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RESUMO ABSTRACT
Este artigo é uma apresentação do conceito de This article is a presentation of Walter Benjamin’s
“imagem dialética”, enquanto ponto de convergência "dialectical image", as a point of convergence in his
no vasto pensamento de Walter Benjamin. Na method. In the general formulation presented here, it is
formulação geral aqui exposta, busca-se iniciar a sought to begin the reflection on the role of aesthetic
reflexão sobre o papel da experiência estética nas experience in the possibilities of emancipation in late
possibilidades de emancipação do sujeito no capitalism. A starting point for articulations with the
capitalismo tardio. Propõe-se um ponto de partida contemporary situation is proposed through the concept
para articulações com a situação contemporânea of "critical image" by Georges Didi-Huberman.
através do conceito de “imagem crítica”, elaborado
por Georges Didi-Huberman. Keywords: Aura; Flâneur; Benjamin; Art; Dialectical
Image.
Palavras-chave: Aura; Flâneur; Benjamin; Arte;
Imagem Dialética.
http://dx.doi.org/10.18830/issn.2238362X.n1.2018.3
“A Arte é o meio mais seguro tanto de alienar-se do mundo como de penetrar nele”1
Goethe
Incapaz de elaborar experiência autêntica (Erfahrung), Essa necessidade de recomeço radical pautou muitas 7
que contenha algum conhecimento transmissível, o formas artísticas nessa virada moderna. Benjamin cita O flâneur foi caracterizado por
indivíduo moderno busca se proteger contra os o precursor da arquitetura moderna Adolf Loos e o Baudelaire a partir do conto O
choques sempre presentes no mundo exterior. O pintor Paul Klee como exemplos dessa ruptura14, além homem da Multidão (1 840), de
excesso de estímulos faz pairar sobre ele o spleen11, a de algumas vanguardas artísticas do século XX, que Edgard Allan Poe. No pequeno
melancolia que o faz indiferente, sedado. Sobra assumem a pobreza de experiência e o esfacelamento conto, Poe narra em primeira
pessoa a perseguição a um velho
apenas vivência (Erlebnis), de quem carrega em si a da tradição, construindo uma nova linguagem, não
que caminha sozinho pelas ruas
experiência coletiva do choque da modernidade. A para descrever a realidade, mas para transformá-la a
de Londres, alheio à multidão
indiferença do indivíduo blasé, que se protege dos partir de suas contradições.
frenética. Em Elogio aos Errantes
choques, caracteriza o sujeito impedido de (201 4), Jacques apresenta e
experimentar. A questão está na incapacidade de A mutação da arte na modernidade é teorizada por contextualiza os tipos de
transformar vivência em experiência coletiva e Benjamin ao redor do conceito de aura, consagrado errâncias urbanas, justificando-
também de experimentar verdadeiramente a no ensaio A Obra de arte na era de sua as uma sob orientação contra-
experiência coletiva transmitida. Último capaz de reprodutibilidade técnica (1936), no qual é definido hegemônica. As errâncias
experimentar a cidade, o flâneur de Baudelaire contém como “aparição única de algo distante”. O caráter urbanas criticam o urbanismo
em si o indivíduo blasé de Simmel12, ambiguamente. único da obra teria dado lugar a sua multiplicidade, moderno e acontecem em Paris
graças às novas possibilidades de reprodução simultaneamente às três fases
mecânica. A arte que vigorava até então, carregada de de seu desenvolvimento. A
Pobreza de experiência e perda valores arcaicos e sacralidade, tem o que Benjamin
primeira modernização (meados
da aura chama de “valor de culto”. A arte moderna,
do século XIX ao início do século
XX), com a reforma urbana do
No capitalismo a infraestrutura impacta na produção reprodutível para as massas e sem “sacralidade”, tem prefeito Haussmann, Baudelaire
cultural: a divisão do trabalho subtrai o tempo e a “valor de exposição”. Analogamente ao processo de escreve sobre as transformações
sensibilidade vital para a experiência autêntica. metamorfose da mercadoria em Marx, seu valor de ocorridas na cidade. O flâneur
Assim, o que tem condições para ser transmitido, troca se sobrepõe ao valor de uso15. Para Benjamin, a aparece em Spleen de Paris
está fragmentado, quebrado, descontinuado. A relação aurática (entre obra e receptor) implica na (1 869) e As Flores do Mal (1 861 ), e
estética do choque é formada por esses fragmentos inacessibilidade. “Em lugar da recepção contemplativa é recriado nos anos 1 930 por
e descontinuidades que surgem da pobreza de característica do indivíduo burguês, deve surgir uma Benjamin. As flanâncias seriam
experiência: recepção característica das massas, ao mesmo tempo portanto o primeiro tipo de
distraída e racionalmente verificadora. Em lugar de errância urbana na modernidade.
Pobreza de experiência: a expressão não O segundo momento, das
basear-se no ritual, ela se funda, daí por diante, na
significa que as pessoas sintam a deambulações, (de 1 930 a 1 940)
política”. (BÜRGER, 2008, p.62)
nostalgia de uma nova experiência. Não, fez parte das vanguardas
o que elas anseiam é libertar-se das modernas, e consistiam em
Imagemdialéticaeimagemcrítica:conceitosbenjaminianosparapensararteeemancipação 29
ações surrealistas, dadaístas, de Antes da criação da categoria da aura, Benjamin reflete tempo no qual as obras são inseridas17. O que mais
deambulações aleatórias que sobre a natureza, interpretação e crítica de arte no importa, para o pensador, não é o que o passado teria
evidenciavam as experiências ensaio intitulado As afinidades eletivas de Goethe a dizer ao presente, mas o motivo do interesse do
físicas no espaço urbano real, ao (1922)16. Partindo da distinção entre “teor factual” e presente em certos eventos do passado (GAGNEBIN,
mesmo tempo criticavam
“teor de verdade” na obra de arte, o autor considera 2014, p.201). É o confronto entre passado (memória)
algumas das ideias urbanísticas
que no momento de sua concepção, ambos os teores e presente que permite o desvelamento do elemento
do início dos CIAM ( Congrès
estariam unidos na obra e que estes vão se separando: oculto do passado na atualidade (Aktualität). Essa
Internationaux d’Architecture
Moderne). O terceiro momento, “teor factual e o teor de verdade, que inicialmente se outra história só se torna possível através de um
das derivas (fim dos 1 950-1 960), encontravam unidos na obra, separam-se na medida processo de rememoração, no sentido de
é uma crítica aos pressupostos em que ela vai perdurando, uma vez que este último reivindicação de um esquecimento, como acontece
básicos dos CIAM e do sempre se mantém oculto, enquanto aquele se coloca no sonho. Despertar é consolidar essa ruptura. E para
modernismo, pelos situacionistas em primeiro plano” (BENJAMIN, 2009, p. 12-13). O despertar do sonho é preciso despertar para o sonho18.
(JACQUES, 201 2, p. 32-33). ponto de partida da crítica corresponderia a um Daí a consciência de si se faz necessária na
estranhamento nascido do confronto entre o teor reivindicação da memória esquecida, oprimida, de
8 factual da obra e o momento histórico ao qual sofrimento e exploração. O rememorado então se
Ligado ao “trauma” em Freud: pertence o crítico. “Neste sentido, a história das obras choca com o presente, faz emergir as contradições da
“Pode-se mesmo dizer que o prepara a sua crítica e, em consequência, a distância realidade e se impõe como alegoria19 que mostra a
termo "traumático" não tem histórica aumenta o seu poder” (BENJAMIN, 2009, p. história como ruína de algo que não aconteceu:
outro sentido que econômico.
13). A investigação deste estranhamento apresenta-
Chamamos assim a uma Mas a própria história é uma ruína
se como única maneira de desvelar seu teor de
experiência vivida que leva à alegórica: ruína enquanto resto das
verdade. No momento dialético do pensar, “a crítica
vida da alma, num curto espaço possibilidades possíveis (e, talvez,
de tempo, um acréscimo de levaria a obra à consciência de si mesma” (KOTHE,
desejáveis), das quais ela só concretizou
estímulos tão grande que sua 1976, p. 17). Para Benjamin a verdade “funda-se na
uma; nesta concretização, porém, se
liquidação ou elaboração, pelos codificação histórica”, está em constante movimento
encontra o índice das outras histórias
meios normais e habituais, e mutação: é a verdade de um específico tempo,
possíveis. Precisamente daí surge a
fracassa, o que não pode deixar nascida de seu confronto com o tempo da obra. Essa possibilidade ontológica do encontro da
de acarretar perturbações relação de distâncias de tempos, de passado que obra de arte com a história (KOTHE,
duradouras no funcionamento fulgura no agora da obra, caracteriza o “índice 1976, p. 47).
energético”. FREUD, Sigmund. histórico”.
1 91 6-1 7: A General Introduction to A memória involuntária20 não obedece à cronologia
Psychoanalysis. SE 1 5 e 1 6.
linear. Essa sobreposição de temporalidades no
Historiografia dos vencidos e “agora” fulgura na “imagem dialética” e sua
9 imagem dialética alegorização lhe confere legibilidade e
Ver os ensaios compilados em
O pensador marxista Michael Löwy inicia o prefácio reconhecimento do tempo histórico presente:
BENJAMIN, Walter. Baudelaire e a
de O capitalismo como religião (1921) afirmando a “Somente a tentativa de parar o tempo pode permitir
Modernidade/ Walter Benjamin.
Trad. João Barrento. Belo posição singular de Walter Benjamin na história do a uma outra história vir à tona, a uma esperança de ser
Horizonte: Autêntica, 201 5. pensamento moderno: “é o primeiro seguidor do resguardada em vez de soçobrar na aceleração
materialismo histórico a romper radicalmente com imposta pela produção capitalista” (GAGNEBIN, 2014,
10 a ideologia do progresso linear” (BENJAMIN, 2013, p. 98). O realismo da arte moderna está em seu caráter
Ver DEBORD, Guy. A Sociedade do p. 7). Benjamin rejeita o culto ao progresso, uma vez alegórico, quando denuncia a crueldade destruidora
Espetáculo (1 967), texto crítico à que a técnica estaria a serviço da classe dominante da organização capitalista, mais do que quando se
sociedade de imagética de e que a história oficial seria constituída por suas pretende totalizar simbolicamente. A negatividade da
consumo. vitórias. O progresso, portanto, não guiaria a alegoria para ele é “denúncia e abrigo da esperança”.
sociedade à superação do capitalismo, somente à Nas palavras de Benjamin:
11 catástrofe: “A catástrofe é o progresso, o progresso
O índice histórico das imagens diz, pois,
Ver BAUDELAIRE, Charles. O é a catástrofe. A catástrofe é o contínuo da história”
Spleen de Paris: pequenos não apenas que elas pertencem a uma
(BENJAMIN apud LÖWY, 2002, p. 205). Assim,
poemas em prosa. Porto Alegre: determinada época, mas, sobretudo,
subverter a noção tradicional de história, por meio
L&M, 201 6 e os ensaios de Walter que elas só se tornam legíveis numa
de uma “historiografia dos vencidos”, abre para
Benjamin sobre Baudelaire. determinada época. E atingir essa
possibilidades de caráter emancipatório.
legibilidade constitui um determinado
12 ponto crítico específico do movimento
No livro das Passagens, sua última e inacabada obra, em seu interior. Todo o presente é
Ver SIMMEL, Georg. A Metrópole e
Benjamin questiona a eficácia das abordagens determinado por aquelas imagens que
a vida mental. In: VELHO, Otavio
historiográficas justificadas pela contextualização do lhe são sincrônicas: cada agora é o agora
Imagemdialéticaeimagemcrítica:conceitosbenjaminianosparapensararteeemancipação 31
20 são descritas. Os dadaístas davam muito Nesta medida o Moderno é um mito
“ mémoire involontaire”, em menos importância à utilidade mercantil voltado contra si mesmo; a sua
Proust. Ver Em busca do tempo de suas obras de arte do que a intemporalidade torna-se catástrofe do
perdido , 1 91 3-1 927. impossibilidade de serem utilizadas instante que rompe a continuidade
como objeto de meditação temporal. O conceito de Benjamin de
21 contemplativa. (BENJAMIN, 2017, p. 41) “imagem dialética” encerra este
Zizek diz ao entrevistador Tavis momento. Mesmo quando o Moderno
Por outro lado, o princípio de montagem da estética conserva, enquanto técnicas, aquisições
Smiley, em 201 5: “ But this X
fragmentada do choque promove a massificação das tradicionais, estas são suprimidas pelo
paradoxically opens up a new
freedom for us, all that white formas artísticas através da sua reprodução. Fotografia choque que não deixa nenhuma
people want to be, not primitive e cinema se desenvolvem como linguagens essenciais herança intacta. Assim como a categoria
tribal, but universal, creating ao funcionamento da indústria cultural, embora os do Novo resultava do processo histórico,
their own space. We, black conteúdos claramente se distingam dentro das que dissolve primeiro a tradição
people, have a unique chance linguagens. O caráter mercadológico da arte, valor de específica e, em seguida, toda e
not to become, not to return to exposição, aumenta numa relação entre distração e qualquer tradição, assim o Moderno não
our particularities, to be more atenção. É o entretenimento. “O cinema restringe o é nenhuma aberração que se deixaria
universal, emancipated than valor de culto não só porque coloca o público numa corrigir, regressando a um terreno que já
white people themselves. You não existe e não mais deve existir; isto é
atitude de apreciação valorativa, mas também porque
see, this is the important thing paradoxalmente o fundamento do
no cinema não inclui o fator atenção. O público é um
for me. ” Tradução nossa. Vídeo
examinador, mas um examinador distraído” Moderno e confere-lhe o seu caráter
disponível em
(BENJAMIN, 2017, p. 45). Se a arte aurática está morta, normativo. (ADORNO, 1970, p. 35)
https:/ / www.youtube.com/ watch
?v=8iMH1 6pPq38. tudo é visível? Todas as imagens já foram vistas? O que
por uns foi considerado fim da arte, para outros A oposição enquanto finalidade torna a vanguarda
22 apareceu como ruínas violentas, propositalmente norma, para Adorno, que condiciona a sobrevivência
Onde se aproxima da “síntese chocantes. da arte enquanto arte à contínua superação da
figurativa” de Kant, num vanguarda a si mesma (KOTHE, 1978, p. 208-209).
esquema de representação Em Teoria da vanguarda, publicado em 1974, Peter Adorno não postula o fim da arte, mas sua necessidade
imagética que sintetiza o aparato Bürger explica que na obra vanguardista, o receptor de saltar para o vazio como única possibilidade de seu
conceitual. experimenta essa recusa do sentido como choque, renascimento. Ultrapassado o moderno, o que nos
que é intencionado pelo artista que pretende alertar resta?
23 o receptor para a necessidade de transformação de
Utilizada a 5ª. versão do ensaio, sua própria práxis vital. Para Bürger é questionável se Embora, de acordo com a tese hegeliana, o deus que
traduzida por João Barrento. a provocação não reforça as posturas existentes, além sacralizava a arte aurática tenha morrido,
Embora o título dessa tradução da impossibilidade de tornar duradouro esse tipo de características do templo sagrado estão conservadas
seja A Obra de arte na época da
efeito: “um choque assim, já quase institucionalizado, nos museus24. O cânone da arte, seu valor
possibilidade de sua reprodução
pode produzir um mínimo de efeito sobre a práxis vital mercadológico, ainda que a obra não seja
técnica , optei por adotar o título
do receptor. Ele acaba sendo ‘consumido’” (BÜRGER, comercializável, gera novo valor de culto por apoiar-
mais conhecido no Brasil, de
traduções de versões anteriores. 2012, p.145). Para Adorno, a obra vanguardista é a se na relação com os bens de consumo. Para Adorno,
única expressão autêntica possível do atual estado do “numa época de superprodução, o seu valor de uso se
mundo. Ela aparece como expressão historicamente torna também problemático e se submete finalmente
necessária da alienação na sociedade do capitalismo ao deleite secundário do prestígio, da moda e do
tardio (BÜRGER, 2012, p.152-153), ao mesmo tempo próprio caráter de mercadoria: paródia da aparência
em que ele critica esse momento da arte moderna em estética” (ADORNO, 1970, p. 27). Para Bürger, “a
sua Teoria Estética, escrita em 1968: construção benjaminiana da história ignora a
emancipação da arte frente ao sagrado operada pela
Os sinais da desorganização são o selo
burguesia.” Pode ter ocorrido uma ressacralização,
de autenticidade do modernismo;
rerritualização da arte, quando ela produz um ritual a
aquilo pelo qual ela nega
partir de si mesma. “Em vez de inserir-se na esfera do
desesperadamente o encerramento da
sagrado, ela assume o lugar da religião” (BÜRGER,
invariância. A explosão é um dos seus
2012, p.63).
invariantes. A energia antitradicionalista
transforma-se em turbilhão devorador.
Imagemdialéticaeimagemcrítica:conceitosbenjaminianosparapensararteeemancipação 33
25 também tempo) promove novas experimentações ao mesmo tempo ao mostrar, remete a algo distante.
Reproduzo nota do autor: emancipatórias. Por isso Didi-Huberman insiste no Nem tudo que se apresenta como arte tem teor de
“ Symptôma , em grego, é o que anacronismo enquanto ferramenta do olhar crítico, verdade. O que Didi-Huberman defende é que as
sucumbe ou cai com. É o
que atualiza os tempos pretéritos pela memória. Em imagens críticas demonstram a possibilidade de uma
encontro fortuito, a coincidência,
seu livro O que vemos, o que nos olha (1988), o autor imaginação política quando indiciam a história dos
o acontecimento que vem
perturbar a ordem das coisas – postula que não há que se escolher entre o que vemos vencidos, a partir de gestos que explicitam a
de forma previsível mas e o que nos olha. Há que se inquietar com o entre – indestrutibilidade do desejo.
soberana.” (DIDI-HUBERMAN, momento que não impõe nem o excesso de sentido,
201 5, p.65) nem a ausência cínica de sentido. “É quando o que A “tradição dos oprimidos” de Benjamin é recolocada
nos olha nos invade”. Para o autor, o “homem da na sociedade pós-industrial, de arte sem aura, mas
26 crença” é aquele que precisa do culto e o “homem da com sintoma, nova forma aurática “secularizada” da
Ver HEIDEGGER, Martin. A Origem tautologia”, o que não enxerga nada além do visível. era da superreprodutibilidade técnica, aquela à qual
da Obra de Arte. Trad. Idalina Nenhum dos dois consegue se abrir para a “imagem Adorno apontou. Sem ignorar a onipresença do
Azevedo e Manuel Antonio de crítica”, porque nenhum deles é crítico. capital, a situação tenebrosa como chama Agamben,
Castro. São Paulo: Edições 70, Didi-Huberman diz:
201 0. A partir de Benjamin, Didi-Huberman entende a obras
A arte não nos salva de nada. No pior
como desvelamento das contradições, imagens em
27 dos casos é uma forma de recobrir as
crise, cujo entre aurático se manifesta enquanto
Marx explica a “subjetividade coisas com um verniz e esquecer o que
sintoma: “A dificuldade sendo agora olhar o que
sem substância” nos Grundrisse está embaixo. A arte não ter valor em si.
permanece (visível), convocando o que desapareceu:
e Alain Badiou retoma em sua Especialmente porque é absorvida pelo
em suma, perscrutando os rastros visuais desse
“hipótese comunista”, mercado. (...) No melhor dos casos, a
desaparecimento, o que antes chamamos: seus
desenvolvida também por Zizek. arte provoca o impensado, o recalcado,
Ver sobre a radicalização do sintomas.”25 (DIDI-HUBERMAN, 2015, p. 65). O um real. E então, é magnífica no que isso
proletariado em ZIZEK, Slavoj. “lampejo” da imagem dialética de Benjamin é a abre de possibilidades e permite o
Primeiro como tragédia, depois “aparição” da nova aura que é sintoma, antitética em exercício de uma imaginação política.
como farsa . São Paulo: Boitempo, si mesma, negativa, ou seja, imagem crítica, que por (DIDI-HUBERMAN, 2016)
201 1 . sua vez transmite a crítica ao sujeito crítico que a narra.
Isso implica na consciência da perda que todo saber O exercício de imaginação política abre para o sentido
impõe: a obra de arte como ruína. Uma imagem que da “organização do pessimismo” no espaço das
critica a imagem – capaz, portanto, de um efeito, de imagens, como diria Benjamin. É preciso estar
uma “eficácia teórica – e, por isso, uma imagem que desperto para enxergar e produzir imagens contra-
critica nossas maneiras de vê-la, na medida em que, hegemônicas “duradouras do passageiro” e trazê-las
ao nos olhar, ela nos obriga a olhá-la verdadeiramente. à narração. As imagens em crise, os sintomas são, na
E nos obriga a escrever esse olhar, não para transcrevê- ordem capitalista, contradições necessárias e
lo, mas para constituí-lo” (DIDI-HUBERMAN, 1998, p. estruturantes que mostram o real da “subjetividade
172). sem substância”27 do proletário contemporâneo.
Deve-se radicalizar a noção de proletariado para um
Coloca-se aura na contemporaneidade enquanto nível existencial e catastrófico de descontinuação do
índice de transcendência, um jogo de distâncias que progresso. Somos todos pobres vivenciadores de
determina a própria natureza da obra de arte, ligado barbárie em meio à multidão, alguns ainda com um
ao que dizia Heidegger26. O acontecer da verdade na pouco de memória e imaginação, capazes de perceber
obra envolve que aquilo seja indiciado, sugerido, o caráter religioso do capitalismo.
numa ampliação da alegoria. Acontece mostrando e
BÜRGER, Peter. Teoria da vanguarda. Trad. José Pedro ZIZEK, Slavoj. Acontecimento: uma viagem filosófica
Antunes. São Paulo: Cosac Naify, 2012. através de um conceito. Trad. Carlos Alberto Medeiros.
Rio de Janeiro: Zahar, 2017.
DIDI-HUBERMAN, Georges. O Que Vemos, O Que Nos
Olha. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Ed. 34, 1998. ___________. Primeiro como tragédia, depois como
farsa. Trad. Maria Beatriz de Medina. São Paulo:
_______________. Diante da Imagem. Trad. Paulo Boitempo, 2011.
Neves. São Paulo: Editora 34, 2015.
Imagemdialéticaeimagemcrítica:conceitosbenjaminianosparapensararteeemancipação 35