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Patologia Aplicada

à Farmácia
Inflamação e Reparo

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Me. Carolina Vieira

Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
Inflamação e Reparo

• Inflamação e Reparo;
• Alterações Hemodinâmicas da Inflamação Aguda ou Eventos Vasculares;
• Eventos Leucocitários da Inflamação ou Eventos Celulares;
• Mediadores Químicos da Inflamação;
• Destinos da Inflamação Aguda;
• Inflamação Crônica;
• Reparo.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Conhecer os conceitos fundamentais sobre a inflamação e o processo de reparo.
UNIDADE Inflamação e Reparo

Inflamação e Reparo
Começaremos a estudar os importantes conceitos de inflamação e reparo, os
quais estão presentes em uma grande variedade de doenças. Os principais tópicos
que serão abordados correspondem aos eventos vasculares e celulares que permeiam
a resposta inflamatória, os mediadores químicos envolvidos no processo e como eles
se integram na tentativa de reparar o tecido lesado.

Classicamente, a inflamação é definida como uma resposta tecidual fisiológica a


uma agressão (de origem infecciosa ou não). No entanto, quando a resposta inflama-
tória persiste insistentemente ou ocorre de forma patológica pode levar ao compro-
metimento do estado de homeostasia corporal, podendo evoluir à disfunção orgânica
e à morte do paciente.

Para você ter uma melhor compreensão da evolução histórica dos conceitos
ligados à resposta inflamatória, é importante lembrar que a primeira descrição
da inflamação data do primeiro século da era cristã, pelo médico romano Aulus
Cornelius Celsus (26-50 d.C.), que a identificou em quatro sinais cardinais – rubor
(eritema), calor (aumento de temperatura), tumor (edema) e dor (algia). Tais sinais
ainda hoje são utilizados para descrever a resposta inflamatória aguda, no entanto,
no século XIX, um quinto sinal foi incluído por Rudolf Virchow (1821-1902) – a
perda de função do tecido ou órgão afetado.

O cirurgião escocês John Hunter (1728-1793) foi o primeiro a considerar que o


processo inflamatório não representava um estado de doença, mas uma resposta
inespecífica que possuía um efeito benéfico sobre o organismo. As primeiras des-
crições microscópicas do processo foram realizadas pelo patologista Julius Friedrich
Cohnheim (1839-1884) pela observação dos eventos relacionados aos vasos sanguí-
neos da região inflamada.

O zoólogo russo Élie Metchnikoff (ou Ilya Mechnikov, 1845-1916) identificou


pela primeira vez o processo de fagocitose de espinhos por amebócitos de larvas
de estrelas-do-mar (1882) e de bactérias por leucócitos em mamíferos (1884), consi-
derando então que o objetivo principal da inflamação seria o de trazer células
fagocitárias (macrófagos) capazes de destruir ou inativar agentes invasores. Enquanto
Metchnikoff estabeleceu o conceito de imunidade celular, Paul Ehrlich (1854-1915)
desenvolveu o conceito de imunidade humoral, propondo que a finalidade da infla-
mação seria a de trazer fatores séricos (do soro) para neutralização de microrga-
nismos invasores. De forma complementar, os estudos de ambos pesquisadores
inauguraram a ciência da Imunologia, sendo agraciados com o Prêmio Nobel de
Medicina em 1908.

A seguir, Sir Thomas Lewis (1881-1945), cardiologista britânico, estabeleceu o


conceito de que substâncias químicas induzidas localmente pelo agente agressor
no sítio inflamatório mediavam as alterações vasculares características da resposta
inflamatória, sugerindo a existência de mediadores químicos da inflamação.
Assim, tais mediadores, agindo juntos ou em sequência, determinavam o caráter

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estereotipado (padronizado) da reação inflamatória, independentemente da natureza
do agente agressor.

Podem ser considerados agentes agressores e, portanto, indutores de inflamação –


agentes infecciosos (bactérias, vírus, protozoários etc.), físicos (por exemplo, radiações,
traumas mecânicos, queimaduras), químicos (como toxinas e substâncias cáusticas),
reações imunológicas, enzimas lisossômicas liberadas de tecido necrótico, dentre
vários outros.

Classicamente, a inflamação é dividida em aguda e crônica – a primeira, de


duração relativamente curta e caracterizada por edema inflamatório (exsudato)
e migração de leucócitos, como neutrófilos, ao sítio inflamatório; a segunda, de
maior duração e menor uniformidade, caracterizada pela presença de linfócitos e
macrófagos, bem como pela proliferação de fibroblastos (fibrose) e de vasos san-
guíneos (angiogênese).

Assista ao vídeo intitulado “Inflamação: aspectos gerais”.


Disponível em: https://youtu.be/TPmcIP7kLDQ

O cenário no qual se desenvolve o processo inflamatório é o tecido conjuntivo


vascularizado, com participação de:
• Fatores do plasma sanguíneo;
• Células sanguíneas (plaquetas e leucócitos, incluindo neutrófilos, eosinófilos,
basófilos, linfócitos e monócitos);
• Células endoteliais;
• Constituintes celulares do tecido conjuntivo (mastócitos, fibroblastos, macró-
fagos residentes);
• Constituintes extracelulares do tecido conjuntivo (como colágeno, elastina
e proteoglicanos).

Alterações Hemodinâmicas da Inflamação


Aguda ou Eventos Vasculares
Os sinais clássicos de rubor, calor e inchaço na área inflamada decorrem das
alterações hemodinâmicas vigentes no início da resposta inflamatória, incluindo, de
forma sequencial, alterações no fluxo e no calibre dos vasos sanguíneos e, a seguir,
na permeabilidade vascular.

Incialmente, ocorre (1) vasoconstrição transitória das arteríolas, seguida pela (2)
vasodilatação das quais, com enchimento de sangue na rede capilar do tecido (daí, o
rubor e o calor verificados).

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A entrada de um maior volume de sangue nos capilares sanguíneos faz aumentar


a pressão hidrostática do plasma ou pressão capilar no local, iniciando a formação
de um edema incipiente do tipo transudato. (rever as Forças de Starling e os tipos de
edema apresentados anteriormente.

A seguir, observa-se (3) o aumento da permeabilidade vascular pela contração das


células endoteliais e consequente abertura de espaços interendoteliais. Isto permite o
extravasamento de proteínas plasmáticas, como albumina e várias outras, para o espaço
intersticial, assim criando uma diminuição da pressão coloidosmótica do plasma e um
aumento da pressão coloidosmótica do líquido intersticial. Neste momento, o edema
se intensifica e passa a ser do tipo exsudato.

O aumento da permeabilidade dos vasos da microcirculação resulta na lentificação do


fluxo sanguíneo (estase sanguínea) e, neste momento, os leucócitos adotam uma orien-
tação mais periférica, chamada de marginação, com aproximação ao endotélio vascular.

O aumento da permeabilidade vascular é observado clinicamente na forma de


inchaço (edema), que pode ser demonstrado ou quantificado experimentalmente
medindo-se o grau de extravasamento nas áreas lesadas de corantes ou proteínas mar-
cadas injetadas por via endovenosa. Corantes como o carbono coloidal (com partículas
de 25 a 30 micrômetros de diâmetro) não são normalmente capazes de atravessar o
endotélio íntegro. Na área lesada, porém, podem atravessar os espaços interendoteliais
aumentados que surgiram como resposta à agressão, ficando assim retidos entre o
endotélio e a membrana basal. Dessa forma, o vaso fica “marcado” pela visualização
do corante nesse espaço pela microscopia óptica ou eletrônica de transmissão.

Dessa maneira, pode-se observar 3 tipos de resposta de extravasamento vascular


na pele de animais submetidos a distintos tipos de agressão:
1. Resposta imediata transitória, que inicia logo após a agressão, atinge seu
máximo em 5 a 10 minutos e diminui em cerca de 15 a 30 minutos, tal
como se verifica na discreta lesão térmica, como, por exemplo, o aqueci-
mento da pele a 54ºC por 5 segundos;
2. Resposta imediata mantida, que também começa imediatamente após a
agressão, mas que persiste por horas ou dias, tal como ocorre nas quei-
maduras graves, nas quais há lesão endotelial que atinge todos os níveis
da microcirculação (arteríolas, capilares e vênulas);
3. Resposta retardada prolongada, que se inicia após um lapso de tempo e
perdura por horas e dias, sendo comum na exposição à radiação ultra-
violeta (queimaduras solares).

Tais alterações hemodinâmicas sequenciais ocorrem por ação de distintos media-


dores químicos, como, por exemplo, as aminas vasoativas histamina e serotonina,
assim como por ação dos fragmentos do sistema complemento C3a e C5a (anafila-
toxinas), que promovem conjuntamente vasodilatação e aumento de permeabilidade
vascular. Já as prostaglandinas, que constituem metabólitos do ácido aracdônico da
via cicloxigenase, exercem efeito apenas vasodilatador.

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Dessa forma, percebe-se que o sistema de mediadores químicos responsáveis
pelo caráter estereotipado da resposta inflamatória apresenta ainda elevado grau de
redundância, ou seja, múltiplos mediadores acabam executando ações em comum.

Assista ao vídeo intitulado “Inflamação aguda: aspectos vasculares”.


Disponível em: https://youtu.be/vt2TJPOPEe4

Eventos Leucocitários da
Inflamação ou Eventos Celulares
Com a lentidão do fluxo sanguíneo (estase sanguínea), ocorrerão os seguintes
eventos relacionados aos leucócitos:
• Aproximação leucocitária ao endotélio vascular (marginação);
• Rolagem (adesão frouxa);
• Adesão firme, mediante expressão de moléculas de adesão complementares na
superfície leucocitária e endotelial;
• Transmigração dos leucócitos através do endotélio (ou diapedese) em direção ao
espaço extravascular e orientada por agentes quimiotáticos;
• Quimiotaxia;
• Ativação leucocitária;
• Fagocitose.

Com a marginação dos leucócitos, o endotélio vascular parece ficar totalmente


recoberto por tais células, fenômeno conhecido como pavimentação.

Logo após a marginação, as células endoteliais e os leucócitos são ativados por


mediadores químicos que induzem a expressão de moléculas de adesão, incluídas em
4 famílias moleculares – as selectinas, as imunoglobulinas, as integrinas e as glico-
proteínas semelhantes à mucina.

As selectinas, por exemplo, são glicoproteínas intracelulares que passam a ser


expressas na resposta inflamatória. Incluem a E–selectina (antigamente conhecida
como ELAM–1, endotelial-leukocyte adhesion molecule 1 ou molécula de adesão
endotélio-leucocitária), presente no endotélio vascular e atuando tanto no processo
de rolagem quanto no de adesão dos leucócitos; a P–selectina, presente no endotélio
e nas plaquetas; a L–selectina, presente nos leucócitos (principalmente, neutrófilos,
monócitos e linfócitos).

As moléculas da família das imunoglobulinas incluem duas moléculas de ade-


são endoteliais: ICAM–1 (intracelular adhesion molecule 1 ou molécula de adesão

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intracelular 1) e VCAM–1 (vascular cell adhesion molecule 1 ou molécula de adesão


à célula vascular), as quais interagem com as integrinas leucocitárias.

As integrinas são proteínas transmembrana de superfície que reagem a sinais


de ativação celular e se ligam a moléculas da família das imunoglobulinas e à ma-
triz extracelular.

Alguns mediadores inflamatórios, particularmente as citocinas interleucina 1 (IL–1)


e fator de necrose tumoral (TNF) induzem a síntese e expressão de moléculas de adesão
endotelial, tais como de E–selectina, ICAM–1 e VCAM–1, as quais estão presentes em
baixos níveis na superfície endotelial em condições normais. Já a P–selectina, nor-
malmente encontrada nos corpúsculos de Weibel Palade, redistribui-se rapidamente
para a superfície celular por ação de substâncias, como histamina, trombina e fator
de ativação plaquetária (PAF).

Com a ativação endotelial por mediadores inflamatórios, inicia-se uma aderência


frouxa e transitória como resultado da interação das selectinas com seus ligantes de
carboidratos, processo este denominado de rolagem (do inglês rolling). Logo após,
os leucócitos são ativados por outros mediadores, como as quimiocinas (citocinas de
baixo peso molecular, como por exemplo, a IL–8), iniciando-se uma adesão firme
pelo aumento da atividade de ligação de suas integrinas.

Após adesão, os leucócitos migram através dos espaços interendoteliais aumen-


tados, processo este denominado de transmigração ou diapedese. À semelhança do
aumento de permeabilidade vascular, a diapedese ocorre principalmente nas vênulas.
A seguir, os leucócitos precisam degradar a membrana basal contínua por meio da
secreção de colagenases.

Assista ao vídeo “The Basic Inflammatory Response”.


Disponível em: https://youtu.be/iVCXRa8FdP0

O tipo predominante de leucócito nesta migração dependerá do tipo de agressão


ao tecido e do(s) mediador(es) químico(s) presente(s). Na inflamação de caráter agudo,
os neutrófilos tendem a predominar nas primeiras 6 a 24 horas de lesão, sendo
então substituídos por monócitos nas próximas 24-48 horas. Uma vez fora do vaso,
estes monócitos se transformam em macrófagos, passando a desenvolver intensa
atividade fagocitária.

Muitas variações podem ser encontradas neste padrão básico de migração leuco-
citária. Por exemplo, nas infecções virais e reações imunomediadas, predominará o
infiltrado linfocitário (Figura 1), enquanto nas reações alérgicas tendem a se acumular
os eosinófilos.

Após extravasarem, os leucócitos emigram ao sítio inflamatório orientados


por um gradiente químico. Tal processo é chamado de quimiotaxia e as subs-
tâncias exógenas ou endógenas envolvidas são chamadas de agentes quimiotáticos
(ou quimiotactinas).

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Figura 1 – Hepatite viral com presença de
infiltrado linfocitário. HE. Aumento 40x
Fonte: Getty Images

Dentre os principais estímulos indutores de quimiotaxia, encontram-se as endo-


toxinas bacterianas, o componente do sistema complemento C5a, os metabólitos do
ácido aracdônico da via lipoxigenase, notadamente o leucotrieno B4 (LB4), e citocinas,
como a quimiocina IL–8.
Esse deslocamento dos leucócitos resulta dos movimentos de seus pseudópodes,
movimentos estes que resultam em interações entre os filamentos de actina com a
proteína miosina.
Muitos agentes quimiotáticos podem ocasionar ativação leucocitária, com aumento
da expressão de moléculas de adesão, desgranulação e liberação de enzimas lisossô-
micas, formação de metabólitos do ácido aracdônico e fagocitose.
A fagocitose envolve 3 fases sucessivas – o reconhecimento e a fixação da partí-
cula a ser engolfada pelo leucócito, a ingestão dessa partícula e a destruição ou degra-
dação da qual.
Muito embora neutrófilos e macrófagos possam iniciar a fagocitose na ausência de
fatores séricos, a grande maioria dos microrganismos necessita ser revestida por imu-
noglobulinas G (IgG), fragmentos do sistema complemento C3b, também denominados
de fragmentos opsonínicos de C3, ou lectinas do plasma que se ligam a microrga-
nismos. Esses fatores são chamados coletivamente de opsoninas e o processo pelo
qual as partículas são revestidas pelas opsoninas é chamado de opsonização, o qual
aumenta a eficiência do processo de fagocitose.
Por sua vez, as células fagocíticas apresentam receptores para C3b e para os
fragmentos Fc das IgG, de forma que as partículas ficam fixadas na superfície leuco-
citária e possam ser, a seguir, ingeridas.
Extensões citoplasmáticas (ou pseudópodes) são, então, projetadas para envolver
a partícula, a qual é puxada para o interior do leucócito, formando um vacúolo
fagocítico, logo circundado por lisossomos que liberam suas enzimas para formar
um vacúolo digestivo.

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Nestes vacúolos, também chamados de fagolisossomas, é iniciada a etapa de des-


truição ou degradação da partícula. No caso de bactérias, a destruição pode ocorrer
por mecanismos dependentes de oxigênio, com formação de grandes quantidades de
espécies reativas de oxigênio, ou por mecanismos independentes de oxigênio, por meio
de substâncias bactericidas presentes em grânulos leucocitários, tais como lisozima,
lactoferrina, proteína bactericida por aumento de permeabilidade (ou bactericidal/
permeability-increasing protein ou BPI), dentre outras.

Após destruição bacteriana, hidrolases ácidas, como as encontradas no interior


dos grânulos azurófilos dos neutrófilos, podem promover seus efeitos digestivos no
interior dos fagolissomas.

Além da liberação de produtos no interior dos fagolissomas, a ativação leucocitária


pode ocasionar também a liberação extracelular de produtos leucocitários, como meta-
bólitos do ácido aracdônico, enzimas lisossômicas e espécies reativas de oxigênio, os
quais amplificam o estímulo inflamatório original e potencializam a lesão tecidual.

Assista ao vídeo intitulado “Inflamação aguda: aspectos celulares”.


Disponível em: https://youtu.be/DEbR38uQcPc

Mediadores Químicos da Inflamação


Os mediadores químicos da inflamação incluem substâncias originárias do plasma
ou derivadas de células. Neste último caso, podem ser simplesmente secretadas a
partir de grânulos nos quais já se encontram pré-formadas ou podem ser sintetizadas
como resultado do estímulo inflamatório.

Muito embora neutrófilos, monócitos/macrófagos, plaquetas e mastócitos consti-


tuam as principais fontes celulares dos mediadores químicos da inflamação, células
mesenquimais, como fibroblastos, fibras musculares lisas e células endoteliais, e
células epiteliais podem participar de sua síntese e secreção.

Os principais mediadores descritos incluem:


• Aminas vasoativas (histamina e serotonina ou 5–hidroxitriptamina – 5–HT);
• Proteases plasmáticas, como os componentes do sistema complemento, o sistema
das cininas plasmáticas e o sistema da coagulação-fibrinolítico;
• Metabólitos do ácido aracdônico (tromboxano A2 ou TxA2, prostaglandinas, leu-
cotrienos e lipoxinas);
• Fator de ativação plaquetária (ou platelet-activating fator – PAF);
• Citocinas ou quimiocinas;
• Espécies reativas de oxigênio;
• Óxido nítrico;

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• Constituintes lisossômicos, neuropeptídios, fatores de crescimento, como fator de
crescimento de fibroblastos (ou Fibroblast Growth Factor – FGF), fator de cresci-
mento epidérmico (ou Epidermal Growth Factor – EGF), dentre muitos outros.
A seguir, você terá um breve resumo dos principais mediadores pró-inflamatórios.
As aminas vasoativas representam os primeiros mediadores liberados no foco
inflamatório. Estão presentes em grânulos de mastócitos, basófilos e plaquetas, no caso
da histamina, e em grânulos de plaquetas no caso da serotonina, como substâncias
pré-formadas que serão liberadas mediante degranulação celular. Promovem dilatação
arteriolar e aumento da permeabilidade vascular, principalmente nas vênulas.

O sistema da coagulação-fibrinolítico pertence à classe das proteases plasmá-


ticas com ação pró-inflamatória. Fibrinopeptídios resultantes da ação da trombina
(fator IIa) sobre o fibrinogênio circulante solúvel durante a formação do coágulo san-
guíneo promovem aumento da permeabilidade vascular e exercem efeito quimiotático.
Por sua vez, a própria trombina estimula a adesão leucocitária e a proliferação de
fibroblastos, enquanto o fator Xa também estimula a maior permeabilidade vascular
e a migração leucocitária.

Adicionalmente, produtos da degradação da fibrina por ação da plasmina indu-


zem aumento de permeabilidade nos vasos sanguíneos da microcirculação, enquanto
a plasmina é capaz de promover a ativação do sistema complemento.

Outras proteases que auxiliam na resposta inflamatória são as calicreínas, que


transformam proteínas plasmáticas inativas, denominadas cininogênios, no peptídio
vasoativo bradicinina.

A bradicinina causa vasodilatação e indução de dor, no entanto, seus efeitos são


rápidos já que é imediatamente clivada pela enzima cininase. A calicreína, por sua
vez, deriva da conversão da pré-calicreína plasmática a partir do fator de Hageman
ativado (fator XIIa, componente da cascata intrínseca da coagulação), sendo a pró-
pria calicreína um ativador do fator XII, criando, assim, um mecanismo de feedback
positivo que amplifica a formação final de bradicinina.

A calicreína por si só tem ação quimiotática e induz a ativação do sistema comple-


mento, com formação de C5a, além de estimular a formação de plasmina.

Percebe-se, assim, que os diferentes sistemas de proteases são complementares


e interdependentes.

Por fim, o sistema complemento ocorre de forma semelhante às cascatas ante-


riormente citadas, nas quais proteínas inativas são ativadas sucessivamente e passam
a estimular reações subsequentes. A cascata do sistema complemento envolve cerca
de 20 proteínas plasmáticas sob forma inativa e seus produtos de clivagem ativos.

Dentre os fragmentos mais importantes desse sistema na inflamação, pode-se citar:


• C3a e C5a (chamadas também de anafilatoxinas), promotoras de aumento da
permeabilidade vascular, formação de metabólitos do ácido aracdônico e va-
sodilatação, a última principalmente por liberação de histamina a partir dos

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mastócitos. C5a ainda induz a expressão de moléculas de adesão, além de pro-


mover quimiotaxia e ativação leucocitária;
• C3b, que funciona como opsonina, favorecendo a ocorrência da fagocitose;
• C5b–9 (ou complexo de ataque à membrana), que possui atividade lítica
sobre microrganismos.

Uma das mais importantes e estudadas famílias de mediadores inclui os metabó-


litos do ácido aracdônico, um ácido graxo poli-insaturado de 20 carbonos esterifi-
cado nos fosfolipídos de membrana celular e que será liberado a partir da ativação de
fosfolipases celulares, como a fosfolipase A2, a partir de estímulos físicos ou químicos,
como C3a e C5a.

Uma vez liberado, o ácido aracdônico pode ser alvo da ação de duas dis-
tintas enzimas:
• Cicloxigenases (COX), resultando na formação de TxA2 e de prostaglandinas,
como PGD2, PGE2, PGI2 (ou prostaciclina);
• Lipoxigenases (LOX), que levam ao aparecimento de ácido hidroxieicosate-
traenoico (5–HETE), de leucotrienos (LB 4, LBC4, LD4, LE4) e de lipoxinas
(LXA4 e LXB 4).

Os metabólitos do ácido aracdônico são também chamados de eicosanoides. A seguir,


citamos suas principais ações na inflamação:
• TxA2: vasoconstrição e agregação plaquetária;
• Prostaglandinas: vasodilatação, sensibilização à dor e indução de febre;
• 5-HETE: quimiotaxia;
• LB4: adesão leucocitária, quimiotaxia, geração de espécies reativas de oxigênio
e liberação de enzimas lisossômicas;
• LC4, LD4, LE4: vasoconstrição, aumento da permeabilidade vascular e bron-
coconstrição;
• Lipoxinas: ações pró-inflamatórias (estimulação da adesão de monócitos e
vasodilatação) e anti-inflamatórias (inibição da quimiotaxia e da adesão de neutró-
filos), servindo como mecanismo endógeno de controle da ação dos leucotrienos.

Importante!
Anti-inflamatórios não-esteroidais (Aines) são capazes de inibir a ação da enzima COX,
diminuindo, assim, a formação de prostaglandinas. Por sua vez, os corticosteroides,
além de inibirem a COX, induzem a formação de lipocortina 1, a qual inibe a atividade
da fosfolipase A2.

O fator de ativação plaquetária (PAF) é outro mediador derivado de fosfolipídios


e sintetizado por diversos tipos celulares (plaquetas, mastócitos, basófilos, neutrófilos,
monócitos/macrófagos, células endoteliais), promovendo vasodilatação, aumento da

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permeabilidade vascular, estimulação plaquetária, adesão leucocitária, quimiotaxia e
geração de espécies reativas de oxigênio (surto oxidativo ou oxidative burst).
As citocinas representam uma ampla categoria de pequenos peptídeos com
funções autócrinas, parácrinas e endócrinas, além de funcionarem como agentes
imunomoduladores. Incluem interleucinas, interferons (com importante atividade
antiviral), fatores de necrose tumoral, monocinas e linfocinas (respectivamente, produ-
zidas por monócitos e linfócitos), quimiocinas (indutoras de quimiotaxia) e fatores es-
timulantes de colônias, sendo produzidas por diversos tipos celulares, como macró-
fagos, linfócitos B e T, mastócitos, células endoteliais e fibroblastos.
A IL–1, o TNF–α e o TNF–β (linfotoxina), por exemplo, apresentam numerosas
ações comuns, como, por exemplo, ativação endotelial (com aumento de expressão
de moléculas de adesão e indução da formação de mediadores químicos pelas células
endoteliais, inclusive citocinas como IL–1, IL–6 e IL–8), além de ativação leucocitária
e ativação dos fibroblastos (com proliferação dos mesmos, síntese de colágeno e de-
senvolvimento de fibrose). Ainda, induzem as respostas sistêmicas agudas associadas
à lesão ou infecção, incluindo perda do apetite, febre, alterações hemodinâmicas do
choque séptico e liberação do hormônio adeno-hipofisário ACTH (ou adrenocor-
ticotrofina), que irá estimular o córtex adrenal a secretar cortisol, com seus efeitos
anti-inflamatórios e imunossupressores, como forma de feedback negativo (ou de
regulação negativa) sobre a resposta inflamatória.

Leia o artigo “Citocinas e dor “ disponível em: https://bit.ly/3bLtV7V

O óxido nítrico (NO) é um gás solúvel produzido por macrófagos, células endo-
teliais e neurônios, respectivamente por ação das enzimas sintases do óxido nítrico
(NOS) induzível por citocinas (iNOS), endotelial (eNOS) e neuronal (nNOS). Suas ações
pró-inflamatórias e anti-inflamatórias abrangem a vasodilatação, a diminuição do recru-
tamento leucocitário e a formação de metabólitos antimicrobianos.
Por fim, são incluídos como mediadores inflamatórios os constituintes lisossô-
micos de neutrófilos e monócitos, que compreendem múltiplas enzimas, como
colagenases, elastases, fosfolipases, proteases ácidas e neutras, além de substâncias
antimicrobianas como lisozima e lactoferrina. Muitas das enzimas lisossômicas são
capazes de digerir colágeno, elastina, fibrina, membrana basal e cartilagem, amplifi-
cando a destruição tecidual e a própria resposta inflamatória.
A lista de mediadores químicos é complementada pelas espécies reativas de
oxigênio, como o ânion superóxido (O2–), o peróxido de hidrogênio (H2O2) e o radi-
cal hidroxila (OH), que apresentam efeitos lesivos sobre outros tipos celulares (como
células endoteliais, tumorais e parenquimatosas) e inativação de antiproteases, dessa
forma ampliando a destruição da matriz extracelular e do próprio tecido.
Neuropeptídeos, como substância P e neurocinina, pertencem à família das
taquicininas. Estão presentes no sistema nervoso central e periférico e colaboram
na reação inflamatória, participando da neurotransmissão da dor e do aumento de
permeabilidade dos vasos.

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Destinos da Inflamação Aguda


A inflamação aguda pode, assim, evoluir para a:
• Resolução completa, com regeneração das células danificadas e restauro da
arquitetura tecidual original;
• Reparo por cicatrização, com substituição do tecido danificado por tecido conjun-
tivo fibroso (fibrose);
• Formação de um abscesso (coleção purulenta ou de pus), quando há presença
ou infiltração de microrganismos piogênicos (formadores de pus), como
Staphylococcus aureus;
• Inflamação de longa duração (inflamação crônica).

Inflamação Crônica
A inflamação crônica ocorre em situações de:
• Persistência de agentes infecciosos (como Mycobacterium tuberculosis na tuber-
culose, Mycobacterium leprae na hanseníase, Treponema pallidum na sífilis e
Candida albicans na candidíase, dentre muitíssimos outros);
• Exposição prolongada a agentes tóxicos exógenos ou endógenos, como partí-
culas de carbono na antracose e gotículas lipídicas numa placa de ateroma;
• Autoimunidade, como ocorre em doenças inflamatórias como artrite reuma-
toide e lúpus eritematoso sistêmico.

Histologicamente, a inflamação crônica se caracteriza pela presença de infiltrados


de células mononucleares, incluindo macrófagos, linfócitos e plasmócitos (linfócitos B
que invadem o tecido conjuntivo e se diferenciam, sintetizando imunoglobulinas ou
anticorpos), com destruição tecidual e reparo por fibrose e angiogênese (formação
de novos vasos sanguíneos) como pode ser visto na Figura 2.

Figura 2 – Pneumonia intersticial, com dano


alveolar difuso e fibrose. HE. Aumento 40x
Fonte: Getty Images

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Assista ao vídeo intitulado “Inflamação Crônica – Aspectos Gerais”.
Disponível em: https://youtu.be/9sGEK02YGKo
Assista também “Inflamação Crônica – Células Envolvidas”.
Disponível em: https://youtu.be/5gY1gxCWnSQ

Um tipo particular de inflamação crônica é a inflamação granulomatosa, que,


em geral, caracteriza-se pela presença de macrófagos ativados e modificados, seme-
lhantes a células epiteliais, daí serem chamados de células epitelioides. Tais células
epitelioides podem se fundir formando células gigantes multinucleadas na periferia
ou no centro dos granulomas (agregados de células epitelioides circundados por halo
de células mononucleares, principalmente linfócitos e ocasionalmente plasmócitos).
As células gigantes podem ser de dois tipos: células de Langhans, nas quais os nú-
cleos estão dispostos de maneira organizada na periferia, formando uma espécie de
arco abaixo da superfície celular (encontradas, por exemplo no granuloma da tuber-
culose), e células gigantes de corpo estranho, nas quais os núcleos estão dispostos
desordenadamente no citoplasma.

Os granulomas, por sua vez, são classificados em dois tipos conforme seu meca-
nismo etiopatogênico: os granulomas de corpos estranhos, os quais impedem a fago-
citose por macrófagos individuais e não suscitam resposta inflamatória ou imune
(por exemplo, fios de sutura) e os granulomas imunes (Figura 3), estes induzidos por
partículas insolúveis capazes de induzir resposta imune celular, desencadeada por
linfócitos T e suas citocinas (por exemplo, o bacilo da tuberculose).

Especificamente na tuberculose, o granuloma é conhecido como tubérculo e se


caracteriza pela presença de necrose caseosa central tal como visto anteriormente,
nos tipos de necrose.

Figura 3 – Granuloma de tuberculose com necrose central (necrose caseosa),


infiltrado linfocítário e células de Langhans multinucleada
Fonte: Getty Images

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UNIDADE Inflamação e Reparo

Em Síntese
Desta forma, pode-se considerar a resposta inflamatória como parte do sistema imune
inato (que nasce com o indivíduo, sem necessidade de introdução de substâncias
ou estruturas exteriores ao organismo), sendo capaz de deflagrar uma resposta
não-específica contra agentes agressores e permitir o reparo do tecido lesado.

Reparo
As tentativas do corpo de restaurar a funcionalidade do tecido diante de uma
agressão local começam cedo na resposta inflamatória e têm por objetivo final o
reparo do tecido agredido. Nesse sentido, o processo de reparo constitui a etapa
final da reação inflamatória e pode envolver duas formas distintas – o reparo por
regeneração e/ou reparo por cicatrização.

Assista ao vídeo intitulado “Reparo tecidual – aspectos gerais e celulares”.


Disponível em: https://youtu.be/skMNoDRu86k
Assista também “Reparo Tecidual – Matriz e Cicatrização de Feridas”.
Disponível em: https://youtu.be/81jjt-b5fHY

O reparo por regeneração consiste no processo pelo qual o tecido lesado é


substituído por células parenquimatosas de mesmo tipo, restabelecendo a arquitetura
tecidual original. Ocorre, por exemplo, em tecidos formados por células lábeis (aque-
las que apresentam proliferação contínua, como as células de revestimento epitelial
e as células sanguíneas) ou estáveis (células com baixo nível de replicação, mas que
podem apresentar rápida proliferação em resposta a estímulos diversos, como é o
caso da grande maioria das células do corpo, incluindo hepatócitos, osteoblastos,
condroblastos, fibroblastos, células endoteliais, fibras musculares lisas etc.

No entanto, muito embora as células lábeis e estáveis possam regenerar, é neces-


sária a existência de uma estrutura de base ou estroma de apoio às células parenqui-
matosas para que tal substituição seja ordenada. Nesse contexto, a membrana basal
parece ser o principal componente estrutural necessário para a ocorrência da rege-
neração do tecido. Em caso de lesão à membrana basal, o tecido que poderia se rege-
nerar poderá ser reparado por cicatrização. É o que ocorre com os hepatócitos do
fígado, os quais apresentam ampla capacidade regenerativa. Entretanto, em caso de
dano ao tecido conjuntivo do órgão, por agressão mantida ou de grande intensidade,
o processo regenerativo pode ser substituído pelo processo cicatricial, com desen-
volvimento de fibrose hepática (cirrose hepática, tal como ocorre no alcoolismo, nas
hepatites virais B e C, na doença hepática gordurosa não-alcóolica).

O reparo por cicatrização é aquele no qual as células perdidas são substituídas


pela proliferação de fibroblastos e desenvolvimento de tecido conjuntivo fibroso, o

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qual constitui de forma permanente a cicatriz (Figura 4). Ocorre em tecidos formados
por células permanentes (as que não fazem divisão mitótica na vida pós-natal, como
os neurônios, as fibras musculares esqueléticas e as cardíacas) ou quando há dano
significativo sobre a membrana basal, mesmo num tecido com lábeis ou estáveis.

Figura 4 – Fibrose hepática (cirrose), com proliferação de tecido conjuntivo


fibroso comprimindo os lóbulos hepáticos. HE. Aumento 10x
Fonte: Getty Images

Pela ausência de fibroblastos, o sistema nervoso central (encéfalo e medula espi-


nhal) apresenta a única cicatrização que não resulta da proliferação de fibroblastos.
Neste caso, os astrócitos (células da população glial e consideradas estáveis) passam
a se dividir, aumentando de tamanho (hipertrofia ou astrogliose) e número (hiper-
plasia ou astrocitose), vindo a constituir a cicatriz glial, a qual preencherá os espaços
nos quais houve destruição neuronal.

Veja mais imagens em: https://bit.ly/3e4jRbP

Esperamos que você tenha compreendido os principais pontos abordados!

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UNIDADE Inflamação e Reparo

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Leitura
Anti-Inflamatórios: Uma Compreensão Total
https://bit.ly/3cOygIJ
Dor: Aspectos Atuais da Sensibilização Periférica e Central
https://bit.ly/2ZjKPYQ
Anti-Inflamatórios não Esteroides: Efeitos Cardiovasculares, Cerebrovasculares e Renais
https://bit.ly/36ekoFg
Aspectos Celulares da Cicatrização
https://bit.ly/3bPOJuW

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Referências
BRASILEIRO FILHO, G. B. Patologia geral. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.

KUMAR, V. et al. Patologia: bases patológicas das doenças. Rio de Janeiro:


Elsevier, 2010.

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