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problema seja solucionado em razão da verdade e legalidade.
Edição de Autor
Caio Victorino
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Dedico esse livro a pessoas de importância
inenarrável em minha vida, em minha fé e em toda
a trajetória que foi percorrida e alcançada até o
último minuto deste livro, que muito me deixa
orgulhoso e lisonjeado pela oportunidade de
aprendizado e sabedoria.
Aos meus queridos mais velhos na Religião de
Orisa e acadêmicos queridos: Mãe Stella de
Òsóòsì, Mãe Nitinha de Òsun, Mãe Tatá de Òsun,
Mãe Lídia de Oxaguian (Bahia), Mãe Meninazinha
de Òsun, Mãe Lúcia de Fátima de Òsun, Mãe
Índia do Bogum, Mãe Débora de Òsun, Pai Flávio
Monteiro de Oya, Pai Daniel Nepomuceno de
Obàtálá (Olufon), Pai Kilombo de Jagun, Pai Bobó
de Oya, Pai Toninho de Òsun (Ifadeyin - Egbá),
Pai Paulo Gazire de Òsóòsì, Tio Miguel Archanjo
de Aganjú, Pai Ubirajara Gomes (Bira de Sàngó),
Pai Alfredo Freire de Òsóòsì, Pai Wlamir Moita de
Obàtálá (Olufon), Pai Luis de Iyemojá (babakekere
do Opô Aganjú), Pierre Verger e Professor Agenor
Miranda.
Aos meus familiares: A minha avó materna Nair,
minha avó paterna Abigair, ao meu avô paterno
Edson, aos meus tios avós (que também foram e
serão sempre meus avós) Lucimar e Paulo, minha
irmã gêmea Camille, minha outra irmã, minha
tia-avó Dilma, ao meu padrinho Diogo, ao meu pai
biológico Márcio e mãe biológica Luanda.
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Sumário
● Dedicatória - 05
● Prefácio - 07
● Capítulo 01 - Òsun: A Mãe da Sabedoria - 08
● Capítulo 02 - A Importância Econômica de Òsun - 30
● Capítulo 03 - Òsun e o Ataojá: Entre o Àgògo e a Coroa - 47
● Capítulo 04 - Festival de Òsun Òsogbo - 54
● Capítulo 05 - Brasil na Nigéria ou Nigéria no Brasil? - 71
● Capítulo 06 - Brasil-Òyó-Òsogbo: As Casas de Òsun - 95
● Capítulo 07 - A Figura de Òsun na Luta Contra o Machismo - 121
● Fontes Bibliográficas - 130
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Prefácio
Esta obra foi idealizada em 2019, iniciada em 2019, mas pausada em tal ano
para que eu pudesse conciliar outras situações de minha vida, pois, por mais
que hoje em dia eu tenha o estudo como uma preferência e até mesmo a
prática do estudo, como um estilo de vida saudável e importante para nutrir
meu intelecto e enriquecer minh’alma, nem sempre foi assim, e para que
passasse a ser de tal forma, muitas situações tiveram de ser ajustadas e o ano
de 2019 foi o último ano de ajuste para que esse estilo de vida pudesse ser
adotado com mais seriedade e de forma mais confortável para mim.
O livro foi escrito sobre Òsun, e não para Òsun, pois creio que essa divindade
seja o princípio, meio e continuidade sem fim, do conhecimento, da sabedoria,
do amor, da fraternidade e da responsabilidade. Ela é a mãe responsável que
trabalha com duas mãos, o mesmo que duas mil mãos fariam e mesmo assim,
não teriam essa eficácia. Em 2016 (tinha 13 anos de idade) eu fui salvo por ela,
após ter tomado uma postura um tanto indevida e irresponsável. Minha mãe,
avó e irmã presenciaram tudo e são as maiores testemunhas de que a mãe da
água (cultuada na água doce, mas se for salgada, não deixará de ser água) foi
benevolente e que é uma das maiores protetoras das crianças e dos jovens.
Por respeito, amor, carinho e devoção a ela, inicio esse grande livro que talvez
tenha poucas páginas ou talvez tenha muitas, mas o importante é o
enriquecimento das pessoas, através de meus estudos, pesquisas e escritas de
cunho histórico, etnográfico e antropológico cultural.
Com o coração eternamente de luto pela perda de mãe Stella, mãe Nitinha,
Verger e seu Agenor, eu dou início a esse livro. Espero que gostem e
lembrem-se: Não existe verdade absoluta e não existe estudo que diga 100%
da realidade, ele sempre será guiado pela linha ideológica e de estudos do
autor ou da autora.
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Capítulo 01 - Òsun: A Mãe da Sabedoria
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de Igede (e também por ter sido um dos locais de origem mítica de Òrúnmìlà,
que segundo algumas narrativas, foi marido de Òsun). No ano de 2019, eu não
tinha o conhecimento que tenho hoje, mas admito que tudo é uma constante
evolução. Eu sempre afirmei sobre a origem ter sido Òsogbo por causa do
templo, mas isso é apenas um detalhe. Òsun esteve por tantos lugares, que se
eu quiser definir sua origem como todo o território de predominância
étnico-Yorùbá, eu posso definir sem problemas. Ela é adorada e possui devotos
em todos os locais, sendo assim, há Òsun em tudo e em todos. Não irei dizer
que há em outras pessoas de outras professam outra fé, por ter respeito a
divindade que eles atribuem cada situação e entre outras justificativas para a
vida. Um fato muito interessante nos dias atuais, é a discussão sobre de quem
Òsun “verdadeiramente” recebeu o oráculo de dezesseis búzios (Èrindílógún):
se foi de Òrúnmìlà, Obàtálá ou Èsù, só que como eu gosto de afirmar que não
existe verdade única, eu irei explanar para cada um de vocês, cada um dos três
Ìtàns de acordo com o meu aprendizado e com a oralidade que foi confiada a
mim - é claro. Acho interessante frisar de que, no Brasil, existe o Ìtàn sobre
bàbá Èsù ter sido o senhor que fez e motivou Òsun a cobrar a consulta
oracular, e isso é bastante interessante, pois ele aborda diferentes situações e
de tamanha complexidade, que serão analisados na hora de abordar tal ìtàn.
Nada mais que justo, né?
Está contido nos odù Òsétúrá e Ogbè'Òsá alguns ìtàns (mitos) que narram
sobre Òsun ter recebido o Èrindílógún de Òrúnmìlà, inclusive é dito por William
(BASCOM, 1980, Pág. 18 - 21) que todos os devotos de algumas divindades
como Sàngó, Oya e Òsun puderam aprender a divinação através de Òsun,
porque foi ela a responsável por aprender a arte da divinação com Òrúnmìlà,
após sua insaciável insistência e curiosidade. Òrúnmìlà foi o senhor escolhido
por Olódùmarè para ser seu porta-voz e a partir daí, todos que desejassem
falar com Olódùmarè, deveriam ir até Òrúnmìlà, pois Olódùmarè não se
comunica com os seres humanos, mas sim com os Orisas, para que eles
entreguem o recado de Olódùmarè (Afo - A voz de Olódùmarè) para nós, os
seres humanos. Naquele momento, apenas Òrúnmìlà era o responsável por
aproximar as pessoas de Olódùmarè. Isso se deve porque é narrado que
Olódùmarè criou 401 profissões e 401 filhos, sendo Òrúnmìlà um destes filhos,
mas por ele ser fraco e frágil, não havia se encaixado em nenhuma profissão.
Como havia uma profissão para cada filho, Olódùmarè questionou Òrúnmìlà
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sobre o que ele gostaria de ser, e foi aí que ele disse que seria um adivinho.
Olódùmarè o questionou, ele apresentou um fruto sagrado (Obi). Após tal
momento, Olódùmarè disse que todos que quisessem acessá-lo, deveriam
acessar Òrúnmìlà. Entregou a seu filho, uma espécie de sacola e disse que ele
deveria aprender a utilizar, pois além do Obi, essa sacola (pequena) seria um
outro oráculo para comunicação dos seres humanos para com Olódùmarè.
Deve ser embasado que segundo alguns ìtàns, era Olódùmarè quem realizava
consultas oraculares para as pessoas. Òrúnmìlà foi o primeiro Orisa
responsável por isso, após seu pai. Alguns até dizem que Igbakeji Olódùmarè (o
segundo após Olódùmarè) seria Òrúnmìlà por isso, pois ele é o mais próximo
de seu pai, por estes acontecimentos. Pelo fato da figura de Òsun ser atribuída
como esposa de Òrúnmìlà, ela é sempre cultuada ao seu lado, seu dia de
adoração é no mesmo que o dele (em algumas tradições) e os ritos tradicionais
para Òsun podem ser realizados através de Idafá (consulta ao oráculo Ifá).
Também deve ser lembrado que há oralidades que diz que Òsun foi a primeira
Ìyápẹ̀tẹ̀bí de Òrúnmìlà.
Como já narrei o ìtàn de Òsun com Òrúnmìlà no Ifá de rama nigeriana,
agora irei narrar o ìtàn de Òsun com Òrúnmìlà no Ifá de rama cubana. Ifá,
embora seja um, a rama de Ifá da Nigéria é muito diferente da de Cuba, ainda
mais no que tange a homossexualidade, contos e cultos. Na rama cubana, um
homem gay não pode e não deve ser babalawo, é recomendado de que cultue
Lògúnède (por ìtàns dele que justifique sua homossexualidade na concepção
existente entre os cubanos) e entre outras interdições que existem, além do
uso de determinados símbolos de culto e também um fato muito interessante,
é que em determinadas famílias, um babalawo não pode ser babalOrisa, pois
uma babalawo não deve entrar em transe com nenhuma divindade - isso com
os babalawos de diferentes tradições, que foram consultados pelo autor. No
Ifá de rama nigeriana, embora alguns tentem justificar que a
homossexualidade não é permitido, são acusações que vêm sendo provadas
serem infundadas e mostram que versos de Odù Ifá foram deturpados para ir
contra a homossexualidade e entre outros. Um babalawo pode ser
homossexual, mas desde que o homossexual tenha ìwà rere (bom caráter) -
assim como um heterosexual - e tenha conhecimento o suficiente e necessário
para exercer o sacerdócio que exige um tanto de conhecimento sobre os Ebo
que são recomendados pelos Odù Ifá. Qual rama está certa? ambas! e se
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houver uma terceira, ela também estará certa. Cada um está certo dentro de
sua razão e para seus seguidores. O que para um é tabu, para outro não será e
está tudo bem. O que não pode e não deve, é um tentar desmentir o outro e
tentar seguir o que uma tradição e rama diferente da que é professada por ele,
prega. Segue o ìtàn de Òsun e Orula que eu aprendi com sacerdotes de Ifá
cubano:
Havia uma moça muito atraente e bela na região de Òsogbo que encantou
muitos homens, inclusive sempre que saía às ruas, muitas pessoas ficavam
admiradas e boquiabertas com tamanha beleza que esbanjava a senhora que
tinha uma grande relevância para tal povo. Quando ela nasceu, nem seu pai
e/ou sua mãe, permitiu que ela soubesse o próprio nome (encontrei variações:
alguns dizem que ela sabia o próprio nome). Apenas eles sabiam, pois seu
noivo teria que descobrir o seu nome. Muitos homens tentaram se noivar com
ela, mas nenhum conseguia descobrir o seu nome e isso acabava fomentando
uma maior disputa entre eles, além de curiosidade, pois queriam descobrir o
nome para que não dessem oportunidade para ela se casar com algum deles e
pelo fato de ser algo de tamanha curiosidade. Havia um senhor muito sábio
conhecido como Orula (Òrúnmìlà), que têm, por sua vez, como amigo, uma
divindade denominada de Eleguá, o senhor que conhece todo mundo e todo o
mundo, pois é ele o grande comunicador e responsável por levar e trazer
recados - é tão importante entre os cubanos, que durante as iniciações de Ifá
em algumas famílias, um neófito recebe um local de culto a Elegguá,
justamente por ele desempenhar tal papel. Entre os da rama nigeriana, eu
pude encontrar muitas variações, inclusive famílias que me disseram que a
pessoa precisava ter um odù que falasse sobre a possibilidade de ter essa
divindade em um local de adoração. Orula, muito interessado em descobrir o
nome da bela moça para que pudesse se casar com ela, procurou Eleguá e
pediu para que ele, a divindade responsável pela comunicação, conhecimento
e até por truculências, descobrisse o nome daquela jovem encantadora. Em
dados momentos, Eleguá se apresentava como menino, outrora como jovem, e
até mesmo como idoso, mas sempre se manteve perto da jovem moça, para
que descobrisse seu nome. Até que um dia estava escondido do lado de fora
de sua casa e ouviu sua mãe exclamar por ela em voz alta. Rapidamente foi até
seu amigo Orula e revelou o nome da moça. Eleguá agradeceu e se dirigiu
rapidamente até o local em que se encontrava a jovem e sua mãe. Ao chegar
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lá, a cumprimentou e disse seu nome. Òsun se casou com Orula e se tornou
uma pessoa de tamanha importância para seus seguidores, devotos e
conhecedores da sabedoria deste grande senhor. Eles possuem um objeto de
culto chamado “Ozun” (Òsun), que é considerado para muitos, como um Orisa,
porque salvou a vida de Orula. Alguns narram que Ozun não é Òsun, outros
narram que é.
Obàtálá é conhecido também como Bàbá Arúgbó, um título que confere e
confirma a sua antiguidade, que acarreta toda sua sabedoria, seu poder e
conhecimento, inclusive, testemunho sobre a criação. Foi ele o responsável por
moldar os seres humanos (segundo oralidade de Ilé-Ifè, Òyó, Òsogbo e Ìbàdàn
consultadas pelo autor ao longo dos anos de 2018 a 2020, em suas pesquisas
sobre Obàtálá e demais Orisa). Se há um assunto que, infelizmente, causa
discórdia e desentendimento entre devotos de Ifá com devotos de muitos
Orisa que não estão ligados a Ifá (entende-se todos os Orisa, exceto Òrúnmìlà)
por iniciação e entre outros, é o fato de que Obàtálá é o Orisa que participou
(logo, se participou, testemunhou) da criação do ser humano e também do
aye, junto de outros Orisa. Na fase primordial, que é a criação do ser humano,
encontramos a participação de três Orisa: Elédùmarè, Ajala e Obàtálá, já na
criação do aye, encontramos todos os Orisa desempenhando seus respectivos
papéis para o desenvolvimento do mundo e para a orientação de seus devotos.
A cooperativa de Oloyes do Aláàfin Òyó, denominada de “Àsà Orisa Aláàfin Òyó
Èsìn Orisa Ìbílè” esteve em Òsogbo no ano de 2016, representado pela
Embaixadora Cultural (não confundamos “embaixatriz” que é a esposa do
embaixador) do Aláàfin Òyó e que está em terras Yorùbás há mais de 20 anos,
esteve em Òsogbo para consultar um dos principais sacerdotes de Òsun, afim
de relatar a realidade da oralidade que foi recebida por ele e muitos outros
sacerdotes de Orisa (que não sejam de Òrúnmìlà). Segundo o sacerdote de
Òsun (Òsunkolade Olayiwola Olósun), o Orisa que ele é sacerdote, utiliza Obi e
também o Èrindílógún que foi recebido através de Obàtálá, que é o
responsável por ter recebido o oráculo e ter repassado aos Orisa que deveriam
possuir o oráculo. Obàtálá é o mais antigo Orisa e que Obàtálá foi o
responsável por liderar a vinda dos Orisa para o aye. O poder de Òsun foi dado
por Olódùmarè, a sua sabedoria e seu domínio sobre um dos oráculos mais
antigos foi dado por Olódùmarè e como dentro da cultura Yorùbá há sempre o
respeito aos mais velhos, quem entregou o oráculo para Òsun foi Obàtálá. O
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irmão de Òsunkolade é bàbá Adigun Olósun, que estava até um acontecimento
que será explicado mais à frente, no lugar de seu pai, que era o principal
sacerdote de Òsun.
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Fotografia 02- Resumo do Odù Òfún.
Fonte: “Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da Internet.
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Fotografia 03 - Fala de nativo de Òsogbo sobre Òsun.
Fonte: Ifatola Sàngódare Awosipe - Página da Internet.
Agora irei relatar o mito sobre o oráculo ter sido repassado para Òsun por
Orisa Èsù, o senhor da comunicação e da cordialidade. Ele é capaz de causar
desordem e também a ordem. Èsù transita entre os dois pólos do mundo, sem
alterar a sua natureza e/ou caráter. O ìtàn que será repassado aqui, é como
segundo consta a oralidade que recebi dentro da Religião de Orisa do Brasil,
com uma velha senhora que me remete a boas memórias afetivas sobre tudo o
que vivenciei.
Òsun sempre foi uma senhora mais interessada e entusiasmada para o
conhecimento, inclusive suas filhas acabam herdando este belo dom que
alguns denominam até como alguém “curioso(a)”. É narrado que Èsù era o
senhor que possuía o conhecimento sobre o oráculo dos dezesseis búzios (Owó
Eyo), mas não queria ensinar para Òsun, a arte do conhecimento e
interpretação da voz de Olódùmarè, então se retirou da companhia de Òsun e
migrou para Ijelu Ekiti (sua terra, onde inclusive existe descendentes de tal
Orisa - a família real de Ijelu). Òsun, ao descobrir onde ele estava, foi atrás
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dele. Quando ainda estava no caminho para alcançar a sua casa, ele apareceu e
questionou a ela o porquê dela estar ali, uma vez que ele não iria repassar
nada a ela, mesmo que ela insistisse e recomendou que ela retornasse para
seu lar (Òsogbo). Como uma senhora que dominava de conhecimentos para
ludibriar pessoas, o desafiou a descobrir o que estava por trás de seus dedos.
Quando Èsù se agacha, ela sopra um pó sobre seus olhos, que o causou
cegueira e também ardência. Èsù começou a reclamar de desconforto nos
olhos e sobre a cegueira e também questionou sobre onde estavam seus
búzios, Òsun, astuciosa, exclama que encontrou um, depois outro e assim
segue pela linha de raciocínio. Èsù então ia respondendo a cada búzio que ela
dizia que encontrava, sendo eles (os dezesseis): 1°) Okanran, 2°) Ejioko, 3°)
Ogunda, 4°) IrÒsun, 5°) Ose e assim por diante. Olódùmarè viu a sua sapiência
e a presenteou então, com o direito sobre o oráculo, para que ela dividisse o
dom com Èsù - que deveria ser seu mestre e professor.
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Fotografia 05 - Bàbá Flávio de Oya com Elejelu (rei de Ijelu) - 2017.
Fonte: Flávio Monteiro - Página da Internet.
Um tempo após, Òsun retorna para a casa de Èsù, mas como ele é esperto
e viu a traquinagem de Òsun, logo disse a ela que só a ensinaria os segredos se
tivesse disponibilidade de se submeter aos domínios dele por sete anos, e que
se não fosse nessas condições, não haveria outra chance de repassar o
conhecimento para ela. Ela aceitou e durante todos os sete anos de serventia à
Èsù e também de aprendizado sobre o oráculo, ela seguiu aprendendo. Após
os sete anos de convívio diário, eles acabaram criando uma relação muito
próxima e também um início de romance. Òsun, por isso, decidiu ir viver ao
lado de Èsù. Um certo dia, o grande Aláàfin Òyó (Sàngó) passa pela residência
de Èsù, quando estava indo para um mercado mais distante de Òyó e se
depara com a bela dama. Rapidamente se apaixona, pois era uma mulher
muito linda, bela e apaixonante. Sem perder tempo, convida Òsun para ir ao
seu palácio (Ààfin - Ùgà) e se tornar sua esposa (Olorì - mulher do palácio real).
A senhora que estava feliz e contente com a companhia de Èsù disse para
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Sàngó que não aceitaria o convite dele, e ao se ver contrariado (Sàngó detesta
ser contrariado, e isso se deve ao costume de que um rei jamais deve ser
contrariado), sequestra Òsun para seu palácio em Òyó. Rapidamente, após o
acontecido, Èsù sente a falta de Òsun e ao não encontrá-la em seu palácio,
começa a procurá-la por todos os quatro cantos. Ao chegar em Òyó, escuta um
triste canto e comentários vindo de uma prisioneira de um calabouço no
palácio do rei. Rapidamente se dirige ao local - com esperança de que seja a
sua companheira - e se depara com Òsun retida no calabouço. Èsù consultou
um grande sábio e este lhe entregou um feitiço para que Òsun tomasse, para
se livrasse da prisão e do amor de Sàngó. Quando Òsun conseguiu que o feitiço
chegasse até si mesma, ingeriu e rapidamente se transformou em um lindo
pássaro que voou até a casa de Èsù e por lá permaneceu.
Lendas coletadas da oralidade de fontes orais do autor, e na mesma forma
foram colocadas aqui. Pode-se observar que em todos os momentos, Òsun é
colocada como uma mulher sábia, esperta, persistente e guerreira. Luta por
seus desejos e por seus princípios. Quem é Òsun? Não sei, também estou
tentando descobrir diariamente desde 2019, quando comecei a estudar mais
profundamente a grande mãe e amiga de Obàtálá.
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Uma das pessoas que está na dedicatória deste livro (Bàbá Flávio Monteiro
de Iyansan) teve a benevolência de me narrar no ano de 2019, um lindo ìtàn
sobre a guerra de Òsun e Obà que ele aprendeu durante sua estadia em Òyó
no ano de 2017. Este é um ìtàn muito pouco difundido, mas espero que a partir
de agora, comecem a difundir pela diáspora, pois é bastante interessante. O
ìtàn de Obà ter colocado a orelha na sopa, têm sua origem no Lukumí (uma das
Religiões de Orisa de Cuba), enquanto a versão que fala da guerra, têm a sua
origem na Religião de Orisa de terras Yorùbás. É narrado pela oralidade, que
Obà é um Orisa que utiliza vestes brancas (Aso funfun), têm tabu com epo
pupa e vinho de palma, pois é descendente de Olufon (Senhor de Ifon - filho de
Obàtálá). Obà é um dos Orisa que esteve presente na criação do aye e
retornou para o Òrun com os demais, porém, teve uma descendente que
carregava tanto Àse (força, poder) que foi considerada a personificação de Obà
e é considerada até hoje. Seu nome completo era Àsàbó Eléèkó Obà (Axabô
Elekô Obà - como alguns chamam na Religião de Orisa de nosso país. Abaixo
estará a da Religião de Orisa de terras Yorùbás), a primeira e mais velha esposa
de Sàngó. Dividia seu amor com outras quatro mulheres (sendo outras duas, as
mais conhecidas: Òsun e Oya). É lembrado com muita tristeza pelos devotos de
Obà, que durante uma guerra que houve entre ela e Òsun, uma orelha foi
arrancada. Após tamanha mágoa (raiva e também tristeza - acredito) ela se
transformou em um rio que cerca sua comunidade perto de Òyó-Ilé (o antigo
território de Òyó que ainda faz parte, mas não é onde está instalado o atual
governo).
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Fotografia 07 - Entrada de um vilarejo de Obà em 2019.
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da Internet.
Fotografia 08 - Odò Obà (Rio Obà) em 2019.
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da Internet.
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Fotografia 09 - Um dos principais locais de culto a Obà em 2019.
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da Internet.
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Fotografia 10 - Local de culto a Obà em 2020.
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da Internet.
Agora irei adicionar neste parágrafo e em outros que podem surgir após
esses, o aprendizado que obtive nos vídeos do Asa Orisa em uma plataforma
digital. O Asa Orisa têm gravado vídeos e gravaram vídeos que estão
registrados em uma plataforma digital, através de uma grandiosa embaixadora
cultural, Doutora Paula Cristina Gomes, pessoa que orienta e bem recebe
brasileiros (e estrangeiros de forma geral) em terras Yorùbás. De antemão, já
agradeço a colaboração de doutora Paula para todos nós do Brasil. Segundo o
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nativo entrevistado em um primeiro momento por doutora Paula (Obàdaiisi),
Obà também era conhecida como Obà Àsàbó Eléèkó (Obà Assabó Elekô - como
chamam na Religião de Orisa de terras Yorùbás), descendente do filho de
Obàtálá (Olufon, o filho primogênito de Obàtálá). Os devotos de Obà também
narram que vêm de ògbóró e o descendente (filha) Olufon recebe o nome
completo de Angberi Olufon. Sua briga com Òsun resultou no corte de uma das
orelhas e que, por sua tristeza, virou um rio. Os nativos entrevistados são tanto
de Obà quanto por descendência paterna, quanto materna. O rio de Obà é um
tanto perigoso para os que não são filhos de Obà, pois diz que os que são filhos
de Obà, ela não os leva, mas se não for, ela os leva e a pessoa morre. O festival
de Obà ocorre quando a água do rio baixa em demasia, para que permita que
os estranhos atravessem o rio sem serem mortos e que diariamente se têm o
costume de alguns anciãos ofertarem Obí para ela em um de seus principais
locais de culto (nas fotos: 08, 09 e 10 - O rio é um local de culto importante em
demasia, pois ali está ela). Obà não se alimenta de óleo de palma e nem com
algo que tenha álcool, gosta de Egbò funfun. Obà utiliza apenas branco por sua
influência familiar e seus devotos utilizam branco como uma forma de agrado
a tal divindade. Ela também utiliza alguns objetos que são utilizados por
Obàtálá. Sendo alguns deles: Agadá (fotografia 11 e 12 - que possui seis
pontas, fazendo alusão aos seis cortes tribais feitos também pelos
descendentes do Aláàfin. Uma das provas do pertencimento de tal
comunidade ao Aláàfin), Opa Yemoo (a esposa de Obàtálá, avó de Obà - que
também possui seis espécies de “argolas” que justificam o pertencimento ao
Aláàfin), um outro tipo de Agadá (este, por sua vez, vai com eles até o rio e são
banhados pelo sangue da cabra sacrificada para tal Orisa e depois retorna para
o templo, como uma prova de realização de sacrifícios para Obà). Os agadás
eram instrumentos de Obà para luta e se realizarem cortes em alguém e o
sangue deste alguém pegar no agadá, ela irá morrer, pois Obà irá atrás. É por
esse motivo, que o sangue da cabra é despejado por cima de tal agadá. Obí
gbanjá (com dois gomos) é o Obí utilizado para consultar Obà, uma vez que ela
não use oráculo de búzios. Obà não se iniciou em Ifá e não teve passagem por
Ifá. Seus sacerdotes não são babalawos - assim afirmam os nativos.
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Fotografia 11 - Agadá Obà (não é o do sacrifício da cabra).
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da internet.
Fotografia 12 - Agadá Obà e suas seis pontas (não é o do sacrifício da cabra).
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da internet.
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Fotografia 13 - Opá Yemoo - Objeto importante de culto a Yemoo.
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da internet.
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Fotografia 15 - Agadá Obà (esse é o do sacrifício da cabra).
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da internet.
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Fotografia 16 - Agadá Obà (esse é o do sacrifício da cabra).
Fonte: Àsà Orisa Aláàfin Òyó Èsìn Orisa Ìbílè - Página da internet.
Após ter falado sobre Òsun e Obà, que é um tema bastante importante e
que deve ser ressaltado neste livro, irei agora falar sobre Òsun em Ilé-Ifè, no
principal templo de Obàtálá. Alguns podem não acreditar em tal fato
apresentado logo no início do parágrafo, mas outros podem acreditar e sem se
surpreender, pois Òsun é uma divindade importante para Obàtálá e ele
também é importante para ela. Como poderíamos ignorar o culto de uma
divindade tão importante na ritualística, se na litúrgica, cumpre importantes
papéis. Contraditório seria. Em Ilé-Ifè dentro do templo de Obàtálá existe um
local bem no centro do templo, que possui água inesgotável e ele se chama
“Òsun Kogbe” (que significa literalmente: “Òsun que nunca seca”). Por lá ser
um templo de extensão totalmente notória, tanto para área interna, quanto
para área externa, muitos Orisa possuem local de culto (Ojúbo) por lá, inclusive
Òsun, Òsóòsì e Obalúayé (que segundo a oralidade dos nativos do templo: foi
um dos filhos de Obàtálá). Òsun recebeu o oráculo de Obàtálá, é a senhora que
também usa branco em reverência a Obàtálá (o mais antigo Orisa), assim como
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diversos Orisa também usam. Em Ilé-Ifè também existe um templo de Òsun
chamado “Itá Òsun”, que é um templo muito bonito, mas que infelizmente não
tenho fotografias para disponibilizar aos meus leitores.
28
Fotografia 18 - Posicionamento de Òsun Kogbe.
Fonte: Obà Alamo - Acervo Pessoal.
29
Capítulo 02 - A Importância Econômica de Òsun
30
introduzir cada leitor a algo chamado “Fatores do Desenvolvimento
Econômico”, que é a compreensão de unicidade de cada fator econômico, que
irá resultar em uma queda no desenvolvimento ou em crescimento. Há um
ramo da economia que estuda isso - Economia Política. É necessário introduzir
o leitor a estes temas, para que possa entrar no atual cenário da Nigéria,
evitando cometer o maior número de equívocos possíveis (mesmo sendo
sabido que é um jovem com dezesseis/dezessete anos de vida quem está
escrevendo este livro, e que não possui qualquer conhecimento universitário
até o dado momento de escrita e produção).
É preciso compreender que o desenvolvimento econômico ocorre através
do processo de acompanhamento e/ou pareamento como tentativa de
aproximação econômica de diversos países dentro de um contexto global,
sendo assim, o desenvolvimento econômico não é um processo que ocorre
internamente dentro de qualquer território, mas sim, globalmente. A
economia somente conseguirá avançar após uma excelente combinação entre
a mão de obra (base de qualquer indústria) e capital (soma de riquezas ou
recursos acumulados que serão destinados à produção de novas riquezas). Um
país só conseguirá se desenvolver economicamente através da boa qualidade
de ensino e também através das novas descobertas (o que chamamos de
“inovações”) que rEsulta em novas formas de produção (capital - mão de obra).
Dentro da Nigéria tivemos uma série de fatores ocorridos - em sua maioria -
por conflitos étnicos extensos entre os yorùbás e igbos e também, na
atualidade, entre os yorùbás e fulanis, além de outros conflitos étnicos
ocorridos naquele local. Os conflitos étnicos africanos são um tanto perigosos
pela forma de organização de cada etnia, pelo costume e cultura que eles
desempenham dentro de um território, além de sua influência (que vai de
acordo com o número de nativos que se reconhecem como da etnia) dentro
dele. Sendo a economia da Nigéria, uma das maiores do continente africano e
uma das menores a nível global, muitas conclusões podemos tirar, inclusive a
dependência deles, com relação ao consumo e estadia de indústrias
estrangeiras no território, com a razão de movimentação na economia do país
(que é precária). Dentro dele, a etnia yorùbá desenvolve praticamente uma
espécie de monocultura, onde temos o Yam (Inhame) como base alimentícia
de tal etnia e das divindades cultuadas por eles (Orisas) e podemos observar
um grande uso de milho branco (para Egbò funfun e outras receitas
31
tradicionais), milho amarelo (pude observar que inclusive o Ooni de Ilé-Ifè é
um grande incentivador do cultivo deste, junto do Yan) e feijão fradinho, o que
implica em uma diversidade atraente para o mercado consumidor externo. O
racismo estrutural também pode ser colocado como um dos fatores que
impossibilitam o desenvolvimento econômico do continente, não podendo ser
desconsiderado em hipótese alguma. Uma importante tese levantada por Luiz
Carlos (BRESSER-PEREIRA, 2006, Pág. 02): “Quando uma economia está em
pleno processo de crescimento é sinal de que existe uma estratégia nacional
de desenvolvimento, que seu governo, seus empresários, técnicos e
trabalhadores estão trabalhando de forma concertada na competição
econômica com as demais nações. Quando uma economia começa a crescer
muito lentamente, senão a estagnar, é sinal de que sua solidariedade interna
está em crise [...] No processo de construção da nação e de promoção do
desenvolvimento, capitalistas, classe média profissional e trabalhadores, ricos
e pobres, direita e esquerda, conservadores e progressistas estão em
permanente conflito, e, ao mesmo tempo, em permanente cooperação porque
é essa solidariedade que define uma nação. A experiência histórica demonstra
que para que um país possa se desenvolver, para que possa haver uma
estratégia nacional de desenvolvimento, é essencial um grande acordo entre
as classes...” Essa fala levantada e muito bem observada por Bresser-Pereira
(2006), nos leva a conclusão sobre o que foi falado antes, no que tange ao
desenvolvimento econômico não ser algo interno, mas sim, externo. Há
diversos casos de crescimento de específicos setores comerciais internos
entrarem em crescimento e o país terminar o ano sem crescimento, pois
enquanto um cresceu (expandiu), o outro retraiu. É por isso que o autor fala
sobre o trabalho de governadores, empresários, técnicos e trabalhadores, de
forma concertada (que permite a conclusão de ser algo no sentido de
cooperação, para que não enfraqueça um lado da economia e fortaleça outra,
mas sim, para que haja equilíbrio).
Infelizmente a economia nigeriana é uma apresenta uma vulnerabilidade
em um maior potencial, se comparada com outras economias - e isso se deve
ao fato de sua respectiva dependência do interesse e instalação de indústrias
petrolíferas e também as indústrias interessadas na extração e comercialização
de gás natural, principalmente pelo tamanho das reservas existentes na
Nigéria, que reservam grandes quantitativos destas matérias primas. Antes de
32
dar início e desenvolver minha pesquisa sobre, eu gostaria de dizer que a
extração de petróleo e de gás natural são processos totalmente nocivos à
natureza, principalmente na Nigéria, um país onde poucas autoridades
mundiais sinalizam preocupação e é o lugar onde as leis ambientais são
flexibilizadas para a instalação das indústrias. Precisa-se fazer uma análise -
desde já - sobre o crescimento do consumo do petróleo e alta extração de tal
bem natural da Nigéria, mas todavia, os investimentos do governo no próprio
desenvolvimento de sua população, não ocorre e não tem ocorrido. Sempre
que formos falar da economia da Nigéria, devemos falar sobre Petróleo e Gás
Natural, pelo motivo de serem grandes bases da economia do país e também
do próprio continente selecionado para ser o fornecedor de gás e petróleo
(resumindo: energia) para o mundo. A entrada de empresas petrolíferas têm
gerado muita lucratividade e isso está corroborando para com o maior
crescimento de capital acumulado (ou disperso, uma vez que não se tenha
conhecimento sobre o destino desse… Alguma empresa?) em muitos países. A
Nigéria está sendo governada por um presidente, cuja etnia é rival dos yorùbás
(fulani) e isso vem ocasionando cada vez mais a morte de yorùbás e também a
grande taxa de violência. Por este motivo, os yorùbás estão com um
movimento separatista (Odùduwà Republic - República de Odudua) e também
com um projeto que visa a defesa e maior proteção do grupo étnico
(Àmòtékùn).
Os países que carregam uma grande dependência econômica da extração
de petróleo e gás natural, apresentam governos com governança inferior aos
demais que não apresentam dependência econômica da extração de tais
produtos energéticos. O desenvolvimento de um país depende da forma que o
governo administra suas riquezas naturais que, certamente, irão garantir o seu
desenvolvimento a mais longo prazo, como bem observa Igor (COSTA, 2013,
Pág. 13): “É importante ressaltar, no entanto, que as economias dos diversos
petro-Estados reagem aos impactos de suas extrações de maneiras distintas.
Alguns tiveram melhor desempenho do que outros na administração de suas
riquezas naturais e, portanto, em seu desenvolvimento econômico a longo
prazo…”, além de ter que ser observado que a renda per capita (indicador de
desenvolvimento econômico de um país ou de uma determinada região) da
Nigéria e da Indonésia possuíam bastante similaridades há praticamente 37
anos atrás (aproximadamente). Devido a uma melhor administração no
33
governo indonésio (ásia), o país apresenta uma renda muito maior do que a da
Nigéria. Para concluir esta parte e poder entrar em falas sobre a crescente
atração de turistas em Òsogbo, eu gostaria de ressaltar uma outra fala de Igor
(COSTA, 2013, Pág. 15): “Sustentabilidade é um conceito que por definição
possui uma dimensão de durabilidade e estabilidade a longo prazo. É a
capacidade de administrar a economia de forma que as gerações futuras
possam ter padrões de qualidade de vida no mínimo iguais aos de hoje em dia.
Isso depende da capacidade das economias atuais proverem os aspectos
supracitados necessários para a perpetuação do bem-estar social, bem como
do uso consciente dos recursos naturais e das condições de meio ambiente…”,
além de desejar ressaltar aqui, que a economia de um país só poderá crescer e
se manter em estabilidade, se houver notável investimento na área da
educação, que é um dos fatores de importância para o desenvolvimento da
população. Atualmente, a população da Nigéria encontra-se em um estado de
Subdesenvolvimento.
Òsogbo, assim como Òyó e Ilé-Ifè, é um local que passa por uma duradoura
ascensão de visita e recebimento de estrangeiros interessados em conhecer a
cultura local e também a Religião de Orisa existente em tal região. Òsogbo é
um local que foi potencializado por uma senhora chamada Susanne Wenger,
Òyó é um local que está sendo potencializado por uma senhora chamada Paula
Cristina Gomes e Ilé-Ifè possui o próprio Ooni (rei) que supre o papel de um
grande difusor de sua cultura e Religião. Tem até uma equipe responsável por
ele no Brasil (situado no Rio de Janeiro) e muito mais. Quando eu falo sobre
potencialização, não estou me referindo a situação delas estarem fazendo mais
que os negros e nem menos que eles, mas sim, que estão utilizando sua
formação acadêmica (um dos privilégios), para ajudar a inserir os negros no
novo mundo. O novo mundo que bate às portas de cada pessoa e,
principalmente, na deles, com uma crueldade maior ainda - o que também é
assustador. Em Òsogbo tivemos Susanne Wenger (conhecida também como
Adunni OlOrisa), uma austríaca nascida no ano de 1905, em Graz – a segunda
maior cidade da Áustria -, tendo como sua nacionalidade, austríaca. Obteve
formação Escola de Artes de Graz, depois foi até Viena, onde conquistou sua
formação no Instituto Federal de Formação e Pesquisa de Artes Gráficas,
tendo, entre os anos de 1933 e 1935, sua formação na Academia de Belas
Artes e também muito conhecida por sua alta criatividade para criações
34
artísticas. Sua presença em Òsogbo foi totalmente notável, pois se dirigiu a tal
local para corroborar para com a melhoria do bosque sagrado, adicionar alguns
detalhes e por tamanho encanto e paixão, permaneceu por lá até o fim de sua
vida. Foi uma senhora muito respeitada e muito amada (até os dias de hoje)
por nativos de Òsogbo. Doutora Paula a conheceu e elas tiveram certa
proximidade. Doutora Paula, por sua vez, uma senhora nascida no ano de
1976, formada em uma universidade não africana (assim como Adunni) e que
foi instalada pelo Aláàfin Òyó como embaixadora cultural. Sua presença é
fundamental e necessária nos dias atuais, para a resistência da Religião de
Orisa de terras Yorùbás, principalmente em Òyó, devido a um agressivo avanço
de Ifá, que tem corroborado por parte de muitos, para com a perda da prática
do Èrindílógún e entre outros fatores, inclusive a presença do Islam e
Cristianismo. Assim como Susanne, seu foco é a restauração de locais que
foram destruídos pela má preservação, é incentivar o crescimento do grupo
étnico yorùbá e também incentivar a preservação da afro religiosidade. É uma
senhora que nasceu na Europa, em Portugal.
Susanne Wenger construiu belas estátuas em Òsogbo e que já foram vistas
por muita gente na internet (virtualmente, forma não física) e também
pessoalmente (de forma física). A Fundação de Susanne Wenger ainda apoia e
incentiva a preservação e mantimento das esculturas do bosque sagrado que
foi construído com a ajuda de Adunni e também com a de nativos que
passaram a prestigiar a arte e se dedicaram a isso. Sua casa, local em que é
narrado sobre ter sido o seu local de falecimento, é um dos maiores pontos
turísticos de Òsogbo, assim como as esculturas. Ela incentivou o turismo,
desenvolvimento e crescimento da população de Òsogbo. Foi um trabalho e
trajetória linda, mas pouco popularizada no Brasil - infelizmente.
35
Fotografia 19 - Casa de Susanne Wenger, visão externa.
Fonte: Susanne Wenger Adunni OlOrisa Thrust - Página da Internet.
36
Fotografia 20 - Tambores tradicionais de ritos que eram e ainda são
realizados na casa de Susanne.
Fonte: Susanne Wenger Adunni OlOrisa Thrust - Página da Internet.
37
Fotografia 21 - Susanne Wenger em Òsogbo, perto da estátua Iya Moopo.
Fonte: Susanne Wenger Adunni OlOrisa Thrust - Página da Internet.
38
operem somente nativos de lá, mas sim, de outros locais do território que eu
chamo de “terras Yorùbás”. Veio ao Brasil e acompanhou o Aláàfin Òyó
durante sua caminhada e trajetória de visita a templos da Religião de Orisa de
nosso país, sendo alguns deles: Ìyá Násò Oká, Òpó Àfònjá e Gantois. É
fundadora de uma fundação que incentiva a cultura étnico-yorùbá e também
faz parte de grandes avanços e conquistas de tal povo.
39
Fotografia 23 - Doutora Paula em Òyó.
Fonte: Paula Cristina Gomes - Página da Internet.
40
Fotografia 24 - Doutora Paula ao lado do Aláàfin.
Fonte: Paula Cristina Gomes - Página da Internet.
41
Durante a entrevista do Sr. Honorável Comissário de Cultura e Turismo de
Òsogbo (Dr. Adebisi Obawale) para o grupo de televisão que eu me orgulho de
fazer parte (Adúláwo TV), tal senhor, como um bom apoiador e incentivador da
cultura e também do turismo (inclusive, segundo moradores locais, ele vem
realizando um bom trabalho em prol da preservação da cultura, incentivando
também o comércio da região), estimulou o povo yorùbá a se orgulhar mais de
sua cultura (Orisa) e falou sobre o uso de trajes tradicionais étnicos que estão
presentes em Igrejas e Mesquitas por tal região, dizendo: “(...) Estão vestindo
uma camisa que não faz parte da nossa Cultura e que é um estilo emprestado.
Então, se a Igreja e a Mesquita estão cantando canções iorubás e eles estão
usando trajes yorubás, esse deve ser o nosso orgulho e é assim que eu vejo
isso.” - tal fala foi realizada após comentar e argumentar sobre a admiração e o
respeito que os países ocidentais possuem pela cultura deles. A roupa deles é
propícia de tal cultura, o dialeto também, as músicas e comportamentos
também, sendo assim, esses são alguns dos fatores que fazem parte e estão
inclusos dentro do conceito de cultura. Falou sobre o quantitativo
relativamente alto (50 milhões) de Yorùbás que estão presentes no sudoeste
da Nigéria. Falou sobre a reafirmação da identidade e cultura, no sentido de
que muitos yorùbás quando viajam para fora do país, principalmente para
alguns locais no ocidente, tendem a vestir roupas pertencentes aos padrões
ocidentais. Condenou essa atitude e falou que devem se orgulhar de quem são,
do que eles têm e que devem utilizar as roupas deles mesmo fora do território
nacional. Falou sobre seus planejamentos com relação às interações
internacionais e se mostrou alguém um tanto motivado em incentivar a cultura
e o turismo (que, principalmente, está ligado ao comércio).
42
Fotografia 26 - Dr. Obawale (com vestes tradicionais) e Olusegun Daramola, o diretor
executivo da Adúláwo TV (com a blusa da Adulawo no corpo).
Fonte: Site Bona Naija - Página da Internet.
43
estados deveriam adotar, pois assim iriam incentivar o respeito e o orgulho de
pertencer a uma religiosidade. Assim como tal governante desempenha um
bom trabalho no estado de Òsun, o Aláàfin Òyó desempenha um trabalho
muito bonito e interessante em prol dos adoradores e devotos tradicionais
(adeptos da Religião de Orisa de terras Yorùbás). O Aláàfin, inclusive, pune
pessoas que praticam e cometem charlatanismo ou se aproveitam da fé do
outro, para golpear este alguém. Dentro da Nigéria, todos os trabalhos de
preservação e incentivo ao mantimento da Religião (que está atrelada a
cultura) são paralelos em constantes variáveis, mas que deveriam ser adotados
por mais pessoas.
Fotografia 28 - Participação de Dr. Obawale em outro noticiário sobre Isese Day (uma
momento muito importante para os devotos de Orisa em terras Yorùbás).
Fonte: Jornal Independent NG - Página da Internet.
44
Fotografia 29 - Manchete de um dos principais noticiários da Nigéria,
falando sobre Dr. Obawale.
Fonte: Jornal The Guardians NG - Página da Internet.
45
Fotografia 30 - Manchete de um noticiário da Nigéria falando sobre um dos motivos para
decretar tal data e também sobre Dr. Obawale.
Fonte: Jornal True News NG - Página da Internet.
46
Capítulo 03 - Òsun e o Ataojá: Entre o Àgògo e a Coroa
47
normal vermos, geralmente, um Arugba entrar em transe com Orisa (um
acontecimento quase que bastante comum de ser visto e observado).
Em Òsogbo, a atual linhagem de sacerdotes do templo de Òsogbo, está
ligada a linhagem dos primeiros sacerdotes do templo. Toda a ancestralidade
do templo admite alguma ligação no grau de parentesco. A legítima
sacerdotisa do templo se chama Ìyá Adesiyan Olayiwola Olósun e o sacerdote
se chama Bàbá Adigun Olayiwola Olósun. Ambos são Àrólé (herdeiros) dos
antigos sacerdotes e sua entrada no templo como principais sacerdotes do
templo não foi decidida pelo Ataojá (Obà Jimoh Abidemi Olanipekun, Laroye II),
pois ele não pode e não deve interferir em nenhum exercício, rito ou prática
tradicional do templo de Òsun. Infelizmente, com o passar do tempo, foi
notada uma intromissão por parte do Ataojá (rei tradicional de Òsogbo) que
gerou uma onda de desentendimentos com uma das mais antigas famílias de
Òsun do mundo, onde bàbá Olósun afirma que o rei começou a interferir no
templo por interesses comerciais e garante que isso é um grande tabu. Por
este motivo, os sacerdotes legítimos se retiraram do templo em dezembro de
2018, o bàbá Olósun levou objetos importantes e indispensáveis do culto de
Òsun para Ìbàdàn com e afirmou que apenas iria retornar quando tudo fosse
resolvido e também reiterou sobre a falta de limites e respeito do Ataojá. Em
2018, no mesmo mês, uma sacerdotisa de Òsun (não possui ligação com a
família de bàbá Adigun e nem com a de Ìyá Adesiyan) afirma em rede social
que o festival iria ocorrer com um novos sacerdotes de Òsun, em seguida é
emitido uma nota por bàbá Adigun que realiza falas pedindo para que se
desconsiderasse os sacerdotes nomeados naquele momento e afirmou que se
o rei (que, segundo o bàbá: é falso) não pode nomear, ele também não pode
instalar novos sacerdotes. Quem aprova, nomeia e instala novos sacerdotes
são os anciãos tradicionais de toda as terras yorùbás, junto dos devotos de
Òsun Òsogbo.
48
Fotografia 31 - Ìyá Olósun de Òsogbo.
Fonte: Òsunkolade Baba Orisa Òsun - Página da Internet.
49
Fotografia 32 - Ìyá Adesiyan em 2019.
Fonte: Bàbá Adigun Olósun - Página da Internet.
50
Fotografia 33 - Bàbá Adigun durante seu festival de Eegun em 2018.
Fonte: Oladapo Agboola - Página da Internet.
51
Fotografia 34 - Bàbá Adigun e Ìyá Olósun em 2007.
Fonte: Bàbá Adigun Olósun - Página da Internet.
Bàbá Adigun, assim como a Ìyá Olósun, possui sua própria comunidade
religiosa em Òsogbo (dentro e fora do templo de Òsun em Òsogbo) e no
mundo inteiro. Durante o ano de 2019, conforme relatou, não assistiu e nem
participou do festival de Òsun, pois foi aconselhado pelas famílias reais e pelos
anciãos de Òsogbo, para que se retirasse e não participasse do festival. Afirma
também, que foi a primeira vez desde quando nasceu, que não assiste e não
participa de um festival de Òsun. Este foi um momento muito triste para bàbá
Adigun que foi criado também pela saudosa Susanne Wenger. Não tive acesso
a informações sobre a permanência ou não de Ìyá Olósun de Òsogbo, durante
o festival de Òsun em Òsogbo. Infelizmente é algo de tamanha tristeza e
desrespeito, o que ocorreu no passado entre o rei e os sacerdotes, pois é dito
até hoje que tudo ocorreu após o rei ter expulsado a sacerdotisa (Ìyá Olósun) e
seu filho (Bàbá Adigun) do templo de Òsun, que está situado no palácio do
Ataojá. No mês de agosto de 2020, momento em que ocorre tradicionalmente
o festival de Òsun em Òsogbo, que reúne devotos e iniciados para esta grande
divindade, em qualquer família que cultue e adore tal divindade, ocorreu um
evento de tamanha tristeza. Segundo o jornal Vanguard (e confirmado a
veracidade por Bàbá Adigun, devido a divulgação por ele, de tal matéria), bàbá
52
se dirigiu ao templo de Òsun em Òsogbo, a fim de tentar retornar a
administração do templo como sacerdote oficial, até para que a antiga Ìyá
Olósun também pudesse retornar, pois como é sabido, o Ataojá colocou novos
sacerdotes no lugar de bàbá e de ìyá Olósun - o que é totalmente indevido e
errado, pois como também foi dito: não é de direito e nem correto, o rei
realizar intervenções dentro do templo. Após bàbá Adigun se dirigir ao templo
com cópias do documento onde o Tribunal de Justiça Nigeriano anula a decisão
(interferência) do Ataojá e determina que os antigos sacerdotes retornassem -
determinação que foi promulgada e deveria estar sendo executada desde o
ano passado -, porém, ao adentrar ao templo acompanhado de outras pessoas
e dizer que deveria assumir o sacerdócio novamente, o atual sacerdote o
impediu de tal e houve uma grande baixaria (envolvendo xingamentos) no
templo. Houve também o uso de guardas para que retirasse o bàbá Adigun
que, segundo relatos, não estava em estado de alteração, mas que foi retirado
por se opôr aos atuais sacerdotes do templo.
53
Capítulo 04 - Festival de Òsun Òsogbo
54
de Òsun em Òsogbo). O festival da grande mãe da água, divindade pertencente
ao agrupamento de Oluweri (divindades cultuadas nas águas), senhora que
ama Asaro, Obi e tantos outros alimentos tradicionais. Seu festival é separado
em seis dias de veneração totalmente necessários e tradicionais (que ocorrem
desde tempos imemoráveis). Sendo estes dias, os seguintes:
1. Iwopopo: Sua principal funcionalidade e importância é purificar a cidade
através de sua principal estrada, afastando os ajogun (espíritos que
agem contra o bem-estar do ser humano). Essa celebração é
considerada para muitos, como o primeiro rito do festival, por
justamente alguns dias após ocorrer a tão conhecida “Lamparina de
Òsun” (Oloju-mèrindílógún). Os devotos de Òsun e outras pessoas
seguem em procissão até uma determinada localidade conhecida como
Gbaemu e presenteiam o Ataojá, enquanto ele distribui bênçãos aos que
o entregam presente. Tal acontecimento está ligado intrinsecamente
com o itan (mito) da fundação de Òsogbo. O Itan narra basicamente que
os ancestrais que viviam em Òsogbo durante uma época, viveram um
tempo de tamanha escassez de água em uma fonte inesgotável de água
em uma localidade conhecida como Ipole e ao encontrar um caçador
chamado Olutimehin (um caçador conhecido por sua tamanha
habilidade e conhecimento na arte e sabedoria da caça), solicitaram para
que encontrasse um possível lugar que tivesse água, para que os
moradores se estabelecessem. Olutimehin e outros caçadores (entre
eles: Ogidan) foram a caça procurar um local para esses moradores
pudessem habitar. Ao encontrar um local às margens do rio Òsun, ele
levou o povo que se está instalado até hoje às margens do rio Òsogbo.
Para concluir: O rito de purificação e toda a sua caminhada percorrida
(simbolicamente) ocorre como forma de recordação e lembrança do
esforço de Olutimehin e outros caçadores. Olutimehin é uma grande
divindade ancestral caçadora de Òsogbo.
55
festival novamente seja repetido, visando o agrado e oferta desse
alimento para Òsun. Durante o festival de muitos Orisa é colhido,
ofertado, degustado e são plantados novos Yan, pois é um legume
(botânicos classificam como “caules”) muito importante para o culto.
Durante este momento, pessoas se unem com outras que podem ter
laços consanguíneos ou apenas afetivos, para a partilha do Yan. Orisa é
união, então por isso eles sempre se reúnem e acompanham uns aos
outros. Muitos até pensam que durante a colheita novo Yan e o plantio
de Yan para o próximo festival, é o momento em que se consulta Òsun
para descobrir o Odù que irá corresponder por aquele povo e pela
comunidade (além de devotos do mundo inteiro que seguem o templo),
porém, é um grande equívoco. Segundo nativos, não existe consulta
oracular neste momento. É um rito tradicional que não visa consulta,
apenas rito. É realizado de forma tradicional, dois dias após o rito
“Iwopopo”.
56
Fotografia 38 - Momento durante Aisun Ijesu em 2020.
Fonte: Baba Awo Sàngótope Ajala - Página da Internet.
57
criação do aye (será explicado em outros trechos deste tópico). A
lamparina de dezesseis pontos (Àtùpà Oloju-Mèrindílógún) é um rito que
se mantém desde o primeiro rei de Òsogbo (que é o mesmo que está
envolvido no mito explicado em parágrafos anteriores, sobre Arugba).
Há duas principais dissidências orais (reconheço que sejam de, no
mínimo, três, porém prefiro me resguardar de uma - a do Ataojá) que
explicam tal rito, sendo elas: 01) Acredita-se que que durante o
momento em que o grande caçador de elefantes, divindade ancestral
ligada à criação de Òsogbo e grande servo de Òsun (Olutimehin) estava
indo pegar água no rio que sempre usava para se comunicar com ela
(uns dizem que este era o rio dela, mas não falam sobre possível
comunicação entre eles. Há duas oralidades sobre isso) e se esbarrou em
uma lamparina com dezesseis pontas, onde vários espíritos da floresta
(Ebora) dançavam em volta dele. Como um caçador astuto, bravo e sem
temor de possíveis atitudes que sejam prejudiciais a ele, tomou as
lamparinas e domou os espíritos, para que eles ficassem favoráveis à ele.
Òsun o avisou que, se ele quisesse manter a posse da lâmpada, teria que
repetir e ensinar aos demais moradores de Òsogbo, que os que tivessem
presentes no rito, deveriam dançar em volta dessa lamparina
anualmente, como uma forma de adoração a ela, de respeito aos
espíritos que habitam até hoje na floresta e também ao ato de tamanha
coragem do caçador; 02) Segundo o professor Wande Abimbola, as
dezesseis lamparinas podem estar ligadas aos dezesseis principais Orisa
que estiveram presentes na criação do aye; às dezesseis principais
palmeiras que foram plantadas no aye, para que desse origem a outras
que iriam corroborar também no Idafá (consulta ao oráculo de Ifá); aos
dezesseis principais Odù Ifá (e eu diria: também Èrindílógún - mesmo
sendo odù diferente). Assim narrou para mim, Olusegun Daramola. Deve
ser ressaltado que é totalmente proibido essa lamparina apagar durante
a realização de ritos e ela só deve ser apagada em um específico
momento, pois se apagar antes, não trará boa sorte para o povoado de
Òsogbo. Isso irrita Òsun e insulta os espíritos da floresta.
58
no quarto momento do festival. Embora seja um festival de Òsun, todos
os Ataojá estão intrinsecamente ligados a ela, pela fato de ser a senhora
fundadora e responsável por todo o sucesso de Òsogbo, inclusive o
sucesso e a alta lucratividade de seu festival e os ditos poderes
míticos-medicinais de seu rio, confirmam o fato. Durante o Ibo-ade
(alguns escrevem: “Iboade”), o rei expõe artigos (coroas, sapatos e entre
outros objetos). O momento também é chamado de “Ojo Iboade, Ojo
Iboriade, Ojo Ibori-Ade”, que significa: “Dia de adoração às cabeças da
coroa”, que nos remetem aos antepassados (ancestrais) que já fizeram
parte da chefia tradicional de Òsogbo. Neste rito, sacerdotes e
sacerdotisas realizam orações ao Orí (cabeça espiritual) dos
antepassados reis, para que eles abençoem o atual rei e escolhas boas
sejam tomadas.
59
Fotografia 40 - Momento do Ritual Ibori-Ade em 2019.
Fonte: Bankole Faniyi - Página da Internet.
60
Fotografia 41 - Duas importantes sacerdotisas de
Òsun Òsogbo em Aisun Odún no ano de 2018.
Fonte: Òsunbukola Olósun - Página da Internet.
61
festival Òsun Òsogbo (são diretamente ligados ao rei, aos principais
sacerdotes de Òsun em Òsogbo e também são grandes apoiadores da
elaboração deste livro), o Arugba não é escolhido todo ano em Òsogbo,
mas sim, por um longo período. Quem for escolhido para ser, deverá se
manter virgem até a entrada de outro Arugba. Solicitei a informação dos
nomes dos Arugba de 2010-2020 e os nomes que tive foram: Oyewale
Buadei (somente 2010) e Oyetunji Òsuntomo (2011-2020). A atual
Arugba foi escolhida quando tinha apenas onze anos e é da família
Matanmi (família real). Ela jamais deverá comer, enquanto exercer tal
função, alguns alimentos como: Peixe, caracol, milho-da-índia.
62
Fotografia 43 - Arugba Òsun em 2020 ao lado dos novos sacerdotes de Òsun.
Fonte: Adeniyi Sàngóyemi Olamilekan - Página da Internet.
63
Fotografia 44 - Arugba Òsun em 2020 ao lado dos novos sacerdotes de Òsun.
Fonte: Adeniyi Sàngóyemi Olamilekan - Página da Internet.
Neste livro já foi narrado um ìtàn sobre o Arugba, mas preciso apresentar
um ìtàn que fala sobre a importância de Òsun para a família real, também
preciso realizar uma outra narrativa sobre a fundação de Òsogbo e
apresentar-lhes a principal penteado da divindade Òsun. Este penteado é
utilizado tanto em Òsogbo, quanto em Òyó. O Reino de Òyó, através do belo
64
desempenho e trabalho do Aláàfin ao lado de doutora Paula Cristina Gomes,
têm preservado e incentivado o mantimento do culto a Orisa, em sua forma
tradicional (sem a adição de Ifá) em muitas comunidades. Ainda incentivam a
interação positiva entre os devotos de Orisa (o que sempre ocorreu), sem com
que um influencie diretamente na forma de culto do outro - o que é bastante
importante. Há uma brasileira chamada “Renata Barcelos” (Iyemojágbemi
Omitanmole Arike) que se iniciou em Òyó no ano de 2018 para o Orisa
Iyemojá, que é uma importante peça entre nós brasileiros, para a divulgação
do culto a muitos Orisa que são até desconhecidos por nós, mas que existe em
terras Yorùbás. Ela é uma grande incentivadora da preservação do culto a Orisa
e é alguém que realiza um trabalho em plataformas digitais, incentivando a
interação entre devotos de Orisa do mundo inteiro, inclusive, com os próprios
Yorùbás.
65
urante o último dia de festival, como de praxe na tradição de Òsogbo,
D
assim como em Òyó, ocorre o ritual que podemos chamar de “Procissão do
Arugba”, pois realmente é uma verdadeira procissão, só que ela não fica à
frente de ninguém, mas sim, entre as pessoas. Durante a procissão, pessoas
entoam Korins (cânticos sagrados) e Orikis (rezas tradicionais), além de saudar
o Orisa (de diversas formas possíveis - devo ressaltar) e realizar diferentes
pedidos. O Arugba é a personificação de Òsun durante aquele festival, pois é
ela a detentora do Àse da divindade e que irá realizar ritos para ela, junto dos
devotos e sacerdotes (pessoas altamente responsáveis). Conforme narra o ìtàn
já apresentado aqui: Òsun foi quem recomendou que todo ano, uma jovem
ligada à realeza e que fosse virgem, carregasse em sua cabeça, uma cabaça
ancestral (de tempos desconhecidos) com importantes objetos de culto, para
que a sociedade tivesse sucesso nos próximos anos, e que esse ritual jamais
deveria deixar de ser feito, pois ele também iria lembrar ao povo, o
estreitamento dos laços entre o povo com a grande divindade do rio. Ainda
segundo a lenda: é importante que o Ataojá tenha participação no festival,
para que possa se comunicar com Òsun, assim como desde a fundação de
Òsogbo o reino do primeiro rei, ocorreu. É Òsun quem determina o sucesso ou
o fracasso de um rei, assim como também já determinou o fracasso
(miticamente - isso será explicado mais à frente) de rivais e opositores dos
Yorùbás. Ela também fez com que uma estéril engravidasse, assim como fez
com que uma mãe sem alimento, conseguisse muitos alimentos para ela e para
seus filhos. Já curou pessoas doentes e quase morrendo, simplesmente com as
abençoadas águas de seu rio. Agora sem enrolações, vamos lá… Òsun ajudou a
esposa do Olarooye (primeiro Atewogbeja - Ataojá) a conseguir parir um filho
de seu próprio útero, porém, ela não era fértil, então súditos foram até o rio
buscar a água para que ela bebesse e se comunicasse com Òsun. Após isso ter
sido feito, Òsun garantiu a fertilidade para ela e todos os moradores de
Òsogbo ficaram felizes, pois dependiam dela, para que a dinastia de reis
tivesse continuidade. Há um poema de Òsun que diz em um de seus trechos
que é Òsun quem ajuda o Obà (rei) a governar Òsogbo. Se não for ela a
responsável por ajudar o rei, Òsogbo irá acabar, pois é ela quem garante o
sucesso e prosperidade. É relembrado pelo povo também, que Òsun cumpriu
sua promessa de defender o povo de Òsogbo dos ataques de invasores,
66
quando se personificou de mulher que entregava bolo de feijão envenenado
para os invasores (isso ocorreu na batalha de Òsogbo, que ocorria entre os
guerreiros de Ìbàdàn e os Fulani Jihadistas). Ela foi a responsável por derrotar
os Fulani (etnia que até hoje possui suas diferenças com os Yorùbás).
Òsogbo é um território, que assim como os demais territórios, possui
diferentes origens míticas e históricas. Não estou contando o ìtàn verdadeiro e
também não estou contando o falso. Narra um dos ìtàns da criação de Òsogbo,
que sua fundação teve três importantes ancestrais envolvidos na fundação:
Lajomo, Olarooye e Olutimehin, que migraram de Ipole Omu (em terra Ìjèsà)
para às margens do rio de Òsun, onde está situado o atual e conhecido
“Òsogbo”. Conforme foi repassado por nativos, ambos ancestrais tinham
descendência direta de Odùduwà e netos de Ajibogun (um dos filhos de
Odùduwà e também fundador de Ibokun). É narrado que em uma limpeza que
estavam fazendo no mato, uma árvore caiu dentro do rio e a água ficou azul.
Imediatamente o povo se assustou ao ouvir uma voz vinda do rio, que dizia:
“Laro, Timehin, gbogbo ikoko aro mi le ti fo tan” (Laro, Timehin, você quebrou
todos os meus potes de corante índigo), após isso os colonos se assustaram ao
ouvir as vozes dos verdadeiros moradores daquela terra (os espíritos)
lamentando à divindade d’água: “Oso Igbo pele o, Oso Igbo rora o” (Feiticeira
da floresta, desculpe e vá com calma). Há narrativas que afirmam que o termo
“Oso” se refere à Òsun, mas há outras que dizem que é aos participantes da
colonização. A lenda que fala sobre “Oso Igbo” ter sido o termo que Òsun se
referia aos colonizadores (há também a oralidade que diz que é o termo pelo
qual os colonizadores se referiam a Òsun), e quando a árvore caiu no rio, a
dona dele questionou aos envolvidos: “Ta lo fo ikoko aro mi o? Eyin Oso Igbo e
tun de o” (“Quem quebrou meu corante índigo das panelas? Vocês, magos da
floresta, estão aqui de novo”), porém, embora seja por este fato ou não, há um
consenso de que o termo “Oso Igbo” é o termo que deu origem ao nome
“Òsogbo” (fazendo alusão a Òsun ou aos colonos). Após acontecido o acidente
no rio, os caçadores (também podem e devem ser chamado assim, pois
caçadores desbravam e o termo ‘colonos’ traz um teor mais complicado,
devido a fatos históricos não tão antigos) realizaram um sacrifício (Ebo) para
apaziguar e neutralizar a ira da grande mãe. Dois nativos me contaram sobre
que ela aceitava Ebo e se descobria, quando era avistado um peixe-deus
(chamado de “Iko” - representante). O primeiro rei de Òsogbo (toda a
67
linhagem de reis - até o dia de hoje - detém laços espirituais com Òsun, pois
passam por ritos tradicionais em seu templo antes de sentar no trono. Há um
ditado em Òsogbo que diz: “Ataojá Loni Òsun” - Ataojá é devoto de Òsun) foi
recebido por um Iko em suas mãos e por este motivo originou o título de
Atewogbeja (Aquele que recebe o peixe nas mãos). Há quem diga que ele é
descendente consanguíneo de Òsun, mas há quem diga que não, que seus
laços são apenas espirituais, porém, assim como o Aláàfin Òyó e o Oòni Ifè
participam de alguns dias das festividades de Sàngó e Odùduwà, o Ataojá
também participa de alguns momentos da festividade de Òsun. Após ser
realizado os sacrifícios e um dos caçadores envolvidos se tornar rei (Olarooye),
Òsun retornou ao aye e disse que anualmente o povo deveria realizar
sacrifícios e que se isso ocorresse, ela continuaria protegendo e apoiando o
povo. Orientou os sacerdotes sobre como deveria ser realizado o sacrifício
anual e prometeu que seu Iko (peixe representante, mensageiro) iria se fazer
presente todo ano para derramar água medicinal (com poderes curativos) no
pote feito de cabaça que é mantido até hoje no palácio do Ataojá. Pediu
também para que no mesmo momento que ocorresse este sacrifício, fosse
celebrado o seu festival. Após isso, foi selado um acordo entre o Ataojá
(representante do povo) com Òsun (a divindade regente daquele local) e hoje
é um dos festivais mais famosos do continente africano. Finalizado o acordo,
Òsun ordenou que o povo se mudasse para uma região conhecida como “Oke
Ohuntoto”, para que eles evitassem sofrer com as constantes inundações, mas
sim, que fossem beneficiados por ela e conseguiram se desenvolver e crescer
rapidamente. O festival de Òsun Òsogbo é uma rememoração deste acordo
que ocorreu entre Òsun e o povo. Ela também os ensinou a fazer um penteado
que consiste no uso de alguns objetos (em miniatura) de bronze e ekodidé
(pena avermelhada que é tabu para o uso de Sàngó e Oya). O penteado se
chama “Àgògo” (em português: Agogô) e segundo algumas tradições: somente
iniciados para Òsun podem utilizar.
68
Fotografia 46 - Arugba Òsun Osobgo no ano de 2018.
Fonte: My Black Festivals (Adegoke Ademidotun) - Página da Internet.
69
Fotografia 47 - Procissão Arugba Òsun Òsogbo no ano de 2018.
Fonte: My Black Festivals (Adegoke Ademidotun) - Página da Internet.
Fotografia 48 - Sacerdotes de Òsun Òsogbo no ano de 2018, sendo dois deles: Bàbá Adigun
e Ìyá Òsunbukola Olósun (com vestes brancas) utilizando Àgògo.
Fonte: My Black Festivals (Adegoke Ademidotun) - Página da Internet.
70
Capítulo 05 - Brasil na Nigéria ou Nigéria no Brasil?
71
mostrar que temos conhecimento armazenado, resguardado e muito bem
protegido por pessoas que possuem um grande conhecimento - digo:
conhecimento além do que os argumentos dizem que não temos. Agradeço, de
antemão, os sacerdotes que irão participar deste capítulo, contribuíndo para
com o meu trabalho.
Começarei falando sobre uma sacerdotisa do estado da Paraíba (localizado
na região nordeste do Brasil), seguidora e conhecedora da tradição
resguardada pelo templo do Ilé Àse Òpó Àfònjá e filha [gostaria de adicionar:
muito querida e honrada, porém, prefiro não me estender muito aqui, porque
futuramente vocês poderão conferir essa história e tantas outras muito
importantes, em uma outra obra minha] de saudosa mãe Stella de Òsóòsì. A
sacerdotisa esteve presente no continente africano, visitou alguns estados e
cidades Yorùbás, presenciou o festival de Sàngó (patrono do templo a que ela
pertence) e também a adoração de Òsun no festival de Sàngó, além de ser uma
sacerdotisa referência no conhecimento para com a sua tradição, no estado da
Paraíba e em outros estados. É uma voz ativa na luta contra o machismo,
misoginia, racismo, intolerância religiosa e qualquer outra forma de
preconceito e atitudes odiosas geradas por este. Seu nome é Lúcia de Fátima
Batista de Oliveira, cujo orúko é: Omidewa. Seu nome religioso já era existente
quando migrou para o Afonjá e foi mantido, conservado e reafirmado à ela,
por mãe Stella, na presença de alguns senhores do próprio templo (Ogan
Wellington, dona Graziela e entre outros citados). Seu templo, por
determinação de mãe Stella e aprovação de Òsun e Sàngó, se chama: “Ilé Àse
Òpó Omidéwà”, fazendo justamente alusão ao templo em que ela deu
continuidade a sua vida espiritual e obteve sucesso e muita felicidade. É
importante incluir mãe Lúcia nessa obra e em outras que, certamente, ela
estará, porque ela fala sobre o avanço e progresso do terreiro do Afonjá na
Paraíba, de forma com que seu culto venha sendo repassado e bem difundido,
como realmente é na tradição existente até hoje. Mãe Stella, por tamanho
carinho que tinha por dona Lúcia, colocou o nome dela no livro que narra
sobre os filhos que as mães de santo do Afonja tiveram em sua gestão e a
prestigiou com atitudes que realmente são e foram escassas de serem vistas
durante sua gestão no terreiro de Afonjá. Mãe Omidewa foi iniciada no de mil
novecentos e oitenta e um (1981) no mês de setembro, por mãe Deta de
Gbèsén (falecida desde 1989). Após adentrar aos ritos tradicionais do Afonjá e
através de um consenso ocorrido com a participação de mãe Stella, ficou dois
anos morando no Afonjá para aprender na vivência.
72
Relembra com muito carinho a sua história, no que tange a iniciação do seu
primeiro agrupamento (barco) de neófitos dentro da Religião de Orisa de
nosso país, no que tange às ritualísticas tradicionais do terreiro de Sàngó
Afonjá, que foi após um encorajamento realizado por mãe Stella à ela, durante
um questionamento sobre ter uma casa ou não (vide a ironia disso, pois mãe
Stella tinha conhecimento do templo de sua filha) e após a resposta deste
questionamento, sua filha relatou respondendo a uma outra pergunta, que
tinha um barco de oito pessoas - sendo elas dos seguintes Orisa: 01 Òòsà
Olúfon, 01 Òòsà Olúfon, 02 Òsun, 02 Iyemojá, 01 Sàngó e 01 Òsóòsì - mas que
estava insegura sobre a realização dos ritos e entre outros, foi aí que mãe
Stella disse: “Tá de férias demais, vá colocar a casa de Òsun para parir” e
enviou uma equipe de quatro pessoas para acompanhar mãe Lúcia na iniciação
de seus neófitos, onde a distância, corroborou para a confirmação do orúko de
um filho de mãe Omidewa, que é do Orisa Òsóòsì (foi seu primeiro iniciado
para este Orisa) e que a sobrinha de mãe Stella (Thereza ti Òòsà Olúfon - peça
fundamental para a evolução do templo) sonhou com o nome. O orúko do filho
é “Olu Oju” (senhor dos olhos - isso se deve ao fato do filho dela ter uma
deficiência nos olhos). Narra que foi um barco trabalhoso, mas muito lindo e
ressalta que até hoje mantém o fluxo de participação de membros do templo
do Afonjá de Salvador (alguns nomes ditos por ela: Dimas e Cida de Nanã -
bisneta de mãe Senhora) em seu templo e que desempenham papéis
importantes na realização de ritos de seus iniciados). A atuação desta senhora
na política é mais uma prova de que a Religião de Orisa pode e deve participar
da política. Nossa Religião é uma política, a nossa organização e hierarquia
também. Ela faz parte da Coordenação da Rede Nacional das Religiões
Afro-brasileira e Saúde na PB, é Conselheira da RENAFRO, Coordenadora do
Programa Fome Zero para as Comunidades Tradicionais no Município de João
Pessoa e entre outros. Premiada como Mestra Griô (segundo informa seu site
e também a própria sacerdotisa), representa e apresenta uma grande
importância para a sobrevivência da oralidade de nossa Religião de Orisa. Seu
saber é vasto e sua boa vontade de ensinar, além de humildade e sabedoria,
também são vastos. seu cadastro no Sistema Nacional de Informações e
Indicadores Culturais (SNIIC) - que foi o órgão responsável por emitir o
reconhecimento de Mestra Griô, lhe concedendo o número de Agente Cultural
SNIIC: 31307.
Além do engajamento para com projetos sociais apoiados por outras
instituições, a filha de Òsun (Omidewa) desenvolve atitudes de
responsabilidade social e que reforçam sua preocupação e militância para além
73
de causas que visam os direitos humanos, mas que também se estendem a
militância pela conscientização da responsabilidade e conhecimento quanto a
relevância dos recursos existentes na natureza. Iniciou no ano de 2020, com o
apoio dos filhos do templo, um projeto chamado “Flora Omidewa”. O projeto
realiza o trabalho de plantio, cultivo e preservação da memória ancestral
afro-americana, sobre a importância de ervas medicinais, até mesmo para a
Religião de Orisa. Um tópico bastante interessante levantado, apontado e
debatido dentro do projeto, é sobre o crescimento das grandes cidades e o
desenvolvimento das pequenas cidades, estarem corroborando para a perda
da acessibilidade às ervas sagradas em bosques e locais de relevante
predominância rural. O espaço onde é realizado o projeto (espécie de bosque
sagrado do próprio terreiro) é um local onde diversas comunidades
tradicionais de Orisa, Nkisi e Vodoun terão acesso, para que apoiem o plantio,
para o consumo e também plantio de novas espécies. Esse fato reafirma mais
ainda o comprometimento e posicionamento estratégico-político de
responsabilidade social, reafirmado pelo terreiro de Òsun e pela sacerdotisa
fundadora dele.
74
Fotografia 49 - Mãe Lúcia em 2020, junto de seus filhos realizando o plantio de ervas
sagradas.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
75
Fotografia 50 - Mãe Lúcia em 2020, junto de seus filhos-de-santo realizando o plantio de
ervas sagradas.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
76
Fotografia 51 - Mãe Lúcia em 2020, ensinando seus filhos-de-santo sobre as ervas sagradas.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
77
Fotografia 52 - Mãe Lúcia de Òsun, Ìyá Omidewa.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
Pedi para mãe Lúcia que falasse sobre Òsun, pois sendo esse livro um
material que têm como personagem principal, o Orisa Òsun e sendo ela uma
filha de Òsun e tendo um terreiro dedicado a esse Orisa, nada mais justo. Além
de me falar um pouco sobre Òsun, ainda me narrou um belo Ìtàn sobre Òsun,
78
que será exposto aqui. Quando a solicitei para falar de Òsun, sua voz tão bela e
que se mostrava em um estado de tamanha felicidade e êxtase, que até eu
pude me emocionar junto. Segundo mãezinha: Falar de Òsun, é falar sobre a
vida, da vida e de alegria. Òsun é a divindade do princípio da existência, pois
além de ser aquela que também rege o útero, é a senhora que mora na água
(em todas as suas formas de uso e de encontro na natureza). Ela é a vida e o ar
que mãe respira, é alegria, é a ancestral que defende e ampara. É a que não a
deixou sem resposta, sem sabedoria e não a abandonou de forma alguma, pois
justifica que o amor de Òsun é incondicional. Òsun a honrou e se mostrou por
ela, quando passou por dificuldades e foi o braço que ela teve. Iya Oládékojú
(um dos nomes atribuídos a Òsun: Òsun, a senhora dona da coroa que cobre os
olhos) é o barulho da turbulência da água, mas também é a do silêncio e da
calma. Ela é a responsável pela água que limpa, é a água da torneira que limpa
os pratos, nossas casas, nosso corpo e nossa alma.
Para finalizar o momento da fala de uma das Religiões de Orisa de nosso
país (Candomblé Ketu) e poder avançar para demais representantes
selecionados para falar sobre as demais Religiões de Orisa de nosso país, irei
relatar um Ìtàn de tamanha preciosidade que foi compartilhado por mãe Lúcia,
para brindar conosco, o grande avanço que possivelmente é representado por
essa obra. Segundo o Ìtàn narrado: O que existe no Òrun, foi replicado no Aye.
Olódùmarè tinha 701 Orisa, mas que embora eles fossem seres divinos, tinha
um lugar no Òrun, que eles não deveriam ir. Èsù, muito curioso, foi até o local
e ao chegar nele, se deparou com um espelho. Ao se encontrar com o espelho,
viu uma segunda versão de si mesmo, reproduzida pelo espelho. Então
imaginou que seria aquele o segredo do local que os Orisa não deveriam
acessar. Chamou os demais Orisa (700) e quebrou o espelho que mostrava o
reflexo do que era apresentado a ele. Após quebrado o espelho, quando os
Orisa olharam, observaram o vazio e se assustaram, logo, foram questionar
Olódùmarè (o grande criador). Após questionado, Olódùmarè puniu Esu e
chamou Èsù, Odùduwà, Ògún e Òsóòsì. Ordenou a que Oòduà criasse algo no
vácuo. Imediatamente ele o responsável por criar algo no vácuo, se consulta
com um babalawo, realiza os ritos tradicionais (sacrifício - Ebo), foi obtido
muitos cauris (búzios) e é dado pelo babalawo: um galo e um saco que seria
amarrado no pé do galo e deu um cordão para Odùduwà. Após isso, foi
amarrado o pequeno saco no pé do galo e quando chega no espaço vazio e
desconhecido, o galo abre o saco e começa a ciscar. Dentro do saco estava
contido uma terra (magia) e no primeiro movimento “cisco” que o galo deu, foi
criado o globo terrestre. Após tal acontecimento, a missão de Odùduwà estava
79
cumprida. Elédùmarè chamou Ògún, Òsóòsì e Esu, ordenou que criassem a
fauna e a flora daqui, mas ordenou que levassem Òsun, porém eles se
reuniram, apontaram defeitos de Òsun (falaram sobre sua vaidade, sobre seu
cuidado com perfumes e até sobre a suposta ‘futilidade’. Òsun ficou bastante
aborrecida) e decidiram, por fim, não trazê-la. Então os três guerreiros vieram
e, por sete dias, tudo o que criavam, não dava certo. Eles foram até Olódùmarè
e foram questionados sobre o porquê de não ter levado Òsun, a senhora da
vaidade, do autocuidado e entre outros. Olódùmarè apenas ordenou que eles
fizessem o que deveria ser feito e cumprissem sua missão. Eles retornaram e
tentaram por mais sete dias, cumprir a missão no Aye, mas como não estava
dando certo, foram até o reino (Casa) de Òsun. Imploram pela recepção de
Òsun, mas embora ela estivesse com vontade de recebê-los, desejou armar
uma estratégia para que não fosse tão fácil para eles. Enquanto não os atendia,
eles levavam ouro, jóias, presentes e entre outros. Quando não cabia mais
presentes na porta de seu reino, um súdito foi até Ìyá Òsun, disse a ela o que
estava acontecendo. Ela ordenou que colocasse os agrados para dentro e os
levasse até ela. Ao se encontrarem, imploram pela ida de Òsun ao Aye junto
com eles. Embora ela estivesse com vontade, tinha de ser estrategista e não
mostrar que estava com vontade. Demorou um total de três dias para arrumar
as bagagens e até que eles viessem ao aye e fizessem o que devia ser feito, se
totalizaram cinco dias - segundo a narrativa, por isso se justifica a presença dos
cinco dias no calendário semanal Yorùbá. Após terem criado a flora, Òsun ficou
debaixo de uma árvore se embelezando (o que ela fazia exatamente no Òrun).
Incomodados com isso, foram questionar a Òsun o que ela iria fazer, pois eles
já fizeram o trabalho deles, então ela criou a água. Então ela dividiu a água
com Iyemojá (ela na água doce e Iyemojá nos oceanos). Òsun e nem Iyemojá
não quiseram voltar para o Òrun, por tamanho amor aos seus filhos e, até
mesmo, à vida, pois sem a água (principalmente a água doce que nos mata a
sede e a água dos oceanos que mata a nossa fome) não conseguiríamos
sobreviver. Após isso, os seres humanos começaram a povoar o aye.
80
Fotografia 53 - Templo de Èsù no terreiro de Òsun.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
81
Fotografia 54 - Gruta sagrada no terreiro de Òsun - local onde se é ensinado mitos e entre
outras informações de tamanha relevância.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
82
Fotografia 55 - Local mais aproximado da gruta do terreiro de Òsun.
Fonte: Mãe Lúcia de Fátima - Acervo Pessoal.
83
denominada de Omolokô e também conto com narrativas mais ligadas a uma
tentativa de reafricanização da Umbanda. Antes que eu apresente o
convidado, gostaria de falar um pouco sobre a sua descendência que é oriunda
de um senhor denominado de “Kaianágua” (há duas divergências orais sobre.
Sendo elas: 1°) Essa era a sua dijina (nomenclatura existente na Religião de
Nkisi); 2°) Era o nome de seu Caboclo. O Sr. Kaianágua teve sua iniciação
dentro dos conformes da Religião de Nkisi (de influência Bantu), mas por
motivos de sua pessoalidade, migrou para a Religião de Orisa denominada
Omolokô (que não é Umbanda e nem é Candomblé. É uma Religião de Orisa
independente, assim como o Batuque do Rio Grande do Sul, também não é
uma nação de Umbanda e nem de Candomblé). Por sua vez, uma senhora
denominada de Maria Bento Barbosa (figura importante para o
desenvolvimento do Omolokô) entrou em transe pela primeira vez com o
espírito da divindade primitiva e donatária dessa terra (Caboclo) - divindade se
chamava de Caboclo Cobra Coral e logo após o transe, ganhou o epíteto de
“Maria Coral pelos filhos do templo de Orisa de Sr. Kaianágua. Devido a sua
grande interação e vontade de conhecimento, além de facilidade para isso,
começou a ser percebido um dom (sacerdócio). Após ser submetida a todos os
rituais devidos e necessários para que pudesse alcançar a maior autonomia
dentro da Religião de Orisa, foi apontada como sacerdotisa (Ìyálórìsà).
Fundando após isso, o seu templo (Tenda Espírita Perseverantes na Fé -
T.E.P.F).
No mês de julho (dia 31), no ano de 1941, no Bairro do Rocha, fundou o seu
templo que também era conhecido como “Cabana do Caboclo Cobra Coral”.
Mãe Maria, a senhora responsável pela boa propagação e divulgação de sua fé,
ajudou com que muitos filhos alcançassem o saber e grande domínio para
representar uma Religião de Orisa não muito difundida (em termos de
conhecimento da sociedade). Teve muitos filhos, entre eles: Mãe Myrthes (que
dirigiu o templo), a bisavó de Rodrigo (o representante de tal Religião nesta
obra); Mãe Elza (a sacerdotisa da atual sacerdotisa de Rodrigo) e tantos outros
nomes. O templo que mãe Myrthes foi a sacerdotisa (o mesmo de mãe Maria
Coral), foi herdado pela avó de Rodrigo e também seria por ele (através da
determinação dos guias, não por laços consanguíneos - não há obrigatoriedade
de ser por essa forma), porém, por motivos de cunho administrativo e pessoal,
o templo que seria repassado ao herdeiro apontado pelos guias (Rodrigo), foi
84
fechado. Após um tempo procurando um templo para que pudesse dar
continuidade às obrigações iniciadas por sua avó (que foi a responsável por seu
desenvolvimento mediúnico e introdução na Religião), encontrou sua atual
sacerdotisa, que vêm a ser filha de uma das irmãs-de-santo da Bisavó de
Rodrigo. Selecionei tal rapaz para colocar nesta obra, por ter um conhecimento
vasto (tive a honra de desfrutar de um pouco de seu conhecimento - sou prova
disso) e por apresentar desde que eu o conheço, em suas falas, uma boa
linhagem de ancestralidade ligada ao Omolokô que é tão confundido e tido por
olhares de muito preconceito, como uma Umbanda Candomblétizada.
Lamentável tamanho desconhecimento, ignorância e/ou preconceito para com
a Religião de Orisa que muitos, inclusive o próprio autor, tiveram início e foram
apresentados aos Orisa. Como explica Bàbá Rodrigo: o templo que ele exerce
sua fé é de originalidade da Umbanda, mas com traços de maior africanização
herdados pelo Omolokô. É muito comum em tempos antigos e também atuais,
encontrarmos templos que, para a sua sobrevivência e resistência, realizaram
esse feito de junção. É importante acrescentar que as crenças e muitos dos
dogmas da Umbanda Sagrada foram mantidos no terreiro de bàbá, bem como,
a própria crença e conhecimento sobre a não incorporação de Orisa naquele
templo, mas sim, de divindades que iriam ser as responsáveis pela
representação destes, entre os seus devotos. As divindades são denominadas
por um termo denominado de “falangeiro”. Para que iniciemos as falas sobre
Òsun na concepção dessa Religião de Orisa (Umbanda e também, de certa
forma, o Omolokô), Rodrigo embasa sobre dona Maria Coral ter tido um
trabalho inicial em seu templo com a Umbanda Tradicional de saudoso Sr. Zélio
(inclusive faz parte da formação e também solidificação da Umbanda). Após
reclamações do Caboclo Cobra Coral (o guia chefe do terreiro dela), no que
tange ao abandono das raízes africanas, ela se alinhou às ideologias de
saudoso Tata Tancredo que foi um dos responsáveis pela reafirmação e da
recuperação de ritos tradicionais africanos dentro de tal religiosidade. Por isso
sua Umbanda e de seus descendentes, têm aspectos também do Omolokô.
Fôra solicitado ao Rodrigo, para que antes que falasse sobre sua concepção
com relação ao Orisa Òsun, narrasse um Ìtàn, mas como uma pessoa muito
consciente dos processos históricos e dos movimentos que ocorreram e que
ocorrem até a contemporaneidade, na Religião de Orisa a que ele pertence,
embasa primeiramente que o Ìtàn narrado por ele, foi de aprendizado
85
ancestral (bisavó -> avó -> ele), mas que em sua Religião de Orisa, os Ìtàns não
possuem muita relevância, ou melhor, não são adotados como são no
Candomblé e na própria terra de culto matriz à Orisa (terras Yorùbás) e narra
que isso também se deve ao próprio processo de embranquecimento dessa
Religião de Orisa. Ele ressalta a importância dos Ìtàns e fala que se trata de
suma importância ter conhecimento sobre tal preciosidade mantida na
oralidade - ressalta também sobre que, quem é dessa Religião de Orisa em
tempos atuais, deve procurar ainda mais se aproximar de suas raízes (não
alterando na ritualística, mas sim, agregando da litúrgica). Ele também fala
sobre seu incômodo com relação a simples definição de “Ìtàn” para
“mitologia”, porque são fatos históricos e se trata de uma cultura e
espiritualidade, sendo assim, uma maior seriedade deve ser tida e um cuidado,
para com as definições. Ele irá narrar um Ìtàn sobre o nascimento de Esu
através de Òsun e ressalta que também é sobre um despertar da
matri-potência (forma de empoderamento feminino).
Narra bàbá, que Òsun é vista como uma mulher doce, delicada e meiga,
mas que também deve-se ter o conhecimento de seu poder estratégico, de sua
sabedoria e de toda a potência representada por ela. Òsun é tida como a
grande mãe, assim como todas as divindades femininas dentro da Religião,
são. Segundo ele, Òsun e Iyemojá são tidas e ligadas muito mais à
maternidade, do que outras divindades. Òsun é a maternidade, fecundidade e
sobre a sua importância na luta contra o patriarcado. Ressalta, como algo de
muita importância e que deve ser explicado, que dentro da Religião que segue,
é muito comum se referir à divindade suprema como Olórun, Olódùmarè,
Nzambi, Deus (termo cristão) e entre outros que reforçam os fortes e estreitos
laços com o cristianismo, mas fala sobre uma prática de adoção de termos do
dialeto bantu e que é importante saber diferenciar o panteão Fon (Vodoun), do
panteão Bantu (Nkisi) do panteão Yorùbá (Orisa). Por ter a consciência de
diferença, ele adotou o termo “Olódùmarè” e “Olórun”, para se definir ao
grande criador, assim como os Yorùbás se referem.
Segundo Oniyemojá (equivalente ao termo “filho(a) de Iyemojá”) Rodrigo, o
Ìtàn começa falando sobre que Olódùmarè criou o mundo enviando um grupo
de Orisa para o aye com a responsabilidade de preparar o planeta para que a
criação tivesse continuidade e para que começasse o desabrochar da vida.
Cada divindade tinha uma missão e devia desempenhar seu papel, porém,
86
entre todas as divindades que vieram para o aye, a única mulher era Òsun.
Antes de dar continuidade ao Ìtàn, mais uma vez reforça que o patriarcado
ainda existente em nosso país realiza a prática de segregação da mulher e as
colocam como impotentes às realizações de diversas situações. Após enviados
os Orisa com suas respectivas tarefas já pré-definidas, ou seja, isso podia se
modificar a todo momento, pois Olódùmarè apenas deu sugestões. Todos os
Orisa masculinos (Okùnrin) realizavam os trabalhos mais brutos (que, no
conceito de muitos, são “trabalhos de homem”) e deixavam sempre para Òsun,
a missão de preparar o alimento de cada um deles e também as oferendas e
entre outros. Òsun, após se sentir inferiorizada e também desprezada pela
falta respeito deles, para com a significância da única divindade feminina que
participou da criação do aye. Com um sentimento de raiva, começou a se
revoltar com o papel que atribuíam a ela, que era de submissão total e
também de figura frágil. Após procurar Olódùmarè e se consultar com o
oráculo, realizou suas queixas, realizou os ritos tradicionais, retornou para o
aye e continuou preparando as comidas, mas passou a colocar feitiço nelas
através do sagrado feminino (do poder das mães ancestrais que foi ensinado
para ela) e com o passar do tempo, infortúnios começaram a acontecer e, que,
inclusive, iam contra a criação do aye, pois as fontes começaram a secar, os
animais começaram a não se reproduzir mais (iniciava-se a escassez de
animais), as plantas começaram a morrer e todos os outros tantos itens que
tinham sua vida garantida, através da fecundidade. Os Orisa masculinos se
assustaram, foram até um oráculo muito sábio e este os alertou e disse que
isso se devia a frustração, revolta e tristeza de Òsun (que foi anunciada por
esse mesmo oráculo, de estar grávida) por ser colocada em um espaço menor
e que não lhe cabia e que deveria ser dado oferendas, agrados e muitos
sacrifícios para ela, ressaltou também que seu filho deveria nascer homem,
pois se nascesse mulher, nada iria cessar, pelo contrário, seria mantido - e o
aye continuaria sendo um grande vácuo, vazio.
Os Orisa que haviam acabado de fracassar no início de sua missão,
tentaram então um novo começo, seguindo o que foi recomendado pelo
oráculo, inclusive, bastante atentos no sexo do bebê que iria nascer. Durante
muito tempo (o mesmo de consulta ao oráculo até o do nascimento do bebê)
realizaram os Ebo e os agrados a Òsun incessantemente. Quando nasce a
criança (Èsù), Òsun trouxe novamente ao planeta o equilíbrio, sendo assim, os
87
rios voltaram a ter água, plantas desabrocharam e entre outros. Rodrigo
analisa que uma mulher pode estar sim presente na cozinha, mas que o papel
de uma mulher é onde ela bem achar melhor para si. Ela pode desempenhar
atividades mais ligadas às práticas de culinária, mas também pode estar
atividades ligadas a um lugar de muita relevância na sociedade, através de sua
competência. Ainda segundo ele, Òsun ensina as mulheres a reconhecerem em
si, uma energia sagrada, a sua força, e que a submissão é uma espécie de tabu
para Òsun, pois a submissão não é estratégia, é uma forma de escravidão.
Embasa também que na sua Religião de Orisa, mesmo sendo sincretizada com
Nossa Senhora Aparecida e ter uma imagem mais ligada a maternidade, a
grande mãe é Iyalode (mãe da sociedade) e representa a independência e toda
grandiosidade que a mulher carrega, inclusive o sagrado feminino. Isso é
independente da Religião de Orisa, pois Òsun é cultuada em todas as Religiões
de Orisa. Por fim, com intuito de conclusão, embasa que como foi narrado
através da oralidade, explica possíveis mudanças que possam ocorrer e fala
sobre ter repassado o Ìtàn mais aproximado possível do que foi recebido e
também que se enquadra dentro da cosmovisão da tradição a que ele
pertence, dentro da Religião de Orisa. Relembra sobre a importância do Ìtàn,
ao embate e à luta que deve existir dentro da Religião e sociedade, para a
igualdade e reconhecimento às diversas causas, inclusive, nesse caso, ao
empoderamento feminino.
88
Fonte: Rodrigo Cassano - Acervo Pessoal.
Agora irei finalizar este capítulo falando sobre uma outra Religião de Orisa,
através de um representante que foi selecionado por mim. Gostaria de incluir
diversas Religiões de Orisa, mas infelizmente não posso colocar essas diversas,
pois embora o livro tenha sido inicializado e idealizado em 2019, está tendo
sua continuidade em 2020 por uma segunda (e, segundo o próprio Orisa,
última) ordem de Òsun, então tenho de ser obediente. A última Religião de
Orisa que será abordada aqui, é o Batuque - uma Religião de Orisa que surgiu
em, aproximadamente no ano de 1800. O senhor convidado se chama Roberto
Junior ti Òsun (conhecido também como Beto da Òsun) e teve seu primeiro
contato com o Batuque aos 24 anos de idade, através do templo de Òsun,
onde, cuja sacerdotisa é conhecida como “Mãe Dalva”. Relembra que era tudo
muito simples, mas que era encantador, porém, de início ele teve um
estranhamento pelo fato de ser diferente do que ele costumava ver (que eram
cerimônias de Candomblé). Falou sobre ter encontrado homens com
bombachas muito amplas e as mulheres com suas saias acompanhadas de
enchimento e sobre a alegria que os devotos estavam, que causou o êxtase de
89
todos, inclusive fala sobre um detalhe bastante interessante, que é o do
quarto-de-santo (chamado de yàrá-Orisa) ficar com uma parte que se
encontrava visível para todos e com bastante comida. Neste primeiro contato
que ele teve com essa Religião, narra que foi após um dia lotado de trabalho e
que durante a cerimônia ficou de pé em um local pequeno e que nada
entendia, mas que algo ali, lhe correspondia (a energia). Em um segundo
momento da festividade que presenciou, narra que vários Orisa ocuparam
(entraram em transe) seus respectivos elégùn e que após essa ocupação,
abriram espaço no meio do templo, para que somente os elégùn Òsun que
estavam ocupados, se fizessem presente no centro. Após este momento,
foram entregues espelhos e perfumes. Os tambores começaram novamente a
entoar o ritmo específico desta divindade, pessoas extasiadas começaram a
gritar “Ore Yeye ooo”, seus elégùn se dirigiram para o quarto-de-santo, e por lá
começaram a baforar perfumes pela boca, em cima dos devotos ou em suas
mãos e cantavam (segundo a oralidade): “Yeye o kari o, yeye o kari o, Òsun kari
o, kari o”. Após isso, narra Beto, que foi o momento em que amou e se
identificou com o Batuque. Dentro do Batuque, em muitas tradições, não é de
costume (mas pode haver), como existe no Candomblé, assim como em alguns
terreiros de Umbanda e/ou Omolokô, de se ter um quarto-de-santo para cada
Orisa. Devo ressaltar que o yàrá-Orisa (Iára Orixá) fica dentro do mesmo
espaço que comporta o salão, porém, são ambientes diferentes. No iára fica o
assentamento individual (pessoal), mas pode existir outros quartos-de-santo e
que comportam Ojúbo. Isso não é uma única verdade. Há templos que talvez
possam fazer diferente disso.
Meses após a primeira cerimônia de Orisa presenciada por Roberto na
Religião de Orisa que ele representa neste livro, se dirigiu até um sacerdote
chamado de bàbá Agnaldo de Xapanã, foi consultar o oráculo e quem
respondeu por ele e se mostrou ser o seu respectivo Orisa, foi Òsun. Vale
ressaltar que dentro do Batuque, segundo como bem lembra uma das fontes
orais (Érick Wolff), não é Èsù quem responde e nem é através de Odù, mas sim,
o próprio Orisa daquela pessoa. Èsù só irá responder e falar o que deve ser
dito, se for ele, o Orisa da pessoa. Após ter consultado o oráculo e adentrado a
partir daquele mesmo momento, ao templo de Orisa que foi iniciado e faz
parte até os tempos de produção dessa obra, vivenciou o que devia ser
vivenciado enquanto não iniciado e depois realizou os ritos tradicionais
90
iniciáticos para que fosse apresentado a todos como um iniciado e conhecedor
do mistério do Àse de Òsun. Ao ser questionado sobre a sua concepção sobre
Òsun, tal sacerdote me falou que ela é a divindade mais popular na Religião de
Orisa a que pertence e que muitos a procuram por motivos de falta de
fertilidade ou afetivos (amorosos). Narra também que Òsun é a mais doce das
divindades, a mãe dos gêmeos (Ibeji). Após ritos tradicionais para ela, são
feitos também para os gêmeos (seus filhos Ibeji), onde é um momento que se
apresenta uma grande variedade de alimentos (salgados e doces - tradicionais)
votivos para Òsun e seus filhos.
Como de costume, pedi para que o último entrevistado deste capítulo
falasse um mito (Ìtàn) de Òsun que ele conhecesse através da oralidade do
Batuque, porém, com receio de que fosse repetir o mesmo Ìtàn que outro
entrevistado, preferiu narrar dois acontecimentos que se enquadram bem
como excelentes histórias e prova do poder e Àse de Òsun. A primeira história
narrada por ele conta que em 2020 (período antes da pandemia ser decretada
em nosso país), durante uma mesa de Ibeji (mesa, no Batuque, é um rito
tradicional que visa agradar a divindade a que se destina a mesa. Apenas
pessoas de Obàtálá, Òsun, Sàngó e Iyemojá podem auxiliar no rito da mesa.
Crianças, mulheres grávidas e idosos também são sempre muito bem-vindas,
pois acredita-se que são sinônimo de Àse), nesta mesa estavam um par de
crianças gêmeas (duas meninas) e cada uma se encontrava em uma
extremidade da mesa. Quando começaram a servir comidas tradicionais como
canja, os doces e entre outros, a Òsun de uma elégùn do templo entrou em
transe (como eles chamam: foi ocupada) e se dispôs a servir e auxiliar nos ritos
que havia acabado de se iniciar. Assim que tudo foi feito, todos começaram a
dançar ao redor da “mesa” (não enquanto espaço físico, mas sim, enquanto
denominação de uma ritualística), ela pegou as gêmeas, apresentou ao
tamboreiro e depois levou as crianças de frente ao quarto-de-santo
(yàrá-Orisa) e ficou com elas ao seu lado, com um semblante de alegria e
orgulho, enquanto pessoas iam “bater cabeça” para ela.
O segundo relato que ocorreu em, aproximadamente 2006 - que, para o
autor, é o mais emocionante - fala sobre um casal que estava esperando uma
criança, porém, por não ter muito dinheiro, não conseguiram fazer todos os
acompanhamentos (inclusive os exames) necessários para que pudessem ter a
certeza de que a criança iria nascer com as mais perfeitas e necessárias
91
condições de saúde (as exigidas para um recém-nascido, é claro). O pai da
criança (nome fictício - como sugerido pelo narrador: Celso) foi ao templo que
era filiado, consultar o oráculo em uma tarde. Assim que ocorreu o início da
consulta, foi apontada a situação de que havia uma batalha pela vida, em
seguida Òsun aparece na consulta oracular e informa o ritual que deveria ser
realizado o mais breve possível para que a criança não morresse, pois se
tardasse, ela poderia morrer. Por não ter uma condição financeira estável, a
comunidade do templo ajudou com materiais para que o rito fosse realizado
brevemente, com o propósito de que nem a criança e nem a mãe (que é
hipertensa), sofressem alguma complicação. Se preparam para possíveis
acontecimentos inesperados que poderiam ocorrer durante algum dos três
dias de ritualística. Assim que a grávida pisou no solo sagrado daquele local
sacro, a Òsun de uma das filhas mais velhas da casa entrou em transe com sua
respectiva elégùn e orientou a todos, para que não houvesse qualquer
preocupação, pois ela estaria acompanhando tudo. Ao se apresentar no
templo, a grávida estava com a pressão nada estável e com dores. Tudo
começou a melhorar conforme o andamento das ritualísticas. Assim que a
criança nasceu, sua mãe a levou no templo para que uma consulta oracular
tradicional para recém-nascidos fosse feita, além de ser apresentada a todos
do Aye (plano físico - alguns traduzem como “terra”) e foi dito que esta criança
teria bons caminhos e entre outros. Quando se passaram alguns dias após a
consulta oracular, a criança foi levada ao médico (consulta de rotina) e o
médico disse que a criança tinha nascido em perfeito estado e a mãe, sem
saber do porquê daquela fala, apenas confirmou. Após isso o médico relatou
que o sangue dos pais não era compatível e que poderia trazer complicações
para a criança durante o período de gestação. A mãe, rapidamente pensou em
Òsun e a agradeceu.
92
Fotografia 58 - Bàbá Roberto ti Òsun.
Fonte: Roberto Junior - Acervo Pessoal.
93
Fotografia 59 - Alguns dos instrumentos sacros de Òsun no Batuque.
Fonte: Roberto Junior - Acervo Pessoal.
94
Capítulo 06 - Brasil-Òyó-Òsogbo: As Casas de Òsun
Este capítulo visa falar sobre duas brasileiras, sacerdotisas de Òsun, que
tiveram como destino, ir até diferentes terras de Òsun (uma foi para Òyó, a
outra foi para Òsogbo). Embora que talvez alguns possam julgar esses últimos
capítulos como “não essenciais”, de antemão eu já aviso que a leitura deste
livro até os capítulos antes deste, se encontrará incompleta, pois todos os
capítulos estão ligados e correlacionados entre si, além de também ter grandes
ensinamentos. Exaltar o Brasil (através das brasileiras) e também Òyó e
Òsogbo, é um dever que deve ser cumprido, aliás, como falar de Òsun, se não
falar de Òyó - que cumpre um importante papel na luta pela preservação e
mantimento da tradição da Religião de Orisa de lá - e também de Òsogbo - que
é o local onde mais se popularizou o culto de Òsun -, além de tantos outros
territórios (o mundo inteiro). Como diz-se a música: “(...)Todo mundo é
D’Oxum”. Devemos sempre respeitar a identidade da grande mãe e tudo
aquilo que envolve este Orisa, no mundo, deve ser bastante amplo,
abrangente, pois ela não faz distinção de nada, nem de intenção. Òsun é
simplesmente a grande mãe. Algumas vezes boa, outras vezes mãe, mas
sempre Òsun!
A cada tempo que se passa, mais brasileiros procuram o continente
africano para viajar e conhecer um pouco mais sobre os Orisa, no que tange a
tradição oral (litúrgica) e prática (ritualística) da Religião de Orisa de lá. É muito
importante que esse processo ocorra por diversos motivos, sendo alguns deles:
01) Ajuda a economia local e incentiva a prática da Religião de Orisa; 02) Ajuda
na manutenção da Religião de Orisa (tanto daqui, quanto de lá - o que é muito
importante); 03) Reafirma nossos laços e identidade, para com a cultura deles
e com aquele povo. Felizmente temos pessoas que utilizam suas estáveis
condições financeiras para viajar e muito colaborar e agregar para conosco,
mas infelizmente temos pessoas que viajam e retornam deslegitimando e
diminuindo o que existe aqui - se esquecendo que há algumas similaridades,
inclusive em “teclas que muitos batem”. Dentro da filosofia de vida encontrada
dentro da cultura dos Orisa, podemos encontrar algo chamado “Iwa Rere”
(significa: bom caratismo) que fala basicamente sobre termos que adotar bons
costumes, boas práticas e termos que praticar em nossa rotina boas atitudes,
pois um Orí é capaz de influenciar o outro (positivamente ou negativamente), e
95
como nossas ações positivas começam a partir da canalização de bons
pensamentos em nossa cabeça, devemos sempre estar com bons
pensamentos. Há momentos de maior fragilidade e entende-se que é difícil se
manter com muito otimismo, porém, se você não pensar de forma otimista,
positivista e negacionista ao negativismo, não será outro alguém que fará isso
por você, pois este alguém não é você. Talvez isso possa parecer algo de
autoajuda, mas acreditem que é, mas também não é. Esse ensinamento faz
parte de uma filosofia sobre Òsun que andei refletindo por algumas noites,
enquanto eu dormia nos mais diferentes horários da madrugada, ansioso pelo
lançamento do livro. A filosofia é a seguinte: “Òsun é o amor próprio, mas não
é o egoísmo”, ou seja, Òsun nos ensina que devemos nos amar, mas que não
devemos ser sempre egoístas em colocarmo-nos acima dos outros e de seus
respectivos problemas e entre outros. Existe diferença entre se amar e ser
egoísta. O amor próprio faz parte de Iwa Rere, pois alguém que possui bom
caráter, ganha tempo amando (a si e ao outro).
Não há iniciação maior que aquela que começa dentro de nós, e Òsun é a
água que todo dia entra e sai de nosso corpo, de diferentes formas. É a água
que mata a sede (que pode matar alguém), é a água que pode matar, que pode
curar e que pode desempenhar diferentes papéis. A água, por si só, já é uma
medicina em potencial. Òsun além de ser água, é um Orisa (por favor, não
aproximem o termo “Orisa” de “deusa”. Os conceitos Yorùbás sobre Orisa são
totalmente completos e não precisam de termos fora da cultura deles, para
definir algo que já é tão bem definido por si só). Acho que já falei bastante por
aqui, não é? Já são mais de 90 páginas exaltando muito Òsun, mas também
Esu, Sàngó, Obàtálá, Òrúnmìlà, Ogun e entre outros. Vamos agora ler e
aprender um pouco com as duas senhoras selecionadas para este capítulo?
Apertem o cinto da imaginação, que agora nossa viagem será para o outro
continente!
Começarei a falar agora sobre Adriana Simões Marino, uma senhora
nascida na Zona Norte do estado de São Paulo, pessoa que hoje em dia é
alguém totalmente dedicada aos estudos de meio acadêmico, principalmente
que envolvam as questões psíquicas de cada ser humano. Antes de ser
graduada na Faculdade São Marcos, deu aulas de ballet e teve como sucessão
de sua primeira graduação, a realização de um mestrado no Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), após isso se especializou em
96
psicopatologia e saúde pública pela Faculdade de Saúde Pública (USP) e tantos
outros dotes mais ligados a área acadêmica. Foi uma aluna bolsista que
batalhou bastante para conseguir se estabilizar em sua profissão e área de
formação acadêmica. Faz parte da Secretaria de Saúde do estado de São Paulo
e se mostra uma pessoa também ligada a grupos e movimentos importantes e
de total relevância para um avanço de todo um grupo que influencia no
desenvolvimento e bem-estar de toda a sociedade. Além de ser uma pessoa
com grandes dotes, é mãe de uma criança de cinco (05) anos de idade e se
classifica como alguém que gosta de fazer “1001 coisas” - observação: Òsun
também é a senhora que recorremos para que possamos ganhar criatividade,
pois também é a divindade que além de ter um útero fértil para gerar o ser
humano, também é quem entrega a ele, o dom da criatividade. Relata também
que no final de seu doutorado (2018), momento que estava pesquisando sobre
Política Pública (Políticas Sociais Públicas), ela desejava realizar algo que
pudesse marcar o início de um novo ciclo, de um novo momento, e até
mesmo, de se permitir a vivenciar novas sensações e sentir novas emoções.
Contatos novos, assim diríamos. Desejava viajar entre o período de Abril e
Maio de 2018 para que pudesse espairecer a sua mente, pois encontrava-se
em um momento de fragilidade. A defesa de seu doutorado seria em Outubro
de 2018 e ele marcaria, desde então, um novo ciclo.
Por não desejar realizar viagens que são costumeiramente organizadas por
agências de viagens, começou a pesquisar alguns lugares que poderiam lhe
despertar um interesse, até porque queria conviver por, no máximo, um mês
com pessoas novas e entre outros. Cogitou viajar para a Bahia e conhecer
algum terreiro de Candomblé, pois ele lhe traria - também - abrigo (não só
espiritual). Devo ressaltar, antes de dar continuidade: sua ligação com a
Religião de Orisa vêm desde os seus antepassados que cultuavam Orisa através
da Umbanda (uma das Religiões de Orisa de nosso país). Relata que na época
de sua bisavó, as reuniões ocorriam em casa e com muitas restrições, pois
havia represálias, o que dificultava mais ainda, porém, foram pessoas que
tiveram uma insistência em seus ideais e se mantiveram firme em sua fé.
Relata que sua avó costumava falar para ela, quando era mais jovem, sobre as
visões que tinha, inclusive foi uma das responsáveis por sua aproximação para
com a Religião de Orisa, pois suas falas eram sempre em bom tom e também
permitia que ela mexesse em seus fios-de-conta (Ìlèkè, guias), algo que ela não
97
permitia que as pessoas nem tocassem, além de ter também uma estátua de
tamanho médio em sua casa de um índio - conforme narra Adriana. Quando
em sua fase mais jovem e amadurecida (adolescente), começou a se interessar
pela Religião de Orisa mais ainda, porém, desta vez, começa a ir em busca
através de uma tradição e de Religião de Orisa que fosse mais compatível
consigo mesma (como se diz no dialeto popular: “Aquela que o santo bate”) e
entre outros. Procurou conhecer outras religiões - que não fossem a de Orisa -,
fez a primeira comunhão e narra que foi divertido, pois fazia com pessoas que
eram de seu agrado. Se iniciou em uma Religião Hindu (Ananda Marga),
frequentou a comunidade, fez retiros e entre outros. Sempre se interessou,
para além da arte e de tudo aquilo que mostrasse a capacidade do corpo, de se
expressar e demonstrar capacidades e habilidades que são tidas e devem ser
consideradas como artísticas. Quando entrou na faculdade, conheceu um
templo de Umbanda bastante interessante (templo regido pelo guia Guaracy,
cujo atual sacerdote é o Sr. Carlos Buby), local que frequentou por sete anos
(07) e é onde sua mãe ainda se mantém como, inclusive, filha-de-santo. Até
que um dia entra em um profundo questionamento sobre a espiritualidade em
seu contexto geral, para além também da existência de Deus e entre outros.
Solicita permissão para afastamento do templo, mas ainda manteve
contato com alguns amigos que fez, começou a realizar algumas visitas nada
frequentes e não constantes. Começa a pensar sobre o fato do transe de
Caboclos, Pretos Velhos e entre outros, serem meras representações geradas
pela mente de cada pessoa e entre outros. Pensava até que falas sobre sua
pessoalidade serem falas que eram algo para atrair e até mesmo gerar um
mistério e convencer de algumas situações, mas ressalta que teve vivências e
experiências que são - até hoje - importantes para sua pessoa e até para seu
amadurecimento. Durante pesquisas realizadas na internet, se espanta ao
descobrir sobre as terras Yorùbás e começa a se atrair, mas esta situação ainda
não havia florescido tanto. Durante uma reunião (alguns chamam de “sessão”)
em um templo espírita que ia com seu avô quando mais jovem - percebe-se
duas situações: conflito do passado quando ia com seu avô (quando menina) e
o “presente daquele momento” (que era uma fase mais amadurecida) - e havia
uma senhora que iria conduzir a reunião e que era praticante de uma Religião
de Orisa de nosso país (Candomblé). Conduziu por motivos de que seu irmão
estava com alguns problemas de saúde. Ao conversar sobre Orisa, a senhora
98
revela seu próprio Orisa e a jovem pergunta sobre que Orisa seria o dela (de
forma inocente) e a senhora fala de forma estúpida (não grosseira) diz que
pelo jeito “mais boba”, deveria ser de Òsun. Entrou em um questionamento
que afirmava “então se ser de Òsun é ser boba, eu não sou dela, pois eu não
sou boba”. Um dia sua mãe se dirigiu até um templo de um senhor chamado
por Pai Luizinho (mudei o termo para preservar a identidade, sendo assim, é
um nome fictício e não têm qualquer ligação e/ou compromisso para com a
realidade) e ao consultar os búzios (Èrindílógún), é revelado que ela era de
Òsun. A partir deste momento, começa uma série de pesquisas na internet
sobre Òsun (momento de descontração: quem nunca fez isso e se via através
dos arquétipos, que atire a primeira pedra. Até hoje em dia pessoas fazem e se
divertem com tal situação), mas repara que não tinha nada escrito sobre ser
“boba”, como bem definiu a senhora do templo espírita. O jogo de búzios
revelou que era um espírito muito antigo e fez algumas falas bastante
interessantes sobre a pessoa dela.
Infelizmente, pelo fato da Embaixada do Brasil e da Nigéria não terem tão
boas relações (inclusive por recomendações sobre a ida pra lá e entre outros),
ela se pôs ainda a observar mais ainda o cenário, mas persistiu, mesmo se
esbarrando por algumas dificuldades de encontrar certas informações. Ao
clicar no link de um flyer de um nigeriano que mora no Rio de Janeiro, que é
babalawo, mesmo sem muito entendimento, ela vai atrás, pois seu único
interesse era alcançar essa tão desconhecida “terra Yorùbá”. Ao conversar com
este nativo sobre seu interesse de conhecer mais sobre aquele território, sobre
querer viajar, conhecer mais e ficar em uma comunidade local e entre outros.
Se coloca a disposição de fazer iniciação caso fosse necessário, mas que queria
mesmo era conhecer e entre outros. Neste mesmo local, se encontra com uma
sacerdotisa de Oya, iniciada por Oyabusola (uma das principais sacerdotisas de
Oya em Òyó) e entra em contato com esta senhora. Ela colocou Adriana em
contato com a doutora Paula Cristina Gomes, foram realizados alguns alertas -
que não foram e nem deveriam ser desconsiderados - e entre outros. Sua
família até tentou incentivá-la a ir para outro país, mas logo depois ao tomar
conhecimento mais embasado do propósito de Adriana, apoiaram e, inclusive,
o pai de Adriana a acompanhou até o aeroporto (algo que não é muito comum
acontecer). Sua viagem, após alguns diálogos, foi decidida em questão de um
mês (julho), mas tinha um foco que era ir no festival de Òsun em Òsogbo que
99
ocorre tradicionalmente em agosto, e não tirou esse foco de sua cabeça.
Durante suas muitas das conversas com doutora Paula, foi consultar os Orisas
e confirmou-se o fato dela ser de Òsun. Elogia a atitude e boa postura de
doutora Paula - classifica como zelosa, cuidadosa e atenciosa - enquanto
permanecia por tal local, assim como muitos outros elogiam. Enquanto
organizava a sua ida e resolvia todos os trâmites para viajar, aguardava o
resultado de um processo seletivo (que acabou não sendo favorável a ela). Em
julho apresenta Renata Barcelos e Adriana por whatsapp por intermédio de
Paula, pois seria uma brasileira que já estaria por lá antes da ida de Adriana (e
assim se inicia a amizade e vínculo entre as duas) e diz que foi um tanto
preparada por sua irmã Renata e graças a ela conseguiu ter sucesso nos
cuidados. Fala que Renata é uma grande mãe, irmã e até mesmo elogia sua
dedicação, que é algo pouco visto. Elogia também Sàngó (Flávio de Paula), um
grande irmão e amigo - pessoa que ela narra em diferentes trechos da
narrativa sobre sua trajetória e o classifica como alguém importante. Doutora
Paula comenta com Adriana também que havia a possibilidade da ida de uma
pessoa pra lá (também brasileiro - Flávio “Sàngó”), na mesma data que ela. Em
todos esses momentos, ela se encontrava perdida, pois muitos deles tinham
mais bagagens e até interesses mais fixos e destinados que ela. Se encontrou
com Renata em seu local de iniciação (dentro da casa de Iyemojá), fala sobre a
aproximação delas duas, narra sobre sua ida ao festival de Òsun Òsogbo,
depois realiza alguns ritos para Egbe (algo que já era planejado antes de pisar
por lá, pois o oráculo havia apresentado que ela deveria fazer isso) e aí parte
direto para o momento de sua iniciação em Òsun (Òyó).
Inicia sua fala sobre a situação de “segredos de hunkó (ou roncó)” e que
deve-se tomar cuidados. Logo, de cara, começa a falar sobre um pouco da
percepção que obteve ao observar a relação Yorùbás - Orisa (e vice-versa).
Segundo ela, os Orisa seriam como pessoas da família, e não como uma
Religião (dentro dos conceitos e princípios perceptivos ocidentais) e comenta
sobre a situação do foco que era dado a pessoa branca. Relata que devido os
estragos causados pela colonização, pessoas brancas são muito potencializadas
por lá (há postagens feitas em 2019 por Renata Barcelos em suas redes sociais,
narrando sobre isso). Relembra que o “Sàngó” foi a pessoa que também a
preparou bastante para a iniciação e ressalta que não havia feito pesquisas
sobre iniciação e situações de lá e foi totalmente sem conhecer as ritualísticas,
100
práticas e costumes tradicionais, no que tange a Orisa. Conta que após a
realização de determinadas ritualísticas no rio, já se encontrava em um estado
de possessão (o que a consagra oficialmente como uma elégùn), com uma
cabaça em cima de sua cabeça, já não conseguia controlar mais o seu próprio
corpo e não tinha muito domínio de si. Ao entrar na casa de Òsun, após o
retorno dos ritos realizado no rio, têm uma sensação sobre ter tido alguma
presença por aquele local em algum outro momento (obviamente: vida
passada, pois nesta vida, seria ali, seu primeiro contato). Quando pisou no
quarto, se lembrou de algumas situações que a fizeram entrar em um estágio
de fragilidade maior, e algumas destas, de forma bastante interessante, foram
simplesmente ignoradas e esquecidas. Narra sobre sua experiência e
dificuldade para satisfazer suas necessidades fisiológicas e que isso lhe
acarretou em um pequeno problema que foi sanado ao tomar uma medicina
tradicional. Não havia fossa e nem buraco na terra, era um tipo de pinico e
sempre estava acompanhada por tudo. Relembra que uma senhora que esteve
muito presente em sua iniciação e a acompanhou, era a sacerdotisa de Obàtálá
(Ìyá Oosaponmile), uma senhora de muita idade. Dona Oosaponmile e Adriana
se entendiam, mesmo uma falando somente Yorùbá e outra somente Inglês e
que conseguiam se entender bem. Adriana contribuiu muito e contribui para
com a sua comunidade, em diferentes aspectos.
Òsunyemi (orúko de Adriana) fala sobre tudo o que pensava, acontecia
durante seu momento de reclusão e comenta com o seu amigo chamado de
Sàngó. Pensava até que podia ser algum tipo de surto, pois conseguia dar
apenas treze passos dentro do quarto que estava e onde também estava o Igbá
de Òsun e que às vezes encontrava uns ratos pelos buracos da casa que estava
em um estado de maior desgaste. Foi dito para ela que era normal isso
acontecer, pois ela estava em muita sintonia com Orisa e por ele estar muito
próximo dela, isso acontecia. Seus banhos, suas rezas matinais e os momentos
que ela reverenciava as pessoas e que também as pessoas também a
reverenciavam, ela ia saudar o Igbá de Òsun (que dizem ser o mais antigo de
terras Yorùbás - até mais que o de Òsogbo - mas isso é questão de oralidade e
crença de cada pessoa) e até pessoas que choravam ao consultar Òsun (assim
como ela). Com muita emoção fala de sua realização pessoal, de sua alegria, de
sua felicidade e até mesmo do sentimento de pertencimento que teve, devido
o acolhimento da comunidade a que ela foi iniciada e entre outros. Fala sobre
101
que, embora tamanha humildade, sempre era tudo muito limpo, cuidado, os
alimentos eram bastante saborosos e outros. Extasiada e muito alegre fala que
foi uma experiência muito boa e que pretende até repetir novamente.
102
Fotografia 60 - Estátua de Òsun Òsogbo.
Fonte: Adriana Marino - Acervo Pessoal.
.
103
Fotografia 61 - Sàngótola (Flávio), Mr. Kola, Òsunyemi e Sàngódamilare (da direita para a
esquerda).
Fonte: Adriana Marino - Acervo Pessoal
104
Fotografia 62 - Consulta oracular antes da realização de ritos tradicionais iniciáticos.
Fonte: Adriana Marino - Acervo Pessoal.
105
Fotografia 63 - Òsunyemi e Iya Oosaponmile.
Fonte: Adriana Marino - Acervo Pessoal.
106
Fotografia 64 - Corredor da casa em que foi abrigada. Primeiro quarto à direita (quarto de
Òsunyemi), segundo quarto à direita (quarto de Bàbá Òsun) e quarto à esquerda é onde fica
o principal local de culto à Òsun.
Fonte: Adriana Marino - Acervo Pessoal.
107
pessoas carismáticas e, pelo menos, as muitas pessoas (mais de 50) que eu
lidei para escrever este livro, foram bem educadas. Apertem o cinto e o “sinto”
(sentimento) e vamos nessa!
Falaremos agora, sobre a Sra. Tânia Schmidt de Carvalho, uma descendente
(neta) de um senhor de nacionalidade alemã, mãe de uma criança de onze (11)
anos de idade, cujo envolvimento com a Religião de Orisa começou quando
criança e desde seus ancestrais, onde grande parte de sua família têm
envolvimento com Candomblé, Umbanda, Espiritismo e entre outros. Quando
alcança seus dezoito (18) anos, é iniciada na Religião de Orisa de nosso país
(Candomblé) para Iyemojá e se retira de tal Religião aos 21 anos por motivos
de dissidências e não identificação que tinha para com essa Religião de Orisa.
Aos 29 anos de idade conhece duas pessoas que se tornaram grandes amigos e
que foram apresentados por uma pessoa que ela considera como um tio, que é
amigo de sua família e também praticante de uma das Religiões de Orisa daqui
(Carlos, seu nome). Ao observar que a jovem estava sem um templo, pouco
perdida e sem direção, apresentou a sua figura até estes dois senhores que são
de Ifá. Carlos falou com ela e narrou com uma visão mais leiga e conseguiu
levá-la para consultar o oráculo com os senhores Marcelo e Erik (iniciados para
Òrúnmìlà, conhecedores de Ifá, através de um Babalawo conhecido como
“Bàbá Salao” - lê-se: sálao) e a partir deste momento, deu início a uma nova
etapa em sua vida. Não se identificou com a Religião de Orisa daqui por seus
motivos, mas se identificou com a de Orisa de lá. O importante é que entre
tudo isso, sua fé em Orisa não se perdeu. Sua história de vida é marcada por
agressões, relacionamentos abusivos e sofrimento, mas sempre perseverante e
batalhando por seus propósitos. Pelo fato de o babalawo de seus amigos ter
criado um laço afetivo a mais, ela se afastou deles e aí continuou novamente
seguindo sem cultuar Orisa e Ifá (algo que conheceu e se identificou).
Conheceu seu Oluwo Ifatoki (nativo da cidade de Iseyin, em Òyó) e durante o
tempo em que conhecia seu Oluwo, sua filha começou a desenvolver
problemas respiratórios graves, onde narra que durante uma das crises que
sua filha teve, ela foi parar no hospital e isso estava próximo de sua ida para a
Nigéria se iniciar em Ifá (que era o caminho e destino dela, segundo o oráculo),
mas com muita insistência, Ifá salvou a vida de sua filha, uma bebê de quatro
(04) anos entubada no CTI. Enquanto ela deixava sua filha em alguns
momentos, sozinha no hospital, ia agindo o que deveria agir, porém, não sabia
108
nem direito o que estava fazendo (pois não falava inglês e entre outros), mas
tinha muita fé e esperança - narra com emoção. Na época ela trabalhava como
segurança de banco, realizou um empréstimo e conseguiu o valor de sua
viagem e com muito sacrifício foi se aproximando de seu destino. Sua filha se
retirou do hospital no dia 03/08/2014 e no dia 04/08/2014, estava indo viajar
para realizar a sua iniciação em Ifá (Itefá). Revela que foi uma atitude de mais
fé, do que de razão, pois muitos desconheciam ifá e realizavam apontamentos
a Ifá, inclusive ela foi vista por muitas pessoas como alguém louca. Ao pisar nas
terras sagradas do continente africano, sentiu por seus pés, o que foi levado
até o seu coração - um único sentimento de retorno às origens. Ao pisar
naquele local, sentia que pertencia e reconhecia aquelas pessoas, foi uma
identificação muito grande. Orgulhosamente fala do apoio de sua família para
consigo mesma, pois eles mesmo sem entender bem o que era, assim como ela
também, apoiaram. Quando passou por determinados ritos, ao ser realizado
uma consulta oracular para ver qual seria o odù que rege a pessoa dela e que
fala sobre ela, logo foi sacado: Ejiogbe (adianto: um importante odù. Ejiogbe é
similar a ejionile). Assim que sacado este odù, muitos se surpreenderam, pois
além de ser uma mulher, ela também é branca e isso surpreendeu muito a
estas pessoas. Ejiogbe é um odù de muito poder.
Com um tom de emoção e empolgamento, fala sobre Ifá ter sido a busca
dela para um novo início, um novo momento, uma nova oportunidade e uma
nova forma de buscar a união em sua família e a saúde de sua filha. Segundo
ela, os Yorùbás narraram que ejiogbe é o rei dos odù. Quando retorna para o
Brasil com “uma tigela cheia de ikins sem saber direito o que era” - nas
palavras dela - começa uma nova etapa: a busca pelo conhecimento e pelo
aprendizado. Seu Oluwo acabou falecendo um tempo após e ela acabou
conhecendo um sacerdote nativo de Òsogbo chamado Ojekunle Olaifa Akande
e dá seguimento até hoje com ele, diz que têm muita gratidão e que se tornou
o que é hoje, pela ajuda dele. Diz que ele é alguém muito importante na vida
dela e responsável por seu crescimento enquanto sacerdotisa de Ifá e Orisa.
Em 2016 retorna para a Nigéria, pois dentro de seu odù Ifá há versos que
narram sobre ela ser elEgbe (pessoa que deve cultuar Egbe Òrun) e para ela,
muitas situações se justificaram através disso, inclusive os problemas que sua
filha e ela mesma, enfrentaram com o passar do tempo. Explica que Egbe Òrun
também atrapalhava suas relações e também atrapalhava o desenvolvimento
109
de sua filha, pois a aproximação de seus companheiros do Òrun, lhes rendia
problemas. Ao retornar em 2016 para se consagrar para Egbe, também se
consagra para egungun, se tornando a primeira mulher estrangeira iniciada
para egungun em Òsogbo. Sua consagração para egungun se deve a um odù
que foi apontado durante a sua iniciação para Egbe, onde apontava que
deveria ter egungun, pois como não tinha pai, e ele supre justamente a função
de um pai. Confirma que realmente seu pai faleceu e sua mãe é uma mulher
guerreira, admirável e que é a melhor pessoa que ela conheceu nesta vida. Sua
mãe criou ela e seus quatro (04) irmãos sozinha, foi uma senhora que
trabalhou para dar boas condições aos seus filhos e ensinou para seus filhos
que eles jamais deveriam depender de outra pessoa, mas que eles deveriam
batalhar e lutar por aquilo que eles desejavam conquistar.
Entre apontamentos que iriam surgir a partir daqueles ritos, quando fossem
ditos para as pessoas e entre outros, ela não ligou. Aprendeu que nasceu com
a condição espiritual de emere e que é uma Iyalode - ambas são condições
(uma de espiritualidade e outra de sacerdócio) de uma pessoa dentro do culto
a Egbe Òrun, e por este livro não ter foco a essa questão, não irei abordar
sobre esse assunto tão complexo por aqui. Narra que Egbe foi uma das
iniciações mais fantásticas, incríveis e maravilhosas que já fez. Como ela narra:
“Ifá foi o portal, Egbe e egungun foi essencial, pois através deles, tudo o que eu
não conseguia ter por um tempo, eu consegui ter. Egungun me ajudou a ter
união familiar, fez com que não brigássemos mais, aproximou o amor fraterno
para perto de nós (os familiares) novamente”. Egbe, como ela também relata,
trouxe muitas informações e fez com que soubesse interpretar a si mesma,
através do conhecimento que estava obtendo dentro deste próprio culto que é
tão essencial e importante. Ifá a levou para Egbe e egungun, Egbe a entregou
para Òsun. Talvez essa última frase não tenha muito sentido antes de você ler
essa próxima explicação: Após sua iniciação para Egbe, muitas situações
começaram a aparecer para ela, inclusive Òsun em seus sonhos e também via
em Òsun, a esperança de ter um Àse a mais, pois ela é a grande mãe que
ampara seus filhos. Se formos estudar a história desta sacerdotisa, veremos
quantas situações nos ligam e nos remetem a Òsun. Se fizermos o mesmo com
a sacerdotisa anterior, teremos também este resultado, essa concepção. Òsun
é a mãe que não deixa seus filhos sem respostas e desamparados.
110
No ano de 2019 retorna para Òsogbo com a finalidade de se iniciar para
Òsun e antes de ir e de tudo dar certo, havia pedido ao Orisa que ela não havia
ainda sido iniciada, mas que tinha muita devoção, que ajudasse ela a ter
condições de retornar para Òsogbo e se iniciar com suas sacerdotisas, as
detentoras do Àse de Òsun, aquelas que conhecem Òsun e que saberiam
conduzir tudo de forma mais correta e respaldada possível. Após seus pedidos,
foi em uma cachoeira realizar ritos tradicionais, entre eles, uma oferta de um
pombo para Òsun, mas preferiu não sacrificar o pombo, pois havia a presença
de adeptos da Umbanda e até outras pessoas que não sabia-se a Religião.
Preferiu não confrontar ninguém. Ela rezou o pombo, ofertou Obi e entre
outros. Assim que soltou o pombo, ele não voou. Simplesmente retornou para
perto de Tânia. Ela o pegou de volta, levou para sua casa e foi até um local de
adoração a Òsun que ganhou durante sua iniciação para Egbe Òrun. No
momento em que foi sacrificar o pombo, ao invés de sair sangue, saiu água - o
que a emocionou muito e mostrou que Òsun estava a favor dela e que se fez
presente ali. Após isso ela conseguiu o dinheiro para que suprisse todos os
seus custos e gastos que teria durante a estadia. Narra que ao chegar lá e
durante tudo o que ocorria, era algo positivo e que foi positivo. O odù de
iniciação para Òsun (dela) é Irosun, e neste odù é narrado passagens onde
Òsun é esposa de Sàngó. As sacerdotisas de Òsun que realizaram a iniciação
dela, imediatamente afirmaram que ela é uma legítima filha de Òsun. As
sacerdotisas disseram que ela realmente precisava despertar esse Àse (força)
dentro dela, que é Òsun.
Dona Tânia diz que Òsun é a mãe benevolente, é a verdadeira mãe, cujo
significado não é somente a beleza, vaidade. É a guerra, pois foi a mãe que
criou seus filhos de forma corajosa, a que lutou para ser bem sucedida. Seus
esforços fizeram com que ela fosse vitoriosa. Ela entra onde só existe homem e
mostra que ela é mulher forte, é a mulher que todos podem descredibilizar,
mas que acredita em si. Òsun ensina sobre perdoar, cura as feridas e
transforma as lágrimas em alegria e felicidade - e tudo isso é Òsun na vida de
sua filha Tânia e também na de muitos. Narra que Òsun é o equilíbrio que ela
precisava para sua vida. Seu orúko é: Iyanifa Iyalode Egbedunmomi Ifayemi
Ojefunke Òsunkemi Aduke. Narra que fechou seu ciclo de iniciações com Òsun
e que após isso ela se sentiu completa. Iya Olósun Òsunkemi Aduke narra que
têm muitos problemas para engravidar, mas que ainda têm esperanças de
111
engravidar mais uma vez. Após uma consulta oracular, Òsun apontou Ire Omo
(ou seja, ela iria ter sucesso em seu desejo de ter filhos), após isso conseguiu
engravidar, só que ocorreu um aborto espontâneo, mas sua mãe já prometeu
lhe dar outra criança, e que ela viria com muita saúde e traria alegria para
todos. Finaliza dizendo que não consegue falar sobre Òsun, pois seus
sentimentos abafam suas palavras, mas em breve descrições, ela diria sobre
Òsun, o que foi descrito anteriormente.
112
Fotografia 67 - Outro momento de realização do Itefá (2014).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
113
Fotografia 68 - Consagração para Egbe Òrun (2016).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
114
Fotografia 69 - Segundo momento da consagração para Egbe Òrun (2016).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
115
Fotografia 70 - Consagração para Egungun (2016).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
116
Fotografia 71 - Segundo momento da consagração para egungun(2016).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
117
Fotografia 72 - Iniciação para Òsun Òsogbo (2019).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
118
Fotografia 73 - Segundo momento da iniciação para Òsun Òsogbo (2019).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
119
Fotografia 74 - Terceiro momento da iniciação para Òsun Òsogbo (2019).
Fonte: Tânia de Carvalho - Acervo Pessoal.
Antes de finalizar este capítulo, gostaria de dizer a todos os leitores que todas
as fotografias expostas aqui, não ferem o segredo e nem o sagrado da Religião
de Orisa. Não há a exposição de forma indevida, não há quaisquer
ensinamentos e/ou explicações, portanto, este livro preserva e não expõe
qualquer informação ou conteúdo que seja segredo.
120
Capítulo 07 - A Figura de Òsun na Luta Contra o Machismo
121
(valores, princípios e até mesmo, a estética). O próprio império de Òsun é
construído a partir da essência que ela carrega e tudo o que se têm, é pelo fato
de ter sido uma boa estrategista e também por ter sido uma senhora muito
sábia (inteligente). Observa, ainda, que o patriarcado de onde se origina o
machismo que atualmente conhecemos, em verdade, é fruto de propriedade
europeia ocidental, e que por isto, a entrevistada não se sente confortável em
associar Òsun com o feminismo (enquanto uma ferramenta de combate e
enfraquecimento do machismo, além de existirem outras causas que Òsun
podia ser mais bem encaixada e adequada no contexto), pois Òsun não
conheceu o machismo, visto não ser proveniente da África de onde se originam
seus mitos. Òsun conheceu a si mesma e a partir disso, se empoderou para
lutar contra os demais obstáculos que apareciam. Apesar de que Òsun, nas
narrativas encontradas através de meios orais, possa ser uma mulher
soberana, independente e entre outros, e isto realmente pode se adequar,
enquadrar e se encaixar para com algumas propostas e ideologias do
feminismo, de qualquer forma, - ela afirma -, não podemos enxergar Òsun
como uma figura representativa do feminismo, uma vez que este ambiente de
violência que pressupõe a existência deste movimento, também ocidental e
europeu, não condiz com a origem desta divindade. Os próprios Ìtàns relatam a
atmosfera africana em que o contexto entre os homens e mulheres, não se
apoiava de forma alguma em supremacias de um sexo em relação ao outro,
mas respeitava suas singulares potências individuais, enaltecendo a figura
familiar de tomada de decisão e respeito mútuo, não se “alimentando” da
violência gerada pelo machismo como conhecemos. Os Ìtàns trazidos até nós
(do continente africano) mostram que as tarefas masculinas e femininas são
separadas pelo fato de procurar realizar um equilíbrio e balanceamento entre
os espíritos femininos e masculinos, sem que isso os delimite a si mesmos, ou
subordinam uns aos outros.
Ao realizar uma comparação bastante precisa entre lavar as joias, afirma que
vive-se em uma sociedade que impulsiona as mulheres a gerarem filhos, para
depois lavá-los e só após tudo isso feito, elas devem lavar as próprias jóias -
isto se realmente houver capacidade, desejo e oportunidade para esta mulher,
para que possa conquistá-las, pois, como também observa, as mulheres
crescem cercadas de objetos e discursos que submetem a própria pessoa delas
a tarefas que estimulam trabalhos domésticos ao invés de desenvolver novos
122
talentos e até mesmo de aptidões que são ignorados e esquecidos, para serem
redescobertos em um tempo mais tarde com o ingresso em âmbito acadêmico,
isto é, levando-se em conta aquelas que tiveram oportunidade para tanto, o
que já caracteriza uma minoria em relação à grande realidade das mulheres
brasileiras, em especial, as mulheres negras e periféricas, que abrem espaços
em suas juventudes para o trabalho ou a maternidade precoce.
Segundo sua análise, Òsun se estranha do contexto feminista pelo fato de que,
sua existência não preconiza o combate de qualquer movimento oposto que a
queira subalternizar ou rivalizar, ela apenas se preenche e existe dentro de sua
imensa forma e cosmo insubmisso, e por sua vez, este seu arquétipo tão
independente faz com que muitas das mulheres questionem internamente
sobre o porquê de não poderem alcançar determinados espaços que lhes
foram retirados antes de seu nascimento. Òsun é a água que consegue realizar
o alcance de todos os espaços, pois, flexível, passa por entre as pedras sendo a
mesma que arrebenta o muro das impossibilidades, através de sua força. Do
seu ponto de vista, o machismo confronta Òsun, ao fomentar pensamentos
que subestimam seu poder, julgando-a uma divindade tão somente dócil,
sedutora, que tudo compreende e como a personalidade de uma mulher feita
para satisfazer os desejos de outrem. Nisto, assim como subestimam Òsun,
também subestimam as mulheres, e se esquecem de que ambas as figuras se
tratam de seres responsáveis pela continuidade e manutenção da vida. Thais
afirma que Òsun convida as mulheres a reconhecerem sua essência e poder,
não pela necessidade de sobrevivência, mas pelo simples fato de serem este
poder, além de também propiciar uma reflexão sobre quais espaços se deseja
atingir e o porquê de se tardar esta luta para atingir o local que se almeja, uma
vez que constituem esta força e apoio tão grande dentro de si mesmas.
Conforme aduz, Òsun é o Orisa que representa a força e o respeito feminino, é
aquela que conhece os segredos da vida para além da morte, pois carrega
consigo os mistérios da fertilidade e a capacidade de gerar uma nova vida,
assim como as mulheres. Através de todo seu significado e importância,
remete às mulheres a realizar um questionamento sobre os exemplos que
estão tomando para si mesmas (deve-se compreender: de meninas à
mulheres) e se ainda continuam lavando os “filhos” antes de lavar as suas
próprias jóias. Relata Thais: “(...) Se ainda continuamos nos questionando se
somos dignas de nossas jóias. Se sequer sabemos que merecemos tê-las. Nesta
123
brecha, adentra-se a violência moral, patrimonial e psicológica, o estupro, a
perseguição, a objetificação, o imperialismo aos quais somos sujeitas a todo
momento. Eu, você e todas as pessoas que conhecemos, conhecem alguma
mulher que passou por algum tipo de violência extrema devido à sua condição
de mulher, seja a qual nível for, isto é, se não formos nós mesmas esta
mulher”. Aproveita a oportunidade que foi entregue à ela para realizar uma
consideração de que, por maior que seja o espaço e oportunidade confiado e
conquistado por uma mulher, independente das barreiras impostas pelo
machismo e por outros problemas estruturais pertencentes à nossa sociedade,
e que por mais que estas mulheres tenham se espelhado no arquétipo das
águas para alcançar tais espaços, ressalta que é ainda mais importante falar
sobre Òsun e seu significado às outras mulheres, pois ao falar sobre esta mãe,
é exposta e explicitada a capacidade que todas estas mulheres possuem de
conquistar, assim como a Deusa, suas próprias “jóias”. Nesta oportunidade
observa, que ainda que, isto pode ser ressignificado e trazido para os mais
diversos ambientes, mesmo aqueles que sejam presididos por homens em sua
maioria. Inclusive, ressalta, que estes ambientes estão ainda mais carentes e
necessitados de que as mulheres atinjam esses espaços, uma vez que não há
equilíbrio onde as duas energias não se comuniquem em pé de igualdade,
ainda mais levando-se em conta o arquétipo masculino que predomina e
permeia nossa sociedade, pautado em disputas de ego, violências e agressões,
típicas do contexto machista. Òsun é a água que permite tal equilíbrio. Embora
os arquétipos que rodeiam Obà e Oya, deidades igualmente femininas, sejam
mais brutos e vorazes que os de Òsun, deve ser sempre lembrado que Òsun é
quem forja a sua própria arma para ir à guerra e que também reveste o seu
próprio corpo - se tornando a sua própria jóia. Quando se leva esta informação
a outra mulher, deve-se entender que as mulheres refletem a própria essência
de Òsun no desejo de exercer o seu próprio propósito e vontade em qualquer
âmbito e finaliza dizendo: “Seja como uma rainha ao lado de um rei, seja como
uma feiticeira e guardiã de conhecimentos sagrados e ancestrais, seja como a
uma grande mãe, seja como uma força gigantesca e natural. Òsun é a
materialização de toda a capacidade feminina de criação e portanto, é o
exemplo que nós devemos seguir, assumir, relembrar e utilizar em todos os
nossos dias, para muito além da criação de filhos, de um lar, ou de um amor
bem sucedido, sendo estes também possíveis, mas abrangendo toda a
124
predestinação e capacidade de escolha inerentes aos nossos Orís e às forças
femininas primárias que carregamos em nosso espírito ancestral, que é
diariamente bombardeado com mensagens explícitas e subliminares que nos
dizem o oposto. Toda mulher carrega em si esta bênção infinita de ser água, e
onde há água, há vida, e portanto há Òsun ávida por lavar suas joias”.
125
chama Andréia Amorim Ribeiro. Uma mulher trans descoberta desde sua
própria existência, pois a nossa própria essência, carregamos conosco desde o
nascimento - e cabe a cada um, aceitar ou não - e é assumida há pouco mais de
20 anos. Narra que é Ònífá há mais de 14 anos (fora os 10 anos que vivenciou
como uma não iniciada na Religião de Orisa de nosso país), assim como para o
Orisa Obalúayé pelo Sr. Sacerdote Wanderlei do Carmo ti Ara (Ayrá - como
muitos também o chamam, inclusive eu), que foi iniciado e aprendiz de
saudosa mãe Regina ti Iyemojá - também da tradição Bamgbose - cujo templo
matriz se situa em Santa Cruz da Serra, no bairro de Duque de Caxias, no
estado do Rio de Janeiro.
Ao ser consultada sobre o machismo, fala que infelizmente é uma cultura
enraizada desde épocas muito antigas e que infelizmente acabou com a vida
de muitas mulheres, assim como ainda acaba com a vida de muitas na
atualidade. Como uma funcionária pública na área da saúde (auxiliar de
enfermagem - exerceu o cargo por muitos anos), observa bem que mulheres
trans, assim como mulheres cis (as que se identificam como mulheres desde o
seu nascimento) sofrem bastantes preconceitos. Alguns são iguais e outros
diferentes, pois infelizmente muitos realizam comparações bastante
preconceituosas e desrespeitosas a reputação de uma mulher trans
(principalmente, mas que não anula o acontecimento entre mulheres cis). Fala
que é lamentável ver que neste século, pessoas ainda se submeterem a agredir
as outras por motivos fúteis - e mesmo que não fossem, ninguém têm o direito
de agredir alguém, principalmente no âmbito físico. De forma orgulhosa narra
que não sofreu preconceito ou qualquer tipo de olhar que revelasse alguma
resistência a sua identidade de gênero, dentro de sua família espiritual (tanto
por parte do sacerdote, quanto por seus irmãos e por demais descendentes) e
também por parte de seus amigos (pessoas que ela se orgulha muito de ter por
perto, pois são pessoas verdadeiras - em sua concepção).
Dona Andréia relembra que, para que possa ser mulher, não se trata de
uma condição, ter vagina, e reforça a ideia de que todos, independente da
orientação sexual, da identidade de gênero, de credo, de etnia,
posicionamento político ou o que for, deve ter sempre caráter, pois a ausência
dele causa muitos estragos, inclusive os desvios de comportamentos que
abrem espaço para a machismo, racismo, lgbtfobia e entre tantas outras
situações que atordoam e assolam a nossa sociedade e que ferem o direito do
126
outro de ser livre. Relembra que para ser feliz, as únicas condições devem ser:
ter limites, prudência e cuidado. Devo ressaltar uma frase que ela disse: "Para
que possamos felizes, precisamos aceitar quem somos e aceitar o que temos,
para que saibamos reconhecer o que precisamos".
Fala também que ser mulher negra, trans e também da Religião de Orisa
daqui, é para poucas pessoas, pois a luta é muita grande e muitas pessoas
decidem parar de seguir seus propósitos para isso, pois nem todos estão aptos
a enfrentar tantas barreiras, tabus e situações. Cada um possui seu destino. Foi
casada com um cristão protestante que seguia a Assembléia de Deus, mas por
ele ter sido uma pessoa que não conhecia bem, ela começou a se impôr e
também começou a introduzi-lo sobre a Religião de Orisa, pois por mais que
ele não quisesse seguir, tinha de conhecer o mínimo, para que não se
permitisse cair em algumas mentiras que criaram por aí, para justificar a
127
demonização da espiritualidade afro e também afro americana. Relembra que
seu companheiro tinha muita resistência, ainda mais quando ela dava consulta
todas as primeiras e últimas segundas-feiras de todos os meses (ainda faz isso)
com divindades conhecidas como "Exu Catiço", mas ressalta que não é de
costume da sua tradição (Bamgbose) cultuar essas divindades. Apenas cultua
quem já cultuava antes, pois eles respeitam o que vem antes, durante e
depois. Antes de iniciar suas falas sobre Òsun, diz que em um país onde
mulheres trans são tidas como prostitutas (somente) e as mulheres cis
também são pessoas ligadas aos cuidados de casa. Machismo nítido - ressalta.
Ela levanta a possibilidade de ter feito e de ter sido a diferença, pois passou
noites estudando para que também, além de para ter uma boa condição
financeira, também representar as pessoas trans (homens e mulheres).
Inicia sua fala sobre Òsun narrando que ela foi um Orisa feminino (Obinrin)
que não se curvou ao machismo imposto pelos Orisa Masculinos (Okùnrin),
pois também batalhou para ir a guerra e também para ir a caça. Quando ela foi
proibida de cumprir uma determinação de batalha que Obàtálá ia comandar,
ela matou todos os guerreiros que eram oriundos de uma comunidade, que
aprenderam por lá. Ela mostrou seu poder (Àse) e também sua força (Àse).
Finaliza sua fala dizendo: "Esse papo que atrás de um grande homem existe
uma grande mulher, é verdade, pois existe uma grande mulher que não se dá
valor e não se respeita". Diz que quando Òrúnmìlà deu o dom da maternidade
para Òsun, que ele não disse que ela deveria ser uma procriadora (pessoa que
faz muitos filhos), mas sim, uma mãe. Uma mãe guerreira, brava, destemida e
corajosa. Uma verdadeira mulher. Òsun é o empoderamento feminino porque
ensina que devemos nos encorajar e lutar por aquilo que é nosso. Antes de
finalizar as falas cabíveis para o livro, ensinou um Ìtàn muito interessante, que
registra até a presença do Lògúnède. Conta-se que Òsun havia saído de seu
reino junto de Òsóòsì e foram até a mata caçar, para que pudessem alimentar
o povo do reino dela, pois embora ela fosse uma boa caçadora, se ela se
juntasse com outro bom caçador, ela conseguiria 2x mais alimentos para o
povo (que não era pouca gente). Durante a caça, eles passam próximos a um
rio e escutam o choro de uma criança, e quando se aproximam, encontram
aquela criança - que seria Lògúnède, a criança que recebeu este nome através
de um consenso de Òsun e Òsóòsì. A criança foi imediatamente resgatada por
Òsun e seu parceiro, foi cuidada e criada por eles. Durante a criação, Òsun deu
128
o poder do amor e o brilho do sol, para que esta criança jamais fosse ignorada
e esquecida, mas que também fosse necessária, pois o brilho também aquece
(e precisamos de calor para sobreviver); Òsóòsì deu o poder da caça e do
conhecimento sobre os animais.
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