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PARA A CRECHE
Ficha Técnica
TÍTULO
Autoras
Cindy Carvalho
Gabriela Bento
Agradecimentos
Agradece-se os contributos das educadoras de infância que se disponibilizaram para uma leitura crítica do documento nas suas
versões mais iniciais, bem como das educadoras de infância que participaram nas ações de formação, dos docentes da formação
inicial, investigadores e outros especialistas.
EDIÇÃO
Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social / Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.)
Diretor-Geral da Educação
Data
2016
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 5
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a. Finalidades da avaliação ................................................................................................................................ 33
ò A avaliação para a aprendizagem...................................................................................... 34
ò A avaliação para a melhoria das práticas ........................................................................ 34
b. As diferentes dimensões da avaliação ....................................................................................................... 37
c. Observação e Registo ..................................................................................................................................... 37
d. Reflexão e Planeamento ................................................................................................................................ 39
e. Avaliação do contexto..................................................................................................................................... 40
f. Avaliação individual .......................................................................................................................................... 40
g. Despistagem de problemas de desenvolvimento .................................................................................... 41
h. Boas práticas na avaliação e acompanhamento das crianças ............................................................ 45
8. A TRANSIÇÃO PARA A EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR ........................................................... 47
SUGESTÕES DE LEITURA..................................................................................................................... 49
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INTRODUÇÃO
O trabalho em creche é absorvente, exigente, complexo e valioso. O/a educador/a de infância desenvolve
um trabalho crucial que envolve assegurar cuidados adequados e também experiências de socialização
positivas, aprendizagens significativas e desenvolvimento global. Naturalmente, no trabalho junto de crianças
até aos 3 anos de idade, o elemento “cuidar” está subjacente a todas as atividades. Cuidar significa estar
atento ao desenvolvimento e às necessidades de cada criança. Cuidar é certificar-se que a criança se está a
desenvolver bem, física e psicologicamente. Cuidar é perceber se a criança descansa, bebe e come o que
necessita mas é também compreender a forma como se interessa pelo que a circunda, como utiliza os seus
sentidos e desenvolve as suas funções motoras. Cuidar é estar atento ao bem-estar e mostrar interesse,
empatia, afeto, envolver-se na interação com a criança, dando atenção ao que ela comunica e ao que a
fascina. Cuidar é, portanto, uma dimensão indissociável de “educar”. É interessante perceber que a palavra
latina educere, que está na origem da palavra educar, significa trazer para fora, criar, atualizar o potencial de
cada criança, sendo o ato de educar o que alimenta, nutre, apoia e cuida para que esse processo aconteça.
Na organização da sua ação educativa, o/a educador/a confronta-se, permanentemente, com a necessidade
de avaliar situações no aqui e no agora, pensar percursos e formas de avançar (tomar decisões e definir
estratégias de ação que melhor se adequem às características das crianças e do contexto) com vista a
chegar ao seu destino - alcançar finalidades educativas. Neste processo, este referencial oferece
orientações que tornam este caminho mais lúcido e fundamentado, sabendo que um único caminho
(estratégia pedagógica) não se adequará a todos os viajantes (adultos e crianças), importando ponderar os
desafios e benefícios oferecidos em cada trajeto pedagógico.
Estas Orientações Pedagógicas assumem-se como uma base orientadora para o desenvolvimento do
currículo em creches. O termo “currículo” refere-se ao conjunto de atividades, experiências, interações,
rotinas e acontecimentos que ocorrem num determinado contexto, organizado de forma a promover a
aprendizagem e desenvolvimento de cada criança.
1 Neste documento referimo-nos a famílias, familiares ou pais de forma indistinta. Estas designações devem ser entendidas como
conceitos genéricos que se aplicam às pessoas que vivem com e cuidam diariamente da criança, estabelecendo com ela laços
afetivos, independentemente das suas relações de parentesco (incluindo, portanto, outros familiares que não os pais, famílias
adotivas, cuidadores em lares de acolhimento, etc.).
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de cada contexto. Existindo uma larga variação nos ritmos e tempos de aprendizagem e desenvolvimento,
sendo cada criança única e irrepetível, o currículo deverá atender não só às diversidades culturais, mas
também às individuais.
Este referencial pedagógico assume-se como inclusivo, devendo cada contexto incorporar estratégias
específicas que permitam uma boa educação para todas as crianças.
Cada educador/a procura assegurar o melhor para cada criança, reconhecendo a importância do
estabelecimento de relações positivas próximas com a família, da comunicação e articulação com outros
agentes da comunidade e com os colegas de profissão, e desenvolvendo trabalho colaborativo com vista a
assegurar continuidade educativa, quer na entrada da criança para a creche, quer na transição para a
educação pré-escolar.
Sendo estas as grandes linhas de pensamento apoiadas nos fundamentos e princípios educativos comuns a
toda a educação de infância, este documento pretende fornecer orientações para o trabalho pedagógico em
creche, organizando-se em duas partes - a parte I, dedicada à explicitação da importância do investimento
nos primeiros anos e apontando fundamentos, finalidades e objetivos educativos para a creche; a parte II,
que apresenta temáticas que não podem deixar de ser alvo de reflexão em qualquer contexto de infância
que procure desenvolver práticas pedagógicas de elevada qualidade em creche:
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I – FUNDAMENTOS, FINALIDADES E OBJETIVOS EDUCATIVOS
1. A IMPORTÂNCIA DO INVESTIMENTO NOS PRIMEIROS ANOS
a. Desenvolvimento cerebral
Cada vez que um bebé interage com o ambiente – reagindo a estímulos e processando informações –
vários sinais percorrem e ativam os circuitos neuronais. No momento em que ocorre uma interação (a
mãe que ri e brinca com o seu bebé, que o conforta com uma canção de embalar, que conversa com
ele,…), imediatamente, milhares de células existentes no cérebro da criança são ativadas, muitas das
conexões existentes entre as células cerebrais são fortalecidas e novas sinapses ou conexões neuronais são
estabelecidas, acrescentando mais especificidade e complexidade ao intrincado circuito cerebral que estará
ativo ao longo da vida.
Formar e reforçar conexões neuronais são as principais tarefas do cérebro nos primeiros anos de vida. No
final do primeiro ano de vida, com cuidados e estimulação adequada, o cérebro do bebé ultrapassa
largamente o número de conexões sinápticas de que necessitará. Isto permite-lhe testar biliões de
diferentes conexões ou trajetos neuronais em cada ação realizada. As suas experiências particulares
determinam quais as conexões permanentes a estabelecer e quais as que deixam de ser necessárias. Desta
forma, um importante processo de eliminação de conexões sinápticas não suficientemente utilizadas
acontece por volta do final do primeiro ano de vida, quando no cérebro da criança se inicia um processo de
“poda” que assegura o estabelecimento da estrutura mais eficiente e funcional, de acordo com as exigências
ambientais e culturais do mundo da criança. A “poda” de sinapses que não são estimuladas permite ao
cérebro fortalecer as conexões neuronais que asseguram respostas mais adaptativas, aumentando a
eficiência com que o cérebro faz o que necessita fazer. Contudo, a “poda” excessiva das conexões
neuronais pode ocorrer quando a criança é privada de interações sensíveis e adequadamente estimulantes
nos primeiros anos.
Como o desenvolvimento cerebral resulta de interações com outros, envolvimento em experiências ativas,
exploração e descoberta, quando as crianças praticam e exercitam capacidades, escutam e conversam,
estão a robustecer conexões e trajetos neuronais específicos do cérebro. Cada vez que este trajeto é
retomado, é fortalecido e a rapidez da conexão aumenta. Pelos 3 anos de idade, a maior parte deste
processo estará completo.
Por isso, as experiências mais precoces da criança são cruciais ao desenvolvimento cerebral. A neurociência
tem demonstrado que as experiências vividas pelas crianças nos primeiros tempos de vida têm um impacto
decisivo na arquitetura cerebral e, por conseguinte, na natureza e extensão das suas capacidades atuais e
futuras. A estimulação de que a criança necessita para um desenvolvimento saudável acontece no âmbito
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das interações diárias com adultos sensíveis e atentos. Todos os bebés e crianças necessitam de muitos
momentos tranquilos em contextos familiares e seguros.
b. Vinculação
As relações precoces têm um impacto decisivo e duradoiro na forma como o ser humano se desenvolve.
Uma das tarefas mais importantes a realizar nos primeiros anos de vida é a construção de uma relação de
vinculação segura. Existe na criança uma força empreendedora para aprender, mexer, explorar e conhecer
a alegria da ação e do sucesso. Mas esta força empreendedora que a leva a deixar o adulto, a correr riscos,
não acontece por oposição a um desejo de proximidade e de segurança. Apenas num clima de segurança a
criança demonstra a sua curiosidade e evidencia o seu ímpeto exploratório. A sua energia, a sua
curiosidade, o seu desejo de aprender, em suma, o seu desenvolvimento sensório-motor, social, linguístico
e do pensamento estão intimamente relacionados com a qualidade das interações e ligações afetivas que
estabelece com as suas figuras de referência. As crianças dependem de adultos atentos e capazes de
estabelecer relações de vinculação positivas, criando um ambiente de exploração convidativo e seguro, a
partir do qual podem aprender ativamente.
É na ausência de ligações seguras que se verifica maior restrição de atividades exploratórias e sociais e um
aumento de perturbações do desenvolvimento.
A curto prazo, o valor de uma vinculação segura é facilmente compreendido pela associação à proximidade
entre adulto e criança, indispensável ao prazer mútuo, à satisfação de alimento, provisão de cuidados e
estabelecimento de uma base segura para exploração. A investigação também tem evidenciado o valor de
uma vinculação segura, a médio e longo prazo, para o desenvolvimento cognitivo, social e emocional.
Crianças seguras evidenciam um desenvolvimento mais positivo em relação à sua autoestima; maior
independência e autonomia; relações mais positivas com outras crianças, educadores/as, professores/as,
pais, etc.; maior empatia, confiança e capacidade de estabelecer relações mais íntimas; maior sucesso
académico.
c. Ecologia do desenvolvimento
A maior parte das famílias assegura a estimulação e calor necessários ao desenvolvimento e atualização do
potencial de cada criança. Mas, muitas crianças não receberão aquilo que necessitam nos seus primeiros
anos de vida, ao nível do desenvolvimento emocional e crescimento saudável do cérebro. Uma das
influências mais destrutivas do desenvolvimento da criança é a imprevisibilidade, a discórdia, um ambiente
triste, pouco responsivo, pouco estimulante e pouco atento. Quanto mais tempo a criança viver sujeita a
experiências de baixa qualidade, maior a probabilidade de ocorrência de problemas de comportamento, de
expectativas sociais negativas, de fraco desenvolvimento global e de insucesso escolar, sendo mais difícil
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mudar a natureza negativa do efeito. Se vivências negativas induzem a produção da hormona cortisol2,
tornando o cérebro mais vulnerável a processos que afetam os neurónios e sinapses, percebe-se que
crianças que cronicamente convivem com elevados níveis de tensão, ansiedade ou frustração, segregando
níveis mais elevados de cortisol, apresentem mais problemas de desenvolvimento.
Percebe-se, afinal, que todas as dimensões, designadamente, desenvolvimento cerebral, vinculação segura e
ecologia do desenvolvimento, são indissociáveis: potenciar uma boa organização cerebral envolve assegurar o
estabelecimento de relações positivas com a criança e que, por sua vez, o estabelecimento de relações
positivas está relacionado com a qualidade dos contextos de vida que a criança conhece.
Assim, a melhor forma de ajudar crianças a crescer curiosas, confiantes, aprendizes capazes, é assegurar-
lhes contextos de elevada qualidade, não esquecendo que um contexto só é bom para as crianças se
também o for para os adultos que cuidam delas.
Uma creche de elevada qualidade será mais eficaz na promoção do desenvolvimento e bem-estar das
crianças quando faz parte de uma constelação de redes e relações de suporte existentes na comunidade
que apoiam o adequado funcionamento das famílias. É fundamental investir em vários níveis da ecologia do
desenvolvimento da criança, providenciando serviços de elevada qualidade para as famílias, seja ao nível de
creches, programas de intervenção precoce na infância e/ou supervisão de amas.
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A hormona cortisol, também conhecida como hormona do stress, é segregada em situações de emergência, ajudando a enfrentar dificuldades ou
problemas. Quando a situação de stress é pontual, uma vez superada a situação de alarme ou de emergência, os níveis hormonais e os processos
fisiológicos voltam à normalidade. Contudo, quando a situação de stress é prolongada, disparam no organismo níveis excessivos de cortisol, a que se
associam problemas de saúde.
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O desenvolvimento e a aprendizagem como vertentes indissociáveis no processo de evolução da criança
O desenvolvimento motor, social, emocional, cognitivo e linguístico da criança é um processo que decorre
da interação entre a maturação biológica e as experiências proporcionadas pelo meio físico e social.
As relações e interações que a criança estabelece com adultos e outras crianças e as experiências que lhe
são proporcionadas pelos contextos sociais e físicos em que vive constituem formas de aprendizagem, que
vão contribuir para o seu desenvolvimento. Deste modo, a aprendizagem influencia e é influenciada pelo
processo de desenvolvimento físico e psicológico da criança, sobretudo numa fase da vida em que essa
evolução é muito rápida. Por isso, em educação de infância, não se pode dissociar desenvolvimento e
aprendizagem.
Esta interligação das características intrínsecas de cada criança (o seu património genético), do seu
processo de maturação biológica e das experiências de aprendizagem vividas, faz de cada criança um ser
único, com características, capacidades e interesses próprios, com um processo de desenvolvimento
singular e formas próprias de aprender.
Embora muitas das aprendizagens das crianças aconteçam de forma espontânea, nos diversos ambientes
sociais em que vivem, num contexto de educação de infância existe uma intencionalidade educativa, que se
concretiza através da disponibilização de um ambiente culturalmente rico e estimulante e do
desenvolvimento de um processo pedagógico coerente e consistente, em que as diferentes experiências e
oportunidades de aprendizagem têm sentido e ligação entre si. Neste processo, o desenvolvimento de
relações afetivas estáveis, em que a criança é acolhida e respeitada, promove um sentimento de bem-estar
e a vontade de interagir com os outros e com o mundo.
Contudo, cada criança não se desenvolve e aprende apenas no contexto de educação de infância, mas
também noutros em que viveu ou vive, nomeadamente no meio familiar, cujas práticas educativas e cultura
própria influenciam o seu desenvolvimento e aprendizagem. Neste sentido, importa que o/a educador/a
estabeleça relações próximas com esse outro meio educativo, reconhecendo a sua importância para o
desenvolvimento das crianças e o sucesso da sua aprendizagem.
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Reconhecimento da criança como sujeito e agente do processo educativo
Esse papel ativo da criança decorre também dos direitos de cidadania, que lhe são reconhecidos pela
Convenção dos Direitos da Criança (1989) o direito de ser consultada e ouvida, de ter acesso à
informação, à liberdade de expressão e de opinião, de tomar decisões em seu benefício e do seu ponto de
vista ser considerado. Garantir à criança o exercício destes direitos tem como consequência considerá-la o
principal agente da sua aprendizagem, dando-lhe oportunidade de ser escutada e de participar nas decisões
relativas ao processo educativo, demonstrando confiança na sua capacidade para orientar a sua
aprendizagem e contribuir para a aprendizagem dos outros.
Cabe ao/à educador/a apoiar e estimular esse desenvolvimento e aprendizagem, tirando partido do meio
social alargado e das interações que os contextos de educação de infância possibilitam, de modo a que,
progressivamente, as escolhas, opiniões e perspetivas de cada criança, sejam explicitadas e debatidas. Deste
modo, cada criança aprende a defender as suas ideias, respeitar as dos outros e, simultaneamente, contribui
para o desenvolvimento e aprendizagem de todos (crianças e educador/a).
O acesso à educação é também um direito de todas as crianças, especificando-se que essa educação tem
como base uma igualdade de oportunidades (Convenção dos Direitos da Criança, 1989, art.º 28 e 29).
Dada a importância das primeiras aprendizagens, é atribuído à educação de infância um papel relevante na
promoção de uma maior igualdade de oportunidades relativamente às condições de vida e aprendizagens
futuras, sobretudo para as crianças cuja cultura familiar está mais distante da cultura escolar. Porém, os
resultados da investigação indicam que essa contribuição depende muito da qualidade do ambiente
educativo e do modo como este reconhece e valoriza as características individuais de cada criança, respeita
e dá resposta às suas diferenças, de modo a que todas se sintam incluídas no grupo.
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Assim, todas as crianças, independentemente da sua nacionalidade, língua materna, cultura, religião, etnia,
orientação sexual de membro da família, das suas diferenças a nível cognitivo, motor ou sensorial, etc.
participam na vida do grupo, sendo a diversidade encarada como um meio privilegiado para enriquecer as
experiências e oportunidades de aprendizagem de cada criança.
A inclusão de todas as crianças implica a adoção de práticas pedagógicas diferenciadas, que respondam às
características individuais de cada uma e atendam às suas diferenças, apoiando as suas aprendizagens e
progressos. A interação e cooperação entre crianças permitem que estas aprendam, não só com o/a
educador/a, mas também umas com as outras. Esta perspetiva supõe que o planeamento realizado seja
adaptado e diferenciado, em função do grupo e de acordo com características individuais, de modo a
proporcionar a todas e a cada uma das crianças, condições estimulantes para o seu desenvolvimento e
aprendizagem, promovendo em todas um sentido de segurança e autoestima.
Por isso, a definição de quaisquer áreas de desenvolvimento e aprendizagem representa apenas uma opção
possível de organização da ação pedagógica, constituindo uma referência para facilitar a observação, a
planificação e a avaliação, devendo as diferentes áreas ser abordadas de forma integrada e globalizante. Esta
articulação de áreas de desenvolvimento e aprendizagem implica reconhecer que brincar é a atividade
natural da criança que melhor corresponde à sua forma holística de aprender.
Ter oportunidade de escolher como, com quê e com quem brincar, na creche ou no jardim de infância,
permite à criança desenvolver os seus interesses, tomar decisões, resolver problemas, correr riscos e
tornar-se mais independente. Ao brincar, a criança exprime a sua personalidade e singularidade, desenvolve
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curiosidade e criatividade, estabelece relações entre aprendizagens, melhora as suas capacidades relacionais
e de iniciativa e assume responsabilidades.
Importa, porém, diferenciar uma visão redutora de brincar, como forma de a criança estar ocupada ou
entretida, de uma perspetiva de brincar, como atividade rica e estimulante que promove o desenvolvimento
e aprendizagem e se carateriza pelo elevado envolvimento da criança, demonstrado através de sinais como
prazer, concentração, persistência e empenhamento, o que a leva muitas vezes a despender grandes
esforços para conseguir realizar o que deseja. A criação de um ambiente educativo em que a criança dispõe
de materiais diversificados que estimulam os seus interesses, e a atenção do/da educador/a às suas
iniciativas, o modo como a encoraja e os desafios que coloca à exploração e à descoberta são fundamentais
para esse envolvimento ou implicação.
Deste modo, brincar torna-se um meio privilegiado para promover a relação entre crianças e entre estas e
o/a educador/a, facilitando o desenvolvimento de competências sociais e comunicacionais e o domínio
progressivo da expressão oral. De igual modo, brincar proporciona outras conquistas, tais como, ter
iniciativas, fazer descobertas, expressar as suas opiniões, resolver problemas, persistir nas tarefas, colaborar
com os outros, desenvolver a criatividade, a curiosidade e o gosto por aprender, que atravessam todas as
áreas de desenvolvimento e aprendizagem na educação de infância, constituindo condições essenciais para
que a criança aprenda com sucesso, isto é, “aprenda a aprender”.
Esta curiosidade e desejo de aprender da criança vão dando lugar a processos intencionais de exploração e
compreensão da realidade, em que várias atividades se interligam com uma finalidade comum, através de
projetos de aprendizagem progressivamente mais complexos, que integram diferentes áreas de
desenvolvimento e aprendizagem e mobilizam diversas formas de saber, de modo a construir os alicerces
de uma aprendizagem ao longo da vida.
A concretização de todos estes fundamentos e princípios educativos no dia a dia da creche e do jardim de
infância exige um profissional que está atento à criança e reflete sobre a sua prática com um interesse
contínuo em melhorar a qualidade da resposta educativa. Neste sentido, a observação e registo permitem
recolher informações para avaliar, questionar e refletir sobre as práticas educativas (nomeadamente, a
gestão das rotinas, a organização do espaço e materiais, a qualidade das relações estabelecidas) sendo ainda
essenciais para conhecer cada criança e a sua evolução. As informações recolhidas permitem fundamentar e
adequar o planeamento da ação pedagógica. A realização da ação irá desencadear um novo ciclo de
Observação/Registo-Planeamento-Avaliação-Reflexão.
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FUNDAMENTOS E PRINCÍPIOS EDUCATIVOS
Criança Educador/a
Cada criança tem uma identidade Tem em conta as características da
1. única e singular, tendo criança, criando oportunidades que
necessidades, interesses e lhe permitam realizar todas as suas
Desenvolvimento e capacidades próprias. potencialidades.
aprendizagem como
vertentes indissociáveis Vive num meio cultural e familiar Considera a família e sua cultura na
que deve ser reconhecido e sua ação educativa.
valorizado.
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3. FINALIDADES E OBJETIVOS EDUCATIVOS
A natureza do trabalho educativo em creche pressupõe a clarificação das suas finalidades educativas. Onde
se pretende chegar? Que objetivos educativos? Que cidadão aos 3 anos de idade?
Que atitudes, capacidades e/ou conhecimentos poderão evidenciar o desenvolvimento destas finalidades
educativas? Que objetivos de aprendizagem? Que tipo de experiências ou oportunidades poderão ajudar a
alcançar os objetivos e finalidades educativas?
Se o desenvolvimento dos bebés e crianças acontece de uma forma holística e não de uma forma
espartilhada em conteúdos ou áreas, educar é investir no todo que é a pessoa em desenvolvimento. Nesse
sentido, todas as organizações por áreas do desenvolvimento ou de aprendizagem são, na sua essência,
artificiais. Segurança e autoestima, curiosidade e ímpeto exploratório, competência social e comunicacional
são dimensões presentes em todo o trabalho que se realiza com as crianças.
A opção de apresentar três grandes finalidades educativas para o trabalho em creche prende-se com a
facilitação que essa organização confere ao nível da observação, do acompanhamento, da planificação e da
avaliação do trabalho pedagógico.
Esta forma de apresentação pretende apoiar o/a educador/a no desenvolvimento do currículo, não
pretendendo limitar as opções, práticas e criatividade próprias de cada educador/a.
Os exemplos não esgotam todas as evidências de aprendizagens a realizar nem têm como
intenção diferenciar ou situar níveis de desenvolvimento e aprendizagem, pelo que será
sempre possível acrescentar outras situações decorrentes da experiência de trabalho em
creche. Note-se, ainda, que os exemplos de consecução das finalidades e objetivos educativos
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que adiante se sugerem, ainda que obedeçam a uma certa organização desenvolvimental,
pressupõem que não se perca o caráter flexível, integrador e transversal, próprio de qualquer
trabalho educativo junto de crianças. Nessa linha de pensamento, muitas manifestações e
oportunidades que são válidas para uma determinada fase poderão ser igualmente
pertinentes noutras fases, ulteriores ou anteriores, sendo que a observação da criança deve
ser sempre global e o seu desenvolvimento encarado como um todo. Assim, o trabalho em
torno das finalidades e objetivos educativos pressupõe que os educadores ofereçam a cada
criança oportunidades integradas de desenvolvimento, resultantes de dinâmicas educativas
transversais e holísticas. Significa que atividades de cuidados e educativas estão
inextricavelmente interligadas, que todas as experiências e oportunidades de aprendizagem
estão entrelaçadas, que aspetos afetivos, cognitivos ou motores são mobilizados de forma
indissociável.
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Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança…
· Faz uma avaliação das suas capacidades, demonstrando confiança em si própria e nos outros
Persiste ou desiste das atividades de acordo com a avaliação que faz das suas capacidades? Recusa ajuda,
tentando resolver um problema sozinha? Pede ajuda quando percebe que não consegue atingir um
objetivo sozinha? Evidencia orgulho e satisfação na realização de atividades de cuidar, ajudar, assumir
tarefas (ex. pôr a mesa; distribuir babetes)? Compreende conceitos de propriedade (“é meu”, “é a minha
mãe”)? É capaz de lidar com graus moderados de mudança ou incerteza? Enfrenta riscos sem ansiedade ou
medo desmesurados?
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O sentido de segurança e autoestima positiva pode ser promovido através de oportunidades
de aprendizagem como, por exemplo:
Entre 1 e 2 anos
· No treino do controlo dos esfíncteres, a abordagem é calma e positiva;
· As rotinas de sono são flexíveis, calmas e positivas;
· É dada a conhecer às crianças uma larga variedade de alimentos;
· É encorajada a autonomia da criança na higiene e na alimentação;
· Os momentos de refeição são calmos, envolvendo interações positivas;
· Os adultos estão atentos e respeitam os sentimentos de bem-estar ou de desconforto que as
crianças comunicam;
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· A independência da criança é estimulada, sabendo que o conforto ou segurança emocional
providenciados por adultos próximos estão garantidos;
· As crianças que procuram fazer as coisas por si próprias são encorajadas e apoiadas;
· São dadas oportunidades à criança para fazer escolhas e as suas decisões são respeitadas;
· O adulto apoia a criança na resolução de problemas ou conflitos e estimula-a a perseguir novos
desafios;
· Os adultos estão vigilantes relativamente a tudo aquilo a que a criança tem acesso e que pode ser
demasiado arriscado ou perigoso;
· A criança é encorajada e apoiada mas não superprotegida, por exemplo, quando cai;
· O adulto ajuda a criança a perceber o que é seguro e o que não é, e as consequências prováveis de
certas ações;
· Conversar sobre pessoas próximas da criança ou acerca de brinquedos que a criança traz de casa
são situações que fazem parte das rotinas naturais da creche;
· Regularmente, as crianças saem para pequenos passeios nas redondezas;
· As crianças são encorajadas a mostrar aos pais as coisas que fizeram ou que descobriram.
Entre 2 e 3 anos
· Existe flexibilidade nas rotinas, nomeadamente nos momentos de descanso;
· De forma crescente são asseguradas oportunidades e tempo para as crianças exercitarem a sua
autonomia, nas situações de alimentação, descanso, higiene, vestir/despir, ….;
· As crianças são assistidas pelos adultos de formas que não suscitam vergonha ou embaraço,
nomeadamente nas situações em que as crianças falham o controlo dos esfíncteres;
· As crianças são encorajadas na expressão adequada das suas emoções;
· O contexto é estimulante e proporciona diferentes desafios em função daquilo que cada criança
necessita para aceder a níveis mais complexos de ação e de pensamento;
· O contexto oferece previsibilidade mas, de forma sensível e atenta, o/a educador/a vai introduzindo
mudanças e surpresa nas rotinas das crianças;
· O contexto procura assegurar espaço para escolha e livre iniciativa, equilibrado com limites claros
e entendíveis pelas crianças;
· Regras sobre o não magoar os outros e cuidar do ambiente são tópicos de conversa e de natural
negociação com os adultos;
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· São dadas oportunidades à criança para falar de experiências familiares a adultos atentos e
interessados;
· A vinda frequente dos pais à creche é desejada e preparada (ex. lanche, passeio, conversa,
atividades).
· uma atitude para compreender o seu mundo, objetos, pessoas, comportamentos, interagindo com
outros, brincando e explorando ativamente, questionando, desenvolvendo, testando e aperfeiçoando as
suas ideias acerca do mundo, de si próprio e dos outros;
· capacidade para fazer escolhas sobre o tipo de espaços, materiais e objetos que quer explorar,
encontrando os seus próprios desafios e objetivos, e organizando-se no sentido de os alcançar;
· um controlo crescente sobre o seu corpo (locomoção, manipulação, coordenação, equilíbrio) e uma
crescente desenvoltura na sua movimentação no espaço;
· capacidade para mobilizar estratégias de exploração ativas, através de todos os seus sentidos e
movimentos ou utilizando ferramentas, materiais e equipamentos diversos;
· uma confiança na forma como utiliza uma variedade de estratégias para exploração e atribuição de
sentido ao mundo, ao nível da resolução de pequenos problemas, identificação de padrões, classificação
de objetos, experimentando, comparando, questionando, ouvindo e participando em conversas,
observando e escutando histórias, etc.
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Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança…
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· Explora noções relativas às propriedades dos objetos
Repara em semelhanças e diferenças nos objetos que a rodeiam (ex. na cor, na forma, no tamanho, na
temperatura...)? Identifica num conjunto de objetos uma determinada propriedade (ex. os bonecos de um
cesto são pequenos ou as bolas de um saco são vermelhas)? Agrupa objetos de acordo com um
determinado critério (ex. com a mesma forma, o mesmo tamanho...)? Percebe se um objeto pertence ou
não a um dado conjunto de objetos (ex. decide onde colocar uma bola muito pequena, se num conjunto de
brinquedos grandes ou num de brinquedos pequenos)? Ordena objetos de acordo com gradações de uma
determinada propriedade (ex. coloca por ordem objetos de acordo com a sua altura, a sua massa...).
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· Os bebés são colocados de modo que tenham um campo de visão alargado e os adultos ajudam-nos
a percecionar os objetos em diferentes posições (de longe, de perto, de frente, de trás…);
· Quando o bebé ainda não se desloca, é fundamental prestar atenção redobrada ao que lhe parece
mais interessante, mudando-o de lugar de forma frequente e em função dos seus interesses;
· Os bebés conhecem diferentes superfícies de exploração (superfícies lisas e rugosas, tapetes, relva,
areia, empedrado, chão macio e chão duro, no interior e no exterior);
· Os bebés têm oportunidade para observar e para se juntarem a outras crianças, para ver e ouvir
novos estímulos, para perceber que as coisas têm um nome;
· Os bebés conhecem uma variedade de experiências sensoriais, incluindo ar fresco, novos cheiros,
cores, temperaturas, sons, luzes, sabores, e podem movimentar-se e explorar livremente diversos
objetos e/ou materiais;
· Frequentemente, o adulto propõe brincadeiras de descoberta do próprio corpo, explorando os pés,
a face, o cabelo, os dedos,… da criança ou de outras pessoas familiares, partilhando e demonstrando
prazer nas descobertas da criança.
Entre 1 e 2 anos
· Antes de intervir numa situação em que as crianças estão envolvidas, o adulto aguarda, observando
empaticamente, até perceber se as crianças necessitam realmente de ajuda, não assumindo
imediatamente que elas não são capazes;
· São dadas amplas oportunidades para explorações ativas, com o apoio mas não com a interferência
do adulto;
· As crianças têm acesso a equipamentos e recursos diversos que estimulam, quer a motricidade
grossa, quer a motricidade fina;
· As crianças têm oportunidades para escutar, falar, observar, recordar, pensar e decidir;
· As crianças são encorajadas a reconhecer a simetria e padrões, a classificar e a estabelecer
correspondências de um para um;
· As crianças são encorajadas a manipular quantidades, de forma a transformar substâncias contínuas
em quantidades discretas (ex. cortar massa de farinha em pequenos pedaços e voltar a ligá-los,
transferir água ou areia para pequenos recipientes e esvaziá-los de seguida...);
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· As crianças têm possibilidade de recolher, separar, organizar objetos e materiais de brincar,
desenvolvendo uma noção de ordem (ex. agrupando materiais similares ou arrumando coisas nos
sítios certos/que lhes estão atribuídos);
· As crianças têm oportunidade de cuidar de plantas ou animais, respeitando e descobrindo as suas
necessidades;
· O adulto questiona e responde às questões da criança sobre o porquê das coisas, mostrando
interesse e compreensão.
Entre 2 e 3 anos
· As crianças encontram no seu dia a dia atividades que estimulam o seu desenvolvimento motor e que
oferecem vários graus de desafio (equilíbrio, utilização de talheres ou de ferramentas, vestir e despir,
atividades de construção, percursos com obstáculos);
· As crianças podem explorar vários livros e histórias sobre temáticas diversas (ex. corpo humano,
animais, objetos, tradições, comportamentos…), bem como cartazes ou imagens interessantes,
sendo encorajadas a dar um nome às coisas, a pensar e a falar sobre elas;
· As crianças podem iniciar e desenvolver pequenas atividades da sua própria iniciativa, identificando e
resolvendo problemas que naturalmente vão ocorrendo, podendo contar com o apoio do adulto
sempre que necessário;
· As crianças são encorajadas a explorar através de ensaio e erro, com vista à procura de soluções ou
novas alternativas, explorando formas e objetos de duas e três dimensões;
· As crianças são encorajadas ao reconhecimento e utilização de símbolos como imagens, desenhos e
sinais, etc.;
· As crianças têm oportunidade de conhecer aspetos relativos à diversidade do mundo natural,
observando plantas, animais, rochas, fenómenos meteorológicos e desenvolvendo atitudes de
cuidado;
· As crianças têm oportunidades de explorar a forma como as coisas se movem ou como podem ser
movidas (ex. soprando, empurrando, puxando, rolando, oscilando, afundando);
· As crianças têm oportunidades de desenvolver a compreensão espacial, juntando e separando
objetos, fazendo construções, organizando e arrumando objetos, observando objetos de diferentes
pontos de vista, utilizando lupas, etc.;
· As crianças têm a oportunidade de vivenciar questões sociais, como regras, deveres e
responsabilidades, alargando o seu conhecimento acerca do mundo social;
24
· As crianças têm oportunidade de conhecer locais de interesse da sua região, contactando com o
património e cultura local.
· Estabelece uma relação de vinculação com um adulto de referência no seu contexto educativo
Estabelece contacto físico e ocular, fica quieto quando o adulto lhe fala? Sorri, balbucia em direção ao
adulto? Procura conforto no colo do adulto? Chama o nome do adulto e partilha o que pensa (“Dói-me a
barriga!”)? Demonstra carinho através de gestos e palavras?
25
· Estabelece relações com outros adultos
Responde aos seus sons e gestos? Envolve-se em brincadeiras? Inicia contacto com o adulto? Traz ao adulto
o seu brinquedo preferido? Inicia uma conversa com o adulto?
26
está triste porque a mamã foi embora”)? Desenvolve estratégias para lidar com conflitos, nomeadamente, a
negociação?
27
· O adulto chama a atenção para conceitos como “mais”, “menos”, “grande”, “pequeno”, “muito”,
“pouco”, etc.;
· O bebé brinca e explora livremente materiais de diferentes cores, texturas, formas e tamanhos;
· O bebé tem oportunidade de experienciar sons da natureza, como o vento nas folhas das árvores ou
o som da chuva e diferentes efeitos da luz, como sombras, luzes em movimento ou luzes com cores.
Entre 1 e 3 Anos
· Os adultos conhecem e respeitam os sinais de conforto e desconforto das crianças;
· A criança tem oportunidade de interagir em jogos de escuta de sons ou palavras, dançar, usando o
seu corpo como forma de expressão;
· Os adultos expandem as verbalizações das crianças, repetindo, modelando novas palavras e frases,
utilizando frases simples e claras, dando tempo à criança para responder e conversar;
· As crianças têm muitas oportunidades para interagir com outras crianças, observar e imitar, partilhar
brinquedos, brincar em conjunto com palavras e histórias, canções e lengalengas;
· As conversas e perguntas do adulto envolvem referências a quantidades (ex. quantos meninos
querem ir passear ao jardim? Tens dois carros muito giros!);
· As crianças são estimuladas para utilização de conceitos espaciais como “em cima”, “em baixo”,
“dentro”, “fora”, etc.;
· A identificação ou nome da criança está escrito nos seus espaços pessoais, através de símbolos e/ou
letras;
· Estão disponíveis livros variados e a exploração ou o contar de histórias são experiências interativas
frequentes e aprazíveis, geradoras de um clima de intimidade;
· São oferecidas oportunidades e materiais para construção e expressão, como tintas, cola, massa de
farinha, areia, desperdícios, folhas, pedrinhas, etc.;
· O adulto apoia o desenvolvimento de toda a atividade simbólica ou de faz-de-conta da criança;
· As crianças têm oportunidade de explorar vários materiais musicais (ex. tambores, campainhas,
xilofone);
· As crianças são incentivadas a experienciar o potencial comunicativo de todo o corpo através da
dança, mímica e jogo dramático;
· As crianças têm amplas oportunidades de iniciar conversas, contar histórias, colocar questões.
28
Sugestões de reflexão:
De que forma as experiências diárias disponibilizadas na creche onde trabalha contribuem para
que as crianças alcancem as finalidades educativas - desenvolvimento de um sentido de segurança e
autoestima; desenvolvimento da curiosidade e ímpeto exploratório; desenvolvimento de
competência social e comunicacional?
Em que aspetos a oferta pedagógica poderá ser melhorada?
Como são as finalidades e objetivos educativos partilhados, comunicados e compreendidos por
todos os envolvidos?
Qual a natureza, relevância e diversidade das experiências que o currículo da creche oferece?
Que oportunidades de interação com outras crianças e adultos são promovidas? Que
oportunidades para atividade livre e espontânea? Que grau de autonomia é oferecido às crianças?
Em que medida as experiências de aprendizagem proporcionadas são inclusivas, refletindo respeito
por todas as crianças?
29
ORIENTAÇÕES PEDAGÓGICAS
PARA A CRECHE
TÍTULO
Autoras
Cindy Carvalho
Gabriela Bento
Agradecimentos
Agradece-se os contributos das educadoras de infância que se disponibilizaram para uma leitura crítica do documento nas suas
versões mais iniciais, bem como das educadoras de infância que participaram nas ações de formação, dos docentes da formação
inicial, investigadores e outros especialistas.
EDIÇÃO
Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social / Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.)
Diretor-Geral da Educação
Data
2016
2
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ……………………………………………………………………………….5
3
· Movimento ............................................................................................................................ 29
· Descoberta do mundo natural ......................................................................................... 30
· Criatividade e socialização ................................................................................................. 31
· Recursos da comunidade ................................................................................................... 32
7. ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO ....................................................................................... 33
a. Finalidades da avaliação .................................................................................................................... 33
· A avaliação para a ................................................................................................................ 34
· A avaliação para a melhoria das práticas ........................................................................ 34
b. As diferentes dimensões da avaliação .............................................................................................. 37
4
II – PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE QUALIDADE
SUGESTÕES
No sentido de possibilitar um acompanhamento mais próximo e individualizado, em cada
contexto poder-se-á identificar as estratégias mais adequadas. Por exemplo, quando existem dois
ou três adultos na sala, uns poderão ficar com parte do grupo no interior enquanto os outros vão
para o exterior; outra possibilidade é, em articulação com o/a educador/a de outra sala, algumas
crianças juntarem-se, em alguns momentos do dia, a esse outro grupo. O sistema de adulto de
referência ou figura chave é também uma forma de facilitar a proximidade e conhecimento da
individualidade de cada criança. Naturalmente, em todas as decisões tomadas, interessa que toda a
5
equipa perceba o seu sentido: porque é que o grupo é dividido? Como? O que é que se planeia
para cada parte do grupo?
A avaliação da experiência subjetiva de bebés e crianças muito pequenas requer que sejam feitas inferências
sobre a qualidade dessa mesma experiência. Tais inferências deverão basear-se num contacto e observação
frequentes e na recolha continuada de informação.
Se queremos saber como cada criança se sente num contexto educativo, temos de procurar perceber até
que ponto as crianças se sentem à vontade, agem espontaneamente, mostram vitalidade e autoconfiança. O
grau de bem-estar evidenciado pelas crianças num contexto educativo indicará em que medida a
organização e dinâmica do contexto ajudam as crianças a “sentirem-se em casa”, a estarem à vontade e a
terem as suas necessidades satisfeitas.
1
Sobre a escala de envolvimento/implicação da criança, no âmbito do Projeto Desenvolvendo a Qualidade em Parcerias (DQP), pode consultar a
página: http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/EInfancia/documentos/manual_dqp.pdf
6
Níveis elevados de bem-estar e de implicação/envolvimento das crianças nas atividades e
rotinas são o melhor indicador da qualidade da oferta educativa.
Porque um contexto educativo direcionado para bebés e crianças, se direciona também, inevitavelmente,
para as suas famílias, o acompanhamento e consideração da experiência da família é uma dimensão de
qualidade inquestionável. Trata-se de perceber até que ponto nas relações que se estabelecem com a
família esta se sente respeitada, conhece proximidade, abertura e aceitação por parte dos profissionais.
2. A ENTRADA NA CRECHE
Quando entra na creche, a criança não consegue perceber por que razão ali está! De facto, em termos
imediatos, ela poderá experienciar a creche como “abandono” e, caso não seja ajudada a lidar com essa
situação de forma sensível e atenta, poderá conhecer níveis elevados de ansiedade. A existência de alguém
que, de forma consistente, continuada e calorosa acompanhe a criança neste processo é crucial. Nesta
condição, os bebés experienciarão menor quebra nas interações afiliativas.
SITUAÇÃO 1
Um bebé de 15 meses chega à creche, ao colo da mãe, agarra-se a ela e chora quando o/a educador/a se
aproxima. O/a educador/a saúda o bebé e a mãe. “Eu sei que gostas muito da mamã. Se calhar vai custar um
pouco dizer adeus à mãe”... E para a mãe: “Como está? Também se sente um pouco triste?” A mãe e o/a
educador/a conversam um pouco sobre a separação. À medida que falam, observam sinais de que a criança está
a ficar mais relaxada e trocam sinais no sentido de que “chegou a hora”. Uns beijinhos, mais algumas lágrimas,
mas a criança está mais disponível para que o/a educador/a a abrace e para acenar “adeus”.
O que pensa sobre esta situação? Identifica, neste exemplo, elementos presentes na sua própria
prática?
A partir do momento em que um bebé é confiado a alguém que não os pais, experienciando um contexto
diferente e não familiar, perde os seus pontos de referência e daí advém uma certa inquietude, se não
mesmo angústia e sofrimento. É um quadro que se pode traduzir por sinais de agitação ou tensão, choros e
7
recusas, modificação dos ritmos de sono ou alimentares, ou mesmo sintomas somáticos (ex. febre,
diarreia).
Embora algumas crianças pareçam lidar muito bem com situações e pessoas novas, a maior parte delas, tal
como os adultos, experienciam sentimentos de incerteza e ansiedade perante o que é novo e diferente
daquilo a que estão habituadas.
Habitualmente, entre os 8-9 meses de idade e o final do segundo ano de vida, a relutância em deixar a mãe
pode ser maior (mesmo na criança que já frequentava a creche e que até aí ficava sem dificuldade) porque a
força da relação de vinculação é muito significativa. É comum que a criança proteste, chore e se agarre aos
pais ou outras figuras afetivamente mais significativas; além disso, poderá demonstrar um comportamento
de maior dependência em relação ao/à educador/a, medo em relação ao novo e desconhecido; “rabugice” e
dificuldade em ser consolada.
SITUAÇÃO 2
A Ana tinha quase 19 meses quando foi para a creche. Nos momentos de separação, a Ana grita muito, recusa-
se a deixar o colo do pai, que tem imensas dificuldades em se afastar. Na ausência do pai, ela pergunta
constantemente pelo papá e parece ter dificuldade em brincar ou em interessar-se seja pelo que for. A Ana anda
atrás do adulto a maior parte do tempo, sempre agarrada à mesma boneca, raramente brinca com outras
crianças e grita fortemente quando estas tentam tirar-lhe as suas coisas; muito medrosa, perturba-se com
pequenas coisas, como alterações na rotina, sujar as mãos, etc. Embora com o tempo o dramatismo da
separação tenha vindo a esbater-se, alguns destes aspetos comportamentais persistiram durante vários meses.
É importante compreender que a criança reage sobretudo a tensões cognitivo-emocionais e não tanto ao/à
educador/a ou à creche em si. O que está em causa é lidar com o novo e discrepante em relação ao que a
criança conhece bem, e lidar com a separação das figuras de vinculação, os seus principais portos de abrigo
e fontes de segurança.
Uma possibilidade é organizar uma transição gradual da família para a creche. A família pode ser
previamente informada de todas as dimensões relacionadas com a organização e dinâmica da creche,
conhecendo os profissionais, procedimentos e espaços. Durante os primeiros tempos, figuras significativas
(como os pais) poderão permanecer acessíveis à criança na creche, permitindo-se o afastamento e
encontro sempre que desejado. Gradualmente o tempo de permanência da criança na creche aumenta,
consolidando-se a relação com o/a educador/a.
8
Este processo apoia e apoia-se simultaneamente no envolvimento e comunicação entre familiares e
profissionais e facilita a transição/adaptação da criança e da própria creche. A ideia de “adaptação” envolve
não só o modo como a criança experiencia o novo contexto, mas também o modo como a própria creche
se organiza (se adapta) para responder adequadamente às necessidades das crianças e suas famílias.
Por vezes, na hora da despedida, distrai-se a criança (“olha o passarinho”), enquanto o pai ou a mãe se
afastam rapidamente, para evitar o confronto com o drama e o choro da separação. Se a curto prazo a
situação parece ficar resolvida, importa refletir sobre o efeito que terá na criança desconhecer quando é que
a mãe ou o pai irão desaparecer, sentir uma total falta de controlo sobre os acontecimentos, conhecer a
imprevisibilidade, o engano…Não será mais importante que a criança conheça a despedida, seguramente
chore um pouco, mas saiba que o pai ou a mãe vão embora e que voltarão mais tarde?
Mostrar compreensão e explicar com calma e firmeza, com palavras adequadas à idade da criança, a
situação de separação, e dizer adeus será a melhor maneira de ajudar a criança a crescer com segurança e
confiança no adulto. Ao mesmo tempo, a criança descobre-se como alguém capaz de lidar e ultrapassar a
situação de frustração que a separação induz.
Ir fornecendo referências temporais também pode ajudar: “agora a mãe vai trabalhar e o João vai brincar. A
seguir, vai almoçar, dormir um bocadinho, lanchar, brincar... e depois vem a mãe, buscar o João para irem
para casa!”. Se a criança puder confirmar esta sequência várias vezes, vai mais facilmente sentir controlo
sobre a situação, e confiar nos adultos que povoam o seu mundo.
Neste processo, a capacidade da creche se adaptar e responder bem às particularidades de cada criança é
um elemento determinante na forma como a criança experiencia o contexto. A este nível, é claramente
importante a disponibilidade de novas figuras de ligação e a qualidade dos cuidados alternativos que a
criança conhece. Mas, mesmo em contextos educativos de elevada qualidade, a maior parte das crianças
não deixará de sentir dificuldades na separação e adaptação. Contudo, em situações de elevada qualidade,
as suas dificuldades esbater-se-ão mais rapidamente com o decurso do tempo, surgindo claros sinais de
bem-estar, níveis mais elevados de implicação e uma autonomia crescente.
9
Importa ainda referir que, quando o comportamento da família na preparação da criança para a separação é
particularmente diferente das práticas habituais, ou pouco natural, será percebido como discrepante pela
criança, aumentando por si só a ansiedade da separação. Preparações claras, que não transparecem a
ansiedade ou preocupação familiar, ajudarão a criança a estruturar e a compreender a separação.
Com as crianças mais crescidas, encontrar uma forma especial e “secreta” de dizer adeus, ajuda as crianças a
manter uma ligação de cumplicidade com os seus familiares queridos – dar um beijinho na palma da mão
para “guardar bem guardadinho” durante todo o dia ou inventar uma canção, lengalenga ou poema “nosso”
para assinalar a despedida, são formas de conforto que podem ajudar a criança a compreender e a lidar com
a separação.
SITUAÇÃO 3
Uma mãe que reinicia o seu trabalho após a licença parental traz a sua bebé de 6 meses à creche.
Anteriormente, a família tinha visitado o centro e conhecido a direção e o/a educador/a responsável. Ficou a
conhecer as finalidades e valores educativos da instituição, as suas práticas e outros aspetos associados à rotina.
Nos primeiros dias, a mãe pôde permanecer na instituição durante todo o dia. Juntas, mãe e filha exploraram a
sala e outros espaços da creche, conheceram as outras crianças, brincaram com alguns brinquedos. A mãe levou
um guizo especial e algumas fotografias da família. Hoje, é o dia em que a mãe retoma o seu trabalho, não
podendo ficar na creche. Quando chega, o/a educador/a saúda-a, conversam sobre as rotinas e atividades
matinais. O/a educador/a comenta, demonstrando compreensão, que deixar a bebé entregue a cuidados de
outros é difícil para a maior parte dos pais e convida a mãe a telefonar, visitar e partilhar preocupações
abertamente. Diz-lhe ainda que o seu envolvimento só poderá ajudar a desenvolver os melhores cuidados à
bebé.
Porque confiar um bebé à creche não é um processo simples, para a boa adaptação da criança e da própria
mãe/pai, torna-se fundamental o estabelecimento de uma relação colaborativa, de confiança, comunicação
aberta entre pais e educadores/as. Por isso, o/a educador/a deve estar atento às questões da adaptação e
dos sinais de mal-estar da criança e dos pais.
Sugestão de reflexão
Como se prepara a instituição para a chegada de uma nova criança? Que tipo de iniciativas são tomadas para
assegurar uma boa resposta à família?
10
3. ROTINAS E ADULTO DE REFERÊNCIA
Para além do brincar espontâneo e atividades socioeducativas2 propostas pelo adulto, nas rotinas da creche
incluem-se os cuidados, que devem ser vistos como áreas de ação educativa igualmente importantes.
Rotinas consistentes, que acontecem sensivelmente à mesma hora e da mesma maneira em cada dia,
fornecem à criança conforto e um sentimento de controlo e segurança. Seja um momento para brincar,
ouvir uma história, comer uma peça de fruta, lavar as mãos, descansar ou ir embora, saber previamente o
que vai acontecer, fornece aos bebés e crianças confiança e estabilidade. E, quando as crianças se sentem
seguras e confiantes no adulto, elas estarão disponíveis para brincar, explorar e aprender.
Os cuidados diários, chegadas e saídas, muda de fraldas, vestir, dar de comer, dormir ou mesmo limpar um
nariz, oferecem oportunidades ricas para o estreitamento de relações diádicas e securizantes, potenciando
desenvolvimento e aprendizagem diversificados. Em situações de atendimento coletivo como as que se
vivem em creches, estas ocasiões podem representar momentos ótimos para estabelecimento de
interações individualizadas, caracterizadas por maior intimidade e cumplicidade, muitas vezes difíceis de
conseguir em contexto de grupo.
SITUAÇÃO 4
O/a educador/a repara na fralda suja da Matilde: “Matilde, temos de mudar a fralda!” Matilde, 8 meses,
sentada no chão, sorri e galreia qualquer coisa. “Vou pegar-te ao colo e vamos mudar a fralda”. A bebé
responde ao gesto e às palavras com um ligeiro movimento do corpo, continua a sorrir e a palrar. À medida que
atravessam a sala, Matilde tenta alcançar um brinquedo que está numa prateleira. “Tu queres aquele brinquedo
mas agora temos de mudar a fralda! São só uns minutos”. Deitada na mesa de muda de fraldas, a bebé
observa a sala e o/a educador/a fala com ela chamando a atenção de Matilde para o seu rosto. “Olha, Matilde,
vamos tirar a fralda suja, aqui está.”- Mostra-lhe a fralda suja e o sítio onde a põe. “E agora vamos limpar o
rabinho e pôr a fralda lavada.” A bebé tenta agarrar a fralda lavada e o/a educador/a deixa-a mexer-lhe.
Matilde distrai-se com um barulho da sala e o/a educador/a aguarda até voltar a ter a sua atenção. Repete
“limpar o rabinho e pôr a fralda” e atua em consonância. Uma outra criança chama o/a educador/a. O/a
educador/a mantém a sua atenção na Matilde e responde: “Agora não posso ver isso, estou a mudar a Matilde.
Assim que terminar, vou ter contigo”. Matilde começa a contorcer-se e tenta virar-se. “Já estamos a terminar,
vou fazer mais depressa”. Matilde olha e o/a educador/a sorri e diz “Linda menina, que presta muita atenção, já
está! Vamos sentar?”. Agarra-a e puxa-a enquanto Matilde estica os braços fazendo alguns galreios. O/a
educador/a imita os seus sons e ambas riem. O/a educador/a pega nela e dá-lhe um beijo.
2
Todas as atividades oferecidas pelo/a educador/a assumem-se como sendo livres: de forma autónoma, a criança pode escolher aderir, ou não, às
propostas do adulto.
11
Que reflexão esta interação lhe suscita?
Nesta situação, repare-se na reação em cadeia à medida que o/a educador/a e a bebé interagem. Várias
interações deste género, ao longo do dia de uma criança, sempre que possível com o mesmo adulto –
adulto de referência - permitem a construção de uma relação pedagógica caracterizada por proximidade,
no seio da qual uma relação securizante se estabelece. O sentimento de ser alguém que se respeita e se
escuta é vital para todo o desenvolvimento da criança. Nesta situação, o/a educador/a procurou envolver a
criança numa situação que lhe dizia respeito. O/a educador/a e a bebé realizaram juntas uma tarefa. Se o/a
educador/a tivesse dado à Joana um brinquedo para as mãos, mantendo-a ocupada e distraída enquanto lhe
mudava a fralda, todo o tom da interação teria sido diferente. A noção de equipa desapareceria e ter-se-ia
uma criança distraída e um/a educador/a relacionando-se com parte do corpo de uma criança e uma fralda
em vez da criança como um todo. A atenção da Joana estaria focalizada no brinquedo e não na atividade em
curso. O principal objetivo do/a educador/a foi manter a bebé envolvida na interação, no seu próprio corpo
e na tarefa em curso. A muda de fraldas foi uma experiência altamente educativa, em que a bebé
“trabalhou” a focalização da atenção, o conhecimento do corpo, a comunicação e cooperação.
O/a educador/a comunica com a bebé acerca do que vai fazer, através de palavras e de gestos. A bebé
utiliza o seu corpo, sorrisos, expressões faciais e vocalizações para comunicar. O/a educador/a interpreta,
explica, questiona. Não houve grandes discursos. Diz pouco, mas o que diz está carregado de significado e
relaciona-se com a ação em curso. Ela ensinou a bebé a escutar e a focalizar-se. Utilizou uma linguagem
contextualizada e comunicou também com o seu corpo e com sons, respondendo à bebé.
Ninguém conhece melhor o sistema de comunicação de uma criança como aquela pessoa que estabelece
com ela uma ligação próxima e consistente - um adulto/educador/a de referência. Por isso, na creche,
importa envidar esforços para evitar substituições sucessivas de cuidadores e, por consequência, contactos
mais superficiais e impessoais.
Se os tempos de rotinas diárias, incluindo os tempos de acolhimento e de fim do dia, são aproveitados
como tempos de qualidade, permitindo o estabelecimento de relações diádicas próximas e altamente
responsivas, a criança conhecerá no contexto da creche tempos educativos de excelência.
Através das rotinas, como descrito na situação 4, as crianças podem aprender muitas coisas:
comportamentos positivos e sentido de responsabilidade em relação à higiene e segurança (ex. lavar as
mãos antes de comer, dar a mão ao adulto quando se atravessa a rua); desenvolver competências sociais e
comunicacionais (ex. à chegada, saudar, à saída, dizer adeus; conversar à mesa; aprender a esperar e
aguardar a sua vez; ajudar a pôr a mesa; Enfim, a experiência de rotinas agradáveis e significativas oferece
oportunidades para o desenvolvimento de confiança, curiosidade, competências sociais, autocontrolo,
12
comunicação, etc. Em grande parte, porque as rotinas se associam a um ingrediente chave para a
aprendizagem e desenvolvimento: relações interpessoais positivas, frequentes e previsíveis.
A figura de referência significa que o bebé ou a criança têm alguém especial com quem podem estabelecer
uma relação de maior intimidade. Uma creche que assegure a existência de figuras de referência é um
contexto que reconhece seriamente a importância da qualidade da relação pedagógica. Quando a criança
conhece a segurança conferida por uma figura de vinculação, no momento seguinte surge a sua
disponibilidade para explorar e aprender e, logo, chegará o momento em que estaremos perante um
cidadão com um forte sentido de “eu” competente, valorizado e amado.
A existência de um adulto de referência para cada criança significa que os pais, a direção da instituição, e o
responsável técnico e pedagógico sabem quem é a pessoa principal responsável por aquela criança. Ser um
adulto de referência ou figura chave de uma criança (ou várias) não significa que a pessoa se dedica
exclusivamente e durante todo o tempo apenas à(s) “suas” criança(s). O trabalho de equipa é muito
importante. Nem sempre o adulto de referência está disponível para atender a todas as solicitações ou
necessidades de cada criança. Profissionais, que trabalham bem em conjunto, abraçarão as mesmas
finalidades e objetivos, compreendendo a importância da atenção individualizada às crianças e comunicando
adequadamente - partilhando informação sobre as crianças, articulando entre si quem fará uma determinada
tarefa, com quem, quando.
Sugestão de reflexão
No meu grupo, qual o ratio adulto-criança? Que papéis/funções são assumidos pelos adultos? Que tipo de
estratégias poderão ser adotadas para proporcionar momentos mais individualizados a cada criança?
Nesta secção aborda-se a importância da criação de parcerias e redes de colaboração, sejam elas grandes
ou pequenas, inter ou intra-instituições, tendo sempre como objetivo principal o bem-estar e
desenvolvimento das crianças.
É importante que, no seio de um contexto educativo, todos os elementos da equipa partilhem os mesmos
princípios e finalidades educativas, participando e assumindo um papel claro na promoção do bem-estar,
desenvolvimento e aprendizagem das crianças. Neste sentido, o trabalho em equipa desempenha um papel
13
fundamental na construção de uma linguagem comum a todos, desde a liderança, até aos funcionários da
cozinha, passando pelos ajudantes de ação educativa e educadores/as de infância.
Contudo, colaborar vai além de trocas de impressões entre colegas sobre as crianças ou sobre os
acontecimentos, implicando o desenvolvimento de atividades e a troca de materiais e, sobretudo, a
planificação e avaliação conjuntas, num processo de formação/supervisão colaborativas.
Os/as educadores/as beneficiam em participar num trabalho contínuo em equipa. Aprendem a conhecer os
interesses e pontos fortes dos outros e a desenvolver estratégias conjuntas de resolução de problemas. É
importante que cada equipa (referimo-nos aos adultos que trabalham em conjunto com um grupo de
crianças, geralmente, um/a educador/a e um ou dois ajudantes) se reúna com frequência para discutir,
interpretar, planear e avaliar com base nas observações das crianças e nas finalidades educativas. Nestes
momentos, devem refletir sobre as suas práticas, sobre os problemas que vão surgindo e possíveis soluções
para os mesmos. Em conjunto, com base no seu conhecimento das aprendizagens e desenvolvimento das
crianças, cada equipa vai construindo um entendimento comum sobre as crianças do grupo, delineando
estratégias que apoiam os seus pontos fortes, os seus interesses e as suas capacidades. Os/as educadores/as
e dirigentes devem também trabalhar em conjunto para conseguir calendarizar estes momentos de
reflexão, tornando-os parte da rotina. A médio/longo prazo, os membros da equipa passam a ser
educadores/as mais eficazes se estiverem algum tempo por dia juntos a pensar sobre aquilo que estão a
observar nas crianças, no modo como as devem apoiar e resolver os problemas que vão surgindo.
14
b. Parceria com as famílias
O bem-estar e aprendizagem das crianças são mais facilmente atingidos quando os/as educadores/as
trabalham em parceria com as famílias. Importa respeitar cada família, reconhecendo as suas semelhanças e
diferenças e valorizando as suas especificidades culturais. Neste sentido, é fundamental que se criem nas
creches climas recetivos, onde todas as crianças e famílias sejam respeitadas e ativamente encorajadas a
colaborar com os/as educadores/as em todo o tipo de decisões. Para que os pais ou cuidadores se
envolvam, é importante criar um ambiente acolhedor, definir um processo de acolhimento centrado na
famílias, partilhar os dados de observação das crianças e encorajá-los a participar. A equipa de
educadores/as, pais e crianças vai-se conhecendo cada vez melhor ao longo do tempo, criando condições
para o crescimento de relações significativas e para o desenvolvimento de projetos conjuntos. As parcerias
também implicam que os/as educadores/as, as famílias e os outros profissionais de apoio trabalhem em
conjunto para explorar o potencial de aprendizagem das atividades, rotinas e brincadeiras diárias. Assim,
podem criar-se oportunidades de partilha e reflexão conjunta, que apoiem a participação e o envolvimento
de todos.
Para que estas parcerias se tornem eficazes e gratificantes, importa que os/as educadores/as, desde o início,
reconheçam o papel da separação, manifestando compreensão e centrando-se nos pontos fortes dos pais e
das crianças. Quando surgem conflitos, é fundamental a utilização de uma abordagem de resolução de
problemas, evitando entrar em confronto com os pais mas mostrando compreensão pelas suas
preocupações e abertura para discutir alternativas possíveis.
Algumas estratégias para promover a participação das famílias: participação em reuniões e encontros
formativos; desenvolvimento de projetos; dinamização de atividades para as crianças; produção de
materiais; acesso a documentos informativos sobre a creche, atividades e aprendizagem das crianças;
15
existência de espaços de partilha oral e escrita (ex. momentos de conversa informal, diários creche-casa). A
criação de redes de suporte mútuo entre pais, que funcionam como espaços de reflexão e partilha de
problemas, dúvidas e inquietações, poderá também ser uma iniciativa interessante.
Mais do que apresentar ideias fechadas aos pais ou famílias, pedindo a sua ajuda para a concretização, é
imprescindível contar com eles também para a produção de ideias, busca de soluções alternativas e
resolução de problemas. Os pais participarão de forma mais entusiasta se sentirem que as suas ideias e
opiniões são valorizadas.
c. Parcerias na comunidade
3
Para mais informação, consultar a página do SNIPI: http://www.dgs.pt/sistema-nacional-de-intervencao-precoce-na-infancia.aspx
16
As parcerias com a comunidade são indissociáveis do trabalho colaborativo com as famílias, uma vez que os
pais/tios/irmãos são, também, cidadãos, funcionários, artistas, que podem estabelecer a ponte com os
diferentes organismos existentes na comunidade, evitando-se instituições fechadas sobre si próprias.
Cada instituição deverá explorar as potencialidades da sua comunidade, criando uma rede de parceiros
sólida e única, sendo importante assumir que a própria creche também poderá configurar-se como uma
mais-valia para o meio em que se insere.
Sugestão de reflexão
Na minha instituição, como é incentivada a participação das famílias? Até que ponto a oferta educativa reflete
o ambiente familiar das crianças e o ambiente da comunidade local?
Que relações e articulações existem com outros estabelecimentos de educação? Como perspetiva a
importância de participar em comunidades ou redes de partilha de práticas entre educadores/as? Que
iniciativas poderá tomar para criar ou participar num grupo de discussão?
17
5. BRINCAR
As atividades dirigidas pelo adulto, ainda que muito adequadas, devem ser apenas uma pequena parte
daquilo que é a educação em creche, podendo as crianças, livre e naturalmente, aderir ou não a essas
propostas. As crianças, através do seu ímpeto natural de desenvolvimento, são o melhor indicador daquilo
que vem ao encontro das suas necessidades desenvolvimentais. Bebés e crianças muito pequenas
desenvolvem-se bem em contextos calorosos e atentos às suas características e necessidades individuais, e
não tanto em atividades de grupo, dirigidas por um adulto.
Para além dos tempos de qualidade em que criança e adulto estão envolvidos em tarefas conjuntas, são
também momentos de qualidade aqueles em que o adulto não dirige a atenção ou ação da criança, estando
disponível e responsivo. Num contexto organizado de forma intencional com vista ao desenvolvimento e
aprendizagem de cada criança, estar junto dos bebés enquanto estes exploram e brincam livremente,
respondendo, e não tanto iniciando a interação, confere um maior grau de liberdade e controlo social à
criança e sustenta o desenvolvimento do seu ímpeto exploratório.
Criar oportunidades de exploração interessantes, dar espaço e tempo à criança, estar disponível e ser
responsivo não é algo que surja naturalmente. Observar e controlar o ímpeto para dirigir e “ensinar” não é
fácil. Trabalhar a iniciativa e autonomia da criança envolve uma capacidade do adulto suspender os seus
próprios interesses e objetivos, para se centrar na valorização da ação da criança.
Sugestão de reflexão
Escolha um momento para estar com a criança e apenas observar e responder às suas iniciativas. Verifique
durante quanto tempo consegue manter esse papel recetivo e responsivo. O que conclui?
Brincar é uma atividade valiosa e natural! Se observarmos uma criança que brinca, percebemos que brincar
faz parte dela. Cada ação da criança envolve todo o seu ser (corpo, cognição e emoção). Sendo algo de
profundamente significativo para as crianças, deve ser encorajado. Quando brinca, a criança envolve-se
ativamente num processo de atribuição de sentido, de forma única, individual, à sua medida. A observação
das crianças enquanto brincam permite inferir porque é que o brincar pode ser um meio de aprendizagem
extremamente poderoso. No brincar/atividade livre as crianças estão totalmente implicadas, atuando no
seu próprio nível de desenvolvimento e de desafio, em controlo. A forma entusiástica e concentrada como
as crianças brincam indica o valor altamente desenvolvimental da experiência. Quando as crianças brincam
fazem descobertas, expressam-se, mobilizam conhecimentos, pensam e resolvem problemas em contexto
significativo. Nas suas explorações autónomas, as crianças dão asas à sua curiosidade e imaginação,
18
aprendem por ensaio e erro, sem medo de falhar. Ao brincar, o ímpeto exploratório, natural e intrínseco a
todas as crianças, ganha espaço de ação.
O brincar tem sido descrito segundo diversas tipologias. Neste documento optou-se por considerar a
seguinte organização:
· Brincar físico e motor: envolve desenvolvimento e controlo dos movimentos corporais. Inclui todos
os movimentos corporais, destacando-se os movimentos dos membros superiores e inferiores,
coordenação e equilíbrio.
· Brincar faz-de-conta ou brincar sócio dramático: sempre que a criança “finge” que algo, uma
situação ou ela própria é ou faz uma coisa diferente daquilo que é na realidade, fala-se de faz-de-conta.
A criança vai experimentando diferentes papéis sociais, ocupações e situações. É um brincar que pressupõe
a mobilização da imaginação e complexificação do pensamento da criança. O desenvolvimento crescente da
linguagem e a amplificação da interação com outras crianças sustentam essa complexificação do
pensamento abstrato, bem como a capacidade de perceber e ter em consideração diferentes perspetivas e
consequente melhoria da competência comunicacional.
· Brincar com a linguagem: envolve brincar com sons, palavras ou ritmos, descoberta de novas
palavras, histórias e canções. Trata-se de um tipo de brincar que sustenta o desenvolvimento do
pensamento, da comunicação e de todos os comportamentos literários (ex. iniciação à escrita).
19
· Brincar com regras: gradualmente, as crianças vão integrando no seu brincar regras de interação. O
desenvolvimento da linguagem tem um importante papel na medida em que as crianças necessitam de
explicar, perguntar e negociar regras e formas de brincar (ex. aguardar a sua vez, utilizar um objeto de
forma específica, aceitar a assunção de papéis diferenciados no brincar).
Numa mesma situação podem estar envolvidos vários tipos de brincar. Por exemplo, a criança pode
imaginar-se um construtor (faz-de-conta) quando está a montar uma torre ou a fazer uma estrada (brincar
construtivo); do mesmo modo, os bebés podem iniciar-se num brincar com regras quando brincam ao “cu-
cu”, aguardam a sua vez numa interação, ou exploram um pedaço de tecido (brincar exploratório).
O brincar é uma forma de aprendizagem e os/as educadores/as podem, através da qualidade da sua
presença, do tempo, espaços e materiais que providenciam para as crianças, de interações e intervenções
estimulantes, assegurar desenvolvimento e aprendizagens diversas, ao nível das finalidades e objetivos
educativos. Neste processo, a criança percebe que o seu brincar é valorizado e respeitado, e o seu sentido
de segurança e de autoestima é robustecido.
A observação do brincar fornece informações valiosas sobre o pensamento, a intensidade e qualidade da
experiência, o desenvolvimento e aprendizagem da criança. Devem evitar-se comentários intrusivos
enquanto a criança brinca. Importa que os profissionais se sintonizem com as crianças, pegando nas suas
manifestações de interesse e atuando no seu prolongamento.
É fundamental contrariar a tendência para a valorização do produto final, para atividades estruturadas e
formais, realçando a importância de um brincar livre, espontâneo, isento de qualquer pressão ou
diretividade por parte do adulto.
20
Papel do adulto no brincar
· Providenciar uma base segura a partir da qual os bebés e as crianças exploram e brincam, no
interior e exterior, e alargando progressivamente as suas interações sociais;
· Prestar atenção e responder aos sinais dos bebés, conversar, nomear, descrever objetos ou
situações, bem como os comportamentos e sentimentos dos bebés, nas diversas rotinas e outras
situações, de forma prazerosa;
· Apoiar os bebés nas suas tentativas para realizar novas ações e para praticar e repetir atividades já
dominadas;
· Providenciar materiais e objetos interessantes para exploração, bem como oportunidades para as
crianças mais velhas arriscarem, se movimentarem, manipularem, investirem nos seus objetivos,
criarem, fazerem de conta, transportarem materiais;
· Modificar o ambiente e as oportunidades oferecidas à medida que as crianças crescem e se
desenvolvem (ao nível de equipamentos, materiais, criação de rampas, degraus, curvas, declives);
· Estimular a diversificação do brincar das crianças e assegurar oportunidades para brincadeiras a
pares ou em pequenos grupos;
· Envolver-se ativamente em interações alegres e desafiadoras com as crianças em diversos tipos de
brincar.
Sugestão de reflexão
Observe o brincar da criança e procure estabelecer uma relação com as finalidades e objetivos educativos
para a creche.
21
6. ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS
A forma como os espaços estão organizados revela as preocupações pedagógicas e os princípios educativos
que lhes estão subjacentes, uma vez que estes, em articulação com a ação do adulto, terão um papel
importante na promoção de aprendizagens e experiências significativas.
A criação de espaços interessantes, dinâmicos e acolhedores é um processo que beneficia de uma
observação continuada e atenta do comportamento de cada criança, e de um olhar reflexivo e crítico por
parte do/a educador/a.
Na organização dos espaços, sejam estes a zona de entrada, cabides, sala de atividades, zona de
refeições ou zonas exteriores, é útil estabelecer objetivos para as diferentes áreas,
procurando-se responder à pergunta: O que é que se deseja que cada espaço seja e transmita?
A discussão em equipa poderá ser mais proveitosa, por comparação à reflexão isolada de cada
educador/a, permitindo assim que todos possam participar na definição e melhoramento de algo que
“pertence” a todos.
22
a. Espaço interior
Segurança e Familiaridade
Os espaços para crianças muito pequenas, que se encontram numa fase de desenvolvimento que exige
valorização das relações próximas, das zonas de aconchego e de familiaridade, e da previsibilidade das
rotinas, devem transmitir um sentimento de “casa”.
Para criar um ambiente mais familiar, por exemplo na zona de entrada pode ser interessante colocar
fotografias da equipa educativa, com uma legenda identificativa de cada pessoa e algumas fotografias das
crianças a brincar. Para os pais ou outras pessoas que frequentam diariamente a instituição, uma zona de
entrada interessante e agradável pode ser um estímulo para um maior interesse e envolvimento nas
atividades da creche. Além disso, pela variedade de pessoas que frequentam esta área, é possível defini-la
como um espaço para a afirmação pública dos valores e princípios da instituição.
Nas salas de atividades é igualmente importante garantir que existem espaços mais calmos e reservados,
propiciadores de momentos de maior intimidade e aconchego, privacidade e isolamento. Uma área com
muitas almofadas, mantas e colchões, que se encontra delimitada por móveis ou paredes pode ser uma
solução para criar um espaço de conforto, onde o adulto pode interagir com uma ou duas crianças ou onde
estas podem descansar. A existência de sofás de tamanho de adulto permite também que o/a educador/a
possa confortar a criança, transmitindo-lhe segurança e suporte ao seu desenvolvimento (cf. ponto
referente a “Conforto dos adultos e autonomia das crianças”). Para criar espaços de maior privacidade, a
criação de esconderijos, cobrindo uma mesa alta ou um caixote de grandes dimensões com lençóis, pode
ser uma estratégia interessante e pouco dispendiosa.
A criação de um ambiente familiar pode também ser potenciada através da existência de álbuns de
fotografias da família/amigos de cada criança, que podem ser consultados sempre que fizer sentido. A
solicitação das fotografias aos pais revela também que existe interesse por parte do/a educador/a, em criar
uma articulação entre a casa e a creche, valorizando-se as rotinas e as atividades familiares. Para as crianças,
a familiaridade e segurança também pode passar pela utilização de elementos de conforto, como a chupeta
ou um boneco especial.
23
A segurança nos espaços de creche envolve também dimensões mais práticas4, como a necessidade de
garantir que os móveis e outros objetos estão bem seguros, uma vez que no início da aquisição da marcha
é muito comum que as crianças se apoiem naquilo que as rodeia para se levantarem e deslocarem. Ainda é
necessário salvaguardar que os materiais que as crianças manipulam não oferecem quaisquer perigos
significativos.
Por último, o conhecimento dos espaços é também um fator que oferece segurança às crianças. Neste
sentido, é importante referir que a reorganização dos contextos deve ser devidamente planeada,
procurando-se perceber o que é pertinente mudar e o que é necessário manter. O/a educador/a deve
compreender que a mudança dos espaços pode causar sensações de desconforto e insegurança nas
crianças, podendo demorar algum tempo até que elas se habituem ao novo espaço. Tanto quanto possível,
as crianças devem ser envolvidas nos processos de mudança, seja através da identificação dos seus
interesses, no diálogo acerca das mudanças e na própria mudança de objetos de uns locais para outros.
Os interesses e as necessidades das crianças são muito díspares. Por isso, neste documento assume-se a
impossibilidade de se fazer uma descrição exaustiva das inúmeras possibilidades de organização do espaço,
optando-se antes por identificar algumas ideias centrais, que vão ao encontro de interesses e necessidades
das crianças.
Numa etapa da vida em que o mundo é compreendido através dos sentidos e das ações com as quais o
sujeito contacta, importa garantir que as crianças têm oportunidade para interagir com estímulos variados e
versáteis. Objetos que possuem diferentes texturas, cores, sons, formas e tamanhos devem estar acessíveis
às crianças para que estas os possam manipular, explorar, transportar, agitar, etc. Se pensarmos na
diversidade de formas que objetos simples, como uma bola (grande, pequena, de plástico, de ténis, de
futebol, de esponja, etc.) ou uma caixa (grande, pequena, retangular, cilíndrica, triangular, de cartão, de
plástico, etc.) podem assumir, torna-se fácil perceber que essa variedade suscitará curiosidade e incitará a
criança a experimentar diferentes sensações e possibilidades de ação. Na mesma linha de pensamento,
objetos que não têm um fim único, podendo servir diferentes objetivos de brincadeira, estimulam a
imaginação e o pensamento divergente. É ainda de realçar a importância de se fornecerem materiais
naturais (ex. conchas grandes, rolhas, nozes) que suscitem o interesse da criança pela sua proximidade com
a Natureza, desde muito cedo. O toque, o cheiro, o tamanho e a massa dos materiais naturais dificilmente
4
Para mais informações ver normas reguladoras das condições de instalação e funcionamento da creche: Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto.
Sobre segurança dos brinquedos pode consultar a página:
http://www1.ipq.pt/PT/AssuntosEuropeus/MarcacaoCE/ListaDasDirectivas/Pages/Por%20Diretiva/Seguranca_brinquedos.aspx
24
podem ser reproduzidos em brinquedos comprados. Além disso, a curiosidade suscitada pelos materiais
naturais conduz à colocação de questões e realização de experiências/explorações que potenciam um
contacto precoce com fenómenos de ciência (biologia, física, geologia, etc.), que posteriormente serão
aprofundados noutras etapas do desenvolvimento.
Com crianças que já são capazes de se sentar, a disponibilização de materiais pode ser feita com recurso a
cestos contendo objetos diversos da vida diária (ex. colheres de diferentes tamanhos, chaves, recipientes
diversos, fruta). A disponibilização de uma diversidade de estímulos fará com que a criança explore
livremente, utilizando todo o corpo (ex. as mãos, os pés, a boca) para experienciar a massa, o tamanho, a
textura, a forma e o som dos objetos que vai tirando do cesto. Neste processo, o bebé começa também a
cultivar a sua capacidade de escolha e de concentração, uma vez que escolhe um objeto entre um conjunto
de opções disponíveis e se concentra em perceber todos os seus pormenores.
Quando as crianças começam a andar é crucial garantir que estas têm espaço para se deslocar, sem que
existam demasiados obstáculos no caminho. À medida que a marcha vai estando cada vez mais consolidada,
torna-se pertinente fornecer mais desafios que exijam outro tipo de destreza motora como saltar, subir,
descer, rastejar, chutar, atirar, entre outros.
Ainda, no planeamento dos espaços, é fundamental considerar áreas que promovam a socialização e o
desenvolvimento da linguagem. Espaços com livros, lápis grossos, canetas, papel, imagens, fantoches,
bonecos e outros objetos que possibilitem o faz-de-conta, estimulam a aprendizagem de conceitos e a
interação com os outros. Tanto quanto possível, é importante que nos espaços de faz-de-conta (ex.
casinha, hospital, loja, oficina, etc.), onde habitualmente várias crianças se juntam, se forneçam objetos da
vida real, que sejam familiares e facilmente identificáveis pelas crianças (ex. acessórios ou disfarces
característicos).
As tecnologias de informação e comunicação e demais media, nomeadamente televisão e rádio, fazem parte
da cultura da sociedade, configurando-se como dimensões sobre as quais as crianças aprendem ou com as
quais aprendem. No trabalho educativo com as crianças o potencial educativo das tecnologias não deve ser
ignorado, ainda que seja necessário adotar uma atitude de parcimónia e de reflexão sobre a sua
25
intencionalidade pedagógica, evitando-se períodos de utilização prolongada e sem o acompanhamento dos
adultos.
Por último, a organização e manutenção dos espaços envolve a reflexão em relação à quantidade de
estímulos que são apresentados às crianças. O excesso de estímulos poderá criar “ruído” ambiental, ao
ponto de dificultar que a criança explore e se concentre naquilo que a cativa. Ainda, observar e perceber o
interesse dos materiais para as crianças é fundamental, podendo vir a ser necessário retirar materiais e/ou
introduzir outros, no sentido de manter ou suscitar o seu interesse e implicação.
Na interação do adulto com a criança, aquilo que é transmitido vai muito além do que é dito ou feito. Os
comportamentos, discursos e olhares transportam uma bagagem emocional que a criança aprende
rapidamente a captar. Desta forma, se o/a educador/a está cansado, stressado, triste ou zangado, é natural
que esses sentimentos afetem a sua forma de estar com o grupo. Assim, torna-se relevante atender, não só
ao conforto da criança no seu dia a dia na creche, mas também ao conforto dos adultos que cuidam dela.
Os comportamentos rotineiros de pegar ao colo, estar agachado no chão, sentar em cadeiras de criança,
transportar materiais (ex. catres, triciclos), entre outros, trazem um maior desgaste ao adulto e prejudicam
a sua saúde.
Neste sentido, o planeamento dos espaços deve considerar a inclusão de materiais que facilitem as tarefas
do adulto. Cadeiras, sofás e mesas de tamanho apropriado, móveis com rodas e carrinhos de transporte de
materiais, são alguns elementos básicos, que podem diminuir o esforço e agilizar as tarefas.
Por sua vez, a progressiva promoção da autonomia das crianças revela-se como uma abordagem pertinente,
que beneficia ambas as partes. Para a criança, o confronto com experiências que lhe permitem adquirir
competências importantes para o seu desenvolvimento possibilita o alargamento do seu campo de ação. Ao
sentir que o adulto confia nela e a considera capaz para executar determinadas tarefas, a autoestima da
criança fortalece-se e esta ganha confiança para novas explorações e aprendizagens. Permitir que a criança
lave as mãos sozinha, sem que o adulto tenha de estar debruçado sobre a torneira, colocar uma escada,
junto da zona de muda de fraldas, pela qual as crianças podem subir sem que o adulto tenha de lhes pegar,
colocar um sofá ou uma cadeira de tamanho normal na sala, onde o adulto possa contar uma história ou
sossegar uma criança de forma confortável, são sugestões que podem melhorar a qualidade da oferta
educativa em creche.
Ainda, para que adultos e crianças possam usufruir dos espaços da melhor forma possível, importa montar
um bom esquema de organização dos materiais que, por um lado, permita que as crianças acedam
facilmente aos objetos e consigam ver o que está à sua disposição e, por outro lado, facilite a arrumação ao
26
longo do dia. Contudo, importa realçar que um bom sistema de organização de materiais não impede que
estes “viajem” para diferentes pontos da sala, pois o transporte/deslocação dos objetos é um interesse
muito comum nas crianças em idade de creche.
O modo como os espaços estão organizados revela a forma como os/as educadores/as respeitam e
valorizam a identidade de cada criança e família. Assim, é crucial refletir em relação ao modo como o
nome, a imagem e a cultura de cada uma é trabalhada e exposta.
Na sala de atividades será interessante colocar espelhos de diferentes tamanhos, onde a criança possa ver o
seu corpo e expressões refletidas, ganhando progressivamente uma noção mais pormenorizada do seu
corpo. As vivências de cada criança, registadas através de desenhos, fotografias, etc., podem ser afixadas nas
paredes da sala e corredores, ao nível do olhar da criança, permitindo dar visibilidade às suas experiências.
Esta abordagem facilita a comunicação com os pais, partilhando-se aquilo que vai acontecendo. Na decisão
em relação ao que afixar, é importante que exista uma preocupação em relação à forma e conteúdo dos
materiais. Os espaços devem transmitir uma sensação de harmonia, apresentando um equilíbrio entre
aquilo que são as experiências e os interesses das crianças e a visão estética do adulto em relação aos
espaços. Neste sentido, é importante observar e conversar com as crianças, procurando-se perceber o que
é que é mais relevante para elas e o que é que gostariam de ver exposto.
Na interação com as crianças, importa que elas sintam que têm espaço para expressar a sua personalidade
e interesses, sem que sejam repreendidas ou julgadas pelos seus comportamentos. Num contexto de
diversidade cultural, será importante dar espaço para que as diferentes heranças culturais sejam partilhadas
e admiradas. Ouvir música ou disponibilizar roupas ou objetos relacionados com as culturas de origem das
crianças são possíveis iniciativas que enriquecem o ambiente em creche.
b. Espaço Exterior
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Nos espaços exteriores, as crianças experienciam uma sensação de liberdade e de autodeterminação muito
importantes para o desenvolvimento de uma identidade positiva. Nas suas atividades, mobilizam todo o
corpo na exploração do meio, dos objetos e das suas próprias competências, efetuando aprendizagens
sólidas, baseadas na experiência pessoal. Fora dos espaços interiores controlados, surgem também novos
desafios e riscos, a partir dos quais a criança pode treinar competências e aprender com os erros.
Para que os espaços exteriores cumpram todas suas potencialidades, é necessário atender ao seguinte:
· O planeamento dos espaços exteriores deve ser feito com o mesmo rigor e dedicação aplicados aos
espaços interiores;
· Os adultos que acompanham as crianças devem valorizar e reconhecer as potencialidades pedagógicas
destes espaços, acompanhando as crianças nas suas descobertas;
· Os espaços exteriores não devem estar organizados do mesmo modo que a sala de atividades,
interessando que se desenvolvam brincadeiras diferentes. No entanto, é importante garantir que os dois
espaços são entendidos como um contínuo, permitindo-se, por exemplo, que alguns objetos circulem nos
dois espaços e que descobertas feitas no exterior possam ser exploradas dentro da sala;
· As crianças devem usufruir do exterior, todos os dias, mais que uma vez ao dia, sempre que possível. A
preocupação dos adultos em manter bebés e crianças pequenas em espaços controlados, seguros e
confortáveis não é incompatível com o usufruto de espaços naturais.
Nesta linha de pensamento, apresentam-se, de seguida, ideias nucleares relacionadas com a criação de
espaços exteriores interessantes para a creche. As ideias apresentadas são apenas sugestões de intervenção
nos espaços exteriores. Considera-se que grande parte dessa tarefa fica à responsabilidade do adulto que
acompanha a criança e deteta o que pode ser necessário introduzir para responder aos seus interesses.
Vivências sensoriais
Os espaços exteriores podem ser vistos como contextos ricos em oportunidades sensoriais, fornecendo
diferentes cheiros, texturas, sons, temperaturas, paisagens, etc. Com o acompanhamento de um adulto
responsivo, a possibilidade de sentir o vento a bater na cara e de ouvir as folhas das árvores a mexer, de
ver os pássaros a voar ou as pessoas que passam na rua, são excelentes momentos de aprendizagem para o
bebé, através dos quais amplifica as interações com o mundo que o rodeia.
SUGESTÕES
Para um bebé que ainda não se consegue sentar poderá ser interessante deitá-lo sobre a relva,
com ou sem manta, e ir alterando a sua posição, para que possa adquirir diferentes perspetivas
28
em relação ao que o rodeia. Bebés de poucos meses, a partir dos seus próprios carrinhos ou de
uma rede, podem contemplar aquilo que os envolve.
Movimento
Ao ar livre, bebés e crianças são estimulados para a ação e para o movimento, aliciados pelas caraterísticas
amplas e dinâmicas dos espaços exteriores.
Os múltiplos pormenores que rodeiam um bebé deitado na relva levam-no a esticar os seus músculos para
tentar chegar mais além e, assim, evoluir para novas formas de deslocação. Crianças que começam a
gatinhar ou a caminhar beneficiam da exploração de diferentes pavimentos, com inclinações e
características distintas (ex. piso de relva, empedrado, areia), através das quais podem adquirir diferentes
informações (ex. qual o piso mais difícil/fácil para manter o equilíbrio? Qual a sensação da relva e da areia
nos pés/mãos?) e melhorar as suas estratégias de movimentação.
Tal como já foi referido, as crianças que começam a andar necessitam de espaço e tempo para conseguirem
dominar verdadeiramente esta capacidade. Neste processo todo o corpo é mobilizado, adquirindo-se
progressivamente uma maior capacidade de coordenação e equilíbrio. À medida que a marcha vai ficando
consolidada, o fascínio da criança pelo movimento passa também a envolver a deslocação de objetos,
importando, por isso, fornecer materiais que permitam ações como empurrar, puxar, atirar, levantar,
encher, esvaziar, entre outras. Estes comportamentos são repetidos muitas vezes pelas crianças, que
beneficiam da repetição para compreender cada vez melhor as propriedades dos objetos e do meio
envolvente.
Com a evolução da capacidade de deslocação, outros movimentos como saltar, correr, trepar, deslizar,
baloiçar, começam também a ser procurados pelas crianças. Assim, há que fornecer estruturas que
permitam responder a estas necessidades, como baloiços, escorregas, estruturas de trepar, túneis,
percursos de obstáculos e equilíbrio, entre outras. Para criar este tipo de estímulos nos espaços, nem
sempre é necessário recorrer a estruturas muito dispendiosas. O aproveitamento das características físicas
do terreno (ex. inclinações) e a utilização de objetos como pneus e cordas poderá ser uma forma de suprir
algumas destas necessidades. Nestas atividades, a presença de risco é inevitável; no entanto, é necessário
considerar que estas são experiências importantes para o desenvolvimento da criança, pois permitem
29
treinar capacidades básicas para a superação de desafios futuros (ex. análise das capacidades individuais e
das características dos contextos, gestão do medo, confiança, persistência). Importa que o adulto dê espaço
à criança para experimentar e errar, sem nunca a colocar em situações de perigo.
As possibilidades de ação no espaço exterior não estão isentas de riscos. É impossível eliminar totalmente a
possibilidade de que ocorra algum acidente, ainda que ligeiro (ex. esfolar o joelho). No entanto, o confronto
com desafios é extremamente importante para o desenvolvimento, justificando-se assim a promoção de
situações de brincar arriscado. Estas experiências permitem treinar competências relacionadas com a análise
das capacidades individuais e das características dos contextos (“Será que eu sou capaz de fazer isto? Será
que este muro é demasiado alto para eu saltar?) e promovem a confiança, a persistência e a autoestima da
criança (“Não tenho a certeza se consigo trepar até aquele ponto. Se cair, vou aleijar-me. Talvez seja boa
ideia tentar outra forma de subir”; “Consegui, fui capaz!”).
Nas atividades de brincar arriscado, o acompanhamento do adulto é importante; contudo, este deve dar
espaço à criança para que seja ela a tomar decisões, experimentando situações novas e aprendendo com os
erros.
Nos espaços exteriores, o contacto com água, solo, paus, rochas, folhas, entre outros, é facilitado,
permitindo a sua utilização variadas experiências e aprendizagens. Por exemplo, através das brincadeiras
com água e solo, a criança vai percebendo que a combinação destes dois elementos dá origem à lama, uma
substância mais espessa e fácil de moldar. Ao tentar escavar diferentes tipos de solo, mais ou menos duros,
também se torna possível treinar a força que é necessário empregar, bem como a coordenação e equilíbrio
do corpo. Ao encher e esvaziar baldes de areia, deitando abaixo, posteriormente, os montes que se
formam ao virar o balde, as crianças aprofundam noções de causa-efeito, cheio-vazio e treinam a
motricidade fina.
Também será interessante fornecer materiais naturais como rochas, conchas e paus, que utilizados com a
devida supervisão dos adultos não trazem perigos relevantes e enriquecem as brincadeiras. Com efeito,
este tipo de materiais alarga o conhecimento do mundo, responde ao ímpeto exploratório da criança e
suscita a sua curiosidade.
A exploração do som conjugado com o movimento, por exemplo, pode ser uma atividade cativante, que
será facilitada se vivida no exterior, uma vez que o barulho produzido não se torna tão perturbador como
no interior de uma sala. O chocalhar das rochas dentro de uma garrafa, o som de dois paus a bater um no
30
outro ou o som e vibração de um pau a bater numa panela, são ações que podem ser repetidas várias vezes
pelas crianças e que progressivamente se vão complexificando (ex. introdução de ritmos).
Por volta dos 2 – 3 anos, a possibilidade de brincar com materiais de diferentes tipos, formas, texturas e
tamanhos conduz à realização de categorizações, importantes para a compreensão e atribuição de sentido
ao mundo.
A categorização dos materiais pode ser feita em função de diferentes critérios, permitindo que a criança vá
interiorizando as diferentes relações que existem entre os objetos (ex. cor, tamanho, forma, massa).
Na descoberta do mundo natural, surge também um crescente interesse por animais e plantas. Com o
desenvolvimento da linguagem, é cada vez mais cativante conhecer os diferentes seres vivos que habitam
nos espaços, perceber como sobrevivem, o que fazem, etc. Este tipo de exploração é praticamente
inesgotável, uma vez que o espaço está em permanente alteração, apresentando diferentes estímulos após
um dia de chuva, sol ou neve. Com efeito, os próprios fenómenos atmosféricos podem deslumbrar as
crianças e dar azo a uma variedade de questões. Desde que devidamente agasalhadas e equipadas (ex.
impermeáveis, galochas), pode ser divertido e muito enriquecedor, brincar no exterior, num dia de chuva.
Observam-se e exploram-se as poças de água, conhece-se a sensação dos pingos de chuva no rosto,
admira-se a transformação do solo e das plantas, etc.
Chapinhar nas poças é uma atividade muito divertida, que mobiliza todo o corpo e transmite uma sensação
de bem-estar e liberdade.
SUGESTÕES
Fornecer imagens de animais possíveis de encontrar no espaço exterior poderá ser uma forma de
promover a curiosidade das crianças e de permitir que sejam elas próprias a identificar aquilo que
encontram. As descobertas que são feitas nos espaços exteriores podem também ser exploradas
no interior da sala, criando-se assim uma articulação entre os dois espaços.
Criatividade e socialização
Com o progressivo desenvolvimento da linguagem, o espaço exterior passa a ser, cada vez mais, um
contexto para interagir com os outros e desenvolver iniciativas em conjunto. A imprevisibilidade e os
31
obstáculos naturais do exterior apelam à cooperação e ao diálogo entre pares, começando-se a partilhar
brincadeiras e interesses e a desenvolver comportamentos de empatia e respeito pelo outro.
Apesar do crescente interesse em se relacionar com os outros, continuam a ser necessários locais onde as
crianças possam encontrar tranquilidade, segurança e conforto. Apesar de poderem afastar-se do adulto,
durante as suas explorações, importa que saibam que podem recorrer ao adulto, sempre que for
necessário. Assim, é importante que os espaços exteriores possuam também zonas mais calmas e
reservadas, onde as crianças possam obter a segurança e privacidade que necessitam (ex. zonas de abrigo).
SUGESTÕES
Os esconderijos podem ser construídos de formas muito simples, utilizando-se, por exemplo,
caixotes e panos grandes. Nestes espaços surge, muitas vezes, um brincar imaginativo, que vai
sendo cada vez mais complexo, em função da idade da criança.
O exterior permite ainda diferentes formas de expressão da criatividade e imaginação. Atividades como
pintar no chão/parede com giz ou água possibilitam movimentos com características distintas daquelas que
são mobilizadas quando se desenha numa folha de papel. Por sua vez, os vários materiais naturais que estão
à disposição da criança permitem representar ideias de uma forma tridimensional, promovendo-se a
capacidade de representação e imaginação. Além disso, a possível desordem causada por atividades
artísticas mais elaboradas, como desenhar com tintas em papel de cenário ou moldar barro, pode ser
minimizada se decorrer no exterior, pois não existem tantos constrangimentos de espaço, nem são
necessárias tantas precauções para evitar que outros materiais fiquem sujos ou estragados.
Recursos da comunidade
Aceitando-se a possibilidade de que nem sempre os espaços exteriores ligados às creches ou locais
normalmente frequentados pelas crianças possuem estímulos e oportunidades de desenvolvimento ricas,
torna-se necessário enfatizar a importância de se utilizarem os recursos da comunidade envolvente (cf.
32
capítulo 4. Trabalho colaborativo e parcerias). Com um reduzido número de crianças por adulto, poderá
ser interessante passear pelo bairro, interagindo com os comerciantes locais ou usufruir dos parques
públicos mais próximos. Estas iniciativas permitem alargar os horizontes da criança, facilitando o
estabelecimento de vínculos com pessoas e locais da comunidade.
Sugestão de reflexão
Como caracterizo as instalações da creche onde trabalho? Que áreas, materiais e equipamentos? Qual o seu
estado de conservação? Que adequação? Que potencialidades? Como são utilizados?
7. ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO
Sugestão de reflexão
a. Finalidades da avaliação
33
A avaliação para a aprendizagem
Ainda que avaliar envolva recolher informação sobre as aprendizagens realizadas pelas crianças, o processo
de avaliação não se resume a isso, uma vez que avaliar a aprendizagem é diferente de avaliar para a
aprendizagem. A avaliação deve direcionar-se para a promoção da aprendizagem e não para classificação ou
comparação entre crianças. Neste sentido, deve colocar-se a ênfase na comparação da criança consigo
mesma, ao longo do tempo, analisando as suas conquistas e evoluções. Este processo pode assumir
diferentes formas e duração variável mas envolve, habitualmente, quatro ações: a recolha de informação
(sendo a observação/escuta ativa o método privilegiado), a documentação e o registo, a reflexão e a
utilização ou ação. Neste sentido, a avaliação é encarada como um elemento indissociável do processo
educativo, que possibilita a definição de critérios para o planeamento de atividades e a criação de situações
que propiciem a aprendizagem das crianças e o seu desenvolvimento em todas as áreas.
A avaliação contribui para a adequação das práticas, para a reflexão sobre os efeitos da ação educativa, para
o envolvimento da criança num processo de análise e construção conjunta e para o conhecimento da
criança e do seu contexto, numa perspetiva holística. Este processo contínuo de observação, reflexão e
registo ajuda o/a educador/a a tomar decisões mais fundamentadas e a estreitar relações com as crianças e
famílias.
A prática diária é fundamental para que os/as educadores/as se tornem progressivamente mais hábeis e
mais confiantes na sua capacidade de observar e registar o desenvolvimento e as aprendizagens de bebés e
34
crianças. No contexto da avaliação, o trabalho em equipa (entre educadores/as, com outros técnicos e com
os ajudantes de ação educativa), alicerçado na partilha e na discussão, também com pais, constitui uma
importante fonte de aperfeiçoamento e de desenvolvimento profissional.
Avaliar para a melhoria das práticas pedagógicas implica recolher informação sobre os níveis de bem-estar e
implicação/envolvimento da/s criança/s5, compreender o que pode estar ou não a afetar o seu bem-estar e
implicação, e utilizar essa informação para melhor apoiar e amplificar as suas experiências de aprendizagem
e de desenvolvimento6.
Para que todo o processo seja bem-sucedido, é fundamental que os profissionais mobilizem competências
de reflexão, autoavaliação, diálogo e escuta, e que tenham um conhecimento sólido sobre as aprendizagens
e o processo de desenvolvimento na infância. É essencial que a avaliação se torne uma componente
principal da sua prática profissional, promovendo os processos reflexivos, valorizando as competências de
observação e análise das práticas, bem como dos seus resultados, e construindo a base de um processo
permanente de inovação e melhoria da qualidade.
No campo da educação de infância têm sido salientadas três dimensões ou categorias do comportamento
do/a educador/a que refletem as características pessoais facilitadoras do desenvolvimento e da
aprendizagem da criança – estimulação, sensibilidade e autonomia. Estas três dimensões são explicitadas no
quadro seguinte.
5
O bem-estar emocional caracteriza-se pela presença de sinais que evidenciam que as crianças se sentem à vontade, agem com alegria e
espontaneidade, mostram vitalidade e autoconfiança. O envolvimento/implicação caracteriza-se pela motivação, concentração, persistência,
interesse, entusiasmo, energia, descoberta, ímpeto exploratório, refletindo a qualidade do contexto ao nível da oferta de boas condições de
aprendizagem e desenvolvimento (cf. capítulo 1, parte II “Dimensões de qualidade do ambiente educativo”).
6
Este documento assume uma perspetiva experiencial sobre a avaliação, atenta aos processos vividos ou experienciados pelas crianças e
valorizando a articulação entre diferentes profissionais/estratégias/perspetivas ou dimensões de análise.
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Estilo do/a Educador/a
A dimensão Autonomia engloba as ações do adulto que proporcionam à criança diversas oportunidades de
experimentação, liberdade para escolher e determinar a direção da atividade que pretende realizar,
facilitando a sua auto-organização, “agência”, sentido de competência e de responsabilidade; engloba
comportamentos que demonstram respeito pelo trabalho e ideias da criança e as avaliações que faz da sua
atividade; engloba oportunidades para a criança participar no estabelecimento e manutenção das regras,
resolver problemas e conflitos.
Observando o seu próprio estilo de intervenção, o/a educador/a pode refletir sobre a forma como
manifesta a sua sensibilidade em relação à experiência das crianças; sobre o seu papel na estimulação e na
promoção da autonomia das crianças.
Sugestão de reflexão
Procure recolher intervenções onde a criança tenha sido (ou não) estimulada e/ou compreendida e/ou onde
a sua autonomia tenha sido promovida. Qual o efeito no bem-estar ou implicação da criança? Como é que
isso afetou a relação criança-educador/a?
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b. As diferentes dimensões da avaliação
Em termos de avaliação da qualidade, podemos identificar três tipos de variáveis: as de contexto (ligadas
ao material, às atividades, às interações, ao clima relacional, à organização, ao espaço para autonomia, etc.),
as de resultado (objetivos e finalidades educativas) e as de processo (implicação e bem-estar
experienciados pelas crianças). Todas estas dimensões ou variáveis são importantes para compreender um
contexto de educação de infância e nenhuma deve ser desvalorizada. Avaliar apenas as capacidades atuais
ou nível de desenvolvimento da criança fornece poucos elementos que permitam planear o ambiente
educativo. É fundamental que o/a educador/a abrace uma perspetiva mais ampla e multidimensional nas suas
avaliações.
A avaliação deve ser conduzida por profissionais próximos da criança, que a conhecem e compreendem as
suas mensagens, fazendo parte das interações e rotinas diárias, em colaboração com as famílias. A avaliação
deve basear-se em situações “autênticas”, em que as crianças estão envolvidas em atividades diárias,
significativas e relevantes, podendo ocorrer nos momentos de cuidado, nas entradas ou saídas, durante os
momentos de higiene ou quando a criança se envolve espontaneamente no jogo, na exploração e na
interação. Devem avaliar-se disposições como a curiosidade, a concentração ou a perseverança,
capacidades como o andar ou o desenhar, atitudes e valores como o respeito por si e pelos outros,
conhecimentos como o significado das palavras ou a classificação de objetos, sentimentos como a tristeza
ou a alegria.
SITUAÇÃO 5
O Pedro, de 18 meses, segura um copo vazio junto a um pequeno curso de água que corre de uma mangueira.
A mangueira está sobre um caminho de rochas, por entre as quais crescem pequenas plantas. O Pedro deita a
água que colocou no copo sobre as rochas e observa enquanto esta desaparece no meio das plantas. O seu
olhar dirige-se para um fio de água que corre numa zona inclinada e escurece o solo seco. Baixa-se para tocar o
solo molhado. Enche o copo novamente. Desta vez, despeja a água sobre o solo, vendo-a a ser absorvida. Enche
de novo o copo e deita a água sobre o solo. Repete três vezes. Cada vez que a água forma uma pequena poça
sobre o solo ele exclama, animado, “oh!”, mas volta a ficar sério quando vê que a água se infiltra no solo.
c. Observação e Registo
A observação é a estratégia mais importante na avaliação com crianças pequenas, embora se possa recorrer
também a outras, especialmente com as crianças mais velhas, como o diálogo e a análise de produtos
(desenhos, esculturas, projetos…). Existe, neste campo, um conflito permanente entre a utilização de
37
instrumentos que parecem mais fáceis e consomem menos tempo, como checklists, e a utilização de outras
ferramentas, de caráter mais descritivo e narrativo, como os portfólios, que exigem mais tempo. Estas
ferramentas possuem propósitos distintos e não se substituem umas às outras: algumas checklists podem
permitir a obtenção de dados quantificados e concluir sobre a frequência da ocorrência de determinada
situação, mas não se direcionam nem para a determinação das causas e reflexão profunda sobre um
momento ou situação, nem para a comunicação com a família. Neste sentido, podem apoiar a prática do/a
educador/a no contexto de uma avaliação que recorra a diferentes fontes de informação com o objetivo de
construir um conhecimento sólido e fundamentado sobre cada criança, sobre o grupo e sobre o contexto.
Muitas observações não são planeadas e ocorrem espontaneamente durante o dia, oferecendo informações
valiosas que podem ser complementadas com observações planeadas, que dão mais detalhes sobre a forma
como as crianças estão a aprender.
É importante que as observações mais significativas sejam registadas, uma vez que as recordações
facilmente se tornam confusas e podem ser alteradas pelas atitudes e crenças do observador. No entanto,
registar tudo o que se vê e ouve não é possível nem necessário. Neste sentido, o/a educador/a deve decidir
o que é mais relevante para construir um retrato significativo das aprendizagens de cada criança.
Um dos desafios que se colocam ao/à educador/a é ser capaz de observar e registar enquanto interage com
as crianças. Aprender a ultrapassar este desafio exige tempo, treino e colaboração. Porque as crianças não
demonstram as suas capacidades “a pedido”, o adulto tem de estar sempre preparado para realizar e
registar uma observação.
SUGESTÕES
Para facilitar a observação, coloque pequenos blocos de folhas (ou outro qualquer suporte para escrever,
desde que seja prático) espalhados em locais estratégicos no espaço interior e exterior. Isto permite que
tome notas, sempre que tiver alguns minutos disponíveis. Apesar deste comportamento do adulto poder
parecer estranho de início, as crianças vão-se habituando ao facto de os adultos tirarem notas e isso
acaba por incorporar-se na rotina diária. Pode, também, organizar-se com os seus colegas de equipa, de
forma que alguns intervenham mais enquanto outros se dedicam mais à observação e registo.
38
O registo/documentação pode incluir notas escritas, histórias, fotografias, vídeos que exemplifiquem o que
a criança faz e diz7. Os adultos e as crianças utilizam estas evidências para valorizar o progresso e para
planear os próximos passos na aprendizagem. A observação regular fundamenta a escolha de experiências
adequadas a cada criança e ao grupo. A documentação também permite que o/a educador/a e a criança
partilhem informações com a família e vice-versa.
d. Reflexão e Planeamento
Pensar no que fazer, como fazê-lo e porquê, e depois avaliar até que ponto os resultados obtidos se
aproximam dos objetivos predefinidos, faz parte do trabalho de qualquer profissional. O/a educador/a
reflexivo utiliza a informação sobre a aprendizagem e desenvolvimento da criança para pensar sobre a sua
própria prática e ponderar como melhorá-la, num processo de autoavaliação permanente. Isto pode ser
feito em conjunto entre colegas de trabalho, com resultados positivos para todas as partes. Esta reflexão
resulta em mudanças na forma como o adulto interage com as crianças e famílias, na organização da sala, na
mudança de rotinas, na planificação de atividades específicas e na disponibilização de outros objetos ou
materiais.
SITUAÇÃO 5 (continuação)
Ana, a educadora responsável pelo Pedro, observou e registou o seu interesse na absorção da água pelo solo
(permeabilidade). Na semana seguinte, decide disponibilizar, no tempo passado no exterior, metades de
garrafões de água com diferentes conteúdos: água, areia, argila, rochas, etc. Ao lado, coloca um regador com
água e questiona o Pedro sobre o que acontecerá se colocar a água nos diferentes recipientes. O Pedro aceita o
desafio e inicia uma exploração das propriedades dos diferentes materiais, não só colocando a água mas
experimentando as texturas com as mãos e misturando-os entre si. A educadora observa, a alguma distância, e
vai fazendo alguns comentários para estimular as suas descobertas (ex. “Já viste que a água foge tão depressa
por entre as rochas e mais devagarinho por entre os grãos de areia?”)
7
O registo/documentação via fotografia ou vídeo requer preocupações éticas, sendo importante assegurar, por exemplo, a obtenção de
consentimento informado dos pais e, quando possível, das próprias crianças.
39
e. Avaliação do contexto
Alguns dos aspetos que influenciam o bem-estar emocional das crianças, a sua implicação e consecução das
finalidades educativas são a oferta educativa, o clima relacional, o espaço para a iniciativa/autonomia, a
organização e o estilo dos adultos.
Clima relacional Ambiente seguro e confortável, potenciador de interações positivas entre todos…
Espaço para a Possibilidade de as crianças escolherem as atividades que querem desenvolver e sua
iniciativa/autonomia participação, na medida do possível, na definição de regras, rotinas e convenções…
Rotina adaptada ao ritmo das crianças, poucos “tempos mortos”, boa articulação
Organização
entre os elementos da equipa…
Existência de adultos sensíveis e estimulantes, que dão espaço à iniciativa das
Estilo do adulto
crianças, mas fornecem também afeto, conforto e segurança…
A partir da análise destes aspetos, o/a educador/a tem a possibilidade de perceber quais as alterações mais
importantes a fazer para melhorar a sua prática diária, garantindo um contexto de qualidade para cada
criança do grupo, assim como para a equipa de adultos que o acompanha.
f. Avaliação individual
A par com a avaliação do contexto, é também fundamental avaliar em que medida as necessidades de cada
criança estão a ser respondidas, tendo como ponto de referência as três grandes finalidades educativas
definidas nestas Orientações Pedagógicas: desenvolvimento de um sentido de segurança e autoestima,
curiosidade e ímpeto exploratório e competência social e comunicacional.
O/a educador/a observa a criança ao longo do dia, atendendo às suas interações, atividades e
comportamentos, de modo a procurar compreender como ela aprende, como processa a informação,
como constrói conhecimento ou como resolve problemas. A indissociabilidade das áreas de
desenvolvimento e aprendizagem leva ao seu cruzamento em muitos comportamentos transversais, pelo
que a observação da criança deve ser sempre global e tão holística quanto possível.
Esta avaliação atende às finalidades educativas definidas para as crianças em idade de creche e deve ser
acompanhada por uma análise das características da criança (dados familiares relevantes, relações e
40
atividades preferenciais, principais aprendizagens – com base na avaliação anterior, e opinião da criança,
quando esta já consegue expressá-la).
A partir das informações recolhidas, o/a educador/a esboça um retrato descritivo e narrativo de cada
criança em cada uma das finalidades educativas (cf. parte I, capítulo 3. Finalidades e objetivos educativos),
salientando as suas características, assim como os objetivos e iniciativas possíveis para cada um dos aspetos
a melhorar. Estas questões devem ser discutidas com a família, envolvendo-a não só com o objetivo de
partilhar informação, mas também para definir o seu papel na implementação de medidas concretas.
De forma contínua e sistemática, o/a educador/a traça um retrato completo das suas aprendizagens e
particularidades de desenvolvimento de cada uma das crianças. Esta frequência, no entanto, poderá variar
de acordo com as necessidades, sendo possível que algumas crianças exijam observações mais frequentes.
É importante que o/a educador/a compare os vários momentos de avaliação entre si e verifique o grau de
sucesso na implementação das medidas propostas na avaliação anterior.
O trabalho pedagógico em creche visa assegurar um atendimento individual e personalizado em função das
características de cada criança, procurando responder o melhor possível a cada uma delas. Como tal, não
pode ignorar a importância de prevenir e despistar precocemente qualquer problema de desenvolvimento,
ou outro que suscite preocupação, assegurando o encaminhamento mais adequado.
Importa destacar que existe uma grande variação na idade em que diferentes crianças adquirem as mesmas
capacidades e algumas podem até “saltar” etapas como o gatinhar, por exemplo, sem que isso constitua
motivo de preocupação. Neste sentido, as orientações sobre o desenvolvimento devem ser
relativizadas, de forma a evitar julgamentos precipitados e “rótulos” que em nada
contribuem para o crescimento saudável da criança. Todavia, se forem observados sinais
preocupantes, é fundamental que se dê maior atenção e, quando necessário, se recorra a um profissional
especializado, de forma a intervir o mais preventivamente possível em todas as situações, em articulação
com a família.
Para além da observação diária, é importante dialogar com os familiares da criança, uma vez que são eles,
muitas vezes, os primeiros a detetar sinais de alerta. O/a educador/a deve assumir uma atitude empática e
demonstrar grande sensibilidade na partilha de informações com a família, de forma a não provocar
ansiedade nem prejudicar a relação de confiança com esta.
Segue-se uma breve descrição de sinais de alerta a ter em conta nos primeiros anos de vida, Estes sinais
não devem ser vistos de forma isolada, importando que se realize uma análise global e
contextualizada da criança. São sinais que servem apenas para alertar o/a educador/a para a
41
necessidade de acompanhar a criança com mais atenção, abrindo a possibilidade de existir alguma
dificuldade que necessita de ser avaliada com maior profundidade.
42
…não mostra iniciativa para agarrar e morder os objetos e os alimentos;
…mostra desinteresse pelo ambiente ou pelos familiares;
…engasga-se com facilidade.
43
…não imita atividades do dia a dia nem participa nas rotinas (por exemplo, “ajudando” a vestir,
tirando meias e sapatos).
44
…não tem qualquer controlo esfincteriano, diurno ou noturno;
…não demonstra afeto pelos familiares ou pessoas mais próximas.
Caso o/a educador/a identifique alguns destes sinais ou tenha dúvidas sobre alguma destas questões, deverá
contactar profissionais especializados nesta área, nomeadamente o Sistema Nacional de Intervenção
Precoce na Infância (SNIPI)8. Para que uma criança e a sua família sejam apoiados pelo SNIPI, existe um
conjunto de critérios de elegibilidade que deve ser tido em conta. As crianças entre os 0 e os 6 anos e
respetivas famílias deverão apresentar condições incluídas num destes dois grupos9:
8
A intervenção precoce na infância (IPI) abrange as crianças entre os 0 e os 6 anos, com alterações nas funções ou estruturas do corpo que
limitam a participação nas atividades típicas para a respetiva idade e contexto social ou com risco grave de atraso de desenvolvimento, bem como as
suas famílias; refere-se ao conjunto de medidas de apoio integrado centrado na criança e na família, incluindo ações de natureza preventiva e
reabilitativa, designadamente no âmbito da educação, da saúde e da ação social - Decreto-Lei n.º 281/2009, de 6 de outubro. Mais informações em
http://www.dgs.pt/sistema-nacional-de-intervencao-precoce-na-infancia.aspx
9
De acordo com o Decreto-Lei n.º 281/2009, de 6 de outubro.
10
Alterações nas funções ou estruturas do corpo incluem Atraso de Desenvolvimento sem etiologia conhecida e Condições Específicas relacionadas
com situações que se associam a atraso do desenvolvimento (nomeadamente, anomalia cromossómica; perturbação neurológica; malformações
congénitas; doença metabólica; défice sensorial; perturbações relacionadas com exposição pré-natal a agentes teratogénicos ou a narcóticos,
cocaína e outras drogas; perturbações relacionadas com infeções severas congénitas; doença crónica grave; desenvolvimento atípico com alterações
na relação e comunicação; perturbações graves da vinculação e outras perturbações emocionais). Estas alterações devem ser validadas por uma
avaliação fundamentada, feita por um profissional competente para o efeito.
11
Crianças com Risco Grave de Atraso de Desenvolvimento podem estar expostas a fatores de risco biológico (por exemplo, prematuridade ou
complicações pré-natais e perinatais) ou fatores de risco ambiental (parentais, como o consumo de álcool, doenças ou maus-tratos, e contextuais,
como o isolamento ou a desorganização familiar).
45
De um modo geral, as boas práticas de avaliação em contextos de educação para crianças possuem quatro
características principais:
· São significativas.
A avaliação deve, por um lado, ocorrer nos contextos naturais da criança e, por outro lado, englobar as
suas diferentes dimensões numa perspetiva holística, ou seja, encarando-a como um todo. Neste sentido,
deve procurar--se incorporar os momentos de observação nas rotinas diárias, transformando-os em algo
normal e familiar para todos.
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A avaliação da aprendizagem e do desenvolvimento é complexa e exige tempo, não se resumindo ao
simples preenchimento de uma checklist. Uma avaliação autêntica exige a utilização de vários métodos,
incluindo a observação, conversas com as crianças e famílias e a análise de documentos. Graças a estes
métodos, o profissional recolhe informação sobre as competências emergentes da criança, conhecimentos,
compreensões, sentimentos e disposições.
Sugestão de reflexão
Esta transição também poderá ser difícil para a família da criança. Para o pai ou mãe que estabeleceu uma
relação de proximidade e confiança com um adulto de referência, que ao longo de muito tempo terá
acompanhado o desenvolvimento da sua criança, o terminar dessa relação pode ser vivido com pesar. Para
o/a educador/a, deixar as suas crianças de referência também não é um processo emocionalmente neutro.
47
A qualidade da comunicação entre profissionais, e entre profissionais e famílias, ressalta aqui como o
melhor recurso no acompanhamento dos processos de separação e transição para uma nova etapa da vida
da criança.
Nestes processos, assegurar a continuidade e sequencialidade do percurso das crianças nos contextos de
educação de infância é importante. A troca de informações entre educadores/as sobre o trabalho realizado
na creche, sobre o desenvolvimento e aprendizagens da criança, atendendo às finalidades e objetivos
educativos, afigura-se relevante. Do mesmo modo, apoiar e informar a família sobre o processo de
transição é indispensável.
Existe articulação e correspondência entre as finalidades educativas definidas para a creche e as áreas de
conteúdo das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, bem como com as componentes do
currículo do 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB), possibilitando a continuidade de todo o processo educativo.
Português;
As finalidades educativas definidas para a creche podem ser consideradas como relevantes ao longo de toda
a escolaridade. É desejável que no final do seu percurso académico, qualquer indivíduo mantenha um
sentido de segurança e uma autoestima que lhe permita estar bem consigo próprio e com os outros; que a
sua curiosidade e ímpeto exploratório permaneçam ativos e visíveis na paixão de continuar a aprender e de
desenvolver projetos; que seja alguém capaz de manifestar capacidades relacionais e de comunicação, de
modo claro e adequado aos diferentes interlocutores, disponível para respeitar e lidar com a diversidade
social.
48
Sugestão de reflexão
O que é que na creche onde trabalho costuma ser feito para trabalhar o processo de transição para a
educação pré-escolar? O que poderá ser melhorado?
49
SUGESTÕES DE LEITURA
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