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Ficha de Trabalho

Português – Módulo 4
Grupo I
Leia com atenção, o texto que se segue.
5 A
Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra, que se não deixa salgar, que se lhe há de fazer? Este ponto
não resolveu Cristo Senhor nosso no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António, que
hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou. Pregava Santo António em Itália na cidade de
Arimino, contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia
10 fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele, e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o
ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés
descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés, a que se não pegou nada da terra, não tinham que sacudir. Que faria logo?
Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência, ou a covardia humana; mas
o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o
15 auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas
vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh, maravilhas do Altíssimo! Oh, poderes do que criou o mar
e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por
sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam.
Se a Igreja quer que preguemos de Santo António sobre o Evangelho, dê-nos outro. Vos estis sal terrae. É muito bom o
20 texto para os outros santos doutores; mas para Santo António vem-lhe muito curto. Os outros santos doutores da Igreja foram sal
da terra. Santo António foi sal da terra e foi sal do mar. Este é o assunto que eu tinha para tomar hoje. Mas há muitos dias que
tenho metido no pensamento que nas festas dos santos é melhor pregar como eles, que pregar deles. Quanto mais que o são da
minha doutrina, qualquer que ele seja, tem tido nesta terra uma fortuna tão parecida à de Santo António em Arimino, que é força
segui-la em tudo. Muitas vezes vos tenho pregado nesta igreja, e noutras, de manhã e de tarde, de dia e de noite, sempre com
25 doutrina muito clara, muito sólida, muito verdadeira, e a que mais necessária e importante é a esta terra, para emenda e reforma
dos vícios que a corrompem. O fruto que tenho colhido desta doutrina, e se a terra tem tomado o sal, ou se tem tomado dele, vós o
sabeis e eu por vós o sinto.
Isto suposto, quero hoje, à imitação de Santo António, voltar-me da terra ao mar e, já que os homens se não aproveitam,
pregar aos peixes. O mar está tão perto que bem me ouvirão. Os demais podem deixar o sermão, pois não é para eles. Maria, quer
30 dizer. Domina maris: “Senhora do mar”; e posto que o assunto seja tão desusado, espero que me não falte com a costumada graça.
Ave Maria.

“Sermão de Santo António”, Padre António Vieira, in Sermão de Santo António e outros textos, Oficina do Livro, agosto de 2008

Responda com clareza e correção às seguintes perguntas.

35 1. Insira o excerto na obra a que pertence, atendendo à sua estrutura interna e externa.
2. Exponha as razões da referência a Santo António neste passo do Sermão.
2.1. Apresente três traços caracterizadores da figura referenciada, recorrendo à fundamentação textual.
3. Identifique, justificando, no segmento textual apresentado, as razões da pregação deste sermão do Padre António Vieira.
4. Proceda ao levantamento de dois recursos expressivos, comentando a sua expressividade.
40 5. Explique por que razão se pode afirmar que o Sermão de Santo António aos Peixes é uma alegoria.

45 6. Faça corresponder cada uma das figuras de estilo da coluna da esquerda à respetiva definição na coluna da direita.

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A. Alegoria 1. Consiste na apresentação de vários elementos segundo uma ordem crescente ou decrescente.
B. Hipérbole 2. Consiste em estabelecer uma relação de semelhança através de uma palavra ou expressão
comparativa ou de verbos a ela equivalentes (parecer, lembrar, sugerir, etc.).
C. Comparação 3. Consiste no emprego de termos exagerados, para realçar determinada realidade.
D. Eufemismo 4. É uma espécie de comparação abreviada, pois deu-se o desaparecimento da palavra ou expressão
comparativa. Existe assim um certo efeito de surpresa, porque a palavra passa a ter, no contexto, um
significado que vai mais além do que o que lhe é habitual.
E. Gradação 5. Consiste em apresentar um contraste entre duas ideias ou coisas, o qual é posto em grande
evidência pela oposição das palavras que designam cada uma dessas ideias ou coisas (relação de
contrários).
F. Antítese 6. Consiste em transmitir de forma suavizada uma ideia ou realidade que é considerada violenta ou
chocante.
G. Metáfora 7. consiste numa sucessão de imagens em que ocorre, normalmente, a personificação de seres, objetos
ou ideias abstratas.
B
Num texto, entre oitenta e cento e trinta palavras, explique o conceito predicável do sermão e refira o modo como as duas
obrigações do sal se concretizam no Sermão de Santo António, de Padre António Vieira.

Grupo II

50 Lê, com atenção, o texto que se segue.

No espetáculo Payassu, fazemos uso das tecnologias de manipulação de imagem, promovendo a interação de figuras
projetadas com o discurso de Vieira, o espaço cénico e as ações do ator, de uma forma absolutamente orgânica. Na gestão dos
recursos narrativos, quer plásticos quer cénicos, evitámos a mera ilustração do sermão e a coincidência de signos, especialmente
os concorrentes com as imagens sugeridas pelo texto, já de si muito rico e profuso. A relação entre a multimédia, o teatro e as artes
5 plásticas desenvolveu-se pelo processo de identificação, incorporação e fusão de elementos expressivos, e não pela sua simples
combinação sequencial.
Existe, ainda, na abordagem interpretativa do Sermão, uma questão importante: a oratória funciona como discurso direto,
objetivo e frontal, procurando convencer o público, argumentando, provando, lançando reptos e propondo respostas. É um
instrumento moralizador e edificante, no intuito de corrigir / melhorar a humanidade. Esta característica, que em Vieira ultrapassa os
10 recursos do contador de estórias, é comum a todos os que têm o ofício de sal — políticos, professores, legisladores, religiosos — e
concentra a ação dramática do ator (construindo alguma dessas personagens) no exercício da pregação, na sua profunda e intensa
oralidade. Em Payassu, o parateatral sobrepõe-se ao teatro, na perspetiva do público, que vê um pregador religioso. Mas o teatro
esconde-se na oratória, pois não temos orador, temos ator; não temos sermão; temos teatro. Para mais, no Sermão de Santo
António aos Peixes, existe outro jogo de metalinguagem, que confunde e complica este juízo de frontalidade: Vieira não prega aos
15 homens, prega aos peixes para pregar aos homens. Um jogo de ilusão, um malabarismo dialético, tanto barroco como
contemporâneo, um caminho tão válido hoje como ontem. Evidente é que tudo isso dificulta o trabalho do ator, que tem de percorrer
um labirinto de olhares, insinuações, alternâncias e subtilezas, oscilando entre um público real e um mundo aquático virtual.

Payassu, o Verbo do Pai Grande (caderno de criação do espetáculo), Teatro de Formas Animadas de Vila do Conde (texto adaptado e
com supressões)

20 1. Selecione a opção correta.

1.1. De acordo com a informação do texto, o espetáculo Payassu


A. oferece uma diversidade de recursos complementares ao discurso vieiriano.
B. é uma representação teatral em que o ator joga apenas com o discurso de Padre António Vieira.

C. apresenta-se como a atualização da mensagem de Padre António Vieira.

25 D. reveste-se de uma plasticidade surpreendente, de forma a superar a ausência do texto vieiriano.

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1.2. Tanto no Sermão de Santo António aos Peixes, de Padre António Vieira, como em Payassu
A. a reação do público é imprescindível à atuação.
B. há pregação religiosa, pelo facto de ambos se assumirem como sermões.

30 C. verifica-se o recurso ao discurso indireto.

D. assiste-se a um jogo de linguagens.

1.3. O sujeito da oração “fazemos uso das tecnologias de manipulação de imagem” (l 1) é


A. nulo subentendido.
B. nulo indeterminado.

35 C. nulo expletivo.

D. simples.

1.4. O segmento “a interação de figuras projetadas com o discurso de Vieira, o espaço cénico e as ações do ator” (ll 1-2)
corresponde
A. ao sujeito.
40 B. ao modificador.
C. ao complemento direto.
D. ao predicativo do sujeito.

1.5. Na expressão “quer plásticos quer cénicos” (l 3), verifica-se uma relação de
45 A. oposição.
B. alternância.

C. condição.

D. adição.

1.6. No segmento “a oratória funciona como discurso direto, objetivo e frontal, procurando convencer o público, argumentando,
50 provando, lançando reptos e propondo respostas. É um instrumento moralizador e edificante” (ll 8,9), a secção sublinhada
desempenha a função sintática de
A. sujeito.
B. Predicativo do sujeito.

C. Complemento do nome.

55 D. Complemento direto.

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