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Curare

• Calebas curare: também conhecida como “curare


cabaça” (gourd curare em inglês) em classificações
britânicas antigas, devido ao seu formato de cabaça
oca. Suas principais toxinas são o alcurônio (allofe-
rine) e a toxiferina.

• Pot curare: tem esse nome por ser embalada em po-


tes (tradução do termo inglês pot) de terracota. Suas
principais toxinas são a protocurarina, protocurina e
protocuridina.

Dessas três famílias, algumas fórmulas pertencentes à ca-


lebas curare são as mais tóxicas, apresentando valores
LD50 .
É importante lembrar que o Curare não é um anestésico.
O uso do Curare como anestesico é letal. O curare é um
bloqueador dos receptores da acetilcolina.

2 História
A primeira referência escrita que existe sobre o curare
aparece nas cartas do historiador e médico italiano Pietro
Martire d'Anghiera (1457 - 1526). Essas cartas foram
Strychnos toxifera, planta de onde se extrai o curare. Ilustração impressas parcialmente em 1504, 1507 e 1508. A obra
do livro Plantas Medicinais de Köhler, de 1887. completa de d'Anghiera, publicada em 1516 com o nome
De Orbe Novo, relata que um soldado havia sido mor-
talmente ferido por flechas envenenadas pelos índios du-
Curare é um nome comum a vários compostos orgâni-
rante uma expedição ao Novo Mundo.[4] Entre as tribos
cos venenosos conhecidos como venenos de flecha, ex-
da amazônia brasileira que utilizam o curare, com al-
traídos de plantas da América do Sul. Possuem intensa
gumas variações do modo de preparo encontram-se os
e letal ação paralisante[1] , embora sejam utilizados me-
Ticunas e Macus [5]
dicinalmente como relaxante muscular ou anestésico[2] .
Seus principais representantes são plantas dos gêneros
Chondrodendron e Strychnos, da qual um dos subprodu-
tos é a estricnina. Este age como bloqueador nicotínico 3 O uso do curare pelos nativos das
na placa motora que localiza-se na fenda sináptica imedi- Américas
atamente oposta ao axônio terminal pré-sináptico.
O curare é um veneno que foi utilizado pelos nativos das
Américas nas flechas de zarabatana, bem como nas ati-
1 Tipos radas por arco. Era usado sòmente na caça, nunca na
guerra[6] .
As três principais famílias de curare são: O curare imobilizava imediatamente o animal, uma vez
que a reação ocorria nos músculos do pescoço, a seguir
• Tubocurare: também conhecida como “tubo” ou nos da nuca e depois nos dos membros. Posteriormente
“curare bambu”[3] , devido ao seu formato de tu- atingia o diafragma e os músculos cardíacos e a morte era
bos de bambu oco. Sua principal toxina é a D- por asfixia. A carne do animal morto podia ser ingerida
tubocurarina. É um alcalóide mono-quaternário e sem problemas, uma vez que o veneno não fazia nenhum
derivado da isoquinolina. efeito no sistema digestivo[7] .

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2 4 MECANISMO DE AÇÃO

de barro cozido recebia o líquido avermelhado contendo


os alcalóides. Em seguida a panela era colocada sobre
fogo lento por dois ou três dias até formar um líquido
com a consistência de xarope e de coloração escura. Este
era colocado em pequenos potes de cerâmica, onde se
solidificava se ali ficasse por muito tempo. Para usá-lo,
acrescentava-se água morna para diluí-lo[10] . Os Maku
abatiam aves e macacos em copas de árvores a quarenta
metros de altura[11] .
Os Kachúyana do Amapá faziam o curare com o
tubérculo do cipó-kamáni. Após ser limpo e ficar de mo-
lho por dois ou três dias nas águas do igarapé, o tubérculo
tinha sua casca removida e a entrecasca, que contém o
veneno, era raspada e guardada para futuro uso. Na lua
certa o preparador levava a raspa para a casa onde o
veneno seria preparado e de lá não saia até que ficasse
pronto, o que demorava de dois a três dias. As raspas
eram fervidas em água e depois coadas e o líquido reco-
lhido voltava à fervura por mais três dias, quando uma
planta chamada rabo de jacaretinga, aranhas e presas
de cobras eram adicionados. Só a primeira era essen-
cial e, embora os outros ingredientes não fossem veneno-
sos, engrossavam o líquido que ficava com a consistência
viscosa. Quando necessário, breu era misturado para o
veneno ficar mais pegajoso. A força letal deste curare
permanecia por muitos anos[7]
Os Yanoama de Roraima, quando caçavam com arco, en-
venenavam suas flechas de taquara com iacoana para aba-
ter macacos, líquido de efeito paralisante como o curare,
extraído da casca de árvore do mesmo nome. Ao atingir o
animal a ponta se separava da haste da flecha e permane-
cia no corpo do animal que, no máximo, em um minuto
Frontispício de uma edição de 1892 do livro de d'Anghiera. caía morto. Utilizavam pontas de flechas intercambiá-
veis, feitas de diferentes materiais, cada tipo destinado a
animais específicos. Além das utilizadas para macacos,
Para produção do curare, o veneno usado nas flechas da havia pontas de dente de cutia para caçar antas e de pon-
zarabatana, casca de uirari era raspada, secada e cozida tas de ossos afiados para pássaros e peixes[12] .
em fogo lento por dois ou três dias, formando um xarope.
Índios paraguaios envenenavam as pontas das flechas
Este era filtrado, colocado em vasilhames e deixado para
com uma substância removida do couro da rã arborícola
secar ao sol e depois acondicionado em potes de barro
Dendobrates tinctorius[13] .
ou tubos de taboca. Com o tempo chegava a ficar bem
endurecido, mas era facilmente dissolvido em água[8] . Índios de Minas Gerais desconheciam qualquer tipo de
veneno que pudesse ser usado nas pontas das flechas[14] .
A índia mais velha da aldeia era a responsável pela pro-
dução do curare, por um motivo bizarro: durante o seu
preparo geralmente a pessoa morria devido às emana-
ções dos vapores venenosos durante o cozimento. Era 4 Mecanismo de ação
então substituída pela segunda mais velha e assim por di-
ante, até que o curare estivesse pronto. Não havia re- O curare é um potente inibidor, que relaxa o músculo es-
cusa de se exercer esta mortal função por parte da ve- triado. Atuando como competidor da acetilcolina pela
lha e nem seus maridos ou filhos faziam qualquer coisa ligação aos receptores nicotínicos (um dos dois tipos de
para tentar impedi-la. Simplesmente fazia parte da cul- receptores pós-sinápticos para o neurotransmissor acetil-
tura indígena[9] . colina, o outro receptor é o muscarínico) da placa mo-
Os Maku do Brasil e Colômbia preparavam o curare ras- tora. Assim, ao bloquear os receptores de acetilcolina,os
pando caules e raízes de plantas pertencentes ao gênero quais são ionotrópicos para cátions,esses não se abrem.
Strychnos spp. As raspas eram colocadas em um funil Desse modo, não ocorre o influxo de Sódio desencadeado
de folhas de arumã (planta da Família Marantaceae) e pela atividade normal da placa motora, que provocaria a
sobre elas água era derramada lentamente. Uma panela despolarização da membrana pós-sináptica. O potencial
3

gerado pela ligação, em condições fisiológicas, da ace- [13] PEREIRA, Manuel Nunes (1892-1985). Moronguêtá:
tilcolina ao seu receptor na placa motora é chamado de um Decameron indígena. Rio de Janeiro, Civilização
potencial de ação da placa motora, o qual é responsável Brasileira. 1980, 2ª Ed.; vol. 1. P. 1-434
por estimular a abertura de canais de Sódio dependentes [14] JOSÉ, Oiliam (1965). Indígenas de Minas Gerais – As-
de voltagem, os quais contribuirão para a amplificação do pectos sociais, políticos e etnológicos. Belo Horizonte,
potencial despolarizante que se espalha pela fibra muscu- Edições MP. 1965, 217 p.
lar, desencadeando a contração.[15]
[15] Kandel, Eric R. Fundamentos da Neurociência e do Com-
portamento...

5 Referências
[1] «Curare». Consultado em 9 de Agosto de 2006.

[2] «Curare». Moderno Dicionário da Língua Portuguesa.


Consultado em 26 de Fevereiro de 2008.

[3] Jean Marie Pelt: Die Geheimnisse der Heilpflanzen, Verlag


Knesebeck, München 2005, ISBN 3-89660-291-8, S. 100

[4] Sneader, Walter (2005). http://books.


google.com.br/books?id=Cb6BOkj9fK4C&
pg=PA99&lpg=PA99&dq=d'Anghiera+
curare&source=web&ots=NM7hH0ybg_&sig=
syjc6J-fcq3e0aNgeS7jKLmFHWI&hl=pt-BR#PPA99,
M1 |capítulourl= missing title (Ajuda). Drug Discovery:
A History. John Wiley and Sons [S.l.: s.n.] p. 472. ISBN
0-471-89979-8. Consultado em 5 de Março de 2008.

[5] Cannali, João; Vieira, João. Efeito de alguns curares natu-


rais e da d-Tubocurarina retardando o tempo de coagula-
ção e o tempo de protrombina do sangue humano. Mem.
Inst. Oswaldo Cruz, 65(2), 167-173, 1967 Scielo Dez.
2011

[6] CAVALCANTE, Messias S. Comidas dos Nativos do


Novo Mundo. Barueri, SP. Sá Editora. 2014, 403p.ISBN
9788582020364

[7] REVISTA DE ATUALIDADE INDÍGENA. Curare – O


silencioso veneno da Amazônia. p. 57-63. In: Revista
de Atualidade Indígena. Brasília, Fundação Nacional do
Índio. 1977, ano I, nº 6, 64p.

[8] GALVÃO, Eduardo (1921-1976). Encontro de socie-


dades: Índios e brancos do Brasil. 300p. Prefácio de
Darci Ribeiro. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1979, 300 p.

[9] DANIEL, João (1722-1776). Tesouro descoberto no


máximo rio Amazonas. Rio de Janeiro, Contraponto.
2004, Vol. 2, 622 p.

[10] SILVA, Alcionilio Bruzzi Alves da (1901-1987). A ci-


vilização indígena dos Uaupés. São Paulo, Linográfica
Editora. 1962, 496 p.

[11] REVISTA DE ATUALIDADE INDÍGENA (1977).


Cultura. p. 32-33. In: Revista de Atualidade Indígena.
Brasília, Fundação Nacional do Índio. 1977, ano I, nº 4,
64p.

[12] REVISTA DE ATUALIDADE INDÍGENA. Cuatá, o


apreciado prato dos Yanoama. p. 61-64. In: Revista
de Atualidade Indígena. Brasília, Fundação Nacional do
Índio. 1978, ano III, nº 13, 64p.
4 6 FONTES, CONTRIBUIDORES E LICENÇAS DE TEXTO E IMAGEM

6 Fontes, contribuidores e licenças de texto e imagem


6.1 Texto
• Curare Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Curare?oldid=45682221 Contribuidores: NH~ptwiki, RobotQuistnix, Leslie, Lijealso, Yurik-
Bot, FlaBot, CostaPPPR, TiagoVieira, Rei-bot, JAnDbot, Barão de Itararé, CommonsDelinker, Spca, Spoladore, Cleberjean, Theshotgun,
WaldirBot, VolkovBot, SieBot, Rush, Yurisalles, Geraldo neto, Alexbot, Mwaldeck, Luckas-bot, Salebot, Xqbot, FilRBot, EmausBot,
WikitanvirBot, Messias s. cavalcante, Legobot, DiegoBot, Klaus-blaze e Anónimo: 21

6.2 Imagens
• Ficheiro:Bowl_Of_Hygieia_by_David.svg Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7b/Bowl_Of_Hygieia_by_
David.svg Licença: CC BY-SA 3.0 Contribuidores: https://thenounproject.com/term/bowl-of-hygieia/512851/ Artista original: David,
USA
• Ficheiro:Deorbonovo.jpg Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/28/Deorbonovo.jpg Licença: Public domain Con-
tribuidores: http://www.dbd.puc-rio.br/brasil500anos/texto_capa10.html Artista original: Pietro Martire d’Anghiera
• Ficheiro:Strychnos_toxifera_-_Köhler–s_Medizinal-Pflanzen-267.jpg Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/
15/Strychnos_toxifera_-_K%C3%B6hler%E2%80%93s_Medizinal-Pflanzen-267.jpg Licença: Public domain Contribuidores: List of
Koehler Images Artista original: Franz Eugen Köhler, Köhler’s Medizinal-Pflanzen

6.3 Licença
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