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Educação Literária
A (80 pontos)
Enfim, que havemos de pregar hoje aos peixes? Nunca pior auditório. Ao
menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem, e não falam. Uma
só cousa pudera desconsolar ao Pregador, que é serem gente os peixes, que se não
há de converter. Mas esta dor é tão ordinária que já pelo costume quase se não
5 sente. Por esta causa não falarei hoje em Céu, nem Inferno; e assim será me nos
triste este Sermão, do que os meus parecem aos homens, pelos encaminhar sempre à
lembrança destes dois fins.
Vos estis sal terrae. Haveis de saber, irmãos peixes, que o sal, filho do mar
como vós, tem duas propriedades, as quais em vós mesmos se experimentam:
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conservar o são, e preservá-lo, para que se não corrompa. Estas mesmas
0 propriedades tinham as pregações do vosso Pregador S. António, como também
as devem ter as de todos os Pregadores. Uma é louvar o bem, outra repreender o
mal: louvar o bem para o conservar, e repreender o mal, para preservar dele. Nem
cuideis, que isto pertence só aos homens, porque também nos peixes tem seu
lugar. Assim o diz o grande Doutor da Igreja São Basílio: Non carpere solum,
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5 reprehendereque possumus pisoes, sed sunt in illis, et quae prosequenda sunt
imitatione . Não só há que notar, diz o Santo, e que repreender nos peixes, senão
também que imitar, e louvar. Quando Cristo compa rou a sua Igreja à rede de
pescar, Sagenae missae in mare, diz que os pescadores recolheram os peixes
bons, e lançaram fora os maus: Colegerunt bonos in vasa, malos autem foras
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miserunt. E onde há bons, e maus, há que louvar, e que repreender. Su posto isto,
0 para que procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso Sermão em dois
pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas virtudes, no segundo repreender-vos-
ei os vossos vícios. E desta maneira satisfaremos às obrigações do sal, que me -
lhor vos está ouvi-las vivos, que experimentá-las depois de mortos.
Começando pois pelos vossos louvores, irmãos peixes, bem vos pudera eu
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5 dizer, que entre todas as criaturas viventes, e sensitivas, vós fostes as primeiras
que Deus criou. ( ... )
Pe. António Vieira, Sermão de Santo António.
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PALAVRAS 11
B (20 pontos)
5. Explicita, num texto de oitenta a cento e trinta palavras, exemplificando, o modo como se
concretiza, no “Sermão de Santo António (aos Peixes)", a alegoria de intuitos críticos.
OU
B (20 pontos)
Lê o seguinte texto.
5.
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Nas naus estar se deixa vagaroso,
Até ver o que o tempo lhe descobre:
Que não se fia já do cobiçoso
Regedor corrompido e pouco nobre.
Veja agora o juízo curioso
Quanto no rico, assim como no pobre,
Pode o vil interesse e sede inimiga
Do dinheiro, que a tudo nos obriga.
(…)
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Este rende munidas fortalezas,
Faz tredores e falsos os amigos:
Este a mais nobres faz fazer vilezas,
E entrega Capitães aos inimigos;
Este corrompe virginais purezas,
Sem temer de honra ou fama alguns perigos:
Este deprava às vezes as ciências,
Os juízos cegando e as consciências;
Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto VIII.
5. Identifica o tema deste momento de crítica, fundamentando a resposta com elementos textuais.
6. Explicita a abrangência da crítica do Poeta.
2. Tanto no “Sermão de Santo António (aos Peixes)”, de Padre A. Vieira, como em Payassu
(A) a reação do público é imprescindível à atuação.
(B) há pregação religiosa pelo facto de ambos se assumirem como sermões.
(C) há um forte recurso à oralidade.
(D) assiste-se a um jogo de linguagens.
(C) um exemplo.
(D) uma explicação.
Para fundamentares o teu ponto de vista, de forma clara e pertinente, recorre a dois
argumentos, ilustrando cada um deles com um exemplo concreto e significativo.
Bom trabalho!