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e do Repente
: ,
Moreira de Acopiara
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o BEABÁDO CORDEL
E DO REPENTE
Moreira de Acopiara
2006 - SP
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o, beabá do Cordel
Eu resolvi escrever
Um cordel sobre CORDEL
Porque o cordel tem sido
Meu companheiro fiel,
E pra tirar do leitor
Alguma dúvida cruel.
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base militar no Nordeste brasileiro. Como os soldados um dos pioneiros. Há notícias de que o paraibano
não tinham muita coisa pra fazer, convidavam os Silvino Pirauá (1848-1913) foi o primeiro a imprimir um
repentistas locais pra cantar pra eles. Terminada a livreto, por volta de 1890. Um dos poetas mais
guerra os americanos foram embora e, chegando em famosos da história do cordel é o já citado paraibano
casa, resolveram cantar repente. Como não tinham Leandro Gomes de Barros, que criou centenas de
viola, improvisaram uma percussão. Virou moda por lá folhetos. E ainda João Martins de Atayde, Rodolfo
e mais tarde voltou para o Brasil. E hoje há por aqui Coelho Cavalcante, Manoel d'Almeida Filho e Firmino
cantores de rap que improvisam muito bem. Teixeira do Amaral. Das gerações seguintes merecem
O poeta Camões, a meu ver uma das mais destaque Patativa do Assaré (1909-2002), Manoel
brilhantes mentes do planeta, glosava motes e escrevia Monteiro, Gonçalo Ferreira da Silva, J. Borges, Antônio
em forma de Cordel, com sete e dez sílabas. Se você Francisco, Antônio Alves, da Bahia, entre outros. E
pegar cada um daqueles cantos maravilhosos de "Os mais recente ainda temos os cearenses Klévisson,
Lusíadas" e imprimir num folheto, eles podem ser Arievaldo Viana e Rouxinol do Rinaré, o piauiense
chamados de cordel. Pedro Costa, os baianos Marco Haurélio e Dalmo
Os temas principais desse tipo de literatura no Sérgio, e mais um bocado de poetas bons.
Brasil foram (e ainda são): o cangaço, a religiosidade, Poetas como Manoel Monteiro, Antônio
as catástrofes, os contos de fada e as grandes Francisco e Gonçalo Ferreira da Silva podem ser
histórias de amor. Sobre padre Cícero, Lampião e frei vistos frequentemente conversando com poetas e
Damião eu conheço dezenas de livretos. Sobre Airtom gente do povo nas feiras livres, depois em reuniões
Senna também conheço dezenas deles. acadêmicas e proferindo palestras nas Universidades,
Esse gênero literário permanece até hoje convivendo, portanto, com todas as tendências das
bastante difundido no Nordeste, especialmente nos ciências, das artes e das letras. Os poetas de hoje são
estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará, Alagoas e muito mais escolarizados, logo, mais esclarecidos. A
Piauí. Os poemas, geralmente vendidos pelos próprios polidez e obediência à gramática não tiram a
autores, ainda narram fatos do cotidiano local, como autenticidade da obra. Pelo contrário, a tornam mais
acontecimentos políticos, festas, desastres, disputas, bela e atraente.
milagres, enchentes, secas ... Grandes escritores como Guimarães Rosa,
São muitas vezes declamados ou contados ao Graciliano Ramos, José Uns do Rego, Cora Coralina,
público, com acompanhamento de violas sertanejas ou Raquel de Queiroz, Carlos Drummond de Andrade,
pandeiros. O poeta escravo Inácio da Catingueira foi Ariano Suassuna e João Cabral de Meio Neto foram
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influenciados por essa forma de literatura popular. O cordel, que tanta gente alfabetizou (inclusive
Uma das obras mais conhecidas é "O romance a mim), teve seu auge entre 1900 e 1960. Felizmente,
do pavão misterioso", de autoria controversa, dividida depois de alguns anos meio que no ostracismo, se
entre João Melquíades Ferreira e José Camelo de reerqueu e hoje atravessa boa fase, sendo divulgado e
Meio. Após inúmeras reimpressões, esse cordel já estudado em escolas e universidades e pesquisado por
vendeu mais de cinco milhões de exemplares. Pra brasileiros e estrangeiros. Por outro lado, surgiram
você ter uma idéia do que isso representa, basta novos poetas, agora mais bem informados e
lembrar que dificilmente um autor consagrado da preocupados com a perfeição da metrificação e das
literatura erudita ultrapassa 10 mil exemplares rimas, com a correção ortográfica, a estética e até a
vendidos. capa. O computador, a meu ver, trouxe muita
O folclore sempre foi o continuará sendo o contribuição.
desafio do tempo. Desde que nasci ouço falar que a
literatura de cordel está morrendo. O surgimento do
rádio provocou um susto nos cordelistas com as
afirmações de que agora o cordel está com os dias
contados. Mas o rádio não conseguiu sufocar nem o
cordel nem o repente e, atualmente, é um grande
aliado. O surgimento da televisão provocou outro susto
I Sextilha é qualquer estrofe de seis versos, ou seis linhas,
que já está passando, e o cordel continua vivo. Assim
não importa o número de sílabas ou a arrumação das rimas.
sendo, acredito que a literatura de cordel sobreviverá
Os cantadores repentistas e os poetas de bancada, também
para sempre como uma das mais encantadoras chamados cordelistas, comum ente fazem sextilhas de sete
manifestações da inteligência e da criatividade. É sílabas, rimando o segundo verso com o quarto e com o
lógico que, como toda arte, o cordel passou e passará sexto. Há ainda o martelo de seis linhas, o mesmo que
por adaptações. sextilha em decassílabo, bonita modalidade muito usada
No começo, as capas dos cordéis eram pelos cantadores repentistas.
2 Sete linhas, ou setilha, ou ainda septilha, é qualquer estrofe
brancas. Traziam apenas o título da obra e o nome do
autor. Depois passaram a ser ilustradas com clichês, de sete versos, independentemente do número de sílabas e da
divisão das rimas. Os repentistas cantam setilhas de sete e de
cartões postais ou. retratos de artistas do cinema. A
dez sílabas, rimando sempre o segundo verso com o quarto e
xilogravura, hoje muito apreciada, só foi introduzida com o sétimo, e o quinto com o sexto. Os cordelistas
por volta da década de 1930. escrevem setilhas de sete sílabas.
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MORElRA DE ACOPIARA é como Manoel
Moreira Júnior assina seus trabalhos poéticos, sejam
impressos, sejam gravados.
Nasceu no dia 23 de julho de 1961, no Sítio
Cantinho, município de Acopiara, sertão central do Ceará,
onde viveu até os 20 anos, entre os trabalhos da roça e a
leitura de livros de bons autores como Graciliano Ramos,
Machado de Assis, Camões, Patatíva do Assaré e a
literatura de cordel.
É autor de vários folhetos e faz palestras sobre o
tema. Transita pelo teatro, gravou dois CDs com poemas
de sua autoria e tem trabalhos musicados e gravados por
vários artistas. Em 2004 foi eleito para a Academia
Brasileira de Literatura de Cordel, ABLC, com sede no
Rio de Janeiro.
Tem quatro livros editados, dentre eles Com o
Pé Direito na Frente.