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1.

A ÉTICA NO ACONSELHAMENTO PSICOLOGICO

A questão que envolve a ética indica tal complexidade, pois diz respeito
à determinação do que é certo ou errado, bom ou mau, permitido ou proibido,
de acordo com um conjunto de normas ou valores adotados historicamente por
uma sociedade.

Uma das perguntas que motivou a presente reflexão foi: como as


discussões que envolvem as questões éticas podem ajudar no manejo do
aconselhamento? Uma postura ética é importante, pois as pessoas confiam aos
aconselhadores e aconselhadoras experiências muito pessoais e profundas.
Algumas destas experiências foram traumáticas, tornando-se um segredo na
vida de muitas pessoas. São, portanto, conteúdos que não podem ser
compartilhados, inclusive com pessoas muito próximas daqueles que se dispõe
a aconselhar.

Para elaborarmos um trabalho sobre a ética no aconselhamento


psicológico, entende-se necessário traçar o conceito do que seria ética na visão
de alguns especialistas no assunto. Ética vem do grego “ethos” que
significa modo de ser; “conjunto de valores que orientam o comportamento do homem
em relação aos outros homens na sociedade em que vive, garantindo, igualmente, o bem-
estar social”, ou seja, Ética é a forma que o homem deve se comportar no seu
meio social (DECHICHI, 2015).

A ética vem sendo discutida em vários conceitos que, por sinal, acabam
sendo muito complexos, pois cada indivíduo traz consigo construções que irão
definir sua moral. Os filósofos gregos aprofundaram seus estudos sobre o
assunto e cada pensador definiu de maneira diferente o que seria ética.

Platão propõe uma ética transcendente, dado que o fundamento de sua


proposta ética não é a realidade empírica do mundo, nem mesmo as condutas
humanas ou as relações humanas, mas sim o mundo inteligível. O filósofo
centra suas indagações na ideia perfeita, boa e justa que organiza a sociedade e
dirige a conduta humana. As ideias formam a realidade platônica e são os
modelos segundo os quais os homens têm seus valores, leis, moral. Conforme o
conhecimento das ideias, das essências, o homem obtém os princípios éticos que
governam o mundo social.

A ética aristotélica, em oposição à ética de seu mestre, é imanente, tendo


suas bases na realidade empírica do mundo, no questionamento acerca das
condutas humanas e na organização social. As exigências com relação à vida na
polis e a realidade do homem, formam o conteúdo das ideias e são ambas as
responsáveis pela escolha dos valores, pela moralidade e pelas leis, pela

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definição das condutas dos homens. Sua teoria ética era realista, empirista em
contrapartida à visão idealista e racionalista de Platão.

Contrapondo a esses dois filósofos, Kant traz uma ética mais voltada
para moral, salientando que a visão de que ações corretas são aquelas ações que
não são instigadas por impulsos ou desejos, mas pela razão prática. A ação é
considerada correta se for empreendida por uma questão de cumprir o seu
dever, e cumprir o dever significa agir de acordo com certas leis morais ou
“imperativos” (AZEVEDO, 2017).

A busca por explicar o que seria ética nos leva a compreensão que, de
certa forma, todos acreditavam que o sentido final da mesma era buscar uma
situação em que a felicidade fosse o final de toda essa busca. Diante disso, o
fazer ético do aconselhamento psicológico nos leva a compreender que o
aconselhador está sempre buscando a melhoria do indivíduo, respeitando-o e
encaminhando para uma melhor condição de vida dentro daquilo que acredita,
juntamente com indivíduo ser o melhor para si. Para tanto se faz necessária
uma postura ética, não só como aconselhador, mas também como pessoa, afinal
não se pode desvincular uma coisa da outra, e, de acordo com CHAUI (2000)
não se pode ter fins éticos se os meios não forem éticos.

Ética é um assunto que perpassa por gerações, culturas etc., e, cada


passagem é sinônimo de modificações nos seus conceitos. A sociedade nos
impõe padrões e para podermos conviver harmonicamente é necessário que
sigamos alguns paradigmas atuais. Dependendo de nossas decisões e ações
traremos conosco o questionamento acerca do que seria ético ou não para nós e
para outro, partindo do pressuposto que não existe ética sem o contato com o
outro. Em outras palavras, para sermos éticos não só temos que estarmos
satisfeitos com nossas decisões, mas também fazermos uma reflexão de que
forma essas decisões foram prejudiciais ou não ao outro, onde através disso
chegaremos a uma moral. é importante salientar que ser ético vai muito além do
que está escrito num código. O aconselhador trará consigo construções e
experiências próprias que não podem ser separados do seu fazer profissional,
pois é através de suas decisões e reflexões que ele embasará seu atendimento de
uma forma imparcial, dando prioridade ao indivíduo como todo.

2. ENCAMINHAR AO PSICÓLOGO

O aconselhamento psicológico visa ajudar a pessoa que o utiliza a


resolver diferentes tipos de impasses situacionais, utilizando o processo de
identificação e atuação sobre comportamentos funcionais para o alcance do
objetivo definido (DI FABIO, 1999, p. 159). Entender o indivíduo, seu
desenvolvimento, ajuda-lo na compreensão da própria subjetividade e no
desenvolvimento das próprias capacidades, numa perspectiva de qualidade de
vida, pode ser tão importante quanto compreender sintomas, fazer diagnóstico
ou dominar técnicas. Por outro lado, a intervenção psicoterapêutica envolve um
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processo global de crescimento e reestruturação, utilizando modelos de
funcionamento humano (CIONINI, 2008, p. 20). Esses modelos de
funcionamento trazem ferramentas que facilitam a compreensão dos sintomas,
elaboração de diagnostico, tratamento e aperfeiçoamento da qualidade de vida
do paciente ou cliente. Percebe-se, então, uma diferença entre as duas práticas e
a importância da psicoterapia diante dos distúrbios e transtornos psicológicos.
Essa clara distinção, exige que o aconselhador conheça os sintomas que o levam
à decisão de encaminhar o aconselhando ao psicoterapeuta. O encaminhamento
ao psicólogo, ao psiquiatra, ao médico deve ser entendido como uma prática
corriqueira, mas para isso o aconselhador precisa entender quando fazer.

Para a psicoterapia os sintomas não se resumem somente as síndromes,


mas servem também para que o psicólogo explore a subjetividade do cliente e
descubra as causas (ALBASI, 2009, p. 87). O psicólogo para entender toda a
natureza expressiva dos sintomas, os enquadra ao funcionamento interno do
indivíduo, tendo em consideração a dimensão biopsicossocial da pessoa. A
visão da relação pessoa-contexto e pessoa-biológico é imprescindível para
entender tanto a formação da personalidade quanto as disfunções psíquicas que
podem ocorrer durante o processo evolutivo da pessoa. O diagnóstico realizado
pelo psicólogo clínico é um percurso árduo, porque para compreender a
origem, causa, tempo de incidência, evolução e permanência de um
determinado transtorno como a depressão do humor, por exemplo, não é
suficiente fazer simplesmente referimento à psicopatologia da afetividade, mas
observar outros aspectos do pensamento, da atenção para se chegar à conclusão
da síndrome. A função de entender a experiência subjetiva dos sintomas vivida
pelo indivíduo é função do psicoterapeuta e não do aconselhador.

Contudo, saber colher os sintomas psíquicos disfuncionais e


desabilitantes durante a prática do aconselhamento psicológico é uma
habilidade importante de todo aconselhador e o instrumento utilizado é a
observação. Através da observação dos comportamentos disfuncionais, dos
discursos verbais carregadas de exageros emocionais ou ausência desses, das
expressões não verbais incongruentes com as afirmações e com o
comportamento apresentado é possível chegar à verificação dos sintomas que
indicam a necessidade de encaminhamento ao psicólogo ou ao médico
psiquiatra.

A comunicação não verbal merece uma atenção especial por parte dos
aconselhadores, porque as expressões não verbalizadas são fortes
comunicadores das emoções e indicadores constitutivos de um tipo de
linguagem usada nas relações interpessoais (DI FABIO, 1999). Trata-se de uma
linguagem silenciosa, mas não por isso menos comunicativa, pois os indivíduos
se comunicam muito através da aparência, das atitudes mímicas e do
comportamento espacial. O rosto dos indivíduos sempre foi desde os primeiros
anos de vida da criança o melhor modo de interação para se entender as

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emoções (alegria, tristeza, raiva, medo, dor, etc). A mímica facial é um método
de comunicação sem palavras que pode conter um número desmesurado de
significados associados a pensamentos e emoções. As expressões faciais dos
indivíduos são fortes indicadores de possíveis sintomas (Lowen, 1978).

O comportamento espacial traduzido na postura é o modo pelo qual o


indivíduo utiliza os membros do próprio corpo. A observação da cabeça
inclinada para baixo pode indicar timidez, incerteza, medo, tristeza, vergonha e
etc. Os braços e pernas dependendo da posição e gestos, podem indicar tensão
ou relaxamento. Portanto, a observação e interpretação da linguagem não
verbal é imprescindível para o entendimento dos sintomas e consequentemente
podem ser motivo de encaminhamento do cliente (aconselhando) ao psicólogo.

Entretanto, elenco alguns exemplos de comportamentos que podem


indicar a necessidade de encaminhamento, a saber: timidez exagerada e
comportamento deprimido constante, mutismo, gagueira, isolamento
voluntário, descuido com a higiene pessoal e na aparência, insônia e hipersonia,
uso abusivo de drogas ilícitas e de álcool, euforia constante, ciúmes
descontrolado, agressividade, incapacidade de expressar sentimentos, tiques
nervosos involuntários (estralar a língua entre os dentes, pisgar os olhos, fazer
caretas, trincar os dentes, mexer repetidamente partes do corpo). As expressões
delirantes de perseguição, ideação suicida, grandeza, catástrofes, também
indicam a necessidade de encaminhamento. Existem as alucinações visivas,
olfativas, auditivas e gustativas (ver, escutar e sentir coisas estranhas). Os sinais
de autolesão: cortes, beliscões na pele, puxões de capelo, mordidas nos lábios.
Os sintomas físicos são também bons indicadores de que o cliente precisa de
um psicólogo, tais como: dores no peito, taquicardia, dores no estômago, dores
musculares, cansaço físico, confusão mental, diarreia, sudorese, problemas de
pele.

Percebe-se a necessidade de os aconselhadores possuírem uma visão


clara, articulada da distinção e das fronteiras entre a prática do aconselhamento
psicológico e psicoterapia para que os sintomas observados denunciem a
complexidade da realidade interior do indivíduo mentalmente necessitado de
apoio psicoterápico.

BIBLIOGRAFIA

LOWEN, A. (1978). Il linguaggio del corpo. Ed. Feltrinelli. Milano.

DANTZER, R. (1991). L’illusione psicosomatica. Ed. Mondadori. Milano.

CIONINI, L. (2008). Psicoterapie. Ed. Carocci. Roma.

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