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Análise crítica sobre Ivermectina para tratamento contra Covid-19.

Autora: Juliana S Zanetti

Contato: zanettijus@gmail.com ou https://www.linkedin.com/in/zanettijus/

Recentemente um estudo realizado pela Universidade de Monash localizada em

Melbourne, Austrália, trouxe à tona uma grande polêmica envolvendo o medicamento

Ivermectina na prevenção e tratamento contra SARS-CoV-2. Este medicamento em

questão é um antiparasitário comercializado desde a década de 80 e muito utilizado no

combate à verminoses e parasitas (como por exemplo: piolho).

Desde 2008 este grupo de estudo vem pesquisando o efeito antiviral da

ivermectina contra uma variedade de vírus. No entanto, todos estes estudos foram feitos

in vitro com culturas celulares (células Vero-hSLAM derivadas de células epiteliais renais

do macaco verde Africano). O grupo de pesquisadores, vem observando o

comportamento de diversos tipos de vírus após a administração do antiparasitário em

cultura celular e, de modo geral, concluíram que há sim uma redução da capacidade de

infecção viral. Apenas à critério de elucidação, no vírus HIV, a ivermectina atua como um

inibidor da interação entre a proteína integrase e a importina heterodimérica α/β1

inibindo assim a replicação viral. Além do vírus HIV, há relatos sobre a inibição da

produção de algumas proteínas virais do vírus Símio 40 (um polioma vírus encontrado em

macacos) e relatos sobre a capacidade deste medicamento de limitar a infecção causada

por vírus de RNA como os vírus da Dengue (1 a 4), vírus da encefalite equina venezuelana
e o vírus da influenza A.

Em 2014 na Tailândia, foi conduzido um estudo clínico de fase III para observar a

ação da ivermectina contra a infecção pelo vírus da dengue e foi demonstrado que a

administração diária desse antiparasitário, favoreceu a redução dos níveis da proteína

viral INS1 no plasma dos participantes de pesquisa. No entanto, não foi demonstrado

nenhum benefício clínico em relação à viremia. Este estudo foi publicado em 2018.

A polêmica gerada em torno da ivermevctina hoje, como um medicamento que

previne e até mesmo cura Covid-19 é semelhante à gerada pela uso da cloroquina em

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meados de março deste ano. De modo geral as pessoas se convenceram de que esse

antiparasitário pode ser a solução para o fim da pandemia em que vivemos e a “ordem"

é pensar que, se “está todo mundo tomando, então vamos tomar também.” Sendo

assim, está ocorrendo uma busca desenfreada e descontrolada pelo medicamento. O

ponto central da questão é que ninguém conhece os efeitos colaterais deste

medicamento quando administrado fora das doses recomendadas, no entanto, a

propaganda boca à boca tem sido tão poderosa que mesmo sem saber ao certo para

que serve a ivermectina, as pessoas tem buscado desesperadamente por ela a ponto de

chamar à atenção de órgãos regulatórios como a ANVISA.

Em nota de esclarecimento publicado em 10 de junho deste ano, a ANVISA

esclarece que “[…] não existe estudos conclusivos que comprovem o uso deste

medicamento para o tratamento de Covid-19, bem como estudos que refutem este uso”.

Ressalta ainda que “[…] o uso do medicamento para indicações não previstas na bula é

de escolha e responsabilidade do médico prescritor”.

Voltando ao estudo de Monash, na Austrália, o grupo de pesquisadores utilizaram

ivermectina na cultura celular Vero-hSLAM (como mencionado anteriormente) infectada

por SARS-CoV-2. Em 24h, observaram uma redução de 93% do RNA viral no

sobrenadante desta cultura e 99.8% de redução de RNA viral no interior das células. Eles

repetiram o ensaio para 48 e 72 horas e o resultado se mostrou cada vez mais promissor,
com menos proteína viral a cada dosagem. O grupo também testou a toxicicade do

medicamento em intervalos regulares de tempo e não foi observado nenhuma toxicidade

nas culturas tratadas.

A conclusão deste trabalho foi que a ivermectina pode sim, reduzir a capacidade

de infecção viral atuando da mesma forma como em outros vírus (citados à cima): se

ligando ao complexo IMPα/β1 e impedindo a replicação viral sem que ocorra toxicidade

para as células. O grupo também relata, que já ocorre a prática da administração de

ivermectina para pacientes com Covid-19, mas não menciona local e nem dosagem. Eles

também mencionam o estudo realizado na Tailândia com dengue e dizem que a

dosagem de administração deve ser diferente pois, os vírus possuem características

diferentes.

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Sem dúvidas, há a necessidade de estudos fase III para demonstrar a eficácia e a

segurança deste medicamento para este novo objetivo. Segundo registros no REBEC

(Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos), no Brasil há somente 1 único estudo fase III

envolvendo ivermectina. O estudo é intitulado: "Estudo controlado de fase IIb, duplo

cego e randomizado para avaliar eficácia e segurança da Ivermectina em pacientes com

Síndrome Respiratória Aguda Grave durante a pandemia de Covid-19” e a data de

registro é de 21 de Abril de 2020. O estudo está sendo realizado pela Faculdade de

Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP).

Referências:

ANVISA: Nota de esclarecimento sobre a ivermectina. Publicado: 10/07/2020 Acessado:

24/08/2020.

Leon Caly, Julian D.Druce, Mike G.Catton, David A.Jans, Kylie M.Wagstaff. The FDA-

approved drug ivermectin inhibits the replication of SARS-CoV-2  in vitro. Antiviral

Research, v. 178, n. 104787, 2020.

Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (ReBEC): identificador primário: RBR-7hzhwd.

Yamasmith et al.. Efficacy and safety of ivermectin against dengue infection: a phase III,

randomized, double-blind, placebo-controlled trial. He 34th Annual Meeting the Royal

College of Physicians of Thailand,  Internal Medicine and One Health,  Chonburi,

Thailand (2018).

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