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Evolução histórica dos direitos

fundamentais
Da Antiguidade até as primeiras importantes
declarações nacionais de direitos

Urbano Carvelli e Sandra Scholl

Sumário
1. Introdução. 2. A Antiguidade greco-roma-
na. 3. O Cristianismo e a Idade Média. 4. Os pri-
mórdios da Idade Moderna. 4.1. A Reforma. 4.2.
Os pensadores espanhóis da Escolástica tardia e
os Monarchomachos franceses. 4.3. Os grandes
filósofos do Estado. 4.3.1. A contribuição inglesa.
4.3.2. A contribuição francesa. 4.3.3. A contribui-
ção alemã. 5. A Idade Moderna: as primeiras
importantes declarações nacionais de direitos.
5.1. A Inglaterra. 5.2. Os Estados Unidos da
América. 5.3. A França. 6. Considerações finais.

1. Introdução
Durante vários anos, a questão das
Urbano Carvelli é professor na Faculdade de raízes e das origens dos direitos fundamen-
Direito da Universidade de Colônia na Repúbli- tais foi considerada esclarecida, apesar de
ca Federal da Alemanha. Bacharel em direito alguns debates controversos sobre aspectos
pela Universidade do Vale do Paraíba, especia- específicos. No entanto, o conhecimento
lista em direito alemão pela Universidade de
de que a análise dos princípios históricos,
Bonn na República Federal da Alemanha, mestre
(Magister Legum) e doutorando em direito pela
políticos e filosóficos dos direitos funda-
Universidade de Colônia na República Federal mentais também é de incalculável valor na
da Alemanha. Jornalista. práxis da nossa realidade atual desponta
Sandra Scholl é uma European Union Liai- nitidamente aos nossos olhos. Assim, não é
son Officer. Trabalha na EuroConsult Research de se admirar que esses princípios estejam
& Education, uma instituição do Ministério no foco de diversas disciplinas científicas
para Inovação, Ciência e Pesquisa do Estado da e que exista um dilúvio de ensaios sobre a
Renânia do Norte e Westfalia com sede na Rhei- temática.
nischen Friedrich-Wilhelms-Universität Bonn.
Uma explicação para a importância
Mestre (Magistra Artium – M.A.) de Ciência Po-
lítica, História e Ciência Jurídica na Rheinische essencial dos princípios dos direitos fun-
Friedrich-Wilhelms-Universität Bonn e douto- damentais pode ser constatada a partir do
randa em Direito internacional pela Rheinische status exponencial que estes recebem dentro
Friedrich-Wilhelms-Universität Bonn. dos Estados de direito modernos. Assim, os
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direitos fundamentais são primordialmente garantias de instituto, direitos de defesa, di-
constitutivos para um Estado constitucional reitos de participação, direitos de prestação,
democrático1 e representam o verdadeiro obrigações de proteção ou como decisões de
núcleo de uma ordem liberal-democrática.2 valor. Também não se deve esquecer que,
Os direitos fundamentais delimitam as nas ordens jurídicas modernas, o método de
áreas nas quais o poder estatal não deve interpretação histórico pertence, juntamente
intervir e representam, ao mesmo tempo, com o gramatical, o sistemático e o teológi-
os fundamentos da comunidade. Eles são co, ao rol dos mais importantes métodos de
a expressão e a garantia tanto da liberdade interpretação das regras jurídicas. Ademais,
política quanto da liberdade pessoal. Os di- o aspecto evolucional também deve ser
reitos fundamentais munem o indivíduo da apreciado. Uma vez que foram necessários
garantia de organização e gerência de sua vários séculos de esforços intermináveis
própria vida, abrindo-lhe a possibilidade de e imensas dificuldades para o estabeleci-
participar da vida política da comunidade. mento dos direitos fundamentais como
Assim, entre os direitos fundamentais e a elemento constitutivo da vida comunitária,
ideia de liberdade democrática desenvol- uma análise abrangente e profunda do de-
veu-se uma relação simbiótica, da qual o senvolvimento histórico, político e filosófico
rompimento conduziria ao abandono do dos direitos fundamentais é obrigatória.
Estado constitucional democrático. A seguir, apresentaremos uma visão
O extraordinário interesse sobre os geral sobre as principais fases do desen-
princípios dos direitos fundamentais não volvimento dos direitos fundamentais
deve, porém, ser analisado através de uma considerando o contexto histórico, político
perspectiva monodimensional ou declara- e filosófico. Primeiramente, trataremos
do como monocausal. A investigação dos das correntes intelectuais na Antiguidade
princípios históricos, políticos e filosóficos greco-romana. Além disso, apreciaremos os
dos direitos fundamentais tem por base as pré-trabalhos intelectuais, os quais foram
mais diversas motivações e objetivos. As- trazidos pelo Cristianismo, e ofereceremos
sim, a importância da investigação desses uma pequena sinopse tanto sobre o mundo
princípios é evidente a todo pesquisador medieval quanto sobre as declarações de
que trata com sistemas políticos em que os direitos medievais. Adiante, analisaremos
direitos fundamentais inexistem ou são in- a influência dos reformadores, dos pensa-
suficientes. Exatamente numa tal situação, dores espanhóis da Escolástica tardia, dos
surge a necessidade de aclarar onde estão Monarchomachos franceses e dos grandes
as raízes, as origens histórico-ideológicas e filósofos do Estado sobre o desenvolvimen-
os motivos que determinam a vigência dos to da ideia dos direitos fundamentais. No
direitos fundamentais. Além disso, os prin- próximo ato, apresentaremos as primeiras
cípios dos direitos fundamentais têm uma importantes declarações nacionais de di-
importância relevante para a compreensão reitos considerando as suas importantes
dos catálogos de direitos fundamentais das contribuições para o desenvolvimento dos
constituições contemporâneas vigentes; direitos fundamentais modernos e, por fim,
especialmente quando se objetiva elucidar encerraremos com algumas considerações
as funções dos direitos fundamentais como finais.

1
Cf. BVerfGE 20, 56 [97]: O Bundesverfassungsgeri-
cht utilizou essa afirmação especialmente em relação à 2. A Antiguidade greco-romana
liberdade de expressão. No entanto, a referida consta-
Na Antiguidade greco-romana, inexis-
tação deve ser entendida como a expressão idiomática
“pars pro toto”. tiam – até aonde as fontes históricas permi-
2
Cf. BVerfGE 31, 58 [73]; 43, 154 [167]. tem tal conclusão – direitos fundamentais

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válidos para todas as pessoas. Assim, a tanto, Aristóteles já julgava a justiça como
ordem social e econômica daquela época uma virtude orientada aos semelhantes, a
estava apoiada amplamente no aceito e qual deveria preservar a igualdade peran-
conhecido instituto da escravidão e de- te os outros; porém, caberia aos estoicos
pendia, de maneira geral, da divisão em proclamar o profundo princípio moral da
diversas camadas sociais (por exemplo: igualdade. Segundo os pensamentos an-
sábios, guerreiros, artesãos, agricultores e tropológicos e éticos dos estoicos, todas as
escravos). Consequentemente, na Antigui- pessoas são seres dotados de razão e iguais,
dade greco-romana, somente os cidadãos os quais devem ter a mesma possibilidade
da Pólis ou, respectivamente, os cidadãos do exercício da livre vontade reconhecida
de Roma possuíam direitos. Um exemplo (HOFMANN, 1988, p. 842; TOPITSCH,
de excelente feição plástica é a concessão 1963. p. 2; KÜBLER, 1965. p. 7-; SAMWER,
de direitos dentro da Pólis. Somente os 1969. p. 230-; FLEINER-GERSTER, 1980. p.
cidadãos da Pólis podiam usufruir da 64-). Os estoicos romanos, principalmente
igualdade perante o direito (Isonomia), da Cícero, Sêneca e Epicteto, orientavam-se,
mesma liberdade da palavra (Isogoria) e por outro lado, aos ensinamentos básicos
do mesmo respeito (Isotimia). Visões que antropológicos e éticos dos estoicos gregos
almejassem a validade do mesmo direito e transcreveram o princípio da igualdade,
para todas as pessoas proporcionariam, até então fundamentado no direito natural,
por conseguinte, enormes repercussões nos para o direito. Na visão dos estoicos roma-
fundamentos da ordem estatal. Contudo, nos, o direito natural (ratio naturae) é uma
mesmo no pensamento antigo, é possível lei da divindade e, portanto, uma norma
encontrar considerações que foram impor- absolutamente obrigatória tanto para as
tantes para o desenvolvimento da ideia dos pessoas quanto para a autoridade divina.
direitos fundamentais (VERDROSS, 1948, Nenhum legislador, ou seja, tanto o senado
p. 118-; SCHMALE, 1997, p. 49-). quanto o povo romano, poderia invalidar
Já no século V a.C., os sofistas defen- aquela lei natural ou a ela se desobrigar
diam o entendimento de que o direito na- (OESTREICH, 1966, p. 12). A transição do
tural deveria ser classificado como superior direito natural de um objeto da filosofia
ao direito positivo. A esta época pertence o para um objeto do pensamento jurídico e
enunciado de direito natural de um sofista da concretização jurídica foi intensificada
chamado Alkidamas, o qual afirmava que principalmente por Cícero (1915, p. 22):
Deus criou todos os homens livres e não fez “Est quidem vera lex recta ratio, na-
nenhum deles como escravo (OESTREICH, turae congruens, diffusa in omnis,
1966, p. 11). Além disso, Platão e seu mestre constans, sempiterna, quae vocet ad
Sócrates seguiam o entendimento de que officium iu-bendo, vetando a fraude
somente uma ordem política obrigada aos deterreat, quae tamen neque probos
parâmetros éticos seria aceitável. Por isso, frustra iubet aut vetat, nec improbus
Platão considerava como obrigatórias so- iubenda aut vetando movet. Huic
mente aquelas leis as quais eram fruto da legi nec obrogari fas est, neque dero-
razão (VERDROSS, 1948, p. 235). Aristóte- gari aliquid ex hac licet, neque tota
les, o qual notoriamente ainda justificava a abrogari potest, nec vero aut per
escravidão por meio das diferenças naturais senatum aut per populum solvi hac
entre as pessoas, acreditava, no entanto, lege possumus, neque est quaeren-
que tanto a proteção da vida e da proprie- dus explanator aut interpres Sextus
dade dos seus cidadãos quanto o fomento Aelius, nec erit alia lex Romae alia
de suas capacidades naturais eram deveres Athenis, alia nunc alia posthac, sed
do Estado (MÜHLEISEN, 1993, p. 6). Entre- et omnes gentes et omni tempore

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una lex et sempiterna et inmutabilis versal daqueles direitos (esses direitos não
continebit, unusque erit communis valiam para os escravos e para as mulheres)
quasi magister et imerpator omnium e que o seu ensinamento não era dirigido
deus (...).” à pessoa humana como indivíduo, pressu-
Por conseguinte, é possível consta- pondo apenas a vinculação coletivista do
tar que, na Antiguidade greco-romana, indivíduo (STERN; SACHS, 1988, p. 61-).
existiram abordagens concretas para o Devido aos enormes confrontos entre
surgimento dos direitos fundamentais, autoridade imperial e a autoridade papal,
faltando, no entanto, apenas o passo surgiram, por volta do final da Idade Mé-
decisivo para a transformação em direito dia, diversos ensaios político-teológicos, os
vigente (JELLINEK, 1914, p. 27). Assim, quais também tratavam do sistema jurídico.
tanto a Constituição grega quanto a romana Nesse contexto, Marcílio de Pádua via o
desconheciam totalmente direitos funda- sistema político comunitário como uma co-
mentais que determinassem os limites da munidade de homens livres, personificada
força estatal e protegessem o indivíduo da pela reunião de todos os cidadãos, em que,
intervenção do Estado. Por conseguinte, por meio da pars valentior civium, surgia a
faltou aos pensamentos greco-romanos lei, a qual também vinculava a autoridade.
tanto uma vinculação universal quanto Marcílio de Pádua foi assim um dos mais
uma ressonância política. importantes defensores da autoridade mo-
derada (OESTREICH, 1978, p. 28-). Além
disso, Guilherme de Ockham classificava
3. O Cristianismo e a Idade Média
os direitos à liberdade e à propriedade
Uma importante contribuição para o como direitos concedidos por Deus e pela
desenvolvimento da ideia dos direitos fun- natureza, os quais estariam intrinsecamente
damentais foi oferecida pelo Cristianismo ligados à pessoa humana. De acordo com
(OESTREICH, 1978, p. 19-). O ensinamento o seu entendimento, as pessoas poderiam
do homem e a sua semelhança à imagem de renunciar, por sua vez, ao exercício desses
Deus (imago dei) conduziram não somente direitos naturais, os quais, porém, jamais
à formação do pensamento da dignidade poderiam ser abandonados definitivamen-
da pessoa humana e à ideia da liberdade te. Com base nessas teses, Guilherme de
pessoal, mas também ao reconhecimento da Ockham é frequentemente denominado
capacidade humana à autodeterminação e como o pai da teoria dos direitos naturais
ao princípio da igualdade de todas as pes- (OESTREICH, 1978, p. 22). Outro pensador,
soas perante Deus (AUGUSTINUS, 2001; Nicolaus de Cusa, partia da igualdade de
AQUIN, 1941, p. 93). Além disso, Tomás de todos os seres humanos e classificava a
Aquino desenvolvia, na alta Idade Média, garantia de direitos iguais para todos como
pensamentos antigos, especialmente aris- fundamento essencial de uma autoridade
totélicos e estoicos, e fundamentava assim justa. Em seus ensaios, Nicolaus de Cusa
o ensinamento da autoridade justa, a qual fundamentou também a ideia da existên-
tinha na liberdade da vida, da pessoa e da cia de um contrato entre a autoridade e os
propriedade os seus alicerces. De acordo súditos e de um direito de resistência dos
com Tomás de Aquino, a autoridade a subjugados (MÜHLEISEN, 1993, p. 7).
qual intervém na vida, na pessoa ou na No entanto, a posição adotada pelos
propriedade dos seus súditos é injusta, genitores eclesiásticos e pela maioria dos
uma vez que aqueles direitos estão sob a teólogos da Idade Média não representa-
proteção divina. Como observação crítica, va aquelas ideias libertárias esporádicas.
cabe mencionar que Tomás de Aquino não Em vez de permitir às pessoas desfrutar
sustentava uma vigência irrestrita e uni- do potencial libertário do Cristianismo, os

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Estados de cunho cristão estavam muito privilégios das castas) (OESTREICH, 1978,
mais ocupados em ganhar a guerra, na qual p. 26). A ideia da limitação do poder da
o poder imperial concorria com o poder autoridade mandamental por meio de um
papal. No mundo ocidental, mesmo depois direito objetivo ganhava aqui os primeiros
de se chegar a conclusão que o imperador contornos concretos. No entanto, direitos
representaria a autoridade máxima na subjetivos e liberdades para toda pessoa
esfera mundana e o papa personificaria a humana ainda não estavam garantidos.
autoridade máxima na esfera espiritual, Finalmente, cabe ressaltar que o Cristia-
não é possível alcançar nenhum progresso nismo e as declarações de direitos da Idade
decisivo referente à evolução dos direitos Média contribuíram, de certa maneira, para
fundamentais. Assim, a ideia de uma au- o desenvolvimento da ideia dos direitos
toridade que recebia a sua legitimação de fundamentais. Porém, tanto os pensamen-
Deus foi utilizada até a Idade Moderna tos libertários isolados cristãos quanto as
como forma de embasar e reforçar as es- fragmentárias declarações de direitos da
truturas mandamentais erigidas.3 Conse- Idade Média não podem requerer para si
quentemente, os subjugados só tinham a um significado maior do que um caráter
chance de conquistar uma liberdade maior pré-figurativo dos direitos fundamentais
quando eram capazes de ampliar os seus na forma de simples limitações do poder
direitos nos períodos em que existia uma da autoridade mandamental ou na forma
debilidade no exercício do poder. Entre as de direitos concedidos às castas.
mais famosas declarações de direitos da
Idade Média, temos a Magna Charta Liber- 4. Os primórdios da Idade Moderna
tatum do ano de 12154 e o Tübinger Vertrag
do ano de l5l4 (NÄF, 1975). Evidentemente Nos primórdios da Idade Moderna,
tratam tais instrumentos apenas de liberda- o Estado corporativo mutava, peu à peu,
des corporativas e privilégios de algumas para um Estado absolutista. Enquanto
classes. Na Magna Charta Libertatum, por o monarquismo absolutista vicejava na
exemplo, estão estipulados os termos nos maioria dos Estados continentais europeus,
quais o monarca podia executar a sua au- os aristocratas ingleses lutavam contra a
toridade perante as castas (principalmente monarquia.5 No entanto, uma vez que a
nobreza e clero). O documento também aristocracia inglesa almejava igualmente
continha garantias contra a usurpação o domínio do poder absoluto, também é
do poder por parte da autoridade man- possível caracterizar a Inglaterra como um
damental e instituía também a proibição dos Estados absolutistas daquela época,
da adoção de medidas na esfera política, porém com a particularidade de possuir
jurídica e econômica que não estivessem um absolutismo parlamentarista.6
de acordo com os direitos consuetudiná- A transformação para um Estado abso-
rios estipulados (direitos que garantiam os lutista no continente europeu ocorreu não
só por meio da forçosa e crescente submis-
3
Evidentemente, existiram também tentativas são da vida comunitária à administração
de não fundamentar o poder do imperador apenas monárquica. As mudanças no sistema
na legitimação divina, como era práxis até aquele
momento, mas também “secundum leges seculi”, 5
Para uma visão detalhada do absolutismo,
especialmente em decorrência do confronto sobre as consultar: (CORNETTE, 2000; DUCHHARDT, 1989;
investiduras entre o imperador Henrique IV e o papa ECKHARDT; CORNELIUS, 1950; HUBATSCH,
Gregório VII (KURZ, 1965, p. 61 et seq.). 1975; KASER, 1923; BARUDIO, 1981; COSANDEY;
4
Para uma visão detalhada, consultar: (STUBBS, DESCIMON, 2002).
1929; HOLT, 1965; PALLISTER, 1972; TURNER, 2003; 6
Para uma visão detalhada da situação na Ingla-
DANZIGER, GILLINGHAM, 2003; THOMPSON, terra, consultar: (AYLMER, 1963; TANNER, 1928;
1972; HOWARD, 1998; VOIGT, 1965, p. 218 et seq.). TREVELYAN, 1965; GOOCH, 1959).

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financeiro, o qual servia até então como narcas absolutistas admitiam no máximo,
base para a independência financeira da por misericórdia ou favor, a retomada de
nobreza, também contribuíram para uma alguns privilégios. Entre aquelas garantias
rápida transformação do Estado. Ademais, dos direitos, cabe citar aqui a Petition of Ri-
a construção do Estado absolutista foi am- ght, de 1627, os Agreements of the People de
parada pela estatização gradativa das par- 1647-1649, o Habeas-Corpus-Act de 1679 e,
cas estruturas judiciárias e pela submissão finalmente, a Declaration of Rights de 1688
dos senhores feudais ao poder monárquico e a Bill of Rights de 1689. Assim, enquanto
(OESTREICH, 1978, p. 33). Consequente- crescia gradativamente o número de movi-
mente, é possível constatar uma mudança mentos contra o absolutismo monárquico
na relação entre a liberdade e a obrigação na Europa continental, a Inglaterra seguia
para com o Estado durante a formação um caminho autônomo da garantia dos
do Estado absolutista em detrimento dos direitos, o qual foi iniciado pela Magna
arduamente conquistados privilégios das Charta Libertatum. Dessa forma, é necessá-
castas. Assim, os representantes de classe, rio salientar que inexistiam movimentos
os quais haviam lutado pela conquista dos contrários ao absolutismo parlamentarista
privilégios e estavam atentos a sua ma- inglês, uma vez que a intenção principal
nutenção, foram oprimidos ou não mais deste era a conquista de outros direitos – em
convocados para as representações e, assim, detrimento do monarca – e a manutenção
praticamente, excluídos da vida pública. dos direitos já conquistados.
Nesse contexto, a nova filosofia da razão
do Estado dominava o Estado absolutista. 4.1. A Reforma
A autoridade monárquica personificava
No processo do desenvolvimento ideo-
unicamente, graças ao seu aparato civil
lógico da ideia dos direitos fundamentais,
e militar, a autoridade pública e a coleti-
a reforma protestante desfruta de uma po-
vidade. Juntamente, ou melhor, no lugar
sição polêmica até os nossos dias (STERN;
daqueles privilégios das castas vigoravam
SACHS, 1988, p. 64). A paleta de interpreta-
agora os ditos e os mandatos promulgados
ções científicas sobre a reforma protestante
pela autoridade absolutista. Essa tutela, a
vai desde uma vinculação direta da ideia
repressão às castas, o cabresto vigente nas
dos direitos fundamentais a alguns dos
liberdades políticas da ascendente burgue-
reformadores até uma completa negação da
sia e a prática constante da intolerância reli-
conexidade entre aquela ideia e o teor do
giosa dão forma aos movimentos contrários
pensamento reformador. Situados no foco
ao absolutismo que eclodiam no continente
das divergências, figuram os ensinamentos
europeu nos primórdios da Idade Moderna.
de Martinho Lutero. Segundo Lutero, com-
As divergências ocorridas entre as
petia às pessoas certa independência e res-
castas e o monarca na Europa continental
ponsabilidade religiosa, as quais permitiam
tinham na Inglaterra o seu paralelo nas
que essas tomassem uma posição contrária
desavenças entre o monarca e o parlamen-
àquela da autoridade mandamental em
to, o qual, a partir da representação das
questões de cunho religioso. No entanto,
castas, transformou-se gradativamente
Lutero não defendia o ensinamento dos
numa representação da coletividade. A
direitos naturais e era explicitamente contra
diferença essencial repousava no fato
uma dedução das exigências das liberdades
de que o parlamento aristocrático inglês
e igualdade civis a partir dos três direitos
conseguiu impor a garantia dos direitos7,
fundamentais cristãos que pregava: liber-
enquanto na Europa continental os mo-
dade, igualdade e solidariedade. Lutero
7
Sobre as garantias mais importantes, consultar: também defendia a posição de que o sub-
(KELLER, 1962). jugado deveria ser obediente à autoridade,

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mas fazia, ao mesmo tempo, uma restrição teção da pessoa contra prisões infundadas
fundamental. Segundo Lutero, a autorida- e o direito de proteção da propriedade
de terrena não deveria dispor sobre a alma contra intervenções imotivadas (STERN;
das pessoas. Nesses casos, seria permitida SACHS, 1988, p. 77). Johannes Althusius
uma resistência, no entanto, somente por postulava, em sua obra “Politica methodice
meio de pedidos e formulações, ergo, desde digesta”, a igualdade de todas as pessoas e
uma obediência dolorosa até o sacrifício da a soberania do povo. Segundo Althusius,
própria vida (OESTREICH, 1966, p. 24). a base de toda autoridade é a livre subor-
Muito mais importante para o funda- dinação dos subjugados. Os direitos destes
mento teórico e a aplicação prática dos deveriam estar fixados por um contrato e
direitos fundamentais foi considerada garantidos por um direito de resistência
a atuação do reformador Calvin (HOF- (GIERKE, 1913, p. 112; STERN, 1988, p.
MANN, 1988, p. 843). Nos seus trabalhos, 72-). Hugo Grotius defendia, na obra “De
Calvin via na relação entre a autoridade e o iure belli ac pacis libri tres”, a tese de que
subjugado uma obrigação recíproca (mutua os direitos naturais das pessoas seriam
obligatio) com direitos e obrigações mútuas. irrenunciáveis e não destituíveis. Uma vez
Para Calvin, a autoridade era obrigada a que esses direitos naturais pertenceriam
promover o bem-estar do povo e a respei- intrinsecamente à natureza racional das
tar os direitos fundamentais. Ele também pessoas, todo e qualquer soberano estaria
conferia um status de direito natural ao necessariamente obrigado a respeitá-los
direito à vida e à propriedade e defendia a (STERN; SACHS, 1988, p. 73).
posição que o uso da resistência por parte
dos subjugados também era legítimo na 4.2. Os pensadores espanhóis da Escolástica
defesa daqueles direitos (OESTREICH, tardia e os Monarchomachos franceses
1966, p. 24). Os pensadores espanhóis do século XVI
As contribuições decisivas para a também contribuíram para o desenvol-
fundamentação e concretização da ideia vimento da ideia dos direitos fundamen-
dos direitos fundamentais esbarram não tais.8 Francisco de Vitória, o fundador da
somente nos ensinamentos do próprio Escola de Salamanca e um dos genitores
Calvin, mas também na influência pecu- do direito internacional moderno, retomou
liar daqueles que o sucederam e de seus as discussões de Carlos V e Felipe II nos
trabalhos. Entre esses calvinistas figuram ensinamentos conciliares dos direitos na-
John Milton, Sir Edward Coke, Johannes turais e os desenvolveu. O jurista e teólogo
Althusius e Hugo Grotius. John Milton, espanhol defendia a equidade e a igualdade
poeta e Secretário de Estado de Oliver de direitos das pessoas como características
Cromwell, exigia especialmente o direito substanciais dos ensinamentos dos direitos
da autodeterminação da pessoa humana, naturais e era convicto da igualdade e da
o direito à tolerância religiosa, o direito liberdade natural de todas as pessoas. Con-
à liberdade de expressão e de imprensa e sequentemente, ele lutou também contra a
o direito à abolição da censura nos livros escravidão nas colônias espanholas e mili-
(STERN; SACHS, 1988, p. 76). No entanto, tou a favor da igualdade de direitos entre
na discussão sobre a Petition of Rights, Sir espanhóis e indígenas (OESTREICH, 1978,
Edward Coke era o experiente Chief Justice p. 34). Por sua vez, mesmo sem considerar
e expressivo parlamentar que ressaltava
constantemente a importância da existência 8
Entre outras, as seguintes obras tratam de ma-
neira geral da Escolástica tardia e do ensinamento
e da validade dos chamados “fundamental jusnaturalista espanhol dos séculos XVI e XVII: (DIE
rights”. Entre aqueles direitos, estariam SPANISCHEN, 1916-1917, p. 236 et seq.; THIEME,
especialmente alinhados o direito de pro- 1953, p. 230 et seq.; GREWE, 1988; REIBSTEIN, 1972).

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as bases teológicas, o jurista Fernando pensadores exponenciais para a ideia dos
Vasquez aprofundou os ensinamentos de direitos fundamentais.10
Vitória e desenvolveu um sistema jurídico
humanista e moral-filosófico. Partindo de 4.3.1. A contribuição inglesa
um fundamento humanista, Vasquez estu- A contribuição dos filósofos ingleses‚
dou os limites jurídicos e o fundamento con- entre as diversas forças propulsoras do
tratual da autoridade taxando a escravidão desenvolvimento da ideia dos direitos
como completamente adversa aos direitos fundamentais, é notadamente muito mais
naturais. Em seus trabalhos, Vasquez avalia expressiva. Assim, é correto dizer que cabe
ainda tanto a igualdade quanto a liberdade aos pensadores ingleses um papel marcante
natural como direitos irrenunciáveis e im- no talho das ideias desenvolvidas naque-
prescritíveis (STERN; SACHS, 1988, p. 66). la época. Uma contribuição de pequena
Outra contribuição para o desenvolvi- importância para o desenvolvimento dos
mento da ideia dos direitos fundamentais direitos fundamentais e, ao mesmo tem-
repousa no movimento dos Monarchoma- po, muito importante para a justificativa
chos franceses.9 O termo Monarchomachos do Estado e a concretização das garantias
é‚ provavelmente, oriundo da obra “De estatais oferecida por Thomas Hobbes e os
regno et regali potestate adversus Bucha- seus ensinamentos sobre o Estado. Nas suas
nanum, Brutum, Boucherium, et reliquos reflexões, Hobbes (1651) parte do principio
monarchomachos libri sex” de William de que todas as pessoas no estado natural
Barclay (1600). Entre os significativos Mo- são possuidoras de direitos naturais. Por
narchomachos franceses, cabe citar aqui, meio do axioma “homo homini lupus”,
especialmente, Théodore de Bèze, Hubert o estado natural é definido pelo filósofo
Languet e Philippe du Plessis-Mornay. Os como aquele estado de guerra de todos
Monarchomachos franceses defendiam a contra todos (bellum omnium contra omnes)
tese de que a autoridade não estaria vincu- (HOBBES, 1651). Para evitar essa situação,
lada somente ao ius divinum e ao ius naturale, seria necessário ajustar um tratado político
mas também à leges, a qual seria promul- no qual as pessoas se obrigassem a obedecer
gada pelo povo. A esta pertenciam, entre a uma autoridade e, ao mesmo tempo, re-
outras, as condições do contrato social (leges nunciassem aos seus direitos naturais (HO-
fundamentales). De acordo com essa posição, FMANN, 1982, p. 18-; HOBBES, 1651). Com
os Monarchomachos franceses reclamavam a união de todas as pessoas surgiria um ser
que o contrato social não deveria ser resul- comunitário (Leviatã), o qual, na figura de
tado de um acordo entre a autoridade e as um Deus mortal, seria o portador de todo
castas e, sim, de um pacto entre a autorida- o poder soberano. Todos os cidadãos deve-
de e o povo (STERN; SACHS, 1988, p. 66). riam obediência absoluta e incondicional
àquela autoridade máxima, a qual seria a
4.3. Os grandes filósofos do Estado
única fonte para o direito (HOBBES, 1651).
Os grandes filósofos do Estado entre Por sua vez, o Estado seria responsável pela
os séculos XVII e XVIII trouxeram, sem manutenção da ordem e da paz. No entanto,
sombra de dúvidas, uma grande e decisiva enquanto Hobbes pregava a existência de
contribuição para o desenvolvimento da direitos naturais no estado natural, John
ideia dos direitos fundamentais. Nesse
contexto apresentaremos a seguir, entre 10
Para tratar devidamente de todos os grandes
filósofos do Estado, seria necessário um estudo
diversas personalidades exemplares, os
amplo e extenso. Tal trabalho teria dimensões pró-
prias e extrapolaria os limites deste estudo. Assim,
9
Sobre os Monarchomachos franceses, consultar: concentrar-nos-emos no decorrer deste ensaio apenas
(TREUMANN, 1895; WOLZENDORFF, 1916). nos aspectos essenciais daqueles filósofos.

174 Revista de Informação Legislativa


Locke deferia o reconhecimento desses os caminhos traçados por John Locke,
direitos e ainda defendia a existência de Charles de Secondat, Baron de la Brède et
direitos individuais e irrenunciáveis que de Montesquieu concebeu a importante
estariam acima dos direitos naturais no obra “De l’Esprit des Lois”. No centro das
estado natural. Na sua obra “Two Treatises teorias de Montesquieu, estão a garantia
of Government”, é possível encontrar na da liberdade do cidadão e o bem-estar do
tríade vida, liberdade e propriedade a for- povo. Montesquieu elaborou não apenas
mulação clássica dos direitos fundamentais: princípios, os quais tratavam de contribuir
“Man being born, as has been proved, para a conquista e a manutenção de uma
with a title to perfect freedom, and liberdade continua. Ele também fundou
an uncontrolled enjoyment of all the – em contrapartida a Locke – a teoria dos
rights and privileges of the law of na- três poderes (OESTREICH, 1966, p. 54).
ture, equally with any other man, or Nas suas palavras, o filósofo idealiza a
number of men in the world, hath by separação dos poderes da seguinte forma:
nature a power, not only to preserve “Il y a dans chaque Etat trois sortes
his property, that is, his life, liberty de pouvoirs: la puissance législative,
and estate, against the injuries and at- la puissance exécutrice des choses
tempts of other men” (LOCKE, 1690). qui dépendent du droit des gens, et
Assim, tanto os direitos do indivíduo la puissance exécutrice de celles qui
quanto o próprio indivíduo estão no centro dépendent du droit civil”11 (MON-
das atenções da teoria do Estado de Locke. TESQUIEU, 1758).
Dessa forma, a superação do estado natural Para Montesquieu, um Estado só po-
e o ajustamento de um tratado político es- deria garantir a liberdade de cada um dos
tariam diretamente relacionados à vontade seus cidadãos quando o poder público
dos indivíduos e à livre opinião pessoal estivesse dividido em um poder executivo,
destes. Consequentemente, uma vez que o legislativo e judiciário e existisse, ao mesmo
poder público é exercido pelo delegatário tempo, um equilíbrio entre estes poderes
para a proteção dos direitos e liberdades (“Le pouvoir arrête le pouvoir”).
dos indivíduos (EUCHNER, 1969, p. 195; A importância fundamental da liber-
AARON, 1971, p. 275 et seq.), é plausível dade do cidadão também foi reconhecida
que os delegantes retomem novamente por Jean-Jacques Rousseau. Tal relevância
para si mesmos, a qualquer momento, o é encontrada nas primeiras linhas de sua
poder daquele numa eventual falta ou principal obra “Contrat Social” com as fa-
infração das obrigações estipuladas. No mosas palavras: “L’homme est né libre, et
entanto, com o intuito de se coibir todo e part-tout il est dans les fers” (ROUSSEAU,
qualquer exagero do poder público perante 1972). Em outra passagem, Rousseau con-
o interesse do indivíduo, é necessário divi- tinua suas ponderações com as seguintes
dir o poder público em um poder executivo palavras:
e um poder legislativo. Segundo Locke
(1690), um controle mútuo só seria possí- 11
Charles de Secondat, Baron de la Brède et de
Montesquieu (1758) explica a lógica dos três poderes
vel se existisse um equilíbrio entre os dois
com as seguintes palavras: “Par la première, le prince
poderes (HIRSCHBERGER, 1980, p. 217). ou le magistrat fait des lois pour un temps ou pour
toujours, et corrige ou abroge celles qui sont faites.
4.3.2. A contribuição francesa Par la seconde, il fait la paix ou la guerre, envoie ou
A contribuição francesa para o de- reçoit des ambassades, établit la sûreté, prévient les
invasions. Par la troisième, il punit les crimes ou juge
senvolvimento da ideia dos direitos les différends des particuliers. On appellera cette
fundamentais também não deve ter a sua dernière la puissance de juger, et l’autre, simplement,
importância menosprezada. Seguindo la puissance exécutrice de l’Etat”.

Brasília a. 48 n. 191 jul./set. 2011 175


“Renoncer à sa liberté c’est renoncer de um estado natural, o qual poderia ser
à sa qualité d’homme, aux droits de superado com a elaboração de dois tratados
l’humanité, même à ses devoirs. Il n’y e um decreto. Com a elaboração dos trata-
a nul dédommagement possible pour dos surgiria, em primeiro plano, o direito
quiconque renonce à tout. Une telle positivo, o qual seria unicamente apto a
renonciation est incompatible avec la determinar o grau de limitação dos direi-
nature de l’homme, et c’est ôter toute tos naturais dos cidadãos (PUFFENDORF,
moralité à ses actions que d’ôter toute 1673). Para esses filósofos, os direitos na-
liberté à sa volonté.” turais representavam o ponto de partida,
Rousseau também seguia uma posição mas, mesmo assim, eram subordinados ao
filosófica jusnaturalista e reconhecia um legislador estatal. Para Christian Wolff, o
estado natural, o qual poderia ser superado Estado também surgia por intermédio de
por meio do acordo de um contrato social. tratados políticos. No entanto, o filósofo
Tal contrato social teria por base a total sub- alemão pregava a vinculação do Estado
missão dos interesses particulares perante ao direito natural mesmo após a oclusão
a vontade geral (volonté générale), ou seja, daqueles tratados. Nas suas palavras:
a renúncia total por parte de cada um dos “dem Oberherrn keinen Gehorsam
cidadãos a todos os seus direitos em bene- schuldig, wenn er befehlen sollte,
fício da comunidade (HIRSCHBERGER, was einem gebietenden, oder verbie-
1980, p. 253-). No entanto, a importância e tenden natürlichen Gesetze entgegen
a influência dos ensinamentos de Rousseau stehet (…)” (WOLFF, 1754).
para a ideia dos direitos fundamentais é Wolff também diferenciava entre os
controversa na doutrina exatamente por direitos naturais inatos irrenunciáveis, os
causa dessa visão radical. Enquanto alguns quais não poderiam ser suspensos por
autores ressaltam o fato de que a submissão renúncia ou por uma lei estatal, e os direi-
à vontade geral traz consigo uma perda da tos adquiridos como cidadão. A segunda
liberdade natural, mas, ao mesmo tempo, metade do século XVIII foi profundamente
possibilita o ganho da liberdade cidadã; marcada pelo pensamento de Immanuel
outros autores apontam as tendências hostis Kant. O grande filósofo alemão salientava
à liberdade e os valores de Rousseau como o continuamente em seus trabalhos a autono-
alicerce fecundo dos regimes totalitários, ou mia moral das pessoas e a diferença entre
seja, como uma contradição à ideia dos direi- os direitos naturais inatos e os direitos
tos fundamentais (REIBSTEIN, 1972, p. 197-; adquiridos. A liberdade, a qual no pensa-
SAMWER, 1969, p. 292-; SANDWEG, 1972, mento kantiano compreende a igualdade,
p. 289-; WOLZENDORFF, 1916, p. 360-). a honra e a liberdade de expressão, é um
direito inato e, portanto, um direito de toda
4.3.3. A contribuição alemã pessoa na sua condição de pessoa humana
Apesar das excelentes contribuições (STERN, 2004, p. 13). Em contraposição à
oriundas da Inglaterra e da França, o tributo infindável garantia nos pensamentos de
alemão para o desenvolvimento da ideia Wolff, Kant via os limites dos direitos inatos
dos direitos fundamentais não deve ser na ordem jurídica do Estado. Porém, o di-
classificado como inexpressivo e, portanto, reito inato não deveria ser restringido além
não deve ser ignorado. Samuel von Pufen- do estritamente suficiente para garantir
dorf, Christian Thomasius e Christian Wol- a liberdade de todos (KANT, 1914). Uma
ff, os grandes filósofos do final do século particularidade do pensamento kantiano é
XVII e início do século XVIII, reconheciam a inexistência de um direito de resistência
as liberdades naturais das pessoas. Pufen- contra a autoridade legislativa e a posição
dorf (1711) e Thomasius (1717) partiam de que a emigração seria a única saída

176 Revista de Informação Legislativa


jurídica possível ao tratar com injustiças. assegurava tanto a comunicação da razão
Por fim, cabe ainda ressaltar que o peque- na eventual ocasião de uma prisão quanto o
no impacto do pensamento dos filósofos desenvolver de um processo justo e regular
alemães no desenvolvimento da ideia dos (OESTREICH, 1966, p. 34).
direitos fundamentais é uma consequência “(…) by which statutes before men-
tanto da fixação excessiva ao direito e à lei tioned, and other the good laws and
quanto da deontologia tradicional alemã statutes of this realm, your subjects
(Deutsche Pflichtenlehre). have inherited this freedom, that they
should not be compelled to contribute
5. A Idade Moderna: as to any tax, tallage, aid, or other like
primeiras importantes charge not set by common consent, in
parliament. (...) And whereas also by
declarações nacionais de direitos
the statute called “The Great Charter
As contribuições dos diversos pensado- of the Liberties of England”, it is de-
res e as respectivas proposições insignes clared and enacted, that no freeman
foram indubitavelmente elementares para may be taken or imprisoned or be
o desenvolvimento da ideia dos direitos disseized of his freehold or liberties,
fundamentais. No entanto, essas ideias or his free customs, or be outlawed or
filosóficas, teológicas, jurídicas e políticas exiled, or in any manner destroyed,
encontraram uma primeira ressonância but by the lawful judgment of his
prática dentro do direito positivo em decla- peers, or by the law of the land. (...)
rações de direitos na Inglaterra, nos Estados And in the eight-and-twentieth year
Unidos da América e na França. Assim, os of the reign of King Edward III, it was
primeiros direitos fundamentais positiva- declared and enacted by authority of
dos representaram um marco na história parliament, that no man, of what es-
da luta da humanidade por direitos e li- tate or condition that he be, should be
berdades e projetavam, ao mesmo tempo, a put out of his land or tenements, nor
eclosão mundial dos direitos fundamentais taken, nor imprisoned, nor disinher-
na concepção dogmática moderna. ited nor put to death without being
brought to answer by due process
5.1. A Inglaterra of law.”12
No decorrer do século XVII, o desenvol- Entre 1647-1649 surge o Agreements of
vimento da ideia dos direitos fundamentais the People, o primeiro texto constitucional
entrou numa fase importantíssima ao apa- formulado. O referido instrumento traz
recerem na Inglaterra os primeiros instru- consigo direitos e liberdades individuais
mentos jurídicos, os quais concretizavam básicos, os quais vão além dos direitos já
o pensamento histórico referente àqueles existentes e deveriam ser respeitados tanto
direitos. Aproximadamente no ano de 1627, pelo monarca quando pelo parlamento.
surgia na Inglaterra a Petition of Right, a qual Entre outros direitos, o referido instru-
trazia em seu bojo alguns direitos epistola- mento tratava especialmente da liberdade
res já existentes (Magna Charta Libertatum). de religião, da liberdade de consciência, da
Por pressão do parlamento, o Rei Carlos I liberdade do serviço militar obrigatório,
reconheceu, especialmente no contexto do da anistia aos adeptos do parlamento e da
referido instrumento, a necessidade de au- igualdade de todos perante a lei (STERN;
torização daquela instituição nas questões SACHS, 1988, p. 80-; OESTREICH, 1966, p.
referentes a criação de impostos. O monarca 34-; SCHRÖDER, 1981, p. 81-).
também confirmava a liberdade dos cida-
dãos, a inviolabilidade da propriedade e 12
Petition of Right, London 1627.

Brasília a. 48 n. 191 jul./set. 2011 177


“That matters of Religion, and the unto any sheriff or sheriffs, gaoler,
ways of God’s Worship, are not at all minister, or other person whatso-
entrusted by us to any human power, ever, for any person in his or their
because therein we cannot remit or custody, and the said writ shall be
exceed a tittle of what our Consciences served upon the said officer, or left
dictate to be the mind of God, without at the gaol or prison with any of
willful sin; nevertheless the public the under-officers, underkeepers or
way of instructing the Nation (so deputy of the said officers or keepers,
it be not compulsive) is referred to that the said officer or officers, his or
their discretion. That the matter of their under-officers, under-keepers
impressing and constraining any of us or deputies, shall within three days
to serve in the wars is against our free- after the service thereof as aforesaid
dom, and therefore we do not allow (...) upon payment or tender of the
it in our Representatives; the rather, charges of bringing the said prisoner,
because money (the sinews of war) to be ascertained by the judge or court
being always at their disposal, they that awarded the same, and endorsed
can never want numbers of men apt upon the said writ, not exceeding
enough to engage in any just cause. twelve pence per mile, and upon
That after the dissolution of this pres- security given by his own bond to
ent Parliament, no person be at any pay the charges of carrying back the
time questioned for anything said or prisoner, if he shall be remanded by
done in reference to the late public dif- the court or judge to which he shall be
ferences, otherwise than in execution brought according to the true intent
of the judgments of the present Rep- of this present Act, and that he will
resentatives, or House of Commons. not make any escape by the way,
That in all Laws made, or to be made, make return of such writ; and bring
every person may be bound alike, and or cause to be brought the body of
that no tenure, estate, charter, degree, the party so committed or restrained,
birth, or place, do confer any exemp- unto or before the Lord Chancellor,
tion from the ordinary course of legal or Lord Keeper of the great seal of
proceedings, whereunto others are England for the time being, or the
subjected. That as the laws ought to judges or barons of the said court
be equal, so they must be good, and from whence the said writ shall issue,
not evidently destructive to the safety or unto and before such other person
and well-being of the people.”13 or persons before whom the said writ
No ano de 1679, surge um novo instru- is made returnable, according to the
mento jurídico intitulado Habeas-Corpus- command thereof; and shall then
-Act, o qual regulava especialmente que likewise certify the true causes of his
ninguém deveria ser preso sem uma dis- detainer or imprisonment (...).”14
posição escrita e que o preso deveria ser A promulgação do Habeas-Corpus-Act
conduzido a um juiz regular dentro de um deve ser entendida como uma reação ao
determinado prazo (RIEDEL, 1980, p. 192-; repetido abuso e a violação dos direitos já
OESTREICH, 1966, p. 35-; HATSCHEK, garantidos pela Petition of Right, a qual proi-
1913, p. 505-; LOTTES, 1981, p. 100). bia a prisão e a punição arbitrária. Entre os
“Whensoever any persons shall notórios instrumentos jurídicos promulga-
bring any Habeas Corpus directed dos, cabe ainda citar a Declaration of Rights
13
First Agreement of the People, London 1647. 14
Habeas-Corpus-Act, London 1679.

178 Revista de Informação Legislativa


do ano de 1688 e a Bill of Rights do ano de 8. That election of members of Parlia-
1689. Considerando os já existentes direitos ment ought to be free;
e tendo em vista as contínuas infrações do 9. That the freedom of speech and
monarca Jacob II contra aqueles direitos, debates or proceedings in Parliament
a Bill of Rights foi proclamada exatamente ought not to be impeached or ques-
com o objetivo de diminuir o poder do tioned in any court or place out of
monarca e aumentar o poder do parlamen- Parliament;
to. Nos seus treze artigos, o instrumento 10. That excessive bail ought not
estabelece a renúncia da coroa à aplicação to be required, nor excessive fines
despótica da lei, proibindo a jurisdição imposed, nor cruel and unusual pu-
religiosa de exceção, determina a ilicitude nishments inflicted;
da instituição de tributos e da organização 11. That jurors ought to be duly im-
e manutenção de um exército ou tropa sem panelled and returned, and jurors
a autorização do parlamento e também a which pass upon men in trials for
garantia do direito de petição, da liberdade high treason ought to be freeholders;
da palavra e da liberdade de voto. 12. That all grants and promises of
“1. That the pretended power of fines and forfeitures of particular
suspending the laws or the execution persons before conviction are illegal
of laws by regal authority without and void;
consent of Parliament is illegal; 13. And that for redress of all grievan-
2. That the pretended power of dis- ces, and for the amending, strengthe-
pensing with laws or the execution ning and preserving of the laws, Parlia-
of laws by regal authority, as it hath ments ought to be held frequently.”15
been assumed and exercised of late, Esses primeiros instrumentos de direito
is illegal; positivo na Inglaterra representam a vitória
3. That the commission for erecting do parlamento inglês sobre a coroa e são
the late Court of Commissioners for também fundamentais para o desenvol-
Ecclesiastical Causes, and all other vimento do próprio parlamentarismo. As
commissions and courts of like natu- declarações de direitos espelham também
re, are illegal and pernicious; uma primeira estação no caminho da solidi-
4. That levying money for or to the ficação jurídica dos direitos fundamentais.
use of the Crown by pretence of pre- Nesse processo, criaram-se pela primeira
rogative, without grant of Parliament, vez axiomas jurídicos de direitos e liberda-
for longer time, or in other manner des executáveis que, em combinação com os
than the same is or shall be granted, elementos básicos jurídico-administrativos,
is illegal; espelham o advento do moderno Estado
5. That it is the right of the subjects constitucional. No entanto, uma vez que as
to petition the king, and all commit- declarações de direitos inglesas tratavam
ments and prosecutions for such principalmente de delimitar os direitos do
petitioning are illegal; monarca em diversos setores especiais, é
6. That the raising or keeping a necessário salientar que aquelas declara-
standing army within the kingdom ções eram apenas preceitos normativos
in time of peace, unless it be with parciais de direitos fundamentais. O perigo
consent of Parliament, is against law; do poder incontrolado e da autoridade
7. That the subjects which are Protes- despótica era dirigido apenas a um órgão
tants may have arms for their defence do Estado, ou seja, à coroa. Por outro lado,
suitable to their conditions and as
allowed by law; 15
Bill of Rights, London 1689.

Brasília a. 48 n. 191 jul./set. 2011 179


é possível constatar um levante geral e dos na Virginia Bill of Rights não estavam
radical contra as estruturas do Estado nas à disposição dos representantes do povo e
constituições dos Estados Unidos da Amé- caracterizavam direitos supraestatais, ou
rica e da França, o que permite classificá-las seja, direitos irrevogáveis e inalienáveis.
como preceitos normativos completos de Assim, o objetivo principal da Virginia Bill
direitos fundamentais; as declarações ingle- of Rights era fixar e ancorar os direitos na-
sas tratavam apenas de uma nova ordem turais pertencentes a cada indivíduo como
das competências nos órgãos do Estado, ou direito positivo em uma constituição. Ao
seja, um deslocamento do poder da coroa contrário dos genitores da ideia dos direi-
para o parlamento. tos fundamentais, os quais desenvolveram
uma teoria de direitos na sinuosidade do
5.2. Os Estados Unidos da América indivíduo, os genitores estadunidenses
O triunfo dos direitos fundamentais é construíram um Estado na silhueta do
selado com a promulgação da Virginia Bill indivíduo e dos seus direitos individuais
of Rights16 em 12 de junho de 1776. Já a pró- (GRIMM, 1970, p. 149; VOSSLER, 1930, p.
pria premissa introdutória destaca o caráter 516-; STERN; SACHS, 1988, p. 92). Assim, a
excepcional, no qual aquela declaração de constitucionalização dos direitos individu-
direitos foi formulada pelos representantes ais na Virginia Bill of Rights representa um
do bom povo de Virginia, reunidos em acontecimento monumental com elevado
assembleia geral e livre. A Virginia Bill of valor dogmático e um exuberante signi-
Rights também reconhecia, no seu artigo l, ficado histórico-constitucional. A fixação
que todos os homens eram, por natureza, constitucional dos direitos fundamentais
igualmente livres e independentes e tinham inatos individuais está perfeitamente assen-
certos direitos inatos, dos quais, quando tada nos artigos 2 e 3 daquele instrumento.
entram em estado de sociedade, não po- “That all power is vested in, and con-
deriam, mesmo que por qualquer tipo de sequently derived from, the people;
acordo, privar ou despojar seus pósteros. that magistrates are their trustees and
A esses direitos pertencem o direito à vida, servants, and at all times amenable to
o direito à liberdade e a possibilidade de them. That government is, or ought
adquirir e possuir propriedade e também to be, instituted for the common
de buscar e obter felicidade e segurança. benefit, protection, and security, of
“That all men are by nature equally the people, nation, or community;
free and independent, and have cer- of all the various modes and forms
tain inherent rights, of which, when of government that is best, which
they enter into a state of society, they is capable of producing the greatest
cannot, by any compact, deprive or degree of happiness and safety, and
divest their posterity; namely, the is most effectually secured against
enjoyment of life and liberty, with the the danger of maladministration;
means of acquiring and possessing and that whenever any government
property, and pursuing and obtai- shall be found inadequate or contrary
ning happiness and safety.”17 to these purposes, a majority of the
Pela primeira vez na história, os direitos community hath an indubitable,
fundamentais da pessoa humana ancora- unalienable, and indefeasible right,
to reform, alter, or abolish it, in such
16
Para uma visão detalhada da Virginia Bill of manner as shall be judged most con-
Rights, consultar: (LEVY, 1986; MELTZER, 1990;
HÄGERMANN, 1910; SALANDER, 1926; CAMP-
ducive to the public weal.”18
BELL, 1813).
17
Virginia Bill of Rights. Virginia, 1776. 18
Virginia Bill of Rights. Virginia, 1776.

180 Revista de Informação Legislativa


Para um observador hodierno, a relação preceitos fundamentais da organização do
entre os direitos fundamentais inatos indi- Estado. Tal instrumento contém não ape-
viduais, a soberania popular, a finalidade nas um catálogo de direitos fundamentais
do Estado e o direito de resistência é evi- abrangente, mas também um reconheci-
dente. Somente a partir do reconhecimento mento da inalienabilidade e da suprale-
dos direitos inatos aos indivíduos e da galidade daqueles direitos. Enquanto os
fixação dos direitos inalienáveis na cons- instrumentos de direitos ingleses tratavam
tituição é que será possível fundamentar a principalmente de direitos relativos aos
liberdade dos indivíduos. A consequência cidadãos ingleses, a Virginia Bill of Rights
lógica da liberdade dos indivíduos é a reconhecia direitos naturais e inatos a todo
existência de uma autonomia individual e e qualquer indivíduo. Nesse contexto, os
não de uma autonomia coletiva, ou melhor, direitos fundamentais cravados no referido
de uma soberania da totalidade do povo. instrumento americano eram classificados
Se uma tarefa do Estado é proporcionar as como pertences a um escalão máximo e
condições nas quais o povo possa atingir o supremo dentro do direito positivo, o qual
mais alto grau de contentamento, pode-se vinculava todos os poderes do Estado e era
deduzir que é permitido a todo e qualquer protegido e guardado pelo poder judiciário.
indivíduo procurar pelo seu sucesso e Consequentemente, a Virginia Bill of Rights
bem-estar pessoal. Por outro lado, o esta- fundamenta direitos fundamentais e irre-
belecimento de um direito de resistência no vogáveis incondicionalmente pertinentes
texto constitucional para os casos em que a todo e qualquer indivíduo e a respectiva
o Estado não corresponda àqueles axiomas autodeterminação destes. Esses direitos
permite deduzir que os preceitos dispostos devem ser respeitados por todos os poderes
nos artigos 1, 2 e 3 da Virginia Bill of Rights estatais, cabendo ao poder judiciário, por
caracterizam indubitavelmente direitos um lado, a tarefa de possibilitar a execução
irrevogáveis e inalienáveis. Entre outros desses direitos e, por outro lado, o dever
princípios estruturais e organizacionais de protegê-los. Exatamente essa concep-
como a separação de poderes e o direito de ção é o que faz a Virginia Bill of Rights um
voto, a Virginia Bill of Rights contém ainda dos maiores acontecimentos na história
os direitos justiçais clássicos como a liber- dos direitos fundamentais e assinala a sua
dade de imprensa e, mais tarde, a liberdade imensa relevância para a sua consolidação
de religião e de consciência. jurídica. Contemplada a partir da nossa
A gigantesca evolução dos direitos fun- realidade, a importância histórica mundial
damentais pode ser facilmente constatada da Virginia Bill of Rights e das declarações
por meio de uma simples comparação da estadunidenses de direitos posteriores
Virginia Bill of Rights com os primeiros ins- não deve ser reconhecida pelo fato de que
trumentos jurídicos ingleses. Com efeito, apenas algumas declarações propiciaram
não se deve esquecer que, em seu âmago, uma proteção e defesa da liberdade do in-
a Virginia Bill of Rights carrega ideias e divíduo contra agressões e outros perigos
experiências inglesas e que também as de maneira efetiva e duradoura.
desenvolveu. Ademais, existem diferen- A Virginia Bill of Rights encontrou uma
ças fundamentais entre as declarações continuação na Declaração Americana de
de direitos inglesas (preceitos de direitos Independência19 em 4 de julho de 1776.
fundamentais parciais) e a declaração ame-
ricana (preceito de direitos fundamentais 19
Para uma visão detalhada da Declaration of
Independence of the Thirteen Colonies, consultar:
completos). Na Virginia Bill of Rights, é pos- (KOCH, 1964; MALONE, 1975; WILLS, 1979; MOR-
sível encontrar uma consolidação jurídica GAN, 1993; BAILYN, 1992; AGEL; GERBERG, 2001;
dos direitos fundamentais juntamente aos BECKER, 1958).

Brasília a. 48 n. 191 jul./set. 2011 181


Tal instrumento é constantemente citado após séculos de opressão por parte da
na literatura e nas investigações científicas autoridade despótica. Esse desejo intran-
devido à fundamentação jusnaturalista sigente de alteração daquelas estruturas
dos direitos fundamentais e pertence, mandamentais existentes e do término da
indubitavelmente, ao rol dos documentos submissão servil é facilmente perceptível
elementares da história constitucional. na introdução da Déclaration des Droits de
“We hold these truths to be self-evi- 1’Homme et du Citoyen.
dent, that all men are created equal, “Les représentants du peuple français,
that they are endowed by their Cre- constitués en Assemblée nationale,
ator with certain unalienable Rights, considérant que l’ignorance, l’oubli
that among these are Life, Liberty, ou le mépris des droits de l’homme
and the pursuit of Happiness. That to sont les seules causes des malheurs
secure these rights, Governments are publics et de la corruption des gou-
instituted among Men, deriving their vernements, ont résolu d’exposer,
just powers from the consent of the dans une déclaration solennelle, les
governed. That whenever any Form droits naturels, inaliénables et sacrés
of Government becomes destructive de l’homme, afin que cette déclara-
of these ends, it is the Right of the tion, constamment présente à tous
People to alter or to abolish it, and les membres du corps social, leur
to institute new Government, laying rappelle sans cesse leurs droits et leurs
its foundation on such principles and devoirs; afin que les actes du pouvoir
organizing its powers in such form, législatif et ceux du pouvoir exécutif,
as to them shall seem most likely to pouvant être à chaque instant com-
effect their Safety and Happiness.”20 parés avec le but de toute institution
Por fim, cabe ainda ressaltar que vários politique, en soient plus respectés;
outros Estados da federação americana afin que les réclamations des citoyens,
também promulgaram constituições pró- fondées désormais sur des principes
prias até o ano de 1789, quando foi promul- simples et incontestables, tournent
gada a Constituição dos Estados Unidos da toujours au maintien de la Constitu-
América com as suas dez Emendas. tion et au bonheur de tous.”22
Assim, os genitores da Déclaration des
5.3. A França Droits de l’Homme et du Citoyen evidencia-
Na Europa, o triunfo dos direitos fun- vam que a postulação de direitos naturais,
damentais prosseguiu com a proclamação inatos, supraestatais e inalienáveis era
da Déclaration des Droits de l’Homme et du a condição essencial para o término dos
Citoyen21 em 26 de agosto de 1789. Com uma abusos despóticos. Como consequência,
clara influência constitucional americana e a déclaration tem um catálogo de direitos
de ideias e teorias dos filósofos franceses, fundamentais abrangente, o qual inclui,
a referida declaração surge em meio a um entre outros, o direito à liberdade, o direito
panorama no qual o desespero por uma à igualdade, o direito à igualdade social
mudança política e social era claríssimo (exceções poderiam estar fundamentadas
no bem-comum), o direito à propriedade,
20
The Declaration of Independence of the Thirteen o direito à segurança, o direito de resis-
Colonies. Philadelphia, 1776.
21
Para uma visão detalhada da Revolução Fran-
tência à opressão, o direito à liberdade de
cesa e da Déclaration des Droits de l’Homme et du ação dentro dos limites da lei, os direitos
Citoyen, consultar: (RIALS, 1988; SCHMALE, 1993, justiçais clássicos, o direito à liberdade de
p. 345 et seq.; GAUCHET, 1991; CHEVALLAZ, 1974;
CALDWELL, 1985; DOYLE, 1989; LEFEBVRE, 1951; 22
Déclaration des Droits de l’Homme et du Ci-
SALVEMINI, 1905; FURET; BOFFA, 1989). toyen, Paris 1789.

182 Revista de Informação Legislativa


opinião, o direito à liberdade de expressão, sable de l’arrêter, toute rigueur qui ne
o direito à liberdade de imprensa e o direito serait pas nécessaire pour s’assurer
à liberdade de religião. de sa personne doit être sévèrement
“Art. 1o – Les hommes naissent et de- réprimée par la loi.
meurent libres et égaux en droits. Les Art. 10o – Nul ne doit être inquiété
distinctions sociales ne peuvent être pour ses opinions, mêmes religieuses,
fondées que sur l’utilité commune. pourvu que leur manifestation ne
Art. 2o – Le but de toute association trouble pas l’ordre public établi par
politique est la conservation des la loi.
droits naturels et imprescriptibles de Art. 11o – La libre communication des
l’homme. Ces droits sont la liberté, la pensées et des opinions est un des
propriété, la sûreté et la résistance à droits les plus précieux de l’homme;
l’oppression. tout citoyen peut donc parler, écrire,
(...) imprimer librement, sauf à répondre
Art. 4o – La liberté consiste à pouvoir de l’abus de cette liberté dans les cas
faire tout ce qui ne nuit pas à autrui: déterminés par la loi.”23
ainsi, l’exercice des droits naturels Numa comparação entre a Déclaration
de chaque homme n’a de bornes que des Droits de l’Homme et du Citoyen e as cons-
celles qui assurent aux autres mem- tituições americanas, é possível distinguir
bres de la société la jouissance de ces entre diversas semelhanças e diferenças re-
mêmes droits. Ces bornes ne peuvent ferentes ao conteúdo e à qualidade jurídica
être déterminées que par la loi. dos instrumentos. Um primeiro aspecto di-
Art. 5o – La loi n’a le droit de défendre verso pode ser encontrado na definição da
que les actions nuisibles à la société. finalidade do Estado. Enquanto na Décla-
Tout ce qui n’est pas défendu par la ration des Droits de l’Homme et du Citoyen a
loi ne peut être empêché, et nul ne finalidade do Estado é garantir a proteção e
peut être contraint à faire ce qu’elle a segurança, a Virginia Bill of Rights parte do
n’ordonne pas. mesmo postulado e complementa aquela
(...) finalidade com a afirmação que o Estado
Art. 7o – Nul homme ne peut être também deve cuidar para a efetivação do
accusé, arrêté ou détenu que dans les mais alto grau de contentamento. Essas alu-
cas déterminés par la loi et selon les sões singulares relativas ao papel do Estado
formes qu’elle a prescrites. Ceux qui demonstram claramente a diversidade da
sollicitent, expédient, exécutent ou relação entre franceses e americanos para
font exécuter des ordres arbitraires com o Estado. Na França, a relação entre
doivent être punis; mais tout citoyen o cidadão e o Estado está extremamente
appelé ou saisi en vertu de la loi doit corrompida ou até mesmo envenenada,
obéir à l’instant; il se rend coupable inexistindo qualquer nuança sentimental.
par la résistance. Evidentes também são as diferentes po-
Art. 8o – La loi ne doit établir que des sições referentes aos limites da liberdade
peines strictement et évidemment pessoal de ação. Enquanto na Virginia Bill
nécessaires, et nul ne peut être puni of Rights as acepções valorativas morais e
qu’en vertu d’une loi établie et pro- supraindividuais determinavam os limi-
mulguée antérieurement au délit, et tes nos quais o indivíduo gozava da sua
légalement appliquée. liberdade de ação, na Déclaration des Droits
Art. 9o – Tout homme étant présumé de l’Homme et du Citoyen o seu raio de ação
innocent jusqu’à ce qu’il ait été dé- 23
Déclaration des Droits de l’Homme et du Ci-
claré coupable, s’il est jugé indispen- toyen, Paris 1789.

Brasília a. 48 n. 191 jul./set. 2011 183


era remetido para a força anônima da lei e repousava na pretensão de consolidar ali-
aos seus respectivos limites. Outro aspecto cerces verdadeiros e majestosos, os quais
interessante está relacionado com o direito ainda deveriam ser concretizados pelos
de resistência. Tendo em vista a relação de futuros comitentes constitucionais. No
ambos os povos para com o Estado, é fácil entanto, uma concretização das exigên-
compreender que o direito de resistência cias abstratas da Déclaration des Droits de
da Déclaration des Droits de l’Homme et du l’Homme et du Citoyen não ocorreu.
Citoyen era muito mais abrangente e ex- O quão duvidoso é a confiança no sig-
tenso do que o dispositivo equivalente na nificado de fundamentos sem aplicação
Virginia Bill of Rights. Enquanto o direito de e vigência jurídica imediata demonstra a
resistência na Virginia Bill of Rights deve ser própria Déclaration des Droits de l’Homme
visto como um direito, com o qual o povo et du Citoyen. Que a referida declaração foi
poderia atingir uma reorganização do go- incorporada nas constituições francesas
verno mediante uma decisão majoritária, posteriores é notório. Porém, tanto o signi-
o direito equivalente na Déclaration des ficado jurídico de seus direitos fundamen-
Droits de l’Homme et du Citoyen representa tais quanto o seu teor constitucional estão,
também uma autorização do indivíduo, o desde então, sujeitos a um destino contur-
que cristaliza novamente a desconfiança do bado. No entanto, a Déclaration des Droits
indivíduo para com o Estado francês. Uma de l’Homme et du Citoyen é, sem dúvida, de
desigualdade interessante entre as duas um inestimável valor mundial tanto para a
declarações repousa na reivindicação por propagação quanto para o desenvolvimen-
igualdade social formulada na Déclaration to dos direitos fundamentais e serve, dentro
des Droits de l’Homme et du Citoyen. Aqui do continente europeu, como um exemplo
é possível sentir o desejo do povo francês radiante para diversas constituições.
para que o feudalismo e os privilégios das
castas sejam eliminados, o que reforça o
próprio caráter revolucionário da Décla-
6. Considerações finais
ration des Droits de l’Homme et du Citoyen. A indagação sobre as raízes e as ori-
Outra diferença evidente e fundamental gens dos direitos fundamentais não deve
está na qualidade jurídica de ambas de- ser considerada a partir de uma visão
clarações. Num primeiro momento, é monodimensional ou monocausal. Na
possível constatar que as duas declarações busca da contribuição decisiva para o es-
abarcavam a noção de direitos inatos, tabelecimento dos direitos fundamentais
supraestatais e inalienáveis. No entanto, como elementos constitutivos da vida em
a Déclaration des Droits de l’Homme et du sociedade, é possível identificar inúmeros
Citoyen não almejava ser uma constituição, coeficientes filosóficos, teológicos, jurídicos
e sim um instrumento com elevado caráter e políticos, os quais, por meio de suas teses
abstrato e intenso teor dogmático. Esse alto e ideias, influenciaram o desenvolvimento
grau de abstração é especialmente visível dos direitos fundamentais.
na seguinte passagem: A controvérsia sobre o eventual co-
“Art. 16o – Toute société dans laquelle nhecimento de pré-formas dos direitos
la garantie des droits n’est pas assurée fundamentais pelos gregos e romanos da
ni la séparation des pouvoirs déter- Antiguidade clássica permanecerá, certa-
minée, n’a point de Constitution.”24 mente, sem uma resposta definitiva. Porém,
Consequentemente, a intenção da Décla- a afirmação de que algumas abordagens
ration des Droits de l’Homme et du Citoyen e reflexões relevantes para o desenvolvi-
24
Déclaration des Droits de l’Homme et du Ci- mento da ideia dos direitos fundamentais
toyen, Paris 1789. já existiam naquela época é plausível. No

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entanto, não se pode negar a inexistência direitos da Idade Média, uma importância
de direitos fundamentais na Antiguidade decisiva para a cristalização da ideia dos
greco-romana, os quais indicassem ao po- direitos fundamentais.
der estatal o limite para o exercício de suas Um acontecimento notável para o de-
pretensões e protegessem tanto o indivíduo senvolvimento da ideia dos direitos funda-
quanto o seu livre-arbítrio. Assim, não é mentais pode ser comemorado apenas nos
possível encontrar impulsos decisivos para primórdios da Idade Moderna, na ocasião
o aparecimento dos direitos fundamentais em que o Estado corporativo se transfor-
na Antiguidade greco-romana, mesmo mou, peu à peu, em Estado absolutista.
constatando a existência de ensinamentos Condição essencial para esse acontecimento
preparatórios. Classificar a contribuição do foi, contudo, a forte concretização do termo
Cristianismo para o desenvolvimento da direito fundamental. Diversos filósofos,
ideia dos direitos fundamentais também teólogos, juristas e políticos tomaram
não é uma tarefa fácil. Certamente não há parte nesse desenvolvimento. Enquanto o
como negar a existência de alguns ensina- papel dos reformadores protestantes para
mentos propensos à liberdade, os quais, o desenvolvimento da ideia dos direitos
por sua vez, representam uma importante fundamentais é controverso na literatura,
preparação para a formação dos direitos existe um grande consenso de que os pen-
fundamentais. Porém, os genitores eclesi- sadores espanhóis da Escolástica tardia e os
ásticos e a maioria dos teólogos da Idade Monarchomachos franceses contribuíram
Média desconsideraram aquelas ideias. com um grande impulso para a formação
Muito mais importante, e no centro das da ideia dos direitos fundamentais. Tam-
atenções, estava a questão da defesa e do bém os grandes filósofos do Estado dos
favorecimento da titularidade e da legitimi- séculos XVII e XVIII proporcionaram uma
dade do exercício da autoridade por parte importante contribuição para o desenvol-
dos representantes do poder espiritual em vimento da ideia dos direitos fundamen-
detrimento dos representantes do poder tais. Entre as diversas forças propulsoras
terreno. Por outro lado, também não é para o desenvolvimento daquela ideia,
possível encontrar nenhum acontecimento destacam-se, sobretudo, os filósofos ingle-
decisivo relativo ao desenvolvimento dos ses, os quais cunharam singularmente o
direitos fundamentais na esfera terrena, pensamento daquela época. O significado
pois seus representantes somente tolera- do pensamento francês e a sua contribui-
vam declarações de direitos nas épocas ção para o desenvolvimento da ideia dos
em que a sua própria autoridade estava direitos fundamentais também não devem
enfraquecida. Assim, a ideia de colocar ser menosprezados. Em contrapartida às
limites ao poder do Estado por intermédio contribuições inglesas e francesas para
de um direito objetivo era fortalecida pelas o desenvolvimento da ideia dos direitos
declarações de direitos. Porém, não se deve fundamentais, os ensinamentos alemães
perder de vista que tais declarações trata- têm uma menor relevância, não podendo,
vam apenas de alguns poucos direitos e contudo, ser ignorados. Consequentemen-
privilégios epistolares concedidos às classes te, a formação dos direitos fundamentais
mais abastadas. Em suma, cabe afirmar que foi impelida por diversas contribuições
tanto o Cristianismo quanto as declarações valiosas, originárias de diversos genitores
de direitos na Idade Média tiveram certa intelectuais. A totalidade dessas contri-
parcela no desenvolvimento da ideia dos buições dá origem a um elixir compacto,
direitos fundamentais. Porém, não é possí- no qual é difícil, senão impossível, atribuir
vel identificar, nos pensamentos libertários um valor concreto a cada um dos diversos
cristãos e nas fragmentárias declarações de quinhões contributivos. Assim, as bases

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ideológicas estavam lançadas; no entanto, a centes a todo e qualquer indivíduo numa
implementação como direito positivo ainda constituição. Assim, a constitucionalização
estava por vir. Tal etapa decisiva só foi con- dos direitos fundamentais do indivíduo na
cretizada quando os diversos pensamentos Virginia Bill of Rights deve ser classificada
e ideias da filosofia, da teologia, da ciência como uma conquista excelsa de enorme
jurídica e da política encontraram uma valor histórico-constitucional.
primeira cristalização nas declarações de Na Europa, a vitória dos direitos fun-
direitos da Inglaterra, dos Estados Unidos damentais prosseguiu com a Déclaration
da América e da França. Essas primeiras des Droits de l’Homme et du Citoyen. Tal
positivações representam marcos expo- declaração também traz consigo a noção de
nenciais na luta da pessoa humana pelos direitos inatos, supraestatais e inalienáveis.
seus direitos e liberdades fundamentais e Porém, não teve no seu âmago a intenção
devem ser considerados como documentos de ser uma constituição concreta. O obje-
de origem dos direitos fundamentais como tivo primordial da Déclaration des Droits
nós os conhecemos hoje. Tal consolidação de l’Homme et du Citoyen era cristalizar os
jurídica foi iniciada com a promulgação de princípios com os quais uma constituição
diversas declarações de direitos na Ingla- ainda deveria ser concretizada. Contudo,
terra durante o século XVII. A Petition of a referida concretização das premissas
Right, os Agreements of the People, o Habeas- abstratas da déclaration nunca aconteceu,
-Corpus-Act, a Declaration of Rights e a Bill o que faz com que esse documento tenha
of Rights representam as primeiras formas uma história excepcional. No entanto, a
dos direitos fundamentais cristalizadas no importância histórica mundial da Déclara-
direito positivo e marcam, portanto, uma tion des Droits de l’Homme et du Citoyen e a
primeira estação na consolidação jurídica sua influência no continente europeu não
desses direitos. Contudo, nas declarações devem permanecer irrefletidas.
inglesas, tratava-se apenas de uma nova A evolução triunfal dos direitos funda-
organização das competências dos órgãos mentais chega ao restante do continente
do Estado, ou seja, um deslocamento do europeu apenas no século XIX e em outros
poder da coroa para o parlamento. Outro tantos Estados do mundo apenas no de-
aspecto dos instrumentos ingleses é a sua correr do século XX. Contudo, seria um
caraterística intrínseca como declarações grande erro considerar que o processo de
de direitos fundamentais parciais. Faltava maturação dos direitos fundamentais como
ainda um passo decisivo no sentido de criar um elemento constitutivo da sociedade já
uma declaração de direitos fundamentais estivesse completo. A história nos ensina
completa. que, frequentemente, foram e são neces-
O verdadeiro triunfo dos direitos fun- sários esforços inimagináveis, privações
damentais ocorre apenas no final do século indescritíveis e uma paciência ainda muito
XVIII com a proclamação da Virginia Bill of maior antes que os direitos fundamentais
Rights. E pela primeira vez na história, os possam encontrar um lugar no âmago da
direitos fundamentais do indivíduo assen- constituição e na consciência das pessoas.
tados na Virginia Bill of Rights não estavam
à disposição dos representantes do povo,
caracterizando assim direitos supraesta- Referências
tais, os quais não poderiam ser abolidos,
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