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auras

auriculturas filosônicas

http://filosonias.pravida.org
http://fruido.pravida.org
http://auricultura.devolts.org
http://oelefantedemarfim.cc
http://kcah.hotglue.me
Felipe Ribeiro é poeta, auricultor, filósofo e trabalha com arte transmidiática
sinestésica, já tendo se apresentado em
diversos festivais internacionais com
instalações e performances sonoras, palestras e
óperas. Entre estes estão a Bienal de Havana
e Istambul, Medialab Prado ARCO08
Madrid, Transmediale, Tesla Berlin, NOD
Meet Facktory Prague, Fórum Social
Mundial, Freewaves Los Angeles, Instituto
Hemisférico, Acúsmatica, Encontro
Internacional Nietzsche Deleuze, Fórum
Social Mundial, Mídia Tática,
Submidiologia, Tsonami Valparaíso,
Corpoinstalação, Videobrasil, Dança em
Foco, Montevideo Amsterdam, Café
Filosófico CPFL, Semanas de Dança, MAM Bahia, Festival de Curitiba, entre outros.
Trabalhou no Centro de Referência à mulher encarcerada com criação de canções de
ninar. Teve trabalhos premiados como a trilha para Eduardo Fukushima com o Prêmio
Rolex de Dança, o APCA com a Key e Zetta Cia., o prêmio Bravo com a cia. Club Noir,
e o prêmio Entretodos pelo documentário Ocupação e Despejo com Rafael Adaime.
Participa de diversos eventos de cultura livre com as redes de arte-atuação
Submidialogia, Mídia Tática, Movimento dos Sem Satélite, Metareciclagem e
Ruidocracia, Vídeo nas Aldeias. Foi curador do primeiro salão de residência do
centro-oeste Fora do Eixo no Museu da República em Brasília e jurado das Oficinas
Owsal de Andrade. Dirigiu e sonorizou para diversos artistas plásticos e companias de
dança incluindo Fernando Marques Penteado, Dimiter Gotscheff, Adolf Shapiro.
Agora acaba de finalizar sua sétima ópera “O Elefante de Marfim” sobre a qual
prepara um filme longa-metragem.
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Filosonia

Σ=ƒ.[(ॐ.φ)÷ψ]
Filosonia: Tornar as afecções (empathos: sympathos, antípathos) sensações (filia),por cruzamentos
no mar de memórias em sentimentos (feelings). Em lógica, todo sentimento é uma patho-logia. Paixão
sonora. Uma pesquisa filosônica se pauta nos limiares da escuta, as lógicas musicantes e em que suas
dinâmicas podem ser usadas nas ampitudes mais abrangentes do trabalho de escuta e composição sonora. Ou
seja, almeja-se uma aproximação do som em todas as instâncias da vida, uma escuta panorâmica (panfonia).
Desde a afetação (hedonista e de desafio) às formas de encadeamento lógico do compositor à relação
harmônica desta com demais compositores.

Som pré-histórico, tom mitológico, modo grego, escala gregoriano (canto chão cristão), campo harmônico
imperial (hinos nacionalizantes), escalas harmônicas implosivas (dialética do renascimento monádico
romantismo/ultrarealismo), escala de escalas (barroco ao fractal surrealismo), campo harmônico das escalas
(serialismo do micro ao macrosonal), sonologia e antroposonia do fim de século progenitor das máquinas. E agora
uma harmonia contextual, faculdade advinda do que no decorrer do século dito vinte ocorreu como um
desdobramento fundamental nas formas de percepção da linguagem. A saber, se até então havia um código
musical autônomo (tonalismo transcedental) baseado na imposição duma lei (harmonia diacrônica), com o
aparecimento da matriz serial (cacofonia), a música se ouve posta em cheque pelos próprios meios culturais
(capitais) que a demandaram como legisladora sonora. Desta dissidência de Mnemosýne com Sonia ocorre a
aparição sutil de dois movimentos sonoros, filosonia e auricultura.
Silêncio, Por Favor

“Suspiras. Sofres?
Respira.
Não há outra lira.”
Silêncio, por favor! Falar, gesto de profanação. Rompemos as intrincadas tessituras entre
silêncio e som para interpormos nosso tremular verborrágico, a explicação quer ter ao inexplicável,
o paradoxo é a paixão primeira do que é: soa.
Nos lembremos que informação não é conhecimento, conhecimento não é sabedoria,
sabedoria não é beleza, beleza não é amor, amor não é música e a música... a música musica algo
para muito além de nós. Nos esqueçamos disto também.
Jogados no mundo, movemo-nos aos caprichos da harmonia de tudo contra a escuta de tudo,
sinergia das potências... Só habitamos pontes, linguagens, vínculos antropocósmicos perdidos na
cegueira das sensualidades, semiônticas. Os amantes das mathemas epistémicas cruzam os abismos
absurdos pautados em seus cabrestos de axiomas, limitamos os sensos por regras estésicas de
bondade, toda procissão tem sua pragmática ritualística. Ao devaneio poético, resta senão suspirar:
Levai-me caminhos, moralizamos a beleza.
Ouçamos a sinfonia do e no mundo, {...} não podemos esquecer o som das britadeiras e dos
automóveis, as pontes estão sempre em construção. Cessasse o esgoto radioativo e suas dança do
acasalamento palavra-lei som-potência do cancioneiro; não mais rissem as buzinas do livre-arbítrio
e do fluxo; os mascates parassem de vender as vendas; não estendesse o sonic boom aviador às linhas
de morte, fuga e fumaça das geometrias orbitais; silenciada a pólis aos seus 40 deciBéis por metro
quadrado; ainda assim, a mais delicada sutileza concreta pleitearia ao fortissimo furioso do barro oco.
A distinção entre ruído e música toca o cerne da estética imanente à transcendência, o que é
indesejado e o que é desejável do que surge? Esquizofonia, o cárcere auditivo a uma paleta de
modulações das ondas sonoras (cortimbre, melodiarmonia, ritmopulso) é também o abrigo de
nossos valores oníricos, moiras e morus. Durar cruza o espaço tal qual alma atravessa qualquer
investida de palavra e inversamente. Nos alimentamos das origens que retemos nestas tramas,
somos como soamos.
Onde ouvimos o agora? {...} Porão escondido atrás das cópias sob a curva do rio, ponte
fictícia do religare entre fé e o que é. A alcova, o ninho, a toca, a terra não tem limites abaixo em
nossos sonhos, o porão é o portão da morte órfica. O refúgio sempre está no olho do furacão, os
ouvidos não piscam. Aqui está quente porque lá fora faz frio, é numa divergência convergente que
alicerçamos nossos paraísos artificiais. É nos invernos da memória que se atualiza o lar de uma casa,
sua máquina de afronta ao cosmo e nisto todo cálice é morada, brindemos.
Que ouvimos do aqui? {...} As vigas de sustentação tremem, respiramos, respiramos, não há
momento que consigamos estar juntos sem alguém falando {...} O espaço seduz-nos com a
intimidade a agirmos, a movermos os cômodos de lugar, os centros de solidões, tédios; paixões
agrupadas nas salas da construção de mais um corpo sem órgãos, reduzimos os refúgios de nossas
musas ao reduto de nossa autoridade de autores, a ágora obriga-nos a subverter nossas relações em
políticas.
Conseguiríamos calar nossas vontades tempo suficiente para ouvir nossos tantos corpos,
porém? {...} Os corpos humanos estão em corpos sociais em corpos arquitetônicos em corpos
celestes, e estes, entre outros criam corpos sonoros da mesma maneira que meu corpo linguístico
enquanto vos falo.
Que pede-nos aqui e agora esta voz que silencia? Favorecidos com a a-tensão, suspendamos por
dez minutos a palavra, não falemos. Experienciemos ao menos uma vez este porão de subjetividades
sônicas, devaneemos a outras escutas de nossas incontáveis peles além da ratio-plausível. Para que a
música nascida de cada ínfimo movimento e gesto nossos, a harmonia sonora dos corpos ambientes, não
nos trespassem despercebida. Só por hoje deixemos soar os cantos de nós, nos esqueçamos só por hoje do véu
da técnica e deixemos que a música nos dance. Ouçamo-nos sem palavras. Silêncio, por favor! Em dez
minutos musicaremos...
Anatomia do Olvido

“Escutar é esquecer.”
… dígitos às tramas de fibras, visco de pálpebras, inflação de metacárpios e pupilas... orbicular estiramento à
ofuscação lacrimal... rugoso vertebrar de papiro, consistência e quebras... arar de cílios... tremulação radial,
folhas ao ar... pisca... falange em cento e oitenta graus de um corpo encadernado... plexo tonal... página em
branco, página virada... pruridos, os signos sob unhas à pele, polêmica dos poros... tinta coagula em tipos...
impressos, penetração das valas papilares... sabeor, saboer... eriçar pelos pêlos, insurgir o gen ido explosão...
barulho... todas as línguas estão mortas recebendo a vida... última sentença antes que os sonhos nos engulam,
temos um corpo a desconstruir... temos um léxico a gestar... vãos moléculas... só, o ruído sabe-se... nada, de
rugas conhecimentos... pulsam! pulso, desmedidas células... carmesim seiva, cantar dos rios primeiros...
calcam veiartérias, estas margens... redentre, almáquinas... que sabemos do amor, senão memórias d’úteros
que enchemos com nossos vazios? caixas acústicas, como perseguiremos teu falsilêncio ressonante feitos
entre o escarlate esquecimento... entre sopro e foz, surdo da marcha já fúnebre, batimento rubro e terno...
fonofagia estio, still fetouvido oceânico... o é nunca cabe-se e quer que nunca acabe... dest’ruímos
d’recepcionados nest’humor a ser expelido, placiente acidez...em espinha escápula o um, abrigo d’homem...
cóccyx nomeado atlas, flexão da extensão à órbita dos satélites... tabula ossea rasa... dor, so it is... pés te erguem
arcos... dêem-te em czima, paixão dos abutres... ode, os primaveris córtex... cérbero, a via dolorosa e térmica...
ser é belo ensífalo... és o fago, diafragmenta pan, crias... disciplinam o reto ao curvo... à horta de suas tantas
peles, lavram... éres íris... húmus do anus do solo... nozes, nós vozes do brotar... tectônicasca ovo rachadura,
berra terras... fiandeiras glândulas, me embrandas... suaveazedo tear subcutâneo, bile e vísceras projetam
fome, trançam... sol calcificado espaldas, os sós sons de flautas vertebradas em fantasias cervicais...
solidifica-se estratos em depressões... do tecido vivo, músculos... enervo arcabouço elo... sulco da fossa
temporal... masca... nem todas as costelas são verdadeiras... mandíbulaxiomas contra o efêmur... me adula
promontório sacro, crista transversal, vá idade... a vida será arcada... natimorto prematurobsoleto, gesto...
cegocolhar insone acolher vér-me... cadáver arado conmusa sermente... it... que só sabe o que se sente... esta
fome de maiores fomes digeridas em nomes... em nome da fecunda ferida dos vírus... nascercado de
corpó... suplício em berros silente e sempre... reticente... e... e... e... só... quando nossos corações pela
primeira vez batem, compreendemo-nos dissonância... a respirardor... trago o ódio ao peito...
aspirei, há o amor-te... até que ali mentasse às flamas, minha ira... chamando brasas às asas...
quimeras pulmonares d’homoplata... raízes flutuantes cinza névoa, m’elán viral dos títeres in sensus
mundi... legado às pedras, putrefato exalantoráxica toxinas... escarrando escárnio acima, larfar-ing
memoiragoraquinstantes... jásperas expéras... fumaças do quandonde, ampulhetalhe...germenow
fleumastigandordem, desertores de ser desertos... cartografias do nadareia movediçando, catárse em
cartilagem... grãos em vão comendurando cagandócios gengivais... soleirascidentes dos multilados
baldaquinos áridos, abóbada crânica... sob, folhágrimassêcas em suas tendências tersãs ao redestorno
que queda na queda crônica... tênue gravidade, tênia e gravidez... entudo absoluto vazio... absurdo,
abismo: proscuro... escolhúnica dos labirintos zigomáticos... meergulho na superfície à precisão
imagética da morte... pro fundo profundo do mundo onde no fundo, no fundo não há fundo...
descascada a cebola, resta o choro, a lâmina, os restos... fé, rugem: é! des-pertando as fúrias
re-veladas... a corda! a corda! todos os nós estão em nós... mácula vertidos ao refletir nos olhos do cú,
demônios que somos... esmagados pelas próprias vísceras... forca intransponível entre virtude e
carne... erigindo nas ruínas dos templos nossos templos à ruína... idolatrando os pés adôneos,
ateando as raízes quadradas ao fio da lâmina sedesejo... segredo, metameta do ente... a vialogopatia
sob a pele vertigensons... harmonia bélica das esferas... além domínio do demasiado espreitando por
um apêndice... entre o entre e o entre... com suas helioconíades névoas lusco fusco turbilhonante de
mônadas às sériespiraisto infinitecido, multiplúnico transcaosmetrogonia da mnemomania...
musicai! Sus urros, no mas que reverberaciones del grito primeiro. Son las palabra a tatuar-se como
moneda de la moenda, valor del lavor , papel del papel...
Um Sistema Musicológico

“Pratica a música, Sócrates.”


1. Nietzscheana ressacralização do mistério, potencialização de paixões e raciocínios através da transcendência
estética, esquizopathológos musical à panarquia ruidosa do mundo, o som além do humano;
1.1. Apolíneo sonhar, bela lógica da fé nos sentidos mensuráveis;
1.1.1. Órgão sem corpo do som, guerra de musas;
1.1.2. Mitologia cosmogônica, metapragmática de caos a logos;
1.1.2.1. Véu de ilusão necessário ao ato perante o rigor das formas absolutas dos afetos;
1.1.2.2. Matemática, número e nôumenon, pontos;
1.1.2.3. Retroalimentação entre arquitetura e ontologia, técnica do princípio e princípio da técnica;
1.1.2.4. A necessidade da estrutura ausente da psiché, a linguagem do jogos;
1.1.2.4.1. Regras, responsabilidade, autoridade e autoria;
1.1.3. Entrelaçamentos de ruído e silêncio;
1.1.3.1. Díade infinitesimal, o paradoxo do ente entre ser e não-ser, linha da dimensão primeira;
1.1.3.1.1. A re-percussão erótica, pulso, ritmo;
1.1.3.1.2. { tempo / espaço = velocidade }
1.1.3.2. Díade infinita, dentre o devir e o uno, linha da dimensão segunda;
1.1.3.2.1. A flauta de Pan, monodia das alturas melódicas;
1.1.3.2.2. { espaço / tempo = distância }
1.1.3.3. Tetráde, a dupla quadratura das díades alicerceando a tridimensionalização no plano decimal:
1.1.3.3.1. { ( 01 ) = ( 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 ) }
1.1.3.3.2. A lira de Orfeu, polifonia das polêmicas monódicas;
1.1.3.3.3. { velocidade / distância = aceleração }
1.1.3.3.4. { distância / velocidade = intensidade }
1.1.3.4. Retorno da série à mônada, a soma das grandezas sonora na cor timbrística;
1.1.3.5. { intensidade / aceleração = aceleração / intensidade = harmonia }
1.2. Dionisíaco embriagar, sublime fé na lógica dos sentidos incomensuráveis;
1.2.1. O som do corpo sem órgãos, músicas de guerra;
1.2.2. Imponderável logomítica, devaneio ápeiron de logos a caos;
1.2.2.1. O lance dos dados, ser-no-vigor dos fatos, relatividade dos afetos formais;
1.2.2.2. Numerologia subjetiva, a matemática qualitativa;
1.2.2.3. A insubmissão sonora à narrativa distinção tempo/espaço, substância formal dialética inerente a
qualquer metro;
1.2.2.3.1. Aeion, tempespaço indistinto das Eríneas, Eros e Caos;
1.2.2.3.2. Quântica das durações e potências comovedoras dos sons;
1.2.2.3.3. Interdependência entre os jogos de linguagem, estética, pragmática, crença e lógica;
1.2.2.4. Criador, suprema criação de domínio público;
1.2.2.5. Corpo, metáfora primordial das mathemas;
1.2.2.6. Limites entre sons e símbolos, semiótica e fenomenologia harmônicas:
1.2.2.6.1. { 0 =  = imponderável, caos e tao [ Silenos ] }
1.2.2.6.2. { 1 = uno, indivíduo e identidade }
1.2.2.6.2.1. { 01, 10 = 2 = díade, separação e confronto [ Apolo e Dionísio ] }
1.2.2.6.2.2. { 01 = 3 = tríade, movimento e representação [ Édipo Prometeu ] }
1.2.2.6.2.2.1. { 0123 = 4 = tetráde, solução e problema }
1.2.2.6.2.2.2. { 0 + 1 + 2 + 3 + 4 = 10 = dobra dimensional }
1.3. A aparição das aparições, o des-velamento(alethéia) dos mistérios
1.3.1. Eterno retorno da diferença subjetiva, volta a §1.
2. Socrática contradição da quadratura instinto raciocínio, moral mística anti-mística demasiado humana;
2.1. Religare filosofia, decadência da poiesis, a arte anti-arte;
2.2. Castração das potências de paixões e razciocínios, moderação e virtude;
2.2.1. Paradoxo da caverna, o fractal representacional;
2.3. Voz e verbo no simbolismo corpóreo, princípios ordenadores;
2.3.1. Ambivalência do choro primeiro, nome e excremento;
2.3.2. Submissão de todas faculdades técnicas à linearidade bidimensional do texto;
2.3.2.1. Redução dos fluxos ao administrável, a representação de música, canção de captura;
2.3.2.2. Progressivismo técnico e modernismo formatador;
2.3.2.3. Jogos pragmáticos com peças musicais e jogos musicais com peças pragmáticas;
2.3.2.3.1. Músicos e atores de música, ouvintescompositores e partituradores;
Um Devaneio Filosônico

“Sem o imperialismo do conceito,


a música teria substituído a filosofia.”
Os sons que nos precedem à existência e ainda estão por cessar são indissociáveis da nossa
utopia sentimental do silêncio: são a substância, a emoção de fundo, de nossas arbitrariedades
harmônicas.
Através da musicæ1, tentativa de apaziguar o tormento deste ouvir transconsciente à
demasiado complexa harmonia do mundo, reduz-se o foco auditivo a um espectro compreensível, e
preferivelmente confortável, das faculdades neuropsicológicas do ouvintecompositor. Esta relação
ambígua da estética enquanto a ordenação da complexidade 2, permite-nos tanto experimentar às
transformações da audição orbitando ao ideal simétrico sob a gravidade sensível-racional do corpo
quanto encurralar no ângulo fechado dos cantos entre melodia, cortimbre, ritmo e harmonia as
infinitesimais arestas das freqüências de nossa esférica escuta 3.
Deixamos que esta segunda imagem de harmonia reverberasse em todas nossas relações com
o musical dividindo os gestos de intuição-criação das de representação em palcos tridimensionais e
interpretação padronizada de instrumentos padrão, para encaixar o movimento no espaço,
partituramos. Por querermos controlar o belo e o sublime acabamos por destruí-los 4.
Sustentando este grande musical espetáculo da institucionalização da intuição, o som
comprimido em três dimensões serve de massa para as arquiteturizações pseudobarrocas de
escadarias ascé(p)ticas de compositores feitos ícones da seriedade sacra deste ofício. O músico
reduzido a ator de música 5 advoga seu conhecimento da lei de seu instrumento masturbador, e
virtuose que é, com o que resta do lúdico dado ao erro, toreia o ruir sob o véu-técnica e este sistema
especialista veste seu ídolo.
As disciplinas formais dos estilos, frente às quais se prostram estes tardios intérpretes
copistas, mascaram na logomítica marcha storia-scientia 6 suas para-doxas religiosas de
retroalimentação entre o paraíso perdido da forma e a esperança no juízo final, confortando as
estreitezas dimensionais de nosso espectro de sensibilidade na linearidade do progresso, para enfim,
na nostalgia do presente fazer da própria existência ensaio 7 de seu produto gregário, a obra 8.
Reduzidas as músicas assim a A Música, objeto de consumação: repetição dos resultados certeiros
em lugar dos processos de devaneio através das impossibilidades das certezas. Eficácia plena da
gestão sócio-econômica do gozo fetichizado em um refinamento cultural 9. A música tal qual o
corpo, porém, é algo para muito além do prazer10.
1
Notar que na musæ cæda o advir, ou sublevar, é também a queda das filhas da memória.
2
George Birkhoff na sua Medida Estética aponta esta inversa proporção entre ordem e complexidade na relação humana
ante a beleza resultante da limitação de nossas capacidades de lidar com os paradoxos sensíveis.
3
Sobre es cutis, interno às peles, trato mais aprofundadamente no trabalho “sob, a pele vertigensons”.
4
Cioran, E. M. Breviário de Decomposição, Procissão de Sub-Homens, pag.175: “ Engajado fora de suas vias, fora de seus
instintos, o homem acabou em um beco sem saída. Queimou etapas... para chegar a seu fim, animal sem porvir,
atolou-se em seu ideal, perdeu-se em seu próprio jogo. Por haver querido superar-se sem cessar, paralisou-se; e não lhe
resta outro recurso senão recapitular suas loucuras, expiá-las e fazer ainda algumas outras”
5
Hegel, G. W. Estética, Idéia e Ideal, Cap.I até a contradição do mimetismo no §3: ”Pretendo que a imitação é o final e
não o fim da arte”.
6
Poderíamos notar, quando Cioran solfeja que "Sem Bach, a teologia seria desprovida de objeto, a Criação fictícia, o
nada peremptório. Se há alguém que deve tudo a Bach, esse alguém é Deus." que é deste mesmo compositor a máxima
morália: “A música é a maior de todas as ciências”.
7
A Construção de Franz Kafka, as venturas da Alice de Lewis Caroll quanto as pinturas de Escher e Magritte exprimem
esta angústia espacial do ponto de vista frente ao fractal. Mais sobre o assunto na obra A Lógica do Sentido de Gilles
Deleuze.
8
Uma linha de fuga está sintetizada por Umberto Eco em a Obra Aberta e a Estrutura Ausente.
9
Nada poda mais às raízes que a rizotomia. Nada contradiz mais ao inteligente sensível que o culto cultuado. O anel dos
Nibelungos é a kitschzação da cidade. Wagner talvez tenha reinventado o souvenir.
10
Que fique claro, que com isto não defendemos as paixões tristes. Mesmo Baruch de Spinoza em algum lugar do Livro
III da Ética defende a necessidade das dores e tristezas enquanto reorganizadoras das funções corpóreas e assim de uma
alegria para além das aparências.
O que toca o humano ao tempo segue em cânone contra as barreiras culturais que almejam ao estético
estático. Entre ambos, fugas dos ouvires na contínua instabilidade do saber-poder, as ondas das modas entrelaçam
as harmonias das eras. O estudo harmônico para chegar aos axiomas da mathesis isolava a música numa audição
idealista. Relevando como ruído, a relação entre as incontáveis faculdades 11 da ecologia cognitiva de um
ouvintecompositor, e ainda o vão-elo entre diversas subjetividades, estes inconscientes harmônicos. As artes, estes
organismos vivos evoluindo a uma velocidade estonteante entre nós, meros hospedeiros, seguem porém se
destruindo e unindo mutuamente em busca de uma harmonia contemporânea 12.
A crítica à teoria das esferas 13 através dos limites epistemológicos feita pelo sintetista logoi technai deixa
saltar aos ouvidos o religare entre crença e ciência no tetratkys 14. Nossas concepções harmônicas surgem das
consonâncias e dissonâncias para com os sons inconscientes, não o contrário, como se as estrelas seguissem o
princípio da humana música. Esta assunção verídica, porém, é senão uma arma numa velada disputa entre dois
métodos de cerceamento das possibilidades auditivas pelo controle na antropomorfose do sonoro. Qual prisão seria
a mais adequada para a intuição musical, o número ou a palavra? O cantochão balbuciaria, os cantos gregorianos
sussurrariam e a sinfonia em fortíssimo clarearia: ambos! O inegável triunfo da ópera e da canção 15 estão
intimamente ligados à necessidade desta criação de uma audição dócil 16, conforme com a lei dos números, desta
agricultura dos nômades sons, literaturização do gado ouvinte humano 17. Neste sentido, o jazz foi de fato, como
querem alguns18, a continuação da música eruditista européia, nela somando através da imagética de emancipação
não mais que o cálculo rítmico enquanto variável das sonatas modernistas.
O ideal da (de)composição moderna 19 desemboca nas experiências limítrofes da dialestética sonora do
século XX20 iniciando a transmediação do texto e seu contexto na formação de texturas 21. Que sons queremos que
nos vistam? Como liberar as artes übermensch de nós? Passos primeiros duma nova estruturação das sempre
crescentes dimensões da existência humana, este eterno retorno ao equilíbrio entre o caos do ouvir ao
ruído-mundo e a necessidade da ordenação cristã dos rebanhos de mercados musicais, passam pela reinvenção do
músico de papel22 enquanto xamã23 do ritual-jogo do ócio, imanência do maestro 24, carcereiro panóptico e
metrônomo intensivo; em busca de um renascimento da música no espírito da filosofia trágica...

11
Mesmo Immanuel Kant, que segundo Bachellard reunia a solidão de sonho e pensamento, se nega a legislá-las em sua
Crítica da Razão Pura Prática.
12
Henry Bergson disseca no quarto livro de A Evolução Criadora a inexistência de impedimento nesse empedoclismo de
que passado, presente e futuro sejam contemporâneos dado às suas diferenças de natureza e não duma gradação
quantitativa espacial dum mesmo modo.
13
Aristóteles. De Caelo, Livro II, §9: “Alguns pensadores supõem que o movimento dos corpos celestes deva produzir
um som, dado que na Terra o movimento de corpos de muito menor tamanho produz dito efeito. Afirmam, também,
que quando o Sol, a Lua e as estrelas, tão grandes e em tal quantidade, se movem tão rapidamente como poderiam não
produzir um som imensamente grande? A partir deste argumento e da observação de que suas velocidades, medidas por
suas distâncias, guardam igual proporção que as consonâncias musicais, asseveram que o som proveniente do
movimento circular das estrelas corresponde a uma harmonia”.
14
Ou Quadrivium o quaterno sagrado da numerologia de Pitágoras de Samos, princípio melódico básico dos cânticos: 1 +
2 + 3 + 4 =10, sendo 10 = 1 + 0. Signo ambíguo de série e mônada.
15
Nietzsche, o compositor de liedez resguardou sua música sob Zaratustra, feito tom posteriormente por Richard
Strauss, todo ímpeto romântico é um imperialismo româmico.
16
As guerras ditas mundiais do séc. XX foram senão a discussão entre tantas concepções da obra de arte total, esta
imersão multimidiática wagneriana, distopia de um dito que dura como o nazismo e o americanbroadway.
17
Cf. Sloterdjik, Pete. Regras para o Parque Humano.
18
Marsalis, Wynton. O Jazz Enquanto Método, I.
19
Schelling, Friederich Von. A Divina Comédia e A Filosofia, §7: “Que o indivíduo forme em um todo aparte do
mundo a ele revelada e, da matéria de seu tempo, de sua história e de sua ciência, crie para si sua mitologia”.
20
Tal qual o minimalismo de Steve Reich, que amplia a sensação de ordem e reduz a da complexidade envolvida no seu
processo e a estocástica de Iannis Xenakis, ou indeterminação probabilística, que amplia a complexidade e reduz a
ordenação, tida por eles como fixidez dos sons.
21
A escritura deleuzeana com seus rizomas e o ritornelos e a música programática baseada em softwares como o
MAXMSP são duas pontas desta remusicalização da palavra.
22
Villa Lobos com este termo pôde ridicularizar a música em potência de que falava Igor Stravisnky.
23
Aquele com excesso de lucidez ou aquele com lucidez dos excessos.
24
Sobre isto pudesse ser escrito: “Pierre Boulez, o antidiletante morreu”.
Auricultura Além da Musicologia

“Música, velocidade dos tempos,


som peso do espaço
tom espera do silêncio.”
Fala-se por tédio e vaidade. Há muito desistimos da verdade por nos enfadar, mas não da beleza que
nos alimenta a vaidade por devir.
A música é anterior ao som como a dança precede a fala. O som é a sublimação dos corpos em energia
através do ar do mesmo modo que a luz é a sublimação dos campos eletromagnéticos através das cores em
música.
O rádio é uma substância eletromagnética implacável que avança irresistivelmente em todas as
direções nas dimensões sonoras contra a qual toda resistência é inútil, logo artística. Seu uso pelas
corporações humanas difusoras de informação, de maneira semelhante, submerge-nos na quantidade sempre
maior de produção cultural pela reprodutibilidade técnica, sem se importar com os limiares de cognição
singular, de modo que a música se torna o desdobramento fractal do ruído, ruído entre ruídos.
A rádio foi o pequeno riacho que moveu a compreensão musicante geométrica pré-industrial
renascentista para a caosmose digital analógica por entre as margens das interfaces maquínicas (incluindo as
abstratas) modernizantes que formam o contemporâneo limiar bauhaus-barroco
(minimalismo-maximalismo).
De seus entrechoques surgiram os dispositivos de controles que moldaram as harmonias contextuais
da acusfera tecnocrática no século XX, o fetiche musical desde a tomada pela voz (Hitler radialista) até a
captura pop plena das paradas, acompanhada paralelamente pela resistência bélica à beleza pelos
experimentadores limítrofes do som em suas buscas por novos modos aurais, como o walkman em sua
tecnologia de guerra de gestação campos de batalhas subjetivas e corporais.
Outras cristalizações de transcópia, multifragmentação até, em última instância, a plena
logaritmização do som da música, fizeram com que tal riacho espectral tornasse-se caudaloso e preenchesse
de significados toda a gama coloral do mar do cinema(kýnema), ao mesmo tempo que, a escuta narcísica se
prostasse diante deste como um lago de águas sujas paradas em estilos buscando por si mesma.
Se, no mito romântico da música ocidental, escutávamos música por entrega aos paradoxos entre
razões e paixões, o que nela há de além-humano ou sua dinâmica geométrica enérgica sutil porvir. Na
hipermoderna escuta acidental, rui em toda parte e sempre só perguntas, urra alto-falantes, carros,
restaurantes, eleva dores a ruas, faz-se salas de espera de ginástica de escritório(cubiculização musical), nas
orelhas tapadas por fones(autismo strictu senso) kaleidofonias reinscrevem o símbolo no ícone,
reinstrumentação do corpo (incorporação sonora-ritual), atemporada, esfacelada,
rockjazzraggagorespeedtechtrancehiprapnbglitchbluessamba em óperação contínua da zona aural,
modalismo arcaico ressignificado pela descontextualização. A obra de arte total não permitiu à música respiro
além da representação sonora, mesmo que já tenhamos ultrapassado os rigores do léxico musical em direção a
novas formas de linguagem pós-alfabéticas.
Sendo a música relegada como a própria representação do efêmero, não devemos esperar que ela se
mantenha desta ou daquela forma por mais tempo que ela mesmo o demande no devir. Mas a nós está vedado
saber da vontade dos sons, das vozes das musas, dos sabores do tempo... a não ser quando estes já tenham
passado. Numa questão musicológica: Quais seriam os pressupostos para uma est-ética instantânea? Como
nos manteríamos apaixonados pelo que se mantém em fluxo?
Fluxo em que tudo se mistura numa pasta sinestésica ao mesmo tempo kitsch e sagrada, a música é o
produto ideal intocável e inquestionável. As imagens quando condensadas se tornam música, a moeda do
capitalismo cognitivo da sociedade espectacular. Sem que se saiba quem seu compositor, já que o que se
passou a compor foram os próprios ouvintes. Tal música transfigurada em ruído das séries aurais demanda o
anonimato em nome da subjetividade coletiva(micropoder da ruidocracia), sem que se distingam o começo de
uma ou o fim da outra nesta trilha sonora, pois neste campo filosônico entre música e som jaz o inefável para
ambas e para nós: o silêncio que desistimos de ouvir.
Um Dia Sem Música

“O pensamento, esse soberano juiz do mundo,


traz ao homem sua mais plena dignidade.
Não é preciso o ruído de um canhão para impedir os seus pensamentos:
basta o ruído de um cata-vento ou de uma roldana.”
Estarei observando o dia sem música por tantos motivos que não caberiam num box set de 48 cds
com sinfonias e óperas compostas somente para isto. O ruído eterno destes tempos implosivos me absurda. Mas
não será esta a desculpa para o autismo amplificado dos ipods. Música, velocidade dos tempos. Alcançada
principalmente através do som (peso do espaço no caos aéreo) entrecruzado pela luz, cor das ondas
eletromagnéticas. Em silêncio, som sublima da matéria energia e condensa dinâmicas em estruturas
geoônticas. Corpó, escuta composição. Um diletantismo ativo, ou como riria o bombástico, um “atingir o
intelecto através dos sentidos”. Sofia é de escutas sinestésicas, enquanto Sonia fracta a luz compactando-a na
tatonomia do au-dio. Tom, espera do silêncio.
Novalis cantou ao terminar de ouvir o velho: Quando dissemos algo abertamente, em verdade, nunca
dissemos nada. Já quando recorremos às cifras e imagens velamos a verdade com o véu da beleza.” ... ... ...
Síbila. Música antecede a som como dança precede fala. Som sublima os corpos em energia através do ar(o
que gesta a quimera pulmonar por vida e apodrece a carne morta) do mesmo modo que a luz dos campos
eletromagnéticos através das cores musíca. O compositor da operatotalis do burgo (Wagner o cibernético) se
lembra de Fausto sobre o bêbado que gritava pedindo o fim do discurso e a entrada da bandinha no
coreto(Beethoven, a escuta surda): “Um supremo espetáculo! Mas ainda, ai! Um espetáculo. Onde findo-te, ó
infinda Natureza?” O rádio é uma substância eletromagnética implacável que avança irresistivelmente em
todas as direções nas dimensões sonoras contra a qual toda resistência é inútil, logo artística. Seu uso pelas
corporações humanas visa propagar pela informação a pandemia, submergindo-nos na quantidade sempre
maior de produção cultural pela reprodutibilidade afetiva(cabendo lembrar que todo afeto após a psicanálise é
senão uma técnica de pulsão desejante) transformando os limiares de cognições singulares, de modo que a
música se tornou o desdobramento fractal do ruído, ruído entre ruídos. Melonoise. {mas também sei que
nenhum canto vale mais do que a vida...}
A rádio foi o pequeno riacho que moveu a compreensão musicante geométrica pré-industrial
renascentista para a caosmose digital analógica por entre as margens das interfaces maquínicas (incluindo as
abstratas) modernizantes que formam o contemporâneo limiar bauhaus-barroco
(minimalismo-maximalismo, sempre intencionalistas). “A natureza diferencia e copia, a arte copia e
diferencia” Outras cristalizações de transcópia, multifragmentação, até em última instância, a plena
logaritmização do vão som-tom de onde captamos a música empírica, fizeram com que tal riacho espectral
tornasse-se caudaloso e preenchesse de significados toda a gama coloral do mar do cinema(o átomo da
composição digital é o quadro a quadro cinemagético), relegando a escuta ao narcisismo prostado diante deste
como um lago de águas sujas paradas em estilos buscando por si mesma. "Eu não sei dizer nada por dizer,
então eu escuto....." Dois pontos que Foucault levanta são particularmente interessantes para nós. O primeiro
é que ele opõe as heterotopias (acusmoses) explicitamente às utopias (silêncio e tom) e implicitamente às
distopias (ruído), “posicionamentos que mantêm com o espaço real da sociedade uma relação geral de
analogia direta ou inversa”. Elas são “a própria sociedade aperfeiçoada” (ou piorada, no caso das distopias) ou
“o inverso da sociedade”. Já com as heterotopias, percebe-se, que a relação com o suposto mundo real não é
simétrica. Em vez de apenas amplificar ou reverter as representações que fazemos do mundo, a heterotopia
desarticula seus elementos e os insere numa configuração totalmente nova. Fosse Foucault um alquimista
diria que a heterotopia solve et coagula.
Eu falei “suposto mundo real”, e não foi por acaso. Porque o segundo traço das heterotopias, que nos
conduz direto e reto de volta à metaficção sonora, é seu “papel de criar um campo de durações ilusórias que
denuncia como mais ilusório ainda qualquer espaço real no devir entre cronos e aeon, todos os
posicionamentos no interior dos quais a vida humana é compartimentalizada”.
Não se canta errado uma canção, se faz uma versão diversa do mesmo mito. “Não apenas como os
sons se compõem. Mas, mais difícil como percebemos este som em relação aos seus elementos contituintes?”
Como Berio disse de Stockhausen "Tapeceiro Sonoro" e de Cage "Tradução Musical do Jogo do Bingo",
dir-se-ia de Boulez "Origami de Partituras". Não apenas como as estruturas musicais se compõem. Mas,
mais difícil ainda como percebemos esta música em relação ao seu contexto(seus silêncios)?
O maestro escuta com os dedos, prova disto são suas tentativas de agarrar o som com as mãos, ou
ainda mais difícil, a música com a pele. Música: uma pulga metafísica atrás do som da orelha.
Da mesma forma que um som não existe sem todo o ruído que lhe é estranho, um músico sem toda a
política da cidade(arquitetura musicante) dos sons não se manteria.
O pós alfabético acena com o retorno do pulso nodal como ponto de apoio da linguagem no corpo,
mímese morfopoética baseada não no talento mas no esforço e no trabalho: “I know that I’m working very
hard, as you are working very hard to know what I’m working on.” Xenakis sobre a performance musical de
Bergson.
“Avalia o instrumento com seu corpo, incorpora a si as dimensões e direções, instala-se no órgão
como nós nos instalamos em uma casa. O que ele aprende para cada tecla e para cada pedal não são posições
no espaço objetivo e não é à sua memória que ele os confia. Entre a essência musical da peça, tal como ela está
indicada na partitura, e a música que efetivamente ressoa em torno do órgão estabelece uma relação tão direta
que o corpo do organista e o instrumento são apenas o lugar de passagem dessa relação.” Merleau Ponty
incorporando Bach.
O silêncio é redondo mesmo, Bachelard. O som e os sonhos nos levariam aos delírios de audiomancia
onde a pedra entra nos alhures do grão... Microtons ao fogo... Os quatro modos de escuta de Pierre Schaeffer:
1.Écouter(Escutar): Disponibilizar o ouvido, interessar-se por. Foco dirigido ativamente a alguém ou
a alguma coisa que me é descrita ou assinalada por um som. O naipe flamejante do desejo. A
preaudição que estimula diretamente no instinto pelos neurotransmissores a uma prática musical.
2.Ouïr(Ouvir): Perceber pelo ouvido. Por oposição a escutar, que corresponde à atitude mais ativa,
aquilo que ouço é aquilo que me é dado na percepção. As mirações vêm do som da floresta ecoando
pra encontrar os corpos trespassados pelas raízes. A trompa d’água da prática sonora.
3.D´entendre(Dentretender): É o estágio da escuta no qual ocorrem as qualificações do ouvir,
dependendo de uma intenção. Segundo Schaeffer, a origem etimológica da palavra aponta que
entender é "ter uma ‘intenção’. Aquilo que entendo, aquilo que me é manifesto, é função dessa
intenção." Escuta a melodia do vento. Escuta o ritmo das rajadas de vento. Escuta a harmonia
espacial dos ventos criando turbilhões. Escuta a brisa que reverbera no espaço. “É preciso ser leve
como uma andorinha, não como uma pluma.” – Valéry
4.Comprendre(Comprende): Realizado a partir da qualificação do entender ensimesmado, é o ato de
perceber um sentido onde o som torna-se um signo que possui relações com um código cultural. O
juízo dos estilos e a guerrilha aural da sociofonia e sonologia. O tremor e a sujeira da posse de um
objeto pelo som, terra. Cuando Artaud habla de la erosión del pensamiento como de algo esencial y
accidental a la vez, é como Diógenes o Cão lembrando que o som é a medida de todas as fraquezas
humanas.

¡Cómo? ¿El oyente tiene pretensiones? ¿Las palabras deben ser entendidas?
A passada melodia entre astros não soa mais – disse a salamandra ao escaravelho. A harmonia
presenta o espaço polidimensional(polimorfias de polifonias). Ritmo atira no arco gerúndio futurações.
Sobre a harmonia contextual:
1) Amúsica é um fenômeno que envolve interação entre diferentes agentes para sua existência e
desenvolvimento;
2) A significação musical é um caso particular de um processo geral de significação (assim como se
pode estabelecer um contínuo entre os processos cognitivos e os processos naturais) e;
3)A cognição musical é um caso particular de uma descrição geral de cognição.

Gainza, que trata exatamente da descrição do processo de aprendizagem musical: “La música, el
ambiente sonoro – exterior al hombre – al entrar en contacto con las zonas receptivas de éste (sentidos,
afectos, mente) tiende a penetrar e internalizarse, induciendo un mundo sonoro interno (reflejo directo o
representación de aquel) que a su vez tendera naturalmente a proyectarse en forma de respuesta o de
expresión musical." Varela et al (1991) passam em revisão às três perspectivas da ciência cognitiva acerca da
noção de cognição e de como ela ocorre. Para os autores, a versão cognitivista clássica, que se apóia em
modelagens da inteligência artificial entende cognição como: Information processing as symbolic
computation – rule-based manipulations of symbols. How does it work? Through any device that can
support and manipulate discrete funcional elements – the symbols. The system interacts only with the form
of the symbols (their physical attributes), not their meaning. The emergency of global states in a network of
simple components. How does it work? Through local rules for individual operation and rules for changes in
the connectivity among the elements.
Pratica a Música! A flauta vertebrada é o canto do cisne morto no ballet..." Representations create
understanding and desire. A essência da música não consiste apenas em agradar os ouvidos, mas também em
enganá-los. Seria preciso uma grande arte para não imitar o pássaro, mas cantar como ele. “-Críton, não
esqueçai de levar um galo a Esculápio!”
A prova(ensaio) de Nino Taro lembra que a sinfonia é a sintonia com a qual sonhava Ford na sua
ditadura temporal, a sincronia dos planos na linha de montagem. O computador é o instrumento que mais se
assemelha à voz humana. Criptografa na própria carne(silíncio) os caminhos metálicos da eletricidade,
criptofona.
Trapdoor paradox is the most simple type of computer virus abre uma porta que abre uma porta que
abre... o fenômeno coquetel, onde em meio a um espaço ruidístico estrutura-se um território harmônico
onde se deslindam as vozes do coro ao solo, o foco aural. As mirações vêm do som da floresta ecoando pra
encontrar os corpos trespassados pelas raízes, a cidade tem som de ruminar de engrenagens em combustão,
que nos chega?

“A guerra deve ser em função da paz


A atividade em função do ócio
As coisas necessárias em função das belas”
Aristóteles e a escuta pelo silêncio.
Se Sócrates percebia que o texto escrito nos faria perder a memória, Platão já concebia a
caverna-cinema nos despojando da imagem-pensamento em nome de fluxo ainda mais rápido. A gravação
sonora nos ensurdecerá da música deixando as escuta nos limites de ruído e silêncio. No futuro toda canção
pop terá seus quinze segundos de ruído e seu 1.5 decibéis de composição subliminar.
“Descansar? Descansar de quê? Quando quero descansar eu viajo e toco pianos.” O urbanismo dos
dados quer gestar uma arquitetura para os afetos através de um sistema iterativo de paisagens de dados... A
iteração é também o sistema de busca nos bancos de dados. Se você gosta de Coleman, provavelmente te
contarei sobre Roach, mas menos de Pärt? "Cada palavra falada nos trai. A única comunicação tolerável é a
palavra escrita, porque não é uma pedra em uma ponte entre almas, mas um raio de uma luz entre astros." -
Fernando Pessoa
Tacitlo Oswald lentamente mastigava olhando os vinis. Mariô os dera, quatro baladas de chopin e o
trio em lá menor de tchaikowsky, dizendo: Nem mesmo nossos breves momentos de revolta escapam ao
fascínio da imagem... - tomou fôlego no café e continuou - ... um sentimento de excrecência, tudo o que
invizível e indizível afastou-se de nós... a falta, o enigma, o campo simbólico, que são exatamente as
condições do pensamento. A sociedade espetacular (a cultura artística) não reprime o pensamento, torna-o
dispensável; a exclusão dessa condição essencial da subjetividade deixa-nos desamparados no caos simbólico (a
chuva em Mautner) desgarrados de uma dimensão essencial de nós mesmos. Tal sensação limítrofe da
ultrapassagem do cognescido levou os grupos humanos todos a inventarem seus mitos, de modo que sejam
dotadas de sentido as novas formas de ordem social. Ocorre que nossos mitos hoje são produzidos
industrialmente, ou hiperindustrialmente.
A cultura deixou de ser a referência da alteridade para tornar-se espelho do que nos é mais íntimo e
familiar, só que tal familiaridade nos vem de fora da subjetividade. No Palácio da Música, caminhando nos
porões com Pitágoras, Cartola ri. Beethoven tomando um mé no jardim com Bartók escuta um tremor que o
amigo cantarola fazendo da traquéia cello, Stratos e Gonzaga riem histrionicamente. Caberia lembrar que
museu era o nome da prisão que construira Hefaísto para as musas. Laranja eletrônica, hackers acionistas de
Amadeus transmutam a melodia (operacracking) em tempos de rúido ao escárnio kitsch da obsolescência
programada destas em mero ruído social. Logo mais as bandas de rock serão tidas ou como ONGs de serviço
público de catárse ou como jogos de videogueime. Sobre a Apassionatta disse Lênin: “Se eu a continuar
ouvindo não levarei a cabo a revolução” Precisamos construir salas de ruídos, como em outros tempos houve
a necessidade de construirem câmaras anecóicas que enfeitassem de bossa a oca fadada ao "nova noise" e salas
de concerto onde se alimentava o olvidar das forças da natureza. O espetáculo alimenta-se das intensidades
(ouça gore doom e speed metal) a violência não lhe é hostil nem estranha. Ao contrário a violência ("sete mil
poetas sádicos nas sarjetas") é o combustível e a cocaína que abastecem o showbusiness, por isto os
EspectaDores estão cada vez mais adaptados a ela.
This {uma química das cores não bastaria para os oceanos superhélios} is our Cage.
Só as mercadorias, em sua juventude renovada protegem o consumidor da velhice, da caduquice, da
insignificância , do esquecimento outorgado a nós pelas dimensões. Um site 2.0 gera um banco de cultura
com produtos poéticos que valem moeda artística numa economia subjetiva em limiar de overdose. Com
uma desvinculação do valor de mercado da música temos uma mais valia do processo sobre o objeto artístico.
A massa desmassificante dos patchworks(a pureza dos dados) compõe na miniaturização dos gestos atuantes a
programassom ambiental no cerne da figura do compositor, feito campo satélite de uma acusfera possível.
“Quem quiser se prestar a compreender o mundo deve saber ao menos uma linguagem de programação”
De modo a explicar a necessidade de superação da precisão industrial por um ócio criativo, De Masi
diz: “A eternidade surge na cidade de Belém, o berço famoso das primeiras covas e liras, como consolação à
morte assim como a arte só deixou marcas de seu nascimento fisicamente num ornato a uma flecha(que mira
a beleza?)..."
Quando em maior perigo, Ulisses se amarrou às sereias pra não ouvir o mastro... à luz sê nó, gêneo.
As ondas sociais que Toffler ressalta são a senoidal espiral de Quetzacoatl como a frequência do
Leviatã, o pulso nodal. Tal música transfigurada em ruído das séries aurais demanda o anonimato em nome
da subjetividade coletiva(micropoder da ruidocracia), sem que se distingam o começo de uma ou o fim da
outra nesta trilha sonora, pois é no campo filosônico entre música e som que jaz o inefável para ambas e para
nós: o silêncio que desistimos de ouvir.
“Faltam pessoas que realizem o silêncio,
aquilo que não tem futuro.”
Pedagogia Aural

“Não se ensina a escutar


se escuta a ensinar.”
Uma pedagogia possível à filosonia consistiria em um conjunto de aulas expositivas e práticas
com o intuito de cativar nos participantes as potências da escuta e fomentar a pesquisa sonora empírica e
conceitual (Hermeto Pasqual, Tom Zé ). Para tanto, são usados desde os recursos mais imediatos do
corpo até os atravessamentos sinestésicos fenomênicos (Gilles Deleuze, Merleau Ponty) da multimídia
ativados mediante as diversas ferramentas gratuitas que se encontram disponíveis na internet (DJ
Spooky, Miller Puckett).
O uso de diversas plataformas tanto globais quanto locais (Hakim Bey, Luther Blissett) permite
a aprendizagem coletiva dos meios de produção, edição e propagação sonora, simultaneamente à
experimentação (Walter Smetak) das mais diversas vertentes de linguagens da composição sonora e
musical. Além disto, impulsiona à atuação na rede de sentidos aurais.
Proporcionar o desenvolvimento teórico e sensível (Thelonious Monk, John Coltrane) através dos
distintos modos de escuta amplia as possibilidades culturais para além das normas sociais da música
(Theodor Adorno, Guy Débord, Walter Benjamin) mediada pelos veículos de comunicação (Marshall
Mcluhan, Henry Pousseour). Desmistificando as formas não comerciais de musicalidades, incitando
uma população cada vez mais produtora de objetos culturais à autonomia artística e crítica tanto quanto
a uma redescoberta das formas outras de soar (Ornette Coleman, Merzbow, Ravi Shankar).
O uso das plataformas de pesquisa e distribuição virtual gera uma área trânsito (Yi-fu Tuan)
entre pesquisa sonora e a indústria musicante, ampliando o foco auditivo no panorama psicoacústico
cotidiano (Lívio Tragtemberg). E propondo o mercado cultural como um ponto chave (Berio) num
estudo de harmonia musical (H.J.Keulheutter, Arnold Schönberg) abrem-se novas vias de acesso ao som.
Sempre incentivados a produzirem suas próprias obras, os participantes se tornam
multiplicadores do conhecimento técnico, teórico e principalmente sensível para com os coletivos de
criação das paisagens sonoras (R.Murray Schafer) e musicais de suas regiões, seja qual sua gama de
encontros (Gaston Bachelard) auditivos (gosto).
Como é ouvir hoje?
Precisaremos percorrer o
caminho histórico do uso sonoro
nas artes (Douglas Kahn), para
compreender os meios de
produção e propagação social dos
objetos sonoros (Karlheinz
Stockhausen, John Cage)
incluindo a música, e os diversos
vínculos sociais mediados
(Abraham Moles, Jean
Baudrillard) como a televisão, o
rádio e a internet. Deste modo
poderemos levar os pesquisadores
sonoros a um posicionamento
coerente do papel que a escuta tem
na sua percepção do mundo e
como o soar (ou não) desenvolve
nele a necessidade contínua
instantânea de escolher o que se
escuta, uma dieta sonora (Erik
Satie).
Esquizopatológica, Música

“...e o que resta é silêncio.”


0. O silêncio não é.
0.1. Senão na abstração esquizopathológica do audível subtraído do audível.
0.1.1. O silêncio é uma promessa linguística vazia.
1. Tudo soa.
1.1. Tudo que existe tem algum tipo de reflexo no corpo sonoro.
1.2. O som é anterior a toda experiência – de que algo é assim.
1.2.1. Ele é anterior ao como, mas não é anterior ao quê.
1.3. Ao som, ouvimos apenas.
1.3.1. Em termos simplificados: o som é número.

2. O audível é tudo que soa num determinado tempespaço.


2.1. O audível é a totalidade das músicas, não dos sons.
2.1.1. O audível é determinado pelas músicas, e por serem todas as músicas.
2.1.1.1. O audível se assemelha a um ouvir-aí (klangfabermelodiedasein).
2.2. O audível problematiza-se em músicas.
2.2.1. Pois a totalidade das músicas determina o que é o ruído e também o que silencia.
2.2.2. Tudo que silencia faz soar outro som no audível.
2.3. O audível é a existência de modulações, movimentos sonoros no tempespaço.
2.3.1. É essencial para o som poder ser parte constituinte de uma música.
2.3.2. Modulações são ligações entre sons.
2.3.3. O som em si, puro, é uma utopia imaginativa, limite inalcançável do atomismo sonoro, mas
os movimentos sonoros são fatos.
2.3.3.1. Pareceria como que um acaso se ao som que pudesse existir por si próprio, só, e se
ajustasse depois a uma situação de silêncio ou ruído.
2.3.3.2. Se os sons podem aparecer numa música, isto já deve estar neles.
2.3.3.3. Não podemos ouvir nenhum som fora da possibilidade de sua ligação modular com
outros.
2.3.3.4. Só podemos ouvir-no-mundo.
2.4. O som é auto-suficiente, na medida em que pode aparecer em todas as situações possíveis, mas esta
forma de auto-suficiência é uma forma de vínculo modular na música, uma forma de não ser
auto-suficiente.
2.4.1. Se conheço o som, conheço também todas as possibilidades de modulação sua em músicas
(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e
espacialização).
2.4.2. A possibilidade de seu aparecimento em músicas são suas modulações.
2.5. Dados todos os sons estão dadas também todas as músicas possíveis.
2.6. O som é seu objeto e nome.
2.6.1. O som é simples.
2.6.2. O som é o elementar(stoichéia) da audição.
2.6.2.1. O som é expoente da música.
2.6.3. Todo som pode ser decomposto em sons constituintes desses complexos através de suas
modulações(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor
timbrística e espacialização).
2.6.4. Os sons todos constituem o ruído, não o audível. Por isto não podem ser compostos.
2.6.5. O som é seu significado.
3. O ruído só pode determinar uma forma física, e não as propriedades metafísicas passionais(pathós) do
audível. Pois estas são produzidas apenas pelas músicas – são constituídas apenas pelas composições modulares
dos sons.
3.1. Os sons não têm sentimentos como os números não têm cor.
3.2. Um som difere de outro – desconsideradas suas propriedades modulares – apenas por serem
diferentes.
3.3. O conceito de som nada é senão o que todos os sons têm em comum, a forma geral do som.
3.3.1. Forma esta indizível.
3.4. O ruído subsiste independentemente de qual seja o audível.
3.5. Espaço e duração são os meios onde os sons pendem juntos através das modulações.
3.6. Só havendo sons pode haver uma forma fixa do audível.
3.6.1. O fixo, o ruído e o som são um só e o mesmo elementar do seu ouvintecompositor..

4. A composição modular dos sons constitui a música.


4.1. Na música os sons se concatenam, como os elos de uma corrente.
4.1.1. Como as moléculas d’água rio abaixo.
4.1.2. Como os rios mundo afora.
4.1.2.1. Nenhuma metáfora poderia descrever o que tenho do audível.
4.2. Na música os sons estão uns para os outros de uma determinada modulação.
4.2.1. A maneira como os sons se vinculam na música é a estrutura musical.
4.2.2. O estilo é a possibilidade de fixação dessas estruturas modulares(arbitrariamente os
movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização).
4.2.3. A totalidade das músicas existentes é o audível.
4.2.4. O que difere o audível do ruído é a existência de uma lógica passional(pathológica) na
audiçãocomposição das modulações sonoras.
4.3. A totalidade das músicas determina também o que silencia.
4.3.1. As músicas são independentes umas das outras.
4.3.2. Da existência ou inexistência de uma música não se pode concluir a existência ou
inexistência de outra.
4.3.3. Mas esta independência é também uma forma de vínculo entre o ruído e a música em
questão.
4.4. Sentimos os sons e damos sentido às músicas.
4.5. A experiência musical é sinestésica.
4.5.1. As modulações de som geram modulações de sentimentos e memórias sinestésicas.
4.6. Compomosouvimos músicas.
4.6.1. A música é a lógica passional dos entressons.
4.6.1.1. A audiçãocomposição musical produz situações através da existência e
inexistências de certas modulações sonoras.
4.6.1.2. A audiçãocomposição musical é mais que um modelo das paixões.
4.6.1.2.1. Aos sons correspondem, na composição sentimentos, paixões.
4.6.1.2.2. Sentir é compor. Ouvir é portanto, compor.
4.6.1.2.2.1. A audiçãocomposição é influenciada por todas as experiências do
ouvintecompositor.
4.6.1.2.2.2. Eu não escuto a qualquer música d’outrem, mas só à minha.
4.6.1.2.2.3. A música composta nunca é a mesma ouvida.
4.6.1.3. Que os sons estejam uns para os outros em determinadas melodias, harmonias,
ritmos, cores timbrísticas e espaços produz sentimentos assim uns para os outros.
4.6.2. A música é uma modulação do que sentimos.
4.6.2.1. A música é a esquizofrenia entre o
som e o audível, límites mínimo e máximo
do fenômeno.
4.7. A música é proposiçãofato.
4.7.1. É assim que a audiçãocomposição se enlaça
com a paixão; ela vai até ela.
4.7.2. Ela é como uma régua(métron) aposta às
paixões.
4.7.2.1. Apenas os pontos mais externos da
régua tocam a paixão a ser medida.
4.7.3. A música é a perpétua relação criadora de
modulações entre os sons que nos trespassam.
4.7.3.1. Tal relação criadora consiste nas
coordenações lógicas entre os sentimentos e
os sons.
4.7.3.2. A música produz a sua própria
medida, suas próprias regras e réguas.
4.7.3.3. Só quem sente algo, compõe.
4.7.4. Só quem habita o que sente põe com o
lógos.
4.7.4.1. A música, para ser composta deve
ter algo em comum com algum pathós.
4.7.4.2. A composição pode compor toda
afecçãosentimento cuja forma ela tenha. A
composição melancólica, tudo que for
melancolia; a composição caótica, tudo que
for caos, etc.
4.8. Uma música não é uma imagem, embora uma
imagem possa corresponder a ela.
5. O estilo é consequência da composição, não o contrário.
5.1. O estilo, o modo de composição, é a possibilidade de
que os sons estejam uns para os outros tal como os sentimentos do ouvintecompositor o estão.
5.1.1. Não pode haver hierarquia dos estilos. Só podemos anteouvir o que nós mesmo
compomos.
5.1.2. Como exemplo disto podemos imaginar o mito histórico da descoberta da perspectiva
pictórica e o impacto que isto teve nas modulações intensivas e timbrísticas entre a música
medieval e a renascentista européia ocidental.
5.2. A audiçãocomposição produz sua paixão de fora, e seu ponto de vista é seu estilo.
5.2.1. A audiçãocomposição pode ou não concordar com a realidade do ouvintecompositor.
5.2.1.1. Desta diferença de estilos nascem as influências e querelas musicais.
5.2.1.2. Não simpatizar com uma música é não simpatizar com as paixõesrazões que
acreditamos que seu compositor tenha.
5.3. A audiçãocomposição não pode colocar-se fora da paixãorazão de seu ouvintecompositor.
5.4. O que toda composição, seja qual for seu estilo, deve ter em comum com algo para poder de algum
modo produzí-lo é seu esquizo pathológico, os filtros das razõespaixões do mundo do
ouvintecompositor.
5.4.1. Estes filtros esquizo pathológico unem os sentimentosidéias aos sons através da criação
contínua de relações sinestésicas entre as experiências memoriais e sensitivas.
5.5. O som não é estilizado.
5.5.1. Porém, toda lógica está submetida a uma estética.
5.5.2. Toda composição é uma composição lógica.
5.5.2.1. Lógica das paixões.
5.5.3. A composição musica uma situação possível no tempespaço lógico.
5.5.3.1. A composição contém a possibilidade da situação que ela produz.
5.5.3.2. A composição produz o que produz por meio do estilo.
5.6. O que a composição produz é seu sentido.
5.7. Tentar explicar uma música é tentar explicar o mundo através daquela música.
5.7.1. Somos como soamos.

5.7.2. A música é a ontologia do ouvintecompositor.


5.7.3. A música é o esquizo coxeando entre paixões e razões: ruídos e silêncios imaginários.
6. O estilo são as regras dos jogos esquizo passionais lógicos.
6.1. A lógica passional de uma composição são suas modulações de sons. Que arbitrariamente expresso
pelos conceitos de movimentação de melodia, intensidade, harmonia, pulso, cor timbrística e
espacialização.
6.2. “Ouvir às musas” como o próprio termo musicae propõe remete que ouvir é por com (ouvire
aude).
6.2.1. A totalidade das modulações é a composição.
6.2.1.1. A totalidade das composições é o audível.
6.2.2. Não podemos compor nada de ilógico, pois o pensamento é lógico e a composição parte
dele para produzir os sentimentos.
6.3. Na modulação, o sentimento exprime-se sensível e perceptivelmente ao ouvintecompositor.
6.3.1. Utilizamos os sons para ouvir o que se põe entre eles, as modulações.
6.3.2. À modulação pertence tudo o que for projeção passional, mas não o pathós. Portanto, a
possibilidade do sentimento, não o próprio sentir. Na modulação está contida a forma de seu
sentido mas não o conteúdo.
6.3.3. A modulação consiste que seus elementos, os sons, estão uns para os outros de uma
determinada maneira. Toda modulação é uma música.
6.3.3.1. A modulação não é uma mistura de sons.(Como a proposição não é uma mistura de
palavras.) A modulação é articulada e contínua.
6.4. Só músicas podem exprimir um sentido, uma classe de sons não.
6.4.1. Fica muito clara a essência da modulação quando a concebemos composta não de melodias,
harmonias, ritmos, timbres, deslocamentos espaciais ou quaisquer outras variáveis modulares
arbitrárias, dimensões dos sons, mas sim de pathólogós.
6.4.2. Duas formas de modulações se mostram possíveis: as elementares, compostas de sons e as
moleculares, formadas de outras modulações.
6.4.2.1. A composição molecular está em relação dinâmica com a composição que trata
das partes constituintes desse complexo.
6.4.2.2. Todo elementar é uma ilusão necessária para se evitar o abismo racional da
impossível essência na linguagem.
6.5. A modulação substitui, na composição, a sons.
6.5.1. Os sons podem apenas ser nomeados, não descritos. Modulações podem ser descritas, não
nomeadas.(Modulações são como flechas ao passo que sons são como pontos).
6.6. Há uma e apenas uma análise completa da modulação: a própria modulação.
6.6.1. Toda composição musical é inominável.
6.6.2. Nomear uma música a reduz a uma imagem poética.
6.6.3. Só a música faz um sentido; e só no contexto modular que os sons tem significado.
7. No caso-limite, as variáveis modulares diversas(arbitrariamente pulso, harmonia, melodia, intensidade,
cor timbrística, movimentação espacial, etc.) são uma e a mesma modulação do som.
7.1. Toda modulação pode ser decomposta em várias modulações constituintes desse complexo em seus
conceitos arbitrários, tais como pulsos, harmonias, melodias, intensidades, cores timbrísticas e
movimentações espaciais.
7.1.1. Quais seriam todas as modulações
elementares?
7.1.1.1. A modulação elementar consiste
em sons. Como não podemos, porém,
fixar o número de sons diferentes,
tampouco podemos especificar a
composição de modulações elementares.
7.1.1.2. Mesmo pulso, harmonia,
melodia, intensidade, cor timbrística e
localização espacial são apenas rastros
arbitrários do movimento sonoro.
7.1.1.3. Em última instância, as
modulações elementares(stoichéia) são
também limites abstratos inalcançáveis
necessários para uma linguagem
musical.
7.1.2. As variáveis modulares podem ou não se
influenciarem mutuamente.
7.2. Se fixamos em variável uma parte constituinte da modulação, há uma classe de variáveis
modulares que são todos os valores da modulação variável assim originada, como nos casos dos
movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização.
7.2.1. Essas variáveis dependem ainda do que nós, segundo convenção sentimental arbitrária,
queremos significar(meinen) com suas partes.
7.2.2. Se transformamos em variáveis, porém, todos os sinais cujo significado foi
arbitrariamente determinado, ainda assim continua a haver uma tal classe(movimentos de pulso,
harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística, espacialização).
7.2.2.1. Esta classe de fixações teóricas, porém, não depende mais de qualquer convenção,
mas apenas da natureza da modulação. Ela corresponde a uma forma lógica subjetiva – a
um protótipo lógico da composição.
7.2.3. Os valores que a variável modular pode assumir são fixados. A fixação de valores é a
variável.
7.2.4. A fixação dos valores da variável modular é a especificação das modulações cuja marca
comum é a variável.
7.2.4.1. A fixação é uma descrição da modulação.
7.2.4.2. A fixação tratará, pois, apenas de temas, não do significado deles.
7.2.4.3. E apenas isso é essencial para a fixação temática, que ela seja uma descrição dos
temas fixos das modulações na música e nada enuncie sobre o estilo.
7.3. O tema é o sentimento que se intenta presentear numa ou mais variáveis modulares.
7.3.1. O tema é a imagem modularsonora.
7.3.2. Duas variáveis modulares diferentes podem ter, portanto, o mesmo tema em comum –
designando nesse caso, sentimentos diferentes.
7.3.2.1. A marca comum de duas modulações nunca pode ser denunciada por serem
compostas com o mesmo tema, mas através de diferentes modos de composição.
7.3.2.2. Pois o tema é, sem dúvida, arbitrário.
7.3.2.2.1. Poderíamos, portanto, escolher também dois temas diferentes e, nesse
caso, o que restaria de comum nas modulações?
7.3.3. Na composição corrente, acontece com muita frequência que um mesmo tema componha
de maneiras diferentes – pertença, pois, a modulações diferentes – ou que dois temas diversos
sejam empregados, na modulação, superficialmente do mesmo modo.
7.3.3.1. O mesmo tema repetido, não é a mesma modulação.
7.4. Para reconhecer a modulação na música, deve-se atentar para o uso significativo na composição.
7.4.1. É só no seu emprego lógico-sentimental, que a música determina um estilo.
7.4.2. Se uma tema não tem serventia na sintaxe musical, não tem sentimento e ou sentido.
7.4.2.1. Na esquizopathológica de composição, o sentimento de uma música nunca pode
desempenhar papel algum; ele deve poder estabelecer-se sem que se fale do significado de
qualquer música, ele pode pressupor apenas a descrição das modulações.
7.5. As modulações possuem traços essenciais e casuais.
7.5.1. São casuais os traços que derivam da maneira particular de composição modular.
7.5.2. Essenciais, os que, por si só, habilitam a modulação a exprimir seu sentimento e sentido.
7.5.2.1. O essencial na modulação é, portanto, o que têm em comum todas as modulações
que podem exprimir o mesmo sentimento.
7.5.2.2. Do mesmo modo o essencial no tema é o que têm em comum todos os temas que
exprimem a mesma variável modular.
7.6. Poder-se-ia, pois, dizer: o som propriamente dito é o que todas as modulações que compõem o
som têm em comum.
7.7. Um modo particular de fixação espaçotemporal do audível, um estilo, pode não ter importância,
mas é sempre importante que seja um modo possível.
7.7.1. E isso se dá na composição em geral: o singular mostra-se repetidamente como algo sem
importância, mas a possibilidade de cada singular nos ensina uma lição sobre a essência do som.
7.7.1.1. Uma música, por exemplo, pode conter uma canção em si sem necessariamente se
reduzir à formacanção.
8. A teoria esquizopathológica de cada ouvintecompositor é sua fixação de temas estilísticos entre uma
modulação sonora e um sentimento.
8.1. O homem tem a capacidade de construir linguagens musicais com as quais se pode exprimir todo
sentimento, sem fazer idéia de como e do que cada modulação significa – como também assobiamos
sem saber como se produzem os sons particulares deste canto.
8.2. Uma fonte principal de nossa incompreensão musical é que não temos uma audição completa, mas
sim fragmentada do uso dos sons em nossas músicas.
8.2.1. A audição panorâmica consiste justamente em ouvir as conexões. Daí a importância da
contínua busca e criação de novas articulações modulares intermediárias entre as já
existentes(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, cor timbrística e
espacialização).
8.2.2. Criando assim sempre novos conceitos teóricos musicais.
8.3. As relações entre as linguagens musicais, os estilos, se assemelham com as que mantêm os jogos.
Pois se você os contempla, não verá na verdade algo que fosse comum a todos, mas verá semelhanças de
família nas modulações sonoras.
8.3.1. Algumas músicas se assemelham pelos ritmos constantes, mas diferenciam-se nos usos
harmônicos. Da mesma forma há famílias de jogos harmônicos bem definidos, como o
tonalismo, que se dividem pelos usos melódicos e timbrísticos em, por exemplo, o pop e a
música de câmara.
8.3.2. A totalidade das músicas de um estilo é sua linguagem musical.
8.3.2.1. Todas as músicas se interconectam rizomaticamente em, no mínimo, algum
aspecto modular.
8.4. A linguagem musical humana é um traje que disfarça o ruído constante do audível. E, na verdade,
de um modo tal que não se pode inferir, da forma exterior do traje, a forma do audível trajado; isso
porque a forma exterior do traje foi produzida segundo fins inteiramente diferentes do de tornar
reconhecível a forma do corpo sem órgãos ao ouvintecompositor.

9. A linguagem musical é o estilo fixado.


10.
10.1. A linguagem privada é a esquizopathológica.
10.2. O estilo é o foco que produz o audível dentre ao ruído.
10.3. Toda música é “crítica da linguagem musical”.
10.3.1. Os acordos tácitos que permitem o padrão da linguagem musical corrente são
enormemente complicados.
10.4. O disco gramofônico, a idéia musical, a escrita musical, a física das ondas sonoras, todos mantêm
entre si a mesma relação interna afiguradora que existe entre a linguagem musical e o audível.
10.4.1. A construção lógica é comum a todos.
10.4.2. A lógica é a linguagem dos jogos.
10.5. Que haja uma regra geral dum jogo por meio da qual o ouvintecompositor pode extrair a sinfonia
da partitura, uma por meio da qual se pode derivar a sinfonia dos sulcos do disco e, segundo a primeira
regra, derivar novamente a partitura, é precisamente nisso que consiste a semelhança interna dessas
configurações, que parecem tão completamente diferentes. E essa regra é a lei da projeção, lei que
projeta a sinfonia na linguagem das notas pela fixação temática. É a regra da transcriação dos sons na
linguagem do disco gramofônico e das partituras.
10.6. Para entender a essência da composição musical, pensemos numa poética de equações, que afigura
os sentimentos que descreve por meio de imagens subjetivas às danças dos algarismos, nunca
inteiramente compreensíveis senão ao seu compositor.
10.6.1. A música reflete apenas o sentimental: pois não sei qual é a situação por ela produzida, por
mais que compreenda a sua lógica de composição.
10.6.2. O ouvinte consegue no limite a intuição de seu autor.
10.6.2.1. A música produz o metafísico.
10.6.3. A música é seu sentido silenciado.
10.6.3.1. Mais se entende uma música quanto mais se entende suas partes constituintes,
suas modulações sonoras.
10.6.3.2. Aos sons não se pode compreender, pois não há som em si.
11. A teoria pathológica de um estilo não procede de um modo tal que se explique cada música dele, mas sim as
modulações elementar constituintes deste estilo de música.
11.1. A educação ostensiva das modulações parte dos temas estilísticos de cada ouvintecompositor que
nos ensinaprende. Com as músicas, porém, nós nos entendemos.
11.2. Está na essência da música poder comunicar-nos um novo sentimento.
11.2.1. Uma música deve comunicar um novo sentido com modulações de velhos sentimentos da
linguagem musical que nos precede.
11.2.1.1. Uma modulação de velhas modulações é uma nova modulação.
11.3. Uma música não é a representação dos sentimentos. Uma música é uma produtora dos sentimentos
em questão pelas próprias experiências e memórias sinestésicas no ouvinte.
11.3.1. A realidade é comparada às paixões e razões pela composição musical, mas a música não é
comparável com a realidade, daí seu passeio esquizo.
11.4. Uma música não pode ser verdadeira ou falsa. Uma música não argumenta.
11.4.1. A música produz apenas a existência e inexistência dos
movimentos modulares dos sons e consequentemente dos sentimentos.
12. Tudo o que pode ser ouvido pode ser composto.
12.1. A música pode produzir qualquer sentimento, mas não pode produzir o
que tem em comum com o sentimento – sua esquizopathológica.
12.1.1. Para podermos representá-la, deveríamos poder nos instalar, com
a música, fora das paixões e razões, de nós mesmos e em última
instância do próprio audível.
12.2. A música não representa.
12.2.1. A música não produz a lógica passional, esta linguagem estilística
se espelha na música que compõe.
12.2.2. O que se espelha na linguagem musical não é musicável.
13. Uma linguagem musical é esta representação de um estilo de composição.
13.1. A música produz a esquizopathológica de seu compositor através das estruturas musicais, divisões
arbitrárias em partes constituintes de seu estilo.
13.1.1. Podemos, em certo sentido, falar de propriedades formais dos sons e modulações, ou seja,
de propriedades da estrutura musical e, no mesmo sentido, de relações entre essas estruturas.
13.1.2. A presença de tais propriedades e relações não pode, todavia, generalizar as estruturas,
únicas; mostra-se, sim, como particulares daquela música que produz aquelas modulações de
sentires e tratam daqueles sons.
13.1.2.1. A uma propriedade de uma música, podemos também chamar um traço de seu
estilo.
13.1.2.2. É uma propriedade estrutural de uma música os traços sem os quais os sons e suas
modulações, e consequentemente seus temas seriam impensáveis(arbitrariamente pulso,
harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e movimentação espacial).
13.2. Não se pode distinguir uma estrutura musical de outra dizendo que uma tem esta e outra tem,
contudo, aquela propriedade; pois isso pressupõe que faça sentido enunciar ambas as propriedades de
ambas as composições.
13.2.1. A presença de uma relação estrutural entre duas músicas exprime-se por uma relação
estrutural de suas modulações.
13.3. As estruturas musicais são inumeráveis.
13.4. Por isso a lógica sonora está submetida à paixão musical.
13.4.1. Dada a natureza sonora, a música mais simples pode também ser a mais complexa para
um ouvintecompositor.
13.5. Por isso só a música nos fornece problemas definitivos.
13.6. Toda música é possível. Todos os sentimentos que ela gera são também possíveis.
13.6.1. A tautologia musical, ou a repetição perfeita de um som prévio, como mostraram-no os
minimalistas, é impossível dado ao incessante acréscimo de memória na duração.
13.6.1.1. Se ouvimos duas músicas, a segunda terá a memória da anterior.
13.6.1.2. Não há portanto metamúsica.
13.6.1.2.1. Mas é possível usarmos de músicas como modulações para uma nova
composição.
13.6.2. A contradição musical, ou a negação perfeita de um som prévio por outro, como
mostraram-no os aleatoristas, é impossível dado que em última instância todos os sons têm uma
ligação de natureza.
13.7. Na sua essência, uma música não é provável nem improvável. Uma modulação ocorre ou não
ocorre, não há meio termo.
14. Todo improviso acontece a priori.
14.1. De um tema nenhum outro tema pode ser logicamente concluído.
14.2. De um ruído ou música, não podemos deduzir a sua completa negação.
14.2.1. Daí a arbitrariedade passional da idéia de silêncio.
14.2.2. Todos os sons na lógica devem admitir justificação.
14.2.3. Devem evidenciar-se que não há sons lógicos, mas pathológicos.
14.2.4. Não há sons proeminentes.
14.2.4.1. Os pássaros não sabem como cantarão, cantam.
14.3. Toda dita lógica musical foca sons que distingue especiais dentre a outros arbitrariamente.
14.3.1. Este foco auditivocompositor é a paixão esquizóide de seu ouvintecompositor.
14.4. As soluções dos problemas sonoros derivam em temas pois estabelecem a tematização.
14.4.1. As soluções dos problemas sonoros são outros problemas sonoros.
14.4.2. Os problemas sonoros são os mais concretos que existem por se encontrarem em direta
ligação com as paixões do ouvintecompositor.
14.5. Uma música é um jogo sonoro de regras em movimento.
15. A especificação de qualquer forma especial seria completamente arbitrária.
15.1. Os limites de minha audição são os limites da minha composição.
15.2. Os limites de minha composição são os limites da minha audição.
15.2.1. O audível e a minha música são um só.
15.3. O mundo tal como o encontro entre o som e o sentido demonstra a inexistência do sujeito
ouvintecompositor.
15.4. O ouvintecompositor não pertence ao audível, mas é o limite do audível.
15.4.1. O ouvintecompositor é o limite de sua música.
15.4.1.1. A autoria se revela então como o limite de uma certa noção estilística da
composição.
15.4.1.2. Uma certa dieta dos nossos plágios.
15.4.1.2.1. Compor,o por com, é o plágio, este ato de desterritorializarmos e
reterritorializarmos modulações.
15.4.1.2.2. De original só os big bangs!, este paraísoperdido som-em-si inicial(se é
que big bangs!).
15.4.1.2.3. Sentir é plagiar.
15.4.1.2.3.1. Plagiamos o saber por seu sabor.
15.5. Onde no mundo se haveria de notar um ouvintecompositor metafísico?
15.5.1. Você se diz que tudo se passa no ouvido e no campo auditivo. Mas o ouvido não se escuta.
15.5.2. E nada no campo auditivo permite concluir que é ouvido a partir de um ouvido.
15.5.3. Ouvimos com nosso todo.
15.6. Isso está ligado a não ser nenhuma parte de nossa experiência também a priori.
15.6.1. Tudo que ouvimos poderia também ser diferente.
15.6.2. Não há uma ordem a priori dos sons.
16. Na composição, processo e resultado são equivalentes.
16.1. A competência e a performance são indissociáveis.
16.2. Em última instância, só há processo e performance. O resultado da obra advém com a morte do
compositor. E só assim se descobre sua competência.
16.3. A teoria musical é a esquizopathológica de um compositor usando sua música como argumento
estético.
16.3.1. A música é transcendental.
16.3.2. A música transcende a seu ouvintecompositor nas suas paixõesrazões.
16.4. As composições são averiguações de suas modulações.
16.5. À questão de saber se a solução dos problemas musicais requerem a intuição, deve-se responder
que é precisamente a linguagem musical que fornece, nesse caso, essa intuição.
16.5.1. As mecânicas tonais, por exemplo, põem a descrição do audível numa forma unitária, o
piano. Concebamos uma superfície de teclas brancas sobre a qual houvesse manchas pretas
irregulares. Dizemos, então: qualquer que seja a configuração que disso possa resultar, sempre
poderei aproximar-me o quanto quiser de sua descrição recobrindo a superfície com uma rede
quadriculada de malhas convenientemente finas(tons e semitons) e dizendo, a respeito de cada
quadrado se é branco ou preto(natural ou sustenidobemol).
16.5.2. Terei posto assim a descrição da superfície sonora numa forma unitária. Essa forma é
arbitrária, pois eu poderia ter utilizado, com mesmo sucesso, rizomas triangulares ou
hexagonais(modos pentatônicos, microtonais frequenciais) ou ainda não ter cristalizado e
simplesmente intuído a mancha sonora a partir de todas as malhas que consigo conceber.
16.6. Às diferentes redes correspondem os diversos sistemas musicais.
16.6.1. E todas as redes serão lógicas, o que reafirma que a música é sempre pathológica e os
sistemas, sempre arbitrários senão segundo seu esquizo ouvintecompositor.
16.6.1.1. Não existem dois pianos com a mesma afinação.
16.6.2. Caracteriza um sistema musical então, uma descrição completa do espectro sonoro, o
audível por meio de uma determinada rede de malhas de determinada finura.
16.6.3. A mecânica dos sistemas musicais são uma tentativa de construir, segundo um só plano,
todas as músicas verdadeiras para um compositor.
16.7. O que o ouvintecompositor silencia é seu falso.
16.8. Mas nenhum compositor se basta em falar de seus limites auditivos e composicionais, mas dos
limites gerais da audição e da composição.
16.8.1. A experiência sonora é solipsista e nisto, sempre única.
16.8.2. Estes escritos são parte da minha teoria musical baseada nas minhas experiências e
memórias sinestésicas enquanto ouvintecompositor.

17. Não podemos comparar nenhum processo com o decurso do tempespaço – que só é experienciável nas
modulações sonoras – mas apenas com um outro processo durável.
17.1. Dois sons podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo, na mesma velocidade ou não, pois
que se entressoam numa mesma modulação.
17.1.1.1. Diria-se que são como um mesmo som.
17.1.1.2. Duas músicas diferentes podem ser estabelecidas deste mesmo som pelas
modulações diversas de vários ouvintescompositores.
17.2. É por isso que a descrição do curso temporal de uma música só é possível se no ampararmos num
outro processo(ampulheta, metrônomo, partitura ou em outras músicas.)
17.2.1. De onde se gera o relativismo total dos tempos modulares(andante, allegro, etc.) e das
alturas(o Lá central do piano a 220mHz).
17.3. Toda a moderna audição das músicas está fundada na ilusão de que as chamadas leis tonais,
modais, seriais, minimais e também as físicas sejam explicações dos fenômenos auditivos.
17.3.1. Assim detêm-se diante das leis musicais como diante de algo intocável, como os antigos
diante de seus modos cíclicos repleto de deuses.
17.3.2. E uns e outros estão certos e errados. Os antigos, porém, são mais claros, na medida em
que reconhecem um termo final claro, enquanto, no caso dos novos “científicos” sistemas, é
preciso aparentar que está tudo explicado.
17.4. O audível é independente de minha vontade.
17.5. O processo de teoria musical consiste em adotarmos a lei mais simples que se possa pôr em
consonância com nossas experiências.
17.5.1. Esse processo não tem, contudo, nenhum fundamento lógico, mas apenas
esquizopathológico.
17.5.2. É claro que não há nenhuma razão para acreditar que realmente ocorrerá o mais simples.
17.6. A música está em toda parte, mas não tem um domínio que lhe seja próprio.

18. Não há um sistema musical fechado.


18.1. Não há uma necessidade lógica de nenhum sistema musical.
18.2. Há talvez necessidades contextuais pragmáticas(culturais, históricas, políticas, recreativas, etc.).
18.2.1. A posição que a teoria musical ocupa atualmente, no coração da composição, conduz à
adoção de uma definição da música unicamente como meio de transmissão de mensagens; e o
resto, o esquizopathológico como sendo só o ruído e a redundância da utopia tácita.
18.3. A questão de sua interpenetração com o campo social(socius) nunca é colocada, os problemas
relativos ao contexto da comunicação permanecem marginais.
18.3.1. Estas necessidades contextuais são também modulações das composições na medida que a
ontologia da música se baseia nas paixões de seu ouvintecompositor.
18.3.2. Não há linguagem musical em si, uma unidade teórica como a do tonalismo é inseparável
da construção de uma formação de poder, neste caso o tom.
18.3.2.1. Como também não pode existir música nacional, mas fenômenos de retomada de
poder musical por um grupo de ouvintescompositores numa certa nação.
18.3.2.2. Não há revolução musical sem uma revolução sentimental.
18.4. O audível advém, de um núcleo elementar da primeira das significações sonoras, ou como um dos
traços fundamentais da pragmática de educação ostensiva de um certo tipo de sociedade, como a
expressão de um mecanismo abstrato que garante a consistência de um certo tipo de ordem musical.
18.4.1. Por exemplo, a questão não é se o ouvintecompositor é dono de sua música ou não, mas
exatamente a desterritorialização da composição da pragmática deste contexto plagiadores/donos
pela reterritorialização dela numa esquizopathológica própria do ouvintecompositor.
18.4.2. O poder se apossa do gozo de musicar como se apossa de todo gozo, para manipulá-lo e
fazer dele um produto gregário.
18.5. Cada música cristaliza uma dança muda de modulações rizomáticas fluindo ao mesmo tempo no
corpo social e no corpo individuado.
19. Todas os sons têm igual valor, mas as músicas têm valores distintos.
19.1. O sentido do audível deve estar fora dele, no que o foco silencia do ruído.
19.1.1. No audível, tudo é como é e tudo acontece como acontece; não há nele nenhum valor – e
se houvesse, não teria nenhum valor.
19.1.1.1. Se há um valor que tenha valor, deve estar fora de todo acontecer e ser-assim.
19.1.1.2. Pois todo acontecer e ser-assim é casual.
19.1.2. O que o faz não casual não pode estar no audível; do contrário, seria algo, por sua vez,
casual.
19.1.3. É por isso que tampouco pode haver composições meramente lógicas.
19.2. É claro que a pathológica musical não se deixa exprimir por completo senão no esquizo das suas
composições.
19.2.1. A pathológica é transcendental.
19.3. O primeiro pensamento que nos vem quando se formula uma lei musical da forma “você deve...”
é: e daí, se eu não fizer? É claro, porém, que a teoria nada tem a ver com punição e recompensa, no
sentido usual.
19.3.1. Portanto, essa questão de quais sejam as consequências de uma composição não deve ter
importância no momento da composição se o ouvintecompositor quiser ser fiel às paixões que o
levam a compor.
19.3.2. Deve haver, na verdade, uma espécie de recompensa e punição passional(ou se preferir,
sentimental), mas elas devem estar e estão na própria música.
19.3.2.1. E também, é claro, a recompensa deve ser algo de agradável e a punição algo de
desagradável.
19.4. Da vontade enquanto portadora das paixões e sentimentos não se pode falar.
19.4.1. Esta vontade é só a música que compõe.
19.5. Se uma boa ou má volição altera o audível, só pode alterar os limites do audível, não as músicas;
não o que pode ser musicado, as paixões.
19.5.1. Em suma, o audível deve então, com isso, tornar-se a rigor outro audível.
19.5.2. Deve, por assim dizer, minguar ou crescer como um todo.
19.5.2.1. A audição do feliz é diversa da do infeliz.
19.5.3. Como também a audição, com a surdez, não morre, se altera.
19.5.3.1. A surdez é um evento auditivo, como Beethoven ensinou-me com lágrimas.
19.6. A solução do enigma sonoromusical está fora do sommúsica.
19.6.1. Como seja o audível, é completamente indiferente para o quê. O silêncio não se revela no
audível.
19.6.1.1. As músicas fazem todas parte apenas do problema, não da solução.
19.6.1.2. Todo canto é um canto do canto.
19.6.1.2.1. Só o silêncio soluciona.
19.6.2. Do sentimento do audível como totalidade limitada(péras) é produzido o sentimento do
silêncio na abstração do além destes limites(ápeiron).
19.7. Para uma resposta que não se pode dar, não se pode tampouco questionar.
19.7.1. O silêncio não existe, ou ainda, eu também não tenho nada a dizer e estou dizendo-o.
19.7.2. Se uma dissonância se pode compor, sua consonância também é possível.
19.7.2.1. Pois só podem haver dissonância onde se conhece as consonâncias.
19.8. O método correto da teoria musical seria propriamente este: nada dizer, senão o que se pode
dizer; portanto, escadas esquizopathológicas pelas quais chegamos ao presente audível– portanto, algo
que nada tem a ver com teoria musical; e então, sempre que alguém pretendesse dizer algo das leis
sonoras e ou musicais, mostrar-lhe que não conferiu os significados passionais a certas modulações
sonoras e ou temas em suas teorias. Esse método seria, para ele, insatisfatório – não teria a sensação de
que lhe estivéssemos ensinando música; mas esse seria o único rigorosamente correto.
19.9. Minhas teorias elucidam dessa maneira: quem me entende acaba por reconhecê-las como retrato
de meus devaneios esquizopathológicos, após ter escalado por eles.
19.9.1. Devo, por assim dizer, jogar fora a escada após ter subido por ela.
19.10. Escrever sobre a música é um apaixonante paradoxo. Ao mesmo tempo que nunca alcançamos o
inefável das modulações de nossos sentimentos, o próprio escrever sobre o papel a dançar é música a
gestar um novo audível.
19.10.1. As palavras com as quais expresso minha música são também, em parte, minha reação à
minha música.
19.10.2. Minha música é também reação às minhas palavras
20. Sobre aquilo de que não se pode falar, dever-se-ia cantar.

“...la la ri la la...”
Lewis Caroll
Cartografias da Escuta

A música é um mapa de escutas.


Sociofonias: As sociofonias partem do encontro com escutas sociais de distintas paisagens sonoras e
grupos aurais para ressoar suas harmonias contextuais e, a partir desta matéria prima relacional, criar obras
em rede que atuem na própria subjetividade sonora local. Seus resultados portanto, variam de acordo com as
condições de cada local e momento específicos, além das interações que aí se dão abrangendo a criação de
óperas, performances, oficinas, fabricação de instrumentos, festas, palestras, instalações sonoras, etc.
Transtornos: O que atravessa o centro rotátil do meio urbano fazendo cruzarem elementos fora do
eixo em territórios sonoros que não os seus usualmente? Buscamos entender como ocorrem as sociedades de
diversos modos de escuta, as cumplicidades de certos modos de vida que acarretam em campos
(a)composicionais de “estilos musicais”. Como as diferentes pessoas escutam e o que elas escutam? Como
essas diferenças de escuta criam referenciais simbólicos (religiosos, culturais, científicos) identitários da
escuta na harmonia contextual?

Alguns dos objetivos de uma cartografia aural são:


• Uma instalação de um gesto sonora composta com todo o material recolhido durante o
processo, incluindo certamente:
◦ Um mapa sonoro da cidade focado em alguma relação sonora relevante, a ser decidida
coletivamente após pesquisa no local, podendo ser as músicas religiosas e laicas ou os
ruídos industriais, por exemplo.
◦ Uma série de jornadas sonoras gravadas em formato mp3 realizadas a partir destas
oficinas, cartografadas no mapa para que pessoas possam fazer tais travessias pelo
espaço urbano aumentado...
• Oficinas abrangendo o processo de escuta, captura, edição e difusão sonora...
• Um libreto-mapa para rotas sonoras no walkmen digital...

Alguns dos processos possíveis para a produção de uma cartografia aural são:
• Conhecer as outras pessoas atuantes simbolicamente e suas obras. Pensar maneiras de
interação sonora com suas obras e processos, pensar locais concernentes com estas.
• Caminhadas gravando sons, recolhendo lixo.
• Pesquisar os questionamentos sonoros das pessoas locais e observar as relações musicais
estabelecidas.
• Preparar a primeira oficina de acordo com os interesses descobertos nos dias anteriores.
• Fazer uma cartografia da cidade com uma primeira trajetória poética.
• Visitar locais concernentes ao foco escolhido no primeiro encontro e dar uma oficina prática
de morfomicrofonação.
• Preparar a terceira oficina de acordo com o material e o processo encontrado durante as
gravações do segundo encontro.
• Preparar os materiais durante um terceiro encontro, incluindo um libreto-mapa para rotas
sonoras no walkmen digital, possíveis artefatos técnicos e cênicos, figurinos, estratégias de
ação.
• Utilizar o último encontro para finalizar o processo de montagem e mesmo para atuar pela
cidade.
Sujeira Sonora, Maquiagem Musical
Base: Que minhas palavras não me maquiem como os belos e grandes automóveis fazem com o
tráfego. Um texto maquia um verso, a memória maquia o devir, a música maquia o som. A pele é o mais
profundo abismo sobre o qual lançaríamos os dados de nossas pontes semiônticas. Alô base, responda! Uma
face é um rosto sem rosto. A interface é o ruído entendido em seu silêncio, assim como a maquiagem é senão
uma sujeira aceitável. Um rosto e seus traços de rostidade (um estilo musical e os movimentos ecléticos que o
atravessam) são resistências de um ego social no corpo (através da tensão muscular e tátil), que tornam seus
segmentos controlados (ocular e oral) em palcos da auto representação política ao impedirem a fluência dos
livres movimento das correntes energéticas dos modos desencouraçados da face (aural e olfativo). Uma
desterritorialização do corpo implica uma reterritorializacão no rosto. Há uma sobrecodificação
(metaprogramação neuroimagética) pela hegemonia do utilitarismo da face e do som (iconoclastia hedonista
musical, hierarquia das alturas melódicas, narcisismo semântico dos dados impuros). Tal máquina de
rostidade (produção social da musicalização e do rosto), efetua uma rostificação de todo o corpo (uma
musicalização de toda a escuta), de seus entornos (you are your playlist) e de suas funções. Se o rosto
produzido socialmente é uma política, desfazer o rosto também será uma política (se a música produzida
socialmente é uma economia, desfazer tal música também será um produto de mercado). Mas eu hei de
maquiar estas palavras com as faces mortas dos ídolos, como se cada nome puxasse nós e os nervos capilares
do ouvido mais próximos à garganta.
Pó: síntese granular da música eletroacústica se baseia no delírio quântico atômico, erotismo de
areia, filé à milanesa, devir rapé da escuta. Do pó ao só, do grão ao drão, do um ao bum. Cheira o cangote da
pessoa ao teu lado. É cheiro de gente ou um casamento químico? Cada torno da roda das modas, ou as giras
das ninfas, por exemplo de Eco a Calypso, são sinos tocando contas de vidro. Baudrillard fala de três estupros
pro nascimento do humano: trabalho, consciência da morte, repressão sexual. O epicentro da artificialidade
se põe entre nosso desejo contínuo pela objetificação de nossas subjetividades, Genet come margaridas antes
de vender seu corpo de novo, carrega as mortalhas de seus afetos em nome de uma autopoiése mais. Eros ergo
Muse. A prostituição por si só permitiu o enfeite, salientando o valor erótico do humano feito objeto e
serviço. Um tal enfeite é, em princípio, contrário ao movimento de negação do enlace sedutivo da mulher
que se nega para gerar a caça ao objeto de si por parte do homem. A prostituição de umas determina o
esquivar-se de outras...formas de uso do rosto. No princípio a prostituição era só uma outra face do
casamento, chamar-se-ia dom ou dote. Não é de se espantar que os mais antigos traços de civilização sejam a
maquiagem funerária e a prostituição. O que se maquila num rosto, mesmo vivo, é seu inevitável cadáver e
são os vermes que gostaríamos de realmente seduzir com a mais
descarada nudez das vestes. A estratégia camaleônica de Bowie,
em sua dança pelas ondas tendenciais dos nichos da moda, o
campo hipermoderno da escuta eclética, tem uma objetificação
direta no entrincheiramento urbano do autismo. O rádio(e seus
ipods provenientes) é uma tecnologia de guerra assim como a
maquiagem rajada alternou do verde vietcongue para o cáqui
jogador de golf iraquiano. Mudança similar da do fim da guerra
fria, e a mudança do paradigma dos espiões para o dos
terroristas, de Mata Hari a Wafa al-Bas. Quando o terrorist-chic
virará tendência em Paris? O soldado está para a santa em
pedaços no passo do gato como o filósofo para a puta sem
clientes. Banhos de sêmem no topo das pirâmides, já romanas.
Quem lamberá as feridas de Orlan? Quem juntará os cacos de
Hans Bellmer, Cindy Sherman? É por rosto mercurial, tronco
salgado e barbatanas sulfúricas que o canto das sirenes atravessa
as eras e as bocadas. É uma emergência, o toque à pele. São
memórias futuras calcinando em teus poros as cores que nem
teus olhos puderam compreender, algumas fodem e procriam
em tua língua, algumas outas, compreensões de cicatrizes.
Súbita efêmera sensação da realização da essência do fogo:
Epifania.
Coração: Tudo que tiveste imensa vontade de dizer e não pudeste expressar em palavras, depois o
mostrará tua face. Elke Maravilha, nada em nuvens de sombras coloridas e constela os céus de luz fria com
estrelas de rímel. Pousa na beira de estrada caiada e canta para Novalis que gira a bolcinha com Burroughs...
Cantos texturados de mútua sedução compõem a carta que ele tem em mãos, manchada como seus olhos.
Fala de um Ulysses que não florecerá, homem de esperas e partidas. Choro de ninfa puta “Eles nunca ficam,
eles não compreendem... e vão.”. Mas sempre um sorriso tremulando a espinha avisa a face a desenhar-se
novamente ao coro do corpo. Visage! Berio desnuda Cathy Barberian apenas para vestir suas cordas vocais
com seus cálculos, lembrá-la da Enlil animal peludo. Lembremos que Poser é um software de avatares. Assim
como o teatro se torna a pátria nula das máscaras de transparências após Godot. E perto destes cantos, Peter
Grimmes é pouco mais que Pinóquio, corpo de madeira em cordas... E jamais nos esqueçamos que a própria
forma vitruviana do corpo carrega em si sentimentos dos mais profundos, Casanova nos gestos mais sutis de
desespero apaixonado ao maquiar as sombrancelhas da amada criatura apenas para poder desenhar-lhe olhos.
Criamos uma música para que alguém ouça não apenas a nós, mas como nós. Desde o pierrô lunar, títere
maquilado dos influxos do íntimo até os arlequins solares do glam; é movida a sangue de purpurina e
gasolina, a vaidade dos Golem. No frenesi de maquiar cada encontro imediato no enredamento útil do
netflerting, faríamos da alteridade não mas que um espelho de youtube. Como vocês cozinhariam em um
caldeirão de cera, se quando aquecido este também se põe a derreter? E ainda, como haveriam de pintá-lo?
Fez questão de deixar os lábios borrados depois do beijo, dormiria na cozinha suja e queria a nudez plena do
descaso de si em mim. No dia seguinte de rosto lavado houvera de recitar Hilda Hilst em inglês enquanto
cambaleava pela Liberdade.
Sombra: Se a não fossem de fluxos em decantações os corpos e a técnica hefaística quisesse de fato
criar a perfeita prisão para as musas, o museu, haveria de mister dispô-lo entre um salão de belezas e uma
academia de gimnopédias com mobília musical, como que ria Satie. Todo erigido em carbono, para facilitar a
datação de nossas vaidades e luxúrias. Olhava dentro de meus olhos e ouvia o tremular enquanto dormiu.
Algo não foi compartilhado.
Some storms are better without
shelter. A cor da flor não escorre
à chuva. Ainda haverá um MAT,
museu do aroma e do toque.
Flores de plástico com
borrifadores de aromas sintéticos
criarão os âmbitos de nostalgia de
certas intoxicações, do chocolate
às caixas envernizadas. O hall das
fezes históricas, de Beuys a
Wharol. Estudiosos farão teses
sobre a consistência e o aroma
destas baseados nos hábitos
declarados e nas imagens de
arquivo. Em algum canto talvez
haja uma pele para quando já não
nos lembrarmos do encontro
incondicional. Beijou meus cílios
e apertando a palma da mão
contra meu peito, riu alto:
mulher! Borrando o seu batom
respondi enquanto tocava sua
buceta: androgênio... Se o artista
aponta os problemas sociais é só para saber-se também a maquiagem destes. A simpatia da comcunbina para
com o eunuco. Nas palavras de Cazuza: “Eu sou burguês, mas sou artista.” Aí vocês suspiram que gostaram
ou não da obra e eu pergunto sobra as suas enquanto me retoco para o próximo concerto.
Blush: A rostidade está inscrita na linguagem como os estilos musicais inscrevem fronteiras à
escuta. Ser babyface implicará a capacidade de representar o papel de barbie-modelo-amante subdominante
ouvindo powerpop de girlsbands e emo, talkingface dará conta de uma pessoa crível que poderá jogar como o
político-vendedor-informante ouvindo jazz fusion classic rock; scarface nos faz voltar aos guetos e aos
submundos mafiosos da vida lôca do lado de lá da ponte do gangsta rap bolero spirituals; fuckingface tem sua
tradução direta ao português assim como o pancadão revirou electrochic parisiense. Obra de arte sob ar
condicionado e a sexualidade maniqueísta(e aqui cito o gnóstico Manis). Como pode a diferença, ou ainda os
trânsitos de sexualidade, fazerem alguma diferenciação ou gestar um transe? Vocês! Todos vocês se
despuzeram a sair de casa e vir ao museu e se prostam com interesse diante nossos sons, mas quantos
estariam interessados em nossos aromas e secreções? Uma das revistas de maior tiragem no Brasil (Caras)
segue neste mesmo sentido, um paradigma de rostidade careta indicando sempre os shows de MPB mais
badalados e chics. Multiplicação da presença das caras e do rosto em lugares públicos pela propaganda
hiperindustrialmodernista (assim como a multiplicação ad infinituum das músicas de fundo). De um lado os
visíveis (e audíveis): os novos nobres, os conhecidos VIPs que tem acesso à tela e sobrepassam as fronteiras do
jabá e do networking; do outro: os desconhecidos (os olvidados das museas), os ignorados pelos lobbys da
imagem e do som. Nos âmbitos artísticos (casta estética) vivemos uma rostidade mais discreta, ainda que não
menos influenciada pela maquinaria sociotécnica que atravessa mercantilmente a sociedade (fetichização do
entreface), buscando impôr a expressividade codificada (enredamento das impregnações dos modos de escuta
e soagem). Imaginem a crise de aprendizagem do político que logo depois de ser maquiado em sua fisionomia,
estudado e treinado durante horas em sua linguagem e em seu discurso, em seu sorriso e em seus gestos,
recebe como último conselho de seu assessor de imagem e voz, um momento antes ir ao ar: “Bom agora, por
favor, seja completamente natural e espontâneo”.
Elogio Ao Plágio
Ruidocracia

O ruído é a morte do som.


[1+12=13]Dentro da democracia dos signos não há espaço possível para o ruído, relegado à mera função de
interferência ou adorno no paisagismo. Com isto sacrifica-se à margem qualquer possibilidade de sondagem
profunda do ruir em si mesmo quando parte-se da linguagem.
[2+11=13]O signo do ruído é o cerne da tecnicologia dos dois extremos controles do demo(massa) aurais: No
religar semiótico, permite aos ciclopes a contemplação da própria morte(XIII ) ao mesmo tempo que os atira na
surdez das iterações( progressões de redundâncias timbrísticas), eterno retorno da escala ao paraíso perdido da
harmonia subjetiva(Ninguém me acertou). Já nas políticas simbólicas, gera os limiares das interações materiais
dos objetos sonoros seja pela imanência heurística que transmuta o ruído novamente em sonema, como pela
homeostasia dos sistemas musicais que imprime o foco tonal à redundância sonora de acordo com as dinâmicas
entrópicas da rede.
[3+10=13]Podemos então falar de um ciclo de três modos de escuta do ruído dentro à natureza
composicional, assim como podemos pensar um sentido como ruído(impregnação) do outro. Mas ainda, o
multimídia quer estar em todas as modas ao mesmo tempo, para as dest'ruir.
[4+9=13]Ruído científico-profano: O ruído organizado como se observa no ícone matemático do ruido
branco(white noise). O empalidecimento dos matizes cromáticos do barulho gerado na síntese log arrítmica compõe
a síntese dum espectro afetivo-racional. Os cães, como a estrela Sirius de Stockhausen vêem em preto e branco e
ouvem melhor a síntese granular das altas freqüências que a pulsação esféride.
[5+8=13]Ruído sagrado: O índice dos silêncios potenciais, as paisagens sonoras em suas implosões de cores e
sutileza de matizes. O templo é sagrado porque não está à venda para culto algum, o tempo é sagrado porque não
pode ser cartografado. Color noises. João Jaula, procurando silêncios encontrou ruídos, buscando morangos achou
cogumelos, buscando o tempo se deparou com a dança e a performance.
[6+7=13]Ruído comercial-laico: O barulho é o produto cultural ideal, pois não distingue a produtores e
consumidores, mantém o trabalho da escuta no nível prototípico da soação sem perder nada da geometria
tipológica da música. O que não é barulho brilhante no mercado cultural se restringe a interferência
sistêmica(metaruído), mas sempre haverá um nicho de consumidores ávidos por turbilhões e é do mote fordista any
color you lik e as long as it's black que os sabbaths encontram seu caminho no seio da indústria da rebeldia. Black
noise. Xenakis, o arquiteto busca ver com os sons pelo resto de sua vida o brilho da granada que lhe tomou um olho e
um ouvido. A estocástica como religiosidade científica do ruído, a composição concreta dos desertos em rolos de
memória. É noise na fita!
[0+13+0=13]O ideal de um mundo sem ruído político é alcançado pelo entranhamento de dois modos de
conduta sonora: Uma codificação quântica em velocidades sempre acelerantes que prende os ouvidos pelas cadeias
de Markov a uma certa faixa repertorial(as óperas de surdos-mudos da Cia. Invisível de Teatro Alchemico), ao
mesmo tempo que uma exclusão pela inclusão como a observada no maximalismo academicista do fim de século.
Este, pelo cálculo de todos os afetos musicais se nega a sentir as escutas que produzem seus sons(dir eito autoral /
dever atuante); se assemelhando assim com a irreversível entropia dos mercados de pasteurização fonográfica, que
por excesso de redundância passaram a ser não mais que barulho para muitos.
[13+1=14]Laranja Eletrônica, os sonhos tangerinas dos rappers hackers acionistas de Beethoven nos
templos do mantra de baixa tecnologia cruzam Dylan escarrando num intonarrumori: "Em direção ao abismo
metálico entre os transistores e as cordas das guitarras... o ruído branco encontrará enfim o blues dos negros, as
musascagam minérios em nós da névoa roxa antevista pelo terceiro ouvido de Hendrix ao roxo profundo das
cabeças de máquinas... Nobody's gonna beat my car / It's gonna break the speed of sound / Oooh it's a killing
machine / It's got everything."
[13+2=15]Sketch's Kitsch! A música como a melodia é em tempos de ostentação ruidística sempre
meramente esboçada: ou sublimada pelo escárnio ou r emixada pela obsolescência programada. Vês as rédeas que
os produtores colocaram nas bandas pelas próprias bandas de freqüência? No futuro toda canção terá seus 15
segundos de barulho.
[13+3=16]O kitsch trabalha sempre sobre a ânsia de "querer parecer vanguarda" lembra Abraham Moles.
O processo de sedução dupla da canção pop( por expansão novideira pseudocientífica e tradicionalismo hedonista
pseudoreligioso) submergirá os famosos três acordes em camadas de atmosferas sonoras e hipnoses subliminares, do
mesmo modo que engoliu a música geométrica pela ideologia significante(os violinos ao fundo do rap) e o transe
mitológico pelo folclore(a onda de acústicos e a percussão maquínica).
[13+4=17]Pagu disse para Oswald: "A industrialização é, pois, por natureza, um desenvolvimento
maternalístico". Quando toda a arte se sujeita ao desígnio do evolucionismo adaptativo dos modos de escuta
estética o desáine se apresenta como padrão de conduta ética do artista, que é reduzido a projetista de
sensibilidades através de impulsos semânticos na vida pública privada. Aí, resta ao ruir artear.
[13+5=18]Canção, praça pública da música. Se podemos falar de democracia nos âmbitos do som
seria, em termos tonais, o de uma arbitrariedade consentida de relações intervalares. Há caminhos sonoros
que todos percorrem, há os cumes e cimos. Do metal ao doom há um duplo movimento de criação de uma
micropolítica estética própria, ao mesmo tempo uma guturalização animalesca das macroestruturas
industriais da forma-banda e uma complexificação das microestruturas digitais que almeja uma comedida
máscara de desregramento. A corrupção se miniaturiza e toma entornos de uma opção estética, lógica da
preferência tribal. Dietas das escalas pantone de ruído.
[13+6=19]A escultura ruidística como estilística do drone já tomou até mesmo as salas de dança com o
Umwelt(Maguy Marin) mas ainda se mantém como linguagem de resistência criativa à cultura capital nos
undergrounds de todo o mundo. Merzbow pode bem ser colocado como o legado de Steve Reich e também
como membro de uma guerrilha postgrindgore crystalpunk. Isto se dá porque o drone enquanto arquitetura
fluida é a escolha pela especialização nas massas bonitas e sublime(imperativo estético legal kantiano), onde a
formação sobrepassa a informação pela sua completa aceitação.
[13+7=20]O modelo dos carros muda, o som dos motores continua o mesmo. Enquanto você não parar
seu carro não fale do meu drone, enquanto seu carburador queimar ossos não reclame de meu cigarro. Eis o
ruído como nuvem de proteção radioativa, escudo eletromagnético da escuta nômade contra quaisquer
arapucas de estilos. Bruito o retorno pós-apocalíptico à natureza da acusfera ionizada pelos impérios
radiantes. Pitágoras a Orfeu no túmulo de Hermes: "Inaudivelmente alto, enternamente durante, longe
alcançando", quando abre os olhos para ouvir a resposta vê Orfeu se afastando no horizonte cantando.
[13+8=21] Ao ruído nem som nem música resistem. À cibernética, rede de volantes de volantes de
redes de poderes, o carro serve de catedral barroca hipermoderna. Gonzalez me disse na lojinha de souvenirs
da capela de ossos: "O modo diabólico está para o pós-moderno como a imagem do cristo para os barrocos". Na
democracia dos signos, o ruído(e isto pode incluir tudo que soe de acordo com o desejo de escuta) é relegado ao
âmbito de loucura, fazendo da própria escuta uma doença por envenamento( pharmakón).
[13+9=22] Devemos compreender que o registro direto do som é um fato novo na história do homem
(a que os teosofistas nomeavam prisma das cores pela luz): data de pouco mais de meio século. Pensemos
também no desenvolvimento dos processos audiovisuais(a harmonia sinestésica). Na época da reprodução da
obra de arte(XV ), torna-se obsoleta a idéia da arte desfrutada enquanto objeto raro e aparece a idéia da arte
como contágio semiótico(Burroughs) A própria idéia da arte(III ) é posta em questão. O que observamos em no
sso tempo é a explosão da informação sonora. A fartura(e miséria) do nosso tempo(ruídos inclusive) aumenta
na medida mesma em que se difunde pela coletividade. A massa consome signos sonoros em massa. O modo
tradicional de ouvir e compreender a música constitui uma pré-ordenação arcaica, com seus significados
esclerosados, que não podem ser impostos ao grande público, pois a este o mundo industrial fornece tantos e tais
meios de acesso e consumo do mundo sonoro, que ele próprio vai desenvolvendo sua capacidade de seleção e
inteligibilidade. O que era qualidade se transforma em quantidade e é preciso encontrar os signos
correspondentes a esta, para sua efetiva comunicação. O mundo das coisas vai-se dissolvendo e cedendo lugar
ao mundo dos signos e da comunicação vital e vivencial. O mundo das coisas é feito de posse privada, o mundo
dos signos, para a comunicação e a cultura pravida. Os objetos industriais(incluindo sua música), hoje,
participam também da natureza da linguagem. O caos da informação sonora que nos aturde está a exigir
uma ordem (não-definitiva - mas probabilística e mutável). Ordenar é selecionar e codificar. Codificar é
transformar em signos - significar, tornar inteligível. Portanto, é comunicar. Aos trabalhadores do ruído,
resta trabalhar dentro dos meios de comunicação de massa até que o sistema se transforme e seja absorvido. E
ruir como imanência, ser o barulho de si mesmo no corpo coletivo. Zumbi indo!
Transtorno Kitsch-Cibernético

A música enquanto brinquedo


é um modelo social do controle
I. Harmonias inconscientes:

Os cerca de trinta mil tatos das membranas basilares, estes osciladores de aproximadamente 35mm,
respondem ao impacto de uma estreita banda freqüencial das ondas sonoras, e de acordo com sua posição em
relação aos nervos auditórios vertem as freqüências e fases sonoras em impulsos elétricos. A quimera tácita
demandaria a fixidez deste ínfimo movimento . Apesar do alcance de captação plena e constante da faixa
vibrante entre +/-20 a 20,000Hz, trabalhamos com uma dilatação e retração do foco consciente auditivo
muito variável, fora do qual ocorrem as micro e macro harmonias inconscientes.
Os ritmos elétricos dos neurotransmissores cerebrais, cocientes de todas as freqüências que cruzam o
corpo, sintetizam-se entre +/-1 a 30Hz podendo ser descritos como o metainfrassom da mente. Os
sentimentos, mapeamentos cerebrais do corpo em relações específicas, desvela à faculdade musical no seu
sentimentalizar do som, estabelecimento de rotas dos ruídos do, e no, corpóreo .
Os organismos harmonizam suas orquestras homeostáticas através destes impulsos elétricos que
variam sua sinfonia de acordo com as necessidades do corpo na sua incessante busca por equilíbrio e
bem-estar. Seu funcionamento varia desde o mais lento possível como na faixa +/-(Delta ~ 1 a 4Hz) que
possibilita o desprendimento egóico para as regulações do metabolismo, das respostas imunitárias e dos
reflexos básicos realizadas somente no sono profundo (REM); passando às ondas +/-(Theta ~ 4 a 8Hz) que
regularizam os comportamentos de dor e prazer e com isso os alicerces das emoções como nos estados de
transe, anestesia e relaxamento; chegando à gama consciente +/-(Alpha ~ 8 a 12Hz) onde se recompõem os
recursos minerais e se ampliam as sensibilidades nervosas e a velocidade de conexões sinápticas, e
acelerando-a até o estado +/-(Beta ~ 16 a 24Hz) de alerta, concentração e aceleração do metabolismo através
da queima adicional de adrenalina e proteínas .
Estes estados coexistem aparalelamente no organismo que as focaliza de acordo com suas
necessidades moleculares, fuga da dor e busca do prazer, que alicerceiam a cristalização de certos hábitos na
programação neurolinguística .
O planeta sobre o qual musicamos também ressoa em sua ionosfera durante seus movimentos de
rotação e translação. As reverberações das suas instabilidades ondulares, reflexos das relações de forças entre
toda a complexidade harmônica de sons nela presentes e os demais corpos celestes, variantes entre 8 a 45Hz .
Terra e Humanos são organismos em uma relação que a harmonia clássica estabeleceria como dissonância
dominante e trabalham, não coincidentemente, em grande parte na mesma faixa de freqüência.
A concha e o das dasein est rondo, o corpo é a casa é o mundo . Tudo se ativa quando se acumulam
contradições, a ciranda do boi é o labirinto do minotauro. À jam se comunica como nos conscertos ante às
partitas, às energias que reverberam as próprias estruturas de um corpoambiente. Fazer o magnetismo dos
falantes e metais estruturais reencontrarem suas ancestralidades na terra, subjetivar os objetos. Todas as
tecnologias não são mais que um mito , e nisto um libretto seria escrito ad infinitum .
O som de um ambiente reverberado nele mesmo nos joga no paralaxx, onde as infinitas
particularidades dos corpos entre a certeza da morte e a impossibilidade do silêncio se interprenetam
Liberando o ato na probabilidade, randomização e improviso com os elementos previamente ensaiados pelos
performantes ao mesmo tempo que liberando o som do texto imanente pelo freqüencismo coloral, criando
massas estocásticas, nuvens, galáxias, campos harmônicos afectivos de multipolaridades atonais, tonais e
modais; desvirtuando o caráter absoluto das estruturas cromáticas transitando entre hiperserialismos e
minimalismos frequenciais.
As posteriores concordâncias entre as diversas faculdades se relacionam com a harmonia entre os
dados dos sentidos aí dispostas, e estas nunca eternas, abismam entre coerência e crença trazendo à tona a
impossibilidade das esferas no fenômeno. A mente frente à beleza incompreensível de si mesma, feita círculo
pluridimensional, torno de tornos da lama lógos, encontra o seu limite no saber-se impotente e pode então
no des-esperar dançagir , manejar a rede de lemes de redes, cibernética.
II. Corprótesespaço, dança das esferas:

A presença em movimento do corpo parte das redes de interlocução possíveis entre espaço
construído, público e objetos (aparatos e próteses). Não há a possibilidade de que a dança seja elaborada
dissociadamente de toda a composição maquínica e das engrenagens potencializadoras das relações entre
espaço e corpo em desdobramento.
Se direcionamos o corpo a uma dança esférica, isto consiste muito mais nos mecanismos de um
enredamento noosférico do que nas imagens que giram em uma mimética do círculo . Hipnotizadores e
hipnotizáveis através da constante ou fragmentada aparição da gira , os corpos experimentam um transtorno,
mas mais do que isso, suas potências conströem a dança no encontro de um corpoespaço.
É nesse caminho que o pensamento corpo segue. Como fazer parte de um mesmo ambiente que
outros corpos e no mesmo dissociar-se, desmembrar-se identificando-se da e na multidão ?
O bailarino desloca-se no espaço como portador do ambiente que o circunda. Desloca o som e é
deslocado por ele, comportando no corpo a memória sonora impressa na subjetividade ao longo de sua
história. As próteses falantes são esse mecanismo do corpo evidenciado, como uma literalização dos sentidos,
um extrovertimento das memórias sensoriais.
A prótese se relaciona com o bailarino como o bailarino se relaciona com o ambiente, dança nele. O
corpo, então, não é mais ele mesmo , não se resume ao visível e palpável, não se delimita mais no próprio
contorno .
Em um mundo de exaltação e esgotamento informacional, os sentidos passam de instrumento de
re-conhecimento do próprio corpo no ambiente a um mecanismo estanque de identificações
pré-estabelecidas a estímulos absolutamente partiturizados. Deixamos morrer seu frescor de sensação
primeira , desapropriamos por completo a possibilidade de sentir em sua totalidade. O corpo carrega os
sentidos como apêndices de sua própria carne, amortece seus fluxos em uma tentativa de não mais responder
aos estímulos de um ambiente exaurido.
Projeções do porvir, nossas idéias diante do perceptível não se configuram mais como arquiteturas ou
estratégias nossas, mas como uma computação funcional constante do confluir com o mundo.
Se por um lado esse confluir libera o si como abertura de possibilidades em um ambiente de riqueza
informacional, este pensar e agir de acordo com o rebanho,
trama influências ao corpo, prendendo-o e isolando-o da
possibilidade de criar suas próprias nomenclaturas,
marginalizando seus desejos e emoções, coibindo sua
interação sensitiva com o mundo. Nos prendemos crendo
já saber a gama de possiblidades reativas possíveis dos
sentidos, nomeamos antes de termos sentido. Carregamos
no próprio corpo, próteses invisíveis, livros de receitas aos
sentidos e às interações com o mundo.
Nos apropriamos do pensamento alheio,
mimetizamos as ações que nos cruzam apenas sem nos
(re)configurarmos a todo momento a partir do encontro
com o outro.
Quando não roubamos mais nada do outro é
porque aquilo que ele nos apresenta já é parte de nós
mesmos, e a paleta interativa se mostra não mais que o
senso-comum. Troca e relação cedem a economia e
alienismo confluindo na inércia e amortecimento dos
sentidos, a pseudointeração individualizante do virtual.
Ressaltar estes transtornos entre corpos físicos e
abstratos que trespassam a subjetividade aproxima-nos do
som (a sensibilidade da duração de que dispomos, além das
memórias: imagens-tempos entrelaçadas a um espaço
eterno subtraído pelo foco). Um corpo enquanto ambiente
ou espaço de si mesmo reconfigura suas percepções no
confluir com outros sistemas. Criando um terceiro corpo
que não o próprio ou a prótese mas a imanência da relação,
aprofundamo-nos na pausa para as percepções primeiras,
um silenciar dos motores inertes e capturados nas reações
pré-estabelecidas pelo aparelho habitualizante. Re-vestir o
próprio corpo , reconhecer-se construído além do eu e
observar o outro que imageticamente pode se deflagrar em
uma mesma situação, mas que comporta em sua
experiência o absurdo da identidade no encontro mediado
pelo maquínico.
A relação meramente funcional entre homem e
máquina levada a seu extremo, um corpo que aciona a
prótese e é acionado por ela, exaure as possibilidades de
interação corporal e torna-o capturável pelas regras que
acompanham tais mecanismos, o kitsch .
III. Inconscientes harmônicos:

Os sons que nos precedem à existência e ainda estão por cessar são indissociáveis da nossa utopia
sentimental do silêncio: são a substância, a emoção de fundo, de nossas arbitrariedades harmônicas.
Através da musicæ , tentativa de apaziguar o tormento deste ouvir transconsciente à demasiado
complexa harmonia do mundo, reduz-se o foco auditivo a um espectro compreensível, e preferivelmente
confortável, das faculdades neuropsicológicas do ouvintecompositor. Esta relação ambígua da estética
enquanto a ordenação da complexidade , permite-nos tanto experimentar às transformações da audição
orbitando ao ideal simétrico sob a gravidade sensível-racional do corpo quanto encurralar no ângulo fechado
dos cantos entre melodia, cortimbre, ritmo e harmonia as infinitesimais arestas das freqüências de nossa
esférica escuta .
Deixamos que esta segunda imagem de harmonia reverberasse em todas nossas relações com o
musical dividindo os gestos de intuição-criação das de representação em palcos tridimensionais e
interpretação padronizada de instrumentos padrão, para encaixar o movimento no espaço, partituramos. Por
querermos controlar o belo e o sublime acabamos por destruí-los .
Sustentando este grande musical espetáculo da institucionalização da intuição, o som comprimido
em três dimensões serve de massa para as arquiteturizações pseudobarrocas de escadarias ascé(p)ticas de
compositores feitos ícones da seriedade sacra deste ofício. O músico reduzido a ator de música advoga seu
conhecimento da lei de seu instrumento masturbador, e virtuose que é, com o que resta do lúdico dado ao
erro, toreia o ruir sob o véu-técnica e este sistema especialista veste seu ídolo.
As disciplinas formais dos estilos, frente às quais se prostram estes tardios intérpretes copistas,
mascaram na logomítica marcha storia-scientia suas para-doxas religiosas de retroalimentação entre o
paraíso perdido da forma e a esperança no juízo final, confortando as estreitezas dimensionais de nosso
espectro de sensibilidade na linearidade do progresso, para enfim, na nostalgia do presente fazer da própria
existência ensaio de seu produto gregário, a obra . Reduzidas as músicas assim a A Música, objeto de
consumação: repetição dos resultados certeiros em lugar dos processos de devaneio através das
impossibilidades das certezas. Eficácia plena da gestão sócio-econômica do gozo fetichizado em um
refinamento cultural . A música tal qual o corpo, porém, é algo para muito além do prazer .
O que toca o humano ao tempo segue em cânone contra as barreiras culturais que almejam ao
estético estático. Entre ambos, fugas dos ouvires na contínua instabilidade do saber-poder, as ondas das
modas entrelaçam as harmonias das eras. O estudo harmônico para chegar aos axiomas da mathesis isolava a
música numa audição idealista. Relevando como ruído, a relação entre as incontáveis faculdades da ecologia
cognitiva de um ouvintecompositor, e ainda o vão-elo entre diversas subjetividades, estes inconscientes
harmônicos. As artes, estes organismos vivos evoluindo a uma velocidade estonteante entre nós, meros
hospedeiros , seguem porém se destruindo e unindo mutuamente em busca de uma harmonia
contemporânea .
A crítica à teoria das esferas através dos limites epistemológicos feita pelo sintetista logoi technai
deixa saltar aos ouvidos o religare entre crença e ciência no tetratkys . Nossas concepções harmônicas surgem
das consonâncias e dissonâncias para com os sons inconscientes, não o contrário, como se as estrelas
seguissem o princípio da humana música. Esta assunção verídica, porém, é senão uma arma numa velada
disputa entre dois métodos de cerceamento das possibilidades auditivas pelo controle na antropomorfose do
sonoro. Qual prisão seria a mais adequada para a intuição musical, o número ou a palavra? O cantochão
balbuciaria, os cantos gregorianos sussurrariam e a sinfonia em fortíssimo clarearia: ambos! O inegável
triunfo da ópera e da canção estão intimamente ligados à necessidade desta criação de uma audição dócil ,
conforme com a lei dos números, desta agricultura dos nômades sons, literaturização do gado ouvinte
humano . Neste sentido, o jazz foi de fato, como querem alguns , a continuação da música eruditista
européia, nela somando através da imagética de emancipação não mais que o cálculo rítmico enquanto
variável das sonatas modernistas.
O ideal da (de)composição moderna desemboca nas experiências limítrofes da dialestética sonora do
século XX iniciando a transmediação do texto e seu contexto na formação de texturas . Que sons queremos
que nos vistam? Como liberar as artes übermensch de nós? Passos primeiros duma nova estruturação das
sempre crescentes dimensões da existência humana, este eterno retorno ao equilíbrio entre o caos do ouvir ao
ruído-mundo e a necessidade da ordenação cristã dos rebanhos de mercados musicais, passam pela reinvenção
do músico de papel enquanto xamã do ritual-jogo do ócio, imanência do maestro , carcereiro panóptico e
metrônomo intensivo; em busca de um renascimento da música no espírito da filosofia trágica.
Dezessete Danças (Dos Sons e Das Escutas)

"-Escavar é a menor das quedas, Platão. Dance!


-Então cavemos, até afastarmo-nos da urbe
e sairmos desta orbe pelo outro lado, Dante."
0 + 17
Além das formas musicais dos pensamentos em suas melodias de sinapses harmonizando sensações e
memórias nos ritmos da vontade... Além dos zumbidos de nossos cérebros e ruminares estomacais
entranhando cantos sanguíneos e estalares de ossos e nervos, além dos suores e suaves rumores deste
submundo que nos conforta dos barulhos que são a cidade máquinamotor em combustão de assinfonias de
transes em trânsitos e tráficos em tráfegos... Além das britadeiras em petit jeté rasgando trincheiras e
brotando flores metálicas onde se lê em construção... Além das serras que mantêm os dodôs na quermeçe
circular dos vinis que erigem novos palcos para as velhas cenas... Além das chaves caindo, das portas fechando,
dos muros pixados pelo salto do le parkour... Além da acusfera terrestre, as estrelas dançam uma larga
harmonia, território das forças abismais na nossa queda para o alto. Dinâmicas de forças sutis e grandes
demais para nossas sensibilidades imergidas nelas, onde a radiação eletromagnética ondula sua
auto-propagação pelo tempo espaço e a dança não pode ser separada dos corpos. Um ovo não se larga, mas é
posto delicadamente num lugar protegido.
Tal como a escuta decodifica não mais que uma faixa mínima do espectro eletromagnético, a vida
ativa geradora de movimentos cinéticos como a conhecemos só atua também numa pequena área das
grandezas conhecidas. Como o som está para a luz, a vida está para o movimento físico.
Um campo magnético variável no tempo gera um campo eléctrico, um campo eléctrico variável com
o tempo gera um campo magnético, e com isso chegamos a uma auto-sustentação entre os campos eléctricos
e magnéticos. O som e o toque são variações de uma mesma energia, dança e música são uma e a mesma arte
em dimensões distintas. Como sentiríamos o silêncio sem todo o ruído? Maxwell e Faraday dançam um
foxtrot nas linhas telefônicas.
Atrás das cochias alguém briga consigo tentando conter seus pensamentos, como se o palco fosse um
abismo e as idéias fossem pesos que a impedissem de voar (qual notas sem melodia por entrar num ouvido).
Ela diz a si: Teu próprio intelecto, que agora é vazio, mas que não se deve considerar como nada, e sim como
intelecto em si, desimpedido, luminoso, estimulante e feliz, é a verdadeira consciência, inseparável do grande
corpo irradiante, não tem nascimento nem morte: é luz imutável. Que pobre tola sou eu! Estava iludida que
era boa, mas percebo agora que aquilo me ultrapassa e muito!
Observe o filósofo sentado à cadeira no meio do labirinto de suas transparências. Seu corpo é uma
estrela que os olhos, de outros galáxias, devoram porque os olhos são bocas que dançam os sabeores da luz,
suas cores.
1 + 16
Sal... Mercúrio... Enxofre... Soam os
três sinais e começa o espetáculo de dança,
o teatro é um ovo e sua escuridão inicial
fala do vácu0 e suas potências.
Somos um timbre, instrumentos
afinados pelas gravidades que clamam por
nossos pesos. Meu corpo se distingue da
lâmpada porque ele é percebido
constantemente, como um timbre se
distingue de uma melodia porque o
violino continua lá depois de finalizada a
cadenza. Ovo visto de fora é pedra.
Tensões às cordas fazem o peão girar
sobre o próprio eixo. A postura do ovo é a
reação mecânica do corpo a suas próprias
ações, muitas traquitanas possuem os
corpos. Quanto do texto não está nas
pontas dos dedos que prestidigitam? Todo
o espaço obscurecido. Gordura reúne
carne à cartilagem.
Caso alguma luz houvesse
poderíamos ouvir o aquecimento de sua
lâmpada e cada dança surgiria como uma
enunciação das paixões-cromas, mas o
próprio espaço cênico é um discurso da
ilusão. As paredes dançam sua queda.
Muitas paredes se parecem, mas cada rachadura é única. Sondamos as rupturas como rompemos as
sondagens e abandonamos as tipologias de dança.
Não acenderá? A dançarina ou o dançarino quer que só ouçamos o corpo desta vez, quasar nu? A
atividade sua gera um movimento imperceptível como tal. Impulsiona tudo o que se move no espaço, fluxos
de consciência e fontes de nutrição da imaginação. É energia, som que se faz luz, vontade cuidadosamente
concentrada e o paradoxo. Ah! O paradoxo! Coloca-nos face a face com a natureza dupla: unidade e sizígia.
Torre de marfim, o corpo.
A dança aceita todos os sons e escutas mas em si mesma não busca música alguma. O linólio retorce
friccionando a madeira que enverga as estruturas até que o teto se range, estes sons beliscam a cera no ouvido
da moça na platéia que sente um tremor na espinha que vai dos cabelos até a espuma do assento vermelho
onde se espalha por toda a fileira até ser sentida no cóccix de um senhor que tosse. Talvez agora esteja parado
sobre o palco, tensionando-se em pausa para criar este silêncio constrangedor, um dedo aponta o teto que
cairá e o outro o arcabouço sob nossos pés.
A paixão eleva-nos não só acima de nós mesmos, mas também abaixo dos limites de nossa condição
mortal e mundana e, ao elevar-nos, ela nos destrói. Esta ascensão que a música impõe à dança encontra na
construção da torre de Babel sua expressão logomítica: tomamos o caminho mais difícil para a adaptação
comum, a linguistificação dos atos e a perseverança do trabalho.
O solo sabe cair para todos os lados. Os grãos têm todas as articulações: flexores-extensores como
dedos, abdutores e rotadores como coxas, pronadores, projetores e constritores. A pessoa com amor-próprio
ferido reage como alguém que foi empurrado e se contrai para não cair, ou abre os braços e abraça a queda da
terra. Nijinski nada na piscina protéica no seio da Mar.
Observe como o filósofo cai no vão entre seu texto e sua voz.
2 + 15
Há uma emanação que surge do palco escurecido, uma phanopéia de sons ou uma melopéia
imagética, que impregnada na platéia faz todo teatro emanar uma tacitologopéia, dança de intelectos através
das palavras não ditas. Ainda revestimos os corpos de palavras para tornar a dança um livro.
A dança intui os processos de controle do desejo almejando somente à intuição mesma desta. Cada
escola de dança é um discurso sobre um conjunto de enunciações. Aurora Consurgens. Frida vira as páginas de
tintas com forma.
Suores escorrem a pele, os músculos se contorcem, um gemido talvez.
A lucidez da escuta repousa nas sementes escuras que racham silêncios dos barulhos, nascem plantas
dentro a ovos. Mídia significa entre, nem isto nem aquilo, algo intermediário, geral, neutro, agente,
transporte. A escuta está imersa no ruído ambiente e no ruído musical, espírito de sua época. A escuta é
absorvida e moldada por estes, às vezes ela até representa a si mesma. Ela então capta 'o que está no ar', o que
o ambiente não pode ou não admitirá, mas que é, não obstante uma parte dele. Algo está sendo tecido ao
fundo do palco.
Diálogo do corpo com o corpo, o ruído se volta a música e diz: "Não me espere nem siga, dança."
Pax de deus erótico da tauromaquia, uma animação em stop-motion de breu e escuridão, o valor de um gesto
na dança sobre o palco está no fato de que tais atos são preenchidos pela idéia de que foram trabalhados. E
quem conseguirá descer do palco? Uma faísca é ouvida sem ser entrevista. O nervo do dedão do pé se conecta
ao córtex como cello.
A evolução mecânica tendendo sempre à entropia e ao desperdício da energia material, não deixa
brechas sobre o desfecho final da dança. É necessário nascer e isto de nascer sempre foi um problema sexual e
continuará sendo. Ao mesmo tempo casta e sensual, a dança transborda também os desejos insatisfeitos
do corpo e seduz o corpo com a tentação do sublime.
A dançarina está lutando pelo biopoder deturpando a verdade de seu corpo, manipulando
eroticamente platéias de maneira desleal em seu próprio interesse. Construtora inflexível que insiste em
manter o que construiu apesar de (e com) seus conflituosos aspectos que provocam desagrado, repugnância,
medo, e em geral perturbam e desordenam a vida e a auto-imagem do público, a dançarina obviamente
redime-nos dos velhos
padrões de ajuste à vida e das
personalidades que se tornam
cada vez mais frias e rígidas
com o tempo, tornando-se
auto-opressoras e limitadoras.
Pressão interior de uma vulva
visando a entumescência; é o
princípio de um compromisso
corporal, da estruturação da
pele como organizadora
nervosa, da estabilidade da
pulsação sanguínea e do foco
mental, gestação de
autoconfiança, e um riso
sereno.
Observe as mãos
suadas como se trabalhassem,
os olhos injetados como
vissem pessoa amada, os
lábios secos para que as palavras saiam como entram, a carne tesa para que os pés deste filósofo se liguem à
cabeça.
3 + 14
A composição de uma afinação da
composição ela mesma. A dançarina é o
corpobra desvencilhado. À parte quaisquer
aspectos teóricos, terá de encontrar um
instrumento de si que dê conta da poesia que
talvez nem quisesse contar, mas que já não
pode conter. Precisará ser tocada por todos
os públicos: puta existencial, filósofo
corpóreo que é. Ouvem-se os encanamentos.
Afinar é uma das artes da purificação, onde
através de distintos filtros se retira o
supérfluo para um certo foco da escuta. Os
processos molares magnéticos - e a música é
um - funcionam por simpatia e antipatia de
forças, tal que os instrumentos musicais são
afinados em vista das diversas reincidências
de encontro energético entre as propriedades
tímbricas dos sons. Já os processos
moleculares químicos - e a escuta é um -
funcionam por solutio, dissolução no sentido
concreto, mas também a solução de um
problema pela concatenação de tensões
harmônicas para a consistência fluida.
A dançarina estrutura uma sintonia
harmônica entre os sons e as escutas, ela é
um campo de batalhas onde música clama
por uma representação e um puro erotismo para com tudo ao mesmo tempo. Fluxos e refluxos irrompem a
quarta parede modulando as funções do corpo mostrando que estas mudanças podem ser experimentadas
diariamente. Andaimes arrastados.
Ouço piscar de olhos. O palco é também um olho e foram os ouvidos que nos equilibraram de pé,
lembra? Sons de três ossículos, do tamanho de grãos de arroz, pulsando sangue que vibra nervos que
traduzem fonemas.
O teatro é uma discussão do relacionamento entre o corpo produtivo e o organismo receptor. A
dança é a forma do sexo. Uma dança sem teatro é pornografia ontológica, um teatro sem dança é psicanálise
lógica. A montagem do espaço cênico está próxima da sensibilização da criança no início da propriocepção,
uma descoberta das possibilidades do organismo, dos discursos já impregnados na carne do espaço e as
entrerrelações das poéticas nesta política. Ainda ressoam os harmônicos da afinação que foi feita daqui.
Alcova, ninho e toca, a terra não tem limites abaixo em nossos sonhos.
É nos invernos da memória que se atualiza o lar de uma casa, sua máquina de afronta ao cosmo e
nisto as vigas de sustentação tremem, respiramos o mesmo ar cheio da poeira de nossas peles despregadas,
não há momento que consigamos estar juntos sem alguém falando. O espaço seduz-nos com a intimidade a
agirmos, a movermos os cômodos de lugar, os centros de solidões, os tédios. Paixões agrupadas nas salas da
construção de mais um corpo sem órgãos, outra obra, outra peça das partes.
Observe como enfim o espaço adentra os poros do filósofo que pode ouvir o que o circunda. Dê
particular atenção a como toda a arcada se reestrutura para ajeitá-lo na cadeira, o mundo.
4 + 13
A dançarina interfere no mundo dando corpo à harmonia ainda irreconhecida que lhe é. Instaura um
procedimento formal corporal, produz de um organismo estético, prolifera os valores necessários a este
processo de biopotência. Seu corpo é mídia sem fins, sintoma e doença. Ao invés de cair de joelhos, atire os
seus ao infinito, não confundindo potência e poder.
As dançarinas são a resistência civil pacífica dos gestos incomuns colocados no cotidiano contra a
docilidade social do movimento, o controle do corpo pelo utilitarismo gestual. A posição e oposição inerentes
ao corpo, feito de resistências, exceto no coma, no transe, no sonho, no sexo com amor.
A dança da morte une a todos. A negação de um saber é justamente o motivo de sua enunciação. Todo
movimento humano se põe e opõe à gravidade. Estátua ideal que cada qual esculpe para si, sem querer, e que o
representa exactamente aos olhos dos outros. Encarna! Incorpora! Soa!
A dança macabra conduz a fila de figuras de todos os estratos sociais dançando em direção aos seus
túmulos. Percebam como todos se movem como cadáveres. Só uma face do som pode ser ouvida, a outra
silenciosa aguarda-nos.
Quatro classes de ídolos assolam nossas mentes antes da finalização da obra cadavérica. Ídolos da tribo
humana fundados na própria natureza da espécie que tende a se crer como medida das coisas no lugar do
indivíduo, ídolos da caverna de cada indivíduo que refrata as luzes das estrelas de modo distinto devido às suas
inclinações ou à admiração que este mantêm com seus amados, ídolos da praça do mercado nascido da
convivência entre as cavernas e do discurso nascido pois as palavras são impostas segundo a apreensão e criam
problemas seja entre eruditos ou vulgares, e ídolos do teatro que migraram a partir de vários dogmas
filosóficos e de leis científicas igualmente artificiais fora do campo de atuação propostos. Bacon retratado por
Bacon.
Os dançarinos como estrelas não podem aproximar-se demasiado uns dos outros ou suas afinações
engolem-se gerando uma
neutralidade coletiva. Nem
tampouco afastarem-se muito
pois explodiriam o palco
timbrístico numa brutalidade
inarmônica aos ouvidos
médios. Uma compania de
dança é uma constelação
afinada por algum desejo
corporal comum, em sua
maioria monetário. O teatro é
uma cubo mágico que contém
uma câmara escura.
O palco é o simulacro
quadrado da sociedade para
descrever os mortos, pois de
fato, em tudo eles se
assemelham aos vivos - exceto
pelo fato de que não tem
vitalidade, que formam uma
aldeia inviável. O cadáver já não é. Sem trocas ou alianças, tal virtuação é um corpo social morto, ficção na
qual o pensamento é reduzido pelo nihilismo à anatomia dos dadadramas individuais num dadarama
tragicômico. Shiva faz dado da cabeça de Mallarmé.
Observe como cada palavra treme o corpo do filósofo e que tal tremor também o faz rever o que
escreveu dando ênfase a certos aspectos de seu canto.
5 + 12
Dança, tende à verdade nós,
pensadores, agora e na hora de nossa
música e não nos deixei cair em trompe
l'oeil, além. Goteja uma clepsidra.
O regente de orquestra está
dançando no exato ponto entre o mestre e o
engodo. Dança é a performance do
professor também. Reduzimos os refúgios
de nossas musas ao reduto de nossa
autoridade de autores, a ágora obriga-nos a
subverter nossas relações em políticas.
Conseguiríamos calar nossas vontades
tempo suficiente para ouvir nossos tantos
corpos, porém?
A dança ensina-nos a agir
modelarmente sacrificando-nos à
pedagogia do sensível, este centro
gravitacional junto aos órgãos genitais. O
cultivo deliberado e cuidadoso da
propriocepção (a percepção das próprias
forças) é o melhor método que se pode
desejar quando se pretende atenuar ou
desfazer as confusões mecânico-afetivas
entre sujeito e seu entorno. A mais
superficial das formas de consciência é a
verbal. O esquema tensional (ou
intencional) é aquilo que dá forma, organiza, exprime e realiza a consciência afetiva. Num espaço cênico de
dança, os dançarinos são o que menos importa.
O teatro é o correlativo cultural da igreja e do banco, nele se dá o culto ao homem culto, e à economia
de valores da sociedade de trocas de objetos de consumo e manutenção dos papéis de atuação (ações da bolsa
subjetiva). O teatro trabalha com a ilusão de um espaço fechado e ainda mais amplo que a realidade. Onde
assistir à peça é aceitar o destino provido por um deus ex-machina e a usura da sabedoria cinética. Assim
como a dança é contra o destino, o ruído de uma platéia é contra o script. A arquitetura que separou sala de
concerto e poluição sonora também igualou a acústica espacial de hospitais, escolas, escritórios públicos,
manicômios, presídios e mais tarde edifícios e centros de compras. A câmara se escondeu na sala da técnica.
A mais-valia sobre a movimentação, o discurso da técnica utilizado na dança, esvazia os laços sociais
dos corpos postos em competitividade cinemática e disciplinarização sistêmica, assim reduzidos a máquinas
de proliferação genética das ideologias além-simbólicas embotidas na tecnocracia cientificista de uma certa
vertente de mobilidade-modelo. Quando picados por um inseto, não precisamos pensar nos eixos corporais
para ter na ferida, por que se demanda de dançarinos e músicos metas logicamente discernidas?
O capitalismo cognitivo organiza a carência, a necessidade e a pobreza que surge como produto de seu
funcionamento, inscrevendo-as em dispositivos e mecanismos tais como programas de assistência, subsídios,
fomentos. Do mesmo modo que a cognição dos valores é esvaziada de verdade atual e a movimentação
cotidiana é esvaziada de dança. Tapumes martelados.
Observe como o filósofo não percebe o próprio corpo, mas se torna ele mesmo não mais que a voz
muda da bailarina. Sua carne está entumescida em poesia que desconhece, é um sistema nervoso da natureza.
Está de pau duro.
6 + 11
A dança fetichiza o corpo técnico para enfrentar as tecnologias de bestialização dos corpos.
Um ogro para cada bailarina, um automóvel para cada perna. Haka e danças de guerra enquadrada dentro
do jogo de rugby.
Só há uma teoria para compreender o vivo: a dedicação individualizada. A carne tem um pensamento
próprio, não se abstrairia, mas fixaria o saber nos corpos. Só há uma técnica para o cultivo da individualidade:
sensibilidade para as diferenças. Há milênios - desde os filósofos gregos - a humanidade vem exercitando-se
na percepção das semelhanças, do regular, daquilo que se repete invariavelmente - a lógica ("aristotélica"). Foi
esse treino bi-milenar que floresceu na tecnologia contemporânea e na sociedade de controle meritocrática do
capital cognitivo-afetivo dos nepotismos funcionais em rede, que é uma imensa promessa de libertação
(quem quer participar da dança com as estrelas! ?). A vida se tornou teatro, Poe! Sons de catracas, ar
condicionado.
Liberdade - lembremos - essencialmente negativa: liberdade obrigatória que não permite que nós
embruteçamos ou animalizemo-nos no esforço físico extenuante, monótono, áspero e eternamente
improfícuo da dança selvagem dos ímpetos; deixando ainda a poucos resistentes o bastante energia restante
para se humanizarem. Depende de como você ouve os sons da ciência, Artaud.
As danças de acasalemento são antes do pavoneamento de uma técnica, o casamento entre duas
danças químicas dinâmicas e corporais. Ballet no pole dancing, passa-passa para os gumboots. O erro mais
fundamental que a representação trouxe à dança foi o de tratar o vivo como se ele fosse mecânico, de fazer
gestos de amor como se a pessoa amada fosse a imagem da pessoa amada, gestos de apelo como se a pessoa
para a qual se apela fosse um galho ao qual nos agarramos. Tíquetes sendo impressos, destacados, jogados
fora.
Parecerá ingênuo
o que vou dizer, mas é
básico: Para a viga de aço
que sustenta este
subsolo, para uma
engrenagem, um
transistor desta
aparelhagem sonora, ou
uma turbina de
resfriamento, dez graus
de temperatura a mais
ou a menos, dez
centímetros de mercúrio
de pressão a mais ou a
menos, um dia de chuva
ou sol antes de aqui
chegarmos, mato tomar
a cidade ou uma grande
desertificação das ruas, o
surgimento de um
vulcão na avenida
paralela, o sexo fabuloso
e a insônia consequente deste, faz pouca ou nenhuma diferença. A coisa mais admirável na máquina, esta
magia que negamos que nos fascine tanto, é sua constância (a repetição de seus movimentos ensaiados).
Observe como ele agora também te observa nos olhos, mais adentro ainda, ele se observa por seus
olhos. Ele que agora é puro videar. Em todas as relações pessoais vigora uma relação óculo-motora muito
viva e muito rápida - bem mais rápida que a de palavras e intenções e afetos. Antes de olhar, os olhos servem
para nos orientar e manter-nos de pé como a escuta nos pôs.
7 + 10
É pela repetição que se reúnem
atividade e competência, e se distinguem
para dançar entre si improviso e moda. Daí
que o ensaio seja também um grande
catalizador de modificações para o próprio
improviso. Mas não há ensaio para a vida e
achar que um ensaio seja menor que um
romance aiônico é problema da maioria dos
cronistas. São cavalos passando a trote sobre
o teto.
As danças alteram as formas de uso
do vigente no contínuo fluxo de
procedimentos experienciais do corpo. Suas
roupas podem tornar-se anexos de teu
corpo, mas permaneça nua até que eu cesse
de sussurrar. O primeiro e derradeiro
suporte da pintura é a pele, todos os outros
materiais são senão extensões da pele. A
percussão corporal entende pouco das
sutilezas da pele.
Mülher, acho basicamente que a
literatura existe para opor resistência ao
teatro. Só quando um texto não pode ser
representado como teatro, é que ele é
produtivo para a cena. As estrelas fixas no
firmamento delimitam o olho.
Os corpos humanos estão em corpos sociais em corpos arquitetônicos em corpos celestes, e estes,
entre outros sete que vemos criam corpos sonoros da mesma maneira que meu corpo linguístico enquanto
vos falo.
O mais fundamental na coisificação do vivo é a constância da relação. Como um instrumento foi
feito para tocar músicas dentro do sistema vigente de escuta cultural, nunca fazemos com ele nada mais que
isso. E essa constância é o que se espera das pessoas emocionalmente maduras: que se possa confiar nas
pessoas e contar com elas. Se não fosse assim teríamos que inventar novas escutas e escalas e instrumentos
continuamente. E a música seria só mais um ruído na resonância estocástica da faixa sonora do espectro
eletro-magnético. A roda do carro é só outra engrenagem na linha de montagem, eis a maldição de Ford: o
modelo muda, o som motor não. Enquanto não param os carros não falem do barulho, enquanto
carburadores queimam não reclamem dos cigarros. A dança realmente popular, não vai vingar na grande
mídia, por isto resistirá. Quando o samba foi cooptado pelos cruzeiros transatlânticos, outros sambas
bailavam além dos fomentos. Repetição da diferença, dobra o origami e tens o balão na boca da personagem
chamada Ópera, e ela diz: "Os olhos que observo no espelho são o de um observador, mas estes mesmos olhos
são dançarinos. A cabeça é um peixe que somente nada ligado pelo botão da rosa córtex à espinha dorsal,
flauta vertebrada em dança látero-flexiva, peixes verticais que somos."
Venha dançarina, erótica como uma batida de carros, se atire contra meu peito. Me penetra com essa
energia orgônica cromada. A música é demasiado conceitual e acadêmica, nós queremos o êxtase puro do
ruído.
Observe como o filósofo provoca você, te tira do conforto de tua cadeira, rapta tua sensibilidade e
pede que se sente em sua língua fazendo morada na tua pele.
8+9
Ajustamento à espera, calma, cala e a paciência. Nada ainda de ver os corpos. Talvez sejam braseiros
do breu de um fogo lento com mais de quatrocentos mil vetores em variável contínua, temendo ultrapassar
os limites do cuidado de si. Mas ainda talvez nem haja ninguém no palco e sejam máquinas a disparar os tais
sons que imprimem suas presenças. Folhas secas.
A impaciência floresceu dos teus desejos e os sonhos te abandonaram o corpo, já sem imagens ou
palavras que resguardassem-te de ti, que sem disciplinas desejantes pôde calar. Construía sua dança como um
puro exercício de metamorfose: crisálidas de seda que se abriam com asas de falenas, batidas a-rítmicas das
dobras e desdobras. Mais do que se parecer com uma mariposa, criatura do passo e do desejo do movimento e
do consumo, ela ardia noites. Loïe Fuller partiturava as pausas e pausava as partituras. Galho quebra.
Como o resultado da produção dos bens transáveis, a dança enquanto produto cultural, ou enaltece o
biopoder consumidor realçando a ilusão técnica sobre o corpo ou se dispõe como impotência criativa na
produção de mais-gozo aos detentores dos meios de produção. Hijikata, Robison Crusoé em Walden pôde
notar o trágico jogo cênico entre o dentro e fora do palco, auto-regulação do que soamos e do que ouvimos
deste soar. Unificar vida e arte é difícil como equilibrar uma balança com um corpo só pulando entre dois
pratos. Instrução hipotética, debate argumentativo, decisão intuitiva. Qual a imparcialidade da escuta quando
colocada nas questões entre os órgãos? Por que a escuta? Os pratos da balança caem, um corpo rola e tudo se
silencia... ...
Ninguém dança aqui agora. A dança embasou um aparelhamento dos corpos pelos códigos de
controle sobre os atos. Não vemos as pessoas dançarem nas ruas (nem mesmo as que se proclamam
dançarinas), elas marcham. E a rua é para o urbano o que a estrada foi para o social, como a ilusão da
interação das linguagens de programação substituiu a programação televisiva no imaginário de poder sobre os
corpos: representação videocrática.
Entendia-se por esquema corporal um resumo de nossa experiência sensível capaz de oferecer um
comentário e uma significação à interoceptividade e à propriocepção do momento através de esquemas
cibernéticos. Fornecia-nos a mudança de posição das partes do corpo para cada movimento executado na
estrutura, a posição de cada estímulo no conjunto e suas dinâmicas de alteração do equilíbrio dos órgãos, o
balanço das impressões cinestésicas e articulares do momento. Para cada espaço corporal, há também um
corpo espacial que projeta mudanças ambientais sensíveis.
Observe como se cala o filósofo e assim se faz poeta, não só as palavras e a voz e os sentidos se
retiram, mas um corpo de barro oco se reveste de universo e nada diz. Queremos o silêncio, mas este insiste
que berremos.
18 - 1
O sapateado do senhor Bojangles. Dos
controles sobre a movimentação cotidiana,
toda impossibilidade física e psíquica com a
qual lida a dança é vista como impotência. A
dançarina é o corpo enlouquecido pela
hipnose estética do entretenimento.
Corpobsoleto à escuta do braço de Stelarc.
Circuit bents.
A arte sendo a mais perigosa e inútil das
tarefas sociais e a dança sendo a mais inútil e
perigosa das artes. Um músico ainda pode se
tornar um matemático ou programador,
uma cineasta pode servir ao ministério da
propaganda, uma pintora ou escultor pode
vir a ser um designer de produtos, mas uma
dançarina ou se torna uma terapeuta de
esportistas ou vira puta.
Uma escola de dança é a somatória das
defesas de um grupo de indivíduos, e estas
estão sempre expressas e atuantes em suas
atitudes e em suas condutas gestuais. Ela
define com precisão um campo de atuação
corporal possível. E contra isto só o ímpeto
individual pode se erguer quando dispõe de
micropoder ou loucura suficiente para tanto.
Chove e ouvimos a água na terra.
Dança desenfreada sobre a chama cegadora, orgânica e sem organização. Ética instantânea do desejo
como dever e às vezes do dever contra o devir. A propiocepção transforma a mecânica corporal em sensação e
neste ato torna as forças musculares, forças da consciência - ou do inconsciente. Asas batendo.
Estátuas, golems e vudus teleonomizam: O problema da mecanização do trabalho e o mito da
máquina, muito antes de existirem como problema social, existiam já como problema subjetivo, organizando
e governando a maior parte das relações interpessoais e o funcionamento de muitas sociedades disfarçada nas
danças, nos passes mágicos que foram ter no mesmerismo.
Uma primavera secreta, quando a semente verde brota da terra infecunda, trazendo a promessa de
colheitas futuras. O verdor, a lepra dos metais, a imanência secreta do movimento na paralisia do
desdançarino butoh. Os espinhos da carne, a aceitação dos defeitos sem os quais não há progresso, o
desmentido doloroso de todas as pretensões idealistas, os resquícios de terra sob nossas unhas. Não há lado
escuro da lua, ela é toda escura.
Sair de si às estrelas, o ovo cai em vôo e se escuta a mudança que pare a tourada da produção de
composições com ímãs e soluções químicas, os ídolos são pisoteados na dança macabra dos sócios, o maestro
se sacrifica à clepsidra da performance para liberar os marionetes de carne e as engrenagens das estruturas, a
roda do carro estomacal, o silêncio da balança de ossos.
Muito simples. mas o que é simples em geral é sempre o mais difícil. De fato o minimalismo musical
demanda não só uma mudança radical no modo de ouvir e soar, mas uma mudança de velocidade de vida,
Boulez. A simplicidade demanda a aceitação de si mesmo e de seus modos de escuta.
Observe como o filósofo respira os conceitos e cheira os olores do fruturo, nele o corpo é só um
sistema respiratório.
19 - 2
É só uma brincadeira de crianças ao sol de luzes artificais. Me editação, a dança é uma reza corporal
abstraída dos ritos. Imanência da fé material. Entrega espiritual ao mundano que personifica o conceito do
que anima.
A secularização do corpo moveu-o do eixo religioso 'lugar sagrado' (templo do tempo), permitindo
uma manipulação interventiva até que esta se torna o novo cuidado de si. O mesmo ocorreu com a loucura,
que passa de um delírio das forças divinas a mera alteração cérebro-mental. Pina à sétima porta.
A pele está viva, Isadora. Quente superfície elástica, que contém o sangue respirado, saco que encerra
todos os segredos entre pensamentos e energias. O desejo move cada gesto, mas cada gesto do desejo
desencadeia uma certa relação com a morte. Um bisturi abre a cortina de um lado a outro.
A metafísica da dança acabou buscando a realidade das coisas além do tempo dos corpos moventes e
mutáveis, onde terminam nossos sentidos e a consciência percebe-se. Deste modo, não podia ser mais que
uma disposição mais ou menos artificial de conceitos, uma construção hipotética. Pretendia ultrapassar a
dança com uma ordenação musical desprendida da escuta (ordem geométrica sem sons), porém só substituiu
a experiência do ruído por um extrato detido, seco, vazio, por um sistema de idéias gerais abstratas,
arrancadas destas mesmas experiências ou, pior, de suas cascas mais superficiais. Música é a dança sem corpo.
Deixa eu soprar todo teu corpo e lamber todo teu corpo e arranhar todo teu corpo e beijar todo teu corpo e
morder todo teu corpo e chupar todo teu corpo. Deixa eu te ouvir.
Ponha uma mão contra a outra em posição de prece, pressione ambas contra ambas, qual é a tocada e
qual toca? O corpo surpreende-se a si mesmo quando se encontra em reflexão. Ulay fazendo sozinho suas
performances, desorientado berra no museu vazio 'Caos reina!'. Corvos craquejam, abre-se uma garrafa de
refrigerantes. Sons de escalpe, coração de feto em contraponto.
Nunca foram lidas pela humanidade as obras dos grandes poetas, pois apenas outros grandes poetas as
podem ler. Têm sido lidas tais obras da mesma forma que as multidões lêem as estrelas. Da mesma forma que
os críticos têm lido os movimentos das grandes dançarinas. Em sua maioria aprenderam as pessoas a dançar
para exercitarem aerobicamente seus corpos, como aprenderam a ler para suprirem-se de armas e aprenderam
a contar iniciados pelos delírios das moedas. O centro do planeta, estrela soterrada.
Foi preciso que um rio violento como o Archelous estuprasse a musa da dança Terpsícore para que
nascessem as sereias, os cantos são efeitos colaterais da respiração do fluxo. Cunningham enrabando de John
Cage.
Observe como medita o filósofo sobre seus próprios gestos e idéias.
20 - 3
Na dança a ontologia (saber do ser) é
substituída por uma enteôntica (ser das
coisas). Na dança o ser se entifica no instante
mesmo em que os entes são objetificados.
Quando eu era o ambiente, você se refugiou
no tempo.

Não parece com, é!


As danças sociais desenham os movimentos
das distintas manadas de estilos de
micromovimentação. O jóquei de faixas de
festa não cria música, cria dança
diretamente. As geometrias hierárquicas dos
salões vienenses vitorianos estão todas
expressas nas peculiaridades de sua gafieira.
Cartas de xadrez.
Para quê criar imagens do corpo humano,
para quê tentar retirar-lhe os contornos,
quando existem a realidade, a verdade, o
próprio corpo? Por que insistem que eu fale
sobre minha dança, meu amado poeta? Para
te desarmar desta energia, minha rara. Como
preferir a sombra ao objecto, ou o modelo ao
original? Como clamar a idealização do que é
e te nomear saudade, amor? Os animais, as
plantas, ou os demônios que se alojam em
cada objeto como num manequim, podem o dançarino dançá-los como o bufo veste a máscara, visto eles
estarem fora. Mas a própria pessoa? O seu rosto, os seus membros estilhaçados, o seu ventre partido, sua
cabeça aberta, o seu sexo em mim, as suas costas arrepiadas ao toque mais leve, os rins, os ombros? A verdade
do corpo humano não é transmissível, não é estranha, não pode do exterior ser espiada. Mais que bela, a
dançarina é de belezas.
O denominador comum a todas as escolas de dança em qualquer período dado da história é este: a
maioria das pessoas reage mal ante uma situação móvel, que exige a cada instante um reajuste intencional e
motor, o que leva o dançarino ao ritornelo ensaio-repetitivo. Não é possível um reajuste intencional sem
'estar presente', sem 'tomar consciência', o que justamente vai de encontro com as necessidades da dança. Um
dançarino ideal haveria de passar por todas as escolas de estilo coreográfico com louvor sem jamais de fato
prender seu corpo a nenhuma forma das propostas, mas isto inevitavelmente o levaria a fundar uma outra
escola.
As formas corporais não podem ter caráter senão a partir do momento em que nós mesmos temos
um corpo. Fôssemos meros observadores, o princípio estético faria algum sentido, mas somo seres estésicos e
nossa vivência das artes e principalmente da dança é estésica. Daí que previstos de corpos que nos permitem
saber o que é o peso, a convulsão, a força, etc., acumulamos em nós mesmos as experiências que nos fazem
capazes de compartilhar, de sentir o estado das formas exteriores a nós. Involuntariamente somos nós que
animamos as coisas.
Observem o filósofo ele mesmo, o devorem. Deliciem-se em julgá-lo, zombem dele, se apiedem,
imaginem histórias pessoais de paixões, como será sua genitália exposta? Engulam-na, engulam-no.
21 - 4
A dança pode ser o deleite puro da autopoiésis e também a certeza de que esta é justamente feita no
prazer de ser. Mas o maestro regendo a orquestra goza do dever já realizado. O diletante não compositor é
como um compositor sem diletância, mas poucos conseguem chegar a um dos extremos.
A dança tornada discurso do 'mais gozo' (pense nas bailarinas dos programas de auditório) se torna a
mais-valia do corpo ready-made definido como mercadoria pela agregação de trabalho a si e à sua linha de
montagem.
Nossos gestos obedecem a um ritmo e a uma simetria direito-esquerda ou esquerdo-direita.
Considero que este fator psicológico desenvolva um papel importante na cognição estereofônica binaural da
escuta, tanto como o espetáculo da simetria tem nas figuras animais e nas composições musicais de
harmonias e melodias. Se a simetria é normalmente horizontal e rítmica (como nas lâminas de Rorschach e
nas síncopes) e poucas vezes vertical e harmônica, é, sem dúvida pela distinção de uso dos pés e das mãos.
Uma carta rasgada.
As hierarquias coreotemporâneas têm uma concepção decididamente dinâmica das formas simétricas
da arte ornamental da dança, vistas não como temas ou entidades inertes, mas como transformações
operativas: movimentos em espaços abstratos, combinações estruturais de conceitos e procedimentos,
metamorfoses do código a subjugar o corpo obediente de dançarinos operários bem como dos intérpretes e
ouvintes por parte do compositor maestro.
A loucura como arcabouço da cooptação do sensível pelas forças reativas que tranformam toda
resistência em impotência: Fisicamente pelo cansaço, falta de gozo, excesso de atividades que não ganham
mundo nem resolvem os problemas pessoais, a aposta sempre num imaterial que não se atualiza, o desgaste
excessivo de movimentos repetidos como se ensaiássemos para viver a dança. Pela cegueira psíquica do
excesso de certezas e(ou) dúvida dos fins e meios utilizados, rasgações de seda e criticismo inútil, todos os
vícios dantescos, o fechamento para o outro, para a diferença evidente. Nossa miséria com um mundo de
corrupção, traição, conspiração, o excesso de lixo que é a arte. A retroalimentação da resistência que gera
resistência, a importância e hierarquia que vai sendo produzida dentro do próprio grupo, a resistencia a nós
mesmos, aos nossos próprios projetos e sonhos e linguagens, o mundo tornado micromundo com todas suas
punições e injustiças, seus ídolos e representações contra o qual se erguem redes de ensino aformal, de
vivências da dança não estetizadas, de intervencionismos aespetaculares, de bodyhackings, desprogramações
poéticas, afetos imediatos: danças no escuro.
Observe como o filósofo escuta cada tilintar desde as estrelas até aqui.
A dança é a música das escutas. Ouçam a filosofia da dançarina.
22 - 5
Uma árvore plantada no pescoço,
laminanimal, não é nem será o bastante para
dançar o delírio das órbitas comer os
próprios tecidos mortos como bebesse fluxos
de suas vidas, banquete de amores teóricos
ou sapiência da mendicância. O cór pó e sua
prioridade pravida em embate à propriedade
privada. És! Já não a espera, mas insone
brusca, carnaval ele mesmo. Rende, ris, veias
das ramagens. Quando repleto de aquários o
mar, como distinguiremos a água dos
cristais, as transparências dos limites?
Na dança vivenciamos o espaço do
descontrole lírico porque nela nos
esforçamos em só controlarmos a nós
mesmos percebendo um limite tênue e frágil.
Os dançarinos viventes em nós (proteínas,
celulas, acúcares, adn...) são todos
assimétricos. A assimetria esquerdireita
acimabaixo é intrínseca à vida, corresponde à
vida, está presente infalivelmente em todos
os organismos, desde os virús passando pelas
enzimas, os vermes e os humanos. E num
vento estelar vai-se tudo. Observe como o
filósofo é a dançarina, como dançam os dois
fazendo amor. Fédon, escravo de Sócrates
dança sobre o vômito do general Alcibíades. No centro do corpo está o fogo ardente da existência, cujo brilho
docemente ilumina o envelope da pele. Tudo em ti de memórias - e isto me inclui - se chocam até que
põem-se a traçar as suas sarabandas de sinais, até que toda a mobília da sala te envolva como crisálida, os
cursos das gotas de suor, as cicatrizes, as rugas, os vergões, a respiração e os teus cheiros todos.
Posso ouvir nos corpos hesitantes dos dançarinos buscando ainda apoio nas palavras e nos sons, não
poemas, mas discursos da dança: dinâmicas anatômicas do encaixe de microfluxos, enunciações cognitivas do
sistema corporal sensitivo, procedimentos de controle experiencial, autopoiésis psicossomáticas
biohistóricas, gramática disciplinar e codificação social através da pedagogia gestual, relativismo relacional e
o corpo como mídia, dieta de saúdes e cuidado de si, fé física na religião laica da intermediação, exercícios da
postura. Cálices se erguem barreiras chamadas estradas e portaos.
Imagine acordar numa manhã estrelada e toda música desapareceu. Todos os instrumentos musicais,
todas as formas de gravação de sons, de partiturações, idas. Um mundo sem música. E mais, ninguém ao
menos se lembra de que a música é feita ou como ela soa. Só nos lembramos que ela um dia houve, num
tempo ancestral. Que ela foi importante para alguém e sua civilização, talvez tenha dado lucros a usurários e
serviu de controle das condutas eróticas e políticas. E então você anseia por enfim ouví-la, a tal música. E aí
as pessoas se reunem para fazer música com nada além de suas vozes e corpos e sem nenhum conhecimento
de como a música deveria soar. A isto, chamo dança. Observe como dança o filósofo dentro da bailarina.

"Falar de música é uma besteira, executá-la uma loucura.


Poesia sem música desvanece, música sem dança falece."
Último Cântico Onírico
I VII
...lástimas nos pórticos míticos ...trágico cálidos íntimos litígios
lágrimas dos sísifos sonâmbulos utópicos o raciocínio lógico – matemático
acéfalos andróides robóticos típicos em assassínio frívolo e apático
estática miríade d’operários trópicos ao lúbrico lúcido mágico
,o último cântico onírico... sob o álgido álibi da fé
inúteis anestésicos ângelus
,o último cântico onírico...
II
...à lápide crisântemos e idílios VIII
balbúrdia e bálsamo ...cáusticos orgásticos martírios
cadáver átomo da existência
bitácula sem bússola em quântico túmulo
do dúbio óbito do lúdico pel’óbvia penélope em ausência
falsinocência histórico - rapsódica vívido ávido cúmulo
,o último cântico onírico... fúnebres fístulas em hipérbato
,o último cântico onírico...

III IX
...música filarmônica de ruídos lívidos ...cópula do pânico e do fascínio
cacófato símile desérticos efêmeros vôo-mitos
cálice do incógnito tórridos, sórdidos
babélicas rápidas rítmicas síncopes impávidos e indômitos
hipnótica explícita cênica síndrome ,o último cântico onírico...
máximas mínimas da índole
,o último cântico onírico...
X
...bélicas falácias do sacrifício
IV frenéticas poéticas fanáticas
...ríspidas sátiras do fatídico anárquicos espíritos em errática
funâmbula ópera da impávida cólera tática hipnótica
antropofágica oligo - mantícoras
da nítida famélica diária órbita democrático - despóticas
,o último cântico onírico... ,o último cântico onírico...

V XI
...hipótese de êxito do êxodo olímpico ...mecânico melancólico rito
eclética catástrofe do xenofóbico solstício eclíptico da decadência
míseras mixórdias do mistério cíclicas sísmicas pendências
contágio do fenômeno pelo semiótico d’obediência à azáfama
magnética do sônico ao ótico anacrônica amiúde amnésia
,o último cântico onírico... ,o último cântico onírico...

VI
...pródigas líricas do empírico XII
catárticos tácitos solilóquios ...ápice ao átimo apocalíptico
lúgubre holística dos gnósticos símile genérico de tânatos
penínsulas do ilusório atônito sob o dionisíaco
calvário o dicotômico sob sândalos
,o último cântico onírico... ,o último cântico onírico...
XIII XIX
...mercadológica d’escolástica dos cínicos ...fétidos sádicos dígitos
catedrático acadêmico pântano lábaros e balaústres trêmulos
sorumbática trêfega úlcera labiríntica epopéia protética
lépido júbilo do látego férvido púlpito d’idéias
cândida câmara do cânon ,o último cântico onírico...
sanatório indissolúvel do sortilégio
quiçá o signo sócrates platônico XX
feito lânguidos dogmáticos ...sofística módica dos símbolos
adúlteros dialéticos sânscritos apofático método implícito
,o último cântico onírico... das metrópoles sem ágora
câncer cívico, o árbitro
XIV célebre artífice capitalístico
...estágio psicótico clínico ,o último cântico onírico...
narcótica acídula farsa sociológica
arquétipos somáticos XXI
o morfético espírito dum zóssima ... parênteses literários símios
acônito para cólicas no estômago alfarrábio cibernético
trâmite sôfrego da cédula antônimo sinônimo
cêntimo célebre célula grávida ignomínia midiática
cabalístico número, a réstia d’árvores da peitórica máquina hidráulica
,o último cântico onírico... pusilânimes sintomáticas máscaras
,o último cântico onírico...
XV
...semânticos pálidos vícios XXII
módulos genéticos cósmicos ...cânones cômicos do anímico
(in)consciências do catenoteísmo próteses éticas sob a estética
súbitas máculas caóticas código múltiplo em hermética
,o último cântico onírico... ,o último cântico onírico...

XVI XXIII
...tímida metafísica do delírio ...polígonos geométricos idílicos
fantasmagórico âmbito rótulos da mágoa a título
próximo dos hábitos dos ânimos da álgebra impossível do que é
âmbitos anônimos dos súditos altímetro da qué
,o último cântico onírico... d’ângulo d’angústia
do intrépido intérprete
XVII córtex explícito, líbero elíptico
...arrogância estúpida do indivíduo do inúmero inpragmaticável
profética gotícula no oceânico subtártaro idêntico ao vórtice sólido - líquido
mímica gráfica da música ,o último cântico onírico...
lâminas atômicas do ridículo
dicotômica dádiva do riso XXIV
,o último cântico onírico... ...patológico domínio do lingüístico
alegórico exílio necessário ao filosófico
XVIII cárcere jurídico - econômico - político
...epidêmica do bêbado apolíneo paraíso flácido do diário tóxico
adónis e suas ágatas só um préstimo florífero póstumo
acústicos díspares bólidos só um póstumo florífero préstimo
heréticos céticos proféticos só um préstimo póstumo florífero
do inócuo súbito sábato ,o últimonírico não cabe em canto algum
,o último cântico onírico... ...nihil nôumenom.
Música Cena Hora Estilo Técnica
Último Cântico Onírico (ou Tudo) O último sonho 04:45 Greco-romana Opera
Insônia (ou Sonâmbulos) Revirando na cama 04:59 Dark Cartoon Punk Rock
Indústria Cultural (ou Cultura
Vendo televisão 07:07 Pop Art Pop
Industrial)
Apenas Outra Tempestade (ou Samba de
O onibus lotado 07:32 Sinalização
Canto XII) roda
Carpe diem tempus fugit et
memento mori (ou Neurose do Trabalhando 08:02 Psicodélico Psicodélico
Paraíso Perdido)
Enquanto você dorme (ou Quem é Perdendo o
09:45 Grafitti Metal
que paga a conta) emprego
Ao telefone com
Diálogo (ou Solilóquios) 10:01 Colagem Colagem
ela
Enquanto você sonha (ou Quem é
Levando a bica 10:09 Desenho antigo Pagode
que paga as contas)
Fila de
Virtualma (ou Engrenagens) 11:00 Arte digital Techno
desempregados
Palavras Cruzadas (ou O Grande Num templo
12:31 Arte sacra Gregoriano
Inquisidor) qualquer
Monólogos (ou Elefante) A prefeitura 13:00 Fractal Contraponto
Gritos do Silêncio (ou tacit) A revolta 14:33 Expressionismo Dodecafonia
O boteco e a boca Arte
Os Outros(ou Abaixo de Tijuana) 15:27 Latino
de fumo latina(Cuba)
O Sonho Acabou (ou Nada) A sarjeta 16:29 Futurismo Fusion
Saudade O sol se pondo 17:57 Impressionismo Fado
Apenas Outros Sertões (ou Grande
As ruas lotadas 18:30 Cordel e egípcio Toada
São os Desertos e Tudo é Deserto)
Baile de Máscaras A falsa festa 20:13 Máscaras flúor Valsa
O Labirinto de Espelhos (ou Introibo O espelho ou a
23:03 Arte conceitual Cacofonia
Ad Altare Dei) navalha
Gestalt (ou A Metamorfose) As drogas 00:00 Surrealista Jazz Funk
Pathos Policárdico (ou Amores
A festa e a orgia 05:26 Pornográfica Eletro
Intransitivo plural)
Moda de
Acordes (ou Nova Manhã) O dia nascendo 07:49 Rascunho
viola
Rapsódia dominical (ou Eu Quero
O último parque 08:08 Álbum familiar Tarantela
Sims)
O Retorno É Terno Penélope (ou
Voltando para casa 08:09 Arte Hindú Minimalismo
Ourobouros Spiritus Mundi)
Dormindo para Carnavalesco Samba
Pi Ano(ou Tudo ou Nada) 12:00
sonhar dark enredo
Simbionirium
O neuropaganismo abriu as veias neurais, sangue elétrico. Quantas de qualias empreenderam a
quimística dos elixires sobre as jaulas líquidas, livros de ética atirados sobre as delegacias. Aevolução
tomou-nos pelas vísceras de nossa errologia dócio. Cada lutabor amargou o triunfo do fracasso no
fashionfascismo. Alternação alterlegislante, causa-perdição da victorstoria. Retrotorno no etante de
aidentidade (existentidade), singularidade contra-real em permavolução. Ditadura da arte, religião da ciência,
um último suspiro da academia e seus vermes enquanto se entulham os livros, abrem os códigos em licensas
poéticas de desatribuição, implantam os chips e queimam as últimas catracas, diplomas e currículos.
Autopotlach ad continfinituum...
"Quem expor suas feridas, será curado. Quem não, adoecerá." Christoff Schlingensief ouve Ai Weiwei
perdido na casa de Jonathan Meese.
Prática arquitetônica (acústica sonora): Planialtimetria (audiometria), programa (programação),
criação (transcriação), partido (orquestra), projeto (partitura), aprovação (crítica), executivo (soação),
cronograma (ensaios), construção (gravação), ação (performance), azimutes (tons), coordenadas (escalas),
cotas (arranjo), desejos (escutas), necessidades (ruídos), sensível (som), cognição (melodia), organograma
(harmonia), fluxograma (progressões harmônicas), orientação (leitmotiv), antropologia (musicologia),
percepção (audição), proporção (radiação e propagação), harmonia (estocástica), ritmo (pulso), função
(música), forma (transmetria), escala (ponto de escuta), desenho (paisagem sonora), aprovação (duração).
Náusea primeira: a espera (a pausa). Desenvolvimento (pesquisa), impressão (allure), cópias (fractais),
burocracias (métodos). Segunda náusea: as restrições (limites do audível). Alvarás (estilos) e etapas (modas).
Terceira náusea: a coreografia do possível (a dança sem coreografia). Maestria (aura), equipes (redes), previsão
(devir), duração (improviso), terceirização (samples e citações), limpeza (decupagem), canteiro (entrescuta),
gerenciamento (cibernética), ponto zero (silêncio), estacas (axiomas), infra-estruturas (harmonias
contextuais), estruturas (nanoharmonias espectrais), lajes (ressonâncias espectrais), vedação (reverberação).
Náusea quarta: o atraso (delay). Aberturas (barulhos inesperados), elétrica (estática), hidráulica (paixões
musicais), caixilharia (fonomia, o nome do som), piso (cultura aural do público), pintura (fonótica), louças
(modulações), metais (conexões com outros sons), acabamentos (libretos e videos), paisagens sociais (audível),
ocup.ação (bioeco em interferência).

Atividade como Protesto:


-Defender o ócio é ainda uma forma de ativismo... zazen, nada surf, om... não agir é
uma ação...
-Todosos sujeitos envolvidos num sistema estão agindo a mesma quantidade de ações
num dado espaço-tempo... niguém está trabalhando mais que os outros, num sentido estrito
da física para o termo trabalho...
-O gozo não pode ser excluído de nenhuma ação sem que esta ação perca também o
seu sentido... não somos ecólatras, mas preserve o clima local...
-Não confudir a potência e a energia potencial que resguardam um ato (por exemplo
cozinhar para todos) com as instâncias de poder e controle sobre o terreno afetivo...
desvincular os atos e atitudes de qualquer política (da nano à macro) para liberar os gestos das
coreografias (mass games)...

Protesto como Atividade:


-Antes de mais nada, protesto... cristianismo platônico, protestantismo kantiano,
espiritismo hegeliano...
-Processo, penso a produção e produzo o pensamento, produto...
-Publico, propago, prolifero... ascese laica da comunhão informacional...
documentação e identidade... consumo de pedagogia...
-Pondero os passos tomados... meditação (me editação) técnico-científica através dos
territórios da comunidade e as pragmáticas ritualísticas que geram os fluxos para a
compreensão do estado atual de coisas e um posterior protesto...
Tupy Phonogramm & Scineciclagem
Polifonia Desgraçada
I{Prayer and Prey}I VIII{Poeste}VIII
animal interdito de cór, pó sete mil trezentos e doze pombos
cast{r}a sobrevipressora defecantes em queda livre
indesejadequável insustemportável é nas fossas ao limo que se sonha
queimará dutos em butas em cartiveiros do confrorto só se domen
árvore caída de joelhos insones e sonâmbulos de mãos dados
mú sick vibrórgão de controle do pasto

II{Peça}II VIIII{All rite!}VIIII


caleidotoit mon óx le coeurbeaur erguendo muros à sua margem
sem linha de montagem em formaT de um perdidoíso sem mel e lanças à máiscara
olhando os óleos soou ubi breu teleociliam os degraus de gen, o sítio
devir gens ossídio, desperdício do descaso distendido em veneno e veneno
gangue transfusa mênstruos coárgu rios ou troço féu a trofia

III{Sem Tabuleiro}III X{Miss A}X


por absurdo, Tempo, espinhos pia da noscente não tem'm, mais traças
sorvem taiças onde li cores que não nomearia batina de gola para todos no coro
nem em numes ou lumes ante o bafo, bufo ria
te iro no pé e tom hei que jorrnar torrentes de baby beefs, catacombes sob os mosteiros
entre bólido roto lá e espora de cá laicifício, o que dá o que come, sacrócio

IIII{El Ai Co.}IIII XI{Ascese ao Ascéptico}XI


quando dinamorama noitea serpente precede à escala anterior à queda
ou oisa que orvalha e a veste lítio urgia pragma ungida em chofre
entumesce a pele clorófila seiva rastejado por dez esfinges de nomes santos
cidade silenciada em cada late e normes genitálias com faces de mônios
podem ouvir! tudo por ídolos da hera dormena

V{Gnoise}V XI{Ascese ao Ascéptico}XI


teus anjos riem embriagados quando a pedra estava irg'rija
conosco oco asco, a garra faca vai da dívia o enclausuramanto
ró! mátula rompida às migas ecolatri{n}a das chaves e maldicção dos umbrais
cinzas brilho por toda a urbe me séria através das fhomens, p’hortas de daninhas
em leito leão ruvas férrimenta pass no burosuicraticídio

VI{Láfora}VI XII{O Transbordamento da Seca}XII


deitada na grama brisa sorri a causa chuva se em foco
autoritântopro, famíntglia em vésperas de viagem com a lama por l’ímpar
aterro com dincheiro, covalta enxame de moscas brancas rompendo as redes
vinhas de lábias úmidas feitas auréolas dodes{a}tin prosaico corrupmér
pó absolurdo, és passo e perde-na onde se parem cem maçãs por estigma

XIII{Marcha Ré que End}XIII}


VII{Violino Compressor}VII são os lábios que nó cruzamento de olhares
um só pão e farbeação largo de sangue se desnudem gargulanta cortina crepúsculo vox
para ali mentar à ávida ave de rapina agora com a abóbada coronária aberta
há alguém fedendo no coletivo fende também o peito retorcido, nasce anlux
será o mendigo fílico no centro da nave ou o padre não pecando por medo
executivo à porta? da fraqueza de sermos humildes
se entreolham as gengivas o corpo sorrindo mas tentamos... tentamos...
Sociofonia
Da Ópera à Próera: Como a transmutação desenrolada do tom ao espectro através do processo
dodecântico dos empilhamentos de notas e
frequências (clusters) até a composição coletiva dos
drones, os sistemas programáticos das musiações
reapresentivas sofreram algumas mudanças
dinâmicas e dramáticas, da atuação à interação
interventiva, da representatividade sasonal ao
ativismo em redes cotidianas na harmonia
contextual. As vozes todas foram identificadas pelos
softwares de síntese vocal.
Os códigos de intervenção política pelas
distintas poiéticas de religares transmidiáticos. Da
criptocracia à ruidopatia através da criptopatia
corpóreo-social.
Espectro Sonoro e Campo Sensório Musical:
Uma escuta de fato compassiva haveria de lidar com
todos os modos de escuta (uma vida, uma escuta), e
mais ainda: com todo o audível humano e suas
limitações lógicas e sensíveis. Toda nova ciência
demanda uma nova linguagem. Toda nova
linguagem surge avançada o bastante para se
assemelhar ao código. Mudar o vento altera apenas
algumas variáveis do som do sino eólico.
Sinaefonia, Crepúsulo dos Tipos: Ondulação
lisa onde se deslindam os cortes dos gestos
programáticos, a senoide cognição fluidificou as
notas e com isso também diluiu as fronteiras entre estilos (modos de composição aural). A noite tipológica vê
os campos gravitacionais de alhures sendo coordenados em suas flutuações pelas estelas-mídias. Sonátemas,
tipos sinestésicos focados em escutas, conectam outras possibilidades de concatenáCào de sons e mesmo de
dinamizações sonoras (ritmos em aritmos, a exemplo) gestando uma metamatemúsica, a auria. Não sou eu
quem me navega, quem me navega é senoide, a nevaga.
Três Tempos da Cera: Grãos, malhas e massas esculpem as intensidades ter-restres da escuta: danças
sensíveis em prismas sinestésicos que gestam partituras-programas, relações entre entrescutas e ritos
sacro-integrais de religação do laico com o profano. Quais os maquineísmos organômicos da composição
muséica? Para que programa-partitura gestxs soantes como dança ritual e não seus resultados meramente
sonoros de antemão.
Concerto Candango: "Um idealismo prático reveste o calo à mão, apagar as contas é um gesto metafísico."

I.Réquiem para Samuel Rawet.


II.Cor ou Ação de Criyestoeal: Um cego (Artemiev) guia um povo ao meio do deserto e onde
menos vegetação encontra, às vozes do povo ecoam-lhe 'Estamos Perdidos.' Desta perdição
fizeram sua nação erguendo capital sobre um cristal. Coroação da cegueira política no
coração do mundo.
III.Esplanada das Putas.
IV.Alvorada na Sacolândia.
V.Mendigo e Estudante no Santuário dos Pajés.
VI.Com Certos Candangos: Céu imóvel, gapão na zona, sis e temäsis, ura lupas e lâmpadas, a
vertigem dos objetos, as empresas do corpo (laibach butoh), nós...

"Onde lidamos diretamente com as arbitrariedades de valorização e a virtualidade atualizada às prag-máticas,


os prgnósticos e as pro-gramáticas da vida sob o aparelhamento capital."
O Despertar dos Hackers: "O Caos não é sagrado e deve ser profanado com orgasmos."Uma conclamação
ao uso ritualístico da tecnologia em reinsistência poiética ao tecnofetichismo. Escrever uma carta sobre
ministério e cultura e não entregar à ministra da cultura. Executar uma série de intervenções na eslpanada
dos mistérios:
I.Circundar o ministério da cultura soando ruído preparado com sons das periferias do país
todo.
II.Propor uma programação para a madrugada (horário aberto e desocupado) com a história do ruído.
III.Escrever um poema intitulado "A Desconstituição do Brasil" e outro chamado "Un Coup de
Pure Däat".
IV.Caso falhem estas tentativas, conversar sobre elas com pessoas nas ruas as mais distintas.
V.Um ciclo: Rito, representação, repetição, autopoesia.

Oratório a Nossa Senhora do Lixo:


Colhias o ouro entre lírios
antes do garimpo
Extraías o leite plástico
onde vertem nosso vômito
Água metalizada, pétreas vísceras
Ofélia bebeu o afogamento
renasceu ícone lácrimo em Fátima
Woolf letra o escapulário
enterrada nas fézes
que maquiam o teatro
cidade em sua farsa-fé
De seu corpo o rio de lixo
nasce no seio Tietê
Ovo

“O sensível é um ovo. O chocamos ou dele nos alimentamos, Quando no limite, vida é energia.”
Aos burocratas da cultura, intelectuais da música e funcionários de museu,

Agora, já realizada a obra, enfim, posso revelar-lhes uma primeira superfície do que se trata OvO. Nós
queremos o silêncio, mas este insiste que berremos...

O Processo:
“Nossa intenção é afirmar esta vida, não trazê-la à ordem do caos nem tampouco sugerir melhorias na criação,
mas simplesmente despertar à vida mesma que estamos vivendo, o que é tão excelente uma vez que se consiga tirar
a mente e os desejos da frente do seu caminho e deixar ela agir por si só.” –
John Cage

No início de 2009, bailarinos me perguntaram quando, tendo trabalhado por mais de dez anos com
música e processos de educação de escutas com dançarinos clássicos e contemporâneos, eu comporia uma
peça de dança. Dias depois sonhei com William Blake dançando com Rimbaud sobre uma esfera (hoje eu diria
se tratar do Museu da República em Brasília) e despertei com a idéia da dança que gostaria de realizar, uma
história da iluminação contada pelos corpos de um casal de amantes na vida real (Daniel Fagundes e Julia
Rocha) fazendo os papéis de Som e Escuta.
Daí surgiu o impulso do projeto “Iluminações”, que foi enviado a pedido do Ibrasotope para sua
realização no festival
Conexões Sonoras. O projeto
consistia em um casal de
dançarinos dançando 46
minutos num ambiente hiper
iluminado refazendo em seus
corpos a história da relação
humana com a luz, a escuta
humana da luz. Se dividiria
em três atos: nus (com
referência às personagens dos
textos de iluminações de
Blake Inocência e
Experiência) contando desde
a escuridão até a invenção da
luz elétrica, com roupas que
refletissem cores
(caleidocorpos que remetem
às Iluminações de Rimbaud) contando a hiper iluminação contemporânea, e no breu da luz negra se
desnudam de novo (A luz dentro da luz da qual fala Niels Bohr) contando sobre a luz da escuridão.
Posteriormente, com a pré-produção do festival tendo decidido a escolha do MIS como espaço de
apresentação em detrimento do CCSP, os problemas começaram a aparecer. O espaço não dispunha de
iluminação teatral, o que inviabilizava o projeto “Iluminações” desde a base. Ao mesmo tempo, o
relacionamento do casal de dançarinos se desfazia. Decidi, utilizar-me de uma imagem alquímica suscitada
por Blake no terceiro livro iluminado (Urizen) onde um ovo era chocado de dentro do vulcão que caberia
perfeitamente com a sala oval do MIS que não estava sendo utilizada. Pré-agendei a utilização da mesma
com a produção do MIS (Bete).
Devido à mudança na direção do MIS e a interesses políticos desta transição, os espaços agendados
pelo festival Conexões Sonoras foram realocados para uma mostra de aniversário da Folha de São Paulo.
Realocação antiética que fora noticiada pelo próprio jornal como salvação de um museu abandonado ao
hermetismo tecnológico. De fato, o MIS havia passado seus últimos anos como centro de uma pequeno
grupo de artistas, fechado à atuação pública de diversos projetos de mérito inconteste que havia conhecido
em espaços fora do país. Não se questiona aqui a validade das obras previamente apresentadas no museu,
houveram também grandes apresentações e instalações.
A completar o quadro de dissolução do projeto “Iluminações” por hora, o casal se separava e eu
perdia meus bailarinos. Em paralelo a isto, o iluminador Paulo Fávero não havia me dado nenhum retorno
favorável ou não à sua participação, o que me levou a contatar o iluminador da ópera de Manaus com quem já
havia trabalhado Moiszes Vasconcelos. Paulo agora me ligava dizendo querer participar do projeto e eu tive
de dispensar Moiszes.
Com todos estes acontecimentos, decidi por manter somente o essencial da obra e mudar seu foco.
Mudei definitivamente o nome do projeto para OvO e decidi dividir o dinheiro dos dois bailarinos entre 7
performers de diversas áreas,
de maneira a ampliar minhas
‘conexões sonoras’. Passando
do âmbito do casal para o do
grupo, se mostrou inevitável,
que alguns aspectos da obra
fossem radicalizados. A
nudez se tornou aspecto de
toda a equipe e o tempo de
duração da obra seria
estendido a doze horas de
modo que trouxesse à tona
sutilezas da vivência acima
das questões propriamente
luminosas, que ficaram a
cargo da sonorização, num
estudo até, para uma possível
execução futura de
“Iluminações”. Da
representação bidimensional da história da iluminação passamos a uma vivência do silêncio que a iluminação
propõe à escuta.
As transformações do projeto não foram capricho ou falta de precisão na atuação, mas necessidades
impostas por problemas que transcendem o compositor. Não fossem realizadas estas mudanças a obra
morreria. A produção do festival e do museu foram notificadas das mudanças do projeto e não fizeram
nenhum tipo de crítica às mesmas, com exceção à nudez. Porém, como o projeto havia sido aprovado com a
nudez dos bailarinos pelo PROAC (talvez por falta de leitura do mesmo), tiveram de consentir.
Os encontros com a equipe geraram uma série de questionamentos sobre o papel desta intervenção e
as especificidades contextuais da obra OvO. O descaso com a arte, os problemas sociais, os deveres autorais e
o desvanecimento do ego do criador demandaram-nos um abandono de nossos desejos estéticos em prol de
um gesto coletivo simbólico dentro das instituições musicais e do museu. Textos e chamados para a tomada
pública do museu foram redigidos. Já não se tratava de uma obra minha, mas de um obrar coletivo de
abertura do campo da arte. Grandes artistas da dança, do teatro, da música, da poesia, da filosofia e tantas
outras áreas compareceram ao OvO, de modo a participar com suas delicadezas desta tomada pública de um
museu que seu próprio diretor havia dito se tratar de ‘abandonado’.
Um dia antes da apresentação uma trompa d'água trouxe uma estrela de anis à concha aural de minha
orelha enquanto meu corpo submergia na banheira da casa de uma amada, acordei com uma dor no ouvido
direito... O médico zen da Lapa disse que meu tímpano estava tåo inchado que parecia um coraçåo, me
receitou uma tríade de panacéias... E a fragilidade da escuta, o valor de sua delicadeza se apresentaram como
cerne da obra toda. Então pensei nas tantas escutas poéticas que não conseguem sair de suas dores e talvez o
músico, ouvido da raça, seja senão parteira de escutas num mundo sem aura.
Durante as montagens da instalação do OvO na sala do nicho onde fomos alocados, levamos comidas
e bebidas com apoio dos funcionários do museu e da produção do festival, que disse que talvez eu só teria de
tirar de meu pró-labore o valor do vinho posto que a prefeitura não aceitava tais como parte da produção. As
comidas poderiam ser debitadas da produção, posto que seria impossível um processo de doze horas sem
alimentar os participantes.
Os técnicos se prontificaram a seguir as regras da obra para auxiliar na montagem do som no espaço e
com tudo pronto, pudemos apagar as luzes gerais com duas horas de atraso. O processo seguiu sem problemas
até que uma reclamação de uma senhora que queria saber o que ocorria dentro do OvO, mas que se negava a
cumprir a nudez, foi registrada pela polícia sob alegações de ‘satanismo e orgia’. Que fique explícito que os
artistas de renome que convidamos a se manifestarem no OvO em momento nenhum atacaram as
propriedades do museu não destinadas à obra, cerca de 150 pessoas passaram pela obra e mais teriam ido se
não houvesse sido cortado no meio.
O museu agiu com intimidações pseudo legais de telefonemas de seu advogado sobre a produção do
festival, que conteve o processo de terror psicológico sobre os participantes do OvO. Obrigaram-me a assinar
um termo onde eu dizia que eles desconheciam o teor da obra, de fato desconheciam, porque não
acompanharam seu processo devido aos problemas políticos do museu e sua transição de direção. Três
reclamações técnicas foram alegadas para estas perseguições (posto que a nudez e o esoterismo inerentes à
obra não podiam): a comida (que propusemos pôr na rua, mas eles não aceitaram), velas e incensos acesos por
pessoas do público (que apagamos quando pedido) e vinho (que era bebido somente pela personagem da porta
que simbolizava Dionísio). Às 16 horas a policia autuou um grupo de visitantes por estarem vestidos de negro
carregando um frango depenado adentro do museu, sob alegação de desordem. Às 17 horas, o museu impediu
a entrada de público na obra. Diversas vezes os artistas foram interpelados de maneira grosseira pelos
funcionários do museu ao andarem pelas dependências do museu cantando ou sorrindo dizendo que ‘a
performance só podia acontecer dentro do OvO’. Aquilo que era um espaço de delicadeza, queriam converter
em uma prisão ou cativeiro e às 19 horas e 30 minutos, eu decidi por finalizar com o trabalho e aceitar a
censura imposta de maneira covarde sobre nós, de modo a evitar problemas para os organizadores do festival
ou para os participantes, que temiam a entrada da polícia no local.
Venho por meio deste demonstrar meu repúdio em relação à forma como a instituição artística, em
especial do Museu da Imagem e do Som, tem atuado sobre a arte e exigir um pedido de desculpas pública por
parte do museu para com todos os participantes-atuantes de OvO e demandar que isto nunca mais ocorra em
instituições públicas de arte.
Reflexões Anteriores à Obra:
“Disse o Céu: Eu abraço aquele trono que é Unu, e eu mantenho guarda sobre o Ovo de Nenek-ur.” –
Livro dos Mortos Egípcio.

Como se iniciam os processos musicais (escutas artísticas) nas pessoas e nas comunidades? Quais as
conexões sonoras que a música traz a uma comunidade aural, como se dá a composição de um escuta?
Cada gesto é um selo. Esses selos são combinados para fechar o ovo do céu, segundo os Dogon.
Quando a chave é ligada ao ovo, este é aberto. Este ovo é esvaziado, enchido com intensidades (energia, em
vez de ondas ou partículas, em termos da física). Nesse ovo havia os germes da nossa realidade objetiva, ainda
não percebidos, um reservatório de porvires. Quem veio primeiro, o evolucionismo ou a criação, o verbo ou a
luz, a dança ou a música? Como pensar uma escuta desde seu princípio (ab ovo)?
Em todos os níveis o ovo regenera, semente animal. Virginal, incorpora as qualidades de ovulação, o
poder de tornar-se desenvolvido durante a fecundação. Útero, caixa acústica ideal que preenchemos com o
ruído do rompimento que é nascer. Sal (matéria corpórea), mercúrio (som vibração) e enxofre (luz
transcendência enérgica) botado (não jogado, mas precisa e delicadamente colocado) no espaço tempo.
A intuição lógica, esta poesia da ciência ativando o canto silencioso da dança, sussurros de números
que se encontram na última dobra antes da superpopulação simbólica, um transbordamento andrógino do
que anima pelo indizível, um é muitos através da divisão sinérgica.
Depois de rachado o ovo, não há como rejuntá-lo na irreversibilidade do tempo espaço, mas novos
ovos podem ser gerados.

Metodologia:
“Se há um outro mundo, ele está aqui mesmo. Se há felicidade, ela parte desde aqui, desde agora.” Cântico Órfico

Existe um segredo pertencente à escuta? Seria a música a desvendá-lo? Como partilhar um modo de
escuta delicado em meio à incessante produção cultural de mais-música como mais-ruído? O problema
central da obra está exposto. A inteligência não pode ir além dele; ela percebe isso e volta-se para si mesma,
dobra-se sobre suas próprias forças, sobre suas próprias pretensões. Ela fixa seu fundamento. Ao se questionar
sobre o mistério, ela o faz impotente. Como estabelecer uma metodologia dinâmica e fluida apriori que não
formatasse ao pensamento a composição de uma escuta (e não de um objeto sonoro ou de uma trilha
musical)?
Metodologicamente, me nego à divulgação do conhecimento adquirido durante este processo para a
ciência sonora e musical. Posso somente indicar, novamente, que a pesquisa fotofônica e de retroacústica
aplicadas a campos muito amplos e diminutos (notadamente quânticos e estocásticos) dos qualias sonoras
geram estruturas hipertonais através de polimicrosintons.

1.Sensível.(som, luz, corpos, aromas)


2.Cultura da arte.(mercado, editais, academia)
3.Especificidade local.(rede institucional, máfias)
4.Retroalimentação.(timbre, intervenção, mito)
5.Política dos afetos.(modos de vida, tensão)
6.Ambiente-ovo.(temperatura, densidade, feitura)
7.Interenredamento.(interações, conexões, show)
8.Intracoletivização.(intensidade, potência, ritual)
9.Escuta-ovo.(música, silêncio, gesto, dança)
10.Poéticas.(diálogos, trocas, toque, olhar)
11.Metapoéticas.(auto-crítica, reflexão, análise)
12.Entrescutas.(harmonia, ritmo, cores, síntese)
13.Retroalimentação.(timbre, intervenção, mito)
14.Economia linguística.(teorias, ciência, lógica)
15.Sensível (som, luz, corpos, aromas)
Instalação Espacial do Ovo:

Entrando numa espiral desde a entrada do museu, um labirinto na entrada do espaço dá vazão a uma
ante-sala negra de sacos de lixo que têm numa sala de restos de tecidos crus na vertical sobre um piso de feltro
amarelo que seriam jogados no lixo. Alguns tecidos cobrem a exposição de infográficos da Folha de São Paulo.
O OvO era um ouvido dentro do museu, um espelho oval, almofadas, aquecedores, cobertas, forno. A escuta
adivinha um labirinto na desordem, presume uma coincidência significativa no encontro fortuito. Pressente
o silêncio do instante. Entreouve alguma coisa que a ofuscaria. Muitos não passarão daqui.
Ora, é preciso coragem para cair no abismo que é o ouvido. Cedo ou tarde, cada um começa a
entender, mais ou menos bem, esse falar obscuro que murmura nas coisas, a ler aquela escrita secreta
espalhada desde os poros até as estrelas, a espuma do mar e o suor dos corpos, a pôr a mão no fogo flamejante
existente em nosso mais obscuro interior nos dizendo que tantas palavras só somaram no grande depósito de
lixo que somos. Atravessando este medo dos próprios defeitos, nosso lixo ao espelho; ultrapassando esta
escuridão de si podemos encontrar nossas delicadezas nuas. As distintas camadas gestam o espaço oval, que
distinto do si circular já apontam para a conexão com outras dimensões do encontro. Vivemos num campo
onde luzes e trevas duelam. As luzes ofuscam: nada se vê; as trevas confundem: nada se vê. Como enxergar?
Qual a razão dessas luzes? E essas sombras? Por que esse jogo de branco e preto? E de onde vem a felicidade de
reconhecer estas coisas? Os acontecimentos se sucedem em ciclones, os seres passam em rajadas.
Os Pactos:
“Não trabalhamos com o sistema operacional cultura, mas com código aberto.” – Filantropöv.

Dois pactos
fundam a escuta
proposta no OvO:
nudez e silêncio. Os
riscos de qualquer
pacto são imensos,
instauram um
esoterismo. E cada
um o pressente bem.
Vê-se as reações
exaltadas dos
adversários como dos
partidários. Ao
pronunciar a palavra
‘esoterismo’ todos
despertam. Alguns se
escandalizam, outros
se entusiasmam. O
esoterista vai ao
âmago do homem para se encontrar e reencontrar o mundo. Existe algo que entusiasme mais e mais gere
inveja nos que não participam do pacto? A escuta é um esoterismo, onde somente outras escutas íntimas são
aceitas. Na ciência pode haver controle do som, na religião (e a música é uma) é necessário crer, quanto à
escuta em seu mistério, ela ocorre ou não. A escuta não é uma questão de conhecimento ou de fé, ela age e
atua. Qual a necessidade destes pactos para a escuta destes sons internos ao OvO? Isto eu não posso dizer.
OvO é uma próera (ópera interventiva) que propõe uma modificação da questão “Qual o sentido da
arte, qual seu valor?” para “A arte tem algum sentido?” Isto é admitido aqui, rejeitado ali. A primeira questão
é, então, formulada da seguinte forma: pode-se falar de arte (da escuta)? Em outros termos, a noção de escuta
da arte é válida ou inaceitável? Trata-se de uma idéia, um conceito ou uma farsa? Trata-se de metafísica ou de
uma fábrica de mistificações? De que lado da filosofia ela se encontra?
A desconfiança do surdo em relação ao ouvinte é radical, se apóia na realidade de suas limitações. Não
se pergunta se a escuta (fragilidade da sensibilidade artística) é isso ou aquilo, mas se ela é ou não é, e caso seja
ela pode ser? Podemos classificá-la como alucinações e devaneios? A suspeita geral dos não-artistas adota
desde o início uma atitude feroz. Não se trata de adversários como nas guerras de ideologias políticas, mas de
exterminadores diante de culpados. A deliberação se transforma em acusação. Quando se fala com um
matemático, critica-se uma demonstração ou uma hipótese, jamais a matemática. Não se inicia uma troca de
opiniões políticas partindo do pressuposto de que seu interlocutor seja louco. Em teologia, cada um admite
que as crenças se opõem, que vão falar de demônios, do céu, de milagre. Em filosofia, as noções confusas são
acolhidas com benevolência. Na cultura artística, porém, não. Basta falar a palavra ‘arte’ e explodem os
escárnios (mesmo entre artistas): charlatanismo, alucinação, delírio, retroalimentação megalomaníaca do
gênio, pseudofilosofia estética. O que acontece com a arte então? Por que aqueles que a deveriam escutar se
recusam ao debate? O adversário da arte – e a maioria dos administradores de arte e curadores o são –
reflete-se indagando “Esta idéia é conveniente?” Ele adquiriu um universo de conhecimentos e de métodos
que atuam sobre a própria arte o tempo todo. O adversário da arte é contra o pacto sensorial público, porque
precisa manter as idéias de produtores e consumidores separadas de modo a manter a hierarquia entre
compositores e ouvintes. Parafraseando Einstein, assim como a religião é o antídoto a qualquer experiência
religiosa, o museu é o antídoto a qualquer experiência artística.
A Nudez:
“Uma música experimental, demanda uma vida experimental.” – John Cage.

Chegamos a um estado tal de inversão de valores sociais, que a vestimenta se tornou a regra e a nudez
um crime. O artifício tomou o lugar do natural, tal como a música suprimiu qualquer possibilidade de escuta.
A arte não trata de vestir, iludir, de consolar, mas de trabalhar, tocar no ponto essencial, penetrar o secreto de
cada um, se o secreto ainda existir. “O iluminado” – dizia Blake em uma de suas iluminuras – “que quebra o
pescoço tentando voar é mais nobre e mais fraternal do que o engenheiro que tenta provar que o homem
jamais voará.”
Dentro do OvO somos somente escutas, sem nomes, corpos ou rostos.

O Silêncio:
Silêncio do mundo, brutalidade dos homens, eis, sem dúvida, a experiência primeira que temos da
‘realidade’. Mas se a natureza silencia, sabemos que ela está lá, nas pedras, nas plantas, com suas chuvas, suas
auroras. Silêncio do mundo. Esse silêncio oprime nosso peito. A cor do fruto não diz ao nosso corpo faminto
se ele está ou não envenenado. As estações não nos ensinam a reencarnação das almas. Os pássaros cantam
sem transmitir nenhuma mensagem. O trabalho hexagonal das abelhas e suas danças heliocêntricas não nos
aconselham em nosso atuar social. Os planetas traçam desenhos sem falar de letras. Quem pode admitir,
entretanto, que a natureza se reduza a um amontoado de átomos em movimento, sem significado? Mesmo o
mundo não tendo nenhum sentido, o homem se coloca incessantemente diante desta questão, em silêncio.
Não terá este questionar sobre o sentido algum sentido?
OvO é um desejo de ir ao fundo da escuta que cada um tem do mundo em busca de seu sintom
(sintonia e sintoma de seu modo de afinação sonora, ruidística e musical) e de lá lançar-se para as
extremidades do audível através da acusfera. Indagar se os seres têm em si, e no todo, um sentido para enfim
enxergar a covardia das musicologias, a crueldade insana dos estilos até compreender, até se reconhecer, até
descobrir nos limites da maldade de cada doce canção, na brutalidade insana das possibilidades de soação,
outros modos de escuta. O vulcão é ouvido sob as cinzas. E para recusar esse silêncio do mundo, para
entender sua linguagem (esta música maior que a música), é necessário praticar o silêncio; e para recusar esta
violência da humanização plena de todo som é preciso praticar uma certa violência ruidística, resistir às
ideologias, frear o pensamento em proveito da meditação, opor à força o não-agir, ao saber o disparate, ao útil
o esplendor. O não-agir não é inação, mas contramovimento, equilíbrio sobre um ouvido só, o disparate não é
ignorância mas apreciar o essencial e negligenciar conscientemente o saber pelo saber da arte pela arte; o
esplendor não é belo, mas irradia de si mesmo, ‘vem de si mesmo’.
Se a escuta se separa ou opõe à cultura musical, de que modo ela se exprime, em segundo grau, como
poderá se exprimir? A escuta se revela por si mesma, não precisa de um psicanalista ou de um crítico. Possui
sua própria linguagem. Entretanto, quem fala em escuta fala em contrariedade com a arte. Uma supõe a
outra, ao menos em um sentido, o da escuta, porque a arte é livre para negar a escuta em nome de uma sã
racionalidade. De que maneira a escuta expressa para ser entendida pelos outros? Será que com a escuta? É
possível o estudo destas questões?
Encontramo-nos diante de uma estranha situação. Ao extremo, chocam-se dois mutismos: o do
ouvinte e o do aurólogo (estudante ou crítico das escutas). De um lado, o ouvinte se cala por respeito à regra
do arcano que quer ocultar aos de fora os segredos conhecidos por aqueles de dentro; de outro aquele que
estuda a escuta se cala para que não venham até ele para obter as informações, as chaves, os códigos. Essa
situação não tem nada de teórica ou caricatural. Ela ocorre freqüentemente e ressalta a diferença entre as duas
distintas posturas de soar: de dentro e de fora. Em outras palavras, pode-se conciliar segredo e revelação? De
que forma um discurso sobre a escuta não apaga, no curso de sua própria escrita, os sinais que pretende ler ou
escrever, como o arqueólogo que esmaga com seus sapatos justamente o objeto frágil que está à procura?
Sobre isto eu não posso falar. Ninguém sabe, é um mistério.
A Censura:
“É difícil encontrar leitura mais confusa e mais fastidiosa do que essas páginas repletas de elucubrações da
imaginação gnóstica e que pareceriam a um leitor superficial terem sido escritas com o propósito de divulgar uma
insanidade sistemática.” Papa Urbano III sobre Pístis Sófia

Outra questão prévia constatada positivamente na execução de OvO: a da contestação não mais
intelectual, mas física. Não mais a autoridade da arte ante os críticos, mas sua autorização junto aos políticos.
Aparentemente, a arte tem sido massacrada, amordaçada, difamada, ridicularizada, proscrita,
anatematizada, perseguida, insultada, martirizada, deformada. Sua história social se acompanha de
mutismos forçados, assim como seu desenvolvimento interior de silêncios consentidos. Constata-se uma
espécie de conflito essencial entre sua existência e sua condição, ainda que se fundamente não mais filosófica
mas socialmente. Se o racionalismo nega seu fundamento, isto é, sua razão, seu valor, até seu ser (teórico),
forças ameaçam sua fundação, isto é, sua organização, sua função, até mesmo sua existência (sensível
imanente). Mas que forças são essas e de que forma? Devemos nos conformar com esse fato?
Primeira disposição contra a arte: a repressão. Uma forma é a proibição, venha de onde vier. De
ordem intelectual (as censuras), de ordem física (os monopólios dos espaços de convívio social e as más
remunerações), de ordem social (a falta de uma legislação específica para o ato artístico), de ordem coletiva (as
dificuldades financeiras).
Segunda disposição contra a arte: a difamação. As medidas de vexação sucedem as medidas vexatórias.
Suas formas se denominam descrédito, calúnia, amálgama, marginalização, escárnio e desprezo. Age-se mais
sobre a afetividade e, em geral, essa maneira de abordar, de difamar a arte parece mais rápida e mais eficaz.
Mais rápida porque é veiculada pelas conversações, transmitida pelas revistas de arte, utilizada mesmo nos
espetáculos de entretenimento. Mais eficaz porque impregna toda a cultura, ela se contenta em sugerir, de tal
modo que se crê encontrar por si mesmo a inanidade da arte, e de que modo resistir a uma idéia que se pensa
tê-la formado pessoalmente? Sem levar em conta que é lisonjeiro fazer-se de superior a Beethoven, zombar
dos pitagóricos.
Terceira disposição contra a arte: a deturpação. Dessa vez a arte é desfeita, submetida à metamorfose
em entretenimento ou utilidade acadêmica e industrial. Na impossibilidade de abatê-la, pode-se desnaturá-la.
Há a falsificação acobertada pela compreensão. Pode-se assim interpretá-la, deformá-la, reconstruí-la,
modernizá-la, traduzi-la. Descarte-se todos os aspectos sagrados e secretos da arte e já não há mais porquê
negá-la, ou oprimi-la: não se fala mais na arte; o tratamento histórico ou técnico representa um modo de
falar da arte como se ela não fosse arte. No caso da redução de seus aspectos artísticos, a arte é reconduzida ao
entretenimento. No caso da recuperação, um fenômeno estritamente artístico termina por servir a
ideologias, a interesses que lhe são totalmente estranhos, até mesmo contrários. Basta evocar as artes
marciais como são atualmente conhecidas e praticadas, sem uma metafísica, sem prática meditativa, voltadas
para a eficácia imediata, para a rentabilidade, dirigidas pela concorrência e pela competição. Assim fizeram
C.G.Jung e os jungianos com a alquimia: a se acreditar neles teriam, enfim, decifrado o enigma, como se os
alquimistas ignorassem seus próprios símbolos!
No entanto pouco adianta ativar o debate apresentando artistas como vítimas. Quase sempre, a arte é
atingida de modo indireto. Condenam-se seus dogmas, seus ritos, suas produções não na sua estética mas
pelos seus efeitos sociais, sua incidência doutrinal, sua origem pagã, etc. O que se constata, com efeito? A
inquisição perseguia a heresia, a irreligião, a superstição, o erotismo... nunca a arte. A inquisição nunca acusa
a arte, até porque desconhece o que é a arte em seu interior, só a conhece por fora.
E o problema se ampliou. Não se trata de questionar como a sociedade vê a arte, mas de que modo a
arte se vê na sociedade. Os detentores do poder, do direito, do saber artístico podem proibir, desacreditar,
deturpar a arte, é bem verdade. Mas pouco sabem sobre a arte. É mais interessante considerar de que modo a
arte se situa antes de se considerar a maneira como a situam. Constata-se que o OvO toma lugar no museu
sem se definir a ele, no entanto. Não pode ser considerado uma ideologia. O OvO se situa no que diz respeito
a ele mesmo. Pretende-se uma tradição autônoma em relação a qualquer festival ou museu. Forma seus
próprios planos de referência. Em último recurso, o OvO depende dele mesmo apenas, senão ele desaparece,
modifica-se, ou não ressurge mais, morre.
OvO, pode-se dizer, é um fenômeno social sem ser um fenômeno cultural. Ele se situa no interior do
museu mas no exterior de suas instituições (Zoneamento de Temporação Autônoma), mesmo as mais
intelectuais ou espirituais. É irrefutável que tenha um aspecto social em vários níveis: jurídico, político,
poético... No entanto, causa espanto que não seja um fenômeno cultural. Por cultura entenda-se, do ponto de
vista do indivíduo, o conjunto de valores e conceitos, de comportamentos e de técnicas transmitidos por uma
sociedade; do ponto de vista do grupo, entende-se por cultura a totalidade das aquisições sociais em matéria
de regras de conduta, conhecimentos, métodos... OvO é demasiado estranho neste conjunto , sua censura o
comprova. Os mistérios de Elêusis (primeiros rituais musicais da Grécia antiga) eram controlados pelo estado
ateniense desde Sólon, portanto eminentemente sociais, não obstante se restringissem à esfera cultural na
medida em que exigiam o silêncio e a nudez de seus participantes, passavam por uma experiência ‘mística’ e
não diziam respeito à filosofia e à religião gregas a não ser acidentalmente.
Em primeiro lugar, quem diz cultura diz herança da civilização. Naturalmente, no OvO, há
transmissão de conhecimentos, técnicas, objetos. Mas como? De modo algum pela via cultural, isto é, pela
imitação e educação, de forma mais ou menos consciente. Todo ovo se vê original, natural, como um
ressurgimento constante e autêntico de aspectos sutis das escutas presentes, da entrescuta destas e sua
harmonia contextual composta. Não se trata de transmitir nem de inovar, como na cultura musical das
vanguardas, mas de reativar os sentidos das escutas.

Agradecimentos:
“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois
desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.” – João Guimarães Rosa

Com tudo isto dito e esclarecido às partes que apreciam explicações, gostaria de agradecer a todos os
envolvidos do evento OvO pela realização da obra e que tudo isto sirva de nutrição a nossas vidas e trabalhos,
que possamos amar mais e enfrentar com força e empenho de nossas escutas as injustiças que surgirem à
nossa frente.
Aos artistas envolvidos diretamente na produção do OvO, sem vocês eu seria só eu: Paulo Fávero
(Luxcolorama e as tabelas de correlação sinérgicas), Daniel Fagundes (dança explosão do desejo), Julia Rocha
(farinha, água, fermento), Juliana Dorneles (Baubo, Hotxuá), Pilantropov Filofenandes (mêtre fou), Kaloan
Menoschite (gesto silencioso por natureza), Caterina Renaux Hering (tecelã de delicadezas), Juliana Rinaldi
(generosidade do movimento), Priscila Blix (lab rindo), Eduzal Fernandes, Felipe Brait (estratégias de
atuação), Pedro Soler, Daniel Costa (pela noção de metafinação espectral e outras magias), Martin Herraiz,
Rafel Mendes, Danilo Barros (pode falar, sim, se precisar mesmo), Carlito Moreira, Tati Abitante, Danilo
Tanq Rosa Choq, às Ghawazee (me enterrem de pé e com uma maçã na boca), Submidialogia,
Metareciclagem, Orquestra Organismo, Movimento dos Sem-Satélites, Aldeias Pataxós, George Sander
(intensividade cognitivante, Carla Bispo (olhar delicioso sobre fotorama) e todos os presentes que tenha me
esquecido de lembrar enquanto escrevo .
A toda a produção e demais participantes do festival Conexões Sonoras: Mario Del Nunzio (o abraço
mais gostoso da eletroacústica), Natacha Mauer (precisão e gentileza), Henrique Iwao, Alexandre Fenerich,
Giuliano Obici (oráculo sonoro), Rodolfo Valente (carinho em conversas durante o processo todo), Luciana
Ohira, Sérgio Bonilha, Lilian Campesato (pela racionalização curatorial), Valério Fiel da Costa (você disse
que ia fazer e fez), J-P. Carón... A todos os que não entraram na obra, porque não puderam, não quiseram ou
precisaram. A todos os funcionários públicos do MIS, seja de qual hierarquia ou administração, pelo
cumprimento de suas funções em prol do público, e nada além disto.

"O sensível é um ovo. O chocamos ou dele nos alimentamos, Quando no limite, vida é energia.”
Félix Guattari.
Bioeco

"Vida incompleta ecoa humanidade."


I. Bio: “Tudo soa, mas o que sempre musica?” O som constitui um ser vivo e uma forma de entranhamento
vital com ressonâncias sutis sobre a própria vida que a muito pouco tempo tivemos experimentos empíricos o
bastante para passarmos a perceber de modo científico. Uma definição simples de vida é a de um fenômeno
que anima a matéria. Qualquer ente material ao ser animado em meio aéreo produz modulação de pressão,
percebida como som pela escuta. Considera-se tradicionalmente que uma entidade é um ser vivo se exibe
todos as seguintes características pelo menos uma vez durante a sua existência:
§ Crescimento, produção de novas células. Os sons ressoam as escutas e através de seus
hospedeiros humanos, se multiplicam tanto física como abstratamente. Daí nascem os
instrumentos-totem do áudio (os alto falantes e gravadores), os modos de vida centrados em ritos
sonoros e os lugares comuns das línguas, os fonemas.
§ Metabolismo, consumo, transformação e armazenamento de energia e massa; crescimento
por absorção e reorganização de massa; excreção de desperdício. As escutas humanas são aparelhos
metabólicos do som. As estruturas geométricas musicais (melodias, ritmos, harmonias) são as
enzimas que gerem o conjunto de transformações que os fluxos químicos do entranhamento sofrem
no interior da escuta. Os ruídos intencionais (rúsica) são suas excrescências.
§ Movimento, quer movimento próprio ou movimento interno. O som é o próprio
atravessamento entre estes dois modos de movimentação. Não sabemos distinguir a afinação do
mundo da de nosso sistema nervoso e sanguíneo.
§ Reprodução, a capacidade de gerar entidades semelhantes a si própria. Basta notar os
sistemas de reprodutibilidade de cantos e rugidos nos animais, as mudanças harmônicas do timbre de
uma folha de acordo com seu desenho.
§ Resposta a estímulos, a capacidade de avaliar as propriedades do ambiente que a rodeia e de
agir em resposta a determinadas condições. O humano é o sistema nervoso do som e devido à sua
efêmera existência (as diversas taxas de atualização da escuta como o tempo de vida de um som)
poderíamos dizer que também seu espaço, seu canto. Através de nós, ele ecoa como subjetivação. O
som é vivo sistema autopoético em constante evolução, tanto molecular (musical), como especimal (aural)
que maximiza o seu leque de futuros possíveis.
§ E a escuta viva, um sistema que reduz localmente a entropia (ruído) mediante um fluxo de
energia criadora de formas geométrico-musicais.
1.1. Bioacústica.. Ouvir o audível (a totalidade abstrata dos sons além mesmo de nossa
escuta) é uma composição vital de foco da escuta. Esta hiperestrutura Não existe ainda nenhum
modelo consensual para a origem da vida como para a origem do som e da música, mas a maioria dos
modelos atualmente aceitos na biologia baseiam-se duma forma ou doutra nas seguintes descobertas:
§ Condições pré-bióticas plausíveis resultam na criação das moléculas orgânicas mais
simples, como demonstrado pela experiência de Urey-Miller.
§ Fosfolípidos formam espontaneamente duplas camadas, a estrutura básica da
membrana celular.
§ Processos para a produção aleatória de moléculas de RNA podem produzir
ribozimas capazes de se replicarem sob determinadas condições.
Existem muitas hipóteses diferentes no que respeita ao caminho percorrido das moléculas
orgânicas simples às protocélulas e ao metabolismo. A maioria das possibilidades tendem quer para a
primazia dos genes quer para a primazia do metabolismo; uma tendência recente avança modelos
híbridos que combinam aspectos de ambas as abordagens.
Podemos definir carne e água como arquiacústica (princípios da escuta) humana. Ouvir é
espacial, sensitivo e temporal. Ouvir permite-nos saber das características de um espaço (altura,
largura, profundidade), sendo portanto forma primeira de arquitetura (enquanto construção abstrata
de estruturas ambientais), seu presente. O som penetrável, a escuta relacional.
‡ Ele está sentado numa sala diferente da que você está agora. Ele está gravando o
som de sua voz falando e vai tocá-lo novamente nesta sala de novo e de novo até que as
frequências ressonantes da sala reinforcem-se de modo que qualquer semelhança de seu
discurso, com excessão do ritmo, seja destruído. O que você ouvirá, serão as frequências de
ressonância naturais da sala articulada pela fala. Ele não toma tal atividade como uma
demonstração de fatos físicos, mas mais como uma maneira de suavizar quaisquer
irregularidades que sua fala possa ter. O que resta da voz é um punhado de ressonâncias, que
fazem parte do corpo acústico da sala.
§ Arquiacústica infrasônica da música e adaptaudição da escuta musical dos focos de escuta
pela composição do audível.
‡ Caladas todas as aves e insetos assim que falou a cachoeira, buraco negro no espectro. Fonte
do sintom inesgotável.
1.2 . Biofonia.. cristal e fumaça :
§ Ergofonias entre Geofonias e Fisiofonias. Música, a flor do som.
§ Molecularidades harmônicas contextuais.
1.3. Bioruído.. hardware e software
§ Transgêneros aurais.

2. Eco: “Há um trovão que antecede o raio.” A escuta do sondador. O Grito de Eco a Narciso. Apesar de a luz
ser mais veloz que o som em proporção astronômica, a percepção humana ocorre de maneira inversa e
percebe os sons como imediatos aos quais as imagens se seguem. "Ouvir propõe, Ver dispõe."
2.1. Ecoacústica..
§ Do som ambiente à sonosfera pelo urbanismo acústico dos nichos soantes.
§ Espectro livre
2.2. Ecofonia..
§ Antropofonia e Sociofonia na ressonância da entrescuta no audível.
§ Produção cultural de ambientes acústicos pseudo-naturais. Turismo musical e paisagem
sonora. Confinamento da escuta interna à muzak-jingle e da externa alienada aos seus ruídos.
Zooacústica e o confinamento segregário como modelo de controle do instinto auditivo.
2.3. Ecoruído..
§ Ressonância espectral e ruído criador.
§ Travessia aural de paisagens ruidísticas.

3. Bioeco: A composição de uma ressonância vital através do som. Peito a vapor. Primeiro ser vivo
eletromecânico...
3.1. Bioecoacústica..
§ Acusmática primordial do princípio vital.
§ Captação e captura. Panfônico, privacidade e controle aural.
• Metareciclando escutas. Gambiologia como base estrutural do steampunk.
3.2. Bioecofonia..
§ Maquineísmos e orgasmonismos.
3.3. Bioecoruído..
§ Aura, crença soante e resistência civil da escuta.

O texto explodiu pra fora do sistem... O material da música, assim como quer Bakhtin, não é o som, e sim o
efeito, a tensão volitiva do artista que molda esse material. a arte sonora coloca a sensação diretamente no
centro das afecções . O que resta da voz é um punhado de ressonâncias, que fazem parte do corpo acústico da
sala. A performance, como afirmação da vivência interpessoal, é a afirmação dessa passagem do material (que
vibra) para o imaterial que é vibrátil, que ressoa.
Arte terrestre-sonora (land-soundart) que mistura dois movimentos estéticos: um criado a partir da
situação de escuta, que exige participação – o caminhar pelo campo que realiza a mixagem –, e outro que é a
própria instalação em si – os alto-falantes pelo campo de escutas podem ser contemplados à distância.
Pintamos, esculpimos, compomos, escrevemos com sensações. As sensações, como perceptos, não
são percepções que remeteriam a um objeto (referência): se se assemelham a algo, é uma semelhança
produzida por seus próprios meios, e o sorriso sobre a tela é somente feito de cores, de traços, de sombra e de
luz. Se a semelhança pode impregnar a obra de arte, é porque a sensação só remete a seu material: ela é o
percepto ou o afecto do material mesmo, o sorriso de óleo, o gesto de terra cozida, o élan do metal, o
acocorado da pedra romana e o elevado da pedra gótica. O material é tão diverso em cada caso (o suporte da
tela, o agente do pincel, ou da brocha, a cor no tubo), que é difícil dizer onde começa e onde acaba a sensação,
de fato.
Infelizmente, ouvimos o ruído, já não podemos fazer como se só existíssemos nós e Deus no mundo;
lamentos, gritos, soluços, brados, encantamentos nos agridem muito antes de receberem sentido; temos,
pois, de compor música a cada instante para sobreviver […] Sem essa obra de fundo que contém o ruído de
fundo, nada se mantém unido, nem as coisas no mundo, nem as pessoas no coletivo, nem os sentidos, nem as
artes, nem as partes do corpo. A música vem da filosofia, ninguém pode se dedicar à segunda sem passar pela
primeira.
Como com a fotografia, a gravação sonora foi desenvolvida consistentemente em busca de um
refinamento da sua maior virtude perceptível: a habilidade em recriar, ainda mais precisamente, um evento
retirado do seu tempo e espaço original. As duas mídias foram criadas para preservar um efeito de
tempo-real, mas ambas foram manipuladas por artistas para criar realidades que só existem como
reprodução.

“Os sons são tecidos com a memória”

O que a arte permite perceber é a diferença existente entre um silêncio meaningless e outro silêncio –
um momento de quietude, como container. O silêncio que contém a potência de todas as sonoridades em si.
Silêncio pode ser algo que não representa uma negação de sentido ou de produção. A distinção entre ready
made e abandono.Vá lá e ouça. Ouça quando isso balança, ouça quando isso roda. Ouça quando você mexe
aqui. "Que terror invade a cabeça de Van Gogh, tomada num devir girassol?" Ouve a luz em seu corpo tinta.
O som é captado, gravado, ‘lido’, escutado. O que se passa? O que é que finalmente se escuta no lugar
daquilo que foi escutado diretamente? Minha morfomicrofonação (como dizia o Caesar) me torna este
monstro entre dançarino sem corpo e poeta sem palavras... Simetria é falta de informação que procria. “Sons
nãointencionais”, foundsounds & Acusmática: descobrir a potência do som que existe, não no seu instante
real e imediato, mas em sua separação de qualquer localidade... Mudando a produção de música do lado da
ação para o da audição, do all sounds a uma situação de always sounds. Radiação sonora … reflexão… difração
… ressonância … 78 ondas estacionárias … realimentação … batimentos … e fala: "Musa Civ Natura."
Conhecer-fazer em lugar de saber-poder. Ontogênese da autonomia aural, a complexificação causada
pelo ruído, e suas ressonâncias estocásticas cogniscíveis geram uma ampliação significante entre distintos
níveis e naturezas das sensações linguísticas. Por este tensionamento de um campo da escuta, a mesma pode
relaxar outras áreas de tensionamento sinestésico revelando outra faceta da aura {outraura} como ponte
entre ressonância vital e a geofania da músical.
Nutrição aural. Ruído como biodigestor da escuta, tal como a biologia é o estômago da linguagem.
Tumor e urbanismo, carbono e a complexificação além da organização entrópica gestando o câncer capital
em seu tumor habitacional da colméia que já não demanda o contato com a terra ou com o céu pelo encontro
subjetivo e midiatiático. Turismo no lixo cultural, ruídos nas trilhas abertas nos campos das escutas. Quais as
empedâncias de um saber na harmonia contextual?
Metaterapia da música, psicofonia. Entrescuta como inconsciente coletivo aural numa relação,
auto-inconsciência da escuta. Ressignificar todo o campo de escutas de uma festa com uma inserção precisa,
efeito coquetel molotov. Reciclagem e smaplerologia perpretam a produção cultural de lixo (físico e
subjetivo), mas como poderíamos um intracuidado soante e uma intersustentabilidade das escutas (incluindo
ressonâncias estocásticas quânticas de qualias. A lógica imposta ao instinto (zoológica), reduz o devir-animal
à territorialidade e encarcera os corpos aos ciclos fechados de vida. Transpolsão, pleroma de poema:
Um Outro Lado do Avesso
(Escuta e Memória, Som e Esquecimento)

"Os que escutam não defendem a si mesmos ou suas idéias,


mas aceitam o que os outros falam como percepções suas.”
Gene Knudsen Hoffman
(0+8) (16-8) (1+7) (9-1) (15-7) (17-9) (2+6) (10-2) (14-6) (18-10) (22-14) (3+5) (11-3) (13-5) (19-11) (21-13) (4+4) (12-4) (20-12)

Não me lembro mais o que me motivou a escrever no córrego, mas não me deixa esta sensação de que
devo finalizá-lo como rio. Prazer cruel guiava a escuta infantil, uma cova por afeto, enterrando água no fogo
para parir vento; marcava tais lutas (e lutos) de momentos em páginas com riscos de máquinas não
inventadas. Mais tarde viria a ateá-las todas ao éter. O olvido era ainda um abismo, sem as pontes nervais.
Das cinzas nasceram tais portos anteouvidos na abóbada da nave. Soou, mas disto quase nada saberá.
As ondas carregavam a pureza senoidal e a beleza (ruído estabilizado) sob chuva a tintinabular os
sinos d’água, esta carne da carne, sangrando o espaço em nuendos de tempos amparados no raio, trovão,
soslaio. A porta aberta os motores entrarem nos caldeirões ferventes deixava, onde bailavam os vegetais sem
parar nem suas cores. Mordias o plástico para ouvir com os dentes as moléculas e cantarolava as poeiras, ao ar
estáticas, no feixe de luz. As rodas, chaves e guizos, a profundeza da pele e seus avisos. O tronco retorcia com
o peso do teu corpo que subia. Da tua voz, porém, não me lembro mas a ouvia.
Me lembro de um tempo quando o som de automóveis ainda não era contínuo. Esquecimento,
interior do sol; num pequeno raio no vinho da mar dentre ao cristal, memória. A música é, faz a escuta
esquecer os sons e se entregar aos seus sonhos. Algo o fez querer ser um raio que antecedesse a trovão, ser rio,
só ar.
Vício ideal, rito metafísico do prazer e seu efêmero, musicar. Cerne da pirâmide viva, sensível
bálsamo da mais-valia espaço temporal (mais-escuta). Forjaria outro alforje, moldaria lemniscata outra,
mascararia ócio em tempo, campo de respiro em espaço acústico e toque em propagação social na rede afetiva
para conseguir ressonância aural nas entrescutas desta harmonia contextual, olvido. Anteporia iconoclasta a
área.
Vítima e réu querem esquecer, só o vector (réu inacusável por sua posição hierárquica disfarçada de
hino e essência) encontra na memorabilia musical produzida, o gozo da nostalgia daquela velha canção.
São ricos senhores de feudos cognitivos ouvindo teu jazz sem fumaça. Injeta a heroína no sangue do
pai. A nostalgia musical (como na meritocracia virtuosística) alicerça a escuta na música, como estrutura a
música no prazer da memória, ouroporos. A máquina riu das partituras e as vomitou de volta.
Anamnese da escuta musical, eixo da timbremelodificação, produz as misturas de tempos vários,
durações. Na melodia são estabelecidos os elos conscientes, mas há muito mais – dinâmicas espectrais, ritmos
subjacentes e auras e alhures do timbre. Qualia engendra uma temporalização específica, processo paradoxal
que combina persistência de recordações infralógicas com um apelo das antecipações de ritornelos (ritos de
ornamentos). Mudança, das qualias mesmas, que advém da escuta de uma frase musical no interior do ruído
infintenso destes campos ressonantes. Uns dançam para lembrar de esquecer, outros para esquecer de lembrar
e ouvir sempre como virgens. Lembrei o que me fez começar a escrever: “História, pudesse findá-la!” A
memória é um afeto do futuro, projeta o corpo como reflexão do devir pelo porvir, a atuar no sacrifício do
amor (memento) e na sedução da paixão (mori). Os cheiros cantam os ventos, como versos do alento da
presença ausente (mas próxima). Esquecer o nome de tudo, a diferença entre sonho e não-sonho.
Esquecimento-nirvana e Memória-satori. Deixar ruído escutar. Memorizar todos os tons da luz e esquecer
as palavras.

“Dizer é esquecer a essência.”


Goethe
Sete Deveres Autorais
"Os filhos devem meramente respeitar seus pais, mas é dever dos pais amarem seus filhos." -
Aristóteles em Metafísica, Livro IX.

1.Liberdade total de edição completa da obra, seja em fragmentos ou por


aparelhamentos em obras ulteriores. Assim como um pai ou uma mãe (autores) não teriam como
evitar que seus filhos fossem modificados por suas relações no mundo, um criador não pode evitar o fato de
sua obra ser modificada por aqueles que a usufruem. Assim como é dever de um pai e de uma mãe criar seus
filhos para o mundo, assim também com a obra e o processo autoral. Todas as ferramentas de edição e
divulgação são formatadas para facilitar esta entrega irrestrita, caso você tenha dúvidas leia o contrato de
privacidade de seu email.
2.Liberdade total de acesso irrestrito ao processo por parte de qualquer interessado.
Assim como uma criança não pode crescer sem o amparo social (sem severas deficiências) da comunidade,
todo processo criador deve estar aberto à colaboração social (mesmo que esta aparente-se como crítica
infundada). Assim como os conhecimentos de criação das crianças foi passado de toda uma geração a um pai e
uma mãe, toda a história humana chega a alguém em autoria. E assim como é dever dos pais serem honestos
com seus filhos e com o Estado Capital (através do consumo de cultura e burocracia), é dever do autor ser
transparente em seus processos e obras (deixando transparecer suas condições psíquicas). O Ministério do
Prazer da Propaganda, através da Portaria K180320111717, se incumbiu de criar uma taxa por desprazer
causada por cada obra ou processo artístico, fazendo com que cada vez vejamos menos casos de desarmonias
nos Templos da Arte.
3.Promulgar a Ditadura da Arte (estado nem sacro, nem laico) como futuro do
Capitalismo. Assim como pais e mães são obrigados a colocar seus filhos em escolas e vaciná-los, as obras
artísticas são alocadas dentro do sistema econômico da arte e são rotuladas (seja por suas técnicas ou estilos),
sendo portanto dever de seu autor levar em conta tais valorações relacionais, de modo a promulgar uma
melhoria para o estado atual do Estado Capital. Assim como pais e mães (autores) influem na religiosidade de
seus filhos (time de futebol, marcas de produtos, etc.) assim também o próprio fazer artístico corrobora com
o sistema capital que gere a manutenção da economologia da arte.
4 .Entrega ao inconsciente coletivo e atuação contínua como meio (médium mídia)
através do esvaziamento do ego. Assim como a paternidade e maternidade ocorre como um ato
natural, instinto de continuação de um gozo do encontro com outrx; a obra e o processo de qualquer autoria
é uma inconsequência que toma vida própria (mesmo que no corpo daquele que obra) e deve ter liberdade de
atuação, mesmo que prejudicando o autor. Assim como um pai morreria por um filho, é preciso que o autor
morra pela obra e a obra morra pelo processo. O prazer da arte e o ministério da ditadura devem ser repetidos
para a completa reprogramação neural dos desejos, de modo a conseguir mais-gozo (mais-valia desejante). O
Ministério do Prazer da Propaganda, através da religiosificação das mídias de massa e da sacralização da
ignorância pueril, visa em manter esta aproximação adolescente sempre fresca com os novos produtos do
Mercado Cultural.
5. Aceitar sacrifícios, não negar oferendas e duvidar de qualquer valoração. Assim
como um pai ou uma mãe nunca espera ser reconhecido como alguém importante para seu crescimento, um
autor não deve esperar que sua obra e processo o agraciem com facilidades (em verdade, grandes são os
sacrifícios a serem empreendidos pelos trabalhadores do prazer no Estado Capital). Assim como um pai ou
uma mãe confiam num filho perante uma acusação de terceiros, assim o autor com sua obra não deve jamais
se rebaixar a críticas (assazmente socialistas, comunistas ou anarquistas). Somente um pai ou uma mãe
anarquistas poderiam vir a prostituir seus filhos ou mesmo abandoná-los, mas isto é serissimamente
recriminável pelo Ministério do Prazer da Propaganda que atua moralmente sob a égide de Jesus Hitler.
Assim como um pai ou uma mãe arrancariam da própria carne para dar de comer aos filhos em tempos
escaços, também o autor poderá ter de passar fome para não se vincular aos hediondos resistentes do Estado
Capital.
6.Se vincular ao máximo de coletivos de atuação Capital possível. Assim como as
famílias são formatadas de acordo com as regras empresariais (nepotismo mafioso da economia dos afetos),
também as obras e processos precisam de empatia (retronecessidade ou metaprostituição) das redes para
poder manterem sua subsistência. Assim como é esperado que os pais incitem em seus filhos a
competitividade, o autor de manter-se em contato com as redes mais influentes e adquirir os títulos que lhe
proporcionarão acesso às obras e processos mais prazeirosos; exemplo disto já pode ser notado na mudança
polética das residências artísticas mundo afora, que anteriormente pagavam estipêndios a artistas do terceiro
mundo para aparelharem seus conhecimentos, coisa que não é mais necessária com o advento do Ministério
da Digitalização dos Afetos, o que levou-os a cobrar taxas de criadores europeus que buscam férias criativas.
7. Agir fora da lei, mas nunca do Bem, da Justiça e da Beleza. Assim como um filho é
bom e belo aos olhos de um pai ou uma mãe, a um autor sua obra e processo sempre lhe apetecem e é para
isto que foram instituídos os Códigos de Beleza do Ministério do Prazer da Propaganda. Para assegurarmos
um consumo contínuo e uma produção fluente de Produtos Culturais que mantenham a situação atual do
Estado Capital ad infinitum, tornando a Ditadura da Arte o rápido possível a religião oficial do Estado
Capital através do Ministério do Prazer. Assim como um filho mataria por seu pai ou sua mãe, pedimos que
você também entre nesta causa e espalhe beleza até morrer de fome. Seja marginal! Seja Herói!
Cultura Dialegital do Contra
Não bastaram todos os livros ou palavras memorizáveis em cantos do peso da moeda (pound's
pound), nada que não fosse alegria de viver teve valor maior que seu uso (dever utilitarista). Cultuamos o
humano culto, húmus do labor à nau, até ver-lhe as florróidas enciclopêuticas envenenando o sorriso de
gesto em fézes cientecníficas. Cultuamos a humilde humanidade em seus cultos de fé na massa da missa
(mess games) até que esquecemos que os olhos eram sementes de atos e fizéssemos latifúndios improdutivos
de nossas chacras. Nem mesmo notar isto nos adiantou para sorrirmos e empinarmos nossas hélices sem o
furor de sermo-nos. Quando postos em resistência à lógica binária, mantivemos sua paridade paraconsistente:
Estávamos novamente uns contra os outros e contra nós mesmos. O nível de sucesso de uma conspiração
(sub_versão) de qualquer forma é inversamente proporcional às conspirações internas. Mas o sucesso se
tornou nosso inimigo também, afinal nós éramos os filhos do império filho do império. Somos contra o
amor porque ele é a arma de controle digital dos bons e dos maus, somos contra os bons por nos apiedarmos
da maldade em nossa ignorância do que queremos e em nossas abstenções plenas de juízo. Cultuamos a
contrariedade contínua de nossos desejos e sensos na sensualidade da alteridade. Somos contra como falamos,
quereríamos a novalíngua do polvo. Somos também a imaginação do futuro, sua sombra de luz. Aprendemos,
seja lá o que fôr, mas aprendemos e este é um império sobre os sentidos pela pedagoria. Somos os tiozões de
moleques que já pensam como aparelhos, avós de minas que sentem como máquinas. Deste avesso do
heroísmo, seres com a pele (religação toque) para dentro dalma e os órgãos (complexos de estratificação)
expostos, quando fazemos algo de bom nos sentimos podres imperialistas do culto à classificação (hierarquia
semântica) da linguagem, e quando somos elogiados ou gratificados nos humilhamos como os piores
detratores da espécie por nossas horrendas demonstrações de fragilidade. Sempre a ruir contra o sucesso
porque não temos mitos ou heróis que tenham sucedido em suceder sem sucumbir aos seus próprios desejos
em prol dos outros. E ainda que sabendo disto, não nos ouviríamos em nome de enterrar alguma língua já
morta. Fomos programados para ir contra o sucesso de qualquer empreitada, baseados nas premissas da
continuidade inequívoca da guerra de todos contra todos. E nas ramificações naturais deste processo nos
âmbitos de nossas subvivências: a vã guarda das modas de modos de atuação social do culto digital na cultura
de ações e sócios; a competição das competências que embasam o macrocoletivismo denegrindo os afetos
imediatos e diretos das microrganizações expontâneas. Negamos o tempo e a duração e por nossa admirável
arrogância não queremos nos inserir como possibilidade de alguém que errou-se em si nem tampouco como
mais uma escola, parte-ido, seita ou clube. Somos contra heróis, solistas, guerrilhas, os malditos gênios
acorrentados como placas de rede slave a depender de suas memórias nas vaidades dos próximos. Temos
vergonha de termos tido inspirações e nos chicotearemos mutuamente até que os burrocratas morram de rir
em suas mansões. Contra o próximo em nome da ubiqüética. Contra a quantificação dos valores em dígitos
cultuamos uma física dos qualia. Contra os complexos de épicos e as simificações côsmicas, contra-dígit
forjamos uma syncomplexão e comsimplia. Uma crítica da razão metacrítica repousa no umbigo de todo
fazedor de mudos, o que fala. O rolo com-im-pressor agora já imprime impressoras, como se escrevem
línguas e programam programadores. Qual o papel do papel? A mão que assina o ato manchada de gangue.A
resistência é a geradora da eletrocidade. O estatal é estático, ex-táctil. Somos contra a idealização da loucura e
sua institucionalização, a arte; e a idealização do corpo produto e sua mercantilização, a arte. Mas só sabemos
ser artistas e talvez de fato o sejamos para além de nossas escolhas e programações. Não bastaram todas as
cartas de baralho, amor e amizade dos poetas, o cânone é o canhão nas muralhas do diálogo (a praça púbica).
Somos contra a poesia, código do real, quereríamos ler direto na dnatureza legislada pela matéria. Mas ainda
não queremos digitar a contracultura, somos contra o trabalho e achamos a preguiça a única opção contra a
entretenimentação do ócio e da vida. Somos contra o diálogo, ligação serial das dúvidas, virús de sistemas
cognitivos. Contra o casal, a ascese, a higiene, a trindade, a suruba da série e o solilóquio da mônada mas ainda
não conseguimos falar todos ao mesmo tempo e nos ouvir em paz e ciência. Quem cala consente, eu não calo
(mas sou contra falar na primeira pessoa do singular). Nos almejamos rastros e dejetos. Dig it all! Contra a
anarqueologia e o desespero do esquecimento cultuamos a abolição da escritura no dialeto sutil.
Evacuamo-nos de qualquer coisa que nos lembre da beleza das pequenas coisas. Contra a publicação,
produção e veiculação de mais objetos de consumo cultural para a alienação da própria publicação, produção e
veiculação dos processos de produção cultural. E antes de tudo, somos contra estarmos contra tudo. Bla bla
bla amamos contra você...
Corpinfest Pânfago
1.After knowing about download all of John Oswald's work available on his websites:
http://www.plunderphonics.com & http://www.pfony.com
2.Listen to everything 11 times in 2 days meanwhile reading his statements and interviews.
3.Edit a cyberphony with the plexoristic material added to the "Ode, Os Primaveris Cortes" as background.
4 .Gather the imagery from the website and make a label.
5.Listen to the "Simplex" composition acquired in the step [3] 9 times meanwhile reading Oswald de
Andrade's "Manifesto Antropofágico".
6.Transwrite it while listening to "Simplex" for at last 5 times.
7.Translate it on Babylon web translator to english.
8.Post it here and on the blog.
9.Write a thanking letter to John Oswald for his works.

...{:}...

"Imn, vér no aussente"


Simplexus

Só a panfagia nos cruza. Artística me ente. Capital mente. Lingüa estica e me enchente. Todas as leis
No mundo. Impressões sob máscaras de todos os autores(até Luther Blisset), de todos os colectivos(como a
da cantata de Johann Sebastian Mastropiero) subspensa palarva. De tonas as semióses. De tonas os tractatus
de lógica chacoalhando os plexos como Henry Bergson arrotando tempos com cerveja Miller. To pi, that's 4
sure Pyt. The unanswered question is which way on the ray, to the center of the light or the edge of sounds?
Como todas as caterpillars. E com Géia e sua diarréia. Contra todos os consumos porquê com todos os
sumos. Só interessa o que não ME interessa, seja em em ou noutreu. A pansexualidade de Sergei. As taras dos
roedores de unha e comedores de cabelos. São Ciscos entrando nos olhos fazendo-nos suar animais.Estamos
sobrexcitados pelos maridos de todas que amam nenhuma. Bloom think Freud as the gay friend of
Bettelheim(Babylon the Bride). O que atropela é a verdade que não vemos o rosto pois Ísis é véu. Não
confundamo-nos, o mensageiro é a mensagem. Por isto clama infindos pontos de perspectiva, para que se
atire nesses vazios e massageie o crânio geodésico da pulsão(tênue linha da sinóide expulsão~impulsão). A
ação como vestido humano(antropomodia), corporeidades em macrodesfilamento. O cinema americano
substituiu o horizonte Oeste quando o mundo acabou no Oceano Pacífico, o cinema europeu quer substituir
o olho imanente. A internet informará que não jaz na memória a arte, mas o medo da morte. Pais do só, mães
dos videntes. Perdidos e armados docemente, com saudade da hipocrisia, pelos sem grados, traficantes e pelos
mecenas(apostadores de commodities). O país grande, cobra. Foi porque estivemos na gramática tempo
demais(mesmo depois da linguística), com nossos jardins botânicos enciclopêuticos. E sempre soubemos
muito bem noo desenho do rio morto criando das cidades os feudos dos quais fugiam os impregnadores. Uma
subjetividade participativa iriam falar os bufos68, um timbre religioso para uma harmonia da fé no Cristo
americano multitudo souvenir. Como todos os exportadores de consciência em embalagens de folha de
bananeira ou caixinhas de bambú. Contra a usura de Raskolnikov! À existência vital do toque, mesmo no
corte. E a corporeidade pós-lógica pro Sr.Ibapuru Urutao. Todo francês é caraíba, os revolucionários estão
mais próximos a Anhagüerra(ou Aguirre). Chegamos ao homem e encontramos um tolete de bosta cega surda
e atuante. Sem nós, a Europa não teria sequer o tricô. A idade da música anunciada pela Tropicália já
passou(the age of music is fast). E Alice com as girls estão ou matando baratas ou escrevendo uns baratos ou
jogando baralho apostando não mais cabeças, mas troncos ecolunas. Não num clube que nos aceite. O
contrato com o Brasil é Bossa e futebol, nossa belíssima cara-de-pau. Nietszche usando bombachas enche a
cuia pra Decartes Leminksy Bashô já trelelé di hackear o catatau, à aurora aural dos rosacruz ao romantismo,
a aurora dourada, a aurora do martelo, à aurora tecnocrática e ao corpo osgônico de Reich e Agrippino. Nóis
trupica mai num bréca... Sempre fomos catequizados, os pajés abriam os olhos dos curumins de dentro pra
fora. Até a cor(u)já mod-ernst-ista tinha o vício pedagônico. As molas nos espectros os impelem a um
sonambulismo de direita. Watchout vanguard rolers, soon Kardec will pass you over at the aetherial
memoirés, isn't it Monsieur Proust? Fizemos a Bahia nascer no Cristo e empalidecemos o terreiro caiado.
Pois sempre há uma patho-lógica no nascimento das admições. Como o Padre de Andrade. Autor de
nossa primeira dívida com o banco de cultura, para ganhar um comissariado. O
presidente-analfabeto-funcional dissera-lhe: ponha isso no museu pra dentadura poder vender. Fez-se a
dívida terna. Gravou seu nome num grão de açúcar na praça da Re-púbica, chamamo-la pátria nula. Carlos
Gomes deixou o Guarany na Itália e trouxo os Lobos pras Villas. O espiritismo recusa-se a conceber a
metafísica sem o empirismo. A morfoantropia, nada impele um homem à auto-comiseração mais que uma
idéia revolucionária(Che Disney). A vacina de uma geração é a doença da outra(a fórmula mágica da Coca e da
Cola). Para o desequilíbrio contra as religiões de curadoria. E as exquisições interiores, não seremos incluídos
pela exclusão de novo. Só, não queremos atender ao mundo de modo celular. Buscamos uma atenção
auracular. Tínhamos a corrupção, inflação da vingança. A poesia codificação das ciências. Comíamos poeria
pra cagar estrelas, bebíamos gasolina pra vomitar asfalto. O totem horizontal da transformação é nosso
desejo. Fadados a fingir. Tudo o que está imóvel deve ser digerido para mover-se de novo. O pensamento
dinâmico do que é stopo. O sistema vítima do indivíduo. Clássica injustiças das fontes. Romance e seus
desajustes. E o interior das conquistas do esquecimento.
Sorrateiros... rota otar tora ator rato taro
O instinto cabaíla. Morte e vida dos hospedeiros da equação. Eu parte o Cosmo no axioma.
Subinsistência. Cognosemento. Cheirar pele pra lacrimejar flores. Como as elites minerais que chupam o
chão nosso. Em territorialização do silíncio e da comunicação. Sempre fomos carnavais canibais
sacro-profanos. O império Azteca vestido de 500 anos como Cabra L. Ou figurando no neo-foclorismo,
cheio de raízes sobre a terra. Como raízes como frutos.Já comungamos ao som do hino comunista. Já
devoramos a língua de Cocteau. Era do som.
Catiti, Catiti
escarra nesta boca que te beija
Hécate! Iód Rà she in Váu Ri
Ama Gia e há vida. O mistério é como sair agora caídos na subida infinda de Sísifo(O Serra Pelado) de
volta ao distríbuto da ceifa com apenas alguns cânticos entoados pelo corpo.Disse a uma mulher o que
acreditava ser uma Dieta. Ela me perguntou que era uma possibilidade de exercício? Ela chamava-se Teresa
Purpurina do Amaral. Comia.Só há mistério onde há também um determinismo lactante. Mas que tem isso
em nós?Como os mitos históricos que começam no fim da história (a moda mora na poda da roda). A data
não localizável. Rubro. Sem Tupã sem Celtas.O progresso das fixações teleológicas pela catalogação(matriz
deleuziana). Só, a aparelhagem. E o sangue plástico das emodiálises.Como a sublimação, as antagonias das
caras como velas tragadas pelo fogo.Com os povos, sempre uma verdade. Como ambos numa missão de
té-dio. Definidos pela sagacidade de um poeta, o André Gidé: -Eu sei, tudo isto já foi dito antes... mas como
ninguém lembra é forçoso repetir à exaustão.Mas se não foram só traficantes, vagabundos e rejeitados que
vieram. Foram fugitivos de si mesmos que se comiam nas plantas de poder, porque somos fortes de
fragilidades e compassivos, como uma rosa e uma cruz.Se o Diabo é a subconsciência do estar-no-Universo
Incriado, Dercy interpreta Guaracy num Carlos Gomes. Cocaí é a avó dos vegetais.Especulamos a
adivinhação até a distribuirmos pelas ciências políticas globais as migrações dos gênios por toda a espécie.O
tédio dos estados fugitivos. Como a urbanização, a arquitetura das enfermidades. Como os conservatórios, a
especulação do tédio inevitável de todo berro.De Henry James a Grudjeff. O totem diagonal do tabu
transfigurado em noite. Comemos uns aos outros, mas somos menos que peido.A mater comuna e a seriema
do ethos andrógino: Realidade das coisas que nos ignoram - imaginação de canto - autorização do sentimento
ante as proles de curiosidades.É gostoso chegar a uma superfície de gnose onde Deus se apresenta em nada...
como iluminação, sem idéia ou ideal. Mas o cotoxó precisava, por isto desconhecia que queria. Porque tinha a
mãe dos Gracos presa em seu cú sem saber que ela é que lhe favala de limpear o traseiro da mátria.A
subjetividade produzida rege a queda dos anjos. De vaga, Musea. Que disso nós?Antes dos brasileiros
descobrirem Portugal, Portugal tinha coberto o fado.Com o índio, um tocheiro. A Maria filha de índios,
afilhada de Hipócrates e Philo de Alexandria e nora de Simão Magus.
O nove(IX ) é a prova da alegria.
Do filiarcado na Pindaíba.
O sexo(II) entre o que se faz chama Compositor(IV) e a Composição(III) - Musicada pela efêmera
sincope do além-humano e o seu desejo. A paixão intempestiva e a capitalização de todos os modus vivendi.
Injetar moedas pra encher o saco de viagens na bolsa. Absorto nos amigos profanos. Para horizontalizá-los
em transmorphopoiésis. A(des)ventura do barro moldado pelo fogo na chuva e no vento. A terrena
trasitoriedade. E também, só as mais impuras hordas conseguiram realizar a panfagia espiritual, que afasta de
nós todos os sentidos da vida e abarca todos os males e bens identificados por Krishna. O que se dá é sempre o
que se come, a sexualização sublime. É comer o celibato enfiando o barômetro na bucetapau do andrógino.
De espiritual, ele se torna eleito e cria inimizades. Afetante, o ardor. Especulante, a gnose. Via-se e fere-se.
Aviltamos a chegada. A alta antropomagia na beatitude das liturgias todas - a veja, a usa, a lúnia, o assinato.
Benção dos chamados cultos populares e crísticos, é com elas que agimos. De Andrade's estarão sempre
unidos na eternidade. Masturbaína.Com Bandeirantes cantando as onze milhões de pessoas na praia grande,
ao redor da estátua de Iemanjá, - a mãe de santo pula 8 ondas e 17 conchas.A nossa interdependência já foi
clamada. Frase típica de político da Ditadura após o fim(sic) da mesma: - Estupra mas não mata que eu
também quero me divertir! Expulsamos os milicos. É preciso expulsar o espírito populista, as ordenhações
dos artistas e o lobby dos ecólatras.Com a sociedade híperrealista, nua frente às câmeras com seus oprimidos
de bolso, castrada por Mcluhan e Bauman - a surrealidade sem simplexos, louca e rouca, prostitutas bonitas
pra namorar Bandeira e Cioran e claustros só para os heremitas alegres do filiarcado na Pindaíba.

f? de andrade
em Pompéia Ano 80 do Vômito do cancro.
Poluição Musical Marítma
Gravar produtos de plástico vendidos em camelôs. Carlos Oswald e Niemeyer fazem uma imagem de
Iemanjá com todo o plástico que forma o vórtex de lixo no oceano pacífico em escala de 1,2x1 e dispem-na no
morro do Corcovado atrás do Cristo Redentor no Rio de Janeiro imaginário da escuta de Verger e Caribé. Os
Modernistas Pontos de Exú devem ser marcados nas catracas que dão acesso às escadas rolantes. Uma
kitschfonia (opereta giocosa segundo Amadeus) onde o gesto (Berio) de formulação plástica da obra (o fogo
afinando as cordas segundo Smeták) de arte sonora é deslindada em sete planos(Branca) de movimentos
descendentes [ holístico, monódico, átmico, piritual, mental, astral & físico ] em direção ao cerne da
Comédia. Assim como Dante(Palestrina Sepultura) fora acompanhado por Virgílio, seremos nós sob o nome
fictício acompanhados por Stockhausen(Flo Menezes), incorporado desde a estrela Sirius na figura de
Miguel Cão Exu das Resinas, para fazer esta travessia além do bem e do mal no divertido universo da música.
Durabilidade, estabilidade e resistência à desintegração são as propriedades que fazem do plástico(e da
música) um dos produtos com maiores aplicações e utilidades ao consumidor final(ouvinte hedonista). São
produzidos anualmente cerca de 100 milhões de toneladas de plástico(canções de amor A B A B A C D A B D
D) e cerca de 10% deste total acabam nos oceanos(no ruído), sendo que 80% desta fração vem de terra
firme(do mercado cultural).
Vórtex(entitade bailante) . No oceano pacífico(no ruído delicado) há uma enorme camada flutuante
de plástico(estruturações dinâmicas dos modos de escuta "fake"), que já é considerada a maior concentração
de lixo do mundo(a radiodifusão, a teledifusão, a digitodifusão), com cerca de 1000 km de extensão(vide
google), vai da costa da Califórnia(do vale do Silíncio), atravessa o Havaí(onde gravam Lost) e chega a meio
caminho do Japão(vide Paprika) e atinge uma profundidade de mais ou menos 10 metros . Acredita-se que
haja neste Vórtex de lixo cerca de 100 milhões de toneladas de plásticos de todos os tipos(a tipologia
classicizante do 2.0). Pedaços de redes( jingles antigos),garrafas(poesias sonoras), tampas,bolas(planimetria
akrónica) ,bonecas(espectrosoperísticos), patos de borracha(preservativos aurais), tênis, isqueiros(rituais
musicantes), sacolas plásticas, caiaques, malas(pop) e todo exemplar possível de ser feito com
plástico(sonoplastia). Segundo seus descobridores, a mancha de lixo, ou sopa plástica tem quase duas vezes o
tamanho dos Estados Unidos(MTV).
Pesquisa-se esta mancha há 15 anos e compara-se este Vórtex a uma entidade viva, um grande animal
se movimentando livremente pelo pacifico(biofonia). E quando passa perto do continente, tem-se praias
cobertas de lixo plástico de ponta a ponta(vide carnaval).
A bolha plástica(escuta hedonista ou musical) atualmente está em duas grandes áreas ligadas por uma
parte estreita(ruído urbano). Referem-se a elas como bolha oriental(misticismo cageano) e bolha
ocidental(maximalismo stockhausênico). Um marinheiro que navegou pela área no final dos anos 90(f?) disse
que ficou atordoado com a visão do oceano de lixo plástico a sua frente. 'Como foi possível fazermos isso?' -
'Naveguei por mais de uma semana sobre todo esse lixo e nele me banhei'.
Pesquisadores alertam para o fato de que toda peça plástica(sample) que foi manufaturada desde que
descobrimos este material, e que não foram recicladas, ainda estão em algum lugar. E ainda há o problema das
partículas decompostas deste plástico(releituras). Segundo dados puros, em algumas áreas do oceano podem
se encontrar uma concentração de polímeros(harmônias) de até seis vezes mais do que o fitoplâncton(tríade),
base da cadeia alimentar marinha(melodia).
Todas a peças plásticas acima foram tiradas do estômago desta ave(como um canto do catalogue de
Oisseaux de Messiaen)
Segundo PNUMA(R.Murray Schaffer), o programa das nações unidas para o meio ambiente(os
higienistas do mundo sem ruído), este plástico é responsável pela morte de mais de um milhão de aves
marinhas(o canto das aves imitam os motores) todos os anos. Sem contar toda a outra fauna(subjetiva) que
vive nesta área, como tartarugas marinhas(carapaças geométricas), tubarões(dentes dos nervos auriculares), e
centenas de espécies de peixes(senhores do labirinto antes de sua cristalização plástica).
Essa deliciosa sopa plásticapode funcionar como uma esponja(aparelho de captura sinestésica), que
concentraria todo tipo de poluentes persistentes(guerrilha semiótica), ou seja, qualquer animal que se
alimentar nestas regiões estará ingerindo altos índices de venenos(propaganda ideológica), que podem ser
introduzidos, através da pesca(composição), na cadeia alimentar humana, fechando-se o ciclo, na mais pura
verdade de que o que fazemos à terra(à harmonia contextual) retorna à nós, seres
humanos(ouvintescompositores).
Seduções da Escuta
I.Musicaridade
“A música não funciona. Quantas canções de amor há e ainda não nos amamos?” John Lennon
1.1. Introdução à inefabilidade aural (Heráclito e o ruído do rio de fogo), incognosciência sonora
(Bachelard, o som e os sonhos, e a fenomenologia do efêmero) e irrepresentabilidade musical (a Jaula de Cage
no confissionário de Foucault).
1.2. Sedução e escuta (teleologia do gemido comparada à do gozo). Qual o som do sangue? A arte de
merda e o coração de ouro.
"Music is not a language. Any musical piece is akin to a boulder with complex forms, with striations and
engraved designs atop and within, which men can decipher in a thousand different ways without ever finding
the right answer or the best one. By virtue of this multiple exegesis, music evokes all manners of
phantasmagoria, as would a catalyzing crystal. - Iannis Xenakis
1.3. Três profundidades da pele do som (som-ruído-epiderme, música-derme,
som-silêncio-hipoderme). Três modos de amar sonoro: caridade (ágape-iemanjá), amizade (filia-iansã),
erotismo (eros-oxum).
1.4. Caridade como pressuposto da estética sonora (Caritas, ama de leite das musas). O anseio pela
beleza (criado por esta mesma) e da arte como consolo metafísico (variações do Zoroastro persa sobre o
Nietzsche compositor de liedez passando pelo Zaratustra cristão de Strauss, e Javé).
1.5. De como a beleza formal (Berio e o gesto musical nos escombros da Broadway) se recolheu ao
silêncio dos ruídos (Debussy e A Mar, Satie com as mobílias) devido à mercantilização da caridade (Smeták,
heremita no instrumento) levando-nos a uma proliferação da escuta plástica (pop, monotonia, emo e rótulos
do desamor moderno-romântico em Bowie e Veloso) na harmonia contextual (Schaffer e as relações entre
ecologia e economia) da atual acusfera (ciberfonia, capital é desafeto) transpassando os processos de sedução
por dança melódica (Amadeus irônico, Bach crente, Berlioz erotômano, Chopin sombrio, Lizst sarcástico)
na hierarquia da altura (Catherine Clemént na ópera com Freddie Mercury assistindo à derrota do feminino).
1.6. Resistência (musicoterapia e cancioneiro de auto-ajuda) e insistência (Coltrane e o Salmo ao
Amor Supremo) na caridade de escuta (Keulheutter e Andrômeda, Stockhausen e Sirius) e composição
geométrica dos fractais sentimentais-lógicos (Kepler, astronomologia e o compositor como composição) da
música.
“E não seria o dever a forma altruísta do amor?” Jean Paul Sartre em “A Imaginação”
"Sem o imperialismo do conceito, a música teria substituído a filosofia: s
eria então o paraíso da evidência inexprimivel, uma epidemia de éxtases" Emil Cioran

II.Filosonia
“Quanto maior o rio, menos ruído ele faz.” Provérbio Tupy
2.1 Introdução à impregnação (Novalis e a luz se decompondo em algo mais que cores e o artista
como sistema nervoso da natureza) por contágio aural (Diamanda Galas e o estupro de Adonis).
2.2 Harmonia entrópica ( Jung e a ausência de foco entropológico do silêncio imanente) dos afetos
(Aristóteles e as amizades como fim da Metafísica, políticas do corpo aural).
2.3 Ruído (“Fedor nos ouvidos. Música não-domesticada. Principal produto e testemunho
comprovatório da civilização” segundo Ambrose Bierce) e desperdício (Mark Twain e a galinha que gemia
como se botasse asteróides).
2.4 Inutilidade (Domenico DeMasi e Roussel tirando um cochilo na rede) como pressuposto tanto
da amizade (Cage e a gagueira de Buckminster Füller) como da composição de uma escuta (Arcano VI da
periferia orelha ao cerne do tímpano onde jaz o tambor do julgamento dos ritmos de encontro).
2.5 Melodia de timbres como fluxo do menor atrito (sintonia e sincronia) por entre as redes da
ruidocracia (Heidegger e a computação como fim da lógica ocidental).
2.6 Audioadicção (Burroughs e as duas abstinências, Cioran e o tédio) dos afetos (Crowley disse
“Bruxos[amigos] do mundo, uni-vos” enquanto Piva pixava nos poliedros “Xamãs[amigos] no mundo,
espalhemo-nos”) e capitalismo subjetivo do aparelhamento das redes (“pirate ships in the chips animals
territories”).
“So don't fear if you hear, A foreign sound to your ear, It's alright, Ma, I'm only sighing.” Bob Dylan
III.Erotonia Tácita
“Prometeu é antes um amante vigoroso a um inteligente filósofo.” Mircea Eliade
3.1. Introdução ao erotismo do tom silencioso (drone, monoatonia e o mantra do ruído).
Metamorphopoiése e o intrincar entre processo e produto (Arcano III do contraste ao envelope), o
palestrante não falará mais, mas apenas incitará os presentes à ação.
3.2. Práticas acústicas (foco auditivo, morfomicrofonação, dançaural).
3.3. Práticas acusmáticas (rugosidade, fluência e corte-ex em edição sonora).
3.4.Práticas harmônicas de acústica contextual (fonosmose, equalização, regência de objetos sonoros).
3.5. Práticas aurais (metaescuta, retroescuta, dançaural).
3.6. Práticas radiais (projeção, difusão, radiação, emanação).
“Através da obediência ativa [ao desejo], a audição torna-se sensível e clara.” Hexagrama Ting do IChing
Duvide
...duvide.deste.texo.e.todos.os.outros.que.vierem.a.te.entregar(serão.muitos.e.todos.querem.algo
)...duvide.de.qualquer.coisa.ou.pessoa.que.se.diga.imparcial...duvide.dos.professores.e.mestres.do
s.quais.não.gostar,mas.principalmente.daqueles.com.os.quais.encontrar.alguma.afinidade...duvi
de.dos.livros:clássicos,dos.últimos.lançamentos,dos.ditos.com.temporâneos,autênticos,originai
s,modernos,libertários,marginais,catedráticos...duvide.dos.rótulos...duvide.dos.métodos,sejam.e
les.racionais,empíricos,trancendentais,formais,passionais,corporais,experimentais.e.até.mesmo
.inexistentes...duvide.da.fé,mas.isto.ainda.é.ter.fé.na.dúvida...dos.que.só.rezam.e.dos.céticos...duv
ide.dos.limites,os.que.você.se.impõe,os.que.lhe.são.impostos.e.os.que.você.impõe.aos.outros...du
vide.dos.grupos,principalmente.os.com.pretensões.políticas(unanimidade.é.quase.sempre.estúpi
da.e.sempre.uma.mentira)...duvide.dos.políticos(e.saiba.que.você.também.o.é)...duvide.dos.altruí
stas.de.toda.laia,sempre.querendo.impor.aos.outros.o.que.é.bom.para.si...duvide.da.ajuda,princip
almente.da.autoajuda...duvide.da.piedade,esta.crueldade.mascarada...de.frases.conclusivas(como.
todas.nesta.folha).e.preste.atenção.especial.a.palavras.como.sempre,todos,nunca,sim,não,claro,
óbvio...duvide.de.quem.fala.em(e.ou).por.nós...duvide.das.aparências,sejam.elas.quais.forem...do.
que.quer.que.queiram.passar.por.essência...das.primeiras.e.segundas.impressões(que.sempre.resg
uardam.intenções)...duvide.dos.avanços.tecnológicos,da.grana,das.dívidas,do.consumo...das.solu
ções,mais.cuidadosamente.ainda.das.que.se.mostram.fáceis...duvide.das.instituições,entre.as.qua
is.ressalto.pátria,família,empresa;que.a.única.ordem.é.o.caos.e.o.humano.somos.um.bicho.vicia
do.em.poder...das.regras,que.o.jogo.é.de.quem.o.joga;jogue!,duvide.de.quem.diz.que.não.o.faz...d
as.posições.definidas(e.definitivas).dos.estereótipos...duvide.da.lógica...duvide.de.quem.não.tem.
opinião.e.de.quem.tiver.uma.inflexível...das.leis,sociais,morais.e.físicas...duvide.de.quem.finge(p
ara.os.outros.ou.para.si.mesmo)não.usar.drogas...de.quem.não.ri.ou.ri.demais...duvide.da.históri
a,conto.da.carochinha;com.isto.duvide.também.das.biografias(incluindo.a.sua)...duvide.dos.mit
os.e.ritos...duvide.das.metáforas,silepses,metonímias.e.paranomásias...duvide.do.bom.gosto.co
mo.do.desgosto...duvide.com.razão.dos.sentidos.e.com.sentido.das.razões...duvide.de.quem.não.
te.olha.nos.olhos.quando.fala.e.de.quem.olha.também...duvide.da.paranóia...do.medo,da.esperan
ça,da.dor,da.alegria...duvide.da(in)felicidade...duvide.dos.homens,mais.ainda.dos.bons.moços.e.d
as.mulheres,principalmente.se.se.disserem.virgem...duvide.de.qualquer.cura,estamos.todos.mor
rendo.e.isto.é.o.único.fato...duvide.da.morte.se.quiser,de.qualquer.forma.ela.virá...duvide.de.que
m.não.pratica.o.que.prega...palavras.sussurram,.gestos.berram...duvide.de.ambos...duvide.da.lou
cura.dos.normais.e.da.normalidade.dos.loucos...duvide.de.todos.os.padrões.e.patrões...duvide.das
.vozes.autorizadas...de.todo.poder(incluindo.os.seus)...da.boa.vontade...dos.beijos,dos.abraços,do
s.olhares...e.se.encontrar.alguém.em.quem.queira.confiar,duvide.del’.sem.rancor.ou.cobranças...
duvide.da.sexualidade:bi,hetero.ou.homo,que.quem.é.alguma.coisa.perde.a.delícia.de.todas.as.ou
tras...duvide.do.amor,mas.ame...da.opção.ou.falta.de...e.da.liberdade,é.possível.se.viver.preso.a.el
a...e.dos.ignorantes,que.ignoram.o.que.querem.e.dos.inteligentes.que.interligam.o.que.querem.t
ambém...duvide.da.inocência...de.quem.não.se.leva.a.sério.ou.se.leva.demais...das.conversas.de.bo
teco.como.das.aulas...dos.amigos.como.dos.inimigos...de.seus.sonhos,estes.paraísos.perdidos...do
.presente,passado.e.futuro...dos.conceitos,tentativas.de.congelar.o.rio.do.e.terno.devir...duvide.d
o.que.você.quer...das.vã.guardas.artísticas...duvide.da.arte...das.sociedades,mesmo.que.não.haja.c
omo.não.ser.parte.duma...de.toda.moda(prática.de.rebanho)...duvide.de.ídolos,deuses.e.dogmas..
.a.dúvida.é.o.cerne.de.toda.conspiração;duvide.das.conspirações...duvide.de.quem.representa.um
.só.papel.ou.se.diz.fora.do.palco...de.quem.só.duvida.como.de.quem.não.o.faz...mas.antes.de.tud
o,duvide.de.si.mesmo...isto.tudo.é.só.uma(a.minha)opinião... alguma.dúvida?
FRNZKFK080908
1.PAUTA:
“Toda a educação assenta nestes dois princípios: primeiro repelir o assalto fogoso das crianças ignorantes à verdade
e depois iniciar as crianças humilhadas na mentira, de modo insensível e progressivo”
1.1.A viabilização da gravação digital do material necessário para a apresentação de uma videópera
binaural para o Festival Tsonami [http://www.tsonami.cl].
1.2.A produção desta ATA, servirá de Programa da Performance Multimídia.
1.3.FRNZKFK Vendo chover em Macondo.pdf

2.DO OBJETO FINAL:


“A forma, o lastimável, uma mísera sombra refugiada no recanto mais distante do reino.”
2.1.Do Público Alvo:
Freqüentadores de uma repartição pública
na cidade de Valparaíso no Chile, um
espaço de fluxo e de pouca fixação
mnemônica onde a programação anterior
se pautava na programação corriqueira da
teledifusão chilena. “Quem procura não
acha, mas quem não procura é achado.”
2.2.Do Formato de Apresentação:
Dois televisores próximo ao teto nas
colunas laterais de uma sala de espera e
atendimento público com dois sistemas
de som independentes. “Mau é qualquer
coisa que distraia.” A obra consiste em
um vídeo que transita entre duas telas,
com sons distintos formando uma
atmosfera quadrafônica. “O mal conhece
o bem, mas o bem não conhece o mal.”

3.DO PROCESSO:
“Existe uma meta, mas não caminho; o que chamamos caminho não passa de hesitação.”
3.1.Nomes Possíveis: “Das Näch Ohr”(A Orelha Noturna) ou “Café Ka”.
3.2.Data de Gravação: Sexta-feira, 03 de Outubro de 2008 a partir das 18h07min. “O tempo é teu
capital; tens de o saber utilizar. Perder tempo é estragar a vida.”
3.3.Da Gravação: “Talvez haja apenas um pecado capital: a impaciência. Devido à impaciência, fomos
expulsos do paraíso e por ela não podemos voltar.” São três(3) movimentos interativos iterativos:
I)Um primeiro tateando as intuições do espaço de cada um. "Quem possui a faculdade de ver
a beleza, não envelhece." Em cortes secos e curtos sempre em silêncio para a concentração da equipe,
bem como para a captação dos microrruídos do espaço. “Um homem de ação forçado a um estado de
pensamento é infeliz até que consiga sair dele.””As Sereias têm uma arma mais fatal que seu canto;
seu silêncio do qual o ouvido não se tapa.”
II)Repetição o mais próximo possível da primeira gravação, mas desta vez com vozes sussurradas que
surgem atrás da lente e uma tentativa de dar fluidez entre os cortes propostos na primeira gravação.
"Talvez haja apenas um pecado capital: a impaciência. Devido à impaciência, fomos expulsos do
Paraíso; devido à impaciência, não podemos voltar."
III)Gravação sem imagem das vozes em off e de objetos tidos como relevantes à edição final
do material durante o processo. “De um certo ponto adiante não há mais como voltarmos. Este é o
ponto que deve ser alcançado. Há muita esperança, só não para nós.”
4 . AMBIENTAÇÃO:
A cidade de Som Caos adentra pelas frestras. "Lento é o rio, rápida a sua sombra. Um peixe sobrevive
ao mar e seu naufrágio.” O edifício é o corpo burocrático do pai. O edifício é a relação das portas da percepção
com o muro material. Os objetos clamam mais a câmera que os homens. “He is interested in the feelings of
the squash ball, and of the champagne bottle that launches the ship. In a football match his sympathy is not
with either of the teams but with the ball, or, in a match ending nil-nil, with the hunger of the goalmouth.”
O edifício é o órgão sem corpos do estado, o brasão da cidade. O escritório pós-burocrático é a festa dos
sentidos expandidos, mas só dentro do cubículo silencioso. “Não é necessário sair de casa. Permaneça em sua
mesa e ouça. Não apenas ouça, mas espere. Não apenas espere, mas fique sozinho em silêncio. Então o
mundo se apresentará desmascarado. Em êxtase, se dobrará sobre os seus pés.” O escritório não vai sanar os
problemas da repartição pública nem a fila. Há filas para o vazio. Os elevadores dançam para filmar a câmera
de vigilância. As placas dos escritórios gestam poemas. O escritório é o corpo icônico do filho.“As minhas
interrogações servem apenas de aguilhão para mim mesmo. Só quero ser estimulado pelo silêncio que se
ergue à minha volta como resposta derradeira. «Até quando conseguirás suportar o facto de que o mundo dos
cães, tal como demonstram cada vez com mais evidência as tuas pesquisas, está para sempre votado ao
silêncio? Até quando conseguirás suportar esta ideia?» Esta, esta é que é a verdadeira grande interrogação da
minha vida, uma interrogação perante a qual as outras interrogações se tornam totalmente insignificantes.
Uma interrogação que diz respeito apenas a nós próprios e a mais ninguém. Infelizmente, posso
responder a esta interrogação com mais facilidade do que às interrogações específicas: aguentarei,
provavelmente, até ao meu fim natural. A serenidade da velhice irá formando uma resistência cada vez maior
a todas as interrogações inquietantes. Tudo indica que hei-de morrer em silêncio e rodeado de silêncio, na
verdade até de forma específica, e antevejo isso com uma certa tranquilidade. Um coração admiravelmente
resistente, pulmões que é impossível ficarem fracos prematuramente, foram-nos dados a nós, cães, como que
por ironia. Assim, sobrevivemos a todas as interrogações, inclusive àquelas que colocamos a nós próprios,
como autênticas fortalezas de silêncio que somos.”
Um dos aspectos mais importantes da obra de Franz Kafka (1883-1924) é a sua crítica implacável dos
fundamentos do Estado moderno, sobretudo no que concerne
à mecanização da vida contemporânea e ao surgimento de
uma elite administrativa altamente burocrática, hierarquizada
e despótica. Ou seja, uma análise sobre as conseqüências
políticas, espirituais, morais e filosóficas que a modernidade,
de um modo geral, desencadeou na estrutura social. “Na Era
Medieval o temporal era inessencial em relação à
espiritualidade; no século dezenove o oposto ocorreu: o
temporal era primário e o espiritual era o parasita inessencial
que torturava-nos longe do tempo tentando destruí-lo.”
Kafka é conhecido como uma das consciências mais agudas
com relação à fratura de sentido na modernidade: esta fratura
significa – para além da derrocada dos "mecanismos"
metafísicos – a "nova" condição moderna de não possuir a
"ingenuidade hermenêutica" necessária na qual se constrói a
trama dos sentidos, esta "novidade", produto da técnica
conceitual-administrativa humana, revela para nós que o
corpo dilacerado no qual habita a fratura não é mero fruto de
um deus qualquer, mas resultado de um projeto humano de
futuro que permanece ativo e para o qual não há retorno – o
ruído dessa fratura é o cinismo ou a mentira sobre si mesma. "É como se alguém tivesse de subir cinco
degraus de escada e uma segunda pessoa apenas um degrau, mas que, pelo menos para ela, é tão alto quanto
aqueles cinco degraus juntos; O primeiro vai vencer não só os cinco degraus, mas também centenas e
milhares de outros, terá levado uma vida ampla e muito fatigante, porém nenhum dos degraus que subiu terá
sido para ele tão importante como, para o segundo, aquele degrau único, que não só pode subir, como passar
por cima." Kafka nunca esteve na Amerika.
5. PERSONMARGENS:
Nenhum rosto será filmado. “O primeiro
sinal de entendimento é a vontade de morrer.”
Todos estão vestidos de terno e gravata.
“Associar-se com seres humanos arremessa-nos na
auto-observação.” Todos são Kafka, ninguém é
Kafka. Cada qual foca um aspecto de Kafka trazendo
para este um enfoque irreferencial. “Poucos, mas
fiéis, amigos.” Como a comunidade, estes não
aceitam nem explicam os demais. “Assim existe aqui
muita coisa a ser cogitada; mas isso não é nada
quando comparado com o fato de que a admissão
pública é um processo muito meticuloso e o
membro de uma família de algum modo suspeita é
rejeitado de antemão; esse indivíduo se submete,
por exemplo, a esse processo, treme durante anos
diante do resultado, por todo os lados lhe
perguntam, com espanto, desde o primeiro dia,
como pôde ousar algo tão sem perspectiva; mas ele
espera –como poderia viver de outra maneira? -,
mas depois de muitos anos, talvez já ancião, ele fica sabendo da rejeição, fica sabendo que está tudo perdido e
que sua vida foi inútil.” Um processo artístico deve ser um machado que quebra o gelo entre nós. “Ours is a
lost generation, it may be, but it is more blameless than those earlier generations.” Os coadjuvantes sempre
conspiram contra os protagonistas. Ethos e Cosmos se integram, mas um não se dilui no outro. Em Kafka,
um agulhão de estranhamento parece estar implantado nas próprias entranhas de cada homem e impede a
possibilidade de uma síntese pessoal estabilizadora.
Dot,
Aqui, o tempo vira espaço. A mala por fazer. Não mais os salões de festa, mas as estações. Cada rosto é um
espelho. Caso não te lembres do que eu te disse, leia a carta. Mas adicione deliciosas futilidades.

Quando enfim meu coração explodiu... Não importa aonde fui, incluindo aqui, foi tudo contra meu
melhor julgamento. É, essa seria uma ótima inscrição para o meu túmulo.
A morte é real, ela vem sem avisos e não pode ser evitada.
Carmen cantarolava Carmina Burana olhando o armário do policial, guerra e paz da vida privada. A
vida sempre me pareceu patética, a humana um pouco mais. O maior vício humano depois da vida é o açúcar,
formigas no trânsito de transes. Me passa um cigarro! A lei me permite fumar em cena. Acende pra mim,
gato.
Mulheres e elefantes nunca esquecem. A cura para o tédio é a curiosidade e não há cura para a
curiosidade. Não há cura para o amor nem para a morte. Melhor um pão molhado de lágrimas a outro seco e
sem sal. Me incomodam tanto estes programas televisivos sobre programas televisivos. A vilania dos homens
provêm principalmente das fraquezas de suas mães. Qualquer mulher que aspire a comportar-se como um
homem, claramente carece de ambição.
Mas à raridade dos homens vislumbram somente as mulheres que usam óculos. No mais, restam os mesmos
cortes de camisas com brasões. Não se reproduzam! Não cedam às besteiras de nenhum tolo presente na
noite. Eles dizem que há algum problema conosco. Talvez uma falta de senso de oportunismo.
Deixei o peso de minhas quinquilharias com Luther King, um homem se mede além do olhar...
Quando vier a nova caça às bruxas, podem me colocar na lista negra de Holly Would to all tomorrow
parties. Meninas, cuidado! O casamento é a mais perigosa das armadilhas... Não! O amor é a maior armadilha
que existe.
Imaculada concepção, combustão espontânea, fogo fátuo. De que adianta legalizarem o álcool e
criminalizarem os outros doces venenos. Babilônia, mãe de todas as prostitutas incluindo burocratas e
empresários, no meu tempo se bebe para falar a verdade ou para calar os ouvidos aos estúpidos. Se você quer
saber o que Deus pensa sobre o dinheiro, olhe as pessoas que ele fez ricas. Um pouco de mau gosto é
como uma pitada de páprica.
Somos o que resta de um desastre que nos matou tanto mais quanto mais noites em claro passamos
amaldiçoando nossa incapacidade de viver desse jeito, nossa inabilidade de ser como tem que ser, nosso jeito
de fazer tudo errado, reclamar tudo errado, viver tudo errado.
Mas como? Somos tão loucas, tão histéricas, tão gostosas... Não pense que só os senhores do destino
alheio estiveram entre minhas ancas, também os loucos e doentes me alimentaram os amores.
Desastradas e sensuais, cortesãs de um mundo decadente. Nossa miséria não tem preço. Eles não
podem tirar nossa morte de nós. Porque amar significa conviver com um estado de insatisfação plena diante
do outro. “Comporte-se! Isso não é jeito de falar... Cale-se, não era esse o momento de expor tais questões.”
Nojo destes convencidos de estar na lenta e inútil caminhada em direção à melhoria social.
Mas esta é uma questão de quem vai viver e quem vai morrer. É preciso inscrever a morte que anda
conosco, encarná-la como sapatos de salto alto e depois nos perfumar na maior cara de pau do mundo, com o
cheiro dos vivos. Incontáveis segredos carregam minha buceta.
Somos, assim, as estrelas de um teatro feito de realmente mortos, outros que vivem como mortos, e
uns poucos duma platéia de demasiado vivos, seduzidos em seu desejo de entendimento, bagunçados em seus
sentidos estéticos, poéticos, temporais e até mesmo na futilidade de suas espiritualidades de mercado.
E como não somos do tipo de madame que goza da possibilidade de descanso (advindo da sorte), é
destes paradoxos que pode surgir o amor (e talvez tal sorte). Sendo assim, continuamos. Nas esperança do
vivo de que isso seja mesmo assim; e na desesperança do morto, de que disso nada possa ser.
Os idiotas não vão nos entender mesmo. Meu trem chegou, adeus.
Check

"Filho de um servo, ... servente de loja, cantor na igreja,


estudante do liceu e da Universidade, educado para a
reverência de superiores e para beijos de mão, para se
curvar perante os pensamentos alheios, para a gratidão
por qualquer pequeno pedaço de pão, muitas vezes
sovado, indo à escola sem galochas."
“A história começa a meio, continua inesperadamente e acaba no fim tornando-se invisível. As personagens
aparecem, movem-se, estão em casa, falam, comem, vão à rua, dormem, respiram e continuam vivas para além
dos aplausos.” – Anton Pavlovitch Tchekov.

•Espaço Protagonista: A transformação do conceito de protagonismo sofre um desdobramento


cabal na obra dramática de Anton Tchekhov, processo que trespassa "A gaivota"(1896); "Tio Vânia"(1897);
"As três irmãs"(1901) e "O Jardim das Cerejeiras"(1904). A partir de um rearranjo da ordem de escrita das
peças, desde os próprios títulos das mesmas, observa-se o crescente afastamento de Tchekhov desde um
protagonista-único até um protagonista-espaço, através da pulverização da figura do sujeito atuante até a
atuação de campos de subjetivação como personagens. Este artifício estético revela, por fim, a inserção do
autor nas correntes filosófico-ideológicas que consideram a verdade como um conceito contextual e
historicamente situado. Destarte, tal forma de encarar o espaço público como palco da subjetividade coletiva
afirma a importância da obra tchekhoviana como uma das fundações do pensamento sociológico relativista, a
monadologia da diferenciação ou harmonia diferencial.
•Conto Sonoro: O conto é uma forma narrativa, em prosa, de menor extensão (no sentido estrito
de sua duração). Entre suas características, estão a concisão, a precisão, a densidade, a unidade de efeito ou
impressão total – da qual falava Tchekhov (1860-1904): O conto causa um efeito singular no leitor; excitação
da memória e emotividade humanística. Um conto sonoro privilegia a crueza factual da escuta de uma prosa
resonante em relação a qualquer poesia musical. A concisão dos eventos sonoros gesta uma densidade da
escuta dos silêncios programados em unidade às especificidades do local da instalação sonora e da arquitetura
afetiva do ambiente.
•Invenção dos Museus: A institucionalização dos museus públicos no final do séc. XIX coincide
com a emergência de um novo escopo de conhecimentos - geologia, biologia, arqueologia, antropologia,
história e história da arte - cada qual, em suas funções de arranjar os objetos encontrados no mundo externo
de acordo com uma sequência evolucionária disposta num espaço (a história do planeta, da vida, do humano,
da civilização, de um indivíduo) formando uma ordem totalizadora das coisas e dos afetos que passavam a ser
historicizados mais e mais através da invenção dos jornais. O museu, bem como a sala de concerto, é a casa da
arte, cárcere seguro da escuta institucional. Os contos de Tchekhov são um museu de afetos cotidianos e ele é
o gênio da escuta da vida alheia .
-Um Conto Sonoro: A Exposição de Museu do Artista Protagonista: A vida de Anton
Tchekhov exemplifica a mudança do campo mitológico de dentro da escritura para a própria biografia
do artista, dos deuses ao gênio. Umvida de servidão, como médico popular e também no devaneio
noturno da escrita. E sua obra está prenhe dos paradoxos desta atuação continuada do nascente
trabalho industrial e as tensões encontradas nos entremeios dos relacionamentos urbanos. A escuta
do outro e a servidão artística tem como meta seu mito póstumo de honrarias por parte das
benfeitorias públicas de serviço social cultural. Para melhor ouvir o espaço do museu em sua
atualização do protagonismo de seus visitantes, propomos dividir a escultura acústica do museu em
duas secções: uma externalidade objetiva e uma internalidade subjetiva.
•Fora {ainda dentro}: O campo de audibilidade possível de Anton Tchekhov ou as mudanças da
paisagem acústica na Rússia do século XIX, da nostalgia naturalista à industrialização da escuta, do
iluminismo musical romântico até o nascimento do kitsch na tragédia da escuta. Imagens sonoras para uma
escuta paisagística. Por se tratar da entrada da exposição, mantemos o modelo representacional utilizada
comumente numa instalação sonora.
-Bosque de Entrada: Uma instalação sonora sutil, como a de qualquer exposição de museu,
que represente o tema tratado sobre a escuta do outro (o mito-artista), aspecto da distância do
contista e do contado através da ótica pedagógica do objeto-sujeito, uma poética dos sons concretos
em música impressionista.

“1. ausência de palavrório político-ecômico-social; 2.objetividade total; 3. veracidade nas descrições de personagens
e objetos; 4. brevidade extrema; 5. ousadia e originalidade; 6. sinceridade.” - Anton Tchekhov em carta ao irmão.
“Tchekhov demonstrou melhor do que ninguém que a ação cênica deve ser entendida do sentido interno (...).
Enquanto a ação externa no palco distrai, diverte ou incita os nervos, a ação interna contagia,
abrange nossa alma e toma conta dela.” - Konstantin Stanislavski.

§Flores de sons: Da obra de Anton Tchekhov são intuídos diversos contos sonoros (o
vento e palavras de amor, carroceiros, estatuetas manuseadas, gaivotas, navios, neve, lona de
circo, seringas, etc.) num espaço acústico mínimo, de densidade sonora sutil que transitam
pelas 06 caixas de sons no desdobramento fractal de uma boneca russa ( матрёшка). Tal
aparelhagem deve estar visivelmente enraizados na arquitetura das árvores secas, expondo a
natureza kitsch da representação e gravação dentro do ambiente-museu. A fina ironia dos
trabalhos de Pavlovich deve se antepor ao desejo de austeridade do compositor.
§Arcondicionamento: Posicionar folhas sêcas amarradas com fios metálicos em
frente aos exaustores de climatização ambiental para, ao mesmo tempo, disfarçar o ruído da
aparelhagem técnica enquanto chama atenção para a existência deste e do mascaramento
naturalista (Народничество).
§Toaletes e Refeitório: Sobre a porta de cada um dos toaletes tocam duas
composições para caixinhas de música (Баба Яга & Коще́ й Бессме́ ртный) que se
somam no ambiente do refeitório.
•Dentro {ainda exposto}: As relações de tensões entre personagens dão vazão a uma arquitetura
acústica que revele os paradoxos da escuta entre a musicalidade interna e o ruído externo, entre o
sujeito-objeto mito-artista da exposição e sua posição museológica (os serventes e técnicos). Construir uma
paisagem sonora que desconstrua a escuta de si no outro, uma prosa microruidosa sobre a escuta musical
expressionista utilizando material adquirido durante o processo de montagem da exposição de acordo com as
especificidades locais.
“O vinho e a música sempre foram para mim um magnífico saca-rolhas.” – Anton Pavlovitch Tchekov.
-Salão dos Vultos: Uma instalação sonora de representação e resonância subjetiva que
posicione o espectador diante de si e dos outros ao seu redor, questionando a micropolítica do conto
tchekoviano. A música como palco da escuta no século XIX, nossa ancestralidade mais próxima, que
acompanha o movimento onde a mitificação deixa o imaginário mitológico em direção às relações
entre indivíduos (cada vez mais parecidos e isolados).
§Palco: Sons que mesclam a atmosfera de uma casa, um teatro, uma repartição
pública e um encontro social (balbucios, passos, nomes, atmosfera da cidade, etc.) saem de
dentro do palco central entremeadas de musicações que orbitam um carrossel composto com
excerptos de concertos de compositores locais da época (Tchaikovsky, Rimsky Korsakov,
Mussorgsky, Balakirev, Stravinsky, Rachmaninov, Shostakovitch, etc.) Um som forte de
cadafalso ocorre aleatoriamente aproximando palco e forca e cortando a cena.
§Espelho Sonoro: Um microfone pendurado sobre o palco, ligado a um aparelho de
modulação temporal, especialmente criado para a ocasião, cria um efeito de dilatação do
tempo e espelhamento das vozes. Como no conto tchekhoviano, as relações entre o
trocadilho linguístico e a ironia da vida surgem mesmo que amparados na ausência total de
um clímax, ou mesmo de um evento.
-Sala das Cadeiras: Contar sobre metareciclagem dos espaços através de objetos abandonados
e suas arquiteturas subjetivas de Tadashi Kawamata relacionadas com as arquiteturas Merzbau de
Kurt Schwitters e a sonoridade de Masami Akita (Merzbow). Trazendo um olhar contista sobre os
espaços fractais contemporâneos.
§Cadeiras: Os serventes do museu são entrevistados e suas vozes são usadas como
instrumentos para compor sons que se movimentam por 04 cadeiras do espaço
tridimensionalmente. Uma ocupação da exposição por parte do museu, de dentro para fora,
com a presença dessas histórias com seus cantos e contos.
§Pulsação ambiental: Uma caixa de subgraves é responsável pela execução de peças
abaixo de 40Hz que vibrem as cadeiras e o próprio ambiente sem interferir nas atmosferas
acústicas adjacentes.
“É o peso do passado e a insatisfação com o presente que isolam os homens.” – Anton Pavlovitch Tchekov.

-Sala da Escrivaninha: Captar a atmosfera de um escritor enquanto escreve, justamente um


escritor de “contos de atmosfera”, como o chama Boris Schneidermann. Enfim honrar a
simplicidade interior do compositor em meio a um mundo de contínuas relações.
§Atmosfera harmônica: Um falante no teto emana um som sutil (silêncio
programado) advindo de um estudo das correspondências de Tchekhov com seus amigos e
familiares (Górki, Stanislavski, Tolstoi, irmão, etc.) onde se buscará um encadeamento
harmônico preciso que se aproxime o máximo da tensão relacional do autor. A influência
aqui é claramente advinda da escola de síntese ondular russa, em especial a de Edward
Artemiev.
§Escrivaninha: Um outro falante sob a escrivaninha emite uma gravação do próprio
museu esvaziado.
-Sala dos Armários: A relação da escrita de Tchekhov com os contos orais da cultura russa
(были́ на) postulado como proto-cibernética, cooperativismo de redes e colaboracionismo da
propriedade intelectual coletiva. O outro no autor.

“A cidade em Tchekhov se desdobra como um conto do tempo no espaço.” – Mikhail Bakhtin.

"Festejou-se o aniversário de um homem muito modesto. E apenas no final do banquete é que se percebeu que
alguém não tinha sido convidado: o festejado." – Anton Pavlovitch Tchekov

§Armários: Uma seleção de obras de novos artistas eletroacústicos (russos e


brasileiros) faz com que cada armário tenha um distinto foco, outras escutas sobre o tema da
alteridade do soar.
§Telégrafo: As letras do nome do autor atravessa o espaço da exposição na forma de
quase imperceptíveis sinais em código morse.

“Cada uma das obras de Tchekhov é resolução de problemas exclusivamente vocabulares.


Suas asserções não são verdade arrancada da vida, mas uma conclusão exigida pela lógica das palavras. A vida
apenas se esboça indispensavelmente, atrás dos vidros coloridos da palavra.” - Vladimir Maiakovski.
Prousit!
“As pessoas querem aprender a nadar
e ter um pé no chão ao mesmo tempo.”
Marcel Proust(1871-1922)

Prelúdio:
A compositora da ópera, Fernet Ribeiro, trajando terno branco e camisa vermelha bebe uma dose de cachaça e
derruba outra no chão saudando a Exu Veludo e Maria Padilha:
“Zaybaq! Àquele andrógino que vive a noite, que nos livre das emboscadas dos gêneros e dos gênios!”
Sai do palco e a cantora, Anna Maria Kieffer, entra e canta as borras do chá que toma vestida em gala. Sobre o
palco se projeta a arte visual de Alessandra Galasso e ao fundo projetado um vídeo previamente realizado com o seguinte
texto.

Primeira Copa:
Após a morte de Celeste Aurabet, sua doce e
sensível empregada doméstica, Macabéa Matamoros
retornou ao quarto no qual a patroa passou seus últimos
dias esquecendo e escrevendo, lembrando e apagando.
Trouxe consigo as pratarias e louças do café como sempre
fez, sem saber bem por quê mas mais pelo tato da bandeja.
Lentamente serviu o café duas vezes fervido em uma das
xícaras brancas, nas quais nunca pôde beber antes, e
seguindo o último pedido da Senhora Aurabet, misturou
ao café suas cinzas mortuárias. Macabéa então tomou o
café e passou a observar os desenhos formados nas borras
à xícara. Aos poucos, estes começaram a se mover e ela
entrando em transe viu se formar na parede de cortiça
uma platéia onde todos usavam máscaras com o rosto do
Mounsieur Proust. E ela cantou:
“Celeste nome, bios rara tempo gota ao vento finda
Sea vox melikraton saccharomyces cerevisiae
Ganimedes flui a escald’lux até o limite do corpórtico
Physis eidos ethos, tales los nepós de Hýdor
It begins as a swann’s song for Lady Lake, Lethé Odile dried
Pergunta o nome do barqueiro Mar Rio Peixoto sem resposta
Shall not drip and drain these classwar mind games
Como é triste ser sozinho num ambiente competitivo
Why should I be affraid of dying? There’s no reason for it too, Bloom
Prometheos on the rocks, paixão primeira dos abutres
Ambrósia além darca, a selva gema or valho na pena e pomba
Gira os pires de porcelana te recebendo ao mas
Ah! A vida dos outros! Os sumos de Madalena e Odette
Já não há a espera , mas insone brusca
Brilho notívago das cortísis, há águas em mim que morrem de sede
Cahier Noirs em mãos de fogo, asma , sibilante tronco de pulma
Obscuro salta no salto da rede de moinhos no óleo da boca
Te oferece o espiral kýkeon à kundalini, kibombo a Eupalinos
DreamK! Clamam as bocantes viscosas de almas úmidas
As paredes do quarto estouram feito rolhas
Podes ver o mar de máquinas moles, delírio pastoso de Nun
Carnaval ele mesmo, Aeon chupando Kronos
Who would stop from brandying? Who is on top the are aim?
Onde estará? Ei! Vocês viram Marcel por aqui?
Batizado a üng uento oliva das copas, veias das ramagens
Cheiro de rum, bebiam o cadáver da avó, bebeu também
Moderação ao vinho dos amores teóricos no banquete
Um primeiro gole de cicuta, depois galo abatido e sangria
Já percebeu o quanto de paixão os livros te roubaram, Gide?
Yeshwa liberado do ofício de engarrafar vinho com hóstias, cambaleia
Sedento pelo mar morto bebe em romanas lupitetas, a Javista ri
Ág ua de beber! Água de beber, camará!
É embriagado, engessado, torto e mal copiado
Desce a espinhosa videira e desperta entre suas estátuas de açúcar
Quando o vinho avinagrou na boca do Areopagita
E a ig’rija invernante pôs seus dementes em hábitos a gozar no subsolo
Para manter o Baphomet dançando em Daath sentado sobre os foles
Bebendo os suores áfogo de correntereza dos tao quimistas
Gestando a sauna divina do órgão [TOSSIR]
A vaca indiana mugiu: sei, vá por ser... veja como transbordam as válvulas peitorais
Não há tinta para marcar as escrituras no Livro de Ág ua
O álcool transpirado pelos poros do pai cheiravam aos gritos da mãe
Barbitúricos nos vitríolos do nigredo, o polvo disse que com a fé se enévoa
Derruba um pentáculo com o vitrúvio marcado
Onde se lê em roxo sobre amarelo “Ao falar sobre a ág ua
Apresente primeiro sua experiência, só depois sua reflexão”
Ou ainda que sangue verde mal absinto dos cantos da garg ulanta
Potamos o fermentar metabólico dos tomos, Lautrec foi-se com elas
O lagarto andou sobre as ág uas até a boca do crocodilo
Jabir Geber, cachoeira de aqua régia desde a cratera lunar
Desthilo as cordas puxam os magnetes a fluir os eletros
Em busca do cálice ergueriam barragens chamadas estradas e portos
Cavalgariam cisnes fossem corcéus marinhos
Até quando gotejarão os narcisos ecos de imagens?
O quarto é uma piscina no meio do mar, um nariz assoa trens a vapor
Albertti perguntava à perspectiva de outro copo: Albedo?
Hangover Beethoven and dig these klangfarbentanz in blue
Benjamin coleciona fotos de Marcel, lírico em épocas de passagens
Para compor uma Kulturgeschichte des Wassers, Monet preferia o lago
Os canais da arcada lembram: Ei-lo hey low... Ah! Meu primeiro porre!
O que sai não é o mesmo que entra , Bocca... Palavrômito! Quando Omar
Enfim repleto de aquários, como distingüiremos a água do cristal? Vas!”

Segunda Copa:
No momento exato da morte de Clara Nunes, a forte e impetuosa
filósofa Catherine Clément retornou às cochias da casa de ópera e vestiu-se
com um uniforme de laranja mecânica. Trouxe consigo librettos, fanzines e
uma garrafa de moloko sem saber bem por que mas mais pelo cheiro do
papel com leite. Ligou um projetor que passava uma encenação da primeira
copa da liqüifonia Prousit! Abrindo o libretto da mesma ela cortou o dedo
anular. O sangue de seu dedo escorreu até o copo se misturando ao moloko.
Catherine então tomou o moloko e passou a observar as estruturas da casa
de ópera desmontada, das roldanas que seguram as cortinas no ângulo da
abóbada às cadeiras sobre os tapetes passando pelos parapeitos e
candelabros. Estes começaram a falar-lhe coisas e ela entrando num transe
dançou suavemente pelo espaço esvaziado. E ela cantou:

“Ouves? Das vigas desta ópera berra Violante: Lasciatemi more rir!
Menstruação de todas las Dianas, Ariadnes e demais tóuroxs de arena
Quero beber o veneno que sai de meus lábios enquanto rego as malas
Como Cobain toma ômensêmem do chefe Seattle no meio da passeata
Sem outro curso que destroçar das paredes, arquitetura rui fluida nostalgia
Liebestod é a finalidade secreta de ópera, Tristão... O mar é ádeus e rastelo
Minha tia Ophelia gostava dos líquidos fritos, silêncios e aves ribeiras
E eu via no olho de peixe da jarra metálica suas mãos molhadas
Olholvidos não são adequados ao perfume, heroíno
Humilha-te a Grenouille e aprendei do gelo seco o que é a caipirinha
Carmem te trocou Don José, não mirando o toureiro mas à ciranda tourear
E descontrolado a apunhala pelas costas sem nem ao menos beber da ferida
Lava as mãos, suja o falo de merda molhada de diarréia e sai de cena
Pressentindo a violência do marido, Nedda tenta escapar
Mas é agarrada por Canio e é esfaqueada até a morte
Na alcôva, a quintessência da ag uardente de maçã ao sol é descoberta
Desdêmona tem a fonte de seu canto torcida por Otello no bar do hotel
Em câmera lenta! Marcel se contém na dinâmica da torção do pescoço
Descreve detalhadamente a dança dos tendões e foge do toque de novo
Alguém tipo assim: Que goste de beber, falar... Syd Barrett e os Beats...
Sob ordens de Herodes, os escudos da falange esmagam Salomé, bandeja
Quando não matam, morrem por... Homens a mar! Rilke émar e coisas são fluxos
Sail away away, ripples never come back. Monk atira seixos verticais destilingüe voz
Tosca abisma o amar rio, perante o Holandês é Senta que voa, nau que é
Borboleta traveste Camusífus na questão suicídio com a espada de seu pai
Diz-lhe lâmina: Morrer com... para não viver na... Seja forte, Hugo...
Gilda, diante de Sparafucile [TOSSIR]...
Brünnhilde se amola na pira funerária de Siegffried, onde os anéis são derretidos
Quantas fogueiras erigidas por poções mágicas? Quantas bruxas, Salem?
Débeis como meninos, fracos como delicados serão também evaporados no aether
Czarevichs, corcundas, excessivos, gigantes, anões, negros, estrangeiros e loucos
Fronteira e torneira, chuveiros de gás, querem mudar-te o líquido e o co{r}po
Women and children first! I will swallow until I burst! I jumped in the river what did I see?
Chama Sieggfried, só por intrigas líquidas envoltas à labareda
Garçon! Alguns bebem pra lembrar, outros pra esquecer!
Giorgio Germont, Felipe II, Wotan... A Rainha da Noite os ag uarda!
Eau! Eau! Eu serei o leiteo de morte núpcia , flauta hidráulica vertebrada
A grande dilúvia virá como estrela vácua, s ão as portas também os poços
Saberão pelo salivar do Tigre que enfim vem a eumatres, Filiarcado na Pindaíba
Palco, derrota do vitorioso, desvio para o vermelho
Nem mesmo Lapis sobrevive à gota contínua dum fundo que xxx, ora
Ouves os cálculos dos fins reais, soror? É catarata, Gaston, catarata...
Ao ver-te pressentir a própria morte, Cassandra
Consumada a tragédia, a platéia aplaude
Marcel?! Marcel?! Estás bem Marcel?! [SOLUÇAR]
Destino infeliz da água, queda por terra
Ou derrota ao fogo morrendo ambos no vento
Volta a ser Marcel criança em minha frente
Mija sobre si como fonte de eterna juventude
Show me the way to the next whiskie bar
Baumann cambaleia pela porta do saloon, eu perdi o meu medo da chuva
Giram os caldeirões de cera de todas as Valburgas
Zosimos agora sente o fervor nos músculos
A carne é triste e eu já devorei todas até o sang ue
Segure Marcelle, Cranach, seu velho imprestável!
O chofre passa como Alexis entre os dois cavalos de Parmênides
Meu amado o conduz ao precipício entre ossatura e pele
Mounsieur Proust é portas e janelas que surgem no assento atrás do teu
Mas o alegre ruído de teu próprio sang ue não deixar-te-á ouví-lo
[TOSSIR]
Os tubérculos de Mimi estão impregnados nas taças de ouro
Fumos decantados na essência do vês céu
Vampiros se escondem no iluminismo dos potes de contear goteiras
Enchem seu barroco de sangue, pororoca do porre
Around Turner every glass of Mäelstorm
Solidões sobre a pia, as louças sempre estarão por lavar
Un reloj és una taza para té que se pone a derretir-se
Goethe perg untava a Dante: Que raios disse ela a Margarida?
“A cada mil maldades de um homem uma de mulher, basta”
Listenin to this Karldeck Marx takes another spirit
Sip sob and speak “There’s no substance hegelmony!”
Da lei seca que o Álcool imPõem-lhe ficou a pharmako poiésis gnosis dynamis
O Coelho tira o chapeleiro Cartola do bule junto ao boneco de neve à mesa
Ele lambe uma wassermusik em la mer, and thanks for the opened cage
Poulenc vê Borboleta fazer quetzacrisálida de haikai
Madam Catterpillar sobre o cogumelo assiste à inundação
Oxum e Obá brigam no inalador de Bethânia
Esguicho ao peito de Kýpris, termina logo este ato
Tarde ensolarada no parque da água branca
Eu preciso mijar, termina logo este ato
Sonha com Tietê, deusa da pureza”

Terceira Copa:
Ao saber da morte de Fernet Ribeiro, compositora da liqüifonia
Prousit!, a diva do canto Anna Maria Kieffer, vestida como Iemanjá, se
reuniu com as amigas de ambas num boteco que freqüentaram juntas. Chovia.
Trouxe consigo fotos do processo de composição e performance da liqüifonia
Prousit! sem saber bem por que mas mais pelas cores das fotografias. De súbito
se ergueu à cabeceira da mesa empunhando um copo americano com uma
bebida transparente, que poderia ser tanto água quanto cachaça. Ligou um
projetor que passava uma encenação da segunda copa da liqüifonia Prousit! e
chorou três lágrimas que cairam no seu copo. Bebeu o copo e reagiu à força da
bebida numa tremedeira, depois passou a olhar as orelhas presentes que ela,
entrando num transe, ouviu cantar. E ela cantou:

“Antes de sentarmo-nos à mesa, eu e tu, Vida. Te peço que, escuta!


O arco-íris que passou da moringa ao copo americano
Canta a transparência da água, ardente ou não
As biles de todos matizes se igualariam à cor em ação?
Filled with mingled cream and amber, polénic
Até quando te apaixonarás por todas as belezas que te cruzam?
Diamantes lâng uidos dos remansos banhados em mirra
As intermitências das vís ceras encheem-nos os óleos d’ág ua
Pisco e bebo gota lácrima, o afeto é clepsidra
Zang Huan raises the water level of the fishpond, fugitive
Na superfície da profundeza, onde Jakces Cocteau nada, e mais nada
[SOLUÇAR] Artime stand still... Queremos os girassóis em germinal
Os salões de festa são mares no meio da piscina, li quorum
Such hilarious visions clamber... Os chapéus e batons
Cuidado anônimos, pra bom bebedor, meia garrafa basta
Se o olhar das coisas fosse grave suavidade, Mundanidade
Quem pensa no tempo também perde tempo. Quem beberia a melodia?
Ao redor da roda de samba o Dodô dança o caminho de Guermantes e Swann
Mas o que raios Margarida respondeu? Bem me quer, mal me quer, bem...
Entra o vesgo no café filosófico dos sonhos perdidos e já dá um talho
Química fotográfica que Braçaï extraíra da câmara clara, revelação
Copo meio cheio-vazio para Caspar Hauser Friederich que evapora
Nem foi tempo perdido... Somos tão jovens numa espécie tão velha!
Em cirrus stratus cumulus, as manchas da doçura no expresso
Nunca confiei em uma bebida que não humanizasse
What care I how time advances? I am drinking ale today
Homem terno andando na onda, sonha com um pileque no Tietê
É claro que isto não vai chegar a lugar alg um, Sirius, meu cão engarrafado
Shannon, Sulis, Sarasvati, Peneus, Y lem, Amzonia
Água seca, fogo lento... Sink before a bigger splash!
Vamos no Johann Sebastian Bar na rua Bergson pra um Schoppenhauer
Beberemos todo petróleo de Gaia vomitando asfalto
Assim chovendo ácida luz, quarta-fera de cinzas
Sabeor, se fosse sólido come-lo-ia... Bebo para tornar-vos interessante
Nossos sang ues de Dolly Cola, a alma vem do alambique e...
Não sabes de onde viestes nem por quê, exalam as mandrágoras
E se a ressaca precedesse a embriaguez da via manifesta?
Não sabes por onde vais nem aonde, florescem as vides
Não bebemos, simplesmente, tomamos um aproximar dos lábios
Enchemos o céu da boca e a costura de nós de estrelas
Escorre à garganta e escorrega a temperatura dos estômagos
Suave, doce, estagnada ou borbulhante... Ah! Vida! És crua e sedenta
Arroio, lavo as vigas dos ossos. És e liqüída!
Tudo foi experienciado pra virar souvenir numa lojinha do museu
Rhyme is Phoney! For the times they are a’chainging!
Mas que papo de boteco! [RIR SOLUÇANDO] Mas que bafo de boteco!
Nadamos nas latrinas atrás da heróia e urinamos as calçadas
Arco líquido sobre um concerto de musgos, algo sob o cais
Pingamos nossa delicadeza ao destempo, ociamos pra lembrar do ofídcio
Se você pensa, que cachaça! Sentir é ág ua, fleume
Rio de afetos em busca do mar da memória
Solução, fórmula que mata e desejo
Na vitória merecida, na derrota necessária
Engole tua agenda junto, e deixa o pulso ser o relógio
Mensagem na garrafa que cai do céu no deserto: Dilúvio!
Eis que finalmente te encontro, Marcel
Fazendo sopa de letrinhas para sua mamãezinha, Morte Verbo
Não aguenta, bebe letras! Um brinde em perdição do tempo encontrado... Prousit! ”

"O que censuro aos jornais é fazer-nos prestar atenção todos os dias a coisas insignificantes, ao passo que
lemos três ou quatro vezes na vida os livros em que há coisas essenciais."
Marcel Proust (1871-1922)
Submidialogias
O que é submidialogia:
Submidialogia é uma rede de conhecimento complexo, espalhada principalmente pelo território
brasileiro, que envolve pessoas de reconhecimento internacional atuantes nas mais diversas áreas da produção
humana (detentores de sabedoria popular, filósofos, cientistas, artistas, líderes de comunidades indígenas,
quilombolas, arquitetos, recicladores, cozinheiros, técnicos, hackers, etc.), para o aponte de problemáticas e a
criação inter-poli-transdisciplinar de soluções práticas e pragmáticas para questões contemporâneas de uma
maneira integradora (individual, social e global).
A palavra submidialogia é um neologismo poético criado para retratar aquilo que está sob os estudos
dos meios, e também aquilo que subjaz ao discurso midiático. O meio é, portanto, no processo submidiático
um conceito fundamental. Pensar e atuar tanto nos meios de comunicação como nos meio-ambientes em
suas diversas dimensões (indivíduo consigo, relacionamentos com os outros, pequenas comunidades, centros
urbanos) em busca de uma forma coesa de integrar as redes de necessidades e desejos humanos numa ecosofia
(uma ecologia do conhecimento, outra ecologia dos encontros e ainda uma ecologia social).

Como fazer submidialogia:


A rede de submidialogia é formada por algumas instâncias práticas:
•Lista de emails (da qual você também pode participar), onde as pessoas se conhecem e
trocam experiências, informações, conhecimentos específicos de suas áreas, sanam dúvidas, abrem
chamadas de trabalho, convites para eventos em sua região, organizam tais eventos.
•Interações em projetos ao longo do ano de acordo com as agendas dos participantes. Ciclos de
palestras são organizados com a vinda de um sociólogo de Campinas ao Maranhão ou um concerto
de um músico curitibano no interior da Bahia, por exemplo.
•Subencontros presenciais em locais específicos para a atuação local. Os subencontros têm
algumas características específicas que explicaremos melhor a seguir.

O que é subencontro:
Um subencontro é uma reunião presencial de pessoas que já formam a rede submidialogia numa
localidade escolhida por uma duração de em média uma semana. Lá, eles criam trabalhos juntos, intervêm no
meio-ambiente e pensam soluções para os problemas desta e de suas regiões.
Os participantes se envolvem com as comunidades locais, que vêm (em grande parte dos casos)
somar-se à rede, organizando diversos eventos tais como:
•Ciclos de palestras sobre os mais variados temas como: filosofia, ciências aplicadas, ciências
humanas, processos artísticos, história local e global, entre tantos outros.
•Ciclos de oficinas de criação prática com artistas e produtores de renome que abrangem desde a
criação de motores elétricos feitos com roda de bicicletas até a feitura das mais avançadas ferramentas
de música a partir de lixo reciclado, passando por oficinas de culinária.
•Ciclos de apresentações públicas incluindo concertos de música erudita e experimental, dança
contemporânea e moderna, instalações plásticas em galerias e ambientes urbanos, performances,
saraus literários, óperas, peças de teatro de vanguarda, entre outras.
•Ciclos de atuação midiática através da participação das mídias locais com programas especiais
feitos para as rádios e televisões locais, intervenção nos pontos de cultura locais, atuação na
comunidade digital e diálogos públicos com representantes da comunidade.
Como fazer um subencontro:
Diversos subencontros foram já realizados, e a sua metologia está em constante progresso. Alguns
pontos práticos que se sustentam desde suas últimas edições são listadas abaixo.
Antes do encontro (pré-produção):
•Decisão de um local e data: de acordo com a necessidade de Um grupo local ou do encontro
de um número mínimo de participantes, por fatores diversos.
•Pesquisa e mapeamento dos interessados locais: Este mesmo grupo pensa conexões
interessantes entre comunidade local e membros da rede (um dançarino com amplos conhecimentos
sobre o corpo ensinando alongamento num retiro de idosos, por exemplo). Neste ponto, começam a
surgir cronogramas e encadeamentos de eventos: Por exemplo, um músico do Rio Grande do Sul está
pesquisando a história da rádio faz um trabalho com um criador de transmissores e ambos pensam
juntos um programa para a rádio local. Este processo por si só já, ao tecer esta malha de interação da
cidade, a prepara para o evento numa expectativa de interesse.
•Viabilização monetária local e de agenda dos participantes: Um esforço conjunto atrás de
editais e patrocínios que viabilizem o encontro são realizadas pela lista. Após a confirmação do
evento (com ou sem patrocínio, dependendo da urgência), os participantes designam a possibilidade
ou não da viagem nas datas marcadas e os organizadores locais encontram um local de convivência e
estadia para locação e os demais locais para os encontros públicos (galerias, museus, casas noturnas,
parques, praças, monumentos, etc.).
•Viabilização das passagens através de leis de incentivo: Um certo número de passagens é
viabilizada por este comitê de organização (através de patrocínios) para alguns convidados (de acordo
com o mapeamento das necessidades locais previamente realizado) e outras são disponibilizadas em
edital aberto à lista para interessados em se envolver mais no processo submidiático e uma seleção é
feita pela própria lista. Alguns participantes, ainda, bancam suas próprias passagens e outros as
conseguem com suas instituições educacionais ou empresas, que vêem no evento uma importante
oportunidade de crescimento para seus pesquisadores e funcionários.

Durante o encontro:
•Acomodação dos participantes: uma casa (normalmente precisando de reformas) é locada. Os
participantes chegam a ela, acomodam suas coisas (normalmente acampam dentro da casa). Ingredientes são
comprados coletivamente. A cozinha, bem como a limpeza são responsabilidade de todos (embora não haja a
necessidade de nenhuma tabela ou obrigatoriedade de tais funções.
•Interações com a comunidade local e com os
outros participantes: Naturalmente as conversas
começam a acontecer nas atividades de habitação.
Colocam infográficos nas paredes, mapas locais. Os
organizadores locais fazem apresentação de pessoas
da comunidade bem como começam a conectar a
rede local com a global. Artistas pintam paredes.
Músicos e programadores colocam uma rádio
interna no ar. Um blog é ativado. O conteúdo é
todo streamado em tempo real.
•Produção de obras e textos: De acordo com
os interesses pessoais de cada participantes, duplas,
trios e grupos se formam e começam a criar poesias,
palestras, músicas, programas, softwares,
esculturas, receitas, festas para os próximos dias,
intervenções urbanas, etc.
•Ciclos de atuações e trocas: Os participantes mostram suas produções e discutem o estado atual do
conhecimento a partir destas como tema, gerando um enriquecimento mútuo de compreensão da vida como
complexo de sistemas integrados. O público local compartilha destas experiências e pode propor também
outras atividades.
Depois do encontro ( pós-produção):
•Publicação de livros, albuns sonoros e vídeos: O material produzido no encontro e sob influência do
encontro, são reunidas em um website bem como em publicações impressas que são disponibilizadas
publicamente para edição.
•Palestras para difusão dos resultados: Os participantes, ao retornarem para suas regiões de origem,
divulgam os aprendizados sobre a rede em falas e começam a articular visitas de outros participantes de
outras regiões que possam esclarecer problemáticas locais e ajudar a buscar soluções com toda a comunidade.
•Centros de Scinestesia Social: As casas alugadas e reformadas, ou outras locações do local onde
ocorreu o subencontro ficam para a comunidade local como um ponto de cultura, enrededado na trama
social como um ativador de melhorias para o meio-ambiente e uma ponte para esta rede global de pensadores
e artistas. Um ótimo exemplo disto, é o Bailux na cidade de Arraial D’Ajuda.
•Remetodologização do próprio submidialogia: O próprio processo de produção, tanto dos indivíduos
quanto do coletivo, é remodelado e adaptado em função dos conhecimentos adquiridos durante o
subencontro.

Meu envolvimento na submidialogia:


Por se tratar de um processo humano, não bastaria que dispuséssemos, à maneira de um manual, os
modos de produção de uma submidialogia para compreender o tipo de mudança social que este implica. Seu
processo é sutil, sub mesmo, e como exemplo vou falar de meu envolvimento na rede. Me chamo Felipe
Ribeiro e sou um compositor de óperas multimídias, cientista sonoro e filósofo.
Fui convidado diversas vezes a participar da lista pela filósofa e esquizoanalista Fabiane Borges a mais
de cinco anos, sem no entanto fazê-lo. Havia participado como aluno de análise de sistemas no ginásio,
sempre com grande timidez, de encontros mídia tática que trouxeram à tona sites como o Centro de Mídia
Independente. Nunca tive muito contato com outros programadores e trabalhava de maneira bastante
isolada nas minhas funções de educador na ONG Cidade Escola Aprendiz. Começa a atuar como artista, era
ainda bem jovem, e acreditava que fazia minha parte com a comunidade. Pode-se dizer que eu estava num
processo de auto-sustentação, tentando pagar as contas de meu recém casamento ao mesmo tempo que
completamente autocentrado em pesquisas de sonologia e suas implicações filosóficas à escuta. Desde
infância tive um problema de socialização e fugia de ambientes públicos (mesmo que virtuais). Estava lidando
com estes problemas também.
Alguns anos depois, uma palestra minha no Fórum de Ecologia Sonora do Fórum Social Mundial
na cidade de Belém do Pará concatenou com as datas de um subencontro que iria ocorrer lá. Aproveitei a idéia
de ter uma casa onde ficar e economizar o dinheiro do hotel para algumas contas e resolvi participar. Entrei
na lista e para minha surpresa, ali haviam pessoas falando sobre assuntos sobre os quais sempre me interessei:
semiótica aplicada, cibernética prática, programação cultural, história da historicidade, estética comparada à
ética, crítica literária, entre tantos outros. Para minha maior surpresa ainda, muitas pessoas na rede, eu já
admirava como pensadores e criadores, visitava seus sites; tantos outros ainda conheci pelos caminhos.
Senti uma coisa maravilhosa, com esta possibilidade de dialogar (e praticar!) sobre todos os assuntos
tidos como demasiado complexos ou abstratos pelas pessoas com quem convivia. Já no subencontro de
Belém, pude fazer novas amizades com pajés, cientistas, camelôs, pessoas locais. A conversa de um hacker
com um pajé é algo absolutamente radical. Entendi uma distância vital entre o turismo e a viagem. Aprendi a
cozinhar tacacá, programar em Python ainda não, mas já sei beber na dose certa como um curandeiro me
mostrou. Fui depois convidado a ir ao evento de Arraial D’Ajuda onde pude ajudar na organização e
participar mais ainda do evento.
Toda minha vida mudou. Minha obra se modificou, já não era mais minha. A arte se tornou só uma
ferramenta para alcançar gestos de amor que pudessem modificar os problemas que sempre me afetaram.
Minhas relações mudaram, fui aos poucos (estou ainda) aprendendo a ser o que sou em público e passei a
viajar mais para mostrar o que e como faço. Compreendi este ponto importante que é a singularidade
complexa para a solução de problemas: esta necessidade de mudança individual, dos pequenos grupos e das
macro estruturas que regem o pensamento humano (lógico e simbólico). Passei a receber visitantes em casa e
a ter amigos no país todo e em vários outros lugares do mundo. Amigos, não no sentido de companheiros de
diversão, mas pessoas afinadas com princípios éticos de melhoria global.
What Does Listening Wants?
Hearing Possibilities:
To increase diversity
To maximize freedom/choices
To expand the space of the possible

Sounding Efficiencies:
To increase specialization/uniqueness
To increase power density
To increase density of meaning
To engage all medias and meanings
To reach ubiquity and free-ness
To become beautiful

Harmonic Complexity:
To increase complexity
To increase social co-dependency (interlistening)
To increase self-referential nature of listening
To align with nature in its stochastic recursive form

Rythmic Evolvability:
To accelerate evolvability
To play the infinite transphony

In general the long-term bias of listening technology is to increase the diversity of sound artifacts, musical
methods, acoustic techniques. More ways, more choices. Over time listening advances invent more energy efficient
cultural methods, and gravitate to sounds which compress the most information and knowledge into a given space
or weight. Also over time, more of more of sound on the planet will be touched by metalistening processes. Also,
sounds tend toward ubiquity and cheapness. They also tend towards new levels of complexity (though many will
get simpler, too). Over time sounds require more surrounding technologies in order to be discovered and to operate;
some bioacoustical technologies become eusocial – a distributed existence – in which they are inert when solitary
(anoise). In the long run, listenability increases the speed at which it evolves and encourages its own means of
invention to change. It aims to keep the transphony of change going.
What this means is that when the future trajectory of a particular field of listening is in doubt, "all
things being equal" you can guess several things about where it is headed:
• The varieties of whatever ways of sounding will increase. Those varieties that give humans more
free choices will prevail.
• Ways of sounding (and listening) will start out general in their first version, and specialize over
time. Going niche will always be going with the flow. There is almost no end to how specialized (and
tiny) some niches can get.
• You can safely anticipate higher energy efficiency, more compact tools and everything getting
smarter towards their means, although which will be these wiill keep being ethical discussion.
• All are headed to ubiquity and free. What flips when everyone has one? What happens when it is
free?
• Any highly evolved form becomes beautiful, which can be its own attraction.
• Over time the fastest moving listening will become more social, more co-dependent, more
ecological, more deeply entwined with other listenings. Many technologies require scaffolding tech
to be born first.
• The trend is toward enabling technologies which become tools for inventing new ways of sounding
easiest, fittest, cheaper.
• Listening needs clean water, clean air, reliable energy just as much as humans want the same.
We don't always have to do what listening wants, but I think we need to begin with what it wants so that
we can work with these forces instead of against them.
Auriculture Fields Of Research
Philosony As A Discipline
• Ontological and epistemological questions about what is music, sound, noise and listening:
artefacts/structures or human processes?
• What is listening cognition and understanding of noise/sound/music?
• What is a musical experience? What is a noise experience?
• What is the place of musical experience in traditional acoustical analysis?

Listening Analysis
• Can traditional analysis be helpful in explaining listenable experience: tension or
complementarity?
• Interdisciplinary and transdisciplinary approaches to listening.
• Formal and informal analysis beyond the score: analysis by ear.
• Cognitive maps and music.
• Analysis and experience.
• Analysis and validity: psychological and ecological reality of existing and future approaches
of listening.

Noise, Sound And Music Semiotics


• What is musical sense-making?Sense-making and signification: same or different?
• Levels of listening sense-making and its correlations to noise, sound and music: syntactic
level, semantic level, pragmatic level.
• Semantics and hermeneutics.
• Semantics and narrative.

Listening Semantics
• Music as reference: self reference or extra-musical reference.
• Program music/absolute music.
• Sintagmatic referentiality in sound and noise.

Sound Pragmatics
• Sound as felt, as experienced.
• Sound and its inductive power.
• Sociology of listening.
• Music and entrainment.

Vocal Pragmatics
• Voice as tool for communication (e.g. prosody, techniques, etc.).
• Voice as tool for expression.
• Voice and emotions.
• Communicative and affective functions of human voice.

Intermediality Of Listening
• Opera, musical, concert albums, song cycles, etc.
• Text, performance, music.
• Intermediality and communication: role of listener as target or actor.
• Intermediality as persuasive instrument.
• Attentional strategies: how to capture the attention of the non-schooled listener?
• Soundart Intervention.
Listening And Time
• Time consciousness and music.
• Musical time and realtime.
• In-time and out-of-time experience of music.
• Perception, memory and imagination.

Listening As Experience
• Listening as temporal art.
• Music as sounding art.
• Sensation, perception, cognition as applied to music.
• Experience and cognition.
• Embodied and enactive approach to music cognition.
• Listening And Emotions
• Chills and thrills.
• Music and arousal.
• Biological foundations of musical emotions.
• Cognitive foundations of musical emotions.
• Physiological aspects of musical emotions.

Biophony
• Neurobiology of listening.
• Physiological responses to listening.
• Music/noise and the brain.
• Music/noise and the hormone system.

Music As Sound
• Impact of sound.
• Spectrographic approach to music listening.
• Music and overtones.
• Music and resonance.
• Music and drones.
• Music and vibration.
• Music and the body.
• Music and movement.
• Music and dance.
• Action and perception, perception as simulated action.
• Music and rhythmic entrainment.
• Bodily resonance to music.
• Music and trance.

Evolution Of Listening
• Origins of music: why is there music?
• Comparative approach: what are the functions given to listening and music all over the
world.
• Musical sense-making between nature and culture.
• Listening instinct/faculty versus language instinct/faculty
• Archeoethnomusicology.
Ecological Approach To Listening
• Music as sounding environment.
• Sound as listening environment.
• Coping with the sounds.
• Functional significance of sounds.
• Musical affordances in sociological structures.
• Listening and direct perception.

Listening Universals
• Psychophysical commonalities.

Listening and psychobiology.


• Universals of music/noise perception.
• Universals of music/noise cognition.
• Sound/music and Gestalt perception.
• Auditory scene analysis.

Visualizing Listening
• The musical score: limitations and possibilities.
• Existing animation software: two-dimensional and three-dimensional.
• Iconic versus symbolic approach.
• Discrete versus continuous approach.
• Spectrogram: limitations and possibilities.
Philosonic Research Commitments

Listening is the music of music.


Competence
1. Who can make sounds/music, and who can interpret/use them?
2. What is the pattern of musical acquisition and learning?
3. Are there stratifications of skill and knowledge? What types? How are they sanctioned, recognized,
and maintained?
4. Is musical acquisition assumed to be unproblematic? A necessity?
5. Do ideologies of "talent" determine or constrain acquisition and competence?
6. What is the relationship between competence, skill, and desire for music?
7. What are the differences between production and reception skills, for individuals, across social
groups?

Form
1. What are the material musical means and how are they organized into recognizable codes?
2. How are musical means distributed across settings and participants?
3. What are the preferred aesthetic orderings?
4. What are the boundaries of perceived forms? What does it mean to be wrong, incorrect, or otherwise
marginal from the standpoint of code flexibility and use?
5. How flexible, arbitrary, elastic, adaptable, open is musical form? How resistant to changes, internal
or external pressures, or other historical forces?

Performance
1. What are the relationships between makers and materials?
2. What is the relationship between individual and collective expressive forms and performance
settings?
3. How are forms coordinated in performance? How adaptable and elastic is musical form when
manipulated by different performers at a single moment in time or over time?
4. How do cooperative and competitive social relations emerge in performance?
What meanings do these have for performers and audience?
5. How do performances achieve pragmatic (evocative, persuasive, ma-
nipulative) ends, if at all?

Environment
1. What resources does the environment provide? How are they exploited'? What relationships exist
between resources, exploitation, and the material means and social occasions for performance?
2. Are there co-evolutionary patterns, ecological and aesthetic, linking the environment and sound
patterns, materials, situations'?
3. What are the visual-auditory-sensate relationships between people and environment, and how is this
pattern related to expressive means and ends'?
4. What myths or models scaffold the perception of the environment? Are these related or
complimentary to conceptions of person, society, expressive resources?
5. What mystical or cosmological associations with the environment support, contradict, or otherwise
relate to the socioeconomic context of musical beliefs and occasions?

Theory
1. What are the sources of authority, wisdom, and legitimacy about sounds and music? Who can know
about sound?
2. Is musical knowledge public, private, ritual, esoteric?
3. What dimensions of musical thought are verbalized? Taught verbally? Non-verbally?
4. Is theory necessary? How detached can theory be from practice? What varieties of knowledge and
activity count as musical or aesthetic theory'? How is music rationalized?
Value and Equality
1. Who values and evaluates sounds'? Who can be valued and evaluated as a maker of sounds?
2. How are expressive resources distributed, specifically among men and women, young and old?
How do stratifications emerge?
3. How do balances and imbalances manifest themselves in expressive ideology and performance?
4. Do sounds deceive? Mystify? Who? Why?
5. Are sounds secret? Powerful? For whom? Why?
6. How do musical materials or performances mark or maintain social differences? How are such
differences interpreted? How are they sustained? Broken or ruptured? Accepted or resisted?

Listening Of Listening
Recursivity (GNU Not GNU ) is a core element in musical composition (Freud's concept of
Nachträglichkeit). Listening to music works as the retroactive assignment of meaning rather than mere deferred
action, and derives the notion of ‘listening to listening’ from their combination. A dialectical conception of time is
proposed, with interpretation involving three logical phases (sensation, memory, forgeting), respectively incumbent
on the listening analyst, on the music and on both. The music listener speaks about music from a position dictated
by his unconscious identifications, which also causes him to reinterpret the listening interpretations and his
silences. By listening to the music's reassignment of meaning to his interpretations, the listener can discover the
music's unconscious identifications and, together with the music, thereby facilitate the process of psychic change of
listening possibilities. We contend that by the function of ‘listening to listening’ it is possible to overcome the
dilemma of whether the listener with his interpretation or the music with his own reinterpretation of it by
showing a recursive formulation:
The silence of silence? Noise, (Cage, 1968)
The noise of noise? Music, (Attali, 1986)
The art of art? Autopoiesis, (Pound, 1908)
The provability of proofs? Metasystems, (Gödel, 1931).
The computability of computation? Abstract automata, (Turing, 1936).
The control of control? Cybernetics, (Wiener, 1948).
The hierarchy of hierarchies? Holons, (Koestler, 1967).
The psychanalysis of psychanalysis? Schizoanalysis, (Guattari and Deleuze, 1968)
The distinction of distinctions? Form, (Brown, 1969).
The cycle of cycles? Hypercycles, (Eigen, 1971).
The formation of forms? Catastrophes, (Thom, 1972).
The perception of perception? Eigenbehaviour, (von Foerster, 1973).
The ordering of order? Spontaneous Social Orders, (von Hayek,1975).
The reality of reality? Communication, (Watzlawick, 1976).
The structuring of structures? Dissipative Structures, (Nicolis and Prigogine, 1977).
The organization of organization? Synergetics, (Haken, 1977).
The nature of nature? Complexity, (Morin, 1977).
The boundary of boundaries? Fractals, (Mandelbrot, 1977).
The dimension of dimensions? Fractal dimensions, (Mandelbrot, 1977).
The system of systems? Living Systems, (Miller, 1978).
The production of production? Autopoiesis, (Varela, 1979).
The loop of loops? Tangled Hierarchies, (Hofstadter, 1979).
The life of life? "La Methode” for thinking complexity, (Morin,1980).
The evolution of evolution? The self-organizing Universe, ( Jantsch, 1980)

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