Você está na página 1de 23

O abastecimento de água na perspectiva da

historiografia europeia e hispano-americana


The water supply from the perspective of european and spanish-american historiography
El suministro de agua en perspectiva de la historiografia europea y hispano-americana
Fabiano Quadros Rückert*

o artigo explora trabalhos produzidos


Resumo pela historiografia espanhola. A terceira
No decorrer das últimas décadas do seção contempla experiências de moder-
século XX, o abastecimento de água foi nização do abastecimento de água no
gradualmente recebendo maior aten- México e na Argentina.
ção dos historiadores que abordaram o
tema a partir de diferentes perspectivas Palavras-chaves: Abastecimento de água.
teóricas e metodológicas e com múlti- História. Historiografia.
plas escalas espaciais. Considerando a
valorização do tema na historiografia
contemporânea, o texto apresenta um Introdução
panorama dos estudos sobre a história
do abastecimento de água na Europa e A história do abastecimento de água
na América Latina, destacando aspectos
possui uma longa temporalidade. No Im-
como as relações entre a oferta de água
pério Romano as técnicas de canalização e
e o capital privado, os conflitos de inte-
distribuição de água possibilitaram a cons-
resse existentes na gestão dos recursos
hídricos e o papel do poder público na trução de aquedutos que abasteciam fon-
criação e administração de sistemas mo-
dernos de abastecimento. A primeira se- *
Doutor em História, Professor Adjunto de História
na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul,
ção do artigo destaca pesquisas realiza-
Brasil, e-mail: fabianoqr@yahoo.com.br
das na Inglaterra e França – dois países
pioneiros nos estudos sobre a história do Recebido em 11/04/2016 - Aprovado em 10/12/2016
abastecimento de água. Na sequência, http://dx.doi.org/10.5335/hdtv.17n.1.

157
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
tes públicas, prédios do governo, casas de água em abundância, as populações urbanas
banho e residências da elite. Os estudos de estavam mais expostas às doenças endêmi-
autores como Evans e Malissard destacam a cas e epidêmicas e o desenvolvimento das
importância social, cultural e econômica do indústrias poderia ser comprometido. Na
abastecimento de água para as antigas cida- intenção de promover a salubridade urbana
des romanas (EVANS, 1997; MALISSARD, e de assegurar a viabilidade do desenvolvi-
1996). Documentos da antiguidade, como a mento econômico, o poder público e o capi-
obra de Sextus Julius Frontinus, escrita ori- tal particular promoveram ações voltadas
ginalmente no primeiro século da era cristã para a modernização dos sistemas de capta-
(FRONTINUS, 1983), registram o empenho ção, tratamento e distribuição de água.
do governo romano na manutenção dos O processo de criação e expansão de
aquedutos e na fiscalização do volume de redes de abastecimento ganhou forma inicial
água consumido. na Europa e estava relacionado à disponibi-
A experiência dos antigos romanos na lidade de capitais e à existência de uma de-
criação de técnicas, de leis e de procedimen- manda por água em grande quantidade. Na
tos administrativos, para organizar a cap- América Latina do século XIX, também hou-
tação e a distribuição de águas, representa ve crescente demanda por água nos princi-
uma etapa importante na história do abaste- pais centros urbanos e surgiram empresas
cimento das cidades. No entanto, o uso das voltadas para o abastecimento de água; no
águas na antiguidade romana não está con- entanto, a maior parte dos capitais disponí-
templado pelo recorte cronológico do estu- veis – muitos procedentes do exterior – foi
do. Proponho, neste artigo, uma abordagem aplicada em setores mais dinâmicos da eco-
focada nos séculos XIX e XX, período em que nomia, como ferrovias, mineração, cultivos
ocorreram grandes mudanças nas relações para exportação e títulos da dívida pública.
entre os grupos humanos e a água. A com- Tanto na Europa, quanto na América Lati-
preensão dessas mudanças implica no estu- na, o poder público ofereceu incentivos para
do das relações entre o binômio urbaniza- os interessados na exploração do abasteci-
ção/industrialização e a valorização da água mento de água. Criou-se, assim, uma con-
nos centros urbanos. Igualmente importante juntura favorável para negociações entre o
para o recorte cronológico fixado, é a reflexão poder público – responsável pela definição
sobre a transformação da água em produto de prioridades de uso das águas – e o capital
comercial e a sua aplicação para manutenção particular – responsável pelos investimentos
da higiene e da salubridade urbana. e pela comercialização do produto.
Na segunda metade do século XIX, Diante do que foi exposto nesta intro-
ampliar a oferta de água potável para as dução, importa reconhecermos que o abaste-
cidades tornou-se um desafio para as au- cimento de água para as cidades dos séculos
toridades políticas, sobretudo nos núcleos XIX e XX apresentou diferentes ritmos de
urbanos que estavam inseridos no processo desenvolvimento e foi influenciado por con-
de expansão da Revolução Industrial. Sem junturas políticas de âmbito nacional ou in-

158
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
ternacional. Considerando a diversidade de O caso do abastecimento da cidade
experiências ocorridas durante a busca pela de Tolouse, destacado por Goubert, é um
universalização do abastecimento de água, interessante exemplo da interação entre es-
o artigo apresenta uma revisão bibliográfica, ses tópicos. Usando técnicas de engenharia
focada em estudos sobre o respectivo tema avançadas para a época, em 1829, o Conselho
em três países da Europa (França, Inglater- Municipal iniciou a construção de uma rede
ra e Espanha) e em dois países da América de abastecimento de água que incluía um
Latina (México e Argentina). Cabe ressaltar aqueduto, um sistema de tratamento natural
que o objetivo principal do artigo é cons- (baseado na decantação em tanques de areia)
truir um panorama sobre “o estado da arte” e uma rede de canos subterrâneos, que distri-
e identificar temas e problemas destacados buía a água em 96 pontos distintos da cida-
pela bibliografia. de, sendo seis fontes públicas e 90 particula-
res. Para assegurar a manutenção financeira
da construção e a manutenção da rede, a
A história do abastecimento de água na
municipalidade cobrou o fornecimento para
França e na Inglaterra particulares e, a partir de 1864, empenhou-se
no estudo de projetos, para ampliar o volu-
Na década de 1980, surgiram na França
me de água e a extensão da rede (GOUBERT,
os primeiros estudos de história sobre o abas-
1989, p. 205-212). O precoce sucesso obtido
tecimento de água. Em 1984, André Guiller-
por Tolouse no abastecimento de água exer-
me publicou o livro Le Temps de l’eau: La cité,
ceu um forte impacto sobre as demais cida-
l’eau et les techniques, inaugurando a tradição
des francesas e, possivelmente, também in-
francesa de pesquisa historiográfica sobre
fluenciou nas decisões do governo a respeito
esse tema (GUILLERME, 1983). Dois anos
do saneamento de Paris.
depois, Jean-Pierre Goubert publicou o clás-
Na capital da França, no período de
sico La conquête de l’eau (GOUBERT, 1986).1
1830 a 1930, ocorreu um amplo processo
Nos estudos pioneiros de André Guil-
de mudança no uso dos recursos hídricos,
lerme e Jean-Pierre Goubert, encontramos
e as ações políticas do governo foram dire-
o esboço de uma historiografia do abasteci-
cionadas para a “universalização” do aces-
mento de água a partir dos seguintes tópi-
so à água potável. Durante esse processo,
cos: (1) a importância da criação e da difusão
coexistiram interesses conflitantes: de um
das técnicas de Engenharia; (2) a ênfase nas
lado, existiam lideranças políticas que não
relações entre a oferta de água e a busca pela
concordavam com o investimento de recur-
salubridade dos grandes centros urbanos;
sos públicos na expansão do fornecimento
(3) a participação do poder público no pla-
de água; de outro, proprietários de imóveis
nejamento e na execução das obras de cap-
que não aceitavam pagar a taxa para uso da
tação e distribuição; (4) a concentração dos
rede de água e proprietários que apoiavam
investimentos públicos em áreas com eleva-
a ampliação da rede na intenção de valorizar
da densidade demográfica.
os seus imóveis, oferecendo água encanada

159
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
para compradores e inquilinos (BOCQUET; Complementando a rede de fontes públi-
CHATZIS; SANDER, 2008, p. 1822). cas, havia um serviço de fornecimento para
No começo do século XIX, algumas au- os proprietários que possuíam condições
toridades públicas de Paris estavam conven- de pagar a taxa fixada pela municipalidade
cidas de que a cidade deveria seguir o mo- (BOCQUET; CHATZIS; SANDER, 2008).
delo de Londres e promover investimentos A meta de estender o abastecimento
particulares no abastecimento de água. A ad- público para toda a cidade já estava em curso
miração pelo modelo inglês de abastecimento no governo de Haussmann, mas os recursos
de água de fato existia. No entanto, isso não financeiros para suprir a crescente demanda
significa dizer que todos os franceses estives- da população eram insuficientes.3 Buscando
sem dispostos a imitar o respectivo modelo. superar a carência de recursos, a municipali-
No projeto que o engenheiro Charles dade reduziu o preço da tarifa de água, para
Mallet elaborou para o abastecimento de atrair um maior número de usuários e obter a
Paris, o serviço seria feito por uma empre- receita necessária para a ampliação do servi-
sa particular, e volume de água, fornecido ço (BOCQUET; CHATZIS; SANDER, 2014).
ao público através de fontes, chafarizes e Na década de 1880, a obrigatoriedade
prédios do governo, seria proporcional ao do pagamento da taxa de água foi discutida
distribuído para os usuários conectados na pelas autoridades políticas de Paris, e muitos
rede; enquanto que, no modelo inglês, a proprietários de imóveis manifestaram resis-
maior parte da água era destinada aos pro- tência em aceitar a cobrança. As discussões
prietários de imóveis. Na mesma época do ainda estavam em curso quando em 1894 o pa-
projeto de Mallet (década de 1820), existiam gamento da taxa tornou-se obrigatório. Nesta
engenheiros franceses que não concorda- época, muitos proprietários já estavam cientes
vam com a concessão do fornecimento da de que o serviço de água encanada oferecia
água para empresas particulares e legisla- vantagens para o descarte do esgoto e também
dores que criticavam a exclusão dos pobres valorizava o preço dos imóveis, tanto para
provocada pelo modelo londrino. venda, quanto para locação. Com os ajustes
Os adeptos de um serviço público de no sistema de cobrança, o uso de hidrômetros,
abastecimento de água para Paris encontra- o aumento no número de usuários pagantes
ram apoio no trabalho do engenheiro Henri e a gradual redução no volume de água for-
Emmery (Chefe do Departamento de Águas necido nas fontes públicas, a municipalidade
de Paris) e no moderno projeto de engenha- parisiense conseguiu a renda necessária para
ria hidráulica criado pelo engenheiro Jules pagar os empréstimos contraídos durante o
Dupuit. Com base nos dados coletados por processo de “universalização da água” – pro-
Emmery2 e no projeto elaborado por Dupuit, cesso que, em Paris, estava praticamente con-
o governo francês criou uma ampla rede de cluído no final da década de 1920.
fontes públicas, usadas pela maior parte dos A experiência do abastecimento de
habitantes de Paris na segunda metade do água na França, nas décadas finais do sé-
século XIX e nas primeiras décadas do XX. culo XIX e no começo do XX, foi marcada

160
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
pela ideia de que o poder público deveria Na década de 1880, a municipalida-
controlar esse serviço. No entanto, essa ideia de ampliou a oferta, captando as águas de
não impediu o surgimento de empresas par- Budo, manancial distante cerca de quinze
ticulares que, mediante negociações com o quilômetros do núcleo urbano. Apesar das
governo, realizaram investimentos na capta- novas obras de captação, a rede de distri-
ção, no tratamento e na distribuição da água. buição era insuficiente e, nas primeiras dé-
A Compagnie Générale des Eaux, criada em cadas do século XX, a falta de água era algo
1852, é um exemplo da atuação do capital comum em diversos bairros da cidade. Inca-
privado no abastecimento de água, na Fran- paz de atender a crescente demanda e sem
ça. Durante as reformas promovidas por os recursos necessários para modernizar
Haussmann, o serviço realizado pela empre- o seu antigo sistema de abastecimento, em
sa foi assumido pelo governo, e a Compagnie 1949, a municipalidade de Burdeos trans-
Générale des Eaux recebeu a função de admi- feriu a gestão do serviço para a Companhia
nistrar os contratos entre a municipalidade e Lyionnaise des Eaux.
os usuários (JACQUOT, 2002). Na Inglaterra do século XIX, a rápida
Outro exemplo francês pode ser encon- urbanização das cidades industriais provo-
trado na história do abastecimento de água cou a necessidade de grandes investimen-
em Burdeos. Nessa cidade, ainda na primei- tos no abastecimento de água e fomentou
ra metade do século XIX, a municipalidade discussões políticas sobre o uso de capitais
encaminhou ações para criar um sistema particulares nesse serviço (MATÉS-BARCO,
público de abastecimento. As limitações 2009; RAMOS-GOROSTIZA; ROSADO-
orçamentárias da administração municipal, -CUBERO, 2013). O grupo de ingleses adep-
a falta de recursos técnicos e os problemas tos da participação do capital particular no
burocráticos dificultaram a construção das abastecimento de água defendia a necessi-
obras, que foram inauguradas em 1865. dade da concessão do “monopólio natural”
para exploração deste serviço, porque ele
El agua, tomada del manantial principal
de Taillan y de otros tres más pequeños, demandava grandes investimentos e alta
llegaba por un acueducto de 11 kilóme- complexidade técnica e oferecia grandes
tros a dos depósitos principales de 22.000 riscos de prejuízo. Esse grupo contou com
m3, uno cerca del centro de la ciudad, en o apoio de John Stuart Mill, que apresentou
una vía que tomó el nombre de calle del
Château-d’Eau, y otro de calle Paulin, en argumentos para justificar a prática do “mo-
un barrio nuevo de construcciones de pe- nopólio natural” – conceito fundamental
queña clase media al oeste de Burdeos. En para a organização do modelo de abasteci-
los años siguientes se construyeron otros mento de água que estava sendo implantado
dos depósitos hacia el norte y el sur de la
na Inglaterra.
ciudad. Con esto se planteaba la economía
del agua en Burdeos: 400 fuentes públicas, Robert Millward pesquisou o desen-
5 fuentes monumentales, 5 fuentes-walla- volvimento do abastecimento de água na
ce, y una red de 248 kilómetros de conduc- Inglaterra e constatou que a postura do Par-
ciones (FERNANDEZ; PÉREZ-CASTRO-
lamento a respeito da exploração particular
VIEJO, 2003, p. 339).

161
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
do serviço foi mudada ao longo do tempo: para a redução da mortalidade, mas não po-
inicialmente, o Parlamento impôs poucas demos quantificar com precisão a dimensão
restrições, e as primeiras companhias hi- dessa importância.
dráulicas encontraram facilidades nas ne- No caso da Inglaterra do final do sécu-
gociações com o governo; posteriormente, lo XIX, convém lembrarmos que o abasteci-
ele manifestou preferência pelo “monopólio mento de água era uma preocupação sanitá-
natural” do serviço e criou novas exigên- ria para o governo e, ao mesmo tempo, uma
cias para o processo burocrático de estudo preocupação econômica para as empresas
e aprovação dos contratos (MILLWARD, que investiam nesse serviço. E, consideran-
2007). O resultado dessa mudança refletiu- do a força do capitalismo britânico no perí-
-se na disparidade entre a situação de Lon- odo vitoriano, não seria exagero inferir que
dres na Era Vitoriana (abastecida por várias o interesse das empresas em expandir a rede
companhias) e a de cidades de pequeno e de fornecimento (ampliando o número de
médio porte, que concediam o serviço para clientes) tenha sido o fator fundamental para
uma única empresa. Outra mudança desta- a expansão do serviço nas cidades inglesas.
cada pelo autor foi a crescente preocupação Em 1840, existiam, neste país, 100 empresas
do governo com a quantidade e a qualidade trabalhando no fornecimento de água, em
da água fornecida. 1870, o número subiu para 500, chegando a
Existem estudos sobre o abastecimento 1.020 empresas em 1915 (MILLWARD, 2007,
de água na Inglaterra que abordam a relação p. 112).5
entre a oferta de água e a redução nos ín- Abordando a experiência inglesa de
dices de mortalidade registrados no final do universalização na oferta de água, Millward
século XIX. A ampliação da oferta de água chama atenção para duas questões relevan-
potável possibilitou maior controle sobre a tes: os interesses envolvidos no uso de novas
febre tifoide e a cólera – doenças de trans- técnicas, para ampliar o fornecimento em re-
missão hídrica. Dessa forma, o aumento do des já construídas, e as dificuldades enfren-
abastecimento de água potável nas cidades tadas pelas municipalidades, para fiscalizar
contribuiu para a mudança na “curva de- os serviços prestados pelas companhias hi-
mográfica” inglesa, reduzindo as taxas de dráulicas. No primeiro caso, o autor aponta
mortalidade. Sobre esse assunto, cabe uma que o aumento na pressão da água encana-
importante ressalva: o crescimento da po- da, apesar de ser uma reivindicação das mu-
pulação inglesa no decorrer do século XIX nicipalidades, era uma condição para a am-
foi influenciado por diversos fatores, dentre pliação da receita das empresas, sobretudo a
os quais estavam o uso da vacinação como partir do uso dos hidrômetros que registra-
recurso profilático, os avanços terapêuticos, vam o excesso de consumo dos usuários. No
a ampliação do atendimento hospitalar e a que diz respeito às dificuldades encontradas
difusão das práticas de higiene entre a po- pelas municipalidades para fiscalizar o de-
pulação.4 Nesse sentido, o fornecimento de sempenho das companhias hidráulicas, ele
água potável em abundância foi importante destaca: a participação de “homens de negó-

162
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
cios” nos Conselhos Municipais; os conflitos to urbano (1994). Na sua obra, apresenta-
entre os usuários e as companhias hidráuli- da como tese de doutorado em História
cas; e as tensões geradas diante da necessi- Econômica, Matés-Barco usou os conceitos
dade de ajustes no custo do serviço. de “sistema natural”, “sistema clássico” e
Importantes semelhanças podem ser “sistema moderno”, para interpretar as di-
observadas no processo de desenvolvimen- ferentes etapas de uso das águas ocorridas
to do abastecimento de água na Inglaterra na Espanha. Segundo o autor, o “sistema
e na França. Em ambos os países, o poder natural” surgiu da inevitável interação do
público participou do processo através de homem com as águas; o “sistema clássico”
decisões políticas referentes à criação e ao foi marcado por um expressivo aumento na
funcionamento de redes modernas de abas- demanda e por técnicas antigas de captação,
tecimento de água. As discussões sobre o armazenamento e distribuição de água; e o
papel do capital particular no fornecimento “sistema moderno” ganhou forma a partir
de água, ocorridas tanto na Inglaterra quan- da Segunda Revolução Industrial (MATÉS-
to na França do século XIX, não estavam re- -BARCO, 1999).
sumidas ao capital empregado ou ao custo No “sistema clássico”, já havia uma
do serviço. Elas envolviam outras questões, preocupação das autoridades políticas com
como a preocupação com a higiene pública, o volume e a qualidade da água fornecida,
o acesso dos pobres à água potável e o di- porém faltavam os recursos técnicos e finan-
reito dos proprietários de imóveis em aderir ceiros necessários para ampliar a oferta de
ou não ao uso da água encanada. Dessa for- água. Foi no decorrer do século XIX, com a
ma, os estudos produzidos sobre a experi- expansão da Revolução Industrial, que ocor-
ência inglesa e a experiência francesa apon- reu a gradual transição do “sistema clássico”
tam para a necessidade de considerarmos a para o “moderno”. Afastando-se das limita-
complexidade da gestão técnica e política do ções na oferta de água que marcaram as cida-
abastecimento de água, uma vez que ambas des pré-industriais, o “sistema moderno” de
estavam interligadas e influenciavam nos abastecimento foi impulsionado pela cres-
resultados obtidos. cente valorização comercial da água, pelo
uso intensivo da Engenharia Hidráulica6 e
pelo surgimento de novas “técnicas organi-
A formação do “sistema moderno” de
zativas” que incluíam a ampliação na oferta
abastecimento de água na Espanha e no custo e mudanças na demanda, tanto
no plano quantitativo, quanto no qualitativo
Nos últimos anos a história do abaste-
(MATÉS-BARCO, 2009, p. 40). Dentro des-
cimento de água na Espanha tem recebido
sa perspectiva, não foi somente o aumento
uma expressiva atenção dos pesquisadores.
demográfico do século XIX que estimulou
Um dos primeiros historiadores a explorar
o crescimento da demanda: as indústrias e
esse campo temático foi Juan Manuel Matés-
as oficinas artesanais necessitavam de mais
-Barco, autor da obra intitulada La conquista
água para produzir, e, ao mesmo tempo, a
del agua: historia económica del abastecimien-

163
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
população das cidades foi adquirindo novos pelos investidores particulares foi gradual-
hábitos de consumo, e as práticas de higiene mente aumentando, especialmente depois
ganharam importância no ambiente urbano. da criação da Sociedad General de Aguas de
Conforme demonstrou Juan Manuel Barcelona, fundada em 19 de julho de 1867.
Matés-Barco, em sua tese de doutorado e Em 1909 a Sociedad General de Aguas de Bar-
em estudos posteriores, a aplicação de capi- celona entrou em atrito com a municipalida-
tais privados na expansão da oferta de água de, alegando prejuízos pela localização do
foi fundamental para a configuração do ponto de captação usado pelo ayuntamento,
“sistema moderno” de abastecimento. No e, ao final das negociações, a empresa obteve
século XIX, houve uma acentuada valoriza- a garantia de que a municipalidade não iria
ção comercial do produto e uma crescente realizar novas obras hidráulicas na área de
demanda por água, sobretudo nas cidades Montcada, onde estava a principal fonte de
que estavam em processo de industrializa- captação que abastecia a rede pública da ca-
ção. Diante de uma conjuntura que criou a pital catalã (MATÉS-BARCO, 1994, p. 60-61).
necessidade de ampliar a oferta de água, o Completava-se, assim, o processo de enfra-
poder público adotou uma dupla estratégia: quecimento da participação do ayuntamiento
ele produziu leis para regulamentar a atu- de Barcelona no fornecimento de água e, em
ação das empresas particulares e ofereceu sentido oposto, o de fortalecimento do setor
diferentes tipos de subsídios para estimular privado.
o crescimento da oferta e, ao mesmo tempo, Em Madri, durante o Antigo Regi-
ampliou a sua atuação no planejamento e na me, foram realizadas diversas obras para o
execução de obras públicas voltadas para o abastecimento de água. Nos primeiros anos
abastecimento de água. do século XVII, enquanto a Coroa investia
Apesar da existência de um marco re- em obras para ampliar a disponibilidade de
gulatório nacional para o uso das águas, a água no palácio, o ayuntamiento empenhou-
atuação do poder público na ampliação da -se em providenciar novas fontes públicas
oferta de água na Espanha apresentou par- para as vilas da cidade (PINTO-CRESPO,
ticularidades regionais. A experiência em 2010). Existiam diversas fontes nas proximi-
Barcelona é um interessante exemplo des- dades do sítio urbano, mas nem todas esta-
tas particularidades. Ainda no começo do vam em condições topográficas adequadas e
século XIX, a municipalidade realizou ne- algumas possuíam volume insuficiente para
gociações para organizar uma distribuição compensar o custo da construção dos canais
capaz de atender a demanda pública e a pri- de distribuição. Visando obter os recursos fi-
vada – esta representada pelos proprietários nanceiros necessários para as obras hidráuli-
que, em troca da colaboração financeira nas cas, em 1621, a Coroa autorizou a venda das
obras, possuíam direito de acesso as águas. águas para particulares, assumindo, assim,
No sistema de abastecimento criado em Bar- um duplo compromisso: abastecer as fontes
celona, o capital aplicado era misto (público públicas e atender os proprietários de imó-
e privado), mas o volume de água fornecido veis que investiram nas obras em troca do di-

164
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
reito ao uso domiciliar da água. Em 1632, os um sistema de elevação mecânica, baseado
trabalhos realizados pelo ayuntamiento e pela no uso de máquinas a vapor, para elevar as
Coroa possibilitaram um fornecimento diá- águas da Fuente de la Reina (manancial lo-
rio de 660.000 litros de agua (PINTO-CRES- calizado no monte El Pardo). Em 25 de se-
PO, 2010), distribuídos entre as 26 fontes pú- tembro de 1851, uma ordem real autorizou
blicas e os imóveis particulares conectados a realização das obras, que foram concluídas
na rede. em 1855. Três anos depois, em 24 de junho
No começo do século XVIII, as autori- de 1858, o Canal Isabel II foi inaugurado. O
dades de Madri defrontaram-se com a neces- volume de água distribuído foi ampliado ex-
sidade de ampliar a oferta de água potável. pressivamente, porém o problema do abas-
O consumo de água nas instituições públi- tecimento das partes mais altas da cidade
cas e o número de proprietários de imóveis não estava totalmente solucionado.
atendidos estavam em expansão, e algumas Em 1899, o engenheiro Diego Martins
fontes já não forneciam o mesmo volume. Rodalvo elaborou um projeto de elevação e
A situação agravou-se, porque o sistema de distribuição mecânica das águas do Canal
abastecimento por gravidade, existente na Isabel II – o que implicava em grandes in-
capital espanhola, era insuficiente no seu vo- vestimentos em máquinas e na construção
lume de água e ineficiente para abastecer as de novas redes e de reservatórios para regu-
partes mais altas da cidade, como os bairros larizar a distribuição. O projeto foi tecnica-
Chamberí, Cuatro Caminos e Bellas Vistas. mente aprovado, e as obras foram iniciadas
No começo do século XIX, as autoridades em 1907 (GONZÁLES-REGLERO, 2014).
públicas empenharam-se no estudo de no- Sob o comando de um comissário régio, o
vos projetos para suprir Madri de água po- Conselho Administrativo do Canal Isabel II
tável. Foi nesse contexto que a possibilidade trabalhou em diversos contratos com forne-
da captação de água do rio Lozoya passou cedores de material e empresas construtoras
a ser tecnicamente estudada. Autorizados e conduziu as operações de crédito neces-
pelo Decreto Real de 10 de março de 1848, sárias para o financiamento das obras. Em
os engenheiros Juan Rafo e Juan de Rivera 1911, quando as novas obras foram concluí-
apresentaram um plano de obras, propondo das, Madri contava com um moderno siste-
a captação das águas do rio Lozoya e a con- ma de abastecimento de água por elevação
dução delas através de um canal, até a cida- mecânica, projetado e construído pelo poder
de de Madri. A proposta dos engenheiros foi público.
aprovada em 18 de junho de 1851 e possibili- No que diz respeito ao abastecimento
tou o começo das obras do atual Canal Isabel de água, Madri e Barcelona são as cidades
II (PINTO-CRESPO, 2010, p. 128-129). espanholas mais contempladas pela biblio-
No mesmo ano em que a Coroa auto- grafia. A importância econômica e política
rizou a captação das águas do rio Lozoya e dessas duas cidades e a elevada concentra-
a condução delas para Madri, o ayuntamien- ção demográfica que apresentam contribuí-
to mobilizou-se para implantar na cidade ram para receberem maior atenção dos pes-

165
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
quisadores; contudo, outros fatores, como a 1932, a rede atendida 10.789 imóveis. Mes-
localização dos arquivos documentais, a sua mo apresentando um crescimento contínuo
qualidade e a existência de instituições que no número de usuários, na década de 1930,
financiam pesquisas sobre o uso das águas, a empresa Aguas de la Coruña enfrentou difi-
também devem ser considerados.7 culdades para atender a demanda da popu-
Nos últimos anos, outras grandes ci- lação sem comprometer o equilíbrio das suas
dades, como Corunha e Malága, também finanças. Em 1939, ela recebeu autorização
foram contempladas com pesquisas sobre do governo para construir um novo ponto
a história do abastecimento de água. Cada de captação no rio Mero e pode ampliar em
uma dessas localidades apresentou particu- 100 litros por segundo o volume de água for-
laridades que demandam nossa atenção. necido. Esse novo investimento na amplia-
Na cidade de Corunha, encontramos ção da oferta não impediu o surgimento de
um interessante caso de transição de regi- atritos entre o ayuntamiento e a empresa. O
mes de gestão do abastecimento de água. ponto de divergência era o aumento no va-
No final do século XIX, o serviço estava sob lor da taxa – desejado pela empresa e nega-
o controle da municipalidade (uma gestão do pela municipalidade (MIRÁS-ARAÚJO,
pública). Buscando ampliar a oferta, em 2003, p. 479).
1888, o ayuntamiento negociou a concessão Em 1949, o Conselho Municipal deci-
do serviço com a The Corunna Water Works diu assumir o controle do abastecimento, e a
Company; posteriormente, a negociação foi empresa contestou a decisão. Depois de um
revogada, e a municipalidade transferiu a impasse entre as partes envolvidas na dis-
concessão para outra empresa, a Sociedad cussão, em 1951, a municipalidade recuou e
Anónima Aguas de la Coruña, constituída em negociou uma nova concessão para Aguas de
1903 (MARTINEZ-LOPÉZ; PINEIRO-SÁN- la Coruña. O modelo de gestão privada ain-
CHES, 2003, p. 182-183). A nova empresa da estava em curso, mas a conjuntura polí-
usou o capital dos acionistas para realizar tica nacional tornou-se desfavorável para
as obras e contou com o apoio do Conselho as companhias hidráulicas com a implanta-
Municipal, que adquiriu uma cota de água ção do novo marco regulador, estabelecido
para uso público e determinou a obrigato- pelo regime franquista, em 01 de fevereiro
riedade da adesão da população à rede de de 1952. Diante de uma conjuntura política
água encanada. Em 1913, o Conselho proi- adversa, em 1954, a Diretoria de Aguas de
biu o uso das fontes públicas – alegando que la Coruña renunciou ao benefício da con-
elas estavam contaminadas – e reforçou seu cessão, transferindo a responsabilidade do
apoio a expansão do serviço prestado pela serviço para a municipalidade e abrindo o
Aguas de la Coruña.8 caminho para negociações sobre o capital da
Nos primeiros anos de funcionamento empresa.9 Criou-se, assim, um sistema mis-
do sistema de água encanada, o crescimento to de gestão da água, no qual o ayuntamento
no número de usuários foi acentuado: em possuía o poder jurídico para tomar as deci-
1908, existiam 1.149 imóveis abastecidos; em sões, e a empresa possuía o capital e a rede

166
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
de água que abastecia a cidade. No final dos morosidade na realização das obras e a insa-
anos 1960, a municipalização da água em tisfação da população, foram criticadas pela
Corunha estava praticamente consolidada, imprensa local, que apontou irregularidades
pois a municipalidade já havia comprado nos contratos e descumprimento das obriga-
mais de 85% das ações da empresa (HERE- ções assumidas pelos concessionários.
DIA-FLORES, 2013, p. 110). No final da década de 1880, estava em
Na cidade portuária de Málaga, o curso um movimento a favor da suspensão
serviço de abastecimento de água também das concessões.10 Mesmo com a existência
apresentou um histórico de transição da ges- de indícios de irregularidade nos contra-
tão pública para a privada (ocorrida no sé- tos, o serviço de abastecimento de água em
culo XIX) e um retorno ao modelo de gestão Málaga continuou sob a gestão particular
pública com a municipalização (ocorrida em até 1918, quando foi encerrado o prolonga-
1918). O interessante no caso de Málaga são do processo de municipalização – processo
a renúncia do ayuntamiento às primeiras pro- que estava sendo discutido pelo ayuntamien-
postas que recebeu para conceder o serviço to desde 1911. O caso de Málaga, apesar de
a particulares, na intenção de realizar obras possuir particularidades, é ilustrativo das
com seus próprios recursos; e, posterior- dificuldades que muitas municipalidades
mente, diante da insuficiência das suas ren- da Espanha enfrentaram depois de conceder
das, em agosto de 1875, a assinatura de um o serviço de fornecimento de água para em-
contrato com Federico Gros Crouvés pela presas privadas; neste sentido, a conclusão
municipalidade, concedendo o direito pela de Victor Heredia-Flores é pertinente:
exploração do serviço por um período de 99
De hecho, la trayectoria del abastecimiento
anos. Com a morte do concessionário, ocor- de agua en la capital malagueña no fue aje-
rida em 1879, os seus herdeiros transferiram na a la situación general del servicio en las
a concessão para outros empresários, e, para grandes ciudades españolas. En la mayoría
decepção do ayuntamiento e da população, as de ellas se habían realizado concesiones a
empresas privadas que estaban dando evi-
obras avançaram em um ritmo lento. dentes muestras de ineficiencia: fraudes,
Em 1885, a municipalidade de Málaga incumplimientos de los contratos, escasa o
assinou um contrato com Leon Gros (filho nula renovación y mejora de las instalacio-
de Frederico Gros Crouvés), autorizando a nes y equipos, etc. En consecuencia, las po-
blaciones sufrían desabastecimientos, cortes
captação de água em outras fontes e conce-
de suministro, continuos cambios de pre-
dendo um benefício perpétuo para explora- sión, frecuentes roturas de las envejecidas
ção dos mananciais que fossem incorpora- tuberías (HERRERA-FLORES, 2013, p. 113).
dos à rede. Na prática, o município ampliou
As relações entre o poder público e o
os benefícios da concessão anterior sem uma
capital particular no planejamento e na exe-
contrapartida efetiva, somente uma hipoté-
cução de obras e serviços de saneamento
tica ampliação no volume de água forneci-
têm sido um dos temas mais explorados pe-
do. As condições das concessões feitas pelo
los pesquisadores na Espanha. Ao lado dele,
ayuntamiento em 1875 e 1885, assim como a

167
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
podemos destacar a questão sanitária – aqui destacam a importância do capital privado
entendida como a relação entre as águas e na criação e na expansão das redes moder-
a salubridade da população. Um exemplo nas de distribuição de água e, ao mesmo
do enfoque na questão sanitária pode ser tempo, abordam diferentes iniciativas do
encontrado no estudo de Jesús Raúl Na- governo, voltadas para a regulamentação e
varro-García (2009) sobre o saneamento na o controle da qualidade do serviço realizado
comarca sevilhana de Aljarafe, na primeira pelas empresas concessionárias. Com base
metade do século XX. Navarro-García con- na bibliografia consultada, não se pode di-
centrou sua atenção nas relações entre o sa- zer que houve um padrão nas decisões polí-
neamento e doenças e destacou problemas ticas referentes ao abastecimento de água na
decorrentes da contaminação das águas na Espanha, uma vez que as municipalidades
respectiva comarca. adotaram diferentes estratégias para condu-
A dependência de poços para capta- zir a gestão do serviço e, em alguns casos,
ção foi uma das características de Aljarafe enfrentaram dificuldades para controlar as
no começo do século passado – período em ações das empresas particulares.
que ainda predominava o “sistema clássi-
co” de abastecimento na maior parte das
Conflitos de interesses e abastecimento
cidades espanholas. Naquele contexto, as
autoridades públicas espanholas contavam de água no México
com diversas leis e regulamentos para coi-
A bibliografia sobre o uso das águas
bir a contaminação dos mananciais hídricos,
no México é ampla e diversificada; nesse
dentre os quais estavam a Instrucción de Sa-
país, existe uma tradição de pesquisas sobre
nidad (Decreto Real de 12 de janeiro de 1912)
o tema e institutos públicos que fomentam
e o Reglamiento de Sanidad Municipal (1925).
projetos interdisciplinares de grande esca-
Apesar da existência da legislação e do em-
la. Inseridos num ambiente acadêmico que
penho das autoridades sanitárias para iden-
valoriza as discussões sobre a gestão de re-
tificar a origem da contaminação dos poços e
cursos hídricos e o desenvolvimento susten-
coibir práticas que prejudicavam a qualida-
tável, historiadores, geógrafos e sociólogos
de das águas, durante toda a primeira me-
mexicanos produziram diversos estudos
tade do século XX, a população de Aljarafe
sobre o uso das águas ao longo dos últimos
continuou dependendo da água captada nos
anos.
poços para suprir as suas necessidades do-
No final da década de 1990, pesqui-
mésticas. Possivelmente, muitas localidades
sadores como Luis Aboites-Aguilar, Diana
no sul da Espanha, ou mesmo em outras re-
Birrichaga-Gardida e Blanca Estela Suárez-
giões, enfrentaram a mesma situação antes
-Cortes publicaram obras de referência, con-
da realização de grandes obras de sanea-
templando temas como a importância das
mento.
obras de irrigação para o desenvolvimento
No conjunto, os estudos produzidos
do México, os conflitos políticos entre o go-
sobre o abastecimento de água na Espanha
verno federal e as municipalidades, a parti-

168
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
cipação do capital privado no fornecimento informações necessárias para uma distribui-
de água e as relações entre urbanização e ção eficiente da água.
obras sanitárias (ABOITES-AGUILAR, 1998 Em mais de uma ocasião, a existência
e 1999; BIRRICHA-GARRIDA, 2003; SUÁ- de divergências entre os interesses públi-
REZ-CORTES, 1998). cos e os interesses privados desafiaram a
Apesar da diversidade de assuntos e autoridade e a competência do ayuntamien-
de escalas espaciais de análise, existem dois to. Inmaculada Simón-Ruiz destaca quatro
conjuntos temáticos que ganham relevância situações de conflitos, ocorridas durante a
quantitativa na bibliografia mexicana: as modernização do abastecimento de água na
práticas de irrigação e o abastecimento de Cidade do México (SIMÓN- RUIZ, 2013).
água nas cidades. O segundo conjunto temá- Dos quatro conflitos destacados pela autora,
tico contempla as relações entre o saneamen- o que melhor sintetizou a complexidade da
to e a urbanização no México e, consequen- exploração comercial dos recursos hídricos
temente, oferece subsídios para pensarmos na capital mexicana, envolveu a municipa-
como esse país conduziu as questões refe- lidade e o empresário Carlos Medina Orma-
rentes ao abastecimento de água e ao des- echea. Em 1844, o empresário assinou um
carte do esgoto. contrato com a municipalidade, recebendo o
Cronologicamente, existem diversos direito de explorar o abastecimento de água
estudos focados no período do governo de na cidade, mediante a realização de determi-
Porfirio Díaz (1876-1911). Nesse período, nadas obras para ampliar o volume e qualifi-
ocorreram importantes obras de urbaniza- car a distribuição do líquido.
ção e saneamento na capital do México. Pla- A iniciativa encaminhada pelo ayun-
nejadas e executadas pelo grupo de técnicos tamiento provocou uma reação negativa em
conhecidos como os “científicos”, as obras alguns setores da sociedade, e surgiram
incluíam, além do abastecimento de água e textos na imprensa criticando a exploração
da construção de uma rede de esgoto, ini- comercial da água. Os adeptos da iniciativa
ciativas para reduzir os danos provocados também se manifestaram através do abaixo-
pelas enchentes. -assinado organizado pelo próprio Orma-
Nas décadas finais do século XIX, a echea. Considerando as críticas recebidas
municipalidade da capital procurou ampliar pela imprensa e a objeção do presidente
a oferta de água e defrontou-se com os se- Porfirio Díaz ao contrato, a municipalidade
guintes problemas: de um lado, os possui- cancelou o compromisso assumido com Or-
dores de mercedes11 não aceitavam a supres- maechea, decepcionando o empresário e o
são do direito de captar/conduzir e usar a grupo de 800 cidadãos que assinaram o ma-
água em suas propriedades; de outro, mui- nifesto, apoiando a privatização do serviço.
tos proprietários de imóveis da área urbana Nesse caso específico de conflito pelo uso da
dificultavam o trabalho do governo, boico- água na Cidade do México, Simón-Ruiz des-
tando o pagamento do serviço ou negando tacou a participação da opinião pública nas
discussões que foram produzidas em torno

169
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
da concepção da água como bem público e para companhias particulares, criadas na se-
ressaltou a importância da receita gerada gunda metade do século XIX.
pelo fornecimento da água realizado pela Na cidade de Puebla, em 1855, o ayun-
municipalidade.12 tamiento assinou um contrato com o empre-
A perda do controle do serviço, que a sário Ignacio Guerrero Manzano, conceden-
municipalidade da capital mexicana procu- do-lhe o direito de explorar o serviço por 44
rou evitar, ocorreu em 1903, quando Porfi- anos em troca da realização de investimen-
rio Díaz transferiu diversas funções admi- tos, que deveriam ser feitos na ampliação
nistrativas do ayuntamiento para o governo do volume de água fornecido e na extensão
federal. Enfraquecendo a municipalidade, da rede distribuidora. As condições do con-
o presidente fortaleceu o governo federal trato não obrigavam o fornecimento para
e ampliou o espaço para a atuação do seu todas as habitações da cidade e incluíam a
grupo de “científicos”. Na concepção dos manutenção das antigas mercedes que bene-
“científicos” e de outros adeptos do regime ficiavam alguns proprietários de imóveis.
de Porfirio Díaz, os problemas sanitários Cinco anos depois da Empresa de Cañarías de
que a população da capital enfrentava eram Puebla iniciar as suas atividades, Manzano
provocados pela falta de educação do povo propôs modificações no contrato, alegando
e pelos proprietários de imóveis que não se- que muitos proprietários de mercedes não es-
guiam os preceitos de higiene exigidos pelo tavam pagando a taxa exigida e muitos cida-
governo. dãos usavam as fontes da municipalidade,
Em 1913, o governo federal concluiu as prejudicando o funcionamento da empresa.
obras do Proyecto de Marroquín e inaugurou No sentido inverso, os proprietários de mer-
um aqueduto de 27 km, para ampliar o for- cedes argumentavam que o direito de uso
necimento de água na Cidade do México. O particular das águas estava sendo violado
aqueduto transportava a água captada nos (TOXQUI-FURLONG, 2009).
mananciais de Xochimilco, e o seu funciona- Em 1872, o governador da Província
mento demandava o uso de energia elétrica posicionou-se sobre o impasse, impondo
para as bombas de captação. Foi uma obra algumas restrições ao trabalho da Empresa
de engenharia de grande porte para a época, de Cañarías de Puebla, e determinou que os
mas, ao contrário do que pensavam os “cien- proprietários de mercedes pagassem a taxa
tíficos”, o uso de novas tecnologias (energia fixada, para receber a água. Essa interven-
elétrica, máquinas, armações de cimento e ção do governo provincial a favor da empre-
canos de ferro) não era suficiente para suprir sa de Mazano não impediu que, em 1882, a
a crescente demanda por água da capital na- municipalidade cancelasse a concessão com
cional. base no descumprimento de cláusulas con-
O empenho do poder público para con- tratuais.
trolar o abastecimento de água na Cidade do Durante a segunda metade do sécu-
México não foi uma regra nacional. Em mui- lo XIX, o governo mexicano incentivou a
tas cidades mexicanas, o serviço foi entregue criação de empresas para uso econômico

170
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
das águas, buscando atrair capitais estran- que foi criticada por diversas autoridades
geiros para a geração de energia, irrigação políticas locais (CONTRERAS-UTRERA,
e abastecimento urbano. Dentro daquela 2011 e 2013).
conjuntura, diversas cidades passaram a No começo do século XX, a população
ser atendidas por companhias particulares: de Chiapas estava dispersa em diversas co-
Puebla (1852), Cualiacán (1887), Córdoba munidades, muitas das quais organizadas
(1887), San Juan Bautista (1896), San Luis de em torno de uma economia rural, e, conse-
Potosí (1894), Torreón (1904), dentre outras. quentemente, eram poucas as localidades
Esse crescimento de empresas atuando no que apresentavam expressiva densidade de-
fornecimento de água foi estimulado pelo mográfica. Mesmo nessas condições, a quan-
poder público de diversas formas, dentre tidade de água era escassa e os problemas de
as quais estavam a concessão de longos pe- contaminação existiam. Os “buracos negros”
ríodos para exploração do serviço, o auxílio usados nas propriedades rurais, assim como
financeiro, a exclusividade no uso de um de- a ausência de redes de esgoto nas cidades e
terminado curso hídrico e, eventualmente, a os estábulos e matadouros nas margens dos
obrigatoriedade de adesão dos proprietários riachos, contribuíram para a contaminação
a rede de água (BIRRICHAGA-GARDIDA, das águas e a elevação dos índices de óbi-
2014). to por doenças, como difteria, febre tifoide
Saindo do plano da gestão econômica e cólera (CONTRERAS-UTRERA, 2011 e
e política do abastecimento de água no Mé- 2013). Enfrentando restrições na quantidade
xico, podemos explorar o assunto na pers- de água disponível e captando o líquido em
pectiva sanitária – certamente uma das mais mananciais contaminados, a população de
relevantes para os interessados nas relações Chiapas pagou em vidas o preço pela preca-
entre a qualidade das águas e a saúde pú- riedade dos serviços de saneamento.
blica. Neste sentido, os trabalhos de Julio Não se pode esperar que os estudos so-
Contreras-Utrera sobre o saneamento e a bre o uso da água no México forneçam um
salubridade no estado mexicano de Chiapas conjunto homogêneo, uma vez que existem
oferecem um exemplo interessante. grandes diferenças entre a distribuição dos
Nas cidades e vilas de Chiapas do final recursos hídricos e as necessidades de cada
do século XIX, existiam diferentes tipos de localidade. Em núcleos urbanos de grande
captação de água, e diversas comunidades porte, como a Cidade do México, Puebla e
enfrentavam dificuldades para o abasteci- Guadalajara, a demanda por abastecimen-
mento da população. O clima árido e o lon- to doméstico e uso industrial foi maior; em
go período de estiagem anual agravavam as outras áreas do país, a demanda para irriga-
dificuldades, reduzindo o volume dos rios e ção ou para uso da água na mineração foi
dos córregos usados pela população. Outro mais acentuada. Da mesma forma, não se
fator agravante, no abastecimento de água pode pensar os efeitos da política de uso
em Chiapas, estava no desvio dos cursos de das águas implantada por Porfirio Díaz sem
água para benefício de particulares – prática observarmos o posicionamento dos municí-

171
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
pios; e, nesse sentido, os estudos mexicanos Rio da Prata foram iniciadas sob a direção
apresentam diversos casos de conflitos entre do engenheiro John Coghlan. Uma parte
os ayuntamientos e o governo nacional e tam- do capital aplicado nessas obras foi obtida
bém contemplam a resistência dos proprie- mediante um empréstimo contraído pelo
tários de mercedes em aceitar as mudanças governo com a empresa Ferrocarril Oeste, e,
no sistema de abastecimento de água. consequentemente, parte da água captada
no Rio da Prata passou a ser fornecida para
essa empresa. A participação da Ferrocarril
Buenos Aires: uma experiência de
Oeste no fornecimento de água gerou dis-
abastecimento público em larga escala cussões entre as autoridades políticas e re-
sultou na criação da Lei Provincial de 26 de
Os primeiros projetos de engenha-
setembro de 1870, através da qual a empresa
ria para a criação de um sistema de abas-
foi afastada da Comisión de Aguas Corrien-
tecimento de água em Buenos Aires foram
tes, Cloacas y adoquinados, órgão criado para
apresentados ao governo pelo engenheiro
administrar as obras e serviços de abasteci-
Carlos Enrique Pellegrini. Em duas ocasiões
mento que estavam em curso em Buenos Ai-
(1829 e 1852), Pellegrini propôs o benefício
res (RÜCKERT, 2013).
da exploração do serviço em troca dos in-
O grupo de adeptos de um sistema de
vestimentos que seriam realizados e recebeu
abastecimento de água controlado pelo po-
uma resposta negativa. Depois dele, outros
der público defrontou-se com um problema
interessados apresentaram propostas ao go-
de ordem financeira: como concluir as novas
verno. Nos anos de 1857 e 1858, formou-se
obras projetadas pelo engenheiro inglês John
uma Comisión Especial para estudar projetos
Fredrick La Trobe Bateman, sem recorrer ao
de abastecimento de água e, novamente, as
capital particular? Inicialmente, o Banco da
propostas recebidas foram rejeitadas. Essa
Província auxiliou a municipalidade através
Comisión emitiu um documento, registrando
de empréstimos destinados especificamente
sua oposição a participação do capital pri-
para as obras de saneamento, mas, apesar
vado no abastecimento de água (BORDI DE
deste auxílio, no período de 1887 a 1880, as
RAGUCCI, 1997, p. 34).
obras foram paralisadas.
Assim como ocorreu em grandes ci-
Em 1881, concluiu-se o processo de
dades europeias, como Paris e Londres, em
federalização de Buenos Aires, e a respon-
Buenos Aires, as autoridades políticas esta-
sabilidade pela conclusão das obras de sa-
vam dividas a respeito de como conduzir os
neamento foi transferida para o governo
investimentos necessários no saneamento.
nacional. Sob o comando do ministro Edu-
Reagindo ao impacto das epidemias de cóle-
ardo Wilde, o governo nacional encaminhou
ra e de febre amarela que atingiram Buenos
negociações para o arrendamiento das obras
Aires no começo da década de 1860, o go-
de saneamento da capital – obras que agora
verno provincial autorizou o uso de recur-
incluíam, além do fornecimento de água, a
sos públicos para o abastecimento da cidade
rede de “cloacas”, projetada por Bateman.
e, no ano de 1868, as obras para captação no

172
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
Buscando privatizar o serviço, em 1887, o Para contornar a crise configurada em
Presidente da República enviou para o Con- torno do saneamento de Buenos Aires, em
gresso Nacional um contrato, fixando as 1890, o governo nacional, presidido por Ju-
condições do arrendamiento. O contrato foi arez Celman, decidiu cancelar o contrato de
discutido em oito seções no Senado, em 11 arriendamiento e assumiu o compromisso de
seções na Câmara dos Deputados e acabou concluir as obras. Com o cancelamento do
sendo rejeitado por não atender as exigên- contrato com a The Buenos Aires Water Sup-
cias da legislação (BORDI DE RAGUCCI, ply and Drainage Company, o saneamento de
1997). Depois de fracassar na primeira tenta- Buenos Aires passou a ser controlado pelo
tiva, em 1888, o Presidente encaminhou um poder público, tanto na parte do abasteci-
novo contrato de arrendamiento, assinado mento de água, quanto na parte do esgoto.
com o empresário Samuel B. Hale, e obteve Depois de assumir o controle definiti-
a aprovação do Congresso. vo das obras e dos serviços de saneamento
A polêmica transferência do controle na capital nacional, o governo argentino de-
das obras de saneamento, em Buenos Aires, frontou-se com o desafio de expandir a ofer-
do governo para o capital particular foi de- ta de água e de redes de esgoto, contando
talhadamente estudada por Olga Bordi de apenas com recursos públicos. Visando res-
Ragucci. Essa historiadora destacou os atri- ponder ao desafio, ele procurou organizar
tos entre o Congresso e o Poder Executivo um quadro de técnicos especializados em
na fase de aprovação do arrendamiento, assi- obras de saneamento. No período de 1901
nado com Samuel B. Hale; e, posteriormen- a 1912, esses técnicos estavam reunidos na
te, abordou os conflitos de interesse decor- Direcion General de Salubridad de la Nación, ór-
rentes desse arriendamento. Ainda em 1888, gão subordinado ao Ministério de Obras Pú-
Hale transferiu os direitos negociados com blicas. A partir de 1912, com a criação da au-
o governo para o grupo de investidores de tarquia Obras Sanitárias de la Nación (OSN),
Londres, registrado com o nome The Buenos o grupo de técnicos especializados em sane-
Aires Water Supply and Drainage Company. A amento recebeu uma expressiva autonomia
partir da transferência, a situação se compli- administrativa e financeira. Sob a direção da
cou, porque a empresa britânica reivindicou OSN, o governo argentino investiu grandes
o controle na execução das instalações sani- recursos financeiros na expansão do sanea-
tárias e na cobrança da taxa pelos serviços mento na capital Buenos Aires e em outras
de água e esgoto. Reagindo as intenções da regiões da Argentina.
empresa, os proprietários de imóveis inicia- O desempenho da empresa OSN nas
ram um boicote ao pagamento da taxa e re- primeiras décadas do século passado foi
ceberam o apoio da imprensa. Criticada pela estudado por Andrés Regalsky e Norma
sociedade portenha, a empresa também en- Lanciotti. Os autores analisaram a contí-
trou em atrito com o governo por questões nua expansão dos investimentos públicos
de ordem técnica, referentes à conclusão das em saneamento e a ampliação dos traba-
obras. lhos da OSN, inicialmente restritos à cida-

173
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
de de Buenos Aires, para as demais regiões governo federal. Rosário-Solveira abordou
da Argentina. No que diz respeito à capital as dificuldades encontradas pela municipa-
nacional, os resultados foram realmente im- lidade de Córdoba em atender a crescente
pressionantes: no período entre 1910 e 1935, demanda por água e esgoto e concedeu uma
o número de usuários dos serviços de sane- atenção especial para as discussões que sur-
amento apresentou um aumento de 400% giram quando o serviço de saneamento foi
(LANCIOTTI; REGALSKY, 2014, p. 191). transferido para a OSN.
A rápida expansão do saneamento na As autoridades municipais de Córdoba
Argentina contou com a participação de em- estavam cientes da necessidade de grandes
presas europeias especializadas em grandes recursos financeiros para expandir o sane-
projetos de engenharia e no fornecimento amento e, ao mesmo tempo, estavam resis-
de materiais e máquinas necessários para as tentes em aceitar as condições fixadas pela
obras. A participação dessas empresas im- legislação federal. Discussões a parte, em
plicava na importação de novas tecnologias 1904, a cidade de Córdoba acabou aderindo
e na cooperação entre profissionais de enge- ao programa federal de saneamento – um
nharia argentinos e estrangeiros. No final do programa que implicava no contínuo forta-
século XIX, empresas britânicas forneceram lecimento da empresa Obras Sanitarias de la
materiais e máquinas para a construção das Nacion. Nesse sentido, uma das constatações
obras projetadas por Bateman – engenheiro feitas por Beatriz Rosário Solveira, foi que:
que também assumiu a responsabilidade de
el Estado federal, en vez de cooperar con
comprar os equipamentos na Europa; pos- los gobiernos locales para realización de
teriormente, com a expansão dos investi- las obras tanto desde el punto de vista fi-
mentos públicos em saneamento, surgiram nanciero como técnico, pero sin construir-
empresas alemãs interessadas em ocupar o las ni administrarlas, lo que hizo fue inter-
venir a través de organismos federales en
mercado, que sinalizava uma boa expectati- la construcción y operación de los sistemas
va de lucro (MÉNDEZ, 2013). de agua potable y cloaca (ROSÁRIO-SOL-
Na bibliografia produzida na Argen- VEIRA, 2014, p. 147).
tina, além dos estudos que destacam o sa-
A citação destacada é oportuna para
neamento de Buenos Aires e a atuação do
apontarmos os efeitos colaterais da centra-
governo federal através da empresa Obras
lização do saneamento promovida pelo go-
Sanitarias de la Nacion, importa ainda des-
verno argentino. Sob o comando da OSN, a
tacar o trabalho de Beatriz Rosário-Solveira
expansão do abastecimento de água e das
sobre o saneamento na cidade de Córdoba
redes de esgoto na Argentina alcançou re-
(ROSÁRIO-SOLVEIRA, 2014). Nesse caso,
sultados sem precedentes na América Lati-
trata-se de um estudo diferenciado, uma vez
na, mas, em contrapartida, custou a perda
que em Córdoba ocorreu uma experiência
da autonomia dos municípios nas questões
de concessão dos serviços de saneamento
referentes ao saneamento, transferiu a recei-
para empresas particulares e, posteriormen-
ta das taxas de água e esgoto para o governo
te, uma transferência desses serviços para o

174
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
federal e provocou o gradual endividamen- desenvolvimento de empresas de abasteci-
to da empresa Obras Sanitarias de la Nación. mento de água apresentaram particularida-
des na América Latina. No México, a comer-
cialização da água encontrou resistência de
Considerações finais
setores importantes da sociedade e gerou
O objetivo deste texto não foi construir conflitos entre as autoridades municipais
uma história comparada sobre o abasteci- e o governo nacional – ambos interessa-
mento de água na Europa e na América La- dos no controle dos mananciais hídricos e
tina. No entanto, a bibliografia consultada na arrecadação da receita que o serviço de
aponta duas importantes possibilidades de abastecimento de água gerava. Na Argenti-
comparação que demandam nossa atenção: na, depois de prolongadas discussões entre
a primeira diz respeito ao uso do capital par- adeptos do liberalismo e os seus críticos, o
ticular no “negócio das águas” e a segunda governo assumiu as obras de saneamento
contempla as diferentes iniciativas do poder em Buenos Aires e implantou um serviço
público para promover o abastecimento de público de abastecimento de água, que foi
água nos países destacados pelo estudo. gradualmente expandido para todo o país.
A aplicação do capital particular na Essas diferenças – e também as semelhanças
captação, no tratamento e na distribuição de apontadas no decorrer do artigo – justificam
água foi uma experiência iniciada na Europa a continuidade das pesquisas sobre a histó-
e influenciada por fatores como a industria- ria do abastecimento de água, tanto na Euro-
lização e a concentração demográfica em de- pa, quanto na América Latina.
terminadas cidades. Conforme demonstra a
bibliografia consultada, a crescente deman- Abstract
da por água potável, decorrente da Revolu-
ção Industrial, possibilitou o surgimento de During the last decades of the twentieth
empresas especializadas na fabricação de century, the water supply was gradually
canos, máquinas e equipamentos hidráuli- getting more attention from historians
cos e, ao mesmo tempo, possibilitou a orga- who addressed the issue from different
theoretical and methodological perspec-
nização de companhias que negociavam a
tives and multiple spatial scales. Con-
exploração do abastecimento de água com o
sidering the appreciation of the subject
poder público.
in contemporary historiography, wish
No decorrer do século XIX, a comer- to construct this paper an overview of
cialização da água tornou-se parte do coti- studies on the history of water supply in
diano das grandes cidades europeias e, de Europe and Latin America, highlighting
certa forma, foi incentivada por diferen- issues such as the relationship between
tes tipos de ações políticas. No continente water supply and private capital, con-
americano, também ocorreu um processo flicts of interest existing in the manage-
de comercialização das águas. No entanto, ment of water resources and the role of
as condições políticas e econômicas para o government in the creation and manage-

175
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
ment of modern water supply systems.
The first section of the paper highlights Palabras claves: Historia. Historiografia.
researches conducted in England and Suministro de agua.
France - two pioneering countries in
studies on the history of water supply.
Further, the article explores works pro-
Notas
duced by the Spanish historiography. 1
Em 1989 o livro de Jean-Pierre Goubert foi tra-
The third section includes moderniza- duzido para a língua inglesa pela Universidade
tion experiences of the water supply in de Princeton. Neste artigo, consultei a tradução
inglesa da obra, intitulada The Conquest of Water
Mexico and Argentina. (GOUBERT, 1989).
2
Na década de 1840, Henri Emmery encarregou-
Keywords: History. Historiography. Wa- -se de organizar um detalhado levantamento da
situação do fornecimento de água em Paris. Ele
ter supply. registrou todas as ruas e residências que possuíam
água e, dessa forma, pode identificar as áreas mais
precárias (BOCQUET; CHATZIS; SANDER, 2014).
Resumen 3
Na Paris do século XIX, havia uma grande dispa-
ridade entre o volume de água fornecido na área
Desde las décadas finales del siglo XX, el central e o volume fornecido nas periferias da ca-
pital francesa. A redução desta disparidade foi um
suministro de agua recebió una especial desafio para o poder público, na medida em que a
atención de los historiadores que han extensão da rede e as obras necessárias para capta-
abordado el tema con diferentes pers- ção e distribuição demandavam altos investimen-
tos e apresentavam certa complexidade técnica.
pectivas teóricas y metodológicas y con 4
O declínio da mortalidade e o crescimento da po-
distintas escalas espaciales. Teniendo en pulação europeia nos séculos XVIII, XIX e come-
cuenta la apreciación del tema en la histo- ço do XX é um assunto debatido por historiado-
riografía contemporánea, el artículo pre- res, economistas e demógrafos. Uma das teorias
mais conhecidas nesse debate foi proposta por
senta una visión general de los estudios Thomas Mckeown que em 1978 atribuiu a dimi-
sobre la historia del suministro de agua nuição da mortalidade ao aumento na oferta de
en Europa y América Latina, destacando alimentos disponíveis para a população. A teoria
de Mckeown, apesar de fundamentada em um
temas como la relación entre la oferta de amplo volume de dados estatísticos sobre a Eu-
agua y el capital privado, los conflictos ropa, não contempla fatores importantes, como
de interés existente en la gestión de los o crescimento da fecundidade, ocorrido ao lon-
go do século XIX, as novas práticas de profilaxia
recursos hídricos y el papel del gobierno (como o uso da vacina), ou as variações na taxa
en la creación de los sistemas modernos de óbito entre áreas urbanas e áreas rurais (MA-
de suministro. La primera sección del TÉS-BARCO, 1999, p. 219-221).
texto destaca investigaciónes llevadas a
5
O impressionante crescimento no número de em-
presas privadas explorando o fornecimento da
cabo en Inglaterra y Francia - dos países água na Inglaterra na passagem do século XIX
pioneros en los estudios sobre la historia para o XX é um indicativo incontestável de que
de suministro de agua. En secuencia, el havia uma relação entre a urbanização/indus-
trialização e a comercialização da água. A mesma
artículo explora algunas obras produ- relação pode ser encontrada nos estudos que tra-
cidas por la historiografía española. La tam do abastecimento de água na Espanha e na
tercera sección enfatiza estúdios centra- França.
6
Sobre a aplicação da Engenharia Hidráulica no
dos en modernización de suministro de “sistema moderno” de abastecimento de água,
agua en México y Argentina.

176
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
Juan Manuel Matés-Barco afirma que: “Algunas a criação de fontes públicas. A distribuição de
soluciones técnicas estaban disponibles mucho mercedes foi uma prática comum na América Es-
antes de la configuración del nuevo sistema - la panhola. Cabe ressaltar que a concessão não cria-
ingeniería hidráulica-, lo que faltaba en bastantes va “derechos definitivos sobre la propiedad del
casos eran los componentes económicos - recur- agua, pues el verdadero dueño del agua seguía
sos financieros, demanda solvente e intensiva-, y siendo el vecindario de la ciudad” (BIRRICHA-
organizativos. De este modo, se entiende que el GA-GARDIDA, 2003, p. 13).
recurso a la empresa privada fue en realidad la 12
Inmaculada Simón-Ruiz afirma que “el agua era
solución al problema organizativo básico del sis- una importante fuente de ingresos a la que el
tema clásico y hasta de todo el Antiguo Régimen Gobierno Municipal no debía renunciar porque
en su conjunto” (MATÉS-BARCO, 2009, p. 37). se trataba de uno de los pocos ramos que había
7
Em Madri, a Fundación Canal Isabel II realiza um evolucionado positivamente entre 1885 y 1895,
importante trabalho de conservação documental llegando a participar en 12.91 % en los ingresos
e divulgação do Patrimônio Histórico e Cultural, totales del Ayuntamiento en 1883 (2009, p. 150).
formado pelas obras do Canal Isabel II, que foram
desativadas durante a modernização do sistema
de abastecimento da capital. Em Barcelona, a Com- Referências
panhia Aguas de Barcelona organizou um amplo
acervo documental sobre as suas atividades e co-
laborou com pesquisas voltadas para a história do ABOITES-AGUILAR, L. El agua de la nación:
abastecimento de água na capital da Catalunha. una historia política del México (1846-1946).
8
Alberte Martínez López e Carlos Pineiro Sán-
México: CIESAS, 1998.
chez destacam a polêmica gerada em torno do
fechamento das fontes públicas pelo Conselho ______. Relación sociedad-naturaleza desde la
Municipal de Corunha. Trata-se de um caso que historia de los usos del agua en México (1900-
envolveu suspeitas de benefício do Conselho à
1940). In: ______. (Org.). Estudios sobre historia
empresa, a insatisfação de cidadãos privados do
uso das fontes e a preocupação com a qualidade y ambiente en América. México: El Colégio de
das águas consumidas pela população. O uso de México/Instituto Pan-americano de Geografia
exames laboratoriais para comprovar a contami- y Historia, 1999. p. 172-190.
nação das fontes ampliou a polêmica (MARTI-
NEZ-LOPÉZ; PINEIRO-SÁNCHES, 2003, p. 187). BIRRICHAGA-GARDIDA, D. La empresa de
9
A renúncia da concessão feita pela empresa Aguas cañerías de Puebla, 1855-1882. Boletín del Ar-
de la Coruña em 1954 foi em parte consequência chivo Histórico del Agua, México, n. 24, p. 13-21,
dos atritos com a municipalidade que impediu o 2003.
reajuste das taxas e, em parte, consequência do
Decreto Federal de 1º de janeiro de 1952; esse ______. (Coord.). La modernización del sistema
decreto determinava que “el Estado regulaba de agua potable en México, 1810-1950. México: El
el abastecimiento de agua a las poblaciones con Colegio Mexiquense, 2007.
ayuda estatal, sólo cuando los Ayuntamientos
fuesen los gestores del servicio” (MIRÁS-ARAÚ- ______. La regulación de las empresas de abas-
JO; REGO-VEIGA, 2004, p. 283). to de agua en México, 1855-1930. Transportes,
10
Segundo Heredia-Flores: “En noviembre de 1887 Servicios e Telecomunicaciones (TsT), Madri, n.
se aprobó un informe que defendía la nulidad
de ambos contratos, aunque no se hizo nada al 26, p. 198-222, mar. 2014.
respecto. Los incumplimientos fueron debatidos BOCQUET, D; CHATZIS, K; SANDER; A. S.
de nuevo en 1896, y en octubre de 1905 el pleno From free good to commodity: universalizing
resolvió la rescisión y anulación de los mencio-
nados contratos, quedando de nuevo sin ejecutar the provision of water in Paris (1830–1930).
por la actitud pasiva del alcalde” (2013, p. 111). Geoforum, n. 39, p. 1821-1832, 2008.
11
As mercedes eram concessões feitas pelos ayunta-
______. Paris au-delà du paradigme haussmen-
mientos (ou pelo rei) para uso particular da água.
O mercedado – cidadão beneficiado pela conces- nien: les détours de la modernisation du réseau
são – era o responsável pelas obras necessárias d’adducion d’eau (1830-1940). Transportes, Ser-
e, em alguns casos, assumia o compromisso com

177
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
vicios e Telecomunicaciones (TsT), Madri, n. 26, GUILLERME, A. Le Temps de l’eau: la cité, l’eau
p. 90-108, mar. 2014. et les techniques. Seyseel: Champ Vallon, 1983.
BORDI DE RAGUCCI, O. N. El agua privada HEREDIA-FLORES, V. M. Municipalización y
en Buenos Aires (1856-1892): negocio y fracaso. modernización del servicio de abastecimiento
Buenos Aires: Vinciguerra, 1997. de agua en España: el caso de Málaga (1860-
CONTRERAS-UTRERA, J. Entre la insalubridad 1930). Agua y Territorio, Jaén, n. 1, p. 103-118,
y la higiene: el abasto de agua en los principales jan./jun. 2013.
centros urbanos de Chiapas, 1880-1942. Tuxtla JACQUOT, A. La Compagnie Générale des
Gutiérres: Universidad Autónoma de Puebla, Eaux, 1852-1952: un siécle des debuts à la re-
2011. naissance. Entreprises et Historia, Local de pu-
______. Entre endemia y epidemia: el paludis- blicação, n. 30, p. 32-44, set. 2002.
mo en el Estado de Chiapas (1873-1940). In: LANCIOTTI, N. S.; REGALSKY, A. Los siste-
NAVARRO-GARCÍA, J. R.; TEIXEIRA, S.; VI- mas de agua potable en la Argentina: gestión
LLASEÑOR, A. T. (Coords.). Gestión hidráulica pública y gestión privada en dos grandes ciu-
en América Latina y España. Sevilla/Campo de dades, Buenos Aires y Rosário. Transportes,
Goytacazes: Seminario Permanente ATMA/ Servicios y Telecomunicaciones (TsT), Madri,
Universidade Estadual do Norte Fluminense n. 26, p. 162-198, mar. 2014.
Darcy Ribeiro, 2013. p. 163-185. LORETO-LÓPEZ, R. Agua, piel y cuerpo en la
CRESPO-PINTO, V (Dir.). Los Viajes de agua historia cotidiana de una ciudad mexicana: Puebla,
de Madrid durante el Antiguo Régimen. Madri: siglos XVI-XX. México (DF): Educación y Cul-
Fundación Canal Isabel II/Universidad de tura, 2010.
Madrid, 2010. MALISSARD, A. La cultura del agua en la Roma
EVANS, H. B. Water distribution in Ancient antigua: los romanos y el agua. Barcelona: Her-
Rome: the evidence of Frontinus. Ann Arbor: Uni- der, 1996.
versity of Michigan Press, 1997. MARTINEZ-LOPÉZ, A.; PINEIRO-SÁNCHES,
FERNANDEZ, A.; PEREZ-CASTROVIEJO, P. C. Nacemento e desenvolvimento dun servicio
El agua y la ciudad: Burdeos y Bilbao (1850- público esencial: o abastecimento de agua na ci-
1920), normas técnicas y normas sociales. Zai- dade de A Coruña, 1903-1936. Cuadernos de Es-
nak:  cuadernos de Antropología-Etnografía, Do- tudios Gallegos, Santiago, f. 116, p. 177-211, 2003.
nostia, n. 23, p. 335-350, 2003. MATÉS-BARCO, J. M. El abastecimiento de
FRONTINUS, S. J. Das águas da cidade de Roma agua de Barcelona: de las tentativas de la mu-
(97 d.C. – 104 d.C.). São Paulo: CETESB, 1983. nicipalizacion al predomínio de la empresa
GONZÁLES-REGLERO, J. El sistema de agua privada (1800-1900). Revista de la Faculdad de
elevada del Canal Isabel II: 1907-1911. Trans- Ciencias Humanas de Jáen, Jaén, v. 3, p. 57-79,
porte, Servicios y Telecomunicaciones (TsT), Ma- 1994.
dri, n. 26, p. 12-36, mar. 2014. ______. La Conquista del agua: Historia econó-
GOUBERT, J. P. La conquête de l’eau: l’avénement mica del abastecimiento urbano. Jaén: Univer-
de la santé à l’âge industriel. Paris: R. Lanffont, sidad de Jaén, 1999.
1986. ______. El desarrollo de las redes de agua po-
______. The conquest of water. Princeton: Princ- table: modernización y cambio en el abaste-
eton University Press, 1989. cimiento urbano. Agenda Social, Campos dos
Goytacazes, v. 3, n. 1, p. 25-58, jan./abr. 2009.

178
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179
MÉNDEZ, P. Tecnología extranjera en las RÜCKERT, F. Q. Experiências de saneamen-
obras de salubridad rioplatenses de los siglos to na cidade de Buenos Aires: dos projetos
XIX-XX. Agua y Territorio, Jaén, n. 1, p. 41-54, de Pellegrini a conclusão do projeto Bateman
jan./jun. 2013. (1829–1905). Revista Esboços, Florianópolis,
MILLWARD, R. La distribution de l’eau dans v. 20, n. 29, p. 68-87, ago. 2013.
les villes en Grande Bretagne au XIX et XX SUÁREZ-CORTES, B. E. (Coord.). Historia de
siècles: le gouvernement municipal et le dilem- los usos del agua en México: oligarquías, em-
me des compagnies privées. Histoire, économie presas y ayuntamiento (1840-1890). México:
& société, Paris, n. 26, p. 111-128, jul./dez. 2007. CIESAS/Instituto Mexicano de Tecnología del
MIRÁS-ARAÚJO, J. La regulación del abaste- Agua, 1998.
cimiento de agua en la ciudad de A Coruña TOXQUI-FURLONG, M. G. Apropriación y
durante el fraquismo: de la gestión privada a distribuición de agua potable en la ciudad de
la municipalización. SEMATA: Ciências Sociais Puebla, siglo XIX. In: LORETO-LÓPEZ, R. (Co-
e Humanidades, Santiago de Compostela, v. 15, ord.). Agua, poder urbano y metabolismo social.
p. 473-486, 2003. Puebla: Instituto de Ciencias Sociales y Huma-
MIRÁS-ARAÚJO, J.; REGO-VEIGA, G. Red y nidades, 2009. p. 131-167.
crescimiento urbano: los efectos de la expan-
sión de A Coruña sobre el abastecimiento de
agua, 1939-2003. Boletín de la A.G.E., Madri, n.
37, p. 279-298, 2004.
NAVARRO-GARCÍA, J. R. El saneamiento en
la comarca sevillana del Ajarafe en la primera
mitad del siglo XX. Anduli: Revista Andaluzia de
Ciencias Sociales, Andaluzia, n. 8, p. 99-120, 2009.
RAMOS-GOROSTIZA, L.; ROSADO-CUBE-
RO, A. Ideas econômicas en torno al servicio de
abastecimiento urbano en la Gran Bretaña del siglo
XIX. Madri: Universidad Complutense, 2013.
ROSÁRIO-SOLVEIRA, B. Agua y saneamien-
to en la ciudad de Córdoba (Argentina), 1880-
1935. Transportes, Servicios y Telecomunicaciones
(TsT). Madri, n. 26, p. 128-160, mar. 2014.
RUIZ-SIMÓN, I. ¡Aguas. El Ayuntamiento de
México se hunde!: 1866-1910. Agenda Social,
Jaén, v. 3, n. 1, p. 137-153, jan./abr. 2009.
RUIZ-SIMÓN, I. El negocio del agua y la crea-
ción de opinión en la ciudad de México, 1884-
1935. In: NAVARRO-GARCÍA, J. R.; TEIXEI-
RA, S.; VILLASEÑOR, A. T. (Coord.) Gestión
hidráulica en América Latina y España. Sevilha/
Campo de Goytacazes: Seminario Permanente
ATMA/Universidade Estadual do Norte Flu-
minense Darcy Ribeiro, 2013. p. 91-103.

179
História: Debates e Tendências – v. 17, n. 1, jan./jun. 2017, p. 157-179

Você também pode gostar