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Bioética

Módulo 2
Aula 1 - Aula 2 - Aula 3
Professoras Autoras:
Celina Camargo Bartalotti e Marcia Rodriguez Vasquez Pauferro
Bartalotti, Celina Camargo
Pauferro, Márcia Rodriguez Vasquez
Bioética: Módulo 2 – Centro Universitário São Camilo –
São Paulo: 2016.
31 f.
Apostila - Módulo 2– Aula 1 – Fundamentos da Bioéti-
ca. Aula 2 – Princípios da Bioética. Aula 3 – Tomada de
decisão em Bioética - Centro Universitário São Camilo
Virtual, 2016.

1. Fundamento de Bioética. 2 . Princípio de Bioética.


3. Tomada de decisão.
I. Título
Centro Universitário São Camilo/SP

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Sumário

Considerações iniciais ….......................................................................................... 5

Aula-1...................................................................................................................... 7
1.1 Fundamentos da Bioética................................................................................... 7
1.2 Definições de Bioética ....................................................................................... 7
1.3 Documentos Fundamentais................................................................................ 10
1.4 Conceito de Pessoa Humana.............................................................................. 14
1.5 Conceito de dignidade....................................................................................... 15
1.6 Valores Morais.................................................................................................... 16
1.7 Multidisciplinaridade, Interdisciplinaridade, Transdiciplinaridade..................... 17
Referências Bibliográficas........................................................................................ 19

Aula-2...................................................................................................................... 20
2.1. Princípios da Bioética........................................................................................ 20
Não Maleficência.................................................................................................. 21
Justiça.................................................................................................................. 21
Autonomia........................................................................................................... 22
2.2. Correntes da Bioética........................................................................................ 24
Bioética Principialista.......................................................................................... 24
Liberalismo em Bioética....................................................................................... 25
Bioética das Virtudes........................................................................................... 25
Bioética Casuística .............................................................................................. 25
Bioética Feminista............................................................................................... 25
Bioética Naturalista............................................................................................. 26
Bioética Personalista........................................................................................... 26
Bioética Contratualista......................................................................................... 26
Bioética da Libertação......................................................................................... 26
Referências Bibliográficas........................................................................................ 27

Aula-3...................................................................................................................... 28
3.1. Processos de tomada de decisão em Bioética................................................... 28
Método Principialista........................................................................................... 28
Método de Diego Garcia....................................................................................... 28
Considerações finais................................................................................................. 30
Referências Bibliográficas........................................................................................ 31

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Objetivo Geral

Compreender os Princípios e fundamentos da Bioética dentro de um contexto de


tomada de decisões em Bioética.

Objetivos Específicos

• Conhecer quais são os fundamentos da Bioética;

• Reconhecer e saber aplicar os quatros Princípios da Bioética (Beneficiência, Não


Maleficência, Justiça e Autonomia);

• Identificar as principais Correntes da Bioética;

• Propiciar a aplicação das ferramentas da Bioética (fundamentos e Princípios)


nos processos de tomada de decisão baseados em juízos de valor (decisões éti-
cas).

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Considerações iniciais …..

Olá!

Bem-vindo (a) ao módulo dois de Bioética.

Preparado (a) para mais essa etapa de estudos?

Espero que sim. Então, vamos ver quais serão os seus desafios de aprendizagem.
Saiba você que, neste módulo, serão introduzidos alguns temas considerados es-
senciais para a reflexão Bioética.

Acompanhe-me!

O conceito de pessoa, que vai muito além da biologia do ser humano, é o valor que
se dá a pessoa humana em cada uma de suas fases - infância, adulto, velhice e até
mesmo antes de nascer (o embrião). Tal valor determinará como a sociedade se re-
lacionará com os demais de sua espécie, seja nas questões cotidianas ou na priori-
zação de recursos para a saúde, ou ainda, na investigação científica (pesquisas em
seres humanos).

Já o conceito de dignidade pode assumir vários significados, todavia há algo em


comum em todos eles - o reconhecimento de que a dignidade é uma característica
inerente à pessoa humana.

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Valores morais fundamentais: existem diversos valores morais, mas talvez a ade-
são a alguns valores mínimos possa garantir uma existência mais harmônica, numa
sociedade mais tolerante às diferenças.

Em relação aos Princípios Bioéticos, servem de diretriz para a tomada de decisões


que não dependem apenas de conhecimento, mas envolvem a emissão de juízos
de valor. Conheceremos, também, algumas correntes da Bioética.

No que se refere aos Modelos de tomada de decisão, entende-se que para viver é
preciso fazer escolhas o tempo todo, mas como é possível respeitar todos os Prin-
cípios Bioéticos e valores morais que estão em jogo numa decisão? Estudaremos
alguns métodos para tomar decisões fundamentadas na Bioética, ok!

Bem, agora você já conhece toda a nossa trajetória de estudos.

Então, vamos lá!

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Aula-1

1.1 Fundamentos da Bioética

Como vimos no Módulo anterior, o neologismo Bioética passou a ser difundido a


partir dos anos de 1970 e foi assumindo diferentes matizes à medida em que seu
estudo foi se desenvolvendo ao redor do mundo. É difícil dizer se a Bioética é uma
ciência, uma disciplina ou um movimento de sensibilização capaz de analisar as
condutas humanas e ajudar a tomar decisões de forma mais consciente.

Vamos analisar algumas definições para esse termo.

1.2 Definições de Bioética

√ Respeito aos seres vivos

Em 1927, em um artigo publicado no periódico alemão Kosmos, Fritz Jahr utilizou


pela primeira vez a palavra Bioética caracterizando-a como o reconhecimento de
obrigações éticas, não apenas com relação ao ser humano, mas para com todos os
seres vivos. Esse texto, encontrado por Rolf Löther, da Universidade de Humboldt,
de Berlim, e divulgado por Eve Marie Engel, da Universidade de Tübingen, também
da Alemanha e busca antecipar o surgimento do termo Bioética em 47 anos. No
final de seu artigo, Fritz Jahr propõe um “imperativo bioético” mencionando que
respeita todo ser vivo essencialmente como um fim em si mesmo tratando-o, se
possível, como tal. Apesar de pioneiro, o termo só ganhou maior repercussão quan-
do Potter e Hellegers voltaram a utilizá-lo nos Estados Unidos no início dos anos
1970 (GOLDIM, 2006).

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√ Bioética Ponte

Quando Van Rensselaer Potter usou o termo pela primeira vez na Universidade de
Wisconsin, seus ensinamentos trouxeram à tona a ideia de que a Bioética pode
ser caracterizada como uma ponte entre o conhecimento biológico e os valores
humanos, por esse motivo, ele afirmava que:

“Eu proponho o termo Bioética como forma de enfatizar os dois componentes mais
importantes para se atingir uma nova sabedoria, que é tão desesperadamente
necessária e tem por base o conhecimento biológico e os valores humanos”.
(Potter, Van Rensselaer. Bioethics: bridge to the future. Englewood Cliffs: Prentice
Hall, 1971)

√ Disciplina combinando ciência e ética.

Em 1971, André Hellegers, obstetra holandês, fundou o Instituto Kennedy na


Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos. Nesse período, ele atuou
como responsável pela contextualização institucional do conceito de Bioética,
consagrando-a nos meios acadêmicos como uma disciplina que combinava ciência
e ética e visava a resolução de problemas do âmbito biomédico (DURAND, 2003).

√ Enciclopédia de Bioética

Até o momento, foram publicadas quatro edições da Enciclopedia de Bioética


pelo Instituto Kennedy, da Universidade de Georgetown, em Washington/EUA.
Essas obras servem de referência para o estudo dessa ciência em todo o mundo.
A cada nova edição, em uma tentativa de acolher diferentes concepções que
surgiam com o passar do tempo, a definição de Bioética foi sendo revisada. Na
primeira edição, de 1978, é compreendida como o estudo sistemático da conduta
humana no contexto das ciências da vida e da saúde, sendo tal conduta referente
a valores e princípios morais. Na edição seguinte (1995), passou a ser conceituada
como o estudo sistemático das dimensões morais nas ciências da vida e da
saúde, em um contexto interdisciplinar. Na terceira edição (2004), foi definida
como o exame moral interdisciplinar e ético das dimensões da conduta humana
nas áreas das ciências da vida e da saúde. A partir da quarta e última edição, a
então denominada Enciclopédia de Bioética passou a se denominar simplesmente
Bioética. Refletindo a evolução histórica desta área do saber, a quarta edição
não despreza as questões de poder no âmbito da ciência, tecnologia e saúde
- abordando temas como neurociência e nanotecnologia - mas dedica maior

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atenção em saúde pública e ambiental. Assim, a revisão desta obra de referência
demonstra nitidamente o dinamismo do campo de evolução do conhecimento
bioético, inspirando novas linhas de pesquisa e perspectivas que ainda não
mereceram a devida atenção no estágio atual de evolução da Bioética.

√ Bioética e dignidade

A Bioética pode também ser definida como “uma dinâmica reflexiva que procura
resgatar a dignidade da pessoa e sua qualidade de vida desde o nível micro até
o nível macro.” Sua abrangência vai muito além das questões da saúde e da bio-
medicina, pois envolve também as questões sociais, políticas e ambientais, entre
outras. Para que isso ocorra, é preciso que haja um entrelaçamento das ciências
humanas, biológicas e exatas. A Bioética é, por definição, multidisciplinar, interdis-
ciplinar e transdisciplinar (BARCHIFONTAINE; PESSINI, 2002).

Podemos considerar que as questões micro são aquelas que se referem ao local em
que a ação ocorre e as questões macro são aquelas relacionadas ao âmbito global.
Assim, uma ação que ocorre no local de trabalho ou no seio da convivência familiar
pode gerar repercussões que a pessoa nem imagina, na comunidade em que está
inserida e, em maior extensão, no Estado ou no país em que ela vive ou até mes-
mo no mundo todo.

Vamos ver como isso ocorre na prática:

Relato de Experiência!

Quando uma pessoa joga um copo no chão parece um ato sem maiores conse-
quências, mas isso pode fazer com que outras pessoas sigam seu exemplo geran-
do o entupimento dos bueiros o que, num dia de chuva forte, pode dar origem a
uma enchente capaz de afetar uma comunidade inteira. A ideia de não se impor-
tar com o lixo gerado pode ser assimilada por outras comunidades, chegando ao
ponto de haver uma repercussão global, envolvendo vários países que assimila-
ram isso em sua cultura e adquiriram hábitos semelhantes.

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1.3 Documentos Fundamentais

No desenrolar da história, foram escritos diversos documentos de caráter nacional


e internacional determinados a exercer um papel fundamental para o estudo e
reflexão Bioética. A seguir, comentaremos os principais documentos.

1947: Publicação do Código de Nuremberg, primeiro documento de caráter interna-


cional que buscava regulamentar as ações relacionadas à ética em pesquisa. Tendo
sido formulado no contexto do pós-guerra, esse Código enfatiza a importância de
obter o consentimento voluntário dos sujeitos de pesquisa para evitar que as atro-
cidades cometidas pelos nazistas em nome da ciência se repitam.
Saiba mais!

http://bioetica.org.br/?siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=2
Leia aqui o Código de Nuremberg.

1948: Publicada pela Organização das Nações Unidas (ONU), a Declaração Universal
dos Direitos Humanos tem como objetivo definir os direitos básicos do ser humano,
ainda impactados pelo horror das atrocidades cometidas na guerra.

Saiba mais!

Leia aqui a íntegra da Declaração Universal dos Direitos Humanos.


https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf

1964: Publicação da Declaração de Helsinque pela Assembleia Médica Mundial


(AMM). Esse documento enfatiza que o médico deve ter como prioridade o bem-
-estar das pessoas, sejam elas pacientes ou participantes da pesquisa. Atualmente,
serve como diretriz não só para os médicos, mas para diversas outras profissões
dedicadas à pesquisa e à assistência à saúde.

O documento já sofreu várias revisões – em 1975, 1983, 1989, 2000, 2004 2008 e
2013.

A última versão, de 2013, é considerada a versão oficial da AMM e substitui todas


as anteriores. Ela pode ser visualizada através deste link:

http://amb.org.br/_arquivos/_downloads/491535001395167888_DoHBrazi-
lianPortugueseVersionRev.pdf

10
Saiba mais!

A Declaração de Helsinque, aprovada em 2013, tem sido alvo de críticas, pois


ocorreu flexibilização de algumas exigências capazes de colocar os partici-
pantes da pesquisa em risco.

Vale ressaltar que a Resolução 466/12 - que estabelece diretrizes éticas para
a realização de pesquisas em seres humanos no Brasil - NÃO considera essa
última atualização da Declaração de Helsinque emitida pela AMM.

1966: com o objetivo de responsabilizar os Estados signatários da Declaração Uni-


versal dos Direitos Humanos e obrigá-los a respeitar e assegurar os direitos hu-
manos em seu território. Em sua XXI Assembleia Geral, a ONU estabeleceu dois
pactos: o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Teoricamente, os direitos civis e políti-
cos deveriam ser implementados imediatamente, sendo sua violação passível de
denúncia. Já os econômicos, sociais e culturais dependem da cooperação interna-
cional e dos esforços de cada Estado, devendo ser implantados de forma gradativa
(WEISS, s.d.).

1974-1978: Publicação do Relatório Belmont - o governo e o congresso norte-a-


mericano constituíram, em 1974, a National Comission for the Protection of Human
Subjects of Biomedical and Behavioral Research, que tinha como objetivo principal
identificar os Princípios éticos “básicos” que deveriam conduzir a experimentação
em seres humanos - o Princípio da Autonomia, o Princípio da Beneficência e o Prin-
cípio da Justiça.

1979: Publicação do Livro Principles of Biomedical Ethics (Princípios de Ética Biomé-


tica) de T. Beauchamp & J. Childress, que define quatro Princípios:

1. Princípio da Autonomia.

2. Princípio da Não Maleficência.

3. Princípio da Beneficência.

4. Princípio da Justiça.

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O principialismo tenta buscar soluções para os problemas e as controvérsias éti-
cas a partir de uma perspectiva negociável e aceitável pelo conjunto das pessoas
envolvidas no processo.

1984: Com o desenvolvimento das técnicas de clonagem de animais e a possibili-


dade de transposição dessa técnica para os seres humanos, surgem novas preocu-
pações éticas com relação à utilização ou não de embriões humanos em pesquisas.
O Relatório Warnock, publicado em 1984, no Reino Unido, visava esclarecer as ques-
tões sobre reprodução humana e embriologia. Como não houve consenso, criaram
um novo termo que gerava menos resistência. Assim, surgiu o termo pré-embrião
para designar o período de desenvolvimento embrionário, que vai da fecundação
até o 14º dia da embriogênese, e foi proposto que poderiam ser feitas pesquisas
com os pré-embriões, desde que fossem destruídos ao final do experimento.

1997: Preocupada com a velocidade crescente do progresso técnico e científico da


genética, onde a esperança de melhoria do bem-estar da humanidade caminha
ao lado de dilemas éticos sem precedentes, a Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) adotou a Declaração Universal sobre o
Genoma Humano e os Direitos Humanos em sua 29ª sessão. O documento completo
está disponível no Portal da UNESCO, em:

http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001229/122990por.pdf

2004: Em 16 de outubro de 2004, em sua 32ª sessão, a UNESCO aprovou por unani-
midade a Declaração Universal sobre o Genoma Humano, visando garantir o res-
peito à dignidade humana e a proteção dos direitos humanos e liberdades fun-
damentais em matéria de recolha, tratamento, utilização e conservação de dados
genéticos humanos, em conformidade com os imperativos da igualdade, justiça e
solidariedade. O documento na íntegra está disponível em:

http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001361/136112porb.pdf

2005: Pela primeira vez na história da Bioética, os Estados Membros comprome-


teram-se com a comunidade internacional a respeitar e aplicar os Princípios fun-
damentais da Bioética condensados num texto único denominado de Declaração
Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. Ao tratar das questões éticas suscita-
das pela medicina, ciências da vida e tecnologias associadas à sua aplicação aos
seres humanos, esta Declaração incorporou os Princípios bioéticos como regras que
norteiam o respeito pela dignidade humana, pelos direitos humanos e pelas liber-
dades fundamentais.

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Saiba mais!
http://unesdoc.unesco.org/images/0014/001461/146180por.pdf

Leia aqui a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos

Ao tratar das questões éticas suscitadas pela medicina, ciências da vida e tecnolo-
gias associadas à sua aplicação em seres humanos, esta Declaração incorporou os
Princípios bioéticos como regras que norteiam o respeito pela dignidade humana,
pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais.

Saiba você que estes temas polêmicos serão aprofundados nos próximos módulos.
Falaremos mais sobre a clonagem de embriões humanos no módulo três. Já para o
quarto módulo, reservamos as diretrizes necessárias para a realização de pesquisas
em seres humanos. Não deixe de relacionar todos esses saberes para aprimorar sua
capacidade de reflexão e tomar decisões mais prudentes no âmbito profissional.

Vamos adiante!

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1.4 Conceito de Pessoa Humana

Segundo Pegoraro (2004), a pessoa humana pode ser definida como substância
individual, existência relacional e potencial. Vamos entender o que quer dizer cada
um desses conceitos.

Definir pessoa como substância individual significa dizer que o ser humano de-
fine-se como animal que pensa e que convive politicamente (Aristóteles). O ser
humano é, portanto, um indivíduo que existe em uma natureza racional. Podemos
dizer então, que uma pessoa se define como substância individual porque é um ser
pensante e autossuficiente.

Se pensarmos na pessoa como existência relacional significa que, desde o nasci-


mento, o ser humano está envolvido em uma rede de relações que começam no
seio materno e se ampliam na família, na cultura, na sociedade, ao longo de toda
a sua existência. Assim, a pessoa vai se construindo em um processo de relações
e, portanto, constitui-se uma existência aberta, um vir-a-ser, justamente por ser
capaz de perguntar, questionar, articular o sentido dos outros entes e a ordem do
mundo (PEGORARO, 2004).

Finalmente, ao definirmos pessoa como existência potencial, pensamos em um


ser que se caracteriza por sua realidade biológica e se constitui progressivamente
desde a concepção até a velhice. Nessa visão, segundo Pegoraro (2004), a pessoa
surge quando há suficiente Autonomia para tomar decisões e esboçar um projeto
de vida.

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É interessante observar que as três concepções pressupõem um ser humano que se
desenvolve em direção a uma vida autônoma.

Existem várias outras definições da pessoa humana, já que esse é um tema muito
estudado pela Filosofia e Teologia ao longo dos tempos. Para finalizar, gostaríamos
de deixar uma célebre definição dada por Emmanuel Kant, no século XVII, e que
continua válida e atual , de certo modo, pois é capaz de sintetizar tudo o que apre-
sentamos sobre pessoa humana.

“Age de tal modo que consideres a humanidade tanto na tua pessoa como na pes-
soa de todos os outros sempre como um fim e não como simples meio.”

Segundo a definição Kantiana, o ser humano possui um valor absoluto, de forma


que não deve jamais ser reduzido a uma coisa, objeto de uso, meio de prazer ou
instrumento de pesquisa (DURAND, 2003).

Figura - 1 Fonte: Opinioesdetodoseasminhas


Evolução Humana

1.5 Conceito de dignidade

Figura – 2

Fonte: Vivencianos dignidade e inJustiça

Segundo Verspieren (2003), podemos atribuir ao termo dignidade quatro sentidos:

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O sentido social, pelo qual o termo designa méritos pessoais e que merecem res-
peito, ou seja, a pessoa é considerada digna de respeito e admiração na sociedade
em função das suas atitudes. Um bombeiro é considerado digno de admiração e
respeito quando põe sua vida em risco para salvar outra pessoa.

O sentido moral, que implica reconhecer dignidade como sinônimo de moralidade,


de valor moral. Nesse caso, a pessoa digna é aquela que adota uma postura de
elevado valor moral, por exemplo, se uma pessoa encontra uma maleta cheia de
dinheiro e decide procurar seu dono para devolver.

O estado de pessoa, segundo o qual é considerado digno aquele que correspon-


de à imagem de pessoa humana na sociedade (considerando corpo e psiquismo).
Assim, uma pessoa digna é aquela que goza de plena saúde física e mental. Inver-
samente, quando uma pessoa tem sua saúde comprometida e torna-se dependente
de cuidados especializados, usa-se a expressão “perda de dignidade”.

Finalmente, a dignidade como atributo essencial traduz o verdadeiro sentido


bioético, segundo o qual a dignidade e a humanidade estão intimamente vincula-
das, ou seja, a dignidade é inerente ao ser humano. Nesse caso, todo ser humano
deve ser considerado digno pelo simples fato de ser um ser humano, independen-
te de sua posição social, suas ações, sua aparência ou qualquer outra coisa que o
qualifique.

1.6 Valores Morais

Cortina (2005) destaca que o agir humano também é influenciado por valores es-
téticos, religiosos, saúde, intelectuais ou de utilidade que não são essenciais. Con-
sidera que uma ação ética deve ser determinada pelos valores morais fundamen-
tais. E quais seriam esses valores? A autora destaca a liberdade, a solidariedade, o
respeito ativo, a igualdade e o diálogo.

A liberdade é entendida como participação - direito a tomar parte das decisões;


independência - direito de assegurar sua própria independência e Autonomia - di-
reito de atribuir-se suas próprias leis buscando ações que nos humanizem.

A solidariedade se apresenta nas ações ao se comprometer com o outro ser huma-


no em empreendimentos ou assuntos dessas outras pessoas.

O respeito ativo consiste em compreender os projetos do outro e ajudá-lo a levá-


los adiante, desde que representem um ponto de vista moral respeitável.

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A igualdade parte do Princípio de que todas as pessoas são iguais em dignidade e,
por isso, merecem as mesmas oportunidades.

E, finalmente, o diálogo, cujo pressuposto indica que a palavra é uma ação capaz
de comprometer quem a realiza e quem a aceita, nesse contexto, dialogar implica
a participação dos afetados pela decisão. Quem dialoga está disposto a ouvir e não
julga que já tem toda a verdade. O diálogo busca uma solução justa.

Saiba mais!

Leia, aqui, o artigo Educação e tolerância: articulações éticas e pedagógicas pos-


síveis, de Marcelo Andrade

http://30reuniao.anped.org.br/trabalhos/GT17-3672--Int.pdf

1.7 Multidisciplinaridade, Interdisciplinaridade, Transdiciplinaridade

Multimídia

https://www.youtube.com/watch?v=ezJSUPkyxlg

Clique, aqui, e veja como trabalhar em equipe ajuda a resolver problemas que
sozinhos não daríamos conta.

A reflexão Bioética se dá a partir da pluralidade de ideias, formações e conheci-


mentos. Para que possamos entender melhor como essa pluralidade se constitui,
vamos falar sobre os conceitos de multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e
transdisciplinaridade.

A multidisciplinaridade se dá pela aproximação de diferentes disciplinas para


solução de problemas específicos, com diversidade de metodologias, porém cada
disciplina mantendo sua metodologia específica. Os campos disciplinares, embora
cooperem, guardam suas fronteiras e ficam imunes ao contato (DOMINGUES, 2005
apud BICALHO; OLIVEIRA, 2011).

A interdisciplinaridade propõe aproximação de campos disciplinares diferentes


para a solução de problemas específicos dedicados ao compartilhamento de metod-
ologia. Nesse ,contexto, as fronteiras entre as diferentes disciplinas são mantidas,
todavia os conhecimentos são partilhados de forma a construir um conhecimento
novo e comum às diferentes áreas. (DOMINGUES, 2005 apud BICALHO; OLIVEIRA,
2011).

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Já a transdisciplinaridade implica rompimento de fronteiras entre as disciplinas.
Nessa modalidade de construção de conhecimentos voltados à solução de proble-
mas temos a abertura das disciplinas envolvidas para algo que é maior do que elas
e ultrapassando-as. O conhecimento não pertence a nenhuma disciplina específica.

Dentro de uma empresa, podemos dizer que todos os profissionais, cada um de


acordo com seus conhecimentos e habilidades, está procurando oferecer o melhor
produto ou serviço para o cliente final naquele ramo de atividade. Se esses profis-
sionais realizam suas tarefas de forma isolada e independente, podemos dizer que
se trata de um ambiente de trabalho multidisciplinar. Se os profissionais trocam
ideias entre si para poder atingir melhor seus objetivos procurando trabalhar de
forma integrada, podemos dizer que existe interdisciplinaridade. Finalmente, se os
profissionais dialogam constantemente e constroem novos conhecimentos, novas
formas de se trabalhar (de um modo que nenhum deles poderia fazer sozinho),
dizemos que existe transdisciplinaridade nessa equipe.

Na verdade, são diferentes modelos de trabalho, sendo que o modelo transdiscipli-


nar é o nível em que há maior interação e integração baseado fundamentalmente
no diálogo, ou seja, o sucesso do trabalho em equipe requer não só habilidades
técnicas, mas também boa capacidade de comunicação.
Agora que já aprendemos os conceitos fundamentais que subsidiam a discussão

Figura – 3

Fonte: Meilycass Interdisciplinaridade

Bioética, vamos conhecer os Princípios que a norteiam, como ela se organiza e


quais instrumentos nos oferece para a tomada de decisões frente às situações com
as quais poderemos nos deparar em nossa vida profissional e cotidiana.

Seguiremos para a Aula 2, cuja proposta de estudo está baseada nos Princípios da
Bioética.

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Referências Bibliográficas

BARCHIFONTAINE, C.P.; PESSINI, L. Bioética: alguns desafios, 2002.

BICALHO, L.M.; OLIVEIRA, M. Aspectos conceituais da multidisciplinaridade e da in-


terdisciplinaridade e a pesquisa em ciência da informação. Encontros Bibli: Revista
Eletrônica de Biblioteconomia e Ciência da Informação, v. 16, n. 32, p. 1-26, 2011.
Disponível em:

https://periodicos.ufsc.br/index.php/eb/article/viewFile/1518-2924.2011v16n3
2p1/19336
Acesso em 24 jan. 2013.

CORTINA, A. Educar na cidadania: aprender a construir o mundo juntos. In: Cidadãos


do mundo para uma teoria da cidadania. São Paulo: Loyola, 2005.

DURAND, G. Introdução geral à Bioética: história, conceitos e instrumentos. São Pau-


lo: Loyola; 2003.

GOLDIM, J.R. Bioética: origens e complexidade. Rev HCPA. v. 26, n. 2, p. 86-92,


2006. Disponível em:

http://www.bioeticaefecrista.med.br/textos/origem%20e%20complexidades.pdf
Acesso em 13 jan. 2012.

PEGORARO, O.A. Capítulo 17: Uma justificativa ética para a clonagem humana. In:
GARRAFA, V.; PESSINI, L (org.) Bioética: poder e inJustiça. 2ª edição. São Paulo:
Loyola, 2004. P. 179-185.

VERSPIEREN, P. A dignidade nos debates políticos e bioéticos. Concilium - Ver Intern


teologia. v. 2, n. 300, p. 169-177, 200.

WEISS, C. O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais [s.d.].


Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/textos/tratado06.
htm> Acesso em 11 ago. 2013.

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Aula-2

2.1. Princípios da Bioética

Convido você a conhecer e a refletir sobre os Princípios da Bioética. Vamos ver


como isso funciona?

Aos poucos, a Bioética tornou-se um espaço de reflexão ética e de diálogo entre as


diversas especialidades do conhecimento científico examinado à luz dos valores e
dos Princípios morais.

A publicação do Relatório Belmont e do Livro de Beauchamp e Childress (Princípios


da Ética Biomédica) nos Estados Unidos, no início da década de 1970, representou
um marco relevante na evolução da Bioética.

Nesses documentos, foram identificados alguns Princípios relevantes para a ética


médica, os quais foram incorporados à Bioética. São eles: Beneficência, Não Malefi-
cência, Justiça e Autonomia. Veja cada um deles!

Beneficência

O Princípio da Beneficência é o que estabelece o dever de fazermos o bem aos ou-


tros, independentemente de desejarmos isso ou não.
Importante!

É importante distinguir três conceitos: Beneficência, que é fazer o bem; Benevo-


lência, que é desejar o bem e Benemerência, que é merecer o bem.

Segundo Durand (2003, p. 162), a Beneficência refere-se à ação a ser feita. É, por-
tanto, o dever de agir no interesse do outro. É, ao mesmo tempo, “um dever, uma
virtude, um Princípio, um valor”.

20
Não Maleficência

O Princípio da Não Maleficência é o mais controverso de todos. Muitos autores o


incluem no Princípio da Beneficência por acharem que, ao evitar o dano intencional
o indivíduo já se está, na realidade, visando o bem do outro.

O Princípio da Não Maleficência propõe a obrigação de não infringir dano intencio-


nal. Hipócrates, ao redor do ano 430 a.C., propôs aos médicos, no primeiro livro da
sua obra Epidemia: “Pratique duas coisas ao lidar com as doenças: auxilie ou não
prejudique o paciente”. Esta talvez seja a citação correta da sua famosa frase em
latim: Primum non nocere (significa: primeiro não causar dano). Esta frase se tor-
nou a máxima da prática médica e inspira os juramentos dos profissionais de saúde
até hoje.

Justiça

Quem deve receber os benefícios da pesquisa e os riscos que ela acarreta? Esta é
uma questão de Justiça no sentido de ‘distribuição justa’ ou ‘o que é merecido’.
Segundo o Relatório Belmont, uma inJustiça ocorre quando um benefício que uma
pessoa merece é negado sem uma boa razão ou quando algum encargo lhe é im-
posto indevidamente.

Outra maneira de conceber o Princípio da Justiça, proposta por Aristóteles, é que os


iguais devem ser tratados igualmente e os diferentes devem ser tratados de forma
diferente.

Existem muitas formulações amplamente aceitas de como distribuir os benefícios e


os encargos (riscos ou ônus):

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* A cada pessoa uma parte igual;

* A cada pessoa de acordo com a sua necessidade;

* A cada pessoa de acordo com o seu esforço individual;

* A cada pessoa de acordo com a sua contribuição à sociedade;

* A cada pessoa de acordo com o seu mérito (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2007).

Saiba mais!

Entenda a diferença entre Justiça e Direito:

http://www.bioetica.ufrgs.br/justica.htm

Autonomia

O Princípio do Respeito à Pessoa, Princípio do Consentimento ou Princípio da Au-


tonomia são centrais na Bioética. As pessoas deixam de ser objetos e passam a
constituir um ser humano dotado de razão e vontade própria, pois tem competên-
cia para decidir. Entende-se que as pessoas devem ter sua Autonomia respeitada e
que os indivíduos, cuja Autonomia está diminuída, devem ser protegidos.

Uma pessoa autônoma é um indivíduo capaz de deliberar sobre seus objetivos pes-
soais e de agir na direção desta deliberação. Respeitar a Autonomia é valorizar a
consideração sobre as opiniões e escolhas, evitando, da mesma forma, a obstrução
de suas ações, a menos que elas sejam claramente prejudiciais para outras pesso-
as.

Segundo Durand (2003), o conceito de Autonomia muitas vezes não é respeita-


do; as relações no campo da saúde, da pesquisa, ou outros campos das relações
humanas, são, muitas vezes, dominadas pela ideia do paternalismo supondo que
aquele que tem mais conhecimento terá poder para tomar decisões e que, portan-
to, o outro deveria se submeter desempenhando o que Durand chama de “papel de
dependência”.

No entanto, respeitar a Autonomia do outro é um Princípio fundamental. “Respei-


tar a Autonomia de outrem não é apenas recorrer à sua autodeterminação, mas
ajudar essa pessoa a ir ao limite de si mesma, ajudá-la a descobrir e a escolher o
que está mais de acordo com o sentido de respeito à dignidade humana” (DURAND,
2003, p. 178).

22
Autonomia Reduzida: nem todas as pessoas têm a capacidade de se autodetermi-
nar. Esta capacidade evolui durante a vida do indivíduo e algumas pessoas perdem
esta capacidade total ou parcialmente devido a doenças, distúrbios mentais ou cir-
cunstâncias que severamente restrinjam a liberdade. Essas são pessoas que preci-
sam ser protegidas, muitas vezes é necessário que outro decida por elas e aí temos
uma questão bastante delicada, pois implica decidir o que é melhor para o outro e
não para si mesmo.

A inclusão do outro na questão da Autonomia trouxe, desde o pensamento de Kant,


uma nova perspectiva que alia a ação individual com o componente social.

É a partir desta perspectiva que surge a responsabilidade pelo respeito à pessoa.


Não pode haver moralidade quando se considera apenas o próprio ponto de vista.

Vamos conhecer o significado e aplicação das Correntes de Bioética?

23
2.2. Correntes da Bioética

Bioética Principialista

Até hoje, alguns autores defendem que todos os problemas de ordem Bioética
podem ser solucionados usando-se os quatro Princípios estudados. Essa corrente de
pensamento é chamada de Bioética Principialista, mas, será que os quatro Prin-
cípios (Autonomia, Beneficência, Não Maleficência, Justiça) dão conta de analisar
todos os conflitos e dilemas éticos que a Bioética se propõe?

Quando analisamos a “Teoria Principialista” verificamos que a Não Maleficência é


predominantemente um dever; Beneficência - também é um dever; Autonomia - é
predominantemente um direito; Justiça - é dever e direito.
Importante!

Segundo Hossne (2006), os Princípios seriam, na verdade, referenciais, e como o


próprio nome sugere, são pontes de referência para a reflexão Bioética. Assim, os
“Princípios” deixam de ser direitos e/ou deveres e passam a ser pontos de refe-
rência, aliás, importantíssimos, porém, não só eles. Em algumas situações, podem
ser necessários outros referenciais adicionais.

Tomemos como exemplo a vulnerabilidade, que também é um referencial bioético


importante. Diante da privação da liberdade ou na presença de uma doença a pes-
soa não apenas perde Autonomia, mas também se torna mais vulnerável. A vul-
nerabilidade pode ser compreendida como a susceptibilidade de ser ferido (NEVES,
2006). Em certo sentido, somos todos vulneráveis, devido às características tempo-
ral e finita de toda a vida humana.

24
São exemplos de outros referenciais úteis a solidariedade, a responsabilidade, a
confidencialidade e a privacidade.

Assim, atualmente, novas correntes vêm se consolidando na Bioética. Vamos co-


nhecer brevemente algumas delas.

Liberalismo em Bioética

Essa corrente busca nos direitos humanos a afirmação da Autonomia do indivíduo


sobre seu próprio corpo e sobre todas as decisões que envolvem sua vida. Segundo
a abordagem libertária de Tristram Engelhardt Jr (Texas/EUA), entre “comunidades
morais” distintas ou entre “estranhos morais” (pessoas que não partilham da mes-
ma moral por questões culturais, religiosas, entre outras.) a autoridade moral seria
derivada a partir do consentimento dos envolvidos.

Bioética das Virtudes

A virtude, um traço de caráter que é valorizado socialmente, é a forma de agir que


enobrece a pessoa, que a aperfeiçoa. O contrário é o vício, que degrada ou des-
trói a pessoa. De acordo com Aristóteles, as virtudes se aperfeiçoam com o hábito.
Essa corrente assume o Princípio da Beneficência como central da ética baseado na
confiança. Exemplos de virtude: fidelidade, compaixão, senso pessoal de responsa-
bilidade e integridade moral.

Bioética Casuística

Caracteriza-se por uma análise caso a caso, não assentando as decisões morais em
quaisquer Princípios ou teorias a priori. Tende a acentuar a importância dos casos e
suas particularidades permitindo fazer analogias com outros casos.

Bioética Feminista

Assume o gênero e o sexo como categorias analíticas centrais buscando o entendi-


mento de seus efeitos no mundo. Articula e discute uma ética do cuidado, compre-
endido enquanto uma forma de acolher e dialogar colocando-se no lugar do outro
e agindo de modo solidário.

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Bioética Naturalista

Procura estabelecer bens fundamentais da pessoa humana, a começar por sua pró-
pria vida como um todo e para condições básicas que constituam sua dignidade.

Bioética Personalista

Trata-se de uma ampla visão antropológica que incide na ética valorizando, entre
outros aspectos, a dignidade humana como centro da elaboração ética, por sua
capacidade e vocação a dar sentido às coisas e ao próprio rumo da vida. É a corren-
te defendida pela Igreja Católica, pois tende a valorizar a pessoa humana enquanto
unidade dotada de espírito e corpo.

Bioética Contratualista

Considera a complexidade das relações sociais e propõe interligações entre direitos


e deveres de ambas as partes. Nas relações de saúde, por exemplo, o profissio-
nal preserva a sua autoridade enquanto detentor de conhecimentos e habilidades
específicas assumindo a responsabilidade pela tomada de decisões técnicas. Nesse
contexto, o paciente também participa ativamente no processo de tomada de deci-
sões exercendo seu poder de acordo com o estilo de vida, valores morais e pesso-
ais. O processo ocorre em um clima de efetiva troca de informações e a tomada de
decisão pode ser de médio ou alto envolvimento, tendo por base o compromisso
estabelecido entre as partes envolvidas.

Bioética da Libertação

Enfatiza as situações concretas em que se encontram os sujeitos ameaçados e desa-


fiados a lutar por viver (principalmente no Terceiro Mundo). Busca situar a Bioética
numa análise estrutural da sociedade como produção da vida e condições de saú-
de, mas também de exclusão. Busca propostas em processos capazes de realizar a
inclusão das pessoas como sujeitos e semelhantes.

Encerramos, nesse instante, a nossa segunda aula do segundo módulo.

Adiante, em nossa terceira aula, você entrará em contato com os processos de to-
mada de decisão em Bioética.

Vamos em frente!

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Referências Bibliográficas

DURAND, G. Introdução geral à Bioética: história, conceitos e instrumentos. São Pau-


lo: Loyola; 2003.

HOSSNE, W.S. Bioética: Princípios ou referenciais? O Mundo da Saúde. v. 30, n. 4, p.


67-6, 2006. Disponível em:
http://www.saocamilo-sp.br/pdf/mundo_saude/41/20_bioetica_principio.pdf
Acesso em 24 jan. 2013.

NEVES, M.P. Sentidos da vulnerabilidade: característica, condição, Princípio. Revista


Brasileira de Bioética, v. 2, n. 2, p. 157-172, 2006.

PESSINI, L. BARCHIFONTAINE, C.P. Problemas atuais de Bioética. 7ª. edição. Loyola:


São Paulo, 2007.

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Aula-3

3.1. Processos de tomada de decisão em Bioética

Mais do que propor instrumentos para reflexão sobre as questões relacionadas à


vida, a Bioética se propõe a ser um instrumento que auxilie a tomada de decisões.
Para tanto, propõe métodos que orientem essas decisões. Vamos conhecer aqui
dois deles - o método principialista e o método de Diego Gracia.

Método Principialista

Baseia-se nos Princípios já estudados de Beneficência, Não Maleficência, Autono-


mia e Justiça, ou seja, a partir da análise dos Princípios relacionados à situação em
questão busca estabelecer uma hierarquia (DURAND, 2003). Por exemplo, pense
em uma pessoa que contrai o vírus HIV e que, orientada a contar ao seu parceiro
desiste de fazer por medo que esse termine a relação. Se fôssemos pensar exclu-
sivamente em Autonomia, esse desejo seria respeitado. No entanto, temos outra
pessoa envolvida e que pode ser gravemente prejudicada. É justo privá-la desta
informação? Estaríamos fazendo um mal a ela omitindo o diagnóstico do parceiro?
O que é mais importante nesse momento: Autonomia ou Justiça?

Método de Diego Garcia

Ao analisar uma situação, Diego Gracia nos propõe alguns passos a serem seguidos.
Inicialmente a identificação clara do problema. Em seguida, a análise dos fatos, a
partir da obtenção do maior número de informações e visões sobre o caso. Poste-
riormente, realiza-se a identificação dos valores implicados e se existem valores
em conflito. Havendo conflito, passa-se a deliberação sobre o conflito fundamental,
buscando a melhor decisão. Uma vez tomada a decisão, deve-se submetê-la à “pro-
va de consistência”, que implica três questões:

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1. Prova de legalidade - A decisão que será tomada é legal?

2. Prova da publicidade - Você tomaria essa decisão se fosse a público?

3. Prova do Tempo - Você tomaria a mesma decisão se pudesse esperar uma


hora ou um dia?

Segundo Gracia, a função da ética não é buscar unanimidade, mas evitar que as
decisões sejam imprudentes. O método proposto consiste em diminuir as incertezas
a um ponto que se possa dizer que tomamos uma decisão prudente.
Multimídia

Clique, aqui, e acesse a entrevista que Diego Gracia deu ao CREMESP

http://www.bioetica.org.br/?siteAcao=EntrevistaIntegra&id=34&p=

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Considerações finais...

A Bioética não traz respostas prontas sobre o que é certo ou errado. Ela procura
ser um instrumento de reflexão para a tomada de decisões, mas, como pudemos
perceber ao longo deste módulo, as tomadas de decisão estão muito relacionadas
às convicções pessoais de cada um, seus valores, suas crenças, sua capacidade de
ouvir diferentes pontos de vista e refletir sobre eles.

Para ser um bom profissional, não basta ter competência técnica. A competência
técnica é fundamental e é uma obrigação (regulamentada pelo seu Código de Ética
Profissional), mas quem pretende ser, de verdade, um bom profissional, precisa ir
mais além. No trabalho (não importa qual seja ele), é necessário relacionar-se com
outras pessoas. Será que você consegue se colocar no lugar do outro para o qual
você prestará algum serviço?

Competência técnica não é tudo. A formação científica nem sempre tem sido acom-
panhada da devida formação humanística e moral necessárias para que ocorra uma
reflexão ética sobre as práticas. Em geral, procura-se nas palavras do profissional
honestidade, precisão, acessibilidade e informação consistentes em relação à sua
doença ou o que quer que o tenha levado ao profissional, assim como suas implica-
ções (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2006).

Faz-se necessário, portanto, humanizar as relações interpessoais. O termo huma-


nização tem sido muito usado. Mas, será que sabemos o que é, de verdade, uma
relação humanizada?

Segundo Pessini e Bertachini (2004), o cuidado humanizado implica a compreensão


do significado da vida, a capacidade de perceber e compreender a si mesmo e ao
outro, situado no mundo e sujeito de sua própria história, ou seja, a relação huma-
nizada pressupõe o desenvolvimento da empatia, da capacidade de se colocar no
lugar do outro.

É por meio desse olhar humanizado que a Bioética nos propõe a possibilidade de
cuidar das relações e tomar decisões.

Partiremos, agora, para o terceiro módulo de Bioética.

Continue se dedicando aos estudos relacionados à Bioética, pois é preciso que você
compreenda a importância desse saber para se tornar um profissional mais respon-
sável e mais consciente de si e dos outros.

Até o próximo módulo!

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Referências Bibliográficas

DURAND, G. Introdução geral à Bioética: história, conceitos e instrumentos. São Pau-


lo: Loyola; 2003.

PESSINI, L. BERTACHINI, L. (org.). Humanização e cuidados paliativos. EDUN-


ISC-Edições Loyola, São Paulo, 2004.

PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. (Orgs.). Bioética e longevidade humana. São Pau-
lo: Loyola, 2006.

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