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4ª FEIRA, 4 DE NOVEMBRO DE 2020 

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O LIVRO DE JÓ
Tradução do espanhol por: Pe. André Sperandio

CONSIDERAÇÕES GERAIS

ó é um dos livros sapienciais do Antigo Testamento e da Tanak. Vem depois do Livro


de Ester e antes do Livro de Salmos. É considerado obra prima da literatura do
movimento de Sabedoria, ou Sapiencial. Também é considerada uma das mais belas
histórias de prova e fé. Conta a história de Jó, um homem justo e temente a Deus. As
inúmeras exegeses presentes neste livro são tentativas clássicas para conciliar a
coexistência do mal e de Deus (teodicéia). A época em que se desenrolam os fatos, ou
quando este livro foi redigido, é controverso. Existe uma famosa discussão no Talmud a este respeito. A autoria
de Jó é incerta. Alguns eruditos atribuem o livro a Moisés. Outros atribuem a um dos antigos sábios, cujos
escritos podem ser encontrados em Provérbios ou Eclesiastes. Há ainda os que defendam que o próprio Salomão
tenha sido seu autor. Por alguns, o livro de Jó é considerado o livro mais antigo da Bíblia, mais até que o livro de
Gênesis. Por outro lado, a Edição Pastoral da Bíblia sustenta que o livro provavelmente tenha sido redigido, em
sua maior parte, durante o exílio, no século VI AC. A Bíblia de Jerusalém sustenta que o livro seja posterior a
Jeremias e Ezequiel, ou seja, escrito em uma época posterior ao Exílio na Babilônia, considerando provável que
sua composição seja no início do séc. V aC.

INTRODUÇÃO

O livro de Jó é um drama com pouquíssima ação, mas com muita paixão. É a paixão que um autor genial,
inconformado, infundiu em seu protagonista. Discordando da doutrina tradicional da retri
retribuição, opõe a um
princípio, um fato; a uma ideia, um homem. Já o Salmo 73 (72) contrapôs a experiência à teoria da retri
retribuição e
encontrou a resposta penetrando no «mistério de Deus». Nosso autor radicaliza o caso: faz sofrer o seu
protagonista inocente para que seu grito brote «das profundezas». A paixão e o sofrimento de Jó inflamam o
entusiasmo de sua busca e de sua linguagem; diante dela vão se projetando, como em ondas concêntricas, os seus
três amigos que repetem incansavelmente e com variações a doutrina tradicional da retri
retribuição: «o sofrimento é a
consequência do pecado».

A ação é muito simples: entre um prólogo e um epílogo, cujas cenas se desenrolam entre o céu e a terra,
quatro sessões de diálogos se desenvolvem. Por três vezes, cada um dos amigos fala e Jó responde; na quarta vez
é Jó quem entra num diálogo solitário com Deus. Nos diálogos com os amigos, mais que um debate intelectual,
se produz uma tensão de planos ou direções: os amigos defendem a justiça de Deus, como juiz imparcial que
recompensa o bem e pune o mal. Mas Jó não está interessado na justiça de Deus, que sua própria experiência
desmente, e apela para um pleito ou disputa com o próprio Deus no qual se manifestará a justiça do homem.
Nesse embate para provar a sua inocência diante de Deus, Jó arrisca sua própria vida. Deus, como instância
suprema, decide a disputa entre Jó e seus amigos como parte interpelada, responde e pergunta a Jó para conduzi-
lo ao seu «Mistério».

DEUS E O SER HUMANO NO LIVRO DE JÓ

Através dos diálogos do homem bom, convencional, que dá graças a Deus porque tudo vai bem, surge um
homem profundo, capaz de assumir e representar a humanidade sofredora, que busca audaciosamente a Deus. No
lugar de um Deus sábio e até mesmo compreensível, surge um Deus imprevisível, difícil e misterioso. No espaço
de um só livro, o nosso conhecimento de Deus, do ser humano e de suas relações, assume novas proporções.
Porque Jó, como um outro Jacó em sua visão noturna, também lutou com Deus; porque o autor empenhou seu
gênio literário e religioso para sacudir com os velhos esquemas, explorando o tema em profundidade. O livro de
Jó é um livro singularmente atual e provocativo, que causa desconforto aos instalados e conformistas. É quase
impossível não ser interpelado por sua leitura, e difícil de compreendê-lo se não se toma um partido.

O autor é um gênio anônimo que viveu provavelmente depois do Exílio, alimentou sua espiritualidade na
recitação de Salmos e conheceu a obra de Jeremias e Ezequiel. A representação sacra de Jó é demasiado
poderosa para admitir leitores indiferentes, ontem como hoje. Os que em sua leitura não interagem com suas
perguntas e respostas internas, os que não tomem partido com paixão, não vão entender o drama; porém, os que
se embrenharem na trama da narrativa e tomarem partido, se sentirão sob o olhar de Deus, submetidos à prova
pela representação do drama eterno do homem Jó.

SIGNIFICADO DO LIVRO DE JÓ: O PROBLEMA DO SOFRIMENTO DO


INOCENTE

Este importante tema constitui a substância do debate entre Jó e seus amigos. O sofrimento, dizem eles, é
o castigo que o pecado produz (4,7; 8,20; 11,4-6; 22,4s). Quando Jó, com base em sua própria experiência, rejeita
essa afirmação, os amigos respondem que todos os seres humanos são pecadores (14,1-4; 15, 14; 25,4-6). Eles
negam a possibilidade de existir alguém que sofra inocentemente. A situação, no entanto, é mais complicada e
encaminha a outras respostas. O sofrimento é um mistério e nós não podemos compreender os caminhos de Deus
(11,7-10; 15,8s.28; 42,3). O sofrimento é permitido por Deus para nos impor disciplina e tornar-nos melhores
(5,17s; 36,15). O sofrimento é permitido por Deus para provar a virtude dos justos (1-2). Todas estas respostas
nos permitem salvaguardar tanto a justiça divina como a inocência humana. No entanto, por mais que este
aspecto se mostre predominante, não parece que seja este o principal propósito do livro. Se por um lado parece
evidente a resposta para o caso que Jó coloca - seus sofrimentos são uma prova (1,9)-, por outro, não há qualquer
resposta para o problema no contexto do livro. Se a finalidade da obra fosse apenas essa, poderíamos considera-
la como um fracasso.

O MISTÉRIO DO SOFRIMENTO E A RELAÇÃO COM DEUS

Um primeiro enfoque nos leva a ver o sofrimento como um problema que deve ser tratado em um nível
intelectual. Um problema é algo que está aí, diante de nós, na nossa frente. Podemos ver todos os seus
componentes, todas as suas dimensões. A questão consiste em colocar todas as peças juntas para dar sentido a
esse quebra-cabeça. Pelo contrário, o mistério é uma situação em que «eu», enquanto pessoa humana irrepetível e
única, encontro-me tão imerso que não posso distanciar-me dele o suficiente para contempla-lo «lá, além de
mim». O amor é um mistério, assim como a morte e o sofrimento. Os problemas estão aí para serem resolvidos
enquanto que os mistérios são para serem vividos, e vividos na relação com os outros. A maior angústia de Jó
emerge da confusão sobre a sua relação com Deus. Deus é realmente seu inimigo? (13,24). A partir desta
perspectiva, os discursos do Senhor oferecem realmente uma resposta. A simples resposta do Senhor mostra
claramente que ele estava aí o tempo todo, presente, ouvindo; isto é, mantendo e afirmando uma relação. Ainda
que Jó não entenda jamais os motivos de seu sofrimento, sabe agora que não está sozinho, e isso lhe dá força para
suportar a luta. E assim, o ponto de vista do livro é menos uma questão de teologia e mais um mistério da fé: a
nossa relação existencial com Deus.

JÓ COM RETIDÃO A MEU RESPEITO

Esta poderosa e irônica afirmação do Senhor (42,7s) nos coloca diante de outro aspecto. Ao longo de todo
o livro, a chave era o que Jó diria em meio às adversidades. Irá blasfemar flagrantemente contra Deus como
Satanás havia predito duas vezes? (1.11, 2.5). Não! Jó acusa seus amigos de falarem falsamente de Deus (13,7-9),
enquanto ele recusa ser silenciado (7,11; 10,1; 13,13; 27,4) até que tenha dito tudo o que tinha a dizer (31,35).
Para neutralizar os desafios de Satanás no prólogo, o Senhor afirma duas vezes, no epílogo, que Jó havia falado
corretamente a seu respeito (42,7s). O que se pode entender por «corretamente»? Gramaticalmente, a palavra
pode ser usada como advérbio (de maneira correta) ou como substantivo (coisas justas). O sentido do texto se
estende aos dois significados. Em primeiro lugar, Jó falou de maneira adequada. Ele lamentou, discutiu, chegou
mesmo a desafiar a Deus. Apesar da constante pressão contrária, manteve firmemente a integridade de sua
experiência, pois era tudo o que lhe restava. A Deus não se serve com mentiras, por mais bem intencionadas
(13,7-9). Jó sabe instintivamente que toda a sã relação com Deus só pode ser baseada na verdade. Porém, em
segundo lugar, Jó também falou «coisas justas»", isto é, foi capaz de intuir e afirmar a presença de um mistério.
Deus e nossa relação com ele são realidades por demasiado grandes e profundas para serem reduzidas ou
abarcadas pela razão humana. Os discursos do Senhor (38-41) deixaram isso bem claro. E Jó, envolto na
experiência do mistério, deixou espaço para a liberdade de Deus. Os amigos, pelo contrário, não acolheram o
mistério, por isso falsearam a Deus e a Jó. Caíram no permanente perigo de muitos pseudo-religiosos, de
ontem e de hoje: buscar no passado todas as referências sobre Deus, sem perceber que o Deus bíblico está
sempre nos surpreendendo e impulsionando para a novidade do futuro (cf. Gn 12 1-3). É nessa fronteira
misteriosa da novidade e da surpresa o lugar onde Deus esperava por seu amigo, e seu amigo não falhou.
Jó falou de sua experiência pessoal (Mistério) com honestidade e justiça, e por causa disso foi capaz de falar de
Deus da mesma forma. Em suma, Jó se comportou como um homem de fé. Seus amigos se revelaram pessoas
apenas superficialmente piedosas.

O SIGNIFICADO DA AMIZADE

Uma dimensão final do livro é o papel e a valor da amizade. Em primeiro lugar, está o exemplo negativo
dos amigos. Movidos por uma genuína simpatia, deixam suas terras distantes e vem para estar junto de Jó. Vendo
o amigo naquelas condições, sentam-se ao seu lado e compartilham do atormentado (e sábio, 13.5) silêncio. Mas,
tão logo Jó começa a falar, suas palavras soam tão ofensivas que seus amigos mostram-se prontos a sair em
defesa de Deus. Cabe a pergunta: seria mesmo em defesa de Deus ou de suas ideias preconcebidas a respeito de
Deus? Mesmo nas condições mais extremas, um amigo deve lealdade a seus amigos (6,14). Jó lamenta não
encontra-la nos seus (6,13-27), e, por isso, anseia por alguém em quem se apoiar; primeiro, um juiz imparcial
(9.33); depois, um mediador (16,19); finalmente um defensor (19,25). Mas não pode contar com ninguém.
«Tornei-me irmão dos chacais e companheiro dos avestruzes. (30,29). Pelo contrário, Jó sempre se comportou
como um amigo para os necessitados e oprimidos e perdoou as penas dos outros (30,24s). Sofar de Naamã havia
dito anteriormente que se arrependera; e assim alcançaria a prosperidade, e os outros viriam a ele pedindo-lhe sua
intercessão (11,19). No final (42,7-9) são os três amigos que vêm a Jó pedindo-lhe que interceda por eles. E Jó o
faz em fidelidade à verdadeira amizade, evitando assim o castigo que tinham merecido. A importante mensagem
que o livro de Jó nos traz diz respeito a experiência humana desses tempos remotos. Na pessoa de Jó vemos
refletidos nossas próprias experiências de sofrimento, dúvidas e conflitos. Mas a vantagem que temos sobre o
nosso herói é que nós podemos contar com um amigo: o autor do livro, por cuja boca fala-nos o verdadeiro
amigo que está sempre do nosso lado e cuja lealdade nunca falha: Deus. A voz do autor, eco da voz de Deus,
constitui parte da sabedoria que temos recebido das «gerações passadas» (8,8). Se nos rendemos à «ortodoxia»
dos nossos tempos, falseamos nossa experiência e, por conseguinte, também a Deus; e «a Deus não se serve com
mentiras» (13,6-9).

PRÓLOGO (1,1–2,13)

Um prólogo em prosa composto de cinco cenas alternadas entre o céu e a terra abre o livro apresentando o
cenário e seus personagens. De um começo tranquilo e feliz passa rapidamente para o sofrimento e a confusão.

PRIMEIRA CENA – NA TERRA (1,1-5)

A figura de Jó parece ser a de um velho e lendário herói da fé (cfr. Ez 14,14-20). Uz está, certamente,
localizada no vasto território que se desenrola a oeste do rio Jordão, mas é difícil precisar sua localização.
Embora nosso herói não pertença ao povo de Israel é, no entanto, um modelo de vida virtuosa. O seu «temor de
Deus» não é mera emoção servil, mas o fruto de uma fé obediente. No contexto teológico dos livros sapienciais,
o temor de Deus é o princípio da sabedoria (cf. Jó 28, 28; Pr 1, 7, 9,10.) É a garantia de uma vida longa e feliz (Pr
3, 13-18). Assim, Jó é abençoado, bem como os seus filhos, gado e servos.

SEGUNDA CENA: NO CÉU (1,6-12)

O Senhor, como um rei que preside a sua corte, aparece rodeado pelos «filhos de Deus», os seus servos e
cortesãos, entre os quais se encontra Satanás. Nem aqueles são os anjos da nossa teologia cristã, nem este é o
diabo. Satanás, «o adversário» é o nome do ofício que desempenha, ou seja, de vagar pela terra em missão de
espionagem. Deus está orgulhoso da integridade de Jó, mas Satanás mostra-se cético, e diante de toda a corte
celestial sugere que Jó é um homem virtuoso e justo simplesmente por conta do que tem. Se viesse a perder tudo
permaneceria ele o mesmo? No contexto de uma cultura de honra e vergonha, Deus, que estava sendo julgado em
seu prestígio, permite que Satanás submeta Jó à prova.

TERCEIRA CENA: NA TERRA (1,13-22)

Em rápida sucessão vão chegando mensageiros que anunciam desastres. Forças destruidoras, naturais e
humanas, que se aliam e se lançam sobre Jó, despojando-o de todos os seus bens. Com gestos dramáticos típicos
de desespero e arrependimento, Jó rasga suas vestes, raspa sua cabeça (Is 15,2; Jr 7,29) é se lança ao chão.
Porém, quando abre seus lábios é sempre para bendizer a Deus. A honra do Senhor está a salvo e Satanás vai
sendo derrotado em sua insinuação.

QUARTA CENA: NO CÉU (2,1-6)

O Corte Celestial entra de novo em cena. O que Jó defende, ao longo de todo o livro, é claro para todos:
não há nenhuma conexão entre a sua vida virtuosa e os seus sofrimentos. Satanás replica com um provérbio tão
enigmático que não nos deixa saber o que ele quer propor. Parece insinuar uma aposta: se Jó for atacado em seu
próprio corpo, certamente que irá proferir blasfêmias contra Deus.
QUINTA CENA: NA TERRA (2,7-13)

Jó é atacado por uma terrível e repulsiva enfermidade cuja descrição é demasiado genérica para ser
diagnosticada. A tradição bíblica sapiencial reconhece e elogia a mulher sábia (Pr 31,10-31), mas a mulher de Jó
só lhe dá conselhos estúpido. Não obstante, Jó não será levado a proferir blasfêmias, «apesar de tudo isso Jó não
pecou com seus lábios» (10). Três amigos recebem a notícia da situação de Jó e, movidos de compaixão, reúnem-
se lá em suas terras distantes – que não é possível localizar com precisão – e partem para levar conforto ao
amigo. Ao chegar, vendo o estado de Jó, também eles explodem em lamentações e, juntando-se a ele, sentam-se
ao seu lado na poeira em silêncio. E assim chega ao seu final o prólogo. O cenário está completo: Jó, sentado na
poeira; Deus do céu, olha atentamente. Façam suas apostas! O que dirá Jó? A audiência: Deus, os amigos e nós, e
nós, os leitores, esperamos ansiosamente.

MONÓLOGO DE JÓ: LAMENTAÇÃO (3,1-26)

A proverbial «paciência de Jó» termina dramaticamente aqui para não reaparecer mais; numa onda de
lamentos lançados sobre todos e sobre ninguém (3,1-10) Jó amaldiçoa o dia e a noite. Não amaldiçoa Deus, mas
o dia em que nasceu e a noite em que foi concebido, desejando que esse dia se tornasse noite e aquela noite que
fosse apagada do calendário. A tradução e significado do versículo 8 são incertos.

DESEJO DE MORRER (3,11-19)

Jó invocou as trevas; agora invoca também a morte. Aparecem aqui as duas características das
lamentações: o «por quê» (Cf Sl 22,2), que implica «não compreendo que seja assim»; e a fixação no «eu» (cfr.
Sl 77,1-6). Diante de sofrimento tão intenso é difícil olhar para fora de si mesmo. Jó anseia pela morte, a que
torna todos iguais, para encontrar repouso.

LIVRA-ME DEUS! (3,20-26)

O grito de «Por quê?» aparece novamente no verso 23b, mas desta vez com um forte acento irônico. Em
1,10, Satanás havia reprovado a Deus por ter «cercado» Jó, sua casa e seu trabalho de bênçãos; Aqui, Jó usa a
mesma palavra para lamentar-se por estar sendo agora encurralado por Deus.

PRIMEIRA SESSÃO DE DISCURSOS (4,1–14,22)


Horrorizados pelos lamentos de Jó e seus repetidos «Por que?», os três amigos abndonam seu sábio
silêncio e se sentem no dever de responder. Os discursos que se desenvolvem em três sessões: 4,1-14,22; 15,1-
21,34; 22,1-27,23. Nos dois primeiros falam cada um dos amigos, e Jó responde longamente. A terceira sessão
aparece um pouco mais desordenada, devido, quem sabe, à confusão do texto.

PRIMEIRO DISCURSO DE ELIFAZ (4,1–5,27)

Elifaz começa educadamente, em típico esstilo sapiencial, apela à sua experiência e reflete a partir dela
(4,7-8; 5,27), mas, curiosamente, recorre também uma revelação especial recebida durante a noite (4,13-21). No
desenvolvimento de seu discurso destaca quatro pontos básicos:

1. Quem é o inocente que perece, o malvado ou o que sofre? (4,7).

2. Que ser humano pode apresentar-se irrepreensível ante o Criador? (4,17-21; cf. 11, 11,. 15,14-16, 25,4).

3. Os seres humanos geram eles mesmos as suas desgraças (5.7).

4. O sofrimento pode ser o corretivo que Deus impõe como convém a um bom pai (5,17); a fidelidade a
Deus traz a abundância de vida (5,23-26).

Elifaz conclui seu discurso com um apelo sincero à experiência (5,27). Desgraçadamente, Jó não o sabe.

RESPOSTA DE JÓ A ELIFAZ
Job reage numa forte explosão de emoções. Sua angústia e sofrimento são grandes demais para se
expressar com palavras comedidas (6,1s), mas pode falar, e mais, deve falar. Jó, então, volta-se para a oração.
Como no Capítulo 3, ainda anseia pela morte, mas esse desejo nunca o levou a pensar em suicídio. Jó não é como
uma estátua de pedra ou bronze (6,12), insensível, mas uma pessoa de carne e osso que chegou às profundezas.
Reconhecendo por fim a presença de seus amigos, lhes dá uma lição sobre o que significa para ele a amizade. De
um amigo se espera a lealdade e a bondade, sobretudo em momentos de aflição. Em vez disso, esses amigos são
como córregos da Palestina, que depois de ficarem cheios pelo efeito da chuva, logo se tornam secos. Não se
pode confiar neles (6,14-21): vieram, viram e retornarão (6,21). Jó os desafia para apontarem seu pecado que
justifique tal tratamento (6,24). A vida é como uma carga pesada e os seres humanos como escravos. Logo
desaparecerão para nunca mais voltar, tragados pelo abismo. Esta e outras declarações indicam claramente a
ausência no livro de Jó, de esperança na ressurreição ou na vida pós-morte (cf. 10,21; 14,10-12; 16,22). Jó não se
cala. No contexto de todo o livro, o versículo 7,11 é verdadeiramente importante. O propósito da aposta sugerida
por Satanás era ver como Jó reagiria, o que diria. E agora, sim, ele diz: por que Deus não o deixa em paz, ao
menos o tempo suficiente para recobrar o fôlego? (7,19). Mesmo que tenha cometido pecado (a questão do
pecado novamente!), não poderia Deus simplesmente perdoa-lo? Um abismo separa toda a possível culpa de Jó
de seus sofrimentos. Logo estará morto e então já será tarde demais (7,20s).

PRIMEIRO DISCURSO DE BILDAD (8,1-22)

Com uma observação ofensiva, o segundo amigo de Jó entra na discussão e, de imediato, passa a fazer a
defender a justiça de Deus. Ainda que já tivesse implícito antes, agora é que a questão se mostra mais clara (3).
De acordo com a melhor tradição sapiencial, Bildad apela para a sabedoria acumulada ao longo dos tempos,
transmitida pelos antepassados (8-10). Repete um provérbio do colorido Egito: «Como as plantas precisam de
água para crescer e florescer, assim os seres humanos precisam de Deus para crescer e prosperar (11s). Em
seguida, Bildad desenvolve o exemplo da pessoa que se esquece de Deus. Semelhante amnésia espiritual só pode
trazer consequências tristes; mais ainda no caso em que essa pessoa alcance certa prosperidade, estará sempre
pendente na balança (13-19). Pelo contrário, Deus não se esquece do justo(20-22). Se Jó se mostrasse
arrependido, mais uma vez a sua vida se encheria de risos e alegria. Ironicamente, Bildad nos faz entrever o que
realmente ocorrerá no final do livro (42,7-17).

RESPOSTA DE JÓ A BILDAD (9,1–10,22)

Embora estes capítulos apresentem muitos problemas de texto e tradução, superabundam imagens
tomadas da justiça legal. Jó se parece, às vezes, com um demandante que quer levar Deus ao tribunal (9,3), mas,
infelizmente, sendo o acusado e o juiz a mesma pessoa, quais poderiam ser suas chances de obter justiça? Outras
vezes, o próprio Jó toma o lugar de acusado e tem de responder, pois isso pode custar-lhe a vida (9,14). A
impotência de nosso herói está se tornando cada vez mais evidente, sobretudo, contra o poder esmagador do
Deus criador. Mesmo assim, a linguagem de Jó vai se tornando cada vez mais ousada e franca. Não pode ser
justificado (declarado inocente), nesta situação em que réu e juiz são a mesma e poderosa pessoa. Não sabe o que
fazer nem o que dizer, pois o que quer que diga não ajudará em nada. Ao longo dos versículos que seguem, a
abundância de perguntas condicionais revela a perplexidade de Jó, tateando por entre uma ou outra saída
possível. Sua vida vai se consumindo rapidamente, com a velocidade de um corredor ou de um barco no Nilo, ou
de uma águia em sua trajetória de voo. Ele não tem chances de sair vitorioso dessa guerra. E mesmo que consiga
restabelecer sua reputação, Deus simplesmente voltaria a manchá-la novamente (9,25-31). Esquecido por seus
amigos, Jó desejaria encontrar uma terceira pessoa, um juiz imparcial (cf. 16,19;. 19,25) que restabelecesse a
justiça entre Deus e ele, mas sabe que isso é impossível. Desesperado, começa de novo a odiar a vida (9,33-35b),
recorrendo uma vez mais às lamentações. Na falta de qualquer outra coisa para dizer, quer ao menos desabafar
suas queixas (como em 7,10): «Por que me tratas assim?» (10,2). Jó apela para a memória de Deus, recordando-
lhe os dias felizes em que o criador o formou, como um oleiro ou um alfaiate que faz seu trabalho com cuidado e
maestria (10,9-12). Por que Deus o persegue agora, encurralando-o como um animal selvagem? (10,16). Como
em 3,11 e 7,15, invoca novamente a morte da qual sabe que não há retorno (10,18-22).

PRIMEIRO DISCURSO DE SOFAR (11,1-20)


O discurso de Sofar se parece com o de Bildad, comedido e cordial (8,2). Como é possível que o que mais
fala seja declarado inocente? Ao contrário de 11,4, Jó não teve a intenção de ensinar nada a ninguém, mas quis
apenas dar voz aos seus conflitos e a sua dor, ante os ouvidos surdos de seus amigos. Censurando Jó por ser se
mostrar tão seguro de si mesmo, sem respeitar o mistério da sabedoria (7-17), Sofar revela pretensa segurança e
ignorância dos limites de sua própria sabedoria. Seu conselho poderia ser assim resumido: esquece essas ideias
radicais, faça tuas orações e corrige tua vida (13s). Se Jó agisse de acordo com a doutrina da retribuição
retri de seu
amigo, desfrutaria de uma existência próspera e encontraria, finalmente, a paz. Também recuperaria sua honra,
suas virtudes seriam reconhecidas e muitos viriam a ele pedindo sua intercessão (19b). A ironia do conselho está
em que, no final (42,8s) serão seus amigos que irão implorar por sua intercessão.

RESPOSTA DE JÓ A SOFAR (12,1–14-22)

Indiferente à acusação de Sofar, Jó inicia aquele que será o seu mais longo discurso, com exceção de
capítulos 29-31. O capítulo 12 está cheio de ideias e terminologias sapienciais; o 13, de expressões legais; e o 14
de lamentações. Numa cultura de honra e vergonha «o que dizem as pessoas» é muito importante; assim em 12,4-
6, Jó manifesta como as suas desventuras só lhe trouxeram desonra e vergonha, transformando-se em escárnio e
desprezo dos vizinhos e amigos. Em 8,8-10 Bildad tinha apelado à autoridade da Tradição, transmitida pelos
antepassados. Aqui Jó faz paródia desta tradição, dizendo que os animais, em sua estupidez, sabem muito bem o
que seus amigos, pelo visto, desconhecem: ou seja, que a desgraça não está necessariamente associada ao mau
comportamento. O provérbio citado, em 12,11, enfatiza que a sabedoria tradicional deve ser submetida ao exame
da experiência, do mesmo modo «como o paladar discerne antes o sabor das iguarias». Elifaz falou antes (5,10-
13) do Deus que cria. Aqui (12,13-25), Jó fala de Deus que introduz o caos no mundo natural (12,15; 19,21s),
ecoando a história do dilúvio universal (Gn 6-8). Também na sociedade humana, a ordem social (ou seja, a
justiça) depende do sábio governo dos reis, conselheiros e juízes (12,17; 18,20). O poder e a força de Deus são
conjugados com a sabedoria e a prudência (12,13-16); o problema está em que, por esta razão, não se pode
compreender como, nós pobres mortais, nos movemos tateando no escuro (12,24s). Mais uma vez, Jó quer levar
Deus ante um tribunal (13,3). Numa cultura da oralidade, as palavras constituem o verdadeiro tecido da
sociedade, e isso alcança a sua máxima expressão na formalidade de um tribunal de justiça. Esta é a razão pela
qual o Antigo Testamento enfatiza a obrigação de dar testemunho fidedigno (Ex 20,16) e da necessidade de duas
ou três testemunhas para se estabelecer legalmente uma acusação (Dt 19,15). Jó tem três testemunhas, mas seu
testemunho é falso! Pensam, por acaso, estar servindo a Deus com a falsidade? Mentem pensando fazer um favor
a Deus ou buscando sua própria defesa ou a defesa de sua teologia? – Eis aqui uma boa pergunta aos que se
ocupam de ministérios pastorais. Os versículos 13,9-11 antecipam o que vai acontecer em 42,7-9. Para mostrar
que as palavras de seu amigo não o intimidaram e, tão pouco silenciaram, Jó diz que está pronto e disposto a
defender, ele mesmo, seu caso diante de Deus e de sair com vida! Isso mostra que está com a razão, pois os
pecadores não podem viver em sua presença (13,16). Jó se dirige a Deus (13,20-27) e diz com ousadia que, sem
condições, um debate com ele (Deus) já o considerava de antemão perdido. Deus deve prometer que Jó não será
sobrecarregado com o seu divino poder («mão») que deixa desarmado e impotente todo aquele que o toca (cf. Ex
23,27). Com esta condição Jó aceitaria comparecer diante de Deus como acusado. (13,22a), ou como demandante
(13,22b). Jó se dá conta de sua insensata confiança e rapidamente volta a se lamentar. Sente-se num beco sem
saída: Deus está longe demais (13,24a) ou muito próximo (13,24b). Sua situação vem graficamente expressa (em
hebraico), com um jogo de palavras: Deus está tratando Jó (´ivyob) como um inimigo (óyeb), e esta é a fonte de
sua constante aflição. Certamente que Jó não pode se considerar sem pecado (13, 26), mas, qualquer que seja a
sua culpa, seu sofrimento é desproporcional em relação a ela. Seu lamento desvela o lado escuro da existência
detendo-se em dois aspectos: a vida humana é frágil e transitória (14,1-6) e não há qualquer esperança de vida
após a morte (14,7-22). Morremos, e aí tudo termina. Apenas dor e agitação interna acompanham o aflito em sua
solidão (14,18-22). Com esta funesta nota de desespero chega ao fim essa primeira série de discursos. Para os
amigos, é a justiça de Deus que está em jogo; para Jó é a integridade de sua experiência. Aqueles tomaram o
partido de Deus, ou melhor, das ideias que fazem a respeito de Deus, que são as que, frequentemente, as «pessoas
piedosas» confundem com o verdadeiro Deus. Jó se aferra à sua experiência e, o que é pior, se nega a ficar em
silêncio.

SEGUNDA SESSÃO DE DISCURSOS (15,1–21,34)


SEGUNDO DISCURSO DE ELIFAZ (15,1-35)

No início (4S), Elifaz mostrava-se mais respeitoso, agora, no entanto, muda de tom. Jó não fala com
prudência, pior, está completamente alucinado. Sua própria boca, língua e lábios, todos os órgãos da fala (5s) o
condenam. Continuando seu ataque contra a pretensa sabedoria de Jó, Elifaz sarcasticamente lhe pergunta se ele
é um místico ou um antigo sábio (cf. Ez 28,11-19), engendrado de uma maneira especial antes da criação (7). A
mesma imagem, com palavras quase idênticas, é aplicada em Pr 8,25b à figura personificada da sabedoria de
Deus. Será que Jó teria tido acesso ao Conselho de Deus? (8). A ironia está em que justamente aí, no Conselho de
Deus, é que os problemas começam para Jó. Elifaz inclui-se a si próprio entre os sábios e anciãos (10). O
versículo 10b sugere que Jó talvez não fosse tão avançado em idade, como comumente é retratado. Se depois irá
gerar filhos e filhas, pode-se deduzir que agora conte meia idade. Elifaz apela para a tradição antiga (17s;. Cf.
8.8), e lança uma série de advertências sobre o destino dos malvados (17-35), concluindo com um proverbial
comentário sobre a futilidade da insensatez (30-35).

RESPOSTA DE JÓ A ELIFAZ (16,1–17,16)

Jó fica impaciente. Queria que seus amigos estivessem em seu lugar para lhes administrar o mesmo
«remédio». Em linguagem típica de Lamentações (cf. Sl 22,7-9,13s;. 17,22) fala de perseguição por parte de seus
inimigos. Às vezes seus pensamentos divagam entre o céu e a terra, ora dirigindo-se a Deus, ora a seus amigos.
Jó não reage com expressões de arrependimento, mas com gestos de dor e tristeza (16,15;. Cf. 1,20) daqueles que
sentem a morte se aproximando (16,18-17,2). Existia uma crença no Antigo Testamento de que o sangue de uma
vítima inocente clamava aos céus por justiça – como por exemplo, o sangue do justo Abel (Gn 4,10) -. Jó espera
que depois que a morte tenha fechado seus lábios, o seu sangue siga clamando. Antes, esquecido por seus
amigos, buscava um árbitro entre ele e Deus; agora espera por uma testemunha, um intercessor lá de cima (16,
19), provavelmente um membro da Corte Celestial que, ao contrário do que fez Satanás, interceda em seu favor.
O texto hebraico de 17,3-10, não está bem claro; Parece que Jó pede a Deus que permita a algum dos seus
conselheiros ocupe-se de sua defesa, como se dá nos tribunais (Gn 38,17;. Dt 24,6-17). Mas não há nenhum.
Definitivamente ele se tornou o escárnio de todos; seu destino é a vergonha. Abandonado, sozinho, achincalhado,
seus pensamentos se voltam para a morte (17,11-16), apresentada com uma série de imagens negativas: região
dos mortos (17,13-16), trevas (17,13), corrupção e vermes (17,14), pó (17,16).

SEGUNDO DISCURSO DE BILDAD (18,1-21)

Depois de algumas breves palavras de reprovação, Bildad começa uma longa descrição sobre o destino
dos ímpios (cfr. 15, 20-35). Usa seis termos, ao que parece, de gíria com significados meio obscuros. Alusões à
tenda destruída (14b-15) ou a morte sem descendência (16-19) provavelmente repercute as aflições de Jó do
primeiro capítulo. Naquele tempo, não havia nenhuma esperança de vida após a morte; a sobrevivência que se
poderia aspirar era o nome preservado na memória dos descendentes. Sem eles, era como se a pessoa nunca
tivesse existido e não podia imaginar destino pior (18s).

RESPOSTA DE JÓ A BILDAD (19,1-29)

Jó começa com uma pergunta típica das lamentações: «Até quando?». As «dez vezes» do versículo 3 deve
ser tomado no sentido de «frequentemente, repetidamente». Embora textualmente não fique muito claro, os
versículos 4s. implicam: «mesmo que eu seja culpado, este é um problema meu, e tu não tens o direito de te
alegrar às custas do sofrimento alheio». Como para manifestar persistência, Jó novamente afirma que Deus está
lhe tratando injustamente (6), fazendo notal às vezes a sua boa conduta para com Deus(7-14). Não apenas Deus o
abandonou, mas também os seus amigos e familiares (13-22). Ele está sozinho e envergonhado. O sentido preciso
do versículo 10 não é tão claro, mas deve significar algo como «fui reduzido a tal extremo que apenas sigo
vivendo». Solitário e já beirando a morte, Jó se agarra à última esperança que lhe resta para reivindicar a sua
causa (23-29). Quer que sua confissão de inocência seja esculpida em pedra para que fale por ele depois de sua
morte (23s). Logo depois (25-27) quer tentar outro tipo de reclamação, mas qual?, como? Estamos diante de um
dos versículos mais famosos e difíceis do livro (25). O «Defensor», algo como o nosso «promotor de Justiça» -
era um ofício da sociedade tribal que trazia consigo a obrigação de defender e proteger os membros mais fracos
da família. Embora suas funções fossem várias (cf. Lv 25,23s;. 47-55; Dt 25,5-10; Rt 4,1-6), a primeira era
manter a unidade vital da família ou da tribo. Jó havia acabado de dizer que todos os seus amigos e aliados lhe
haviam esquecido; agora se agarra ao último fio de esperança: quem sabe não tenha restado ainda algum familiar
por aí que apareça agora, apresente-se ao tribunal e ateste a sua inocência. Quem é esse Defensor? Alguns
comentaristas opinam que é Deus; outros, de forma mais convincente, afirmam que se trata de uma terceira
pessoa que, com Jó, enfrenta aquele que é, ao mesmo tempo, juiz, promotor e carrasco, isto é, Deus. Mas quando
isso aconteceria? São Jerônimo em sua tradução da Vulgata – de onde Hendel tomou inspiração para o seu
Messiah – afirma que isso acontecerá no dia da ressurreição, mas esta versão é contrária a posição mantida ao
longo do livro: não há vida após a morte (cfr. 14,10-22). Jó parece se agarrar a um possível resgate de última
hora, enquanto ainda está vivo. Este é, pelo menos, o seu maior desejo (26b). Dado a natureza confuso do texto,
qualquer interpretação é uma tentativa. Jó termina com uma advertência – e previsão: os que persistem em
condená-lo acabarão finalmente por serem submetidos, eles próprios, a juízo (28s;. Cf. 42,7-9).

SEGUNDO DISCURSO DE SOFAR (20,1-29)

Como Elifaz (15,17-35), e Bildad (18,5-21), Sofar se apressa a descrever o destino dos malvados. Para
responder a Jó, Sofar se apoia, seguindo o estilo sapiencial, tanto em sua reflexão pessoal (2) como na tradição
transmitida pelos antepassados (4). Os malvados ignoram a Deus e aos seus mandamentos, e se colocam eles
mesmos no lugar de Deus. São orgulhosos e arrogantes (6), mas perecerão para sempre com seu próprio esterco
(7). Falando de injustiça social (15-19), diz que a avareza os leva a oprimir aos pobres e necessitados (17-22).
Mas a alegria da riqueza ilícita não é duradoura, pois Deus, qual terrível guerreiro, acometerá contra o malvado
com toda a extensão de suas armas cósmicas (23-28). Se, de fato, Jó está experimentando a ira de Deus, o que
mais se pode esperar? Este é o destino dos ímpios (29).

RESPOSTA DE JÓ A SOFAR (21,1-34)

Este discurso de Jó constitui, de fato, uma resposta aos argumentos dos seus amigos, entrando assim num
autêntico diálogo com eles. Contém numerosas referências (demais para se refletir sobre todas aqui) ao que foi
dito acima. Se os seus amigos não podem lhe oferecer o benefício do silêncio (13,5), que pelo menos prestem
ouvidos ao que está dizendo, pois não rdt´s falando de generalidades, mas de seu próprio sofrimento pessoal (5s).
Os últimos argumentos dos amigos focam o destino dos malvados. Jó os retoma e os rebate: os malvados não
sofrem, mas pelo contrário, a maior parte deles prospera e morre feliz. Além disso, zombam de Deus! (14). Era
crença comum daquela época que os efeitos do pecado eram prolongados através de suas famílias a
descendentes. Isso pode até ser verdade, diz Jó, mas é injusto. O que peca deve sofrer ele mesmo o seu castigo. O
que vai acontecer depois que morrer já não lhe importa muito (18-21). Mas não, os maus não sofrem, pelo
contrário, prosperam e morrem felizes. É assim que tem sido sempre as coisas e assim é que serão. Os inúteis
conselhos dos seus amigos não são nada mais que mentiras (34). Assim termina a segunda rodada de discursos.

TERCEIRA SESSÃO DE DISCURSOS (22,1–27,23)

As duas primeiras sessões discursos transcorre de modo ordenado: os amigos falam e Jó responde a cada
um deles. A terceira, no entanto, aparece desordenada e confusa. Elifaz fala e Jó responde. O discurso de Bildad,
de apenas cinco versículos, está provavelmente truncado; Sofar permanece em silêncio. E mais: parte do que diz
Jó parece mais apropriado na boca de seus amigos. Os peritos ainda estão tentando chegar a uma conclusão
coerente, mas dá a impressão de que Jó e seus amigos estão gritando, todos ao mesmo tempo, o que poderia ser
muito provável no final de um «diálogo entre surdos» sobre a ordem cósmica e moral.

TERCEIRO DISCURSO DE ELIFAZ (22,1-30)

Elifaz reage à refutação de Jó e lhe acusa de uma série de pecados graves (6,11), justamente o que
costumam fazer os poderosos contra os pobres e desamparados (8). No antigo Oriente Médio, as viúvas e os
órfãos eram considerados os mais desvalidos e necessitados da sociedade, já que não tinham quem os defendesse
diante de um tribunal. Ao longo do Antigo Testamento, o dever dos poderosos era o de estar do lado dos fracos e
desamparados e estabelecer a justiça, não perverte-la. Elifaz persiste em seu discurso e, por último, convida Jó a
que acerte ele mesmo as suas pendências com Deus (21-30). Se se arrepender, poderá novamente desfrutar da luz
e do cuidado de Deus (28), e encerra assim a sua argumentação. Elifaz nos revela o triste retrato da degeneração
a que pode chegar uma «pessoa religiosa», quando confunde seus pobres intentos de conhecer a Deus com a
revelação mesma. É o que acontece frequentemente também em nossos dias. Seria demasiado ingênuo considerar
que este seja apenas um problema do passado.

RESPOSTA DE JÓ A ELIFAZ (24,25)

Jó anseia de novo poder levar seu caso a um tribunal. Os versículos 23,3-7 abundam em terminologia
jurídica. Curiosamente, parece que dispensa a ajuda de um mediador (árbitro, testemunha ou advogado), mas está
disposto a conduzir ele mesmo o seu caso, convencido de que pode provar a sua inocência. Mas as coisas não são
tão fáceis. Deus desapareceu (23,8s). A ironia de 23,10b chama a atenção: nós, os leitores, sabemos que Jó está
sendo provado e que, finalmente, a justiça será feita; contudo, Jó atravessa a noite escura da alma. Ele se manteve
completamente fiel, mas Deus tem seus caminhos misteriosos (23,11-14). Jó se pergunta porque Deus ainda não
fixou uma data para se sentar no tribunal e tomar suas decisões (24,1). Retomando o tema da injustiça social, Jó
descreve o comportamento dos malvados que oprimem os fracos e desvalidos (24,2-4); segue-se uma longa
descrição da luta dos pobres pela própria sobrevivência. Novamente estamos diante de um problema de então que
se repete diariamente em nossas ruas nos dias de hoje. A próxima unidade (24,13-17) é uma espécie de reflexão
sapiencial sobre os dois caminhos, o da luz e o das trevas, focando melhor aqueles que amam as trevas. Dia e
noite simbolizam as duas opções de vida. O assassino, o adúltero e o ladrão se protegem na escuridão para
cometer seus crimes. Transtornando a ordem natural das coisas, o anoitecer é para eles como o amanhecer,
quando despertam para realizar as obras do mal.

TERCEIRO DISCURSO DE BILDAD (25,1-6)

Bildade inicia suas alegações finais louvando a Deus Criador que estabelece a paz no céu. Os versículos
seguintes (4-6) retornam ao tema familiar: todos os seres humanos estão corrompidos e cheios de iniquidade
(4,17-21; 11,11; 15,14-16). A pretensa inocência de Jó é simplesmente impossível. Um ser humano inocente?
Não existe tal coisa. Estas reflexões sobre a condição humana são as últimas palavras registradas dos amigos de
Jó.

RESPOSTA FINAL DE JÓ (26,1–27,23)

Os dois capítulos seguintes são problemáticos; parecem mais o resultado de fragmentos posteriormente
recolhidos e justapostos. Jó começa respondendo as provocações habituais de seus amigos e repreende-os
valendo-se da abundância da clássica terminologia sapiencial, ou seja, conselhos, avisos e reflexões (26,2s). Eles
se afastaram do autêntico caminho da sabedoria por não levar em consideração um fato fundamental: a
experiência pela qual Jó está passando. A magnífica descrição da criação, que vem logo a seguir (26,5-14),
poderia muito bem ser a continuação do hino ao Criador de Bildad (25,2-6). Tal como está o texto, dá a
impressão que Jó tenha interrompido Bildad para concluir, ele mesmo, o hino iniciado por seu amigo,
descrevendo a atividade criadora de Deus em termos que lembram Gn 1. Com um juramento solene, Jó continua,
uma vez mais a insistir em sua inocência. É Deus quem lhe faz injustiça, mas, ao contrário de seus amigos, Jó
não servirá a Deus com mentiras e falsidades (27,4;. Cf. 13,7-9). O fato de Jó insistir no que diz ser «minha
justiça» não significa que não se reconheça pecador, mas que a sua posição é justa enquanto a de seus amigos é
falsa (27,6). Os versículos seguintes (27,7-21) soam curiosamente como fora de lugar na boca de Jó. Eles
parecem ser mais o eco daquilo que os amigos reprovam nele. Alguns especialistas tentaram reconstruir a partir
deles um terceiro discurso perdido de Zofar. Buscando, no entanto, um sentido para este texto, tal como ele está,
bem que poderia ser este: segundo a lei do antigo Israel, aquele que se reconhecesse culpado de falso testemunho
contra um inocente, lhe seria imposta a mesma punição recebida pela parte inocente. É isso que Jó deseja aos
seus pretensos amigos (27,7), explicitando depois os castigos com os quais eles o ameaçaram (27,8-23).

POEMA SOBRE A SABEDORIA (28,1-28)

Este capítulo não se encaixa muito bem no livro. A maioria dos especialistas concorda que se trata de uma
composição independente. Sua função no texto seria a de uma interrupção, ou melhor ainda, um comentário
editorial do narrador. O tema é tomado do refrão que se encontra em 12,20: «Onde se acha a sabedoria?». Às
vezes, o texto hebraico é difícil. Em 28,1-12, a sabedoria não pode ser extraída da terra e muito menos ser
comprada. Os seres humanos usam a imaginação e destreza para escavar e retirar da terra minerais valiosos:
ouro, prata, cobre, ferro, pedras preciosas. No entanto, nessa busca toda por coisas preciosas, onde se pode
encontrar a sabedoria? Nem os pássaros com vista penetrante, nem os animais que vagueiam pela terra, jamais a
viram.

NADA NEM NINGUÉM NA CRIAÇÃO CONHECE O CAMINHO PARA A


SABEDORIA (28,13-23)

Todo o esforço humano é inútil, e nada na criação pode servir de ajuda. A sabedoria é mais preciosa do
que o ouro e a prata (cf. Pr 3, 14s) e de tudo o que possa ser encontrado em uma amostra de jóias (15-19). A
busca por sabedoria se revela como uma tarefa impossível, porém, é assim realmente? 28,24-28 32 Deus faz
conhecer o caminho. Só Deus, na plenitude do seu conhecimento e poder criativo, conhece o caminho da
sabedoria. A atividade criadora de Deus é descrita pela primeira vez (28,3; 9,11). A associação entre a criação de
conhecimento e sabedoria tradição percorre todo o Antigo Testamento (cf. Prov 3,18-20;. 8,22-31). É através da
criação que Deus provê e nos abre o caminho para a sabedoria. Da mesma forma que a sabedoria humana se
manifesta no comportamento dos seres humanos e da sabedoria de Deus é revelada em Sua atividade divina.

SÓ DEUS CONHECE O CAMINHO (28,24-28)

Só Deus, na plenitude de seu conhecimento e poder criador, conhece o caminho para a sabedoria. A
atividade criadora de Deus é descrita por primeiro (28,3; 9,11). A relação entre criação e sabedoria percorre toda
a tradição sapiencial do Antigo Testamento (cf. Pr 3,18-20;. 8,22-31). É por meio da criação que Deus estabelece,
abre e revela o caminho para a sabedoria. Da mesma forma que a sabedoria humana se manifesta através do
comportamento humano, assim também a sabedoria de Deus se revela em sua divina atividade. Se antes foi dito
que a busca da sabedoria pelos seres humanos era uma empresa inútil, agora se diz que há um caminho que nos
leva a ela: o temor de Deus e afastamento do mal (e Jó possui essas virtudes, cf. 1,1-8) é o princípio da sabedoria.
Em outras palavras, a busca pela sabedoria deve começar por estabelecer um bom relacionamento com Deus. O
capítulo 28 volta-se para o debate precedente e sugere que a busca apontada alí era uma pretensão demasiado
ambicosa. Em seguida, volta-se para as palavras do Senhor e para o final do livro onde se afirma que a sabedoria
está em Deus, revelada sim, na criação, mas para além do alcance dos seres humanos.

MONÓLOGO DE JÓ: FIM DE SUA DEFESA (29,1–31,40)

Jó esgota todos os seus recursos. Sua tentativa de arbitrar em causa própria não encontra ouvidos. Já não
pode citar a Deus, pois este se foi. Além disso, as testemunhas são falsas e se declaram contra ele diante do
tribunal. Seu longo discurso se estende sobre os capítulos 29-31. Tem início a descrição de uma feliz relação que
teve com Deus (29) e, com doloroso lamento, contrasta depois com a situação presente (30), e conclui suspirando
por sua futura reivindicação com um vibrante juramento de inocência, corroborada pela longa série de seus
comportamentos morais.

QUE TEMPO BOM, AQUELE! (34 29,1-25)

Jó começa por recordar a proximidade e as bênçãos de Deus que experimentou naqueles dias felizes em
que era honrado por todos. Às portas da cidade, onde o povo se reunia para discutir negócios e tratar de questões
sociais e legais, Jó era considerado um sábio, especialmente pelo respeito com que suas palavras eram acolhidas
(21-23). No contexto de todo o livro, essas recordações estão repletas de amarga ironia. Seu comportamento
honrável se manifestava na forma como tratava com justiça todos os demais, em especial os pobres, as viúvas, os
órfãos, os cegos, os coxos, os necessitados, os estrangeiros, todos vítimas dos malvados (12-17). Por conseguinte,
teria o direito de esperar as bênçãos correspondentes que lhe asseguravam uma feliz velhice.

AGORA AS MESAS VIRARAM (30,1-31)

Agora, em vez de honra, desonra e vergonha!, desprezado até mesmo pela escória da sociedade. O
lamento de Jó se volta para Deus (20-26). Agora, na necessidade, quem está do seu lado (24-26)? Jó falou de
seus inimigos e Deus, agora descreve sua própria situação (16.17,28-31). Sua vida se desvanece; até os ossos lhe
doem; sente-se só e abandonado. Durante todo este tempo, suspeirou por um amigo que lhe fizesse companhia. E
agora, seus únicos amigos tornaram-se chacais e avestruzes - animais do deserto conhecidas por sua «linguagem»
ofensiva (29) .

JURO QUE SOU INOCENTE! (31,1-40)

Duas vezes citado diante de Deus para que comparecesse em juízo e respondesse às acusações contra ele
(13,13-19; 23,2-7); Jó pronuncia agora um longo juramento de inocência. Pede a Deus, em primeiro lugar, que, o
pese na balança da justiça, ou seja, numa balança «fiel», verdadeira (6). Apresenta em seguida, um resumo das
suas condutas, rigorosamente morais. O texto é às vezes um tanto quanto é incerto, mas podemos citar, pelo
menos, as seguintes seções: 1. Falsidade e engano (5-8). 2. luxúria e adultério (9-12). 3. Direitos dos escravos
(13-15). Jó não só tratou be, aos escravos, mas a todos, homens e mulheres que para ele são iguais, criaturas de
um mesmo Criador (cf. Pr 14:31; 17,5; 22,2; 29,13). 4. Mau-trato aos pobres e necessitados (16-23). 5. Idolatria
(24-28) -O versículo 25 se refere ao ídolo da riqueza e do dinheiro; os versículos 26s são uma advertência contra
as religiões pagãs circunvizinhas, adoradores do sol e da lua. 6. Ódio contra os inimigos (20-30) - A maldição
contra os inimigos é comum nos salmos de lamentações (cf. Sl 29,23-29), mas Jó não havia amaldiçooado a
ninguém. 7. Hospitalidade (31-33) - Nas sociedades antigas, a hospitalidade para com os estrangeiros era um
valor sagrado e um dever. 8. Hipocrisia (33s) Novamente Jó centra-se em suas atitudes de integridade pessoal. 9.
Exploração da terra (38-40) – Face à crise ecológica que hoje enfrentamos, a preocupação do Antigo Testamento
pela a integridade da criação deve nos fazer pensar. Jó deu conta de todas as relações que tecem a vida humana:
com Deus, consigo mesmo, com os outros – amigos, inimigos, servos, pobres e necessitados - e com o meio
ambiente. Tudo isso entra no conceito bíblico de justiça. E pela última vez, Jó reafirma sua inocência (35-37).

DISCURSOS DE ELIÚ (32,1–37,24)

Jó conclui sua defesa pedindo uma resposta a Deus. O que vai acontecer agora? E, quando menos espera,
surge em cena um intruso chamado Eliú. Trata-se de um jovem revoltado que, aparentemente, esteve ouvindo
todo o debate e não pode conter-se mais. Irritado com o que acabara de ouvir, quer ainda botar mais lenha
naquela fogueira (32,19). E o faz com quatro discursos que, ainda que não tragam nenhuma novidade, manifesta
sua convicção, paixão e verborragia.

PRIMEIRO DISCURSO DE ELIÚ 32,1-33,33.

Apesar de sua juventude, Eliú se acha no dever de falar. A sabedoria nem sempre, - ou não
necesariamente -, não está associada tem a ver com a idade, pois é um dom do espírito/sopro de Deus (32,8-18).
Ao contrário dos outros dois amigos, o jovem chama Jó pelo nome (33,31). Depois de um longo preâmbulo (32,
6-B-33.7), entra finalmente no assunto. Jó reivindicou sua inocência, afirmando que Deus estava lhe tratando
como a um inimigo, ignorando seus gritos de socorro. Pois bem, Jó está equivocado (33,12). Deus fala, mas jó é
que, provavelmente, não tenha o escutado. E fala, seja por meio de sonhos e pesadelos ou através da
enfermidade, para advertir o pecador e trazê-los de volta ao caminho da vida (33,14-22). Eliú também cita ainda
um mediador celestial, membro da corte de Deus (33.23), o que vem em socorro dos pecadores que se
arrependem. Jó desejou ardentemente um mediador (16,19-22), mas certamente esperava dele outra coisa.

SEGUNDO DISCURSO DE ELIÚ (34,1-37)

Depois de censurar os amigos, Eliú empreende uma longa defesa da justiça e da equidade de Deus (10-
29). Deus vê tudo e é ele quem dita a sentença. Aquele que se afasta de Deus só pode culpar-se a si mesmo (24-
27). Como os amigos, da primeira rodada de discursos, o jovem sugere a Jó o que ele deve dizer para manifestar
seu arrependimento (31s). Os versículos finais (34-37) são duros e cruéis, - e irrelevantes -, como aqueles que
saíram da boca dos amigos.

TERCEIRO DISCURSO DE ELIÚ (35,1-16)


Eliú continua a desenvolver o tema da grandeza e da transcendência de Deus. Os oprimidos clamam a
Deus, mas ele parece não escutá-los. Deus, porém, escuta e responderá, mas os que por clamam é que se
encontram fechados em si mesmos e não esperaram o tempo suficiente (14). É a resposta simplista e banal de
sempre para proteger «nossas» idéias acerca de Deus.

QUARTO DISCURSO DE ELIÚ (36,1–37,24)

A primeira parte do discurso (36,1-21) é a continuação da discussão das sessões anteriores. Os destinos do
justo e do malvado são submetidos novamente à revisão. A segunda parte (36,22-37,13) louva a grandeza do
Criador. Seu poder, sabedoria e conhecimento estão acima da nossa capacidade de compreensão (36.26). Eliú
centra-se no dom divino da chuva (36,27-37,13): Será que Jó está çevando em conta as maravilhosas obras de
Deus? (37,14). Em todo o Antigo Testamento, as «maravilhas de Deus» dizem respeito às grandes obras que
realizou quando libertou Israel da escravidão no Egito. Na tradição sapiencial, as maravilhas de Deus são as
obras da criação. Eliú lança uma série de perguntas a Jó que, é claro, sempre tem como resposta um «não»
(37,15-21). Por mais sábios que sejamos, jamais poemos responsabilizar Deus. Tudo o que podemos fazer é
«teme-lo» - adora-lo e reverencia-lo -, e nisso consiste o princípio da sabedoria (28,28). Eliú é um figurante na
cena, uma simples figura de transição. Suas observações anteriores trataram das discussões que Jó teve com seus
amigos; agora volta-se para adiante, centrando cada vez mais em Deus, terminando com a descrição da
tempestade e mais uma série de questões que pretendem humilhar Jó. O Senhor irá falar a partir da tempestade
com uma lista de questões semelhantes.

DISCURSOS DO SENHOR (38,1–42,6)

Agora é o Senhor, que esteve ouvindo e tomando notas (35.13), quem fala. Os amigos achavam que Deus
não precisava falar. Jó, pelo contrário, sim; pediu a Deus, ou uma lista de obrigações (penitências) ou uma
sentença. Todos ficam chocados. O Senhor entra como um a mais no debate e responde com dois discursos (38,1-
40,2, 40,6-41,26). Jó, por sua vez, responde brevemente com dois outros (40, 3-5; 42,1-6). O Senhor não
responde a nenhuma das questões colocadas; na realidade, suas palavras oferecem apenas uma série de contra-
questões destinadas a tirar Jó do seu pequeno mundo, abrindo-lhe um horizonte mais amplo.

PRIMEIRO DISCURSO DO SENHOR (38,1-40,2)

Deus fala a partir da tempestade. Agora é a vez de Deus perguntar e de Jó responder. Jó é convidado a
entrar no mistério primordial do cosmos. Em primeiro lugar, a fundação da terra é descrita como uma casa
construída de acordo com um plano detalhado de arquitetura (38,4-7). Em seguida, sob a ordem do Criador, surge
o mar que é revestido e circunscrito por seus limites cósmicos. E o que dizer da manhã (38,12-15), quando a
claridade reúne todas as cores e lança sua luz sobre as ações dos malvados? Jó será capaz de compreender as
águas primordiais ou as fontes da luz? (38,16-20). No versículo 38.21 podemos perceber um toque da ironia
divina. Depois de discorrer sobre a estrutura básica do cosmos, o Senhor volta aos mistérios que envolve o
universo, especialmente os fenômenos da natureza (38,22-30). Os interesses de Deus vão muito além do pequeno
mundo de preocupações humanas de Jó. Seu poder criador manifesta a sua providência - na antiguidade, muitos
acreditavam que o destino humano estava escrito nas estrelas. Em seguida são mencionadas as constelações
celestes (38,31-33). Pode Jó produzir a chuva e envolver-se a si mesmo com nuvem da tempestade como num
manto? (38,34s). Verdadeiramente o Senhor criou tudo com sabedoria (38,33-38; cf. Pr 3,18-20; 18,22-30; Sl
104,24). O resto do discurso é dedicado ao mundo animal (38,39-39,30). Cinco pares de animais silvestres são
mencionados: Os leões e os corvos (38,39-41); as cabras montesas e as cervas (39,1-4); jumento montês e o boi
selvagem (39,5-12); o avestruz e o cavalo de guerra (39,13-25); o falcão e águia (39,26-30). Na cultura do
Oriente Médio, todos esses animais foram associados com imagens negativas (demônios, caos, deserto). O
Senhor é quem sugere que não só cuida desses animais, mas que também estão sob seu o controle, e isso é uma
bênção para a humanidade. Assim terminam as duas partes do primeiro discurso com o qual o Senhor responde a
acusação de Jó de que não há nenhum plano ou providência no mundo.

RESPOSTA DE JÓ AO SENHOR (40,3-5)


O Senhor faz uma pausa para recuperar o fôlego e dar a Jó oportunidade de responder. Antes Jó havia
mencionado como as pessoas cobriam a boca com as mãos ante suas palavras como sinal de respeito (29.9).
Agora é ele que cobre respeitosamente a sua boca. Jó não confessa qualquer pecado, é simplesmente inundado
ante o mistério de Deus e do universo.

SEGUNDO DISCURSO DO SENHOR (40,6-41,26)

O Senhor lança um novo desafio a Jó: é mesmo necessário que condenes a Deus para afirmar tua
inocência? (40,8). E no que segue, apresenta a descrição de dois grandes monstros: Beemot (40,15-24) e, mais
extensivamente, Leviatã (40,25-41,26). Os especialistas querem identifica-los com o hipopótamo e o crocodilo -
e assim os temos traduzido -, porém, na cultura do Oriente Médio, são também mitos/símbolos do caos
primordial que o Senhor, tendo-os criado, mantém sobre eles domínio e controle. Estamos, provavelmente, diante
de uma mescla de mitologia e zoologia. Deus desafia Jó: Quem os seguraria pela frente, e lhe furaria as ventas
para nelas passar cordas? Podes tu captura-los? (40,24). Eles se exibem pelo mundo, afrontando e atacando, de
modo a fazer com que tudo volte ao caos. Contudo, Deus não os destrói, antes, controla-os.

RESPOSTA DE JÓ AO SENHOR (42,1-6)

Finalmente, Jó reconhece o poder e os desígnios de Deus e admite que vão além de sua capacidade de
compreensão. Antes, Jó sabia sobre Deus através dos ensinamentos da tradição. Agora, submerso no mistério,
tem um conhecimento mais direto Dele, e renega tudo o que tinha falado. Estarian mostrando arrependimento por
seus supostos pecados? Certamente que não, pois a Deus não se serve com mentiras. Jó pode ter ido longe
demais em sua ânsia por compreender, porém seu sofrimento não é consequência do pecado. O que realmente
agora compreende é a fragilidade e os limites da condição humana ( [6] «pó e cinza»).

EPÍLOGO (42,7-17)

O livro chega ao seu final com um epílogo em forma de prosa e que se desenvolve em três cenas: 1. Deus
censura Elifaz e seus dois companheiros: «Não falastes corretamente de mim, como Jó, meu servo» (7). E isto é
tão irônico quanto importante. Para dar ainda mais ênfase, é repetido no versículo seguinte. Os amigos precisam
pedir perdão a Jó se quizerem evitar o castigo. Jó concede o que pedem e Deus aceita que seja assim. 2. Além da
honra, Deus devolve a Jó as suas propriedades (10s), ainda que este não tenha feito qualquer menção ou pedido a
esse respeito. Familiares e amigos vêm agora dar-lhe verdadeiro consolo. 3. Por fim, Deus o abençoa (12-17),
devolvendo-lhe o gado (duas vezes o que possuia antes), uma família com sete filhos e três filhas, cujos nomes
refletem seu apelo: Jemimah (Paloma), Keziah (Acácia) e Keren-happuch (Azabache*). Jó morre feliz, cheio de
anos e cercado pelos filhos até a terceira geração.

REFERÊNCIA BIBLIOGÁFICA:

Autor desconhecido | Retirado de: http://www.bibleclaret.org/bibles/lbnp/AT/44Job.doc | Acesso em 28/10/2014 | Pastoral


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NOTA

*Azabache: mineral negro e brilhante, duro, compacto e leve, que é uma variedade de carvão utilizado para fazer jóias ou
ornamentos.

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