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Aquilo que os olhos veem ou

o Adamastor - Análise da
obra
A obra Aquilo que os olhos veem ou o Adamastor  mistura com
mestria  factos históricos com ficção. Aliás, a obra retrata uma história
relatada por uma personagem histórica Mestre João. Este foi um físico
e cirurgião no reinado de D. Manuel. 
O enredo tem início com um monólogo de Mestre João que, após
longos anos no Oriente, regressa a Portugal. Em determinado ponto
da viagem de regresso, ao passar o Cabo da Boa Esperança, mais
precisamente Angra de S. Brás, recorda acontecimentos que
aí testemunhara muitos anos antes. É dessa forma que Mestre João
começa a narrar as suas memórias desse tempo, quando, na nau em
que regressava da Índia, recolheu, nesse mesmo local, um náufrago,
Manuel.
Manuel é o protagonista da obra e, contrariamente a Mestre João, é
uma personagem ficcional que conta também ele uma história
fantástica e terrível, passada num momento anterior às próprias
memórias de Mestre João. 
Desta forma, conclui-se que a ação centra-se em três tempos
distintos: o presente (correspondente à viagem de regresso de Mestre
João), o perfeito (o tempo das memórias de Mestre João) e o mais-
que-perfeito (relativo às recordações de Manuel). 
Na Cena 1, apresenta-se o narrador da ação, que inicia um monólogo,
afirmando que o seu “coração está cheio de memórias e melancolias”.
Desta forma introduz a memória do momento em que recolheu
Manuel, dado quase como morto. Assim, simultaneamente
apresentam-se os antecedentes da ação presente e as personagens
principais. Sucedem-se, então,  os acontecimentos que representam a
ação central da peça: o encontro do náufrago e o relato da sua história
(cena 2 até à cena 13).
A cena 14 corresponde ao desenlace da ação. 
Os episódios relatados entre as cena 2 e 4 surgem no tempo presente
por encaixe. É no Tempo do Perfeito (que se inicia na cena 2)  que o
leitor acede às memórias de Mestre João, quando este conta a história
de um náufrago recolhido pelos seus marinheiros. Na cena 4, retoma-
se o tempo presente, quando Mestre João abandona as
deambulações pelas suas lembranças e ele próprio duvida da
veracidade dos acontecimentos que recordara anteriormente. Não
compreende como, sendo ele um homem da ciência, poderia acreditar
numa história fantástica como o encontro com o Adamastor relatado
por Manuel. Já na cena 5, retoma-se o tempo da memória de Mestre
João (Tempo do Perfeito), quando Manuel já mais recuperado,
consegue ter forças para contar o que lhe acontecera. Neste ponto faz
referência ao seu encontro com o Adamastor, apelidando-o de
"Demónio" e "Avantesma", dizendo que as naus onde seguiam os
seus companheiros foram "atirados pelo mar como bocados de
papel” com o objetivo de o atingir. 
Na cena 6, o leitor pode aceder às memórias de Manuel – “ Tempo do
mais-que-perfeito” , que surge por encaixe. Então, Manuel inicia a
narração de como seguiu as pisadas de seu pai, que integrara a frota
de Bartolomeu Dias aquando da passagem do Cabo da Boa
Esperança. Explica também que o sonho que tivera, em que salvava o
seu próprio pai das garras de Adamastor, o arrastara para aquela
situação em que se encontrava. 
PERSONAGENS
Mestre João é um homem das ciências, dominado pela racionalidade.
O episódio narrado por Manuel fá-lo duvidar do seu pensamento
racional, porque, segundo a sua forma de pensar, figuras como a do
Adamastor não existem. No entanto, estas dúvidas não o impedem de
sentir curiosidade sobre aquele ser fantástico, chegando mesmo, na
cena 12, a considerar a Avantesma como uma criatura natural de
Deus. 
Manuel é um adolescente, segundo a sinopse da obra, com  14/15
anos que vive com a mãe e a irmã Ana em Massarelos, nos arredores
do Porto. O pai partiu no passado na frota de Bartolomeu Dias, e
Manuel já estava assim familiarizado com a vida no mar. Um dia
sonha que o pai é atacado pelo Adamastor. Nesse sonho revelador e
premonitório, Manuel enfrenta o monstro, laçando-se à água para
salvar o seu pai e vence-o. O seu sonho acaba por se tornar
realidade, como se pode verificar na fala do pai, acabado de regressar
da sua viagem: “ Por pouco morria eu ali! (…) Salvou-me o meu Anjo
da Guarda…”. 
Posto isto, Manuel convence-se que o monstro quererá vingança.
Algum tempo mais tarde, embarca na armada de Pedro Álvares
Carbral, que acaba por naufragar ao lago do Cabo das Tormentas.
Com a certeza que o Adamastor o procura, acaba também ele por
naufragar, mas sobrevive, embora bastante ferido.
Manuel é, desta forma, uma personagem comum, sem nenhum traço
de excecionalidade. O facto de sobreviver ao naufrágio transforma-o
num herói, pois é o único que sobrevive da sua armada. 
A figura de Adamastor é de extrema importância na ação,
omnipresente em toda a obra, sem nenhuma vez aparecer
fisicamente. Esta figura disforme é referida logo no título da obra,
introduzida através de uma conunção subordinativa disjuntiva (ou).
Esta expressa exactamente a ideia de alternativa, ou seja, o que
vemos ("Naquilo que os olhos veem") corresponde à realidade,
enquanto a figura do Adamastor corresponde ao irreal e inexplicável.
Assim, o Homem tem sempre a oportunidade de acreditar na realidade
ou aceitar o inexplicável. 

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