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Notas de Aula 1 - Teoria do Consumidor (Parte 1)

Microeconomia
Curso Cecı́lia Menon

1 Introdução
1.1 Apresentação e Programa do Curso
1.1.1 Contato
Emails: jglresende@gmail.com
Telefone: 3107-6603
Contato por email mais seguro.
Questões, dúvidas sobre exercı́cios, etc - enviar com antecedência de dois dias antes da aula,
preferivelmente.

1.1.2 Programa da ANPEC


O curso seguirá o programa da ANPEC, reproduzido abaixo.
As aulas terão duas partes. Na primeira, será exposta a teoria do assunto abordado. Na segunda,
serão resolvidos exercı́cios, a maioria exercı́cios de provas passadas da ANPEC.
Sugestões sobre o curso, material, aula, didática são sempre bem-vindos.
Provas da ANPEC: http://www.anpec.org.br/exame.htm.

Programa da Anpec:

I. Demanda do Consumidor

1. Teoria do Consumidor: Teorias cardinal e ordinal. Curvas de indiferença. Limitação orçamentária.


Equilı́brio do consumidor. Mudanças de equilı́brio devidas à variação de preços e renda (equação
de Slutsky): efeito-preço, efeito-renda e efeito-substituição. Escolha envolvendo risco.
2. Curva de Demanda: deslocamento da curva e ao longo da curva. Elasticidade-preço, elasticidade-
renda, elasticidades-preço cruzadas. Elasticidades compensadas e não-compensadas. Classificação
de bens: normais, inferiores, bens de Giffen, substitutos, complementares. Excedente do consum-
idor. Demanda de mercado e receita total, média e marginal.
II. Oferta do Produtor
1. Teoria da produção - Fatores de produção. Função de produção e suas propriedades. Isoquantas.
Elasticidade de substituição. Rendimentos de fator, rendimentos de escala. Função de produção
com proporções fixas e proporções variáveis. Combinação ótima de fatores. Firma multiprodutora.
2. Custo: Custo de Produção. Curvas de isocusto. Função de custo; curto e longo prazo; custo
fixo e variável. Custo marginal; custo médio.
3. Curva de Oferta da Firma e da Indústria de curto e longo prazos.

1
III. Mercados

1. Concorrência Perfeita: O equilı́brio da empresa em concorrência perfeita: a curva de oferta;


deslocamento da curva e mudança ao longo da curva; curto e longo prazo; elasticidade-preço da
oferta. Equilı́brio do mercado: posição de equilı́brio, deslocamento das curvas de procura e de
oferta.
2. Monopólio: Equilı́brio da empresa monopolista. Discriminação de preços; barreiras à entrada.
Comparação com o mercado de concorrência perfeita.
3. Concorrência Monopolı́stica: Diferenciação do produto. Equilı́brio da empresa em concorrência
monopolı́stica: curto e longo prazo. Comparação com o mercado de concorrência perfeita.
4. Oligopólio: Caracterização da estrutura oligopolı́stica.
4.1 Modelos Clássicos - Cournot, Bertrand e Edgeworth; fatias de mercado; cartéis; liderança de
preços; comparação com o mercado de concorrência perfeita.
4.2 Modelos de mark-up - Princı́pio do custo total; curva de demanda quebrada; concentração e
barreiras à entrada; diferenciação e diversificação do produto.
5. Formação de Preços e Fatores de Produção.

IV. Equilı́brio Geral e Teoria do Bem-estar

1. Troca Pura;
2. Troca Com produção;
3. Caixa de Edgeworth;
4. Bens Públicos;
5. Externalidades.

V. Economia da Informação

1. Seleção adversa;
2. Perigo Moral;
3. Modelo de Sinalização;
4. Modelo de Principal Agente.

VI. Teoria dos Jogos

1. Equilı́brio de Nash;
2. Equilı́brio de Nash em Estratégias Mistas;
3. Jogo Repetido;
4. Equilı́brio Perfeito em Subjogos.

2
1.1.3 Bibliografia
Principal (recomendado pela ANPEC como leitura básica):

• Varian, Hal. Microeconomica - Princı́pios Básicos - Uma abordagem Moderna (7o edição).
Editora Campus.

Auxiliar (recomendado pela ANPEC como leitura complementar)

• Nicholson, Walter e Snyder, Christopher. Microeconomic Theory: Basic Principles and


Extensions (10th edition). Thomson South-Western.

Outros livros recomendados pela ANPEC:

1. Pindyck, Robert e Rubenfeld, D. Microeconomia, 6a ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall,
2006. (recomendado pela ANPEC como leitura básica)

2. Gibbons, R. Game Theory for applied economists. Princeton University Press, 1992 (caps 1
e 2) (recomendado pela ANPEC como leitura complementar)

1.1.4 Distribuição de Questões

Ano I-Demanda II-Oferta III-Mercados IV-EG&BE V-Info VI-Jogos


1990 1,2,3,4,15 5,6,7,8 9,10,11,12,13,14,15 0 0 0
1991 1,3 4,5,6,10,12,13,14 2,7,8,9,11 15 0 0
1992 1,2,3,4,11 5 6,7,8,9,10 11,12,13,14,15 0 0
1993 1,2,3,4,15 5,6,8 7,9,10,11,12,13 14 0 0
1994 1,2,3,4,5,11 6,10,13,14 7,8,9 12,15 0 0
1995 1,2,3,4,5 6,7,8 9,10,11,12,13 14,15 0 0
1996 1,2,3,4,5 7,8,9,10 6,11,12,13,14 15 0 0
1997 1,2,3,4 5,6,7,8 9,10,11,12 13,14,15 0 0
1998 1,2,3,4,10,12 5,6 7,8,9,11 14,15 0 13
1999 1,2,3,4,9 5,6,7,8 10,12,13 11,15 0 14
2000 1,2,3 4,5,6 7,8 9,10,11 12,13 14,15
2001 1,2 3,4,5 6,7,8,15 9,10 11,12 13,14
2002 1,2,3 5 4,6,14,15 7,9,10 8,12 11,13
2003 1,2 3,4 5,6,7,13 8,10,14,15 9 11,12
2004 1,2,9,13 3 4,5,6,10,12,14 7,15 8 11
2005 1,2,3 4,5 6,7,13,14 8,11,15 9 11,12
2006 1,2,12 3,4 5,6,13,14 7,8,15 9 10,11
2007 1,2,3,15 4,5 6,7,12,13,14 7,8 10 11
2008 1,2,3,4 5,6 8,10 7,11,12 13 9,14,15
2009 1,2,3,8 4 5,10,13 6,7,9,14 15 11,12
2010 1,2,3,4,5 6 7,9,11 8,12,13,14 15 10

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1.1.5 Calendário de Aulas (“Tentativo”)

Aula Dia Assunto Aula Dia Assunto


1 23/02 (Qi) Consumidor 16 10/06 (Sx) Mercados
2 03/03 (Qi) Consumidor 17 17/07 (Sx) Mercados
3 23/03 (Qa) Consumidor 18 01/07 (Sx) Mercados
4 25/03 (Sx) Consumidor 20 06/07 (Qa) EG e BE
5 30/03 (Qa) Consumidor 21 08/07 (Sx) EG e BE
6 01/04 (Sx) Incerteza 22 13/07 (Qa) EG e BE
7 06/04 (Qa) Incerteza 23 01/08 (Sg) EG e BE
8 08/04 (Sx) Incerteza 24 04/08 (Qi) EG e BE
9 15/04 (Sx) Firma 25 05/08 (Sx) EG e BE
10 29/04 (Sx) Firma 26 12/08 (Sx) Jogos
11 04/05 (Qa) Firma 27 17/08 (Qa) Jogos
12 11/05 (Qa) Firma 28 26/08 (Sx) Jogos
13 18/05 (Qa) Mercados 29 08/09 (Qi) Info
14 25/05 (Qa) Mercados 30 15/09 (Qi) Info
15 03/06 (Sx) Mercados 19 22/09 (Qi) Info

1.2 Conceitos Básicos


1.2.1 O que é Microeconomia
Microeconomia Estuda a rationale das decisões dos agentes econômicos. Provê justificativas
para uma série de problemas econômicos.

Questões Algumas questões tratadas pela Microeconomia:

• Efeito do aumento de um imposto de importação,


• Efeito de uma abertura comercial,
• etc.

1.2.2 Tipos de Agentes Econômicos


Os principais tipos de agentes que a microeconomia estuda são:

• Consumidores

• Firmas

• Governo

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1.2.3 Consumidores e Firmas
• Consumidores
– Manifestam suas ações na economia por intermédio de suas demandas.
– Buscam o máximo de satisfação a partir de sua riqueza e dos preços dos bens e serviços
disponı́veis para consumo.
• Firmas
– Manifestam suas ações na economia por intermédio de sua demanda por insumos ou
fatores de produção e por sua oferta de bens e serviços produzidos.
– Procuram maximizar seu lucro a partir da tecnologia de que dispõem para produzir o
bem ofertado e dos preços dos insumos que compõem o bem ofertado.

1.2.4 Análise Positiva e Análise Normativa


Análise Positiva
• Descreve o comportamento dos agentes e os resultados da interação entre os comportamentos
dos agentes.
Análise Normativa
• Estuda como os resultados deveriam ser e o que fazer para obtê-los.
Exemplo: Um modelo de economia positiva constata que existe monopólio em algum setor da
economia. A economia normativa estuda como este monopólio atinge a sociedade e o que pode
ser feito para corrigı́-lo.

1.2.5 Economia Neoclássica


Princı́pios Básicos da Economia Neoclássica:
1) Comportamento maximizador (sujeito a restrições),
2) Equilı́brio.
Esses dois princı́pios usam a idéia de racionalidade: As ações dos agentes econômicos são coerentes
com a busca de seu propósito (mesmo que essa busca resulte em um comportamento prejudicial
ao próprio agente ou à sociedade).

1.2.6 Economia de Mercado


Em uma economia de mercado temos que:
• Sistema de preços opera livremente;
• Alocação eficiente dos recursos de uma sociedade;
• Economia de informação;
• Descentralização das decisões;
• Bens são produzidos pelos produtores mais eficientes e consumidos pelos consumidores que
atribuem o maior valor ao bem;

5
1.2.7 Critério de Eficiência de Pareto
Falhas de Mercado: impedem que o mercado seja eficiente (no sentido de Pareto).
Eficiência de Pareto: Uma alocação satisfaz o critério de eficiência de Pareto se não existe como
melhorar a situação de algum agente sem piorar a de outro agente.
Observação: o critério de eficiência de Pareto não diz nada sobre desigualdade. Ele é apenas um
critério mı́nimo de eficiência, que exclui desperdı́cios na sociedade.

1.2.8 Falhas de Mercado


Algumas falhas de mercado:

• Externalidades;

• Poder de mercado;

• Informação Imperfeita;

• Bens Públicos.

Se alguma dessas falhas de mercado estiver presente, não podemos afirmar que a alocação de
recursos e bens alcançada por essa sociedade satisfaz o critério de eficiência de Pareto.

1.2.9 Modelos Econômicos


Simplificações da realidade que ajudam a entender um problema complexo.
Exemplo: mapa rodoviário.
Navalha de Occan: regra para a escolha entre modelos: se temos dois modelos que explicam o
mesmo fenômeno, escolhemos o modelo mais simples.

1.2.10 Postulados
Algumas idéias são primordiais no raciocı́nio econômico:

• Escassez

– Recursos da sociedade são limitados;


– Sem escassez não existe problema econômico;
– Custo de oportunidade: custo de algum bem ou serviço é o valor da melhor alternativa
de uso dos recursos utilizados para se adquirir esse bem.

• Escolha (tradeoffs)

– Escassez impõe a necessidade de escolher entre alternativas possı́veis;


– Tradeoff : situação em que para se obter alguma coisa deve-se sacrificar outra;
∗ tradeoff entre canhões e manteiga;
∗ tradeoff entre equidade e eficiência.

6
• Comportamento Individual Maximizador
• Substituição
– Agentes estão dispostos a fazer as escolhas que a escassez de recursos exige;
– Entre quaisquer dois bens A e B que desejamos, estamos dispostos a abrir mão de um
pouco de A para receber um pouco de B;
– Essa substituição normalmente envolve pequenos incrementos dos bens (incrementos
marginais);
∗ Firma: produz até o ponto em que o acréscimo de receita pela venda do último
bem produzido (benefı́cio para a firma) for igual ao custo marginal de produzi-lo
(perda para a firma).

1.2.11 Implicações dos Postulados


• Agentes econômicos tomam decisões dependendo dos custos e benefı́cios destas decisões. Se
houver alteração nestes custos e benefı́cios, as decisões podem se modificar.
• Incentivos na economia podem induzir as pessoas ou firmas a tomarem certas decisões
(agentes econômicos respondem a incentivos: importância fundamental em economia).
• Desenho de polı́ticas públicas deve levar em conta que as pessoas podem alterar seu com-
portamento devido a uma nova lei, e essa mudança pode ter efeitos não desejáveis.
• Exemplo: Lei Seca nos Estados Unidos.

1.3 O Problema do Consumidor


1.3.1 O Problema do Consumidor
O consumidor busca a satisfação mais alta possı́vel, dada a quantidade de recursos de que dispõe.
A satisfação do consumidor é caracterizada por preferências. Os recursos do consumidor são
caracterizados por restrições orçamentárias (ou qualquer outra restrição relevante ao problema).
⇒ Dois objetos diferentes:
• Preferências: caracterizam o gosto do consumidor;
• Restrições: caracterizam a escassez do problema.

1.3.2 O Conjunto de Escolha de Consumo


O primeiro objeto que devemos definir é o conjunto de escolha de consumo do indivı́duo, repre-
sentado por X.
Esse conjunto contém todas as alternativas de consumo possı́veis do indivı́duo. Para problemas
sem incerteza, esse conjunto quase sempre é Rn+ .
Seja uma cesta de consumo x ∈ X, onde X = Rn+ . Então x = (x1 , . . . , xn ), onde x1 ≥ 0, . . . , xn ≥ 0
são as quantidades dos bens ou serviços (indexados de 1 a n) que o indivı́duo pode desejar consumir.
Note a hipótese de perfeita divisibilidade dos bens.

7
Propriedades de X O conjunto X satisfaz as seguintes propriedades:

6 X ⊂ Rn+ ;
1. ∅ =
2. 0 ∈ X;
3. X é fechado;
4. X é convexo.

Exemplo: X = R2+ = {(x1 , x2 ) ∈ R2 ; x1 ≥ 0, x2 ≥ 0}, o conjunto das cestas formadas apenas


por dois bens, satisfaz as quatro propriedades acima. A grande maioria das questões da ANPEC
sobre a teoria do consumidor considera cestas de apenas dois bens.

8
2 A Restrição Orçamentária
2.1 Definições Básicas
2.1.1 Restrição Orçamentária
A restrição orçamentária representa a escassez no problema do consumidor. Cada consumidor
possui uma quantidade de dinheiro para gastar em um determinado perı́odo de tempo, digamos
um mês.
Diferentemente das preferências, a restrição orçamentária é, a princı́pio, observável. Se uma
mudança de comportamento é causada por uma variação no conjunto de possibilidade de consumo,
obtemos uma explicação direta e objetiva para o fenômeno observado.

2.1.2 Notação
• x1 , . . . , xn : quantidade dos bens 1, . . . , n;

• p1 , . . . , pn : preços dos bens 1, . . . , n;

• x = (x1 , . . . , xn ): cesta de bens, p = (p1 , . . . , pn ): vetor de preços.

• m: renda do consumidor.

Vamos usar as seguintes hipóteses:

• Hipótese 1: Preços dos bens são fixos (consumidor tomador de preços - mercado competitivo),

• Hipótese 2: A renda m do consumidor é exógena (não existe escolha de trabalho),

• Hipótese 3: Dois bens apenas.

2.1.3 A Restrição Orçamentária


A restrição orçamentária pode então ser escrita como:

p 1 x1 + p 2 x2 ≤ m

Ou seja, o que o consumidor gasta não pode ultrapassar a quantidade de dinheiro de que dispõe.
A reta orçamentária é o conjunto de cestas de bens que custam exatamente m (ou seja, cestas de
bens que exaurem toda a renda do consumidor):

p 1 x1 + p 2 x2 = m

O conjunto factı́vel de consumo é descrito por:

B = {(x1 , x2 ) ∈ R2+ ; p1 x1 + p2 x2 ≤ m}

Para B definido acima, não existem não-linearidades, indivisibilidades ou problemas de interde-


pendência de consumo.

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2.1.4 Representação Gráfica para o Caso de Dois Bens
Vamos ilustrar a restrição e a reta orçamentárias em um gráfico onde os eixos representam a
quantidade dos bens.
Observe que:
• Se o consumidor gastar todo o seu dinheiro no bem 1, ele pode comprar no máximo m/p1
unidades desse bem.
• Se ele gastar todo o seu dinheiro no bem 2, ele pode comprar no máximo m/p2 unidades
desse bem.
• A reta orçamentária possui inclinação −p1 /p2 . A inclinação da reta orçamentária informa
o valor de troca de mercado entre os dois bens: para se obter uma unidade do bem 1, o
consumidor tem que abrir mão de −p1 /p2 unidades do bem 2.

x2
6

m
p2
@
@
@
@ Reta Orçamentária
@  (Inclinação: −p /p )
1 2
@
@
@
@
Restrição @
Orçamentária @
@
@
@
@
@
@ -
m x1
p1

2.1.5 Custo de Mercado de um Bem


Suponha que o consumidor escolha x1 unidades do bem 1 e x2 unidades do bem 2, quantidades
que satisfazem a reta orçamentária. Ele decide consumir ∆x1 a mais do bem 1. Para isso, ele
vai ter que abrir mão de uma quantidade do bem 2, representada por ∆x2 , de modo que a reta
orçamentária continue válida:
p1 (x1 + ∆x1 ) + p2 (x2 + ∆x2 ) = m
Subtraindo da expressão acima a reta orçamentária original, dada por p1 x1 + p2 x2 = m, obtemos:
∆x2 p1
=−
∆x1 p2
Note que −p1 /p2 é o custo de oportunidade do bem 1: para o consumidor obter mais uma unidade
do bem 1, ele deve abrir mão de p1 /p2 unidades do bem 2.
Exemplo: Suponha que p1 = 2 e p2 = 4. Então ∆x 2
∆x1
= − 42 = − 12 . Portanto, se o consumidor
quiser consumir mais uma unidade do bem 1, ele tem que abrir mão de 1/2 unidade do bem 2.

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2.1.6 Interpretações Alternativas
1) Escolha de trabalho. x1 tempo, x2 bem composto, m renda endógena, depende do tempo
trabalhado.
2) Escolha intertemporal. x1 consumo no perı́odo 1, x2 consumo no perı́odo 2 (bens com-
postos homogêneos), p1 normalizado para 1, p2 preço do consumo no perı́odo 2 em termos
do preço do consumo no perı́odo 1 (dado pela taxa de juros, usualmente).

2.2 Estática Comparativa


2.2.1 Efeitos de uma Alteração na Renda
Se a renda do consumidor aumenta, o seu conjunto de possibilidade de consumo se expande:
ele agora pode comprar mais de todos os bens. No gráfico, como os preços dos bens não se
alteram, a relação de troca de mercado dos bens permanece a mesma, ou seja, a inclinação da reta
orçamentária não se altera. Portanto, a nova reta orçamentária se desloca para fora, paralelamente
à reta original. Similarmente, se ocorrer uma diminuição da renda, o conjunto de possibilidade de
consumo se reduz e a reta orçamentária se desloca para dentro, paralelamente à reta original.

x2
6
Mudança na RO causada

p2 por um aumento na renda m
@
@ (renda aumenta de m para m̄)
@
@
m @
p2 @
@  @
@ @
@  @
@ @
@ @
@ 
@
@ @
@  @
@ @
@ @
@ @
@ @ -
m m̄ x1
p1 p1

2.2.2 Efeitos de uma Alteração nos Preços


Se o preço de um dos bens se modificar, a inclinação da reta orçamentária se modifica também.
Por exemplo, se o preço do bem 1 aumentar, a reta se desloca de modo que o intercepto vertical
não muda, já que o preço do bem 2 não mudou (se o consumidor comprar apenas o bem 2, ele
adquire a mesma quantidade que antes, m/p2 ).
Porém, o intercepto horizontal muda para um ponto de menor valor (se o consumidor comprar
apenas o bem 1, ele agora adquire uma quantidade menor do que antes, já que o preço desse bem
aumentou).

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x2
6
Mudanca na RO causada
m
p2 Q por um aumento no preço p1
SQ
S Q (aumenta de p1 para p̄1 )
S QQ
S Q
S Q
Q
S Q
S Q
Q
S Q
S Q
Q
S Q
S Q
Q
S  QQ
S  Q
S 
+
 Q
S Q
Q
S Q
SS Q
Q -
m m x1
p̄1 p1

2.2.3 Preços Absolutos e Preços Relativos


O que ocorre se todos os preços e a renda aumentam?
Por exemplo, suponha que todos os preços dobram de um perı́odo para o outro. Nesse caso a
restrição orçamentária se torna

(2p1 )x1 + (2p2 )x2 ≤ (2m),

igual à restrição orçamentária original,

p1 x1 + p2 x2 ≤ m.

Intuitivamente, se todos os preços da economia aumentam (ou diminuem) na mesma proporção,


incluindo a renda do consumidor, então nada muda.

2.2.4 Numerário
Portanto:

• Mudanças nos preços absolutos não têm efeito real;

• Agentes econômicos não sofrem de ilusão monetária;

• Apenas mudanças nos preços relativos têm efeito.

Podemos então transformar um dos preços em numerário, o que significa torná-lo igual a 1.
Por exemplo, preço do bem 1 como o numerário da economia: a restrição orçamentária se torna

x1 + (p2 /p1 )x2 ≤ (m/p1 )

12
2.2.5 Questão 4 - Exame 1993

A figura 1 apresenta a linha de orçamento (AB) de um consumidor


que possui uma renda de $300.

x2 6
(0) A expressão algébrica da linha de
orçamento (AB) é dada por: x1 + 2x2 = 10.

(1) O preço do bem 2 relativo ao bem 1 é


igual a 2.

(2) O preço nominal do bem 2 é $30.


5 H
A
HH (3) A função de utilidade U (x1 , x2 ) = x1 x2 é
H
HH C compatı́vel com a escolha da cesta igual a (5; 2, 5).
2,5 Hr
HH
H (4) A curva de demanda pelo bem 1, x1 = 2p1 + p2 ,

H B
HH
é compatı́vel com a função de
-
utilidade descrita em (3).
5 10 x1

2.3 Restrições causadas pela Escassez


2.3.1 Restrições causadas pela Escassez
Vamos derivar restrições ao comportamento do consumidor geradas pela restrição orçamentária.
Suponha que a demanda de um bem i qualquer depende dos preços de todos os bens e da renda
do consumidor. Logo,

• x1 = x1 (p1 , p2 , m): demanda do bem 1 (é a escolha ótima de consumo do bem 1 pelo
indivı́duo), escrita como função do preço do próprio bem 1, dos preços dos outros bens (no
caso, do bem 2), e da renda do consumidor;

• x2 = x2 (p1 , p2 , m): demanda do bem 2 (é a escolha ótima de consumo do bem 2 pelo
indivı́duo), escrita como função do preço do próprio bem 2, dos preços dos outros bens (no
caso, do bem 2), e da renda do consumidor.

Essa demanda é chamada demanda ótima ou Marshalliana.

2.3.2 Restrições sobre a Demanda


Restrições:

• Lei de Walras ou “Adding-up”:

p1 x1 (p1 , p2 , m) + p2 x2 (p1 , p2 , m) = m.

• Homogeneidade. A demanda Marshalliana de cada bem é homogênea de grau zero:

xi (tp1 , tp2 , tm) = xi (p1 , p2 , m), para todo bem i, para todo t > 0.

13
2.3.3 Conclusão
Observações:

• Todas as restrições vistas são obtidas usando apenas a restrição orçamentária;

• Nada foi dito sobre os gostos ou preferências dos consumidores;

• Mais ainda, as restrições de “adding-up” e homogeneidade (e outras restrições a respeito


da variação da demanda Marshalliana obtidas a partir dessas duas restrições) são tudo
o que podemos dizer sobre o comportamento do consumidor usando apenas a restrição
orçamentária.

Então para inferirmos mais restrições sobre as demandas, precisamos modelar as preferências dos
consumidores.

14
3 Preferências e Função Utilidade
3.1 Preferências
3.1.1 Conjunto de Escolha do Consumidor
Denotamos por X (contido em Rn+ , no caso geral, ou em R2+ , no caso de dois bens) o conjunto que
representa as cestas de bens disponı́veis para o consumidor.
Um elemento do conjunto X ⊂ R2+ é um vetor x = (x1 , x2 ), onde xi é a quantidade do bem i,
i = 1, 2, na cesta x.
O conjunto de escolha do consumidor pode ser bem geral, e incluir quantidades de bens impossı́veis
de serem fabricados. Esse conjunto enumera apenas possibilidades que o consumidor gostaria de
consumir, e não o que é realmente possı́vel de ser consumido (lembre-se que esse é o papel da
restrição orçamentária!).

3.1.2 Preferências
Vamos supor que cada consumidor é capaz de ordenar as várias cestas de consumo disponı́veis
em ordem de preferência. Para quaisquer duas cestas x e y diferentes, o consumidor é capaz de
comparar essas cestas: ou x é melhor que y ou y é melhor que x.
Chamamos essa relação de preferência, e a representamos por “”. Escrever x  y significa “x é
preferı́vel (fracamente) a y.”

Definição: A relação binária (comparação de uma cesta com outra) representada por x  y
significa dizer que x é (fracamente) preferı́vel a y.

Um sistema de preferências  é uma relação binária definida no conjunto de consumo X, que


satisfaz três dos axiomas abaixo, completeza, reflexividade e transitividade.

3.1.3 Preferência Estrita e Indiferença


Podemos também definir as seguintes relações:

Definição: A relação de preferência estrita , derivada de , definida no conjunto X, é dada por

x  y se e somente se x  y e y  x

Definição: A relação de indiferença ∼, derivada de , definida no conjunto X, é dada por

x ∼ y se e somente se x  y e y  x

Portanto, temos que:

• x  y: x é tão bom quanto y;

• x  y: x é estritamente melhor do que y; e

• x ∼ y: x e y são indiferentes.

15
3.1.4 O que são os Axiomas?
Cada axioma tem um significado preciso e supõe algo sobre o comportamento do consumidor.
Exemplo: Axioma de monotonicidade: prefere mais do que menos.
Axiomas sobre preferências são portanto hipóteses sobre o comportamento dos consumidores.
Essas hipóteses podem ser testadas.

3.1.5 Axiomas - Relação de Preferências


Vamos supor que a relação binária  satisfaz os seguintes axiomas:

• Axioma de Completeza: Para quaisquer cestas x e y em X, ou x  y ou y  x (ou


ambos).

• Axioma de Reflexividade: Para qualquer cesta x em X, temos que x  x.

• Axioma de Transitividade. Para quaisquer cestas x, y e z em X, se x  y e y  z então


x  z.

Definição: A relação binária  definida no conjunto X é uma relação de preferência se satisfaz


os axiomas acima.

3.1.6 Axioma de Transitividade


O axioma de transitividade é crucial para a teoria do consumidor: sem ele, em geral, não é possivel
dizer qual é a cesta preferida pelo consumidor.
O melhor argumento em defesa da transitivadade das preferências é de ordem normativa. Pre-
ferências não-transitivas resultam na possibilidade de um “dutch book”: uma sequência de trocas
que levam o consumidor a perder todo o seu dinheiro.
Exemplo: suponha que um consumidor tenha uma cesta x de bens e que ordene as cestas x, y, e
z da seguinte maneira não-transitiva: x  y, y  z e z  x, ou seja, x  y  z  x. Por meio de
trocas circulares, o consumidor terminaria com a mesma cesta inicial e sem dinheiro algum. Esse
resultado é consequência direta das preferências não serem transitivas.

3.1.7 Outros Axiomas


• Axioma de Não-Saciação Global. Para todo x ∈ X, existe uma cesta y ∈ X tal que
y  x.

• Axioma de Não-Saciação Local. Para todo x ∈ X, existe uma cesta y ∈ X suficiente-


mente próxima de x tal que y  x.

• Axioma de Monotonicidade. Para todos x, y ∈ X, se x ≥ y, então x  y, enquanto se


x > y, então x  y.

• Axioma de Convexidade. Se x e y são duas cestas de bens tais que x ∼ y, então


λx + (1 − λ)y  x, para todo λ ∈ [0, 1].

16
• Axioma de Convexidade Estrita. Se x e y são duas cestas de bens distintas tais que
x ∼ y, então tx + (1 − t)y  x, para todo t ∈ (0, 1).

• Axioma de Continuidade. Os conjuntos  (x) ≡ {y ∈ X; y  x} e  (x) ≡ {y ∈ X; x  y}


são fechados para todo x ∈ X.

O axioma de não-saciação global diz que, para qualquer cesta considerada, sempre existe uma
outra cesta que provê maior satisfação. O axioma de não-saciação local vai além: diz que para
toda cesta, existe uma outra cesta bem próxima a ela que provê maior satisfação ao consumidor.
O axioma da monotonicidade diz que mais é melhor : se acrescentamos mais bens à cesta do
consumidor, sua satisfação aumenta.
O axioma de convexidade diz que médias são melhores do que extremos: uma combinação de
duas cestas indiferentes entre si é sempre tão boa quanto qualquer uma das cestas que forma a
combinação. Uma versão mais forte desse axioma é o da convexidade estrita, que diz que a cesta
média é estritamente melhor do que as cestas que a formam.
O axioma da continuidade é de caráter técnico, necessário para o resultado principal da próxima
seção, de representação de uma preferência por uma função de utilidade.

3.1.8 Preferências lexicográficas


A preferência lexicográfica para o caso de dois bens é definida como:

(x1 , x2 )  (y1 , y2 ) ⇔ {x1 > y1 } ou {x1 = y1 e x2 ≥ y2 }

A lógica dessas preferências assemelha-se à lógica de procurar uma palavra no dicionário.


A preferência lexicográfica é completa e transitiva. Porém, não pode ser representada por nenhuma
função de utilidade (pois não é contı́nua).

3.1.9 Questão 3 - Exame 1994


Três indivı́duos participam de um comitê encarregado de apreciar os projetos A, B e C. Sabe-se
que o sı́mbolo < representa a relação “é pior que”, e que as preferências dos indivı́duos são as
seguintes:
indivı́duo 1: A < B < C
indivı́duo 2: B < C < A
indivı́duo 3: C < A < B
O processo decisório do comitê recomenda considerar as alternativas duas a duas, escolhendo o
projeto vencedor por maioria simples. Nestas condições pode-se afirmar que:
(0) As preferências do comitê seriam completas.
(1) As preferências do comitê não são transitivas.
(2) O comitê poderia ser considerado um núcleo decisório tı́pico contemplado pela Teoria do
Consumidor.
(3) O ordenamento dos projetos pelo comitê é idêntico às preferências do indivı́duo 3.

17
3.2 Função de Utilidade
3.2.1 Função de Utilidade
Do ponto de vista prático, preferências nem sempre são fáceis de se manusear e de se obter
inferências econômicas.
Definição: Uma função de utilidade assinala para cada cesta x ∈ X um valor u(x) ∈ R.
Uma função de utilidade nada mais é do que uma representação numérica das cestas disponı́veis
para o consumidor.
Se para as cestas x e y temos que u(x) > u(y), então dizemos que a cesta x provê mais utilidade
(ou satisfação, ou bem-estar) para o consumidor.

3.2.2 Exemplos de Funções de Utilidade com Dois Bens


• Utilidade Cobb-Douglas: u(x1 , x2 ) = xα1 xβ2 , α > 0, β > 0.
• Utilidade Linear: u(x1 , x2 ) = ax1 + bx2 , a > 0, b > 0.
• Utilidade Quase-Linear: u(x1 , x2 ) = g(x1 ) + x2 .
• Utilidade de Leontieff: u(x1 , x2 ) = min{ax1 , bx2 }, a > 0, b > 0.
1
• Utilidade CES: u(x1 , x2 ) = (axρ1 + bxρ2 ) ρ , a > 0, b > 0.

3.2.3 Utilidade Linear e Utilidade de Leontieff


Utilidade Linear:
u(x1 , x2 ) = ax1 + bx2 , a > 0, b > 0
Representa bens substitutos perfeitos - ou seja, o consumidor aceita substituir um pelo outro a
uma taxa constante.
Utilidade de Leontieff:
u(x1 , x2 ) = min{ax1 , bx2 }, a > 0, b > 0
Representa bens complementares perfeitos - ou seja, são consumidos sempre em conjunto, em
proporções fixas.

3.2.4 Teorema da Representação


Definição: A função de utilidade u representa o sistema de preferências  se para todo x, y vale
x  y ⇔ u(x) ≥ u(y).

Teorema de Representação. Seja X = Rn+ . Se o sistema de preferências satisfaz os axiomas


de completeza, reflexividade, transitividade e continuidade, então existe uma função de utilidade
u contı́nua que representa esse sistema. Mais ainda, qualquer transformação monotônica positiva
dessa função de utilidade também representa o mesmo sistema de preferências.
As preferências lexicográficas constituem um exemplo clássico de preferências para as quais não ex-
iste função de utilidade que a represente. Esse tipo de preferência é completa, reflexiva, transitiva,
porém não é contı́nua (não satisfaz o axioma da continuidade).

18
3.2.5 Consequências do Teorema da Representação
O importante em uma função utilidade é o modo em que ela ordena as cestas de bens, e não o
número especı́fico associado a cada cesta.
Suponha que u representa , ou seja,

x  y ⇔ u(x) ≥ u(y)

Se f é uma função crescente em todo o seu domı́nio (ou seja, uma transformação monotônica
positiva), então temos que:

x  y ⇔ u(x) ≥ u(y) ⇔ f (u(x)) ≥ f (u(y))

Logo, f (u(.)) também representa o mesmo sistema de preferências que u representa, no sentido
de que preserva a ordenação das cestas de bens determinada por .
Mais ainda, se u e v são duas funções de utilidade que representam o mesmo sistema de preferências,
então existe uma função f : R → R crescente tal que v(.) = f (u(.))

3.2.6 Cardinalidade vs Ordinalidade


Bentham e Mill, Gossen, Jevons, Menger, Walras: bens geram utilidade mensurável. Seria então
possı́vel comparar o ganho em utilidade do aumento de consumo de um bem, por exemplo.
Pareto, Hicks, Slutsky: aspecto ordinal é o que importa (um tanto quanto confusa a discussão
desses autores).
Atualmente, na teoria da escolha apenas ordinalidade é importante. Porém, funções de utilidade
definidas de modo cardinal são usadas em análises de bem-estar.

3.3 Curvas de Indiferença e TMS


3.3.1 Curvas de Indiferença
Uma curva de indiferença representa um conjunto de cestas indiferentes entre si. Então, uma
curva de indiferença contém todas as combinações de cestas que dão o mesmo nı́vel de satisfação
ao consumidor.

• ∼ (x) = {y ∈ X : y ∼ x} (em termos de preferências),

• I(k) = {x ∈ X : u(x) = k} (em termos de utilidade).

Chamamos mapa de indiferença a coleção de curvas de indiferença distintas de uma determinada


utilidade.

Exemplo: Preferências “bem-comportadas”. No caso de dois bens, uma curva de indiferença


muito comum é convexa em relação à origem (representa preferências completas, reflexivas, tran-
sitivas, monôtonas e estritamente convexas). A figura abaixo ilustra o mapa de indiferença tı́pico
de utilidades bem-comportadas.

19
x2
6
Curvas de indiferença
“bem-comportadas”

ū3 > ū2

ū2 > ū1

ū1
-
x1

Exemplo: Bens Substitutos Perfeitos. O mapa de indiferença de bens substitutos perfeitos,


com a = b, é ilustrado na figura abaixo.
x2
6
Curvas de Indiferença
u(x1 , x2 ) = x1 + x2

@
@
@
@  @
@ @
@ @
@  @ @
@ @ @
@ @ @
@
@ @@ @ @ -
x1

Exemplo: Bens Complementares Perfeitos. O mapa de indiferença de bens substitutos


perfeitos, com a = b, é ilustrado na figura abaixo.
x2
6 Curvas de Indiferença
u(x1 , x2 ) = min{x1 , x2 }



semi-reta x2 = x1

-
x1

20
3.3.2 Relações
Uma preferência bem-comportada será representada por uma utilidade bem comportada. Os
axiomas de uma preferência se refletem na utilidade que a representa. Se a preferência é monótona,
a utilidade que a representa é crescente. Observe que o significado de utilidade crescente é o mesmo
de preferência monótona, o consumidor prefere mais a menos.
Se a preferência for convexa, a utilidade que a representa será quasecôncava, ou seja, para duas
cestas x e y quaisquer, então a cesta definida como uma combinação linear dessas duas cestas,
zt = tx + (1 − t)y, para todo t tal que 0 ≤ t ≤ 1, é fracamente preferı́vel à cesta menos preferida
entre x e y. Formalmente,

u(zt ) = u(tx + (1 − t)y) ≥ min{u(x), u(y)},

para todo t ∈ [0, 1]1 . A intuição dessa propriedade para a utilidade é a mesma intuição da
propriedade de convexidade da preferência, já que as duas representam a mesma ideia para o
comportamento do consumidor, de que ele prefere médias a extremos. Nesse caso, a curva de
indiferença terá um formato convexo com relação à origem.
Finalmente, se a preferência for estritamente convexa, a utilidade que a representa será estrita-
mente quasecôncava, ou seja, para duas cestas x e y distintas (x 6= y) quaisquer, então a cesta
definida como uma combinação estrita dessas duas cestas, zt = tx + (1 − t)y, para todo t tal que
0 < t < 1 (se t = 0, obtemos que zt = y, se t = 1, obtemos que zt = x), é estritamente melhor do
que cesta menos preferida entre x e y. Formalmente, temos que:

u(zt ) = u(tx + (1 − t)y) > min{u(x), u(y)},

para todo t ∈ (0, 1). A intuição dessa propriedade para a utilidade é a mesma intuição da
propriedade de convexidade estrita da preferência, já que as duas representam a mesma ideia para
o comportamento do consumidor, de que ele prefere estritamente médias a extremos. A figura
abaixo ilustra esse caso.

x2
6

x q
@
@
@
@ q xt = tx + (1 − t)x̂
@
@
@
@
@q
@

-
x1

1
um modo equivalente de definir quaseconcavidade é dizer que todo o conjunto de contorno superior da função,
C(ū) = {x ∈ X; u(x) > ū}, é um conjunto convexo: se x e y pertencem a C(ū), então tx + (1 − t)y pertence a
C(ū), para todo t ∈ [0, 1].

21
Para as curvas de diferença, temos que valem as seguintes relações:
• O axioma de transitividade implica que duas curvas de indiferença distintas não podem se
cruzar.
• O axioma de monotonicidade implica que não existem “males”: mais de cada bem é mel-
hor. Monotonicidade implica que as curvas de indiferença tenham inclinação negativa. Pre-
ferências monotônicas também são chamadas preferências crescentes.
• O axioma de convexidade implica que a curva de indiferença seja convexa em relação à
origem (ver figura acima - ilustra a curva de indiferença de uma preferência estritamente
convexa).

3.3.3 Taxa Marginal de Substituição


Definição: Taxa Marginal de Substituição (TMS). A taxa marginal de substituição (TMS)
é a inclinação da curva de indiferença.

A TMS entre dois bens mede a taxa pela qual o consumidor está disposto a trocar um bem por
outro: a TMS do bem 1 pelo bem 2 é o valor que o consumidor atribui ao bem 1 em termos do
bem 2.
A TMS é um número negativo: se o consumidor abre mão de um pouco de um bem, ele precisa
receber um pouco do outro bem para manter-se na mesma curva de indiferença (consequência do
axioma de preferências crescentes).
Porém, alguns livros definem a TMS como o valor absoluto da inclinação da curva de indiferença.
Isso é uma fonte enorme de confusão em algumas questões da ANPEC, nas quais não é possı́vel
inferir qual definição o examinador utilizou na questão.

3.3.4 Exemplo
∂u ∂u
Exemplo: Suponha que ∂x 1
= 12 e ∂x 2
= 4. Então na margem (para pequenas mudanças ou
trocas entre os bens), uma unidade do bem 1 vale três vezes mais para o consumidor do que uma
unidade do bem 2. Logo, a taxa marginal de substituição entre os bem 1 e 2 é −3.
Ou seja, se aumentarmos o consumo do bem 1 por uma unidade e diminuimos o consumo do bem
2 por 3 unidades, então o consumidor continua com o mesmo nı́vel de satisfação (na mesma curva
de indiferença).

3.3.5 Fórmula
A utilidade marginal do bem xi mede o acréscimo na utilidade devido a um aumento no consumo
do bem i:
∂u(x)
U M gxi (x) =
∂xi
O valor da utilidade marginal não possui nenhum conteúdo econômico, pois apenas a ordenação das
cestas importa. Se usarmos uma outra utilidade para representarmos as preferências, a utilidade
marginal mudará.
A única informação relevante que podemos obter da utilidade marginal é do seu sinal: se a
utilidade marginal de um bem é positiva, então quantidades maiores desse bem aumentam o nı́vel

22
de bem-estar do consumidor (observe que essa propriedade será válida também para qualquer
outra utilidade representando essa preferência).
Podemos derivar a TMS usando a utilidade marginal de um bem. A fórmula da TMS entre dois
bens (1 e 2) :
∂u(x1 ,x2 )
dx2 ∂x1 U M gx1 (x1 , x2 )
T M S1,2 (x1 , x2 ) = = − ∂u(x ,x )
=−
dx1 du=0
1 2 U M gx2 (x1 , x2 )
∂x2

3.3.6 Observações
1. A TMS não depende da função de utilidade que usamos para representar as preferências.

2. A TMS pode ser medida na prática, se certas condições forem satisfeitas (preferências bem
comportadas).

3. Se as preferências são estritamente convexas, o valor absoluto da TMS diminui quando


percorremos uma curva de indiferença (na direção de se afastar do eixo do bem 2).

3.3.7 TMS de Algumas Funções de Utilidade


1. Utilidade Cobb-Douglas: u(x1 , x2 ) = xα1 xβ2 , α > 0, β > 0. Nesse caso,

U M gx1 (x1 , x2 ) α x2
T M S1,2 (x1 , x2 ) = − =−
U M gx2 (x1 , x2 ) β x1

2. Utilidade Linear: u(x1 , x2 ) = ax1 + bx2 . Nesse caso, a TMS entre os dois bens é igual a
−a/b, qualquer que seja a cesta de bens considerada.

3. Utilidade com um Bem Neutro: u(x1 , x2 ) = x1 . Nesse caso, a TMS entre os bens é
infinita.

4. Utilidade de Leontieff: u(x1 , x2 ) = min{ax1 , bx2 }. Nesse caso, a TMS é zero, infinita, ou
não está definida, dependendo da cesta considerada. Mais especificamente, temos que:

• Se (x1 , x2 ) é tal que ax1 < bx2 , T M S1,2 (x1 , x2 ) = +∞;


• Se (x1 , x2 ) é tal que ax1 > bx2 , T M S1,2 (x1 , x2 ) = 0;
• Se (x1 , x2 ) é tal que ax1 = bx2 , T M S1,2 (x1 , x2 ) não é definida.
1
5. Utilidade CES ou ESC (elasticidade constante de escala): u(x1 , x2 ) = (axρ1 + bxρ2 ) ρ ,
a > 0, b > 0, ρ < −1, ρ 6= 0. Nesse caso,
 1−ρ
U M gx1 (x1 , x2 ) a x2
T M S1,2 (x1 , x2 ) = − =−
U M gx2 (x1 , x2 ) b x1

23
3.3.8 Preferências e Utilidades Homotéticas
A preferência de um consumidor é chamada homotética se satisfaz a definição abaixo. A utilidade
do consumidor é chamada homotética caso represente preferências homotéticas (todas as funções
de utilidade vistas até agora - com exceção da utilidade quase-linear - são homotéticas).
Definição: Preferências homotéticas. As preferências  são homotéticas se todas as curvas
de indiferença são relacionadas por expansões proporcionais ao longo de raios:
se x ∼ y, então αx ∼ αy, ∀α ≥ 0,
onde x e y são cestas de bens.
Para qualquer linha reta saindo da origem em direção ao quadrante positivo, todos os pontos de
curvas de indiferença distintas que essa linha cruza possuem a mesma TMS.
Portanto, se conhecemos uma única curva de indiferença gerada por uma preferência homotética,
somos capazes de descrever todas as curvas de indiferença geradas por essa preferência, pois todas
as curvas de indiferença são versões aumentadas ou diminuı́das umas das outras. Ou seja, podemos
descrever completamente o sistema de preferências que gerou essa curva. Esse fato tem implicações
importantes, principalmente na análise empı́rica da teoria do consumidor.

x2
6

 Preferências Homotéticas
B s

Pontos A e B (e C e D)

 têm a mesma inclinação

A s


 

 D 
 s


C
s


   u1
 

 
  u0
 
 
 -
x1

Representação de Preferências Homotéticas. Toda função utilidade que representa pre-


ferências homotéticas pode ser escrita como:
u(x1 , x2 ) = f (v(x1 , x2 )),
onde f é uma função estritamente crescente e v é uma função homogênea de grau 1 (ou seja,
v(tx) = tv(x), ∀t ≥ 0).
É fácil verificar que a função Cobb-Douglas u(x1 , x2 ) = xγ1 x1−γ
2 , com 0 < γ < 1, é homotética,
pois ela é homogênea de grau 1 (f é a identidade nesse caso). As funções de utilidade linear, de
Leontieff e CES são também homotéticas.

24
3.3.9 Questões da ANPEC
RESOLVER: QUESTÃO 6, EXAME 2011; QUESTÃO 1, EXAME 2010; QUESTÃO 2, EX-
AME 2009; QUESTÃO 1, EXAME 2007; QUESTÃO 1, EXAME 2006; QUESTÃO 1, EXAME
2004; QUESTÃO 1, EXAME 2002; QUESTÃO 1, EXAME 2001; QUESTÃO 1, EXAME 2000;
QUESTÕES 1, 2 e 4, EXAME 1999; QUESTÕES 1 e 2, EXAME 1998.

OBSERVAÇÃO: Questões de exames mais antigos, relacionadas ao assunto: QUESTÃO 2,


EXAME 1996; QUESTÕES 1 e 2, EXAME 1994; QUESTÃO 1, EXAME 1993; QUESTÃO 1,
EXAME 1991; QUESTÃO 1, EXAME 1990.

3.3.10 Leitura sugerida:


• Varian, capı́tulos 1 (O Mercado) , 2 (restrição Orçamentária), 3 (Preferências) e 4 (Utilidade).

• Nicholson e Snyder: Capı́tulos 1 (Economic Models), 2 (Mathematics for Microeconomics)


e 3 (Preferences and Utility).

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