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Dr.

Rodrigo Orgeda
Esp. Henryck Cesar Massao Hungaro Yoshi

Introdução à Mecânica
dos Fluidos

PLANO DE ESTUDOS

Propriedades dos Fluidos

Definindo os Fluidos Análise Dimensional

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

• Introduzir o estudo da mecânica dos fluidos por meio • Estudar a teoria matemática da análise dimensional, apre-
da conceptualização dos fluidos, seguida da definição da sentando sua aplicação na mecânica dos fluidos e os nú-
tensão de cisalhamento. meros adimensionais.
• Definir os conceitos de viscosidade absoluta (dinâmica),
massa específica, peso específico e viscosidade cinemática.
Definindo
os Fluidos

Em suas aulas de física, muito provavelmente,


você estudou assuntos relacionados aos chama-
dos fluidos, como o conceito de pressão e a Lei de
Pascal, por exemplo. No contexto dos fenômenos
de transporte, a mecânica dos fluidos busca levar
este estudo adiante, explicando o comportamen-
to físico dos fluidos e as leis que o regem. Ela é,
portanto, uma ciência fundamental em diversas
vertentes da engenharia, pois possui aplicação
prática a muitas situações, como escoamentos em
tubulações, pressões em barragens, deslocamento
de fluidos e, até mesmo, aerodinâmica (afinal, o
próprio ar atmosférico é um fluido).
Podemos afirmar que a mecânica dos fluidos é uma das ciências básicas mais
fundamentais para os engenheiros. A palavra “mecânica” remete ao estudo do com-
portamento de sistemas submetidos a uma ou mais forças. A palavra “fluido”, por
outro lado, pode ser um pouco mais difícil de se definir. Vamos começar por uma
definição mais elementar: fluido é uma substância que, ao ser colocada em um reci-
piente, assume o formato do recipiente, não possuindo forma própria. Baseado nesta
definição, podemos, então, concluir que líquidos e gases são fluidos, diferentemente
dos sólidos, como ilustra a Figura 1:

Superfície livre

Sólido Líquido Gás


Fluidos
Figura 1 - Comparação entre fluidos e sólidos em um recipiente
Fonte: Brunetti (2008, p. 1).

É importante observar que, enquanto os gases ocupam todo o recipiente, os líquidos


podem apresentar uma superfície livre caso o recipiente não esteja completamente
cheio.
Apesar de esta ser uma definição suficiente para dizer se uma substância é um
fluido ou não, a mecânica dos fluidos faz mais sentido se partirmos de uma defi-
nição um pouco mais abstrata: fluido é qualquer substância capaz de fluir. Para
desenvolvermos melhor esta ideia, descreveremos a observação prática chamada de
“experiência das duas placas”.
Considere um sólido de material qualquer, preso entre duas placas planas, uma
inferior e uma superior. É então exercida uma força sobre a placa tangencial ao sólido,
na direção do plano da placa, como na Figura 2a. Mantendo a força constante, o que
se observa é que o sólido é deformado de maneira angular até certo limite, no qual
as tensões internas equilibram a força externa aplicada, atingindo uma condição de
equilíbrio estático (Figura 2b).

UNIDADE 2 63
Ft = c te Ft = c te

(a) (b)
Figura 2 - Experiência das duas placas para um sólido
Fonte: Brunetti (2008, p. 2).

Dessa forma, podemos dizer que: ao aplicar uma força tangencial constante a um
sólido, ele se deforma angularmente até atingir uma nova posição de equilíbrio
estático.
Agora, vejamos o que acontece com um fluido submetido a esta mesma expe-
riência. Imagine que seja possível acompanhar cada unidade de fluido ao longo do
experimento. Para facilitar a visualização, denominaremos o volume de ABCD, cada
letra correspondendo a uma extremidade (Figura 3a).
Ao aplicar a força tangencial à placa superior, ela passa a se deslocar a uma veloci-
dade v. O que se observa é que os pontos do fluido em contato com a placa superior
(lado AD) adquirem esta mesma velocidade v, enquanto os pontos do fluido em
contato com a placa inferior (lado BC) ficam parados junto dela (veja a Figura 3b).
Surge, portanto, o princípio da aderência: quando em contato com uma superfície
sólida, os pontos de um fluido aderem-se aos pontos desta superfície.
Dessa forma, se a força tangencial for mantida sobre a placa superior, movendo-a
à velocidade v, as partículas de fluido em contato também se moverão à velocidade v,
na mesma direção e sentido. Isto significa que a condição de equilíbrio estático não
será atingida, de modo que o volume de fluido poderá se deformar continuamente
(veja a Figura 3c).

Ft = c te Ft = c te
A D A D A D

B C B C B C

(a) (b) (c)


Figura 3 - Experiência das duas placas para um fluido
Fonte: Brunetti (2008, p. 2).

64 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Essa experiência permite, portanto, diferenciar sólidos de fluidos sob a perspectiva da
mecânica dos fluidos: quando submetidos a forças tangenciais, sólidos se deformam
limitadamente, enquanto fluidos podem se deformar continuamente sem alcançar
um novo equilíbrio estático. Nossa definição final de fluido será então:

Fluido: substância que se deforma continuamente quando submetida à ação de


uma força tangencial constante qualquer.
Fonte: adaptado de Brunetti (2008).

Apesar de parecer exagero chegar a esta definição, você verá, em capítulos futuros,
que o princípio da aderência é fundamental para compreender certos conceitos,
como o de camada limite, que é essencial no estudo tanto da mecânica dos fluidos
quanto dos demais fenômenos de transporte. Outra observação importante pode ser
feita com relação à experiência de duas placas. Para tanto, é necessário antes definir
o conceito de tensão de cisalhamento.

Tensão de Cisalhamento – Lei de Newton


da Viscosidade

Considere uma superfície de área A, sobre a qual é aplicada uma força F . Podemos
decompor esta força na sua componente tangencial (Ft ) e na sua componente normal
à superfície (Fn ), como mostra a Figura 4. Nesta unidade, discutiremos sobre a com-
ponente tangencial e, na próxima, analisaremos a componente normal.

Fn

F
A
Ft

Figura 4 - Ação de uma força sobre uma superfície e suas componentes normal e tangencial
Fonte: Brunetti (2008, p. 3).

UNIDADE 2 65
A tensão de cisalhamento é definida como a razão entre o módulo da componente
tangencial da força e a área da superfície em que é aplicada:

Ft
t=
A

Portanto, é a força tangencial por unidade de área, sendo dada, geralmente, em N/m²
(SI), kgf/m² ou dina/cm².
Voltando à experiência de duas placas, note que, no caso dos fluidos, ao exercer
a força tangencial sobre a placa, ela passa a ser acelerada da velocidade nula até uma
velocidade finita, v0, que permanece constante ao longo do experimento. Isto é, a partir
de um determinado momento, não há mais aceleração. Pela segunda Lei de Newton
da dinâmica, isto significa que a resultante das forças deve ser nula (condição de
equilíbrio dinâmico). Como não existem outras forças externas atuando no sistema,
conclui-se que a força aplicada na placa é equilibrada por forças internas do fluido.
Para entender estas forças internas, podemos recorrer ao princípio da aderência.
Na experiência, a camada de fluido junto à superfície superior move-se à velocidade
v0, enquanto a camada de fluido junto à superfície inferior terá velocidade nula. As
camadas intermediárias, por sua vez, passam a se mover conforme um gradiente de
velocidades, indo de zero (na placa inferior) até v0 (na placa superior), como mostra
a Figura 5a.
v0 Ft
A v v0
v1 v1
v2   
(v1 é maior
v2 que v2)
Diagrama
y de velocidades
B

(a) (b)
v + dv
v
y + dy
y

(c)
Figura 5 - Gradiente de velocidade e tensões de cisalhamento entre as camadas de fluido na expe-
riência de duas placas
Fonte: adaptada de Brunetti (2008).

66 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Este deslizamento entre camadas (por estarem em velocidades diferentes) faz com
que elas exerçam forças tangenciais umas sobre as outras, criando tensões de cisa-
lhamento (veja a Figura 5(b)), equilibrando a força externa Ft, e fazendo com que a
placa superior fique com a velocidade constante v0. Newton evidenciou que, para a
grande maioria dos fluidos, a tensão de cisalhamento é proporcional ao gradiente
de velocidade (variação da velocidade v na coordenada y – veja a Figura 5(c)). Ma-
tematicamente, podemos escrever esta afirmação da seguinte forma:

dv τ
τα ou = cte.
dy dv
dy

Esta é a chamada lei de Newton da viscosidade. Fluidos que obedecem esta relação
são chamados de fluidos newtonianos, como água, ar e óleos, por exemplo. Fluidos
não newtonianos não serão trabalhados, pois são de menor interesse geral e pode
ser bastante difícil descrever seu comportamento.

Sir Isaac Newton (4 de janeiro de 1643 – 31 de março de 1727) foi um físico e ma-
temático inglês reconhecido como o ícone da revolução científica do século XVII.
A descoberta da decomposição da luz branca, suas três leis da mecânica clássica,
a lei da gravitação universal e suas contribuições no desenvolvimento do cálculo
diferencial e integral são consideradas como alguns de seus principais trabalhos.
Fonte: Westfall (2018, on-line)1.

UNIDADE 2 67
Propriedades
dos Fluidos

Vamos, agora, discutir algumas propriedades


bastante importantes para a análise dos fluidos e
escoamentos. A primeira delas é encontrada no
tópico que você acabou de estudar: a lei de New-
ton da viscosidade; mas afinal, você saberia definir
o que é a viscosidade?

68 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Quando um objeto sólido desliza em relação a outro, observamos o surgimento
de uma força na superfície de contato, na direção oposta ao movimento – a chamada
força de atrito. De forma análoga, quando um fluido se movimenta em relação a um
sólido ou a outro fluido, observa-se que também existe uma resistência ao movimento.
A propriedade que representa esta resistência é a viscosidade. Naturalmente, existem
fluidos com maiores ou menores viscosidades, afinal, é muito mais fácil correr ao ar
livre (onde estamos imersos em ar, um fluido) do que em uma piscina cheia de água.
Como vimos, para fluidos newtonianos, a tensão de cisalhamento é proporcional
ao gradiente de velocidade. A constante de proporcionalidade é justamente a visco-
sidade dinâmica ou absoluta (m) do fluido:

τ dv
 cte.  τ µ
dv dy
dy

No SI, três formas comuns de expressar as unidades de viscosidade são: kg/(m.s),


N.s/m² ou Pa.s (em que Pa é a unidade de pressão, pascal). Outra unidade comum
é o poise (P), equivalente a 0,1 Pa.s, sendo também frequentemente utilizado como
centipoise (cP, um centésimo de poise). A viscosidade da água a 20 ºC é de 1 cP, por
isso a unidade serve como uma referência conveniente.
De forma prática, podemos dizer que a viscosidade é a propriedade que representa
a dificuldade de o fluido escoar. Ela surge em nível microscópico, devido à coesão
das moléculas e os choques entre elas. Por causa disso, ela é também variável com a
temperatura. Você pode verificar este fenômeno fazendo a seguinte comparação: o
óleo de cozinha espalha melhor antes ou depois de aquecê-lo? Em líquidos, o aumento
da temperatura reduz a viscosidade, enquanto nos gases, o aumento da temperatura
aumenta a viscosidade.
A seguir, analisaremos um exemplo para nos apropriar melhor do assunto que
estamos discutindo. Muitos dos exemplos abordados no livro são utilizados para que
possamos, também, aprender conceitos novos. Por isso, não se preocupe se, neste
momento, você não conseguir desenvolvê-lo sozinho. Às vezes a teoria é melhor
compreendida quando utilizamos um exemplo prático, não é mesmo?

UNIDADE 2 69
1 EXEMPLO É necessário substituir o lubrificante do pistão de certo equipamento. Você sabe que
o pistão é cilíndrico, com massa de 500 g, diâmetro de 15 cm e altura de 6 cm. Ele
trabalha dentro de um cilindro com 15,1 centímetros de diâmetro e deve cair com
a velocidade constante de 1,4 m/s. Qual deve ser a viscosidade do lubrificante para
atender a estas condições de operação? Considere uma aceleração da gravidade de
10 m/s².

Solução:

Para facilitar a visualização, podemos fazer um esboço do problema:

Dc = 15,1 cm

Dp = 15,0 cm
h = 6 cm


Lubrificante
Força Peso (P)

Para que o pistão caia à velocidade constante, é necessário que ele esteja em equilíbrio
dinâmico: há movimento, mas não há aceleração. Pela segunda lei de Newton, temos:
 
F  m.a 0
Aqui, duas forças estão atuando: o próprio peso do pistão (P) e a força da tensão de ci-
salhamento (Ft), que é a resistência do lubrificante ao movimento. Assim, em módulo:

Ft = P

Lembre-se que, pela definição de tensão de cisalhamento:

Ft
t=
A

Ft = t . A

70 Introdução à Mecânica dos Fluidos


A tensão de cisalhamento ( t ) pode ser avaliada por meio da lei de Newton da
viscosidade, enquanto a área em questão é a área lateral do pistão. Lembre-se que o
pistão é um cilindro, cuja área lateral é calculada pelo produto da sua circunferência
e seu comprimento. Logo:
dv
=τ µ= ; A π . Dp . h
dy

 dv 
Ft  τ . A   µ  . (π . D p . h)  P
 dy 

Note que, para calcularmos a viscosidade por meio desta equação, é necessário ava-
liarmos o gradiente de velocidades de alguma maneira. O procedimento rigoroso e
de resultado mais preciso seria empregar coordenadas polares para resolver a integral.
Entretanto, em algumas situações, é possível simplificar o gradiente de velocidade,
assumindo a variação de velocidade como linear. Observe o diagrama a seguir:

y dv
v2
dy
dy v1


Nesta representação, uma variação dy na direção do eixo y corresponde a uma va-


riação dv na velocidade. Contudo, quando a distância (ε) entre as superfícies for
relativamente pequena, é razoável considerar que esta variação é linear, como na
figura a seguir:

y v0
dv
dy


UNIDADE 2 71
Assim, podemos simplificar a lei de Newton para a seguinte forma:

v0
τ =µ
ε

Retornando ao exemplo, note que a distância ε da parede do cilindro ao pistão é


correspondente a:
Dc  D p
e  0, 05 cm
2

Esta é uma distância razoavelmente pequena para considerarmos um gradiente de


velocidade linear. Assim:
 v0 
 µ ε  . (π . D p . h )  P
 

A força peso do pistão é dada por:


P = m .g

Portanto, isolando a viscosidade e admitindo uma aceleração da gravidade de 10 m/s²,


chegamos ao resultado desejado:

m. g .ε
µ
v0 . π . D p . h
(0, 500 kg ) . (10 m / s ²) . (0, 0005 m)
µ
(1, 4 m / s ) . (3, 14) . (0, 15 m) . (0, 06 m)
kg .m². s
µ  6, 32 . 102
s ².m3

kg .m
A unidade base de Newton é N = . Assim, temos que:
s2

N .s
  6, 32 . 10 2
m2

Apenas para fins comparativos, o resultado mais preciso para este problema (não consi-
derando o gradiente de velocidade linear) seria de, aproximadamente, 6,29.10-2 N.s/m².
Isso indica um erro de 0,48%, que pode ser admitido como desprezível, comprovando
a viabilidade da simplificação feita.

72 Introdução à Mecânica dos Fluidos


A viscosidade é uma das características mais importantes no momento de escolher
o melhor óleo lubrificante para um carro. Na prática, o produto precisa ser viscoso o
suficiente para criar uma película protetora entre as partes do motor, mas não pode
ser tão viscoso a ponto de oferecer muita resistência ao movimento das peças, exigir
mais força para ser bombeado e fluir lentamente pelo motor. Os menos viscosos
circulam com mais facilidade, permitindo uma lubrificação mais rápida e que alcança
cada centímetro das peças. Essa excelente fluidez faz com que nenhuma parte se
desgaste mais do que outra, diminuindo a necessidade de pequenas manutenções.
Fonte: Stabelini ([2019], on-line)2.

As próximas propriedades que iremos abordar são relativamente simples, mas seus
nomes podem causar certas confusões. Para evitar que isso ocorra, iremos caracteri-
zar: densidade, massa específica e peso específico. Nos seus estudos, os fluidos serão
admitidos como meios contínuos e homogêneos, ou seja: as propriedades em cada
ponto do fluido coincidem com as suas propriedades médias. Com isso em mente,
vamos começar diferenciando densidade de massa específica.
Considere um corpo de massa ( m ) e volume total ( V ), seja ele maciço ou oco.
É possível definir, matematicamente, a densidade desse corpo por meio da seguinte
relação:

m
d=
V

Caso o corpo analisado seja maciço e homogêneo ou caso a parte oca seja descon-
siderada, a densidade é chamada de massa específica (ρ). Em geral, depende da
temperatura e da pressão, sendo característica do fluido. No SI, a unidade é kg/m³.

m
r=
V

É também comum chamar a massa específica de “densidade absoluta”. Contudo, al-


guns materiais utilizam o termo “densidade” de forma mais genérica, referindo-se a
corpos e objetos, em vez de substâncias específicas. Isso pode gerar dúvidas quando
os objetos forem maciços ou ocos, por isso, será evitado ao longo deste material.

UNIDADE 2 73
Por sua vez, o peso específico (γ) segue uma lógica semelhante: é o peso (P) por
unidade de volume (V). No SI, a unidade é N/m³, sendo comum também encontrá-la
dada em kgf/m³:
P
g=
V

Como o peso é o produto da massa com a aceleração da gravidade, ou seja, P = m.g ,


é possível traçar uma relação entre peso específico e massa específica:

m.g
γ γ ρ.g
V

Para líquidos, estas duas propriedades são essencialmente constantes, pois podem ser
consideradas substâncias incompressíveis, ou seja, uma variação na pressão não varia
o seu volume. Para gases, os efeitos da pressão não podem ser desprezados. Vejamos,
agora, um exemplo para esclarecer o que acabamos de estudar.

2 EXEMPLO Você possui duas esferas, uma maciça e uma oca, feitas de um único e mesmo material.
Conhecendo suas massas e volumes, calcule a massa específica e o peso específico
deste material, e a densidade de cada esfera.

Esfera A Esfera B
Maciça Oca
Volume: 3 cm³ Volume: 5 cm³
Massa: 9 g Volume vazio: 2 cm³
Massa: 9 g

Solução:

Ambas as esferas são do mesmo material. Calculando a massa específica do material


para a esfera A, temos:

mA 9g
=
rA == 3= g / cm³ 3000 kg / m³
VA 3 cm³

74 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Ao fazer o mesmo para a esfera B, devemos nos atentar a utilizar apenas o volume
de material, ou seja, descontando a parte oca. Dessa forma:
mB 9g
rB    3 g / cm³  3000 kg / m3
VB ,total  VB ,vazio (5 cm³  2 cm³)

De fato, se o material de ambas as esferas é o mesmo, a massa específica deve ser a


mesma. Considerando uma aceleração da gravidade de 10 m/s², podemos avaliar o
peso específico facilmente:

kg m N
= . g 3000
γ ρ= 10 =
2
= 30000 3
30
m³ s m
Agora, calculando a densidade da esfera A:

mA 9g g kg
d=
A = = 3
3= 3
3000 3
VA 3 cm cm m

Note que este resultado é igual à massa específica do material. Isto faz sentido pois
ela é maciça. Por outro lado, ao calcularmos a densidade da esfera B, veremos que,
apesar de ter massa e volume de material idênticos ao da esfera A, o fato dela ser oca
faz com que sua densidade seja menor:
mB 9g g kg
=dB = = 3
1,=
8 3 1800 3
VB ,total 5 cm cm m

Sabendo o que é viscosidade dinâmica/absoluta e a massa específica, podemos defi-


nir a chamada viscosidade cinemática ( n ), obtida pela razão entre a viscosidade
absoluta e a massa específica:

µ
ν=
ρ

No SI, sua unidade é m²/s. Existe também outra unidade utilizada com frequência, o
stoke (St), equivalente a cm²/s, sendo também frequentemente utilizado o centistoke
(cSt). Este é um parâmetro importante para a mecânica dos fluidos, sendo também
chamado de “difusividade de momento”.
Por fim, conhecidas estas propriedades, é importante definirmos dois conceitos
fundamentais para o restante de seu estudo:

UNIDADE 2 75
Fluido ideal: aquele cuja viscosidade é nula, sem
perdas de energia por atrito e sendo também in-
compressível. Naturalmente, não existem fluidos
ideais, mas às vezes este conceito é utilizado em
problemas de mecânica dos fluidos.
Escoamento incompressível: escoamento de
fluido, em que seu volume não varia ao modificar
a pressão. Em geral, os escoamentos podem ser
considerados incompressíveis, pois ou o fluido
é um líquido ou as velocidades em questão são
baixas.
Fonte: adaptado de Çengel e Cimbala (2015).

A seguir, abordaremos a técnica de análise dimen-


sional, importante para compreender as variáveis
e grandezas fisicamente. Demonstraremos o seu
uso com as propriedades que você acabou de es-
tudar neste tópico.

76 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Análise
Dimensional

Muitos casos da engenharia na vida real não são


viáveis de serem resolvidos de forma puramente
analítica, seja porque não conhecemos ou não
conseguimos resolver as equações ou, ainda, por-
que a quantidade de variáveis é muito grande. Por
isso, às vezes, a experimentação é o único méto-
do que permite produzir modelos matemáticos
capazes de descrever os fenômenos observados.
Contudo, experimentos exigem tempo e dinheiro,
sendo fundamental projetá-los de maneira en-
xuta, em que seus resultados são aproveitados de
forma eficiente. A análise dimensional surge para
alcançar esta eficiência, racionalizando a pesquisa
e reduzindo custos e tempo.

UNIDADE 2 77
Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo.
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Os três principais propósitos da análise dimensional são:


• Desenvolver modelos matemáticos capazes de descrever o fenômeno em estudo.
• Elaborar parâmetros adimensionais (sem dimensão) que facilitam a interpre-
tação de resultados experimentais e o design de experimentos.
• Prever semelhanças entre parâmetros e fenômenos.

O objetivo aqui não é desenvolver matematicamente as estratégias de análise dimen-


sional, mas fornecer formas de utilização prática deste assunto. Para isso, começaremos
com o conceito de equações dimensionais.

Equações Dimensionais

Na descrição de fenômenos físicos, encontramos diversos tipos de grandezas diferentes,


por exemplo: força, aceleração, velocidade, energia, tempo e espaço. Como você bem sabe,
cada uma destas grandezas é dada por dimensões e unidades diferentes. Contudo, ao ana-
lisá-las, podemos identificar que elas não são todas independentes entre si, uma vez que
estão relacionadas por leis físicas e definições. Assim, podemos reduzir este conjunto de
grandezas para apenas três grandezas independentes, a partir das quais podem ser obtidas
todas as outras, sendo chamadas de base completa da Mecânica.
Por exemplo, a grandeza “velocidade” nada mais é do que uma combinação das
grandezas “espaço” e “tempo”. Afinal, se um corpo percorre 20 metros (espaço) em 5
segundos (tempo), podemos dizer que ele está se movendo a 4 metros por segundo
(velocidade). Assim, a grandeza “velocidade” depende das grandezas independentes
“espaço” e “tempo”.
As grandezas utilizadas como independentes podem ser escolhidas conforme a conve-
niência, mas, em geral, costumam ser: força, comprimento e tempo (base FLT). Esta será
a base adotada ao longo deste material, mas fique atento, pois não é tão raro encontrar
materiais que utilizem a base MLT: massa, comprimento e tempo. As demais grandezas
que não fazem parte da sua base completa são denominadas grandezas derivadas.

78 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Estabelecidos estes conceitos, podemos então definir o que são as chamadas
equações dimensionais.

Equação dimensional: equação monômia (ou seja, de um único termo) que relaciona
uma grandeza derivada com a base completa.
Fonte: Brunetti (2008).

Agora, vamos explorar o uso da análise dimensional por meio das propriedades dos
fluidos que estudamos anteriormente.

3 EXEMPLO Escreva a equação dimensional da viscosidade cinemática na base FLT.

Solução:

Sabemos que a viscosidade cinemática é dada pela razão entre a viscosidade dinâmica
e a massa específica:

µ
ν=
ρ

É necessário, inicialmente, analisar as dimensões destas duas propriedades. A massa


específica, por definição, é a razão entre massa e volume:

m
r=
V

Note que estamos trabalhando com a base FLT: força, comprimento e tempo. Isso
significa que a massa é uma de suas grandezas derivadas e deve ser escrita em função
das grandezas fundamentais. A lei física que consegue expressar a massa nessa base
é a segunda lei de Newton:

F
F  m.a  m
a

UNIDADE 2 79
A força (F) é uma de nossas grandezas fundamentais. Portanto, ao analisar sua di-
mensão, temos que [F] = F. A aceleração (a), por outro lado, tem unidades de compri-
mento dividido por tempo ao quadrado, como m/s², por exemplo. Suas dimensões
são, portanto: [a] = L/T² = LT-2. Assim:

F [F ] F FT 2
m  [ m]   2
  FT 2 L1
a [a ] LT L

De forma semelhante, sabemos da geometria que volume (V) tem dimensões de


comprimento ao cubo, ou seja: [V] = L³. Combinando [m] e [V], temos para a massa
específica:
[m] FT 2 L1
[r ]   3
 FT 2 L4
[V ] L

Resta agora verificar as dimensões da viscosidade absoluta. Pela lei de Newton da


viscosidade, temos:

dv τ
τ µ  µ
dy dv
dy

Como definimos anteriormente, a tensão de cisalhamento é:

Ft
t=
A

A força tangencial (Ft) é, evidentemente, uma força, portanto, uma grandeza funda-
mental: [Ft] = F. Por sua vez, da geometria sabemos que a área (A) tem dimensões de
comprimento ao quadrado: [A] = L². Combinando-as, temos, então:

[ Ft ] F
[t ]   2  FL2
[ A] L

 
O gradiente de velocidade dv dy também pode ser analisado da mesma maneira:
são variações de velocidade (comprimento/tempo) por variações de posição (com-
primento). Assim:

 dv  [v] LT 1 1
 dy   [ y ]  L  T
 

80 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Portanto, as dimensões da viscosidade absoluta são:

[τ ] FL2
[µ ]   1
 FL2T
 dv  T
 dy 

Finalmente, combinando a viscosidade absoluta e a massa específica, podemos es-


crever a equação dimensional da viscosidade cinemática na base FLT, que é o que
desejamos:

[µ] FL2T
[ν ]   2 4
 F 0 L2T 1  L2T 1
[ρ ] FT L

O nome viscosidade “cinemática” é devido ao fato de suas dimensões não envolve-


rem força, apenas comprimento e tempo – as próprias grandezas fundamentais da
cinemática, suficientes para relacionar todas as grandezas derivadas deste campo
da física. Outros, como termodinâmica e eletromagnetismo, podem demandar mais
do que três grandezas fundamentais.

Números Adimensionais

No estudo dos fenômenos de transporte, é comum nos depararmos com alguns nú-
meros que, apesar de possuírem grande significado prático e físico, não apresentam
unidades. São os chamados números adimensionais, que independem de todas as
grandezas fundamentais e costumam ser indicados pela letra grega π.
Para melhor ilustrar como eles funcionam, vamos começar por um dos números
adimensionais mais fundamentais e conhecidos da mecânica dos fluidos: o número
de Reynolds (Re).
ρ.v. D v. D
=Re =
µ ν

Em que ρ é a massa específica do fluido, v é a velocidade do escoamento, D é o


diâmetro da tubulação, µ é a viscosidade absoluta do fluido e n (letra grega) é a
viscosidade cinemática.

UNIDADE 2 81
Façamos, inicialmente, a análise dimensional desta equação. Nos exemplos ante-
riores, verificamos que [r ]  FT 2 L4 e [  ]  FL2T . Além disso, v é uma velocidade
e D é um comprimento, então: [v]  LT 1 e [ D] = L . Combinando-os na forma do
número de Reynolds, teremos:

[ρ ] .[v] .[ D] FT 2 L4 . LT 1 . L
[Re]    2
 F 0T 0 L0
[µ ] FL T
Como todos os expoentes são iguais a zero, conclui-se que o número de Reynolds
independe das grandezas fundamentais força, comprimento e tempo. Assim, por
definição, é um número adimensional.
As utilidades do número de Reynolds serão mais bem discutidas nas unidades a
seguir, mas já vale mencionar de antemão que seu principal uso é na caracterização
de escoamentos de fluidos, como laminares ou turbulentos, sendo de grande impor-
tância tanto na mecânica dos fluidos quanto nos processos de transferência de calor
e massa. Dessa forma, o número de Reynolds demonstra que este comportamento
do escoamento depende de um conjunto de grandezas e não delas individualmente.
Afinal, de onde surgem os números adimensionais e como eles têm tamanha
significância? Neste material, você será poupado das raízes matemáticas rigorosas
e exaustivas que existem por trás destes números, como o chamado Teorema Pi de
Buckingham, utilizado na concepção de um número adimensional para um certo
fenômeno. Em vez disso, faremos uma apresentação qualitativa em que seja mais fácil
compreender o papel dos números adimensionais.
Brunetti (2008) sugere o seguinte exemplo: imagine que você deseja determinar
a força F de resistência ao avanço de uma esfera lisa mergulhada em um fluido. Tal
força costuma ser chamada de força de arrasto ou arraste.
Experimentalmente, observa-se que esta força é uma função de variáveis, como
o diâmetro ( D ) e a velocidade ( v ) da esfera, e a massa específica ( r ) e viscosidade
( µ ) do fluido. Isto é:

F = f ( D , v, ρ , µ )

v
D ρ, μ
F

Figura 6 - Representação do experimento para estudo da força de arraste


Fonte: adaptada de Brunetti (2008).

82 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Considere, agora, que você gostaria de testar, pelo menos, cinco valores distintos
para cada variável. Isto seria o equivalente a 625 pontos experimentais (D, v, ρ, m),
ou seja, por assim dizer, o experimento seria realizado 625 vezes. Da sua vivência
com disciplinas experimentais, você deve ter noção que isto demandaria um grande
tempo e possivelmente muitos recursos. Este número iria ainda mais longe se fossem
consideradas mais variáveis ou se tentássemos mais valores para cada uma.
Além disso, há ainda outro problema fundamental: como você faria a representação
gráfica de seus resultados? Se, por exemplo, inicialmente você optasse por fixar ρ e µ , você
poderia construir um diagrama FxD com diferentes curvas para as diferentes velocidades,
como representado na Figura 7.
F
vn v2
v1

ρ1, μ1
D
Figura 7 - Diagrama FxD para diferentes velocidades com massa específica e viscosidade constantes
Fonte: Brunetti (2008, p. 145).

Ainda seguindo nosso exemplo, observe quantos dos seus resultados seriam con-
templados por este diagrama:
• 1 valor de massa específica (r ) .
• 1 valor de viscosidade ( µ ) .
• 5 valores de diâmetro ( D) .
• 5 valores de velocidade (v) .

Isto é, um único diagrama destes contemplaria apenas 25 dos seus 625 resultados:
cinco curvas, uma para cada velocidade, cada uma com cinco pontos para cada um
dos diâmetros testados. Isto significa que seriam necessários 25 diagramas diferentes
para representar todos os resultados, basicamente formando uma matriz ρ (linhas)
x µ (colunas), em que cada elemento da matriz é um diagrama.

UNIDADE 2 83
F F
vn v2 vn v2
v1 v1
μ variável
ρ fixo
ρ1, μ1 ρ1, μ n
D D

ρ variável ρ variável
μ fixo μ fixo
F F
vn v2 vn v2
v1 v1
μ variável

ρ n , μ1 ρ fixo ρ n, μ n
D D
Figura 8 - Matriz de diagramas FxD para avaliação da força de arraste em diferentes diâmetros, velo-
cidades, massas específicas e viscosidades
Fonte: Brunetti (2008, p. 145).

Como se isto tudo já não fosse exaustivo o bastante, reflita acerca de duas últimas
perguntas: seria viável tentar identificar e descrever o comportamento desejado tendo
que observar e analisar 625 diagramas diferentes simultaneamente? Se o número de
variáveis ou de valores testados para cada uma fosse reduzido, visando simplificar o
experimento e a análise, será que os resultados seriam realmente bons e suficientes
para descrever um fenômeno físico rigorosamente?
Vamos verificar como os números adimensionais podem simplificar este experi-
mento. Considere os seguintes números:
F ρvD
= π1 = 2 2
e π2
ρv D µ

Note que π2 é justamente o número de Reynolds. Caso queira praticar, você pode
fazer a análise dimensional de π1 para verificar se ele é mesmo adimensional. O im-
portante neste momento é que você perceba que p1 e p2 , juntos, contemplam as
quatro variáveis em estudo ( D, v, ρ, µ) .
Agora, voltemos para o experimento. Se utilizarmos uma única esfera de diâme-
tro D e um único fluido de massa específica r e viscosidade µ , pode-se variar a

84 Introdução à Mecânica dos Fluidos


velocidade v e medir a força F . Isto é, teremos pares ( F , v) para um trio ( D, ρ , µ)
fixo. Note que, se você conhece todos estes cinco valores em cada ponto experimen-
tal, você pode também avaliar p1 e p2 em cada um destes pontos. Assim, você po-
deria organizar a seguinte tabela:
Tabela 1 - Resultados para o experimento da força de arraste variando a velocidade

Ponto F v D ρ  π1 π2

µ
F1 ρv1 D
1 F1 v1 D r π1,1 = π2,1 =
2
ρv D12 µ

µ
F2 ρv2 D
2 F2 v2 D r π1,2 = π2,2 =
2
ρv D22 µ

µ
F3 ρv3 D
3 F3 v3 D r π1,3 = π2,3 =
2
ρv D32 µ

µ
F4 ρv4 D
4 F4 v4 D r π1,4 = π2,4 =
2
ρv D42 µ
F5 ρv5 D
5 F5 v5 D r µ π1,5 = 2
π2,5 =
ρv D52 µ
Fonte: os autores.

Além disso, ambos os números adimensionais contêm a velocidade, que é o parâmetro


que foi variado. Assim, é possível afirmar que para cada π1 existe um π2 correspon-
dente, sendo possível construir o diagrama π1 x π2:

π1 = F
ρv²D²

(80; 1,6)
1,6
(200; 0,5)
0,5 ρvD
π2 =
80 200 µ
Figura 9 - Diagrama hipotético π1 x π2
Fonte: os autores.

Agora, é importante que você compreenda a seguinte afirmação: os pontos desta


curva dependem do conjunto (ρ , v, D, µ, F ) e não de seus valores individuais. Isto
significa que o experimento foi genérico, e os resultados são válidos para outras

UNIDADE 2 85
esferas de diâmetros diferentes ou outros fluidos com massas específicas e viscosi-
dades diferentes. Por exemplo, o ponto (200; 0,5), na Figura 9, é válido para qualquer
conjunto (ρ , v, D, µ, F ) , desde que:

F ρvD
=π1 = 0, 5 e =
π2 = 200
ρv 2 D 2 µ

Dessa forma, a curva contempla todas as infinitas combinações de valores das cin-
co variáveis, sendo capaz de descrever o fenômeno em estudo com versatilidade e
economizando tempo e recursos. Diagramas como este são chamados de diagramas
universais do fenômeno. Vamos fixar esta ideia por meio de um exemplo quantitativo.

4 EXEMPLO Você possui um óleo cuja massa específica é 930 kg/m³ e a viscosidade dinâmica é de
5,81x10-2 N.s/m². Se uma esfera de 1 centímetro de diâmetro se desloca neste fluido
à velocidade de 0,5 m/s, qual a força de arrasto sobre ela? Considere o diagrama
hipotético da Figura 9.

Solução:

Os parâmetros que conhecemos são suficientes para calcular o número adimensional


π2:
kg m
930 3 . 0, 5 . 0, 01 m
ρvD m s
π2    80
µ 2 N . s
5, 81.10
m2
Pelo diagrama da Figura 9, quando π2 = 80, temos que π1 = 1,6. Assim, é possível
calcular F:

2
F kg  m 2
π1   F  π1. ρv2 D2  1, 6 . 930 .  0, 5  .  0, 01 m   3, 72 . 102 N
ρv 2 D 2 m³  s

Como você deve ter notado, os números adimensionais podem facilitar bastante o
estudo de leis e fenômenos físicos. Assim como o número de Reynolds, alguns núme-
ros que aparecem com certa frequência nos fenômenos de transporte recebem nomes
próprios, como os números de Mach, Euler, Fourier, Biot, Nusselt, Prandtl, Schmidt,
Sherwood e muitos outros. Uma vez que este material é de natureza introdutória, eles
não serão todos abordados, mas caso você procure conhecê-los, certamente sua visão
analítica acerca dos fenômenos de transporte ficará mais aguçada.

86 Introdução à Mecânica dos Fluidos


Você pode utilizar seu diário de bordo para a resolução.

1. Duas placas planas paralelas estão posicionadas a uma distância ε = 3 mm. O


espaço entre elas é preenchido com um óleo de viscosidade cinemática de ν =
0,2 St e massa específica ρ = 850 kg/m³. A placa inferior fica imóvel, enquanto
a placa superior passa a se mover horizontalmente com velocidade v0 = 3 m/s.
Qual a tensão de cisalhamento agindo sobre o óleo?

v0 = 3 m/s

3 mm

2. Uma película de óleo de 2,5 mm foi colocada sobre uma superfície plana inclinada
em 45°. Em seguida, uma placa quadrada, com peso de 30 N e 1 metro de lado,
foi colocada para deslizar sobre este plano. Observou-se que, ao longo de sua
descida, a placa atingiu a velocidade de 4,2 m/s, que se manteve constante até
o final do deslocamento. Qual a viscosidade dinâmica do óleo?

2,5 mm

4,2 m/s 30 N

45°

87
3. Sendo a pressão (p) em um ponto qualquer de um líquido em repouso dada
pela equação:

p =r.g .h

Em que ρ é a massa específica, g é a aceleração da gravidade e h é a profundidade


do ponto em relação à superfície livre do líquido. Escreva a equação dimensional
da pressão na base FLT.

4. Deseja-se determinar a viscosidade cinemática do metanol a 20 °C. Sabe-se que,


nesta temperatura, a massa específica deste fluido é de 788,4 kg/m³. Experimen-
talmente, você observou que, quando uma esfera de 1 centímetro de diâmetro
se desloca no metanol à velocidade de 1,49x10-2 m/s, a força de arrasto sobre a
esfera era de 8,75x10-6 N. Dessa forma, qual a viscosidade cinemática do meta-
nol? Considere, de maneira hipotética, que o diagrama da Figura 9 seja válido.

88
LIVRO

Mecânica dos Fluidos


Autor: Franco Brunetti
Editora: Pearson Prentice Hall
Sinopse: livro que se destaca por tratar a mecânica dos fluidos de maneira
bastante didática e prática, por vezes evitando explorar as raízes matemáticas
dos conceitos em prol de desenvolver no leitor a habilidade de usá-los. O con-
teúdo é organizado de maneira que o aluno se acostume mais facilmente com
a disciplina, em grau crescente de dificuldade e realismo.
Comentário: este livro é uma das principais referências utilizadas neste material.
Nesta unidade, tratamos de forma compacta e introdutória os conteúdos dos
capítulos 1 e 6. De forma semelhante, as unidades futuras contemplarão também
os conteúdos dos capítulos 2 e 7. Recomenda-se que o aluno, futuramente, faça
a leitura do capítulo 8, que trata de instrumentação para medidas das proprie-
dades dos fluidos e escoamentos, mas que, para uma boa compreensão, exige
alguns conceitos que ainda serão estudados nas próximas unidades.

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BRUNETTI, F. Mecânica dos Fluidos. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008.

ÇENGEL, Y. A.; CIMBALA, J. M. Mecânica dos fluidos: fundamentos e aplicações. 3. ed. Brasil: AMGH Edi-
tora, 2015.

WELTY, J. R.; RORRER, G. L.; FOSTER, D. G. Fundamentos de Transferência de Momento, de Calor e de


Massa. 6. ed. São Paulo: Editora LTC – GEN (Grupo Editorial Nacional), 2017.

REFERÊNCIAS ON-LINE

¹Em: https://www.britannica.com/biography/Isaac-Newton. Acesso em: 02 out. 2019.

²Em: https://blog.texaco.com.br/havoline/viscosidade-do-oleo/. Acesso em: 02 out. 2019.

90
1. O problema pode ser resolvido utilizando a lei de Newton da viscosidade:

τ dv
 cte.  τ µ
dv dy
dy
Por conveniência, como a distância ε é relativamente pequena, é razoável considerar um gradiente de velocidade
linear, conforme indicado na figura. Neste caso, podemos simplificar a expressão para a forma:

v0
τ =µ
ε
Para utilizar esta equação, precisamos da viscosidade dinâmica do óleo, que pode ser calculada a partir da
viscosidade cinemática e da massa específica, que foram fornecidas. Convertendo em unidades do SI:

1 cm² / s 104 m2 m2
n  0, 2 St  2 . 105
1 St 1 cm² s

Calculando a viscosidade dinâmica:

µ
ν  µ  ρ .ν
ρ
kg 5 m2 kg N .s
µ  850 . 2 . 10  1, 7 . 102  1, 7 . 102 2
m3 s m.s m

Então, a tensão de cisalhamento pode ser encontrada:

 N . s  3 m / s 
t   1, 7 . 102 2 
 m  3 . 103 m  
t  17 N / m2

91
2. A viscosidade dinâmica pode ser encontrada por meio da avaliação da tensão de cisalhamento que atua
sobre a placa. O primeiro passo é realizar o balanço de forças, decompondo a força peso (P) em uma com-
ponente normal (Pn) e uma tangente (Pt) à superfície inclinada, e indicando a força que impõe resistência
ao movimento da placa (Ft):

Ft

Pn
P

45° Pt

Se a velocidade da placa estava constante, significa que a aceleração na direção do deslocamento era nula.
Portanto, pela segunda lei de Newton (F = m.a), a força resultante (FR) nessa direção também será nula, ou seja:

FR  Pt  Ft  0
Pt  Ft

Como conhecemos G, a geometria nos possibilita determinar Gt, pois o ângulo interno  deve ser justamente
a inclinação da superfície, 45°:

Pt
sen q 
P
Pt  P . sen q
Pt  (30 N ) . sen 45  Pt  21, 21 N
Portanto:

Pt  Ft  Ft  21, 21 N

Agora, pela definição de tensão de cisalhamento ( t ), temos:

Ft
t=
A

92
Observe que a força Ft está atuando sobre toda a superfície inferior da placa, a qual está em contato com a
película de óleo. Dessa forma, como é uma placa quadrada de um metro de lado, a área em questão será:

A= l 2= (1 m)2 = 1 m2

Como conhecemos Ft e A, podemos determinar t:

Ft 21, 21 N N
=
t = 2
= 21, 21 2
A 1m m
Em posse deste valor, podemos alcançar o objetivo da questão utilizando a lei de Newton da viscosidade:

dv
τ =µ
dy

Precisamos, agora, determinar, de alguma maneira, o gradiente de velocidades. Note que a distância da placa
à superfície (ε) é justamente a espessura da película: 2,5 mm. Por ser uma espessura pequena (afinal, é uma
película), é razoável considerar um gradiente de velocidades linear. Assim:

dv dy ε
τ µ  µ  τ.  τ.
dy dv v0

 N   2, 5 . 10 3 m 
   21, 21 2  .  
 m   4, 2 m / s 
N .s
  1, 26 . 10 2
m2
3. Nos Exemplos 3 e 4 desta unidade, já foi demonstrado que as dimensões da massa específica na base FLT
são:

[m] FT 2 L1
[r ]   3
 FT 2 L4
[V ] L
Além disso, sabemos que g é a aceleração da gravidade e, portanto, possui dimensões de comprimento por
tempo ao quadrado, como apresentado no Exemplo 4:

L
[g]  2
 LT 2
T

93
A última variável que resta, h, representa a profundidade do ponto. Logo, sua dimensão deve ser unicamente
de comprimento:

[ h] = L

Com estes três parâmetros, podemos fazer a análise dimensional da pressão conforme a equação enunciada:

[ p ]  [r ] .[ g ] .[h]  FT 2 L4 . LT 2 . L  FL2

De fato, este resultado faz sentido, pois significa “força por unidade de área”, sendo compatível com unidades
típicas de pressão como N/m² (ou Pa).

4. Conhecemos a massa específica (ρ) do metanol, o diâmetro (D) da esfera utilizada, a velocidade (v) e a força
de arrasto (F) observadas no experimento. Considerando válido o diagrama hipotético da Figura 9, dois
números adimensionais são importantes:
F ρvD
=π1 = 2 2
e π2
ρv D µ

As informações que possuímos são suficientes para avaliar π1:

F 8, 75.106 N
π1    0, 50
ρv 2 D 2 2
kg  m
 
2
788, 4 3 .  1, 49.102  . 102 m
m  s
Pela Figura 9, temos que quando π1 = 0,5, π2 = 200. Conhecendo este valor, é possível utilizar a equação de π2
para determinar a viscosidade absoluta do metanol:

kg m
788, 4 . 1, 49.102 . 0, 01 m
ρvD ρvD m 3 s kg
π2   µ   5, 87.104
µ π2 200 m.s

kg 1N N .s
µ  5, 87.104  5, 87.104 
m . s 1 kg . m m
2
s
Cuidado, o exercício ainda não acabou! Foi solicitada a viscosidade cinemática e não a absoluta (dinâmica).
Assim, para concluir a questão, basta dividir este último resultado pela massa específica:

N .s
5, 87.104 2
ν
µ
 m2  7, 45.107 m
ρ kg s
788, 4 3
m

94
95
96

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