Augusto Frederico Schmidt para a qualidade do texto de
Graciliano e levou à publicação, em 1933, de seu primeiro
romance, “Caetés”. Na época, o autor já havia deixado a prefeitura
de Palmeira. De linguagem apurada e criativa, a qualidade
“literária” do relatório era completamente inesperada em informes
daquele tipo. O texto e seu autor atraíram a atenção de uma seleta
roda de literatos do Rio de Janeiro, na época capital política e

79
cultural do país. O editor carioca Augusto Frederico Schmidt foi o
primeiro a supor que atrás daquele texto de teor administrativo se
escondia um escritor. Schmidt teria escrito ou mandado dizer a
Graciliano: “Envie o romance!”. Assim, em 1933, foi publicado o
romance Caetés, obra de estréia de um dos maiores romancista que
o Brasil já teve.

Relatório ao Sr. governador Álvaro Paes

Receita. 96.924$985. Não empreguei rigores excessivos. Fiz


apenas isto: extingui favores largamente concedidos a pessoas que
não precisavam deles e pus termo às extorsões que afligiam os
matutos de pequeno valor, ordinariamente raspados, escorchados,
esbrugados pelos exatores.

Cemitério. 243$000. Pensei em construir um novo cemitério,


pois o que temos dentro em pouco será insuficiente, mas os trabalhos
a que me aventurei, necessários aos vivos, não me permitiram a
execução de uma obra, embora útil, prorrogável. Os mortos
esperarão mais algum tempo. São os munícipes que não reclamam.

Iluminação. 7:800$000. A prefeitura foi intrujada quando, em


1920, aqui se firmou um contrato para o fornecimento de luz. Apesar
de ser o negócio referente à claridade, julgo que assinaram aquilo às
escuras. É um bluff. Pagamos até a luz que a lua nos dá. (...)

80
Projetos. Tenho vários, de execução duvidosa. Poderei
concorrer para o aumento da produção e, consequentemente, da
arrecadação. (...) Iniciarei, se houver recursos, trabalhos urbanos.
(...) Empedrarei, se puder, algumas ruas. Tenho também a idéia de
iniciar a construção de açudes na zona sertaneja.
Relatório de Graciliano publicados no Diário Oficial,
Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2013

Fotomontagens de Jorge Lima

As facetas do poeta alagoano Jorge de Lima são difíceis de


mensurar. Além da poesia, prosa, pintura, escultura, folclore, e,
médico com grande clientela no Rio de Janeiro, o “rei dos poetas”
foi o primeiro artista brasileiro a produzir fotomontagens. As tintas
eram surrealistas, mas com temas brasileiros. Cerca de 11 originais
sobreviveram nos arquivos de Mário de Andrade, e que se encontra
hoje no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP). As fotos
fizeram parte da mais recente exposição das fotomontagens de
Jorge, no Rio de Janeiro, em 2010, A Pintura em Pânico –
fotomontagens de Jorge de Lima. “Trata-se de uma obra raríssima
que permancia desconhecida e praticamente inacessível, apesar do
importante papel na nossa história da arte, pelo de ser fundador das
práticas fotográficas no Brasil”, diz Simone Rodrigues, curadora
da exposição.

“Ele investigou temas de formas fundamentais de brasilidade,


moldando-as de acordo com sua visão do mundo, influenciada

81
também pela mística cristã. Regionalista e universal; popular e
erudito. É o caráter multifacetado de suas criações desafiam até hoje
a compreensão por parte da crítica”.
José Nivaldo de Farias, estudioso de Jorge de Lima,
professor de letras na Ufal, autor de “O Surrealismo na poesia de
Jorge de Lima, Editora PUC-RS, 2011

Augusto Malta: Rio sob olhar alagoano

O alagoano de Mata Grande Augusto Cesar de Malta


Campos (1864-1957) foi o principal fotógrafo da evolução urbana
do Rio nas primeiras décadas do século XX, período de acelerada –
e por vezes traumática – modernização. Radicado na cidade desde
1888, ano da Proclamação da República, trabalhou inicialmente
como comerciante de tecidos, até dar seus primeiros passos como
fotógrafo amador na virada do século.

“Contratado em 1903 como fotógrafo oficial da Diretoria


Geral de Obras e Viação da Prefeitura do Distrito Federal, cargo
criado especialmente para ele, Malta teve como missão inicial
registrar imagens de todas as ruas que teriam seu traçado modificado
pelo gigantesco projeto urbanístico do prefeito Pereira Passos, no
período conhecido como “bota-abaixo”. Pereira Passos, de quem o
fotógrafo se tornou amigo, deixou a prefeitura em 1906, mas Malta
conservou-se no posto por mais 30 anos, registrando desde grandes
eventos, como a Exposição Nacional de 1908 e a inauguração da

82
estátua do Cristo Redentor (em 1931), até aspectos da vida cotidiana
da cidade”.
Texto de apresentação do portal do Instituto Moreira Sales
(IMS), que desde 2002 detém todo o acervo de fotos do alagoano

Um gigante da fotografia
Até os 24 anos Augusto Malta viveu entre Alagoas e
Pernambuco. Em Mata Grande, sua família dominava toda a
região, indo até mais além, quando seu tio, Euclides Vieira Malta,
tornava-se governador de Alagoas. Em Recife, cumpriu o serviço
militar, quando esperava ser chamado para fazer carreira. Mas para
decepção de Augusto, fora dispensado. Foi aí que tomou coragem
e partiu para o Rio de Janeiro. Ele mudou-se para a Corte Imperial
aos 24 anos, em 1888, e foi trabalhar com comércio de tecidos,
mas depois trocou seu tino comercial, pelas máquinas fotográficas.

No ano seguinte, foi proclamada a República, e o Rio passou a


ser "Distrito Federal". Em 1903, Augusto Malta conheceu o prefeito
do Rio de Janeiro, Francisco Pereira Passos, que promovia uma
mudança radical no cenário da cidade. Após observar um
impressionante conjunto de vistas em negativos de vidro, registradas
por Augusto, o prefeito cria o cargo público de fotógrafo municipal e
o nomeia. No Rio de Janeiro, a maior parte das fotografias de
Augusto Malta encontra-se dividida entre o Museu da Imagem e do
Som do Rio de Janeiro e o Arquivo Geral da Cidade do Rio de
Janeiro. São, ao todo, 80 mil fotos, incluindo 2.600 negativos em
vidro e 40 panorâmicas. Já no Museu da Imagem e do Som a coleção

83
reúne cerca de 27.700 fotografias do Rio de Janeiro, tiradas por
Augusto Malta durante o período em que atuou como fotógrafo oficial
na gestão do prefeito Pereira Passos, no início do século XX.
Texto de apresentação do portal do Instituto Moreira Sales
(IMS), que desde 2002 detém todo o acervo de fotos do alagoano

Casa Museu Graciliano Ramos

Na casa onde morou o prefeito da cidade de Palmeira dos


índios, Graciliano Ramos, há muitas relíquias acerca da vida e da
obra de Graciliano, como sua máscara mortuária, feito pelo artista
Honório Peçanha, com a face de Graciliano ao lado, de seus
personagens em Vidas Secas, o vaqueiro Fabiano, sua mulher
Sinhá Vitória, os dois meninos e a cachorra Baleia. Também fazem
parte do acervo edições raras das obras publicadas em países como
a Ucrânia, textos atilografados e revisados por Graciliano à mão –
há controvérsias sobre o fato de que Graciliano não teria escrito
seus textos em máquinas, mas com lápis ou caneta tinteiro. No
museu é possível ler Jorge Amado, em um prefácio que escreveu
para a edição portuguesa de Vidas Secas, que retrata um belo perfil
do alagoano Graciliano Ramos, na visão do baiano.

“Esse homem seco e difícil, seco de carnes, econômico em sua


literatura da qual eliminou qualquer gordura, cuja amizade era
moeda de câmbio alto, reservada para alguns, que começou a
escrever já maduro (aos quarenta e poucos anos de idade) e que
morreu cedo, em plena força criadora. Esse Graciliano Ramos do

84
interior de Alagoas, com algo de senhor feudal e de cangaceiro
reivindicador, foi um dos homens mais doces e ternos que conheci, e
um dos mais fiéis amigos. A lealdade era sua virtude fundamental”.

Festival de Verão de Marechal Deodoro

O primeiro Festival de Verão foi em 1968, onde a praia a do


Francês fervilhava de músicos, hippies, estrangeiros, e por onde
circulava um ar de liberalidade, com mulheres fazendo topless,
“maconha liberada”, em esquinas e na praia. O Francês era apenas
um povoado de pescadores, as ondas eram mais selvagens, e já
eram point de surf. Na bela cidade histórica de Marechal Deodoro,
o Festival de Verão mudava o tom, a cidade cheirava a cultura e
arte popular, com apresentações de forma espontânea e divertida.
Foi, em seu tempo, um dos maiores eventos culturais do Brasil.
Quem tem mais de 50 anos lembra com saudade detalhes das
apresentações da arte e cultura na histórica cidade de Marechal
Deodoro nos anos 70. Este festival fez a auto-estima do povo, eram
eventos esperados durante o ano, uma vitrine da mostra da nossa
cultura, nossas raízes, ficou no inconsciente da população em
forma saudosista, a lembrança dos festivais.
Festival Internacional de Cinema de Penedo

O Festival de Cinema teve como palco o glorioso cine São


Francisco, nos anos 1970 e começo dos anos 1980. Era grande o
glamour e cenas do mainstream da sétima arte, onde grandes
estrelas do cinema desfilavam no tapete vermelho. E a

85
efervescência do Teatro Sete de Setembro, recebendo as grandes
trupes nacionais e os grupos locais que resistem ao tempo. E o
brilho das estrelas não parava aí. Pelo tapete passou meio mundo
do cinema brasileiro e internacional. Cacá Diegues, Nelson Pereira
dos Santos, Sylvio Back, Hector Babenco, e tantos outros,
lançaram seus filmes, Eva Vilma era a lady de Penedo, sempre
liderava as rodas.

A moçada do cinema alagoano: Elinaldo Barros, Beto


Leão, Ronaldo Andrade, José Márcio Passos, Mário Aluízio,
Celso Brandão, Solange Lages e tantos e tantos outros. O ciclo
original do Festival de Penedo não existe mais, foi ótimo enquanto
durou, de 1975 a 1982. Em suas primeiras edições, exibia curtas
ou longas-metragens nacionais junto com a mostra competitiva de
filmes alagoanos em Super 8. O sonho acabou.

Modernismo e Festa da Arte Nova

Em 1928, o movimento modernista em Alagoas chegou


forte e provocou uma reviravolta na sonolenta Maceió. A Festa da
Arte Nova deu o impulso que faltava para a entrada dos

86
modernistas em Alagoas. A festa serviu para romper com o que se
entendia como arte e trazer o novo, a liberdade proposta pelo
modernismo. Dois livros do historiador Moacir Sant´Ana formam
a melhor obra escrita sobre o assunto: Documentário do
Modernismo (1978), com toda a memoráblia do movimento - e
História do Modernismo em Alagoas - 1922-1932 (1980). Os
livros trazem a repercussão, em Alagoas, do Movimento
Modernista, desencadeado, em fevereiro de 1922, com a referida
Semana de Arte Moderna, e não só desse movimento de
vanguarda, mas igualmente de um outro, o Movimento
Regionalista do Nordeste. A Festa da Arte foi realizada em 17 de
julho de 1928, promovida por intelectuais da terrinha, como
Mendonça Júnior, Valdemar Cavalcanti, Carlos Paurílio, Mário
Brandão e pelo pintor Lourenço Albuquerque. Aurélio Buarque de
Hollanda, um dos convidados para a festa, deu o tom do
acontecimento:

“Creio que a festa será brilhante. Escandalosamente


brilhante. Creio porque não temos dirigentes acadêmicos –
imortaloides com admiráveis cérebros de consistência ... granítica.
Quem está à sua frente, na parte literária, é gente moça. É gente que
pensa e trabalha. Que tem alguma coisa na cabeça. Uma coisa muito
falada – por cuja posse endoidecem certos velhotes e rapazolas
imbecis de 50, laureados pelos noticiaristas safados dos jornalecos e
pelas academias de primeiras letras. Já todos sabem o que é. Talento.
Haverá um baile, para remate de tudo. É bom. Mas muita gente não

87
irá assistí-la. São os despeitados e ofendidos ... Também não faz mal.
Porque se fosse todo mundo, o prédio não caberia tanta gente”.
Aurélio Buarque de Holanda, no artigo A Festa da Arte
Nova, do livro Documentário do Modernismo, de Moacir Sant
´Ana, Editora da Universidade Federal de Alagoas – 1978

Chapéus de Guerreiro: símbolo das Alagoas

Os chapéus do auto natalino de Guerreiro, um dos mais


tradicionais do folclore alagoano, viraram um objeto de arte
símbolo de Alagoas, um dos mais procurados por visitantes –
principalmente sua miniatura. Os chapéus são “catedrais”, igrejas
com torres, feitas de papelão, madeira, espuma e revestidos com
tecido coberto de lantejoulas, contas, miçangas, cacos de espelho e
bolas de árvore de natal, enfim, toda sorte de material
industrializado colorido e brilhante. Estes chapéus com formas
arquitetônicas, assim como as coroas e diademas, são fabricados
artesanalmente por pessoas ligadas aos grupos que preservam uma
tradição. O mestre do Patrimônio Vivo Alagoano Cícero Abdias,
conhecido como Cicinho do Campeão do Trenado, é um brincante
do Guerreiro que se destaca como artesão dos chapéus – vindo de
uma escola que teve o mestre Benon como um clássico. Mestre
André do Guerreiro Mensageiro do Padre Cícero, também
confecciona e reforma chapéus e coroas de Guerreiro no fundo de
sua casa, no bairro do Tabuleiro, em Maceió. Cor e brilho são
qualidades indispensáveis para os materiais utilizados na
confecção dos chapéus e, em meio aos artesãos.

88
“Eu tinha dez anos quando comecei a fazer os chapéus de
guerreiro. Eu via o meu irmão fazendo e aprendi. É um trabalho
difícil, bonito e importante. Além de confeccionar os chapéus, eu
danço Guerreiro. Comecei com o Caboclinho e agora danço
Guerreiro. É uma tradição de família. Lá todos participam. Com a
morte de meu pai Nivaldo Abdias (também Mestre do Patrimônio
Vivo), hoje, eu estou à frente do Grupo Guerreiro Campeão do
Trenado. Sinto-me feliz por manter a tradição. Eu gosto do que
faço”.

Tânia Maya Pedrosa e a arte popular

Tânia Maya Pedrosa é a divulgadora e força motriz da arte


popular alagoana. Ela é autora da publicação Arte Popular de
Alagoas, 2004, um livro-ícone com grandes histórias e
personagens. Tânia é uma primeira dama sagaz, ágil, faz as coisas
acontecerem. Apaixonada pelo artesanato alagoano, ela fez de seu
apartamento, um verdadeiro museu, são peças de madeira, de ferro,
pinturas, miniaturas, e muitos quadros e telas com arte naif, da qual
ela uma das maiores expressões. São dois andares de obra de arte.

“Tânia de Maya Pedrosa, tudo que ela deseja ela obtém, tal é
sua força. Pesquisadora incansável das artes Nordestinas, em
particular de Alagoas; é com uma tenacidade feroz que ela descobre
novos talentos, aos quais ela dedica grande parte de seu tempo, em

89
detrimento de pintora ingênua (naif). Ela pratica, quase sempre
madrugada afora, com real talento, poesia e efusão de cores”.
Ceres Franco, crítica de arte e galerista brasileira, que mora
no Sul da França, em Arte Popular de Alagoas, Grafitex – 2004

Dona Marinita e o bordado Singeleza

Uma bela história. O bordado Singeleza tem um nome, o da


mestra Marinita (1925-2009), que aos 84 anos ainda segurava a
agulha e o bastão. Ela, somente ela, tinha o saber deste raro
bordado. Marinita conseguiu repassar sua técnica às suas
seguidoras. As meninas já trabalham novas peças, tentam superar
os obstáculos. Mas, a melhor notícia, que pode dar impulso pela
sobrevivência do bordado e bico Singeleza vem da Universidade
de La Basilicata, Itália. Pesquisadores desta instituição estiveram
em 2015, no Brasil, para fechar parceria com a Universidade
Federal de Alagoas para estudos de tombamento. Olha só: a renda,
confeccionada somente em Alagoas, é similar ao Puntino Ad Ago
italiano feito exclusivamente por associações de artesãs da região.
O convênio tem a finalidade de solicitar à Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), a inscrição
(candidatura multinacional) da Singeleza alagoana e do bordado
Puntino como bens culturais da Humanidade.

“A renda singeleza é a graça de minha vida. Esqueço o tempo.


A gente vai fazendo com vontade que aumente e não pode tirar a

90
vista. Brincou com a verdade erra, perde o ponto. Aí entroncha tudo,
e o bordado perde o caminho”.
Dona Marinita, em Mestre Artesãos das Alagoas, 2ª edição
atualizada, Instituto Arnon de Mello, 2014

O Café do Cupertino

Muito já se escreveu sobre a celebridade de determinados


bares, cafés e restaurantes, que eram frequentados pela nata da
intelectualidade – no caso dos bares, a nata da malandragem. O
exemplo mais falado, fotografado e ilustrado é o do Café e
Confeitaria Colombo, no Rio de Janeiro, no fim do século 19, que
reunia personalidades literárias como Olavo Bilac, o alagoano
Guimarães Passos, Emílio de Menezes e tantos outros. Em
Alagoas, já no século XX, nos primeiros anos da década de 1930,
um pequeno café localizado na Rua do Comércio, em Maceió, era
frequentado por grandes nomes das letras nordestinas.

“O café do Cupertino adquiriu celebridade, porque era


freqüentado por Graciliano Ramos, José Lins do Rêgo, Rachel de
Queiroz, Santa Rosa, Valdemar Cavalcante, Aloísio Branco, Carlos
Paurílio, Alberto Guimarães Passos, José Auto, Aurélio Buarque de
Holanda, Manuel Diégues Júnior, Théo Brandão, Raul Lima e tantos
outros intelectuais e escritores que formavam uma roda permanente,
sem qualquer característica boêmia, pois consumiam sempre café
pequeno e cigarros”.

91
Carlos Moliterno, no artigo Graciliano Ramos em Maceió,
na Revista Alagoana de Letras, no quatro, ano IV, dezembro de
1978

Camarão alagoano do Bar das Ostras

Receita tradicional no mercado gastronômico de Maceió,


criada por dona Oscarlina e seu Pedro há pelo menos 60 anos, foi a
primeira a ganhar o título de bem imaterial do Estado de Alagoas.
O Bar das Ostras, que nasceu no Vergel do Lago, mas mudou-se
para outros lugares, foi o restaurante mais visitado e conhecido da
capital alagoana durante sua existência. Depois de fechado, a
receita ficou guardada a sete chaves. A receita foi tombada em
2011 como patrimônio materiale do Estado, e agora que faz parte
da gastronomia turística e pode ser apreciada em qualquer mesa
alagoana.

Preparo do Camarão Alagoano do Bar das Ostras

Colocar em água fervente os camarões, deixar por 10 minutos.


Em seguida retirar os camarões da água fervente e colocá-los em
água fria e descascar. Após limpar os camarões, colocá-los
novamente na água com um pouco de sal, deixar ferver por 5
minutos. Esfriar e reservar. Colocar no liquidificador o tomate, a
cebola, o pimentão, o coentro, vinagre e o extrato de tomate. Em
seguida colocar o molho liquidificado numa panela, leve ao fogo,
acrescentando o azeite, limão, deixe cozinhar por 10 minutos, sem

92
reduzir o volume. Mexendo sempre. Coloque a metade da manteiga,
os camarões e continue mexendo, acrecente o restante da manteiga,
deixando ferver por 10 minutos em fogo baixo. Para a Farofa: Em
uma panela colocar o óleo e a cebola, levar ao fogo até que fique
transparente. Acrescente a manteiga, o extrato de tomate e o colorau,
mexer até dissolver. Aos poucos colocar a farinha misturando com a
colher.

Sururu de capote: patrimônio alagoano

Em novembro de 2014, o Conselho Estadual de Cultura


aprovou, por unanimidade, o registro do Sururu como Bem
Cultural de Natureza Imaterial. O pedido de registro como
patrimônio imaterial foi solicitado formalmente pelo professor da
Universidade Estadual da Alagoas, Edson Bezerra, autor do livro
Manifesto Sururu: por uma antropofagia das coisas alagoanas. Para
Edson Bezerra, o registro foi uma conquista do povo alagoano,
pois o sururu possui uma cultura rica e forte, e tem o sururu
inserido no contexto histórico do estado. “É uma vitória importante,
porque o Sururu está inserido em nossa cultura. Desde o tempo dos
escravos que o molusco é utilizado em iguarias. Apesar de ser
encontrado em outros estados também, ele ficou mundialmente
conhecido como prato típico de Alagoas.

“Sururus existem em quase todas as lagoas do Brasil. Porém os


desta lagoa, devido às circunstâncias especiais explicadas pelos
naturalistas, como mistura de água do mar com águas dos rios que

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deságuam na lagoa, e outras causas, tornam-se como que degenerados,
pequenos, gordinhos, gostosíssimos”.
Jorge de Lima, Calunga – 2ª edição 1943

"Esse negócio de patrimônio é interessante. Se tem a


necessidade de um emburguesamento. Tirou-se o sururu da pobreza e
deu-se a ele uma condição nobre, mas deixando o povo de ser visto.
Temos que ver que, no meio desse sururu bonito, que a gente come,
está sendo vendido a quanto? Quanto esse cara ganha por mês para
dar comida para o filho dele".
Sávio de Almeida, em Gazeta de Alagoas, O Patrimônio
que vem das margens, por Larissa Bastos

Baile da Chita de Paulo Jacinto

O tradicional Baile da Chita, da cidade de Paulo Jacinto,


com mais de 60 anos de festa, agora é Patrimônio Histórico,
Artístico, Cultural e Imaterial do Estado. Desde junho de 2015,
quando a Assembleia Legislativa aprovou projeto de lei – em
matéria do deputado Inácio Loiola foi aprovado, por unanimidade,
pelos deputados estaduais durante a sessão ordinária – que o baille
foi reconhecido como patrimônio imaterial. O Baile da Chita foi
criado em 1951 com o objetivo de angariar fundos para a
emancipação política da então Vila de Paulo Jacinto. O nome
“Baile da Chita” se deve ao fato do evento ser realizada logo após
os festejos juninos, no mês de julho, quando a cidade ainda está
enfeitada com adornos que tem como base um volume

94
considerável de tecidos com estampas de várias formas e
motivações florais, com predominância sobre o mais brasileiro dos
tecidos, que é a chita.

Meninos da Avenida da Paz

Nos anos 60 e 70, a praia da Avenida era a mais limpa e


linda de Maceió. Todo mundo corria para lá. Mais quem se divertia
mesmo eram os Meninos da Avenida. Garotos que viviam o sonho
da juventude, com o riacho Salgadinho limpinho, que dava até para
tomar um banho depois da praia. Os bailes eram no Clube Fênix
Alagoana, tinha concurso de miss, o mago Frazão puxando a
moçada para a foto, e o Carnaval! Tinha jogo de futebol na praia;
soltar arraias, lutar de gata parida embaixo das amendoeiras,
garrafão no coreto, e as primeiras cachacinhas. Quem conta sobre
esse tempo é engenheiro Américo José Peixoto Lima, o Lelé, que
organizou o livro “Meninos da Avenida”, lançado em 2011, e que
hoje se transformou em um blog de sucesso. Mais de 20
colaboradores da turma contam suas histórias até hoje.

“É um tributo à amizade, recheado de fatos que fazem parte


da história da cidade, das memórias de um tempo que não volta mais;
de uma parte da cidade que teve seus anos de glória, no entorno da
Avenida da Paz. Podemos dizer que vivíamos no paraíso, e que o
nosso compromisso era com a felicidade. Fizemos e vivemos muitas
histórias.”

95
Américo José Peixoto Lima, em entrevista ao jornal Gazeta
de Alagoas em 25/12/2011
Estes são os Meninos da Avenida que escreveram no livro e
que hoje continuam a contar as histórias de Jaraguá, no blog :
Alberto Cardoso (Cuca), Alberto Rego de Carvalho, Carlito
Lima, Eurico Uchoa, Francisco Nemésio (Chiquinho), Guilherme
Palmeira, Humberto Gomes de Barros, João Kepler, Milton
Hênio, Mozart Cintra, Murillo Rocha Mendes, Paulo Ramalho de
Castro, Paulo de Castro Silveira, Ricardo Peixoto e Sônia
Cardoso...

Ruas de Maceió: memória perdida

Rua da Alegria, do Alecrim, do Sol, do Cravo, do Capim, do


Araçá, do Cafundó, Augusta, Bela, da Imperatriz, dos Fogueteiros,
Formosa, do Abacaxi, das Vassouras, da Praia, da Harmonia,
Sovaco da Ovelha, do Veado, Beco do Mijo, Beco das Sete
Facadas, Beco do Sapo, Beco da Baiana, do Bacalhau, Praça Rex,
Praça Rayol, Praça Montepio dos Artistas, Ladeira do Paraíso,
Ladeira do Cortiço, Ladeira do Urubu, Avenida da Paz, Avenida
Condor, Rua Cruzeiro da Favela.
Todos esses nomes de ruas, logradouros, praças, becos e
vielas, deixaram de existir já faz algum tempo em Maceió. Em seu
lugar as placas indicam nomes de personalidades da vida nacional
e local, alguns ainda vivos, na maioria das vezes sem merecimento
devido, nem a importância confirmada pelo veredito popular. Os
critérios da escolha dos nomes das ruas ou da mudança deles se

96
devem apenas à aprovação pela Câmara de vereadores, ou à
indicação isolada de um vereador, do prefeito da capital.

Edécio e o Nome de Minha Rua


Apenas um livro registra com precisão as histórias e as
memórias dessas ruas. É a do velho historiador Félix de Lima
Júnior, que conseguiu catalogar quase por inteiro os nomes e as
histórias das ruas de Maceió. Este trabalho, interrompido com a
morte do escritor, mas foi compilado e revisado pelo radialista
Edécio Lopes, em 1974, já que no seu programa “Manhãs
Brasileiras” os textos de Félix de Lima Júnior eram lidos ao vivo
no quadro especialmente criado por Edécio, chamado o “Nome de
Minha Rua”, quando esquadrinhou mais de 118 nomes de ruas.

“Foi um trabalho exaustivo que seguramente esgotou o tema.


Sem dúvida é a melhor obra e o melhor registro sobre o assunto,
inclusive com partes que nem sequer foram impressas no livro, uma
crônica chamada “Rua da Amargura”, onde Félix de Lima Júnior
cria uma hipotética rua com seus personagens e fatos marcantes”.

Feira livre de Arapiraca

A Feira Livre da 2ª maior cidade alagoana, é mais antiga


que a própria emancipação da cidade. As primeiras bancas
começaram a se agomerar no século 19, mas precisamente em
1884, de acordo com o historiador e artista popular, Zezito
Guiedes. Ele relata em seu livro Arapiraca através dos tempos, que

97
a feira começou ao redor de uma tamarineira, “em cujos galhos os
açougueiros penduravam a carne para vender a população”. Quase
140 anos depois, a feira livre se tornou a maior do Nordeste. Todas
as segundas-feiras, em 27 ruas do Centro, centenas de barracas
vendem de tudo e para todos: de lojinhas de secos e molhados,
tecidos, calçados, ferragens, aos pratos feitos de comida de feira
mesmo, como sarapatel, bode assado, buchada e até carne de ave,
como nambu e rolinha. Neste caldeirão calorento do agreste,
também estão os artistas populares como repentistas, cordelistas,
sanfoneiros. Foi neste ambiente que Hermeto Pascoal, natural de
Lagoa da Canoa, buscou inspiração para sua formação musical,
bem como os utensílios que costuma usar em suas apresentações,
como chaleira, bacia, apito de caçar passarinho.

“No final dos anos 80, Arapiraca assumiu a condição de


cidade-polo da região e sua feira já era considerada a maior do
Nordeste. Com o inevitável declínio da cultura do fumo, intensificou-
se o êxodo rural e os camponês, com a falência da agricultura, se
refugiaram no centro urbano, aumentando as favelas e milhares de
cortiço, e se apegaram à feira de Arapiraca como única tábua de
salvação”.
Por Zezito Guedes, em seu livro Arapiraca através do
tempo, de 1999, edição do autor

Feira de Viçosa

98
Em atividade há mais de 100 anos, quase sempre aos
sábados, a feira de Viçosa, sempre atraiu os mascates da região da
Zona da Mata alagoana. Lá se encontra de tudo, carnes, peixes,
temperos, macaxeira, inhame, artesanato, calçados, roupas, e as
indispensáveis ervas medicinais da cultura popular tradicional,
geralmente vendidas em alto e bom som pelos comerciantes. A
área total da feira possui cerca de 500 pontos de vendas, que são
bastante variados e setorizados, facilitando a localização por parte
do comprador. Em julho de 2017, o fotógrafo Juarez Cavalcanti e o
poeta e escritor Sidney Wanderley, lançaram o livro A Feira, pela
Imprensa Oficial de Alagoas. Fotográfo e poeta retornaram sete
vezes “ao local do crime”, como explicou o viçosense Sidney
Wanderley, “para confirmar ou desmentir as impressões, os
cheiros, o burburinho, os detritos e as relíquias da memória que em
mim fizeram morada”, completa Sidney. O livro é uma viagem no
tempo, com fotos de Juarez e o texto supimpa de Sidney. Leia
textos do livro:

O começo

“Nosso trabalho tinha início às cinco da matina do sábado,


envoltos numa bruma espessa e sufocante, à espera de que o Sol,
ainda indeciso e bocejante, irrompesse. Começávamos pelas tarimbas
dos marchantes, migrávamos para o galpão do milho, do arroz e da
farinha, assistíamos à impiedosa degola das galinhas, e daí nos
dividíamos a prosear e fotografar o mezinheiro, o fumeiro, o
bananeiro, o barbeiro, as fateiras, os verdureiros e uma fieira de

99
“eiros” e “eiras” que compõem e colorem a feira e a manhã. Concluí
um poema escrito há quase vinte anos com estes versos: “Não
retornes nunca ao lugar/ em que outrora/ infância e festa se
confundiram”. Retornei – para me confirmar, para me estranhar,
para me contradizer. Para ver a feira, para ler a feira, para sê-la”.

Fim de feira

“Semelhantemente a certos amigos e animais de estimação, a


feira morre em suave agonia e gradativamente, legando-nos um
rastro de fetidez e decomposição. Melancias, jacas, abóboras e
bananas pisoteadas por pés humanos e reviradas pelos cães
esquálidos geram uma lama espessa e viscosa que os faxineiros
municipais tentarão com esforço extremo e escasso sucesso debelar.
Desse caldo tenebroso, quiçá similar àquele em que a vida irrompeu
há três e meio bilhões de anos, é que a feira renascerá, brotando do
chão ao sétimo dia, como Cristo ressuscitou ao terceiro, porém com
uma férvida alegria e uma estonteante irreverência que jamais
habitaram o Crucificado em seus trinta e três anos de existência
terrenal.

Feira do Passarinho resiste

A Feira do Passarinho se transformou em uma lenda, não tem


mais aquele tipo de comércio curioso, onde tudo era vendido nas
dormentes do trem, que até hoje faz a principal linha da região
metropolitana, que liga o bairro de Jaraguá até o distrito de Lourenço

100
Albuquerque, em Rio Largo. Era um louco ritual, onde a cada
passagem do trem – hoje chamado de Veículo Leve sobre Trilhos
(VLT) – os ambulantes retiravam os produtos da linha e o
recolocavam após a passagem dos vagões. A feira sobreviveu à
demolição do antigo mercado público, e desde os anos 1930 se
manteve firme, no bairro da Levada, e ainda hoje tem gente que só a
chama de Feira do Passarinho. Até o começo dos anos 2000 a feira
resistiu e em alguns quarteirões as barracas de lona ainda continuavam
as atividades. Mas nada no ariscado comércio no meio do trilho.
Vendia-se de tudo: sapatos, bolsas, peças de automóveis e até
bicicletas. Chegou a ser chamada “Feira do Rato”, pois muitos dos
objetos vendidos – principalmente quando surgiram os aparelhos
celulares – eram receptados de atravessadores e pelos próprios
suspeitos de roubo. Em 2012, o cineasta e produtor Charles Northrup
realizou o documentário Fim da Linha - Viagem além dos trilhos. Ele
explicou seu projeto:

“A Feira do Passarinho se mistura com a cidade, assim como


o escambo misturou-se aos trilhos, que traçaram linhas cruzando
destinos e escrevendo um pedaço importante da nossa cultura. Ela
não acabou e nunca acabará, pois a feira se perpetuará na
recordação de todos aqueles que por décadas viram o trem caminhar
com toda sua poesia diária incessante até o fim da linha”.

O tamarineiro e os passarinhos
No livro História de Maceió, o cronista Bráulio Leite Júnior,
fala dos tempos primitivos da Feira do Passarinho, que ganhou este

101
nome pela presença constante de gaioleiros e vendedores de pássaros.
Na sombra de um frondoso tamarineiro, os negócios com a venda de
pássaros silvestres, hoje proibida, corriam soltos.

“Sob a essa árvore nasceu aquele tipo de ponto comercial,


curioso sob todos os aspectos, que se chamou Feira de Passarinhos.
Foi embaixo de suas frondes que começaram, pelos dias da década de
trinta, a se aglomerar gaioleiros e donos de passarinho, com o fim de
trocar e vender suas aves... do negócio exclusivo com aves, passou a
vender e trocar objetos velhos: relógios, instrumentos antigos, toda
uma gama imensa de artigos, do brechó da roupa usada ao ferro
velho”
Por Bráulio Leite Júnior, em História de Maceió, edições
Catavento, Maceió, 2000

Relógio Oficial: a hora do bonde

“O hábil relojoeiro sr. Antônio Ferreira pôs em movimento


o Relógio Oficial na coluna construída às expensas do governo do
Estado à rua do Comércio, no seu entroncamento com a rua do
Livramento”, dizia o Jornal de Alagoas um dia depois da
inauguração. O relógio foi inaugurado ao meio-dia de um sábado,
mais precisamente no dia 11 de março de 1922. Ficava bem no
centro de Maceió, no cruzamento da Rua do Comércio com a do
Livramento e foi adquirido pelo então governador Fernandes Lima
na joalheria A Nacional, do Rio de Janeiro. Tinha como função
amenizar as reclamações de negociantes, fazendeiros e senhores de

102
engenho que perdiam a hora do trem e eram forçados a pernoitar
na capital.

"Desde as doze horas do dia 11 do corrente mês o relógio do


governo do Estado de Alagoas marca a hora do 3° fuso horário,
contado do meridiano de Greenwich. De ordem da Superintendência
da Navegação, a Capitania dos Portos deste Estado assume a
responsabilidade da exatidão da hora marcada pelo mesmo relógio,
acertado diariamente ao meio dia", escreveu o comandante Aníbal
Amaral que informava sobre a responsabilidade da Capitania dos
Portos em ajustar as horas do Relógio.
Moacir Medeiros de Sant`Ana, em Efemérides Alagoanas,
Instituto Armon de Melo, 1992

Ponto de partida do trem


Do Relógio Oficial, partiam os bondes elétricos da
Companhia Alagoana de Trilhos Urbanos, conhecida como Catu.
Os veículos ligavam o centro de Maceió aos bairros do Trapiche da
Barra, Bebedouro, Jaraguá e Bom Parto. O movimento constante
dos pesados veículos que chegavam e saíam fazia trepidar o
relógio, que, dizia-se, não regulava bem.

"Aquele espaço era uma espécie de catedral da cultura, era o


coração da cidade, onde as pessoas ficavam sabendo das notícias,
onde tinham livrarias e onde se reuniam também muitas pessoas para
beber, conversar e também criar boatos contra o Governo", conta o

103
doutor em História e membro da Academia Brasileira de História,
Douglas Apratto Tenório.
Moacir Medeiros de Sant`Ana, em Efemérides Alagoanas,
Instituto Armon de Melo, 1992

Praça Deodoro, nossa Place de la Condorde

O escritor Bráulio Leite Junior registra em seu livro


Histórias de Maceió que a Praça Generalíssimo Manoel Deodoro
da Fonseca, antes chamada de Largo do Cotinguiba e Largo das
Princesas, foi idealizada pelo pintor Rosalvo Ribeiro, quando de
sua volta à Europa. O notável artista alagoano remodelou toda
praça, bem no feitio da famosa Place de la Condorde, em Paris, e
colocou no meio uma estátua equestre de Deodoro. A
remodelagem da praça foi a pedido do então intendente (prefeito)
Demócrito Brandão Gracindo. No entorno já pontificavam a
primeira escola da capital, a Pedro II, o Tribunal de Justiça e o
Teatro Deodoro. Leite descreve no livro uma foto da praça datada
de 1920.

“Na estampa vê-se os oitizeiros plantados em seu derredor


ainda de baixo tamanho e os locais destinados às retretas, que

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reuniam familiares maceionses nas tardes festivas e nas noites de
domingo. Canteiros, naturalmente, havia, mas existiam também
largos espaços e calçadas limpas para o passeio das melindorsas e
almofadinhas, olhares furtivos, acenos velados ou mesmo encontros à
luz de lindos e bem trabalhados postes de luz elétrica, em forma de
lampiões. Logradouro limpo. Arejado, espaçoso, que só saudades traz
aos setentões e oitentões de agora, espremidos e emperrados entre
ambulantes, ônibus, barracas, pipoqueiras, montes de lixo”.
Por Bráulio Leite Pedrosa, em Hostórias de Maceió, Edições
Catavento, Maceió-São Paulo, 2000

Jaraguá nas crônicas de Maya Pedrosa

Com uma sólida formação historiográfica, o respeitado


intelectual alagoano José Fernando de Maya Pedrosa conhece
como ninguém o lengendário bairro de Jaraguá. Ele decifra todos
os enigmas, conta as grandes histórias e as melhores recordações
do bairro no livro Histórias do Velho Jaraguá, de 1998. J. F. Maya
Pedrosa, revela toda a saga do bairro, desde sua origem, que para
ele se confunde com o nascimento da capital, com textos que reúne
antigos documentos coligidos, e até a recomposição da época, feita
com graça, simplicidade e muitos personagens e causos. Segundo o
cronista Luiz Nogueira Barros

“o livro é um deleite, capaz de provocar saudades, montando


pedrinhas sobre pedrinhas, em uma varanda soprada por ventos
suaves o livro remonta o passado, recompõe a poesia de uma cidade

105
que foi emergindo da terra e das águas, numa leitura caleidoscópica,
de uma época capaz de despertar os poetas, os cronistas e os
pintores, tal seu efeito hipnótico sobre o leitor”.

Pedrosa divide seu livro em três partes: o princípio, o


ambiente e o homem. São crônicas de rara beleza, para se entender
de verdade suas deliciosas histórias, como ele mesmo as apresenta
em su belo e desconhecido livro:

“É fácil imaginar como seria interessante narrar os


acontecimentos de Jaraguá e seus personagens durante epidemias,
quando a Alfândega se transformou em hospital; os choques entre
marinheiros, policiais, soldados e populares no meretrício; a
passagem meteórica da segunda Guerra trazendo para o bairro gente
de fora, americanos, paulistas, pernambucanos; a Festa de Bom
Jesus dos Navegantes nas procissões marítimas pela enseada; os
hábitos de uma elite social que regulava a riqueza e exercia o poder;
as manifestações dos habitantes do Poço e Pajuçara; as festas de São
João na Estrada Nova; os bailes da Fênix e do Tênis; o que se falava
no DIVA – Departamento de Investigação da Vida Alheia; os fatos da
construção do Porto pela Geobra. Quem quiser que aprofunde o
tema, mas certo de que nunca chegará a esgotá-lo”.

O princípio
“Quando teria então surgido aquele pequeno braço do mar
que vimos correr por trás do (Clube) Fênix para desembocar no

106
Sobral? Como teria sido cavado aquele Salgadinho onde a geração
dos anos 1930 pescava de tarrafa e pegava caranguejo? Por força
mutável por excelência? Sem nenhuma pretensão de resolver o
enigma, existe aí um fato que deve intrigar o pesquisador, porque,
salvo melhor juízo, surge a hipótese daquele curso ter sido cavado
pela mão humana, a menos que as plantas (mapas) de 1803 e de 1820
tenham omitido sua representação por um engano ou por um motivo
qualquer... Porteriormente foi aquele curso d´água que passava pela
(praça) Sinimbu, desviado para o oitão do Hotel Atlântico, por onde
sai toda a poluição da cidade, infestando a Praia da Avenida e toda
enseada de Jaraguá, num autêntico desatre ecológico”.

O ambiente
“Os ruídos também fazem memória. Jaraguá chegava a ser
barulhento. Ouvia-se o ranger dos bondes em marcha, freando,
fazendo a curva, passageiros batendo nas sinetas, motorneiros
acionando a alavanca. Do cais do Porto, ouviam-se os apitos dos
rebocadores e o assovio de seus vapores, os troles dos trapiches
chiando por cima dos trilho, um o outro fordeco de comendador e
coronel de engenho com aquela buzina “aûa”. Na Sá e Albuquerque
e na Barão de Jaraguá era o tilintar das rodas das carroças a burro,
com aqueles elos metálicos percutindo nas sobra dos paralepípedos.
Na noite lá estavam as pensões da Sá e Albuquerque de cujas janelas
altas saíam amplificados os boleros, tangos e valsas de suas vitrolas
ou conjuntos ao vivo, de onde se destacavam pistões e clarinetes,
intercalados pelas palmas e vivas e às vezes tiros de revólver de seus
ruidosos frequentadores e os gritos de mulheres se mostrando”.

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O homem
“Como não podia deixar de ser, a humanidade dos trapiches
era exótica, desde o administrador melhorado, ou do proprietário
aristocrata, até os arrumadores, trapicheiros, estivadores, vigias,
operadores de guindaste, barcaceiros e marinheiros. Os trapicheiros,
visto de longe, pareciam um formigueiro em atividade. Todos eram da
mesma cor, faziam movimentos iguais, ágeis e irrequietos, como se
alguma coisa os fizessem agir por automomatismo. Na cabeça, um
turbante enrolado para proteger o peso dos sacos e fardos, um lenço
à moda dos piratas ou simplesmente o forro dos cabelos
encarapinhados, sempre melados de garapa e suor salgado do
corpo”.
Por J. F. Maya Fernandes em Histórias do Velho Jaraguá,
edição avulsa (do autor), Gráfica e Editora Talento, 1998

Baleia: entre Vidas Secas e Cannes

O cineasta Nelson Pereira, diretor do premiado longa Vidas


Secas (1963), baseado no romance de Graciliano Ramos, viveu um
momento tenso no Festival de Cannes em 1964, quando levou a
cachorra Baleia, personagem do livro de Mestre Graça, em carne e
osso para pisar suas patas no tapete vermelho. Só que o filme
mostra a cena em que Fabiano mata a cachorra, de tão magra que
estava. Só que a Baleia teve uma morte técnica, estava vivinha
dentro do avião que a levou a Cannes.

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“Uma condessa italiana ficou furiosa com o filme, disse que
só povo subdesenvolvido, para fazer o filme, e matar o animal. Mas
foi a Air France que ofereceu uma passagem para a Baleia ir para
Cannes. A história estourou, mas a tal defensora dos animais seguiu
cética, argumentando que, na verdade, a produção encontrou uma
nova cachorra apenas para exibir aos desconfiados – porque vira
lata é tudo igual”.

Nelson Pereira dos Santos, em talk show da Feira Literária


de Paraty, em 2013, que homenageava Graciliano.
Jofre Soares “dirigiu” Baleia
Sobre o mesmo assunto, o cineasta detalhou que pretendia,
em princípio, trabalhar “cientificamente” com a cachorra para
dirigi-la, usando um “método pavloviano, de reflexo
condicionado”. Na prática, confessou Nelson Pereira, a ideia era
deixá-la sem comer e, apenas na hora das filmagens, distribuir
porções de refeição estrategicamente pelo set, conforme a
necessidade de movimentá-la pelo espaço. De acordo com ele,
contudo, o plano fracassou. Quem sabotou foi um próprio
integrante da equipe, descoberto após alguns dias. Era o Jofre
Soares, responsável pelo papel de Fabiano, que dividia
clandestinamente seu almoço com Baleia. “O Jofre não comia
junto com a equipe, saía andando e ia derrubando pedaço de
carne para ela comer. Eu falei: ‘Já que você deu de comer, você
vai dirigir a baleia!’”. Leia trecho de Vidas Secas, em que
Graciliano descreve a morte real da Baleia do livro.

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"A cachorra Baleia estava para morrer. Tinha emagrecido, o
pelo caíra-lhe em vários pontos, as costelas avultavam num fundo
róseo, onde manchas escuras supuravam e sangravam cobertas de
moscas. As chagas da boca e a inchação dos beiços dificultavam-lhe
a comida e a bebida. Por isso Fabiano imaginava que ela estivesse
com um princípio de hidrofobia e amarrara-lhe no pescoço um
rosário de sabugos de milho queimados. (...) Então Fabiano resolveu
matá-la. Foi buscar a espingarda de pederneira, lixou-a, limpou-a
com o saca-trapo e fez tenção de carregá-la bem para a cachorra não
sofrer muito. (...) Pobre Baleia. Escutou, ouviu o rumor do chumbo
que se derramava no cano da arma, as pancadas surdas da vareta na
bucha. Suspirou. Coitadinha da Baleia”.

Graciliano Ramos em Vidas Secas, 1938, 62ª edição 1992,


Editora Record

110
TERRA DAS MARAVILHAS

Cachoeira de Paulo Afonso

Formada por diversas quedas d’água que se espalham pela


rocha como imensas cascatas, a Cachoeira de Paulo Afonso está
situada no Baixo São Francisco. O abundante volume de água cai
sobre os “degraus” formando imensas áreas de espumas que
descem pela rocha a uma altura de cerca de 80 metros. Dentre as
inúmeras quedas d’água, destaca-se a Cachoeira Véu da Noiva,
que abriga lindas quedas d´água e paisagens naturais indescritíveis.
Com a construção das usinas, as águas que formam a cachoeira
foram represadas, permanecendo apenas em pequeno volume, o
que permite observar melhor o belo conjunto de rochas polidas
pelas águas durante milhares de anos.
Em épocas programadas, as comportas da barragem são
abertas, num espetáculo de impressionante beleza. A cachoeira de

111
Paulo Afonso encontra-se situada no centro geográfico das regiões
mais pobres dos Estados da Bahia, Alagoas, Sergipe e
Pernambuco. A visita de D. Pedro II, em 1859, também foi
homenageada por meio de uma placa de bronze. O poeta alagoano
Jorge de Lima, em seu poema Rio São Francisco, descreveu a
beleza da cachoeira e ainda falou de Delmiro, o “cearense que
desceu com uma turbina na mão” e transformou as águas da
cachoeira em energia elétrica para fazer funcionar a primeira
hidrelétrica nordestina.

E o rio, o grande rio como a alma do sertão


desce de Paulo Afonso com sete ataques de doido, e ruge,
e espuma, e bate e dorme lá embaixo
como um gigante que sofre de ataques de convulsão.

Cachoeira de Paulo Afonso !


A água está doida !
Até os peixinhos fogem dela !
Até as pedras estremecem !
Até D. Pedro II teve medo da cachoeira !
E o cearense desceu com uma turbina na mão.

Delmiro vê que o rio era o monge de Assis,


e viu que era preciso descruzar outra vez
os braços do santinho.

112
E os braços edificaram a caatinga,
iluminaram os capões,
e quando o mestiço inspirado pelo santo
ia fazer o milagre da multiplicação
e salvar o nordeste e remir o sertao,
o trabuco do irmão lobo calou o grito da raça
Miserere mei.

Deus, secundum magnam misericordiam

Angiquinho: a 1ª hidrelétrica do Nordeste

Passear no sítio histórico de Angiquinho é adrenalina pura, é


mover as rodas da história. Com suas últimas quedas de água, na
enconsta íngreme do alto das pedras, ficam as casas das bombas e
das máquinas, que abrigam as turbinas da primeira hidrelétrica do
Nordeste, construída por Delmiro Gouveia; a sinuosa linha férrea;
a casa onde morou o pioneiro e a vila operária. Os casarios
recuperados, os dormentes da linha férrea ainda esperam a
recuperação. Nas entranhas da usina saem paisagens lunáticas,
águas muito limpas mostram o fundo translúcido do Velho Chico.
São pedras e rochas, e tocas de rio para todos os lados.
O coração começa a bater mesmo nas escadarias de metal
que desce 45 metros abaixo das rochas, no caminho da velha casa
das máquinas, que abriga os três geradores Brown Bowers e
Piccardi, que alimentavam a usina, com 1.250 killowats, fruto da

113
cabeça do cearense Delmiro Gouveia. A descida é vertiginosa,
escadas em espiral, com plataforma para mirante, de onde os olhos
captam uma imagem inesquecível do que resta da cachoeira de
Paulo Afonso, ou parte dela. A visão do Velho Chico cercado por
cânions e corredeiras é colossal, e uma cachoeira transbordante na
entrada do lago da usina, que iluminou boa parte da região até nos
anos 60. Depois de uma intensa luta pela revitalização do
patrimônio do Complexo da Usina de Angiquinho, em Delmiro
Gouveia, o patrimônio foi tombado pelo Estado, e a Companhia
Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) entregou à população todos
os equipamentos recuperados.
Epidendrum alagoensis: a orquídea alagoana

O médico e ambientalista alagoano Luiz de Araújo Pereira,


considerado um dos mais importantes orquidófilos no país, foi o
descobridor de uma nova espécie vegetal (orquídea) designada
Epidendrum alagoensis, planta considerada “nova para a ciência”,
conforme Anais do 14º Congresso da Sociedade de Botânica do
Brasil, e divulgada em publicações especializadas no Brasil
Alemanha e Japão. Dentre seus títulos publicados sobre o mundo
das orquidáceas estão os livros: Orquídeas de Alagoas (1981),
Aditamento à Orquideologia Alagoana (1982), Orquídea: Lenda e
Poesia (1983) e Álbum das Orquídeas de Alagoas (2000). Nos seus
livros, Pereira fala também da importância de outra planta: a
Cattleya Labiata, a rainha do Nordeste, que tem em Alagoas seu
maior celeiro, em virtude do clima perfeito para o cultivo dessa

114
espécie, principalmente em Chã Preta, Mar Vermelho e Maravilha.
Aqui em Alagoas são 160 espécies.

“Há 30 anos, a Cattleya Labiata florescia na quaresma, entre


o Carnaval e a Semana Santa. Num conjunto de 200 pés desta planta,
sobre árvores ou em vasos, não temos lembrança de haver
contemplado flores, senão na época citada; pois bem, agora, o que se
vê, num cultivo em tudo idêntico àquele mais antigo: flores durante
todo o ano!”.
Luiz de Araújo Pereira, em Orquídeas de Alagoas – Sergasa
Maceió – 1981

Mutum das Alagoas

Já são quase 30 anos sem registros dessa ave na Mata


Atlântica, mas os três últimos exemplares encontrados no
município litorâneo de Roteiro foram criados e reproduzidos em
cativeiro e hoje já são cerca de 230. A ave é uma das mais raras do
planeta. É genuinamente alagoana, específica do litoral Sul, e
começou a desaparecer por causa do desmatamento na região para
a plantação de cana-de-açúcar. Isso aconteceu na década de 1980 e
desde então alguns estudiosos brasileiros têm se empenhado na
reprodução da espécie em cativeiro para que ela possa voltar ao
seu habitat.

“O Mutum de Alagoas é uma das duas únicas aves no mundo


que só existem em cativeiro; a outra é a ararinha azul. Também em

115
todo o mundo, só existem duas espécies salvas a partir de um trio: o
gavião que ocorre nas Ilhas Seychelles, na África, e o nosso mutum.
Diante dessa raridade, me empenhei todos esses anos para
reintroduzir essa espécie na natureza”.
Fernando Pinto, presidente do Instituto para Preservação da
Mata Atlântica (IPMA)

Santuário do peixe-boi marinho

No litoral Norte de Alagoas, em Porto de Pedra, fica o


santuário dos peixes-bois marinhos. Em maio de 2015, o Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)
inaugurou a nova base, que que se estende em toda a Área de
Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, maior unidade de
conservação (UC) da Marinha do Brasil. A base tem como
principais finalidades ampliar as ações de proteção, conservação e
manejo da biodiversidade marinha na região; desenvolver as
atividades de aclimatação, soltura e monitoramento de peixes-boi
marinhos na natureza. O peixe-boi é um mamífero aquático
extremamente dócil e de hábitos costeiros.

Ameaça de extinção
A espécie é considerada criticamente ameaçada de extinção
no Brasil. Estima-se que existam apenas 500 indivíduos. Em
Alagoas, a espécie fica geralmente perto de rio, estuários e
manguezais. Seu ciclo de gestação é 13 meses. No estado, a pesca
predatória, a poluição e a destruição dos manguezais, estão

116
empurrando peixe-boi para a sua extinção. Em 20 anos de
existência em Alagoas, o Programa de Manejo para a Conservação
dos Peixes-Boi, com base em Maragogi, atingiu taxas de sucesso
que superam muitas outras iniciativas similares existentes no
mundo, elevando a variedade genética da espécie, recolocando as
populações existentes e recolonizando áreas ocupadas no passado.
Mas a luta para salvar o animal não é fácil.

Ruínas do mosteiro de São Bento

O sítio arqueológico da igreja e mosteiro de São Bento de


Maragogi faz parte do Patrimônio Cultural Nacional, protegido
pela Constituição Nacional, mas que continua sob a pressão de
fatores externos como a degradação de suas ruínas, e a ação de
vândalos. De acordo com o estudo feito pelo Instituto Histórico e
Geográfico Nacional (Iphan), a igreja e o mosteiro foram
construídos no século XVII. O primeiro registro de que se tem
notícia da edificação data de 1643, em mapa produzido por Georg
Marcgraf, cartógrafo e pintor alemão. Construída no alto do morro,
a igreja sempre foi uma referência religiosa para a comunidade,
sendo cenário de festas e cultos de santos católicos. Na década de
1970, uma nova igreja foi construída mais próxima do litoral, onde
hoje fica o centro de São Bento.
A partir dessa mudança, o local começou a sofrer um forte
processo de degradação, que em pouco tempo se transformou em
um conjunto de ruínas. São estas ruínas que hoje fazem parte da
visitação turística, onde do alto do morro pode-se contemplar uma

117
das mais lindas paisagens do mar de Maragogi. Durante os séculos
XVII e XVIII a igreja e o mosteiro eram habitados por padres
beneditinos e a servir de abrigo para viajantes católicos durante
suas peregrinações entre o interior e o litoral. No local foram
enterrados alguns destes religiosos, o que torna ainda mais
misteriosa a história do convento.

Rio Manguaba: o “roteiro da civilização”

O antropólogo, romancista e poeta alagoano Dirceu


Lindoso, um nome seminal para entender a região Norte do Estado
– ele mesmo um nativo de Maragogi - em seu livro Formação de
Alagoas Boreal, mostra a importância do rio Manguaba para
conhecer a colonização da região, inserida no contexto do Ciclo da
cana de Açúcar, onde os engenhos usam da água do rio para seu
funcionamento e desenvolvimento.

“De Porto de Pedra a Porto Calvo foram erguidos engenhos


de açúcar com casa grande e capela, senzala de escravos. E. ainda
hoje, subir o rio Manguaba, nos seus 4 quilômetros até o Porto de
Varadouro, é uma admirável aula de história. O rio Manguaba é
pois nosso roteiro da civilização, uma espécie de caminho hídrico por
onde a civilização européia dos séculos XVI e XVII penetrou o
interior de Alagoas Boreal. Caminho de índios, colonos, escravos,
espanhóis e portugueses, soldados e de comerciantes das Índias
Ocidentais. Em suas ribeiras plantaram-se os primeiros centros de
colonização e produção colonial: os engenhos de açúcar. E eram

118
eles: Porto Lino, Porto das Ostras, Bateria, Porto Gersino, Tibau,
Barbaça, Preguinha, Pinheiro, Estaleiro. E no Vale do Grapiúna os
engenhos Caxangá, Areal, Sabiaú e Capivara”.

Engenhos: A rota do açúcar

Os primeiros engenhos surgiram nos vales dos rios


Manguaba, Camaragibe e Santo Antônio, na região Norte de
Alagoas. A fertilidade da terra, a abundância das águas, a
proximidade das matas, o ótimo clima tropical, o acesso aos mares
oceânicos, e o uso intensivo de mão de obra barata e escrava de
negros e índios, a ascensão da chamada aristocracia famíliar
açucareira, formaram o caldo da rota do açúcar. Dos antigos
engenhos que polvilhavam as margens dos rios restam apenas
ruínas deste passado glorioso e doloroso ao mesmo tempo. Estas
ruínas se transformaram em dezenas de roteiros de visitação, que
hoje fazem parte do setor turístico alagoano. Em Porto Calvo, é
imperdível, por exemplo, a visita ao engenho Escurial, que teria
pertencido a Domingos Fernandes Calabar, ou o engenho São
Gonçalo, onde ainda existe a Casa Grande e a Igreja de São
Gonçalo, que segundo os proprietários foram erguidos ainda no
século 17.

A grande barreira de Corais

O litoral Norte de Alagoas tem a guarda, compartilhada com


Pernambuco, da maior barreira de corais do Brasil e a segunda

119
maior do mundo, só perdendo para os Grandes Corais da Austrália.
São 130 km realçados pelo verde dos coqueiros e o azul intenso do
mar. A exuberância das piscinas naturais e biodiversidade da vida
marinha são atrações à parte e de uma beleza indescritível. A Área
de Proteção Ambiental Costa dos Corais, entre Pernambuco e
Alagoas – foi criada em 1997 para proteger os recifes costeiros e
ecossistemas associados, além de fauna ameaçada de extinção
como o peixe-boi marinho. A área estende-se de Tamandaré em
Pernambuco até Maceió, em Alagoas. Embaixo da água fica um
dos mais ricos e importantes ecossistemas do mundo, uma barreira
de recife de corais que se estende, próxima a costa alagoana.

Serra da barriga: pátria de Zumbi

O Parque Memorial Quilombo dos Palmares foi tombado


em 1986, incide sobre a parte mais acantilada da serra que abrigou,
no século XVII, o Quilombo dos Palmares e seu principal líder,
Zumbi. O Parque foi implantado em 2007, em um platô (área
plana) do alto da Serra da Barriga. O local recria o ambiente da
República dos Palmares – o maior, mais duradouro e mais
organizado quilombo já implantado nas Américas. Em tamanho
natural, foram reconstituídas algumas das mais significativas
edificações do Quilombo dos Palmares. Com paredes de pau-a-
pique, cobertura vegetal e inscrições em banto e yorubá, avista-se o
Onjó de farinha (Casa de farinha), Onjó Cruzambê (Casa do

120
Campo Santo), Oxile das ervas (Terreiro das ervas), Ocas
indígenas e Muxima de Palmares (Coração de Palmares). O poeta
alagoano Jorge de Lima, eternizou a Serra.

Serra da Barriga
Jorge de Lima

Serra da Barriga!
Barriga de negra-mina!
As outras montanhas se cobrem de neve,
de noiva, de nuvem, de verde!
E tu, de Loanda, de panos-da-costa,
de argolas, de contas, de quilombos!

Serra da Barriga!
Te vejo da casa em que nasci.
Que medo danado de negro fujão!

Serra da Barriga, buchuda, redonda,


de jeito de mama, de anca, de ventre de negra!

Mundaú te lambeu! Mundaú te lambeu!


Cadê teus bumbuns, teus sambas, teus jongos?

Serra da Barriga,
Serra da Barriga, as tuas noites de mandinga,
cheirando a maconha, cheirando a liamba?

121
Os teus meio-dias: tibum nos peraus!
Tibum nas lagoas!

Pixains que saem secos, cobrindo


sovacos de sucupira,
barrigas de baraúna!

Mundaú te lambeu! Mundaú te lambeu!


De noite: tantãs, curros-curros
e bumbas, batuques e baques!
E bumbas!
E cucas: ô ô!
E bantos: ê ê
Aqui não há cangas, nem troncos, nem banzos!
Aqui é Zumbi!

Barriga da África! Serra da minha terra!


Te vejo bulindo, mexendo, gozando Zumbi!
Depois, minha serra, tu desabando, caindo,
levando nos braços Zumbi!

Jorge de Lima, Serra da Barriga, em Poemas Negros de 1947

Último refúgio do Tigre dos Palmares

A serra dos Dois Irmãos é o ponto culminante do município


de Viçosa, atingindo cerca de 400 metros de altura, que teria sido o

122
último refúgio de Zumbi dos Palmares. Seu nome deriva de seus
cabeços mais importantes – os Dois Irmãos, separados entre si pela
cachoeira do rio Paraíba e que se situam na divisa entre os
municípios de Viçosa e Cajueiro. Constituem-se em atração
turística natural, distantes 8 Km da sede municipal e entrecortados
pela via férrea. O historiador Alfredo Brandão criou, em 1900,
uma bela “estória” para “explicar” a gênese dos Dois Irmãos – a
lenda de Inhamunhá, a meiga e sedutora iara que teria cometido o
suicídio (convertendo-se após a morte na cachoeira do Paraíba)
para evitar o combate de morte entre os irmãos guerreiros e
indígenas Pirauê e Pirauá, desejosos de desposá-la. Enlouquecidos
com o trágico desaparecimento da pretendida, os dois irmãos,
possuídos por infinita melancolia, acabaram por transformar-se em
gigantescas pedras que são hoje a serra dos Dois Irmãos. O certo e
indiscutível é que a serra dos Dois Irmãos serviu de refúgio e
esconderijo para o herói Zumbi e seus seguidores, fato este
comprovado através de minuciosas pesquisas empreendidas por
Alfredo Brandão e constantes em seu livro Viçosa de Alagoas. Ou
nas palavras do historiador:

“Não é de admirar que o Zumbi se tivesse refugiado a


princípio no Sabalangá e mais tarde na serra que lhe fica próxima –
a serra dos Dois Irmãos – a qual, por causa dos seus desfiladeiros,
seus penhascos abruptos e suas gargantas profundas, por uma das
quais se precipita o Paraíba, poderia oferecer todas as condições de
estratégia e resistência”.

123
Alfredo Brandão, em Viçosa das Alagoas, publicado em
1914

Reserva Biológica de Serra Talhada

A Reserva Biológica Federal de Pedra Talhada - um dos


últimos remanescente da Mata Atlântica alagoana – tem 50 km
quadrados de área e fica entre os municípios de Quebrangulo, Chã
Preta, Lagoa do Ouro e Correntes (Estados de Alagoas e de
Pernambuco). O clima de Pedra Talhada é marcado por duas
estações: uma estação seca, de setembro a fevereiro, e uma estação
chuvosa, de março a agosto. A riqueza de espécies, tanto animal
quanto vegetal, deve-se, principalmente, a três fatores
determinantes: O tipo de relevo, que permite a diversidade da flora
e da fauna, com uma variação de altitude de mais de 900 metros
entre o fundo dos valões e o topo rochoso. A localização
geográfica fica no ponto de convergência de três ecossistemas
florestais: Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga. A abundância de
água fornecida pelas 165 nascentes que formam inúmeros riachos e
brejos do topo da montanha até nas pastagens do entorno.
Para saber mais sobre a Reserva leia o livro Biodiversidade
da Reserva Biológica de Pedra Talhada, 2016, de autoria do
engenheiro agrônomo alagoano Rodrigo Guimarães e do suíço
Louis Nusbaumer. O livro é resultado do levantamento de 30 anos
de pesquisadores brasileiros, americanos, holandeses, suíços,
mexicanos e franceses na região de Pedra Talhada. São 2.500
fotos, artigos de 74 cientistas internacionais, sobre a importância

124
da reserva em áreas como flores e vegetações, biótipos, e toda a
fauna e flora locais

Marituba do Peixe: o pantanal alagoano

Nas margens do Velho Chico estão as terras bonitas dos


arrozais e das vegetações rasteiras, uma varzea chamada Marituba,
no litoral Sul de Alagoas, que recebe enchentes anuais, provocadas
pelos rios Piauí, Perucaba, Marituba e Camundongo. Os cordões
arenosos fizeram com que a região ficasse conhecida como
pantanal alagoano. Duas usinas e um projeto de irrigação fazem
constantes pressão e potencializam riscos. Mas a paisagem é
inesquecível, à noite alguns jaracarés são vistos pelos olhos acesos.
A Várzea da Marituba, chamada "Pantanal Alagoano", que
fica a apenas 20 km de Penedo, uma das mais importantes cidades
históricas de Alagoas, distante, por sua vez, 160 km de Maceió, é
uma Área de Preservação Ambiental (APA), desde 1988, e
surpreende por sua biodiversidade imensa – um paraíso para
biólogos, pescadores e para aqueles que curtem a Natureza em toda
a sua plenitude. Flores de vários tipos e cores, semelhantes à
vitória-régia, pássaros, aves e peixes de várias espécies, além de
animais silvestres são encontrados no local. No povoado Marituba
do Peixe, situado na zona rural de Penedo, os habitantes são
pessoas simples e hospitaleiras, que ganham a vida como
pescadores e artesãos.

Praias da Copa do Mundo

125
Na Copa do Mundo no Brasil, em 2014, o Ministério do
Turismo lançou a campanha nacional “As Praias da Copa do
Mundo”, com a escolha de nove destinos por Estado, para trabalhar
comercialmente, com o objetivo de divulgador o destino Brasil em
todo o mundo. Em Alagoas as escolhidas foram Maceió, Maragogi,
Japaratinga, Porto de Pedras, São Miguel dos Milagres, Barra de
Santo Antônio, Paripueira, Marechal Deodoro e Barra de São
Miguel.

Litoral alagoano
É paixão à primeira vista. Com sol o ano inteiro e uma brisa
gostosa, as praias alagoanas são selvagens, cristalinas, exóticas,
desertas, cercadas de arrecifes e coqueirais, radicais para a prática
do surf, isoladas para o nudismo e mansas como uma piscina
natural. Os 230 quilômetros da costa marítima de Alagoas são puro
prazer e êxtase. É impossível não deixar de apaixonar-se!

Um mundo de águas
A viagem pelo mundo de águas começa pelo litoral Norte.
A praia de Maragogi exibe a maior barreira de corais e piscinas
naturais do país. Nas galés, um inesquecível mergulho onde se
observa a vida subaquática, e o incrível peixe-boi marinho.
Japaratinga é de uma beleza estonteante! O mar é calmo, sem
ondas, águas mornas e claras. Em Porto de Pedras, São Miguel dos
Milagres, Barra de Camaragibe, não se perde o fôlego. São
quilômetros e mais quilômetros de lindas praias, rios, lagoas,

126
mangues, falésias de areia colorida, antigos engenhos do ciclo do
açúcar.

Ilhas e praias exóticas


Na Barra de Santo Antônio, a exuberante Ilha da Croa - uma
praia paradisíaca com clima de romantismo e naturalidade. A praia
de Carro Quebrado foi apontada pela revista Playboy brasileira
como uma das mais bonitas do país. Paripueira é certamente a mais
festiva de todo litoral, é conhecida pela sua alegria no Carnaval, e
sua orla cheia de bares e restaurantes.

Praias lindas e famosas


Em Maceió, as praias urbanas são uma atração à parte. Na
orla marítima repleta de bares e restaurantes, um banho de mar e
fantasia em praias de nomes exóticos Sereia, Riacho Doce, Garça
Torta, Guaxuma, Jacarecica, Jatiúca, Ponta Verde e Pajuçara. Em
Marechal Deodoro está a conhecida Praia do Francês, cenário de
filmes como Bye Bye Brasil, do cineasta Cacá Diegues, é a mais
visitada do Estado.

Playground aquático
Na Barra de São Miguel é festa e diversão todos os dias.
Bares na orla, banana boat, jet sky, passeios de lancha, ultraleve.
Um verdadeiro playground aquático. Uma barreira de arrecifes faz
do mar uma piscina, com águas paradas e mornas. O passeio de
lancha até a Praia do Gunga, pela grande enseada da lagoa do

127
Roteiro, é inesquecível. Esta praia é considerada uma das 10 mais
bonitas do Brasil pela revista Quatro Rodas.

Outros roteiros
Massagueira e Barra Nova são pontos de descanso, com
banhos, esportes náuticos e a mais genuína culinária alagoana.
Pontal do Coruripe, uma praia habitada por pescadores - a região
tem grande potencial pesqueiro - com bons restaurantes e
artesanatos, com destaque para as mulheres que trabalham com a
palha.

Mares do Sul
As lagoas da região litorânea do Sul, a rota do cumurupim,
são de beleza rara: Lagoas Azeda, do Pau e de Jequiá. O litoral
Norte tem praias dominadas por imensas falésias, mares desertos e
de difícil acesso. Entre os destaques estão as praias da Barra de
Jequiá e Dunas de Marapé. Pontal do Peba fecha o ciclo das praias
do Litoral Sul. É onde o Rio São Francisco mergulha no Oceano
Atlântico. É possível ver de perto o abraço do Rio São Francisco
com o mar.

Mar Vermelho: a Suíça alagoana

O clima frio com característica serranas, temperatura média


entre 26 e 13 graus, rendeu a Mar Vermelho a denominação de
Suíça das Alagoas. A cidade avança no setor de turismo com a
chegada de novas pousadas no chamado circuito do frio, no Vale

128
do Rio Paraíba. Com atitude de 636 metros, Mar Vermellho é uma
considerada uma boa opção também para auxiliar no tratamento de
doenças respiratória, com atestam médicos especialistas. Mas são
as belezas locais de cidade interiorana, com inúmeras fontes de
águas minerais, cachoeiras, passeios a cavalo. Uma bonita estátua
de pedra do Cristo Redentor e o portal na entrada da cidade
recebem vistantes de todas as partes do país. Todos os anos, na
estaão chuvosa, entre junho o julho, é realizado o Festival de
Inverno na cidade.

TERRA DE VALENTES

A queda de Palmares e a cabeça de Zumbi

A capital palmarina, a Cerca Real do Macaco, na Serra da


Barriga, em União dos Palmares, foi tomada em 6 de fevereiro de
1694, pela expedição das tropas imperiais sob o comando de
Domingos Jorge Velho – ex-bandeirante e mercenário sob o soldo
do governo português, dos comerciantes lusos e senhores de

129
engenho. Os negros fugitivos, denominados quilombolas, sob o
comando de Zumbi dos Palmares, resistiram durante 27 anos aos
ataques, com perdas e ganhos ao enfrentar os canhões de Exército
imperial. O líder negro Zumbi, foi anunciado como morto em
várias batalhas, mas nunca se teve certeza. Vários governadores
das províncias e chefes militares falaram até em cabeça cortada.
Historiadores, como Dirceu Lindoso, sempre duvidaram do fato,
na verdade seria uma mentira oficial para ocultar a força do líder
negro.

“É mais fácil crer que Zumbi – pelo guerreiro que era – fugiu
ou foi preso e não reconhecido, e vendido como outros. Das cabeças
que chegaram aos representantes do rei, nenhuma era a cabeça de
Zumbi, como o império romano, que nunca teve em suas mãos a
cabeça de Spartacus. Zumbi é uma figura histórica de grande
relevância, é a maior figura de herói de nosso povo afro-alagoano e
afro-brasileiro, e que nós, brancos, vivemos a mentir-lhe a história”.
Dirceu Lindoso, O Poder Quilombola, Edufal – 2007.

Resistência negra supera Dia do Quebra

Os negros alagoanos resistiram à intolerância religiosa e o


Estado pediu perdão – 100 anos depois do episódio conhecido
como Quebra de Xangô. No dia 1º de fevereiro de 1912, em
Maceió, véspera de um Carnaval, uma milícia armada, denominada
Liga dos Republicanos Combatentes – uma trupe incendiária
comandada por um militar e com o apoio de políticos - invadiu os

130
terreiros da capital, com a quebra, retirada e queima em praça
pública dos objetos de culto sagrado. Durante décadas, os negros
foram intimidados pela violência racial e pelo poder local, e os
terreiros tiveram que adotar o Xangô Rezado Baixo, sem o uso de
atabaques. Em 2012, no centenário do Quebra, o governo de
Alagoas pediu perdão oficial. Hoje, Alagoas tem mais de dois mil
terreiros espalhados pelo estado, e que cantam alto.

“Por isso celebramos o Xangô Rezado Alto, para que nunca


mais em Alagoas as comunidades afro-religiosas se sintam
intimidadas ou envergonhadas de professar sua religião, que é um
grande e reconhecido tributo para a formação da Cultura alagoana”.
Rachel Rocha, em Para Entender o Quebra, Diário Oficial,
31 de janeiro de 2012.

Alagoanos mortos contra a ditadura

Seis alagoanos, e um destino em comum. Foram presos,


torturados, censurados e mortos pela ditadura militar, que durou de
1964 até o final dos anos 1980. Considerados pelo regime militar
como "inimigos do Estado", eles foram vítimas do terror
institucionalizado e não tiveram a mesma sorte de outras centenas
de milhares de militantes que foram beneficiados pela Lei da

131
Anistia, em 1979. Essa "operação caça às bruxas" deixou famílias
inteiras aflitas, traduzida em dor, sofrimento e a brutal violação dos
mais elementares direitos humanos. Estes são os alagoanos
corajosos militantes que deram a vida pela democracia.

Luiz de Almeida Araújo. Nasceu em Anadia, em 27 de


agosto de 1942. Em 1957 estava em São Paulo, com sua mãe e
irmãos, onde começou trabalhando como office-boy. Através do
movimento estudantil conseguiu ser chefe da organização Ação
Libertadora Nacional (ALN). Em 68, viajou para Cuba, de onde
voltou em 70, já na clandestinidade. Em uma de suas prisões, em
24 de junho de 71, Luiz Araújo, nunca mais foi visto. Antes de ser
trucidado, foi obrigado a assistir a uma sessão de espancamento,
em plena Avenida Angélica, no coração de São Paulo, de sua
companheira Mércia de Almeida, grávida de seu filho. Foi morto
aos 29 anos.

Gastone Lúcia Beltrão. Nasceu em Coruripe, em 12 de


janeiro de 1950. Tinha temperamento calmo e doce. Estudou nos
colégios Imaculada Conceição, Moreira e Silva, mas fez segundo
grau no Rio de Janeiro, onde entrou para o movimento estudantil.
Em 68, fez vestibular de Economia na Universidade Federal de
Alagoas (UFAL). Em 69, viajou para a Europa e Cuba. Na ilha,
recebeu treinamento militar de guerrilha. Esteve no Chile, de onde
voltou na clandestinidade ao Brasil. Militava na Ação Libertadora
Nacional (ALN). Em janeiro de 1972, cinco anos antes da Anistia,

132
em uma emboscada preparada pelo delegado Sérgio Paranhos
Fleury, Lúcia foi sumariamente metralhada ao reagir à voz de
prisão, no centro de São Paulo: tinha 22 anos.

Manoel Lisboa de Moura. Nasceu em Maceió, em 27 de


fevereiro de 1944. Iniciou sua atividade política logo jovem, no
movimento estudantil do Colégio Liceu Alagoano (Colégio
Estadual de Alagoas), foi membro da União dos Estudantes
Secundaristas (UESA) e participou do Movimento Popular de
Cultura. Militou na Juventude Comunista, no PCB e no PC do B.
Em 64, era estudante de medicina da UFAL, quando teve sua casa
invadida por policiais e teve que fugir para Recife e depois para o
Rio. Fundou o Partido Comunista Revolucionário (PCR). Em
1973, foi visto com vida por mais de dez dias nas celas do IV
Exército, em Recife. Foi transferido para São Paulo, onde
continuou sofrendo torturas. Em setembro desse mesmo ano, o
governo paulista informava a morte oficial de Manoel Lisboa, em
um tiroteio no bairro da Moema, com 29 anos. Existem versões de
que Manoel Lisboa tenha sido morto nas celas do IV Exército, por
tortura.

Odijas Carvalho de Souza. Nasceu em Atalaia, em 21 de


outubro de 1945. Estudante de agronomia da Universidade Rural
de Pernambuco, ele militou no Partido Comunista Revolucionário
(PCBR). E, em janeiro de 71, junto com a estudante Lilian Guedes,
foram presos na praia de Maria Farinha, em Paulista (PE). Levados
ao Dops e torturados barbaramente, Odijas não escapou. Depois da

133
sessão de tortura foi recolhido ao hospital militar do Recife, com
retenção de urina, vomitando sangue, ossos fraturados e ruptura de
rins, baço e fígado. Ele morreu em fevereiro, aos 25 anos. No
atestado de óbito falava em embolia. Foi enterrado com o nome de
Osias, o que dificultou na identificação do corpo.

José Dalmo Guimarães Lins. Nasceu em Maceió, março de


1933. Estudou no Colégio Marista e entrou para o PCB ainda
adolescente. Trabalhava como representante comercial. Entre 62 e
63 esteve em Cuba, na União Soviética, onde cursou Ciências
Políticas. José Dalmo volta Maceió e integra-se à executiva
estadual do PCB. Ficou algum tempo em Alagoas, cursou Direito,
mas foi expulso, acusado de subversão. Em 67, seu apartamento
foi invadido pela polícia e Dalmo levado ao DOI-CODI. Dalmo foi
obrigado a assistir sessões de torturas em sua mulher. Depois desse
episódio ficou distante e não conseguiu recuperar o trauma. No dia
11 de fevereiro de 1971, Dalmo pôs fim a sua agonia jogando-se
do sexto andar do prédio onde morava, no Leblon. Tinha 37 anos.

Jaime Amorim de Miranda. Nasceu em Maceió, 18 de julho,


dirigiu a Voz do Povo - órgãos oficial do PCB - que circulava em
Alagoas desde 1947, até ser fechado pelo golpe militar de 64.
Sempre ligado aos movimentos populares, foi preso diversas vezes,
uma em 1964 e cassado, como jornalista profissional do Rio de
Janeiro, onde trabalhou em redações e traduções - falava
fluentemente o francês e o inglês.

134
Perfis extraídos do Documento da Comissão Mista do
Congresso Nacional sobre a Anistia e depoimento de familiares e
do livro Dos filhos deste solo, de Nilmário Miranda e Carlos
Tibúrcio, editora Boitempo – 1999.

A morte de Manoel Fiel Filho

Manuel Fiel Filho (1927-1976) nasceu no sítio Gavião, em


Quebrangulo, Alagoas. Aos 18 anos de idade migrou para a cidade
de São Paulo, desde os anos 1950. Foi padeiro e cobrador de
ônibus antes de se tornar operário metalúrgico na Metal Arte
Industrial Reunidas, no bairro da Mooca. Lá trabalhou no setor de
prensas hidráulicas por 19 anos. Ele era casado com Thereza de
Lourdes Martins Fiel, tinha duas filhas, e morava num sobrado na
Vila Guarani. O operário metalúrgico alagoano morreu aos 49 anos
em uma cela do Doi-Codi, maior centro de tortura da ditadura
militar na época.
Fiel, depois de ser preso – acusado de pertencer ao Partido
Comunista Brasileiro – foi torturado até a morte. A versão oficial,
desmantelada depois, foi de que Manoel Fiel Filho teria cometido
“suicídio”. O fato aconteceu três meses depois da morte do
jornalista Vladimir Herzog. A prisão e o assassinato foram em
circunstâncias muito parecidas. Os eventos deflagraram o processo
que levou à redemocratização do País. Na época, o então
presidente da República, general Ernesto Geisel, demitiu do
Comando do II Exército, responsável pelo DOI-Codi, o general
Ednardo D’Ávila.

135
Perdão, Mister Fiel: o filme
Em 1980, foi lançado o livro Manoel Fiel Filho: quem vai
pagar por este crime?, de Carlos Alberto Luppi, pela Editora
Escrita. Já nos anos 2000, estreou em 2009, sob a direção do
cineasta alagoano Jorge Oliveira, o documentário Perdão, Mister
Fiel. O filme conta a perseguição política ao metalúrgico pela
ditadura militar brasileira, que resultou em seu assassinato nos
porões do Doi-Codi. Personalidades como Luiz Inácio Lula da
Silva, Fernando Henrique Cardoso, José Sarney, Jarbas Passarinho
e Marival Chaves, ex-agente do Doi-Codi, dão seus depoimentos
sobre o episódio.

Vladimir: ex-líder estudantil que incendiou 68

Vladimir Gracindo Soares Palmeira nasceu em Maceió, em


dezembro de 1944, quando a Força Aérea Brasileira partia para a
Itália com 23 mil pracinhas que iriam lutar na 2ª Guerra Mundial.
Filho de família tradicional de Alagoas - o pai, Rui Palmeira,
senador (1954) e o irmão Guilherme governador (1979, 1982), mas
Vladimir nasceu para a guerra. Foi no Rio de Janeiro onde
Vladimir construiu sua militância política. Com 22 anos, em 1966,
assumiu a presidência do CACO (Centro Acadêmico Cândido de
Oliveira), a ponta de lança do movimento estudantil contra a
ditadura, e em 1967 era presidente da União Metropolitana dos
Estudantes (UME). Com um banquinho, um megafone e sua voz,
inflamou a juventude carioca. Foi preso da polícia. Mas não

136
adiantou. Em 1968, as manifestações estudantis foram lideradas
por Vladimir, contra o regime militar, que culminaram com a
passeata dos 100 mil, no Rio. Vladimir foi preso e banido do país.
Viveu em Cuba, na Argélia e na Bélgica. Foi o último a voltar pela
Lei da Anistia. Foi deputado federal pelo PT em 1986 e reeleito em
1990. Vladimir Palmeira saiu do Partido dos Trabalhadores em
junho de 2011.

“Os estudantes e o povo voltam às ruas porque o governo se


negou a atender às nossas exigências. À série de reivindicações que
fizemos, a ditadura respondeu não. Pois, não, respondemos nós. Não
à repressão, não à dominação estrangeira, não à exploração de um
povo, não à miséria deste povo, não à morte deste povo. Os
estudantes cumprem seu papel de denúncia da ditadura”.
Vladimir Palmeira, discurso na Passeata dos 100 mil - Rio
de Janeiro, 26 de Junho de 1968, Centro do Rio

General alagoano no front da guerra

O general Mário de Carvalho Lima (1908-1983) sempre


consagrou seu papel de soldado e cidadão das Alagoas. Desde o
tempo que saiu da lendária Escola Militar de Realengo, no Rio de
Janeiro, o general participou de todas as revoluções que ocuparam
as páginas da história de 1930 para cá – em etapas difíceis de lutas
internas e externas, e até luta entre irmãos brasileiros. Como
tenente do Exército, Carvalho foi para o front, comandou pelotões

137
e relatou – como se fosse um correspondente de guerra – o que se
travou na Revolução Constitucionalista de 1932, no Vale do
Paraíba, São Paulo, na luta contra os paulistas sublevados que
enfrentaram o presidente Getúlio Vargas. O livro Diário de um
Soldado foi escrito em pleno teatro de operações da guerra, entre
14 de julho e 2 de outubro. Uma semana após seu retorno das
trincheiras, o oficial de Transmissão, tenente Mário de Carvalho
Lima, mostra toda sua versatilidade e estreia como correspondente
de guerra, na série “Diário de um Soldado na Revolução
Constitucionalista de 1932”, publicada na primeira página do
Jornal de Alagoas em 31 edições, de 05 de novembro a 20 de
dezembro.

Notícias do front
Toda a série do Diário do Soldado, publicado no Jornal de
Alagoas, foi recuperada e fotocopiada da coleção do Instituto
Histórico e Geográfico de Alagoas, e editada pelo escritor e
engenheiro Américo José Peixoto Lima, filho do general. Na série
e no livro, o tenente mostra episódios de tensão, tiros no front,
encontro de amigos e irmãos em linhas opostas, com texto baseado
em crônicas de guerra bem apuradas e ótimas descrições do que se
passou na linha de combate.

“26 de julho. Ao atravessarmos um trecho da estrada para


Engenheiro Passos, onde se achava a nossa frente de combate, no
início da marcha, já ouvíamos tiros das metralhadoras. Fomos
recebido à bala. Foi terrível a travessia: bala para todos os lados.

138
Felizmente, no homem a homem, conseguimos transpor as linhas
inimigas. No final, ouvi de um soldado: Ah que vida horrorosa meu
Deus! Era o nosso batismo de fogo... A princípio a notícia não foi
muito bem recebida, pois no meio de nossos soldados havia mais de
80 homens que nunca tinha pegado em um fuzil. Porém, o brasileiro é
soldado por natureza”.
Diário de um Soldado Alagoano no front da Revolução de
1932, Mário de Carvalho Lima, Nossa Livraria, Recife,
organização Américo José Peixoto Lima

Graciliano: a prisão anunciada

“No começo de 1936, funcionário na Instrução Pública (o


correspondente hoje a secretário de Educação) de Alagoas, tive a
notícia de que misteriosos telefonemas com veladas ameaças, me
procuravam o endereço. Desprezei as ameaças”. É o começo da
narrativa de Graciliano Ramos, na abertura do capítulo dois, do
volume 1 do livro Memórias do Cárcere (1953), quando foi preso -
sem culpa formada ou nota por escrito - em 3 de março do mesmo
ano. O mistério estava desfeito, mas, o maior romancista alagoano
já sabia, avisado por amigos. Entre os “possíveis” motivos,
Graciliano, ingênuo, pensou que o descontentamento fosse porque
“havia suprimido nas escolas o Hino de Alagoas”. Na verdade, as
“forças consideráveis” era o Estado Novo de Getúlio Vargas, que o
taxava de homem de esquerda, comunista (ele só veio a se filiar no
PCB em 1945). Um amigo o aconselhara a fugir, mas Graciliano
ficou em sua casa, na Pajuçara, alinhavando o romance Caetés,

139
com um copinho de cachaça ao lado e a mala pronta do outro. E a
família chorando.

“Afinal, cerca de sete horas, um automóvel deslizou na areia,


deteve-se à porta e um oficial do Exército, espigado, escuro, cafuz ou
mulato, entrou na sala.
– Que demora, tenente! Desde o meio-dia que estou a sua
espera.
- Não é possível, objetou o rapaz empertigando-se.
- Como não? Está aqui a valise pronta, não falta nada.
O sujeitinho deu um passo à retaguarda, fez meia volta,
aprumou-se, encarou-me
- Vai apenas essa maleta? Aqui entre nós posso dizer: acho
bom levar mais roupa, é um conselho.
- Obrigado, tenente

Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em Obra


Completa, 25ª edição – Editora Record (RJ) – 1992.

Confissões de um capitão

Em 1964, o tenente do Exército Carlos Roberto Peixoto


Lima, então com 24 anos, o Carlito Lima, recém saído da
Academia Militar das Agulhas Negras (RJ), viveu uma reviravolta
em sua vida, tanto como militar, como profissional. Em 2001, ele
lançou seu primeiro e mais famoso livro “Confissões de uma
Capitão”, onde conta seu período intrépido como carcereiro na 2ª

140
Companhia de Guarda em Recife. De índole pacífica e de coração
amoroso e boêmio, Carlito conta como provocou a ira do Exército
Brasileiro em sua passagem pela carceragem de Recife, onde tinha
um tratamento amistoso com presos políticos como o ex-
governador Miguel Arraes - que depois ficou seu amigo – Paulo
Freire (o educador), Paulo Cavalcanti e Francisco Julião, líder das
Ligas Camponesas. Carlito Lima lançou sua primeira obra aos 61
anos. De lá para cá, já publicou mais de 800 crônicas e 18 livros.
“Confissões de um capitão” foi traduzido para espanhol e
comercializado na Feira de Frankfurt, na Alemanha.

“Confesso a minha “traição” ao Exército, porque eu tratava


bem os presos políticos, levando bilhetes que as famílias escreviam
para eles. Cheguei inclusive a namorar a filha de um dos presos, fato
que fez o Exército me mandar para o Amazonas, onde fiquei por dois
anos. Foi a primeira vez que um tenente que participou da Revolução
escreveu um livro desta natureza”.
Entrevista de Carlito Lima ao jornalista Carlos Nealdo,
jornal Tribuna de Alagoas, edição de 26/10/2001
Freitas Neto, o anjo vermelho

Em 11 de julho de 1997, no mesmo dia em que chegavam a


Cuba os restos mortais do guerrilheiro Che Guevara vindos da
Bolívia, o avião russo modelo Antonov 24, da Cubana Aviación,
despencava no mar do Caribe matando o vereador, jornalista,
radialista e advogado alagoano João Vicente Freitas Neto (1949-
1997), aos 42 anos, e sua mulher, Maria das Graças de Carvalho

141
Freitas. Era mais uma viagem de Freitas à ilha de Fidel Castro,
onde havia participado, em Santiago de Cuba, do Festival de
Cultura do Caribe, conhecido como Fiesta del Fuego. Em sua vida,
Freitas Neto era apaixonado por Cuba, organizou várias viagens
para o país caribenho, abrindo os caminhos entre Alagoas e Cuba,
que foi importante, por exemplo, na luta contra o vitiligo, durante a
gestão da secretária de Saúde, Kátia Born. Seu corpo foi trasladado
para Maceió, dias depois, sem o da sua mulher, que desapareceu no
mar após a tragédia.

“Você tratou logo de usar seus super-poderes de anjo


vermelho para dar coragem ao povo alagoano a ir à praça para lutar
e morrer se preciso, com dignidade. Como você mesmo escreveu num
dos artigos sobre Graciliano Ramos: `a morte interrompe apenas a
convivência física, o ideal permanece vivo”.
Texto da jornalista Graça Carvalho, no artigo O Anjo
Vermelho, na Gazeta de Alagoas, na edição especial de 20/07/97.

Freitas: amor ao povo alagoano


Freitas Neto nasceu na capital alagoana, em 19 de dezembro
de 1949, e morou por muitos anos no tradicional bairro de
Bebedouro. Foi ativista político como estudante secundário e
universitário, abraçou as carreiras de jornalista e radialista muito
cedo, passando pelas redações de esporte e política dos principais
veículos de comunicação de Alagoas, além de trabalhar como
correspondente, por 19 anos, do Jornal Estado de São Paulo, o

142
“Estadão”. Sua capacidade de liderança o levou à presidência do
Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Alagoas, no final da
década de 1970, destacando-se na luta contra a ditadura militar em
seu período final. Como candidato à presidência da Federação
Nacional dos Jornalistas (FENAJ), em 1983, levantou a bandeira
de luta pela Democratização da Comunicação, percorrendo
diversos estados no país. Em 1982, Freitas Neto filiou-se ao
PMDB, por cuja legenda elegeu-se vereador por Maceió. Na
Câmara, contabilizou a sua presença em 314 sessões, só nos três
primeiros anos de mandato, fez 166 discursos e 16 projetos de lei.

“Freitas deixou grandes contribuições como combatente pelas


liberdades públicas, como defensor dos movimentos sociais, como
sindicalista, como militante socialista e como parlamentar que deu
exemplo na luta contra a corrupção, as desigualdades sociais e a
violência política em Alagoas”.
Jornalista Marcelino Freitas Neto (filho do Freitas).

“O Freitas fez mais. Junto com os jornalistas Dênis Agra e


Adelmo dos Santos, deram o pontapé inicial para a retomada do
movimento sindical em Alagoas, após o golpe de 1964. Eles
comandaram a primeira greve dos trabalhadores, em pleno regime
militar. Freitas Neto era assim: amanhecia no jornal, dormia em
cima do birô, ou debruçado sobre a máquina de escrever. Quando se
dedicava a algum caso, ia até o fim”.

143
Texto do jornalista Roberto Vilanova, no artigo O que foi
isso, companheiro? na Gazeta de Alagoas, na edição especial de
20/07/97.

Freitas Neto: acervo preservado


O Museu da Imagem e do Som de Alagoas é o atual
guardião da memória e do acervo do jornalista Freitas Neto, desde
julho de 2017. O acervo foi doado pelos filhos Marcelino Freitas e
Glória Freitas, que lembraram do acidente, que interrompeu a
atuação do pai como “embaixador” de Cuba em terras brasileiras.
Numa época em que a Ilha sofria consequências do embargo
econômico americano, Freitas ficou conhecido por organizar
eventos e inúmeros voos de solidariedade a Cuba, nos quais levava
profissionais de diversas áreas e políticos dos mais variados
partidos, além de doações para o povo cubano. Na entrega das
documentações e objetos do jornalista, o MISA promoveu a
exposição “Freitas Neto nos 200 anos de Alagoas: a trajetória de
um alagoano feito de ferro e de flor”, que marca os 20 anos de
falecimento do jornalista, político e sindicalista.

Petróleo em Alagoas: Drama, mortes e livro proibido

A história dos heróis alagoanos do petróleo começa no


século XIX, no distrito de Riacho Doce, quando surgem os
pioneiros da prospecção, o geólogo alemão José Bach, o aviador
Paulo Martins e o engenheiro Edson de Carvalho. A história
envolve boicote do governo Getúlio Vargas em favorecimento às

144
multinacionais do óleo; a morte insolúvel de um estrangeiro em
Alagoas, e o fim das minas de petróleo em Riacho Doce, onde
jorrou pela primeira vez. Dois livros são essenciais para conhecer
esta história: O Drama da Descoberta do Petróleo (1958), de Edson
de Carvalho, e o Escândalo do Petróleo (1959), de Monteiro
Lobato. O livro de Lobato é um libelo em favor da luta dos
alagoanos pelo Petróleo, chegou a ter sua venda proibida pelo
governo Vargas, pelo seu conteúdo explosivo e denunciante.

“José Bach, um incompreendido sábio alemão que o destino


fez encalhar em Alagoas, levou 13 anos a estudar aquele trecho da
costa nordestina e a fazer levantamentos geológicos. Com base nesses
estudos, proclamou a tremenda riqueza oleira do Riacho Doce: “Há
aqui petróleo para abastecer o mundo”, dizia sempre. E formou uma
modesta empresa. Súbito, morre afogado. Ao atravessar um braço da
lagoa Mundaú, conduzido por um canoeiro que não era o habitual, a
embarcação revira e o pobre sábio perece. O canoeiro limitou-se a
um banho. Dias antes, a 26 de agosto de 1918, havia Bach enviado ao
chefe da polícia o seguinte apelo: `Exmo. Sr. Achando-me com minha
família residindo em Garça Torta, onde exerço as funções de diretor
técnico da Empresa de Minas Petrolíferas, e achando-me sem
garantias pessoais e materiais, venho solicitar a V. Ex. as necessárias
providências, afim de que sem receio possa aqui residir e exercer
minhas funções´”.
Monteiro Lobato, em O Escândalo do Petróleo e Ferro,
editora Brasiliense, 1959, exemplar original numerado 132

145
Outro mártir do petróleo: o herói aviador
O desaparecimento de Bach retardou muitos anos a
mobilização do petróleo em Riacho Doce. Mais tarde, um senhor
de Maceió adquire da viúva de Bach os direitos sobre os estudos e
os projetos do geólogo, e associasse ao aviador cearense Euclides
Pinto Martins, um herói nacional dos anos 1920, quando fez a
primeira viagem aérea dos Estados Unidos ao Brasil. Pinto Martins
(hoje nome do aeroporto internacional de Fortaleza) já era famoso,
quando após ao famoso "raid" entrou no negócio do petróleo em
Alagoas. Ele foi encontrado morto em seu quarto com um tiro na
cabeça, em um episódio até hoje insolúvel, em 12 de abril de 1924.

“O povo o aclamou como herói nacional, O Congresso


concede-lhe um prêmio de 200 contos, que ele não chegou a receber.
Suicida-se antes disso em um quarto de hotel, sem que ninguém
compreendesse semelhante tragédia. Era o petróleo. Na véspera do
“suicídio” Pinto Martins havia telegrafado ao seu sócio em Maceió:
´Negócio fechado; assinarei contrato dentro de três dias`. A sua
papelada – mapas, relatórios e mais os estudos de José Bach em seu
poder – tudo desapareceu do hotel”.
Monteiro Lobato, em O Escândalo do Petróleo e Ferro,
editora Brasiliense, 1959, exemplar original numerado 132

Pioneiro do petróleo em Alagoas morre pobre


Dois meses depois da morte de Pinto Martins, ainda
segundo o relato de Monteiro Lobato, descobre-se em Recife que
“dois caribes andavam aliciando capangas para uma ´caçada de

146
gente` em Riacho Doce. A chefatura da polícia em Alagoas é
informada de que a vida de Edson de Carvalho corria perigo. A
polícia monta guarda à casa do pioneiro e à sonda. O golpe falha, e
o nome do terceiro mártir fica em branco”. Edson Martins
sobreviveu, mas morreu pobre. Ele descreveu toda sua epopéia no
livro O Drama da descoberta do Petróleo Brasileiro (1958). Edson
narra como fundou a empresa Companhia de Petróleo Nacional,
tendo com sócio o próprio Monteiro Lobato.

“Começam as perfurações, o então Departamento Nacional de


Produção Mineral abre campanha contra a empresa. Recorre à
imprensa. Procura desmoralizar os pioneiros. Assaca-lhes as maiores
infâmias. Nada consegue. Em 1932, o poço São João, em Riacho
Doce, com 250 metros de perfuração, irrompe com um fortíssimo jato
de gás de petróleo. Tinha vencido”.
O Drama da descoberta do Petróleo brasileiro, de Edson
Carvalho, Imprensa Oficial Graciliano Ramos – 2010, coleção
Pensar Alagoas.

Um rebelde do petróleo
Em 1939, morria o poeta, jornalista, advogado e deputado
federal alagoano Emílio Elizeu de Maya, autor do relevante O
Brasil e o Drama do Petróleo (José Olympio: Rio de Janeiro,
1938), que por muito tempo foi usado como bandeira nacionalista
pelos que defendiam o petróleo brasileiro. “Sua posição em relação
ao petróleo, ainda nos idos do fi m da década de trinta, criou

147
especulações”, lembraria muitos anos depois o ex-governador
Divaldo Suruagy. “Seria Emílio um fanático radical de esquerda?
Buscamos ainda em (José Fernando de) Maya Pedrosa a resposta a
tais indagações: Nem fanático, nem visionário, nem utópico.
Emílio de Maya foi, na verdade, um democrata autêntico, que
levou ao debate público, através do livro, as posições assumidas na
Câmara dos Deputados”.

“A singularidade de Emílio de Maya (além de ser um


precursor de atitudes) consiste na rebeldia orgânica, pacata, de
operar resoluções sem derramamento de sangue e em acompanhar a
marcha do progresso sem renegar a liberdade do homem – condição
essencial para a vida de qualquer homem de qualquer raça”
Por Breno Accioly (1921-1966), escritor alagoano

Petrobras não reconhece pioneiros alagoanos


O engenheiro Vinícius Maia Nobre, na apresentação que faz
do livro de Edson Carvalho, em edição fac-símile lançada em
2010, pela Imprensa Oficial Graciliano Ramos, afirmava que a
Petrobras, estranhamente, não reconhecera o trabalho do
engenheiro Edson Carvalho em busca do petróleo. “Cabe a nós,
brasileiros, lendo este livro, enaltecer essa figura heróica de nossa
história”. Já o jornalista Bartolomeu Dresch, que ganhou prêmios
nacionais ao fazer reportagens sobre o assunto, também passou por
dificuldades pela falta de dados, de fontes e da má vontade das
autoridades. Foi quando conheceu Vicentina Alves de Oliveira,
viúva de Edson.

148
“Em determinado dia, no entanto, adentra na redação do
Jornal de Alagoas, com um bau debaixo do braço, uma senhora
baixinha, cara e jeito de guerreira. Era Vicentina Alves de Oliveira,
viúva de Edson de Carvalho, que levava seus pertences pessoais.
Foram dez reportagens especiais, com direito a ameaças, prêmios, e
reconhecimento na Câmara Federal e Assembleia Legislativa, e
repercussão em toda a imprensa nacional. A Petrobras resolveu abrir
seus arquivos a respeito das explorações petrolíferas desenvolvidas
em Riacho Doce. Novos estudos foram programados. Seguiram-se
diversas outras publicações”.
Bartolomeu Dresch, na apresentação do livro O Drama da
descoberta do Petróleo brasileiro, de Edson Carvalho, Imprensa
Oficial Graciliano Ramos – 2010, coleção Pensar Alagoas.

As muitas histórias de Riacho Doce


Riacho Doce inspirou o escritor paraibano José Lins do
Rego, que viveu um bom tempo em Alagoas, a escrever um
romance ficcional com o mesmo nome desta praia, em uma trama
sobre uma tórrida paixão entre dois personagens, Eduarda e Nô,
tendo como cenário uma pacata vila de pescadores. Em 1990, a
rede Globo lança uma das primeiras minisséries, transportando o
livro de Zé Lins para a telinha. Vera Fischer e Carlos Alberto
Richelli foram os atores que deram vida ao casal, com as filmagens
no cenário original de Riacho Doce. O livro Riacho Doce de Zé
Lins, lançado em 1939, apesar de ser ficcional, lança nas suas
páginas uma história real, o drama do petróleo. “Num dia qualquer,

149
quando mal se esperasse, o óleo subiria para o céu com uma força
danada, e todos ficariam ricos”, pag 113. Em 1932, sete anos antes
do lançamento do livro, Alagoas foi destaque no país quando pela
primeira vez jorrou petróleo em Riacho Doce, no poço São João,
da Companhia de Petróleo Nacional, do pioneiro alagoano Edson
de Carvalho.

Operação Taturana: teje preso!

A última sessão do desembargador Antônio Sapucaia da


Silva, se deu aos 70 anos, um dia antes de seu aniversário, em 31
de mão de 2008, quando teve de deixar o Tribunal de Justiça de
Alagoas por atingir o limite máximo de idade. Sapucaia entrou
para a história do Judiciário nacional, com decisões corajosas e
inéditas no País, quando decidiu pelo afastamento das funções e do
mandato eletivo dez deputados da Assembleia Legislativa de
Alagoas que faziam parte da Mesa Diretora da Casa. Baseado nas
provas colhidas pela Polícia Federal, os parlamentares foram
presos na chamada Operação Taturana. A PF acusava os deputados
de desviarem R$ 300 milhões da Assembléia, dinheiro que teria
sido desviado para o pagamento de folhas pessoais “fantasmas”,
com favorecimento a parentes dos parlamentares e de empréstimos
não pagos pelos deputados, debitados na conta do Poder
Legislativo, alimentado por verbas do duodécimo, pagas pelo
erário público. A vida nunca foi fácil para o desembargador
Antônio Sapucaia, um senhor negro, discreto, elegante, de cabelos
brancos e óculos de grau profundo. Sua vida profissional chegou

150
ao clímax em janeiro de 2002, quando assumiu como
desembargador do Tribunal de Justiça, a corte máxima da Justiça
alagoana, onde no ano seguinte chegaria à presidência da casa,
também por merecimento.

O discurso bomba
Em uma sessão tensa, Sapucaia estava impecável, com sua
toga preta reluzente, uma manta vermelha trespassando a cintura.
Ele lia seu discurso com uma emoção impressionante, e suas
palavras caíam como bombas nas caras sonolentas dos
desembargadores afundados em suas cadeiras de espaldar altos.
Era a quarta vez que Antônio Sapucaia tentava entrar na corte por
merecimento, nas outras três vezes fora preterido ou não indicado
na lista tríplice de escolha do pleno do TJ. Entre as afirmações que
causaram grande repercussão está a de que “desembargadores se
locupletam em seus gordos vencimentos”; “vezes sem conta,
magistrados viajam às expensas do Tribunal, sem que uma linha
sequer seja publicada no Diário Oficial” e uma máxima: “O juiz
Nicolau dos Santos Neto, o famigerado Lalau, fez escola (aqui) no
Estado”. Indagado se não temia ficar isolado em conseqüências das
críticas a seus colegas de toga, Antônio Sapucaia afirmou que isso
não o deixa preocupado.

“Não me preocupa em nada esse possível isolamento. O meu


temperamento já é mesmo arredio e anti-social por natureza, e meu
tratamento com eles será exclusivamente voltado para assuntos
jurídicos, de maneira clara a transparente. As ruas têm alma, olhos,

151
ouvidos e bocas de onde saem vozes incontroláveis. Nada do que aqui
se passa permanece hermeticamente entre as paredes, há sempre um
pórtigo ou uma brecha invisível, deixando escapulir os fatos, mesmo
os interna corporis. Pelo que me lembro só uns dois
desembargadores me cumprimentaram no final, mas no calor da hora
não lembro quem foi”.
Teotônio Vilela: o século do menestrel

O nome Teotônio tem origem grega e significa popular, que


vem do povo. Não poderia ser a maneira mais apropriada para o
casal Elias Brandão Vilela, o capitão Sinhô, e Isabel Brandão
Vilela, a dona Bilinha, batizar o sétimo dos seus 10 filhos. Nascido
há 100 anos, em Viçosa, no interior alagoano, a figura e os ideais
de Teotônio Vilela (1917-1983) estão mais vivos do que nunca não
só pela celebração de seu centenário, mas pela força de seu nome
quando se fala em democracia, em movimentos por eleições
diretas.

"Ele foi o grande detonador das Diretas Já. Quase sempre


falava no assunto em palestras para públicos mais restritos. Teotônio
morreu em novembro de 1983 e a campanha das diretas começou pra
valer no início de 1984, mas ele era sempre lembrado e citado.
Teotônio Vilela seria absolutamente vital neste atual cenário do
país".

Por Carlos Marchi, jornalista e autor do livro Senhor


República – A vida aventurosa de Teotônio Vilela, Editora Record,

152
em entrevista a Ana Clara Brant, no jornal Estado de Minas, em
28/05/2017

Teotônio e seu amor secreto


O livro de Carlos Marchi, detalha toda a vida política do
menestrel e histórias apimentadas de sua vida pessoal, só agora
reveladas. No capítulo “O sopro do amor tardio”, o jornalista fala
do romance entre Teotônio e Maria Luíza Fontenele, do Partido
Comunista Revolucionário (PRC), que foi a primeira mulher eleita
prefeita de capital no Brasil, no caso, Fortaleza. A união
aparentemente inimaginável entre o usineiro e a comunista foi
contestada pela própria Maria Luíza, que era 25 anos mais nova
que o alagoano. Um dia ela disse: "Nossa relação não pode dar
certo. Eu sou uma comunista, vinculada ao PRC e você é um
usineiro liberal, que foi da Arena. Para onde esse caso da gente
vai?" Teotônio riu e respondeu: "Nós vamos juntos até uma curva
da estrada que está lá na frente, onde vou descer. Não se preocupe,
essa curva não está longe". Por ironia do destino, o defensor da
anistia morreu no dia do aniversário de Luíza, 27 de novembro.

"Se fosse um mero caso extraconjugal, eu nem citaria. Mas foi


um relacionamento que teve uma grande importância para ele;
mudou sua vida política e o influenciou demais."

Por Carlos Marchi, jornalista e autor do livro Senhor


República – A vida aventurosa de Teotônio Vilela, Editora Record,
21/08/2017, em O Estado de Minas

153
Teotônio: a canção do peregrino
Marchi foi repórter em Brasília durante as décadas de 1970
e 1980 e além de ter convivido com o político de Alagoas foi
amigo pessoal dele. A relação próxima é anunciada já nas
primeiras páginas da obra. Em uma tarde de 1983 sem grande
movimento e sem notícias nos corredores do Senado, o jornalista
foi surpreendido: "Por onde você vai, cabra? Vem comigo pra ver
uma coisa bonita", convocou o então senador. Era a gravação de
Menestrel das Alagoas, composição de Milton Nascimento e
Fernando Brant em homenagem a Teotônio Vilela, que se tornou
um hit nacional na voz de Fafá de Belém.

Menestrel das Alagoas


Milton Nascimento e Farnandoi Brant

Quem é esse viajante


Quem é esse menestrel
Que espalha esperança
E transforma sal em mel?
Quem é esse saltimbanco
Falando em rebelião
Como quem fala de amores
Para a moça do portão?
Quem é esse que penetra
No fundo do pantanal
Como quem vai manhãzinha

154
Buscar fruta no quintal?
Quem é esse que conhece
Alagoas e Gerais
E fala a língua do povo
Como ninguém fala mais?
Quem é esse?
De quem essa ira santa
Essa saúde civil
Que tocando a ferida
Redescobre o Brasil?
Quem é esse peregrino
Que caminha sem parar?
Quem é esse meu poeta
Que ninguém pode calar?
Quem é esse?

Teotônio Vilela e a luta armada


Teotônio Brandão Vilela (1917-1983) foi empresário,
escritor e político brasileiro, em mandatos de deputado estadual,
vice-governador e senador por Alagoas. Teotônio, com seu cajado
e chapéu preto, retratado pelo cartunista Henfil, ficou para sempre
como símbolo das Diretas Já. No ano de 1937, abandona os
estudos e volta para Alagoas, onde passou a trabalhar com seu pai,
que era proprietário rural. Como o pai, virou agropecuarista e, em
seguida usineiro, fundo uma usina de açúcar, a Usinas Reunidas
Seresta. A data 27 de novembro de 1983, há 33 anos, é para ficar
na história dos alagoanos e brasileiros. Exatamente no mesmo dia

155
do primeiro comício que marcou a campanha das Diretas Já – em
um dos maiores movimentos de massa já vividos pelo País - morria
em Maceió o menestrel das Alagoas. Teotônio Vilela, que deu o
grito das Diretas Já, não viu nascer a primeira eleição presidencial
que pôs um ponto final ao período de 20 anos da ditadura militar.

O Evangelho segundo Teotônio


Um ano depois de sua morte, o cineasta Vladimir de
Carvalho, lança o filme “O Evangelho segundo Teotônio”. O filme
é quase didático, em uma longa e derradeira entrevista com o
menestrel, onde entre coisas confirmou seu apoio ao golpe militar,
e manteve esse apoio nos anos da guerrilha armada, só retirando
quando enxergou a lentidão da abertura.

“Com a voz cansada, esgotada pelo câncer, Teotônio lança


seu entrecortado recado final: ´Se eu fosse, hoje, um jovem na
América do Sul, eu me ingressaria na luta armada para defender o
povo da opressão`”.
Por César Fonseca, em reportagem na Folha de São Paulo
“A luta armada, segundo Teotônio Vilela”, de 2407/1984

Jornalista Costa Rego desafia Getúlio

156
Senador, deputado federal e jornalista, Pedro da Costa Rego
(1889-1954) foi governador de Alagoas (1924-1928), onde
conseguiu o apoio do Legislativo para realizar as reformas de base
e de infraestrutura. Seu programa de Crédito Agrícola foi uma de
suas marcas. Como jornalista, Costa Rego foi editor de grandes
jornais e revistas do país, e conviveu com Assis Chateubriand,
Austragésilo de Athayde, San Thiago Dantas e Júlio Mesquita –
entre os jornais que trabalhou está o “Correio da Manhã”, do Rio, o
mais influente jornal da então Capital Federal.

“Conta-se que o presidente Getúlio Vargas, à hora do café,


não dispensava a leitura do editorial e do artigo assinado por Costa
Rego no “Correio da Manhã”. Getúlio Vargas, na própria expressão
do jornalista, era um de seus “assuntos”, e o presidente, apesar de
sua enorme soma de poder, temia as opiniões do eminente alagoano.
E mais ainda as opiniões, a ironia que a pena de Costa Rego
imprimia no papel”.
Discurso de posse do poeta e jornalista Carlos Moliterno,
que assumia a cadeira nº 1 da Academia Alagoana de Letras, de
Costa Rego, que já fora de Gracindo Palmeira – em revista da
AAL, nº 15 – 1989

O governador que perseguiu bandidos

157
Como homem público, Costa Rego despertou muita
controvérsia, pois fez um governo forte e conseguiu preservar o
princípio da autoridade, a ponto de modificar a paisagem política,
sobretudo no interior do estado, onde predominava o mando
absoluto dos chamados coroneis. Além de acabar com os
mosquitos e o jogo desenfreado, acabou também, pelo menos por
um tempo, com o banditismo em Alagoas. Ele mandava seu recado
pelas suas mensagens na Assembleia. Como essa, de 1925, com o
título Repressão aos bandidos.

“Iniciei, como é de domínio público, uma repressão


sistemática aos bandidos. Para começá-la, tive naturalemente
que enfrentar alguns desgostos, lutando contra a mentalidade
da minoria que domina os centros rurais. Em consequência,
instrui as autoriades no sentido de procurarem, onde
estiverem, detendo-os: os criminosos processados e quase
sempre foragidos nos engenhos e fazendas, com a proteção
velada ou ostensiva, dos diretores e possuidores de
estabelecimentos desta natureza”.
Costa Rego, no livreto Na Terra Natal (1924-1928),
Imprensa Oficial – 1928

Tobias Granja: uma vida de luta

158
Nasceu em Palmeira dos Índios no dia 13 de fevereiro de
1945. Filho de Manoel de Araújo Granja e de Maria Bernadete
Tobias Granja. No início da década de 1960, com 15 anos e já
morando em Maceió, destacou-se como líder estudantil
secundarista, chegando a presidir a União dos Estudantes
Secundarista de Alagoas, a UESA. Depois do Golpe Militar de
1964 foi trabalhar na imprensa do Sul, sendo repórter das revistas
Manchete e Cruzeiro. Nesse período, concluiu o curso de Direito.
Em meados da década de 1970, volta a Maceió e continua no
jornalismo, além de advogar. Foi candidato a deputado federal em
1974, mas não conseguiu se eleger. Exatamente um ano antes de
ser assassinado, no dia 15 de junho de 1981, Tobias redigiu uma
petição ao presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas, que ficou
quase como um vaticínio:
“A arma contra a covardia é a fé, a convicção na verdade.
Nem as emboscadas, nem as bombas nos amedrontam, porque uma
ideia não morre no meio do fogo. Se for preciso, entrego minha vida
em sacrifício”.

Tobias: um tiro traçoeiro na nuca


Há 35 anos, junho de 1982, um tiro fatal na nuca mata o
jornalista e advogado Tobias Granja, em um do episódios mais
lametáveis da história de Alagoas. Tobias era candidato a deputado
estadual, e passara toda a tarde do dia do crime distribuindo
panfletos em bairros de Maceió. Às 17h30 do dia quinze de junho,
no exato momento em que saía do seu escritório, situado na antiga

159
Rua Augusta, no Centro de Maceió, uma emboscada aguardava
Tobias. O pistoleiro agiu covardemente pelas costas e disparou um
tiro mortal, por trás, em sua nuca.

“Imediatamente, o Sindicato dos Jornalistas e outras


entidades da sociedade civil, como a OAB, denunciaram o clima de
insegurança e a pistolagem institucionalizada. A entidade dos
profissionais de imprensa, sob a liderança do jornalista Dênis Agra,
transformou-se no “Sindicato da Vida” contra o “Sindicato da
Morte”. Tobias Granja era advogado do ex-cabo José Henrique da
Silva e de seus irmãos, que estavam envolvidos num conflito
sangrento com integrantes poderosos da família Cavalcanti
Lins/Calheiros. Era tempo difícil, com o País voltando a vivenciar a
primeira eleição direta para governadores dos Estados pós 1964”.
Joaldo Cavalcenti, no artigo Um tiro traiçoeiro na
sociedade, em Gazeta de Alagoas, em 24/05/2012

Estudantes alagoanos vencem censura

Nos anos de chumbo, em plena ditadura dos anos 1960,


estudantes alagoanos desafiaram a polícia e venceram a censura
em Alagoas, durante o governo Lamenha Filho, com um feito
monumental. O relato é do economista e professor Radjalma
Cavalcanti, e que à época era o presidente do Diretório Central dos
Estudantes e viveu toda esta história. A peça Liberdade Liberdade
de Millôr Fernandes, protagonizada pelo autor Paulo Autran, um
marco da resistência contra o regime militar, quase que não chega

160
em Maceió, se não fosse a atuação dos estudantes. Autran, que
estava em Recife apresentando a peça, foi intimado pela Secretaria
de Segurança Pública de Alagoas a não apresentar a peça em
Alagoas. Mas diante de um grande barulho dos estudantes
alagoanos, a peça foi liberada. Liberdade foi apresentada para um
público exultante que lotou o Teatro Deodoro por dois dias. No
final o DCE afixou uma placa na entrada do teatro, com frase
cunhada pelo jornalista Luiz Gutemberg: "Nesse teatro, Paulo
Autran cantou a liberdade". Veja o que falou Radjalma:

“Não foi fácil, mas conseguimos. Fui ao Recife contatar Paulo


Autran, perguntamos a ele, que se a gente conseguisse, ele faria a
peça em Maceió. Autran concordou. Fomos ao Diário de
Pernambuco, que tinha boa circulação em Maceió, e falamos da
censura da peça em Alagoas. A notícia foi um estrondo. O
governador ligou para o delegado da ordem pública e perguntou o
que era aquilo, ele confirmou a censura. Horas depois, fui chamado
pelo governador, que liberou a peça. O delegado ficou possesso”.
Trecho da reportagem o SNI em Alagoas, revista Última
Palavra, 1987; com depoimento de Radjalma Cavalcanti, na Feira
Literária de Marechal Deodoro, 2015

Jangadeiros Alagoanos: uma saga de heróis

Os jangadeiros alagoanos Umbelino José dos Santos, com


45 anos e mestre da embarcação, natural de Passo de Camaragibe;
Joaquim Faustilino de Sant’Ana (41), de Barra de São Miguel;

161
Eugênio Antônio de Oliveira (25) e Pedro Ganhado da Silva (36),
de Coruripe, são verdadeiros heróis esquecidos em sua terra. Muito
mais que a homenagem que receberam ao ganhar o nome de uma
importante rua no bairro da Pajuçara, em Maceió, eles hoje
deveriam estar no panteão dos grandes heróis e dos grandes feitos
de Alagoas. Em 1922, há 95 anos, o grupo partiu de Maceió na
pequena jangada de seis paus, chamada Independência – uma
homenagem à esta efeméride brasileira – e, após percorrerem em
linha reta mais de 1.100 milhas, o equivalente a aproximadamente
dez mil milhas, e 98 dias de viagem, os tripulantes desembarcam
no cais do Arsenal de Marinha, no Rio de Janeiro, quando foram
recebidos pelo presidente da República Arthur Bernardes.

“A ousada viagem fazia parte de uma série de homenagens


que várias Colônias de Pescadores realizaram como contribuição aos
festejos do Centenário da Independência do Brasil, que aconteciam
na então capital federal, o Rio de Janeiro. Vários estados brasileiros
enviaram embarcações, mas poucas navegaram por todo o trajeto e
nenhuma teve a ousadia de utilizar uma frágil jangada. A ideia desta
homenagem partiu de Homero Galvão, presidente da Colônia
Cooperativa dos Pescadores Almirante Jaceguay, que conseguiu a
autorização do capitão dos Portos Antônio Viera Lima e do
governador do Estado Fernandes Lima”.
Por Moacir Medeiros de Sant’ana, em Efemérides
Alagoanas; com os jornais A Noite, O Paiz e Jornal do Recife.

A volta em grande estilo

162
Após deixarem a jangada no Rio de Janeiro, que foi
oferecida ao Museu Histórico Nacional, os jangadeiros voltaram a
Maceió a bordo do vapor Santos, do Lloyd Brasileiro. Já dentro da
enseada de Jaraguá, às 8 horas da manhã do dia 21 de dezembro,
foram recebidos por flotilhas de jangadas floridas, de canoas
embandeiradas — vindas das lagoas Mundaú e Manguaba — dos
saveiros, de onde soltavam foguetes, — cujo espocar juntava-se ao
som dos apitos das lanchas e dos navios fundeados no porto — de
lanchas repletas de famílias, de rebocadores levando a reboque
lanchões com o pessoal da estiva que levantava seguidos vivas aos
bravos nautas que retornavam.

Os jangadeiros estavam cobertos de flores e vestiam uniformes


de reservistas da Marinha de Guerra, de cor azul ferrete, e exibiam
as medalhas de ouro a eles concedidas pela colônia alagoana na
Bahia. As homenagens continuaram com a construção de um
monumento na Praia da Pajuçara, inaugurado no dia 11 de junho de
1923, e que hoje não mais existe. Outra homenagem foi proposta pelo
deputado Costa Rego, que solicitou ao governador a cunhagem de
sete medalhas de ouro na Casa da Moeda para lembrar o feito e
homenagear os intrépidos jangadeiros.
Por Moacir Medeiros de Sant’ana, em Efemérides
Alagoanas; com os jornais A Noite, O Paiz e Jornal do Recife.

Bancada comunista: o sonho acabou

163
Com o fim da ditadura de Getúlio Vargas durante o Estado
Novo, vários partidos foram legalizados e realizadas eleições para
presidente, deputados federais e senadores ainda em 1945. No
entanto, a escolha dos governadores e dos deputados estaduais
(além de prefeitos e vereadores) ocorreu apenas em 19 de janeiro
de 1947. O Partido Comunista do Brasil (PCB) foi um dos
primeiros a fazer o registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e
se habilitar para as disputas eleitorais. Essa legalidade dos
comunistas, entretanto, não durou muito. Em 19 de janeiro de
1947, o PCB em Alagoas elegeu três deputados estaduais. André
Papini Gois, José Maria Cavalcantie e Moacir Rodrigues de
Andrade. Em outubro de 1947, os mandatos são cassados e, em
janeiro de 1948, a brutal perseguição que o governador Silvestre
Péricles aplicava aos comunistas em Alagoas fez com que os três
deputados cassados deixassem o estado. Em 7 de maio de 1947, o
registro foi cancelado no TSE.

André Papini (1908-1966). Nascido em Brejo Grande,


Sergipe, ele era considerado um penedense. Ainda jovem foi
trabalhar no comércio de Penedo, onde funda e é diretor de uma
associação de classe. Com 21 anos, muda-se para o Rio se Janeiro,
onde trabalha em banco particular. Logo regressa a Alagoas. Como
estudante, participou de congressos nacionais da UNE – União
Nacional dos Estudantes; foi secretário de redação e diretor do
Jornal de Alagoas e A Voz do Povo, jornal do Partido Comunista.

164
Após a cassação em 1948, Papini passa a viver em Recife onde
advoga, principalmente em defesa dos operários.

Moacyr Rodrigues de Andrade. Participou da Revolução de


1930, sendo preso no Rio de Janeiro. Após a cassação do seu
mandato, não havia clima político e sequer segurança pessoal para
continuar vivendo em Alagoas. Deixou o estado e passou a viver
clandestino no Rio de Janeiro. Em 1952 foi à União Soviética,
chefiando uma delegação de nove dirigentes sindicais e militantes
do PCB. Era secretário de organização do núcleo do PCB da
capital e tinha 36 anos quando se elegeu deputado estadual em
1947.

José Maria Cavalcanti. Era Cabo do Exército no 20º


Batalhão de Caçadores de Maceió. Há registros de sua prisão já em
1931. Participou do levante comunista de 1935 em Recife. Preso,
cumpriu pena durante cinco anos em Fernando de Noronha. Após a
cassação do mandato, foi deslocado para o Rio de Janeiro, vindo a
ser um dos dirigentes do Comitê dos Marítimos. Em fevereiro de
1962, quando PCB perde dezenas de dirigentes, José Maria
Cavalcanti aparece no grupo de dirigentes que depois formou o
PCdoB, ao lado de Diógenes de Arruda Câmara, João Amazonas,
Pedro Pomar, Maurício Grabois.

Fontes: Blog do Majella, Luiz Nogueira Barros (A Solidão


dos Espaços Políticos) e sites diversos.

165
Silvestre manda fechar jornal

Logo após o cancelamento do registro do PCB, em 7 de


maio de 1947, Silvestre Péricles mandou fechar rapidamente todas
as células comunistas no Estado, além de impedir a circulação do
jornal “A Voz do Povo”. Na Assembleia Legislativa, o presidente
interino, deputado Clímaco da Silva, solicitou imediatamente
reforço policial por motivos de segurança. O Jornal de Alagoas de
11 de maio de 1937 noticiou assim o cerco:“Ontem, às 14 horas,
um caminhão da Força Policial do Estado parou em frente ao
prédio da Associação Comercial onde funciona a Assembleia
Legislativa, espalhando tropa no local, cercando o edifício.
Armados de fuzis e metralhadoras, os soldados estacionaram no
local. Ia ser realizada uma reunião da comissão constitucional da
Assembleia Constituinte, mas alguns deputados ante a presença
dos soldados que empunhavam armas como se estivessem
preparados para um choque próximo, não chegaram a subir as
escadas da Associação. A população ligava o acontecimento de
ontem às recentes prisões de elementos filiados ao Partido
Comunista”. A perseguição era tamanha que os três deputados
foram presos pela Polícia Militar no dia 25 de outubro. Eles tinham
ido a São Luiz do Quitunde com o objetivo de libertar um operário
que fora preso naquela cidade. Entrevistado sobre o episódio, o
governador Silvestre Péricles declarou:

166
“Se os criminosos, ladrões e assassinos, com fantasias
ideológicas ou sem elas, me aborrecerem, o pau canta e não para
mais. É o que estou dizendo: se me aborrecerem o pau canta e não
para mais”.

Fontes: Blog do Majella, Luiz Nogueira Barros (A Solidão


dos Espaços Políticos) e sites diversos.

Aldo Rebelo e a política estudantil

José Aldo Rebelo Figueiredo nasceu em 23 de fevereiro de


1956, em Viçosa, Alagoas. Em 1975, entrou para o curso de
Direito na Universidade Federal de Alagoas. Presença ativa no
processo de reconstrução da UNE, Aldo foi eleito presidente da
entidade, em seu 32º Congresso, em Piracicaba, no ano de 1980.
Após essa gestão, Aldo ajudou a fundar a União da Juventude
Socialista e foi eleito seu primeiro coordenador. Aldo Rebelo
seguiu carreira política e elegeu-se vereador pelo PCdoB, em 1988,
e deputado federal, em 1990, reeleito até 2002. Foi presidente da
Câmara dos Deputados de 2005 a 2007. Elegeu-se novamente
deputado nas eleições de 2010. Foi ministro de Relações
Institucionais de 2004 a 2005, ministro do Esporte de 2011 a 2014
e ministro da Ciência e Tecnologia a partir de 2015. No final dos
anos 1970 Aldo Rebelo foi o grande articulador da retomada do
movimento estudantil.

A bandeira azul turquesa da UNE

167
O PC do B dominava a União Nacional dos Estudantes,
quando em maio de 1979 acontecia, no Centro de Convenção de
Salvador, na Bahia, o famoso Congresso da Reconstrução, a volta
da UNE legalizada desde 1964. Era a estudantada soltando o verbo
na terra de Castro Alves, dez mil estudantes pintando o sete na
praia da Pituba, no Pelourinho e nas quebradas da capital. Mas
dentro do “gigante” Centro de Convenções, que ainda não tinha
sido concluído, a coisa pegava fogo: maconha, socialismo, guerra
de guerrilhas, anistia, os rachas internos do movimento estudantil e
a bandeira azul turquesa da UNE. O alagoano Aldo Rebelo e o
carioca Marcelo Beraba enfrentam-se no discurso. A tendência
Liberdade e Luta – a famosa Libelu - era a mais assanhada e
anarquista: militantes e simpatizantes. O clima era de total
sublevação. A conspiração era geral. “A UNE Somos nós, a UNE é
a nossa voz”, o grito saia a plenos pulmões, de calça jeans, camisas
de malha, bandeiras ao vento. O teatro Vila Velha mostrava shows
de Gil, Gonzaguinha, Ivan Lins. Estava vingado o congresso
anterior, ainda na clandestinidade, em um sítio de Ibiúna (SP), em
1968, quando a polícia fechou o cerco e prendeu 920 estudantes.
Em Salvador, discussões políticas, paz, amor e anarquia.

168
TERRA DE HEROÍNAS

Ana Lins: uma burguesa revolucionária

Ana Maria José Lins (17../ 1839) é considerada a primeira


heroína alagoana. Nascida e criada em berço de ouro, filha e
mulher de proprietários rurais, Ana Lins aderiu aos ideais da
Revolução Francesa de 1817, e lutou de arma na mão para derrubar
o regime colonial. São célebres os episódios em que resistiu até o
último tiro contra a invasão de seu engenho Sinimbu, em São
Miguel dos Campos, em 1824 – até a rendição e prisão, junto com
seu filho João Lins, futuro Barão de Sinimbu. Ou quando se
envolveu na fuga de seu marido e seu filho mais velho de uma
prisão em Recife. Sua feição, de acordo com o historiador Craveiro
Costa, “era alta, esbelta, de fisionomia enérgica, patenteando no
rosto a ancestralidade paterna (Ana era descendente de holandês e
de Cristovão Lins, que tinha sangue índio e mestiço), dotada de
uma educação intelectual, em um tempo em que poucas mulheres
sabiam ler e escrever”.

“Mulher em quem se fixaram as mais fortes, mais vivas, mais


enérgicas qualidades de uma matriarca. Era uma mulher simples e

169
magnífica esposa brasileira. Heróica nos gestos e na ação militar. A
força da ancestralidade do 1º século, o sentimento de brasilidade
sempre crescente, concentrou e plasmou nela a figura da matriarca
nem sempre compreendida diante do patriarcado vigente, sobretudo
da classe a que pertencia: a de senhora de engenho”.
Manuel Diégues Júnior, em Dona Ana Lins Matriarca,
Diário de Pernambuco, 26/08/1951.

Rosa da Fonseca: a mãe da República

Rosa Maria Paulina da Fonseca (1802-1873) é conhecida


nos meios militares como a patrona da família do Exército
Brasileiro, e por ser a mãe do proclamador da República, marechal
Deodoro da Fonseca. Ela nasceu na então Cidade de Alagoas,
capital da Província de mesmo nome, atual município de Marechal
Deodoro. Em 1824, casa-se com o major do Exército Imperial
Manoel Mendes da Fonseca, valoroso militar e monarquista
convicto. Mulher de caráter varonil, sempre o apoiou em suas
resoluções e o acompanhou, intimorata, nos transes da vida, até seu
falecimento, já reformado no posto de Tenente-Coronel, em 24 de
agosto de 1859. Dessa união nasceram dez filhos, sendo duas
mulheres, Emília e Amélia, e oito varões. Todos os homens
abraçaram a carreira das Armas, ocupando posições de destaque na
vida militar.

Filhos mortos em combate

170
Rosa da Fonseca perdeu grande parte de seus filhos no front
das guerras, quando sete de seus filhos seguiram para os campos de
batalha. Permaneceu junto a ela seu filho Pedro Paulino, tenente
reformado do Exército, literato e estatístico, futuro governador de
Alagoas e senador federal por esse Estado. Morreram os filhos
Afonso Aurélio; o capitão de Infantaria Hyppólito; o major de
Infantaria Eduardo Emiliano; ficaram feridos Hermes e o próprio
Deodoro, sendo que esse último recebera três ferimentos por tiros
de fuzil. Durante as comemorações pela vitória em Itororó, ao ser
informada da morte de Eduardo e da situação de Hermes e
Deodoro, teria dito: "Sei o que houve. Talvez até Deodoro esteja
morto, mas hoje é dia de gala pela vitória; amanhã, chorarei a
morte deles". Seu neto, o Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca,
foi o 8º Presidente da República, exercendo seu mandato entre
1910 e 1914. Ao instituir o dia 18 de setembro, data natalícia de
Rosa da Fonseca, a matriarca exemplar, como o Dia da Família
Militar, o Exército Brasileiro presta a devida homenagem à
família, na figura de Rosa da Fonseca, reconhecendo a importância
do espírito de sacrifício e de luta.

Tia Marcelina: o primeiro terreiro de xangô

Tia Marcelina contruiu o primeiro terreiro de Xangô


existente em Maceió, como lugar de congregação da identidade de
uma nação africana. Apesar da importância de Tia Marcelina para
o Xangô, não se pode atribuir a ela o título de maior representante
da cidade, devido a existência de outros importantes representantes

171
e fundadores de terreiros, como Chico Foguinho, pai Adolfo,
mestre Roque, Manoel Loló e outros.

“A perseguição e a discriminação aos negros em Alagoas


existiram desde a época do Quilombo dos Palmares, pois a ordem era
exterminar, eliminar, massacrar todos os Quilombolas. Em Alagoas,
uma das vítimas desta perseguição foi Tia Marcelina uma figura
semelhante à Mãe Menininha do Gantois. Tia Marcelina era uma ex-
escrava africana de Janga, Angola, era uma descendente do
Quilombo dos Palmares e de família real africana e, junto com
Manoel Gelejú, Mestre Roque, Mestre Aurélio e outros fundaram os
primeiros Xangôs do Brasil, no bairro de Bebedouro, em Maceió. Ela
tinha o saber, o carisma e a voz viva dos Orixás, sendo contemplada
com a coroa de Dadá, homenagem outorgada pelos oráculos do
continente africano, era o posto mais alto da hierarquia religiosa
africana no Brasil”.
Histórias não contadas de Tia Marcelina, texto de Edson
Moreira, um griot (contador de histórias), Coletivo AfroCaeté, 21
de julho de 2010

As versões da morte de Tia Marcelina


Informações colhidas do mestre Zumba, filho de dona
Hortência,que era a filha de Santo de Tia Marcelina, e que ouvia
muitas histórias dos antigos Babalorixás e da escravidão, revelam
como foi a morte de Tia Marcelina, para a qual existem duas
versões.

172
A primeira versão foi ao saber que ia ser visitada pela Liga
dos Republicanos Combatentes (organização que perseguia os
Xangôs em Alagoas e seus seguidores) com sede em Alagoas,
chefiada pelo sargento que não tinha uma das pernas e ex-
combatente da Guerra dos Canudos, Manoel Luiz da Paz, ela preferiu
atirar-se na cacimba existente no quintal de seu terreiro. A Segunda
Versão, contada por sua filha de Santo Hortência, foi que por não
aceitar submeter-se a aquelas humilhações, teria sido espancada e
morta com ferimentos de sabre na cabeça. Uma das causas da
perseguição religiosa das matrizes africanas em Maceió em 1912, foi
a divergência de duas facções políticas. Uma que frequentava e era
adepta dos terreiros e a outra não simpatizante. Esta última para
atingir seus opositores realizou o “Quebra”, como ficou conhecido
esta violência religiosa. O Quebra era a destruição dos terreiros de
Alagoa”.
Histórias não contadas de Tia Marcelina, texto de Edson
Moreira, um griot (contador de histórias), Coletivo AfroCaeté, 21
de julho de 2010

Acotirene: a conselheira de todos os palmarinos

A história de Acotirene exemplifica bem a visão mítica e, e


ao mesmo tempo real, dos Quilombos dos Palmares. Enquanto
mito era a conselheira de todos os palmarinos; como fato real, seu
nome é dado a um importante mocambo, instalado no litoral dos
estados de Pernambuco e Alagoas. Acotirene foi uma das primeiras
negra que habitou a Cerca Real dos Macacos, no topo da Serra da

173
Barriga, o primeiro povoado quilombola. Ela liderou e influenciou
os negros fugitivos que se chegavam e multiplicavam. Reinou
absoluta, até mesmo quando Ganga Zumba assumiu o poder. Era
consultada para tudo, de problemas familiares e decisões políticas
e militares. Outro mito criado é que, mesmo morta, aparecia aos
chefes quilombolas para orientá-los..

“Há indícios de que Acotirene e Aquatune eram lideranças


femininas em Palmares. Mas podiam haver outras. Como eram as
vidas das mulheres em Palmares? Mas não é difícil imaginar o
cotidiano de uma mulher no quilombo. De personagens como
Dandara e Acotirene pouco sabemos. A primeira teria sido uma
brava guerreira que teria acompanhado Zumbi logo após o
assassinato de Ganga Zumba em 1678. Já Acotirene teria sido uma
liderança feminina dos primeiros tempos de Palmares, influenciando
as lideranças posteriores como Zumbi e Ganga Zumba. Ao que
parece a mãe do rei de Palmares residia no quilombo denominado
Aqultune. Nunca é bom esquecer que Palmares era sociedade em
guerra permanente, portanto sua estrutura sócio-econômica era
igualmente militar. O desequilíbrio de sexos entre a população
escrava também evidenciou”.
Eduardo Oliveira, em Quem é quem na negritude brasileira,
Congresso Nacional Afro-Brasileiro, 2006

Nossa Senhora dos Prazeres, a padroeira de Maceió

174
Nossa Senhora dos Prazeres, também conhecida como NS
das Sete Alegrias, ganhou grande impulso em sua “adoração”,
segundo a Igreja Católica, depois de sua aparição no século XVI,
em Portugal. A disseminação de sua devoção é de origem
franciscana, isto porque os prazeres, ou alegrias de Nossa Senhora
foram escritos por um franciscano. São elas: A Anunciação, a
saudação de Isabel, o Nascimento de Jesus, a visitação dos Reis
Magos, o encontro com Jesus no Templo quando ele conversava
com os doutores da Lei, a aparição de Jesus Ressuscitado e a
coroação de Maria no céu.

Como padroeira de Maceió, o marco zero foi o dia 31 de


dezembro de 1859, quando após a benção da nova imagem da
padroeira – doada pelo Barão de Atalaia – foi inaugurada, com a
presença da Família Real, na Catedral Diocesana, antiga Matriz da
NS dos Prazeres, hoje Catedral Metropolitana, administrada pela
Arquidiocese de Maceió, completando 158 anos de história e
religiosidade”.
Ernani Méro, Igrejas de Maceió. Funted – 1987

A luta de Clara Charf Marighella

Filha de judeus russos de Odessa, Clara Charf nasceu em


Maceió, em 17 de julho de 1925, aos 25 se transformou em
militante política, aos 90 continua na luta, com participação em
organismos nacionais e internacionais em favor da mulher e dos
Direitos Humanos, que a consagrou como uma das maiores ativista

175
política do país. Em março de 2015, recebeu o prêmio Excelência
Mulher, do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo. Clara foi
presa pela ditadura militar, era mulher do inimigo número um dos
ditadores de plantão, Carlos Marighella (1911-1969), até seu
assassinato, em São Paulo, pela polícia comandada pelo delegado
Sérgio Paranhos Fleury. Vítima de perseguição, Clara partiu para o
exílio, em Cuba, e voltou em 1979, nas asas da Anistia. Filiou-se
ao PT, foi candidata a deputada estadual, mas não levou. Passou a
vida inteira no resgate da vida de Marighella –, em 1996 o Estado
brasileiro reconheceu os direitos dos mortos e desaparecidos.

“Aqui se inicia uma jornada de resgate da memória de


Marighella, ela também resgatará a história verdadeira de tantos
outros revolucionários que deram sua vida pelo povo e foram
enxovalhados pela ditadura”.
Declaração de Clara Charf em 1979, durante o traslado dos
ossos de Marighella para a Bahia, sua terra-natal, por Yara Falcón,
em Mulheres Alagoanas, suplemento da Gazeta Alagoas, em 2001.

Macabéa: a estrela alagoana de Clarice Lispector

Em seu último romance – A Hora da Estrela (1977) -,


Clarice Lispector encontrou o seu “espelho” na protagonista do
livro, a alagoana Macabéa, moça pobre de Maceió, onde os
Lispector se estabeleceram ao chegar ao Brasil, em 1920, fugidos
da 1ª Guerra Mundial. Foi em Maceió que a escritora e romancista
trocou seu nome original Chaya, por Clarice. O romance narra a

176
história da datilógrafa Macabéa, que migra para o Rio de Janeiro.
“É a história de uma moça que era tão pobre que só comia
cachorro-quente. Mas não é só isso. A história é sobre uma
inocência pisada, uma miséria anônima”, dizia Clarice em “A
última entrevista de Clarice”, por Júlio Lerner. Clarice projetou em
Macabéa seu próprio final trágico, quando alguns dias depois da
publicação do livro, faleceu, no Rio de Janeiro, de câncer no
ovário. “Macabéa reduzira-se a si. Também eu, de fracasso em
fracasso, me reduzi a mim, mas pelo menos quero encontrar o
mundo e seu Deus”.

“Como nordestina, há milhares de moças espalhadas por


cortiços, vagas de cama num quarto, atrás de balcões trabalhando
até a estafa. Não notam sequer que são facilmente substituíveis e que
tanto existiriam como não existiriam. Poucas se queixam e ao que se
saiba nenhuma reclama por não saber a quem. Esse quem será que
existe?”, trecho do livro A Hora da Estrela”, de Clarice Lispector
Clarice Lispector, em Clarice uma biografia, de Benjamim
Moser. Rio de Janeiro, Editora Cosac Naif, 2014

Clarice bem que tentou não matar Macabéa


No livro A Hora da Estrela, por mais que quisesse não
matar Macabéa – por páginas e mais páginas, Clarice retém o
destino da moça em suas mãos: “Por enquanto não passava de um
vago sentimento nos paralelepípedos sujos”. Mas ela termina
sendo vítima fatal de um atropelamento por um carro Mercedez
Benz amarelo, quando saía de uma cartomante. “Clarice converteu-

177
se na sua própria ficção. É o melhor epitáfio possível para
Clarice”, escreveu o jornalista Paulo Francis, na obra “Clarice:
impressões de uma mulher que lutou sozinha”.

“Ainda podia voltar atrás em retorno aos minutos passados e


recomeçar com alegria no ponto em que Macabéa estava na calçada
– mas não depende de mim dizer que o homem alourado estrangeiro a
olhasse. É que fui longe demais e já não posso retroceder”.
Clarice Lispector, em Clarice uma biografia, de Benjamim
Moser. Rio de Janeiro, Editora Cosac Naif, 2014

Selma Bandeira: militância na veia e no coração

Selma Bandeira (1944-1986), médica sanitarista e


deputada estadual (PMDB), sertaneja de Delmiro Gouveia, foi a
primeira presa política a ser beneficiada pela Anistia, depois de
um ano e três meses de prisão em Pernambuco, quando militava
pelo Partido Comunista Revolucionário (PCBR). Desde 1973 vivia
clandestinamente em consequência da perseguição política, em
Recife, onde foi presa, em 1978. Na prisão, foi submetida a
sessões de torturas. Eleita deputado estadual em 1982, tendo com
bandeira a luta pelo direito das mulheres, Selma Bandeira morreu
aos 49 anos,em 1986, em um acidente automobilístico, durante
sua campanha pela deputada federal.

178
Dicionário Mulheres de Alagoas ontem e hoje, obra de
Enaura Quixabeira e Edilma Acioli Bomfim, Edufal 2007, com
prefácio de Solange Chalita

Lily Lages, a 1ª mulher eleita em Alagoas

A médica alagoana Maria José Salgado Lages (1907-2003),


Lily Lages, foi a primeira parlamentar a ser eleita pelo voto dos
alagoanos, em 1934. Lily foi uma destemida deputada, e participou
ativamente na redação da Constituinte Estadual. Emplacou leis
importantes de proteção à mulher e à criança, como a destinação de
7% dos cofres do Estado para a Saúde Pública, e mais 3% para
aplicação no amparo à maternidade e à infância. Foi fundadora da
Federação Alagoana pelo Progresso das Mulheres, a primeira a ser
reconhecida por um governo, em 1993, como de utilidade púbica.
Foi médica otorrinolaringologista - rodou o mundo para se
especializar – e professora da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, onde morou até a sua morte. Quando da sua formatura, era
conhecida como “gata angorá”, inspirado pelos seus olhos verdes.
Em uma entrevista ao Jornal do Brasil, do Rio, quando foi
premiada pela líder feminista Bertha Lutz, em 1933, por seu
trabalho em Alagoas, ela resumiu suas ações:

“Tenho segurança de que a mulher triunfará sempre e que


resume uma força estupenda de ação, com o direito, portanto, de
interferir mais assídua e intimamente no trabalho de reorganização
de nossas leis e códigos, reparando a injustiça dos homens e

179
defendendo os princípios fundamentais da imprescindível e urgente
renovação social”.
Lily Lages, em Memórias Legislativas, revista da
Assembléia Legislativa Alagoana nº 18, organizada por Solange
Chalita.

Linda, a primeira dama do teatro alagoano

Lindinaura Vieira Mascarenhas, a teatróloga e atriz


alagoana Linda Mascarenhas (1895-1991), apresentou-se pela
primeira vez em um palco em 1956, então com 61 anos, quando
recebeu o prêmio de melhor atriz, na peça Mulheres Feias, de
Achille Saita. Eleita a primeira dama do teatro alagoano fundou a
Associação Teatral de Alagoas, a ATA, em 1955, onde fez escola e
reuniu o melhor das artes cênicas de Alagoas, no núcleo formador
da ATA, entre os atores da geração de Linda, e que hoje lutam para
manter em cena o teatro de Alagoas estão Homero Cavalcante,
Sávio de Almeida, Ronaldo de Andrade, Beatriz de Sá Brandão
(Tisinha), José Marcio Passos, José Correia da Graça, Dário
Bernardes, Lauro Gomes, Octávio Cabral Linda atuou em diversas
montagens, ganhando um prêmio pelo papel na peça Dona Xêpa,
de Pedro Bloch, com a qual percorreu várias capitais nordestinas.
O atual presidente da ATA, Ronaldo de Andrade, em seu livro “O
teatro e Linda Mascarenhas” conta que conviveu com Linda
quando a conheceu (ela já aos 76 anos) e explica como foi essa
transição de carreira até chegar ao teatro.

180
"Durante toda a vida ela participou de eventos, espetáculos,
saraus e declamando poesias, que era uma prática muito comum no
início do século 20 e 30. Mas foi só em 1952, quando Luiz Gutemberg
e Noémia Ambrósio, dois estudantes de Juazeiro, convidam Linda
para dirigir um espetáculo. A partir desse novo momento ela se
mantém no teatro, como se fosse destino, e aí surge o desejo de se
tornar atriz. Sua estreia como atriz no teatro aconteceu aos 61 anos,
em 1956, quando interpretou “Lizaveta”, na peça “O Idiota”, de Léo
Vital, baseada no romance homônimo de Dostoievski, com direção de
Heldon Barroso”.
Do livro O Teatro e Linda Mascarenhas, de Ronaldo de
Andrade e Izabel Brandão (orgs), Edufal, 2011

Na luta pelos direitos femininos


Linda foi também, e principalmente, uma militante em
defesa dos direitos das mulheres. Junto com a deputada e médica
alagoana, Lily Lages, ajudou a criar a Federação Alagoana pelo
Progresso Feminino (FAPPF). A instituição, de cunho feminista,
lutava pelos direitos civis das mulheres, como o voto. Foi a
primeira vez que mulheres se reuniram para uma prática de luta
pela defesa e progresso da mulher em Maceió. Na FAPPF, Linda
Mascarenha, praticou o “feminismo possível”, como chama
Ronaldo de Andrade em seu livro.

“Era o que ela podia fazer dentro das limitações políticas e


ideológicas do período em que viveu. Ela defendia uma melhor

181
educação para as mulheres para que elas pudessem ter sua
independência. Para isso, ela criou em sua própria casa uma escola
para domésticas com o nobre objetivo de alfabetizá-las. Também
organizava palestras cujos temas versavam sobre os direitos das
mulheres”.

Do livro O Teatro e Linda Mascarenhas, de Ronaldo de


Andrade e Izabel Brandão (orgs), Edufal, 2011

Joana Gajuru, o mando feminino no Guerreiro

Maria Joana da Conceição (1866-1986), Joana Gajuru


nasceu na cidade alagoana de Lagoa da Canoa. A data é
imprecisa porque naquela época não se usava o registro em
cartório das meninas negras nascidas no engenho. Mesmo assim
Joana foi batizada na Igreja e depois ganhou o apelido de
"gajuru", dado a todos os negros nascidos por lá. Joana Gajuru
começou a dançar o Guerreiro, segundo ela própria, quando tinha
apenas 15 anos. Naquela época a festa era feita e protagonizada
apenas por homens. Joana nem quis saber: logo rompeu a
tradição e passou a organizar, ela própria, a sua festa do
Guerreiro. Depois disso não parou mais e, durante 70 anos, Joana
Gajuru levou sua festa por todo o estado de Alagoas, começando
na noite de Natal, passando pelo Dia de Reis e se estendendo
durante os meses de janeiro e fevereiro. Gajuru conseguiu viver
mais de 120 anos. As poucas fotografias suas que restam são de
uma das últimas festas que promoveu, mas quando já estava bem

182
velhinha e com a saúde abalada. Mesmo assim Joana Gajuru
dançou seu Guerreiro, fumou seu cigarro de corda e bebeu sua
cachacinha. Morreu, gloriosa, no ano de 1986. Fonte: Portal dos
Amigos Associados de Lagoa da Canoa

Os filhos de Joana Gajuru


A guerreira Gajuru não está mais no plano presente, mas sua
imagem forte e sua vida de heroína da cultura alagoana, deixou
plantada suas sementes na Associação Teatral Joana Gajuru, com
22 anos de fundação, e que foi o primeiro grupo de teatro de rua de
Alagoas. O Joana Gajuru se notabilizou no Estado e no Brasil por
seu trabalho, ligado sempre à pesquisa e aos estudos do fazer
teatral na rua e também no palco, e ao uso em suas montagens das
culturas populares nordestina e brasileira. Esse trabalho está
presente em A Farinhada, espetáculo com mais de 20 prêmios e
que marcou o teatro alagoano; Uma Canção de Guerreiro no
Chumbrego da Orgia, espetáculo de rua que marcou a estreia do
grupo, Baldroca, Versos de um Lambe Sola, Fome Come, A
Estória da Moça Preguiçosa, Severino Gajuru, entre outros. O
Joana Gajuru surgiu a partir de uma oficina de teatro de rua
ministrada pelo grupo Imbuaça-SE, em 1994, em Maceió. No
grupo pioneiro estão os atores: Abides de Oliveira, Aílton Protásio,
Diva Gonçalves, Jairo Bezerra, Jorge Adriani, Regis de Souza,
Vlademir Dantas e Tereza Gonzaga.

Jarede Viana: humanista e revolcionária

183
Jarede Viana de Oliveira (1938-2008) foi militante do
movimento estudantil, lutou contra a ditadura e pela anistia. Foi
Vereadora em Maceió pelo MDB e pelo PC do B, partido no qual
militou até o início dos anos 90. Militante da Educação, foi
fundadora do Sindicato dos Trabalhadores pela Educação (Sinteal).
Como militante feminista, era coordenadora da Marcha Mundial
das Mulheres em Alagoas. Quando morreu, Jarede lutava contra
um câncer há dois anos e meio e ainda estava ativa na militância.
Jarede nasceu em um lar com duas fortes influências – o
cristianismo de sua mãe evangélica e o socialismo de seu pai
comunista. Criada na ética do trabalho, adquiriu fortes princípios
que viveu e testemunhou. Logo após a sua morte, o movimento
Marcha Mundial das Mulheres publicou uma mensagem
emocionante para sua mais nobre integrante.

“Sua forma de viver e ver o mundo a levava a estar e


ocupar todos os espaços que julgava importante para construir a
boa luta. Assim ela construiu sua vida pública sempre atenta e
indignada com as desigualdades e injustiças sociais. Assim, estava
sempre à frente das lutas anti-imperialista no seu estado e na
construção do feminismo como luta política das mulheres. Com
ela, em nossa convivência na militância feminista, aprendemos a
arte de olhar para frente e “saber viver”. Ela acreditava que era
possível mudar o mundo e a vida das mulheres. O seu descanso
causa ao movimento feminista, a MMM uma lacuna sem
precedentes, sentiremos sua falta e estamos tristes. Mas somos

184
mais fortes e aguerridas por termos tido ela como companheira de
luta e de sonhos”.

Ceci Cunha: vocação para servir ao povo

Josefa Santos Cunha (1949-1998), médica, vereadora e


deputada federal, nasceu em Feira Grande, no agreste alagoano,
mas fez sua carreira política e profissional na vizinha Arapiraca.
Ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
Alagoas e fez residência médica no Hospital no Hospital Souza
Aguiar, no Rio de Janeiro, assumindo a obstetrícia como ramo da
medicina a realizá-la profissionalmente. Iniciou suas atividades
profissionais na Casa de Saúde Neves Pinto, em Maceió, e, logo
em seguida retornou para Arapiraca onde, durante mais de 20 anos,
exerceu a medicina com extrema dedicação e muito amor, tendo
realizado milhares de partos. Talhada para servir à comunidade,
em 1988 foi convocada para participar do processo eleitoral, tendo
sido eleita vereadora pelo PSDB, com a maior votação obtida entre
os concorrentes. Em 1989 participou ativamente da campanha de
Mário Covas à Presidência da República. Em 1994, é eleita
deputada pelo PSDB. Em 1998 foi reeleita deputada federal, com
consagradora votação, representada por 55 mil (quase o dobro da
votação da eleição de 1994). Leia também o verbete: Ceci Cunha:
a cerimônia do adeus.

Vera Arruda: a conquista do mundo fashion

185
A estilista alagoana Vera Arruda (1966-2004) nasceu em
Palmeira dos Índios. Em 1986, aos 20 anos, foi eleita Miss
Alagoas, chegando a participar do concurso Miss Brasil do mesmo
ano. Sua vida como artista e design de moda iniciou-se fazendo
bijuterias, que vendia para amigas, em um cômodo de seu
apartamento o ateliê dos seus trabalhos. Desde criança, gostava de
desenhar suas próprias roupas, talento que herdou de sua avó, e
contratava costureiras para executá-las. Em 1997 mudou-se para
São Paulo em busca de novos horizontes. Em 1998, resolveu
participar do Phytoervas Fashion Awards, evento que daria origem
ao São Paulo Fashion Week. Não deu outra, foi escolhida a melhor
estilista do evento. Logo em seguida foi convidada para estudar no
Studio Berçot, em Paris, e começou a desenvolver acessórios para
grifes como Ellus e Rosa Chá e roupas para socialites, tendo como
a maior incentivadora Adriana Galisteu. Nos últimos anos, fez
figurinos para artistas como Ivete Sangalo, Astrid Fontenelle,
Margareth Menezes, Xuxa. Nos anos 90, foi a primeira estilista a
resgatar o nacionalismo criando um vestido de franjas com a
Bandeira do Brasil. Seu nome está imortalizado em Maceió, que
reconheceu o seu talento e criou no bairro Stella Maris, um
corredor cultural com seu nome, numa imensa praça, onde são
expostos permanentemente a história de alagoanos ilustres e ícones
da cultura local.

“No final dos anos 1990, boa parte das grandes marcas
seguiam os padrões minimalistas, geométricos e com modelos
andróginos para tentar se adequar ao mercado internacional. Vera

186
Arruda seguiu na contramão e sacudiu o mercado ao apresentar
peças que resgatavam as cores, a exuberância e a feminilidade da
mulher brasileira”.
Por Aline Amaral, jornalista e produtora de moda Alina
Amaral, no portal TNH, Agenda “a”, 31 de julho de 2014

Peró Andrade e seu circo social

Peronilda Batista de Andrade, a Peró, é uma alagoana


arretada. Com toda simplicidade de sua alma e de seu semblante,
ela tem uma trajetória espetacular, no sentido literal da palavra.
Seu palco é o circo, o picadeiro, onde já formou centenas de
meninos e meninas na arte circense, tirando-as da rua, do lixo, da
violência, das drogas. Produtora e diretora teatral, Peró começou
no teatro quando ainda era bem jovem. Hoje, com 65 anos, Peró
orgulha-se, com razão e reconhecimento, de ser a criadora do
projeto social “Sua Majestade, o Circo”, com o apoio do grupo
canadense Cirque du Soleil, que leva espetáculos para o mundo
todo.

Sua Majestade o Circo: A construção da cidadania


O Circo da Peró não trabalha apenas com arte circense, mas
com teatro, dança, música e canto, além de realizar diversas
atividades educativas, como o Picadeiro da Leitura e o Picadeiro
da Matemática. O objetivo é possibilitar a construção da cidadania
e o resgate da cultura circense no Brasil. O projeto é ligado à Rede
Circo do Mundo Brasil, que integra o projeto social do Cirque du

187
Soleil. Comandado por Peró de Andrade, o projeto reúne 179
crianças, adolescentes e jovens carentes, na faixa etária de 5 a 26
anos, sendo 90% delas da comunidade da Vila Emater II, favela do
lixão de Maceió.

“Eu comecei com circo profissional, mas depois da primeira


experiência acabei me apaixonando pelo circo social. É muito bom
poder ver meus alunos trabalhando em empresas e serem elogiados
por seu comportamento, pelo diferencial que cada um possui como
pessoa humana. nunca me senti obrigada a formar artistas – por se
tratar de uma escolha individual -, mas sempre me senti responsável
pela formação das crianças enquanto cidadãs”.

Entrevista a Elayne Pontual, na Revista Graciliano, agosto


de 2012

Major Elza: no front da 2ª Guerra Mundial

A major Elza Cansanção Medeiros (1921-2009) foi uma


militar brasileira, uma das primeiras oficiais-enfermeiras do
Exército, sendo a mulher mais condecorada por serviços na guerra
(mais de 40 honrarias). Filha de pais alagoanos - Aristhéa
Cansanção e do médico alagoano sanitarista Tadeu de Araújo
Medeiros - amigo de Alberto Santos Dumont e auxiliar direto de

188
Oswaldo Cruz na campanha contra a febre amarela. Major Elza foi
a primeira brasileira a se apresentar como voluntária, na Diretoria
de Saúde do Exército, para lutar na Segunda Guerra Mundial, aos
dezenove anos. Embora sonhasse em lutar na linha de frente, teve
que se conformar em seguir como uma das setenta e três
enfermeiras da Força Expedicionária Brasileira (FEB), uma vez
que o Exército Brasileiro, à época, não aceitava mulheres
combatentes. Sua atuação na 2ª Guerra Mundial começou em
Alagoas, prestando socorro aos náufragos do navio Itapagé,
torpedeado na costa brasileira pelo submarino alemão U-161.
Também enveredou pela música, teatro e jornalismo. Natural do
Rio de Janeiro, carioca do bairro de Copacabana, aprendeu música
e idiomas. Por indicação de Arnon de Mello, ingressou na
Associação Brasileira de Imprensa. Estreou, com Fernando Torres,
Nathália Timberg e Sérgio Brito no Teatro Universitário, com a
peça Dama da Madrugada. Formou-se em Jornalismo pela
Faculdade Nacional de Filosofia.

Major tem sangue de heroína alagoana


Todo seu destemor tem uma explicação genealógica. Major
Elza era descendente em quarta geração de dona Ana Lins de
Vasconcelos, mãe do Visconde de Sinimbu. Ana Lins foi o último
baluarte da Revolução Nacionalista de 1824. "Lutou até o último
dedal de pólvora e foi presa, levada a pé até a cidade de Alagoas
(hoje, Marechal Deodoro). Por toda parte em que ela passava,

189
levantava o povo, de modo que ficou pouco tempo presa. A única
benesse que pediu foi a de ficar com o filho, que veio a ser o
Visconde de Sinimbu, Primeiro Ministro do Império, ocupando
todas as pastas, exceto a da Marinha", dizia, orgulhosa, a Major
Elza. Foi membro da Academia Alagoana de Cultura, quando se
dedicou à preservação da memória fotográfica da FEB. Sempre
que falava sobre sua carreira, ela não deixava de lembrar seu
vínculo com Alagoas, a ponto de dizer que gostaria que, quando
morresse, metade de suas cinzas ficasse no Rio e a outra metade
viesse para Maceió. E como era a vida de enfermeira de guerra no
front?

“O ferido não tem posto nem nacionalidade. Quem tem


prioridade é a doença. Eu fui lutar contra os alemães, mas a saúde do
ser humano é outra coisa. Na verdade, os alemães eram os feridos
mais obedientes e mais tranquilos que nós tínhamos. Porque eles
estão acostumados a obedecer. Para exemplificar, naquela época o
remédio principal era, além da penicilina, a sulfa. Então a primeira
dose de sulfa a se dar são oito gramas, portanto, dezesseis
comprimidos de sulfa e trinta e dois de bicarbonato, que o
desgraçado precisava tomar de uma vez só. O brasileiro sempre
reclamava, o alemão não. Você entregava o monte de comprimidos,
ele arregalava os olhos, pegava a caneca de líquido, enchia a boca e
engolia tudo de uma vez”.

Capitão Olímpia: nossa Ana Nery

190
A alagoana Olímpia de Araújo Camerino, nascida nos
primeiros anos do século XX, em 1906, era capitão enfermeira e
chegou a escrever o livro A Mulher Brasileira na Segunda Guerra
Mundial. Aos 38 anos, comandou um grupo de 67 enfermeiras que
voluntariamente se apresentaram para acompanhar os nossos
combatentes da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e do 1º
Grupo de Caça, no front da guerra, na Itália.

“A capitão Olímpia foi sempre considerada a líder das


enfermeiras, por suas qualidades excepcionais de bondade, bom
senso e equilíbrio, a par de seus dotes de competência profissional. A
ela todos recorriam nas horas de dúvidas, de incerteza e de conselho.
Além dos serviços inestimáveis que prestou na guerra e na paz, em
longa carreira de enfermeira militar, a capitão Olímpia aparece
agora nos brindando com com o livro que estava faltando, relatando,
com dados estatísticos e testemunhos valiosos, o que foi a
organização do “Quadro de Enfermeiras” para servir na Segunda
Guerra Mundial, como essas enfermeiras, todas voluntárias, se
prepararam para a missão e como a cumpriram nos campos de
batalha na Itália. Esta enfermeira alagoana da Segunda Guerra
Mundial renova em nós valores morais e de bravura de nossa gente,
demonstrados nas horas difíceis de conflitos bélicos inevitáveis”.
Carlos de Meira Matos, general do Exército, R1, consulta ao
portal da FEB, em 27/08/2017

Relatos de uma guerra

191
No seu livro, Olímpia Camerino conta aspectos do que foi a
adaptação do grupo de enfermeiras em meio a um campo minado
de guerra, em hospitais norte americanos. Ela fala da rotina do
trabalho nesses hospitais, as horas incansáveis de vigília, atenção e
cuidados com os pracinhas hospitalizados, a extraordinária força
moral necessária para assistir à chegada de nossos feridos do front
– cabeças dilaceradas, pulmões perfurados, intestinos expostos,
pés, pernas e braços arrancados e a dependência a elas de muitos
desses pracinhas carentes de olhos e membros, exigindo-lhes muito
mais que o serviço de enfermagem. No livro da capitão pode-se ler
um precioso depoimento extremamente útil aos estudiosos de
nossa história militar e aos pesquisadores de psicologia e
sociologia, por oferecer precioso manancial de observações sobre o
caráter do brasileiro. Na apresentação do livro, a heroína de guerra
alagoana fala com saudades de sua terra.

Meu uniforme

Como me orgulho de ti!


Dize-me se te honrei e onde guardar-te.
As medalhas do Brasil
A Coroa Dourada do 5º Exército Americano
Que trazes em ti, são a prova de que te honrei.
O lugar onde te guardei,
no Museu da minha terra,
Alagoas, que é a Terra de Rosa da Fonseca, é bem um altar.

192
Por Olímpia Camerino, capitão enfermeira do Exército
Brasileiro, em trecho extraído do livro A Mulher Brasileira na
Segunda Guerra Mundial, Capemi Editora e Gráfica, 1983

Lucy Brandão. A musa da contracultura

Nos anos 1980 uma animada troupe dominava Maceió, o


mundo undergrown aflorava nos bares e espaços urbanos da
cidade, e a deusa Maria Lucy Brandão Maia Gomes (1961-2000)
era a que mais brilhava, com suas performances e poesias, sua
loucura lírica, sua estética própria, sua vanguarda literária e sua
verve libertária. Maceió era um território avançado, encontro dos
enfants terribles da mocidade alegre de uma Maceió, ainda
suburbana, para aquela turma do barulho, dos grandes encontros,
da liberdade de fazer o que bem entendesse, seja para o bem seja
para o mal. De um lado, estavam a burguesia e a oligarquia
alagoanas, que lotavam ambientes chiques do Fornace, da boate
Middô e do Gstaad - nome de uma estação de esqui nos alpes
suíços. Do outro lado da avenida, com Lucy Brandão e a turma, a
paz reinava entre a moçada de cabeça boa, no circuito dos bares
alternativos, com música ao vivo e eletrônica. As noites eram
incríveis, na chamada quadra da alegria: o Cheiro Verde, de João e
da Iara - que servia aquele caldo verde gostoso e quentinho de final
de noite; o Trupizupe, do Paulinho Boca de Cantor, um bar
dançante -, ambos na rua Jangadeiros Alagoanos; tinha o Brilho da
Cidade, como Lily e Claudinha. Na Praça dos Sete Coqueiros
ficava o Salva Vidas, de Vevéu e Sandrinha, com música new

193
wave e muito rock; e o Sargento Pimenta, do Leto e da Galega. Foi
um tempo bom, de muita curtição e com Lucy Brandão no coração.
Vale a pena ler esta poesia, publicada em seu santinho, distribuído
em sua fuga para o céu, aos 39 anos, novinha.

Íris Alagoana

Pinta o mundo com o pincel do amor, do perdão.


Pinta o coração com o marrom dos mangues.
Com o nosso sangue guerreiro das Alagoas,
e das mães parideiras, nas veias de nossas lagoas.

Chão vermelho, céu azul, mares verdes e degradés


Espelhos de guerreiro e reisado vamos colorir de esperança
Nossas crianças, nossas crenças, nossas festanças
Na ótica de minhas íris, na mina dos olhos de sol
Dos meus sonhos brejeiros da beirada
De Mundaú e Manguaba.

Índia Graciliana desafia deputado

Filha do cacique xukuru-kariri Manoel Selestino da Silva e


Maria de Lourdes Gomes da Silva, Graciliana Selestino Gomes da
Silva, é uma líder indígena, e nasceu em Palmeira dos Índios.
Presidente do Comitê Intertribal de Mulheres Indígenas, Graciliana

194
Celestino, ela representa sua tribo de forma incontestável. Em
2003, Graciliana foi manchete nos jornais ao repercutir uma
notícia de um deputado que que insinuou “que Palmeira não é mais
dos Índios”. Graciliana tomou um susto com a idéia do deputado
Gervásio Raimundo (PTB), e ficou estarrecida com o argumento
do político. “Palmeira não é mais dos índios, porque eles não
existem mais. Palmeira hoje é uma terra dos empresários que
fazem o progresso da região (sic)”, afirmava Gervásio, em
pronunciamento na tribuna de Assembléia Legislativa, na defesa
de seu projeto de lei de tirar o aposto “dos Índios” do nome da
cidade de Palmeira, terra secular dos xucurus, da tribo de
Graciliana. Ela rasgou o verbo:

“É uma afirmação muito grave de uma pessoa sem cultura,


é um desrespeito aos nossos povos. Ninguém vai nos tirar o direito
de ficar na nossa terra. Não tenho outra palavra a não ser dizer
que o desequilíbrio é o pior do sentimento humano. Pena que os
alagoanos elegeram um cidadão desta natureza. E não é só ele,
tem deputado que a gente quer ver longe. Eles vão ver o que é
bom nas próximas eleições, quando não terão voto de ninguém. A
terra é nossa e de nossos ancestrais, e não vai ter deputado
nenhum que vá tirar a gente de lá, nem trocar nome de nada”.

195
TERRA DO CANGAÇO

Lampião foi tropeiro de Delmiro Gouveia

Por volta de 1916, então com 22 anos, Virgulino Ferreira da


Silva, o Lampião (Serra Talhada - PE, 1896 – Poço Redondo -
SE)- 1938), estava em Delmiro Gouveia, sertão de Alagoas. Ele

196
trabalhava para o fazendeiro e dono da Fábrica da Pedra (antigo
nome da cidade), o emergente industrial Delmiro Gouveia, como
tropeiro, transportando algodão e couro de bode. Quando soube do
assassinato do chefe por pistoleiros contratados pelos concorrentes
estrangeiros no setor têxtil, Lampião teria sido empurrado para o
cangaço. Quem conta a história é o cantor e compositor alagoano
José Luiz Calazans, o Jararaca (autor da famosa marcha Mamãe eu
quero mamar), em uma entrevista histórica ao jornalista Wilson
Reis (já falecido), publicada no jornal carioca Última Hora, em
1977. Ele conta que já era um conhecido seresteiro e cantor e
sempre era convidado para animar as festas nos salões da casa de
Delmiro, na Pedra.

“Nessa época conheci o Virgulino, era um jovem como outro


qualquer, pacato e trabalhador, que gostava de versejar e dedilhar
sua viola, entoando cantigas da época. Ele servia na fazenda de
Delmiro como tropeiro, tinha verdadeira adoração pelo patrão.
Quando soube de sua morte foi ao porão da fazenda, junto com
outros empregados, abriu umas caixas retirou rifles e munição e
partiu em busca dos criminosos. Seu nome só viria a ser falado
depois.”
Cabeças Cortadas são exibidas em Piranhas

Partiu de Alagoas o ataque final ao bando de Lampião. Na


madrugada do dia 28 de julho de 1938, no final de uma trilha de
caatinga seca e arbustos, na grota de Angico, em Poço Redondo
(SE), irrompeu o tiroteio entre as tropas volantes da polícia

197
alagoana, comandada pelo tenente João Bezerra da Silva, em que
morreram Lampião, Maria Bonita, Enedina, Luiz Pedro,
Mergulhão, outros seis cangaceiros. O governador de Alagoas,
Osman Loureiro, logo mandou exibir as cabeças cortadas nas
escadarias da prefeitura de Piranhas (AL).

“Tem fim, desse modo, o principal grupo cangaceiro que


ensanguentava o Nordeste. Nos anos e décadas seguintes, o cangaço
entra em moda: José Lins do Rego publica o romance O Cangaceiro;
Raquel de Queiróz, a peça teatral Lampião; Lima Barreto roda o
filme “O Cangaceiro”, e Rui Facó publica um ensaio de glorificação
da rebeldia sertaneja.”
Darcy Ribeiro, em Aos Trancos e Barrancos – como o
Brasil deu no que deu – Editora Guanabara – 1985.

Chuva de balas em Angicos: a morte de Lampião

No riacho da Forquilha, gruta de Angicos, em Poço


Redondo, Sergipe, em 28 de julho de 1938, Virgulino Ferreira da
Silva, o Lampião, ao lado da mulher, Maria Gomes de Oliveira, a
Maria Bonita, e mais 10 cangaceiros, foram emboscados e mortos
pela polícia de Alagoas. Eram cinco horas da manhã, quando uma
volante comandada pelo tenente João Bezerra, juntamente com o
sargento Aniceto Rodrigues e sua tropa, surpreenderam Virgulino
e seu bando com uma chuva de balas de revólveres, fuzis e até
metralhadoras portáteis. Lampião, protagonista do cangaço,
fenômeno social brasileiro nos anos 1930, tinha então 40 anos,

198
quando escolheu Angicos como esconderijo inexpugnável, cercado
de pedras pontiagudas, cactus gigantes, umburanas e uma
vegetação fechada da caatinga, às margens do rio São Francisco.

O que aconteceu depois da degola


Depois da decapitação, historiadores apontam para uma
verdadeira caça ao tesouro dos cangaceiros, desde as joias,
dinheiro, perfumes importados – Lampião usava o francês Fleur d
´Amour - tudo mais que tinha valor foi alvo da rapinagem
promovida pela polícia. Piranhas e Delmiro Gouveia são as cidades
do Baixo São Francisco alagoano mais importante para o Cangaço,
junto com Serra Talhada (PE) – onde nasceu Lampião, Jeremoabo
(BA), Uauá (BA), Floresta (PE), Poço Redondo (SE), Porto da
Folha (SE) e Glória (BA). Foram locais onde funcionaram as sedes
das volantes ou das passagens de Lampião. Pelo lado político, o
cerco a Angicos se deu sob pressão, tendo como alvo, o presidente
Getúlio Vargas, que sofria sérios ataques dos adversários por
permitir a existência de Lampião. O interventor de Alagoas,
Osman Loureiro, levou a pressão a sério e promoveu uma caça
implacável a Lampião, adotando providências para acabar com o
cangaço. Ele prometeu promover ao posto imediato da hierarquia o
militar que trouxesse a cabeça de Lampião ou alguém de seu
bando. Hoje, a grota de Angicos se transformou em uma trilha de
aventuras, por caminhos íngremes, até o local exato da chacina,
onde uma grande cruz de madeira está fincada nas pedras, com os
nomes de todos os cangaceiros mortos. O Museu do Sertão, em

199
Piranhas, mostra o cotidiano do sertanejo, artigos de uso dos
vaqueiros e fotografias históricas sobre o ciclo do cangaço.

Soldado Josias juntou as cabeças

Aos 18 anos de idade ele ingressou na Polícia Militar de


Alagoas como soldado para combater os cangaceiros que agitavam
no sertão do Estado. Em 2005, aos 85 anos, era uma das últimas
testemunhas vivas de uma época de subversão no sertão
nordestino, com a atuação de bandos de cangaceiros e salteadores.
Coube-lhe a missão que ele ainda hoje, 67 anos depois, recorda
com náuseas: foi ele quem juntou as 11 cabeças dos cangaceiros
mortos, entre eles Lampião, Maria Bonita e Luiz Pedro, para a
fotografia. Mas, quando lhe perguntam se identificou entre os
cangaceiros mortos o líder famoso e a sua mulher, Josias é
cauteloso: “Eu nunca vi Lampião nem Maria Bonita, mas quem os
conheciam garante que eram eles mesmo. E eu tenho de acreditar”,
sustenta.

“Quando Lampião foi morto, na manhã do dia 28 de julho de


1938, Josias recorda que todos os cuidados tinham sido adotados
para surpreender o cangaceiro. Por exemplo: o trem chegou à
Estação de Piranhas sem apitar – foi a primeira vez que isso
aconteceu. E o telegrafista da Rede Ferroviária ( Valdemar
Damasceno, avô do desembargador Washington Luis e dos prefeitos
Inácio Loiola, de Piranhas, e Xepa, de Olho D´Agua do Casado),

200
passou o seguinte telegrama cifrado: “Tenente Bezerra, tem boi no
pasto”. O tenente Bezerra estava em Delmiro Gouveia.
Por Roberto Vilanova, no portal Alagoas 24 horas, em
11/10/2005

Ataque ao casarão da baronesa

Há exatos 95 anos, em junho de 1922, o cangaceiro


Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, entrava na vila de Água
Branca, em Alagoas, assaltando e levando grande quantia de
dinheiro do casarão e joias da baronesa de Água Branca, Joana
Vieira Sandes, viúva do barão Joaquim Antônio de Siqueira
Torres, que teve de seu primeiro casamento o Cônego Torres, o
padre que havia batizado o menino Virgulino quando estava na
titularidade de vigário de Serra Talhada (PE). Cerca de um ano
depois da morte dos pais, Lampião esqueceu a jura de vingança
que tinha feito e voltou a região de Alagoas para fazer um saque a
maior vila da região. Pertencente ao bando de Sinhô Pereira e Luiz
Padre, o cangaceiro se juntou aos irmãos e companheiros da vida
de crime e andou pela região em busca de dinheiro para manter
armando seu bando. Para isso, mandou bilhetes aos principais
fazendeiros da região pedindo ajuda em dinheiro para comprar
munição, porém, em um desses bilhetes que chegou ao
consentimento da baronesa, a mesma mandou uma resposta para o
portador que tinha dinheiro, mais era pra comprar de bala para seus
jagunços “arrancar a cabeça dos bandidos”. Depois do cerco ao
pelotão policial do local, com todos rendidos, Lampião e seu bando

201
invadiram o casarão da baronesa. Enquanto a polícia era rendida,
outra parte do grupo já havia entrado na cidade e agia no saque ao
casarão da Baronesa de Água Branca. Irreverente, Lampião foi até
ela e, fitando-a com severidade, soltou o vozeirão:

“Então, senhora Baronesa, vai arrancar-me a cabeça agora?.


Venha, vamos dá uma volta pela cidade para que vosmecê e todos
daqui saibam que com Virgulino não se brinca nem se manda recado
desaforado”.

Água Branca: O diabo é alagoano na terra do sol

Mas o cangaço não tinha acabado. Durante a chacina de


Angico, Corisco e sua mulher Dadá se encontravam bem longe
dali. Cristino Gomes da Silva, o Corisco, lugar-tenente de
Lampião, alagoano de Água Branca, alto sertão alagoano, cinco
dias depois vingou a morte do chefe e matou toda a família do
“coiteiro” que entregou o grupo. Com o passar dos anos, ficou belo
como um galã de cinema: possuía boa estatura, ombros largos, pele
alva e cabelos louros e longos. No dia 5 de maio de 1940, por fim,
na região de Brotas de Macaúbas, na Bahia, uma volante cercou o
que restou do grupo de Corisco, e o matou com uma rajada de
metralhadora. Em 1964, Glauber Rocha lança o filme que marcou
o Cinema Novo, Deus e o Diabo na Terra do Sol, tendo Corisco
como protagonista, vivido pelo ator Othon Bastos, que travou o
inesquecível duelo com Antônio das Mortes.

202
“Se entrega, Corisco!
Eu não me entrego, não,
Eu não sou passarinho,
Prá viver lá na prisão.

Se entrega, Corisco!
Eu não me entrego, não,
Não me entrego ao tenente,
Não me entrego ao capitão,
Eu me entrego só na morte,
De parabelum na mão!”

Música de Sérgio Ricardo

TERRA DE VILÕES

Domingos Jorge Velho: O carrasco de Zumbi

203
No século XVII, prevalecia no Brasil as expedições de
bandeirantes para conquistar territórios indígenas que ainda não
haviam sido tomados pelos colonizadores portugueses. Na segunda
metade deste século, Domingos Jorge Velho seria o bandeirante
que mais se destacaria nesta função. Natural da cidade de Vila de
Parnaíba (SP), ele nasceu em 1641, 50 anos mais tarde já era
conhecido como um fervoroso caçador de índios, e de negros.
Documento publicado no livro República dos Palmares, do
historiador Décio Freitas (Edufal, 2004, pag. 118), mostra como
foi o acordo entre o “mercenário” Domingos Jorge Velho, com o
apoio do Exército Português e de empresários escravagistas, para
entrar na guerra genocida e racial. O documento mostra o contrato
celebrado entre a coroa portuguesa, por meio do governador de
Pernambuco, João da Cunha Souto Maior, e o paulista Domingos
Jorge Velho, para a destruição de Palmares. Entre as condições
estavam:

“Que depois de extinguir os ditos negros senão poderá servir


deles nestas Capitanias e será ele Domingos Jorge a mandar por
nesta praça do Recife todas as presas, para dali as mandar vender ao
Rio de Janeiro e Buenos Aires. O governador lhe disporá em que
conformidade o que há de fazer, e só poderão ficar nestas capitanias
os negros filhos dos Palmares de idade de sete até doze; que uns e
outros serão vendidos por conta do dito coronel Domingos Jorge
Velho e de sua gente; por que para ele será sua valia”.

204
Apagaram Angiquinho: o assassinato de Delmiro

Na esteira da construção de pequenas hidrelétricas, no final


do século 19, que serviam para abastecer empreendimentos
particulares, Delmiro Gouveia (1863-1917) apostou todas as suas
fichas na construção de sua usina, aproveitando a força da
cachoeira de Paulo Afonso. Por outro lado, não havia nessa época,
um controle do governo central sobre os recursos hídricos. Uma
legião estrangeira entra na onda dessa nova fonte de energia.
Aparecem a The São Paulo Railway Light and Power e a American
Foreign and Power Company. A Usina Angiquinho surge com a
finalidade de fornecer energia para a fábrica de linhas de Delmiro
– inaugurada um ano após a usina – e fez grande sucesso de
vendas, com a marca Estrela para o mercado nacional e Barrilejos
para exportação, quando chegou a dominar o mercado nacional e
praças da América do Sul. Ele já atraia a ira dos fortes
concorrentes do setor têxtil mundial. Em 10 de outubro de 1917,
sentado em uma cadeira de vime, Delmiro é emboscado e
assassinado, com três tiros à queima-roupa, em seu bangalô da Vila
da Pedra, hoje a cidade de Delmiro Gouveia, aos 54 anos de idade.

“A noite era quente e abafada, como costumam ser as noites


de verão no sertão nordestino. Firmino Rodrigues Pereira, a última
pessoa que falou com o coronel Delmiro, disse que deixou Delmiro a
ler tranquilamente o Jornal de Alagoas no alpendre da casa. Algumas
pessoas asseguraram que a luz elétrica foi cortada por alguns

205
segundos e, nesse ínterim, passou um desconhecido com um lampião
de querosene aceso diante da varanda. Então, ouviram-se os tiros”.
Jornal do Commércio do Recife, na edição de 14 de
setembro de 1968.

Atiradores de aluguel mataram Delmiro


Na época, um dos acusados foi o coronel José Rodrigues de
Lima, chefe político e intendente de Piranhas, devido a interesses
contrariados e aborrecimentos por questões de fornecimento de
lenha a Paulo Afonso. Era comprador de peles e via diminuir seu
movimento comercial desde que Delmiro se instalara em Pedra.
Outro apontado como mandante do crime foi José Gomes, chefe
político de Jatobá, hoje Tacaratu, Pernambuco, cuja filha de
criação Delmiro raptara 15 anos antes. A indústria inglesa de
linhas Machine Cotton também foi acusada, 10 anos após o crime.
A multinacional comprou toda a maquinaria da Fábrica de Linhas
da Pedra, sua única concorrente na América do Sul, para depois
cometer mais um crime: jogar no fundo da cachoeira de Paulo
Afonso todas as máquinas da Pedra. As autoridades policiais
conseguiram prender os supostos assassinos de Delmiro: Róseo
Morais do Nascimento, José Inácio Pia, o Jacaré, e Antonio Félix
do Nascimento. Foram condenados a 30 anos de prisão.

Silvestre Péricles: “Sou rápido no gatilho!”

206
Em 1979, o general Mário de Carvalho Lima lançou o livro
Sururu Apimentado, que dá a versão da caserna nos conturbados
anos 1950, principalmente na disputa sangrenta pelo governo de
Alagoas, entre Silvestre Péricles e Arnon de Melo, que terminou
ganhando as eleições. O livro traz relíquias, como a reprodução da
reportagem “Sou rápido no gatilho”, dos famosos jornalistas Davi
Nasser e Jean Mazzon (repórter fotográfico), para a revista O
Cruzeiro, edição de fevereiro de 1950. “Ilustraram-na com
instantâneos fotográficos bem extravagantes, nas quais aparecia o
governador Silvestre Péricles de revólver em punho em plena
posição de tiro, dando um aspecto bem burlesco ao trabalho
jornalístico”, comentava o autor no livro. Veja a seguir a abertura
da matéria assinada por Davi Nasser, que teve repercussão
internacional.

“Eu sou a fera que vocês procuram; jornalista aqui eu trato


na chibata”. Essa foi a saudação com que os repórteres foram
recebidos pelo governador de Alagoas, Silvestre Péricles de Góis
Monteiro, numa ilhota onde passava as férias perto de Maceió.
Masson (o fotógrafo) disse-me que “aquilo era um Robespierre (líder
da Revolução Francesa que guilhotinava os inimigos). O governador
explodiu então em uma gargalhada. Qual Robespierre qual nada! (ele
havia captado as palavras de meu companheiro). – Eu estava apenas
dando cor local à ideia que vocês, do Sul, fazem de nossa Alagoas.
Mas isto aqui vai mal! Muito mal! O sangue correrá em Alagoas, mas
não serei eu que vou derramá-lo. É o povo. Uma dia, a massa

207
esgotada em sua paciência, que sem limites, irá à Assembleia
Legislativa e botará fogo naquilo”.
Sururu Apimentado – apontamentos para a história política
d Alagoas, de Mário de Carvalho Lima, Imprensa Oficial
Graciliano Ramos, 2ª edição – 2008

Fernandes Lima manda quebrar terreiros

O nome que batiza uma das maiores e mais importante


avenida de Maceió é o do advogado e jornalista José Fernandes de
Barros Lima (1868-1938), que foi por duas vezes governador de
Alagoas nos períodos 1918-1920 e 1921-1924. Fernandes Lima
teve grande influência na política e na sociedade alagoana, e fez
parte da elite econômica e da oligarquia local. Durante 38 anos
exerceu mandatos como o de vice-governador, senador, deputado
estadual e federal. Alagoano de Passo de Camaragibe, Fernandes
Lima esteve nos bastidores políticos de Alagoas de 1892 a 1930.
De forma infeliz, Fernandes Lima se envolveu em um episódio
inolvidável da história brasileira. Em 1º de fevereiro de 1912,
como vice-governador, autorizou milícias armadas e guardas
pessoais a invadir e quebrar casas de culto afro-brasileiras,
espancando seus praticantes e destruindo objetos sagrados de culto.
No chamado Dia do Quebra de Xangô, um dos episódios mais
tenebrosos da história de Alagoas e do Brasil, um dos atos mais
violentos de intolerância e violência religiosa e racial.
Historiadores, antropólogos, doutores da história do negro, em
uníssono, apontam para o forte protagonismo de Fernandes Lima,

208
até mesmo como mentor político da Liga dos Republicanos
Combatentes – uma liga de clube que reunia militares -
“viabilizada e autorizada” por Fernandes - que saiu pelas ruas de
Maceió para “manter a ordem”, “moralizar os costumes”, depois
da vitória nas eleições.

“Como se tratava de uma guarda particular, seus soldados


prosseguiram com os desmandos, estimulados pela orientação
autoritária de seu padrinho e vice-governador do Estado, Fernandes
Lima”.
Por Ulisses Neto Rafael,pesquisador paraibano, em
entrevista à revista Graciliano, edição nº 13 – março/abril de 2012.

Graciliano, sobre Fernandes: o monstro macobeba*


O romancista Graciliano Ramos falou sobre Fernandes
Lima, em 1930, em que lhe deu o codinome de Macobeba – um
monstro mitológico - em duas crônicas escritas para o Jornal de
Alagoas publicadas no livro Garranchos Textos Inéditos -
organizados por Thiago Mio Salla (Record, 2012). Em Nota, o
autor assinala que o político tratado no artigo, em chave alegórica,
como Macobeba, seria Fernandes Lima, que na época perdera a
eleição para Costa Rego, e alegava que a votação teria sido
marcada por fraudes.

“Não há, pois, Macobeba, como fugir desta alternativa: ou tu


mentes, ou todos os seus fiscais constituíam um bando de imbecis,

209
incapazes de denunciar no momento oportuno uma fraude na eleição.
A primeira hipótese é verdadeira. Teus fiscais não eram imbecis. Tu,
sim, Macobeba, é que mentes e mentes com tanta maior importância
quanto é certo que foste, em pessoa, um dos fiscais das eleições”.
Garranchos, Thiago Mio Sallo, Editora Record, 2012, no
texto inédito Palavras a Macobeba, Jornal de Alagoas, 15 de março
de 1934.

* Macobeba é uma figura mitológica imaginada por Júlio


Belo, pseudônimo de José Mathias, numa série de textos publicados
no jornal pernambucano A Província em 1929. “O Macobeba era
muito grande, tinha o tamanho de uma sucupira de meio século, com
um extenso rabo, metade de Leão e metade de cavalo, quatro imensos
olhos vermelhos como quatro grandes brasas vivas. Era mais feio que
o cão”. Nota do livro Garranchos Textos Inéditos, organização
Thiago Mio Sallo.

Cerimônia do adeus: a morte de Ceci Cunha

Era um dia de muito orgulho para a deputada federal reeleita


Ceci Cunha, em sua diplomação no fórum de Maceió, quando uma
tragédia aconteceu, na conhecida Chacina da Gruta (bairro de
Maceió). Um tiro a queima-roupa de escopeta em seu pescoço
acabou com a vida da deputada, na noite de 16 de dezembro de
1998, horas depois da sua diplomação. O crime abalou Alagoas e o
Brasil. Após o discurso de posse, já no início da noite, Ceci tirou a

210
histórica foto com os deputados federais e estaduais eleitos. Era a
cerimônia de adeus

"É por essa história de desafio, de luta, de muita coragem, que


hoje estou aqui. Não foi o acaso. Foi a sensação de que a todos é
dada a oportunidade; mas a poucos a emoção da chegada. Vou me
esforçar também para manter o tratamento a todos, de modo
equitativo, jamais abrindo mão de minha autoridade, porque não
tenho medo do desconhecido. O perigo poupa sempre aqueles que o
desafiam de frente”.

Trecho do discurso de Ceci Cunha, jornal Gazeta de


Alagoas, dezembro de 1998

Gravação mostra trama dos pistoleiro


A poucos metros do fórum de Maceió, um grupo de
pistoleiros monitorava todo caminho de Ceci. Em um
impressionante relato, contido no Inquérito Policial nº 001/99 de
junho de 1999, assinado pelo delegado da Polícia Federal em
Alagoas Paulo Fernando Bezerra, pode-se constatar passo a passo
do crime

"A hedionda chacina, conforme demonstrado nesses autos,


ocorreu por volta as 19h40 do dia 16 de dezembro de 1998, quando
vitimou a deputada Josefa Santos Cunha "Ceci Cunha”; seu esposo
Juvenal Cunha da Silva; Iran Carlos Maranhão Pureza; e dona Ítala
Ney de Maranhão Pureza, proprietária do imóvel onde a chacina foi

211
consumada, quando conversavam no terraço da casa nº 284, da rua
Eloi Lemos de França, bairro Gruta de Lourdes, nesta capital.
Naquela sombria noite, indivíduos fortemente armados, invadiram as
dependências da casa, como que num festival macabro dispararam de
forma incessante suas armas sem oferecer a menor chance de defesa
às suas vítimas”.

Crimes insolúveis: uma lista interminável

O assassinato de Ceci entra aqui, como exemplo e como


símbolo de uma era marcada pela impunidade, pela falta de
coragem cívica e institucional de todas as autoridades do Estado –
de todos os poderes - que lavaram as mãos e fecharam os olhos
para crimes políticos que permanecem no panteão dos casos
considerados insolúveis. O alto grau de impunidade e a
complacência das autoridades públicas no enfrentamento ao crime
organizado torna Alagoas uma terra sem lei, e um Estado
conhecido nacionalmente como a terra da pistolagem, do cabra da
peste, da Guarda Nacional do coronéis, do o sindicato do crime, da
Gangue Fardada e dos grupos políticos que continuam a impor a
lógica perversa do medo e da ameaça, para preservar seus
domínios territoriais e políticos, e promover chacinas e
assassinatos por motivos inconfessáveis.

“A lista é grande, mas podemos citar alguns casos que fazem


parte do rol de crimes sem soluções, cujos autores materiais e
intelectuais – os poderosos e intocáveis mandantes – continuam

212
gozando do beneplácito de uma liberdade criminosa e cúmplice: Luiz
Campos Teixeira (1950), Marques da Silva (1957), Beato
Franciscano (1957), Humberto Mendes (1957), Moacir Peixoto
(1960), Robson Mendes (1962), Valter Mendes (1972), Coronel
Adauto Barbosa (1970), jornalista Tobias Granja (1982), delegado
Ricardo Lessa (1991), Sílvio Vianna (1996) e Ceci Cunha (1998) e o
vereador Fernando Aldo (2007)”.

Gilvan Ferreira, em reportagem do jornal Primeira Edição,


de dezembro de 2002

213
TERRA DA POESIA

O Mundo do Menino Impossível

Este poema de Jorge de Lima (1893-1953), publicado em


1927, foi a primeira manifestação do autor no movimento
Modernista. Gilberto Freyre e Manoel Bandeira aclamaram o
poema; José Lins do Rego definiu “O Mundo...” como “os mais
belos versos que a gente pode ler em português”. O menino do
poema quebra os brinquedos antigos e estrangeiros, para buscar,
sozinho, sua criação autêntica, aplicando a criação e a tradição do
faz-de-conta aos objetos de seu ambiente. Jorge de Lima foi um
dos estandartes para a chegada do Modernismo em Alagoas,
liderando, junto com Lins do Rego, a abertura oficial do
movimento, em Maceió, com a famosa Festa da Arte Nova, em
junho de 1928. Vale ler a poesia inteira, sem edição.

O mundo do menino impossível

Fim da tarde, boquinha da noite


com as primeiras estrelas
e os derradeiros sinos.

214
Entre as estrelas e lá detrás da igreja,
surge a lua cheia
para chorar com os poetas.

E vão dormir as duas coisas novas desse mundo:


o sol e os meninos.

Mas ainda vela


o menino impossível
aí do lado
enquanto todas as crianças mansas
dormem
acalentadas
por Mãe-negra Noite.
O menino impossível
que destruiu
os brinquedos perfeitos
que os vovós lhe deram:

o urso de Nurenberg,
o velho barbado jugoeslavo,
as poupées de Paris aux
cheveux crêpés,
o carrinho português
feito de folha-de-flandres,
a caixa de música checoslovaca,
o polichinelo italiano

215
made in England,
o trem de ferro de U. S. A.

e o macaco brasileiro
de Buenos Aires
moviendo la cola y la cabeza.

O menino impossível
que destruiu até
os soldados de chumbo de Moscou
e furou os olhos de um Papá Noel,
brinca com sabugos de milho,
caixas vazias,
tacos de pau,
pedrinhas brancas do rio...

“Faz de conta que os sabugos


são bois...”
“Faz de conta...”
“Faz de conta...”

E os sabugos de milho
mugem como bois de verdade...

e os tacos que deveriam ser


soldadinhos de chumbo são

216
cangaceiros de chapéus de couro...

E as pedrinhas balem!
Coitadinhas das ovelhas mansas
longe das mães
presas nos currais de papelão!

É boquinha da noite
no mundo que o menino impossível
povoou sozinho!

A mamãe cochila.
O papai cabeceia.
O relógio badala.

E vem descendo
uma noite encantada
da lâmpada que expira
lentamente
na parede da sala...

O menino pousa a testa


e sonha dentro da noite quieta
da lâmpada apagada
com o mundo maravilhoso
que ele tirou do nada...

217
Xô! Xô! Pavão!
Sai de cima do telhado
Deixa o menino dormir
Seu soninho sossegado!
Os “meninos impossíveis” do modernismo
Com a adesão de Jorge de Lima ao Modernismo,
principalmente depois da publicação de O Mundo do Menino
Impossível, em 1927, surge o grupo alagoano literário que vai
divulgar e incorporar o movimento. Passam a ser denominados
“Os meninos impossíveis” das Alagoas, que vão dominar a cena
literária do fim dos anos 1920, até os anos 1930, quando surge o
Romance Nordestino.
“Nas colunas de vários jornais periódicos de nossa província,
foram estampados noticiários, crônicas e estudos, de autoria entre
outros, de Jorge de Lima, José Lins do Rego, Tavares Bastos, Emílio
de Maya, Pontes de Miranda, Barreto Falcão, Arnon de Mello,
Valdemar Cavalcanti, Guedes de Miranda, Paulo Malta Filho,
Manuel Diegues Júnior, Aurélio Buarque de Holanda, Raul Lima,
Luiz Lavenère, José Aloísio Vilela, Costa Aguiar, Carlos Paurílio,
Carlos J. Duarte, Renato Alencar, Aloísio Branco, Mário Marroquim,
Lobão Filho e Alberto Passos Guimarães”.
Moacir Sant`Ana, em História do Modernismo em
Alagoas,Edufal, 1980 e Documentário do Modernismo, Edufal,
1978.

A princesa Caralâmpia e Meninos Pelados

218
O romancista alagoano Graciliano Ramos também escreveu
literatura infantil, talvez querendo espantar seus próprios
fantasmas. O livro A Terra dos Meninos Pelados foi escrito por ele
logo após ser solto da prisão da Ilha Grande, num quarto de pensão
no Rio de Janeiro, e foi concluído em 1937, um ano antes de seu
quarto, último e decisivo romance: Vidas Secas. O mestre Graça
fez mais dois livros infantis: Alexandre e outros heróis e Pequena
História da República. Em “A Terra dos Meninos Pelados, uma
novela (gênero literário) curta, com 18 capítulos, Raimundo e
Caralâmpia vivem em um mundo de sonhos. O autor criou a
personagem espelhada em sua amiga a psiquiatra Nise da Silveira,
que fora sua companheira na prisão.

Aí Raimundo entristeceu e enxugou os olhos:


— É uma obrigação. Vou-me embora. Vou com muita saudade,
mas vou.
Tenho saudade de vocês todos, as pessoas melhores que já
encontrei. Vou-me embora.
— Volte para viver conosco, pediu Caralâmpia.
— É, pode ser. Se acertar o caminho, eu volto.
— Adeus, meus amigos. Lembrem-se de mim uma ou outra vez,
quando não tiverem brinquedos, quando ouvirem as conversas das
cigarras com as aranhas.
Fiquei gostando muito delas, fiquei gostando de vocês todos.
Talvez eu não volte.
Vou ensinar o caminho aos outros, falarei em tudo isto, na
serra de Taquaritu, no rio das Sete Cabeças, nas laranjeiras, nos

219
troncos, nas rãs, nos pardais e na guariba velha, pobrezinha, que não
se lembra das coisas e fica repetindo um pedaço de história. Quero
bem a vocês. Vou ensinar o caminho de Tatipirun aos meninos da
minha terra, mas talvez eu mesmo me perca e não acerte mais o
caminho.
Graciliano Ramos, em A Terra dos Meninos Pelados, edição
FNDE/ Ministério da Educação – 2003

Hermeto Pascoal: poesia tirada do som

Nascido em Lagoa da Canoa, agreste alagoano, em 22 de


junho de 1936, Hermeto Pascoal, o albino brasileiro mais
conhecido no mundo, com sua barba e cabelão galego crespo,
olhos estrábicos bem abertos, e seus óculos fundo de garrafa, faz
música desde menino. Aos sete anos começou a tocar sanfona de
sete baixos e flautas rudimentares feitas por ele mesmo. Ao longo
de toda a carreira, a criatividade de Hermeto tem se mostrado
inesgotável. Desde o grunhido do porco ao alvoroço das galinhas
vale tudo: chaleira, panela, ferro, madeira. Mas ele virou estrela
internacional como multi instrumentista: saxofone, bateria, piano,
escaleta, flauta, violão, contrabaixo, bombardino, sanfona, que toca
magistralmente. Em Calendário do Som (2000), chegou ao
requinte de criar uma composição diferente para cada feriado e dia
de santo. Ele já tinha criado uma canção para o Dia de São
Antonio.

Vem uma pessoa e diz

220
Amanhã tem acompanhamento
Que santo? É Santo Antonio

E sai todo mundo


De chapéu na cabeça
Com o Santo Antonio na caixa
E aquela meninada atrás
E sai de casa em casa

Esmola pra Santo Antonio


Esmola pra Santo Antonio
Ajudar você

Pode dar ovos, pinto, abóbora, o que tiver


Quando é a festa?
É dia 13, dia de Santo Antonio
Ô de casa
Ô de casa

Esmolinha prá Santo Antonio


Santo Antônio casamenteiro.

Hermeto Pascoal, no disco Zambumbê-Bum-Á – 1979 –


Warner Arquivos

Rosália Sandoval, a poetisa pioneira

221
Rosália Sandoval (1876-1956) foi poetisa, cronista,
jornalista, professora. Aos trinta e dois anos de idade foi
transferida da cadeira de professora primária de Tatuamunha, em
Porto de Pedras, para a de Jussara em União dos Palmares. Dirigiu
o Colégio Parthenon. Professora de Português e Francês. Viveu no
Rio de Janeiro a partir da década de 1920. Ficou órfã de pai ainda
criança, e perdeu o irmão poeta (Sebastião Sandoval) ainda muito
nova. Pioneira na literatura, dedicou sua vida à produção literária,
fazendo versos, contos, fábulas, anedotas, prosa poética intimista,
crítica literária e literatura infantil.

Boemia

Loura boemia segue em longa estrada,


cabelos soltos, bandolim vibrando,
olhos no espaço, trêmula, cantando,
cantando a mágoa que em seu peito mora.

Pés descalços, o rosto cor da aurora,


vai pelas ruas todas esmolando...
esmola? Não. Desde que vai cantando
recebe o prêmio da arte que enamora.

... Na blusa clara dois remendozinhos


ocultando a maldade que fizeram
as travessas roseiras do caminho.

222
Formosa e jovem passa pela vida,
sem ter os sonhos que seus pais tiveram
sem amor, sem vaidade, sem guarida!

Publicado no jornal maranhense Pacotilha, em 28 de março


de 1917, disponível em memória.bn.br

Rosália Brandão: a rainha louca dos palcos

No final de novembro de 2015, Alagoas ficou mais triste


com a morte da poetisa, escritora, advogada e procuradora de
Estado, Rosália Brandão. Rosália era a felicidade em pessoa, fez
parte da geração dos 1980/1990, em Maceió. Foi, ao lado de sua
grande amiga, Aline Marta, as rainhas loucas dos palcos na cena
musical alagoana, com os grupos Caçoa Mas num Manga, quando
realizaram o antológico show Babe Bicho, que reuniu no palco
Júnior Almeida, Nelsinho Braga, Jorge Barboza, Gal Monteiro,
Aline Marta, Rosália Brandão, Emídio Magalhães, e uma
“cozinha” maravilhosa: Zé Barros, Zé Carlos e Baygon, Mirna
Porto e Eliane Vielmond. Rosália escreveu o livro Racional
Radical, prefaciado por Lucy Brandão, com projeto gráfico da
jornalista Patrícia Pavas e capa do teatrólogo e artista plástico Lael
Correa. Poemas ácidos, verdadeiros, por vezes ferinos, cruéis,
como a vida, muitas vezes. Rosália representou uma geração
alagoana que namorava o rock, o pop, o dark, o gótico, o trash. Ela
cravou seu nome na cultura e na música alagoana.

223
Anilda Leão: musa da poesia alagoana

Anilda Leão (1923 - 2012) foi uma poeta, escritora,


militante feminista, atriz e cantora brasileira. Escreveu textos para
diversas publicações alagoanas, como as revistas Caetés e
Mocidade e os jornais Jornal de Alagoas e Gazeta de Alagoas.
Num evento organizado pela Federação Alagoana pelo Progresso
Feminino, em 1950, apresentou-se pela primeira vez como cantora.
Passou então a militar pelos direitos das mulheres, tendo
participado do Congresso Mundial de Mulheres realizado em 1963
em Moscou, como representante da Federação Alagoana pelo
Progresso Feminino. Em 1953, chocou a sociedade alagoana ao se
casar com o jornalista e escritor Carlos Moliterno, que era
desquitado. Na época, ainda não existia divórcio no Brasil.
Escrevia poemas desde os 13 anos de idade, mas só em 1961
publicou o seu primeiro livro, Chão de Pedras. Em 1973 escreveu
um volume de contos, Riacho Seco, com o qual conquistou o
Prêmio Graciliano Ramos da Academia Alagoana de Letras. Como
atriz, trabalhou nos seriados Lampião e Maria Bonita e Órfãos da
Terra (1970), e nos filmes Bye bye Brasil, Memórias do Cárcere
(1984) e Deus é brasileiro (2002).

224
De dentro da lagoa
emergem as casas tristes
de moradores mais tristes ainda
a água parada fedendo
poluindo a meninada
que brinca de tomar banho.

De dentro da lagoas
a boca aberta dos sapos
engolindo outros bichos

E a sujeira boiando
lavando os trapos da gente
que mora por perto
gente triste sambuda doente.

Todo dia tem menino morrendo


todo dia morrendo.
Lagoa assassina!
A Lagoa!?
Ou quem? ...

em Revista da Academia Alagoana de Letras, nº 10, 1984

Jorge Cooper: poesia enxuta e cortante

225
O poeta Jorge Cooper (1911-1991) é alagoano, mas durante
a juventude passou algumas décadas no Rio de Janeiro e em São
Luiz (MA). Foi bancário e funcionário público federal. Seus
poemas trazem a marca da brevidade, da ausência da pontuação, da
escolha de palavras de uso cotidiano; os temas enfocam,
principalmente, as memórias do poeta e o próprio exercício da
poesia. Em 2011, a Imprensa Oficial do Governo de Alagoas
lançou o livro Poesia Completa de Jorge Cooper, em que foram
reunidos todos os poemas do autor em homenagem a seu
centenário. Em 2013, sua vida e obra viraram filme, dirigido por
Victor Guerra, e acabou por ganhar o Prêmio Guilherme Rogato,
promovido pela Secretaria de Cultura de Maceió. Um dos
organizadores do livro Obras Completas, o também poeta,
Fernando Fiúza, fala sobre a obra de Cooper, e uma poesia de
Cooper encerra o verbete.

“A presença de Cooper [...] um signo da continuidade de uma


poesia áspera, enxuta e contundente, livre de penduricalhos
mitológicos e malemolência brejeira, e de uma postura poética que
dá as costas (melhor seria uma banana) à oficialidade e à reverência
acadêmicas”.
Maceió
ausente
fácil se me afigura
inteiro caber dentro de
Maceió
Mas se nas descidas da vida

226
o torna-caminho
é Maceió
claro então me volta à memória
o beco sem saída
o jogo de gata-parida
que é
Maceió
para o pobre de Jó.
Obras Completas, Jorge Cooper,
2011, p. 182

De Lêdo para Jorge


Agrada-me principalmente nos poemas de Jorge Cooper a
identidade que existe entre o poeta e seu panorama natal. Projetando
em seus versos as preocupações de ordem metafísica ou psicológica a
que nenhum poeta verdadeiro pode fugir, animando-os com a força
de um talento que o tempo só poderá tornar mais límpido e sequioso,
Jorge Cooper decerto enriquece sua geração com uma poesia em que
são muitas as originalidades substanciais e felizes soluções
arquiteturais. Contrariando o comportamento de seus jovens pares,
que comumente se evadem para as paisagens inventadas, muitas
bebidas nas terras de ninguém dos panoramas de poetas europeus,
Jorge Cooper não fugiu: é com uma dignidade de um participante e
de um intérprete de seu dramático mundo nativo que ele nos fala na
terra natal, das redondezas da terra, da lagoa e das estrelas.

227
Por Lêdo Ivo, no argumento do documentário Jorge Cooper
– A Cidade é do Poeta , direção de Victor Guerra

Cooper: um estandarte da poesia


O poeta Jorge Cooper foi o estandarte e a revolução da
troupe dos anos 1980 na provinciana Maceió. Há histórias
incríveis, sobre o barulho que estes meninos impossíveis causaram
na cena literária local. O filho de Jorge, o também poeta Charles
Cooper, relata um desses episódios, de movimentação produzida
pelos jovens intelectuais. Há a história da panfletagem feita por
Marcos de Farias Costa, acompanhado pelo amigo também poeta,
Norton Sarmento no evento na Reitoria da Universidade Federalde
Alagoas (Ufal), onde o meio universitário e a Academia Alagoana
de Letras estavam homenageando outro poeta, outro Jorge, o Jorge
de Lima.

“O teor do panfleto era na realidade um manifesto que se


falava da existência de dois Jorges: um extremamente conhecido
poeta, romancista, o autor de Invenção de Orfeu; e outro, o Jorge
Cooper, poeta intimista, hermético, inédito, comunista, um senhor
simpático, culto e sem frescura que ouvia, lia e opinava a novíssima
geração que precisava de um referencial. Surtiu efeito o panfleto-
manifesto, chamando atenção de uma professora da Universidade de
Roma, Luciana Stegagno Picchio (1920-2008), erudita, estudiosa da
literatura portuguesa e brasileira, amiga do homenageado Jorge de
Lima. Pelo seu interesse pelo Jorge pouco conhecido, foi à procura
do mesmo no dia seguinte, ciceroneada por Marcos de Farias Costa.

228
Aquele encontro produziu uma frase dita como de autoria da italiana
de ser Jorge Cooper ‘um cacto solitário da poesia alagoana’. O
reconhecimento dos companheiros de geração de Cooper foi
acontecendo quase diariamente, não sei com certeza, se de modo
espontâneo ou de modo contingencial. A história da inédita obra
cooperiana em se tornar pública e acessível a todos, a partir daí, vai
ser longa”.
Por Chales Cooper

Gonzaga Leão: simplicidade e engajamento

Alagoano de União dos Palmares, Luiz Gonzaga Leão,


nasceu em 1929 e hoje já nos seus oitenta e tantos anos é um
guerrilheiro da poesia. Está sempre avant la lettre, com seus livros
sendo lançados, ele não pára de fazer versos. Na literatura, tem
diversos livros de poemas publicados e sua obra foi reconhecida
por escritores como Carlos Drummond de Andrade. É membro da
Academia Alagoana de Letras e Academia de Letras e Artes do
Nordeste. Gonzaga Leão não negou sua pena, em poemas de alto
lirismo, para expressar o repúdio às tentativas contra a dignidade
humana, mas sua poesia é marcada pela simplicidade e leveza.
Como ele mesmo fala na apresentação do seu livro Tijolo sobre
Tijolo, Palavra sobre Palavra (Imprensa Oficial Graciliano Ramos,
2012), de onde extraímos o poema que vem logo a seguir. “É uma
poesia simples, nada complicada e, para entendê-la, não precisa
decifrá-la ou levá-la aos divãs da psicanálise. Nenhuma conotação

229
moralista, conceituosa, filosófica. Enfim, é uma poesia leve,
onírica, intimista mas também contemplativa, de um lirismo, acho,
quase em extinção, que se coloca sempre ao lado da vida, tantas
vezes amarga, suja, violenta, mas que nos deixa, como raspa no
fundo do tacho, alguma coisa de sua beleza. De sua sensualidade.
É quando poeta acorda e a poesia acontece”.

Que mar é esse?

Que mar é esse que cala


quando me faço presente?
que mar é esse que fala
bem fundo se estou ausente?

Que mar é esse tão grande


(parece que não tem fim)
Que começa pelas ondas
e sempre termina em mim?

Que mar é esse que sabe


tudo de mim e que ama
partilhar comigo a casa
partilhar comigo a cama

230
e se possível querer-me
e se possível tocar-me
e se possível possuir-me
e se possível anular-me

para me dizer que sou


aquele astuto marujo
que só viaja nos mares
que escuta dentro dos búzios

Paulo Renault, o motor da nova poesia

Paulo Renault Braga Villas Boas (1958-2003) era irrequieto


por natureza, boêmio por excelência, poeta humanista, mas de face
amarga, contra a hipocrisia do mundo. Morreu aos 48 anos, mas
deixou uma obra densa, forte, que se encaixaria bem no Brasil de
hoje. A Saga do Toureiro foi seu primeiro livro, lançado em 1994,
pela editora da Universidade Federal de Alagoas. Segundo Edson
Mario de Alcântara, que faz a apresentação, “o poeta desmascara o
falso bem, desmascara a bondade formal e mentirosa... não há
poema que não denuncie o estado do mundo”.

Se vocês pensam...

Se vocês pensam que eles vão parar por aí,


Estão enganados.
É que as gaiteiras, manimbus e aratus

231
Já estão dizimados.
A jaracuçu, a cobra verde,
O uçá e o guaiamum
Já boiam de barriga para cima
Entre o pântano e a lagoa.

E o que há de mais de podre nesta cidade,


(afora os discursos políticos, claro),
Tomam o rumo das lagoas, do mar e dos rios.
Mas eles não vão parar por aí não!

Ainda haver-se-á de passar pelas praias


Vestidos de astronautas,
Não que iriam transformar as águas em lua,
Mas, ao contrário, em anti-lua.

Já expulsaram os atores dos palcos,


Os quadros de vanguarda das galerias,
Já acabaram com os museus,
Orquestras e centros de arte.
Mas eles não vão parar por aí!

E só restará como música


A buzina dos automóveis,
E quem quiser assistir a uma peça,
Terá que se dirigir à Assembleia Legislativa,
E quem quiser ver um quadro,

232
Só nas salas de aula, quer dizer, vazias.
Porque eles já deram um jeito de expulsar
Professores e alunos.
Mesmo assim eles não vão parar aí!

Quando restar só o cadáver,


Eles irão arrancar as carnes,
Engolir o sangue coagulado,
Roer os ossos,
Comer os miolos e dar descarga no que sobrar.
Depois vão colorir a cidade para dizer
Que está tudo bonitinho.

Paulo Renaul, em Saga do Toureiro, Fundação Teatro


Deodoro, 1994

Renault: poesia, militância e música


A política foi um dos assuntos que mais atraiu Paulo
Renault, além da poesia, da música e da boemia com os amigos.
Chegou a militar no Partido Comunista Brasileiro (PCB), mas não
resistiu aos dogmas do “Partidão”, mas ele tinha nas veias o sangue
do histórico militante comunista Júlio de Almeida Braga, seu avô e
um dos fundadores do PCB, em Alagoas. Mas o caminho da poesia
e da musica escolhidos, levou com ele os conceitos aprendidos na
militância. Paulo Renault foi parceiro musical, como compositor,
dos músicos alagoanos Chico Elpídio, Eliezer Setton, Marcondes
Costa e Carlos Moura. Integrou com eles um dos mais importantes

233
grupos musicais de Alagoas, o Grupo Terra, no final dos anos 70 e
até o início dos oitenta.

O mundo boêmio de Renault


Paulo Renault vivia de forma simples e franciscana, entre o
trabalho, a família, os livros e os amigos nos botecos, ali bem
pertinho, no bairro de Jaraguá, onde morava e adorava os papos e
discussões acaloradas com amigos, da tardinha ao amanhecer. Ali,
buscava o fermento de sua árida poesia. Poeta, compositor,
funcionário público, trabalhou na Fundação Cultural Cidade de
Maceió e Fundação Teatro Deodoro, Paulo Renault foi até
vendedor da Brahma, mas sempre atento ao mundo.

“O boteco com três mesinhas à beira do riacho do Salgadinho


era um termômetro da sua satisfação. Agora imaginem os finais de
tarde no Largo do Mercado de Jaraguá, no alegre Buraco da
Zefinha? Um típico copo-sujo da cidade, mas que durante muitos
anos foi frequentado por boêmios de várias extrações sociais. Era o
local onde o poeta pontificava com mais assiduidade. O samba
cantado pelo cantor Zé Paulo era o que havia de melhor e diferente
nas tardes de sábado em Maceió. Os intervalos invariavelmente eram
destinados aos recitais dos poemas de Renaul e de outros poetas. Os
amigos, depois de tomar muitas cervejas, insistentemente solicitavam
que Paulo Renault declamasse Vou embora pra New York, o seu mais
conhecido poema. Palmas, assovios, gritos e mais bebidas, sempre”.
Por Geraldo de Majella, no endereço

234
http://majellablog.blogspot.com.br/2010/06/poeta-
compositor-e-boemio.html

Jacinto Silva: passeio por Maceió

Jacinto Silva (1933-2001), um dos maiores forrozeiros


alagoanos, representante máximo do coco sincopado como ritmo
musical, foi também compositor e poeta, e dos melhores. Ele
deixou para nós essa letra ritmada, que fala de suas farras pelos
bairros de Maceió. O cantor, poeta, compositor e estradeiro –
adorava fazer shows Brasil à fora – cresceu ouvindo cantadores de
coco, repentistas, violeiros, mestres de reisado e de toré,
guerreiros, cantadores de sentinela e terço, e os grandes artistas da
época de sua adolescência: Orlando Silva, Francisco Alves, Bob
Nelson e Luiz Gonzaga. Jacinto se tornou um exímio cantor, que
virou um ícone do baião, do xote, do xaxado, do coco alagoano, do
arrasta-pé e da marcha de roda.

Ô que saudade danada


não posso nem recordar
me lembrei do meu xodó
lá de Maceió
e da turma de lá

Eu tenho saudade do bairro do Poço


Trapiche da Barra, Mangabeira e o Farol
de Ponta da Terra e de Jaraguá

235
da festa do Prado eu era o maior

E em Ponta Grossa
no Vergel do Lago eu tinha um namoro
me deu saudade da turma de lá
E hei visitar o meu bairro Bebedouro

Ô que saudade danada


não posso nem recordar
me lembrei do meu xodó
lá de Maceió
e da turma de lá

Nunca mais eu vi um sururuzeiro


entrar na lagoa e tirar sururu
pegar siri ou caranguejo uçá
pescar carapeba, mandin e muçum
camarão e ostra também têm valor

Jacinto se lembrou de sua terra amada


tenho saudade do Gogo da Ema
e das morenas que tem na Levada

Luiz Gonzaga canta seu amor por Alagoas

236
Com letra de Edu Maia, violonista dos anos 1980, Pedaço
de Alagoas foi um sucesso nacional na voz do rei do Baião, Luiz
Gonzaga, quando mostra seu amor por Alagoas e sua veia de
“estradeiro”. Sua voz soa vigorosa para cantar Alagoas e sua
beleza, quem não ainda ouviu corra para ouvir. Pedaço de Alagoas
aparece em seu último trabalho, o LP Vou te Matar de Cheiro,
editado pela gravadora Copacabana, e também tece elogios a
pontos famosos como a Praia do Francês e a Lagoa Mundaú. De
Lourival Passos ele gravou “Maceió”, na qual também exalta a
beleza inconfundível da capital mais bonita do Brasil, “Ai, ai, qua
saudade, ai que dó. Viver longe de Maceió”. Com o estouro da
música, o autor de Pedaço de Alagoas, Edu Maia gravaria um
compacto da música por um selo paulista com vocal de Silvinha
Araújo e participação de Oswaldinho do Acordeon.

Pedaço de Alagoas

Luiz Gonzaga
Autor: ( Edu Maia)

Areia branca à beira-mar


Ai que saudade
Qualquer dia desse eu volto lá.

Quem é que não gosta de carinho


Quem é que não gosta de um xodó
Quem é que não sente saudade

237
De um dia de sol em Maceió.

Num passeio de barco ou de jangada


E a velha piscina do meio do mar
Levar sua namoradinha
Pra um dia feliz e regressar.

Num domingo de sol bem cedinho


Passear na Lagoa de Mundaú
Tomar uma cachaça no trole
E pedir tira-gosto de caju.

Tomar banho na Bica da Pedra


Rever a Praia do Francês
E a Barra de São Miguel
Cururipe tem praias tão lindas
Que se confundem com o mar
São José de Coxinho abençoe
Lagoa do Pau pra marujo que há.

Negra Fulô: um poema para a beleza

Do cultuado poema Negra Fulô, não se sabe se é uma


personagem fictícia ou uma aventura sensual do poeta Jorge de
Lima (1893-1953), onde relembra sua infância como menino de
engenho, e mescla a dura vida a que eram submetidos os escravos
aos aspectos sensuais e sedutores das escravas, as mucamas, que

238
enchiam de desejos os homens brancos da corte. Seu poema Essa
Negra Fulô foi publicado pela primeira vez na editora Casa
Trigueiros, em Maceió, em 1928.

Essa Negra Fulô

Ora, se deu que chegou


(isso já faz muito tempo)
no banguê dum meu avô
uma negra bonitinha,
chamada negra Fulô.

Essa negra Fulô!


Essa negra Fulô!
Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá)

— Vai forrar a minha cama


pentear os meus cabelos,
vem ajudar a tirar
a minha roupa, Fulô!

Essa negra Fulô

Essa negrinha Fulô!


ficou logo pra mucama
pra vigiar a Sinhá,

239
pra engomar pro Sinhô!

Essa negra Fulô!


Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá)
vem me ajudar, ó Fulô,
vem abanar o meu corpo
que eu estou suada, Fulô!

vem coçar minha coceira,


vem me catar cafuné,
vem balançar minha rede,
vem me contar uma história,
que eu estou com sono, Fulô!

Essa negra Fulô!


....

O Sinhô foi açoitar


sozinho a negra Fulô.
A negra tirou a saia
e tirou o cabeção,
de dentro dêle pulou
nuinha a negra Fulô.

240
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
Cadê, cadê teu Sinhô
que Nosso Senhor me mandou?
Ah! Foi você que roubou,
foi você, negra fulô?

Essa negra Fulô!

Lúcia Guiomar: ícone da poesia alagoana

Volto à minha terra


em prateados cavalos alados
quem nasce caetés
morre caetés

Em Poemeu, 1977, São Paulo

Lúcia Guiomar Porciúncula Teixeira (1943-2016), a nossa


Lúcia Guiomar, foi a mais sensível, grandiosa e genial poeta
alagoana, e deixou um rastro de luz por onde passou. Médica, com
especialidade em psiquiatria, ela se tornou uma referência na saúde
mental entre os profissionais de sua geração. Ao mesmo tempo,
com a mesma sensibilidade, Lúcia Guiomar fez da poesia sua

241
inspiração e sua arte, foi o coração acelerado da vanguarda e do
movimento underground dos 1960 e 1970, com posições firmes de
enfrentamento à repressão da ditadura militar. Inspirou outras
gerações, mergulhou de cabeça na superestrutura do mundo.
Irriquieta por natureza, criou eventos que se tornaram cultuados.
Lúcia foi uma das idealizadoras do Festival de Verão de Marechal
Deodoro, cujo primeiro se realizou em 1968, como também do
Prêmio Guerreiro Alagoano. Uma das idealizadoras, também do
Primeiro Stand'Art, na década de 70, onde selecionou textos nos
quais foram incluídas poesias de autores alagoanos, no espetáculo
“Poesia e Expressão Corporal”, que apresentou e dirigiu. No
Segundo Stand'Art, dirigiu o espetáculo denominado Ilha, no
Teatro de Arena Sérgio Cardoso, composto, em especial, de
poesias de Jorge de Lima e Beto Leão. Criadora do projeto "Ética
e Estética das Águas". Editora de O Clínico, jornal do Diretório
Acadêmico da Faculdade de Medicina e onde iniciou a publicação
de poemas de sua autoria. Na década de 60 começou a publicar
poesias no suplemento literário da Gazeta de Alagoas.

Obras: Poemeu, São Paulo, Gráfica Bentívegna Editora,


1973; Araterra, Maceió, Editora Grafitex, 1981; Os Bons
Demônios, Maceió, Grafitex , 1981 (poesia de cordel); Poemas
Gerados no Hiato - Poemas Gerados no Exílio, Maceió, Grafitex,
1981; Expressão Guaruaba, ilustrações de Reinaldo Lessa, São
Paulo, Massao Ohno Editor, 1992. Uma das alagoanas citadas no
Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras de Nely Coelho.
Sobre sua obra poética foi publicado Lira e Angústia, de autoria

242
de Raquel Villard Miranda, São Paulo, Edicon, 1988. E a obra
completa de suas poesias reunidas em Negro e Azul como a Alma,
de 2001, editado pelo seu grande amigo, Beto Leão. Com as
poesias Atlantis, Natura, Caeté 89, Narciso: Da Natureza e do Ser
participou de A Poesia das Alagoas, Recife, Edições Bagaço,
2007.
Narciso: da natureza e do ser

quando alcei voo


voei por partos pragas e partidas
de maceió às vagas estrelas
das manguabas às madrugadas

quando partida pedaços cantei


fiz-me
absinto
trombeta
virada
e virei
as teorias dos planctos
poeiras
pedaços de estrelas

ex-fera em contato com a beleza


mar se marco
navegante sem rastros
rastreadora de mim

243
para lá das tordesilhas
navego minha jangada

Caeté 89

conservo em minha alma


o manto do mantra
o verde do verbo minha língua
restingas vertigens
mistura de dores tambores
celestiais sabores
como as estrelas do arco-íris
persigo perigos
sete fadas
sete risos
cavalgados até o âmbar
toda luta toda paz
cochilo o conflito da andorinha
pasto raro
ave de rapina
curva de coqueiro
infinito retorno à madrugada
parto das enseadas
agridoce planctons da vida
saboreando néctares e nabos
como em uma grande gargalhada

244
Poemas coligidos do livro A Poesia das Alagoas,
organizado por Edilma Bomfim e Carlito Lima, Edições Bagaço,
2007, Recife

Vera Romariz: poesia no sangue na veia

Vera Romariz, 65 anos, é poetisa, cronista e crítica literária,


professora e doutora em letras e pesquisadora. Ela já nasceu com a
palavra declamada e a dramatização de textos e agora: “sou uma
mulher de letras e palavras”. Vera é neta de um dos maiores
expoentes do romantismo parnasiano brasileiro, o poeta Sabino
Romariz (1873-1913). Seu pai, João Romariz, lhe fazia ficar
rodeada de livros; seu irmão Sabino Romariz, jornalista e poeta
também lhe deu luzes e vozes. “Era uma família de boa tradição da
escrita, tomei gosto e tino e estou aqui”. Sua poesia, como explicou
no lançamento de seu livro mais recente (Pincéis, 2017), “é fruto
da observação e da experiência, transformando em palavra poética,
alegre, triste, densa”, como em Pincéis, que traz líricas sobre a
morte do renomado pintor alagoano Pierre Chalita.

“A poesia é um exercício diante do mundo, que eu aprisiono


com sentidos e trituro, mentalmente, até convertê-lo em linguagem
poética. As experiências infantis, as perdas familiares, a assunção
prazerosa ou doída do ser feminino, as contradições sociais
configuradas nas ruas de minha cidade, meu próprio rosto, perplexo,
ao espelho”.

245
Campo Minado

Campo minado, coração de mulher


bala explosiva em tempo de repouso
Pise devagar ou não pise
erga as mãos em ninho
e segure com dedos
de casca de ovo

Campo minado, coração


de mulher
a fúria do temporal
antes de parir chuvas
nuvens densas
fúria reservada

E atrás dos olhos


na história do antes
das janelas abertas
retrato da fêmea
face fada
varinha de condão
mas - atenção ! –
que muda
e medra
terra em ensaio de terremoto
atenção !

246
a mina medra
e é rastro na mão que mexe.
Campo minado, coração
de mulher
pise devagar
ou não pise
erga as mãos em ninho
e segure com dedos
de casca de ovo
Sem Óculos

N a cama te quero
sem óculos
esquadro e régua
sem limites nas dobras
dos lençóis
mais moderno
selvagem
das entradas e bandeiras
petróleo sem surpresas
ciências plataformas
correntes colossais
Na cama te faço
objeto de pesquisa
sem financiamento
externo
materialista dialético

247
de roucas práxis
rituais diabólico jeito de ser Deus
sem cruz
cruzando corpos desiguais
Na cama te quero
vivendo papéis profanos
motor ligado
jato de gás em fogo
fósforo que vira tocha
no sair da caixa
e incendeia jardins, plantas, flores
canaviais

Obras de Vera Romariz: Cacos, 1977; Quase Pássaro


(1986); Campo Minado (1986); Amor aos Cinqüenta (2004) e
Película (2008); Camões: O Poliedro da Poética Portuguesa
(1980); Quem é Você, Manuel Bandeira? Ensaio literário para o
público infantil em co-autoria com Edilma Acioli Bomfim (1986).
Recebeu da Academia de Letras da Bahia em 1990, o prêmio
nacional de Ensaio Literário Adonias Filho pelo trabalho
Identidade e Alteratidade Culturalno Romance Luanda Beira
Bahia; Amor aos Cinquenta (poesia), 2004; Tomá Lá, Dá Cá
(resenhas críticas (2011).

Marcos Farias: poesia avant la lettre

248
Marcos de Farias Costa, 63 anos, é até hoje o que se pode
considerar o enfant terrible da literatura alagoana. Irrequieto por
natureza, o bardo alagoano vive, pensa e transborda poesia, de
todas as formas que se possa imaginar. Desde os anos 1980,
quando “militava” em um grupo de intelectuais “sobreviventes”
que até hoje forma a turma da cena contemporânea das artes e
manhas das Alagoas. Entre os que constituem este importante
grupo estão Sidney Wanderley, Marcondes Costa, Diógenes
Tenório Junior, Elício Murta, Luis Costa Pereira Junior, Susana
Souto, Luzia Helena Wittmann, Norton Sarmento Filho. Na cena
atual cada um foi um em busca de seus sonhos, cada um foi buscar
seu pão e sua cachaça, mas nunca abandonaram o front das letras.
Marcos Farias publicou livros de poemas carnalmente eróticos,
escreveu ensaios sobre literatura universal, editou a revista cultural
Dialética, dedicada a temas como tradução de poesia, literatura
comparada e crítica literária. Recentemente lançou dois CDs com
músicas autorais, em sua própria voz. E no momento organiza uma
antologia de letras de música que citem ou façam alusão a Maceió.
Alagoano da gema, ele tem na versatilidade de estilos o seu talento
para as artes: para além de poeta, ele é cantor, tradutor, editor,
livreiro, compositor (de sambas e chorinhos), e nas horas vivas
dedica-se à crítica literária, “sempre se opondo ao mau-mocismo
das velhas práticas provincianas dos elogios entre amigos e do
puxa-saquismo autocongratulatório”, como ele próprio assinala.
Formado em Psicologia, nunca exerceu a carreira, preferindo optar
pela poesia. É tradutor da língua alemã. Compositor bissexto, com
prêmios e reconhecimentos.

249
Oficina do soneto
Pra cometer um soneto é preciso
dosar-se muito bem amor e morte
e da mistura então glosar o mote,
assim como quem monta um paraíso.

Um soneto se faz com azar e sorte,


uns lances de loucura e de juízo -
um soneto se arma em pranto e riso,
o coração ao sul e a mente ao norte.

Mas fazê-lo perfeito, necessário


o tom mais pessoal, e o verbo vário,
senão resta somente artifício.

E eis que chego ao fim do impune vício,


ponho o verso final, branco no preto,
e pronto, terminei este soneto.
_____________

James Joyce

James Joyce carregava Dublin,


como eu carrego Maceió em mim.

Aqui todos os açúcares e areias,

250
untam Ulysses: episódio das sereias.

A genialidade da alma jesuíta


revém. Genealogia da escripta.

Coisa com coisa — obra em marcha:


o universo linguístico se encaixa.

Joyce era gamado por música,


I am a polaridade acústica.

Joyce era cego e via Homero.


Sou vários homens e o invero

Vetor da poesia. Ficção?


Fuga per canonem. Canto chão.

Joyce bêbedo puro pornógrafo,


Amanteperverlíricopolígrafo.

Jewgreek in greekjew. (Bloom,


Yesim, silèncio, sim, Sins, yesnoon.)

Dublar Dublin? Trilagoas, entimemática.


Maceió, Ítaca, Eldorado, Nausicaa.

251
Tanta sedução doente seja acedia:
Translúcida infinita melodia.

Os bagos da fé

Eu juro
pelos pentelhos da Virgem
que o meu futuro
é pura vertigem.

Eu prometo
pelas barbas de Maomé
botar cianureto
no teu café.

Eu garanto
pelas trombetas de Jericó
que o meu canto
supera a clave de dó.

Eu testemunho
sem cruzar os dedos
que o mês de junho
não tem segredos.

Eu asseguro
por meus testículos

252
que não aturo
quaisquer versículos.

Eu abjuro
todas as juras
todos os muros
e sepulturas.

Obra: O amador de sonhos (1982), Ócios do ofício (1984),


A quadratura do círculo (1991), A comédia de Eros (1997), Doce
Estilo Novo (2000), O Jardim Selvagem (2013), A História do
Soldado, tradução de C. F. Ramuz (2017), pela Imprensa Oficial
Graciliano Ramos.

Arriete Vilela e as raízes da poesia

Arriete Vilela nasceu em Marechal Deodoro. Aos nove


anos, mudou-se para Maceió e estudou no Colégio de São José;
graduou-se em Letras, na Universidade Federal de Alagoas e fez
mestrado em Literatura na Universidade Federal da Paraíba,
defendendo, com louvor, a dissertação A revista Novidade:
contribuição para o estudo do Modernismo em Alagoas. Pertence à
Academia Alagoana de Letras.A autora já recebeu mais de 30
prêmios, dentre eles onze nacionais, concedidos pela União
Brasileira de Escritorese recebidos na Academia Brasileira de
Letras.Fantasia e avesso, uma prosa poética pontuada pelo discurso

253
erótico-amoroso e pela paixão ao fazer literário, atualmente na 5ª
edição, foi adotado no vestibular da Ufal, por 3 anos e
proporcionou à autora vários prêmios, inclusive nacionais. Em
2005, foi editado o primeiro romance de Arriete Vilela, Lãs ao
vento, que recebeu o prêmio da União Brasileira de Escritores e o
Prêmio Internacional de Literatura, da Academia Feminina Mineira
de Letras. Em 2011, Arriete Vilela teve cinco poemas traduzidos
para o espanhol e publicados na Antologia de poetas brasileños
actuales pela Paralelo Sur Ediciones, Barcelona, Espanha. O livro
Maria Flor foi adaptado pela Panam Filmes, produtora alagoana, e
exibido em outubro de 2012 com o título “Farpa”.

Pedem-me notícias de mim.


Eu as dou assim: em versos.

Há tempos não permitia que pedras


rolassem com o limo macio das palavras.
Eu usava arpões para não fisgar
as minhas fragilidades.

Mas, porque me pedem notícias de mim,


eu as dou assim: em versos.

Uso a máscara dos antigos bailes


e danço ao som de um clarinete
que sempre imaginei ser do avô.

254
(O avô - ah, os equívocos da infância!
o avô tocava bumbo.)

Porque me pedem notícias de mim,


confidencio afetos em palavras
que os contradizem, em excesso de murmúrios,
já que as tardes concretas silenciaram
os meus antigos (des)amores.

Pedem-me notícias de mim.


Eu as dou assim: em versos
que me desmentem.

Arriete por Arriete

“A literatura – renda em papel – é a minha trincheira de


resistência. A vida me dói? Escrevo. A paixão amorosa me
privilegia e me desassossega? Escrevo. A morte mostra a cara
quando leva algum amigo? Escrevo. Alguém me atraiçoa,
negando-me a inteireza do afeto? Escrevo. A minha alma
amanhece com a sensação de desamparo, sabendo-se sem um colo
acolhedor? Escrevo.E, ao escrever, teço-me de renda. Sou linha e
sou bilro e sou almofada recheada com a folha da bananeira. Sou
neta maravilhada diante de uma avó no oitão da casa, à fresca da
tarde, espiando as folhinhas novas da pitangueira, mas sou,

255
também, avó seduzida pelos risos infantis que, hoje, enchem a
minha casa e o meu coração.Escrevo, escrevo, escrevo.
Apaixonadamente. Com a alegria e com as contradições de uma
alma que nasceu poética, que sofreu muitos reveses e que insiste
em não ser enrodilhada, mas rendilhada”.

Palavras em travessia, em Gazeta de Alagoas, edição de


13/12/2013

Empilho palavras
sob o sol ardente,
para não empalhar mágoas
à sombra dos amores.

Observo como o vento rendilha


a árvore para que eu consiga,
nessa azulada manhã de frio,
rendilhar-me
e deixar de ser, repetidamente,
a palavra que te aflige
e te pereniza.

Caminho à beira-mar
para aprender a ser cais, somente,
e não mais âncora ou elos,
nem casco musgoso de barcaça.

256
Empilho palavras
para que, ao sol ardente,
virem cinza em cores
e me surpreendam a cada estação
com a sempre nova e rotineira
des/ventura do amor.

Obras (poesia e ficção): Eu, em versos e prosa (1970), 15


poemas de Arriete (1974), Recados (1978), Para além do avesso da
corda (1980), Pequena história da meninice e outras estórias
(1981), Remate (1983), Fantasia e avesso (1986), Farpa (1988), A
rede do anjo (1992), Dos destroços, o resgate (1994), O ócio dos
anjos ignorados (1995), Tardios afetos (1994), Vadios afetos
(1999), Grande baú, a infância (2003), Frêmitos (2003), A Palavra
sem Âncora (2005), Lãs ao vento (2005), Ávidas paixões, áridos
amores (2007), Obra poética reunida (2009).

Sidney Wanderley: um poeta brasileiro

O poeta, cronista, contista, prosador e leitor de grandes


figuras literárias, Sidney Wanderley, 61 anos, sendo 26 de poesias,
desde o lançamento de seu primeiro livro em 1991, até o mais
recente, em 2017, teve uma carreira de ascensão fulgurante em sua
sina de poeta e cronista, já batizado como poeta brasileiro, pois
rompeu fronteiras literárias. Sidney trocou cartas e ganhou elogios
do poeta Carlos Drummond de Andrade; e se tornou amigo
influente do escritor paulista Raduan Nassar. Ao mesmo tempo

257
transformou sua cidade natal Viçosa das Alagoas, em um burgo
contemporâneo e universal, com grandes histórias e grandes
personagens. Permaneceu em Viçosa até os quinze anos de idade.
A literatura ganhou força em sua vida entre os 17 e 18 anos,
quando cursava medicina, curso que não gostava. “No primeiro
ano de Medicina, ao cursar Anatomia, percebi a absoluta falta de
vocação para esse curso e essa profissão. Danei-me a escrever
poemas (na época, lia um bocado Drummond, Pessoa e João
Cabral), e até hoje não me curei desta doença”. Sidney ghegou a
trocar cartas com o grande poeta mineiro, em uma delas
Drummond solta um perfil de seu missivsta alagoano:

“Sua poesia é certeira e comunicante, exprimindo embora um


jeito muito especial de ser e reagir diante da vida. Você se afirma, se
define, ao mesmo tempo dá a dimensão geral do homem, na
complexidade do ser presente e sentinte. E compõe um verso forte,
provocador, que não deixa o leitor indiferente”

Palavras de Carlos Drummond de Andrade endereçadas a


Sidney, impressas na orelha do livro Na pele do lago (1999)

Inequação

Não se entra e sai da amada


como se entra e sai do teatro.
Do teatro se entra e sai
da mesma forma e maneira:

258
com cinco dedos por mão,
com vinte dedos no corpo,
trinta ideias na cabeça,
algum dinheiro no bolso;
com vida, se entrarmos vivos;
defuntos, se entrarmos mortos.

Na amada mergulhamos
por completo, inteiramente,
e quando à tona tornamos
há em nós algo de menos:
pode ser nosso suor
a encharcar nossas vestes;
nosso sangue, nosso sêmen
que em seu ventre floresce;
pode ser nossa agonia,
nossa careta de gozo ou
nossa contrição de prece.

O fato é que algo resta


longe de nós, naufragado,
e não mais somos quem éramos
quando cansados fugimos
do mar gozoso da amada.

Não se entra e sai da amada

259
como se entra e sai de um auto.
Num auto se entra e passeia
por ladeiras e ruas planas,
por campos, charcos, desertos,
asfalto, barro batido,
canaviais, açucenas,
e ao final da jornada
restamos inteiros e vivos,
de igual forma como entramos.

Na amada mergulhamos
por completo, inteiramente,
e quando à tona tornamos
há em nós algo de excesso:
pode ser o seu perfume
reacendendo em nossa pele,
a mancha do seu batom
tatuada em nosso ombro,
um pelo do negro púbis
boiando em nossa saliva,
ou o nosso peito inflado
de senhor dono do mundo
(porque senhores da amada).

O fato é que ao final


da batalha sem porfia
em nosso corpo habita

260
algo que antes não havia:
um sargaço, um crustáceo,
sal, areia, maresia,
ou algo que antes no mar
gozoso da amada dormia,

Em verdade não se entra


como se sai da amada:
em nós algo se acrescenta,
ou em nós algo há que falta.

Do livro Desde Sempre, 2000

Drummond e Raduan no radar do poeta

Sidney Wanderley iniciou a troca de correspondência com


Carlos Drummond de Andrade em abril de 1980, quando o jovem
poeta de 21 anos, recebeu a primeira das dez cartas do poeta
Sidney Wanderley. Aos 78 anos e reconhecido então como o maior
poeta brasileiro, Drummond enviou a carta a Sidney após ler
“Poesia, Canção Suicida”, ensaio do alagoano de Viçosa premiado
em concurso pela Academia Alagoana de Letras que analisava a
ideia do suicídio nos primeiros dez títulos da obra de Drummond.
“Grata, muito grata surpresa, a leitura do seu trabalho, tão
discretamente enviado, e a revelar a existência de um amigo
distante, cheio de simpatia compreensiva para com a minha

261
versalhada, a remota e a de agora”. Drummond faleceu em 17 de
agosto de 1987, e ainda em abril Sidney receberia sua última carta.
Em 1991 data de publicação de Poemas post-húmus, Sidney se
aproxima de outro monstro da literatura brasileira, o escritor
paulista e best seller, Raduan Nassar. Motivado pela obra Poemas
post-húmus que recebeu de um jornalista. Raduan entra em contato
com Sidney Wanderley através de carta, gerando uma aproximação
que se transformou em influente amizade. Leia a poesia que
encantou Raduan, Poemas post-húmus:

crepúsculo.
mudo faz-se o mundo
e loquaz a luz
**
do derradeiro canto
do pomposo cisne
ri-se o riacho irônico.
**
sem culpa ou agasalhos,
plácidos peixes passeiam
no estreito mar do aquário.
**
cauda e crina equinas
eriçam quando roçam
carnes femininas.
**
na cozinha da casa-grande

262
entre a fuligem e os temperos
o tricô dos fuxicos se expande.

**
com frieza assassina
engole bois e pastagens
a espessa neblina.
**
talvez celebre a andorinha
morta no campanário
o repique desses sinos.
**
bem hajam os que ouvem
átomos, galáxias,
brumas e Beethoven.

Sidney Wanderley, no livro Hai Quase, Editora Guararapes


(PE)

Zé da Feira: a poesia popular

José Alves Feitosa, jornalista profissional (repórter


fotográfico) e poeta. Nasceu em 29 de março de 1951 na cidade de
Paulo Jacinto, Alagoas. Filho do cearense Antonio Alves Barbosa
e de Rosa Feitosa Barbosa. O pai “seu” Antonio, trabalhador,
passou parte da vida entre Alagoas e o Ceará, mas em 1960 o velho
artesão toma uma decisão definitiva na vida: fixou-se em Paulo

263
Jacinto, região serrana no agreste alagoano. José, o segundo dos
filhos, depois de perambular como cigano com o pai entre Alagoas
e Juazeiro do Ceará, foi estudar em Viçosa. O contato com os
cantores, a música popular e a poesia de cordel, abriu uma janela
na vida do adolescente que mais tarde se tornaria poeta. O
ambiente de boemia em Viçosa, terra de grandes figuras, como o
músico Zé do Cavaquinho, Teotônio Vilela, Octavio Brandão, José
Maria de Melo, José Pimentel, José Aloísio Brandão, Alfredo
Brandão, Sidney Wanderley, Denis Melo, Eloi Loureiro Brandão,
Nelson Almeida e outros. Feitosa, diz sempre que: “Foi em Viçosa
que iniciou o aprendizado do jornalismo e de minha profissão de
repórter fotográfico”. Trabalhou como repórter fotográfico em
todas as redações de Alagoas, dos extintos Jornal de Alagoas, o
mais antigo do Estado, que pertencia aos Diários Associados e
Jornal de Hoje, Gazeta de Alagoas, Tribuna de Alagoas. O olho de
repórter e a sensibilidade de poeta caminharam juntos. Em todos
esses momentos esteve presente o jornalista e poeta José Feitosa, o
Zé da Feira.

Sequidão

A terra queima ardente


Nem sequer pode chorar,
Não germina a semente
Porque água não há.

É a seca devorando

264
O que existe no chão,
Bebendo a água da terra
Do esperançoso sertão.

O sol no alto inclemente,


Tão quente, abrasador...
Espelhando fome e pavor.

É a terra tremendo
O gado gemendo,
A lavoura morrendo...
É só desolação!
É a terra queimando,]
O povo chorando,
Pedindo, implorando
A salvação...
nas águas da irrigação!

Zé da Feira, em O Sonho do Zé da Feira, Sergasa, 1983 –


Maceió

Fernando Fiúza: a poesia com vida própria

Fernando Otávio Fiúza Moreira, 56 anos, escreveu seu


primeiro livro de poesia – O vazio e a Rocha – com 31 anos, em
1992. Na década de 80, Fernando Fiúza forma-se em Economia
pela Universidade Federal de Pernambuco, entretanto, nunca

265
exerceu a profissão, e partiu para construir sua trajetória como
poeta, compositor, tradutor, crítico literário, professor e
dramaturgo. Fernando Fiúza seguiu os passos de grandes
intelectuais alagoanos, e embarcou na diáspora literária, deixando
Maceió para aportar no Rio de Janeiro e lá viveu até meados da
década de 90, período – segundo o próprio poeta - de maior
produção do autor. Em 1995, resolve ir para França estudar,
voltando em 2000 com os títulos de mestre e doutor em Langue et
Littérature Françaises, pela Université Stendhal Grenoble-III. Ao
terminar o doutorado, volta para Maceió. Em 2001 ingressa na
Universidade Federal de Alagoas, como professor da graduação e
pós-graduação do curso de Letras. Referente à sua produção
poética, Fernando Fiúza lança seu segundo livro em 2004: Tira-
prosa; em 2008, Alagoado; já em 2012 é lançado Outdó. Em 2013,
o poeta resolve enveredar pelo ramo da dramaturgia, e vê no palco
Balanço Final – um monólogo, com direção de Homero Cavalcante
e interpretação de José Márcio Passos. No livro Alagoados,
Fernando retoma seu umbigo, e reúne 20 anos de poesia sobre sua
terra, Alagoas. “Alagoado não procura a alagoanidade (apenas um
dado, viciado): sua baliza é porto, lugar permanente de passagem,
a primeira terra, a última água, o fim do mar, lugar de bandeiras e
neurto, ou quase: uma nação visitando outra, em casco, gente e
fardos. A bússsola artesanalmente fabricada às duras penas – e a-
partes”.

O Mapa

266
Há quem perceba no mapa
geográfico de Alagoas
o formato de um revólver.

O lado externo do cabo


é de esmeralda corrente
e um morno colar de areia;

O de dentro, também verde,


de canaviais e mangue,
lagoa, riacho e rio.

O cão seria em Penedo


e a mira na Paulo Afonso
onde Delmiro se fez.

O lado externo do cano


é também feito de água
cansada do São Francisco.

O gatilho mais preciso


presisamente em Palmeira
- ou seria em Quebrangulo?

Searas gracilianas
- agrestes de talo e prego,

267
rifle, cinema e calor.

Mas não foi arma que vi


no mapa das Alagoas,
foi um alvo negro e úmido.

A virilha da direita
é de esmeralda corrente
e um morno colar de espuma;

Da sinistra sabe o rio


que dá diamba e melão
e na foz fez um deserto.

Sob os pelos afiados


- palha de cana e caatinga
- dorme uma carne macia.

- Pedra mole e massapé –


sangue velho, muita rima,
rendado, ostra e espelho.

Mas a greta é imprecisa:


Paraíba ou Mundaú?
Neste aí Jorge de Lima

na leda da margem porosa

268
fundou seu mundo de luz
sob as mangueiras em flor.

Fernando Fiúza, poesia coligida do livro Alagoado, 2008,


Belo Horizonte

TERRA DE CAMPEÕES

Zagallo: O coração de leão

O alagoano de Maceió, Mário Jorge Lobo Zagallo, 84 anos,


é acima de tudo um vencedor. O velho Lobo é o único homem na
face da terra a ter quatro títulos em Copas do Mundo, duas com
jogador (1958, na Suécia e em 1962, no Chile), uma como técnico
em 1970, no México, e mais uma como coordenador-técnico: em
1994, nos Estados Unidos. Em 2002, o Brasil conquistou o penta
sem Zagallo. Na Copa de 2006, ele voltou a ser coordenador-

269
técnico, mas após a eliminação do Brasil acabou se afastando do
futebol. Com fama de pão-duro e supersticioso, Zagalo cerca-se de
amuletos e manias, incluindo uma fixação pelo número 13. Como
jogador, além de ter sido tricampeão pelo Flamengo (1953/54/55),
foi bicampeão pelo Botafogo (1961/62). Como treinador
conquistou o Campeonato Carioca de 1972 pelo Flamengo e o
bicampeonato pelo Botafogo (1967/68). Zagallo, como jogador, foi
o personagem da semana do jornalista Nelson Rodrigues, na
coluna que escrevia para a Manchete Esportiva, em agosto de
1958, no jogo Flamengo 2 x 2 Botafogo.

“Começa o jogo. Zagallo se atira na batalha. Ele quer ser o


Zagallo campeão do mundo. Lá, sempre apanhava a bola, ele fazia
lembrar o Tom Mix do cinema mudo: partia em todas as direções.
Despontava atrás, na frente, na meia-canja, e tudo ao mesmo tempo,
numa presença múltipla e constante. Seu tórax magro esconde um
coração, um coração tremendo. Walter Scott, se o reconhecesse diria:
“Zagallo, Coração de Leão”.
Nelson Rodrigues, em O Berro Impresso nas Manchetes,
editora Agir/ RJ - 2007

O “forminguinha” veloz da Canarinha

Atuando como ponta-esquerda, conquistou títulos de


campeão carioca e foi convocado para a seleção brasileira, que
disputaria a Copa do Mundo de 1958 na Suécia. Era o armador
pela esquerda, o desafogo da defesa, o idealizador do contra

270
ataque, o ajudante no lateral, o formiguinha do time campeão do
mundo. Como jogador, em clubes, iniciou sua carreira nos
aspirantes do America carioca, onde chegou a conquistar o Torneio
Início em 1949; transferiu-se, e foi posteriormente tricampeão
carioca pelo Flamengo, bicampeão carioca pelo Botafogo, clube
onde também veio a conquistar a Taça Brasil, e outros títulos, além
de bicampeão mundial pela seleção brasileira. No Botafogo
participou da fase áurea do time, jogando ao lado de astros como
Garrincha, Didi e Nilton Santos. Seus títulos cariocas e a conquista
da Taça Brasil o levaram a seleção brasileira de futebol. Com ele o
Brasil inovou taticamente e jogou em 1958 no esquema 4-3-3, pois
Zagallo era um ponta esquerda que recuava para ajudar no meio-
de-campo. Nessa Copa e na seguinte (1962) deixou na reserva
Pepe, grande astro do Santos e companheiro de Pelé.

Dida é campeão do mundo

Edivaldo Alves de Santa Rosa nasceu em Maceió, em 16 de


março de 1934, e morreu no Rio de Janeiro, em 17 de setembro de
2002. Conhecido como Dida, o alagoano foi artilheiro no
Flamengo do Rio de Janeiro e campeão do mundo na Suécia, em
1958. Dida atuava na posição de Meia e iniciou no CSA de
Maceió, sua cidade natal. Durante uma partida entre as seleções de
futebol de Alagoas e da Paraíba nesta cidade, foi notado por
dirigentes do Flamengo. Convidado para testes no clube, foi
aprovado, apesar da timidez e da icterícia, que seria tratada.

271
Mesmo franzino, tornou-se o maior artilheiro do Flamengo até a
era Zico, marcando 257 gols em 364 jogos entre 1954 e 1963.
Deixou a titularidade com a chegada do treinador Flavio Costa e
transferiu-se para a Portuguesa em 1964. Encerrou a carreira no
Atlético Júnior da Colômbia. Na seleção Dida era um dos titulares
até a Copa do Mundo de 1958. Disputou o primeiro jogo da
Seleção Brasileira contra a Seleção Austríaca, porém uma contusão
o deixou no banco de reservas e abriu vaga para o jovem Edson
Arantes do Nascimento (Pelé), que encantaria o mundo com seu
futebol. Faleceu em 17 de dezembro de 2002, aos 68 anos, vítima
de insuficiência hepática e respiratória.

Reserva de Pelé
Dida jogava originalmente como ponta de lança, e deu azar
de ser a mesma posição que o Pelé. Na Copa de 1958, começou
como titular, mas depois perdeu a vaga para o “rei”, mas foi
Campeão do Mundo na Suécia. Seu temperamento irascível, como
explica em sua autobiografia escrita junto com o radialista Luiz
Alves, o fez comprar sérias brigas com a imprensa, e os próprios
dirigentes. No capítulo “a força de um falso diamante”, o craque
aponta toda sua ira contra o ex-jogador Leônidas da Silva, o
Diamante Negro, então comentarista na Copa pela imprensa
paulista.

“Chamaram-me de grosso, de medroso, graças a um tal de


Leônidas Silva, um dos homens fortes da Comissão Técnica, embora
seu nome não fizesse parte da mesma. Este senhor, conforme soube

272
mais tarde, sem poder negar suas raízes, sem olvidar a inveja de por
ter sido eu quem superou seu prestígio no Flamengo, tornado-se
então o maior ídolo de todos os tempos na história da Gávea (sic),
valeu-se de um microfone para soltar sua peçonha contra mim que,
inocente, dentro de campo, dava tudo de mim e corria horrores” .
(ALVES, 1993)

Marta Vieira: de Alagoas para o mundo

Aquela menina mirradinha, nascida em Dois Riachos, sertão


de Alagoas, que vendia geladinha (flau), puxava carroça na Feira
de Gado – a mais movimentada do estado – matava rolinha para
comer e que fugia da aula para bater bola com os meninos na terra
rachada, embaixo da ponte - agora é a rainha Marta, atacante de
futebol, cinco vezes eleita a melhor jogadora do mundo e
embaixadora das Nações Unidas (ONU) para a infância e
juventude. Marta Vieira da Silva joga hoje no time feminino do
Orlando Pride, na Flórida. No Brasil, a camisa 10 da seleção pôs
no peito a medalha de ouro dos Jogos Pan-Americanos de Santo
Domingo (2003) e do Rio de Janeiro (2007), e a de prata na
Olimpíada de Atenas (2004) e na Copa do Mundo feminina (2007),
num jogo em que Marta perdeu um pênalti – fazendo a mãe
desmaiar na sala de casa. Após grandes exibições recentes, Marta
chegou a ser comparada a Pelé, sendo chamada pelo mesmo de o
"Pelé de Saias". Além disso, entrou na calçada da fama do
Maracanã, em 2007, após o ouro no Pan do Rio, sendo a primeira
e, até agora, a única mulher a deixar a marca dos pés neste local.

273
Juvenal: o vaqueiro campeão

O maior e mais talentoso jóquei de todos os tempos no


Brasil, pentacampeão do Grande Prêmio Brasil, o mais importante
do país, é um vaqueiro alagoano de Delmiro Gouveia, Juvenal
Machado da Silva. Aposentado, com 61 anos, ele deixou as glórias
de lado, e agora vive no sertão alagoano, brincando com os netos e
cuidando de sua terra. A vida de Juvenal virou filme, Lá Vem o
Juvenal, do cineasta alagoano Hermano Figueiredo, de 2012. Dono
de uma tocada com a canhota que poucos conseguem chegar perto,
Juvenal ainda possui uma legião enorme de fãs. Ele chegou ao
Jóquei Clube do Brasil, no Rio de Janeiro aos 16 anos para
ingressar na Escola de Profissionais do Turfe em 1971 e
conquistou a sua primeira vitória. Juvenal foi hexacampeão da
estatística de jóqueis, de 1976 a 1981, dono de mais 4000 vitórias,
somente no Hipódromo da Gávea. Ele só perdeu o hepta para Jorge
Ricardo em 1982. Em sua trajetória de sucesso, fez o público
vibrar com belas vitórias. Todos que o acompanharam nestes 33
anos, jamais vão esquecer do jóquei alagoano. E todo o seu público
também conhece o famoso bordão: “Lá vem o Juvenal!”, criado
pelo locutor oficial do Jockey Club Brasil: Ernani Pires Ferreira.

“Juvenal Machado tem ainda, tanto no aspecto físico como no


seu comportamento, todas as características de suas raízes indígenas.
E como índio, é um homem que não se deslumbra com o sucesso,
nunca perdeu a simplicidade e serenidade; sendo acima de tudo uma

274
pessoa do povo que gosta de viver em contato com a natureza, numa
relação de harmonia com a terra, com os animais. Este talvez seja o
segredo de sua genialidade.”
Hermano Figueiredo, diretor do filme Lá vem o Juvenal, de
2012

Eduardo Canuto: punhos de aço

O vereador alagoano Eduardo Canuto seguiu a vida política,


mas deixou um legado gigantesco no esporte, para não dizer
pesado, onde chegou ao estrelato mundial na luta livre, como
campeão mundial de kickboxing, encerrando sua carreira nos
ringues com um cartel de 40 lutas, sendo 36 vitórias e apenas
quatro derrotas. Com 49 anos, em 2012, Canuto se despediu dos
ringues com uma vitória no IV Coliseu Extreme Fight, em Maceió.
Já passaram doze anos que ele tinha abandonado os ringues,
quando construiu uma carreira de sucesso. Simples, emotivo,
vencedor, atravessou cada dificuldade com a serenidade de um
verdadeiro campeão. Lutador referência chegou ao topo do seu
esporte com títulos mundiais, recordes de público em ginásios e
lutas memoráveis. Parou.

Sônia: a maior paraolímpica alagoana

Com 27 anos de experiência paraolímpica, Sônia Maria de


Gouveia, hoje com 56 anos, viveu sua glória quando abriu a
contagem de medalhas do Brasil no Parapan-americano do Rio de

275
Janeiro, em 2007, com o bronze no lançamento de dardo, e prata
no disco. Sônia também estufou no peito muitas medalhas em
campeonatos nacionais, internacionais, no Mundial de Assen, na
Holanda, em 2006, com medalha de bronze no lançamento de
dardo. Com dois anos foi acometida pela poliomielite, mas seguiu
sua estrela, primeiro na natação, depois se consolidou no dardo e
no disco. Desde 1989 vem ganhando campeonatos em todo mundo,
com medalhas no Brasil, na Venezuela, na Inglaterra.

Marina Tavares: top ranking no tênis

A atleta alagoana Marina Tavares, 31 anos – começou jogar


aos oito -, tem um cartel qualificado e com muitas vitórias. Marina
já esteve no topo ranking brasileiro de dupla profissional, e se
manteve entre as 100 primeiras tenistas no ranking mundial juvenil
em simples e duplas, durante os anos 1998, 1989 e 2001, quando
viveu sua fase de ouro nas quadras de grama e saibro. Ela foi
convocada várias vezes para integrar a Confederação Brasileira de
Tênis em Campeonatos Mundiais. Hoje, afastada das quadras, ela
não perdeu o ímpeto de campeã, agora fora de campo, quando
criou em Maceió um projeto para ensinar tênis a crianças carentes,
uma forma de inclusão social através do esporte. Nascia, assim, o
Instituto Marina Tavares (IMT). Marina Tavares vai encarar mais
um desafio na sua vida: a alagoana recebeu um convite para
integrar o Comitê Rio 2016, grupo organizador das Olimpíadas e
Paraolimpíadas, disputadas na Cidade Maravilhosa.

276
“Eu acho um esporte fantástico. Gosto de esporte em geral,
mas o tênis é disparado. Então, o conselho que dou é que, se gosta, se
vê que tem alguma identificação, se tem talento, vai fundo. Se não
tiver, vai no esforço. Vale à pena persistir, porque no fim das contas o
único foco não é você ser tenista profissional. No meu caso sim,
porque foi e é o meu objetivo. Mas através do esporte é possível
ganhar uma bolsa de estudos, numa boa universidade americana, por
exemplo. O tênis abre portas e, mesmo que se jogue num nível
amador, sempre abre espaços”

Fátima Pinto: geração de ouro do voleibol

Nos anos 1960 e 1970, Alagoas vivia uma efervescência em


seu voleibol feminino, a adrenalina e os hormônios pulavam em
jogos eletrizantes entre os times do Clube Fênix Alagoana, do CSA
e do CRB, e lá fora, a seleção alagoana papava campeonatos
regionais e nacionais. Desse caldo, saiu uma jogadora poderosa,
Fátima Pinto, convocada pela primeira vez para a Seleção
Brasileira de Voleibol principal, em 1973, aos 17 anos Nos anos
setenta, passou cinco anos com as meninas do vôlei brasileiro, nas
quadras internacionais em campeonatos sulamerianos,
panamericanos e mundial. Participou de etapas decisivas na
Coréia, Japão, Argentina e no México, dentro de um Estádio
Azteca lotado – onde a seleção brasileira conquistou o
tricampeonato mundial – “com os mexicanos gritando Brasil e
jogando os sombreros para alto”. Aos 65 anos, Fátima Pinto é chef
gourmet, e mantém seu portal Ciscando na Cozinha com opções de

277
comida regional. Mas ela não esquece as amigas e colegas que
formaram com ela a geração de ouro do voleibol feminino
alagoano: Alzira, Luana, Ana, Denise, Silvana, Simone, Cristina,
Nina, Cilza, Tereza, Rosa, Lucy Fireman, Clarissa, Socorrinho,
Lucia Sarmento, Vanessa, Suzana, Noêmia e Kátia Born.

Yohansson é ouro em Londres

Seu nome é Yohansson Nascimento Ferreira, 25 anos,


consagrado mundialmente pelo ouro nas paraolimpíadas de
Londres, em 2012. Veio ao mundo e cresceu sem as duas mãos,
fruto de um problema congênito durante sua formação no ventre da
mãe. “Eu acho que já nasci um paratleta”. O velocista alagoano se
notabilizou como o atleta mais rápido do mundo nos 200m rasos
T46 (categoria para pessoas com amputações) nas Paraolimpíadas
de Londres, quando conquistou a medalha de ouro. Nessa prova,
Yohansson fez o tempo de 22s05, batendo o recorde mundial.
Resultado: foi ao lugar mais alto do pódio ao conquistar a medalha
de ouro para o paratletismo brasileiro. Hoje, o campeão acumula
cerca de 150 medalhas desde que fincou pé no atletismo, fruto de
várias competições em que participou no Brasil e no exterior.
Garoto humilde, do bairro do Vergel do Lago, desde que ingressou
no atletismo em 2005 até o ano de 2008 a barra foi pesada.
“Sempre treinei em pistas sem condições e sem um centavo de
patrocínio. Mas sempre acreditei no meu sonho.”

Garrincha: a flecha que partiu de Alagoas

278
Manoel dos Santos, o Mané Garrincha (1933-1983), um dos
maiores jogadores do futebol mundial de todos os tempos,
bicampeão do mundo pela Seleção Brasileira na Suécia (1958) e no
Chile (1962), tem suas raízes plantadas em Alagoas. Seu pai,
Amaro Francisco dos Santos, é alagoano de Quebrangulo, que
como o avô do jogador, Manoel Francisco, vivia como índio
nômade, fugindo do jugo da escravidão imposta pelo colonialismo,
até a chamada diáspora, quando o pai do craque e sua família
fugiram de Águas Belas (PE), para o agreste de Alagoas. A vida de
Garrincha e seus vínculos com seus ancestrais índios de Alagoas é
uma história de tirar o fôlego, e foi contada no livro do jornalista
Mário Lima, Mané Garrincha – A Flecha Fulniô das Alagoas
Mestiçagem, futebol-arte e crônicas pioneiras. O livro mostra o
inventor do futebol arte com sua terra mater, onde chegou a jogar e
a vestir o manto sagrado do CSA e no ASA de Arapiraca.

“(Os pais de Garrincha) contentaram-se em reproduzir em


Pau Grande o mesmo estilo de vida que levavam nas Alagoas. Talvez
porque o cenário fosse parecido: em Quebrangulo, o horizonte era a
Serra da Barriga; em Pau Grande, a Serra dos Órgãos. As malas e os
sacos de aniagem que abriram ao chegar podiam conter somente as
alpercatas de couro e uma ou duas camisas de riscado. Mas eles
traziam também os invencíveis costumes do Sertão: as superstições,
os desafios de viola, as redes de dormir, o sexo sempre em riste, a
naturalidade com que se produziam filhos fora do casamento,”
Rui Castro, no Livro Estrela Solitária, de 1997.

279
Anjo das pernas tortas volta à sua terra-mãe
Em Alagoas, Mané Garrincha não foi uma estrela solitária,
apesar da flagrante decadência física em que se encontrava. A
torcida lotou os dois estádios que receberam o Anjo das Pernas
Tortas na Terra dos Marechais, em dois desses incontáveis jogos
de exibição, Mané virou espécie de artista saltimbanco pelo Brasil.
As duas cidades contempladas foram Maceió e Arapiraca. Era 19
de setembro de 1973, data que muitos nunca esqueceram. Foi
como um sonho, em verdade, para muitos torcedores do CSA.
Afinal, dois ídolos do futebol brasileiro vestiriam a camisa azulina
no mesmo dia. No dia inesquecível, uma feliz coincidência, como
lembra o jornalista e diretor do Museu dos Esportes, Lauthenay
Perdigão, que homenageou Dida dando-lhe o nome do museu. “A
camisa do CSA tinha praticamente as mesmas cores da primeira
grande conquista do Brasil, em 1958: um azul muito parecido com
a que a seleção usou na Suécia”.
Roberto Menezes: a lenda dos gramados alagoanos

Roberto Gonçalves de Menezes, ou simplesmente Roberto


Menezes, nasceu no dia 9 de maio de 1948, e desfilou sua arte
entre 1965 e 1975 por três clubes: CRB, CSA e o Vitória da Bahia.
Mas foi no Galo da Pajuçara, seu time de coração, onde o craque
mostrou sua arte por mais tempo (entre 1965, ainda nos juvenis,
até 1973). A torcida do Alvirrubro não esquece aquele jeito
elegante e único de tratar a bola. Estilo clássico, cabeça sempre
levantada, lançamentos precisos, peito estufado: era o estilo do

280
“Galego” – como era chamado por alguns amigos. Parecia andar
na ponta dos pés para jogar com a cabeleira elegante, que, não
raro, encantava a mulherada nos estádios. Elegante mesmo era seu
futebol, cuja habilidade quase lhe rendeu um prêmio nacional: a
disputadíssima “Bola de Prata”, condecoração que a revista Placar
elegia os melhores jogadores do Brasil nos anos 1970. E foi a
partir da disputa da Bola de Prata contra ninguém menos que o
quarto-zagueiro mineiro Wilson Piazza, tricampeão mundial em
1970 pelo Brasil, que Menezes saiu do patamar de craque para
virar uma lenda dos gramados do Brasil e de Alagoas. Roberto
Menezes faleceu há doze anos, vítima de câncer em um dos olhos.

Lembro-me, como uma das mais arrebatadoras das minhas


lembranças infantis, a elegância majestosa do seu futebol. O prazer
voluntarioso e apaixonado com que a bola deixava-se levar,
submetida a seus pés, à sua volúpia, a seus caprichos de jogador
refinado, elegante e objetivo. As nossas ruas confluíam, apontando
para a Praça Sinimbu, onde fomos criados quase maloqueiros,
jogando pelada em um campo vasto, pois a Praia da Avenida era
nossa, e Roberto Menezes, futuro engenheiro e já ídolo de futebol,
mostrava-nos gratuitamente o engenho de sua arte, para nós mais
que complicada, insondável. Hoje eu sei porque as bolas do mundo
inteiro tinham uma grande paixão por ele, que as tratava com
respeito e indiferença.

“O galego foi uma cobra criada na turma da Sinimbu”.


Roberto Menezes era “o cara” do futebol alagoano no inicio dos

281
anos setenta, a era dos hippies, do movimento estudantil, dos poetas
undergrounds. Com seus cabelos louros e cacheados fazia a alegria
da moçada. “Ele é de um tempo que o romantismo fazia a cabeça da
juventude naqueles anos dourados, em que arte e futebol andavam
juntos. Nessa época, o quarto-zagueiro fazia parte da chamada
Turma da (Praça) Sinimbu, que se reuniam para conversar sobre as
boas coisas da vida”, lembra o amigo de infância Bessa da Loteria.
Foi campeão pelo CRB onde começou em seus juvenis. Jogava futebol
e cursava engenharia. Em 1973 só não ganhou a Bola de Ouro da
revista Placar porque o CRB não se classificou para as semi finais do
campeonato brasileiro. No ano seguinte se transferiu para o Vitória
de Salvador assinando um contrato de dois anos com o mais alto
salário do clube. Quando sentiu que estava sendo boicotado pelos
companheiros pediu para voltar ao futebol alagoano. Em 1975, o
CRB não se interessou na sua volta e o CSA conseguiu Roberto
Menezes por empréstimo de um ano, quando foi mais uma vez
campeão alagoano. Quando encerrou seu contrato com o CSA voltou
a cuidar de sua carreira para cuidar da profissão de engenheiro. Em
28 de agosto de 2003, morria uma lenda do futebol alagoano.
Cláudio Canuto, jornalista e cientista social em seu artigo
Eu o vi jogar, 2003

Aventuras de Jacozinho

O lendário ponta-direita Jacozinho ganhou quase tudo no


CSA, foi defendendo o time azul, de 1981 a 1987, que conquistou
cinco títulos de campeão alagoano e três vezes vice da Taça de

282
Prata. E se tem festa para Jacó, tem alegria também para a
molecada. Ídolo do CSA dentro de campo e fora dele, Jacozinho,
se notabilizou com seu jeito excêntrico, moleque. Era um eterno
menino, bon vivant, que sempre cativou adultos e crianças.
Driblava como poucos e tinha o poder de despertar as multidões.
Ele dominava a bola, domava seus marcadores e hipnotizava o
público. Desembarcou em Maceió em 1981 e multiplicou os
torcedores do CSA. Em campo, fazia estragos por onde passava;
fora dele, cativava até os rivais com um jeito que chegava até
mesmo lembrar um tal Garrincha das Alagoas. Passou por diversos
clubes ao longo da sua carreira, entre eles Jequié (BA), Galícia
(BA), Lêonico (BA), Corinthians de Presidente Prudente (SP),
ABC (RN), Baraúnas (RN), Rio Branco FC (AC), Nacional (AM),
Santa Cruz (PE) e Ypiranga (PE). Mas a fase de maior sucesso foi
defendendo o CSA.

O dia em Zico ficou p... da vida


Em 1986, Zico promoveu uma grande festa no seu retorno
ao Flamengo. Na partida especial, o craque defendeu o rubro-negro
no duelo com uma seleção formada por grandes nomes do futebol
mundial, entre eles o argentino Diego Armando Maradona. A saga
começou quando Jacozinho foi jogar com o CSA contra o
Cruzeiro, em Belo Horizonte, e resolveu tentar a sorte no Rio de
Janeiro. Ele foi assistir a um jogo do Vasco no Maracanã, e o
repórter da Rádio Globo Washington Rodrigues ao ver o “astro” no

283
estádio, convidou Jacó para comentar a partida. Ele assumiu o
comando da jornada e não teve pra ninguém. A torcida do Vasco
deixava de prestar atenção no jogo para ouvir as histórias do
boleiro. Naquela mesma semana, Zico programava sua festa no
Maracanã, e o repórter Márcio Canuto tentou colocar o craque do
CSA no “script”. “Com aquele jeitão todo dele, o Márcio Canuto
me disse: ‘vamos, Jacó, vou lhe apresentar ao Zico e você vai
entrar nessa festa, meu filho. O povo quer que você jogue.” Na
apresentação ao craque do Flamengo, o sergipano percebeu que as
coisas não seriam tão fáceis assim. “O Zico mal pegou na minha
mão e virou de costas. Quis ir embora, mas já tinha feito amizade
com outros jogadores, como o Júnior, e o Márcio me convenceu a
ficar”.

Passe de Maradona... drible no goleiro... goool


Jacozinho contou que ficou esperando ansioso pela
oportunidade de entrar no jogo de despedida de Zico no Flamengo,
contra a seleção do técnico Telê Santana. Que assistia ao jogo
tranquilamente, sentado no banco de reservas dos jogadores
convidados para a “festa”. “Eu estava aperreado porque queria
mostrar o meu futebol. Era a chance. No segundo tempo, a partida
estava morna e, de repente, a massa começou a gritar meu nome:
‘Jacozinho! Jacozinho! Jacozinho! Eu era o circo que o povo
queria, e o Telê resolveu atender à torcida. Ele me chamou para
conversar e mandou entrar no lugar do Falcão”. Jacó entrou
endiabrado em campo. Buscando o jogo a toda hora, o jogador
percebeu em certo momento que Maradona havia recebido a bola

284
sozinho no meio-campo. Partiu em velocidade e foi lançado por
Maradona no meio da defesa do Flamengo. O ponta dominou a
bola em velocidade, deu um drible da vaca no goleiro Cantarelle,
ganhou do zagueiro Figueiredo na corrida e encostou para o gol
vazio. “Consagração geral. Depois daquele gol, amigo, a torcida
esqueceu o Zico e só gritava o meu nome. Saí do Maracanã
consagrado. No outro dia as manchetes destacavam: Jacozinho
rouba a festa de Zico”, conta Jacó. Toda essa fama, rendeu a Jacó
entrevistas nas mais conceituadas revistas de esporte do País, como
a capa de Placar com a camisa da seleção brasileira.

E o massagista Castanha tirou a bola do gol

A partida estava eletrizante no Rei Pelé, no Clássico das


Multidões, em um 8 de abril de 1976, até aos 40 minutos do
segundo tempo entre CSA x CRB. Foi tudo muito rápido, Silva
do CRB arrancou pelo meio driblou o goleiro Paulo Sérgio e
chutou para o gol vazio. Vazio? Quando a torcia ia começar a
comemorar o gol, um vulto aparece atrás da trave e chuta para
frente a bola que ia entrar. Quarenta mil torcedores se esgoelavam,
os azulinos pulavam de alegria. Foi o Castanha! Foi o Castanha! E
foi mesmo. O massagista e apaixonado pela CSA, apesar da
celeuma, não se arrependeu:

“Daí, o Silva veio com grande categoria, conseguiu driblar o


Paulo Sérgio e chutou. Quando a bola ia para o nosso gol eu estava
por trás da trave e entrei em campo. Chutei a bola e a desviei. Os

285
‘caras’ vieram atrás de mim, querendo me pegar. Do vestiário, fui
levado para o Mutange e saí de lá para um restaurante que tinha no
bairro de Ponta Grossa, chamado ‘Buraco da Zefa’. Ao chegar lá,
estavam juntos torcedores do CSA, do CRB e membros da imprensa.
Alguns torcedores do CRB ainda partiram para me bater e eu me
defendi segurando uma cadeira. Foi uma confusão danada, mas no
final foi tranquilo”.
Cícero Lopes de Araújo, o Castanha, massagista do CSA

Paranhos: paredão alagoano na zaga são-paulina

Marivaldo Paranhos Prado, o zagueiro-central Paranhos, aos


67 anos, eterno ídolo do CSA, e que brilhou no São Paulo, revela
como marcava seus principais atacantes adversários: “O Rivelino
todo mundo sabe que era meio invocado, sempre marquei em
cima”; “Com Pelé, tive a sorte de pegar o ‘negão’ já quase em fim
de carreira. Mas o rei não era fácil. Batia um bocado quando
podia”; “Com Zico joguei realmente de cara feia e ele nem chegou
mais perto”. Paranhos jogou pelo tricolor do Morumbi de 1973 a
1977, quando conquistou um Paulista e um vice na taça
Libertadores da América; fez 233 jogos, sendo 111 vitórias, 85
empates e 37 derrotas. Paranhos continua sendo um dos mais
queridos jogadores do CSA em todos os tempos. Zagueiro que
começou no Mutange em 1965 e foi campeão juvenil, se tornou um
grande zagueiro que no time principal também conquistou alguns
títulos participando da campanha do tetra nos últimos três títulos
de 1966, 1967, 1968. Ainda jogou no time do Santa Cruz de Recife

286
e voltou a Maceió para encerrar sua carreira no CSA. Tentou a de
treinador no próprio clube azulino, mas não deu certo.

TERRA DE FUTEBOL

1908: Penedo inaugura o football em Alagoas

Ismael Accioly que, um dia, foi presidente do CRB, realizou


uma pes Por Lauthenay Perdigão, em Arquivos Implacáveis, 1981,
editado pela Associação dos Cronistas Desportivos de Alagoas
quisa no jornal penedense – O Monitor – e escreveu que em 1908

287
o futebol já era uma realidade na cidade de Penedo. E o primeiro
jogo aconteceu no dia 27 de dezembro daquele ano. E aconteceu
em um terreno improvisado localizado em frente ao Cemitério
Publico, no bairro do Cajueiro Grande. Foot-Ball Club foi,
provavelmente, o primeiro clube que surgiu em Penedo e que
usava as cores vermelho e branco. O clube tinha dois times que
jogavam entre si. E foram essas duas equipes que disputaram o
jogo do dia 27 de dezembro. Uma época em que tínhamos o Gool-
keeper, Full-back, Half-back, Center-half e Center-forward.
totalmente a maquete original que estava com sérios problemas.
Por Lauthenay Perdigão, em Arquivos Implacáveis, 1981,
editado pela Associação dos Cronistas Desportivos de Alagoas

1909: Primeiro jogo em Maceió

Quando o futebol começou a aparecer em Alagoas um


jornal chamado Gutenberg foi de muita importância para as
pesquisas sobre o novo esporte. O proprietário Dr. Eusébio de
Andrade assumiu uma posição em defesa do futebol dando
cobertura sistemática as noticias e aos primeiros jogos. Havia uma
intimidade entre o novo esporte e a redação do Gutemberg. Mas
tudo se deve ao esforço de Manoel Machado, então no 5º ano de
Academia de Medicina da Bahia. Quando chegou de férias nos fins
de 1908, Manoel Machado trazia a idéia de fundar em nossa capital
um clube destinado à prática desse esporte. Animou outros
acadêmicos, como ele em férias na cidade, e no dia 31 de
dezembro, instalava-se na sua residência, na Praça dos Martírios, o

288
Alagoano Foot-Ball Club, do qual Manoel Machado foi aclamado
presidente. A maioria nunca tinha visto um jogo de futebol, apenas
Manoel Machado, Mário Trigo e Amadeu Dourado tinham um
vago conhecimento das regras do novo esporte. Depois de vários
adiamentos, chegou à tarde memorável da apresentação ao publico.

O jogo da Sofia: CRB 6 X 0 CSA

Chega a ser polemico pelas declarações de alguns


jogadores que participaram da partida disputada no dia 10 de
outubro de 1939 pelo segundo turno do Campeonato Alagoano. A
partida foi realizada na Pajuçara, e o juiz foi Artur Reis, ex-
jogador do Centro Sportivo Alagoano. Segundo depoimento do
lateral esquerdo do CSA, Rui Craveiro (falecido), o resultado da
Sofia não foi normal. Os dois times se equivaliam. Rui afirmou
que houve um desastre. Primeiro, porque os azulinos não
concordaram com a arbitragem que, apesar de ter jogado no CSA,
tinha brigado com a diretoria do clube do Mutange. Artur Reis
teria confirmado dois gols irregulares do Clube de Regatas Brasil.
Depois, porque o goleiro azulino, Orlando Gomes de Barros, se
descontrolou, e irritado, colocou duas bolas para dentro do seu
próprio gol. Finalmente, Rui Craveiro comentou que depois do
final da partida teve que aguentar a gozação dos alvirubros na
Praça do Rex que fica perto do campo da Pajuçara. O jogo não
chegou a terminar diante da confusão.
Por Lauthenay Perdigão, em Arquivos Implacáveis, 1981,
editado pela Associação dos Cronistas Desportivos de Alagoas

289
O jogo do Xaxado. CSA 4 X 0 CRB
O jogo do Xaxado foi um dos que mais emocionou a torcida
azulina. Não somente pelo resultado de 4 x O, mas pelo passeio
que o clube deu no seu tradicional adversário, o CRB. Xaxado é o
famoso ritmo musical. Na época, 10 de setembro de 1952, era a
musica do momento, das paradas de sucesso. Todo o Brasil
dançava o xaxado com Luiz Gonzaga. E naquela tarde, no campo
da Pajuçara, os jogadores do CRB dançaram o xaxado no ritmo
azulino. Foi um baile, um olé. Jamais se pensou em desrespeitar o
adversário, mas era gostoso observar a bola de pé em pé com os
alvirubros na roda. Como ninguém se lembrava do jogo da Sofia
(CRB 6 x CSA O), o marcador ficou mesmo nos 4 x 0. Havia
condições para superar os 6x0, entretanto, os jogadores do CSA
preferiram os dribles espetaculares, as jogadas de alto efeito
técnico, com a torcida azulina batendo palmas e gritando,
ritmicamente, a palavra xaxado. Muitos gols foram perdidos.
Por Lauthenay Perdigão, em Arquivos Implacáveis, 1981,
editado pela Associação dos Cronistas Desportivos de Alagoas
Rivalidade até no apito
Em 1941 aconteceu um fato interessante envolvendo os
tradicionais clubes da cidade. Um caso que mostra como era a
rivalidade entre CSA e CRB. Até mesmo em um amistoso para
arrecadar fundos para ajudar aos leprosos de Alagoas, a pedido do
então governador interventor Ismar de Goes Monteiro. O CSA não
queria, o presidente do clube, Paulo Pedrosa não aceitou participar
do jogo. Achava que, naquele momento, o CRB estava muito

290
melhor pelas contratações que havia feito. Dizia que o CRB queria
vencer o campeão de qualquer maneira. Mesmo assim, aceitou
comparecer ao Palácio dos Martírios para conversar com
Interventor Góes Monteiro e o presidente do CRB Rui Palmeira.

“Devido as pressões recebidas pelo Interventor, e os


conselhos de amigos, Paulo Pedrosa aceitou o desafio, mesmo
contra sua vontade. Quando Rui Palmeira indicou para apitar a
partida o tenente Hugo Cravo, o CSA não aceitou. Para os
azulinos, Hugo era torcedor do CRB e, deste jeito não tinha graça.
A situação somente ficou calma quando indicaram o major Mário
Lima para apitar a partida. O jogo foi realizado no mutange. No
final. a grande supressa da tarde. Vitória do CSA por 3 x O. O jogo
foi realizado no dia 12 de outubro de 1941. Os gols do CSA foram
de Pedrinho. Emiliano e Toscano. O juiz foi o major Mario Lima”.
Por Lauthenay Perdigão, em Aquivos Implacáveis do
Futebol Alagoano

Lauthenay: um homem chamado futebol

A memória do esporte em Alagoas tem um nome:


Lauthenay Perdigão, jornalista, radialista, escritor, maior
conhecedor da história do futebol alagoano, e fonte número um
para jornalistas esportivos. Nos mais de 50 anos dedicados ao
esporte, a juntar histórias e registros, é preciso conhecer as outras
faces da Lauthenay Perdigão: jogador de futebol, cronista

291
esportivo, construtor do Estádio Rei Pelé, no fim dos anos 1960, e
exímio entrevistador, como o famoso bate papo com o capitão
Bellini, campeão de 1958 pelo Brasil. Ele hoje é diretor e curador
do Museu de Esportes Edvaldo Santo Rosa, nome do atacante
alagoano Dida, seu amigo, e campeão do Mundo em 1958 e
artilheiro no Flamengo. Além da privilegiada memória, ele está
sempre presente ao museu para mostrar seus tesouros. São mais de
10 mil fotos, 400 mil camisas de clube, em todas as épocas, seis
mil reportagens (de revistas, jornais, TV, rádio ou internet).

“Ele sempre colecionou revistas, jornais, áudios e mostra a


razão pela qual é a enciclopédia e a referência do esporte em
Alagoas, principalmente o futebol. Nosso Estado tem o privilégio de
ter um sujeito que dedicou grande parte de sua vida a isso, graças a
sua persistência, inteligência e amor à causa. O resultado é o belo
espaço que todos, do alagoano ao turista, têm para apreciar a cultura
e a paixão pelo esporte”.
Márcio Canuto, jornalista da Rede Globo São Paulo

Leilão londrino arremata tesouro do Museu Dida

Em 2004, com o Museu Dida fechado por situação precária,


o diretor Lauthenay Perdigão teve que retirar todas as peças para
não perdê-las. Foi quando teve a idéia, junto com a família do
jogador, de vender a principal relíquia do museu: a camisa azul,
número 10, que Pelé usou na final da Copa de 1958, contra a
Iugoslávia, quando marcou dois gols, inclusive aquele da meia lua

292
sobre o beque dentro da área, um dos mais bonitos de todas as
Copas. Foi uma decisão difícil. A camisa tinha sido dada ao
jogador alagoano Dida, que era seu reserva imediato, que ao
morrer entregou à sua família. Os filhos decidiram doar a camisa
ao museu. Mas o fato está noticiado nos jornais da época, em 21 de
setembro de 2004, na Casa Christhie´de Londres, por um
colecionador privado por 105 mil dólares, pó equivalente na época
a R$ 300 mil reais.

“O museu sofria com as infiltrações, estava fechado e cheio de


mofo. Para reabri-lo o caminho que restou foi levar a leilão. A
família ficou com uma parte e para o museu sobrou R$ 45 mil. Foram
muitos impostos e taxas, mas de 50% do valor. Mas o museu tem
outra camisa original do Pelé no Santos, e essa não vai sair daqui”.
Por Lauthenay Perdigão

A rasteira de Graciliano no futebol

Em 1921, 30 anos depois de o futebol chegar ao Brasil –


como esporte de elite - graças à maleta de Charles Miller, que
trouxe da Inglaterra bola, camisas de time, uma bomba para encher
as bolas e as regras do Football Association, o escritor Graciliano
Ramos, então um jovem com 29 anos, desancou o futebol em um

293
artigo publicado no jornal “O Índio”, que circulava em Palmeira
dos Índios (AL). Com o pseudônimo J. Calisto, Graciliano
assinava uma coluna intitulada “Traços a esmo”, em que fazia
comentários ácidos em geral. No domingo de 10 de abril de 1921,
ele escreveria Futebol é fogo de palha, que depois se tornou
documento importante da história do futebol brasileiro.

“Pensa-se em introduzir o futebol, nesta terra. É uma


lembrança que, certamente, será bem recebida pelo público, que, de
ordinário, adora as novidades. Vai ser, por algum tempo, a mania, a
maluqueira, a ideia fixa de muita gente. Com exceção talvez de um ou
outro tísico, completamente impossibilitado de aplicar o mais
insignificante pontapé a uma bola de borracha, vai haver por aí uma
excitação, um furor dos demônios, um entusiasmo de fogo de palha
capaz de durar bem um mês. Temos esportes, alguns propriamente
nossos, batizados patrioticamente com bons nomes em língua de
preto, de cunho regional, mas por desgraça abandonados pela débil
mocidade de hoje. Além da inócua brincadeira de jogar sapatadas e
de alguns cascudos e safanões sem valor que, de boa vontade,
permutamos uns com os outros, quando somos crianças, não temos
nenhum exercício. Somos, em geral, franzinos, mirrados, fraquinhos,
de uma pobreza de músculos lastimável.”
Hemeroteca da Biblioteca Nacional, jornal O ìndio,
Palmeira dos Índios, edição de 12 de abril de 1921

“Nada de estrangeirices. Cultivem a rasteira, amigos!”. A


grande dúvida é que Graciliano, que parece claro é que se dirigia

294
especificamente à sua gente do sertão, aos leitores do jornal de sua
pequena Palmeira dos Índios. Mas parece falar para o Brasil como
um todo, sendo que neste caso o jornal “O Índio” decerto não era o
melhor palanque, e talvez fosse audácia demais para um talento tão
novo e suburbano, em uma terra desconhecida. A contraposição
sertão/grandes cidades aparece no texto com frequência reforçando a
ideia de que fala mais para sua gente do que para todo o país, onde
sugeria para a mocidade exercitar-se em jogos nacionais, sem mescla
de estrangeirismo, como o murro, o cacete, a faca de ponta”.

“Estrangeirices não entram facilmente na terra do espinho. O


futebol, o boxe, o turfe, nada pega. Desenvolvam os músculos,
rapazes, ganhem força, desempenem a coluna vertebral. Mas não é
necessário ir longe, em procura de esquisitices que têm nomes que
vocês nem sabem pronunciar. Reabilitem os esportes regionais que aí
estão abandonados: o porrete, o cachação, a queda de braço, a
corrida a pé, tão útil a um cidadão que se dedica ao arriscado ofício
de furtar galinhas, a pega de bois, o salto, a cavalhada e, melhor que
tudo, o cambapé, a rasteira. A rasteira! Este, sim, é o esporte
nacional por excelência! Todos nós vivemos mais ou menos a atirar
rasteira uns nos outros. Na vida prática, é claro que aumenta a
natural tendência que possuímos para nos utilizarmos eficientemente
da canela. No comércio, na indústria, nas letras e nas artes, no
jornalismo, no teatro, nas cavações, a rasteira triunfa. Cultivem a
rasteira, amigos!

A criação de jogadores-caranguejo

295
O jornalista Mário Magalhães escreveu uma das belas
páginas do futebol brasileiro, no livro Viagem ao País do Futebol
(1998), resultado de uma pesquisa e reportagem por todo o Brasil,
com fotos de Antônio Galdério. Em Alagoas, ele fez reportagens
arrasa-quarteirão, que mexeu com os caciques do futebol aloano,
como empresário João Feijó, dono do Conrinthians Alagoano,
fundado em 1991. Mário entrevistou Feijó, que fez declarações
contundentes, como não se importar pela subida do time à primeira
divisão do Brasileirão, apostando em uma empreitada muito mais
lucrativa: a de comprar e vender jogadores. Ele mantém vínculos
do passe, por exemplo, do jogador Grafite. Veja o que João Feijó
falou sobre como mantém seus jogadores, usando como
“metáfora” os mangues alagoanos.

“O nordestino pega um pneu de caminhão velho e joga nele


uma biquinha com água e um caranguejo magro, que vai ser
engordado e vendido depois. É esse o trabalho que executo. Eles
estão sendo colocados dentro do pneu, com coco ralado e comida.
Depois de engordarem, os venderei bem gordinhos. Essa é a minha
realização”.

Mário Magalhães e Antônio Gaudério (fotos), no livro


Viagem ao País do Futebol, Dórea Bokk and Arts (DBA), São
Paulo - 1998

Alagoas na Copa do Mundo no Brasil

296
Na Copa do Mundo de junho de 2014, Alagoas não foi uma
das sede do mundial, mas virou um Centro de Treinamentos de
Seleções (CTS), quando uma grande reforma no estádio Rei Pelé
foi realizada, com inclusão de academia, laboratório; o gramado
foi todo recuperado. Alagoas foi o estado-anfitrião da seleção
africana de Gana, os “Estrelas Negras” da Áfica. O país jogou no
Grupo G da competição, ao lado de Alemanha, Portugal e Estados
Unidos, e não passaram das quartas de finais. A escolha por
Alagoas muito se deve ao fato de que vários jogos da chave estão
marcados para acontecer em Estádios da Região Nordeste. Gana
estreou no dia 16 de junho, contra os americanos, na Arena das
Dunas, em Natal. Depois, no dia 21 de junho, com os alemães, que
viriam a ser campeões do Mundo no Brasil, na Arena Castelão, em
Fortaleza. Por fim, os africanos enfrentaram a seleção de Portugal,
no Mané Garrincha, em Brasília, no dia 26 de junho.

GENTE

“Tão largo que é quase como se incluísse tudo que, na história


de Alagoas, é socialmente importante. Pois da história da gente

297
alagoana se pode generalizar, como no passado do carioca, que é a
história de uma gente quase anfíbia. Não se deve deixar de
considerar a grande influência, sobre a formação do alagoano, que
vendo sendo o açúcar através do latifúndio, da monocultura e da
escravidão. Através do sistema patriarcal e quase feudal de relações
entre senhores de terras com lavradores, de donos de casas-grandes
com escravos de senzalas ou quilombos de mocambos: de homens
com mulheres; de brancos com pretos, de europeus com indígena; do
homem com a natureza – com as terras, com as matas, com as
águas”.

Gilberto Freyre, no prefácio ao livro de Manoel Diégues


Júnior, O Banguê das Alagoas - traços da influência do sistema
econômico do engenhode açúcar na vida e na cultura regional,
EDUFAL 2012- Coleção Nordestina

PROFISSÕES & OFÍCIOS

Bordadeira/ rendeira

298
Mulher que faz bordado ou renda. As alagoanas estão entre
as melhores do Brasil. É um trabalho delicado e detalhista. Entre
os bordados que são genuinamente alagoanos estão filé, labirinto,
bilro, singeleza, meia noite. Todo trabalho artesanal reúne uma
tradição de conhecimentos que são repassados por gerações. Esses
conhecimentos são também aprimorados com o passar do tempo,
acrescentando-se melhorias e inovações ao produto ou ao modo de
produzi-lo. Trata-se de um ofício em que mãos e mentes
laboriosas, debruçadas sobre uma mesma atividade feita à mão,
geralmente sem uso de livros ou manuais técnicos, aprendem a
fazer fazendo. Ficou famosa a música de Zé do Norte, Mulher
Rendeira, em sua letra original.

Olê, mulher rendeira


olê mulher rendá
a pequena vai no bolso
a maior vai no embornal
se chora por mim não fica
só se eu não puder levar
o fuzil de Lampião
tem cinco laços de fita
o lugar que ele habita
não falta moça bonita
Barranqueiro/ ribeirinho

Povos que têm a vida ligada ao rio, que habitam as ilhas e


barrancos de rios como o São Francisco. Esses povos ribeirinhos

299
observam as cheias que trazem peixes e renovação para a vida.
Eles cultivam o arroz, o milho, o feijão; e o sustento da pesca,
agricultura e criação de animais. Em Alagoas, os ribeirinhos são os
moradores do Baixo São Francisco, formado pelas cidades de
Penedo, São Braz, Igreja Nova, Belo Monte, Traipu, Pão de
Açúcar, Piranhas e Delmiro Gouveia.

“A energia do trabalhador da margem são as lagoas


marginais. Sem cheias elas não enchem. Como território, as margens
deveriam estar na mão do povo ribeirinho para mudar a história.
Plantar o arroz ou outro tipo de legume. Mas o que acontece. Estão
plantando é cana”.

Por Antônio Gomes dos Santos, Seu Toinho, presidente da


Federação dos Pescadores de Alagoas e membro do Movimento
Nacional dos Pescadores, em Agência Alagoas, entrevista em
fevereiro de 2010

Cortador de cana

Eles ajudam a produzir o álcool dos automóveis e o açúcar


que usamos em casa. São os “boias-frias” porque a comida que
levam para o campo costuma esfriar antes da hora do almoço. No
Nordeste, são assalariados e quase sempre não têm os direitos
elementares garantidos. Sua tarefa é cortar a maior quantidade de
cana-de-açúcar possível, braçada por braçada. Cada trabalhador é
responsável por uma fileira de pés de cana; conforme vai cortando,

300
ele faz uma pilha. O fiscal vem e mede as pilhas com um
compasso. Para cada metro de cana empilhada, o cortador ganha de
5 a 10 centavos. Entre os instrumentos usados pelo canavieiro está
o podão (faca grande e comprida) para não se machucar. A safra da
cana dura seis meses. No resto do ano, enquanto espera a cana
brotar de novo, o cortador faz sua plantação de subsistência ou
emigra para as capitais à procura de trabalho. O setor
sucroalcooleiro já chegou a empregar dois milhões de pessoas na
atividade durante o Proálcool, programa de estímulo à produção de
etanol. Hoje, são cerca de 600 mil trabalhadores, dos quais 150 mil
na área agrícola.

Em lugares distantes
onde não há hospitais nem escola
homens que não sabem ler e morrem de fome aos 27 anos
plantando e colhendo a cana que viraria açúcar
em usinas escuras, homens de vida amarga e dura
produziram esse branco e puro açúcar com que adoço meu
café nessa manhã
em Ipanema

“O Açúcar” de Ferreira Gullar, em Antologia Poética, 1997

Destaladeira de fumo

301
O cultivo do fumo foi a principal atividade econômica por
mais de cinco décadas em Arapiraca, no agreste alagoano, onde as
mulheres trabalhavam horas a fio sentadas no chão nos “salões de
fumo”, destalando e selecionando as folhas já colhidas ao som de
cantigas entoadas para espantar o sono durante as madrugadas. As
cantigas tiveram seu período áureo nas décadas de 1940 e 1950.
Eram versos de amor o dia inteiro, numa alegria contagiante e que
atingia o seu ponto máximo no chamado derradeiro dia de fumo,
quando era encerrada a destalação da safra e o patrão oferecia uma
buchada de um carneiro gordo, bem como um forró acompanhado
ao som de harmônica e muita bebida para comemorar o
encerramento da colheita.

Rapaziada adeus, adeus


Adeus, adeus que já me vou
Eu levo pena e saudade
Do moreno que ficou

Adeus Cajueiro
Adeus Cajuí
Adeus que eu vou-meimbora
Para o ano eu volto aqui

Despedida meu bem despedida


A nossa função se acabou

302
Vamos deixá para o ano
Se nós todos vivo for

Marisqueira e Despinicadeira

Quase sempre um trabalho para as mulheres na cadeia do


pescado, principalmente o sururu, o massunim e outros moluscos
das Alagoas. São profissões antigas do povo ribeirinho dos mares e
lagoas. A marisqueira cata e a despenicadeira tira o marisco da
concha, como no caso do sururu de capote. A letra da música
Pérola, de Altair Pereira, fala desse universo:

Tapete negro
Que a água esconde
Lugar comum entre lugares onde eu cresci
Tuas pontes, teus mangues mistérios
Mundaú das ilhas, dos casebres, a lagoa mãe
És senhora de rara beleza
Eu vi a pérola
Eu vi a Pérola
Eu vi a pérola
Na concha de um Sururu
Em tuas margens
Eu lembro ainda
Da árdua luta quase tem.
Pescador

303
Alagoas contava, em 2013, com mais de 31 mil pescadores
registrados nas colônias espalhadas pelo estado, que tem quatro
grandes polos de atividade: Rio São Francisco; Maceió e litorais
Sul e Norte; o Complexo Lagunar Mundaú e Manguaba; e os
criatórios de peixe em cativeiro, principalmente a tilápia. De
acordo com o IBGE, há os pescadores envolvidos com a atividade
industrial (assalariados), e os sem registro (carteira de trabalho).
Os profissionais são aqueles que pescam para a subsistência de
suas famílias, mas conseguem gerar excedentes que são
comercializados no mercado, e os de subsistência são aqueles que
pescam para a manutenção de suas famílias e que não conseguem
gerar excedentes para o mercado.

“Nossa profissão estava atrelada à Marinha, hoje está lá, no


artigo oitavo da Constituição, que garante nossa livre associação.
Foi uma luta nossa. Foi um avanço, mas temos que combater esses
outros problemas que estão chegando. Agente não precisa de grandes
projetos, precisamos também dos pequenos projetos. Os pescadores
não podem entrar na onda dos grandes projetos. Quem tem um Rio
São Francisco como esse tem que lutar pela liberdade do rio, pela
revitalização do rio”.

Por com Antônio Gomes dos Santos, Seu Toinho, presidente


da Federação dos Pescadores de Alagoas e membro do Movimento
Nacional dos Pescadores, em fevereiro de 2010
Tirador de coco

304
O tirador de coco é o morador dos sítios de coqueiros do
litoral. Usa as peias feitas de cipó, com que sobe nos coqueiros e
faz o corte dos frutos com uma foice de cabo curto. É comum ver
no litoral do Nordeste profissionais que ganham a vida subindo em
coqueiros para colher frutos. Embora não pareça, tirar coco é uma
atividade de extremo risco, pois sem qualquer equipamento de
segurança, esses homens arriscam suas vidas subindo em coqueiros
com até 30 metros de altura. Nessa arriscada atividade, eles portam
apenas um facão “rabo de galo”, muito utilizado no corte de cana-
de-açúcar e um recipiente plástico tipo spray, geralmente
embalagem vazia que reaproveitam, colocando óleo diesel,
principal arma contra os marimbondos caboclos e outros animais
peçonhentos que habitam as copas dessas palmeiras. No Congresso
Nacional tramita um projeto de regulamentação da atividade
profissional dos tiradores de coco que beneficiará uma massa de
trabalhadores. O escritor paulista Mário de Andrade, em seu
famoso livro Turista Aprendiz (1983), em sua viagem etnográfica
pelo Nordeste teve os tiradores de coco, em sua atividade
profissional como personagens de seus registros fotográficos. Em
seu trabalho constatou a precariedade das condições de vida e
saúde destes trabalhadores que colocam em nossas mesas a
deliciosa água de coco.

Jangadeiros alagoanos

305
Em Alagoas, existem alguns tipos de atividade entre os
jangadeiros, a mais popular é o que faz a travessia para galés e
piscinas naturais; há os que pescam em alto mar, com linha de
mão; e os lacustres, que percorrem as ilhas das lagoas. Em Maceió
existe a Rua Jangadeiros Alagoanos, entre Ponta da Terra e
Pajuçara, que presta uma homenagem aos pescadores Umbelino
Santos, Eugênio de Oliveira, Joaquim Tertuliano e Pedro Ganhada,
tripulantes da jangada “Independência”, que zarparam pelas águas
do Oceano Atlântico até a capital da República, em 1922, o Rio de
Janeiro, para comemorar o 1º Centenário da Independência.

Vaqueiro

O tradicional vaqueiro, aquele que, montado em cavalo,


bota o boi para correr, no meio do mato, trespassando galhos e
gravetos, em uma arte sem igual, virou mais uma tradição que
trabalho. Mas eles ainda estão espalhados pelo sertão a fora, nas
fazendas de gado, muitos com dupla função: são capatazes, que
cuidam do gado e da fazenda inteira. Muito diferente de tempos
atrás, como relata Graciliano em Vidas Secas, quando seu
personagem, o vaqueiro Fabiano, corria também atrás da fome.

“Chape-chape. As alpercatas batiam no chão rachado. O


corpo do vaqueiro (Fabiano) derreava-se, as pernas faziam dois
arcos, os braços moviam-se desengonçados. Parecia um
macaco.Vivia longe dos homens, só se dava bem com animais. Os

306
seus pés duros quebravam espinhos e não sentiam a quentura da
terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-se a ele... A pé,
não se aguentava bem. Pendia para um lado, para outro, cambaio,
torto e feio”.

Graciliano Ramos, em Vidas Secas, 1938, 16ª edição 1992,


Editora Record

Lavadeira

Em Alagoas, são as lavadeiras do rio São Francisco e dos


grandes vales dos rios Mundaú e Paraíba, enxaguando e lavando a
roupa nas pedras, que estão no imaginário popular alagoano.
Graciliano Ramos se espelhou no trabalho cuidadoso delas, para
construir uma analogia no trato com a palavra, com a língua pátria,
o português.

“Deve-se escrever da mesma maneira com que as lavadeiras


lá de Alagoas fazem em seu ofício. Elas começam com uma primeira
lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem
o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil,
ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais
uma molhada, agora jogando água com a mão. Batem o pano na laje
ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até
não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é
que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para
secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A

307
palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra
foi feita para dizer”.

Graciliano Ramos, em Linhas Tortas – 1962.

Canoeiro/ Barqueiro

O canoeiro vive em vários habitats de Alagoas. No


ambiente das lagoas Mundaú e Manguaba, na pesca do sururu e em
aluviões dos sítios e das ilhas; e no Rio São Francisco, onde são
em grande número nos portos naturais, como o de Piaçabuçu.

“- Canoeiro, me leva para a ilha de Santa Luzia. Porquanto


me leva, canoeiro?
- Déistão ida, déistão volta, patrão.
O canoeiro ficou besta, quando Lula lhe passou uma pelega de
cinco. Lula compreendeu como se explorava ali o trabalho do pobre
já acostumado a pedir por mais quatro horas de remo contra as
correntes do canal, um preço ínfimo.
- Vambora, patrãozinho!
- Vamos”.

Jorge de Lima, em Calunga – 1943.

308
Acendedor de lampião

O lampião a gás que iluminou muitas ruas de cidades no


século XIX, foi um grande acontecimento. Ele foi inventado na
Inglaterra em 1792, a intenção principal era aumentar os turnos nas
fábricas. Mas ao transplantá-los para as ruas essas criaram vidas.
Hoje não dá para imaginar ruas escuras, é bem possível que
alguém denuncie se uma luz estiver queimada. Mas durante muito
tempo as cidades ficavam às escuras. Ou se contava com a lua
cheia ou era preferível ficar em casa. O lampião ajudou nisso. E aí
surgiram os acendedores de lampiões, eles saiam ao cair da tarde
acendendo a fonte de luz, ao amanhecer eles os apagavam e davam
a manutenção necessária. Nas Alagoas dos velhos tempos, a
profissão – hoje extinta – do acendedor de lampião foi imortalizada
pelo poeta Jorge de Lima, em um poema que entrou para a
literatura nacional.

O acendedor de lampiões

Lá vem o acendedor de lampiões da rua!


Este mesmo que vem infatigavelmente,
Parodiar o sol e associar-se à lua
Quando a sombra da noite enegrece o poente!

Um, dois, três lampiões, acende e continua


Outros mais a acender imperturbavelmente,
À medida que a noite aos poucos se acentua

309
E a palidez da lua apenas se pressente.

Triste ironia atroz que o senso humano irrita:


Ele que doira a noite e ilumina a cidade,
Talvez não tenha luz na choupana em que habita.

Tanta gente também nos outros insinua


Crenças, religiões, amor, felicidade,
Como este acendedor de lampiões da rua!

Poesia de Jorge de Lima, com informações da Revista de


História da Biblioteca Nacional, ano 7, nº 85 out. 2012

Caçador de caranguejo

Caçador de caranguejo continua sendo uma profissão de


subsistência para muitas famílias moradoras do litoral e,
principalmente, na boca de manguezais, habitat das principais
espécies em Alagoas, os caranguejos guaimum e uçá, o mais
peludo, chamado pelos caçadores da foz do rio São Francisco, de
Toni Ramos. Homens, mulheres e crianças avançam sobre as
raízes dos mangues, perseguindo a trilha deixada pelas patas dos
animais, que saem das tocas escuras para buscar comida. Quase
sempre enfrentando milhares de pernilongos, com tochas acesas
em latas ocas, e mergulhando na lama preta do mangue,
arrancando o caranguejo com a mão - enfiada nos tocas – tentando
fugir das mordidas. Ficou famosa a reportagem do jornalista

310
alagoano Audálio Dantas, na icônica revista Realidade, em março
de 1970, com o título Povo Caranguejo.

“Os homens estão voltando do pântano. Vai começar o drama


de cada dia nas entranhas negras da lama onde vivem os
caranguejos. O grande silêncio que boiava sobre o mundo pegajoso
do mangue começa a se desfazer à medida em que os homens
avançam: no princípio, galhos secos estalando sob os pés
encouraçados, com a terra ainda firme; aos poucos, o ruído macio da
lama sendo pisada, e engolindo os pés, depois as pernas, coxas,
barrigas. Os homens estão chegando no centro do pântano. Os
caranguejos, assustados, refugiam-se nos buracos. Na superfície
escura fica apenas o rastro de suas patas – as marcas do longo
passeio em busca de comida. A vida dos caranguejos palpita de
sobressalto sob os pés dos homens. A luta está para começar”.

Audálio Dantas, em Povo Caranguejo, do livro Tempo de


Reportagens, editora Leya (SP), 2012

Caçador de Caranguejo: a canção


A vida do caçador de caranguejo também foi retratada no
cancioneiro popular em grande sucesso do compositor baiano
Gordurinha, Vendedor de Caranguejo, cantada pelo também
baiano Gilberto Gil. A música canta o dia a dia do vendedor de
caranguejo, e o drama vivido pelo que se chama homem-
caranguejo, também abordado nos estudos do famoso médico,

311
filósofo e humanista Josué de Castro, em seu livro Geografia da
Fome.
Vendedor de Caranguejo

Gilberto Gil
Compositor: Gordurinha

Caranguejo Uçá
Caranguejo Uçá
Apanho ele na lama
e boto no meu caçuá

Tem caranguejo
tem gordo guaiamum
cada corda de dez
eu dou mais um
eu dou mais um
eu dou mais um
cada corda de dez
eu dou mais um

eu perdi a mocidade
com os pés sujos de lama
eu fiquei analfabeto
mas meus filho criou fama
pelos gosto dos menino
pelo gosto da mulher

312
eu já ia descansar
não sujava mais os pé

os bichinho tão criado


satisfiz o meu desejo
eu podia descansar
mas continuo vendendo caranguejo

313
ÍNDIOS DAS ALAGOAS

No Brasil, do ano 2008, um milhão de pessoas se declarou


indígena. O governo reconhece a existência de 240 etnias. Em
Alagoas temos os Aconã (Traipu), Geripancó (Pariconha), Kalankó
(Água Branca), Karapató (São Sebastião), Kariri-xocó (Porto Real
do Colégio), Karuazu (Pariconha), Katoquim (Pariconha),
Koiupanká (Inhapi), Tingui-botó (Feira Grande), Xucuru-kariri
(Palmeira dos Índios), Wassu cocal (Joaquim Gomes). No estado
de Alagoas existem hoje 11 nações indígenas, somando mais de
vinte mil índios.

Aconã: povo do Baixo São Francisco

O povo Aconã habita a região do Baixo São Francisco, no


povoado de Bom Jardim, na cidade ribeirinha de Traipu,
apresentava, em 2017, uma população estimada de 73 famílias
índias em uma área de 281.1840 hectares com demarcação de
reserva indígena, concedida no ano de 2003 pela Fundação
Nacional do Índio (Funai). A tribo vive em uma área com
urbanização precária, com água encanada, luz, e uma escola para
doze índios. A história dos índios Aconãs remonta meados do
século 17, quando os jesuítas fundaram em Porto Real do Colégio,
Alagoas, um convento e um colégio com o propósito de catequizar
as tribos indígenas da região. Em 1703, Carta Régia dava a cada

314
família terra para plantar e colher. Em 1759, os jesuítas foram
expulsos abandonando o colégio e o convento. Outro fato
marcante, é que não existem mais índios, e sim caboclos, juntos e
misturados índios e negros. Em 1859, D. Pedro II, esteve com os
índios, ocasião em que foi concedida uma área de terra para sua
sobrevivência. Por fim, a Funai concede 281 mil hectares de terras
registradas como Terra Indígena Aconã, na comunidade de Bom
Jardim, onde habitam até hoje, preservando costumes e tradições
culturais indígenas.

“Desde 25 de Novembro de 1979 iniciava-se o processo de


reconhecimento oficial do seu povo pela Funai tendo como principal
nome e representante legal do pajé João Ferreira o então, José
Saraiva Irmão que lutou arduamente em nome de seu povo
conseguindo reconhecimento em cinco de maio de 1983. A primeira
gleba de terra foi adquirida em agosto de 1984. Em 13 de Outubro
1984, Adalberto Ferreira, cacique da aldeia, assumiu a missão de
pajé após o falecimento de seu irmão João Ferreira passando a
missão de cacique para José Saraiva Irmão em cerimônia religiosa
sob práticas de rituais”.

Arquivo Pessoal de José Saraiva Irmão, em 03/05/2014, no


portal wikinativa/Aconã

Aconã: “Terra Protegida, identifique-se”


Para chegar até a reserva Aconã, vive-se uma aventura
inigualável. Partindo da cidade de Piaçabuçu, embarca-se em

315
canoas ou lanchas, que partem cortando as águas do São Francisco,
em direção à foz. A lancha percorre o trajeto bem perto das
margens, ao lado de paisagens deslumbrantes de mangues,
paredões de areia caindo pela força das águas e milhares de
caranguejo entrando nas locas de lama preta dos mangues. Em 40
minutos se chega ao povoado de Bom Jardim, onde ficam as terras
demarcadas pela Funai na aldeia Aconã. Apesar da sisudez da
placa indicativa, “Terra Protegida, Identifique-se”, o visitante é
muito bem recebido por um incessante cheiro de sândalo e pelo
cacique José Saraiva, em sua casa, com mulher e filhos, aos 77
anos. Óculos escuros tipo Waldick Soriano, o cacique solta o verbo
e diz que está esperando uma equipe de TV para fazer uma séria
denúncia: “Todo nosso cedro está sendo destruído e levado por
pescadores para fazer canoa”, diz.

Aconã: palavra do cacique


O cacique José Saraiva, disse que já ganhou muito dinheiro
e sustentou a família vendendo cocais de pena, brincos, pulseiras e
até colar de dente de macaco, para turista no Mercado Modelo de
Salvador. Mas encerrou a carreira de empresário, em 1983, para
liderar a tribo no processo de criação do posto pela Funai e na
demarcação de 13 tarefas de terra, onde de 15 em 15 dias
acontecem os rituais, que branco nenhum pode ver, “nem
antropólogo e nem sociólogo”, avisa. E o cacique, fumando um
cachimbo, cheio de colares no peito e o relógio dourado abriu o
verbo:

316
“Hoje não diferenciamos quem é A ou B em razão da mistura.
A própria história do Brasil não conta nada, foi feita no estrangeiro.
Só é boa quando é contada pelos próprios índios, que continuam
contando histórias de 600 anos atrás, como nossos pais nos
informaram”.
“Éramos seis milhões na zona litorânea. Os portugueses, os
franceses e os holandeses usavam os índios para produzir gente de
forma mais rápida para se manter no poder”.

“Nós vivia (sic) com soberania, com civilização própria,


amando a natureza, sem ambição com as mulheres nem com o
dinheiro. Tínhamos peixe e caça para comer e todas as plantas
medicinais”.

“Meu maior desgosto da vida é ver a situação a que chegou o


São Francisco; quando ele morrer e não podermos dar mais jeito.
Como é que ficam os governantes, os prefeitos das cidades
ribeirinhas que não se levantaram para proteger o rio dos desvios da
transposição. Daqui a uns 70 anos, vamos atravessar o São
Francisco a pé”.

Geripancó vira bóia-fris no corte

A nação Geripankó tem uma população de 4.629 índios


(FUNAI/SEII 2011), e suas terras estão localizadas próxima à
cidade de Pariconha, alto sertão de Alagoas. São descendentes dos
Pankararu do Brejo dos Padres. Fizeram uma 'viagem de fuga'

317
devido às perseguições e falta de terra pela colonização. Os
Geripancó vivem em oitos comunidades e, devido às necessidade
de subsistência, trabalham como meeiros de fazendeiros da região,
nos meses que correspondem ao inverno. No verão, geralmente
vão para o corte da cana-de-açúcar nas usinas de Alagoas e em
outros Estados vizinhos. Eles retornam ao fim da moagem para
plantar feijão, milho e mandioca durante o inverno. O solo não é
adequado para cultivar muitos frutos, mas tem caju, pinha, jaca e
manga e o umbu no inverno.

Karapató

Grupo indígena brasileiro, que habita a aldeia Plak-ô e o


povoado Terra Nova, ambos situados no município de São
Sebastião, no estado de Alagoas. É de etnia kariri, a língua falada é
tupi guarani, de acordo com o Censo Funai de 2000, eram 364
indivíduos.

Kariri-Chocó

Estão localizados na região do baixo São Francisco, no


município alagoano de Porto Real do Colégio, cuja sede fica em
frente à cidade sergipana de Propriá. As duas cidades estão ligadas
pela ponte que serve de eixo entre a região Sul e o Nordeste
brasileiro, como parte da BR-101. A aldeia e o posto indígena
estão cerca de um quilômetro da praça central da cidade. Teve
origem em 1578 com a chegada dos jesuítas que aportaram na

318
região reunindo várias nações indígenas (Kariri, Karapatós e
Aconans) criando um aldeiamento denominado "urubu-mirim".
Seu cotidiano é muito semelhante ao das populações rurais de
baixa renda que vendem sua força de trabalho nas diferentes
atividades agropecuárias da região. Atividades culturais: Cantos e
torés, artesanato, cerâmica utilitária e ervas medicinais e atividades
econômicas: agricultura, olaria, pesca e artesanato.

Tingui Botó

Os Tingui-Botó habitam a comunidade Olho D´Água do


Meio, no município alagoano de Feira Grande. Até o início da
década de 80, eram conhecidos como "caboclos", quando foi
reconhecida a identidade indígena pela Funai. Desde esse período
preservam dois hectares de mata para realizar o ritual secreto do
Ouricuri, principal emblema de sua identidade, que continuam
resguardando das populações vizinhas.

Wassu Cocal

Povo indígena que habita a zona da Mata Alagoana, entre os


municípios de Joaquim Gomes e Novo Lino, e a região dos vales
do Paraíba e Mundaú. Os Wassu Cocal são da etnia Kariri. Eles
possuem um grupo de apresentações do toré, formado por seis
homens e seis mulheres, e é apresentado no Dia do Índio para o
público que visitar a comunidade. Na parte religiosa, possuem
tradições, cultura, costumes. Possuem um sincretismo, com uma

319
missa inicial com padre, e após uma cerimônia de oito dias na qual
só participam os índios, por possuírem rituais secretos, na qual
ocorrem curas e outras manifestações que o branco não pode ficar
sabendo.

Xukuru Kariri

Grupo indígena oriundo do município brasileiro de Palmeira


dos Índios, no estado de Alagoas, e provêm da união de duas etnias
distintas, Xucuru e Kariri. Em Alagoas, habitam as Áreas
Indígenas Mata da Cafurna, Xucuru-Kariri e Fazenda Canto, e às
margens do lago formado pela Barragem de Moxotó, no município
de Glória, na Bahia.

Kalankó

A área onde atualmente vive o grupo da etnia Kalankó está


localizada próxima aos municípios alagoanos de Água Branca e
Mata Grande. O grupo reivindica parentesco e descendência com
os Pankaruru de Brejo dos Padres, Pernambuco. É que entre o final
do século XIX e início do século XX uma parte deste grupo teria
migrado em direção ao sertão alagoano.

Karuazu

320
O longo processo de migração experimentado por famílias
pankararu desde a extinção oficial do aldeamento de Brejo dos
Padres, no penúltimo quartel do século XIX, promoveu a formação
recente de coletivos de identidade indígena genealógica e
culturalmente ligados aos índios Pankararu (PE).

A realidade de hoje: um índio proletário

Um dos maiores pensadores sobre questões indígenas no


país, o professor e historiador alagoano Luiz Sávio de Almeida, na
aula inaugural do mestrado em História da Universidade Federal
de Alagoas (Ufal), em agosto de 2014, alertou aos futuros
historiadores sobre a atual situação do ensino e da realidade
indígena nas escolas e universidades brasileiras. Ele sugeriu novas
perspectivas para o estudo desses povos, e vaticinou: “A maior
aldeia indígena será Maceió”.

“Os estudos sobre os indígenas estão muito focados em


questões como identidade, cultura, religiosidade, mas estão
esquecendo de analisar a história dos índios e sua relação com a
urbanização e a interferência do modelo econômico capitalista. A
razão do capitalismo não permite a lógica do aldeamento e não
respeita as fronteiras étnicas e políticas. Esse sistema quer configurar
o índio na condição de proletariado, transformando a pobreza
indígena em reserva de mão-de-obra, por isso é de interesse o índio
pobre. Ele vai da pobreza rural à pobreza urbana. Não tenho dúvidas

321
de que, no próximo censo, a maior aldeia indígena de Alagoas vai ser
Maceió. Não me interessa se você é marxista ou não; não interessa
que corrente ideológica você segue; o que interessa é que a
universidade tem responsabilidade por uma coisa que se chama povo.
Ninguém é objeto de estudo, a academia não elimina a desigualdade.
É importante sabermos o quanto precisamos aprender com esse
povo".

Pioneiro na antropologia

Estevão Pinto (1895-1968). Estevão de Menezes Ferreira


Pinto (1895-19680) nasceu na Rua do Açougue (hoje Moreira
Lima), centro comercial de Maceió, na capital de Alagoas.
Humanista, considerado um dos pioneiros da antropologia no
Brasil, Estevão Pinto teve uma relevante atuação como historiador,
sociólogo, antropólogo e folclorista, especializando-se na área de
etnologia indígena, especialmente da região Nordeste do Brasil.
Foi aluno do Colégio Diocesano, em Maceió, mudando-se para o
Recife, em 1912, onde cursou o Preparatório para ingressar na
Faculdade de Direito do Recife, bacharelando-se em Ciências
Jurídicas e Sociais, no ano de 1917. Foi colega de faculdade de
Barbosa Lima Sobrinho e Sylvio Rabello. Foi um dos principais
responsáveis pela criação, em 1950, da Faculdade de Filosofia de
Pernambuco e o seu primeiro diretor, além de ter sido o primeiro
professor titular de Antropologia e Etnografia. Fez parte de
diversas sociedades científicas nacionais e internacionais, entre as
quais o Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico

322
Pernambucano; o Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo; a
Sociedade Brasileira de Geografia; da Sociedade Geográfica
Americana (Buenos Aires); a Société des Américanistes de Paris.
Em 1952, indicado pelo sociólogo Roger Bastide e convidado pelo
historiador Lucien Fébrve, proferiu uma palestra sobre a
antropologia brasileira, na Escola Prática de Altos Estudos (École
Pratique des Hautes Études), de Sorbonne, em Paris. A obra de
Estevão Pinto, segundo o sociólogo paulista Florestan Fernandes,
equipara-se às pesquisas de Couto de Magalhães, Nina Rodrigues e
do alagoano Arthur Ramos. O folclorista alagoano José Maria
Tenório Rocha escreveu o livro Estevão Pinto, um dos pioneiros
da antropologia no Brasil. Fortaleza: Fundação Waldemar
Alcântara, 1994.
http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php

323
NEGROS DE ALAGOAS

Berço da resistência negra brasileira

Alagoas se destaca nesse cenário por ser o berço da


resistência negra brasileira, tendo como principal líder Zumbi dos
Palmares. O Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, em
União dos Palmares, foi o maior e mais bem organizado quilombo
da América do Sul, funcionando como uma espécie de
confederação, que abrigava os vários quilombos que existiam
naquela localidade. Em Alagoas, as comunidades quilombolas
ainda existentes receberam certificados após um longo processo de
estudo sobre suas áreas. O reconhecimento das propriedades dos
remanescentes quilombolas e a emissão de seus títulos só foram
possíveis devido à mobilização do movimento negro no País. Até o
ano de 2006 haviam 18 comunidades quilombolas cadastradas em
Alagoas, número que só vem crescendo desde então. Entre 2007 e
2010 foram realizados 41 cadastros chegando ao total de 68

324
comunidades quilombolas certificadas e uma em processo de
estudo, segundo dados da Fundação Cultural Palmares. A maior
concentração destas comunidades em Alagoas se encontra na
microrregião serrana dos Quilombos, que abrange sete município:
Chã Preta, Pindoba, Ibateguara, Santana do Mundaú, São José da
Laje, Viçosa e União dos Palmares que é o mais populosos destes.

Em terras quilombolas

Nas comunidades quilombolas alagoanas a situação dos


povoados permanecia precária, quase desumana, se não fosse pelos
seus habitantes, que vivem com simplicidade em uma situação de
extrema pobreza, porém adaptados ao relevo, ao clima e ao que a
natureza oferece em sua volta. Os problemas são comuns em cada
uma delas: faltam escolas, infraestrutura, banheiros, água e
esgotamento sanitário, iluminação; o acesso é intrincado e
perigoso, que com as chuvas tudo piorou de forma acentuada. Toda
esta realidade foi constatada e mapeada pelo próprio Governo de
Alagoas, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento, na
publicação “Estudo sobre as comunidades Quilombolas de
Alagoas”, de 2015, que fez um amplo diagnóstico sobre as 68
comunidades quilombolas em 35 municípios, que tiveram a
emissão de posse de terras, certificadas e garantidas pela
Constituição de 1988, como Patrimônio Cultural Brasileiro. Os
donos da terra são remanescentes dos negros fugitivos, na guerra

325
colonial do Império contra os quilombolas, sendo o mais famoso
deles a Serra Real dos Macacos, a Serra da Barriga, em União dos
Palmares, onde reinou Zumbi.

Retrato do povo negro das Alagoas


Entre os resultados auferidos pelo estudo estão a
comprovação de que estas comunidades vivem hoje de forma
vulnerável, marcados pela exclusão e o isolamento. Dados do
Cadastro Único (CadÚnico), estatística onde estão concentradas as
informações sobre as comunidades quilombolas, apontam que 75%
dos quilombolas alagoanos possuem uma renda familiar per capita
mensal de 77 reais, faixa considerada extremamente pobre. O
estudo mostra que 86% destas famílias sobrevivem do programa
Bolsa Família, e 75% vivem da agricultura de subsistência. Em
julho de 2015, segundo o estudo, 4.543 famílias e 16.089
quilombolas estavam cadastradas. Os dados referentes à educação
também são muito desafiadores. Do total de pessoas com cadastro
ativo em julho de 2015, constatou-se que 34% são analfabetos,
valor muito acima do índice estadual que é de 21,8% (PNAD,
2013). Quanto aos domicílios, 72,1% das casas de comunidades
quilombolas são de alvenaria com revestimento, mas 13% ainda
vivem em casas de taipa ou de lona, sem qualquer estrutura,
“submetidos, dentro outros perigos, a convivência com animais
peçonhentos, a exemplo dos barbeiros, aranhas e escorpiões”, diz
um trecho do documento.

Os Caminhos da Liberdade

326
Na Região dos Quilombos, um roteiro de turismo étnico,
aberto em 2008, oferece um passeio turístico cheio de histórias e
aventuras, dentro da imensidão da natureza. Tudo começa no
Parque Memorial Quilombo dos Palmares, onde encontra-se a
comunidade quilombola Muquém, importante por seu artesanato
em cerâmica. O roteiro segue até Palmeira dos Índios, na
comunidade Tabacaria, com cerca de 89 famílias descendentes de
escravos é o primeiro território quilombola reconhecido pelo
Governo Federal. O roteiro conta ainda com Poço das Trincheiras,
onde se encontram três comunidades remanescentes de
quilombolas: Jacu e Mocó, Jorge e Alto do Tamanduá, seguida de
Arapiraca, Taquarana e Pão de Açúcar, cada uma com duas
comunidades cada: Pau D’arco e Carrasco, Mameluco e Poços do
Lunga, Poço do Sal e Chifre do Bode. Existem também
comunidades em Penedo (Tabuleiro dos Negros), Cacimbinhas
(Guaxini), Santana do Mundaú (Filus), Santa Luzia do Norte
(Quilombo) Batalha (Cajá dos Negros), Monteiropolis (Paus
Pretos) e Delmiro Gouveia (Cruz). Em todo roteiro, o visitante
pode conhecer um pouco da cultura remanescente dos negros,
como artesanato, danças e culinária.

Toponímias indígenas e negras na boca do povo


A terminologia alagoana incorporou vocábulos que
chegaram de diferentes origens e matizes linguísticas, que
entraram de forma fácil no falar do alagoano, principalmente dos
índios e negros. Desse universo fazem parte toponímias Tupi,
como Pajuçara, Piaçabuçu, Ouricuri, e vocábulos Bantos como

327
quilombo, cambona, mutange. E personagens reais como Miss
Paripueira, Moleque Namorador e imaginários: Negra Fulô, Negra
Juju. “Em sua abrangência, (as toponímias) formam um grupo que
reúne expressões correntes na memória linguística e no cotidiano
alagoano, e que possibilita a popularização de termos e
expressões”, em Iconografia Alagoana (2011), pelo sociólogo
Bruno César Cavalcante.

Toponímias mais usuais e conhecidas: Catolé, Pajuçara,


Pratagy, Ipioca, Jacarecica, Guaxuma, Jatiúca, Mundaú, Manguaba,
Cambona, Gulandin, Guaxinin, Jacuípe, Jacutinga, Japaratinga,
Jaraguá, Jequiá, Maceió (Maçayó), Manguaba, Mundaú, Arapiraca,
Maragogi, Caeté, Taboca, Taquarana, Kariri, Pindoba, Murici,
Calunga

Negros muçulmanos nas Alagoas

Escritores e antropólogos alagoanos como Arthur Ramos e


Abelardo Duarte, e o maranhense Nina Rodrigues - pioneiro nos
estudos sobre a cultura negra no país -, registraram a presença de
negros muçulmanos em Alagoas, em uma história marcante, mais
praticamente desconhecida, desses negros escravos maometanos e
seguidores de Alá e do Corão, chamados de malês. Eles foram
trazidos para a Bahia, mas há fortes indícios de sua presença em
Penedo, no Baixo São Francisco, em Alagoas, no início do século
XIX. O nome malê teria vindo de negros muçulmanos originários
de Mali, mas segundo o antropólogo Arthur Ramos, que também

328
confirmou a presença malê em Alagoas, o gentílico não agradava
aos adeptos, que era dito de forma pejorativa.

“Os malês são adeptos, no Brasil, de um islamismo sui


generis, que já veio deturpado da África por aluviões fetichistas, e se
transformou aqui no contato com outras religiões”.

Arthur Ramos, em O Negro Brasileiro, 1940,


www.brasiliana.com.br

Rebelião malê em Penedo


O livro “Negros Muçulmanos nas Alagoas (Os Malês)” de
Abelardo Duarte, edição de 1958, considerado uma raridade
bibliográfica, é um dos mais importantes sobre a presença dos
escravos muçulmanos em Alagoas. Abelardo apresenta o livro
como uma memória lida no Instituto Histórico e Geográfico da
Bahia, em 1956, sobre a vida e obra de Nina Rodrigues, que previu
a extinção dos negros muçulmanos no Brasil. O livro registra a
rebelião Malê, em 1817, nas ruas de Penedo. Os negros escravos
muçulmanos vestiam túnicas até os pés, usavam gorro e
conservavam as barbas, e traz importantes registros como fotos dos
Malês, após a insurreição.

“Até em Alagoas chegou o reflexo desse irredentismo negro-


muçulmano, com a esboçada e fracassada insurreição Malê de 1815,

329
que a sagacidade e a diligência do ouvidor da comarca das Alagoas,
Antonio Ferreira Batalha, fizeram abortar, prendendo os cabecilhas,
tomando medidas preventivas e cuidando cautelosamente de verificar
a existência de negros fugitivos vindos da Bahia, impedindo o intento
da “intimação criminosa” como disse o ouvidor Batalha em seu
ofício ao governador e capitão mor de Pernambuco”.

Abelardo Duarte, em Negros Muçulmanos em Alagoas (Os


Malês) Memória, edições Caeté, Maceió, 1958

A festa dos mortos


O médico e folclorista alagoano Mello Moraes Filho (1844-
1919) tem entre suas crônicas publicadas em Festas e tradições
populares doBrasil (Editora do Senado, Brasília, 2002), a exímia
narrativa sobre a “Festa dos Mortos”, celebrada duas vezes por ano
pelos escravos negros muçulmanos de Penedo, segundo ele, até
1888, ano da Abolição. Antropólogos e folcloristas, como
Abelardo Duarte e Nina Rodrigues, confirmam a importância do
relato de Melo Moraes, mas que ainda precisa de uma maior
confirmação do que ele viu, ou ouviu dizer, e até mesmo
questionam o “sentido folclórico” do texto. Mello Moraes Filho
descreve a cerimônia, mas não faz referência ao islã, indicando
apenas “origens do hebraísmo” nos ritos dos observados.

330
“A Festa dos Mortos, que o dr. Mello Moraes desenha em
Penedo é com certeza uma festa muçulmana. A prática de reza e
longos jejuns, a abstinência de bebidas alcoólicas, as relações da
festa com as fases lunares, o sacrifício de carneiros, a vestimenta de
largas túnicas alvas, a descrição de todas as práticas e costumes
malês, que não se encontram nas festas dos negros fetichistas. De que
nacionalidade eram esses malês, e que o autor não disse, não
indagou, nem tenho dados para julgar”.

Raimundo Nina Rodrigues, em Os Africanos no Brasil,


1933

As negras muçulmanas
As professoras e pesquisadoras Mariza de Carvalho Soares e
Priscilla Leal Mello, do Programa de Pós-graduação em História
da Universidade Federal Fluminense, colocaram mais luzes sobre o
livro de Abelardo Duarte, além da descrição da rebelião no ano de
1815. Segundo as pesquisadoras, Duarte se preocupou em mostrar
que os muçulmanos permaneceram em Penedo após aprisão de
muitos de seus grupos, anexando ao texto foto de 1887. No vers da
foto – que reúne cinco homens e quinze mulheres, consta:
“Candomblé — Brinquedo dos Africanos de Penedo”. Para as
pesquisadoras, a foto exibida sugere uma comparação com as duas
imagens que ilustram o capítulo A Festa dos Mortos, de Mello
Moraes Filho. A primeira delas é a do “Chefe Sacrificador”; a
outra, a da “Boiádera Negra”, “de turbantes e panos da costa, de

331
saias rendadas e leves chinelinhas, as mulheres negras
prodigalizavam aos convivas do estranho festim comidas à moda
de seu país. Graciosa e vistosamente trajada, recobria-lhes a mão
suspensa uma chuva de fitas de todas as cores, e mais missangas e
búzios que a adornavam de um palmo”, disse o memorialista.

“Uma explicação possível para essa distorção numérica entre


homens e mulheres africanas islamizadas pode ser encontrada na
economia do tráfico entre os muçulmanos na África e no Atlântico.
No contexto da escravidão muçulmana, as mulheres eram
prioritariamente destinadas às regiões árabes: as mais desejadas
eram tomadas como concubinas, e as demais relegadas às tarefas
mais baixas e trabalhosas. Isso talvez explique a dificuldade, até o
momento, de os historiadores encontrarem vestígios significativos de
mulheres muçulmanas escravizadas o que torna a foto ainda mais
significativa, colocando em destaque uma questão de gênero
importante: a diversidade das práticas religiosas, das relações entre
sexos, assim como a indumentária como uma importante fonte de
informação sobre as relações sociais”.

Por Mariza de Carvalho Soares e Priscilla Leal Mello, no


artigo “O resto perdeu-se” História e Folclore: O caso dos
muçulmanos das Alagoas, de 2006

A Cultura Negra

332
O legado negro em Alagoas é de uma importância seminal,
e estas expressões e talentos estão na arte popular, na música, na
dança, nos folguedos e folclore, na atitude religiosa, que sofreu
muita oposição, pressão, discriminação e violência, como o Dia do
Quebra dos xangôs de Maceió, em 1912. Na gênese de nossas
maiores expressões populares está a forte presença do negro, e foi
exatamente assim que a cultura negra resistiu e avançou.

“A vitalidade da presença negra foi bem maior do que as


barreiras do preconceito e da exclusão. Que o digam o Guerreiro, o
Reisado, o Bumba-meu-Boi, as festas de Reis de Congo, o Maracatu,
a Taieira, o Samba-de-Matuto, o Quilombo, as Negras da Costa, as
Baianas, motivos de orgulho do alagoano. O batuque dos escravos no
terreiro contagiava todos, até os mais refratários. É digno de registro
que as danças estrangeiras não conseguiam, tanto nos casamentos
como nas outras festas da roça, superar o encanto das batucadas e
das trovas, e depois, no período imperial, das chulas e das toadas”.

Douglas Apratto Tenório, em Caderno Saber, Jornal de


Gazeta de Alagoas, edição de 01/11/2014

Presença Banta em Alagoas


“O termo bantu deriva de "ba-ntu" , plural de mu-ntu (pessoa,
indivíduo), e se refere a uma imensa família etno-linguística da qual
descendia o maior contingente de escravos trazidos para o Brasil,
aqui chamados angolas, cambindas, congos, benguelas,
moçambiques, entre outras denominações. Foram negros bantos

333
provenientes, sobretudo, dos atuais territórios de Angola, falantes do
quicongo, do quimbundo e do umbundo, entre outras línguas; da
República Democrática do Congo (Congo-Kinshasa, ex-Zaire) e da
República Popular do Congo (Congo-Brazzaville), falantes do
quimbundo e do quicongo, entre outras, que constituíram a força de
trabalho africana espalhada inicialmente na costa brasileira, entre os
séculos XVI e XIX, formando a quase totalidade dos negros cativos
em Alagoas. Os rebeldes de Palmares, por exemplo, eram
seguramente bantos, em sua maioria e talvez mesmo em sua
totalidade”.
Por Bruno César Cavalcanti, no artigo Bantas Coisas de
Alagoas - culturas negras, passado e presente, em 12 de Dezembro
de 2005

Folclore alagoano é negro

O negro escravizado, que por muito tempo sobre (viveu) no


espaço rural, na Zona da Mata dos engenhos de açúcar, foi o
agente provocador que tornou Alagoas um celeiro de
manifestações folclóricas – o Estado tem o hoje o maior e mais
diversificado números de folguedos do país. Com destaque para
músicas e danças, como os pagodes clássicos, os sambas, oscocos
alagoano, segundo ensina Aloisio Vilela: coco topado, remado,
travessão, cavalo manco, trupé repartido, o sete e meio, o xipapá, o
falado, o dobrado, o tranquiado, o de entrega, o de roda, o de
"pareia", o coco solto. Essas “invenções rítmicas e coreográficas

334
da cultura popular de Alagoas” são resultados de um contexto da
escravidão.

“Foram dessas realidades negociadas a partir das fazendas e


engenhos alagoanos que brotaram formas culturais ambivalentes ou
ambíguas quanto ao reconhecimento social dos teores de negro-
alagoanidades que as preenchem. Isso transparece com nitidez no
chamado "folclore negro", que para Alagoas os estudos de Abelardo
Duarte listaram: as danças do coco alagoano, do buá, do bate coxa, e
ainda do lundu; as músicas do esquenta-mulher e dos barbeiros; a
literatura oral negra do ciclo do Pai João, das cantigas de ninar e
dos adágios populares; a escultura, como a estatuária fantástica,
radicalmente distinta da européia; as profissões "de ganho", como os
vendedores ambulantes e as baianas quituteiras da velha Maceió, no
centro e em Jaraguá, lembradas por Félix Lima Jr; e os folguedos
populares, hoje mais ou menos vivos e mais ou menos mortos, como o
Bumba-meu-Boi, o Reisado, o Guerreiro, as desaparecidas Taiêras,
as Baianas, o Quilombo, e o finado Maracatu”.
Por Bruno César Cavalcanti, no artigo Bantas Coisas de
Alagoas - culturas negras, passado e presente, em 12 de Dezembro
de 2005

O primeiro dia 20 de novembro na Serra

Foi a 1ª festa na Serra da Barriga, em União dos Palmares,


como Patrimônio Histórico Nacional, em 20 de novembro de 1984.
Era a festa da cumeeira, na Zona da Mata alagoana, onde Zumbi

335
plantou as raízes da liberdade do negro com muita guerra e muito
sangue. A serra viveu seu apogeu no Quilombo dos Palmares, que
se transformou em palco sagrado de resistência dos negros. A serra
estava radiante e iluminada, com a inauguração do busto do líder
Zumbi em pedra-sabão e do pavilhão das bandeiras, uma grande
oca de madeira e palha, construída para o tombamento da serra
pelo governo brasileiro. A Serra da Barriga comemorava também,
pela primeira vez no calendário nacional, o 20 de novembro como
Dia da Consciência Negra, deixando na poeira da história o 13 de
maio da Princesa Isabel. O topo da Serra se transformou em uma
mãe África. Negras e negros de Angola, da Nigéria, de
Moçambique, do Congo e da Serra Leoa dançavam e gritavam
palavras de ordem, batendo duro no chão, fazendo poeira na serra.

Abdias, Bob Marley e os negros fumando diamba


Para marcar a data estava lá o ministro da Cultura Aluísio
Pimenta e deputado federal e secretário da Cultura do governo do
Rio de Janeiro, Abdias do Nascimento, vestido a caráter, com bata
colorida e um barrete na cabeça, feliz da vida. Abdias foi autor do
projeto de lei que declara Feriado Nacional o dia 20 de novembro.
Depois de enfrentar resistência ferrenha na Câmara Federal e
vencer no voto, ele era o mais feliz no meio da festa. Foi um
registro importante ocorrido numa vibrante cerimônia, no mesmo
cenário onde existiu a República dos Palmares. Até os negros
militantes americanos, seguidores de Martin Luther King e da

336
pantera Ângela Davis, estavam lá. Uma foto em preto e branco
revelava uma linda negra da Nigéria que fazia um inflamado
discurso. No cair da tarde, a serra viveu uma cena inesquecível. Os
negros da Jamaica, com cabelos amarrados em feixes, em baixo da
sombra de uma frondosa palmeira, cantavam canções de Bob
Marley, jogavam capoeira, tomavam goles de vinho daquele da
jarra grande e fumavam um baseado do tamanho de um charuto.
Não sei se foi a primeira vez que o secretário Abdias presenciava
uma cena assim. Ele também estava com os olhos bem abertos.

ILUSTRES ILETRADOS

Analfabeto. Do grego Analphábetos, ‘aquele que não


conhece nem o alfa nem o beta’. 1. Que não conhece o alfabeto. 2.
Que não sabe ler nem escrever: “E o que fez Rousseau? Quase
analfabeto até aos trinta anos, começa a escrever aos trinta e
cinco (Graça Aranha, A Estética da Vida, p. 194). 3.
Absolutamente ou muito ignorante.

Em Novo Dicionário Aurélio Século XXI, 4ª impressão


1999

337
É um paradoxo a existência de índices tão altos de não
letramento e de não alfabetização, no berço de gênios da literatura
brasileira como Jorge de Lima (1893-1953); Graciliano Ramos
(1892-1953), Lêdo Ivo (1924-2012) e Aurélio Buarque de Holanda
(1910-1989). Ao citar em seu verbete a condição do filósofo
Rousseau de analfabeto que superou sua ignorância aos 35 anos,
Aurélio levou em alta conta seu desejo de que todos pudessem ser -
um dia - Jean Jacques Rousseau(1712-1778). Eles não se tornaram
um Rosseau, um erudito das letras mundiais, mas como ilustres
iletrados de Alagoas deixaram páginas de glória na história da arte
popular, da cultura, do folclore, da música, da poesia e das
tradições orais, como donos das histórias mais espetaculares. Na
lista estão artistas populares como os trovadores, poetas
cordelistas, cantores, artistas populares, e figuras do folclore e dos
folguedos. Gente liga à plebe rude.
Chico Nunes das Alagoas

“Sou natural de Alagoas/ nasci para cantador/ Francisco


Nunes Brasil/ poeta improvisador”. Este é o carimbo que Chico
Nunes usava para marcar a autoria de sua obra. Francisco Nunes de
Oliveira (1904-1953), o Chico Nunes das Alagoas, um dos maiores
artistas populares do Nordeste, era um ilustre iletrado. Suas
improvisações, versos, desafios e canções foram anotados e
compilados por estudiosos folcloristas, amigos, filhos e fãs. É um
imenso repertório de mais de 300 canções, sem um verso escrito
por ele, mas cantados e interpretados por onde passasse.

338
“Chico Nunes foi um desses repentistas que ainda glosa com o
copo na mão. Sem tribuna e nem local fixo para se apresentar, os
improvisos vão se largando nos caminhos, bares, bordeis... O tempo
distorce e tumultua, porque nada fica em letra de forma para se
eternizar. A figura do poeta se folcloriza e a ele passa a atribuir-se
todos os improvisos que andam no ar. Seu repertório acaba se
tornando maior que as chamadas anedotas de Bocage”.
Por Mário Lago, no livro Chico Nunes das Alagoas, da
editora Civilização Brasileira, edição 1975

Chico noTrovador Berrante


Mário Lago escreveu sua biografia do Rouxinol de Palmeira
dos Índios depois de conhecer Chico, nas gravações do filme São
Bernardo, em Viçosa, no bar Trovador Berrante, na praça central
de Viçosa, no início dos anos 1970, durante as gravações do filme
São Bernardo, baseado na obra de Graciliano, dirigido por Leon
Hirszman. O bar era de um amigo de ambos, o lendário boêmio
músico e artista popular Zé do Cavaquinho, que chamou Mário
para conhecer o poeta. “Você nunca ouviu falar do Chico?”, e
foram assim em noites de intensas farras, conversas, rodas de
música e um interminável conhecer, de varar noites a fora, que
Mário Lago, Chico Nunes e Zé do Cavaquinho, foram amigos até o
fim como relata Mário Lago.

“Lembra mais alguma coisa do Chico Nunes, Zé? Era sempre


assim com essa pergunta que eu entrava no Trovador Berrante,

339
pouco importando que ele repetisse o já contado na véspera.
Escutava pacientemente, na certeza de que, de um momento para
outro, surgiria um detalhe esquecido. Procuro reproduzir aqui tudo
que ele contou, conversando a sua maneira solta e despreocupada de
dizer as coisas. Se falhei no intento de repetir o Chico Nunes que eu
ouvi, azar do poeta, que era bom às pampas. Aos quatro anos, em
consequência de um sarampo, ele adquiriu uma forte miopia, que lhe
cortou os passos nos estudos. Apesar dos óculos, com enorme
sacrifício conseguiu ler ou escrever alguma coisa”.
E na sequência, Mário mostra um verso de Chico Nunes.

Não tenho sabedoria


Porque não me interessei
Muito pobre, não alisei
Os bancos da academia

Jacinto: o “rei” do coco alagoano

Sebastião Jacinto da Silva(1933-2001) se tornou um ícone


da música popular nordestina, considerado um dos maiores
forrozeiros do país, profundo conhecedor e inventor do coco
sincopado, abandonou a escola logo cedo, mas foi criado ouvindo
os coquistas, repentistas, violeiros, mestres de reisado, e no rádio
os sucessos de Orlando Silva, Francisco Alves, Luiz Gonzaga.
Começou a cantar ainda pré-adolescente.

340
“Em 1945, com doze anos, envolvido pela música e pelo
jogo de futebol no campo da estação, Jacinto é mais uma vez
reprovado no exame de promoção da 1ª série. Depois disso,
abandonou definitivamente os estudos. Ainda adolescente
começou a frequentar feiras, festas e os cabarés da Rua
Pernambuco Novo, em Palmeira dos Índios, cantando embolada,
coco de roda e forró”

Em As Canções, por Luciano José, Imprensa Oficial


Graciliano Ramo, 2013

Jacinto: o forrozeiro do Brasil


O forrozeiro alagoano Jacinto Silva deixou uma obra de
mais duzentas composições, vinte LPs, dois CDs, um gravado na
França. Jacinto começou sua vida de sucesso em 1959, quando o
primeiro disco pela gravadora pernambucana Mocambo, no ano
seguinte “estoura” no mercado musical com seu primeiro sucesso
que tinha o refrão Chora Bananeira, Bananeira Chora. Viveu seu
período áureo nos anos 1960 e 1970. Sua estreia como artista foi
em 1955, na rádio Difusora de Alagoas, assinou contrato com a
CBS (hoje a Sony), e fez carreira nacional; participou como
compositor em trabalhos de grandes estrelas da MPB, como
Abdias dos Oito Baixos, Ângela Maria, Clemilda, Coronel
Ludugero, Genivaldo Lacerda, Marinês, Quinteto Violado, Trio
Nordestino, Xangai e Silvério Pessoa.

341
“A cultura musical nordestina autêntica e original – que foge
do atual padrão de forró estilizado, com simulação de ritmo
caribenho e mexicano, untada de baixo calão – pode ser definida a
partir de quatro figuras emblemáticas: Luiz Gonzaga (inventor e
divulgador do baião), Jackson do Pandeiro (intérprete habilidoso de
senso ritmo invejável), Dominguinhos (virtuoso instrumentista de
herança gonzaguiana), e Jacinto Silva (cantador especialista em
várias modalidades de coco e forró). Ao popularizar o coco
sincopado – gênero musical que fundia trava-língua com pique de
embolada – Jacinto conseguiu desenvolvê-lo de forma complexa e
sofisticada, tanto no modo compor como na de interpretar”.
Em As Canções, por Luciano José, Imprensa Oficial
Graciliano Ramo, 2013

Fernando e seu livro de aventuras

O escultor Fernando Rodrigues dos Santos (1928-2009), ou


Fernando da Ilha do Ferro, reconhecido no mundo da arte popular
no Brasil e no Exterior, como um dos grandes nomes em arte bruta
na madeira, com seus famosos bancos rústicos, que o tornou uma
referência nacional. A arte de seu Fernando levou o mundo a
conhecer Ilha do Ferro, no município de Pão de Açúcar, região
ribeirinha do rio São Francisco, onde formou uma grande escola de
escultores de arte popular, hoje tão ou mais famoso que ele. Artista
popular fantástico, Seu Fernando não é letrado, mas autor de um
livro muito curioso. Ele organizou na memória uma
impressionante coleção de relatos, que garante serem totalmente

342
verdadeiros, e ditou linha a linha para seus filhos e amigos. São
histórias de caças hilariantes, testemunhos sobre Lampião e seu
bando e aventuras inimagináveis, tudo saído de sua cabeça de
pensador.
“Em seu caderno, mestre Fernando (re) produziu cultura,
registrou os fatos históricos, alguns pintados com um tom
fantástico e contribuiu, através do ato de criar, para a construção
de uma identidade cultural do território, sendo, portanto,
verdadeiro agente mediador entre aquela pequena fatia da
população alagoana e mundo externo em diálogo cada vez mais
acentuado em nossa contemporaneidade. E para que os escritos
do mestre Fernando não sejam lidos somente por aqueles que
adquiriram suas esculturas em vida”.

Por Jairo Campos, reitor da Universidade Estadual de


Alagoas, Jairo Campos

Mangação na escola
Em uma parte de seus “escritos” seu Fernando fala de sua
infância, das difíceis condições da família, e de sua decepção ao
chegar pela primeira vez a uma escola, em uma experiência nada
agradável e que marcou sua vida, já que largou os estudos, que
nem começara. Até chegar ao estrelato como um dos maiores
artistas populares de Alagoas e do Brasil, Fernando Rodrigues teve

343
infinitas profissões. Além de “agradecer a Deus pelo dom e
coragem de ser caçador”, ele foi pescador, bodegueiro (foi dono do
Redondo o bar mais animado da Ilha), foi sapateiro, servente de
pedreiro, poeta (“fazedor de rimas”), farinheiro, criador de bode,
gado e galinha de Guiné, e até jogador de futebol.

“Em 1940, eu com 10 anos de idade, minha roupa da escola


minha mãe é quem fazia na mão, uma roupa de saco de açúcar, o
calção era no meio das pernas. Minha mãe ia no mato para tirar rapa
de umbuzeiro para pintar minha roupa. Ninguém sabia no mundo que
cor era, e o sapato era de pano também, O livro que eu levava para
escola era do 4º grau e eu não sabia nem o ABC. Quando chegava lá,
as meninas só eram para mangar dos meus trajes”.

FIGURAS POPULARES

Odete: a morena mais amada de Maceió

Odete Augusto dos Martírios, a Negra Odete (1928-2006)


era a morena mais bonita e charmosa de Maceió, e a preferida de
dez entre dez jovens alagoanos, que viviam no auge da juventude,

344
entre os anos 1950 e 1960. Eles ficavam loucos quando passava
aquela mulata sestrosa, com o corpo cheiroso e vestido
apertadinho, no auge de sua vida sexual, até a decadência. Um tabu
permanece até os dias de hoje, mas pouca gente fala: quem levou a
Nêga Odete para a cama? Aos coqueirais na penumbra ou as areias
noturnas do mar de Jaraguá? Odete nasceu em uma família pobre,
foi criada pela avó no bairro da Levada. Cresceu uma menina
alegre, cativante. Tinha as ruas, as praças, a lagoa Mundaú para
brincar, pescar e catar sururu. Criou-se livre, sem estudar, correndo
e percorrendo toda biboca da cidade. Um de seus maiores fãs, e
amigo, o escritor Carlito Lima, autor de muitas histórias sobre ela,
não poupa elogios à beleza da mulher que dedicou sua vida aos
prazeres sexuais – que sempre assegurou nunca ter recebido nada
pelas noitadas que oferecia aos “sortudos” que escolhia – e
bagunçou a sociedade conservadora da capital. Odete seria hoje a
nossa Gabriela Cravo e Canela.

“Tornou-se uma moça bonita, rosto oval, cabelos negros,


olhos penetrante. Corpo roliço, bem moldado, cheio de curvas
acentuadas na cintura e nos quadris. Pele macia, sedosa como jamais
alguém teve. Odete despertava desejo nos homens quando andava,
rebolado natural, cadenciado, como se flutuasse ouvindo música...
Assim foi se espalhando a história da beleza daquela negra alegre de
belo sorriso, dentes brancos, lábios grossos, uma loba no amor.
Muitos homens desejaram, muitos homens foram rejeitados. Odete se
transformou num mito, figuras das mais populares de Maceió.
Adorava dançar, como não podia frequentar clubes, partia para as

345
boates de Jaraguá apenas para rodopiar ao som dos conjuntos
tocando os boleros. Muitos parceiros de dança tentaram levá-la para
o quarto, ela recusava, queria apenas dançar. O único local que
aceitava uma empregada, negra, analfabeta, no salão de dança, era a
zona. Noite alta, com o sapato pendurado entre os dedos, voltava
para seu quarto, sua casa na Praça Sinimbu”.
Carlito Lima, no blog Meninos da Avenida, em 19/12/2014
http://meninosdaavenida.blogspot.com.br/2014/12/o-ultimo-
natal-da-nega-odete-por-carlito.html

Benedito Mossoró, o rei da noite de Maceió

“Quem passa, hoje, pela Rua Jequiá, no bairro do Canaã,


Maceió, e não conhece o seu passado, nem vai desconfiar que
durante quase um quarto de século (de 1967 ao início dos anos 90)
por ali passavam e estacionavam, durante longas horas, os melhores
carros de Maceió, levando empresários, políticos, advogados,
jornalistas, literatos, gente de poder e influência. Ali ficava um
endereço conhecido em toda Alagoas - a boate Areia Branca. Seu
dono era um homem que, ainda em vida, virou folclore, quase lenda:
Benedito Alves dos Santos, o Mossoró. Benedito Mossoró foi um
personagem de Maceió que ganhou a camaradagem e o respeito das
personalidades da terra. Acabou se tornando parte da cultura
popular alagoana. Negro e praticamente analfabeto, saiu do nada
para se tornar um próspero empresário do prazer, o rei da noite.
Virou letra de um samba de sucesso nacional (Só em Maceió, com
Martinho da Vila)”.

346
Por Plínio Lins, trecho da reportagem na Gazeta de Alagoas,
edição de 26/06/2005

Só em Maceió
Martinho da Vila

Teka, rendeira
Eliane, praiera
Vamos pra Paripueira
Vamos pra Paripueira
Vai ter sururu
Vai ter sururu
E o Maré fica na beira
Da Lagoa de Mundaú
Vou tomar uma azuladinha
E vou convidar vocês
Pra comer uma agulhinha
Lá na Praia do Francês

E um casadinho de feijão
Lá na casa do Seu João
E depois vou vadiar
Com as meninas do Mossoró
Só em Maceió

Só em Maceió
É que se pode vadiar

347
Com as meninas do Mossoró
Com as meninas do Mossoró

Sandoval Caju e o marechal Floriano


O nome do sertanejo paraibano Sandoval Caju (1923-1974)
chegou aos ouvidos dos alagoanos pela rádio Difusora, onde
narrava programas humorísticos de auditório, como o Palito de
Fósforo, que incendiou os auditórios e fez sua popularidade. Em
1960, Caju arriscou-se a competir com caciques da política
alagoana a disputa pela prefeitura de Maceió. Ele ganhou. Nos três
anos que governou a cidade construiu 36 praças e modernizou 22
delas, sempre com o “S” marcado em bancos, rela-relas e balanços.
Ele usou bordões famosos como o “vim de branco para ser mais
claro”, que o ator alagoano Paulo Gracindo confessou ter “tomado
emprestado” para seu personagem Odorico Paraguassu, na novela
O Bem Amado.

“E tanto foi de branco e tanto foi claro que acabou prefeito de


Maceió, com espetacular votação. Inclusive com o apoio de Floriano
Peixoto. Diante da estátua do Marechal de Ferro, falava um dia ao
povo. De repente, abriu os braços:
- Marechal Floriano, vós que sois o patrono da terra das
Alagoas, dizei a este povo se estais ou não apoiando a candidatura de
Sandoval Caju à prefeitura de Maceió.
A praça calada como quarto de freira, e Sandoval, braços ao
vento, insistia:
- Respondei, Marechal, respondei!

348
Depois, num soluço, os olhos molhados de gratidão, gritou:
- Obrigado, Marechal. Obrigado. Quem cala, consente.

Sebastião Nery, Folclore Político: 1950 - Geração Editorial,


2002.

Tenório Cavalcanti e a metralhadora Lurdinha

Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque (1906-1987)


nasceu em Palmeira dos Índios, viveu em Alagoas até aos 15 anos,
em 1924, quando mudou para Caxias, na Baixada Fluminense, no
Rio de Janeiro, onde fez sua história política. Dominou a política
na baixada entre 1933 a 1964, foi conselheiro do presidente João
Goulart, e eleito governador do Rio, mas imediatamente cassado
pelo golpe, em 1964. Conhecido como o “Homem da Capa Preta”
– que virou filme, em 1986, do diretor Sérgio Resende e José
Wilker no papel principal – que a usava para esconder sua magreza
e a famosa metralhadora Lurdinha. Ficou famosa a briga que teve
com o então de deputado baiano Antonio Carlos Magalhães.

O fato é que numa das sessões na Câmara Federal, no início


dos anos 60, Tenório Cavalcanti discursava contundentemente contra
o ex-presidente do Banco do Brasil e então Ministro da Fazenda de
Jânio Quadros, Clemente Mariani, conterrâneo de ACM, então ainda
jovem, pediu um aparte e retrucou as acusações de Tenório. "vossa
excelência pode dizer isso e mais coisas, mas na verdade o que vossa
excelência é, mesmo, é um protetor do jogo e do lenocínio, porque é

349
um ladrão”. Ao ouvir isso, Tenório Cavalcanti disse "vai morrer
agora mesmo", no que foi contido por vários deputados, que
agarraram o revólver de Tenório, impedindo a morte de ACM, que a
essa altura já tinha tido uma incontinência urinária e, diante da
impossibilidade de ser alvejado, bradava no microfone “atira, atira”.
Ao ver a poça de urina no chão, cena constrangedora em que se
encontrava ACM, Tenório Cavalcanti começou a rir dele e disse:
"Podem sossegar. Eu só mato homem”.

http://jornalggn.com.br/blog/alessandre-de-argolo/o-dia-em-
que-toninho-malvadeza-se-urinou-de-medo-do-homem-da-capa-
preta

O governador que adorava rolete de cana

De 1961 a 1966 o então governador de Alagoas Luiz


Cavalcante (1913-2002) turbinou os rumos do desenvolvimento do
Estado. Ele chegou a patente de general-de-brigada. Mas ficou
conhecido como major Luiz. Construiu escolas, estradas e uma
penitenciária, equipou hospitais, mas ficou conhecido como o
governador que gostava das crianças e de chupar rolete de cana
(pedaços da cana enfiados em cachos de palito fino de madeira),
uma tradicional iguaria do Nordeste.

“Mesmo tendo chegado à patente de general, o Major Luiz,


como era conhecido, parecia demonstrar mais apreço ao
reconhecimento popular do que às honras militares. Adotou tal

350
simplicidade à frente do Governo que se tornou conhecido por
passear sem segurança pelas ruas da capital. No lugar de assessores
militares, preferia a companhia de crianças e pobres com quem
dividia roletes de cana que o tornou personagem recorrente da
crônica política alagoana. E, de tão cristalizada, essa imagem
folclórica do “Major” quase se sobrepôs às realizações de sua
gestão”.
Radjalma Cavalcante e Felipe Cavalcante,
em crônica da Gazeta de Alagoas, edição 03/08/2003.

O governador do cajueiro solitário

Conhecido pelo seu gênio temperamental e explosivo,


Silvestre Péricles de Góis Monteiro (1896-1972) foi governador de
Alagoas de 1947 a 1951. Sua sucessão foi marcada por uma
guerra, com muitas mortes de mando político, envolvendo
parlamentares e a família Góis Monteiro. Em seu tempo o Estado
recebeu a alcunha de Alagóes, quando família exerceu o
mandarinato em Alagoas durante o Estado Novo. O presidente
Getúlio Vargas nomeou seus irmãos, Pedro Aurélio, como o
poderoso ministro da Guerra, e Edgar para ocupar o governo de
Alagoas. Eleito governador em 1947, Silvestre comandou o Estado
com punhos de ferro, mas um episódio tirou o personagem do
sério. Ele convocou todos seus secretários, já na madrugada, com
uma ordem inusitada: ouvi-lo recitar uma poesia de sua lavra.
Depois de percorrer as ruas de Maceió com a comitiva, ele pediu

351
que todos os carros oficiais apontassem sua luz para o tal cajueiro
solitário, e falou aos presentes.

“Convoquei os senhores para que tenham a primazia de ouvir


uma das obras primas da poesia brasileira. Acabei, a poucos
momentos, de compor um poema dedicado a este cajueiro solitário, e
pensei premiar os meus diletos amigos com a honra de sua audição”,
e com entusiasmo leu a poesia. Os espectadores se entreolharam
sarcasticamente, porém aliviados pelo grande susto que passaram.
Mário de Carvalho Lima, em Sururu Apimentado
Apontamentos para a História Política de Alagoas – 2ª edição,
Editora Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2008.

Edécio Lopes: o Embaixador do Frevo

Pernambucano de nascimento, alagoano de coração, Edécio


Lopes (1933-2008) é referência quando o assunto é Carnaval em
Alagoas. Coroado Embaixador do Frevo, o radialista, escritor e
compositor, que se notabilizou e influenciou milhares de alagoanos
entre os anos 1970 e 1980, quando por mais de 30 anos apresentou
o programa Manhãs Brasileiras. Notabilizou-se pelo brilhantismo
com que conduzia suas entrevistas, pela boa música que divulgava,
pela liberdade de expressão e por sua paixão pelo carnaval, em
especial o de Alagoas. Sua obra-prima foi o frevo-canção “Cidade
Sorriso”

Subi a ladeia do Farol

352
fiquei no mirante a olhar
os raios dourados do sol
no azul imenso do mar.
Olhei a Cidade Sorriso
eu vi Maceió tão feliz

mostrando tanta riqueza


ao povo desse País.

Eu vi eu vi eu vi eu vi!
Vi tanta coisa boa
no mundão de lagoa
um barco a deslizar

Eu vi eu vi eu vi eu vi!

Trapichão enfeitado
CRB no gramado
com CSA a jogar

Jatiuca, Pajuçara
Ponta Verde joia rara
Avenida Jaraguá

Depois de ver coisas tantas


eu vi afinal de contas
que terra mais linda não há.

353
Edécio Lopes, música e letra

Edécio Lopes e o “Manhãs Brasileiras”


A voz do radialista Edécio Lopes ainda ecoa nos ouvidos
dos alagoanos, nos anos 1970, que não perdiam o “Manhãs
Brasileiras” na espera de novas canções. O programa influenciou
gerações inteiras de alagoanos entre os anos 70 e 80. Seus
repertórios, suas seleções são insuperáveis, e entraram para a
história do rádio alagoano. Edécio era dono de um invejável acervo
sobre a história da música popular brasileira e, nesse rol, o frevo
tinha lugar cativo. Desde 2010, todo seu acervo está sob a custódia
do Museu da Imagem e do Som (Misa), no Memorial do Rádio
Alagoano Espaço Edécio Lopes. Radialista com mais de 50 anos
de atuação, foi também poeta e escritor com três livros publicados.
O Manhãs Brasileiras esteve no ar de 1975 a 2008, com 33 anos de
muita música, papo, entrevistas e “aulas” sobre o carnaval
alagoano.

Aldemar Paiva: frevo com marca alagoana

Aldemar Paiva (1925-2014) é alagoano, mas pernambucano


de coração, parceiro do compositor pernambucano Nelson Ferreira.

354
Juntos fizeram uma das poesias que mais marcaram o carnaval
pernambucano, o frevo canção “Frevo da Saudade”. Aldemar
escreveu a letra e Nelson a música. Na literatura Aldemar Paiva foi
um exímio contador de causos. Um dos mais famosos dele é:
Monólogo de Natal. Aldemar Paiva também foi poeta, cordelista,
ator, radialista, jornalista, compositor, produtor artístico e
publicitário. Nasceu em Maceió, foi um dos fundadores da Rádio
Difusora, mas seguiu sua carreira artística em Pernambuco, onde
durante muitas décadas comandou programas de enorme sucesso.

Frevo da saudade

Nelson Ferreira - Aldemar Paiva

Quem tem saudade


Não está sozinho,
Tem o carinho, da recordação...
Por isso quando estou
Mais isolado
Estou bem acompanhado
Com você no coração...
Um sorriso, uma frase, uma flor,
Tudo é você na imaginação..
Serpentina ou confete...
Carnaval de amor...
Tudo é você no coração...
Você existe

355
Como um anjo de bondade
E me acompanha
Neste frevo de saudade

Canção à terra natal


O script que se tornou modelo para o programa
protagonizado por Chico Anisio e foi sucesso nacional - a
Escolinha do Professor Raimundo - foi uma criação de Aldemar
Paiva. Em 1948, fundou a Rádio Difusora de Alagoas,
transferindo-se em 1951 para o Recife. Substituiu ninguém menos
que Chico Anísio no cast da Rádio Clube. Ocupou os cargos de
diretor artístico da PRA-8 (Rádio Clube) e de diretor-geral da
emissora e da Rádio Tamandaré (ambas dos Diários Associados).
Assinou colunas de humor nos jornais Diário de Pernambuco,
Diário da Noite e Jornal do Commercio. Durante um quarto de
século comandou o já citado “Pernambuco, Você É Meu”, líder
nacional de audiência. Participou como produtor e ator dos
programas ‘Som Brasil’, ‘Praça da Alegria’ e ‘Chico City’, na rede
Globo. Aldemar compôs marchas carnavalescas e frevos
pernambucanos em parceria com grandes compositores do Recife,
entre eles, Capiba e Nelson Ferreira. Mas ele também cantou sua
terra natal em lindas palavras, como autor da música Pajuçara.

Pajuçara
Aldemar Paiva

... Em Pajuçara há mais encanto, há mais luz

356
Pajuçara onde o mar beija as areias
Com mais alma e mais amor
Pajuçara lindo berço das sereias
Que nos deu o criador
Pajuçara que refletes num sorriso
O teu coqueiral em flor
Tens uma beleza rara
Pajuçara

Nô Pedrosa, o mais ilustre anarquista

Walfredo Pedrosa de Amorim, o Nô Pedrosa, nasceu em


Santa Luzia do Norte em 1940. Ele é conhecido por todos que
frequentam os arredores da praça Pedro II e Assembleia
Legislativa, e tem deputado que desvia seu percurso para não levar
uma chamada de Nô e sua “brigada vermelha”. Nô Pedrosa
pertence a uma família com tradição e militância política na
esquerda alagoana. O irmão mais velho, o escritor Valter Pedrosa
foi o primeiro que iniciou a militância no Partido Comunista
Brasileiro (PCB), na segunda metade da década de 1950. O
ativismo do jovem Nô Pedrosa ajudou a formar vários núcleos de
jovens militantes comunistas no movimento estudantil secundarista
e universitário. Em 1964 foi preso pela ditadura, junto Valter e os
irmãos Jaime e Nilson Amorim Miranda, dirigentes do PCB em
Alagoas. Ao sair da prisão continuou a militância política, e a
sonhar com uma possível resistência armada, e dessa maneira

357
derrotar a ditadura. O tempo passou, prisões voltaram a acontecer,
líderes estudantis foram presos e submetidos a tortura em Alagoas
e por todas as partes do país, a anistia chegou, e Nô voltou a suas
origens de liberatário, louco e anarquista, e as 75 anos continua
formando novos quadros de esquerda.

“A militância comunista se esvai, e Nô Pedrosa torna-se cada


vez mais um anarquista em franca aliança com os demais grupos de
militantes de esquerda. Não deixa de ser curiosa a sua atitude. O que
não mudou entre uma fase e outra foi a capacidade de aglutinar
jovens seguidores. Fez da porta da Biblioteca Pública Estadual e dos
corredores da Ufal o seu palco de proselitismo político-ideológico”.

Por Geraldo de Majella.

Duda Calado. O “guardião” do inferno

O doutor e professor Luiz Duda Calado (1927-1995) foi


uma das figuras alagoanas mais instigantes e emblemáticas da
história cotidiana de Alagoas. O lendário médico legista foi
durante mais de 40 anos o “guardião” do Instituto Médico Legal
Estácio de Lima – desde sua fundação em 1947 - e exumou
milhares de cadáveres. Morreu esquecido. Seus alunos da
Faculdade de Medicina Legal eram fãs de Duda, tanto pela sua
simplicidade como pela sua habilidade em lidar com corpos
expostos nas aulas de anatomia. Ele os abria com um bisturi afiado
e uma leveza formidável. Ele ficou conhecido nacionalmente pelo

358
uso de folhas de manjericão no nariz ao fazer a exumação dos
cadáveres. “O manjericão tem uma essência natural que impede
que o cheiro da putrefação entre pelo nariz”, atesta Manoel
Cassiano, auxiliar de necropsia e que acompanhou Duda por 19
anos no IML. Entre suas exóticas manias estava a de colecionar as
armas dos crimes mais bárbaros. De acordo com João Aurélio,
filho de Duda, essa “coleção” está guardada no museu Théo
Brandão. Para Duda Calado, “trabalhar com defunto é uma
vocação natural”. Mas ele jamais esqueceu o caso da jovem
assassinada pelo marido ciumento, com 129 facadas desferidas por
todo o corpo da mulher.

“Morto não dá voto”


Desde aquele tempo, Duda Calado já denunciava o IML
como uma casa dos horrores, abandonada pelo poder público.
Formado pelo Instituto Nina Rodrigues, da Bahia, um dos mais
importantes centros de medicina legal do País, e é dono da cadeira
nº 25 da Academia Nacional de Medicina Legal. Ele teve como
mestre o próprio Estácio de Lima, alagoano que deu nome ao IML.
Nos 40 anos, quando se manteve como diretor do IML, Duda
Calado contabilizou a dança das cadeiras de 98 secretários de
Segurança Pública. Ele revelava, na época, que a única geladeira
do IML “foi, durante muito tempo, a câmara frigorífica da Colônia
de Pescadores de Penedo”. A câmara foi adaptada e utilizada para
guardar os corpos, que acabavam podres, pois a câmara não tinha
temperatura ideal para conservação.

359
“Nunca, em nenhum governo, o IML foi olhado ou tratado
como deveria. Sempre ficou jogado ao segundo plano, sem apoio de
ninguém. Morto não dá voto, no entanto temos que enterrá-los em
covas rasas e, às vezes, sem a presença da família, como um
indigente”.

Zé do Cavaquinho: eterno boêmio da Viçosa

O bar de nome trovador berrante, localizado na Praça


Apolinário Rebelo, talvez não tivesse a magia se não fosse pela
figura de seu proprietário, José Rodrigues de Moura, o Zé do
Cavaquinho (1911-1981). Músico autodidata, seresteiro, trovador e
recordista de farras que fora, Zé com os seus chorinhos, muitos dos
quais de improviso, reunia autoridades, curiosos, farristas e
turistas.Zé do Cavaquinho nasceu em Viçosa e segundo ele
mesmo começara a vida de boêmio muito cedo, aos 11 anos, e já
em 1929 compôs o seu mais conhecido choro, o escorrego do
urubu.Zé com seu dom artístico tivera muitos saudosos amigos,
como o velho senador Teotônio Vilela e a “lenda” Waldir
Azevedo, o criador do chorinho “Brasileirinho”. Zé sem dúvida era
o que mais bebia, pois bebia com todos os fregueses, muitas vezes
o velho senador ia de manhãzinha arrancá-lo da cama, ainda
bêbado e dormindo, amarrava-o na sela de um cavalo manso e
seguiam em bando para onde tivesse farra.Fora uma vida inteira
levada em “olhares e sorrisos” como o próprio dizia. Em 2005 foi
lançado um CD com suas músicas mais conhecidas, interpretadas
pelos seus filhos, todos músicos.Zé do Cavaquinho faleceu em

360
abril de 1981. Seu histórico bar foi totalmente reformado,
ganhando placas comemorativas e galeria de fotos e artigos,
continuando a ser o reduto dos boêmios de Viçosa.Foi pai de
quinze filhos, todos eles exímios tocadores de cavaquinho e violão.

FIGURAS CARNAVALESCAS

Foliões da era ouro do Carnaval

361
Nos anos da década de 1930, Maceió iniciava o período
considerado como sendo a época de ouro do Carnaval alagoano.
Nos clubes e nas ruas, as marchinhas dominavam, mas já
começavam a sentir a crescente presença do frevo pernambucano,
principalmente tocados pelas orquestras dos blocos nas ruas da
cidade. O tradicional Banho de Mar à Fantasia da Avenida da Paz
arrastava multidões para as manhãs dos domingos anteriores ao
Carnaval. Por lá desfilavam blocos, troças, ranchos e mascarados.
Do sábado de Zé Pereira até a terça-feira gorda, a festa se
transferia para a Rua do Comércio, incluindo a Praça dos
Martírios. O corso e os carros alegóricos abriam as noites que
quase sempre acabavam, para parte da população, nos clubes. Nos
bairros, o carnaval acontecia na Praça Moleque Namorador e em
Bebedouro, na ainda Praça Major Bonifácio Silveira, que viria a
ser a Coronel Lucena Maranhão.

Moleque Namorador

Armando Veríssimo Ribeiro (1921-1949), O Moleque


Namorador foi um modesto e pobre vendedor de jornais - nascido
em São Luis do Quitunde - que transformou o Carnaval alagoano,
com seus ousados passos de frevo, sua camisa colorida, seu boné e
a sombrinha. Levou o Carnaval para as ruas de Maceió e para os
palcos, quando o passista brilhou no Teatro Deodoro. Boêmio o
tempo inteiro, deu vida às festas de momo nos anos 1930 e 1940.

362
Ainda é até hoje símbolo do carnaval alagoano e virou nome de
praça, no bairro do Prado.

Pedro Tarzan
Um homem corpulento e de pele negra, Pedro Ferreira Auta
(1929-2001) mantinha uma espécie de “ritual” para confeccionar
suas fantasias carnavalescas. Para evitar ser incomodado pelos
comentários alheios sobre os trajes que produzia, ele buscava se
isolar do contato com as pessoas. “Não queria ouvir a opinião de
ninguém”, confessou ao cineasta alagoano Pedro da Rocha, no
documentário Memórias de um herói de carnaval (1988). Não era
segredo para ninguém. Bastava perguntar para Pedro Ferreira de
onde vinha a inspiração para criar as suas fantasias que ele
revelava sem nenhum rodeio:“Através dos filmes que vinha
assistindo, como O Grande Guerreiro, com Victor Matuse, Um
Passo da Morte, com Kirk Douglas, Talhado em Granito, com
Randolph Scott e O Último Guerreiro, com Jack Palance”.
Desfilando pelas ruas durante as festas momescas vestido de heróis
dos épicos hollywoodianos, ele logo se tornou “o rei do Carnaval
alagoano”.

“Sua paramentação de cacique era de um legítimo pele-


vermelha sioux ou qualquer tribo distante de todas as nações
indígenas. O povo ainda hoje imagina o nativo a cavalo, saudando os
cara-pálidas com um sonoro ugh!”.
Ênio Lins, em Arte Popular de Alagoas – 2004.
Rás Gonguila

363
Figura de proa do carnaval alagoano, Rás Gonguila era um
homem do povo, um engraxate. Ele fundou um dos primeiros e
importante bloco carnavalesco, o Cavaleiro dos Montes. Negro
forte, espirituoso e alegre, Rás Gonguila dizia que era rei da
Etiópia. O local onde trabalhava como engraxate, na Rua do
Comércio, tornou-se ponto de encontro de boêmios, poetas e até
figuras políticas. Morador da Ponta Grossa, era muito respeitado e
tido como um líder da comunidade. “Todo ano desfilava à frente
do bloco arrastando uma multidão com orquestra de frevo. Atrás
do bloco misturavam-se pedreiros, engenheiros, médicos,
enfermeiros, desocupados, prostitutas e soldados”, conta o escritor
Carlito Lima.

“Tinha até uma história engraçada do Arnon de Mello, que


era candidato a senador na época, e o Teobaldo Barbosa levou o
Arnon para o Vergel do Lago e Ponta Grossa, onde o Gonguila era
liderança; aí o Arnon se apresentou e deu a mão para ele e disse:
‘Muito prazer, seu Gorila’ e ele respondeu: ‘gorila é a p.q.p., seu
Arnon, meu nome é Gonguila’ e assim Arnon conseguiu todos os
votos da região”.

Carlito Lima, no endereço


http://meninosdaavenida.blogspot.com.br

364
Maestro Manezinho

Manuel Tenório de Moura (1922-2003) era louco por


carnaval, foi o fundador, em setembro de 1940, do Bloco
Carnavalesco Sai da Frente, que detêm o maior número de títulos
(32) nos concursos de bloco.

“Certa vez (o jornalista) Denis Agra, teve uma ideia de


animar as caminhadas do (vereador) Freitas Neto, candidato a
vereador pelo PCB, e chamou Manezinho e sua orquestra para fazer
um arrastão na Rua do Comércio com o nosso gordo candidato do
Partidão. O maestro não contou duas vezes, acertou a apresentação e
fez mais, na ausência de músicos, arregimentou os integrantes da
banda da Polícia Militar para tocar na orquestra que iria animar a
candidatura comunista”.

Régis Cavalcanti, em Gazeta de Alagoas, 26/ 10/ 2013.

Januário Gusmão, o Canhoto

Januário foi uma das figuras mais populares de Maceió, em


um tempo onde o Carnaval de rua fazia a festa de multidões.
Chamado de Januário Canhoto era um exímio violonista e um
“bamba no bandolim”, de acordo com o radialista Jorge Lins que
acompanhou de perto toda emoção transmitida por Januário nas
festas de Momo. De sua profissão de marinheiro – trabalhava na

365
Alfândega de Maceió e no Cais do Porto – também tirou sua
diversão: Januário foi fundador e organizador do bloco
carnavalesco “Os Marujos”, que desfilava pelas ruas da Pajuçara e
Ponta da Terra na década de 1950 e arrastava centenas de pessoas.
Ele também organizava festas juninas e de Natal com quadrilhas,
pastoris (inclusive o dos homens vestidos de mulheres com
maracujás imitando os seios), reisados, fandango (ou marujada) no
Largo de Nossa Senhora de Fátima, na Ponta da Terra. Morreu de
infarto do miocárdio no Sábado de Zé Pereira, em pleno Carnaval
de 1963, a festa de que ele mais gostava. O amigo da família, Jorge
Lins, relembrou Januário e sua importância para o Carnaval.

“O Januário é um nome que tem que ser lembrado,


principalmente falando em festas, animação e cultura. Foi uma figura
lendária e popular, que animava o Carnaval, onde tocava seu
bandolim e violão como se fosse um regional e sua orquestra com
som amplificado nos alto falantes espalhados em postes pela rua, as
chamadas cornetas. Ele também animava o São João, e realizava
todos os tipos de brincadeira, como quebra pote e pau de sebo. Era
bonito vê-lo vestido de marinheiro, sua boina branca e camisa de
marinheiro, de azul. Ele marcou a minha infância”.
Jorge Lins, radialista alagoano, em janeiro de 2016

366
A “fashion” Miss Paripueira

Ambrosina Maria da Conceição (1910-1995) foi coroada


miss durante um corso da rapaziada no Carnaval de Paripueira, nos
anos 70, e a daí por diante assumiu o título até morrer. Ambrosina
era figura assídua nas festas da cidade, como a de Santo Amaro.
Ela chegava toda serelepe, psicodélica da cabeça aos pés, a moçada
fazia a maior zoeira. Ela coletava todas as roupas e acessórios
pelas casas de veraneio da cidade.

“A sedução de Miss Paripueira eram suas narrativas


fantásticas, suas criações ousadas – peruca, vestido longo, bolsa,
colar e óculos sempre enormes. Sua originalidade era infinita, uma
estética naif-fashion, encantava pela extravagância. Foi durante anos
personalidade dos verões alagoanos do litoral do litoral Norte”.
Luciano Padilha, professor-doutor da Ufal, em Arte Popular
de Alagoas – 2004.

Setton Neto, o eterno rei Momo

Salomão Setton Neto (1920-1994) foi o gordo mais


simpático e brincalhão que Alagoas já conheceu. Com este
primeiro nome de rei, Setton nasceu para ser monarca: durante 19
anos foi o rei-momo oficial do Carnaval de Maceió, de 1970 a
1988. Sua vida de artista começou na juventude. Aos 28 anos,

367
como cantor, Setton integrou o cast da Rádio Difusora de Alagoas,
em sua inauguração, em 1948.

“Figura marcante do Carnaval alagoano foi, sem sombra de


dúvida, o Setton Netto. Comerciante do ramo de tecidos – a Casa
Setton era de seu pai –, Setton era cantor de samba, do “cast” da
Difusora. Sabia e interpretava todos os sambas canções do saudoso e
famoso Cyro Monteiro – o “Formigão”. Foi o Rei Momo de reinado
de maior duração. Folião por excelência, sabia, mais de que
ninguém, desempenhar o papel de Monarca da Folia. Levava o cargo
a sério.”
Jornalista Alves Damasceno, no blog
Alagoas é muito mais – entrada em 17/11/2011.

Saleiro Pitão, o folião dos clubes e das ruas

No carnaval do Clube Fênix Alagoana,o folião Cláudio


Saleiro Pitão (1920-1990) era o rei da pista e do salão. Suas
fantasias eram caprichadas, de lantejoulas e paetês. Na rua, sempre
estava ao lado do rei-momo, e antes de brincar o Carnaval, corria
as rádios de Maceió para cantar suas marchinhas. “Certa vez meu
pai fez uma fantasia Amolador de Língua de Sogra que provocou
uma polêmica danada”. Cláudio Saleiro Pitão Filho, em Revista
Graciliano, na reportagem Cortejo Fantástico – edição Março 2014

368
Major Bonifácio: festeiro de Bebedouro

Bonifácio Magalhães da Silveira nasceu no dia 14 de maio


de 1867 em Recife, Pernambuco. Era um dos grandes entusiastas
do Carnaval alagoano. Comerciante e defensor dos direitos dos
negros, era um lutador para que a cultura e os festejos populares
saíssem da margem e viessem desfilar suas cores, danças e alegrias
no Centro da cidade. Fazia de Bebedouro um reduto festeiro. A
praça principal virava um imenso parque de diversões. Nos
carnavais de Maceió, o nome Major Bonifácio era sinônimo de
folia. Graças a ele, seu bairro ficou conhecido como a República
da Alegria. Criou e incentivou a Sociedade Bebedourense, que
tanto promoveu as artes cênicas no início do século em Bebedouro.
Em sua chácara, improvisou um pequeno teatro e depois fundou o
Teatro Santo Antônio, que funcionou entre 1909 e 1930. Era
famoso o Clube Carnavalesco das Ciganinhas do Major, que reunia
mulheres do bairro, a maioria era de empregadas domésticas.
Também foi criação do Major Bonifácio o bloco Os Gigantes. Os
desfiles deles em direção ao centro de Maceió eram aguardados
com muita expectativa.

Nega Juju é da favela

369
Personagem lendária da marcha “Sururu da Nega”,
composta em 1934, por Pedro Nunes e Aristóbulo Cardoso, e
muita executada nos carnavais de Maceió.

“É da favela? Não, nega Juju


Nasceu num rancho da terra do sururu
Quadris roliços, o cabelo atrapalhado
Quem vê diz que traz feitiço no olhar apimentado
Cavando a vida no Canal do Mundaú
Pesca caboclo, maçunim e sururu

Em Bebedouro, no Farol, na Ponta Grossa


Com o sururu da nega a folia é nossa
Não há petróleo, não há porto, não há nada
O bom problema é o sururu lá na Levada”.

Aristóbulo Cardoso e Pedro Nunes - 1934

“A letra do publicitário Pedro Nunes exalta o trabalho da


catadora de sururu, representado pela Nega Juju, fantástica
personagem que esbanja sensualidade, apesar de sua deplorável
condição social. Na segunda parte denuncia o fato de a cidade
não possuir um porto marítimo, na época, para o escoamento de
petróleo, quando o “ouro negro” foi descoberto em Alagoas.

Luiz Barroso Filho, membro da Comissão Alagoana de


Folclore, em Gazeta de Alagoas, 20/04/2005

370
Jararaca: Carnaval para o mundo

“Mamãe eu quero, mamãe eu quero, mamãe eu quero


mamar”. Este é o refrão da música de Carnaval considerada a de
maior sucesso de todos os tempos, tanto no Brasil como no mundo.
O autor é um alagoano da gema e do ovo, José Luiz Rodrigues
Calazans (1896-1977), o Jararaca, da dupla Jararaca e Ratinho
(Severino Rangel, baiano de Itabaiana). A dupla foi sucesso no
Brasil ao longo de 54 anos. A marca da dupla foram as gags
humorísticas. Mamãe eu quero foi gravada em 1937, e a letra é de
autoria de Jararaca. Mas o sucesso estrondoso da música, que
conquistou os EUA, foi na voz da portuguesa naturalizada
brasileira, famosa no cinema de Hollywood, Carmem Miranda. A
dupla deixou mais de 80 discos de 78 rpm e dois LPs onde
alternavam números musicais com vasto anedotário.

Mamãe eu quero, mamãe eu quero,


Mamãe eu quero mamar!
Dá a chupeta! Dá a chupeta! Ai! Dá a chupeta
Dá a chupeta pro bebê não chorar!

Dorme filhinho do meu coração!


Pega a mamadeira e entra no meu cordão.

371
Eu tenho uma irmã que se chama Ana:
De piscar o olho já ficou sem a pestana.

Eu olho as pequenas, mas daquele jeito


E tenho muita pena não ser criança de peito!...
Eu tenho uma irmã que é fenomenal:
Ela é da bossa e o marido é um boçal!

Música e letra: José Luiz Calazans

Jucá Santos, o intelectual do Carnaval

Antes era tudo de Pernambuco, principalmente o frevo e as


canções de Capiba. Depois Alagoas se firmou, quando começou a
luzir a estrela dos grandes compositores, maestros e carnavalescos
de Alagoas. "A crítica social, de forma mordaz, porém alegre e
graciosa, era o tom das nossas genuínas composições de carnaval”,
relembra o jornalista e compositor Jucá Santos, que sabe tudo de
música carnavalesca. Chegou até mesmo a emplacar um bolero nas
paradas de sucesso na voz de Waldick Soriano. A composição de
Jucá teve direito a mais de 10 regravações em Long Plays, os
saudosos “bolachões” de 78 RPMs, quando Maceió aderiu ao disco
de frevos autênticos, tocadas por orquestras que marcaram época
nos anos 70, como a Big Band Show, do maestro Ivanildo Rafael,
e o Carnaval Temperatura, do maestro arapiraquense Jovelino
Lima.

372
“Essa foi a era de ouro das composições de carnaval em
Alagoas. Época que tínhamos o Banho de Mar à Fantasia que ocorria
uma semana antes do carnaval e a pessoas iam à praia e sabiam as
músicas de cor”, lembra Jucá, ao fazer referência também aos blocos
“Amigo da Onça” e “Vulcão” que arrastavam milhares de foliões na
praia da Avenida, ao som do frevo autêntico com marchinhas e
bordões.

Seresteiros da Pitanguinha pedem passagem

Grupo musical criado em 1994 que revive os passeios


musicais noturnos pela cidade. Ao longo de sua existência,
percorre os bairros da cidade e já se apresentou em dezenas
cidades do Estado. Desde o ano de 2001 trouxe de volta a tradição
dos bailes carnavalescos de clubes, realizando o seu anual Baile de
Máscaras. Gravou dois discos resgatando a memória dos antigos e
atuais compositores alagoanos e tem um livro que narra a sua
história inicial. Atualmente reunem-se a cada primeira sexta feira
do mes no bairro que tem o seu nome, promove passeios na cidade,
bailes temáticos e participa com a sua alegria em reuniões culturais
e científicas do Estado. A partir do ano de 1994 um grupo de
amigos transformou a paixão pela música em uma ação de
resistência cultural e participação cidadã, contribuindo para a
melhoria da qualidade de vida da população, além de manter uma
atividade de fundamental importância para a preservação e
incremento da vida cultural da cidade.

373
Alegres manhãs do Pinto da Madrugada

Em 2000, um grupo de amigos, entre eles: Eduardo Lyra,


Marcial Lima, Marcos Davi e Braga Lyra, formaram o núcleo
criador do bloco Pinto da madrugada, com a ideia de resgatar as
tradições culturais da terra, ligadas ao carnaval. Seu nome de
batismo está ligado ao famoso Galo da Madrugada, de Recife. O
Pinto é hoje uma grande festa familiar, onde não existe cordão de
isolamento e as pessoas colocam na pista, ou melhor, na orla, toda
sua imaginação e irreverência. O Pinto fez sua primeira
apresentação, a Cerimônia de Batizado, em janeiro de 2000,
quando homenageou as grandes figuras que contribuíram com o
carnaval na história de Alagoas, que receberam a “Comenda da
Ordem do Pinto“, entregues a ilustres representantes do verdadeiro
carnaval, como o folião Prego, o maestro Manezinho, o radialista
Edécio Lopes. A folia do Pinto da Madrugada tem dia e hora para
desfilar, na orla de Maceió, todo sábado que antecede o carnaval,
logo cedinho.

Marcial Lima: um tributo ao mestre da cultura

Considerado um dos mais representativos pesquisadores e


incentivadores das tradições populares alagoanas, Marcial Lima,
que faleceu aos 67 anos, em 2011, deixa importante legado á
cultura, ao folclore e à memória do Estado; sócio-fundador do
bloco Pinto da Madrugada e ex-secretário de Cultura do
Município. Marcial Lima era funcionário aposentado do Banco do

374
Brasil. Filho do radialista Lima Filho, um dos fundadores da Rádio
Difusora, ainda jovem despertou interesse pela cultura. Foi ator,
compositor e agitador cultural. Participou de várias peças teatrais,
entre elas a "História do Amarelinho e o Valente Secundino"
escrita por Wolney Leite e Gercino Souza. Para o ator Chico de
Assis a morte de Marcial "representa uma perda muito grande para
Alagoas, pois com ele morre parte da nossa cultura. O legado de
seu trabalho ficará para sempre marcado pela dedicação e alegria".
Marcial também teve passagem por empresas de publicidade e
ficou famoso nos anos 1980 como garoto-propaganda da empresa
AGEAL, que prestava serviços terceirizados de higiene, limpeza,
dedetização e outros executados em prédios e domicílios. Na
propaganda, Marcial dizia o bordão: "Ageal, limpeza total!".

http://www.tribunahoje.com/noticia/5588/alagoas/2011/09/1
7/morre-um-dos-principais-fundadores-do-pinto-da-
madrugada.html

Os blocos de ontem e os de hoje

O frevo chegou a Alagoas nos carnavais maceioense nas


primeiras décadas do século XX, quando surgiram os primeiros
blocos genuinamente alagoanos, mas caindo no passo e na folia
dos fundadores pernambucanos. Animando as ruas de Maceió
estavam o Vassourinhas, Lenhadores, e Maracatus, como o
Cambina de Ouro. Dentre esses inúmeros blocos, clubes e troças
estavam os rivais Vou Botar Fora e Cavaleiros dos Montes, ambos

375
aparecidos em 1932. Era um carnaval de rua, com muita pinga,
muita melação, muito pega-pega e frevo nos ouvidos. Muitas águas
rolaram até chegar aos dias de hoje, com o Pinto da Madrugada, as
Pecinhas, a Seresta da Pitanguinha, e tantos outros.

"Um espetáculo interessante é a saída de um bloco


carnavalesco. Mulheres, crianças, velhos e moços, ricos e pobres,
gazeteiros e estudantes, uma doida coordenação carnavalesca,
vivendo aquela hora de uma alegria incompreensível... é "Vou Botar
Fora", clube de todo mundo". A idéia de que vivíamos certo apogeu
festivo, de gosto cívico até, aparecia também na nova safra de
composições próprias desse entusiasmado carnaval, que não
deixavam dúvidas sobre onde morava a festa: Em Bebedouro, no
Farol, na Ponta Grossa com o Sururu da Nega a folia é nossa...O
bom problema é o sururu lá da Levada...".

Diz um trecho do jornal O Liberal, no ano de 1933, citado


no artigo Um Carnaval se faz com homens e litros! De Bruno
César Cavalcanti, professor de antropologia e pesquisador no
Laboratório da Cidade e do Contemporâneo (LACC) do Instituto
de Ciências Sociais da Universidade Federal de Alagoas.

Lança perfume no ar

“Já circulava, de forma cada vez mais acessível, diferentes


marcas de produtos exclusivos para a festa carnavalesca, entre esses
o “combustível inebriante do lança-perfume”, aquelas de metal da

376
Rodoro, de cheiro agradável. O comércio de fantasias, de tecidos e
dos demais adereços carnavalescos, a indústria dos lança-perfumes
promovia e esquentava o ambiente do carnaval da velha Maceió.
“Quem se debruçar sobre os jornais diários do período carnavalesco
nas décadas de 1930 ou 1940 verá a força participativa da
propaganda e do comércio do lança-perfume, a atenção dispensada a
este produto pelos colunistas carnavalescos. O mesmo se poderia
dizer dos refrigerantes e das bebidas, muitas das quais de fabricação
local”.

Em artigo de Bruno César

Bons tempos da folia

Portanto, foi quando todas essas condições estiveram


reunidas que o frevo, sua música e sua dança, como os maracatus,
os caboclinhos, as la ursas, os grupos de bobos e outros, se
tornaram a forma preferida da brincadeira dos maceioenses nos
velhos carnavais populares. Eram os bons tempos da folia nos
bairros com fluidez automática à área central de Maceió.

“Os desfiles de agremiações à base das estrondosas


orquestras de frevo, ao que parecem, favoreceram o desenvolvimento
de multidões aglutinadas na função de "fazer o passo" seguindo os
blocos, marchando para a grande aglomeração da área central da
cidade, vindas de todos os lados, e notadamente da Ponta Grossa,
criando polos de folia ou ainda pulando alucinadas em torno das

377
bandas distribuídas em palanques, na extensão que ia da Praça dos
Martírios ao ponto onde se ergueria o edifício do antigo Produban”.

Em artigo de Bruno César

Folia agora é pré-Carnaval

LEGIÃO ESTRANGEIRA

Anita Studer: a guardiã da mata alagoana

A ornitóloga suíça e doutora em botânica Anita Studer, hoje


com 72 anos, chegou ao Brasil em 1976, em busca de uma pequena
ave preta chamada anumará, que fora vista por cientistas pela
última vez na Mata de Pedra Talhada, em Quebrangulo, Alagoas.
Com seus binóculos profissionais, a paixão pela pesquisa e sua
alma de passarinho, ela avisou ao seusupervisor acadêmico em São
Paulo sobre a descoberta do pássaro, que lhe daria uma boa tese
para seu mestrado, mas ouviu um alerta: “Seu estudo requer pressa.
A floresta desaparecerá em nove ou dez anos”, previu o seu
supervisor, referindo-se ao rápido desmatamento da área. Ela
respondeu de bate pronto: “Primeiro eu vou salvar a floresta, e em
seguida eu tenho todo o tempo do mundo para estudar o anumará”.
Desde sua chegada no coração da mata de Serra Talhada, em 1980,
até hoje, Anita repovoou os céus da região com novas espécies de
anumarás, plantou mais de um milhão e meio de árvores nativas
em grandes viveiros, com a ajuda da população, criou a Associação

378
Nordesta, com trabalhos ambientais em 16 estados, inclusive na
Amazônia, mas, segundo a própria Anita, as ações estão mais
concentradas no Nordeste brasileiro, nos estados de Alagoas e
Pernambuco.

“Foi aqui onde tudo começou. Tinha que fazer uma tese de
mestrado e meu orientador falou de um pássaro raro que tinha
sumido há muito tempo. Fui seguindo as pistas, e, numa tarde quente
de dezembro de 1980, um menino me mostrou um ninho de anumará
na fazenda Riachão, em Quebrangulo. E aí não parei mais. Fomos
criando ações na educação, convidando as crianças a participar do
plantio, pois a mão que planta não destrói mais a natureza”.
Entrevista de Anita Studer à rádio França Brasil (FRI
Brasil), no programa Vozes do Mundo, em 07/05/2016

A luta para criar a Reserva Biológica


Anita e seu português de estrangeira, “com sotaquezinho de
nordestina”, como gosta de brincar, além de se tornar especialistas
em pássaros, ela virou uma militante da sustentabilidade do Meio
Ambiente e da Educação. E começou a ganhar apoio de
proprietários de terra – que começaram a permitir o replantio nas
margens dos rios – ambientalistas, população local, comunidades
científicas e grandes corporações internacionais. Foi quando em
1989 o governo federal torna uma faixa 4,5 hectares de Mata
Atlântica local a Reserva Biológica de Serra Talhada, com
proteção integral de toda a área. Assim se formou uma parceria
entre a Associação Nordesta Reflorestamento e Educação e o

379
Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, a IMBio, para a gestão
da floresta. Desde o início da parceria mais de dois milhões de
árvores já foram plantadas, e construídos um posto de saúde, duas
escolas e um centro de educação ambiental. Anita recebeu o Rolex
Awards, premiação da relojoaria suíça que completa 40 anos. “Mas
o nosso trabalho não acabou”, afirma. Aos 72 anos, ela se empenha
em uma cruzada para cessar, de vez, a extração de madeira.

“Entre os fundamentos da Nordesta estão a proteção das


florestas tropicais, especialmente no Brasil, com uma missão de
ajudar a população do entorno da floresta, com ações de cidadania,
meio ambiente e educação. Tentamos trabalhar sempre em paz, pois
gera muito mais resultados e rende mais a longo prazo”.
Entrevista de Anita Studer à rádio França Brasil (FRI
Brasil), no programa Vozes do Mundo, em 07/05/2016

Abdias do Nascimento: Cinzas na Serra

Nos 100 anos de um dos maiores líderes negros do país, o


ex-deputado e ativista político Abdias do Nascimento, sua cinzas
foram lançadas nas terras da Serra da Barriga, em novembro de
2011, 27 anos depois daquele dia 20 de novembro de 1984, na
festa da cumeeira, que inaugurava o 20 como Dia Nacional da
Consciência Negra. O pedido foi do próprio ativista. Nascido em
Franca, no interior de São Paulo, Abdias Nascimento era filho de
uma doceira e um músico e sapateiro, de família pobre, ele chegou
à faculdade, e se formou em Economia. Foi o primeiro negro a

380
ocupar as vagas de deputado federal e de senador da República no
Brasil.

“Ele dizia que queria voltar para o solo sagrado. Foi uma
reverencia a história que ele tanto cultuou, pois o quilombo foi um
entrelaçar de lutas. Não foi um espaço só de negros, mas que abarcou
as diferenças em busca de uma causa comum: a liberdade”.

Por Arísia Barros, militante da causa negra e coordenadora


do Instituto Raízes da África, responsável pela cerimônia na Serra

“Foi a volta do meu marido, da matéria dele, para o lugar


onde seu espírito sempre esteve. Sua vida foi lutando pela liberdade e
o desejo dele era ter suas cinzas jogadas no local da resistência de
todos os povos africanos”.
Elisa Larkin, socióloga, viúva de Abdias Nascimento

Jeanne Moreau, a Joana Francesa das Alagoas

Com locações em Maceió e União dos Palmares, a premiada


atriz francesa Jeanne Moreau – que faleceu em julho de 2017, com
89 anos – estrelou em 1973 o filme “Joana a Francesa”, do cineasta
alagoano Cacá Diégues. Joanna faz o papel de uma francesa
gerente de um bordel em São Paulo em 1930, que decide aceitar a
proposta de um coronel e vai morar em sua fazenda de cana em
Alagoas, onde as transformações políticas e o progresso
econômico mostram a decadência dos antigos engenhos. O drama

381
tem a participação do estilista, também francês, Pierre Cardin, e de
artistas locais como Beto Leão. A voz de Jeanne foi dublada pela
atriz Fernanda Montenegro. A atriz francesa já tinha sido dirigida
por grandes diretores como Michelangelo Antonioni, François
Truffaut, François Ozon, Louis Malle e Orson Welles, entre outros.

“Foi na década de 1970 que fiquei apenas de longe, atento,


assistindo à movimentação daqueles que viriam a ser meus
companheiros de arte e noitadas, festas e festivais. Eles, orgulhosos
com a companhia de Jeanne Moreau e Pierre Cardin, iam de Maceió
a União dos Palmares, de trem ou no volks do poeta Pedro Nicácio,
como para uma Woodstock caeté. Aquela eufórica inquietação
possuía um mentor. Ela era provocada por Cacá Diégues. Foi de
longe que acompanhei o acontecimento, mas assisti de perto à
première alagoana, do filme Joana, a Francesa, no Cine São Luis”.
Ronaldo de Andrade, ator, em Gazeta de Alagoas, edição
02/06/2012.

Clarice Lispector ganha novo nome em Maceió

Clarice Lispector (1920-1977), premiada escritora e


jornalista nascida na Ucrânia, chegou ao Brasil por Alagoas.
Morou em Maceió durante parte da infância. Foi na capital que
recebeu o seu novo nome (Clarice). De acordo com um de seus
biógrafos, o norte-americano Benjamim Moser, foi em Maceió que
a família adotou nomes brasileiros.

382
“O pai Pinkhas, virou Pedro, a mãe Mania, ficou Marieta, as
irmãs Leah, virou Elisa e Tania adotou o mesmo nome. Já Clarice,
que tinha um ano e meio, não teria nenhuma lembrança de Chaya
(seu antigo nome) nem dos horrores da Ucrânia”.
Benjamim Moser, em Clarice, uma biografia - editora
Cosacnaify, 2011.
O poeta Ledo Ivo também falou sobre a passagem de
Clarice por Alagoas.

“Em Maceió, nas ruas que cheiravam a açúcar e maresia, e


que declinavam para o mar de navios ancorados, a menina ucraniana
foi tocada para sempre pelo que haveria de ser o emblema do seu
destino: a luminosidade solar. Após os dias e meses iniciais de neve e
bruma, e de céus fechados e sombrios, ela conheceu o sol, o
mormaço, e o vento do mar”.

Ledo Ivo, em O Vento do Mar, editado pela Academia


Brasileira de Letras – 2011.

Pierre Verger fotografa o Velho Chico

Em duas passagens por Alagoas, em 1947 e 1951, o


fotógrafo e etnólogo francês Pierre Verger (1902-1996), com sua
máquina Rolleflex, retratou o rio São Francisco e seu entorno, que
se transformou no livro “Alagoas de Pierre Fatumbi Verger”, com
125 fotos, em que mostra a cultura, o povo, a poesia e a
industrialização que começava na época, como a construção da

383
usina hidrelétrica de Paulo Afonso, em Delmiro Gouveia. O livro
foi organizado pela museóloga Cármen Lúcia Dantas e conta com
textos da própria organizadora, e de Alex Baradel, responsável
pelo acervo fotográfico da Fundação Pierre Verger e do professor
Douglas Apratto Tenório. Ele adotou Salvador como sua casa,
onde fundou a Fundação Pierre Verger. Ali estão guardados mais
de 63 mil fotografias e negativos tirados até 1973, como também
os documentos dele e sua correspondência.

Rogato:italiano funda cinema alagoano

O mais consagrado crítico de cinema em Alagoas, o


jornalista Elinaldo Barros consagrou o dia da morte do cineasta
italiano Guilherme Rogato (1898/ San Marco Argentano/ Itália – 9
de setembro de 1966/ Maceió), como o marco zero do cinema
moderno alagoano. Biógrafo de Rogato, Elinaldo contou a grande
epopéia do italiano no livro Rogato – A Aventura dos Sonhos das
Imagens em Alagoas, e cravou a importante data na história do
cinema alagoano. No dia 16 de setembro de 1910, no Porto de
Santos, em São Paulo, o casal de italianos Guiseppe Rogato e
Filomena Ponte Rogato, acompanhado do filho Guilherme Rogato,
desembarcaram no Porto de Santos. O inquieto garoto se
apaixonou pelas lentes, e descobriu sua profissão. Como fotógrafo
atuou em São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro, onde montou seu
primeiro estúdio. Oito anos após sua chegada ao Brasil ele
conheceu Alagoas, em 1918, com o objetivo de promover, em
Maceió, uma exposição de fotografias em esmalte, que organizou

384
com o argentino Ramon Spá e foi aberta ao público em janeiro de
1919, no Teatro Cinema Floriano. Foi paixão à primeira fotografia.

Rogato “roda” filmes alagoanos


Muda-se para a cidade trazendo na bagagem câmeras e a
vontade de retratar a região. Faz isso em 1921, e exibe para o
público, em sete de abril, no Cine-Teatro Floriano, as primeiras
produções alagoanas, os curtas: Carnaval de 1921 e A Inauguração
da Ponte de Cimento em Vitória. Rogato só viria a rodar seu
primeiro longa metragem no estado em 1933, junto com Etelvino
Lima. “Casamento é Negócio?”. A direção e produção contaram
com atores e atrizes locais. O filme em preto e branco e mudo, é
durma social, tendo como pano de fundo as prospecções de
petróleo em Alagoas, que motivava grandes debates na época. O
filme conta a estória de um jovem que adquire ações na companhia
de petróleo e é repreendido pelo pai, que não acreditava na
existência desse mineral na região. No desenrolar da trama aparece
ainda um espião americano que paga a um mendigo para que este
lance uma bomba na companhia petrolífera. O filme foi
protagonizado pelos atores Luis Girard, Morena Mendonça,
Moacir Miranda, Josefa Cruz, Agnelo Fragoso, Armando
Montenegro, Orlando Vieira e o Major Bonifácio Silveira. O filme
é de 1933, com a produção da Gaudio-Film e o financiamento da
Companhia de Petróleo Nacional. A película sofreu a censura
federal no dia da avant-première e liberado após alguns meses,
com a exibição no Cassino Capitólio, em Maceió.

385
Rogato e Costa Rego: Terras das Alagoas
Seus primeiros filmes impulsionaram a carreira de Rogato, e
os jornais locais e regionais cantavam loas ao novo cinema do
italiano. Para a imprensa daquela época, havia um vasto manancial
para a realização de filmes grandiosos e genuinamente alagoanos.
Foi neste clima de otimismo geral, que foi exibido em Maceió o
filme no País da Amazônia, em 1925. Dois anos depois, como “o
bravo Rogato se deslocando a vários municípios, o filme Terra das
Alagoas foi concluído e exibido ao público da capital e do interior.

“O então governador do Estado, Pedro da Costa Rego,


vislumbrou a partir dele a possibilidade de fazer um projeto idêntico.
E nada melhor do que convocar Guilherme Rogato para realizar um
filme à semelhança do amazonense. Um filme que decantasse na
celulose as paisagens, o comércio, a pujança de Alagoas e seus trinta
e seis municípios. Contando com o apoio oficial, Rogato foi ao Rio e
Janeiro em busca de material e, em outubro retornou em condições
de rodar Terra das Alagoas”.

Elinaldo Barros, no livro Panorama do Cinema Brasileiro,


Cesmac/ Edufal, 2ª edição 2010

Luiz Lucariny: fundador da arquitetura alagoana

O engenheiro e arquiteto italiano Luiz Lucariny ( Lucca


8/3/1842/ Maceió 14/7/1907) estudou na Academia de Belas Artes
de Nápoles e com 18 anos formou-se arquitetura. Aos 21 anos

386
alista-se no Exercito, onde ingressa no Corpo de Engenheiros. Sua
vinda para o Brasil deve ter se dado entre o final de 1872 e o início
de 1873, quando chega ao Rio de Janeiro. Sua presença em
Alagoas está registrada em três de fevereiro de 1875, quando o
Diário das Alagoas, publica um anuncio da dissolução da
sociedade que mantinha, com mais três sócios, na Rua do
Açougue, no centro de Maceió. O Almanack Administrativo da
Província das Alagoas, editado em 1877, publica a informação que
o arquiteto Lucarini tinha seu escritório, em Maceió, na rua
Primeiro de Março.

Obras em Penedo e Maceió


Neste mesmo ano, Carvalho Sobrinho, fundador da Imperial
Sociedade Phiarmonica Sete de Setembro, o convida para projetar
o Teatro 7 de Setembro, em Penedo. Outros trabalhos surgem, e
Lucarini muda-se para aquela cidade, onde vive até 1893. Projeta e
edifica, além do citado Teatro, o Mercado e a Casa Escolar.
Transfere-se para Maceió. Nos governos de Paulo e Euclides Malta
projeta ou constrói o Palácio do Governo, o Mercado Público, o
Teatro Deodoro, a Intendência Municipal, o Tribunal de Justiça, a
Santa Casa de Misericórdia, além de residências para particulares,
bem como se preocupa com os problemas urbanos de Maceió de
sua época. Foi Diretor de Obras Públicas do Estado, nomeado no
governo de Manuel Duarte. Também ocupou o cargo de
engenheiro-arquiteto da Municipalidade de Maceió. Provavelmente
ocuparia os dois cargos, quando falece. Algumas cidades do
interior solicitaram seus serviços: o Mercado Público de União dos

387
Palmares; um estudo para a canalização urbana do rio Coruripe e o
levantamento da planta da Vila de Viçosa.

Stucker: os cartões postais de Maceió

A vida de um dos pioneiros e mais consagrado repórter


fotográfico do Brasil, Eduardo Roberto Stucker, tem uma bela
passagem em Maceió, onde durante a década de 1950 seus cartões
postais em preto e branco com as paisagens da capital faziam
sucesso de público e venda. Eduardo chegou ao país vindo da
Suíça, logo após o fim da Primeira Guerra Mundial. A família
desembaraçou no porto de Cabedelo, em João Pessoa (PB). O
patriarca da família, Eduard Francis Rudolf Deglon Stuckert, era
um homem de múltiplos ofícios profissionais, era fotógrafo,
desenhista, escultor e intérprete em oito línguas estrangeiras. Em
João Pessoa, fixa residência e começa a trabalhar como fotógrafo,
em companhia dos filhos Manfred, Gilberto e Eduardo Roberto. O
filho caçula, Eduardo Roberto, na década de 1950 deixa João
Pessoa e ao passar por Maceió (AL), emprega-se no jornal Gazeta
de Alagoas e se torna o precursor do fotojornalismo. É dessa época
a coleção de cartões fotográficos ou postais impressos e
distribuídos nacionalmente.

388
Uma família de fotógrafos
Ao deixar Maceió, dirige-se à então capital federal, Rio de
Janeiro, e passa a trabalhar no jornal O Globo. Em 1957, durante o
governo Juscelino Kubitschek, é destacado pela direção do jornal
para fazer uma longa reportagem da construção de Brasília.
Eduardo trabalhou durante um ano fotografando a construção da
nova capital do país e registrando o cotidiano da construção e dos
trabalhadores. Quando é chamado de volta ao Rio de Janeiro, deixa
o filho Roberto Stuckert a documentar a construção de Brasília.
Poucos meses antes de Brasília ser inaugurada, Eduardo Roberto
retorna com toda a família para o Planalto Central, onde fixa
residência. Na década de 1970, com os filhos Roberto, Rodolfo,
Eduardo e Rosiane, funda a Stuckert Press, empresa de
fotojornalismo.

José Lins do Rego volta à terrinha

O escritor paraibano José Lins do Rego (1901-1957) morou


em Maceió, e nesta cidade formou o núcleo do novo Romance
Nordestino, junto com Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz,
Aurélio Buarque de Holanda e Jorge de Lima. Na capital alagoana
escreveu Menino de Engenho. Dez anos depois partiu para o Rio
de Janeiro, em 1935, conquistou ainda mais a crítica e colaborou
para a imprensa, escrevendo para os Diários Associados e O
Globo. Em 30 de janeiro de 1951, como jornalista, acompanhou a
posse do governador Arnon de Mello, na reportagem para os
Diários, “Alagoas liberta”.

389
“O avião militar começou a sobrevoar a cidade. Lá estava a
Lagoa Manguaba, o coqueiral, o mar verde, o porto, como uma
figura de geometria, na praia desenhada. Olhei pelo vidro e o meu
coração estremeceu de saudades dos tempos felizes. Revi Alagoas da
minha mocidade, dos meus anos decisivos da vida, cidade que me deu
a paz maior do coração, e o gosto para ser tudo o que sou, a força
para poder arrancar do barro informe da memória os livros que
foram o sangue, a carne e o espírito dos meus tempos fecundos. Vi a
cidade de Maceió debaixo da maior alegria. Enquanto o automóvel
rodava pela estrada, o cheiro da terra nordestina tomava conta de
mim. Senti-me o paraibano chegando a Alagoas em 1926, para fazer
amizades duradouras. Então, uma geração de meninos grudou-se
comigo. Seriam eles os meus melhores amigos.”
Citado no livro Sururu Apimentado, Apontamentos para a
História Política de Alagoas, de Mário de Carvalho Lima, 2ª
edição, Editora Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2008.

Raquel de Queiróz na “roda de Maceió”

A romancista e jornalista cearense Rachel de Queiroz


(1910-2003), a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira
de Letras, também morou em Maceió, onde se casa com o poeta
alagoano José Auto. Muda-se de Fortaleza para Maceió, em 1935,
onde faz amizade com Jorge de Lima, Graciliano Ramos e José
Lins do Rego. Aproxima-se, também, do jornalista Arnon de
Mello.

390
“Nesse período em Maceió, por coincidência, Zé Lins
morava lá, engraçado. Ele era fiscal de imposto de consumo e
morava lá. E o Aurélio Buarque de Holanda também morava lá.
Era uma roda de tantos que depois vieram para cá! Então a gente
tinha um botequim, um café, um ponto chique de Maceió, onde a
gente reunia-se todas as tardes a tomar um chopinho, um
cafezinho, a conversar. Depois viemos para cá [Rio], o Alberto
Passos Guimarães, Valdemar Cavalcanti, Aurélio Buarque de
Holanda, eu e Zé Lins”.
Por Rachel de Queiroz, em O Globo, 17/10/2000

São Pixinguinha inaugurou o choro alagoano

Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897-1973), Pixinguinha,


considerado maior músico brasileiro de todos os tempos - pai do
choro como ritmo musical e exímio flautista, saxofonista,
compositor e arranjador brasileiro – teria vindo à capital alagoana,
em 1922, com sua banda Oito Batutas, logo depois de seu show em
Recife. Mas a historiografia ainda é frágil sobre o assunto.

“Há indícios de atividades chorísticas aqui em nosso Estado,


pelo menos, desde 1922, quando o correu a Semana de Arte Moderna,
coincidentemente o ano em que Pixinguinha e seu grupo Oito Batutas
estiveram em Maceió, e também excursionaram a Paris e Buenos
Aires. Infelizmente a passagem destes artistas ainda não foi
devidamente avaliada”.

391
Marcos de Farias Costa, em Aqui, Pixinguinha de outros
chorões – Revista Graciliano, nº 9, junho e julho de 2011.

Mané Garrincha jogou no CSA e ASA

Manoel dos Santos, o Mané Garrincha (1933-1983), nasceu


em Pau Grande (RJ), mas tem uma história bonita dele em
Alagoas. Um dos maiores jogadores do futebol mundial de todos
os tempos, bicampeão do mundo pela Seleção Brasileira na Suécia
(1958) e no Chile (1962), Garrincha tem suas raízes plantadas em
Alagoas. Seu pai, Amaro Francisco dos Santos, é alagoano de
Quebrangulo. A vida de Garrincha é uma história de tirar o fôlego.
Os vínculos do inventor do futebol-arte com sua terra máter se
estendem aos times alagoanos, quando chegou a jogar e a vestir o
manto sagrado do Centro Sportivo Alagoano (CSA) e do gigante
alvinegro ASA de Arapiraca. Amigo de Mané, o jogador alagoano
Edvaldo Santa Rosa, o Dida, dedica um capítulo inteiro a
Garrincha em seu livro autobiográfico.

“Garrincha foi um fenômeno sem igual. Um verdadeiro gênio


do futebol, infelizmente não compreendido e reconhecido por muita
gente. A humildade de “seu” Mané ninguém, jamais, conseguirá ter.

392
Fomos amigos, e ele me ajudou em Alagoas, nos idos de 1972,
vestindo a camisa azul e branco do CSA, em um amistoso contra o
ASA. Foi última vez que o estádio Trapichão recebeu seu Mané”.
Dida Histórias de um Campeão do Mundo, escrito pelo
jornalista Luiz Alves (Sergasa – 1993).

Papa polonês reza na beira da lagoa Mundaú

O papa polonês João Paulo II (1920-2005), líder mundial da


Igreja Católica, pontificou no Vaticano de 1978 até a sua morte,
esteve em Maceió em 19 de outubro de 1991, onde orou para
milhares de fiéis no papódromo, construído para receber o papa,
localizado às margens da lagoa Mundaú, no conjunto Virgem dos
Pobres. Em sua homilia ele saudou o povo alagoano, falou das
nossas belezas naturais, empregos e moradias.

“Queridos irmãos e irmãs de Alagoas e do Brasil! De vossa


bela terra que deu tantos filhos ilustres à pátria, quero elevar a Deus
minha prece pelo homem brasileiro que precisa de trabalho e de teto.
Um país tão jovem precisa cada ano de ver crescer os postos de
trabalho. Um país de tal expressão demográfica, necessita com
urgência de uma política habitacional inteligente, baseada no fato
evidente de que a casa não é algo mais, mas um componente
fundamental de qualquer política autêntica!”.

393
Texto reproduzido pela Arquidiocese de Maceió.
http://www.arquidiocesedemaceio.org.br

Dom Hélder Câmara mandando brasa

No primeiro número da revista Última Palavra, que circulou


nos anos 1980, em Maceió, a reportagem “As Revelações sobre
Alagoas” mostrava matéria baseada no conteúdo de papéis com a
chancela do Serviço Nacional de Informações (SNI), carimbados
como Secreto e Confidencial. A reportagem dava um raio-x
completo de como os espiões da ditadura analisam a vida de
militantes políticos. Em uma desses episódios, com a presença de
Dom Hélder em um encontro com estudantes em Maceió, os
documentos apontam para a fala do religioso.

“Mesmo considerando o clero no estado “absolutamente


conservador”, na pessoa do arcebispo Dom Adelmo Machado, o
núcleo do SNI tinha uma constante preocupação com as visitas do
arcebispo de Olinda e Recife, Dom Helder Câmara. Só em 1968, dom
Hélder esteve em Maceió mais de três vezes. Na última, num encontro
com estudantes e jovens trabalhadores, os “olheiros” do SNI
resgataram essa pérola dele, que está expressa no relatório: “É
preciso o calor da juventude para continuar mandando brasa”.
Trecho da reportagem As Revelações sobre Alagoas, revista
Última Palavra – nº 1, 1987.

Altemar Dutra “nasceu” em Piranhas

394
O acesso à cidade Piranhas, único patrimônio tombado na
região do semi-árido alagoano, é pela rodovia Altemar Dutra
(1940-1983), uma descida sinuosa onde se vê a cidade por inteiro e
o Velho Chico no fundo. Um visual deslumbrante. Por isto o “rei
do bolero” brasileiro e seresteiro inveterado Altemar Dutra dizia
sempre; “nasci no dia que conheci Piranhas”. A orla com as praias
fluviais do São Francisco, em Piranhas, também leva seu nome,
com a estátua em bronze do cantor, em pé, abraçado ao seu violão.
Ele cantou músicas que viraram pérolas da MPB, como
“Sentimental Demais”, “O Trovador”, “Brigas” e “Que Queres Tu
de Mim”. Altemar está na memória dos moradores mais antigos e
também é nome de rua, pizzaria, lanchonete. Sempre gostou de
festa, seresta e pesca em Piranhas, até sua morte, em Nova Iorque,
aos 43 anos, quando apresentava um show para a comunidade
latino-americana, no clube noturno El Continente.

Nelson Pereira dos Santos: “Sou alagoano”

O cineasta paulista, morador do Rio de Janeiro e alagoano


de coração, Nelson Pereira dos Santos, 87 anos, dirigiu o filme
Vidas Secas (1963), baseado no romance de Graciliano Ramos
(Vidas Secas, 1938) - um dos filmes brasileiros mais premiados em
todos os tempos, sendo reconhecido como obra-prima. “Eu gosto
muito do povo de Alagoas. Quando eu cheguei ao Rio de Janeiro
(depois das filmagens, entre 1962 e 1963), eu disse: Agora eu sou
alagoano”. Nelson ainda teve um segundo encontro com

395
Graciliano no filme Memórias do Cárcere (1984), uma adaptação
livre do livro, com a espetacular atuação do ator Carlos Vereza no
papel do Mestre Graça. O cineasta foi fundador do Cinema Novo,
junto com Glauber Rocha, é imortal da Academia Brasileira de
Letras. Nelson esteve em Alagoas em 2010, para conferências e a
realização de um documentário, produzido pelo seu filho, e que
mostrou os bastidores desse reencontro com Alagoas e as
paisagens de Vidas Secas.
“Quero rever as locações, conversar com as pessoas e estou
torcendo para que a situação tenha melhorado, pois acredito no
princípio de que o espírito humano resiste e é capaz de encontrar
alternativas para sair das situações mais negativas. Acredito que o
retrato da miséria e da seca continue, mas torço para ser
surpreendido com mudanças”.

Fernando Coelho, na reportagem especial Vidas Secas 70


anos, Gazeta de Alagoas, 28/12/2008; no endereço
http://www.tjal.jus.br/?pag=verNoticia&noticia=2296

Um almoço para Mário de Andrade

Nas cartas que escreveu ao poeta Manuel Bandeira, Mário


de Andrade (1893-1945) menciona a viagem que fez ao Nordeste
entre 1928 e 1929, quando escreveu: “Pois é, estou de viagem
marcada pro norte. Vou na Bahia, Recife, Rio Grande do Norte,
onde vive um amigo do coração Luís da Câmara Cascudo”. A
viagem foi descrita no livro O Turista Aprendiz (Belo Horizonte -

396
editora Itatiaia: 2002). O fato não está neste livro, mas Mário
mudou seu itinerário, e passou um domingo em Maceió, onde o
ilustre viajante foi recebido pelo poeta Jorge de Lima e o
romancista José Lins do Rego, “em um almoço com comidas e
refrescos da terra”.

“Pelo “Manaus” passou domingo (9 dez. 1928) pelo nosso


porto o escritor paulista Mário de Andrade que vem gozar suas férias
pelo Nordeste. Dele tem se dito tudo: que é um gênio, que é
“blaguer”, que é apenas um fazedor de tolices. Por todos estes
ataques Mário tem atravessado sem perder a sua serenidade. De
volta a São Paulo, o escritor de Macunaíma visitará o nosso sertão,
por quem manifesta desejo de entrar em contato”.
Moacir Medeiros Sant´Ana, em Documentário do
Modernismo (Alagoas: 1922/31), MEC e Ufal – 1978.

Mário Lago das Alagoas

O ator, poeta, compositor carioca Mário Lago (1911-2002) é


um dos estrangeiros que aportaram em Alagoas e deixaram trilhas
de emoção e paixão. Autor de sambas populares como "Ai que
saudade da Amélia" e "Atire a primeira pedra", ambos em parceria
com Ataulfo Alves, ele escreveu o livro Chico Nunes das Alagoas
(Civilização Brasileira, 1975), hoje uma raridade bibliográfica.
Lago começou a contar a história de um dos maiores artistas
populares alagoanos depois de conhecer Chico, nas gravações do
filme São Bernardo, em Viçosa. Lago encontrou Chico no bar

397
Trovador Berrante, na praça central de Viçosa, no início dos anos
1970, durante as gravações do filme, baseado na obra de
Graciliano, dirigido por Leon Hirszman. O bar era de um amigo de
ambos, o lendário boêmio músico Zé do Cavaquinho, que chamou
Mário para conhecer o poeta. “Você nunca ouviu falar do Chico?”,
e foi assim em noites de intensas farras, conversas, rodas de
música e um interminável conhecer, de varar noites à fora, que
Mário Lago, Chico Nunes e Zé do Cavaquinho, ficaram amigos até
o fim, como relata Mário Lago.

“Lembra mais alguma coisa do Chico Nunes, Zé? Era sempre


assim com essa pergunta que eu entrava no Trovador Berrante,
pouco importando que ele repetisse o já contado na véspera.
Escutava pacientemente, na certeza de que, de um momento para
outro, surgiria um detalhe esquecido. Procuro reproduzir aqui tudo
que ele contou, conversando à sua maneira solta e despreocupada de
dizer as coisas. Se falhei no intento de repetir o Chico Nunes que eu
ouvi, azar do poeta, que era bom às pampas”.
Por Mário Lago em Chico Nunes das Alagoas, editora
Civilização Brasileira, 1975

Mário Lago: militante comunista


Filho do maestro Antônio Lago e de Francisca Maria
Vicencia Croccia Lago, e neto do anarquista e flautista italiano
Giuseppe Croccia, formou-se em Direito pela Universidade do
Brasil, em 1933, tendo nesta época se tornado marxista. A opção
pelas ideias comunistas fez com que fosse preso em sete ocasiões.

398
Foi casado com Zeli, filha do militante comunista Henrique
Cordeiro, que conhecera numa manifestação política, até a morte
dela em 1997. O casal teve cinco filhos: Antônio Henrique, Graça
Maria, Mário Lago Filho, Luís Carlos (em homenagem ao líder
comunista Luís Carlos Prestes) e Vanda.E com apuro, Lago
também pesquisou a infância pobre do poeta, e fala das
dificuldades de Chico Nunes para estudar, ler ou escrever. “Aos
quatro anos, em consequência de um sarampo, adquiriu uma forte
miopia, que lhe cortou os passos nos estudos. Apesar dos óculos,
com enorme sacrifício conseguiu ler ou escrever alguma coisa”.

Gracindo: o bem-amado alagoano

Pelópidas Guimarães Brandão Gracindo, o grande ator


nacional Paulo Gracindo (1911-1995) nasceu carioca mas sempre
se considerou alagoano, pois foi viver em Maceió ainda bebê.
Sonhava ser ator, mas o seu pai, o político alagoano Demócrito
Gracindo, era uma pedra no sapato, e lhe dizia sempre:“No dia em
que você subir a um palco, saio da plateia e te arranco de lá pela
gola”. Ele respeitou a proibição até a morte do pai. Aos vinte anos,
mudou-se para o Rio, dormiu na rua e passou fome. Batizado
Pelópidas, no palco mudou o nome: “Uns me chamavam de
Petrópolis, outros de Pelopes. A empregada me chamava de
Envelope”. Num dos primeiros trabalhos, a personagem de
Gracindo ficava dois minutos no palco, o que levou um crítico a
fazer o seguinte comentário: De onde veio esse rapaz que não faz

399
nada e aparece tanto? Participou das maiores companhias teatrais
dos anos 30 e 40.

Gracindo ganha estátua na orla de Maceió


Em maio de 2017, Paulo Gracindo ganhou uma escultura
em bronze, da cabeça aos pés, que hoje está fincada no calçadão da
orla de Maceió, em uma homenagem da prefeitura da capital.
Gracindo é uma das maiores referências do teatro, cinema e
teledramaturgia brasileira. Com a radionovela O Direito de Nascer,
encantou no papel de Alberto Limonta; e no programa de rádio
Balança mas Não Cai interpretou, com Brandão Filho, o quadro do
Primo Pobre e Primo Rico.Na televisão fez personagens
inesquecíveis, como o Tucão da telenovela Bandeira 2
(1971);coronel Ramiro Bastos em Gabriela (1975); João Maciel de
O Casarão (1976); padre Hipólito de Roque Santeiro (1985). Mas,
o mais marcante foi o prefeito Odorico Paraguaçu, de O Bem
Amado de Dias Gomes.

Marechal Deodoro vira Sucupira


Em 2009, a cidade de Marechal Deodoro se transformou na
cidade cenográfica de Sucupira, do filme O Bem Amado, do
diretor pernambucano Guel Arraes. Nas ruas históricas, grandes
nomes do cinema nacional, como Marco Nanini, Andréa Beltrão,
Zezé Polessa e Drica Moraes. Numa das cenas de gravação, na
Igreja Nossa Senhora do Carmo, Marco Nanini, que interpreta o
prefeito de Sucupira. Foram mais de quatro mil pessoas de
Marechal Deodoro e região que se inscreveram para participar da

400
figuração do longa. O Bem Amado foi produzido pela empresária
Paula Lavigne, em parceira com a Globo Filmes e a Buena Vista
Internacional. Integram o elenco José Wilker (Zeca Diabo), Maria
Flor (Violeta), Matheus Nachtergaele (Dirceu Borboleta), Caio
Blat (Neco Pedreira) e Tonico Pereira (Vladimir).

“Marcos Nanini, maior ator brasileiro da atualidade, está à


vontade na roupagem de Odorico Paraguaçu. Lembrei-me do ex-
prefeito de Maceió, Sandoval Caju, quando Nanini (Odorico) no
palanque inicia o discurso mostrando seu terno de linho: “Vim de
branco para ser mais claro”. Fui testemunha dessa tirada de
Sandoval nos anos 60. As irmãs Cajazeiras que eram sisudas
solteironas na série, tornaram-se sensuais, menos carolas, até
gostosas. A participação de José Wilker como Zeca Diabo foi
pequena, mas decisiva no desenrolar da trama”.
Por Carlito Lima, na época secretário de Cultura de
Marechal Deodoro, em entrevista à TV Gazeta de Alagoas

Moreira Alves e o impeachment

Um dos mais importantes e combativos jornalistas


brasileiros Márcio Moreira Alves (1936-2009), ex-deputado
federal, nasceu no Rio de Janeiro, mas deixou uma marca na
história política de Alagoas, ao ser ferido à bala no episódio do
impeachment do governador Muniz Falcão, durante tiroteio na
Assembleia Legislativa. Em setembro de 1957, Márcio foi enviado
pelo jornal carioca Correio da Manhã para cobrir a crise política

401
existente no estado de Alagoas, onde a Assembleia Legislativa
deveria se reunir para decretar o afastamento do governador Muniz
Falcão, acusado do assassinato de um deputado oposicionista (até
hoje nunca provado). Durante essa sessão, a Assembleia alagoana
foi invadida, travando-se um tiroteio entre os deputados, no qual
Márcio Moreira Alves foi baleado. Mesmo ferido conseguiu enviar
a matéria, naquele tempo um telegrama, ao seu jornal, ganhando,
com essa cobertura, o prêmio Esso de reportagem de 1958.

Telegrama feito em sangue


O texto do telegrama de Márcio Moreira Alves foi transcrito
na primeira página do Correio da Manhã do Rio de Janeiro, edição
do dia 14 de setembro de 1957 com a seguinte manchete e
subtítulo: “Dissolvida à bala a Assembleia de Alagoas – Deputados
governistas, portando metralhadoras, abriram fogo para impedir a
discussão do parecer favorável à decretação do impeachment do
governador Muniz Falcão – Relato impressionante e dramático do
representante do “Correio da Manhã” que foi ferido durante o
tiroteio”. Veja a íntegra da reportagem enviada pelo jornalista
ferido:

Maceió, 13 (do enviado especial do Correio da Manhã,


Marcio Alves)
“Cheguei às 6 da manhã de hoje, acompanhando o presidente
da UDN. Imediatamente saímos a tomar contato com o ambiente

402
político de Maceió, onde se vivia momentos de expectativa. O Palácio
do Governo estava vazio de povo e cheio de homens armados. O
governador movimentou a cidade durante toda a manhã. A partir do
meio dia passou a receber em Palácio. Às 15 horas a Polícia
Estadual formou em frente ao edifício da Assembleia. Os deputados
da oposição se encontravam no recinto. Às 15:10 horas, deputados
situacionistas liderados pelo deputado Claudenor Lima, subiram a
escadaria vestidos de capas, sob as quais portavam metralhadoras.
Penetraram imediatamente no recinto. Nenhuma palavra chegou a
ser trocada. Os deputados da situação abriram fogo imediatamente a
esmo. Vários feridos. Impossível dizer número, pois figuro entre eles.
De relance vi um deputado de terno escuro, de óculos, empunhando
metralhadora sob a capa, que me afirmaram ser Claudenor Lima. Vi
o fogo da metralhadora, senti dor na perna e caí. Durante uma hora,
juntamente com quatro outros feridos, abriguei-me atrás de três sacos
de areia destinados a proteger a taquigrafia. Esperei socorro. As
ambulâncias tiveram dificuldades em atravessar o cerco de
cangaceiros, que ameaçavam o corpo médico com metralhadoras.
Removido para o Pronto Socorro, foi diagnosticado fratura do fêmur.
Meu estado geral bom. Reportagem encerrada. Marcio Alves”.

O provocador do AI-5
Márcio Moreira Alves também ficou famoso por proferir o
discurso que provocou o governo militar a baixar o Ato
Institucional número 5, o famigerado AI-5, em 1968. Ele foi um
dos primeiros cassados pela nova medida de força dos militares -
acusavam-no de ofensas às Forças Armadas e tiveram negado

403
pedido de autorização para processá-lo, o que foi usado como
pretexto para o "golpe dentro do golpe" -, Marcito, como era
conhecido pelos amigos, deixou o País clandestinamente e só
voltou após a anistia de 1979.

Félix de Vandesmet: barão francês é o 1º usineiro

Nascido na França como Félix Eugene, filho de um


industrial francês proprietário de uma fábrica de fiação e lã, o
Baron du Saint Siége Félix EugèneWandesmet, o Barão de
Vandesmet escolheu as terras férteis de Atalaia para implantar, em
1891, a Usina Brasileiro, a primeira usina de açúcar de Alagoas.
Antes de chegar ao Brasil, Vandesmet instalou-se com um amigo
em Guadalupe, nas Antilhas, onde fundaram uma usina de açúcar.
Chegando ao Brasil, desembarcou no Rio de Janeiro e procurou o
Imperador Dom Pedro II, em sua residência de verão em
Petrópolis, em busca de investimentos para seus negócios, mas
nada conseguiu. Depois de tentar negócios na Bahia, desembarcou
em Alagoas, no Pilar, na época o mais importante empório
comercial do interior, onde construiu a mais moderna usina de
açúcar de Alagoas. Todos os equipamentos foram importados da
Europa, detentora, na época, da mais avançada tecnologia do ramo
açucareiro.

“Foi o primeiro a usar em Alagoas a irrigação de fazendas


através de motor a gás pobre (lenha). Instalou um telefone à manivela
para a sua comunicação entre a usina e Atalaia. Introduziu em

404
Alagoas as variedades de cana de açúcar: Demerara, Barbados e
White Transparent. O então presidente da República Afonso Pena,
atraído pela fama da Brasileiro, fez uma visita à usina e provou da
aguardente lá fabricada, que ele próprio rotulou de “uísque
Vandesmet”. A Usina Brasileiro, mesmo mudando de nome,
funcionou até 1958. Em 16 de agosto de 1929, aos 81 anos, morreu o
Barão de Vandesmet.
http://www.atalaiapop.com/paginas/historia/1.html

O suíço que construiu o sonho de Pindorama

O suíço Renê Bertholet (1907-1969), personagem


desconhecido do alagoano, foi o europeu que construiu, em
Coruripe, a Cooperativa Pindorama de Colonização Agropecuária
e Industrial, a maior cooperativa agro-industrial do Nordeste. E
para chegar até ela, René viveu a aventura dos grandes homens da
história. Aos 26 anos, viu chegar o horror do nazismo e a 2a
Guerra Mundial. René combateu Hitler, arriscou sua vida levando
mensagens secretas para os aliados, liderou movimentos de apoio
aos judeus, furando o cerco dos soldados para levar comida e
remédios nos campos de concentração. Em 1945, com a vitória dos
países aliados, ajudou a reconstruir a Europa devastada. Em 1950,
René aportou no Brasil e nunca mais deixou o país. Começou em
uma colônia agrícola do Paraná, quando trouxe sua vivência para
Alagoas. No começo dos anos 60, Bertholet já era diretor técnico
da então Companhia Progresso Rural. A empresa ameaçou fechar a
colônia, mas Renê e a turma pioneira decidiram transformar a

405
colônia em cooperativa. Ele mesmo comprou terras e doou a
colonos, com a missão de obter terra produtiva e divisão de
trabalho e renda. E nunca mais Pindorama parou.

Gustavo Paiva: o paraibano das Alagoas

O industrial paraibano Gustavo Pinto Guedes de Paiva


(1892-1947) fez sua história na cidade de Rio Largo, onde além de
construir seu império durante o Ciclo do Algodão, em torno da
Companhia Alagoana de Fiação e Tecidos, foi considerado um
patrão exemplar, com a criação de escolas, creches e departamento
de saúde para seus operários. Após concluir seus estudos em
Penafiel, Portugal, e com a morte prematura da mãe, Gustavo
Paiva resolveu voltar ao Brasil para tentar a carreira comercial.
Com 18 anos de idade, em 1913, desembarcou no Rio de Janeiro.
Na capital do país trabalha como subgerente da Companhia
Petropolitana, uma fábrica de tecidos de Petrópolis. No dia 25 de
novembro de 1916, casa-se com Judith Teixeira Basto, filha do
comendador José Antonio Teixeira Basto, que negociava em
Alagoas. Convidado pelo sogro para assumir a empresa, Gustavo
Paiva muda-se com a esposa para Maceió, onde chega em meados
de 1917. Um ano depois falece seu sogro, o comendador Teixeira
Basto, deixando para ele, então com 26 anos de idade, o desfio de
representar os interesses da família de sua esposa na Companhia.

Comendador comunista

406
Gustavo Paiva ganhou o título popular de “Comendador do
Povo” e foi taxado de comunista. À frente das empresas e do seu
tempo, Gustavo Paiva revelou-se um empresário muito diferente
dos tradicionais líderes de uma economia atrasada e ainda
carregada das relações escravistas abolidas poucos anos antes no
país. As leis trabalhistas engatinhavam no Brasil quando Gustavo
Paiva passou a adotar relações mais humanizadas entre a empresa
que administrava e os trabalhadores, fazendo investimentos para
proporcionar educação, saúde, lazer e cultura aos operários. Aos 37
anos de idade, após receber homenagens dos operários em Rio
Largo, Gustavo Paiva agradeceu e disse que persistiria na sua
cruzada para melhorar as condições de vida dos operários, e
revelou que por ter esta postura, já o tinham chamado até de
comunista. O comendador morreu em outubro de 1947. O jornal
Gazeta de Alagoas assim noticiou o fato.

“A partir da Rua Dr. Pontes de Miranda, os operários e


funcionários oriundos do local das fábricas, retiraram o corpo do
coche fúnebre conduzindo-o à mão até o cemitério. Ali se comprimia
uma compacta multidão, calculada em muitos milhares de pessoas”.

407
MEMÓRIA DO JORNALISMO ALAGOANO

Valmir Calheiros: mestre que uniu gerações

Da máquina de escrever aos terminais de computadores,


nota-se que o barulho das Olivettes e Remingtons e a fumaça dos
cigarros no ar, coalhando o cinzeiro, não existe mais. Porém,
ficaram os bambas, aqueles jornalistas que superam os tempos, e
unem gerações. O maior deles chama-se Valmir Calheiros, nosso
grande chefe master sênior. Ele nos deixou, em março de 2014, ou
encantou-se, chegando lá como fazia aqui, todos os santos dias. Lá
vinha ele, camisa arregaçada, testa franzida e acentuada, óculos

408
girando entre a mão e o bolso: “Seu cara”... A alegria, o bom papo,
a grande pauta fluía entre nós. No final, Valmir ainda estava no
batente, com mais de 50 anos de jornalismo, e em seus quase 70
anos de vida, como priofissional da Organização Arnon de Mello,
onde ocupava as funções de editorialista e repórter especial do
Jornal Gazeta de Alagoas.

Reportagens e causos
“Por acaso, fui ao Cine Plaza, e tinha lá um galego, um
senhor bem gordo, vendendo pipoca, comecei a conversar com ele
e uma senhora também moreninha, bem humildezinha, ajudando
ele botar a pipoca no saquinho.... Bem, e eu desconfiei que ele não
era alagoano, não era português, pelo sotaque, comecei a puxar,
puxar, puxar , aí puxei essa velhinha pro meu lado assim, e ela
me disse é alemão. Eu disse: o senhor é alemão, eu quero
conversar com o senhor. Fui, fui. insisti e cansei de tanto insistir
aí ele contou que tinha fugido do (Adolfo) Hitler, da tropa de
Hitler, porque o pessoal queria pegá-lo de qualquer maneira. Era
um dissidente nazista”.

“Nas minhas andanças descobri uma família, que o nome


dos filhos, eram nomes de atores de Hollywood. Mas essa história
não chegou a ser contada, foi uma pena, porque eu viajando com
o senador Arnon e com o deputado Oséias Cardoso, a gente
andando no interior, quando saímos da pista principal, e entramos
assim na variante que vai para Capela, Cajueiro, aquele meio de
mundo. Aí o Oséias sente sede e disse Valmir, vá pegar um coco

409
de água pra mim ali. A gente chama coco é aquele uma vasilha de
água, coisa e tal e cheguei lá disse moço, me arranje um pouco
d’água. Aí o velhinho tava assim, aí disse: Jane Altman vá buscar
água para o moço. Ao mesmo tempo ele pergunta: Ô Jane, cadê o
Roy Rogers, aí a menina respondeu e saiu... Achei que era uma
brincadeira. Aí comecei a puxar conversa, peraí seus filhos tem
nome de artistas... Quais os nomes deles? Tem o Rocky Lane, Billy
Elliot... E meninas? Também tem nome de artistas? Tenho três que
trabalham aqui no roçado... Sofia Loren, Gina Lollobrigida e
Lauren Bacall”.

“Ainda nessa viagem, lá em Palmeira dos Índios, o senador


Arnon de Mello me apresentou Tenório Cavalcante, o homem da
Capa Preta. Ele estava na casa do Valdemar Lima, escritor,
famoso; e o senador Arnon chegou e disse... Valmir entrevista o
Tenório... eu disse pode deixar senador, aí o Tenório, ficou assim,
numa cadeira de balanço, e eu comecei a conversar com ele. E a
primeira pergunta, o senador, ficou assim, de todas as cores, eu
notei que Arnon ficou vermelho assim que eu perguntei: Dr.
Tenório, quantos homens o senhor já matou? Aí ele chegou e
disse: Meu filho nunca pergunte quantos já matei, pergunte
quantos já salvei, com minhas obras sociais lá em Caxias (no Rio
de Janeiro, onde Tenório foi prefeito), coisa e tal, Orfanato São
José... entendeu? Notei que ele respondeu na bucha assim... Mas,
respondeu”.

Aldo Ivo, o último dos moicanos no batente

410
O jornalista alagoano José Aldo Ivo (1932-2017) foi um
hOmem de batente no jornalismo. Até sua morte, aos 85 anos, ele
ainda trabalhava. O jornalista dedicou 67 anos de sua vida ao
exercício da profissão e foi um dos responsáveis pela proposta de
criar o curso de jornalismo na Universidade Federal de Alagoas
(Ufal). Aldo Ivo tinha oito irmãos, dentre eles o escritor alagoano
Lêdo Ivo, e deixou cinco filhos, nove netos e quatro bisnetos.
Estudou na escola estadual Dom Pedro II, na Praça Deodoro. ”No
colégio eu já fazia um jornalzinho na máquina de escrever batendo
como o dedinho, toda semana eu fazia como se fosse um boletim
então eu já nasci com o dom”. O tempo passou e ele estava da
mesma forma, simples. O jornalista não dirigia, não tinha
computador e nem celular, andava de ônibus e de táxi e continuava
exercendo as suas atividades profissionais no jornal semanário
Tribuna do Sertão, de Palmeira dos Índios, onde faz a editoria de
Turismo, e na assessoria da Federação das Indústrias do Estado de
Alagoas (Fiea). No Jornal de Alagoas conquistou sua primeira
carteira assinada, depois de trabalhar sem remuneração, em 1949.
O Jornal de Alagoas já pertencia aos Diários Associados do
magnata da imprensa Assis Chateaubriand, e foi fundado em 1908,
pelo jornalista Luiz Silveira. Mas teve um fim melancólico, como
relata Aldo Ivo.

“O jornal praticamente acabou depois que venderam a


rotativa, acabaram com a oficina. Foi um golpe contra o jornal.
Porque jornal sem oficina é um mundo sem alma e nós temos a

411
redação tudo... mas a oficina fazia o jornal, tinha as máquinas. As
máquinas foram vendidas para O Norte, diário do Ceará. Depois que
começou a ser impresso no Diário de Pernambuco e sem a oficina ele
começou a cair. O Jornal de Alagoas quando eu cheguei tinha um
diretor era o Dr Ulisses Braga Júnior, naquela época, comprava
caminhões, carretas de bobina e o cheque ia primeiro que as
bobinas”.

Esporte no sangue e na veia


Aldo Ivo começou sua vida de jornalista como repórter
esportivo, e com a caneta e o bloco na mão chacoalhava nos
bondes de Maceió para cobrir os treinos do Centro Sportivo
Alagoano (CSA), no bairro do Mutange, e do Clube Regatas Brasil
(CRB), na Pajuçara. Aldo também participou ativamente da
criação da FAPE (Fundação Alagoana de Participação Esportiva),
durante o governo do Major Luiz Cavalcanti, ponto de partida para
a construção do Estádio Rei Pelé, com a arrecadação vinda dos
famosos festivais de bingo. Mas como um apaixonado pelo
Botafogo do Rio de Janeiro, ele acha que a imagem de “rei” de
Pelé foi engendrada na rede Globo.

“A Globo pegou umas latas fez uma coroa e botou no Pelé.


Ele é rei por causa da Globo, mas fazendo uma ligeira comparação...
Pelé não foi melhor que Garrincha; Pelé não foi melhor que Zizinho;
Pelé não foi melhor que Leônidas. Só pra dizer o fato. Então se Pelé é
rei, Mané Garrincha era Papa, deu sozinho uma Copa do Mundo

412
para o Brasil, a do Chile, em 1962. Aliás o ataque era todo
botafoguense”.
Audálio Dantas: alagoano conquista o mundo

Nascido em Tanque d'Arca - “uma cidadezinha alagoana


pequena e com uma localização esplêndida, fica num pé de serra,
na transição do Agreste para o Sertão” - Audálio Dantas deixou
sua terra logo cedo, aos seis anos, e fez toda sua formação em São
Paulo. Entre seus pontos altos está o prêmio que recebeu da
Organização das Nações Unidas (ONU), pela série de reportagens
sobre o Nordeste brasileiro publicadas na extinta revista Realidade.
Também foi presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de
São Paulo à época do assassinato pela ditadura militar do jornalista
Vladimir Herzog. Foi o primeiro presidente eleito por voto direto
da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e deputado federal
pelo extinto MDB. Atualmente Audálio é vice-presidente da
Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e diretor executivo da
revista Negócios da Comunicação.

Pelas ondas do rádio as primeiras notícias


O pai de Audálio, Otávio Martins Dantas era um pequeno
comerciante e uma pessoa muito inquieta, migrou, primeiro dentro
do estado, e depois resolveu ir pra São Paulo – Audálio ficou em
Alagoas até os dez anos e depois seguiu o pai. Mas as lembranças
de criança já apontavam para o dom da notícia, do jornalismo.

413
Acho que foi a primeira referência que eu tive da notícia, foi
via rádio e via leitura de jornal por terceiros, não minha. Um
farmacêutico local chamado Daniel Pimentel, nunca vou esquecer, a
única farmácia do lugar, no final de tarde ele reunia os amigos na
calçada, pegava a Gazeta de Alagoas, o Jornal de Alagoas, e lia as
notícias. Isso era na época da guerra, 1944/43 por aí. E ele lia as
notícias de uma maneira muito curiosa, parecia locutor de rádio,
dizia: “Moscou” ou “As tropas russas”, daí interpretava. “Berlim”,
“Londres”, e eu ouvia aquelas notícias, uma maravilha pra mim. Foi
o primeiro contato que eu tomei com a notícia de jornal que tinha um
aspecto até importante no sentido da imaginação. Ficava imaginando
que é que é isso, o que é guerra, o que que é Moscou, o que que é
Paris, Londres, entendeu?

Graciliano Ramos: influência literária


Foi por meio de um consagrado conterrâneo, o romancista
Graciliano Ramos, que Audálio Dantas começou a alçar vôos
maiores em sua profissão. O mestre Graça foi sua grande
influência literária e jornalística. Audálio leu Graciliano aos 14, 15
anos.

“Primeiro eu li o Jorge Amado falando dos brasileiros, sem


falar nos outros autores. Depois caí no Graciliano e nunca mais
abandonei, eu me agarrei ao Graciliano como uma âncora, digamos
assim, do ponto de vista do contar, do dizer, do escrever. Acho que foi
fundamental na minha formação antes mesmo de eu ir pro
jornalismo, e depois passei a pesquisar sobre o Graciliano Ramos,

414
principalmente, na trajetória jornalística dele, ele teve um papel
muito importante no jornalismo brasileiro. Numa época, em que não
se falava no que se chama hoje de copidesque, ele era o redator que
ia buscar a forma correta de se dizer as coisas. Quando migrou para
o Rio de Janeiro, ele foi trabalhar na profissão, naquilo que era a
porta de entrada dos jornalistas, que era a revisão. Ele ficava
escondido lá no fundo, mas era aquilo que ele podia fazer bem,
porque ele era um profundo conhecedor da língua e no trabalho de
revisão ele deu uma contribuição. Aliás, o jornalista Graciliano veio
antes do romancista. Muitos jornalistas vêm antes do romancista. O
jornalismo é, digamos, o caminho para o desenvolvimento da ficção
depois”.

Lauthenay e os Arquivos Implacáveis

Quando a gente fala em jornalismo esportivo aqui em


Alagoas, a gente sempre tem uma referência, exatamente uma
pessoa que se dedica, e ele vem se dedicando há muito tempo as
coisas do futebol, as coisas do esporte de uma forma geral. Hoje,
Lauthenay ainda publica seus artigos em blogs locais e é o curador
do Museu dos Esportes Dida, localizado no estádio Rei Pelé, sendo
um dos mais importantes do Nordeste em termos de acervo sobre o
futebol.

Os primeiros bate-bolas na imprensa


“Em 1957, tive uma oportunidade, eu não me lembro se foi
o Jota Costa que me chamou para escrever no Diário de Alagoas,

415
que ficava na Avenida Moreira Lima, então, eu fui pra lá e
comecei a escrever alguma coisa sobre história do esporte, sobre
história do futebol, porque, parece que dentro de mim tinha
alguma coisa assim de como é que eu posso dizer... um repórter
investigativo. Então, eu ouvia falar: O Jogo do Xaxado, o Jogo da
Sofia, o tetra campeonato do CRB, eu ia nos jornais e procurava
ali, pegava aquelas figuras que participaram daqueles jogos, eu
ia procurar onde eles estavam pra eles me contar aquelas
histórias. Na época, eu gravava no K7, depois a gente começou a
gravar em vídeo, mas, já é outra época, então, eu sempre tive esse
cuidado de voltar ao passado, e procurar as coisas que tinham por
lá, pra gente trazer aqui pro futuro”.

A turma pioneira do esporte


“Na Rádio Progresso, no Edifício Ary Pitombo, era uma
espécie de foca, que tinha que arranjar as notícias, pra levar e
datilografar. E quando eu cheguei lá, encontrei uma turma
maravilhosa, Edécio Lopes, Floracy Cavalcante, Jorge Villar, Sabino
Romariz, Claudio Alencar. Enfim, tinha um monte de gente que me
ajudou muito e eu aprendi com eles, que eles estavam iniciando
também, depois, se tornaram ícones no rádio alagoano, eu aprendi
com eles e que eu também procurei ensinar aqueles que foram
chegando depois de mim. Então, eu comecei assim, procurando as
notícias, indo no CSA no CRB, atrás de notícias, ia de bonde, ia de
ônibus, e três meses depois, o Eraldo Bulhões, que começou a gostar
do meu trabalho, pediu que eu ficasse como chefe do departamento de
esportes, e foi quando eu comecei a arrumar, e aquela mania de

416
dentro do departamento ter fotografias em tudo quanto é canto, de
gravar tudo, e fazer essas coisas todas”.

Tempos de ouro no futebol


“Olha, em 1959, veio prá cá, Fluminense, depois da Copa
do Mundo, depois da Copa de 58, no começo de 59, veio o
Fluminense, Botafogo, Flamengo, e esses clubes vieram aqui com
os seus campeões do mundo. E eu entrevistei todos eles, havia
muita facilidade naquela época. Hoje não. Mas, naquela época, eu
chegava ao Parque Hotel, na portaria eu nem dizia que era repórter.
Só bastava dizer assim: Eu quero conversar com o Castilho ou o
Didi, o Pinheiro, e o Telê também. Aí o porteiro dizia peraí um
minutinho. Aí telefonava pro quarto e dizia. “Olha, tem um rapaz
aqui pra conversar com você”. Aí ele dizia: Mande subir. Aí eu
subia, ele saia do quarto, tinha um lugar assim, meio reservado, aí
a gente sentava e conversava comigo, ele dizia que queria
conversar com ele pra o jornal. Tal e tal. Hoje não. Hoje, a gente
vai é um monte de segurança, não deixa entrar, não pode
conversar”.

Guardião dos tesouros do futebol


“O Museu me dá forças É isso mesmo. Já passei aqui
períodos muito ruins que pensei desistir, mas a minha família não
deixava. Não, não vai. Você vai continuar lá. Isso a gente passa por
cima. Não tem problema. Mas, quando chegam os turistas aqui que

417
conversam que diz que é bonito. O pessoal tira fotografias. As
escolas, que vem pra cá, os meninos que vem pra cá, que a gente
senta ali e fica conversando com eles, eles fazendo aquelas
perguntas gosadas pra gente responder. Enfim, isso deixa a gente
feliz e com vontade de fazer mais. São 20 anos que a gente
praticamente tem aqui, e a gente a cada dia a gente fica mais feliz,
porque apesar dos pesares, apesar dos problemas, a gente está
levando, eu tenho uma família maravilhosa, uma família que me
ajuda muito nisso, me da todo apoio e não tem outro jeito. Tem
que continuar”.

Antonio Sapucaia: um aguerrido jornalista

De origem simples, o jornalista e desembargador Antônio


Sapucaia da Silva é filho ilustre do Pilar, de onde saiu também
Arthur Ramos e Costa Rego, grandes nomes de Alagoas, ambos
biografados por Sapucaia em livros. Sapucaia foi nomeado juiz em
oito de março de 1971 e depois atuou nas comarcas de Água
Branca, Colônia Leopoldina, Viçosa, Atalaia. Mas antes de entrar
na carreira jurídica, foi escriturário da loja Mesbla e jornalista.
Antônio Sapucaia foi de uma geração aguerrida, de muita luta
política e profissional, na convivência diária da Casa dos
Estudantes, pelos idos de 1967/1968, com nomes que ganharam
peso histórico como os jornalistas Tobias Granja, Albérico
Cordeiro, Josenildo Carvalho, Cícero Canuto, Pedro Teixeira.
Sapucaia fez carreira na Gazeta de Alagoas, e tornou-se, junto
Eduardo Menezes, o primeiro copidesque da imprensa alagoana.

418
“Não tinha esse tipo de redator nos jornais de Alagoas, o modelo
foi trazido pelo Leopoldo Collor de Mello do Jornal do Brasil,
onde trabalhava”. Na Gazeta ele chegou a função máxima do
jornalismo, a de secretário de redação. Antonio Sapucaia é o autor
da mais completa biografia sobre o jornalista e ex-governador de
Alagoas, Costa Rêgo.

Costa Rêgo: fonte de inspiração


“O Pilar foi um celeiro de intelectuais, personalidades
como Arthur Ramos e Costa Rêgo (ex-governador de Alagoas),
principalmente Arthur Ramos, no campo da ciência foi um dos
maiores antropólogos do Brasil e morreu aos 46 anos de idade na
condição de diretor da Unesco (Organização das Nações Unidas
para a Educação, Ciência e Cultura), depois de haver publicado
centenas de trabalhos de ordem cientifica e impressionar, não
apenas o Brasil, mas, até fora no exterior também. Cresci ouvindo
os nomes de Arthur Ramos e de Costa Rêgo. E, na realidade,
talvez até antecipando uma possível pergunta sua, o despertar da
minha vocação foi através do nome de Costa Rêgo. Costa Rêgo foi
a minha fonte de inspiração, minha base de vocação, porque, com
efeito, naquela época era o maior jornalista do Brasil,
ombreando-se com Assis Chateaubriand, Macêdo Soares,
Prudente de Moraes Neto, todo aqueles nomes de maior vulto do
jornalismo brasileiro, estavam ao lado de Costa Rêgo” .
Costa Rêgo: 1º professor de jornalismo no Brasil
“Costa Rêgo foi um homem um que enfrentou dificuldades
terríveis, tremendas, pra chegar ao Rio de Janeiro, saiu de Pilar em

419
condições abomináveis, porque havia perdido o pai, havia perdido a
mãe, mas teve a felicidade de ir para o Rio de janeiro, e lá foi... A
vocação dele já nasceu em Pilar. Ele saiu daquí em 1900 ele tinha 11
anos de idade, mas a família dele era de jornalista. Tinha o Zadir
Índio e o Fernando Mendonça, que eram intelectuais em Pilar. Então
Costa Rêgo foi, juntamente com o irmão Rosalvo da Costa Rêgo - que
tornou-se arcebispo do Rio de Janeiro -, e lá chegando foram criados
pelo tio. Fez o ginásio no Mosteiro São Bento, e por incrível que
pareça ele se tornou o primeiro professor de jornalismo do Brasil.
Aliás, essa tese vem sendo defendida e difundida pelo José Marques
de Melo, em todos os congressos, em todas as oportunidades que ele
tem”.

Como Costa Rêgo chegou ao governo


“Foi o seguinte. Primeiro começou com jornalismo, ele era
um jornalista altamente conceituado no Brasil. Era um homem que
tinha intimidade com Getúlio Vargas, pois trocavam charutos,
essas coisas - eram fumadores inveterados de charutos. Vargas
também, mas ele mantinha uma coluna no Correio da Manhã, e
criticava abertamente Getúlio Vargas, mas, eram amigos. Então
veja o seguinte. Com esse prestígio dele o então governador da
época era Fernandes Lima, e acharam que podia ser o nome
indicado para governar Alagoas, mesmo porque ele defendia muito
o Estado de Alagoas e as políticas locais. Além disso, era um
homem de alta dignidade, isso também contava bastante. É
incrível, na época existia isso, hoje está desaparecendo aos poucos,
gradativamente. Mas, havia um Costa Rêgo no Brasil naquela

420
época. Ele chegou até a me contar que foi cogitado pra ser
candidato à presidência da República, na época em que esteve bem
próximo do Getúlio Vargas, chegou a ser cogitado o nome dele e
tal. Era um homem de alto destaque e deu-se o seguinte. Ele então
foi convidado pelo Fernandes Lima pra vim governar Alagoas.
Aceitou e veio como candidato único, ele governou de 1924 a
1928”.

Tesoura press na goma arábica


“Tínhamos os nossos noticiaristas locais e evidentemente os
nacionais, eu recordo que até o Edécio Lopes passou um período na
secretaria de redação, ele cuidava da parte internacional do jornal.
Mas, a parte nacional... A Gazeta naquela época tinha um carro, um
jeep, dirigido pelo Moura, pai da nossa amiga Elza Moura, que
trabalhou na Gazeta durante muito tempo. E o Moura ia ao
aeroporto, não esperava que chegasse nas bancas, e ia apanhar os
jornais diariamente: o Globo principalmente, Folha de São Paulo, O
Estado de São Paulo, ele apanhava esses jornais principais do Brasil,
e quando chegava, nós recortávamos as matérias principais,
substituíamos os títulos e colávamos com goma arábica e a tesoura.
Eram dois instrumentos indispensáveis na redação”.

O múltiplo Damasceno: padre, jornalista e compositor

O jornalista, advogado, professor, filósofo, religioso e


compositor de frevo canção – escreveu Evocação a Alagoas,
elogiado pelos papas Capiba e Nelson Ferreira – José Alves

421
Damasceno, participou de forma marcante da transição do
jornalismo romântico para o profissionalismo, entre os anos 1960 a
1980. Trabalho em quase todos os jornais de Alagoas e do Rio de
Janeiro, onde conheceu o alagoano Tenório Cavalcanti, dono do
jornal A Luta, já sem sua famosa metralhadora Lourdinha. Foi, por
algum tempo, editor de O Semeador, órgão da Arquidiocese de
Alagoas. Mas quase troca a igreja por uma morena carioca.

Tem governo, sou contra


“Naquele tempo aqui em Maceió tinha A Gazeta, Diário de
Alagoas, Correio de Maceió, só não tinha a Tribuna, era jornal pra
todo lado. E o Jornal de Hoje que tinha aparecido em Bebedouro,
com Dr. Jorge Assunção. Foi no Jornal de Hoje onde eu encerrei a
minha carreira de redação. Passei pelo Jornal de Alagoas, como
redator, depois fui pra o Diário de Alagoas, levado pelo Floriano Ivo,
irmão do Lêdo Ivo e do Aldo Ivo, me levou pra lá, era o jornal do
Muniz Falcão, jornal de oposição, eu terminei me notabilizando como
editorialista de oposição porque eu mandava cacete no governo.
Como aquela história: tem governo? Sou contra. E eu fiquei com esse
rótulo de anti-governista”.

O integralismo em Alagoas
“Minha fase religiosa vem de 1971 prá cá. É quando aqui em
Maceió chegou a Igreja Católica Brasileira, e o professor Vanilo
Galvão, meu padrinho de crisma, era um homem inteligente, mas
tinha um defeito, coitado, que morreu com ele. Eu chamei muita
atenção dele, acho até que ele nunca me perdoou por isso. Tinha a

422
mania de ser integralista, e eu nunca vi nada de bom no integralismo.
É tão facínora, um credo tão safado, tão horroroso, como o nazismo.
Era um nazismo brasileiro, misturado com o fascismo daquele
maluco, o Mussolini. Era um bobo, tão inteligente, um escritor de
tantos métodos aderir a uma porcaria daquela. Mas Dom Vanilo era
amicíssimo compadre. O Plínio (Salgado, chefe supremo do
integralismo brasileiro), era padrinho de dois filhos dele. Ele
personificou o integralismo em Alagoas, mas ele trouxe também a
Igreja Brasileira, um cisma que se deu em 1945, separando parte da
Igreja Romana, abrindo aos padres que quisessem se casar a ter esse
direito, contrair matrimonio e continuar no ministério. Eu queria me
casar e queria ser padre e eu vou por aqui. Não cheguei a casar, mas,
morei com uma menina, no Rio de Janeiro, quando fui prá lá. Passei
um tempão, fui jornalista, lá eu entrei na imprensa e fui professor, eu
comecei a ensinar em cursinhos lá, eu era professor de filosofia, eu
fui professor de primeira aqui em Alagoas, publicou uma apostila
completa de filosofia para vestibular, e essa apostila, anos depois se
transformou em um livro, e havia carência de professor de filosofia”.

O encontro com o capa preta


“Damasceno você está aonde? Olhe o deputado Tenório
Cavalcante, está louco por um editor para o jornal dele lá de Caxias,
a Luta. Ele não confia em ninguém, mas pelo fato de você ser
alagoano, já ganhou o Tenório”. Com esse recado de um amigo eu
fui lá. Gostei do Tenório. Ele já estava sem capa, já tinha cortado a
barba, estava cassado pela revolução. Ele dizia que cortaram a juba
do Leão, era meio dramático o Tenório. Era um velho totalmente

423
louco, era um homem simpático, alto, muito bem elegante, só andava
de colete, dois 38, não sei o que mais usava. Não usava mais a
Lourdinha não. Ali foi na fase da Capa Preta já tinha sido contado
em livro, já seria depois do filme. O José Wilker é igualzinho ao
Tenório como jovem, é aquilo ali que tá no filme. E foi logo me
testando: - Olhe, vá ali na máquina e me faça um bilhetinho, coisa de
quatro linhas, dizendo porque você quer trabalhar comigo aqui no
jornal. O Ivan me deu a dica antes. “Elogie, que esse velho gosta de
um elogio, diga que você admirava ele, desde rapazinho”. Aí eu
escrevi: - Minha vontade de trabalhar, na Luta era poder conviver
com o senhor, como no tempo que ao lado da família o senhor
parecia o Zorro da minha infância. Ele quase morre. Ele não tinha
mais barba, mas ele recorria muito à barba, ao cavanhaque e disse: -
Puta que pariu, eu vou te botar na Academia Brasileira de Letras. Tá
empregado. Você quer ganhar quanto aqui?”.

O menino que viu o impeachment I


“No dia do impeachment de Muniz Falcão, em 1957, eu era
menino, estudava no Colégio Estadual, aluno do segundo ano,
quando a aula foi suspensa pela manhã, mais ou menos umas dez
horas, todo mundo teve que ir pra casa, porque já se previa tumulto
e não era bom ninguém ficar aqui na rua e tal, e se alguém com a
farda do colégio fosse pego na rua ia ter 15 dias de suspensão, e
outras penalidades. Eu fui com uma turminha, nós sabíamos que ia
haver um problema lá na praça da Assembleia, fomos olhar, muita
confusão, eu me lembro do Castro Filho, falando no caminhão,
transformado em palanque né? - A nossa marcha é pacífica! Não

424
estamos armados! E eu comecei a ter medo da multidão, fomos
para a Catedral, pra ver lá de cima, do parapeito. Lá encontrei meu
amigo Teodomiro: - Damasceno, vamos pra torre do sino, que a
gente vê melhor”

O menino que viu o impeachment II


“Daqui a pouco foi bala, eu nunca tinha ouvido na vida um
tiro, e ouvi milhares de tiros de uma vez só. Rajada, bala , fuzil, aí
eu percebi que o exército subiu no prédio da Delegacia Fiscal, eles
estavam atirando para Assembleia. E vi quando um rapaz, jovem
ainda, de terno branco, pulou a janela da Assembleia e caiu na
marquise e houve alguma coisa com a perna dele que ele não se
levantou mais. Depois eu vim saber que foi o jornalista Marcio
Moreira Alves da revista O Cruzeiro . E vi também saiu a pessoa,
depois eu soube, era o deputado Gomes de Barros , Carlos Gomes
de Barros, que levou uma rajada no pescoço. O senador Teotônio
Vilela, levou um tiro na mão. A morte do deputado Humberto
Mendes, eu vi quando saiu alguém deitado já. Eu pensei que fosse
né? Foi o primeiro que saiu. Foi ele. Aí que começou a confusão, e
foi uma coisa horrorosa, foi uma coisa que... aquilo não pode
existir mais né?”

Aydete Vianna: mulheres conquistam a redação

A jornalista Aydete Vianna de Lima nasceu em Maceió, é


advogada, formada pela Universidade Federal de Alagoas,
procuradora de Justiça (aposentada), jornalista e poetisa. Aydete

425
tem um papel marcante na história do jornalismo em Alagoas, e foi
uma das precursoras. Ela viveu um tempo que era muito difícil a
mulher fazer parte das redações dos jornais.

A hora e a vez das mulheres


“Ah! Mulheres na redação era uma coisa difícil mesmo. No
rádio a presença da mulher já era muito restrita. Era um pouquinho
maior do que jornal. A mulher que trabalhasse em rádio, não era
muito bem vista não. Mas tinha a Floracy Cavalcante, a melhor
voz do mundo, a mais linda. Floracy era tudo que eu achava de
bonito. Quando eu já estava no jornal Gazeta como jornalista,
então apareceram a Lilian Rose, que é a Maria José Palmeira, e a
Cândida Palmeira, que depois com a morte do nosso saudoso
colega Marcos Vinícius, as meninas que estavam na Gazeta da
Tarde, subiram para crônica social da Gazeta”.

A precursora Arlene Miranda


“Qando eu cheguei, a Arlene já tinha passado por alí, repare
que menina, que mulher desbravadora. Ela, já tinha passado. Nós
não nos encontramos como colegas na redação, mas, eu ouvia falar
muito dela. Ela era uma menina, quando chegou lá e se apresentou,
disse que queria ser jornalista, eu acho que ela deu conta do
recado. Mas, depois, parece que ela teve de morar em Paris, e teve
de se afastar. Então, eu fiquei quase sozinha, na época,
apareceram, a Cândida Palmeira, eu já estava no jornal, isso era
1968, 1969. Então, a minha experiência, eu não tenho diploma de
jornalista, mas, na época não precisava, não é isso? Eu acho que

426
está correto hoje, que a nossa profissão, está muito mais
valorizada, com exigência, não só para o jornalista ou o redator,
mas, também para o jornalista de rádio, radialista, porque esse
curso da a ele o embasamento cultural, a gente não vê tanta
besteira que sai nos jornais, que vai ao ou sai na TV”.

Alta sociedade no afã das crônicas


“Nós tínhamos ainda aquelas senhoras da alta sociedade que
queriam ser jornalistas e cronistas, mas não podiam eu acho. Elas
mandavam crônicas, eram pessoas que escreviam bem, eu criei e
editei um caderno feminino, a Gazeta Feminina, quando recebia
crônicas dessas senhoras que já mandavam também pra Gazeta
normal né?. E a Gazeta criou um caderno que tinha umas páginas
que o leitor tinha vez. E na Gazeta Feminina, que eu dirigi que
editei, e escrevia uma crônica semanalmente. Mas, antes da crônica
elas já vinham atuando, nesse caderno. Lá em casa a gente quase
que era obrigada a escrever, eu digo a gente porque eu e Teobaldo
nós éramos os mais jovens e a gente sofria, os mandamentos do
Temístocles que era meu irmão mais velho entendeu? E eu acho
que eu me saia bem nas crônicas, eu recebia elogios”.

Graciliano no batente do jornalismo

427
O romancista Graciliano Ramos (1892-1953) dedicou-se à
literatura, à política e ao ensino, mas também era um grande
jornalista. Com 12 anos, em Viçosa, escreve seus primeiros textos.
Foi lá onde nasceu de fato a verve de escritor e jornalista, quando
conheceu o agente dos Correios, intelectual e dono da maior
biblioteca da cidade, Mário Venâncio. Além de professor de
Geografia, Venâncio era editor do periódico O Dilúculo (A Tarde),
de publicação bimensal. Graciliano trabalhou até o fechamento do
jornal, um ano depois, com a morte Venâncio. Em 1909 inicia sua
colaboração no Jornal de Alagoas, sob vários pseudônimos,
Almeida Cunha e Lambda. Em Palmeira dos Índios, Graciliano
também colaborou como cronista de O Índio, assinando com o
pseudônimo J. Calisto. Em agosto de 1914, aos 22 anos, embarca
para o Rio de Janeiro no vapor Itassupê, e continua sua carreira de
jornalista como revisor dos jornais cariocas Correio da Manhã, A
Tarde, O Século, e o periódico fluminense Paraíba do Sul, e na
revista Dom Casmurro. Em uma carta ao pai, Mestre Graça parece
decidido em procurar emprego na imprensa, descartando qualquer
outra coisa, como comerciário ou no serviço público.

“Que é que essa gente de Maceió sabe a respeito de minhas


resoluções? Não quero emprego no comércio – antes ser mordido por
uma cobra. Sei também que há dificuldades em se achar um emprego
público. Também não importo com isso. Vou procurar alguma coisa
na imprensa, que agora, com a guerra, está boa a valer, penso.

428
Portanto... os amigos que guardem suas opiniões”, Viçosa, em 21 de
agosto de 1914.

Do livro Cartas, Editora Record, 1980, com desenhos de


Portinari, em Carta ao Pai, Sebastião Ramos , aos 22 anos

Mestre Graça na Imprensa Oficial alagoana


O então governador Álvaro Paes, impressionado com os
dois relatórios de prestação de contas de sua gestão como prefeito
de Palmeira dos Índios (1929 e 1930), convida Graciliano Ramos
para dirigir a Imprensa Oficial do Estado. Os relatórios, escritos de
forma impecável e em linguagem literária, depois ficaram famosos
e integram o corpo do livro Viventes das Alagoas. A Imprensa
Oficial onde Graciliano Ramos atuou tinha sede na Rua Boa Vista,
centro de Maceió, em um belo casarão de dois andares construído
pelo governador Clodoaldo da Fonseca, em 1912. A gestão de
Graciliano na Imprensa Oficial do Estado é rápida. Ele assume em
31 de maio de 1930, e fica até 26 de dezembro de 1931.
Desgostoso com a vida de burocrata da imprensa, ele volta para
Palmeira dos Índios, onde escreve os primeiros capítulos de São
Bernardo, entre cafés, cachaças e cigarros, em uma sala arejada e
por trás do altar da Igreja Matriz. Mas ele não deixou de se divertir
com o pessoal da redação, naquele Centro de Maceió belo e
reluzente.

“O pessoal da redação chefiada por Graciliano ia para a


Imprensa Oficial bater o ponto e fechar o D.O, e depois arruavam

429
pelo Centro e Jaraguá. Tomavam cervejas e cafezinho no Bar do
Cupertino, na esquina da rua do Comércio e a do Livramento. O
diretor Graciliano Ramos teve então que ampliar o número de
máquinas de escrever e modernizar toda a estrutura da Imprensa
Oficial”.
Petrúcio Vilela, jornalista palmeirense e ex-colunista de
Economia do Jornal de Alagoas; trabalhou no Jornal do Brasil e
revista Veja

Agamassa do texto jornalístico na obra de Graça


Foi no batente dos jornais onde trabalhou - no Rio de
Janeiro e em Alagoas - com sua linguagem enxuta e sintética que
Graciliano obteve mais fermento para sua obra. Pérolas de seu
texto podem ser encontradas entre as suas colaborações para a
revista carioca literária semanal, Dom Casumurro, que circulou
entre 1937 e 1944. Na época, era a mais importante publicação do
gênero do Brasil, chegando a atingir 50.000 exemplares por
semana. Segundo o jornalista sergipano, o “víbora” Joel Silveira,
“todos os literatos do Brasil escreviam ou visitavam a redação
quando passavam pelo Rio e Dom Casmurro ficou como um ponto
de referência para todos da esquerda.” Entre seus colaboradores,
incluíam-se, além de Joel Silveira, Graciliano Ramos, Murilo
Mendes, Oswald de Andrade, Rachel de Queiroz, José Américo de
Almeida, José Lins do Rego, Cecília Meireles, Astrojildo Pereira,
Adalgisa Nery, Jorge Amado. Esta é a pérola escolhida, a crônica
de Graciliano, Os Sapateiros da Literatura - rebatendo outro artigo
de Mário de Andrade - publicado também em Linhas Tortas:

430
“Afinal, quem são os rapazes do D. Casmurro? Os sapateiros
da literatura. Não se zanguem, é isto. Somos sapateiros, apenas.
Quando, há alguns anos, desconhecidos, encolhidos e magros,
descemos as nossas terras miseráveis, éramos retirantes, os
flagelados da literatura. Tomamos o costume de arrastar os pés no
asfalto, freqüentamos as livrarias e os jornais, arranjamos por aí
ocupações precárias e ficamos na tripeça, cosendo, batendo,
grudando ... Enfim as sovelas furam e a faca pequena corta. São
armas insignificantes, mas são armas”.
Graciliano Ramos, em Linhas Tortas, Record, 1962

José Marques de Melo: mestre da academia

José Marques de Melo é jornalista, professor universitário,


pesquisador científico e consultor acadêmico. Nascido em
Palmeira dos Índios, em 1943, Começou a trabalhar como
jornalista, em 1959, integrando as equipes dos jornais Gazeta de
Alagoas e Jornal de Alagoas, atuando depois no Jornal do
Commércio e Última Hora (Recife), A Gazeta e O São Paulo (São
Paulo) e Revista de Cultura Vozes (Petrópolis, RJ). Colaborou
ainda como articulista dos jornais O Estado de S. Paulo, Folha de
S. Paulo, Correio Braziliense (Brasília), Zero Hora (Porto Alegre),
Diário do Grande ABC (São Paulo), Diário de Pernambuco
(Recife) e A Tarde (Salvador). Obteve os títulos de Bacharel em
Jornalismo (Universidade Católica de Pernambuco, 1964),
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais (Universidade Federal de

431
Pernambuco, 1965) e Pós-Graduação em Ciências da Informação
Coletiva (Centro Internacional de Estudos Superiores de
Comunicação para a América Latina, Quito, Equador, 1966).
Fundou, em 1967, o Centro de Pesquisas da Comunicação Social,
mantido pela Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero, então
vinculada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Sua
atividade foi interrompida durante o regime militar, quando esteve
impedido de exercer a docência em universidades públicas
brasileiras. Anistiado em 1979, reassumiu sua cátedra na
Universidade São Paulo (USP). Durante a gestão do Reitor José
Goldemberg, foi escolhido pela comunidade acadêmica e por ele
nomeado em 1989 para exercer o cargo de Diretor da ECA-USP
(Escola de Comunicação e Arte, uma das mais conceituadas do
Brasil), mandato cumprido até 1993, findo ao qual decidiu
aposentar-se voluntariamente da instituição. Atualmente é docente
do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da
Universidade Metodista de São Paulo, sendo Titular da Cátedra
Unesco de Comunicação para o Desenvolvimento Regional.
http://www.marquesdemelo.pro.br/perfil.htm

Nunes Lima: a vida sem retoque

Manoel Nunes Lima (1931-2011), cartunista e jornalista


alagoano, era um homem simples, que viveu sua vida inteira de
forma franciscana no batente do jornalismo. Escreveu e desenhou o
povo humilde das Alagoas, falou por eles. Em uma charge,
professora e aluno travam o seguinte diálogo: Conjugue o verbo

432
comer! - Ao que o aluno indagou de volta: comer o que,
professora? Sua concepção do cotidiano simples, do seu humor
admirável, e a ironia fina e sutil, estiveram em suas charges
publicadas na página de Opinião, da Gazeta de Alagoas por
décadas, ou nas crônicas que escreveu na coluna Vidas Sem
Retoque, transformada em livro, em 2008. “Nunes é uma daquelas
raridades que nós temos. O seu trabalho vai em cima das camadas
mais simples. A popularidade que ele alcançou era impressionante.
As pessoas colecionavam os recortes. Era fácil vê-los em
barberarias, oficinas”, Ênio Lins, no Diário Oficial do Estado –
20/07/2009.

“Era o tempo de telefone grande e preto, da máquina de


escrever, do linotipo que derretia chumbo para fazer notícias, da
teletipo barulhenta, dos clichês de zinco, da velha rotativa que
engolia rolos de papel em branco, e os devolvia cheios de letras, de
notícias que os gazeteiros gritavam em seus pregões, que se
misturavam ao ranger dos bondes no trilho. Foi nesse ambiente que
nasceu Vidas sem Retoque, contando casos acontecidos aqui e
alhures neste mundo de Deus e de satã”.
Nunes Lina, na apresentação de seu livro Vidas sem
Retoque, com edição de Lima de Amorim – 2008

Denis Agra: jornalista investigativo

A caneta Bic azul do editor da revista Última Palavra,


jornalista Dênis Agra (1950-1992)– nos anos 1980 -, deslizava

433
com rapidez e estilo pelas laudas brancas tipo A4, no front de mais
uma reportagem. A do último coronel, a do intocável da polícia, e
tantas outras páginas que apontaram para o caminho das pedras das
Alagoas, da lama do sururu ao “há algo mais no ar, além dos
aviões de carreira”. De sua lavra já saíram reportagens de grande
repercussão: a última entrevista do coronel Elísio Maia, em Última
Palavra é de tirar o chapéu. Entre as respostas da velha raposa foi
“eu prefiro o ferrão que o boi”. Foi ombudsman do jornal da
família Collor, a Gazeta de Alagoas. Liderou a categoria nos
enfrentamentos e negociações salariais. Participou da criação do
piso nacional de jornalista, como diretor da Federação Nacional
dos Jornalistas (Final). Denis Agra morreu na flor da idade, aos 42
anos, depois de lutar contra um câncer. Ele nasceu em Viçosa,
estudou medicina na Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Em
1973, foi preso e torturado em Recife. O que motivou a sua prisão
e de outros estudantes em Alagoas foi o fato de ser um líder
estudantil e militante clandestino do Partido Comunista
Revolucionário (PCR).

Livros sobre Denis Agra


Após 23 anos de sua morte, Denis Agra continua no cenário
alagoano. Dois escritores, e fraternos amigos de Denis, se
debruçaram diante da vida dele, que deu inspiração para a
literatura. Depois de Codinome Mota, de Joaldo Cavalcante, agora
ele é foco novamente em Um jornalista em defesa da Liberdade
(Editora Bagaço, 2014), assinado pelo historiador e escritor
Geraldo de Majella, o livro narra a trajetória de Agra, ativista de

434
esquerda contra o regime ditatorial e defensor da ética no
jornalismo. Fartamente ilustrado com fotos do dia a dia das
redações. Em suas 63 páginas, a publicação de Majella mostra um
panorama da trajetória de Denis Agra. São nove capítulos que
passeiam desde seus primeiros passos até a militância política em
grupos como os Partidos Comunista Revolucionário (PCR),
Socialista Brasileiro (PSB) e Comunista Brasileiro (PCB) e seu
papel como profissional da imprensa. Segundo Majella, o desejo
de escrever o livro nasceu enquanto se debruçava sobre outro
trabalho: o Dicionário dos Comunistas, que ele elabora há oito
anos.

“A ideia era mostrar para os estudantes, para jornalistas


recém-formados que não tiveram contato com a geração anterior,
esse personagem tão importante para as causas sociais, que
trabalhou na organização e na defesa dos jornalistas, mas que se
preocupou, também, com os trabalhadores. É um tipo de jornalista
que está acabando”.

Geraldo de Majella, em entrevista ao jornal Gazeta de


Alagoas, na edição de 06/08/2014

Mendonça Neto: a voz que não cala

Antônio Saturnino de Mendonça Neto (1945-2010) nasceu


em Rio Novo, Minas Gerais, mas foi entre Alagoas e o Rio de
Janeiro, que viveu seu tempo de mocidade, de inquietação, de vida

435
política e profissional. No Rio de Janeiro iniciou sua carreira de
jornalista, no Diário de Notícias, depois nas revistas O Cruzeiro e
Manchete. Foi deputado estadual e deputado federal por Alagoas
entre 1974 e 1994, defendendo, entre outras causas, a volta à
democracia representativa, uma distribuição de renda mais justa e a
probidade no uso do dinheiro público. No Rio de Janeiro, como
antiga Capital Federal ele se aproximou do ex-governador da
Guanabara, Carlos Lacerda. A influência política do udenista
carioca moldou a sua vida como jornalista e político. Mendonça
Neto ficou conhecido como “A voz que não se cala”, devido ao seu
persistente combate aos ladrões de colarinho branco. Ele dedicou
boa parte de sua vida à luta contra a corrupção e em defesa da
moralidade pública.

“Penso que o problema essencial de Alagoas não é a


corrupção que avilta o seu povo e condena o seu destino a ser um
destino de pobreza e submissão. Para mim, é a falta de autoridade
dos governantes que castiga a nossa terra, falta de autoridade para
impor que os recursos do Estado sejam gastos com o povo alagoano,
sem a desonestidade ou a incompetência dispersiva dos que ocupam
cargos públicos, como barganha política do que por merecimento”.
Texto de Mendonça Neto em sua coluna do jornal Extra,
setembro de 2010

Mendonça Neto no front do jornalismo


Mendonça Neto foi jornalista profissional desde os 20 anos.
Sua primeira reportagem saiu em 1960, já como manchete de capa,

436
na Gazeta de Alagoas. Mendonça descobriu e entrevistou o cabo
Honorato, o matador de Lampião. A partir daí ele ganhou o Brasil.
No jornal carioca Diário de Notícias teve sua carteira assinada e foi
repórter, colunista, chefe de redação e fez coberturas em todo o
país. Sua fama correu, trabalhou na revista O Cruzeiro e Manchete,
onde realizou grandes reportagens como as eleições norte-
americanas de 1968. Entrevistou personagens e celebridades
nacionais e internacionais como Elis Regina, Tom Jobim, Mané
Garrincha, Jânio Quadros, JK, Francisco Julião, Chico Buarque,
Charles Aznavour, Cláudia Cardinalle, Richard Nixon, Leonel
Brizola, Ulisses Guimarães. Entre muitos outros personagens.

O datilógrafo dos verbetes do mestre Aurélio


No livro de Mendonça Neto, O Ministro que Virou Garçom
(2006), que reúne o resumo de suas reportagens e crônicas, ele
relata seu início de carreira, aos 19 anos, como datilógrafo das
fichas de verbetes do dicionarista Aurélio Buarque de Holanda,
emprego pedido pelo seu pai. Aceito na casa do dicionarista, a
figura lhe deu medo: “cabelos desgrenhados, de movimentos
inquietos na pequena sala, ruminando palavras, parecia um animal
trancafiado na jaula”.
“Nada mais falso. Com o tempo revelou-se uma figura
humana e suave. A missão era datilografar os verbetes, nos meus 19
anos achava a tarefa simples, até conhecer o método bibliográfico. O
autor vinha lutando com seu dicionário há mais de dez anos e
perdera o patrocínio de uma grande editora. Estava só, por sua
conta, a casa entulhada de fichas e ele sem saber se, um dia, ainda

437
conseguiria editá-lo ou, pelo menos, deixá-lo pronto. Economizava
tudo, sobretudo papel. Quando me via rabiscando garatujas naquelas
folhas, fazia uma advertência paternal. Nos intervalos do trabalho,
contava-me histórias dos dicionários, do seu amor a eles e de sua
angústia de não saber se conseguiria quem bancasse a primeira
edição. “Sou um simples professor, não aguento tocar isto sozinho”,
me dizia. Um dia, iria chegar a editora Nova Fronteira, de Carlos
Lacerda, e fazer do Aurélio o dicionário mais popular da história do
Brasil. Mas até este dia, o combustível do mestre Aurélio era a fé
absoluta no que fazia”.
Mendonça Neto, no livro O Ministro que virou garçom,
editora Voz de Minas, 2006, pag 195

Íris Alagoense: o primeiro jornal

O primeiro jornal que circulou em Alagoas, o célebre Íris


Alagoense, teve sua primeira edição impressa na Bahia, em 1831.
O impresso ainda mudaria seu nome para O Federalista Alagoense,
que circulou até 1836. Editado por um único redator, o jornalista
francês Adolphe Emile de Bois Garin, vindo de Recife, onde
editara o periódico Espelho das Brasileiras. Era o porta-voz da
Sociedade Patriótica de Maceió, um jornal político, literário e
mercantil. O jornal chegava a Alagoas com as mesmas
características de outros jornais do país, era notável seu
inconformismo e a crítica a todas as formas de poder absoluto.
Antes do Íris Alagoense, a publicação de jornais, em Alagoas, era
proibida pelo Império. O primeiro jornalista alagoano, Afonso de

438
Albuquerque Melo, padre e deputado provincial, natural da antiga
cidade de Alagoas (atual Marechal Deodoro) atuou apenas quando
o Íris foi renomeado para O Federalista Alagoense.

Antes do jornal, a tipografia


A primeira tipografia em Alagoas, A Patriótica, foi instalada
na Rua do Livramento, Centro de Maceió. O nome Patriótica era
uma referência à Sociedade Patriótica Federal, organizada em todo
o país pelos liberais. A tipografia foi criada em 1831, pelo então
presidente da província de Alagoas, o paraibano Manoel Lobo de
Miranda Henriques, numa tentativa de ganhar a simpatia dos
alagoanos, que o receberam com desconfiança, e mostrar suas
obras públicas. Ele comprou o maquinário do pernambucano João
Batista Franco com dinheiro arrecadado entre seus partidários. A
nova tipografia trouxe de Pernambuco o primeiro editor, o francês
Adolphe Emílio de Bois Garin, que trabalhava no Espelho do
Recife, que redigia bem em português. Foi a gráfica Patriótica que
lançou o Iris Alagoense – cujo primeiro número, em 1931, tinha
sido impresso na Bahia. O redator era Adolfo Emílio de Bois
Garin, auxiliado por dois jovens alagoanos, João Simplício e
Bartolomeu de Carvalho.No dia 18 de fevereiro de 1832, o nº 50
do Iris Alagoense circulou pela última vez. Quatro dias depois, o
porta-voz dos liberais volta a circular com nova denominação,
agora era O Federalista Alagoense.

439
Atentado ao redator
O francês Garin, que redigia o jornal, terminou por ser
alvodos embates entre os grupos políticos locais. Seis dias depois
de ter circulado o último número do jornal, o editor e redator foi
atingido por tiros de pistola, saindo ferido no peito e com mais de
doze caroços de chumbo no corpo. Voltou para Recife
imediatamente.Auxiliado pelo advogado pernambucano Felix José
de Melo e Silva, quem assume a editoria do jornal é um dos líderes
dos liberais alagoanos, padre Afonso de Albuquerque Melo, que
passa a ser o primeiro jornalista alagoano.

Fonte: Pesquisa do professor Douglas Apratto Tenório para


o fascículo nº 8 de Memórias Legislativas, 1998, editado pela
Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas.

O lendário Jornal de Alagoas

O velho Jornal de Alagoas, da rede nacional que o magnata


da imprensa brasileira, Assis Chateaubriand, montou no Brasil, foi
fundado em 1908. O lendário JA viu passar uma centena de
gerações de jornalistas e intelectuais alagoanos que antes de
ganharem o mundo publicaram textos e gastaram a sola dos
sapatos para subir os degraus que levavam ao tablado do segundo
andar, onde ficava a redação. Colegas que ficaram famosos após
escreverem poesias, contos e reportagens no JA. A lista é grande e
começa com Graciliano Ramos – redator e cronista; Aurélio
Buarque de Holanda – redator, revisor e cronista – e escritores que

440
deixaram a marca de sua produção literária no JA: José Lins do
Rego, Manoel Diegues Junior e a cearense Rachel de Queiroz –
que passou um bom tempo morando em Maceió – Jorge de Lima, e
tantos outros mestres.

Naipe de ouro e a venda da rotativa


Ainda tem aquele naipe de ouro, a geração aguerrida que
enfrentou desafios monumentais como a censura, jornal falido,
salário baixo. Mas que fizeram do JA um diário digno de se ler e se
ver. Eles eram os batutas: Valmir Calheiros, Freitas Neto, Denis
Agra, Tobias Granja, Joarez Ferreira, Romero Vieira Belo e
Noaldo Dantas, o fundador de jornais. Naquele longínquo março
de 1984, quando escrevia meus primeiros textos no Jornal de
Alagoas, no mesmo velho sobrado dos veteranos, na rua
Conselheiro Lourenço Albuquerque, Centro de Maceió, o
esplendor tinha virado ocaso. Apesar do esforço e da valorosa
equipe, a situação não era fácil. Da rotativa offset Goss, modelo
United, de fabricação norte-americana comprada em 1974,
substituindo a última linotipo, com algumas adaptações ao
chumbo, sobraram apenas as correntes dos guindastes que levaram
o maquinário, os cilindros, as bobinas de papel, as dobradeiras e o
motor de 4O HP. O parque gráfico tinha sido vendido para pagar
dívidas.

441
MEMÓRIAS POLÍTICAS*

* Resumo do encarte Memórias Legislativas, publicado pela


Assembleia Legislativa de Alagoas, em fascículos, durante o ano de
1998, sob a coordenação do jornalista Stefani Brito Lins, com apoio
de colaboradores

Euclides Malta: sertão domina política

Euclides Vieira Malta (1861- 1944) foi governador de


Alagoas por duas vezes(1900-1903 e 1906- 1909, magistrado e
político alagoano. Filho do alferes de milícias Manoel Francisco
Malta e Maria Vieira Malta, casou-se com Maria Gomes Malta,
filha de Manuel Gomes Ribeiro, o barão de Traipu. Formado pela
Faculdade de Direito de Recife em 1886, ocupou o cargo de
promotor público em Atalaia, Coruripe e Penedo. Ainda no sélculo
IXX foi deputado estadual (1890-1891 e 1895-1896), prefeito de
Penedo (1895-1897), deputado federal (1892-1893 e 1897-1899, e
senador (1903-1905, 1906-1908 e 1921-1926). Sua sobrinha-neta,
Rosane Collor, foi a primeira-dama do Brasil entre 1990 e 1992,

442
durante o governo Collor de Mello. O ciclo político de domínio
dos Malta finalizou em 1912. Na oposição estava Fernandes Lima,
que lançou como candidato ao governo o general Clodoaldo da
Fonseca. O afastamento definitivo de Euclides Malta só se dará na
década de 1930, e muitos de seus seguidores permaneceram na
ribalta do poder.

“Como político, enorme foi o seu prestígio pessoal e a


lealdade a seus princípios e aos correligionários. Dentre os
empreendimentos levados a efeito por sua administração. Destacam-
se a conclusão das obras do Palácio dos Martírio (hoje Museus
Floriano Peixoto), a construção do Teatro Deodoro, o cais sobre o
São Francisco, em Penedo e a construção dos monumentos de
Floriano, Deodoro, Sinimbu, Rosa da Fonseca”.
Por Diegues Júnior, pai.

Fernandes Lima. O Caboclo Indômito

José Fernandes de Barros Lima (1868-1938) nasceu em


Passo de Camaragibe (AL) foi um alagoano que fez da luta pelo
poder o objetivo máximo de sua vida. Cursou direito no Recife,
participou das campanhas pela Abolição e depois retornou ao
Estado de Alagoas, onde iniciou sua vida política. Foi deputado
estadual na legislatura 1893-1894. Eleito deputado federal na
gestão 1894-1896, destacou-se pela oposição à oligarquia
dominante, chefiada por Euclides Malta. Sua candidatura foi
favorecida pela nova orientação do governo federal, então chefiado

443
pelo presidente Hermes da Fonseca (1910-1914), que passou a
intervir em alguns estados, inclusive com o afastamento de seus
governantes, no que ficou conhecido como “política das salvações.
Em março de 1918 foi eleito e reeleito governador de Alagoas,
permanecendo no exercício do governo até 1924, quando tomou
posse o novo governador Pedro da Costa Rego. Contra a tese de
que o desenvolvimento deveria ser feito da capital para o interior,
durante seu governo lançou o slogan “Rumo aos campos”,
buscando interiorizar sua ação administrativa.
Fontes: Texto de Reynaldo de Barros, da Fundação Getúlio
Vargas e fotos do fascículo Memórias Legislativas nº 23, da
Assembleia Legislativa de Alagoas, com pesquisa de Douglas
Apratto Tenório.

Tomás Espíndola: professor dos grandes mestres

O médico e deputado estadual Tomaz do Bomfim Espíndola


(1832-1969) – chegou a exercer o cargo de governador de Alagoas
como presidente da Assembleia em 1867 – teve sua vida
biografada pelo historiador Félix Lima Júnior. Entre suas obras de
destaque está o compêndio “Geographia alagoana ou descripção
phisica, política e histórica da Província de Alagoas, pela
Typographia do Liberal, 1871”. Espíndola era pesquisador nato e
curioso, sua tese de doutoramento foi “A Profilaxia do Cólera
Morbus Epidêmico”. Espíndola ensinou no lendário Liceu
Alagoano, o colégio que formou grandes escritores e poetas. Félix

444
Lima Júnior se despediu de seu amigo, na beira do seu túmulo, na
sacristia da Catedral de Maceió.
“Espíndola foi um homem austero, culto, brilhante... viveu
cercado pela estima e alta consideração dos alagoanos. Morreu
serenamente, com a consciência tranquila, pois cumprira sua missão
na terra e, dedicado, servira a sua pequenina província”
Pesquisa do professor e pesquisador José Maria Tenório
Rocha, mestre e pesquisador em antropologia Cultural
Visconde de Sinimbu: o monarquista convicto

João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu (1810-1906), filho


da lendária Ana Lins, uma mãe revolucionária nas lutas de
1817/1824, foi deputado estadual, e passou a atuar na política
nacional, como deputado geral (hoje seria federal ou senador).
Nasceu em São Miguel dos Campos e fez uma longa jornada pelo
Brasil e pelo mundo, como Embaixador do Império. Como
diplomata resolveu imbróglios importantes como o acordo com o
Uruguai, na questão do Rio da Prata. Morreu quase centenário,
mas monarquista convicto. “Sou monarquista, morrerei
monarquista, mas nunca conspirei contra a República. Receio que
o Brasil se fragmente em republiquetas, o que seria uma
desgraça”.

Demócrito Gracindo. O meteoro de Viçosa

“Demócrito Brandão Gracindo (1884-1927) foi um


meteoro fulgurante que, durante seu curto período de existência

445
terrena, iluminou o céu das Alagoas. Nasceu em Viçosa em 1884;
aos 19 anos termina o bacharelado na Faculdade de Direito do
Recife, em 1903. Filho de coronel, Demócrito casa-se com
Argentina Guimarães Gracindo, que depois de perderam o
primeiro filho, que se chamaria Epaminondas, tiveram apenas um
herdeiro, de nome Pelópidas Gracindo, que anos depois tornou-se
famoso no País, como o ator teatral Paulo Gracindo. Depois de
ser juiz em várias comarcas em Alagoas e no Pará, retornou a
Maceió como catedrático de História Geral do Brasil no Liceu
Alagoano e exercendo, simultaneamente, intensas artividades
profissional, literária e política. Foi prefeito de Maceió, secretário
de Estado por duas vezes, deputado estadual e federal. E mais:
diretor secretário do Banco do Norteste do Brasil, com
participação na gestão... Não aceitava nossos recreios na Praça
Rosa da Fonseca, hoje desaparecida, a mim pessoalmente,
tracionava-me pelo pescoço para retorno às aulas do Lyceu, a nos
dizer com o seu vozeirão, que lugar de aluno é na sala de aula.
Fui um dos últimos alunos de sua cátedra, nos idos de 1926”.

Democrático Gracindo, segundo os literatos


“Solenidade famosa aconteceu em Alagoas, no salão nobre do
Instituto Arquelógico e Geográfico de Alagoas um ano após o
falecimento de Demócrito Gracindo, por iniciativa da Academia
Alagoana de Letras, denominada os 80 minutos de Demócrito.
Guedes de Miranda, falou sobre Demócrito acadêmico; Carlos de
Gusmão com finura e inteligência sobre a condição de advogado de
Demócrito; Jorge de Lima analisou a trajetória política do

446
homenageado; Costa Rego comentou o contexto oratório do saudoso
alagoano; Cipriniano Jucá falou sobre o sonhador que emoldurava a
sua personalidade; Jaime de Altavila do professor de energia e
dinamizador; e Lima Júnior realizou uma profunda análise
sociológica de Demócrito como homem de rua... A sua tez morena,
como se fora um açoreano, dava o coroamento de popularidade ao
vulto eminente que enriquecia as ruas de Maceió, e era um canal de
segurança e liberdade”.
Pesquisa do médico, escritor e professor Ib Gatto Falcão,
em Memória Legislativa nº 31, em 1998
Rodrigues de Melo: presença negra na polítca

Manoel Rodrigues de Melo, nascido no final do século 19,


em 1876, foi um negro lutador, uma grande figura intelectual e
político alagoano pouco lembrado na história, que sentiu orgulho
de sua raça, e que lutou pelas causas do povo. Filho da ex-escrava
Florinda Joaquina Rorigues de Melo, vendora de tapioca em
Maceió. Desde cedo absorveu a vocação para os estudos. Fez
bacharelado em Ciência Jurídicas e Sociais na Faculdade de
Direito do Recife. Foi deputado estadual, secretário de Governo,
delegado-geral de polícia, promotor público, e na literatura floi um
dos fundadores da Academia Alagoana de Letras.

Contra o racismo, o santo negro


Nas sessões de júri, advogados perdidos em seu arrrazoado,
evocavam a pele negra de Rodrigues de Melo para provocá-lo. A
tática funcionava, pois Rodrigues saía de sua explanação, e, irado,

447
ia fazer apologia à sua raça. Existem vários casos pitorescos
relatados sobre o assunto. Num deles, contado por Elisabeth
Mendonça, numa questão de júri com o Dr. Ciridião Durval, esse
falou que, nem um milagre de São Benedito, fazia o o promotor
arrancar provas a ele. Provocado, falou sobre a figura do santo
negro, e de seus milagres por mais de uma hora, prendendo a
atenção do auditório de maneiria espetacular.

Pesquisa do professor Douglas Apratto Tenório, mestre e


doutor em história

André Papini. Líder de uma bancada perseguida

André Papini Góes (1908-1966), nascido sergipano, de


Brejo Grande, vem de uma família sem muita predestinação para a
política, mas ele decidiu seguir seus ideais de homem de esquerda.
Depois de passar pelo Rio de Janeiro e São Paulo, nos anos 1930,
volta a Maceió em 1943, quando assume a direção do jornal A Voz
do Povo, órgão do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Sua
atuação no movimento estudantil – chegou a ser o representante e
líder da União Nacional dos Estudantes – permitiu que saísse
vitorioso das eleições para deputado estadual, em 1947, junto com
mais dois deputados: José Maria Cavalcanti – ex-cabo do Exército
e que tempos depois, em 1972, faria parte da fundação do PC do B,
ao lado de Diógenes de Arruda Câmara, João Amazonas, Pedro
Pomar, Maurício Grabois e Moacir Rodrigues Andrade, que após a
cassação de seu mandato foi viver clandestino no Rio de Janeiro.

448
Eles assumem o mandato em março de 1947, dois meses depois o
Tribunal Superior Eleitoral vota pelo cancelamento do registro, sob
pressão do governador eleito, Silvestre Péricles.

Silvestre “empastela” a A Voz do Povo


A vitória na Justiça não apetece sua sanha de anticomunista,
e Silvestre Péricles age rápido: fecha violentamente as células
comunistas e “empastela” o jornal do PCB, A Voz do Povo.
Mesmo cassados, os deputados comunistas denunciam na tribuna
do Legislativo. No Senado, o líder comunista Luiz Carlos Preste
repercutiu o fato no país: “Só um defunto ressuscitado de
Nuremberg poderia usar métodos que estão sendo empregados pelo
governador de Alagoas, tanto os impropérios e desprezo, bem
como os elogios”. A Assembleia é cercada, e Silvestre volta ao
ataque:

“Se os comunistas tiverem a audácia de desacatar ou anular a


decisão do TSE. A polícia recebeu ordem de reprimir energicamente
qualquer crime desses apaniguados de Moscou. Quem duvidar não
perde por esperar... se os criminosos, ladrões, assassinos ou sem eles,
me aborrecerem, o pau vai cantar e não vai parar mais... para este
trabalho nós aqui em Alagoas temos muita gente. Temos o Exército
Alagoano anticomunista”.

Silvestre Péricles, em pesquisa do professor e pesquisador


José Maria Tenório Rocha, mestre e pesquisador em Antropologia
Cultural

449
Mello Motta: ética na política

Lourival de Mello Motta (1906-1989), médico, jornalista e


deputado estadual e federal por três legislaturas (1934/1947/1950),
nasceu em Palmeira dos Índios, de onde saiu para assumir seu
primeiro mandato na Assembleia Legislativa em Maceió. Foi um
político que dignificou o mandato, com fatos marcantes como
repassar o seu salário de deputado para instituição de caridade,
vivendo de seus proventos de médico. Mello Motta foi sócio do
jornal Diário do Povo, que denunciava diariamente as violências
cometidas pelo poderoso clã dos Góis Monteiro. O jornal, que
tinha em sua redação Rui Palmeira, Aurélio Vianna, Lincoln
Cavalcanti, Otávio Lima, Genésio de Carvalho e Zadir Cassela, foi
destruído completamente pela truculência governista. Com
mudança de governo, no auge de sua carreira, Mello Motta
renuncia o seu mandato, que acabara de conquistar ao derrotar os
candidatos governistas. Ao ganhar na Justiça a ação de indenização
movida contra o Estado pela destruição do seu jornal, ele
discursou.

“Que não tornem os alagoanos a sofrer mutilações de ordem


moral ou política, na sua vida de povo livre, ou os que acabam de ser
varridos do poder pelo voto popular, ou por outro qualquer grupo
dominante que pretenda seguir o desgraçado exemplo”.
Pesquisa do professor Douglas Apratto Tenório, mestre e
doutor em história

450
Freitas Cavalcanti: presença na política nacional

Antonio de Freitas Cavalcanti (1908-2002), foi o deputado


mais votado por Alagoas, exercendo mandato na Câmara de 1945 a
1954. No Senado, onde exerceu mandato de 1954 a 1962, foi
membro da Mesa, tendo ocupado a 2ª Secretaria e presidido a
Comissão de Finanças. Freitas Cavalcanti também integrou os
quadros do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e membro
da Academia Alagoana de Letras, onde se tornou “um dos
guardiões da memória de seu povo”. Freitas Cavalcanti deixou a
carreira política para assumir o cargo de ministro do Tribunal de
Contas da União, que presidiu de 1966 a 1967. Orador eloquente,
este penedense saía do remanso de sua cidade para a agitação
política em centros maiores como Minas Gerais e Rio de Janeiro,
a capital da República, onde conviveu grandes nomes como
Juscelino Kubitscheck, Jânio Quadros, Eurico Gaspar Dutra, João
Goulart, e lideranças alagoanas como Arnon de Mello, Rui
Palmeira, Teotonio Vilela.

“O telurismo do Rio São Francisco marcou profundamente o


seu eu. O desenvolvimento da região sanfranciscana foi a razão
maior, em duas décadas, de sua atividade parlamentar. Encontramos
a presença do seu trabalho em inúmeras obras nas cidades
ribeirinhas do Velho Chico. A Codevasf (Companhia de
Desenvolvimento do Vale do São Francisco) teve nele um de seus
esteios”.

451
Por Divaldo Suruagy

Aurélio Vianna: na ponte Rio-Alagoas

Aurélio Vianna da Cunha Lima (1914-2003) nasceu no


município do Pilar. Estudou o curso primário no Grupo Escolar
Diegues Júnior, na Pajuçara, em Maceió. Após ser convertido ao
protestantismo e ingressar na Igreja Batista, estudou nos colégios
Batista do Rio de Janeiro e Salesiano, em Recife. Na capital
pernambucana também concluiu o curso de Contabilidade e o de
Filosofia. Logo cedo já estava envolvido na política, participando
da Esquerda Democrática e sendo eleito deputado estadual pela
Coligação UDN-PSB nas legislaturas 47-50 e 51-54. No final do
último mandato de deputado estadual, deixa a UDN e se filia ao
PSB e é eleito deputado federal (55-59). Na eleição seguinte, é
reconduzido à Câmara. Em outubro de 1962 é eleito senador pelo
Estado da Guanabara na coligação. No início dos trabalhos
legislativos em 1963, foi escolhido como líder do PSB. No Senado,
atuou por duas legislaturas, até 1971. Em 1965, candidata-se ao
governo da Guanabara, pelo PSB, porém sem êxito. Com a
extinção dos partidos pela ditadura militar, filia-se ao MDB, e é
eleito novamente senador pela Guanabara em 1966, assumindo a
liderança do partido em Brasília.

Título de eleitor impede reeleição


Nas eleições de 1970, após tentar a reeleição para o senado
pela Guanabara (hoje Rio de Janeiro), Aurélio Vianna foi impedido

452
pelo Tribunal Superior Eleitoral por ter título de eleitor registrado
em Alagoas. Volta para Maceió e tenta permanecer no Senado,
mas é derrotado. Como senador integrou as comissões de Assuntos
da Associação Latino-Americana de Livre Comércio e do Mercado
Comum Europeu, do Distrito Federal, dos Projetos do Executivo,
Relações Exteriores, entre outras. Ao fim do seu mandato, passa a
representar a UFAL e a UFPE, em Brasília. Aurélio Vianna ainda
foi professor em Maceió. Ensinou no Colégio Batista Alagoano e
na UFAL, como professor titular da cadeira de História da
Antiguidade e Idade Média. Faleceu em Brasília no dia 21 de
março de 2003.

Pesquisa de João Azevedo para o fascículo nº 25 de


Memórias Legislativas, publicação da Assembleia Legislativa de
Alagoas, 1998.

Arnon de Mello: jornalismo e política

Arnon de Mello (1911-1983) foi um jornalista, advogado,


político e empresário brasileiro, pai de Fernando Collor de Mello,
ex-presidente do Brasil, e de Pedro Collor de Mello. Estudou em
Maceió até mudar-se para o Rio de Janeiro em 1930, onde
trabalhou como jornalista em A Vanguarda, jornal fechado pela
Revolução de 1930. Advogado formado pela Faculdade de Direito
da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1933, trabalhou no
Diário de Notícias, Diários Associados, Diário Carioca e em O
Jornal. Em 1936 assumiu a direção da Gazeta de Alagoas e foi

453
membro do conselho diretor da Associação Brasileira de Imprensa.
Após o fim do Estado Novo ingressou na UDN e foi eleito
suplente de deputado federal em 1945. Por esta legenda foi eleito
simultaneamente deputado federal e governador de Alagoas em
1950, optando por este último cargo, onde cumpriu um mandato de
cinco anos. Retornou à vida política sendo eleito senador em 1962,
ingressando na Arena após a decretação do bipartidarismo pelo
Regime Militar de 1964. Reeleito pelo voto direto em 1970 foi
reconduzido ao mandato como senador biônico em 1978. Ao
falecer estava filiado ao PDS, no qual ingressou em 1980.

Tiroteio e morte no Congresso Nacional


Há 55 anos, um tiro entrava para a história do Brasil: no
plenário do Senado, em Brasília, no dia 4 dezembro de 1963, o
senador alagoano Arnon de Melo deu um tiro fatal que atingiu o
senador José Kairala, do Acre. O alvo dos tiros disparados por
Arnon era o senador alagoano Silvestre Péricles de Góis Monteiro,
ex-governador de Alagoas e inimigo público da família Collor. Ao
errar o alvo, Arnon acabou matando o suplente José Kairala, que
naquele fatídico dia comparecera ao plenário do Senado para seu
último dia de trabalho no exercício do mandato. De acordo com o
jornalista Claudio Humberto Rosa e Silva, em seu livro “Mil dias
de Solidão – Collor bateu e levou”, a arma do crime entrou no
plenário do Senado dentro da bolsa de dona Leda Collor, mulher
de Arnon. O trecho com essa informação está no segundo capítulo
do livro, que tratada da “Dialética do Trabuco”. Segundo o

454
jornalista, dez dias antes da posse de Arnon, em entrevista ao
jornal O Globo, em 21 de janeiro de 1963, Silvestre revelou que
iria impedir o ingresso do inimigo no Senado.

“Jurado de morte pelo desafeto Silvestre, que, de revólver


calibre 45 sempre no coldre, ameaçou recebê-lo no plenário à bala,
Arnon disse ao Jornal do Brasil, na véspera, 30 de janeiro, que
tomaria posse a qualquer custo, até com risco de vida. Apesar da
tensão, a solenidade de posse foi realizada sem incidentes, porque
medidas adicionais de segurança haviam sido tomadas.
Inconformado, Silvestre continuava a ameaçar Arnon de morte,
prometendo consumar o assassinato se o adversário tivesse a
‘ousadia’ de ocupar a tribuna do senado para fazer discurso”.

http://www.almanaquealagoas.com.br/noticias/?vCod=8146

Muniz Falcão: impeachment e volta ao poder

Sebastião Marinho Muniz Falcão (1915-1966), natural de


Ouricuri (PE) fez sua carreira política em Alagoas, como
governador do Estado e deputado federal. Estudante secundarista
em Crato ingressou na Universidade Federal de Pernambuco, mas
concluiu seu curso em 1947 pela Universidade Federal de Alagoas.
Advogado, jornalista e delegado regional do trabalho nos estados
de Alagoas, Sergipe e Bahia, sua carreira política teve início em
1950 quando foi eleito deputado federal. Foi eleito governador de
Alagoas em 1955 para um mandato de cinco anos. Como

455
governador sofreu um processo de impeachment, deflagrado por
opositores. Em 13 de setembro de 1957 foi marcada a votação do
impedimento, entretanto um novo confronto onde houve um
mortos e muitos feridos de parte a parte, que fez suspender a
sessão. A gravidade do fato foi levada ao presidente Juscelino
Kubitschek que decretou intervenção federal no estado em 15 de
setembro e no dia 18 os deputados estaduais aprovaram o
impedimento do governador que foi substituído pelo vice-
governador Sizenando Nabuco. Inconformado, Muniz Falcão foi
ao Supremo Tribunal Federal que o repôs no cargo em 24 de
janeiro de 1958.

“Muniz não era populista, como costuma ser tratado por


analistas políticos, mas popular. Ele era povo. Foi o primeiro
delegado regional do Trabalho, que defendeu os sindicatos de
operários e trabalhadores; outros delegados eram autoritários, e
controlados pelos barões da indústria açucareira. Tinha sempre um
pé atrás. A ideologia de Muniz era um mundo sem abismos, mas
sempre a favor dos mais necessitados. Como delegado do Trabalho
mexeu com muitos interesses da classe dominante, por isto o taxaram
de populista, de comunista. Naquela época era uma prática dos
reacionários colar o rótulo de comunista aos desafetos”,

Depoimento de seu secretário de Governo na época, Murillo


Rocha Mendes, no livro Vida, Amor e Trabalho, uma biografia,
2015, do jornalista Mário Fernando Lima.

456
Jogo do bicho financia obras sociais
Ao arrumar sua sala para começar a trabalhar, o secretário
de Governo do então governador Muniz Falcão, Murillo Rocha
Mendes descobriu algo inusitado. Em três gavetas, estavam
abarrotadas mais de 200 cartas fechadas e endereçadas ao
governador. Ao abri-las viu que se tratava de reivindicações e
pedidos, como tijolos e telhas. Mendes levou as cartas ao
governador, que adotou os pedidos com uma solução inimaginável.
Naquele tempo o dinheiro do Estado era curto e difícil. Aí o
governador Muniz Falcão decidiu usar o dinheiro do jogo do bicho
– uma contravenção aceita e acatada pelos governos, até hoje,
como é o caso de Alagoas. Todas as tardes, o oficial de gabinete do
secretário ia à sede onde se concentravam as apostas do jogo do
bicho, pegava o borderô e o dinheiro do resultado, e o depositava
em um banco. A conta para saldar os compromissos das cartas. O
próprio governador, em audiência com as pessoas, era entregava o
cheque.

“A arrecadação da verba da receita líquida era depositada


em uma conta que sustentava todo esse serviço de ajuda aos que
procuravam o governador. Era uma verba que não fazia parte do
orçamento, e a distribuição dela estava sob a minha administração, e
durou até o fim do governo de Muniz. Os repasses eram
administrados não só por mim, mas pelo governador, porque era ele
que autorizava os pagamentos, que eram controlados por mim, tudo
de forma equacionada e com muito rigor. Tenho guardado todos os
canhotos, para que depois não dissessem que me locupletei com o

457
jogo do bicho. Queria e fiz uma carreira com dignidade, honradez e
respeito".

Trecho do livro Vida, Amor e Trabalho, Murillo Mendes


uma biografia, do jornalista Mário Fernando Lima, 2016

Lamenha: o escolhido da ditadura

Antônio Simeão de Lamenha Lins Filho (1919-1997) foi um


político alagoano que exerceu o mandato de governador de
Alagoas. Desde 1966, quando o Estado de Alagoas era governado
por um interventor federal - o general João Batista Tubino - por
três vezes seguidas os governadores eram escolhidos pelos
militares e nomeados pela Assembleia, depois da indicação do
governo vigente. Foi assim com Lamenha Filho, e seus sucessores
como Afrânio Lages, Divaldo Suruagy e Guilherme Palmeira.
Usineiro e arrimo de família era membro do PSD e foi eleito
prefeito de sua cidade natal, São Luiz do Quitunde, em 1950, e
deputado estadual em 1954, 1958 e 1962. Nomeado governador
em 1966 pelo presidente Castelo Branco, após Muniz Falcão,
vencedor das eleições de 1965, que ganhou mas não levou. O
candidatp não atingiu a maioria absoluta de votos conforme
previsão constitucional vigente. Durante o seu governo, além do
salto na arrecadação, Lamenha e sua equipe deixaram marcas,
como a ampliação da eletrificação do estado e do abastecimento de
água encanada nas cidades do interior. Inaugurou obras
importantes como o Estádio Rei Pelé, o Matadouro Frigorífico de

458
Satuba, além de implantar a Escola de Ciências Médicas, a
Fundação TV Educativa. Em 1974 colocou seu nome à disposição
da Arena, partido do Governo Militar, como candidato ao Senado,
mas foi preterido em função da candidatura de Teotônio Vilela.

Afrânio Lages: o homem do general Garrastazu

O advogado, professor, jornalista e político alagoano


Afrânio Salgado Lages (1911-1990) foi escolhido governador de
Alagoas em 1970. Candidato a governador de Alagoas em 1955 foi
derrotado por Muniz Falcão (PSP), entretanto foi escolhido para
ocupar pela Arena, mediante escolha do presidente Emílio
Garrastazu Médici. Advogado formado em Direito na
Universidade Federal da Bahia em 1931. Em seu estado presidiu a
OAB e o Instituto dos Advogados de Alagoas. Membro do
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e da Associação
Alagoana de Imprensa. Afrânio iniciou carreira política como
deputado estadual (1935-1937), mandato extinto pelo Estado
Novo. Professor da Universidade Federal de Alagoas e diretor da
Faculdade de Direito, foi conselheiro do Tribunal de Contas do
Estado dirigiu a Carteira de Colonização do Banco do Brasil e a
Caixa Econômica Federal.

Divaldo Suruagy. O mais longevo político alagoano

O economista Divaldo Suruagy, nascido em São Luís do


Quitunde, em 1937, e que faleceu em março de 2015, governou o

459
estado de Alagoas por três vezes,: 1975-1978; 1983-1986 e 1995-
1997. Suruagy entrou na história mais por sua queda, no episódio
provocado pela revolta do servidores - em 17 de julho de 1997-
pelas condições em que estavam, salários atrasados em até cinco
meses. É segundo político alagoano que mais tempo ficou na vida
pública no Estado: 40 anos. O recorde é de Visconde de Sinimbú,
que passou por todos os cargos no Império. Funcionário público
municipal junto à prefeitura de Maceió, trabalhou como servente,
auxiliar de escritório e escriturário até se formar em Economia pela
Universidade Federal de Alagoas em 1959, e a seguir chefiar a
Divisão de Impostos Prediais e Territoriais. Foi presidente da
Central de Abastecimento e da Companhia de Silos e Armazéns de
Alagoas, tornou-se afilhado político do governador Luiz
Cavalcanti que o nomeou secretário de Fazenda, cargo ao qual
abdicou para disputar e ser eleito prefeito de Maceió em 1965,
naquele que seria o último pleito direto durante vinte anos.

Primeiro mandato
Cumprido o seu mandato, ingressou na Arena e foi eleito
deputado estadual em 1970, destacando-se tanto como líder da
bancada do governo Afrânio Lages. Tamanho afinco garantiu sua
escolha como cargo indicado de governador do Estado, "cargo
biônico", pelo presidente Ernesto Geisel em 1974, e sua gestão
como chefe do executivo assegurou sua eleição para deputado
federal em 1978.

Segundo mandato

460
Membro do PDS a partir de 1980, foi eleito governador em
1982, nas primeiras eleições diretas para governadores do país no
período da Ditadura Militar e, durante o curso de seu novo
mandato, apoiou a candidatura de Tancredo Neves à presidência da
República, e a seguir ingressou no PFL em 1986, ano em que foi
eleito senador.

Terceiro mandato
Em 1994 foi eleito para o seu terceiro mandato de
governador, quando já estava filiado ao PMDB. Entretanto, uma
situação de grave crise político-financeira forçou sua renúncia ao
cargo em 17 de julho de 1997, quando o seu vice-governador
Manoel Gomes de Barros - " o Mano", tomou as rédeas do poder
estadual.

Queda de Suruagy
Em 17 de julho de 1997, milhares de servidores públicos
protestaram contra a desvalorização dos trabalhadores ao então
governador Divaldo Suruagy. Eles reivindicavam melhoria nas
condições de trabalho nas repartições públicas e pela falta do
salário. Desesperados, muitos servidores cometeram suicídio
depois de seis meses sem receber salário, militares e civis se
uniram em um combate armado nas proximidades da Assembleia
Legislativa de Alagoas, que estava protegida pelas tropas do
Exército. Houve quebra-quebra nas ruas e, finalmente, aconteceu a
queda do governador Suruagy.

461
Guilherme Gracindo Soares Palmeira

Ministro aposentado do Tribunal de Contas da União


(TCU), Guilherme Palmeira nasceu em Maceió em 1938.
Governou Alagoas 1979 e 1982, sendo o responsável pela
nomeação de Fernando Collor como prefeito de Maceió, fato que
levaria este último a iniciar uma trajetória que o levaria a ser eleito
presidente da República num espaço de dez anos. Bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro em 1963, retornou ao seu estado, sendo eleito deputado
estadual pela Arena, em 1966, 1970 e 1974, licenciado-se para
ocupar a Secretaria de Indústria e Comércio no primeiro governo
Divaldo Suruagy. Indicado governador de Alagoas em 1978,
firmou um acordo para pacificar as correntes políticas arenistas,
em especial a liderada pelo senador Arnon de Melo, que conseguiu
a nomeação de seu filho, Fernando Collor, como prefeito de
Maceió. Extinta a Arena, Guilherme Palmeira ingressou no PDS e
foi eleito senador em 1982 derrotando Teotônio Vilela, um dos
próceres pela redemocratização do Brasil. Eleitor de Tancredo
Neves no Colégio Eleitoral em 1985, cerrou fileiras no PFL e foi
eleito presidente nacional do partido em 1986. Disposto a
recuperar seu capital político foi eleito prefeito de Maceió em
1988, mandato ao qual renunciou em 1990 quando foi eleito para o
seu segundo mandato como senador.

Ronaldo Augusto Lessa Santos

462
Ronaldo Lessa nasceu em Maceió em 25 de abril de 1949,
governou o Estado de Alagoas por dois mandatos, em 1998,
reelegendo-se em 2002 vencendo o ex-presidente Fernando Collor.
Formado em Engenharia Civil pela UFAL, Ronaldo Lessa
trabalhou em obras como a reforma da refinaria de petróleo de
Duque de Caxias, do terminal marítimo da baía de Ilha Grande, do
metrô do Rio de Janeiro e da Ponte Rio–Niterói. Eleito em 1982
deputado estadual em Alagoas pelo PMDB, candidatou-se ao
governo daquele estado em 1986, ficando em terceiro lugar. Elege-
se prefeito de Maceió em 1992, apoiando Kátia Born como sua
sucessora. Em fevereiro de 2005, adere ao PDT pelo qual
disputaria a eleição de 2006 ao Senado Federal. Seria derrotado
pelo ex-presidente da República Fernando Collor. Nas eleições de
2010 disputa novamente o governo alagoano, onde alcança o
segundo turno mas é derrotado por Teotonio Vilela Filho.

Teotonio Brandão Vilela Filho

O economista Teotonio Vilela nasceu em Viçosa, 29 de


janeiro de 1951, governou o Estado de Alagoas em dois mandatos:
2006 e 2010. Nasceu em berço político, como filho do “menestrel”
Teotônio Vilela, símbolo nacional da luta pela redemocratização e
pela anistia. Formado em economia pela Universidade de Brasília,
com especialização em Administração de Empresas pela Fundação
Getúlio Vargas. Teotonio estreou na política como o mais jovem
senador da República, aos 35 anos, em 1986. Dois anos depois,
1988, ele foi um dos fundadores do Partido da Social Democracia

463
Brasileira, o PSDB. Entrou para a história política de Alagoas
como o único político do estado a ser eleito, por três vezes
consecutivas, para o Senado: 1986, 1994, 2002 e legislou até o
final de 2006. Já no primeiro mandato, destacou-se como uma das
100 cabeças pensantes do Congresso Nacional, por sua atuação
durante a elaboração da Constituição de 1988.

Renan Filho

José Renan Vasconcelos Calheiros Filho, nascido em


Murici, em 1979, é um político alagoano filiado ao PMDB, e atual
governador de Alagoas. Foi eleito prefeito do município de Murici,
em Alagoas, nas eleições de 2004, sendo reeleito em 2008. Nas
eleições de outubro de 2010 foi eleito dputado federal, sendo
naquele pleito o candidato mais votado de Alagoas. É filho do
senador Renan Calheiros, com Maria Verônica Rodrigues
Calheiros. Em outubro de 2014, foi eleito em primeiro turno
governador de Alagoas com 52,16% dos votos válidos.

464
CULTURA POPULAR/ SABERES

“Estão se tornando cada vez mais escassos os grupos


folclóricos provenientes do ciclo dos engenhos do Nordeste. É natural
que assim seja, porquanto lhes falta a dinâmica de sua fonte
inspiradora. Falta-lhes o suporte da aristocracia rural de outrora.
São manifestações híbridas, estáticas. Perderam o seu conteúdo
social. Não mais contribuem para o fortalecimento e permanência do
sistema vigente. Para que esta herança cultural permaneça, ao menos
representativa, são criados atualmente grupos folclóricos em escolas

465
e associações, bem como ainda recebem incentivos de instituições
culturais e turísticas uns poucos remanescentes dos chamados
“grupos autênticos”, embora deslocados de seu tempo e de sua
função social”.

Cármen Lúcia Dantas, em Aspectos da Cultura Popular de


Alagoas, Universidade Federal de Alagoas – 1987

Folclore & Folguedos

“Por mais que tenha de ser acidentado o caminho do Brasil


através dos tempos, quaisquer que tenham de ser as desilusões que os
destino históricos lhe reservem, o nosso há de sobreviver no futuro, e
lá bem longe, quando os sondadores do passado houverem de
rastrear o fio de ouro de nossas tradições, não farão no ruído das
batalhas, ou nas gincanas políticas, mas sim nas efusões da alma, nas
energias do sentimento, em nosso folclore”

466
Sílvio Romero, no prefácio do livro Festas e Tradições
Populares, de Melo Morais Filho

Os ciclos do folclore alagoano

O Boletim Alagoano do Folclore, organizado pela Comissão


Alagoana de Folclore (CAF), na edição especial dos 53 anos de
atividade, 2001, mostra o artigo Sistematização do Folclore
Alagoano, do professor e folclorista, Théo Brandão. Na
publicação, ele divide e classifica o folclore e os folguedos de
Alagoas em ciclos. O Marítimo ou Costeiro, o Agrícola e o
Pastoril, ou Sertanejo. Dos folguedos populares de Alagoas vejam
os mais significativos.

Reisado

Auto popular profano-religioso, formado por grupos de


músicos, cantores e dançadores que vão de porta em porta, no
período de 24 de dezembro a 06 de janeiro, anunciar a chegada do
Messias, homenagear os três Reis Magos e fazer louvação aos
donos das casas onde dançam. De origem portuguesa, sua principal
característica é a farsa do boi que constitui um dos entremeios,
onde ele dança, brinca, é morto e ressuscita. O traje são saiotes de
cetim enfeitados com fitas douradas e prateadas, coletes com
espelhos aplicados e camisa branca. Os personagens: rei, rainha,
mestre, contramestre, embaixadores, mateus, catirina, palhaço.

467
Ó que noite linda, raiou a lua
Ela flutua no céu azulado;
Mimosa istrêla vem dispontando,
Ela vem guiando nosso Reisado.

Ó que noite linda, raiou a lua


Ela flutua na imensidão
Mimosa istrela vem dispontando
Ela vem guiando nossa fonção.

Música colhida por Théo Brandão, publicada em seu livro O


Reisado Alagoano, Edufal 2007. O livro original foi publicado em
1951, e ganhou o prêmio Mário de Andrade de livro do ano.

Guerreiro

Théo Brandão classifica o Guerreiro como sucessor e “alter-


ego” do Reisado. O folguedo Guerreiro é característico de Alagoas
e o mais apreciado, por ser também o mais rico, o mais colorido, o
mais bonito e por isso mesmo o mais frequente nas festas
populares. Surgiu em Alagoas entre os anos de 1927 e 1929, sendo
resultado da fusão do Reisado alagoano e do antigo e desaparecido
Auto dos Caboclinhos, da Chegança e dos Pastoris. Possuem em
média 36 personagens entre rei, rainha, mestre, contramestre,
palhaço, índio Peri, cboclinho da lira, estrela de ouro, banda da lua
e estrela republicana.

468
“Quanto é deslumbrante a apresentação de um Guerreiro! A
beleza das vestes, de cores variadas, o esplendor dos chapéus, das
coroas, dos diademas, cheios de espelho, de contas de aljofre, de
fitas, de areia brilhante, trazendo formatos exóticos, copiando o feitio
de igrejas e mesquitas orientais. E a melodias dos cantos, a dinâmica
da difícil coreografia, o gingado do corpo, a agilidade das figuras na
parte da Guerra, do Índio Peri, da Sereia, da Lira e dos
“Caboclinhos da Lira”:

“Vamos matar nossa Lira,


Antes que ela venha do porto
Não cabem duas rainhas
“Nessa aldeia de caboclo”

Pedro Teixeira de Vasconcelos, em Transição: reisado X


guerreiro, Boletim Alagoano de Folclore, nº 1 – 2001

Guerreiro!
Cheguei agora
Nossa Senhora é nossa defesa
menina me dê um beijo
só não quero no pescoço
quero no bico do peito
que é lugar que não tem osso.

Guerreiro!
Cheguei agora

469
Nossa Senhora é nossa defesa
tristeza pode ir "simbora"
neste terreiro
ninguém sofre
ninguém chora

Ô minha gente!
dinheiro só de papé
carinho só de mulhé
capitá só Maceió

Cancioneiro popular alagoano

Mestras do Guerreiro

Nenhum folguedo se iguala ao guerreiro em matéria de


animação nos passos de batida forte, nos gestos e nas ações. Ainda
mais quando quem comanda a brincadeira são as rainhas
guerreiras, que tem uma forte tradição em Alagoas. Nomes
emblemáticos como Maria Odilon, Zeca Bispo, Joana Gajuru e
mestra Virginia, que abrem a voz para fazer sua estação:

Eu sou a mestra Virgínia


Eu sou a rainha do fogo
Eu sou a dona dos raios
E do corisco e do trovão
Todos me prestem atenção

470
Eu vou vencer minha batalha
Á vista de Santa Bárbara
Com o cálice na mão

Boa noite meus senhores


Boa noite eu venho dar
Que a Gajuru falada
Chegou hoje no lugar.
Pega a peça figurá
Verde, encarnado, azul
Guerreiro da Gajuru
Ta em primeiro lugar

Pastoril

É o mais conhecido e difundido folguedo de Alagoas. É


uma fragmentação do Presépio, sem os textos declamados e sem
diálogos, constituídos apenas por jornadas soltas, canções e danças
religiosas ou profanas de épocas e estilos variados. Como os
Presépios, origina-se de autos portugueses antigos, guardando a
estrutura dos Noéis de Provença, França. As pastorinhas dividem-
se em dois cordões, o azul e o encarnado e no centro fica a diana,
que defende os dois partidos.

“Eu sou a mestra do cordão encarnado,


O partido eu sei dominar,
Eu peço palmas, peço fitas e flores

471
Aos meus senhores peço proteção.

Azul é o céu,
Azul é o mar,
Azul é a rainha
Que vamos coroar!

Estrela do Norte,
Cruzeiro sagrado,
Vamos dar um viva,
Ao cordão encarnado

Sou a Diana, não tenho partido,


O meu partido são os dois cordões,
Eu peço palmas
Peço fitas e flores
Ô meu senhores sua proteção

Adeus minha gente,


Queiram me desculpar,
Que a nossa jornada,
Já vai terminar!
Adeus, é tarde,
Já vamos partir.
O dia amanhece
Preciso dormir!

472
Presépio

O Auto, também conhecido como pastoril dramático ou auto


das pastorinhas, é apresentado em três atos que versa sobre o
nascimento de Jesus Cristo. Origina-se dos antigos autos
portugueses que eram formados de dramatização medieval, entre
os figurantes estão a mestra, contramestra, Diana, caçadora,
pastores, anjo Gabriel e Lusbel.

Estrêla do Norte
Cruzeiro do Sul,
Viva a cor do céu –
O celeste azul.

Quando raia a aurora


Quando o dia luz
Lindo, o cor de rosa
É o que mais seduz,

Théo Brandão, em Folguedos Natalinos Chegança,


Coleção Folclórica da Ufal - 1976

Chegança

Auto de temática marítima versando temas vinculados à


vida no mar, às dificuldades como tempestade, contrabando, briga
entre marujos e lutas entre cristãos e mouros infiéis, seguidores de

473
Maomé. Deriva-se das “mouriscadas” peninsulares ou das lutas e
danças entre cristãos e mouros da Europa. É de origem ou
aculturação européia.

No dia segunda-feira
Que esta nau parti queria
Na terça embarca os marinhêros
Na quarta a munição e artilharia.

Choram belas alagoanas


Neste embarque arrigoroso,
Militá e marinhêros
Que são homes caprichosos

Adeus, adeus, Alagoas


Saudade eu vou levar
De nossa pátria querida
De nossa terra natá,
Vamos marchá para a guerra
E vê o má de Lisboa.
Adeus, adeus, Alagoas
Até quando eu vortá.

Théo Brandão, em Folguedos Natalinos Chegança,


Coleção Folclórica da Ufal 25 - 1976

Fandango

474
Auto de assunto marítimo que corresponde a Marujada,
Barca e Nau Catarineta de outros Estados brasileiros. Não possui
enredo ordenado e lógico. É apresentado em um barco construído
em terra, com palanque, onde são entoados cantigas náuticas de
diversas épocas e origens. Possui nítida formação portuguesa.

Baianas

Grupos de dançadores trajados com vestes convencionais de


baianas, que dançam e fazem evoluções ao som de instrumentos de
percussão. Constitui uma modificação rural dos maracatus de
Pernambuco com elementos dos pastoris e dos cocos com a
denominação de Samba-de-Matutu ou Baianal. Não possui enredo
determinado. As baianas cantam uma sequência constituída de
marchas de entrada ou abrição de sede, peças variadas e, por fim, a
despedida.

Baianas vamos saudar,


Nossa tia Marieta
A dona deste lugar
E a maio deste planeta.

A nossa estima por ela,


É grande, de mais valor
E a alegria nossa é dela,

475
E todo esse nosso imenso amor.

Quilombo

Não existe, de nenhum modo, ligação entre o fato histórico


dos Quilombos dos Palmares com o folguedo. O Quilombo é uma
adaptação local ou uma reinterpretação de origem branca e erudita
de danças brasileiras e européias que demonstram lutas ora entre
negros e brancos ou, mouros e cristãos ou negros e índios
(caboclos). O auto é apresentado em barracas ou ranho de palha,
enfeitado com bandeirinhas e realiza-se em três etapas. É
acompanhado pelo som do Esquenta Mulher (banda de pífano).

Folga negro,
Branco não vem cá,
Se vier,
Pau há de levar.

Folga negro,
Branco não vem cá
Se vier,
O diabo vai levar

Cavalhada

476
Desfile, corrida de cavalos e jogos de argolinha, realizado
em amplas praças próximas às igrejas. Teve origem nos torneios
medievais, tendo como participantes doze cavalheiros ou pares que
são divididos em cordão azul e encarnado. As cavalhadas são
encontradas em quase todos os municípios de Alagoas e se
apresentam por ocasião do Natal ou festas de Santos.

“À tarde, devidamente paramentados, em dupla fila, marcham


os cavaleiros compassadamente ao som da orquestra regional de
pífanos e zabumba denominada “Esquenta Mulher”, com direção à
capela ou igreja mais próxima. Chegados à sua frente, fazem a
saudação ritual, tirando os gorros, benzendo-os, benzendo-se,
arrancando as facas das bainhas e beijando-as como sinal de
fidelidade à religião que professam. Desmontam e seguida dirigem-se
ao altar para depositar seus buquês, para felicidade ao torneio que
vai começar... A torcida do azule do encarnado, de um lado e do
outro da pista, mesmo arrostando a seus cavaleiros, pula, berra, joga
chapéus ao ar quando seus favoritos conseguem fazer a lança, isto é,
colher a argolinha... consistem as carreiras de argolinhas em
procurar o cavaleiro em disparada, enfiar a lança no anel de ferro,
recolhendo-a da garra”.
Théo Brandão, em Folguedos Natalinos Taieiras,
Coleção Folclórica da Ufal 32 - 1976

Folguedos Carnavalescos

477
Essas manifestações são resíduos importantes dos folguedos
natalinos alagoanos - em alguns casos havendo transposição direta
- como é o boi-de-carnaval, que foi extraído de entremeios dos
guerreiros e dos reisados. As músicas tocadas têm ritmo forte,
contagiante, algumas são chamadas de “pancadas-motor”.

Boi de Carnaval
Boi feito com armação de madeira e coberto com tecido
vistoso ou chitão. Sai às ruas durante os três dias de carnaval
fazendo pedidos de dinheiro, de bebida ou vendendo o boi. Sua
origem é européia, africana e ameríndia. Os bois que surgem em
Alagoas recebem influência dos bumbas, reisados e guerreiros.

Ursos de Carnaval (La Ursa)

Grupos de carnavalescos que saem às ruas brincando com


um urso feito de estopa e fibras vegetais. Sai da sede e dança de
porta em porta fazendo pedidos de dinheiro, bebidas e gêneros
alimentícios.

Os Gigantões (Bonecas)

Bonecas gigantes que possuem de dois a três metros de


altura. Veste-se com tecido colorido de chitão. De origem européia
são comuns em procissões e festas. A boneca é conduzida por um

478
homem localizado no seu interior. O cortejo é formado ainda pelos
tocadores e eventuais participantes.

Cobra Jararaca

Grupo constituído de dez a quinze pessoas que trajando


short, lambuza-se com tintas e pós e brincam durante o carnaval
amarrados por uma corda. A brincadeira foi criada por um
pescador chamado Mané do Balaio há muitos anos passados.

Toré de Índio

De aculturação indígena, os caboclos dançam em círculos,


fazendo movimentos coreográficos simples e ritmados para
agradecer e agradar as divindades ou para rezar suas orações.
Dá-lhe toré
Dá-lhe toré
Faca de ponta
Não mata mulher

Toré de Xangõ

De origem indígena, o toré é prática de terreiro afro-


brasileiro. Corresponde ao catimbó e a pajelança de outros
Estados. É a reunião dos crentes com a finalidade de encontrar

479
remédios para os doentes, que são recebidos através dos caboclos
que “baixam” e receitam ao som dos maracás. Como manifestação
folclórica, comparável no sentido de apresentações, a um folguedo
qualquer, um reisado, um guerreiro, etc.

Negras da Costa

Dança cortejo, sem enredo ou drama, formada por homens


vestidos com trajes convencionais de baianas, que dançam ao som
de ganzás e reco-reco. São adaptações alagoanas dos maracatus
pernambucanos, sem nenhuma ligação com as religiões afro-
brasileiras.

Ô raia o sol,
Suspende a lua,
Negra da Costa
Quem anda na rua!

Ô tuê, ô tuê
Ô tuê, ô tuá
Negra da Costa
Mandou me chamar!

Abra a roda, yoyô


Abra roda, yayá
A Negra da Costa
Chegou pra brincar

480
Samba-de-Matuto

Dança cortejo, sem enredo ou drama, na qual as cantigas


dançadas fazem referência a Santos católicos, a espíritos das
religiões afro-brasileiras e as cenas do cotidiano. Possui
identificação com os terreiros de xangôs. Antes de cada
apresentação o mestre acende três pontos de velas para que os
orixás permitam o bom andamento do folguedo.

Eu ontem fui à a maré


Fazer uma pescaria
Quando amanheceu o dia
Ia arribando até

Na cabeça da galé
Aboiou um cação
Ouvi o nome de Tião
Namorador de Zezé.

Acredite se quiser
Tire o meu cartaz de bamba
O meu fracasso é o samba
E carinho de mulher

Canção de Mestre Amaro

481
Caboclinhas

Dança cortejo, sem enredo ou drama semelhante aos


baianais e samba-de-matuto. Os personagens trajam-se com
reisados e cantam fazendo referência a caboclas, temas do
cotidiano e de amor acompanhados por bandas de pífanos. Não
possui influência ou ligação com os caboclinhos de Pernambuco.

Estava na beira da praia


Vendo a maré que fazia
Quando eu ia, ela voltava
Quando eu voltava, ela ia.

Dei laço na fita verde


Dei outro na verde rama
Benzinho você não sabe
Quem é cativo não ama
Folguedos de festas religiosas

No calendário cultural do Estado de Alagoas vamos


encontrar as Festas de Santos Católicos. Essas festas, geralmente
montadas na Matriz local, contam, além da parte religiosa (missas,
novenas, procissões), com quermesses, leilões, jogos de azar,
bares, etc. Contam também com a presença de folguedos oriundos
do período natalino e carnavelesco.

Mané do Rosário

482
Grupo de mulheres e homens mascarados que dançam,
pulam e se requebram ao som da dança de pífanos. Surgiu em
1762, durante a festa em homenagem ao Santo quando apareceram
dois mascarados que brincavam e dançavam na porta da Igreja.
Todos os anos, por ocasião da festa, sugiram os mascarados e
ninguém conseguia saber quem eram. Em 1776, sumiram. A
comunidade resolveu copiar os trejeitos e as danças e, como não
soubessem o nome da brincadeira, atribuíram o fato ao morador
Manoel do Rosário, pessoa que gostava de dançar reisado e
maracatu.

Chegamos na porta da Igreja


Para louvar o senhor São José
Com o nosso Mané do Rosário
Até para o ano, se Deus quiser!
Ele haverá de querer!

Bandos

Grupos de mascarados, uns a cavalos, outros a pé, que


fazem corridas pelo povoado anunciando, com antecedência a festa
do Santo (Santa Luzia) que irá acontecer em breves dias. O grupo
corre e dança ao som do Esquenta Mulher e participam da
procissão e convocam o povo a participar da festa.

Maracatu

483
Dança processional e cortejo real, parte dos reinados dos
congos. A palavra maracatu é de origem africana que significa
dança ou batuque. O Maracatu pernambucano penetrou com tanta
intensidade em Alagoas que criou formas alagoanas dessa
manifestação, assim como as cambindas, o samba-de-matuto, as
negras da costa, baianas e as caboclinhas.

Ê, ê, ê, maracatuê
Baiana do Centro todos venham vê.

Cantemos, cantemos, maracatuê


Cambindas do Pôrto todos venham vê.

Brilha o só e brilha a lua


E brilha as Cambindas hoje na rua.

Cambinda Nova que guerra venceu:


Foi Pôrto-Rico que apareceu.

Cantou, canto, ó meu meu secretaro,


Cambindas do Pôrto é da Pajuçara.

A estrêla d´arva e quem vem coroando


Cambinda do Pôrto é quem vai brilhando.

Théo Brandão, em Folguedos Natalinos Maracatu,

484
Coleção Folclórica da Ufal 21 - 1976

Taieiras

Dança cortejo de caráter religioso afro-brasileiro que faz


louvação a São Benedito e Nossa Senhora do Rosário, padroeiros
dos pretos. De aculturação africana, ligados aos reinados dos
congos e estrutura na época da escravidão, seus principais
personagens são: rei, rainha, mateu, catirina, crioula, figural e
africanas.

Taiêiras do Pôrto
Foi quem nos guiou,
Estrela do céu
Foi quem nos coroou

Dançai, taiêirinhas,
Na ponta do pé,
Fazei cortezia
Ao sinhô São José

Théo Brandão, em Folguedos Natalinos Taieiras,


Coleção Folclórica da Ufal 28 - 1976

Bumba-meu-boi

485
Auto popular de temática pastoril que tem na figura do boi o
personagem principal. Aparece em todo o Brasil com nomes
parecidos. Em Alagoas a apresentação do Bumba é semelhante a
um teatro de revistas, com desfiles de bichos ao som de cantigas
entoadas por cantadores do conjunto musical que faz o
acompanhamento.

A chã de dentro,
É pra seu coroné.
A chã de fora
É pra dona Aurora.
A passarinha
é de dona Aninha.
O coxão,
É pra seu João.
Mocotó do pé
É pra seu Zé.
Mocotó da mão
É pra seu Lesbão.

Os miúdos
É pra seu Joca.
Os miolo
É pra Mané Crioulo.
A aparação
É pra seu Tubarão.
A rabada

486
É pra negrada.
A tripa gaiteira
É pra dona Eleuza.
A tripa fininha
É pra dona Chiquinha.
O figo do animal
É pro pessoal.
Resta pouco pra repartir
Tou com pressa pra sair.

Embaixada colhida por Abelardo Duarte, em Taperaguá,


Marechal Deodoro

Marujada

A marujada que aparece em Alagoas possui elementos de


folguedos náuticos, reisados, taeiras, pastoris etc. Por ser variante
do Fandango, possui origem lusitana, juntando-se a outras culturas.

Cambinda

Dança-cortejo, sem enredo ou drama, na qual as cantigas


dançadas fazem referências a assuntos do cotidiano e santos
católicos. Embora cultuem São Benedito, nos cânticos não há a
menor referência a seu nome, nem o grupo possui ligações com as
religiões afro-brasileiras. Cambindas são sinônimos ou adaptações

487
alagoanas dos Maracatus de nação, oriundos de Pernambuco,
penetrados em Alagoas através dos municípios da região norte do
Estado. Cabinda, Cambinda ou Kabenda, segundo Mário de
Andrade, era um reino de gente africana próximo de Loanda,
Angola. Nina Rodrigues identifica os Cambindas aos conguenses.

Coco Alagoano

O Coco alagoano é uma dança cantada, sendo acompanhada


pela batida dos pés ou tropel. Também é denominada de Pagode ou
samba. Surge na época junina ou em outras ocasiões que se quer
festejar acontecimentos importantes nas comunidades rurais. Por
ocasião da tapagem de casa, o coco aparece em todo o seu
esplendor. Tem origem africana, filiada ao batuque angola-
conguense. Talvez tenha surgido na zona fronteiriça de Alagoas e
Pernambuco, no cordão de serras ocupadas no século XVIII pelo
célebre Quilombo dos Palmares. Dessa região espalhou-se por todo
o Nordeste, onde recebeu nomes e formas coreográficas
diferentes, como: Coco Praieiro, na Paraíba; Bambelô ou Coco de
Zambê, no Rio Grande do Norte; Tará ou Coco de Roda, em
Pernambuco; Samba de Aboio e Samba de Coco, em Sergipe.

“Em breve chegou uma dessas noites de luar do Norte. Lula


saiu para ver a noite. Andou, andou; parou numa casa de esquina
onde dançavam o coco. O ganzá animava os pares suarentos: um
negro cantador tirava a embolada, e a macacada, homens e
mulheres, de mãos pegadas, davam umbigadas bem unidos um no

488
outro, e depois sob o ritmo da dança se esbarravam em novas
umbigadas nos demais pares que compunham a roda. A embolada do
preto era como toda embolada uma lambança em que se prometia
fazer e acontecer. Vinha um pituim enjoativo, misturado de Oriza, lá
dentro, mas as palmas e o sapateado cadenciado eletrizavam o
pessoal que respondia ao refrão”.
Jorge de Lima, em Calunga – Editora Alba (RJ) 1943 – 2ª
edição

Dança de São Gonçalo

Dança religiosa de origem e aculturação portuguesa,


inicialmente apresentada nos templos religiosos católicos, com o
objetivo de catequizar os pecadores. Foi considerada de caráter
mundano, sendo proibida pelas autoridades, passando a ser cantada
e dançada nas zonas rurais, onde ainda hoje é aceita e praticada.
Tem como personagens o Mestre, tocador de viola; o Contra-
Mestre, tocador de meia-cuia ou meia cabaça, dois Guias que são
sempre os segundos de cada cordão e os demais participantes
dançadores, todos vestidos de brancos, com quepes e turbantes. Em
Alagoas, a dança, oriunda do estado da Bahia, encontra-se no
município de Água Branca, tendo como mestre José Ricardo dos
Santos, Mestre Deca, que preserva o único grupo existente no
estado.

MESTRES DO PATRIMÔNIO VIVO

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*Textos dos jornalistas Telma Elita, Wellington Santos, Paula
Newton e Larissa Bastos editados e condensados, da série
“Patrimônio Vivo: Mestres da Cultura Alagoana”, publicada
originalmente no Diário Oficial do Estado de Alagoas, entre 2009 e
2011

Registro do patrimônio vivo

Alagoas valoriza seus artistas populares, seus mestres e


mestras do guerreiro, do reisado, quadrilha, pastoril, coco de roda,
chegança, as baianas; os homens e mulheres do barro, do bilro, da
madeira, a música do pífano, viola, rabeca. Esses heróis da cultura
popular, em carne e osso, e do alto de sua sabedoria, desvendam
histórias de vida e trabalho. Vestem suas mais belas roupas para as
justas homenagens: o reconhecimento histórico do ofício de
Mestre. Uma herança viva, para a posteridade dos rituais, canções,
poesias e a cena teatral. Eles e elas integram uma galeria
esplendorosa – um naipe de ouro do folclore – protegidos pela lei
estadual nº 6.513, do Registro do Patrimônio Vivo (RPV), que
desde 2004 já selecionou mais de 40 mestres detentores dos
conhecimentos e das técnicas necessárias para a preservação da
cultura tradicional ou popular da terra dos Caetés.

490
Nelson da Rabeca - luthier e rabequeiro
Marechal Deodoro

De ex-cortador de cana ao Jô Soares.


A história de Nelson dos Santos, o Nelson da Rabeca, bem
que poderia ser a de um filme. Aos 54 anos, o cortador de cana viu
na televisão um homem a tocar violino. Ele quis fazer igual. Foi no
meio do mato, arranjou madeira e construiu, a seu modo, um
instrumento. “O som não era muito bom”, avalia. Passadas quase
três décadas, Nelson da Rabeca é músico conhecido no país inteiro.
Foi ele mesmo que apareceu na TV, como rabequeiro, no
Programa do Jô, na Rede Globo. A sonoridade de Seu Nelson é
admirada por instrumentistas dos quatro cantos e até sua rabeca
ganhou nome entre os estudiosos, chama-se Deodora. Nelson da
Rabeca é da terra dos marechais. Quando questionado sobre a
idade, responde, meio sem jeito: “Não sei. Acho que 83”. Além do
violino, o mestre carrega uma ingenuidade que cativa. É generoso
no riso. Ele se diz grato pela vida que leva hoje: longe da lavoura,
com uma casinha e a música, de companhia.

“Esse homem quando começa com a rabeca, não para mais”,


entrega Benedita Duarte dos Santos, esposa do artista. O casal está
junto há 50 anos. “Quando ele disse que ia fazer um violino, a gente
não acreditou. Todo mundo ‘mangou’ e veja só, conseguiu”.

491
O homem que faz música da madeira
Se a alma é música, que a casa seja um pedacinho dela
também. Na entrada de Marechal Deodoro, todos sabem onde
mora o instrumentista. “A casa de Seu Nelson fica logo mais na
frente, é laranja com verde, tem porta marrom e uma rabeca em
cima”, foi essa a descrição de um ciclista anônimo. Da calçada, já
se ouve o som da Deodora. “Podem entrar, fiquem à vontade”, diz
Nelson da Rabeca. As visitas são levadas logo para um quarto,
fechado a chave. Porta aberta, o mundo de Nelson à vista. As
paredes estão cobertas de fotografias. O homem é mesmo uma
celebridade. No canto do quarto, um baú, também trancado. Findo
o mistério, o tesouro impressiona: muitas rabecas. O trabalho como
luthier começa cedo, no quintal. “Às 5 horas, eu já estou aqui,
fazendo rabeca. Eu passo meu dia cortando madeira, serrando. As
ferramentas fui eu mesmo que construí”, conta.

Maria Flor dos Santos - mestra Guerreira


Maceió

A guerreira dos colares e dos anéis

Há mais 70 anos, Maria Flor dedica a vida ao guerreiro. Foi


estrela de ouro, rainha e mestra. Hoje, embala a tataraneta com
canções do folguedo. Maria Flor dos Santos é mulher vaidosa. Aos
79 anos, não abre mão dos anéis nem dos colares. As unhas estão
sempre bem pintadas. É uma rainha. Já foi também estrela de ouro
e por último, mestra. Tem saber reconhecido pela Lei do

492
Patrimônio Vivo de Alagoas. Desde menina, dedica a vida ao
guerreiro. Nascida no Engenho Prazeres, na cidade de Flexeiras,
Maria Flor, com 10 anos, começou a brincar no folguedo.
“Ninguém na minha família dançava. Só eu. Muito nova, fui
estrela de ouro e rainha. As meninas tinham inveja de mim”,
lembra. Pouco tempo depois de chegar a Maceió – “com 20 e
poucos anos” –, foi participar do grupo de Jorge Ferreira, em Chã
de Bebedouro. Nesse, passou dois anos. Mas era preciso criar o
próprio guerreiro, ser a dona da brincadeira. Há 25 anos, ela criou
o Guerreiro Vencedor Alagoano, na Chã da Jaqueira. E já tem
sucessoras na famíla.

Dona Flor, como é mais conhecida, vive hoje com uma


bisneta e a única tataraneta, a pequena Rita de Cássia, seu xodó.
“Ela canta toda manhã, só músicas do guerreiro. Os meninos
enchem a casa e ela se distrai, brinca com eles, lembrando das
apresentações”, revela a neta, Aurizete Flor dos Santos.

Clarice Severiano dos Santos 1934-2012


Rendeira de bilro - São Sebastião

Dona Clarice, as mãos que tecem renda

Dona Clarice é uma mestra consagrada. Desde ficou


conhecida na cidade de São Sebastião – onde dava aulas de bilro
com a arte, vendia peças pelo Brasil. A renda de bilro é uma
tradição no município de São Sebastião, localizado a 100 km de

493
Maceió. A prefeitura do lugar mantém até uma escola para que a
arte não se perca. Na sala de aula, estão meninas entre 8 e 12 anos,
e mulheres, poucas, que ainda teimam em aprender o ofício. Para
todas, Clarice Severiano dos Santos, 74, é exemplo. Não há quem
não a conheça na cidade. A mestra, uma profissional de longa data,
diz que já passou um ano para fazer uma colcha. Além dessa dança
de bilros, levada por mãos habilidosas, a rendeira dá aulas na
escola. É professora exigente. “A peça para ficar boa é preciso
firmeza. Os pontos têm que sair bem fechados, senão a renda fica
frouxa.” As peças dela, feitas com muito primor, são vendidas
pelos quatro cantos do país. O talento garantiu até um encontro
com o empresário Roberto Marinho, já falecido.

“Ele viu meu trabalho numa revista. Gostou e me convidou


para fazer parte da Feira da Providência, em 1984. Eu fui para o Rio
de Janeiro por conta da Globo. Era um luxo só. Tinham artesãos do
Brasil todo. Na abertura, ele foi lá nos conhecer. O homem era uma
simpatia, muito distinto”.

Arte é repassada para filhas e netas


No cotidiano, a força de vontade de Dona Clarisse
impressiona. Ela faz renda todo dia. Com essa peleja toda, a vista e
a coluna reclamam. “As costas doem. Passar o dia inteiro sentada
nessa cadeira não é brincadeira.” Os óculos ficam bem rentes ao
rosto. São aliados inseparáveis. O ofício foi repassado às três
filhas, Maria, Josefa e Djenalva, e à neta, Amélia.. Quanto aos
bilros – as peças de madeira, que mais lembram piões –, a mestra

494
conta que podem chegar até 180. Para dar sustentação a todas essas
ferramentas, um tamborete, com os pés para o alto. Interessante
também são os nomes dos pontos. As alunas sabem de cor: olho de
pombo, tracinho, bico Ester, feixe de lenha. Tem também o dedo
do cão, mas Dona Clarice pede que esse não seja pronunciado. “É
feio, preferimos dizer Serra de Catatu”,

“Com 8 anos, eu já colocava as meninas para aprender o


bilro. Segui a lição da minha mãe, Maria das Dores. Criança, eu já
ganhava meu dinheirinho. Comprava boneca, casinha. A peça para
ficar boa é preciso firmeza. Os pontos têm que sair bem fechados,
senão a renda fica frouxa”.

Djalma José de Oliveira - Mestre Jayme Guerreiro


Coruripe

“Guerreiro é tudo, só está abaixo de Deus”

Djalma José de Oliveira, também conhecido como Jaime,


caminha lentamente. “As minhas pernas já não são boas, mas
graças a Deus, eu ainda vou para todo lugar que eu quero”, diz. É
com essa determinação que ele sai da cidade de Coruripe, onde
vive há 28 anos, e vai a Maceió para as apresentações do guerreiro
Leão Devorador, “da finada Mestra Vitória”, emenda. No
folguedo, mestre Djalma é responsável pelos versos, pela música.
“Eu não tenho preguiça de nada nessa minha vida, muito menos de

495
cantar. Eu sou bom na rima e no improviso”, anuncia. De repente,
começa a encher a sala de lembrança que não se toca. São as peças,
todas compostas por ele. Para agitar o sangue, pede um cafezinho
quente. A inspiração surgiu com a cantoria de vaqueiros:

“Eu estava na Cachoeira do Meirim, com 13 ou 14 anos,


quando ouvi: ‘A usina de mercê/ planta cana pra moar/ o curumba
vem de cima/ trabalhando pra ganhar/ quando o passageiro passa/
corta cana pra chupar/ grita boi, ê/ grita boi, á. Era assim mesmo. Eu
nunca esqueci uma palavra. Foi essa música que abriu a chave da
minha cabeça. Na minha vida o guerreiro é tudo. Só está abaixo de
Deus. Foi o que me deu a capacidade de lidar com as pessoas. É a
minha origem. É tudo mesmo”.

Elias Procópio – Cordel e viola


Maceió

Da lata e do coco para novelas em cordel

O garoto Elias Procópio, aos 10 anos, não podia ver uma


lata. Ele pegava, começava a bater e já fazia uma cantoria. Nascido
em Murici, o violeiro foi levado criança para Atalaia. Foi nessa
cidade, que começou toda a história de versos. No início, os
ensaios não foram com a viola. “Eu era cantador de coco e pagode.
Tocava para o pessoal das fazendas dançar. Essa era a minha
festa.” O primeiro instrumento foi o cavaquinho. “Eu tinha 10 ou
12 anos. Carreguei cinco contos da minha irmã e comprei. Meu

496
pai, quando soube, devolveu o dinheiro a ela e não achou ruim.
Sempre me apoiou.” O ofício como repentista começou em 1975.

“Antes disso, eu sustentava a minha família com o cordel.


Vendi muito. Eu fazia feito em novela: contava uma parte da
história e deixava o melhor em suspense. Não tinha quem não
comprasse”.

O romance do Pavão Misterioso foi inspiração


Elias Procópio seguiu sua vida cantando e tocando, mas teve
suas inspirações e ensinos ao longo da carreira; como mestres ele
cita grandes cordelistas: João Martins de Athayde, Leandro Gomes
de Barros e Francisco Sales de Arêda. “Na minha casa ainda
guardo esse cordel legítimo. Que é meu preferido: A história do
Pavão Misterioso, de José Camelo de Melo Rezende. É boa
demais”. Já na moda de viola suas referências foram Rouxinol do
Norte, João de Lima e Thiago Passarinho. Com tamanho
conhecimento, passou a conciliar a literatura com a viola.

“Durante o dia, eu andava com um baú de folheto e caixa de


som, microfone. Quando era perto da noite, eu escondia tudo no meio
do mato e saía para tocar nas festas. Essa era minha vida. Alimentei
sete filhos assim”.

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José Pereira Lima, seu Dedeca – Reisado
Água Branca

Na Serra do Cavalo, a dança do azul e encarnado

Chegar até José Pereira Lima, 79, o Seu Dedeca, não é das
tarefas mais fáceis. O mestre do reisado mora no alto da Serra do
Cavalo, em Água Branca. O caminho é de ruas de barro, ladeira
dificultosa. Não pense que o carro vai até a porta. É preciso andar
por meio do mato. Terminada a maratona, não se acha o homem.
“Ele está na Jurema”, diz a companheira Maria Aparecida. Jurema
é uma lavoura, a uns 40 minutos do local. Ela pede a um sobrinho
para buscar o mestre. Durante a espera, um passeio na
comunidade. As meninas do reisado vivem na Serra do Cavalo.
Depois de um giro rápido, todas estão concentradas na casa de Seu
Dedeca. Fazem um furdunço só. Passado esse tempo todo, Seu
Dedeca aparece. Como o interesse era o de conhecer o grupo de
reisado, Seu Dedeca se põe logo a se arrumar e a pedir que a
garotada também o faça. As meninas respeitam o mestre como se
fosse um avô, pedem até a bênção. Depois chegaram a figura do
Mateu e o tocador. O apito do mestre dá início aos passos
ensaiados, à disputa do azul contra o encarnado, com direito a
espadas, e o canto das meninas.

“Do céu, eu escolhi uma estrela/ Do jardim, eu escolhi


uma flor/ Da terra, eu escolhi minha mãe para ser meu grande

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amor”, a mãe referida na toada é Nossa Senhora Aparecida, a
homenageada por esse auto-popular que pertence ao ciclo natalino

Maria Benedita da Silva – folguedo Mané do Rosário


Poxim, Coruripe

De Maria para Maria, desde 1762

A negra Maria Benedita dos Santos, aos 54 anos, tem um


rosto exuberante e alegre, coberta pelo manto que marca o
folguedo Mané do Rosário, que só existe no povoado de Poxim,
em Coruripe – a 85 km de Maceió. Maria Benedita é quem lidera o
folguedo, considerado único no Brasil, foi criado em 1762 e é
repassado ao longo do tempo pela mesma família e agregados.
Homens e mulheres, com o rosto coberto, participam da
manifestação, que acontece religiosamente todo o dia 19 de março,
dia de São José, padroeiro de Poxim, em frente à igreja da
comunidade. A depender das novas Marias, as filhas de Benedita,
o Mané do Rosário segue firme. Maria José dos Santos, 29, tem
cinco crianças. “Dois já brincam com a gente, um menino de 12
anos e uma menina de 10. Os menores ficam ansiosos, logo estarão
na brincadeira”, revela. A caçula, Maria Lurdes, a pequena Bidô,
com 13 anos, confessa: “Se eu não participo, eu choro”.

“Eu tenho oito filhos vivos e todos participam do Mané do


Rosário. Os netos também estão na brincadeira. Minha mãe, Maria
do Carmo dos Santos, 84, é a integrante mais experiente. Ela era a

499
dona do grupo. Já recebeu essa herança da minha avó, Maria Josefa
da Cunha. Mas com a idade, passou para mim”.
Mané foi exímio dançador
Os demais integrantes são vizinhos da família dos Santos.
Os palhaços carregam chocalhos na cintura e têm a face pintada de
carvão. Com os passos, uma festa tumultuada. A música é feita
com tarol, caixa, surdo e pífano. Nada de vozes. O folguedo é todo
instrumental. O Mané do Rosário está registrado no trabalho de
Câmara Cascudo, Dicionário do Folclore Brasileiro. É definido
como teatro popular. No livro, conta-se que foi mesmo em 1762
que apareceu uma dupla de mascarados, que brincava e dançava na
porta da igreja. A folia deles foi até 1766, quando sumiram, sem
deixar identidade. Foi a partir deste ano, que a comunidade se
reuniu, copiando os trejeitos dos dois, e prosseguiu com a festa.
Mas a autoria foi atribuída a Manoel do Rosário, um conhecido
dançador de reisado e maracatu. Por isso, o nome Mané do
Rosário. Ao todo, participam 36 integrantes. Os dançadores se
apresentam com roupas femininas e aventais. Escondem o rosto
com panos brancos e na cabeça, chapéus de palha.

José Ricardo dos Santos Neto - Dança de São Gonçalo


Água Branca

Uma tradição de música, dança e fé

Homens e mulheres vestidos de branco e com as cabeças


cobertas. Estão ajoelhados e de pés descalços. Rezam, entoam

500
ladainhas. Durante uma hora, eles se preparam para a Dança de
São Gonçalo, oferecida aos mortos. O ofício acontece numa capela
simples, no Alto Sertão de Alagoas. O mestre, José Ricardo dos
Santos Neto, 59, é o guardião dessa história. O santuário fica no
povoado Cal, na cidade de Água Branca – a 320 km de Maceió.
Depois do asfalto, é necessário passar por estradas de terra batida.
Em tempos de chuva, a travessia se torna uma verdadeira
provação. A tradição está na família de José Ricardo, o Seu Deca,
há muitas décadas. A música é muito bonita. Antes da dança e nos
intervalos das jornadas, o mestre afina minuciosamente seu
instrumento, uma rabeca, seu José Carlos de Santos, fica com o
adufe – um pandeiro pequeno, de madeira leve, e tem ainda os
vizinhos: o violão de Cícero Gonçalves, e o pandeiro de Ademar
Ricardo dos Santos.

“Eu sou mestre há 35 anos, mas lembro do São Gonçalo


desde criancinha. Aprendemos com o nosso povo da Bahia, vindo da
cidade de Santa Brígida. Somos quase todos da mesma família, mas
pode participar também quem tenha boa vontade”.

São Gonçalo tocava viola


São Gonçalo é santo português, festejado no dia 10 de
janeiro – data em que faleceu, em 1259. De acordo com o
professor Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), no Dicionário do
Folclore Brasileiro, São Gonçalo, eremita, deixou tradições
populares vivas. Fez uma ponte de pedra. Tocava viola. Na obra,
Câmara Cascudo, nordestino do Rio Grande do Norte, revela ainda

501
que o santo convertia mulheres, dançando com elas, alegremente,
mas tendo nos sapatos pregos que o feriam nos pés. Em Água
Branca, os devotos, quase todos familiares de Seu Deca, dançam
durante horas. Os movimentos são ordenados. Remetem às fases
da lua e à posição das estrelas. No grupo, participam 12 mulheres e
quatro homens, os tocadores. Apesar da música e dos passos
animados, a festa a São Gonçalo é levada com seriedade pelos
participantes. Quase todas as mulheres têm mais de 60 anos.
Durante cada uma das jornadas, que tem duração média de 30
minutos, elas giram e se ajoelham com a força de jovens.

“Quando eu danço, eu sinto uma zonzeira. Mas venho todas as


vezes. Participo do ofício e de toda a parte que é ajoelhada. Vim a pé.
Passei 13 dias caminhando. Se Deus quiser, volto ano que vem”.

Benon Pinto da Silva – Guerreiro


Maceió

Treme Terra, o guerreiro vencedor

Benon Pinto da Silva nasceu em Pernambuco, mas com dois


meses de nascido, veio para Alagoas. Foi nesta terra que conheceu
o guerreiro, mais precisamente na cidade de Cajueiro.
“Antigamente, tinha muita festa. Com 7 anos, eu me metia no
meio. Tinham todos os folguedos, mas eu só me interessava pelo
guerreiro”, afirma. Foi caboclinho no famoso grupo de Mestra
Gajuru, aos 10 anos. Ele foi de tudo no guerreiro: caboclinho,

502
vassalo, peri, embaixador. Ainda em Cajueiro, criou o Barreira
Pesada, e finalmente o Treme Terra, em Maceió, na década de
1980. Em São Paulo o Treme Terra já foi campeão. “Eu me vi no
meio de 22 Estados, num festival. Antes da nossa apresentação, o
Rio Grande do Sul era o primeiro. Mas quando a gente fez a
guerra, vencemos. A bandeira de Alagoas ficou lá no alto”.

“Em Alagoas, eu trabalhava como investigador da Polícia.


Gostava de prender bandido grande. Mas quando era sábado e
domingo, eu era do guerreiro. Passava a noite inteira acordado,
chegava na segunda-feira com sono mas ia para a luta”.

Chapéu de guerreiro: um ícone alagoano


Bonitos também são os adereços, como os chapéus de palha
bordados com catedrais, coroas e tiaras, feitos pelo artista. “Eu
aprendi sozinho. Já vendi 200 para o Japão”. As peças são
enfeitadas com espelhos, alfajôres (pérolas miúdas), miçangas e
fitas prateadas. São muito caprichosas. Mas o que importa mesmo
é saber dançar o guerreiro. “O guerreiro para ser bom tem que ter
muita coisa. São 35 pessoas que participam, entre rei, rainha,
palhaço e catirina. O mestre é o responsável por tudo. Eu estudei
para isso, mas não sou mestre não. A gente sempre tem muito a
aprender.”

503
“Aposentadoria? Aposentadoria nada minha filha, eu só paro
com o guerreiro quando Jesus quiser. Não tem homem aqui na terra
que me faça parar.”

José Sebastião de Oliveira 1947-2010


mestre de Guerreiro - Viçosa

Dança de pisado forte

José Sebastião de Oliveira, 61, nasceu na cidade de Atalaia.


Mas há 33 anos, mora em Viçosa, que fica a 86 km da capital. Foi
o município que deu nome ao folguedo dele, o Guerreiro da
Viçosa. Na mocidade, o mestre deu a partida como cantador de
pagode. Depois, conheceu a viola. Mas a paixão é mesmo pelo
guerreiro – auto surgido em Alagoas e que nas palavras de
Sebastião, “é filho do reisado”.

“Já sabiam que eu era cantador de pagode e repentista. Por


isso, me pediram para montar um grupo de guerreiro. Já faz quase 30
anos. Sempre achei bonito. Menino, eu não participava. Mas gostava
muito de ver os mestres Adelmo, Juvenal, Venâncio e Benon. Hoje, eu
sinto meu joelho. Mas ainda faço uma hora e meia de apresentação.
O pisado continua forte, parece estremecer o chão”.

Juvenal Leonardo Jordão – Mestre Guerreiro


Maceió

504
Felicidade é um apito e o folguedo

Juvenal Leonardo Jordão é um guerreiro de verdade.


Alagoano nascido em Boca da Mata, vai ao mercado todos os dias
e negocia camisa, relógio antigo, tudo que chega em suas mãos,
para vender, Mas quer saber a alegria desse homem? “A minha
felicidade é pegar meu ‘apitozinho’ e brincar com meu povo”, diz.
Esse é o mestre Juvenal, um dos criadores do Guerreiro Vencedor
Alagoano. “Com 12, 13, 15 anos, eu trabalhava e brincava. Já fiz
de tudo nessa minha vida. Para o roçado, eu ia com 4 anos.
Limpava a terra para a macaxeira era com a mão, que nem enxada
eu podia pegar ainda. Depois, já rapaz, eu passei a tirar sururu da
lagoa. Foi com esse intento, que eu vim para Maceió. Tinha 24
anos’. Na capital, firmou-se como mestre da cultura popular.
“Durante 15 anos, eu tive meu guerreiro na Chã da Jaqueira. Tenho
essa arte como um dom.O mestre tem que ter juízo saber inventar
a cantoria, e sem esse dom nem adianta brincar”.

“O guerreiro é o prazer que eu tenho na minha vida. O


cardiologista já me disse que cantar faz bem para o meu coração.
“Eu tenho essa arte como um dom. O mestre tem que ter juízo, saber
inventar a cantoria. Quem não tiver esse dom nem adianta brincar”.

Maria José dos Santos - Baianas


Coruripe

505
Saias rodadas dão cores praieira

Maria José dos Santos, 63, nasceu nas Barreiras, povoado da


cidade de Coruripe. Criança, ela já tinha como diversão a dança do
pastoril. O amor pela cultura popular veio do berço. O pai,
Dionísio Faustino dos Santos, contava histórias para a
comunidade, sempre em versos. A mãe, Terezinha Maria, não
perdia de ver uma disputa entre o azul e o encarnado. Com 11
anos, já estava no pastoril, mas o grupo não durou muito tempo.
Entre tantas brincadeiras, a mestra das Barreiras nunca deixou de
lado as baianas. Foi esse folguedo que garantiu a Maria José o
título de patrimônio vivo alagoano. Há oito anos, ela criou o grupo
Baianas Praieira, numa referência ao belo cenário do Litoral Sul.
Com elementos do pastoril e do coco, a festa reúne 12 mulheres,
três tocadores e um rimador, todos moradores das Barreiras.

“O povo daqui não dá valor. Diz que é um bando de velhas


enxeridas. Gostamos mesmo é de nos apresentar em outros lugares.
Mas quando eu paro um pouco com os ensaios, as outras baianas
vêm logo aqui, dizendo: Vamos dançar que a gente está enferrujando
os ossos.”

Nelson Vicente Rosa - Coco de Roda


Arapiraca

Mutirão de casas na batida do pé

506
Nelson Vicente Rosa, falecido em 2017 aos 80 anos, foi o
típico lavrador nordestino. Nasceu na Vila Fernandes, comunidade
agrícola da cidade de Arapiraca, e nunca arredou pé do lugar.
Criou os sete filhos graças à benevolência da terra e a muito
trabalho. Foi no povoado que o mestre presenciou as primeiras
manifestações culturais. Mas só depois dos 30 anos, nos anos
1970, que ele começou a fazer as festinhas no estilo do coco de
roda. Ele levou seu conhecimento ainda à escola do povoado. O
esforço valeu à pena. Hoje, os garotos estão afinados, sabem de cor
os versos do coco. A batida dos pés é cheia de vigor. As
vestimentas estão nos conformes, alinhadas. A voz de Seu Nelson
também impressiona. Faz gosto assistir à brincadeira. Na família, a
tarefa de quebrar o coco foi repassada hoje aos três netos: Wesley,
10, José Wellerson, 11, e Wilianny Karlly, 13. A tradição está
garantida na Vila Fernandes.

“No meu tempo de infância o coco estava no começo, eu me


lembro das casas de taipa. A construção era feita com a ajuda de
toda a comunidade. Para aterrar o piso, o povo fazia o samba pisado,
o pagode. Era uma festa. Tinha mutirão também no trabalho com a
terra. Todo mundo se reunia para a limpeza dos terrenos, no plantio
da mandioca. Não tinha pagamento. No final, a satisfação era
chamar uns tocadores e fazer um samba”.

Áurea Barros Tavares– Pastoril e Quadrilha


Maceió

507
Dos cordões ao casamento matuto

Áurea Barros Tavares poderia ser daquelas senhoras


quietinhas, de voz pausada. Mas a alagoana, que nasceu em
Satuba, comanda ensaios de quadrilha, pastoril e coco de roda. Por
mais de sete décadas, foi aplaudida pelo azul e o encarnado do seu
grupo “Mensageiros de Fátima”. A festa acontecia no Tabuleiro
dos Martins, na capital, e reúne jovens de toda a região. “Eu
comecei no pastoril com 5 anos, como borboleta. Aos 13, já tinha o
meu próprio grupo. Sempre fiz de coração”, afirma. Como toda
arte apaixonada, a de mestra Áurea conquista muitos discípulos.
Durante toda a conversa, a criadora da quadrilha Alegria do Sertão,
que tem 45 anos de existência, é cercada por muitos jovens. Mestra
Áurea revela o segredo da Alegria do Sertão: “Tudo na minha
quadrilha é original. O casamento é matuto, sem essa história de
muito exagero. O matuto usa chapéu de palha e camisa de xadrez”.

“Desde os cinco anos me dediquei à cultura popular. Tenho


amor também a todos que participam do meu pastoril, da quadrilha,
do coco. São como meus filhos. O pastoril é uma história que está
dentro da Bíblia, sobre o nascimento de Jesus menino. O folguedo
representa a visita dos pastores ao estábulo de Belém, com cantos e
louvações. Tem como origem os dramas litúrgicos, mostrados nas
igrejas. Essa é mais uma festa do ciclo natalino”.

Luzia Simões da Silva 1933-2010 – Chegança


Coqueiro Seco

508
Mouros versus Cristões: barca dos brincantes

Na cidade de Coqueiro Seco, às margens da Lagoa


Manguaba, Luzia Simões da Silva, é figura popular. Nascida no
município, Mestra Luzia participou do primeiro grupo de cultura
popular ainda adolescente. “Meus pais não gostavam de
brincadeira. Eu fui contra a vontade deles.” Surgia assim o
encantamento pelos folguedos. A mestra ensaia pastoril, baianas e
chegança. “Comecei na chegança da mestra Lila. Eu era
contramestra e mouro. Ainda hoje é o meu folguedo preferido,
sempre foi”, diz. Com 75 anos, Luzia Simões sente dores fortes na
coluna. “Eu não consigo ficar em pé por muito tempo, mas canto
nos ensaios quase todos os dias. É só deixar uma cadeira reservada
para mim.” A chegança tem origem nas lutas em mar aberto entre
cristãos e mouros. Entre as personagens, está o almirante, o capitão
de mar-e-guerra, o mestre-piloto, os embaixadores. Luzia Simões
conta que o nome Silva Jardim, do seu grupo, foi inspirado numa
grande embarcação, vinda de Portugal para o Brasil.

“Eu tenho fé de ter uma barca construída aqui, em Coqueiro


Seco. A chegança precisa de um lugar próprio para se apresentar.
Ela canta a música tradicional da chegança: Viva o sol, a lua e as
estrelas/ Viva o céu e a terra/ Eu dou viva à bandeira brasileira/ Viva
o cruzeiro do norte/ Viva o cruzeiro do sul/ Eu dou viva ao Silva
Jardim/ Naqueles mares tão fortes”.

509
José Felix dos Santos 1938-2011 – Pífano
Maceió

Jota do Pife: o começo com uma flauta de taboca

O mestre do pífano José Félix dos Santos faz questão de ir


todos os anos ao Juazeiro do Norte, acompanhado do pífano e de
uma bandinha, construída há 30 anos. A vida é marcada por
coincidências. Aos 7 anos, o cearense José Felix ouviu uma banda
de pífano. No comando dos instrumentos, “era meu xará que estava
passando pela fazenda onde morávamos e eu me encantei. Pedi a
meu pai: O senhor podia fazer um ‘pifinho’ pra mim?”, lembra. O
menino foi atendido e logo estava afiado na flauta de taboca. Com
dez dias, estava tocando Vitalina, uma música bem conhecida na
época. De Vitalina para cá, já se passaram 64 anos. “Esse é meu
único vício. Eu não bebo, não fumo. Mas não sei ficar sem tocar.
Mesmo quando estou só, pego meu pife e faço um sonzinho”,
conta José Felix, mais conhecido como Jota do Pife. Hoje, com 71
anos, o homem ainda mantém os pulmões firmes. Emenda uma
canção na outra. Entre as músicas mais queridas estão as romarias.
Mestre Jota é pifeiro de muita fé. Em casa, uma parede inteira

510
dedicada aos santos. Todos os anos, ele vai pelo menos uma vez a
Juazeiro do Norte (CE). “Essa minha banda é leve. Faço questão
de levar comigo e tocar entre as orações”, diz.

“Cheguei a Maceió ainda na minha mocidade, com 15 anos.


Meus avós, meu pai e minha mãe nasceram aqui, em Murici. Por isso,
todos os meus documentos têm como se eu fosse alagoano. Esse é o
meu lugar”.

A “banda leve” do Jota Pife


Para a surpresa dos ouvintes, José Felix conduz a banda e
não se trata de outros músicos. José Felix toca o prato, o tarol, o
bumbo e o surdo. Como ele consegue? Por meio de uma
engenhoca, criada pelo artista há 30 anos. Todos os instrumentos
estão unidos por uma caixa. O som é orquestrado pela batida do pé.
Nas mãos, apenas o pífano. A referência do músico, no início da
jornada, foi o Rei do Baião. “Eu entrei pesado no Luiz Gonzaga.
Era um sucesso só”, lembra. E Jota do Pife tinha era um destes
iluminados e coroados.

“Eu gosto de todo mundo e todo mundo gosta de mim. É um


querer bem danado, tenho uma infinidade de afilhados, só na rua
onde moro são seis crianças. Eles estão sempre por aqui. Gosto de ter
a casa cheia, de animação. Eu e Maria (José da Conceição) tivemos
16 filhos: oito homens e oito mulheres. Deus levou metade: quatro
homens e quatro mulheres. Eu ficava triste porque não é brincadeira
você perder uma criança de 4 anos, já crescidinha. Dos que ficaram,

511
eu só tenho alegria. Na família, são 22 netos. O primeiro bisneto está
a caminho”.

Irinéia Rosa Nunes da Silva – Ceramista


Muquém - União dos Palmares

A maestra dos quilombos

A mestra Irinéia Rosa Nunes da Silva é a moradora do


povoado Muquém, comunidade quilombola, que abriga os
descendentes de Zumbi, na cidade de União dos Palmares, berço
da resistência negra no Brasil, no pé da Serra da Barriga. Nas ruas
estreitas, todos se conhecem. “Aqui, somos de uma família só. São
primos, tios, irmãos”, conta Irinéia, que já foi selecionada pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura (Unesco), recebeu as maiores honrarias do governo do
Estado e é considerada patrimônio vivo alagoano. Das mãos de
Irinéia surge rendeira apoiada no bilro, mãe com bebezinho no
colo e até Santo Antônio. Sem falar na infinidade de cabeças. As
mulheres seduzem pelos cabelos enrolados. “Eu gosto de fazer
essas neguinhas. Capricho nos detalhes”. No Muquém, as peças de
cerâmica são uma tradição. “Minha mãe fazia panela. Ela aprendeu
com a minha avó. Esse trabalho aqui tem muita história”, anuncia.
Mas há 30 anos, a mestra resolveu inovar, decidiu criar os

512
“brinquedos” – como ela mesma definiu suas maravilhosas cabeças
de gente no barro.

“Eu já passei por muito sofrimento. Nem casa eu tinha. Vivia


era debaixo de ponte e de madeira velha. Mas hoje, eu estou em paz.
E é com sossego que produzo minhas peças, de 10 a 12 peças por dia.
Começo às 8 da manhã e vou até o final da tarde. Levo esse tempo
todo e faço só umas cabeças, umas panelas Por mim, chegava mais
cedo, 5 da manhã. Mas tenho que arrumar as coisas em casa, fazer o
meu chazinho. Quando me abuso, deixo tudo por conta das minhas
filhas e fico com os meus bonecos.”

Nivaldo Abdias Bomfim 1932- 2013 – Guerreiro


Maceió

Sangue guerreiro campeão

“É Deus quem ajuda. Eu faço tudo na hora, feito repente.


Guerreiro para ser bom tem que cantar bem; as figuras devem ser
animadas e dançar bonito.” É a palavra de ordem do mestre
Nivaldo Abdias, que reúne filhos e netos no grupo Campeão
Trenado, na Chã da Jaqueira. O guerreiro está no sangue da
família. Com nove filhos, o mestre tem oito no folguedo. O neto
mais novo, também Nivaldo Abdias, já veste os trajes de índio
Peri. A criança tem 7 meses e bate os pezinhos ao ouvir os versos
do avô. A esposa dele, Creuza Bomfim, é a rainha da brincadeira.
A paixão pela cultura popular começou ainda na infância, em

513
Palmeira dos Índios. Lá, com 8 anos, participava do reisado da
mestra Zefa Bispo. Seu pai, Agápito Bomfim, era o mateu. Aos 12
anos, era mestre no guerreiro da comadre Joana Gajuru, em
Maribondo. A mãe de Seu Nivaldo era curandeira. Quando lembra
dos antepassados, ele fala: “Nós somos índios, xucurus-kariris”.

“A próxima geração já está envolvida na arte. Esse meu


netinho, o Nivaldo, já brinca de ser índio. Tenho uma neta de 10
anos, a Nadja, que já sabe toda a parte da estrela de ouro. Todos que
entram nessa família gostam do guerreiro, inclusive os genros e as
noras”.

Manoel Venâncio de Amorim 1924-2008 - Guerreiro


Maceió

Mensageiro de Padre Cícero

Manoel Venâncio de Amorim, que viveu 84 anos, foi


reconhecido como mestre do guerreiro, no comando do
Mensageiros de Padre Cícero, e cantador de pagode, no Tira-
Teima. Venâncio, nascido no município de Cajueiro (AL), foi
dançador menino. Os primeiros passos aconteceram no reisado de
João Vieira de Melo, padrinho dele. O homem era dono do
engenho Monte Alegre, lugar propício para as brincadeiras, e berço
do mestre. Com 14 anos, já era contramestre. Foi nessa época
também que deu um abraço na viola. O primeiro instrumento foi
feito por ele, com a palha do coco catolé. Domada a viola, passou a

514
acompanhar o pai, o mestre de reisado Cícero Venâncio de
Amorim, conhecido como Gavião. Após a morte de Venâncio, a
festa segue. Agora, sob a regência do mestre André Joaquim dos
Santos, 61. O senhor de riso fácil assumiu o Mensageiros de Padre
Cícero a pedido de Augusta Maria da Conceição, amiga do
cantador e baiana conhecida, do herdeiro de Manoel Venâncio,
Petrúcio, que é tambozeiro no guerreiro.

Maria Vitória da Silva 1938-2008 – Guerreiro


Maceió

Na pele do índio Peri

Maria Vitória da Silva, que morreu aos 70 anos, foi a única


mulher em Alagoas a representar o índio Peri, no guerreiro. Nasceu
na cidade de Viçosa, mas foi na capital que fez história com o
folguedo. Na juventude, fundou o Leão Devorador acompanhada
pelo mestre Djalma de Oliveira. Foi apresentada à brincadeira
menina, aos 8 anos. Foi na Viçosa, no guerreiro de Das Dores Jupi.
Essas informações fazem parte do acervo da Associação dos
Folguedos Populares de Alagoas (Asfopal). São anotações dos
pesquisadores Ranilson França (1953-2006), um folclorista que
ainda vive no coração dos mestres, e da presidente da entidade,
Josefina Medeiros. O pai de Maria Vitória era brincante também.
Jacinto Marques da Silva era festeiro dos bons. Em Maceió,
participou do Vencedor Alagoano. Era rainha. Aos 26 anos, foi
mãe do Leão Devorador. Foi também para Josefina Medeiros que a

515
mestra confidenciou que, na sua falta, gostaria que o Leão
Devorador ficasse sob os cuidados da filha, Anadege Moraes da
Silva, 53, e com o apito de Seu Djalma, 70. “Essa foi a herança que
eu recebi da minha mãe. No início, foi muito difícil. Quando eu
ouvia a música do guerreiro, eu chorava,”, conta Anadege. Pouco
antes de morrer, viu concretizado o sonho de ter a própria sede. A
conquista se deu com o prêmio Culturas Populares – Humberto
Maracanã, em 2008. “A inauguração da sede foi o dia mais feliz da
minha vida. Já posso morrer em paz”, disse à presidente da
Asfopal.

Severino João da Silva, o Jaçanã – Pandeirista


Maceió

Na batida do couro

É na batida rápida do pandeiro que o artista de alma simples


Severino João da Silva, o mestre Jaçanã, transforma em música o
que vê a sua volta. O talento veio de nascença: o avô era tocador
de viola e o pai, de harmônico. Rodeado de batutas, ele aprendeu
rápido e, aos 12 anos, já animava as festas de Panelas, cidade
pernambucana onde nasceu. Não demorou muito para que o local
ficasse pequeno para ele. Depois de passar por Recife e São Paulo,
escolheu Maceió como lar. Foi em Alagoas que o violeiro e
repentista fez amigos, teve filhos, se casou e consolidou sua arte.
Foi aqui também que veio o reconhecimento: aos 53 anos, seu
Severino é um dos 11 novos selecionados para o Registro do

516
Patrimônio Vivo da Secretaria de Estado da Cultura (Secult). A
vitória veio, segundo ele, para coroar tantos anos de dedicação.
“Sei que fui contemplado porque mereci, por todo o tempo
dedicado à minha arte”.

Anésia Maria da Conceição 1902-2014 - Rezadeira


Santa Luzia do Norte

A famosa rezadeira de Santa Luzia

Se tem uma personalidade que encarna fielmente a honraria


de ser um Registro do Patrimônio Vivo das Alagoas, essa pessoa
se chama Anézia Maria da Conceição. Do alto dos inacreditáveis
109 anos de idade, já é considerada uma lenda no mais populoso
bairro da pequena cidade de Santa Luzia do Norte, a 63 km de
Maceió. Mesmo sem enxergar e andar, mas absolutamente lúcida e
de bom-humor, dona Anézia é a rezadeira mais famosa e a
primeira parteira de Santa Luzia do Norte. “A grande maioria do
povo acima dos 30 anos aqui do bairro do Quilombo nasceu pelas
mãos de mamãe”, atesta a filha da mestra, Maria Anunciada
Silvestre.

João Pereira de Lima – Viola e Repente


Porto Real do Colégio

517
Uma palavra e o repente começa

Basta dizer uma única palavra para que o mestre João


Pereira de Lima, ou João de Lima das Alagoas, como ele gosta de
ser chamado, comece a criar. Em poucos minutos, dezenas de
estrofes e rimas feitas pelo senhor de 68 anos já pairam no ar. A
inspiração é constante e, nas mãos do talentoso artista, pode virar
música, poesia ou cordel. Assim como o formato, os temas
também são variados – os mais citados, porém, são a saudade e a
infância no campo, assuntos que muitas vezes acabam por se
combinar. A preferência tem explicação: as imagens de Porto Real
do Colégio, onde nasceu e se criou, continuam fortes na mente do
violeiro, cordelista e trovador. Foi na cidade que ele começou a
vida artística. Ainda criança, acompanhava o pai, que era cantador,
nas festas pelas fazendas do município e, ensinado pelos primos,
aprendeu a tocar e afinar sua viola. A profissionalização aconteceu
mais tarde, por volta dos 20 anos, quando decidiu tentar a vida em
Maceió.

Arthur Moraes dos Santos – Guerreiro


Maceió

Ao som da Lira do guerreiro

A voz sai com dificuldade, em função de problemas de


saúde, mas a força de vontade e o sangue de guerreiro encorajam o

518
mestre Artur Moraes a entoar um dos versos do Guerreiro das
Alagoas, onde atuou por mais de 70 anos. “Ô minha Lira, a rainha
primeira; encruza a perna, seja mais ligeira...”, canta o velho
brincante. É assim ritmando que mestre Artur Moraes dos Santos,
86 anos, comandou por muitos anos o Guerreiro Santa Isabel,
localizado no bairro de Chã da Jaqueira, em Maceió. Ele nasceu
em 1925, em Fernão Velho, mas foi criado na cidade de Satuba. O
gosto de dançar guerreiro veio aos 10 anos no grupo do mestre
Manoel Vicente, no distrito de Rio Novo, quando o velho povoado
ainda se chamava Carrapato. Lá foi bandeirinha e depois brincou
como embaixador.À frente do guerreiro Mensageiro Padre Cícero,
mestre André comanda a brincadeira no bairro Santos Dumont e
leva a alegria aonde for convidado

Anadeje Morais – Guerreiro


Maceió

A dama do Leão Devorador

A vida de Anadeje Morais se confunde com a trajetória do


guerreiro Leão Devorador, do qual participa desde os 5 anos,
incentivada pela mãe. Ela cresceu com o folguedo e perpetua o
legado da Mestra Vitória e de José Tenório, idealizadores do
guerreiro da Chã de Jaqueira. O trabalho persistente pela
preservação do saber e da tradição popular foi reconhecido pelo
Conselho Estadual da Cultura, que a escolheu como Mestra do
Patrimônio Vivo de Alagoas. O grupo de dona Anadeje conta com

519
30 participantes de diferentes faixas etárias, dos 10 aos 70 anos,
misturando experiência de várias gerações. “Tudo começou como
brincadeira, pois quando criança, não percebíamos a grandiosidade
do guerreiro. Hoje ele representa para mim um dos fatores mais
importantes na minha vida, sinto-me realizada em cada
apresentação, que são únicas.”

Maria Neide Martins Mãe Neide – mãe de santo


Maceió

A sacerdotisa da cultura afro

Aos 51 anos, Maria Neide Martins, a Mãe Neide Oya


D’Oxum, trabalha com entusiasmo para manter o trabalho que
desenvolve no Grupo Espírita Santa Bárbara, localizado no Village
Campestre em Maceió. A entidade foi criada em 1984 para
incentivar e disseminar os costumes e tradições da cultura afro-
brasileira, com foco no respeito aos rituais de religiões de matriz
africana. Mãe Neide conta que começou a participar de cultos afro-
brasileiros em 1983. Com a fundação do grupo, em 1994, ela
passou a trabalhar a religião associada a trabalhos sociais. O
trabalho envolve 148 jovens no projeto Inaê de inclusão social,
onde são oferecidos cursos de cabeleireiro, culinária dos orixás,
sala de bijuterias e ateliê. O centro também mantém uma creche,

520
onde as mães da comunidade que trabalham e estudam podem
deixar seus filhos no período da manhã até as 16h. Neste período,
as crianças têm aulas voltadas à alfabetização e fazem três
refeições por dia.

Maria de Lourdes Menezes – Bonequeira


Piaçabuçu

Uma boneca de carne e osso

As mãos de dona Maria de Lourdes Menezes têm muita


história para contar. Mesmo já marcadas pelos sinais que o tempo
insiste em imprimir, elas ainda guardam as lembranças do batente
nas casas de família de Piaçabuçu e nas plantações de arroz da
cidade. O trabalho sempre ajudou no sustento, mas não escondeu o
verdadeiro dom: é por meio das mãos que a senhora de 69 anos
transforma retalhos e linhas para dar vida a delicadas bonecas de
pano. Foi às margens do São Francisco que a bonequeira
profissional – e agora mestra do Patrimônio Vivo de Alagoas –
nasceu e iniciou, ainda menina, vendo a avó costurar bibelôs
próprios, sua trajetória. A técnica, contudo, foi modificada e

521
aperfeiçoada. “As da minha avó eram bem diferentes, não eram
como as minhas. Quando comecei também não fazia bonecas tão
elaboradas. Com o tempo fui aperfeiçoando cada vez mais”, conta
ela. A profissionalização veio aos 22 anos, sem ajuda de
professores. “Aprendi mesmo sozinha e posso dizer que é um dom
que Deus me deu. Tudo que aprendi foi vontade própria, até
porque, naquela época, não tinha quem ensinasse”, conta ela. Hoje,
no entanto, a realidade já é bem diferente: ainda às margens do rio,
a até então única artista de bonecas da região não só vende sua
produção como também divide o conhecimento com as mulheres
do local. Os ensinamentos são repassados em oficinas realizadas
pela Ong Velho Chico, que tem ajudado dona Lourdes em seu
trabalho.

Expedito Tavares dos Santos – Reisado


Viçosa

Com o reisado nas veias

Herdeiro de uma tradição iniciada pelo avô, mestre


Expedito Tavares comanda com energia um dos últimos grupos
dedicados a esse folguedo em Alagoas. Quem vê o senhor
franzino, até meio tímido, não imagina a força que ele carrega
dentro de si. Mas, como diz o ditado popular, as aparências
enganam e mestre Expedito Tavares logo trata de mostrar o motivo
pelo qual foi escolhido como Registro do Patrimônio Vivo de
Alagoas. Dono de uma pisada forte e de um ritmo marcante é ele

522
quem comanda o histórico reisado Virgem dos Pobres, localizado
no povoado de Bananal, em Viçosa, e um dos últimos do Estado. A
liderança do grupo foi passada pelo pai, o também mestre Osório
Tavares, e abraçada por mestre Expedito com todo vigor. O talento
para dar continuidade à tradição – que se iniciou com o avô e
mestre Terto Tavares – foi revelado ainda na infância, quando, aos
8 anos, ele entrou no folguedo como figurante. “No início, achava
que não conseguiria dançar e disse isso para o meu pai, mas ele me
encorajou muito, até que realmente consegui”, conta.

Jorge Calheiros – Literatura de Cordel


Pilar

Cotidiano com rima, sonoridade e inspiração

O mestre Jorge Calheiros faz literatura de cordel há 36 anos.


Autodidata, ele conta que foi apresentado ao mundo da leitura pela
irmã e sua primeira expressão nesse universo foi seu nome escrito
com uma pedra de carvão. Desde então, apaixonou-se pelas
palavras e tornou-se referência na arte de contar histórias, ofício
que lhe garantiu o título de Mestre do Patrimônio Vivo de Alagoas.
Aos 74 anos, o cordelista tem 86 títulos publicados. Em seus
textos, ele mistura humor, romance, drama, crítica para contar
histórias do cangaço, crendices, sátiras políticas e aspectos do
cotidiano alagoano. Natural do município de Pilar, ele afirma que
quando era criança e morava na zona rural, só existia uma pessoa

523
que sabia ler e escrever na vizinhança. Quando anoitecia, era
comum as crianças se reunirem em volta de uma fogueira para
escutar a leitura de livros infantis.

Mestre Zé Hum – Chegança e Pastoril


Coqueiro Seco

Este puxador das cantorias da Chegança e do Pastoril


tornou-se autodidata e ainda hoje, ensina com entusiasmo jovens
sobre o manejo e os segredos do pandeiro. E o mais importante , a
preservar a cultura popular na região com os folguedos populares.
Mestre Zé Hum também empresta seu talento de pandeirista à
Chegança e ao Pastoril e por causa de um curioso apelido que
ganhou fama na região. “Por volta de quatro ou cinco anos de
idade, eu tinha mania de fazer ‘hum, hum’ em tudo que minha mãe
me dizia ou perguntava. Daí, me puseram o apelido de Zé Hum”,
explica José Gomes Pureza, o famoso Mestre Zé Hum, um dos
mais novos Mestres do Registro do Patrimônio Vivo de Alagoas.
Aos 71 anos, Mestre Zé Hum conta que se apaixonou pela
Chegança e Pastoril quando contava 15 anos de idade. “Via dois
tocadores de pandeiro em ação, o Tatá e o Luís da Betila, gostei e
passei a tocar até hoje.”

Raul Vicente de Queiroz – Repentista e violeiro


Maceió

O trovador das Alagoas

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Nem as marcas dos 82 anos de vida enfraqueceram a
potente voz que ainda enche a sede da Associação dos Violeiros e
Trovadores de Alagoas. Raul Vicente de Queiroz, fundador da
entidade em 1976, é um dos artistas que receberam o certificado de
mestre do Registro do Patrimônio Vivo de Alagoas. Nascido em
São Joaquim do Monte, interior de Pernambuco, Raul chegou a
Alagoas após rodar o Brasil como feirante e repentista. “Alguém
disse que eu era a pessoa certa para montar a Associação e eu
resolvi me mudar de Aracaju para cá. Foi assim que vim parar em
Maceió”, conta. A primeira trova e muitas mais – Era o primeiro
dia do mês de outubro de 1940 quando o céu de Pernambuco
escureceu às 9h da manhã. Na pequena São Joaquim do Monte, um
menino corre para buscar lápis e papel. Enquanto muitos
observavam o fenômeno, Raul Vicente, com apenas 12 anos,
tratava de escrever o que viria a ser o seu primeiro livro de cordel.
Mas as palavras escritas, sozinhas, não lhe contentavam. Faltava-
lhes volume e voz. Foi aí que as poesias ganharam ritmo e viraram
repente na boca do seu Raul. Nas feiras do interior de Pernambuco,
as trovas criativas ajudavam a vender os seus cordéis e
medicamentos caseiros.

José Gonçalves dos Santos – Pandeiro


Capela

O poeta cantor Hilton do Pandeiro

525
José Gonçalves dos Santos nunca havia visto um pandeiro.
Sua batucada ecoava de latas vazias na fazenda onde morava, em
Capela, até que, aos 12 anos, ganhou de presente o instrumento ao
qual tem dedicado a vida. A partir de então, o menino José virou
Hilton do Pandeiro. Com 78 anos, o poeta-cantador entrou para o
Registro do Patrimônio Vivo Alagoano, recebendo o título de
mestre. Suas inúmeras cantigas já chegaram à Alemanha, aos
Estados Unidos e à Suécia, onde foram elogiadas, segundo o
mestre, por nomes importantes da cultura alagoana, como Pedro
Teixeira e Théo Brandão. Apesar de ser funcionário da prefeitura
de Capela há quase 30 anos, mestre Hilton teve na agricultura seu
principal ganha-pão. Mas o pandeiro tocado ali, no meio da feira
capelense, já chegou a suprir as despesas de casa em apenas duas
horas de apresentação. Quando perguntado em que se inspira para
criar suas peças, Hilton responde com altivez: “Não preciso de
nada disso de inspiração, não. Faço cantiga aqui, na brincadeira”.
Basta dar-lhe um mote – ou seja, um tema ou algumas palavras – e
deixar o resto a cargo da criatividade. A boa memória compensa o
pouco que sabe ler. Toda sua criação está guardada na cabeça.

Lizanel Cândido da Silva – Jacaré – Capoeira


Maceió

A capoeira como filosofia

A expressão cultural desenvolvida no Brasil por escravos


está muito bem representada em Alagoas. Em 1984, Lizanel

526
Cândido da Silva, o mestre Jacaré, voltou do Estado de São Paulo,
trazendo em sua bagagem a arte afro-brasileira que envolve luta,
dança, cultura popular e música. A plástica dos movimentos e a
ginga contagiante embalada pelo berimbau foram os principais
motivos que levaram o mestre a começar a praticar a luta, que hoje
ele considera como uma verdadeira filosofia de vida. Em seus 40
anos de dedicação à capoeira, sendo 26 em Alagoas, mestre Jacaré
já repassou seus ensinamentos para cerca de duas mil pessoas.
Hoje ele ensina jovens e crianças de escolas públicas em quatro
municípios do Estado – Maceió, União dos Palmares, Branquinha
e Murici – e é com o público infantil que o mestre se diz mais feliz
em trabalhar.
“Costumo passar para as crianças lições educacionais,
psicológicas e de conscientização. A capoeira vai muito além dos
movimentos, das músicas. É muito mais que uma luta. Ela traz um
conjunto de ensinamentos em todos os aspectos para quem pratica e
vive intensamente essa arte fascinante”.

José Cícero Bonfim – Cicinho – Guerreiro


Maceió

Filho de mestre, é mestre também

O artesão José Cícero Abdias Bonfim, o Índio Cicinho, é


mais um representante da cultura popular alagoana que será
homenageado com o título de mestre do Registro do Patrimônio
Vivo Alagoano. Entusiasmado com o reconhecimento do Estado

527
ao trabalho que aprendeu aos 10 anos de idade com um de seus
irmãos, mestre Cicinho diz que a paixão pelo guerreiro é herança
do pai, mestre Nivaldo Bonfim. Mestre Cicinho foi agraciado pelo
seu traço inconfundível na confecção de chapéus de guerreiros.
Não apenas com amor, talento e dedicação, o agora mestre Cicinho
faz os chapéus desde a década de 1980. Os chapéus da estrela de
ouro, estrela do Norte, estrela brilhante, coroa da rainha, de índio,
de vassalo, de caboclinha, todos os ricos personagens do Guerreiro
alagoano foram agraciados com sua arte marcante. Cicinho, que
assume o personagem Índio no grupo, conta que a origem do nome
do Guerreiro que sua família dança – já que 90% dos membros são
formados por filhos, noras, irmãos, sobrinhos e esposa do mestre
Nivaldo – se deu em homenagem a um amigo do patriarca, o
Francisco Jupi, conhecido como Campeão Treinado.

João Galdino, o mestre Bia – Pífano


Viçosa

A música como arte e profissão

“Oh, Viçosa do meu Brasil! Eu venho de ti, a saudade me


mata. Eu amo é Viçosa, Princesa da Mata”. Os versos singelos,
mas profundos, saem de dentro da alma de um cantador, para ser
mais exato, da alma de um soprador, que fez do pífano sua
profissão e vida. Foi assim, entoando versos na companhia de seu
inseparável instrumento, que João Galdino da Silva, o mestre Bia,
78 anos, foi homenageado ao receber o certificado de Mestre do

528
Registro do Patrimônio Vivo da Cultura alagoana. Sua trajetória de
pifeiro tevê início lá nos idos de 1950, quando, pela primeira vez,
viu e ouviu o instrumento em uma das famosas festas do pé-de-
serra de Viçosa. A partir de então, mestre Bia formou seu próprio
conjunto e começou enveredar nos tons do pífano com sua
bandinha.

“Aquele som penetrou na minha alma e não saiu mais de mim.


Logo depois de um ano que me apaixonei pelo som do instrumento,
começamos a tocar de graça, depois a gente já ganhava uns trocados
da redondeza e, em seguida, mais conhecidos, começamos a ganhar o
nosso dinheirinho”.
Teófane Silveira – Palhaço Biribinha - Arte Circense
Arapiraca

A arte de fazer rir

Ele estreou no circo aos 7 anos de idade, por influência do


pai, à época proprietário do Circo Mágico Nelson. Com 52 anos de
carreira dedicados à arte de fazer rir, Teófanes Silveira Júnior,
mais conhecido como palhaço Biribinha, torna-se Patrimônio Vivo
alagoano, após aprovação de seu registro pelo Conselho Estadual
de Cultura do governo do Estado. O reconhecimento público marca
mais uma etapa na vida deste artista, que adotou a cidade de
Arapiraca como sua terra, após passagens por vários estados
brasileiros. Com 59 anos de idade, Biribinha atualmente representa
um ícone do circo em Alagoas. A carreira artística ele herdou dos

529
pais, o ator e produtor Nelson Silveira, e a também atriz caricata e
sambista, Expedita Silveira, conhecida como Ditinha Silveira.
Ainda garoto, nos anos de 1940, Biribinha acompanhava a família
nas apresentações por cidades de Alagoas, principalmente
Arapiraca, onde residiam. Com o falecimento dos pais, o artista
herdou o ofício, contagiando dois dos filhos a também seguir no
mundo das artes.

“Agradeço a Deus e ao público que me é fiel. Dedico este


reconhecimento a todas as pessoas que de alguma forma
contribuíram para que eu continuasse com esta trajetória, durante
esses 52 anos de carreira. Teófanes Silveira veio para este mundo
para ser o palhaço Biribinha. Eu fico muito feliz com este
reconhecimento”.

Mestre Verdelino: o “rei” a embolada

Mário Francisco de Assis, o mestre Verdelinho (1945-


2010), o “rei” da embolada alagoana, é artista popular desde os
oito anos de idade, como cantador e poeta, pois saia com seu pai
para as feiras, “tirando da rima o sustento da vida”. Passou a ser
cantador de coco ou pagode, cantando com Corió e Canário nos
mais diversos ambientes: “Achava bonito o violeiro cantando
acompanhado pela viola as histórias escritas no Cordel, e passei
também a cantar. Depois, empolgado pelos diversos gêneros da
viola passei a cantar seistilhas, galope a beira mar, quadrão a beira

530
mar”. No sítio Chã da Mangueira, em São Miguel dos Campos
conheceu o cantador Sebastião Maceno que o incentivou ainda
mais o gosto pela cantoria. Sem condições de possui uma viola
construiu sua própria viola de “costa de palha de palmeira”
iniciando assim sua arte de violeiro. Ouvia falar nos grandes
nomes da viola como Frederico Bernardes, Manoel Nenê, Joaquim
Vitorino, entre outros. Mas foi o cantador Otávio José que o
batizou de Verdelinho de Alagoas, em 1962, o que muito lhe
agradou. Foi companheiro, por muitos anos , da afamada mestra de
reisado, Dolores Jupi, com quem muito aprendeu, sendo também
Mateu do guerreiro da mestra Joana Gajuru, por vários anos. Vindo
para Maceió, começou a dançar guerreiro, em 1968, com o mestre
Jorge Ferreira, na Chã da Jaqueira, como carregador de maleta e
“botador de entremeios”. Certa feita, tendo que substituir o mestre
Jorge no guerreiro do professor Pedro Teixeira, passou a comandar
definitivamente o grupo. Durante muitos anos foi mestre de reisado
e guerreiro, em Chã Preta, sempre ao lado do Professor Pedro
Teixeira, com quem percorreu quase todo o território nacional, em
festivais e encontros de cultura popular. Com suas bonitas rimas e
o gingado do seu bandeiro, destacou-se no cenário cultural de
Alagoas, sendo citado pelo mestre Ariano Suassuna como “um dos
maiores poetas populares que já conheci”. Dentre as composições
mais apreciadas está o belíssimo pagode gravado pelo cantor
alagoano Wado e pelos grupos “A Barca” e “Comadre Fulozimha”

“A terra deu, a terra dá, a terra cria


A terra cria, a terra deu, a terra dá

531
A terra fica, movimenta, a terra há
A terra acaba com toda nossa alegria
A terra acaba com o inseto que a terra cria
Mas, nascendo na terra, nessa terra há de viver
Morrendo na terra, pra nesta terra é de comer
Tudo que vive nesta terra pra esta terra é alimento
Nosso Deus corrige o mundo com o seu dominamento
Sei que a terra gira com o seu grande poder”

PENSADORES DO FOLCLORE ALAGOANO

Escola Folclorista de Viçosa

De acordo com Abelardo Duarte, foi o escritor Manuel


Diégues Junior que “batizou” como Escola de Viçosa, o quarteto
formado por Théo Brandão, José Maria de Melo, José Aloísio
Vilela, e José Pimentel do Amorim, que viriam a se tornar os
maiores pensadores do folclore alagoano, com importante recorte
de Viçosa, que serviu como base da cultura popular que buscavam:
os folguedos, os autos, as danças, a alegria do povo, e levando para
Alagoas a sistematização desse folclore, a explicação – pelas raízes
– da dança, do som, das palavras que os brincantes traduziam nas
ruas. Eles dividiram as tarefas de pesquisa, cada um em uma linha
folclórica, para depois fazer o encontro dos mestres. Théo fixava-

532
se nos folguedos tradicionais: guerreiros, reisados, pastoris; José
Aloísio Vilela, na poesia popular, na dança de coco, repentistas e
cantadores; José Maria de Melo, nos contos, sentinelas e adivinhas
e José Pimentel na medicina popular, no curandeirismo, rezas e
benzeduras.
O padrinho da escola, Manuel Diégues, incluiu no grupo o
folclorista Pedro Teixeira de Vasconcelos, também nascido em
Viçosa, o mais novo da turma, que tinha como marca o pastoril –
foi o maior animador da brincadeira em Maceió, partidário do
cordão azul. Os trabalhos iniciados em Viçosa e sistematizado em
Alagoas, culminou com a criação da instituição guardiã dos
interesses do folclore do estado, a Comissão Alagoana do Folclore
(CAF), fundada há 67 anos.

O poeta do folclore das Alagoas

O maior folclorista das Alagoas, Théo Brandão, nascido


Theotônio Vilela Brandão (1907-1981), também foi poeta,
professor, pesquisador, médico, farmacêutico e secretário de
Estado. Em Maceió, o museu que leva seu nome, é hoje um dos
mais importantes do Nordeste, antigo Museu de Antropologia e
Folclore, da Universidade Federal de Alagoas, da qual foi
fundador. Para o novo museu, Théo Brandão cedeu seu acervo
pessoal, considerado um dos melhores em antropologia e folclore.
Foi poeta modernista, professor, mas sua paixão sempre foi o
folclore. Neto de senhores de engenho, toda sua família é marcada
pela intelectualidade. Em 1931, publica seu primeiro trabalho de

533
caráter folclórico – “Folclore e Educação Infantil”. A partir de
1949, começa a ganhar prêmios locais e nacionais pela sua obra,
como “Folclore de Alagoas e Reisado Alagoano. Estudiosos dos
EUA, Itália e Portugal propagaram a obra de Théo Brandão no
Exterior. Entre seus grandes livros estão Folclore de Alagoas
(1949), Folguedos Natalinos de Alagoas (1961, na terceira edição),
Cavalhada das Alagoas (1969), Quilombo (1969).

“Quando fui proposto para o Instituto Histórico de Alagoas,


1937, resolvi então abraçar o folclore. De forma que meu discurso de
posse é exatamente, ao lado do elogio do folclore, o elogio dos
folcloristas, inclusive com dados biográficos dos que me precederam.
Daí por diante era natural que eu começasse a me dedicar mais ao
folclore porque havia assumido esse compromisso”.
Do livro “Théo Brandão, Mestre do Folclore Brasileiro”, do
amigo e também pesquisador José Maria Tenório Rocha.

“Folclorista não é profissão para ganhar dinheiro”


A frase é de Théo Brandão expressa toda sua dedicação às
artes populares de Alagoas. Morto aos 74 anos em setembro de
1981, o também médico Théo Brandão se imortalizou pela coleta e
estudo quase obsessivo das manifestações artísticas populares. “É,
de longe, o pesquisador alagoano que mais registrou, analisou e
escreveu sobre a cultura popular dos quatro cantos do Estado”,
assinala o jornalista cultural Roberto Bonfim. Não é à toa que o
acervo deixado por ele deu para fundar o museu que leva o seu
nome e funciona no belo palacete amarelo em frente a praia da

534
Avenida da Paz. Sete anos após a morte do amigo, o também
pesquisador José Maria Tenório Rocha lançava “Théo Brandão,
Mestre do Folclore Brasileiro”. No ensaio biográfico, no primeiro
capítulo “O Homem”, é o próprio Théo que se revela:

“Eu nunca fui um pesquisador que saísse para fazer uma


pesquisa armado de todo aquele aparato dos sociólogos e de uma
equipe que pudesse ajudar. Eu saía sozinho, às vezes acompanhado.
Mas isso tudo eu fazia roubando sábados e domingos da minha
atividade de médico. Sabendo que não tinha memória extraordinária,
logo cedo verifiquei que teria de gravar. Em 1948 adquiri, às minhas
custas, um gravador de fita para fazer as minhas gravações,
sobretudo de músicas. O financiamento de tudo era feito pela minha
própria bolsa. Então eu tinha de poupar o material, às vezes eu
gravava apenas o começo da música, então mandava que eles
cantassem de novo eu copiava à mão para poupar o material”.
Do livro “Théo Brandão, Mestre do Folclore Brasileiro”, do
pesquisador José Maria Tenório Rocha.

Memória de Théo, por seu discípulo Pedro


Outro integrante da Escola de Viçosa que foi discípulo de
Théo Brandão, Pedro Teixeira de Vasconcelos, escreveu um
brilhante ensaio biográfico sobre o mestre, no Boletim Alagoano
de Folclore, em 1982, alguns meses após sua morte. “Falar sobre
Théo Brandão é muito fácil pois a sua vida terrena foi tão simples
como simples foi a sua alma privilegiada”

535
“Nascido nas terras dadivosas da Princesa das Matas
(Viçosa) passou sua infância na gleba natal, ouvindo o marulhar
sonoro das águas do velho Paraíba... Sentiu o cheiro do mel quente
fervendo nas tachas de cobre do velho Engenho Boa Sorte. Esteve
presente às festas do Senhor Bom Jesus do Bonfim, assistindo às
cavalhadas puxadas pelo destro caveleiro Quincas Vilela, da
Ingazeira, e gravando na memória os pregões de Chico Doninha nos
célebres leilões de prendas e de gado. Bateu palmas aos cantadores
de coco e repentistas nas tradições dos serões da casa do patriarca
José Aprígio dos Passos Vilela, seu avô materno. Embeveceu-se com
as apresentações dos reisados, dos Quilombos e das Taieiras nas
festas de Natal e São Sebastião. Foi neste ambiente que o menino de
engenho cresceu e alçou vôo para as alturas em demanda da glória
da fama, levando sempre no coração e nos lábios a imagem querida
da terra que o viu nascer”.

José Aloísio Brandão Vilela (1903-1976), ensaísta,


folclorista e jornalista tinha uma memória privilegiada, sabia de
cor um inesgotável repertório de peças de todos os folguedos,
aboios, cantorias, poemas e histórias. Tinha uma vasta coleção de
folhetos de cordel, doada ao Museu Théo Brandão após sua morte.
Seu ingresso na vida jornalística ocorreu em 1924, no A Lanceta,
em Viçosa. Tornou-se grande autoridade em poesia popular, e foi o
último dos quatro da Escola Folclorista a deixar Viçosa. Viveu
entre sua biblioteca e a convivência com os caboclos dos engenhos
Mata Verde e Boa Sorte. Dessa vivência diária com o homem do
povo conseguiu recolher subsídios do saber popular que

536
enriqueciam suas conferências. Em outubro de 2015, a Ufal
relançou sua importante obra Coletânea de Assuntos Folclóricos. A
Coletânea reúne cinco trabalhos, escritos em diferentes épocas da
vida do autor, sobre temas do folclore alagoano, como:
manifestações populares de Viçosa, cantoria de viola, vaquejada,
danças e folguedos.

“Não era somente um investigador da cultura popular, mas


constituía a própria cultura popular, no esplendor de sua
legitimidade. Uma enciclopédia de conhecimentos folclóricos. Sabia
muito sobre tradições de sua terra, sobre a origem e significado das
danças, dos cantos e folguedos populares tradicionais”.
Por Luiz Câmara Cascudo, folclorista

José Maria de Melo (1906-1984). Logo cedo, na mocidade,


juntou-se a um grupo de estudiosos que iria formar o núcleo da
Escola Folclorista de Viçosa, e se tornou “um escritor de fino trato,
o amoroso de Viçosa, o estilista do folclore, o autor seguro de
Enigmas Populares, sua grande obra”, disse dele o escritor
Abelardo Duarte. Foi nessa obra, que José Maria Duarte confirmou
sua intuição para o folclore. “Menino de Engenho, criado a ouvir
histórias de Trancoso, a brincar de bacondê e a decifrar
advinhações, dormindo ao doce embalo da rede, arrepiado com as
façanhas do papa-figo, do lobisomem, e da caipora ou enlevado
dom as enternecedoras cantigas de adormecer, não é de se
estranhar que cedo me aperfeiçoasse ao folclore”. (Enigmas
Populares, Rio de Janeiro, 1950). Durante 18 anos presidiu a

537
Academia Alagoana de Letras. Em 1971, deixa o plano da pesquisa
folclórica e surpreende o mundo literário com seu romance
Canoés, que focaliza a vida nos engenhos de açúcar.

José Pimentel Amorim (1904-1980). Um dos quatro da


Escola Folclórica de Viçosa, José Pimentel é médico formado pela
Faculdade de Medicina da Bahia (1932). Além de 17 trabalhos
sobre Esquistossomose, escreveu três volumes sobre Medicina
Popular em Alagoas, em segunda edição, reunindo rezas, orações
curativas e orações fortes, remédios e práticas obstetrícias. Menino
de interior, Zeca estudaria no Instituto Viçosense do educador
Ovídio Edgard de Albuquerque (1891-1955), dividindo carteira
com outros nomes de literatos da cidadezinha. Na capital, cursou
os secundários no Diocesano e no Ginásio de Maceió.

Pedro Teixeira (1916-2000). Folclorista, historiador e


professor, Pedro Teixeira nasceu em Chã Preta, terra do melhor
regional, sua cavalhada faz 100 anos de apresentação em 2015. Foi
nesse berço de cultura popular que ele nasceu, cresceu e voltou
como um guerreiro do folclore. Um dos últimos da linhagem da
Escola de Viçosa, Teixeira presidiu a Comissão de Folclore
Alagoano. Sua vocação sempre foi o magistério, ensinou Línguas e
Folclore em vários colégios e ajudou a fundar diversos
estabelecimentos de ensino. Organizou e animou vários grupos
folclóricos e folguedos populares, como: reisado, guerreiro, baiana,
taieira, pastoril, quilombo, pagode, samba-trupé, coco, maracatu,

538
nega da costa e outros. Era reconhecido pelos inúmeros convites
para apresentações, palestras e seminários pelo Brasil e exterior.

“Numa métrica incomum, muito há de poesias cantadas nos


grupos folclóricos de Alagoas, esta sobressai. Não simplesmente,
pelo fato de exaltar o nosso Estado, mas também por ser criação de
uma mente genial, chamada Pedro Teixeira de Vasconcelos”.
Por Olegário Venceslau da Silva, escritor e poeta

Abelardo Duarte (1900 - 1992). Professor, jornalista e


médico, Abelardo Duarte na verdade foi um múltiplo intelectual
para o seu tempo, escreveu os livros e que depois viraram
clássicos: Dom Pedro II e Dona Cristina em Alagoas (1975); Um
folguedo do Povo: Bumba meu Boi e sua mais importante e
seminal obra Folclore Negro (1974), quando entrou em definitivo
para a grande escola dos pensadores do folclore alagoano. Em sua
passagem pelo Instituto Histórico e Geográfico, no mesmo ano, fez
outro trabalho de vulto: classificou, junto com Théo Brandão, a
Coleção Perseverança, um dos mais ricos acervos sobre memória
negra no Brasil, formada pelas peças que foram recuperadas no
episódio do Dia do Quebra (1912), em que os terreiros de Maceió
foram destruídos por militantes da direita. Foi um dos poucos
talentos alagoanos que não partiram na “diáspora” para outros
estados e países, escolheu ficar em Alagoas.

539
“Música e dança são inseparáveis da vida do negro. Os povos
afro-negros, em seu habitat original, dela se utilizam largamente nas
suas cerimônias mágico-religiosas e guerreiras. Claro é que, atirado
de chofre num status social diverso do seu de origem, o escravo negro
introduzido no nosso país não abdicaria facilmente do cultivo dessas
manifestações artísticas, a esses derramamentos, a que o próprio
senhor branco não se opôs e com que continuou, indiferente aos
sofrimentos físicos e morais, a pautar os atos da vida social no seu
novo mundo atribulado”.
Abelardo Duarte, em Folclore Negros das Alagoas, capítulo
do livro, na revista Academia Alagoana de Letras, nº 12 – 1986.

Ranilson França (1953-2006). Herdeiro de uma das mais


reconhecidas escolas de pesquisa da cultura popular - onde
constam nomes como Aloísio Vilela, Théo Brandão, Manuel
Diégues Júnior, José Pimentel Amorim, José Maria de Melo, Félix
Lima Júnior e Pedro Teixeira, com muitos dos quais conviveu -,
Ranilson França soube como poucos compreender a riqueza do
processo criativo que nasce no seio das comunidades. Foi o último
presidente, dessa geração de ouro do folclore, da Comissão
Alagoana de Folclore (criada por Théo Brandão em 1948).
Também presidiu a Associação dos Folguedos Populares de
Alagoas (Asfopal), coordenou a diretoria de Ação Cultural da
Secretaria Estadual de Educação e foi assessor de assuntos
estudantis e comunitários do Cesmac. Dentre as suas realizações

540
está à criação do programa Balançando Ganzá, da Rádio Educativa
FM desde 1987.

A nova escola do folclore alagoano. Os ensinamentos de


nossos folcloristas pioneiros foram de tal importância que Alagoas
não teria como imortalizá-los, se não fosse pelo trabalho contínuo,
pelas sementes germinadas por novos folcloristas, aqueles que
aprenderam com Théo Brandão, fora do âmbito da escola de
Viçosa. Sua extraordinária contribuição como professor da
Universidade Federal de Alagoas, deixou uma outra academia, a
dos novos mestres.

“Théo Brandão formou a seu redor, na academia federal


alagoana, um círculo de discípulos que continuaram o trabalho após
seu desaparecimento – figuras de proa como Carmem Lúcia Dantas,
Vera Lúcia Calheiros, Fernando Lobo, Luiz Sávio de Almeida, Nuzi
Mendonça, Severina Abreu, Tereza Wucherer Braga e Josefina
Novaes. Seus dois discípulos mais atuantes, porém, foram José Maria
Tenório Rocha e Ranilson França”.

Douglas Apratto, em Alagoas Popular Folguedos e Danças


de nossa Gente, Instituto Arnon de Mello, 2ª edição 2014

541
ARTES & ARTISTAS

Mãos que tecem os bordados, que talham a madeira, que


amassam o barro e alinhavam palhas – e que fazem das dádivas da
natureza um artesanato singular, reconhecido e apreciado pelo Brasil
- estão transformando vidas e provocando uma “revolução
silenciosa” em todos os recantos de Alagoas. Um talento que se torna
uma marca nossa, de todos os alagoanos. O artesanato feito à mão
em Alagoas é um patrimônio, uma joia da cultura brasileira, um
elemento importantíssimo na composição da história, do
desenvolvimento social e econômico. São os mestres e mestras artesãs

542
que colocaram Alagoas no mercado nacional e internacional do
artesanato, e seus herdeiros e herdeiras que de posse do
conhecimento milenar de seus avós multiplicaram sua arte,
repassaram seus conhecimentos. Ou aqueles que chegam agora, com
a força do novo, em um círculo virtuoso de concepções artísticas que
nunca vai acabar.

Texto de abertura do livro Catálogo do Artesanato


Alagoano, Secretaria de Planejamento, 2014, texto de Mário Lima

ARTISTAS POPULARES DAS ALAGOAS

A arte popular de Alagoas é hoje uma referência importante


no mercado de arte nacional e internacional. Cada vez mais o
universo de colecionadores aumenta e nos itens mais cobiçados,
estão os artistas alagoanos. Esta constatação não vem somente da
análise de especialistas, mas também, de quem acompanhou de
perto o nascimento, a evolução e a consagração de nossos artistas.
Pessoas apaixonadas pela arte, que dedicaram grande parte de sua
vida no garimpo de obras populares em todas as regiões das
Alagoas. É o profissional ou o artista que tem o talento do “fazer

543
popular”, tira das riquezas naturais e culturais o material para seu
trabalho. Em Alagoas entre as mais importantes matérias primas
para uso artesanal estão o a madeira (principalmente a mangueira),
o barro (cerâmica); cipós (cestarias); couro do bode, do boi e do
peixe; metal (esculturas), rendas e bordados, tecelagem.

Antonio Deodato – Escultor e santeiro


Marechal Deodoro

Um santo presepeiro de ofício

O escultor e santeiro de ofício, Antonio Deodato Sobrinho


(1926-2012) era um negro forte e alto, com mais de 1,80 de altura,
em seus últimos momentos vivia na ponte aérea Maceió - São
Paulo, onde montou uma oficina e era professor de Artes . Sua
vida é uma história de cinema. Começou fazendo bonecos de
barro, que vendia na feira do Passarinho. Foi descoberto por Thé
Brandão, o mais importante folclorista alagoano. Théo, com seu
olhar de descobridor, levou Deodato para estudar no Liceu de
Artes e Ofícios, em Maceió. O garoto cresceu, fazendo de tudo nas
artes, mas sua escolha foi a madeira. Se transformou em santeiro
de ofício. Foi consagrado pelas centenas de São Francisco que
talhou e rodou o mundo. No Liceu, ele se transformou em
monitor, depois foi professor de Arte na Universidade Federal de
Alagoas, por notório saber. Com trabalhos de todos os tipos e
formas, o mestre Deodato foi um daqueles artistas mambembes
que não faz catálogos, nem tampouco sabe onde estão suas obras.

544
Na pedra, no cimento, no barro, na madeira, nas tintas, na cerâmica
e em tudo que lhe traga inspiração, é da alma do artesão de onde
vem a sua essência.

"A fonte de meu trabalho vem da alma, só pode ser da alma.


Quando vejo um tronco de madeira já fico ligado, sacando, olhando,
até que me dá um estalo. Mas é da alma e do coração onde tudo flui".

No Rio, com Cartola e Dona Zica


Deodato resolveu partir para o Sul Maravilha. A primeira
parada foi no Rio de Janeiro, onde desembarcou em 1947, depois
da Segunda Guerra, com a vontade imensa de ter seu trabalho
reconhecido. Viajou na terceira classe de um Ita do Norte, saindo
do porto de Jaraguá, em Maceió. Levou com ele uma única mala, e
que maaaala ele levava! "Era uma mala mesmo, daquelas de
madeira forrada com pano e pintada por mim. De um ladouma
onça brigando com a cobra, do outro um pavão vistoso com um
rabão enorme. Ela foi meu travesseiro no navio". Quebrado e
cansado, Deodato foi parar aonde todo Nordestino parava naquele
tempo, na Feira de São Cristóvão, que lhe deu abrigo. Lá, Deodato
fez de tudo, peças em madeira, pinturas e até lameiras de caminhão
com a máxima "Deus te Guie". Mas Deodato tinha estrela, e
daquelas que encandeia. Ele resolveu subir o morro, onde passou
um tempo de ouro, convivendo com Cartola e Dona Zica e os
sambistas da velha guarda da Estação Primeira da Mangueira, onde
Deodato começou a fazer arte nos barracos da Escola.

545
"Minhas alegorias eram feitas de papel marchê. Hoje é tudo
feito de resina e poliéster. Os carros quando entravam na avenida
tremiam, era um visual deslumbrante".

Santeiro faz imagem de cristo sangrar


É Fantástico! “É ele!". E as beatas correram até os pés do
santeiro Antônio Deodato. Postado na entrada da igreja Cristo
Ressuscitado, no bairro de Butantã, em São Paulo, o mestre
alagoano em artes de santo estava lívido e espantado com a
recepção. A algazarra das devotas tinha um motivo fora do
comum: o cristo em madeira talhado por Deodato sangrava no
altar, um líquido vermelho pingava o chão. "As mulheres pulavam
no meu pescoço, se ajoelhavam, me chamavam de milagreiro, até
um velhinho deixou as muletas e se esparramou aos meus pés". O
“sangue” era a tinta de resina desprendida da madeira, que deu a
Deodato a fama do santeiro que virou santo, em uma reportagem
no programa Fantástico da Rede Globo.
De espantador de urubu a lutador de Box
A arte e a criação sempre estiveram perto de Deodato, desde
sua infância sofrida em Maceió, quando ganhava tostões para
espantar urubu com vara nos matadouros de carne, até o momento
máximo do esporte, como estrela do boxe nos ringues brasileiros.
Deodato brilhou no Clube Espéria, em São Paulo e nas manchetes
da Gazeta Esportiva, até beijar a lona, com soco de seu adversário,
o Demolidor. "Um dia meti o focinho na lona e passei 22 dias
internados no Hospital Beneficência Portuguesa, com o nariz
arrebentado, parecendo mais uma tromba. O nocaute afastou de

546
mim os amigos, as namoradas e os fãs”. Uma de suas últimas obras
foi é o busto do Marechal Deodoro, que fica no trevo de acesso ao
Francês, da rodovia AL 101 Sul

ESCOLA DE CAPELA

João das Alagoas ganha o mundo

João Carlos da Silva, o João das Alagoas, é o porta


estandarte do artesanato alagoano, além de apoiar os artistas
alagoanos em feiras e exposições pelo Brasil, ele passa todo seu
saber para o que ele chama de “discípulos”. Seu território é o ateliê
na cidade de Capela, com espaço para exposição, criação e o forno.
É um mestre da cerâmica responsável por recriar o boi do bumba-
meu-boi, peça tão comum na arte figurativa popular brasileira.
Com as mãos, João faz surgir do barro grandes bois com seus
mantos esculpidos em baixo e alto relevo, representando histórias
do folclore nordestino, das brincadeiras de rua, dos casamentos,
dos batizados, enfim, as histórias do povo e suas tradições. O barro
é levemente colorido, numa técnica singular. João é autodidata,
sempre fez tudo sozinho. Desde pequeno, já se destacava na escola
através de seus desenhos. Usava o barro como brincadeira para
fazer boizinhos. Ele conta que aprendeu com a experiência e a
observação, e que a sua inspiração vem de outros grandes artistas
brasileiros, como o mestre Vitalino, sua principal referência.

Prêmios internacionais

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Há mais de dez anos, João das Alagoas vive de sua arte.
Tem um currículo imponente: ganhou vários prêmios de melhor
artesão em alguns Estados; uma menção honrosa, em Córdoba,
Argentina e muitas de suas obras integram importantes coleções de
arte popular que estão expostas em galerias do Recife, de São
Paulo, de Belo Horizonte, de Porto Alegre e do Rio de Janeiro.
João tem peças expostas também no exterior, como o Museu de
Cerâmica do México.

A Infância do mestre
Mas a arte está na vida de João da Alagoas desde pequeno.
Era do barro que ele, quando criança, criava seus próprios
brinquedos. Cavalos, bois, vaqueiros e cangaceiros faziam parte de
sua criatividade. Desde 1987, João das Alagoas sobrevive
exclusivamente da sua arte. Sua trajetória assemelha-se a de outros
artistas, também conhecidos mundialmente, como o mestre
Vitalino, sua maior inspiração, e Marliete, ambos do Alto do
Moura, em Caruaru, e tantos outros artesãos do qual considera suas
grandes fontes para seu aprendizado. O conhecimento também
veio dos livros e das matérias em revistas sobre os artistas
pernambucanos. A semelhança com eles não é apenas pelas
dificuldades com que deu início ao sonho de viver da arte do barro
em sua cidade, mas por formar discípulos de sua obra.Com as
mãos meladas de barro, água e manuseando uma faquinha,
diariamente seu João vai dando forma ao barro.

A arte do bumba meu boi

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O Bumba meu Boi é sua marca registrada, inspirado pelos
artesãos do Alto do Moura e que trouxe a estabilidade do mestre na
década de 90. Em seu ateliê, João das Alagoas trabalha ao lado de
outros artesãos que também viajam pelo mundo por meio de suas
obras e sobrevivem, exclusivamente, do trabalho deles com o
barro. Segundo o mestre, as orientações que ele deu não devem ser
vistas como ensinamentos e sim como oportunidades para que cada
um expressasse a sua história, seu talento, seus sonhos. Tanto é que
as obras são diversificadas, cada uma tem um estilo próprio.

“Antes de produzir bois, minha vida era bastante sacrificada e


o dinheiro arrecadado com a venda das outras peças mal dava para
fazer minha feira. Vivíamos assando e comendo. Mas com os três
prêmios que conquistei na Fenearte (Feira Nacional de Negócios do
Artesanato) proporcionaram minha estabilidade. Na época eu não
tinha minha casa própria e com esses prêmios comprei um terreno e
construí minha casa”.
Sil e as torres de cerâmica

Ex-cortadora de cana, Maria Luciene da Silva, a Sil, uma


ex-cortadora de cana que se tornou uma das mais expressivas e
talentosas artistas populares do Brasil. Sil faz parte da escola de
ouro do artesanato de barro de Capela, e teve como mestre, o
famoso João das Alagoas. Mas ele confirmou o valor de sua obra, e
João disputa o mesmo espaço na casa-ateliê de Capela. Suas torres
gigantes, escarpadas de bonecos de barro, com paisagens no fundo,
é algo espetacular. Seu casamento de matuto virou peça de

549
trabalho. Todo mundo quer. Na primeira visita que fez ao ateliê do
mestre já foi para ficar. E suas primeiras peças?

“Foi um cavalinho. No começo eram cavalinhos, bois e


pequenos bonecos. O nome Sil vem do tempo de criança, era assim
como era chamada pelos seus pais; meus pais não conseguiam
chamar o nome completo dos meninos, aí cada um tinha seu apelido...
Aí eu comecei a assinar como Sil, eu pensei em assinar Luciene, mas
não, Sil é um nome que eu trago de muito tempo”.

MESTRES DA ARTE POPULAR

Fernando da Ilha do Ferro – escultor em madeira


Ilha do Ferro – Pão de Açúcar

O encantador de madeira

“O que mais me encanta no artesanato é o resultado.


Quando eu estou fazendo uma coisa assim (uma peça), vem outra

550
na minha cabeça e aí eu deixo aquela e já começo a outra. E eu
não sei quando termina, quem diz é a peça”.
As palavras são do mestre popular Fernando Rodrigues,
uma das muitas almas imortais do rio São Francisco, que deixou a
sua história gravada nas madeiras, nas pedras e nos íngremes
caminhos das caatingas que cercam a Ilha do Ferro, em Pão de
Açúcar, um lugar idílico e encantado, onde nasceu, viveu e morreu.
O mestre faleceu no dia 10 de janeiro de 2009. A tradição da arte
popular da madeira vem desde a origem secular do vilarejo. Mas
foi o escultor Fernando Rodrigues dos Santos (1928-2009), ou
Fernando da Ilha do Ferro, ou Fernando da Calu, ou ainda,
Fernando do Japão (nome da vila onde nasceu), que fez a Ilha ficar
famosa. Ele inventou o design em arte bruta, quase selvagem, de
mesas, cadeiras e bancos rústicos, que o tornou uma referência
nacional em arte popular, pontuando a Ilha do Ferro entre os
maiores polos de arte popular do Brasil, na configuração de arte
como forma de expressividade de artistas do povo, a exemplo do
mestre Vitalino, de Caruaru (PE), Severino de Tracunhahém (PE) e
os mestres populares do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais,
e de Juazeiro do Norte, no Ceará”.

Cabeça de pensador
Artista popular fantástico, Seu Fernando não é letrado, mas
autor de um livro muito curioso. Ele organizou na memória uma
impressionante coleção de contos que garante serem totalmente
verdadeiros, com histórias de caças hilariantes, testemunhos sobre
Lampião e seu bando e aventuras inimagináveis, tudo saído de sua

551
cabeça de pensador. Para “não morrer e enterrar os causos”, ele
passou toda a história para suas filhas e filhos, e jovens que
chamou para escrever seu livro de memórias.

“Não é só da madeira que tiro minhas esculturas. Tem pedra


que é a cara de uma mulher. Eu fazia coisa pelas nuvens, deitado
nessas pedras, meio-dia, eu fazia pro chão. Eu via um tampo de uma
parede e já fazia desenhos. O que mais me encanta no artesanato é o
resultado. Quando eu estou fazendo uma coisa assim (uma peça), vem
outra na minha cabeça e aí eu deixo aquela e já começo a outra. E eu
não sei quando termina, quem diz é a obra”.

Uma herança consagrada


Em janeiro do próximo ano, Fernando Rodrigues estaria
completando 90 anos de vida. Hoje, certamente, ele estaria em sua
Ilha do Ferro, relembrando suas histórias, e acompanhando seus
filhos e filhas, genros e netos a continuar seu trabalho, sempre
inventando coisas saídas da natureza e de seus sonhos. Todos os
artistas populares do povoado falam de forma gentil e carinhosa do
mestre, como Petrônio, o que mais incorporou o imaginário do
“príncipe das madeiras”.

“Seu Fernando foi quem me deu as primeiras ferramentas. Ele


não tinha um pingo de ambição, o que ele gostava mesmo era fazer
arte”.

Aberaldo Santos - escultor em madeira

552
Ilha do Ferro – Pão de Açúcar

Pássaros, bichos e bonecos

Os pássaros em madeira do artesão Aberaldo Santos são


estilizados, coloridos, de todos os tamanhos e... só falta eles
cantarem. E não seria impossível em um cenário mágico como a
Ilha do Ferro, em Pão de Açúcar. Filho de um fabricante de
canoas, Aberaldo começou a trabalhar com a madeira desde muito
cedo. Porém, não seguiu a carreira do pai; foi com a arte figurativa
que Aberaldo mais tarde veio a se tornar um dos escultores
populares mais prestigiados do Brasil. Aberaldo já participou de
grandes exposições nacionais para mostrar e vender suas peças,
esculpidas em mulungu, uma madeira com textura mole, de onde
tira seus pássaros, rostos de figuras humanas, barcos e cobras.
Começou na roça, criando gado e ovelha no sítio do pai, Manoel da
Costa Lima. Mas ele ficou fascinado com o mundo do Velho Chico
e seus grandes navios, barcos, lanchas e canoas. Hoje seu forte são
seus pássaros e bonecos com raízes de pau. A madeira, geralmente,
é o mulungu, mais fácil de manusear e dar o entalhe. Ele também
faz gaviões, corujas, banquinhos rústicos e todo tipo de boneco,
alguns, revela “são auto-retratos meus, é o que comentam”.

“A Ilha do Ferro é cercada por dois riachos, quando chovia e


tinha muita trovoada, que se transformava em enxurrada. E lá
vinham aquelas madeiras como um presente abençoado que
encostavam-se à beira do riacho e nas pedras. Aí a gente começou a

553
se aproveitar dessas madeiras. Hoje não tem mais isso, a chuva que
bate é tão pouca que não dá nem para encher os riachos”.

Eraldo Dias Lima - escultor em madeira


Ilha do Ferro – Pão de Açúcar

O mais telúrico do mestres

Eraldo Dias Lima, com 70 anos, é o mais telúrico dos


mestres, e o mais humilde e introspectivo. Não sai de sua ilha por
nada, principalmente depois que sofreu um acidente em quase
perde a perna. Ele é assim, dramático e comovente. Quando a
reportagem o avistou, ele estava embaixo de uma frondosa
mangueira, em seu quintal, trabalhando um relevo de mulher. A
peça tinha um pouco de sangue, saído da mão do artesão ao cortar
o dedo com a faquinha de talhar (“Ah! Meu filho isso faz parte da
profissão, um cortinho aqui outro cortinho ali”. E de onde vem
tanta inspiração?

“A inspiração vem daqui mesmo. Quase todo mundo sabe


fazer, são pessoas inteligentes, muitos não fazem por preguiça. E eu,
assim doente desse jeito, não sei ficar parado, compro meu material,
boto no quintal e vou fazendo, fazendo. Ninguém me ensinou nada
não. Olhe moço, que eu não vou na casa de ninguém para espiar.
Gosto de fazer o que sai da minha cabeça. Tudo no mundo eu faço, se
botar pra fazer eu faço. É de família, todos eram artistas, meu pai era
sapateiro, meus primos faziam anel e alianças, e até espingarda”.

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José Petrônio Faria dos Anjos – escultor de madeira
Pão de Açúcar

A arte mágica do mago Petrônio

Com 49 anos, Petrônio já foi um assentado em


acampamento do Movimento dos Sem-Terra (MST) e hoje divide
seu dia a dia entre a pesca profissional (de subsistência) e o seu
trabalho de artista da madeira. Petrônio é um dos mais expressivos
artesão do local, o mais imagético de todos eles. Em seu sítio
Estrelo, onde está sua oficina, na entrada da Ilha do Ferro, o acesso
cercado por bonecos estranhos e totens de madeira fincados no pau
do arame farpado, ou espalhados pelo caminho. São dezenas de
troncos velhos esculpidos em que aparecem monstros, lobisomem,
carcaça de lagarto e calangos, cabeça de índio, papa vento, olhos
de sogra (uma imburana com olhos para todos os lados). Petrônio
iniciou sua carreira de artista popular em 2001, mas na infância já
reinava nas artes do brinquedo – fazia miniatura de aviões e
carrinhos - pois não podia comprar, por ser de uma família sem
posses. Mas o jogo virou quando conheceu o escultor Fernando
Rodrigues, que lhe lançou um desafio: fazer ex-votos de madeira
(cabeças, pés, mãos). “Ele me deu as ferramentas, uma glosa e um
serrote, e fui fazendo mais e mais. Eu ganhava de R$ 10 por
semana, e ele me pagou os mesmo R$ 10 numa única peça. Por
isto estou aqui até hoje”.

555
“De início não foi inspiração, mas necessidade e precisão.
Mas a vida com o artesanato e a pesca melhorou muito minha
situação. Faço o que gosto, meu trabalho vai do imaginário ao
utilitário, bancos, mesas, cadeiras, banquinhos, ex-votos, um pouco
de tudo da arte. Sempre inventando novas formas e sempre
observando a natureza”.

Valmir Lessa: cadeiras de raiz – escultor em madeira


Ilha do Ferro

O herdeiro de Fernando

Walmir é o mais próximo herdeiro de Fernando Rodrigues,


tanto pela forte influência no modo de fazer como de parentesco:
Valmir casou com a filha de Fernando, Rejânia. Mas a família tem
outros artistas como os netos de Fernando, Bedeu, Vandinha e
Camila. Valmir trabalha no Boca do Vento, ateliê que foi de seu
Fernando, que continua a ter uma forte presença no local. Valmir
abriu um pequeno quarto, com uma lâmpada pendurada no teto,
onde entre teias de aranha e muita poeira, surgiram obras primas
do mestre, entre ex-votos, bonecos e cadeiras. A reportagem
fotografou as peças. Valmir estava trabalhando o entalhe de um
totem, de madeira crua, com sua faca amolada. Ele conta que gosta
mesmo e se sente à vontade fazendo as cadeiras de raízes de pau,
aquelas que tornaram seu sogro famoso. “Eu já fazia as cadeiras
com ele, desde buscar as madeiras na serra, até o corte, a armação,

556
o alongamento dos galhos e cipós. Por isto faço com sabedoria, foi
ele que me passou tudo”.

“A maioria das coisas já vem pronta. Já são feitas pela


natureza. Tem uma cadeira aqui que eu só coloquei o pé. O povo diz
que eu sou bom, mas eu olho a madeira morta e digo: ‘Isso aqui vai
dá um pássaro. Ou, isso aqui dá uma cadeira’. Enxergo o que já
existe ali”.

Vavan - escultor em madeira


Ilha do Fero

Impecável na arte final

Edvan Alves de Lima, 56 anos, é outro estreante como


artista de madeira da Ilha do Ferro, e já chega com uma coleção
peças de encher os olhos: onças, peixes, pavões, luminárias ornada
de pássaros, lagartos, em uma fauna colorida e imaginativa. Seu
ateliê às margens do São Francisco estava repleto de peças, com
uma variedade incrível de arte figurativa. Ele trabalhava na olaria
do pai fazendo telha, “quase como um trabalho escravo, 12 horas
por dia”, quando há quatro anos se libertou do duro trabalho e
mergulhou no universo da madeira. Mas Vavan já fazia canoinhas,
e pegou uma encomenda de seis unidades da prefeitura de
Piranhas. E a partir daí não parou mais.

557
“O artesanato na minha vida esteve sempre presente, desde
cedo, quando “reinava” com um serrote fazendo peças,
principalmente canoas que até hoje é a que mais gosto. Minha
inspiração vem desde menino, tenho uma visão muito na frente, meu
desejo é sempre transformar e buscar algo novo. Qualquer pau eu
transformo numa peça. Muitos aí trabalham com o pau feito. Eu olho
o que tenho em mãos, vejo as formas, e deixo minha imaginação
fluir”.

Vieira – escultor em madeira


Ilha do Ferro

Pássaro, gente e barquinho

José Bezerra Sandes Viera, o Vieira, 54 anos, também é


outro grande escultor de madeira da Ilha e um dos preferidos dos
galeristas de Alagoas e de todo o Brasil. Seu talento é inigualável e
suas peças são reconhecidas num simples olhar, são objetos de arte
singulares, seus pássaros são minuciosamente talhados. Todos
belíssimos. Antigamente ele criava os bichinhos de verdade na
gaiola. “Mas eu deixei, não quero mais prendê-los. Presos, só estes
meus pássaros de madeira”. Vieira começou no roçado, depois se
transformou em carpinteiro, quando começou a trabalhar as
esculturas. Viera também fez muitos galos-de-campina, araras e
sabiás, como também centenas de miniaturas da famosa canoa de
Tolda, embarcação do Velho Chico.

558
“Tem que ter cabeça para saber o que você vai fazer da
madeira. Eu de imediato já vejo formas nela. Mas prefiro desenha
primeiro no papel e depois ir elaborando a obra. Gosto de misturar
as cores, acho que fica tão bonita quanto à natureza do lugar”.

Zé Crente - escultor de madeira


Ilha do Ferro

Obras de arte no quintal

José Alvaci Dias de Melo, o Zé Crente 55 anos, vai logo


falando sem se importar com qualquer pieguice ou vanglória, mas
de forma natural: “Meu nome é Zé Crente, sou conhecido no Brasil
todo, já saí na Globo News, e tenho peça até nos Estados Unidos”.
Ele é mesmo uma figura extrovertida, um grilo falante, que divide
seu cotidiano entre sua arte em madeira, e as profissões de pedreiro
e coveiro do cemitério da Ilha. Ele não pára na sua lida diária,
continua a trabalhar em seu quintal, enquanto não constrói seu
ateliê. Guarda a suas peças em uma geladeira quebrada.

“Eu brincava com a madeira desde criança, juntava a


meninada fazia cobra, passarinhos, índios, Lampião e barquinhos.
Quando meu pai morreu meti a cara no trabalho e aprendi a arte do
artesanato. Foi quando entrou na minha vida o seu Fernando,
conselheiro de todas as horas. Nós íamos para mata pegar os paus, e
comia rapadura com farinha e queijo”.

559
Manoel da Marinheira –escultura de madeira
Boca da Mata

O mágico da jaqueira

Em Boca da Mata, a 80 km de Maceió, está um santuário de


arte popular em troncos de madeira, também conhecida por ser a
cidade onde nasceu o artista Manoel da Marinheira (1917-2012).
Suas esculturas representam um legado para Alagoas, com
reconhecimento no Brasil e no mundo. Sua família e seus
discípulos continuam a tirar dos troncos de jaqueira peças que
mostram o imaginário da fauna do planeta - de miniaturas a obras
colossais - como onças, leões, peixes, macacos, tatus, bois, gatos,
elefantes, jacarés, ursos com peixe na boca, esculturas imensas de
várias faces. Manoel da Marinheira também incentivou os filhos
que se interessavam pela arte. Antônio, Maria Cícera e Severino
são filhos do primeiro casamento. Maria Cícera foi a única que não
seguiu os passos do pai, mas do avô. Ela é escultora de imagens
sacras, que podem ser vistas em seu ateliê e no museu da cidade. Já
Manoel da Marinheira Filho e André da Marinheira são os filhos
do segundo casamento seguem também a arte do pai. Aos 12 anos,
Manoel começou a esculpir “escondido” do pai, quando foi
“flagrado” por Liberalino. Quem conta essa história do despertar
de Manoel para as artes, é um de seus filhos, André da Marinheira,
numa manhã de verão, em seu ateliê na Boca da Mata.

560
“Meu avô perguntou – o que você leva escondido aí, rapaz –
meu pai ficou aperreado e derrubou as ferramentas e o coelho que
havia começado. Meu avô deu um sorriso e devolveu a peça a
Manoel. E ele começou a fazer peças uma atrás da outra, e
presepadas com suas fantasias. Uma vez ele colocou uma de suas
onças em uma corrente amarrada no esteio de sua casa. Um agente
da Sucam (que trabalhava no controle da malária) ao ver a onça
pulou pela janela e saiu correndo em disparada, morrendo de medo”.

A tradição continua
André é um dos 20 filhos que Manoel teve em dois
casamentos, dez do primeiro e mais dez do segundo. Quinze estão
vivos, e cinco seguiram a carreira do pai: Maria Cícera, Antônio e
Severino, mudos de nascença – conhecidos como os mudinhos, e
Manoel e André da Marinheira. Assim como seu pai, Dete Barros,
esposa de Severino, é quem cuida do ateliê dos irmãos surdos, e
resolve problemas de encomendas e das participações em feiras e
exposições. O ateliê dos surdinhos é na garagem da casa onde
vivem, bem próximo a entrada de Boca da Mata. De lá saem peças
maravilhosas, bem similares as que eram esculpidas pelo pai, que
são mais rústicas. André começou a fazer sua arte em madeira aos
12 anos, quando esculpiu sua primeira peça, um tatu; com 15 anos
se especializou e refinou sua produção, e aos 48 anos mostra a
força de sua produção, e diz estar feliz por contar a história das
gerações da família Marinheira. O artista diz que já ensinou o
ofício a mais de uma dezena de discípulos.

561
E a saga da família Marinheira vai seguir em frente, com a
quarta geração. Depois do bisavô LIberalino, do avô Manoel e do
pai André, o garoto Andrezinho, com nove anos, já está na boca do
povo. “Outro dia ele chegou para mim e disse: painho rabisque um
peixe para eu cortar. Ele fez e um cliente comprou a peça, eu noto
que ele está inspirado”, finaliza André, com uma ponta de sorriso.

Marinheira ganha o mundo


O talento do artista fez com que suas obras o tornasse
conhecido nacionalmente. Exemplo disso é uma onça suçuarana,
exposta no Memorial da América Latina, em São Paulo. Mas aqui
mesmo, no Balneário Águas de São Bento, em Boca da Mata, está
o Museu Manoel da Marinheira, com curadoria do empresário
Jorge Tenório, desde os anos 1970 coleciona obras da família
Marinheira. São mais de 1200 peças espalhadas por dez salas,
lotadas de obras de arte. Foi também na década de 70, quando o
fotógrafo e pesquisador Celso Brandão e o pintor alagoano
Fernando Lopes descobriram o escultor, que o trabalho de Manoel
da Marinheira ganhou mais visibilidade. Eles começaram a
divulgar as obras junto a artistas e intelectuais da época. Daí em
diante as obras dele ganharam o mundo. Hoje o mestre tem peças
nos Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, França.

Nos 101 anos do genial artista


Para marcar o primeiro ano do centenário de Manoel da
Marinheira a revista Graciliano da Imprensa Oficial de Alagoas

562
promoveu em julho de 2017 a exposição “A Floresta Encantada
Manoel da Marinheira”, no Complexo Cultural anexo do Teatro
Deodoro, a maior de toda história das artes alagoanas. Sessenta
esculturas do pioneiro e dos filhos e discípulos que formam a
família Marinheira foram vistas por mais de cinco mil visitantes. A
mostra fez parte da programação oficial das comemorações dos
200 anos de emancipação política de Alagoas, e tem o apoio da
Diretoria de Teatros do Estado de Alagoas. Na produção do
espetáculo foram precisos quatro caminhões-baú, 24 carregadores
e empilhadeiras, para transportar um volume de mais de 15
toneladas de esculturas maciças de madeira, trazidas do Museu
Manoel da Marinheira, localizado na fazenda Bento Moreira, em
Boca da Mata, Zona da Mata alagoana. O acervo é do colecionador
Jorge Tenório, da Usina Triunfo, um aficionado pelas esculturas de
Manoel da Marinheira e sua família, entre eles André, Antônio,
Severino, Manoel Filho e o discípulo Fábio. O Museu foi aberto
em 2005, e possui mais de 1.200 peças.

Pedroca – escultor em madeira


Maceió

563
O poeta da madeira

Mestre Pedrocas nasceu em Viçosa, foi criado em Olho d


´água do Casado, e até 1978 fez suas artes em Arapiraca, onde foi
discípulo de Zezito Guedes, consagrado escultor. Pedrinho, como
era chamado na infância, começou a esculpir em legumes
arrancados da roça da família. A batata doce e a macaxeira
viravam macacos, passarinhos. Mas pra seu desconsolo, dois dias
depois a peça estava seca e mofada.

“Minha trajetória do escultor teve início aos sete anos, por


influência de minha mãe, que fazia arte em argila. Vendo
diariamente ela transformar o barro em utensílios de louça
utilitária, como panelas, frigideiras, potes de todos os tipos. Eu
comecei da argila, já que minhas esculturas em legumes não
duravam muito. Depois conheci e me apaixonei pela madeira,
pedra, resina e hoje faço artes até em coco”.

Resêndio – escultor de madeira


Porto Real do Colégio

564
Os bonecos do mestre Resêndio

Do alto de seus 72 anos, o escultor Resêndio da Silva, vive e


trabalha em sua casa-ateliê, em Porto Real do Colégio, no Baixo
São Francisco alagoano, terra onde nasceu, e faz desde os 60 anos
seus belíssimos bonecos de madeira, para o Brasil e para o mundo.
Mesmo com seu jeito tímido, simples e franciscano, mestre
Resêndio vive hoje sua fase consagradora, como um dos maiores
artistas populares do Brasil, muito requisitado por galerias de arte,
colecionadores, decoradores e especialistas de arte e design de todo
país. Segundo o fotógrafo e pesquisador de arte popular Celso
Brandão, um museu de arte contemporânea da cidade americana de
Palo Alto, na Califórnia, está preparando um salão para receber
uma coleção de bonecos do mestre Resêndio. Na galeria
Karandash, em Maceió, a proprietária, a artista visual Maria
Amélia Viera, comemora a boa fase do mestre, com um estoque de
mais de 100 peças compradas a Resêndio.

“Eu estive lá e vi que tem mesmo. Um dos espaços estava


lotado de bonecos meus, e no andar de cima tinha outros tantos. Hoje
não tenho a mínima ideia de quantos bonecos eu já fiz, mas tenho
peças espalhadas por todo o país, São Paulo, Rio, Bahia, Minas
Gerais”.

Mestre Dedé – escultor


Lagoa da Canoa

565
Uma arte para sempre

Em Lagoa da Canoa, no agreste alagoano, o escultor


Antônio Alves dos Santos, o mestre Dedé, não pára. Patrimônio
Vivo de Alagoas, 64 anos, talhava com uma enxó a sua última
peça, antes de se internar em um Hospital de Arapiraca, por
recomendação de sua médica. Ele estava com lesão no estômago e
um câncer provocado por 30 anos de tabagismo, 30 anos de fumo
de corda em cigarros de palha. Até então seu único vício, pois não
toma bebidas alcoólicas. No quintal de sua casa, onde gosta de
fazer suas peças, o mestre estava sorridente, para ele “o que
importa é ser feliz e fazer o que gosta”. Sua face negra está cortada
por sulcos, bem diferente quando tinha 50 anos. Os cabelos estão
brancos, o sorriso sempre presente, muito simpático, responde bem
às perguntas. A gente vê que é mestre de verdade. Ele mostra seus
três totens que estavam em seu ateliê com figuras cumpridas e
delgadas, muita expressividade nas figuras talhadas, e
dramaticidade nas cores, que são as marcas mais evidentes de sua
obra.

“Faço maior, faço menor, faço o que a pessoa quiser, ou levar


da maneira que está. Comecei sem compromisso, mas hoje minhas
histórias são civilizadas e contemporâneas. Tenho estilo próprio, e
sei que muita gente admira e do meu jeito acho bonito o que faço.
Desde criança trabalhava fazendo arte, e ainda estou aqui, mas acho
que não somos valorizados como trabalhadores de baixa renda. Um

566
totem desses poderia valer até R$ 50 mil, tenho meus gastos com a
peça, mas o pessoal quer comprar por R$ 2 mil, R$ 3 mil”.

Arlindo Monteiro – escultor


Maceió

A arte em um palito

Faça-se a luz, em latim fiat lux. Foi assim, num lampejo de


um sonho, que o artista popular pernambucano, Arlindo Monteiro,
56 anos - que vive em Alagoas há mais de 40 anos – deixou de
trabalhar com escultura em troncos de coqueiro, de até quatro
metros e meia tonelada de peso, para começar suas obras primas
em miniaturas de palito de fósforo, com quatro centímetros de
comprimento, e peso quase zero. Hoje ele faz miniaturas como
ninguém, de São Jorge no seu cavalo a todos os personagens do
alto de Guerreiro, folclore mais conhecido e admirado de Alagoas.
No tablado de seu ateliê é possível ver, protegidos por tubos de
ensaio, vidros de válvula e bolas de cristal, personagens do
cotidiano e da história popular, como pescador, surfista, bailarina,
aviador, Lampião e Maria Bonita, e peças complexas como o
bumba meu boi, a primeira missa do Brasil. E santos, muitos
santos.

“Tudo começou quando um amigo me avisou que tinha na


praia da Avenida mais de dez coqueiros derrubados. Fui lá e trouxe
até aqui, no meu ateliê do Mercado Central, empurrando os rolos

567
com os pés e cortando no braço as toras em 20 pedaços. Fiquei com
as mãos sangrando. Cheguei lá em casa e pensei: meu Deus, porque
a gente trabalha tanto e passa tanta dificuldade. Fui dormir e tive um
sonho com um cristo entalhado em um palito de fósforo. Quando
acordei me veio a inspiração. Eu tinha em casa um pacote de fósforo
com dez caixas e gastei todas as dez para fazer o Cristo crucificado.
Não tinha pintura, não tinha nada, mas fiquei feliz por ter feito algo
diferente”.

Raimundo das Favelas – escultura em madeira


Lagoa da Canoa

A escultura migratória

A vida do escultor popular Raimundo Batista de Oliveira,


55 anos, é o próprio roteiro e enredo de um filme sobre um rapaz
nordestino que, como tantos outros, deixa sua terra natal em busca
de emprego no “Sul Maravilha”. Uma saga muitas vezes vista,
escrita, contada e cantada. Raimundo das Favelas, nome de artista,
como se auto-denominou, mostra em sua obra a importância de
suas mudanças e adversidades no processo de migração a que foi
submetido, de certa forma determinante na construção de sua
personalidade e de sua linguagem artística. Ele nasceu na
comunidade rural de Alto Cruzeiro, município de Lagoa da Canoa,
no agreste alagoano. Na sua via-sacra morou em Arapiraca (AL),
Aracaju (SE) e em São Paulo. Nesta última viveu até os vinte anos.
Na capital paulista trabalhou na fábrica de calçados Lambert, com

568
os restos do couro fazia artesanato para vender em frente ao Museu
do Ipiranga. De volta a Alagoas começou a trabalhar com
artesanato. Raimundo foi descoberto pelo mestre Zezito Guedes,
escultor popular de infinita grandeza, reconhecidamente um
formador de novos talentos, nascido na Paraíba, mas que escolheu
Arapiraca como sua terra há muitos anos.

“A partir do momento que me tornei discípulo de Zezito as


portas do circuito nacional da arte popular brasileira se abriram
para mim, além do estímulo que me fez buscar novas formas para
minha escultura. Logo me vieram as lembranças do que eu havia
vivido em São Paulo, as paisagens urbanas e a forma de morar e
viver das pessoas em encostas e favelas, ambiente em que vivi
também”.

Olhares da arte popular alagoana

A arte popular de Alagoas é hoje uma referência importante


no mercado de arte nacional e internacional. Cada vez mais o
universo de colecionadores aumenta e nos itens mais cobiçados,
estão os artistas alagoanos. Esta constatação não vem somente da
análise de especialistas, mas também, de quem acompanhou de
perto o nascimento, a evolução e a consagração de nossos artistas.
Pessoas apaixonadas pela arte, que dedicaram grande parte de sua
vida no garimpo de obras populares em todas as regiões das
Alagoas. Gente como o fotógrafo, cineasta e pesquisador Celso
Brandão; os artistas visuais e donos de galeria, Maria Amélia

569
Vieira e Dalton Costa; e Tania Maya Pedrosa, pintora,
colecionadora e autora de livros sobre cultura popular. Entre outros
grandes colecionadores do estado, que podem ser considerados
como guardiões da arte popular alagoana.

De máquina em punho
O fotógrafo Celso Brandão é um dos mais conceituados
conhecedores e colecionadores da cultura popular. Em sua casa, no
sítio Carababa, no bairro de Ipioca, no litoral Norte, estão
guardados tesouros da arte genuína de diferentes escultores e
pintores alagoanos. As esculturas estão por toda casa, nos
corredores, na sala, na varanda e nos jardins. Peças grandes como
uma mesa de centro colorida para jogos de roleta, com cadeiras de
madeira do escultor Fernando da Ilha do Ferro; totens e máscaras
incríveis de mestre Dedé; pássaros de Viera, e uma das primeiras
onças esculpidas pelo genial Manoel da Marinheira. Segundo
Celso, há mais de 50 anos ele registra a arte popular, incluindo
suas incursões com o mais importante antropólogo alagoano Théo
Brandão. Celso registrou, na maioria das vezes em fotos em preto e
branco, o folclore, a dança, os autos, as esculturas e a arte que
brotam em Alagoas. E ao mesmo tempo, aumenta sua coleção,
como apaixonada pelos grandes mestres da madeira.

“Desde muito jovem, os objetos artesanais me provocavam um


verdadeiro fascínio: miniaturas de barro, carrinhos de madeira ou
máscaras de carnaval me levavam a percorrer feiras e bairros para
comprá-los e conhecer seus fabricantes no ambiente doméstico ou de

570
trabalho. No final do ano assistia àquela variedade de folguedos
natalinos, chegando a dançar como pastor do cordão azul, na Matriz
de Viçosa. Vivências de infância e juventude que me marcaram e
prosseguem trilhando novos ou velhos roteiros. De máquina em
punho, encontrei um sentido maior para essas incursões”.

Entre o popular e o contemporâneo


O casal de artistas plásticos Maria Amélia Vieira e Dalton
Costa, curadores e proprietários da galeria Karandash, vivenciam -
desde 1986 -, todos os passos da arte popular alagoana, sendo
responsável pela introdução de nossos mestres no mercado de arte
brasileiro. No início, nos primeiros dez anos, eles faziam parte de
uma “proposta radical” do universo contemporâneo e cosmopolita
das artes. Mas foram seduzidos pela arte popular. “Aos poucos,
assistimos a nossa coleção de arte popular invadir o espaço físico
da Galeria, e daí, para acreditar que ficaria bacana promover o
diálogo das nossas obras com as obras da coleção... Foi rápido. E
gostamos do resultado. Nossa galeria assume hoje um espaço
fundamental no mercado de arte brasileira, porque é a
representação mais completa da arte do Nordeste”, revela Maria
Amélia. Mas não foi fácil chegar até o bom momento vivido hoje
pelas artes alagoanas. Somente nos anos 1990, começam a surgir
os grandes nomes de mestres, e a comercialização de seus produtos
para grupos especializados, como colecionadores, gente da
decoração e do design e galeristas.

571
“Hoje os colecionadores, os amantes e interessados na arte
popular pipocam nos quatro cantos do país. Alguns complementam
suas belas coleções com obras significativas dos nossos artistas,
outros iniciam uma coleção. Muitos Colecionadores de arte
contemporânea também colecionam arte popular. São Paulo ainda é
o maior consumidor de arte do país, também de arte popular. A arte
popular tem o frescor da inventividade e é tida hoje como algo
absolutamente necessária na vida dos apaixonados por estética, por
cultura, por arte”.

Tânia e seu museu de arte popular

Tania Maya Pedrosa é uma das maiores divulgadora da arte


popular alagoana. Ela é autora de publicações como Arte Popular
de Alagoas, 2004, um livro-ícone com grandes histórias e
personagens. Apaixonada pelo arte popular alagoana, ela fez de
seu apartamento, em Maceió, um verdadeiro museu de arte
popular. São peças de madeira, de ferro, pinturas, miniaturas de
artistas com Fernando Rodrigues, Resêndio, Vieira, Cigano,
xilogravuras de Enéas Pica-Pau, raridades do pernambucano
Vitalino, e muitos quadros e telas com arte naif, da qual ela é uma
das maiores expressões. São dois andares de pura obra de arte.
Trata-se uma coleção privada, não aberta ao público. Foi em terras
alagoanas, como senhorinha de engenho, educada para o erudito,
que se apaixonou pela beleza do folclore, em suas feições mais
populares. Tania foi durante mais de dez anos titular do Conselho
Estadual de Cultura, quando começou a realizar suas pesquisas em

572
longínquos locais, à procura de artistas do povo. Hoje seu acervo
de arte popular é uma referência nacional, seus velhos e novos
amigos artesãos também estão consagrados e exportam sua parte
para o Brasil e para o mundo. A pintora tem parte de sua coleção
exposta em mostra permanente na sede do Instituto Nacional
Histórico e Geográfico (Iphan), no bairro de Jaraguá, na capital
Maceió.

O brilho do artesanato de Alagoas

Fios e Tecidos (Bordados de Alagoas)

É um artesanato verdadeiramente feminino; “tu me ensina a


fazer renda, que eu te ensino a namorar”, insinuam os homens,
que sabem muito bem que bordar, rendar, inventar bicos com
singeleza não é com eles. As mulheres tecem seus bordados
trabalham como abelhas rainhas, todas juntas, numa colmeia
chamada linha de montagem. É tudo feito à mão, com trabalhos
divididos entre elas: cortar, desfiar, alinhavar, bordar, lavar e
engomar. São toalhas, panos, jogos de cama e mesa, em um
trabalho milenar que hoje transforma a vida da mulher alagoana.

Dona Iracema: Bordados à luz de candeeiro

Em Entremontes, distrito da cidade de Pìranhas, uma


bucólica paisagem de pracinhas, ruas estreitas e antigos casarões
coloniais. O cotidiano de homens e mulheres é diferente, mas

573
similar. Os homens, que vivem da pesca no Velho Chico, costuram
as redes de pesca de náilon rompida por peixes e pedras do rio, na
sombra dos arvoredos. E as mulheres bordam. Dona Iracema
Araújo Sarmento, trabalha com bordado desde os oito anos. "A
arte do bordado saiu da minha própria cabeça e aprendi por conta
própria. Aos 10 anos comprei meu primeiro bastidor (armação
redonda em madeira para dar apoio ao bordado) e a agulhinha de
costurar. Hoje sou uma das lutadoras do corte e do bordado", se
orgulha Iracema. Com dificuldades de visão, "pelas noites de
bordado na luz do candeeiro", dona Iracema diz que só vai deixar o
bordado quando não enxergar mais. Com o dinheiro ganho da
costura ela compra roupas para os filhos e filhas.

Ivete Sangalo se rendeu ao bordado


O facebook da Companhia de Bordados de Entremontes –
dona Iracema é uma das fundadoras – registra a visita, em abril de
2015, da cantora brasileira Ivete Sangalo. Que lá mesmo brilhou
com seu vestido branco todo bordado, em frente à sede da
companhia. São 70 costureiras e bordadeiras que integram a
companhia, fundada em 2002, que faz do bordado em linho
Panamá e cambraia um caso de sucesso na inclusão social em uma
das regiões mais pobres do país. As peças são vendidas para todo o
país, e já foram expostas no exterior, como em Milão, polo
mundial de moda. Na cidade, a tradição do bordado foi passada de
mãe para filha desde o século 19, quando a colonização portuguesa
trouxe os primeiros desenhos de ponto e linha como o labirinto, o
rendendê e o ponto de cruz.

574
Bordado de filé

Ainda nos anos 1990, a mais lendária estilista alagoana Vera


Arruda (1966-2004), já usava o bordado filé em suas roupas
tropicalistas, com as cores do Brasil, nas passarelas nacionais e
internacionais. E o filé pegou. De acordo com percentual do
Programa do Artesanato Brasileiro em Alagoas (PAB), mais de
nove mil artesãos inscritos no Sistema de Cadastramento do
Artesanato Brasileiro, 70% trabalham com o filé , o bordado
tradicional alagoano. Pronto para seu reconhecimento como
Patrimônio Cultural do Estado, o filé é a principal fonte de renda
das famílias do Pontal da Barra e de várias comunidades de
Marechal Deodoro. O filé é bastante valorizado no resto do país
pela tradição, autenticidade e riqueza de detalhes em todas as
peças.

Bordado Meia Noite

Na Ilha do Ferro vivem cerca de 200 famílias, que se


sustentam por meio da pesca, de atividades agrícolas e, sobretudo,
do artesanato. Junto às esculturas e aos móveis de madeira, o
bordado boa-noite é um dos pilares desse artesanato. Criado há
mais de um século, o bordado é uma variação da técnica do
redendê, um ponto descoberto por países nórdicos (Dinamarca,

575
Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia), e que chegou a nossas
plagas graças à herança portuguesa nas comunidades ribeirinhas do
São Francisco. Dentre as flores da localidade, foi em especial a flor
denominada “boa-noite” que serviu de inspiração para os primeiros
bordados, aplicados sobre os fios desfiados de linho, e acabou por
dar nome à nova técnica. A Cooperativa Art-Ilha, onde se reúnem
mais de 40 mulheres bordadeiras de todas as idades, é a maior
responsável pela produção e comercialização dos artigos de cama,
mesa e banho, que apresentam ricos detalhes feitos com o bordado
boa-noite.

Renda de Bilro

São Sebastião - no Agreste alagoano – é a capital dos bilros


de Alagoas. A renda de bilro é uma tradição no município,
localizado a 100 km de Maceió. A prefeitura mantém uma escola
para que a arte não se perca. Na sala de aula, estão meninas entre 8
e 12 anos, e mulheres, que ainda teimam em aprender o ofício.
Para todas, Clarice Severiano dos Santos, 74, é exemplo. Não há
quem não a conheça na cidade. As peças dela, feitas com muito
primor, são vendidas pelos quatro cantos do país. No cotidiano, a
força de vontade dessa mestra impressiona. “Eu faço renda todo
dia. Só paro à noite, depois das 11 horas, quando a minha filha
mais nova chega da faculdade. Ela estuda em Penedo”, conta. Com
essa peleja toda, a vista e a coluna reclamam. “As costas doem.
Passar o dia inteiro sentada nessa cadeira não é brincadeira”,
admite. Os óculos ficam bem rentes ao rosto. São aliados

576
inseparáveis. O ofício foi repassado às três filhas, Maria, Josefa e
Djenalva, e à neta, Amélia. “Com 8 anos, eu já colocava as
meninas para aprender o bilro. Segui a lição da minha mãe, Maria
das Dores. Criança, eu já ganhava meu dinheirinho. Comprava
boneca, casinha”, diz. Interessante também são os nomes dos
pontos. As alunas sabem de cor: olho de pombo, tracinho, bico
Ester, feixe de lenha. Tem também o dedo do cão, mas Dona
Clarice pede que esse não seja pronunciado. “É feio, preferimos
dizer Serra de Catatu”, afirma. Trata-se de mais uma superstição da
mestra de São Sebastião.

Barro ou cerâmica

No romance Calunga, de Jorge de Lima, ao falar da pobreza


entre os ribeirinhos das lagoas, ele escreveu que o povo já estava
acostumado a comer “barro cru, tijolinho de massapé cozido –
vermelhinho – e mascar bolões de barro cozido, cacos de telha e
balas de badoque”. Mas isto deve ter ficado no passado, porque o
barro virou matéria prima nobre para uma arte que tornou Alagoas
conhecida dentro e fora do país. Em todas as 11 cidades ribeirinhas
do Rio São Francisco tem produção ceramista. O movimento na
feira do barro de Penedo é grande, a de Porto Real do Colégio, é
outro polo, neste último, as ceramistas são chamadas de louceiras,
e as peças louças. A cerâmica indígena de Porto Real também é
forte. Existem outros centros produtores de barro, como Lagoa da
Canoa, Matriz de Camaragibe e Viçosa.

577
As cabeças de barro de Dona Irinéia

A artesã Dona Irinéia, mestra do Patrimônio Vivo de


Alagoas, liderança do povoado quilombola do Muquém, em União
dos Palmares, apesar da idade, está sempre em ritmo de produção,
ajudada pelo marido Antonio Nunes. Em 2014, o barro de Alagoas
foi atração na Copa do Mundo do Brasil, quando artesãos da terra
mostraram seu trabalho em exposição itinerante pelas cidades-sede
da Copa. Mas o maior sucesso mesmo, foram as cabeças da artesã.
Suas peças rodaram por São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e
Brasília, com mais 90 diferentes peças de artesanato alagoano. Só
para a Copa, ela teve que confeccionar 300. “Estou bastante
contente em participar com a minha arte nesse evento tão
importante para os brasileiros. É a cerâmica de Alagoas vista pelo
mundo”, vibrou. Dona Irinéia entende do riscado. Ela faz de uma
bola de barro a arte crua dos bonecos há 37 anos, e foi vencedora
de inúmeros prêmios municipais, estaduais e nacionais, tem
esculturas expostas por todo o território nacional. Através delas dá
seguimento aos ideais de liberdade, motivo de orgulho para os
alagoanos, em especial, às mulheres da comunidade quilombola
que têm em sua imagem, exemplo vivo de resistência.

Os bois de João das Alagoas

No barro, um bumba-meu-boi de tamanho real. João Carlos


da Silva, o João das Alagoas, é o porta estandarte do artesanato
alagoano, além de apoiar os artistas alagoanos em feiras e

578
exposições pelo Brasil, ele passa todo seu saber para o que ele
chama de “discípulos”. Seu território é o ateliê na cidade de
Capela, com espaço para exposição, criação e o forno. É um
mestre da cerâmica responsável por recriar o boi do bumba-meu-
boi, peça tão comum na arte figurativa popular brasileira. Com as
mãos, João faz surgir do barro grandes bois com seus mantos
esculpidos em baixo e alto relevo, representando histórias do
folclore nordestino, das brincadeiras de rua, dos casamentos, dos
batizados, enfim, as histórias do povo e suas tradições. O barro é
levemente colorido, numa técnica singular. João é autodidata,
sempre fez tudo sozinho. Desde pequeno, já se destacava na escola
através de seus desenhos. Usava o barro como brincadeira para
fazer boizinhos. Ele conta que aprendeu com a experiência e a
observação, e que a sua inspiração vem de outros grandes artistas
brasileiros, como o mestre Vitalino, sua principal referência. Há
mais de dez anos, João das Alagoas vive de sua arte. Tem um
currículo imponente: ganhou vários prêmios de melhor artesão em
alguns Estados; uma menção honrosa, em Córdoba, Argentina e
muitas de suas obras integram importantes coleções de arte popular
que estão expostas em galerias do Recife, de São Paulo, de Belo
Horizonte, de Porto Alegre e do Rio de Janeiro. João tem peças
expostas também no exterior, como o Museu de Cerâmica do
México.

Fibra

579
Ao lado da cerâmica (barro e argila) e da madeira, a fibra de
uso artesanal é a de maior atividade e geração de emprego no
Brasil, e também em Alagoas. Foram os índios que criaram as
técnicas originais de trançar as fibras vegetais; principalmente pela
diversificação desta fibra. Em Alagoas existem centros de
produção de fibras de coqueiros, palmeiras e bananeiras, folhas de
taboa e a planta trepadeira - o cipó. É um artesanato leve, não pesa,
basta ter habilidade na mão, no manuseio da costura e na
inventividade do artesão. Os objetos são os mais diversos, vão
desde os artefatos indígenas – até hoje produzidos – como
máscaras, cocares, tiaras e braceletes, até todo tipo de cestaria.

Bananeira (palha e tronco)

Em Maragogi, litoral Norte, as conhecidas "Mulheres de


Fibra", devido a matéria-prima que usam para fabricação de peças
de artesanato, vendem sua produção em assentamentos agrários
(Água Fria e Massangana). Ao desfibrar a folha e o tronco da
bananeira, e transformá-los em fios de tecer, elas produzem objetos
utilitários – passadeiras, jogos americanos, porta copos, bolsas e
carteiras, comercializados em feiras de diversos Estados do Brasil.

Palmeira Ouricuri (palha)

Existem centros de produção e venda em cidades do litoral


Sul, como Penedo, Feliz Deserto e Coruripe, mais propriamente no
Pontal do Coruripe, onde se instalaram as artesãs. Com o uso da

580
palha elas realizam a própria preservação do meio ambiente, com a
reciclagem da matéria-prima, e garantem o sustento da família. O
trabalho das cesteiras é conhecido em todo Brasil e exterior. A
marca do artesanato são cestas, bolsas e objetos decorativos a
partir da palha, e depois coloridas com anilina e polidas.

Taboa (folha)

Em Feliz Deserto, Litoral Sul de Alagoas, a folha de taboa -


uma planta aquática encontrada em áreas de várzeas, brejos e
manguezais – está mudando a vida de uma geração inteira de
mulheres. Há mais de 20 anos, elas usam dessa tradição, talento e
criação, apara a confecção de pufes, bolsas, tapetes, cestos e outros
objetos de decoração. O beneficiamento da palha de taboa deu tão
certo, que hoje famílias inteiras na cidade vivem deste artesanato.

Cipó (planta trepadeira)

Nas regiões mais altas de Água Branca, entre as serras da


região, o cipó - plantas trepadeiras de hastes finas e flexíveis que
pendem das árvores – é trançado e usado na confecção de um
artesanato com fibras maiores, e mais duráveis. O beneficiamento
do cipó está centralizado nas comunidades de Serra do Paraíso,
Serra da Laranjeira e Sitio Baixa do Pico que ficam a uma

581
distância de aproximadamente 4 Km da cidade. Entre os produtos
comercializados estão cestas, caçuá, caqueiras, cadeiras, balaios.

Diversidade da arte popular

A arte naïf em toda sua simplicidade e esplendor

Tânia de Maya Pedrosa nasceu em 1933 em Maceió,


Alagoas. Formada em Direito, cursou Letras (Francês) e fez vários
cursos de literatura e artes em geral. Pintora de arte naïf - do
francês, arte ingênua, ou arte primitiva moderna, caracteriza-se
pela simplicidade - foi várias vezes premiada, participou e foi
curadora de várias exposições no Brasil, na França e na Suíça. Tem
obras expostas em museus e embaixadas e tem sido citada por seu
trabalho em diversas publicações especiais. Tânia iniciou sua
carreira como pintora naïf no começo da década de 90, tendo
porém mantido sua pintura escondida durante anos até que amigos
a convenceram a enviar duas telas de sua autoria ("Devoções
Populares" e "Crenças Populares") para participar da Bienal Naïf
de 1998 em Piracicaba, promovida pelo SESC/SP. Desde então
participou de inúmeras exposições no Brasil e no exterior e foi

582
premiada mais três vezes nas Bienais Naïfs do Sesc/SP, tendo
recebido seu último prêmio na Bienal no ano de 2006.

"Tânia de Maya Pedrosa é uma guardiã de tesouros. A sua


vida tem sido uma sucessão de descobertas inclusive a descoberta de
si mesma, como apreciada artista plástica. O seu olhar está sempre
voltado para uma das fortuna das Alagoas: a nossa arte popular, que
é ao mesmo tempo o espelho e o sonho de um povo, o dia da festa e a
noite do canto e da dança. Nas pinturas, esculturas e objetos que
Tânia de Maya Pedrosa soube acumular, conferindo-lhes a
hierarquia de um museu real, a criação artística, anônima ou
portadora do selo de uma autoria, testemunha o que o homem tem de
mais belo e nobre, no seu trajeto terrestre: o fazer criativo."
Ledo Ivo, poeta alagoano, membro da Academia Brasileira
de Letras.

O mundo mágico dos brinquedos

Tudo pode ter começado pelo pião de madeira que rodopia


no chão, ou as bonecas de pano, e caminhões de madeira com
chassis de lata. Em Alagoas, quem não brincou com o Mané
Gostoso. Um boneco de madeira fina e leve, que fica no meio de
duas barras, com cordão trespassado, que quando se aperta as
dobras, ele faz malabarismo nas barras, do modo de atletas
olímpicos. O bambolê de hoje é de plástico, mas o antigo era feito
de bambu ou taquara.

583
“Através da recreação a criança se relaciona com o mundo e
constrói seu próprio universo. Aqui nas Alagoas, como em qualquer
outra parte do Brasil, há brincadeiras e brinquedos das mais
variadas formas – simples e funcionais, feitas por mãos sensíveis que
enriquecem a nossa cultura e mantém viva nossas tradições”.

Mestres Artesãos das Alagoas, 2ª edição, Instituto Arnon de


Mello, 2014

Os mestres do brinquedo em Alagoas


Alagoas se transformou em um celeiro de mestres populares
do brinquedo como artesanato. Um dos mais famosos
colecionadores de brinquedos do Brasil é David Glat, que tem mais
de 3.000 peças, e faz exposições itinerantes por todo o país. A
coleção tem exemplares de artesãos de todo país. São brinquedos
de madeira, tecido, lata, metal, fibras naturais, sementes, cabaça,
pedra, borracha, papel maché, papelão, jornal, lona, arame, raízes,
palha, couro, barro, areia, além de brinquedos reciclados
construídos a partir dos mais diversos rejeitos da sociedade
industrial e da vida urbana. De Alagoas, Davi Glat destacou 11
alagoanos, que tem peças exibidas no Museu do Brinquedo.

Mestre Lampião, de Arapiraca. Aluízio Nogueira Motas é


natural de Santana de Ipanema. Produz arte popular desde os seus
tempos de adolescente. Por 35 anos cumpriu jornada de trabalho
como mecânico na indústria de fumos Cacique de Arapiraca, mas
nunca deixou de produzir grande variedade de brinquedos. Mané-

584
gostoso, piões, caminhões, aviões, brinquedos de cabo, rodas
gigantes e cata-ventos. Ele cita também Zezinho, de Arapiraca, que
é discípulo do mestre Lampião . e mais: Adailton Rodrigues dos
Santos, de Lagoa da Canoa; Cicinho de Pão de Açúcar; João
Carlos da Silva, João das Alagoas, de Capela; Nan, da Ilha do
Ferro; José Nilson Barbosa, de Palmeira dos Índios e Nena, de
Capela, Sil, de Capela; Nilson, de Viçosa; Valmir, da Ilha do
Ferro.

Cabaça seca lembra curvas femininas

A cabaça é um fruto, de formato oval, oco por dentro, que às


vezes parece as curvas de corpo feminino. Classificada como fruto da
cabaceira, tem em todo o Nordeste, e dependendo da região tem
vários nomes: cumbuca, maracaxá, poronga, purunga, taquera e
outras mais. Além do artesanato, ou sua venda in natura, as cabaças
estão no folclore alagoano, como instrumento musical. Peças de
percussão como o Xequerê, que é uma espécie de chocalho feito com
miçangas coloridas envolvendo cabaças secas, usado no Maracatu
Baque alagoano.

Mestres Artesãos das Alagoas, 2ª edição, Instituto Arnon de


Mello, 2014

Couro bruto em Dois Riachos

585
No fim do século XVII, devido à expansão da conquista
territorial, os rebanhos de bois foram distribuídos ao longo de
Alagoas, desde as regiões são franciscanas até o Agreste o Sertão.
O corte, a carne, o couro e o leite foram condições sem as quais o
sertanejo estaria mais ainda isolado. Mas a cultura permaneceu, e
em algumas áreas com tradição rural, como Batalha, Major
Isidoro, Viçosa, Chã Preta, Água Branca, Piranhas, Delmiro
Gouveia, Palmeira dos Índios e Dois Riachos, sustentam o
mercado de couro da região. E para fazer celas, correias,
chibatas, chapéus, gibão de vaqueiro, e até sandálias xô boi, os
artesãos usam instrumentos pesados como facas e facões,
máquinas de costura de linha grossa, pregos, alicates, martelos,
sovelas e tesouras. O produto ainda é garantido com a venda de
couro cru, ou dos curtumes da região, na feira de Dois Riachos, a
maior de Alagoas na comercialização de animais. A feira é aberta,
onde circulam todos os personagens como vaqueiros,
compradores, açougueiros, artesãos, e tocadores de viola.

Mestres Artesãos das Alagoas, 2ª edição, Instituto Arnon de


Mello, 2014

Sucata que vira arte: esculturas de Zezito Guedes

Mestre do Patrimônio Vivo de Arapiraca, José Gomes


Pereira, mais conhecido Zezito Guedes, nome que ganhou de seu
famoso fã, Ariano Suassuna (1927-2014), é um artista intelectual.
Além de botar a mão na massa para fazer de sucatas de ferro

586
esculturas geniais – também trabalha faz com madeira, gesso e
pedra -, ele é um renomado escritor, com livros importantes como
“Cantigas das Destaladeiras de Fumo”, “A Feira de Arapiraca”,
“Folclore da Seca”, “Tabira e Outras Manifestações Populares” e
“Arapiraca Através do Tempo”, alguns deles publicados pela
Fundação Joaquim Nabuco, de Pernambuco, e pela Editora da
Universidade Federal de Alagoas (Edufal). Em 2009, a Prefeitura
de Arapiraca inaugurou o Museu Zezito Guedes, na Praça Luiz
Pereira Lima, que tem acervo de grande porte do escultor. Ariano
Suassuna, autor de obras como “Auto da Compadecida” e “Pedra
do Reino”, elogiou o escultor em texto publicado no catálogo da
Mostra Individual Zezito Guedes, na Fundação Joaquim Nabuco,
em 1975. Segundo Zezito, foi Ariano quem colocou sua alcunha de
Zezito Guedes.

“Com Zezito Guedes, surge, mais uma vez, a confirmação


daquilo que vivo dizendo a respeito do Nordeste e do nosso grande
povo: ambos têm reservas maravilhosas de invenção e criação, e de
vez em quando como acontece agora com Zezito Guedes, irrompe de
todas as deformações que andam fazendo, para aparecer com uma
obra pura e forte, como é sem dúvida, a escultura em madeira desse
moço”.
Ariano Suassuna, sobre Zezito Guedes

Xilogravura do Pica Pau, mestre Enéias Tavares

587
A xilogravura é uma das técnicas mais antigas, vindas da
Idade Média. Em Alagoas, Enéias Tavares dos Santos, o Pica-Pau,
é o nosso maior xilógrafo. Enéias continua a encantar o mundo
com sua arte. Chegou a ser tema de livros e pesquisas, como a
publicada por Denilda Moura no livro O Poeta e Xilógrafo Enéias
Tavares dos Santos, em 1983. O processo para produzir um quadro
em xilogravura e passá-lo para uma ilustração de cordel não é tão
simples quanto o resultado final tenta sugerir. Uma vez riscada, a
madeira é talhada. Com o desenho esculpido, a peça vai para uma
prensa que reproduz as cópias em papel. Aos 74 anos de idade,
Enéias Tavares diz que aprendeu todo o processo sozinho. A
relação com a arte brotou quando ainda era criança, aos 11 anos.
"Vi um camarada fazendo carimbos, achei bonito e aquilo
entranhou meu espírito. Dos carimbos com nomes de amigos e
parentes, fui fazendo desenhos e depois rumei para a xilogravura”.

As máscaras de Achiles Escobar

O artesão e artista plástico Achiles Escobar é o mestre das


máscaras, principalmente as de Carnaval, que corta, desenha, pinta
e borda com todo tipo de material. São máscaras que relembram os
bailes carnavalescos e também a cultura alagoana, com a presença
de chita e franjas. Ele utiliza a técnica de papel colê e machê e o
trabalho de pintura manual, o artista plástico fez uso de material
reciclável para elaborar as peças decorativas.

Mais diversidade do artesanato alagoano

588
Alpercata xô boi – Batalha
Arte plumária indígenas – Porto Real
As louças de Porto Real do Colégio
Cadeira de tronco de coqueiro – São Miguel dos Milagres
Cadeiras e bancos com madeira de mangue – Ilha do
Ferro
Candeeiro de flandres – Feira de Arapiraca
Casca de coco, ou quengo do coco: ladrilhos, jangadas,
bonecos, arranjos
Cestos e caçoás de cipó para lombo de animal – Região
Agreste e Sertão

Chapéu de coro. Sebastião Belarmino: o último chapeleiro


– Arapiraca
Chapéu de palha moldado por pilão – Litoral Norte
Covos (armadilha para peixes) feitos de taboca e cipó –
Jequiá da Praia
Esculturas de Geraldo Dantas – Arapiraca
Esteira de piripiri –Vale do Mundau
Imagens sacras de Saturnino João – Arapiraca
Peneiras ou urupemas (quadrada ou circular) – Litoral Sul
Rabecas construídas com a melhor madeira – Marechal
Deodoro
São Francisco talhado em madeira – Antonio Deodato
Tecelãs de Água Branca – Povoado Quixabeira

589
Utensílios da palha de ouricuri tingidas por anilina – Feliz
Deserto e Coruripe

Principais centros de produção

Água Branca. Cestaria em palha de ouricuri e cipó


Batalha. Sandálias sertanejas em couro
Boca da Mata. Escultura em madeira e patchwork
Cajueiro. Colchas de retalho e artesanato em bambu
Coruripe. Cestaria em palha de Ouricuri
Capela. Barros e argila (cerâmica)
Delmiro Gouveia. Tecelagem
Feliz Deserto. Cestaria em palha de taboa
Maceió (Pontal da Barra). Bordado Filé
Maragogi. Artesanato em fibra da bananeira e quenga de coco
Marechal Deodoro. Bordados: Filé e Labirinto
Palmeira dos Índios. Artesanato em palha da bananeira e
cerâmica indígena
Pão de Açúcar (Povoado Ilha do Ferro). Bordado Boa-noite
Penedo (Povoado de Marituba do Peixe)
Cestaria em palha de ouricuri
Piranhas (Povoado de Entremontes). Bordados Rendendê e
Ponto de Cruz
Porto Real do Colégio. Bordados Rendendê e Ponto de Cruz
São Sebastião. Renda de bilro
União dos Palmares. Artesanato em cerâmica

590
Fonte: Secretaria de Planejamento, 2014

ARTES & ARTISTAS

“Todas as artes contribuem para maior de todas as artes, a


arte de viver”

Berthold Brecht

591
MÚSICA

Augusto Calheiros, a patativa do Nordeste

O cantor e compositor alagoano Augusto Calheiros (1891-


1956) nasceu numa família com boa situação financeira. Mas aos
nove anos viu a família passar dificuldades. Transferiu-se rapazola
para Garanhuns. Ali trabalhou como dono de bar, fabricante de
sapatos, hoteleiro, subdelegado e até carcereiro. Paralelamente
levava sua vida musical cantando nos cinemas locais.Jovem ainda,
foi para Recife, onde conheceu Luperce Miranda, tendo sido
convidado a participar, como cantor, do grupo formado pelos
irmãos Luperce (bandolim), João (bandolim) e Romualdo Miranda

592
(violão), e mais os violonistas Manuel de Lima (que era cego) e
João Frazão (Periquito). Por sugestão do historiador Mário Melo, o
grupo passou a chamar- se Turunas da Mauricéia, numa alusão ao
governador holandês do séc. XVII, Maurício de Nassau.Foi logo
apelidado de “A patativa do Norte”, pela sua voz afinadíssima e
estilo peculiar de cantar, que o tornariam um dos cantores mais
originais do seu tempo. Descendente de índio, Augusto fez um
tributo a seus ancestrais com a música Senhor da Floresta, que se
tornou um de seus maiores sucessos.

Um índio guerreiro da raça tupi


Vivia pescando
Sentado na margem do rio Chuí
Seus olhos rasgados, no entanto
Fitavam ao longe uma taba
Na qual habitava
A filha formosa de um morubixaba.

Um dia encontraram
Senhor da floresta no rio Chuí
Crivado de flechas,
De longe atiradas por outro tupi
E a filha formosa do morubixaba
Quando anoiteceu, correu
Subindo a montanha
No fundo do abismo desapareceu.

593
Naquele momento
Alguém viu no espaço, à luz do luar
Senhor da floresta de braços abertos
Risonho a falar:

Ó virgem guerreira
Ó virgem mais pura que a luz da manhã,
Iremos agora unir nossas almas
Aos pés de Tupã

Fonte: Dicionário Cravo Albin da Música Popular


Brasileira, 2012

Sucesso no Rio de Janeiro


Em janeiro de 1927, os Turunas desembarcaram no Rio de
Janeiro, com suas roupas sertanejas e chapéus de aba larga.
Estrearam com muito sucesso no Teatro Lírico, em espetáculo
patrocinado pelo jornal Correio da Manhã, cantando emboladas,
cocos e outros ritmos ainda desconhecidos dos cariocas,
apresentando-se depois, em várias ocasiões, na Rádio Clube. Como
solista gravou canções sertanejas na Casa Edison, obtendo grande
sucesso com os Turunas, no Carnaval de 1928, com a embolada
Pinião, de autoria de Luperce Miranda, que não participou dessa
gravação. No ano seguinte o grupo se desfez e o cantor passou a
atuar individualmente.Em 1923 foi para Recife, PE, onde começa a
cantar na recém-inaugurada e segunda rádio transmissora

594
brasileira, Rádio Clube de Pernambuco.Calheiros, a partir de 1929,
fez também sua carreira solo, mantendo um estilo próprio cantando
músicas sertanejas.No auge de sua popularidade, dividindo com
Jararaca e Ratinho, Dercy Gonçalves, Arthur Costa e outros,
cantava na Casa de Caboclo, famosa casa de espetáculos
inaugurada em 1932, localizada na Praça Tiradentes, onde era
divulgada a música regional brasileira. Ao todo gravou 80 discos
78 rpm com 154 músicas.

Fonte de pesquisa: Secretaria de Estado da Cultura de


Alagoas, Blog do Etevaldo, Blog do Nazareth, Blog História de
Alagoas e Recanto das Letras.

Gerson Filho, um forrozeiro danado de bom

Segundo o pesquisador José Gama Lessa, o penedense


Gerson Filho foi um dos precursores e fundadores do que se
consolidou como Forró. Exímio tocador do "Fole de Oito Baixos",
marcou época. Será lembrando, entre outras personalidades locais
marcantes da música “forrozeira”. Gerson Filho nasceu no dia 12
de março de 1915, na Fazenda Mundeis, em Penedo. Iniciou sua
vida artista tocando ganzá no grupo folclórico na fazenda de seu
pai.Aos 10 anos, no caminho da Escola, ouviu o som da sanfona de
Zé Moreno e ao regressar da aula, localizou a casa do músico e
pediu ao mestre para tocar. Em 1927, aos 12 anos, fez sua

595
apresentação como sanfoneiro de Oito Baixos e, no mesmo ano,
compôs sua primeira música: "Choveu em Minha Roça" - o
primeiro forró como gênero musical. Gerson Filho usou os
pseudônimos de Penedo, Baianinho da Sanfona, Zé Piaba, Zé
Mamede, Baianão da Sanfona, Zé Piatã, Gerson e seu 8 Baixos - só
para citar alguns. Ele foi o responsável pelo lançamento da
conterrânea Clemilda e viveu com ela por 28 anos.Brilhou como
sanfoneiro contratado, no Rio de Janeiro, pelas mais famosas
rádios de seu tempo: Tamoio, Guanabara, Mayrink Veiga e Rádio
Nacional (no Programa apresentado pelo alagoano Paulo Gracindo
e com participação também de Jackson do Pandeiro e Almira).
Atuou por muito tempo em Sergipe, na Rádio Difusora (hoje
Fundação Aperipê) e Rádio Liberdade.
Por José Lessa, em ensaio sobre personalidades alagoanas
no universo do Forró, publicado na edição de Junho de 2017 no
Almanaque Alagoas 200 anos
Almir Medeiros

Compositor, regente, instrumentista, maestro. Estudou no


Grupo Escolar Silvestre Péricles, no Almirante Tamandaré, em
Recife, tendo terminado o primário no Grupo Escolar Benício de
Barros Dantas, em Maceió. Começou e estudar música na Escola
Técnica Federal de Alagoas, com o professor e maestro Manduca,
com quem aprendeu a tocar clarinete. O seu mestre no violoncelo
foi Nelson Campos, da Universidade Federal da Paraíba. Medeiros
fez curso de Licenciatura em Música pela UFAL (1990), diversos
cursos de aperfeiçoamento. Especialização em Educação Artística

596
pelo Cesmac. Atuou como violoncelista na Orquestra Sinfônica de
Sergipe, como também na extinta Orquestra Sinfônica de Alagoas,
da qual foi regente. Foi regente, ainda, da Orquestra de Câmara da
UFAL e fundador do Quarteto de Cordas Pau-Brasil. Professor do
Centro Federal de Educação Tecnológica, onde leciona as
disciplinas musicais, além de história da arte e folclore no curso de
turismo. Compôs, entre outras: Suíte Nordestina; Toré Dia do
Índio; Abertura Allegro Dançante; Maracatu em Maceió; A
Laurça; Retirantes, Invasão. Compôs, ainda, trilhas sonoras para
espetáculos de dança, teatros, documentários, publicidade e vídeos,
destacando-se: Espetáculo Teatral A Arca de Noé; documentário
Artur Ramos; espetáculo Alagoas Terra da Liberdade; Balé
Folclórico.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Bandas e filarmônicas

As chamadas sociedades musicais alagoanas viveram um


período de ouro, entre os últimos anos do século XIX e as
primeiras décadas do século XX. Mas, as dificuldade em sua
manutenção e a falta de prioridade do setor público está deixando
acabarem em Alagoas as bandas de música. “A mais antiga
instituição ligada à criação e à preservação da tradição musical
brasileira. Nunca deixou de cumprir o papel de escola livre de
música, verdadeiro conservatório do povo. Notadamente em

597
pequenas cidades interioranas, desenvolve importante trabalho
educativo e social, propiciando oportunidade de uma vida mais
digna a centenas de jovens carentes”, afirma o pesquisador
Wilson Lucena, detentor do saber sobre a trajetória das
filarmônicas. Ainda de acordo com Wilson, embora Maceió tenha
sido uma das precursoras das chamadas “furiosas”, ele só
perdurou no interior do Estado, onde elas resistem ao tempo, e
formam um circuito musical encantador:

Coqueiro Seco. Sociedade Musical Professor Francisco


Pedrosa, a Furiosa, regida pelo policial militar Maestro Silvestre

Piaçabuçu. Filarmônica Euterpe São Benedito, que


descende da banda de rabecas que tocou para o imperador Pedro II,
no século XIX. Há 50 anos ela existe pela abnegação dos maestros
Euclides, Francelino e João Ferreira, este último já falecido.

Pão de Açúcar. Banda de Música Guarany. Regida por


Petrúcio Ramos, oficial-regente reformado da base da Banda da
Base Aérea de Salvador.

Marechal Deodoro. A casa verde da Filarmônica Santa


Cecília é a mostra da resistência dessa banda, em ação desde 1910,
há 105 anos. É um orgulho para a cidade, músicos e alunos vestem
seus fardamentos nas apresentações. São 100 alunos e 80 músicos
mantidos pela prefeitura. É a de maior atividade em Alagoas.

598
Marechal Deodoro. Sociedade Musical Carlos Gomes,
fundada em 1915

Traipu. Filarmônica Lira Traipuense, regida pelo maestro


Antônio Basílio, e conta com mais de 70 músicos.

Trecho da reportagem do jornalista cultural e presidente do


IZP, Roberto Amorim, na revista Graciliano, nº 9 – junho/julho de
2011

Banda Mopho: psicodelismo e Beatles na veia

A banda alagoana Mopho, desde 1996, é uma pedra rolando


na cena do rock psicodélico, do hard e folk rock de Alagoas, com
fãs espalhados pelo país, por gravadoras cult, como a Baratos e
Afins. Nas horas inspiradas, fazem shows com a banda cover Alma
de Borracha, uma alusão ao disco Rubber Soul, dos Beatles, de
1965, onde cantam os Fab-four. Seus integrantes são João Paulo
(guitarra e voz), Hélio Pisca (bateria), Junior Bocão (baixo e voz) e
Dinho Zampier (teclado). O tecladista da formação original é
Leonardo Luiz. A Banda tem suas origens em 1989 na cidade de
Arapiraca, agreste alagoano, quando João Paulo e Junior Bocão
formam uma banda cover dos Beatles. Em 1994, João Paulo muda-
se para Maceió e forma a banda Água Mineral, de Rock and Roll e
Blues, e em 1996, muda o nome da banda para Mopho. O nome é
originado de brincadeiras de amigos que, na efervescência do

599
movimento Manguebeat em Recife, disseram que a banda ia
"mofar" no estúdio.

O álbum Mopho: sucesso de crítica e público


O disco Mopho, lançado em 2000 pelo selo paulistano
Baratos Afins, foi aclamado pela crítica nacional e projetou a
banda em importantes festivais de música independente como
Abril Pro Rock, Porão do Rock, Balaio Brasil, Festival de Inverno
De Garanhuns. Com o disco, a banda chegou a figurar em um TOP
35 da rádio californiana KALX, de Berkeley, e arrancou vários
elogios como do ex-Mutantes Arnaldo Baptista, do maestro
Rogério Duprat, até de uma banda americana Wondermints, que
acompanhava o Brian Wilson, do The Beach Boys, em turnê. Este
álbum é considerado um dos melhores álbuns da década de 2000.
Após o grande sucesso do primeiro álbum, a banda se dissolve em
2003 quando estava prestes a lançar o segundo trabalho. Junior
Bocão e Hélio Pisca vão para São Paulo e formam a banda Casa
Flutuante, enquanto João Paulo grava com Leonardo o Sine
Diabolo Nullus Deus, lançado pela Baratos Afins em 2004. Em
2008, após cinco anos separados, o grupo anuncia o retorno e com
planos para um novo disco. Em 2011, o disco "Volume 3" é
lançado pela Pisces Records.

Um Lindo Dia de Sol


Banda Mopho

Veja só meu amor

600
Leve embora meu coração
Nunca mais quero ser
Aquele tolo homem feliz

Eu, que lembro bem, vou seguir


A minha estrada sem fraquejar
Vou sorrir como nunca
Sem tentar me enganar
Quem sabe esqueça

Se você encontrar
Alguém perfeito eu vou rezar
Vou ficar, vou morrer
Vai ser um lindo dia de sol

Eu, que lembro bem, vou seguir


A minha estrada sem fraquejar
Vou sorrir como nunca
Sem tentar me enganar
Quem sabe esqueça

Banda Cachorro Urubu, o melhor do Raul

Em 2013, Mariano Lanat, baixista da banda (a primeira) de


Raul Seixas, em Salvador, 'Raulzito e os Panteras', declarou que a
Cachorro Urubu foi a melhor banda que ele viu interpretar as
canções de Raul Seixas. Ele participou inclusive de um ensaio da

601
banda nos preparativos para um 'Tributo' a Raul, e ainda
aproveitou a deixa para tocar ao vivo com eles a música "Maluco
Beleza". A banda está há mais de 10 anos fazendo shows,
principalmente os Tributos a Raul Seixas, no Clube Fênix
Alagoana, sempre na data de aniversário do lendário cantor Raul
Santos Seixas (Salvador, 28 de junho de 1945). Ele morreu em
1989, é considerado um dos pioneiros do rock brasileiro. Sua obra
musical é composta por 17 discos lançados em seus 26 anos de
carreira. Em todas as apresentações, a banda veste literalmente a
aura do cantor. Calças bocas-de-sino, botas, "camisas psicodélicas"
e performances. E no começo, trazem ao palco um rádio velho,
sintonizando em diversas estações, passando por "Rebolations" da
vida, até chegarem em "Se o rádio não toca", de Raul e Paulo
Coelho.

"Raul era um figura; um personagem. Desde os cinco anos de


idade, guardava tudo num baú dele. O baú do Raul. O artista era
único. E é difícil de tocá-lo! Há toda uma complexidade nos arranjos
vocais e nas músicas", salienta o cantor Phillipe.

Banda Xique Baratinho

Festejada em Alagoas e admirada por onde passa, a banda


Xique Baratinho situa-se no patamar das raras que conseguem
extrair originalidade na mistura de rock e regionalismos. Formada
em 98, a rapaziada conquista fácil o público com um rock brejeiro
de pegada maliciosa. A banda é formada por Railton Sarmento,

602
Aldo Jones, Lelo Macena e Tárcio Rodrigues, e misturam ritmo
grove, guitarras criativamente pesadas e sopros de melodias
marcantes. Uma dose generosa de tempero pisado na cultura
popular alagoana e eis a artimanha sonora do Xique Baratinho. Na
poesia, a turma ora entorta ora apruma canções populares e
cantigas de mestres do folclore, sem deixar de lado as composições
próprias que seguem a mesma linha, numa reverência explícita aos
brincantes da região. Matreiros na habilidade de cadenciar o rock
com coco de embolada, eles vão decodificando extratos poéticos
da sabedoria popular capturados nas feiras, esquinas, praças e
praias das Alagoas.

Carlos Moura e a sereia de Maceió

Antigo parceiro de baile e barzinhos, no circuito estudantil,


do cantor Djavan. Natural de Palmeira dos Índios, Carlos Moura
começou a se apresentar junto com os Bárbaros, tocando em bailes
e matinês nas tardes de domingo em Maceió, no início da década
de 1970. Mais tarde no Grupo Vento, começou a compor e cantar
suas próprias canções. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde deu
início a carreira solo, gravando em 1980, "Reviravolta", o seu
primeiro LP. Mas foi com seu segundo disco, "Rosa de Sol", que
veio torná-lo reconhecido nacionalmente com a música "Minha
Sereia", uma homenagem à Maceió, colocando-o entre os
destaques da MPB. A confirmação do sucesso do cantor e
compositor alagoano concretizou-se com os discos: "Água de

603
Cheiro" e "Estrela Cor de Areia". Essa boa sequência de sucessos
fez com Carlos Moura fizesse apresentações no programa Som
Brasil (Globo); Empório Brasileiro (BAND); Jô Soares Onze e
Meia (SBT) e Fantástico (Globo) que exibiu um clip da música
"Cometa Mambembe", grande sucesso nacional. Durante o São
João pelo Brasil, apresentou-se ao lado de figuras como
Dominguinhos, Genival Lacerda, Zé Ramalho e Geraldo Azevedo.
Nos anos 1990 fez uma série de apresentações pelo Canadá.

Minha Sereia
Carlos Moura

Mergulhar no azul piscina


No mar de Pajuçara
Deixar o sol bater no meu rosto
Ai que gosto me dá

Mergulhar no azul piscina


No mar de Pajuçara
Deixar o sol bater no meu rosto
Ai que gosto me dá

E as jangadas partindo pra o mar


Pra pescar, minha sereia

Maceió, minha sereia


Maceió, minha sereia

604
Mergulhar no azul piscina
No mar de Pajuçara
Deixar o sol bater no rosto
Ai que gosto me dá

E as jangadas partindo pra o mar


Pra pescar, minha sereia

Chau do Pife: um chorinho para Alagoas

José Prudente de Almeida recebeu o apelido de Chau


quando adolescente, no município de Boca da Mata, interior de
Alagoas. Ao começar a tocar o pífano ou pife, foi batizado de Chau
do Pife, descobrindo o amor pelo instrumento, que já dura mais de
35 anos. Por volta dos 50 anos, casado há mais de 15 anos, com
três filhos, vive exclusivamente da música. Chau toca hoje em um
pífano de alumínio com sete furos que ele mesmo faz. O pai de
Chau era agricultor em Boca da Mata e plantava feijão, mandioca e
milho. Para proteger a plantação de milho dos pássaros que
atacavam logo cedinho, seu pai lhe deu um pífano de quatro furos
para que ele “apitasse” para espantá-los. “E eu tinha que apitar
muito, porque se ele pegasse algum milho comido, eu apanhava”,
disse Chau. Com o tempo seu pai percebeu o interesse que ele
tinha pelo “pedaço de cano” que ele furava, a taboca, e deu ao
pequeno Chau um pife de seis furos para tocar. E assim começou a
história musical de Chau do Pife. Sua primeira apresentação foi

605
numa Feira em Atalaia, aos 14 anos. Ganhava dinheiro com essas
apresentações e ficava umas quatro semanas sem ir cortar cana,
“um serviço muito ruim”, diz. Música própria, ele só começou a
fazer há 16 anos, na banda Forró e Xodó. Hoje, os músicos que
tocam com Chau são: Irineu e Lula Sabiá (sanfonas); Xéxéu
(Zabumba); Renato (triângulo) e Deda (baixo). Vivendo
exclusivamente da música, Chau busca inspiração para suas
composições no seu dia-a-dia, como Memória dos Pássaros,
música que dá nome ao seu primeiro CD. Em 2006 lançou seu
segundo CD, Ninguém Anda Sozinho.

Cícero Flor: nosso cantor underground

Com canções de folk-rock rural, e muitas baladas


melancólicas e românticas, Cícero Vieira fez de seu disco Trilha,
um clássico alagoano. Músico rodado, com estilo próprio, de
vanguarda, Cícero ficou algum tempo fora da cena musical,
marcado pelo seu lado introspectivo de poeta urderground. Amigo
de infância do músico Fernando, da dupla Duofel, teve seu CD
definido assim por um jornalista alagoano que o ouviu: "Se o CD
do Duofel foi o lançamento do ano (2006), o disco do Flor
surpreendeu". Pura verdade. Muitos nunca tinham ouvido a voz
rouca cheia de um estilo próprio e cativante de Flor. E quando
ouviam percebiam quanto tempo perderam. O nome artístico
Cícero Flor, vem de suas bases roqueiras do Flower and Power
(Flores e Poderes), no final dos anos 1960, quando os hippies
entraram em cena. E ele sempre foi assim, franciscano, sandália

606
lep-lep, bolsa de couro, e o violão, que toca de forma magistral.
Aos 13 anos, cantava em programas de auditório da Rádio
Difusora de Alagoas, em praças públicas, festas de aniversários,
colégios. Em 1978, no 1.º Festival Estudantil de Música,
promovido pelo extinto Departamento de Assuntos Culturais, hoje
Secretaria da Cultura, foi eleito o melhor intérprete, com uma
músicas de sua autoria: “Saudações a um Velho Companheiro”.
Em 1979, participou do Show da UNE (União Nacional dos
Estudantes), na Faculdade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro ao Lado
de Joyce, Originais do Samba, Carlos Lyra, Terezinha de Jesus,
entre outros artistas de consagração nacional. Tocou no programa
de Adelson Alves na Rádio Globo e no programa do cantor e
compositor Luiz Vieira, na Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Em
2000, lança seu melhor trabalho: “Trilha”, depois de uma batalha
de longa data.

Dydha Lyra, o pintor-cantor-poeta

Alagoano de São José da Laje, Dydha Lyra é múltiplo:


Poeta, pintor, cantor, compositor, desenhista, escultor. O artista
plástico disse que desde criança já se destacava pelos seus
desenhos na escola, e também quando cantava nas festas da cidade
onde nasceu. O artista é integrante do grupo Movimento da
Palavra, que reúne poetas alagoanos. O último lançamento do
grupo foi o livro de poemas Antologia Poética, que teve a
participação de Lou Correia, José Alberto Costa, Cavalcante Filho,
Arlene Miranda, Valderez Barros e Lys Carvalho. Mas nas artes

607
plástica ele vê uma situação nada boa. Na opinião do artista, os
grandes pintores de Alagoas estão acabando, e se preocupa com a
não renovação da classe. “Os grandes pintores alagoanos estão
morrendo, e não estão aparecendo novos artistas. Outra grande
deficiência em Maceió é a não existência de uma escola de arte, ou
a realização anual de um salão de arte, para incentivar s mostrar o
trabalho dos nossos artistas”.

Entrevista a Thayanne Magalhães, jornal Primeira Edição,


em 18/07/2011

Djavan: um mestre da MPB

O cantor e compositor Djavan Caetano Viana, nasceu em


Maceió, em 1949. Seu primeiro conjunto foi o LSD (Luz, Som,
Dimensão), com o qual, a partir dos 18 anos, apresentou-se em
Maceió, como vocalista e guitarrista. Participou de festivais
estudantis, juntamente com Carlos Moura. Em 1973, passa a viver
no Rio de Janeiro. Projetou-se nacionalmente ao participar, em
1975, de um festival de musica (Abertura, TV Globo), com a
música Fato Consumado, que se classificou em 2º lugar. No ano
seguinte iniciou a gravação de uma série de LPs que o
consagraram como compositor e intérprete: A Voz, o Violão, a
Música de Djavan, Som Livre, 1976; Djavan, EMI, Odeon, 1979;
Alumbramento, EMI, Odeon, 1980; Seduzir, EMI, Odeon, 1981;
Luz, CBS, 1984; Para Viver um Grande Amor, CBS, 1983; Lilás,
CBS, 1984; Meu Lado, CBS, 1986; Não é Azul Mas é Mar, CBS,

608
1987; Djavan, CBS, 1992; Coisa de Ascender, Columbia, 1992
-CD; Novena, EPIC, 1994 - CD; Malásia, EPIC, 1996- CD, Bicho
Solto XIII (1998); Djavan Ao Vivo Volumes 1 e 2, Sony Musical,
1999; Milagreiro, 2001; Vaidade - no qual é autor das doze letras e
músicas - editado pela Luanda Records, sua própria gravadora;
Matizes, 2007: Ária, 2010, Gravadora Luanda, Records e Biscoito
Fino. Entre seus sucessos musicais destacam-se, "Seduzir", "Flor
de Lis", "Lilás", "Pétala", "Se…", "Eu te Devoro", "Açaí",
"Segredo", "A Ilha", "Faltando um Pedaço", "Oceano", "Esquinas",
"Samurai", "Boa Noite" e "Acelerou". Ele também retrata muito
Alagoas em suas letras, como a recente Farinha (boa das Alagoas).

Farinha
Djavan

A farinha é feita de uma planta da família das


euforbiáceas, euforbiáceas
de nome manihot utilissima
que um tio meu apelidou de macaxeira
e foi aí que todo mundo achou melhor!...
a farinha tá no sangue do nordestino
eu já sei desde menino o que ela pode dar
e tem da grossa, tem da fina se não tem da quebradinha
vou na vizinha pegar pra fazer pirão ou mingau
farinha com feijão é animal!
o cabra que não tem eira nem beira
lá no fundo do quintal tem um pé de macaxeira

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a macaxeira é popular é macaxeira prá ali, macaxeira pra cá
e em tudo que é farinhada a macaxeira tá
você não sabe o que é farinha boa
Farinha é a que a mãe me manda lá de Alagoas

Djavan: o fato consumado conquista a telinha


Nascido em Maceió, capital de Alagoas, filho de uma mãe
negra e de um pai branco que trabalhava como ambulante. Sua
mãe, lavadeira, entoava canções de Ângela Maria e Nelson
Gonçalves. Djavan poderia ter sido jogador de futebol. Lá pelos
11, 12 anos, o garoto Djavan Caetano Viana divide seu tempo e
sua paixão entre o jogo de bola nas várzeas de Maceió e o
equipamento de som quadrifônico da casa de Dr. Ismar Gatto, pai
de um amigo de escola. Da primeira paixão, despontava como
meio-campo no time do CSA (Maceió), onde poderia ter feito até
carreira profissional. Aos 23, chega ao Rio de Janeiro para tentar a
sorte no mercado musical. É crooner de boates famosas - Number
One e 706. Com a ajuda de Edson Mauro, radialista e conterrâneo,
conhece João Mello, produtor da Som Livre, que o leva para a TV
Globo. Passa a cantar trilhas sonoras de novelas, para as quais
grava músicas de compositores consagrados como "Alegre
Menina" (Jorge Amado e Dorival Caymmi), da novela "Gabriela";
e "Calmaria e Vendaval" (Toquinho e Vinícius de Moraes), da
novela "Fogo sobre Terra". Em três anos, nas horas vagas do
microfone, compõe mais de 60 músicas, de variados gêneros. Com
uma delas, "Fato Consumado", tira segundo lugar no Festival
Abertura, feito pela Rede Globo, e chega ao estúdio da Som Livre.

610
Em 1976 sai "A voz, o violão, a música de Djavan", um disco de
samba sacudido, sincopado e diferente de tudo que se fazia na
época. O seu primeiro álbum trouxe o "carro-chefe": "Flor de Lis"
que se torna um grande hit nas rádios.

Eliezer Setton: o forró com marca própria

Eliezer Otílio Setton nasceu em Maceió, em Janeiro de


1957, é cantor e compositor brasileiro de Forró e MPB. Filho de
Salomão Setton Neto, o eterno Rei Momo do Carnaval de Maceió
por 19 anos consecutivos, e de Terezinha Otílio Setton, Eliezer
Setton começou a compor em 1976 e no ano seguinte participou do
seu primeiro festival de música, o que resultou em sua primeira
música gravada, Desesperança, e lhe proporcionou o ingresso no já
existente Grupo Terra, grupo musical que foi um marco da cultura
alagoana do final dos anos 70 e início dos anos 80. Em 1983,
depois de distinguir-se no IV Festival Universitário de Música,
promovido pelo Diretório Central Estudantil da Universidade
Federal de Alagoas, conquistando o segundo e terceiro lugares
como compositor, além do prêmio de melhor intérprete, aventurou-
se como músico da noite atuando em Maceió, São Paulo (1984) e
Rio de Janeiro (1985-1989), fazendo o tradicional voz e violão.

A canção épica em tributo à terra natal


De volta a Maceió, em 1989, continuou sua trajetória de
festivais, culminando com as participações no Canta Nordeste

611
(transmitido ao vivo pela Rede Globo para toda a Região), onde foi
finalista em 1994 e 1995. Compositor eclético, é na música
nordestina que vem colhendo os melhores frutos. Da parceria com
Pedro Sertanejo, pai de Oswaldinho do Acordeon, surgiu Campo
Formoso, o primeiro forró com sanfona e tudo, gravado por Eliezer
num disco de Pedro Sertanejo, em 1982. Da parceria com
Oswaldinho do Acordeon, nasceu, dentre outras, Na hora H,
música que Elba Ramalho gravou em 1992 e foi indicada para o VI
Prêmio SHARP. O casamento com o Forró estava sacramentado e
o compositor passou a ser gravado pelos intérpretes do cancioneiro
nordestino. Em 2011, Eliezer volta ao Forró no CD "O Quelso",
que apresenta uma exclusiva e interessante versão da popular "My
way", que ganha ares forrozeiros e ficou "Bem a meu jeito". “O
Forró é a cara do Nordeste, por isso nunca teve ascensão. Sempre
foi discriminado, assim como o nordestino. A música nordestina
está diluída. Na hora que começou a valer dinheiro na boca das
bandas de som eletrônico, deixou de ser autêntico". Eliezer Setton,
em entrevista ao "O Jornal", em 06/06/2010. Mas Eliezer também
canta sua terra, resgata pérolas de músicas antigas, principalmente
as carnavalescas. Mas seu mais bonito tribito está na canção Não
há quem não morra de amores pelo meu lugar:

Eu sou da terra onde há lagoas


Da terra onde há marechais
De tantos risos de tantas loas
Tantas ilhas tantas croas
À sombra dos coqueirais

612
Ah! Calabares de Holanda
Mares de uma banda
E o Velho Chico ao sul
Esse Graciliano
Esse Jorge de Lima
Essa Nêga Fulô
Ah! Marechal Floriano
De ferro e de flores
Não há quem não morra de amores
Pelo meu lugar

Ah! Mais que um solo de cana


Essa terra tem gana
De fumo e algodão
Djavan, Jararaca
Hermeto, Paurílio
Maestro Fon-fon

Ah! É Zumbi dos Palmares


União de cores
Não há quem não morra de amores
Pelo meu lugar

Ah! Cabanada no norte


Um bispo sem sorte
Os Caetés

613
Teotônio Vilela
Pontes de Miranda
Aurèlio de A a Z
Ah! Mesa rica de renda
E de tantos sabores
Não há quem não morra de amores
Pelo meu lugar

Ah! Brincadeira é chegança


E o guerreiro que dança
Faz tremer o chão
Zé Maria Tenório
Entra! Pedro Teixeira
Theo Brandão
Ah! Dos Prazeres Senhora
Abençoe os senhores
Não há quem não morra de amores
Pelo meu lugar

Fernando Melo: violão alagoano conquista mundo

Nascido em Arapiraca, Fernando Melo já tocou no mesmo


palco onde se apresentaram nomes como Eric Clapton, B. B. King
e Herbie Hancock. Fanático por música o instrumentista diz que
ouve de tudo. Com 50 anos de idade, o instrumentista Fernando
Melo é apontado como um dos maiores virtuoses da música
brasileira, ao lado de seu companheiro de estrada, o paulistano

614
Luiz Bueno, com quem criou, há 27 anos, o Duofel - duo
instrumental que figura entre os mais respeitados do Brasil e do
exterior. Em 1985, formaram o duo, que passou a acompanhar
Tetê Espíndola. Nesse mesmo ano, atuou ao lado da cantora na
interpretação de "Escrito nas estrelas", tendo sido responsável
também pelo arranjo da canção que venceu o "Festival dos
Festivais" (TV Globo). O músico, autodidata, sentiu cedo, nas
veias, o desejo de se expressar por meio da música. Aos 6 anos,
ainda em sua cidade natal, deixava a mãe cabreira ao cantar na
porta da sorveteria do cinema do município, quase sempre em
troca de guloseimas e de ingressos para as matinês. Em meados
de 1970, Fernando decidiu deixar para trás a capital alagoana,
rumo à selva de pedra, São Paulo/SP. Sofreu com a mudança,
assim como todo nordestino que se aventura por aquelas bandas.
Hoje, com uma carreira consolidada, ele experimenta o sabor da
superação, encantando espectadores mundo afora com sua
música inventiva e autêntica. Com um currículo que exibe shows
em países como Bélgica, França, Suíça e EUA.

Fonte: Jornal "Gazeta de Alagoas", 29/03/2005

Florentino Dias: monstro sagrado da regência brasileira

615
Com seis anos de idade, o alagoano Florentino Dias
começou a estudar música. Aos nove, mudou-se com a família para
o Rio de Janeiro, onde pôde, tempos depois, concretizar o sonho de
infância: tornar-se maestro de orquestras. A trajetória do musicista
inclui o curso de graduação em Música na UFRJ, o mestrado em
Regência de Orquestra nos Estados Unidos e a carreira de docente
universitário. É fundador e Regente titular da Orquestra
Filarmônica do Rio de Janeiro há 26 anos. Também é membro da
Academia Internacional de Música na Cadeira de "Richard
Strauss" e da América Symphony Orchestra League. Foi o
primeiro e único regente brasileiro homenageado com uma Batuta
de Ouro, representando o Brasil como Membro Internacional
Order of Merit. Pelos Estados Unidos recebeu do América
Biographical Institute, "The Presidencial Seal of Honor" por sua
exemplar realização no campo da música. Florentino é fundador de
três orquestras no Rio de Janeiro. Em 1962, a Orquestra
Filarmônica Estudantil do Diretório Acadêmico Padre José
Maurício, da Escola de Música da UFRJ. Em 1969 fundou a
Orquestra Sinfônica e Coral da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Com ela realizou mais de 150 concertos pelo interior do
Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Conseguiu que a
Universidade reconhecesse o Coral como disciplina, com
publicação em Boletim.

Alagoano cria Filarmônica carioca

616
Em 1978 criou a Orquestra Filarmônica do Rio de Janeiro,
da qual é Regente Titular. É formado pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro e professor titular da mesma Escola. Concluiu
mestrado em Regência na Washington University, USA, e
frequentemente tem sido regente convidado dos Festivais de Verão
na Flórida e em Nova York. Estudou com grandes mestres, como
Francisco Mignone, Eleazar de Carvalho, Robert Wykes, Harold
Blumenfeld e outros. É membro da Academia Internacional de
Música e da American Symphony Orchestra League e em 1987 foi
homenageado com uma "Batuta de Ouro" e com o Título de
Cidadão do Estado do Rio de Janeiro pela Assembléia Legislativa
do Estado do Rio de Janeiro. Foi homenageado com dois valiosos
prêmios no Fórum Mundial em Washington D.C. O American
Biographical Institute criou uma fundação com seu nome,
"Florentino Dias Award Foundation", e pelo International
Biographical Centre, da Inglaterra, foi eleito "International
Professional of the Year 2007", em sua especialidade. Em
setembro de 2014, o maestro Florentino Dias, há 35 anos à frente
da Orquestra Filarmônica do Rio de Janeiro, finalmente aposentou
sua batuta.

Gustavo Gomes: a fábrica de som

O cantor e compositor alagoano Gustavo Gomes diz que


tem mais de 500 músicas compostas e que, em 2012, lançou quatro
discos autorais simultaneamente. O primeiro álbum, Solidão
Nunca Mais (2009) levou 10 anos para ser lançado. A longa

617
gestação inicial foi compensada recentemente com a gravação de
seis álbuns até 2012. Inicialmente considerado sambista, Gustavo
ampliou sua área de visão musical e abriu outras trilhas sonoras,
como reggae, forró, soul music, pop e até música erudita. “Hoje eu
componho reggae, amanhã valsa, de outra vez, frevo... Não estou
comprometido com nenhum estilo musical popular ou erudito.
Componho por intuição e, muitas vezes, lembrando os
compositores já existentes”.

Heckel Tavares: do erudito ao popular, o maestro maior

O compositor, maestro e arranjador Hekel Tavares (1896-


1969) nasceu em Satuba, Alagoas. Estudou piano com uma tia e
ainda criança aprendeu harmônica e cavaquinho, mas sua maior
paixão sempre foi a música popular. Hekel adorava ouvir
cantadores de desafios e reisados. Foi para o Rio de Janeiro em
1921 e lá começou a estudar orquestração com o maestro J.
Otaviano. Ao lado de Waldemar Henrique, Marcelo Tupinambá, e
Henrique Vogeler, sob a influência nacionalista da Semana de Arte
Moderna (1922), criou um tipo de música situado na fronteira do
erudito e do popular. Sua primeira composição de sucesso foi
Suçuarana (parceria com Luiz Peixoto), lançada em 1927. Em
1927, o compositor se viu na contingência de voltar às revistas
mais populares dos teatros da Praça Tiradentes. Na parceria com o
compositor Luiz Peixoto, obteve seu maior êxito popular com a
música Casa de Caboclo gravada por Gastão Formenti na
Parlophon, em 1928. Ainda neste ano, Patrício Teixeira gravou Eu

618
Ri da Lagartixa, também lançada na Parlophon. Já no início da
década de 1930, Hekel Tavares compôs com muitos parceiros entre
os quais Joraci Camargo com quem fez Favela e Leilão, com
Ascenso Ferreira a Chove!… chuva!… E com Álvaro Moreira
Bahia, Murilo Araújo Banzo e Luís Peixoto, as músicas Na Minha
Terra Tem e Felicidade. Autor de mais de 100 músicas, de 1949 a
1953 percorreu quase todo o Brasil, em missão especial do então
Ministério da Educação e Saúde Pública, pesquisando motivos
folclóricos que utilizaria em diversas obras.

Suçuarana
Composição: Heckel Tavares - Luiz Peixoto

Faz três sumana


Que na festa de Sant'Ana
O Zezé Suçuarana
Me chamou pra conversar
Dessa bocada
Nóis saímo pela estrada
Ninguém não dizia nada
Fomo andando devagar

A noite veio
O caminho estava em meio
Eu tive aquele arreceio

619
Que alguém nos pudesse ver
Eu quis dizer
Suçuarana, vamo imbora
Mas Virgem Nossa Senhora
Cadê boca pra dizer

Mais adiante
Do mundo, já bem distante
Nóis paremo um instante
Predemo a suspiração
Envergonhado
Ele partiu para o meu lado
Ó Virgem dos meus pecados
Me dê a absorvição

Foi coisa feita


Foi mandinga, foi maleita
Que nunca mais indireita
Que nos botaram, é capaz
Suçuarana
Meu coração não me engana
Vai fazer cinco sumana

Maestro faz sinfônica do coco alagoano


Heckel Tavares fez peças clássicas como o Concerto para
Piano e Orquestra em Formas Brasileiras, obras para piano e
violino, coro misto, solistas e coros infantis entre outros motivos

620
folclóricos e regionais, como Engenho Novo, Bia-tá-tá. Ainda com
o material obtido na viagem, em 1955, fez Oração do guerreiro,
para baixo profundo. Compôs ainda o Concerto, para piano e
orquestra; o Concerto em formas brasileiras, para violino e
orquestra; O sapo domado e A lenda do gaúcho. Deixou
inacabados, Rapsódia nordestina e Fantasia brasileira, ambas para
piano e orquestra, além do drama folclórico Palmares.
Infelizmente, Hekel Tavares não é muito conhecido pela maioria
dos brasileiros por causa da retirada da educação musical das
escolas em 1960, motivo pelo qual nós brasileiros ficamos a mercê
de uma formação musical totalmente influenciada pelo mercado
discográfico.

Hermeto Pascoal. O bruxo do som.

Compositor. Instrumentista. Toca acordeão, flauta, garrafa,


piano, bacia, saxofone e sintetizador, entre outros instrumentos
musicais. Nascido na cidadezinha de Lagoa da Canoa, município
de Arapiraca, em Alagoas, não foi trabalhar na roça porque não
podia pegar sol – é o mais famoso albino brasileiro. Ia para a roça
em um carro de boi com seu pai e ficava deitado em uma árvore,
ouvindo passarinhos. Autodidata, aprendeu a tocar praticamente
sozinho. Começou a tocar acordeon aos 10 anos de idade.
Aprendeu junto com o irmão José Neto, tocando na harmônica de
oito baixos do pai, que a deixava em casa para ir trabalhar. Os dois
passaram a revezar-se tocando acordeão em festas de casamentos,
batizados e bailes ao ar livre, debaixo de árvores, os chamados

621
bailes de pé-de-pau, comuns no Nordeste e no Norte. O pai chegou
a vender duas vacas para poder pagar um acordeão de 32 baixos
para os filhos. Em 1950, sua família mudou-se para o Recife.

Hermeto: ensaio do dicionarista Cravo Albim

“Tempos atrás, durante um especial gravado na Rádio MEC,


Hermeto me comoveu quando falou das crianças. E por uma razão
muito simples: ele se orgulha de preservar a simplicidade das
crianças, segundo ele o caminho mais direto para o encontro da
divindade ou de Deus. E Hermeto – compreendi isso agora –
conseguiu o impossível, que é ser um arauto da modernidade, da
invenção, do passo à frente e ser de uma simplicidade cativante, de
um despojamento de que só mesmo ou os gênios ou os santos são
capazes. Ele me falava outro dia que sua carreira internacional
(começada a partir de 1970) só lhe trouxe alegrias, como as de ser
gravado por Miles Davis, seu fã número um e que lhe abriu as portas
do jazz mundial. “Pois é, o Miles gostou tanto que queria gravar todo
um elepê só comigo e com músicas minhas. Mas eu tive que voltar
para fazer um sonzinho lá no Jabour (distante subúrbio carioca) e me
mandei. Por isso não fiz”. Atualmente, Hermeto Pascoal apresenta-se
com cinco formações: Hermeto Pascoal e Grupo, Hermeto Pascoal e
Aline Morena, Hermeto Pascoal Solo, Hermeto Pascoal e Big Band e
Hermeto Pascoal e Orquestra Sinfônica. Diz ele que, por enquanto, é
só!!”.
Dicionário Cravo Albim de Música Popular Brasileira.

622
João do Pife: “um gênio na arte de tocar o pífano”

João Bibi dos Santos (1932-2009) nasceu lá para as bandas


de Porto Real de Colégio, quando ele nasceu não tinha a ponte
Porto Real- Propriá (Sergipe), sobre o Rio São Francisco. Mas
como um legítimo ribeirinho, aprendeu logo as coisas. Músico,
instrumentista. Analfabeto, aprendeu a tocar pífano ainda criança,
quando ajudava os pais na lavoura de fumo, em Arapiraca.
Autodidata, porém dono de uma musicalidade ímpar, o menino
logo começou a ganhar fama e a ser reconhecido pelo seu talento.
Do final da década de 1960 até o fim da década de 1980, viveu a
fase áurea de sua carreira artística, realizando shows em todo o
Brasil, acompanhando o humorista Coronel Ludugero e tocando
com artistas de renome nacional, como Luiz Gonzaga e
Dominguinhos. Considerado por Hermeto Pascoal como um gênio
da arte de tocar o pífano e um ícone da cultura popular nordestina.
Recebeu da Prefeitura de Arapiraca, o Troféu Arraiá da Integração,
em reconhecimento á preservação da Música de Raiz e a Cultura
Popular. Discografia: LP´s: O Rei do Pife; Coletânea Pau de Sebo,
sucesso na década de 1970; João do Pífaro no Sertão.

Jota do pife. Mestre de banda de pífano

José Félix dos Santos (1938-2011), 0 Jota do Pife, sempre


foi mestre de Banda de Pífano. Começou a tocar pífano sozinho,

623
aos sete anos de idade. Com 16 veio para Maceió ser animador de
festas de fazendas na Zona Rural, passando a ser conhecido como
seu Jota. No início dos anos 1960, criou a Banda de Pífano
Consagrada Jesus Maria e Todos os Santos, também conhecida
como a Bandinha do Jota, composta por seis músicos, e formada
por tarol, bumbo, surdo e pratos. Confeccionava seus próprios
instrumentos: a flauta é de tubo PVC e tem pife de cano de
alumínio, de taquara e de taboca. Todo este conhecimento e arte
tem sido repassado às crianças da comunidade de Poço Azul. Em
2007 recebeu o Certificado do Registro do Patrimônio Vivo de
Alagoas.

João de Lima: o violeiro “corda de aço”

Foram essas vivências que fizeram João de Lima


amadurecer na vida, desde que fugiu do sítio dos pais, aos 16 anos,
para subir em pau-de-arara rumo ao interior de São Paulo. Ainda
sem a companhia da viola, haveria de se embrenhar nos campos de
cafezais, algodão e amendoim para, só aos 20 anos, de volta a
Alagoas, virar mestre em tirar versos e rimas das cordas de aço. E,
ele recorda sua primeira apresentação em público. "Foi no sítio
Poço Comprido, em Limoeiro de Anadia. Eu e o cantador José
Francisco das Alagoas. Foi complicado porque eu nem sabia ainda
afinar a viola, que naquele tempo era guardada coberta com uma
toalha cheia de broches. Mas, naquela noite ganhei um bom
dinheiro e consegui comprar meu primeiro violão, em Arapiraca.
Ainda me lembro. Era azul, com cordas de aço, custou treze mil

624
reis e, eu afinava como viola. O mestre folclorista Théo Brandão o
encaminha à rádio Difusora de Alagoas, onde passou a atender ao
pedido dos ouvintes com seus repentes e modas no programa A
Hora dos Municípios, na época reproduzido para todo o Nordeste.
A cantoria de sua viola também chegou ás rádios Palmares,
Progresso e outras. Ainda nos anos 1970, João de Lima começou a
construir sus história em programas de TV de repercussão
nacional. No Rio de Janeiro: "Fui para o trono do Show de
Calouros de Cassino do Chacrinha!. Participou dos programas O
Povo na TV, no SBT e Sem Censura, na TV Educativa. Chegou ás
ondas das rádios Nacional, MEC, Globo, Tupi, Mauá... Ao palco
do Sílvio Santos. Até ao programa do Jô Soares...
Texto da jornalista Elô Baêta, no Caderno 2, em O Jornal -
2012

Jacinto Silva: um ícone da música nordestina

Jacinto Silva (1933-2001) nasceu no povoado de Canudos,


hoje município de Belém, Alagoas. Mas sua família fixou
residência em Palmeira dos Índios. O cantor, poeta, compositor e
estradeiro – adorava fazer shows Brasil à fora – cresceu ouvindo
cantores de coco, repentistas, violeiros, mestres de reisado e de
toré, guerreiros, cantadores de sentinela e terço, e os grandes
artistas da época de sua adolescência: Orlando Silva, Francisco
Alves, Bob Nelson e Luiz Gonzaga. Jacinto se tornou um exímio
cantor, que virou um ícone do baião, do xote, do xaxado, do coco
alagoano, do arrasta-pé e da marcha de roda. Viveu seu período

625
áureo nos anos 1960 e 1970. Sua estreia como artista foi em 1955,
na rádio Difusora de Alagoas, assinou contrato com a CBS (hoje a
Sony), e fez carreira nacional; participou como compositor em
trabalhos de grandes estrelas da MPB, como Abdias dos Oito
Baixos, Ângela Maria, Clemilda, Coronel Ludugero, Genivaldo
Lacerda, Marinês, Quinteto Violado, Trio Nordestino, Xangai e
Silvério Pessoa. Ao longo da carreira, foram quatro discos 78
RPM, dois compactos, vinte long-plays e três CDs.

“A cultura musical nordestina autêntica e original – que


foge do atual padrão de forró estilizado, com simulação de ritmo
caribenho e mexicano, untada de baixo calão – pode ser definida
a partir de quatro figuras emblemáticas: Luiz Gonzaga (inventor e
divulgador do baião), Jackson do Pandeiro (intérprete habilidoso
de senso ritmo invejável), Dominguinhos (virtuoso instrumentista
de herança gonzaguiana), e Jacinto Silva (cantador especialista
em várias modalidades de coco e forró). Ao popularizar o coco
sincopado – gênero musical que fundia trava-língua com pique de
embolada – Jacinto conseguiu desenvolvê-lo de forma complexa e
sofisticada, tanto no modo compor como na de interpretar”.
Luciano José, autor do livro Jacinto Silva As Canções,
Maceió, Imprensa Oficial Graciliano Ramos – 2013, que contém
todas as letras e músicas de Jacinto.

Jacinto: o mestre do coco sincopado


E Jacinto Silva seguiu os passos da escola do cantor e
compositor de forró e baião, o paraibano Jackson Pandeiro - a

626
ponto de alguns críticos afirmarem que Jacinto seria um imitador
de Jackson. Mas hoje não existem mais dúvidas, embora
continuasse sempre a cultuar e seguir seu mestre Jackson, Juvenal
sempre teve seu estilo próprio, seu ritmo sincopado e diferente e
sua grande dedicação aos ritmos regionais nordestino, como o coco
e o forró, de forma autêntica e autônoma, é considerado atualmente
um clássico alagoano.

“Em minha opinião de apaixonado pela música popular


brasileira, temos quatro compositores contemporâneos, no quadro
do forró alagoano, que se enquadram no teorema das gerações:
Juvenal Lopes, Luiz Wanderley, Jacinto Silva e Florival Ferreira.
A citação seletiva não desmerece a contribuição musical do
forrozeiro Gerson Filho, nem ao mestre Zinho; tampouco as
composições de Tororó do Rojão, ou a de José Candido, seja no
forró pé de serra ou em suas variantes menos tradicionais”.
Por Marcos Farias Costa, poeta, livreiro, boêmio e
especialista em música de Alagoas, na abertura do livro de Luciano
José - Jacinto Silva As Canções, Maceió, Imprensa Oficial
Graciliano Ramos – 2013

Silvério Pessoa traz à tona Jacinto


Em 1995, o cantor, poeta, compositor e pesquisador
pernambucano, Silvério Pessoa encontrou o forrozeiro Jacinto
Silva, em Caruaru (PE). Buscava alguma música para seu
repertório. Mas tudo se transformou, Silvério viu que a obra de
Juvenal era muito maior. Em 2000, Silvério Pessoa deixa de lado

627
sua produção de compositor, e abraça a produção de gravar Jacinto
Silva, e lança o CD Bate no Mancá. Nesse CD, Silvério Pessoa,
logo após sair da banda Cascabulho, realizou um trabalho de
resgate da obra de Jacinto Silva e regravou alguns de seus grandes
sucessos. Regravou de forma espetacular, com muito bom gosto e
altíssima qualidade. No início de cada faixa, há uma fala do
próprio Jacinto Silva, falando sobre as frugalidades do forró, e com
isso passando um pouco do romantismo da história e origem desse
ritmo nosso, tão querido e que, aos poucos, vai se perdendo, assim
como todo o conhecimento que não é transcrito e fica somente na
memória dos mais antigos. “Silvério Pessoa é cantor e compositor,
nascido na zona da mata no norte de Pernambuco, na cidade de
Carpina. Cresceu ouvindo músicos de forró no Rádio e passou a
admirar o estilo de Jacinto Silva de quem se tornou fã. Sua mãe,
professora de acordeon e sua vó, frequentadora assídua dos
programas de auditório de Recife nas décadas de 1940 e 1950,
tiveram grande influência em sua formação musical, na qual
também muito contribuíram as programação das rádios do
interior”, Texto do encarte do CD Bate o Mancá (O Povo dos
Canaviais) 2000 – Natasha.

Quadra e Meia
Jacinto Silva

Coco de embolada é diferente do coco de roda


Coco de roda não é coco de embolada
No coco de improviso canta quem sabe rimar

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Quem canta fica calado, quem não sabe quer cantar

Galope à beira-mar é diferente de uma sextilha


Uma sextilha não pode ser um mourão
Preste bem atenção, é uma quadra, quadra e meia
É um martelo alagoano, é um quadrado é um quadrão

Não é todo cantor que canta coco do jeito que eu canto


Do jeito que eu canto, eu quero ver você cantar
É um nó é um garrancho é um garrancho é um nó
Cantador tenha cuidado pra língua não embolar

Chora Bananeira
Jacinto Silva

Chora bananeira, bananeira chora


Chora bananeira, o meu amor já foi embora

Menina se quer ir, vamos, não se ponha a imaginar


Quem imagina cria medo, quem tem medo não vai lá

Foi embora meu amor, eu sei onde ele está


Eu tenho o endereço mas não vou procurar

Menina cor de canela, não olhe pra mim chorando


Porque a sua família já esta desconfiando

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Nosso amor tão passageiro, eu não posso recordar
Se o passado voltasse eu voltava a te amar

O dia já clareou, vou fazer minha obrigação


e dar viva a São Pedro, Santo Antônio e São João

Chora bananeira, bananeira chora


Chora bananeira, meu amor já foi embora

Júnior Almeida: música no embalo do coração

Genuíno representante da geração 1980, principalmente no


circuito de Maceió, Júnior Almeida sempre estava junto com seu
violão e as meninas, sempre apaixonado; daí suas românticas
baladas musicais. Surgiu em estilo avant gard para uma Maceió
sonolenta, com o grupo “Caçoa mas num manga" – Nelsinho
Braga, Jorge Barbosa, Gal Monteiro, Aline Marta, Rosália
Brandão, Emídio Magalhães. Foi uma época de afirmação de uma
geração de músicos talentosos que nem sempre continuaram nos
palcos alagoanos, pois alguns se dedicaram a outras atividades
profissionais, como o jornalismo, a arquitetura, a carreira jurídica.
Em 1985, classificado em primeiro lugar no V Festival
Universitário de Música da UFAL com "Lúcia Coragem", decidiu
seguir a carreira artística solo. De lá pra cá são mais de 20 anos de
estrada, contabilizando inúmeros shows. Apresentações realizadas
em praticamente todos os palcos alagoanos, em diversos palcos do

630
País, como Fortaleza, Paraíba, Recife, Salvador, Porto Alegre,
Santa Maria, Blumenau, Florianópolis São Paulo e Rio de Janeiro
e, também no exterior. O cantor também tocou ao lado de Milton
Nascimento no Show Crooner. Júnior Almeida passou a atrair a
curiosidade de produtores e cantores de todo o Brasil depois que
teve a música "A Cor do Desejo" (de Júnior Almeida e Ricardo
Guima) gravada pelo cantor Ney Matogrosso em seu mais recente
trabalho, o CD Beijo Bandido. A sonoridade de Júnior Almeida já
foi conferida na França, quando, a convite da Aliança Francesa,
participou do Festival do Sul na cidade de Marselha. Depois seguiu
em turnê em outras seis cidades. Em São Paulo, tocou ao lado de
talentos como Hermeto Pascoal, Leila Pinheiro e Duofel. Em 2015,
foi autor da música que marcou os 200 anos da cidade de Maceió.

Maceió, meu xodó


Autor: Júnior Almeida

Toquei meus pés neste chão


deixei o mar me levar
plantei flores no coração
Morena
Nas ruas desse meu lugar
Ruas tão cheias de vida
Gente que quer ser feliz
Querer paz e justiça
Morena
Tudo que a gente sempre quis

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Onde quer que eu vá, cidade
Levarei seus pedaços comigo
O calor deste sol que nos arde
E o azul desse céu infinito
Que a cidade se faça verdade
E acolha com carinho e zelo
Cada filho que dela é parte
Cada parte deste canto inteiro.

Ô Maceió
Parabèns para você agora
Com seus 200 anos de história
Com seus 200 anos de amor

Juvenal Lopes: o comandante do Samba

O cantor e compositor Juvenal Lopes (1930-1999) nasceu


no bairro de Laranjeiras, Rio de Janeiro, mas a família volta depois
para Maceió, no bairro do Prado. Sempre esteve no meio das rodas
de samba. Em 1950 compõe seus primeiros sambas, embora tenha
feito de obras musicais de todos os gêneros: do maxixe ao choro,
da vala ao baião, do frevo ao samba, mas foi no estilo regional que
criou suas obras-primas: Pisei no Lírio e Chuva Pedida. Sua maior
obra é o disco CD Brinquedo Acabado, lançado em 1999, que
recebeu novos e modernos arranjos do maestro Almir Medeiros,
produtor do disco, que soube recriar a atmosfera dos anos 1940 e

632
1950, que resgata o clima daqueles anos. Outro fato que resgatou a
importância de Juvenal Lopes no cenário musical alagoano foi o
lançamento, em 2007, do livro do poeta Marcos Farias Costa,
Juvenal Lopes - O Comandante do Samba, que resgata a vida e a
obra do sambista. A obra de Juvenal Lopes ganhou o país, na voz
de Clemilda, Marinês, Noite Ilustrada entre outros. Juvenal foi, na
realidade, um dos maiores compositores da música alagoana em
todos os gêneros musicais. Um boêmio, um homem do povo, mas,
sobretudo, foi um homem que tinha grande sensibilidade, que sabia
colher da alma do nosso povo e transmitir a alegria, a dor e o
sentimento do alagoano, Juvenal foi um sociólogo e transmitiu a
esperança do povo nordestino que, como diz na composição
“Chuva Perdida”:

Chuva Pedida
Juvenal Lopes

Meu povo pediu pra chover


Mais a chuva pedida aqui não chegou
O gado ta todo morrendo
Ta tudo sofrendo, meu Deus que horror
Mandacaru já virou pó
Nordestino sofre e chora, seu moço
Chega a fazer dó
Essa gente precisa ter
Saúde e educação

633
Falta água, não vem chuva
Pra vingar a plantação
Tem tanto caboclo rezando
Olhando o céu sem chover
E não vem um pingo d'água
Pra molhar o meu sofrer
Eita que seca malvada
Racha a alma na terra até

Mais enquanto a chuva não chega


Nordestino morre de fé

Do livro Juvenal Lopes, O Comandante do Samba, de Marcos


Farias Costa, Ideário 2007

Mácleim: a voz da música e da crítica

O alagoano Mácleim é compositor, cantor, produtor


musical, arranjador, jornalista, blogueiro e crítico musical, que não
pára diante dos entraves colocados diante à cultura alagoana,
principalmente quando se trata de sua categoria. Já compôs trilhas
para teatro e também já foi colunista do Jornal "Extra-AL", em
Maceió. Começou sua carreira participando de diversos festivais
universitários. Na década de 1980 foi para o Rio de Janeiro,
estudou no Conservatório Villa Lobos, cantou na noite carioca e
trabalhou em vários estúdios, entre eles Master, Drum e Verd. Já
tocou e cantou ao lado de importantes artistas como Djavan, Elba

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Ramalho, Milton Nascimento, entre outros. Viveu um período na
Europa, realizando inclusive, turnês artísticas por Londres, Paris e
Amsterdã. A mistura de Jazz, MPB e ritmos regionais levada pelo
alagoano encantou muita gente e abriu caminhos para a
consolidação de sua carreira artística. Integrou o grandioso Projeto
Pixinguinha, criado há pela Fundação Nacional das Artes para
fomentar e difundir a MPB, nos anos 1970 e 1980. Participou de
uma caravana musical acompanhado pelo Grupo Vocal 4, do Rio
de Janeiro e do baixista mineiro Ezequiel Lima. A cada
apresentação, os três interagem no palco, unidos pela linguagem
universal da música.

Maestro Fon-Fon e a conquista da Europa

Otaviano Romeiro Monteiro (1908 – 1951), mais conhecido


como Maestro Fon-Fon, nasceu em Santa Luzia do Norte, terra de
música ancestral, onde iniciou suas atividades musicais aos 11
anos. Foi um compositor, maestro e instrumentista brasileiro; o
primeiro a utilizar naipes de saxofones, trombones e trompetes,
dando a sua orquestra uma sonoridade especial. Iniciou suas
atividades musicais aos dez anos, tocando pífano. Lá chegando,
decidiu ficar na capital, mas, sem carteira de reservista e, logo, sem
possibilidade de conseguir emprego, ingressou no Batalhão de
Polícia, com a intenção de fazer parte da banda musical, o que não
conseguiu uma vez que não sabia ler música. Sua orquestra fez o
acompanhamento nas gravações de diversos artistas, entre eles,
Ataulfo Alves, Jararaca & Ratinho, Dircinha Batista, Emilinha

635
Borba, Francisco Alves, Joel & Gaúcho e Araci de Almeida. Em
1944, Odete Amaral gravou seu choro “Murmurando”, com letra
de Mário Rossi, que se tornou um clássico do choro cantado. Em
1947, a convite do Club de Champs Elysées, ele e sua orquestra
foram a Paris, França, e permaneceram na Europa por quatro anos,
apresentando-se em diversos países. Fon-Fon veio a falecer
durante essa excursão em Atenas, na Grécia. Durante a viagem,
eles gravaram seu único elepê pelo selo London: “Fon-Fon ET La
musique Del Brasil”, nunca editado no Brasil.

Roberto Becker: a voz popular das Alagoas

O cantor alagoano Domingos Annunziato Litrento (1939-


2012), mais conhecido como o cantor e compositor brega–pop
alagoano Roberto Becker tem na bagagem mais de 1.000 músicas,
entre marchinhas, serestas e forrós. No ano de 1970, Becker e seu
grupo Os Golden Lions gravaram um raríssimo compacto duplo
independente pela gravadora Rozemblit, com influências da
Tropicália e, num estilo que. para muitos, assemelhava-se ao
Mangue-Beat. Gravou em 78 rotaçoes, compactos, Lps e CDs. É o
compositor do hino do estádio Rei Pelé. Fez muitos jingles para
políticos. Participou na TV canal 2 do Recife - Jornal do
Comércio, no Programa "Você Faz o Show", de Fernando
Castelão. Na rádio Progresso de Alagoas, através de Jurandir
Costa, passou um ano, de muito sucesso, com o Programa Becker
Show. Musicou muitos poemas de Alceu Vamose, Olavo Bilac,
Castro Alves, Alvares de Azevedo, dentre outros.Compôs, aos

636
nove anos, a marcha Serpentina, e posteriormente, entre outras
De Bandinha, Entre suas composições, destaque para Fricó Forró.
Em parceria com Ádila Becker compôs Não Foi o Vento

Sóstenes Lima, uma trajetória surpreendente

O alagoano José Sóstenes Nascimento de Lima, ou Sóstenes


Lima, como é conhecido, é compositor, cantor, escritor e produtor.
Formado em Arquitetura e Urbanismo, pela Universidade Federal
de Alagoas e em Direito, pelo Centro de Estudos Superiores de
Maceió. Nascido em Alagoas, iniciou sua trajetória artística no
circuito dos festivais universitários nos anos 1980, fundando os
Grupos "Arte Nova" e "Âmago de Rio". Entre 1991 e 1999
consolidou uma carreira dentro do universo Gospel, com as bandas
"Blues 126" e "Êxodus", vencendo diversos Festivais da Juventude
Batista. Em 2000 retornou ao trabalho com MPB. Tendo o seu
trabalho calcado nos ritmos brasileiros, especialmente nordestinos,
a exemplo do Xote, Baião, Coco, Maracatu, Boi de Carnaval. Com
destacada participação em diversos Festivais do Brasil,
enriquecendo sua discografia com gravações em CDs desses
eventos. Apresentou, em 2000, o show “De vento e de silêncio” no
Teatro de Arena. Em 2001 produziu a 1ª Mostra Alagoana de
Música, evento que conjugou música, artes plásticas, dança e
literatura, em duas edições e apresentou o show “Casa de Silêncio
e Verso”, com o poeta Otávio Cabral e Wilma Araújo, no Sururu
de Capote. Em 2002, integrando a Caravana Alagoana de Música

637
realizou shows em Maringá(PR), Paranaguá(PR),
Florianópolis(SC) e Porto Alegre(RS). Ainda em 2002 venceu o e-
festival IBM, com a música “Noites de Bar”, abrindo show de
Zélia Duncan, numa das etapas, e de Jorge Benjor, na final.

Tororó do Rojão: uma explosão de estrelas

Ele é o estrondo, o ribombar do trovão, o trupizupe - raio da


silibrina. É o novo big bang das galáxias e estrelas. Não é
brincadeira não! Esse cara existe, é “o diabo na rua, no meio do
redemoinho”, nas palavras de João Guimarães Rosa, em Grande
Sertão. Ele é cantor, compositor e excepcional intérprete. Com
vocês, Tororó do Rojão, o alagoano de Matriz de Camaragibe,
Manoel Apolinário da Silva, 73 anos de vida bem vivida, junto
com muita gente boa do xote, do xaxado, do forró e do baião
brasileiros, e bote frevo, e bote rock nessa fusão de sons. Foi
zabumbeiro de Luiz Gonzaga, e companheiro de peripécias do rei
da sanfona. Tocou o triângulo na gravação original da música
“Ovo de Codorna”. O parceiro e irmão Jacinto Silva, outro
forrozeiro de ouro de Alagoas, foi a fonte onde Tororó buscou sua
sonoridade musical, ao ritmo do coco e da embolada, e mergulhado
também na música do paraibano Jackson do Pandeiro, o rei do
ritmo. Jackson para Tororó é o palco, a cena, o bom humor, o jogo
de cintura, a alegria gestual. Mas acima de todos eles, está o Vavá
dos Oito Baixos, o mestre sanfoneiro com quem formou “Os
inseparáveis do Forró”. Nos seus dois Long Plays e três CDs
gravados, Tororó toca e canta de tudo: Boemia, malandragem,

638
sexo, linguagem profana, brega, pop, a temática social, e também
muita sacanagem e “fuleiragem” nas canções. Ele é único nesse
ponto. Mas sua espinha dorsal é o forró, na versão mais genuína.

“Ô Cabra bom!”
Era com esse gentílico que Tororó se apresentava, sempre
de bom humor, para quem sofreu na pele a pobreza, no corte e na
limpa da cana-de-açúcar. Mas a vida sorriu para Tororó, pelas
ondas da Rádio Difusora, no programa de Odete Pacheco, lá pelos
idos de 1950. Dali em diante sua carreira decolou, tornando-o
reconhecido e aplaudido como o autêntico forrozeiro das Alagoas.
Tororó era múltiplo e versátil, une gerações de artistas, dividiu o
palco com legendas como Tom Zé, Duofel, Wado, Mopho e Xique
Baratinho, no Festival de Música Independente (FMI), em Maceió.
O despertar musical chegou logo cedo, escutando sua mãe Maria a
cantar o coco, em sua cidade natal, Matriz do Camaragibe. Daí em
diante, o artista já começava a sonhar em ser uma estrela da música
popular, um artista de verdade, de carteirinha e tudo. Assim foi a
vida do grande Tororó. Muita luta, muita garra pela vida de quem
venceu a pobreza com seu talento, apesar de continuar pobre,
vivendo e ajudando toda a família com sua aposentadoria de
funcionário público da Petrobras. Muito pouco, por sinal. O que
valia era seu plano de saúde, por uma velhice mais segura. Mas o
que ele queria mesmo era voltar aos palcos. Tororó deixou marcas
na música, e uma legião de fãs. Uma delas, a jornalista Paula Félix,
que produziu um documentário sobre o cantor. O líder da banda

639
Xique Baratinho, Railton Sarmento, prepara um novo show com
várias bandas da cena musical alagoana apresentando as músicas
de Tororó. As luzes da ribalta estão acesas, o palco está pronto
para mais um espetáculo do mestre do forró, seja aonde for, assim
na terra como no céu. Tomara que ele volte iluminado, endiabrado,
angelical, pronto para outras traquinagens. Salve Tororó pelos
séculos!”.

Wado: o mais alagoano dos estrangeiros

Wado é o nome artístico de Oswaldo Schlikmann Filho, um


cantor e compositor brasileiro de música popular brasileira,
nascido em Florianópolis e radicado em Maceió desde os oito anos
de idade. Seu estilo musical possui influências do samba, do rock e
inúmeros representantes da MPB. É formado em Jornalismo pela
Universidade Federal de Alagoas. Seu álbum de estréia,
"Manifesto da Arte Periférica" em 2001, foi aclamado pela crítica.
A partir de então, passou a se apresentar em inúmeros festivais e
eventos regionais, nacionais e internacionais. No ano seguinte,
lançou o álbum "Cinema Auditivo" e em 2004 lançou "A Farsa do
Samba Nublado", ambos igualmente bem recebidos pela crítica
especializada. Em meados de 2005, junto com os parceiros
Alvinho Cabral e Marcelo Frota, deu início ao projeto que criaria o
grupo Fino Coletivo. O músico se desligaria da premiada banda
mais tarde, para dar continuidade seus projetos solo. Em 2008
lançou seu quarto álbum solo, "Terceiro Mundo Festivo". Ainda
em 2008 foi premiado pelo Projeto Pixinguinha, que o permitiu se

640
apresentar em diversas cidades de Alagoas, bem como produzir de
forma independente seu quinto álbum, "Atlântico Negro".
"Atlântico Negro" possui duas faixas com trechos do escritor
africano Mia Couto, com quem assinou parceria para este trabalho

Uma carreira nacional construída em Maceió


No ano de 2011 Wado lançou seu álbum intitulado "Samba
808" com participações de grandes nomes da musica nacional
como: Zeca Baleiro, Marcelo Camelo, Mallu Magalhães e outros.
Em 2013 lançou "Vazio Tropical" (com produção de Marcelo
Camelo), álbum que teve ótima recepção da crítica, considerado
um dos melhores discos de 2013. Fã assumido do escritor do poeta
africano Mia Couto, Wado conseguiu efetivar uma parceria
importante, que se torna simbólica em sua carreira de compositor:
duas de suas músicas foram feitas com a colaboração do escritor
moçambicano que conta histórias de seu povo utilizando palavras
híbridas de dialetos tribais. Seu disco Atlântico Negro foi eleito
pela Rolling Stone Brasil como o nono melhor de 2009. E Wado
ainda ficou em sétimo lugar na lista dos dez melhores da década,
numa votação com cerca de 70 jornalistas, críticos e especialistas
de renome na área musical. Apesar de morar em Alagoas, Wado
mantém uma agenda constante de shows pelo Brasil.

Atlântico Negro
Wado

E o Atlântico assim o fez

641
Essa é a morte da raça
A inevitável hibridez
É lindo que assim se faça
Foi fruto do Atlântico
Culpa do Atlântico
Em branco e preto
Negro, pardo, parto
No mar azul
Atlântico negro vai renascer

Discografia

(2015) 1977. Deck


(2014) O ano da serpente. Saravá Records
(2013) Vazio Tropica. Oi Música
(2011) Samba 808. Independente
(2009) Atlântico negro. Independente
(2008) Terceiro mundo afetivo. Mubi
(2007) Fino coletivo (c/ grupo Fino Coletivo). Universal
Music
(2004) A farsa do samba nublado. Tratore
(2002) Cinema Auditivo. Tratore
(2001) O Manifesto da Arte Periférica. Dubas

MÚSICA INSTRUMENTAL

642
Zé Barros, o guitarrista que abriu o rock

Antes mesmo de surgir em meados da década de 1980, os


primeiros cantores e cantoras contemporâneos de Alagoas, como
Eliezer Setton, Ricardo Mota, Chico Elpídio, Deyves, Máclein,
Júnior Almeida e a primeira musa, Leureny, entre muitos outros,
desde 1960 já começava a ser formada a usina de som, liderada
pelo pessoal da cozinha, os instrumentais pioneiros, que no final
também ampliaram suas performances na direção, produção e
montagem de discos e shows. Pioneiro dos pioneiros é o guitarrista
José Barros, que aos 15 anos já tocava guitarra, com a ajuda da
irmã, Leureny, lá pras bandas de Paulo Jacinto, onde morava. Ele
foi responsável por popularizar a música instrumental em Alagoas.
Tocou com vários nomes da música nacional, em letras de artistas
como: Geraldo Azevedo, Teca Calazans, Reginaldo Rossi, Núbia
Lafaiete, Orlando Dias, João do Vale, Peninha, entre outros.

Banda Porão: a primeira do rock de Alagoas

Zé Barros é um pioneiro da música instrumental no Estado.


Em 1976, fez seu primeiro show com o tecladista Luizinho Assis;
e em 1977, com Félix Baigon e Beto Batera, em seguida formou a
Banda Porão. Em 1982, ao lado de Nelson Braga e José Cícero
(Jatiúca), formou a primeira banda de rock, a Banda Porã, oda qual
gravou seu trabalho em Alagoas.

Félix Baigon

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É praticamente impossível falar em música instrumental
produzida em Alagoas sem esbarrar, diversas vezes, no nome do
contrabaixista Félix Baigon. Nos últimos 30 anos, ele tem figurado
como músico e produtor de vários artistas da terra, como Júnior
Almeida, Mácleim e Fernanda Guimarães. Em 2008, Baigon deixa
a cozinha musical, e mostra seu lado desconhecido: o de
compositor. “É o momento de revelar o resultado do processo de
criação de muitos anos. É o divisor de águas do seu trabalho
enquanto músico”.

Beto Batera (1949-2010)

A morte do mais lendário baterista alagoano, Roberto


Antonio Vieira Gomes, o Beto Batera, aos 61 anos, foi a crônica de
uma morte anunciada, por seus sérios problemas com o
alcoolismo. Mas ele sempre foi assim, irrequieto, doidão, genial
nas baquetas e amigo de verdade. Toda turma ia vê-lo sempre, às
sextas-feiras e sábados no Trilha do Mar, na Garça Torta, sempre
acompanhado de ótimos músicos e fazendo jazz de primeira
qualidade. O baterista geralmente se apresentava com nomes de
peso na cidade, a exemplo do grupo Power Jazz: Everaldo Borges,
Felix Baigon, Geraldo Benson e Carlos Balla.

Nelsinho Braga

644
O arquiteto Nelson Braga foi outro pioneiro da cena
roqueira alagoana. Cantor, compositor, violonista e guitarrista,
Nelsinho compôs duas bandas que fizeram história, apesar do
pouco tempo de aparição. Mas foram aparições marcantes nos
grupos Caçoa mais Não Manga e a Beira Banda da Lagoa, durante
o final dos anos 1970 aos anos 1980. No início dos anos 1980
participou do grupo Caçoa Mas Num Manga, que tinha a seguinte
composição: Jorge Barbosa – o hoje jornalista cultural e roqueiro
Sebage - Gal Monteiro, Aline Marta, Rosália Brandão, Júnior
Almeida, Emídio Magalhães. Alguns desses músicos depois (1984)
fizeram o show “Babe Bicho”, no Teatro de Arena e em outros
palcos ao ar livre em Maceió. A participação no Babe Bicho foi de
Zé Barros, Zé Carlos e Baygon, Nelson Braga, Mirna Porto e
Eliane Vielmond. Esse período, a década de 1980, foi produtivo e
de muita criatividade. Bandas surgiam e logo se subdividiam com
outras formações; foi uma época de afirmação de uma geração de
músicos talentosos que nem sempre continuaram nos palcos
alagoanos, pois alguns se dedicaram a outras atividades
profissionais, como o jornalismo, a arquitetura, a carreira jurídica.
Pois a Beira Banda da Lagoa confirmou todas as expectativas, em
um show remake, em 2000, resenhado pelo jornalista Ênio Lins.

“Pois a Beira Banda da Lagoa confirmou todas as


expectativas e fez um senhor espetáculo na noite de sexta-feira. As
ruas no entorno do Engenho Jaraguá ficaram lotadas e os veteranos
jogaram pesado, revivendo o clima dos anos 80 em grande estilo. A
Beira Banda da Lagoa teve uma existência quase efêmera, na virada

645
da década de 70 para a de 80. Gravou um disco, um grande mérito.
Mas outros tantos grupos floresceram por aqueles tempos e tiveram
existências mais longevas, como foi o caso do Grupo Terra. E a tribo
do cinema, quando vai revitalizar-se. Olha aí a boa lição desses
respeitáveis senhores da Beira Banda da Lagoa. Nelsinho Braga, Zé
Barros, Jatiúca e Máclein mostraram um trabalho que comprova a
busca da inovação e da qualidade desde há (pelo menos) 20 anos.
Outro fato digno de elogios é o relançamento do CD com as músicas
do antigo compacto simples. Um documento importante, garantindo a
preservação da memória musical recente”.

Ênio Lins na Gazeta de Alagoas de 24 de Outubro de 2000

Nelsinho e a História da Concha do Mar!


Nelsinho Braga também brilhou nos palcos dos festivais
estudantis. Junto com a Beira Banda da Lagoa, eles se
classificaram em segundo lugar no 3º Festival Universitário de
Música 1981/1982, com a música A História da Concha do Mar,
com letra e música de Nelson Braga. Ela está gravada no disco do
III Festival (LP em Vinil) e no Compacto Duplo da Beira Banda da
Lagoa (CD em Vinil). É uma poesia que vale escutar, em alto e
bom som.

A história da concha do mar


Letra e música: Nelsinho Braga

Na rua do Sol

646
Você vinha subindo ladeiras
Correndo, balançando as cadeiras
Melada de amor e suor.

Cantando um frevo
que o marinheiro pediu
olhou para o céu e sorriu
Sentiu purpurina no ar.

E foi com o sorriso aberto


E o coração alucinado
Que puxou um Cordão Encarnado
Que se formou a seu lado

De mil foliões encantados


Arlequins apaixonados
Que olhavam...
...Prá Lua

Perdida que se achou


Pelo céu caminhando e mostrou
Uma avenida na beira da praia.
E você dançou
A noite inteira
E na quarta-feira
Na lambida das ondas na areia
Você sumiu,

647
E surgiu
A Concha do Mar...
Lá, laiá, láiá,
Lá, laiá!

Para escutar a música, com a gravação original, acesse:


http://www.bairrosdemaceio.net/musicas/player.php?
Id=225&Tipo=Musica&
Naipe de ouro de instrumentistas alagoanos

Antonio Carmo: Piano


Carlos Bala: bateria
Café de Jesus: Bateria
Chico Eupídio: compositor e violonista
Dário Américo e Paulo Lenilson: Violinos
Dudu de Athaíde: Bateria
Estácio: Surdo, caixa, tamborim
Everaldo Borges: Sax e Flauta
Fábio Valois: Piano e teclados
Genaro: Acordeom
Ilê: Percussão
Jiuliano Gomes: teclado
Lucas Farias: Saxofone
Luiz Pompe: Violão de nylon
Marcius Campelo: Bateria
Neném: Viola
Noberto Vinhas: Violões e guitarras

648
Nilton Souza: Maestro
Orquestra de Tambores de Alagoas: Batuque
Pinduca: Violão
Quartinha: Zabumba e Triângulo
Ricardo Lopes: Guitarra
Ronalso: Percurssão
Roni: Trombone
Selma Brito: Piano
Siqueira Lima: Trompete
Toni Augusto: Guitarra
Tião Marcolino: Sanfona
Welington Sarmento: Cavaquinho
Wilbert Fialho: Violão de 7 e de 6 cordas
Van Silva: Baixo
Zailton Sarmento: Flauta e Teclado
Zé Vicente: Cavaquinho

CANTORAS ALAGOANAS

Cris Braun: uma cantora Cult do Brasil

A cantora e compositora Cris Braun nasceu em Estrela (RS),


e mudou-se na década de 70 para Maceió, onde estudou violão,
sendo aconselhada por seu professor a cantar. Posteriormente
estudou percussão, teclados e composição. Começou a fazer shows
em 1985, acompanhada por baixo e teclado. Apresentou-se no
Mistura Fina (RJ) nessa época. Foi um dos membros do grupo de

649
rock Sex Beatles, com quem lançou dois discos, "Automobília"
(1994) e "Mondo Passionale" (1995). Em 1998, participou do
projeto "Novo Canto", da Rádio JB FM, que apresentava novos
talentos da música brasileira. No ano seguinte, gravou seu primeiro
CD, "Cuidado com pessoas como eu", pelo selo Fullgás, de Marina
Lima. O CD foi bem recebido pela crítica, destacando-se a faixa-
título (Cris Braun, Nilo Romero e William Magalhães) e uma
releitura drum'n'bass de "Brigas" (Evaldo Gouveia e Jair Amorim).
Em 2002, apresentou-se no Bastidores (RJ), com o show
"Artérias", interpretando composições próprias como "Filme
antigo", "Contradição" e "Gávea Posto 6" (com Paula Toller e
George Israel) e clássicos como "Brigas" (Evaldo Gouveia e Jair
Amorim) e "Bom conselho" (Chico Buarque). Como compositora
tem parcerias com Alvin L. e Paula Toller. Sua composição "Como
é que eu vou embora?", gravada pelo Kid Abelha, entrou na lista
das mais tocadas em 1997, e "Menos carnaval" foi gravada com
relativo sucesso por Belô Velloso. Em 2005 lançou o segundo
disco solo, "Atemporal", com composições próprias, como "Entre
o céu e a terra", "Atemporal" e a releitura de "Nenhuma dor"
(Caetano Veloso). Em 2012, Cris Braun lançou o CD "Fábula",
com músicas autorais, além composições de Wado e uma parceria
de Marina Lima e Alvin L, entre outras.

Clemilda: a forrozeira do Brasil

Clemilda Ferreira da Silva (1936-2014) nasceu em São José


da Laje, em 1936, e se tornou uma cantora brasileira premiada,

650
estourou nas paradas de sucesso com a música “Prenda o Tadeu”,
em 1985, e a partir de então participou de vários programas de
rádio e TV, entre eles o “Clube do Bolinha”, na Rede
Bandeirantes, e o “Cassino do Chacrinha” e "Os Trapalhões", na
Rede Globo. Nesse mesmo ano ganhou seu primeiro Disco de
Ouro e em 1987, com o disco “Forró Cheiroso”, mais conhecido
como “Talco no Salão”, ganhou seu segundo Disco de Ouro.
“Foram os dois momentos mais importantes pra mim”. Clemilda
passou a infância e a adolescência em Palmeira dos Índios, Zona
da Mata de Alagoas. No começo da década de 1960 decide viajar
para o Rio de Janeiro para "tentar a sorte", onde então consegue
emprego como garçonete. Até então ainda não havia descoberto o
dom artístico que tinha. Em 1965, consegue cantar pela primeira
vez na Rádio Mayrink Veiga no programa "Crepúsculo sertanejo",
dirigido por Raimundo Nobre de Almeida, que apresentava
profissionais e calouros. Nessa ocasião, conhece o sanfoneiro
Gerson Filho, contratado da gravadora e também alagoano como
ela, que popularizou o fole de oito baixos e já era artista com disco
gravado. Com ele Clemilda viria a se casar. Fez algumas
participações em dois LPs do esposo, e a partir de 1967 começou a
gravar seu próprio disco. Sua carreira tomou impulso com os
shows que fazia em Sergipe, onde vive há mais de duas décadas,
sempre acompanhada pelo marido. Após 1994, com a morte do
companheiro, a forrozeira-mor afastou-se dos shows e se dedicou
como apresentadora do programa “Forró no Asfalto”, na TV
Aperipê de Aracaju, programa há mais tempo no ar da emissora. A
forrozeira que é considerada 'Rainha do Forró' se consagrou como

651
um dos maiores ícones da música sergipana com 50 anos de
carreira, gravação de 40 discos e seis CDs. Ela tem dois discos de
ouro e dois de platina. A cantora faleceu em novembro de 2014,
em Aracaju, onde morava há mais de 20 anos. Ela tinha ainda
histórico de hipertensão e Parkinson.

Elaine Kundera: a voz da MPB em Alagoas

O gosto pela MPB foi estimulado desde cedo, quando ainda


era criança. Em sua casa ouvia músicas de ícones da MPB, a
exemplo de Clara Nunes e Cartola. E assim foi sendo construída a
base musical de uma das vozes de destaque do cenário musical
alagoano. O seu nome é Elaine Kundera. A sua voz e interpretação
dispensam apresentação. Aos 17 anos de carreira, a intérprete se
prepara para mostrar o seu talento em seu primeiro CD solo. O
projeto está sendo montado em parceria com a ONG Candeeiro
Aceso e está em fase de captação de recursos, escolha das músicas
e detalhes da produção. O trabalho vai trazer 15 faixas, onde todas
as músicas são inéditas e de cantores alagoanos. Enquanto os
detalhes da gravação do CD estão sendo acertados, Kundera
continua com a sua agenda de shows e participações em projetos
culturais. A intérprete está sempre recebendo convites e marcando
a sua presença em grandes produções alagoanas, a exemplo do
Teatro Solidário, Divas alagoanas, Dose Dupla e Viola Enluarada.

652
Apesar de ter nascido em São Paulo e morado em Minas Geras
durante um bom tempo, Elaine se considera arapiraquense. Ela
veio morar na cidade com a sua família na década de 1980. E,
desde então, onde quer que vá leva o nome de Arapiraca. Quando
canta, Elaine Kundera dá vida as músicas. Ela justifica que
somente canta quando consegue sentir a música.

"Viver de arte é complicado no Brasil, e principalmente no


interior alagoano. Mas é possível realizar um bom trabalho fazendo o
que realmente se gosta”.

Elaine Kundera, em entrevista a Ana Cavalcante, no jornal


Alagoas em Tempo, 2004

Fernanda Guimarães: a voz de veludo

A paixão natural por música ensinou Fernanda Guimarães a


cantar. Cantora, compositora e instrumentista com quase 14 anos
de carreira vivida em Alagoas e pelo Nordeste, Fernanda
Guimarães já foi vocalista e instrumentista de duas bandas – a
extinta FatorRH e a ativa Zero82 – ganhou reconhecimento em boa
parte do Nordeste com visitas competentes e particulares pelo rock
progressivo, o folk e o pop rock, criando identidade própria na
interpretação das músicas de suas influências musicais. Mais
madura e intimista, tomou para si a gravidade aveludada e refinada
da voz e decidiu criar o grupo 4Jazz reunindo no repertório Jazz e
Sambas. Recentemente participou do projeto “Elas Cantam Bossa

653
Nova” ao lado das melhores cantoras do estado. Intérprete finalista
do Festival de Música Alagoana do Sesc em 2002 e 2004 e
segunda colocada no Festival CantaCUT de São Paulo, Fernanda
conquistou currículo suficiente para abrir com primor os shows de
Paralamas do Sucesso, Flávio Venturini, Vanessa da Mata, Djavan
(com quem dividiu palco num dueto memorável em Maceió) e
Maria Rita. Considerada a revelação da música alagoana, Fernanda
alça outros voos e apresenta-se com frequência nos palcos do Rio
de Janeiro, São Paulo e Maceió. Morando no Rio de Janeiro,
Fernanda Guimarães lançou o seu primeiro CD intitulado "Verbo
Livre" em 2010.

“O meu trabalho tem pitada de jazz, tem latinidade e tem


brasilidade e por outro lado segue uma linha pop marcante, pelo
menos essa é uma grande influência, já que quase sempre gostei de
atuar na música pop”.

Fernanda Guimarães, no jornal Gazeta de Alagoas – edição


de 03/03/2010

Irina Costa: a voz que veio da África

Dona de uma das melhores e mais versáteis vozes de


Maceió, a cantora Irina Costa navega por vários estilos
primorosamente. Nascida em Angola, mas brasileira e alagoana de
coração, a cantora já participou de vários concursos musicais.
Dentre eles, venceu o Lusavox por escolha do público e se

654
apresentou no canal RTPi para mais de 141 países. Origem
angolana, ascendentes portugueses e criação em Alagoas. Talvez
seja por isso que a trajetória da cantora Irina Costa, cuja família
saiu de Angola para Alagoas em meio à guerra no país, em 1975,
seja marcada, assim como o Oceano Atlântico, pela confluência
entre Portugal, África e Brasil. Em outubro de 2014, a intérprete
fez, no Teatro Deodoro, o maior show de sua carreira, “O Mar Fala
de Mim”, espécie de superprodução síntese de suas raízes com a
participação de mais de 40 músicos do Estado em um repertório
que vai de Madredeus a Caetano Veloso, de Caymmi a Ennio
Morricone. Veja entrevista concedida por Irina ao blog Ouvido
Interativo.

E quanto à cantora, existe uma Irina brasileira?


Existe mais do que isso. Existe uma Irina transita entre dois
mundos; mas, sobretudo, existe uma Irina que respira e vive música.
Seja para o que for. Trabalho, dirijo, acordo e adormeço com música.
Falo através da música. A minha vida é uma trilha sonora.

Há quanto tempo você canta?


Desde que me entendo por gente! (risos). Mas, a sério, há 10
anos.

Como é a receptividade do público alagoano e brasileiro ao


fado?
Muito boa. O fado (e a música portuguesa) arrebatam o
coração, porque falam de sentimento, falam da alma e para a alma,

655
falam do amor, da sina. E, ao contrário do que se pensa, tenho cada
vez mais gente jovem na platéia. Porque a juventude tem uma
urgência nas palavras e na expressão. O fado também.

Qual a sua opinião a respeito da cena musical alagoana?


Incrivelmente produtiva, ávida por espaço, inquieta, talentosa.
Temos mais é que nos orgulhar do que é produzido na nossa Alagoas.
Olhar para o umbigo. E o que me encanta é perceber que essa mesma
inquietação e esse talento-monstro não deixa esmorecer esses
alagoanos, nascidos ou de coração, que nos brindam com música de
primeira qualidade, projetam Alagoas, ainda que com toda a
dificuldade. Porque possibilidades existem.

http://ouvidointerativo.blogspot.com.br/2011/06/entrevista-
irina-costa.html

Leureny: diva da música alagoana

Leureny Barros é considerada uma diva no meio artístico


alagoano. Aos 70 anos continua em plena atividade cantando
música de boa qualidade para um público que a acompanha, desde
que estreou na carreira em 1970, cantando no programa “A Grande
Chance”, de Flávio Cavalcante, na então TV Tupi do Rio de
Janeiro. Lá obteve a nota máxima de todos os jurados e conquistou
um contrato com a gravadora Copacabana, onde gravou dois discos
cantando músicas de Marcos e Paulo Sérgio Valle, Eduardo Souto
Neto, Sérgio Bittencourt e Geraldinho Carneiro. Leureny Barros,

656
portanto, enriquece o meio artístico alagoano hoje ajudando a
formar novas gerações de artistas com quem tem dividido os
palcos desta terra. Em maio de 2015, ela lançou seu novo show:
“Leureny – De volta pra casa”, em Paulo Jacinto, que representou
um retorno afetivo à cidade e ao carinho dos inúmeros amigos e
familiares que vivem na zona da mata alagoana. Com essa
apresentação ela contribuiu para a reabertura do Clube Recreativo
Paulojacintense, seguindo assim os passos de sua mãe, dona
Zefinha, que décadas atrás criou na cidade o famoso Baile da
Chita. A intérprete e cantora Leureny Barbosa é natural de Paulo
Jacinto, onde viveu sua infância e adolescência, mudando-se para
Quebrangulo, onde se descobriu artista. A partir daí, não parou
mais. Foram vários shows Brasil afora. Gravou disco em parceria
com grandes nomes da MPB, entre eles Leila Pinheiro e a grande
violonista Rosinha de Valença (considerada a maior violonista
brasileira de todos os tempos). Em 1996 se apresentou no Festival
de Jazz de Montreux, na Suíça. Em 2004 participou do projeto
“Alagoas de Corpo e Alma”, cantando no Canecão, no Rio de
Janeiro, para mais de duas mil pessoas. Participou também de um
concurso musical com a famosa Beth Nascimento. Sua grande
influência foi Rosinha de Valença que generosamente doou a
Canção "Dama da Noite" para Leureny. Amiga e parceira musical
de Djavan e outros artistas. Em outubro de 2014, nos seus 70 anos,
ela reuniu seis grandes cantoras da cena alagoana: Elaine Kundera,
Fernanda Guimarães, Irina Costa, Nara Cordeiro, Wilma Araújo e
Wilma Miranda, além da banda formada por músicos notáveis
como Zé Barros, Everaldo Borges, Carlos Bala e Jiuliano Gomes.

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Millane Hora: the Voice Brasil por um triz

Millane Fabrícia da Hora Figueiredo Fortes (Arapiraca, 22


de maio de 1983) é uma cantora e compositora brasileira.
Advogada e cantora, Millane começou sua carreira com 13 anos,
em 1997, e já participou de diversas bandas, de ritmos diferentes,
desde o forró ao axé. Hoje em dia faz um som autoral, com
influências que vão do jazz à MPB. Sua carreira autoral começou
com a gravação do seu 1º DVD promocional: “Despertar meu
Destino”, em 2007. Em 2011 gravou seu primeiro CD intitulado
VentVert. Millane já participou de festivais de música influentes
como a Femusesc (2009, 2010 e 2011) e representou Alagoas na
Femucic, em Maringá em 2010. Participou de programas
televisivos, como Fama 4, Ídolos 1 e Domingão do Faustão, onde
foi escolhida por votação popular para cantar com a baiana Ivete
Sangalo, no Carnaval de Salvador 2010. Foi uma das participantes
da 3ª temporada do talent show The Voice Brasil, sendo eliminada
na fase tira-teima.

Wilma Araújo: da MPB às canções da cultura popular

Wilma Araújo iniciou a sua brilhante carreira artística em


1993, participando do Festival Nacional dos Empregados da Caixa
Econômica Federal. Obteve o 1º lugar na eliminatória de Alagoas e
o prêmio de melhor intérprete na final realizada em São Luiz do
Maranhão. Em seu repertório, Wilma sempre inclui, pérolas e

658
clássicos da MPB, que na sua voz requintada se transformam em
boas lembranças e em delicadas interpretações. Ela sempre tem um
cuidado especial com o seu figurino e uma excelente presença de
palco. Veterana em festivais de músicas, já teve a oportunidade de
participar de produções como o Femusesc (Mostra de Música do
Sesc Alagoas) e o Banco de Taletos Febraban (Festival de Artes de
Federação dos Bancos). Wilma Araújo é intérprete de canções da
MPB. Sempre grava e canta em seus shows músicas de
compositores alagoanos como Gustavo Gomes, Junior Almeida,
Macléim, e outros. Ela já regravou canções do Maestro Fon Fon e
cantos do Grupo de Baianas Mensageiras de Santa Luzia,
resgatando assim a nossa autêntica cultura popular.

Wilma Miranda: nossa Elza Soares

A cantora Wilma Miranda é dona de uma das vozes mais


bonitas de Alagoas, com suingue que parece com os melhores
momentos de Elza Soares ou Nana Caymmi, mas ela não imita.
Faz de sua voz um momento único, de acelerar corações. Concluiu
o curso secundário no Colégio Conceição, onde aos 10 anos,
costumava cantar na igreja e a convite das freiras, que em troca a
ajudavam com roupas e lanche. Iniciou o curso de Letras na
UFAL, instituição onde participou do 1º Festival de Música
Natalina, obtendo o 1º lugar como cantora. Em viagens ao exterior
sempre que tinha oportunidade divulgava as composições
brasileiras. Realizou cursos de francês e inglês, em São Paulo,
além de estudar violão e técnica vocal na Escola Play de Música.

659
Retornou a Maceió e teve aulas de piano com a professora Selma
Brito. Durante sua trajetória artística, participou de alguns festivais
ligados à música, atuando como cantora e intérprete, entre os quais
se destacam: Festival de Maringá (1998), primeiro lugar em
música e arranjo e Festival Ver, com Confirmar, música de sua
autoria, obtendo o primeiro lugar como intérprete. Após um câncer
na tireoide sublingual e corda vocal, não parou de cantar. Em 2004,
no show nacional MPB Petrobrás, Wilma Miranda abriu a cena
para a apresentação de Ângela Maria, foi um grande show.
Renata Peixoto

A jovem cantora, compositora e intérprete Renata Peixoto é


reconhecida como uma das promessas da música alagoana atual.
Com o primeiro álbum, Infinita, lançado em plataforma virtual
recentemente, Renata fixou um pé no blues – com a banda Blues
Way, que acompanha a cantora – e outro na Nova MPB, mas
desenvolveu um trabalho de ritmos diversificados e uma clara
influência do jazz e da música pop. O disco traz dez faixas, que
foram apresentadas na internet antes do show de lançamento do
álbum completo, no Teatro Deodoro. De Dire Straits a Luiz
Gonzaga, de Pink Floyd a Martinho da Vila, Renata cresceu
ouvindo todo tipo de música dentro de casa. Já aos nove anos
começou a tocar flauta doce, violão e ter aulas de canto. Mesmo de
forma eclética, o trabalho autoral traz composições que recorrem
sempre, mesmo que indiretamente, as infinitas nuances da mulher,
desde a sua sensibilidade e delicadeza até a sua independência e
força.

660
TEATRO

Associação Teatral de Alagoas (ATA)

Fundada pela primeira dama do teatro alagoano Linda


Mascarenhas (1895-1991), em 12 de outubro de 1955, a mais
importante instituição teatral de Alagoas comemora 60 anos. Linda
presidiu a associação até o seu falecimento, com mais de 90 anos
de idade. Funcionava na residência da presidente, na Ladeira da
Catedral. Após a morte de Linda Mascarenhas, reduziu suas
atividades. Foi a instituição que promoveu o primeiro concurso de
peças teatrais em Alagoas. Em 1999, sua diretoria era assim
formada: Presidente, Ronaldo de Andrade; vice-presidente, José
Márcio Passos; tesoureiro: José Correia da Graça; diretor artístico:
Homero Cavalcante; diretor de divulgação: Geusa Correia;
presidente de honra: Anilda Leão. Uma foto surpreendente,
registrada no livro Arte Popular das Alagoas (2004), de Tânia

661
Maya Pedrosa, mostra como foi um dos melhores momentos
vividos pelo teatro alagoano, ainda com Linda Mascarenhas viva, e
bem na foto. O documento é de 1983, com foto tirada no salão
Nobre do Teatro Deodoro (sem os devidos créditos do fotógrafo).
Na foto lá estão: Linda Mascarenhas, Anilda leão, Gustavo Leite,
Ronaldo de Andrade. Homero Cavalcante, Lídia e Dário
Bernardes, Beatriz Sá Brandão (Tisinha), Jorge Barbosa, Virgílio
Palmeira, Edberto Ticianeli, Kátia Born, Roberto Lopes, Douglas
Apratto

Arte Popular em Alagoas, Pesquisa e Organização, Tânia de


Maya Pedrosa. Maceió, Grafitex, 2004

O Manifesto Makamãdi e as novas montagens

A partir de 1995, nos cem anos de nascimento de Linda


Mascarenhas, a ATA lança o manifesto Makamãdi – baseado na
autonomia criativa e no profissionalismo do teatro alagoano - que
dá partida a uma nova fase nas atividades da associação,
principalmente quanto às montagens. O marco inaugural foi a peça
“Comeram o Bispo Dom Pero Fernandes Sardinha”, sob a direção
de José Márcio Passos, em 1980, no teatro Deodoro. Nesta fase
foram sete montagens, entre elas, Quando se deu o eclipse, 1980;
Duvidamos, 1981; fazendo Chuva, 1982; os últimos dias de
solidão de Robson Crusoé, 1987; Itinerário de Graça, 1993 e A
Mandrágora, 1994.

662
“Foi uma “crise” que nos levou a redimensionar a trajetória
da ATA. Aqueles apelos anunciados por Lauro Gomes, com o teatro
de participação e vanguarda, por José Márcio Passos, em na
montagem de Dom Pero, receberam o incremento do desejo de
criação de um “teatro alagoano para os alagoanos”. Daí
promovemos o reencontro de todo o núcleo de sócios da ATA: o autor
cedendo o seu texto inacabado (da peça) “A farinhada”.

Artigo de Ronaldo de Andrade, na revista Graciliano, nº 2,


novembro de 2008.
A peça “A Farinhada” estoura no Brasil
A peça “A Farinhada”, de Luiz Sávio de Almeida, trilha
sonora de Maclén Carneiro e direção de René Guerra, foi sugerida
ao grupo Joana Gajuru em 1997, e depois de uma leitura
dramatizada realizada pela ATA, estourou na cena teatral alagoana
e brasileira. A montagem foi um marco do teatro alagoano. A peça
“A Farinhada” se passa numa casa de farinha do interior e conta a
história de amor, entre Pedro Bom e Rosa Maria, ambos
perseguidos pelo dono do local. A peça também aborda conflitos
sociais, com tristezas e alegrias andando de mãos dadas, onde
todos se encontram e conversam sentados em tocos de pau,
Antonios, Chico Chalés, Raimundas, Inácias das Pedras e Rosas
Marias. A peça continua a fazer sucesso todas as vezes que entra
em cartaz.

“Para entender o sucesso da montagem de “A Farinhada”,


dirigida por René Guerra e Flávio Rabelo, com mais de 150

663
apresentações em mais de 30 cidades brasileiras, 36 prêmios e 57
indicações em festivais nacionais, é necessário entender o processo.
Todos os artistas e técnicos chamados eram energicamente positivos,
nada nos atrapalhava, não havia dificuldades, tudo acontecia de
maneira certa, porque queríamos que assim ocorresse. A equipe
soube vencer, fomos maiores”.

Artigo do ator Régis de Souza, na revista Graciliano, nº 2,


novembro de 2008

Bráulio Leite Júnior (1931-2013).

O teatrólogo, jornalista, diretor e ator de teatro e advogado,


Bráulio Leite Júnior foi o mais longevo mecenas das artes
alagoanas. Ele comandou o teatro Deodoro durante 11 governos –
de Muniz Falcão a Afrânio Lages. É de sua lavra na antiga
Fundação Teatro Deodoro, o Teatro de Arena Sérgio Cardoso. Foi
fundador também do Museu da Imagem e do Som e do Centro de
Belas Artes Alagoano. Atuou no grupo formado pelo Teatro de
Amadores de Maceió (TAM). Fundou e dirigiu o grupo teatral "Os
Dionísios", bem como o Teatro Operário do SESI, o Teatro
Universitário de Alagoas, o Teatro de Brinquedos de Maceió, o
Teatro Alfredo de Oliveira e o Grupo dos Quatro. Presidente, por
três anos, da Sociedade de Cultura Artística de Alagoas.. Fundador
das orquestras: Filarmônica de Alagoas e de Câmara de Alagoas,
do Quinteto de Metais e da Sala de Concertos Musicais Heckel

664
Tavares. Delegado, por 13 anos, em Alagoas e Sergipe, do Serviço
Nacional de Teatro. Delegado, e ainda, por quatro anos, do
Instituto Nacional de Cinema, do MEC. E, por fim, delegado da
Sociedade Brasileira de Autores Teatrais - SBAT, por 11 anos.
Secretário Executivo da Sociedade Nacional de Teatro Prêmio de
Melhor Ator, do Festival Nacional de Estudantes, no Rio de
Janeiro, com bolsa de estudo na Academia de Arte Dramática de
Nice (França). Por 11 anos consecutivos recebeu o prêmio Melhor
Ator, conferido pela Associação de Cronistas Teatrais de Alagoas.
Membro do Conselho Estadual de Cultura, do Conselho de
Folclore Alagoano e da AAI. Coordenador e realizador do 1º e 2º
Festivais de Arte de Penedo, bem como do 1º Festival Alagoano de
Teatro.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Edu Passos: pioneiro da dança afro

Bailarino, coreógrafo, professor. Pioneiro da dança Afro no


estado de Alagoas desde 1985. Formou-se em Minas Gerais e
depois em Dança pela UFAL. Em 2000 foi bailarino e coreógrafo
no espetáculo Tambores dos Palmares apresentado em 20 de
novembro, em comemoração ao dia da Consciência Negra, no
Museu Vivo Zumbi dos Palmares, na Serra da Barriga em União
dos Palmares promovido pelo cenógrafo Gustavo Leite. Professor
de dança afro e expressão corporal no Centro de Belas Artes de

665
Alagoas. Recebeu o 1º Prêmio de Expressões Culturais Brasileiras,
patrocinado pela Petrobrás em 2010.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Eliane Cavalcanti: a primeira escola de balé

Fundada em 1973, foi a primeira Escola de Balé de


Alagoas. Em 1972, a bailarina Eliana Cavalcanti, egressa da
posição de primeira bailarina do Grupo de Ballet do Recife e de
professora de balé do Curso de Danças Clássicas Flávia Barros
(Recife), resolve ensinar em Maceió, numa das dependências do
Colégio Santíssimo Sacramento. No ano seguinte, já morando em
Maceió, funda o Ballet Eliana Cavalcanti, instalado no Centro da
cidade. Em 1975, realiza o primeiro de seus espetáculos anuais, no
Teatro Deodoro. Com o aumento do número de alunos, em 1977,
transfere a sua sede para a Rua Barão de Alagoas, também no
Centro. Em 1981, é inaugurada a sede definitiva do Ballet Eliana
Cavalcanti, localizada no Farol e, ao mesmo tempo, surge o Ballet
Íris de Alagoas.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Emília Clarck: o balé da modernidade

666
Emília Clarck é bailarina profissional alagoana, graduada
em Serviço Social pela Universidade Federal de Alagoas, pós-
graduanda em Metodologia do Ensino das Artes Cênicas pela
Universidade Internacional de Curitiba. Integrou o Balé Stagium
por uma década, participando dos principais festivais de dança
mundiais, como Bienal de Lyon (França), Acordanse (Suiça),
L'áquila (Itália), Havana (Cuba), Cadiz (Espanha), Guanajato
(México), Joinville (Brasil), Festival de Dança (Hungria), etc.
Atualmente possui a Academia e Companhia de Dança Maria
Emília Clark, e o Projeto voluntário Dança a Serviço da Educação,
iniciado em seu Estado desde 1999. A coreógrafa e bailarina Maria
Emília Clark comemorou em 2014 os 15 anos da escola de dança
que mantém em duas unidades em Maceió, nos bairros do Jaraguá
e Ponta Verde. O balé reúne dançarinos formados com Maria
Emília e, também, os estudantes – desde os mais jovens, incluindo
a meninada. “Este nosso novo trabalho da escola reúne diversos
balés do repertório clássico, como “O Corsário”, “O Pássaro azul”,
“Giselle”, “Dom Quixote” e “Esmeralda”, além do musical
contemporâneo”, diz a bailarina, destacando a “atitude
memorialista com as cores e as obras” da artista visual Eva
Lecampion.

A arte da dança em Telma César Cavalcante

Professora e mestra em Arte, formada pela Universidade de


Campinas (Unicamp-SP), a alagoana Telma César, com mais de 25
anos de cena, palco e performance, é uma das referências quando

667
se fala em dança e música em Alagoas. Múltipla profissional,
Telma foi uma das primeiras integrantes da banda pernambucana
Comadre Florzinha, sucesso em todo país, nos anos 1990. No
grupo, Telma fazia vocal, rabeca e percussão, em ritmos como
coco, baião e ciranda. Atualmente é professora do Curso de
Licenciatura em Dança da Universidade Federal de Alagoas,
integra o Grupo de Pesquisa Danças do Brasil do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e dirige a
Cia. dos Pés, como fundadora, bailarina e coreógrafa. Um de seus
últimos espetáculos, “Encontros”, é apresentado pela companhia
desde 2010.

Homero Cavalcanti e os Filhinhos da Mamãe

Ator, escritor, advogado, teatrólogo, e professor alagoano.


Formou-se em Direito pela UFAL (1973). É também carnavalesco,
como um dos líderes do famoso bloco Filhinhos da Mamãe, que
anima todos os carnavais desde que saiu pela primeira vez, em
1983, sempre da praia da Avenida, em frente ao museu Théo
Brandão. É Professor do Curso de Artes Cênicas do Instituto de
Ciências Humanas, Comunicação e Artes, da UFAL. Foi,
juntamente com Linda Mascarenhas e Lauro Gomes, um dos
responsáveis pelo desenvolvimento e sustentação da Associação
Teatral das Alagoas (ATA). Foi, ainda, o representante, em
Alagoas, da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais. Fundador,

668
com Ronaldo de Andrade, em 1976, da revista Bruzundanga. Entre
suas peças teatrais de sucesso estão Quando se Deu o Eclipse;
Fazendo Chuva; Uma Flor de Outra Cor, Duvidamos, esta última
peça teatral em parceria com Ronaldo de Andrade; e os escritos: A
Estrela-Guia Que Não Sabia Para Onde Ia, Maceió, EDUFAL,
1998; Liberdade, Sonho em Cena, Maceió, CESMAC/UFAL,
2009; Linda Mascarenhas, a Diretora, in O Teatro & Linda
Mascarenhas.

Chico de Assis: Dom Quixote da cena alagoana

Enfrentando os moinhos, com sua careca lustrada, sua


echarpe de renda filé sobre a camisa arregaçada, e a voz de poeta
tenor declamando Essa Negra Fulô, de Jorge de Lima, Chico de
Assis comemora 40 anos de vida artística, em 2016. E no clímax
de uma novela das nove da noite da Rede Globo, Velho Chico. No
papel do personagem Coronel Salgado, ele participou dos
primeiros 20 capítulos da novela, uma superprodução rodada em
Alagoas, com imagens em 45 mm, película de cinema. Nessa
mesma época, Chico de Assis atuou em quatro espetáculos
diferentes: O Diário de Anne Frank; Graciliano, um brasileiro
alagoano; Memórias de Heloísa. Chico virou multimídia, com seu
programa Café com Poesia, na TV Assembleia. Em Alagoas,
Chico ainda protagonizou campanhas nacionais de divulgação do
estado, o Alagoas de Corpo e Alma, nos anos 2000, durante o
governo de Ronaldo Lessa.

669
“Comecei minha carreira artística como ator em 1966 quando
tinha apenas oito anos de idade em Maceió, Alagoas, um dos lugares
mais lindos do mundo. Tudo teve inicio no grupo escolar Dr. José
Maria Correia das Neves, popularmente chamado de “Frango
Assado”. Meu primeiro mestre foi o folclorista Pedro Teixeira que
tomei como padrinho. Minha genitora Dona Tereza Romeiro;
escritora, leitora da bíblia, mãe de seis filhos sendo três homens e
três mulheres, cada um com uma penca de filhos. Francisco meu pai,
já falecido, quando em vida foi funcionário dos Correios e gostava de
tocar clarinete. Meu tio Otaviano Romeiro, conhecido como maestro
Fon Fon; um grande músico brasileiro fez bastante sucesso no Brasil
e no exterior, vindo a falecer na Grécia”.

Chico e o cinema nacional


A arte de Chico de Assis ultrapassou as divisas de Alagoas e
chegou à cena nacional em novelas e cinemas. Seu primeiro
trabalho no cinema como ator foi com Nelson Pereira dos Santos
em 1982, no filme Memórias do Cárcere, obra de Graciliano
Ramos. Depois viriam outros como “Deus é Brasileiro” (2003),
Espelho d’água (2010) e em minisséries para TV Globo como
Memorial de Maria Moura, e na clássica novela Irmãos Coragem,
em 1995, que Dias Gomes readaptou do original de Janete Clair,
em 1970.

670
“Não existe maneira melhor de celebrar esse momento, senão
atuando, exercendo meu ofício. Dele sobrevivo, com ele viverei até o
último dia em que respirar o ar dessa terra de Tupã. Terra de
Olorum. Terra de meu Deus...”

Chico de Assis em entrevista a jornalista Lívia


Vasconcellos, na Agenda A portal TNH, em 22/02/2016

Otávio Cabral

Otávio Cabral é ator, escritor e professor de Literatura


Dramática na Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Natural
do município de Pilar, despertou o interesse pelo teatro na década
de 50, quando era aluno do Grupo Escolar Experimental, em
Maceió. Frequentemente assistia espetáculos infantis como
atividade complementar da escola no Teatro Deodoro, e uma certa,
vez ao prestigiar uma montagem de Pluft, o Fantasminha,
manifestou o desejo de pisar em um palco. Alguns anos depois, em
1966, participou da montagem da Associação Teatral das Alagoas
– ATA, com a peça de Pirandello, "As laranjas da Sicília", sob a
direção de Linda Mascarenhas. No mesmo ano, participou da
segunda e a terceira peça "O Telescópio", de Jorge Andrade, pela
ATA e "A História de João Rico", de Volney Leite, e Gercino
Souza, pelo Teatro de Amadores de Maceió - TAM. No ano
seguinte (1967), participou da peça "Riacho Doce", de Lauro
Barros, pelo Os Independentes; "Chapeuzinho Vermelho",
adaptação de Volney Leite, pelo Grupo Teatral Educação e Cultura

671
– GTEC e "Os Ossos do Barão", de Jorge Andrade pela ATA. Em
1969, foi eleito presidente do Teatro Universitário de Alagoas –
TUA, e juntamente com o grupo montou "Antígona", de Sófocles,
como uma forma de combater a ditadura e discutir o autoritarismo
com a sociedade, através de um texto irrecusável pela censura. A
peça foi montada, o que arrebatou de melhor espetáculo, melhor
direção (Alfredo de Oliveira) e melhor ator coadjuvante (Otávio
Cabral). Ao lado das atividades artísticas, Otávio Cabral passou a
exercer, desde 1994, a função de professor de Literatura
Dramática, do Curso de Licenciatura em Artes Cênicas, da
Universidade Federal de Alagoas, tendo defendido a tese intitulada
O Riso e o Social - O poder transformador da comédia na trilogia
cômica de Volney Leite e Gercino Souza, que resultou na
publicação do livro intitulado O Riso Subversivo.

http://www.memorialdeartescenicas.com.br/site/teatro-
c2/136-otavio.html

Pedro Onofre

Teatrólogo, ator, roteirista de cinema, advogado, pintor,


poeta, escritor, jornalista, administrador cultural, analista judiciário
aposentado do TRT da 19ª Região. Estudou no Instituto São Luís,
no Ginásio Nossa Senhora do Bom Conselho e no Colégio Porto
Carrerro, no Recife, onde terminou o ginasial. Retorna a Maceió,
em 1955, e estudou no Colégio Guido de Fontgalland e na Escola
Técnica de Comércio. Em 1956 foi um dos fundadores, em

672
Maceió, do Centro Alagoano de Estudos Cinematográficos, bem
como da Associação Alagoana do Rádio. Um dos primeiros
dirigentes do Museu da Imagem e do Som , em 1961. A partir de
1964 passa a morar no Recife e a seguir volta a viver em Maceió.
Funda o Instituto de Estudos Culturais, Políticos e Sociais do
Homem Contemporâneo - IECPS. Foi presidente da Fundação
Teatro Deodoro. Coordenador de Planejamento Cultural da
Sercretaria Estadual de Cultura, no governo Divaldo Suruagy e
presidente da Fundação Teatro Deodoro, no governo José Tavares.
Um dos fundadores de AML. Membro da Academia de Letras e
Artes do Nordeste, com sede em Recife e da Academia Alagoana
de Cultura Membro, desde 1956, da Associação Alagoana de
Imprensa Membro, também, do Conselho Municipal de Meio
Ambiente.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

René Guerra: do teatro para o cinema

Diretor teatral alagoano, em 2002, foi estudar cinema na


Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo,
cidade na qual passou a residir. Desde 1990 desenvolveu
processos teatrais educacionais no colégio Marista de Maceió e no
Curso Contato e System, tendo dirigido 22 espetáculos. Trabalhos
de direção profissional: 1997: A Farinhada, com o Grupo Joana

673
Gajuru. 1998: Além do Ponto, Cia. Das Mãos; Terra Terta, Cia.
Penedense de Teatro, em Penedo . 1999: Vida, espetáculo do Balé
Íris de Alagoas, no qual atuou como encenador. 2000: Dois
Perdidos Numa Noite Suja, no Curso de Formação do Ator, em
Maceió; Fulaninha e Dona Coisa, Cia das Mãos; Tambores dos
Palmares, promovido pelo Governo do Estado em União dos
Palmares, e do qual foi encenador. 2001: Alagoas, Terra da
Liberdade, igualmente promovido pelo Governo do Estado, no
qual foi, também, encenador. 2002: Quase Tudo Sobre Quase
Nada, espetáculo de balé no qual Isabelle Rocha era a principal
bailarina. Prêmios: 1995: Melhor Diretor no Festival Estudantil
Alagoano, 1997: Melhor Diretor, no 5º Festival Nacional de Teatro
Isnard Azevedo, em Santa Catarina; 1998: Melhor Diretor no
Festival de Teatro de Nova Hamburgo; 1999: Melhor Diretor, no
3º Festival de Teatro do Mercosul, Curitiba (PR). Revelação, na
19º edição do Festiva1 de Curta-metragem de São Paulo.
Participou, em 2006, das oficinas do Festival de Cinema de Berlim
- na Berlinale Talent Campus -, onde trabalhou no
desenvolvimento de projetos de ficção e de documentação sobre
personagens considerados marginais pela sociedade. O filme, um
curta de ficção, Os Sapatos de Aristeu, com o qual estreou como
diretor de cinema, levou praticamente os cinco anos do curso da
FAAP para ser terminado. Este curta-metragem teve sua première,
em 11 de novembro de 2008, no Cine Sesi Pajuçara .

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

674
Ronaldo de Andrade

Escritor, professor, poeta, ator, dramaturgo. Em 1970,


começou seu trabalho na Associação Teatral de Alagoas (ATA).
Fundador, em 1976, com Homero Cavalcante Nunes, da revista
Bruzundanga. Graduou-se em Psicologia, CESMAC (1980).
Especialização em Teatro, UFPB (1986) com o TCC: Os
Acadêmicos: Um Capítulo do Teatro Alagoano. Mestrado em
Artes e Teatro, pela Escola de Comunicações e Artes da USP
(1996) com a dissertação: Teatro Amador no Maceió das Alagoas
(1940-1970): A Trajetória do Efêmero. Professor do Curso de
Artes Cênicas do Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e
Artes, da UFAL, desde 1983. Sócio do IHGAL e da ATA.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Grupo Cena Livre

Há 37 anos, mais precisamente em 15 de novembro de


1979, a inquietação de Mauro Braga – ator e diretor alagoano
formado em São Paulo – formou o Grupo Cena Livre. Desde
então, a companhia, que atualmente é coordenada pela dramaturga,
atriz e diretora Ana Sofia Oliveira, já montou 40 espetáculos e
desenvolveu oficinas e projetos que movimentam o segmento até

675
mais recente espetáculo montado pelo grupo, Zelodaro Come
Pano, do professor e escritor Luiz Sávio de Almeida. Entre os
muitos espetáculos que se destacam durante a trajetória de atuação
da companhia, estão Ararinha, o Anjo Azul, de Mauro Braga, que
ganhou Melhor Direção e Melhor Espetáculo na Mostra Alagoana
de Teatro, em 1996, com 174 apresentações e recorde de público
no estado; Igreja Verde, com texto de Luiz Sávio de Almeida, que
teve a atuação de Chico de Assis e coreografia de Edu Passos
premiadas em Festival Nacional em São Paulo; e Hello Boy, com
montagem do diretor e dramaturgo paulista Roberto Gill Camargo,
com a qual participou de eventos importantes como o Janeiro de
Grandes Espetáculos, em Recife, e realizou a primeira edição
Teatro é o Maior Barato.

Do livro Graciliano Arte, editora Imprensa Oficial


Graciliano Ramos, 2017

Teatro da Poesia

O Teatro da Poesia representa aqui o que há de mais fresco


entre as companhias de Alagoas. Criada ainda em 2015 pelos
atores Louryne Simões e Jadir Pereira, recém-formados em Artes
Cênicas pela Universidade Federal de Alagoas, eles buscam atrair
novos integrantes que como eles vão investigar mais a fundo o que
vem a ser o teatro poético. De acordo com a fundadora Louryne

676
Simões, a ideia de montar a sua própria companhia veio da
observação de outros espetáculos: a forma como a poesia aparece
no cotidiano, e como ela entra em cena. Partindo do princípio do
ator criador, a companhia busca descobrir em seus trabalhos como
as obras artísticas tornam-se poéticas, extrapolando o texto e
ganhando espaço na cenografia, luz, sons, figurino. O primeiro
trabalho apresentado pela Teatro da Poesia ao público estreou no
dia 25 de novembro de 2016, no teatro Jofre Soares, dentro da
programação do Festival de Teatro de Alagoas.

Do livro Graciliano Arte, editora Imprensa Oficial


Graciliano Ramos, 2017

Teatro Joana Gajuru

São mais de 20 anos em atividade, dez espetáculos


montados e mais de 20 prêmios Brasil afora. Tempo mais do que
suficiente para deixar o nome marcado no teatro Alagoano. Com
espetáculos que tem como base a cultura do imaginário popular, a
literatura de cordel e o cotidiano nordestino, a Associação Teatral
Joana Gajuru – nome dado em homenagem à mestra de Guerreiro
Maria Joana da Conceição, uma das mais importantes figuras dos
folguedos alagoanos – surgiu em 1995, com o espetáculo “Uma
Canção de Guerreiro no Chumbrego da Orgia”, retirado da
literatura de cordel, que conta em versos a chegada de Lampião e
de uma prostituta no céu. Com apoio e direção de Lindolfo
Amaral, integrante de um dos mais importantes grupos de teatro de

677
rua do Brasil, o Imbuaca (SE), a Joana Gajuru iniciou sua
trajetória, que viria a ser mais conhecida pelo espetáculo A
Farinhada. Com texto de Luís Sávio de Almeida, direção de René
Guerra e Flávio Rabelo, a peça viajou o Brasil por mais de oito.

Do livro Graciliano Arte, editora Imprensa Oficial


Graciliano Ramos, 2017

Claricena

Fundado dentro da Universidade Federal de Alagoas, o


grupo Claricena nasceu como um projeto de montagens artísticas
elaboradas a partir das obras da escritora Clarice Lispector – como
seu próprio nome sugere (Clarice + Cena). Com a direção geral de
Anderson Vieira, desde 2014 o grupo formado por 16 integrantes
já montou quatro peças, são elas: “Espectro” (2014), “Granja dos
Corações Amargurados” (2015), “Adeus, Clarice!” (2016) e “A
Descoberta de Um” (2016). Depois de uma série de apresentações
em mostras e congressos acadêmicos de Teatro em Maceió, desde
2015 o grupo participa de editais como o do Teatro é o Maior
Barato – que busca incentivar a ida dos alagoanos às apresenta-
ções de dança, teatro e música a preços populares –, e alcançou
públicos mais diversos. A estreia da primeira temporada do
espetáculo “Adeus, Clarice”, no Teatro de Arena Sérgio Cardoso,
nos dias 5 e 6 de agosto, marca a transição artística do grupo. De
montagens de textos com inspiração em Clarice Lispector, eles
passaram a trabalhar com uma linguagem local, com referências do

678
coco de roda, quadrilha junina e do pastoril. O espetáculo em si
traz em cena flores que passam por uma seca no Jardim chamado
Alagoas e que recebem a visita de uma flor de outro jardim que os
convida a buscar outro lugar para que permaneçam vivas.

Do livro Graciliano Arte, editora Imprensa Oficial


Graciliano Ramos, 2017

Teatro Deodoro: o templo da grande arte

“O majestoso Theatro Deodoro de portas abertas para o


povo alagoano”

Esta era a manchete dos pasquins locais, em 15 de


novembro de 1910, na inauguração da nova casa de espetáculos,
marcando os 21 anos da Proclamação da República. Na ribalta
começavam as peças teatrais “O Dote”, de Arthur Azevedo, e o
drama “Um Beijo”, do alagoano J. Britto, apresentado pelos atores
Lucilla Peres e Antônio Ramos. Mas um primeiro “castigo” se
abateu sobre a nobre missão da casa, de mostrar teatro, dança e
música. Mesmo sob protestos dos intelectuais da época, quatro
anos depois de inaugurado o salão nobre passou a ser local de
exibição de filmes, com a chegada da época de ouro do cinema
mudo americano, os chamados “embaixadores de Hollywood”.

Teatro Deodoro sob a batuta de Lucariny

679
Foi o arquiteto italiano Luiz Lucariny, famoso pela obra do
Teatro Sete de Setembro, em Penedo, que traçou as linhas clássicas
que formam o Teatro Deodoro que, pelo estilo inovador de sua
arquitetura, em estilo neoclássico com reflexos do barroco, é
considerado hoje um dos mais bonitos do Brasil. É importante
ressaltar o trabalho desenvolvido na construção do prédio pelos
mestres-de-obras Antônio Barreiros Filho e Oreste Scercoeli. O
orgulho dos alagoanos na ocasião era descrito pelo jornal Tribuna
de Alagoas, então em circulação:

“O Teatro Deodoro é um primor de bom gosto arquitetônico.


A frente construída em estilo jônico e renascença tem três largas
portas envernizadas, que, junto com louvores coloridos e dourados no
alto do frontispício, produzem agradável efeito”.

No ‘panteão’ das artes cênicas, pelo palco do Deodoro


passaram astros e estrelas que encantaram o mundo, como a diva
do canto lírico Bidu Sayão, Itália Fausto, Clara Wass, Carmem
Miranda. As glórias do teatro estavam mesmo nas exibições de
gala, de artistas nacionais e internacionais consagrados. A lista é
extensa e de grande valor na história do teatro brasileiro: o
consagrado ator, o maior nome do Teatro Nacional, Procópio
Ferreira; o dramaturgo Paschoal Carlos Magno, com sua Caravana
da Cultura, e o ator Paulo Autran.

Histórias do Teatro Deodoro

680
Em 1954, na temporada da Companhia Eva Todor, o Teatro
Deodoro sofreu um incêndio no palco, destruindo, naquela ocasião,
o seu "pano de boca" original, que retratava a cachoeira de Paulo
Afonso, trabalho notável do cenógrafo italiano Orestes Scercoelli,
também responsável pela pintura do Salão Nobre do Deodoro,
alterada na reforma de 1975. Em 1957, o Deodoro foi reinaugurado
com apresentação do notável ator Rodolfo Mayer, que encenou o
monólogo de Pedro Bloch, "As Mãos de Eurídice". A constelação
de estrelas que brilharam no palco do Teatro Deodoro também
inclui a atriz Bibi Ferreira e o cantor Vicente Celestino. A partir de
1910, e nas décadas seguintes, o Teatro Deodoro recebeu clássicos
da dramaturgia mundial, como "Medéia", de Eurípedes;
"Antígona", de Sófocles; "L'Ecole des Femme", de Molière; "O
Inspetor Geral", de Gogol; "O Idiota", de Dostoiewski; "Uma Rua
Chamada Pecado", de Tenessee Williams; "Mortos Sem
Sepultura", de Jean Poul Sartre; "O Sorriso de Gioconda", de
Audus Huxley; e montagens internacionais como a ópera "A
Toscana", pela Companhia Lírica Italiana, e o tenor Abelle de
Angeli. Também se apresentou no palco do Deodoro os bailarinos
internacionais Istvan Rabovski e Nina Verchinina.

Zé Márcio Passos

Ator, autor e diretor de Teatro José Márcio Vieira Passos,


65 anos, é um dos nomes mais respeitados do meio cultural
alagoano. Não apenas pelo talento indiscutível que Deus lhe deu,
mas sobretudo pelo caráter digno que carrega consigo desde o

681
berço que o criou na pequena Viçosa, outrora Princesa das Matas.
Incansável na promoção do meio cultural alagoano, José Márcio é
uma referência de qualidade não só para o Estado, como para o
Brasil. Durante décadas foi um dos principais atores e diretores da
ATA – Associação Teatral de Alagoas – entidade cultural fundada
pela saudosa Linda Mascarenhas. São incontáveis as peças em que
atuou no Estado. Na televisão brasileira atuou na TV Globo, nos
anos 80, na novela Brilhante, de Gilberto Braga e dirigida por
Daniel Filho. Atuou ainda no filme Deus é Brasileiro e Bye Bye
Brasil, de Cacá Diegues. José Marcio Passos é orgulho alagoano
pelo bem que faz ao nome dessa terra.

CINEMA

Os cinemas de bairro de Maceió.

Dos anos 1950 até a década de 1980, Maceió chegou a ter


mais de 20 cinemas. E era a diversão predileta tanto da classe

682
média como da periferia. Todos queriam assistir aos grandes
filmes, “no escurinho do cinema”, como diria Rita Lee. O Cine São
Luiz, no centro foi o último a fechar as portas, em 1996. Daí por
diante o poderio da televisão, as telenovelas dominaram o
imaginário popular. Começou a invasão pornô nos cinemas de
bairro, como Plaza, no Poço, e o Ideal, na Levada. Nesse caldeirão
que deu o ultimato aos cinemas de bairro também estão a pirataria
dos filmes e a segurança, que encalacrou o cinéfilos em salas
multiplex dos shoppings. É o preço da modernidade, e da
insegurança.

Plaza, no Poço. O Cine Plaza funcionou até 1992 e hoje é


uma coleção de ruínas, não existe mais nada: o telhado desabou, a
sala de projeção virou depósito de lixo e a fachada uma casa do
terror. Antes, passavam todos os filmes da série italiana de western
Trinity, com Terence Hill e Bud Spencer, conhecido como "a mão
esquerda do Diabo". Apesar de bons do gatilho, eles não
dispensavam uma boa luta de socos, nas quais, Bambino se mostra
invencível. Era uma gritaria única, que zoava pelas portas laterais
da sala.

Lux, na Ponta Grossa. O Cine Lux era o maior cinema de


bairro de Maceió, com 899 cadeiras e teve suas atividades
finalizadas em 1986. O Lux era o preferido do mais importante
crítico de cinema de Alagoas, o jornalista Elinaldo Barros. Ele

683
conta que guardava o dinheiro do lanche e do ônibus para ver
filmes todos os dias, e 90% do que via era no Lux, que hoje virou
igreja evangélica.

“Eu vivi a época de ouro dos cinemas da capital. Passavam


sempre filmes bons, interessantes corria até a bilheteria e dizia:
´Ainda tem lugar. Só na frente, mas ainda tem lugar`, e voltava para
dentro das salas. E agente corria para a 1ª fila, com a vã ilusão de
sermos o primeiro a ver o filme”.

Elinaldo Barros, em entrevista Wanessa Mota, na revista


Graciliano, nº 9, junho e julho de 2011; Elinaldo Barros, no
programa Página Aberta, da TV Educativa, 2009

Rex, na Pajuçara
O Cine Rex tinha o formato de bolo e a frente era em art
noveau, mas antes de fechar, em 1978, o teto desabou. Mas não
havia sessão, quase que termina em tragédia o fim dos cinemas de
bairro em Maceió. Há controvérsias se quem veio primeiro foi a
praça Rex, ou o cinema Rex.

São Luiz, no Centro


Foi o último cinema de bairro a fechar em Maceió, em
1996, mas quem conheceu o velho cine, se arrepia até hoje, com
sua sala de paredes em arabescos, as cadeiras confortáveis, o

684
cheiro de pipoca e chicletes. A saída, por trás era um fuzuê, com
todo mundo falando com todo mundo sobre o filme visto.

Ideal, na Levada
O ideal era o mais popular, perto da antiga Feira do
Passarinho, no Mercado da Produção, tinha de tudo, até mesmo
filmes de arte. Mas foi o primeiro a aderir à invasão pornô.

Beto Leão: morre uma lenda do cinema alagoano

O artista visual, ator, cenógrafo e diretor de cinema Beto


Leão morreu aos 66 anos, em Maceió, em outubro de 2015, vítima
de complicações causadas pelo câncer. Ele vinha lutando contra a
doença há oito anos. Nascido em Quebrangulo, Leão viveu muitos
anos no Rio de Janeiro, onde trabalhou como cenógrafo e diretor
de arte em novelas e seriados da TV Globo. Mudando para São
Paulo nos anos 1990, atuou na extinta TV Manchete e no SBT.
Retornando a Maceió no início dos anos 2000, Beto Leão foi
secretário de Estado da Cultura no governo de Ronaldo Lessa,
dirigindo e produzindo em 2005 o documentário “Jayme Miranda,
Vida e Luta”, último trabalho cinematográfico. Outros momentos
no cinema são os filmes de Cacá Diegues “Joana francesa” (1973)
e “Xica da Silva” (1976), além do épico histórico de Paulo Thiago
“A Batalha dos Guararapes”, rodado em 1978. Em março de 2014
realizou na galeria Fernando Lopes (Cesmac), sob curadoria de
Carol Gusmão, a exposição “Ofícios”, em que apresentou 60
quadros pintados ao longo de 30 anos.

685
Beto Leão e o roteiro de um filme inacabado
O cineasta e artista plástico alagoano Beto Leão, contou em
seis takes, a história do cinema em Alagoas, no artigo “Roteiro de
um filme inacabado”, para o Caderno de Debates do Conselho
Estadual de Comunicação – A Cultura em Alagoas, em junho de
2003. Vale a pena conhecer os trechos desse artigo, que na verdade
conta a história do cinema alagoano:

Take 01

Plano Geral da enseada da Pajuçara, com seus intocados


coqueirais, suas jangadas. O silêncio é quebrado pelo apito de um
vapor que surge no horizonte. Corria o ano de 1918, quando
provavelmente com uma câmara na mão e cheio de idéias na cabeça,
desembarcava no cais de Jaraguá, Guilherme Rogato, um dos
pioneiros do cinema alagoano. Em 1921, depois de voltar da Europa,
se instala em Maceió onde roda dois curtas: “Carnaval em 1921” e
“A inauguração da ponte em Victoria”. Nascia aí o cinema alagoano.
E seguiu-se o movimento, com a realização do mítico “Casamento é
Negócio”, de Guilherme Rogato, para muitos, o marco zero do
cinema ficcional alagoano. O filme tratava da exploração do petróleo
em Alagoas.

Take 02

686
Passaram-se 33 anos e eis que em 1967, o curta “Rosa
Pereira a Silva”, de Júlio Simom e Teógenes Nunes, se destaca no
extinto festival JB/ Mesbla. A repercussão do filme junto à imprensa e
apaixonados pela 7ª arte incentivou o produtor José Wanderley a
rodar “A volta pela estrada da violência”. Sucesso em Alagoas, mas
que infelizmente não teve acesso à distribuição nacional. Fade-out.

Take 03

Sala de visitas. Numa tela improvisada são projetadas


imagens coloridas, num ritmo acelerado. Vozes, discussões, apartes.
São jovens alagoanos exibindo seus experimentais filmes em super-8.
A luz acende-se! Silêncio. Sem dúvida o maior e mais profícuo
movimento do cinema alagoano, foi facilitado pelo advento do super-
8. Equipamento prático e de baixo custo, possibilitou a produção e
realização de filmes de diretores que marcaram profundamente a
década de 70. Desde a “A Busca” de Carlos Bezerra, de 1972, a
“Enigmas Populares”, de Celso Brandão, em 1978. Ano do último
Festival de Cinema Brasileiro de Penedo.

Take 04

Interior noite. Cine São Francisco. Glamour, burburinho,


nervosismo. E lá estavam Júlio Simom, Joaquim Alves, Celso
Brandão, José Márcio Passos, Carlos Hora, José Geraldo Marques,
Edson Silva, Cícero Amorim, José Maria Tenório, e dezenas de
outros jovens realizadores, a espera das premiações. Ah! Quanta

687
saudade! Quanta irresponsabilidade, deixarem o Festival de Penedo
desaparecer.

Take 05

Plano fechado Cinema São Francisco. Letreiro apagado.


Bilheterias fechadas. Onde guardaram as fotos de Marylin Monroe,
Clarck Gable, Sofia Loren, James Dean que enfeitavam a sala de
espera? Onde se encontram os garotos que colecionavam
apaixonadamente pedaços de negativos de seus ídolos. O projetor
está enferrujado e morto. E o cine Lux, o Cine Plaza. O Cine Rex, o
Cine São Luiz. Black out.

Take 06

Exterior dia. Amanhecer. Equipe de cinema arma o set na


caatinga – É Nelson Pereira dos Santos. Filma “Vidas Secas” em
Alagoas. Assim é que resta do cinema alagoano. Apenas servem aos
cineastas, as suas histórias, sua gente, sua paisagem. Assim se dá
com nosso maior cineasta Cacá Diegues, que aqui rodou “Joana
Francesa”, “Bye Bye Brasil” e o belo “Deus é brasileiro. E eis que
meio cabisbaixo finalizo o roteiro desse filme alegre, às vezes triste,
mas cheiuo de esperança para que o cinema alagoano – feito fênix –
renasça.

Em Caderno de Debates do Conselho Estadual de


Comunicação – A Cultura em Alagoas, em junho de 2003

688
Cacá Diegues: co-fundador do Cinema Novo

Nascido em Maceió, em 1940, Carlos José Fontes Diegues,


o cineasta, jornalista e advogado Cacá Diegues, com seis anos
muda- se para o Rio de Janeiro, acompanhando seu pais. Formou-
se em Direito pela Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Estudante fez jornalismo, em especial no jornal O Metropolitano,
editado pela União Metropolitana de Estudantes (UME), tendo
sido, ainda, participante ativo da política estudantil, bem como do
movimento cineclubista. Um dos realizadores mais ativos do
lançamento do Cinema Novo, movimento que ajudou a criar, ao
lado de Glauber Rocha, Leon Hirzsman, Joaquim Pedro de
Andrade, Davi Neves, Gustavo Dahl e Paulo César Saraceni. Neste
período é quando dirige os filmes em longa metragem: Ganga
Zumba, Rei dos Palmares (1964) cujo tema retomaria, vinte anos
depois, com Quilombo (1984). Às inquietações do Cinema Novo,
A Grande Cidade- 1966; Os Herdeiros, 1969, de tom alegórico e
tropicalista, aliam-se ao desejo de chegar mais perto do público em
Quando o Carnaval Chegar (1972) e Joana a Francesa (1973 ) --
uma das primeiras co-produções internacional do país,
protagonizado pela estrela francesa Jeanne Moreau -- e em especial
no sucesso de bilheteria de Xica da Silva (1976).

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

689
De Chuvas de Verão à Tieta do Agreste
Depois da crônica da vida suburbana em Chuvas de Verão
(1978), o vasto painel de um país que se transforma em Bye, Bye
Brasil ( 1980). Os conflitos da juventude são o tema de Um Trem
para as Estrelas (1987); seguem-se Dias Melhores Virão (1990)
lançado primeiro na televisão; Veja Esta Canção, (1994), um longa
metragem em quatro episódios, co-produzido pela TV Cultura de
São Paulo e primeiramente exibido na emissora; Tieta do Agreste,
(1996), Orfeu, 1999 e Deus é Brasileiro (2002 ), este último
filmado, em grande parte, em Alagoas. Seus filmes estão
associados com a música popular, em episódios inspirados e
musicados por canções de Caetano Veloso, Chico Buarque,
Gilberto Gil e Jorge Benjor. Seu 16º. Filme de longa metragem O
Maior Amor do Mundo, com José Wilker e Taís Araújo, 2006, que
recebeu, em 2007, o titulo de Melhor Filme no Festival de Cinema
Brasileiro, em Paris. Homenageado numa retrospectiva de sues
filmes, em Roma, ganhou da Fundação Roberto Rosselini, pelo
.conjunto da obra e importância no cinema mundial., o Prêmio
Rosselini, bela estatueta de bronze desenhada por Federico Fellini.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


Edições do Senado – Brasília 2005

Cacá Diegues: um pensador cosmopolita


A maioria dos 18 filmes de Diegues foi selecionada por
grandes festivais internacionais, como Cannes, Veneza, Berlim,
Nova York e Toronto, e exibida comercialmente na Europa, nos

690
Estados Unidos e na América Latina - o que o torna um dos
realizadores brasileiros mais conhecidos no mundo. É oficial da
Ordem das Artes e das Letras (l'Ordre des Arts et des Lettres) da
República Francesa. Também é membro da Cinemateca Francesa.
O governo brasileiro também lhe concedeu o título de Comendador
da Ordem de Mérito Cultural e a Medalha da Ordem de Rio
Branco, a mais alta do país. Tem dois filhos, Isabel e Francisco, do
seu casamento com a cantora Nara Leão. Tem três netos: José
Pedro Diegues Bial (2002), filhos de Isabel; e Monah André
Diegues (2004) e Mateo André Diegues (2005), filhos Francisco.
Desde 1981, é casado com a produtora de cinema Renata Almeida
Magalhães. Além do cinema, publicou as obras: O Diário de Deus
é Brasileiro, Objetiva, 2003; Dias Melhores Virão: Do Roteiro
Escrito por Antônio Calmon, Vicente Pereira, Vinicus Viana e
Carlos Diegues, Baseado em Argumento de Antônio Calmon, Rio
de Janeiro, Ed. Record, 1990; Palmares: Mito e Romace da Utopia
Brasileira, Rio de Janeiro, Rio Fundo Editora, 1991, juntamente
com Everardo Rocha; Chuvas de Verão: Um Filme, Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira.

Celso Brandão: o olho da cultura popular alagoana

Celso Quintela Brandão é fotógrafo, cineasta, professor - e


tem uma coleção importante de registros em preto e branco em
fotos e objetos da cultura popular alagoana, sobretudo os folclores
e folguedos. Licenciado em Comunicação Visual pela
Universidade Federal de Pernambuco (1977). Especialização em

691
Fotografia como Instrumento de Pesquisa na Comunicação Social,
UCAM (2004). Professor na UFAL, desde 1998, especializou-se
em documentários sobre aspectos da vida do povo nordestino. A
partir de 1982, professor de Fotografia nos cursos de Jornalismo e
Arquitetura da UFAL. Entre seus trabalhos fotográficos se
destacam: levantamentos fotográficos do artesanato das cidades de
Alagoas, Santana do Ipanema; do artesanato em cerâmica de
Carrapicho - SE, para ilustrar o livro Carrapicho - Cerâmica e Arte;
da Coleção Arqueológica Indígena, da Coleção Etnográfica
Indígena e peças do acervo histórico, artístico e antropológico do
Museu do IHGAL. Cabe ressaltar, ainda, a documentação
fotográfica das comunidades pesqueiras de Santa Luzia do Norte e
Coqueiro Seco; fotografia do poeta e xilógrafo Enéas Tavares dos
Santos, para ilustrar o livro Poesia de Circunstância num Folheto
de Cordel e, por fim, toda a documentação audiovisual do museu
Théo Brandão, entre 1977 e 1986. Na cinematografia, seus
trabalhos foram: Reflexos, produzido em 1975, primeiro colocado
no I Festival de Cinema de Penedo.

A luz de Theo Brandão


Esteve ao lado, o tempo todo enquanto durou, da escola
folclorista de Viçosa, com Théo Brandão, José Maria de Melo,
José Aloísio Vilela e José Pimentel do Amorim. Só tinha uma
“concorrência” entre os mestres, a máquina fotográfica Rolleyflex
de Theo Brandão, queria tirar todas as fotos. Uma foto icônica de
Celso mostra Théo e sua Rolley. Em 1982, produz: O Guerreiro de
Alagoas; Conversa com Fernando Lopes; Chão de Casa, sobre as

692
diversas etapas da construção de uma casa de barro, madeira e
palha da região lacustre de Barra Nova, ao som do pandeiro e dos
versos do Coco de Roda, puxado por Mestre Fagundes.

Elinaldo Barros: o senhor cinema

O jornalista Elinaldo Barros começou na crônica esportiva do


Diário de Alagoas. Universitário, passa a escrever sobre cinema no
Jornal de Alagoas. Formado em Letras pela UFAL (1970), foi
professor do Colégio Guido de Fontgalland e do Curso de Educação
Artística da CESMAC. Foi funcionário do Departamento de Assuntos
Culturais (DAC) e participou da organização do Festival do Cinema
Brasileiro de Penedo, entre 1975 a 1982. Colaborou, ainda, na
organização de Festivais Estudantis de Música Popular. Dirigiu, por
dois anos, o Museu da Imagem e do Som (MISA). Pela Secretaria de
Cultura, participou da organização de outros eventos: Festival de
Fotografia, Salão de Humor, Festival de Marechal Deodoro, e
Seminários de Literatura. Com sua mulher - Maria Flora de Melo
Soares e Ismar Gato produziram o programa Difusão Cultural, pela
Rádio Educativa FM. Atua em tele-jornalismo na TV Gazeta,
comentando sobre cinema. Obras:

Panorama do Cinema Alagoano, apresentação de Jorge


Barbosa, capa e montagem fotográfica de Esdras Gomes, Maceió,
DAC/Senec/Sergasa, 1983

693
Livros de Elinaldo:
Cine Lux: Recordações de um Cinema de Bairro, Maceió,
Secult, 1987 (prêmio da Academia Alagoana de Letras, em 1988)

Rogato: A Aventura do Sonho das Imagens em Alagoas, com


uma Apresentação Quase Desnecessária, de José Maria Tenório
Rocha, Maceió, Secult, 1994

Panorama do Cinema Alagoano, 2ª Edição revista e ampliada,


Maceió, EDUFAL, 2010

Elcio de Gusmão Verçosa Filho

Cineasta, escritor, tradutor, professor, bacharel em Cinema,


em 2000, pela Fundação Álvares Penteado (SP), mestre em
Ciências da Religião pela PUC-SP (2003) e doutor em Ciências da
Religião, ainda pela PUC-SP (2007). Verçosa Filho traduziu
publicações especializadas em Filosofia Antiga e Religião, em
especial das editoras Loyola e Abril. Tem experiência na área de
Teologia e Filosofia moderna, atuando principalmente nos
seguintes temas: teoria da religião, teologia mística, patrística,
crítica filosófica da Religião, Filosofia Política, Filosofia Moderna
e Filosofia da Religião. Trabalha também como roteirista, diretor
de cinema e publicidade e tradutor de publicações especializadas
em Filosofia Antiga e Religião. Obra: A Ação Civilizatória- de
Delmiro Gouveia no Sertão Alagoano (1902-1917), juntamente
com Élcio de Gusmão Verçosa e Edvaldo Francisco do

694
Nascimento, em Escritos Sobre a Educação Alagoana;
Compêndios, Periódicos, Manuscritos e Práticas Educativas
(Século XIX, XX e XXI), Maceió: EDUFAL, 2011, Élcio de
Gusmão Verçosa e Mailza da Silva Correia (orgs).

Guilherme Rogato

Exímio fotógrafo e cineasta ítalo-alagoano, ele dirigiu o


primeiro filme rodado em Maceió, Casamento é Negócio. Morreu
em 1966, no anonimato, sem uma nota sequer em jornais. Quer
saber mais? Leia o livro do jornalista Elinaldo Barros, A Aventura
do Sonho e da Imagem em Alagoas, de 1993.

Hermano Figueiredo

Cineasta. Criou uma inusitada forma de exibir filmes: em


velas de jangadas à beira-mar, pelo litoral de Alagoas, em um
projeto intitulado Acenda uma Vela, realizado pelo Ideário
Comunicação e Cultura, com patrocínio do Ministério da Cultura.
Em 2004, produziu o filme de média metragem: Mirante Mercado,
além do curta em 35 mm. Choveu. E Daí ? este premiado no
Festival de Cinema de Recife (PE) com o laurel Gilberto Freyre.
Em 2005, produziu A Última Feira. Em 2007, foi selecionado no
concurso de roteiros DOCTVAL com o vídeo Calabar, no qual
mistura ficção e documentário. Em 2008, passa a coordenar,
nacionalmente, o Programa Olhar Brasil, criado pela Secretaria do
Audiovisual do Ministério da Cultura. Em 2009, produziu Lá Vem

695
o Juvenal. Sua última realização foi a iniciação em ficção com o
curta Um vestido para Lia onde divide a direção com Regina Célia
Barbosa (prêmio de melhor roteiro na categoria curta-metragem
nacional no 5º Festival de Cinema de Triunfo, em Pernambuco) e
selecionado para Circular Festival Brasileiro de Filme Infanto-
juvenis em Londres.

Jofre Soares (1918-1996)

Famoso ator alagoano, de Palmeira dos Índios, foi


protagonista dos três filmes do cineasta Nelson Pereira dos Santos
baseados em obra de Graciliano Ramos - Vidas Seca (1963), São
Bernardo (1972) e Memórias do Cárcere (1984). Ator da rede
Globo fez dezenas de novelas e mais de 10 filmes, entre eles
Chuva de Verão, que o consagrou.

Paulo Gracindo (1911-1995)

Ator da rede Globo, o Coronel Paraguaçu, da épica novela


O Bem Amado, Paulo Gracindo embora nascido no Rio de Janeiro,
quando seu pai era deputado federal, sempre se considerou
alagoano, por ter sido criado em Alagoas, para onde foi levado
com muito pouca idade. Estudou em Maceió, no Colégio Adriano
Jorge, transferindo-se para Recife, onde terminou os preparatórios
no Colégio Nóbrega. Estava na Faculdade de Direito em 1930,
quando foi, como soldado raso do Serviço de Tiro da Faculdade,
combater com os revolucionários. Terminada e Revolução e, com a

696
morte do pai, desaparecia o seu maior obstáculo à sonhada carreira
de artista, onde iria se consagrar pela sua versatilidade no teatro,
rádio e cinema e, em especial, na televisão. Volta a estudar e
Direito, no Rio de Janeiro, na mesma turma de Mário Lago, que
iria ser, durante muito tempo, seu colega de trabalho no rádio, mas
não termina o curso.

Na tablado e na telinha
Estreou no teatro em 1934, após algumas montagens
amadoras -- em especial no Teatro Ginástico Português -- na
Companhia de Procópio Ferreira, fazendo uma figuração na peça
Pérola. Em 1942, protagonizou nessa rádio a novela Em Busca da
Felicidade, mas seu grande sucesso de público foi o personagem
Albertinho Limonta na novela O Direito de Nascer. Na televisão,
onde passou a atuar mais decididamente a partir da década de
1970, destacou-se em telenovelas, tais como o personagem Tucão,
em Bandeira 2, 1971; Ossos do Barão, 1973; Roque Santeiro,
1985; mas, sobretudo, como o coronel Odorico Paraguaçu, o
prefeito de Sucupira, em O Bem Amado, telenovela em 1973 e
minissérie em 1980; e, ainda, o Coronel Ramiro Bastos, em 1975,
na novela Gabriela, Cravo e Canela, além de O Casarão, 1976 e A
Rainha Louca.

Pedro Rocha: o cinema popular

Nasceu em Junqueiro-AL em 1957, é cineasta, produtor,


membro da Associação Brasileira de Documentaristas e

697
Curtametragistas – Secção AL. Entre os filmes realizados em
vídeo estão Botija, Lobisomem, Mula Sem Cabeça, as três
animações são de 1997, Em Nome do Pai, do Filho e da Folia -
com o qual recebeu o 1º lugar na I Mostra Competitiva de Vídeos
Alagoanos - e Raul Vicente – Entre Pelejas e Amores, ambos de
1998 e os documentários Carnaval Temperatura e Memórias de um
Herói de Carnaval, os dois de 2003, documentários. Sanfona
Sinfônica, de 2007, Histórias da Difusora em Estrelas Radiosas, de
2008, documentários, Sandoval Caju – Além do Conversador, de
2011. Pedro da Rocha é um dos poucos diretores de cinema em
Alagoas, se não o único, que vive exclusivamente dos filmes que
produz. A intimidade com o universo do cinema é antiga – remonta
ao final da década de 1980. “Na época eu trabalhava na Secretaria
de Cultura (Secult), e lá havia uma câmera que usávamos para
documentar a cultura popular alagoana, preservando-a dessa
forma. Foi a partir daí que minha relação com o cinema se
estreitou.”

Werner Salles e o cinema peninsular

Werner Salles Bagetti nasceu em Brasília no ano de 1972, e


radicou-se em Maceió em 1984, onde se graduou em Jornalismo
pela Universidade Federal de Alagoas. Apesar da formação, nunca
atuou no ramo, dedicando sua carreira inicialmente a atividade
publicitária, e futuramente também a realização de obras
audiovisuais. Após diversas experimentações em vídeo, ele estreou
com o documentário Imagem Peninsular de Lêdo Ivo, em 2003,

698
projeto vencedor do edital DocTV, promovido pela TV Cultura.
Como o título explica, a produção biografa o poeta que é hoje o
mais importante representante vivo da literatura alagoana. Em
2005, Werner voltou a ser contemplado no mesmo prêmio, dessa
vez com História Brasileira da Infâmia, documentário que propõe
uma reflexão sobre a escrita da história ao defrontar versões para a
morte do 1º Bispo do Brasil, Dom Pedro Fernandes Sardinha,
ocorrida há mais de 450 anos. Além dos DocTVs, o cineasta
realizou alguns filmes institucionais, entre eles O Homem, o Rio e
o Penedo, projeto do Programa Monumenta, da Unesco. Com
Interiores ou 400 Anos de Solidão, projeto contemplado no
Programa Petrobras Cultural, o diretor faz seu filme mais ousado e
subjetivo até aqui ao assumir uma linguagem experimental e
polissêmica.

Sadi Cabral (1955-1986)

Nascido em Maceió, em 10 de setembro de 1906, Sadi


Cabral tornou-se ilustre pela dedicação e paixão pelas artes em
geral. Trabalhou no rádio, no teatro, na televisão, no cinema, além
de ter sido bailarino, compositor e professor. Aos 17 anos, Sadi
tinha clara a sua vocação. Já morava no Rio de Janeiro quando
começou a atuar no teatro, nas companhias de Lucília Pérez,
depois na de Leopoldo Fróis e, então, na de Abigail Maia, na qual
estreou profissionalmente, em 1924, na peça Secretário de Sua
Excelência. No início da carreira, cursou dança e coreografia no
curso de Maria Ollenewa e Richard Nemanoff e participou de

699
alguns espetáculos no Teatro Municipal como bailarino. Adepto do
sistema de realismo psicológico do teatrólogo russo Constantin
Stanislavski (1863-1938), Sadi dedicou-se também a estudá-lo.
Stanislavski discriminou um conjunto de regras para a vivência de
emoções autênticas em cena, com o objetivo de que o ator
mergulhasse em sua memória emocional e estudasse cada intenção
do personagem, de modo a dar a ele a sensação de realidade. Era
meados da década de 1940 quando esse alagoano participou do
Teatro Experimental Negro, atuando em O imperador Jones, de
Eugene O’Neill, apresentando no Teatro Municipal do Rio de
Janeiro a situação do negro após a abolição. Em junho de 1949,
passa a lecionar, desde o início, no Curso Prático de Teatro, que
Santa Rosa conseguiu instalar junto ao Serviço Nacional do Teatro.
Em 1956, Sadi Cabral entrou para o Teatro Brasileiro de Comédia
e, pela atuação em Eurydice, de Jean Anouilh, direção de Gianni
Ratto, recebeu o Prêmio Saci do jornal O Estado de S. Paulo.
Nesse mesmo ano, lançou pela Sinter o LP Sadi Cabral interpreta
poemas de Luiz Peixoto, em que declamava poemas de Bandeira.

Sadi Cabral: 40 filmes e novelas


O currículo de Sadi incluiu participações em mais de 40
filmes, entre eles, Pureza; Vinte e quatro horas de sono; O dia é
nosso; Terra violenta; Inconfidência Mineira e Escrava Isaura.
Depois do primeiro convite da TV Tupi, em 1967, para que Sadi
Cabral participasse de Paixão proibida, de Janete Clair, vieram
muitos outros. Entre as décadas de 1970 e 1980, ele fez parte do
elenco de diversos folhetins de televisão. Passou pelas TVs

700
Bandeirantes, Excelsior, Tupi; Cultura e Globo. Nesta, interpretou o
personagem Seu Pepê, que fez Sadi conquistar definitivamente os
telespectadores e ganhar popularidade. A história do poderoso
Hipólito Peçanha, que, confundido por Patrícia como um faxineiro da
fábrica da qual era dono, faz-se passar por Seu Pepê, virou,
inclusive, tema de uma marchinha de carnaval no ano de 1972. Seu
último trabalho na televisão foi em Maçã do amor, novela exibida
pela TV Bandeirantes. Na música, Sadi Cabral fez a primeira
composição em 1938, em parceria com Custódio Mesquita. A opereta
A bandeirante, apresentada em outubro do mesmo ano no Teatro São
Pedro, na capital gaúcha, Porto Alegre, deu início a uma amizade
que rendeu outras canções. Sadi tornou-se letrista, escrevendo com
Custódio, nos anos seguintes, as valsas Velho realejo, O pião,
Bonequinha, além do fox Mulher, que tornaram-se grandes sucessos
na voz de Sílvio Caldas, Carmen Costa, Carlos Galhardo e do grupo
Anjos do Inferno. Com Davi Raw, compôs os choros Sapoti e
Cachorro Vagabundo, além do samba Ciúmes, gravado por Rubens
Peniche.

Por Aline Veroneze

701
ARTISTAS VISUAIS

Quer saber sobre um segmento da cultura alagoana que por


si só encheria um mini-dicionário, é o das artes plásticas: pintura,
escultura, fotografia - das artes populares às clássicas, das
primitivas ao neoclássico, dos abstratos aos surrealistas, dos naifs
aos digitais. Teria que ser uma imensa lista. Escolhemos os artistas
em um universo de dois grandes livros, na verdade catálogos
raríssimos, da genial Tânia de Maya Pedrosa. Expostos nos
volumes Arte em Alagoas (1993) e Arte em Alagoas II (1994),
ambos editados pelo Ministério da Cultura e Secretaria da Cultura
do Estado de Alagoas. No catálogo, com textos explicativos de
críticos literários, estão obras de artistas plásticos alagoanos, que
representarão os grandes pintores e pintoras, já que Alagoas, na
pintura e escultura, além da quantidade de artistas, tem também, e,
sobretudo, qualidade. Tentamos reparar essa ausência incluindo
alguns novos e contemporâneos pintores, pintoras e escultores (as).

Agélio Novais: a arte da colagem

O artista plástico Agélio Novaes não usa tinta e nem faz


pinturas. A cor de suas obras vem de recortes de revistas e folders

702
que usa para compor seus quadros. Nascido em Viçosa, o artista
plástico que morou e estudou no Recife e que há 20 está de volta a
Maceió. São obras feitas a partir de colagens confeccionadas com
papel couchê e cola líquida transparente. A técnica de arte no papel
surgiu ainda da infância. Quando menino, nos trabalhos escolares,
ele já fazia muita coisa com colagem em cartolinas.

“O que se vê nas minhas colagens é parte da minha vivência


em Jaraguá, onde morei; são cenas da movimentação no cais, da
boemia... Sem falar no tempo que vivi no Centro do Recife, região que
é um celeiro e tanto para observação”.

Alba: toda simplicidade de uma naif

Alba do Nascimento Correia, pintora alagoana, começou


suas atividades artísticas em Manaus com Giselda Ribeiro. Em
Maceió, freqüentou a escola Rosalvo Ribeiro com o professor
Lourenço Peixoto, grande talento alagoano. Suas obras são
marcadas pela simplicidade e franqueza, além da ingenuidade e
espontaneidade que lhe são peculiares, características de uma
artista de estilo Naif. Marcou presença em eventos importantes
como o XXV Salão de Arte Moderna no Rio de Janeiro, I e II
Salão de Arte Global de Pernambuco. Seus Jardins são muito
admirados por poetas e pessoas sensíveis de um modo geral, graças
à singeleza e capacidade de transportar as pessoas para um mundo
de sonhos e paz.

703
Alex Barbosa e seus tons em pastel

Alagoano de Maceió, o arquiteto e artista plástico Alex


Teixeira Barbosa fez sua formação Arquitetura e Urbanismo na
Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro, e fez estágio no
escritório de m dos maiores arquitetos do Brasil, Sérgio Bernardes.
Mas antes já descobrira sua vocação artística. No começo era
desenhos a bico-de-pena, em 1969 já fazia sua primeira individual.
Mais tarde descobriu o pastel, cujos segredos passaram a dominar,
com curso de aprimoramento em Paris, em 1973. “Desde então é
com o pastel que o artista vem criando o melhor de sua obra, que
distribui em dias vertentes distintas: as composições com figuras
humanas ou com frutas, objetos e paisagens. Particularmente
notáveis são suas paisagens de manguezais”, assinalou o crítico de
Arte, Romeu Loureiro, no livro Arte Alagoas II, 1994.

Alex tira da prancheta projeto de Niemayer


Na arquitetura, Alex Barbosa nunca deixou de brilhar cm
seus projetos, com presença garantida nas edições da Casa Cor,
desenvolvendo projetos com ambiente funcionais, diferenciados e
iluminados. Mas o que marcou seus trabalhos foram duas grandes
obras, que hoje são equipamentos importantes na urbanização de
Maceió. O Memorial Teotônio Vilela, inaugurado em abril de
2005, quando tirou da prancheta os desenhos criados por Oscar
Niemayer; e o Memorial da República, n Praia da Avenida, com
seu pavilhão das bandeiras e os bustos dos generais de ferro. Um
espaço muito procurado por turistas e pelos alagoanos.

704
Bárbara Lessa: esculturas de vanguarda

A escultora, pintora, e pesquisadora Bárbara Heliodora


Uchoa Lessa, está entre os artistas alagoanos de vanguarda, com
trabalhos expressivos e talentosos, baseado em pesquisas sobre o
contexto social e político de seu Estado e do país. É uma expertise
em uso de material reciclado, que acompanha as tendências da arte
clássica e popular.

“Os trabalhos de vanguarda de Bárbara Lessa mostram uma


nova linguagem. Na escultura e na pintura, encontramos sempre algo
novo e descobrimos em seu trabalho uma bela construção de luz e
sombra. Pintar é uma bela linguagem, u meio maravilhoso de
comunicação e é justamente isso o que Bárbara Lessa para os
sensíveis apreciadores da arte. E como isso não bastasse, a artista
mostra um intenso e belo estilo criador, personalíssimo, forte ,
mágico, como deve ser o seu mundo interior”.

Por Anilda leão, em Arte Alagoas, Ministério da Cultura,


1994

Dinah, a pintura começou aos 60

A pintora, costureira e professora Bernardina Dinah de


Oliveira, a Dinah (1921-2011) também foi costureira e formou-se
em pedagogia. Fundadora, juntamente com algumas senhoras, do

705
Lar da Menina. Iniciou sua carreira na pintura aos 60 anos, após
sua aposentadoria. Sua formação artística se deu no ateliê Pierre
Chalita. Participou de inúmeras exposições individuais e coletivas.
É um dos artistas divulgados na obra Arte Alagoas II, publicada
quando da exposição em homenagem ao centenário de nascimento
de Jorge de Lima, pela Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de
Janeiro, sob a curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

Beto Nascimento: o grito das aquarelas

O pintor alagoano Beto Nascimento também um mestre do


designer, como programador visual, arte-finalista, paginador,
criador de murais, editor. Morou em Brasília nos anos 1980 e
retornou a Maceió, em 1992, quando se incorporou a vida artística
da capital. Participou de dezenas de exposições com coleções
temáticas, principalmente em aquarela, como a série Entradas e
Bandeiras, onde mostrou bandeiras esfarrapadas, sujas, uma
tradução plástica da situação política do Brasil. Logo depois,
segundo o crítico de artes, Romeu Loureiro, mudou suas
concepções. “Como se a luz alumbrante de sua terra natal tivesse-o
ajudado a exorcizar suas angústias existenciais, o artista apresenta-
se bem introspectivo”. Romeu Loureiro, no livro Arte Alagoas II,
1994.

Beto e Márcia Normande: irmãos também na arte visual


Beto e Márcia Normande vão além dos laços de família.
Eles são autores de uma arte harmônica e delicada que une traços

706
em comum em telas que impressionam. O mais recente trabalho, a
exposição “Texturas e cores abstratas e expressionistas”, em
novembro de 2015, foi sucesso de visitação. “Com a curadoria de
Carol Gusmão, a mostra apresenta o trabalho recente desses dois
artistas veteranos, que criaram uma identidade conjunta de
conceitos que se reflete nos trabalhos primorosos e inventivos que
realizam. Entre a decoração de festa de Réveillon, que realizaram
em dupla para o evento “Absoluto“ de 2012, e os trabalhos
isolados de cada um, seja no teatro ou em exposições, Normande e
Normande compõem a fina flor das artes visuais maceioenses.
Grafismo também é outra característica dos trabalhos de Beto e
Márcia. Márcia Normande participou da montagem “O Diário de
Anne Frank”, como membro do grupo decano Cena Livre,
assumindo a direção de arte do espetáculo. Beto Normande é um
dos artistas que trabalharam na recente exposição itinerante “Velas
Artes”, pintando em estilo abstrato e expressionista as ondas do
mar e o sol da Pajuçara, no pano de uma das 15 velas de
embarcações da Associação dos Jangadeiros que compuseram a
mostra ao ar livre”.

Betuca Lima e as igrejas de Maceió

O pintor alagoano Mario Humberto Peixoto Lima, o Betuca


Lima, é um autodidata, mas com talento de mais para fazer de uma
tela uma obra de arte rústica, quase naif, mas com identidade
própria, estilo próprio. A sua série Igrejas de Alagoas é
reconhecida e muito procurada. Realizou exposições na Galeria da

707
Universidade Federal de Alagoas, por duas vezes, e na Galeria
Mário Palmeira. É um dos artistas divulgados no livro Arte
Alagoas II, publicada quando da exposição em homenagem ao
centenário de nascimento de Jorge de Lima, pela Fundação Casa
de Rui Barbosa, Rio de Janeiro, sob a curadoria de Lula Nogueira e
Tânia Pedrosa. Betuca Lima é economista, foi por muito tempo dos
quadros da UFAL, trabalhou na Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e líder estudantil. Betuca
Lima é casado com Tânia Calheiros Lima, tem um filho, dois
netos, e integra o Movimento Familiar Cristão.

Bismarck: o operário da arte

Pintor e professor, Fernando Bismarck (1934-2013) nasceu


no Recife, onde estudou, nos anos 50, no ateliê do restaurador
Abelardo Rodrigues, com quem fez curso livre de Pintura e
História da Arte. Em 1968, aos 34 anos passa a viver em Maceió.
Na capital, Bismarck foi coordenador do Centro de Belas Artes,
curador da Galeria Rosalvo Ribeiro. Genioso, dono de um lirismo
comovedor, não as más condições de seu povo, “operário da arte,
retratista do cotidiano, fermentou sua dor em dias de poucas
palavras, afogou no chope, amargou sua solidão, brandiu seu
pincel contra os moinhos de vento”, escreve o escritor Ezequias da
Rocha.

“Há a beleza plástica dos sobrados, os velhos casarões


revisitados, pelo boêmio nas noites recifenses, expurgando fantasmas

708
do passado. Antigas residências dos senhores do açúcar, o sobrado,
nem processo revolucionário, foi invadido pelo povo, abriu suas
portas ao comércio miúdo, pequenas oficinas e baixo meretrício – era
o povo no poder”

Trecho do ensaio do escritor Ezequias da Rocha, no livro


Arte Alagoas II, sob a curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

Cesário Procópio: santeiro de ofício

O escultor alagoano Cesário Procópio dos Mártyres (1884-


1956) ainda criança já demonstrava paixão pela arte de esculpir.
Usava casca da Cajazeira para esculpir bonecos. Em Penedo, onde
nasceu, entrou para a oficina do mestre Júlio Phidias, e seu talento
correu o mundo. Em 1929 Cesário recebeu encomendas da Casa
Luneta de Ouro, do Rio de Janeiro. No Rio, Cesário fez várias
obras de escultura na madeira, destacando-se São João Evangelista
que se encontra em uma igreja no bairro de Botafogo. Cesário era
um escultor fiel a escola Barroca. O seu estilo inspirado na
gramática Luso-Brasileira não aceitava a deturpação de seu
potencial criativo. São inúmeras as obras de Cesário, todavia, o
Bom Jesus dos Navegantes tem uma história. O escultor tem
esculturas de madeira espalhadas por todo o Brasil.

A tradição dos santeiros de Penedo


O ofício de santeiro é uma tradição tricentenária em Penedo.
Claudionor Higino, mestre do Patrimônio Vivo de Alagoas, é o

709
mais novo, e, talvez, o último representante da escola gloriosa de
santeiros penedenses. Ele faz parte da quinta geração como
discípulo do mestre Antônio Pedro dos Santos, o pioneiro na arte
de esculpir imagens sacras, arte que veio de Portugal com os
franciscanos. A segunda geração foi liderada pelos mestres Júlio e
Dioclécio Fídeas; a terceira, com o mestre Cesário Procópio
Martyres, depois com o filho dele, mestre José Vécio Martyres,
que é padrasto do mestre Claudionor Higino. Além de Claudionor,
há outros santeiros famosos na cidade, como Antônio Francisco
dos Santos e George de Carvalho Andrade.

“A gente espera encontrar nas novas gerações um discípulo


que queira continuar. Temos que ter uma escola para repassar essa
arte. Deus nos livre, mas se os mestres que temos hoje aqui
morrerem, essa arte de esculpir santos vai acabar porque não
estamos formando mais as novas gerações e acaba um capítulo
importante da história dos santeiros de Penedo”.

Claudionor Higino, em entrevista a Arnaldo Ferreira em


reportagem jornal Gazeta de Alagoas, edição 25 de outubro de
2015

Carlos Fiúza e suas espinhas de peixe

O artista plástico alagoano Carlos Fiúza, com seus 52 anos,


já tem 32 de trabalho profissional, além da sólida formação:
estudos de desenho e pintura com Vânia Lima (Maceió) e Rubens

710
Guerchman (MAM-RJ); Arquitetura e Urbanismo (UFPE),
doutorado em Educação (PUC-Rio) e pesquisador e professor da
ENSP-FIOCRUZ (RJ). Em 1984 fez sua 1ª coletiva no Rio de
Janeiro, a mostra ‘Como Vai Você, Geração 80?’, realizada no
Parque Laje e em 2014. Também no Rio, a exposição Litorais,
divididas em quatro núcleos: litoral dos coqueiros-pintura, litoral
dos peixes-estrutura, litoral de cajus-desenho, litoral do ciclista
estrutural e dos cachorros desconstruídos. São trabalhos em tinta
acrílica sobre tela e sobre MDF, com o uso das técnicas de velatura
e de monotipias que compõem mosaicos. Há influências indiretas
da obra de José Pancetti, no que se referem aos temas e algumas
formas (cajus, barcos e linhas de areia), e de Leonilson, na alusão
ao bordado.

“Já pintei selvagens lobos, guarás e macacos que são pura


linha. Já dissequei cajus em planos de cores e gosto de “cortar” na
tela espinhas de peixes; fazendo dos restos desse saudável alimento
litorâneo um dos principais elementos de nossas representações”.

Por Carlos Fiúza, em 1996, no livro Arte Alagoas II, sob a


curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

Carmen Omena: uma pintora preservacionista

A artista plástica Carmem Lúcia Barbosa de Omena (1994-


2012) desde cedo despertou a vocação pelo estudo das Artes. Ao
longo de décadas dedicou sua vida à causa da Cultura Popular,

711
sendo o Folclore sua maior paixão, dentro deste emaranhado de
inteligência, cultura e vocação artística. Iniciou-se na arte em 1968.
Fez curso de desenho e pintura com os professores Lourenço
Peixoto, Pierre Chalita e Maria Teresa Vieira. Fez parte do
Simpósio Internacional do Centenário de Nascimento de
Graciliano Ramos e de outros inúmeros eventos e exposições.

“Sua temática preservacionista da natureza pretende ser uma


bandeira de luta contra a destruição ambiental. Há uma
predominância de composição horizontal, onde a cor define a
intenção da artista na abundância do verde e na presença de tons
azuis se insinuam de céu e mar. Carmem Omena retoma a natureza
no que tem demais saudável e exuberante, e ingressa na galeria de
pintores alagoanos pelo contínuo exercício de coragem, de
persistência w de talento”.

Por Cármen Lúcia Dantas, em 1996, no livro Arte Alagoas


II, sob a curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

Carmem Omena: a paixão pelo folclore


No dia de seu falecimento, em 28 de janeiro de 2012, os
jornais e portais “esqueceram” da pintora, e deu destaque a seu
lado mais contemporâneo, seu lado mais amado: a cultura popular.
“Morreu a folclorista e pesquisadora Carmem Omena, presidente
da Comissão Alagoana de Folclore e diretora da Associação de
Folguedos Populares de Alagoas. Segundo a ex-presidente da

712
Associação, Josefina Novaes: Alagoas perdeu hoje mais uma
grande defensora da cultura popular alagoana... uma entusiasta e
uma pesquisadora da arte popular no estado”. Entre 1990 e 2002
realizou a curadoria de cerca de 20 exposições. Lançou, numa
parceria com o SESC/AL e Atelier Casa 50, o CD “Folguedos
Natalinos Alagoanos /Pastoril” dentro da Coleção Memória
Musical produzido pelo Centro de Difusão e Realizações Musicais
do SESC/AL. Era admiradora e colecionadora de lapinhas e
presépios feitos por artesãos populares, possuindo um acervo de
mais de 70 conjuntos, de várias cidades e países, que eram
expostas anualmente, no mês de dezembro.
Dicionário Mulheres de Alagoas, Ontem e Hoje - por
Enaura Quixabeira e Edilma Bonfim, 2007, Edufal, e no endereço:

Celi Leite: a pintura antropológica

Celi Bezerra de Melo dos Santos, mais conhecida como Celi


Leite, “é uma pintora que trabalha o imaginário com tintas frescas
e poesia”, afirma Solange Lages Chalita, sobre o perfil de Celi. Os
a animais, a arte primitiva, incentivada pela antropologia são traços
constantes nos óleos de Celi. São pássaros tropicais piando em
florestas exuberantes, são tigres representando a criação da mãe
natureza. Ela estudou pintura no ateliê de Pierre Chalita. Celi Leite
é uma das artistas divulgadas na obra Arte Alagoas II, publicada
quando da exposição em homenagem ao centenário de nascimento
de Jorge de Lima, pela Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de
Janeiro, sob a curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

713
Ceres Vasconcelos: arte no topo do Brasil

A arquiteta e artista plástica alagoana Ceres Vasconcelos é


uma das mais premiadas e reconhecidas no país. Estudou pintura
acadêmica, inglês, piano, violão, história das artes, francês, balé
clássico, tênis e expressão corporal. Muito jovem ganhou o
primeiro lugar no Concurso Nacional de Desenho Livre,
promovido pela Embaixada da França. Graduou-se em Arquitetura
e Urbanismo, UFAL (1982). Participou da Exposição Arte de
Alagoas, realizada em 1993 na Fundação Casa de Rui Barbosa, no
Rio de Janeiro. Vencedora do concurso promovido pela DECA
(1998), quando teve seu projeto exposto no Museu de Arte
Moderna de São Paulo. Em 1999, recebeu o prêmio Design e foi
considerada Arquiteta do Ano. Em 2000, volta a receber o título e,
em 2002, em São Paulo, é agraciada com o título Super Cap de
Ouro. Participou da Bienal Internacional de Arquitetura em São
Paulo; participa da Mostra Casa Cor, em Pernambuco, desde 1997.
Possui trabalhos publicados em revistas nacionais como Casa
Cláudia, Casa & Jardim, Casa Cor Brasil, Viver Bem, Espaço D,
Banheiro Deca 1998 e Arte Alagoas I entre outras; e em
publicações internacionais: Decoration Show Houses IV - 2000,
Décor Year Book Nordeste 2000 e 2001. Participou ainda das
mostras: Instituto dos Arquitetos do Brasil (1993, 1997 e 1999) no
Rio Grande do Norte, de Ideia Natal 1996; Mostra VB Móveis e
Mostra Florense 2000; HOTAL, Pernambuco e Expoarte 2000;
Mostra Arfetacto, Mostra Novitá/APALA e Mostra Designer

714
´s/Pinacote UFAL em 2001. Foi convidada especial de Alagoas
para participar do megaevento Casa Plural Fashion e Arte, mostra
de maior porte do Nordeste, em 2002.

Correia Flores: a fúria das cores

O pintor, cenógrafo e ativista cultural alagoano Marcos


Correia Flores é um agrestino de Quebrangulo, terra natal de
Graciliano Ramos, que ganhou o mundo das artes e do glamour.
Foi aprendiz do mestre Lourenço Albuquerque, e reaprendiz da
mestra Maria Tereza Vieira. Flores teve sua arte e a “fúria dos
coloridos sofisticadamente feéricos” no auge dos anos 1970 e
1980. É um dos artistas divulgados na obra Arte Alagoas II, sob a
curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

“Não deve ser em vão que ele repete tanto – “minha pintura é
a minha psicoterapia”... Para com estes artistas, cujos mergulhos
sofridos são verdadeiras realizações vicariantes, mergulhos nossos
que os medos cotidianos impede-nos de possuí-los, uma dívida
coletiva sempre há de permanecer e uma gratidão legítima há que vir
desde o recôndito espírito. Apresentar Correia Flores é, sem dúvida,
uma tarefa que me faz bem. Aos olhos e a alma. Fazendo-o, espero
estar contribuindo para que a nossa com este artista possa ir-se
apagando”.
Por José Geraldo Marques, Arte Alagoas II, sob a curadoria
de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

715
Dalton e Maria Amélia: Heróis da resistência

Os artistas visuais Maria Amélia Vieira e Dalton Costa são


o que podemos chamar de heróis da resistência. Eles mantêm um
dos raros espaços particulares em Alagoas destinados a
preservação da cultura popular local. Ao todo, mais de duas mil
peças criadas pelas mãos de artesãos, que vivem nos
desconhecidos rincões deste país, além das obras de seus
fundadores, estão salvaguardadas no espaço. Não há dúvida de que
o casal é obstinado e apaixonado pelo trabalho que realizam,
afinal, a galeria (Karandash) neste ano completa 28 anos de
fundação. Mesmo diante de realidades adversas, os galeristas
buscaram alçar novos voos. Desde 2008, eles desenvolvem, com o
apoio de instituições privadas e públicas, os projetos Tecendo a
Manhã e O Museu no Balanço das Águas. Ambas as ações
possuem um caráter sociocultural e levam para crianças, jovens,
escultores, artesãos e bordadeiras de povoados às margens do rio
São Francisco a oportunidade de obterem novos conhecimentos
sobre o fazer artístico.

Texto de Francisco Ribeiro, na Revista Graciliano e na


Graciliano online, em outubro de 2013

Diálogo entre arte popular e contemporânea


O jornalista e diretor de cinema digital Cláudio Manoel
Duarte lançou na internet, em 2015, o vídeo “Karandash”, que
faz uma investigação sobre o trabalho realizado pelos artistas

716
Dalton Costa e Maria Amélia Vieira à frente da galeria
Karandash, que é, também, o museu Coleção Karandash de Arte
Popular e Contemporânea. A discussão do vídeo gira em torno
dos conceitos e prática da arte e dos possíveis caminhos que ela
pode trilhar. Nesse contexto, o trabalho realizado pelo casal,
como galeristas garimpando obras entre excepcionais artistas
populares do Nordeste, acaba influenciando a própria produção
dos dois artistas, identificados com as obras coletadas por eles em
povoados e cidades ribeirinhas do São Francisco pelo Sertão
afora. Como diz Maria Amélia no vídeo, “a Karandash cria um
diálogo entre a arte popular e contemporânea”. Esse trabalho de
quase 30 anos de Maria Amélia e Costa, importantíssimo e único,
cruzando as fronteiras do Estado, navegando com um barco
próprio, o chamado Museu no Balanço das Águas, às margens de
povoados como Ilha do Ferro em Pão de Açúcar e Entremontes
em Piranhas, e outras comunidades do lado sergipano do rio,
construindo assim uma ponte entre a caatinga e a urbanidade da
capital Maceió.

Texto do editor do portal Alagoas Boreal, Jorge Barboza


http://alagoasboreal.com.br/video/72/especial/netvideo--
karandash-destaca-a-trajetoria-dos-artistas-visuais-dalton-costa-e-
maria-amelia-vieira

Delson Uchoa e seu universo fantástico

717
Inevitável não ter o olhar preso pelas cores de Delson
Uchôa, em suas pinturas e fotografias. A mistura das referências do
cotidiano, do universo popular de diversas regiões do Brasil cria
obra de forte impacto visual. O artista participou de importantes
exposições como a célebre mostra Como vai você? Geração 80 e
outras em instituições como o Instituto Tomie Ohtake (São Paulo),
Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (Recife). Suas obras
fazem parte de importantes acervos como o do Museu de Belas
Artes do Rio de Janeiro, de Gilberto Chateaubriand (MAM-RJ), de
João Sattamini (MAC-Niterói), do Museu de Arte Moderna
Aloísio Magalhães (Recife). Com paleta vibrante e em escala
mural, as pinturas de Delson Uchôa trazem desenhos geométricos e
abstratos que nos remetem a símbolos. Formas que por vezes se
repetem padrões que se aproximam da estamparia. Suas criações
fazer referência a universos fantásticos, como em Atlântida (1998)
e populares como Tudo que reluz é ouro (2000). Em uma de suas
mais recentes exposições, em 2014, Delson Uchoa continua a se
reinventar. Com fotografias em duratrans sobre backlight, ele traz
sombrinhas coloridas usadas pela população nordestina para a
proteção do sol, que foi transformada em uma série, chamada
“Bicho da Seda”. Através dela, o artista pesquisou as cores do
nordeste e criou um personagem para isso, o qual carrega
constantemente sombrinhas, em cores e estampas variadas.

Dênis Matos: natureza alagoana

718
Iniciou o seu estudo de Arte Moderna em 1970, por
intermédio do Departamento de Arte e Cultura (DAC) de Alagoas.
Fez vários cursos nas áreas das Artes Plásticas e participou de
inúmeras coletivas e individuais, ao longo de sua carreira como
pintor, conquistando lugar de destaque no cenário das artes em
nosso Estado. Em algumas de suas obras usa técnicas misturadas,
com permanent marker, tinta e verniz acrílico sobre tela, como é a
série Monumentos da Natureza da Terra Alagoana.

Edgar Bastos (1935 - 2002)

O pintor estudou no Grupo Escolar Fernandes Lima. Em


1967, expôs, em mostra conjunta, na Galeria Rosalvo Ribeiro, da
Prefeitura Municipal de Maceió: da qual foi funcionário. Sua
primeira individual foi em 1977, no Salão de Recepção do hotel
Ilhena, na Base Naval de Aratu (BA). Em São Paulo: tomou parte
em coletiva no Paço das Artes (1983), no Rio de Janeiro, na
Galeria Sérgio Milliet, da FUNARTE (1979) e no Senado Federal,
em Brasília (1985). Participou, em AL, do Grupo Vivarte. Outras
coletivas: Centro de Arte e Cultura de Alagoas (1980) Galeria
Karandash (1982) Galeria de Arte Grafitti (1984) Galeria -Oficina
de Arte R.G.- (1989), todas em Maceió. Um dos seus trabalhos
participou da exposição Arte Popular Alagoana 2003, realizada na
Galeria SESC/Centro, de 19/08 a 05/09/2003. É um dos artistas
divulgados no livro Arte Contemporânea das Alagoas, publicado
em Maceió: em 1989, sob coordenação de Romeu de Mello-

719
Loureiro. Participou, em 1993, da Exposição Arte de Alagoas, na
Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro.

ABC das Alagoas, Dicionário Biobliográfico e Geográfico


de Alagoas, por Francisco Reinaldo Amorim de Barros, Edições do
Senado Federa, 2005

Edna Constant: a dona da Casa da Arte

A artista plástica, pesquisadora e professora Edna Constant


Mendes, é uma senhora fora de série, ativa e serelepe, que brilha
como uma estrela no bairro da Garça Torta. Nascida em Palmeira
dos Índios em 1933, ela concluiu o primário e o antigo curso
ginasial. Mas seguindo seus sonhos e desafios, ela fez de sua casa,
desde 1985, um projeto social: a Casa da Arte, na Praça São Pedro,
185. A casa levantou vôo e se transformou em uma organização
não governamental, com parcerias nacionais e internacionais, entre
elas a Universidade Federal de Alagoas e o Ministério da Cultura.
Além da casa, Edna foi vice-presidente da Associação dos
Moradores de Garça Torta, e presidente da Associação Casa da
Arte, como coordenadora do projeto Poleiro dos Anjos.

Uma casa para pintar o sete


Bem na beirada do mar, na bela praia de Garça Torta, bairro
periférico no litoral norte de Maceió, se encontra este lugarzinho
mágico. Galeria de arte, centro de estudos, espaço aberto pra
reflexão, produção e interação cultural. Porto seguro para as obras

720
de artistas de todos os lugares e para os olhares curiosos da
comunidade local, que dificilmente encontraria oportunidade de
vivenciar a experiência artística através de outros canais. É a Casa
da Arte de Dona Edna, uma mulher cativante e dedicada que deu
inicio a este projeto há vinte e um anos e que hoje é um dos Pontos de
Cultura do estado de Alagoas, dentro do Programa Cultura Viva do
Governo Federal. A Casa da Arte atende atualmente 100 crianças e
jovens entre cinco e 18 anos de idade em aulas de música, pintura,
teatro, e dispõe de um laboratório de línguas (português, inglês e
espanhol). Dona Edna Constant conta um pouco da história do lugar.
“Já vínhamos a um longo tempo utilizando a casa para exposições,
aberta para a comunidade daqui. Foi quando, a partir do natal de
1999, resolvemos mudar um pouco, expandir as atividades, incluir a
comunidade e seus meninos e meninas como protagonistas dessa
história, eles já viviam sempre por aqui mesmo, mas como
espectadores, a partir deste momento eles passaram a ser atores”.

Texto do jornalismo Macelo Cabral no overmundo, em


novembro de 2006
http://www.overmundo.com.br/overblog/a-casa-da-arte-de-
dona-edna

Eva Le Campion: o lado social da arte

A pintora, ceramista, escultora e professora alagoana Eva Le


Campion é formada em Letras pela Universidade Federal de
Alagoas. Estudou pintura na Escola de Artes Visuais do Parque

721
Laje, no Rio de Janeiro. Cursou, e também ensinou desenho e
pintura no Ateliê da Fundação Pierre Chalita. A artista
desenvolveu trabalhos artísticos com jovens carentes e em situação
de risco, na Cruz Vermelha de Alagoas, com programas de
atividades com oficinas de tecelagem e cerâmicas que a artista
realizou com a comunidade carente de Maceió. A Cerâmica Cruz
Vermelha foi montada pela própria artista em Maceió. Fez
especialização em língua inglesa, na Bonners Ferry High Schoool
(EUA) e em língua francesa, na Universidade de Lyon. Cursou
História da Arte na PUC-RJ. Sua mais recente exposição foi
Pinacoteca Universitária, em novembro de 2015. A exposição
Moira foi composta de pinturas em tecidos e cerâmicas, a mostra
reúne obras que refletem a trajetória da artista e a construção de
uma poética própria. As moiras, na mitologia grega, eram
responsáveis por tecer, cortar e determinar o fio da vida dos deuses
e dos humanos.

ABC das Alagoas, Dicionário Biobliográfico e Geográfico


de Alagoas, por Francisco Reinaldo Amorim de Barros, Edições do
Senado Federa, 2005, com o portal
http://www.alagoas24horas.com.br/936076/pinacoteca-
universitaria-apresenta-exposicao-moira-da-artista-eva-le-campion/

Edmilson Oliveira encanta o mundo com sua arte

Mergulhado no universo de cores desde os 10 anos,


Edmilson Silva de Oliveira, o Ed Oliveira, pintou seu primeiro

722
quadro aos 11 anos e de lá prá cá não parou mais. Natural de Paulo
Jacinto, Alagoas, o artista plástico passeou por vários estilos, mas
se considera um pintor contemporâneo. Não é a toa que criou seu
jeito próprio de fazer arte, dando asas à imaginação, quebrando
barreiras e paradigmas, indo mostrar o que melhor sabe fazer (arte)
pelas bandas da Europa. Autodidata, Ed Oliveira pôde mostrar seu
talento de maneira mais ampla aos 17 anos quando aceitou o
convite do pároco de sua cidade natal para restaurar o acervo da
igreja Matriz de Nossa Senhora das Graças. E sob as graças da
padroeira dos paulo-jacintenses percebeu que poderia trilhar
caminhos mais longos e vencer qualquer desafio. Prova disso é que
naquele mesmo ano realizou sua primeira exposição, em Palmeira
dos Índios. Sem medo de arriscar, o artista enveredou por várias
ramificações e em 1994 foi convidado pela ONG Nordeste
Reflorestamento e Educação, com sede em Genebra, Suíça, a
ensinar desenho e pintura para jovens na cidade alagoana de
Quebrangulo. Naquele ano, participa ainda de três exposições
coletivas em Maceió, através do Projeto Alagoas Presente. Após
revelar vários talentos e aprimorar sua arte, em 2002 a cultura teve
uma baixa com o fechamento da escolinha de pintura. Em 2011 a
carreira de Ed deu um salto maior e foi encantar o público europeu.
O sucesso foi tanto que durante exposição em Genebra, na Suíça,
no Salle Communale de Plainpalaisem, em comemoração aos 25
anos da Associação Nordeste, em apenas um dia vendeu 70 obras.

Texto da jornalista Maria Salésia, em 19/08/2015 no


endereço:

723
http://novoextra.com.br/outras-edicoes/2015/834/18488/ed-
oliveira--encanta-o--mundo-com-sua-arte

Edmilson e seus escultores aprendizes


Quem passeia pelas ruas de Quebrangulo pode esbarrar e se
deslumbrar com esculturas gigantes - esculpidas pelas mãos de
aprendizes sob o olhar e orientação de Edmilson. São tatus,
tamanduás, borboletas, corujas, além de uma variedade de
pássaros. Vale ressaltar que a inspiração para este trabalho veio da
Serra de Pedra Talhada - área de reserva da Mata Atlântica
preservada há mais de 20 anos pela Nordeste, associação ligada a
uma ONG Suíça, coordenada pela ambientalista Anita Studer.
Além do que, o interesse de Ed por material reciclado surgiu em
2004, incentivado pelo ambientalista suíço, Dlan Barckler, quando
prestava serviço a Nordeste. Ainda em Quebrangulo, dois bonecos
gigantes do grupo folclórico Nega da Costa ganham vida nas mãos
do artista. O artista plástico alagoano que tem como carro chefe de
suas carreiras pinturas em óleo sobre tela com papel reciclado,
destacando figuras surrealistas.

Texto da jornalista Maria Salésia, em 19/08/2015 no


endereço:
http://novoextra.com.br/outras-edicoes/2015/834/18488/ed-
oliveira--encanta-o--mundo-com-sua-arte

Everson: o surrealismo alagoano

724
Everson Fonseca Oliveira nasceu em Maceio (AL) em 1959.
Como tantos outros, começou a desenhar ainda em criança e a
pintar aos dezesseis anos, se tornou m autodidata. Seu currículo
remonta a 1977, quando realizou sua primeira Exposição
Individual na Galeria Mário Palmeira Junior que acabava de ser
inaugurada. Nos primeiros tempos, seus trabalhos mantiveram-se
num academicismo puro; aos poucos foram surgindo os elementos
surreais, que marcou enfim, a consolidação definitiva do seu
Estilo, tornando próprio, personalíssimo e inconfundível. O
colorido, propositadamente artificial (mais para o terroso) de suas
telas contribui para a perfeição do clima surrealista das suas obras.

“A arte do pintar é um desafio permanente. Existem mil


possibilidades no criar, todas marcadas por dois elementos mágicos:
o pensar e o fazer. Ambos se articulam num infinito de possibilidades
e desafios permanentes. Instaura-se assim um amplo universo de
perguntas desafiadoras. Everson Fonseca oferece as suas respostas
plásticas na criação de imagens muito peculiares, plenas de estilo. A
sua linguagem é facilmente reconhecível por dois aspectos: a técnica
apurada, desenvolvida pelo trabalho consciente e consistente, e a
instauração de um universo paralelo, em que as perguntas se
acumulam para indagar o observador”.

Por Oscar D’Ambrosio, doutor em Educação, Arte e


História da Cultura e mestre em Artes Visuais pelo Instituto de
Artes da Unesp

725
Fernando Lopes: o consagrado pintor alagoano

José Fernando de Lima Lopes (1936-2011), Fernando


Lopes, fez seus estudos em Garanhuns (PE). Começa a pintar em
1951, mas já desenhava desde criança, quando se encontrava em
Recife, onde estudava piano e viria a formar-se em Direito. Não
exerce essa atividade, dedicando-se à arte com exclusividade.
Nascido na cidade de São Miguel dos Campos, filho de família
tradicional e descendente de imigrantes espanhóis. Conhecido
mundialmente, Fernando Lopes despontou nas artes plásticas
alagoanas por volta de 1959. Firmou-se no cenário nacional como
possuidor de uma consistente e fecunda inventiva. Sua obra
impregnada do místico espírito do seu povo identifica os anjos e os
santos, a realidade empírica de sua data e do seu ambiente, foi um
historiador preocupado com o rigor da perspectiva e do volume,
representando o mundo através de elementos alegóricos de rara
beleza e muita vitalidade plástica, expirando-se sempre nos antigos
casarões de sua terra natal, inovando e experimentando novas
técnicas.

Admiradores famosos e exposições internacionais


Em seu círculo de amizade e admiradores constatavam
grandes personagens nacionais, como Jorge Amado, Aurélio
Buarque de Holanda, Lêdo Ivo, Francisco Brennand e o pintor Di
Cavalcanti. Fernando Lopes admirava e colecionava artes plásticas
e do Barroco brasileiro, ouvia constantemente música clássica e
erudita enquanto desenvolvia sua arte. Fernando Lopes participou

726
de exposições coletivas nas Embaixadas do Brasil em Paris, Roma,
Israel, Estados Unidos; participou de Bienais nas mais importantes
cidades do país. Chegou a expôs em Londres em 1970 por três
vezes com outros artistas da América do Sul. Seus quadros estão
expostos em museus e em importantes coleções particulares
brasileiras, como: Museu Bloch, Manchete Vieta, Abril Cultural,
Giovanna, Bonino, Aloísio de Paula Machado, Museu de Olinda,
Fundação Armando Álvares Penteado - SP, Museu do Sol- SP e
Alfredo Knope Nova York.

Gaspar Luiz: as mais lindas mulheres

Gaspar Luiz Rodrigues Costa (1954 - 2005) desde a


adolescência já iniciou na pintura com desenhos de tipos humanos
da década de 20, que conheceu em documentação iconográfica.
Posteriormente, suas telas passam a ter tipos femininos, envoltos
em tecidos transparentes. Estudou pintura, com Roberto Lopes e
Fernando Lopes. No livro Arte Alagoas II, de 1994, é o próprio
Gaspar Luiz que faz a apresentação de sua obra no catálogo,
organizado por Tânia Maya Pedrosa Lula Nogueira.

“Procuro ser artista cada dia que passa e ainda não encontrei
o verdadeiro caminho. Faço parte de uma leva que acredita na
inspiração, se vier acompanhada da transpiração; produzo todos os
dias e sem preocupação com “ismos” ou correntes daqui ou de lá;
apenas tento dar uma linguagem amena e despretensiosa para que o

727
meu público lide com naturalidade com minhas peças; o dever do
alquimista pictórico é este”.

Gaspar Luiz em , no livro Arte Alagoas II, 1996, sob a


curadoria de Lula Nogueira e Tânia Pedrosa.

Getúlio Mota

Pintor, escultor, professor. Filho de Paulo de Miranda Mota


e Berenice Nunes Mota. Estudou no Colégio Diocesano.
Licenciado em Filosofia (1966), pela Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da UFAL, no prédio em que, em 1965, pinta um
mural de 16 metros quadrados intitulado Evolução do
Conhecimento. Funda, em 1966, o Laboratório de Pesquisa da Arte
Infantil. Sob a orientação de Augusto Rodrigues, faz, em 1969,
estágio na Escolinha de Arte do Brasil, no Rio de Janeiro. Funda,
estrutura e instala em 1970, para a Secretaria de Educação e
Cultura, a Escolinha de Arte de Alagoas, hoje incorporada ao
Centro Educacional de Pesquisa Aplicada (CEPA). Faz no Rio de
Janeiro, em 1971, o curso de Educação Criadora, com Thomas
Hudson, da Universidade Cardiff - Inglaterra. Em 1961, realizou
sua primeira exposição individual, na Biblioteca Pública Estadual.
É divulgada na obra Arte Alagoas II, publicada quando da
exposição em homenagem ao centenário de nascimento de Jorge
de Lima, pela Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro.
Obra: Alguns que Surgem, Coletânea Estudantil, Maceió,
Departamento Cultural da União dos Estudantes Secundaristas

728
(UESA), apresentação de Lima Júnior, 1963 (ensaio, juntamente
com José Vianney dos Passos, João Azevedo, Alves Damasceno e
José Renivan).

Hércules Mendes: a arte da charge jornalística

Hércules de Almeida Mendes tem formação acadêmica em


Ciências Econômicas, com vários cursos de especialização e em
nível de pós-graduação. Apesar de ser designer gráfico autodidata
fez cursos e estágios na Escola de Belas Artes de Pernambuco,
IUB, Ministério da Educação, agências Norton e Vicar
Publicidade. Colaborou em vários jornais e revistas, onde se
destacam as tiras diárias publicadas no jornal Gazeta de Alagoas,
charges e ilustrações nas revistas Última Palavra e Evidência, bem
como no Jornal de Alagoas. Participou de inúmeras mostras e
concursos em Maceió, Recife, Rio de Janeiro, Curitiba, Piracicaba,
Salvador, Brasília, Salvador, Caratinga, Teresina, Roma, Espanha,
Bélgica, Coréia, China, Irã, Romênia. É também escultor e trabalha
em criação de marcas e peças publicitárias. Publicou junto com
Nunes Lima e Manoel Viana, o Livro de Graça. Executou o Mural
do Estádio Rei Pelé e arte final do Brasão de Armas e Bandeira do
Estado de Alagoas em parceria com o Doutor Théo Brandão. A
caricatura foi a porta de entrada de Hércules Mendes na charge.

“Cheguei por acaso, fazendo logo de início, caricaturas de


pessoas. Os franceses chamam de Portrait Charge, a essa
modalidade de humor gráfico. É uma varredura crítica do

729
personagem, os seus traços característicos, suas deformações físicas,
suas desproporções, sua expressão facial e corporal. A charge
transfere esses componentes para o fato, o acontecido ou mesmo
ainda, para o que está por acontecer. A memória, a informação, a
irreverência ou o espírito crítico, alimentam a criatividade. Claro que
tem que haver uma certa habilidade para o desenho caricatural”.

Ismael Pereira: uma arte multicultural

Ismael Pereira Azevedo nasceu em Capela, não a cidade


alagoana do Vale do Paraíba, mas de Sergipe, em 1940. Aos cinco
anos de idade muda com sua família para Aracaju onde prosseguiu
seus estudos. Casado duas vezes, teve cinco filhos. Em Aracaju
tornou-se empresário do ramo da publicidade e artista plástico.
Realizou sua primeira exposição individual em Aracaju, na Galeria
de Artes Álvaro Santos, em 1965. Neste mesmo ano, mudou-se
para Arapiraca. Ali foi fundador da Câmara Júnior de Arapiraca e
de uma emissora de radio, foi integrante da Maçonaria e
participante de diversas entidades no campo artístico e cultural da
cidade. Ingressou na vida pública em 1973, sendo eleito vereador
por Arapiraca. Ismael Pereira foi também deputado estadual pelo
Estado de Alagoas por três legislaturas. Em outubro de 2015,
Ismael fez sua mais recente exposição “ReVivendo”, com estilos
que passam como uma linha do tempo de sua obra, que ganhou um
teor multicultural.

730
“Retornar a esta terra se constitui como uma forma singular
do renascimento que me permite mostrar obras da minha lavra aos
amantes das artes e da cultura e reavivar, com meus olhos de agora,
as imagens dos tantos cantos e recantos desta bela e acolhedora
Cidade Sorriso onde vivi”.

http://aquiacontece.com.br/noticia/2015/10/24/aberta-
exposicao-de-ismael-pereira-revela-arte-multicultural

Guerreiros, cajus, jangadas e mandalas


Ainda criança, Ismael dava sinais nítidos de familiaridade
com o desenho. Com um pequeno pedaço de lápis, caco de prato,
pedaço de pedra, desenhava figuras nas paredes, nas calçadas ou
pedaços de papel. Já adulto, os primeiros trabalhos de Ismael
Pereira eram figurativos, pautados especialmente na cultura do
interior de Alagoas. Com a passar do tempo, o artista inovou ao
lançar a série “Guerreiro das Alagoas”. Nesta série, os
característicos chapéus dos integrantes desse folguedo lhe
inspiraram composições geométricas, cujas linhas retas eram
quebradas por estratégicas colagens de chita. Depois ele criou a
série “Jangadas das Alagoas”, mostrando velas reduzidas a simples
triângulos, agrupadas em sobreposições ou servindo de suportes a
elementos decorativos. Mais inovadora ainda foi a série dos
“Cajus”, na qual desconstruiu a fruta símbolo de sua terra, a ponto
de transformá-la, num violão muito bem ornamentado. Na
sequência, o artista descobriu a mandala, uma de suas obras mais

731
famosas; dela se apoderou para criar composições com grande
riqueza de detalhes.

José Zumba: a visão negra da arte

José Zumba (1920-1996) foi um artista plástico negro,


alagoano, nascido em Santa Luzia do Norte. O artista aprendeu
artes plásticas quando morou em Pernambuco e deixou suas
impressões em telas que retratam figuras humanas,
predominantemente negras, paisagens, manifestações culturais,
festas e costumes populares de Alagoas. Os traços e tons presentes
em suas obras marcaram as artes plásticas e a cultura do Estado, e
seu legado pode ser encontrado em todo o território alagoano, em
prédios públicos, museus e residências. Cursou a Escola de Belas
Artes do Recife, onde estudou Artes Plásticas. Exposições
individuais e fez exposições em Londrina-PA, 1953; Curitiba-PA,
São Paulo e Recife, 1957. Participou de diversas coletivas, bem
como da Exposição Arte Popular, Coleção Tânia de Maia Pedrosa,
realizada no Museu Théo Brandão, em Maceió, jan. 2002. Tem
trabalhos em acervos de museus da França, Itália, Rússia e
Argentina. Sua pintura remete às raízes africanas ao retratar
Zumbi, pretos velhos e mães de santo e ganha uma nova dimensão
antropológica e sociológica. Em 2013, Zumba foi homenageado
com uma exposição no Dia da Consciência Negra, com 80 telas de
sua autoria mostradas no hall do Museu Palácio Floriano Peixoto.

732
“Este alagoano de Santa Luzia do Norte foi um grande
batalhador. Sustentou esposa e filhos com sua arte, pintando
diariamente e saindo para vender as telas pelas ruas da cidade,
repartições públicas e casas de colecionadores. Sua pintura remete às
raízes africanas ao retratar Zumbi dos Palmares, pretos velhos e
mães de santo e ganha uma dimensão antropológica e sociológica
quando nos apresenta os saberes e fazeres alagoanos, em especial as
manifestações folclóricas e usos e costumes, como o não mais
existente vendedor de mel”.

Por Oswaldo Viégas, no caderno Saber, Gazeta de Alagoas,


em dezembro de 2011

Lourenço Peixoto: o decano de gerações

O pintor, escultor e professor de arte Lourenço Albuquerque


(1897-1986) nasceu há dois séculos, e morreu aos 90 anos
deixando uma geração inteira de pintores e pintoras que passaram
pelas suas mãos. Quando aprovava com louvor alguma pintura
assinava em baixo. Era observador, detalhista, mas quem passava
por ele estava pronto para seguir as belas artes. Estudou no Colégio
Diocesano e no Liceu Alagoano. Em 1913, passa a trabalhar na
Litografia Trigueiros, a fim de estudar gravura e pintura com Karl
Michael e Sigismund Gobat, temporariamente em Maceió. O
primeiro contato com a pintura e o desenho deu-se em 1915,
quando foi discípulo de Carlos Leão Xavier, no Liceu de Artes e
Ofícios. Para ministrar o ensino das Artes Plásticas, criou, em

733
1925, o Instituto de Belas Artes de Alagoas que, posteriormente,
iria chamar-se Instituto de Belas Artes Rosalvo Ribeiro,
responsável, nos fins da década de vinte, pela promoção de vários
salões de arte, dos quais participaram alunos do estabelecimento
(Violeta Leite e Tarcila Pitanga - escultura) e artistas
independentes: Zaluar de Sant`Ana, Moreira e Silva, Eurico
Maciel, Luis Silva, Durval Honório, Calheiros Gomes (pintor e
escultor), Cícero Leandro (caricaturista) e o próprio Lourenço.
Teve, ainda, atividade destacada na Festa da Arte Nova, em 1928,
cujo programa constou de uma seção literária e uma exposição de
pintura de alguns dos seus trabalhos. Sua temática oscilou entre a
fixação de tipos locais e paisagens. Fundou, a 29/09/1928,
juntamente com Aloísio Branco, Carlos Paurílio, Waldemar
Cavalcanti e Diégues Junior, entre outros, a Revista Maracanã,
dedicada às artes e letras e da qual só um número foi publicado.

ABC das Alagoas, Dicionário Biobliográfico e Geográfico


de Alagoas, por Francisco Reinaldo Amorim de Barros, Edições do
Senado Federa, 2005

Lula Nogueira: as cores do cotidiano

O artista plástico Luiz Nogueira Gomes, Lula Nogueira,


nasceu em Maceió, em 1960. Lembra-se de pintar desde criança.
Começou com dez anos de idade, retratando os cortadores de cana,
as estações de trem, as cenas do cotidiano da fazenda do avô no
interior. Tudo isso pintado a guache em cadernos de desenho. Ao

734
mesmo tempo, tinha um verdadeiro “museu” no seu quarto.
Colecionava objetos, postais, pendurava-os pelas paredes,
improvisava as primeiras colagens. O artista Pierre Chalita, amigo
da família, viu seus desenhos e recomendou que lhe dessem telas,
tintas, pincéis. Aos onze anos ingressou no curso de pintura de
Vânia Lima, onde aprendeu a trabalhar com outras técnicas, como
o fusain, o óleo, o nanquim. Aos quatorze anos foi para Recife
cursar o segundo grau. Lula escolheu Engenharia, levou nove anos
para concluir o curso, com várias interrupções. Nesses intervalos,
viajou para os Estados Unidos, França, entre outros países. Porém
nunca desistiu da arte. Aos dezenove anos fez oito meses de curso
no ateliê de Pierre Chalita. Mas seu espírito irrequieto queria mais,
conhecer novas técnicas, experimentar outros materiais. Sua
primeira exposição foi aos vinte anos, na cidade de Marechal
Deodoro. Pintava sanfoneiros, pastoris, gaiolas de pássaros,
casarios, lembranças da infância.

Por Mariza Campos da Paz, vice-presidente da Fundação


Lucien Finkelstein
http://daslagoascanario.blogspot.com.br/

Lula Nogueira: um pintor naif contemporâneo

735
Lula Nogueira é considerado um dos destaques das artes
plásticas do estado de Alagoas. Ele é um artista que privilegia
cenas representativas da vida e cultura alagoana, pintando seu
cotidiano, além dos aspectos culturais e históricos do estado.
Descrita como "viva, alegre e buliçosa", a arte de Lula Nogueira
realmente não faz concessões à mistura de cores: usa e abusa das
cores, adicionando um caráter eufórico ao seu ato criativo. Além
disso, muitas de suas telas assemelham-se a folhetins
multicoloridos, isso sem desmerecer nenhum dos dois gêneros.
Para o escritor alagoano Lêdo Ivo, a arte de Lula Nogueira é naif,
mas também pop. Já Viviane Duarte acredita que ele é naif
contemporâneo. Para o crítico de arte Ruy Sampaio, considerar o
pintor alagoano um representante da arte naif é um verdadeiro
equívoco. Num ponto todos concordam: Lula Nogueira, ao retratar
o cotidiano da vida urbana e rural de Alagoas, o faz de uma
maneira muito simples e intensa, mas sem folclorismo.

“Meu trabalho é carregado de referências musicais e


personalidades (algumas desconhecidas) que já ajudaram a mudar o
mundo de alguma forma, como cientistas, astronautas, vencedores do
prêmio Nobel da Paz, causas de proteção a animais e ao meio
ambiente, entre outros elementos que trazem vibrações positivas para
as pessoas”.

Orlando Santos: um cubista alagoano

736
Artes Plásticas e Cultura Popular: a união dessas vertentes
se torna um prato cheio nas mãos do cubista alagoano Orlando
Santos, que consegue transmitir com pinceladas a grandeza e o
colorido das manifestações folclóricas do Nordeste. Apesar de o
cubismo ter sido um movimento artístico de curta duração, com
apenas cinco anos, Orlando, aos 46 anos de idade, consegue
eternizar o estilo no movimento circular dos vestidos usados pelas
dançarinas do Reisado, na cauda triangular dos peixes do Rio São
Francisco ou nos quadros em zigue zague das calças dos próprios
pescadores. “O Cubismo é uma temática versátil, de grandiosidade
e movimento muito marcante da arte. Meu trabalho é influenciado
por mestres como Picasso, Portinari e Di Cavalcanti”. Orlando
estudou Artes na Fundação Pierre Chalita, em Maceió, e na Escola
Nacional do Desenho, em Porto Alegre. Ele já fez mais de 20
exposições individuais e coletivas e trabalha sempre com o acrílico
sobre tela, retratando temas regionais.

Paulo Caldas: as cores do Nordeste

Pintor e desenhista. Autodidata, desenha desde os onze


anos. Começou, em 1979, a pintar a pastel e, posteriormente, a
óleo. Residiu em São Paulo, onde realizou uma exposição
individual em 1980. A partir de 1981 se instala definitivamente em
Maceió. Desenvolveu, com Ricardo Maia, as Jornadas da Cruzada
Plástica, com o fito de divulgar os artistas alagoanos. Nos anos
2000, Paulo Caldas, depois de dar uma pausa nas obras
surrealistas, ele colocou em prática o colorido projeto Cordão

737
Nordeste. A partir daí, Paulo começou a transformar em pinturas as
histórias de trancoso e da carochinha contadas pela avó; os
cenários, personagens e as brincadeiras do mundo real, além do
farto universo do folclore alagoano. As telas são recortes de um
Nordeste colorido, vivo, alegre e lúdico. Uma realidade recriada
para ser entendida e, ao mesmo tempo, seduzir crianças e jovens.
"Não podemos deixar nossa juventude crescer sem contato com a
arte e os artistas da terra. Sem isso, que referência eles terão do
lugar onde nasceram e vivem?", alerta. Para isso, ele apresenta ao
público infanto-juvenil os coloridos trabalhos povoados de
cangaceiros, guerreiros, carros de lata, cirandas, circo, pau de sebo,
mamulengos e muitas outras referências guardadas no seu
imaginário de criança curiosa e artista observador e saudosista dos
tempos que jogava ximbra nas ruas de barro de Maceió.

ABC das Alagoas, Dicionário Biobliográfico e Geográfico


de Alagoas, por Francisco Reinaldo Amorim de Barros, Edições do
Senado Federa, 2005; com Roberto Amorim, em fevereiro de
2009 no Link:

Pedro Cabral: arquiteto projeta o artista

Dizem que arte e arquitetura caminham de mãos dadas.


Velhas conhecidas. Talvez irmãs gêmeas (que foram pelo menos
durante um longo período), vistas como divisões de um mesmo
todo – sendo a arquitetura considerada parte da história da arte e
presente na quase totalidade de livros sobre o assunto. No caso de

738
Pedro Cabral, essas duas vertentes andam mesmo juntas. Arquiteto
por formação, artista por vocação, ele engloba em si um pouco de
cada uma delas. A formação na ciência de projetar e organizar
espaços, criar ambientes, deu o embasamento para o lado pintor.
Dois aspectos indissociáveis, afirma – tanto no mundo como na
vida dele.

“Elas são indissociáveis, mas a arquitetura é mais complexa.


Reúne arte, tecnologia e normas impostas. Gosto muito da
arquitetura. Só não gosto de depender de normas, leis, burocracias,
dinheiro dos outros para realizar a minha arquitetura. Já a minha
arte são todos os traços e cores que herdei da arquitetura. Uma
comunhão de pensamentos e atos”.

Pedro Cabral em entrevista a jornalista Larissa Bastos no


link:
http://gazetaweb.globo.com/gazetadealagoas/noticia.php?
c=274634

Pedro Cabral e as razões do coração


Pedro Cabral - arquiteto, urbanista, professor, artista
plástico, poeta e cronista - tem vários substantivos (na verdadeira
concepção da palavra: substância), que podem ser colados à sua
pessoa: lírico, brilhante, inteligente e simples. Pedro é daquelas
figuras que parece que você conheceu há muito tempo, já na
primeira mirada. Ele está sempre feliz, com seu ar de pessoa de
fina estampa. É, ao mesmo tempo, um grande poeta e pintor, e um

739
cronista de primeira qualidade. Tive a grata satisfação de lançá-lo
como colaborador da imprensa. É autor de belas crônicas e ensaios
nos jornais Gazeta de Alagoas, O Jornal, Extra e O Dia. Nos anos
1990 e 2000 foi um dos primeiros alagoanos a fazer sucesso na
internet, com seu delicioso blog Pois É, no começo distribuído nos
e-mails dos amigos. Em 2015/2016 lançou sua principal e mais
importante exposição: as razões do coração, na galeria Fernando
Lopes, no Cesmac.

O impressionismo em cores nordestinas


Razões do Coração é a primeira exposição individual de
Pedro Cabral, que reuniu 50 trabalhos, resultado de uma trajetória
de 20 anos. A exposição, com curadoria de Ricardo Maia, ficou em
cartaz em outubro e inicio de novembro de 2015. Na sua paleta de
cores o vermelho “grita” em tons fortes, junto uma gama de cores
quentes e vibrantes. As telas representam a relação do artista com o
mundo e as coisas que o cercam. Dividida por séries, que devido
ao formato da galeria mais parece vagões, a exposição convida o
visitante a fazer um passeio pelas cores, amores, referências do
universo infantil, lembranças afetivas, representações da cultura
popular e nordestina, cenas do cotidiano, o gosto pela música e
pela poesia, o flerte com a obra do artista europeu Matisse, versão
sobre o episodio dos Índios Caetés versus Bispo Sardinha.

740
“Toda minha escola eu parti do impressionismo para cá.
Concentrei meu estudo no impressionismo, final do século 19. Monet,
Lautrec, Van Gogh. As cores de Van Gogh, o amarelo, abracei o
amarelo do Van Gogh com um carinho extraordinário. As pinceladas
eu fui buscar de Monet. São vários tijolinhos que foram me ajudando
a chegar ao que estou fazendo agora”.

Pedro Cabral em entrevista a jornalista Larissa Bastos no


link:
http://gazetaweb.globo.com/gazetadealagoas/noticia.php?
c=274634

Persivaldo Figueirôa

Nasceu em Vertentes, Pernambuco, mas há 17 anos reside


em Maceió. É um artista apaixonado pela pintura de Picasso, com
seus traços marcantes e figuras propositadamente distorcidas. Fala
da sua arte com o mesmo encanto: “Meu trabalho é multicolorido,
a paixão pelas cores primárias são evidenciadas, acentuando-se a
isso todo o calor e beleza do Nordeste. Quanto ao estilo, sigo a
linha figurativa com grande influência abstrata”.

A arte das irmãs Petuba

As irmãs Zenilda (1963), Zenaide (1965), Zeneide (1967).


Filhas de Marinete (1944), nasceram em Arapiraca. Marinete, que
era costureira, 'ingressou' na arte fazendo bonecas com os retalhos.

741
Inspiradas na mãe, as filhas começaram a fazer trabalhos artísticos
em 1993 com o professor Zezito Guedes em Arapiraca, esculpindo
pedras. A família levou as bonequinhas de pano para a exposição
Arte Nordeste, a tradicional Artenor, em Maceió, e com o sucesso
da iniciativa foram incentivadas a continuar o trabalho com panos
e bordados, que hoje é a principal atividade. A família Petuba cria
quadros e painéis bordados em tela, com fragmentos de pano, em
geral retratando cenas infantis e a vida no interior. Obras que
encantam por refletirem uma rara habilidade de composição,
perspectiva e utilização de cores.

Pierre Chalita: o precursor da pintura em Alagoas

Pierre Gabriel Najm (1930-2010) foi um pintor, escultor,


desenhista, professor e colecionador de arte brasileiro. Filho de
família de imigrantes libaneses, é arquiteto formado pela
Faculdade de Arquitetura do Rio de Janeiro. Estudou, também, na
Academia de Belas Artes San Fernando (Madrid – 1957) e na
Escola de Belas Artes de Paris (1958). Por indicação da Fundação
das Nações Unidas para a Arte e Cultura (Unesco) foi o decorador-
chefe do filme Les Mimes Orienteaux et Occidenteaux, de Jean
Doat e Paul Bordry (Paris – 1960). Sua obra é marcada pelo
trágico da condição humana, pela exaltação do sentimento e pelo
calor da carne. A sedução do movimento e a profusão de cores
estão sempre presente em seu mundo e em suas alegorias
pictóricas. Em 1950 matriculou-se na Faculdade de Arquitetura do
Recife e estudou pintura sob a orientação do professor Murillo

742
Lagreca, no Recife. Em 1982, foi nomeado professor de História
da Arte, na UFAL.

“Desde a década de 50, marco do início de sua carreira, ele


imprimiu ao fazer estético uma estrutura sólida que lhe permitiu
evoluir, resistindo à efemeridade dos modismos. Esta estabilidade se
sedimenta nos conceitos plásticos que a arquitetura lhe forneceu, na
autenticidade do conteúdo social da mensagem veiculada, no domínio
de uma técnica com novas possibilidades, sem romper, contudo, com
a tradição universal da pintura que usa o suporte na tela, como
instrumento de trabalho, pincéis, e material, pigmentos dissolvidos no
óleo. Se tivéssemos de rotular a arte desse grande mestre brasileiro,
da segunda metade do século XX, nós a chamaríamos de
Transexpresionista, pois nela os problemas psicológicos são filtrados
à luz dos critérios sócio-econômicos”.

Por Solange Chalita, textos do livro Fundação Perre Chalita,


um Exercício de Cidadania, 1991, edição numerada editada e
patrocinada pela Salgema Indústrias Químicas

Ricardo Maia e o movimento Vivarte

Nascido em Maceió, capital do estado de Alagoas, já na


infância fez contatos com a música, a pintura, o desenho e o teatro.
É graduado em psicologia pelo Centro de Estudos Superiores de
Maceió e mestre em psicologia social pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Por dez anos e meio, ensinou na rede

743
pública e privada de ensino superior. Nesse período, pesquisou no
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas estimulando a pesquisa
sobre o campo artístico alagoano. Criou informalmente, com
alunos e alunas, o Grupo de Estudos em Ciências Organizacionais
Não Industriais (GECONI) para conhecer as idéias de Domenico
De Masi sobre criatividade e grupos criativos. Criou inclusive a
linha de pesquisa “Arte, Artista e Cultura na Sociedade Alagoana”.
Nos anos 1980, foi um dos criadores do Grupo Vivarte (1984-85) e
das “Cruzadas Plásticas” (1987-88): dois importantes movimentos
das artes visuais pelo modernismo em Alagoas.

“O Grupo Vivarte (1984-1985) e a sua “Cruzada Plástica”


(1987-1988) agitaram o campo artístico, dividindo-o e dividindo-se,
de modo micropolítico, entre vivartistas e chalitista; entre artistas
novos e novíssimos; entre vivartistas “revoltados” e vivartistas
“apenas insatisfeitos”. Ou, ainda, de maneira mais didática, para se
pensar dialeticamente o processo histórico da arte, em Alagoas, entre
artistas “figurativista” e “abstraconistas-caetés”. A conseqüente
reação de pânico simbólico por parte das chamadas “elites
pictóricas” da Maceió artística, eliciada por esse vivartístico
“aluvião de mudanças”, foi, com toda certeza, mais um desses
desdobramentos, visivelmente notáveis, acarretados pela
participação simbolicamente subversiva e semioticamente auto-
atualizada de Maria Amélia Vieira; personificando, assim, um sinal
de identidade (e, portanto, de diferença) entre os ânimos políticos,
que, no referido campo, se dividiam ― e, de certo modo, ainda se
dividem ― entre chalitismo e vivartismo”.

744
Ricardo Maia, na página de seu facebook, em 20 de junho
de 2014, no artigo “Mamélia, a Vivartista”
https://www.facebook.com/ricardo.maia.39142/posts/30005
4346835826

Roberto Ataíde: uma trajetória interrompida

O pintor e arquiteto alagoano Roberto Ataíde (1962-1995),


iniciou sua carreira como estudante de Desenho e Pintura na
Fundação Pierre Chalita (1981-85). Mas teve sua carreira
interrompida, quando morreu aos 33 anos, vítima da Aids. Estudou
Serigrafia, Desenho Livre com Jadir Freire e fez diversos cursos no
campo da arte, dentre eles o Curso de Criatividade, Análise Crítica
e Problemas de Composição na Linguagem Visual, com Fayga
Ostrower. Em meados dos anos 80 foi Técnico de Artes Plásticas
do SESC. Participou de várias exposições coletivas. Em 1982, no
Concurso Carlos Moliterno (IHGA) recebeu o prêmio de 1º lugar.
Neste mesmo ano conquistou o 1º lugar no concurso Graciliano
Ramos de Artes Plásticas, promovido pela Ufal. Recebeu o prêmio
Industrial Ernesto Maranhão com a aquarela A Ilha, em
homenagem aos 70 anos do poeta Carlos Moliterno. Pouco
documentado, no entanto, e com uma curtíssima carreira, Ataíde
deixou marcas profundas (e desconhecidas do grande público)
trazidas por seu trabalho de pintor, que dominava várias técnicas
(carvão, acrílica, óleo…) e criava um caminho próprio estético,
principalmente num “semi-abstracionismo” onde pesquisava

745
volumes, criados por cores intensas e formas não precisas que por
vezes geravam sensações de vagas figuras.

“Roberto é sempre lembrado por sua doçura, certa


ingenuidade em lidar com o mundo, como uma aventura poética que
o fazia um artista de cores e formas, um embelezador da vida. Minhas
lembranças sobre ele remetem sempre a de um menino lindo, crescido
e feliz. Com um sorriso iluminadíssimo e sem nenhuma dúvida sobre
seu amor pelas artes. Uma vida tão breve mas que nos deixou mais
que traços e cores”, relata o videoprodutor alagoano Cláudio
Manoel, que lançou em 2014 um documentário sobre o pintor –
Traços e Cores - com cerca de 25 minutos de duração, realizado
pelas produtoras Imaginário é TV e Meu Bolso Produções Artísticas.

http://www.ufal.edu.br/noticias/2014/03/pinacoteca-
universitaria-lanca-documentario-sobre-o-artista-alagoano-roberto-
ataide

Rosalvo Ribeiro: belas artes em Paris

Rosalvo Alexandrino de Caldas Ribeiro (1865-1915) nasceu


na antiga Santa Maria Madalena da Lagoa do Sul, atual Marechal
Deodoro, e foi um dos filhos de uma cidade que também exportaria
para o Brasil, além de marechais, políticos da estatura e porte de
um Tavares Bastos, músicos como Misael Domingues ou
desbravadores como Ladislau Neto. Rosalvo Ribeiro, além de
renomado artista plástico, foi também paisagista, músico e

746
professor. Todavia, foi nas artes plásticas a sua melhor
performance, e, através dela, com uma técnica apuradíssima, ele
transitaria com leveza e maestria em temas históricos, militares,
retratos, paisagens, registros cotidianos e ainda, cenas de gênero.
Mestre da pintura alagoana, Rosalvo é um artista de sólida
formação, que percorre as mesmas etapas dos artistas brasileiros
mais destacados da segunda metade do século XIX. Estudou na
Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro, viaja, em
1889, para Paris para continuar seus estudos na Escola de Belas
Artes e na Acádemie Julian. Retorna ao Brasil em 1901. Torna-se
Diretor da Biblioteca Pública Estadual de Alagoas em 1902. Em
1910, assume o projeto da estátua equestre do Marechal Deodoro
da Fonseca e da praça que leva o nome do militar, em Maceió. Aos
48 anos, morre de tuberculose. A temática e estilo de Detaille
exercerão grande influência na produção francesa de Rosalvo
Ribeiro, manifestos inclusive na tela La charge ("A carga"), de
tema militar, exposta no Salon de 1898 com relativo sucesso (mais
tarde doada ao governo de Alagoas, na condição de "envio".

Rosalvo Ribeiro, por Moreno Brandão


“O nosso pintor, nascido na lendária ex-metrópole de Alagoas
(26 de novembro de 1867), tem em mente preparar uma tela histórica
sobre o incêndio ateado na mesma cidade pelos holandeses.
Enquanto não desempenha essa grandiosa recepção, dedica-se, desde
de sua volta da Europa, à feitura de retratos e pochades. Também de
Rosalvo Ribeiro muito se tem exigido, sendo o complacente artista
forçado a malbaratar muito talento em obras subalternas e em

747
trabalhos como as praças Deodoro e Tavares Bastos, tão
severamente criticadas por estetas e críticos de fancaria. Nos quadros
por ele plasmados verificam-se, entretanto, as qualidade primaciais
de um verdadeiro artista, que detesta as cores vivazes, sabendo,
porém, imprimir a seus painéis os traços inconfundíveis peculiares
aos mestres. Ao que aí fica apenas nos cumpre acrescentar que o
nosso grande pintor era filho do major Felippe Angelo Ribeiro,
conhecido pela força assombrosa e proverbial de que era dotado, e
da exma. sra. d. Josefina de Caldas Ribeiro. A morte de Rosalvo
ocorreu a 20 de abril de 1915, sendo o seu cortejo constituído por
vinte e cinco pessoas! As suas telas são, além das que já foram
citadas (L’ Innocence, La Sommission, La Charge, Le Factionaire, Le
Régiment, Vielle Bretonne), Vieux Baron, Pequeno Tambor, Garotos
de Paris, No Atelier, Oficina de Ferreiro, Cabeças de Expressão, O
Dragão, Pequeno Mendigo, A leitura, Mulher Russa (estudo do nu), A
Índia, etc”.

Texto de Moreno Bradão publicado originalmente no Diário


de Pernambuco de 7 de novembro de 1925 com o título As artes
plásticas em Alagoas

Rosita Peixoto Lima e arte Bauer

A pintora alagoana Rosita Maria Peixoto Lima, aos 81 anos,


continua com sua paixão acesa pelos pincéis, pelas telas, pelas
cores fortes de seus quadros. Sua pintura foi modelada nos ateliês
Lourenço Peixoto e Pierre Challita. Lourenço chegou a assinar em

748
baixo de suas pinturas, e Chalita afirmava gostar das cores fortes
dos óleos de Rosita. Hoje, por sua idade, deixou o óleo e passou a
pintar com tinta acrílica. Na sua temática estão paisagens, as lagoas
de Maceió, jangadas, as pastoras do Pastoril, a elegância das
mulheres, naturezas mortas. Atualmente, ela pinta uma coleção
inspirada na arte alemã Bauernmalerei, que significa, em tradução
literal, "pintura campestre". É um estilo rústico floral, cujas origens
remontam ao século XVII. Ele caracteriza-se especialmente pelas
pinceladas livres e espessas de temas florais, com traços de branco
e fundo patinado. Supõe-se que a técnica era inicialmente
empregada para aprimorar a arte no ambiente, a partir do
reaproveitamento artesanal de objetos metálicos ou de madeira
durante a II Guerra na Europa. Nos dias de hoje, ela é bastante
difundida em todo o mundo graças à sua aura campestre e
romântica. Rosita, além das telas em acrílico, pinta também objetos
inspirados na arte Bauer alemão, como travessas e pratos de
madeira, baldes e objetos de latão, banquinhos e estantes.

Rosival Lemos

O pintor Rosival Souto Lemos (1936-2005) foi um


autodidata, frequentou o ateliê de José Paulino de Albuquerque.
Fez estudos na Escola de Artes Visuais Parque Lage, no Rio de
Janeiro-RJ. Desenhou desde os 14 anos, mas só em 1956 pintou o
seu primeiro quadro a óleo. Em 1967, montou uma exposição
conjunta com Edgard Bastos na Galeria Rosalvo Ribeiro, da
Prefeitura Municipal de Maceió. Individuais: 1980: Luxor Regente

749
Hotel, Rio de Janeiro-RJ. 1981: Sucata Decorações; Plaza Hotel,
Arapiraca; Panorama Galeria de Arte, SalvadorBA. 1982: Galeria
Grafitti. 1984: Ponta Verde Praia Hotel; Fundação Jose Augusto,
Natal-RN. 1985: Galeria Karandash Arte Contemporânea. 1987:
Sucata Decorações. 1990: Galeria Karandash Arte Contemporânea.
1987: Sucata Decorações. 1990: Karandash Arte Contemporânea.
1994: Sucata Decorações. 1995: Gstaad. 1996; Terracota. 2000:
Armazém 384. Coletivas: 1973: Stand´Art de Alagoas. 1974:
Pinturas Pelo Teatro, Aliança Francesa. 1975: 1ª Mostra de
Minquadros, Galeria Ambiental; 1º Encontro de Artes
Pernambuco/ Alagoas, Galeria Ambiental; Convenção Nacional
IBM, Hotel Nacional, Rio de Janeiro-RJ.

ABC das Alagoas, Dicionário Biobliográfico e Geográfico


de Alagoas, por Francisco Reinaldo Amorim de Barros, Edições do
Senado Federa, 2005; com Roberto Amorim, em fevereiro de
2009 no Link:

Solange Chalita

É artista plástica, tendo se iniciado no Ateliê livre de Pierre


Chalita. Seu itinerário plástico apresenta duas fases: a primeira,
figurativa e uma segunda, abstrata. Trabalha com tinta acrílica
sobre tela, e usa texturas. Realizou várias exposições no Brasil e no
exterior, entre elas várias capitais brasileiras e no exterior: Roma e
Madri. Em parceria com seu marido, o decano Pierre Chalita fez
exposições em Buenos Aires e Lima, no Peru. Autora de cerca de

750
10 livros, Solange Lages lembra que sua influência foi seu pai, o
médico José Lages Filho, da tia Lily Lages e da professora Edla
Braga no estimulo à leitura. Comenta também sobre a influência
que sofreu dos autores Machado de Assis e Malba Tahan, que a
inspiraram na adolescência e na vida adulta. Ela também colabora
com assuntos culturais nos jornais de Maceió. Foi colaboradora
semanal na área de Literatura do Jornal “Gazeta de Alagoas”, no
caderno “Mulher”, durante dois anos. Atualmente, é presidente do
Conselho Deliberativo da Fundação Pierre Chalita, sediada em
Maceió e vice-presidente da Academia Alagoana de Letras.

Tânia de Maya Pedrosa

Nasceu em 1933 em Maceió. Formada em Direito, cursou


Letras (Francês) e fez vários cursos de literatura e artes em geral.
Pintora naif, foi várias vezes premiada, participou e foi curadora de
várias exposições no Brasil, na França e na Suíça. Tem obras
expostas em museus e embaixadas e tem sido citada por seu
trabalho em diversas publicações especiais. Tem uma vida cultural
intensa, escreve artigos para revistas e publicações diversas.
Dedicou-se à pesquisa, é colecionadora de arte popular nordestina,
já publicou dois livros a respeito - Arte Alagoas I e II - e possui um
dos acervos particulares mais representativos de arte popular
nordestina. Tânia iniciou sua carreira como pintora naif no começo
da década de 90, tendo, porém mantido sua pintura escondida
durante anos até que amigos a convenceram a enviar duas telas de
sua autoria ("Devoções Populares" e "Crenças Populares") para

751
participar da Bienal Naif de 1998 em Piracicaba, promovida pelo
SESC/SP. Seus dois trabalhos não só foram selecionados como
também receberam o Prêmio Aquisição pela tela "Devoções
Populares", que passou a fazer parte do acervo do SESC e foi a
capa do catálogo desta mesma exposição, lançado também em
1998. Leia o que o poeta alagoano Lêdo Ivo, falou sobre Tânia
Pedrosa.

"Tânia de Maya Pedrosa é uma guardiã de tesouros. A sua


vida tem sido uma sucessão de descobertas inclusive a descoberta de
si mesma, como apreciada artista plástica. O seu olhar está sempre
voltado para uma das fortunas das Alagoas: a nossa arte popular,
que é ao mesmo tempo o espelho e o sonho de um povo, o dia da festa
e a noite do canto e da dança. Nas pinturas, esculturas e objetos que
Tânia soube acumular, conferindo-lhes a hierarquia de um museu
real, a criação artística, anônima ou portadora do selo de uma
autoria, testemunha o que o homem tem de mais belo e nobre, no seu
trajeto terrestre: o fazer criativo."

Tânia Pedrosa expõe na França


Conhecida internacionalmente por suas pinturas de estilo
naif, Tânia Maya Pedrosa ganha mais uma vez a atenção do mundo
das artes. Em junho de 2017, ela foi destaque na França, na cidade
de em Gisors, região da Normandia, no 9º Festival d’Art Marginal
Le Grand Baz’art”. Nascida em Maceió em 27 de outubro de 1933,
Tânia chegou a cursar letras e se formou em direito na
Universidade Federal de Alagoas, mas foi na pintura que se

752
encontrou profissionalmente. Ela chegou a fazer diversos cursos de
arte e andou o Sertão alagoano e outros estados do Nordeste
brasileiro movida pela arte popular e seus mestres artesãos. Tânia
também mantinha amizade com muitos intelectuais alagoanos, a
exemplo do jornalista e poeta Lêdo Ivo, Aurélio Buarque de
Holanda e Marina Baird, entre outros, o que a inspirava a trilhar
pelo caminho das artes. Tânia coleciona prêmios como o Prêmio
Aquisição e Destaque Bienal Naïfs do Brasil (1998, 2000 e 2006),
e Comendas Ordem do Mérito Ministro Silvério Fernandes de
Araújo Jorge (2007), do Mérito dos Palmares (2014) e Nise da
Silveira (2015).

Vânia Lima

Vânia de Moura Lima é pintora, professora. Um dos poucos


artistas alagoanos que não é autodidata. Formou-se em línguas
neolatinas pela Faculdade de Filosofia da UFAL. Começou a pintar
aos dez anos, sob a orientação do professor Lourenço Peixoto,
ateliê que frequentou durante seis anos, fazendo curso no Instituto
Rosalvo Ribeiro. Em 1967 transferiu-se para o Recife, onde fez o
Curso Superior de Pintura na Escola de Belas Artes da
Universidade Federal de Pernambuco (1971), tendo sido monitora
das cadeiras de Desenho Artístico e Paisagem. Concluído o curso,
retornou a Maceió. Desde 1972 mantém um curso de iniciação ao
desenho e à pintura, para adolescentes. A partir de 1970, começou
a participar de exposições.

753
Mais Pintores

Aloisio Coimbra
Carlos Xavier da Costa
Eurico Maciel
Joaquim Brígido
Luiz Silva
Messias de Melo
Miguel Torres
Natalício Barros
Reinaldo Lessa
Ricardo Sarmento (escultor)
Teixeira da Rocha
José Rodrigues de Miranda
José Paulino Lins
José Menezes
Virgílio Maurício
Fredy Correia
Paulo Caetano
Virgílio Maurício
Zaluar de Sant´Ana

Mais pintoras

754
Alba Nascimento Correia
Ângela Nadir Oiticica
Augusta Martins
Carmem Correia Acioli (1897-2001)
Célia Malta
Ceres Vasconcdelos
Creusa de Souza Accioly
Cristiane Acioli Jatobá
Darcy de Farias Costa
Denise Fereira Jambo
Fátima Leão
Irene Duarte Silva
Lysete Alves de Carvalho
Maria José Lima Soares
Maria Luiza Pontes de Miranda
Maria Rosa Maia Nobre Piatti
Marisa Gatto
Martha Sraújo
Miriam Falcão Lima
Morgana Maria Pita Duarte
Naná Loureiro
Nelza Amorim de Miranda
Noêmia Duarte (1897-1962)
Sandra Pereira das Neves
Stela Maria Mota
Vera Gama

755
ARTE CONTEMPORÂNEA

Thiago Oli

“Dono de um talento inegável e promissor. Em seu curto


tempo de atuação profissional já demonstra muita competência no
que faz. Thiago tem uma forte influência em HQ (História em
Quadrinhos), desenha com facilidade e tem controle do traço e
colorização impressionantes. É um artista que recolhe em suas
habilidades talento, técnica e domínio do desenho. Acompanhei os
processos de alguns trabalhos que ele realizou em livros infantis,
capas de revistas, ilustrações para ivros e peças publicitárias e posso
afirmar com clareza que ele tem mostrado sua relevância na
ilustração alagoana”.

Por Weber Bagetti, no livro Graciliano Arte, 2017, editado


pela Imprensa Oficial Graciliano Ramos

Suel

Autodidata e natural de Palmeira dos Índios, Suel Cordeiro


Damasceno, o Suel, atua na street art há mais de duas décadas. A
cultura underground, as HQs (História emQuadrinhos) e o grafite
são as principais influências do artista visual, que também considera

756
a pintura clássica e contemporânea referências presentes nos
trabalhos que desenvolve e paredes e murais. A desconstrução é um
elemento constante na arte de Suel, cujas cores fortes e alegres e a
fluidez dos traços remetem à Art Nouveau – linhas longas e curvas
que podem ser associadas a formas e estruturas da natureza. Com
grafite, pincel ou qualquer técnica ao alcance das mãos, Suel leva
para a rua a ideia de que o desconhecido não é, necessariamente,
assustador. É ao ar livre, em comunidades ou em estabelecimentos
que pagam pela sua produção, que o artista tem maior visibilidade e
um contato direto com o público.

Por Weber Bagetti, no livro Graciliano Arte, 2017, editado


pela Imprensa Oficial Graciliano Ramos

Léo Villanova

Um dos profissionais mais qualificados de Alagoas, tem


domínio técnico e criativo, apuro e habilidade nos traços e cores,
diversidade de estilos e impressionante talento e visão para os
diversos suportes: ilustração, desenho técnico, charges e fotografia.
É um artista que apresenta domínio e rapidez na execução dos
trabalhos, inteligência e fluidez na concepção das ideias. Chargista
de alto grau técnico e criação, recentemente elaborou uma série de
desenhos da cidade de Maceió antiga, coleção que foi mostrada numa
galeria de arte na cidade, ou seja, um dos ícones da ilustração
alagoana.

757
Por Weber Bagetti, no livro Graciliano Arte, 2017, editado
pela Imprensa Oficial Graciliano Ramos

LITERATURA ALAGOANA

“Alagoas pode ser considerada como objeto de análise a


partir da década de setenta do século XIX e em cerca de 30 anos
aparecem três formas básicas de enxergá-la, o que se dá através do
que vou chamar de modelos Caroatá, Dias Cabral e Nolasco Maci-
el... Dias Cabral foi tão brilhante quanto Caroatá; foram dois
grandes pensadores na transição do escravismo para o capitalismo...
e Pedro Nolasco Maciel, da geração socialista, esteve na crista da
onda política em momentos chaves da vida provincial; foi
abolucionista, republicano e socialista”.

Luiz Sávio de Almeida, em Alagoas: quantas podem existir,


no Caderno de Debates do Conselho Estadual de
Comunicação, Cultura Alagoana, junho de 2003

758
PIONEIROS DA LITERARTURA

Crônica de frei franciscano foi o primeiro texto

Dentro do convento de Nossa Senhora dos Anjos, em


Penedo, surgiria o primeiro texto, com saber público e datado, de
1761. A preciosa “Crônica”, do frei Jaboatão, falando sobre a
Igreja das Correntes, antes uma capelinha para a santa, e as
inundações fluvais - as “cheias grandes” - do São Francisco. O
registro está no livro Quadros da História de Alagoas, de Jurandir
Gomes, impresso pela editora Casa Ramalho, 1956.

“Foi colocada a Imagem com o título Corrente, pela que


tomavam os da sua irmandade, título que de corrente de braço, com
que se prendiam e mostravam escravos da Senhora, se foi passando
com propriedade para a outra corrente, a do Rio São Francisco, que
lhe fica ao pé. Sem dúvida com o devido obséquio se fez a mudança,
pois a mesma Senhora parece que assim o quis, porque costumando o
rio nas suas maiores enchentes levar toda aquela praia, com grande
detrimento para os moradores dela, porque lhes tomavam a maior
parte das casas, não fincando de fora o lugar onde se fundou a sua

759
capela, depois que ali se erigiu não chegaram mais até o presente as
águas do rio, ainda mais nas maiores inundações”.

Frei Jaboatão, Penedo, 1761, no livro Quadros da História


de Alagoas, de Jurandir Gomes, impresso pela editora Casa
Ramalho, 1956 – 1º milheiro
Alagoas, uma história escrita a partir do século XIX

Caroatá

Desconhecido por grande parte dos alagoanos, José


Próspero Jeová da Silva Caroatá (1825-1890), deputado estadual
(1852-1853), advogado militante, jornalista, juiz, professor de
geografia e grande intelectual do século XIX, nasceu em Penedo,
mas até hoje sua fisionomia não é conhecida apesar de todas as
pesquisas em busca de seu registro fotográfico. Após se formar em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife
(1850), Caroatá retorna a Alagoas, atua, em 1851, no jornal O
Correio Maceioense e em dezembro do mesmo ano é redator-chefe
de O Timbre Alagoano, órgãos do Partido Conservador. Foi diretor
do Liceu Alagoano. Posteriormente, transfere-se para o Rio de
Janeiro, onde é nomeado oficial da secretaria do Ministério da
Justiça. Em 1864, o Correio Mercantil publica, em série, seu
trabalho Memória Descritiva e Estatística do Rio São Francisco. Já
a Crônica do Penedo foi a mais conhecida e cultuada, e valeu como
passaporte para se tornar membro do Instituto Histórico e
Geográfico de Alagoas. A revista do IGHA abre seus três

760
primeiros números com a série da crônica de Caroatá. Ao ser
impressa, em 1914, sai com inúmeros erros, inclusive e até mesmo
o nome de autor. Considera-se como a 1ª edição integral aquela
feita em Maceió, 1962, reedição da DEC, Imprensa Oficial, 60
páginas. Com introdução e notas de Moacir Medeiros de Sant´Ana.

“O texto de Caroatá sobre Penedo é simplesmente magistral:


há toda uma erudição sobre o local, a grande unidade do sistema
reconhecia na base de sua vida política. Ele constrói a existência de
um Penedo histórico, urbano, sem índios, sem escravos na correlação
e forças. Penedo era eminentemente branca. Alagoas seria o local e o
branco. Evidentemente, este modo de pensar Alagoas permaneceu”.

“O Caroatá dá uma visão de Alagoas em todos os setores: da


economia à política. Toda hora que você lida com uma questão
chamada poder, passa por tudo isso. Todo livro é uma plataforma
política. Principalmente os que dizem que não são. Não tem um que
não seja. Caroatá é fantástico e extraordinário porque ele sabe disso.
Ele não nega que está a serviço do poder local”.

Luiz Sávio de Almeida, em Alagoas: quantas podem existir,


no Caderno de Debates do Conselho Estadual
de Comunicação, Cultura Alagoana, junho de 2003

Dias Cabral

761
Francisco Dias Cabral (1834-1885) foi historiador, médico.
Iniciou bastante tarde seus estudos históricos, apesar de ser um
profundo conhecedor da história alagoana, ter grande capacidade
crítica e uma imaginação investigadora. Começou seus estudos
primários em Maceió, em 1840, e concluiu seu ensino superior ma
Bahia, e virou doutor cirurgião. Em 1826, estava em Maceió
exercendo a profissão. Mas segundo o historiador Moreno
Brandão, sua maior obra foi a criação do Instituto Arqueológico e
Geográfico Alagoas, depois de passar todas as instituições de
saúde e beneficência de Alagoas. Médico da Colônia Militar de
Leopoldina, professor e diretor do Liceu de Artes e Ofícios e do
Asilo de Órfãs de NS do Bom Conselho. Médico do Hospital de
Caridade de Maceió. Abolicionista e membro da Sociedade
Libertadora Alagoana. Dias Cabral foi fundador do Instituto
Arqueológico de Alagoas, e um dos pioneiros a trazer á tona a
guerra dos Palmares. Em 1872, foi responsável pelo lançamento da
revista da instituição, tendo nela publicado inúmeros trabalhos.
Dias Cabral é patrono da cadeira 11 do IHGA e da cadeira 32 da
Academia Alagoana de Letras.

"De todos, porém, o maior foi Dias Cabral, e seu devotamento


com que se consagrou à consolidação do Instituto e pelo cabedal de
ciência que possuía e que incorporou ao patrimônio da associação.
Só faltou um cenário mais amplo para ser um sábio de renome
mundial.”

Luiz Sávio de Almeida, em Alagoas: quantas podem existir,

762
no Caderno de Debates do Conselho Estadual
de Comunicação, Cultura Alagoana, junho de 2003

Pedro Nolasco Maciel

Precursor dos romances de costumes alagoanos, Pedro


Nolasco Maciel (1861 - 1909) foi jornalista e era um intelectual
operário, gráfico, foi funcionário do Departamento dos Correios e
Telégrafos entre 1889 e 1903. Membro da Sociedade Libertadora
Alagoana, que lutava pelo fim da escravidão. Sócio do Clube
Literário José Bonifácio, do qual foi vice-presidente e, por muitos
anos, orador do Montepio dos Artistas Alagoanos. Foi fundador do
O Gutenberg, tipógrafo do Diário das Alagoas, redator dos jornais
Tribuna do Povo, Jornal de Notícias, Constelação, O Popular, O
Viçosense. Seus romances estão entre os melhores escritos em
Alagoas, como o livro Crônica Vermelha - Leitura Quente,
publicada pela primeira vez, em 1899, sem indicação da tipografia
e sem o nome de seu autor. Um retrato de Maceió pintado com as
cores ficcionais, entretanto, com personagens bem reais. É de sua
lavra também, A Filha do Barão, considerado pelo historiador
Moacir Medeiros de Sant´Ana “o primeiro romance de costumes
alagoanos, representando uma referência cronológica da História
da Literatura de Algoas”.

“No dia seguinte ao que se deram os acontecimentos a cidade


de Maceió comentava o fato de ter-se dado um escândalo no baile da
véspera entre a filha do barão de Piragé e o alferes Aníbal. Era o

763
resultado imediato das calúnias arrogadas à digna moça pela
perversa Laura. Os boatos, diz com acerto um escritor, são como
grandes rios: quanto mais longe chegam maior vulto tomam... A
surpresa causada ao senhor barão por notícias que tão perto afetava
a sua dignidade e a honra de sua filha, levou-o à casa do doutor
Benício, de onde, entretanto, saíra afagando a convicção de que
Alcina fora vítima da mais requintada calúnia. De volta aos seus
penates, o barão recebera uma carta. Abrindo-a leu o seguinte:
“Exmoº Sr. Barão de Piragé.

Tendo e muito alto valor os dotes morais e as excelentes


qualidades que exaltam a Exma. Sra. D. Alcina, tomei a deliberação
de enviar a V. Excia. a presente carta, manifestando deste modo o
desejo que alimento de receber perante ao altar a mesma Exma. Sra.
como minha legítima esposa. Peço vênia para assinar-me.
Cidade de Alagoas, setembro de 1845, Anibal de Alencastre.”

Pedro Nolasco Maciel, trecho do livro A Filha do Barão,


capítulo III, Planos Sinistros, publicação do SENEC/AL e
Departamento de Assuntos Culturais do Ministério da Educação,
1974

No tempo da Guarda Nacional

Memorial Biográfico do Comendador José Rodrigues Leite


Pitanga. A obra é do professor, deputado e senador, Francisco de
Paula Leite e Oiticica (1853-1927). Seu personagem, o

764
comendador Pitanga (1810-1909), foi fundador da Guarda
Nacional em Alagoas, e do esquadrão de Cavalaria de Dom Pedro
I, em Anadia. Em 1894, Leite Oiticica assumiu a suplência de
Floriano Peixoto, que assumiria a vice-presidência da República.
Como delegado de polícia no governo de Pedro Paulino inaugurou
o primeiro asilo para loucos.

“Se o cabra não ler, vai ficar muito difícil entender Alagoas.
Hoje seria considerado um texto de direita. Mas é imperdoável
querer, por conta desse tipo de balizamento, deixar de dizer que é
uma obra-prima. É um artigo publicado em três números na Revista
do Instituto Histórico. É fantástico! Extraordinário! O cara escreve
sabendo que está em cima de um palanque, de uma plataforma
política. Tem que ser lido sim”.
Entrevista de Sávio Almeida ao jornalista Lelo Macena, em
Gazeta de Alagoas – 27/11/2005

Nicodemos: uma chacoalhada na história

História de Anadia em princípio arqueológico, contendo a


descrição topográfica, nomes de todos os funcionários públicos,
biografia de alguns de seus representantes, anais da igreja,
genealogia das principais famílias da província que nela têm
origem, remontando-se ao quinto grau em ascendência e crônica
minuciosa de todos os acontecimentos, desde 1801 (publicado em
1881). Este é o nome do livro de Nicodemos de Souza Moreira
Jobim (1836-1913), editado em Maceió, por Amintas e Filhos,

765
1881. Nicodemos foi historiador e professor, membro do Instituto
Arqueológico de Alagoas, além de ter feito o primeiro relato que se
tem notícia sobre o folclore alagoano, em 1872, quando raros eram
os estudos sobre o tema no Brasil (no jornal O Liberal, em artigo
intitulado Lenda Anadiense e tradição história).

“Esse cara é fundamental pela chacoalhada que ele dá no


tipo de história que era feita. Ele baseia a história dele na história
oral, em coisas que só agora são valorizadas. É genial pela audácia
na forma de construir o texto com condições de informação que na
época não tinham prestígio científico”.
Entrevista de Sávio Almeida ao jornalista Lelo Macena, em
Gazeta de Alagoas – 27/11/2005

SÉCULO XX: LIVROS SEMINAIS

O Banguê nas Alagoas Traços da influência do sistema


econômico do engenho do açúcar na vida e na cultura regional

Livro seminal do sociólogo, antropólogo e escritor alagoano


Manuel Diegues Júnior (1912-1991). Com15 anos já presidia o
Grêmio Literário Guimarães Passos, no final da década de 1920,
que reunia os literatos emergentes da época: Aurélio Buarque,
Guedes de Miranda, Raul Lima, Valdemar Cavalcanti, Arnon de
Mello. Exerceu cargos públicos de relevância em sua área de
estudo, entre eles Departamento de Assuntos Culturais (DAC),

766
órgão equivalente ao Ministério da Educação, onde de 1974 a 1979
promoveu grandes avanços culturais, também no seu estado. O
livro O Banguê teve sua primeira edição lançada em 1949, e que
teve mais duas edições reeditadas pela Ufal. Manuel sofreu críticas
por ser “o maior e único discípulo de Gilberto Freyre, cuja
influência é o ponto frágil da obra”. Mas quem escreveu o prefácio
foi mesmo o sociólogo pernambucano Gilberto Freyre. “O (livro)
Banguê é tão largo que é quase como se incluísse tudo que, na
história das Alagoas, é socialmente importante. Pois da história da
gente alagoana se pode generalizar, como do passado do carioca,
que é a história de uma gente quase anfíbia. Apenas do lado das
águas já amorosamente tão estudadas por Octávio Brandão”.
Gilberto Freyre, no prefácio da edição de O Banguê das Alagoas,
Edufal – 1978. A Universidade Federal de Alagoas lançou, em
2012, a terceira edição de O Banguê pela Coleção Nordestina. A
edição foi organizada e apresentada pelo professor Elco Verçosa.

“Se o que se faz de um pensador um clássico é, sobretudo, a


perenidade das questões que ele levanta, a par das pistas que abre
para os que pretendem, depois dele, avançar no desvendamento dos
temas e objetos sobre os quais se debruçou, não há como negar a
Diégues Júnior e ao seu “Banguê das Alagoas” a denominação de
clássicos. O trabalho do mestre Diégues Júnior representa uma obra
seminal para quem quer que pretenda entender aquolo que se chama
algoanidade”.
Prefácio do professor Elcio Verçosa na 3ª edição do livro
Banguê das Alagoas, Coleção Nordestina Ufal, 2012

767
Contribuição à História do Açúcar em Alagoas

Livro clássico do historiador, professor, bacharel em


ciências jurídicas e social, Moacir Sant`Ana, originalmente
lançado em 1970, pelo Instituto do Açúcar e do Álcool, que reúne
informações detalhadas sobre a presença da cana de açúcar, com
pesquisas que vão desde o período colonial até meados do século
XX. Moacir dirigiu o Arquivo Público de Alagoas desde 1962, é
professor de Introdução ao Estudo da História, História de Alagoas
e História da Cultura Alagoana, na UFAL. É membro do Instituto
Histórico e Geográfico de Alagoas, da Academia Alagoana de
Letras. Com mais de 50 obras publicadas sobre Alagoas e várias
outras no prelo, Santana é apontado por Sávio como um autor
fundamental dentro da bibliografia sobre o Estado.

“O Moacir é uma espécie de virada em Alagoas. Ele tem


textos fundamentais sem os quais não se entende isso aqui. O segundo
capítulo do livro dele, chamado Uma Associação Centenária:
História da Associação Comercial de Maceió, tem que ser lido. Já
Contribuição à História do Açúcar em Alagoas tem coisas
importantíssimas. O Moacir é um brilhante historiador.
Entrevista de Sávio Almeida ao jornalista Lelo Macena, em
Gazeta de Alagoas – 27/11/2005

A Utopia Armada

768
Livro do historiador alagoano Dirceu Lindoso (1932) que
explica e retrata o povo alagoano em movimentos contestatórios –
até mesmo de guerra de guerrilhas na região das matas – contra os
colonizadores e escravagistas, logo após ao fim da Guerra da
Cabana, 1832. “As matas alagoanas são tomadas pelos grandes e
médios proprietários de Alagoas e Pernambuco, sua Mata Atlântica
é derrubada para ceder espaço à extensão do plantio de cana de
açúcar e colônias de estrangeiros,reduzindo o homem pobre que
outrora sobrevivera da caça, da pesca e dos frutos comestíveis, a
um errante sem perspectivas vindouras. Na visão de Dirceu
Lindoso. “A devoração das matas pelo fogo das fornalhas dos
engenhos e dos roçados grandes significou a degradação da
pobreza colonial, que surgira na época da conquista e ocupação, e
sua conversão em miséria sesmeiro-escravista”. Janaína Cardoso
de Mello, Alagoas e a escrita de si mesma e de sua gente, em
Revista Crítica da História, Centro de Pesquisa e Documentação
Histórica da UFAL- UFSE- 2015. Apud Dirceu Lindoso, em A
Utopia Armada – Rebeliões dos Pobres nas matas do Tombo Real
– Paz e Terra (RJ), 1983

Folguedos Natalinos

Famoso livro de Theotônio Vilela Brandão (1907-1981),


Théo Brandão, médico, folclorista, antropólogo e professor que
definiu as novas bases e fronteiras dos folguedos e folclore das
Alagoas, em um movimento que começou no final os anos 1940,
em defesa da pesquisa do folclore alagoano. O livro Folguedos

769
Juninos foi lançado em 1973, tem capa do artista plástico Pierre
Chalita e ilustrações de Hércules Mendes. Em 1976, a
Universidade Federal de Alagoas e o Museu Théo Brandão lançam
a Coleção Folclórica Folguedos Natalinos de Théo Brandão, em
folhetos populares, com mais de 32 fascículos. O livro fascinante e
mostra um universo de beleza e resistência. Sobre as baianas, por
exemplo, Théo comenta “além de ser um ritmo original e quente...
são as narrações de sucessos, episódios, acontecimentos que se
refletiram na mente popular, e, que, se repetidas, mantém a
tradição sempre viva e alegre”.

“O Théo foi um dos melhores do Brasil. Eu não estou dizendo


que eu concordo com ele, estou dizendo que ele é um dos melhores
que eu já li em toda a minha vida, no tipo de coisa que ele fazia. Ele
tem que ser lido. Especialmente a introdução do livro dele, Folguedos
Natalinos. Brilhante! Tem que ser incluído no rol das leituras
cruciais sobre Alagoas”.
Entrevista de Sávio Almeida ao jornalista Lelo Macena, em
Gazeta de Alagoas – 27/11/2005

Terra das Alagoas (1922)

O livro de Adalberto Marroquim, de quem não se tem


muitos dados bibliográficos, é um livro raríssimo, de grande
beleza, tanto nos textos, quase que uma enciclopédia de Alagoas,
como em seu visual. Editado originalmente pela Editori Maglioni
& Strini, em Roma, 1922, o livro tem 294 páginas com

770
encadernação do editor. Profusamente ilustrado no texto com
fotogravuras e reproduções de fotografias de paisagens, sendo
algumas desdobráveis, e no final um mapa do Estado de Alagoas a
partir de um levantamento de 1917. A obra foi impressa sobre
papel couché, mostrando as paisagens e as plantações, a
urbanização, os retratos das personalidades, os interiores dos
edifícios públicos, as vias de comunicação, as fábricas de diversas
atividades econômicas, as centrais elétricas, os mercados e os
locais turísticos, o acervo de pintura dos museus.

Ninho de Cobras: Maceió desnudada

“Em Maceió, só Deus pedoa”, esta frase do livro Ninho de


Cobras, de 1973, causou muita polêmica após o lançamento do
romance, considerado por muitos críticos como a melhor prosa do
poeta Lêdo, e a mais mordaz com relação a sua terra natal. O
romance traz Maceió por inteiro, sem subterfúgios, fala em
metáforas, desde o chefe de sindicato do crime até a vida mundana
em uma Maceió feérica, ruas movimentadas, casarões, rios e
praias. O romance se passa em um só dia, com personagens
inesquecíveis, que viviam em Maceió nos anos 40, durante o
Estado Novo de Getúlio Vargas. Veja o que Lêdo falou sobre seu
próprio romance, em instigante entrevista do autor à jornalista
Milena Andrade, em 2010.

“É um romance sobre alagoanos que não emigram, aqueles


que amam Alagoas, que acham que lá é o melho lugar do mundo. É o

771
Estado do Brasil onde há menos emigração, sabia? Digo que esse
meu livro é a história de alagoanos que amam a terra natal como as
cobras amam os ninhos de pedras, com todos os defeitos, com as
fofocas, os adultérios, os assassinatos”.
Lêdo Ivo, em entrevista a Milena Andrade, revista
Graciliano, edição no 7, novembro/dezembro de 2010.

Maceió de Outrora, vol. I

O escritor Félix Lima Júnior, no livro Maceió de Outrora


(1976), com apresentação de Théo Brandão, estuda os aspectos
pitorescos da Maceió antiga, os costumes e hábitos da capital no
começo do século passado. Os amoladores de canivetes, facas e
tesouras, os tocadores de realejo; o vendedor de papagaios; os
moleques de pés descalços que apregoavam à porta dos teatros o
afenim, dedinho, broa de goma, tapioca de eucalipto, broas de
eucalipto, de goiaba e de mel de abelha; do vendedor de leite tirado
em frente das casas dos clientes; e ainda dos pregões de Maceió.

“Num dos portões do Mercado Municipal aos domingos, o


doutor Raiz, xingando o “homem da cobra”, concorrente perigoso,
no centro de um círculo e futuros fregueses, fazia propaganda e suas
misturas maravilhosas, suas garrafadas, suas ervas e raízes infalíveis
para qualquer doença, da lepra, à dor de barriga, da “espinhela

772
caída” ao câncer. Muito compenetrado, com ares de verdadeira
sumidade “soltava o verbo”.
– Batata de purga! banha de preguiça! Gitó! Pimenta d´água!
Óleo de jibóia preta! Mangiroba! Catingueira rasteira! Mamão
jaracatiá! Raiz de juá! Remédio para mulher desconcertada!
Garrafada das sete sementes! A turma ria a bom rir enquanto dona
Apolinária, antiga zeladora da Confraria de Nossa das Vitórias, da
Catedral, fechava a cara, resmungando, e ia rogando pragas ao
doutor”.

Félix Lima Júnior, Maceió de Outrora, v. 1, apresentação de


Théo Brandão, Maceió, Arquivo Público de Alagoas/SERGASA,
1976, (memórias)

Maceió de Outrora, vol. II

Em 2001, a escritora, socióloga e jornalista Rachel Rocha,


publicou o livro Maceió de Outrora, v. II, uma obra póstuma de
Félix de Lima Júnior, com textos selecionados e apresentados pela
autora. "Reside aqui a preciosidade da obra deste escritor curioso
que tanto se aproxima da linguagem etnográfica: no detalhamento
do cotidiano, na busca pelo dado direto, de primeira mão, mas que
não descuida da investigação junto a outras fontes: jornais, por
exemplo, fotografias, folhetos publicitários de campanhas
políticas, documentos. Etnógrafo no estilo e na curiosidade.
Intuitivo na metodologia. Grandemente afeito às observações
diretas, Félix Lima Jr. manteve-se sempre atento a objetos que

773
somente na segunda metade do século XX ganharam
expressividade com a chamada nova história cultural, uma história
antropológica, atenta a uma história das mentalidades, dos odores,
da moda, dos comportamentos enfim, que informam as realidades
culturais de sujeitos inseridos num tempo e num espaço
específicos". Maceió de Outrora, v. II, obra póstuma, texto
selecionado e apresentado por Rachel Rocha, Maceió, EDUFAL,
2001.

Canais e lagoas, obra prima de Octávio Brandão

Foi a partir dos estudos dos canais e das lagoas, realizados


por Octávio Brandão, que se iniciou a conscientização de
preservar, por todos os meios possíveis, as lagoas Mundaú e
Manguaba, considerado um dos maiores complexos lagunares do
país. Estes estudos in loco, por volta de 1915 e 1916 foram
expostos na sua célebre conferência de 12 de outubro de 1917,
realizada no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGA),
em Maceió. Depois, este mesmo trabalho foi publicado no então
Jornal do Comércio do Recife.

“Tenho mergulhado na alma da nossa natureza e na do nosso


povo, mortificando-me com eles, sofrendo quando vejo a agonia dos
“tabuleiros” ou a miséria em que vive a minha raça, pesquisando-
lhes as verdades, inquirindo-lhes as belezas, sondando-lhes as

774
ansiedades com imenso carinho, o profundo amor e a vocação
suprema que sempre tive pelos estudos nacionais (...”).

E continuava, o bravo Octávio Brandão:

“(...) Para isso, não tenho olhado nem dinheiro, nem fadigas,
fazendo até hoje 33 excursões, numa das quais andei 30 e tantas
léguas a pé em três dias e meio - um saco às costas e um bordão aos
ombros, em trajes de vagabundo ou farroupilha, tomando
apontamentos sobre tudo quanto os nossos olhos viam, galgando
serranias, mergulhando no âmago dos chapadões, irrompendo pelos
matagais, afundando nos boqueirões bravios, desafiando as maretas
lagunares em fúria, dormindo ao relento com o lençol do frio e o
docel das estrelas no azul, através de mil acidentes e mil vicissitudes,
na ânsia de - bandeirante moderno - querer escrever um másculo
poema de energia sobre-humana da exaltação lírica, de sonho
impetuoso e de realismo profundo e cheio esta minha alma de uma fé
tão alta e de uma esperança tamanha que para ultrapassá-las só
encontro a fé dos Apóstolos quando, pelo mundo, partiram a espalhar
a Boa Nova e a esperança que ilumina a alma dos velhos
navegadores quinhentistas”.
Octávio Brandão, em trecho da conferência de 12 de
outubro de 1917, realizada no Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas (IHGA), Maceió

História da Civilização das Alagoas

775
Na escolha do poeta Carlos Moliterno, o livro História da
Civilização das Alagoas, de Jayme de Altavila, estaria entre as
quatro obras fundamentais para se estudar a História de Alagoas,
junto com Geografia Alagoana, ou Descrição Física, Política e
Histórica da Província das Alagoas”, de Tomaz Espíndola; História
das Alagoas, de Moreno Brandão e História das Alagoas, de
Craveiro Costa. O livro, que teve sua primeira publicação em
1933, continua a ser uma referência nos estudos sobre a história de
Alagoas. Na edição de 1962, a 4ª, acrescida, revista e atualizada,
tem anotações do historiador Moacir Medeiro de Sant´Ana. No
capítulo Alagoas Republicana, Altavila relata de forma
folhetinesca, mas com apuração histórica, confirmada por Moacir,
como se deu a transição do dois primeiros governos da República,
entre dois alagoanos, os marechais Deodoro e Floriano.

“Por dois anos (1890/1991), Deodoro presidiu


republicanamente o Brasil, tendo gestos de coragem cívica como
quando dissolveu o Congresso (sic) irrequieto e gestos de
desprendimento quando declarou aos seus partidários – “Não quero
aumentar o número de viúvas e de órfãos em meu país. Mandem
chamar o Floriano. Não sou mais presidente da República e vou
pedir a reforma (aposentadoria). E aquele gesto dera origem à
revolta de 23 de novembro de 1891, chefiada pelo intrépido almirante
Custódio José de Melo. E Floriano Peixoto, chamado ao poder no
caráter de vice-presidente, encontrando a nação explorada pelos
pedagogos (sic), teve que usar da manopla de aço e sustentar a
República... Passou a história a sua célebre resposta aos revoltosos,

776
como havia de receber a esquadra inglesa caso ela viesse até nós: “À
bala!”.
Jayme de Altavila, em História da Civilização das Alagoas,
Departamento Estadual de Cultura – Maceió, 1962, 4ª edição,
anotada por Moacir Medeiros de Sant´Ana

A diáspora literária

Ao longo do tempo, uma geração inteira de intelectuais


alagoanos notáveis deixa Alagoas, alguns não retornaram jamais,
como Graciliano Ramos depois de sua prisão, em Maceió. Rio de
Janeiro foi o destino preferencial. A recém institucionalizada nova
capital da República tinha uma intensa vida literária, e foi o destino
escolhido para muitos desses alagoanos, alguns até então já
destacados no cenário nacional. A lista é grande e representativa,
em se falando da velha guarda literária: Aurélio Buarque, Pontes
de Miranda, Diégues Júnior, Jorge de Lima, Lêdo Ivo, Arthur
Ramos, Waldemar Cavalcante, Povina Cavalcante, Arnon de
Mello, Graciliano Ramos, Mendonça Júnior, Nise da Silveira,
Costa Rêgo, Romeu de Avelar, Oliveira Litrentos, Judas
Isgorogota, Alberto Passos Guimarães, Octávio Brandão e tantos
outros. Teria alguma explicação para o fato? O cronista e jornalista
alagoano Luiz Nogueira Bastos, apresentou um apontamento
categórico sobre o assunto, na Revista da Academia Alagoana de
Letras, em 1999, número 17, nos 80 anos da instituição.

777
“Não posso determinar com exatidão os motivos dessa
permanência deles lá pelo Sul do país. Mas com certeza a grande
metrópole, o Rio de Janeiro de então, lhes oferecia maiores
incentivos, maiores motivações. Estácio de Lima foi para a Bahia. A
Maceió provinciana, com uma política cultural governamental,
acanhada, imagino, pode ter os deixado escaparem. É verdade que
muitos ficaram por aqui. Jayme de Alta vila e realizou uma grande
obra. E até deixou transcrito, num verso, o problema dos que
partiram e dos que ficaram. Intelectuais não surgem do dia para a
noite. São longos anos de preparação e muitas as circunstâncias.
Novos intelectuais surgirão, com certeza, mas terão muito mais
dificuldades”.
Luiz Nogueira em Revista da Academia Alagoana de
Letras, em 1999

ALAGOANOS IMORTAIS DA LITERATURA

Cinco alagoanos fazem parte da Academia Brasileira de


Letras (ABL), a mais importante instituição literária brasileira
fundada na cidade do Rio de Janeiro em 20 de julho de 1897, pelos
escritores Machado de Assis, Lúcio de Mendonça, Inglês de Sousa,
Olavo Bilac, Afonso Celso, Graça Aranha, Medeiros e
Albuquerque, Joaquim Nabuco, Teixeira de Melo, Visconde de
Taunay e Rui Barbosa. De sua fundação até hoje, foram cinco os
alagoanos que integram a lista dos imortais, que vestiram o fardão
da Academia: Guimarães Passos, Goulart de Andrade, Aurélio
Buarque de Holanda, Pontes de Miranda e Lêdo Ivo.

778
Guimarães Passos

O poeta louco que conquistou a glória

Sebastião Cícero dos Guimarães Passos (1867-1909), poeta


e jornalista, fundador da Academia Brasileira de Letras (ABL),
nasceu no bairro de Jaraguá, Maceió, na atual Rua Sá de
Albuquerque, e era irrequieto por natureza. Viveu na capital
alagoana até aos 19 anos. Em 1886, depois de passar por todos os
colégios, entre eles o Liceu Alagoano, aos 19 anos parte para o Rio
de Janeiro, clandestino em um navio, junto com um tio deputado.
Entre as razões de ter deixado Maceió estavam as brigas com o pai,
Tito Passos, “em conseqüência de seu espírito vadio e rebelde”.

“Sem ligar importância a coisa alguma deste mundo,


absolutamente diferente a tudo, Sebastião passou por todos os
colégios de Maceió, inclusive o Liceu Alagoano, como um dos mais
talentosos e também o mais vadio dos alunos, fazendo rir mestres e
condiscípulos com suas diabruras”.

Raimundo Menezes, em Guimarães Passos e sua época


boêmia, Martins São Paulo, 1952

A roda boêmia da Rua do Ouvidor


Ao chegar ao Rio de Janeiro, com seu espírito aberto, sua
inquietude de nordestino, sua verve de poeta de jeito extravagante,

779
conquistou a roda boêmia da Rua do Ouvidor. Eram poetas,
jornalistas e panfletários, que constituíram a geração de 1886. Lá
estavam Raul Pompéia, Artur Azevedo, Coelho Neto, e aquele que
viria a ser seu amigo irmão: Olavo Bilac, o “príncipe dos poetas
brasileiros”. Guimarães Passos ganhou fama como o poeta da
inspiração fácil, escrevia seus poemas “em um jato de impulso de
sua assombrosa vitalidade (Ranulfo Goulart)”.

“Sua extraordinária beleza física, sua personalidade


turbulenta e chistosa, bem como a inadequação à realidade, levaram-
no a todas as extravagâncias, inclusive a de tomar parte nas lutas
contra o Marechal Floriano Peixoto, quando era “florianista
exaltado” (alagoano como ele). Desses fatos, aliados ao momento
que viveu, transformou o poeta, no próprio mito parnasiano, cheio de
esplendor e romantismo, mas nem sempre profundo”.
Heliônia Ceres, em Guimarães Passos, Série Difusão de
Alagoanos Ilustres, Universidade Federal de Alagoas, 1977

Campeão de popularidade nas ruas do rio


Bastante conhecido no meio intelectual, Guima, como os
amigos o chamavam, se consagrou um campeão de popularidade,
conquistou o Rio de Janeiro com a canção Casa Branca da Serra,
publicada na revista A Bruxa, em 26 de junho de 1896, ganhou as
ruas e era cantada por toda a parte. Depois ele veio emplacar mais
um sucesso musical, com sua poesia: O Lenço. Era o auge de sua
popularidade.

780
“Certo ano um dos carros alegóricos do préstito carnavalesco
inspira-se n´O Lenço soneto famoso de Guimarães Passos,
reproduzindo-o ao vivo com quatro beija-flores no alto, carregando o
lenço, entre serpentinas e nuvens de conffeti e fogos coloridos”.
Raimundo Menezes, em Guimarães Passos e sua época
boêmia, Martins São Paulo, 1952

Esse seu lenço que possuo e aperto


De encontro ao peito enquanto durmo, creio
Que hei de um dia mandar-te, pois roubei-o
E foi meu crime, em breve descoberto.

Luto, contudo, a procurar quem certo


Possa nisso servir-me de correio;
Tu nem calculas qual o meu receio,
Se em caminho fosse o lenço aberto
Porém, oh minha vivida quimera!
Fita as bandas que habito, fita e espera

Que enfim, verás, em trêmulos adejos


Em cada ponta um beija-flor regando
Ir o teu lenço pelo espaço voando
Pando, enfunado, côncavo de beijos.

Guimarães Passos, em Versos de um simples,


Casa Laemmert RJ 1891

781
O fardão, a tuberculose, o jornalismo e o fim
Em 1990, quatro anos depois de sua posse na academia, a
tuberculose instalou-se definitivamente no corpo do poeta. Sem
ligar para recomendações médicas, nem temporadas em estações
de água termais, Guimarães Passos segue sua vida de boemia e
vive de escrever artigos para os jornais da época como O Malho, O
Mequetrefe, O País – pasquins de muito sucesso na época. Os
amigos o convencem de se tratar na ilha da Madeira, e ainda deram
500 mil reis para as despesas. Depois de passar um tempo na ilha,
“sem melhoras e cheio de enfado e saudades aproveitou os últimos
dinheiros e partiu para a França”. Em um relato dramático,
transcrito pelo seu biógrafo Raimundo Menezes, é possível sentir
como foi a morte estúpida do poeta.

“Chegou a Paris, certa noite, na estação do Norte, só,


ardendo em febre e sem dinheiro. Exausto da viagem e sem ter para
onde ir, sentou-se num carrinho de mala da grande gare, chia de
barulho. A sorte teve ainda um sorriso, quando um patrício, Dr.
Magalhães Castro, que ia buscar um amigo, reconheceu o autor de O
Lenço e foi hospitalizado, “onde enfunado, côncavo de beijos viveu
sua derradeira meia dúzia de dias”.

Raimundo Menezes, em Guimarães Passos e sua época


boêmia, Martins São Paulo, 1952.

Guimarães Passou foi enterrado em Paris, no cemitério do


Père Lachaise e lá permaneceu durante onze anos, quando seus

782
restos mortais foram transferidos para o Brasil, uma iniciativa da
Academia Brasileira de Letras, em 28 de dezembro de 1950

Goulart de Andrade

Da Escola Naval para a boemia e às letras

José Maria Goulart de Andrade (1881-1936), engenheiro,


geógrafo, jornalista, poeta, cronista, romancista e teatrólogo,
nasceu no bairro de Jaraguá, em Maceió. Eleito para a Academia
Brasileira de Letras, em 1916, na cadeira de Casimiro de Abreu.
Fez os estudos primários e secundários em Maceió. Aos 16 anos,
foi para o Rio de Janeiro e ingressou no curso preparatório para a
Escola Naval, mas pretendia, na verdade, fazer-se homem de
letras. Sua inclinação poética fez Goulart de Andrade deixar a
Escola Naval para matricular-se na Escola Politécnica. Ali obteve
o título de engenheiro em 1906. Mas logo cedo, vinculou-se ao
grupo de poetas boêmios, entre os quais Guimarães Passos (seu
conterrâneo), Olavo Bilac, Emílio de Menezes, Martins Fontes.
Como poeta, esmerou-se na especialidade das poesias difíceis, de
forma fixa o vilancete, o rondel, a balada e sobretudo o canto, real,
uma das mais complexas formas poéticas. Tornou-se também
jornalista, sendo um dos redatores de O Imparcial nos primeiros
tempos, onde teve o convívio de João Ribeiro (João do Rio),
Humberto de Campos e Augusto de Lima.

Forte Abandonado

783
De pé, no promontório, encravado na bronca
Penedia, onde o mar atropelado ronca,
Ribomba, estoura, estruge, espoca, estronda, esbarra,
Abandonado avulta o vigia da barra!
Ó naus, podeis entrar! Podeis vir, exilados,
Peixes, que íeis buscar abrigo em outros lados,
Quando o bruto estridor dos canhões sacudia
O fraguedo; e a fumaça o almo esplendor do dia
No firmamento azul, empanava de chofre,
Saturando todo o ar de salitre e de enxofre!

Pássaros, volitai! Nada aqui vos aterra:


As máquinas de morte estendem-se por terra,
Frias, mudas, sem mais aquele brilho antigo
Que era para a pupila um ríspido castigo!
No muro, em cada frincha, a grama brota inculta,
Cobre as trincheiras, enche as guaritas, oculta...
... E toques de clarins não enchem os espaços
Agora! E que contraste estes ruídos, maninhos,
Mortíferos canhões guardam ninhos e ninhos,
Paz e Amor!... Pode a abelha as melífluas colméias
Fabricar sem temor, ao longo das ameias!
Pode aqui vicejar a tímida violeta!
Pode adejar a iriante e inquieta borboleta!

Sempre azul seja o céu! A liana filiforme

784
Medre e floresça! A brisa em fruto a flor transforme!
Venha o rijo Aquilão soprar a pulmão pleno!
Venha a Lua banhar de luz o terra-pleno
Venha aqui dentro o Sol e esta terra fecunde!
Venha o musgo crescendo e a muralha circunde!
Venha gemer o mar, que espumarento, esbarra
No rochedo em que dorme o vigia da barra!

Goulart de Andrade, em Poesias, H. Garnier RJ, 1907

Aurélio Buarque de Holanda

Amor às palavras e a língua pátria nasceu cedo

Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1910—1989) foi um


crítico literário, lexicógrafo, filólogo, professor, tradutor e ensaísta
brasileiro. Passou sua infância em Porto de Pedras (nasceu em
Passo de Camaragibe). Em 1923, mudou-se para Maceió, Alagoas,
onde, aos 14 anos de idade, começou a dar aulas particulares de
português. Aos 15, ingressou efetivamente no magistério: foi
convidado pelo Ginásio Primeiro de Março a lecionar em seu curso
primário. Já naquela época passou a se interessar por língua e
literatura portuguesas. Formou-se em direito pela Faculdade de

785
Direito do Recife em 1936. Nesse mesmo ano, tornou-se professor
de Língua Portuguesa e Francesa e de Literatura no Colégio
Estadual de Alagoas. Em seu discurso de posse na Academia
Brasileira de Letras, em 19 de dezembro de 1961, Aurélio revela
sua infância em Alagoas, sua paixão pelo mar, pelas palavras e
pelo Nordeste, sobre a terra de seu antecessor, de quem ocuparia a
cadeira, Austregésilo de Athayde (1898-1993), professor,
jornalista, cronista, ensaísta e orador. Leia trechos do discursos na
ABL.

O mar

Contudo, mais viva que a presença de águas fluviais trago


presa à memória a presença do mar: nascido à beira-rio, em Passo
de Camaragibe, vivi na beira-mar de Porto de Pedras, terra de meu
Pai, dos oito meses aos dez anos. A mim, o mar (“Oceano terrível,
mar imenso”, amedrontava-me Gonçalves Dias, nas páginas do
Quarto Livro de Leitura, de Felisberto de Carvalho), o mar me
sugeria menos as terras longínquas, alongadas, os “outros mundos,
do que o outro mundo” – céu. O céu era fronteira do oceano, por
mais que, porta-voz dos geógrafos, me asseverasse o contrário a
minha professora. Mais certa, para mim, a geografia de um colega de
classe. – “Pelo mar a gente vai ao céu, rapaz!” – assegurava ele. E
contava do menino que um dia saíra a pescar, “e a jangada foi-se
afastando, foi-se afastando da terra, que quando ele deu fé estava
junto-junto do céu. Ai o pequeno fez um rombo no céu com a vara de

786
pesca, mas não houve nada, não, graças a Deus, que São Pedro,
habilidoso que só ele, remendou tudo bem remendado, com sabão”.

As assombrações

E dentro do coração do menino o mistério ganhava corpo e


asas. Corpo e asas dilatavam-se com as histórias de Trancoso,
contadas por meu Pai e amigos meus, à noite (porque: “quem conta
história de dia cria rabo de cotia”...), na calçada de casa, quando se
calava a luz dos lampiões espaçados e capiongos, e o luar tomava
conta de tudo, furtando o sono e prodigalizando sonhos que
prescindiam de olhos fechados. Avultava, à brancura lunar, um
mundo arrepiantemente escuro de mal-assombrados. Eram proezas
da Caipora, do Lobisomem, do Fogo-Corredor, do João-Galafoice: e
era o medo a nos arregalar os olhos e apertar-nos os corações. O
mistério crescia e, com ele, o desejo precoce de o decifrar. Ora, as
operações mentais, por mais silenciosas, têm por substância a
palavra: com palavras pensamos, e em palavras.

As palavras

A palavra, pois, não é tão só o veículo do pensamento, senão


também a própria matéria dele. Desse prazer de interrogar o mistério
e da ânsia de esclarecê-lo me há de ter vindo o interesse por um novo
mundo – o mundo vocabular. Entrei a amar as palavras, ferramenta
do ofício das idéias e porventura chave de enigmas. Daí viria a
desabotoar, com o volver dos anos, o aprendiz de lexicografia, o

787
interessado pelo exame dos textos, pela exegese poética, o estudante e
curioso da língua. Assim, Senhores Acadêmicos, antes de agradecer-
vos a generosidade que aqui me trouxe, viajo ao arrepio do tempo,
para revocar à tona dos dias de hoje, por contraste com a iluminação
factícia desta sala, a luz natural de tantas noites de minha infância, e,
mais contrastantemente, o escuro de tantas outras noites, tão gratas
ao João-Galafoice, à Caipora, ao Lobisomem, e a companheiros de
seu fabuloso universo.

As estrepulias de Austragésilo

Daí por diante, são bem claras as reminiscências de


Austragésilo: banhos no Beberibe, presepes e pastoris, festas
passadas em Olinda, na bela praia “povoada de coqueirais, tufada de
cajueiros pejados de frutos, a admirar os menestréis pechisbeques, os
cantores melosos ou estrídulos nas dolências primitivas das modinhas
ao violão”. E mais: procissões e novenas, e meses marianos, e festas
de São João e de São Pedro, quando o enlouqueciam “as rodinhas, os
buscapés, os estrídulos e gementes foguetes de rabo, as fogueiras, as
cantilenas do tempo, semi-selvagens e semi-religiosas”. E banhos de
mar – “banhos salgados”– e “pequenos passeios em jangadas,
bordejantes na praia”, que ao mar alto ninguém se aventurava. Nas
noites de luar, “apagavam-se os lampiões, e com a tremulina
luminosa de prata abundantíssima que se derramava pelo ambiente,
fazíamos as serenatas”, “e cantávamos as modinhas plangentes,
arrancadas às almas sofredoras dos menestréis da moda”.

788
Rio de Janeiro, a pasárgada dos literatos alagoanos
A partir de 1938, Aurélio passa a morar e trabalhar no Rio
de Janeiro, o local preferido dos literatos alagoanos. Aurélio
publicou artigos, contos e crônicas na imprensa carioca. Em 1941,
deu início a seu trabalho de lexicógrafo, colaborando com o
Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa. Em 1942, lançou o
livro de contos Dois Mundos, que foi premiado dois anos depois
pela Academia Brasileira de Letras. Em 1945, casou-se com
Marina Baird. A partir de 1950, começou a escrever para a revista
Seleções do Reader’s Digest, na seção Enriqueça o Seu
Vocabulário. A preocupação com a língua portuguesa e o amor
pelas palavras levou-o a estudar e pesquisar o idioma durante
muitos anos com o objetivo de lançar seu próprio dicionário.
Finalmente, em 1975, foi publicado o Novo Dicionário da Língua
Portuguesa, conhecido como Dicionário Aurélio ou somente
“Aurelião” ou “Aurélio”. Em 1977, publicou o Minidicionário da
Língua Portuguesa, que também é chamado de “Miniaurélio”. Em
1989, lançou o Dicionário Aurélio Infantil da Língua Portuguesa,
com ilustrações do Ziraldo.

Aurélio Buarque de Holanda: a derradeira entrevista


Olhos azuis cintilantes bem abertos e perdidos em algum
ponto do espaço, cabelos brancos encrespados, a voz grave e
pausada, gestos lentos, porém expressivos, e a mão trêmula, em
consequência do Mal de Parkinson. Era dezembro de 1988. Assim
estava o alagoano de Passo de Camaragibe, dicionarista, filólogo,
tradutor, contista, crítico literário, professor e imortal da Academia

789
Brasileira de Letras (ABI), aos 78 anos, na casa de amigos,
enquanto curtia o que viriam a ser suas últimas férias na terra natal
e sua derradeira entrevista. Poucos tempo depois, mestre Aurélio
foi acometido de uma forte crise de pneumonia e teve que voltar às
pressas para o Rio de Janeiro. Aurélio Buarque se recuperava
lentamente na Clínica Bambina. Mas em 29 de fevereiro de 1989 o
mestre não resistiu e faleceu.

“A concepção de um dicionário exige calma e muita


pachorra (do Aurélio: vagar, lentidão). É como uma paixão, uma
cachaça da boa. Uma obra interminável que nunca sai perfeita
como a gente quer. Sou o maior leitor de meu próprio dicionário,”
revelava Aurélio Buarque sentado em uma confortável poltrona,
reclamando do "bombardeio" de flashs da câmara do repórter
fotográfico.

Mestre Aurélio e sua turma nos cabarés de Jaraguá


Um dos pontos altos da entrevista, e de valor histórico, foi
sua descrição da época em que conviveu com grandes intelectuais
como os também alagoanos Graciliano Ramos, Jorge de Lima,
Théo Brandão e José Lins do Rego - um paraibano que adotou
Maceió - e mais a cearense Raquel de Queiroz, que passava uns
tempos em Maceió. Aurélio lembrou dos encontros nos cabarés de
Jaraguá e do Café do Cupertino, no Centro, onde se reunia o seleto
grupo de intelectuais para conversas literárias, políticas e sobre a
vida mundana da capital. Aurélio descreveu uma das atrações da

790
época, o então emergente escritor Graciliano Ramos. “E chegava
aquele homem mal vestido, com paletó de linho amarfanhado, feito
por algum alfaiate de Palmeira dos Índios. Figura predominante e
malcriada. Gostava de dizer aforismos e palavrões. Acendia um
cigarro atrás do outro.” E ele continuava a falar sobre essa época,
com um certo sorriso nos lábios, sempre assistido de perto pela sua
mulher Marina Baird Ferreira.

“Nunca fui totalmente envolvido por esse grupo de eternos


boêmios, mas de vez em quando me aventurava pelos casarões
iluminados de Jaraguá, onde ficavam os melhores cabarés. Divertia-
me muito "caçando" mulher na zona com amigos, mas nunca fui da
pá virada”.

Pontes de Miranda

O grande mestre dos estudos jurídicos

Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda (1892 — 1979) foi


um jurista, filósofo, matemático e escritor brasileiro. Autor de
livros nos campos da Matemática e das Ciências Sociais como
Sociologia, Psicologia, Política, Poesia, Filosofia e, sobretudo
Direito, tem obras publicadas em português, alemão, francês,
espanhol e italiano. Aos dezenove anos formou-se bacharel em

791
Direito e Ciências Sociais (1911) pela Faculdade de Direito do
Recife, mesmo ano em que escreveu seu Ensaio de Psicologia
Jurídica, o qual foi alvo de elogios de Ruy Barbosa. Foi professor
honoris causa da Universidade de São Paulo, Universidade do
Brasil, Universidade do Recife, Universidade Federal de Alagoas,
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e
Universidade Federal de Santa Maria (RS). Em sua produção
bibliográfica, 144 volumes dos quais 128 estudos jurídicos,
destaca-se seu Tratado de Direito Privado, obra com 60 volumes e
mais de 30 mil páginas, concluído em 1970. Por duas vezes foi
premiado na década de 1920 pela Academia Brasileira de Letras,
da qual tornou-se imortal em 1979. Pontes de Miranda tinha 87
anos, quando se candidatou à ABL, pela terceira vez, e foi eleito.
Pontes de Miranda foi mais um alagoano a escolher o Rio de
Janeiro, então capital da República, para viver. Chegou em 1912 e
teve o privilégio de conhecer e conviver com José Veríssimo, Rui
Barbosa, Clóvis Beviláqua, Coelho Neto, Lafayette Rodrigues
Pereira, Oswaldo Cruz, Artur Orlando, Carlos de Laet, Oliveira
Lima e, no Itamarati, o Barão do Rio Branco. Seu primeiro livro, À
Margem do Direito, foi escrito em Pernambuco, aos 17 anos e, ao
chegar ao Rio de Janeiro, a Editora Francisco Alves já o tinha
publicado em Paris.

Lêdo Ivo

“Poesia é uma magia da linguagem”

792
Lêdo Ivo (Maceió, 18 de fevereiro de 1924 — Sevilha, 23
de dezembro de 2012) foi um jornalista, poeta, romancista,
contista, cronista e ensaísta brasileiro. Seu primeiro livro foi As
Imaginações. Fez jornalismo e tradução. Da sua vasta obra,
destacam-se títulos como Ninho de Cobras,A Noite Misteriosa, As
Alianças, Ode ao Crepúsculo, A Ética da Aventura ou Confissões
de um Poeta. Era membro da Academia Brasileira de Letras, eleito
em 13 de novembro de 1986 para a cadeira 10, sucedendo a
Orígenes Lessa. No discurso de posse Lêdo Ivo falou de seu ofício:
fazer poesia.

“Poesia é uma magia da linguagem: uma magia criada pelos


homens. E, na mesa do mundo, essa infindável celebração do
universo, testemunhando uma vocação e um magistério, haverá de ter
sempre uma serventia, quer assegurando a continuidade do idioma
nativo através dos tempos, quer renovando as imagens da existência e
do homem como prova maior de nossas vidas. Graças a essa
linguagem, aqui estou. Certamente fui trazido pelos navios de minha
infância e pelos ventos do mar que, atravessando lagunas e
coqueirais, ilhas e estaleiros apodrecidos, alcança esse irmão
separado de nós que se confunde com os caranguejos semiocultos na
terra mole e escura dos mangues e maceiós – essa terra congeminada
à água que é a minha raiz e o meu berço, a minha Pátria e a minha
Linguagem, e até mesmo o meu pesadelo”.

Lêdo Ivo, em seu discurso de posse na ABL, em abril de


1987

793
Infância deixa marcas profundas no poeta
Filho de Floriano Ivo, maçom, e Eurídice, dona de casa
católica, Lêdo Ivo conviveu com 11 irmãos, na região do Centro e
Farol. Estudava no Dom Pedro II, reduto dos estudantes do bairro,
“um colégio exemplar”. Em frente, a grande praça Marechal
Deodoro, o playground da meninada da época. Desta fase o poeta
lembra os passeios, em um Ford bigode que o pai alugava para os
primeiros passeios reveladores, que impressionaram o poeta em
sua infância. Como o dia em que em um passeio de barco pela
lagoa Mundaú conheceu a Ilha de Santa Rita.

“Naquela viagem de barco, vi os apanhadores de sururu


mergulhados até a cintura na lama negra e nutris, arrancando os
molhos também negros e peganhentos. Debrucei-me para olhar os
pescadores na canoa cheia de tainhas , carapebas, camorins, gordos
bagres do Pilar, aratus que traziam para o sol o negror de suas tocas.
Meu pai me apontou a Ilha de Santa Rita, . Era a primeira ilha que eu
contemplava em minha vida. Mas que a breve palavra insulada em
sua própria magia, ela emergia a meu encontro como uma paisagem
completa, com os coqueirais domados pelo vento, e as mangueiras e
jaqueiras gordas como goiamuns monstruosos.”

Jornalismo e efervescência poética


Com 16 anos, Lêdo Ivo troca o cenário idílico das docas,
dos peixes, dos morcegos, dos mares e lagoas, por Recife, terra
natal de seu pai e centro nervoso da literatura nordestina. Dois anos

794
depois, em 1942, ele volta para Maceió e começa a trabalhar como
repórter no Jornal de Alagoas e Gazeta de Alagoas. Em 1943
transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde termina a faculdade e
trabalha em jornais cariocas, como O Amanhã, dos Diários
Associados, revista Manchete e Diário de Notícias. No Rio
também veio a conhecer sua paixão por toda a vida Lêda. Escreveu
seu primeiro livro de poemas As Imaginações, aos 20 anos. No ano
seguinte, publicou Ode e Elegia, que ganhou o prêmio Olavo
Bilac, da Academia Brasileira de Letras. De lá para cá não parou,
escreveu 27 livros de poesia – um com sua obra completa (Poesia
Completa 1940-2004, Topbooks RJ) – uma autobiografia, cinco
romances, três livros infanto-juvenis. Se tornando, o mais
produtivo e efervescente poeta do Brasil, até sua morte.

O Desastre
A Aurélio Buarque de Hollanda

Havia chuva e outono


e nos multiplicávamos.
Orquídeas no aeroporto
sempre nos sabotavam.
E fantástica e de branco
vinhas e me abraçavas.

Pássaro, sono, túmulo,


os inimigos mortos
Sempre de assalto.

795
Depois era a praia longa.
Na tarde fria estávamos afundados

E marchávamos
como soldados.

Na tarde fria nos suicidávamos.


Mesmo entregues à fria morte
Com que furor guerreávamos!

Voltei no entanto à praia onde tomavas


banho de mar e talvez sonhavas.

Ó miss, ó garde-party, ó desastre!

Lêdo Ivo, em As Imaginações (1940-1943), Poesia


Completa (1940-2004), Topobooks, RJ, 2004

“O único antropófago sou eu”


Aonde quer que estivesse, o poeta Lêdo Ivo sempre gostava
de frisar sobre sua ancestralidade indígena – sua mãe Eurídice
tinha sangue de índio caeté. Como cofundador da Geração de 45
do Romance Nordestino, Lêdo foi uma das vozes contra o
movimento Modernista de 1922, e um dos intelectuais que mais
reagiram às ousadias do ideário modernista “cunhado pelos moços
de São Paulo”. E o poeta alagoano, até sua morte, permaneceu com

796
seu estilo sagaz, bem humorado, mas certeiro com quem não lhe
agrada tanto.

“No meu caso pessoal, o lugar de nascimento, o berço, a


origem tem muita importância. De modo que minha poesia e minha
prosa refletem muito esse universo da infância e da adolescência e
até da ancestralidade, que eu evoco à circunstância de a família de
minha mãe ter ancestralidade dos índios caetés. Eu até brinco muito
com os antropófagos paulistas dizendo que eles não comeram
ninguém. O único antropófago da literatura brasileira sou eu, e não o
bestalhão do Oswald de Andrade. Eles roubaram a antropofagia
alagoana”.

Por Milena Andrade, em entrevista com Lêdo Ivo,


na Revista Graciliano, nº7, dezembro de 2010

Acervo sob a guarda do Itaú


Em 2006, aos 82 anos de idade e 60 de vida literária, Lêdo
Ivo doou seu espólio ao Instituto Moreira Salles (IMS), dos
controladores do banco Itaú, que adquiriu 2.300 itens do autor de
Calabar, entre documentos pessoais, livros, manuscritos, cerca de
300 fotografias e mais de 600 correspondências suas com os ícones
da literatura nacional, como Érico Veríssimo, Manuel Bandeira,

797
Jorge Amado e João Cabral de Melo Neto. A coleção de Lêdo Ivo
se junta ao acervo do IMS, que já guarda as obras Clarice
Lispector, Orto Lara Resende, Ana Cristina César e Rachel de
Queiroz. O público pode ter acesso pelo site www.ims.com.br. O
jornalista alagoano Fernando Coelho entrevistou Lêdo Ivo, que
falou sobre o fato.

“Já estava na hora de arrumar a casa. Do meu grande acervo


nada estava organizado. Nunca me preocupei em organizar. Tudo
estava nos caixotes de papelão. Tem coisas escritas em Alagoas e até
um manuscrito do romance A Morte do Brasil (publicado em 1984).

Em Gazeta de Alagoas, edição de 22 de julho de 2006, Poe


Fernando Coelho

“Queimem tudo o que poder”


Ainda bem que a grande obra do poeta alagoano já se
encontra em livros, arquivos, acervos e na letra dos estudiosos, que
asseguram a imortalidade do artista. De dependesse dele, não
existiria qualquer forma fragmentada de sua obra ou
reminiscências incompletas. Tudo deveria ser queimado, disse o
poeta iconoclasta: “Quando eu publico um livro, eu queimo os
originais para não deixar rastros. Eu gosto de ver a obra acabada”,
disse Lêdo ao jornalista Fernando Coelho, em Gazeta de Alagoas
(22 de julho de 2006). No livro Curral de Peixes, com poesias
escritas entre 1991 e 1992, o iconoclasta Lêdo Ivo rasga o verso

798
para falar sobre “poemas inacabados”, na intensa poesia A
Queimada.

A Queimada
Lêdo Ivo

Queime tudo o que puder:


as cartas de amor
as contas telefônicas
o rol de roupas sujas
as escrituras e certidões
as inconfidências dos confrades ressentidos
a confissão interrompida
o poema erótico que ratifica a impotência
e anuncia a arteriosclerose

os recortes antigos e as fotografias amareladas.


Não deixe aos herdeiros esfaimados
nenhuma herança de papel.

Seja como os lobos: more num covil


e só mostre à canalha das ruas os seus dentes afiados.
Viva e morra fechado como um caracol.
Diga sempre não à escória eletrônica.

Destrua os poemas inacabados,os rascunhos,


as variantes e os fragmentos

799
que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.
Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.
Não confie a ninguém o seu segredo.
A verdade não pode ser dita.

Academia Alagoana de Letras

A criação da Academia Alagoana de Letras foi idéia do


historiador Moreno Brandão, nos idos de 1910, com o objetivo de
formar uma instituição que desse incentivo e apoiasse os
intelectuais da época. Sua organização e realização foram
discutidas, com muitas discordâncias, entre os futuros membros da
entidade, inclusive pelo escritor Graciliano Ramos. Somente em
1919, pelo incentivo do escritor e poeta Jaime de Altavila,
retomaram-se os preparativos, culminando em 1º de novembro
com a oficialização da sua fundação, em ata lavrada no antigo
Salão Nobre do Teatro Deodoro, tendo como primeiro presidente o
alagoano Moreira e Silva. Há quatro categorias de sócios: efetivos,
em número de 40, dos quais por exigência estatutária, 25 residem
em Maceió; beneméritos, honorários e correspondentes.

Patronos (40)

Adriano Jorge
Pedro Paulino da Fonseca
Ambrósio Lira

800
Torquato Cabral
José Alexandre Passos
Ciridião Durval
Cônego Domingos Fulgino
Fausto de Barros
Tavares Bastos
Moreira e Silva
Tomaz Espíndola
José Duarte
Alves de Amorim
Joaquim Cavalcante

Sabino Romariz
Guimarães Passos
Correia de Oliveira
M. J. Fernandes de Barros
Cônego João Machado de Melo
Augusto de Oliveira

João Severiano da Fonseca


Rosalvo Ribeiro
Visconde de Sinimbu
Alves de Farias
Sebastião de Abreu
Melo Moraes
Oliveira e Silva
Franco Jatobá

801
Aristeu de Andrade
Inácio de Barros Acioli
Ladislau Neto
Dias Cabral
Olímpio Galvão
Barão de Penedo
Roberto Calheiros
Inácio dos Passos
Mesquita das Neves
Messias de Gusmão
Afonso de Mendonça

Sócios Fundadores/ Primeiros ocupantes

Manoel Moreira e Silva


Artur Acioli
Virgílio Guedes
Agripino Éther
Manoel Rodrigues de Melo
Barreto Cardoso
Jorge de Lima
Povina Cavalcanti
Teótimo Ribeiro
Mário dos Wanderley
Tito de Barros
Teodoro Palmeira

802
Ranulfo Goulart
Guedes de Miranda
Lima Júnior
Jayme de Altavila
Cipriano Jucá
Luiz Acioli
Fernando Mendes de Oliveira Mendonça
Hermann Byron de Araújo Soares
Carlos Garrido
Fernandes Lima
Orlando Araújo
Gilberto de Andrade

José Avelino da Silva


Moreno Brandão
Jaime de Altavila
Paulino Rodrigues Santiago
Luiz Joaquim da Costa Leite
Leonino Correia
Padre Júlio de Albuquerque

Cônego João Machado de Melo


Demócrito Gracindo
Aurino Maciel
Diegues Júnior
Joaquim Diegues
Carlos de Gusmão

803
Júlio Auto Cruz Oliveira
Américo Melo
Luís Lavenère
Leite e Oiticica
Otávio Gomes

Segundos ocupantes

Costa Rego
José Maria de Melo
Paulo de Castro Silveira
José Francisco da Costa Filho
Abelardo Duarte
Luís de Medeiros Neto
Guiomar Alcides de Castro
Mendonça Júnior
Cléa Marsígilia
Ricardo Ramos
Ferreira Pinto
Raul Lima
José Sílvio Barreto de Macedo
Armando Wücherer
Fernando Iório
Arnon de Melo
Divaldo Suruagy
Oiticica Filho
Teotônio Vilela

804
Ezequias da Rocha
Alves Mata
Manuel Diegues Júnior
Paulo de Albuquerque
Reinaldo Gama
Silvestre Péricles de Goés Monteiro
Eunice Lavenére
Pedro Teixeira Cavalcante
Aurélio Buarque de Holanda
Théo Brandão
Antônio Santos
Cyridião Durval e Silva
Romeu de Avelar
Humberto Cavalcante
Félix Lima Júnior
Luiz Gonzaga Leão
José Pimentel Amorim
José Aloísio Vilela
Carlos Pontes
Augusto Galvão
José da. Silveira Camerino

Terceiros ocupantes

Carlos Moliterno
Humberto Vilela
Teófanes Barros

805
Tobias Medeiros
Arriete Vilela Costa
Margarida de Mesquita
Freitas Cavalcanti
Aloísio Américo Galvão
Lobão Filho
Heliônia Ceres
Marcos Bernardes de Melo
Osman Loureiro
Douglas Apratto
Manoel Wanderley de Gusmão
Ledo Ivo
Ib Gatto Falcão
Ilza do Espírito Santo Porto
Luiz Gutenberg
Francisco Valois
Oliveiros Litrento
Anilda Leão Moliterno
Solange Lages Chalita
Moacir de Medeiros Sant’Ana
José Maria Tenório da Rocha
Aristeu Bulhões
Waldemar Cavalcanti
Ernani Méro
Paulo Malta Ferraz
João Ferreira de Azevedo
João Arnoldo Paranhos Jambo

806
Adalberon Cavalcanti Lins
Gilberto de Macedo

Quartos ocupantes

Dirceu Accioly Lindoso


Aloísio Costa Melo
Antonio Sapucaia
Diogenes Tenório de Albuquerque Júnior
Mário Marroquim
Luiz Nogueira Barros
Rui Medeiros
Aldo Rubens Flores
Luiz Renato de Paiva Lima
Edson Mário de Alcântara
Maria Teomirtes Barros Malta
Jaime Lustosa de Altavila
Enaura Quixabeira Rosa e Silva
Ivan Bezerra de Barros.

Quintos ocupantes

Carlos Barros Méro


João Leite Neto
Sylvio Von Söhsten Gama

807
Humberto Gomes de Barros
José Uberival Alencar Guimarães
Milton Hênio Neto de Gouveia
Ricardo Nogueira Bezerra
Fernando Collor de Melo
Carlito Lima

ESCRITORES ALAGOANOS/ PERFIS

Abelardo Duarte (1900-1992)

808
Professor, jornalista, médico. Foi autor do notável livro
Dom Pedro II e Dona Tereza Cristina nas Alagoas, em que relata a
viagem imperial a Penedo, e outra cidades do Baixo São Francisco,
até a Cachoeira de Paulo Afonso, Maceió e a zona lacustre.
Estudou no Lyceu Alagoano, e teve Arthur Ramos como professor.
Fez Medicina na Bahia, na mesma turma de Nise da Silveira, se
formando em 1926. Quando estudante fundou, em 1923,
juntamente com Artur Ramos, Mário Magalhães da Silveira, João
Lessa Azevedo, Eduardo Santa Rita, entre outros, a Revista
Acadêmica, dedicada à ciência e à literatura, tendo sido publicada
até 1926. Membro da AAL, tendo ocupado a cadeira 5, e membro
da Academia Carioca de Letras.

Adalberon Cavalcanti Lins (1907-1990)

Jornalista, advogado, secretário de estado, deputado


estadual. Nasceu em Palmeira dos Índios, onde estudou com
Graciliano Ramos. Exímio romancista, Adalberon escreveu uma
ficção sobre a vida de Zumbi, O Tigre dos Palmares (1978),
seguido de outro lançamentos de sucesso de público e crítica,
como Coquetelismo no Sertão, Maceió, Casa Ramalho, 1956;
Curral Novo, Rio de Janeiro, Livraria São José, 1958; Sidrônio,
Rio de Janeiro, Ed. Leitura, 1963; Caminhos Incertos, Maceió,
SERGASA, 1976, capa do autor e O Tigre dos Palmares, Maceió,
SERGASA, 1978, prêmio Jayme de Altavilla na categoria
romance. Colaborou em periódicos, especialmente em Maceió,
destacando-se o seu trabalho Homenagem a Graciliano Ramos,

809
publicado no Jornal de Alagoas. Na imprensa, manteve a coluna
Cipó de Fogo.

Adalberto Marroquim (1833-?)

Deputado estadual em três legislaturas, diretor do Ensino


Público. Foi autor e organizador do livro Terra das Alagoas,
impresso em Roma, Ed. Maglione & Strini, 1922 - Repositório de
Informações sobre o Estado. É uma das mais importantes obras já
editadas sobre determinado período de nossa história, tanto do
ponto de vista documental histórico e fotográfico, quanto do nosso
patrimônio arquitetônico, artístico e cultural. O trabalho de
Adalberto Marroquim foi reeditado pela Academia Alagoana de
Letras, em série numerada, de mil exemplares.

Alberto Passos Guimarães (1908-1993)

Alberto Passos Guimarães, alagoano nascido em Maceió


deixou obras que merecem ser estudadas e conhecidas pelos
alagoanos. Ele tinha especial interesse por economia e pela questão
agrária, mas as questões políticas de forma geral também lhe
interessavam, tanto é que ele se filiou ao Partido Comunista
Brasileiro (PCB) muito jovem e se engajou na luta pelo socialismo.
Alberto Passos convivia na Maceió da década de 1930, com
Aurélio Buarque de Holanda, Rachel de Queirós, Valdemar
Cavalcanti, José Lins do Rêgo, Manoel Diegues Júnior, Carlos
Paurilio, Mendonça Júnior, Mário Palmeira, Rui Palmeira, Jorge

810
de Lima, Raul Lima, Aloysio Branco, Mário Brandão e Graciliano
Ramos, que era o mais velho dessa turma. Foi um dos fundadores
da Academia dos Dez Unidos; da Festa da Arte Nova, uma espécie
de Semana de Arte Moderna realizada em apenas um dia; e, por
último, o Grêmio Literário Guimarães Passos, ambiente de poetas
e prosadores que tinham, na época, menos de 25 anos de idade.
Ingressou na imprensa em Maceió, tendo fundado, juntamente com
Waldemar Cavalcanti, Afrânio Mello e outros, em 11 de abril de
1931, a revista literária Novidade. Colaborou, também, no O
Estado, O Jornal de Alagoas, A Vanguarda Proletária, que dirigiu a
partir de janeiro de 1933. Perseguido politicamente, viveu um
período escondido em Maceió, e, ainda, no interior da Bahia, onde
vendia sabonetes. Chegou ao Rio de Janeiro em 1940. Ingressou no
IBGE, como redator, onde realizou vários estudos, entre eles o
Primeiro Censo das Favelas do Rio de Janeiro, em 1950. Era
responsável, no IBGE, pela coleção Retratos do Brasil.

Aloísio Branco (1909-1937)

811
Aloísio Machado Bezerra Branco, na vida literária, Aloísio
Branco, nasceu em São Luiz do Quitunde, a 6 de janeiro de 1909 e
morreu em Maceió, a 4 de fevereiro de 1937. Era filho de Lindolfo
Branco Bezerra e Maria Amália Alves Machado. Estudou as
primeiras letras no seu município e os preparatórios no Liceu
Alagoano e no da Paraíba. Foi oficial de gabinete do Secretário
Geral do Estado e, ao falecer, era funcionário da Administração do
Porto de Maceió. Colaborou em todos os jornais e revistas de
Alagoas, na imprensa pernambucana e no Boletim de Ariel, do Rio
de Janeiro. Formou-se pela Faculdade de Direito do Recife.
Escreveu poesias, contos, crônicas, ensaios, artigos, pois era um
espírito curioso por tudo o que fosse letra de forma. Mas foi como
poeta que o seu nome firmou-se entre os seus companheiros de
geração, embora fosse também uma grande vocação de ensaísta.

“Pode-se dizer que aqui na província foi Aloísio Branco o


poeta que melhor soube tirar efeitos rítmicos dos versos longos.
Verifique-se a sua produção poética e aí teremos a frequência com
que o poeta lança mão desse recurso para encontrar os seus efeitos
sonoros. Tanto no poema da pequena viagem, como no em louvor ao
telefone, sente-se que a sua mensagem não poderia caber nesses
poemas de versos curtos e sons breves, porque era mesmo do seu
temperamento, alongar-se na procura de um efeito mais rítmico para
a sua poesia. Talvez, como nenhum outro, daqui da província, foi
Aloísio Branco o que mais se beneficiou dessa liberdade que o
modernismo trouxe para a poesia. Aloísio Branco não procura imitar.
Com ele tivemos urna manifestação poética diferente daquilo que

812
conhecíamos em matéria de poesia. Ele não foi um inovador, no
sentido rigoroso, mas que deu à nossa poesia provinciana um sentido
novo, urna dimensão diferente, não resta a menor dúvida”.

Do livro “Notas sobre poesia moderna em Alagoas”, de


Carlos Moliterno, Departamento Estadual de Cultura, 1965

Alfredo Brandão (1874-1944)

Viçosense letrado, Alfredo Brandão acaba de ganhar uma


nova edição do seu raro livro Viçosa de Alagoas - o Município e a
Cidade, de 1914. Formou-se em Medicina pela Faculdade da Bahia
(1902). Sua tese sobre Tabagismo obteve aprovação com distinção.
Iniciou sua clinica em Bom Conselho (PE), depois ingressou no
Exército, como médico, esteve na Campanha de Canudos e
trabalhando em Mato Grosso. Foi expedicionário do marechal
Rondon, em São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Pernambuco,
onde foi diretor do Hospital Militar do Recife. Em 1931 volta a
viver em Maceió. Era sócio do IHGA, onde ingressou em 1937.
Entre suas obras estão Contribuição Para a Geografia Botânica do
Estado de Alagoas, 1915; Crônicas Alagoanas (História, Lendas e
Etnografia), prefácio de Humberto Bastos, Maceió, Casa Ramalho,
1939; A Escrita Pré-histórica do Brasil, com um Apêndice Sobre a
Pré-história de Alagoas. Provavelmente teria encantado Gilberto
Freyre com sua descrição do mestiço, em seu livro Viçosa das
Alagoas. “Sobre o ponto de vista étnico, há uma grande mistura
oriunda do cruzamento das três raças que se fundiram – a branca, a

813
preta e a cabocla. Encarado no seu conjunto o que fere logo a
atenção do observador é a mestiçagem, isto é, o produto do
caldeamento dos três elementos heterogêneos. Esse produto tem no
cabra o seu mais perfeito representante”,

“Ocupando-me da terra, procurei fazer-lhe a descrição física


e política, insistindo sobre as suas riquezas naturais, sobre o
comércio, sobre a agricultura e sobre o clima, do qual salientei as
moléstias mais comuns, as causas da morbidade, e as medidas
higiênicas mais necessárias. Da vida do engenho, tão pouco estudada
pelos nossos folk-loristas – cuja atenção se tem voltado mais
particularmente para as zonas do sertão - delineei alguns quadros
que evoquei das reminiscências da minha infância, quase toda
escoada na solidão dessas matas”.

Alfredo Brandão, na apresentação do livro Viçosa de


Alagoas - O Município e a Cidade, Recife, Imprensa Industrial,
1914 (inclui notas históricas, geográficas e arqueológicas ), Recife
– 1914

Arnoldo Jambo (1922 - 1999)

Cronista, historiador, jornalista, advogado. Serviu, no


período de 1939 a 1941, à Marinha de Guerra. Formou-se em
Direito pela UFAL. Com a baixa, voltou a Maceió, onde se iniciou
na imprensa, como revisor na A Gazeta de Alagoas, passando em
seguida a colaborador do Suplemento Literário do Jornal de

814
Alagoas, e, posteriormente, na sua direção. Foi um dos
organizadores do jornal A Voz do Povo, tendo sido forçado, por
motivos políticos a emigrar para Recife, onde foi editorialista do
Diário de Pernambuco. Regressando a Maceió, exerceu por mais
sete anos as funções de secretário de redação do Jornal de Alagoas,
desempenhando ao mesmo tempo as funções de crítico literário do
referido matutino. Diretor do Departamento Estadual de Cultura a
partir de 1961, cargo que ocupou nos governos Muniz Falcão e
Luís Cavalcante, promoveu a publicação de CADERNOS, com as
séries: "Estudos Alagoanos ", "Reedições DEC”, "Vidas e
Memórias", "Folguedos de Alagoas ", "Estante Alagoana de
Monografia", "Cultura Didática", "Poesia de Sempre" e "Arquivos
Acadêmicos" além de outras atividades culturais de caráter
pioneiro no Estado. Membro da AAL, tendo ocupado a cadeira 38.
Membro honorário da AML

Arnon de Mello (1911-1983)

Arnon Afonso de Farias Mello foi governador de Alagoas


(1951-1956), jornalista, advogado, político e empresário
brasileiro. Ainda adolescente, foi membro do Grêmio Literário
Guimarães Passos, juntou-se ao grupo de intelectuais, entre os
quais Jorge de Lima, Aurélio Buarque de Holanda, Raul Lima,
Valdemar Cavalcanti, Manuel Diégues Júnior e José Lins do Rego.
Aos 14 anos já era revisor e repórter do Jornal de Alagoas, onde
havia começado como agenciador de assinaturas. Chega a diretor-
geral em 1936, quando aquele jornal foi adquirido pela cadeia dos

815
Diários Associados. Transferiu-se para o Rio de Janeiro em 1930 e
matriculou-se na Faculdade de Direito. Trabalhou no Diário de
Notícias e nos Diários Associados antes da graduação. Em 1936
assumiu a direção da Gazeta de Alagoas e foi membro do conselho
diretor da Associação Brasileira de Imprensa. Após o fim do
Estado Novo ingressou na UDN e foi eleito suplente de deputado
federal em 1945 e exerceu o mandato mediante convocação. Por
esta mesma legenda foi eleito simultaneamente deputado federal e
governador de Alagoas em 1950, optando por este último cargo
onde cumpriu um mandato de cinco anos. Na literatura, participou
do Movimento Modernista com a turma do Grêmio Literário em
Maceió, e sempre arriscava fazer crônicas sobre os livros dos
amigos, como a que escreveu sobre o poema Essa Nêga Fulô, de
Jorge de Lima.

“Essa Negra Fulô é um belíssimo poema. Bonito prá burro! É


um poema, além de tudo brasileiro. Brasileiro da cabeça aos pés.
Todo sensualidade. Dum delicioso sensualismo que seria capaz de
abalar o próprio Sr. Alberto Oliveira, já petrificado em vida numa
praia do Rio. Uma coisa suavíssima, gostosa, que a gente passa a
vida toda para ler, sem sentir o menor cansaço. Tem cadência, tem
ritmo, tem tudo enfim. Traçado todinho numa linguagem de
encantar.”

Arnon de Mello, no artigo Essa negra Fulô, no jornal A


Pilhéria, Recife – 1928, em Documentos do Modernismo, Moacir
Medeiros de sant´Ana – Ufal 1978

816
Barafunda

Pseudônimo de Joaquim Antônio Siqueira Torres (1808-


1938). Poeta de espírito zombeteiro, fazia sátiras violentas, teve
uma vida de aventuras, e foi até ameaçado de morte. Bacharelou-se
em Direito pela Faculdade de Recife. Poeta satírico, seus versos e
modinhas eram cantados pelo interior do Estado, sendo entre as
modinhas a mais popular aquela denominada Genura. Teve uma
vida errante e cheia de aventuras, vagando por Alagoas, até ser
ameaçado de morte por causa de sátiras violentas. Exerceu
advocacia e foi juiz de direito em Passo Fundo (RS), de onde saiu
por razões políticas, refugiando-se em Rivera, Uruguai. Jornalista
no Amazonas. Internado no Hospício da Praia da Saudade, em
1923, no Rio de Janeiro. Entre suas obras estão Ouro de Lei, 1918;
Carola Maluca, Rio de Janeiro, 1919 (prosa); Pontas de Fogo, Rio
de Janeiro, 1922, (crônicas); Gigantes e Pigmeus,

Breno Accioly (1921-1986)

Escritor, jornalista, médico. Breno Accioly nasceu em


Santana do Ipanema, no meio do sertão alagoano, cercado pela
aridez de paisagens e pessoas, e partiu para o mundo com “sua
dramaticidade profunda”, à lá Dostoievsk, segundo o grande crítico
Tristão de Athaide em uma crônica de um jornal carioca
reproduzido na orelha de seu livro João Urso (1995) – com
prefácio de José Lins do Rego e ilustrações de Cândido Portinari.
Em 1938, matriculou-se na Escola de Medicina do Recife, mas sua

817
inclinação era para a literatura. Até 1942, dividiu a banca escolar
com a imprensa pernambucana, trabalhando no Diário de
Pernambuco, Jornal do Comércio e Diário da Manhã. No final de
1942 Breno mudou-se para o Rio de Janeiro, onde concluiu o curso
na Faculdade de Ciências Médicas (1946), especializando-se em
hanseníase. Foi médico da Prefeitura da então Capital Federal.
Breno Accioly morreu prematuramente, aos 45 anos, em seu
modesto apartamento, em Ipanema, no Rio de Janeiro, tinha sido
diagnosticado com esquizofrenia. A professora e escritora, Edilma
Bonfim, lançou o livro Razão Mutilada - Ficção e Loucura em
Breno Accioly, sobre a obra do autor. No prefácio ao livro João
Urso, José Lins do Rego lembra-se do garoto que conheceu no
passado.

“Neste rapaz, que conheci ainda menino em Alagoas, há uma


vocação indomável para a literatura. Lembro-me dele ainda criança,
de corpanzil disforme, em Santana do Ipanema, terra áspera que
tanto marcou sua personalidade. Há nesta geração nova uma forte
preocupação com o destino do homem como pessoa. Breno Accioly é,
no entanto, uma verdadeira força poética que se depruça sobre o
homem para sondar-lhe as profundezas.”

José Lins do Rego, no prefácio do livro João Urso,


Civilização Brasileira, RJ, 1995

818
Carlos Moliterno: paletós e poesias

Em uma entrevista com o poeta Carlos Moliterno (1912-


1998), para a Revista Última Palavra, já no olimpo de seus 76
anos, com sua poesia e sua sabedoria, contou a trajetória da
literatura alagoana. Alagoano nato e descendente direto da
Calábria, Moliterno foi, por 11 anos, um virtuoso alfaiate, da
tradicional linhagem italiana. “Naquela época não existia ainda a
indústria de roupas feitas. Toda sociedade confeccionava paletós
de casimira, smokings, casacas e fraques nas dezenas de
alfaiatarias da capital. Era o tempo em que todo mundo só ia para
os bailes de casaca, fraque, bengala e chapéu”, lembra. Foi gerente
da Companhia de Cigarros Souza Cruz em Alagoas e diretor da
Imprensa Oficial por 15 anos. Em sua face literária, Carlos foi
presidente da Academia Alagoana de Letras, e um prolífico
ensaísta e poeta, com uma vasta obra. Anilda Leão, sua musa,
outra grande poeta, ouvia atentamente e se fazia presente com
inteligentes intervenções, ao final recitou o 59º e último soneto, de
sua mais famosa obra, A Ilha, de 1969:

De espanto e medo o vento do oceano


Meu rosto cobre, e cobre a Ilha ausente
do mapa no meu corpo decalcado
em linhas retomadas da memória.
Não era já o dia e nem a noite.

819
O relógio parou. Parou a vida.
Parou a própria Ilha sonegada,
Nas águas turvas e no céu de chumbo.
...

Os peixes no meu corpo permanecem,


R as escamas me cobrem sobre as águas
E em escamas de peixe me converto.

Carlos Moliterno, em A Ilha, edição do autor, 1969,


ilustrações de Hércules

Moliterno: “presidente da academia não era literato”


Em 1955, Carlos Moliterno exerceu pela 1ª vez a
presidência da Academia Alagoana de Letras. Então, ninguém
melhor que ele para traçar os caminhos da literatura caetés, das
gerações de poetas, escritores, críticos literários que marcaram
presença no século XX na literatura alagoana. Foi através do
movimento de literatura, da poesia, dos intelectuais, advogados e
gente influente que as alfaiatarias de Maceió viveram sua melhor
fase, e Moliterno começou a penetrar no mundo intelectual da
província. Segundo ele, a primeira geração de intelectuais
alagoanos, com projeção no cenário nacional, vem do final do
século 19, com o poeta Guimarães Passos. “Ele também foi o
primeiro conterrâneo a entrar para a Academia Brasileira de Letras,
em 1896”. Segundo Moliterno, que ainda não havia nascido nesse
tempo, Passos foi contemporâneo de Olavo Bilac, Coelho Neto,

820
Joaquim Nabuco. Depois dele veio Goulart de Andrade, poeta
parnasiano, também imortal da ABL. Mas o tempo ainda não era
de poetas, mas de gente influente.

“O primeiro presidente da Academia Alagoana de Letras não


era literato, mas um representante do governador Fernandes Lima,
Demócrito Gracindo, pai do ator Paulo Gracindo. Um excelente
orador, mas sem livros publicados, nesse tempo não se exigia que o
presidente fosse um homem letrado”.

Entrevista com Carlos Moliterno, por Mário Lima,


na revista Última Palavra, 1988, nº 18

Moliterno: um passeio na literatura Caeté


Segundo o ideário do poeta Carlos Moliterno foram duas as
gerações que deixaram seu toque de encanto, lirismo e densa
poesia e prosa. A de 1930, que contava então “com o maior dos
poetas brasileiros” Jorge de Lima, e mais Diegues Júnior,Valdemar
Cavalcanti, Raul Lima, ,Aloísio Branco, Cipriano Jucá. Foi nessa
época também quando surgiu o chamado romance social
nordestino, com forte inclinação pela realidade por que passava o
país e o Nordeste principalmente. Moliterno cita os romances de
José Lins do Rego sobre o ciclo da cana e “O 15” de Raquel de
Queiroz, ambos residentes na época em Maceió. Outra fase áurea
da prosa e poesia alagoanas foi a de 1945, a geração do pós-guerra,
na qual o poeta Carlos Moliterno se insere, quando o movimento
cultural alagoano toma novos rumos, com o modernismo sendo a

821
corrente literária mais influente nessa nova geração. Estão entre os
poetas desse tempo, Ledo Ivo, Jorge de Lima - com seu poema de
adesão ao modernismo O Mundo do Menino Impossível -, Breno
Acioly (ficcionista), Francisco Valois (poeta), Cléa Marsíglia, Luiz
Gonzaga Leão, Moliterno e Anilda Leão.

“Só a partir dos anos 1980 é que surge uma nova safra de
bons poetas, entre eles Lúcia Guiomar, Marcos Farias Costa, José
Geraldo Marques entre outros. Eles têm publicado muita coisa boa.
Alguns com o mau hábito de falar de outras gerações e da própria
Academia Alagoana de Letras. Vejo a nova geração com mais
interesse político que cultural. Quem quiser fazer críticas à realidade
do país é muito melhor escrever em prosa, em material jornalístico do
que na poesia. Escrever poesia é ter um momento lírico e dramático”.

Entrevista com Carlos Moliterno, na revista Última Palavra,


1988, nº 18.

Carlos Paurílio: a vida na boemia

O poeta Carlos Malheiros da Silva (1904-1941), conhecido


Carlos Paurílio, era filho do músico Hipólito Paurílio da Silva,
dono de cinemas como o Cine Floriano e o Delícia. Mas sua
paixão era a poesia e as rodas da boemia, participou ativamente
dos movimentos literários como a Festa da Arte Nova e do
Modernismo em Alagoas. Muito cedo já manifestava vocação
literária. Aos 18 anos já escrevia e publicava seus sonetos, o que o

822
levou a participar dos meios intelectuais. Colaborou com revistas
como a Novidade, surgida em 1931 sob a direção de Alberto
Passos Guimarães e Valdemar Cavalcante. Teve grande projeção
nacional e contava com a participação da elite intelectual de
Maceió, a exemplo de Graciliano Ramos e Jorge de Lima. Com 31
anos trabalhava na Imprensa Oficial como revisor, mas já nesta
época era dependente do álcool. Em depoimento, Alzira, sua
mulher, já viúva, revelava: “Logo depois que casei descobri que
não frequentava mais o seu emprego. Saía pronto para o trabalho
todas as manhãs, mas não ia para lá. Ia beber com os amigos de
mesa”. Seu lugar predileto era o Bar Único, na Ladeira do Brito.
Ele justificava: “Escrevo quase bêbado. É a única maneira que
encontro para me colocar dois pés acima do mundo”. Ou ainda,
como explicou para seu amigo J. Silveira: “Corpo e alma se
dependem. A alma quando é de cristal como a nossa, vive da sua
tristeza, dos seus sonhos felizes e das suas mágoas. Possuo assim
dois tipos de trabalhos: os que faço para ganhar, os que faço para
vibrar a alma, para sonhar acordado”. Morreu subitamente em 30
de dezembro de 1941, com apenas 37 anos de idade.

Craveiro Costa (1871-1934)

Jornalista, professor e maçom, João Craveiro Costa era


historiador com vocação, investigar, pesquisar, buscar o assunto
onde ele estivesse. Autor de vasta obra, entre elas O Fim da
Epopeia Notas para a História do Acre, onde viveu de 1910 a 1922,
como promotor público, enfrentando os fazendeiros e grileiros dos

823
seringais. Na volta a Maceió, atendendo ao convite do governador
Fernandes de Lima. Vivia inteiramente para o trabalho e
elaboração de seus livros. Ao mesmo tempo dedicou-se ao
jornalismo, em especial ao jornalismo político, no jornal O
Gutenberg, no qual utilizava o pseudônimo de Gavarni,
participando na campanha contra o governo de Euclides Malta.
Devido a violência da luta política que se estabeleceu em Alagoas,
entre outras consequências viu-se obrigado a se afastar do Estado,
residindo em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde exerceu por
cinco anos a função de guarda-livros. Entre suas obras estão
Indicador Geral do Estado de Alagoas, Casa Ramalho, 1902;
História das Alagoas, (Resumo Didático) prefácio de Aurino
Maciel, Cia. Melhoramentos, São Paulo; O Fim da Epopéia (Notas
Para a História do Acre), Maceió, Tipografia Fernandes, 1925, saiu
em 2ª edição, na série Brasiliana.

Craveiro esquecido
De acordo com o historiador Moacir Sant`Ana, em artigo
escrito para a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas, de 1984, nos 50º ano de morte do sócio-fundador e
membro efetivo do instituto, nada saiu na imprensa e nem sequer
no necrológico da revista. “Morreu pobre, vitimado por um
colapso cardíaco, quando se achava em sua mesa de trabalho”. Por
que então este silêncio, esta indiferença em torno do nome do
grande historiador? Moacir relata:

824
“Fomos encontrar num pronunciamento de José Barbosa
Netto, representante de Alagoas no Congresso de Estatística
realizado no Rio de Janeiro, em 1938. “... Craveiro Costa, sociólogo,
panfletário, cronista, historiador, economista, pedagogo, assumira as
proporções de um gigante, a cuja sombra se sentiam inquietos os que
ainda hoje tremem a simples evocação de sua memórias.”

Moacir Medeiros de Sant´Ana, no artigo Craveiro, da


revista do IHGA, volume 39 – 1984

Na tentativa de resgatar a presença de Craveiro Costa na


literatura alagoana, a Editora da Universidade Federal de Alagoas
(Edufal) reedita o livro “Instrução Pública e Instituições Culturais
de Alagoas e Outros Ensaios” revisado, anotado e ampliado com
15 escritos do autor e uma reportagem publicados na Revista de
Ensino. A coordenação editorial, apresentação, notas e
biobibliografia são do professor Elcio Verçosa e Maria das Graças
de Loiola Madeira, ambos professores doutores em Educação
Brasileira e pesquisadores da UFAL

Cícero Péricles: economia nas Alagoas

Cícero Péricles de Carvalho é professor da Universidade


Federal de Alagoas, com doutorado em Economia pela
Universidade de Córdoba (Espanha). Autor de “Economia Popular
– uma via de modernização para Alagoas”, na 6ª edição, e “Análise
da reestruturação produtiva do setor sucroalcooleiro”, 3ª edição,

825
ambos publicados pela Edufal. Em 2015, na Bienal Internacional
do Livro de Alagoas, O professor Cícero Péricles relançou o livro
“Formação Histórica de Alagoas”, publicado pela primeira vez na
década de 80. Segundo o pesquisador, as duas primeiras edições
refletiam as notas de leitura daquela época.

“Com o passar do tempo, o texto não sofreu reformulações,


saindo de circulação com o fim das tiragens. Desde então, as
prioridades docentes na área de Economia me afastaram do tema.
Mas no cotidiano da sala de aula como professor, percebi o quanto
ainda há carência de textos introdutórios para a história econômica
de Alagoas. Foi essa necessidade que me estimulou a retomar o livro
original, atualizando-o integralmente até chegar nesta nova edição.
Nestas três décadas, os principais temas da formação alagoana foram
reinterpretados à luz de novas pesquisas; e muitas publicações de
qualidade foram lançadas ou relançadas, abrindo caminhos para
consulta de fontes contemporâneas e permitindo uma ampliação ou
reelaboração dos assuntos discutidos”.

Dirceu Lindoso

Dirceu Aciolly Lindoso, 82 anos, tem mais um novo título


para comemorar em reconhecimento à sua carreira. Em 25 de
março de 2015, o mestre recebeu o título de Doutor Honoris Causa
da Universidade Federal de Alagoas, que ajudou a fundar. Dirceu é
jornalista, tradutor, poeta, romancista, antropólogo, etnólogo,
historiador alagoano e um entusiasmado pesquisador da cultura

826
alagoana. Nasceu em Maragogi e só veio a Maceió já adulto, já que
as melhores estradas apontavam para Pernambuco. Estudou no
Colégio Batista do Recife, e depois no exterior. Por sua posição
política e a militância marxista esteve dez meses preso em Maceió.
No dia em que foi libertado, foi embora para o Rio de Janeiro. Ele
foi assessor do Ministro de Educação e Cultura, na área de
Desenvolvimento do Patrimônio Cultural. Membro da Academia
Alagoana de Letras (AAL), onde ocupa a cadeira número um. E é
sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas
(IHGAL). No seu discurso de posse no IHGA, em outubro de
2009, além de dar uma aula de história alagoana ele fez várias
declarações de amor a sua terra, e na última ele fechou: “minha
profissão é ser alagoano”.

“Somos assim: pequenos, de vida independente curta, mas de


vida histórica densa, porque guardamos na nossa história dois
acontecimentos que traduzem toda nossa nacionalidade, como o
Quilombo dos Palmares no século XVII e a Guerra dos Cabanos no
meado de século XIX. Nele, pelo que aconteceu, se fizeram as
Alagoas, e assim juntas: a Alagoas do Norte e a Alagoas do Sul. Com
dois polos luminares: a cidade luso-flamenga do Penedo, nas ribeiras
altas do rio São Francisco, e a cidade luso-flamenga do Porto Calvo,
nas grandes matas do rio Manguaba e na ribeira do porto antigo do
Varadouro... Alagoas é para mim uma coisa maior, e posso dizer
monumental”.

827
Dirceu Lindoso, em seu discursos de posse no IHGA.
Revista do IHGA, dezembro, 2005

Arquivo de Évora, Portugal


Dirceu Lindoso garante que foi ele o primeiro a tocar no
assunto de que havia uma cultura alagoana – “o termo cultura era
tratado de outra forma”. Segundo ele, grande parte dos documentos
históricos sobre Alagoas estaria na Europa. As informações sobre
todas as tribos de índios que habitavam as regiões de Penedo até o
alto sertão alagoano estão no Arquivo de Évora, em Portugal. Nos
acervos de São Petesburgo, Torre do Tombo, Portugal,
Leningrado, Luanda, Uidá, na Nigéria, e Moçambique estariam
guardados, segundo Lindoso, documentos importantes sobre a
história de Alagoas. “Essas são as minhas fontes. São diferentes
das fontes de outros pesquisadores daqui. A nossa história não
começa aqui.”.

“Se você estudar a destruição de Palmares, você vai ver que o


motivo foi a terra, que era muito fértil naquela região. Essa história
de que os negros se suicidaram pulando de penhascos não existe.
Eram mais de 30 mil negros e a maior parte foi vendida para o sul do
Brasil e para a América Central”,

Douglas Apratto Tenório

828
O escritor nasceu em São Miguel dos Campos, foi secretário
de Estado da Educação (1986), fez seus primeiros estudos na sua
cidade natal. Fez o curso colegial em Maceió e o bacharelado em
História pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFAL
(1968). Mestrado em História, pela Universidade Federal de
Pernambuco (1976) e doutorado na mesma universidade (1994).
Professor de História Geral e do Brasil, bem como de Geografia,
em diversos colégios e universidades. Foi diretor do Centro de
Ciências Humanas, Letras e Artes da UFAL. Em 1978, se torna
membro da Academia Brasileira de História, da AAL. O escritor
tem mais de 30 livros publicados e premiados, e é colaborador na
imprensa alagoana e nacional. Entre suas principais publicações
estão A Tragédia do Populismo (1995); As Ferrovias em Alagoas.
Estudo da Implantação do Transporte Ferroviário nas Alagoas
Durante o Período Imperial Até o Alvorecer do Período
Republicano, Recife, Ed. Grafbom, 1977; A Sociedade e a Política
Alagoana nas Décadas de 20 e 30, Maceió, Imprensa Universitária,
UFAL, 1977; Capitalismo e Ferrovias no Brasil (As Ferrovias em
Alagoas), Maceió, EDUFAL, 1979; Metamorfose das Oligarquias,
Curitiba, H D Livros, 1997; Caminhos do Açúcar. Engenhos e
Casas-Grandes das Alagoas, Brasília, Senado Federal, 2008
juntamente com Dantas, Carmen Redescobrindo o Passado:
Cartofilia Alagoana, juntamente com Carmen Lúcia Dantas,
Recife, Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2008.
Douglas Apratto é reitor do Centro de Estudos Superiores
(Cesmac).

829
Livro: A Tragédia do Populismo
O historiador e professor Douglas Apratto, 70 anos, é autor
de importantes obras, onde retoma a linhagem dos grandes textos
da historiografia alagoana, com pesquisa de fôlego e escrita
científica, mas com um novo estilo de contar os fatos, “sejam eles
dramáticos, empolgantes, grandiosos e humanos” ou trágicos,
como no seu livro A Tragédia do Populismo (1994). A obra retrata
o período do impeachment do governador Muniz Falcão (1957),
tendo como pano de fundo o comportamento da elite política
alagoana, considerada um marco na história política do estado.
“Quatro décadas separam-nos do governo Muniz Falcão e
serenadas agora as paixões, começa a aparecer no grande quadro
político alagoano detalhes e nuances que têm, na pena privilegiada
de Douglas Apratto Tenório, uma ótica científica com a máximo
rigor da metodologia histórica. Sua formação humanística,
entretanto, deu também a este livro um sabor clássico”. Armando
Souto Maior, no prefácio da edição. Veja trechos do capítulo II,
Uma tragédia anunciada.

“A atmosfera maceioense, na sexta-feira, 13 de setembro de


1957, é de tensão. Respira-se ar de tragédia prestes a explodir...
Antevê-se, claramente, um clima de desencadeamento de paixões
políticas com o estalo inevitável das soluções violentas... durante
quarenta minutos, o tiroteio (na Assembleia Legislativa) entre as duas
bancadas era intenso. “Ouvia-se disparos vindo das ruas, enquanto
balas pipocavam por todos os lados do recinto, enquanto pedidos de

830
socorro surgiam dos muitos feridos”. Mais de mil tiros foram
disparados, inclusive alguns de fora para dentro”.

Douglas Apprato Tenório, em A Tragédia do Populismo O


Impeachment de Muniz Falcão, Edufal, Maceió – 1995.

Elysio de Carvalho: rebelde, irrequieto e anarquista

Elysio de Carvalho foi um penedense de alma sonhadora e


irreverente, uma das maiores expressões da cultura brasileira.
Nasceu ribeirinho, na Rua da Penha, Penedo, e foi fazer carreira
literária lá fora. Filósofo e poeta, com vários livros publicados,
amigo de intelectuais como Mário de Andrade, Machado de Assis,
Manuel Bandeira, Elysio fez suas primeiras letras em Penedo. Aos
doze anos ingressou no seminário de Olinda, e assistiu ao que
chamou de “a encapotada hipocrisia fradesca”. Em 1895 ingressou
no Liceu Alagoano onde cursou Humanidades. Em 1898 instalou-
se no Rio de Janeiro e funda jornais e revistas, colabora com
revistas européias e traduz para o Brasil obras de Nietzsche, Stirne,
Freud e Oscar Wilde. Em 1904, funda e dirige a Universidade
Popular, que estabelecia educar o proletariado brasileiro dentro dos
preceitos socialistas. Foi professor da Academia de Polícia do Rio
de Janeiro, além de exercer com maestria o cargo de sub-diretor do
Gabinete de Identificação e de Estatística da Polícia do Distrito
Federal. Convidado pelo Ministro da Justiça de Portugal para dar

831
parecer sobre as reformas dos serviços policiais portugueses,
agradece e não aceita. Dedica-se ao jornalismo. Sua morte precoce,
vítima de tuberculose, na Suíça em dois de novembro de 1925,
com 46 anos incompletos, deixou um espaço vazio na cultura
brasileira.

Élcio de Gusmão Verçosa

Escritor, pesquisador e professor, doutor em História e


Filosofia da Educação pela Universidade de São Paulo (USP),
mestre em Política e Planejamento Educacional pela Universidade
Federal de Pernambuco, e bacharel em Letras pela Universidade
Federal de Alagoas (1969). Foi Presidente do Conselho Estadual
de Educação por três mandatos consecutivos, reconduzido por seus
pares sempre pelo voto direto; voluntário do Programa de Pós-
Graduação em Educação do Centro de Educação da Ufal. Verçosa
é reconhecido como um dos pilares na renovação dos quadros de
pesquisadores de Alagoas. “Ele dá uma generosa, fértil e incisiva
contribuição científica, sendo leitura obrigatória para todos aqueles
que desejam pensar sobre esta nossa nação Alagoas. Vamos então
ler seu texto e pensar em como está sendo fértil o refazer as
Alagoas”, disse Sávio de Almeida, em seu blog Coleção Espaço
em 02/01/2012. Élcio Verçosa é autor de mais de 10 importantes
livros, o mais recente - dezoito anos após a publicação original –

832
“História da Educação Superior em Alagoas de suas Origens ao
Século XXI”, foi lançado na Bienal do Livro de Alagoas, em
novembro de 2104.

“Caminhando nos meus estudos e percebendo que as práticas


dominantes no interior da universidade, “em meio às transformações
por que passava a sociedade, e apesar delas, constantemente
reiteravam, no plano da cultura, o ethos tradicional e oligárquico que
parecia ser sua característica essencial", logo me dei conta de que a
historiografia produzida sobre Alagoas e sua educação padeciam de
limites explicativos, quando não de lacunas severas, tanto em relação
à incipiente história produzida sobre a universidade, quanto naquela
mais ampla, feita sobre os viventes das Alagoas”.

Élcio Verçosa, na introdução à obra “Intelectuais e


processos formativos em Alagoas (Séculos XIX-XX)”, de 2008

Teologia e militância política


Em 1957, aos 10 anos, Élcio Verçosa estudava no
Seminário dos Padres Dehonianos, no bairro da Várzea, em Recife,
na Escola Apostólica do Sagrado Coração de Jesus, com padres
holandeses e brasileiros da mesma Congregação – SCJ, chegou a
fazer o noviciado e estudou Filosofia, em nível superior, no
Seminário Regional do Nordeste, em Camaragibe (PE). Em 1966,
deixou a vida religiosa e, voltando para Maceió, além do
bacharelado em Letras, iniciou sua fase de militância estudantil,
contra a ditadura militar, tendo, em 1968, sido eleito presidente do

833
Diretório Acadêmico de Letras onde enfrentou, junto com a
professora Jarede Viana, o Comando de Caça aos Comunistas
(CCC). Casado desde 1970 com Ivanilda Soares de Gusmão
Verçosa, também Professora e que conheceu na militância
estudantil e política, tem dois filhos: Elcio de Gusmão Verçosa
Filho e Catarina Soares de Gusmão Verçosa e um neto, Diógenes
Verçosa Domed. Aposentou-se da UFAL em 2006, após 35 anos
de serviço. Recebeu da comunidade acadêmica da UFAL o
honroso título de Professor Emérito. Em 2004, recebeu o título de
Cidadão de Maceió, outorgado pela Câmara de Vereadores, por
iniciativa do Vereador Thomaz Beltrão. Atualmente, é
coordenador Acadêmico da Faculdade SEUNE e professor de
Sociologia do Direito no Curso de Direito naquela instituição
universitária.

Félix de Lima Júnior (1901-1986)

O maceioense Félix Wanderley Lima nasceu na capital no


primeiro ano do século XX, para se transformar em um pacato
gerente do Banco do Brasil - já com seu nome literário Félix de
Lima Júnior - e no “maior pescador de pérolas históricas e
literárias desta nossa província encantadora de todos os tempos”,
conforme relato de seu colega no IHGA, José Pinto Góes. Segundo
Góes, na revista do IHGA, teria escrito 46 livros até sua morte. O
mestre Félix fez parte da Academia dos Dez Unidos e da
Academia Guimarães Passos. Membro do IHGA, empossado em
1954, na cadeira da qual é patrono Francisco Inácio de Carvalho

834
Moreira (Barão de Penedo). Lima Júnior é da AAL, onde
ingressou em 1957. Ele esquadrinhou o passado, e trouxe para
presente, por meios de perfis literários Tiradentes, Pedro II,
Floriano Peixoto, Rio Branco, Caixas, Varnhagem, Delmiro
Gouveia, Gilberto Freyre. Ele nasceu em um casarão na rua do
Comércio, a mais tradicional do Centro de hoje, que em seu tempo
ouvia os o barulho dos carros de boi “varando os silêncios das
argentinas madrugadas e dos soturnos magismos das noites
largas”.

“Félix mergulhava fundo, nas águas por vezes bem turvas dos
mares da historiografia pátria e de lá, à superfície surdindo, as mãos
pejadas trazia das mais preciosas gemas e marcantes eventos
sócio/históricos da sua terra querida”.

Josué Pinto Góes, na revista do IHGA, volume 44 – Maceió


1995.

Francisco Valois (1932-2008)

O poeta, advogado, jornalista e economiário Francisco


Valois – que tem como homônimo o famoso delfim da França e
duque da Bretanha (nos anos 1500) – sempre dividiu sua vida entre
os versos, a burocracia de um banco, e o jornalismo cultural. A
partir de 1951 passa a integrar o corpo de redatores de quase todos
os jornais de Maceió, começando no Jornal de Alagoas, como
tradutor de telegramas. Chefia o gabinete do presidente da Caixa

835
Econômica Federal em Alagoas e em 1970 é designado gerente da
agência central daquela Caixa em Alagoas, chegando em 1971 até
1981, quando se aposenta por tempo de serviço. Em 1983 assume a
editoria do suplemento literário Tribuna Cultural do jornal
Tribuna de Alagoas. Em 1987, é nomeado subsecretário da
Secretaria de Cultura. Em 1996, assume a editoria de Cultura,
suplemento literário do jornal O Diário, e, em 1998, passa a
coordenar a página literária de Letras & Artes de O Jornal. Nesse
ano é nomeado chefe de gabinete da Secretaria da Cultura e passa a
integrar o Conselho Estadual de Cultura, permanecendo em ambos
até 31 de dezembro daquele ano. Membro da AAL, empossado em
1972, onde ocupa a cadeira 24, bem como da Academia de Letras e
Artes do Nordeste. Sócio do IHGAL, empossado em 1986. Obras:
O Grito, Maceió,1952; Testamento Poético de Jorge de Lima,
1958; Rosa da Manhã Nascente, SERGASA 1979; A Noite
Reinventada, Edições Catavento, 2001. Foi na revista da Academia
Alagoana de Letras que ele desfilou suas poesias, como
colaborador assíduo.

A noite reinventada

A noite se reinventa e a lua tece,


na transparência azul do céu tarjado,
a lírica canção de amor que, em prece,
o vento me segreda. Deslumbrado,

No olhar retenho a rosa que floresce

836
na quietude do campo serenado
e sugere um veleiro que alvorece,
na solidão do porto abandonado:

e nessa solidão que o porto habita,


onde a maré vazante não se agita,
exila-se a saudade primitiva:

- o gesto de um adeus acontecido


remanesce no olhar entardecido
como sombra lunática, opressiva.

Francisco Valois, na Revista da AAL, 1996


Valois e o amigo Jorge de Lima

Da reportagem “Poeta relembra o amigo Jorge de Lima”,


reportagem de Lelo Macena, no jornal Gazeta de Alagoas, edição de
05/02/2006

O poeta Francisco Valois, conterrâneo de Jorge de Lima, teve


o privilégio de conhecê-lo pessoalmente e ter ficado seu amigo. Mas
foi somente em 1951, durante uma visita de Jorge de Lima a Alagoas,
que Francisco Valois pôde travar contato mais íntimo com o poeta.
Na ocasião, o autor de Invenção de Orfeu fez uma conferência na
Academia Alagoana de Letras (AAL) - a qual ajudou a fundar no
início do século passado. Uma homenagem para o “príncipe dos
poetas alagoanos” foi preparada por um grupo de intelectuais e

837
escritores locais arregimentado para recebê-lo. Todos
acompanharam Jorge de Lima em uma espécie de passeio turístico,
onde o convidado ilustre matou saudades da paisagem da Lagoa
Mundaú e da culinária alagoana, em especial do sururu, um de seus
pratos prediletos. “A partir deste dia, começamos uma grande
amizade. Num momento em que ficamos a sós, no Park Hotel, no
Centro de Maceió, onde ele estava hospedado, o Jorge me mostrou os
originais de Invenção de Orfeu”. O último encontro dos dois
aconteceria no ano seguinte, em 1953, alguns meses antes da morte
de Jorge, em Recife. Jorge viera descansar na casa do irmão, Mateos
de Lima, no Recife, e pediu para que Valois viajasse até a capital
pernambucana a fim de que pudessem se encontrar.

“Quando cheguei na casa do Mateos, o Jorge estava sozinho.


Encontrei-o numa banheira, sentindo fortes dores e aplicando
morfina em si mesmo. Em seguida, chegaram às pressas Mateos de
Lima e um médico amigo da família. Eles já estavam com as
passagens de avião compradas e a ordem era levá-lo com urgência
para o Rio de Janeiro. Foi a última vez que o vi”.

Gilberto de Macedo (1923/2008)

Médico, professor, poeta, psicanalista, humanista e crítico


literário, Gilberto de Macedo faria 60 anos de psiquiatria até sua
morte. Seus livros são até hoje objeto de teses em universidades e
congressos em todo país. Foi o primeiro diretor do Hospital
Portugal Ramalho. Gilberto Macedo foi professor da Universidade

838
Federal de Alagoas. Com mais de 15 livros publicados, em títulos
que compreendem medicina legal, física contemporânea, política,
literatura, poesia, psicologia e criminalidade; e o famoso ensaio
que escreveu com Gilberto Freyre, Casa Grande & Senzala - Obra
Didática? Rio de Janeiro, Cátedra, Brasília, INL, 1979. Foi um dos
mais assíduos colaboradores da revista da Academia Alagoana de
Letras. Com estilo erudito, ele escreveu de tudo na revista, ensaios
desde a filosofia da história de Santo Agostinho e poesia, como
esse desfecho do artigo O Universo Imaginário da poesia, um hino
de amor aos versos.

“A poesia é intensamente intuitiva. Seu mundo todo é feito de


subjetividades. Não se constrói com os fatos, mas com sentimentos
que se consubstanciam em linguagem; paixões em forma estética. Só
há poesia com inspiração. Já dizia Jacques Maritain: “não há musa
fora da alma”. Ou como afirmava Paul Claudel, que a poesia “vive
nas camadas mais profundas do ser”. A poesia se concretiza no
poeta, que dela se nutre, com ela vibra, exalta-se, vive”.

Gilberto Macedo, na revista da AAL Maceió – ano VII nº 7,


dezembro de 1981

A atualidade de Gilberto de Macedo


Gilberto de Macedo é dos grandes construtores da medicina
em Alagoas e no Brasil, junto com outros pioneiros como Arthur
Ramos, Nise da Silveira, Jorge de Lima, Breno Accioly, Estácio de
Lima, Melo Moraes, Virgilio Mauricio, Mário Magalhães da

839
Silveira, Abelardo Duarte, Ib Gatto e tantos outros. É
impressionante sua atualidade quando se fala em saúde mental, e
seu contexto social e político. Em 1988, na revista Última Palavra,
de Maceió, Gilberto de Macedo participou de uma mesa redonda
sobre a saúde mental do alagoano e do brasileiro - que teve o título
A nossa loucura - O Brasil não vai bem da cabeça, diagnóstico de
psiquiatras alagoanos – ilustradada pelo jornalista Ênio Lins (uma
charge do mapa de Alagoas sentado no divã) e coordenada pelo
jornalista Mário Lima. Tudo que ele disse, 27 anos depois, é como
se estivesse no presente.

Como é que fica a relação entre doença mental, esquizofrenia


e a crise social? São problemas intrinsecamente ligados? Aonde
vamos parar? Na república do crioulo doido? Ou já estamos nela?

Gilberto Macedo – À medida que se acentua a crise a questão


vai se tornando mais íntima. Não é determinante, mas a
probabilidade é muito grande pela própria natureza do fato mental,
que não pode ser visto isolado da sociedade. A crise global influi
poderosamente no desencadeamento de distúrbios mentais. Estamos
vivendo hoje uma crise acentuada de iminência patológica, mas não
sou pessimista, certamente haverá um processo de reflexão para
tentar sair desse ciclo sócio-patogênico para uma organização social.

Qual o sinal mais visível dessa degeneração da vida nacional?

840
Gilberto Macedo – O problema da injustiça social. O que se vê
é a Constituinte fazer suas regras e partir de interesses partidários
que representam grupos. Não bastam eleições diretas, nem
democracia participativa. É preciso que a pessoa que vote esteja bem
informada e adquira uma consciência social. Poder escolher sem
influências sugestivas e o que é pior, pela compra de voto. A compra
do voto é muito pior que a ditadura velada, pois apenas aparenta
democracia, mas não passa de um jogo de manipulação de massas.
Muito pior que a violência física é a violência simbólica do engano,
das imagens forjadas, das noticias pré-fabricadas, que infelizmente é
o que está ocorrendo. Vivemos em uma sociedade mascarada, com
aparência de democracia.
Ivan Barros: resistência na literatura alagoana

O promotor de Justiça aposentado, jornalista e escritor Ivan


Barros, com raízes fincadas e crescidas em Palmeira dos Índios, é
mesmo um resistente da literatura e do jornalismo alagoano. O
imortal da Academia Alagoana de Letras lançou em 2015 seu 29º
livro, onde conta a saga política do ex-governador Divaldo
Suruagy. No jornalismo, apesar da idade e da doença que o assola
mantém a Tribuna do Sertão, o maior jornal do Agreste e Sertão
alagoanos, sob a batuta de seu filho Vladimir Barros. Ivan também
atuou como jornalista profissional na extinta Rede Manchete, no
Rio de Janeiro. Entre as suas 29 obras estão publicações de
Assuntos Jurídicos, biografias que vão desde Pontes de Miranda
até o Papa Francisco. Mas Ivan ficou mais conhecido como um dos
biógrafos de Graciliano Ramos, e guardião de seu acervo. Tem em

841
sua coleção objetos e documentos preciosos do mestre Graça.
Apesar de não ter nascido em Palmeira dos Índios, foi nesta cidade
que Graciliano Ramos, natural de Quebrangulo, viveu a maior
parte do tempo em que esteve em Alagoas, entre 1910 e 1932. A
paixão pela cidade é retratada em diversas obras do escritor, como
Caetés (1933), São Bernardo (1934) e Vidas Secas (1938). Essa
trajetória inspirou o livro Roteiro Sentimental de Ivan Barros,
autor de três títulos sobre o Mestre Graça.

Relíquias de Ivan Barros reavivam Graciliano


O pesquisador Ivan Barros possui um fascículo original de
O Índio, jornal no qual Mestre Graça trabalhou como jornalista e
onde assinava a coluna Garranchos, usando os pseudônimos J.
Calisto, Anastácio Anacleto, Lambda e JC. Tido como bom
modelo de texto jornalístico, que primava pelo estilo enxuto e sem
adjetivos, seu maior foco era tratar sobre educação e políticas de
igualdade. “O Índio tem enorme valor histórico. Além da coluna
Garranchos, quem observar bem ainda pode ver os anúncios da
loja de tecidos Sincera, onde Graciliano trabalhou durante anos
com o pai. Em breve, esse fascículo será doado à Universidade de
São Paulo (USP), que tem os meios adequados para a preservação
e perpetuação do documento”, disse Barros.

Maya Pedrosa: um memorialista

O escritor, memorialista e contista José Fernando de Maya


Pedrosa, nascido em 1932, chega os 82 anos, com uma bela

842
história para contar. Depois de estudar no Grupo Escolar Diégues
Júnior, no Colégio Guido de Fontgalland, Colégio Nóbrega, no
Recife, e no Liceu Alagoano, José Fernando ingressa, em 1949, na
Escola Preparatória do Exército, em Fortaleza, e depois na
Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ), de onde
sai aspirante a oficial. Segue carreira no Exército até 1987, quando
se aposenta como coronel. A partir daí começa sua carreira
literária, como diretor da Biblioteca do Exército – onde lança
livros clássicos como A Grande Barreira - Os Militares e a
Esquerda Radical no Brasil: 1930-1968, em 1998, que se tornou
uma bíblia para os militares e políticos que apoiaram o golpe de
1964. Em Alagoas, é escolhido como membro do Instituto
Histórico e Geográfico, na cadeira da qual o patrono é o Barão de
Penedo. Entre sua produção cultural destacam-se obras como “A
Saga do Barcaceiro”, de 1994, sobre o ciclo das águas e seus
personagens; Histórias do Velho Jaraguá, com prefácio de Luiz
Nogueira de Barros, em 1998. E se aventurou também por
biografias, com as de Emílio de Maya e Solano Lopes, e relatos de
fatos históricos com a Guerra de Canudos, a Guerra Fria.

Luiz Gutemberg: um alagoano no Planalto Central

Jornalista, romancista, teatrólogo, comentarista e escritor,


Luiz Gutemberg Lima Silva, nasceu em Maceió no ano de 1937,
onde viveu até os 18 anos. Formado em Direito pela Universidade
Federal de Alagoas, o ex-professor do Curso de Jornalismo da
Universidade de Brasília também já foi conferencista em

843
seminários como o de Jornalismo Internacional da Universidade de
Stanford - Estados Unidos, chegando ainda a estagiar no jornal The
Washington Post. Com um vasto currículo, começou cedo, aos 15
anos na Gazeta de Alagoas, como repórter. Trabalhou na revista
Manchete e no Jornal do Brasil, do Rio, foi editor-assistente da
revista Veja, em São Paulo, analista político e diretor da Rede
Bandeirante. Publicou obras de grande sucesso de público, entre
elas “O Jogo da Gata Parida” e “Rendez-vous no Itamaraty”. Seu
talento como jornalista aproximou-o do mundo político nacional, o
que resultou na publicação da biografia de alguns senadores, como
a de Pedro Simon. No teatro, Gutemberg escreveu as peças “Auto
da Perseguição e Morte do Mateu”, “O Homem que enganou o
diabo... e ainda pediu troco”, “Auto da lapinha Mágica” e “O
Processo Crispim”. Em 1955 começa a trabalhar no jornal A
Gazeta de Alagoas. Entra para a Faculdade de Direito em 1956,
porém, mudando-se, no ano seguinte, para o Rio de Janeiro,
interrompe o curso, o qual só iria retomar seis anos depois,
formando-se em 1967. Trabalha como repórter e redator em
diversos jornais do Rio, tais como Diário de Notícias, Tribuna da
Imprensa e Jornal do Brasil e nas revistas Manchete e Mundo
Ilustrado. Regressa em 1961, a Maceió, no Governo Luiz
Cavalcante, como Chefe da Casa Civil. Gutemberg mora em
Brasília desde 1970, onde dirige as Edições Dédalo. Ele diz por
que deixou Alagoas.

“Foi uma fatalidade profissional: em julho de 1968 a Editora


Abril preparava o lançamento da revista semanal, lembraram de

844
mim, que estava morando em Maceió, me chamaram e lá fui me
incorporar ao grupo de fundador da Veja, em São Paulo, como editor
assistente. Fui e não voltei mais, salvo para visitas rápidas e
inesquecíveis férias de verão, a cada janeiro. Na verdade, esta foi
apenas a segunda e definitiva saída. A primeira deu-se em 1957, aos
18 anos, quando – com a cara e a coragem – emigrei para o Rio de
Janeiro para cumprir minha vocação de jornalista: desde os 16 anos
trabalhava na Gazeta e não resisti à tentação de experimentar a
grande imprensa nacional do eixo Rio-São Paulo. Precisei apenas de
uma semana para conquistar meu primeiro emprego, na revista
Manchete, que vivia seu apogeu, e de onde me transferi para o Jornal
do Brasil, que estava sendo modernizado por Odylo Costa Filho, e
onde vivi minha grande experiência profissional. Mas sempre, como
até hoje, não consigo esquecer Alagoas, meu coração, esteja onde
estiver, está sempre em Maceió”.

Majella: uma história contada em vermelho

O historiador, escritor e biógrafo Geraldo de Majella Fidelis


de Moura Marques, alagoano de Anadia, é um dos mais prolíficos
escritores alagoanos, sempre com um verniz de sua militância
política. Verdadeiro guardião da trajetória gloriosa do Partido
Comunista Brasileiro, ele não se importa em enfrentar os ideólogos
da direita e os neófitos sobre os movimentos populares e seus
maiores e mais combativos personagens que fizeram a história, à
sombra da política oficial. Majella é autor de livros engajados
como Caderno da Militância – histórias vividas nos bastidores da

845
política; Execuções Sumárias e Grupos de Extermínio em Alagoas
(1975-1998); Rubens Colaço: Paixão e vida – A trajetória de um
líder sindical; Mozart Damasceno, o bom burguês; O PCB em
Alagoas: Documentos (1982-1990); Dênis Agra: um Jornalista em
Defesa da Liberdade (2014), e seu mais recente livro Jayme
Miranda, um revolucionário brasileiro, Editora Bagaço, 2015.
Majella veio de uma família de classe média baixa, pai
comerciante do interior e mãe professora primária da rede estadual.
Ainda jovem, ele conheceu poetas, cantores, cantoras, artistas,
atores de teatro e jovens rebeldes que desafiavam como podiam a
ditadura militar ou mesmo transgrediam as normas de condutas
sociais da época. Ao fazer 50 anos, Majella falou sobre seu tempo
de militante, tempos difíceis de enfretamento à ditadura.

“Os desafios eram maiores que as nossas idades e


experiências na arte da organização partidária. Este imprensado que
vivíamos: de um lado o gigantismo do PCdoB e dos seus aliados; do
outro, o conservadorismo das forças políticas, enfileiradas no PMDB,
sem deixar de considerar que se tratava dos que combateram a
ditadura em maior ou menor grau. A participação nas eleições com
candidatos próprios foi a prova de que tínhamos de participar desse
mundo ainda desconhecido. Uma espécie de zona cinzenta. Escolher
candidatos nem sempre é uma coisa fácil; o processo eleitoral é
sedutor e envolvente, não é difícil identificarmos os candidatos ou os
que estão em sua volta envolvidos com irregularidades, com o ilegal.
A “conquista do voto” invariavelmente é como se fosse um imã, um
vale-tudo. O ilegal transita da compra propriamente dita do voto ao

846
tráfico de influência e à distribuição de benesses – na maioria das
vezes públicas: são favores, empregos etc. Transitar nesse ambiente
foi um rito de passagem para o amadurecimento que chegou em meio
às lutas, com derrotas e vitórias.

Jaime de Altavila (1895-1970)

É o nome literário de Anfilófio de Oliveira Melo, professor,


poeta, deputado estadual, vereador, prefeito de Maceió. Filho de
Balbino Figueiredo de Mello e Deolinda de Oliveira Mello. Fez
seus estudos no Liceu Alagoano. Aos quinze anos inicia sua
colaboração em jornais. Matriculou-se na Faculdade de Direito do
Recife, onde morou três anos, terminando, porém, seu curso, na
Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, em 1923.
Nesse mesmo ano regressa a Alagoas. Foi professor de História
Geral, Instrução Moral e Cívica e História da Civilização, além de
Sociologia na Escola Normal de Maceió e no Liceu Alagoano, de
onde foi diretor. Foi diretor da Imprensa Oficial de Alagoas em
1915, promotor público. Foi fundador da Academia Alagoana de
Letras Membro, e partir de 1923, membro do Instituto Histórico e
Geográfico. Sua obra é vasta, com 25 livros publicados, os quais
incluem assuntos como Direito, História, romances, poesias,
contos e composições musicais, de parceria com o mestre alagoano
Hekel Tavares. É de sua lavra a poesia publicada no blog do
médico Milton Ênio, no fechamento e seu artigo “Nossa Alagoas
Querida”, em 14/09/20014

847
“Eu trago a minha terra nos meus olhos
Minha terra é morena como as arvores sertanejas
Minha terra tem os cabelos verdes como os coqueirais
Eu trago minha terra em meus ouvidos
Minha terra é sonora como o sabiá da mata
Eu trago a minha terra em meu olfato
Minha terra cheira a mel quente dos engenhos
Eu trago a minha terra nos meus lábios
Minha terra é saborosa como os frutos de nossas arvores
Eu trago a minha terra bem dentro do coração
Minha terra é formosa; boa e hospitaleira
Minha terra é para mim/O pedaço melhor da terra brasileira”

Moacir Medeiros de Sant´Ana

Com 86 anos, Moacir Medeiros é o que se pode chamar de


arquivo vivo da história de Alagoas, guardião dos grandes acervos
e escritor de quatro costados, prestigiado por todas as gerações de
escritores, poetas, pesquisadores. Além de 53 obras publicadas,
106 artigos em jornais e revistas, 47 prefácios, o professor Moacir
Sant´Ana foi diretor do Arquivo Público de Alagoas por mais de
40 anos, e foi responsável pela sua manutenção, reconstituição e
salvaguarda do patrimônio histórico do Estado. Em setembro de
2013, a Universidade Federal de Alagoas lhe concedeu o título de
Doutor Honoris Causa, como forma de reconhecer a contribuição
do professor no que refere à formação de pesquisadores de História
e por sua produção intelectual. Em 2014, a Universidade Estadual

848
de Alagoas, também lhe concedeu o título de Honoris Causa, por
notório saber. É autor de obras importantes como A História do
Modernismo em Alagoas (1980); Contribuição à História do
Açúcar de Alagoas (1970); História da Imprensa em Alagoas:
1831-1981 (1987); Efemérides Alagoanas (1992).

“Moacir Medeiros de Sant´Ana é um pesquisador nato;


nato, e, sobretudo, honesto. E se tornou hoje, desculpem a
franqueza dos mestres – o maior conhecedor da história das
Alagoas, não por ouvir dizer ou por repetir o que os antigos já
disseram, mas por pesquisar, investigar, estudar, comparar”.

Manuel Diégues Júnior, historiador, no prefácio do livro


Contribuição à História do Açúcar, Moacir Medeiros de Sant´Ana,
edição fac-simile da Coleção Pensar Alagoas – Imprensa Oficial
Graciliano Ramos 2011

Judas Isgorogota: o desconhecido poeta alagoano

O poeta e jornalista alagoano Agnelo Rodrigues de Melo,


que adotou o pseudônimo de Judas Isgorogota (1901-1979), nasceu
em Lagoa da Canoa, agreste alagoano. Viveu em Maceió até os 23
anos, quando mudou-se para o Rio de Janeiro e depois para São
Paulo onde ganhou projeção internacional. Parte de sua obra
poética traduzida para vários idiomas (francês, inglês, alemão,
espanhol, italiano, húngaro, árabe, checo e lituano). Com toda essa
bagagem é quase um desconhecido em sua terra. Estreou na letras

849
com Caretas de Maceió, em 1922, poesias humorísticas sobre
costumes e personalidades locais, inicialmente publicadas em O
Bacurau. Sócio fundador da Academia Alagoana de Letras,
ocupando a cadeira 25. Transferiu-se para São Paulo em 1924,
onde foi secretário da revista Arquivos da Polícia Civil de São
Paulo, órgão da Secretaria de Segurança, em São Paulo, atuou na
Revista do Brasil, de Monteiro Lobato, e, na imprensa diária, nos
jornais: Gazeta, onde dirigiu A Gazeta Infantil, (SP), O Estado de
São Paulo, Jornal do Comércio e nas revistas Comentário, Revista
Oriente e A Época.

Bebedouro
Judas Isgorogota

Na Manguaba tranquila uma canoa


Dança lá em baixo: lá em cima, a lua
Põe pó de arroz na face da lagoa...
Junto às margens, o mangue; após, a rua.

E a choupana humilde, a tabaroa,


Rica de sonhos na pobreza sua...
Depois, alguém; e nesse alguém um choro
Silencioso lhe molhando o olhar.

O alguém sou eu; a terra é Bebedouro...

850
Desconversemos... não convém lembrar.

Publicada no jornal Correio Paulistano, abril de 1938.

Luiz de Medeiros Neto (1914-1992)

Deputado federal, professor, jornalista. Seus estudos no


Seminário Arquidiocesano de Maceió, onde também fez os cursos
de Humanidades, Filosofia, Teologia e História, entre 1925 e 1935,
quando, em novembro, é ordenado padre. Diretor do Departamento
de Educação, entre 1942 e 1945, bem como Diretor do
Departamento das Municipalidades e de Assistência ao
Cooperativismo (1941-45). Elege-se deputado federal, pelo PSD,
na legislatura de 1946-50, sendo reeleito sucessivamente para mais
seis mandatos, caso único no estado. Em novembro de 1970 se
elege suplente do senador Luís Cavalcante para a legislatura 1971-
78. Como parlamentar, esteve nos Estados Unidos para conhecer
os trabalhos de recuperação e valorização do Vale do Tennessee;
na Argentina, analisando a obra social do governo Perón; e, na
Bolívia, examinando as obras da Comissão Mista Brasil-Bolívia.
Membro da AAL, onde ocupou a cadeira 6; da Academia Carioca
de Letras, da Academia de Arte e Cultura de São Paulo, da
Federação das Academias de Letras do Brasil e do IHGA. Sua ação
foi decisória na criação da UFAL, da qual foi fundador e professor
catedrático de História e professor emérito. Fundador, ainda, do
Centro Universitário de Brasília - CEUB, do qual foi professor nas
cadeiras de História Geral e História do Brasil. Durante certo

851
período ocupou a Presidência do Conselho Estadual de Educação.
Em 1971, o Papa Paulo VI concordou com sua Reductio Ad
Statum Laicum, tendo, então se casado com a professora Andréa
Maria Coelho da Paz de Medeiros Neto. Entre as suas obras estão
Versos e Rima, 1941 (poesia); História do São Francisco, Maceió,
Casa Ramalho, 1941.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Luiz B. Torres (1926-1992)

Lançou seu primeiro livro, “Procissão dos Miseráveis”, em


1970, e foi com ele que recebeu seu primeiro prêmio como
escritor: O do Moinho Nordeste, numa indicação unânime da
Academia Alagoana de Letras. “Os Índios Xucuru e Kariri em
Palmeira dos Índios” foi outro livro escrito por Luiz Torres e teve
quatro edições ampliadas. Por seu empenho em pesquisar e
escrever sobre os primeiros habitantes de Palmeira dos Índios, foi
convidado e tomou posse no Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas, em 1974. “A Terra de Tilixi e Txiliá – Palmeira dos
Índios nos Séculos XVIII e XIX” foi outro livro escrito por Luiz
Torres, em 1975, e que lhe deu uma Menção Honrosa, por seus
méritos como historiador, pelo Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas. Em 1984, o Instituto Joaquim Nabuco, de Pernambuco,
concedeu-lhe a Medalha de Mérito, por seus relevantes serviços
prestados à cultura nordestina e brasileira. Em 1987, recebeu da

852
Fundação Teatro Deodoro o Mérito Cultural, face aos seus
préstimos de benemerência a essa entidade. Em 1991, lança mais
uma obra: “Visão Social do Evangelho”. Dois livros de Luiz
Torres foram lançados in memoriam: “Roteiro Sentimental de
Graciliano Ramos em Palmeira dos Índios”, em parceria com o
também palmeirense Ivan Bezerra de Barros, em 1992. Luiz Torres
deixou várias obras concluídas, mas não publicadas: “Eu e o
Amor”; “Socorro, não quero ser padre”; “O Catolicismo e sua
influência em Palmeira dos Índios”; “Estou Baleado, me acudam”;
“Vereadores e Prefeitos desde 1838”; “Jornais Palmeirenses desde
1865”; e “A cidade do Amor”, onde narra a lenda da fundação de
Palmeira dos Índios.

A fundação do Museu Xucuru


Na área de pesquisa, Luiz Torres trouxe à tona a história da
cidade de Palmeira dos Índios. Descobriu documentos dos séculos
XVIII e XIX, fatos reais ocorridos no desenvolvimento do
pequeno arraial, e definiu datas históricas. Em 1971, fez o mesmo
trajeto que os oficiais da Guarda Nacional fizeram em 1822,
quando, por ordem do Imperador, delimitaram as terras destinadas
aos índios xucurus e kariris. Encontrou os marcos e também suas
testemunhas, que serviram como indicativos fronteiriços dessa
área. Descobriu seis cemitérios indígenas e neles desenterrou 35
igaçabas. Encontrou panelas, machados, pontas de flechas e outros
instrumentos pertencentes à civilização indígena no passado. Em

853
1971, funda o Museu Xucurus de História, Artes e Costumes, e
nele coloca todos os materiais pertencentes ao passado,
encontrados por ele, além de arrecadar junto à população outros
instrumentos pertencentes às famílias mais tradicionais da taba
xucuru/kariri. Em 1966, o então prefeito José Duarte Marques
sanciona a lei 691, onde determinava como símbolos oficiais da
cidade de Palmeira dos Índios, o Hino, o Brasão e a Bandeira
confeccionados por Luiz Torres em co-parceria com outros
palmeirenses. Em 1988, produziu e dirigiu um documentário sobre
a lenda da fundação da cidade de Palmeira dos Índios, em VHS,
tendo como protagonistas os próprios descendentes dos índios
xucuru/kariri. Em 1989, filma a história do fundador da primeira
tipografia da Vila de Palmeira dos Índios, bem como a fundação do
seu primeiro jornal.

Manoel Diégues Júnior (1912-1991)

Manoel Baltazar Pereira Diégues Júnior foi sociólogo,


professor, jornalista, advogado e folclorista. Seus estudos
primários e secundários foram realizados no Grupo Escolar
Diégues Júnior, no Liceu Alagoano e no Ginásio de Maceió. Aos
16 anos, foi fundador e primeiro presidente do Grêmio Literário
Guimarães Passos e, por um período de dois anos (1932-1933),
secretariou a Comissão de Folclore. Concluiu o curso de Ciências
Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife em 1935,
mas dedicou-se ao estudo da Antropologia e da Sociologia. Em

854
1939, radicou-se no Rio de Janeiro e trabalhou na Secretaria Geral
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Exerceu
o cargo de Diretor Geral do Departamento Estadual de Estatística
dos Estados do Espírito Santo (1940) e de Alagoas (1942). Em
1945, foi eleito membro da Comissão Nacional de Folclore do
Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), órgão
da Unesco. Entre 1958 e 1979, exerceu o cargo de Diretor do
Centro Latino-Americano de Pesquisas em Ciências Sociais e do
Departamento de Ações Culturais do Ministério da Educação. Foi
professor de Antropologia Cultural e Antropologia no Brasil e
diretor do Departamento de Sociologia e Política da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Sua maior obra é O
bangüê nas Alagoas, traços da influência do sistema econômico do
engenho de açúcar na vida e na cultura regional (1949).

“Reclamava-se, portanto, o banguê alagoano que se


sscrevesse a sua história, de maneira que não apagassem, no futuro,
suas tradições tão cheias de beleza: os engenhos resistindo à invasão
holandesa, e sofrendo os martírios de incêndios consecutivos;
senhores de enegenho batendo-se por seu Deus e sua pária; as festas
religiosas, as de batizado e de casamento, também as reuniões
sociais; senhores e senhoras de engenho deixando em testamento
trancelins de ouro, móveis de jacarandá, pulseiras de prata; imagens
vindas de Portugal; escravos sadios e fortes, outros doentes e
maltratados ou ainda emancipando negros bons que serviam com
dedicação; engenhos indo à praça por dívidas; outros sendo vendidos
por não podendo mais os seus senhores mantê-los”.

855
Manoel Diegues Júnior, em O Banguê nas Alagoas, edição
Edufal – 1980

Diégues funda Grêmio Guimarães Passos


Um primeiro momento importante na vida de Diégues
Júnior é, sem dúvida, a fundação do Grêmio Literário Guimarães
Passos em Maceió, sediado curiosamente em sua própria casa no
bairro da Pajuçara, naquela noite de 1927: um ano-chave na
compreensão cultural e de transição nas Alagoas, de vez que se
publicam as primeiras obras modernistas, em forma de versos. O
Grêmio será uma amostra do antagonismo entre o passado
parnasiano e o presente modernista, o tradicionalismo e o
progressismo, assim como fora o Congresso Regionalista do
Recife no ano anterior. Imersos nesta atmosfera alagoana estariam
nomes da estatura de um Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz,
Théo Brandão, José Lins do Rego, Santa Rosa Junior, José Aloysio
Vilela, Aurélio Buarque de Holanda, Valdemar Cavalcanti, Arnon
de Mello e Aloysio Branco. Neste momento, o próprio Diégues se
divide entre o tradicional e o moderno, ora sob influência de um
nome que se tornaria verdadeiramente seu mestre, que foi Gilberto
Freyre, ora pela sombra e presença pessoal daquele médico de
Maceió que fora o doutor Jorge de Lima, o qual lhe ministrou, a
conta-gotas, que o modernismo não era injeção de meras
invencionices e insanidades.

856
Moreno Brandão (1875-1938)

Nascido em Pão de Açúcar, no dia 14 de setembro de 1875,


“num casarão amigo, ao pé da igreja”, Francisco Henrique Moreno
Brandão fez os primeiro estudos ainda em Pão de Açúcar, com o
mestre Jovino da Luz. Depois, em 1887, já em Penedo, iniciou o
curso de humanidades no Colégio São José. Com 13 anos de idade,
escreve no jornalzinho da escola o seu artigo inaugural, abordando
a escravidão. Com a morte do avô que o criava, em janeiro de
1990, interrompe os estudos por um ano, para retomá-lo em
Maceió no Colégio Liceu Alagoano. Em 1992, morre a sua mãe e
Moreno Brandão interrompe novamente os estudos e fica sem
rumo. Ele confessa que para fugir da vadiagem a que se entregara,
pediu autorização ao ministro da Guerra para se matricular no
Colégio Militar do Rio de Janeiro. No ano seguinte, ainda
perseguindo o objetivo de estudar na Escola Militar, Moreno
Brandão tenta ingressar no 26º Batalhão de Infantaria. Mas ao
chegar ao Rio de Janeiro, em 1895, as matrículas já estavam
encerradas. “Minha nevrose, então, se exarcebou muito e, premido
por ela, apesar do tratamento a que me submeti, sob a direção do
doutor Nina Rodrigues tive, em setembro, regresso a Entremontes”
(na época um distrito de Pão de Açúcar). Em 1914 assume a
função de redator do Diário da Noite e, em seguida, funda com
Orlando Lins o Instituto Maceioense. Destacou-se também como
jornalista, poeta, romancista e historiador, sendo eleito Deputado
Estadual na legislatura de 1921 a 1924. Era sócio efetivo do

857
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e membro da
Academia Alagoana de Letras. Autor de vasta obra literária.

“A sua obra é tão vasta que não cabe, nem só enunciá-la, nos
limites de um discurso. Prosador, poeta, romancista, orador,
jornalista, filólogo, historiógrafo, só um livro poderia comportar o
índice de sua prodoção. Romances, deixou seis; contos, sem conta;
estudos alagoanos, ele próprio os denominou, 21... Além de tantos
outros não catalogados. Ainda ultimamente tinha em mãos de
editoras algumas obras, cujos nomes ainda não conheço”.

Inácio Gracindo, em discurso de apresentação de Moreno


Brandão, em sua posse em 1938 – na Revista do IHGA, volume
XX – Maceió, 1938/1939

Milton Hênio

Famoso médico pediatra e escritor, Milton Hênio nasceu em


Maceió, em 1937. Estudou no Colégio Guido de Fontgaland.
Formou-se pela Faculdade de Medicina da UFAL (1962). Fez
cursos em sua área de especialização, destacando-se
Gastroenterologia cirúrgica, no Hospital das Clínicas de São Paulo,
Desenvolvimento Psicológico da Criança, e Atualização sobre
Pneumopatias. Participou de diversas Jornadas Alagoanas de
Pediatria, de Jornadas Brasileiras de Pediatria, de Congressos
Brasileiros de Pediatria, É membro da Associação Médica

858
Brasileira, da Sociedade Médica de Alagoas, da Sociedade de
Pediatria de Alagoas, da Academia Americana de Pediatria. Sócio
do IHGA, desde 1991, onde ocupa a cadeira 43, da qual é patrono
Aníbal Falcão Lima. Obras: Medicina e Vida, Maceió, SERGASA,
1991; Pequeno Dicionário de um Pediatra, Maceió, Ed. Catavento,
1999; Sempre aos Domingos, Maceió, Ed. Catavento, 2001;
Sempre aos Domingos 2. Crônicas, Maceió, Imprensa Oficial e
Gráfica Graciliano Ramos, 2006. Tem mais de 500 artigos,
publicados na A Gazeta de Alagoas sobre assuntos relacionados
com a criança em seus mais variados aspectos.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Romeu de Avelar (1893-1972)

Um dos mais importantes relatos sobre as batalhas travadas


entre portugueses, espanhóis e holandeses, na chamada Guerra
Brasílica, durante os anos 1600, o do livro Calabar interpretação
romanceada do tempo da invasão holandesa, do jornalista e
historiador alagoano Romeu de Avelar (1893–1972) é um primor
de leitura, cuja última edição é de 1973, um ano antes da morte do
autor, tornando-se uma raridade bibliográfica disputada entre os
“ratos” de alfarrábios. Desde lá nunca houve outra reedição. O

859
romance é também um verdadeiro libelo que mistura lirismo e o
resgate histórico de Domingos Fernandes Calabar, em que o autor
reconstrói – batalha por batalha – a vida e morte do herói alagoano.
Romeu penetra no manancial histórico, nos arquivos, nos pontos
de vista antagônicos, e o mais importante: ele percorreu os locais
onde foram travadas as guerrilhas, e mostra com precisão de
detalhes cada movimento das tropas, do começo ao fim do livro,
do começo ao fim da guerra. Da primeira batalha até a última,
quando Calabar foi capturado e decapitado.

Livro proibido
Romeu foi o primeiro a escrever um livro sobre o
personagem Calabar (a primeira edição original foi bancada pelo
próprio autor em 1938), contestando a ideia de que Calabar teria
sido um traidor. Na época foi considerado subversivo e apreendido
pelas autoridades. Nele, o autor corajosamente argumenta que
Domingos Calabar, por ter sido brasileiro a gritar por liberdade no
Brasil, antes de Tiradentes, Frei Caneca, entre outros esconjurados,
e teve todo o direito de escolher de que lado lutar. Avelar nos
mostra ainda um Calabar não apenas corajoso, mas também um
patriota. Segundo o autor, “Domingos Fernandes Calabar foi um
insurreto e um clarividente que se antecipou à revolução histórica e
liberal do Brasil”.

Jornalista e biógrafo
Romeu de Avelar nasceu em São Miguel dos Campos e
morreu em Leopoldina, Minas Gerais, em um acidente de

860
automóvel. Seu nome verdadeiro era Luís de Araújo Morais. Foi
um dos responsáveis pelo lançamento em 1914 da Revista Frou-
Frou e também diretor de jornais e revistas em Maceió como A
Imprensa e o Diário de Maceió. O escritor alagoano escreveu
também contos, peças de teatro, crônicas, um romance do cárcere
(À sombra do presídio, 1928) e a biografia do General Góis
Monteiro. Membro da Academia Alagoana de Letras, onde ocupou
a cadeira 32.

Valdemar Cavalcanti (1912-1982)

A história de Valdemar Cavalcanti se confunde com a


própria trajetória da literatura nordestina e do jornalismo
brasileiro. O alagoano completaria 100 anos no dia 29 de março
(2012). Jornalista, crítico literário e funcionário público (IBGE),
Vavá, como era conhecido pelos amigos, fez parte de uma das
maiores e mais refinadas safras de escritores regionais
brasileiros. Um grupo de estudiosos que exerceu grande
influência no Nordeste, entre filólogos, romancistas e críticos
literários, como os amigos Graciliano Ramos, Jorge de Lima,
Jorge Amado, Raquel de Queiroz, José Lins do Rego, Aurélio
Buarque de Holanda, José Condé e Santa Rosa, entre outros. No
jornalismo, Valdemar tornou-se o primeiro crítico literário, e o
pioneiro como colunista diário do jornalismo impresso, pelo ‘O
Jornal’, de Assis Chateaubriand, onde por duas décadas manteve
a coluna ‘Jornal Literário’. A ligação de Valdemar com o
jornalismo começou cedo, aos 16 anos, quando ocupou o cargo de

861
redator do Jornal de Alagoas e depois da Gazeta de Notícias.
Nomeado secretário da prefeitura de Maceió aos 20 anos, não
deixou o jornalismo de lado. Pelo órgão da Arquidiocese ‘O
Semeador’, liderou em 1924, em Maceió, a Semana de Arte
Moderna, da qual participaram, entre outros, Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira, Carlos Paurílio, Aluísio Branco e Lourenço
Peixoto.

Perfil do jornalista Rafael Cavancati, neto de Valdemar, em


artigo da Gazeta de Alagoas Os 100 anos de Valdemar Cavalcanti–
edição 14/04/2012

Valdemar e a revista Novidade


Uma de suas maiores obras nasceu em 1931, quando
fundou com Alberto Passos Guimarães o semanário cultural
‘Novidade’, que circulou de 11 de abril a 26 de setembro na
capital alagoana. Até hoje a revista é uma referência no meio
acadêmico e literário. Ainda em Maceió, Valdemar datilografou
os originais de ‘Menino de Engenho’, clássico do amigo José Lins
do Rego, com quem mais tarde veio para o Rio de Janeiro, em
1933, onde trabalhou no Diário Carioca e fez crítica literária no
Diário de Notícias. Zé Lins, inclusive, foi um dos seus grandes
amigos, principalmente na capital carioca, companheiro no
‘Sabadoyle’, encontro de intelectuais na casa de Plinio Doyle; ou
nas partidas de futebol do Flamengo, paixão em comum dos dois
rubro-negros. No ano seguinte, em 1934, voltou ao Nordeste,
convidado para assumir o Diário de Pernambuco como secretário

862
de redação, no Recife. Dois anos mais tarde voltou para sua terra
natal, onde dirigiu a Gazeta de Alagoas, de Maceió. Valdemar
também foi membro honorário da Academia Francesa de Letras e
levantou, em 1965, o Prêmio Jabuti, como Melhor Crítica com o
Noticiário Literário, além do consagrado Prêmio Machado de
Assis, da Academia Brasileira de Letras (ABL), principal
premiação literária no país, além do prêmio Estácio de Sá de
Literatura em 78, entre outros. Membro da Academia Alagoana de
Letras (AAL), onde ocupou a cadeira 32, publicou em 1960 o seu
único livro, ‘Jornal Literário’, pela José Olympio. O acervo de
mais de 80 mil títulos, herança de sua vida dedicada à literatura e
ao jornalismo, foi doado à biblioteca da Casa de Rui Barbosa, em
Botafogo.

Perfil do jornalista Rafael Cavancati, neto de Valdemar, em


artigo da Gazeta de Alagoas Os 100 anos de Valdemar Cavalcanti–
edição 14/04/2012

Revista Novidade: as revelações


A pesquisadora Ieda Lebensztayn, autora de “Graciliano
Ramos e a Novidade: o Astrônomo do Inferno e os Meninos
Impossíveis” (Editora Hedra), é doutora em literatura brasileira
pela USP e pós-doutoranda no IEB-USP, conseguiu um feito
nunca antes alcançado: o acesso à coleção completa da revista

863
Novidade, no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGA),
e fez um apurado estudo sobre a coleção.

“Este artigo é uma apresentação da revista Novidade, de


Maceió, 1931, na qual Graciliano Ramos publicou algumas crônicas
e o capítulo 24 de Caetés. Em meu doutorado, desenvolvo o estudo da
Novidade, a partir da análise e interpretação dos textos de seus
colaboradores, como Valdemar Cavalcanti, Alberto Passos
Guimarães, Carlos Paurílio, Aloísio Branco, Willy Lewin, Diégues
Júnior, Aurélio Buarque de Holanda, Santa Rosa. Sendo meu
propósito compreender a formação da obra de Graciliano Ramos,
interessa-me, junto com a leitura de Infância, conhecer esses
escritores, o contexto histórico e histórico-literário da revista e as
crônicas de Graciliano nela publicadas, anteriores aos romances.
Assim, busco reparar o silêncio da historiografia literária quanto à
Novidade e mostrar a importância dos textos de Graciliano nela
publicados como matrizes temáticas e formais de sua obra”.

Trecho de artigo da pesquisadora Ieda Lebenstayn, na


revista Estudos Avançados, publicado em 25 de abril de 2007

Os “Meninos Pelados” da Novidade


Afetuosamente, Graciliano Ramos se refere a Valdemar e a
outros companheiros do tempo da Novidade como “meninos
pelados”, em uma analogia a seu livro de literatura infantil “A terra
dos meninos pelados”, que escreveu lodo depois de deixar a prisão,
no Rio de Janeiro. A revista Novidade circulou com 24 edições de

864
dezesseis páginas, de 11 de abril a 26 de setembro de 1931, com
periodicidade semanal. A revista Klaxon, de São Paulo, a primeira
revista modernista, de Mário de Andrade, Oswald de Andrade,
Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, dentre outros, durou nove
números (1922), e A Revista, de Belo Horizonte, de Carlos
Drummond de Andrade, Emílio Moura, João Alphonsus, Pedro
Nava, Abgar Renault, publicou três números (1925-1926).

“Com satisfação, dediquei-me à leitura dos textos da


Novidade e à preparação de um índice, o que me permitiu identificar,
no corpus bastante variado da revista, uma estrutura e alguns temas
recorrentes. Quanto à estrutura, compõe-se de: editorial, o chamado
“artigo de fundo”; expediente e tópicos; uma sequência de textos,
podendo incluir artigos sobre política, contos, crônicas, ensaios de
crítica literária ou teatral; a seção de poemas; fotografias; crítica e
notas de cinema; notas da semana; sociedade (“moda”, “registro de
aniversários”, “festas”) e anúncios. Quanto aos temas, a Novidade é
reveladora dos problemas sociais nordestinos e brasileiros e da
insatisfação que perduraram após a Revolução de 1930. Desnuda em
suas várias faces uma realidade de miséria: a violência do cangaço, a
indústria das santas milagreiras, o analfabetismo, a política
personalista, a necessidade de reforma da Constituição”.

Trecho de artigo da pesquisadora Ieda Lebenstayn, na


revista Estudos Avançados, publicado em 25 de abril de 2007

Quem escreveu na Novidade

865
Graciliano Ramos
José Lins do Rego
Jorge de Lima
Murilo Mendes
Álvaro Lins
Aurélio Buarque de Holanda
Santa Rosa Júnior
Valdemar Cavalcanti
Alberto Passos Guimarães
Carlos Paurílio
Aloísio Branco
Manuel Diégues Júnior
Raul Lima

Ib Gato (1914-2008)

Médico, secretário de estado, professor, jornalista, Ib Gatto


Falcão foi um dos maiores beneméritos de Alagoas, para além de
sua obra literária. Forma-se na Faculdade de Medicina da Bahia
(1935) e regressa a Maceió, onde a partir de 1936 é médico do
Pronto-Socorro. Professor-fundador da Faculdade de Medicina de
Alagoas, da qual foi catedrático de Clinica Cirúrgica. Foi
secretario de Saúde e Assistência Social (1961/65) no governo
Luiz Cavalcante, desenvolveu um programa de construção de
habitações populares. Secretário de Planejamento do Governo
Lamenha Filho (1967), quando presidiu o Conselho de
Desenvolvimento Econômico do Estado. Secretário de Saúde e

866
Serviço Social no governo José de Medeiros Tavares. Sócio do
IHGA, empossado em 1949 na cadeira 3, da qual é patrono Osório
Gato. Membro da AAL, tendo sido eleito seu presidente em 1998,
sendo reeleito sucessivamente. Entre 1970 e 1974 foi Diretor da
Escola de Ciências Médicas, sendo hoje professor emérito da
instituição, como também da UFAL.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Tomaz Espíndola (1832-1889)

Deputado, presidente interino da Província, médico e


jornalista. Considerado o pai da história de Alagoas, teve uma
avaliação consagradora de sua vida. Em 10 de julho de 1867, com
a exoneração do presidente (hoje seria governador) da Província,
Galdino Augusto da Natividade, Espíndola assume o governo.
Nessa época, o Brasil estava lançado na Guerra do Paraguai.
Bacharelou-se na Faculdade de Medicina da Bahia. A obra mais
conhecida de Tomaz Espíndola é Geografia Alagoana Descrição
Física, Política e Histórica da Província das Alagoas, ainda em
edição tipográfica de 1871. Uma das melhores análises feitas desse
político e intelectual alagoano é do memorialista Félix Lima
Júnior, nos 80 anos de nascimento de Espíndola, em 1969, quando
falou durante o sepultamento do corpo de Espíndo, na sacristia da
Catedral Metropolitana de Maceió: “Tomás Espíndola foi um
homem austero, culto, brilhante, de aprimorada educação,

867
convivendo com os mais destacados elementos da sociedade
alagoana, que o estimavam e o respeitavam. Estudioso de tudo
quanto se referia e interessava a nossa terra. Morreu serenamente,
com a consciência tranquila, pois cumprira na Terra e, dedicado,
servira a sua pequena província”.

Coleção Memórias Legislativas, documento da Assembleia


Legislativa de Alagoas – 28/12/1997

Ivan Fernandes Lima (1927-1995)

Professor e Geógrafo, Ivan Fernandes Lima nasceu em


Murici, e deixa obras fenomenais sobre a geografia alagoana. Após
os escritos pioneiros de Craveiro Costa, Octávio Brandão, Moreira
e Silva e Thomaz Espíndola, um homem apaixonado pelas
paisagens e pelo relevo de sua terra natal se tornou o mais
importante geógrafo alagoano do século 20. O mapa de Alagoas,
como se conhece hoje, tem seus limites precisamente
esquadrinhados graças aos contínuos trabalhos de campo do mestre
Ivan. Ele, que a bordo de uma antiga Rural e depois num jipe,
percorreu cantos e recantos de todos os 102 municípios alagoanos.
Formado em Direito e em Geografia e História (licenciatura e
bacharelado) pela antiga Faculdade de Filosofia de Pernambuco,
Ivan Fernandes Lima não se limitou à sala de aula. O ex-professor
do colégio Marista do Recife, do Lyceu Alagoano, do Colégio
Batista e da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) sempre trilhou
as subidas e descidas das serras alagoanas em paralelo ao percurso

868
pedagógico. Foi ele quem sistematizou os mapas de Alagoas. Toda
essa divisão em mesorregiões foi ele quem iniciou. Entre inúmeras
notas, cartilhas didáticas e artigos científicos, dois livros de Ivan
Fernandes Lima merecem ser destacados. O primeiro, Maceió - A
Cidade Restinga - é uma obra extremamente técnica sobre a
formação geomorfológica da cidade, lançado em 1961, que serviu
de tese para a admissão do geógrafo como professor no tradicional
Lyceu Alagoano: e o clássico Geografia de Alagoas, livro didático
lançado em 1965, veio como uma obra geográfica de porte. Ampla
e abrangente, e foi utilizada como base para o ensino da geografia
de Alagoas nas escolas da rede pública da década de 60.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Mulheres escritoras e poetisas

Arlene Miranda (1937-2013)

Arlene Miranda foi a primeira jornalista profissional de


Alagoas, quando começou a trabalhar no Jornal Gazeta de Alagoas

869
em 1954, aos 15 anos de idade. Ela foi a primeira mulher a
trabalhar em uma redação de jornal em Maceió como jornalista.
Depois disso morou em muitos lugares e passou por diversas
redações. Em 1980, afastou-se do jornalismo e se casou com o
mineiro Nilo Pereira, indo morar no interior de Minas Gerais.
Arlene se aposentou precocemente devido a problemas
cardiovasculares. Afastada das redações, passou a dedicar-se à
literatura dando seguimento a uma carreira iniciada em 1966
quando lançou “A Hora Presente”, que foi relançado em janeiro de
2004. As obras que se seguiram foram: “Perfis” (crônicas), em
1991, sobre a imprensa alagoana dos anos 50 e 60; “Histórias Bem
Contadas” (crônicas), em 2000; “Os Colibris em Festa (poesia) e
“Retratos da Vida” (crônicas), ambos em 2006. Arlene Miranda
fez ainda parte da Academia Maceioense de Letras e do grupo
literário Movimento da Palavra. Em seu terceiro livro, Histórias
Bem Contadas, de 2000, ela fala de c casos pitorescos em sua vida,
inclusive um pedido de casamento que lhe fez o jogador Pelé, em
1958, no Recife.

Dicionário Mulheres de Alagoas ontem de hoje, de Enaura


Quixabeira Rosa e Silva e Edilma Acioli Bomfim, Edufal 2007

Cléa Marsiglia (1929-2005)

Diplomada em Direito pela Faculdade de Direito de


Alagoas. Advogada na Procuradoria do IAA. Membro da AAL,
onde ocupou a cadeira 9. Com Francisco Valois editou a revista

870
Acaieme, que ficou no primeiro número. Publicou: Sarabanda,
Maceió, Editora Caeté, 1951, (poema em prosa); Difícil reino
amar, Maceió, SENAC/DAC, 196- (poesia); Jarro de porcelana,
ilustrações de Roberto Lopes, Maceió, SERGASA, [s.d.] (poesia):
Luminária, Maceió, DAC/SENEC, SERGASA, 1974 (poesia);
Quarteto do tempo, Maceió, 1968, (poesia); Cânticos da terra, São
Paulo, 1956, prêmio no concurso feminino de poesia, em 1956, de
A Gazeta, de São Paulo; Poemas e baladas, Rio de Janeiro, Edições
Leitura, 196- (poesia), entre outros. “Cléa Marsiglia é um poeta de
rara leveza, retirando a poesia da pura sensação. É uma pena
conhecer uma poeta tão sutil com tanto atraso e mesmo que ela vindo
da terra de dois outros dois grandes poetas (Jorge de Lima e Lêdo
Ivo), não seja festejada nacionalmente”.

Clara Ramos (1932-1993)

Filha de Graciliano Ramos e Heloísa Ramos, Clara Ramos


deixou Maceió em 1937, quando foi morar com a mãe no Rio de
Janeiro. Aos 11 anos publicou seu primeiro livro, “Uma garota fala
dos grandes”. Trabalhou como jornalista no Correio da Manhã e na
Rádio Globo. Em 1979, lança sua grande obra “Mestre Graciliano:
Confirmação humana de sua obra”, pela Civilização Brasileira.
Clara ficou conhecida também pela briga que travou contra a
famíia, por achar que o livro do seu pais Memórias do Cárcere
tivera capítulos aduterados pelo Partido Comunista, a que
Graciliano fora militante (1945). Com esses capítulos nas mãos,
Clara travou uma briga pública com o resto da família. Na ocasião,

871
o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma reportagem com o
título: “As memórias que Graciliano não escreveu”. Clara acusava
a mãe, Heloísa, e o irmão Ricardo de ter permitido a interferência
na obra do pai. Cobrava deles a entrega dos outros capítulos
manuscritos. Clara morreu em 1993, aos 71 anos, sem ter se
reconciliado com os familiares. Ela ainda acreditava que o livro
fora alterado pelos comunistas.

“Mais uma vez tenho consciência de minha precariedade.


Relaciono num livro as implicações do caso, assino embaixo,
deixo o caso registrado, a solução nas mãos de Deus”, escreveu
em seu último livro, Cadeia, publicado um ano antes de morrer.

Cármem Lúcia Dantas

Professora, museóloga, escritora e administradora cultural.


Alagoana de Penedo, Cármem Lúcia Dantas formou-se
Museologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e fez
Mestrado em Literatura, na UFAL. Tem uma vida dedicada a
cultura alagoana e é uma das mentes privilegiadas do Estado. É
membro do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, mas é
considerada a madrinha do Museu Théo Brandão, da UFAL, por
tê-lo recuperado em apenas dois anos, após passar 14 anos
fechado, devido a inércia de gestores públicos. Tendo Penedo
como memória efetiva, uma cidade de majestosos casarões, um
verdadeiro museu a céu aberto, ingressou no curso de Museologia,
na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Retornando à Alagoas,

872
especializou-se em História do Brasil e fez mestrado em Literatura
Brasileira pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Enveredou pelo caminho do magistério e notabilizou-se pela
especial proficiência com que lecionou História da Arte, na UFAL.
Trabalhou no Departamento de Assuntos Culturais da Secretaria de
Educação de Alagoas (DAC), juntamente com a diretora Solange
Chalita, realizaram o 1° Festival de Cinema de Penedo e o Festival
de Verão (arte) de Marechal Deodoro. Cármen Lúcia recebera
convite do Reitor da UFAL, Rogério Moura Pinheiro, para
recuperar o Museu Théo Brandão. Aceitou o desafio e exerceu
com êxito a missão. Conseguira recursos para restauração do
prédio, instalação do acervo e a manutenção do Museu.

“Cármen Lúcia Dantas é um verdadeiro ícone da cultura


alagoana. Como amigo, admirador e parceiro - em várias obras
sobre a história e a cultura alagoana - posso afirmar que a
personalidade desta mulher se faz sentir com vigor na Alagoas
contemporânea. Penedense extremamente orgulhosa de suas raízes,
da mesma forma que glorifica seu estado natal. Como educadora e
intelectual, tem uma vida multiforme e rica. Dá uma contribuição
ímpar para as artes e a memória alagoana”.
Por Douglas Apratto Tenório
Edilma Bomfim Acioli

Escritora, professora e crítica literária, Edilma Acioli é


graduada em Letras, pela UFAL, e pós-graduada em Linguística e
Comunicação, com mestrado em Letras e Linguística, pela UFAL,

873
em 1992, com a dissertação Uma Representação Poética do
Discurso Amoroso em Fantasia e Avesso, de Arriete Vilela.
Doutora em Letras, pela UFAL (2000), tendo defendido a tese
Razão Mutilada: Uma Visão Junguiana da Loucura em João Urso,
de Breno Acccioly. Professora de Teoria da Literatura e Literatura
Portuguesa na UFAL, desde 1995. Consultora, CESMAC, desde
2008. Membro do corpo editorial da Entre Aberta - Revista do
Centro de Estudos Superiores de Maceió, desde 2008. Ingressou na
ALANE, em 2007, ocupando a cadeira 137, cujo patrono é o
contista Breno Accioly. Edilma lançou recentemente mais uma
edição do livro Razão Mutilada - Ficção e Loucura em Breno
Accioly, de 2005.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Enaura Quixabeira

Enaura Quixabeira Rosa e Silva, alagoana de Maceió,


começou sua carreira literária em 1995, a com publicação do
ensaio “A Alegoria da ruína”, e doutora em Letras pela Université
Stendhal Grenoble 3 e mestra em Literatura Brasileira na
Universidade Federal de Alagoas. Sócia efetiva da Academia
Alagoana de Letras, Enaura Quixabeira é crítica literária, ensaísta e
poetisa. Considerada uma das mais conceituadas intelectuais de
Alagoas, Enaura trabalhou com formação de professores na rede
pública de ensino e como professora de Literatura, na UFAL, é

874
sócia efetiva da Academia Alagoana de Letras. Foi agraciada em
2008 com a comenda Nise da Silveira, conferida pelo Governo do
Estado. A escritora já conta com 10 livros publicados, dentre eles
"Do traje ao Ultraje” e "Lúcio Cardoso: paixão e morte na
Literatura brasileira", além de vasta produção científica. Ela
atualmente coordena o núcleo do Programa de Pesquisas do
CESMAC. “Eu amo a literatura porque as piores coisas da vida,
com o toque da arte, se transformam; elas se transfiguram e isso é
maravilhoso. E através da arte fugimos deste mundo banal e dessa
realidade fria”, diz, destacando a obra “Lúcio Cardoso - Paixão e
Morte na Literatura Brasileira”, como sendo o seu trabalho mais
acabado.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Izabel Brandão, uma intelectual para o Brasil

Ela nasceu em Pedra Azul, Minas Gerais, no Vale do


Jequitinhonha, Sul do Estado, a parte mais nordestina das Gerais,
perto da Bahia. Esta aproximação chega a Alagoas, onde Izabel
Brandão constrói e colhe os frutos do que plantou, com uma das
mais notáveis intelectuais que o Brasil precisa conhecer ainda
mais. E Alagoas também. Com 57 anos, a escritora e professora,
filha de Armando da Rocha Brandão e Izabel das Dores Brandão,
já publicou três livros de poesia (As horas da minha alegria, de
2013, Ilha de olhos e espelhos, de 2003, Espiral de fogo, de 1998)

875
e organizou vários de crítica (solo ou em colaboração). Atualmente
organiza (em colaboração) uma antologia intitulada Traduções da
cultura: perspectivas críticas feministas. Formada em Letras pela
Universidade Federal da Paraíba, Izabel Brandão possui mestrado
em inglês e literaturas correspondentes pela Universidade Federal
de Santa Catarina, doutorado em literatura inglesa pela University
of Sheffield, Inglaterra, e pós-doutorado na Universidade Federal
de Minas Gerais. Atualmente é professora da Faculdade de Letras
da Universidade Federal de Alagoas, No lançamento de seu
terceiro livro, “As Horas da minha Alegria”, em março de 2014,
onde conta em versos sua vivência por onde passou, ela crava sua
paixão por Alagoas.

“É, talvez, a cidade que eu gostaria que Pedra Azul tivesse


sido. A cidade real é outra, menor do que a da minha imaginação. É
como Maceió para mim. E este é um capítulo à parte na minha
trajetória de busca. Se você me perguntar se eu gosto daqui, vou
responder que aqui eu construí a minha vida. Então, Maceió faz parte
de mim e nela criei espaços que são genuinamente meus, os quais eu
compartilho com quem convive comigo. Essa Maceió criada é minha
também e me deu o que tenho de melhor, que é o meu filho Pedro.
Como não gostar de Maceió? Assim, o poema “Porto Final” resolve
muito dos conflitos que uma “estrangeira” como eu (e muitos que
também têm a mesma condição) teve que enfrentar para resgatar a
“casa” presente no coração da cidade: Este mar é meu/ a cidade
também. Por isso o fecho do livro diz “É aqui mesmo que/ Vou ficar."

876
Guiomar de Castro (1923-1992)

Poetisa, jornalista, funcionária pública. Agente Fiscal do


Imposto de Renda e, depois, Auditora Fiscal da Fazenda Nacional.
Publica suas primeiras crônicas em O Semeador, em Maceió. Em
1963, recebe o prêmio Personalidade Literária do Ano, em 1967, o
de Escritora do Ano, concedido pela Crônica Social de Alagoas.
Em 1972, recebe a medalha e diploma do IHGA pelos serviços
prestados à coletividade. Membro da AAL, tendo ocupado a
cadeira 07. Sócia do IHGA, onde toma posse em 1968, na cadeira
14, sendo patrono, Romeu de Avelar. Tem trabalhos publicados
pela Academia Goiana de Letras. Sócia do Grupo Literário
Alagoano, da AAI, da Federação Alagoana pelo Progresso
Feminino. Obras: A Europa É Assim, Maceió, Imprensa Oficial,
1963, prêmio da AAL (viagem); São Miguel dos Campos, Maceió,
DEC, Série Estudos Alagoanos, 1964; Discursos Acadêmicos,
Maceió, Imprensa Oficial, 1965, (discursos); Camões, O Gênio da
Raça, 1976, (ensaio); Castro Alves, o Lírico, 1979 (ensaio).

Dicionário Mulheres de Alagoas ontem de hoje, de Enaura


Quixabeira Rosa e Silva e Edeilma Acioli Bomfim, Edufal 2007

Heliônia Ceres (1927-1999)

877
Professora, jornalista, escritora, poetisa e contista, Heliônia
Ceres é licenciada em Letras Neolatinas pela Faculdade de
Filosofia do Recife (1952). Ingressa no jornalismo, em 1957, ainda
no Recife. Fez cursos de especialização em Língua e Literatura
Italiana, no Instituto Italiano de Cultura (1964), no Rio de Janeiro,
de Teoria da Literatura, na Universidade Federal de Minas Gerais
(1972); em Literatura Brasileira, Universidade de São Paulo
(1975). Lecionou Língua Francesa no Colégio Santíssimo
Sacramento (1953) e professora titular de Português e Francês no
Colégio Estadual Moreira e Silva (1957-63). Professora Língua e
Literatura Italiana, UFAL (1961-73). Sócia do IHGAL, tendo
tomado posse em 1994, na cadeira 14. Membro da AAL onde
ocupou a cadeira 12. Membro, ainda, do Grupo Literário de
Alagoas e da Associação Alagoana pelo Progresso Feminino, da
qual foi vice-presidente. Academia Brasileira de Letras (sócia-
correspondente); Pen Club do Brasil (sócia-correspondente);
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Femininos.

“Na literatura, Heliônia atuava como um pintor abstrato,


onírico, tendendo para a superação do mimetismo através das
imagens densas e plena de signos. Já em seu livro de estréia, e
escritora mostra-nos o caminho ficcional que abraçará: o da fuga do
medelo realista de ficção, pois constrói uma obra plena de
paradoxos, ironias, estranhamento e fantasmagoria narrativas”.

878
Vera Romariz, no artigo Resgatando Heliônia Ceres dez
anos depois: enfim! De Edilma Acioli Bomfim, em Gazeta de
Alagoas, Caderno Saber, 4/7/2009

Heloísa Maria de Gusmão Medeiros

Heloísa de Gusmão (1943-1989) foi uma brilhante filósofa,


oradora, cronista, jornalista, imortal da Academia Alagoana de
Letras (AAL), e se especializou em letras francesas – escreveu
artigo memorável s0bre Charles Baudelaire (Revista da AAL, nº
15, 1988) – e outros estudos sobre Graciliano Ramos. Pelo
desempenho ganhou o título de especialista em língua e literatura
francesa, da Universidade de Nancy. Em seu discurso de posse na
Academia, em 1984, ela preconizou o que o mundo passa hoje,
como se o passado fosse o presente.

“O homem deste final de século conturbado, ainda não


esqueceu as tragédias de Hiroshima e Nagasaki. Os gritos das
crianças, chamas humanas devoradas por intolerância sócio-política,
as convulsões dos adultos impotentes e a perplexidade dos velhos
ante uma morte coletiva, inédita, ainda nos estarrecem e destroçam a
sensibilidade. Ameaçados ante a possibilidade de um holocausto
nuclear, convivendo com as contingências seculares, ignorando a
natureza do cosmo e a finalidade da vida humana, o viajante
solitário, peregrino, carece de um pouso, um alento, uma libertação”.

Revista da Academia Alagoana de Letras, nº 10, 1984.

879
Ilza Porto (1919-2004)

Professora, escritora, romancista e jornalista. Estudou no


Asilo de Órfãs, em Bebedouro, no Colégio Santíssimo Sacramento
e finalmente diplomou-se em Letras pela UFAL (1972). Estudou,
ainda, na Universidade de Nancy, França (1995). Quatro prêmios
da Academia Alagoana de Letras, por livros de poesia e crônicas e
poemas escritos em francês. Recebeu, ainda, o prêmio da
Associação de Cultura Franco-Brasileira. Fundadora e presidente
do Grupo Literário Alagoano. Consócia do IHGA, empossada em
1984 na cadeira 47. Membro da AAL, na cadeira 21. Membro,
ainda, do Conselho Estadual de Cultura, da AAI e da Academia de
Letras e Artes do Nordeste Brasileiro. Obras: Poemas da Vida
Real, prefácio de Carlos Moliterno, Maceió, SERGASA, 1973;
Contos do Vale de Jacarecica, capa de Pierre Chalita, Maceió,
SERGASA, 1979, prêmio Romeu de Avelar, 1979 (contos ); Félix
Lima Jr. - O Amigo dos Estudiosos, Maceió, 1984 (biografia );
Major Bonifácio Magalhães da Silveira, o Homem do Governo e o
Homem do Povo Anotações de Sua Neta, (biografia); Memórias de
uma Colegial, Maceió, SECULT/SERGASA, 1993; Mandacarus,
nota introdutória de Heloísa Marinho de Gusmão Medeiros, capa
de Marisa Gatto, Maceió, SERGASA, 1987 (contos). Em certo
período foi responsável pelo Suplemento Literário do jornal A
Gazeta de Alagoas. Escreveu, ainda, critica literária para aquele
jornal e para o Jornal de Alagoas. Com O Grito, participou do livro
Contos Alagoanos de Hoje, São Paulo, LR Editores Ltda, 1982,
seleção, prefácio e notas de Ricardo Ramos e ilustrações de Pierre

880
Chalita, e com este mesmo conto, de Os Contos de Alagoas - Uma
Antologia, de Antônio S. Mendonça Neto, Maceió, Ed. Catavento,
2001. Escreveu, por vários anos, crônicas dominicais na Gazeta de
Alagoas, tendo, no mesmo jornal, dirigido a Gazeta Literária. É
uma das alagoanas citadas no Dicionário Crítico de Escritoras
Brasileiras (1711-2001) de Nely Coelho.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

Luitgard: a formação antropológica alagoana

A antropóloga alagoana Luitgarde Oliveira Cavalcanti


Barros, sertaneja de Santana do Ipanema, nascida em 22 de
dezembro de 1941, faz parte da geração de estudantes
universitários formados em plena Ditadura Civil-Militar. Num
contexto político e social de efervescência, os estudos acadêmicos
eram vistos por muitos alunos como parte da militância política.
Sem fugir à “regra”, Luitgarde O. C. Barros se dedicou aos estudos
do universo social e cultural do sertão nordestino, remontando suas
origens e buscando entender os movimentos insurgentes dos
sertanejos. Por isso, seus estudos durante o mestrado foram
dedicados ao catolicismo popular nordestino. Seu mestrado foi
concluído no ano de 1980, pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC/SP). Nessa etapa da sua vida acadêmica, a
antropóloga se debruçou sobre a religiosidade do sertanejo a partir
da devoção ao Padre Cícero. O título de sua dissertação foi A Terra

881
da Mãe de Deus: Um Estudo do Movimento Religioso de Juazeiro
do Norte, que teve sua primeira publicação, com o mesmo título,
em 1988, pela editora Francisco Alves. Ao retornar aos estudos
acadêmicos na década de 1990, a autora continuou se dedicando ao
universo sertanejo ao analisar o cangaceirismo como objeto de sua
tese de doutorado. A tese recebeu o título de A Derradeira Gesta:
Lampião e Nazarenos Guerreando no Sertão e foi publicada em
2000, pela editora Mauad em coedição com a FAPERJ. Por Selmo
Nascimento da Silva, no artigo “As contribuições de Luitgarde
Oliveira Cavalcanti Barros para os estudos do universo social e
cultural do sertão nordestino, 2011”, em Perspectiva Sociológica.

Leda Almeida

Escritora, editora, professora, historiadora. Graduação e


Mestrado em História pela UFAL (1988 e 1998). Especialização
em Filosofia, UFAL (1991). Doutorado em Educação, UFPE
(2007) com a Tese: Para Além da Paisagem: O Estado de Alagoas
nas Representações Sociais e nas Práticas Pedagógicas dos
Professores de 1ª a 4ª Séries da Escola Pública. Pós-doutorado em
Interculturalidades, pela Universidade Aberta de Lisboa. Militou
pelo DCE, na coordenação de cultura e participou do 1º concurso
de poesia falada, que revelou o ator alagoano Chico de Assis.
Coordenadora Editorial da Editora Catavento (1989-90).
Professora na UFAL, desde 1991. Professora do CESMAC (1990).
Diretora da Edufal, de 1996-99, quando promoveu a 1ª Bienal do
Livro e da Arte do Estado de Alagoas. Coordenadora da Delegacia

882
do Ministério da Educação (1985-89). Diretora geral do Museu
Théo Brandão (2004-10). Curadoria Do Memorial Ledo Ivo Da
Literartura Alagoana. 2009 e Instalação da Sala de Memória do
Hospital Universitário da Ufal 2009. Obras: Cidadania: Que Bicho
é Esse? , ilustrações de Tiago Amaral, Maceió, Ed. Catavento,
1997; Piaget e Freud: um Encontro Possível?, Maceió, Edufal
1997, juntamente com Heliane Leitão; A História de Maceió Para
Crianças, juntamente com Sandra Lúcia dos Santos Lira,
ilustrações de Ênio Lins e Tiago Amaral, Maceió, Catavento, 1998;
Rupturas e Permanências em Alagoas. O 17 de Julho de 1977 em
Questão, Maceió, Ed. Catavento, 1999, prêmio da AAL, 2000.
Entre outros.

ABC das Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros,


edição do Senado Federal, 2005

ROMANCE ALAGOANO

Muito se fala nos meios literários alagoanos que não


existe mais na terrinha grandes romances e romancistas
alagoanos, como fora em grande parte do séculos XIX e
XX, a exemplo de Graciliano Ramos, Pedro Nolasco Maciel
– o precursor do romantismo via folhetins – Jorge de Lima,
e seu maravilhoso romance de costumes Calunga, ou o mais
prolífico romancista daquele tempo, Aldaberon Calvalcante
Lins.

883
“O folhetim contribuiu para a propagação da literatura em
Alagoas, ou seja, a publicação fragmentada de uma obra diariamente
nos rodapés dos jornais. No ano de 1858, em Alagoas, possivelmente,
o romance já era um gênero bastante difundido. Pelo menos isto é o
que se depreende inclusive na leitura da coluna `A Viola´, do nosso
primeiro jornal de publicação diária, O Diário de Alagoas, assinada
com o pseudônimo. Em Alagoas, a mais recuada referência sobre
romance escrito por alagoano situa-se entre 1869 e 1870. Disputam a
primazia o Mendigo, assinado por um presumível João Dionísio, e
Isaura, de Antonio Duarte Leite da Silva (1870). Em seguida, uma
sucessão de ficcionistas surgiu na literatura local, tendo a maioria
deles, nos fins do século XIX, inspirados no romantismo e publicado
em capítulos nos jornais. Em 1886, a Tipografia Mercantil editou em
Maceió, reunindo em volume único os fragmentos publicados em
jornal, em 1885, do primeiro romance de costumes alagoanos, A
Filha do Barão, de Pedro Nolasco Maciel. Na ficção alagoana do
século XX, de seu inicio aos dias atuais, encontram-se as mais
diversas tendências, desde realismo, naturalismo, regionalismo,
modernismo, até as técnicas narrativas contemporâneas. A poesia
alagoana passou a ter um número maior de cultores a partir da
segunda metade do século XIX. Românticos, simbolistas ou
parnasianos, estes poetas deixaram seus versos em jornais ou
enfeixados em pequenos volumes, editados pelas tipografias locais.
Pode se dizer que este conjunto de regionalistas representou para a
história literária de Alagoas uma época de apogeu”.

884
Moacir Medeiros de Sant´Ana, em estudo introdutório ao
livro "A filha do Barão", de Pedro Nolasco Maciel, Senec/MEC,
1976, 2ª edição

“Quem pensar que, em Alagoas, a mina da ficção secou depois


que Graciliano morreu – e secado por não ter dado o máximo -, está
muito enganado. O velho Graça foi grande, não das letras alagoanos,
mas das letras brasileiras. Dada a sua estatura excepcional, é claro
que não serve como parâmetros. Mas há valores expressivos,
trabalhando na noite, enrustidos por timidez ou o que for, como com
receio de dar na vista, mas que estão a merecer a atenção dos
observadores literários. Os romances alagoanos são feitos, em sua
maior parte, usando como material e barro humano do Nordeste
rural, brigas de clãs, lutas políticas, desespero dos pobres diabos, E
contando sua longa história numa linguagem de autêntico sabor
nativo. Rica a substância folclórica”.

Valdemar Cavalcanti, crítico literário alagoano, no artigo


Província dá Romance, em seu Jornal Literário – Revista
Academia Alagoana de Letras, ano IV, nº 4 – dezembro de 1978

Veja abaixo a lista escolhida dos romances dos anos 1940 a


1980, sugeridas pelo jornalista alagoano Petrúcio Vilela

A Filha do Barão, Pedro Nolasco Maciel, DAC 1976


Boca da Grota – Carlos Gusmão. Sergasa, 1970
Calunga, Jorge de Lima, Editora Alba 1943

885
Os Canoés, José Maria de Melo. UFPE 1971
Caetés, Graciliano Ramos, Editora Record 1947
A Utopia Armada, Dirceu Lindoso, 1983
Manuscritos Alagoenses, Rubens Jambo, 1985
O Último Senhor de Engenho, A.S. Mendonça, 1986
Angústia, Graciliano Ramos, Record 1936
O tigre dos Palmares, Adalberon Cavalcanti Lins, 1978
Curral Novo. Aldalberon Cavalcanti Lins, 1958
Sidrônio. Adalberon Cavalcanti Lins.1962
Caminhos Incertos. Adalberon Cavalcanti Lins, 1976
Mandacarus, Ilza Porto, 1989
Padre Eutanásio, Luiz Lavenere, 1921
Calabar, Romeu de Avelar, 1938
Procissão dos Miseráveis, Luiz B. Torres
Povóa Mundo, Dirceu Lindoso, 1980
A família rubro. J. Costa Filho, 1980

Cena literária contemporânea

Adélia Magalhães
Anselmo Carlos Chagas
Ari Lins Pedrosa
Audemário Lins
Alice Plancherel
Bruno Cavalcanti
Benilda Guimarães
Beto Brito

886
Carlos Nealdo
Carlito Lima
Cícero Péricles
Edilma Acioly Bonfim
Enaura Quixabeira
Fernando Bastos
Fernando Coelho
Fernando Fiúza
Fernando Lira
Gal Monteiro
Isvânia Marques
Joanita Cardoso
Jorge Calheiros
Margarida de Mesquita
Mariquinha
Maria Angélica Silva
Maria Cecília Lustosa
Octávio Cabral
Pablo de Carvalho
Petrucia Camelo
Rosalvo Acioli
Regina Barbosa
Regina Dulce Lins
Regina Marques
Ricardo Cabús e a poesia no varal
Ruth Vasconcelos
Sidney Wanderley

887
Siloé Amorim
Selma Jardim
Simone Cavalcante
Taina Costa
Tchello d´Barros
Vanessa Alencar
Volney Rebelo
Weber Salles
Yara Falcon

O CALDEIRÃO CULTURAL DE LINDOSO*

* A partir de citações do historiador Dirceu Lindoso, em


Interpretação da Província – Estudo da Cultura Alagoana – Edufal,
Fundação Manoel Lisboa e Seplan/AL - 2005

O livro “A Interpretação da Província”, de acordo com o


autor Dirceu Lindoso, na verdade, foi seu discurso de posse, ao
receber o diploma de membro honorário do Instituto Histórico e
Geográfico de Alagoas, na noite de 26 de agosto de 1980, e mais
duas conferências em 1984, em um seminário de Cultura, “em que
me estendi com garra a uma variedade de fatos, que levaram a um
corpus inscriptionum mais completo e longo”. As três conferências
sobre cultura alagoana tiveram seus textos reunidos depois pela
Fundação Manoel Lisboa, que enfeixam o livro. Uma verdadeira
aula magna sobre a cultura alagoana, de fio a pavio.

888
“Por que essa ideia de que, para descrever a cultura
alagoana, eu usei essa arte arqueológica de unir cacos, colar
pedaços do que se achava partido? Daí a ideia da cacaria reunida
de uma maneira sistemática. Cacaria no bom sentido arqueológico,
do qual saiu um perfeito marajoara de um dos tesos de Marajó”.

Dirceu Lindoso, em prefácio à 2ª edição de Interpretação da


Província, Edufal -2005

Alagoas: um cadinho de ideias fumegantes

No estudo, Dirceu Lindoso, com o seu modelo de “arte


arquelógica”, mostra o que se configurou na escrita alagoana, dos
séculos XVIII, XIX e começo do século XX, vai desde a geração
de 1860, que ele inclui pioneiros como Dias Cabral, Tavares
Bastos, Ladislau Neto, passando pela ruptura de Octávio Brandão,
em Canais e Lagoas, até a música de Djavan e Hermeto Pascoal.
“Alagoas é uma pipineira de intelectuais”, disse a escritora
paraibana Raquel de Queiroz – que morou em Maceió - em
conversa com o próprio Dirceu Lindoso, em seu apartamento no
Rio.
Na abertura do ensaio, Lindoso fala da “civilização das
águas”, de Alagoas como um estado “anfíbio” como se referiu
Gilberto Freyre; e em livos como Canais e Lagoas, Calunga e a
Invenção de Orfeu, obra prima de Jorge de Lima, e segundo
Dirceu, uma “criação anfíbia”: “o que é uma ilha senão um
círculo?”. Soneto XXIII, Canto V. O autor segue sua análise dos

889
primeiros escritos e primeiros livros, até chegar ao esperado
paradoxo da luta de classes. “A história da Província passa a ser
contada a partir dos interesses de classe dos grandes propietários
rurais e da burguesia mercantil urbana”. Veja a seguir a “pipineira”
da cultura alagoana. “São manifestações contraditórias de uma
mesma realidade que designamos a cultura alagoana”, ensina
Lindoso.

O ideário da Geração de 1860 (a historiografia tradicional)


Os poemas religiosos de Jorge de Lima
A crítica social de Pedro Nolasco
O realismo (Vidas Secas) de Graciliano Ramos
A ruptura de Canais e Lagoas, de Octávio Brandão
A textualidade jornalística de Pedro Mota Lima
A etnografia religiosa (negra) de Arthur Ramos
A crítica ao Estado Imperial de Tavares Bastos
A linguística regional de Mário Marroquim
Os doutores do folclore ( Escola de Viçosa)
O “messianismo democrático” de Teotônio Vilela
O conservadorismo liberalizante de Rui Palmeira
A ruptura historiográfica de Utopia Armada
O populismo político de Muniz Falcão
A militância socialista de André Papini e Jaime Miranda
A música popular de Djavan e Hermeto Pascoal
O ideário sertanista de Antônio Cotrim Soares
O darwinismo de Dias Cabras
A antropologia criminal de Estácio de Lima

890
A sociologia agrária de Alberto Guimarães Passos
A poesia de Jorge de Lima e Ledo Ivo
ALAGOANOS UNIVERSAIS

Deodoro: o proclamador da República

Primeiro presidente do Brasil Republicano, o marechal


Manoel Deodoro da Fonseca (1827-1892) governou o país de 1889
a 1891, nasceu na cidade de Alagoas, atual Marechal Deodoro, no
dia 5 de agosto de 1827 e estudou em escola militar desde os 16
anos. Em 1848, aos 21 anos, integrou as tropas que se dirigiram a
Pernambuco para combater a Revolução Praieira e participou
ativamente de outros conflitos durante o Império, como a brigada
expedicionária ao rio da Prata, o cerco a Montevidéu e da Guerra
do Paraguai. Ingressou oficialmente na política em 1885, quando
exerceu o cargo de presidente (equivalente ao atual de governador)
da província do Rio Grande do Sul. Assumiu a presidência do
Clube Militar de 1887 a 1889 e chefiou o setor antiescravista do
Exército. Com o título de marechal, Deodoro da Fonseca
proclamou a república brasileira no dia 15 de novembro de 1889 e
assumiu a chefia do governo provisório. A primeira constituição
republicana estabelecia que as eleições no Brasil seriam diretas e
que o presidente e seu vice seriam eleitos pelo voto popular.
Entretanto, determinava também que, em caráter excepcional, o
primeiro presidente e o primeiro vice seriam eleitos indiretamente,
isto é, pelo Congresso Nacional. Foi o que aconteceu. No dia
seguinte à promulgação da Constituição, o Congresso elegeu de

891
forma indireta os marechais Deodoro da Fonseca para presidente e
Floriano Peixoto para vice-presidente, em 25 de fevereiro de 1891.

“No dia 13 de novembro o marechal Deodoro, prevendo a


necessidade do golpe, declarou ao futuro marechal Ilha Moreira: “A
república é nossa única saída, é a salvação do Exército; depois é
conveniente irmos ao encntro da vontade do povo; talvez possamos
evitar o derramanento de sangue. E assim sendo, na manhã de 15 de
novembro de 1889, Deodoro tem um atitude decidida em face da
dubiedade do momento e transpõe o umbral da porta do Quartel
General, para declaração imediata da República. “Os minutos de
incerteza que eu passei em frente ao Quartel General valeu para
todos os a nos da minha vida”.

Trecho do livro História da Civilização Brasleira, de Jayme


de Altavila, edição do Departamento Estadual de Cultura, 1962

Abolição apressa chegada da República


A abolição da escravatura, em 13 de maio de 1888, pela
princesa Isabel, apressou a proclamação da República, como um
dos estopins que provocou a queda da Império. Já próximo à
decisão da princesa Imperial Regente, deu um passo avançado
contra o escravagismo nacional, como registra Jayme de Altavila
em seu livro:

“Deodoro representou perante ao trono contra a ordem


imperial que transformava o Exército em figuras fardadas de

892
“capitães do mato”, pois era ele obrigado a capturar pelo interior
das províncias os miseráveis escravos fugitivos do jugo desumano dos
seus senhores. Há quem assevere que a abolição da escravatura foi o
cupim que corroeu o trono do Império, pois os grandes senhores,
prejudicados com a falta de braço africano, arruinaram-se e
começaram a cercar fileira em oposição à monaquia”.

Trecho do livro História da Civilização Brasleira, de Jayme


de Altavila, edição do Departamento Estadual de Cultura, 1962

Briga entre titãs: Deodoro versus Floriano


Por dois anos, Deodoro presidiu a República, com decisões
graves, como o fechamento do Congresso. O governo do Marechal
deveria terminar em 1894, mas o período registrou sérios
problemas políticos e econômicos. A política econômica, que tinha
como ministro da Fazenda Rui Barbosa, foi marcada pelo
"encilhamento", que se caracterizou pelo incentivo à emissão de
moeda por alguns bancos e pela criação de sociedades anônimas.
Como resultado, houve forte especulação financeira e falência de
bancos e empresas. A formação de um novo ministério liderado
pelo barão de Lucena, político vinculado à ordem monárquica, a
tentativa de centralização do poder e às resistências encontradas no
meio militar conduziram o país a uma crise política, que teve seu
ápice na dissolução do Congresso Nacional. Ao mesmo tempo
crescia no meio militar a influência de Floriano Peixoto, que
também fazia oposição a Deodoro juntamente com as forças
legalistas que levaram à renúncia de Deodoro da Fonseca em 23 de

893
novembro de 1891. Neste mesmo dia, Deodoro declarou aos seus
partidários:
“Não quero aumentar o número de viúvas e de órfãos em meu
país. Mandem chamar o Floriano. Não sou mais presidente da
República e vou pedir minha aposentadoria”.

“E Floriano Peixoto, chamado ao poder no caráter de vice-


presidente, encontrado a nação explorada pelos pedagogos, teve que
usar de manopla de aço e sustentar a república que ia periclitante.
Passou à história a sua célebre resposta aos que perguntavam como
havia e receber a esquadra inglesa caso ela viesse até nós: - à
bala’”.

Trechos do livro História da Civilização Brasleira, de Jayme


de Altavila, edição do Departamento Estadual de Cultura, 1962

Floriano: o “marechal de ferro”

Com a fama de valentão, por tomar medidas corajosas, o


segundo presidente da República, Floriano Vieira Peixoto (1839-
1895) recebeu a alcunha de “marechal de ferro”, que governou o
Brasil de de 1891 a 1894. Floriano nasceu no dia 30 de abril de
1839 no engenho Riacho Grande, em Ipioca, distrito de Maceió.
Filho de lavradores pobres, foi criado pelo tio e padrinho, o
coronel José Vieira de Araújo Peixoto. Cursou o primário em
Maceió e a Escola Militar no Rio de Janeiro, para onde foi
mandado aos 16 anos. Revelou distinção e bravura no exército,

894
especialmente na Guerra do Paraguai, da qual participou até o
desfecho, em Cerro Corá. Como lembrança, guardou a manta do
cavalo de Solano Lopes. Exercia o papel de ajudante general-de-
campo, segundo posto abaixo do ministro do Exército, o visconde
de Ouro Preto, quando teve início o movimento republicano em
1889. Recusou-se a fazer parte da conspiração, mas também não se
dispôs a combater as tropas republicanas rebeladas.

Movimentos rebeldes
Com a proclamação da República, ocupou o Ministério da
Guerra, em 1890, e foi eleito vice-presidente de Deodoro da
Fonseca no ano seguinte. Com a renúncia de Fonseca, assumiu a
presidência e governou no regime que ficou conhecido como "mão
de ferro" até o final do mandato, em 1894. Venceu um período
conturbado por movimentos rebeldes, entre eles a Revolta da
Armada, no Rio de Janeiro, e a Revolução Federalista, que
começou no Rio Grande do Sul e tinha como objetivo destituir
Peixoto do poder. Neste movimento, o conflito aconteceu entre
republicanos de orientação positivista e liberais, liderados por
Silveira Martins, político de destaque durante o Império. Em sua
homenagem o governador catarinense Hercílio Luz decretou a
mudança de nome da capital, de Desterro para Florianópolis em 10
de outubro de 1894. Abandonou a carreira política assim que
deixou o cargo de presidente. Morreu em Divisa, hoje distrito de
Floriano, no município de Barra Mansa, Rio de Janeiro, em 26 de
junho de 1895.

895
Um índio no berço da República
Dois grandes historiadores clássicos alagoanos – Abelardo
Duarte e Moreno Brandão – tentaram mostrar ao longo de suas
obras a importância do índio no processo de mestiçagem nas
Alagoas, e que tinha o marechal Floriano Peixoto como uma
“admirável espécie”

“Embora Alagoas tivesse sido (um) dos (estados) que mais


cedo sofreram o processo de despovoamento indígena,
principalmente pelo quase extermínio dos caetés, seria um grave erro
desconsiderar essa contribuição do aborígene para o caldeamento
das populações alagoanas”.

Abelardo Duarte, em Aspectos da Mestiçagem nas Alagoas,


1955.

Um índio no berço da República 2


Já Moreno Brandão, citado por Jurandir Gomes, vê traços
indígenas na compleição de Floriano Peixoto, o marechal de Ferro
e fundador da República.

“A colonização, que não se faz sem grandes esforços, aliou


ao sangue caboclo, sangue proveniente de uma parte da península
Ibérica, que, juntando-se ao índio, produziu tipos como aquele de

896
que é admirável espécie o Marechal Floriano Peixoto, em cuja
fisionomia está perfeitamente estreotipados los traços do
silvícola”.

Moreno Brandão, citado por Jurandir Gomes, em Quadros


da Historia de Alagoas, Casa Ramalho Editora, 1956.

Aureliano Cândido Tavares Bastos (1839-1875)

Tavares Bastos ultrapassou as divisas da província, e foi


líder político nacional durante os anos 1800, como uma das
principais vozes do movimento republicano e federalista, contra a
monarquia. Seja pela sua luta como jornalista, e, principalmente,
como homem público: eleito três vezes deputado federal por
Alagoas, sendo a primeira com 22 anos de idade. A precocidade
também alcançou sua morte, morreu aos 36 anos, na cidade de
Nice, na França, fulminado pela tuberculose. A notícia causou
comoção no país, Seu corpo foi embalsamado e trazido para o Rio
Janeiro, a capital federal e onde morava, e seu corpo sepultado no
cemitério João Batista.

“Levar ao conhecimento da juventude a figura do insígne


estadista que não pode ser esquecido. Ele é bem um símbolo de
cultura, de coragem, de luta. Triste de um povo que ignora os feitos
de seus sábios. Será um povo com o perigo de ficar sem história. E
Tavares Bastos é um dos lindos capítulos da História das Alagoas e
do Brasil”.

897
Paulo Silveira de Castro, em um Titã das Alagoas, Sergasa –
Maceió, 1976, publicado pelo Instituto Histórico de Alagoas e o
Conselho Federal da Cultura
O menino franzino que ajudou a mudar o Brasil
Tavares Bastos nasceu em Marechal Deodoro, já com a
saúde debilitada e estatura de menino franzino. Aos oito anos já
fazia o secundário e teve que esperar até os 15 para fazer
faculdade. Bacharelou-se em Direito em uma das mais importantes
instituições da época, a Faculdade de Direito do Largo do São
Francisco em São Paulo. Como jornalista escrevia para o Correio
Mercantil (SP), com o pseudônimo de “O Solitário”, que depois
teve suas crônicas reunidas em seu primeiro livro (Cartas do
Solitário, 1862). Defendia e pensava um Brasil moderno, justo e
aberto para o mundo.

“As reformas proposta por Tavares Bastos incluíam... um


novo sistema de representação do Judiciário, emancipação gradual
da escravatura, promoção da imigração estrangeira, liberdade
religiosa, liberdade de comércio e cabotagem, e a abertura do rio
Amazonas ao estrangeiro. Enfim, uma multiplicidade de medidas
articuladas, umas às outras, compondo uma reforma profunda do
Estado e da sociedade”.

Gabriela Nunes, autora da tese Centralização e


Descentralização do Império, em Gazeta de Alagoas - Tavares
Bastos da série Memória Cultural de Alagoas, janeiro de 2008.

898
Tavares Bastos na geração de 1860
O historiador Dirceu Lindoso assinala o surgimento
intelectual da “figura admirável” de A. C. Tavares Bastos, na que
ele denomina “Geração de 1960”, quando um grupo de intelectuais
iniciou no espaço da cultura alagoana a produção de seus
trabalhos. Nesse grupo, Lindoso inclui Ladislau Neto, Melo
Morais, Thomaz Espíndola e Dias Cabral. Apesar de ver em
Tavares Bastos a figura mais ilustre desta geração, ele faz críticas a
seu pensamento de filosofia econômica liberal.

“As noções de liberalismo, de modernização e de progresso,


como se encontram no discurso de Tavares Bastos, se compõem em
elementos contraditórios e ideológicos, que configuram em um
conteúdo utópico. Escancarar as portas do Império ao poder
econômico estrangeiro, era estabelecer as condições de
subalternidade de nosso crescimento econômico ”.

Dirceu Lindoso, em Interpretação da Província – Estudo da


Cultura Alagoana, Edufal – Maceió 2005, 2ª edição

Arthur Ramos (1903-1949)

Arthur Ramos de Araújo Pereira faria 112 anos em sete de


julho de 2015. O “cientista da civilização”, que morreu em Paris,
aos 46 anos, depois de deixar uma vasta obra de mais de 300
livros, principalmente sobre o negro no Brasil. Era um humanista

899
por convicção e, através de suas ideias libertárias, lutou contra o
imperialismo e o preconceito racial. Chegou ao ápice de sua
carreira como diretor do Departamento de Ciências Sociais do
Fundo das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
(Unesco), quando passou a morar em Paris, em 1949. Na capital
francesa, neste mesmo ano, quando começava construir um Plano
de Paz para o mundo, ao lado de Bertrand Russel, Jean Piaget,
Maria Montessori e Julien Huxley, ele morre em Paris, vítima de
um edema pulmonar. Antropólogo, médico, escritor e folclorista,
Arthur Ramos foi brilhante como estudioso do negro africano, e
depois do negro brasileiro. Lançou três obras fundamentais nesta
área de pesquisa: O Negro Brasileiro (1934), A Mestiçagem no
Brasil (1951) e O negro na Civilização Brasileira (1956). Passa a
ser considerado como “o maior africanista do Brasil”, por
intelectuais como Gilberto Freyre, Jorge Amado e sociólogo
francês Roger Bastide, autor da obra 0 Candomblé na Bahia
(1961), que escreveu sobre Arthur Ramos:

“Seu mérito está no método. Arthur Ramos desprendeu-se de


todo e qualquer preconceito, quer de raça, quer de religião. Ensinou
aos africanistas brasileiros o valor da objetividade científica”.

Roger Bastide citado em Arthur Ramos - significativas


passagens, de Dídimo Ottto Kummer, Edições Catavento, 2003.

O cientista da civilização

900
Apesar de morrer muito novo, Arthur Ramos devotou mais
da metade deles aos estudos sobre psicanálise, psicologia social,
ecologia, educação, antropologia e o folclore alagoano. Um legado
que o situa entre os mais respeitados intelectuais de todo o mundo.
Além de diversos livros, o prodigioso alagoano deixou registrados
quase seiscentos artigos - cerca de duzentos elaborados nos últimos
quatro anos de vida - sobre as ciências acima citadas, mas
principalmente sobre a condição do negro na sociedade brasileira.

Infância e carreira
O garoto Arthur, com nove anos, fez seus estudos primários
no Externato Progresso Pilarense, fundado pelo professor João
Frederico da Costa, terminando em 1914, quando o mestre
declarou: “Levem daqui este menino, comigo nada mais tem que
aprender”. E Arthur foi longe, e até hoje seu trabalho repercute.
Em 2003, no centenário de AR, sai pela Coleção Nordestina, uma
publicação coletiva das universidades federais da região: A
Mestiçagem no Brasil. O livro foi lançado em 1951, em edição
francesa (Le Métissage au Brésil), e só agora, 64 anos depois, saiu
esta edição, traduzida pela professora e antropóloga alagoana
Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros, da Universidade Estadual do
Rio de Janeiro, uma das maiores estudiosas de Arthur. Ela atesta a
atualização da obra de Arthur Ramos:

“Nada tão interessante como, num momento em que os


políticos transformaram o problema racial no Brasil num
empreendimento eleitoreiro, a publicação de um livro síntese sobre os

901
debates em que se digladiaram intelectuais, de todas as correntes do
pensamento social brasileiro, na primeira metade do século XX,
sobre essa questão”.
Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros, no posfácio do livro
A Mestiçagem no Brasil, de Arthur Ramos, Edufal – 2003

Fundador de museu no Rio de Janeiro


Escreveu seu primeiro artigo literário aos 15 anos no
semanário O Pilar, que era impresso na cidade desde 1918, com
seu irmão, Nilo Ramos, sendo redator-chefe. Em 1921, já estava
em Salvador, onde se formou médico em 1926. A partir de 1932
ganhou o mundo, primeiro o Rio de Janeiro, onde se formou em
Antropologia. Entre 1926 a 1949, Arthur Ramos produziu mais do
que qualquer outro escritor brasileiro, em igual período de tempo.
Foi traduzido para o espanhol, inglês, alemão e tcheco. Nas
comemorações de sua data festiva, não é somente Pilar e Alagoas
que realizam homenagens ao autor, mas São Paulo, Salvador, Rio
de Janeiro, onde fundou o Museu de Arte Afro-brasileira, em 1944,
até então o único no gênero do país, também festejam o mestre.
Nos Estados Unidos ensinou e fez pesquisas nas Universidades de
Louisiana, Califórnia, Harvard e Columbia, ao lado de grandes
nomes das Ciências Sociais. Em Pilar, a casa natal do cientista se
transformou na Casa de Cultura Arthur Ramos, tombada pelo
Patrimônio Histórico Estadual em 1986.

Preso pelo Dops na ditadura Vargas

902
Firme em suas convicções libertárias, Arthur Ramo foi
preso duas vezes pelo Departamento de Ordem Social (Dops), na
ditadura do presidente Getúlio Vargas. Sua prisão ocorreu em
outubro de 1937, quando estava em seu consultório, no Edifício
Odeon, na Cinelândia, Rio de Janeiro, acusado de ser membro da
Liga dos Intelectuais Antifascistas. “Foi um ato para me
amedrontar. O que eles visavam era impedir que eu usasse minha
cátedra, para desmascarar as doutrinas em voga, que difundiu a
grandeza da Alemanha nazista”. Mas sua voz não calou:

“Sabemos quais foram os resultados dessas doutrinas de


pureza racial, de crença na supremacia do dolicéfalo louro: a
discriminação e a luta de raças, o anti-semitismo, o anti-negrismo, o
ódio aos povos de cor... Essas atitudes e opiniões do europeu face aos
indígenas nada mais são do que racionalizações da política de
dominação imperialista”.

Arthur Ramos, em texto da contracapa do livro A


Mestiçagem no Brasil, Edufal – 2003

Luta contra o imperialismo


Arthur Ramos era um humanista e, por meio de suas ideias
libertárias, lutou contra o imperialismo e o preconceito racial. Ele
ainda teve problemas com autoridades além das fronteiras. Ao
denunciar a presença de soldados norte-americanos em bases
brasileiras, o alagoano entra em choque com o governo daquele
país e é impedido de entrar nos EUA. O arquivo de Arthur Ramos

903
foi oferecido à venda pela viúva Luisa Ramos para o Ministério da
Educação em 1954, cinco anos após a morte dele. Em 1956, o
acervo foi efetivamente comprado pela Biblioteca Nacional. Em
Paris, no ano de 1949, foi diretor do Departamento de Ciências
Sociais do Fundo das Nações Unidas para Educação, Ciência e
Cultura (Unesco), mas quando começava construir um Plano de
Paz para o mundo, ao lado de Bertrand Russel, Jean Piaget, Maria
Montessori e Julien Huxley. Mas ele morre na capital francesa, aos
46 anos de idade, vítima de um edema pulmonar, no dia 31 de
outubro de 1949. Nunca esqueceu sua terra. Percebe-se isso
quando escreveu:

“A minha recompensa maior será a de estar ouvindo aquelas


vozes queridas que os ventos constantemente trazem-me do Pilar
distante para a música do meu coração”.

Nise da Silveira (1905-1999)

“Eu sou como o sururu, uma ostrinha difícil de abrir-se”. A


frase que Nise da Silveira gostava de falar, mostra a face da
alagoana, da médica psiquiatra reconhecida no Brasil e no mundo
– foi amiga de Carl Jung, e divulgadora de sua obra no Brasil. Ela
humanizou o tratamento psiquiátrico no país, e fundou o Museu do
Inconsciente, no Rio de Janeiro, protagonizado pelos próprios
pacientes, em suas expressões artísticas. Com sua visão humanista
da loucura, e verdadeira guerrilheira contra métodos de tratamento
como eletro-choque e lobotomia, Nise teve uma vida atribulada.

904
Em 1936, por sua posição antifascista, e militante da Aliança
Nacional Libertadoral, foi denunciada e presa pela ditadura de
Getúlio Vargas. Passou mais de um ano na Casa de Detenção Frei
Caneca, no Rio. Teve como vizinhos de cela, Olga Benário, mulher
de Carlos Prestes, então o maior líder comunista brasileiro, e
Graciliano Ramos. O encontro é relatado pelo mestre alagoano em
seu livro Memórias do Cárcere.

“Além de uma grade lateral larga, distingui, afinal, uma


senhora pálida e magra (Nise tinha 31 anos quando foi presa), de
olhos fixos, arregalados. O rosto revelava fadiga, aos cabelos negros
misturavam-se alguns fios grisalhos. Referiu-se a Maceió,
apresentou-se: Nise da Silveira. Noutro lugar o encontro me daria
prazer. O que senti foi surpresa, lamentei ver minha conterrânea fora
do mundo, longe da profissão, do hospital, dos seus queridos loucos”.

Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere (1953);


reportagem Gazeta de Alagoas, A mulher sem igual, por Janayna
Ávila, de 12/07/2009; e Dicionário das Mulheres de Alagoas,
Enaura Quixabeira e Edilma Aciolli Bionfim, Edufal, 2007

Um museu para seus “queridos loucos”


Nise foi pioneira e vanguardista quando fundou, no Rio de
Janeiro, em 1952, o Museu de Imagens do Inconsciente. O MII,
maior herança de Nise, existe até hoje, e foi o primeiro do gênero
criado no mundo. Seu acervo inclui mais de 350 mil obras de seus
pacientes psiquiátricos, entre pinturas, desenhos, modelagens e

905
xilogravuras. O museu fica no bairro Engenho de Dentro, Rio de
Janeiro, e toda a coleção foi tombada pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Este centro de estudo e
pesquisa - que reúne obras produzidas nos ateliês de pintura e
modelagem – já lançou artistas interno para circuito das artes como
Emidgio de Barros, Rafael Domingues e Fernando Diniz. Através
deste trabalho introduziu a psicologia jungiana no Brasil. Também
fundou e se dedicou à casa da Palmeira, no Rio, que recebe
egressos de hospitais psiquiátricos, onde oficinas de arte eram
dirigidas por voluntários.

A paixão pelos gatos


Nise também foi pioneira na pesquisa das relações afetivas
entre pacientes e animais, que chamava de co-terapeutas. Os gatos
sempre foram a paixão da psiquiatra alagoana. Di Cavalcanti fez
um óleo de Nise da Silveira onde ela posa com seus felinos. “Com
relação aos gatos, de tanto vê-los na rua desamparados, eu ia
apanhando e trazendo prá casa. Chequei a ter 23 gatos. O gato
não tem essa capacidade de perdoar, como eu não tenho. Eles são
muito especiais. No Hospital, introduzi os animais como ajuda
para os doentes. Como co-terapeutas. Um analista americano, de
quem eu tenho um livro costumava trabalhar com um cão no
consultório. Como aliás Freud trabalhava com um cão no
consultório; Jung trabalhava com um cão no consultório. Marie
Lenize Von Franz, com quem eu fiz análise, trabalhava com um
cão no consultório. Aqui o cão não entra nos lugares”.

906
“Os gatos são os seres mais lindos, inteligentes e
independentes do mundo. Essa é a razão por que os homens tem
tanta dificuldade de se relacionar com eles e os perseguem
indiscriminadamente desde o início dos tempos.”

“Desprezo as pessoas que se julgam superiores aos


animais. Os animais tem a sabedoria da natureza. Eu gostaria de
ser como o gato: quando não se quer saber de uma pessoa,
levanta a cauda e sai. Não tem papo”.

Frases de Nise da Silveira, no portal Casa das Palmeiras


http://casadaspalmeiras.blogspot.com.br/2010/10/frases-de-
nise-da--silveira.html

Maceió, uma volta que não aconteceu


Sua formação básica foi no Colégio Santíssimo Sacramento,
um colégio de freiras, na época, exclusivo para meninas, em
Maceió. Aos 15 anos entrou na Faculdade de Medicina da Bahia, e
formou-se como a única mulher entre os 157 homens desta turma,
aos 21 anos, e entre seus colegas de turma estavam Arthur Ramos
e Abelardo Duarte. Em sua tese final ela aponta as relações entre a
mulher e a criminalidade, pobreza, desigualdade, promoção da
saúde no Brasil. Entre 1983 e 1985 o cineasta Leon Hirszman
realizou o filme "Imagens do Inconsciente", com roteiro da própria
Nise, uma trilogia mostrando obras realizadas pelos internos. Nise

907
da Silveira foi reconhecida nacionalmente quando recebeu as
maiores comendas como a Ordem do Rio Branco no Grau de
Oficial, pelo Ministério das Relações Exteriores (1987);
Personalidade do Ano de 1992, da Associação Brasileira de
Críticos de Arte; Medalha Chico Mendes, do grupo Tortura Nunca
Mais (1993) e Ordem Nacional do Mérito Educativo, pelo
Ministério da Educação e do Desporto (1993). Entre suas obras
publicadas estão Jung: Vida e Obra (1968), Imagens do Consciente
(1981) e Casa das Palmeiras (1986). Se ela ganhou status de uma
celebridade nacional, em Alagoas não foram muitas as
oportunidade. Afinal, para ela Maceió era um mito, um mito que
viu só de longe. Veja na entrevista concedida por ela a Luiz
Gonzaga dos Santos, em Psicologia: Ciência e Profissão (Print
version ISSN 1414-9893/ Psicol. cienc. prof. vol.14 no.1-Brasília
1994)

Uma saudade...
Da minha casa em Maceió. Até me lembro dos versos de um
poeta que diz assim: "minha mãe, é em ti que eu penso, oh! casa".
Esse é um dos motivos porque eu me recuso a ir a Maceió, prá não
ver essa casa.

E se tivesse que voltar?


Voltava certa de que ia ter uma emoção muito forte.

É um tempo mítico?

908
Acho que sim. Acho que Maceió prá mim é um mito. Uma
cidade mítica que estragaram completamente querendo imitar
Copacabana. Eu adoro Maceió. Tenho medo de ir a Maceió.

Graciliano Ramos em auto-retrato

“Nasceu em 1892, em Quebrangulo, Alagoas. Casado duas


vezes, tem sete filhos. Altura: 1,75 metros; sapato 41; colarinho 39.
Prefere não andar. Não gosta de vizinhos. Detesta rádio, telefone e
campainhas. Tem horror às pessoas que falam alto. Usa óculos. Meio
calvo. Não tem preferência por nenhuma comida. Indiferente à
musica. Não gosta de frutas nem de doces. Sua leitura predileta: a
Bíblia. Escreveu Caetés com 34 anos de idade. Não dá preferência a
nenhum dos seus livros publicados. Gosta de beber aguardente. É
ateu. Indiferente à Academia. Odeia a burguesia. Adora crianças.
Romancistas brasileiros que mais lhe agradam: Manuel Antônio de
Almeida, Machado de Assis, Jorge Amado, José Lins do Rego e
Rachel de Queirós. Gosta de palavrões escritos e falados. Deseja a
morte do capitalismo. Escreveu seus livros pela manhã. Fuma
cigarros “Selma” (três maços por dia). É inspetor de ensino, trabalha
no “Correio da Manhã”. Apesar de o acharem pessimista, discorda
de tudo. Só tem cinco ternos de roupa, estragados. Refez seus

909
romances várias vezes. Esteve preso duas vezes. É-lhe indiferente
estar preso ou solto. Escreve à mão. Seus maiores amigos: Capitão
Lobo - oficial comandante do quartel em que esteve preso, em 1936,
no Recife; Cubano - ladrão que o escritor conheceu na prisão, José
Lins do Rego e José Olympio. Tem poucas dívidas. Quando prefeito
de uma cidade do interior, soltava os presos para construírem
estradas. Espera morrer com 57 anos”.

Por Graciliano Ramos, no livro Cartas, MPM


Comunicações, Rio de Janeiro, 1980
Os “Garranchos” de Graciliano
Um livro com oitenta textos inéditos de Graciliano Ramos
foi lançado em 2012, para marcar os 120 anos de nascimento do
romancista alagoano, confirmar a perenidade de sua obra e torná-lo
atual para as novas e futuras gerações. O livro Garranchos (editora
Record) foi organizado pelo professor doutor da Universidade de
São Paulo (USP), Thiago Mio Salla, um dos mais proeminentes
estudiosos de Graciliano. No livro estão reunidas crônicas,
epigramas, artigos de crítica literária e cartas, ao longo de sete anos
de pesquisa, inclusive em Alagoas. Mio Salla confere a Garranchos
o mérito de permitir ao leitor acompanhar a "evolução estilística"
de um autor que, ao experimentar diversos gêneros (crônica,
poesia, conto, ensaio político), encontrou seu nicho quando
abandonou seus pseudônimos. E eram vários, de J. Calisto a
Anastácio Anacleto. Leia trecho da entrevista de Thiago Sallo ao
suplemento da Imprensa Oficial de Alagoas, edição especial dos
120 anos do Mestre Graça:

910
“O maior legado de Graciliano repousa fundamentalmente na
maestria de sua obra, na qual se destacam o rigor formal, o
enxugamento, paralelamente à ênfase na introspecção e na
problematização de diferentes temas de caráter social, tais como a
miséria, a exploração, a humilhação, entre outros ingredientes que
compõem um caldeirão de conflitos bem brasileiro, prestes a
explodir. Dessa mescla entre contenção (formal) e revolta (temática),
o artista extrai sua força, que o engrandece e o afasta de qualquer
esquematismo redutor. Ao mesmo tempo, a trajetória política do
romancista revela-se emblemática para se pensar as principais
questões que marcaram o campo intelectual brasileiro da primeira
metade do século XX. Graciliano sempre viveu no fio da navalha.
Administrou as mais diversas pressões (financeiras, políticas e
estéticas), mantendo sua integridade como homem e como escritor”.

“Atualidade de Graciliano se faz presente em grande parcela


das publicações recolhidas em Garranchos. Contudo, mais
especificamente, podemos destacar a série de textos que dá nome ao
livro. Trata-se de 14 crônicas publicadas no pequeno jornal O Índio,
de Palmeira dos Índios. Nesse conjunto de escritos, já podemos
encontrar um Graciliano interessado pela coisa pública, que assumia
a condição de defensor da população da referida cidade interiorana,
reivindicando, sobretudo, o incremento da educação no município.
Em linhas gerais, já se observa aqui o prenúncio do Graciliano
prefeito de Palmeira dos Índios e diretor da Instrução Pública do
Estado de Alagoas. Sua batalha pelo aprimoramento do ensino é uma

911
bandeira que até hoje se faz urgente em praticamente todos os cantos
do país”.

Entrevista de Thiago Mio Salla no suplemento do Diário


Oficial, edição especial 120 anos de nascimento de Graciliano
Ramos, em 26 de outubro de 2012

Audálio é o universo de Graça


O jornalista Audálio Dantas foi o organizador e curador, em
2003, da maior e mais importante exposição já vista sobre a vida e
a obra de Graciliano Ramos: O Chão de Graciliano, que percorreu
muitas cidades brasileiras, e marcou os 110 anos de nascimento do
autor e os 70 anos do primeiro romance “Caetés”. Em 2007, foi
lançado o livro de arte-reportagem “O Chão de Graciliano”,
editado pela Tempo d’Imagem, com texto de Audálio Dantas e
fotografias de Tiago Santana, e mostra a região de nascimento e
criação literária de Graciliano Ramos. A obra, com versão em
inglês e espanhol, é o resultado de várias viagens ao sertão de
Alagoas e Pernambuco, a partir de 2002, quando foi feito o
primeiro ensaio fotográfico para a exposição “O Chão de
Graciliano”.

Quero deixar uma importante reivindicação, que faço no


sentido de que o Graciliano Ramos seja lembrado não naquele

912
sentido clássico de fazer um monumento, aquelas besteiras que se
fazem. É um absurdo que se tenha um patrimônio dessa grandeza e
ele praticamente seja abandonado. Você passa em Viçosa a casa em
que ele viveu não existe mais. não há um pequeno museu em Viçosa
com o nome de Graciliano Ramos; passa em Quebrangulo que é a
cidade natal, e tem a casa de nascimento que pertence a um cidadão
que tem muito boa vontade mas ele até vive, desculpe a expressão, de
saco cheio de pessoas que chegam lá e perguntam “ah! essa era a
casa do Graciliano”. O Estado não fez nada, está lá uma escola que
tinha o nome de Graciliano Ramos em Quebrangulo, não sei se vocês
sabiam disso, foi mudado o nome, tem o nome de uma diretora, de
uma professora daquela escola, é absurdo. O Museu-casa de
Graciliano Ramos em Palmeira dos Índios, que aí não é
responsabilidade do estado que ele pertence ao Ministério da
Cultura, a prefeitura parece que tem um convênio, é uma simples
exposição de documentos sem condições de tratamento, nada”.

Dênis: biografia de Graça revisitada


Reavaliada 120 anos depois de seu início, em 27 de outubro
de 1892, a extraordinária trajetória pessoal, literária, intelectual e
política de Graciliano Ramos contada por seu melhor biógrafo
ganhou nova edição, ampliada e revisada, pela Boitempo Editorial
em 2012. A nova versão da biografia O Velho Graça foi
originalmente publicada há 20 anos pelo professor de literatura
Dênis de Moraes. Entre as novidades, estão um bem cuidado
caderno iconográfico, com imagens raras e até inéditas, e a mais
esclarecedora entrevista concedida pelo escritor, em 1944, nunca

913
antes publicada em livro. A garimpagem em arquivos públicos e
privados de Rio de Janeiro, São Paulo e Alagoas, assim como as
dezenas de testemunhos de amigos, parentes, artistas, intelectuais e
companheiros de geração enriqueceram sobremaneira o trabalho.
Com argúcia de historiador e sensibilidade literária, Moraes traça a
interligação entre as várias personas de Graciliano Ramos: o
menino traumatizado pelas surras na infância; o jovem autodidata
que lia Balzac, Zola e Marx em francês; o mítico comerciante da
loja Sincera; o revolucionário prefeito de Palmeira dos Índios; o
zeloso diretor da Imprensa Oficial e da Instrução Pública de
Alagoas; o preso político no inferno da Ilha Grande; o escritor
sufocado por apuros financeiros; o estilista da palavra na redação
do Correio da Manhã; o militante comunista aos esbarrões com a
burocracia partidária. Leia um trecho do livro:

“Fico imaginando o que Graciliano acharia de ter sido


biografado. Talvez fingisse desprezo por sua escolha. O que me
leva a crer nisso? Uma declaração feita por ele, em novembro de
1937, em uma carta ao tradutor argentino Raúl Navarro, que lhe
pedira um currículo sumário para anexar a um conto em vias de
publicação em Buenos Aires:

“Os dados biográficos é que não posso arranjar, porque não


tenho biografia. Nunca fui literato, até pouco tempo vivia na roça e
negociava. Por infelicidade, virei prefeito no interior de Alagoas e
escrevi uns relatórios que me desgraçaram. Veja o senhor como
coisas aparentemente inofensivas inutilizam um cidadão. Depois que

914
redigi esses infames relatórios, os jornais e o governo resolveram não
me deixar em paz. Houve uma série de desastres: mudanças, intrigas,
cargos públicos, hospital, coisas piores e três romances fabricados
em situações horríveis – Caetés, publicado em 1933, S. Bernardo, em
1934, e Angústia, em 1936. Evidentemente, isso não dá para uma
biografia. Que hei de fazer? Eu devia enfeitar-me com algumas
mentiras, mas talvez seja melhor deixá-las para romances”.

http://www.boitempoeditorial.com.br/v3/titles/view/o-
velho-graca

Sobre o Mestre Graça


Antonio Cândido, Ficção e Confissão: Ensaios sobre
Graciliano Ramos: Editora 34 (1992)
Valdemar de Souza Lima, Graciliano Ramos em Palmeira dos
Índios: Civilização Brasileira (1980)
Denis Moraes, O Velho Graça, José Olympio (1992)
Clara Ramos, Mestre Graciliano: Confirmação Humana de
uma Obra: Civilização Brasileira (1979)
Ricardo Ramos, Retrato Fragmentado: Siciliano (1992)
Moacir Medeiros Sant’ana, A Face Oculta de Graciliano
Ramos: Arquivo Público de Alagoas (1992)
Thiago Mio Salla, Garranchos, Editora Record (2013)

Obras de Graciliano Ramos


Caetés, romance, 1933
São Bernardo, romance, 1934

915
Angústia, romance, 1936
Vidas Secas, romance, 1938
A Terra dos Meninos Pelados, 1939
Infância, memória, 1945
Insônia, contos, 1947
Póstumas:
Memórias do Cárcere (2 vols), 1953
Viagem, impressões de viagem, 1954
Linhas Tortas, crônicas, 1962
Viventes das Alagoas, crônicas, 1954
Alexandre e Outros Heróis, crônicas, 1962
Cartas, correspondência, 1980
Catas a Heloísa, correspondência, 1992
Relatórios, documento, 1994

Graciliano de A à Z

Por Dídimo Otto Kummer, em Pequeno Dicionário


Graciliânico, Edições Catavento 2001 (texto editado e resumid). O
livro tem mais de 200 verbetes, sendo escolhido um por cada letra.

Academia. Certa vez Graciliano explicou ao filho Ricardo


Ramos o porquê da sua ausência nos “quadros” da Academia
Brasileira de Letras (ABI), alegando três motivos: “primeiro, teria
que mendigar votos; segundo, não sou de beijar mão e terceiro, o
fardão, sendo este o pior dos motivos. O fardão me lembra fantasia

916
de guerreiro ou mateu; depois, ao vestir o fardão, eu me sentiria
um século mais velho”.

São Bernardo. Grande parte do livro escrito na sacristia da


Igreja Nossa Senhora do Amparo, onde antes funcionara uma
escola, da qual Graciliano fora professor. Inicialmente foi
publicado pela editora Ariel, do médico Gastão Cruls. O livro foi
concluído em 1932, escrevendo-o em dez meses, de fevereiro a
novembro, sendo lançado apenas em 1934. São Bernardo foi
publicado em Portugal (1958), Alemanha (1960), Hungria (1961),
EUA (1979). Em 1949, o livro virou uma rádio-novela pela Rádio
Globo do Rio. Em 1972 virou filme (dirigido por Nelson Pereira
dos Santos). Aurélio Buarque de Holanda classificou o livro como
“um Balzac rural”. Segundo o jornalista e biógrafo de Graciliano,
Dênis de Moraes, o conto “A carta”, escrito por volta de 1925,
teria sido a semente da obra São Bernardo.

Cinema. Quatro de seus romances viraram filmes: Vidas


Secas, São Bernardo, Memórias do Cárcere e Insônia. São
Bernardo, produzido em 1972, ganhou o troféu Margarida de Prata
da CNBB. Dirigido por Leon Hirszman, foi filmado na fazendo
Boa Esperança em Viçosa, com atuação magistral de Othon
Bastos, no papel de Paulo Honório. Vidas Secas virou filme em
1963, dirigido por Nelson Pereira dos Santos. Um fato merece
destaque: não tem trilha sonora, som mesmo só o rangido dos
carros de boi. Integravam o elenco Átila Iório (Fabiano), Maria
Ribeiro (Sinhá) e Jofre Soares, que na época era um simples

917
aposentado cabo da Marinha em Palmeira dos Índios. O filme foi
vencedor da Palma de Ouro em Cannes. Memórias do Cárcere,
também de Nelson Pereira dos Santos, foi filmado em 1984, e
ganhou mais uma vez o festival de Cannes. O ator Carlos Vereza
fez o papel de Graciliano e atriz Glória Pires interpretou Heloísa
Ramos. O quarto filme foi Insônia, filmado em 1980, realizado
pelo Sindicato dos Artistas do Rio de Janeiro, em três episódios,
com um elenco magistral: Joel Barcelos, Wanda Lacerda, Bete
Mendes, Otávio Augusto e Ney Santana.

Deputado. É quase desconhecido que Graciliano tenha sido


candidato a deputado federal por Alagoas pelo Partido Comunista
Brasileiro (PCB), em 1942, ainda morando no Rio de Janeiro.
Recebeu uma decepcionante votação: 62 votos. Antes das eleições,
Graciliano redigiu um manifesto intitulado Carta aos Alagoanos,
que foi distribuída entre o eleitorado de Alagoas. Interessante algus
trechos: “Depois de uma longa ausência (ele não voltaria a
Alagoas depois de sua prisão) aqui me vejo a conversar com
vocês, como se nos achássemos em Palmeira dos Índios ou no café
do Cupertino, onde batíamos papo. Convém, talvez, lembrá-los:
não é que resolveram fazer de mim candidato a deputado? Vejam
só! Na Câmara é certo que me dariam um papel bem chinfrim...
Até hoje, com franqueza, o que foi que os nossos deputados
representaram?”.

918
Escrever. Graciliano tinha por hábito escrever pela manhã
cedinho e ia até perto do meio-dia. Escrevia a lápis e usava
qualquer folha de papel (até notas de venda da loja Sincera – de
seu pai), depois seria datilografada, dificilmente por ele.
Escandalizava-se com as notícias de que havia colegas escritores
ditando para gravador. No costume de escrever cedinho, tinha
como companhia um dicionário (Caldas Aulete), dois ou três
maços de cigarros, preferindo o da marca Selma em Palmeira dos
Índios, e Astória ou Colúmbia, no Rio de Janeiro, e mais fósforos,
uma garrafa térmica de café e, uma vez por outra, uma garrafa de
cachaça, de preferência tipo cabeça.

Falecimento. Graciliano faleceu em 20 de março de 1953,


no Rio de Janeiro. Na Casa de Saúde São Vítor, na praia de
Botafogo. Estavam presentes Dona Heloísa, a filha Clara e a irmã
Anália. Morreu na cidade one chegara pela primeira vez há 40
anos, então muito jovem com o sonho de vencer na cidade grande.
Praticamente terminou sua vida pobre, tanto que as despesas da
hospitalização seriam pagas com recursos levantados por uma
comissão de intelectuais. Seu corpo foi velado na Câmara
Municipal. Discursaram o senador Ezequias da Rocha, e os
deputados federais por Alagoas, Madeiros Neto e Muniz Falcão. O
enterro foi pago pelo jornal Correio da Manhã, do Rio de Janeiro,
onde trabalhava desde a década de 1940.

919
Golfo. Em determinada ocasião desejou que Alagoas fosse
transformada num golfo (parte do mar que penetra nas terras, cuja
abertura é extremamente larga), já que a forma de Alagoas bem se
prestava para tal, além do mais geograficamente o Brasil não tinha
nenhum. Isto em decorrência do ressentimento grande que sentia
pelo Estado, por conta de sua prisão injusta, covarde e movida à
traição. À dona Heloísa Ramos afirmou que só voltaria a Alagoas
“se pudesse oferecer a isso um terremoto que acabasse tudo”.

Homenagens. Em Alagoas, o escritor foi homenageado de


diversas formas. Identificam-se um conjunto habitacional; a
Imprensa Oficial de Alagoas, batizada de Graciliano Ramos, bem
como sua publicação principal a revista Graciliano, que completa
em 2018, dez anos de circulação. E mais: um viaduto na Avenida
Fernandes Lima, um colégio no bairro do Poço, a Casa Museu
Graciliano, em Palmeira dos Índios, um posto de saúde em
Maceió. A Câmata Municipal instituiu a comenda Graciliano
Ramos, concedida a personalidades nacionais e estrangeiras.

Inspetor. Em agosto de 1939, Graciliano foi nomeado


Inspetor Federal de Ensino Superior, junto ao ginásio que
funcionava no Mosteiro de São Bento, no Rio de Janeiro. O cargo
foi conseguido pelo amigo e poeta Carlos Drummond de Andrade
que, na época, era assessor de Gustavo Capanema, então ministro.

Juventude. Os filhos de Graciliano, Márcio e Junio, faziam


parte da Juventude Comunista de Maceió, e comandaram uma

920
reação estudantil contra à visita do integralista Plínio Salgado. No
teatro Deodoro, a estudantada dera uma vaia, após o discurso do
visitante, acompanhada de estouro de traques tipo cabeça-de-
negro. O chefe integralista “camisa verde” teve que fugir pelos
fundos do teatro. Acharam que tinha o dedo do Velho Graça no
complô.

Leitura. Até os nove anos de idade o nosso grande escritor


não tinha leitura, como se diz aqui no Nordeste, quando se refere a
alguém analfabeto. Segundo Graciliano, isso foi em decorrência da
improvisação de professoras a que foi submetido. Apontava ainda
a deficiência das escolas no interior, usando as seguintes palavras:
“Não existe prisão pior que uma escola do interior. A escola era
um lugar onde se enviava crianças rebeldes”.
Luiza Amado. Filha mais velha de GR, atual controladora
da empresa HG (Herdeiros de Graciliano), com 14 membros.
Única filha viva, ela sempre contestou a acusação da irmã Clara de
que Ricardo Ramos (outro irmão) teria publicado o original errado
de Memórias do Cárcere, já que Graciliano revisava seus textos à
mão na mesa cativa da Livraria José Olympio. Clara publicou um
livro, Cadeia, contestando a edição póstuma, e desuniu mais a
família. Em 2023, os livros de Graciliano cairão em domínio
público. A lei determina que a família detenha os direitos por 70
anos depois da morte. Até lá, a editora é a Record.

Literatura. No Rio de Janeiro, Graciliano trabalhou no


jornal literário Dom Casmurro, com sede no Rio de Janeiro que era

921
marcado pela irreverência nos textos, crônicas e críticas literárias.
Uma pérola sobre sua passagem pelo jornal está na crônica Os
Sapateiros da Literatura, rebatendo um outro artigo de Mário de
Andrade, em Linhas Tortas:

“Afinal, quem são os rapazes do D. Casmurro? Os sapateiros


da literatura. Não se zanguem, é isto. Somos sapateiros, apenas.
Quando, há alguns anos, desconhecidos, encolhidos e magros,
descemos as nossas terras miseráveis, éramos retirantes, os
flagelados da literatura. Tomamos o costume de arrastar os pés no
asfalto, frequentamos as livrarias e os jornais, arranjamos por aí
ocupações precárias e ficamos na tripeça, cosendo, batendo,
grudando... enfim, as sovelas furam e a faca pequena corta. São
armas insignificantes, mas são armas”.
Memórias. O “livro da cadeia” como Graciliano chamava
Memória do Cárcere. Escrito em 1946 (dez anos após sua prisão).
O livro seria publicado somente em 1953, pela Editora José
Olympio. Incrível a memória de Graciliano que, sem ter anotado
nada no período da prisão, consegue dez anos depois escrever o
livro, chegando, inclusive, a citar 260 nomes de pessoas que ele
conviveu na prisão. Promessa cumprida ao diretor da do presídio,
no exato dia de deixar a prisão: “Hei de pagar um dia a
hospitalidade que os senhores me deram... Pagar como?
Contando lá fora o que existe em Ilha Grande... escrevendo, ponto
tudo no papel. – O senhor é jornalista? - Não senhor. Faço livros.
Vou fazer um... duzentas páginas ou mais. Os senhores me deram
um assunto magnífico. Uma história curiosa, sem dúvida”.

922
Nise da Silveira. A lendária psiquiatra alagoana Nise da
Silveira (1905-1999) foi companheira de prisão de Graciliano
ramos, sendo uma das cinco mulhres presas em Ilha Grande, no
Rio de Janeiro. Sobre o escritor conterrâneo ela falou: “Realmente
fomos bastante amigos, uma amizade singela nos quais duas
pessoas se comunicam de verdade, íntimo a íntimo”. Em defesa da
sisudez de Graciliano, Nise assim define: “Compreende-se que
pessoa assim afinada para captar o bem, nos mais variados
cumprimentos, de onde fosse do mesmo modo sensível e quaisquer
manifestações da brutalidade, de perfídia, do mal. Tinha, pois, que
tomar suas medidas de defesa. Vestir carapuça dura, enrolar-se
com arame farpado”. Nise foi presa no próprio hospital onde
trabalhava, denunciada por uma enfermeira, com a acusação de ser
marxista. Foi libertada um mês antes de Graciliano.

Obsessivo. Tinha o hábito de, às 11 horas da manhã, tomar


demorados banhos. Tinha obsessão pela limpeza, inclusive adotava
o ritual de lixar suas mãos com pedra de pome, para livrar-se da
nicotina. Também era obsedante com as unhas, aparando-as
diariamente. Lava as mãos com frequência e suas roupas tinham
que estar imaculadas.

Patrão. Embora tendo bom relacionamento com seu chefe,


Paulo Bittencourt, diretor do jornal Correio da Manhã, no Rio de
Janeiro, não compareceu ao aniversário do chefe. Alegou para
Conde, jornalista da revista O Cruzeiro, que o convidou, “que

923
jamais sentaria na mesma mesa com o patrão, ainda mais para bater
palmas e cantar parabéns, pois todo patrão é filho da puta”.

Quebrangulo. Pequena cidade alagoana, berço do escritor,


nascido às 16 horas de 27 de outubro de 1892, na Rua Nova, 11.
Saiu do lugar aos dois anos. A casa onde nasceu, ao longo dos
anos, sofreu alguma descaracterização. Necessita, urgentemente,
ser tombada. Sobreo município: foi criado em 1872, quando
desmembrado de Viçosa. Pelo censo de 2000, Quebrangulo conta
13.384 habitantes. A única referência encontrada sobre Graciliano
é uma placa na entrada da cidade, com a seguinte mensagem:
“Você chegou em Quebrangulo, terra natal de Graciliano Ramos”.

República. Sobre o proclamador da República, marechal


Deodoro da Fonseca, Graciliano explicita o seguinte: “Era um
pobrezinho. Dom Pedro o recolhera, educara, dera-lhe posição e
dragonas (condecoração militar). Em paga a tantos favores, uma
rasteira no protetor bambo. Ingrato. Devia ter esperado que o
velhinho desse o couro às varas”. Pior foi saber que Dom Pedro e
família deixaram o Brasil no navio chamado Alagoas.

Sincera. Era a denominação de seu estabelecimento


comercial, em Palmeira dos Índios. Loja Sincera foi transformada
hoje nas lojas Guido, situada vizinha à prefeitura. A Sincera tinha
propaganda tipo: “vendemos com 2% de juros, cobrados só após
80 dias, ou então, “magnífico sortimento de fazendas, miudezas,
ferragens, tintas etc”. E ainda: “preço sem competição”. Com a

924
chegada da loja Pernambucana, a Sincera foi falindo aos poucos.
Graciliano foi um verdadeiro dublê de negociante e intelectual.
Ainda bem que fracassou como negociante, ganhando todos, com
ele como escritor.

Testamento. Três meses antes de falecer, Graciliano


chamou o seu filho Ricardo e conversaram sobre os cuidados
necessários para com seu “testamento literário”: “Preste atenção
ao que não está nos livros. Se assinei com meu nome, pode
publicar. Se usei as iniciais G.R. leia com cuidado. Se usei as
iniciais R.O. (Ramos Oliveira) ou G.O (Graciliano Oliveira),
tenha mais cuidado ainda. O que fiz sem assinatura ou iniciais
não vale nada, deve se besteira. Já com pseudônimo, não, não
deixe sair. Tome conta, pode ter importância. Talvez um dia os
livros rendam alguma coisa- bom para sua mãe e as meninas”.

Viçosa. Graciliano foi morar em Viçosa com seus pais em


1900, onde tinha parentes. Iniciou, nesse lugar, a leitura de
romances, vivendo aí parte da infância e adolescência. A cidade é
chamada de Atenas alagoana, tendo sido o município criado em
1831, quando foi desmembrado de Atalaia. Morava na casa de seus
pais, na rua Juazeiro. Em Viçosa fundou dois jornais.

Zelo. Foi o que Graciliano demonstrou quando da sua


primeira prisão (1930). Recomendou à dona Heloísa que tivesse
cuidado com as crianças, na saíds de casa e guardasse com cuidado
os originais de Caetés, indicativo do carinho nutrido pelo “primeiro

925
rebento literário”, segundo a irmã Marili. O que elas fizeram
juntas? Enterraram os originais numa lata, embaixo de um pé de
sapoti, no quintal da casa da irmã Otília, que morava no bairro de
Jaraguá.

Diplomatas do Império: Sinimbu e Barão de Penedo

Alagoas forneceu dois grandes vultos à nossa política


exterior, ambos titulares do Império: o visconde de Sinimbu e o
Barão de Penedo. João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu nasceu
em São Miguel dos Campos, bacharelou-se em Direito na
Universidade de Olinda, foi deputado federal e falava corretamente
diversos idiomas. Viajou por todo a Europa. Foi governador de
Alagoas, Bahia e Rio Grande do Sul. Serviu ao governo imperial
ministérios da Agricultura, Comércio, Obras Públicas e Justiça.
Como diplomata resolveu imbróglios importantes como o acordo
com o Uruguai, na questão do Rio da Prata. Morreu quase
centenário, mas monarquista convicto.

“Após o 15 de novembro de 1889, esse grande homem, que


veio a falecer quase centenário, assim se manifestara: ´ Sou
monarquista, morrerei monarquista, mas nunca conspirarei contra a
República. Receio que o Brasil se fragmente em republiquetas, o que
será uma desgraça`. Essas palavras confirmam que não só o espírito
conciliador e perspicaz, porém, acima de tudo, o civismo de
Sinimbu”.

926
Jurandir Gomes, em Quadros da História de Alagoas Breves
Ensaios sobre a História Pátria, Casa José Ramalho Editora, 1956

Diante do Papa: críticas ao governo imperial


Francisco Inácio de Carvalho Moreira, o barão de Penedo,
foi deputado por Alagoas de 1849 a 1852. Em 1852, foi nomeado
para representar o Brasil junto aos Estados Unidos, entrando para o
serviço diplomático. Exerceu vários cargos na Europa, entre eles o
de ministro plenipotenciário na Grã-Bretanha. Distinguiu-se
também junto à Santa Sé (1873) na “Questão Religiosa”,
salientando-se também como presidente da Comissão Brasileira na
Exposição Universal de Paris. Recebeu do Papa a Grã-Cruz de 1ª
Classe da Ordem de São Gregório Magno de Roma e de Portugal a
Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo.
“Por ocasião da “questão religiosa”, surgida em nosso país
com o processo dos bispos de Olinda e Belém do Pará, foi novamente
escolhido, pela finura de sua atuação, para missão oficial em Roma,
onde enfrentou a diplomacia do Cardeal Antonelli, justificando
perante Sua Santidade o Papa o criticável procedimento do governo
imperial”.

Jurandir Gomes, em Quadros da História de Alagoas Breves


Ensaios sobre a História Pátria, Casa José Ramalho Editora, 1956

Octávio Brandão (1896-1980)

927
O alagoano Octávio Brandão deve ser aclamado como um
personagem universal. De sua terra natal Viçosa, ele ganhou o
mundo, e se tornou não somente o primeiro ambientalista
alagoano, com seu clássico livro Canais e Lagoas, de 1919, mas
com um ser um humano sem igual. Octávio Brandão é reconhecido
também pela sua luta política, como ativista e militante do Partido
Comunista Brasileiro (PCB), e em sua biografia também mostra
seu talento no jornalismo (ensaios e crônicas), na poesia e na
produção intelectual e acadêmica, como lembra o professor José
Roberto Guedes, bacharel em Direito e Pós-Graduado em Direito
Ambiental pela Universidade de Campinas, e um de seus
biógrafos. Guedes lançou em 2008 o livro Octavio Brandão –
Dispersos e Inéditos, obra relevante para todos aqueles que se
identificam com as riquezas naturais e minerais do Brasil, bem
como sentem, pelas coisas nordestinas, uma singular paixão. A
edição é uma obra evocativa que reúne artigos, poesias, crônicas,
estudos, anotações, ensaios e críticas do viçosense Octavio
Brandão.

"Octavio Brandão, na verdade, foi nosso primeiro ecologista.


Era dono de um idealismo sem limites e de grande coragem cívica,
ainda que sofresse a frustração de não encontrar entre grande parte
dos intelectuais da época simpatia, apoio e estímulo, justiça e
compreensão”.

JR Guedes (organizador), Dispersos e Inéditos, 2005,


editora da UFSC - Florianópolis

928
A deportação para a Alemanha e Rússia
Até os últimos dias de sua existência, Octávio Brandão
lutou contra tudo e contra todos, pelo ostracismo a que fora
relegado em razão de seu idealismo e inquietação política. “Ele fez
desse idealismo que abraçara o ponto de partida na sua trajetória
conturbada de escritor revolucionário”, conta Guedes. Para se ter
uma ideia da longa e penosa peregrinação que fora a sua
existência, Octávio Brandão, sua mulher Laura e três filhas foram
deportados para a Alemanha, em 1931, em seguida para a Rússia.
Octávio Brandão foi um dos poucos que no começo do século XX
teve duas atitudes das mais relevantes: uma, a defesa do nosso
meio ambiente e, outra, na luta pelo nosso petróleo. Na defesa do
petróleo, Octavio Brandão produziu trabalhos publicados em
jornais alagoanos e do Rio de Janeiro, bem como de suas pesquisas
científicas em Alagoas, por volta de 1920/1930.
Perfil político e familiar
Octavio Brandão Rego. Poeta, naturalista, libertário,
anarquista, comunista, precursor do petróleo no Brasil. Ou como
“informava” o extinto Departamento de Ordem Pública e Social:
“farmacêutico, perigoso, agitador de operários”. Nasceu em
Viçosa, no dia 12 de setembro de 1896. Filho de Manoel Correia
de Mello Rego e Maria Loureiro Brandão Rego. Sua mãe morreu
quando ele tinha 4 anos e ficou órfão de pai aos 11. Foi o tio
materno, Alfredo Brandão – autor de Viçosa de Alagoas - quem o
criou. Octavio Brandão foi, junto com Astrojildo Pereira, um dos
pilares da formação do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Sua

929
ideologia e militância levaram-no a passar 15 anos de sua vida no
exílio e décadas na clandestinidade. Foi preso 17 vezes. Escrevia
sobre história, sociologia, ciências naturais, e mais poesias,
incontáveis artigos para jornais, estudos científicos. Falava vários
idiomas e foi o tradutor de O Manifesto Comunista para o
português. Também usou pseudônimos para veicular suas idéias:
Antonio Chicote, Brand, Salomão, Salomão Bombarda, Manuel,
Souza Dragão, Scipião Fogareu, Krieg, Karl Krieg, Fritz Mayer,
Daniel Brauna. Morreu no dia 15 de março de 1980, lutando contra
um AVC.

Fonte: Sociedade dos Amigos de Viçosa


www.vicosadealagoas.com.br

Maestro Fon-Fon: de Santa Luzia para o mundo

Nascido Otaviano Romero Monteiro (1908-1951), às


margens da Lagoa Mundaú, no município de Santa Luzia do Norte,
desde pequeno, aos 10 anos de idade, já tocava numa banda de
pífanos local. Saiu de Alagoas ainda adolescente para se tornar
uma celebridade como regente, arranjador, instrumentista e
compositor. Sua morte na Europa – onde permaneceu em uma
grande turnê com sua orquestra por quatro anos (1947-1951) –
causou uma grande comoção. Fon-Fon veio a falecer durante essa
excursão em Atenas, na Grécia. Durante a viagem, eles gravaram

930
seu único elepê pelo selo London: “Fon-Fon et la musique del
Brésil”, nunca editado no Brasil. Em 1935 criou sua própria
orquestra, para atuar no Cassino Assyrio, no Rio de Janeiro. Foi o
primeiro maestro no Brasil a utilizar naipes de saxofones e metais,
dando à sua orquestra uma sonoridade especial. Em 1942
acompanhou com sua orquestra, na Odeon, Ataulfo Alves e sua
Academia, na gravação do clássico samba “Ai que saudades da
Amélia”, de Ataulfo Alves e Mário Lago. A partir daí dirigiu e
acompanhou grandes nomes da música popular brasileira, como
Carmem Miranda, Francisco Alves, Dircinha Batista, Moreira da
Silva, Almirante, Emilinha Borba, Dalva de Olveira, Herivelton
Martins, Orlando Silva, e Aracy de Almeida.

“Lá no povoado do Quilombo, tinha uma banda de “pífanos “,


que tocava nas ruas de Santa Luzia. Pífano é um instrumento de
sopro, artesanal; feito de madeira e que tem um som muito bonito, dá
um agudo que não se consegue tirar em outro instrumento. Essa
banda de pífanos, pertencia a uma família chamada “ Mugumba”. Eu
ficava admirado olhando eles tocarem. De tanto acompanhar a
banda, um dia deram-me um pífano para eu tirar uma música. Daí
prá frente, não parei nunca mais. Não fosse aquele gesto, eu não
estaria hoje aqui na Europa”.

Maestro Fon-Fon em entrevista ao jornal O Globo, reproduzida


do artigo O alagoano que encantou o Brasil e a Europa”.

Os últimos dias e a última carta de Fon-Fon na Europa

931
Durante os últimos anos na Europa, no final dos anos 1950,
o maestro Fon-Fon enviou uma série de cartas para a família, uma
delas para a irmã, Vicentina Romeiro, em que fala da saudade de
sua terra e de suas apresentações palcos europeus: “Centina,
primeiro que tudo espero encontrá-la bem de saúde. Hoje tive uma
emoção sem igual. No show aqui em Madri tocamos a música
Touradas em Madri do Braguinha. Foi lindo! os espanhóis
adoraram. Só não encontrei uma espanhola natural da Catalunha.
Estou morrendo de saudades de vocês e de comer um sururu de
capote aí em Santa Luzia”. Em dezembro de 1950, Fon Fon envia
uma carta ao seu pai, Amaro Romeiro descrevendo os momentos
que vivia na Europa. A carta foi escrita em dezembro após o natal,
vindo Fon Fon a falecer em agosto de 1951 em Atenas, Grécia,
momento em que regia sua orquestra durante uma apresentação.

“Meu Pai. Não podia deixar de lhe comunicar a minha última


parada. No momento encontro-me na Grécia, onde todos os costumes
são diversos de toda Europa. Deixei de lhe escrever estes meses,
porque não me demorei em nenhum país, mais um mês, de modo que
espero demorar no mínimo três meses neste belo país. Pretendo
seguir depois para o Brasil. Já me encontro cansado de todos os dias
a mesma luta e sem esperança de mais nada. Conheço toda Europa,
elevei a música do nosso país. Fiz a música brasileira ser conhecida,
embora monetariamente não me tenha dado resultado. Porém estou
contente com o que Deus me deu. Aqui deixo o meu abraço a todos da
nossa família, desejando um ano cheio de felicidades e próspero
1951. Minha benção e que Deus os guarde. Otaviano Romeiro”.

932
Reproduzida do artigo O alagoano que encantou o Brasil e a
Europa, por Chico de Assis
no portal http://maestrofonfon.blogspot.com.br/

Dom Avelar Brandão Vilela. Cardeal Primaz do Brasil

Dom Avelar nasceu em Viçosa, 13 de junho de 1912, de


morreu em Salvador, 19 de dezembro de 1986. Com uma atividade
pastoral intensa, Dom Avelar foi nomeado, em 1971, Arcebispo
Primaz do Brasil e 23º Arcebispo de Salvador. Dom Avelar
Brandão Vilela tem seu nome gravado na história da Igreja
Católica, como um dos representantes mais lúcidos, ponderados e
virtuosos. Iniciou seus estudos no Seminário de Maceió e no
Seminário de Olinda. Foi ordenado em 27 de outubro de 1935.
Membro do corpo docente e orientador espiritual do Seminário de
Aracajú, foi secretário da diocese de Aracajú. Foi capelão
diocesano da Ação Católica. Com apenas 33 anos foi sagrado
bispo de Petrolina, sendo consagrado em 27 de outubro de 1946,
pelo bispo Dom José Thomas Gomes da Silva, bispo de Aracaju,
tendo como co-consagrantes Dom Adalberto Accioli Sobral, bispo
de Pesqueira e Dom Mário de Miranda Vilas-Boas, arcebispo de
Belém do Pará. Em 5 de novembro de 1955, é elevado a arcebispo
de Teresina. Frequentou o Concílio Vaticano II, entre 1962 e 1965.
Foi eleito presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano
(CELAM), mandato que exerceu entre 1966 e 1972. Frequentou a

933
Primeira Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos, na Cidade
do Vaticano, entre 29 de setembro e 29 de outubro de 1967, a
primeira Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, entre
11 a 28 de outubro de 1969 e a II Assembléia Ordinária do Sínodo
dos Bispos, entre 30 de setembro e 6 de novembro de 1971. Em 25
de março de 1971 foi transferido para a Arquidiocese de São
Salvador da Bahia. Em 5 de março de 1973, foi criado cardeal no
Consistório Ordinário Público de 1973, recebendo o barrete
cardinalício das mãos do papa Paulo VI e o título cardinalício de
São Bonifácio e Santo Aleixo. Em 1975 requereu da Santa Sé o
Título já consagrado da primazia de sua arquidiocese, o Santo
Padre enviou seu representante o núncio apostólico para conferir o
título numa cerimônia na Catedral-Basílica Primacial de São
Salvador, em 25 de outubro de 1980.

Misael Domingues, o Ernesto Nazareth do Nordeste

Misael Domingues da Silva (1857-1932), alagoano de


Marechal Deodoro, foi um exímio pianista e compositor musical,
sendo comparado ao lendário Ernesto Nazareth, segundo o maestro
pernambucano Guerra Peixe. Sobre ele falou Manoel Diégues
Junior, no Diário de Notícias do dia 22 de dezembro de 1957: ”O
nome de Misael Domingues teve larga tradição; exerceu, no campo
da composição musical do Nordeste, um papel importante, de alta
influência, de repercussão social”. Foi autor de aproximadamente
90 obras, entre valsas, polcas, choros e maxixes. Exímio pianista,

934
conhecia plenamente o repertório de sua época. Suas obras foram
editadas pela casa Préalle, de Pernambuco que, depois, as mandava
para serem impressas pela Vreitkopf & Hartel, da Alemanha. Em
1889, compôs o primeiro Hino do estado de Alagoas. Em 1980, foi
homenageado pela pianista Sonia Maria Vieira, que gravou suas
obras no LP "Sonia Maria Vieira revela Misael Domingues 48
anos depois". Em 1984, sua serenata “Em pleno luar”,
originalmente composto para dois violinos ou dois bandolins e
piano, foi gravada no LP triplo "Recordações de um sarau artístico
- Homenagem a Ernesto Nazareth".

http://dicionariompb.com.br/misael-domingues

Engenheiro e abolicionista
Misael Domingues também atuou como engenheiro, chegou
a ser o executor de grandes obras como as ferrovias Ferro Norte de
Alagoa, Sul de Pernambuco, Central de Caruaru e Alcobaça à Praia
Rainha, no Pará. Durante muitos anos foi engenheiro chefe das
obras públicas do Estado de Pernambuco e técnico da Inspetoria de
Portos, Rios e Canais.Em 1875, seu nome já era conhecido na
capital do Império. Nas páginas do Jornal do Comércio, consta
anúncio da polka-lundú “Mamãe já disse”, impressa e distribuída
pela loja de músicas de “D. Filippone”.Quando foi estudar no Rio
de Janeiro, em 1878, sua chegada foi anunciada no jornal Gazeta

935
de Notícias: “Chegou a esta Corte o jovem pianista compositor
Misael Domingues Lordsleem, conhecido pelas suas graciosas
músicas publicadas em Genebra, e outras aqui e em Maceió”.Teve
papel importante na campanha abolicionista, participando, com
seus dois irmãos Francisco Domingues e José Domingues de ações
de alta relevância em defesa da causa dos negros.

http://dicionariompb.com.br/misael-domingues

Elon Lages: o matemático do Brasil

O alagoano Elon Lages Lima (1929-2017) foi um dos mais


importantes matemáticos brasileiros. Mestre e doutor (PhD) pela
Universidade de Chicago, ganhador por duas vezes do Prêmio
Jabuti da Câmara Brasileira do Livro e recebedor do Prêmio Anísio
Teixeira do Ministério da Educação. Seus trabalhos de pesquisa
envolvem topologia diferencial, topologia algébrica, e geometria
diferencial.Era pesquisador emérito do Instituto Nacional de
Matemática Pura e Aplicada (IMPA), instituição da qual foi diretor
em três períodos distintos. É autor de mais de trinta livros sobre
matemática, seis dos quais se destinam à formação e
aperfeiçoamento de professores do ensino médio. Iniciou sua
carreira como professor secundário em Fortaleza, Ceará.
Bacharelou-se em matemática pela Universidade do Brasil, em
1953 e obteve os graus de mestre e doutor em matemática pela
Universidade de Chicago. É membro titular da Academia
Brasileira de Ciências (ABC) e da Academia de Ciências dos

936
Países em Desenvolvimento (TWAS). É Professor Honoris Causa
da Universidade Federal do Ceará (UFC), da Universidade Federal
da Bahia (UFBA), da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), da Universidade de Brasília (UnB) e da Pontifícia
Universidade Católica do Peru, doutor Honoris Causa pela
Universidade Federal de Alagoas (UFAL), pela Universidade
Federal do Amazonas (UFAM). Ganhou duas vezes o Prêmio
Jabuti da Câmara Brasileira do Livro pelos livros Espaços
Métricos e Álgebra Linear, e recebeu o prêmio Anísio Teixeira do
Ministério da Educação.

PATRIMÔNIO HISTÓRICO
E GEOGRÁFICO

“A cana-de-açúcar foi o motivo da ocupação do território ao


sul de Pernambuco. Com ela vieram os engenhos com suas casas-
grandes e capelas. Os aglomerados humanos que surgiram a seguir
trouxeram com eles construções destinadas à moradia, ao comércio,
ao culto religioso e à administração. Essas construções, com suas
diversidades de épocas, estilos, materiais e funções, atestam
diferentes fases da história de Alagoas. A vida de um povo pode ser

937
contada a partir de diferentes perspectivas. A arquitetura é uma
delas. Desde tempos imemoriais, as maneiras como as comunidades
constroem suas moradias e outras edificações voltadas a fins
econômicos, religiosos ou administrativos, denotam traços
característicos de sua gente. .. A geografia e o clima também têm
sobre elas um forte efeito, condicionando várias de suas funções e
aspectos. A tradição e a cultura se encarregam de dar-lhes a
conformação final”.

Em Alagoas Memorável, patrimônio arquetetônico, do


Instituto Arnon de Mello, 2002, organização Cármem Lúcia
Dantas, Douglas Apratto e José Luis Mota Menezes

Bens tombados

O tombamento é um ato administrativo realizado pelo


Poder Público com o objetivo de preservar, por intermédio da
aplicação de legislação específica, bens de valor histórico,
cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para
a população, impedindo que venham a ser destruídos ou
descaracterizados. O Tombamento pode ser aplicado aos bens
móveis e imóveis, de interesse cultural ou ambiental, quais sejam:

938
fotografias, livros, mobiliários, utensílios, obras de arte, edifícios,
ruas, praças, cidades, regiões, florestas, cascatas etc. Somente é
aplicado aos bens materiais de interesse para a preservação da
memória coletiva.

Sítios históricos tombados pelo Iphan*

*São 11 os bens com tombamento federal em Alagoas pelo


Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)

Marechal Deodoro:Conjunto arquitetônico e urbanístico

Foi tombado pelo Iphan em 2009. A área definida para


proteção envolve três locais descontinuados - o Centro, a área do
Carmo e a área de Taperagua - todos com seus elementos de
interesse, devido à sua importância histórica e relevância
paisagística. A cidade possui importantes registros para a história
do urbanismo no Brasil, como a praça de origem da vila com a
forma original do período de 1611 a 1636. Nesse patrimônio
destacam-se os aspectos originais dos edifícios e, principalmente, o
Convento Franciscano de Santa Maria Madalena, datado de 1659.
Marechal Deodoro sediou a primeira capital de Alagoas, além de
ser a cidade natal do proclamador da República, que deu nome à
localidade. Possui várias edificações religiosas que se configuram
como indicativos socioculturais das atividades que ali se
desenvolveram ao longo dos anos, onde o casario e as edificações

939
religiosas retratam a história da economia e das batalhas que
ocorreram na região.

Marechal Deodoro: Casa do presidente da República

Museu Marechal Deodoro da Fonseca Casa térrea urbana


onde nasceu o proclamador da República brasileira, Marechal
Deodoro da Fonseca. Em ruínas na época do tombamento (1964),
foi posteriormente reconstruída e abriga hoje o Museu Marechal
Deodoro da Fonseca. O marechal foi o proclamador e 1º
presidente da República, em 5 de agosto de 1827. O cidadão mais
famoso da cidade, pertencente a uma família de tradição militar,
ingressou na Escola Militar do Rio de Janeiro em 1843, com pouco
mais de 15 anos. Participou ativamente da guerra entre Brasil,
Uruguai e Paraguai, voltando de lá com o título de coronel. Em
1884, foi promovido a marechal e, cinco anos após, no dia 15 de
novembro de 1889, liderou a Proclamação da República. Como
primeiro Presidente da República do Brasil, permaneceu no cargo
até novembro de 1891, quando, já muito doente, passou o cargo
para o também alagoano marechal Floriano Peixoto.

Marechal Deodoro: Convento e Igreja de São Francisco

Tombados em 1964. A construção do convento foi iniciada


em 1684 e concluída em 1723. Anexa ao convento, a Igreja de
Ordem Terceira de São Francisco começou a ser erguida na
segunda metade do século XVIII. Desde 1984, o complexo abriga

940
o Museu de Arte Sacra de Alagoas. O tombamento incide sobre
todo o seu acervo. A obra surgiu a partir de um pequeno convento
fundado para 12 monges, em 1635. Com a invasão dos holandeses,
os religiosos se refugiaram na Bahia e o convento ficou fechado
até 1659. O atual convento foi concluído apenas em 1723. Em
1908, passou a abrigar o Orfanato São José. Com o tempo sofreu
muitas modificações mas sempre com a função de culto religioso.
A fachada principal é em estilo rococó e a lateral em neoclássico,
em decorrência da construção ter sido realizada em etapas. .

Palmeira dos Índios: Casa de Graciliano Ramos

Tombado em 1965. Casa térrea urbana, erguida no primeiro


quartel do século XX, onde residiu o escritor Graciliano Ramos.
Abriga um museu e uma biblioteca com o acervo do antigo
proprietário. No museu encontram-se relíquias acerca da vida e da
obra de Graciliano, como sua máscara mortuária, feito pelo artista
Honório Peçanha, com a face de Graciliano ao lado, de seus
personagens em Vidas Secas, o vaqueiro Fabiano, sua mulher
Sinhá Vitória, os dois meninos e a cachorra Baleia. Também fazem
parte do acervo edições raras das obras publicadas em países como
a Ucrânia e Rússia; e sua máquina de escrever - há controvérsias
sobre o fato de que Graciliano não teria escrito seus textos em
máquinas, mas com lápis ou caneta tinteiro. Do armário saem
peças inusitadas e atuais, como uma foto de Zélia Gattai – mulher
de Jorge Amado - com dedicatória, de 1961, no Rio, enquadrando
o marido, Jorge, e a viúva de Graciliano, dona Heloísa, com a neta

941
de ambos, Fernanda Ramos Amado, filha de Luiza Ramos Amado
(filha do Mestre Graça), e de James Amado, filho de Jorge. Luiza
fez Jorge e Graciliano formarem laços de família, uma ciranda de
roda.

Penedo: Conjunto histórico e paisagístico da cidade

O tombamento foi em 1996, na classificação Conjunto


urbano O tombamento incide sobre um conjunto de logradouros e
edificações em uma área da margem esquerda do Rio São
Francisco, sobretudo no Centro Histórico da cidade.

Penedo: Um relicário a céu aberto

Penedo é um relicário vivo a céu aberto, jóia da arte barroca


brasileira, a mais antiga povoação do Baixo São Francisco. Uma
janela maravilhosa para contemplar o esplendor do Velho Chico,
suas águas verdes peroladas, as velas multicoloridas dos barcos e
os rochedos encravados nas margens, de onde vem seu nome
Penedo, uma pedra grande. A cidade impressiona pelo seu
riquíssimo casario de padrão colonial, seu patrimônio histórico e
cultural, construído por franceses, holandeses, portugueses,
missionários franciscanos, índios, negros e bravos alagoanos. Povo
de uma verve hospitaleira e gentil que vai desde os canoeiros, os
beiradeiros, os pescadores, os mestres artesãos até as tradicionais
famílias, os barões do açúcar, do arroz e da indústria têxtil.
Chamada pelo escritor Gilberto Freyre de a "Cidade dos

942
Sobrados", Penedo viu surgir seu atual cenário de belas igrejas e
casarões entre finais do século 17 e início do século 19. Entre as
igrejas mais importantes estão o Convento de São Francisco e as
igrejas de Nossa Senhora dos Anjos e Nossa Senhora da Corrente.
Um pequeno e despercebido local, mostra a que ponto chegou a
religiosidade dos antepassados de Penedo. O Oratório da Forca,
construído em 1769, destinava-se às preces dos prisioneiros antes
de serem sacrificados. Depois das orações, eles eram levados para
ilhas e croas do São Francisco para o enforcamento, já que a
Penedo cristã não podia aplicar uma pena de morte sumária.

Penedo: Convento e Igreja de Santa Maria dos Anjos

Tombado em 1941 na classificação conjunto arquitetônico


religioso. O convento primitivo foi erguido em 1661, a pedido dos
moradores. O atual conjunto começou a ser erguido em 1682. A
igreja e a capela-mor ficaram prontas em 1689. Passou por
diversas reformas no século XVIII. O tombamento engloba todo o
seu acervo.

Penedo: Igreja de Nossa Senhora da Corrente

Tombado em 1964, como Templo católico A construção da


igreja foi iniciada em 1765, a partir da Capela Mor preexistente,

943
por ordem do capitão-mor José da Silva Reis. O tombamento
incide sobre todo o seu acervo

Penedo: Igreja de São Gonçalo dos Homens Pardos

Tombada em 1964, como templo católico. Erguida para


substituir a capela primitiva dos ermitões. A construção foi
iniciada em 1758, quando a irmandade foi organizada. O
tombamento incide sobre todo o seu acervo.

Piranhas: Sítio histórico e paisagístico da cidade

Tombamento de Piranhas 2006 Conjunto urbano Única


cidade do semiárido nordestino tombada como patrimônio
histórico nacional, Piranhas se destaca pelo seu casario colonial,
disposto irregularmente em morros e baixadas. O tombamento
engloba diversas edificações e logradouros públicos.

Porto Calvo: Igreja Nossa Senhora da Apresentação

A igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação foi


tombada em 1955, como conjunto urbano. Fundado por Cristóvão
Lins no século XVI, o povoado de Porto Calvo foi elevado à
categoria de vila em 1636, com a chegada do donatário Duarte
Coelho. A matriz do povoado foi erguida em 1610 e sofreu
diversas descaracterizações com o passar do tempo.

944
Lista de bens tombados pelo Estado de Alagoas*
*Secretaria de Estado da Cultura do governo de Alagoas –
Secult 2015

Pontal da Barra – Maceió


Praça Marechal Floriano Peixoto – Maceió
Usina Hidrelétrica de Angiquinho - Delmiro Gouveia
Cidade de Marechal Deodoro
Cidade do Penedo
Cidade de Piranhas e distrito de Entremontes
Bairro de Jaraguá – Maceió
Ilha de Santa Rita - Marechal Deodoro

Arquitetura Civil

Escola Estadual Rocha Cavalcante - União dos Palmares


Casa do Barão de Penedo – Penedo
Antigo Cine Pilarense – Pilar
Associação Aliança Comercial – Maceió
Sobrado dos Irmãos Brêda – Maceió
Palacete da Baronesa - São Miguel dos Campos
Casa de Aurélio Buarque de Holanda Passo de Camaragibe
Sociedade Perseverança – Maceió
Museu da Imagem e do Som - MISA Maceió
Paço Imperial de Pão de Açúcar - Pão de Açúcar
Palácio Marechal Floriano Peixoto – Maceió
Teatro Deodoro – Maceió

945
Casa de Jorge de Lima – Maceió
Academia Alagoana de Letras – Maceió
Paço Imperial – Penedo
Associação Comercial de Maceió – Maceió
Casa do Poeta Jorge de Lima - União dos Palmares
Museu Théo Brandão - Maceió
Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde – Maceió
Teatro Sete de Setembro – Penedo
Casa de Cultura de Viçosa – Viçosa
Palacete Barão de Jaraguá – Maceió
Casa do senador Teotônio Vilela – Viçosa
Casa de Arthur Ramos – Pilar
Tribunal de Justiça de Alagoas – Maceió
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas - Maceió
Palácio do Trabalhador – Maceió
Complexo Arquitetônico NS do Bom Conselho – Maceió

Arquitetura Religiosa

Igreja e Convento NS dos Anjos – Penedo


Igreja de NS da Corrente – Penedo
Igreja de São Gonçalo Garcia – Penedo
Igreja e Convento de São Francisco, Santa Maria Madalena -
Marechal Deodoro
Igreja da Ordem 3ª de São Francisco - Marechal Deodoro
Igreja NS Mãe dos Homens - Coqueiro Seco
Igreja NS do Ó – Maceió

946
Igrejas de Maceió - Catedral Metropolitana; NS do
Livramento; NS do Rosário dos Pretos; Bom Jesus dos Martírios;
Capela de São Gonçalo de Amarante; Arcebispado de Maceió
Igreja Matriz de Santa Luzia do Norte
Igreja de Nossa Senhora da Guia – Maceió
Casarão da Baronesa em Água Branca

Festas e celebrações

JANEIRO

Festa do Bom Jesus dos Navegantes – Penedo. Um dos


eventos mais tradicionais do estado acontece nas cidades de Pão de
Açúcar e Penedo. A festa, realizada há várias décadas, apresenta
manifestações religiosas e culturais que reverenciam o protetor dos
navegantes. Centenas de devotos, turistas e pescadores seguem em
barcos, lanchas e canoas pelo Rio São Francisco, durante a
procissão em homenagem ao Bom Jesus.

Festa do Santo Amaro. A Festa de Santo Amaro é um dos


atrativos da cidade de Paripueira. Além da religiosidade
manifestada na missa e na procissão, o evento apresenta vários
shows musicais e culturais. O espetáculo "Paripueira – Senhora
das Águas", encenado por artistas locais, conta a história da cidade.

Feira dos Municípios de Alagoas. Promovida pela


Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), a Feira dos

947
Municípios é uma vitrine do potencial do estado, e tem como
objetivo gerar negócios e apresentar as atividades que impulsionam
o desenvolvimento dos municípios. O evento é uma excelente
oportunidade para mostrar serviços, divulgar potencialidades
turísticas e culturais, como também comercializar artesanato e
produtos das localidades.

Festa da Padroeira Nossa Senhora do Bom Conselho. De


23 de janeiro a 02 de fevereiro. O maior evento religioso e cultural
do interior de Alagoas converge naturalmente grande parte da
população do município de Arapiraca para o centro da cidade.

FEVEREIRO

Festas Carnavalescas. Alegria e beleza marcam as festas


em Alagoas, que têm no Carnaval o grande destaque do Calendário
de Eventos. Várias prévias antecedem os festejos de Momo, e
Maceió tem como destaques o Baile Municipal; Concurso do Boi;
Bloco Pinto da Madrugada entre outros blocos que resgatam os
carnavais antigos ao som de marchinhas carnavalescas, em
Jaraguá. O Carnaval de rua mantém suas tradições originais,
destacando-se os municípios de Paripueira, Marechal Deodoro,
Barra de São Miguel, Coruripe, Barra de Santo Antonio, Maragogi
entre outros.

ABRIL

948
Paixão de Cristo. Em Arapiraca, a encenação da Paixão de
Cristo lota o Morro Santo da Massaranduba, é um megaespetáculo
realizado no teatro ao ar livre que encena a história de Cristo. O
evento é grandioso e tem como elenco artistas da localidade e de
renome nacional.

JUNHO

Forrogaço. Na cidade de Piranhas, no Alto Sertão de


Alagoas, acontece o Forrogaço, uma prévia das festas juninas que
reúne várias atrações, inclusive nacionais, além de muito forró pé-
de-serra, comidas típicas e apresentações culturais.

Festas Juninas. No mês de junho, as sanfonas, zabumbas e


triângulos ditam o ritmo das festas juninas em Alagoas. As
quadrilhas, grupos de coco-de-roda e shows com bandas de forró e
duplas sertanejas transformam as cidades de Maceió, Arapiraca,
Pilar, São Miguel dos Campos, Coruripe, Marechal Deodoro e
Piranhas num verdadeiro arraial.

JULHO

Festival de Inverno. Água Branca, localizada no Alto do


Sertão alagoano, registra, nesse período do ano, uma temperatura
baixa, e o frio atrai muitos visitantes durante a realização do

949
Festival de Inverno, que tem na sua programação atrações culturais
e animados show

Jeep Show de Arapiraca. Para quem gosta de aventuras e


curte fazer trilha, o município de Arapiraca realiza o Jeep Show,
evento que percorre trilhas na zona rural e em circuito fechado na
zona urbana. O encontro é promovido pelo Jeep Clube de
Arapiraca reunindo amantes dessa prática esportiva de várias
partes de Alagoas, do Nordeste e do Brasil.

AGOSTO

Festival do Repente e poesia em Arapiraca. São três dias


de grandes emoções, disputas de poetas repentistas, declamações
de poesias matutas e toda uma mística nordestina que reúne os
grandes nomes do gênero no Brasil. É um festival que tem o
propósito de incentivar a proliferação da cultura do repente em
Arapiraca e região, resgatando e fomentando a arte da cantoria de
viola. Fortaleceu-se então, o Festival do Repente, Poesia e Viola,
momento ímpar para a cantoria de viola, onde nessa reunião
brilham nomes como: Ivanildo Vilanova, repentista respeitado
nacionalmente. Na poesia nordestina, nomes como o do poeta e
radialista Zé do Rojão, cordelistas como o arapiraquense Ronaldo.

SETEMBRO

950
Missa do Vaqueiro. Evento religioso que acontece em
União dos Palmares e Canapi. A tradicional Missa do Vaqueiro
conta com uma rica programação artística e cultural. Os shows de
forró e na feirinha típica, onde são expostos objetos artesanais e
decorativos, são comercializadas comidas tradicionais à base de
milho e mandioca.

Festival da Lagosta. Gastronomia também é um forte


atrativo do Calendário de Eventos de Alagoas. Maragogi, no
Litoral Norte, promove o Festival da Lagosta, que, além de servir
saborosos pratos à base de frutos do mar, oferece ainda atrações
musicais e muita animação.

Festival do Maçunim. O município de Feliz Deserto, no


Litoral Sul alagoano, realiza um dos maiores eventos de pesca
esportiva do Nordeste, com animada programação musical. Na
gastronomia, destaque para o concurso do prato mais saboroso
feito com o Maçunim, marisco encontrado facilmente no
município.

OUTUBRO

Expoagro. Exposição Agropecuária e Produtos Derivados


de Alagoas - Expoagro, realizada no Parque da Pecuária, em

951
Maceió, atrai muitos criadores e expositores de vários estados.
Bovinos, eqüinos, caprinos e ovinos participam da exposição,
leilões, desfiles e torneios. A Expoagro mostra o que há de melhor
em relação ao gado de corte e gado de leite. Movimenta milhões
em negócios durante o evento, e conta com uma programação
diversificada.

NOVEMBRO

Festa Literária de Marechal Deodoro (Flimar). A Feira


Literária de Marechal Deodoro (Flimar), já está no Calendário de
feiras culturais brasileiras e internacionais. Considerado um dos
principais eventos culturais do Nordeste, a Flimar incentiva a
leitura e a valorização dos livros através de uma programação que
inclui palestras, workshops, apresentações folclóricas, sessões de
cinema, demonstrações de gastronomia, shows e manifestações
culturais. A presença e público médio tem sido de 30 mil pessoas,
incluindo as comunidades locais, alunos, professores e visitantes.
“A Flimar foi um sucesso inesperado em sua primeira edição e foi
evoluindo desde então. Nesta seguência queremos deixar a
semente da literatura plantada na cabeça das pessoas”, diz o
criador da Flimar, Carlito Lima.

Bienal Internacional do Livro de Alagoas. Maior evento


literário de Alagoas, a Bienal Internacional do Livro de Alagoas,
chega a sua 7ª edição, em novembro de 2015, no Centro Cultural e
de Exposições de Ruth Cardoso, com o tema “Palavras, sons,

952
imagens: universos de sentidos”. O evento é uma realização da
Universidade Federal de Alagoas, por meio de sua Editora, a
Edufal. Segundo o site oficial do evento, a estimativa de público
para este ano é de mais de 260 mil. No ano de 2013 o número de
visitantes foi de 252 mil pessoas.

Gincana de Pesca de Arremesso. Evento organizado pelo


Clube de Pesca de Penedo, onde acontece o desfile de abertura.
Porém, a Gincana de Pesca e Arremesso, evento nacional, é
realizada na praia do Pontal do Peba, no município de Piaçabuçu.
Diversos shows musicais abrilhantam a festa que atrai, além dos
amantes da pesca, muitos turistas.

Proclamação da República. Marechal Deodoro comemora


em grande estilo o dia da Proclamação da República. A cidade,
berço do Proclamador e primeiro presidente do Brasil, é palco de
festividades diversas, e atrai muitos visitantes. A festa tem início
com o hasteamento das bandeiras, execução do hino nacional e
desfile militar.

Consciência Negra. Foi em União dos Palmares, na Serra


da Barriga, que os negros rebelados contra a escravidão fundaram
o Quilombo dos Palmares, tendo como líder maior, Zumbi dos
Palmares. No dia 20 de novembro, data do aniversário da morte de
Zumbi, são realizadas ações no local, como: palestras, shows,
musicais, exposições de artesanato.

953
Festival do Bagre. Acontece no Pilar, e conta com vasta
programação artística: shows com bandas, diversas atrações
culturais, esportivas e concurso gastronômico, onde o prato
principal é o bagre, peixe fisgado na Lagoa Manguaba, que banha
o município.

DEZEMBRO

Aniversário de Maceió. O aniversário da Capital alagoana


é comemorado em grande estilo. Várias atrações musicais, com
artistas da terra e bandas conhecidas nacionalmente, constam da
programação. O evento é prestigiado por maceioenses e turistas.

CIRCUITO CULTURAL

No universo da cultura, o museu assume funções as mais


diversas e envolventes. Uma vontade de memória seduz as pessoas e

954
as conduz à procura de registros antigos e novos, levando-as ao
campo dos museus, no qual as portas se abrem sempre mais. A
museologia é hoje compartilhada como uma prática a serviço da
vida. O museu é o lugar em que sensações, ideias e imagens de
pronto irradiadas por objetos e referenciais ali reunidos iluminam
valores essenciais para o ser humano. Espaço fascinante onde se
descobre e se aprende, nele se amplia o conhecimento e se aprofunda
a consciência da identidade, da solidariedade e da partilha. Por meio
dos museus, a vida social recupera a dimensão humana que se esvai
na pressa da hora. As cidades encontram o espelho que lhes revele a
face apagada no turbilhão do cotidiano. E cada pessoa acolhida por
um museu acaba por saber mais de si mesma.

Texto: Instituto Brasileiro de Museus - Ibram

Museus de Maceió (com ano de fundação)

1869. Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas


1961. Arquivo Público do Estado de Alagoas

955
1975. Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore
1980. Museu de Arte - Fundação Pierre Chalita
1980. Museu de Arte Brasileira - Fundação Pierre Chalita
1984. Fundação Teotônio Vilela
1985. Casa da Arte - Garça Torta
1987. Museu da Imagem e do Som
1991. Museu de História Natural da UFAL
1993. Museu dos Esportes Edvaldo Alves Santarosa
1994. Memorial Pontes de Miranda da Justiça do Trabalho
1995. Museu do Cangaço (perdido em incêndio)
1996. Instituto Arnon de Mello
1997. Casa da Palavra
2001. Museu do Comércio (Associação Comercial de Alagoas)
2003. Centro de Memória da Justiça Eleitoral
2005. Memorial Teotônio Vilela
2005. Memorial à República
2005. Ecomuseu Comunitário Graciliano é uma Graça
2006. Museu Palácio Floriano Peixoto
2012. Memoriais de Graciliano Ramos e Ledo Ivo
2008. Casa Jorge de Lima

Museus de Alagoas

BOCA DA MATA
MUSEU MANOEL DA MARINHEIRA

956
Boca da Mata AL CEP 57680-000
www.aguasdesaobento.com.br
Artes visuais. Esculturas em madeira,tendo como temas
animais, da autoria do titular do museu e de seus familiares.

MACEIÓ
COLEÇÃO KARANDASH DE ARTE POPULAR E
CONTEMPORÂNEA
Avenida Moreira Silva, 89 – Farol
Maceió AL CEP 57051-500
www.karandash.com.br
Esculturas, pinturas, desenhos, gravuras, cerâmicas, rendas,
banco de dados de artistas. Acervo dividido em arte
contemporânea, arte popular e objetos utilitários, expondo e
promovendo artistas locais.

PALMEIRA DOS INDIOS


MUSEU XUCURUS
Praça do Rosário, s/n – Centro
Palmeira dos Índios AL CEP 57600-540
guiamaceio.wordpress.com/...museu-xucurus-palmeira-dos-
indios; www.colegioweb.com.br/geografia/museu-xucurus
Instalado na Igreja do Rosário, construída por escravos,
reúne peças religiosas indígenas da época da escravidão e
documenta a vida cotidiana da cidade, ao longo dos tempos.

957
PENEDO
MUSEU DO PAÇO IMPERIAL
Rua Damaso do Monte, s/ n – Centro histórico
Penedo AL CEP 77200-000
Tornou-se Paço Imperial a partir da visita de Dom Pedro II
a Penedo. Seu acervo remete à época deste Imperador.

PILAR
CASA DA CULTURA E MUSEU ARTHUR RAMOS
Avenida Professor Artur Ramos, 195 - Centro
Pilar AL CEP 57150-000
smoraes.pilar@hotmail.com
Pinturas, objetos históricos, fotografias, história da cidade,
maquetes, banners.

PIRANHAS
MUSEU DO SERTÃO
Rua José Martiniano Vasco, s / n – Centro Histórico
Piranhas AL CEP 57460-000
www.piranhas-al.com.br
Iconografia do Cangaço, memorabilia da ferrovia Paulo
Afonso e da navegação a vapor na região. Peças das culturas
ribeirinhas.
PORTO REAL DO COLÉGIO
CASA DA CULTURA DE PORTO REAL DO COLÉGIO
Avenida Moacir Andrade, s/n - Centro
Porto Real do Colégio AL

958
mucioprc@ig.com.br
Artesanato, fotografias, instrumentos domésticos.

SANTANA DO IPANEMA
MUSEU HISTÓRICO E DE ARTES DARRAS NOYA
Praça Manoel Rodrigues da Roicha, s / n – Centro
Santana do Ipanema AL CEP 57500-000
Arte local. Fixa a memória das culturas formadas às
margens do Rio Ipanema.

SÃO MIGUEL DOS CAMPOS


MUSEU HISTÓRICO E CULTURAL FERNANDO
LOPES
Rua Visconde de Sinimbú, 60 – Centro
São Miguel dos Campos AL CEP 57240-000
casadaculturasmc@yahoo.com.br
www.casadaculturasmc.hd1.com.br
Instalado do Palacete da Baronesa, expõe obras de artistas
alagoanos, como Fernando Lopes, Pierre Chalita, José Paulino e
Tânia Pedrosa. Junto ao Museu, existe o Espaço Douglas Apratto,
sala multiuso que abriga exposições.

UNIÃO DOS PALMARES


MEMORIAL QUILOMBO DOS PALMARES
Rua Marechal Deodoro da Fonseca, s/n – Centro
União dos Palmares AL CEP 57800-000

959
turismo.pmup@hotmail.com
Memorial das lutas sociais do movimento negro brasileiro.
Acervo em formação.

VIÇOSA
MUSEU DE ARTE SACRA DE VIÇOSA (AL)
Avenida Firmino Maia, s/n – Centro
Viçosa AL CEP 57700-000
pmvicosa.cultura@ig.com.br
graca.vasconcelos68@yahoo.com.br
Fotografias de personalidades eclesiásticas, imaginária de
santos.

PENEDO
CASA DO PENEDO

Há 20 anos a Fundação vem resguardando o maior acervo


histórico e bibliográfico a cidade, promovendo atividades que
contribuem para o engrandecimento da região e de seu povo. Na sede
da Fundação, situada à Rua João Pessoa, está instalada a Biblioteca,
o Arquivo, Auditório com a galeria de penedenses ilustres, o
anfiteatro e o Memorial Permanente, que expõe a história econômica,
política, cultural e artística da cidade do Penedo e do Baixo São
Francisco. A Fundação Casa do Penedo é considerada a guardiã das
tradições, das riquezas e herança cultural do Baixo São Francisco,
em especial do povo penedense, uma vez que mantêm um rico acervo
bibliográfico, iconográfico e cartográfico, somados a preciosos

960
objetos de arte que simbolizam a cultura e a tradição de sua
população. No dia 26 de setembro de 1992, uma multidao fechou a
rua João Pessoa, no Penedo. Gente vinda de todos os cantos parou
para ouvir a um recital com o pianista Joel Soares, o ator Valmor
chagas e o poeta Cassiano Nunes

BIODIVERSIDADE:
FLORA E FAUNA

961
“Cadê o marreco. A quantidade de marreco que você via aqui
no rio não era brincadeira, eles faziam a maior festa. Eu tirava foto
da nuvem de marreco passando aí na beira. Tiraram nosso adubo
orgânico e colocaram adubo químico para dar duas safras, e aí veio
a mortandade de marreco, do paturi, da jia, do calango. Era a coisa
mais linda do mundo. Há 25 anos o nosso rio era assim: Passarinhos
cantavam alegres e não tinha veneno aqui, também não tinha
barragem, era bom demais viver aqui. Hoje é um São Francisco
prisioneiro, está preso pela barragem de Sobradinho, só soltam água
quando querem. Porque nós vamos pagar esse preço. Essas árvores e
esses passarinhos são nossos irmãos. São criaturas criadas por Deus
para ajudar a gente a viver”.

Antonio Gomes dos Santos, o Toinho Pescador, agraciado


com o prêmio Muriqui, do Conselho Nacional da Biosfera da Mata
Atlântica (2007)

INTERIOR DE ALAGOAS

Zona da Mata. Primeiro, tiraram o pau-brasil; depois a


madeira, para fazer barcos, móveis, construção e lenha. Por fim,

962
veio o Proálcool. Da primitiva Mata Atlântica, não restam mais
que dois terços. Foi onde surgiu um dos primeiros povoamentos do
estado, como Porto Calvo; e pela quantidade de rios perenes, foi
também onde apareceram os primeiros engenhos de açúcar. Os
maiores rios da Zona da Mata são: Manguaba, Tatuhamunha,
Camaragibe e Santo Antonio. A Zona da Mata atinge ainda os
vales do Mundaú e do Paraíba do Meio. Foi nesta região onde se
instalou a República dos Palmares e onde foi travada a guerra dos
Cabanos. A Zona da Mata se extendia ainda até Coruripe, e ficava
bem caracterizada na área de Colônia de Pindora, onde tinham as
árvores de melhor qualidade.

Semiárido. Fica entre a Zona da mata e o Sertão, com uma


porta de entrada pelo agreste. E ainda possue um bioma muito
delicado, a Caatinga. Esta área está sempre sujeita a secas de nove
meses ou mais. É ela o que mais caracteriza o sertão. Nas
caatingas, as temperaturas são elevadas e a umidade baixa. Suas
árvores, na seca, ficam sem folhas e assumem uma coloração
cinza-esbranquiçada. Daí o nome caatinga, dado pelos indígenas:
em tupi a palavra significa plana (caá) e branco (tinga). A
paisagem só volta ficar exuberante na época das chuvas, de um
verde inacreditável. O juazeiro e a oiticica são das poucas árvores
que não perdem folhas.
Brejos de altitude. Área caracterizada pela presença da
água na forma de olhos d´água. Em Alagoas alguns brejos de
altitude, talvez os mais importantes pela ocupação humana, acham-
se os maciços sertanejos de Água Branca e Mata Grande. Na zona

963
rural, ainda trabalham pequenos engenhos de rapadura e
aguardente. E a agricultura consta cana-de-açúcar, milho, feijão,
mandioca, além de frutíferas: mangueiras, jaqueiras, cajueiros e
umbuzeiros.

São Francisco Alagoano. O Velho Chico banha Alagoas a


partir do cânion, a Noroeste, até o extremo Sul do Estado, onde
deságua no mar, numa foz de delta. Avistado pela primeira vez em
1501, por Américo Vespúcio. O trecho alagoano se divide em três
subvales: Alto, Médio e Baixo. O Alto Vale compreende o começo
do lago Moxotó, a partir da cachoeira de Paulo Afonso, até
Piranhas, na extensão do cânion de 62,5 km, e de Piranhas até
Entremontes, na concluência com o rio Capiá. O Médio Vale tem
113,5 km de extensão, da confluência do Capiá, ao riacho do
Sampaio, de Pão Açúcar a São Braz. E o Baixo Vale compreende o
extremo Sul de Alagoas, quando o rio São Francisco chega ao
Oceano Atlântico.

A Fauna
A devastação da cobertura vegetal da Mata Atlântica, o
quase fim dos arbustos da caatinga, a poluição das águas e a caça
predatória formam um caldo de cultura que poderia até ser um
quadro de flora e fauna dizimada. Ainda que se tenha um interior
povoado por distintos e diversificados animais, a fauna nem de
longe lembra os grandes animais, que desapareceram,
principalmente os mamíferos

964
Peixes:ictiofauna
No interior, encontramos no rio São Francisco a maioria dos
peixes da região. Vários habitam riachos e rios permanentes menos
caudalosos, que são poucos no Sertão por causa do clima quente e
seco. O lago formado pelo enchimento da represa de Xingó, em
Piranhas, tornou-se reservatório de várias espécies, ai mesmo
tempo foi grande o impacto da barragem sobre a vida dos peixes da
região.

Tilápia. É um peixe autóctone, vindo das águas do rio Nilo,


no Egito, e hoje povoa todo Baixo São Francisco, e move a
economia do pescado na região. Em 2012, eram mais 180
produtores, por meio da criação por tanques–rede. A tilápia
também caiu no gosto público, e hoje já faz parte da culinária
alagoana.

Bagre. Também conhecido como mandi. Apresentam


nadadeiras dorsal e peitorais, e possuem um ferrão com substância
tóxica, que pode causar ferimento doloroso. Habitam águas fundas
e se alimentam de detritos. É um peixe importante para a
sobrevivência da população ribeirinha, principalmente nas lagoas
Manguaba e Mundaú. Em Pilar, existe, sempre no mês de
novembro, o Festival do Bagre.

Muçum. Peixe alongado semelhante à enguia, e pode


chegar a um metro de comprimento. É comum em açudes, charcos

965
e rios calmos. Enterra-se no lodo, com a cabeça de fora para caçar
peixes e crustáceos.

Piranha. Carnívora e voraz, e chega a até três quilos de


peso. Vive em cardumes, o quer a torna perigosa para homens e o
gado. A população ribeirinha consome a conhecida piranha negra
ou vermelha. O imperador Dom Pedro II, em sua viagem ao São
Francisco fez um desenho de uma piranha em seu diário de bordo.

Traíra. É um peixe de remanso, charcos e açude, preguiço,


gosta de ficar dentro do lodo, e só se alimenta de presas fáceis,
como peixes doentes ou machucados. Sua carne é apreciada, mas é
espinhento.

Surubim. O surubim é um peixe de couro que apresenta


corpo alongado com uma grande cabeça provida de barbilhões,
sendo a maior e mais valiosa espécie da Bacia do São Francisco.
Existem relatos de surubins com mais de 120 Kg capturados no
Rio São Francisco, entretanto atualmente dificilmente um surubim
deste tamanho é capturado.

Curimatá. Alimentam-se de restos de vegetais e animais


microscópicos no fundo. Somente é pescado de tarrafa, pois anzol
é difícil por seu hábito alimentar. Tem muito espinhos, mas a
população ribeirinha consome. Em outras regiões é salgada e
secada ao s0l para consumo.

966
Tucunaré. O Tucunaré é um peixe que pode medir entre 30
centímetros e 1 metro. Seu corpo é longo e estreito, cheio de
escamas, de cor amarelo-esverdeada, por cima ele é escuro mas a
barriga é branca. O Tucunaré é natural da bacia amazônica, mas
hoje está rio São Francisco. É muito apreciado pela sua carne
saborosa.

Répteis
Lagartos/ Lagartixas/ Camaleão/Camaleão Sinimbu (um
dos maiores da espécie no Brasil, vive nas caatingas)/ Cágado
(habita as caatingas e o agreste, na maior parte do tempo é
aquático).

Cobra-Cipó. Habitante das caatingas, bastante comum.


Embora não seja peçonhenta, sua picada causa inflamação e dor
forte no homem. Come lagartos.

Cobra Coral/ cobra-verde/ Bicuda/ Surucucu Pico-de-jaca


(maior serpente venenosa do Brasil, circula nas matas)/
Jiboia/Jararaca (serpente peçonhenta das caatingas, muito comum)/

Cobra Cascavel. Mata por envenenamento, e se alimenta


de vertebrado de sangue quente, vive em cerrados e caatingas.

Mamíferos

967
Alagoas tinha matas exuberantes, antes da colonização, da
caça predatória, e do plantio da monocultura da cana. Que
guardavam índios e grandes mamíferos. Com a redução do se
habitat, alguma espécies já não encontradas mais em Alagoas: a
anta, a suçuarana e a onça-pintada. Elas desapareceram de
Alagoas. Hoje, outras espécies de mamíferos estão em extinção no
estado, como o guariba, o porco-do-mato e a lontra.

Quati. Vive nas matas e anda em bando, costuma comer


frutos na copa das árvores. Procura as presas nas frestas das
pedras, e nos ocos das árvores.

Catita. Habita a caatinga e áreas de vegetação aberta, é


semelhante a um pequeno rato.

Gato-do-Mato. O Leopardus tigrinus tem ocorrência ampla


no Brasil, em Alagoas ele vive nas caatingas e nas matas. Mas,
infelizmente sua população continua decaindo e corre risco de
extinção. Em 2103, a ONG Biodiversidade Brasileira estima que
nos próximos 15 anos, ou três gerações, ocorrerá um declínio de
pelo menos 10% desta população, principalmente pela perda e
fragmentação de habitat causadas pela expansão agrícola.

Macaco-prego. Anda em grupo de mais de cinco, distribui-


se na Mata Atlântica e nas c caatingas. Resiste apesar da perda do
habitat e de servir como bicho de estimação.

968
Porco-do-mato. Habita todo o Estado, das matas ao litoral,
às caatingas. Mas está muito ameaçado pela perda habitat e pela
perseguição dos caçadores. Nas matas secas da caatinga mantém-
se em atividade à noite, por causa do forte calor.

Rato-do-mato. Espécie bastante comum nas matas,


capoeira, áreas abertas de vegetação. Vive por toda parte de
Alagoas.

Paca. Também corre sério risco de extinção em Alagoas.


Habita as matas, quase sempre perto da água. Também alvo
frequente de caçadores, pois sua carne é boa e considerada exótica.

Veado-Mateiro. Ocorre por toda a parte de Alagoas, onde é


também perseguido pelos caçadores, pela carne e pelo couro.
Como frutas, folha e flores.

Cutia. Habita toda Alagoas, fica mais ativo ao amanhecer e


no crepúsculo, quando sai em busca de alimentação.

Mocó. Roedor típico das regiões pedregosas e secas.


Alimenta-se de brotos vegetais, folhas e frutos. O mocó tem que
correr para não cair no prato do sertanejo. Além de fugir do gato-
do-mato, gaviões e cobra, o mocó é muito apreciado na culinária
sertaneja.

969
Tatu. Vive em área abertas e bordas da mata. Abriga-se em
tocas que cava na terra, com suas garras fortes. O dorso é coberto
por uma carapaça.

Aves
Alagoas abriga pássaros e aves em extinção, e, apesar das
ameaças em ecossistemas como a caatinga, foram descobertas mais
quatro novas espécies nos últimos anos. Verdadeiras joias aladas
como o pintor-sete-cores e o macuco do Nordeste fazem parte de
nossa fauna alagoana.

Papagaio-verdadeiro. Habita o semi-árido, é uma das mais


estimadas aves brasileiras, muito perseguida pelo comércio, que
por se tratar de um pássaro silvestre não pode ser vendido.

Corrupião. Ave típica da região semi-árida. Tem um canto


maravilhoso e imita até outras aves. É muito disputada no mercado
clandestino de venda aves.

Garcinha-branca-do-gado. Ave originária das savanas


africanas, mas desde a última década se alastrou por Alagoas, é
muito comum vê-la sempre perto da manada de bois, lhe catando
os insetos que ficam em suas patas e no couro. Vivem em
simbiose.

970
Pintor-sete-cores. Ave ameaçada de extinção. É uma
maravilha da natureza a sua plumagem. O que resta da sua espécie
vive na Mata Atlântica de Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Os
vendedores clandestinos são seu maior inimigo.

Caboré. A menor coruja de Alagoas. Habita matas ralas,


cerrados, graças à proliferação de ratos. Presta serviço ao
combatendo os insetos.

Coleirinha. Ocorre somente nas áreas de floresta de


Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Vive em grupo e a meia altura,
entre as árvores da mata.

Cravina. Vive no meio da caatinga, é uma bela ave do


semi-árido

Saí-beija-flor. Belo Pássaro. O colorido é exuberante, em


plumagem que vai do azul ao verde.

Galo-de-campina. Um dos queridos e cantantes pássaro do


Brasil. Em Alagoas está no interior e no litoral. Mas é típico da
caatinga. É conhecida por ter sua cabeça pintada de vermelho, sua
maior característica.

Canário. Muito conhecido em Alagoas, habita áreas abertas


tanto do interior como no litoral. Convive bem com o homem,
chega a formar ninhos em telhados.

971
Jacu-de-Alagoas. É uma nova subespécie do mutum de
Alagoas, o Jacu Preto, que há pouco tempo estava em extinção,
mas projetos em Alagoas tentam repovoá-lo.

Curió. Habita várzeas, margem de córregos e de rios. O


curió tornou-se raro em Alagoas, mas muito colecionador de
pássaro, tem um exemplar em sua gaiola. Seu canto é um dos mais
lindos do Brasil.

Rolinha-capim. Habita o semi-árido, e é bastante caçada


em toda a região de Alagoas, apesar de ser família dos
columbídeos (pombos) tem uma carne apreciada.

Seriema. Ave do semi-árido brasileiro. Comedora de cobra,


inclusive venenosas. De médio porte, é caneluda e tem bico forte.
Se alimenta de insetos e répteis.

Urubu. Ave das mais conhecidas, observada em geral nas


alturas, de onde desce planando atrás de presas. Habita áreas de
lixões, durante a seca aparece sempre cercando os bois e vacas
magros em vias de morte.

Flora
Alagoas, apesar de ser um estado pequeno, tem vários tipos
de vegetação. Suas matas, com suas madeiras de leis, seu pau-
brasil, foram sistematicamente sendo destruídas pela mão do
homem. São séculos de exploração de madeiras, tanto pelo Norte,

972
com o uso para fabricar as naus das grandes guerras entre
holandeses e portugueses; e no Sul, no Rio São Francisco, que
também foi porto de saída para exportação de madeira. Mas,
enfim, alguns pedaços da mata resistiram, e são espécies de rara
beleza.

Árvores/ Sertão e Agreste

Craibeira. Árvore símbolo de Alagoas. Integra a flora das


margens dos rios do Sertão, onde exibe o espetáculos de seus belos
cachos amarelos. Ao longo do rio São Francisco também possível
ver exemplares, como a da Ilha do Ferro.

Barriguda. Árvore comum nas caatingas mais secas, em


geral cresce isolada. Tem uma hipertrofia no caule que é
semelhante a uma barriga.

Umbuzeiro. É a sombra do sertão. Tem uma envergadura


grande, é bastante ramificada, e diferente de todas as outras
árvores. É rapidamente identificada, tem muita reserva de água e
pode suportar longas estiagens. Seu fruto, o umbu, é altamente
comercial.
Juá (ou Juazeiro). Árvore que chega a quatro metros; tem
uma boa sombra e sua folhagem é usada alimentar (forragem) para
ovinos , caprinos e bovinos

973
Baraúna. Um das maiores árvores da caatinga, ocorre em
todo o Nordeste. Sua madeira, e o núcleo duro, tem muito valor
econômico.

Catingueira. Uma das espécies mais dispersa do Sertão


alagoano. Rebrota rápido quando é cortada, o que acontece
também com as espécies da caatinga.

Jurema-Preta. Árvore pequena está em toda a região


ribeirinha ao São Francisco.

Carnaúba. Em Alagoas, existem populações às margens do


rio Moxotó, mas é encontrada mais no Ceará e Piauí. A cera de
SUS folhas podem ser usadas na fabricação de graxa, papel
carbono e sabonete.

Ouricuri. Palmeira muito frequente no Agreste e no Sertão,


formando densas populações em áreas planas ou serras. Na Serra
da Barriga, em União dos Palmares, podem ser vistas à distância.

Árvores/ Zona da Mata

Barbatimão. Chega aos 15 metros de altura. De caule


avermelhado, é uma árvore muito procurada pelos raizeiros das
feiras-livres. O chá e sua de sua folha e de seu caule tem poder
cicatrizante nas feridas externas.

974
Pau-falha. Essa árvore tornou-se pouco comum em
Alagoas, em conseqüência da exploração no passado, por seu caule
retorcido e elegante, que servia de sustentação a alpendres.

Visgueiro. Árvore de zona úmida, presentes nas bordas e no


interior das matas. De copa ampla, bastante ramificada, atinge até
20 metros de altura. A,

Ipê-roxo. O ipê perde as flores quando floresce e de longe


se avista o roxo das flores sobre o verde da floresta. É cultivada
também de forma ornamental.

Sucupira. Exibe densos cachos de flores roxas, mas


pequenas. Possui madeira pesada, fibrosa e de longa durabilidade.

Pau-de-jangada. Árvore de madeira leve, muito procurada


para a fabricação de canoas e jangadas. É difícil de observar hoje,
nas matas, a beleza de seus frutos redondos, com longos pelos.

Jatobá. Árvore de 10 a 15 metros de altura, com tronco


entre 40 a 50 de diâmetro. A medicina popular usa frutos e casca
para impotência sexual. Sua fruta também é comestível.

Munguba. Árvore de grande porte, que desenvolve raízes


tubulares para lhe dar sustentação. Tem madeira um pouco mole
para o uso em marcenaria, mas é usada na fabricação de cercas.

975
Imbaúba (ou Umbaúba, ou Árvore da Preguiça). Cresce
rápido e dá condições ao desenvolvimento de outras espécies, ao
fornecer matéria orgânica com a queda de folhas, frutos e ramos.
Foi uma das primeiras plantas a serem instaladas nas matas ou em
áreas abertas recém-desmatadas.

Pindoba e Juçara. São palmeiras características do interior


das matas da região úmida de Alagoas.

Flores e Plantas

Açucena. São do gênero Amaryllis, geralmente bulbosas,


com flores vistosas e aromáticas, como a açucena-branca, também
conhecida como lírio-branco. Está presente na Mata Atlântica
alagoana.

Fruta Pão. Cultivada em pomares, praças, jardins e


lavouras em todo estado. Umas pela beleza outra pelo remédio
caseiro.

Jasmim. Da mesma forma que o pé de fruta Pão, o jasmim


também é visto nos jardins de muitas casas em Alagoas, sei cheiro
inebriante é maravilhoso. Nativas do Velho Mundo. São em sua
maior parte arbustos ou lianas, de folhas simples ou compostas.
Quase todas as espécies possuem flores brancas, mas há algumas
de flores amarelas ou rosadas.

976
Macaxeira. Mandioca, aipi, aipim, castelinha, uaipi,
macaxeira, mandioca-doce, mandioca-mansa, maniva, maniveira,
pão-de-pobre, mandioca-brava e mandioca-amarga são termos
brasileiros para designar a espécie. Em Alagoas, a macaxeira já faz
parte da vida do sertanejo e agrestino, tanto para sua mesa, como
para seu sustento. É um dos vetores emergentes da economia
popular.

Bananeira. Além do fruto banana, a folha da bananeira está


presente no cotidiano do homem desde o início de sua existência.
Ela acompanhou a evolução humana e já foi utilizada como
vestimentas, artesanato, passando por forrações de camas e
telhados e hoje, é explorada com frequência na gastronomia.

Cactos, bromélias e arbustos

Macambira-de-flecha. É uma bromélia que acumula água


diretamente nas cisternas formadas pela disposição de suas folhas
em roseta. Chega a atingir quatro metros de altura.

Coroa-de-frade (ou Cabeça-de-frade). Cacto em forma de


globo, as espécies são usadas de forma ornamental, plantadas em
muro, jardins e nos interiores das casas nordestinas.

Mandacaru. Cacto que atinge uma altura de até seis


metros, prefere áreas menos seca de solo argiloso. Produz flores

977
grandes e frutos vermelhos. É o mais conhecido da espécie cacto,
já foi nome de livros, romances e poesias.

Xiquexique. Espécie facilmente reconhecida pela forma de


candelabro. Aparece nos solos mais secos e rasos. Existe muitos
exemplares nas margens do Baixo São Francisco.

Quipá. Cacto que se distribui por toda a região do semi-


árido. As folhas nascem na parte final dos entrenós que compõem
o corpo da planta, geralmente é baixa ao rés do chão.

Mamoma (ou Carrapateira). É planta da família das


euforbiáceas. Recebe outras designações, conforme a região: em
algumas regiões da África, é abelmeluco; na língua inglesa, é
castor bean; na língua espanhola, é ricino, higuerilla, higuereta e
tártago. O seu principal produto derivado é o óleo de mamona,
também chamado óleo de rícino. Embora seja usado na medicina
popular como purgativo. É também usada em brincadeiras de
meninos, que usam a carrapateira em seus estilingues e petecas
para acertar o alvo, geralmente s lagartixas

Melão-de-Santo-Caetano. O melão de São Caetano, aquele


melãozinho cor de laranja, com carnosidade, que pode ser
facilmente encontrado em cercas, alambrados, terrenos baldios. É
uma planta originária de partes como leste da Índia e sul da China.
Tratando-se de características, é uma trepadeira de cheiro
desagradável que possui flores amareladas ou esbranquiçadas.

978
LITORAL DE ALAGOAS

O litoral ou costa de Alagoas corresponde a uma faixa


geográfica, que vai da foz o rio Persinunga, no extremo Norte do
Estado, até a foz do rio São Francisco, no extremo Sul, com 230
quilômetros de extensão. A largura do litoral varia de poucos metros
a mais de quatro quilômetros. Estreito ao Norte, fica mais largo no
Centro, área das lagoas Mundaú e Manguaba, e alcança sua maior
expressão na foz, no Pontal do Peba. As paisagens litorâneas
resultam das variações do mar ocorridas entre sete e a dois mil anos
atrás. Estes movimentos transgressivos afetaram o afogamento dos
rios, por deposições arenosas; a variação do lençol d´água
subterrâneo (lençol freático), que trouxe o fechamento de estuários,
originando lagoas, e formas marcantes do território alagoano, como
recifes, dunas, restingas e brejos.

Praias
Na linha de contato entre mar e terra, podemos encontrar
três tipos de costa: rochosa, arenosa e lamacenta. Em todo litoral
predomina uma faixa formada por acúmulos de sedimentos, como
dunas e falésias, e outros trazidos pelos rios, ondas e correntes, e
ventos. O principal é a areia, mas também temos conchas, lama,
restos de vegetais e animais. Os sedimentos também são formados
por lixo, muito lixo acumulado e poluição, que vem se tornando
um transtorno, principalmente nas praias urbanas de Maceió.

979
Recifes e Corais
Alagoas tem a segunda maior barreira de corais do mundo.
A Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais, a maior unidade
de conservação marítima do Brasil e a segunda maior barreira do
mundo, só perde para a Grande Barreira de Corais da Austrália,
abrange uma área de 413 mil hectares, espalhada por 135
quilômetros de litoral, vai da cidade de Tamandaré (PE) a
Paripueira (AL). A extinção de corais já teve um impacto sem
proporções há décadas, com danos irreversíveis. O ponto mais
movimentado da barreira fica em Maragogi (AL), nas famosas
galés, piscinas naturais rasas a 5 km da costa. Estima-se a presença
de 60 mil visitantes por ano. A área de visitação é restrita e
monitorada. Fonte: Ministério do Meio Ambiente.

Estuários e Lagoas
Em 230 quilômetros de costa, 17 lagoas – uma em cada 14
quilômetros. A abertura para o mar constitui um estuário, região
sujeita às marés. As espécies que aqui sobrevivem oferecem fartura
de alimentos. Ameaçada apenas pelas agressões humanas. A
vegetação ciliar, além do papel fundamental de nutriente, responde
pela fixação das margens dos rios, lagoas e estuários. Mas a oferta
de alimentos vem caindo vertiginosamente, com a degradação de
habitats com os manguezais. Dentre as 1u7 lagoas, duas se
destacam: a Manguaba (com 34 km² - a maior do Estado) e a
Mundaú (23 km²). Estima-se que 200 mil pessoas vivem na região,

980
diretamente envolvida com a obtenção de alimento neste
complexo, que tem uma grande variedade de espécies como:
Moluscos: Maçunim, Mela-pau, Ostra, Redondo, Sururu,
Taiobas, Unha-de-velho

Crustáceos: Aratu, Chama-maré, Craca, Guiamum,


Marinheiro, Siri, Uça, Xié

Restingas e Dunas
A restinga é um conjunto de formações geológicas, ao longo
do tempo, caracterizado por depósito de areias, coberto por uma
flora variada, como campos ralos de gramíneas, moitas de arbusto
intercaladas de clareiras, matas fechadas ou brejos com densa
vegetação aquática. Nos anos 1990, as restingas e as dunas
cobriam quase 80% do litoral brasileiro. Isto representa cinco mil
quilômetros, dos quais 18 estavam no litoral alagoano (Litoral de
Alagoas, Guia do Meio Ambiente, 1994). A restinga do Pontal da
Barra é um exemplo para se ver de perto.

Manguezal
Os mangues são considerados patrimônio nacional, como
define o artigo 225 da Constituição Federal do Brasil, mas
infelizmente isto só existe no papel. Os mangues, mesmo diante de
sua importância ambiental e social, sempre foram considerados
pouco atrativos e áreas sem valor econômico. O resultado dessa
concepção quase provocou a extinção de um ecossistema essencial
para a sobrevivência de inúmeras espécies da zona costeira. Dos

981
230 km que formam a zona costeira alagoana, 150,91 km²
constituem manguezais. Nessa extensão, destacam-se as lagoas
Mundaú, Manguaba e do Roteiro, os rios Coruripe, Salgado,
Maragogi, Tatuamunha, Santo Antônio, Manguaba e Camaragibe,
entre outros. O manguezal é importante porque é o berçário
natural de muitas espécies marinhas, como algumas espécies de
camarões, moluscos e peixes, além de dar subsistência a milhares
de pessoas que vivem da pesca em seu entorno.

Foz do São Francisco


Em uma visão aérea, a foz do rio São Francisco se mostra
sinuosa, com seus baixios alagados, dunas, manchas de florestas e
extensos coqueirais. São inúmeros alagadiços, várzeas que
interligam lagoas, separam pequenas ilhas. As formas atuais do
relevo incluem terraços marinhos, planícies marinhas, dunas
móveis e fixas e superfícies pantanosas. No lado alagoano, o delata
tem formato triangular, e ocupa terras dos municípios de
Piaçabuçu, Penedo e Feliz Deserto. Entre os acidentes geográficos
se destaca a várzea da Marituba, conhecida com o Pantanal
Alagoano.

Fauna

Ainda se vêem garças, alguns anfíbios e répteis, inclusive


jacarés. Mas, a outrora rica fauna do litoral alagoano, muitas
espécies desapareceram. Hoje, entre as espécies mais ameaçadas
está o peixe-boi marinho e a tartaruga marinha. Em nossa fauna

982
marinha-estuarina, há desde esponjas, corais e caramujos, lindos
peixes ornamentais, grandes mamíferos que resistem ao tempo, a
peixes, muitos peixes.
Anêmona-do-mar. As anêmonas-do-mar são um grupo de
animais sésseis (não possuem capacidade de locomoção, vivem
fixos, associados à um substrato). Utiliza seus tentáculos para
capturar alimentos. São intimamente relacionadas aos corais,
águas-vivas e hidras.

Corais: Embora os corais pareçam pedras, são animais. Na


verdade são colônia, ou aglomerados de milhares desses animais,
alguns pré-históricos. Frequentemente se diz que os corais formam
"recifes", barreiras calcárias como as encontradas no litoral do
Nordeste. Os recifes de coral são, provavelmente, as comunidades
bentônicas mais ricas e complexas dos oceanos. Formaram-se ao
longo de milhões de anos, a partir da deposição do carbonato de
cálcio proveniente dos esqueletos de corais, e estão entre as
comunidades marinhas mais antigas que se conhece - a sua história
remonta há 500 milhões de anos atrás. Estima-se que um único
recife de coral pode albergar, pelo menos, 3.000 espécies de
animais.

Caravelas (ou Água-Viva). É uma das criaturas mais


bonitas, estranhas e misteriosas que existem. Tão perigosas quanto
bonitas. Elas existem há mais de 650 milhões de anos e existem
milhares de espécies diferentes. A maioria é transparente e tem o
formato de um sino. São considerados animais marinhos, que

983
variam bastante de tamanho. Na grande maioria a locomoção
depende da das correntes ou é tão limitada que não têm forças para
ir contra a correnteza. A água-viva é um animal que tem o corpo
composto por cerca de 98 % de água. Se ela encalhar na praia,
praticamente irá desaparecer à medida que a água evaporar. Uma
água-viva adulta também é conhecida como Medusa (por causa de
Medusa, a criatura mitológica com cobras no lugar do cabelo).

Caramujos. É um molusco, mas nas areias da praia eles são


as conchas. São lentos solitários, sedentários, se grudam em cascos
de embarcações, na praia eles fazem aquela trilha de conchinha,
que todo mundo gosta de colecionar. Podem ser encontrados em
lagoas, nas areias da praia, principalmente junto a foz de rios. Os
moluscos têm uma composição frágil, são animais de corpo mole,
mas a maioria deles possui uma concha que protege o corpo. Nesse
grupo, encontramos o caracol, o marisco e a ostra. Há também os
que apresentam a concha interna e reduzida, como a lula, e os que
não têm concha, como o polvo e a lesma, entre outros exemplos. O
grande caramujo marinho vive se arrastando nas rochas ou areias
no fundo do mar. Já as ostras e o marisco fixam-se nas rochas no
litoral, enquanto a lula e polvo nadam livremente nas águas
marinhas.

Polvo. Os polvos são moluscos marinhos da classe, da


ordem Octopoda (oito pés), possuindo oito braços fortes e com
ventosas dispostos à volta da boca. O polvo tem um corpo mole,
sem esqueleto interno (ao contrário das lulas) nem externo. Como

984
meios de defesa, o polvo possui a capacidade de largar tinta, de
mudar a sua cor (camuflagem, através dos cromatóforos), e
autotomia de seus braços. Todos os polvos são predadores e
alimentam-se de peixes, crustáceos e outros invertebrados, que
caçam com os braços e matam com o bico quitinoso. Para auxiliar
a caça, os polvos desenvolveram visão binocular e olhos com
estrutura semelhante à do órgão de visão do ser humano, tendo
percepção de cor.

Caranguejos.Os caranguejos (também conhecidos como


uças) são crustáceos caracterizados por terem o corpo totalmente
protegido por uma carapaça, com quatro pares de patas terminadas
em unhas pontudas, o primeiro dos quais normalmente
transformado em fortes pinças. Por terem cinco pares de patas
ambulatórias são da ordem de crustáceo chamada Decapoda. Em
Alagoas, os caranguejos são os principais alvos da venda
clandestina. Até mesmo durante período de defeso, temporada de
proibição da pesca da espécie, as apreensões são recordes.

Tatuí. O Emerita brasiliensis, conhecido pelos nomes


comuns de tatuí ou tatuíra, é uma espécie de crustáceo que habita
praias arenosas, fazendo escavações na areia. Dificilmente
ultrapassam os quatro centímetros de comprimento, mas é possível
o crescimento até sete centímetros, com carapaça castanho-
amarelada. São encontrados na zona de arrebentação das praias do
Brasil, onde vivem enterrados na areia, a pouca profundidade. São
usados na culinária. Sua presença é um indicador da qualidade

985
ambiental de uma praia: praias com um certo grau de poluição ou
de presença humana não costumam mais apresentar tatuís.

Siri. Todo siri é, na verdade, também um caranguejo. A


explicação é simples: siri não passa de um nome popular dado aos
membros da Portunidae, uma das várias famílias de caranguejos.
Ambos têm como principal característica o fato de possuírem dez
patas - o que faz com que camarões e lagostas também pertençam à
mesma turma. A diferença mais evidente entre os siris e as demais
espécies de caranguejo está no formato das duas patas traseiras.
"Nos siris, elas não são pontiagudas - como nos outros caranguejos
- mas achatadas e amplas. Graças a essa característica, o siri é o
único caranguejo capaz de nadar", afirma o biólogo Sérgio Luiz de
Siqueira Bueno, da USP. O tamanho varia muito de uma espécie
para outra, mas os maiores siris não passam de 20 centímetros de
envergadura, enquanto certos caranguejos podem chegar a até 50
centímetros. Para completar, existem ainda algumas diferenças de
hábitos entre eles. Ao contrário dos outros caranguejos, os siris são
animais exclusivamente marinhos - não vivem em água doce,
embora, eventualmente, entrem em manguezais.

Lagosta. Lagosta é o nome comum dado a uma grande


diversidade de espécies de crustáceos decápodes marinhos da
subordem Palinura, caracterizados por terem as antenas do
segundo par muito longas e os urópodes em forma de leque. Estes
crustáceos podem atingir grande tamanho, com peso superior a 1
kg, e têm uma grande importância econômica, uma vez que são

986
considerados alimentos de luxo. O nome comum tem apenas base
morfológica, razão pela qual não tem significado taxonômico
preciso para além do nível de subordem.

Camarões. A pesca e a produção em cativeiro de camarões


é uma das atividades econômicas mais importantes, devido ao
elevado valor comercial destes produtos de luxo da alimentação
humana. Mas em Alagoas a situação do camarão barba-roxa, ou
espigão, não é das melhores. O avanço da pesca predatória na costa
alagoana e o baixo volume de água lançado na Foz do Rio São
Francisco são responsáveis pela inclusão do camarão espigão ou
sete barbas – 75% de toda a captura – na “lista vermelha” dos
animais em risco de extinção, apontados por um fórum nacional de
cientistas e biólogos, e divulgada anualmente pelo Instituto
Biodiversitas e Ibama.

Estrela-do-mar. A Estrela-do-Mar é um animal, e


exclusivamente marinhos, que vivem no fundo. São
aproximadamente 1600 espécies que podem ter uma grande
variedade de formas e cores. Entre seus parentes mais próximos
podemos citar o Ouriço do Mar, a bolacha do Mar e o Pepino mar.
A estrela-do- mar é um animal com sistema digestivo com certo
grau de complexidade, possuem boca, esôfago, estômago, intestino
e ânus. Uma característica única desses animais é que elas evertem
seu próprio sistema digestivo. São animais carnívoros

Peixes

987
Arraia. Também chamada de raia. Tem o corpo achatado,
em forma de disco, com uma cauda fina e alongada. Vive no fundo
e pode enterrar-se para se defender ou cavar a areia em busca de
alimentos. Habita perto da costa, e pode entrar em estuários e
lagoas com a maré enchente.

Agulha. Habitam em águas costeiras, e entram em estuários


e lagoas. Ocorre no litoral alagoano a agulhinha, que a maxila
inferior alongada, como se fosse um bico, e maxila superior curta.
E o agulhão, com as duas maxilas do mesmo tamanho. Carne
muito apreciada para tira-gosto, embora considerada de qualidade
inferior, É pescada com um facho de luz, quando são atraídas para
as redes ou para próprio barco do pescador.

Cação (ou panã ou lixa). Tem corpo alongado e cabeça


achatada. Alguns apresentam os lados cabeça salientes, com os
olhos nas extremidades, lembrando um martelo. São marinhos,
mas podem entrar em estuários e lagoas na maré cheia.

Camurim. Peixe carnívoro, relativamente grande, com


mandíbula saliente. Carne de qualidade, mas pouco consumida em
Alagoas. Vive em estuários e lagoas.

Carapeba. Grande fonte de renda para pescadores,


principalmente em Alagoas, onde a carapeba chega a ser um
símbolo da terra, e justifica pelo seu gosto saboroso. Foi cantada

988
em verso e prosa, com direito a música de Luiz Gonzaga, o rei do
baião. Peixe outrora abundante no mar alagoano, carapeba é
palavra de origem tupi como sentido de peixe miúdo. Segundo o
Dicionário Aurélio, trata-se de "peixe de corpo ovalado, boca
pequena desprovida de dentes, e com apenas dois raios ósseos na
nadadeira anal". Medindo até 30 cm, a carapeba é considerada uma
iguaria de grande prestígio na culinária alagoana - especialmente
as fritas, mas também ensopadas.

Carapeba

Luiz Gonzaga

Êi, lá vem esquema muié


Ê som, é gente, é vida, é pó

Êi, lá vem esquenta muié


Do meu sertão
Carapeba
Bandinha quente
Abrindo frente
Alegrando vai

Pife, pratos, tarol, zabumba


É tumba, tumba
E a folia sai

989
Bonifácio, Major do povo
Velhinho novo a comandar
Carapeba por onde passa
Faz som de graça pra se brincar
Cioba. Cioba é um peixe costeiro, cabeça grande, com
espinhos na nadadeira dorsal. Cor avermelhada, com pequena
mancha escura nas laterais. Pode-se se encontrar em estuários e
lagoas, ou no mar, é peixe de ficar entre as pedras. Pode chegar a
75 cm de comprimento, coloração avermelhada com ventre mais
claro, estrias escuras e douradas no dorso e nos flancos. No Brasil,
também conhecido como ciobinha, mulata, realito, vermelho-
paramirim. Em Portugal, conhecido simplesmente como pargo
vermelho. É um peixe de carne muito saborosa e apreciada
comercialmente.

Tainha (ou Curimatã). Peixe de bom tamanho, vive em


mar aberto da costa. Em certas épocas do ano aparece de cardumes
à beira-mar, onde se pode capturá-lo em rede de tarrafas. É uma
grande fonte de renda para pescadores. A tainha está no brasão de
Alagoas – uma fileira de três tainhas correndo as águas do litoral.

Manjuba. Pequeno peixe, com uma faixa prateada na


lateral do corpo. É pescado em grandes quantidades,
principalmente entre as cidades antes da foz do Rio São Francisco,
principalmente Piaçabuçu. Poe ser consumido frito ou salgado,
ótimo para tira-gosto. No litoral não pé muito conhecido.

990
Pescada. Peixe importante para a produção pesqueira,
principalmente no verão. De tamanho médio a grande, apresenta
escamas maiores na linha lateral. Vive no mar, e em estuários e
lagoas.

Peixe-galo. Muito comum no litoral alagoano, vive na


rebentação das ondas, perto do litoral. Sua cor é prateada,
apresenta um forte achatamento lateral. Carne apreciada pela
população. Tem um dorso verde-azulado escuro com tom azul-
metálico mais claro nos flancos e ventre esbranquiçado. Com
corpo muito alto e bastante comprimido lateralmente, a parte
anterior da cabeça é quase reta mantendo essa característica da
ponta do focinho ao alto da cabeça, o que explica ser chamado
popularmente de testudo. Quando adultos formam grupos de
poucos indivíduos, aos pares ou solitários, chegando a atingir 1,8 a
2 kg medindo de 40 até 50 cm.

Xaréu. Podem ser encontrados em todo o litoral brasileiro.


Frequentam locais com fundo duro, de pedra ou areia, próximos a
ilhas e costões, onde procuram por pequenos peixes para se
alimentar. Grandes exemplares são encontrados em mar aberto,
sendo que os pequenos podem ser capturados dentro de baías.
Presente em todo Oceano Atlântico esse peixe apresenta bastante
resistência a variações de salinidade, podendo ser encontrado em
água salgada, salobra e em rios costeiros. No período da migração
aproxima-se facilmente do litoral nadando a pequenas
profundidades, e em cardumes, quando são pescados facilmente.

991
Cavalo-marinho. O cavalo-marinho (Hippocampus) é um
peixe ósseo, a cabeça lembra a de um cavalo, tem a cauda enrolada
ligeiramente na extremidade. Habita os recifes coralíneos. Existem
32 espécies diferentes de cavalos-marinhos nos mares de regiões
de clima tropical e temperado, em profundidades que variam de 8 a
45 metros. Todas as espécies são consideradas vulneráveis por
órgãos de proteção à natureza. O corpo desse pequeno e delicado
peixe é coberto por placas em forma de anel. Esse peixe pode
medir entre 15 cm e 18 cm. O cavalo-marinho é muito querido
pelo pessoal que gosta de dançar ciranda. Ele ganhou até música.

Cavalo Marinho
Quinteto Violado

Nas horas de Deus, Amém


Pai, Filho e Espírito Santo
São as primeiras cantigas
Que nesta casa eu canto
Nossa Senhora da Guia,
Me cubra com vosso manto

Vem meu boi bonito


Vem dançar agora
Já deu meia noite
Já rompeu a aurora

992
Cavalo marinho
Chega mais pra adiante
Faz uma misura
Pra toda essa gente

Cavalo marinho
Dança no terreiro
Que a dona da casa
Tem muito dinheiro

Cavalo marinho
Dança na calçada
Que a dona da casa
Tem galinha assada

Cavalo marinho
Já são horas já
Dá uma voltinha
E vai pro teu lugar

Tartarugas do Mar. Há várias espécies deste réptil


amplamente distribuídos pelos mares das regiões tropicais e
subtropicais de todo o mundo. Ameaçadas de extinção chegaram
quase que completamente de alguns pontos do litoral alagoano,
devido á coleta de ovos, ao abate da fêmea que subiam às praias
para desovar; também pela captura em rede de pesca. A tartaruga
verde, que atinge até 1,5 metro de comprimento e pode pesar 250

993
quilos, usa o litoral de Alagoas como zona de alimentação e aqui,
pode, ocasionalmente, desovar.

Mamíferos

Peixe-boi-marinho. É um mamífero aquático extremamente


dócil e de hábitos costeiros. A espécie é considerada criticamente
ameaçada de extinção no Brasil. Estima-se que existam apenas 500
indivíduos. Fazendo um comparativo com outro animal ameaçado
de extinção do País, a Jaguatirica, por exemplo, tem população
estimada em 40 mil exemplares. O felino habita o Cerrado, a
Amazônia, o Pantanal e a Mata Atlântica. Em Alagoas, e no
Nordeste, ele ficam geralmente perto de rio, estuários e
manguezais. Seu ciclo de gestação é 13 meses. No estado, a pesca
predatória, a poluição e a destruição dos manguezais, estão
empurrando peixe-boi para a sua extinção.

Saguim. Único primata do litoral, muito comum nas


restingas, sítios, quintais, desde que seja arborizado e protegido.
Eles andam em bando de até dez espécies, são mansos, comem na
mão das pessoas, mas são ariscos. Alimenta-se de frutos, insetos,
ataca ninhos de passarinhos, mas adora uma banana colocada perto
deles. Costuma morder as cascas das árvores.

994
Raposa. Vive nos campos e nas áreas abertas. É comum vê-
las correndo em canaviais ou atravessando rodovias. Alimenta-se
de pequenos roedores, aves e insetos. O homem do campo a
persegue, pela fama atacar animais domésticos, como a galinha. Há
registros da chamada raposa-da-caatinga, que alimenta-se
basicamente de pequenos animais, frutos e insetos. No Nordeste
brasileiro, a seca que assola a região semi-árida no período de
agosto a janeiro, não afeta só a população rural, más também os
animais silvestres. Entre estes animais, encontramos as raposas,
que buscam alimentos fugindo da seca, principalmente nas
rodovias onde são atropeladas a noite na busca de alimentos.

Capivara. É o maior roedor do mundo, pesando até 91 kg e


medindo até 1,2 m de comprimento e 60 cm na altura. A pelagem é
densa, de cor avermelhada a marrom escuro. É possível distinguir
os machos por conta da presença de uma glândula proeminente no
focinho. Em Alagoas elas não são muito comuns, mas é possível
observá-las às margens de rios e lagoas. A capivara é herbívora e
vive em grupo de 6 a 20 indivíduos.

Aves

Andorinha-do-rio. Encontra-se em lagoas, córregos e rios,


e mesmo junto à praia. Faz seu ninho em barrancos ou em galhos
ocos perto da água. Voa rente à superfície da água para apanhar
insetos, beber água ou tomar um banho rápido. Só vivr em grandes

995
grupos e fazem um algazarra danada com seus silvo curto e
estridente.

Garça. Também conhecida como garça pequena, chega a


medir 58 centímetros de comprimento. Vive em águas doces,
salobras ou então na praia. Come peixes crustáceos, moluscos e
pequenos sapos. Fazem o ninho em árvores, geralmente chamadas
de ninhais.

Anum-branco. Anda sempre em bando por área abertas ou


cobertas de arbusto. Constroe ninhos coletivos usados por todos os
da mesma espécie. Cada ninho contém, em média, 15 ovos de
diversas fêmeas. Alimenta-se de insetos, artrópodes e pequenos
répteis.

Rolinha-fogo-pagou. Gosta das restingas, campos, cerrados


e caatingas, mas pode ser encontrada também nas cidades. Mede
cerca de 20 centímetros. Seu alimento básico são grãos e sementes.
Constróe o ninho idem forma de tigela, onde põe ovos brancos.
Seu canto, traduzido como “fogo apagou”, deu origem ao seu
nome, e até música de Luiz Gonzaga, o rei do baião. Os meninos e
suas carrapateiras, o caçador com suas soca tempero e a panela,
são seus inimigos.

Fogo Pagou
Luiz Gonzaga

996
Teve pena da rolinha que o menino matou
Mais depois que torrou a bichinha, comeu com farinha...
gostou
Fogo pagou
Fogo pagou
Fogo pagou... tem dó de mim

Fogo pagou
Fogo pagou
Fogo pagou... é sempre assim

Todo mundo lamenta a desgraça que a gente passa


num dia de azar
Más se disso tirar bom proveito sorrir satisfeito fingindo chorar

Teve pena da rolinha que o menino matou


Mais depois que torrou a bichinha, comeu com farinha...gostou

Fogo pagou
Fogo pagou
Fogo pagou..tem dó de mim

Jaçanã. A Jaçanã vive nos brejos, lagoas e açudes com


vegetação aquática. Tem pernas esticadas, dedos longos, com
unhas de até quatro centímetros, o que lhe permite caminhar pela
vegetação com se estivesse em terra firme. Alimenta-se de

997
sementes, brotos de planta, insetos, moluscos, e pequenos
crustáceos e peixes.

Irerê (Paturi, Siriri, Marreca-Viúva, Marreca-Piadeira). O


irerê é talvez o pato mais conhecido do Brasil. E não só pela sua
beleza, mas também pela frequência com que é visto em áreas
urbanas. Não raro ser visto em bandos barulhentos sobrevoando as
grandes cidades, inclusive à noite. O seu canto também é um
capítulo à parte, já que o som de sua voz lhe confere os dois
principais nomes que leva – irerê ou paturi. Ele é muito agudo e
alto, semelhante ao barulho de alguns apitos ou brinquedos de
borracha. Visualmente esta ave possui uma espécie de máscara
branca na face, que se acentua em contraste com o pescoço negro e
o bico chumbo. Além disso, o peito é castanho e o resto do corpo
estriado em branco e preto. Somente em voo dá para ver as suas
asas escuras. Habita lagoas, banhados, campos inundáveis e
açudes. Alimenta-se de folha, insetos e pequenos crustáceos.

Martim-pescador-grande. Pássaro brasileiro, vive perto de


grandes rios, lagoas, manguezais e à beira mar. Pousa em galhos,
fios ou estacas acima da água, de onde mergulha para capturar
peixes ou rãs. Faz o ninho em buracos, nos barrancos de rio, ou
estradas.

Sabiá-da-praia. O sabiá-da-praia também é chamado, em


português, de sabiá-da-restinga, sabiá-piri e tejo-da-praia. Em
francês é moqueur des savanes e, em inglês, tropical mockingbird.

998
É encontrado ao longo do litoral brasileiro, do Rio de Janeiro para
o norte e também no Caribe. Os adultos têm 25 cm de
comprimento e pesam 54 g. Alimentam-se no chão ou na
vegetação ou descem de um poleiro para capturar invertebrados.
Comem principalmente insetos e algumas bagas. São capazes de se
aproximar de humanos, retirando comida de pratos ou da mesa. O
sabiá-da-praia não tem canto próprio: reproduz cantos de outros
pássaros. Tem uma vocalização variada e musical e canta, por
vezes, de noite. Com cauda longa e plumagem cinza-claro nas
costas e branca nas sobrancelhas, lembra os verdadeiros sabiás.

Socó-boi. Vive em áreas úmidas, como brejos, várzeas e


lagoas, e regiões florestais. Sua alimentação consiste em peixes,
insetos, crustáceos, moluscos, Possuiu hábitos solitários e constrói
ninhos em cima de árvores. Tem 93 centímetros de altura. A
plumagem adulta - idêntica para ambos os sexos - é adquirida aos
dois anos de idade, caracterizando-se pelo pescoço castanho e
manto pardo-acinzentado, manchado de acanelado; possui um bico
bastante longo. A plumagem do socó-boi jovem é amarela-clara
com faixas transversais negras, garganta e ventre brancos e o bico
é relativamente curto.

Gavião-carijó. O gavião-carijó é uma ave de rapina


encontrada em diferentes ambientes, ocorrendo do México à
Argentina e em todo o Brasil. É a espécie predominante no Brasil.
É o terror dos galinheiros. Também é conhecido pelos nomes de
anajé, gavião-indaié, gavião-pinhel, gavião-pega-pinto, inajé,

999
gavião-pinhé, indaié, pega-pinto e papa-pinto. Como toda ave de
rapina tem um papel indispensável no equilíbrio da fauna como
regulador da seleção. Evita uma superpopulação de roedores e aves
pequenas (como é o caso dos ratos e pombos nos centros urbanos),
além de eliminar indivíduos defeituosos e doentes.

Plantas do mar

Algas/ Orelha-de-rato/Alface do mar/ Samambaia/


Sucupira-mirim/ Murici/ Salsa de praia/ Salsa-branca/ Chanana/
Pinheiro da Praia/ Guajuru/ Feijão da Praia/ Imbé/ Maracujá-do-
mato/Aninga/ Ninféia/ Baronesa

Gaiteira ou Mangue Vermelho. É a principal árvore das


águas mais fundas nos manguezais de toda a América tropical e
África. Atinge até 15 metros de altura. As raízes-escoras ampliam
sua base e melhoram sua fixação ao solo. As sementes germinam
ainda presas aos compridos frutos, e as pequenas raízes às vezes
alcançam o sol antes de sua queda.

RELEVO E HIDROGRAFIA

As serras de Alagoas*
*Descrição de Ivan Fernandes Lima, em Geografia de
Alagoas

1000
“O relevo de Alagoas compreende o trecho meridional da
Borborema. Tem a forma de um leque, a se rebaixar, em níveis
escalonados. Para o Rio São Francico e para o mar. Seus
gigantescos patamates semi-circundam o núcleo mais elevado, a
noroeste do Planalto de Garanhuns. Fora desta área existe no
ocidente alagoano uma zona elevada, pertencentes às áreas de Água
Branca e Mata Grande, e, no trecho centro-norte o pequeno maciço
de Santana do Ipanema”.
Planície ou Baixada Litorânea

“Abrange a formação das praias, dos terraços marinhos, das


restingas, dos cordões litorâneos, dos recifes da costa e dos terrenos
semi-patanosos dos mangues”, Sempre domnada pelas elevadas
encostas dos tabuleiros, ou seja, as falésias, do lado marinho, e as
ribanceiras, que acompanham os rios ou ficam às margens das
lagoas”.

Baixo Planalto Sedimentar dos Tabuleiros

“Formado pelas serras pouco elevadas que estendem do mar,


com suas falésias, até as primeiras serras cristalinas a oeste,
denominadas tabuleiros. Sua altitude é de 40 a 50 metros sobre o
nível do mar, na frente dos penhascos, e de 200 metros no interior,
nas denominadas chãs”.

Base Oriental da Escarpa Cristalina

1001
É a parte do território onde morros e serras instalam-se nela,
numa paisagem de vales rebaixados. Os seus rios correm paralelos
à própria escarpa com inflexão para o mar.

Serras desta categoria: Bolívia, Cabeça de Porco ou Brejinho,


Cachoeiras, Espinhaço da Gata, Junqueiro, Limoeiro e Preguiça.

Escarpa Cristalina Oriental

Na parte voltada para o mar, porque uma outra existe, para o


lado ocidental do sertão.

Serras: Azul, Bananal, Batente, Cocal, Cotia, Cruzes, Cuscus,


d´água Dois Irmãos, Maricota, Naceia, Ouricuri, Ouro, pedra
Talhada e Tamoará.

Patamar Cristalino do Nível de 500 metros

Vencidas as cumeadas da Escarpa, alcançamos uma


superfície de 500 metros de altitude, aparentemente irregular, com
seus morros e vales escavados.

Serras: Bananal, Barriga, Bois, Bolandeira, Cachorro, Cafuxi,


Cajaíba, Canastra, Carrapateira, Cassessé, Cigana, Cocal, Esconso,
Galho-do-meio, Gravatazinho, Guaribas, frio, Lage, Manacan,
Maracujá, Olho d´Água, Paquevira, Pedra Branca, Pedras do Bolão,

1002
Pelada, Poço Comprido, São Pedro, Serrinha, Surrão Velho, Tanque
d´Arca, Tavares, Tronco, Vento e Vigia.

Escarpa Cristalina Ocidental

A base dessa escarpa difere da Oriental pois não existe


depressão periférica.

Serras: Bonifácio, Cedro, das Flores, Luciano, Muro,


Palmeira, Pinhas ou Piás, São Pedro, Vento.

Pediplano Sertanejo

O conjunto de serras pouco onduladas do oeste alagoano.


Nesta categoria se encontram os três maciços do estado: Água
Branca, Mata Grande e Santana do Ipanema.

Serras: Água Branca, Almeida, Bernardino, Branca dos


Lençóis, Brecha, Caiçara ou ou Maravilha, Camonga, capelinha,
Carié (morro), Cavalos, Chico, Corcunda, Crauanã, Gavião,
Gravatá, Guaribas, Gugi, Jacioba, Japão, Lagoa, Laje, Mangabeiras,
Mãos, Padre, Pai Mané, Panela, Parafuso, Pariconha, Pilões, Poço,
Porteira, Priaca, Rosário, Santa CruzSanta Rosa, Sobrado, Solteiros
e Velame.

OS RIOS DE ALAGOAS

1003
*Descrição de Ivan Fernandes Lima, em Geografia de
Alagoas

“Os rios são identificados em duas vertentes: a dos rios


orientais, que deságuam no Atlântico e a dos rios ocidentais que vão
despejar no Rio São Francisco. São pequenas bacias hidrográficas
em geral oriundas do Planalto da Borborema. O conjunto de seus
rios forma o tipo de drenagem radial. No caso dos rios orientais o
centro dispersor é o Planalto de Garanhuns, enquanto que para os
ocidentais é o conjunto da serra do Orobó, junto a Pesqueira, ambos
em Pernambuco. Rios de planalto, em sua maior extensão, com
cachoeiras e pequenas corredeiras, até atingirem a baixada
litorânea, onde deslizam como rios de planície. Enquanto os da
primeira vertente são perenes, em parte pela umidade que lhes vem
do Atlântico, os da segunda são, em sua maioria, temporários, ou
seja, correm somente em parte do ano”.

Rios que deságuam no Oceano Atlântico. Coruripe,


Poxim, Jiquiá ou Jequiá, São Miguel, Niquim, Samaúma, Lagoa
Manguaba e Rio Paraíba-do-Meio, Lagoa Mundaú e Rio Mundaú,
Reginaldo, Jacarecica, Guaxuma, Garça Torta, Doce, Pratagi,
Santo Antônio Mirim ou a sua corruptela Rio Meirim, do Senhor,
Suassui, Caxéu, Sapucai, Jitituba, Santo Antônio Grande,
Camaragibe, Tatuamunha, Lajes, Manguaba, Salgado, Pitangui,
Maragogi, Paus e Persinunga, este na fronteira com Pernambuco.

1004
Afluentes do São Francisco. Moxotó, Botoque ou
Pariconha, Mosquito, Talhada, Capiá, Grande, dos Farias, Jacaré,
Ipanema, Traipu, Itiuba, Boacica, Perucaba, Piauí e Marituba.

Lagoas

São 22 as principais lagoas do estado, às quais deve ele seu


nome. São divididas em três tipos: as do litoral, autênticas
lagunas invadidas pelo mar; as da margem do Rio São Francisco,
formadas e invadidas pelo grande rio, e, finalmente, as de terras
interiores, as quais podem ser permanentes ou temporárias.
Lagoas do Litoral: Mundaú ou do Norte, Manguaba ou do
Sul, Jiquiá, Roteio, as da área da vila do Poxim: Escura, Tabuleiro,
Guaxuma e Vermelha, Timbó, Patos e do Pau e, finalmente, as
lagoas da falésia de Jiquiá: Pacas, Doce, Comprida, Mangues,
Taboada, Azeda e Jacarecica.

Lagoas da margem do São Francisco: Tororó, Santiago,


Jacobina, Cabaceira, Várzea e Sação, Marcação, Muguengue, de
Baixo, Comprida, Santa Fé, Meio, Tapuia, Várzea, Campo,
Sampaio, Enxada, Mocambo, Porta, Cangote, Caldeirão, Sobrado,
Grande, Engenho, Marizeiro e Salgada. Abaixo de Penedo,
praticamente no delta, encontram-se as lagoas: Botafogo, Mangue,
Várzea Grande e Caiada.

Lagoas de terra interior (resultado de acumulações, em


pequenas depressões, de águas durante a estação chuvosa): Santa

1005
Luzia, Curral, Gado Bravo, Pé Leve e Lunga. Em Palmeira dos
Índios encontram-se lagoas de água salgada: Porcos, Canto e
Nova.

Cachoeiras. Embora a maioria se encontre na vertente


oriental, devido ao caráter permanente das águas, a maior delas,
Paulo Afonso está na vertente do Rio São Francisco. A segunda
em importância é a cachoeira Serra d´Água, no Rio Camaragibe.

Catita, rio Jacuipe; Duas Bocas e Piaba, ambas no Rio


Manguaba; São Francisco da Cachoeira, no Rio Castanheiro;
Tombador, no Rio Santo Antônio Grande; Escada, no Rio Mundaú,
na divisa com Pernambuco. Além da cachoeira, entre as localidades
de Rio Largo e Gustavo Paiva ficam as lagoas Tombador, no
Mundaú-Mirim; Dois Irmãos, no Paraíba-do-Meio; Grande, no rio
Caçamba; Serraria, no Rio Paraibinha e Poço Redondo, no Rio
Porongaba.

Pontas do litoral

1006
A costa é constituída de vários aspectos, dividindo-os em:
costas altas, com falésias, costas baixas, com as praias, além de
manguesais, lagunas e recifes. Nelas são encontradas as seguintes
pontas: Patacho, nas proximidades de Porto de Pedras; Estância, ao
norte da barra do Rio Camaragibe; do Prego, nas imediações do Rio
Suaçui e Ponta Verde, em Maceió, no que se refere as praias do
Litoral Norte, ou de recifes. E finalmente, no litoral sul, ou de delta,
encontra-se o Pontal do Peba e o Pontal do Piaçabuçu. Nesta parte
do litoral encontram-se, ainda, os baxios de Dom Rodrigo, do Miaí e
Pelea.

As ilhas

Do rio São Francisco: da Criminosa, da Fitinha, da Negra,


do Monte, do Gondim, da Tereza, do Toinho, do Cachimbão, da
Mamoeira, de Santo Antônio, das Canoas e de São Pedro,
Chimaré, Formosinho, São Brás, Prazeres, Santa Maria e
Limoeiro.

As da lagoa Mundaú são: Frades, Boi, Grande e a de Santa


Rita (esta última, segundo Ivan Fernands Lima, pertenceria às duas
lagoas).

As da lagoa Manguaba são: Tomé, Perrexil, Gonçalão,


croa de Holanda, além da de Santa Rita. Fernandes Lima ainda

1007
cita, sem definir em qual das duas lagoas: Andorinhas, Fogo e
Maranhão

Frutas das Alagoas

Pitomba, Sapoti, Genipapo, Jaca, Manga, Mangaba,


Cajarana, Pitanga, Jaboticaba, Oiti, Cajá, Umbú cajá, Siriguela e
Pinha. A fruta pinha de Palmeira dos Índios.

“Na Palmeira a pinha é de graça. Aqui uma dúzia custa mil


reis. Nem as pinha são pinhas, chamam-nas frutas do conde. Veja que
heresia. Mudar o nome das sagradas pinhas palmeirenses”.

Graciliano Ramos, no Rio de Janeiro


AMBIENTALISTAS PIONEIROS

Otávio Brandão (1896-1980). Jornalista, político, cientista


e considerado o primeiro ambientalista de Alagoas, ele foi pioneiro
na defesa das riquezas naturais do estado. Brandão é autor de um
dos mais importantes livros sobre o tema ambiental de toda
história: Canais e Lagoas, que trata da sobrevivência e proteção do
complexo estuarino Mundaú-Manguaba.

Ladislau Neto (1838-1894). Considerado o cientista mais


influente no Brasil no século 19, este naturalista e professor
alagoano foi um dos primeiros diretores do Museu Nacional do

1008
Rio de Janeiro, nomeado pelo Imperador Dom Pedro II. Botânico
por formação, Ladislau transformou o museu num centro mundial
de exposição e aprendizado científicos.

Ivan Fernandes Lima (1927-1995). Professor e geógrafo


alagoano que escreveu um dos mais essenciais livros sobre
ecologia e meio ambiente do estado, Geografia de Alagoas.
Fernandes Lima, que deu nome a avenida, é um ilustre
desconhecido da nova geração. Porém, ele foi o primeiro a
classificar as bacias hidrográficas de Alagoas e a fazer o 1º mapa
topográfico do complexo Mundaú-Manguaba.

Paulo Ramalho Pedrosa (1906-1980). Morador das


margens da lagoa Mundaú, Paulo Ramalho se dedicou à defesa do
meio ambiente desde sua infância, quando aos oito anos já
estudava a fauna e a flora do complexo Mundaú-Manguaba. Como
vereador de Maceió, Ramalho foi um ardoroso defensor da Mata
Atlântica e o primeiro a realizar uma dragagem nas lagoas.

1009
LIVROS PARA
ENTENDER ALAGOAS

“Vai um indivíduo andando a vida toda à cata de prazeres


intelectuais e colhendo pelo caminho, em vez de fortuna, aventura
e/ou mulheres, colhendo livros – os bons, os favoritos, os necessários,
os que dão alegria, estímulo ou satisfação íntima – juntando-os com
carinho e ternura constantes... Eis que de repente o homem tropeça e,
por conta do destino, lá se vai, de vez, interrompendo para sempre o
suave convívio. E todos aqueles livros, reunidos por um gosto
diferente de viver e conviver, logo passam à condição de órfãos... Mal
se joga a última pá de cal sobre o caixão do colecionador, e já os
herdeiros estão telefonando para os proprietários de sebos para que

1010
levem quanto antes o entulho. E é assim, que um mundo de
ansiedades, indagações e perplexidades intelectuais, composto com
tenacidade e amor, de repente se desfaz, por força da indiferença e da
incompreensão”.

Valdemar Cavalcanti, crítico literário alagoano, em trecho


do artigo Herança Condenada. Revista da Academia Alagoana de
Letras, nº 3, dezembro de 1977

HISTÓRIA DE ALAGOAS

Títulos da Coleção Nordestina*

A Coleção Nordestina* é uma rede regional mantida desde


1999 com a união de oito editoras universitárias, entre elas a
Universidade Federal de Alagoas, cujo objetivo é compor uma
coleção destinada a publicar ou republicar obras representativas da
produção intelectual da região Nordeste. A temática dos livros é
abrangente, incluindo áreas como Literatura, Ciências Sociais,
Folclore e Antropologia. Veja o que foi publicado de Alagoas:

ALTAVILA, Jayme de. A Testemunha na História e no


Direito, 2009

1011
BRANDÃO, Moreno. A História de Alagoas e o Baixo São
Francisco, 2015

BRANDÃO, Octávio. Canais e Lagoas, Edufal 2001

BRANDÃO, Théo. Reisado Alagoano. Edição original 1953

QUEIROZ, Álvaro. Episódios da História de Alagoas,


Edições catavento, 1999

DIÉGUES JÚNIOR, Manoel. O bangüê nas Alagoas: traços


da influência do sistema econômico do engenho de açúcar na vida
e na cultura regional, 3ª edição, Edufal, 2ª edição, 2012

DIÉGUES JÚNIOR, Manuel. O Engenho de Açúcar no


Nordeste, 2006

DIÉGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no


Nordeste do Brasil, edição original 1954

DUARTE, Abelardo. Folclore Negro das Alagoas, edição


original 1954

LIMA JÚNIOR, Félix. Maceió de outrora (Org. e


apresentação de Rachel Rocha), 2012

1012
LINDOSO, Dirceu. Utopia Armada, 2005

MARROQUIM, Mário. A Língua do Nordeste, 4ª edição

PEREIRA, Moacyr Soares. Os Índios Tupi-Guarani na Pré-


História, suas invasões do Brasil e o Paraguay, seu destino após
descobrimento

RAMOS, Arthur. A Mestiçagem no Brasil, 2012

RAMOS, Arthur. Culturas Negras do Novo Mundo, 2013


SANT´ANA, Moacir Medeiros de. História do Modernismo
em Alagoas, 1980

Coleção Pensar Alagoas*

A coleção Pensar Alagoas*, editada pela Imprensa Oficial


Graciliano Ramos, desde 2010, reedita, em formato fac-símile, obras
importantes sobre Alagoas que estavam fora de catálogo.

BRANDÃO, Moreno. Vade-Mecuum do Turista em


Alagoas, 1937

1013
CARVALHO, Edson de. O Drama da descoberta do
petróleo brasileiro, 1970

DUARTE, Abelardo. Dom Pedro II e Dona Teresa Cristina


nas Alagoas – viagem realizada ao Penedo e outraS cidades
sãofranciscanas, à cachoeira de Paulo Afonso, Maceió, Zona
Lacustre e região Norte da província (1859-1860), 1975

LIMA JÚNIOR, Félix. Maceió de Outrora, 2014

LIMA, Fernandes. Maceió a Cidade Restinga – contribuição


ao estudo geomorfológico do litoral alagoano, 1990

LINS, Adalberon Cavalcanti. O Ninho da Águia - saga de


Delmiro Gouveia, 1987

PERDIGÃO, Lauthenay. História do Futebol Alagoano –


Arquivos Implacáveis, 2014

ROCHA, Tadeu. Delmiro Gouveia - o pioneiro de Paulo


Afonso, 1970

SANT´ANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à História


do Açúcar em Alagoas, 1958

Mais Alagoas

1014
ALAGOAS. Alagoas em mapas acervo sobre o Estado de
Alagoas. Secretaria de Planejamento do governo de Alagoas, 2012]
ALAGOAS. Departamento estadual de Estatística, Alagoas
e seus municípios. Maceió, Imprensa Oficial, 1944

ALAGOAS. Roteiro cultural e turístico. Pierre Chalita,


Carmém Lúcia, Solange Berard. Maceió – 1979

ALBUQUERQUE, Isabel Loureiro. História de Alagoas.


Imprensa Oficial, 2000

ALMEIDA, Luiz Sávio de; SILVA, Amaro Leite da e


FERREIRA, Gilberto Flores (orgs.). Índios de Alagoas – memória,
educação, sociedade. Maceió, Edufal 2011

ALMEIDA, Sávio de. Memorial biográfico de Vicente de


Paula – o capitão de todas as matas: guerrilha e sociedade
alternativa na mata alagoana. Edufal, 2008

ALMEIDA, Luiz Sávio de. Alagoas nos Tempos do Cólera

ALMEIDA, Luiz Sávio de. Chrônicas Alagoanas


Lembranças das matas e agrestados das Alagoas. Edufal 2013

ALMEIDA, Luiz Sávio de. Crendices e Superstições em


Alagoas

1015
ALMEIDA, Luiz Sávio de. Dois Dedos de Prosa com os
Karapotó

ALMEIDA, Luiz Sávio de. O Negro e a Construção do


Carnaval no Nordeste

ALMEIDA, Luiz Sávio de. Resistência, memória,


etnografia. Maceió, Edufal, 2007
ALTAVILA, Jayme de. História da Civilização das
Alagoas. Imprensa Oficial, 1967

BRANDÃO, Alfredo. Chrônicas Alagoanas. Maceió, Casa


Ramalho, 1939

BRANDÃO, Moreno. A História de Alagoas. Coleção


História de Alagoas - Fundação Universidade Estadual de Alagoas
(Funesa), EDUAL- Arapiraca, 2004

BRASILEIRO, Hum. Opúsculo da Descrição Geographica e


Topographica, Phizica, Política e Histórica do que Unicamente
Respeita à Província de Alagoas no Império do Brasil

CANDIDO, Antônio (apresentação). 50 anos do romance


Cahetés. Maceió, Departamento de Assuntos Culturais, 1984

1016
CASCUDO, Luiz Câmara. Geografia Alagoana no Domínio
Holandês 1940/1941, em Revista do Instituto Histórico e
Geográfico de Alagoas, volume 21, Maceió, pp. 18/26

CAVALCANTI, Edward Robinson de Barros. Alagoas, a


Guarda Nacional e as origens do coronelismo. RJ, 1979,
documento do Arquivo Público de Alagoas

CHALITA, Pierre; DANTAS, Carmém Lúcia e Berard,


Solange. Alagoas: roteiro cultural e turístico. Maceió – 1979
CONTI, Mário Sérgio. Notícias do Planalto. São Paulo,
Companhia das Letras, 1999

COROATÁ, José Próspero Jeová da Silva. Crônicas de


Penedo. Maceió, Departamento Estadual de Cultura, 1962

CORREIA, Temóteo. O pitoresco da política no país das


Alagoas. Edições Catavento, 2008

COSTA REGO, Pedro da. Na Terra Natal (1924-1928).


Maceió, Imprensa Oficial, 1928

COSTA, Craveiro. História das Alagoas: resumo didático.


São Paulo, Melhoramentos, 1983

COSTA, Craveiro. Maceió. Rio de Janeiro, José Olympio


Editora, 1939

1017
COSTA, João Craveiro. Instrução Pública e Instituições
Culturais de Alagoas & outros ensaios

COSTA. Craveiro. O Indicador Geral do Estado das


Alagoas (1874-1934), edição de 1902

DANTAS, Carmem Lúcia e BRADEL, Alex (orgs).


Alagoas de Pierre Fatumbi Verger, Caleidoscópio, Maceió, 2010.

DANTAS, Cármem Lúcia; LÔBO, Fernando Antonio Netto


e MATA, Vera Lúcia Calheiros (orgs). Théo Brandão - Vida em
Dimensão Edição Comemorativa ao centenário (1907-2007).
Governo de Alagoads, 2008

DUARTE, Abelardo. Aspectos da Mestiçagem em Alagoas.


Maceió, Imprensa Oficial 1955

ESPÍNDOLA, Tomás. A Geografia Alagoana, ou Descrição


Física, Política e Histórica da Província das Alagoas

HALFED, Henrique Guilherme. Atlas e Relatório de


exploração do Rio São Francisco desde a cachoeira de Pirapora até
o Oceano Atlântico, do engenheiro civil Henrique Guilherme
Halfed (1787-1873). Trata-se da segunda edição do atlas –
reproduzido por fac-símile e acrescido de texto final – da rara
edição de 1860, editado pela litografia Imperial.

1018
FREITAS, Décio. República dos Palmares – pesquisa e
comentários em documentos históricos do século XVII. Edufal,
2004

GOMES, Jurandir. Quadros da História de Alagoas – breves


ensaios sobre a história pátria. Casa Ramalho Editora, Maceió,
1956

GUSMÃO, Carlos de. Alagoas e suas propriedades rurais.


Diário Oficial, Maceió, 1923

GUTEMBERG, Luiz. O Anjo Americano. São Paulo,


Companhia das Letras, 1995

LACOMBE, Lourenço (org). Viagens pelo Brasil – Bahia,


Sergipe e Alagoas – 1859. Organizado pelo professor Lourenço
Lacombe, a partir da edição de 1959 – com título original Diário
de Viagem ao Norte do Brasili no centenário da expedição do
imperador Dom Pedro II, pela a Universidade Federal da Bahia.
Nesta nova edição, de 2003.

LEITE JÚNIOR, Bráulio. Histórias de Maceió. Maceió,


Edições Catavento, 2000

1019
LIMA, Mário de Carvalho. Sururu Apimentado –
apontamentos para a história política de Alagoas. Maceió,
Imprensa Oficial 2ª edição

LIMA, NUNES. Vidas sem retoque. Século Z


Comunicação, 2008

LINDOSO, Dirceu. A Utopia Armada – rebeliões de pobres


nas matas do tombo real (182-1850). Paz e Terra (RJ), 1983

LINDOSO, Dirceu. Formação de Alagoas Boreal. Maceió,


Catavento, 2000

LINDOSO, Dirceu. Interpretação da Província – estudo da


cultura alagoana. Edufal, 2005

LINDOSO, Dirceu. O Poder Quilombola, Edufal, 2007

LINDOSO, Dirceu. Rebeliões de Pobres nas Matas do


Tombo Real, Edufal, 1983

LIRA, Fernando José. Formação da riqueza e da pobreza de


Alagoas. Maceió, Edufal, 2007

MACEDO, Maurício de. Esfinge Caetés – visita em versos


a história de Alagoas. Edições Catavento, 1999

1020
MAJELLA, Geraldo de. O PCB em Alagoas – documentos
(1982-1990). Maceió, Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2011

MARROQUIM, Adalberto. Terra das Alagoas. Maglioni &


Strini (Itália), 1922

MERO, Ernani Otacílio. Coisas do Penedo. Sergasa, 1982

MERO, Ernani Otacílio. O barroco em Alagoas. Maceió,


Sergasa, 1989

MOURA, Antônio Joaquim (1778-1854). Opúsculo da


discripção geográphica, topographica, phizica, política e histórica
do que unicamente reporta à província de Alagoas, no Império do
Brasil. Organizador: Douglas Apratto Tenório. Maceió, Edufal,
2009

NETO, Medeiros (padre). História do São Francisco.


Maceió, Casa Ramalho, 1941

NORDESTE, Carlinhos do. Mestre Deodato – a vida do


artista contada em versos de cordel. Edições Catavento, 2003

OLIVEIRA, Nilton. Eu fui testemunha: vinte anos na


política. Maceió, edufal, 1979

1021
PEDROSA, J. F. de Maya. Histórias do Velho Jaraguá.
Maceió, edição do autor 1998.

PIMENTEL, Jair Barbosa. Alagoas uma má notícia – livro


reportagem. Edição do autor, 2015

SANT´ANA, Moacir Medeiros de. A história da Imprensa


Alagoana (1831-1981). Maceió, Arquivo Público, 1987
(publicação comemorativa dos 75 anos do Diário Oficial (1912)

SANT´ANA, Moacir Medeiros de. Efemérides Alagoanas,


v. I e II. Maceió, Instituto Arnon de Mello, 1992 e 1993

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Teatro Alagoano, novembro 2008
Água Doce: Cultura e Vila das Alagoas, fevereiro 2009
Aurélio, o homem que virou dicionário, novembro 2009
Um mergulho no Rio São Francisco, junho 2010
Ledo Ivo, o poeta da transgressão, dezembro 2010
Sandoval Caju, o personagem e a cidade. Maio 2011
Memória Cultural, sobre o passado de Alagoas, julho 2011
Brincadeira Popular, folclore alagoano, outubro 2011
Teotônio e o Brasil, a trajetória , dezembro 2011
Literatura, a hora e a vez, fevereiro 2012
Os silêncios do Quebra, abril de 2012

Design alagoano e identidade cultural, junho 2012


Carlos Moliterno e Manuel Diégues Júnior, agosto 2012
O cinema alagoano pede passagem, outubro de 2012
Panorama da produção autoral, dezembro de 2012
Graciliano Ramos, vida, obra e reflexões, março 2013
Paixão em Cores, o futebol alagoano, junho 2013
Carne de Carnaval, festejos carnavalescos, fevereiro 2014
Jorge de Lima, o criador, agosto 2014

1030
Sabores de Alagoas, setembro de 2014
Guerreiros do Nordeste, cangaço, novembro 2015
Arte & Censura, novembro de 2015
Maceió 200 anos, 2015
O oceano de Djavan, 2016
Fauna Viva, 2016
Alagoas \nação Zumbi, 2016
Instante capturado, 2017
Manifesto da Arte Popular, 2017

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BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Chegança.


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BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Fandango.


Coleção Folclórica da Universidade Federal de Alagoas, 1976

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BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Guerreiro.
Coleção Folclórica da Universidade Federal de Alagoas, 1976

BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Maracatu.


Coleção Folclórica da Universidade Federal de Alagoas, 1976

BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Pastoril. Coleção


Folclórica da Universidade Federal de Alagoas, 1976

BRANDÃO, Théo. Folguedos Natalinos - Presépio.


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ÍNDICE REMISSIVO

A Voz do Povo
Abdias Nascimento
Abdias, Bob Marley
Abelardo Duarte
Academia Alagoana de Letras
Ação Libertadora Nacional
Acebilio

1040
Achiles Escobar
Acotirene
Adalberon Cavalcanti Lins
Adalberto Marroquim
Adelmo dos Santos
Afrânio Lages
Agélio Novais
Águas do Aurélio
Alagoanos universais
Alagoas Boreal
Alba Nascimento Correia
Alberto Passos Guimarães
Alceu Mainard
Aldemar Paiva
Aldo Ivo
Aldo Jones
Alex Barbosa
Alfredo Brandão
Aline Marta
Allen Ginsberg
Alma de Borracha
Almir Medeiros
Aloísio Branco
Aloísio Coimbra
Aloísio Vilela
Alpínia purpurata vermelha
Altair Pereira

1041
Altemar Dutra
Ambientalistas de Alagoas
Américo José Peixoto Lima (Lelé)
Américo Vespúcio
Ana Lins
André Papini
Ângela Nadir Oiticica
Angicos
Angiquinho
Anilda Leão
Anistia
Antônio Cândido
Antonio Carmo
Antonio de Dedé
Antonio Deodato
Antônio Francisco dos Santos
Antonio Sapucaia
Arcanjo
Arthur Ramos
Ari Cipola
Aristóbolo Cardoso (compositor)
Arivaldo Maia
Arlene Miranda
Arnoldo Jambo
Arnon de Mello
Arriéte Vilela
ASA

1042
Associação Teatral de Alagoas
Audálio Dantas
Augusta Martins
Aureliano Cândido Tavares Bastos
Aurélio Buarque
Aurélio Buarque de Holanda
Aurélio Vianna
Aydete Vianna
Azuladinha

Baile da Chita
Baleia – Vidas Secas
Banda "Esquenta Muié"
Banda Cachorro Urubu
Banda Gato Zarolho
Banda Mopho
Banda Porão
Bandas e filarmônicas
Banguê nas Alagoas
Barafunda
Bárbara Lessa
Barreto Falcão
Bartolomeu Dresch
Baygon
Benedito Fonseca

1043
Benedito Mossoró
Benjamim Moser
Benon Pinto da Silva
Bens tombados
Bernardina Dinah de Oliveira
Beroaldo Maia Gomes
Beto Batera
Beto Leão
Beto Nascimento
Beto Normande
Betuca Lima
Bety Faria
Bidu Sayão
Bismarck
Biu Cabecinha
Bob Vilanova
Boca da Mata
Boca de Maceió
Bordado de filé
Bordado Meia Noite
Bordado Singeleza
Botafogo
Braga Lyra
Brasão de armas
Bráulio Leite Júnior
Brejos de altitude
Breno Accioly

1044
Bruno César Cavacalcanti

Cabo Henrique
Cacá Diegues
Cachoeira de Paulo Afonso
Cachorra Baleia
Café do Cupertino
Calabar
Calunga
Cândida Palmeira
Canhoto
Canibais
Canoa de Tolda
Cantinho da Saudade
Capiba
Caralâmpia
Carlinhos Marechal
Carlito Lima
Carlos Xavier da Costa
Carlos Alberto Richelli
Carlos Balla
Carlos Fiúza
Carlos J. Duarte
Carlos Marighella
Carlos Moliterno

1045
Carlos Moura
Carlos Paurílio
Carlos Vereza
Carmem Correia Acioli (1897-2001)
Cármem Lúcia Dantas
Carmem Miranda
Carmem Omena
Carnaval
Castanha (massagista)
Ceci Cunha
Celi Leite
Celso Brandão
Cena literária contemporânea
Cerca Real do Macaco
Ceres Vasconcelos
Cesário Procópio
Charles Bukovski
Chau do Pife
Chico Buarque
Chico Eupídio
Chico Nunes
Chico Nunes das Alagoas
Cícero Flor
Cícero Péricles
Cícero Vieira
Cidade Sorriso
Circuito cultural

1046
Clara Charf Marighela
Clara Ramos
Clarice Lispector
Cláudia Gordon
Claudio Canuto
Cláudio Moreira Pacheco
Claudionor Higino
Cléa Marsiglia
Clemilda
Clóvis José da Silva
Clube Fênix
Coleção Perseverança
Comendador Peixoto
Contracultura alagoana
Corisco
Corisco
Correia Flores
Costa Aguiar
Costa Rego
Costa Rêgo
Couraçado Caetés
Craveiro Costa
Cravo Albim
CRB
Creusa de Souza Accioly
Cris Braun
Cristiane Acioli Jatobá

1047
CSA
Culinária alagoana

Dalton Costa
Damião de Souza
Darcy de Farias Costa
Darcy Ribeiro
Dário Bernardes,
Dario Pingo de Ouro
Davi Nasser
Décio Freitas
Delmiro Gouveia
Delson Uchoa
Demócrito Gracindo
Denis Agra
Destaladora de fumo
Dia do Quebra
Dias Cabral
Diáspora Literária
Dida – jogador
Dinho Zampier
Diplomatas do Império
Dirceu Lindoso
Divaldo Suruagy
Djavan

1048
Dom Hélder Câmara
Dom Pedro I
Dom Pedro II
Domingos Fernandes Calabar
Domingos Jorge Velho
Dona Clarice
Dona Iracema
Dona Irineia
Douglas Apratto Tenório
Duda Calado
Duofel
Dydha Lyra

Edberto Ticianelli
Edécio Lopes
Edgar Bastos
Edgar Moraes
Edições Catavento
Edilma Bomfim Acioli
Edenilson Oliveira
Edmilson Salles
Edna Constant Mendes
Ednilson Salles
Edson Bezerra
Edson de Carvalho

1049
Edson Moreira
Edu Maia (compositor)
Edu Passos
Eduardo Canuto
Eduardo Xavier
Edvaldo Santa Rosa
Elaine Kundera
Elba Farias Gazaneu
Elcio de Gusmão Verçosa
Eliane Cavalcanti
Eliane Vielmond
Eliezer Setton
Elinaldo Barros
Elysio de Carvalho
Elza Miranda
Embarcações do Velho Chico
Emídio Magalhães
Emília Clarck
Emílio de Maya
Enaura Quixabeira
Ênio Lins
Erb
Ernani Méro
Esportes & Futebol
Estátua de Zumbi
Estefânia Goes
Estevão Pinto

1050
Euclides Malta
Eurico Maciel
Eva Le Campion
Everaldo Borges
Evocação a Alagoas
Ezra Pound

Farois de Alagoas
Fátima Leão
Fátima Pinto
Félix Baigon
Félix de Lima Júnior
Fernanda Guimarães
Fernandes Lima
Fernando Bismarck
Fernando Coelho
Fernando Collor
Fernando Fiúza
Fernando Lobo
Fernando Lopes
Fernando Melo
Fernando Pontes
Fernando Rodrigues
Ferreira Gullar
Ferreti

1051
Festa da Arte Nova
Festas e celebrações
Floracy Cavalcante
Florentino Dias
Floriano Peixoto
Fotomontagens (Jorge Lima)
Francisco Oiticica
Francisco Valoir
Fredy Correia
Frei Jaboatão
Freitas
Freitas Cavalcanti
Freitas Neto

Gal Monteiro
Galo da torre do Rosário
Gama Júnior
Ganga Zumba
Gaspar Luiz
Gastone Lúcia Beltrão
General Mário Lima
Georg Marcgraf – cartógrafo
George de Carvalho Andrade

1052
Geraldo Benson
Geraldo de Majella
Gerson Filho
Getúlio Mota
Getúlio Vargas
Gicélia Lopes de Oliveira
Gilberto de Macedo
Gilberto Freyre
Gogó da Ema
Góis Monteiro
Gonzaga Leão
Goulart de Andrade
Graça Dias
Graciliana Celestino
Graciliano Ramos
Grupo Vivarte
Guedes de Miranda
Guerra dos Cabanos
Guilherme Palmeira
Guilherme Rogatto
Guiomar de Castro
Gustavo Gomes
Gustavo Leite
Gustavo Lima
Gustavo Paiva

1053
Halfeld
Heckel Tavares
Hélio Miranda
Hélio Pisca
Heliônia Ceres
Heloísa Maria de Gusmão Medeiros
Henrique Davino
Henrique Lima
Hércules Mendes
Hermano Figueiredo
Hermeto Pascoal
Hidroaviões
Hidronavegação
Hilarina
Homero Cavalcante
Homero Cavalcanti
Humberto Lins
Humberto Mendes

Ícones
Igreja Nova
Ilha do Ferro
Ilhas
Ilza Porto

1054
Impeachment
Índios das Alagoas
Interior de Alagoas
Irene Duarte Silva
Irina Costa
Irineu e Lula Sabiá
Ismael Pereira
Italo Graciano Matos
Ivan Fernandes Lima
Ivanildo Rafael
Ivson Monteiro

Jacinto Silva
Jack Kerouak
Jacozinho
Jaime de Altavila
Jaime Miranda
Jangadas da Pajuçara
Jangadeiros alagoanos
Januário Canhoto
Jararaca
Jarede Viana
Jayme Amorim de Miranda
Jayme d’Altavila
Jean Mazzon

1055
Jeanine Toledo
Jeanne Moreau
Joana Gajuru
João Bezerra da Silva
João das Alagoas
João de Lima
João do Pife
João Guimarães Rosa
João Paulo
João Paulo II
Joãozinho Paulista
Joaquim Alves
Joaquim Brígido
Jofre Soares
Jorge Barbosa
Jorge Barboza
Jorge Cooper
Jorge da Sorte
Jorge de Lima
Jorge Lins
Jorge Oliveira
Jorge Siri
José Aloísio Brandão Vilela
José Aloísio Vilela
José Augusto Xavier
José Bach
José Cícero

1056
José Dalmo Guimarães Lins
José Geraldo Marques
José Joaquim
José Kairala
José Lins do Rego
José Luiz Calazans (Jararaca)
José Marcio Passos
José Maria de Melo
José Maria Tenório Rocha
José Marques de Melo
José Menezes
José Paulino Lins
José Pimentel Amorim
José Próspero Jeová da Silva Caroatá
José Rodrigues de Miranda
José Wilker
José Zumba
Josefina Novaes
Josué Junior
Jota do Pife
Juarez Cavalcanti
Juarez Orestes
Jucá Santos
Judas Isgorota
Júnior Almeida
Junior Bocão
Jurandir Gomes

1057
Juvenal Lopes
Juvenal Machado
Kleber Roubaud

Ladislau Neto
Lael Correia
Lagoa da Canoa
Lagoas
Lamenha Filho
Lampião
Lauro Gomes
Lauthenay Perdigão
Le Champion
Leda Almeida
Ledo Ivo
Lêdo Ivo
Lelo Macena
Léo Palmeira
Leureny
Liceu Alagoano
Lilian Rose
Liliana Brandão
Lily Kapetanakis
Lily Lages
Linda Mascarenhas

1058
Literatura infantil
Litoral de Alagoas
Lobão Filho
Lourenço Lacombe
Lourenço Peixoto
Lourival Passos
Lucas Lamenha
Lúcia Guiomar
Luciano José
Lucy Brandão
Luis Felipe Scolari
Luiz Inácio Lula da Silva
Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros
Luiz B. Torres
Luiz Câmara Cascudo
Luiz Cavalcante
Luiz de Almeida Araújo
Luiz de Almeida Neto
Luiz de Medeiros Neto
Luiz Gonzaga
Luiz Lavenère
Luiz Lucariny
Luiz Sávio de Almeida
Luiz Vera Filho
Lula
Lula em Maceió

1059
M

Macabéa
Mácleim
Maestro Fon-Fon
Maestro Manezinho
Major Bonifácio
Major Luiz
Mané Garrincha
Manhãs Brasileiras
Manifesto Sururu
Manoel Bandeira
Manoel Diégues Júnior
Manoel Fiel Filho
Manoel Lisboa de Moura
Manoel Viana
Manuel Diegues Júnior
Marcel Gautherot
Marcelino Freitas Neto
Marcial Lima
Márcio Canuto
Marcio Moreira Alves
Marcos Aurélio
Marcos de Farias Costa
Marcos Plech
Maria Amélia Vieira
Maria Bonita

1060
Maria José Palmeira (Lilian Rose)
Maria Luiza Pontes de Miranda
Maria Rosa Maia Nobre Piatti
Maria Teresa Vieira
Marília Ferreira
Marina Tavares
Marinês
Mário de Andrade
Mário de Carvalho Lima
Mário de Gusmão
Mário Lago
Mário Magalhães
Mário Marroquim
Mário Tilico
Marisa Gatto
Marta Vieira
Martha Araújo
Martha Arruda
Martinho da Vila
Maurício de Nassau
Mello Motta
Memória do Jornalismo Alagoano
Memória do Rádio Alagoano
Memórias do Cárcere
Memórias Legislativas
Menestrel das Alagoas
Meninos da Avenida

1061
Messias de Melo
Mestre Graça
Mestre Zinho
Mestres Artesãos das Alagoas
Miguel (Rocha) Rosas
Miguel Torres
Millane Hora
Milton Hênio
Miriam Falcão Lima
Mirna Porto
Miss Paripueira
Misso
Moacir Medeiros de Sant´Ana
Modernismo
Modernismo em Alagoas
Moleque Namorador
Monteiro Lobato
Moreno Brandão
Morgana Maria Pita Duarte
MR-8
Muniz Falcão

N
Naná Loureiro
Natalício Barros
Navegação fluvial
Nega Juju

1062
Negra Fulô
Negra Odete
Negro no futebol alagoano
Nelsinho Braga
Nelson da Rabeca
Nelson Pereira dos Santos
Nelson Rodrigues
Neto
Neuza Amorim de Miranda
Neuza Saleme
Ney Conceição
Nilo Peixoto
Nise da Silveira
Nivaldo Yang Tay
Nô Pedrosa
Noêmia Duarte (1897-1962)
NS dos Prazeres
Nunes Lima

Octávio Brandão
Odete dos Martírios
Odete Pacheco
Odijas Carvalho de Souza
Operação Taturana
Orlando Santos

1063
Orquídea alagoana
Osman Loureiro
Otávio Cabral

Padroeira de Maceió
Pajuçara
Pajussara
Pantanal alagoano
Pão de Açúcar
Paranhos
Patrícia Lins
Patrimônio Imaterial
Paulo Alencar
Paulo Autran
Paulo Caetano
Paulo Caldas
Paulo Gracindo
Paulo Malta Filho
Paulo Martins
Paulo Silveira de Castro
PC do B
PCB
PCR
Pedro Cabral
Pedro da Rocha

1064
Pedro Nolasco Maciel
Pedro Nunes
Pedro Onofre
Pedro Tarzan
Pedro Teixeira
Peró Andrade
Persival Figueroa
Petrobras
Petróleo em Alagoas
Petuba
Peu
Piaçabuçu
Pierre Cardin
Pierre Chalita
Pierre Verger
Pindorama
Piranhas
Pixinguinha
Plínio Lins
Pontes de Miranda
Porto Calvo
Porto Real

Quebra de Xangô
Quebrangulo

1065
R

Rachel de Queiroz
Rachel Rocha
Rádio alagoano
Rádio Difusora
Radjalma Cavalcanti
Railton Sarmento
Ranilson França
Rás Gonguila
Raul Lima
Rei Pelé – Trapichão
Relatórios do prefeito Graciliano
Renan Filho
Renda de Bilro
Renê Bertholet
René Guerra
Réplica da Estátua da Liberdade
Riacho Doce
Ricardo Maia
Ricardo Mota
Ricardo Neto
Ricardo Santado
Ricardo Sarmento
Rita Vilela
Roberto Ataíde

1066
Roberto Becker
Roberto Lopes
Roberto Mendes
Roberto Menezes
Roberto Vilanova
Robertson Dort
Rodrigues de Gouveia
Rodrigues de Melo
Rogério Gomes
Romance alagoano
Romance Nordestino
Romeu de Avelar
Rommel
Ronaldo de Andrade
Ronaldo Lessa
Rosália Brandão
Rosália Sandoval
Rosita Peixoto Lima
Rosival Lemos
Rosivaldo Reis
Ruas de Maceió
Rubens Colaço
Rubens Quintela
Rui Palmeira
Ruth Quintela

1067
Sabino Romariz
Saleiro Pitão
Sadi Cabral
Salles
Sambaqui
Sandoval Caju
Sandra Pereira das Neves
Santa Rita
Sávio de Almeida
Selma Bandeira
Seresteiros da Pintanguinha
Setton Neto
Sil
Silva
Silva Cão
Silvério Pessoa
Silvestre Péricles
Sinos de Maceió
Soarestes
Socorrinho Breda
Solange Chalita
Solange da Costa
Solange Sarmento
Sônia Maria de Gouveia
Sóstenes Lima
Stela Maria Mota

1068
Suely Bandeira
Suetônio Madeiros
Sururu Apimentado

T
Tadeu da Costa Lima
Tânia de Maya Pedrosa
Tânia Pedrosa
Tavares Bastos
Teatro Deodoro
Teixeira da Rocha
Tenório Cavalcanti
Teotônio Brandão Vilela
Teotonio Brandão Vilela Filho
Tereza Setton
Tereza Wucherer Braga
Terezinha Agra
Terezinha Porto
Théo Brandão
Thiago Mio Salla
Tia Marcelina
Tobias Granja
Tomás Espíndola
Tororó do Rojão
Traipu
Trapichão

1069
U

União dos Palmares

Valdemar Cavalcanti
Valmir Calheiros
Vânia Lima
Vera Arruda
Vera Fischer
Vera Gama
Vera Lúcia Calheiros
Vera Romariz
Vicente de Paula
Vicente Ferreira
Vinícius Maia Nobre
Virgílio Maurício
Virgulino Ferreira da Silva
Visconde de Sinimbu
Vladimir de Carvalho
Vladimir Herzog
Vladimir Maiakovski
Vladimir Palmeira

1070
Wado
Walfredo Bandeira de Melo
Walfrido Alencar
Werner Salles
Wilma Araújo
Wilma Araújo
Wilma Miranda
Wladimir Carvalho

Xéxéu
Xilogravura do Tico Tico
Xique Baratinho

Yohansson

Zabumbeiro
Zafi
Zagallo
Zaluar de Sant´Ana

1071
Zé Barros
Zé Carlos
Zé Márcio Passos
Zé Preta
Zélia Maia Nobre
Zezinho
Zezito Guedes
Zinho
Zumba
Zumbi dos Palmares

1072

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