Você está na página 1de 29

Curares e quinas

Apresentação
O curare é uma substância antiga utilizada pelos nativos da América do Sul. Essa substância é
amplamente conhecida, e há relatos de que os povos indígenas utilizavam-na para a caça. No Brasil,
os índios da Região Amazônica utilizavam nas flechas o curare obtido a partir de cascas de espécies
de cipós das famílias Menispermaceae e Loginaceae. O motivo para isso é que o curare tem grande
potencial de envenenamento, e sua utilização pode provocar paralisia da musculatura. Sabe-se
também que os alcaloides presentes no curare apresentam benefícios, e ele foi o primeiro fármaco
utilizado na anestesiologia em cirurgias e tratamento do tétano.

Já a quinina é um alcaloide usado pelos incas no Peru. Essa substância ficou conhecida devido a
uma lenda espanhola durante a invasão no Peru, quando se teve conhecimento de uma árvore
empregada para o tratamento da febre da malária. Relata-se que um soldado espanhol, que tinha
sido contaminado pelo protozoário causador da malária, bebeu uma água de cor amarronzada na
qual essas árvores haviam caído. Após uma noite de sono, quando acordou, observou que a febre
havia desaparecido. A quinina é empregada para o tratamento e o desenvolvimento de novos
fármacos antimaláricos, isolados do gênero Cinchona, e aplicada como aditivo amargo na produção
de alimentos e bebidas.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender a química e a biologia dessas substâncias, os
métodos de extração, sua caracterização, doseamento e propriedades farmacológicas, além de
entender como o farmacêutico desempenha um papel importante na segurança e na utilização dos
produtos naturais.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Definir, quimicamente, plantas que contenham curares e quinas.


• Relacionar aspectos farmacológicos de plantas que contenham curares e quinas.
• Descrever, de forma prática, a identificação desses compostos e a sua correlação com
espécies brasileiras.
Desafio
A malária é uma doença infecciosa que atinge regiões tropicais, causada pelo protozoário do gênero
Plasmodium. Os principais sintomas são febre alta, calafrios, suores e cefaleia que ocorre ao longo
do ciclo da doença, e o vetor da doença é o P. falcipaum. O Ministério da Saúde no Brasil, por
muitos anos, instituiu um protocolo que preconiza o uso da quinina como fármaco de primeira
escolha. A quinina é obtida a partir das cascas da quina do gênero da Cinchona. Essa extração
ocorre em meio aquoso e ácido, e várias outras substâncias são extraídas concomitantemente.

Então, Marcos começa a questionar como deverá ser a extração e o doseamento. Você faz parte da
equipe de Marcos no laboratório de pesquisa em produtos naturais, e ele precisa que você o ajude
a resolver esse problema.

Com a finalidade de compreender o procedimento de extração e doseamento, analise:

a) Qual a melhor forma de extração a ser feita e qual o melhor solvente para o processo? Quais
outros processos de extração são aceitáveis?

b) Quais testes são aplicáveis para identificação e doseamento da quinina?


Infográfico
A quinina é um composto da classe dos alcaloides e derivado do triptofano. Ela apresenta um
núcleo quinolítico, responsável por diferentes efeitos farmacológicos. Esse grupo de alcaloides
pertence à espécie da Cinchona e tem sido utilizado no tratamento de malária, neuralgia, espasmos
musculares, fibrilação cardíaca, além de ser utilizado na indústria alimentícia como flavorizante. A
quinina está presente nas cascas da quina, encontrada em árvores nativas da América do Sul.

Neste Infográfico, veja como ocorre a formação da quinina e o processo de extração e identificação
dos alcaloides.
Aponte a câmera para o
código e acesse o link do
conteúdo ou clique no
código para acessar.
Conteúdo do livro
O curare foi utilizado por muito tempo nas florestas tropicais da América do Sul como um veneno
extremamente forte, sendo empregado em flechas. A mistura do curare era fervida em água por
cerca de dois dias e, então, evaporava para se tornar uma pasta escura e espessa com gosto
amargo. A morte por curare é causada por asfixia, uma vez que os músculos esqueléticos ficam
relaxados e paralisados.

O curare começou a ser utilizado como anestésico em 1943, quatro anos depois que a substância
tubocurarina foi isolada, sendo empregada em processos cirúrgicos. A quinina é um alcaloide que
apresenta gosto amargo, tendo várias funções farmacológicas (antiarrítmicos, antimaláricos e
analgésicos) e sendo utilizada como flavorizante na indústria alimentícia.

A descoberta da quinina ocorreu durante a conquista do Império Inca pelos espanhóis na região do
Peru (século XVI). Os invasores tomaram conhecimento dessa árvore, que era utilizada para
tratamento da malária. A fama da quinina se espalhou pelo mundo, e seus benefícios para diversos
tratamentos farmacológicos foram apresentados. Existem alguns testes que ajudam na
identificação e na quantificação da quinina.

No capítulo Curares e quinas, da obra Farmacognosia aplicada, você irá estudar quimicamente e
biologicamente essas substâncias, os métodos de extração, caracterização e doseamento e suas
propriedades farmacológicas.

Boa leitura.
FARMACOGNOSIA
APLICADA

Carlos Ananias Aparecido Resende


Curares e quinas
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir, quimicamente, plantas que contenham curares e quinas.


„„ Relacionar aspectos farmacológicos de plantas que contenham curares
e quinas.
„„ Descrever, de forma prática, a identificação desses compostos e sua
correlação com as espécies brasileiras.

Introdução
O curare é um extrato aquoso obtido do cipó. O termo vem da palavra
“veneno”, que era preparado pelos índios da região amazônica e utilizado
em flechas. O curare é considerado minimamente venenoso quando
absorvido pelo trato gastrointestinal, mas, quando em contato direto
com o sangue, é letal. A preparação do curare pelos indígenas obedecia
um padrão de calor, partes utilizadas e concentração, que era verificada
provando-se o curare. Os diversos alcaloides presentes no curare não
são mais utilizados como paralisante muscular em cirurgias (SÁ, 2012;
SOENTGEN; HILBERT, 2016).
A quinina é um alcaloide utilizado para o tratamento de malária,
neuralgia, espasmos musculares e fibrilação cardíaca. É utilizada na in-
dústria alimentícia como flavorizante. Diferentes métodos são aplicados
na sua extração e controle de qualidade, para garantir a otimização e
confiabilidade dos fármacos que estarão disponíveis no mercado (SILVA;
ARAGÃO, 2009).
Neste capítulo, você irá estudar essas substâncias do ponto de vista
químico e biológico. Também vai ver quais são seus métodos de extração,
sua caracterização, seu doseamento e suas propriedades farmacológicas.
2 Curares e quinas

1 Conhecendo química e biologicamente


o curare e a quinina

Curare
Curare é um termo que descreve uma combinação de extratos. Essa substân-
cia apresenta o alcaloide tubocurarina, e é utilizada por indígenas como um
poderoso veneno (SÁ, 2012). Os indígenas classificam o curare em três tipos,
estabelecidos em função de seu armazenamento, forma de preparo e recipiente
utilizado, que são os seguintes (SIMÕES et al., 2017):

„„ Curare de tubo de bambu: extrato de menispermáceas.


„„ Curare de cabaça (casca dos frutos de espécies de Cucurbitaceae):
extrato da espécie loganiáceas.
„„ Curare de pote de barro: extrato de espécies de duas famílias.

A tubocurarina, cuja estrutura química você pode ver na Figura 1, é um


dos princípios ativos encontrado no curare, presente na Chondrodendron
tomentosum, uma trepadeira nativa da América do Sul. A tubocurarina é um
composto heterocíclico, com a presença de núcleo isoquinolínico, tendo como
precursor a fenilamina e a tirosina, um sal quaternário que apresenta cadeias
do grupo metil, solúveis em água (BARREIRO; FRAGA, 2015; MELOROSE;
PERROY; CAREAS, 2015).
A origem biossintética dos alcaloides se inicia pela rota do ácido chi-
químico a partir dos carboidratos. O ácido chiquímico é responsável pela
formação dos aminoácidos aromáticos L-fenilamina e L-tirosina, precursores
dos alcaloides isoquinolínicos (MELOROSE; PERROY; CAREAS, 2015).
Acompanhe na Figura 2 a biossíntese dos alcaloides isoquinolínicos.
Curares e quinas 3

Alcaloide
quaternário

Figura 1. Estrutura química da tubocurarina.


Fonte: Adaptada de Simões et al. (2017).

Eritrose-4-fosfato + Fosfoenolpiruvato Ácido chiquímico

A formação do
Condensação de dois metabólitos corismato acontece
para a formação do ácido chiquímico com a junção do
fosfoenolpiruvato

Alcaloides
Tirosina Prefenato Corismato
isoquinolínicos

Figura 2. Biossíntese dos alcaloides isoquinolínicos.


Fonte: Adaptada de Simões et al. (2017).

Na tubocurarina, os dois átomos de nitrogênio estão separados por 10


átomos de hidrogênio, apresentando centros carregados positivamente.
A distância interatômica (1,4 nm em tubocurarina) é muito dependente da
estrutura e estereoquímica, uma vez que os átomos estão separados do centro
(MELOROSE; PERROY; CAREAS, 2015). Veja o processo de formação da
tubocurarina na Figura 3.
4 Curares e quinas

Oxidação eletrônica de grupos


fenóis produz radicais estabilizados
MeO por ressonância
Acoplamento radical: é provável
NMe O2 MeO que seja um processo gradual
HO NADPH
H
NMe MeO MeO
O
H
NMe NMe
HO
H H
(S)-N-metil-coclaurina O OH O OH
O
O SAM
MeO
O2
NMe NADPH O O
HO H H H
H O OH OH
MeN MeN Me2N

OMe OMe OMe


HO
Tubocurarina
(S)-N-metil-coclaurina

Figura 3. Processo de formação da tubocurarina.


Fonte: Adaptada de Melorose, Perroy e Careas (2015).

O acoplamento oxidativo fenólico é um fator crucial para a modificação da


benziltetrahidroisoquinolina, que é o esqueleto básico para muitos outros
tipos de alcaloides. A tubocurarina representa o acoplamento de duas moléculas
de benziltetrahidroisoquinolina por pontes de éter, mas esse acoplamento é
menos frequente do que o de carbono–carbono, uma ligação intramolecular
entre anéis aromáticos (MELOROSE; PERROY; CAREAS, 2015).
Ao longo da história, algumas plantas foram utilizadas para a preparação
do curare, e elas apresentam propriedades farmacológicas, como as listadas a
seguir (SIMÕES et al., 2017; KING, 1945; RAGHAVENDRA, 2002; SPIROVA
et al., 2019; VIRTUOSO et al., 2005):

„„ Noz-vômica (Strychnos nux-vomica L.): a parte da planta utilizada para


o preparo são as sementes. Era utilizada no passado para o tratamento
de transtornos gastrointestinais.
„„ Uva-do-mato (Chondrodendron tomentosum): é um potente relaxante
muscular, utilizado como adjuvante em cirurgias e no tratamento de
crises convulsivas.
„„ Corticeira (Erythrina velutina): uma espécie da flora brasileira que
apresenta atividade sob o músculo esquelético, provocando paralisia
muscular. A parte da planta utilizada é a casca.
Curares e quinas 5

Quinina
A quinina é extraída das cascas da quina. Foi isolada pela primeira vez em
11 de setembro de 1980 na França, pelos químicos Pierre Joseph Pelletier e
Joseph Bienaimé Caventou. Registros históricos relatam que índios começaram
a observar que animais doentes obtiveram melhoras após ingerir água de uma
lagoa onde havia cascas de quina (ALMEIDA et al., 2009).
A quinina é um alcaloide quinolínico e apresenta em sua estrutura quí-
mica, que você pode ver na Figura 4, um núcleo quinolínico, responsável por
diferentes efeitos farmacológicos. Utilizada na indústria farmacêutica para
o desenvolvimento de fármacos antimaláricos e no tratamento de distúrbios
digestivos, a quinina vem sendo empregada na indústria de alimentos como
aditivo de amargura (SIMÕES et al., 2017).

Álcool
Amina

Éter

Alcaloide terciário

Amina
Figura 4. Estrutura química da quinina.
Fonte: Adaptada de Simões et al. (2017).

A água tônica é considera um refrigerante e apresenta, em sua constituição, 82mg/L


de quinina. A quinina, inicialmente, era utilizada como um composto com benefícios
antimaláricos, mas a indústria de alimentos a utilizou para conferir o gosto amargo,
uma característica sensorial marcante. A água tônica também é utilizada em bebidas
como mistura para coquetéis feitos com gin (MINIM et al., 2009).
6 Curares e quinas

A biossíntese da quinina, ilustrada na Figura 5, é semelhante à de outros


alcaloides indólicos, de acordo com Simões et al. (2017, documento on-line):

O triptofano (1), um aminoácido de núcleo indólico, forma, por descarboxila-


ção, a triptamina (2), a qual, mediante condensação de Pictet-Spengler com o
monoterpeno secologanina (3), forma a estrictosidina (4). A incorporação do
intermediário corinanteal (5) sugere que o grupo metóxi-carbonilíco se perde
em estágios anteriores, formando duas isoformas. A partir do corinanteal (5),
os caminhos divergem completamente, e a formação do esqueleto quinolíni-
co requer um rearranjo não apenas da porção monoterpênica, mas também
do núcleo indólico, formando intermediários como 6, 7 e 8, para formar os
alcaloides quinina (9), cinchonidina quinidina e cinchonina.

Figura 5. Rota biossintética da quinina.


Fonte: Simões et al. (2017, documento online).
Curares e quinas 7

Os alcaloides quinolínicos são encontrados na espécie do gênero da


Cinchona L., que são árvores nativas da América do Sul e de outros países.
As cascas dessa espécie devem ser utilizadas na faixa de 8 a 12 anos. Apresenta
solubilidade em água, sendo um fármaco extremamente básico (BARREIRO;
FRAGA, 2015; SIMÕES et al., 2017; OLIVEIRA; SZCZERBOWSKI, 2009;
SILVA; ARAGÃO, 2009).
Estudos relacionados à estrutura química da quinina levaram ao desenvolvi-
mento de análogos sintéticos a partir do grupo farmacofórico o anel quinolínico
(cloroquina, primaquina e mefloquina) (BARREIRO; FRAGA, 2015).
A transmissão da malária ocorre pelo parasita do gênero Plasmodium,
ou seja, é uma doença parasitária transmitida pela picada do mosquito fêmea
do gênero Anopheles (RATHORE et al., 2005). A malária apresenta como
sintomas febre, calafrios, cefaleia, vômitos, anorexia, diarreia e anemia. Caso
não seja tratada adequadamente, pode causar complicações maiores ao paciente,
como edema pulmonar, complicações renais, icterícia e obstrução dos vasos
sanguíneos cerebrais, situação que poderá levar o paciente a óbito (FRANÇA;
DOS SANTOS; FIGUEROA-VILLAR, 2008).
O fármaco de primeira escolha para o tratamento da malária é a quinina,
presente na constituição química de algumas espécies de plantas, como as lis-
tadas a seguir (SIMÕES et al., 2017; POLLITO; TOMAZELLO FILHO, 2006).

„„ Cinchona calisaya (quina amarela): utilizada como um antimalárico


e antiparasitário, também auxilia no processo digestivo. As partes
utilizadas da planta são as cascas. Nesta droga encontram-se presentes
60% de quinina.
„„ Cinchona amazônica: espécie do gênero Cinchona, chamada popular-
mente de árvore da quinina. Sua casca é utilizada para o tratamento
da malária.

2 Aspectos farmacológicos de curares e quinas

Curare
O curare apresenta propriedades paralisantes; essa ação ocorre sobre os
receptores nicotínicos da acetilcolina nos músculos. O curare trabalha de forma
competitiva com a acetilcolina, sendo um antagonista. Provocando bloqueio
neuromuscular e, em seguida, flacidez muscular, a ação da tubocurarina
acontece por um período longo (SIMÕES et al., 2017).
8 Curares e quinas

A neostigmina e a piridostigmina são antagonistas da tubocurarina, ou


seja, revertem o efeito de bloqueio neuromuscular promovido pela tubocura-
rina. Utilizada também como antídoto no caso de envenenamento por curare,
a neostigmina promove o aumento da concentração de acetilcolina no sistema
neuromuscular (ARAÚJO; SANTOS; GONSALVES, 2016; MELOROSE;
PERROY; CAREAS, 2015).
Em 1947, a tubocurarina possibilitou o desenvolvimento de fármacos da
classe dos bloqueadores ganglionares e relaxantes musculares utilizados em
cirurgias intestinais (BARREIRO; FRAGA, 2015). Alguns efeitos colaterais
causados pela tubocurarina são hipertensão, taquiarritmia, apneia, bronco-
espasmo, insuficiência respiratória, rubor e salivação.

Quinina
O mecanismo de ação da quinina ainda não é totalmente elucidado. Ela pode ser
usada como um antiarrítmico, sendo indicada na manutenção do ritmo sinusal
e da fibrilação atrial, na prevenção recorrente da taquicardia e no tratamento
de diferentes linhagens celulares (MELOROSE; PERROY; CAREAS, 2015).
Alguns estudos relatam que a quinina age sobre os fosfolipídios da mem-
brana do vacúolo digestivo. Essa degradação compromete a hemoglobina,
levando o parasita à morte (FITCH, 2004).
O metabolismo do quinina ocorre no citocromo P450, uma enzima hepá-
tica, na qual ocorre a oxidação do fármaco. A excreção da forma inalterada
do fármaco ocorre pela urina — 20% da dose administrada é excretada.
A 3-hidroxiquinina é o principal metabólito produzido pelo fármaco; em
pacientes com deficiência renal pode causar toxicidade (SIMÕES et al., 2017).
Existe uma limitação ao uso do quinina, por ter uma janela terapêutica
curta; pode ainda haver o desenvolvimento de cardiotoxicidade e o cinchonismo
(toxicidade neurológica, cardiovascular e gastrointestinal). A quinina é um
dos fármacos que podem ser utilizados no primeiro trimestre da gestação
(TAKEM; D’ALESSANDRO, 2013; WHITE, 2007).
Indivíduos que apresentam um nível plasmático elevado do fármaco podem
ter um aumento da toxicidade — isso ocorre devido à ligação com proteínas
plasmáticas. Em pacientes com malária grave, o período de meia-vida da
quinina se torna mais longo (SIMÕES et al., 2017).
Curares e quinas 9

Os antimaláricos foram desenvolvidos como profilaxia e


tratamento da malária. O hospedeiro da malária apresenta
um ciclo biológico complexo, e deve ser empregado
um esquema terapêutico adequado à terapia que será
aplicada ao paciente. Existem hoje poucos fármacos
para tratamento e, por uso incorreto da população, vêm
aumentando os casos de resistência medicamentosa a
esses fármacos. Se quiser saber mais a respeito, leia o artigo
disponível no link a seguir.

https://qrgo.page.link/kiHbP

3 Caracterização, doseamento e extração

Curare
Existem diversas reações que podem ser empregadas para a identificação
de alcaloides, mas algumas drogas necessitam de testes específicos para sua
identificação. A metodologia de extração, de modo geral, consiste em tratar
o material vegetal na forma de pó com solução aquosa de ácido diluído e,
em seguida, neutralizar adicionando um solvente orgânico. Esses alcaloides
são precipitados com adição da solução de carbonato de sódio ou amônia
(SIMÕES et al., 2017).
A caracterização e o doseamento da tubocurarina podem ser feitos com
os seguintes métodos (SIMÕES et al., 2017):

„„ Cromatografia em camada delgada (CCD): método utilizado para


isolamento e identificação da tubocurarina, alcaloide presente no curare.
É empregado o regente iodo platinado na cor marrom para a detecção
do alcaloide.
„„ Cromatografia liquida de alta eficiência (CLAE), cromatografia a
gás (CG) e volumetria: o doseamento da tubocurarina pode acontecer
por um desses três métodos. Pode ser empregando na fase móvel do
gradiente do CLAE.
10 Curares e quinas

Quinina
A extração do quinina ocorre por meio do líquido — líquido é o momento
em que dois componentes de uma mistura são separados quando entram em
contato com o solvente orgânico no qual ocorrerá o processo de dissolução
(SIMÕES et al., 2017).
Outros autores citam a extração por meio de ultrassom. Essa técnica con-
verte as ondas do ultrassom de energia elétrica para energia mecânica, e a
propagação dessas ondas no meio líquido provoca uma variação de pressão.
A formação de bolhas ocorrem pela alta frequência, quando ocorre a im-
pulsão para a formação das bolhas. Durante esse processo ocorre um efeito
vibratório na célula, levando a sua ruptura e liberando seu conteúdo (SILVA;
ARAGÃO, 2009).
A caracterização e o doseamento pode ser feitos pelas seguintes técnicas:

„„ Cromatografia em camada delgada (CCD): método utilizado para


o isolamento de alcaloides indólicos. Este método é utilizado para a
identificação de compostos conhecidos (BESSEGATO; CARDOSO;
ZANONI, 2016).
„„ Cromatografia liquida de alta eficiência (CLAE): método empregado
para a quantificação de alcaloides indólicos, que apresentam forte ab-
sorção pelo núcleo indólico, que se concentra na região violeta; assim
o método se apresenta sensível. Este método trabalha com a CLAE
acoplada à detecção de alta florescência (FLD) (CANALES et al., 2020).

Existem alguns testes colorimétricos empregados na identificação quinina,


listados a seguir:

„„ Teste de eritroquinina: apresenta coloração avermelhada.


„„ Teste de Herapatita: apresenta aspecto metálico.
„„ Ácidos oxigenados: apresenta fluorescência azul na presença de ácido
sulfúrico.
„„ Teste de taleioquina: verde esmeralda.

Acompanhe no Quadro 1 os testes colorimétricos reativos para a confir-


mação de alcaloides.
Curares e quinas 11

Quadro 1. Testes reativos colorimétricos para confirmação de alcaloides

Reativo para alcaloides Composição Cor do precipitado

Dragendorff Iodobismutato Alaranjado


de potássio

Mayer Iodomercurato Branco


de potássio

Bertrand Ácido sílico-tungstato Branco

Bouchardat/Wagner Iodo-iodeto de potássio Marrom

Sonnenschein Ácido fosfomolíbdico Branco


Ácido tânico Bege

Heger Ácido pícrico Amarelo

No link a seguir você encontra um site com mais infor-


mações sobre os testes utilizados para identificação e
extração de alcaloides.

https://qrgo.page.link/ZvxQx

O conhecimento acerca da utilização dos produtos naturais e a troca de


experiências entre os diferentes povos levaram ao desenvolvimento de estudos
voltados para compostos químicos naturais responsáveis por diversas atividades
biológicas (MONTANARI; BOLZANI, 2001). No desenvolvimento de novos
fármacos para o tratamento de doenças diversas, a natureza tem um papel
fundamental (VIEGAS JÚNIOR; BOLZANI; BARREIRO, 2006).
12 Curares e quinas

ALMEIDA, M. R. et al. Pereirina: O primeiro alcaloide isolado no Brasil? Revista Brasileira de


Farmacognosia, v. 19, nº. 4, out./nov. 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0102-695X2009000600026. Acesso em: 21 fev. 2020.
ARAÚJO, C. R. M.; SANTOS, V. L. dos A.; GONSALVES, A. A. Acetilcolinesterase - AChE: uma
enzima de interesse. Rev. Virtual de Quim., v. 8, nº. 6, p. 1818–1834, 2016. Disponível em:
http://static.sites.sbq.org.br/rvq.sbq.org.br/pdf/v8n6a04.pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
BARREIRO, E. J.; FRAGA, C. A. M. Química medicinal: bases moleculares da ação dos
fármacos. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. 608 p.
BESSEGATO, G. G.; CARDOSO, J. C.; ZANONI, M. V. B. Contribuições da fotocatálise hetero-
gênea e fotoeletrocatálise no tratamento de efluentes contendo corantes. In: ZANONI,
M. V. B.; YAMANAKA, H. (org.). Corantes: caracterização química, toxicológica, métodos
de detecção e tratamento. São Paulo: UNESP/Cultura Acadêmica, 2016. p. 261–282.
CANALES, N. A. et al. Historical chemical annotations of Cinchona bark collections are
comparable to results from current day high-pressure liquid chromatography techno-
logies. Journal of Ethnopharmacology, v. 249, mar. 2020. Disponível em: https://www.
sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0378874119312255. Acesso em: 21 fev. 2020.
FITCH, C. D. Ferriprotoporphyrin IX, phospholipids, and the antimalarial actions of
quinoline drugs. Life Sci., v. 74, nº. 16, p. 1957–1972, mar. 2004. Disponível em: https://
www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0024320503011391?via%3Dihub.
Acesso em: 21 fev. 2020.
FRANÇA, T. C. C.; DOS SANTOS, M. G. dos; FIGUEROA-VILLAR, J. D. Malária: aspectos his-
tóricos e quimioterapia. Quím. Nova, v. 31, nº. 5, p. 1271–1278, abr. 2008. Disponível em:
http://static.sites.sbq.org.br/quimicanova.sbq.org.br/pdf/Vol31No5_1271_59-AG07101.
pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
KING, H. Curare alkaloids. Part VIII. Examination of commercial curare, Chondrodendron
tomentosum R and P and Anomospermum grandifolium eichl. Journal of the Chemical
Society, 1948. Disponível em: https://pubs.rsc.org/en/content/articlelanding/1948/jr/
jr9480001945#!divAbstract. Acesso em: 21 fev. 2020.
MELOROSE, J.; PERROY, R.; CAREAS, S. Medicinal Natural Products Medicinal. Statewide
Agricultural Land Use Baseline, v. 1, 2015.
MINIM, V. P. R. et al. Água tônica: aceitação e análise tempo-intensidade do gosto
amargo. Ciênc. Tecno. Aliment., v. 29, nº. 3, p. 567–570, jul./set. 2009. Disponível: http://
www.scielo.br/pdf/cta/v29n3/a18v29n3.pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
MONTANARI, C. A.; BOLZANI, V. da. S. Planejamento racional de fármacos baseado
em produtos naturais. Quím. Nova, v. 24, nº. 1, p. 105–111, jan./fev. 2001. Disponível
em: 21 fev. 2020.
Curares e quinas 13

OLIVEIRA, A. R. M. de; SZCZERBOWSKI, D. Quinina: 470 anos de história, controvérsias


e desenvolvimento. Quím. Nova, v. 32, nº. 7, p. 1971–1974, ago. 2009. Disponível em:
http://static.sites.sbq.org.br/quimicanova.sbq.org.br/pdf/Vol32No7_1971_47-AG08646.
pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
POLLITO, P. A. Z.; TOMAZELLO FILHO, M. Cinchona amazonica Standl: (Rubia-
ceae) no estado do Acre, Brasil. Bol. Mus. Para. Emilio Goeldi Ciênc. Nat., v. 1, nº. 1,
abr. 2006. Disponível em: http://scielo.iec.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi
d=S1981-81142006000100001. Acesso em: 21 fev. 2020.
RAGHAVENDRA, T. Neuromuscular blocking drugs: discovery and development. J. R.
Soc. Med., v. 95, nº. 7., p. 363–367, jul. 2002. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.
gov/pmc/articles/PMC1279945/. Acesso em: 21 fev. 2020.
RATHORE, D. et al. Antimalarial drugs: current status and new developments. Expert Opin.
Investig. Drugs, v. 14, nº. 7, p. 871–883, jul. 2005. Disponível em: https://www.tandfonline.
com/doi/pdf/10.1517/13543784.14.7.871?needAccess=true. Acesso em: 21 fev. 2020.
SÁ, M. R. Do veneno ao antídoto: Barbosa Rodrigues e os estudos e controvérsias
científicas sobre o curare. Revista Brasileira de História da Ciência, v. 5, suplem., p. 12-21,
2012. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/24118/2/Do%20
veneno%20ao%20antidoto.pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
SILVA, I. D. D.; ARAGÃO, C. F. S. Avaliação de parâmetros de extração da Cinchona Vahl
por métodos farmacopéicos e não farmacopéicos. Rev. bras. farmacogn., v. 19, nº. 3, jul./
set. 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
-695X2009000500021. Acesso em: 21 fev. 2020.
SIMÕES, C. M. O., et al. (org.). Farmacognosia: do produto natural ao medicamento.
Porto Alegre: Artmed, 2017.
SOENTGEN, J.; HILBERT, K. A química dos povos indígenas da América do Sul. Quím.
Nova, v. 39, nº. 9, p. 1141–1150, ago. 2016. http://static.sites.sbq.org.br/quimicanova.sbq.
org.br/pdf/AG20160200.pdf. Acesso em: 21 fev. 2020.
SPIROVA, E. N. et al. Curare alkaloids from Matis Dart Poison: Comparison with d-tu-
bocurarine in interactions with nicotinic, 5-HT3 serotonin and GABAA receptors. PLoS
One, v. 14, nº. 1, p. 1–17, jan. 2019. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/
articles/PMC6319706/. Acesso em: 21 fev. 2020.
TAKEM, E. N.; D’ALESSANDRO, U. Malaria in pregnancy. Mediterr. J. Hematol. Infect. Dis., v. 5,
nº. 1, jan. 2013. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3552837/.
Acesso em: 21 fev. 2020.
VIEGAS JÚNIOR, C.; BOLZANI, V. da S.; BARREIRO, E. J. Os produtos naturais e a química
medicinal moderna. Quím. Nova, v. 29, nº. 2, mar./abr. 2006. Disponível em: http://
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422006000200025. Acesso
em: 21 fev. 2020.
14 Curares e quinas

VIRTUOSO, S. et al. Estudo preliminar da atividade antibacteriana das cascas de Erythrina


velutina Willd., Fabaceae (Leguminosae). Rev. bras. farmacogn., v. 15, nº. 2, abr./jun.
2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
-695X2005000200012. Acesso em: 21 fev. 2020.
WHITE, N. J. Cardiotoxicity of antimalarial drugs. The Lancet Infectious Diseases, v. 7, nº. 8,
p. 549–558, 2007. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/laninf/article/
PIIS1473-3099(07)70187-1/fulltext. Acesso em: 21 fev. 2020.

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun-
cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.
Dica do professor
O curare e as quinas representam um avanço na medicina para o desenvolvimento de novos
medicamentos. A história da humanidade e a utilização de plantas medicinais por povos que tinham
os conhecimentos empíricos foram fundamentais para o desenvolvimento de novos fármacos.

Nesta Dica do Professor, você irá compreender mais sobre os aspectos farmacológicos do curare e
da quinina.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) A tubocurarina é o principal aditivo encontrado no curare. O curare recebe esse nome por
apresentar vários compostos que são considerados venenosos. A tubocurarina tem ação
paralisante e é utilizada como relaxante muscular.

É possível visualizar, em sua estrutura química, algumas funções orgânicas, entre elas:

A) ácido carboxílico.

B) álcool.

C) anidrido.

D) cetona.

E) éter.

2) A quantificação dos principais ativos presentes em plantas pode ser feita de diferentes
maneiras. Existem alguns métodos que auxiliam na quantificação de princípios ativos, a
qual tem um papel importante para o desenvolvimento de novos estudos. J.L.M
é pesquisador de uma universidade e necessita realizar uma quantificação de tubocurarina e
quininas em seu laboratório. Então, precisa saber qual método empregar para a
quantificação da tubocurarina.

De acordo com seus conhecimentos, qual método dever ser utilizado para a quantificação da
tubocurarina?

A) CCD.

B) CLAE.

C) Dragendroff.

D) Teste de taliquimia.

E) Mayer.

3) O curare apresenta atividade paralisante quando em contato com o corpo, trabalhando de


forma competitiva com a acetilcolina. A tubocurarina, por muito tempo, foi utilizada como
relaxante muscular em processos cirúrgicos.

A ação da tubocurarina ocorre em quais receptores?

A) Receptores muscarínicos.

B) Receptores colinesterase.

C) Receptores monoamina.

D) Receptores adrenérgicos.

E) Receptores nicotínicos.

4) Durante o processo de metabolismo da quina, ocorrem algumas transformações no fármaco,


chamadas de oxidação. Essa oxidação gera um metabólito secundário, chamado de 3-
hidroxiquina.

Em qual desses grupos de pacientes deve-se ter atenção redobrada durante a administração
de quinina?

A) Pacientes renais.

B) Pacientes hipertensos.
C) Pacientes asmáticos.

D) Pacientes com deficiência de cálcio.

E) Pacientes em período de menopausa.

5) Durante a aula de Biologia, um professor explicou que os índios nativos da América do Sul
utilizavam o curare em flechas para a caça, explicando que o termo era designado para
denominar a palavra veneno. O curare é uma mistura de cipós de várias espécies da
Amazônia. Então, um aluno da classe levantou a seguinte questão: “Se o curare é um veneno,
os índios não poderiam consumir a carne da caça morta com as flechas”.

Por que os índios não morriam ao consumirem a carne envenenada?

A) O curare apresenta baixa toxicidade e é pouco absorvido pelo trato gastrintestinal.

B) O curare apresenta ação farmacológica nula sobre o trato gastrintestinal.

C) Os índios realizavam um ritual de preparo para a limpeza da carne, que se tornava própria
para o consumo.

D) O curare não apresenta ação sobre os bloqueadores neuromusculares.

E) O curare apresenta alta toxicidade e é muito absorvido pelo trato gastrintestinal.


Na prática
O uso indiscriminado de plantas medicinais vem se tornando frequente no mundo moderno, o que
vem trazendo alguns problemas de saúde para a população, como possíveis interações
medicamentosas que podem comprometer o tratamento.

Nesta Na Prática, conheça o caso de Dona Maria e o uso das cascas de quina para o tratamento de
distúrbios gastrintestinais.
Aponte a câmera para o
código e acesse o link do
conteúdo ou clique no
código para acessar.
Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Extração de alcaloides
No link a seguir, você verá como ocorre o processo de extração dos alcaloides.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Estudo do efeito do macerado de flores de mulungú sobre


operaria de abelhas africanizadas
As plantas do gênero Erythrina são conhecidas por produzirem alcaloides, flavonoides e
isoflavonoides. Essas plantas representam a principal fonte de alcaloides tetracíclicos, os quais
apresentam atividade semelhante à do curare, causando paralisia muscular.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar.

Você também pode gostar