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Parte I

Projeto de Compostos e
Estruturas-sanduíche

1
Capítulo 1

Tipos de compostos, fibras e matrizes

Este capítulo dedica-se a uma série de aspectos qualitativos referentes aos materiais compostos. Uma
razoável familiaridade com esses aspectos é fundamental antes que se passe às formulações matemáticas
que serão objeto de diversos dos demais capítulos. Basicamente, serão considerados aqui aspectos como
tipos de compostos existentes, características dos compostos reforçados por fibras de alto desempenho,
características e propriedades das fibras e de diversos tipos de polímeros usados como matrizes e,
finalmente, características de alguns processos de fabricação de compostos. xo , xo . xo , xo .

1.1 Definição e tipos de material composto


Inicialmente é importante contar com uma definição formal do que se entende por materiais compostos.
Consideramos que:

Um material composto é um conjunto de dois ou mais materiais diferentes,


combinados em escala macroscópica, para funcionarem como uma unidade,
visando obter um conjunto de propriedades que nenhum dos componentes
individualmente apresenta.

Todos os termos da definição são de fácil compreensão, mas um deles merece cuidado especial,
que é o de especificar que os componentes aparecem em escala macroscópica no composto. Isso para
distingui-lo das ligas, por exemplo, nas quais também são combinados diferentes materiais, como o
ferro e manganês no aço, mas em escala atˆomica. Nos compostos, a escala de dimensões das inclusões
é tipicamente da ordem de um micrometro ou maior.
O conceito de material composto é uma ferramenta filosófica poderosa no sentido de que ele permite
ao engenheiro, até certo ponto, criar um novo material, enfatizando certas características desejáveis,
enquanto minimiza outras indesejáveis, por meio da combinação de componentes. Uma gama bastante
ampla de aspectos de comportamento do material pode ser manipulada no projeto de um composto,
e efetivamente é, como por exemplo:

•Resistência estática e à fadiga; •Capacidade de trabalho a alta e baixa temperatura;


•Rigidez; •Isolamento ou condutividade térmica, elétrica ou acústica;
•Resistência à corrosão; •Dureza, dutilidade;
•Resistência à abrasão; •Aparência estética.
•Redução de peso;

3
Capítulo 1. Tipos de compostos, fibras e matrizes 15

Figura 1.4: Diferentes tipos de tramas para tecidos de fibra de vidro.

módulo de elasticidade bastante baixos. Isso ocorre em virtude das ondulações que cada mecha faz ao
longo da trama. Durante a aplicação de carga uniaxial, as ondulações primeiro tendem a se endireitar
antes de começar a suportar cargas. Isso pode resultar em deformações exageradas, ocasionando falta
de rigidez.
Tecidos com nível superior de rigidez são conseguidos com tramas irregulares como a da Figura
1.4c, que mostra uma trama tipo cetim. Existem dezenas de diferentes tramas. No caso do cetim,
cada fio sofre menor número de ondulações, estendendo-se em linha reta por extensões mais longas.
A forma mais rígida possível é conseguida com feixes de fios ou mechas paralelas. Obviamente esse
tipo de conjunto por si só seria impossível de ser manipulado. Duas formas de conseguir esses feixes
unidirecionais são:
• Com o auxílio de fios mais finos na direção transversal, responsáveis apenas por manter as mechas
unidas. As mechas não são onduladas.
• Outra forma, freqüentemente construída em oficina, consiste em costurar as fileiras paralelas de
mechas em costuras colocadas a distâncias regulares, de forma a conseguir uma manta unidire-
cional e manipulável.
Por causa do custo e da facilidade de manuseio, os tecidos são bastante usados na construção
de grandes peças e como partes de fuselagem de aviões, cascos de barcos e dutos. Um tecido de
342 g/m2 , por exemplo, pode gerar uma lâmina de cerca de 1 mm de espessura. De forma geral, os
tecidos permitem a construção de grandes espessuras com poucas camadas, o que simplifica o processo
construtivo manual. Ao mesmo tempo, grandes extensões podem ser cobertas pela sobreposição de
peças de tecido, formando uma estrutura contínua, sem emendas ou uniões, de espessura praticamente
uniforme.
Fibra moída (milled fiber )
Mechas de fibras contínuas podem ser moídas a comprimentos de 0,14 mm a 6,5 mm. São usadas
como carga, ou seja, misturadas à resina de forma a alterar sua resistência mecânica.

Uso atual da fibra de vidro


Características como resistência e rigidez, aliadas ao baixo custo, fazem com que a fibra de vidro
seja usada numa ampla faixa de componentes. Tradicionalmente esses componentes se restringiam
18 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

Tabela 1.8: Propriedades típicas de monocristais.

densidade temperatura resistência módulo módulo resistência


Material ρf , kg/m3 de fusão ◦ C σ Rf , MPa Ef , GPa Ef /ρf σ Rf /ρf
Óxido de 3.890 2.080 14.000 a 700 a 3,6 a 180 a
alumínio, Al2 O3 27.000 2.400 6,9 617
Carbeto de 2.495 2.450 6.700 450 2,7 180
boro, B4 C
Grafite 2.250 3.590 20.700 1.000 9,2 444
Carbeto de 2.147 2.315 6.900 a 700 a 2,2 a 222 a
silicio α, SiC 34.000 1.000 10,8 318
Ferro 7.820 - 13.000 207 1,7 27
Cobre 8.900 - 3.000 125 0,34 14
Níquel 8.951 - 3.900 215 0,44 24

O uso de asbesto como reforço de resina fenólica pode gerar compostos com temperatura máxima
de trabalho contínuo entre 200o C a 320o C. Tecido de asbesto em silicone gera compostos para a faixa
de 230o C a 400o C. Tecidos de vidro podem levar à mesma faixa de temperatura de trabalho.

1.2.6 Fibras cerâmicas


As fibras cerâmicas são usadas como reforço de matrizes metálicas e cerâmicas em aplicações de altas
temperaturas. Elas combinam alta resistência e rigidez com resistência térmica e resistência a ataques
químicos. Diversas marcas comerciais são disponíveis, como:

• Fibras de alumínio, da Du Pont de Nemours & Co. com nome de Fiber FP. Elas retêm resistên-
cia até 1.370o C. Têm diâmetro de 20 µm, densidade de 3.450 kg/m3 , resistência de ruptura de
1.380 MPa e módulo de elasticidade de 379 GPa.

• Carbetos de silício, SiC, produzidos pela AVCO Special Materials Co., pela Nippon Carbon Co.,
e pela Textron.

• Outro processo de produção é aquele por pirólise, que produz fibras com diâmetros menores,
10 µm−20 µm e menor densidade (2.600 kg/m3 ) que os demais, embora com resistência e módulos
inferiores, 2.000 MPa e 180 GPa.

• Spectro 900 da Allied Chemical Corporation. É uma fibra de polietileno UHMW (ultra—high—
molecular—weight), com densidade de apenas 970 kg/m3 .

1.3 Tipos e propriedades das matrizes


Como já mencionado, fibras por si só são incapazes de suportar estados multiaxiais de tensões, apenas
tensões trativas na direção axial das fibras. Essa deficiência é ilustrada na Figura 1.5, onde um
feixe de fibras é submetido a solicitações transversal e cisalhante. Pode-se observar que a integridade
do conjunto dependerá fundamentalmente do desempenho de uma matriz que aglutine as fibras e
transmita as tensões. Como conseqüência, diversos modos de falha de um composto fibroso serão
diretamente relacionados à resistência e à falha na matriz. A importância da matriz num composto
Capítulo 1. Tipos de compostos, fibras e matrizes 21

Tabela 1.10: Propriedades típicas de alguns polímeros.


Termofixos Termoplásticos
Material poliéster epóxi poliamidas fenólicos silicone peek(1) polisufone
Densidade 1.100- (1.213) 1.460 1.320- 1.850- 1.300 1.250
ρm , kg/m 3 1.400 (2) 1.450 2.810
Módulo elasticidade 2.100- 2.700- 3.500- 4.000 2.800
à tração Em 4.400 3.380(2) 4.500
Módulo à compressão (3.860)(2)
Ruptura à 34- 29-130 120 50- 17- 92 75
tração σ mR 100 (29)(2) 55 34
Ruptura à 90- (158) 190- 60-
compressão σ mR 250 (2) 250 100
Elongamento, % 2,0 0,4-0,8
Temperatura de 140- 150-
transição Tg 200 200 143 225
Temperatura de 250 260- 150- 260 310 175-
trabalho contínuo 460 (320)(2) 190
Temp.de cura p/ (120) 175-
uso geral (2)(3) 230(4)
Coeficiente de dilatação 55- 45-65 90 45- 94-
térmica αm 100 110 100
Absorção de água em 0,15- 0,08- 0,3 0,1-0,2 0,1 0,2
24h, % em volume 0,6 0,15
Módulos e tensões em MPa, temperaturas em ◦ C. Coeficiente αm em 10−6 /◦ C.
(1) Sigla de PolyEtherEtherKetone. (2) Valores para a marca comercial NARMCO 2387 [92].
(3) Para uso em alta temperatura, a cura pode ser feita até a 200◦ C. (4) Pós-cura é necessária
para aplicação a alta temperatura. (5) Com carga de asbestos.
Capítulo 1. Tipos de compostos, fibras e matrizes 35

Os processos de moldagem por membrana são dos mais antigos. É costume dividi-los em três tipos:
• moldagem a vácuo
• moldagem à pressão
• moldagem em autoclave
Estes processos estão esquematizados nas Figuras 1.14 a 1.16. Note que não necessariamente eles
sejam mutuamente excludentes. Pelo contrário, são em geral usados em conjunto. Como os sistemas
a vácuo e a pressão são análogos, será considerado com mais vagar apenas o primeiro. As etapas
principais do processo a vácuo são:

Figura 1.14: Esboço dos principais componentes do processo de moldagem por membrana a vácuo.

• Cobrir o moldado com uma película separadora perfurada, para evitar adesão com as demais
membranas.

• Cobrir a película separadora com camadas de material poroso. Esse material, como feltro, deve
permitir o fluxo de ar e a saída do excesso de resina.

• Posicionar uma tira de juta, ou outro material semelhante, logo após a borda do moldado.

• Cobrir o conjunto com uma película de celofane ou náilon. Aplicar uma resina selante nas bordas
da película.

• Lentamente aplicar vácuo enquanto se elimina com rolos as rugas das membranas e o excesso de
ar. O excesso de resina do moldado deve ser conduzido às bordas do molde.

• Manter o conjunto sob pressão de vácuo até que a cura se complete, quer seja a temperatura
ambiente quer seja em forno.

O processo de moldagem à pressão é análogo ao descrito, apenas as membranas são forçadas


ao encontro do moldado por pressão externa. Essa pressão pode ser de até 0, 35 MPa (3, 5 atm) e
geralmente esse método é preferível ao processo a vácuo, por ser mais efetivo no aumento do volume
relativo de fibras.
O processo por autoclave, Figura 1.16, é o processo-padrão na indústria aeroespacial. É usado na
fabricação com pré-impregnados, embora, em geral, possa ser usado com qualquer tipo de fibras nos
processos molhados já descritos nas seções sobre o processo manual.
Autoclave é simplesmente um vaso de pressão aquecido, no qual todo o conjunto, o molde, moldado
e membranas, é colocado e submetido a um ciclo especificado de temperatura e pressão para a cura.
As pressões aplicadas ficam na faixa de 0,25 MPa a 0,7 MPa (2,5 atm a 7,0 atm).
Capítulo 2

Revisão de elasticidade linear

Neste capítulo há uma breve revisão de alguns elementos básicos da mecânica do contínuo, que serão
úteis no tratamento de laminados compostos feito na Parte I deste livro. Uma das primeiras hipóteses
usada na teoria de materiais compostos é que eles se comportam de forma elástica e linear — são
duas definições distintas. O comportamento elástico significa que, se o corpo for carregado, após o
descarregamento ele retornará completamente às suas formas e dimensões originais, sem apresentar
nenhuma deformação residual. O comportamento linear pode ser entendido como uma proporcionali-
dade entre carregamento e resposta. Por exemplo, se os módulos das forças forem multiplicados por
um mesmo fator c, um corpo que exibe comportamento linear teria seus deslocamentos, suas defor-
mações e tensões em cada ponto multiplicados pelo mesmo fator c. Em geral, um comportamento
linear de um material é obtido aplicando-se valores de tensões, deformações, deslocamentos e rotações
suficientemente pequenos.

2.1 Tensões
Consideremos um corpo em equilíbrio sob a ação das forças F1 , F2 , · · · , Fn , como ilustrado na Figura
2.1a. Observe que se o corpo como um todo está em equilíbrio estático, cada parte dele
também está. A Figura 2.1b mostra o diagrama de corpo livre de uma parte do corpo, designada
como A, definido pelo corte de um plano imaginário. Esse corte define uma superfície S, cujo vetor
normal unitário é nb , de componentes {b n} = {1; 0; 0}t nas direções cartesianas.1 A parte A do corpo
está sujeita a forças aplicadas em sua superfície externa, e a forças internas distribuídas sobre a
superfície interna S. Estas forças internas são distribuídas continuamente sobre a superfície de forma
semelhante às forças hidrostáticas ou à pressão do vento atuando sobre uma superfície externa de
um corpo. Entretanto, as forças internas não atuam apenas perpendicularmente à superfície interna,
elas possuem componentes tangentes à superfície, atuando de forma semelhante a um atrito interno.
Identifica-se um elemento de área ∆A localizado num ponto genérico P da seção S. Nesse elemento
atua a força ∆Fi , um vetor geralmente não normal à superfície S. O limite de ∆Fi /∆A quando
∆A → 0 é a tensão no ponto P, com unidades de força/área. Em geral a tensão é expressa através de
suas componentes, uma normal à superfície e duas tangentes, essas chamadas componentes de tensão
normal e cisalhantes.
Usa-se normalmente a letra grega σ (sigma minúsculo) para designar as tensões normais, e τ (tau
minúsculo) para as tensões cisalhantes. Uma componente de tensão não depende apenas do ponto
P, onde ela é calculada, mas também da direção da força que a gerou e da direção do vetor normal
à superfície onde ela atua, i.e., a orientação da face. No corpo mostrado na Figura 2.1a, pode-se
1
O sobrescrito “t” será sempre usado no texto para indicar o transposto de um vetor ou uma matriz.

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44 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

Figura 2.4: Deformação de um corpo.

Figura 2.5: Extensão de um segmento no interior de um corpo.

Consideremos a seguir as deformações. A expansão em série de Taylor de u (x, y, z) na direção


x retendo apenas o termo linear é:

∂u (x, y, z)
u (x + δx, y, z) = u (x, y, z) + δx + E. (2.4)
∂x
O lado esquerdo é o deslocamento num ponto próximo à posição {P } = {x, y, z}t , isto é, em {Q} =
{x + δx, y, z}t . Esse deslocamento em {Q} é aproximado no lado direito como o deslocamento em
{P }, mais uma variação δu = (∂u/∂x) δx e mais um erro E proveniente do truncamento da série. Se
os deslocamentos e gradientes forem suficientemente pequenos, como é usual em muitas estruturas em
engenharia, é possível utilizar apenas

∂u
u (x + δx, y, z) = u (x, y, z) +δx. (2.5)
∂x
Esta é então uma teoria linear, a qual incorre no erro E. Em seguida, define-se

δu|x = u (x + δx, y, z) − u (x, y, z) , (2.6)


Capítulo 3

Micromecânica de uma lâmina

Um laminado típico é constituído por várias lâminas, freqüentemente idênticas, variando suas orien-
tações para melhor atender aos requisitos de projeto ou de fabricação. As propriedades macroscópicas
do laminado, como resistência e comportamento elástico, dependem, portanto, das propriedades das
lâminas individuais que o compõem, além da ordem e orientação das lâminas. Após sua construção,
as propriedades mecânicas de uma lâmina podem ser determinadas por ensaios mecânicos. Na etapa
de projeto, entretanto, estes ensaios são obviamente inviáveis, sendo importante dispor de ferramentas
de cálculo para estimativa dessas propriedades. Este problema pode ser expresso esquematicamente
de seguinte forma:

A resposta aproximada a este problema envolve o estudo das interações microscópicas entre os
elementos constituintes da lâmina (matriz e reforços), constituindo a área de pesquisa denominada
micromecânica de uma lâmina. Esta área compõe, de certa forma, um contraponto ao chamado
estudo macromecânico da lâmina, em que a lâmina é considerada um corpo homogêneo embora
anisotrópico, com propriedades mecânicas globais supostas conhecidas e determinadas previamente,
quer pelas formulações da micromecânica quer por via experimental [92].
O presente capítulo apresenta um breve sumário das fórmulas micromecânicas mais conhecidas e
tradicionais na literatura para a estimativa das principais propriedades elásticas, térmicas e de re-
sistência de uma lâmina. O texto visa, principalmente, constituir uma “fonte de fórmulas”, auxiliando
no trabalho de projeto. As descrições teóricas são reduzidas ao mínimo, porém tentou-se apresentar
referências bibliográficas suficientes para permitir que o leitor prossiga estudo em qualquer tópico de
interesse.

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58 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

3.2.1 Coeficientes de dilatação proveniente da umidade


Sabe-se que as resinas mais usadas na construção dos laminados, as resinas poliméricas, absorvem
umidade do ar. O volume de umidade absorvido provoca uma dilatação nas dimensões da lâmina, de
forma muito semelhante à dilatação provocada por variação térmica. Então, de forma semelhante a
(3.7), definem-se os coeficientes de dilatação por umidade nas direção 1 e 2 como:

εU
1 = β 1 ∆U e (3.9)
εU
2 = β 2 ∆U, (3.10)

onde U é a concentração de umidade na lâmina, definida por


massa do material úmido − massa do material seco massa de umidade presente
U= = , (3.11)
massa do material seco massa do material seco
e εU U
1 e ε2 são deformações de origem higrométrica, análogas às deformações térmicas. Observa-se
que ε , εU e β, definidos neste item e no anterior, são parâmetros adimensionais se forem definidos
T

em unidades do sistema SI, enquanto α é dado por ◦ C−1 .

3.2.2 Frações de massa e de volume


O principal parâmetro indicativo da constituição da lâmina é a proporção relativa entre fibra e resina.
Ocorre que, durante os processos de fabricação, é mais fácil o uso e a medição das massas relativas,
enquanto os valores teóricos de propriedades usados no projeto (obtidos pelas fórmulas sumarizadas
nas próximas seções) são calculados em termos de fração de volume. Cumpre pois expor algumas
definições e relações básicas, definindo primeiramente as seguintes quantidades:

vc −→ volume do composto;
40vf , vm −→ volume de fibras e de matriz no composto;
vv −→ volume de vazios presente no composto;
40mc −→ massa do composto;
mf , mm −→ massa de fibra e de matriz.

Tem-se, então, as seguintes relações:

vc = vf + vm + vv e (3.12)
mc = mf + mm . (3.13)

De forma geral, um composto pode ser constituído por mais de dois componentes; por exemplo,
resina/epóxi com reforço combinado de fibra de vidro, de carbono e partículas de diversos tipos. Assim,
(3.12) e (3.13) podem ser postas na forma geral
nc
X nc
X
vc = vi e mc = mi , (3.14)
i=1 i=1

onde nc é o número de componentes do composto. Entretanto, por simplicidade na notação, nas


deduções que se seguem, continuaremos usando apenas compostos de dois constituintes.
Definem-se Vf e Vm como as frações volumétricas de fibras e de matriz, e Mf e Mm como as
respectivas frações de massa:
76 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

Figura 3.14: Estimativas de G12 pela regra da mistura nas linhas tracejadas e pela equação de
Halpin-Tsai nas linhas contínuas.

3.6 Coeficientes de Poisson

Pode-se usar o modelo representado na Figura 3.6 para obter uma fórmula simples para a estimativa
do maior e do menor coeficiente de Poisson, ν 12 e ν 21 .
Quando se aplica carga na direção 1 da lâmina, usa-se a hipótese de que as deformações na fibra e
na matriz são idênticas, isto é, εf = εm = ε1 na direção 1. Já na direção 2, as deformações provenientes
de σ 1 são distintas, dadas por

ε2m = −ν m ε1 e ε2f = −ν f ε1 , (3.78)


onde ν m e ν f são os coeficientes da fibra e da matriz. Considerando, como ilustrado na Figura 3.6b,
que, para um comprimento representativo L da lâmina na direção 2, as parcelas de fibras e da matriz
perfazem comprimentos Lf e Lm , as deformações transversais sofridas são

∆2m ∆2f
ε2m = = −ν m ε1 e ε2f = = −ν f ε1 , (3.79)
Lm Lf
onde ∆2m e ∆2f são as variações de comprimento. A segunda igualdade de (3.79) permite o cálculo
da deformação no segmento de lâmina como:

∆2m + ∆2f −ν m ε1 Lm − ν f ε1 Lf
ε2 = = .
L L
80 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

Figura 3.17: Coeficientes de dilatação térmica em termos do volume de fibras para um composto
vidro/epóxi.

Obter a variação dos coeficientes α1 e α2 para este composto em termos do volume relativo de fibras.

Solução:
O gráfico da Figura 3.17 mostra a variação dos coeficientes para este composto em função do volume de
fibras. Note que o coeficiente de dilatação longitudinal α1 de um composto praticamente independe do volume
relativo de fibras quando este varia na faixa de 0,3 a 1,0. Outro aspecto observado é que, de fato, α2 pode ser
superior ao coeficiente de dilatação da matriz, isto é, embora o coeficiente da fibra seja bastante inferior ao da
matriz, cerca de 10% de fibras pode fazer o coeficiente transversal do composto ser superior ao da resina.

Tipicamente as fibras terão coeficientes de dilatação bem menores que a matriz plástica, como
visto nesse exemplo e nos dados de propriedades físicas de fibras e polímeros apresentadas nas Tabelas
1.1, 1.2 e 1.9 (páginas 7 e 20). Observa-se que, para alguns tipos de fibras de carbono, o coeficiente
pode ser negativo. Isso abre a possibilidade, bastante atrativa em engenharia, de projetar compostos
com coeficiente de dilatação quase nulos em certas direções.
Por último, deve-se lembrar que os coeficientes de dilatação de um material, como qualquer outra
propriedade mecânica, são função da temperatura. Entretanto, a variação do coeficiente de dilatação
das fibras com a temperatura é bastante pequena. Para os polímeros, a dependência é mais acentuada
quando se considera, por exemplo, o epóxi, numa faixa de temperatura mais larga, como −100o C a
200o C.

3.9 Constantes elásticas para mantas de fibras curtas


Considere aqui as mantas de fibras curtas como a ilustrada na Figura 1.3, página 14. Elas são formadas
por uma camada de fibras picotadas, geralmente de 20 a 25 mm de comprimento, orientadas de forma
aleatória. Esta aleatoriedade, entretanto, só se aplica no plano xy. Ao longo dos planos transversais
xz e yz é mais freqüente as fibras se disporem todas paralelamente ao plano xy, como ilustrado na
Figura 3.18. Isso forma um material isotrópico no plano xy ou 12.
Capítulo 4

Macromecânica de uma lâmina

O termo comportamento macromecânico refere-se ao comportamento da lâmina apenas quando as


propriedades mecânicas aparentes médias, em sua forma macroscópica, são consideradas. Essas pro-
priedades são obtidas (1) diretamente de ensaios com corpos de prova, feitos com aquela lâmina, ou
(2) de forma aproximada a partir das propriedades termomecânicas dos componentes da lâmina, as
fibras e a matriz. O segundo processo é um dos objetos de estudo da micromecânica da lâmina,
tratado no Capítulo 3. Conhecidas estas propriedades mecânicas, que são propriedades do material,
estima-se agora o comportamento de uma lâmina sob um conjunto de carregamentos combinados, e
geralmente aplicados fora das direções principais de ortotropia do material. Este é o objeto do estudo
macromecânico de uma lâmina, visto neste capítulo.
A restrição básica da teoria apresentada é assumir um comportamento elástico-linear para os
materiais tratados. Essa hipótese é bastante acurada até o ponto de ruptura nas lâminas de vidro-
E/epóxi e boro/epóxi, exceto no cisalhamento, em que a aproximação é pobre. Entretanto, a linearidade
encontrada é geralmente superior à dos metais, e a teoria, como descrita, é amplamente usada na
engenharia.

4.1 Relação tensão-deformação para materiais elástico-lineares


A relação tensão-deformação de um material elástico-linear é:
⎧ ⎫ ⎡ ⎤⎧ ⎫

⎪ σ1 ⎪⎪ C11 C12 C13 C14 C15 C16 ⎪
⎪ ε1 ⎪

⎪ σ2 ⎪
⎪ ⎪ ⎢ C22 C23 C24 C25 C26 ⎥⎪⎪ ε2 ⎪


⎪ ⎪
⎪ ⎥⎪ ⎪
⎨ ⎬ ⎢ ⎢ ⎥⎨
⎪ ⎪

σ3 C33 C34 C35 C36 ε3
=⎢⎢

⎥⎪ , (4.1)

⎪ τ 23 ⎪
⎪ ⎢ C44 C45 C46 ⎥⎪ γ 23 ⎪


⎪ ⎪
⎪ ⎣ ⎦⎪⎪ ⎪


⎪ τ ⎪ C55 C56 ⎪ γ 31 ⎪
⎩ 31 ⎪ ⎭ ⎪
⎩ ⎪

τ 12 sim. C66 γ 12

que, em forma compacta, será representada por:


© 1ª £ 1¤ © 1ª
σ = C ε , (4.2)
onde “sim.” indica “ simétrica”; σ i e τ ij com i, j = 1, 2, 3 são as tensões normais e cisalhantes,
respectivamente; εi e γ ij com i, j = 1, 2, 3 são deformações normais e cisalhantes, £respecti-¤
vamente; e Cij , com i, j = 1, ..., 6 são os elementos da matriz de rigidez do material C 1 . O
expoente 1 indica o sistema de coordenadas usado, definido pelos eixos cartesianos 1 − 2 − 3.

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88 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

distribuem de forma aleatória e macroscopicamente homogênea ao longo das direções 2 e 3, como


ilustrado na Figura 4.13, página 114. Dessa forma é de esperar que existam relações especiais entre as
propriedades nessas duas direções. Neste caso, prova-se [113] que os termos da matriz de rigidez (4.3)
possuem as seguintes relações:

C22 = C33 , C12 = C13 , C55 = C66 , 2C44 = C22 − C23 . (4.16)

Essas relações podem ser alteradas nos casos em que as fibras estejam orientadas nas direções 2 ou
3, como explicitado nas eqs.(15.72) e (15.76), permutando os índices da forma indicada ali. As relações
(4.16) junto a (4.12) resultam em relações entre as constantes de engenharia, que são as seguintes:

E3 = E2 , G31 = G12 ,
E2
ν 13 = ν 12 , G23 = . (4.17)
2 (1 + ν 23 )
ν 23 = ν 32 ,

Observe que no plano 2-3 o material é isotrópico, tornando óbvias as relações 1, 3 e 5 da equação
acima. Um material com esta característica é chamado transversalmente isotrópico no plano
2-3.
Além dessas relações entre as propriedades elásticas, as lâminas apresentam relações especiais
também entre as resistências em diferentes direções (eq.(4.96), página 113).

4.2 Lei de Hooke para material ortotrópico sob EPT

Considere que uma lâmina no plano 1-2, como ilustrado na Figura 3.1, esteja sob um estado plano de
tensão (EPT). Diz-se que um corpo está sob um estado de tensões plano se cada ponto está sujeito a
tensões apenas num único plano, no caso o plano 1-2, isto é, apenas σ 1 , σ 2 e τ 12 são não nulos e

σ 3 = 0, τ 23 = 0, τ 31 = 0, ∀ (x, y, z) ∈ Ω. (4.18)

Usando estas relações, parte das componentes de deformação em (4.7) torna-se:

ε3 = S13 σ 1 + S23 σ 2 , γ 23 = 0 e γ 31 = 0, (4.19)

enquanto as demais ficam:


⎡ ⎤
1 ν 21
⎧ ⎫ ⎡ ⎤⎧ ⎫ ⎢ − 0 ⎥⎧ ⎫
⎨ ε1 ⎬ S11 S12 0 ⎨ σ1 ⎬ ⎢ E1 E2 ⎥ ⎨ σ1 ⎬
⎢ ν 12 1 ⎥
ε = ⎣ S21 S22 0 ⎦ σ =⎢ − 0 ⎥ σ , (4.20)
⎩ 2 ⎭ ⎩ 2 ⎭ ⎢ E1 E2 ⎥⎩ 2 ⎭
γ 12 0 0 C66 τ 12 ⎣ 1 ⎦ τ 12
0 0
G12
ou, em forma matricial, © 1ª © ª
ε = [S] σ 1 , (4.21)
onde [S] é, agora, a chamada matriz de flexibilidade reduzida da lâmina ortotrópica sob estado
plano de tensão, em relação aos eixos principais. Essa relação pode ser invertida resultando na relação
tensão-deformação reduzida:
Capítulo 4. Macromecânica de uma lâmina 103

© ª © ª
Nesse exemplo tornam-se claras as diversas interdependências entre as grandezas σ 1 , {σ x }, ε1
e {εx }. Como ilustrado na Figura 4.6, dado qualquer um destes itens, os outros três podem ser obtidos
usando relações constitutivas ou de transformação de coordenadas. Além disso, existem sempre duas
seqüências de cálculo para a obtenção de um item a partir de outro. Cabe ao calculista a escolha do
caminho mais curto.

Figura 4.6: Fluxograma de cálculo para tensões e deformações numa lâmina nas direções 1-2 e x-y.
O termo à origem da flecha é igual à matriz indicada vezes o termo ao final da flecha.

4.6 Resistência de uma lâmina ortotrópica


O problema considerado consiste em calcular, aproximadamente, a carga de falha de uma lâmina
ortotrópica, submetida a um estado plano de tensões representado por {σ x , σ y , τ xy }, partindo de
resistências obtidas de ensaios simples realizados em algumas poucas direções. Alguns dos motivos
que tornam essa proposição razoavelmente problemática são os seguintes:
a) É irrealizável a experimentação das características de uma lâmina em todas as direções, uma
vez que estas envolvem o campo dos números reais nas seis dimensões de tensão, e θ na faixa de 0◦
a 180◦ . São, então, realizados testes em algumas direções notáveis; as mais óbvias são as direções
principais do material.
b) Nos materiais isotrópicos, os critérios de falha se baseiam em tomar as componentes de tensão
aplicadas segundo um sistema qualquer 0xyz, deteriminar as tensões máximas no sentido do Círculo
de Mohr, e compará-las a um único valor de resistência obtido em ensaio simples. Entretanto, nos
materiais anisotrópicos, esse processo não funciona. Para apreciar isso com mais clareza, considere
o exemplo a seguir.

Exemplo 2
Considere uma lâmina de vidro-E/epóxi com as seguintes propriedades:
- Resistência a tração na direção 1: X = 1.050 MPa.
- Resistência a tração na direção 2: Y =28 MPa.
- Resistência ao cisalhamento no plano 1-2: S =42 MPa.
120 Materiais Compostos e Estruturas-sanduíche — Projeto e Análise

onde

µ ¶ µ ¶ ³ τ ´2
1 1 1 1 σ 21 σ2 12 σ1 σ2
a= − σ1 + − σ2 , b= + 2 + −√ , c = −1.
Xt Xc Yt Yc Xt Xc Yt Yc S Xt Xc Yt Yc

O coeficiente de segurança é então a menor raiz C que seja maior que um. Mesmo que não exista
nenhuma raiz nesse intervalo, observa-se que qualquer valor de C, desde que positivo, pode ser visto
também como um fator de carga, isto é, aquele número que pode ser multiplicado pelas componentes
de tensão no ponto para levá-lo ao limiar de falha.
Nota-se que, se Xt = Xc e Yt = Yc , o critério reduz-se a:

σ 21 σ1 σ2 σ 22 τ 212 1
2
− + 2
+ 2
= 2. (4.117)
X XY Y S C
O uso da aproximação (4.112) para F12 faz que (4.117) assuma a forma de um critério modificado
de Tsai-Hill, como pode ser visto por comparação à equação (4.98) do EPT, quando as resistências à
tração e à compressão são idênticas.
Além das limitações já mencionadas do critério de Tsai-Hill existe um problema adicional. Como
várias teorias inspiradas no critério de von Mises, a de Tsai-Hill não leva em conta o efeito da tensão
hidrostática no processo de falha. Assim, o critério prevê que um composto jamais falhará sob tensões
hidrostáticas. Basta aplicar σ 1 = σ 2 = σ 3 = σ e τ 12 = τ 32 = τ 13 = 0 em (4.95) e se tem todo o
lado esquerdo nulo, indicando segurança para qualquer nível de solicitações σ. Evidentemente, essa é
uma previsão falsa. Já o critério de Tsai-Wu, em sua forma tridimensional, leva em conta o efeito da
componente hidrostática das tensões.

4.7.5 Critério de Hoffman

O critério de Hoffman pode ser visto como uma extensão do critério de Hill ou uma simplificação do
de Tsai-Wu. Em relação ao critério de Hill, é feita a inclusão de termos lineares de diferenças entre
resistências de tração e compressão [74][88]. Nas aplicações em modelos de plasticidade anisotrópica,
o modelo de Tsai-Wu apresenta forte sensibilidade quanto aos parâmetros de propriedades medidas
experimentalmente. Assim, o critério de Hoffman tem sido bastante utilizado tanto em problemas de
plasticidade de metais quanto em falha frágil de laminados fibrosos.
A expressão do critério pode ser colocada na forma

1 © 1 ªT © ª © ªT
σ [P ] σ 1 + σ 1 {q} = 1, (4.118)
2
© ª
onde [P ] e σ 1 são os mesmos termos usados para expressar o critério de Hill, eq.(4.88), e

{q} = {c1 ; c2 ; c3 ; 0; 0; 0}T . (4.119)


As matrizes [P ] e {q} contêm nove parâmetros de material, que podem ser determinados por nove
ensaios nas direções principais de ortotropia: três ensaios de tração, três de compressão e três de
cisalhamento.

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