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Antonio Francisco

A Sorte do Preguiçoso
e o Peixinho Encantado
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~ ~

Antônio Francisco

A sorte do Preguiçoso
e o Peixinho Encantado
A nossa vida não passa
De uma çhama amarela
Num castiçal de ilusão
Tremendo em cima da vela
Com a boca do destino
Foi não foi soprando nela.

E quando o destino quer


Faz o que quer com a gente
Quem mente diz a verdade
Quem diz a verdade mente
O valente fica frouxo
E o frouxo fica valente.

Uma velhinha morava ~


Nas terras de um reinado
Numa pequena cabana
Feita de barro queimado
Morrendo de trabalhar
No seu pequeno roçado
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Tinha um filho, mas o mesmo. Levante seus pés do chão
Era uma carga pesada. Faça das mãos uma asa
Passava o dia deitado Vá antes que o sol se mude
Numa pequena latada. E fique da cor de brasa
E só saia debaixo E traga um feixe de lenha
Para comer e mais nada. Pra cozinhe desta casa
A mãe vivia pedindo o preguiçoso saiu
Pra ele lhe ajudar Se arrastando e gemendo
E ele dizendo a ela Entrou na mata chorando
Ainda vou enricar Se maldizendo e dizerido.
Debaixo dessa latada Quem não tem sapato novo.
Sem precisar trabalhar. Bota no velho um remendo.
E assim ele vivia E foi ver se tinha força
O dia todo deitado Para quebrar um galhinho
Numa esteira de palha Mas quando pegou na ponta
Com 10 cordéis do seu lado. Avistouali pertinho,
E sua mãe dia e noite Um poço de água fria
Dando duro no roçado. Na beirada do caminho.
Até que um dia a velhinha Jogou o galho no mato
Amanheceu afobada Fez uma concha da mão,
Acordou o preguiçoso E quando meteu a concha
Com uma boa varada. Nas águas do cacimbão.
Dizendo vá para o mato Pulou um peixe das águas,
E não me venha sem nada Subiu e caiu e no chão ..
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O rapaz pegou o peixe E um grande feixe de lenha
E quando ia guardar Caiu nos pés do rapaz
O rapaz olhou a lenha,
O peixinho no seu bolso
Ouviu o peixe falar: E disse não tenho gás
O feixe é muito bonito
- Me jogue dentro da água
Que garanto lhe ajudar. Mas é pesado demais.

Só basta você dizer E novamente pediu:


Meu peixinho eu quero agora - Ó meu peixinho encantado
Isto, aquilo, aquilo outro Faça este feixe de lenha
Que eu farei na mesma hora o
Andar de frente e de lado
O que você desejar Que eu quero ir pra casa
1~
Em cima dele montado.
Sem defeito e sem demora. ,~

Iffi
io
::I:
:z Mal o rapaz terminou
O preguiçoso pegou ,H
X

O peixinho com a mão


IH

ia..
'UJ A ultima frase da senha
.o Pulou em cima do feixe
Olhou para ele e jogou
E saiu daquela brenha
De novo no cacimbão.
Montado no espínhcço
Pensando ... Esse peixinho
Daquele feixe de lenha.
Vai ser minha salvação.

E foi logo abrindo a boca E saiu montado nele


E pedindo sem demoro: Num ritmo cadenciado.
Rindo, zombando do tempo
- Ó meu peixinho dourado
Pelas ruas do reinado
Não me falhe nesta hora
Feliz da vida pensado
Eu quero um feixe de lenha
No seu peixinho encantado.
Nos-meus pés aqui agora!
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E no abraço da sorte E com medo se escondeu
Já tinha grudado nele. Trancada no quarto dele
Quando viu numa calçada Chorando dentro do quarto
Direto olhando pra ele Sem ir sequer na janela
Uma mocinha bonita Para seu pai nem ninguém
Sorrindo, zombando dele. Notar como estava ela.

o rapaz vendo a risada Porque se o pai notasse


De troça, que a moça deu. Além de ficar zangado
Ficou com raiva, e de novo Ia ter que castigá-Ia
Do peixinho se valeu: Pois era o rei do reinado
- Peixinho faça essa moça E por ser rei não podia
Ter já, já um filho meu. Por ninguém ser desonrado.

Chegando em casa o rapaz Mas um dia a sua mãe


Deitou-se no seu cantinho Foi ver como estava ela
Comendo do que queria E quando entrou no seu quarto
Sem trabalhar um tiquinho Que viu o estado dela
Vivendo ele e a mãe Do susto que teve quase
Do milagre do peixinho. Que pula pela janela.

A moça que o preguiçoso E imediatamente


Pediu pra ser castigada Mandou chamar o marido
Pelo peixinho dourado Pra ver como estava a filha
Estava desesperada E o que tinha acontecido
Sem saber como e por quem Pra que sua filha tenha
Tinha sido engravidada. De repente adoecido.
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Quando o rei viu sua filha Batendo de porta em porta


Mandou ligeiro chamar O rei chegou no ranchinho
O melhor médico que tinha Onde o preguiçoso estava
Trabalhando no lugar Deitado no seu cantinho.
Pra cuidar de sua filha Abriu a porta e entrou
Dia e noite sem parar. Na frente abrindo caminho.

E de repente chegou Quando o menino avistou


O médico da vizinhança O preguiçoso deitado
Que disse olhando á princesa: Correu para o lado dele
- Muito breve ela descansa, E ficou ali de lado
Pois a sua filha está Dizendo: - Meu pai é este
Esperando uma criança! Que vocês tem procurado.

O rei quando ouviu aquilo O rei pegou sua filha


Soltou um berro e tremeu, A criança e o rapaz
Saiu do quarto da filha Botou os três numa balsa
Penetrou no quarto seu Feita de caixão de gás
E só saiu do seu quarto E mandou botar no mar
Quando o menino nasceu. Pra não vê-los nunca mais.

Com quatro anos depois Quando o preguiçoso viu-se


O rei ainda zangado, No meio do mar bravio
Pegou o neto e a filha Disse: - Valha meu peixinho
E saiu pelo reinado Me livre já deste frio
Procurando o pai do neto Transforme já esta balsa
Que tinha dele zombado. Num luxuoso navio.
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E naquele mesmo instante Todo bordado de ouro
Um pau da balsa quebrou-se De prata, cobre e metal
O mastro caiu de lado Com uma torre enorme
O leme se apartou-se Com um farol de cristal
Mas antes de afundar-se Encandeando as estrelas
Num navio transformou-se. Do espaço sideral.

E ficaram ali morando E ficaram os três vivendo


Um ano dentro do mar Naquele castelo lindo
Naquele belo navio Zornbcmdo os três do tempo
Sem nada ali lhe faltar O tempo todo sorrindo.
Até que o preguiçoso Com a criadagem toda
Enjoou de navegar. Todo tempo lhe servindo.

E novamente pediu Agora é parar um pouco


Ao seu peixinho encantado: Os pés do tempo e voltar
- Eu quero um belo castelo Para ver como ficou
Nem longe nem encostado O rei que quis se vingar.
Do palácio do meu sogro Jogando a filha e o neto
Todo de ouro bordado. E o preguiçoso no mar.

E naquele mesmo instante Depois que o rei jogou


O navio estremeceu Eles três no abandono
Mergulhou nas águas daras Trancou-se num quarto grande
E depois apareceu Escuro como carbono
Em forma de um castelo Com a mão da consciência
Nas terras do sogro seu. Roubando noites de sono
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E numa noite de insônia
Ele viu pela janela Um moço bem parecido
Uma torre muito alta Apareceu no portão
Com uma luz amarela E disse: - Entre seu rei,
E uma bandeira branca Vamos entrar no salão
Balançando em cima dela. E almoçar com a gente
Um saboroso leitão.
Quando o dia amanheceu
O rei chamou um criado O rei não reconhecendo
E disse: - Vá ver a luz O preguiça falou:
Que brilha do outro lado - Vou almoçar com você
Em cima de uma torre Mesmo sem fome, mas vou
Nas terras do meu reinado. Pelo carinho com que
O senhor me convidou,
O criado foi e veio
Num ritmo alto e seguro O rei entrou e ficou
E disse: - Meu rei eu vi Totalmente abobalhado
Todo cercado de muro Olhando a mesa repleta
Um castelo de marfim, De frutas, vinho e guisado.
De cristal e ouro puro. Com os talheres de ouro
Brilhando pra todo lado.
O rei muito curioso
Foi logo ver o castelo A mulher do homem era
Quando chegou no palácio Educada, meiga e bela
Tremeu, ficou amarelo O filho dela sorrindo
Pois nunca que tinha visto Sentado do lado dela.
Outro tão grande e tão belo O rei nunca tinha visto
Uma família daquela.
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O preguiçoso sorriu
E comeu com apetite E disse: :- Vou explicar
Como há tempo não comia Como tudo aconteceu,
Sentindo algo de estranho A hora o dia o lugar ...
Como há tempo não sentia E contou toda historia
Olhando aquela família Sem tirar nem aumentar.
Que ele não conhecia.
o rei pulou de feliz
Qu'ando findou o almoço Perdoou foi perdoado,
O preguiçoso pensou: Comprou sete carros pipa
'Agpra chegou a hora . De cana, vinho e quinado
De saber quem mais errou E disse: - Vou dar seis meses
E fazer roubar quem nunca De festa em todo reinado.
Antes na vida roubou."
Nesse tempo eu tinha ainda
E ali mesmo pensando Coragem de viajar
Se valeu do seu peixinho E como estava ali perto
E apareceu no bolso, . O rei mandou me chamar
Do rei, naquele instantinho E perguntou se eu queria
Duas colheres de ouro Da festa participar.
Enroladas num lencinho.
Eu respondi que queria
Quando o rei se levantou Mas só se o genro dele
Que disse: - Muito obrigado Mandasse logo buscar
O preguiçoso falou: . A mãe pra morar com ele
- Me perdoe meu rei amado Pra ela aqui, acolá
Mas o que o senhor tem Dar umas varadas nele.
No bolso esquerdo guardado?
o preguiçoso ouviu
O rei muito encabulado E disse perdão amigo,
No bolso meteu a mão Vou mandar agora mesmo
E quando viu as colheres Buscar ela em seu abrigo
Disse: - Eu não entendo não Pra ela viver o resto
Me diga como é que pode ' Da vida dela comigo.
Eu roubar sem ser ladrão?
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Quando a velhinha chegou


Mandou buscar Ribamar,
Major Lucena e Concriz
Damião e Luzimar,
Pra cantar coco e canção
Ler romance e declamar.

Mandou buscar em Campina


Grande, Manoel Monteiro,
Em Caucaia Arievaldo
Viana, seu companheiro
Pra desmanchar em cordéis
Aquele reinado inteiro.

Quando a festa terminou


Eu coloquei no bomó
Uma banda de peru,
Três pedaços de mocó,
Eu trouxe pra tira-gosto,
E o resto passar no rosto
Dos ateus de Mossoró.
~\.~ (@}k...
'~12 CONTOS DE~'

CASCUDO EM FOLHETOS DE

,~CORDEL~
-~1i&

.-:; -A So~edo Preguiçoso e o "I


Peixinho Encantado

Autor: Antonio Francisco


Baseado no conto "O Peixinho Encantado",
recolhido por Câmara Cascudo em sua obra
"Contos Tradicionais do Brasil",

Antonio Francisco Teixeira de Meio,


é poeta popular e compositor,
nascido a 21 de outubro de 1949
em Mossoró no Rio Grande do Norte,

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