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Eu estava repleta de hematomas.

Desde a cabeça até os pés se avistavam o resultado de um


caos não completamente instalado mas que acabara de começar e eu pude reconhecer isso.
Senti medo, me senti sozinha mas não falei para ninguém. Liguei para a minha chefe do
trabalho e falei de um jeito tão triste: (mesmo eu fazendo o máximo possível para não parecer
abalada) :

- Hoje não poderei trabalhar, me acidentei de moto e preciso ir ao hospital.

-Ta okay, mas ce ta bem?

-Estou bem machucada.

E estava mesmo. Não sabia chegar a conclusão se eu estava mais machucada


psicologicamente ou fisicamente, mas guardei a dor, engoli lentamente e desliguei o telefone
dizendo:

“-Depois te mando o atestado médico.” Desliguei.

-E aí, o que ela disse?

Hoje sei dizer que eu estava muitíssimo doente psicologicamente, então minha dor maior era
interna com certeza, pois esse que acabara de me questionar era em pessoa o causador de
todo aquele caos que de tanta vergonha de mim mesma, acabei fugindo com ele mesmo.

Pois ele disse: Faço isso porque te amo, casais brigam e isso diz respeito somente a nós dois.
Foi assim que ele me manteve confusa, com mais medo e afastada de todas as outras pessoas
por um longo tempo.
Era uma tarde de 2013, não sei dizer exatamente o dia mas lembro que eu aguardava
ansiosamente por uma vaga numa faculdade pública, eu havia prestado uma prova chamada
ENEM (exame nacional do ensino médio, que avalia as competências desenvolvidas ao longo
da Educação básica, como também tem como objetivo selecionar candidatos para o ensino
superior) e me inscrevi para concorrer em alguns cursos do ensino Superior.

Um email chegou dizendo que eu havia sido selecionada para cursar Manutenção de
aeronaves numa cidade do interior de São Paulo e lá constava toda a relação de documentos,
local, horário que eu deveria comparecer e com quem eu deveria tratar.

Meu coração chegou a sair pela boca, sério. Eu fiquei muito feliz, pois eu era fascinada por
aeronaves na época tinha muita curiosidade e muito desejo em me tornar uma piloto de avião,
achava que com esse curso com certeza eu atingiria meu objetivo de pilotar futuramente, ou
ao menos estaria sempre ali, próxima de coisas que me despertavam ainda mais o interesse.

Eu separei todos os documentos, digitei o endereço no google, olhei toda a universidade, me


encantei, procurei o local que estava descrito no email e anotei tudo. Depois fui contar aos
meus pais. Primeiro foi com minha mãe:

-Mãe, eu fui aprovada numa faculdade pública. Não precisa pagar mensalidades, porém não é
aqui na cidade...

-E é onde?

-Em São Carlos.

-E onde você moraria? Com quem?

-Não sei. Teria que alugar uma casa, numa república ou me hospedar na própria faculdade
mesmo eles tem um lugar lá.

Pude ver no semblante dela que aquilo jamais iria acontecer. Onde eu estava com a cabeça
quando eu me deixei sonhar, pensar que ao menos haveria a chance de que eu iria estudar
fora da cidade onde meus pais moravam? Logo meus pais, tão conservadores, simples, sem
sonhos grandes ou planos de entusiasmo, que gostam de viver na rotina e que o que é
diferente os assusta muito ou os repugna dando um ar pecador.

-Deus proverá.

Essa foi a resposta dela no momento mas depois de ter conversado com meu pai, chegaram a
conclusão de que não era seguro me mandar pra uma faculdade fora da cidade e que não
teriam dinheiro algum pra me manter por lá. Mas hoje sei que o que os amedrontava era o
fato de republicas e faculdades serem lugares com grande concentração de putaria, bebidas,
falta de noção, perda de todas as dignidades possíveis (segundo os filmes gringos e algumas
noticias ou fofocas) e me mandar longe dos olhos deles seria inaceitável pra uma família
religiosa bem conservadora. Pois odiariam ter de explicar pros outros uma gravidez inesperada
de sua filha ou terem que de repente me internar numa clínica de reabilitação porque eu virei
uma drogada. Eles pensaram tudo isso e um pouco mais. Mas nunca no fato de que eu havia
estudado muito, me dedicado na escola, era uma aluna boa e tinha muito interesse em
continuar estudando, não somente interesse como estava correndo atrás disso, cheia de
vontade e brilho nos olhos, mas nem sequer me perguntaram o que eu queria, o que eu
planejava e como eu sempre fui criada pra atender expectativas deles e esperar em Deus, eles
disseram: Tudo é na vontade e no tempo de Deus, Deus sabe de todas as coisas, não se chateie
com isso, ore e peça pra que ele te guie e ele abrirá caminhos possíveis na sua vida.

Eu aceitei isso e assim, não só passei naquela faculdade como também em vários outros cursos
mas todos os que despertavam meu interesse eram fora da cidade onde eu morava e eu logo
descartei um a um.

O ano todo eu estive a procura de um emprego na área do curso tecnológico que eu havia
cursado no SENAI para que ao menos eu pudesse tentar investir numa graduação em
faculdade privada. Mas já era final do ano e nada. O cargo que eu pretendia era 90% ocupado
por machos, enquanto nos encheram de esperanças de que as mulheres estavam dominando a
área, a indústria (e todas as lorotas que poderiam inventar para se promoverem), quando na
pratica as empresas preferem machos para execução de grande parte das tarefas sem ao
menos darem chances para as mulheres mostrarem que existem inúmeras coisas que fazem
brilhantemente melhor que qualquer outro ser na face da terra e, com isso, me falaram:

“Grandes shoppings estão inaugurando na cidade, você deveria enviar seu currículo, pois lá
tem bastante emprego para mulheres”. Por mais repugnante que seja essa fala, não é nada
menos que a realidade em si, pois infelizmente na primeira tentativa eu já fui chamada para
um trabalho no shopping como vendedora numa loja de bolsas e acessórios.

Iniciei o trabalho em Outubro de 2013, era meu primeiro emprego. Na mesma loja (minúscula,
por sinal) haviam outras 4 mulheres. Pra mim era um horário péssimo de trabalho,
remuneração baixa, condições muito piores. Mas era o que tinha. Trabalhava 6 dias na semana
(das 14:00h as 22:20h) pra folgar um, revezando domingos e feriados (das 12:00h as 20:20h),
porem pra minha sorte eu morava por perto.

Logo eu fiz minha inscrição numa faculdade privada para o curso de administração e
frequentei as primeiras aulas. Fiz muitas amizades, polemizava muito mas só isso. Se eu não
estivesse zoando, estava dormindo obviamente, pois eu sempre estava muito cansada pelos
horários de trabalho no shopping e as matérias não despertaram meu interesse em nada. Eu
não me identifiquei com o curso, mas tinha pessoas muito amigáveis e rolou pegação com um
garoto inclusive. Ele era um preto lindo, simpático e bem caloroso, tirou seu pênis para fora
durante o beijo e eu sem noção do jeito que era me agachei e comecei a chupar. Detalhe: No
campus num canto não muito isolado. Fomos pegos por um zelador e ele nos tirou dali. Mas só
lembro disso. Esse foi meu ultimo dia no campus.

Eu tinha muita necessidade de me manter estudando e não sei por qual motivo eu me inscrevi
num outro curso técnico gratuito e iniciei as aulas. Eu ia para a escola pela manhã e ia direto
para o shopping trabalhar. Isso quando eu ia. Pois o curso tinha avaliação através de trabalhos
feitos em casa e eu não tinha tempo para realiza-los durante o dia, então eu fazia eles durante
a madrugada e quando era hora de ir para as aulas, eu estava dormindo. Ou seja, faltava muito
e acabei perdendo o curso. Mas nos poucos dias que fui fiz inúmeras amizades, cantava rap na
sala de aula, fazia rimas, ria muito.

E foi assim que, eu me conformei que ou eu teria feito a faculdade pública ou jamais faria uma
particular, pois além de meus horários serem precários, o dinheiro também não dava. Uma
mensalidade era mais que 75% do meu salário. Então continuei trabalhando.

Minha vida virou outra. Eu não ia mais a igreja (mas também não ia pra nenhum outro lugar),
comprava milhares de coisas que nunca tive (parcelado em 10 prestações), estava cada dia
mais bonitinha no auge dos meus 19 anos e despertava interesse de diversos machos e com
isso, começou a rivalidade feminina dentro da loja que eu trabalhava.

Hoje, acho isso muito ridículo. Nós mulheres somos seres únicos com potencial para extrema
independência e além de tudo, belíssimas em cada detalhe, mas somos ensinadas desde muito
novas de como devemos agir, como devemos fazer (tudo dentro do interesse patriarcal) e
quando vemos estamos ali, fazendo de tudo pra sermos escolhidas por um macho escroto,
competindo entre nós.

Tinha uma moça que era mais nova que eu. O nome dela era Erica. Ela era muito tímida
inicialmente, andava sempre cabisbaixa , sua coluna era até encurvada pela má postura, o
rosto repleto de acnes agressivas e o cabelo sempre mal penteado, com mal cheiro e preso
num rabo de cavalo. Érica nunca conversava diretamente com nós, eu fazia muitas palhaçadas
e me lembro que incluía ela pra ver se enturmava e ela se limitava a dar risada. Depois os
homens começaram a rodear, feito uns animais rodeando a presa, passavam sempre na frente
da loja, alguns puxavam assunto e eu gostava muito.

Primeiro começou com nem lembro quem. Sei que eu tinha um namoradinho que morava no
Paraná , um moço muito inteligente, alto, branquíssimo de cabelos pretos contrastando seu
rosto com grande harmonia.

Porem com um jeito não muito agradável. Ora soberbo, ora sem graça demais.

Nosso relacionamento era baseado em sexo oral porque eu tinha muito medo de penetração
antes do casamento. Parece bem engraçado dizendo assim, mas vê-se que eu não tive
educação sexual alguma porque segundo minha família, transar estava fora de cogitação, pois
não poderia acontecer, era pecado. Mas aconteceu, muito cedo e muito errada v e mais triste
ainda: tudo o que eu sabia, eu ti. E mesmo não sendo virgem mais, após eu ter passado pelo
batismo, eu me envolvia com os homens e no calor do momento não permita penetração,
somente chupava eles e quando eles queriam davam umas lambidas em mim também.

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