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HISTÓRIAS DA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA

O MOVIMENTO SANITARISTA
Nas primeiras décadas do século XX o brasileiro, sobretudo o homem do campo, estava
doente. Alguns não conseguiam ver solução para isso e mantinham uma atitude negativista.
Outros, ufanistas, ignoravam o problema. Mas os que abraçaram a campanha sanitarista
acreditavam que havia cura para o mal do povo. O personagem Jeca Tatu, criado por Monteiro
Lobato.era um caipira que não fazia nada na vida devido à doença e à preguiça. Lobato aderiu
à campanha em prol do saneamento rural e deu a seu personagem educação sanitária.

Para os defensores do saneamento, a questão da saúde, assim como a da educação,


era também elemento crucial na construção da nacionalidade. Um claro exemplo da
relação entre o abandono e o isolamento das populações sertanejas e a ausência de um
sentimento de identidade nacional está no Relatório Médico-Científico publicado em 1916
por Belisário Pena e Artur Neiva, do Instituto Oswaldo Cruz que afirma que é "raro o indivíduo
que sabe o que é o Brasil. Piauí é uma terra, Ceará outra terra. Pernambuco outra (...). A única
bandeira que conhecem é a do divino." A publicação desse relatório foi extremamente
importante para a tomada de consciência da situação sanitária do país. A campanha do
saneamento rural foi igualmente intensificada pelo movimento nacionalista que se
generalizou a partir da Primeira Guerra Mundial.

Os sanitaristas consideravam a federalização da República - ou seja, a relativa autonomia


dos estados, dominados pelas oligarquias locais - o maior obstáculo a uma ação coordenada
com vistas ao combate às doenças endêmicas do país. E estas não eram poucas:
ancilostomose, malária e doença de Chagas, para citar só as mais comuns. Havia uma
Diretoria Geral de Saúde Pública, vinculada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, que
praticamente não funcionava. Clamava-se pela criação de um Ministério da Saúde Pública,
por uma ação de caráter nacional para o tratamento da saúde do brasileiro. Em fevereiro
de 1918 representantes das elites política e intelectual fundaram a Liga Pró-Saneamento do
Brasil, sob a direção de Belisário Pena. Este fato marcou a passagem de um período mais
espontâneo da campanha sanitarista para uma ação mais organizada.

A despeito da excelente repercussão que vinha obtendo na imprensa e nos debates


parlamentares, a campanha só deslanchou de fato em 1918, graças à epidemia de gripe
espanhola. Ao atingir as cidades, particularmente o centro político-administrativo do país, e ao
ignorar as distinções entre as classes sociais, o que lhe valeu o apelido de "gripe democrática",
a epidemia determinou uma nova apreciação do problema pelas autoridades competentes. O
próprio presidente Rodrigues Alves, eleito naquele ano, e parte do contingente militar enviado
ao teatro de operações na Primeira Guerra Mundial foram vítimas fatais da gripe espanhola.

Em dezembro de 1919, foi criado o Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), que
daria maior amplitude aos serviços sanitários federais. A partir de então, a participação e a
intervenção do Estado na área de saúde pública só tendeu a se ampliar e se solidificar. A
interdependência compulsória que as epidemias e endemias criaram entre os estados e os
municípios, de um lado, e o poder central, de outro, contribuiu gradualmente para o
fortalecimento do Estado. A ação do poder central por todo o país, por sua vez, ajudou a
minar o sistema oligárquico.

Dionildo Dantas

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